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Mulheres no Terror

Estamos vivendo na renascença do terror dirigido por mulheres, porém, para ter um renascimento, é necessário passar por uma idade das trevas antes

(Camila Novaes Maia, 2018).

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No início do século XX, já tínhamos uma pioneira do cinema, no entanto foi esquecida pela história. Alice Guy Blaché nasceu em 1873 na França e após a morte de seu pai em 1893, Alice treinou como estenógrafa e datilógrafa, campos novos na época, para poder sustentar a mãe e a si mesma. Em 1894 começou a trabalhar como secretária na empresa Comptoir Général de Photographie, administrada por León Gaumont e uma das primeiras companhias cinematográficas do mundo.

Alice Guy foi convidada a participar da introdução do primeiro cinematógrafo desenvolvido pelos irmãos Lumière. Alice percebeu o potencial da nova tecnologia e decidiu, com a permissão de Gaumont, filmar algumas cenas com o novo aparato. Gaumont aceitou o acordo desde que não atrapalhasse seu trabalho como secretária. Alice Guy Blaché lança seu primeiro filme em 1896 e em 1903 uma das primeiras obras cinematográficas que abordam o gênero de terror, Faust et Méphistophélès (1903). O gênero de terror no cinema oferece, como valor artístico, a conexão entre nossos medos verdadeiros e nossas fantasias sobre esses medos, no entanto a maioria desses filmes é concebida com a intensão de “lucro”. Segundo King, em seu livro “Dança Macabra”, a arte não é criada conscientemente, mas sim, expelida involuntariamente. Nos anos 80 o mainstream do terror estava repleto de insegurança masculina. Muitos filmes se limitavam em tramas de adolescentes mortos e o “papel” das mulheres era de transar, gritar ou morrer. Essas produções cinematográficas obtém seus horrores

Hoje em dia, quando as mulheres pensam em terror, pensamos em fome. A assinatura da ansiedade feminina da nossa época é o corpo de uma mulher, tomada pela necessidade de tomar e devorar o que não deveria; um pesadelo de consumo incontrolável e descontrolado

(Camila Novaes Maia, 2018).

pelo simples fato da morte e não se interessam em levantar questões políticas. Na metade do século XX a predisposição de Hollywood se inclinava em diretores homens e brancos, anulando inteiramente as vozes femininas. Apesar disso, de uns anos pra cá, percebemos uma ascensão gradativa das diretoras de terror, mesmo sendo obscuro o número de diretores do sexo feminino em todo o mundo, existe uma tendência maior em valorizar as obras realizadas por essas mulheres. Julia Ducournau que realizou o filme “Raw” (2016), Ana Lily Amirpour, diretora do filme “Garota Sombria Caminha pela Noite” (2014) e Jennifer Ken que dirigiu “Garota Infernal”(2009) são exemplos de diretoras que trabalham o gênero de terror dentro de um universo feminino que possui ansiedades femininas, muitas vezes ignoradas pelas próprias mulheres. Até mesmo alguns projetos dirigidos por homens centraram-se nas personagens femininas, refletindo sobre valores políticos opressores dos

direito das mulheres e a importância do feminismo na sociedade. Filmes como Sob a Pele (2013) dirigido por Jonathan Glazer e A Bruxa (2015), de Robert Eggers são alguns exemplos. De alguma forma podemos perceber que há uma urgência em retratar no gênero de terror o que há de mais errado no mundo. Temas sobre traumas, abusos, impotência, vulnerabilidade e perda de controle são procurados desproporcionalmente por mulheres. O terror feminino se manifesta, mais do que nunca, em diversas formas, sendo produzido em diversos países, culturas, retratando mulheres negras, asiáticas e LGBT’s. Esse tipo de produção de terror manifesta a estética e a arte de uma maneira intencional. Nos filmes “Raw” (2016), “Garota Infernal”(2009) e “Garota Sombria Caminha pela Noite” (2014), as mulheres são retratadas como vampiras, demonios ou simplesmente canibais. O tema persiste e podemos concluir que quando uma mulher pensa em terror, ela pensa em fome e a fome é sobre sexo e o complexo de castração entre as mulheres que possuem uma relação com a alimentação tão politicamente pesada, quanto o sexo. As mulheres só vão parar de se perguntarem quando vão em frente se ela pode ter isso, se ela merece isso ou se ela quer isso, quando os desejos se tornarem comuns e suas ambições forem aceitáveis quando essas são iguais as ambições dos outros.

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