Daniela Tomaz
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Daniela Tomaz
segunda edição
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
autora: Daniela Ribeiro Santos Tomaz
estágio curricular, de 1 de Janeiro de 2005 a 30 de Junho de 2005 responsabilidade do arqº Joaquim Orlando Fonseca Massena Atelier: Avenida República, nº 740, sala 63, Vila Nova de Gaia
Prova Final para Licenciatura em Arquitectura Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto 2004/2005 docente acompanhante: arqº Carlos Nuno Lacerda Lopes docente arguente: arqº Eliseu Vieira Gonçalves
pesquisa e execução, de Junho a Novembro de 2005 discussão pública do trabalho, a 21 de Fevereiro de 2006 edição e acabamento por marco antónio fonte de imagem da capa: www.bernhardleitner.com edição académica: 2 cópias (Fev.2005)
abstract Este trabalho encontra-se dividido em três partes principais, segundo uma intenção clara de introdução, desenvolvimento e conclusão. Numa primeira parte procuro enquadrar o leitor no tema, fundamental para a compreensão do campo de estudo, subdividindo em dois capítulos: “Semântica e Vocabulário” e “Tempo e Evolução”. O primeiro capítulo introduz o vocabulário específico, estabelecendo as bases de uma linguagem comum para arquitectos, engenheiros acústicos e músicos. A inclusão desta última é importante na medida em que acústica e música se referem ao mesmo fenómeno sonoro, com conceitos de alguma forma sinónimos. Este capítulo vem introduzir noções fundamentais, como: espaço sinestético, trinómio arte ciência e técnica, acústica como conceito e som como fenómeno físico. No segundo capítulo, estudo a relação entre as diversas formas de som e espaços ao longo dos tempos, para compreender a transformação do espaço acústico. Procuro então perceber a importância do som, da acústica, como determinante ou consequência de uma concepção espacial, através de momentos temporais que considero representativos de um modus operandus. Este percurso começa com uma referência a um primeiro abrigo, a caverna, pela magia dos sons escutados nesses espaços. Prossegue com o teatro da Antiguidade Clássica, pelo paradigma que representa a primeira influência documentada da importância da palavra falada na concepção do espaço. Avança na constituição do espaço litúrgico medieval e barroco, onde palavra cantada e música são as funções principais. O Renascimento é referido como momento de abstracção e racionalização, invertendo definitivamente a hierarquia sensorial. Na dualidade entre influência do som nas manifestações espaciais e influência do espaço nas manifestações sonoras, elejo o aparecimento das salas de concerto e o pensamento de um compositor, com o objectivo de criar o último instrumento da orquestra: o teatro de ópera em Bayreuth. O Modernismo na arquitectura concentra pela primeira vez a importância fundamental do Arquitecto no projecto acústico, integrando a acústica como nova condicionante, inspiradora da concepção de espaços, que se querem funcionais e humanos. O Modernismo na música, como fundamental na quebra de tradicionalismos espaciais na execução, procurando novas organizações que são novas sonoridades e novos tipos arquitectónicos. O momento temporal seguinte é paradigmático no estabelecimento definitivo da acústica como ciência ao serviço da arquitectura – a acústica arquitectural – desde o seu nascimento com a determinação objectiva do tempo de reverberação, à sua consolidação, com as diversas escolas de pensamento que reflectiram e produzem, agora, espaços com qualificação acústica. Embora de génese cronológica nos reboliços revolucionários do industrialismo do século XIX, destaco finalmente o ruído, como elemento de caracterização e perturbação da qualidade de vida na cidade contemporânea e em oposição, o anseio crescente pelo silêncio. Numa segunda parte do trabalho integro os elementos de estudo aprofundado, abordando as especificidades de três tipos arquitectónicos, em três capítulos: “habitação-colectiva na Rua das Pedreiras, V. N. de Gaia”,” igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses” e “Casa da Música, Porto”. A escolha dos exemplos pretende reunir tipologias onde a acústica assume diferentes graus de interacção com a arquitectura; revelar a acústica como componente da arquitectura recorrente, usual e de excepção, e explorá-la como componente de projecto, reabilitação e obra, encontrando pontos de análise transversais. Em cada exemplo é seleccionado um espaço de estudo específico, havendo uma incursão do geral ao particular. A acústica é assim analisada desde a
localização e implantação do edifício aos condicionalismos do espaço de estudo. A análise, dos respectivos espaços contíguos, é essencial para a compreensão da influência acústica nos elementos de compartimentação, colocando a tónica no isolamento sonoro. No espaço de estudo é comparada a função acústica com a função do espaço, como forma de averiguação da coerência ou disfuncionalidade acústica. A função acústica é estudada na sua influência sobre a forma, proporção e escolha de materiais, terminando com uma reflexão sobre a dialéctica entre acústica e arquitectura no processo de projecto. Na terceira e última parte do trabalho, faço uma extrapolação das considerações feitas nos capítulos anteriores e lanço futuras incursões de estudo. A estruturação exprime a tónica tanto no espaço acústico, em “espaço e tipologia”, como nos seus intervenientes e criadores, em “arquitecto(s) e acústico(s)”. Neste sexto capítulo, sintetizo as semelhanças e particularidades da qualificação acústica das diferentes tipologias. As diferenças e inerências dos tipos espaciais enquanto despoletadoras de construções acústicas positivas ou negativas e enquanto condicionadas ou limitadas pela legislação sonora. A reabilitação acústica como disfunção espacial e projectual, denunciadora de uma consciencialização tardia da importância do conforto acústico, transversal a todas as tipologias. Finalmente, destaco as posições dos principais intervenientes na construção acústica, procurando o encontro de uma linha de acção para a disciplina de arquitectura enquanto organizadora, motivadora e integradora do projecto acústico. Abrange o ensino da arquitectura na consciencialização acústica, as diferentes formas de actuação e prática perante o projecto acústico e a Arquitectura como gesamtkunstwerk e união do sensorial ao funcional. Esta reflexão final pretende exaltar os pontos principais do trabalho, que ligam definitivamente o pensamento acústico ao arquitectónico, tentando compreender o papel do arquitecto na dialéctica constante entre arte e ciência.
agradecimentos Gostaria de agradecer a algumas pessoas, entre elas amigos, colegas e profissionais, que tornaram possível a realização deste trabalho. Ao arquitecto e professor José Prata (ESMAE), pela ajuda imprescindível na minha aprendizagem acústica e musical. Especificamente, gostaria de referir o acesso a livros e documentos de grande importância temática, nomeadamente, a bíblia da acústica de salas, Concert and Opera Halls – How they sound, de Leo Beranek; a disposição de informação relativa ao caso de estudo da Igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses; por toda a discussão de ideias. Ao Marco António (MA), por anos de paciência, crítica e discussão de arquitectura. Pelo seu apoio e força fundamentais, no prosseguimento deste tema e desta prova; pela crítica inteligente e atenta de ideias e acções; pelo trabalho imprescindível na edição; À engenheira de acústica Eduarda Silva (SOPSEC), pela sincera disponibilidade na discussão sobre acústica, particularmente da problemática da habitação, e pelo seu apoio no caso de estudo da habitação multifamiliar na Rua das Pedreiras, Canidelo, V. N. de Gaia. Ao especialista em acústica, Renz van Luxemburg, (TNO-TUE Center for Building Research), pela resposta pronta ao questionário elaborado sobre o projecto acústico na Casa da Música, Porto e pela disponibilidade demonstrada em futuros esclarecimentos. À engenheira de acústica Beatriz Pinto (AFA), pela ajuda no caso de estudo da CdM; Ao arquitecto Nuno Rosado (OMA), por todos os esclarecimentos e pela realização de um questionário no caso de estudo da Casa da Música, Porto; Ao engenheiro de acústica Rui Ribeiro, (ABSORSOR), pela discussão sobre acústica e por toda a disponibilidade na prossecução do caso de estudo, Escola de Música no Porto, muito embora não tenha sido apresentado nos trâmites deste trabalho. Ao engenheiro de acústica Octávio Inácio (ESMAE), pelos esclarecimentos sobre acústica, e particularmente sobre o pensamento de Higini Arau. À Teresa Queiroz, pela cedência do livro Acústica Musical, de Luís Henrique; ao André Evangelista, pela discussão sobre liturgia católica; À Balonas Projectos, Marta Ferreira (CdM) e SOPSEC, pela disponibilidade da informação respectiva a cada uma das empresas ou instituições, apresentadas no âmbito dos casos de estudo. Ao meu orientador, professor e arquitecto Carlos Nuno Lacerda Lopes, por acreditar nesta prova e em mim.
À minha mãe.
abstract agradecimentos introdução
Espaço e Som Semântica e Vocabulário
013 015
técnica
017
arte e ciência
019
espaço sinestético
019
arquitectura acústica
023
acústica arquitectural e arquitectónica
025
som como fenómeno físico
027
Tempo e Evolução
035
do eco – a caverna
037
da palavra – o teatro da Antiguidade Clássica
037
da palavra cantada – o espaço litúrgico medievo
043
da ausência– a razão renascentista
047
da música – a emoção religiosa barroca
049
do silêncio – as salas de concerto
053
da obra de arte total – o Festspielhaus de Bayreuth
055
057 da técnica – o Modernismo forma/função: mito ou realidade humanização da arquitectura: importância dos elementos sensoriais música espacial: o espaço modelado pela intenção do compositor
da acústica arquitectural – nascimento e consolidação
069
do ruído – paradigma da cidade contemporânea
073
espaço acústico português habitação-colectiva na Rua das Pedreiras, V. N. de Gaia
079 081
da cidade ao edifício
083
do edifício ao fogo
083
o fogo
087
igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses
093
da cidade ao edifício
095
do edifício à igreja
095
a igreja
097
Casa da Música, Porto
105
da cidade ao edifício
107
do edifício à Sala 1
109
a Sala 1
111
Acústica e Arquitectura espaço e tipologia
131 133
espaços acústicos e não acústicos
135
reabilitação acústica
141
legislação como instrumento
143
arquitecto(s) e acústico(s)
149
ensino
151
prática
151
gesamtkunstwerk
155
bibliografia créditos de imagem notas biográficas
RUBERT DE VENTÓS, Xavier (2002), Prólogo in DOMENECH, Francesc Daumal, Arquitectura acústica: Poética y diseño; 2 Acústica deriva do grego Akouein, que significa ouvir; 3 As unidades de pesquisa utilizadas foram a biblioteca da Faculdade de Arquitectura (FAUP), Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo (ESMAE), Faculdade de Engenharia (FEUP), Biblioteca Municipal Almeida Garrett (BMAG) e Biblioteca Virtual da U.P. A primeira como referência da investigação em arquitectura, e as seguintes foram fundamentais para o conhecimento específico; 4 Legislação, desenvolvimento de projecto, reabilitação acústica, avaliação subjectiva e objectiva do espaço, através de questionário, entrevista, observação directa ou indirecta; 1
introdução É tão importante ouvir como ver. Como arquitectos aprendemos a saber ver. Contudo, é igualmente importante reconhecer o papel das outras percepções sensoriais no usufruto do espaço. Ver é uma forma de tocar à distância, assim como ouvir também é uma das maneiras de medir o espaço. Como é afectada a qualidade de vida e o conforto dos espaços, pela percepção auditiva? Qual o papel do arquitecto perante o projecto acústico? «En contraste con la vista, el oído es sintético y secuencial. Los sonidos y las palabras van siempre unos tras otros. (…)Las configuraciones auditivas son más potentes y penetrantes que las Gestalten figurativas. (...) es mucho más fácil ver sin entender que escuchar sin atender.»1 O objectivo desta prova final é conhecer a relevância da percepção auditiva na criação e vivência dos espaços. Criação, porque a percepção auditiva pode assumir uma componente no desenho dos espaços,deixando este de ser simplesmente uma consequência de imposições visuais. Vivência, porque a percepção auditiva tem um papel importante no conforto e qualidade dos espaços que habitamos. O campo de estudo compreende a Acústica2 como uma área do conhecimento ao serviço da Arquitectura. O estudo do contexto histórico, surge com o objectivo de conhecer a evolução e transformação da qualificação acústica dos espaços, do empirismo e imprevisibilidade à ciência. O método inerente a este trabalho pressupôs um faseamento rígido. A integração no campo de estudo e o desenvolvimento das questões levantadas no panorama arquitectónico português. A primeira etapa abarca primeiramente uma incursão na bibliografia geral e específica,3 de forma a se poder circunscrever os limites do trabalho. Na segunda etapa, foi essencial um critério de selecção e abordagem metodológica para o desenvolvimento de três exemplos. Este critério pretendeu exaltar a relação e variação entre qualificação acústica e tipologia arquitectónica, e as diferentes tónicas de estudo presentes no projecto acústico4. Cada caso é desenvolvido segundo a intenção de procurar a posição da obra enquanto arte e ciência. Para tal, todo o trabalho pressupôs um exercício de discussão com profissionais na área da arquitectura e engenharia acústica, para um melhor entendimento da interdisciplinaridade do projecto e execução em arquitectura. O estudo das questões acústicas em arquitectura pareceu-me aliciante pela atracção e gosto pessoal relativo ao universo sonoro que nos rodeia, seja este composto por música ou por ruído. Mas sobretudo quis evidenciar umas das componentes da arquitectura que parece hoje tão negligenciada pela comunidade em geral. Em particular, espero demonstrar que as preocupações com o som na arquitectura não são exclusivas de engenheiros ou cientistas e que estas ocupam o seu lugar na concepção do projecto arquitectónico. Esta é uma reflexão acima de tudo sobre arquitectura.
Espaรงo e Som
Semântica e Vocabulário técnica arte e ciência espaço sinestético arquitectura acústica acústica arquitectural e arquitectónica som como fenómeno físico
Esta reflexão visa a utilização consciente de termos e conceitos. Foi ao empregar o termo técnica associado a acústica – a que tão instintivamente recorria no início do trabalho e que mais tarde me apercebi não ser de todo correcto – que me levou a tentar compreender outros conceitos próprios à linguagem arquitectónica. São estes conceitos, à partida mais básicos que, da utilização corrente, geram dúvidas quanto ao significado que primeiramente os gerou. Numa última parte, com igual importância, insiro o leitor no vocabulário científico a que recorro no desenvolvimento da prova. Não foi objectivo a sua apurada clarificação, que não se justificaria em arquitectura, mas tão-somente a integração e esclarecimento de ideias que julgo importantes no conhecimento do arquitecto.
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MÜLLER, Werner et VOGEL, Gunther (1974), Atlas de Arquitectura 1, p. 11; PORPHYRIUS, Demetri (1991), “From Techne to Tectonics”, in BALLANTYNE, Andrew (ed), What is architecture?, p. 134; 3 PORPHYRIUS, Demetri (1991), ibidem, p. 129; 4 FERNANDES, Manuel Correia (1980), “1972 – A escola por dentro” in ESBAP: arquitectura anos 60 e 70: apontamentos, p. 31; 1 2
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Semântica e Vocabulário
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técnica «A arquitectura é, já no seu sentido original antigo, um conceito vasto e multifacetado. Das suas duas raízes em grego antigo, uma (arch) expressa o começo, a direcção e a iniciativa; e a outra (tecton), a invenção, criação, solidificação e a construção.» 1 A origem etimológica de um conceito é fundamental para o seu esclarecimento. Na citação acima não se encontram referências específicas nem à arte, nem à ciência, mas sim à técnica (tecton). É a própria arquitectura que deriva etimologicamente da palavra grega tecton, construtor, possuidor de um conhecimento específico, a techne: «Originally the builder was a builder in timber – carpenter – and only later was he to become a builder in stone or a mason. This is well illustrated by the Greek word for builder, tecton from which tectonics, and eventually architecture, derive their meaning within the context of Western Civilization. » 2 Na Antiguidade Clássica, e, nomeadamente, na cultura grega, não existia distinção entre arte e ofício, utilizando-se um único termo para artista e artesão: technites: «Craftsmen and artists alike were all thought of as technites, that is men who had a techne and knew how to practice it. (…) the Greek word techne refers to a kind of knowledge. It implies method and consistency and it represents man’s reasoned intelligence put into practice.»3. Arte e técnica partiram portanto de um mesmo conceito. Técnica, neste sentido, também era arte. Esta referência explícita a um conhecimento teórico como base de uma prática é uma tónica fundamental da arquitectura como racionalidade construída, e está ligada a uma característica dos primeiros arquitectos que parece muitas vezes já ter sido esquecida. A invenção era consequência natural da resposta a um determinado problema, obtendo-se por isso formas novas. O uso repetido e acrítico de formas, materiais e sistemas, isto é, a ausência de criação, é contrária à própria natureza e etimologia arquitectónica. Quando em linguagem corrente se fala de técnica, esta adquire significados múltiplos. Em arquitectura, a ideia de pormenor técnico é sinónimo de informação muito especializada. O recurso a vocabulário pouco acessível (técnico) está muitas vezes presente nas especialidades técnicas, que são consideradas disciplinas distintas do projecto de arquitectura. Esta separação entre técnica e arquitectura evidencia-se nos procedimentos legais e camarários de construção de uma obra: primeiramente apresenta-se o projecto de arquitectura e só depois os projectos das especialidades: estruturas, infraestruturas de saneamento, abastecimento de águas, electricidade, térmica, ventilação e acústica. Neste sentido são vistas como técnicas, por requererem conhecimentos aprofundados, de ordem racional e científica. Esta associação da técnica à ciência, não é constatada só nos dias de hoje: «(…) nesta conjuntura desenvolvimentista, o apelo à “competência” dos técnicos sensibilizava muitos profissionais que viam na sua aproximação às áreas da “ciência e da tecnologia” a condição necessária (e há muito esperada pelos arquitectos) para a obtenção de um novo estatuto social e profissional.»4 As palavras do arquitecto Manuel Correia Fernandes evidenciam essa forte relação, num contexto de questionamento das metodologias de projecto, que se vivia na Escola do Porto em 1972/73. A técnica, contudo, não é exclusiva do pensamento científico. Pressupõe sim, uma ou mais formas de atingir um determinado objectivo. A técnica deverá ser então equiparada à techne grega, como parte integrante da arquitectura. É indissociável do acto arquitectónico, da arquitectura como fim, contrariamente ao que se passa actualmente. A técnica, em arquitectura, pertence ao
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ZUMTHOR, Peter (1998), “For the silence of sleep” in Thinking Architecture, p.12; AALTO, Alvar, (1940) “L´humanisation de l’architecture”, in Schildt, Göran, Alvar Aalto, de l’œuvre aux écrits, p. 140; 7 WRIGHT, Frank Lloyd (1896), “Architect, Architecture and the client”, in PFEIFFER, Bruce Brooks (ed), Frank Lloyd Wright: collected writings, p. 28; 8 GROPIUS, Walter, (1913) “L’évolution de l’architecture industrielle moderne»; in Richard, Lionel, (ed), Walter Gropius: architecture et société, p. 28; 9 KEIL DO AMARAL, Alfredo (1965) “Pintores.Escultores.Arquitectos. Para quê?”; palestra pronunciada num Colóquio da Escola Superior de Belas-Artes, no âmbito da Semana de Recepção aos novos alunos; in Keil do Amaral o arquitecto e o humanista; 10 WRIGHT, Frank Lloyd (1896), “Architect, Architecture and the client”, op. cit. p. 28; 5 6
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domínio da projectação e execução, através das metodologias de projecto e formas de execução. A técnica é tanto artística quanto científica. arte e ciência «Architecture has its own realm. It has a special physical relationship with life. I do not think of it as either a message or a symbol, but as an envelope and background for life which goes on in and around it, a sensitive container for the rhythm of footsteps on the floor, for the concentration of work, for the silence of sleep.»5 A arquitectura já foi vista como uma ciência no passado, o que parece bem longínquo do pensamento arquitectónico actual. A actividade projectual em arquitectura está para além do conhecimento e método científico: «No decurso das últimas décadas, a arquitectura tem sido frequentemente comparada à ciência e foram feitos esforços para tornar os seus métodos mais científicos, até mesmo para fazer dela uma ciência completa. Mas a arquitectura não é uma ciência.»6Nestas palavras, Alvar Aalto (1940), destacava já a arquitectura da actividade científica, encarando-a como possuidora de uma função de harmonia para com a actividade humana. Esta função superior, é, de certa forma, Arte, impulso criativo: «“Art”, then, in the sense that we should see it, is to be revered and fostered as the creative power which gives the “practical” true, “practicability”. Something to feel ennobling enthusiasm for and to work for.»7 O estatuto de arte tem sido porventura complicado de estabelecer, compreender e explicar, embora vulgarmente aceite como intrínseco à actividade arquitectónica. O seu relacionamento conheceu portanto momentos de afastamento e união. Ainda no rescaldo do desenvolvimento científico do início do século XX, a escola de pensamento preconizada pela Bauhaus, assumiu um importante papel no restabelecimento da ligação entre arte e ciência, no processo de produção e construção. «A sua colaboração (do artista) não é nem um luxo, nem um acrescento secundário, ela deve tornar-se um elemento indispensável no aparelho de conjunto da indústria moderna»8. A Arte foi e é, portanto, o contraponto natural e equilibrador numa vida pautada pelo avanço e domínio da ciência e técnica. Keil do Amaral, na década de 60, apontava já este mecanismo de dependência e interrelação, como inerente à actividade humana: «essa inegável importância da arte na época da Ciência não é um facto ocasional, mas, precisamente, uma consequência directa da grande incidência científica e técnica na vida actual, (...) o fruto duma reacção humana de equilíbrio.» 9 Necessitamos agora desta nova reunião da arte com a vida, com o processo construtivo, de um novo equilíbrio em arquitectura. O papel da ciência na arquitectura é importante não como essência, mas como instrumento. A ciência é importante para a arquitectura como conhecimento específico, como auxiliar na busca do espaço qualificado, humano. «(…) Art is at one with the Absolute to whom Science is utility maid. (…) Science has been creeping up, putting tools into modern artist hands that haven’t yet learned to use them and opening new possibilities inconsistent with preconceived Art ideals.»10 Arquitectura resulta da fusão entre a iniciativa da arte e o conhecimento proveniente da ciência. Cabe ao arquitecto estar atento a estas novas ferramentas, técnicas, que a ciência tem vindo a dispor e saber interpretá-las, integrá-las, para gerar conhecimento, para que a arquitectura evolua enquanto arquitectura. espaço sinestético
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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol.12, p. 148; A audição é ainda, para algumas sociedades africanas, mais importante que a visão; 13 «Ce n’est qu’avec la Renaissance que Dieu est devenu image. Il n’était auparavant que son ou vibration». SCHAFER, R. Murray (1977), Le paysage sonore, [The Tunning of the World], p. 25; 14 SCHAFER, R. Murray (1977), ibidem, p. 25; 15 CHION, Michel (1998); El sonido [le son], p. 82; 11 12
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«FISIOL. Produção de duas ou mais sensações sob a acção de uma só impressão: uma das sensações aparece no ponto de ou órgão onde actuou a impressão; a outra ou outras em pontos ou órgãos afastados. (Do grego syn, juntamente, aisthesis, sensibilidade, e suf. Ia)»11 A visão está para a arquitectura, da mesma forma que a audição está para a música? Sem ouvirmos, a capacidade de apreendermos o fenómeno musical é seriamente afectada, exceptuando os fenómenos de vibração que são sentidos corporalmente, associados com os instrumentos que produzem sons a baixas frequências. Sem ver, deixamos de sentir, compreender o espaço arquitectónico? Quando falamos em arquitectura, quatro dos cinco sentidos estão – ou deveriam estar – em alerta constante… ver, ouvir, tactear, cheirar. No caso de um sentido estar em falta, conseguimos, para sentir a arquitectura, exaltar todos os outros de forma a compensarmos essa ausência…nem mesmo a visão é indispensável, como se julga. O arquitecto tende a privilegiar este sentido em detrimento de outros igualmente importantes, atribuindo uma excessiva importância do desenho (emotivo) do espaço, face à função/funcionalidade (ratio) do mesmo. A audição foi um sentido privilegiado nos tempos mais recuados da História: a palavra de Deus, a história da tribo. Talvez por uma ligação mais emocional que racional àquilo que nos rodeia. 12 A primazia visual é um facto histórico, que parece suplantar e dominar toda a discussão em arquitectura. «Não é senão com o Renascimento que Deus se tornou imagem. Não era antes que som ou vibração.»13 Murray Schafer (1977), fala-nos do regresso da sociedade ocidental a um estado mais primitivo, através de uma maior consciencialização actual da importância de «reencontrar a qualidade do ouvido claro»14. Mas pelo contrário, ainda não retornámos a este estado primário e instintivo. Hoje testemunhamos a primazia visual na importância da imagem, que tão frequentemente ocupa as nossas conversas, o nosso vocabulário do quotidiano: imagem de cidade, imagem do edifício, etc.…Mas de que forma usamos as outras percepções na qualificação de um espaço? Sentir um espaço arquitectónico, é sentir as texturas dos seus materiais, tacto; é inalar os seus cheiros, registando, assimilando, memorizando, olfacto; é também ouvir. A impressão geral, sensação de um espaço é motivada então pelas diferentes percepções. Quando nos referimos a uma sala como quente ou fria, pode não ser uma característica da sua temperatura, mas uma sensação adquirida por informações de carácter visual e/ou auditivas. Uma sala fria pode o ser pela aplicação de cores frias, e, de igual forma, uma sala quente pode o ser quando existe ênfase nos sons graves propagados nesse espaço. A essência do espaço sinestético reside nesta multiplicidade e complexidade sensorial. Michel Chion, na sua obra El sonido (Le son,1998), refere-se a estas percepções como transensoriais (do castelhano transensoriales), isto é, percepções que não pertencem a nenhum sentido em particular, mas podem usar o canal de um sentido sem que o seu conteúdo fique encerrado nos limites do mesmo. Uma destas percepções transensoriais relaciona a audição ao chamado tacto interior. «falar de transensorialidade é recordar que seria errado pensar que tudo o que é auditivo só é auditivo. É também dizer que os sentidos não são entidades fechadas sobre si mesmas.»15 Esta interrelação entre sensações enquadra mesmo o paladar na sensação da arquitectura, por exemplo, através do olfacto. Sinestesia em arquitectura implica o uso de mais do que um sentido para usufruirmos, habitarmos. A concepção do espaço sinestético pressupõe compreender as necessidades orgânicas, humanas, funcionais desse mesmo espaço, evitando as
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Carácter acústico do espaço: variável, Teatro Total (W. Gropius, projecto 1927); centrífugo, Kammermusiksaal der Philharmonie (E. Wisniewski, Berlim 1987); tonal, Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, (Siza Vieira, Porto 1986-94).
CHION, Michel (1998); ibidem, p. 83 ; RASMUSSEN, Steen Eiler (1962), “Hearing architecture” in Experiencing Architecture, p. 224; 18 O autor refere-se ao Museu Thorvaldsen, Copenhaga de 1834, Ibidem, p. 225-226; 19 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 292; 20 DOMÈNECH, F. Daumal; Arquitectura acústica, Poética y diseño, p. 25; 21 Este conceito de Daumal y Domènech torna-se mais correcto do que correcção acústica, termo do âmbito da acústica arquitectural; 22 Vd. DOMÈNECH, F. Daumal; op. cit. p. 47-91; 16 17
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convenções simbólicas, formais, muitas vezes associadas a requisitos visuais. Conceber e habitar no espaço sinestético é experimentar a arquitectura: «Mas o espaço não é uma coisa visual. Constrói-se igualmente mediante a experiência de nos deslocarmos no espaço com o tacto. Um cego de nascimento, que se pode mover, tem uma representação do espaço muito mais concreta do que uma pessoa que vê, a qual, por uma enfermidade de nascimento, não de pode deslocar mediante o tacto dos objectos; por tudo o mais, o olhar funciona em parte, como um tacto à distância.»16 Espaço sinestético é sinónimo de espaço arquitectónico, mas ao qual muitas vezes, como arquitectos, parecemos não atentar. arquitectura acústica «Can architecture be heard? (…) We see the light it [arquitectura] reflects and thereby gain an impression of form and material. In the same way we hear the sounds it reflects and they, too, give us an impression of form and material.» 17 A pergunta retórica do arquitecto Steen Rasmussen (1959), relembra um dado importante da percepção espacial: da mesma maneira que a luz, também o som nos dá informações sobre a forma e os materiais que revestem o espaço. «The floors are of stone, the walls of stone, the ceilings of stone, even the residents are of stone. All of these hard, sound-reflecting surfaces give the rooms their hard, long-reverberating tones.» 18 A arquitectura pode sim ser ouvida. Ouvir é inerente à experiência do espaço arquitectónico. Acústica, deriva do grego Akouein, que significa ouvir. Eu entendo a acústica de um espaço, como a resposta global desse espaço quanto à qualidade das percepções sonoras nele criadas. Neste sentido toda a arquitectura é acústica, pois em todos os espaços arquitectónicos ocorre comunicação de mensagens sonoras. A qualidade acústica de um espaço tem vindo a ser ignorada e com resultados prejudiciais à fruição e sentido da própria arquitectura enquanto espaço sinestético. Urge actualmente a redefinição da arquitectura. Murray Schafer, já na década de setenta, apontava para esta revalorização, através da educação do ouvido. «Quando um ensino da estética acústica digna deste nome for por fim dado, a educação do ouvido deverá constituir o curso base.»19 A arquitectura acústica exprime uma intenção clara, conceito do projecto e da obra, mais do que uma qualidade espacial. Nas palavras do arquitecto Francesc Daumal y Domènech, arquitectura acústica é a «arte de crear o proyectar y construir la acústica, es decir, de diseñar los diferentes sonidos conforme a una intención acústica relacionada con los deseos del diseñador, y construirlos con la ayuda de los conocimientos físico acústicos, los materiales y los métodos vinculados a la misma construcción arquitectónica.»20 Portanto, exige uma «poética acústica» ou definição da intenção acústica do espaço; um «desenho acústico», que são os métodos de aplicação e construção da poética acústica; e finalmente a «reabilitação acústica»21, na correcção eventual dos espaços que careçam de qualificação acústica. Esta perspectiva de Domènech é bastante interessante e inovadora, nomeadamente na qualificação do carácter ou personalidade acústica dos espaços. Este método de catalogação dos sons através das suas relações espaciais foi dividido pelo autor segundo três formas: «actividade», «efeito espacial» e «acento», recorrendo a uma oposição de parâmetros. Assim, por exemplo, um espaço pode ser considerado constante ou variável pela sua actividade, centrípeto ou centrífugo pelo seu efeito espacial e tonal ou atonal pelo acento.22
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BERANEK, Leo (1996); Concert and Opera Halls – How they sound, p. 1; «A acústica musical estuda cientificamente todos os aspectos relacionados com a produção, propagação e recepção do som para fins essencialmente musicais.» in HENRIQUE, Luís, Acústica Musical, p. 6; 25 Luís Henrique no seu livro Acústica Musical dedica-lhe um capítulo: “Acústica de salas”, p. 757804; 26 Vd. HENRIQUE, Luís L.(2002), ibidem, p. 15; 27 Para conhecimento do pensamento vitruviano, vd. “da palavra – o teatro da Antiguidade Clássica”; 28 MARTINS DA SILVA, P.(2000), “Soluções construtivas – tipo: módulo IV”, in PATRÍCIO, Jorge (ed), Aspectos regulamentares e normativos no domínio do ruído e das vibrações, p. 2; 29 Vd. SHERIDAN, Ted et VAN LENGEN, Karen (2003), “Hearing Architecture: Exploring and Designing the Aural Environment.”, p. 37-44; 30 O Prof. Rui Calejo aponta também a igualdade entre os dois conceitos; 31 Luís Henrique é considerado o pai da acústica musical em Portugal; 23 24
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Arquitectura acústica aponta para uma qualidade sensorial do espaço, auditiva, e para a necessidade de um conceito e intenção na construção dessa qualidade. acústica arquitectural e arquitectónica «Acoustics, taken in the broadest sense, is the science of sound. Resonance, frequency (pitch), amplitude, wave reflections and delay times – these are some of the things about which acousticians ask questions and formulate answers.»23 Um dos impulsionadores do primeiro estudo predominantemente acústico de auditórios e salas de ópera em 1962, Leo Beranek, deixa explícita a definição da acústica como uma ciência, neste caso, do som. A acústica arquitectural, ciência que estuda os conceitos da emissão, comunicação e recepção de sons no domínio do projecto e da construção de espaços, é um dos campos de estudo da Acústica como ciência. Os outros domínios da Acústica, que se relacionam com a arquitectura, são a acústica ambiental e acústica musical24. Com o aumento exponencial dos valores de ruído nas cidades, a acústica ambiental é fundamental no controlo da qualidade de vida das cidades, e deveria estar intimamente ligada com o papel do urbanista. A acústica musical encerra a primeira ligação histórica da acústica com a arquitectura, embora como poética, e não como ciência. Com poética refiro-me a uma vontade de ligação directa entre ambas as áreas, embora com valências mais empíricas e idealistas, que funcionais. Esta ligação entre acústica musical e acústica arquitectural existe nos espaços para fins musicais, como salas de concerto.25 Só no século XX é que a Acústica foi considerada uma ciência ao serviço da arquitectura, o que justifica algumas confusões ao nível da linguagem e algum questionamento e dúvida da sua pertinência para o projecto de arquitectura. Esta dúvida reside na permanência poética de alguns dos mitos acústicos, nomeadamente os provenientes do pensamento pitagórico26 e vitruviano27, no encontro da correcta proporção de espaços através do recurso aos intervalos mais harmoniosos da música. Outros mitos há, que não são tão poéticos, e levam a julgamentos absurdos. «Um destes mitos, talvez dos mais generalizados, traduz a “confusão” entre isolamento e absorção sonoros. Esta confusão reflecte-se algumas vezes, das formas mais bizarras, em “soluções” cuja aceitação se encontra garantida com a recomendação de que integram “materiais acústicos”, os tais materiais-panaceia cuja presença deveria, por si só, resolver todos os problemas acústicos, seja qual for a sua natureza.»28 A acústica em arquitectura possui um potencial de intervenção no projecto de arquitectura. Nos Estados Unidos da América (EUA), já foram realizados trabalhos de investigação que visam desenvolver este potencial da envolvente auditiva (aural environment), como uma valência condicionante do desenho e forma dos espaços.29 A indefinição quanto aos termos utilizados, ainda não terá sido ultrapassada. Segundo Oliveira de Carvalho, são distinguidos conceitos como acústica arquitectónica, acústica de edifícios e acústica de exteriores. A primeira refere-se «ao uso dos conceitos e técnicas da Acústica, em locais de grande intervenção arquitectónica como por exemplo, os locais para grandes audiências», enquanto que a segunda estuda a qualificação acústica dos edifícios em geral, englobando as questões de condicionamento e isolamento sonoros. Em arquitectura, contudo, esta diferenciação não faz sentido. Toda a acústica de edifícios é acústica arquitectónica.30 Segundo Luís Henrique31, acústica arquitectónica engloba a acústica de edifícios
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Representação por oscilograma: som puro, som grave e som agudo.
