Revista Poder | Edição 147

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ISSN 1982-9469

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R$ 19,50

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AG OSTO 2 02 1 N.14 7

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PROPÓSITO, INCLUSÃO E ESPERANÇA

CENA ABERTA Dono do mercado cenográfico e executor de alguns dos maiores eventos do país, o empresário MARCELO CHECON

descobre o setor público, adquire novas companhias e se prepara para crescer na reabertura Bancos digitais prosperam à sombra das grandes instituições, que já sentem o tranco

E MAIS

O surfista PEDRO SCOOBY a rigor; as afinidades eletivas do advogado AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO; os livros de cabeceira do reitor JOSÉ VICENTE; a sala que é quase pinacoteca da galerista LUISA STRINA e o futuro feminino das big techs

Fugindo do espírito de manada, o exbanqueiro RONALDO CEZAR COELHO passa longe do bitcoin e do day trade para lucrar como um dos maiores investidores da bolsa

SOB PRESSÃO

O professor de Direito RAFAEL MAFEI traça a biografia do impeachment no Brasil e

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CRÉDITO APROVADO

TOURO BRAVO

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QUINTA ONDA

Um guia para navegar no 5G

BURACO DA FECHADURA

O mercado do sexo encontra as startups na mais excitante indústria do momento


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INOVAÇÃO É O CAMINHO

O empresário Nana Baffour, de Gana, amplia os negócios globais com foco em diversidade 41

OPINIÃO

A deputada federal Tabata Amaral analisa o “presidencialismo de cooptação” 44

SUMÁRIO 8 10 14

FOTOS PAULO FREITAS; NILTON AKIRA/DIVULGAÇÃO; ARQUIVO PESSOAL

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BIOGRAFIA DO IMPEACHMENT

O PONTO G DAS SEXTECHS

Empresas brasileiras voltadas ao bem-estar sexual crescem enquanto lutam para desmistificar tabus

ENSAIO

Em sua melhor fase, o surfista Pedro Scooby enxerga para além do esporte e se lança nos negócios

PODE ISSO, RONALDO?

Professor de Direito da USP, Rafael Mafei discute a história do impeachment no Brasil

OPINIÃO

Marly Parra explica por que a diversidade é essencial para a produtividade cooperativa

O megainvestidor Ronaldo Cezar Coelho segue comprando 30

ESPECIAL TECNOLOGIA

Como a quinta geração de internet móvel irá revolucionar nossa conexão, os dez anos do Vale do Silício mineiro e a realidade das mulheres nas big techs

NO INÍCIO DAS CONTAS

Nativos digitais e incumbentes se movimentam para conquistar clientes bancários

ESPELHO

Jaqueline Conceição e sua luta pela emancipação política de mulheres negras

EDITORIAL COLUNA DA JOYCE O MELHOR CENÁRIO

Responsável por grandes eventos, o empresário Marcelo Checon transformou crise em oportunidade

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CONSUMO CANTO DE PODER ESTANTE SOB MEDIDA PODER VIAJA HIGH TECH CULTURA INC. ÚLTIMA PÁGINA

MARCELO CHECON POR ADRIAN IKEMATSU

AGENDA PODER

BVLGARI + bvlgari.com ERMENEGILDO ZEGNA + zegna.com QUIKSILVER + quicksilver.com.br RICARDO ALMEIDA + ricardoalmeida.com.br

NA REDE: /revista-poder-joyce-pascowitch @revistapoder @_PoderOnline /Poder.JoycePascowitch

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PODER EDITORIAL

S

ucumbir à pandemia nunca foi uma opção, mas dependente de aglomerações para crescer – e sobreviver –, o empresário Marcelo Checon decidiu entrar em um setor em que jamais imaginou estar: o público. Fez hospitais de campanha e tendas para pessoas vulneráveis em São Paulo enquanto estandes, palcos e estruturas para eventos gigantes como Rock in Rio e Lollapalooza não saíam do chão. Mais do que isso, num espírito que oxalá também mova outros líderes, foi às compras e incorporou companhias ao ecossistema de sua MChecon. Aos 43 anos, Checon – clicado por Adrian Ikematsu – talvez tenha o sangue nos olhos de tantos empresários, mas seus novos e ousados passos foram fruto de estratégia e prospecção. São características também dos players das fintechs e dos bancos digitais, que já tiraram da zona de conforto os bancões e seus lucros infindáveis. Fazer o dinheiro correr não é para todo mundo, e o investidor Ronaldo Cezar Coelho, irmão do famoso juiz de futebol Arnaldo Cezar Coelho, há tempos se destaca na carreira – e passando bem longe do day trade e das criptomoedas. Diversidade é um tema incontornável hoje em dia no mundo corporativo, e o executivo Nana Baffour, CEO da Qintess, tem lugar de fala, o que certamente o ajudou a atrair para o Brasil dinheiro do BID, o Banco Interamericano de Desenvolvimento. É bom que por aqui o empresariado se descole dos humores de Brasília, mas caso seja necessário, nunca é demasiado entender como são – e foram – impichados os presidentes brasileiros, objeto de livro do advogado Rafael Mafei, professor da Faculdade de Direito da USP e autor de Como Remover um Presidente. Se o empreendedorismo está em alta, não surpreende que ele também esteja a explorar as zonas, digamos, mais erógenas do capitalismo, como o mercado de sexo, tema de reportagem de Nina Rahe. O rumo da nossa democracia é pauta em artigo da deputada federal Tabata Amaral enquanto a consultora Marly Parra escreve sobre a importância da presença feminina nos conselhos de administração. Ainda por aqui, um guia sobre o futuro 5G, as mulheres que andam a transformar o Vale do Silício, o surfista big rider Pedro Scooby no nosso Ensaio de PODER e uma palinha de uma das salas mais bonitas do país: a do apartamento da galerista Luisa Strina, em São Paulo, fotografada por Paulo Freitas. Tem muito mais aqui, mas o espaço é curto e eu não quero dar spoiler. Vamo que vamo.

R E V I S TA P OD ER . C O M . B R



VIA SATÉLITE

Depois do alerta que o Brasil precisa mostrar ao mundo como pretende zerar o desmatamento ilegal e as emissões de carbono para não sair da próxima Conferência do Clima (COP26), em novembro, como vilão, o ex-embaixador americano TODD CHAPMAN foi mais contundente em um reservado almoço de despedida – ele se aposentou – realizado em Brasília com políticos, diplomatas e empresários. Assim como a Ásia, origem do coronavírus, a Amazônia é vista como possível polo de enfermidades e se o Brasil não retomar o papel de protagonista ambiental vai perder mais do que a desejada cadeira na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Para bom entendedor, meia palavra basta.

BATATA QUENTE

A sinalização desagradou o seu padrinho político, João Doria, e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Para FHC, que declarou abertamente voto em DORIA, o governador paulista tem a seu favor a boa gestão na pandemia para além da vacina – São Paulo não perdeu arrecadação – e se conseguir moderar o gênio pode sentar na mesa de negociação com um bom cacife. Seja para cabeça de chapa, seja para vice.

A possibilidade de Jair Bolsonaro ingressar no PP tem desagradado alguns deputados da sigla. A avaliação é que a chegada comprometeria alianças locais com a oposição, em especial no Nordeste, e redirecionaria o fundo partidário das campanhas parlamentares para a reeleição presidencial. Além disso, colaria o partido na queda de popularidade do governo. Vale lembrar que o novo presidente do PP, o deputado federal ANDRÉ FUFUCA, é aliado de primeira hora do governador do Maranhão, FLÁVIO DINO (PSB), alvo de ataques constantes do presidente.

