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a 44 Entrevista Emílio Torrão - Presidente da CIM - Região de Coimbra

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“É PRECISO INJECTARI RAPIDAMENTE DINHEIROI NA ECONOMIA LOCAL EI REGIONAL PARA RETOMARI O DESENVOLVIMENTO”I

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Emílio Torrão, presidente da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra

Criticando o facto dos fundos comunitários estarem, uma vez mais, centrados nos grandes centros metropolitanos, Emílio Torrão, presidente da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra, apela aos empreendedores e investidores para que preparem candidaturas, realçando o facto dos técnicos da CIM-RC estarem disponíveis para ajudar. «É da máxima importância que se comece a utilizar o dinheiro do PRR», garante

Assumiu recentemente a lide-

rança da CIM - Região de Coimbra. Como está a ser o início de mandato face à conjuntura actual?

Emílio Torrão - Neste início de mandato temos tido alguns constrangimentos porque há todo um conjunto de coisas que estavam pendentes que, em função das eleições, pararam. Neste momento estamos a retomar o normal ritmo da CIM. Este é um mandato de continuidade, já assumi isso publicamente. Tenho muita honra em suceder ao José Carlos Alexandrino e ao Dr. João Ataíde, pessoas com quem trabalhei enquanto presidente de câmara e enquanto membro do Conselho Intermunicipal. Tenho muito orgulho neles e grande apreço pelo que eles fizeram e pela forma como geriram a CIM. Aquilo que se pretende sempre é conciliar todo um conjunto de interesses, de assumir a região por inteiro, e fazer com que o senhores presidentes de câmara possam encontrar na CIM um local próprio para desenvolverem políticas intermunicipais pensadas e concebidas para todos, de forma igualitária. Mesmo os territórios de baixa densidade têm um lugar muito especial na nossa estratégia, porque têm de ter uma atenção especial. Não uma atenção paternalista nem proteccionista ou

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de favorecimento, mas de grande estímulo, de grande incentivo, com os meios adequados para que possam recuperar alguns dos seus problemas demográficos, isolamento e de desenvolvimento económicosocial que tanto preconizam os seus presidentes de câmara. E nessa perspectiva, trabalhamos todos os territórios em conjunto mas temos sempre esta atenção de incentivo, de criar políticas estruturantes para esses territórios.

Quais são as suas principais prioridades para a região, nomeadamente no que diz respeito ao sector empresarial?

Ninguém pode governar a Comunidade Intermunicipal sem ter um programa, e existe um programa já perfeitamente assumido, pensado e estudado por pessoas que entendem e sabem ler o território. Falo da Estratégia Integrada de Desenvolvimento Territorial 2021-2027, que foi aprovada no Conselho Intermunicipal, e onde estão as linhas estruturantes da nossa actuação. Este é um mandato de continuidade. Irei dar o meu cunho pessoal, porque sou uma pessoa desassossegada e pretendo sempre trazer para a política algo que é muito meu: o inconformismo, alguma rebeldia (não anarquista), de não aceitar o não, sempre no sentido de evoluir para o sim. Essa será a única marca mais pessoal. Nós temos na nossa Estratégia de Desenvolvimento Integrada cinco objectivos principais que queremos concretizar na prática: Região Pioneira e Líder, Região Exemplar, Região Comprometida, Região Metropolitana e Região Especializada. Fui eleito pela confiança dos meus pares para desenvolver e colocar no terreno esta estratégia integrada que está pensada e trabalhada por quem sabe como o devemos fazer. Agora temos de a concretizar.

Pode especificar essas visões que pretendem implementar?