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Meyer & Neumann (1972) cit. por HENRIQUE, Luís L.(2002), Acústica Musical, p. 758; BARRON, Michael (1993), Auditorium Acoustics and Architectural design, p.9;
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e a acústica de salas. A primeira debruça-se unicamente sobre questões de isolamento, tanto a sons aéreos como de percussão, enquanto que a segunda estuda o «campo sonoro complexo gerado em espaços fechados, tais como salas de concerto e teatros.» 32 Aqui a definição de Oliveira de Carvalho para acústica de edifícios será mais correcta. Entre acústica arquitectónica e acústica arquitectural, a distinção também não é consensual, não estando devidamente estudada ou apontada na literatura existente. Arquitectural e arquitectónico são apresentados como sinónimos, mas por vezes são aplicados com sentidos algo diferentes. Isto poderá ser devido à derivação etimológica da palavra arquitectónica (tectónica) estar mais visível neste caso. Arquitectural é semelhante a architectural, (do inglês) e architecturale (do francês), o que não espantaria já que a língua portuguesa é fértil na inclusão de neologismos e estrangeirismos. Já o castelhano adopta o termo acústica arquitectónica. Eu faço a distinção, e aplico apenas o termo acústica arquitectural. Acústica arquitectónica remete para o domínio da construção, aplicação, materialidade, tectónica. Acústica arquitectural integra mais coerentemente a relação da acústica como ciência ao serviço da arquitectura, no domínio tanto dos conceitos como da sua aplicação. som como fenómeno físico «Sound is generated in most cases by a vibrating object. Human vocal chords or the vibrating reed of a clarinet are obvious example, but any wall which transmits sounds from a neighboring room is also vibrating, even though the amplitude is miniscule.»33 Através da percepção de um determinado som, conseguimos distinguir basicamente três características fundamentais: sensação de intensidade (pressão), altura (frequência), duração (tempo) e timbre. Enquanto que a primeira aponta para um discernimento de um som forte ou fraco, a segunda diz de um som se este é agudo ou grave, e a terceira se é curto ou longo. A última, possivelmente a característica mais difícil de objectivar, distingue se um som é por exemplo metálico ou aveludado, escuro ou brilhante. Estas são características psicofisiológicas que correspondem a características físicas determinadas objectivamente. Os conceitos que se seguem sintetizam os conhecimentos base sobre som como fenómeno físico, com base nas duas representações mais comuns da onda sonora, oscilograma e espectro sonoro. Som puro (sinal) Sons complexos
tipo de som composto por uma única componente/frequência tipo de som composto por várias frequências, podendo ser periódicas ou aperiódicas. São os sons musicais: a frequência percebida ou dominante é o tom.
Oscilograma
representação que indica a evolução no tempo da pressão sonora.
T Período (s) f Frequência (Hz)
tempo que demora a completar um ciclo; número de ciclos por segundo (um ciclo, um hertz - Hz); Uma oitava sobre um som musical equivale ao dobro da frequência. As oitavas são referência para as medições acústicas: 125, 250, (baixas frequências) 500, 10000 (médias frequências), e 2000,
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Representação por espectro sonoro: som complexo, ruído rosa, ruído branco e ruído de tráfego.
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HENRIQUE, Luís L.(2002), op. cit. p.231;
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4000 Hz (altas frequências). informa sobre a magnitude da flutuação da pressão sonora: grande para sons fortes e pequena para sons fracos. A unidade habitualmente usada é o decibel (dB)1. Embora seja uma função/ relação (ratio measure), é usado comummente como valor standard de referência. 50 dB equivalem a uma conversação normal e 100 dB a clímaxes extremos em salas de concerto. λ Comprimento de Onda (m) – distância percorrida pela onda num período. Sendo V = F x, λ temos 17 m para 20 Hz e 17 mm para 20000 Hz. Importante a comparação com dimensões de um espaço: a frequências baixas, (comprimento de onda largo), as ondas sonoras contornam objectos (difracção); a altas-frequências, (comprimentos de onda curtos), as ondas sonoras são mais facilmente absorvidas ou reflectidas. c Velocidade de propagação (m/s)- rapidez é constante e depende do meio : 343 m/s. para o ar; 1460 m/s para água e 5000 a 6000 m/s para o vidro. Amplitude
Espectro sonoro
representação que indica os níveis de pressão sonora (dB) por frequência, contidos num determinado som complexo.
Ruído branco
ruído padrão, onde a cada banda de oitava, corresponde um aumento da pressão sonora de 3 dB; nível de pressão sonora constante para todas as frequências; usado como sinal para medições acústicas e corresponde ao efeito do ruído no interior de um edifício; níveis de pressão sonora maiores nas baixas frequências; corresponde ao efeito do ruído exterior proveniente do tráfego automóvel.
Ruído rosa
Ruído viário
«Os fenómenos de reflexão, absorção e difracção dependem da relação entre o comprimento de onda e o tamanho do obstáculo.»34 Estes conceitos que se seguem sintetizam as características principais do comportamento do som em espaços fechados. A difracção, absorção, reflexão e difusão, especificam o comportamento das ondas sonoras. A Reverberação é um dos parâmetros acústicos mais referenciados na qualificação acústica de um espaço. A formação de Ecos (focalizados ou flutuantes) e Ondas estacionárias revelam os comportamentos acústicos a evitar. Difracção
consiste no contorno de barreiras e reajuste das ondas sonoras como se não existissem obstáculos., acontecendo no caso do comprimento de onda ser maior que o tamanho do obstáculo. De modo análogo, este fenómeno é também responsável pela passagem de som através de orifícios pequenos, gerando um novo foco emissor com características semelhantes à energia incidente.
Absorção
A absorção acústica diminui a energia das ondas sonoras e é
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Fenómeno de reflexão: reflexão em elementos planos, côncavos e convexos, e difusão por irregularidade.
«Typical porous absorbers are fabrics, curtains and carpets; the most efficient materials are mineral wood, fiberglass and acoustic open-cell foam. In auditoria the major absorbing surfaces are the clothed audience and performers, who at mid-frequencies absorb about 90% of incident energy.» BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 15; 36 Escolhendo a massa do painel e o tamanho da caixa-de-ar, controla-se a frequência de absorção máxima; 37 Vd. HENRIQUE, Luís L.(2002), op. cit. p. 67; 38 «An acoustic mirror is a large, plane, massive surface of, for instance, concrete or plastered masonry.», BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 15; 39 «if neither the source nor receiver are within the extended circle of the concave surface, then the reflection should be weaker than from a plane surface. (…)Concave surfaces which focus on or near the audience are now taboo for auditoria.» in BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 22; 40 Luís Henrique refere a reflexão de superfícies convexas como difusão; 41 Morfey 2001, in HENRIQUE, Luís L., op. cit. p. 772; 35
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medida através do coeficiente de absorção (α) – fracção entre a energia incidente e absorvida, que varia entre 0 (absorção nula) e 1 (absorção total). Existem, três tipos fundamentais: absorção porosa, absorção por painel ou membrana, e absorção por ressonância. Absorção porosa: a energia sonora é absorvida pelo movimento de fricção das partículas nos poros do material, sendo mais eficaz nas altas-frequências. Para melhor desempenho nas frequências mais baixas o material tem de ser mais espesso.35 Absorção por painel ou membrana: a energia sonora é absorvida por dissipação da mesma no movimento do painel/membrana, que consiste numa placa flexível separada do suporte por apoios preferencialmente não rígidos (sistema massa/mola). É mais eficaz nas baixas frequências.36 Absorção por ressonância: a energia sonora é dissipada no elemento ressoador. Este mecanismo advém do efeito contrário existente nos ressoadores de Helmholtz: «If a small amount of porous material is placed in the neck of the bottle, it no longer acts as a resonator aiding sound generation but as a tuned acoustic absorber, highly efficient at absorbing at the resonant frequency but absorbing little at other frequencies.» 37 Reflexão
Fenómeno que ocorre quando os obstáculos são maiores do que os comprimentos de onda envolvidos. É regida pelas leis de Descartes: ângulo de incidência igual a ângulo de reflexão (semelhante à reflexão luminosa para as médias e altas frequências.)38 Superfícies côncavas: A onda reflecte-se focalizando-se num ponto. As focalizações do som são perigosas: se o emissor ou receptor estiverem perto do ponto focal da superfície côncava, a reflexão pode ser ouvida como um Eco.39 Superfície convexa: A onda reflecte-se em todas as direcções, dispersando o som. 40
Difusão
tipo de reflexão que ocorre se a incidência ocorrer numa superfície irregular, não havendo relação directa entre o ângulo de incidência e a direcção da reflexão. A difusão compreende o espalhamento, dispersão do som em diversas direcções.
Reverberação
Para um som curto, primeiro ouvimos o som directo, depois as primeiras reflexões, do tecto e paredes laterais, e depois o som reverberante, que define a resposta acústica geral do espaço. Tempo de reverberação (Tr) ou T60 foi definido pela primeira vez com Sabine (1898), e consiste no «tempo que a energia de um campo sonoro reverberante estacionário leva a decair 60 dB, após extinção da fonte sonora»41.
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Reverberação e tempo de reverberação: som directo e som reverberante em esquema e reflectograma (impulse response); tempos de reverberação ideais em função do volume.
«Anecoicos – (física) que tem pouco eco; que tem pouca ou nenhuma reflexão de som; câmara anecoica - recinto fechado cujas paredes se encontram cobertas de material absorvente de som, de forma que este sofra uma reflexão mínima» in Dicionário Porto Editora 2004; 43 Em termos gerais, temos 2 segundos para música sinfónica, 1 segundo para discurso e 0,5 segundos para o interior de uma casa; 42
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Em suma, é o tempo que um som demora a extinguir-se. Se o tempo de reverberação for muito longo, o espaço é considerado vivo. Se for muito curto, a sala é considerada seca, ou, no caso de haver mínima ou nenhuma reflexão de som, anecoica42. O valor optimizado do tempo de reverberação depende do programa, função do espaço. O compromisso para espaços multifuncionais só é conseguido com o recurso a acústica variável. Alguns autores defendem ainda a optimização do valor consoante o volume do auditório. Falarmos unicamente de um valor para o tempo de reverberação não é muitas vezes correcto e fidedigno da resposta reverberante do espaço. Contudo, se só houver informação relativa a um valor43, este será uma média do valor das médias frequências. Para a palavra aconselhase a manter o mesmo valor de reverberação para todas as frequências, enquanto que para a música, poder-se á querer um maior valor para as baixas frequências. Eco
reflexão sonora com um grande atraso face ao som directo (superior a 50mseg), provocando a percepção dos dois sons separadamente: som directo e som reflectido. Ecos focalizados (focused echoes): resultam de superfícies côncavas como paredes e tectos semi-circulares, e cúpulas. Ecos flutuantes ou pulsantes (flutter echoes): repetição múltipla de um som num intervalo de tempo muito curto. Resulta da localização da fonte sonora entre paredes paralelas e reflectoras. É mais sentido nas altas-frequências.
Ondas estacionárias
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resultam da interferência (construtiva e destrutiva) de ondas que se sobrepõem. Estas ondas não avançam, formandose e desfazendo-se, permanecendo no mesmo lugar. São responsáveis pelos modos acústicos de um espaço, nos quais algumas frequências são ampliadas, em detrimento de outras. São particulares das baixas frequências.
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Tempo e Evolução do eco – a caverna da palavra – o teatro da Antiguidade Clássica da palavra cantada – o espaço litúrgico medievo da ausência – a razão renascentista da música – a emoção religiosa barroca do silêncio – as salas de concerto da obra de arte total – o Festspielhaus de Bayreuth da técnica – o Modernismo forma/função: mito ou realidade humanização da arquitectura: importância dos elementos sensoriais música espacial: o espaço modelado pela intenção do compositor da acústica arquitectural - nascimento e consolidação do ruído – paradigma da cidade contemporânea
O Som, ocupa um lugar na Arquitectura. O capítulo seguinte estuda o enquadramento das diferentes manifestações sonoras, enquanto motivadoras da concepção e vivência dos espaços. Mais do que um varrimento a todas as frequências da História da Arquitectura e do Som, procurei momentos representativos de uma poética acústica. A dificuldade do estudo da percepção sonora ao longo dos tempos é notória em relação à percepção visual.
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Teatro de Epidauro, Grécia: Corte e fotografia [2005], mostrando a montagem de uma peça de teatro.
SCHAFER, R. Murray (1977), Le paysage sonore, [The Tunning of the World,], p. 298; SCHAFER, R. Murray (1977), ibidem, p. 301; 3 MÜLLER, Werner et VOGEL (1974), Gunther, Atlas de Arquitectura 1[Atlas zur Baukunst – Band 1], p. 201; 1 2
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Tempo e Evoluçao
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do eco – a caverna «O homem primitivo era fascinado pelas propriedades acústicas das cavernas que habitava. A caverna das Trois Frères e Tuc d’Audobert em Ariège possuem pinturas representando homens mascarados, exorcizando através de instrumentos de música feitos de animais. Imaginamos facilmente os rituais sagrados de preparação para a caça que aconteceriam nestes lugares sombrios e ressonantes»1 O Som era o sentido primordial, elo de união entre Homem e lugar, e estava presente em inúmeras manifestações naturais e sociais: o som dos elementos naturais, a alerta do perigo, os rituais sagrados. Era também a principal forma de comunicação, antes do advento da Palavra escrita. A reverberação e o eco, como formas sonoras, foram sempre marcados por um forte simbolismo religioso desde o início da existência humana. O eco (a repetição parcial ou total do som original) evoca a impressão espacial de superfícies múltiplas e distantes entre si, como que um espaço imensurável. Está mais próximo do inexplicável, do Divino, do que da realização Terrena. Numa altura mágica e confusa como terá sido o tempo do homem primitivo, o eco, sendo condicionado pela forma e matéria do espaço, era uma propriedade acústica, que invocava por quem o emitisse, uma impressão de autoridade e poder. da palavra – o teatro da Antiguidade Clássica «Os primeiros arquitectos construíam com o ouvido assim como com o olho»2 A palavra falada, o discurso, era na Antiguidade Clássica uma das formas mais importantes de comunicação. A sociedade greco-latina era ainda uma sociedade oral, embora constitua o berço da linguagem actual (os gregos são os criadores do primeiro alfabeto completo). A oralidade ocupava um lugar proeminente na sociedade, manifestando-se culturalmente no teatro, filosofia, política, justiça. O filósofo grego Platão chegou a delimitar o tamanho da comunidade ideal em 5040 habitantes, no seu escrito A República, que seria a audiência à qual um único orador se podia convenientemente dirigir. A arquitectura atestava a importância da oralidade no investimento na arquitectura pública. Na arquitectura grega, a importância da palavra é mais fundamental na arquitectura religiosa (com o teatro), enquanto que na arquitectura romana a importância da palavra escutada já era sentida na arquitectura civil: a basílica, o erário (edifício do tesouro) e a cúria, (tribunal). «O teatro grego é um palco religioso.»3 A arquitectura grega vive intensamente do lugar, da interpretação da envolvente. A paisagem natural constitui assim o pano de fundo da sua arquitectura, mas não se confunde com esta. Só no período helenístico (em oposição à autonomia do templo) é que o teatro grego vem criar uma integração física da arquitectura religiosa com a paisagem. Esta característica cenográfica está imbuída em toda a estrutura do teatro grego, que tem o altar como centro da composição. A plataforma circular onde se movimentava o coro (thymelici) era denominada de orquestra (orchestra), sendo construída em madeira e só depois em pedra, por volta do século IV a.C.. O espaço de representação era rematado posteriormente pelo edifício da cena (skene, scenae), onde se movimentavam os actores (scaenici), sendo composto por uma plataforma (proscénio) e pela fachada de cena (scenae frons).
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Propagação da palavra no teatro grego: esquema em corte das reflexões sonoras da orchestra e som directo; esquema em planta do teatro de Priene, mostrando uma melhoria das condições visuais e acústicas.
A pouca profundidade do palco, característica dos teatros gregos, é também importante para permitir a reflexão do chão da orquestra para a audiência; 5 Vd. BARRON, Michael (1993), Auditorium Acoustics and Architectural design. O efeito de absorção sonora por parte da audiência (grazing incidence effect) afecta a chegada do som a lugares mais distantes. Isto acontece porque o som directo percorre tangencialmente a uma superfície altamente absorvente, a audiência. Para evitar esta absorção às frequências médias, basta cumprir uma boa linha de visão; 6 BARRON, Michael, (1993) Auditorium Acoustics and Architectural design, p. 244; 7 Vd. BARRON, Michael (1993), ibidem. Para espaços abertos, o factor de inteligibilidade é a relação entre sinal e ruído (signal-to-noise), que é a relação entre som útil e ruído de fundo. Para espaços fechados, é importante a sequência de reflexão (refection sequence); 8 No teste de inteligibilidade de articulações de palavras, Epidauro teve 72%. Embora com o anfiteatro vazio, e sem brisa, facto que fazia descer de 80 para 40%. Shankland,1973; 9 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 301; 10 Vd. SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. Manter 14000 pessoas em sossego actualmente parece irreal. Os lugares sossegados fundamentais para que a palavra fluísse em boas condições são uma utopia nos ambientes urbanos em que vivemos; 11 BENEVOLO, Leonardo (1960), introdução à arquitectura, [Introduzione all’architecttura], p. 55; 4
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O espaço destinado aos espectadores (cavea), rodeava a orquestra e estava normalmente adaptado ao terreno inclinado. As condições acústicas do teatro grego eram excelentes para a propagação da palavra e ainda hoje são motivo de espanto e investigação, dado que são magníficos testemunhos acústicos de uma época onde a Acústica ainda não se tinha desenvolvido como ciência. Com igual espanto é o facto de suportarem audiências na ordem das 14000 pessoas, e os teatros actuais dificilmente ultrapassarem os 2500 lugares. Como compreender que a palavra seja tão bem ouvida e entendida por todos os elementos da cavea, isto é, que exista audibilidade e inteligibilidade? Para a palavra falada, existe um limite físico de alcance do som, baseado em níveis isométricos de intensidade sonora. Para as posições de audição laterais não se deve ultrapassar os 30 metros de afastamento e para a frente do orador, o limite é fixado em 50 metros. O teatro de Epidauro possuía uma distância máxima de 70 m, o que implica um longo alcance da palavra, conseguido com o auxílio das primeiras reflexões sonoras, e não apenas pelo som directo. A materialização da orquestra em pedra (material reflector) era então fundamental para estas reflexões4, assim como a inclinação dos lugares sentados (20 a 34º), o que favorecia, tanto a boa visibilidade como a boa audição:5 «The members of the audience receive the direct sound. This is shortly followed by a reflection from the front of the horizontal orchestra; the reflection occurs both for the chorus on the rear half of the orchestra and for actors on stage. Some further reflections will come from the stage house [scenae] but since this is behind the speakers their reflection energy will be small.»6 Para a palavra ser entendida, para que haja inteligibilidade da palavra, fundamental no teatro, tem de existir um baixo valor do tempo de reverberação, conseguido por serem espaços exteriores. A mesma dimensão e forma num espaço enclausurado, não seriam compatíveis com o uso da palavra.7 O Teatro de Epidauro, 350 a.C., é dos poucos exemplares restantes da arquitectura do teatro grego, sendo notável pela sua perfeição acústica e arquitectónica8. « No anfiteatro de Epidauro, o som da queda de um gancho, é distintamente audível de cada um dos catorze mil lugares que contém – eu próprio o verifiquei.»9. A sua funcionalidade exemplar ainda hoje é comprovada pela realização de espectáculos. O afastamento máximo do observador atinge os 70 metros. A disposição geométrica dos lugares, com uma abertura de 210º, implica pobres condições visuais e acústicas nos lugares mais afastados, destinados a estrangeiros, mulheres e espectadores atrasados. No Teatro de Priene (350 b.C.), o menor ângulo de distribuição da cavea, e um possível melhor aproveitamento topográfico, podem ser sintomáticos de um reajuste visual e auditivo. Associado à prática teatral grega, o uso de máscaras parece funcionar acusticamente como pequenos megafones. Não era contrário às boas condições acústicas, mas poderia ser apenas o reflexo de alguma agitação por parte da audiência.10 A arquitectura romana exprime as bases da arquitectura actual. O espaço romano tem um carácter positivo, como matéria, estabelecendo os seus próprios limites. A passagem do sistema trilítico (grego) ao sistema construtivo da parede contínua (romano) permite a autonomia estrutural necessária à autonomia conceptual. «Assim sendo, a complementaridade entre arquitectura e natureza já não é determinante, e a própria arquitectura pode ser concebida como fundo ou como horizonte.»11O edifício da cena (scenae), aparece agora ligado estruturalmente à cavea, formando uma unidade construtiva sólida. A função de representação do teatro romano, sem intuitos religiosos, permitiu
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Teatro grego e teatro romano: planta do teatro de Epidauro, Grécia e planta esquemática de um teatro romano, segundo Vitrúvio.
VITRUVIUS (século I), Les dix livres d’architecture, [De Architetura Libri Decem], V .vi. p. 131. Todas as traduções de Vitrúvio tiveram como auxiliares a tradução na língua inglesa, in SMITH, T. Gordon (ed), Vitruvius on Architecture, New York: The Monacelli Press, Inc., 2003; 13 Vd. BARRON, Michael (1993), op. cit; 14 VITRUVIUS (século I), ibidem, V. iii. p. 124; 15 Vd. VITRUVIUS (século I), ibidem, V. viii. p. 135; 16 VITRUVIUS (século I), ibidem, V. iii. p. 124; 17 Foi comprovada por Scott Russell em 1838; 18 VITRUVIUS (séc. I), op. cit. V iii. p. 125; 19 Vitrúvio dedicou a este tema um capítulo inteiro no Livro V, capítulo 5, “De theatri vasis” p. 128130; 20 Vd. “som como fenómeno físico”; 12
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uma alteração da orquestra e do edifício da cena. A primeira deixa de ser o lugar do altar e do coro para ser ocupada pelos senadores, enquanto que o edifício da cena (agora exclusivo lugar de representação) ganha maior importância, atestada na dimensão e estrutura: «A plataforma [proscénio] tem de ser mais profunda do que a dos Gregos. Isto é necessário porque todos os nossos actores actuam na scenae, sendo a orquestra destinada aos lugares dos senadores.»12 O Teatro de Aspendus, século II d.C., em Roma, permanece como o exemplar mais bem conservado do teatro romano. A existência de um velarium teria algumas propriedades em reflectir o som, mas sem aumentar a reverberação, que seria prejudicial à inteligibilidade da palavra13. As alterações formais do teatro romano face ao grego, apresentam naturalmente consequências acústicas. A ausência das reflexões da orquestra, agora ocupada, está compensada pelo maior ângulo das bancadas (30,34º) e pelo menor tamanho do teatro romano face ao grego. Epidauro tem capacidade para 14000 pessoas e Aspendus tem capacidade para metade, 7000 pessoas, tendo uma distância máxima significativamente inferior, na ordem dos 50 metros. O primeiro tratado de arquitectura que hoje se conhece, De Architetura Libri Decem foi escrito por Marco Vitrúvio, arquitecto romano do século I. Este documento, o Livro V, é significativo da preocupação com o som da palavra e testemunha o conhecimento dos arquitectos da antiguidade greco-romana, conscientes das implicações acústicas da sua arquitectura. A voz era mesmo determinante na escolha do lugar e concepção do teatro. «Um especial cuidado deve ser tido para que o lugar não seja surdo, mas no qual a voz se espalhe com a maior clareza. Isto pode ser obtido se um sítio for escolhido onde não impeça a reflexão.»14 Para Vitrúvio, a escolha do sítio é fundamental para o total desempenho da voz, devido à existência de lugares que constituem um obstáculo para a sua natural propagação. Katechountes são os lugares dissonantes e surdos, onde a voz perde intensidade; os periechountes são os lugares circumsonantes, onde a voz não aparece articulada; os antechountes são os lugares ressonantes, onde existe confusão na mensagem, com as últimas sílabas repetidas (eco). Os synechountes são os lugares consonantes, que reforçam e aumentam a intensidade da voz.15 Os lugares consonantes são assim os mais apropriados para a construção do teatro. Vitrúvio recomendava a presença de uma «linha do lugar mais baixo ao lugar mais alto tocando as arestas cimeiras [dos lugares]. Desta forma, a voz não será obstruída.»16Esta consciencialização da equiparação da boa linha visual com a boa acústica foi comprovada mais tarde como estando correcta.17 A concepção do teatro grego e romano, nomeadamente na organização dos lugares dos espectadores era motivada por intenções acústicas. «Os antigos arquitectos estudaram a natureza ascendente da voz, e consequentemente, regraram a elevação dos lugares sentados do teatro.» 18 Já no Coliseu Romano, 70-80 d.C, a forma oval da arena responde a intenções estritamente funcionais e estruturais, de organização do maior número de pessoas possível (50.000) para a visualização de um espectáculo. Como forma de melhorar acusticamente os teatros, Vitrúvio aconselhava a disposição de vasos ressoadores: «De acordo com a anterior investigação de princípios matemáticos, sejam feitos vasos de bronze, proporcionais ao tamanho do teatro»19. A disposição e proporção dos vasos, tinha a finalidade de melhorar a intensidade e clareza da voz em determinadas tonalidades, harmonias. Estes vasos não são mais do que ressoadores de Helmholtz, criados para ressoar a uma determinada frequência e a intervalos específicos desta.20 Todavia o seu uso não era uma prática corrente. Nas construções de hoje, a especificação e afinação tonal pode parecer absurda
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Comunicação oral paleocristã: uso do modelo basilical romano; secção transversal da antiga Basílica de S. Pedro, Roma.
MACONIE, Robin (1995), “Musical Acoustics in the age of Vitruvius”, The Musical Times, p. 81; VITRUVIUS (séc. I), op. cit. V iii. p. 125; 23 Vd. “acústica arquitectural e arquitectónica”; 24 Vd. relação entre proporção na música e na arquitectura “da ausência – a razão renascentista”; 25 CARVALHO, A. P. Oliveira (1994), “Effect of architectural styles on objective acoustical measures in Portuguese catholic churches”, p. 613; 26 ZEVI, Bruno (1984), Saber ver a arquitectura [Saper vedere l’architettura], p. 71; 27 BAGENAL, Hope (1931), Planning for Good Acoustcs, cit. por RASMUSSEN, Steen Eiler (1962), “Hearing architecture” in Experiencing Architecture, p. 228; 21 22
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mas, na Antiguidade greco-romana o discurso público era muitas vezes regido por certos modos ou tonalidades, de forma a acentuar o dramatismo da cena: «Given such a convention, architecturally assisted resonance of a specific tonality makes both practical and aesthetic sense»21 Esta preocupação tonal com o uso da palavra era comprovada com o estudo das proporções espaciais. «Através da proporção canónica dos matemáticos e a proporção musical, conseguiram que todos os sons pronunciados na cena chegassem aos ouvidos dos espectadores de uma forma clara e agradável.»22 À semelhança da harmonia das esferas de Pitágoras23, o estudo da proporção dos espaços era para Vitrúvio derivado da experiência tonal de intervalos harmónicos. A relação entre a boa proporção e a proporção musical é uma área que fascinou arquitectos de várias épocas.24 Os estudos de Vitrúvio demonstraram grande conhecimento dos fenómenos acústicos, e o seu pensamento revela que são pertencentes ao domínio da arquitectura. Num tempo onde não havia qualquer possibilidade de medir objectivamente a frequência ou compreender aprofundadamente as formas de propagação do som, a extraordinária acústica dos espaços gregos e latinos é notável. O que nos remete para a citação inicial: os arquitectos na Grécia e Roma sabiam ouvir. da palavra cantada – o espaço litúrgico medievo «No acto de devoção, o som tem mais impacto que qualquer outro factor.»25 A religião cristã alterou o universo sonoro da sociedade vigente. A Igreja procurava afastar qualquer manifestação associada à cultura pagã para a instituição de um novo culto, onde a participação dos fiéis é o centro do acto religioso. A música não seria ouvida na igreja pelo prazer das belas combinações de sons, mas sim pela capacidade de elevação espiritual que a sua audição traria. Por isso, está encarnada na liturgia pela palavra cantada. A comunicação litúrgica – base do universo sonoro cristão – era largamente influenciada pela acústica dos espaços religiosos. As primeiras construções de raiz, para o culto cristão, são baseadas no modelo basilical romano e não no templo. «A igreja cristã não é o edifício misterioso que guarda o simulacro de um deus; em certo sentido, tampouco é a casa de Deus, mas o lugar de reunião, de comunhão e de oração dos fiéis.»26 A esta vontade de comunicação, a palavra seria fundamental. Uma das primeiras basílicas paleocristãs, a antiga Basílica de S. Pedro do Vaticano (Roma c. 324), é descrita por Hope Bagenal como sintomática da estreita relação da palavra com o espaço. O ritmo normal da palavra proferida pelo padre – devido ao elevado tempo de reverberação – conduzia a um atropelo e consequente ininteligibilidade da mensagem. Era então necessário falar de uma forma mais marcada e compassada. A grande dimensão das igrejas associada a uma forte reverberação conduz à existência de uma nota musical (frequência), que, por vibrações simpáticas, reforça a intensidade inicial do emissor (efeito eigenton) permitindo um maior alcance sonoro no espaço direccional e longitudinal das igrejas de planta de cruz latina. A modulação da voz cantada e o ritmo das entoações litúrgicas eram influenciados pela resposta acústica das igrejas medievais. A existência de uma nota simpática permitia o ajuste da palavra ao espaço através de uma frequência de ressonância: «(…) “sympathetic-note” – that is to say “a region of pitch in which tone is apparently reinforced”. If the reciting note of the priest was close to the ‘sympathetic note’ of the church (…) the sonorous Latin vowels would be carried full-toned to the entire congregation.»27 Era a nota de recitação ou tenor (do latim tenere).
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Reverberação gótica: passagem da cobertura em madeira para a cobertura em pedra; imagem da abadia cisterciense Le Thoronet.
SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 291; No papado de Gregório Magno (590-604) foi instituído o cantochão (canto gregoriano), responsável pela uniformização da liturgia católica romana; 30 A entoação litúrgica era designada por cantochão, sendo classificado pela forma como era cantado: antifonal (alternância dos coros), responsorial (alternância entre solista e coro) e directo (sem alternância); 31 SHERIDAN, Ted et VAN LENGEN, Karen (2003), “Hearing Architecture: Exploring and Designing the Aural Environment.” p. 39; 32 ZEVI, Bruno (1984), op. cit. p. 80; 33 ZEVI, Bruno (1984), op. cit.; 34 Léonin (1159-1201) e Pérotin (1170-1236), respectivamente cónego e trabalhador na catedral de Notre Dame em Paris, foram os primeiros compositores polifónicos, e a sua obra inspirava-se directamente na catedral francesa; vd. GROUT, Donald J. et PALISCA, Claude V. (1988), História da Música Ocidental [A History of Western Music]; 35 RASMUSSEN, Steen Eiler (1962), “Hearing architecture” in Experiencing Architecture, p. 230; 28 29
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«Eigenton é uma palavra alemã que se aplica à ressonância fundamental de uma sala, que produz a reflexão das ondas sonoras sobre as superfícies paralelas. Podemos localizá-lo empiricamente, experimentando diversas notas, frequências. A sala (particularmente se estiver vazia) ressoará fortemente ao uníssono da voz quando a boa nota for emitida.»28 Em 391 d. C, com a instituição do cristianismo como religião oficial, o latim substitui o grego como língua oficial da liturgia em Roma, marcando a linguagem litúrgica católica até ao 1965, com o Concílio de Vaticano II. Contudo esta não era uma língua que o homem comum entendesse. Este facto coloca em questão a importância da inteligibilidade da mensagem. Nos primórdios do cristianismo, coincidente com a desagregação do império romano, mesmo com a instituição oficial do latim como língua oficial da liturgia, haveria ainda o recurso natural às línguas vernaculares no acto litúrgico. Só muito mais tarde, no século XI e XII, com as reformas gregorianas29 e a consequente uniformização litúrgica, é que foi consagrada a separação entre o latim falado na igreja e o latim vulgar ou baixo latim. Do século IV ao século XII, a mensagem da cerimónia religiosa foi compreendida por um menor número de pessoas. Não obstante este facto, seria mais importante que a palavra fosse entendida ou que o crente se sentisse emergido na experiência de adoração? O longo tempo de reverberação, que chegava a atingir 6 ou mais segundos, levava ao fiel, a sensação de estar mergulhado no espaço, submerso nos sons do cantochão30, comprovando a importância da experiência religiosa em detrimento da compreensão da mensagem. A ideia de imersão é evidente, no espaço religioso medieval. A criação deste ambiente misticista corrobora com a tensão desejada ao acto de constrição e é semelhante à tensão acústica do espaço, que está atento ao mais mínimo dos sons e movimentos. Esta sensibilidade sonora estava presente em espaços como os da Abadia cisterciense Le Thoronet, sul de França: «Here each sound, even a pin dropped at the end of a nave some 40 meters away, generates a full range of harmonics overtones…the nave is so sound-sensitive that one becomes aware that every body movement creates an impact on the volume of air in the chamber.»31 A tensão acústica era uma qualidade acústica que imanava da arquitectura cisterciense. Os seus autores defendiam um regresso às origens primárias do Cristianismo, acentuando o carácter ideológico da arquitectura em detrimento dos aspectos práticos. S. Bernardo, responsável pela estruturação da ordem de Cister, propõe moderação nas dimensões, decoração e ostentação. O sentido de depuração e minimalismo invoca um regresso à austeridade e reencontro com a pureza das formas na arquitectura, que pretende ser reduzida à sua essência. Conduz então a espaços mais reverberantes e vivos. «O pacato ritmo paleocristão, a aceleração dos bizantinos, a interrupção bárbara dos ritmos (…)» 32 O crescente rítmico que vemos, na evolução espacial das primeiras basílicas paleocristãs à igreja românica, culminando na «continuidade espacial»33 do gótico, acompanha o evoluir dos sons ouvidos nesses espaços. A palavra recitada ou declamada evolui para um cântico modelado, mais tarde no século VI acompanhado por coro. Derivada do espaço reverberante gótico, este crescendo de complexidade e densidade sonora, é marcado pela passagem do cântico monofónico (cantochão) para a polifonia34 no século XI. «When it was discovered that the unifying tonal effect of the church as an instrument was so great that more than one tone could be heard at the same time with pleasing results, the harmonies produced by the coinciding notes began to be regulated and used.»35
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Ascese gótica do som e luz: abadia cisterciense de Santa Maria de Alcobaça, de 1153.
Nas igrejas com tecto de madeira, as baixas frequências são mais absorvidas, passando o tempo de reverberação mais longo para as altas-frequências. Vd. HENRIQUE, Luís L.(2002), Acústica Musical, p. 804; 37 Antiga Basílica de S. Pedro do Vaticano e Igreja de Santa Sabina, Roma c. 422.432; 38 A pedra da catedral gótica reflecte as baixas e médias frequências, absorvendo as altas, superiores a 2000 Hz; 39 A desmaterialização estrutural apenas na cabeceira da igreja é uma característica do gótico português, particularmente na Abadia de Santa Maria de Alcobaça, de 1153; 40 Problemático desejo de verticalismo ou esforço para equilibrar com a altura as dimensões planimétricas? As coberturas das igrejas góticas chegaram a elevar-se a mais de 50 metros de altura. Vd. BENEVOLO, Leonardo, (1960) introdução à arquitectura, [Introduzione all’architecttura], p. 118; 41 DA VINCI, Leonardo, Trattato della pittura, núm. 24, cit. por BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura do Renascimento, p. 342; 42 MANFRED, Sack, “On the Mysterious Relationship of Music and Architecture”, p. 16; 43 A primeira publicação de De Architetura Libri Decem de Vitrúvio é de 1452; 44 A repercussão acústica, onde a proporção musical aplicada leva à existência de uma tonalidade sonora específica de um determinado espaço, é de interpretação subjectiva; 36
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O tempo de reverberação da igreja gótica, parâmetro objectivo dependente do volume e da capacidade de absorção das superfícies, não terá sido sempre tão elevado. A substituição da madeira36, na cobertura usada nas primeiras basílicas paleocristãs,37 pela pedra da cobertura abobadada, reforça a reverberação.38 A poética do som das igrejas góticas está em sintonia com a poética da luz. As janelas puntiformes são substituídas por amplos envidraçados, que, particularmente na cabeceira39, inundam o espaço sagrado. Estas superfícies filtram a luz e reflectem o som, numa dupla articulação sensorial na criação de um ambiente próprio à celebração democrática da religião. O impulso vertical promove esta ascese mística, que é tanto visual como acústica.40 Forma, função e som estão interrelacionados e são interdependentes. da ausência – razão renascentista «(O olho) está à frente da astrologia; faz a cosmografia; orienta e corrige todas as humanas artes; move o homem às mais distintas partes do mundo; é príncipe das matemáticas, seus conhecimentos são verdadeiros; descobriu os elementos e o seu lugar natural; tornou possível predizer as coisas futuras mediante o curso das estrelas; deu origem à arquitectura e à perspectiva, e à divina pintura.» 41 O Renascimento foi o momento derradeiro na primazia da visão sobre a audição, despoletado pela descoberta da Perspectiva, no século XV. O predomínio da razão sobre a emoção que caracteriza o homem renascentista, em oposição ao medieval, está presente na relação entre ciência e arte. Se antes havia alguma dúvida quanto ao sentido principal na apreensão de conhecimentos e comunicação, estas são dissipadas com a idade moderna. Na relação entre ciência e arte motivaram-se muitos mitos, na relação entre forma e qualidade acústica. Um deles é o da proporção da arquitectura clássica; o silogismo é feito, comparando Música com Arquitectura. Harmonia, em música, resulta da relação de intervalos considerados consonantes, ou perfeitos, aos nossos ouvidos: 8ª, 5ª, 4ª, 3ª; Estes intervalos têm uma explicação física e matemática descoberta por Pitágoras na antiguidade: se fizermos vibrar uma corda ela emitirá um som numa determinada altura (frequência). Se dividirmos a corda ao meio, o som produzido estabelece uma relação de 8ª com o som anterior (1:2). Analogamente a 5ª corresponde a uma razão 2:3 e o intervalo de 4ª, 3:4. Estas foram proporções levadas da música para a arquitectura, esperando com estas o alcance de uma nova regra de acção em arquitectura: «And for Alberti, (…) it was the numbers with which the harmony of tones would delight our ears, the very same that enchant our eyes and mind.»42 Leon Battista Alberti aplicou estes conhecimentos em arquitectura, inspirados pela descoberta do pensamento vitruviano.43 Na sua obra De Re Oedificatoria (Florença 1485), esta e outras relações entre a arte e a ciência são expostas como forma de acção em arquitectura. Desta forma, pensou-se que aquilo que era harmonia para os ouvidos o poderia ser para os espaços. A arquitectura clássica fundamentou a proporção dos seus espaços, com a proporção matemática dos intervalos harmónicos da Música, esperando criar também espaços harmoniosos. E isto é uma cozza mentalle44. Andrea Palladio, intelectual humanista de Veneza, também conhecedor das proporções musicais, aplicava-as nas suas obras. Numa das suas obras de arquitectura civil, a Villa Capra, mais conhecida como Rotonda (1566-1567, Vicenza), o gosto pela composição e os elementos simbólicos sobrepõem-se à funcionalidade do edifício. A Villa romana foi feita para ser vista, como um objecto na paisagem para ser contemplado
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Intenção ou consequência acústica? A inserção de cúpulas no Renascimento e os efeitos de ecos focalizados; planta e imagem da Duomo Santa Maria del Fiore, Florença.
