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ALGARVE INFORMATIVO Revista semanal - 5 de outubro, 2019

«3651 ALGARVE» ESTÁ DE REGRESSO | «QUANDO ELA É ELE» | «MEDEIA» |ALGARVE RAFAEL CORREIA INFORMATIVO #221 LEONARDO DA VINCI RECORDADO EM ALBUFEIRA | FOME |TEMPORADAS RUSSAS EM LOULÉ


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18 - «365 Algarve» está de regresso

68 - «O Relatório da Coisa»

30 - FOMe em São Brás de Alportel

56 - Rafael Correia/Sickonce/Gijoe ALGARVE INFORMATIVO #221

100 - Leonardo da Vinci recordado em Albufeira 8


80 - «Quando Ela é… Ele»

124 - Dia Mundial do Turismo

152 - Semana Europeia do Desporto

112 - «O Sul de Sophia» em Lagos 42 - «Medeia» em Loulé OPINIÃO 136 - Paulo Cunha 138 - Adília César 140 - Ana Isabel Soares

90 - Temporadas Russas em Loulé 9

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365 Algarve regressa para trilhar antigos e novos caminhos da paisagem humana algarvia Texto: Daniel Pina 19

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quarta edição do 365 Algarve arranca em outubro e traz um novo conceito, para além de novas propostas culturais. De outubro de 2019 a maio de 2020, o ciclo de programação parte de uma ideia de território enquanto paisagem à escala humana, que se pode percorrer a pé. Porque um dos principais eixos para se refletir sobre a ideia de Europa é exatamente a relação com a geografia que habitamos.

trilhos da memória de um Algarve dos anos 1930 e 1940, este novo projeto oferece experiências culinárias em locais monumentais, passeios nas hortas, com colheita de alimentos e aulas de culinária, numa grande festa dedicada à mesa das famílias algarvias. Com atividades em outubro, novembro e dezembro de 2019, e depois mensalmente entre fevereiro e maio de 2020, este é um elogio à mesa da avó, para que todos o possam experienciar, num festival que quer sentar à mesa gerações de residentes e visitantes, numa grande festa familiar.

O 365 Algarve propõe uma programação que vai permitir, através do ritmo do caminhante, conhecer melhor praças e ruas, os detalhes do espaço comum e a beleza do nosso património, como é o caso do Festival da Comida Esquecida. Pelos

Outra novidade que frisa o tema desta quarta edição é o programa «(A)Prender-me no Algarve». Assim, a bordo de uma carrinha pão de forma, revisita-se e aprende-se sobre o património, costumes, tradições e

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musicalidades do que constitui e formou o povo algarvio. Uma vez por mês, entre outubro de 2019 e maio de 2020, esta é uma experiência que vai levar os participantes a viajar, física e metaforicamente, pelo tempo e pela história da paisagem humana local. Também pela primeira vez na programação do 365 Algarve, o «Out (In)verno» traz uma oferta na área do astro-turismo, fazendo a ligação entre as artes e a divulgação científica através de concertos temáticos, caminhadas e oficinas de ciências. Um evento que vai animar as noites entre 1 a 3 de novembro e que se repete em janeiro e maio de 2020. Claro que o público pode contar com a continuação de eventos de referenciado 365 Algarve como o «Lavrar o Mar», com cerca de 90 sessões, entre Aljezur e 21

Monchique, num novo ciclo de programação em que se dará especial destaque para as já tradicionais sessões de novo circo na passagem de ano, reunindo algumas das melhores companhias europeias do género. Outro emblemático projeto do 365 Algarve é o «Jazz nas Adegas», que tem tido cada vez mais procura de público, quer nacional, quer internacional, e que continuará com sessões duplas por concerto. Em novembro, o LUZA – Festival Internacional de Luz do Algarve mudase para Faro, invadindo o seu centro histórico para um fim de semana inigualável. Em março, o Festival do Contrabando retorna à Vila de Alcoutim para recordar os trilhos que os contrabandistas tinham na região ALGARVE INFORMATIVO #221


raiana. Centrando-se num legado cultural e histórico de memória coletiva recente na região e em toda a zona fronteiriça, ainda é possível recordar os percursos e procedimentos dos contrabandistas dos anos 1930 e início dos anos 1940, com o fim da guerra civil espanhola e o início da Segunda Grande Guerra a moldarem as vivências das populações. A propósito dos 120 anos do nascimento do poeta popular, António Aleixo, a Rede Azul – Rede de teatros do Algarve, encomendou o espetáculo, «Diz-me António» a três artistas algarvios. Entre dezembro e maio, este projeto que inclui dança, música e spoken word vai envolver os espetadores e pessoas da comunidade, incluindo ainda uma visita guiada que permitirá um envolvimento muito concreto com o local de acolhimento do espetáculo. Com enorme destaque a nível

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nacional, na sua estreia, a segunda edição do FICLO – Festival Internacional de Cinema e Literatura de Olhão, integra a programação do 365 Algarve, contando com uma residência artística de um argumentista de renome internacional, para além do festival, que ocorre entre fins de março e inícios de abril, em vários espaços do concelho de Olhão. Promovido pelo Cineclube de Tavira, esta é uma nova proposta na região, que foi também convidada a estar representada no Festival de Cannes 2019. O Festival Verão Azul acontece entre outubro e novembro e traz ao Algarve nomes de internacional relevo nas artes performativas contemporâneas, como Niño de Elche (música/flamenco) e Alessandro Sciarroni (Leão de Ouro da Bienal de

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Veneza de 2019). Na nona edição do festival, de realçar o investimento na criação de espaços de interação e encontro entre artistas, a comunidade e o público, em Faro, Lagos e Loulé. Ainda durante o mês de outubro, o evento «Poesia a Sul» vai invadir a cidade de Olhão com inúmeras atividades ligadas à poesia, incluindo música, exposições, workshops e mesas redondas. Poetas de cerca de 30 23

nacionalidades reúnem-se neste encontro internacional que vai ainda promover sessões em Tavira, Faro e Sevilha. Proposta estreante no 365 Algarve, o LAC Open Days – LAC Laboratório de Atividades Criativas tem uma forte componente de arte urbana e pretende mostrar o trabalho dos artistas em ALGARVE INFORMATIVO #221


residência no espaço do LAC, em Lagos. Integrado no projeto estão ainda visitas ao circuito de arte urbana em Lagos, workshops de stencil e um roteiro de arte contemporâneo por territórios de baixa densidade que foram alvo de intervenções artísticas criadas no âmbito do «WATT?:», um projeto artístico para a comunidade, promovido em 2016. As várias propostas acontecem em outubro e dezembro de 2019 e em 2020, mensalmente até ao mês de maio. «Em Canto pela Algarviana» é outro projeto inédito que se mostra, pela primeira vez, na programação do 365 Algarve, promovido pelo Grupo Coral Ossónoba. Um conjunto de seis passeios em troços específicos da Via Algarviana, que serão reforçados com momentos musicais feitos a partir do reportório do grupo. A experiência é complementada com momentos gastronómicos em ALGARVE INFORMATIVO #221

restaurantes do percurso ou com a participação em festas tradicionais de algumas das localidades, como é o caso da Festa do Pão Quente e do Queijo Fresco de Vaqueiros, em Alcoutim. Mensalmente entre outubro de 2019 e março de 2020. Após uma concorrida terceira edição, o Festival Internacional de Piano do Algarve regressa a Portimão, Loulé e Faro, com 10 concertos. O festival tem início em novembro de 2019, com a atuação da Zhejiang Symphony Orchestra, da China, regressando depois todos os meses, entre janeiro e abril de 2020. Em fevereiro será a oportunidade de receber o Festival Amendoeiras em Flor, que durante dois dias leva ao sítio da Cumeada de Alta Mora, em Castro Marim, um mercado de produtos e artesanato local e regional, com uma forte programação musical tradicional e 24


popular, teatro de rua, atividades para crianças, assentes em jogos tradicionais, gastronomia típica e vários percursos pedestres. A estrela da festa é a amêndoa algarvia, que será celebrada com a confeção de uma torta de amêndoa gigante e com workshops de plantio de amendoeiras, num território tão marcado pela desertificação, despovoamento e envelhecimento da população. Em fevereiro, abril e maio vai-se poder estar «À Babuja». Com encenação de João de Brito, esta é uma nova criação que conta com uma das mais inovadoras e originais vozes da jovem literatura portuguesa, Joana Bértholo. Uma narrativa que tem como inspiração cinco palavras profundamente ligadas ao universo gastronómico algarvio: Alfarroba, Anchova, Medronho, Muxama e Dom Rodrigo. Um cheirinho a Algarve que, com uma original roulotte de comida, vai ocupar zonas públicas de destaque, indo ao encontro dos locais e visitantes.