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...BRUTUS

Enquanto isso...

O interesse dos investidores nas startups brasileiras só aumenta. Em julho elas captaram juntas mais de US$ 484 milhões. A Movile, controladora da iFood, recebeu um aporte recorde de R$ 1 bilhão, o maior desde a sua fundação; a Unico, de biometria facial, se tornou o mais novo unicórnio do pedaço após levantar US$ 120 milhões; e a Omie, de software de gestão, cativou o Softbank na última rodada antes de um provável IPO na Nasdaq. Somente nos primeiros seis meses deste ano, o valor de aportes recebidos por startups do país já ultrapassa em 40% o total investido em todo o ano de 2020.

FOTOS ISAC NÓBREGA/PR; ROQUE SÁ/AGÊNCIA SENADO; GOVERNO DE SÃO PAULO; GILSON TEIXEIRA/SECAP; MARCOS CORRÊA/PR; ROBERTO SETTON; GETTY IMAGES; DIVULGAÇÃO

ATÉ TU...

Alguns dos principais caciques tucanos estão apostando as fichas no senador RODRIGO PACHECO para a disputa ao Palácio do Planalto em 2022. Segundo um dos fundadores do PSDB, ex-ministro conhecido por ser bastante crítico, a conduta de Pacheco é “irretocável” e não por acaso ele é a autoridade mais bem avaliada no Congresso. Bruno Araújo, presidente da sigla, já disse nas entrelinhas que o partido poderia abrir mão da cabeça de chapa.


BREVÊ

Porto Seguro, no litoral sul da Bahia, vai ganhar nos próximos anos o segundo aeroporto internacional. Um grupo alemão, em parceria com o governo do estado, está investindo R$ 1 bilhão no projeto que vai beneficiar, principalmente, turistas estrangeiros que visitam a região. A alta demanda justifica o ânimo dos alemães: com sol ou chuva, todos os dias a região recebe viajantes que procuram as mais belas e badaladas praias como Trancoso, Caraíva e Santo André. As obras já começaram e o terminal fica a pouco mais de 20 km de distância do atual aeroporto. Em Itacaré, vizinha de Ilhéus, outro aeroporto também está saindo do papel.

NA PISTA Atual presidente do BNDES,

GUSTAVO MONTEZANO tem chamado a atenção nas rodas cariocas. Primeiro porque é jovem; segundo, está solteiro; e, terceiro, tem dinheiro para gastar. Como ele, apenas o presidente do Banco Central, outrora chamado de muso, Roberto Campos Neto – mas esse é casadíssimo com Adriana Buccolo de Oliveira Campos. Aos 40 anos, Montezano tem a energia dos 20. Vai aos bares, curte com os amigos, dança com as paqueras... E como não é exatamente um rosto conhecido do grande público, aproveita. Vale lembrar que no ano passado ele foi condenado a pagar uma indenização a um condomínio em que morou, em São Paulo, depois de ter causado confusão para não dar fim a uma festa de aniversário.

MEGAFONE

O mais recente manifesto da sociedade civil contra as ameaças ao sistema democrático ligou o sinal de alerta na equipe do presidente Bolsonaro. Diferentemente de outras vezes, intelectuais, políticos, banqueiros e empresários que nem sempre costumam se manifestar assinaram o documento “Eleições serão respeitadas” em favor do voto eletrônico. Entre os signatários estão os banqueiros Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles, do Itaú-Unibanco, os empresários Luiza Helena Trajano e Frederico Trajano, do Magazine Luiza, Sonia Hess, ex-Dudalina e vice-presidente do Grupo Mulheres do Brasil, Luiz Stuhlberger, gestor do Fundo Verde, ex-ministros Celso Lafer e Nelson Jobim, diplomatas Roberto Abdenur e José Maurício Bustani entre outros. Inicialmente, mais de 250 personalidades endossaram o texto – aberto para outros apoios na internet – que defende a Justiça Eleitoral e diz que a sociedade “não aceitará aventuras autoritárias”.

OS CÃES LADRAM

Depois da compra da Zee.Dog por R$ 715 milhões, a Petz – do CEO e fundador SERGIO ZIMERMAN – deu passo largo rumo a um objetivo ambicioso: ser reconhecida como a maior e melhor rede de pets do mundo até 2025. Para analistas de mercado, a meta é bem realista. Ela é líder no Brasil, conta com 138 lojas, 116 centros veterinários e dez hospitais. Os diferentes serviços oferecidos a um custo baixo, com qualidade, e somados ao foco digital, branding, e a presença global da Zee.Dog em mais de 45 países explicam. A expectativa é de que a Zee.Dog tenha um faturamento bruto de R$ 228 milhões em 2021.


O que você sabe não tem valor; o valor está no que você faz com o que sabe. BRUCE LEE

SAS

3 PERGUNTAS PARA... QUAL FOI O MAIOR DESAFIO DA EQUIPE MÉDICA NA OLIMPÍADA?

Já estava previsto que todo mundo estaria tenso por causa da Covid-19. O que não estava previsto era que, apesar de toda organização, seria muito difícil que tudo funcionasse bem em relação aos exames, testes. O Tocog [comitê organizador dos Jogos de Tóquio] e o COI [Comitê Olímpico Internacional] decidiram que diariamente todos seriam testados e só na Vila Olímpica eram 10 mil pessoas. Foi preciso ter uma estrutura enorme e que não atrapalhasse o andamento dos Jogos. No começo foi difícil, na minha cabeça o Japão era o lugar mais organizado do mundo, então me surpreendi. Era muita tensão porque alguém ser contaminado ou estar próximo de alguém que foi contaminado significava perder o sonho de um ciclo olímpico. A QUE SE DEVE O SUCESSO DA PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA?

Nós trabalhamos seis meses antes

das Olimpíadas para fazer com que todos chegassem com segurança. Antes de sair de São Paulo cada um de nós fez pelo menos cinco testes – o COI exigia dois. Fizemos várias reuniões, orientamos até na divisão dos quartos. Não deixamos dois levantadores de vôlei juntos, por exemplo, porque se ambos ficassem doentes acabaria o time. Outra coisa foi não deixar que os atletas se estressassem com os testes: fizemos com que coletassem os exames com calma, nos dormitórios. São cuidados mínimos que fizeram a diferença. SOBRE A SUA EXPERIÊNCIA EM SITUAÇÕES EXTREMAS, DE QUE FORMA ESSE PROJETO DO HC FOI ACIONADO NA PANDEMIA?

Quando entrei para diretoria clínica criamos um grupo de desastres porque o HC é um hospital imenso, somos referência, e tínhamos que ter esse preparo. Uma das coisas para as quais a gente se preparou foi com relação ao ebola na época em que o vírus talvez pudesse chegar a São Paulo.

NINHARIA

Fizemos treinamento, inclusive com roupas de astronauta. O plano de desastres foi utilizado muitas vezes: no incêndio do Memorial da América Latina quando bombeiros inalaram fumaça; no tiroteio em Suzano [atiradores alvejaram uma escola], quando recebemos dois helicópteros com pacientes – para cada aeronave é preciso 50 pessoas para o atendimento. Em suma, o plano nada mais é do que fazer o que você sabe em um curto período de tempo e numa proporção muito maior porque, em um desastre, chegam cinco, dez, quinze, e é preciso dessa logística para tratar as pessoas de forma rápida. Com a Covid não foi diferente, a gente desencadeou nosso maior plano para atender o maior número de pessoas, da melhor forma, e o HC foi brilhante nisso.