Vd. “da acústica arquitectural – nascimento e consolidação”; Vd. “som como fenómeno físico”; 47 Sobre o perigo do eco em auditórios, vd. BERANEK, Leo (1996), Concert and Opera Halls – How they sound, p. 494; 48 Leonello Tarabella e Silvano Burgalassi, vd. CARROL, Rory (1999), “Pisa Baptistery is giant musical instrument”; 49 MANUEL DE VASCONCELOS, José (1988), “Apresentação de Severo Sarduy” in SARDUY, Severo (s.a.), Barroco, [Barroco], p. 15; 45 46
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de longe. A sua acústica interior não é coincidente com esta funcionalidade necessária para a habitação: o conforto e intimidade. A conjugação de espaços de planta rectilínea e curvilínea traduz-se numa variação acústica considerável. As superfícies côncavas, pelo efeito de focalização do som, no seu centro, criam disjunções visuais e acústicas, o que Wallace Clement Sabine45 designou por efeito de whispering gallery. A qualidade acústica do espaço central renascentista é uma consequência de um exercício de composição e proporção, o que poderia ser contestado por determinados espaços renascentistas, onde alguns elementos curvos causam distorções sonoras por muitos considerados demasiado assombrosas para serem uma coincidência: o eco focalizado.46 Esta distorção sonora, tanto pode ser vista como qualidade acústica, como um erro a evitar. Tudo depende do contexto arquitectónico. Num auditório contemporâneo, o eco é um crasso defeito acústico. «Echoes resound from focusing domes, semi-circular walls, and other acoustically difficult shapes, and great care must be taken to avoid them in design».47 Estaria o arquitecto do Renascimento consciente do efeito sonoro da introdução de cúpulas nos seus espaços? O Baptistério de Pisa, uma estrutura circular de 1152 ao qual foi adicionado uma cúpula no século XV, possui um efeito acústico singular. Os seus ecos atribuemlhe uma acústica semelhante a um órgão de tubos, funcionando como um instrumento musical. Dois musicólogos italianos48 consideram-no uma intenção clara dos arquitectos renascentistas de criação de um espaço para além da estética visual. A cúpula, no entanto, como elemento arquitectónico de cobertura, é usada em outros espaços de funções diferentes, se não mesmo opostas: a cúpula da catedral de Florença e a cúpula da Rotonda. Estas duas obras arquitectónicas constituem dois dos mais emblemáticos exemplos da arquitectura renascentista. A primeira é resultado da mestria de um dos seus arquitectos mais reconhecidos, Filippo Brunelleschi e constitui um símbolo da arquitectura religiosa do Quatrocento italiano. A segunda, pertencente à tipologia palladiana da villa romana, permanece como monumento da arquitectura civil da Renascença. Haverá talvez um desajuste da forma e função do espaço, numa síntese só conseguida cinco séculos mais tarde, com positiva afirmação do Movimento Moderno. Em suma, existe a afirmação da existência de uma intencionalidade acústica, mas pela valorização da mente e visão parece-me mais credível como consequência, do que como conceito. Os próprios ideais humanistas por que se regem os artistas do Renascimento, recolocam o paradigma da arquitectura. A arquitectura tem como objectivo servir o Homem, assumindo o seu valor pela respectiva adequação em relação a este. A abstractização da obra no Renascimento, querendo torná-la perfeita, é oposta a este objectivo humanista. Até que ponto é válida esta vontade de perfeição, colocando a obra mais longe de nós (Terreno) e mais próximo de ideais inatingíveis (Divino)? da música – a emoção religiosa barroca. «A viagem do homem barroco é entre a luz e a sombra. O seu quotidiano é um deserto de desassossego dominado pela desmedida importância de todos os pormenores, uma ponte para a transcendência. A dúvida, a inquietação, a emotividade extrema geram os grandes visionários do tempo barroco. A prática barroca é de tudo isso expressão, mas é na repressão moral que dominou o século XVII e no endeusamento da razão filosófica que melhor se encontra uma porta para a explicação a contrário do mundo barroco e dos seus aspectos.» 49 O Barroco, na arquitectura, veio contrapor à razão e equilíbrio renascentista, uma emoção e tensão dinâmica na arte do século XVII e XVIII. É a passagem do espaço central
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Barroco como momento de inversão acústica: média da resposta de 36 igrejas, comparando parâmetros subjectivos - Reverberação, Clareza, Impressão Geral e Palavras Compreendidas - com estilos arquitectónicos: 1-Visigótico, 2-Românico, 3-Gótico, 4-Manuelino 5-Renascensa, 6-Barroco, 7-Neoclassico, 8-Contemporâneo.
Vd. SARDUY, Severo (s.a.), Barroco, [Barroco]; A reacção contra a degradação dos poderes e o descrédito papal dos séculos XIV e XV conduziu à Reforma Protestante de 1517; 52 MANUEL DE VASCONCELOS, José (1988), op. cit. p. 15-16; 53 A igreja de Santa Clara apresenta um coeficiente de absorção médio de 0,23, sendo o valor mais alto de um estudo realizado num universo de 31 igrejas católicas portuguesas construídas entre o século XII e século XX. Vd. QUEIROZ E LENCASTRE, Margarida (1998), A inteligibilidade da palavra em igrejas católicas, através de análises de carácter objectivo e subjectivo; 54 Vd. CARVALHO, A. P. Oliveira et MORGADO, A. E.J., et HENRIQUE, Luis (1996) “Analysis of Subjective acoustic measures and speech intelligibility in Portuguese churches” e CARVALHO, A. P. Oliveira (1994) “Effect of architectural styles on objective acoustical measures in Portuguese catholic churches”; 55 THEINER, A.(1874), Acta(…) Concili tridentini (...) cit. por GROUT, Donald J. et PALISCA, Claude V. (1988), op. cit. p. 285; 56 Esta ideia é a base da música realizada posteriormente, baseada na sobreposição de uma linha melódica sobre uma harmonia – estrutura de acordes; 57 Este contraponto musical era também um contraponto espacial. Em autores barrocos como Bernini e Borromini, a ideia de espaço axial é combinada com o espaço central, criando uma nova dinâmica de eixos contrapostos; 50 51
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do quadrado e círculo, para o espaço axial e bifocal da elipse50. A arquitectura religiosa (espaço sagrado) é marcada pela propagação dos ideais da Contra Reforma católica, que apostava na renovação do catolicismo, manchado pelas ideias da reforma protestantista51. O Concílio de Trento (1545-53), marca do início dos esforços contra-reformistas, foi um despoletador de inúmeras alterações no panorama nacional e internacional. A arquitectura religiosa assume agora uma espectacularidade absoluta, aperfeiçoando formas de persuasão dos crentes, o que explica a necessidade de criar um modelo de uma igreja clara e comunicante, com o maior número de pessoas possível. No contexto europeu, uma das respostas da Contra-Reforma foi a alteração dos interiores de igrejas católicas, por ordem a enaltecer a devoção: decoração exuberante e viva, trabalho em ouro (talha dourada) e a inclusão de órgãos musicais. «O corpo do renascimento foi, pelo equilíbrio que lhe presidiu, lugar de razão, de ponderosa afirmação. A transcendência para que aponta toda a arte barroca implica um outro corpo: ágil, leve, esculpido pela tentação, em tensão permanente. Um corpo em festa, animado pela paixão.»52 Desta forma, a arquitectura retoma a ideia de encenação e teatro. As igrejas portuenses de S. Francisco e Santa Clara, (segundo quartel século XVIII), são dois exemplos do barroco português, paradigmáticos desta transformação interior do espaço sagrado. O trabalho profuso e delicado do interior, em Santa Clara, ganha uma homogeneidade pelo recobrimento total das superfícies interiores por talha dourada. O trabalho escultórico da madeira fornece novas texturas às superfícies, aumentando significativamente a absorção sonora da igreja 53. Esta alteração das superfícies de revestimento, com maior absorção e difusão sonora, condiciona as características acústicas do espaço barroco. São espaços que apresentam tempos de reverberação bastante inferiores aos seus antepassados medievais e renascentistas, o que, em muito, contribui para a inteligibilidade da palavra. No programa de investigação de Acústica de Igrejas, desenvolvido pelo Laboratório de Acústica da FEUP na década de 90, foi estabelecida uma correlação entre parâmetros acústicos (objectivos e subjectivos) e os diferentes estilos de arquitectura. Os valores obtidos encontram-se publicados em documentos que enfatizam diferentes análises e confirmam a relação entre acústica e arquitectura do âmbito religioso 54. Os espaços religiosos do Barroco, confirmam o período onde a Reverberação é mais baixa, assim como a Clareza e Definição com o seu maior valor. Estas características acústicas mudavam radicalmente a sonoridade dos espaços. A Clareza era também uma clareza musical. A par das transformações na arquitectura, a música sacra católica sofreu alterações derivadas do espírito da Contra Reforma. A ideia de que a polifonia tornava a mensagem do texto religioso ininteligível não conduziu à sua proibição: «Qualquer concepção do canto em modos musicais deverá destinar-se, não a dar ao ouvido um vão prazer, mas a permitir que as palavras sejam claramente entendidas por todos e, assim, os corações dos ouvintes sejam tomados pelo desejo das harmonias celestiais, na contemplação da beatude dos eleitos.» 55 A técnica do contraponto, ao qual se identifica a música do período barroco, exige atenção e definição de cada som. Esta técnica consistia, essencialmente, na contraposição de várias linhas melódicas, que mantinham a sua independência e definição. Desde a polifonia simples, com clara independência das linhas melódicas, no barroco era usual o contraponto entre uma linha melódica de suporte, grave (o baixo contínuo) e uma linha ornamentada superior, mais aguda 56. A acústica do espaço sagrado é fundamental para a criação contrapontística barroca. 57 A correlação da acústica e música é evidenciada em Johann Sebastian Bach, compositor do século XVIII. O denominado período de Leipzig (1723-1750), onde foi
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Concertgebouw, Amesterdão: corte longitudinal de Van Gendt para o concurso e vista interior após a renovação em 1998.
Cada ano passado em Leipzig, Bach compunha 58 cantatas e uma Paixão para a Sexta-feira Santa. Uma das suas obras mais conhecidas é a Paixão segundo S. Mateus (BWV, 244), 1727; 59 Vd. RASMUSSEN, Steen Eiler (1962), op. cit. p.231; 60 Vd. BAGENAL, Hope (1931) in RASMUSSEN, Steen Eiler (1962), “Hearing architecture” in Experiencing Architecture; 61 BERANEK, Leo (1996), op. cit. p. 6; 62 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 171; 63 Vd. “espaço sinestético”; 64 Vd. SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit, p. 170-173; 65 Para uma completa sinopse da evolução formal e acústica das salas de concerto e de ópera, vd. BERANEK, Leo; Concert and Opera Halls – How they sound; New York: ASA Acoustical Society of America, 1996; 58
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director musical na igreja luterana de Thomaskirche, demarcam a influência deste espaço na sua obra. A prolífica composição de Bach, nomeadamente a Cantata e a Paixão58, foi direccionada para Thomaskirche. As condições acústicas desta igreja revelam os moldes dos ideais da Reforma Protestante, na qual o sermão era dado, em parte, na língua vernacular. Revela também as características acústicas ideais para o desenvolvimento da técnica contrapontística de Bach, na perfeição de todos os pormenores. A estrutura gótica do edifício de três naves foi alterada com a introdução de galerias laterais (próprias do culto luterano), a aplicação de madeira segundo a ornamentação própria do barroco e a introdução de cortinas nas entradas. Estas alterações provocaram um decréscimo do tempo de reverberação e permitiram a inteligibilidade do discurso religioso, retirando a eventual ressonância tonal da parede pétrea, o que garantiu a composição musical em diversas tonalidades59 . O tempo de reverberação – sem as alterações do século XIX – era de 2,5 segundos, com toda a congregação, que atingia um universo de 1800 pessoas; a meia ocupação do espaço baixaria para 1,6 segundos, o que seria baixo para a música coral e organística clerical, mas apropriada para o detalhe musical barroco e para a inteligibilidade da missa luterana.60 O Barroco na arquitectura, que ideologicamente serviu a igreja da Contra-Reforma, estava também presente nalgumas reformulações da Igreja da Reforma protestantista, mais austera. Serviu, acusticamente, o espaço sagrado tanto na música barroca que invoca detalhe, como na percepção da mensagem essencial ao culto luterano. Os esforços contra-reformistas de espetacularização visual da missa levaram eventualmente a uma cisão entre música erudita e a arquitectura dos espaços sagrados. A música do Barroco tardio, procurou assim outros espaços de actuação, não influenciados por directivas religiosas: «Baroque orchestral music was usually performed in relatively small rooms with hard, reflecting walls, the rectangular ballroom of a palace, for instance, which had considerable intimacy and, when occupied, a reverberation time longer than that of a conventional living room, yet low – under 1.5 sec. (…) Even today, we prefer to listen to this highly articulated music in a small room, acoustically intimate, with fairly low reverberation time.»61 do silêncio – as salas de concerto «…A sala de concerto torna possível a escuta atenta, da mesma forma que o museu favorece a focalização e a selecção do olhar.»62 O final do século XVIII marca a cisão da música com o espaço sagrado. O universo sonoro solta-se da constrição religiosa. A música ultrapassa o contexto cultural que lhe deu origem, para criar o seu próprio ambiente acústico: as salas de concerto. Neste espaço de «escuta atenta», a oposição entre ouvintes e intérpretes é absoluta, nascida de uma conduta comportamental restrita, como a posição quieta e o ritual das palmas63. O detalhe musical exige então uma concentração e intelectualização, contrariamente à canção popular da rua, dos espaços exteriores. O silêncio absoluto das salas de concerto (com raros momentos de pausa) marca a vivência sonora nas salas de concerto, até aos dias de hoje. O predomínio das altas-frequências64, proporcionadas pela directividade clara, entre emissor e ouvinte, provoca um som menos envolvente, mas claro e definido. A sala de concerto tem a sua origem em Londres, na segunda metade do século XVIII, tendo como modelo a sala de tribunal. A sua forma rectangular65 subsiste, ainda hoje, como um modelo recorrente da tipologia. Os primeiros espaços (Hanover Square
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Teatro de ópera europeu: plantas dos mais importantes teatros do século XVIII.
BERANEK, Leo; Concert and Opera Halls – How they sound, op. cit; Vd. “da acústica arquitectural: nascimento e consolidação”; 68 DE BOER, Henriette Posthuma, Concertgebouw & Royal Concertgebouw Orchestra, p. 15; 69 FÖLLMER, Golo et GERLACH, Julia (2004) “Audiovisions. Music as an Intermedia Art Form”; 70 WAGNER, Richard “Das Kunstwerk der Zukunft” [The Art-Work of the Future], cit. por JOHN, Barbara, “The Sounding Image: about the relationship between art and music—an art-historical retrospective view”; 71 GROUT, Donald J. et PALISCA, Claude V. (1988), op. cit. p. 316 ; 72 A materialização ficou a cargo do arquitecto Otto Brueckwald; 73 O teatro da Renascença tem origem no teatro clássico antigo e foi impulsionado pelo contacto a redescoberta de documentos antigos, como o Architectura Libri Decem de Vitrúvio. Um dos elementos com maior desenvolvimento no teatro renascentista é a scenae frons; 66 67
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Room, Londres, 1791-1794) defendiam o detalhe e a clareza, com baixos tempos de reverberação. Com o crescimento da popularidade na audição de concertos públicos, alterase a postura musical e espacial. A música perde detalhe e urge por intensidade sonora e o espaço dilata as suas dimensões, passando de uma actividade de elites para uma actividade social comum. No estudo de referência na qualidade acústica das salas de concerto de todo o mundo66, dois dos melhores auditórios considerados67, Concertgebouw em Amesterdão (1887) e o Grosser Musikvereinssaal em Viena (1870), datam do século XIX, sem qualquer recurso a cálculo, mas apenas a modelos existentes de sucesso. No caso do Concertgebouw, a inspiração veio do Neue Gewandhaus de Leipzig, que é dois anos anterior e foi destruído em 1943: «the large auditorium was modelled on the same ‘shoe-box’ format as in Leipzig, although at 44 x 27.80 x 17.50 meters, with seating for more than 2000 people, it is much larger.»68 Os dois segundos de tempo de reverberação, para as médias frequências são adequados para uma música que se quer com mais intensidade e com menor exigência, na atenção e concentração. É a passagem do intelectualismo exigido pela música de Bach, para a música apaixonada do período romântico. A inovação perante o modelo paralelipipédico – que veio mais tarde a ser referenciado como caixa-de-sapatos (shoe box) – só existiu com sucesso no auditório da Berlin Philharmonie (1956-63), de Hans Scharoun. «The reception situation in concert halls (…), is to a large extent subordinate to visual criteria. The listener with closed eyes may be highly respected (...), however, s/he is a minority in the audience. The majority of concert visitors intensely follow the conductor and the musicians with their eyes.»69 da obra de arte total – o Bayreuth Festspielhaus «The great Gesamtkunstwerk [obra de arte total] that has to embrace all genres of art, in order to consume, to destroy each one of these genres to some extent as resources for the sake of achieving the overall purpose of them all, in other words the unconditional, direct representation of perfect human nature – this great Gesamtkunstwerk (i.e. our spirit) recognizes not as the arbitrary possible deed of the individual, but as the necessarily conceivable joint work of the people of the future.»70 A vontade de unir as artes sob a mesma expressão surgiu no século XIX por intermédio de um compositor. Para Richard Wagner, as artes da música, dança, poesia e pintura, tendo atingido o seu máximo como artes individuais até ao início do século XIX, poderiam apenas evoluir através de um trabalho de síntese, que ele designou por gesamtkunstwerk ou união de todas as formas de arte. Esta síntese seria incarnada na ópera, que é na sua essência «uma obra teatral que combina solilóquio [monólogo], diálogo, cenário, acção e música contínua (ou quase contínua)»71 . O gesamtkunstwerk de Wagner foi finalmente atingido em 1876, com a construção de um espaço idealizado pelo compositor, para albergar, exclusivamente, as suas óperas: o Bayreuth Festspielhaus, na Alemanha72. O teatro de ópera tem as suas origens no Teatro da Renascença, com o Teatro Olímpico de Palladio73 (Vicenza 1584), marcando o enclausuramento definitivo do espaço da cena. Da experimentação formal ocorrida na primeira metade do século XVII, ficou a forma em ferradura a mais utilizada. O sucesso deste modelo – que prevalece por 200 anos – mesmo perante as más condições visuais dos camarotes, é explicado à luz de um ponto
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Inovação acústica: o fosso de orquestra de Bayreuth: planta , corte longitudinal e proposta de concepção actual.
O arquitecto foi Giuseppe Piermarini. O La Scala alberga actualmente 2289 lugares; BARRON, Michael (1993), op. cit. p.312; 76 BERANEK, Leo, op. cit. p. 231; 77 WAGNER, Richard cit. por BERANEK, Leo, op. cit. p. 3; 78 Aqui a exacerbação da profundidade perspéctica com um duplo proscénio tem como objectivo a tensão dramática; 79 Wagner é considerado precursor do audiovisual e do cinema actual; vd. DANIELS, Dieter, “Sound & Vision in Avantgarde & Mainstream”; 80 JOHN, Barbara, “The Sounding Image: about the relationship between art and music—an arthistorical retrospective view”; 74 75
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de vista social da época: ir ao teatro para ver e ser visto. Acusticamente, este modelo era adequado para a ópera tradicional, que exigia salas com alta definição e pouco volume (fullness of tone), ao contrário da ópera wagneriana que pede mais reverberação e consequentemente menos definição. Dois dos mais consagrados exemplos são a Ópera de Paris de Charles Garnier (1778), e o Teatro La Scala, (Milão1875)74 ainda com estilo barroco. «Acoustically, the situation in La Scala (and its close italian relatives) is special; it’s reputation is certainly among the best in the world.»75 O Bayreuth Festspielhaus vem quebrar com a tradição do teatro de ópera italiano. A inovação do teatro de ópera de Wagner em relação aos seus congéneres, no modelo barroco italiano, reside essencialmente na forma do auditório e na disposição da orquestra. A utilização do modelo do anfiteatro semicircular veio quebrar com a tradição formal instalada no modelo em ferradura do teatro barroco italiano. Visava a distribuição democrática dos espectadores sem a ditadura das galerias e camarotes, para re-centrar a atenção, novamente, nos actores em cena e não em quem atendia ao espectáculo. A disposição da orquestra é, também, uma novidade, embora este modelo não tenha sido novamente utilizado, foi seguramente inspiração para algumas investigações actuais em acústica de salas. O modelo italiano exige o fosso, descoberto antes do proscénio. Em Bayreuth o fosso é parcialmente coberto. Desta forma, toda a orquestra está fora de vista de qualquer espectador, cumprindo um dos objectivos de Wagner, a orquestra invisível. Um dos objectivos da utilização de um fosso, em ópera, é a de equilibrar o volume sonoro da orquestra com os cantores. Em Bayreuth, o objectivo do fosso coberto iria mais ao encontro da dramatização audio-visual: «He expected to create acoustically a mysterious sound, emanating from a invisible orchestra, with a modified, somewhat uncanny timbre.»76 «(...) After creating the invisible», Wagner pretendia ainda a anulação do edifício, «I would now like to create the invisible theatre».77 Este radicalismo expressa uma vontade pessoal clara do autor: ir a Bayreuth pelo espectáculo, pela obra, e não pelo espaço que a alberga. Talvez por isso, se explique a simplicidade estrutural de Bayreuth, num espaço que cresceu literalmente, de dentro para fora, um volume simples, para o auditório (teatro clássico), e os dois volumes acoplados para a cena78 . Esta linearidade entre interior e exterior explica, talvez, a estranheza volumétrica e desconcerto formal do seu exterior. Para exaltar a experiência audiovisual (sinestética) que as suas obras procuravam, talvez a solução fosse mesmo uma arquitectura invisível, onde a concentração e usufruto do espaço se centrasse no objectivo principal do teatro, e não no teatro em si. A sinestesia entre som e visão, apenas fundidas na mente humana, foram desde sempre poderosas expressões artísticas.79 O apelo da obra musical wagneriana ainda hoje é paradigmático: o Festival de Bayreuth, com exclusiva integração das óperas de Wagner, ainda hoje é, um sucesso com lotação esgotada (na compra de bilhetes) com cinco anos de antecedência. Pela força da associação acústica e visual, Wagner é considerado o percursor da actividade multimédia e particularmente do cinema e dos espectáculos de pirotecnia musical: «The musical staging, with the orchestra in a concealed pit that concentrates the audience’s attention entirely on the interplay of music and stage setting is seen as a precursor of cinematic performances.»80 Não é por isso de todo estranho ouvir um trecho das Valquírias acompanhado por uma explosão de luz e cor. da técnica – o Modernismo forma/função: mito ou realidade
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Forma simples, única função: estações de rádio da II Grande Guerra; bandstands de G. Asplund e N. E. Eriksson, (Exposição de Estocolmo, 1930), e Niall McLaughlin, (Bexhill-on-Sea, 2002), com imagem e esquisso mostrando em fundo o De La Warr Pavilion, 1935.
SULLIVAN, Louis (1896), cit. por MÜLLER, Werner et VOGEL, Gunther (1981), Atlas de Arquitectura 2, p. 521; 82 GROPIUS, Walter, (1913) « L’évolution de l’architecture industrielle moderne » in Richard, Lionel, (ed), Walter Gropius: architecture et société, p. 31; 83 GROPIUS, Walter, (1923) « Principes de production du Bauhaus » in Richard, Lionel, (ed), Walter Gropius: architecture et société, p. 35; 84 Vd. BARRON, Michael (1993), op. cit. Esta obra de Barron busca a relação entre forma arquitectónica e comportamento sonoro, dada a pouca atenção a que este campo tinha sido devotado. Resulta de um estudo de vários tipos de auditório, desde salas de concerto, música de câmara, teatro, ópera e espaços multifuncionais, através de análises de parâmetros objectivos e inquéritos conduzidos em espectáculos ao vivo; 85 Vd. JONES, Peter Blundell et KANG (2003), Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”; 86 Esta bandstand foi construída em homenagem ao De La Warr Pavilion, de Mendelsohn e Chermayeff, 1935.Vd. artigos: “Winged heroics: bandstand, Bexhill-on-Sea, England” , Architectural review, 2002 Abr., v.211, n.1262, p.38-39; e “Wing span: bandstand, Bexhill-on-Sea, England”, Architectural review, 2002 Dez., v.212, n.1270, p.77; 81
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«É uma lei de todas as coisas orgânicas e inorgânicas, físicas e metafísicas, humanas e sobre-humanas, de todas as manifestações do intelecto, do coração e da alma, que a vida é reconhecível pela sua expressão, que a forma segue sempre à função.»81 Os Congressos Internacionais de Arquitectura Moderna (CIAM), realizados a partir de 1928, vieram trazer uma discussão pública dos objectivos e métodos da arquitectura, questionando o tradicionalismo e acomodação da prática arquitectónica vigente. Os postulados de Le Corbusier – presentes na Carta de Atenas e saídos do IV CIAM de 1933 – vêm trazer um conjunto de princípios unificadores. Pretendia-se assim a criação de um código único, que regularizasse a qualidade das construções e da própria cidade para a população em geral. Esta será a preocupação de um primeiro momento do Movimento Moderno, denominado Estilo Internacional, decorrente certamente das vicissitudes de um conturbado período histórico dominado pela I e II Guerra Mundial e pela imediata capacidade de resposta que era exigida à arquitectura. A vontade de criar parâmetros mínimos de vida baseava-se nos princípios da função como geradora da forma: funcionalismo. Para o arquitecto modernista a forma não é delírio, capricho, mas uma resposta a requisitos funcionais e racionais: «A época nova exige o seu próprio sentido. A forma exactamente consagrada, não deixando nenhum espaço ao acaso, os contrastes evidentes, o acerto das estruturas, o encaixe dos elementos semelhantes, a unidade de forma e cor serão a bagagem estética do arquitecto moderno. (…). »82 A escola da Bauhaus, na segunda década do século XX, defendia já uma orientação racional da procura da boa forma através da função. «(...) na Bauhaus, procura-se determinar a forma de cada objecto de acordo com as suas funções e apelos naturais, (...) a busca de formas novas a todo o custo é de rejeitar assim como o emprego de formas ornamentais puramente decorativas.»83 Perante uma arquitectura que se quer acima de tudo funcional, a investigação sobre forma é realizada segundo o objectivo, função. Este estudo tinha sido já realizado na procura formal dos instrumentos musicais, cuja função é unicamente a reprodução de som. E a forma dos espaços cuja finalidade é a audição? Os auditórios funcionam como o último dos instrumentos musicais. Não estará a sua forma, directamente relacionada com o tipo e qualidade de som que ouvimos nesse espaço?84 A Acústica na Arquitectura modernista, mostra-se como um campo prolífico de pesquisa conceptual, onde para a função ouvir, existirá uma determinada forma. A arquitectura como evolução compreende na sua concepção, um maior número de elementos. Se após a revolução industrial, a preocupação apontava para elementos essenciais, como a iluminação, aquecimento e ventilação, com o avançar do conhecimento sobre qualidade de vida, encontramos a preocupação com outros factores, como a acústica. O surgimento de novas formas, através de um novo vocabulário formal dos arquitectos modernistas, aponta a atenção dada à acústica: as bandstands (dispositivos para actuação ao ar-livre), criadas para celebrar a actuação de um grupo musical ao ar-livre, dirigindo as reflexões de som para a audiência, tal como, as estações de rádio costeiras (do inglês east-coast wartime listening stations) são um poderoso instrumento acústico, devido à simplicidade da forma para uma única função85. Este género de construções, desaparecidas com o término da II Guerra Mundial, foi recentemente reinterpretado por Niall McLaughlin86 em Inglaterra. Mas para os arquitectos modernistas de desígnio funcionalista, a acústica foi
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Evolução formal acústica: corte longitudinal da Sala Pleyel (G. Lyon 1925-1927) e do projecto da Sociedade das Nações (Le Corbusier/G. Lyon 1927).
Peter Blundell Jones e Jian Kang, investigaram o teor científico das soluções preconizadas por alguns dos mestres do Modenismo, procurando perceber a acústica como real ou fictícia matéria de projecto; vd. JONES, Peter Blundell et KANG, Jian (2003), “Acoustic form in the Modern Movement”, p. 75; 88 Para um estudo aprofundado do exemplo da Sala Pleyel e SDN, vd. “da acústica arquitectural – nascimento e consolidação”; 89 Le Corbusier (1928), carta postal dirigida a G. Lyon, cit. por TEXIER, Simon (2001), «Gustave Lyon: architecture et acoustique du Trocadéro à Pleyel», Moniteur architecture AMC, p.75 ; 90 Le Corbusier (1927), in Schweizerische Bauzeitung, 9 julho 1927 cit. por TEXIER, Simon (2001), ibidem; 91 Estes estudos foram realizados por Peter B. Jones e Jian Kang; 92 MEYER, Hannes, (1928), “Construir”; 93 AALTO, Alvar, (1940) “L´humanisation de l’architecture“, in Schildt, Göran, Alvar Aalto, de l’œuvre aux écrits, p. 140; 87
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determinante ou justificação formal? «Acoustics is an area in which many interesting claims were made, and some famous Modernist designs were supposedly formed, or at very least inspired, by acoustics forces. These historical instances beg the question whether acoustics is really a legitimate and helpful formal determinant of buildings. Perhaps instead, the acoustic arguments put forward by architects to justify their formal choices were just convenient alibis»87 A complexidade funcional de alguns conteúdos programáticos mostrou, do ponto de vista acústico, o investimento em formas também mais complexas. A linearidade e simplicidade formal evoluíram assim para vocabulários novos, que pretendiam ser a resposta para uma melhor acústica. A ciência acústica (acústica arquitectural) está agora em desenvolvimento inicial, o que deu azo a justificações intuitivas, por parte de arquitectos modernistas, sem haver um efeito directo entre causa (função) e efeito (forma). A parceria do arquitecto Le Corbusier com o engenheiro Gustave Lyon para o concurso internacional do projecto da Sociedade das Nações (SDN) de 1927 (1º lugar), funcionou como uma abordagem projectual de maior coerência científica na procura formal. As capacidades já demonstradas por G. Lyon, na Sala Pleyel88, foram paradigmáticas para uma aproximação entre arquitectura e ciência, no domínio da forma acústica. «Je vois ici des gens, des choses, des événements qui sont de la nature du trace de la Sala Pleyel, c’est-à-dire tendant vers une solution pure.»89 A aproximação formal do desenho do tecto, denota na proposta de Corbusier, uma preocupação com a acústica, colocada como determinante formal principal em relação às necessidades construtivas. «(…) de telle façon que les nécessités statiques (forme des arcs) viennent au-devant des nécessités acoustiques (forme du plafond de la salle).Ce plafond est tout simplement une coquille sonore et polie, formée de minces plaques de staff ou de verre»90 A proposta de Hannes Meyer para o mesmo projecto (3º lugar) foi suportada, igualmente, por desenhos e cálculos técnicos onde a acústica foi factor determinante da forma final. Contudo, estudos posteriores91, revelam que a sua construção teria sido um desastre acústico, pelo uso da forma oval que é potenciadora de ecos focalizados, não só do som proveniente do orador, mas como do ruído da audiência. O radicalismo formal desta proposta afigura-se mais próxima da acústica como justificação, do que como verdadeira intenção funcional. Para Hannes Meyer, arquitectura não era arte mas construção. «Construir é um processo biológico, construir não é um processo estético. (…) Construir é só organização: organização social, técnica, económica, psicológica»92. Esta radicalidade racional, no processo de projecto, denota uma busca funcional profunda. A obtenção final de uma forma igualmente radical, mas que não cumpre os desígnios funcionalistas (acústicos) que lhe deram origem, põem todo o exercício de pura razão em causa. humanização da arquitectura - importância dos elementos sensoriais « (a arquitectura) É sempre o mesmo grande processo que ambiciona sintetizar, combinar milhares de funções humanas precisas ; arquitectura continua arquitectura. O seu objectivo é sempre o de colocar o mundo material em harmonia com a vida humana.»93 A busca da casa para todos ou do machine à vivre, vontade de chegar a uma solução universal expressa pela arquitectura de um primeiro momento do Movimento Moderno, não estaria compatível com a satisfação de outras funções essenciais, para uma boa qualidade de vida, do foro psicofisiológico. Desta forma, se compreende a
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Acústica como controle do ruído: Paimio Sanatorium, 1929-1933: implantação e corte esquemático do lavatório da célula dos quartos.
