FRATERNO SEMPRE ATUAL, COM O MELHOR DO CONTEÚDO ESPÍRITA A n o
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Entrevista Ana Ariel
Nascida em berço espírita, a ativista do movimento pela defesa da vida “Brasil sem aborto” conta como se envolveu com a luta pela valorização da vida e o acolhimento de mulheres grávidas. Ana Ariel não titubeia, quando sente uma gestante vacilar: “Se você não quiser ter seu filho, não aborte. Dê ele para mim.” Leia nas páginas 4 e 5.
A importância do investimento na educação no espírito
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crise financeira que se abate sobre os brasileiros, com altos índices de desemprego e consequente perda de renda nas famílias, também se reflete nas entidades espíritas, que estão vivendo momentos desafiadores, diante da escassez de verbas, com a retração de investidores, associados e colaboradores habituais. Instituições que há décadas mantinham-se plenamente ativas, hoje se perguntam o que fazer para continuarem com os projetos. A jornalista e educadora Dora Incontri, através da Associação Brasileira de Pedagogia Espírita, reacende a questão da importância do investimento na educação do espírito, um processo histórico que remonta às ideias reencarnacionistas de Sócrates e Platão, passando por uma linha de educadores comprometidos com a liberdade e o amor. Com Kardec e seus continuadores, o espiritismo surge como síntese desse longo projeto educacional, baseado na fé raciocinada, uma grande transformação que marca uma nova era na vida da Humanidade. Leia nas páginas 8 e 9.
Heloísa Pires e os sonhos de liberdade O mundo atual nos faz refletir como a escravidão ainda existe, disfarçada, mas impedindo à maioria dos indivíduos desenvolver suas potencialidades. Alguns são escravos de impulsos inferiores, outros escravos do extrato bancário, outros, ainda, escravos do corpo, esquecendo-se da finalidade primeira desse instrumento: ajudar o espírito a realizar os seus sonhos de liberdade. Leia mais na página 11.
Os fantasmas e suas aparições Na Inglaterra, no final do século 19, a questão dos fantasmas e da mediunidade estava presente nas revistas e na sociedade. William Crookes e outros autores famosos tentam apresentar para as sociedades científicas o que chamavam de espiritualismo moderno. Mas a Sociedade de Pesquisas Psíquicas rebate, dando outra versão para os fenômenos espirituais que pipocavam na Europa. Leia na página 13.
Carmem de Sevilha Nada é o fim. A vida sempre se renova. www.correiofraterno.com.br
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eDItoRIAl
Amor, união e
Uma ética para a imprensa escrita
futuro
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echávamos esta edição quando assistimos à abertura dos jogos olímpicos no Brasil, no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro. Vendo as diversas delegações que ali desfilavam, tínhamos uma ideia da diversidade que o planeta abriga, demonstrando o quanto o egoísmo e o personalismo podem abafar uma realidade tão convidativa ao amor, à solidariedade, à união entre os povos. O sentimento de gratidão por estar vivo, fazendo parte dessa morada, ainda de provas e expiações, sim, mas que já apresenta em seus momentos de festa como seria conviver sempre com esses bons sentimentos de fé, esperança, nos
conscientiza ainda mais da necessidade de nos educarmos para o Bem e no Bem. Propostas de educação podem ser diversificadas, mas só um objetivo maior pode reuni-las em favor do progresso moral da humanidade: a pedagogia do amor. Esse mesmo amor a que nos alertaram tantos educadores, cujo maior representante é Jesus. É assim também a pedagogia espírita, matéria de capa desta edição. Uma proposta libertadora, de mergulho nos sentimentos mais escondidos, que – assim como a abertura da Olimpíada – nos convida à reflexão, à mudança, a um olhar horizontal que nos faça compreender o outro, compartilhar experiências e deixar marcas para a história futura.
em dois artigos, escritos por Allan Kardec e publicados na Revista Espírita, em 1858, estão encerradas as diretrizes que o Correio Fraterno adota como norte para o trabalho de divulgação: • A apreciação razoável dos fatos, e de suas consequências.
Assim como aos atletas, coube semear o verde, a paz, a consciência de quão lindo é esse planeta e precisa ser preservado, a nós, pela educação espírita, universal também em seus propósitos, cabe também cuidar da nossa semente. Da fé e do amor, da esperança que educa e renova o espírito imortal, fazendo-o transcender e entender sua comunhão com a Criação. A mesma que nos abriga, nos aguarda e nos inclui a cada desafio, a cada passo, a cada conquista. Boa leitura!
Olá, Fátima. É verdade. Mas Allan Kardec se adianta ao fato, abordando essa questão já na Revista Espírita (dezembro, 1868) lembrando que ela tem uma razão de ser, por não haver duas palavras para exprimir duas ideias diferentes, porque a palavra religião, na opinião geral, é inseparável da ideia de culto; por despertar exclusivamente uma ideia de forma, que o espiritismo não tem.
Mas Kardec foge à mera discussão estéril, quando complementa: “No sentido filosófico, o espiritismo é uma religião, e nós nos vangloriamos por isto, porque é a doutrina que funda os vínculos da fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples convenção, mas sobre bases mais sólidas: as próprias leis da Natureza”. Obrigado pela participação! Equipe Correio.
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FRATERNO ISSN 2176-2104 Editora Espírita Correio Fraterno cnPJ 48.128.664/0001-67 Inscr. estadual: 635.088.381.118
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• Discussão, porém não disputa. As inconveniências de linguagem jamais tiveram boas razões aos olhos de pessoas sensatas. • A história da doutrina espírita, de alguma forma, é a do espírito humano. o estudo dessas fontes nos fornecerá uma mina inesgotável de observações, sobre fatos gerais pouco conhecidos. • os princípios da doutrina são os decorrentes do próprio ensinamento dos espíritos. não será, então, uma teoria pessoal que exporemos. • não responderemos aos ataques dirigidos contra o espiritismo, contra seus partidários e mesmo contra nós. Aliás, nos absteremos das polêmicas que podem degenerar em personalismo. Discutiremos os princípios que professamos.
CORREIO DO CORREIO Espiritismo religião A questão se o espiritismo é ou não religião sempre é lembrada. (“O aspecto religioso do espiritismo”, edição 469). Mas o mais importante é se saber se com ele estamos conseguindo nos transformar em pessoas melhores. Um abraço. Fátima Antunes, Diadema, SP.
• Acolhimento de todas observações a nós endereçadas, levantando dúvidas e esclarecendo pontos obscuros.
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• confessaremos nossa insuficiência sobre todos os pontos aos quais não nos for possível responder. longe de repelir as objeções e as perguntas, nós as solicitamos. Serão um meio de esclarecimento. • Se emitirmos nosso ponto de vista, isso não é senão uma opinião individual que não pretenderemos impor a ninguém. nós a entregaremos à discussão e estaremos prontos para renunciá-la, se nosso erro for demonstrado. esta publicação tem como finalidade oferecer um meio de comunicação a todos que se interessam por essas questões. e ligar, por um laço comum, os que compreendem a doutrina espírita sob seu verdadeiro ponto de vista moral: a prática do bem e a caridade do evangelho para com todos.
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Acontece Pesquisadores reunidos em 2015: mais de uma década de encontros
Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo
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contece nos dias 27 e 28 de agosto, na sede da USE Estadual de São Paulo, o 12º Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo. O evento já se consolidou no calendário anual, tanto para os pesquisadores que têm oportunidade de apresentar os seus estudos, antes submetidos e aprovados pela comissão organizadora, como para o público que se identifica com essa oportunidade rara no meio espírita, que valoriza o olhar da ciência sobre as temáticas espíritas. O evento é aberto ao público, mas requer inscrição. O tema central este ano será Mediunidade: Pesquisa e história. Local: USE, Rua Gabriel Piza, 433 Santana – São Paulo, SP. www.lihpe.net
Alguns trabalhos a serem apresentados: • As investigações dos fenômenos psíquicos/espirituais no século XIX – por Marcelo Gulão Pimentel. • Psicofonia, história oral e fontes históricas – por Adolfo de Mendonça Junior. • Entrevista com o médium Fernando Bem – por Marco Milani. • As pesquisas sobre mediunidade realizadas pelo Instituto Windbridge – por Jáder Sampaio. • Os fundamentos biopsicológicos da mediunidade: revisão da literatura e sugestões de pesquisas futuras – por Adilson Assis. • A comunicação com os espíritos e sua crença na sociedade brasileira: análise de diferentes grupos religiosos – por Tiago Paz e Albuquerque. • A mediunidade alegada por muitas pessoas é evidência de uma relação mente-corpo alternativa? – por Antônio Marcos de Oliveira.