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Entre fevereiro e maio, os «Encontros do DeVIR» regressam a Faro, Lagos e Loulé. o projeto mantém-se na programação do 365 Algarve e tem-se consolidado junto do público, com propostas cada vez mais em linha com os grandes desafios sociais e culturais que enfrentamos coletivamente. O festival, que tem o propósito de pensar o território, tornando as distâncias geográficas, político-sociais e artísticas mais curtas e compreensíveis, tem como tema deste ano o «Resgate». Vão-se recuperar obras e criadores que foram marcos da história e da arte contemporânea, cruzando esses temas com as questões do combate às alterações climáticas. Em março, abril e maio, a proposta dos Percursos Performativos no Património instala-se em Lagoa para promover passeios encenados a locais marcantes da história e do património do concelho.

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O Ventania – Festival de Artes Performativas do Barlavento acontece também em março, incluindo diversas linguagens artísticas, com predomínio das artes de rua e que, em 2020, terá mais uma vez como base programática as questões ambientais mais diretamente ligadas à água enquanto recurso precioso e escasso. Em maio, realiza-se a quarta edição do Algarve Jazz Gourmet Moments, expandindo-se para fora dos limites do concelho de Lagos, com concertos previstos em Lagoa e Loulé. Além desta programação, as Smooth Jazz Gourmet ALGARVE INFORMATIVO #221

Sessions vão oferecer 35 concertos, distribuídos por restaurantes dos três concelhos envolvidos que acompanharão menus especialmente concebidos para os dias do festival. Ao todo, serão mais de 400 iniciativas culturais que o 365 Algarve vai promover por toda a região e que incluem mais de uma centena de concertos, cerca de 50 espetáculos de teatro e cerca de cem ações relacionadas com o património da região, entre outros eventos . 26


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MARIONETAS ENCANTARAM CRIANÇAS DE SÃO BRÁS DE ALPORTEL Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina ALGARVE INFORMATIVO #221

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manhã do dia 14 de setembro foi de grande festa para os mais pequenos de São Brás de Alportel, em virtude da passagem do FOMe – Festival de Objetos e Marionetas & Outros Comeres pelo Cineteatro de São Brás. O evento, organizado pela ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve em parceria com seis concelhos do Algarve Central, viajou neste dia até ao coração da Serra do Caldeirão com três propostas repletas de magia, ilusão e boa-disposição, que deixaram de sorriso nos lábios as ALGARVE INFORMATIVO #221

dezenas de crianças presentes, mas também os seus pais. Em «STOP», tanto o palco como os bonecos são minúsculos, num espetáculo que pode caber numa pequena mala. No entanto, quando esta se abre, o público pode esperar um verdadeiro milagre, pois as realistas marionetas contam histórias e expressam sentimentos e humores num show sem palavras. A delicada animação de marionetas é realmente especial e as habilidades artísticas do criador e manipulador András Lénárt proporcionaram uma experiência única para os espectadores. 32


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Seguiu-se «Laia e o voo da imaginação», protagonizado por Júlia Barnabé e sua marioneta de fios, Laia, construída à mão em madeira pela artista. Com 22 fios e olhos articulados, Laia personifica uma criança fascinada por pássaros e pintura. Ao brincar, Laia convida a assistência a viajar pelas infinitas possibilidades da sua imaginação e, quando pinta no papel um pôr do sol com gaivotas planando ao redor, ela mesma se torna capaz de voar. No meio dos seus devaneios, vai interagindo com as pessoas do público, dançando, abraçando-as, sentando-se em suas pernas e fazendo pinturas nas suas mãos. Entre marioneta e marionetista há um delicado jogo de ALGARVE INFORMATIVO #221

cumplicidade e afeto, numa narrativa imagética, sem o uso da palavra, que fala sobre a fusão entre o real e o imaginário no universo infantil. Finalmente, em «Cyclose» percebeuse que o nascimento não é o começo e que a morte também não é o fim, pois o ciclo continua. O espetáculo poético criado e interpretado por Margo Gram envolve três marionetas de fios, que criam uma encantadora viagem onírica de imaginação. E, com uma energia contagiante e um delicado desempenho, fascinaram as crianças e adultos que ocuparam a sala de exposições da Galeria de São Brás de Alportel . 34


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COMPANHIA JOÃO GARCIA MIGUEL E MÁRIO LAGINHA LEVARAM «MEDEIA» AO CINE-TEATRO LOULETANO Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

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Companhia João Garcia Miguel juntou-se ao prestigiado pianista Mário Laginha para levar ao Cine-Teatro Louletano, no dia 27 de setembro, uma peça de teatro que recupera questões da tragédia como a redefinição de «Medeia» e do papel da mulher no tecido social. «Medeia» tem texto de Francisco Luís Parreira a partir da tragédia homónima de Eurípides, é representada por Sara Ribeiro e David Pereira Bastos, com direção e encenação de João Garcia Miguel, contando com música original de Mário ALGARVE INFORMATIVO #221

Laginha, interpretada ao vivo. A Companhia João Garcia Miguel põe em evidência a relação entre o passado e o futuro e levanta questões que considera estarem subjacentes à obra de Eurípides – o papel do feminino e a perda do seu poder simbólico, com a transição de uma sociedade matriarcal para outra, de caráter patriarcal, a redefinição do tecido social e político, que daí advém, e a transparência das relações interpessoais, além de entre outras questões que se prendem com a emigração e o estatuto do refugiado. “É neste sentido que a obra mantém atualidade e pertinência no mundo contemporâneo”, considera João Garcia Miguel. 44


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A Companhia João Garcia Miguel recorda que a tragédia levanta “uma questão central sobre os protagonistas da História e a vida dos indivíduos”, componente que considera determinante “na abordagem da obra, em busca das sombras que nos moldam o ser”. A figura de Medeia, nas diferentes lendas, é ambivalente e é símbolo de um período de transição do matriarcado para o ALGARVE INFORMATIVO #221

patriarcado, recorda a companhia. Passa de deusa da cura e da sabedoria, para feiticeira ameaçadora e poderosa e, por fim, para mulher ciumenta e infanticida. Assim, “a feminilidade e, principalmente, a feminilidade dotada de poder, foi desvalorizada e vista como demoníaca, na mesma proporção do crescimento do poder patriarcal”, enfatiza João Garcia Miguel. 46


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DJ E PRODUTOR HÁ MAIS DE 20 ANOS, RAFAEL CORREIA CONTINUA A TER IDEIAS PARA LHE OCUPAR TODOS OS MINUTOS DISPONÍVEIS Texto: Daniel Pina | Fotografia: Camille Leon

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ntre ser o produtor Sickonce e o DJ Gijoe, Rafael Correia anda habitualmente numa roda-viva, envolvido em projetos como a «Moda Vestra», em parceria com João Frade e Ana Perfeito, ou a Grafonola Voadora & Napoleão Mira, que ainda no dia 26 de setembro protagonizou, em Lagos, o fantástico espetáculo «O Sul de Sophia», para além de trabalhos com diversos artistas de hip-hop e de outras sonoridades. E foi no final do século passado, ou do milénio passado, que o estudante de arquitetura adquiriu equipamento de DJ e passou a dedicar algum do seu tempo livre a essa atividade, quando andava na faculdade em Lisboa. De regresso ao Algarve, e já a trabalhar como arquiteto, gravou o seu primeiro disco em 2004 e durante cerca de oito ALGARVE INFORMATIVO #221

anos foi conciliando estas duas facetas. “A música era um hobby muito sério, ou uma segunda profissão, porque, quando saia do emprego, ficava várias horas no estúdio. Muitas coisas que aprendi no curso de arquitetura continuam a ser guias para mim na minha música, assim como conhecimentos que me foram transmitidos por professores. Claro que a arquitetura é mais rigorosa do que outras formas de arte, mas se calhar é essa responsabilidade que me torna um produtor mais metódico”, indica Rafael Correia, à conversa no seu estúdio em Portimão. Depois de trabalhar em alguns ateliers de arquitetura, Rafael Correia ingressou na equipa de Reabilitação Urbana do Município de Portimão, de onde só saiu quando sentiu que necessitava dedicar 58


mais tempo à música. “Não larguei completamente a arquitetura, ainda fiz uma coisa ou outra, mas a música precisava de mais espaço na minha vida e arrisquei”, recorda, lembrando que, no princípio, apenas se interessava pelo scratch, em ter um gira-disco na mesa e aprofundar a sua técnica de hip-hop. Depois, começou a experimentar misturar música, uma coisa levou a outra e, de repente, ia acompanhar grupos de hip-hop e via-se a pôr som nas festas. “Ganhei esse gosto, interessei-me mais pela componente da eletrónica, abri os meus horizontes. Nunca pensei em ser DJ num clube ou discoteca, o que me seduzia eram as técnicas de produção e scratch”, assume o entrevistado. “No emprego, as pessoas mais próximas e as chefias conheciam esta minha outra faceta, tinha a felicidade de conseguir meter uns dias de férias quando se aproximavam

