ROAD TO 2050: Rumo à neutralidade carbónica do setor da Pedra Natural até 2050
Este Roteiro permitirá às empresas do Setor da Pedra Natural, aceder a informação e ferramentas que as irão apoiar na identificação das soluções mais adequadas à descarbonização.
A
pedra é algo do passado?
A fabricação de pedra tem sido crucial para a expressão artística e de engenharia desde há milénios.
A
utilização
da Pedra Natural na construção sustentável
Do ponto de vista do comportamento mecânico, a pedra natural tem características diferenciadoras pela positiva.
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EDITORIAL
No mês em que se realiza a 58ª edição da Marmo+MAC, o principal evento mundial da Indústria da Pedra Natural, representando toda a cadeia de produção e valor, desde tecnologias de ponta, design, novas tendências, aplicações e inovação, o CTCV dedica especial atenção a esta indústria, na presente edição da revista Técnica.
Num mercado altamente competitivo, a internacionalização da Pedra Natural torna-se crucial no crescimento desta indústria nacional. Segundo os dados referentes à edição de 2023, verificou-se uma participação de 1.507 expositores, oriundos de 54 países, num evento que contou com 47 mil visitantes de 138 países, tendo Portugal tido uma expressiva representação, com a presença de 57 empresas nacionais, que mostraram que a qualidade superior da pedra natural portuguesa é de facto uma vantagem competitiva global.
Com especial atenção ao desenvolvimento e tendências da indústria dos recursos minerais, na qual se inclui a Pedra Natural, e com uma perspetiva de a curto, médio prazo poder aumentar a sua capacidade instalada de forma a suplantar as necessidades tecnológicas destas indústrias, o CTCV estará pela primeira vez presente como expositor, apresentando as suas competências para este setor, reforçando o seu posicionamento como um parceiro de confiança e decisivo na promoção da inovação e desenvolvimento tecnológico, enquanto fatores agregadores de valor a esta indústria.
Com consumidores cada vez mais atentos e informados, com maior consciência ambiental e orientação para a sustentabilidade, a par de políticas europeias que se regem por um novo paradigma, onde a sustentabilidade assume o papel central e em que o acesso ao financiamento público europeu depende de critérios, indicadores e resultados que reflitam um claro compromisso com a sustentabilidade à luz da taxonomia verde europeia, a inovação e o desenvolvimento tecnológico, surgem como resposta às metas europeias para atingir a neutralidade carbónica e para o cumprimento do principio de ‘não prejudicar significativamente’ o ambiente, conhecido por DNSH ‘Do No Significant Harm’, que no caso de algumas industrias, obrigam a elevados investimentos tecnológicos.
Os desafios da competitividade são grandes, mas as oportunidades de financiamento para moldar a estratégia e investir em processos de inovação sustentável também são muitas, desde a redução de custos operacionais, como energia, água, matérias-primas primárias e outros recursos, à criação de novas vantagens competitivas com a introdução de novos ou melhorados produtos e processos, em mercados cada vez mais exigentes e em constante evolução e incerteza.
Torna-se assim fulcral a parceria de empresas industriais a centros de tecnologia e inovação, conhecidos como CTI, como o CTCV, tanto no acesso ao conhecimento tecnológico, à fiabilidade de resultados de ensaios e serviços prestados, bem como no desenvolvimento de projetos de inovação produtiva e investigação e desenvolvimento, cujas muitas oportunidades de financiamento são destinadas a projetos em consórcio entre empresas e entidades do sistema de inovação, onde as responsabilidades e o risco são partilhados, mas onde os resultados serão seguramente melhores.
Jorge Marques dos Santos Presidente do Conselho de Administração do CTCV
SUMÁRIO
SUMMIT STONE BY PORTUGAL – II Encontro Nacional da Indústria da Pedra Natural
ROAD TO 2050: Rumo à neutralidade carbónica do setor da Pedra Natural até 2050
A pedra é algo do passado?
A degradação da pedra e sua previsibilidade
PROJETO MOBILIZADOR INOVMINERAL 4.0 – TECNOLOGIAS AVANÇADAS E SOFTWARE PARA OS RECURSOS MINERAIS
A utilização da Pedra Natural na construção sustentável
A plataforma BIM Library Marketplace
Valorização de cascas de ovos em pastas de revestimentos cerâmicos
Declaração Ambiental de Produto – DAP e FDES – contributo para a internacionalização e sustentabilidade
Ef2Decarb - Plano de Promoção da Eficiência no Consumo de Energia com Vista à Descarbonização
As Garantias de Origem como ferramenta para a descarbonização da indústria da cerâmica e do vidro
Propriedade, Edição e Redação
CTCV - Centro Tecnológico da Cerâmica e do Vidro Rua Coronel Veiga Simão, 3025-307 Coimbra (T) 239 499 200 (E) comunicacao@ctcv.pt (W) www.ctcv.pt NIF: 501632174
Diretor
António Baio Dias
Subdiretor
Sandra Carvalho
Coordenador
Nuno Nossa
Colaborações
Alexandra Figueiredo, Anabela Amado, Andreia Castro, Carlos Monteiro, Célia Marques, Clemente Pinto, Fabio Sitzia, F. Vásquez, Inês Rondão, Irene Ferreira, I. S. Vilarinho, João Ribau, J. Silva, Marisa Almeida, Miguel Jerónimo, Milene Lopes, M. N. Capela, M. P. Seabra, Pedro Cardoso, Pedro Frade, Rodrigo Pereira, Samuel Lameiro, Sandra Carvalho, S. Batista, Victor Francisco
Design e Arte Final
José Luís Fernandes
Capa
Projetada usando recursos do Adobe Firefly Impressão
Gráfica Almondina - Progresso e Vida; Empresa Tipográfica e Jornalistica, Lda Rua da Gráfica Almondina, Zona Industrial de Torres Novas, Apartado 29, 2350-909 Torres Novas (T) 249 830 130 (E) geral@grafica-almondina.com (W) www.grafica-almondina.com
Tiragem
250 exemplares
Publicação Periódica inscrita na ERC (Entidade para a Comunicação Social) com o nº 127420
Estatuto Editorial disponível em https://www.ctcv.pt/estatuto-e
É proibida a reprodução total ou parcial de textos sem citar a fonte. Os artigos assina dos veiculam as posições dos seus autores.
SUMMIT STONE BY PORTUGAL
– II
Encontro Nacional da Indústria da Pedra Natural
Célia Marques
ASSIMAGRA
(iniciativa promovida pela ASSIMAGRA e enquadrada na agenda verde Sustainable Stone by PORTUGAL financiada pelo PRR)
No passado dia 12 de julho, o SUMMIT Stone by PORTUGAL reuniu a indústria portuguesa da pedra natural no Convento de São Francisco em Santarém para discutir os desafios e as oportunidades deste setor essencial para a economia nacional.
O encontro, que contou com o Ministro da Economia, Pedro Reis, a Secretária de Estado da Energia, Maria João Pereira, o Presidente do IAPMEI, Luís Guerreiro, o Presidente da Comissão de Acompa-
nhamento do PRR, Pedro Dominguinhos, entre tantas outras personalidades, destacou a necessidade de uma abordagem integrada e sustentável para enfrentar os desafios do setor, promovendo a inovação, a expansão internacional e a liderança responsável.
Destacam-se as principais conclusões:
Expansão Internacional: A qualidade superior da pedra natural portuguesa é uma vantagem competitiva global. É crucial que a indústria aproveite todas as oportunidades, incluindo apoios comunitários e
outras formas de financiamento, para reforçar as estratégias de exportação e fortalecer parcerias internacionais.
Inovação: A inovação é essencial para melhorar processos, criar produtos de maior valor agregado e atender às crescentes exigências dos consumidores. Continuar a investir em tecnologia e investigação, adotando uma mentalidade de constante evolução, é vital para a sustentabilidade e competitividade deste setor.
Sustentabilidade: A sustentabilidade foi um dos principais temas em debate. A gestão eficiente e economicamente viável do recurso mineral, que é finito e não renovável, é fundamental. O acesso ao território e a busca de equilíbrio entre a indústria extrativa e as sensibilidades ambientais são dos maiores desafios que hoje o setor enfrenta. Exemplos como o modelo do Parque Natural das Serras d´Aire e Candeeiros, apresentado pelo ICNF, demonstram que é perfeitamente possível encontrar pontos de equilíbrio em respeito com o ambiente e as comunidades presentes nos territórios.
Práticas Sustentáveis: A utilização da pedra em novas dimensões que promovem a circularidade de materiais e a redução de desperdício é uma das mais importantes respostas às exigências dos consumidores e mercados, cada vez mais atentos à pegada ecológica e aos indicadores de sustentabilidade, que deve ser, cada vez mais, fomentada nas empresas.
Regulamentação e Competitividade: A adoção de práticas sustentáveis deve ser equilibrada com uma regulamentação justa que não prejudique a competitividade. É necessário impor regras sérias e objetivas, mas com uma abordagem realista que considere o contexto global. A sustentabilidade económica deve caminhar lado a lado com as práticas ambientais e sociais.
Liderança: A liderança nas organizações foi destacada como um fator crítico para o sucesso. A liderança moderna vai além de dar
ordens, envolvendo a inspiração, motivação e união das equipas em torno de uma visão comum. As empresas devem criar projetos empresariais que também sejam projetos de vida para as pessoas, garantindo assim a retenção de talento.
Desafios ESG: A indústria da pedra natural tem a responsabilidade de ser um exemplo em sustentabilidade ambiental, social e de governance. As empresas precisam de se comprometer não apenas com os resultados de hoje, mas também com as gerações futuras, incorporando práticas responsáveis em todas as suas operações.
O evento ficou ainda marcado pelo lançamento da nova marca BROOT – Dialogues from within (www.broot.pt), o mais recente projeto liderado pela ASSIMAGRA enquadrado na agenda verde do setor financiada pelo PRR, que é também um laboratório de inovação e criatividade que fomenta novas parcerias dentro de áreas que partilham a forte herança da pedra natural, tida como a principal matéria que brota da terra para se tornar obra.
Há um caminho muito exigente a percorrer mas a indústria da pedra natural está comprometida com a excelência, a sustentabilidade e inovação, cientes da responsabilidade e dos benefícios que a mesma acrescenta para Portugal.
ROAD TO 2050: Rumo à neutralidade carbónica do setor da Pedra Natural até 2050
Carlos Monteiro, Marisa Almeida, Inês Rondão, Sandra Carvalho, Victor Francisco e Pedro Frade
Centro
Tecnológico da Cerâmica e do Vidro, Coimbra
As alterações climáticas representam um dos maiores desafios enfrentado pela humanidade [1]. A principal causa das alterações climáticas tem origem antropogénica: a queima de combustíveis fósseis para mobilidade, produção de energia elétrica e processos industriais [2] aumenta as concentrações de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, particularmente dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, gases fluorados (e outros).
No Acordo de Paris (2015) [3], 195 países que assumiram o compromisso de manter o aumento da temperatura global abaixo dos 2°C e reunir esforços para limitar o aumento a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.
O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC-Intergovernmental Panel on Climate Change) [4] constatou que:
• As emissões globais de dióxido de carbono (CO2) aumentaram quase 50% desde 1990;
• De 1880 a 2012, a temperatura média global aumentou 0,85°C. Para cada aumento de 1 grau na temperatura, as colheitas diminuem cerca de 5% (as principais culturas sofreram reduções significativas de produção a nível global de 40 megatoneladas por ano entre 1981 e 2002 devido a um clima mais quente);
• As emissões de GEE tiveram um crescimento mais rápido entre 2000 e 2010 do que em cada uma das três décadas anteriores;
• Com as emissões atuais, é provável que, até o final deste século, o aumento da temperatura global exceda 1,5°C;
• Mudanças institucionais e tecnológicas significativas serão ferramentas essenciais para reduzir significativamente os riscos e impactos das mudanças climáticas.
Para cumprir estas metas ambiciosas, é determinante promover mudanças fundamentais com impacto na redução da emissão GEE, particularmente CO2, para uma descarbonização efetiva até 2050. O sucesso desta missão irá, portanto, depender em grande parte da implementação das melhores tecnologias disponíveis (MTD) ou do desenvolvimento de tecnologias inovadores emergentes, em setores industriais-chave.
O enquadramento regulamentar para a descarbonização, tanto no contexto europeu quanto no português, é crucial na implementação de estratégias orientadas para a redução das emissões de carbono, e na transição para uma economia hipocarbónica. No contexto europeu, iniciativas e regulamentação como o Pacto Ecológico Europeu (European Green Deal) [5], Metas de Descarbonização da União Europeia e as diretrizes estabelecidas pela Comissão Europeia indicam um caminho para a neutralidade climática até 2050. Estes programas estabelecem metas ambiciosas para a redução das emissões, impulsionam a transição para energias renováveis e promovem práticas sustentáveis em diferentes setores.