Setembro Amarelo. A prevenção do suicídio
O Apresentação musical
TIM e VANESSA “CÂNTARO” Dias: 17 de setembro às 20h (sábado) 18 de setembro às 19h (domingo)
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o lançamento do novo projeto, “CÂNTAROS”, Tim e Vanessa fazem um resgate de canções consagradas dos primeiros CDs e somam as mais recentes composições, para construir junto ao público um ambiente de sensibilização e harmonia. As canções são interpretadas com graça e simplicidade por Vanessa, oferecendo a sua doce voz ao longo dos anos para vá-
rios projetos artísticos. A dupla é voluntária neste trabalho musical, não recebendo cachês pelas apresentações, e revertendo todos os recursos obtidos com a venda dos CDs/DVDs para obras sociais e para a produção de novos trabalhos. Local: Teatro Sesiminas: Rua Padre Marinho, 60 – Santa Efigênia – Belo Horizonte – MG Informações: Victor Hugo: (31) 99745-5656 Ingressos: www.timevanessa.com.br
Centro de Valorização da Vida (CVV) está organizando, pelo sexto ano consecutivo, o Simpósio Internacional de Prevenção do Suicídio. Depois de passar por Guarulhos, São Paulo, Florianópolis, Rio de Janeiro e Brasília, o evento será realizado em Fortaleza, no dia 8 de setembro, das 19 às 21 horas, no Hotel Recanto Uirapuru (Bairro Castelão). No dia anterior, haverá a terceira edição de um debate sobre “A dificuldade da abordagem do suicídio pela mídia”, com a participação de jornalistas e blogueiros. No ano passado, representantes da editora Correio Fraterno realizaram durante o Simpósio a entrega dos direitos autorais do livro Viver é a melhor opção: a prevenção do suicídio no Brasil e no mundo, para o CVV. Eles foram destinados pelo autor, o jornalista André Trigueiro, que há anos se mobiliza pela causa. Suicídio O suicídio mata um brasileiro a cada
45 minutos e uma pessoa a cada 40 segundos em todo o mundo. Pelo menos o triplo disso tentou tirar a própria vida no mesmo período. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 90% dos casos podem ser prevenidos e a quebra dos tabus é o primeiro passo para isso. www.correiofraterno.com.br
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“Não aborte. Dê seu filho para mim” Por elIAnA HADDAD
Ana Ariel com as crianças atendidas pela Associação Amigos da Criança, em Campinas.
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ascida em berço espírita, a atriz e cantora Ana Ariel é ativista do movimento pela defesa da vida “Brasil sem aborto”. Mãe de três filhos, dois deles (Antonio, 13 anos, e João Paulo, 6 anos) são crianças que poderiam ter sido abortadas. Antonio foi adotado por Ana em função de uma palestra em que disse: “não aborte, tenha o seu filho que eu crio”. Uma gestante que a assistia não teve dúvidas: logo após o parto, solicitou ao hospital que a procurasse. e ela lhe entregou o bebê. Já João Paulo sobreviveu a uma gravidez de alto risco, que não deveria passar do quarto mês. Ana encarou o desafio e determinou que iria levar a gestação adiante, absolutamente em repouso. o menino nasceu prematuro, de seis meses, e Ana continuou firme e forte. com duas experiências bem marcantes de maternidade, ela afirma que tanto as palestras que profere sobre valorização da vida como a direção da SoS Afeto, que criou para acolher mulheres grávidas, são resultados da decisão que teve de proteger e preservar a vida.
Como e quando você iniciou o seu projeto pessoal de defesa da vida? Ana: Comecei a fazer palestras sobre o tema aos 13 anos. Assisti no colégio ao filme O grito silencioso (The Silent Scream, documentário estadunidense de 1984 dirigido por Bernard Nathanson), um vídeo do Movimento Pró-Vida, que trata do aborto e suas consequências, mostrando a dor de um feto. Tive ali a certeza de que o aborto não era algo indiferente ao meu espírito. Mesmo jovem, inexperiente sobre os assuntos da sexualidade e das causas e consequências do aborto, daquele dia em www.correiofraterno.com.br
diante nada mais foi igual. Demorei muito para entender que não deveria falar contra o aborto, mas sim em defesa da vida. Como foi assumir-se como mãe, aos 21 anos, de uma criança que poderia ter sido abortada? Tive muito apoio. Minha mãe é fundadora da AMIC - Associação dos Amigos da Criança, em Campinas, SP. Temos um trabalho social intenso. A instituição, que já tem 25 anos, recebe subsídios para recolher a mãe e a criança, até que essa mulher se firme e encontre um familiar, alguém
que esteja apto a recebê-los. Lá percebemos que não é que as mães não queiram ter seus filhos. Elas não têm suporte e, desesperadas, preferem abortar. No departamento SOS Afeto, sou responsável por socorrer a gestante nesse momento difícil. Muitas não têm parentes próximos, outras foram violentadas e, já se sentindo agredidas, não querem cometer outra violência, abortando o bebê. A ideia é recolher com carinho e orientar essas mães, gestantes. Isso é prevenção, valorização da vida. Quantas mães já passaram pela SOS Afeto? Não sabemos o número de quantas mulheres já foram acolhidas, mas temos o número de crianças que estão vivas. São 183 crianças que não sofreram o aborto, tornando-se cidadãs do mundo, com o direito assegurado de poder escolher, falar, fora do ventre materno. E a justificativa de que a mulher é dona de seu corpo e que só a ela cabe decidir sobre o que fazer com ele? Faço parte também de um grupo bem bonito, o Grupo Materno, que protege
a gestante e defende a humanização do parto. Acho essa questão do corpo bem complexa. Porque ao mesmo tempo em que acredito e defendo o empoderamento feminino para decidir, cuidar e gestar seu filho, não consigo entender como isso pode estar relacionado à autorização para assumir uma morte. A vida do outro não me pertence, seja extra ou intrauterina. Você não acha injusto colocarmos essa responsabilidade apenas na mulher, tirando a responsabilidade de uma estrutura, uma sociedade para receber e respeitar esse novo cidadão? Há mais de 20 anos palestrando sobre o assunto, o que vejo é que nenhuma mulher que tem apoio deseja abortar. Apoio de um marido, um namorado, um pai, uma mãe, ou uma instituição que diga: eu estou com você, se você não quer criar esse filho, tenha essa criança, que te acompanhamos e encaminhamos esse bebê para adoção. Dessas mulheres que já socorremos, muitas não querem mesmo ver a criança, mas elas deram a ela a chance de ela viver. E muitas criam vínculo. Por isso no primeiro ano de vida oferecemos todos os subsídios para que ela fique com seu filho, enxoval, vaga garantida na creche etc. Muitas acabam até mesmo tornando-se funcionárias. Como você vê as políticas públicas para isso? Tenho uma amiga muito querida, advogada, a favor do aborto, que diz que, em política pública, tudo é uma questão de dinheiro, de quanto se investe. Você pode investir para legalizar o aborto – um procedimento intrauterino que vai levar cerca de 30 minutos – ou em uma gestação inteira, com acompanhamento de dois anos, como fazemos. Quanto custa para o governo um aborto e quanto custa uma vida? Por que na sua opinião a vida é tão malbaratada? Quando falamos de políticas públicas, temos que olhar as mulheres em situação de rua, em situação de violência. Quanto se destina financeiramente para esse grupo? Nada. O subsídio é muito pequeno. A Delegacia da mulher tem poucos recursos. Eu entendo quando dizem que vão legalizar o aborto no sentido de proteger essa mulher. Agora, se ela pudesse ser
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protegida, com um pré-natal financiado, uma moradia estruturada, será que desejaria abortar? E no Brasil inteiro há mulheres abortando todos os dias. Quais as marcas que você percebeu nas mulheres que abortaram? Está na estatística. Mais de 75% das mulheres entram em estado de culpa, depressão profunda, pensam ou cometem suicídio. A consequência psicológica é gravíssima. O aborto causa também para o útero uma série de sequelas, como ruptura uterina, doenças por causa da clandestinidade, curetagem pós-aborto, placenta prévia etc. Na SOS Afeto vemos muitas mulheres que quiseram abortar, porque estavam no terceiro ano de medicina, porque não era o momento na vida que achavam adequado, e não geraram nunca mais. Hoje estão na fila de adoção, tentando ter uma vida de maternidade. Penso que tem a nossa hora e a hora que o universo manda. Como vocês tratam o aspecto religioso? É difícil falar de religião lá. A fé, para mim, seria a raciocinada, da doutrina espírita, da minha programação no meu processo reencarnatório. Para o evangélico, o católico, para o cristão, enfim, filho é um presente de Deus. E para quem é ateu, como argumentar? O argumento é o direito à vida, advogar por essa criança. Se você perguntar ao meu filho que tem 13 anos hoje: você queria ser abortado? E para o de 5, você gostaria de ter sido abortado? Eu que fiquei de repouso absoluto 78 dias, no hospital, podendo morrer no parto, tendo que fazer transfusão, com riscos de uma histerectomia na cesárea... Decidir pela vida deles? Isso é incabível, mesmo sabendo que poderão ou não voltar um dia através da reencarnação. Qual o papel da doutrina espírita dentro desse contexto do aborto? Influência total. A gente entende que nenhuma reencarnação ocorre fora de hora. E aqui não estou falando de questão biológica, mas de questão espiritual. Allan Kardec é muito claro na pergunta de O livro dos espíritos em que, se a mulher sofre risco, salve-se a mulher e não a criança. Mas eu pensava: “hoje tem tantos recursos na medicina para cuidar da mãe
e do bebê e uma gravidez não pode ser descartada por isso... Pensava: “Posso até ficar sem útero, mas quero ficar com meu filho.” Encarnação é isso: desafios para serem superados e, assim, progredirmos.