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atuações mais importantes, era só uma questão de mudar o «chip» de forma natural”. Sickonce surge formalmente em 2004/2005, embora o produtor sempre estivesse presente na vida de Rafael Correia quando criava os seus instrumentais. Houve, porém, uma altura em que foi necessário separar as águas, distinguir o que era o DJ e o Produtor. “Eu próprio baralhava um bocadinho as coisas porque as duas vertentes faziam parte intrínseca do meu dia-a-dia. A diferença é que, para ser DJ, não precisava «treinar» e as atuações normalmente aconteciam aos fins-de-semana, davam para conciliar com a arquitetura. Já a criação e produção de discos exigia-me muito tempo”, distingue o algarvio, enquanto nos mostrava a parafernália

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de sintetizadores, teclados e computadores que ocupam o seu estúdio. “Estar sempre a aprender e colocar-me novos desafios foi a forma que arranjei para continuar apaixonado pela produção. Podia continuar a usar instrumentos virtuais no computador, mas esta ligação às máquinas torna tudo mais estimulante. Não critico quem faz tudo no computador, desde que o faça com honestidade, mas esta é a minha forma de trabalhar”, frisa Rafael Correia. Esta postura levou o produtor a ter que aprender toda a teoria musical, não bastava carregar numas teclas dos sintetizadores, e, curiosamente, aprender tornou-se mais fácil a partir do momento em que começou a dar aulas na ETIC_Algarve. “Para ensinar aos outros não posso saber apenas aquilo que preciso para mim. Tive que estudar tudo ALGARVE INFORMATIVO #221

para depois poder explicar como se trabalha com estes equipamentos, o que me abriu os horizontes”, reconhece, acrescentando que ser produtor também lhe escancarou as portas a outros estilos musicais, já que, como Gijoe, estava mais ligado ao hiphop. “Hoje, as sonoridades estão mais fundidas, diluíram-se as fronteiras entre estilos. Quase desde o início da minha carreira que tenho o projeto «Deep:her» com a Emmy Curl e era a única coisa que, na altura, me afastava mais do hip-hop. Levei, de facto, alguns anos até que o produtor Sickonce conquistasse a sua independência do DJ Gijoe. A partir desse momento começaram a aparecer convites para participar em vários projetos, porque a minha paixão é a música, seja qual for o estilo”. 60


QUEM SOBE DEPRESSA TAMBÉM DESCE DEPRESSA A Grafonola Voadora com Napoleão Mira e o «Moda Vestra» são os projetos mais complexos e mediáticos em que Rafael Correia tem estado envolvido no passado recente, e que o catapultaram para um cenário mais fora do hip-hop, mas este continua bem presente no quotidiano do produtor e dj, como se constata com o disco «Porcelana» feito em parceria com Perigo Público. Engane-se, porém, quem pensa que tudo são rosas, nada disso, o Algarve continua a ser uma região periférica e nem todos dão o devido valor a estas duas profissões. “Eu tenho a sorte de dar aulas e de saber fazer outras coisas, como a fotografia e vídeo, que me ajudam a ter uma base financeira estável, mas sinto que estou a fazer um

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trabalho sólido à volta da música e que isso está a ser reconhecido pelos outros. Aliás, como DJ Gijoe só toco em sítios que gosto e onde me sinto completamente à vontade, escolho as datas a dedo. No fundo, são os projetos de produção que me ocupam a maior parte do tempo”, analisa, não negando que, em Lisboa, tudo é mais fácil de acontecer. “Basta ir pôr música num sítio e surgem logo outros trabalhos. A internet não substitui o contato direto com as pessoas do meio, o que significa que, no Algarve, a batalha é mais dura. Mas vamos fazendo o nosso caminho e a longevidade da editora Kimahera é prova disso”. A internet tem todas as vantagens que se lhe reconhecem, mas também tornou o mercado mais global, de modo que

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Sickonce não está a «competir» apenas com os produtores algarvios ou portugueses, mas com produtores de todo o mundo. Assim, para se ter sucesso, para se singrar, é preciso estar constantemente a criar, e com qualidade, algo que, no início, apoquentava Rafael Correia. “Às vezes penso o que acontecerá se esta vontade e inspiração se esgotarem, mas estou constantemente a reinventar-me, experimento coisas novas com as máquinas, exploro as questões que os próprios alunos me colocam. Por enquanto tenho ideias para me ocupar todos os minutos que tenho disponíveis e há tanta criatividade ao meu redor que acho difícil ela esgotar-se”, acredita o entrevistado. Uma inspiração que advém igualmente de conviver e trabalhar com artistas de outras sonoridades, admitindo prontamente que trabalhar com João 63

Frade no «Moda Vestra» foi um desafio tremendo. “Depois disso já fiz jam sessions de jazz, algo que antes era impensável para mim, porque as máquinas têm regras e limitações, mas dei a volta à situação e tornei-me mais um músico no meio de uma banda. São desafios que me desbloqueiam para chegar aos próximos níveis”, reconhece Rafael Correia, concordando ainda que perceber ou dominar todas as componentes que envolvem a produção de um disco é uma mais-valia nos tempos atuais. “As novas gerações estão habituadas a lidar com tudo e essa também é a forma de pensar, por exemplo, na Kimahera. Somos autossuficientes porque fomos construindo uma equipa que consegue corresponder a todas as necessidades, desde a criação e produção da música até aos próprios videoclips e ALGARVE INFORMATIVO #221


fotografias. Mas, como digo muitas vezes aos miúdos, é preciso definir qual é a nossa atividade principal. Há uma vertente que não podemos saber mais ou menos, temos que dominá-la mesmo a sério. Eu gosto de fotografar e fazer vídeo, contudo, se quiser atingir um determinado nível para as minhas produções, peço a alguém de fora para assegurar essa componente”, garante. O que também Rafael Correia explica frequentemente aos seus alunos, amigos e colegas é que o sucesso não é instantâneo, dá trabalho, demora tempo. “Infelizmente, o que o mercado musical e as redes sociais transmitem à malta nova é que o mais importante é ter aquela fotografia do palco, com um mar de gente à frente, de braços levantados e a gritar. Eu cresci numa época em que isso era apenas uma consequência, em ALGARVE INFORMATIVO #221

que o meu objetivo era fazer uma música de que gostasse para mostrar às pessoas”, recorda, pensativo. “Aquele momento da foto pode saber bem, mas acaba, não nos vai preencher para sempre. Estas fórmulas de resultado rápido são muito ingratas porque, normalmente, quem sobe depressa também desce depressa. Hoje, ninguém se lembra de quem esteve no topo há três anos, porque esses desapareceram e foram substituídos por outros num instante”, avisa. Rafael Correia sempre teve, todavia, os pés bem assentes no chão, tudo o que fez foi com cabeça, tronco e membros, provavelmente graças ao rigor e responsabilidade que ganhou com a arquitetura, mas admite que nunca imaginava que ser produtor viria a 64


ser uma atividade a tempo inteiro. “Na altura, essa realidade estava limitada a muito poucos. Eu pensava que a arquitetura me ia acompanhar para o resto da vida e que a música era um hobby que ia manter enquanto me apetecesse. Acabei por trocar as coisas e nem sei se, no futuro, não vou descobrir outra atividade qualquer a que me vou dedicar. O que aprendi nesta caminhada é que, se formos bons a fazer aquilo de que gostamos, conseguimos alcançar os nossos objetivos. Pode não ser fácil, mas é possível”, aconselha. Para já, Sickonce tem novo EP disponível nas plataformas digitais, a edição física do «Moda Vestra» deverá ser editada, em CD e Vinil, ainda em 2019 e está a braços com 65

o «Porcelana» de Perigo Público, a que se somam mais projetos com Napoleão Mira e Edgar Valente. “Estão sempre a acontecer coisas interessantes, umas para se passar para disco, outras apenas para tocar ao vivo. As oportunidades vão aparecendo e eu vou agarrando-as, sem nunca ser aquele dj ou produtor exuberante, com muito show-off, porque também não sou uma pessoa muito extrovertida no dia-a-dia. A minha personagem em palco acaba por bater certo com quem realmente sou, embora tente levar mais máquinas para cima do palco para as pessoas perceberem que está tudo a ser feito no momento, que não vai tudo gravado de casa” . ALGARVE INFORMATIVO #221