No contexto nacional, Portugal tem avançado com iniciativas alinhadas com as diretrizes europeias. A promulgação da Lei de Bases do Clima [6] e a implementação do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) [7] são exemplos fundamentais desse enquadramento regulamentar. Estas estratégias estabelecem metas, objetivos e ações específicas para reduzir as emissões de GEE, incentivar o uso de energias renováveis, promover a eficiência energética e alcançar a neutralidade carbónica.
A articulação entre os regulamentos europeus e as políticas nacionais, é essencial para garantir uma abordagem coesa e eficaz rumo à descarbonização. O alinhamento entre esses dois níveis regulatórios proporciona diretrizes claras e facilita a implementação de estratégias que não só reduzem o impacto ambiental, mas também promovem o desenvolvimento sustentável e a competitividade no mercado global.
O Projeto ROADTO2050
O Roteiro para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural –, ROADTO2050, financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), é um projeto liderado pela ASSIMAGRA com o apoio do Centro Tecnológico da Cerâmica e do Vidro (CTCV). O Plano de Recuperação e Resiliência, no âmbito do aviso Componente C11 – Descarbonização da Indústria, estabeleceu uma linha de financiamento dirigido às associações empresariais e centros tecnológicos dos diferentes setores industriais. Esta iniciativa visa a elaboração de roteiros setoriais que forneçam às empresas informações e ferramentas necessárias para identificar as soluções mais adequadas à descarbonização dos seus processos.
O objetivo principal do Roteiro para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural é constituir um documento de referência, apresentando soluções orientadoras e viáveis de forma a auxiliar o Setor da Pedra Natural, na tomada de decisões rumo à descarbonização do setor, visando assim alcançar a neutralidade carbónica até 2050.
O Roteiro foi estruturado e focado num plano de trabalho que visa, de uma forma detalhada, a identificação de medidas e tecnologias abrangentes para a descarbonização, sem, no entanto, desconsiderar tecnologias que possam encontrar em estágios de maturidade tecnológica relativamente baixos.
A abordagem metodológica para o desenvolvimento dos trabalhos foi estruturada considerando as seguintes etapas principais:
Fase1 - Diagnóstico exaustivo ao potencial de descarbonização do setor da pedra natural
Foi desenvolvido um questionário, dirigido às empresas do setor, com o qual se pretende efetuar um levantamento exaustivo das principais fontes de emissão de CO2, consumos energéticos e identificar Potencial tecnológico de descarbonização e oportunidades de melhoria/ ameaças e barreiras.
Fase 2 - Elaboração do Roteiro de descarbonização do setor da pedra
1. Contexto do setor da Pedra Natural;
2. Identificação dos principais vetores de descarbonização relevantes para o setor;
3. Evolução prevista para o setor no horizonte 2025, 2030, 2035, 2040, 2045 e 2050 – por tipologia geológica / por rocha ornamental e rocha industrial;
4. Propostas de trajetórias custo-eficazes de redução de emissões de GEE do setor para 2030, 2040, 2050 – cenários;
5. Identificação das principais tecnologias de descarbonização, disponíveis para o setor dentificação de medidas de economia circular e medidas que contribuam adicionalmente para a melhoria da qualidade do ar e para a utilização sustentável e proteção dos recursos hídricos;
6. Análise de custo benefício das medidas, técnicas e tecnologias;
7. Propostas de trajetórias custo-eficazes de reduções de emissões de GEE do setor, para 2030, 2040 e 2050 – definição de cenários;
8. Considerações finais com sistematização de medidas, eficiência e cronogramas.
Fase 3 - Plano de Capacitação e Disseminação de Conhecimento no âmbito da construção do Roteiro para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural
Para que os roteiros de descarbonização sejam implementados e as metas alcançadas, é essencial o envolvimento de todos os stakeholders, com o objetivo de estabelecer uma cultura industrial focada na implementação das medidas identificadas no roteiro.
São assim propostas iniciativas de capacitação de recursos humanos (treino, formação e competências).
Esta fase de Capacitação e Disseminação de Conhecimento junto das empresas e restantes stakeholders, e inclui as seguintes atividades:
1. Manual de identidade do projeto;
2. Eventos de envolvimento de stakeholders e disseminação de conhecimento
3. Ciclo de workshops regionais e envolvimento das empresas nas práticas de Descarbonização do Setor da Pedra Natural;
4. Desenvolvimento de recursos pedagógicos digitais para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural;
5. Realização de um Open Day com envolvimento da comunidade local;
6. Curso de especialização para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural;
7. Portal para a descarbonização do setor da Pedra Natural;
8. Divulgação de resultados do roteiro.
Fase 4 - Monitorização e Avaliação
Esta fase engloba a monitorização progressiva dos indicadores de realização e de resultado que serão objeto de contratualização e a avaliação, em termos metodológicos, da preparação do roteiro, nomeadamente pelas entidades Gestoras do Projeto.
Fase 5 - Gestão do Projeto
Esta fase engloba a gestão da execução física e financeira do Projeto ao longo dos 24 meses. Será efetuado um acompanhamento progressivo das atividades planeadas no decurso do projeto, de modo a otimizar tarefas e recursos, conducentes à boa execução do projeto no seu todo.
Eventos que decorreram no âmbito do Projeto ROADTO2050
Kick-off ROADTO2050 - Roteiro para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural
O dia 27 de outubro, fica marcado pelo arranque do Roteiro da Descarbonização da Pedra Natural, projeto a desenvolver-se nos próximos dois anos, e que representa um passo significativo na direção certa, demonstrando o compromisso da indústria da pedra natural com os pilares da sustentabilidade.
O evento de kick-off, realizado no Montebelo Mosteiro de Alcobaça, contou com a presença expressiva de vários atores do setor, nomea-
damente empresários/as que assumirão um papel preponderante para o sucesso deste roteiro.
Durante o dia foram várias as intervenções com foco em temas importantes como a análise de ciclo de vida de produto e a sua pegada ambiental, as Declarações Ambientais de Produto (DAP) e a forma como a transição digital pode vir a capacitar as empresas face aos novos desafios. Este evento reuniu mais de 82 participantes e 13 palestrantes.
Projeto ROADTO2050 – Roteiro para a Descarbonização do Setor da Pedra Natural BREAKOUT SESSIONS | VILA VIÇOSA | PORTO DE MÓS | MARCO DE CANAVESES
O Projeto ROADTO2050 promoveu um Ciclo de Breakout Sessions nos dias 12, 15 e 16 de abril, em Vila Viçosa, Porto de Mós e Marco de Canaveses.
Estes eventos, organizados pela ASSIMAGRA, com o apoio do CTCV e ADENE, enquadram-se num conjunto de sessões que têm como objetivo recolher contributos dos Industriais do setor para o desenvolvimento do Roteiro para a descarbonização da indústria da Pedra Natural.
Grupos de reflexão compostos por Industriais, Fornecedores de Tecnologia, Académicos e Investigadores discutiram soluções de curto, médio e longo prazo para os Vetores de Descarbonização do setor. Contou com 7 palestrantes e uma audiência de 66 pessoas.
Conclusões
Os roteiros de descarbonização setoriais, apoiados pelo Plano de Recuperação e Resiliência (Componente C11 – Descarbonização da Indústria), representam uma oportunidade única para uma mudança de paradigma na transição energética justa, democrática e coesa, e assim alavancar a descarbonização do setor industrial.
Este Roteiro, ROADTO2050, permitirá às empresas do Setor da Pedra Natural, aceder a informação e ferramentas que as irão apoiar na identificação das soluções mais adequadas à descarbonização dos seus processos e, na adoção de práticas mais sustentáveis, fundamentais para trilhar caminho rumo à neutralidade carbónica, até 2050.
Referências
[1] Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC). Global Warming of 1.5°C: IPCC Special Report on Impacts of Global Warming of 1.5°C above Pre-Industrial Levels in Context of Strengthening Response to Climate Change, Sustainable Development, and Efforts to
Eradicate Poverty. Cambridge University Press; 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/sr15/ (Acedido a 21 de Maio 2024).
[2] Lackner, M., Chen, WY., Suzuki, T. (2012). Introduction to Climate Change Mitigation. In: Chen, WY., Seiner, J., Suzuki, T., Lackner, M. (eds) Handbook of Climate Change Mitigation. Springer, New York. https://doi.org/10.1007/978-1-4419-7991-9_1~
[3] The Paris Agreement, United Nations Climate Change. Disponível em: https://unfccc.int/process-and-meetings/the-paris-agreement (Acedido a 21 de Maio 2024).
[4] IPCC, Global Warming of 1.5°C, 2019. Disponível em: https://www. ipcc.ch/sr15/download/#full (Acedido a 21 de Maio 2024).
[5] The European Green Deal, European Commission. Disponível em: https://commission.europa.eu/strategy-and-policy/priorities-2019-2024/european-green-deal_en (Acedido a 21 de Maio 2024).
[6] Lei de Bases do Clima. Disponível em: https://diariodarepublica. pt/dr/detalhe/lei/98-2021-176907481 (Acedido a 21 de Maio 2024).
[7] Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030 (PNEC 2030) Disponível em: https://www.portugalenergia.pt/setor-energetico/bloco-3/ (Acedido a 21 de Maio 2024).
A pedra é algo do passado?
João Ribau
Agência Nacional de Inovação
Há cerca de 5.000 anos, a Idade da Pedra marcou um período da pré-história em que os humanos usavam ferramentas primitivas feitas de pedra – antes de existirem ferramentas de metal – tais como simples martelos para lascar outras pedras, quebrar nozes, sementes ou transformar argila em pigmentos. Ainda assim, existia inovação criativa além das ferramentas. A peça de arte mais antiga conhecida da Idade da Pedra remonta há cerca de 40.000 anos1 .
E não parou por aí. A pedra e a sua inovação acompanharam a civilização humana até hoje tal como as técnicas de fabricação.
A fabricação de pedra tem sido crucial para a expressão artística e de engenharia desde há milénios, como se verifica em vários exemplos clássicos, como as ruínas egípcias, Stonehenge, os edifícios dos antigos gregos e romanos, onde o mármore predominava, inúmeros templos, castelos, ou catedrais medievais.
Inovação e sustentabilidade
A inovação não é apenas alicerçada por avanços tecnológicos, per si, maior cadência produtiva, redução de custos, ou preferências do consumidor. Em prol de um futuro melhor, hoje o desenvolvimento sustentável [na sua primeira definição – desenvolvimento que dá resposta às necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de poderem satisfazer as suas, i.e. evitando a degradação e a exaustão dos recursos naturais, a equidade na distribuição de recursos, e (numa definição mais atualizada) potenciando a equidade económica e social]2 tem uma importância fundamental em qualquer economia, e com impactos em qualquer setor.
Consequentemente, as políticas europeias têm pautado diversas estratégias que privilegiam a sustentabilidade e a gestão eficiente de recursos de produtos e serviços ao longo do seu ciclo de vida. Numa perspetiva semelhante, a nível nacional destaca-se por exemplo o Roteiro para a neutralidade carbónica 2050 e o Plano de Ação para a Economia Circular em Portugal (PAEC), integrando uma estratégia de valorização de um novo paradigma de crescimento económico para a economia portuguesa.
Muitas destas estratégias têm tido um impacto relevante e visível nos projetos de I&D&I, em programas europeus (e.g. Horizonte Europa) ou nacionais (e.g. PT2030, PRR), nomeadamente no crescente nível de exigência de resultados e respetivos indicadores (e.g. redução de emissões, do consumo energético, dos recursos materiais, etc.).
Muitas destas exigências, quando obrigatórias, ordenam maior esforço por parte das empresas, traduzindo-se na necessidade de aumentar o uso de energias renováveis, a redução substancial do uso de combustíveis fósseis (incluindo gás natural), ou a transformação tecnológica dos processos. O que muitas vezes requer investimentos adicionais - tornando-se num desafio em termos de competitividade em mercados globais, sobretudo onde as cadeias de abastecimento têm maior segurança, mão de obra é mais barata, ou as regras e metas sustentáveis menos exigentes.
Um dos exemplos, é o alinhamento dos projetos com o Pacto Ecológico Verde, que pretende atingir a neutralidade carbónica em 2050. Para concretizar esta transição ecológica da UE, o Pacto contempla medidas de apoio ao setor industrial, abrangendo a criação de um quadro regulamentar mais simplificado, melhor acesso ao financiamento, mais apoios ao desenvolvimento de competências e maior segurança nas cadeias de valor.
