cinestecidades o sentimento nas cidades protagonistas
Gabriela Jastrenski Pereira Freire
orientação: Ana Lúcia Reboledo Sanches
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro Universitário SENAC - Santo Amaro como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Design com linha de formação específica em Design Gráfico.
São Paulo, 2017
A interação entre as pessoas é a força propulsora subjacente a todas as cidades.
- Geoffrey West
agradecimentos Aos meus pais, que me trouxeram até aqui. Aos amigos, que me viram crescer nesses quatro anos. Ao Henrique, que me manteve sã durante o projeto. À Ana Lúcia, que acreditou na minha ideia desde o início. Obrigada por tudo! <3
resumo O projeto propõe um estudo sobre o impacto da cidade nas relações humanas e como isso é retratado a partir do cinema. Com foco em duas grandes metrópoles, Buenos Aires e Tóquio, a pesquisa traça um paralelo entre essas cidades a partir dos filmes Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual (Medianeras, Gustavo Taretto, 2011) e Encontros e Desencontros (Lost in Translation, Sofia Coppola, 2003). A partir de uma metodologia fenomenológica e
analítica, a pesquisa apresenta insumos que possibilitam uma leitura não apenas da linguagem estética das metrópoles, mas dos sentimentos e fenômenos sociais que as permeiam. Partindo da premissa do filme como uma experiência sinestésica, foi possível ressignificar as obras audiovisuais e as transformar em peças gráficas. A entrega consiste em dois volumes que tangibilizam a estética dessas cidades-protagonistas, mas, principalmente, os sentimentos dos personagens que ali habitam.
Palavras-chave: Design Gráfico; Cinema; Cidades; Tangibilização.
sumário
cinestecidades
50
processo criativo
51
introdução
12
conceito criativo
53
objetivo
13
paleta cromática
57
justificativa
14
universo imagético
57
metodologia
16
tipografia
59
marca & naming
63
produto final
66
projeto
18
cidades-protagonistas
18
o recorte da cidade
24
memorial descritivo
82
relação com indivíduos
30
considerações finais
88
a estética da cidade
40
resultados de pesquisa
46
referências
90
requisitos para o projeto
48
lista de imagens
94
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objetivo geral O objetivo do projeto é promover um estudo sobre o papel da cidade na relação dos indivíduos e a influência da estética urbana no cotidiano, baseado em obras cinematográficas que possuem grandes metrópoles como personagens. A partir de um roteiro personalizado, foram desenvolvidos dois fanzines que tangibilizam a essência dos filmes, o relacionamento entre os personagens e a cidade e sua estética particular (cores, elementos, personagens, falas), transformando-as em elementos gráficos e sensoriais.
específico
INTRODUÇÃO
Entender como a metrópole pode influenciar nas fragilidades sociais e, a partir daí, desenvolver um produto que aborde o sentimento e a estética das cidades-protagonistas: Buenos Aires e Tóquio.
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justificativa O projeto de pesquisa propõe um estudo sobre o impacto da cidade nas relações humanas e como isso é retratado a partir do cinema. Com foco em grandes metrópoles como Buenos Aires e Tóquio, o projeto traça um paralelo entre as cidades a partir dos filmes Encontros e Desencontros (2003) e Medianeras (2011). A pesquisa permeia a estética urbana e sua influência na qualidade de vida e, principalmente, na qualidade mental dos indivíduos.
O tema é relevante pois retrata questões comuns às metrópoles em geral, ressaltando algumas fragilidades sociais contemporâneas como estresse, depressão, ansiedade e solidão, que podem ser associadas às grandes cidades. Essas fragilidades são recorrentes nesses filmes, selecionados justamente por retratarem a urbe de uma maneira subjetiva e cotidiana, de modo que o espectador seja capaz de criar vínculos e identificações com os personagens e o cenário urbano retratados em cena – frequentemente traçando paralelos com a cidade em que habitamos. O produto final do projeto são dois fanzines que tangibilizam a essência das obras cinematográficas e, principalmente, o relacionamento entre os personagens e a metrópole, além de abordar sua estética particular e suas principais características (cores, elementos, personagens, falas), transformando-as em elementos gráficos e sensoriais. Ao redirecionar essas características sensoriais dos filmes para outra mídia visual, o projeto
desenvolve relações entre o mundo gráfico e o mundo sensorial, ressaltando a dicotomia entre o real e o virtual. Traçando um paralelo entre o fanzine e o cinema, por exemplo, podemos entender que ambos são contadores de histórias. Tal formato foi escolhido por conta do diferencial do projeto. Diferente de outras publicações com mesmo tema, os filmes retratados, além de terem como ponto de partida o cenário urbano e as cidades protagonistas, sugerem uma ligação mais profunda, poética e sensitiva: são obras que não se encaixam em padrões midiáticos hollywoodianos e que, assim como o fanzine, moram em um cenário mais simples e independente. O termo fanzine vem da expressão fanatic magazine, em inglês, e retrata publicações feitas para um público entusiasta por determinado assunto, no caso, o cinema. Diferentemente das publicações comerciais, o fanzine possui menor tiragem e cunho artesanal. Ademais, o zine é um tipo de publicação popular que defende o consumo de produtos impressos.
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metodologia A abordagem da pesquisa se dará através do método fenomenológico descrito por Merleau Ponty, que de maneira neutra e objetiva, aborda questões humanas baseadas na capacidade de percepção do indivíduo, a partir de seus sentidos, onde o entorno é o gerador de significado primordial. Segundo Fábio Botelho Josgrilberg, doutor em Ciências da Comunicação pela ECA/USP: Tudo aquilo que é percebido pela consciência é definido na fenomenologia como fenômeno, sendo-lhe atribuído um sentido no momento da percepção pela consciência doadora de sentido. A percepção, é importante notar, precede qualquer atividade categorial. Sendo assim, a ciência, bem como a linguagem e a cultura, é apenas uma expressão segunda dessa relação fundadora. (2006 apud Merleau-Ponty, 1966, p. III).