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LOULÉ FICOU FASCINADO COM «O RELATÓRIO DA COISA» Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

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ram para ser quatro apresentações, um número ambicioso, até arriscado, de sessões de teatro se pensarmos na multiplicidade de eventos culturais que estavam a acontecer um pouco por todo o Algarve em setembro. Mas a Mákina de Cena, associação cultural nascida ainda há não dois anos, em Loulé, é isso mesmo, ambiciosa, irreverente, movida a energia nuclear pela dupla dinâmica Carolina Santos/Marco Martins e por um conjunto de amigos que se deixaram contagiar pelo seu entusiasmo. E assim se programou «O Relatório da Coisa» a partir do conto de Clarice Lispector, para os dias 17, 18, 19 e 21 de setembro, na Casa da Mákina. ALGARVE INFORMATIVO #221

Eram para ser quatro, mas tiveram que ser cinco, porque a tremenda adesão de público obrigou à realização de uma sessão extra na tarde do domingo, 22, e se calhar mais não se fizeram porque iriam chocar com a restante programação da Mákina de Cena. Uma programação que Marco Martins abordou de forma resumida, na noite de estreia, enquanto Carolina Santos e Ana Karina se preparavam para lá das cortinas, na sala de ensaios/espetáculos/formação e tudo o mais que a dupla de diretores artísticos da Mákina de Cena se lembrar de organizar e dinamizar. E a expetativa ia aumentando entre o público, desejoso que o espetáculo começasse. 70


Entre analogias e referências múltiplas, «O Relatório da Coisa» foi escrito por Clarice Lispector e publicado em 1974, assumindo um novo significado num mundo moderno que, para além de ser muito eletrónico, se viciou no virtual e no digital, e onde «ser» já não pertence exclusivamente ao domínio do real e material. “Porque, de acordo com este relatório, uma das barreiras a ser vencida para chegar ao que «é» consiste na desvalorização da palavra e em anteceder a nomeação. Assim como o relógio não dá conta do significado do tempo, a palavra poderá ser ineficaz na sua capacidade de significar”, explica Carolina Santos que, com a colaboração de Marco Martins e Ana Karina, se propôs transpor «O Relatório da Coisa» para cena num formato intimista, “que cruza a poética do absurdo com a arte de contar

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histórias, privilegiando a imaginação, ora abolindo a quarta parede, ora intensificando a solidão do intérprete na procura daquele espaço misterioso que antecede a verbalização das coisas”, acrescenta a atriz e encenadora. Abrem-se finalmente as cortinas, o público senta-se e, no palco, uma máquina de escrever aguardava pacientemente pela chegada de D. Madalena Prudência, “que vive só num espaço fora do normal, com uma rotina muito própria de alguém que concentra em si todas as dúvidas relativas à existência do tempo e das coisas, dos fenómenos energéticos da matéria, e do seu futuro na literatura”, descreve Carolina Santos, que interpreta, de forma estonteante, esta personagem tresloucada, repleta de

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frases de significado incerto e de pensamentos conflituosos. “Ela procura terminar um relatório preciso e confidencial, ainda que não consiga, pois tudo o que é essencial é seco, e o seu discurso fica muito vezes molhado pelas emoções”, justifica Carolina Santos. Fruto da sua formação em teatro físico na prestigiada Ecole Internationale de Theatre Jacques Lecoq, a personagem de Madalena Prudêncio assenta que nem uma luva em Carolina Santos, que esteve, voltese a dizer, fantástica, dominando com mestria o ritmo, cadência e volume das suas falas, por vezes quase obrigando o público a chegar-se mais à frente para melhor perceber o que era dito e, de 73

repente, disparando a viva voz uma das suas tiradas filosóficas. E as gargalhadas iam-se sucedendo, enquanto Carolina Santos ia trocando de roupa, escrevinhando sob a luz de uma lâmpada incandescente, explicando histórias com recurso a imagens e adereços de cartolina. Um espaço cénico simples, mas de grande dinâmica, atrás do qual se ia movendo, uma sombra nas sombras, Ana Karina, ao passo que Marco Martins assumia o controlo do som e luz. De imaginação fértil e íntimo sofrido, o cansaço e falta de sono de D. Madalena Prudêncio dificultavam a tarefa de relatar e transmitir certas características ALGARVE INFORMATIVO #221


de uma vida apodrecível, com o público refém das suas palavras, “uma parte integrante deste delírio, são os seus ouvintes imaginários reais, que confirmam a necessidade de descrever os erros do Tempo e de Deus”, comenta Carolina Santos. «Porque a loucura nunca existe só. Já o tempo, é sempre e imutável», lá dizia Clarice Lispector, num relatório que fascinou o público que esgotou a Casa da Mákina nestas cinco sessões.

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Assinada por Carolina Santos, em colaboração com Ana Karina e Marco Martins, a criação teatral foi a primeira proposta da temporada oficial da Casa da Mákina, o espaço cultural e performativo de Loulé gerido pela Mákina de Cena desde abril do corrente ano. A produção foi financiada pela Câmara Municipal de Loulé e pela Direção Regional de Cultura do Algarve e aguçou, e de que maneira, o apetite para o que virá a seguir .

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AUDITÓRIO MUNICIPAL DE OLHÃO REGRESSOU DAS FÉRIAS DE VERÃO COM «QUANDO ELA … É ELE» Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

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Auditório Municipal de Olhão abriu as portas da temporada 20192020 com uma divertida comédia nacional, no dia 20 de setembro, com «Quando ela... é ele». A hilariante peça conta no elenco com os atores Luís de Mascarenhas, Paulo Oliveira, Tiago d’Almeida e Filipa Giovanni e retrata a história de Emílio, um jovem homossexual não assumido, oriundo de Vila Nova da Ranhosa, mas que vive em Lisboa por motivos profissionais.

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Certo dia, o seu pai, um homem do norte muito conservador e viril, decide ir a Lisboa visitar o filho e conhecer finalmente a sua «nora». O que o Lacerda não sabe, nem sonha, é que a sua «nora» se chama, na verdade, Chico, o companheiro de Emílio, um rapaz, no mínimo, exuberante e muito assumido. Em pânico, Emílio suplica a Chico que saia de casa por uns dias e pede a Rita, uma colega e amiga, para se fazer passar por sua namorada. Sucedem-se mil e uma peripécias até que se constata que Emílio nunca enganara o pai no que toca às suas orientações sexuais… . 82


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FESTIVAL DE ARTE RUSSA CLÁSSICA E CONTEMPORÂNEA APRESENTOU-SE NO CINE-TEATRO LOULETANO Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

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oulé recebeu pela primeira vez as Temporadas Russas no Algarve e o Festival que as integra, no dia 29 de setembro, no Cine-Teatro Louletano. O Festival de Arte Russa Clássica e Contemporânea realizou-se no contexto do 240.º aniversário das relações diplomáticas russo-portuguesas que se celebra em 2019 e deu seguimento à tradição das temporadas russas da Paris dos inícios do séc. XX, incorporando, segundo a organização, “as brilhantes imagens de arte clássica e contemporânea russa com a interpretação de artistas russos, dando a conhecer a arte e a cozinha tradicionais”. Do programa fez parte a atuação de Oleg Pogudin e seu quinteto; um momento musical de M.Glinka, P.I. Tchaikovsky, S.Rachmaniniov, R. Gliér interpretado ALGARVE INFORMATIVO #221

pelos solistas Mikhail Shumov (violoncelo), Ivetta Natskaya (viola de arco) e Elena Tsouranova (piano); a exposição «Migração como a arte de viver», da fotógrafa Irina Kuptsova; e o buffet russo, composto por uma mesa tradicional russa para os visitantes do festival. E um dos destaques da tarde de domingo foi, de facto, a performance de Oleg Pogudin, considerado «a voz de prata da Rússia» e um dos melhores cantores de romance russo que, na sua essência, é muito semelhante ao fado. A organização do festival pertenceu ao Estúdio «Histórias Musicais», teve direção artística de Irina Svechnikova, direção de dança de Larisa Shumskaya, direção musical de Mikhail Shumov e contou com o apoio da Agência Federal da Rússia «Rossotrudnichestvo» e da Câmara Municipal de Loulé . 92