Para além de mais investimento, a UE quer promover maior transparência. Assim, o regulamento de taxonomia da EU pretende definir exatamente, e de forma comparativa, quando uma empresa, ou atividade, é sustentável em comparação com os seus concorrentes –sendo que estas empresas, ao destacarem-se positivamente, podem dispor de mais benefícios. Complementarmente, o princípio de ‘não prejudicar significativamente’ o ambiente, conhecido por DNSH (‘Do No Significant Harm’), é um dos critérios que deve ser acautelado para que uma atividade económica seja considerada ambientalmente sustentável à luz da taxonomia verde europeia, e simultaneamente uma condição para o acesso a vários fundos europeus.
Sustentabilidade no setor da pedra
Existem diversos exemplos que merecem ser reconhecidos no setor da pedra para alcançar os objetivos do Pacto Ecológico.
Na área do consumo de energia, tecnologias mais eficientes e o uso de fontes renováveis, contributos fundamentais desde a extração ao
processamento. No consumo de água, a reutilização, a minimização da necessidade de água “nova”, e evitar o descarte de águas prejudiciais à saúde e ambiente, implementando sistemas de tratamento, purificação, e reutilização, são objetivos de sustentabilidade para todo o setor.
A nível de redução de resíduos, novos métodos de transformação e reutilização de subprodutos da pedra, ou mesmo a implementação da simbiose industrial implicando criar uma rede colaborativa e de troca de recursos entre entidades, têm vindo a trazer benefícios ambientais, mas também económicos. Alavancado pelas políticas europeias (e não só) do ecodesign (projeto ecológico), sustainable by design (projeto sustentável), zero defect (zero defeitos), zero waste (desperdício zero), novas tecnologias têm vindo a fazer a diferença para ir além da reutilização de materiais, como a redução das espessuras de corte através de ferramentas de elevado desempenho, e tecnologias de projeto mais complexas e capazes.
O paradigma da transformação industrial tem vindo a evoluir num
sentido mais social também, sendo inegável que a segurança e proteção no trabalho tem vindo a aumentar através da implementação de medidas que protejam os colaboradores na sua saúde física e mental, bem-estar corporativo, ou a formação e atualização de competências. Atualmente, tem vindo a ser dado cada vez mais importância ao impacto positivo criado nas comunidades locais, valorizando a quantidade de material extraído e processado nos distritos industriais próximos e a competência no seu trabalho significa fazer da extração de pedra, definida como fator de desenvolvimento económico, social e cultural, um processo de coesão e identidade capaz de envolver toda a comunidade.
Desafios e oportunidades
Muitas das empresas operam da mesma forma há décadas, e é fácil encontrar indústrias cujo desafio de descarbonização é de elevado risco – de fiabilidade ou viabilidade económica. É por isso que a inovação é tão crucial para a descarbonização destas indústrias: não
havendo outras opções. Face às metas definidas pela UE, é urgente procurar tecnologias disruptivas, novos equipamentos que possam ser rapidamente implementados.
A evolução natural passará pela utilização de novas formas de energia, suportadas na digitalização de processos, e promovendo o desenvolvimento de tecnologias mais eficientes nos processos.
A eletrificação de processos térmicos é uma possibilidade em alguns casos, podendo usufruir de energia renovável. Ou, na impossibilidade da eletrificação, é possível encontrar novos combustíveis, “mais limpos” (e.g. biometano, hidrogénio, biomassa, solar), ou mesmo implementar tecnologias de captura de carbono para compensar as emissões.
A transformação digital da indústria são parte da solução para o problema, já que grande parte das tarefas industriais apresentam um grande potencial de automatização e desmaterialização com recurso a tecnologias já existentes. Por exemplo, na fase de projeto, a simulação e modelação de peças ou estruturas (e.g. utilizando o BIM (Building Information Modeling), realidade virtual/aumentada). Para um maior controle dos processos, ou para otimizar as paragens para manutenção, a modelação e analítica dos processos (e.g. utilizando computação, sensorização, IoT, inteligência artificial, manutenção preditiva, etc.). A rastreabilidade de recursos também tem demonstrado vantagens para o apoio á decisão na monitorização de fluxos materiais desde o projeto ao chão de fábrica. E outro exemplo tem sido a impressão 3D que tem vindo a crescer no setor da construção.
Embora o financiamento para a inovação seja muitas vezes um obstáculo, muitas vezes o verdadeiro desafio é o conhecimento e o acesso a oportunidades para inovar.
Existem várias entidades nacionais que tentam fazer chegar esse conhecimento às empresas, como por exemplo, ANI, IAPMEI, COMPETE, AICEP, FCT, START-UP PORTUGAL, Fundo Ambiental, Banco Português de Fomento, as Comissões De Coordenação E Desenvolvimento Regional, entre outras. Mas também não é fácil chegar ao conhecimento generalizado de todas as oportunidades. Mesmo o Balcão Dos Fundos, uma plataforma online que permite encontrar diversas fontes de financiamento para projetos, não é completo. É importante que as empresas contactem as entidades em busca de oportunidades de forma aberta, pois o ecossistema é inerentemente dinâmico. Alguns exemplos:
• O PRR português é um programa, com um período de execução até 2026, que visa implementar um conjunto de investimentos distribuídos por cerca de 14 mil M€ de subvenções e 2,7 mil M€ de empréstimos. Como exemplo, a implementação do hidrogénio verde, a eletrificação de tecnologias de produção, a captura de CO2 são temas de alguns dos projetos no âmbito do PRR (e.g. nos avisos para a criação de Roteiros para a descarbonização e das Agendas mobilizadoras verdes). Ainda no PRR a digitalização de processos, o teste e experimentação de soluções digitais inovadoras, e a implementação de modelos de
negócio também estão a ser consideradas (e.g. Polos de Inovação digital, Testbeds, Coaching 4.0, indústria 4.0);
• O Portugal 2030 põe em prática o Acordo de Parceria entre Portugal e a Comissão Europeia para aplicar 23 mil milhões de euros dos Fundos Europeus no desenvolvimento da economia portuguesa, entre 2021 e 2027. Nele podemos encontrar concursos para apoiar o I&D Empresarial e a Inovação Produtiva;
• Existem também apoios sob forma de benefícios fiscais que beneficiam empresas com atividades de I&D, como por exemplo a medida SIFIDE II.
• A nível internacional, o Horizonte Europa é o atual Programa-Quadro de Investigação e Inovação da União Europeia, que, com conclusão prevista para 31 de dezembro de 2027, tem uma dotação orçamental prevista de 95,5 mil milhões de euros para apoio às atividades de investigação e Inovação, por norma, em colaboração com entidades europeias.
O que é necessário para um ecossistema de inovação saudável?
É tradicionalmente conhecido que muitos dos setores trabalham de forma fechada, não interagindo com outros setores. Também, por receios associados à concorrência, as empresas evitam partilhar conhecimento, boas práticas, e sobretudo más práticas. Isto atrasa a inovação e o conhecimento de novas ferramentas. Por outro lado, é frequente encontrar empreendedores com ideias inovadoras, mas desligados dos problemas que as indústrias enfrentam. Também estes dois grupos não interagem com facilidade.
Muitas das oportunidades de financiamento, algumas incluídas nos programas referidos acima, exigem que os projetos sejam feitos em consórcio – em colaboração entre empresas a nível europeu, nacional, e cooperando com entidades do sistema científico. A construção de um consórcio para desenvolver um projeto não é tao difícil como se pensava, mas tem de ser pensada. Não é difícil porque felizmente tem sido cada vez mais noticiado que as invenções nascem de parcerias. E que o mundo científico (universidades, centros de investigação, laboratórios, etc.) querem trabalhar em problemas reais. Mas tem de ser pensada, porque um consórcio precisa de todos, –os “cientistas” precisam de saber os problemas, e os “empresários” precisam de abrir as portas das suas fábricas. O risco tem de ser partilhado. E o financiamento ser visto como uma oportunidade de implementar uma inovação, não de forma gratuita, mas apoiada e dissolvendo o risco. Esperar que uma inovação exista para o curto prazo é também um ingrediente para o insucesso. Da mesma forma, que assumir ganhar financiamento à primeira vez que se candidata, também o é. É um jogo de paciência, e frustração, e que deve ser partilhado com os nossos parceiros de projeto. Por isso, escolher os parceiros certos para criar um consórcio é fundamental. Tal como não desistir. Os benefícios serão colhidos.
MAGNETINDUSTRIA
EQUIPAMENTOS PARA A INDÚSTRIA. UNIPESSOAL, LDA
TECNOMAG
Há mais de 20 anos ao serviço da indústria
Desferrização
Equipamentos para descontaminação e separação de barbotinas, vidrados, matérias-primas, reciclagem de metais, vidro, cartão, plástico, indústria alimentar e farmacêutica, etc.
• Desferrizadores para líquidos e sólidos de alta intensidade
• Barras magnéticas
• Placas magnéticas
• Overbands
• Filtros magnéticos
Separação de sólidos
• Separadores de corrente de Foucault para metais n/ magnéticos
• Separadores vibratórios
Controladores de prensagem hidrostática IST
Automação industrial
Projetos específicos de engenharia
A degradação da pedra e sua previsibilidade
Fabio Sitzia
Laboratório HERCULES Universidade de Évora
A degradação da pedra de construção é um processo lento, mas constante, que inclui alterações físico-químicas, mecânicas e estéticas, causadas por fatores ambientais como a biocolonização e as variáveis termo-higrométricas, a precipitação, a composição atmosférica, a intensidade do vento e a radiação solar.
O clima é, portanto, o fator natural que condiciona a alteração da pedra e atua de forma diferente dependendo dos parâmetros. Em climas pouco chuvosos, como os desérticos ou estepe, onde as temperaturas médias anuais são médias-altas, a pedra de construção sofre pouca degradação. Nos climas subpolares e polares, o efeito do gelo e do degelo provoca na pedra uma degradação puramente físico-mecânica. Pelo contrário, nos climas tropicais equatoriais e monçônicos, os efeitos da chuva e das temperaturas médias anuais elevadas são responsáveis pela degradação química da pedra. O clima mediterrâneo que afeta a maior parte do território português, é uma condição em que as rochas são afetadas por uma degradação físico-química tendencialmente de média a baixa intensidade.
Geralmente, as zonas costeiras (classificáveis como aquelas compreendidas entre a costa e 5 km para o interior) estão sujeitas a uma degradação complexa e dificilmente previsível devido à interação da pedra com a humidade ambiental mais salina do que as zonas interiores.
Além dos fatores termo-higrométricos e da precipitação, o efeito dos anidridos atmosféricos como, por exemplo, CO2, N2O, SO2 e outros compostos como O3 podem determinar uma corrosão da pedra geralmente indicada como surface recession. Os anidridos mencionados reagem com o oxigénio e a água atmosférica, levando à formando ácidos. Estes desempenham uma função de degradação na pedra de construção, causando danos de forma mais extensa com base nas próprias características químicas e mineralógicas da pedra. As rochas silicatadas são comumente mais resistentes do que as rochas carbonatadas. Estas últimas, por outro lado, são relativamente mais suscetíveis a ação dos agentes atmosféricos e, por serem constituídas praticamente por um único mineral, são mais simples de estudar do ponto de vista químico.
A meteorização das diferentes litologias, pode ser recriado em laboratório, "antecipando" o comportamento da pedra submetida a várias condições atmosféricas. Este tipo de teste é comumente cha-
mado ageing, palavra que abrange uma enorme gama de práticas laboratoriais, muitas das quais reguladas por normas europeias.
Os mesmos ciclos de gelo e degelo e choque térmico (norma EN 12371 e EN 14066) são respetivamente classificáveis como testes de envelhecimento (ageing) e são frequentemente usados para "antecipar e definir" a resposta da pedra ao stresse devido a condições climáticas extremas. Outros ensaios acelerados dizem respeito à exposição à luz solar e a outros parâmetros climáticos.
Embora não seja propriamente óbvio, os mesmos testes de resistência aos sais segundo EN 12370 e EM 14147 são classificáveis como ageing
Normalmente, pensa-se que em todos os testes de envelhecimento é possível estabelecer uma correlação entre o tempo de duração do teste e o tempo de exposição em condições naturais. Isto é, em parte, verdade, mas é válido apenas em alguns dos testes de envelhecimento. Por exemplo, uma correlação empírica entre o tempo de duração do teste e o tempo de exposição em condições naturais poderia ser realizada nos testes de exposição solar, onde se mede a variação de cor da pedra ao longo do tempo. Neste caso, de facto, a intensidade solar reproduzida na câmara climática pode ser relacionada com a intensidade solar natural num determinado local de interesse. Em qualquer caso, mesmo obtendo uma relação entre os dois parâmetros, é sempre bom reproduzir o teste (valiadação do teste) em ambiente natural e verificar se a relação estabelecida é correta ou não.