ter uma vida cheia de amor. Há casos, também, que conforme a gravidez vai passando, a gestante vai se familiarizando com a ideia, com os movimentos do bebê e acaba não se arrependendo de ter ficado com a criança.
E no caso do estupro? Temos na instituição crianças sobreviventes de estupro e que a mãe levou a gestação até o final e o que vejo é que eles são os melhores filhos, mais amorosos, os mais queridos. Também temos crianças cujas mães não optaram pelo aborto porque não queriam ser causadoras de outra violência. E não digo crime com relação ao direito penal, digo em relação à lei divina: o meu direito sobre outra vida. Eu sou contra. Acho que a mulher tem que deixar seguir a gestação até o final. Já vi mães, também, que estupradas, não querem nem ouvir falar no bebê. Mas, depois, na vara de infância, alguém pode estar de mala pronta esperando por ele, para
O que está em risco hoje? A legalização do aborto, o que é lamentável. Sei que há muito desrespeito à mulher, clínicas clandestinas, sem o mínimo de higiene. É desumano o que as mulheres passam, os remédios que tomam, com sérios riscos, inclusive para o bebê, quando não conseguem efetivar o aborto. Apesar de tudo disso, porém, continuo contra a legalização do aborto no Brasil. Não se pode querer consertar um erro com outro. O aborto compromete o Brasil como “Pátria do Evangelho”. É compactuar com algo criminoso, contra o direito à vida. Quando perdermos essa força, será mais uma batalha. Penso também que
Filha do estupro, não. Filha de Deus O Seminário Internacional em Defesa da Vida, realizado em 12 de julho, em Brasília, em comemoração aos dez anos do Movimento Brasil sem Aborto, contou com a participação da conferencista Rebecca Kiessling, dos Estados Unidos. Aos 47 anos, advogada, mãe de cinco filhos (dois adotados), Rebecca é ativista pró-vida com várias frentes de trabalho, dentre os quais a fundação do Hope After Rape, entidade que apoia e protege mães e filhos sobreviventes de estupro. Sua história de vida está contada no filme The gift of life (TV Movie 1982). “Fui concebida quando a minha mãe biológica foi sequestrada e ameaçada com uma faca por um estuprador. Quando nos conhecemos, eu já tinha 19 anos”, conta a ativista, registrando a sua gratidão pelos legisladores e ativistas pró-vida e esclarecendo que só não foi abortada porque o aborto ainda era ilegal em Michigan, o que dificultou a ação clandestina. Rebecca foi adotada por uma família judia. Mais tarde descobriu sua verdadeira história. Tornou-se cristã, o que mudou a sua forma de ver a vida. “Quero ensinar aos meus filhos, ao mundo, que o valor das pessoas não está nas circunstâncias de sua concepção, de seus pais, sua aparência, os seus sucessos ou fracassos, suas habilidades ou deficiência. Entendi que fui criada com um propósito, à imagem e semelhança de Deus. E
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as clínicas de aborto, legais ou clandestinas, deveriam ter um vídeo esclarecedor, conscientizando sobre o que ocorre com o feto e os riscos para a mulher, que incluem altos índices de consequências emocionais e fisiológicas: depressão, culpa, medos, esterilidade, etc. É preciso dar chance à mulher para saber a que está se submetendo. O que você diria à mulher que, nesse momento, esteja pensando em abortar seu bebê? Se você não quiser ter seu filho, não aborte, dê ele para mim. A AMIC tem muitas mães como eu que têm muito amor e coragem para criar seu filho. Se você estiver pensando nisso nesse momento, entre em contato comigo, envie um email, me ligue, porque tenho certeza de que a gente vai cuidar do seu bebê. (contato@anaariel.com.br www.facebook.com/anaariel.cantora)
Rebecca Kiessling, conferencista internacional em defesa da vida
sei que a própria Bíblia diz que mesmo que os pais abandonem seus filhos, Deus nunca os abandonará. Isso me trouxe grande consolo, esperança, uma identidade, não como filha de um estupro, mas uma criança de Deus.” Em entrevista exclusiva ao Correio Fraterno, em São Paulo, a ativista lembrou que onde a indústria da pornografia com conexão com negócios de exploração sexual é mais desenvolvida, maiores são os índices de violências sexuais. “Estudos mostram que quanto mais cedo o homem é exposto à pornografia, maior é a sua desconexão para conseguir se relacionar de uma maneira saudável. Muitas crianças estão crescendo ao lado de um pai agressivo, que também não respeita suas mães. Como há famílias destruídas! Muitos, homens e mulheres, ainda desconhecem o que é uma relação saudável.” www.correiofraterno.com.br
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coISAS De lAURInHA
Por tAtIAnA BenIteS
Batidas na porta L
aurinha conversa com seu pai: –Você sabia que os espíritos começaram a se comunicar por batidas na parede? Isso deve fazer muuuuito tempo! – Sim, sabia. onde você aprendeu isso? – Aprendi na aula de evangelização infantil. – Muito bom, você saber disso. – Agora eu sei que eles batiam na parede para as irmãs Fox ouvirem. e elas eram muito novinhas. Você sabia? – Sim, essa história é muito interessante... laurinha queria contar tudo o que sabia e interrompeu seu pai, dizendo: – Daí, pai, eles inventaram um código com as batidas. Faziam perguntas e os espíritos respondiam
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sim ou não. – Depois eles... e laurinha interrompeu seu pai novamente: – eu sei, eu sei! Daí elas contaram para os pais, que começaram a perguntar e ter respostas também. Depois, pai, combinaram batidas diferentes para cada letra e começaram a formar palavras. Isso demorava um tempão. – Vinha gente de muitos lugares para verific ar, até descobrirem que era verdade mesmo e que um poderia ajudar o outro. – Isso mesmo! Parabéns aprendeu direitinho. – É pai, e isso começou a acontecer em várias partes do mundo e muito mais pessoas começaram a ir atrás para entender. Isso foi legal para o
espiritismo, né? – Foi. Despertou para que as pessoas soubessem que existe vida depois da morte. tudo começou assim, pelos fenômenos, laurinha. – As batidas dos espíritos, não é? – Sim, as batidas. – então posso chamar a dona Mirtes de espírito! – Por quê? – perguntou o pai intrigado. – Porque ela sempre bate na porta. nunca toca a campainha! o pai da laurinha olhou com cara de bravo e falou: – laurinha!!! – espírito encarnado, pai! Tatiana Benites é autora dos livros tem espíritos no banheiro e tem espíritos embaixo da cama (Ed. Correio Fraterno)
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JULHO - AGOSTO 2016 O BAÚ DE MEMÓRIAS PODE SER FEITO POR VOCÊ! Envie para nós um fato marcante sobre o Espiritismo em sua cidade. Ele pode ser publicado aqui nesta seção. E-mail: redacao@correiofraterno.com.br.