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QUADROS VIVOS, Mร QUINAS E ENGRENAGENS DESFILARAM EM ALBUFEIRA EM HOMENAGEM A LEONARDO DA VINCI Texto: Daniel Pina| Fotografia: Rui Gregรณrio/CMA

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erca de 500 jovens das escolas do 2.º e 3.º ciclo do concelho de Albufeira assistiram, no dia 26 de setembro, ao desfile evocativo dos 500 anos da morte de Leonardo da Vinci. O cortejo foi constituído por três dezenas de figurantes caracterizados de forma a retratar alguns dos quadros mais conhecidos do Mestre, entre os quais o próprio Leonardo da Vinci, a Dama de ALGARVE INFORMATIVO #221

Arminho, Mona Lisa e a Última Ceia, pelo painel com o desenho do Homem Vitruviano, máquinas e engenhocas, um simpático dragão, malabaristas, pintores, uma dançarina de fogo, acrobatas e uma divertida banda de música, e partiu do Largo dos Paços do Concelho em direção ao Largo Eng.º Duarte Pacheco. Pelo caminho, residentes e turistas deixaram-se contagiar pela alegria do grupo e foramse juntando para ver a Parada. 102


maioritariamente conhecido pela sua pintura, no entanto, ele foi também um dos maiores inventores da História mundial, tendo produzido ideias muito à frente do seu tempo, como os protótipos do helicóptero, do submarino e muitas outras, algumas das quais aqui representadas num dos painéis que integram o desfile”, destacou. José Carlos Rolo fez igualmente questão de sublinhar a importância da educação ao longo da vida. “É fundamental a aprendizagem que se faz na sala de aula, mas é igualmente importante envolver a comunidade neste processo de aprendizagem contínua, por isso, este evento tem dois momentos distintos: o desfile, dirigido essencialmente à comunidade escolar e uma performance noturna com recurso a projeção de imagens na fachada da Galeria Municipal Pintor Samora Barros vocacionada para o público em geral”, explicou.

O presidente da Câmara Municipal de Albufeira estava visivelmente satisfeito pela adesão das escolas, tendo aproveitado o momento para agradecer aos professores e alunos que aceitaram o repto da Autarquia para participar na iniciativa. “Este ano assinala-se os 500 anos da morte de um dos maiores génios da humanidade e Albufeira, como cidade pertencente à rede mundial de cidades educadoras, não poderia deixar de se associar ao evento. Leonardo da Vinci é 103

No Largo Eng.º Duarte Pacheco, a Parada invadiu o palco, num momento em que figuras, máquinas e engrenagens ficaram em exposição. À semelhança do que aconteceu ao longo do percurso, alguns dos artistas aproveitaram para interagir com a população e houve mesmo quem tivesse a sorte de ser retratado por um dos famosos pintores vindos diretamente da capital do Renascimento para a praça principal da cidade. «O Grande Arquiteto da Cidade Ideal», montado na sua máquina com todos os apetrechos, ia anunciando a construção de uma Grande Catedral feita de massa e de pizza e a divertida banda musical deu o ALGARVE INFORMATIVO #221


mote a uma bonita dança com fogo e a exibições acrobáticas. À noite, «A Luz do Renascimento e o Sagrado» estiveram em destaque, novamente no Largo Eng.º Duarte Pacheco, num bonito espetáculo com recurso a mecanismos multimédia e do teatro de imagem, numa verdadeira aula de história ao vivo, dirigida a públicos de todas as idades. Homens e mulheres estátua vestidos de claro transportaram e rolaram bidons brancos, formando esculturas em movimento. A fachada da Galeria Pintor Samora Barros iluminou-se e transformou-se no centro dos acontecimentos com a projeção de videomapping a retratar imagens icónicas de Arte Sacra do Renascimento, com especial enfoque na obra do grande Mestre Leonardo da Vinci, evocando a efeméride dos 500 anos da sua morte. O espetáculo, com locução em português e inglês, terminou com a intervenção do público numa largada de balões brancos que marcou o evento de magia e simbolismo . ALGARVE INFORMATIVO #221

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GRAFONOLA VOADORA & NAPOLEÃO MIRA APRESENTARAM «O SUL DE SOPHIA» EM LAGOS Texto: Daniel Pina| Fotografia: Camille Leon

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o âmbito do centenário de Sofia de Mello Breyner Andresen, a Câmara Municipal de Lagos encomendou à Grafonola Voadora & Napoleão Mira uma performance audiovisual intitulada «O Sul de Sophia», com o objetivo homenagear esta escritora e poetisa com fortes ligações ao Algarve. O espetáculo realizou-se no dia 28 de setembro, no Auditório do Centro Cultural de Lagos, e pretendeu realçar a importância que o Algarve teve na sua obra, através de uma (re)construção geografia afetiva, simbólica, visual e musical de quadros audiovisuais referentes à sua obra poética, feita com a inspiração neste Sul, e em particular, a cidade de Lagos. A equipa artística foi composta por: Napoleão Mira – Voz; Luís Galrito – Voz e piano; João Espada – Arte Visual e sonoplastia; Ricardo Martins – Guitarra Portuguesa; João Campos Palma – Acordeão; e Sickonce (Rafael Correia) – Eletrónica. Recorde-se que Sophia de Mello Breyner Andresen foi a primeira mulher portuguesa a receber, em 1999, o Prémio Camões - o mais importante galardão literário da língua portuguesa. O seu corpo encontra-se no Panteão Nacional desde 2014 . ALGARVE INFORMATIVO #221

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ALGARVE CELEBROU DIA MUNDIAL DO TURISMO COM CONCERTO INÉDITO NO AEROPORTO DE FARO Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

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plataforma do Aeroporto Internacional de Faro foi palco de um concerto inédito e exclusivo em Portugal, no Dia Mundial do Turismo, 27 de setembro, numa iniciativa organizada pela Região de Turismo do Algarve, com o apoio da ANA – Aeroportos de Portugal e da Orquestra Clássica do Sul, que contou com a participação da fadista Katia Guerreiro e de três orquestras regionais portuguesas.

Sul, a Orquestra Filarmonia das Beiras, a Orquestra do Norte e a fadista Katia Guerreiro atuaram juntos para surpreender os passageiros que circulavam naquele que é um verdadeiro símbolo da importância da atividade turística para o Algarve. No aeroporto, uma das principais portas de entrada para quem escolhe a região como destino de férias, Katia Guerreiro interpretou dois fados acompanhada por elementos das três orquestras, que tocaram ainda as obras «Ribatejo», de Frederico de Freitas, e Marcha Triunfal da ópera «Aida», do compositor Giuseppe Verdi .