Os argumentos aqui levantados devem ser baseados em lógicas préexistentes, seja por autores, pesquisas ou análises, que tratam de assegurar a veracidade das informações e toda a sua conceituação. A técnica de pesquisa descritiva utilizada para a coleta de dados e para a análise dos mesmos se dará através de uma pesquisa bibliográfica a partir de leituras de obras específicas, além de análises de obras cinematográficas e conteúdos baseados em percepções estéticas e sinestésicas. Interpretação de textos, assimilação de conteúdos originais e estruturação coerente do pensamento com base em teóricos que norteiam o projeto também serão essenciais para o desenvolvimento da pesquisa em questão.
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projeto cidades-protagonistas
Muitos diretores trabalharam as cidades-protagonistas com um forte apelo estético, orientados muitas vezes pela valorização turística. Woody Allen, por exemplo, realizou uma série de obras percorrendo grandes metrópoles: Manhattan (1979), Vicky, Cristina, Barcelona (2008), Meia-Noite em Paris (2011) e Para Roma, com Amor (2012). Da mesma maneira, temos Win Wenders com Alice nas Cidades (1974), Paris, Texas (1984), Asas do Desejo (1987) e Lisboa (1994). Outros exemplos são: Paris, Te Amo (2006), Nova York, Eu Te Amo (2008) e Rio, Eu Te Amo (2014) que fazem parte da série Cities of Love do produtor, roteirista e diretor francês Emmanuel Benbihy, onde as obras são compostas por uma coletânea de curta-metragens que retratam o amor nas grandes metrópoles. Para a presente pesquisa, os filmes selecionados como objetos de estudo – Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual (Medianeras, Gustavo Taretto, 2011) e Encontros e Desencontros (Lost in Translation, Sofia Coppola, 2003) – são conectados pelas cidades protagonistas e seus cenários, que possuem extrema
relevância na significação no cotidiano dos personagens, uma vez que refletem as suas escolhas, sentimentos e ações. Seu principal diferencial com relação às outras obras se dá através da influência urbana na vida dos intérpretes, que gera muitas vezes um sentimento de angústia, opressão e não pertencimento. Cada obra possui suas características únicas de retratar o relacionamento dos personagens dentro daquele cenário, uma vez que exprimem o viés do diretor e muito do culturalismo expresso por cada uma das cidades. Todavia, é possível notar características ideológicas em comum nos filmes, como a solidão nas grandes cidades, o relacionamento dos indivíduos e sua relação com a tecnologia, além de aproximações gráficas, como paleta cromática, fotografia e cenários. Outro ponto de partida para traçar um paralelo entre as obras é o forte vínculo entre as metrópoles, que possuem características comuns ao redor do globo e, principalmente, a sua maneira espontânea de retratar o cotidiano, de maneira singela, poética e subjetiva.
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Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual Mariana (Pilar López de Ayala) e Martín (Javier Drolas) moram no mesmo quarteirão no centro de Buenos Aires, uma metrópole que os une ao mesmo tempo em que os separa: frequentam os mesmo lugares, mas não sabem da existência um do outro. Martin é um web designer fóbico que custa a sair de seu apartamento. Mariana é arquiteta e trabalha como vitrinista. Submersos na solidão urbana, as personagens revelam seus descontentamentos com a cidade ao mesmo tempo em que buscam sentido em seus relacionamentos – sejam pessoais ou virtuais. Medianeras, Gustavo Taretto, 2011.
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Encontros & Desencontros Bob Harris (Bill Murray) e Charlotte (Scarlett Johansson) são dois americanos em Tóquio. Ambos ficam hospedados no mesmo hotel, embora não se conheçam. Bob é um ator de cinema que vem à cidade para filmar um comercial de uísque, enquanto Charlotte acompanha seu marido John (Giovanni Ribisi) a trabalho. Diante das noites mal dormidas e da solidão de suas estadias, Bob e Charlotte passam a questionar suas rotinas e a buscar no outro um sentimento mútuo de identificação, que parece lhes faltar na cidade. Lost in Traslation, Sofia Coppola, 2003.
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É importante ressaltar a definição da cidade de acordo com cada observador. O modo como o diretor busca captar a cidade é um viés deveras subjetivo, além de ser uma escolha livre do cineasta: ele é o guia turístico de um universo cinematográfico (MOGADOURO, 2015). Existe o viés do diretor, o meu viés, o viés de outros indivíduos – que podem ou não concordar com o ponto de vista alheio.
O que faz alguém representar de uma determinada forma em detrimento de outra é o mesmo motivo que faz alguém se identificar com aquela forma de representação: trata-se da experiência comum de vida urbana. Tratase, então, da cidade invisível, contemporânea, que está em mim, que está em Taretto e que está no público que, de alguma forma, se sente tocado pela obra. (MOURA, 2016, p. 41).
A fala de Moura evidencia uma identificação com a representação fílmica. Buenos Aires e Tóquio são cidades concretas, muito embora as obras sejam uma representação mediada pelo imaginário de seus respectivos diretores, que captam uma cidade real, mas não a cidade real em si (MOURA, 2016). Ademais, para cada indivíduo existe uma cidade, que não é definida por sua essência, mas pela própria vivência do homem.
Cada pessoa percebe e enxerga não a cidade em si, mas o que a cidade proporciona para cada um de experiência de vida, de repertório social e de visão de mundo. Ora, tudo que é percebido por nós é uma combinação entre a coisa
o recorte de uma metrópole
concreta e a nossa formação mental. (MOURA, 2016, p. 42).
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As duas obras escolhidas como objetos de estudo possuem dois observadores diferentes: Gustavo Taretto e Sofia Coppola, que exibem personagens que não são flâneurs1 propriamente ditos, mas que experienciam o entorno da mesma maneira, sempre buscando significado. Tendo posto que a cidade, sempre que retratada, é representada através de uma visão específica, o recorte utilizado por Gustavo Taretto, em Medianeras, mostra uma Buenos Aires decadente onde a arquitetura ali presente mostra-se insatisfatória, criando empecilhos até mesmo físicos que dificultam o encontro dos dois personagens centrais. Para Sofia Coppola, a cidade de Tóquio torna-se um paradoxo: enquanto protagonista, possui exageros e, justamente por isso, seus personagens sentem-se reclusos. O próprio nome original da obra em inglês, “Lost in Translation” ou
“Perdido na Tradução”, em tradução livre, remete às dificuldades culturais, espaciais e linguísticas das personagens em uma cidade completamente diferente da habitual. Além disso, esse sentimento de deslocamento pode ser verificado também em Medianeras, possivelmente gerado pelo sentimento de “estar na cidade”. Se por um lado as personagens de Coppola estão completamente fora de sua zona de conforto em uma cidade que não lhes pertence, por outro, as personagens de Taretto habitam sua própria urbe, mas, ainda assim, não se encontram. Esse deslocamento de identidade baseado em espaços que nos cercam pode ser perfeitamente exemplificado por Marc Augé em sua teoria sobre Não-Lugares. Para o autor, um lugar pode ser definido como identitário, relacional e histórico. Um espaço que não se relaciona com essas três categorias pode ser definido como um não-lugar. Segundo Marc Augé:
Flâneur (do verbo flâner, que significa “para passear”) é um termo cunhado pelo poeta francês Charles Baudelaire designado a um indivíduo observador que vaga pela cidade, sem objetivos específicos, mas atento à experimentação dos arredores e possivelmente à estética do entorno urbano. Também pode significar “vadio”, “errante” e “observador”.