A este respeito, é importante lembrar que os testes de envelhecimento raramente são programados para oferecer este tipo de informação, mas são geralmente concebidos para compreender os mecanismos básicos da degradação da pedra e/ou as condições de degradação extremas em tempos razoáveis, em vez de esperar décadas em exposições naturais.
Nos testes mencionados, muitas vezes as condições às quais as amostras de pedra são submetidas são realmente extremas e, em
alguns casos, foram criticadas, pois as modalidades de degradação da pedra em condições extremas podem diferir da degradação da pedra que ocorre em condições naturais. Isto significa que o envelhecimento e meteorização não são perfeitamente paralelos e a confiança em demasia nos testes de envelhecimento pode ser, em alguns casos, limitante.
Os testes são realizados em câmaras climáticas que podem ser projetadas para seguir normas específicas e outras que possuem maior flexibilidade, permitindo alterar os parâmetros e reproduzir ciclos de temperatura, pressão, humidade, entre outros, diariamente.
Dessa forma, obtêm-se testes de degradação mais “natural”, o que deve garantir uma maior analogia entre a degradação natural e a degradação artificial.
Recentemente, no âmbito académico, são concebidos testes de degradação não "forçados ou extremados", para simular condições naturais realistas, simplesmente acelerando ciclos diários e sazonais de temperatura ou outras variáveis. Nesse caso, obtêm-se testes mais
fiéis à realidade, que, no entanto, devem ser acelerados de maneira cautelosa. Mesmo neste tipo de teste, fatores de aceleração muito elevados afastam a simulação da realidade ambiental. Se isso ocorrer, há um efeito "estático", ou seja, uma condição em que a amostra não consegue absorver, por exemplo, uma variação de temperatura, mantendo uma temperatura superficial praticamente inalterada. Isso é muito importante na pedra, pois trata-se de um material com condutividade térmica limitada.
PROJETO MOBILIZADOR INOVMINERAL 4.0 – TECNOLOGIAS AVANÇADAS E SOFTWARE PARA OS RECURSOS MINERAIS
InovMINERAL4.0 – Tecnologias Avançadas e Software para os Recursos Minerais
O Projeto Mobilizador INOVMINERAL 4.0 – TECNOLOGIAS AVANÇADAS E SOFTWARE PARA OS RECURSOS MINERAIS, candidatado em 31 de julho de 2019 ao Aviso nº 14/SI/2019 - Sistema de Incentivos à Investigação e Desenvolvimento Tecnológico (SI I&DT), Programas Mobilizadores, teve como principal objetivo a reorientação de modelos industriais inovadores para a Indústria dos Recursos Minerais através do desenvolvimento de tecnologias avançadas, novos produtos e software que respondam a toda a cadeia de valor: upstream, valorização dos Recursos Minerais e Market Place
O INOVMINERAL 4.0 envolveu um consórcio de 20 entidades liderado pela CEI – Companhia de Equipamentos Industriais, constituído por 8 Empresas de Pedra Natural, 5 Empresas Tecnológicas, 5 Entidades do Sistema Científico e Tecnológico e 2 Entidades Gestoras de Clusters: FRAVIZEL, FRONTWAVE, SEVERAL WAYS, STREAM CONSULTING, MARFILPE, SOLANCIS, JULIPEDRA, LSI STONE, POLIMAGRA, DIMPOMAR, MVC, POLITÉCNICO DE LEIRIA, FCUL, FCUP, ISCTE, MÁRMORES VIGÁRIO, ACPMR, IST e PTPC.
Em torno dos Eixos de Economia Circular, Digitalização de Processos, Processos Colaborativos 4.0 e Dinamização e Criação de Competências estiveram em processo de desenvolvimento 24 novas soluções inovadoras capazes de revolucionar o modus operandi da cadeia de valor da Indústria dos Recursos Minerais, desde o reconhecimento e avaliação de reservas de Recursos Minerais ao envolvimento e acompanhamento direto do cliente na conceção e fabrico dos seus produtos. Foram seis as novas tecnologias, metodologias e produtos, baseados nos pilares da Economia Circular, valorização da pedra natural, inovação produtiva, recuperação de resíduos e novos produtos e uma nova metodologia para a prospeção não invasiva e eco eficiente de recursos minerais, garantindo a Sustentabilidade, Produção Mais Limpa e Desperdício Zero. Oito novas tecnologias respondem diretamente à Digitalização e Automação de Processos de toda a cadeia de valor dos Recursos Minerais com maquinaria e software IoT de valorização de Pedra Natural, otimização de exploração e fabricação e recuperação e utilização de resíduos, em articulação com uma plataforma integrada de cocriação e venda de produtos de Recursos Minerais.
Oito tecnologias inovadoras permitem ao cliente maior envolvimento e acompanhamento dos seus produtos na fase de conceção e fabrico, em consonância com os desafios impostos pela Indústria 4.0 através de ferramentas de realidade aumentada, gestão produtiva e conceção de novos produtos, plataforma de coordenação e abastecimento de Rochas Ornamentais, tecnologias de otimização e logística de exportação e softwares de gestão empresarial e produtiva. Dois pacotes de metodologias e tecnologias garantem a modernização e flexibilização dos perfis profissionais, promovendo a Dinamização e Criação de Competências, orientando-as para funções em empresas integradas no contexto Industrial e Económico 4.0, com tecnologia de fabricação de peças industriais e artísticas através de desperdícios de Pedra Natural e um simulador de formação avançada em gestão e tecnologias digitais. No dia 11 de julho, foram apresentados os resultados do INOVMINERAL 4.0, na empresa MARFILPE. Estiveram presentes cerca de 50 participantes, entre membros do projeto e pessoas ligadas ao Setor dos Recursos Minerais, ao ambiente, ao ensino, à tecnologia e à inovação. A missão e atividade dos parceiros do Projeto Mobilizador foi destacada pelo dinamismo e cooperação no desenvolvimento e validação de tecnologias, metodologias e produtos sustentáveis, digitais e inovadores que no seu conjunto contribuem para o sucesso, desenvolvimento e revolução industrial do Setor dos Recursos Minerais, bem como permitido uma incontestável valorização da cadeia de valor do Setor. O Projeto Mobilizador contou com um investimento elegível de 5.686.111,50 € e um incentivo não reembolsável de 3.769.068,43 €, no desenvolvimento de 24 soluções, em 5 PPS (Produto, Processo, Serviços), 4 PPS de IDI e 1 PPS de Gestão e Promoção, com cofinanciamento do COMPETE 2020, LISBOA 2020 e Portugal 2020 e União Europeia através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.
Os resultados obtidos, que permitam maior valor acrescentado, a toda a cadeia de valor, resultou na mobilização de mais parceiros e na construção de uma AGENDA VERDE – SUSTAINABLE STONE BY PORTUGAL, no âmbito do PRR, onde o Setor continua comprometido com a inovação, com a internacionalização, valor acrescentado, mais ambiente, mais segurança e menos desperdício.
(2024-2025)
Início do curso
1 julho a 15 setembro Período de
A utilização da Pedra Natural na construção sustentável
Clemente Pinto
Universidade da Beira Interior – UBI | Covilhã
Em 2020, realizou-se em Londres uma exposição intitulada “New Stone Age”, focada na aplicação estrutural da pedra natural. A motivação para a exposição, e para a dinâmica que o tema da utilização da pedra em novas estruturas tem implicado, com simpósios, parcerias para investigação e desenvolvimento, e até notícias e reportagens em meios de comunicação importantes, como o jornal inglês “The Guardian”, assenta na capacidade do material para ajudar a reduzir a pegada carbónica no setor da construção. Diferentes estudos mostram que construir com pedra tem emissões de dióxido de carbono inferiores a todas as alternativas de materiais e sistemas de construção. Adicionalmente, é quase senso comum que uma construção em pedra é durável no tempo, com reduzidos custos de manutenção.
A utilização da pedra natural na construção tem sido uma prática antiga, mas com o advento de novos materiais e técnicas de construção, sua aplicação estrutural tem sido negligenciada. No entanto, a crescente preocupação com as questões ambientais e a busca por soluções sustentáveis têm ressuscitado o interesse pela pedra natural como material de construção. As vantagens são múltiplas e evidentes.
Do ponto de vista do comportamento mecânico, a pedra natural tem características diferenciadoras pela positiva. Por exemplo, no território nacional é fácil ter acesso a rochas com resistências à compressão superiores a 160 MPa, o que as coloca na categoria de material com ultraelevada resistência. Isso significa que a pedra pode suportar cargas extremamente elevadas, tornando-a ideal para certas aplicações estruturais onde a durabilidade e a resistência são cruciais.
Perante todos os aspetos e vantagens referidas anteriormente, parece ser legítimo questionar porque é que a aplicação estrutural da pedra é ainda residual em muitos países e porque é que não se incrementa de forma rápida. A resposta à questão implica um enquadramento técnico e histórico, a que se pode adicionar algumas suposições cuja confirmação requer uma abordagem que vai para além do presente texto.
Até à Revolução Industrial e à produção em grande escala de materiais metálicos com elevada resistência à tração, a construção de estruturas relevantes como pontes e catedrais resultava de um domínio da relação entre forma e forças. Ou seja, não existiam soluções que permitissem vencer vãos livres relativamente grandes com
estruturas robustas e duráveis, que não fossem formas com curvatura, arcos ou abóbadas. Embora os grandes arcos e abóbadas fascinem o observador pelo domínio da técnica e pela clareza com que o equilíbrio é garantido, formas com curvatura são limitadoras do ponto de vista da gestão dos espaços construídos e não resolvem os problemas mais prementes a que a construção sempre teve de responder, como criar habitações e espaços de trabalho capazes de albergar muita gente.
A associação do betão com o aço, o que se conhece como betão armado, deu aos arquitetos e engenheiros a possibilidade de não dependerem das formas com curvatura, existindo uma maior liberdade para a criação e gestão dos espaços. Por outro lado, a indústria da construção encontrou uma solução rápida e económica para construir em grande escala, fazendo uso do facto do betão ser um material moldável, com construção in-situ mais fácil, rápida e económica.
As vantagens da construção com betão armado terão sido uma motivação para que os diferentes intervenientes no setor da construção, desde empresas, produtores de matérias-primas, universidades e institutos de investigação, se lançassem para o desenvolvimento técnico e científico que permite a prática sistemática do projeto e da construção com esse material. Esse facto é evidenciado pelos códigos de dimensionamento disponíveis e bem desenvolvidos, e pelos imensos trabalhos de investigação realizados por todo o mundo. Esse cenário é também observável para a construção com aço e com madeira, não se podendo dizer o mesmo na utilização estrutural da pedra.
O cenário acima descrito parece justificar que a utilização estrutural da pedra se tenha tornado residual, levando à perda de conhecimento e vontade de o desenvolver por parte dos centros de investigação, para além da perda de capacidade de aplicação por parte das empresas de construção. Por outro lado, as empresas de extração e processamento, que estão mais afastadas da construção em si, dedicaram-se ao que lhes era pedido, ou seja, pedra para aplicações ornamentais com utilização estrutural pouco relevante. Para tal, desenvolveram-se, passaram a empregar tecnologia, com significativo acrescento de valor ao produto. Note-se, aliás, que se verifica um maior desenvolvimento tecnológico do setor da extração e processamento de pedra do que no setor da construção, que está mais atrasado em termos de processos industriais.
A problemática das alterações climáticas associadas às emissões de CO2, após a Revolução Industrial, colocam desafios à indústria da construção, na medida em que tem de se tornar mais sustentável, empregando materiais com menos emissões e utilizando toda a gama de produtos, reduzindo ao mínimo a não utilização do que não tem valor comercial ou pode ser considerado como resíduo. Acresce a essas exigências a necessidade de maior industrialização orientada para a pré-fabricação, com maior controlo de qualidade e menor tempo de construção in-situ, respondendo simultaneamente à crescente falta de mão de obra.
O cenário de exigência e de emergência imposta ao setor implicará a pedra natural como parte de solução, fazendo com que possa reganhar relevância em aplicações estruturais, sem colidir com as aplicações e produtos atualmente desenvolvidos. Assim, importa analisar de que modo se pode fazer a reintrodução da pedra na construção, atendendo a um conjunto de condicionamentos relacionados com as linguagens arquitetónicas contemporâneas, os procedimentos de projeto estrutural, os processos de controlo de qualidade e as exigências do mercado na perspetiva do consumidor final.
Numa época em que se está a assistir a uma nova revolução, neste caso digital, a capacidade de resposta do setor da exploração e processamento da pedra é diferente do que terá acontecido aquando do surgimento e crescimento da construção em betão armado. Ou seja, o setor está mais bem preparado para ajudar o setor da construção a ser mais sustentável, potenciando a aplicação estrutural da pedra, uma vez que dispõe de tecnologia de corte e produção de elementos
bastante sofisticada, eficiente e com integração de uma cadeia de informação entre todos os intervenientes.