Tratou-se da primeira vez que músicos, maestro e coro da Orquestra Clássica do ALGARVE INFORMATIVO #221

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Um aperto de mão,um voto? Paulo Cunha (Professor) m Portugal, desde que vivemos com pleno direito e liberdade de voto, sempre que os diversos tipos de eleições se intercalam entre si, assiste-se a uma repetição dos velhos métodos e hábitos de persuasão, convencimento e conquista dos chamados «eleitores indecisos». Lembro-me de, ainda puto, logo a seguir ao 25 de abril de 1974, observar a forma como os novos políticos tentavam convencer os também, na altura, novos eleitores. A campanha eleitoral era feita através dos cartazes que se colavam nas paredes e nos muros, nas pinturas murais, nos dois únicos canais televisivos disponíveis, nos comícios, nas arruadas e no contacto porta a porta. Recordo-me de observar como imensas pessoas se digladiavam para receber algumas «lembranças» que os partidos políticos lhes queriam oferecer. Na altura sempre me questionei como é que alguém se deixaria sugestionar ou até convencer com bagatelas em forma de «souvenir». Hoje, mais de quatro décadas volvidas, ainda vejo imagens nos múltiplos canais televisivos e nas redes sociais onde as diversas forças políticas usam algumas metodologias do passado. É, pois, prova evidente que funcionam! Enquanto jovem, na qualidade de candidato a integrar a Assembleia Municipal de Faro, recordo-me da minha fugaz passagem na vida política partidária (como independente) e no que então aprendi no terreno. Em campanha, lembrome da forma desprendida, incisiva, direta e eloquente como alguns dos meus ALGARVE INFORMATIVO #221

«camaradas de movimento partidário» avançavam sobre os transeuntes que com eles se cruzavam. Logo percebi que não estava talhado para a função. Pensar que, em poucos minutos, teria de usar o meu intrínseco ser para tentar pregar e «vender» ideias e ideais a quem não os procurou, era algo com o qual não conseguia compactuar. Outro ato que sempre me pareceu ser bastante pessoal era, e continua a ser, o aperto de mão, pois, sendo usado em praticamente todas as ocasiões sociais, o seu uso dá naturalmente lugar a muitas análises. A linguagem corporal é um dos primeiros contactos com outra pessoa, razão pela qual assume tanta importância na nossa sociedade. Não me parece, por isso, apropriado avançar sobre alguém dando-lhe a mão, dando-lhe, ao mesmo tempo, a sensação que desejamos algo seu em troca. Antigamente, o aperto de mão era uma forma de cumprimento que estava adstrita a pessoas de status semelhantes e servia como fortalecimento das transações comerciais. O negócio era selado com um aperto de mão firme. Hoje, segundo os especialistas, não é muito difícil disfarçar aquilo que se demonstra e se pretende num aperto de mão, pois a maior ou menor firmeza, o desvio do olhar, a mão transpirada ou trémula, tal como uma mão que se estica sem vigor, evidenciam a falta de entusiasmo e o pouco interesse em aprofundar uma relação de amizade, negócios ou outra. Acredito, portanto, que haja por aí muita gente com toalhetes no bolso, fazendo paragens frequentes para retemperar forças e higienizar os membros 136


superiores. É caso para perguntar: votos, a quanto obrigam? Ao contrário de muitos, não escolho seja quem for pelas palavras de circunstância, pelo sorriso, pelo panfleto entregue à última da hora, pelas ofertazinhas e, 137

finalmente, por um “Venha cá um passoubem!”. A memória, o discernimento, a informação e a clarividência são os melhores tónicos para uma boa escolha, seja ela qual for. E nem os beijinhos me convencem! .

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Da poesia na infância Adília César (Escritora) Anna é linda. Ela é linda e isso basta-me. O sol bate na casa amarela dela, é quase como um sinal de Deus. (Jimmy, 5 anos de idade)

pequeno Jimmy deambula pelo espaço. É visível um vazio expressivo sinistro, um vagar anestesiado, enquanto recita um poema. Lisa Spinelli, a sua educadora de infância, escreve de forma compulsiva cada um dos versos, ditos numa linha melódica de uma nota só, num caderno vagamente destroçado que carrega consigo para toda a parte. Nesse caderno está escrevinhada toda a ânsia de Lisa em ser poetisa: insinuações de uma escrita pretensamente poética que não convence ninguém. Mas os poemas de Jimmy são como pequenas luzes que dão vida a esse caderno e a mulher torna-se obsessiva na sua missão de salvar o talentoso menino da banalidade da vida que o espera: crescer, tornar-se adulto, ganhar a vida, ter uma família; e depois morrer, como de costume. Lisa não consegue submeter-se aos valores práticos da sociedade em que ambos se inserem e de um modo doentio organiza uma sequência de eventos manipulatórios em torno das pessoas com quem convive, inclusive a família de Jimmy, para salvar a genialidade rara da criança, a qualquer custo, uma vez que ela acredita que a sociedade tudo fará para a esmagar. A obsessão vai demasiado longe e Lisa rapta Jimmy, levando-o a passar algum tempo num ALGARVE INFORMATIVO #221

ambiente de comunhão com a natureza, junto a um lago, numa tentativa de incentivar a criação poética do menino. Mas ele fica assustado e só quer voltar para casa. Quando a polícia chega para o resgatar, Jimmy é colocado sozinho no carro de patrulha e as últimas palavras que se ouvem são dele: - Tenho um poema. Tenho um poema! Mas ninguém ouve o seu poema. É o princípio do fim preconizado por Lisa. - Que belo argumento para um filme, de uma complexidade psicológica vibrante, diriam os leitores desta crónica. De facto, a ideia deste argumento pertence a Sara Colangelo que realizou o filme The Kindergarten Teacher, pelo qual recebeu o prémio de melhor realização no Festival de Sundance, fazendo também parte da selecção oficial do Festival de Toronto. Foi estreado em Portugal em 2019 e o Cineclube de Faro exibiu-o no dia 1 de Outubro. A viagem perigosa, desesperada e metafórica, vivenciada pelos dois protagonistas, é uma chamada de atenção sobre as relações de poder do adulto educador para com a criança educanda, com fronteiras éticas sempre difíceis de definir. Do ponto de vista de Lisa, a frustração leva-a a executar sucessivos rituais obsessivos que a conduzirão, muito provavelmente e 138


O pequeno Jimmy tinha um tio que lhe lia poemas, o que foi crucial, decerto, para a criação dos seus versos. Ora Jimmy não simboliza a criança comum e a argumentista confere a essa personagem uma força e uma maturidade que raramente se vêem numa criança de 5 anos. Na verdade, os poemas que ditos ao longo do filme foram na realidade escritos por três adultos - Kaveh Akbar, Dominique Townsend e Ocean Vuong – considerados grandes poetas contemporâneos. Mas o filme deixa-nos uma pista importante para que a poesia possa fazer parte da vida de qualquer pessoa: é imperioso guardar os versos da infância na pequena concha das mãos.

durante um tempo considerável, a uma penitenciária. Do meu ponto de vista de educadora de infância que desenvolve um projecto pedagógico de sensibilização à poesia, recuso submeter-me a angústias de antecipação dos destinos artísticos das crianças que acolho todos os dias. Vi o filme através dos olhos de uma educadora que privilegia a ambiência pedagógica proporcionadora de desenvolvimento artístico precoce nas crianças (função que exerço há mais de 30 anos). E depois, deixo-as ir: as crianças, as luzes poéticas, as raras genialidades. Talvez de vez em quando consiga despertar nessa grande infância que acolho há tanto tempo uma centelha potencialmente estética e isso basta-me.

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Deixo-vos um poema pensado e dito pelo Tiago P. de 4 anos, em contexto de jardim de infância. É um poema de intervenção social, de afirmação do eu poético e intensamente humano. A profundidade da reflexão surpreendeume pela simplicidade, pelo efeito emocional e estético que provocou em mim (não é essa uma das funções da poesia, a de assumir uma voz provocadora?). Hoje, o Tiago tem 7 anos e já não pensa em poesia. Os contextos familiar e escolar que o acolhem tendem a não valorizar esse tipo de competência. Mas este poema saiu de dentro dele, pertence-lhe e isso basta-me: Santiago rima com Tiago. Eu gosto dos nossos nomes que são poemas. O meu poema é mais pequenino. Mas eu sou mais do que o meu nome. Sou mais do que um som: sou o Tiago. (Tiago P., 4 anos) . ALGARVE INFORMATIVO #221