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BAÚ DE MEMÓRIAS
As ”ruas espíritas” de São Bernardo Por raymundo r. espelho
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a década de 1960, a vila onde se encontram as instalações do Lar da Criança Emmanuel e também da editora Correio Fraterno estava se urbanizando. Retirada do centro da cidade de São Bernardo do Campo, nela havia ainda muito mato e os clarões dos barrancos de terra rosa e argilosa. Mas poucos devem saber por que ali, na Vila Alves Dias, há tantas ruas com nomes de personagens espíritas, conhecidos por todos nós. Pensando em prestar uma homenagem e também divulgar os expoentes do espiritismo, nós enviamos na época à prefeitura uma lista, com sugestão de nomes que poderiam ser dados às novas ruas que ali surgiam, o que o departamento responsável acatou prontamente. Av. Bezerra de Menezes, rua Batuíra, rua Allan Kardec, rua Cairbar Schutel, Emmanuel, Eurípedes Barsanulfo, Humberto de Campos, Maria João de Deus são alguns nomes de que me lembro no momento. Lembro-me também de que na ocasião da inauguração da placa que nomeava a rua Cairbar Schutel, o escritor e tradutor Wallace Leal Rodrigues veio de Matão, SP, prestigiar o evento. Wallace dava na época sua valiosa contribuição às instituições fundadas por Cairbar Schutel desde meados de 1960, chegando a coordenador editorial da Revista Internacional de Espiritismo e do Jornal O Clarim, bastante conhecidos no meio espírita. Ele desencarnou em 1988, mas o seu nome é sempre lembrado, por seu talento e pela qualidade das obras que deixou. Wallace traduziu cerca de 15 livros e escreveu seis publicações, dentre elas: A esquina de pedra, E para o resto da vida, pela editora O Clarim. Na ocasião, tive o prazer de conhecê-lo e de também ter com ele uma agradável conversa, quando falamos muito a
Uma das ruas principais no centro de São Bernardo, na década de 1960
respeito do trabalho da divulgação. Cerca de 50 anos já se passaram desse nosso encontro. As mudanças e os recursos para a divulgação da doutrina que existem hoje eram inimagináveis. Grande parte dos espíritas, em número muito menor do que o atual, era o idealista, que participava da fundação e em seguida começava a subir as paredes das instituições. Éramos poucos, mas com uma vontade muito grande de levar a doutrina consoladora à frente, em tempos de muito preconceito e poucos recursos. Hoje vejo que tudo valeu a pena. Do passado, ficarão sempre as boas lembranças, como esta do encontro com Wallace Leal e, no presente, a satisfação de ver que muitas frentes de trabalho continuam desafiando o tempo e seguindo à frente, oferecendo o que o espiritismo tem de melhor, no esclarecimento, no auxílio e no consolo para tantos corações. Raymundo R. Espelho é um dos fundadores do Lar da Criança Emmanuel e da Editora Espírita Correio Fraterno.
Nascido a 11 de dezembro de 1924, em Divisa, ES, Wallace Leal Valentin Rodrigues veio para Araraquara, SP com a família, na década de 1930. Com talento incomum para as artes, foi diretor e ensaiador do TECA – Teatro Experimental de Comédia de Araraquara –, chegando até o Rio de Janeiro e obtendo patrocínio do Ministério da Cultura e destaque na importante revista O Cruzeiro. Wallace recebeu diversos prêmios, dentre os quais: o Prêmio Cija, com o conto Porta aberta para fora da vida (1948), Prêmio Apolo, da Crítica Teatral do Rio de Janeiro (Revelação de direção) (1957), Prêmio Paschoal - 1º Festival de Teatro Universitário de Santos (1958). No espiritismo, Wallace iniciara-se aos 16 anos, ingressando na editora O Clarim em 1964 e lá permanecendo por 25 anos. Em março de 1973, passou a trabalhar também para a revista internacional Planeta, que com sede em Paris, passaria a ser também publicadas no Brasil, através da Editora Três. Por vários anos, os leitores foram brindados com seus artigos, sempre com temas que enfocavam a fenomenologia espírita. (Da Redação) Escritor e editor Wallace Leal
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ESPECIAL
Pedagogia espírita Sob a mira da crise Por Eliana Haddad e Izabel vitusso
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crise financeira que se abate sobre os brasileiros, com altos índices de desemprego e consequente perda de renda nas famílias, também vem se refletindo nas entidades espíritas, que estão vivendo momentos desafiadores, diante da escassez de verbas, pela retração de investidores, associados e colaboradores habituais. Dentre elas, justamente em função desse cenário de dificuldades, a Associação Brasileira de Pedagogia Espírita chamou a atenção nas redes sociais recentemente, com a publicação de uma carta-aberta, solicitando ajuda para que o seu trabalho não fosse interrompido. Herculano Pires, em 1985, já dizia em seu livro Pedagogia espírita que “o espiritismo é a doutrina da educação por excelência” e que uma educação espírita se faz pela busca de superação que desperta para o desenvolvimento do homem integral, num sentido totalmente humanista. Essa foi a inspiração encorajadora que levou a educadora Dora Incontri, pós-doutorada em Filosofia da Educação pela USP, tanto a erguer sua frente de trabalho na direção da educação espírita, quanto como mover-se nos últimos dias nas ações emergenciais para driblar a crise. Aliás, Dora bebeu direto na fonte de Herculano Pires. Era ainda menina quando frequentava a casa de professor, em São Paulo, juntamente com seus pais. www.correiofraterno.com.br
gogia espírita que realizou de 2004 a 2014 ajudaram a divulgar o seu propósito, como um gerador de possibilidades de transformações significativas na caminhada do espírito encarnado e suas consequências sociais. “Não há dúvida de que a proposta é boa, é a ideia de Kardec!”, considera Maurício Zanolini, coordenador de projetos da ABPE. “Existem escolas católicas, protestantes e a sociedade aceita muito bem. Mas quando se fala em educação espírita, ainda há uma grande resistência. A proposta da pedagogia espírita é mais recente e seu formato, também diferenDora Incontri: “Nosso objetivo sempre foi te, porque a educação, resgatar o espiritismo como proposto por nesse caso, é um projeto Allan Kardec” do e para o espírito, um aprendizado que não é pontual”, justifica é uma proposta prática de educação e tem o coordenador. a sua especificidade de trabalhar também Desde 2004 já se formaram [em nível com o aspecto espiritual do ser humano, universitário] dezenas de educadores de que constrói a sua própria evolução aqui, todo o Brasil, produzindo conteúdo acacomo um ser reencarnado, projetando-se dêmico de pesquisa, editando-se livros, na transcendência.” fazendo-se parceria com universidades Mas a realidade dos últimos tempos para pós-graduação, promovendo-se o tem mostrado que há que se ter coragem diálogo inter-religioso e o debate aberto. para sustentar a ideia de uma iniciativa E para os que imaginam que essa como a Associação Brasileira de Pedagoproposta da pedagogia espírita é algo gia Espírita, sem fins lucrativos e mantida recente, Dora lembra que sua história por associados e colaboradores. remonta a Sócrates e Platão, que eram Criada em 2004, a ABPE tornou-se reencarnacionistas, a Allan Kardec, um rapidamente conhecida, com adeptos de educador, discípulo de Pestalozzi que todas as partes do Brasil. Os próprios conseguiu Rousseau, que por sua vez teve gressos nacionais e internacionais de pedainfluência de Comenius. Essa linha peSede da ABPE em Bragança Paulista, SP
Seu sonho de trabalhar em prol do diálogo inter-religioso, de militar por uma nova educação, que incluísse de maneira interdisciplinar a espiritualidade, a autonomia do educando, como faziam os grandes clássicos da Educação — Comenius, Rousseau e Pestalozzi — possivelmente começara ali. Seu primeiro passo foi a instituição da editora Comenius, em 1998, inspirada nos ideais libertadores do educador checo Jan Amos Comenius (1592 -1670). “Nosso objetivo sempre foi resgatar o espiritismo como foi proposto por Allan Kardec, no seu caráter científico, filosófico e moral/ religioso. A educação espírita