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O lugar e o não-lugar são, antes, polaridades fugidias: o primeiro nunca é completamente apagado e o segundo nunca se realiza totalmente – palimpsestos em que se reinscreve, sem cessar, o jogo embaralhado da identidade e da relação. (1994, p. 74).
É interessante observar a conexão entre três autores: Marc Augé constitui sua teoria sobre Lugares e Não-Lugares a partir da A Invenção do Cotidiano, de Michel de Certeau, que propõe as noções de lugar e espaço. Da mesma maneira, Merleau-Ponty utiliza-se da mesma referência de Certeau para suas percepções de espaços, que estudam o espaço geométrico e o espaço antropológico, em sua Fenomenologia da Percepção. O espaço geométrico diz respeito ao ambiente físico, enquanto o espaço antropológico é determinado pela estruturação dos próprios indivíduos. Novamente, Augé posiciona-se favorável à ideia do espaço antropológico:
A supermodernidade2 é produtora de não-lugares, isto é, de espaços que não são em si lugares antropológicos e que [...] não integram lugares antigos: estes, repertoriados, classificados e promovidos a “lugares de memória”, ocupam aí um lugar circunscrito e específico. (1994, p. 73).
Assim, entendemos que os espaços chamados de não-lugares, não são geradores de identidade, tampouco configuram-se como espaço antropológico. 2 Supermodernidade foi um conceito desenvolvido por Marc Augé em sua obra Não-Lugares para conceituar a atual exorbitância dos princípios criados na modernidade. Para Gilles Lipovetsky, o termo pode ser utilizado como Hipermodernidade.
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Logo, podemos considerar que a cidade determina uma tensão solitária aos personagens, uma vez que é composta por não-lugares. Entre os recortes de metrópoles propostos por outros autores, podemos citar o artista gráfico Vahram Muratyan em Paris versus New York: a tally of two cities, que retrata graficamente a dicotomia entre as metrópoles Nova Iorque e Paris. Do ponto de vista de Muratyan, as duas cidades possuem características únicas em sua arquitetura, costumes e pontos turísticos, ao passo que ambas se aproximam justamente onde se diferem. Outro exemplo de
Fig 1. O jornal
Fig 2. A fachada
recorte se dá em As Cidades Invisíveis, de Ítalo Calvino, que reúne a visão de Marco Polo sobre as diversas cidades por onde passou em sua jornada, cada uma com seu espaço e suas particularidades. Para Calvino, o protagonismo das cidades chega ao nível de personificação das mesmas, que possuem nomes personalizados. Ademais, cada cidade descrita pelo autor é única em sua estética, muito embora essas mesmas cidades sejam arquétipos, representando sua essência, mas também refletem paradoxalmente outras cidades sem que isso intervenha em sua singularidade.
Fig 4. Proposta visual da cidade de Zaira, de Calvino. Ilustração de Karina Puente.
Calvino traz as cidades personificadas separadas por capítulos, como por exemplo: “As cidades e o nome” (sobre identidade e sentido de lugar), “As cidades e os símbolos” (sobre a subconsciência coletiva e a imagem da cidade) e “As cidades e as trocas” (sobre as relações entre os habitantes), onde o autor retrata os fios (Ercília) e redes (Esmeraldina) sobrepostos, além da noção de mutabilidade das cidades, ainda que feitas de concreto (MONTEIRO, 2009). É interessante observar a mesma fala presente no discurso inicial de Martín, em Medianeras, que ironiza a estética dos fios emaranhados que preenchem o céu de Buenos Aires.
Fig 3. O drink Fig 5. Captura do filme Medianeras, 2011.
Fig 6. Captura do filme Medianeras, 2011.
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De maneira leve e poética, os filmes retratam o relacionamento dos personagens em meio à cidade. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman fez diversas análises sobre o relacionamento humano na pós-modernidade, e estudou, entre outros assuntos, a liquidez3 à qual estamos sujeitos na atualidade. Sua principal crítica gira em torno das relações frágeis, chamadas pelo autor de conexões. Tais conexões pressupõem a instabilidade das relações humanas a partir de uma nova configuração das tecnologias de comunicação e informação que trazem consigo novos cenários de interação interpessoal.
Fig 7. Captura do filme Medianeras, 2011.
relações entre a cidade e o indivíduo
Esta mesma configuração característica da modernidade líquida proposta por Bauman, está ligada também aos fluxos de informações sensoriais bastante intensos na comunicação urbana, gerados a partir de um motor de ansiedade — as cibercidades. Segundo André Lemos: A liquidez de Bauman diz respeito aos ideais pós-modernos de fluidez, efemeridade e fragilidade existentes, sobretudo, nos relacionamentos humanos.