No entanto, há trabalho que é necessário e que terá que incorporar os centros de investigação, as universidades, os clusters e as empresas, num esforço conjunto para recuperar tempo perdido, atrair profissionais como arquitetos e engenheiros e para conferir conhecimento e competência. Para além do desenvolvimento de produtos e a sua certificação, é necessário trabalho de investigação que crie bases para futuros códigos de dimensionamento e projeto, normas de controlo de qualidade e linhas orientadoras para a conceção e produção. É imperativo que esses esforços sejam coordenados e apoiados por políticas públicas que incentivem a pesquisa e a inovação no uso estrutural da pedra.
A convicção de alguém que estuda a aplicação estrutural da pedra há quase vinte anos é de que do ponto de vista técnico tudo isso é possível. A capacidade de interação e colaboração entre os intervenientes no setor, numa visão do local para o global e numa perspetiva de investigação/desenvolvimento integrada, serão a chave para alcançar os objetivos, fazendo com que a pedra, mais uma vez, nos ajude a persistir e a evoluir para um futuro positivo. É uma visão otimista que requer um compromisso conjunto e uma abordagem proativa para superar as barreiras existentes e maximizar o potencial da pedra natural na construção moderna.
Além disso, a educação e a formação de novos profissionais na área são cruciais. Arquitetos, engenheiros e outros profissionais da construção precisam estar bem informados sobre as vantagens e técnicas de utilização da pedra. Programas de formação contínua e workshops podem ajudar a disseminar o conhecimento e incentivar a adoção de práticas sustentáveis. A colaboração internacional também pode desempenhar um papel importante, permitindo a troca de ideias e tecnologias inovadoras que podem ser adaptadas para diferentes contextos locais.
Em resumo, a pedra natural tem um potencial significativo para contribuir para a construção sustentável. A sua reintrodução como material estrutural requer um esforço conjunto de pesquisa, desenvolvimento e formação, além de políticas de apoio que incentivem a inovação. Com a tecnologia atual e uma abordagem colaborativa, é possível revitalizar o uso da pedra na construção, promovendo um setor mais sustentável e eficiente.
A plataforma BIM Library Marketplace
Rodrigo Pereira e Irene Ferreira STREAM Consulting
Introdução ao problema
O setor das pedras naturais desempenha um papel crucial na estética, design e valorização de propriedades no setor imobiliário. No entanto, a integração tecnológica deste setor ainda está aquém do desejado, especialmente em comparação com outros segmentos da construção civil que têm avançado rapidamente na digitalização e eficiência dos processos, impulsionados pela transição para a Indústria 4.0 e pelo uso do Building Information Modeling (BIM).
A complexidade e ineficiência do processo convencional de venda e aquisição no setor de pedras naturais são exacerbadas pela natureza personalizada dos produtos. Esta personalização torna o processo mais complexo, resultando em comunicação fragmentada entre as entidades envolvidas nas fases iniciais dos projetos. A ausência de uma solução centralizada agrava ainda mais o problema, dificultando a seleção, especificação e obtenção de cotações, além de fragmentar informações técnicas, preços e disponibilidade.
Definição de BIM
O BIM é uma metodologia que abrange todo o ciclo de vida de um projeto de construção, desde a fase inicial de design e planeamento até à construção, instalação e manutenção. Utilizando modelos tridimensionais, o BIM permite a construção e visualização virtual realística de edifícios, facilitando a colaboração e informação entre todas as partes envolvidas.
O BIM não apenas aprimora a eficiência na fase de construção, mas também desempenha um papel essencial na manutenção e remodelações, garantindo que todos os dados do projeto sejam atualizados e acessíveis ao longo de sua vida útil. Esta abordagem integrada permite que engenheiros, arquitetos e fornecedores trabalhem de maneira mais colaborativa e eficiente.
Objetivos e soluções propostas
Para mitigar os problemas identificados, foi desenvolvida uma plataforma web designada de (BIM Library Marketplace) BLM, que integra ferramentas BIM, projetada para facilitar a compra e venda
de produtos em pedra natural para a construção de edifícios. Com um foco em encomendas personalizadas e os respetivos objetivos permite:
1. Agilizar o Processo de Encomenda: Facilitar a seleção, especificação e obtenção de cotações para produtos em pedra natural;
2. Centralizar Modelos: Reunir detalhes técnicos, preços e disponibilidade numa plataforma única, melhorando a eficácia da comunicação e do processo de compra e venda;
3. Promover a Colaboração: Utilizar o BIM para criar um ambiente onde engenheiros, arquitetos e fornecedores possam interagir e colaborar de forma mais eficaz durante todo o processo de procurement.
A aplicação proposta permitirá que os fornecedores disponibilizem os seus modelos BIM padronizados, possibilitando que os compradores experimentem virtualmente esses produtos nos seus projetos. A plataforma BLM prioriza a acessibilidade e compatibilidade entre diferentes softwares orientados à metodologia BIM, incorporando na sua arquitetura o uso de ficheiros IFC (Industry Foundation Classes). Entre as suas diversas funcionalidades, destacam-se as seguintes:
1. Cotações de Produtos Personalizados: A plataforma permite aos clientes submeter, de forma rápida e eficaz os seus projetos aos transformadores/fornecedores de pedra natural com capacidade de responder a encomendas personalizadas. Devido à natureza personalizada destes pedidos, processo complexo e não linear, a plataforma permite extrair dos modelos BIM os dados necessários para a realização de orçamento com a devida listagem de produtos, quantidades, tipo de pedra, dimensões, etc., assim como oferecer ao cliente o apoio técnico necessário ao refinamento dos produtos pretendidos;
2. Acompanhamento em Tempo Real: Inerente ao processo de adjudicação e aquisição, a plataforma abre um canal de comunicação que permite ao cliente perceber o estado atual de execução da sua encomenda, desde a fase de projeto/orçamentação até à sua entrega ou conclusão, conforme acordado entre as partes. Isto proporciona transparência e tranquilidade, permitindo que os clientes saibam exatamente como, que produtos e quando serão entregues;
3. Marketplace de Produtos Padronizados: A plataforma também funciona como um marketplace onde os fornecedores podem listar os seus produtos standard. Os clientes podem
assim navegar por uma ampla gama de produtos disponíveis, visualizar descrições detalhadas, preços e imagens. Isto facilita a comparação e a escolha dos produtos que melhor atendem às suas necessidades;
4. Segurança de Dados: Para garantir que todas as informações sejam mantidas seguras, a plataforma utiliza criptografia para proteger mensagens, dados de negociação entre outros dados sensíveis dos utilizadores. Isso assegura que todas as comunicações e transações sejam confidenciais e seguras.
Conclusão
A implementação de uma plataforma BLM que integra ferramentas
BIM representa um passo significativo para a modernização do setor da pedra natural. Ao centralizar informações e facilitar a colaboração entre diferentes atores do setor, a plataforma não só otimiza o processo de compra e venda, mas também promove uma maior eficiência e competitividade no mercado. Através de uma abordagem
inovadora, a plataforma BLM visa resolver problemas críticos de comunicação e gestão, posicionando este setor em linha com as tendências tecnológicas atuais. O BLM resulta do trabalho desenvolvido na empresa Stream Consulting que detém elevada experiência ao nível da consultoria técnica nas áreas da inovação e desenvolvimento de processos, gestão de operações e de logística e engenharia e gestão industrial.
O projeto está a ser desenvolvido no âmbito da Agenda SustainableStone by Portugal – Valorização da Pedra Natural para um futuro digital, sustentável e qualificado (Projeto n.º 40), enquadrando-se no WP3 – Connect Stone, Aviso n.º 02/C05-i01.02/2022, financiado pelo Programa de Recuperação e Resiliência (PPR), pela República Portuguesa e pela União Europeia (UE) no âmbito do Programa Next Generation EU. O projeto conta com colaboração de entidades da indústria da pedra natural e outras entidades, nomeadamente Solancis, Julipedra, Marfilpe, AireLimestones, Arrow 4D, CEI, Dimpomar, IPLeiria, U. Évora que desempenham um papel fundamental na formulação crítica dos requisitos e na avaliação empírica do serviço.
Valorização de cascas de ovos em pastas de revestimentos cerâmicos
M. P. Seabra 1 , I. S. Vilarinho 1 , M. N. Capela 1 , J. Silva 2 , S. Batista 2 e F. Vásquez 3
1 CICECO – Instituto de Materiais de Aveiro/DEMaC - Departamento de Engenharia de Materiais e Cerâmica, Universidade de Aveiro, 3810-193 Aveiro, Portugal.; 2 Grupo MCS Portugal, Zona Industrial de Oiã, Lote 34, 3770-908 Oiã, Portugal.; 3 Instituto de Tecnología Cerámica (ITC), Asociación de Investigación de las Industrias Cerámicas (AICE), Campus Universitario Riu Sec, 12006 Castellón, Spain.
Resumo
Valorizar os resíduos é extremamente importante em termos económicos e ambientais. Só na Europa, são geradas cerca de 150 mil toneladas/ano de casca de ovo que, geralmente, têm como destino os aterros sanitários. As cascas de ovo são, essencialmente, constituídas por carbonato de cálcio, uma das matérias primas utilizadas na produção de revestimentos cerâmicos (monoporosa). Assim, este estudo tem como objetivo estudar a valorização deste resíduo (bio-calcite), como matéria-prima secundária para as pastas de monoporosa.
Para tal foram testados diversos teores de substituição (0, 25, 50, 75 e 100% em massa) da calcite, matéria-prima natural utilizada atualmente, por resíduos de casca de ovo. As características fisico-quimicas dos provetes cozidos foram avaliadas, tendo-se constatado que os valores obtidos estão dentro dos limites de especificação destes produtos. Portanto, este estudo demonstrou que a calcite mineral pode ser totalmente substituída por resíduos de casca de ovo. Os revestimentos cerâmicos desenvolvidos consomem menos matérias-primas virgens e promovem a diminuição da quantidade de resíduos depositados em aterro.
1. Introdução
O aumento do consumo de bens está a causar diversos problemas ambientais nomeadamente o aumento da quantidade de resíduos gerados e a rápida diminuição dos recursos naturais. Uma vez que os resíduos acarretam custos com a sua gestão e eliminação, o interesse na sua valorização tem vindo a aumentar [1].
Em 2018, foram produzidas, no mundo, cerca de 77 milhões de toneladas de ovos, o que corresponde a ≈8,5 milhões de toneladas de casca de ovos [2]. A casca do ovo é constituída por uma rede de fibras proteicas (membrana orgânica), carbonato de cálcio cristalino (95% da massa), carbonato de magnésio, fosfato de cálcio e água [3]. Portanto, a casca, uma vez separada da membrana, é uma fonte de carbonato de cálcio (CaCO3). Nos últimos anos, foram estudadas di-
versas aplicações para as cascas de ovo [4] nomeadamente em materiais de construção [5], polímeros [6], metais [7], catalisadores [8] e materiais cerâmicos [9-12].
As pastas utilizadas na produção dos revestimentos cerâmicos (monoporosa) além dos outros constituintes (areia, argila, caulino) tem entre 10 e 15% (em massa) de calcite [13]. Em 2022, o mercado global dos revestimentos cerâmicos foi avaliado em 122 bilhões de euros [14] pelo que o consumo de calcite é elevado. Assim, este trabalho tem como objetivo estudar a substituição da calcite mineral por bio-CaCO3 nas pastas de monoporosa. Para tal procedeu-se à caraterização do resíduo e foram testados vários níveis de substituição.
2. Materiais e métodos
As matérias-primas utilizadas na formulação da pasta cerâmica foram fornecidas pela Mota Ceramic Solutions (MCS) e os resíduos de casca de ovo foram cedidos pela Fabridoce Lda. O defloculante utilizado foi o Dolapix PC67.
A redução da granulometria das cascas de ovo e da calcite foi efetuada (via líquida) em moinhos de jarras de porcelana. Em ambos os casos, foram adicionados 8 % (em massa) de caulino, que atua como agente suspensor, aumentando a eficiência de moagem. A influência do tempo de moagem na distribuição granulométrica do material foi avaliada. Após a moagem, as suspensões foram peneiradas (212 μm), secas (105 °C) e desagregadas num almofariz de ágata. A mistura das outras matérias-primas foi moída num moinho de bolas (10 kg de matérias-primas, água e desfloculante). Em seguida, foram adicionados à suspensão, 12% (em massa) de CaCO3 previamente moído, a suspensão foi homogeneizada num turbo diluidor e, em seguida, peneirada a 425 μm. Para obter uma pasta com a humidade desejada (≈20% em massa) esta foi vertida numa placa de gesso.
