6 minute read
A embaixada de Silver
Realmente, havia dois homens do lado de fora da paliçada. Um deles acenava com um pano branco, e Silver estava imóvel ao seu lado.
Era bem cedo, e a manhã mais fria que jamais enfrentei, com um vento gelado que doía nos ossos. Uma camada baixa de vapor branco que saíra do pântano durante a noite cobria o chão por onde andavam Silver e seu assistente. — Fiquem dentro da casa — disse o capitão. — Aposto que se trata de um truque. E gritou: — Quem vem lá? Parem, senão atiramos. — Bandeira branca — gritou Silver. O capitão estava no alpendre, cautelosamente abrigado. Virou-se e falou conosco: — Doutor Livesey, tome conta do lado norte. Jim, fique com o leste. Gray, a oeste. Todos do outro turno devem estar prontos para recarregar os mosquetes. Atenção, homens, e cuidado.
E virando-se para os amotinados: — E o que querem? — gritou. Dessa vez foi o outro homem que respondeu. — Capitão Silver, senhor, pede permissão para entrar — berrou. — Capitão Silver! Não o conheço — gritou o capitão. — Sou eu, senhor — respondeu Long John. — Esses pobres rapazes me escolheram para ser o capitão, depois da sua deserção, senhor.
Enfatizou bastante a palavra “deserção”. — Queremos chegar a um acordo — continuou. — Tudo o que peço é sua palavra de que poderei sair são e salvo dessa paliçada. — Não tenho nenhuma vontade de falar com você — disse o capitão Smollett. — Mas pode vir tranquilo. Os traidores estão todos ao seu lado. — Isso basta, capitão — berrou Long John, animado. — Confio em sua palavra.
Silver avançou até a paliçada, jogou sua muleta por cima e, com grande vigor e habilidade, conseguiu superar a cerca e caiu em segurança do lado de dentro.
Devo confessar que estava entretido demais com o que estava acontecendo para ter qualquer serventia como sentinela. Já tinha me esgueirado para trás do capitão, que se sentara na soleira da porta.
Silver teve muito trabalho para subir a colina, devido à inclinação do terreno e à areia fofa. Finalmente prestou continência diante do capitão. Estava vestido com suas melhores roupas, um imenso casaco azul com botões de bronze, chegando até seus joelhos, e um belo chapéu pendurado atrás da cabeça. — Aqui está você, homem — disse o capitão, levantando a cabeça. — É melhor se sentar. Se tem algo a falar, é melhor que diga logo. — Tem toda a razão, capitão Smollett — replicou Silver, sentando-se na areia. — Primeiro o dever, com certeza. Bem, vocês fizeram um bom trabalho ontem à noite. Algum de vocês bate com força. E não posso negar que muitos dos meus homens ficaram abalados. Mas pode anotar, capitão, isso não acontecerá duas vezes, com mil trovões! Vamos organizar nossos turnos de vigilância e maneirar um pouco no rum. Eu estava muito cansado, mas sóbrio. Se tivesse despertado um pouco antes, teria flagrado vocês no ato. Ele ainda não tinha morrido quando me aproximei. — E daí? — disse o capitão Smollett. Tudo o que Silver tinha dito parecia uma charada para o capitão. Do meu ponto de vista, fiquei com uma suspeita. As últimas palavras de Ben Gunn vieram à minha mente. Pensei que talvez ele tivesse feito uma visita aos piratas durante a madrugada, enquanto todos estavam caídos bêbados em torno do fogo, e calculei com satisfação que só restavam 14 inimigos.
— Bem, é o seguinte — disse Silver. — Nós queremos aquele tesouro e nós o teremos, isso é o que nos interessa! Vocês gostariam de salvar suas vidas, calculo, e é isso que lhes interessa. Vocês têm um mapa, não é verdade? — Pode ser que sim — respondeu o capitão. — Ora, veja, vocês têm, sei muito bem — devolveu Long John. — O que quero dizer é que nós queremos seu mapa. Saiba que nunca quis lhes fazer mal. — Isso não vai funcionar comigo, homem — interrompeu o capitão. — Nós sabemos exatamente o que você queria fazer e estamos pouco ligando. No momento, você sabe que não pode fazê-lo.
E o capitão o encarou muito calmo, começando a encher o cachimbo. — Muito bem — disse. — Quem sou eu para dizer o que os cavalheiros devem julgar certo ou errado. Já que vai fumar um cachimbo, capitão, vou tomar a liberdade de fazer o mesmo. Encheu um cachimbo e o acendeu. E os dois homens se sentaram em silêncio, fumando por algum tempo. Ora olhando um para a cara do outro, ora socando o fumo no cachimbo. Foi divertido assistir a eles contracenando daquele jeito. — Então ficamos assim — recomeçou Silver. — Vocês nos dão o mapa do tesouro, param de ficar atirando em pobres marujos e arrebentando suas cabeças enquanto dormem. Assim, podem escolher: ou voltam a bordo conosco, depois que o
tesouro tiver sido embarcado, e juro, pela minha honra, que vou deixá-los em algum ponto seguro da costa. Ou, se isso não for do seu agrado, pois existem desavenças mal resolvidas, se preferirem ficar aqui, podem ficar. Dividimos mantimentos com vocês. E da mesma forma faço meu juramento de que avisarei o primeiro navio que avistar para que venham resgatar vocês. Agora você é quem sabe.
O capitão Smollett se levantou e esvaziou o cachimbo na palma da mão esquerda. — Isso é tudo? — perguntou. — É tudo! — respondeu John. — Recuse essa oferta e só voltará a ver as balas dos nossos mosquetes. — Muito bem — disse o capitão. — Agora você vai me ouvir. Se vierem um de cada vez, desarmados, me comprometo a levá-los acorrentados de volta para casa, de forma que tenham um julgamento justo na Inglaterra. Se não vierem, meu nome é Alexander Smollett, já desfraldei a bandeira da minha pátria e mandarei todos vocês para o inferno. Não vão conseguir encontrar o tesouro, nem conseguem pilotar a embarcação. Não vão conseguir nos enfrentar. Gray sozinho escapou de cinco dos seus homens. Silver, seu navio está ancorado num abrigo a leste, e não vai passar disso. É o que tenho a lhe dizer. Por tudo o que é sagrado, atirarei em você na próxima vez que o encontrar. Ande, homem. Dê o fora daqui, nem que tenha que se arrastar, e faça isso rápido.
O rosto de Silver se desfigurou, seus olhos queimando de ódio. Despejou no chão as brasas do cachimbo. — Preciso de ajuda para me levantar! — gritou. — Não conte comigo — devolveu o capitão. — Quem vai me ajudar? — rugiu. Nenhum de nós se moveu. Rosnando os piores xingamentos, ele rastejou pela areia até conseguir apoio no alpendre para içar a si mesmo para cima da muleta. Cuspiu na fonte. — Com mil trovões, podem rir agora! — gritou. — Em menos de 1 hora, vou arrebentar sua velha fortificação como se fosse um barril de rum. Então, os que já estiverem mortos serão os sortudos.
E, com as pragas mais tenebrosas, saiu tropeçando colina abaixo, arando a areia com sua muleta. Atravessou a paliçada com a ajuda do homem com a bandeira branca e desapareceu entre as árvores.