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dagógica continua no espiritismo, que traz a influência de toda a herança desses grandes educadores e que no Brasil teve prosseguimento com Eurípedes Barsanulfo, Tomás Novelino, Anália Franco, J. Herculano Pires, Pedro Camargo (Vinícius), Ney Lobo, dentre outros. Mesmo tendo como referência nomes de expressividade em nosso meio, poucos ainda compreendem a importância desse trabalho, um projeto cultural, educacional, que exige engajamento e autonomia, analisa a educadora. Ela reforça que não basta à proposta apenas responder a anseios de crescimento do ser. “Nosso desafio também é a busca constante pela forma mais adequada para sensibilizar as pessoas para esse propósito, estimulando-as ao seu progresso, mas respeitando-se o momento de cada uma”, acrescenta. Diante desta realidade desafiadora, Dora Incontri assume-se em busca de auxílio, através de novos associados, novas matrículas, novos investidores. E analisa: “Muitos nos dizem que é uma questão de marketing, mas penso que a pedagogia espírita não é um produto, algo pontual que mereça uma ação de compra”, explica-se. Segundo ela, seria preciso sensibilizar a pessoa para que ela mesma tenha esse despertar emancipatório e queira se educar. “A educação é uma questão que afeta todo mundo. Todos têm seu processo educativo, com suas alegrias e traumas. O que se propõe é fazer-se um resgate desse processo de forma autocrítica.” Dora também levanta a questão cultural de nosso país, lembrando que 90% da verba destinada ao terceiro setor, que já é pequena, vão para projetos de assistência social, tanto espíritas como não espíritas, diferentemente dos outros países, que valorizam e destinam doações expressivas para universidades e pesquisas, prestigiando sempre a boa formação e o desenvolvimento. Trabalhar com o público infantil também assegura um pouco mais de visibilidade, em matéria de captação de recursos financeiros. Mas ao se dedicar por 15 anos à educação em escolas públicas e particulares, Dora constatara que tinha mesmo que investir na educação dos adultos. Também trazia consigo a reco-
mendação de Tomás Novelino, discípulo de Eurípedes Barsanulfo, e fundador do reconhecido Educandário Pestalozzi, em Franca, SP, dizendo que sua maior dificuldade para trabalhar com a pedagogia espírita era a falta da formação de adultos para aplicá-la. Essa foi a chave para Dora montar o seu quebra-cabeças: primeiro, fundaria a editora, para publicar livros que dessem base ao desenvolvimento da pedagogia espírita; segundo, multiplicaria esse conhecimento através de congressos, cursos, seminários; e terceiro, instituiria uma pós-graduação para formar multiplicadores do projeto. A ideia inicial era que tudo isso fosse regido por uma faculdade de pedagogia. Mas percebeu-se com o tempo que o projeto de uma universidade livre, um espaço para espíritas e não espíritas, de ideias pedagógicas avançadas, filosóficas, sociais, e sobretudo com a inclusão da espiritualidade atenderia muito melhor aos anseios. Enfim, um meio acadêmico alternativo, uma vez que o curso de pós-graduação,
institucionalmente reconhecido durante muitos anos, poderia agora ser ampliado numa versão ainda mais abrangente, independentemente de seu reconhecimento pelos órgãos oficias de educação. “Em uma consultoria, realizada em 2014, constatou-se que a ABPE tinha o que muitas faculdades particulares não possuem: uma rede de mais de 50 professores — doutores, pós-doutores e livre-docentes — e uma significativa produção acadêmica, nacional e internacional, através dos congressos realizados. Foi a nossa escolha e é o que a gente pensa para a pedagogia espírita. Assim trabalhamos, desejando que o tempo traga o seu reconhecimento, independentemente da oficialização do ministério”. “Somos a maior nação espírita do mundo e precisamos estar representados. Somos também um país cuja maior parte acredita na reencarnação. A pedagogia espírita é baseada na reencarnação, é uma pedagogia reencarnacionista e isso tem que ter alguma ressonância na sociedade”, finaliza Dora Incontri.
Um pedido especial estamos num momento de grave crise econômica no Brasil. Isso todo mundo sabe. A maioria está sentindo na carne. As instituições sem fins lucrativos sofrem particularmente com isso. nós, da Associação Brasileira de Pedagogia espírita, estamos nessa hora de encruzilhada. Muitas empresas, muitas instituições, muitos trabalhos se fecham, desaparecem, vão à falência com uma crise desse tamanho. outras se adaptam, se reinventam, esperam abaixar a poeira, insistem até o sacrifício e resistem, para se levantarem mais adiante, quando a tempestade passar. esperamos estar nesse segundo caso. Para isso, precisamos da contribuição dos que acreditam em nosso projeto, dos que acompanham nossos blogs (da ABPe e da Universidade livre Pampédia), dos que já foram ou são nossos alunos (e são mais de 500), dos que já estiveram em nossos congressos (e são mais de 3 mil), dos que já leram nossos livros, da editora comenius (e são milhares, ao longo de 18 anos de trabalho). (...) estamos lutando para que o espiritismo dê uma contribuição cultural, pedagógica e filosófica consistente no Brasil e, para isso, buscamos excelência acadêmica, ensaiamos excelência estética (porque a beleza educa) e mantemos compromisso com a transformação da sociedade. Ajude-nos a manter as portas abertas! Dora Incontri
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LIVROS & CIA. Editora Comenius Telefone: (11) 98155-2788 www.editoracomenius.com.br A educação segundo o espiritismo de Dora Incontri 272 páginas 16x23 cm
AME-Brasil Telefone: (11) 2574-8696 www.lojaamebrasil.org.br Uma nova medicina para um novo milênio: a humanização do ensino médico de diversos autores Organizado por Décio Iandoli Júnior e outros 460 páginas 16x23 cm
Editora Sinodal / Vozes Telefone: (51) 3037-2366 www.editorasinodal.com.brr Em busca de sentido de Viktor E. Frankl 186 páginas 14x21 cm
Editora Correio Fraterno Tel.: (11) 4109-2939 www.correiofraterno.com.br A força do amor de J. W. Rochester psicografia de Arandi Gomes Teixeira 336 páginas 14x21 cm
Para conhecer os projetos da ABPE ou aderir à campanha de sócios (pessoa física ou jurídica), acesse www.pedagogiaespirita.org.br. Fones: 11- 4232-8515 98155-8005.
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Do abandono à superação Por SÔnIA KASSe
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onstantemente vemos e ouvimos notícias sobre crianças que são abandonadas pelas próprias mães e deixadas à mercê da sorte. Na maioria dos casos, esse abandono deve-se à gravidez precoce, ao baixo rendimento salarial e ao desemprego. Muitas dessas crianças crescem num ambiente totalmente inadequado e desestruturado, perambulam pelas ruas, dormem pelos cantos, pedem dinheiro nos faróis e acabam se envolvendo com drogas, furtos, violência e muitos outros delitos; algumas, inclusive, são exploradas por adultos inescrupulosos. A obra A reencarnação de uma rainha, de J. W. Rochester, psicografia de Arandi Gomes Teixeira, publicada pela editora Correio Fraterno, aborda esse tema que atinge a personagem principal Panderva, que logo após o seu nascimento foi abandonada nas ruas de Florença e deixada para morrer. Resgatada por pessoas de má índole, a menina cres-
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ceu entre maus-tratos e fome constante, até o dia em que conseguiu fugir e passou a viver nas ruas realizando pequenos serviços em troca de moedas. Mas o destino é inexorável e colocará no caminho de Panderva pessoas de caráter ilibado, que a farão retornar à sua posição na realeza como nos tempos de outrora, quando reinava como rainha. É a Providência divina dando-lhe uma chance de redenção dos atos praticados numa outra vida. Com um enredo cativante, o autor vai construindo a trama de amor, ódio, ganância e vingança que envolverá todos os personagens, conduzindo o leitor a uma compreensão das oportunidades que temos de nos redimir ou não diante de nossas culpas e erros. Leitura prazerosa com um final surpreendente. Sonia Kasse é professora do Ensino Fundamental, aposentada.