3
32 | 33 A cidade-ciborgue é a cidade da cibercultura, preenchida e complementada por novas redes telemáticas — e as tecnologias daí derivadas, internet fixa, wireless, celular, satélites etc. — que se somam às redes de transporte, de energia, de saneamento, de iluminação e de comunicação. Devemos compreender a cidadeciborgue como um híbrido, composto de redes sociais, infra-estruturas físicas, redes imaginárias (Westwood e Williams 1997), constituindo um organismo complexo, cuja dinâmica está atrelada às novas tecnologias da cibercultura, próximo da metáfora do ciborgue (Lemos 1999). A cidade sempre foi um artifício e hoje essa
Ainda segundo Moura (2016), os efeitos desse cotidiano midiatizado impactam não apenas a cidade, mas também o vínculo das pessoas com os espaços urbanos e suas relações interpessoais. Um outro ponto observado nas obras em estudo é a ansiedade gerada pela grande quantidade de desconhecidos que existem ao redor das personagens principais. A cidade pertence ao protagonista, mas também existem tantos outros desconhecidos no mesmo lugar, cada um com suas preocupações e rotina, a quem a cidade também pertence. Segundo Madeleine Bunting:
artificialidade está presa nas garras do digital. (2004, p. 130-131). O espírito da cidade é formado pelo acúmulo de minúsculas interações
A comunicação torna-se predominantemente virtual e, consequentemente, as redes que deveriam nos conectar, contraditoriamente nos isolam. Além disso, de acordo com Moura (2016), na intenção de se resguardar da abundância informacional característica das cibercidades, o indivíduo cria uma certa indiferença aos estímulos visuais e sonoros do espaço urbano e também aos habitantes. Na cena inicial de Encontros e Desencontros, temos o claro exemplo de uma cibercidade, evidenciado por seu exacerbado fluxo de informações visuais e sonoras.
cotidianas com o motorista de ônibus, os outros passageiros, o jornaleiro, o garçom do café; das poucas palavras, dos cumprimentos, dos pequenos gestos que aplainam as arestas ásperas da vida urbana. (s/d apud BAUMAN, 2009, p. 88)
Na mesma obra, Confiança e Medo na Cidade, onde Bauman trata das relações entre os indivíduos e a cidade, surgem dois conceitos de sociabilidade: mixofilia e mixofobia, agravantes dessa ansiedade urbana.
A cidade induz simultaneamente à mixofilia e à mixofobia. A vida urbana é intrínseca e irremediavelmente ambivalente. [...] Mixofobia e mixofilia coexistem não apenas em cada cidade, mas também em cada cidadão. Trata-se claramente de uma coexistência incômoda, cheia de som e fúria, mas, mesmo assim, muito significativa para as pessoas que sofrem a ambivalência da modernidade líquida. (BAUMAN, 2009, p. 47-48) Fig 8. Captura do filme Encontros e Desencontros, 2003.
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Entende-se como mixofilia o interesse em estar em um ambiente diferenciado, estimulante e em meio às diferenças. Já o seu termo oposto, a mixofobia, pode ser compreendido como o medo de misturar-se com outros indivíduos, com estrangeiros e até mesmo com o desconhecido. Ainda de acordo com Bauman (2009, p. 49-50), arquitetos e urbanistas poderiam contribuir com o aumento das reações mixofílicas em detrimento das mixofóbicas, difundindo espaços públicos abertos e colaborativos que pudessem acomodar os habitantes - muito embora o oposto seja muito mais favorecido atualmente. Podemos observar um comportamento mixofóbico em alguns personagens dos filmes: Martín e Mariana, na obra de Taretto e Charlotte na obra de Coppola.
Fig 9. Captura do filme Medianeras, 2011.
Da mesma maneira em que existem termos que definem o sentimento positivo ou negativo da sociabilidade, temos também duas concepções de sensação que dizem respeito à urbanidade, ou seja, ao desprezo ou estima por determinado lugar. Yi-Fu Tuan, geógrafo e precursor da geografia humanista, cunhou o termo topofilia, em sua obra homônima Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente, que é definido como uma experiência pessoal que significa “o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou ambiente físico” (1974, p. 5). Já o termo oposto, topofobia, é o receio ou angústia de determinado lugar ou ambiente. Bauman debate com Richard Sennett a respeito do receio dos indivíduos que habitam as cidades. Sennett reconhece, em sua obra Carne e Pedra, a capacidade de personificação da cidade, expressando que o urbano, a arquitetura e a cidade são derivativos da civilização, muito embora a civilização, de certo modo, também seja diretamente acometida
pela cidade. Segundo Bertucci (2011), a solução para as pessoas seria, então: “voltar a reparar umas nas outras, a se sensibilizar com a cidade, pois jamais seremos capazes de captar a diferença alheia enquanto não reconhecermos nossa própria inaptidão”. O que faz com que as pessoas se identifiquem com as cidades cinematográficas é justamente a proximidade com a cidade em que vivemos – e que pode muito bem ser um cenário em comum entre as grandes metrópoles, o que nos faz, de certa forma, criar vínculos e identificações com os personagens e o cenário urbano na qual estamos vendo – frequentemente fazendo paralelos com a cidade em que habitamos. O filme é uma construção narrativa que pode ou não ser ficcional, e possui como premissa a propagação de uma mensagem. Além de ser um produto comercial, a obra cinematográfica possui um viés subjetivo, uma compreensão que muitas vezes parte de um imaginário construído a partir de um repertório intrínseco ao autor.
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Para os autores em estudo, a cidade deixa de ser um mero cenário para ser também intérprete da obra, num enredo que firma seus pilares no espaço urbano, em sua personificação, na interação das personagens e, mais do que isso, fazendo-se valer das propriedades sinestésicas propiciadas aos indivíduos. O ser / estar parte da cidade geram diversas experiências sensoriais: físicas e psicológicas, que fazem parte da rotina progressiva e do cotidiano dos transeuntes. Em Medianeras, tão próximo da nossa realidade justamente pela maturidade, considerando nossas carências e anseios, nos deparamos com protagonistas que compartilham conosco os seus dias fundados na solidão latente, onde digerimos uma história que parecemos já ter vivenciado. Segundo Taretto, o filme retrata:
É justamente por conta dessas barreiras arquitetônicas, das diferenças, do caos, da rotina, das fragilidades sociais contemporâneas (tais como estresse, depressão, ansiedade e solidão, entre outros males da modernidade líquida) e da ausência de identificação com os espaços urbanos que nos fechamos cada vez mais para determinadas interações interpessoais, nos levando à reclusão e, por fim, à solidão. Esta mesma solidão e ausência de identificação que analisamos em Medianeras, é presente também em Encontros e Desencontros. E isto desemboca em uma individualização espiritual [...] propiciada, em virtude de sua grandeza, pela cidade. É evidente uma série de causas. Inicialmente, a dificuldade de fazer valer a própria personalidade nas dimensões da vida na cidade grande (SIMMEL, 2005, p. 587).