De forma a avaliar a influência do teor de substituição da calcite por bio-calcite foram testados vários teores - 0,25, 50, 75 e 100%. Na referência das amostras, L refere a calcite, E a casca do ovo e D o valor do
D50. A formulação de referência é L100D4, 100% de calcite com D50 de 4 μm. Os provetes foram preparados na MCS recorrendo à extrusão (provetes cilíndricos) e à prensagem uniaxial (amostras retangulares). Uma vez conformadas as amostras foram secas a 105°C e, em seguida, cozidas na universidade (escala laboratorial, forno descontínuo) e na Aleluia Ceramics S.A. (escala industrial, forno de rolos contínuos). No forno descontínuo a taxa de aquecimento foi 5°C/min até 980°C, 15 min de patamar e uma taxa de arrefecimento de 15°C/ min. Na Aleluia Ceramics S.A., a temperatura máxima alcançada foi 1000°C. Estas temperaturas foram medidas com anéis de Buller.
A composição química da calcite e da casca do ovo foi avaliada por fluorescência de raios X (FRX) e a sua composição mineralógica por difração de raios X (DRX). As análises termodiferencial e termogravimétrica (ATD/TG) foram realizadas desde a temperatura ambiente até 1200°C. O coeficiente de expansão térmica linear (ISO 10545-8) foi determinado para as pastas. Para observação da morfologia recorreu-se à microscopia electrónica de varrimento (MEV).
Para os provetes foi avaliada a perda de peso, a retração total, a resistência à flexão (em seco e em cozido, ISO 10545-4), a densidade aparente e a percentagem de absorção de água (ISO 10545-3) das amostras cozidas (10 réplicas por teste). A microestrutura das amostras foi avaliada por MEV.
3. Resultados e discussão
A calcite e a casca de ovo são compostos, essencialmente, por óxido de cálcio (96,5 e 98,4% em massa de CaO - Tabela 1) e foi detetada apenas uma fase cristalina: a calcite. No ATD/TG (Figura 1) a calcite exibe apenas um pico endotérmico (entre 700 e 850°C), acompanhado de perda de massa, que corresponde à decomposição do carbonato de cálcio [15]. A massa da amostra estabiliza a ≈850°C e a perda de massa total é 44 %. Nas cascas de ovo, observa-se um pico exotérmico entre 400 e 500°C acompanhado de uma pequena perda de massa (<5%) que corresponde à oxidação da matéria orgânica [16], que se deve à presença de fragmentos de membrana. Tal como para
a calcite, entre 650 e 800°C observa-se um pico endotérmico (decomposição do CaCO3) e a massa estabiliza aos 800°C (perda de massa total de 48%).
A avaliação da influência do tempo de moagem permitiu concluir que para atingir um D50 de 4 μm (valor de referência), o tempo necessário, no caso das cascas de ovo, é 6 vezes maior do que para a calcite. O aumento do tempo de moagem está associado a custos mais elevados que podem comprometer a viabilidade económica desta aplicação. Assim, foi efetuada uma análise económica simplificada (Tabela 2) tendo sido considerados dois cenários:
1) Calcite como fonte de CaCO3 e deposição em aterro dos resíduos de casca de ovo;
2) Resíduos de casca de ovo como fonte de CaCO3 e deposição em aterro apenas da sua membrana orgânica.
Assumiu-se que o consumo de eletricidade para um moinho de bolas
X.
1
Tabela 2 – Análise económica para as duas fontes de carbonato de cálcio: calcite e cascas de ovos.
Cenário 1 2
Fonte de CaCO3 Calcite Cascas de ovos Electricidade (€/ton)1
1 Custo da eletricidade para as empresas em Portugal ≈0,10 €/kWh; 2 Custo deposição em aterro 30 a 60 €/ton; 3 Seis vezes o custo da calcite; 4 Membrana (5 % em massa). Componentes
Tabela
– Resultados da fluorescência de raios
Figura 1 - Resultados da ATD e da TG da: a) Calcite e b) Cascas de ovos.
industrial descontínuo é ≈50 kWh/ton de material seco moído [17].
O cenário 1 tem um custo mais elevado do que o 2 (Tabela 4) e é dividido entre os dois setores envolvidos. No cenário 2, como as pastas cerâmicas apenas contêm ≈12% (em massa) de CaCO3, o custo adicional da electricidade é de ≈3 €/ton, resultando num incremento insignificante (0,048 €/m2). Portanto, a substituição da calcite por resíduos de casca de ovo é economicamente viável. Considerando o menor custo para deposição em aterro (30 €/ton) as empresas transformadoras de ovos poupariam cerca de 28,5 €/ton. Além disso, o cenário 2 também tem benefícios ambientais, nomeadamente a redução de resíduos de casca de ovo depositados em aterro e a diminuição da extração e consumo de calcite.
Na figura 2 estão patentes as micrografias, obtidas por MEV, da casca do ovo e da calcite. A membrana (Fig. 2A), parece ter uma estrutura compacta, e a casca (Fig. 2B) exibe um sistema ramificado de pequenas agulhas (mais finas na parte externa do que na interna). A calcite apresenta partículas maiores do que a casca de ovo (Fig. 2C e D), as
partículas têm várias formas e não se observa aglomeração.
Nas análises térmicas constatou-se que as pastas L100D4, L50E50D4 e E100D4 exibem uma perda de massa total idêntica (≈11 %) e que o peso estabilizou em torno de 800 °C. Os seus coeficientes de expansão térmica linear (α, 200-300ºC) também são muito semelhantes (entre 2,31 e 2,33 × 10−6 K−1). A perda de peso seco-cozido varia entre 27 e 29% e a retração durante a cozedura é bastante reduzida (<0,5%). Os provetes secos exibem uma resistência à flexão ligeiramente inferior a 4 MPa e não se observa influência da fonte de carbonato de cálcio (Figura 3). Esta tipologia de material deve apresentar resistência mecânica (em cozido) >15 MPa [17], o que se verifica para todas as composições preparadas.
Os valores da absorção de água (AA%) permitem constatar que, para todas as condições de cozedura, a utilização de resíduo de casca de ovo promove um pequeno aumento (15 e 18%). No entanto, todos os valores estão dentro dos exigidos pela EN 14411 (10–20%). O teor de resíduos incorporados não influência a densidade geométrica. As
Figura 2 - Micrografias obtidas por MEV: parte interior (A) e e xterior (B) da casca de ovo; pó de casca de ovo (C) e de calcit e (D).
Figura 3 - Resistência à flexão dos provetes secos e cozidos em diferentes condições: Lab – laboratório e Ind - industrial.
amostras preparadas com bio-CaCO3 apresentam uma porosidade aberta um pouco superior, mas, tendo em conta os valores da resistência à flexão e densidade, a sua fase densa é mais compacta ou tem fases mais resistentes do que os provetes que usam calcite como fonte de cálcio.
4. Conclusões
Os resultados obtidos mostram que é possível substituir a calcite mineral por bio-CaCO3 pois as características técnicas (coeficiente de expansão térmica, perda de massa, retração, resistência à flexão, absorção de água, densidade) do material não foram afetadas. A utilização de resíduos de casca de ovo tem um custo adicional, relacionado com a etapa de moagem, de apenas ≈0,048 €/m2 de revestimento cerâmico. Os produtores destes resíduos podem poupar ≈28,8 €/tonelada de resíduos. Portanto, pode-se concluir que a substituição da calcite por bio-CaCO3 é viável do ponto de vista técnico e económico. A reintrodução da casca de ovo na cadeia de valor do setor cerâmico contribui não só para a economia circular, mas também para uma simbiose industrial.
Financiamento
Este trabalho foi desenvolvido no âmbito do projeto CICECO-Instituto de Materiais de Aveiro, UIDB/50011/2020 & UIDP/50011/2020, financiado por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e Tecnologia/MCTES e o projeto EggshellenCe, LIFE19ENV/ES/000121, financiado pelo Programa LIFE 2014-2020 da União Europeia para o Ambiente e para a Ação Climática.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Fabridoce Lda. pela cedência dos resíduos de casca de ovo e à Aleluia Cerâmicas S.A. pela utilização do seu forno.
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Declaração Ambiental de Produto – DAP e FDES – contributo para a internacionalização e sustentabilidade
Marisa Almeida, Pedro Frade, Anabela Amado, Alexandra Figueiredo, Milene Lopes e Andreia Castro Centro Tecnológico da Cerâmico e do Vidro (CTCV)
1. Introdução – O que é uma DAP?
Uma DAP – Declaração Ambiental de Produto é um documento que fornece informações detalhadas sobre os impactes ambientais de um produto ao longo de seu ciclo de vida. Também conhecida como EPD (Environmental Product Declaration) em inglês ou FDES (Fiche de Déclaration Environnementale et Sanitaire) em francês, esta declaração é baseada em normas internacionais e segue uma metodologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV).
As DAPs são declarações ambientais Tipo III, que seguem a norma ISO 14025 – Rótulos e declarações ambientais – Declarações ambientais Tipo III – Princípios e procedimentos. Apresentam assim, informação ambiental quantificada sobre o ciclo de vida de um produto (seguindo a metodologia da ISO 14040 e ISO 14044), de forma a permitir comparações entre produtos que desempenham a mesma função, que começam a assumir um cariz muito relevante na comunicação de fornecedor-cliente, face às crescentes exigências de sustentabilidade da sociedade.
Para cálculo do desempenho ambiental, existem várias normas de referência para a sua elaboração em função dos requisitos específicos de cada operador de programa.
Têm como objetivo principal a utilização na comunicação empresa-empresa (business-to-business), mas podem ser utilizadas na comunicação empresa-consumidor (business-to-consumer). A organização necessita de assegurar que os dados são verificados de forma independente, para serem declarações do Tipo III.
A harmonização das instruções gerais do programa, em particular as regras para a categoria do produto (RCP) são incentivadas entre programas para satisfazer o princípio de comparabilidade. Estabelece a utilização da série de normas ISO 14040 no desenvolvimento de programas de declaração ambiental Tipo III e declarações ambientais Tipo III.
2. Para que serve uma
DAP?
O objetivo global das declarações ambientais é incentivar a procura e a oferta, de produtos de construção que causam menos impacte no ambiente, através da comunicação de informações verificáveis e precisas sobre aspetos ambientais dos produtos de construção, estimulando um potencial de informações do mercado para a melhoria contínua do ambiente. Essa metodologia de desenvolvimento de DAP para produtos de construção deverá ser consistente, cientificamente robusta de modo a assegurar a contabilização dos impactes ambientais gerados sem promover a dupla contagem, de acordo com a ISO 21930:2007.
Uma DAP/FDES fornece informações multicritério, objetivas, quantitativas e qualitativas relativas a uma função e à vida útil de um produto na obra.
As DAPs devem fornecer informação para o bom desenrolar do planeamento e avaliação dos edifícios, assim, para produtos de construção podem ser usadas pelos arquitetos e projetistas de edifícios para comparar os impactes ambientais de produtos da construção sob determinadas condições, servindo como fonte de informação para a seleção de produtos com base na sustentabilidade, bem como pelos sistemas de avaliação de sustentabilidade de edifícios e outras obras de construção. Também podem ser uma ferramenta muito relevante de melhoria contínua em termos da sustentabilidade por parte dos fabricantes de materiais e produtos.
3. Caraterísticas e benefícios de uma DAP:
As características principais de uma DAP englobam:
• Transparência: Fornece informações transparentes e verificáveis sobre os impactes ambientais de um produto, ao longo do seu ciclo de vida, ou seja desde a extração de matérias-primas até o fim de sua vida útil.
• Comparabilidade: Seguem uma norma comum, bem como regras para as categorias de produto (se existentes para o produto em causa). Permite a comparação de impactes ambientais entre produtos similares, facilitando decisões informadas para consumidores e empresas.
• Normalização: Geralmente seguem normas internacionais, como a ISO 14025, que define os requisitos para o desenvolvimento de DAPs. No caso concreto dos produtos de construção existe a ISO21930 e a EN15804+A2+AC (existindo depois normas complementares para diversos produtos).
• Categorias de Impacte Ambiental: Avalia diversas categorias de impacte ambiental, incluindo:
- Alterações Climáticas: diversos indicadores de acordo com a origem como os fósseis, biogénicas. Contabiliza as emissões de gases de efeito estufa (inclui o cálculo pegada de carbono);
- Indicadores de energia (renovável e não renovável) e recursos naturais;
- Impacte sobre a biodiversidade e uso do solo;
- Toxicidade humana (cancerígena e não-cancerígena);
- Vários indicadores de poluição (ex. acidificação, eutrofização, ecotoxicidade, depleção da camada de ozono, depleção de recursos, etc);
- Geração de resíduos e incorporação de matérias-primas secundária; materiais para reciclagem, etc.