0,04%: esse percentual irrisório mostra a parte recebida por startups fundadas só por mulheres do total aplicado por investidores em 2020 – apesar delas serem 4,7%. A Endeavor está reforçando o compromisso de construir um ecossistema mais diverso e inclusivo dobrando a aposta nas companhias criadas por elas. No primeiro semestre deste ano, saltou para 27% o número de mulheres à frente de scale-ups nos programas de aceleração da rede. Segundo a ONU, mais igualdade entre homens e mulheres na economia poderia impulsionar o PIB global em mais de US$ 6 trilhões. Ou seja, sem inclusão não há salvação.

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FOTOS GETTY IMAGES; MAURÍCIO NAHAS; REPRODUÇÃO INSTAGRAM PESSOAL; DIVULGAÇÃO

BEATRIZ PERONDI, PERONDI, membro da comissão médica do Brasil nos Jogos Olímpicos de Tóquio e coordenadora responsável pelo projeto, treinamento e atendimento de catástrofes ou situações extremas do Hospital das Clínicas da FMUSP


COIMBRA É NOIS

Tem sido bastante produtiva a estada do rapper Emicida – umas das personalidades mais influentes do Brasil de hoje – em terras portuguesas. Responsável pela cátedra de residência artística no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, ele desembarcou por lá no fim de julho e desde então está 100% focado no curso. A agenda é cheia: palestras, intervenções artísticas, rodas de conversa, entrevistas. A ideia da residência, que rola até outubro, é promover uma reflexão e um diálogo sobre a relação entre arte, ciência e transformação social. Como ele mesmo diz: Qual o sentido da vida? Pra frente.

EM AGOSTO A MULHER E O HOMEM DE PODER VÃO... ASSISTIR ao novo documentário sobre o chef Anthony Bourdain, Roadrunner, que relembra a sua vida e desvenda a misteriosa e trágica morte, na França, em 2018. Destaque para os depoimentos dos amigos Barack Obama e Iggy Pop OUVIR o aguardado disco póstumo de Prince. Welcome 2 America foi gravado em 2010 e arquivado por anos até chegar nas plataformas digitais GARANTIR os ingressos da nova

temporada do Fronteiras do Pensamento. O ciclo de conferências tem início no dia 25 com nomes como Yuval Noah Harari, autor de Sapiens, e Margareth Atwood, criadora de The Handmaid’s Tale

SEGUIR

o perfil @tanaka_ tatsuya e conhecer o incrível projeto do artista japonês que apresenta em miniatura a vida cotidiana utilizando objetos domésticos comuns

ESCUTAR o podcast The Other Latif,

da Radiolab. Em seis episódios, o jornalista investigativo Latif Nasser desvenda o chocante caso de um homônimo seu preso em Guantánamo acusado de terrorismo

TORCER pelos atletas do Brasil nos

Jogos Paralímpicos de Tóquio, no Japão. O evento marca a despedida das piscinas do nadador Daniel Dias, o maior nome da história do esporte paraolímpico, dono de 24 medalhas

VISITAR a exposição Lygia Clark 100 anos, que reúne uma centena de obras da artista, entre pinturas, desenhos, bichos, trepantes, fotografias e documentos, em sua grande maioria inéditas ao público brasileiro. Na Pinakotheke Cultural do Rio de Janeiro BAIXAR o Merlin. O app projetado

para observadores de pássaros, dos amadores aos experientes, captura o canto das aves e identifica a espécie entre centenas de milhares

LER o primeiro romance do diretor Quentin Tarantino. Era uma vez em... Hollywood é baseado no filme estrelado por Leonardo DiCaprio e Brad Pitt e vencedor de duas estatuetas do Oscar em 2020 INVESTIR em fundos ESG. Produtos vão de equidade de gênero, ações de empresas ambientalmente responsáveis e companhias focadas em água e energia solar COMEMORAR a reabertura do Museu da Língua Portuguesa. Após seis anos fechado, o local foi completamente transformado com novas tecnologias e mais interatividade SONHAR com o Saturnia, superiate de 100 metros recém-lançado pelo estúdio italiano Lazzarini Design. Avaliado em cerca de R$ 1,8 bilhão, é dividido em cinco andares e conta com um miniporto próprio para embarcações menores.

ACOMPANHAR a terceira temporada

da série Incertezas Críticas, no canal Curta!, dedicada a pensadores brasileiros. Christian Dunker, Maria Rita Kehl e Marilena Chaui são alguns dos convidados

com reportagem de carol sganzerla, dado abreu, nina rahe e paulo vieira PODER JOYCE PASCOWITCH 13



RETOMADA

O MELHOR CENÁRIO Responsável por erguer estandes e palcos para multidões em eventos como Rock in Rio, Lollapalooza e Salão do Automóvel, que pararam na pandemia, Marcelo Checon dá um reset em sua empresa, faz hospitais, adquire companhias e transforma, como no chavão, crise em oportunidade por paulo vieira fotos adrian ikematsu

A

pandemia da Covid-19 gerou reações variadas em milhões de pessoas. Houve quem tenha mudado comportamentos e rotinas e agora pretenda levar essa nova disposição para sempre; houve quem tenha decidido se manter “business as usual”; e houve quem tenha ensaiado viver como se não houvesse amanhã. No front dos negócios, alguns empresários tiveram despertada uma certa fome de viver, ou, quem sabe, uma fome de crescer. Foi o caso de Marcelo Checon, 43 anos, da MChecon, cuja atividade, a de cenografia de grandes eventos e ativação de patrocinadores (live marketing), foi quase que mortalmente alvejada pela Covid-19. “Nosso negócio é dependente de aglomeração”, sintetizou o empresário a PODER em seu amplo escritório em edifício do complexo do Shopping VillaLobos, em São Paulo. A MChecon monta as estruturas dos maiores eventos do Brasil: Lollapalooza, Salão do Automóvel, Boat Show, Rock in Rio – no caso do grande festival


‘‘Comecei a empresa em 2005 apenas com clientes do setor privado, o idioma que uso é esse. Talvez na minha cabeça houvesse um pouco de preconceito contra o setor público. Na pandemia decidi trazer pra cá gente que entende de licitação e editais”

