Reportagem Perfil - Super Joe

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Repórter: Diego Cruz do Nascimento RA: 201301762 Turma: 2BCSNJO D01 Data: 06/11/2014 Perfil

Super Joe A história de um jovem que superou dificuldades como um verdadeiro super-herói Por Diego Nascimento

– Ô Japa! Já paguei a conta, viu?!? Japa gay! Japa gay! Trocadilhos, imitações de Sílvio Santos e Marcelo Rezende, muitas piadas, tirações de sarro com os amigos, uma caneca do Corinthians cheia de cerveja Budweiser na mão e um grande sorriso no rosto. Quem olha para este rapaz alegre, de cabelos longos, vestindo seu inseparável colete com o logo da banda de Heavy Metal Dio, seu cinturão de balas de fuzil e brincando com seus conhecidos do Bar do Kuroda, na Galeria do Rock, não imagina que ele já chegou próximo de ultrapassar os portões para o mundo dos mortos de forma trágica. – E aí, Sofia! – Sofia? – É...sofiadaputa! Hahaha, bora tomar uma cerveja? Esse é Joelson Benício de Macedo. Ou Joe, como é mais conhecido. Aliás, muito conhecido. Fazer amizade é com ele mesmo. Não há quem fale mal do jovem de 25 anos, apesar de vez ou outra exagerar nas brincadeiras quando fica alcoolizado. E foi por conta desses exageros que ele quase foi dessa para a melhor. Mas primeiro, deixeme falar um pouco mais sobre ele. Técnico de manutenção especializado em equipamentos da Apple, fã de Rock N' Roll e Heavy Metal, corintiano roxo e um verdadeiro maluco, no bom sentido da palavra. Mora sozinho desde muito novo e seu sonho, assim como o de muitos headbangers – metaleiros para os leigos –, é ir ao festival Wacken Open Air, na Alemanha, assistir concertos das maiores bandas de Metal do mundo. Já foi usuário de cocaína. Mas parou, após fazer algumas observações. “Muita gente que frequenta esses bares da região central usam essa porcaria. E eu percebi que eles acabavam fazendo muitas besteiras por conta do efeito dela. Fora que você percebe que a aparência da pessoa muda com o tempo. Ficam acabados! Por isso parei com isso. Prefiro apenas beber minha Bud”, relata Joe. De certa forma, foi também a cocaína que, indiretamente, quase acabou com sua vida. Era uma sexta-feira como outra qualquer e Joe seguiu a sua rotina após sair do trabalho. Foi para o Bar do Kuroda tomar algumas cervejas e encontrar os amigos. Após a Galeria do Rock fechar, às 19h30, seguiu rumo à Avenida 9 de Julho para o Bar do Black Metal, reduto e ponto de encontro de headbangers. Apenas um boteco sujo e feio, como tantos outros existentes em São Paulo. A diferença mesmo fica por conta dos frequentadores e o som que toca no ambiente, geralmente a sombria e nefasta vertente do Metal conhecida como Black Metal. Daí vem o nome do estabelecimento. Como de costume, conhecia praticamente todo mundo que estava ali e foi cumprimentando os presentes,


um por um. Os amigos mais próximos também já se encontravam no local. – Uoooou, o Super Joe chegou! – Chega mais, Joe, seu bicha! – Ui, não me chame assim! Haha! Parecia um dia como outro qualquer. A esta altura do campeonato, ele já estava levemente alcoolizado. Tudo dentro dos conformes. Afinal, era o início do final de semana. Normalmente ele e os amigos viravam a noite juntos em algum rolê qualquer. Mas pelos mais variados motivos, todos eles foram embora mais cedo nesse dia, ficando apenas o nosso protagonista e uma garrafa de Brahma, que era entornada goela abaixo diretamente do gargalo. O jeito era atravessar a rua e ir para o Bar do Bin Laden, local onde se encontram diversas tribos, como os góticos, punks, roqueiros fãs de hard rock 'farofa' e grunges. "O Bar do Black Metal é até frequentado por algumas mulheres, mas a predominância é de homens mesmo. Por isso quando eu quero caçar, eu vou para o Bin Laden. Lá tem muitas mulheres. Como meus amigos foram embora, resolvi ver o movimento por lá", disse Joe. O Bar do Bin Laden é mais um boteco imundo e sórdido do centro de São Paulo. Uma verdadeira amostra do submundo da vida boêmia da cidade. Pessoas de todos os tipos e comportamentos se reúnem neste lugar, além das tribos urbanas já citadas. Brigões que arrumam qualquer pretexto por alguns minutos de porrada, bêbados, alcoólatras, alguns viciados em pó ou pessoas consideradas normais pela sociedade que não gostam de frequentar lugares certinhos e quadrados, apenas. Mas parecia não ser o dia de sorte do jovem. Havia poucas moças no recinto. No entanto, Joe avistou um colega de longa data no interior do bar, sentado em uma cadeira e apagado de tanto beber. Assim, foi até ao seu encontro. Este colega era conhecido como Mãozinha, por conta de uma deficiência de nascença que fez com que seus braços ficassem atrofiados. Tinha cabelos loiros na altura dos ombros e usava calça com estampa de onça, típica vestimenta dos adoradores do Glam Rock. O nosso personagem principal já estava muito bêbado a essas alturas. Tentou acordar Mãozinha algumas vezes, mas sem sucesso. Até que aos risos, teve a “brilhante” ideia de jogar cerveja na cabeça de seu camarada. Sem maldade. Apenas o já apontado exagero em suas brincadeiras quando fica entorpecido pelo álcool. Enquanto isso, em uma cadeira próxima, estava um homem conhecido na região pelo apelido de Megadeth. O Megadeth é uma banda americana de Thrash Metal e também o grupo preferido deste rapaz. É tão fã ao ponto de ser chamado pelo nome do conjunto musical. – Hey Joe, vamo parar com isso aí! Mó mancada o que você tá fazendo – disse Megadeth. Megadeth é alto e troncudo. Já quebrou a cara de muitos caras no Bin Laden e nas redondezas. Não é uma pessoa má. Seu problema é a cocaína. Cheira muito pó, o que faz com que rapidamente mude de personalidade. Fica de pavio curto e qualquer motivo, por mais torpe que seja, é motivo para partir para a agressão. Naquele dia não foi diferente. Estava ‘frito’ de tanta farinha e seus olhos quase saltavam para fora do rosto. Após mais alguns – ignorados – pedidos para que Joe parasse com a brincadeira,