• Processo de Verificação: As DAPs são verificadas por terceiros independentes para garantir a precisão e credibilidade das informações fornecidas.
Em termos das suas vantagens podem ser sumariadas como:
• Sustentabilidade: Contribuem para as organizações identificarem e melhorarem os aspetos e impactes ambientais de seus produtos ao longo do ciclo de vida.
• Eco-Marketing: Proporciona uma ferramenta eficaz de marketing, demonstrando o compromisso da empresa com a sustentabilidade.
• Cumprimento de requisitos: Ajuda a cumprir requisitos de clientes, regulamentações ambientais e requisitos de sustentabilidade (incluindo relatórios de sustentabilidade).
• Competitividade: Diferencia produtos no mercado, oferecendo vantagem competitiva para empresas que investem em práticas sustentáveis, permitindo o acesso a mercados internacionais que valorizam o desempenho ambiental.
• Parcerias e Colaborações Internacionais: Empresas que investem em sustentabilidade são vistas como parceiros mais atrativos. Uma DAP pode facilitar colaborações com outras empresas, ONGs e instituições que valorizam a responsabilidade ambiental. Parcerias internacionais podem “abrir portas” para novos mercados e oportunidades de negócios.
• Resiliência a Mudanças no Mercado: Com as crescentes preo-
Figura 1 - Exemplos de indicadores de uma DAP
cupações globais com as alterações climáticas e sustentabilidade, os mercados mundiais preferem produtos mais sustentáveis. Ter uma DAP ajuda a empresa a estar preparada para essas mudanças, de forma a que os seus produtos permaneçam relevantes em diversos mercados.
• Redução de riscos: A DAP ajuda a identificar e mitigar impactes ambientais ao longo do ciclo de vida do produto. O que conflui para uma redução de riscos associados a regulamentações ambientais e requisitos dos consumidores por práticas sustentáveis, tornando a empresa mais resiliente a pressões externas no mercado internacional.
4. Como elaborar as DAPs
As DAP são baseados em ACV, inventário do ciclo de vida (LCI) e/ou módulos de informação. A informação e aspetos ambientais relevantes que não foram abrangidas pela ACV são tratadas como informação ambiental adicional.
O fabricante, ou o grupo de fabricantes, do produto de construção, é o proprietário dos dados e responsável pela DAP do produto de construção, de acordo com a RCP. Para além destes fabricantes, ninguém está autorizado a declarar o desempenho ambiental do produto de construção (ISO 14025: 2006).
As DAP são feitas com base em regras previamente desenvolvidas denominadas como RCP, também designadas por PCR (Product Category Rules) e, que são comuns para produtos com as mesmas funções.
A nível europeu destaca-se a nova norma EN 15804+A2:2019+AC sobre “Sustainability of construction works – EPD – core rules for the product category of construction products”. Esta norma visa fornecer as regras para a categoria de produtos aplicáveis a produtos de construção. Estes RCP constituem a base para a construção de qualquer
DAP para que possam ser comparáveis. As RCP, pretendem harmonizar a informação obtida e a metodologia de ACV utilizada para que seja possível a comparação de produtos com funções idênticas.
5. Tipologias de DAPs
Existem várias tipologias de DAP, consoante o tipo de avaliação de ciclo de vida considerado. Assim, de acordo com a EN15804+A2, a DAP pode ser:
• do “berço à porta com etapa C e etapa D" com a etapa de fim de vida e módulo D (desempenho mínimo obrigatório segundo EN15804+A2+AC), podendo existir exceções de exclusão de fim de vida e etapa D;
• do “berço ao túmulo”, quando considera todo o ciclo de vida do produto;
• do "berço à porta com etapa C e etapa D com a opção" com a etapa de construção ou a de utilização.
A DAP quando expressa em módulos de informação, permite a fácil organização e expressão de “módulos” de dados ao longo do ciclo de vida do produto. A abordagem requer que os dados subjacentes sejam consistentes, reprodutíveis e comparáveis.
Quando a DAP inclui somente determinadas etapas do ciclo de vida, a DAP torna-se um módulo de informação, neste caso, é expressa por unidade de referência.
Todavia, quando a DAP inclui todas as etapas do ciclo de vida, como a etapa de produto (extração de matérias-primas, seu transporte e produção) (A1 a A3), o transporte (A4), a instalação no edifício (A5), uso e manutenção (etapa B) e a etapa de fim de vida (etapa C) e os benefícios para além do ciclo de vida (módulo D), a DAP é dita ser "do berço ao túmulo" (ver figura 1) é expressa por unidade funcional.
Figura 2 - Enquadramento de avaliação de ciclo de vida
6. Conclusão
As DAPs assumem-se como uma importante ferramenta voluntária de comunicação de impactes ambientais, a utilizar na avaliação da sustentabilidade de materiais com vista a uma construção sustentável, transparecendo para o cliente final o desempenho ambiental do produto, podendo assim constituir-se como um fator diferenciador e potenciador de melhorias de forma a diminuir os impactes ambientais do produto.
Uma DAP contribui significativamente para a internacionalização de uma empresa ao aumentar a credibilidade, facilitar a conformidade com regulamentações e requisitos de clientes, proporcionando uma diferenciação competitiva, melhora a eficácia do marketing global, aumenta a resiliência a alterações no mercado e reduz riscos. Estes fatores tornam os produtos mais atrativos e acessíveis a mercados globais, promovendo o crescimento e a expansão internacional da empresa, bem como a sua sustentabilidade.
Bibliografia
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Base de dados Ecoinvent v3.9 (2022). (em www.ecoinvent.org) e software SimaPro
Declaração Ambiental de Produto (DAP) - Fator Chave de Sustentabilidade – YouTube - https://www.youtube.com/watch?v=hpysho6nj68
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EN 15804:2012+A2:2019+AC - Sustentabilidade das obras de construção – Declarações ambientais de produtos – Regras de base para as categorias de produtos de construção
NP ISO 14025:2009 Rótulos e declarações ambientais – Declarações ambientais Tipo III – Princípios e procedimentos
ISO 14040:2006 – Environmental Management – Life Cycle Assessment – Principles and Framework (ISO, 2006a).
ISO 14044:2006 – Environmental Management – Life Cycle Assessment – Requirements and Guidelines (ISO, 2006b).
EN 15942:2011 Sustainability of construction works – Environmental product declarations – Communication format business-to-business
Figura 3 - Etapas do ciclo de vida de um produto da construção (baseado EN 15804, EN 15942 e EN 15978)
Espectrómetro de fluorescência de raios-X com dispersão de comprimento de onda.
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Ef2Decarb – Plano de Promoção da Eficiência no Consumo de Energia com Vista à Descarbonização
Pedro Cardoso e Samuel Lameiro
Centro Tecnológico da Cerâmico e do Vidro (CTCV)
Introdução
No passado dia 11 de julho, a APICER – Associação Portuguesa das Indústrias de Cerâmica e de Cristalaria, em colaboração com o CTCV – Centro de Tecnologia e Inovação, organizou o evento "Eficiência Energética e Descarbonização – Estratégias e Boas Práticas no Setor Cerâmico" no Business Center Leonardo da Vinci (Coimbra, Antanhol).
O principal objetivo deste evento foi a divulgação dos resultados obtidos no projeto Ef2Decarb, uma medida financiada no âmbito do PPEC (Plano de Promoção da Eficiência no Consumo de Energia com Vista à Descarbonização) e aprovada pela ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos).
O painel de oradores foi constituído por José Cruz Pratas da APICER (Associação Portuguesa das Indústrias de Cerâmica e de Cristalaria), António Baio Dias do CTCV , Patrícia Lages da ERSE , João Paulo Calau da ADENE, Paulo Pires da Vista Alegre , Artur Serrano do CTCV, Rui Neves do CTCV, Pedro Cardoso do CTCV, Samuel Lameiro do CTCV e Samuel Moreira do CTCV.
Projeto
O desenvolvimento do projeto, a cargo do CTCV, permitiu reunir 40 empresas do ramo da cerâmica com consumos abaixo de 500 tep/ano, onde foi possível selecionar 20 que seriam alvo de diagnósticos energéticos, com identificação de possíveis medidas de eficiência energética para redução dos consumos energéticos e emissões de GEE.
Como principais pilares, o Ef2Decarb pretendia promover mudanças de comportamentos na utilização racional de energia, através de ações de sensibilização em workshops nas empresas, formação de gestores de energia, criação de ferramentas de suporte à implementação de Boas Práticas de Eficiência Energética e induzir a redução do consumo de energia e emissões carbónicas, através de
diagnósticos energéticos e aplicação de medidas de eficiência energética.
Participantes
Após a abordagem inicial para angariação das empresas, demonstraram interesse em participar no projeto mais de 40 empresas, sendo a sua maioria empresas do setor da louça utilitária e decorativa.
A distribuição setorial foi efetuada com base no valor do CAE (Classificação Portuguesa de Atividades Económicas), e processou-se da seguinte forma:
Atividades realizadas
No decorrer do projeto, foram desenvolvidas várias atividades e ações, que se encontraram divididas em três fases principais:
• Fase 1. Levantamento de Informação
O processo de recolha de dados teve início com a disponibilização de um questionário para avaliação da Maturidade Energética de cada
Figura 1 - Distribuição setorial das empresas participantes
empresa, de forma a posicionar cada uma relativamente às necessidades de eficiência energética. Aqui, foram desenvolvidas 15 questões de escolha múltipla, sendo que apenas 11 delas seriam determinantes para a avaliação da Maturidade Energética.
Em simultâneo, foram recolhidos os dados das faturas energéticas de cada um dos tipos de energia utilizados na empresa, capacidades produtivas e situação financeira, mais concretamente o respetivo VAB. Todos os dados pedidos tinham como ano de referência 2021. O propósito desta recolha teve como foco o cálculo dos 3 indicadores chave para a comparação de empresas: Consumo Específico, Intensidade Específica e Intensidade Carbónica.
• Fase 2. Diagnósticos Energéticos
Após o tratamento dos dados recolhidos na fase 1, deu-se início à realização dos diagnósticos energéticos. Nesta fase foi feita uma seleção de 20 empresas. Este trabalho de diagnóstico teve como focos diversas atividades nas empresas, numa tentativa de identificar os equipamentos com maior consumo e a atribuição de medidas de melhoria, tanto de consumo de energia como de emissões carbónicas. Deste modo, foram tidas em análise a obtenção do processo produtivo, realização de medições elétricas aos principais consumidores, levantamento das características da iluminação existente, levantamento das características dos motores elétricos, análises termográficas a diversos equipamentos, realização de esquemas unifilares da rede elétrica, de esquemas da central de ar comprimido e obtenção de características dos principais consumidores elétricos e térmicos.
Figura 2 - Resultados dos questionários de avaliação da Maturidade Energética
Figura 4 - Termografia de forno intermitente
Figura 5 - Exemplo de substituição de compressor de ar comprimi do com variação de velocidade
Figura 6 - Exemplo de substituição de caldeira a GN por uma bom ba de calor
Figura 3 - Consumos globais das empresas participantes, com desagregação por tipo de energia
• Fase 3. Ações de Sensibilização
A decorrer em simultâneo com as fases anteriores, existiram também Workshops de Sensibilização e um Concurso de Ideias, abertos a todas as empresas, e um curso para criação de um Gestor de Energia, porém apenas para as 20 empresas da fase 2.
Os Workshops de Sensibilização tiveram uma duração de 6 horas por empresa e foram efetuadas em regime presencial, envolvendo em média 10 colaboradores das 40 empresas no sentido destes tomarem consciência e adquirirem conhecimento de medidas comportamentais que tenham impacto direto na redução de consumos.
Os valores totais de consumos e custos de energia encontram-se presentes na Figura 7, onde se pode verificar que a amostra escolhida das 20 empresas retrata aproximadamente metade dos participantes do projeto.
Relativamente aos balanços efetuados aos 20 diagnósticos, e considerando que todas as medidas de eficiência energética propostas seriam implementadas, obtiveram-se os seguintes resultados:
Em termos dos pontos de atuação no que diz respeito ao combate de desperdícios energéticos, foram principalmente abordadas as temáticas do ar comprimido, os sistemas de gestão de energia, o ajuste do ciclo de cozedura, a iluminação, a implementação de sistemas fotovoltaicos para produção de energia elétrica para autoconsumo e algumas medidas diversas, tais como a substituição/retrofit de fornos cerâmicos, aplicação de isolamento térmico em tubagens, substituição do material refratário de vagonas ou a substituição de caldeira de combustíveis fósseis para bomba de calor. A desagregação por tipologia de medida encontra-se na Figura 9.