de rock, erguendo os estandes dos principais patrocinadores. Em 2019, a empresa, revela Checon, faturou R$ 130 milhões. Com o advento da pandemia, a companhia perdeu quase 80% da receita e precisou cortar quase à metade sua força de trabalho. Por outro lado, a paralisação dos negócios deu azo para que o clichê empresarial mais surrado de todos os tempos, aquele dos ideogramas chineses, ganhasse concretude: o empresário fez da crise, oportunidade; do limão, a limonada. Sem jamais ter trabalhado com entes públicos, a MChecon passou a fazê-lo. Primeiro com o Estado de São Paulo, cliente para o qual ergueu dois hospitais de campanha, o de Heliópolis e do Ibirapuera, na pista de atletismo Constâncio Vaz Guimarães; depois, ganhou uma licitação do município de São Paulo e estruturou para a metrópole cinco grande tendas de acolhimento da população vulnerável nas praças da Sé e da República, além de outros lugares do centro. Nessas tendas, pessoas em situação de rua podem agora tomar banho, fazer higiene pessoal e lavar suas roupas em máquinas. O contrato, de cerca de R$ 2 milhões por mês, se encerra neste agosto. “Vimos que o serviço que o fornecedor anterior entregava era nota 5, a instalação elétrica, por exemplo, tinha fios desencapados. Na MChecon, a gente procura ser nota 500. Nossas instalações elétricas têm tomadas alinhadas na régua, com a indicação de voltagem, fazemos isso normalmente para os clientes do setor privado. Acho que a prefeitura de São Paulo não estava acostumada com esse nível de serviço.” O acabamento mais Casa Cor do que Cohab Tabajara pode ter impressionado a prefeitura, ainda que o “plus a mais” não tenha sido exatamente o adesivo 110/220 V, mas o fato de Checon ter prospectado e ao fim convidado a concessionária de saneamento paulista Sabesp para participar, como patrocinadora, do projeto. Assim, economizou-se o dinheiro gasto com caminhão-pipa e, mais importante, parou-se de interromper o serviço para o usuário quando o recolhimento de dejetos e o reabastecimento de água era executado. A tubulação da Sabesp, que se liga à rede de esgotos, é retrátil e dever ser desconectada quando as tendas forem desarmadas. A experiência com o cliente do setor público, que amenizou dramaticamente a crise na MChecon, acabou por gerar uma divisão dedicada dentro do organograma da companhia, tocada por três pessoas. No planejamento estratégico até 2025, a ideia é que pelo menos 25% do faturamento seja oriundo daí. Pode-se dizer, por isso, que a pandemia foi de alguma forma proveitosa para o empresário, já que lhe abriu por-

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tas de um segmento com o qual jamais pensou seriamente trabalhar. “Comecei a empresa em 2005 apenas com clientes do setor privado, o idioma que uso é esse. Talvez na minha cabeça houvesse um pouco de preconceito contra o setor público. Na pandemia decidi trazer para cá gente que entende de licitação e editais, e hoje me dedico diariamente a prospectar clientes desse setor”, diz.


Detalhes da sede da MChecon, com a coleção de credenciais do empresário para os eventos de que sua companhia participa

Mas a limonada não para aí. Mesmo em momento tão adverso, a MChecon foi às compras e despejou R$ 10 milhões em quatro aquisições, na tentativa de criar um “ecossistema”, como diz Checon, ou, mais propriamente, uma holding, já chamada M&Co. Ao negócio de cenografia de eventos e live marketing foram agregadas a Recon, uma empresa que fabrica tendas (e que impressionaram Checon ao erguer os hospitais de campanha) e estruturas para estandes; a Triart, que fornece divisórias de alumínio, também para feiras e convenções; a 100% Eventos, de poltronas, sofás e outros móveis próprios para eventos sociais como casamentos; e uma companhia de móveis para cerimônias corporativas, a Checon Locações, fundada há 20 anos por seu irmão mais velho, Luciano. Com o movimento, o empresário busca claramente aumentar sua participação de mercado, e as aquisições, por isso, não devem parar. “Seguimos olhando oportunidades. Banheiros químicos, por exemplo, têm uma demanda absurda em eventos como Carnaval e mesmo na construção civil, e há no Brasil apenas duas ou três empresas desse segmento. A ideia até 2025 é capitalizar, ganhar musculatura e aumentar o ecossistema.” Checon conta que dois advi-

sors, às vésperas do encontro com a PODER, sugeriram a ele abrir mercado na bolsa. O empresário refuta a ideia, não pela trabalheira com governança, já que deseja ter todas as empresas do grupo auditadas, mas porque não consegue enxergar minimamente a necessidade disso. “Quando me falam de IPO, eu digo: ‘Como assim?’. Por ora, penso em ir atrás de venture capital, de smart money, até mesmo de estruturar, se for o caso, um family office.”

TEMPO LIVRE

A necessidade não tem lei, dizia Oliver Cromwell, um dos “founding PODER JOYCE PASCOWITCH 17


fathers” britânicos, e a simples irrupção da pandemia abriu picadas, como se viu, na MChecon. O oceânico tempo livre que se impôs a líder e liderados é pai do novo momento da empresa. “A crise trouxe vários aprendizados para a gente, como o de pensar em negócios que antes não analisávamos até por questão de tempo”, diz. “Mas também ganhamos mais resiliência, aprendemos a parar, respirar, conseguir resolver reuniões com Zoom, como tantos fizeram, mas que era um instrumento que antes a gente não usava”. A história de como decidiu erguer hospitais de campanha em São Paulo lembra um pouco aquela imagem do mundo dividido entre os que choram e os que vendem lenços. Checon (e o planeta inteiro) viu a construção a toque de caixa dos hospitais em Wuhan, na China, na virada de 2019 para 2020, e achou que podia fazer o mesmo por aqui. A questão é que nenhum gestor público imaginava que houvesse tal demanda no Brasil – afinal, síndromes respiratórias anteriores, como a Mers, não haviam deixado a Ásia. “Fiz um projeto em duas horas e enviei pro João [Doria], que me passou o contato do secretário da Saúde.

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Ali [na secretaria] todos achavam que aquilo não seria preciso. Três semanas depois me perguntaram se eu queria participar da licitação”, conta. “Acabei ganhando e entreguei um hospital de 268 leitos com quase o dobro do tamanho do chinês.” Checon já havia trabalhado bastante com o governador, mas antes da entrada de Doria na política, seja para eventos do grupo Lide, seja erguendo os shoppings sazonais de Campos do Jordão e Guarujá. O empresário não o procurou desde que venceu as elei-

FOTOS DIVULGAÇÃO

No “cineminha”, a entrada de Marcelo Checon no setor público, ao vencer a licitação de dois hospitais de campanha para o combate à Covid-19, erguidos na capital paulista, em 2020, e ao levantar as tendas de atendimento à população vulnerável em 2021


‘‘Seguimos olhando oportunidades. Banheiros químicos, por exemplo. A ideia até 2025 é capitalizar, ganhar musculatura e aumentar o ecossistema” ções para prefeito, em 2016, e deixou-o numa lista de contatos de amigos que, como disse a PODER, “um dia posso encontrar”. “Percebi que esses contatos são muito mais [valiosos] do que isso.” Para quem desconhecia as licitações públicas, a nova experiência foi quase redentora. Mas houve sobressaltos, como a sondagem inicial para fornecer respiradores pulmonares e a necessidade de fazer toda uma caixa de dejetos sob a tenda do hospital de campanha – “surpresas que o edital não mostra”. Acertar a temperatura do ar-condicionado também foi um problema, já que os 19 graus solicitados pela chefia médica transformavam o interior da instalação, em pleno inverno de 2020, num freezer. “A solução foi desligar o ar à noite.”