Queremos que esta seja uma Região Pioneira e Líder, queremos fomentar um sistema educativo de excelência, onde a ciência, a tecnologia e a inovação sejam uma referência nacional – estamos a trabalhar com vários projectos nessa área, em parceria com o ensino superior, com as escolas; queremos criar uma Região Exemplar que preconize os valores ambientais, da economia circular, do aproveitamento dos recursos hídricos, da transição para uma energia limpa e equitativa, com adaptação às alterações climáticas e prevenção de riscos, uma região que tenha essa referência como um acto normal de gestão. Também uma Região Comprometida e que valoriza o seu potencial endógeno, aquilo que é característico de cada um dos territórios. Formando um só dão um carácter supra-regional a qualquer concelho. Neste objectivo, defendemos também a facilitação da mobilidade, a garantia da equidade nas condições de acesso ao emprego, saúde, educação, cultura e direitos sociais. São objectivos que nesta Estratégia Integrada nós temos como valores essenciais a desenvolver. Nesta estratégia, temos visão mais arrojada que me parece importante destacar: a criação de uma Região Metropolitana. Costumo explicar isto de uma forma muito simples: a região de Coimbra teve na história, e ao longo do tempo (e não há muito tempo), uma importância estratégica muito elevada no país. Com a criação das duas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa, fomos sufocados por essas duas áreas metropolitanas, e nós queremos direitos iguais. Quase todos os dias aparecem calls para candidaturas que só são válidas para as áreas metropolitanas e nós achamos que a região Centro tem de ter o seu papel no país. Sempre teve e vai ter de certeza absoluta. É uma questão de tempo. Nós vamos sempre defender a afirmação da região de Coimbra como uma região metropolitana e tudo iremos fazer, com todos os parceiros, agentes económicos e entidades, para que essa região metropolitana se afirme. Não será no meu mandato, naturalmente, mas eu e a minha equipa queremos criar as bases necessárias para que esta Coimbra se afirme

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como região metropolitana. Temos ainda a visão de criar uma Região Especializada na área da saúde. Naturalmente já temos tudo cá dentro, é só potenciar esse produto especializado de excelência: temos investigação de excelência e temos hospitais de referência nacional e internacional.

O que será necessário para criar essa região metropolitana?

Será muito importante, para já e em primeiro lugar, criar as bases para que se construa um sistema de mobilidade que afirme a região. Sem um sistema de mobilidade de transportes não é possível afirmar a Região Metropolitana. Mas, a Região Metropolitana tem de ser criada com um conjunto de iniciativas que já estamos a desenvolver, no sentido de unir todo o território numa base comum, numa plataforma que estes dezanove municípios desenvolvam em conjunto com o ensino superior, nomeadamente com a Universidade de Coimbra e com o Instituto Politécnico de Coimbra, por forma a criarmos projectos muito fortes de construção dessa Região Metropolitana. Fomos deixando para trás este objectivo e temos agora de o construir. Temos de fazer tudo de novo, temos de pensar não só na cidade de Coimbra - é evidente que será sempre o centro urbano principal desta Região Metropolitana mas, em conjunto com todos os outros 19 municípios, desenvolver a tal rede de transportes, cultural (que nós já estamos a afirmar), rede social, administrativa, trabalhando o turismo, o ambiente. No fundo, toda a rede que temos de fazer de protecção da nossa região.

Qual a sua opinião sobre a realidade das empresas deste território?

Temos excelentes empresários, excelentes empresas. Mas em primeiro lugar, deixe-me dizer que para mim há uma coisa que é essencial: o facto dos programas de financiamento comunitário estarem a demorar muito tempo. A resposta é muito lenta e isso não favorece nada o nosso tecido empresarial. Não é compatível, nos dias de hoje, o tempo que demora a aprovar um projecto e o tempo que demora a disponibilizar as verbas de apoio. Isso desincentiva qualquer empresário para que possa prosseguir com os seus investimentos. Naturalmente, nós queremos estar mais perto desses empresários, e para isso estamos a desenvolver projectos muito especializados de troca e partilha de informação, inclusivamente de apoio a esses mesmos empresários, para diminuir o fosso que existe ente a sua vontade de se candidatar a um apoio comunitário e a decisão final. Quando vêem a sua candidatura aprovada, já os preços dos materiais estão diferentes, já tudo está desactualizado. Nos tempos que correm, tempo é dinheiro, e o nosso tecido empresarial não pode continuar a viver à espera de um financiamento comunitário mais de um ano. Por outro lado, em todo o território estamos a desenvolver um conjunto de iniciativas no âmbito, por exemplo, das zonas industriais e na área

Tempo é dinheiro, e o nosso tecido empresarial não pode continuar a viver à espera de um financiamento comunitário mais de um ano

Sem um sistema de mobilidade de transportes não é possível afirmar a Região Metropolitana

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agrícola, com projectos pioneiros muito interessantes de emparcelamento. Estamos em todos os sectores com projectos específicos e portanto não estaremos parados, porque na afirmação de uma região temos de ter essa capacidade de reinvenção. No Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), ao nível da capacitação com o programa STEAM, vamos ter oportunidades únicas de capacitar os nossos empresários para que possam servir melhor a dinâmica empresarial e de conhecimento que é necessário ter para que as empresas ainda possam evoluir mais.

