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Terror como Gênero

“O terror possui vários graus de representações artísticas, mas sempre é um elemento que está presente na obra.”

(STEPHEN KING, 1981)

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O gênero terror é quase impossível de se definir, mas podemos analisar os elementos que o compõem e tirar algumas conclusões. Ao racionalizarmos o gênero, é necessário diferenciar as camadas de construção da obra. Primeiro está o horror, logo depois o terror e no final a repulsa.

O horror está em uma das cenas mais chocantes de “O Exorcista” (1973): Regan, uma garota de doze anos e possuída pelo demônio, usa um crucifixo em função de uma masturbação - ato considerado profano para a igreja católica e para sociedade como um todo - logo depois do ato, gira a cabeça em 180 graus e somos convencidos de que há forças sobrenaturais agindo sobre a menina. A camada de terror, que fica entre o horror e a repulsa, é vivenciada em várias cenas do filme de terror psicológico “O Inquilino” (1976) de Roman Polanski. Baseado no livro de Roland Topor, o filme conta a estória de um simples arquivista em busca de um apartamento em Paris. O protagonista - interpretado pelo próprio diretor - consegue um apartamento em uma espécie de condomínio, no qual sua última locatária cometeu um suicídio recentemente. A trama é construída a partir de cenas

que direcionam o espectador para o sentimento de paranóia que o protagonista vive em detrimento do ambiente que é posto no filme. Os vizinhos do prédio são extremamente severos com barulho e tudo que o protagonista faz os incomodam. Todo esse clima de tensão está presente ao longo da obra e nos direciona cada vez mais para os sentimentos confusos e angustiantes da paranoia em seu estado mais primitivo. O filme nos traz a inquietação de não sabermos onde exatamente está o medo - se os vizinhos estão conduzindo o protagonista à loucura ou se isso tudo não passa de

Colagem do filme “O Exorcista”1973. Foto: IMDB Internet Movie Database

uma invenção da sua própria cabeça

Entre cenas de sexo com uma galinha, entre mãe e filho, gente comendo fezes e close em ânus, está o filme “Pink Flamingos” (1972) de John Waters. Na narrativa podemos verificar a última camada que constrói um filme de gênero de terror: a repulsa. O filme narra a competição de pessoa mais repugnante viva, posição em que a protagonista Divine e sua família tem o orgulho de manter. Segundo Stephen King, um bom filme de terror explora as três camadas de forma homogênea, não priorizando uma mais que a outra, equilibrando estes 3 elementos. Os trabalhos de terror não estão interessados nos valores que rodeiam a civilização, eles buscam a interação com o espectador, tirando seus sentimentos mais profundos e primários, mas ao mesmo tempo, sentimentos enraizados pela sociedade e pelas experiências vividas dentro de determinada cultura e tempo. Stephen King, em seu livro Dança Macabra, analisa o tema de terror e compara como uma busca ritmada que está em constante movimento e transformação. O autor de terror mais popular do século, faz uma comparação da narrativa do terror com uma dança em um espaço repleto de elementos sociais que são aceitáveis e comuns. O autor de uma narrativa de horror faz uma união entre a mente consciente e a mente inconsciente do público, através de uma vigorosa ideia que se desempenha com força aos olhares da platéia.

“O terror é um combate travado nos recantos secretos do coração”.

(STEPHAN KING, Dança Macabra, 1981).

Filmes de terror são feitos dentro de determinada prática social e cultural com a capacidade de representar questões inerentes ao seu contexto histórico (Roger Chartier, 1990). Os filmes de terror, nesse sentido, buscam se apropriar do sentimento do medo que sempre esteve presente na história da humanidade. Filmes de terror, por tanto, possuem uma carga histórica muito grande e rica para análise do comportamento humano ao longo de sua trajetória no tempo. Livros considerados sagrados como o Corão, a Bíblia e textos antigos da Ásia possuem muitos elementos com tema de terror e que descreve uma atmosfera do grotesco. O inconsciente humano, as mitologias que transcendem os séculos e as representações do cinema de terror possuem aspectos semelhantes. O medo como sentimento principal do gênero, habita na mente humana e reproduz monstros que se aproximam de criaturas criadas na mitologia (Eliade, 1991). O cinema de terror, no entanto, replica estes monstros e evoca os medos mais primordiais do ser-humano. O gênero terror sempre foi usado como forma de entretenimento para o público de todas as idades, classes sociais e culturas, muitas vezes acompanhando o pensamento e a linguagem do ser-humano, com isso, o terror se apresenta em diversas formas de arte - o artista recria a partir de sua realidade usando recursos externos a ela de modo a decodificar uma significação mais ampla e social - as limitações, neste sentido, dão características estéticas específicas ao seu gênero. Medo, pânico, horror e terror são sentimentos que nos isolam da multidão e do contato com o outro, sentimentos estes, que nos encaminham para a solidão. A trilha sonora de filmes de terror nos insinua que o encaminhamento para a solidão e angústia está presente nas tramas aterrorizantes. Algumas trilhas são construídas de maneira simples e repetitiva que se rompem constantemente, levando-nos à desintegração. Entretanto, estas emoções - evocadas por filmes de terror - nos levam à um paradoxo: o instinto de reintegração com o próximo. A ilusão essencial de que a união e conexão com o mundo nos leva de volta a estabilidade e conforto mental, porém o medo que nos afronta é inclassificável e misterioso, parte de dentro de cada um de nós de maneira complexa e individual (Stephen King, 1981, p.28-40).

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