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Introdução
Figuras 1 e 2 : Ambas a imagens são referentes a “Exposição Bahia” , na quinta Bienal. Setembro 1959, Ibirapuera São Paulo - SP. (imagens escaneadas do livro Tempos de Grossura: Design do Impasse). “Nunca possuímos tantas coisas como hoje, mesmo que as utilizemos cada vez menos” (SUDJIC, 2008, p.5)
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Estamos cercados por tantos objetos e artefatos, que não sabemos dizer tudo que temos dentro de nossas casas. Na contramão, vemos pessoas buscando construir peças e utensílios partindo de bases nunca antes vistas, novos artefatos que resultam de combinações e associações imprevistas.
Objetos descartados, que não mais desempenham suas funções originais ou sofreram algum tipo de dano, estão sendo requalificados, ganhando novas funções, novas identidades, novos usos no contexto contemporâneo.
No Brasil, cerca de 160 mil toneladas de resíduo sólidos são coletados diariamente, segundo dados do IPEA . Dessas 160 mil toneladas, 57,41%, aproximadamente 91,86 mil toneladas são de matéria orgânica e o restante, 42,59%, 68 mil toneladas, equivale a material que pode ser reciclado. Porém, apenas 13% deste material é reciclado e somente 14% da população é atendida pela coleta seletiva.
Portanto, a utilização de material descartado como matéria prima para “invenção” de futuros objetos, além de ser uma prática antiga em comunidades menos abastadas ou menos habituadas ao convívio e ao consumo de produtos industriais, encontra, de certa forma, um estímulo ou incentivo diante de um cenário como esse apresentado pelos relatórios do IPEA acima citados.
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Nota
Lina Bo Bardi casou-se com Pietro Maria Bardi em 1946, ano em que veio com ele para o Brasil, Entre 1948 e 1951 fundou com Bardi a empresa Palma – Studio de Arte e Arquitetura, atuando nas áreas de design de objetos, gráfico e interiores. Seus projetos mais conhecidos em São Paulo são a Casa de Vidro (1951), residência do casal, o MASP na Av. Paulista (1969) e o SESC-Pompéia (1986). Entre 1959 e 1965 atuou em Salvador, Bahia, restaurando e revitalizando o conjunto do Solar do Unhão e reformando o teatro Castro Alves. Nos anos de 1980, projetou a Casa do Benin, o conjunto da Ladeira da Misericórdia, o Teatro Glauber Rocha e a sede do Olodum, todos no centro histórico de Salvador. A arquiteta dedicou-se a estudar design e a arte popular. assuntos sobre os quais publicou livros e artigos. (página 20 bibliografias). Um dos primeiros contatos com esse universo no Brasil, foi celebrado e documentado por Lina Bo Bardi (1914-1992), arquiteta italiana nascida em Roma , e naturalizada brasileira em 1953. (figuras 1 e 2) Lina foi responsável por organizar a mostra “.Exposição Bahia”, na V Bienal de São Paulo (1959) , e a exposição Civilização do Nordeste (1963), no Museu do Unhão, em Salvador, após ter feito uma pesquisa no interior da Bahia sobre Antropologia Cultural e Arte Popular Nordestina. Nestas excursões recolheu objetos singulares e mobiliários desenvolvidos pela comunidade local, de forma espontânea e empírica. Surpresa, a arquiteta reage à descoberta de “objetos úteis” fora do padrão, e com forte apelo cultural vernacular:
Matéria prima: o lixo. Lâmpadas queimadas, recortes de tecidos, latas de lubrificante, caixas velhas e jornais. Cada objeto risca o limite do “nada” da miséria. Esse limite e a contínua e martelada presença do “útil e necessário” e que constituem o valor desta produção, sua poética das coisas humanas não-gratuitas, não criadas pela mera fantasia. (BARDI, 1994, p. 35)
As impressões de Lina Bo Bardi refletem uma imagem que nos habituamos a encontrar nos dias de hoje. Com o aumento da marginalização e exclusão social, o ser humano encontra artifícios para sobreviver. Criar é uma alternativa tanto financeira quanto intelectual e essas alternativas incluem desde criação com base em matéria prima “bruta”, como o barro, argila, madeira, metal, etc. até a criação com base em objetos, tanto de descarte quanto que estavam em uso e encontraram outros destinos com finalidades distintas, sendo levados a construção de
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Figura 3: Capa da obra do livro em que Gusmão apresenta imagens de objetos encontrados nas ruas das cidades, especialmente na zona sul e no centro do Rio de Janeiro.
artefatos úteis ou a fazer peças únicas que adquirem status de obras de arte.