Em Portugal, a evolução da arquitectura moderna com capacidade de identificação nacional (a terceira via), preconizada por Fernando Távora (1923-2005) foi importante pela crítica a alguns caminhos da arquitectura Moderna; 95 Vd. WILSON, C. St. John (1979), “Alvar Aalto and the State of Modernism” in MIKKOLA, Kirmo (ed), Alvar Aalto: vs. the Modern Movement=ja modernismin tila; 96 ZEVI, Bruno (1984), op. cit, p. 125; 97 AALTO, Alvar, (1940), “L´humanisation de l’architecture», op. cit. p.140; 98 AALTO, Alvar, (1940) “L´humanisation de l’architecture», op. cit. p.140; 99 AALTO, Alvar, (1940) “L´humanisation de l’architecture”, op. cit. p.140; na prática, muitas das valências funcionais em Paimio não resultariam. Segundo Weston, a água fazia barulho nos lavatórios; vd. RAUSKE, Eija, “A Biblioteca de Viipuri”, in Alvar Aalto em sete edifícios: Interpretações do trabalho de um arquitecto, p. 29-33; 94
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importância das várias reacções regionalizadas dos ideais do Movimento Moderno, que enriqueceram e deram novo sentido à arquitectura.94 Uma das vozes críticas foi o arquitecto Alvar Aalto, relutante e oponente à Nature and standards of Existenzminimum, tema do II CIAM, em Frankfurt95. A crítica ao Estilo Internacional é de facto marcante na afirmação de um funcionalismo para além do essencial e fisicamente útil. Uma arquitectura que «responde a exigências funcionais mais complexas, isto é, funcional não só com relação à técnica e à utilidade, mas à psicologia do homem. A sua mensagem pós-funcionalista é a humanização da arquitectura.»96 O papel de Alvar Aalto na arquitectura europeia e nórdica, foi fundamental para o reencontro do paradigma da arquitectura, a adequação ao homem, e neste sentido humanista. Este retorno a uma arquitectura voltada para o homem é fundamental para uma atenção a factores sociais e psicofisiológicos. Aqui os elementos sensoriais, fontes humanas de recepção de informação sobre tudo o que nos rodeia, são essenciais para a ideia completa de conforto do homem, na valente física e psicofisiológica. Esta preocupação com o uso, o conforto, as percepções sensoriais, está patente por exemplo na escolha de materiais: «A cadeira em aço tubular é certamente racional do ponto de vista técnico e industrial: ela é ligeira, fácil de construir em série, etc. Contudo, as superfícies de aço e crómio não são satisfatórias do ponto de vista humano. O aço é demasiado condutor do calor. A superfície de crómio reflecte demasiado a luz e, mesmo do ponto de vista acústico, não é conveniente num espaço interior.»97 O conforto em todas as escalas de intervenção, estará patente na criação do mobiliário de Aalto, com particular enfoque na Cadeira de Paimio (Paimio Chair 1931-32), em madeira arqueada. No Paimio Sanatorium, 1929-1933, a atenção dada a todas as funções humanas é exímia. O seu arquitecto, Alvar Aalto, considerava importante o entendimento das necessidades psicofisiológicas de pessoas doentes, como estimuladoras no fornecimento de dados importantes para a habitação recorrente. O sanatório é representativo dos ideais modernistas: luz, ar e sol. Paimio para Aalto foi arauto de um cumprimento destas valências funcionalistas fisiológicas, mas acima de tudo pelas valências de bem-estar psicológico. A atenção à acústica em Paimio, com tónica fundamental na contenção do ruído, foi considerada fundamental, conjuntamente com a atenção à iluminação e ventilação, estando visível desde a escolha do sítio, disposição programática, até aos pormenores das peças de mobiliário. O lugar de implantação do sanatório, entre bosques e afastado de qualquer povoação, é fundamental para o silêncio. A própria articulação volumétrica diferenciada consubstancia uma separação de funções salutar para a recuperação mental: espaços de ruído (serviços) e espaços de silêncio (dormitório). No volume de serviços, o estudo do único sistema de ventilação artificial do edifício, permitiu a eliminação das portas pivotantes de comunicação da cozinha com a zona de restauração, eliminando, favoravelmente, uma fonte de ruído visual e sonoro. No volume do dormitório dos pacientes, a pesquisa centra-se nas células dos quartos, nas «questões relativas à forma dos quartos, às cores, à luz natural ou artificial, ao sistema de aquecimento, aos aspectos nocivos trazidos pelo ruído, etc»98. Nestas células individuais é inovadora a introdução de parâmetros acústicos na concepção do espaço que até então eram praticamente desconhecidos: «Para evitar o ruído, uma das paredes era insonorizada e os lavatórios (cada doente tinha o seu, nos quartos de duas camas), especialmente concebidos para que a água escorra da torneira e reencontre sempre a porcelana segundo um ângulo muito agudo, não fazendo ruído algum».99 Alvar Aalto, demonstrou com Paimio uma atenção especial na contenção do ruído, marca definitivamente a acústica como tónica projectual na sala de conferências
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Forma acústica do Movimento moderno: o tecto ondulado da Biblioteca de Viipuri, 1927-1935; imagem e diagrama projectual acústico.
GIEDION, Siegfried, cit por RAUSKE, Eija, “O Sanatório de Paimio”, in Alvar Aalto em sete edifícios: Interpretações do trabalho de um arquitecto, p. 15; 101 AALTO, Alvar (s.a.) cit. por PALLASMAA, Juhani , “Alvar Aalto: Toward a Synthetic Functionalism”, in REED, Peter (ed), Alvar Aalto: Betweeen Humanism and Materialism, p. 30; 102 Vd. RAUSKE, Eija, “A Biblioteca de Viipuri”, in Alvar Aalto em sete edifícios: Interpretações do trabalho de um arquitecto, p. 29-33; 103 Estudos realizados por Peter Jones e Jian Kang; 104 JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”, p. 79; 105 RAUSKE, Eija, “A Biblioteca de Viipuri”, op. cit. p. 33; 106 AALTO, Alvar (s.a.) cit. por PAATERO, Kristina, “Igreja de Vuoksenniska”, in Alvar Aalto em sete edifícios, p. 114; 100
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da Biblioteca de Viipuri, Finlândia (actualmente Vyborg, Rússia), em 1927-1935, onde a acústica é importante instrumento de criação espacial e não apenas em questão de isolamento sonoro. A importância da luz numa sala de leitura é semelhante à importância do som num espaço de palestra e debate. Na sala de conferência e debate da biblioteca de Viipuri – cujo tecto ondulante é a forma acústica mais celebrada do início do modernismo – diagramas comprovam o apurado estudo das primeiras reflexões, essenciais para uma boa inteligibilidade da palavra: a forma ondulante pretendia criar um campo sonoro mais regular, diminuindo a atenuação de som que se manifesta naturalmente ao longo do comprimento da sala. A conjugação entre «argumentação científica» e a «imaginação artística»100 tornam esta obra singular e de certa forma apodíctica de uma maneira de estar na arquitectura: «The ceiling of the auditorium consists of joined wooden slats …which disseminate sound, particularly speech at close quarters, in an acoustically advantageous way. Since debate is important as lectures, audibility is not merely in one direction, as in concert halls. My acoustic construction is aimed at making every point in the auditorium equal as a transmitter and a receiver of words spoken at normal loudness over the floor. I consider acoustic problems to be primarily physiological and psychological, which is why it cannot be solved by purely mechanical means.»101 A esta afirmativa influência, declarada por Aalto, da acústica do espaço sobre a decisão formal, seguiram-se posturas críticas, que mostravam a fragilidade das opções conceptuais em prol da boa sonoridade. Segundo Malcom Quadrill102 , uma sala comprida não é a forma ideal para um espaço de palestras e debates, assim como o perfil curvilíneo seria associado a uma descoberta construtiva e material, mais do que a uma boa reflexão sonora. Estudos recentes apontam também para resultados opostos aos preconizados por Aalto103 : o volume sonoro é, de uma maneira geral, mais atenuado por superfícies difusas do que por superfícies lisas, devido ao regresso de alguma energia sonora à fonte (backscattering). Contudo, a adopção deste perfil curvilíneo evitou outros defeitos acústicos, nomeadamente, o aparecimento de ressonâncias, caso as vigas fossem postas a descoberto, (esta solução parece-me no entanto difícil de perpetrar numa obra de Alvar Aalto) e a criação de ondas estacionárias devido ao paralelismo entre chão e tecto, com a sala parcialmente ocupada. Não obstante o sucesso ou insucesso acústico, o tecto ondulado em Viipuri, tornou-se um detalhe importante, da obra como um todo, e traça o vocabulário dos trabalhos posteriores do arquitecto. «That these curves seemed by their designer naturally given – or at least obedient to natural laws – was important for their justification whether or not they actually worked acoustically».104 A biblioteca de Viipuri assume-se como «o trabalho com o qual Aalto se afastou do modernismo ortodoxo dos CIAM e criou um exemplo modelar da sua arquitectura sensual.»105 O estudo das reflexões acústicas, como base de encontro formal, está presente na igreja de Vuoksenniska, (Vuoksenniskan kirkko), Imatra, Finlândia, 1953-58. A aparente irracionalidade das formas curvilíneas surge novamente associada a uma função acústica, aliás, descrita pelo próprio Alvar Aalto: «O altar foi colocado numa posição axial simbólica, o púlpito e o órgão foram instalados de maneira assimétrica. Daí resultou automaticamente que se obteve uma forma única e assimétrica da sala, tanto nas projecções de plano como de corte transversal. As superfícies das paredes e do tecto têm uma forma que reforça que reforça as ondas de som emitidas pelo altar e pelo órgão.»106 A divisão tripartida da igreja atesta uma maior funcionalidade do espaço. Acusticamente, esta solução é vantajosa, pois limita a dispersão da intensidade sonora.
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Estudo de reflexões acústicas: Vuoksenniskan kirkko, Imatra, Finlândia, 1953-58; light-models e corte longitudinal.
Em 1950, as informações sobre a determinação objectiva do tempo de reverberação já existiam há mais de 40 anos; vd. “da acústica arquitectural – nascimento e consolidação”; 108 CAGE, John (1974), “El futuro de la música”, in Escritos al oído, p. 159; 109 A peça é composta para três orquestras dispostas separadamente num auditório. A separação advinha da necessidade de execução simultânea de excertos/grupos complexos de andamentos diferentes, em simultâneo; 110 CAGE, John (1974), op. cit.; 107
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A publicação de light-models comprova o controlo da forma global através do estudo dos caminhos de reflexão, para a obtenção de um campo sonoro difuso. Os lightmodels baseiam-se na similitude entre som e luz na descrição de reflexões e servem para analisar primeiras e segundas reflexões e a distribuição da intensidade de som. A principal desvantagem reside na sua adequação como estudo unicamente para as altas-frequências, banda de frequência em que o som se aproxima à luz como fenómeno físico (ondulatório). Outra falha é a ausência de informação sobre os tempos de chegada das reflexões, que determinam o tempo de reverberação107, o parâmetro objectivo mais relevante num espaço vivo, como uma igreja. música espacial: o espaço modelado pela intenção do compositor «(…) Apercebo-me agora que no seu trabalho muitos compositores não têm uma pessoa em mente, mas sim um lugar (um ambiente). (…) Há uma música para ser tocada em cúpulas geodésicas, em inusitadas plataformas subterrâneas, em lavandarias automáticas, em campos, em bosques, e em cidades concebidas como Robert Moran as concebe, como imensas salas de concerto» 108 A incursão pela música espacial está, directamente, relacionada com o Modernismo na Música. Tal como na arquitectura, lutou-se pelo abandono das convenções tradicionais, radicadas na música na técnica de composição, até então baseada na harmonia tonal e no compasso. A passagem para o atonalismo e evolução para o serialismo na Música era coadunante com novas formas de reacção desta com o espaço, mais uma vez, quebrando com os cânones tradicionais das salas de concerto. A música espacial expressa uma reavaliação e aproveitamento do espaço acústico por parte de alguns compositores do século XX. O primeiro a radicalizar esta vontade foi Karlheinz Stockhausen. A sua peça Gruppen (1955-57) é inovadora pelo aproveitamento do espaço, desestruturando a formação compacta da orquestra clássica. Nesta obra, o público estava rodeado pelos músicos, tornando-se participante e não meramente observador.109 Um extremo da música espacial de Stockhausen é Sterklang (1971), para ser executada num parque público durante a noite, atingindo a descontextualização do espaço acústico fechado. O Som, como fenómeno musical, é questionado. Na distinção entre sons musicais e ruidosos, John Cage e Edgar Varèse lutaram a favor dos ruídos. Hoje, e depois da revolução modernista na Música, não se teme a utilização de sons não tonais. «Já não discriminamos os ruídos. (...) os sons que antes eram considerados desafinados agora se chamam microtonos. São parte integrante da música moderna.»110 A exploração de novos sons, e a descoberta dos sons electrónicos, mostraram uma vertente espacial inovadora. O radicalismo espacial de Stockhausen assume forma na construção do primeiro auditório hemisférico, na Exposição de Osaka (1970), por concepção do próprio compositor. Stockhausen pretendia mais do que um espaço para albergar a música por ele composta, um espaço adequado às potencialidades da música electrónica em geral. O espaço acústico afirmou-se definitivamente na Arquitectura, enquanto que a música espacial é ainda associada a instalações, a uma arte do efémero e do experimentalismo. Poéme Electronique de Varèse – especialmente encomendado para o Pavilhão Philips da Exposição de Bruxelas de 1958 (demolido depois da exposição) – era difundido por altifalantes dispostos por todo o espaço, criando uma união entre tempo e espaço. Iannis Xenáquis, responsável pela sua concepção geométrica, associou-se a Le Corbusier para a concepção geral do espaço. «‘Poème électronique’ is the first,
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Música espacial: auditório hemisférico na Exposição de Osaka, (Stockhausen 1970) e Pavilhão Philips da Exposição de Bruxelas (Le Corbusier e Iannis Xenáquis 1958).
FÖLLMER, Golo et GERLACH (2004), Julia, “Audiovisions. Music as an Intermedia Art Form”; BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 29; 113 Vd. BARRON, Michael (1993), op. cit.; 114 BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 403; 111 112
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electronic-spatial environment to combine architecture, film, light and music to a total experience made to function in time and space.»111 da acústica arquitectural - nascimento e consolidação Wallace Clement Sabine, é o pai da acústica arquitectural. A sua importância foi fundamental no estabelecimento definitivo da acústica como ciência ao serviço da arquitectura. Como professor assistente, no Departamento de Física da Universidade de Harvard, em 1898, tem a sua primeira experiência de investigação, que tinha como fim melhorar a acústica do Fogg Art Museum. O sucesso desta intervenção – reduzindo o tempo de reverberação de 5.5 segundos para 0.75 segundos conseguido através da aplicação de materiais absorventes – foi crucial para a sua principal invenção: a equação do tempo de reverberação, nascida a 29 de Outubro de 1898. Passados mais de 100 anos, este parâmetro objectivo é ainda crucial no projecto acústico. «Despite the many advances of recent years, reverberation time remains the single most valuable measurable quantity for the acoustics of an enclosed space.» 112 Sabine é considerado o fundador da acústica de interiores. Ao desenvolvimento tardio da ciência do som em espaços, duas causas são apontadas. A relação entre som e espaço requer um tratamento estatístico e não linear, exigindo um processo de selecção de informação, que, nem hoje chegou a consenso. De igual forma, se coloca o problema das medições, essencial para o desenvolvimento científico, resolvido apenas a partir de 1920.113 A única oportunidade de Sabine colocar em prática a sua investigação num estudo acústico de raiz acontece no Boston Symphony Hall, datado de 1900. Uma das maiores dificuldades prendeu-se com a sua dimensão. (a lotação inicial abarcava 2625 lugares, face aos 1680 do Grosser Musikvereinssaal e os 2037 do Concertgebouw). O estudo de Beranek – precursor do estudo acústico de auditórios – aponta, num universo de 56 salas de concerto de todo o mundo, o Boston Symphony Hall, Concertgebouw e Grosser Musikvereinssaal, como detentores da melhor qualidade, Categoria A+ ou Superior. A semelhança entre forma e proporção destes três exemplos é notória pela forma paralelipipédica pura, desenhada até no plano do tecto, também horizontal. O Boston Symphony Hall procurou uma recreação da acústica do Gewandhaus de Leipzig, modelo do Concertgebouw, mas foi através do cálculo que Sabine determinou a altura ideal para o tecto. A disponibilização do tempo de reverberação conduziu primeiramente a algum facilitismo e simplismo da acústica ao cumprimento de uma fórmula. Este pensamento revelou-se desastroso em alguns auditórios construídos no século XX, particularmente pela falsa ideia, que a qualificação acústica dependia da única ponderação do tempo de reverberação e sem salvaguarda da forma e proporção. No entanto, a forma é progressivamente mais determinante da qualidade acústica, com o aumento da dimensão: «What makes the confusion understandable is that for smaller auditoria, design form is often unimportant. It is only near the capacity limits that acoustic design becomes critical. In crude terms these are above 800 seats for proscenium theatre, above 1000 seats for opera and above 1500 for concert halls.» 114 A descoberta de outras medidas objectivas consensuais, para além do tempo de reverberação, foi no entanto mais difícil. Hoje existe o consenso na importância de prever mais do que um parâmetro objectivo nos espaços destinados à fruição musical. Os parâmetros objectivos estão directamente relacionados com sensações subjectivas, capazes de serem descritas por um ouvinte, sem o recurso ao método
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Acústica arquitectural: ranking de qualidade acústica de 53 salas de concerto.
BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 36; Para uma compreensão prática destes parâmetros “Casa da Música, Porto”; 117 BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 36; 118 Le Corbusier, cit. por TEXIER, Simon (2001), “Gustave Lyon: architecture et acoustique du Trocadéro à Pleyel”, p.72; 119 A Sala Pleyel foi alvo posteriormente de sucessivas alterações: em 1981 e em 1994. De salientar o elevado número de ocupantes: 2386 lugares; 120 TEXIER, Simon (2001), op. cit. p. 76; 115 116
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científico «(…) the appreciation of music acoustics is multi-dimensional.»115 As cinco principais dimensões, sensações subjectivas são: clareza, reverberância, envolvimento, intimidade e intensidade116 . «In the search for design strategies for good acoustics, it is convenient to be able to relate a physical characteristic of the hall to a subjective quality. For instance, large room volume produces a reverberant sound.»117 A introdução de uma medida objectiva é o passo intermédio entre passagem da característica física do auditório para a sensação subjectiva do som. Sendo Sabine, um físico norte-americano, como entender a sua influência nos seus contemporâneos europeus?Simultaneamente à experiência do Boston Symphony Hall nos E.U.A, a construção da Sala Pleyel, em França, 1925-1927, levantava uma discussão pública semelhante. «“Preuve de l’évolution architecturale», la salle Pleyel, ranime un débat on sommeil depuis la construction de l’Opéra Garnier. »118 Gustave Lyon, engenheiro civil, é responsável por vários projectos na área da acústica arquitectural, tornando-se particularmente conhecido com a renovação acústica do salão de festas Trocadero, em Paris (1903-1911). A elaboração do projecto da Sala Pleyel, é um marco na construção de salas de concerto. O trabalho da forma por G. Lyon, para além do volume puro paralelepipédico – forma dominante na construção desta tipologia – é marcado pelo seu perfil em forma de concha, sendo resultado de cálculos sobre a propagação dos sons. Contudo,segundo Beranek, nenhuma atenção foi dada ao tempo de reverberação. A existência de um eco teve de ser corrigida (não obstante os cálculos). O elo transatlântico é claro; Lyon recorreu a uma firma nova-iorquina para a correcção do eco, conseguida pelo avanço das pesquisas norte-americanas – influenciadas por Sabine – na absorção da energia sonora. 119 A publicação da mais importante obra de Sabine, Collected Papers on Acoustics, (Harvard, Cambridge University Press, 1927), é um marco indiscutível para a difusão internacional da sua investigação pioneira, em prol do método científico e não do empirismo e tradição dos modelos existentes, como era augurado por alguns arquitectos em França. A postura vanguardista de Lyon, não era defendida por toda a classe de arquitectos. A colaboração com Le Corbusier, na Sociedade das Nações (1927) e no Palácio dos Sovietes em Moscovo (1931), comprova a vontade de integração da acústica como ciência. Mas a postura oposta do arquitecto Auguste Perret nomeadamente na Sala Cortot, Paris (1928-1929) e a defesa do empirismo, comprova alguma nebulosidade quanto ao papel da ciência e arte, na definição do espaço arquitectónico. A diferença fundamental, entre o pensamento europeu de raiz francesa, e o norte-americano, parece residir numa aparentemente simples questão: «faut-il réfléchir, diriger le son, ou plutôt l’absorber?»120 A reflexão sonora permite uma melhor difusão sonora e um campo sonoro mais abrangente, mas se não for controlada, pode originar, entre outras situações, um eco. A absorção, que controla o tempo de reverberação e o amortecimento de reflexões não desejadas, pode também funcionar em excesso, retirando brilho e força à energia sonora. A busca do equilíbrio sonoro é o objectivo do projectista acústico. Na Europa, a Berlin Philharmonie (1956-63), projecto do arquitecto Hans Scharoun, é uma obra exemplar, tanto pela qualidade espacial como pela qualidade acústica. O sucesso residirá numa frutuosa e íntima parceria de Scharoun com o engenheiro acústico Lothan Cremer. A qualidade acústica, com o conceito inovador do auditório, só foi conseguida graças a uma estreita colaboração com Cremer, desde o início. A ideia principal do arquitecto, de música no centro, quis remontar um princípio ancestral de comunicação, colocando músicos e espectadores de uma forma inovadora que desmaterializava a convenção social elitista do modelo da caixa-de-sapatos. O maestro
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Berlin Philharmonie, Hans Scharoun: estudo em planta de reflexões sonoras.
PESSOA, Fernando, “Ode Triunfal” in CARDOSO Altino M. (ed) Antologia – Fernando Pessoa; SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit.; 123 Na língua portuguesa faz-se ainda a distinção entre barulho e ruído, sendo a primeira definida como um ruído mais intenso; 121 122
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é o centro de toda o auditório, alcançando uma intimidade acústica e visual sem precedentes no modelo paralelipipédico (nenhum ouvinte está afastado mais de 30 m do palco). Privilegia o som directo, acima do som reflectido. A principal dificuldade no uso desta disposição central é directividade dos instrumentos e a ausência de reflexões laterais, já que estas superfícies não existem. A Berlin Philharmonie superou as dificuldades acústicas do modelo formal base, alcançando uma harmonia conjunta entre acústica e arquitectura. Esta maneira de agir, entre arquitectura e acústica, fundou talvez uma base de pensamento, que é, hoje, encarnada pela escola espanhola sob a égide de Higini Arau, no trabalho da forma desde o início da concepção do projecto. Esta maneira de encarar o projecto acústico, de construção positiva, é oposta a uma ideia de condicionamento e minimização de danos, presente nos projectos onde a acústica entra como disciplina de interacção no decorrer do processo de projecto, ou mesmo em fase de execução. Aqui, a relevância acústica é minimizada a uma tentativa de correcção, longe da perfeição e harmonia desejada. O debate do empirismo imprevisível e a falibilidade do modelo científico, patentes na sociedade europeia e americana da primeira metade do século XX, ainda parece de alguma forma uma arma para alguma desculpabilização face à fiabilidade da acústica como ciência. Esta dúvida ainda permanece, actualmente. do ruído – paradigma da cidade contemporânea. «Ó rodas, ó engrenagens, r – r – r – r – r – r – r eterno! Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria! Em fúria fora e dentro de mim, Por todos os meus nervos dissecados fora, Por todas as papilas fora de tudo quanto eu sinto! Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, De vos ouvir demasiadamente de perto, E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso De expressão de todas as minhas sensações, Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!»121 ruído, noise (in), bruit (fr): Som não desejado; som não musical; todo o som forte; perturbação de um sinal;122 A definição de ruído sonoro não será ainda hoje consensual.123 Das quatro possibilidades, talvez a mais consensual seja a de som não desejado. Isto porque, até mesmo os sons musicais podem ser desejados por uns e não desejados por quem não se interessa em ouvi-los. Durante algum tempo, havia uma identificação do ruído como todo o som não musical. Esta definição remonta ao século XIX, correspondendo à ideia de que os sons periódicos (sons musicais) eram opostos aos sons não periódicos (ruído) como o som das ondas, do vento nas folhas, etc. Desde a década de 70, que estes conceitos se transformaram, na alteração do conceito de sons musicais. Nas palavras de John Cage, a música passou a ser «organização de som», e a sua matéria, os sons musicais, podem ser encontrados na vida, no quotidiano e não simplesmente nos instrumentos musicais tradicionais. Desta forma, a música também pode conter o som de um comboio, do ladrar dos cães, de uma sirene. Tudo depende da organização, integração e intenção. Sons que são aceites e desejados.
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Ruído: Barcelona, Praça da Catalunha.
Michael T. Bass, Londres (1864), Street Music in the Metropolis, in SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 102; 125 Para aspectos particulares da legislação portuguesa, vd. “legislação como instrumento”; 126 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 271; 127 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 21; 128 Aos sons que caracterizam e distinguem uma comunidade ou lugar, Schafer denominou de marca sonora (soundmark); 129 RUBERT DE VENTÓS, Xavier (2002), Prólogo in DOMENECH, Francesc Daumal, Arquitectura acústica: Poética y diseño, p. 10; 130 Vd. SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit, p.21; 124
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Porém, o ruído como som não desejado, ilustra o conceito como subjectivo. A necessidade de legislar e homogeneizar, democratizar, urge por termos quantitativos, embora os primeiros esforços fossem de carácter qualitativo. A legislação contra o ruído tem a sua origem no século XVI, ilustrada na preocupação – ironicamente – de retirar a música das ruas, considerada um flagelo para actividade quotidiana e intelectual. «Os signatários desta carta são, todos, professores, artistas ou cientistas. Na prática da sua arte – que procura a paz e o bem-estar da humanidade – eles são, dia após dia, fatigados, atormentados, massacrados, rendidos muitas vezes à demência pelos músicos das ruas.»124 A primeira legislação europeia contra o ruído, selectiva e qualitativa, além de não se exprimir por valores objectivos dos níveis sonoros (dB), apenas contemplava alguns tipos de manifestação sonora, como a voz humana, e não outras fontes ainda mais ruidosas A legislação tem vindo a identificar cada vez mais o ruído como todo o som forte (som intenso) procurando eliminar níveis sonoros que são para todo o ser humano, objectivamente, perigosos e perturbadores.125 Em termos físicos e electrónicos, o ruído é toda a perturbação de um sinal, de uma comunicação. Daí a passagem para o conceito de ruído como tudo o que impede um acto de comunicação, a mensagem. Aqui separa-se da sensação auditiva, para o domínio mental. Pode existir então ruído sonoro, visual e mesmo táctil. A característica principal dos ambientes sonoros da cidade contemporânea (paisagem sonora) é o surto dos sons não desejáveis (ruído). Mas de que forma o ruído, é prejudicial à vida? O limiar da dor situa-se nos 140 dB, aproximadamente. A exposição a sons intensos tem consequências físicas comprovadas, não só para o sentido da audição, como para todo o corpo humano. As exposições prolongadas a sons menos intensos têm, também, duras consequências, mas, essencialmente, do foro psicológico. Desta forma, «a melhor legislação contra o ruído, na nossa época, é aquela que reúne dispositivos quantitativos e qualitativos, mesmo que seja necessário atender – devido à tendência da natureza humana para a uniformização – a uma erosão do qualitativo em favor do quantitativo, este último correspondendo a uma vantagem do espírito tecnocrático.»126 O ruído é, assim, uma característica da cidade contemporânea. É a principal tónica da paisagem sonora actual. «A paisagem sonora define-se como campo de estudo acústico, qualquer que seja. Este pode ser uma composição musical, um programa de rádio, ou um ambiente acústico.»127 O conceito de paisagem sonora remete-nos para a similitude entre códigos visuais e auditivos. Para Schafer, os sons que ouvimos, tal como as imagens que vemos, distinguem-se por uma relação de fundo e figura, isto é tonalidade e sinal. A ideia de tonalidade, deduzida a partir da música, refere-se a um som em permanência, sobre o qual se distinguem todos os outros, os sinais, aos quais prestamos atenção.128 Claro que a diferença principal entre estes estímulos, demarcante da ideia de paisagem, é o factor tempo, que opõe a simultaneidade da informação visual à característica sequencial da informação sonora: «En contraste con la vista, el oído es sintético y secuencial. (…)No existen paisajes auditivos (verbales o musicales) ni perspectivas sonoras; tampoco hablamos de puntos de oído en el sentido en que lo hacemos de los puntos de vista.»129 No entanto, a perspectiva de Schafer é positiva no desenvolvimento da linguagem comum à acústica de espaços, aqui preferencialmente, ligados ao espaço exterior. A paisagem sonora global das cidades, é cada vez mais de reduzida qualidade. Esta paisagem sonora lo-fi130 (do inglês low-fidelity) tem como génese a evolução técnica decorrente da revolução industrial em Inglaterra (1780-1840). O século XIX marcou definitivamente a descoberta de um universo sonoro sem precedentes. Por um lado, o aumento significativo da intensidade do som, ligada à actividade profissional emergente,
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Silêncio: Estocolmo.
SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p.117; CAGE, John (1974),op. cit.; 133 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 304; 134 LEITNER, Bernhard (1985), “Acoustic Space. A conversation between Bernhard Leitner and Ulrich Conrads”; 135 SCHAFER, R. Murray (1977), op. cit. p. 296; 131 132
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e por outro, o estabelecimento de um continuum sonoro, de intensidade média ou mesmo baixa, mas igualmente perturbadora. Se outrora, os ruídos tinham um andamento e ocorrência variável, com o surgimento da máquina, o ritmo passou a ser constante e cada vez mais rápido. Surge, assim, a linha direita em acústica, um fenómeno acústico que nos envolve com «sons com banda larga de frequência, sem personalidade nem dinâmica»131 . Este ruído de fundo permanente provém dos aparelhos que têm a sua própria nota musical: aparelhos de ar condicionado, aspirador, microondas, caldeira e até os computadores, que têm o seu zumbido contínuo, citando os mais domésticos. O desenvolvimento prolífico e exponencial dos níveis de ruído, na sociedade contemporânea conduz, como equilíbrio, a uma vontade de reencontrar o silêncio. «(…) Também nos tornámos receptivos ao silêncio. Em geral, o silêncio já não é tão desagradável como era antes. (…)»132 A vontade de isolamento estará, talvez, na origem do enquadramento da acústica como valência negativa e não positiva. A arquitectura evolui de um espaço de ampliação e qualificação dos sons para um espaço de isolamento e ausência de sons. O reforço e aumento dos níveis de intensidade sonora das actividades, conduziu a uma menor atenção aos sons positivos, seja a música, a palavra, ou a movimentação natural de um pássaro, automóvel ou sirene. Deixámos de querer incorporar os sons da envolvente no espaço interior de trabalho ou habitação. «Num mundo calmo, a acústica arquitectural faz-se inventiva. Num mundo ruidoso, ela torna-se simples técnica de camuflagem dos sons internos e de protecção contra as incursões das turbulências do exterior.»133 Sentimo-nos atraídos por cidades completamente diferentes. Quando ansiamos por calma e tranquilidade, procuramos uma paisagem sonora com um fundo sonoro de pouca intensidade, onde os sinais que dela emergem não nos sejam perturbadores. Uma cidade como Estocolmo é marcada visual e acusticamente por elementos de calma. A neve e gelo, que caracterizam a cidade, e a ausência de luz, modelam o ritmo de vida, naturalmente calmo, remetendo os seus habitantes para o conforto dos espaços fechados: «Threatening noises induce a feeling of spatial insecurity, an irritating and anxietyprovoking awareness of outside space. On the other hand, silently falling snow tends to make the city increasingly quiet; the outside space falls silent. The interior is embedded in the silence of the exterior.»134 Numa cidade como Barcelona, nomeadamente no seu centro, somos completamente bombardeados por uma grande quantidade de informação visual e acústica, existindo uma grande vontade de vivência do espaço público, como na praça da Catalunha e um pouco por todos os bairros da cidade. Somos avassalados pelos sons dos passos, dos automóveis, de um ritmo rápido de uma cidade que vive plenamente os seus espaços exteriores. «O homem moderno refugia-se nos espaços fechados, a fim de fugir do ambiente negativo do exterior. Na paisagem sonora lo-fi da megalópole contemporânea, as fronteiras acústicas (entre exterior e interior) são mais dificilmente perceptíveis.»135 A nossa vivência dos espaços fechados é condicionada pelos elementos naturais; sempre foi. Por mais que tentemos renegar o espaço exterior, este é fundamental e determina o nosso comportamento no interior das habitações. Os sons do exterior são naturalmente canalizados para os espaços interiores através dos vãos de comunicação com o exterior (janelas) fonte de luz e som. Em termos de isolamento sonoro, é certo que as caixilharias e envidraçados são os elementos mais fracos do sistema, que se luta por melhor isolar. Mas não deixa de ser questionável esta vontade em isolar, afastar, que é acima de tudo uma questão social. A casa é cada vez mais um reduto, íntimo e de descolagem da envolvente, onde não há lugar para relações de vizinhança e contacto
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com o exterior. Ao procurarmos um espaço para habitar, deveríamos atentar à paisagem sonora que o rodeia, se nos estimula contacto ou isolamento. E aqui, diferentes sociedades assumem diferentes comportamentos, de acordo com a sua relação com o meio envolvente. Se por um lado, nos sentimos confortáveis e seguros, estes vãos permanecem abertos; se por outro, nos sentimos devassados pelo exterior, todos os vãos são fechados e a casa volta-se para si própria.
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espaço acústico português
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MATOS, Jorge (2005);
habitação-colectiva da Rua das Pedreiras, Vila Nova de Gaia da cidade ao edifício do edifício ao fogo o fogo
Na habitação – base da pirâmide tipológica em arquitectura – a acústica constitui uma das mais recentes áreas de intervenção. Este atraso face a outras áreas que mostraram a sua pertinência no auxílio e apoio ao projecto de arquitectura, como a segurança contra incêndios e o conforto térmico, é explicado não só pelo desenvolvimento tardio da ciência do som, mas também pela evolução natural da qualidade da construção, que busca um nível de conforto e exigência tendencialmente superior. Toda a arquitectura pressupõe evolução, e neste sentido, o conforto acústico é o mais recente patamar. A técnica e a ciência são indicadoras de mudança, de aumento do nível de qualidade. A habitação-colectiva começa agora a incorporar a acústica como valência de projecto. Em Portugal, esta incorporação advém de uma exigência, não só dos construtores e projectistas – que incorporam técnica e, economicamente, soluções de conforto acústico, viáveis à arquitectura recorrente - mas também, através dos próprios utilizadores, que se começam a aperceber da qualidade acústica como reflexo de uma boa vivência e usufruto da casa. «O ruído de vizinhança representa a queixa mais frequente que os portugueses fazem sobre a sua habitação, sendo o ruído proveniente da rua a quarta queixa mais comum.»1
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Mapa de radiação sonora: situação nocturna actual e prevista e situação diurna actual e prevista.
Vd. Artigo 4.º nº 6 (DL n.º 292/2000) em anexo, para restrição ao licenciamento de habitação, escolas, hospitais, ou similares; 3 Vd. Artigo 3.º alínea g (DL n.º 292/2000) em anexo, para definição e implicação de zonas sensíveis; 4 O ruído proveniente de equipamentos colectivos são limitados pelo RRAE, embora os de domínio particular, como a exaustão das cozinhas, não o seja; 2
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ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
A habitação multifamiliar na Rua das Pedreiras, Canidelo, V. N. de Gaia, actualmente em fase de projecto de execução, é uma obra da autoria de Balonas Projectos, com especialidade de acústica realizada pela SOPSEC Acústica, autoria dos engenheiros Rui Calejo e Eduarda Silva. O estudo seguinte refere-se então à fase de licenciamento, que ocorreu a Fevereiro de 2005. da cidade ao edifício A localização da habitação, no seio do planeamento territorial, depende de lógicas de organização a nível municipal e metropolitano. A dependência da sua construção em locais silenciosos, tal como escolas, hospitais, ou similares2, invoca uma protecção essencial a quem habita. O exemplo insere-se num tecido não consolidado, limitado a sul pela actual Rua Nova das Pedreiras e futura Via de Ligação 7 (VL7), e a norte, por um talude. O sítio, com o atravessamento desta nova artéria, apresenta uma grande alteração a nível acústico, marcando a passagem dos valores de ruído apropriados, numa zona sensível, para valores na ordem dos admissíveis, apenas numa zona mista. A alteração da envolvente sonora, numa área que é sensível por definição funcional3, determina uma futura intervenção camarária, no sentido de restituir os valores anteriores de ruído, como o controle do volume de tráfego, ou a construção de barreiras acústicas. A implantação do edifício, paralelamente à VL7, aparenta uma relação de proximidade e ligação com a rua. Mas, sendo complicada a ligação franca ou directa a partir desta artéria de elevado calibre, todas as entradas no interior do edifício processamse pelas traseiras. Existe uma forte relação de intimidade e resguardo na parte traseira, libertando o rés-do-chão para a chegada de viaturas e entrada dos habitantes. A implantação paralela não deixa de ser algo contraditória com a relação tradicional entre rua e edifício, mas torna-se benéfica, acusticamente. O paralelismo invoca um efeito barreira ao ruído de tráfego, havendo um maior silêncio na fachada norte. Dada a inexistência prévia de um mapa de ruído da área, foi elaborado para este terreno, um Relatório sobre Recolha de Dados Acústicos; conclui da adequação ou não da intervenção no sítio. O mapa de radiação sonora elaborado, demonstra a alteração do nível sonoro actual e previsto, exemplificando, claramente, o efeito barreira que introduz o edifício, e demonstra a forte exposição ao ruído que sofrerá na fachada sul. do edifício ao fogo Na relação fogo e edifício, uma das principais questões face à habitação ou qualquer construção é a separação entre zonas colectivas e zonas privadas estando as primeiras mais associadas a zonas de ruído e as segundas a zonas de sossego, o fogo. Na habitação-colectiva, as zonas mais passíveis de existirem e produzirem ruído fora do fogo, são as estruturas ligadas ao elevador, os grupos hidrocompressores (sistema de bombagem), o posto de transformação, os portões de garagem e o grupo de gerador de emergência (este último não existe no presente exemplo). Todas estas situações devem ser integradas no projecto de arquitectura, de forma a minimizarem o contacto directo com as zonas de silêncio. As infraestruturas, são responsáveis por grande parte do ruído no interior do fogo, em particular a mecanização da extracção do sistema de ventilação, que pode atingir valores na ordem dos 70 a 80 dB.4 O exemplo é claro na articulação vertical destes espaços. No encontro com o piso-térreo exterior de acesso, a separação horizontal entre garagem e fogo deve contemplar a obtenção de conforto acústico, mas também, conforto térmico. A esta
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Implantação: barreira acústica ao ruído.