A VOLTA DAS MULTIDÕES

Checon se alegrou com a realização do festival Lollapalooza em Chicago, em 1º de agosto, às vésperas de seu encontro com PODER, que teve capacidade de espectadores “full”, bastando ao fã mostrar o

comprovante de vacinação ou um teste negativo de Covid. O mesmo festival e o Rock in Rio estão programados para 2022 no Brasil, e são eventos-chave para a retomada da empresa. O ano que vem tende a significar uma espécie de novo-velho normal para a MChecon, que então já carregará as novas expertises do setor público e o arranque das novas marcas da holding. “O Checon é um grande parceiro do Rock in Rio e é sempre uma ótima oportunidade trabalhar ao lado de quem vive em constante evolução. Ele aprimora PODER JOYCE PASCOWITCH 19


Marcelo Checon vê a retomada dos shows e aglomerações nos Estados Unidos e projeta parte importante do futuro de sua empresa por aqui. O Lollapalooza, que acaba de acontecer em Chicago, tem sua versão paulistapaulistana mantida para março de 2022, mas tudo pode mudar, dada à veloz penepenetração da variante delta do coronavírus pelo mundo. Na Holanda, um festifestival de música em Utrecht, em julho, reuniu 20 mil pessoas que tiveram de apresentar documento de vacinação ou testes de Covid, e acabou com 5% de contaminados. Para Artur Andrade, editor do Panrotas, principal veículo de turismo e eventos do Brasil, a retomada está em marcha. “Já há espaços sem data disponível em novembro”, diz. “O maior retorno no calendário é previsto para 2022 e uma recuperação a níveis pré-pandemia um pouco mais para frente. Mas tudo pode acelerar com a confiança dos participantes e empresas, basta ver que a venda de hotéis de lazer em julho foi maior que o melhor mês de 2019. E o turismo pode nos surpreender ainda mais.”

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suas entregas ao consumidor a cada ano, o que reflete todo olhar inovador de seu trabalho para o festival”, disse Rodolfo Medina, CEO da Dreamers, a executora do Rock in Rio. Checon diz que as relações com os clientes, como Medina, também mudaram, no rumo de um melhor entendimento – e eventualmente de menos grana, com mais recursos sendo alocados no “figital”, ou seja, em lojas e eventos físicos como no ambiente digital. “Veio esse choque de realida-

ASSISTENTE DE FOTOGRAFIA CHARLES WILLY

EM TURNÊ


‘‘Fiz o projeto [do hospital de campanha] em duas horas. Mas na Secretaria da Saúde achavam que ele não seria preciso. Três semanas depois me perguntaram se eu queria participar da licitação” de, e criou-se a possibilidade de sermos mais honestos na relação, de falar para o cliente que receber depois de 200 dias é inconcebível.” Também entrou em cena, com a pandemia, o uso de materiais mais baratos, menos nobres. “Será que algo para durar quatro horas precisa de investimento tão alto?”, Checon faz a pergunta retórica, e conta que o tempo aberto nos primeiros meses do isolamento também permitiu para a companhia fazer uma “imersão” nesses novos materiais – a cara chapa de inox, por exemplo, foi trocada por fórmica e por curvim, sem prejuízo estético, segundo ele. A perspectiva do que se avizinha é excitante, mas ninguém no 13º andar do edifício Villa Lobos está em sangria desatada para absorver uma suposta demanda reprimida. A grande ocupação das mesas do escritório nestes dias se deve a um “job” pontual para um grande banco, e um sistema com ao menos um dia de home office para os colaboradores já foi implantado. Checon teme um recrudescimento da variante delta

do coronavírus, mais transmissível, mesmo não tendo, neste ano e meio de pandemia, baixas importantes na equipe – um produtor, que trabalhou no projeto com a prefeitura de São Paulo, teve um quadro um pouco mais preocupante, mas se recuperou bem. O próprio Checon e Samara, sua mulher, quando ganharam a primeira filha, em 11 de novembro, acabaram pegando Covid, mas com efeitos muito leves. Eles desconfiam que a transmissão foi na maternidade, e ficaram felizes por nada ter acontecido a Maria Helena – pelo contrário, pediatras disseram que a bebê provavelmente desenvolveu anticorpos. Talvez o próximo Réveillon e o Carnaval de 2022 não sejam, como já se especulou, os mais apoteóticos do século, e a alegria pelo fim dos tempos de restrição, tão exuberante. O exemplo da MChecon, contudo, mostra que é possível encher o copo gota a gota, no ritmo de uma pequenina vitória por dia. No fim, quem sabe, todos teremos conquistado, como no slogan de seu mais famoso cliente, um mundo melhor. n PODER JOYCE PASCOWITCH 21


CONJUNTURA

NO FIM INíCIO DAS CONTAS

Nativos digitais e incumbentes se movimentam para conquistar consumidores ávidos por inovação na guerra dos bancos POR ANGELICA MARI


FOTO GETTY IMAGES

U

ma década após a eclosão dos bancos digitais, neobanks e grandes instituições do setor avançam para uma nova fase de competição, em um contexto de modernização do sistema bancário com o open banking e uma crescente maturidade do consumidor na adoção de serviços financeiros digitais – que o diga o recém-chegado Pix. O Brasil é o quinto maior do mundo, atrás do Reino Unido, Coreia do Sul, Suécia e França, segundo pesquisa da Exton Consulting. Por aqui, bancos digitais como Nubank, Inter, Original, C6 Bank, Agibank, Neon e Next já ultrapassam os 80 milhões de contas – só o Nubank acumula mais de 40 milhões de clientes. Na bolsa, em termos comparativos, enquanto as quatro maiores instituições do país – Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil – amargam perdas que chegam perto de 40% e a maior queda de lucro em 21 anos, os papéis do Inter subiram mais de 400% nos últimos 12 meses. A bonanza dos players digitais se deve a fatores como a crescente predisposição do público a esse modelo. Um estudo publicado pela Juniper Research prevê que mais da metade da população global (53%) deve usar serviços bancários virtuais até 2026. Grande parte desse avanço se deve à pandemia, que provocou uma onda de inovação dos produtos e serviços ofertados por instituições do setor. Segundo Bruno Diniz, professor e sócio na consultoria de inovação Spiralem, o setor bancário no Brasil amadureceu notavelmente, em parte graças aos neobanks, que impulsionaram o desenvolvimento do setor com um modelo inovador a custos muito mais baixos. Por outro lado, incumbentes tomaram nota das práticas trazidas pelos entrantes, principalmente no atendimento ao cliente. “Bancos digitais elevaram a barra [de exigências] dos usuários de produtos e


serviços financeiros no Brasil e mudaram percepções ao mostrar que existe uma forma de atendimento e entrega diferente daquela experiência sofrível que conhecíamos anteriormente”, diz o especialista. Além do foco no usuário, Diniz nota que os neobanks têm as vantagens de uma infraestrutura tecnológica moderna e leve, além da ausência de agências e uma força de trabalho enxuta, ao passo que os grandes têm uma forte presença física, tradição de mercado e uma base maior de clientes. “As diferenças entre digitais e incumbentes mostram

va de adoção de serviços de bancos digitais, assim como aconteceu com ferramentas de comunicação como o WhatsApp, que tiveram uma adesão inicial gradativa seguida de um crescimento exponencial, diz Luiz Marcelo Calicchio, o Teco, um dos sócios-fundadores do C6 Bank. A isenção de tarifas é um fator importante no processo, assim como a crescente sofisticação de serviços oferecidos por esses players: “Quanto mais necessidades do seu cliente você endereça, com uma experiência e preço adequados, maior é a chance de se ter uma participação cada vez mais relevante nas finanças des-

maneira consciente, com uma análise de crédito muito boa para construir os portfólios de crédito, e aí sim ter a rentabilidade do todo”, detalha o executivo. O segredo dessa receita, segundo o sócio do C6, é a inovação na distribuição de produtos como o crédito, uma frente em que bancos tradicionais têm vantagens por causa de suas redes de agências físicas. Parafraseando um alerta feito por Candido Bracher, expresidente do Itaú, Teco ressalta que incumbentes precisam achar a inovação antes que os novos bancos encontrem a distribuição. E para alcançar o maior número de clientes possível, o C6 aposta em sua criação de marca de estilo de vida, focada no segmento de

‘‘A burocracia dos grandes bancos tira autonomia e não fomenta a colaboração, elementos necessários para ter sucesso na nova economia”

um panorama cada vez mais evidente quando pensamos em como essas instituições vão brigar no próximo nível do jogo”, pontua.