[...] uma solidão a que já estamos acostumados. De todos os dias. Solidão urbana. A solidão que sentimos quando estamos rodeados de desconhecidos. A das cidades em que as pessoas se sentem mais seguras entre quatro paredes. A solidão do delivery. A solidão da mensagem de texto e do e-mail. (TARETTO, 2011).
Ainda sobre Medianeras, podemos discorrer sobre uma grande crítica por trás do filme: a defesa de que as patologias mais comumente encontradas nas metrópoles são geradas a partir da cidade e de suas barreiras arquitetônicas físicas – literalmente chamadas de medianeras4, que batizam o filme de Taretto. Aqui, temos a oportunidade de entender um paralelo constante entre a relação das cidades com os indivíduos.
Na arquitetura, medianera é o nome dado às paredes laterais dos edifícios que não possuem janelas, por conta de sua proximidade com as construções adjacentes. Em espanhol: pared medianera. Em português: empena-cega.
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Fig 10. Captura do filme Encontros e Desencontros, 2003.
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Na obra de Coppola, a tecnologia é expressa de maneira ainda mais pulsante pela própria cidade do que pelos indivíduos. Mais uma vez, a individualização ocorre pela falta de adaptação das personagens na metrópole e, muito embora vejamos Tóquio como uma cidade efervescente, a personalidade dos protagonistas contrapõe-se mais uma vez, revelando-se de maneira quase absorta.
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Gilles Lipovetsky, em seu discurso acerca da estetização, discute alguns aspectos do consumo, do capitalismo e da cultura, assim como os fenômenos artísticos culturais em suas mais diversas expressões. Segundo o autor, no capitalismo transestético5 não se vende apenas o produto, se vende a beleza, o design, o personalizado, o diferente. A grande questão para o autor é que arte e mercado estão cada vez mais em fusão, inflando e saturando a experiência contemporânea da sociedade sobre os valores estéticos. Assim, a arte e a estética perdem seu poder questionador e passam
a invalidar a sua capacidade de transformar a humanidade, agregar sensações ou refletir sobre a própria função, onde seu propósito passa a ser, então, prioritariamente mercadológico. Lipovetsky demonstra grande relevância em suas teorias, pois aborda aspectos estéticos em todos os sentidos possíveis permeando, ainda, o universo do cinema, e por este motivo tornase essencial como teoria de base para o projeto. A maneira como os alguns cineastas representam a cidade e a cultura dos cenários de seus filmes, pode ser compreendida pela doutoranda em Estudos da Mídia, Gabriela Gadelha:
[...] As cidades históricas estão se reconfigurando e se tornando miseen-scènes6, verdadeiras obras de arte no espaço urbano, capazes de mexer com a emoção e o imaginário dos visitantes por meio da “estetização total da vida cotidiana”. (2016 apud LIPOVETSKY, 2015, p. 239).
a estética urbana
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O termo transestético evidencia o caráter híbrido da arte, da cultura e do consumo. Encenação, direção e produção de filmes ou peças.
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A citação de Gadelha traz a questão da estética para o urbano e o cotidiano, e cria um paralelo com a pesquisa em questão. Se por um lado a crítica do autor gira em torno da exacerbação da estética como superficial e decorativa, é necessário ressaltar que é possível trazer as cidades, a cultura de seus cenários e o cotidiano cinematográfico de maneira real, leve e sem pretensões, como vemos nos recortes dos filmes utilizados como objetos de estudo. Para exemplificar, os filmes em questão possuem como uma de suas características principais a análise visual e cultural de determinadas cidades, utilizadas como “cidadespersonagem”. Diferente de outras grandes obras massificadas que retratam, principalmente, o glamour e o consumo em massa das grandes cidades, aqui o intento é justamente provocar a cidade crua, como realmente a vivenciamos, longe dos estereótipos cinematográficos onde vemos histórias que retratam um cotidiano muito distante da nossa realidade, muito
embora exista de fato um capitalismo latente presente nas grandes cidades, cada vez mais impulsionado pelo turismo e entretenimento. Alguns teóricos como Lipovetsky e Jan Gehl defenderam que as cidades passaram a ser construídas como um produto de consumo, em prol da estetização pejorativa e capitalista, onde a “a organização técnica do consumo [...] levou a cidade a consumir-se a si própria.” (DEBORD, 1967). Arquiteto e professor dinamarquês, Gehl estudou o poder das cidades modernas de afastar a interação humana e afirma que podemos começar a construir cidades de uma maneira em que as necessidades humanas sejam levadas em consideração. Ele defende que o planejamento urbano deva ser centrado nos habitantes e em sua qualidade de vida e não puramente pautado na estética ou na necessidade de abrigar cada vez mais carros e moradias. Nascido em Copenhague, cidade considerada a mais habitável do mundo, o arquiteto critica o modelo modernista de urbanização como individualista,
além de acreditar que a maneira como construímos a cidade realmente impacta em nossa saúde. Da mesma forma, a escritora e ativista americana Jane Jacobs também foi a favor da humanização das cidades e contribuiu com a crítica a respeito do abandono e da precarização das metrópoles, capacitando os espaços para as relações interpessoais a partir da concepção das cidades, buscando eliminar seus empecilhos sócio-espaciais. Outrossim, o conceito de “cidade genérica”, trabalhado pelo arquiteto Rem Koolhaas, critica as cidades contemporâneas partindo da premissa de que o urbanismo globalizado contribuiu com a padronização das cidades, que tornaramse, com o tempo, destituídas de qualidades ou identidade própria.
A cidade genérica, tal como é descrita por Rem Koolhaas, seria então a cidade que se auto-reproduz sem ‘sentimentalismo’, sem a menor preocupação com uma singularidade que lhe seria própria, a cidade que nasce e renasce em função das necessidades e contingências, a cidade que engendra de maneira objetiva, pragmática, sua própria morfologia. [...] A cidade autometamórfica. Não há então necessidade de se ter qualquer preocupação estética, uma vez que as cidades genéricas, por sua própria similaridade, impõem sua própria configuração como uma estética sem critérios, sem referências, totalmente liberada da busca de singularidade. (JEUDY, 2005, p. 98-99).