«Estes sons resultam da excitação directa de um elemento de compartimentação qualquer, e podem, devido à rigidez das ligações existentes, propagar-se com grande facilidade através de toda a malha estrutural do edifício.» Podem ser mais incomodativos do que os sons aéreos. in PATRÍCIO, Jorge (2000), “Acústica de edifícios: isolamento sonoro a sons aéreos e de percussão: Módulo I”, in Aspectos regulamentares e normativos no domínio do ruído e das vibrações: curso sobre, p.21; 6 Quanto maior for o valor do isolamento a sons aéreos, melhor será o desempenho acústico, ao contrário do isolamento aos sons de percussão, que são avaliados segundo um processo de radiação: «Neste processo quanto menos energia um elemento de compartimentação radiar, melhor é o isolamento sonoro que permite assegurar.» Desta forma, quanto menor for o valor, melhor. PATRÍCIO, Jorge (2000) ibidem; 7 A organização interior dos espaços é claramente dominante no tratamento do alçado sul, que denota mais uma vez a estrutura convencional paralelipipédica; 5
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condição de separação exterior e interior, adiciona o facto de ser no piso térreo que se localiza o espaço de maquinaria do elevador, com transmissão maior de ruído aos espaços marginais. Este problema é resolvido com o efeito tampão da caixa-de-betão, funcionando como barreira acústica e térmica. À operatividade ruidosa do elevador, uma das prorrogativas no projecto de acústica, é proposta uma dessolidarização da estrutura de apoio em relação ao edifício, de modo a impedir a transmissão das vibrações ao fogo, e uma porta acusticamente melhorada na entrada dos fogos. Neste projecto, a intenção desta laje duplicada vem ao encontro de um desejo de dinâmica formal face ao volume paralelepipédico da habitação convencional, como comprova a inclinação da cumeeira em ambos os alçados. Na relação fogo/fogo, princípios para uma boa arquitectura coincidem com uma boa qualidade acústica, nomeadamente, no acerto vertical das zonas ruidosas (zonas de água) e das zonas de silêncio (salas e quartos). A configuração da laje numa habitação, para efeitos de isolamento a sons de percussão5 favorecidos pela transmissão vertical, pressupõe o princípio do revestimento de piso resiliente ou o princípio das lajetas flutuantes. Enquanto que, o primeiro se baseia num amortecimento da energia de impacto no próprio revestimento, como em linóleos, madeira colada, o segundo consiste na separação da área de impacto da estrutura, através de uma manta resiliente, elástica, como a lã de rocha. A transmissão horizontal de ruído entre dois fogos é essencialmente aérea6 , o que exige o reforço dos elementos verticais de separação. No módulo tipo, estas zonas de contacto estão localizadas na junta de dilatação e entre dois quartos. A duplicação da parede é fundamental para o isolamento aos sons aéreos, devido ao efeito massa-mola-massa. Na relação fogo/exterior, a situação usual de contacto é a fachada norte e sul. A orientação das zonas de sossego para norte coincide com a natureza acústica dessa envolvente, assim como a orientação das zonas mais ruidosas para sul, coincide com a lógica da envolvente dominada pelo futuro atravessamento de uma via de tráfego elevado. O alçado, que aparece diferenciado a norte e a sul, privilegia no entanto a comunicação com a envolvente mais ruidosa, pela dimensão e forma dos vãos. Em oposição, o carácter pontual das janelas a norte, resguarda a entrada de luz e som, numa envolvente silenciosa. Tanto a nível de orientação solar, como de orientação acústica, a linguagem dos alçados devia ser invertida.7 Nos módulos de excepção, que são os remates do edifício, diferentes soluções foram abordadas. Os topos nascente e poente diferem do módulo tipo, por pertencerem a um mesmo fogo, o que aumenta a liberdade de concepção espacial do mesmo. A linguagem rasgada dos seus vãos, sendo comum a nascente e poente, não advém de motivos de orientação solar, mas de uma vontade de abertura para com a envolvente. Acusticamente, existindo nos dois topos uma envolvente neutra e calma, a utilização de envidraçados totais não implicaria índices de isolamento elevados. No entanto, a legislação neste sentido é uniforme e mantém os mesmos critérios de isolamento, o que pressupõe a existência de uma caixilharia em vidro duplo. O sistema de fixação do revestimento exterior à estrutura (por grampos) é, também, denunciador de consequências na qualidade acústica. Neste caso, a caixa-dear existente, indica a existência de um futuro efeito tambor com a incidência da chuva na fachada. O som da chuva não é, necessariamente, um som a evitar, aproximando a vivência no interior da habitação ao exterior. No entanto, socialmente, a habitação na arquitectura portuguesa tem evoluído para um isolamento ao exterior e não para uma integração deste na arquitectura, que acontece aliás, na arquitectura japonesa. Não fará tanto sentido na legislação do ruído japonesa, a existência de critérios de isolamento sonoro mínimos na habitação, obrigando toda a fachada a filtrar completamente os sons
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Relação fogo/edifício. Corte longitudinal, corte transversal e planta piso tipo.
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Para controlo de ruído de equipamentos, vd. Artigo 5.º nº 1 alínea h (DL n.º 129/2002);
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do exterior. Estes sons são, desejáveis. O que se passa com o som passa-se, também, com o ar. O problema das condensações é associada a uma má construção e arquitectura. Mas acima de tudo, não existe uma consciência de utilizadores em ventilar, arejar, em admitir que o ar entre dentro de casa. Cabe então aos projectistas, combater a resistência de utilização de sistemas de admissão natural na fachada, que não acontece, igualmente, no presente exemplo. O estudo acústico, mas também o térmico e de ventilação na habitação, depende desta consciencialização. A necessidade de ar e luz era já advogada no Movimento Moderno. E a necessidade do som? O isolamento sonoro será o caminho a seguir? o fogo A habitação, como função, pressupõe a ideia de abrigo, protecção, refúgio, descanso, mas também lazer e deleite. A função acústica é assim variável consoante os espaços que a incluem, embora, de uma forma geral, são actividades das quais não decorre muito ruído. Esta condição não implica, pelo contrário, que sejam espaços devotados ao silêncio. É aliás um conjunto de espaços onde confluem várias funções acústicas. O quarto é o espaço mais silencioso, sendo usual a audição de equipamentos de elevada definição, vocacionados para a audição de música. A presença de novas tecnologias, como o imprescindível computador pessoal, apresenta níveis de ruído de fundo muitas vezes perturbantes, embora, dificilmente, nos apercebamos da sua existência. A sala comum é o espaço de encontro e reunião por excelência na habitação, atingindo, em algumas situações de convívio, as mesmas condições acústicas de um restaurante, onde existe a preocupação com a palavra, com o ouvirmos as pessoas. Na sala comum confluem diversas funções acústicas, desde a comunicação oral, ao fenómeno audiovisual da televisão. Se antes era a lareira, a televisão é, actualmente, o novo Fogo, que aproxima e junta os seus habitantes. Promove a audição atenta e pede por espaços íntimos, espaços de escuta. A casa-de-banho sendo uma zona que apresenta emissões consideráveis de ruído, é um espaço ao qual, muitas vezes, não é dada atenção. Os elementos de separação vertical entre espaços do fogo têm aqui uma especial atenção, nomeadamente no contacto com uma zona calma. A distribuição dos equipamentos sanitários deve, na medida do possível, evitar esta localização. As casas-de-banho, são também espaços que convidam ao relaxamento, daí o nome. A acústica tem aqui, uma valência de construção positiva, não apenas de isolamento. Este espaço afigura-se como lugar privado, onde exercitamos regularmente as potencialidades sonoras dessa câmara reverberante, que o é, graças à sua dimensão reduzida e superfícies altamente reflectoras. A cozinha reúne o espaço com maior emissão de ruído. O sistema de exaustão, um dos equipamentos mais perturbantes de toda a habitação, torna, muitas vezes, a permanência neste espaço, insuportável. Sendo um equipamento de uso e dispositivo de ligação individual, a sua intensidade sonora não é contemplada pelo Regulamento dos Requisitos Acústicos dos Edifícios (RRAE, DL n.º 129/2002)8. Neste caso, o projecto de acústica definiu como critério complementar de conforto o controlo dos limites máximos de intensidade emitida por estes aparelhos, o que aumenta o conforto acústico. A construção acústica – que implica uma atitude positiva de concepção, para além do acto de isolar os sons – pode e deve ser diferenciada na habitação. Nuns espaços urge absorver, a sala comum, e outros, casa de banho, a reflexão é até desejada. O isolamento sonoro é igualmente diferenciado, com correspondência na legislação:
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Relação fogo/exterior: fachada como filtro sonoro; alçado norte, nascente, poente, sul.
Um dos problemas referidos, ao nível da interfonia entre as condutas de extracção, pode ser resolvido com condutas individuais ou colectivas em pisos intercalados. SILVA, Eduarda (2005); 9
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entre compartimentos de um mesmo fogo não há qualquer critério assinalado, já que o seu controlo é integrante do comportamento de um mesmo núcleo de pessoas, que escolheram partilhar o mesmo espaço. As imposições de conforto acústico, surgem apenas nas zonas calmas (quartos e salas) em confronto com outros fogos, circulação comum, garagem e envolvente exterior. A preocupação com forma e função acústica não é, de todo, pensada para a habitação recorrente. Aliás, a relação de influência da forma sobre a função aparece como um mito, desde as experimentações do Movimento Moderno. Ela é, no entanto, geradora de conceitos acústicos. A função acústica sugere formas, o que é sensível à actuação do arquitecto. Na habitação-colectiva, podemos identificar, não por intenção, mas por consequência, uma alteração do espaço acústico derivado da alteração da forma e proporção dos espaços físicos. Uma dessas alterações é o decréscimo de altura livre. Desde a habitação do século XIX ao apartamento contemporâneo, a altura tinha um mínimo de três, quatro metros e dotava os espaços de maior liberdade. Com a regulamentação da habitação-colectiva, as necessidades mínimas e veiculadas dos 2,40 metros, limitam os espaços. Existia, anteriormente, uma maior liberdade de construção acústica, no sentido em que é possível tornar um espaço reverberante, num mais intimista, com o auxílio da absorção sonora. Já o contrário é difícil, fisicamente. Num espaço com superfícies reflectoras que seja seco, o aumento da reverberação é impossível, já que pressuporia um aumento do volume do espaço. Os materiais usados são convidativos de sonoridades. O soalho em madeira, tem a sua característica acústica, e dela advém o efeito tambor, dos sons de percussão. É um som que faz parte de uma memória do habitar. Hoje, quem deseja um soalho em madeira, tem de saber viver com ele. Tem de querer ouvir o seu ranger, as batidas dos passos, a dilatação térmica, o cheiro. Na maior parte das situações, escolhemos uma determinada solução, construtiva ou formal, mas não estamos preparados para arcar com tudo o que ela implica. O desconhecimento e ignorância invocam um desrespeito generalizado. No presente exemplo, como na maioria das habitações de carácter multifamiliar, a madeira continua a ser o material eleito, em parte do fogo. A justaposição directa sobre o elemento de suporte (ausência de caixa de ar) elimina qualquer som por impacto ou ressonância. Elimina assim futuras queixas por parte dos utilizadores (drama do cliente anónimo), inerente à democracia arquitectónica. A interacção entre a equipa de arquitectura e a equipa de acústica, existiu desde uma fase inicial, essencialmente por constituir um momento de decisões que podem destruir o conforto acústico do espaço. Esta organização funcional primária é determinante no alinhamento vertical das áreas de silêncio e ruído, exigindo uma qualidade não só acústica, mas também da estrutura e infraestruturas. São, assim, detectados quaisquer contactos entre zonas de ruído e silêncio, para serem resolvidas no restante desenvolvimento projectual. O projecto de acústica tem um papel determinante na definição qualitativa do som, mas também na qualificação da temperatura e arejamento. Uma boa solução de isolamento acústico é também uma boa solução de isolamento térmico, devendo haver sintonia entre os dois projectos na busca de materiais que possam cumprir ambas as necessidades. Constitui também um avanço e melhoria das soluções de ventilação, não só a nível infraestrutural9 nos sistemas de extracção de ar, mas também ao nível do estudo dos sistemas de admissão de ar na fachada, que não foram pensados para este projecto. A
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O fogo, análise da relação entre exigência de silêncio e emissão de ruído: do silêncio/silêncio ao ruído/ruído.
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ventilação é uma das áreas de projecto que pode minar a acústica, pela introdução de ruído no espaço da casa. A equipa de acústica tem assim uma postura nos projectos das especialidades de térmica e de ventilação, entrando em constante contacto com o arquitecto, para que se mantenha a boa qualidade acústica. Numa fase de execução do projecto, a interacção com o projecto de arquitectura manifesta-se na escolha dos materiais e sistemas construtivos. A maior dificuldade reside na manutenção do projecto em obra. As alterações de materiais e os desvios projectuais são a realidade ainda a superar.
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igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses da cidade ao edifício do edifício à igreja a igreja
A igreja, como local de culto religioso, tem um lugar simbólico em arquitectura. A construção de uma igreja foi, na arquitectura portuguesa, e particularmente no Barroco, uma tipologia recorrente, ligada ao exercício unitário da Igreja Católica. Hoje, o aparecimento e proliferação de outras formas de culto tornam a construção de igrejas escassas, no sentido católico tradicional. Em Portugal, a acústica, como auxílio de projecto é ainda pouco considerada na criação do espaço religioso. Só nos últimos anos foram incluídos projectos de estudo acústico de raiz, e mesmo assim, muitos só considerados em fases tardias de projecto. A inclusão, ainda que tardia, resultará de uma consciencialização da acústica (por parte de cliente e arquitecto), como valência de construção importante; muitas das intervenções acústicas, surgem a partir de exemplos existentes com disfunções acústicas graves, que interferem com a vivência do espaço.
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Criação arquitectónica de uma envolvente acústica controlada: planta de localização escala 1 500 e fotografia do enquadramento com a avenida Gago Coutinho.
SIZA VIEIRA, Álvaro (2000) « A Igreja », in Imaginar a Evidência, p. 49; SIZA VIEIRA, Álvaro (2000), ibidem, p. 61; 3 SIZA VIEIRA, Álvaro (2000), ibidem, p. 61; 1 2
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igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses
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A igreja de Santa Maria do Marco de Canaveses, da autoria do arquitecto Álvaro Siza Vieira, foi projectada de 1990 a 1994, sem projecto de condicionamento acústico. A construção começa a 10 de Abril de 1994, sendo inaugurada a Julho de 1996. Foi objecto de uma correcção electroacústica, em 2000. da cidade ao edifício A escolha do lugar para futura construção de uma igreja, na religião católica, é sempre derivada de uma vontade e conceito religioso específico. Em algumas ordens monásticas, a Igreja procura lugares isolados da urbe (mais silenciosos), devido à necessidade de introspecção e meditação. Quando o objectivo é chegar à comunidade, aos fiéis, a inserção dos lugares de culto, aparece frequentemente no contexto urbano. Hoje, a igreja surge no seio da comunidade, no núcleo habitacional. Segundo o Regulamento Legal da Poluição Sonora (RLPS), a igreja é um lugar de recolhimento, o que define a sua localização em zonas sensíveis. Esta determinação implica, acusticamente, a manutenção de níveis baixos de ruído na envolvente. No caso da igreja de Santa Maria, o local escolhido, «dificílimo, com grandes diferenças de cota, sobranceiro a uma estrada com muito tráfego»1, invoca a transformação de um espaço ruidoso numa envolvente calma, através da própria arquitectura. O conjunto volumétrico formado pelo complexo paroquial e edifício da residência, agora em construção, tem aqui uma função essencial de protecção do edifício da igreja, formando um pátio (adro) que resulta como acesso reservado a todos os espaços a uma cota superior à rua movimentada, a Avenida Gago Coutinho. O muro de envasamento da igreja e capela mortuária resulta, também, como barreira sonora. do edifício à igreja À igreja, associamos os espaços primários de assembleia e altar, com função de oração e reunião. Na Santa Maria, estas funções estão integradas num volume único, ao qual se inclui o espaço do baptistério e órgão, em dois volumes acoplados. As funções secundárias, como sacristia, cartório, confessionário e sala de reuniões, estão integradas num volume justaposto lateralmente ao principal. A independência volumétrica deste corpo – à excepção da comunicação na zona do altar – não interfere, acusticamente, com o espaço da assembleia. A igreja de Santa Maria está associada à capela mortuária – uma extensão do corpo principal que a um nível inferior estabelece as bases de assentamento – embora com percursos funcionais relativamente autónomos entre si. A única comunicação é feita pela escada e elevador que liga a galeria da capela ao corpo da sacristia. Desta forma, geram-se percursos independentes. Igreja e capela apresentam funções distintas, ambas com uma ideia de percurso fechado e circular. «Neste projecto, a unidade é conferida pelos percursos que terminam todos no ponto de partida, circularmente. A sensação final é realmente de um espaço fechado, bem delimitado.»2 Ao entrar, o claustro (espaço «em que as pessoas vão fumar, conversar ou eventualmente, por que não, tratar de negócios»3), como espaço exterior de transição, que permite ruído durante a realização de cerimónias fúnebres onde o silêncio é dominante. O ruído proveniente dos espaços contíguos à igreja (corpo da sacristia e capela mortuária) não tem pertinência suficiente porque não albergam funções ruidosas. As perturbações acústicas mais plausíveis provenientes de espaços externos à igreja são o ruído exterior. Dos vãos envidraçados, como pontos acústicos frágeis, são, particularmente, relevantes a abertura horizontal contínua, na parede sudeste, pelo
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Mapa sonoro da igreja de Santa Maria: o reforço sonoro do sistema electroacústico PA (Public Adressed), a fonte sonora do orador localizado no ambão e o som ininterrupto da água escorrendo da pia baptismal.
ANDRADE, Eugénio de, “O inominável”, 92-x-27, in AAVV (1998) Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses; 5 Vd. “da palavra cantada – o espaço litúrgico medievo”; 6 SIZA VIEIRA, Álvaro (2000), op. cit. p. 55; 7 SIZA VIEIRA, Álvaro (2000), op. cit. p. 55; 4
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ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
contacto com a Avenida Gago Coutinho; e a porta de entrada, que pelas suas dimensões (3 por 10 metros) consiste numa potencial fonte de ruído, se se encontrar aberta. No entanto, a porta é uma situação funcional de excepção. a igreja A igreja, como espaço religioso, tem assistido a uma alteração funcional, desde os seus primórdios até hoje. A função de igreja como casa de Deus deu lugar à casa dos fiéis, espaço de encontro da comunidade. A arquitectura religiosa é disso reflexo. Actualmente existe uma tensão funcional entre igreja como Casa de Deus, lugar de transcendente meditação e igreja como Casa dos fiéis, lugar de comunicação litúrgica, de ensinamentos morais e sociais. A função acústica da igreja depende desta definição funcional. Assume uma importância no estudo acústico já que combina silêncio, música e palavra. É um organismo de uma funcionalidade acústica complexa. O silêncio, presente na meditação e introspecção esteve e está sempre associada ao espaço religioso. Esta função está intimamente ligada com o sentido de isolamento aos sons do exterior. Será estranho se, no acto de meditação e reza, formos interrompidos por buzinas, som de automóveis ou semelhantes: «Nunca/dos nossos lábios aproximaste/o ouvido, nunca/ao nosso ouvido encostaste os lábios; /és o silêncio, /o duro espesso impenetrável/silêncio sem figura. /Escutamos, bebemos o silêncio nas próprias mãos/e nada nos une/ – nem sequer sabemos se tens nome.»4 Historicamente, a Música e a Palavra entram como formas de comunicação litúrgica. Particularmente, a Música é particularmente importante no acto litúrgico já que a língua usada, latim, não era sempre compreendida pela comunidade ouvinte5 . A Palavra, actualmente como função acústica principal, é a principal forma de comunicação da liturgia, não podendo por isso ser descurada. Na igreja de Santa Maria, existe uma oposição entre a vontade, de seguir as novas orientações litúrgicas e de continuar com modelos tradicionais. Acusticamente, a igreja não procurou o silêncio, o recolhimento do espaço religioso, visto por Siza Vieira como «obsessivo». A visão inovadora do autor, perante os convencionalismos tradicionais, está consagrada no rasgamento horizontal ao nível do olhar, que permite a comunhão entre o crente e o movimento do exterior. Siza foi sensível às alterações litúrgicas, o que não deixa de convocar alguma estranheza no facto de não ter sido pensada a acústica de raiz: «Aquilo que é agora legível é o resultado da decantação de determinadas reflexões sobre o espaço, hoje tão difícil, da igreja. Esta dificuldade é devida a uma série de importantes alterações na liturgia: pense-se na celebração da missa, que agora encontra o sacerdote virado para a assembleia e já não de costas.»6 O estatuto de auditório era revisto por Siza, como nova função da igreja, embora não no sentido usual: «Todavia era evidente a necessidade de criar uma projecção do celebrante, uma comunhão com a assembleia, sem que, inevitavelmente, se criasse aquela distância própria de qualquer auditório.»7 A comunhão com a assembleia falhou na sua função principal: a inteligibilidade da palavra. A igreja de Santa Maria é um exemplo incontornável de incompatibilidade entre função do espaço religioso contemporâneo (assegurar um ambiente favorável à percepção da palavra) e função acústica, que reside na audição e compreensão da mensagem. O diálogo entre duas pessoas afastadas mais de três metros, é impossível. O estudo da acústica em igrejas é recente em Portugal, tendo sido desenvolvida no âmbito de um programa de investigação científica da Faculdade de Engenharia da
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Reflexões sonoras: ausência de primeiras e segundas reflexões úteis a partir do tecto. esquisso e corte transversal.
Sob orientação de Oliveira de Carvalho (Carvalho, 1994, Morgado, 1996, Queiroz e Lencastre 1998). 9 Vd. QUEIROZ E LENCASTRE, Margarida M.M.F.Q., A inteligibilidade da palavra em igrejas católicas, através de análises de carácter objectivo e subjectivo, Tese de Mestrado em Engenharia Civil, Construção de Edifícios. Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, Porto, 1998; 10 Principal índice para a averiguação da inteligibilidade da palavra; 11 A última e terceira posição de medição não foi estudada no presente caso de estudo, visto a igreja não ser detentora de púlpito; 12 Carvalho, A. P. Oliveira (1998), “Siza Vieira e a acústica da igreja do Marco de Canaveses”, breve artigo nos jornais: Diário de Notícias 23.07.1998, Urbanismo & Construção (p. 2) 27.07.1998 e Público (p. 12) 21.08.1998; 13 Carvalho, A. P. Oliveira (1998), “Siza Vieira e a acústica da igreja do Marco de Canaveses”, Urbanismo & Construção, 27.07.1998, p. 2; 14 Texto de Federico Garcia Lorca, encenação de Castro Guedes; cenários de Siza Vieira; direcção musical de José Prata; flauta de bisel por Daniela e Filipa Tomaz; 8
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ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Universidade do Porto8. Uma das teses de dissertação, resultantes do programa, aborda a inteligibilidade da palavra, através da análise de parâmetros objectivos e subjectivos em 31 igrejas católicas portuguesas, de períodos de tempo compreendidos entre o século XII e XX9 . O único parâmetro objectivo analisado, recorrendo ao uso de equipamentos, foi o RASTI (Rapid Speech Transmission Índex)10 , em três locais de emissão distintos: frente do altar, ambão (com instalação sonora ligada) e púlpito, quando existente. Os parâmetros subjectivos basearam-se na realização de testes, com um grupo controlado de auditores, que se rege pela contagem de palavras, correctamente, percebidas e quantificação da respectiva percentagem. Neste estudo, a igreja de Santa Maria destaca-se pela detenção de uma má inteligibilidade. No índice RASTI-Altar, em conjunto com a igreja da Serra do Pilar, são os dois exemplos com pior inteligibilidade. Para a medição a partir do ambão, RASTIInstalação-Sonora, a igreja de Santa Maria deteve neste estudo, o valor mais baixo de inteligibilidade, sendo a única dentro do escalão mau.11 No momento de publicação desta prova (1998), ainda não existia o actual sistema de Reforço Sonoro (2000), o que mostra a debilidade da instalação sonora anterior, em melhorar a inteligibilidade. Esta inadequação da igreja de Santa Maria a esta função acústica fundamental, foi alvo de duras críticas ao projecto de arquitectura. Uma das vozes críticas surgiu de Oliveira Carvalho, num artigo12, que contestava a atribuição do prémio IberFAD à Igreja de Santa Maria e ao seu autor: «Dispõe de uma ultra-excessiva reverberação que torna totalmente impossível o uso inteligível da palavra. .[e continua] Com o som a ser reflectido de modo incontrolável por todas as superfícies mal projectadas, com um volume de ar totalmente incontrolado, os ouvintes só muito dificilmente percebem o que se lhes diz e alguns ficam até com dores de cabeça com o ecoar constante de tais ruídos durante quase uma hora de duração de qualquer serviço religioso.»13 A adequação da igreja à função acústica de inteligibilidade da palavra é inexistente. Algumas igrejas construídas de raiz têm como função estipulada, a audição de música sacra, desligada da comunicação litúrgica. Converter a igreja em auditório de música é, cada vez mais, uma função acústica recorrente. A inadequação do espaço à propagação da palavra, por excesso de reverberação, invoca o ambiente acústico das igrejas góticas, onde o cantochão e a polifonia simples usam o espaço como instrumento de ampliação do volume sonoro. Esta função acústica foi atestada com a realização de actividades fora da missa religiosa, nomeadamente com a apresentação da peça de teatro Cristo (2000)14. O acompanhamento musical da peça, efectuado por uma flauta de bisel solo, não necessitou de qualquer apoio electroacústico. A melodia, baseada num desenho musical simples, ressoava da igreja com um som cheio. A fala dos actores, que se deslocavam na zona do altar e assembleia, era, obrigatoriamente, assistida pelo sistema de electroacústica, com microfones em cada um dos actores, por necessidades claras de compreensão do discurso. No entanto, sendo a palavra a função acústica principal de uma igreja contemporânea, o espaço deve ser fisicamente pensado em função desta, e não da música. A música, embora presença do espaço religioso, consegue adaptar-se, mais facilmente, do que a palavra. Assim, Santa Maria não pode receber música barroca, que urge por detalhe. A solução electroacústica é muitas vezes viável como solução projectual onde o programa contemple iguais e semelhantes necessidades para a música e palavra. Na igreja de Santa Maria, as actuações musicais e teatrais são raras e pontuais; embora resultem bem, acusticamente, elas foram uma agradável coincidência não contemplada no projecto.
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Formação de ecos: nas primeiras reflexões, a partir do tecto; nas primeiras e segundas reflexões, a partir do tecto e parede posterior; corte longitudinal.
«the proportion of energy in the impulse response which arrives early as a fraction of the whole», Barron, Michael (1993), op. cit. p.18; 16 Para o discurso são consideradas primeiras reflexões, as chegadas nos primeiros 50 ms (inteligibilidade do discurso) e para a música, as reflexões chegadas nos primeiros 80 ms. (clareza da música); vd. definição de reverberação, “som como fenómeno físico”; 17 Para conhecimento aprofundado sobre desenho de espaços para albergar discurso, vd. “Acoustics for Speech” in Barron, Michael (1993), op. cit. p. 223-238; 18 Sabendo que A (superfície de Absorção Sonora Equivalente Total)=132 m2 e VolumeTotal=8994 m3, (QUEIROZ E LENCASTRE, Margarida M.M.F.Q., A inteligibilidade da palavra em igrejas católicas, através de análises de carácter objectivo e subjectivo, p. 202), segundo a fórmula de Sabine, Tr=10,9 segundos; 19 Sobre proporção áurea e acústica, vd. “Casa da Música, Porto”; 6 BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 46; 20 QUEIROZ E LENCASTRE, Margarida M.M.F.Q., A inteligibilidade da palavra em igrejas católicas, através de análises de carácter objectivo e subjectivo, p. 123; 15
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Mas quais os factores que determinam que uma igreja, ou outro espaço fechado, tenha boa inteligibilidade? Segundo Barron, a inteligibilidade da palavra é afectada por uma relação entre sinal e ruído existente, podendo o ruído de uma ventilação, por exemplo, ser suficiente para minar a inteligibilidade. A existência de ruído de fundo pode ser, praticamente, eliminada, como causa de ininteligibilidade, na igreja de Santa Maria. Mesmo a presença de aberturas, não constitui uma perturbação sonora suficiente. A principal preocupação é em torno do estudo das reflexões sonoras. Para a inteligibilidade da palavra são mais importantes as primeiras reflexões1, do que as últimas reflexões15 ; aqui a dimensão é importante. Para espaços pequenos, um tempo de reverberação curto (1 segundo) é suficiente para permitir uma boa inteligibilidade; para espaços de grande dimensão, para além de um curto tempo de reverberação, deve haver boas primeiras reflexões16 . A igreja de Santa Maria exigiria, assim, para uma boa inteligibilidade, um baixo tempo de reverberação e boas primeiras reflexões, e nenhuma das características existe. O tempo de reverberação foi estimado em 10 segundos17 , o que ultrapassa desmesuradamente o tempo aconselhado, para a inteligibilidade acima referido. A proporção do espaço é determinante para esta excessiva reverberação. A secção quadrada da nave (16,5 x 16,5 m) é responsável por um excesso de volume de ar. Este factor, associado aos materiais de revestimento (reboco e azulejo) justificam a excessiva reverberação, já que são materiais pouco absorventes, principalmente o azulejo. A madeira colocada no pavimento, não é significativa para a redução do tempo de reverberação e, à semelhança do teatro romano, a absorção das primeiras reflexões provenientes do chão, prejudica a inteligibilidade. Esta proporção entre largura e altura não é igualmente aconselhada pela falta de apoio às primeiras reflexões que provoca este excesso de altura. Segundo certos acústicos, como Higini Arau, esta relação deve recair na secção áurea (2/3)18 . As primeiras reflexões são, então, descontroladas: «For an acoustic reflection to occur is principally a matter of simple geometry.»19 O estudo formal da igreja implica assim o estudo geométrico das primeiras reflexões. Tornase, particularmente, importante o estudo formal na área onde se situa o orador (altar), que deve permitir o encaminhamento correcto das primeiras reflexões. Na igreja de Santa Maria, numa posição central do orador no altar, ou lateral no ambão, todas as ondas sonoras se perdem, porque em vez de serem encaminhados para a audiência, com uma altura humana em escala, são projectados para o alto, ou para espaços não desejados. Reflexões tardias são a evitar, pela formação de ecos e privilegiar as primeiras reflexões. Será por isso, justificável, que as superfícies traseiras sejam absorventes, já que, não constituem boas superfícies de reflexão, para a inteligibilidade da palavra. No presente exemplo, estas reflexões são demasiado tardias, e os esquemas comprovam a formação de ecos, nas áreas junto ao orador, onde a diferença entre percursos de reflexão e som directo é menor. São, dificilmente, audíveis e reconhecidos, devido à existência de um campo sonoro demasiado reverberante. No estudo referido, A Inteligibilidade da Palavra em Igrejas Católicas, através de Análises de Carácter Objectivo e Subjectivo, na maioria das igrejas é comprovada uma correlação entre características arquitectónicas, ligadas à proporção e características dos materiais, como denunciadores e interferentes no nível de inteligibilidade. «Para o RASTI as melhores correlações acontecem com o Distância ao Altar, o Coeficiente de Absorção Médio, a Absorção Total e a Altura Máxima.» 20
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HIGINO, Nuno (1998), “A Igreja de Santa Maria: Nascimento e desenvolvimento de uma ideia.”, cit. Álvaro Siza, in Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, p. 147; 21
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A repercurssão da forma global, para a qualidade acústica na inteligibilidade da palavra, é complexa e, à semelhança dos espaços para música, a sua interferência é maior em espaços de grandes dimensões. A igreja de Santa Maria encarna o modelo da planta rectangular, como aliás toda a tipologia, pela permanência do modelo da cruz latina em detrimento da cruz grega, que levantaria mais problemas acústicos pela falta de direccionalidade do espaço. Não existem elementos publicados pelo seu autor, que comprovem a existência de projecto de acústica na igreja de Santa Maria em Marco de Canaveses. A nível legislativo, não existe imposição de elaboração de um projecto de qualificação acústica em igrejas. Esta é uma valência que deve ser suportada pelo arquitecto, que busca o maior conforto e qualidade possível do espaço. As deficiências acústicas foram só notadas com o espaço em construção. «Quando começamos a aperceber-nos que a acústica não será boa, sobretudo com a igreja vazia, diz-me: - Então, compete-lhe a si resolver o problema…» 21 Em 2000, o problema foi minimizado com uma intervenção electroacústica. O sistema foi introduzido por vontade expressa do pároco, Nuno Higino, aquando da realização da peça de teatro Cristo. Este evento foi catalisador da melhoria acústica, que até então não se achava possível de realizar. A integração ficou a cargo do arquitecto José Prata, especialista em sistemas de electroacústica e responsável pela direcção musical da peça. Foi feito apenas um Reforço Sonoro, procurando controlar a dispersão do som e dirigir o feixe sonoro especificamente para o lugar onde se situa o público, daí a designação sistema PA, (Public Address). O objectivo é concentrar a energia nos ouvidos das pessoas e evitar iluminar, acusticamente, a arquitectura: paredes, tectos, chão, a fonte do problema. Com este reforço sonoro do som directo, aumenta a inteligibilidade. No entanto, não existe (hoje) qualquer sistema electroacústico que elimine a reverberação de um espaço, que continua a perturbar a comunicação no presente exemplo. Na igreja de Santa Maria do Marco de Canavezes, não se justifica uma reabilitação acústica física. A reformulação profunda para melhorar a acústica da igreja, implicaria a adição de uma grande quantidade de superfícies absorventes, o que alteraria, completamente, o espaço existente; a adição de elementos formais, como canópias, ressoadores de absorção, alteraria a configuração formal projectada e existente. O estatuto arquitectónico inerente ao edifício, adquirido pelo autor, não é compatível com a reformulação profunda que exige a reabilitação acústica.
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HENRIQUE, Luís L.(2002), Acústica Musical, p. 758;
Casa da Música, Porto da cidade ao edifício do edifício à Sala 1 a Sala 1
«Auditório significa literalmente “lugar para ouvir”, enquanto que teatro, é uma palavra de origem grega que significa “lugar para ver”».1 A sala de concertos é o espaço onde a acústica se consagrou, definitivamente, como essencial à busca arquitectónica. A música poder-se-á fazer em qualquer lugar, mas é no espaço, que foi construído à sua medida, que os desejos do compositor de música se poderão concretizar e assim tornar Música plena. Em Portugal, a construção de uma sala de concertos não é usual, embora o seja na Europa, desde o século XVIII. Talvez, porque, em excessiva medida, se pense que qualquer casa de espectáculos serve para albergar teatro, ópera, dança, música. Tal não é verdadeiro, nem sincero, para com nenhuma destas artes performativas, que exigem diferentes espaços de actuação, e diferentes funções acústicas. À simplicidade de uma única função acústica, contrapõe-se a complexidade e confusão do desejo programático de contemplar todas as funções acústicas, que só é possível com compromissos de ambas as partes, ou, mais recentemente, com soluções de electroacústica. A polivalência e flexibilidade dos usos do espaço, coloca questões que permitirá à Acústica evoluir enquanto ciência.