ADOÇÃO

Pela primeira vez, o número de downloads de aplicativos de neobanks no Brasil ultrapassou a parcela de instituições tradicionais, com os bancos digitais garantindo uma participação de mercado de 52% em 2020, segundo um levantamento do UBS Evidence Lab. Esse cenário dá pistas de uma iminente aceleração na cur-

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se cliente”, diz Teco, cuja empresa aposta na tese de um banco digital que endereça as necessidades de pessoas físicas e jurídicas nas verticais de pagamento, investimento e crédito em uma só plataforma. Neste cenário, a monetização do C6, que hoje tem uma base de cerca de 8 milhões de clientes, ficará por conta de empréstimos, seguida de serviços. O J.P. Morgan, que comprou 40% do C6 em junho, deve ajudar nessa estratégia, explica Teco, com uma série de elementos da grade de produtos do banco americano que podem ser reaproveitados. “Precisamos, inevitavelmente, ser um banco completo. Eu atraio o depósito, distribuo esse dinheiro de

alta renda. Além disso, o banco conta com os corretores da Som.us, empresa de seguros e resseguros, além de uma rede de quase 700 ex-gerentes bancários que atuam como consultores empresariais, vendendo serviços do banco digital. “Acreditamos em um modelo de distribuição híbrido, para atravessar a barreira do comportamento do ser humano em consumir produtos financeiros do mundo físico diretamente no ambiente digital”, diz Teco.

ADAPTAÇÃO

Para reagir ao avanço dos neobanks, players como o Itaú apostam na transformação digital aliada a uma abordagem “phygital”, em que o consumidor define a dimen-

FOTOS DIVULGAÇÃO; ILUSTRAÇÃO FREEPIK

Rodrigo Cury, diretor executivo do BTG


Acima, Renato Lulia, diretor de relações com investidores e inteligência de mercado do Itaú Unibanco; à esq., Rodrigo Cury diretor executivo do BTG

são, funcionalidades e tipo de uso dos canais físico e virtual. O banco diz ter dobrado o investimento anual em tecnologia desde 2018, para permitir que clientes contratem produtos de forma inteiramente digital, física ou, ainda, começar uma interação em um canal e concluí-la em outro, de acordo com a preferência do usuário. Com 60 milhões de clientes, o Itaú Unibanco reportou um aumento de 64% na abertura de contas e 70% na contratação de produtos por canais digitais em março deste ano em relação ao mesmo mês em 2020. Porém, a rede de agências continuará cumprindo

um papel “relevante” no negócio, diz Renato Lulia, diretor de relações com investidores e inteligência de mercado do Itaú Unibanco. “No que cabe a nós definir, já estabelecemos que o lugar que queremos ocupar perante nossos clientes é o de um banco digital com a conveniência do atendimento presencial”, diz o executivo do Itaú. Oferecer opções de atendimento nos mundos físico e virtual também é importante dada a vasta gama de perfis que o banco atende, segundo Lulia: “Nossa base de clientes é muito diversificada sob inúmeros aspectos. Suas necessidades são distintas, tanto em função do perfil como do momento da vida financeira de cada um”, pontua. Outros incumbentes têm criado empresas digitais para intensificar sua própria transformação e viabilizar novas frentes de negócio. Um exemplo é o banco de investimentos BTG Pactual, que lançou sua operação de varejo digital, o BTG+, em janeiro de 2020. “No nosso caso, há uma cultura favorável à inovação e o BTG+ é um negócio totalmente novo. Conseguimos utilizar os produtos de investimento que o atacado tem, além de fazer uma série de coisas que esses novos braços que competem com a organização maior provavelmente não conseguem”, diz o diretor executivo do banco Rodrigo Cury. Segundo ele, um dos grandes entraves enfrentados por bancos tradicionais é a transformação cultural que acompanha o modelo digital. “A solução que executivos inteligentes acabam encontrando é separar iniciativas digitais para não as matar: a governança e a burocracia dos grandes são muito

cruéis, tiram a velocidade, autonomia e não fomentam a colaboração, que são elementos necessários para ter sucesso na nova economia”, ressalta.

COMPETIÇÃO

O open banking, sistema em implementação no Brasil que prevê o compartilhamento dos dados pessoais dos clientes entre as instituições financeiras com a anuência do usuário, deve subir o tom da guerra entre os bancos tradicionais e os digitais, com outros players como grandes varejistas entrando no jogo, segundo Diniz, da Spiralem. “Estamos caminhando para uma realidade em que os grandes bancos não estarão mais no centro de tudo e precisarão criar plataformas que unam o que eles têm de melhor e terceiros, que desenvolvem produtos e serviços melhores”, ressalta o especialista. “Instituições terão que se tornar mais abertas e adaptar a forma em que operam há anos para conseguirem sobreviver.” Mesmo com a perspectiva de um futuro mais competitivo, agentes do setor são unânimes em um ponto: há espaço para todos. “O Brasil é um dos maiores e mais evoluídos mercados bancários do mundo, com uma demanda enorme por serviços de uma população altamente digitalizada e aberta a inovação”, diz Cury, do BTG+, citando exemplos como a rápida adoção do Pix, sistema de pagamentos instantâneos que já supera o boleto, TED e DOC. “Continuaremos tendo espaço para bancos mais especializados em determinados nichos, além de players com uma oferta mais abrangente. Há espaço para quem quiser competir: no fim das contas, quem vai definir quem vence é o consumidor”, finaliza. n PODER JOYCE PASCOWITCH 25