O Plano de Recuperação e Resiliência trará claros benefícios para as empresas da região?

Costumo dizer que as pessoas perdem muito tempo a discutir que o PRR podia ser melhor ou pior. Mas o que está a acontecer é que os programas abrem com prazos extremamente curtos e as pessoas continuam a discutir se é o mais adequado, se podiam fazer melhor, e o dinheiro continua a não ser utilizado. Aquilo que é preciso, com o PRR a representar milhões e milhões de euros, é injectar rapidamente dinheiro na economia local e regional, por forma a que as pessoas possam, de uma vez por todas, retomar o desenvolvimento. É importantíssimo que toda a gente pense em projectar o futuro porque os milhões de euros do PRR estão aí. É preciso que, com projectos devidamente preparados para as candidaturas e alinhados com os objectivos do PRR, quando os programas abrirem, as pessoas estejam na primeira linha a candidatarem-se e a acederem ao dinheiro. Na nossa óptica, o PRR está muito centralizado nas grandes áreas metropolitanas, mais uma vez, e é pouco territorializado. Nessa perspectiva, quem não souber, quem não for devidamente preparado para uma candidatura no PRR, não vai ter vencimento de causa. Por isso mesmo, apelo que as pessoas deixem de discutir o PRR e que se preparem, olhem, estudem, consultem quem vos pode ajudar. Os técnicos da CIM estão disponíveis para ajudar todos e quaisquer empreendedores ou investidores porque para nós é da máxima importância que se comece a utilizar o dinheiro do PRR.

O Portugal 2030 também será fundamental para alavancar o sector empresarial da região?

Nós já tomámos posição e vamos dar o nosso contributo na consulta pública que está em curso. Efectivamente, tem os mesmos vícios do PRR, está muito centralizado nos grandes centros urbanos, favorece as grandes empresas e os grandes grupos económicos que têm dinheiro e capacidade de resposta rápida, e favorece menos os empreendedores do Interior, das zonas fora dessas áreas metropolitanas, que têm menos recursos e menos capacidade de investir e de aceder, mas uma vez, ao novo programa de financiamento comunitário. Nessa perspectiva, estamos a dar o nosso contributo por forma a que esse programa possa ser melhorado. Há uma coisa que nos preocupa muito: os DLBC’s (Desenvolvimento Local de Base Comunitária), que podiam distribuir candidaturas para as micro e médias empresas, simplesmente estão a ser banidos deste novo programa comunitário, e só vão trabalhar na área agrícola. É uma grave afronta ao Interior do país e às zonas menos capacitadas, que precisavam de uma gestão mais aproximada dos fundos comunitários. Os programas comunitários são sempre muito pouco adequados ao território, com os objectivos que estão já preconizados, e a forma de os cumprir, mais adequados para as grandes áreas metropolitanas e menos para os territórios do resto do país. São essas as nossas críticas, porque mais uma vez falta suprir, com esse novo programa, algumas deficiências próprias destes territórios. Em Lisboa ou Porto não se coloca a questão dos transportes, mas na região Centro coloca-se. Nunca desenvolvemos um sistema de transportes integrado que abrangesse todo o território, e portanto o isolamento das pessoas tem de ser alcançado com uma rede de mobilidade à séria, pensada em termos de região. Isso não existe e não vislumbramos que esteja suficientemente acautelado no novo programa 2030. Quem desenha estes programas muitas das vezes devia conhecer melhor os territórios. Não conhece ou então não quer conhecer, mas nós estamos aqui para os lembrar e faremos o nosso trabalho,

O PRR está muito centralizado nas grandes áreas metropolitanas, mais uma vez, e é pouco territorializado

Não podemos ter municípios e comunidades com cada vez mais competências sem envelope financeiro

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faremos o nosso trabalho, até porque, como já disse, somos a favor de uma regionalização e de uma importância cada vez maior que as Comunidades Intermunicipais podem ter no desenvolvimento integrado do território, porque nós damos a cara, estamos perto dos munícipes. Pela sua própria natureza, as CIM são compostas por autarcas, e portanto o que é mais importante é aproximar a decisão das pessoas, e isso é garantido com as CIM. Agora, não podemos ter municípios e comunidades com cada vez mais competências sem envelope financeiro, outro assunto que nós reclamamos sempre na nossa luta diária.