Tanto para Lina Bo quanto para Gabriela Gusmão (na nota de rodapé dizer quem é ela), estas criações são alternativas viáveis nas situações de vida em que estas pessoas se encontram. Em Tempos de Grossura (1994) Lina identifica os criadores dos artefatos como artesãos, que constroem a partir de materiais que foram utilizados por eles e, portanto, estes descartes já se encontram à disposição deles. “Mas esta não-alienação artística coexiste com a mais baixa condição econômica, com a mais miserável das condições humanas” (BARDI, 1994, p. 25) Já em Rua dos Inventos , Gusmão trata os construtores como inventores, que buscam pela cidade materiais que podem servir a seus propósitos. (figura 3) Assim a autora reconhece o caráter de “desenho vernacular” que tais objetos assumem, inventados por estes habitantes urbanos.
A meu ver, tais engenhos caracterizam o desenho vernacular, refletido de maneira própria a realidade da região em que se encontram. Aqui tratamos de manifestações do povo brasileiro, que com sua capacidade inata traça planos ou estratégias de sobrevivência desenvolvendo projetos. (PEREIRA, 2002, p. 26)
Para entender a transformação e criação destes inventos, estabelecemos como objetivo deste Trabalho de Conclusão de Curso, um estudo abordando o que caracteriza um objeto e um artefato, mostrando suas semelhanças e diferenças, apresentando onde serão utilizados cada um dos termos neste tra-
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balho. Além disso desenvolvemos uma reflexão sobre o significado destes objetos (e para atingir tal objetivo tivemos que estudar a teoria dos signos e a semiótica) ,identificando-os enquanto signos (e identificando os signos que os compõem). Dentre os objetivos secundários deste TCC mostraremos como podem ser dispostos estes elementos de forma a mudar a composição resultante das peças, com pequenas intervenções em elementos característicos que faziam parte do artefato anteriormente.
As transformações dos objetos propostas neste trabalho são divididas em três categorias, que eventualmente se sobrepõem:
1.
2.
3. reuso, quando o objeto assume uma nova função, deixando para trás sua função original; reciclagem, quando se restitui a matéria ou se divide o material a fim de criar algo, surgindo um novo artefato; ressignificação, quando desconstruímos e reconstruímos o artefato, a partir da subversão dos significados dos signos identificados.
Esses engenhos levam à transformação de um objeto em outro que não o previsto no momento da produção industrial. O novo assume outra função, outro conceito, outro significado, mesmo que mantenha a forma original, transfigurando-a. (PEREIRA, 2002, p. 25)
É imprescindível um estudo de comportamento dos objetos para que possamos fazer uma análise de transformação. Para que isso seja possível, abordaremos a semiótica e a linguagem como instrumentos de
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construção e desconstrução de identidade do artefato, apresentando os conceitos de Charles Sanders Peirce (1839 - 1914), criador da semiótica. Para que entendamos melhor a construção dos artefatos, este projeto busca analisar produções construídas a partir da reutilização de artefatos, como uma forma de expressão e de sustento. Este levantamento feito através de pesquisas em livros, artigos e documentários, que abordam o tema em diferentes âmbitos, a fim de se observar e absorver os conhecimentos que já foram discutidos e relatados sobre o tema em questão.
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Design. Artifício. Artefato
Design, um termo tão amplo quanto a própria concepção de arte. Desde o início dos tempos o conceito de “design” foi o responsável por traduzir modos de pensar e produzir objetos/ produtos; a forma ou maneira com a qual os objetos seriam vistos e como seriam produzidos ou reproduzidos (manufatura e indústria). É a óptica pela qual a sociedade enxerga e traduz os padrões da época.