PREGÃO

dora, a maior fatia individual da o fim dos anos 1960, quando Fiel aos próprios empresa. O mesmo já havia acona bolsa de valores ainda era aprendizados, o tecido com a Light, da qual commato, um ambicioso vendedor de automóveis de Copacabana megainvestidor Ronaldo prou 20% em duas etapas (a segunda, em 2020). Seus 20% na apostou numa oportunidade que muCezar Coelho segue Energisa – menos apenas que os daria sua vida. Influenciado por figuras como Francisco Gros, diretor da comprando, comprando 30% da família Botelho – foram adquiridos em 2016 e fecham o financeira que atendia a loja de care comprando. Depois tripé do fundo. Por enquanto. ros (décadas antes de se tornar prena privatização da BR. sidente do Banco Central, BNDES e de dobrar a aposta em “Apostei Com a saída da Petrobras, o valor Petrobras), o jovem Ronaldo conseplena desvalorização destravou. Eu tinha 4%, fui a 8% e guiu um emprego para ser auxiliar da o objetivo de chegar a 10%, corretora Multiplic no pregão carioda Light, ele se tornou o tenho podendo ir a 15%.” Depois de faca, onde já tinha algumas ações. Ali, maior acionista da BR lar à PODER, ele já detinha 9,5% percebeu que os homens realmente ricos do mercado eram os investido- Distribuidora, onde deve das ações da BR. Ronaldo afirma ser mera coinres de fundos públicos (Petrobras, aumentar sua posição cidência a concentração de sua BB, Vale) que colecionavam cautecarteira em empresas de geração las a longo prazo. Constatou também ainda este ano e distribuição de energia e comque muitos underwritings (IPOs) enbustível. “A BR vai expandir seu calhavam de início, para atingir a esPOR FERNANDO SOUZA plano de negócios e crescer com tratosfera tempos depois. “Fomos ao aquisições e fusões. Já a Energisa Rio Grande do Sul assistir ao primeiro lançamento do grupo Gerdau, e não vendeu na- é a empresa que tem a melhor gestão do setor eléda”, lembra. Incumbido pela corretora de promover trico brasileiro, com a família Botelho, da qual sou os papéis da Casa Sano, antiga fabricante de telhas amigo. A Light fez a mudança completa do conselho e caixas d’água de amianto que estreara sem êxito e se beneficia de sócios como o Beto Sicupira, que no mercado, Ronaldo virou habitué da rodoviária atraí para a empresa como investidor e conheço da do Rio, de onde partia com um contrato de 100 mil bolsa desde 1969. Por ser sócio da 3G, ele tem uma ações para fazer barulho em São Paulo. Deu certo. experiência extraordinária de pessoas e processos.” Estar cercado das pessoas certas é um dos manQuando o preço subiu, ele realizou a venda, pegou seu lucro da operação e se tornou sócio da Multiplic. damentos de Ronaldo. Habituado a citar seus pares O início da carreira de investidor do carioca Ro- e influenciadores nas conversas, ele os chama penaldo Cezar Coelho, 74 anos, traz muitos dos apren- la versão carinhosa de seus nomes – o que chega a dizados que fizeram dele um dos maiores acionis- soar uma excentricidade, considerando se tratar do tas da bolsa brasileira, com uma carteira de mais de grosso do PIB nacional. “Eu brincava com o Zé SaR$ 7 bilhões. Em julho, seu fundo Samambaia foi fra: ‘Compra ações!’. Queria que ele fosse o maior notícia ao adquirir 7,95% das ações da BR Distribui- acionista da Nestlé, porque tinha tamanho para isso.

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FOTO ARQUIVO PESSOAL

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PODE ISSO, RONALDO?


Ele respondia: ‘Meu pai dizia lá na Síria que, se juros compostos tivessem asas, voavam’”, conta, ilustrando a predileção do banqueiro. Muitos dos colegas de Ronaldo se criaram no Leblon, o bairro que, segundo ele, acumulou uma das maiores redes de saberes sobre gestão de fortunas

do mundo. “Eu não tenho analistas, nem gente fazendo gráficos, nem nada. Eu uso o conhecimento da ‘Universidade Aberta do Leblon’”, diz, referindo-se ao círculo informal de gestores do bairro. “Tenho um orgulho imenso da história do André Esteves, que eu vi chegando. E o Beto [Sicupira], a nova geração, o Pedro Quaresma, que está na Faria Lima... Vieram de onde? Da Universidade Aberta do Leblon.” Adepto da filosofia “buy and hold” – que o fez manter uma participação de 6% na Souza Cruz por três décadas –, ele não apenas carrega posições por anos, como reinveste os dividendos. “Sou um investidor de longo prazo, não fico perto do pano verde. Só perde com boas ações quem as vende”, diz. “Não me preocupo com cotações, eleições, pessimismo... Gosto de ir contra a manada. É ali que a gente vê oportunidade.” Um exemplo de como Ronaldo reage a um revés aconteceu no ano passado. “Comprei a Light a R$ 20, R$ 22. Bem no meu aniversário ela amanheceu a R$ 7. Mas se eu achava bom comprar a R$ 22, também deveria achar a R$ 7. Quando me recuperei do golpe, dobrei a parada, indo de 10% para 20%.” Embora não se envolva na gestão das empresas, Ronaldo deRonaldo Cezar Coelho monstra estar atento a seus moconcedeu entrevista vimentos. Sobre a mesma Light, à PODER por vídeo durante uma pausa em ele conta como o problema de lisuas férias gações elétricas clandestinas no Rio – uma sangria de 600 mil consumidores no sistema da empresa – passou a ser tratado como questão governamental. “Falar dessas perdas como ‘gato’ ou ato criminoso de gente pobre e favelada é falso, é vulgar. Como é que você lança uma conta mínima de R$ 250, em que metade do valor é ICMS, para uma PODER JOYCE PASCOWITCH 27


pessoa que só está acima dos sem-teto? Ela teve perda de renda, desemprego, vive do auxílio emergencial... Felizmente o governo do estado entendeu isso, e está em curso uma mudança para o consumidor de baixa renda, com ICMS mínimo de 12%.” Enquanto deixa a governança para gestores como Sicupira, Ronaldo pegou para si o ‘E’ das práticas ESG (Environmental, Social, Governance) como propósito profissional e pessoal. Seus planos incluem o replantio de Mata Atlântica e a produção de água no âmbito da BR Distribuidora, onde pretende emplacar a BR Florestas, e o reflorestamento do entorno da sua fazenda histórica em Vassouras, no Vale do Café fluminense. “A BR tem 8 mil esquinas no Brasil, e cada uma pode manter um quiosque de serviços ambientais. Quando ficar identificado que ali não tem apenas distribuição de carbono, a dinâmica será diferente.” Em Vassouras, Ronaldo afirma já ter plantado 152 mil árvores e aumentado o ritmo para 20 mil novas mudas por ano. A ideia é emendar a mancha de Mata Atlântica de sua fazenda a outras duas nos arredores, criando um corredor silvestre. “A BR pode replicar isso multiplicado por cem, por mil.” Em outra iniciativa pessoal na região, o Instituto Vassouras Cultural, fundado e presidido por Ronaldo, adquiriu o casarão em ruínas da Santa Casa, de 1848, para restaurá-lo e, até 2022, transformá-lo em um museu sobre a identidade do povo brasileiro. Embora não se furte a falar de mercado, ele gosta de introduzir temas mais amenos. Colecionador de arte inveterado, sua compulsão é capaz de arrastá-lo ao agreste pernambucano para garimpar um maracatu de Mestre Vitalino. “Sempre prometo que não vou comprar mais nada, já que a coleção de arte moderna está toda amarrada. Mas outro dia fiquei emocionado com um Portinari. E comprei.” Membro dos conselhos do MAM Rio, da Bienal e do Masp, Ronaldo mantém em comodato no museu paulista a tela Composição (Figura Só) (1930), de Tarsila do Amaral, que emprestou para a exposição Tarsila Popular, em 2019, recorde histórico de público. “Aquela Tarsila ganhou uma nova dimensão ao se tornar ‘a Tarsila do Masp’. Nunca mais voltou para a minha casa, nem vai voltar.” Criado em um apartamento alugado do IAPC (programa de habitação popular de Getúlio), no Lido, em

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Em 1997, em reunião com o então presidente Fernando Henrique Cardoso, época em que era executivo do Comitê Rio 2004 para ser sede dos Jogos Olímpicos; e em 2000, como candidato do PSDB à prefeitura da capital fluminense, conversando com eleitores no centro da cidade