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Acústica do lugar: Boavista (ruído) em oposição ao Parque da Cidade (silêncio).
BURMESTER, Pedro (1999), cit. por ANDRADE, Sérgio (2005), “9 nomes para um projecto” in AAVV, “A casa abre-se à música”, suplemento in Público, 2005.04.14, p. 34; 3 KOOLHAAS, Rem, cit. por FARIA, Óscar, “Entrevista Rem Koolhaas Arquitecto Casa da Música” in AAVV, “A casa abre-se à música”, suplemento in Público, 2005.04.14, p. 64; 4 Vd. “MARMELO, Jorge (2005), “Koolhaas, Viñoli, Perrault”, in AAVV, “A casa abre-se à música”, suplemento in Público, 2005.04.14, p. 48-49; 5 RICCA, Agostinho (2001), “Casa da Música: os desconcertos”, in Expresso 2001.12.22; 2
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Casa da Música, Porto
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A Casa da Música, foi projectada por Rem Koolhaas, OMA (Office for Metropolitan Architecture, Roterdão). O projecto de acústica é da autoria de TNO-TUE Center for Building Research, Renz Van Luxemburg, M. Hak e M. Prinsen (Holanda), tendo sido acompanhado pela AFA Associados (Porto). O projecto iniciou-se em Setembro de 1999, na sequência de um concurso de ideias ganho pelo consórcio OMA/ARUP. O projecto de escoramento e faseamento construtivo foi realizado em 2001. da cidade ao edifício A evolução do processo de concepção da Casa da Música (CdM), desde cedo, foi delineada como portadora de uma diversidade funcional (acústica e arquitectónica) na construção de algo mais do que um auditório. Pretendeu-se «uma instituição aberta às várias expressões musicais do nosso tempo»2, tendo como lema, a Música ao serviço da cidade. O conteúdo programático excepcional da CdM pressupõe uma lógica de localização que permita servir um maior número de pessoas possível. O efeito magnético de atracção que provocou a Casa da Música foi associado ao efeito de renovação urbana preconizado pelo Museu Guggenheim (de Frank Gehry) em Bilbau: «O efeito Bilbau é um dos mais negativos factores em discussão neste momento. (…) O Porto tem um carácter único: é uma cidade estabelecida, com uma arquitectura estabelecida, com arquitectos estabelecidos, com uma cultura estabelecida. Desse modo, não vai ser nunca um edifício que vai pôr a cidade no mapa, ela já está no mapa, (…).»3 Mais do que um catalisador numa envolvente sem identidade ou atracção, a Casa da Música procurou a complementação dos leitmotiv existentes. A ideia de introdução deste equipamento cultural na cidade adveio de uma oportunidade temporal limitada: a Porto 2001 Capital Europeia da Cultura. Esta constrição temporal reflectiu-se, também, na escolha do sítio4, também polémica. Sentimento, aliás, presente em todas as fases do processo de projecto e construção. Uma das posições, desfavorável à localização na Boavista, era partilhada por diversos arquitectos e está particularmente elucidada em Agostinho Ricca. Sendo a localização central, na cidade - uma das prioridades da Sociedade Porto 2001 - a proposta do arquitecto portuense ia ao encontro de um lugar de condições opostas à Boavista, o Parque da Cidade. A escolha de um lugar calmo, silencioso, «poético como são as envolventes dos modernos Palácios da Música de muitos dos países da Europa, Helsínquia, Tampere, Micaeli, St. Gallen, Salford, etc.»5, iria diminuir, decerto, a complexidade das soluções construtivas, que buscavam o isolamento total do ruído de tráfego da movimentada Boavista. Todavia, sendo o Parque da Cidade uma área, acusticamente, sensível – diria mesmo super-sensível – possuidora de níveis de ruído de fundo, drasticamente inferiores aos da Boavista, as necessidades de controlo da emissão de ruído para o exterior exigiriam semelhantes soluções de isolamento, aqui, inversamente do interior para o exterior. Nesta última solução, a actual envolvente sonora do Parque da Cidade seria, drasticamente, alterada. O aumento do fluxo de pessoas e automóveis seria, inevitavelmente, contribuidor de acréscimo de ruído, assim como as actividades, que hoje se desenrolam na base exterior do edifício, seriam muito, provavelmente, eliminadas por constituírem poluição sonora. O ruidoso espírito acústico do lugar da Boavista, como é a natural agitação contemporânea, é coincidente com as funções desenvolvidas no edifício. A relação do edifício com a envolvente próxima é também objecto de discussão, essencialmente, pela imposição do edifício-objecto, com uma arquitectura que não
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Isolamento sonoro de espaços marginais transversais: S(inusoidal)-shaped curved glass.
Vd. GASPAR, José Miguel, “A lenda da Casa da Música é verdadeira”, entrevista a Rem Koolhaas, in Jornal de Notícias, 2005.04.05; 7 LOURENÇO, Nuno, “Música Visual na rotunda da Boavista”, in Público 2005.09.06, p. 41; 8 KOOLHAAS, Rem (2005), cit. por GASPAR, José Miguel (2005), op. cit.; 9 Vd. PINTO, Beatriz M. (2004) et al “S-Shaped Glass also stands for Soundless: Sound Insulation measurements and implication for building practice”; 10 As Salas do Serviço Educativo, situadas no piso 5, comunicam igualmente com a Sala 1, mas da sua actividade não decorre ruído; 6
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nasceu das constrições e inspirações do genius loci, como o próprio arquitecto confirma, mas de uma ideia vinda de outro lugar e programa6. «O espaço a que, com boa vontade, se pode chamar praça é um espaço que escorre à volta do grande cristal sem que nada de significativo se passe para além do torcicolo provocado pela obrigação de olhar de lado para cima ao fazer a inocente circunvalação do meteorito.»7 A praça não foi, realmente, projectada para receber, acústica e funcionalmente, as animações que nela decorrem, por desejo inflamado pelo edifício-ícone. Qualquer actuação, que supera em muito o volume sonoro aconselhado, é ouvida com ecos repetidos na frente de rua construída da Avenida da Boavista. Os eventos ao ar livre proliferam sem qualidade acústica, por não ter sido pensada nenhuma estrutura exterior para os receber. A configuração de meteorito ou «cristal» naquela que é a malha consolidada da zona da Boavista, traduz o significado de monumento e busca relações ousadas que não passam pela tradicional abertura no piso-térreo. Toda a estrutura suga o transeunte para o seu próprio interior, onde toda a atenção se encontra desenvolvida. «Em relação à Casa, o que dizemos é isto: não estamos interessados em fazer um edifício público, mas em fazer um edifício para o público.»8 do edifício à Sala1 A relação entre o auditório principal da Casa da Música – Sala1 – e os restantes espaços da CdM, revelam intenções espaciais diametralmente opostas. A Sala 1 e a Sala 2 apresentam-se como espaços positivos, de pureza e simplicidade volumétrica, contrastante com a natureza negativa dos restantes, que parecem existir do confronto entre a superfície volumétrica principal («cristal») e as estruturas dos auditórios (as caixas). Um bom isolamento sonoro é uma das principais lutas acústicas numa sala de concerto. As causas do ruído, podem ser internas ou externas ao próprio auditório.Nas causas externas, é fundamental a protecção contra o ruído exterior, que na Boavista são essencialmente ruído de tráfego. A futura passagem do metro, na Avenida da Boavista (ainda não decidida se subterrânea, ou, à superfície), poderá constituir um acrescento de vibrações estruturais, colmatadas pela protecção resiliente das estacas de suporte da Casa da Música. É igualmente importante o controle de ruído proveniente dos espaços contíguos ao auditório. A Sala 1 assume-se como volume, envolvido, vertical e horizontalmente, por espaços, sem nenhum contacto directo com o exterior, o que privilegia o isolamento sonoro aos sons do exterior. Nos topos da Sala 1, o contacto é feito através de dois espaços de passagem, intermediário entre esta e o exterior. O único sistema de transição é o vidro curvo patenteado S(inusoidal) shaped glass.9 Estes panos envidraçados constituem duas das entradas no auditório: a nascente, para a bancada do coro, e a poente, para a parte posterior da audiência (o uso destas aberturas é condicionado a músicos e técnicos, respectivamente). Estes dois espaços marginais à Sala 1, sendo de passagem, não constituem níveis de ruído ameaçadores para a actividade decorrente no auditório. Em oposição, os espaços contíguos às paredes laterais são espaços de cuja actividade decorre ruído: a sala cybermusic, foyer café e Sala 2. A complexidade do isolamento sonoro é derivada não apenas desta situação de contiguidade, mas principalmente pela comunicação visual que estes espaços estabelecem com a Sala 110 , tornando esses pontos frágeis, acusticamente, pela necessidade de envidraçados. A inovação técnica da patente S(inusoidal) shaped glass, foi uma inovação necessária do projecto de acústica, de adaptação às necessidades do projecto de arquitectura,
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Isolamento sonoro de espaços marginais de topo: S(inusoidal)-shaped curved glass.
Vd. “Acústica, questionário a Renz van Luxemburg” nº3; Vd. ibidem, nº2; 13 Para influência da palavra e música na qualificação acústica, vd. “Acústica, questionário a Renz van Luxemburg” nº6; 14 Vd. “Arquitectura, questionário a Nuno Rosado”, nº3; 11 12
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resolvendo eficazmente o problema11. Uma das formas de isolar a Sala 1 de todos os ruídos externos (interiores ou exteriores ao edifício) reside na colocação de espaços-tampão entre o auditório e o exterior, isto é, espaços que não emitam ruído, e que não necessitem de silêncio, como átrios. Uma posição radical, funcional, é a duplicação estrutural do volume do auditório para o volume do edifício. Esta solução, conhecida como caixa dentro da caixa, foi já utilizada no London Royal Festival Hall (1951). Na Casa da Música esta solução é levada ao extremo: o único contacto entre as duas estruturas é feita por apoios resilientes12. Esta des-solidarização completa da estrutura é fundamental para o isolamento sonoro a sons de percussão. Para o ruído de fundo é igualmente importante a contenção de ruído decorrente do interior da sala, como equipamentos e audiência. a Sala 1 A função do espaço é essencial para a determinação do conceito acústico de qualquer espaço. A função do auditório principal da Casa da Música (Sala 1) é ouvir. Ouvir música. A função acústica coincide com a função essencial do espaço, o que explica a atenção e ênfase dado neste projecto. Numa Casa da Música, a música é a função acústica principal. A palavra assume uma função acústica secundária, mas que foi contemplada, já que ela é parte integrante dos espectáculos de música contemporânea e mantém alguma flexibilidade com usos futuros13 . Esta hierarquização das funções acústicas, é fundamental para o conceito acústico, para que se possa sonhar e atingir a perfeição, como era aqui pretendido. Dentro da função musical, o tipo de música é também fundamental, já que diferentes tipos de música exigem diferentes tipos de qualidades acústicas. A música sinfónica romântica exige maior volume e intensidade sonoro, em detrimento do detalhe e definição musical, o que justifica tempos de reverberação entre 1,8 e 2,2 segundos; a música de câmara não pretende tanto o volume sonoro, mas, fundamentalmente, a definição e clareza musical, exigindo, entre outros parâmetros objectivos, um tempo de reverberação entre 1,4 e 1,7 segundos (o seu uso está pensado para a Sala 2, por corresponder a estas necessidades). O género musical escolhido é, então, extremamente importante para a função acústica. A Sala 1 foi pensada para albergar música sinfónica ou para abarcar todos os géneros musicais? A programação actual mostra um predomínio dos registos pop e rock e levanta algumas dúvidas quanto à sua determinação no programa inicial. Esta questão é importante porque põe em causa a acústica da sala principal da CdM. A Sala 1 foi pensada para albergar todos os géneros musicais, o que é esclarecido pela posição da equipa de arquitectura14 . O repertório sinfónico foi escolhido como função acústica principal, o que consubstancia a necessidade de resposta musical única na cidade. A hierarquia é fundamental para a qualidade acústica. Para a adaptação da acústica aos diferentes géneros musicais, a Sala 1 possui, segundo Renz Van Luxemburg, uma acústica variável. Este conceito é discutível na medida em que a variação não é significativa, já que toda a estrutura formal é, essencialmente fixa (paredes, tecto, chão). A acústica é variável, devido a alterações de elementos sobrepostos ou apostos a esta estrutura. Os elementos de variação contemplam um ligeiro ajuste ao reportório musical, e não uma alteração drástica de usos. Um dos elementos de variação consiste no sistema de tripla cortina: a cortina blackout, cortina acústica e cortina decorativa. Apenas a segunda foi pensada com
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Variações da luz natural na Sala 1: dia (c/cortina acústica), dia, anoitecer, noite (c/cortina decorativa).
Vd. “Arquitectura, questionário a Nuno Rosado”, nº2 e nº5; Esta apreciação acústica foi feita a partir dos parâmetros subjectivos enunciados, em 1996, por Beranek, excepto o parâmetro Envolvimento. Beranek determina dois parâmetros de Espacialidade, um ligado ao Envolvimento, e outro à Largura Aparente da Fonte. Neste caso, dada a dificuldade e menor importância da Espacialidade por sensação da largura aparente da fonte, irei considerar apenas o Envolvimento, como Barron, 1993; 17 Notas de repertório: Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) foi prolífero e genial na sua curta vida. A ópera D.Giovanni é considerada como um dramma giocoso, e a Sinfonia nº 40, característica do seu vasto repertório sinfónico. Richard Strauss (1869-1949) é considerado um dos compositores sinfónicos alemães de maior notoriedade. Ein Heldenleben é considerada por Grout, como «um autêntico clímax do gigantismo pós-romântico, quer no estilo, quer na orquestração.», vd. GROUT, Donald J. et PALISCA, Claude V. (1988), História da Música Ocidental [A History of Western Music], p. 661; 18 Vd. “Acústica, questionário a Renz van Luxemburg” nº5; 19 Uma particularidade da sala é a possibilidade de ampliação da zona de palco, nos concertos que envolvem um avultado número de músicos. Nestes casos, como era neste concerto, o distanciamento entre a primeira fila e o palco é praticamente inexistente, o que decerto invocará grande intimidade visual e acústica nestes lugares; 15 16
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um uso acústico, para tornar a sala mais ou menos reverberante. As restantes funções da cortina entram em contradição projectual e levantam uma questão de decisão arquitectónica fundamental: O espaço de auditório tem como função ouvir e esta é uma função que só se exalta e aperfeiçoa com a menor atenção dada ao sentido visual. Por isto, qual o sentido da introdução de envidraçados? Alguns autores vêem, mesmo, o auditório como o lugar da arquitectura invisível. Os inúmeros factores de distracção visual presentes na Sala 1 retiram capacidade auditiva – a Sala 1 é por definição uma sala de concertos e não um teatro. Esta opção, base, de introdução de luz natural e directrizes visuais influi na qualidade acústica (nomeadamente no isolamento sonoro dos mesmos envidraçados) e não conseguiu ainda motivar uma alteração comportamental tradicional: é exigida a ausência de luz num concerto. Os elementos cenográficos existentes são por isso, bastante discutíveis. 15 O segundo elemento de variação, a canópia, corresponde ao elemento reflector situado acima do palco destinado a direccionar as primeiras reflexões mais cedo. A sua variação, em pressão e inclinação, foi uma das alterações preconizadas pela equipa de acústica holandesa no início de Setembro, e faz variar os ângulos e dinâmica das primeiras reflexões. O seu desenho é inovador acima de tudo pelo uso de polímeros, (em substituição da madeira), que pretende assegurar uma transparência e leveza do elemento. Todavia, necessidades técnicas da zona de palco (não contemplada devidamente em projecto), conduziram a uma sobrecarga da canópia com projectores de iluminação, que destrói a transparência desejada. O sistema de electroacústica, designado por sistema PA (Public Address), surge como um Reforço Sonoro. Este sistema é semelhante ao instalado na igreja de Santa Maria, com o objectivo principal de aumentar o som directo e não a variação da qualidade acústica real. Este sistema é composto pela colocação simétrica de um conjunto de colunas para reforço das médias e altas-frequências (mensagens de voz), e outro conjunto para reforço das baixas frequências (concertos pop, rock, etc). Para uma definição da efectiva qualidade acústica da Sala1, é mais importante uma avaliação subjectiva crítica, do que a apresentação sumária dos vários parâmetros acústicos objectivos, que tem difícil correlação com a arquitectura. Dado que em acústica, a escolha do repertório tem influência na melhor ou pior resposta da sala, evito a generalização e procuro um reportório que estabeleça um elo com a intenção programática da sala. Com este objectivo apresento a minha impressão subjectiva da Sala 116, pela audição da Orquestra Nacional do Porto, orquestra residente da CdM, a 17 de Setembro de 2005. O repertório constou da interpretação dos temas de W.A. Mozart, Abertura D. Giovanni (Praga, 1787), Sinfonia nº 40 e, numa segunda parte, o poema sinfónico Ein Heldenleben, (A Vida de um Herói, 1898), de R. Strauss.17 Em relação à sensação de Reverberação, senti que era uma sala viva, (em oposiçãoao que sentimos ser uma sala seca, ou morta), especialmente, nas altas-frequências. Esta sensação está directamente relacionada com a medida objectiva do tempo de reverberação. O projecto previu um tempo de reverberação na ordem dos 2 segundos18. A sensação de volume sonoro ou Intensidade, é boa, particularmente, na mesma banda de frequências que a sensação de Reverberação, podendo chegar, nos registos mais agudos, a alguns excessos e estridência. A sala apresenta boas condições de intimidade visual19. A Intimidade acústica permite-nos sentir se a música, que é tocada, nos parece como se estivéssemos numa sala de pequenas dimensões. «A sense of intimacy for instance, is basic to any performance, without which that essential rapport between performer and audience is absent. If a concert
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Electroacústica: fonte omnidireccional dodecaédrica para medições acústicas.
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Electroacústica: colunas do sistema PA, baixas e altas frequências.
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Arquitectura, questionário a Nuno Rosado (OMA) FORMA «What form should one use to enhance to the utmost the brilliance, harmony and depth of sound from a symphony orchestra? Is there perhaps an ideal form on acoustics grounds for a drama theatre for Shakespeare’s plays?» Barron (1993). 1: O desenho dos espaços da Casa da Música (CDM) aponta para uma oposição entre espaço positivo e espaço negativo, sendo que as Salas 1 e 2 parecem ser o ponto de partida estrutural e formal, que organiza todo o edifício. Da fase inicial à execução do auditório, como se desenvolveu o processo de chegada à sua forma final? A maioria das instituições culturais serve somente parte da população. A maioria conhece a sua forma (o seu aspecto) exterior, mas somente uma minoria conhece o que acontece no seu interior. O atelier Office for Metropolitan Architecture (OMA) respondeu à relação entre o público no seu interior assim como no seu exterior considerando o edifício como um sólido ao qual são extraídos os 2 volumes dos auditórios e todos os outros programas públicos criando um conjunto de vazios no bloco maciço. O edifício revela o seu conteúdo para a cidade, ao mesmo tempo que cidade é exposta ao público no seu interior, de uma forma inovadora. Os restantes espaços entre os programas públicos expostos, consistem em zonas de serviço secundários como foyers, restaurante, terraços, áreas técnicas e acessos verticais. A circulação pública contínua liga todos os programas públicos e restantes espaços dispostos em torno do grande auditório através de escadas, plataformas e escadas rolantes. Este “loop” possibilita a utilização do edifício para festivais com “performances” simultâneas; “A Casa da Música”. A forma exterior é resultado directo de uma “pele”, com papel estrutural, que envolve e que suporta todos os volumes dos programas dispostos em torno do auditório. FUNÇÃO « (…) fiquei desiludido com os dois grandes janelões não deixarem ver para o exterior, uma vez que a luz natural não tem um papel muito importante numa sala de concertos.» Jorge Figueira (2005)
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2: A opção pela introdução de luz natural num auditório é por si controversa, já que imprime uma primazia à percepção visual numa tipologia onde a função principal é ouvir. Em qualquer espaço fechado, a presença de rasgamentos permite por um lado a entrada de luz natural como factor de conforto, e por outro, a possibilidade de uma ligação visual com o exterior, a envolvente. Na Sala 1 da CdM, contudo, ambas as possibilidades estão comprometidas por dois factores: a ausência de luz imposta na grande parte dos concertos de música implica o uso da cortina blackout, e, mesmo sem este elemento de barreira, a forma curva do vidro imprime uma distorção visual quase estonteante, não deixando perscrutar mais do que uma impressão do exterior. Qual o objectivo dos rasgamentos no auditório principal? Esta opção revelou-se um fim que justificou os meios utilizados – a técnica? Os vãos nos topos dos auditórios oferecem uma alternativa inédita à cenografia dos auditórios. Sendo exactamente a audição a função principal no seu programa, é permitida uma certa distracção visual durante um concerto. Em variadíssimas situações de concerto são usados um conjunto de elementos cenográficos (projecções, variação de cores na iluminação, etc.) que complementam a performance musical. Assim a paisagem exterior com as suas variações de luz e cor, com variações diárias e anuais, podem ser introduzidas no espectáculo. As cortinas blackout servem somente para retirar a luz natural da sala mas não têm um papel relevante de um ponto de vista acústico. Não são portanto uma imposição num concerto. Existe na mesma posição um outro conjunto de cortinas acústicas que possuem um papel importante para determinados desempenhos acústicos mas que dispõem de uma transparência superior a 50%. 3: O auditório – como espaço onde a acústica é um factor fundamental na qualidade da sua vivência – pressupõe um uso e destino único e definido. Qual o programa da sala principal e para que funções foi optimizada? O auditório é uma sala de concertos, preparada para todos os géneros musicais. Embora não seja predestinada para tal, por vezes recebe espectáculos com pequenas performances aliadas à interpretação musical. 4: Nas salas com grande dimensão, a forma torna-se um factor de grande influência da qualidade acústica. Pela espectacularidade e monumentalidade do edifício da CdM, não deixo de sentir alguma timidez quando entro no volume do auditório (a sala principal
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tem pouco mais de 1000 lugares). Qual o factor decisivo no encontro da dimensão da Sala 1, as exigências do programa ou a relação de escala com a cidade? A capacidade de lotação da Sala 1 é de aproximadamente 1300 lugares. Este número foi-nos apresentado no programa inicial pelo cliente, e é provavelmente o resultado de um estudo socio-cultural-económico. A sala é dimensionada para este número utilizando as proporções geométricas necessárias para um bom desempenho acústico. DIALÉCTICA «Porque existe sempre esta tensão entre, por um lado, o rigor e mesmo puritanismo e, por outro, uma espécie de rendição voluptuosa à beleza ou à estética.» Rem Koolhaas (2005). 5: Visualmente, o interior da sala exprime uma grande quantidade de informação. No seu todo, não haverá ruído visual a mais? Voltamos ao factor visual numa performance musical. Sendo que, de um ponto de vista funcional só a acústica seria relevante para um bom desempanho musical, acontece que ao presenciar um concerto o aspecto visual tem um um papel fulcral no concerto. Desde a roupa utilizada pelos artistas, à sua postura em palco, aos jogos de luz assim como à estética da sala, são elementos que influenciam o público mesmo que de uma forma inconsciente. Cada concerto possui um conceito para uma imagem que se pretende exibir. Através da iluminação (artificial ou natural) poderá ser utilizada ou não a informação fisica-visual da sala. Já assisti a um concerto onde a sala é omitida estando toda a iluminação concentrada no palco e a restante área escurecida; um outro, onde além da utilização visual da totalidade da sala de concertos com jogos de luz que percorria as paredes foi ainda associada outros efeitos de iluminação nas salas adjacentes com comunicação visual com o grande auditório. Em suma, a quantidade de informação é controlada pela iluminação. 6: A Sala 1 é, como conceito, o oposto dos restantes espaços da CdM, nomeadamente na linguagem arquitectónica, ecletismo versus minimalismo. O vocabulário artístico funde-se com o técnico, sem muitas vezes nos apercebermos da real função de toda
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a parafernália disposta. Tal como os dois rasgamentos dos topos, quais os elementos formais que partiram de uma premissa da equipa de arquitectura? E os da equipa de acústica? Após uma pesquisa sobre a qualidade acústica de diferentes salas de concertos no mundo concluímos juntamente com o nosso consultor que as melhores salas têm a forma da “caixa de sapatos”. Onde poderíamos então inovar no caso de uma tipologia tradicional como uma sala de concertos? Desde o início da concepção deste espaço, trabalhamos conjuntamente com o consultor acústico, onde este solucionou a concretização dos nossos desejos arquitectónicos, assim como também inventamos soluções arquitectónicas para responder a requisitos puramente acústicos. Como resultado desta simbiose obteve-se um auditório onde todos os elementos formais assim como a maioria dos materiais utilizados têm um papel directo e fulcral acústico para além da caracterização espacial da sala.
Acústica, questionário a Renz van Luxemburg SHAPE «I felt that I had to go for this competition when I realized that the piece I had conceived for the house of my client was the ideal shape for an auditorium: the shoebox shape - which is also the shape of the auditorium of Casa da Música. This was the detail that allows the building to be born.» Rem Koolhas (2005) 1: The shoebox room is one of the most recurrent models in the auditoria architecture. What are the acoustic implications of a space with this type of shape? To start with you have to understand that we are talking about a concert hall for symphonic music and for 1500 listeners. In such a situation we have the choice between a shoe box shaped hall and a more round form like the Philharmony in Berlin. In terms of acoustics we distinguish the stage/platform acoustics for the musicians and the acoustic for the audience. Both have to be excellent. As the acoustic perception is the total mix of all parameters these have to be balanced very well. Very important are the lateral reflections with respect to the envelopment. In short the lateral reflections are more easy to control in a
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shoe box shaped hall than in a room with different shape. Furthermore making a choice for a shoe box shape is also making a choice for the characteristics of the hall. In a shoe box shaped hall the clarity is less than in the other type of hall. This is very beneficial for romantic music. If you prefer a hall excellent for more modern music the round shape, with more clarity is preferred. 2: Innovation is a term that we can apply in all CdM, especially in the acoustic field. In the Ingenium magazine it is focused the concept of box in a box. Was this a conceptual or constructive option? From who did this came from? The concept of the box within a box came from us. The reason is that we wanted to realize a hall with no or very low background noise. To realize a very high sound insulation we needed the keep out all kind of vibrations. This is only possible with such a concept. FUNCTION “Under the effect of two panels of curved glass, the small and the large auditorium are special lenses through the city, post-modern stained-glass.” Jorge Figueira (2005) 3: The use of the S(inusoidal)-shaped curved glass was, in fact, a challenge in terms of noise reduction and structural support. For an auditorium, where the main goal is to hear perfectly, some authors exactly relate to be the place of the invisible architecture (one of the reasons for which the lights are disconnected, is for the spectator to be able itself to lead for the aural perception). What are the acoustic commitments when using this element as a partition? The acoustic comments are that the S-shaped glass contributes very well to the division of the sound energy in the room. The glass scatters the sound and does not generate echoes or colorization. As we can see now people like to use the different type of curtains to control the daylight. 4: Each material, element, interferes with the behavior of the sound waves: reflection, diffraction, diffusion or absorption. Of the formal elements, as the baroque organs, the canopy and the curtains, as well as the finishing surfaces, what’s the main role of each of these elements for the acoustic performance of the space? What’s the difference
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between canopy and the acoustic shell? The main roll of all these elements is to contribute to the ideal sound field. At first the sound on the stage has to be perfect and all the same over the stage. The ease of playing ensemble is very important. In the hall we tried to create the same acoustic quality for every seat. Very important are the QRD diffusers as they control the horizontal and vertical sound distribution in the hall. Balconies and organs, scatter and kick down the sound. Finishing contributes to the low frequency absorption and the seating must compensate the presence of people. The difference between the canopy and an acoustic shell is that the canopy is a well designed reflector above the stage taking care for the reflection between musicians and sufficient early reflection for the audience close to the stage. An acoustic shell does the same but is also used in to cut of too much volume like in a fly tower. 5: As Michael Barron (1993) says, «the appreciation of music acoustics is multidimensional». Of the main acoustic subjective parameters, as the reverberation time, intimacy, clarity, envelopment and loudness, which are the ones that had had preponderant role? Which objective parameters had been foreseen and with what values? We aimed at a reverberation time of 2.0 s in the occupied hall, a clarity just below zero and a LF of at least 0.2. 6: The use of speech is part of the repertory of modern music which is part of the programme of CdM. Reverberation Times and other parameters for the speech intelligibility are distinct from the ones required for music. How was this apparent dichotomy solved? By introducing the acoustic curtains and a good shape of the canopy. 7: What can we understand by fixed or variable acoustic? Which of these concepts exists in Sala 1? Variable acoustics imply the possibility to adapt the acoustic to the music or
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performance. With combinations of the acoustic curtains and the moving canopy all kind of combinations are possible. Because all kind of technical provision as hoist, lighting bridge and technical bridge are also foreseen even shows etc are possible. DIALECTICS In 1886, one of the most recognized concert rooms for its high quality acoustics, the Concertgebouw in Amsterdam, was finished. However, and given that the acoustics as science connected to architecture appeared with Sabine in the 20th century, the acoustic quality of the space remained unknown until its construction. In the Concertgebouw case, as much as the room dimensions as the elements design and type of materials, had had as reference the Neue Gewandhaus de Leipzig, two years previous. 8: In CdM, was it used any existing model as a way of controlling the acoustics? What forecast tools were used? Are we still facing some degree of unpredictability for the final acoustic quality validation? For Casa da Musica we used the simulation program Catt acoustic and we built a scale model 1: 10. As we depend on properties of materials that are often measured in different conditions we have to deal with reliability of data and statistics. 9: To speak of acoustic conditioning is different of speaking of acoustic quality of a space. The last one points with respect to an intrinsic cooperation between architecture and engineering, that is, in a cooperation since an embryonic phase of the project, while the first one accuses a bigger separation of functions and intervention in distinct phases of development of the project. Which of these existed when establishing the relation between acoustics and architecture in CdM? I strongly believe in compensation effects of architecture on acoustics. All the human senses operate together. So only the acoustic quality is valid.
BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 408; O meu lugar era central ao comprimento total da audiência; 22 A sensação de Envolvimento, está objectivamente, relacionada com o índice IACC (interaural cross-correlation coefficient), que determina a diferença temporal da chegada das ondas aos dois ouvidos Schroeder et al, 1974; vd. HENRIQUE, Luís L., op. cit. p. 790; 23 A Clareza subjectiva depende dos valores do tempo de reverberação e da Clareza objectiva (early-to-late sound index - C80); 24 «Carpets are to be avoided, or when desired should be very thin and cemented directly to a solid base. All cracks, openings in the ceiling, large areas of ventilation grilles, and the like, should be avoided to preserve bass. In general, all surfaces, except the stage floor, should be heavy, dense material» BERANEK, Leo (1996), op. cit p. 418; 25 É importante referir que este factor só é notório em Strauss, que usa todos os naipes da orquestra: metais, madeiras, cordas e percussão. Excepção feita às partes corais, inexistentes nas peças ouvidas; 20 21
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hall lacks acoustic intimacy, the customer is fully justified in expressing his preference for his compact disk player».20 Pareceu-me boa, semelhante à expectativa visual, o que é natural, dada a capacidade não elevada da sala (1238 lugares). No entanto, a posição de audição pode ser um factor de influência21 , como me foi notado por um amigo ouvinte sentado nas filas traseiras. Neste caso, a sensação de intimidade desceu para razoável ou mesmo má; assim como, foi sentido algum atraso do som, relativamente, ao que era visto, o que indicia a presença de percursos de reflexão, excessivamente, longos. A sensação de Envolvimento, ou seja, perceber que o som vem de todas as direcções, numa sala de concerto é particularmente importante. As reflexões laterais são essenciais para uma sensação de Envolvimento, e estas são particularmente ricas no modelo caixa-de-sapatos.22 O Envolvimento está associado com a existência de difusão sonora, responsável pela sensação de que o som chega de várias direcções. Outro factor, extremamente importante para a música, é a definição distinta dos sons, Clareza objectiva, semelhante à inteligibilidade, para a palavra. Aqui o repertório ouvido é uma forte condicionante, já que, diferente do repertório barroco que prima pelo detalhe musical, no repertório sinfónico de grande vulto, como o de Strauss, este factor não se torna tão importante. Sentimo-nos mais embriagados pelo volume sonoro e pela espacialidade da sala, do que propriamente pela distinção deste ou daquele instrumento. Contudo, em termos de avaliação julgo ser razoável.23 A Sala 1 não é uma sala quente. Para mim, a presença vigorosa de baixas frequências (baixos) e que determinam o Calor da sala, é fundamental. É aconselhável um tempo de reverberação que pode chegar aos 3 segundos, em contrapartida com os 2 segundos das médias e altas frequências, não obstante haver diferentes posições quanto à necessidade da sua predominância, face às outras frequências em salas de concerto. Senti, no conjunto do concerto, que existe uma falta de reverberação e intensidade nas baixas frequências. Esta frieza acústica está justificada pelo excesso de absorção das baixas frequências.24 A falta de baixos está relacionada com o excesso de madeira como revestimento, se esta tiver pouca espessura. Áreas excessivas de difusores QRD (Quadratic Residue Diffusers), também em madeira, são apontadas por Beranek como causa de perda de baixos, em salas de concerto. Outra potencial causa, comum em salas de concerto com falta de reverberação e força nos baixos, é o excesso de material absorvente dos assentos, nomeadamente com excessiva espessura. Na Sala 1, o desenho inovador dos assentos (Maarten van Severen), com o objectivo de absorver e conter a reverberação, terá excedido o valor ideal. Em relação ao Equilíbrio, relativo aos diferentes naipes, timbres da orquestra, foi o segundo factor que considerei pior25 (a seguir ao Calor). Tendo em conta a natureza dos instrumentos envolvidos, a secção de metais foi a que mais sobressaiu, seguindo-se a percussão. Tanto as madeiras, como estranhamente, as cordas, perdem alguma qualidade tímbrica. Este desequilíbrio pode derivar das características acústicas da sala ou de um possível desajuste por parte dos próprios músicos. Em acústica, o bom equilíbrio acústico é aquele que não depende do esforço suplementar da orquestra, em compensar cada naipe e em executar em uníssono. O desenho, da zona de palco, é essencial para uma boa comunicação entre elementos da orquestra, primordial na criação de equilíbrio. O Ruído-de-Fundo, é um critério fundamental em auditórios, baseado na necessidade de silêncio total dentro da sala. Os limites máximos do ruído de fundo são, geralmente, definidos pelo critério NC (Noise Criterion) ou NR (Noise Rating), sendo o primeiro originário dos Estados Unidos da América e o segundo da Europa. Sendo o isolamento imaculado, uma das batalhas da CdM, é importante referir que a ausência de ruídos de tráfego é completa. Contudo - notório apenas em poucos momentos do
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Estudo de forma: A Sala 1 da Casa da Música, Porto (2005, C), em comparação com os três melhores salas de concerto mundiais (no estudo acústico de Leo Beranek, 1996): Simphony Hall, Boston (1900, A), Musikvereinsaal, Viena (1870, B) e Concertgebouw, Amsterdão (1888, D).