O design é a linguagem que uma sociedade usa para criar objetos que reflitam seus objetivos e seus valores. Pode ser usada de formas manipuladoras e mal-intencionadas, ou criativas e ponderadas. (SUDJIC, 2002, p.49)
Sabemos que o design induz o comportamento de como os produtos serão percebidos, pois, entendido como “projeto”, deve assumir uma finalidade e, assim, procurar atingir um objetivo através da opção por este ou aquele modo de conceber o que se pretende produzir. Mas, para se compreender sua natureza precisamos estabelecer uma conexão ainda mais profunda com a essência do que está sendo criado e concebido, em termos de origem e destino de uma ideia.
“Sua raiz etimológica está no latim arte factus, “feito com arte”, [...] ou seja: tudo aquilo que não é natural.” (CARDOSO, 2014, p.47).
Para Cardoso (2014), os artefatos têm uma característica essencial: todos surgem com uma finalidade utilitária, e se originam de um “fazer” artístico (daí o hábito de denominarmos artistas os artesãos), um há-
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bito ou técnica de lidar com um material com talento e diferenciação. Para Cardoso (2014) para existir um entendimento do artefato deve-se entender seis fatores que são determinantes para a construção do seu significado: três deles relacionados à compreensão, “ponto de vista”, “discurso” e “experiência” e os outros três à materialidade, “uso”, “entorno” e “duração”.
Assim, o autor se vale de um exemplo, como um relógio, para analisar como se daria a produção de significado do objeto pensada para cada fator:
O fator “uso” revela como o artefato funciona, levando a entender qual seria sua função. Por exemplo: Aparelho de marcação de tempo de um dia (24 horas).
O fator “entorno” apresenta o artefato, tendo em vista a sua visibilidade, construção e aceitação. Diz respeito ao contexto, em que o objeto será utilizado. Por exemplo: Como será o relógio: parede, pulso, bolso, está relacionado ao momento histórico e a necessidade do usuário.
O fator “duração” mostra tempo de vida do artefato, quanto tempo ele se mantém o mesmo. Por exemplo: O quanto o relógio será usado até não servir mais a sua função. A pulseira de couro, de um relógio de pulso, caso não tenha manutenção e cuidado constante, acaba rachando e se despedaçando, mudando suas características.
”A existência de qualquer objeto decorre dentro de um ciclo de vida que comporta desde sua criação até sua destruição.” (CARDOSO, 2014, p.66).
O fator “ponto de vista” é a óptica pela qual a
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sociedade vê o artefato. Por exemplo: Que tipo de relógio é usado no momento, hoje é comum as pessoas responderem à pergunta “que horas são”, pegando o celular no bolso e vendo as horas em um relógio digital (hoje utilizado como acessório/status/diferencial). O fator “discurso” é a forma com que o “ponto de vista” é divulgado e compartilhado. Por exemplo: Qualidade que são passadas para influenciar o seu uso, propagandas, conversas com amigos e até mesmo review, que são feitos em sites e vídeos. O fator “Experiência” demonstra sua relação com o artefato, relação direta com o “uso” e o “ponto de vista”. Por exemplo: A impressão ao usar aquele determinado produto. No caso de um relógio de pulso, se ele é “clean”, transmite sua informação com objetividade; se é ergonômico, todo tipo de contato com ele melhora ou piora sua experiência.
A bagagem que possuímos de vivências, obtidas diretamente ou por empréstimos, colore nossa percepção e define o modo como processamos qualquer experiência atual. (CARDOSO, 2014, p.73).
Esses fatores, para se entender um todo, muitas vezes não são de entendimento simples quando separados, porque todos são complementares e são intrínsecos ao artefato, sendo que a separação de cada tópico como está acima, acaba por ser ineficaz para entender o pleno significado do objeto. Destacamos esse ponto pois, segundo a semiótica peirceana nenhum significado é definitivo, sendo sempre parcial, e sujeito as circunstâncias em que ele é atribuído a qualquer objeto.
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