O que considera que falta na área de influência da CIM para que mais empresas se fixem neste território?

Já aqui disse que a mobilidade é fundamental, porque se as pessoas tiverem um sistema de transportes adequado podem trabalhar em qualquer parte do território, como acontece nas áreas metropolitanas onde, com um sistema de transportes minimamente adequado, com um tempo de viagem curto e uma economia vantajosa, é possível usar o transporte público para ir para o local de trabalho. Por outro lado, existem vias de comunicação que têm de ser melhoradas ou complementadas, como o IP6 e o IP7, e temos de ver também as linhas de transporte ferroviário. Tudo isso precisa de uma atenção especial por forma a que a região se possa desenvolver de forma harmoniosa. Caso contrário, continuamos com os mesmos problemas. Penso que temos um conjunto muito alargado de empreendedores e de empresários que podem e devem crescer naturalmente, se tiverem condições para que isso aconteça: que as suas mercadorias escoem normalmente, que haja um acesso melhorado ao Porto da Figueira da Foz. O próprio porto é um assunto que tem de ser colocado na ordem do dia porque, efectivamente, esta região tem um porto que tem de ser utilizado e que tem de servir todo o tecido empresarial que integra a região. Penso que a limitação de acesso ao porto e o tipo de calado dos navios que têm de aceder ao porto é algo que nós queremos ver desenvolvido. Outra questão prende-se com a nova linha ferroviária alta velocidade. Estamos preocupados com a paragem em Coimbra e da sua integração com toda a rede. É muito importante para Coimbra um transporte de alta velocidade, que permita aceder a qualquer parte do país, nomeadamente às duas áreas metropolitanas mais importantes, mas tem que haver uma regularidade de paragem que penso que, até agora, não está efectivamente garantida. Para nós, a cadência e a frequência é importante.

O Porto da Figueira da Foz é um assunto que, para Emílio Torrão, tem de ser colocado na ordem do dia

A falta de mão-de-obra poderá ser apontada também como um entrave ao desenvolvimento e à fixação de novas empresas?

Uma das condições que as zonas do Interior e mais desertificadas têm para aumentar a demografia é que, efectivamente, existam oportunidades de emprego nessas regiões. Para isso, e para que as empresas se instalem, é preciso haver boas vias de comunicação, condições para que os municípios tenham os seus parques de negócio e industriais com lotes para venda, e financiamento desses mesmos parques. Além disso, é preciso uma política integrada no âmbito da energia. Estamos já a trabalhar as comunidades energéticas, andamos a pedir aos municípios contributos para que possamos implementar as comunidades energéticas que vão diminuir a factura de energia dessas empresas. Por outro lado, todos os estabelecimentos de ensino superior preconizam também uma maior ligação às empresas. É algo que estamos a trabalhar e em que eu estou muito empenhado, porque não há empresas fortes, um tecido empresarial forte, um desenvolvimento económico forte, se o conhecimento não chegar às empresas. Às vezes, as empresas têm pequenos problemas que podem ser facilmente resolvidos pelos investigadores. Tanto o magnífico reitor da Universidade de Coimbra como o senhor presidente do Instituto Politécnico de Coimbra estão disponíveis e empenhados nesse objectivo comum, que é também da Comunidade Intermunicipal e dos municípios. Para nós era importante criar as condições necessárias para que essa fluência de comunicação exista e dê frutos, como acontece em outros locais do país com pólos universitários e onde a comunicação é mais fácil, menos enviesada.

Alguma mensagem que queira deixar a quem estiver a ler esta entrevista?

Deixo uma mensagem muito simples: é preciso acreditar para mudar. E para mudar é preciso empenho de todos. Nós faremos a nossa parte, estaremos disponíveis para aceitar sugestões, projectos e desafios. Precisamos que as pessoas que vivem nesta região a pensem como um todo, como uma grande comunidade, como uma grande área metropolitana (ainda sem todas as condições). Porque se assim pensarmos, podemos almejar alcançar no futuro o nosso grande objectivo, a nossa própria capacidade de resiliência. Temos condições únicas, temos um território extremamente valioso no património, nas infraestruturas, na localização geográfica e estamos perto de tudo. Nem todos nos podemos deslocar a todo o lado, porque não temos as vias de comunicação necessárias, mas a grande maioria da região já tem boas acessibilidades, precisamos é que as pessoas acreditem na sua própria região. O desafio que eu faço é esse mesmo: acreditar para mudar.

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