OPINIÃO

Do Reboliço #57 Ana Isabel Soares (Professora) que o moleiro gostava de contar histórias das gentes… E o que o Reboliço gostava de as ouvir… Coisas que não têm descrição; ou melhor, que só repetindo: lembrando e repetindo, para lembrar mais e repetir outra vez. O Reboliço compreendia, porque ouvia assim: quanto mais histórias contava, então depois de já não lhe dar o corpo ousadia de trabalhar, mais histórias tinha para contar o velho moleiro. Se estava calado – um dia mais cabismundo vem a todos –, demorava maior tempo a retomar o fio. Nos últimos anos de vida, não teve outro remédio senão sair do Moinho Grande e ir morar para um lugar onde podiam dar-lhe de comer a horas, fazê-lo levantar da cama todos os dias, ajudá-lo a continuar a viver, para que, em vindo a magana, não o achar derrubado. Era um lugar sem grandes alegrias, mas o moleiro era de índole alegre, e aquilo passava. Como tivera cinco filhos, e estes lhe tinham dado mais que duas mãos cheias de netos, e em bisnetos já a conta ia por aí diante, tinha sempre visitas. Uma ou outra lá o convenciam a ir à rua dar uma voltinha, um passeio de carro, mais das vezes até ao Moinho. Demorava meio minuto o silêncio, já sentado no automóvel, depois do exaspero breve (“Moços, deixem-me estar, que eu só já dou é trabalho”). Então, era ouvi-lo a fazer o mapa da cidade: “Olha, ali morava fulano. Era primo de sicrano, e a irmã foi quem fez e disse e tomou. E naquela porta havia uma família, o pai, escuta, tal e tal, e ao cimo daquela rua, estás a ver, ali?, o filho de beltrano foi aquele que depois ALGARVE INFORMATIVO #221

assim e assado...”. Era um dínamo, a conversa, não tinha parança. E era porque em moço – mais moço, vá – lidara com toda a gente, ricos e pobres, magros e gordos, rijos e moles, elas e eles, velhos, novos, meãos e aldeãos, que fossem ou não fregueses seus, o que o moleiro queria era lidar, conversa, e o que lhe dava o espírito agora em lembrar eram as histórias das pessoas todas: como quem pegasse nos novelos que, de noite, a melancolia espalhara pelo chão, desenrolasse um a um o que ainda sobrava das esferas pequenas, e atasse uma noutra as pontas, para voltar a enovelar, em bola grande, aqueles fios. Tudo se ligava a tudo, não havia jeito de ser de outra maneira – por isso mesmo as frases não se lhe acabavam, não tinham um final. Interrompiam-se, vá, era o muito. Sobravam no pensamento do velho moleiro os caminhos que não andara com as pernas (as pernas que faziam nas escadas do Moinho Grande milhas carregadas com as sacas ao ombro e o boné branco). E o Reboliço, escutando, ia com ele por lugares que também só via com a recordação do homem, que queria fazer ver. “Vocês não conhecem isto”, dizia, como se estivesse no lugar que descrevia, “isto”, e era à porta do Moinho que estava sentado, a falar de outras paragens. «Isto» era além, era longe, e estava ali. “Há ali um lugar, chamam-lhe o Pulo do Lobo. Já lá foste?”, perguntava a um neto. Ou virava-se para um dos filhos, “Tu já lá foste”. Daí era jorrar como a água que já correu no Guadiana, uma força na voz: “Como a água que aquilo enche!!! Os 140


Foto: Vasco Célio

cerros que aquilo tem de um lado e outro! A água enche!”, jurava, abrindo muito os olhos, que eram pequenos, mas nem se dava pela pequenez, de tanto que tudo admiravam. “Aquela água tem de ir até lá acima e pular toda ali por um buraco!”. Há maior espanto do que ver correr a água de um rio, saltar do alto? O velho era assim que se espantava. E com as histórias das gentes. “Era onde passavam os contrabandistas. O teu avô, filho da minh’alma, ainda conheceu alguns contrabandistas que pulavam aquilo, ali no Penedo Gordo”. A voz baixava um nadinha para falar dos homens que se afoitavam: “Mas era afoitar muito, que água era forte. Por isso é que aquilo ficou o Pulo do Lobo. Também, se um tipo se desequilibra, ia lá 141

por aí abaixo, e adeus ó vindima!, nunca mais sabiam dele”, já dizia, no pasmo. “Ali no Penedo Gordo havia um que era assim bem gordo. Pulava com a carga às costas, zás, era um pulo”. E rematava, falando da arte do contrabandista, como quem contava das cautelas de afinar um instrumento e mostrava os louros que coroavam os homens bravos: “Agora o que é, é ter a certeza de não se desequilibrar. Só dois é que – ali no Penedo Gordo havia uns quantos, mas só dois é que pulavam. E aquele pulou, arranjava fazenda” . *Reboliço é o nome de um cão que o meu avô Xico teve, no Moinho Grande. É a partir do seu olhar que aqui escrevo.

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«CARPE NOX» MARCA ENTRADA DO RÉVEILLON DE ALBUFEIRA NA IDADE ADULTA Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina arpe Nox», assim se chama o ambicioso e surpreendente programa que a Câmara Municipal de Albufeira, em parceria com a APAL – Agência de Promoção de Albufeira, está a preparar para as últimas horas de 2019 e para as primeiras horas de 2020, naquele que será o 18.º ano em que se assinala o réveillon na capital do turismo algarvio. Passagem de ano de Albufeira que é uma referência nacional, em virtude da sua qualidade, e que lhe granjeou, inclusive, já algumas transmissões em direito para a ALGARVE INFORMATIVO #221

televisão pública a partir da Praia dos Pescadores. Contudo, não obstante este sucesso, o executivo camarário liderado por José Carlos Rolo achou por bem romper com o passado e oferecer algo novo, aproveitando esta entrada na «maioridade». O romper não é total, no entanto, pois mantêm-se eventos de grande êxito como o Paderne Medieval e o Festival SolRir, mas a noite de final de ano na Praia dos Pescadores vai ter uma cara nova, sofrer uma profunda transformação, conforme se ficou a saber na manhã de 27 de setembro, Dia 144


José Carlos Rolo, Presidente da Câmara Municipal de Albufeira, e José Santos, Presidente da APAL

Mundial do Turismo, durante a apresentação do programa realizada no Cais Herculano. “Em 2002 introduzimos um modelo completamente diferente de se festejar o fim-de-ano, trouxemos grandes nomes nacionais e internacionais, fizemos um brinde monumental que entrou para os recordes do Guiness. Quisemos, no entanto, lavar a cara para se recuperar a dinâmica que foi criada nessa época”, explicou José Carlos Rolo, presidente da Câmara Municipal de Albufeira, lembrando que, desde essa altura, a grande maioria das localidades passou a ter os tradicionais concertos e fogos-de-artifício para assinalar o réveillon. “Entendi que devíamos colocar a fasquia num patamar mais alto, num investimento feito a 145

pensar no entretenimento dos residentes e visitantes, mas também no retorno económico que dele possa advir, do fluxo financeiro que venha a gerar. E, por isso, peço aos empresários locais para não encerrarem os seus estabelecimentos durante a passagem de ano”, apelou o edil. «Las Ketchup» atuaram em direto para a SIC, em 2002, num espetáculo memorável que deu o «pontapé-desaída» para os famosos réveillons de Albufeira, que nem nos períodos mais complicados da crise claudicaram. “Foram 17 anos em crescendo, com algumas dificuldades pelo meio, e a APAL foi importantíssima para se ALGARVE INFORMATIVO #221


Carla Ponte e Paulo Dias

criarem momentos marcantes com os UB40, Nelly Furtado, Bob Sinclair, Xutos & Pontapés, tivemos os «Ídolos» com a maior produção televisiva de sempre na rua, entramos para o Guiness com o maior brinde do mundo. Quando começamos, em 2002, foi uma novidade, seguiu-se Portimão e, agora, esse formato é replicado um pouco por todo o país”, analisou Carla Ponte, Chefe da Divisão de Turismo e Cultura da Câmara Municipal de Albufeira, falando em cerca de 850 mil pessoas que festejaram a passagem-de-ano na Praia dos Pescadores desde então. A entrada na maioridade dá o mote para o Réveillon de 2019/2020 em Albufeira e o desafio lançado por José Carlos Rolo foi “desenvolver-se um conceito único que se traduza numa experiência inesquecível”, indicou Paulo Dias, Chefe ALGARVE INFORMATIVO #221

de Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Albufeira. “Começamos por olhar para a Praia dos Pescadores, um cenário que, por si só, já é bonito, e tentamos perceber como é que a podíamos valorizar ainda mais, acrescentando novos elementos cénicos e de animação. E queremos que o público seja um dos atores principais do espetáculo, como já o tínhamos feito por ocasião do recorde do Guiness e na gala dos «Ídolos». Não se trata apenas de ir à praia para ver os espetáculos musicais e o fogo-deartifício com a família e os amigos, pretendemos que assistam a algo que só vai acontecer naquela noite e naquele local”, descreveu Paulo Dias. A fasquia foi colocada num patamar bastante elevado e, para que tudo corra bem, a Câmara Municipal de Albufeira 146


chamou a conceituada TAVOLANOSTRA, uma produtora internacional sedeada em Portugal. Quanto ao cenário para esta megaprodução, as novidades começam logo por um palco de 50 metros de frente, desenhado especialmente para este evento e que vai interagir com o público, o mar, o céu, a falésia e os barcos que estarão ancorados ao largo da costa. “O palco vai estar montado no sítio habitual da praia, mas vão ser igualmente montadas várias torres de laser e luz que vão pintar todo o cenário. Este ano, o fogo-de-artifício vai ser colocado no mar, para além de termos barcos em toda a frente da Praia dos Pescadores que vão fazer parte do espetáculo”, adiantou Carla Ponte. No que toca aos concertos musicais, serão exclusivos do réveillon de Albufeira e teremos, segundo Paulo Dias, “aquela que é, provavelmente, a melhor banda nacional ao vivo da atualidade a tocar em Portugal, os Amor Electro”. “Vão fazer um espetáculo com um alinhamento único, desenhado