Particularmente em momentos de solo instrumental, como o solo de violinista em Ein Heldenleben; Dada a infalibilidade projectada do isolamento da caixa principal, obvio que a causa seja interna à própria sala, provavelmente de algum equipamento, possivelmente um projector luminoso de maior potência, ou o som da pressurização da canópia; 28 Aconteceu uma vez no espectáculo, no espaço foyer-café, mas poderá não ter sido intencional; 29 O clímax musical nem sempre corresponde ao momento de maior volume sonoro. Um momento de silêncio e/ou solo instrumental consegue por vezes criar a mesma tensão musical. Nesta peça um dos momentos mais tensos corresponde a uma série de pergunta-resposta entre a violinista principal e a orquestra; 30 Vd. “da acústica arquitectural - nascimento e consolidação”; 31 O chamado efeito engenton: vd. “da palavra cantada – o espaço litúrgico medievo”; 32 Richard Bolt definiu cientificamente em meados século XX, uma zona proporcional. Nela garantia haver uma boa distribuição de todas as frequências. Este estudo aplicava-se no entanto apenas a salas de pequenas dimensões; 33 Para conhecimento das diferentes propostas por acústicos e tratadistas arquitectónicos, Vd. DOMENECH, Francesc Daumal, Arquitectura acústica, Poética y diseño, p. 82-84 e 293-296; 34 Vd. HIGINI, Arau (1999), “ABC de la acústica arquitectónica”; 35 A proporção é aproximada e constatada por ROSELLÓ, Graciela (2002), Tectónica: acústica, 14: p.67; 26 27
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concerto26 - senti algum desconforto, face ao ruído de fundo. Uma ressonância numa frequência específica e aguda, que indicia ruído de equipamento27 e ruídos da audiência. Finalmente, Ruído Visual. Poderá parecer estranho a inclusão de um parâmetro visual, mas o conceito de espaço sinestético implica a transensorialidade das nossas percepções. Um fenómeno que acontece usando um determinado canal sensorial (visão), mas interfere com outros (audição). Refiro-me ao excesso de informação visual que nos demite da função de observador, retirando-nos a atenção desejada à audição. Neste caso, falo não só do excesso de luz na sala (mesmo nas luzes dos assentos), cuja presença não se justifica durante a performance, mas também por acontecimentos extrínsecos à sala, visíveis a partir dela de qualquer um dos envidraçados, como o ligar de luzes.28 Sensorialmente, existe uma oposição sonora. Por um lado podemos ver o movimento a decorrer nesses espaços, mas o objectivo é a não audição dos sons correspondentes. Esta é uma disfunção acústica. Neste parâmetro, penso que a sala é insuficiente. Em suma, a resposta da sala é boa, e particularmente muito boa no repertório sinfónico de grande vulto. Parece corresponder melhor com o aumento do número de músicos em simultâneo, conseguindo nos momentos de clímax da peça captar mesmo a atenção do ouvinte, com um volume de som que enche a sala.29 A forma da Sala 1 da Casa da Música é uma típica caixa de sapatos. O plano inclinado da audiência corresponde à identificação de parâmetros visuais e acústicos: uma boa linha de vista é essencial à propagação do som. É uma evolução perante o chão horizontal do modelo da caixa paralelipipédica, aliás patente no trio acústico de referência Musikvereinssaal-Concertgebouw-Symphony Hall30, ainda detentor de galerias, uma reminiscência social do teatro de ópera, não existente na CdM. No entanto, a Sala 1 possui camarotes e Sala Vip (sobranceira ao palco), o que contradiz o espírito democrático da vivência contemporânea de uma sala de concertos. Avança no modelo formal do século XIX e XX, mas estagna com a manutenção convencionada dos lugares sociais. Este desajuste é expresso pela falta de procura e ocupação destes lugares. A forma paralelipipédica, que em arquitectura expressa uma simplicidade formal, apresenta condicionalismos acústicos complexos, não obstante, a já referida potenciação de boas primeiras reflexões. Uma dessas condições é a potenciação de ecos flutuantes, pelo paralelismo e pouca absorção, entre paredes, (altas frequências) e a potenciação na formação de ondas estacionárias, por superfícies paralelas e simetrias (baixas frequências). O segundo fenómeno potencia a ressonância da sala a frequências específicas (colorações), impedindo uma distribuição uniforme do som31 , sendo bastante perturbador numa sala com fins musicais. Estas ressonâncias específicas, dependem da proporção da sala e são uma das causas de deturpação acústica de espaços32. Uma melhor proporção favorece as primeiras reflexões, sendo assim um aspecto fundamental da acústica. O estudo de proporções de salas prismáticas rectangulares foi objecto de atenção por arquitectos e acústicos, desde Vitrúvio, Palladio, Pacioli (nº de ouro), a Arau33. Uma das proporções mais usadas pelo acústico Higini Arau é a de 2 x 3 x 5 (altura, largura, profundidade). Esta proporção é aconselhada pelo próprio no seu livro34, e foi, nomeadamente, pensada no auditório de Ciudad de León, dos arquitectos Mansilla e Tuñon35. Contudo, do projecto à construção, a interferência de outros factores, como uma maior capacidade, transforma muitas vezes a proporção ideal para outras mais longilíneas. A proporção 2 x 3 x 5 corresponde à proporção áurea (conjugação em planta e alçado do rectângulo de ouro) com um desfasamento de apenas um metro. Esta
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Estudo de proporção: a proporção áurea (2,3,5), na comparação com a Casa da Música, em corte transversal e planta.
Comprimento=52m, altura=12-18m, largura=22m; A proporção áurea existe realmente em planta (aproximadamente 3/5), excluindo a zona de palco. Contudo, os volumes não são acoplados, como em algumas situações de teatro de ópera e constituem um volume único; 38 «For a surface to be acoustically diffusing requires an irregularly profiled surface with projections of a depth between 0.3-0.6 m.» BARRON, Michael (1993), op. cit. p. 15; 39 BERANEK, Leo (1996), op. cit. p. 459; 40 Vd. “Acústica, questionário a Renz van Luxemburg” nº1; 36 37
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simultaneidade entre proporção áurea em arquitectura e proporção ideal em acústica, mostra alguma identidade entre espaços estéticos e espaços que soam bem, embora esta afirmação não implique que todas as proporções agradáveis à vista o sejam para o ouvido. A busca da proporção ideal conjuga uma complexidade para além do domínio de uma ou de outra percepção sensorial. A importância de manter a proporção áurea, para uma boa acústica em salas paralelipipédicas, é mais importante na relação altura e largura, no ponto de transição entre palco e audiência. A proporção da Sala 1 em planta (2 x 5)36 determina, claramente, uma direccionalidade acústica e visual37, mas mantém a desejada aproximação à secção áurea na relação altura e largura. Esta aproximação é conseguida com o recurso à canópia, que rebaixa a altura máxima no ponto de transição no palco. Em conjunto com as formas adoptadas e escolha de materiais, a proporção é uma das caracterizações e influências acústicas do espaço. No projecto de acústica, os revestimentos e formas adicionadas são uma consequência das escolhas e condicionalismos acústicos determinados pela forma volumétrica e proporção. Uma das principais preocupações é a difusão homogénea do som, para a qual a forma do tecto é fundamental. A manutenção da horizontalidade na CdM provoca o surgimento de elementos adicionais no auxílio do desenho das primeiras reflexões e criação de um campo sonoro difuso, como a canópia e difusores QRD nas paredes laterais e tecto. A difusão é naturalmente conseguida com superfícies irregulares, a uma grande escala e a uma pequena escala, na própria forma do revestimento. Os dois órgãos localizados no palco são importantes pela sua função de difusão, actuando como reflectores essenciais. Adicionalmente, a Sala 1 apresenta no tecto e lateralmente áreas consideráveis de difusores QRD, que correspondem a um perfil irregular. Alguns autores, como Michael Barron, defendem a presença de difusores no espaço, para garantir a existência de um campo sonoro difuso, que é fundamental, por exemplo, num auditório38. Mas a sua utilização está longe de ser consensual. Alguns acústicos, como Higini Arau, defendem a criação de um campo sonoro difuso pelo trabalho da forma do auditório, e não com a inclusão de difusores. Na relação entre a existência de um campo sonoro difuso e a aplicação de difusores, não é, ainda, conhecida uma implicação objectiva: «When designing a concert hall, architects and acousticians should devote major attention to the provision of adequate irregularities, both large scale and small on walls and ceilings. Diffusivity is an architectural feature that must not be underestimated.»39 A absorção sonora é fundamental na contenção do tempo de reverberação, presente naturalmente no corpo da audiência ou assentos. É também importante para a eliminação de reflexões não desejadas, como as da parede posterior, que potenciam a formação de atrasos, ou mesmo ecos. Na CdM, a relação entre a arquitectura e as especialidades técnicas, foi a de um maestro para com uma orquestra e os seus diferentes naipes. A dependência das diversas especialidades para com a partitura determinou as soluções preconizadas por cada uma, na obrigação e necessidade de se incorporarem no conceito já criado. A construção da CdM partiu de um projecto de uma casa unifamiliar e não do encontro a priori de necessidades programáticas específicas. O volume exterior foi concebido a partir desta diferente base programática, e o volume do auditório (caixade-sapatos) foi encontrado pelo arquitecto ainda neste programa anterior, tornando-se o motivo principal de desenvolvimento da organização funcional de todo o edifício. A escolha do modelo caixa-de-sapatos 40 , implicou a interacção constante entre a equipa de acústica e a equipa de arquitectura, na determinação exacta das proporções, elementos formais e superfícies de revestimento. Cada elemento possui uma função
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Reflexão e difusão sonora: variação canópia e difusores QRD tecto e parede.
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Vd. “Arquitectura, Questionário a Nuno Rosado” nº6;
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acústica determinada.41
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espaço e tipologia espaços acústicos e não acústicos reabilitação acústica legislação como instrumento
O espaço acústico assume, com as diferentes tipologias, diferentes características. Algumas reiteram para si a necessidade de uma construção positiva, de desenho e poética acústica. Outras reclamam apenas a necessidade de silêncio. É nesta construção sonora pela sua negação, que surgem os maus espaços acústicos, e em alguns casos, a reabilitação acústica. A legislação surge como um dos instrumentos, com influência determinante da consciencialização da importância da acústica na arquitectura.
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Acústica negativa: Biblioteca da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto.
SCHAFER, R. Murray (1977) Le paysage sonore [The Tunning of the World],p. 305; SCHAFER, R. Murray (1977) [ibidem], p. 304; 3 Sobre espaços acústicos e não acústicos, Vd. JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”; 4 JONES, Peter Blundell et KANG, Jian (2002), “Acoustic form in the Modern Movement”, p. 83; 1 2
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espaço e tipologia
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espaços acústicos e não acústicos “O arquitecto de hoje trabalha para os surdos. Ele mesmo tem os ouvidos fechados.”1 A habitação, como base da arquitectura, é uma tipologia onde a qualidade das percepções sonoras nela escutadas é negligenciada. Surge em oposição a outras tipologias, onde a acústica já foi considerada como elemento fundamental de estudo, como auditórios, igrejas e salas de aula. Os motivos prendem-se com a construção acústica positiva e a construção acústica negativa, isto é, enquanto que a concepção positiva de uma intenção acústica é clara nas primeiras tipologias referidas, pela presença e importância determinante da comunicação sonora e pela existência inequívoca de um emissor e auditor, outros espaços há, em que a acústica é sentida pela sua negação (silêncio) e consequentemente, unicamente, pela necessidade em isolar o som. A habitação, actualmente enquadrada no modelo do edifício plurifamiliar, é vista como construção acústica pela negativa. A actual legislação, que constitui praticamente a única intervenção efectiva da acústica no projecto de habitação, é disso espelho. A incisão no isolamento sonoro a sons do exterior e do interior do edifício, invoca o estado actual de sentimento face à envolvente do fogo, isolamento. Não revela por isso as potencialidades de construção positivas, descritas na habitação-colectiva da R. das Pedreiras, dos sons que pretendemos ouvir. «A partir do momento que estes espaços (…) não serviram mais do que espaços funcionais de trabalho silencioso, a arquitectura cessou de se constituir como arte de uma estética acústica positiva.»2 A acústica negativa é o reflexo das necessidades de silêncio e manifesta-se, por exemplo, em espaços como bibliotecas, museus, escritórios e habitações. Este silêncio é reflexo da sociedade egoísta e individualista em que vivemos, não só uma consequência das turbulentas incursões ruidosas do exterior e do interior, devendo por isso ser tido em atenção. Estes espaços são, também, designados por nãoacústicos3, por terem uma atenção centrada na redução e não na ampliação de sons. «The concert hall represents the epitome of acoustic work in a positive sense,(…). But acoustics is not only important in performance spaces: it also has a strong effect on ‘non-acoustic’ spaces like libraries, museums and dining halls.»4 Numa sala de leitura de uma biblioteca, a palavra de ordem mais ouvida é: silêncio!”. Mas este mecanismo de protecção começa a revelar-se desadequado, se for entendido para todos os espaços de uma biblioteca. Será o silêncio essencial à actividade de leitura ou apenas uma norma social convencionada? Na Biblioteca da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP), o silêncio imposto compele a um isolamento, na actividade de leitura, que não corresponde às necessidades do curso. Na sala de exposições de um museu, também o mais esperado é o silêncio; silêncio no andar, silêncio no falar, coadunantes com o olhar atento, tradicional, dos objectos apostos à arquitectura. Também o museu se soltou desta solitária contemplação da obra de arte estática, para impor um novo comportamento dinâmico. Os exemplos dos mega-museus, como o Museu de Serralves, no Porto e o Museu Guggenheim, em Bilbau, impõem pela sua arquitectura, um ruído saudável na sua utilização, que é também um factor de atracção. No entanto, a redução de alguns sons é fundamental para que os sons da comunicação sonora, que ocorre em todas as tipologias arquitectónicas mas de forma
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Limiar da dor: evolução musical em torno de uma maior potência sonora.
Vd. DOMENECH, Francesc de Paula Daumal (2003); Arquitectura acústica, Poética y diseño, p. 28; 6 Em vigor a partir de 2002 com o RRAE; 7 SCHAFER, R. Murray (1977) op. cit. , p. 308; 5
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diferenciada, sejam claros e entendidos. A tipologia do restaurante é disso paradigmática. Não é raro frequentar espaços de restauração e lazer, onde o ruído de fundo é tão elevado, que torna impossível uma conversa a um volume sonoro normal. Este facto é comprovado pelo efeito Lombard; sobe-se a voz para que esta sobressaia do ruído de fundo, já que, a conversa dos outros é ruído de fundo, aumentando o nível sonoro existente. Este efeito é muito mais perturbante em lugares reverberantes e com um elevado número de ocupantes, como bares, restaurantes e discotecas.5 Não só é afectada a comunicação, como é perturbado o equilíbrio psicofisiológico. A construção acústica positiva é então absorver, e não reflectir. Na Cantina do Pólo do Campo Alegre (2003), a falta de previsão do tempo de reverberação, por ser demasiado elevado, destrói qualquer possibilidade de permanência minimamente confortável e sã no espaço. Esta desatenção é contrária à legislação actual6 que estipula um tempo de reverberação, para espaços de restauração, de acordo com o volume do espaço. O excesso de superfícies reflectoras, nos chapeados da copa e os vãos envidraçados da zona de restauração, provoca um atropelo de sons que eleva substancialmente o ruído de fundo (efeito lombard). Contudo, a reverberação num espaço de restauração nem sempre foi vista como nefasta, embora não seja de todo aconselhável numa visão contemporânea. A descrição de Schafer, nos anos 70, a experiência acústica vivida no restaurante do Sidney Opera House, (Joern Utzon, 1973) é disso exemplo: «No restaurante, a terceira e mais pequena das estruturas do conjunto – bem que dotada de imensas abóbadas – reparei que o chão devia continuar tal e qual, sem moqueta [tecido de lã, muito apertado, próprio para estofos e alcatifas] e que uma cozinha aberta ocupava o centro da sala. Apanhei uma tábua de dois metros de comprimento, que se encontrava a meus pés e deixei-a cair. A reverberação era comparável à de Santa-Sofia em Istambul. Ela ultrapassava provavelmente os oito segundos. (…) Se um dia visitarem Sidney, não se esqueçam de escutar o eco que faz a vossa colher de sopa.»7 Outros espaços, como bares e discotecas, acrescentam à vivência no espaço de restauração, a audição de música. As discotecas, autênticas câmaras acústicas, são já entendidas como fonte de ruído para a envolvente. Com a legislação vigente, nomeadamente o RLPS (Regulamento Legal da Poluição Sonora), já são impostos limites rigorosos na emissão de ruído para o exterior. No entanto, o nível de qualidade do som, sentido no interior do espaço, ainda não é assimilado ou compreendido por quem frequenta estes espaços, tanto a nível de volume sonoro, como desenho acústico. O volume sonoro demasiado elevado, que pode atingir os 102 dBA nas frequências mais graves, alcança níveis de intensidade sonora perto do limiar da audição humana. A maior incidência nas frequências graves, presentes nos sons electrónicos e na percussão mais do que nos instrumentos clássicos como o contrabaixo, é uma característica, cada vez mais presente, no tipo de música ouvido nestes espaços. Os sons graves são mais difíceis de absorver, pelo elevado comprimento de onda; contornam obstáculos, surgem como nova fonte sonora quando atravessam pequenos orifícios e dobram esquinas. Este comportamento sonoro só é evitado pela absorção por painel ou membrana e pela absorção porosa, se a espessura dos elementos de revestimentos for elevada. As baixas frequências, provocam também uma maior vibração, em pessoas e arquitectura, propagando-se mais facilmente com estruturas rígidas contínuas A localização, implantação, forma e formas dos bares e discotecas são determinantes para um bom isolamento face ao exterior. A construção acústica destes espaços deve estudar também a reflexão e não apenas a absorção e isolamento, já que a função principal é ouvir música de grande volume sonoro. É de evitar a formação de
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Medições acústicas do nível do RASTI estão a ser efectuados (Novembro 2005), para averiguar a real e objectiva qualidade acústica; 9 Vd. “arquitecto(s) e acústico(s)”; 8
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ecos focalizantes, particulares de formas côncavas e parabólicas e ecos flutuantes, particulares do paralelismo entre elementos de separação com grande capacidade de reflexão, procurando formas que contribuam para um bom campo difuso, e de reverberação controlada. A construção acústica positiva encontra-se mais bem definida nos espaços como salas de concerto e auditórios, onde emissor e receptor estão claramente definidos. No entanto, esta relação unívoca entre função espacial e acústica não evita a existência de erros acústicos graves nestas tipologias. O auditório, com particular ênfase na comunicação verbal e de aprendizagem, é muitas vezes mal projectado acusticamente. Esta disfunção acústica torna-se particularmente nociva no auditório que cumpre função de sala de aula, acontecendo ainda em construções recentes Um desses exemplos é o Auditório da FAUP, com alguma similitude formal e acústica com o espaço da igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses. O semelhante excesso de volume de ar em detrimento de poucas superfícies absorventes denuncia a existente e elevada reverberação, que interfere com a função de comunicação, mesmo com a possibilidade funcional de divisão do auditório em dois espaços compartimentados. O Reforço Sonoro foi a solução encontrada para melhorar a inteligibilidade e fazer com que a palavra seja ouvida nos pontos mais afastados, mas não foi eficaz na qualidade acústica: o acompanhamento visual do orador é fundamental para que o ouvinte capte a mensagem sonora. A disposição do sistema electroacústico não é também coincidente com a função de alternância, entre emissor e receptor, isto é, a audiência não tem qualquer possibilidade de recorrer à acústica assistida para se fazer ouvir. Talvez por isso seja tão raro e tímido o discurso formulado do anfiteatro para o orador. Outros exemplos ainda mais crassos são os anfiteatros da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Comparativamente ao auditório da FAUP, este anfiteatro possui uma reverberação mais elevada, com uma inteligibilidade da palavra muito reduzida. A sua construção mais recente e o contexto espacio-funcional tornam esta disfunção ainda mais alarmante.8 Uma das possíveis causas para o existente esforço sobre-humano entre professor e aluno, em gerar uma boa comunicação verbal, residirá em algo mais do que o elevado tempo de reverberação. Como referido na igreja de Santa Maria – em relação à inteligibilidade da palavra – são igualmente importantes os factores de forma e proporção, para uma boa orientação das primeiras reflexões. Nos anfiteatros da FEUP, a forma trapezoidal não é geradora de boas primeiras reflexões, permitindo uma elevada dispersão sonora, ao contrário das salas rectangulares. Esta escolha formal implica o trabalhar da forma do tecto, de forma a direccionar as primeiras reflexões para a audiência, tal como fazia o arquitecto Alvar Aalto na década de 30. 9 A principal diferença entre os anfiteatros, acusticamente, perfeitos do tempo de Vitrúvio e os seus congéneres contemporâneos, reside no enclausuramento do espaço, responsável pelo fenómeno de reverberação. O minimalismo arquitectónico dos elementos de reflexão do teatro grego (orquestra e cena) reforça o som directo e as primeiras reflexões. O espaço acústico, de construção positiva, deve ser uma valia de todas as tipologias e não, meramente, dos auditórios, sejam salas de concerto ou espaços de palestras e debates. O espaço não-acústico, de construção negativa, ganha uma importância na arquitectura cada vez maior, pela crescente necessidade de isolamento, face ao universo sonoro que nos rodeia. Mas a atenção exclusiva e intensa da acústica pela negativa, retira à percepção sonora a sua capacidade de comunicação e informação espacial. Este retorno ao silêncio retira as energias projectuais da acústica qualificada, proliferando desastres acústicos, aos quais a reabilitação nem sempre dá resposta.
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Reabilitação electroacústica: igreja de Santa Maria, Marco de Canaveses.
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JONES, Peter Blundell et KANG, Jian (2002), op. cit. p. 83;
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reabilitação acústica «Comfortable acoustic conditions may go unnoticed by users, but poor acoustics can damage the whole design. (…)Following acoustic disasters of this kind in a number of award-winning buildings, acoustic comfort in ‘non-acoustic’ spaces is receiving increasing attention.»10 Os espaços não acústicos são mais frequentemente espaços onde existe uma má acústica. A preocupação central é o isolamento sonoro; este acaba por estar mais salvaguardado devido à acção do regulamento. Esta despreocupação conduz frequentemente às designadas reabilitações acústicas. Reabilitação acústica é um dos domínios da acústica arquitectural, cuja acção modifica, a acústica de espaços existentes. Por diversos motivos, a recorrência a estas e quaisquer medidas de carácter correctivo é de evitar por diversos motivos. O principal motivo é do foro ontológico, isto é, a reabilitação acústica não substitui o projecto acústico. Deve, por isso, ser uma excepção e não uma norma metodológica. O factor financeiro é crucial, motivando muitas vezes a não intervenção. Por último, os defeitos acústicos podem ser de uma tal ordem, que a sua correcção pode ser impossível, tornando muitas vezes insuportável o seu uso. Esta atenção é paradigmática no caso da Igreja de Santa Maria. Como explicitado no exemplo, e revelado pelo estudo do programa de investigação em acústica de Igrejas, este espaço sofreu uma intervenção electroacústica, que apenas minimizou o problema acústico do espaço. A electroacústica não é tábua de salvação. Os sistemas de electroacústica têm também uma aplicação no sentido da transformação da acústica da sala. Enquanto que os sistemas tradicionais de reforço sonoro, apenas reforçam o som directo. É, hoje, possível a transformação da acústica real em acústica virtual. A acústica virtual permite a criação de um espaço acústico maior que o real, através do aumento da reverberação, transformando uma sala seca numa sala viva. A Universidade de Delft, na Holanda, é pioneira nesta investigação, sendo a Aula Magna de Delft um dos exemplos de acústica virtual (do inglês acoustic space enhanced). Permite assim uma alteração acústica sem interferência na arquitectura, mas é apenas adequado quando a intervenção no espaço arquitectónico é desaconselhada, como na Ópera de Viena. Já o contrário, a transformação de uma sala viva numa sala seca por electroacústica, é impossível e bastante difícil. Nesta situação, a transformação física é a mais acertada, com a introdução de material absorvente. A alteração da arquitectura é aqui incontornável. As implicações danosas resultantes de um mau espaço acústico, estão ainda longe de serem, totalmente, conhecidas e percebidas, tanto por arquitectos, como pelos usufruidores directos. Esta inércia, generalizada, origina disfunções espaciais que só são detectadas muitas vezes na conclusão da obra. Embora algumas correcções se possam fazer com um grau mínimo de interferência na materialização do espaço, alterando apenas os materiais de revestimento ou através da electroacústica, na grande parte dos casos, implica uma alteração profunda do espaço arquitectónico. Na arquitectura anónima, corrente, as implicações financeiras de uma reabilitação acústica, aliada ao referido desconhecimento ou acomodação, por parte dos seus utilizadores e donos de obra, perpetua muitos desastres acústicos, um pouco por toda a cidade, por todo o país. O exemplo da habitação é mais uma vez paradigmático. Quando compramos uma casa, temos mais noção dos efeitos da orientação solar, da entrada de luz natural na casa, do que propriamente se ela irá soar de forma agradável, ou se não iremos ouvir o vizinho do lado a arrastar a mesa, ou o buzinar dos carros na rua. Na maior parte dos casos, apenas se preocupam com os equipamentos da casa ou a dimensão. A
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Legislação do Ruído: valores máximos de tempo de reverberação, em edifícios comerciais, escolares e hospitalares.
Vd. Artigo 3.º alínea d (DL n.º 292/2000) em Anexo, para definição de mapas de ruído; PATRÍCIO, Jorge (2001), “A Nova lei do Ruído”, Jornal Público, 2001.05.14; 13 Vd. Artigo 3.º e 4.º (DL n.º 292/2000) em Anexo, para definição e implicação de zonas sensíveis ou mistas; 11 12
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legislação é um passo importante, mas está longe de corresponder às necessidades do conforto acústico qualificado. legislação como instrumento Em Portugal, a legislação como controlo mínimo de qualidade foi introduzida apenas em 1987, com um documento percursor das preocupações com a poluição sonora e a qualidade acústica ambiental: a Lei de Bases do Ambiente (Lei n.o 11/87, de 7 de Abril). Este documento viria apenas a ser revisto passados 13 anos, com o actual Regulamento Legal da Poluição Sonora (RLPS, Decreto-Lei nº 2922000 de 14 de Novembro). Para uma exigência mínima no conforto acústico vivido no interior dos edifícios, surge em 2002, o Regulamento dos Requisitos Acústicos dos Edifícios (RRAE, Decreto-Lei nº 1292002 de 11 de Maio), tendo sido contestado por não abranger tipologicamente todos os espaços e pela dificuldade na aplicação real dos critérios. O RLPS é a base de qualquer pedido de licenciamento para construção ou reabilitação, exigindo a entrega do extracto do mapa de ruído ou relatório de dados acústicos, que conclui da adequação ou não do local à intervenção pretendida. A elaboração de mapas de ruído11 a nível metropolitano – estabelecendo as curvas isofónicas da mesma forma que a topografia o faz no desenho das curvas de nível – tem como objectivo principal a conservação dos níveis de ruído para uma determinada zona, de forma a que futuras construções não venham alterar a envolvente sonora existente. A sua potencialidade como instrumento do planeamento territorial vai ser integrada na elaboração do próximo PDM (Plano Director Municipal) do município do Porto, para o qual estão a ser elaborados os mapas de ruído pelo LAIC (Laboratório de Acústica do Instituto da Construção). Esta é aliás uma das características do PDM como instrumento do planeamento territorial, a clarificação do potencial funcional de cada zona: zonas menos ruidosas para edifícios que requeiram silêncio – habitação, escola, hospital, igreja – e zonas mais ruidosas para edifícios que não requeiram silêncio – como industria, comércio e alguns serviços. Todavia, o mapa de ruído ultrapassa esta valência de assessoriamento territorial, que, como muitos PDM’s, assume uma rigidez excessiva na demarcação funcional urbanística, retirando liberdade à intervenção do projecto de arquitectura na requalificação urbana. Esta não é uma questão da utilidade dos mapas de ruído, mas de atitude no urbanismo e arquitectura. O mapeamento de ruído é, acima de tudo, uma ferramenta de auxílio à actividade projectual – assim como as plantas topográficas e restantes elementos – elucidando a compreensão do lugar e justificando estratégias de intervenção e construção. Esta valência está aliás prevista pela legislação, embora sem prazos definidos, na disposição desta informação: «No que respeita à criação de mapas de ruído, esta nova lei [RLPS] vai mais longe do que aquilo que a ainda proposta de Directiva comunitária sobre a gestão do ruído ambiente preconiza, (…). A Directiva impõe datas-limite e quantificação de aglomerações populacionais onde deve ser efectuada cartografia de ruído: até ao ano 2005 a aglomerados com mais de 250.000 habitantes, estendendo-se até 2010 aos aglomerados com mais a 100.000 habitantes. No RLPS propõe-se para todos os aglomerados, embora que faseadamente, sem limites temporais nem quantificação populacional.»12 Como regulamento, o objectivo principal é assegurar que novas construções não contribuam para novo e incremento da actividade ruidosa, estabelecendo dois critérios distintos relativamente à emissão sonora para o exterior de qualquer edifício; um que impossibilita ultrapassar os limites estabelecidos consoante a classificação da zona como mista ou sensível (critério ambiental13) e outro que se relaciona com o impedimento de
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Vd. Artigo 8.º n.º 3 (DL n.º 292/2000) em Anexo, para implicação do critério de incomodidade; Vd. Artigo 4.º nº 6 (DL n.º 292/2000) em Anexo, para restrição ao licenciamento de habitação, escolas, hospitais, ou similares; 16 Para conhecimento aprofundado sobre vantagens e desvantagens do RLPS, Vd. CARVALHO, A. P. Oliveira (2001), “O novo regime geral sobre a poluição sonora (RGR): Um passo em frente ou uma oportunidade perdida?”, Ingenium, Fev. 2001 e PATRÍCIO, Jorge, “A Nova lei do Ruído”, Jornal Público, 2001.05.14; 17 Artigo 6.º nº 1, alínea c, DL n.º 129/2002; 18 D2 m, n, w ≥ 30 dB; 19 Vd. Quadro I, (DL n.º 129/2002); 20 O regulamento é algo vago a respeito a outras imposições, nomeadamente de carácter europeu: «A determinação do índice de isolamento sonoro a sons de condução aérea, normalizado, D2 m, n, w, do índice de isolamento sonoro a sons de percussão, L’ n, w, e do tempo de reverberação, T, deve ser efectuada em conformidade com o disposto na normalização portuguesa aplicável ou, caso não exista, na normalização europeia ou internacional.», Artigo 6.º nº 2, DL n.º 129/2002; 14 15
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gerar situações de incomodidade14 para os que habitem, trabalhem ou permaneçam nas imediações, decorrente do funcionamento do edifício. E aqui, as funções ruidosas de certos edifícios têm maior dificuldade no cumprimento do regulamento, particularmente se estiverem localizadas em zonas pouco ruidosas. Neste caso, o isolamento interior e exterior imposto nos espaços produtores de ruído, funcionam também como isolamento exterior e interior. Num edifício como a Casa da Música – produtor de ruído mas com exigência de silêncio – não está em causa a emissão de ruído para o exterior mas sim a do exterior para o interior. A sua localização numa zona ruidosa invoca critérios ambientais mais rigorosos no interior. O RLPS não impõe assim restrições de licenciamento para a localização de actividades que requeiram silêncio (excepto habitação, hospitais, escolas ou similares15 ) que será da responsabilidade do planeamento territorial referido anteriormente ou, na ausência, do próprio dono de obra que terá um esforço complementar para fazer cumprir critérios de comodidade acústica interior (RRAE) em zonas ruidosas.16 Todavia, por definição de zona sensível, os “locais de recolhimento”, são também incluídos nesta categoria, como as igrejas. O RRAE designa as especificidades acústicas de cada edifício, se este estiver enquadrado nas tipologias assinaladas (edifícios habitacionais e mistos; comerciais, industriais ou de serviços; escolares e de investigação; hospitalares; recintos desportivos e estações de transporte de passageiros). Nem sempre é fácil perceber o enquadramento. Um edifício como a igreja de Santa Maria é um edifício de serviços. Neste caso, a qualidade acústica imposta é mesmo assim redutora, abrangendo apenas algumas zonas do edifício. De igual forma, num edifício como a Casa da Música, só os espaços comerciais ou de serviços do seu interior é que se encontram vinculados pela legislação. Nos edifícios comerciais, industriais ou de serviços, uma acertada imposição relaciona-se com o LAr (índice de ruído particular de equipamentos do edifício), limitado nas zonas «onde se exerçam actividades que requeiram concentração e sossego»17 , o que revela um critério correcto e necessário em termos legislativos. De resto, apenas existem limitações quanto ao isolamento de sons aéreos entre exterior e interior18, nos espaços interiores, que funcionem como restauração ou escritório19 , o mesmo se aplicando na determinação do valor máximo do tempo de reverberação. Todos os restantes espaços da igreja e da CdM, como o espaço de oração e auditórios, respectivamente, podem assim estar sujeitos (em termos legislativos nacionais) ao ruído do exterior e a um tempo de reverberação indeterminado. 20 Não existe assim a obrigatoriedade de um projecto de condicionamento acústico em alguns espaços, como igrejas ou auditórios. Nestes casos, a consciência colectiva é determinante para uma boa acústica, o que coloca diferentes comportamentos nestas duas tipologias. Na CdM, a acústica é tida como factor essencial, onde um bom projecto estimula muito mais do que o cumprimento da parca legislação vigente. Mas em outras tipologias, como as igrejas, onde não existe a consciencialização da necessidade de se efectuar um projecto acústico, as carências funcionais do projecto só são reveladas posteriormente, como na igreja de Santa Maria. A habitação é a tipologia que se encontra mais protegida pela legislação, mas no que respeita ao isolamento sonoro. Por esta razão é tão difícil de reagir criativamente na concepção acústica de um projecto de habitação, limitando-se muitas equipas projectistas ao mero cumprimento legislativo, o que aliás não é só decorrente em acústica, mas em todas as especialidades e às vezes na própria arquitectura, que se esquece do seu valor crítico e não-comodista. No exemplo da habitação-colectiva da Rua das Pedreiras, o esforço da equipa de acústica é notório, não só no cumprimento natural da legislação
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Este critério de comodidade suplementar está visível na caracterização dos espaços comuns de entrada nos fogos, dotados com tectos fono-absorventes à base de gesso cartonado perfurado com lã mineral, para absorção do ruído nestas zonas e não perturbação no interior do fogo; 22 Vd. Artigo 5.º nº 6 (DL n.º 292/2000) em Anexo, para compreensão do deferimento tácito; 23 CARVALHO, A. P. Oliveira (2001), “O novo regime geral sobre a poluição sonora (RGR): Um passo em frente ou uma oportunidade perdida?”, Ingenium; 21
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vigente, mas acima de tudo, por critérios de conforto suplementares, pensados como fundamentais para uma boa acústica. 21 Esperamos, no entanto, que todas as entidades envolvidas – Cliente, Projectistas e Câmara – estejam cientes da importância do conforto acústico e incorporem estas valências nos projectos e obras, não obstante as permissividades regulamentares: «E tal como em grande parte da legislação entre nós, existe sempre uma porta aberta para não serem tomadas as medidas exigidas, pela figura do deferimento tácito. No artigo 5º n.º 6 22 é referido que a ausência de parecer no prazo de 20 dias entende-se como parecer favorável. Qualquer câmara municipal pode assim não exigir o exigível. É o governo central a claramente autorizar a desresponsabilização dos órgãos do Estado de nível concelhio. Faz-se a lei (adequada e correcta) mas logo no mesmo instante se indica a forma de a não aplicar (e sem ser sancionado por isso).» 22 A acústica em arquitectura tende para uma divisão, numa cada vez maior especialização: Acústica de auditórios, acústica de igrejas, acústica de teatros, acústica de bibliotecas, acústica de salas de aula, acústica de edifícios de habitação, acústica de exteriores, etc. Esta divisão encontra-se expressa na variedade do regulamento (RRAE), que como explicado, revela-se pouco abrangente. O regulamento peca pela referência específica a certos grupos tipológicos, com imposições inadequadas ou desajustadas ao espaço em si. É certo que existem necessidades acústicas diferentes em cada tipologia, mas a linguagem e conceitos principais são os mesmos. O excesso de divisão pode incorrer numa diminuição de competências e exigências ao profissional. Este fenómeno é semelhante em arquitectura, com a actual tendência na especificação; arquitectura de interiores, arquitectura paisagista, arquitectura de exteriores, e deverá ser equacionado como percurso de evolução ou regressão na qualidade arquitectónica.
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arquitecto(s) e acĂşstico(s) ensino prĂĄtica gesamtkunstwerk
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CATT_Acoustic: exemplificação das metodologias de projecto acústico actuais. A imagem acima refere-se ao sistema electroacústico da CdM, mostrando a distribuição da transmissão da palavra (STI), com e sem ruído de fundo.
