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CAPITULO XXXI - A URUCUBACA QUE ATTACCA 177/186
CAPITULO XXXI A URUCUBACA QUE ATTACCA
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A Camara, a serviço do prefeito que accaba de assumir, approva a lei chamada "hygienista", que, ja sei, celeumas causará por seu effeito. Mudar-me desta merda até que acceito! Raymundo tambem, claro! Mas fiquei sabendo que teremos, quando um rei expulsa seus vassallos, um fim feio. Seremos despejados desta zona, que, appós reconstruida, se destina a novos occupantes, nova dona. A dona é a constructora, a que a ladina e experta prefeitura proporciona vantagens e direitos... Nós? Magina!
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São muitos quarteirões, formando immenso xadrez num tabuleiro. Os predios são antigos, decadentes e ja não teem alta quotação, como é consenso. Aqui só mora aquelle que, no censo, figura como excluso e pobretão, ou seja, nós, Raymundo, eu, os que estão commigo e esmolla pedem, que eu dispenso. Pretende a prefeitura trocar nosso sujissimo ambiente por um novo, limpinho, sem excombro nem destroço. Si fosse para um limpo dar ao povo daqui... Mas eu morar aqui não posso? Daqui ninguem me tira! Eu não me movo!
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Inutil resistencia, a do coitado que, em cyma duma cama, ja definha! Raymundo se revolta ao ver a minha difficil condição, mas é meu fado. Marcada a data, as tropas nem recado nos dão para sahir, ou, como eu vinha dizendo, um "ultimato". Depressinha occupam tudo! À porta, está um soldado. Retiram-nos à força! Nossa tralha mal temos um tempinho de junctar! Raymundo, apparvalhado, se attrapalha. Nem tinhamos, concordo, um lindo lar, mas, pelo menos, era o que nos calha! Agora, aonde irão nos albergar?
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Nos levam para um grande camburão, à frente estacionado. Formam fila innumeros vizinhos: intranquilla manhan! Mais camburões, depois, virão. Me lembra aquillo a mesma operação de guerra que os nazistas, numa villa pacata, executavam para abril-a às tropas invasoras... Que afflicção! No tempo do nazismo, se saqueia a casa do judeu, desappropria o algoz a sua victima, na aldeia. Aqui, nem tem valor, é micharia a tralha que pilharem... Mas se odeia identico invasor: é tyrannia!
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No albergue, nossas coisas formam pilha num cantho, e a gente logo se accommoda. Maneira de dizer: aquillo é foda! Cachorro e gatto, puta com familia! Fallando em gatto, ao ratto maravilha ver tanta podridão à sua roda: com restos de comida nem se açoda o bicho: para todos ha partilha! Doentes só peoram em tal leito. Alguns morrem mais cedo, aggradescendo por terem ido logo... Eu não acceito! Raymundo tira os oculos: o horrendo scenario, menos nitido, um effeito mais leve lhe provoca... Está soffrendo.
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À noite, a choradeira das creanças famintas nos impede de dormir. Mas, mesmo no silencio, só fakir consegue se deitar em tantas lanças. São ponctas, são ponctadas, são as panças vazias, são as dores de sentir fraqueza, tremedeira, de pedir soccorro em vão, perdendo as esperanças. Levanto-me. Raymundo até cochila, deixando-se vencer pelo cansaço. A custo, chego à porta e tento abril-a. Está trancada! Estamos presos! Faço mais força, emfim consigo, e da intranquilla prisão me livro... A noite é de mormaço.
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Raymundo, ao accordar, ja não me vê por perto. Acha que estou, talvez, naquella enorme fila para usar a bella privada, onde é terrivel o buquê. Mais tarde, me procura: "Olá! Cadê aquelle rapaz pardo e magricella que estava aqui commigo?" Em vão appella: ninguem me viu. Veria alguem você? Estou ainda longe do centrão. Preciso de carona: este logar paresce nem no mappa ter menção! Num omnibus consigo viajar de graça. Bem melhor que o camburão que tinha nos levado ao novo lar.
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O centro da cidade está todinho cercado e patrulhado. Creio até que alguma auctoridade quer, a pé, andar com segurança em seu caminho. Talvez seja o prefeito que, adivinho, está fiscalizando, desde a Sé ao fim do Minhocão, si algum café tem mesa na calçada ou pombo em ninho. Nem penso em retornar, mesmo, ao cortiço. Pretendo é percorrer pensada ropta que leva aonde accabo, emfim, com isso. Bem gasta, agora, tenho a minha bota. Em breve, ella será, feito o serviço, objecto deschartavel que se exgotta.
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Na praça, em frente à petrea cathedral, os guardas revistando estão, armados, um gruppo de pivetes. Para os lados eu olho e, vindo, vejo um policial. Melhor entrar na egreja. Menos mal si fico ouvindo os sinos badalados ou som tocado em orgam. Os soldados nem pisam nesta crypta sepulchral. Me sento, espero um pouco. Estou sem pressa. Olhando para cyma, vejo o tecto immenso, abobadado, altão à bessa. Da cupula, ou da torre que concreto não leva, mas granito, me interessa saber si alguem pullou, si cahiu recto.
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Ja posso, emfim, sahir. Noto que a praça está menos lotada: o cidadão commum se admedrontou, com camburão p'ra todo lado, uivando quando passa. Paresce até que lembra, à immensa massa, aquella data em março, esse montão de guardas impedindo a multidão de entrar na egreja e orar por uma graça. Passando pelo Pateo do Collegio, reparo que limparam o chartaz politico, depois que o povo elege-o. Agora, pouco importa. Tanto faz si eleito ou nomeado: o privilegio é o mesmo, com caixinha a Satanaz.