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AnálISe
Sonhos de liberdade Por HeloÍSA PIReS
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conceito de liberdade é possibilidade de escolha. Somos livres pelo pensamento, explica O livro dos espíritos, mas pelo pensamento também nos escravizamos a situações difíceis, enquanto não compreendermos a lei do amor, que Jesus resumiu em uma simples frase: “fazer ao outro o que desejamos que o outro nos faça...”. Na psicografia de Chico Xavier, Emmanuel, através do livro Há dois mil anos, apresenta um exemplo de escravidão espiritual. Rico e poderoso, o senador Públio Lêntulus é escravo do orgulho e do egoísmo. Arrastado por impulsos menos adequados, cria graves problemas para ele, acreditando em calúnias e rejeitando a esposa, por julgá-la indigna do seu amor. Por orgulho, manda prender um judeu que jogou uma pedra no veículo onde estava com a família e, embora não saiba, o moço é vendido como escravo e futuramente tramará terrível vingança, sequestrando seu filho querido e o escravizando. Quando desencarna, o senador pede para nascer escravo. E só então começará a realizar os seus sonhos de liberdade; escravo fisicamente, espiritualmente começará o processo de libertação de suas imperfeições... Um contemporâneo nosso, Nelson Mandela (1918-2013), inicia a sua juventude escravo da raiva e da agressividade contra os brancos que humilhavam o seu povo. Preso por 27 anos, começa a desenvolver os seus sonhos de liberdade. Quando sai da prisão, depois de uma vida dura quebrando pedras, compreendendo a necessidade de agir racionalmente, não mais se entrega às paixões inferiores. E num gesto lindo de liberdade, convida o seu povo negro a perdoar aqueles que os humilhavam. Nelson continuou a auxiliar o seu povo através de atitudes dignas, que levaram os que os rejeitavam a iniciarem a própria libertação, começando a compreender que brancos, negros, amarelos, vermelhos, azuis, somos todos irmãos... José Herculano nos lembra que Sócrates não hesitou em tomar cicuta, porque
desenvolvera a liberdade de consciência, a compreensão da inexistência da morte e da importância da vida como possibilidade de experiências, que nos libertam dos medos que nos impedem a grande libertação: a libertação da nossa ignorância... O mundo atual nos faz refletir como a escravidão ainda existe, disfarçada, mas impedindo à maioria dos indivíduos desenvolver suas potencialidades. Alguns são escravos de impulsos inferiores, outros escravos do extrato bancário, outros ainda, escravos do corpo, esquecendo-se da finalidade primeira desse instrumento: ajudar o espírito a realizar os seus sonhos de liberdade, projetando-nos, encarnados na Terra, às dimensões espirituais mais elevadas. Somos luzes, criaturas divinas e precisamos do alimento precioso, proporcionado pelas luzes dos ensinamentos de Jesus. Mas não seguimos o Mestre. Deformamos suas lições, introduzimos ideias pagãs e judaicas nos seus ensinamentos. Escravizamo-nos ao castigo, ao medo, à dor, criando um Deus que castiga e um inferno pior do que o cristão. A Idade Média nos mostra que, como escravos da ignorância, tentamos através
da tortura, da morte, da ambição, matar, roubar, justificando que desejávamos apenas salvar o próximo... Mas de um mal nasce um bem e a escuridão da Idade Média prepara o Renascimento. Um período da história da humanidade em que conseguimos maior desenvolvimento e responsabilidade, embora ainda não praticando, como seria de desejar, os exemplos do mestre de Nazaré... Necessitamos de uma educação especial para a formação de um mundo novo, que só será construído por um indivíduo novo. Essa educação, que já existiu entre os druidas há seiscentos, oitocentos anos antes da vinda de Jesus, consegue trans-
formar o ser que teme a vida e a morte em um indivíduo forte, que compreende o que nos ensinou Jesus: Somos deuses, somos luzes; podemos fazer o que ele fez e muito mais. E ainda, explica que se tivermos fé do tamanho de um grão de mostarda, nada será impossível. Mas nos ‘perdemos’ na festa do mundo, como diz Herculano Pires; julgamos que nossa imortalidade é física e permanecemos por séculos criando reencarnações difíceis, pelos atalhos dolorosos por nós criados. A nossa inércia espiritual nos torna escravos de nós mesmos... Esta educação especial, que nos conscientiza sobre nossas potencialidades, permitirá que nos transformemos no indivíduo desenvolvido integralmente, como os mestres enviados por nosso irmão mais velho. Buda, Sócrates, Platão, Confúcio, e tantos outros, tentaram nos libertar, mas contavam com o nosso esforço... Através da conscientização de que somos centelhas etéreas, aprendemos que como filhos amados e criados por Deus, carregamos o “gene” do Criador, a capacidade de agir sobre a energia cósmica universal, como seus cocriadores. Ministrada nos lares, nas casas espíritas e espiritualistas, nas escolas... essa educação especial oportunizará o acesso à Verdade; será a ponte para o verdadeiro entendimento do Consolador Prometido por Jesus, que um dia alcançará toda a humanidade... Heloisa Pires é pedagoga, escritora e conferencista espírita. Filha do escritor José Herculano Pires.
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Seminários sobre dependência química, suicídio e depressão O Projeto Caminhos, da Federação Espírita Brasileira, vem realizando pelo Nordeste seminários sobre dependência química, suicídio e depressão. Programação: CEARÁ SET Dia 3 de setembro, das 8:00h às17:30h. Na Federação Espírita do Estado do Ceará. Rua Princesa Isabel, 255. Centro, Fortaleza, CE. (Para preparo dos trabalhadores de casa espírita). Apoio: FEEC.
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MARANHÃO Dia 1 de outubro, das 14:30h às 18:30h. No Centro Educacional Aprender Pensando. Rua Dr. Justo Pedrosa, 800, Centro, Balsas, MA. (Aberto ao público em geral). OUT
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Dia 2 de outubro, das 8:00h às 12:00h Local: Casa Espírita da Rosa. Rua Professor Joca Rego, s/n. Centro, Balsas, MA. (Para o preparo dos trabalhadores da casa espírita). Apoio: Federação Espírita Maranhense. Informações: procaminhos@gmail.com OUT
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Divaldo Franco realizará palestra NOV em São Bernardo O orador espírita Divaldo Pereira Franco estará dia 17 de novembro em São Bernardo do Campo, SP realizando conferência, no Centro de Formação dos Profissionais da Educação Ruth Cardoso, CENFORPE. O convite há muito vinha sendo renovado ao orador, através de três instituições espíritas cinquentenárias da cidade — Centro Espírita Obreiros do Senhor, Lar da Criança Emmanuel e Lar Espírita Maria Amélia. Local: Avenida Dom Jaime de Barros Câmara, 201, Planalto, São Bernardo do Campo, SP. O evento terá início às 20 horas.
Teste seus conhecimentos e sua memória relacionando os livros clássicos da literatura espírita com os seus respectivos autores:
1 Gabriel Delanne
Devassando o invisível
2 Cairbar Schutel
Nossos filhos são espíritos
3 Ernesto Bozzano
A pluralidade dos mundos habitados
4 Léon Denis
Missionários da luz
5 Yvonne Pereira
Vinha de luz
6 Humberto de Campos
Vida e atos dos apóstolos
7 André Luiz
Educação para a morte
8 Emmanuel
1 Animismo e espiritismo
9 Camille Flammarion
Loucura sob novo prisma
10 J. Herculano Pires
O grande enigma
11 Hermínio C. Miranda
O espiritismo em sua mais simples expressão
12 Bezerra de Menezes
Os animais têm alma?
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Boa Nova
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Feijoada Beneficente Dia 21 de agosto
Local: Salão de festas do Lar, av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 2955, São Bernardo do Campo, SP. (11) 4109-8938. Venha e traga a sua família!
