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Como a fome afeta o desenvolvimento do aprendizado?

De acordo com a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), a segurança alimentar é a “realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade su ciente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis”. Em oposição, a insegurança alimentar é de nida como a falta de acesso consistente a alimentos su cientes para viver uma vida ativa e saudável.

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Em uma classi cação do Instituto Brasileiro de Geogra a e Estatística (IBGE) 1, ela é dividida em três graus e de nida como: insegurança alimentar leve, que se trata da preocupação ou incerteza quanto ao acesso aos alimentos no futuro ou acesso a alimentos de qualidade inadequada; insegurança alimentar moderada, ou seja, redução quantitativa de alimentos e/ou ruptura nos padrões de alimentação por falta de alimentos entre adultos; e, por m, insegurança alimentar grave, isto é, quando a redução quantitativa de alimentos ou ruptura nos padrões de alimentação atinge todos os membros de uma família e chega às crianças. É nessa última situação que a fome passa a ser experienciada por toda uma família e quando os conceitos de fome e insegurança alimentar convergem.

Idealmente, para crescerem plenas, crianças necessitam de uma dieta rica em nutrientes, como vitaminas

1 Informações disponíveis em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101858.pdf e minerais, proteínas, aminoácidos e fosfolipídios, além de baixo teor de açúcar e de gordura. Porém, a realidade para uma parte das crianças e dos jovens em idade escolar é bem diferente: ter comida na mesa de casa, depois de um dia na escola, pode não ser uma aposta segura.

Segundo o portal “Olhe para a fome”2, no m de 2020, 19,1 milhões de brasileiros(as) conviviam com a fome. Em 2022, o número subiu para 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer. Mais drasticamente, no pior dos cenários, lares com crianças são os que contam com menos alimentos. Famílias com crianças menores de 10 anos representavam 9,4% da insegurança alimentar em 2020 e, hoje, representam 18,1%.

Além de todas as consequências que esse acontecimento tem para as famílias e o país, isso signi ca um agravamento no desenvolvimento educacional do Brasil. Alimentação e desempenho escolar estão diretamente interligados: calorias fornecem energia, e, sem energia, como as crianças poderão prosperar em seu aprendizado? É lógico o porquê de crianças famintas não conseguirem desenvolver todo o seu potencial. Se a situação já é insustentável para um adulto, é ainda pior para um indivíduo em plena formação.

Muitos formuladores de políticas educacionais e pesquisadores geralmente se concentram em fatores como inteligência, qualidade do professor e rigor do currículo ao considerar as variações que in uenciam o sucesso acadêmico de um aluno. Mesmo quando as

2 Informações disponíveis em: https://olheparaafome.com.br/ conversas chegam a razões não acadêmicas, como o nível de educação dos pais, o envolvimento da família na vida escolar e o status socioeconômico, o importante papel que a segurança alimentar exerce na capacidade de sucesso de uma criança é frequentemente negligenciado, e a situação é grave.

Como a fome atinge o desenvolvimento das crianças em idade escolar?

Estudos têm mostrado que a insegurança alimentar não afeta apenas o crescimento físico natural das crianças, mas também interfere em sua capacidade intelectual e nas suas habilidades sociais. Assim, crianças de famílias sem acesso sustentável a alimentos têm mais probabilidades de agravar problemas de desenvolvimento em áreas como linguagem, habilidades motoras e comportamento.

É o consumo de proteínas e carboidratos, por exemplo, que levará à liberação de neurotransmissores no cérebro, que, por sua vez, in uenciarão o desempenho acadêmico. Entretanto, a questão não se encerra apenas na problemática do acesso à comida; ela chega também à qualidade dos alimentos consumidos. A comida mais acessível costuma ser menos saudável; por isso, famílias com insegurança alimentar são muito mais propensas a relatar o consumo de alimentos não saudáveis, o que, segundo o Center for Educational Neuroscience3, pode ocasionar um impacto na de ciência de certos nutrientes e prejudicar o desenvolvimento cognitivo.

A fome não é apenas uma moléstia física; ela acaba por causar, também, um imenso impacto psicológico. Por exemplo, ela afeta a qualidade do sono e, por consequência, atrapalha o funcionamento pleno de todas as outras capacidades cognitivas ou motoras. Um estudo publicado na revista de literatura biomédica PubMed4 mostrou que os problemas de saúde mental entre as crianças (e suas mães), como depressão, ansiedade e transtornos comportamentais, aumentam à medida que se eleva a insegurança alimentar.

3 Informações disponíveis em: www.educationalneuroscience.org.uk/ resources/neuromyth-or-neurofact/diet-makes-a-di erence-to-learning

4 Informações disponíveis em: www.pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15173408

A fome, muitas vezes, impossibilita que as crianças se sintam integradas ao contexto social, pois a malnutrição as impede de participar de atividades diárias que requerem esforço, seja físico ou intelectual, como as interações com colegas na escola. Ainda segundo a PubMed, muitas delas, quando chegam à adolescência, têm duas vezes mais probabilidade de consultar um psicólogo ou de serem suspensas das atividades escolares.

Crianças precisam de nutrição para crescerem, se desenvolverem e se concentrarem no aprendizado, em vez de pensar na comida que não têm. Em suma, precisam ser capazes de se concentrarem nas aulas para serem bem-sucedidas em suas vidas cotidianas e sonharem com um futuro promissor. É inegável que a pobreza de tantas famílias deve ser combatida, mas a consciência da desnutrição de crianças e jovens que enfrentam essa situação certamente merece atenção e ações. A questão é: o que mais as escolas podem fazer? Não há uma resposta fácil ou única, já que essa é uma responsabilidade compartilhada entre poderes, mas ela, com certeza, pode começar a ser respondida ao se debater o tema com a comunidade escolar, além de ser representada junto ao poder público local.

Entre os bons exemplos de parceria, temos o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que oferece alimentação e ações de educação alimentar e nutricional a estudantes de toda a Educação Básica pública, assim como o auxílio merenda, benefício nanceiro que faz parte dos programas do governo e é voltado para alunos matriculados em escolas da rede pública de ensino do estado de São Paulo que se enquadram na categoria de vulnerabilidade socioeconômica. Além disso, o Programa de Alimentação Escolar, também da cidade de São Paulo, proporciona, todos os dias, cerca de duas milhões e trezentas mil refeições, com um cardápio que prioriza itens orgânicos e de agricultura familiar. para mais de um milhão de estudantes da rede municipal de ensino.

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