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especialmente para esta noite, com mais arranjos e músicos. Para depois da meia-noite, escolhemos a banda mais virtuosa a tocar neste momento em Portugal e uma das mais reconhecidas internacionalmente, os The Black Mamba. Tiveram a humildade de aceitar um desafio fantástico, tocarem aquilo que fazem, mas também interpretarem medleys com vários êxitos dos últimos 30 anos”, prosseguiu Paulo Dias. O fogo-de-artifício terá o seu ponto alto à meia-noite, mas incluído num espetáculo piro-aéreo-musical, num verdadeiro acontecimento multissensorial, nas palavras do Chefe de Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Albufeira. “Teremos ainda um espetáculo com oito para-motores numa acrobacia aérea de dança sincronizada, para além de dois aviões de aerobática sincronizada”, revelou, declarando ainda que o réveillon

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2019/2020 de Albufeira não será feito de momento isolados, mas será, sim, “uma espécie de filme que começa às 22h30 e que acabará por volta da 01h30/02h, uma história composta por vários elementos”. “É um espetáculo que tem que ser visto do princípio ao fim, portanto, recomendamos que planeiam as vossas passagens-de-ano de maneira a que ALGARVE INFORMATIVO #221

consigam ver o filme todo”, reforçou Carla Ponte. «Carpe Nox» ou «Aproveite a Noite» promete, de facto, ser um estrondo. “Acho que vai merecer a pena estar na Praia dos Pescadores nesta noite, vai ser uma mudança de paradigma na passagem-de-ano de Albufeira”, finalizou José Carlos Rolo . 148


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PORTIMÃO FOI PALCO DO ENCERRAMENTO NACIONAL DA SEMANA EUROPEIA DO DESPORTO Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

5.ª Semana Europeia do Desporto, que se assinala de 23 a 30 de setembro sob o lema #BEACTIVE, foi vivida muito intensamente em Portimão Cidade Europeia do Desporto 2019, com a autarquia local a preparar um vasto ALGARVE INFORMATIVO #221

conjunto de propostas com o objetivo de desafiar os munícipes a praticarem atividade física nos diferentes equipamentos desportivos municipais e a título gratuito. O encerramento oficial da Semana Europeia do Desporto a nível nacional aconteceu, no dia 29 de setembro, junto ao Portimão Arena, tendo como ponto alto a Marcha/Corrida Solidária – «Passeio da 150


Memória», que sinalizava o Dia Mundial da Doença de Alzheimer, com a participação de largas centenas de pessoas vindas de todo o Algarve e cujos donativos eram destinados à Associação Alzheimer Portugal. O término da Semana Europeia do Desporto foi uma organização conjunta do Instituto Português do Desporto e Juventude, da Câmara Municipal de Portimão, da Junta de Freguesia de Portimão, de associações regionais de modalidades desportivas, associações e clubes locais, culminando num mega polidesportivo instalado no Parque de Feiras e Exposições, que vibrou intensamente com praticantes de 25 modalidades desportivas. A manhã desportiva contou com a presença do Presidente do Conselho Diretivo do IPDJ, Vítor Pataco, da Presidente da Câmara Municipal de Portimão, Isilda Gomes, do 151

Diretor Regional do Algarve do IPDJ, Custódio Moreno, bem como de representantes de múltiplas associações e clubes desportivos, escolas, autarquias, centros municipais de marcha e corrida, ginásios e grupos informais ligados ao desporto. Durante a cerimónia de boas-vidas aos participantes, a Campeã da Europa de Bodyboard, Joana Schenker, e o atleta paralímpico de Paraciclismo, Luís Costa, deixaram palavras de incentivo à prática desportiva regular, seja ela de forma lúdica ou competitiva, realçando os efeitos positivos que daí advém para o dia-a-dia das pessoas. Vítor Pataco voltou a comprovar, no terreno, a força e dinamismo dos agentes e associações desportivas do Algarve, uma região que é um exemplo de boas-práticas a ser seguido pelo resto do país. Já Isilda Gomes não poupou ALGARVE INFORMATIVO #221


elogios aos portimonenses, aos cidadãos anónimos, atletas, treinadores e dirigentes, assim como aos funcionários da autarquia, pelo contributo inestimável que têm dado para tornar Portimão Cidade Europeia do Desporto 2019 num tremendo sucesso. “A atividade desportiva em Portimão nunca mais será a mesma depois deste evento. Há um antes e um depois de 2019, Portimão e o Algarve mereciam isto e estamos a tornar também Portugal num país melhor. A prática desportiva é fundamental para uma maior e melhor saúde de todos nós”, enfatizou a presidente da Câmara Municipal de Portimão. Depois do tiro de partida para a marcha/corrida solidária, a extensa comitiva de convidados assistiu à prática de modalidades como o voleibol, ALGARVE INFORMATIVO #221

patinagem freestyle, andebol, karaté, boxe, ténis, basquetebol, desporto adaptado, golfe, ginástica, patinagem, ténis de mesa, ciclismo, desportos náuticos, xadrez e judo. A Semana Europeia do Desporto é uma iniciativa da Comissão Europeia e tem por principal objetivo a promoção dos benefícios da prática regular do desporto, sendo celebrada simultaneamente em 38 países, e sendo coordenado em Portugal pelo IPDJ. Para o efeito foi criado há cinco anos o movimento #BEACTIVE, incentivando todos a dinamizar iniciativas de carácter aberto e gratuito, de forma a motivar e envolver os cidadãos na adoção de estilos de vida ativos e saudáveis . 152


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DIRETOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina (danielpina@sapo.pt) CPJ 3924 Telefone: 919 266 930 EDITOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 12P, 8135-157 Almancil SEDE DA REDAÇÃO: Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 12P, 8135-157 Almancil Email: algarveinformativo@sapo.pt Web: www.algarveinformativo.blogspot.pt PROPRIETÁRIO: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Contribuinte N.º 211192279 Registado na Entidade Reguladora para a Comunicação Social com o nº 126782 PERIODICIDADE: Semanal CONCEÇÃO GRÁFICA E PAGINAÇÃO: Daniel Pina FOTO DE CAPA: Daniel Pina A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista regional generalista, pluralista, independente e vocacionada para a divulgação das boas práticas e histórias positivas que têm lugar na região do Algarve. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista independente de quaisquer poderes políticos, económicos, sociais, religiosos ou culturais, defendendo esse espírito de independência também em relação aos seus próprios anunciantes e colaboradores. A ALGARVE INFORMATIVO promove o acesso livre dos seus leitores à informação e defende ativamente a liberdade de expressão. A ALGARVE INFORMATIVO defende igualmente as causas da cidadania, das liberdades fundamentais e da democracia, de um ambiente saudável e sustentável, da língua portuguesa, do incitamento à participação da sociedade civil na resolução dos problemas da comunidade, concedendo voz a todas as correntes, nunca perdendo nem renunciando à capacidade de crítica. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelos princípios da deontologia dos jornalistas e da ética profissional, pelo que afirma que quaisquer leis limitadoras da liberdade de expressão terão sempre a firme oposição desta revista e dos seus profissionais. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista feita por jornalistas profissionais e não um simples recetáculo de notas de imprensa e informações oficiais, optando preferencialmente por entrevistas e reportagens da sua própria responsabilidade, mesmo que, para tal, incorra em custos acrescidos de produção dos seus conteúdos. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelo princípio da objetividade e da independência no que diz respeito aos seus conteúdos noticiosos em todos os suportes. As suas notícias narram, relacionam e analisam os factos, para cujo apuramento serão ouvidas as diversas partes envolvidas. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista tolerante e aberta a todas as opiniões, embora se reserve o direito de não publicar opiniões que considere ofensivas. A opinião publicada será sempre assinada por quem a produz, sejam jornalistas da Algarve Informativo ou colunistas externos. ALGARVE INFORMATIVO #221

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