Ambas as obras estudadas evidenciam o crescimento de suas cidades pautado em uma expansão vertiginosa. Na obra de Taretto, podemos observar como as irregularidades urbanas são avassaladoras para os protagonistas: logo no início do filme ouvimos o discurso mais significativo de Martín ao longo da história, onde narra a sua arquitetura e os espaços urbanos.
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Fig 11. Captura do filme Medianeras, 2011.
Já para Coppola, a cidade é intensa e demonstra, enquanto personagem, um ritmo mais acelerado, contrastando com a letargia existencial dos protagonistas. Desta maneira, evidenciamos também um comportamento apático nas personagens justamente pelo sentimento de magnitude causado pela cidade. Aqui a cidade dota-se de um protagonismo tecnológico tão complexo que as personagens tornam-se reclusas. Como vimos anteriormente nas cibercidades, o fluxo de informações visuais na cidade é deveras exorbitante, de modo que os indivíduos criam uma espécie de indiferença aos incentivos visuais. A quantidade de elementos simbólicos que constroem o urbano torna-se parte da cidade, influenciando diretamente nos hábitos e relações de seus residentes.
Fig 12. Captura do filme Encontros e Desencontros, 2003.
Entende-se, portanto, que as pessoas, os edifícios, as vitrines, as ruas, as avenidas, as publicidades, os sistemas de comunicação, os monumentos arquitetônicos estão configurados de forma a construir uma realidade simbólica do seu próprio contexto urbano. Esses elementos, quando vistos como um todo, possibilitam uma reflexão sobre os hábitos e vivências de uma determinada cidade. (MOURA, 2016, p. 42).
Para concluir, Lipovetsky e Serroy (2009) entendem que a constante disseminação de imagens e informações na atualidade não está atrelada diretamente ao declínio da cultura, tampouco da arte ou da sensibilidade estética. Tal disseminação integra uma era midiatizada que pode ainda ser passível de reflexão.
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resultados de pesquisa
Com a pesquisa foi possível analisar que os autores utilizados na pesquisa demonstram a percepção de que foram, de alguma forma, impactados pelo urbano, o que confirma que os recortes compostos por Gustavo Taretto e Sofia Coppola estão muito próximos do nosso cotidiano. No primeiro capítulo, entende-se que as visões dos cineastas responsáveis pelas obras utilizadas como objeto de estudo são parte de um recorte composto por suas experiências. Assim, cada criação composta a partir de uma visão sobre a cidade é intrínseca e depende única e exclusivamente de um viés cultural e experimental do autor. A escolha dos recortes é embasada em minhas experiências pessoais e em uma maneira própria e inerente de ver o mundo. De qualquer maneira, as diferentes visões que coincidem com esse mesmo olhar convergem em um ponto de relevância e desenvolve a veracidade das ideias aqui levantadas, uma vez que foram validadas por diversos autores. No segundo capítulo, compreendese a fragilidade das relações humanas a
partir da visão de Bauman e a liquidez das nossas conexões, sobretudo no ambiente urbano e no cenário das cibercidades, que trabalham a combinação entre os espaços físicos e virtuais. Aqui, efetivamente falamos a respeito do sentimento de estar na cidade e a sensação de pertencimento - ou a falta dele. No terceiro capítulo, foi abordada a estética das grandes metrópoles e realizado um contraponto com as cidades-protagonistas retratadas. Foi possível elucidar a dicotomia da estética urbana pejorativa e limitada, em conjunto com a exacerbação informacional que funciona como motor de consumo estético nas metrópoles, que influencia direta e indiretamente no convívio dos habitantes. De maneira geral, a pesquisa criou relações entre a estética urbana e o conceito de cibercidade, correlacionando uma tecnologia intangível com os nossos espaços de habitação tangíveis. O paradoxo dessa relação está no fato de que os espaços urbanos e a tecnologia, que deveriam estar combinados na união e no relacionamento dos indivíduos, culminam muitas vezes no oposto.
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requisitos para o projeto O primeiro requisito foi a elaboração da pesquisa em si, que serve de embasamento teórico para o projeto. Como segundo requisito, temos a produção dos roteiros para as peças. Esse processo foi baseado em um método conhecido como Cadáver Esquisito, desenvolvido no século XX por pintores surrealistas, e moldou a estrutura na qual os sentimentos dos personagens foram trabalhados nos fanzines. Para o desenvolvimento do produto, pesquisas de referências e análise de materiais físicos foram
essenciais e serviram de inspiração, assim como técnicas gráficas que também se mostraram necessárias para composição do objeto. Por fim, o terceiro requisito foi a busca por suportes e materiais que pudessem traduzir a essência dos filmes para um produto gráfico. Além disso, para a criação da identidade visual do projeto, foi necessário compor um universo imagético, cromático e tipográfico, que até então eram apenas parte dos recortes captados nos filmes, a partir do olhar dos diretores.
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processo criativo
cinestecidades
O processo criativo das peças gráficas foi baseado em uma técnica conhecida como Cadáver Esquisito, desenvolvida no século XX por pintores surrealistas, que consistia, basicamente, na escolha aleatória de partes do corpo que, juntas, deveriam formar um todo. O roteiro foi definido da seguinte maneira: com o filme mudo e sem legendas, foi possível tomar nota dos sentimentos dos personagens que se relacionam, principalmente, com a cidade. A partir da coleta desses dados, um mapa de sentimentos foi desenvolvido para que pudesse embasar a criação das
peças. O maior desafio do projeto foi justamente esse: a busca pela tangibilização dos sentimentos dos personagens com a metrópole e como buscar materiais, imagens e elementos que pudessem realizar essa tradução do filme para outro tipo de suporte gráfico, no caso, os fanzines. Independentemente do mapa de sentimentos composto, é importante elucidar que tanto os personagens quanto as obras apresentam uma sensibilidade exacerbada, fato que justifica, mais à frente, a escolha das cores, dos materiais e até mesmo do conceito criativo das peças.
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conceito criativo O conceito das peças é tangibilizar a relação dos personagens com a cidade e consiste, graficamente, em camadas de papeis diferentes sobrepostas, com tamanhos e cores diferentes. Esse caráter fragmentado se justifica, pois as cidades possuem diversas informações
visuais que se sobrepõe. Da mesma maneira, os sentimentos podem existir em conjunto, sobrepondo-se uns aos outros e intercalando-se. Para cada tipo de material, uma sensibilidade diferente, resultado da relação dos personagens com a própria metrópole.
