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introdução

O presente Trabalho Final de Graduação (TFG), para o curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), foi desenvolvido sob o contexto da pandemia de COVID-19. Nesse sentido, é importante destacar que o TFG foi elaborado de acordo com as restrições e limitações que o isolamento socioespacial promove, ainda que sempre buscando manter a qualidade e o empenho. Assim, o nível de participação social, o envolvimento, as visitas inloco e o acesso aos dados - os quais são extremamente necessários para que haja uma aproximação com a realidade -, foram dificultados devido a todo este panorama atual.

A relevância do presente trabalho relaciona-se ao fato de trazer à tona duas questões de extrema importância para a sociedade contemporânea: o conceito ampliado do habitar e sua relação com os processos participativos nos projetos de arquitetura e urbanismo. A discussão do conceito ampliado do habitar se faz importante à medida que se compreende que o habitar não se trata apenas da unidade habitacional em si, mas sim de toda uma discussão de direitos à cidade, saúde, educação, esporte, lazer, cultura e, inclusive, à natureza. Já os processos participativos se integram nessa discussão uma vez que se apresentam como uma das formas de responder aos problemas político-sociais das cidades ao incluir a opinião, os valores e o desejo dos usuários, garantindo cidadania e democracia na concepção dos espaços (BARONE, 2004). Assim, ao dar voz aos usuários, levando-os à efetiva apropriação e identidade com o espaço construído, as chances de se alcançar um projeto de arquitetura e urbanismo mais adequado e pertinente são maiores.

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Nesse sentido, este TFG possui como objetivo geral apresentar uma proposta de implantação de um assentamento agroecológico para um acampamento de famílias ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Esse acampamento denomina-se Marielle Vive e localiza-se em Valinhos (SP). O desafio deste TFG se relaciona justamente ao fato de se projetar neste cenário: um assentamento agroecológico em um terreno ocupado por famílias ligadas ao MST na Zona Rural da cidade. E como objetivo específico, devido a todas as restrições que o contexto de pandemia apresenta, bem como as restrições físicas do próprio território, este TFG buscou apresentar uma resposta projetual mais detalhada para a centralidade principal do atual acampamento que, por possuir a Catenária, a Horta Mandala e todos os serviços coletivos como a ciranda, a cozinha comunitária e a enfermaria, já se enquadra como um espaço importante e reconhecido pelos acampados. Neste sentido, a escolha de seguir com o detalhamento desta área do assentamento seria a contribuição mais relevante como um produto de TFG para subsidiar a comunidade no atual momento do acampamento e, ao mesmo tempo, condizente com os prazos do calendário deste ano letivo.

Para tanto, optou-se por realizar um projeto participativo a fim de identificar e reconhecer as reais necessidades dos sujeitos, isto é, as demandas e preferências dos moradores no que tange ao programa de necessidades. Em projetos participativos o usuário (que no caso desta pesquisa é um coletivo de pessoas) participa de todo o processo, compondo todo o escopo das decisões relacionadas ao projeto, seguindo as metodolo-

gias previamente definidas. Este tipo de projeto é importante para que além de ampliar o repertório arquitetônico, as famílias consultadas compreendam seus direitos como cidadãos e saibam como reivindicá-los (LANA, 2007). Ainda que alguns dos processos e atividades não tenham sido realizadas devido a todo o contexto da pandemia, foi possível, por meio de algumas visitas e consultas à lideranças, chegar a um programa de necessidades e a uma proposta de implantação correspondente às necessidades dos usuários e moradores.

Deste modo, os métodos a serem utilizados nesse projeto são descritos a seguir: 1. Revisão bibliográfica sobre os temas pertinentes à pesquisa: literatura relacionada a temas como a cidade contemporânea neoliberal, o direito à cidade e à cidadania, a crise urbana e a urbanização brasileira, a relação entre reforma agrária e reforma urbana, movimentos sociais de luta pela terra, processos participativos, diretrizes ambientais e de sustentabilidade e o conceito ampliado do habitar. 2. Estudos de casos na literatura: estudo de referências de possibilidades de morfologia, arranjos de habitação coletiva e assentamentos agroecológicos, ecovilas e/ou cohousings. 3. A partir destes levantamentos, realizou-se consultas a algumas lideranças do acampamento Marielle Vive para que fosse possível identificar e reconhecer suas necessidades, demandas e preferências relacionadas às suas expectativas relacionadas ao futuro assentamento e às moradias. Para isso, foram realizadas duas visitas ao acampamento, anteriormente ao início da pandemia. Além disso, algumas lideranças, coordenação e apoiadores do acampamento foram consultados e, este contato foi facilitado pelo grupo de trabalho (GT) criado na UNICAMP, do qual fazemos parte.

Deste modo, a partir dessas consultas foi possível identificar algumas pistas e preferênciaspara a elaboração das diretrizes de implantação e do Programa de Necessidades. Em suma, este memorial subdivide-se em quatro livretos. O primeiro se dirige à explanação do contexto da temática referente à luta por direitos na cidade neoliberal. O segundo aos conceitos estruturadores que fundamentam o projeto. O terceiro se dirige à análise física e socioeconômica do lugar onde se encontra a área de intervenção. E, o quarto, ao detalhamento do projeto.

“Preso à minha classe e a algumas roupas, vou de branco pela rua cinzenta. Melancolias, mercadorias espreitam-me. Devo seguir até o enjôo? Posso, sem armas, revoltar-me? Olhos sujos no relógio da torre: Não, o tempo não chegou de completa justiça. O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera. O tempo pobre, o poeta pobre fundem-se no mesmo impasse. Em vão me tento explicar, os muros são surdos. Sob a pele das palavras há cifras e códigos. O sol consola os doentes e não os renova. As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase. (...)”

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