Megadeth partiu para cima dele. Desferiu muitos socos em seu rosto. Ele ainda tentou reagir, inutilmente, já que o seu agressor era muito forte. Com a face ensanguentada, perdeu a consciência e bateu com a cabeça no chão. Nocaute! Em um combate oficial, como as lutas do UFC, teria parado por aí. Mas Megadeth estava ardendo em fúria. Mesmo com Joe caído desacordado, passou a desferir incontáveis chutes em sua cabeça. Demorou muito tempo até que surgisse alguém que o fizesse parar. A cena era feia. Uma ambulância foi chamada, levando-o imediatamente ao Hospital do Servidor Público, na Vergueiro. Já Megadeth foi embora para casa como se nada tivesse acontecido. Um mês em sono profundo – Joe foi internado na UTI em estado grave. Precisou passar por uma cirurgia intracraniana às pressas. Os médicos rasparam o seu cabelo, a fim de facilitar o procedimento. O irmão, Jean Breno de Macedo e alguns amigos estavam à espera de notícias. Após algumas horas, os cirurgiões vieram até a sala de espera. E as novidades não eram nada animadoras. – O Joelson está em estado crítico. Seu cérebro está praticamente destruído. Vai ficar em coma por um bom tempo. Se acordar, é bem provável que tenha muitas sequelas. Dificilmente ele será o mesmo e talvez fique em estado vegetativo – informou o doutor. Obviamente o irmão e os amigos presentes custaram a acreditar no que acabaram de ouvir. Todos choravam e queriam crer que tudo aquilo não passava de um pesadelo. Alguns puderam visitá-lo na Unidade de Terapia Intensiva. Joe estava totalmente desfigurado. Apenas a tatuagem de Ozzy Osbourne em seu braço direito dava indícios de que realmente era ele ali cheio de tubos naquela cama. E permaneceu assim por aproximadamente um mês. O despertar – Uma notícia deu uma ponta de esperança para os que o conheciam. Joe havia despertado do coma e foi enviado para um quarto comum. No entanto, não esboçava nenhuma reação. Até o momento, tudo levava a crer que ele viveria em estado vegetativo, assim com o doutor havia previsto. Mas para surpresa de todos e, principalmente, dos médicos e enfermeiros, ele passou a externar algumas reações após algumas semanas. Após a visita de uma tia, na qual ele nunca gostou, a recepcionou com o dedo do meio em riste. Apesar do gesto grosseiro, o irmão Jean ficou feliz com a atitude, pois isso mostrava que Joe estava raciocinando, mesmo que não falasse ou esboçasse nenhuma reação facial. Depois de uns dias, passou a responder perguntas dizendo sim ou não com a cabeça. Um amigo que vestia uma camiseta da banda Iron Maiden perguntou se ele conhecia a estampa. Joe apenas respondeu com um horns up, o famoso gesto dos chifrinhos. Todos riram esperançosos. Após duas semanas, Joe apontou para um papel e uma caneta que estava em uma mesa ao lado. Douglas, um dos amigos, pegou os objetos e deu a ele. Então ele começou a escrever algo com certa dificuldade. Quando terminou, entregou o papel para o amigo. Nisso, o rapaz caiu na gargalhada. Estava escrito no papel a frase: Seu viado. O ‘Super Joe’ estava voltando. A recuperação – Após o coma, ficou pelo menos mais um mês e meio internado no Hospital do Servidor Público. Nesse momento, Joe já esboçava reações faciais, como sorrir e também balbuciava algumas palavras, além de caminhar com a ajuda do irmão


Jean. Recebeu alta e foi para a casa de parentes. Passou por sessões de fisioterapia e fonoaudiologia. Após apenas seis meses, já falava normalmente e conseguia caminhar sozinho. Chegou a visitar os profissionais que cuidaram dele no hospital. Os médicos, sempre muito surpresos, diziam que ele havia se recuperado muito rápido e que o fato de ele estar quase 100% era um milagre. Joe voltou a trabalhar, porém evitava visitar os bares que faziam parte de sua rotina. Era de casa para o trabalho, do trabalho para casa. Todavia, através de um colega, recebeu um recado de Megadeth. Ele queria o ver e conversar sobre o ocorrido. O local de encontro? Bar do Bin Laden. Foi então enfrentar os seus demônios nesta reunião. Megadeth pediu perdão pelo que fez. Disse estar muito arrependido e que não tinha noção do que estava fazendo naquele dia. Joe o perdoou. Após alguns meses, voltou a frequentar os bares de outrora. O Bar do Kuroda, o Black Metal e o Bin Laden. “Não vejo motivos para sumir daqui. Eu perdoei o Megadeth, sem falar que meus amigos estão todos por aqui. Hoje eu tomo cuidado, claro. Mas não vou deixar de vir aqui por conta do passado”, revela. E assim, em todas as sextas-feiras, Joe começa a sua rotina de final de semana, sempre avisando ao Orlando Kuroda de que ele já pagou a conta. – Japa gay! Japa gay! Uoooou!


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