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paleta cromática É importante dizer que os diretores são capazes de manipular as emoções dos telespectadores a partir das cores, uma vez que a cor tem o poder de influenciar o modo como lidamos com as sensações. A paleta cromática do projeto foi baseada no universo imagético dos filmes. Os tons de rosa e azul claro sugerem uma sensação de delicadeza e fragilidade, muito presentes na poética das obras retratadas.
cmyk: 10, 40, 20, 0 rgb: 224, 165, 173 hex: #E0A5AD pantone: 501 U
cmyk: 5, 30, 15, 0 rgb: 236, 187, 190 hex: #ECBBBE pantone: 502 U
cmyk: 5, 20, 10, 0 rgb: 252, 212, 210 hex: #FCD4D2 pantone: 503 U
cmyk: 40, 20, 0, 0 rgb: 149, 182, 223 hex: #95B6DF pantone: 659 U
cmyk: 25, 10, 0, 0 rgb: 186, 210, 237 hex: #BAD2ED pantone: 658 U
cmyk: 15, 5, 0, 0 rgb: 212, 227, 245 hex: #D4E3F5 pantone: 657 U
universo imagético Muito do universo imagético das obras foi utilizado para compor o projeto gráfico. Acrescido apenas de outras imagens que, mesmo não estando presentes diretamente no filme, fazem parte de seu contexto e da narrativa dos personagens.
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tipografia O projeto trabalha com quatro faces tipográficas distintas: a Lemon Milk para a identidade visual e chamadas principais. Sem serifa, geométrica e all caps, a fonte possui grande personalidade e pode ser utilizada em sua versão preenchida ou com o outline sobreposto. A Cabrito Didone foi utilizada para a marca, subtítulos e
chamadas secundárias. Serifada e com terminações arredondadas, ressalta os atributos poéticos do projeto. A Avenir compõe as massas de texto mais extensas e possui ótima legibilidade por ser geométrica e não possuir serifa. Por fim, a Shorelines é uma fonte script que serve como apoio nas peças gráficas, trazendo sempre alguma fala do filme.
avenir
lemon milk
tipografia
abcdefghijklmn opqrstuvwxyz 1234567890
abcdefghijklmn opqrstuvwxyz 1234567890
cabrito didone
shorelines
abcdefghijklmn o p q rs t uvwxyz 1234567890
abcdefghijklmn opqrstuvwxyz 1234567890
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marca & naming A marca é uma combinação entre lettering, endosso e grafismo. O desenho foi desenvolvido em linhas e simboliza graficamente a cidade. A mancha de cor sobre o grafismo representa o sentimento ali presente. O logo possui três versões: grafismo completo com
endosso, símbolo sem endosso e apenas o símbolo, utilizado em aplicações reduzidas, onde o símbolo chega a uma redução máxima de 7mm. As três versões podem ser utilizadas dentro da paleta cromática, ou seja, a mancha de cor pode ser aplicada tanto no rosa quanto no azul.
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O nome remete aos três pilares sobre os quais o projeto é pautado:
cinema + sinestesia + cidades cinema (cine) – abreviação de cinematographe, a partir do grego kinema, que significa “movimento”, de kinein, “deslocar, movimentar, mexer”. sinestesia – synaísthesis, que quer dizer “sentir junto”. O termo é resultado da combinação de syn, que significa “união”, “junto”, “ao mesmo tempo”, e aísthesis, que quer dizer “sensação”.
A escolha do uso do endosso “o sentimento nas cidades protagonistas” surge da necessidade de trazer à tona um pouco mais sobre o tema abordado no projeto.
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produto final
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Tipo de impresso: 02 fanzines + 01 luva Título do impresso: Cinestecidades: Buenos Aires (Medianeras), vol. I Cinestecidades: Tóquio (Encontros & Desencontros), vol. II
memorial descritivo
Conceito editorial do impresso: Os dois fanzines nascem da necessidade de ressignificar uma plataforma cinematográfica para uma peça gráfica tangível, que possa expressar o sentimento dos personagens de estar na cidade através do olhar dos diretores: Gustavo Taretto e Sofia Coppola. O formato foi escolhido por conta do diferencial do projeto: assim como o zine, os filmes trabalhados moram em um cenário mais simples e independente. Além disso, o fanzine possui menor tiragem, cunho artesanal e ainda defende o consumo de produtos impressos.
Público-alvo O público-alvo é composto por mulheres e homens, sem definição de faixa etária, que tenham interesse no consumo de peças independentes, que procuram retratar o cinema urbano por um viés poético e sensível. Periodicidade e tiragem: O projeto foi desenvolvido apenas para o trabalho de conclusão de curso. Sua periodicidade é tida como pontual, mas pode estender-se posteriormente em outros volumes. A primeira tiragem contém dois volumes, Buenos Aires e Tóquio, protegidos por uma luva.
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Padronização gráfica (grid):
LUVA: Capa: percalux branco 300g/m² Revestimento: papel couché fosco 90g/m² Dimensões: 135mm x 205mm x 15mm
IMPRESSÃO MIOLO: No projeto gráfico das peças foram utilizados diversos tipos de papeis, justamente para trabalhar os diferentes tipos de sinestesia que envolvem o relacionamento dos personagens com as cidades protagonistas. Substratos utilizados: Couché fosco | Gramatura: 90g/m² Couché brilhante | Gramatura: 90g/m² Papel jornal | Gramatura: 90g/m² Papel vegetal | Gramatura: 90g/m²
Formato aberto: 260mm x 200mm | Formato fechado: 130mm x 200mm. Margens: Superior 10mm ; Inferior 10mm ; Interna 10mm ; Externa 10mm. Colunas: 02 ; Medianiz: 6mm ; Sangria: 5mm.
Couché e sulfite: são papeis simples, utilizados como base. Papel jornal: mais fino e poroso, remete à um contexto urbano e cotidiano. Papel vegetal: mais delicado, remete à sensibilidade e vulnerabilidade dos personagens.