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Elaborado por Izabel Vitusso e Hamilton Dertonio, especialmente para o Correio Fraterno
Pitsografia vamos olhar a pizza e ver o que acontece!
Pra quê, filha?
Tenho que fazer um trabalho sobre pitsografia! é sobre artes!
ENIGMA
Que discípulo anotou a prece dominical (Pai Nosso) proferida por Jesus pela primeira vez? qualquer hora, em qualquer lugar
Solução do Passatempo Veja em: www.correiofraterno.com.br
Resposta do Enigma:
levi foi quem tomou nota das palavras que Jesus, que continha, em síntese, todo o programa de esforço e edificação do cristianismo nascente.
Ciclo de Conferências InternacioAGO nais em Ciência e Espiritualidade Para celebrar os 10 anos de fundação do Núcleo de Pesquisa Saúde e Espiritualidade, será realizado na Universidade Federal de Juiz de Fora o VII Ciclo de Conferências Internacionais em Ciência e Espiritualidade, de 28 a 31 de agosto. O evento contará com a presença do professor Harald Walach, diretor do Instituto de Estudos Transculturais em Saúde e professor da Europa Universität Viadrina (Alemanha). Informações: www.ufjf.br/nupes.
OBRAS CLÁSSICAS E SEUS AUTORES
Fonte: Boa nova, de Humberto de Campos, por Chico Xavier, FEB.
AGENDA
psicopictografia! é a pintura que espíritos ligados à arte fazem através dos médiuns! Não da pizza, laurinha!
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VOCÊ SABIA
Os fantasmas e suas aparições Por Jáder Sampaio
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sia, 1858. Alfred, um naturalista em expedição no arquipélago malaio, envia uma correspondência a seu colega inglês, Charles. Ele pedia ajuda na publicação de um manuscrito. Charles recebeu o trabalho, leu e ficou lívido. Ele estava pesquisando o mesmo assunto e chegou à mesma conclusão há décadas, mas não publicara até o momento, sempre procrastinando, à espera de mais evidências. Montou, então, uma mesa na Linnean Society e apresentou ao mesmo tempo, para seus colegas e para o mundo, a mesma teoria escrita à distância por dois pares de mãos. Ela ficou conhecida no futuro como “teoria da evolução das espécies com base na seleção natural”, ou simplesmente, evolucionismo, ou ainda, indevidamente, darwinismo. Inglaterra, 1865. De volta da Ásia, Alfred resolve dedicar-se ao estudo dos fenômenos espirituais. Após ter visto fenômenos de raps e movimentação de mesas na casa de um amigo, procura a Sra. Marshall, sem identificar-se, e assiste a muitas sessões mediúnicas. Ele já havia magnetizado garotos e curumins, no passado, mas aqueles fenômenos eram diferentes. Foi
em um grupo de seis pessoas, sem identificar-se. Ao passarem as mãos, em ritmo cadenciado, sobre um alfabeto impresso, batidas sobre a mesa iam identificando as letras que desejava fossem escritas. A primeira palavra foi ‘Pará’. A segunda foi ‘Herbert’. Surpreso, Alfred sabe que se está falando de seu irmão, morto durante a longa viagem pela região amazônica, há quatorze anos! Abalado em seu ceticismo, formulou uma última pergunta à inteligência sem corpo, uma pergunta que a médium não poderia jamais saber: “Que amigo comum o viu pela última vez?”, e as batidas formaram o seguinte nome: ‘Henry Walter Bates’. Um ano depois, o ainda jovem Alfred escreveu um livreto: O aspecto científico do sobrenatural. Nele já se encontram embutidas muitas horas de leituras e observações. Textos contendo a síntese dos escritos e depoimentos de cientistas, artistas, literatos e outras pessoas de reputação e inteligência que defendem a continuidade da vida psicológica após a morte do organismo humano. Em 1871, Alfred está fazendo uma conferência, na Dialectical Society. Nela ele ataca um filósofo muito respeitado nas ilhas: David Hume. Hume teria se
oposto vigorosamente à possibilidade de explicação de uma cura, por exemplo, pela atuação de espíritos dos mortos. Mais do que isto, Hume acha que não há método de estudo capaz de provar sua existência. O conferencista escolhe os principais argumentos e os desmancha, pacientemente, enquanto lê seu calhamaço de papéis. Ele defende de forma expressiva a volta das pesquisas espiritualistas ao estatuto das ciências naturais, que sustentam teorias com base em observações de fatos. Passados onze anos, em 1882, o cenário da indiferença inglesa sobre o espiritualismo havia mudado. Nas duas últimas décadas do século, a questão da vida após a morte incomodava os professores das universidades britânicas. Eles resolveram então criar uma sociedade, que foi batizada com o nome Sociedade de Pesquisas Psíquicas. A questão dos fantasmas e da mediunidade estava presente nas revistas e na sociedade. William Crookes já havia publicado seu relatório de pesquisas sobre os fenômenos com a Srta. Florence Cook e outros autores famosos, conhecidos no meio científico, defendiam o espiritualismo moderno e tentavam apresentá-lo para as sociedades científicas com seus trabalhos de revisão e pesquisa. Neste clima, a Sociedade de Pesqui-
sas Psíquicas publica um grande volume, chamado Os fantasmas dos vivos, onde demonstra a existência da telepatia com um enorme número de casos estudados, mas não trata da comunicabilidade dos mortos. Seriam os fantasmas totalmente explicáveis através da telepatia? O Sr. Alfred, mais conhecido agora por seu sobrenome, Russel Wallace, então membro da Sociedade e já reconhecido cientista proeminente, coautor da teoria da evolução das espécies com Charles Darwin e autor de trabalhos e livros naturalistas, resolve mostrar que a telepatia não é suficiente para explicar nem mesmo os casos estudados no livro. Conseguirá ele realizar mais esta proeza? Será possível mostrar que além dos fantasmas dos vivos, existem fantasmas dos mortos? Não responderei a esta pergunta. Deixo ao leitor um ‘dever de casa’, ou uma ‘leitura obrigatória’ técnica que adotava quando lecionava em universidade, nem sempre bem acolhida pelos alunos. Recomendo, então o livro Os fantasmas e suas aparições, traduzido por nós e recém-publicado pelo Instituto Lachâtre, que conta mais esta aventura intelectual do naturalista galês. Escritor e editor do blog Espiritismo comentado, Jáder é um dos editores da série Pesquisas Brasileiras sobre o espiritismo, publicada pelo CCDPE ECM e LIHPE.
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FOI ASSIM
O primeiro dia em Veneza Por FABIANO POSSEBON
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inha esposa Sandra e eu estivemos em Veneza em setembro de 2014 para comemorarmos os nossos trinta anos de casados. O porteiro do hotel em que estávamos hospedados, em uma cidade próxima a Veneza, Mestre, informou-nos que deveríamos tomar bonde e ônibus para chegarmos até Veneza. Passeamos a tarde toda pela terra do famoso Marco Polo. Quando voltamos ao terminal, vi escrito num ônibus o nome do bairro em que ficava o nosso hotel. Convidei então minha esposa. “Vamos, vai dar certo”. Sandra topou e iniciamos o que no fim seria um grande aprendizado. Em primeiro lugar, algo que eu esperava não aconteceu. Não havia placa indicativa dentro do ônibus ou sistema de som orientando sobre as próximas paradas. E esse centro de Mestre não chegava nunca!