A realização do Concursos de Ideias – “Gestos para reduzir Consumos” teve como objetivo premiar a criatividade dos colaboradores. Pretendia-se que sugerissem medidas de melhoria e poupança de energia, ao mesmo tempo que eram motivados para comportamentos de eco-consumo.
Já o curso de Gestor de Energia, dedicado apenas a 1 elemento de cada uma das 20 empresas escolhidas para a realização do diagnóstico energético, teve duração total de 12 horas e foi dada em regime e-learning. Teve como objetivo formar um colaborador, dos mais responsáveis, de forma a que fosse capaz, de forma autónoma, de fazer a recolha, tratamento e interpretação da informação inerente à caraterização energética da empresa.
• Fase adicional. Análises Energéticas
No decorrer da fase 3, e mais concretamente ao longo dos Workshops de Sensibilização, algumas empresas que não tinham sido selecionadas para a fase 2 apresentaram interesse em receber um relatório com o tratamento dos 3 indicadores energéticos. Assim, também foram desenvolvidos e entregues as análises energéticas às restantes empresas.
Comentários finais
O facto de terem sido escolhidas empresas com consumos energéticos inferiores a 500 tep/ano não surge ao acaso, visto que este representa o limite, definido pela legislação, a partir do qual as empresas passam a estar abrangidas pelo SGCIE – Sistema de Gestão dos Consumos Intensivos de Energia. Nesse caso, é obrigatória a realização de um Plano de Racionalização do Consumo de Energia (PREn), onde é exigido que as empresas se comprometam a reduzir os seus indicadores energéticos, nomeadamente entre 4% a 6% o Consumo Específico (CE) e a Intensidade Energética (IE), mantendo constante a Intensidade Carbónica (IC).
Como as instalações abaixo dos 500 tep/ano não têm essa imposição, a realização destes diagnósticos teve especial importância na medida em que permitiu a obtenção de um estudo e análise da sua
Figura 7 - Consumos das 20 empresas de diagnóstico, com desagre gação por tipo de energia
Figura 8 - Resultados das poupanças das medidas de eficiência energética propostas
Figura 9 - Desagregação por tipologia de medida
situação energética, que de outro modo, à partida, não seria obtido. No entanto, estas empresas podem, em regime voluntário, aplicar o SGCIE e celebrar Acordos de Racionalização do Consumo de Energia com a DGEG.
Como se pôde verificar pelos resultados obtidos na fase dos diagnósticos energéticos, ainda existem algumas deficiências energéticas nas empresas, pelo que há margem para implementação de medidas de combate aos desperdícios de energia. Grande parte dos participantes não possuíam qualquer tipo de sistema fotovoltaico, recorrendo exclusivamente aos comercializadores de energia elétrica para satisfazer as suas necessidades.
Além disso, a grande maioria apenas tinha instalado o conta-
dor geral de consumo de gás (natural ou propano), pelo que os consumos de fornos, caldeiras ou outros queimadores era totalmente desconhecido. Um número muito reduzido de empresas já tinha realizado uma auditoria no âmbito do SGCIE a título voluntário, e por isso já estavam mais consciencializadas para o tema da eficiência do que as restantes, com mais preocupação sobre a tipologia de medidas que poderiam implementar além das descritas nos respetivos PREns.
Este projeto, e mais concretamente os diagnósticos, caso sejam totalmente implementados, permitirão a redução de consumo de energia em cerca de 758.4 tep/ano, equivalentes a 6 251 546 kWh/ano e à emissão de 1 805 tCO2e/ano.
O CTCV estará presente na MARMOMAC, visite-nos no Hall 12 Stand D2.
As Garantias de Origem como ferramenta para a descarbonização da indústria da cerâmica e do vidro
Miguel Jerónimo
EEGO – Entidade Emissora de Garantias de Origem/Guarantees of Origin Issuing Body
Em julho de 2024, com o arranque do mecanismo de Garantias de Origem (GO) para gases de origem renovável, Portugal deu um importante passo no caminho para a descarbonização da sua economia. Este sistema, a funcionar desde 2020 para o setor elétrico, estende-se agora também aos gases renováveis, como o biometano e o hidrogénio verde. Este acontecimento marca o início de uma nova era, crucial para o futuro da indústria nacional, principalmente para os setores mais intensivos em energia, como a indústria da cerâmica e do vidro.
O que são Garantias de Origem?
As GO são certificados eletrónicos que comprovam que uma determinada energia foi gerada a partir de fontes renováveis. É um mecanismo conceptualmente simples, mas que constitui uma poderosa ferramenta para a promoção de energias renováveis. Cada GO equivale a 1 MWh de energia e pode ser comercializada separadamente dos respetivos fluxos físicos. Este mecanismo de book & claim permite aos consumidores escolherem a energia que consomem, assegurando que esta provém de fontes renováveis e contribuindo assim para o cumprimento dos seus objetivos de sustentabilidade. Esta diferenciação possibilita a atribuição de um valor específico a cada tipo de energia, instituindo assim um mercado de atributos renováveis que incentiva a produção e o consumo de energias mais limpas. Ao oferecer uma fonte de receita adicional relevante para os produtores, este sistema dá uma contribuição importante para a viabilidade e o financiamento de novos projetos.
Uma GO tem a validade de 12 meses a partir da data de produção da energia, durante os quais pode ser livremente comercializada no espaço europeu e o seu ciclo de vida termina com a sua alocação a um determinado consumo através de um «cancelamento», que terá de ser realizado até 18 meses a contar da data de produção.
Em Portugal Continental, o sistema é assegurado pela REN-Rede Elétrica Nacional S.A., que detém as competências de Entidade emissora de Garantias de Origem (EEGO) para os setores elétrico, dos gases renováveis e de baixo teor de carbono e também para a energia de aquecimento e arrefecimento.
Enquadramento legal
O regime jurídico deste sistema resulta de atos legislativos europeus, em particular da Diretiva (EU) 2018/2001 (RED II), relativa à promoção da utilização de energia de fontes renováveis. A transposição da legislação europeia para a ordem jurídica interna tem sido feita através
de vários diplomas, destacando-se mais recentemente a publicação do DL n.º 15/2022, que atribui a regulação desta atividade à ERSE, e o DL n.º 84/2022, que completa a transposição da RED II e estabelece um regime contraordenacional, atribuindo competências de fiscalização à ENSE E.P.E.
O Mercado de Garantias de Origem
A nível europeu este mecanismo é facilitado e normalizado por uma associação de entidades emissoras, Association of Issuing Bodies (AIB), que mantém o sistema European Energy Certificate System (EECS) e assegura que os procedimentos adotados por todos os países seguem as mesmas normas. A AIB mantém ainda a plataforma informática que assegura a interoperabilidade entre os vários sistemas e facilita a troca deste tipo de certificados a nível internacional.
Apesar de estar legalmente limitado ao espaço europeu, este mercado tem apresentado níveis de crescimento muito significativos, atingindo pela primeira vez, em 2023, as mil milhões de GO emitidas e as 950 milhões de transferências internacionais. A nível interno também se tem verificado um crescimento considerável dos volumes, ilustrando uma notável evolução do mercado nacional de GO.
O preço de uma GO tem apresentado uma volatilidade muito signi-
ficativa, em particular em 2022, durante um período de grande agitação nos mercados energéticos, em que o valor passou de cerca de 1€ no início do ano para os 9€ no final do ano. Com a estabilização subsequente dos mercados e o aumento da oferta, tem-se verificado uma descida gradual nos preços, que atualmente se situam na ordem de 1€.
Importa salientar que grande parte do valor deste mercado é transferido diretamente para todos os consumidores nacionais. Isto acontece porque as GO das instalações que beneficiam de apoio à produção são entregues à DGEG que as comercializa através de leilões, revertendo estas receitas para o Sistema Elétrico Nacional. Desde julho de 2021, quando foi realizado o 1º leilão, a receita total para os consumidores nacionais totaliza já quase 200 milhões de euros.
No setor do gás, embora vários países já possuam esquemas de certificação operacionais e ocorram algumas trocas internacionais, ainda não existe um verdadeiro mercado europeu de GO. Por enquanto, as operações internacionais são predominantemente bilaterais, realizadas através de cancelamentos «ex-domain», ou seja, sem a transferência efetiva das GO entre os diferentes registos. Apesar dos importantes desafios técnicos e regulamentares que ainda persistem, os avanços que se observaram recentemente oferecem boas perspetivas. Até final do ano, espera-se que um grupo representativo de países, incluindo Portugal, esteja interligado e totalmente operacio-
nal, estabelecendo assim as bases para a criação de um verdadeiro mercado europeu. Isso será ainda mais importante para este setor, uma vez que se espera que as GO tenham preços consideravelmente superiores aos que se verificam no setor elétrico.
Arranque da certificação da origem dos gases em Portugal
A expansão deste mecanismo aos gases de origem renovável irá ocorrer em fases distintas, de onde se destacam:
• Já operacional: Certificação de gases de origem renovável de âmbito nacional injetados nas redes de serviço público de gás, incluindo Unidades Autónomas de Gás;
• Até final do ano: Arranque das operações internacionais, logo após a adesão formal ao EECS;
• Próximo ano: Certificação de gases de baixo teor de carbono e off-grid.
Este plano de implementação está em linha com as necessidades do mercado e, até final do ano, deverá posicionar Portugal na vanguarda europeia nesta área, refletindo o compromisso da REN com a sustentabilidade e a inovação do setor energético nacional. Embora a produção de gases renováveis em Portugal ainda seja muito reduzida, com apenas alguns projetos piloto em operação, a emissão das GO será crucial para assegurar a viabilidade e o financiamento dos novos projetos que vêm a caminho.
Importa referir que as GO, só por si, não poderão garantir o cumprimento das metas nacionais de consumo de energias renováveis, sendo para isso necessário o cumprimento de determinados critérios de sustentabilidade. O cumprimento desses critérios é comprovado por meio de Provas de Sustentabilidade (PoS), conforme definido na legislação vigente. Em Portugal, a verificação desses critérios recai sobre a Entidade Coordenadora do Cumprimentos dos Critérios de Sustentabilidade (ECS), cujas funções são desempenhadas pelo LNEG, I. P. Neste âmbito, um dos importantes desafios será a definição de um modelo de integração entre as GO e as PoS, tanto a nível nacional como europeu, devendo esta integração estar definida até à primeira metade do próximo ano.
A
Importância deste mecanismo para os setores da cerâmica e do vidro
Os setores vidreiro e cerâmico são caracterizados pelos seus elevados consumos energéticos, que alimentam os seus processos industriais e que representam uma parte significativa da sua estrutura de custos. Tradicionalmente, esses consumos dependem essencialmente de combustíveis fósseis, em particular do gás natural. No entanto, as metas de descarbonização para estes setores estabelecidas nas legislações europeia e nacional são cada vez mais exigentes e ambiciosas.
Um dos pilares na estratégia da EU para a redução de emissões de gases com efeito de estufa, é o Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), que abrange cerca de 40% do total de emissões da EU, incluindo setores industriais com utilização intensiva de energia como é o caso da cerâmica e do vidro. As novas metas estabelecidas no CELE impõem desafios consideráveis e a sobrevivência de muitas empresas dependerá muito da sua capacidade de se transformarem e de adotarem processos mais sustentáveis, que garantam uma redução significativa das suas emissões de carbono. É, portanto, urgente que estas empresas transformem os atuais processos industriais, com vista à aceleração da sua descarbonização, sem comprometerem a sua eficiência e competitividade. Será certamente importante a inovação em novos processos e materiais, mas grande parte desta transformação passará necessariamente por uma melhoria na eficiência energética e, principalmente, pela utilização de combustíveis mais verdes.
Não sendo viável uma eletrificação integral dos consumos, mesmo que esta possa constituir uma boa solução complementar, a utilização de gases renováveis, como o biometano e o hidrogénio, assume-se como crucial para esta transição. A curto prazo, o biometano surge naturalmente como a solução preferível, mas todos os vetores terão de ser considerados. Neste contexto, as GO podem assumir um papel fundamental no processo de transição, permitindo que as empresas possam comprovar que o seu consumo de energia provém de combustíveis renováveis e de baixo teor de carbono. Para que isso seja possível, é essencial a criação de um quadro legislativo adequado que permita a utilização de GO no âmbito do CELE.
Algumas notas finais
O arranque do mecanismo de GO para gases renováveis em Portugal oferece uma oportunidade única para a transformação da indústria mais energeticamente intensiva rumo a uma economia mais sustentável e competitiva. Contudo, os desafios que ainda persistem exigem uma estreita colaboração entre a indústria, as entidades competentes nesta área e os legisladores. Só através de uma integração bem-sucedida deste novo mecanismo com os critérios de sustentabilidade e com o CELE será possível maximizar os seus benefícios, garantindo a competitividade e a sustentabilidade da economia e um futuro mais verde para todos.