Formatos: Para criar as diferentes camadas do livreto, foram utilizados três tamanhos de lâmina. Da menor para a maior: 1. ABERTO: 200mm x 100mm FECHADO: 100mm x 100mm 2. ABERTO: 220mm x 140mm FECHADO: 110mm x 140mm 3. ABERTO: 260mm x 200mm FECHADO: 130mm x 200mm Acabamento gráfico: Dobra, refile e grampo. Processo de impressão: Digital a laser, por conta de sua baixa tiragem e diferentes tipos de substratos. Sistema de cores: Realizada em CMYK (4x4), mas também pode ser feita em escala PANTONE.
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Pré-impressão (softwares): Montagem e estudo: Adobe Illustrator CC 2015 Diagramação: Adobe Indesign CC 2015 Edição: Adobe Photoshop CC 2015 Resolução utilizada: 300 DPI.
IMPRESSÃO PÔSTER Substratos utilizados: Papel jornal | Gramatura: 90g/m² Couché fosco | Gramatura: 90g/m² Formato: ABERTO: 240mm x 360mm FECHADO: 120mm x 180mm Acabamento gráfico: Dobra e refile. Processo de impressão: Digital a laser, por conta de sua baixa tiragem e substrato poroso. Sistema de cores: Realizada em CMYK (4x4), mas também pode ser feita em escala PANTONE. Pré-impressão (softwares): Montagem: Adobe Illustrator CC 2015 Edição: Adobe Photoshop CC 2015 Resolução utilizada: 300 DPI.
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considerações finais
Foi um longo projeto, que exigiu muitas escolhas e curiosidade pelas percepções urbanas. A definição do tema não foi fácil: foram meses de ansiedade cogitando um tema que pudesse reunir tanto um projeto que abrigasse meu gosto particular, quanto algo de cunho acadêmico, sem deixar de lado a relevância social. Sempre tive em mente duas vertentes: o urbano e o cinema. A partir dessas duas direções, foi possível criar um universo sensorial e significativo que pudesse ser tangibilizado no final. Justamente pela junção de pequenos tópicos abordados, cada qual com sua importância ímpar, acabei me deparando com um tema recheado de pequenas complexidades que caminharam em paralelo. Por mais multifacetada que tenha sido a pesquisa, o envolvimento com o tema foi essencial para que houvesse aprofundamento no que diz respeito à cidade, onde foi possível experienciar e balancear cada vez mais o meu olhar com o distanciamento científico necessário para o projeto. A cidade e o urbano, a partir das obras cinematográficas,
mostraram ser um assunto poético e delicado, a partir das visões dos cineastas e da minha própria visão, uma vez que o recorte realizado pelas obras reflete também a minha percepção sobre a cidade e os relacionamentos. Ao mesmo tempo, trabalhar o coletivo a partir de uma visão particular tornou-se deveras complexo e subjetivo, pois entende-se que existem milhares de seres pensantes com opiniões divergentes, e não uma única percepção universal sobre os convívios urbanos. Ademais, a experiência de encontrar obras e autores que coincidem em pensamento com minhas percepções pessoais é admirável. Pude ter a ciência de que outras figuras sentiram-se, de alguma forma, impactadas pelo urbano — seja pelo excesso de informações que captamos diariamente ou pela falta de interesse visual nas grandes cidades — o que confirma que os recortes compostos por Gustavo Taretto e Sofia Coppola estão muito próximos de nossas realidades, possibilitando uma identificação real com o tema da presente pesquisa.
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lista de imagens
Figura 1. página 26 Paris versus New York - O jornal <https://goo.gl/x1zqUK>
Figura 8. página 32 Captura do filme Encontros e Desencontros, 2003 - Acervo pessoal.
Figura 2. página 26 Paris versus New York - A fachada <https://goo.gl/SjbNp6>
Figura 9. página 34 Captura do filme Medianeras, 2011 <https://goo.gl/Ib5wpm>
Figura 3. página 26 Paris versus New York - O drink <https://goo.gl/tXnh74>
Figura 10. página 37 Captura do filme Encontros e Desencontros, 2003 - Acervo pessoal.
Figura 4. página 27 Proposta visual da cidade de Zaira, de Calvino <https://goo.gl/JeCgKN>
Figura 11. página 44 Captura do filme Medianeras, 2011 Acervo pessoal.
Figura 5. página 27 Captura do filme Medianeras, 2011 <https://goo.gl/Oci33n>
Figura 12. página 45 CapturadofilmeEncontroseDesencontros, 2003 <https://goo.gl/UjR8Cr>
Figura 6. página 27 Captura do filme Medianeras, 2011 <https://goo.gl/QPbvbZ>
Painel referencial (gráfico) página 54 Painel referencial – Autoria própria
Figura 7. página 31 Captura do filme Medianeras, 2011 <https://goo.gl/TbdZbc>
Painel referencial (produto) página 55 Painel referencial – Autoria própria Painel universo imagético página 56 Capturas dos filmes – Acervo pessoal
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Mockups do produto - pรกgina 67-81 Autoria prรณpria Mapa de Buenos Aires <https://goo.gl/hJLVSW> Mapa de Tรณquio <https://goo.gl/2v6WtE> Imagem promocional do filme Medianeras - pรกgina 20 <https://goo.gl/t8jCAg> Imagem promocional do filme Encontros e Desencontros - pรกgina 22 <https://goo.gl/BcvDyk>
© Gabriela Jastrenski Pereira Freire, 2017
Freire, Gabriela Jastrenski Pereira. cinestecidades: o sentimento nas cidades protagonistas / Gabriela Jastrenski Pereira Freire - São Paulo (SP), 2017. 101 f.: il. color. Orientador(a): Ana Lúcia Reboledo Sanches, Marcos Aurélio Castanha Júnior, Regis Orlando Rasia. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Design com linha de formação específica em Design Gráfico) - Centro Universitário Senac, São Paulo, 2017. 1. Design Gráfico. 2. Cinema. 3. Cidades. 4. Tangibilização. I. Sanches, Ana Lúcia Reboledo. (Orient.) II. Castanha Jr., Marcos Aurélio. (Orient.) III. Rasia, Regis Orlando. (Orient) IV. Título
fontes AVENIR / CABRITO / LEMON MILK / SHORELINES papel OFFSET 120 g/m² impressão ARRISCA