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Começamos a ficar desconfiados. Pensei: “Este ônibus deve estar passando por toda a periferia, só depois irá ao centro”. Depois de rodar bastante, todo mundo desceu num ponto. Só nós dois ficamos lá, sentadinhos. O motorista chegou até nós e falou: “Aqui é o ponto final. Vocês não vão descer”? Pensei: “Ponto final?! Onde estamos”? Comecei a transpirar, ficar agitado. Falei para ele: “A gente ia descer no centro de Mestre”! “Já passamos faz tempo, disse ele, numa mistura de italiano oficial com dialeto vêneto. “Deviam ter me avisado, que eu deixava vocês lá”. O que posso fazer é leva-los até um outro ponto, onde podem pegar outro ônibus”. Graças a Deus, o motorista foi legal. Aquele lugar era muito ermo! Ao descermos no outro ponto, vimos uma senho-
ra sentada no banco, com a qual fizemos amizade. Descobrimos que ela era russa e que morava na Itália já há alguns anos. Falava razoavelmente bem o italiano. Contamos o nosso drama e quando o outro motorista chegou, ela mesma foi com ele conversar. “Não adianta perdermos a calma”, Sandra me lembrava. “Uma hora a gente chega. Não temos compromisso com nada. Ninguém está nos esperando. Na pior das hipóteses, pegamos um táxi. Precisamos ficar calmos para poder raciocinar, fazer a coisa certa, do contrário...” Felizmente Sandra se lembrou do nome de uma avenida próxima ao hotel, a avenida Sandovà. Esta sim era bem conhecida. Foi bom termos conversado com a senhora russa. A gente acabou se descontraindo. Quando o outro ônibus chegou
ao ponto, ela mesma foi conversar com o motorista e explicar a nossa situação. Antes de descermos, o motorista explicou-nos qual seria o próximo ônibus que deveríamos tomar e em que ponto deveríamos fazê-lo. Descemos, caminhamos um pouco, de repente, quem nós avistamos? A russa. “Desci antes do meu ponto. Eu vou levar vocês até o ponto certo. O motorista não os orientou corretamente. E eu não conseguiria dormir, se não fizesse isso.” Bem tarde da noite, finalmente conseguimos chegar ao hotel. Foi de fato um grande aprendizado. É preciso ser mais humilde, não arriscar, se não tivermos certeza das coisas. E, por fim, confiar. Pois nunca estamos sós. Além dos bons amigos espirituais, sempre encontraremos gente pronta a ouvir-nos e a nos ajudar.
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DIRETO AO PONTO
O valor do tempo Por UMBERTO FABBRI “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou... Já tenho entendido que não há coisa melhor para eles do que alegrar-se e fazer o bem na sua vida”. (Eclesiastes 3:1,2,12).
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tempo tem um papel fundamental em nossas existências. Os ponteiros inexoráveis do relógio não param, não se detêm perante os dias, anos e séculos, fazendo do tempo tanto o nosso aliado como o nosso inimigo, dependendo sempre de como o utilizamos. Se soubermos aproveitá-lo, o ganhamos, mas se dele nos descuidamos, o perdemos, porque, como nos lembra o velho dito popular: “O tempo não volta atrás”. Uma grande verdade é que precisamos muito dele. Ele é imprescindível para realizarmos nossa evolução, nosso crescimento material e espiritual. Sem o tempo, como poderíamos usufruir da reencarnação? Como adquirir o conhecimento necessário para apreender as leis divinas e compreender todas as suas aplicações? Como nos diz a citação de Eclesiastes, Deus nos oferece um tempo para tudo: nascer, crescer, morrer, estágios que nos trazem oportunidades valiosas e em cada
um deles, grandes aprendizados. Na infância a criança está aberta para receber e ser contagiada pela educação, e aprender outros valores, que poderão nortear sua vida futura. É tempo de conquistar corações com a nova apresentação corporal. Vestidos de anjos, encantam os familiares e possivelmente antigos desafetos. É tempo de recomeçar... Na maioridade, as lutas pela sobrevivência material e emocional se desenvolvem de acordo com nossas disposições e posturas. Buscamos geralmente a felicidade, nos enganamos, nos arrependemos, voltamos a tentar novamente. “Tempo de
plantar e se arrancar o que se plantou”, porque sempre é possível retomar a oportunidade, e tentar outra vez. Infelizmente, alguns estacionam no meio do caminho se culpando, ou culpando o semelhante e, parados, veem o tempo passar, desperdiçando-o. Mas é tempo de continuar... Na velhice, consolidamos os aprendizados, aparamos as arestas e temos ainda um tempo de partida, deste, para outro mundo. E quando lá chegamos, tudo recomeça, pois, se por um lado aqui morremos, por outro, em nova dimensão, renascemos. É tempo de refletir... O tempo não para, tampouco a vida...
Muitos dizem que somente o tempo cura nossas dores, e somente ele pode cicatrizar nosso coração. Na realidade, com sua ajuda, conseguimos trabalhar nosso íntimo, modificando os sentimentos que nos adoecem, aplicando os remédios infalíveis do perdão, da paciência, da compreensão, da fé, da piedade e da resignação. Para passar bem o tempo, não há forma melhor do que o nosso empenho no trabalho que aprimora nossa essência espiritual, que auxilia os que necessitam e que traz o conforto material. A preguiça, o desânimo, a ociosidade são inimigos do nosso crescimento, pois matam o tempo e queimam as grandes oportunidades que Deus nos oferece. Todavia, querer acelerar o tempo, cultivando a ansiedade e a pressa, também se constitui uma atitude enganosa. O equilíbrio é fundamental para melhor administrarmos nossa vida, nosso tempo, nossa imortalidade. Temos a imortalidade à nossa frente, contudo, nos cabe escolher como passaremos por ela. Sofrendo por desperdiçar o tempo ou trabalhando na construção do reino divino em nós para mais rápido usufruirmos da verdadeira felicidade. Então, não perca tempo! Profissional de marketing, Umberto é orador e escritor brasileiro e mora atualmente na Flórida, EUA. Autor dos livros O traficante e Amor e traição, ditados pelo espírito Jair dos Santos (Correio Fraterno).
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CORREIO FRATERNO
JULHO - AGOSTO 2016
MÍDIA DO BEM Este espaço também é seu. Envie para nós as boas notícias que saíram na mídia! Se o mal é a ausência do bem, é hora de focar diferente!
Fotógrafa elabora álbum sensorial
Descobertas genéticas sobre depressão
Quem lê mais vive mais
Há onze anos acostumada a fazer ensaios de casais, bebês e famílias, a fotógrafa Márcia Beal, de Porto Alegre, resolveu fazer uma surpresa para um casal deficiente visual que quis fazer um álbum de fotos de sua bebê. Com a ajuda de um artista plástico e um designer, ela elaborou um álbum com texturas, textos em braile e até cheirinho de bebê. “Esse modelo do álbum sensorial foi desenhado para impressão 3D para que eles pudessem sentir a imagem. Ao lado da figura em alto-relevo, uma mostra de cada acessório usado pelo bebê também foi colocado. Em braile, o texto descreve que Natália está deitada no cestinho com um fundo bege, coberta com uma manta cor de rosa, abraçada num ursinho de lã, com uma florzinha no cabelo”, um mimo, que só um coração tocado pelo amor é capaz de criar.
Um estudo genômico que usou um método inovador para recrutar participantes identificou pela primeira vez 15 regiões do genoma que parecem estar associadas à depressão em indivíduos descendentes de europeus. “Identificar genes que afetam o risco de desenvolver uma doença é o primeiro passo para compreender a biologia da própria doença”, disse um dos autores do estudo, Roy Perlis, do Hospital Geral de Massachusetts (Estados Unidos). A participação incluiu entrevistas com 300 mil pessoas de ascendência europeia e informações sobre o histórico médico dos voluntários. “Os modelos com base em neurotransmissores que estamos usando para tratar a depressão já têm mais de 40 anos. Esperamos que a descoberta desses genes nos indique os caminhos para novas estratégias de tratamento”, disse Perlis.
O estudo, chamado Um capítulo por dia, realizado nos Estados Unidos ao longo de 12 anos analisou a relação entre a longevidade e os hábitos de leitura de 3.635 pessoas com mais de 50 anos. Os pesquisadores dividiram esse grupo em três: os ‘não leitores’, os ‘leitores’ (liam por até três horas e meia na semana) e os ‘superleitores’ (liam mais de três horas e meia por semana). Descobriram que os não leitores haviam morrido mais cedo do que os leitores, e bem mais cedo do que os superleitores. Quem lia até 3h30 por semana, segundo o estudo, tinha 17% menos chances de morrer antes dos 62 anos do que quem não lia nada. E quem fazia parte do grupo dos superleitores tinha 23% menos chances de morrer antes dos 62. Um motivo a mais para se desfrutar o prazer da leitura.
Fonte: Portal G1
Fonte: Estadão-Ciência
Fonte: Superinteressante
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