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SCHAFER, R. Murray (1977), Le paysage sonore [The Tunning of the World], p. 305; ARAU, Higini, “La inmaterialidad creativa del sonido”, Tectónica: acústica, 14: p. 2;
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ensino «O estudo dos sons não entra actualmente nas escolas de arquitectura senão para o interesse em os reduzir, isolar e absorver.»1 Na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP), pertence a uma cadeira semestral, que estuda todo o controlo ambiental do edifício. As matérias abordadas são direccionadas para o acto de reduzir, absorver e isolar, exceptuando na tipologia consagrada da acústica, o auditório. Com uma breve incursão na possibilidade e vantagem da reflexão e difusão sonoras. A construção positiva acústica não é evidenciada como valência qualitativa das várias tipologias, tal como a questão do isolamento sonoro, que é remetido ao cumprimento da legislação. O ensino mantém estes princípios acústicos, numa perspectiva algo limitada do projecto acústico e da importância da Acústica para os arquitectos. Talvez por isso seja uma cadeira que a muitos cause desinteresse pelas matérias focadas, ou nelas não reveja a sua potencial intervenção. O ensino é o espelho das limitações reais e da mentalidade vigente da comunidade dos arquitectos, que se demite, projectualmente, de incorporar novas valências e ferramentas. A Arquitectura reúne conhecimentos de diversas ciências, sendo uma delas a Acústica. Deve por isso ser integrada como conhecimento de e para arquitectos – ensinada por arquitectos – numa adequação da comunicação científica ao domínio artístico, ambos do foro arquitectónico. prática «Un buen orfebre del sonido debe ser capaz de conjugar con delicadeza el diseño, concebido como un arte, y las leyes de la materia, ayudando a conseguir el volumen y la forma exacta dentro de las posibilidades de orden físico, para que el nuevo ser nazca de manera armónica y equilibrada.»2 A prática acústica apresenta, ainda, derivações significativas face ao modelo previsto. Uma das formas de prever a acústica de um espaço, é recorrendo a programas de modelação 3D, como o CATT-Acoustic que, através da representação da forma do espaço e das características dos materiais de revestimento, estabelece a resposta de todos os parâmetros objectivos desejados. Este procedimento é sensível à prática arquitectónica; a elaboração de maquetas em suporte real ou digital, é uma das formas de controlar os efeitos do espaço futuro, real. As modelações virtuais são um auxiliar metodológico corrente em ambas as disciplinas na relação entre o conceito e a materialização deste. Em acústica de salas, antes dos avanços computacionais, recorriase à execução de modelos reais, que eram seguidamente testados. A evolução tem conseguido eliminar alguma das incertezas quanto ao resultado final. A consolidação da acústica como ciência veio retirar o mito do projecto acústico como misterioso e obscuro, que era sentido até ao início do século XX. Até ai, a acústica era deixada ao empirismo, na cópia de modelos de sucesso fortuitos. Mesmo arquitectos como Charles Garnier, que se dedicaram ao estudo da acústica pela constatação da sua importância em arquitectura, acabaram por dever tudo à sorte e não ao conhecimento inequívoco. A imprevisibilidade era ainda bastante elevada: «The credit is not mine; I merely wear the marks of honor. It is not my fault that
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Arquitecto: Alvar Aalto, Auditório da Universidade Politécnica de Espoo (Otaniemi, Helsínqui 1953-66).
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GARNIER, Charles, cit. por. BERANEK, Leo; Concert and Opera Halls – How they sound; XU, Albert, cit. por MENARD, Jean-Pierre, «Les acousticiens», p. 54;
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acoustics and I can never come to an understanding. I gave myself great pains to master this bizarre science, but after fifteen years of labor, I found myself hardly in advance of where I stood on the first day…I had read diligently on my books and conferred industriously with philosophers – nowhere did I find a positive rule of action to guide me; in the contrary, nothing but contradictory statements. For long months, I studied, questioned everything, but after this travail, finally I made this discovery. A room to have good acoustics must be either long or broad, high or low, of wood or stone, round or square, and so forth…Chance seems a dominant in the theatrical [opera house] world as it is in the dream world in which a child enters Wonderland!»3 O estudo aprofundado com recurso a modelações 3D é vocacionado para espaços-auditórios, sejam igrejas, salas de concerto, teatros, discotecas, etc. onde a função acústica apresente uma complexidade elevada. Depende, também, da dimensão física e da capacidade financeira do projecto em si. Numa igreja de pequenas dimensões, o controle do tempo de reverberação é suficiente para garantir uma boa construção acústica positiva. Já numa sala de concertos de dimensões iguais ou superiores à Sala 1 da Casa da Música, justifica-se o controle de mais parâmetros como a Clareza e Intensidade sonora. A eficácia acústica depende da escolha criteriosa dos parâmetros que se deseja controlar. Como em arquitectura, demasiada informação acaba por resultar em ausência de informação palpável ao desenvolvimento e coerência projectual. Na prática arquitectónica, as diversas disciplinas intervenientes na concepção do projecto – entre as quais a acústica – possuem graus de interacção bastante diferenciados. A existência de um conceito é essencial para a harmonia das diversas partes intervenientes, que podem ser descritas como o funcionamento de uma orquestra: «l’acousticien est le premier violon, mais l’architecte, lui, est le chef de orchestre»1 Desta forma, o acústico, como o primeiro violinista, é encarregue de lidar com todos as partes intervenientes. No caso da criação de uma sala de concertos, teatro ou sala polivalente, o acústico comunica com o projectista de iluminação, de ventilação e mesmo com os cenógrafos e músicos ou actores. Na habitação, como referido na habitação multifamiliar da Rua das Pedreiras, o acústico tem de dialogar com o projectista da térmica, ventilação e arquitectura. O encontro do conceito-base é que pode ser diferenciado: ou é estabelecido à priori pelo arquitecto, ou encontrado, simultaneamente, pelas diversas equipas de projectistas. A imposição prévia do conceito do edifício, pela equipa de arquitectura, pareceme lógica e segura, estando por detrás de obras como a Casa da Música, Porto. Esta postura é no entanto decorrente de uma metodologia projectual. Em ateliers formados por equipas multidisciplinares, a concatenação do conceito principal, que motiva as diferentes especialidades, é gerada em conjunto. Em ateliers onde os exercícios de reunião, envolvem deslocações e ateliers diferentes, a discussão prévia do conceito torna-se praticamente impossível e inviável. Este esforço prévio de coordenação conjunta parece utópico, na medida em que os tempos actuais de elaboração projectual parecem querer estabelecer um modelo que se torne acima de tudo rápido e financeiramente viável. Mas a existência, ou não, deste esforço inicial discrimina as obras de arquitectura onde projecto e construção são coincidentes – sem surpresas, derrapagens ou correcções – daquelas onde o projecto não conseguiu domar as vicissitudes da construção. Certamente por isso, o funcionamento interdisciplinar, usual em Espanha, corresponde a um estranho sucesso da obra e projecto, face a alguma da descoordenação que assistimos no processo arquitectónico em Portugal. Esta colaboração em fase embrionária entre acústica e arquitectura, foi,
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Acústico: Higini Arau, Auditório de la Ciudad de Léon (Mansilla y Tuñon).
JONES, Peter Blundell et KANG, Jian (2002), “Acoustic form in the Modern Movement”, p. 82; Vd. exemplo Vuosenniska kirkko, “humanização da arquitectura: importância dos elementos sensoriais”; 7 Manfred Kerkel, «Esoterik und formale Gestaltung in Skrjabins Spätwerken» cit. por FÖLLMER, Golo et GERLACH, Julia, „ Audiovisions. Music as an Intermedia Art Form.“ - sobre o compositor russo e proclamado como sensível a percepções sinestéticas Alexander Skrjabin (1872–1915); 5 6
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particularmente importante no Movimento Moderno. Os grandes maestros não eram autónomos e isolados no desenvolvimento projectual, mostrando um diálogo fundamental para a integração da acústica como ciência ao serviço da arquitectura. As parcerias de Le Corbusier com Gustave Lyon (ainda que o projecto não tenha sido concretizado), deram o mote para futuras frutuosas colaborações. Em pleno desenvolvimento da acústica arquitectural, o processo criativo da Berlin Philarmonie foi único na transformação do conceito inicial de Hans Scharoun na forma final desenvolvida por Cremer. O conceito funcional de Música no Centro, tinha e tem, como contrapartida acústica principal, a natureza directiva de cada instrumento. O encontro final foi derivado de uma actividade projectual conjunta:«Cremer struck a bargain with Scharoun: if they were to pursue the difficult and risky idea of music in the round, Cremer must be allowed freedom to make the forms work acoustically. Scharoun agreed and a fruitful collaboration ensued: Cremer said later that Scharoun was the best architect he had ever worked with, for he always managed to change things to accommodate the acoustician’s demands without destroying his own concept.»5 Esta é a base da prática acústico-arquitectónica promovida por Higini Arau. O trabalho inicial em estrita coordenação com o arquitecto é frutuoso na qualidade espacial. Os trabalhos de Alvar Aalto em espaços religiosos, nos anos 30, apontavam já uma preocupação primordial no estudo acústico, particularmente no estudo das reflexões geométricas do som, já confirmadas como importantes para a inteligibilidade da palavra6. A inexistência deste estudo em Siza é estranha, dada a existência de uma identidade arquitectónica entre estes dois arquitectos. Aliás, mesmo em outras tipologias, a qualidade acústica nas obras de Siza Vieira revela-se pelas suas deficiências. Alvar Aalto, formalmente, optou pelo anfiteatro em trapézio, sendo a sua utilização quase exclusiva nos auditórios para música, como o Kultuuritalo, e a Finlandia Concert Hall, ambos em Helsínquia. A utilização deste modelo no Auditório da Universidade Politécnica de Espoo (Otaniemi, Helsínqui 1953-66), revelou um desenho acústico inteligente em relação à limitações do modelo formal em trapézio. O papel de Alvar Aalto, como arquitecto – não obstante a relação directa entre as formas adoptadas e a sua função acústica – é fundamental e percursor da integração da acústica na arquitectura. Não se conhece de facto a este arquitecto nenhuma colaboração com acústicos, como em Corbusier e Scharoun, mas a sua sensibilidade acústica era impressionante, particularmente pela atenção percursora dada a tipologias não consagradas acusticamente. O Paimio Sanatorium, é o maior exemplo desta atenção ao som como conforto psicofisiológico. O arquitecto, como maestro ou músico, não encontrou ainda a sua posição. A materialização do projecto acústico deve ser encontrada de acordo com o conceito acústico do espaço. Este conceito pode partir, apenas, do arquitecto, mas é da discussão embrionária multidisciplinar, que nasce a melhor relação projecto e obra. gesamtkunstwerk «By overcoming all differences, the synthetic Gesamtkunstwerk is meant to immensely expand consciousness and lead to a state of ecstasy. It shall therefore be structured in such a way that all of the five senses fuse together to become a union.” 7 Desde o tempo da Bauhaus que se augurava a reunião das diferentes artes com a ciência. Terá chegado talvez o momento de deixarmos de remeter, acriticamente,
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COPELAND, Roger, “Merce Cunningham e a estratégia da percepção”, in CELANT, Germano (ed), Merce Cunningham, Milano: Edizioni Charta, 1999; p. 145; 8
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a preocupação com o ruído, a palavra ou a música, exclusivamente a engenheiros, melómanos ou legisladores. Não será o tempo de (re)integrar as preocupações com a acústica no processo projectual arquitectónico? Longe de querer retirar à técnica, o que é da técnica, não nos podemos demitir da responsabilidade ética na nossa função fundamental, a criação de espaços habitáveis. Foi demonstrado que a audição, embora de uma forma menos exuberante que a visão - no foro psicofisiológico - tem um peso decisivo na sensação de conforto num espaço. Em arquitectura e acústica, o caminho de integração entre arte e ciência é curto, mas encontra reminiscências em outras expressões da História, seja com Wagner, a Bauhaus ou Aalto. Com a síntese das artes, as óperas de Wagner, em Bayreuth eram uma expressão de sinestesia sensorial: o som puro sem a distracção do corpo da orquestra, e, por outro lado, a focalização visual na cena, sem a distracção da estrutura social das óperas italianas, na lógica do ir para ser visto. No espaço cenográfico, autores como Bertolt Brecht eram contra a síntese wagneriana, já que esta apoiava a imersão medieval misticista e passiva, associando-a aos ideais culturais da Alemanha nazi. O princípio da separação de Brecht, na composição da cena, defendia a separação entre som, movimento e cenário: «Enquanto a expressão ‘Gesamtkunstwerk’ (ou ‘obra de arte integrada’), implicar que a integração é desordem, que as artes devem ‘fundir-se’, os vários elementos serão todos igualmente despromovidos e cada um funcionará como simples ‘alimento’. O processo de fusão estende-se ao espectador, que é também lançado para dentro do caldeirão e se transforma numa parte passiva (sofredora) da obra de arte total.(…) Qualquer coisa destinada a provocar hipnose acaba por induzir uma embriaguez sórdida ou criar nevoeiro; é preciso acabar com ela. Palavras, música e cenário têm de se tornar mais independentes uns dos outros.»8 Com Paimio, a síntese das diversas funções psicológicas, fisiológicas e sociais é mais equilibrada e frutuosa na concepção geral do espaço arquitectónico. Provoca a sensação de espaço sinestético, um espaço onde a sua vivência é entendida como multisensorial, superando o funcionalismo físico e alcançando um funcionalismo humano. A derradeira função do espaço arquitectónico é constituir-se como Gesamtkunstwerk, como obra de arte total. Se primeiramente o podemos observar na síntese das artes bauhasiana e wagneriana, também o podemos encontrar na síntese funcional aaltiana. Esta síntese ultrapassa a união das artes, para reiterar a nova reunião, da arquitectura com as ciências. A Arquitectura como obra de arte supera o estatuto artístico da sua concepção, através da integração de diversas ciências, sendo uma delas, a Acústica.
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III
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TEXIER, Simon, “Gustave Lyon: architecture et acoustique du Trocadéro à Pleyel», Moniteur architecture AMC, Fevereiro 2001, n.113, p.72-77;
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http://search.epnet.com/login.aspx?direct=true&db=bvh&an=493375, [05.08.29];
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créditos de imagem Espaço e Som p.22 p.39;
DOMENECH, Francesc Daumal, “La arquitectura del sonido”, Tectónica: acústica, 14, BERANEK, Leo; Concert and Opera Halls – How they sound; New York: ASA, 1996, p.239; Imagem Autora [040322];
p.26
DÍEZ, José Maria Marzo et ROSELLÓ, Graciela, “Introducción a la acústica arquitectónica”, Tectónica: acústica, 14: p.5;
p.28
DÍEZ, José Maria Marzo et ROSELLÓ, Graciela, ibidem, p. 6;
p.30
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, London: E&FNSpon, 1993, p.21; HENRIQUE, Luís L., Acústica Musical, op. cit, p. 764;
p.32
HENRIQUE, Luís L., Acústica Musical, op. cit, p. 787 e p.775; (Ginn 1978)
p.36
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit p. 243; Imagem Eduarda Silva [2005];
p.38
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit. p. 241; BARRON, Michael, ibidem, p. 245;
p.40
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit. p. 242; SMITH, T. Gordon (ed), Vitruvius on Architecture, New York: The Monacelli Press, Inc., 2003, p.165;
p.42
RASMUSSEN, Steen Eiler, “Hearing architecture” in Experiencing Architecture, Cambridge, The Massachusetts institute of Technology, 1962, p. 228;
p.44
SHERIDAN, Ted et VAN LENGEN, Karen, “Hearing Architecture: Exploring and Designing the Aural Environment.”, in Journal of Architectural Education, Nov2003, Vol. 57 Issue 2, p.40;
p.46
DIAS, Pedro, História de Arte em Portugal, O Gótico, Vol.4, Lisboa: Publicações Alfa, S. A., 1986; p. 10;
p.48
MANFRED, Sack, “On the Mysterious Relationship of Music and Architecture”, HDA Dokumente zur Architektur 8: Architecture Music, Junho 1997, p.16;
p.50
CARVALHO, A. P. Oliveira et MORGADO, A. E.J., et HENRIQUE, Luis, “Analysis of Subjective acoustic measures and speech intelligibility in Portuguese churches”, 131st Meeting of the Acoustical Society of America, Indianapolis , EUA, 13-17 Maio 1996, p. 21;
p.52
DE BOER, Henriette Posthuma, Concertgebouw & Royal Concertgebouw Orchestra, Amsterdam, Ámsterdam: Ludion, 2003, p. 10; DE BOER, Henriette Posthuma, ibidem, p. 23;
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p.54
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit p. 4; (V. Louis, 1782)
p.56
BERANEK, Leo, Concert and Opera Halls – How they sound; op. cit., p.235; MENARD, Jean-Pierre, «Les acousticiens», Moniteur architecture AMC, Novembro 1994, 56: p.54;
p.58
JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”, Architectural Research Quarterly, Cambridge University Press, vol. 7. no 1, 2003, p. 76; JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, ibidem, p. 76; AAVV , “Winged heroics: bandstand, Bexhill-on-Sea, England“ , Architectural review, 2002 Abr., v.211, n.1262, p.38; AAVV , “Winged heroics: bandstand, Bexhill-on-Sea, England”, ibidem, p.38;
p.60
TEXIER, Simon, «Gustave Lyon: architecture et acoustique du Trocadéro à Pleyel», Moniteur architecture AMC, Fevereiro 2001, n.113, p.75; BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit p. 83;
p.62
TUOMI, Timo et al (ed), Alvar Aalto em sete edifícios: Interpretações do trabalho de um arquitecto, [catálogo exposição Kusthalle Helsinki 1998 e Centro Comercial de Belém 1999,] Helsinki: Museu de Arquitectura Finlandesa, 1999, p. 12 REED, Peter (ed), Alvar Aalto: Betweeen Humanism and Materialism, New York: The Museum of Modern Art, 1998, p.166;
p.64
JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”, op. cit, p.78; REED, Peter (ed), Alvar Aalto: Betweeen Humanism and Materialism, New York: The Museum of Modern Art, 1998;
p.66
JONES, Peter Blundell et KANG, Jian, “Acoustic form in the Modern Movement”, op. cit, p.78; TUOMI, Timo et al (ed), Alvar Aalto em sete edifícios: Interpretações do trabalho de um arquitecto, op. cit., p. 115;
p.68
GRIFFITHS, Paul, A Música Moderna, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1987, p. 140 GRIFFITHS, Paul, ibidem, p. 157; SHERIDAN, Ted et VAN LENGEN, Karen, “Hearing Architecture.”, op. cit, p.41;
p.70
BERANEK, Leo, Concert and Opera Halls – How they sound; op. cit., p.58;
p.72
BARRON, Michael, Auditorium Acoustics and Architectural design, op. cit p. 98;
p.74
Imagem Autora[041106];
p.76
Imagem Marco António [0401]
espaço acústico português p.82
SOPSEC Acústica, “Relatório sobre Recolha de Dados Acústicos para aprovação de Licenciamento da habitação-colectiva da Rua das Pedreiras, Canidelo, V. N. de Gaia”,
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[04.07.09]; p.84
BALONAS projectos, Arquitectura Urbanismo, “Projecto de Licenciamento da habitaçãocolectiva da Rua das Pedreiras, Canidelo, V. N. de Gaia” [05.01];
p.86
BALONAS projectos, Arquitectura Urbanismo, ibidem;
p.88
BALONAS projectos, Arquitectura Urbanismo, ibidem;
p.90
Imagem Autora sobre BALONAS projectos, Arquitectura Urbanismo, ibidem;
p.94
AAVV, Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, Paróquia de Santa Marinha de Fornos: Santa Marinha de Fornos, 1998, p. 75 Imagem [autora 051028];
p.96
AAVV, Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, op. cit, p. 79; Imagem Autora [051028];
p.98
AAVV, Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, op. cit, p. 52; Imagem [autora] sobre AAVV, Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, op. cit, p. 82;
p.100
Imagem Autora sobre AAVV, Igreja de Santa Maria. The Church of St. Mary: Marco de Canaveses, op. cit, p. 79;
p.106
Imagem Autor desconhecido [Maio 2005] FILIPE, Jorge, O Porto visto do céu, Lisboa: Argumentum edições, 2000, p. 127;
p.108
Imagem Autora [050908];
p.110
Imagem Autora [050908];
p.112
Imagem Autora [050922], [050922], [050922] e [050908];
p.113
DURAN AUDIO, “Design and simulation electroacoustic installation” [040724] Imagem Autora, medições acústicas na CdM [050922]
p.124
Imagem Autora;
p.126
Imagem Autora sobre Imagens cedidas pela CdM , Marta Ferreira, Gabinete de Relações Públicas, [0508]
p.128
CdM , Marta Ferreira, Gabinete de Relações Públicas,[0508] Imagem Autora, medições acústicas na CdM [050922]
Acústica e Arquitectura p.134
VIII
Imagem Autora [051026]
Daniela Tomaz
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
p.136
SCHAFER, R. Murray, Le paysage sonore, s.l., J.C. Lattès, 1977, p.169 [com alteração da legendagem de francês para português];
p.140
Imagem Autora [051028];
p.142
“Regulamento dos requisitos acústicos dos edifícios” (RRAE), Decreto-Lei nº 1292002 de 11 de Maio, p.4427;
p.150
DURAN AUDIO, “Design and simulation electroacoustic installation” [040724]
p.152
DOMENECH, Francesc Daumal, “La arquitectura del sonido”, op. cit., p.37; REED, Peter (ed), Alvar Aalto: Betweeen Humanism and Materialism, op. cit., p. 249;
p.154
Tectónica: acústica, 14, p.71;
IX
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Daniela Tomaz
notas biográficas AALTO, Alvar
(1898-1976) Arquitecto finlandês, arauto da regionalização dos ideais do Movimento Moderno na realidade escandinava. As obras mais importantes são “Sanatório Paimio” em Paimio, Finlândia 1928-1933, “Villa Mairea” em Noormarkku, Finlândia 1938-1939 e “Câmara Municipal de Säynätsalo” em Jyväskylä, Finlândia, 1949-1952.
ALBERTI, Leon Battista
(1404-1472)
ARAU, Higini
Doutorado em Física, pela Universidade de Barcelona, Espanha, 1984, e especialista em Acústica. Actualmente exerce a actividade como projectista acústico no ESTUDI ACUSTIC H. ARAU e como professor integrado no Mestrado de Acústica na Universidade Ramon Llull em Barcelona. Em 1988 foi autor de uma fórmula revista do cálculo do tempo de reverberação distinguida internacionalmente. Foi galardoado, entre outros, com o prémio de arquitectura FAD 2000, pela sua colaboração em construções recentes em Espanha.
BACH, Johann Sebastian (1685-1750) BAGENAL, Hope
Consultor acústico britânico 1922 a 1960. Das suas obras destacamse Planning for Good Acoustics 1931, de importância para arquitectos e acústicos, a co-autoria no projecto acústico do Royal Festival Hall, Londres 1951.
BARRON, Michael
Licenciado em Engenharia na Universidade de Cambridge, com estudos no Institute of Sound and Vibration Research, é professor na Universidade de Bath de acústica arquitectural e pratica consultoria acústica. Realizou um Inquérito Acústico a Auditórios Britânicos, possuindo publicações no âmbito da acústica de auditórios.
BERANEK, Leo
(1914-) Doutorado em Ciência pela Universidade de Harvard, foi Director Técnico do Laboratório de Acústica no MIT, Massachussets Institute of Technology. Foi consultor acústico de diversas salas de concerto, entre as quais, a “Aula Magna de Caracas”, a “Ópera de Tóquio” e a “Sala de Concertos de Jerusalém”. É uma das personalidades no campo do som e acústica.
CARVALHO, A. P.Oliveira Licenciado em Engenharia Civil pela FEUP e Doutorado em Acústica Arquitectónica pela Universidade da Florida, EUA. É actualmente Professor Associado e Director do Laboratório de Acústica da FEUP, sendo autor ou co-autor de 60 trabalhos na área da Acústica Ambiental e de Edifícios.
CORBUSIER, Le
X
(1887-1965) Arquitecto francês de origem suiça formado pela École d’Art em La Chaux-de-Fonds. Impulsionador do Movimento Moderno na Arquitectura com a elaboração da Carta de Atenas em 1933, foi autor de diversas obras entre as quais, «Villa Savoye », Poissy-sur-Seine, França
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Daniela Tomaz
1928, onde aplicou aqui os «5 pontos para uma nova arquitectura» e «Unité d’Habitation», Marseille, França 1947-1952, onde estabeleceu a prática da construção modularizada e possibilitou ao arquitecto estudar as proporções humanas sintetizadas no «Modulor». CHION, Michel
Professor da Universidade Paris III. É cineasta, vídeo autor, compositor de música concreta, investigador e ensaísta. É autor de Le son em 1998, La Audiovisión e La música en el cine.
CREMER, Lothan
(1905-1990).
DOMENECH, F. Daumal
Arquitecto e catedrático na Universitat Politécnica de Catalunya (UPC), é professor de Acústica na Escola Técnica Superior d’Arquitectura de Barcelona (ETSAB). É igualmente consultor acústico.
GROPIUS, Walter
(1883-1969) Arquitecto alemão. Estuda em Munique e Berlim antes de participar do estúdio de Behrens em 1907, onde completa sua formação. É o mentor do projecto da escola Bauhaus. As principais obras são a Fábrica Fagus, em Alfed an der Leine, Alemanha 1911, “Bauhaus – Dessau”, sede da Staatliche Bauhaus em Dessau, Alemanha 1925 e Impington Village College, Cambridgeshire, Inglaterra 1936.
JONES, Peter Blundell
Arquitecto inglês. Professor de arquitectura na Universidade de Sheffield e autor de monografias sobre Scharoun e Häring. Trabalha correntemente numa monografia de Gunnar Asplund.
KEIL DO AMARAL, F.
(1910) Arquitecto e urbanista português, formado pela Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, exercendo a actividade na Câmara Municipal de Lisboa com dedicação à criação e renovação de parques e jardins, em especial em Monsanto e no Campo Grande. Foi galardoado com a medalha de ouro da Exposição Internacional de Paris em 1937 e com o prémio municipal de arquitectura. Publicou ainda as obras “A Arquitectura e a Vida” 1942, “A Moderna Arquitectura Holandesa” 1943, e “O Problema da Habitação” 1945.
KOOLHAAS, Rem
(1944-) Jornalista, argumentista e arquitecto holandês, de formação e prática profissional. Funda o OMA, Office for Metropolitan Architecture, em Londres 1975, responsável por variadas obras entre as quais “Educatorium” 1998 e “Casa da Música”, Porto 2005. Das publicações destaca-se “Delirious New York” 1978 e “SMLXL” 1995. É desde 1995 professor na Universidade de Harvard, onde promove o estudo das condições de vida nas cidades.
LYON, Gustave
(1857-1936) Engenheiro civil de Minas e politécnico francês. É responsável pela reabilitação acústica da Sala Trocadero, Paris (19031911), projectação da Salle Pleyel, Paris 1925-27 e parceria com Le Corbusier para a Sociedade das Nações, Genève, 1927.
XI
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Daniela Tomaz
KANG, Jian
Professor de acústica na Universidade de Sheffield. O seu trabalho de investigação centra-se acústica arquitectural e ambiental. Uma das suas obras escritas é o The Acoustics of Long Spaces: theory and design guidance , publicado por Thomas Telford em 2002.
MARTINS DA SILVA, P.
Doutorado em Ciências de Engenharia em 1975, com agregação em Física em 1988. Actualmente é Investigador-Coordenador no LNEC e Professor catedrático convidado na FCL.
MEYER, Hannes
(1889-1954) Arquitecto suíço, de pensamento racionalista. Uma das obras que o caracteriza é a Escola Alemã de Comércio em Bernau 192830.
PALLADIO, Andrea
(1518-1580)
PATRÍCIO, Jorge V.
Licenciado em Engenharia Civil (1987), e doutorado em Engenharia Civil pela Universidade Técnica de Lisboa, no IST. É actualmente Investigador Auxiliar do LNEC, exercendo funções no Núcleo de Acústica e Iluminação do Departamento de Edifícios.
PITÁGORAS
(c.570-497 a.C.), matemático grego, foi o pai da acústica musical, descobrindo as relações físicas e matemáticas dos sons musicais. Acreditava também na harmonia das esferas: “ a distância entre os planetas bem como o seu movimento estavam relacionados com intervalos musicais, e que cada planeta emitia um som proporcional ao seu peso. Estes sons eram completamente concordantes, podendo produzir uma bela melodia.”
SABINE, W. Clement
(1857-1920) Físico norte-americano fundador da acústica arquitectural como ciência. A sua maior descoberta é a equação do tempo de reverberação a 29 de Outubro de 1898, aplicada pela primeira vez no Boston Symphony Hall em 1900, uma das três melhores salas de concerto mundiais (Beranek 1996).
SHAFER, R. Murray
(1933-) Compositor de música canadiano e autor de inúmeros livros, dos quais The Tunning of the World é a síntese.
SCHAROUN, Hans
(1893-1972) Arquitecto alemão, com ligações ao pensamento Expressionista. Projectou a Geschwister Scholl High School em Lunen, Westphalia (1962) e ficou conhecido pela projectação de teatros e salas de concerto como a Berlin Philharmonie Building (1956-63).
SIZA VIEIRA, Álvaro
(1933-) Licenciado em Arquitectura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto e doutorado “Honoris Causa” por algumas Universidades entre as quais Valência, Lausanne e Palermo. Exerce actualmente a profissão de arquitecto na cidade do Porto, sendo autor de numerosos projectos em Portugal, Espanha, França, Holanda, Bélgica, Itália e Alemanha. Da sua vasta obra construída integra “Casa de chá da Boa Nova”, Leça da Palmeira 1958-63; “Piscina das marés” Leça da Palmeira 1961-66; “Bairro social Quinta da Malagueira Évora” 1977.
XII
Daniela Tomaz
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
STOCKHAUSEN, Karlheinz (1928-) Compositor, professor de música e maestro alemão, com formação em piano e pedagogia musical na Escola Superior de Música de Colónia e de línguas germânicas, filosofia e musicologia na Universidade de Colónia. Investigador dos sons concretos, é percursor da criação da música electrónica. Até 1973, compôs mais de cinquenta obras, com as quais já foram editados mais de cinquenta discos. Trabalha, desde 1977, na composição de um ciclo musical de teor dramático sobre os sete dias da semana, denominado Licht (“Luz”). VARÈSE, Edgard
(1883-1885) Compositor francês, com estudos em engenharia e música. É o autor de “Hyperprism” em 1923, “Poéme Electronique” em 1958 e do conceito de música como “som organizado” (Vd. CAGE, John).
XENAKIS, Iannis
(1922-2001) Engenheiro e compositor francês de origem grega. Licenciado em engenharia em Atenas e trabalhou em Paris como arquitecto para Le Corbusier depois da II Grande Guerra. Estudou composição com Darius Milhaud and Olivier Messiaen. É o autor da peça «Metastasis» e do conceito de “música estocástica”, ideia de massas sonoras movendo-se pelo espaço e tempo.
WAGNER, Richard
(1813-1883) Compositor, poeta alemão. Criador do conceito gesamtkunswerk, ou obra de arte total, que procurava aplicar na sua obra musical inserido no género do teatro de ópera. Das suas obras destacam-se “Tristão e Isolda” 1865 e “Parsifal” 1882.
XIII
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
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Regulamento Geral do Ruído_excertos “Regulamento Legal da Poluição Sonora” (RLPS), Decreto-Lei nº 2922000 de 14 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 2592002, de 23 de Novembro.
Artigo 3º 3 - Para efeitos do presente diploma, entende-se por: a) Actividades ruidosas – actividades susceptíveis de produzir ruído nocivo ou incomodativo, para os que habitem, trabalhem ou permaneçam nas imediações do local onde decorrem; b) Actividades ruidosas temporárias – as actividades ruidosas que, não constituindo um acto isolado, assumem carácter não permanente, tais como obras de construção civil, competições desportivas, espectáculos, festas ou outros divertimentos, feiras e mercados; c) Avaliação acústica – a verificação da conformidade de situações específicas de ruído com os limites estabelecidos; d) Mapa de ruído – descritor dos níveis de exposição a ruído ambiente exterior, traçado em documento onde se representem as áreas e os contornos das zonas de ruído às quais corresponde uma determinada classe de valores expressos em dB(A); e) Períodos de referência: i) Período diurno, das 7 às 22 horas; ii) Período nocturno, das 22 às 7 horas; f) Ruído de vizinhança - todo o ruído não enquadrável em actos ou actividades sujeitas a regime específico no âmbito do presente diploma, habitualmente associado ao uso habitacional e às actividades que lhe são inerentes, produzido em lugar público ou privado, directamente por alguém ou por intermédio de outrem ou de coisa à sua guarda, ou de animal colocado sob a sua responsabilidade, que, pela sua duração, repetição ou intensidade, seja susceptível de atentar contra a tranquilidade da vizinhança ou a saúde pública; g) Zonas sensíveis – áreas definidas em instrumentos de planeamento territorial como vocacionadas para usos habitacionais, existentes ou previstos, bem como para escolas, hospitais, espaços de recreio e lazer e outros equipamentos colectivos prioritariamente utilizados pelas populações como locais de recolhimento, existentes ou a instalar; h) Zonas mistas – as zonas existentes ou previstas em instrumentos de planeamento territorial eficazes, cuja ocupação seja afecta a outras utilizações, para além das referidas na definição de zonas sensíveis, nomeadamente a comércio e serviços.
Artigo 4º 3 a) As zonas sensíveis não podem ficar expostas a um nível sonoro contínuo equivalente, ponderado A, LAeq, do ruído ambiente exterior, superior a 55 dB(A) no período diurno e 45 dB(A) no período nocturno; 3 b) As zonas mistas não podem ficar expostas a um nível sonoro contínuo equivalente, ponderado A, LAeq, do ruído ambiente exterior, superior a 65 dB(A) no período diurno e 55 dB(A) no período nocturno. 6 - É interdito o licenciamento ou a autorização de novas construções para fins habitacionais e a construção de novas escolas ou hospitais ou similares em zonas classificadas como sensíveis ou mistas ou onde não vigore plano de urbanização ou de pormenor sempre que se verifiquem valores do nível sonoro contínuo equivalente ponderado A, do ruído ambiente no exterior, que violem o disposto no nº 3.
XIV
Daniela Tomaz
ARQUITECTURA e ACÚSTICA: o espaço sinestético
Artigo 5º 4 - Para efeitos do disposto nos ns. 2 e 3, os pedidos devem ser acompanhados dos seguintes documentos: a) No licenciamento de operações de loteamento e de empreendimentos turísticos e na autorização de localização e na informação prévia - do extracto do mapa de ruído ou, na sua ausência, do relatório sobre recolha de dados acústicos; b) No licenciamento de obras de construção civil - de projecto acústico a ser junto com os restantes projectos de especialidades. (…) 6 - Os projectos acústicos carecem de parecer favorável da entidade licenciadora competente, se esta pertencer a administração central do Estado ou à administração regional autónoma ou, subsidiariamente, da direcção regional do ambiente e do ordenamento do Território (DRAOT) respectiva, entendendo-se a ausência de parecer no prazo de 20 dias como parecer favorável.
Artigo 8º 2 - A instalação e o exercício de actividades ruidosas de carácter permanente em zonas classificadas como mistas, ou nas envolventes das zonas sensíveis ou mistas, ficam condicionados ao respeito pelos limites fixados no nº 3 do artigo 4º e pelo requisito acústico fixado no número seguinte. 3 - A diferença entre o valor do nível sonoro contínuo equivalente, ponderado A, LAeq, do ruído ambiente determinado durante a ocorrência do ruído particular da actividade ou actividades em avaliação e o valor do nível sonoro contínuo equivalente, ponderado A, LAeq, do ruído ambiente a que se exclui aquele ruído ou ruídos particulares, designados por ruído residual, não poderá exceder 5 dB(A) no período diurno e 3 dB (A) no período nocturno, consideradas as correcções indicadas no anexo I.
XV
Bernhard Leitner; SoundCube; 1971(capa e contra-capa)