Copacabana, Ronaldo estudou no tradicional Colégio Pedro 2º e se formou em Direito pela PUC. Filho de um propagandista médico e uma funcionária concursada dos Correios, ambos paraenses, sua mãe era descendente da Amazônia Judaica – movimento migratório do século 19 que trouxe judeus marroquinos para trabalhar no ciclo da borracha. “Meu chip de acumulação e respeito ao dinheiro certamente é da mamãe.” Por iniciativa própria, ele se aproximou do judaísmo nos últimos anos e, em setembro de 2020, se deu “de presente” o brit milá, o ritual judaico de circuncisão. “É uma cerimônia feita no oitavo dia de vida, e eu fiz aos 74 anos. Faltava uma clareza na minha identidade religiosa e espiritual.” Ronaldo tem um único irmão – Arnaldo Cezar Co-


FOTOS ARQUIVO PESSOAL; ANA CAROLINA FERNANDES/FOLHAPRESS; SERGIO LIMA/FOLHAPRESS

“Bitcoin é cassino, não tem a ver com investimento. Eu até entendo a teoria da nova moeda, mas não tenho mais idade para isso” elho, o próprio, primeiro árbitro brasileiro a apitar uma final de Copa, em 1982, e por quase três décadas principal comentarista de arbitragem da Globo. Inseparáveis, ambos chegaram a trabalhar juntos no mercado financeiro e são sócios na TV Rio Sul, afiliada da emissora no estado. O que muita gente não sabe é que, tal qual o irmão investidor, Arnaldo teve uma carreira muitíssimo bem-sucedida em uma corretora própria, a Liquidez, vendida no ápice, quando era uma das maiores da BM&F. Depois de 26 anos no Multiplic, que se transformara em banco de investimentos, Ronaldo e seu sócio Antonio José de Almeida Carneiro, o Bode, venderam suas participações para o Lloyd’s por US$ 600 milhões. A essa altura (1996), ele surfava na carreira política, no segundo de seus quatro mandatos como deputado federal – um pelo PMDB (1987 a 1990) e três pelo PSDB (1995 a 2006), partido que ajudara a fundar e lhe trouxe posteriormente inconvenientes: ex-tesoureiro, ele foi investigado pela Polícia Federal por supostas irregularidades na campanha de 2010 do então candidato a presidente José Serra. Longe da vida partidária, o ex-político, ex-banqueiro, empresário, megainvestidor e neofilantropo se mantém otimista sobre o futuro do país. “O Brasil testa a nossa paciência, mas vai mudar. Olhe para o agronegócio, o maior produtor de seis das mais im-

portantes commodities do mundo. Olhe para a produção de petróleo do Rio, que salvou o Brasil nos últimos 50 anos e vai nos salvar nos próximos 50.” Sobre o mercado, Ronaldo vê com bons olhos os setores de varejo, proteínas e tecnologia, mas é alérgico à especulação digital. “Bitcoin é cassino, não tem nada a ver com investimento. Eu até entendo a teoria da nova moeda, mas não tenho mais idade para isso.” O investidor diz não simpatizar também com certos modelos da nova economia. “Não acredito em negócios que têm um cadastro que vale não sei quanto, mas você não vê o lucro.” Em um momento de queda dos juros e migração de CPFs para o mercado de ações, Ronaldo Cezar Coelho nunca pareceu ter tanta razão. “Eu só invisto na bolsa.” n PODER JOYCE PASCOWITCH 29


EPÍLOGO

BIOGRAFIA DO

IMPEACHMENT Professor de Direito da USP e autor de Como Remover um Presidente, Rafael Mafei discute as condições jurídicas, políticas e sociais para afastar presidentes no Brasil e explica como evitar que nossa democracia esteja sob permanente ameaça de quarteladas ou parlamentadas

m meio a uma série de denúncias envolvendo contratos para compra de vacinas contra a Covid-19, tem crescido a pressão pelo impeachment de Jair Bolsonaro (sem partido). Na mesa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que tem o poder de decidir sobre o andamento do processo, já são mais de 130 pedidos protocolados – e barrados pelo apoio parlamentar costurado pelo Planalto. Os denunciantes acusam o presidente de cometer crimes de responsabilidade na condução da pandemia (ao promover aglomerações e demorar a comprar vacinas, por exemplo), assim como ter participado de atos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), ou supostamente interferir em instituições como a Polícia Federal. Contudo, nenhum dos pedidos teve o mérito analisado. Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Rafael Mafei, poupar Bolsonaro de sequer ser ameaçado pelo impeachment traz sérios riscos à democracia. Autor do recém-lançado Como Remover um Presidente – Teoria, História e Prática do Impeachment no Brasil (ed. Zahar), Mafei argumenta que o presidente comete crimes em série e não há dúvidas sobre a viabilidade jurídica de seu impeachment. No entanto, é preciso fechar a complicada equação política para colocar o processo em marcha.

PODER: QUAL A EQUAÇÃO NECESSÁRIA PARA A ABERTURA DE UM PROCESSO DE IMPEACHMENT? RAFAEL MAFEI: Impeachments prosseguem quando um

determinado conjunto de circunstâncias está presente. Primeiro a popularidade do governo vai mal e há um grande descontentamento popular. Porém, não basta

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que esse descontentamento exista dentro da cabeça das pessoas, privadamente. É preciso que ele se externe em manifestação pública e isso, normalmente, é feito com o povo nas ruas em atos que costumam ser motivados por conta de um episódio específico, um escândalo que faça com que o descontentamento privado se transforme na comunhão em torno de um protesto. O [Fernando] Collor, por exemplo, tinha um governo contestado, impopular, seriamente abalado por denúncias de corrupção. Em determinado momento, por iniciativa dele próprio, aquilo se transformou em manifestação pública quando ele convocou as pessoas para irem às ruas com uma peça de roupa nas cores da bandeira do Brasil demonstrar apoio ao governo. E todo mundo foi para as ruas, mas vestindo preto, em sinal de desaprovação. Um segundo ponto importante é que quase sempre a impopularidade de um governo é determinada pelo seu desempenho econômico – é muito difícil que um presidente sofra ameaça de impeachment, não importa a magnitude do escândalo que o atinja, se a economia estiver indo bem. Depois, este determinado fato negativo precisa ser continuamente ecoado pelos canais de informação e, então, os políticos do Congresso Nacional, que são as pessoas que controlam juridicamente o impeachment, precisam ser compelidos a agir – mas aí entra um cálculo político porque eles avaliam se a situação deles vai melhorar ou piorar em uma eventual troca de governo. Ou seja: economia ruim, impopularidade, denúncias e escândalos, manifestação de descontentamento popular, reverberação pública pelos canais de circulação de informação e conjugação de uma estratégia política dentro dos partidos.

FOTO RENATO PARDA/DIVULGAÇÃO COMPANHIA DAS LETRAS

E

POR DADO ABREU


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do presidente da Câmara. Ela diz que a Câmara dos Deputados pode autorizar, mediante 2/3 de aprovação, que o presidente da República seja processado por crime de responsabilidade. Ou seja, ela dá à Câmara, aos 513 deputados, esse poder de autorização. Já a Lei do Impeachment, a Lei 1.079, diz que a denúncia apresentada à Câmara deverá ser lida na sessão imediatamente subsequente e encaminhada para a comissão especial. Portanto, o que ela exige do presidente é que leia e encaminhe. E traz uma regra razoável: se o pedido for estapafúrdio, ou evidentemente impróprio, pode ser arquivado desde logo, sem a necessidade da criação de comissão. Um exemplo aconteceu com o Itamar Franco, que foi fotografado na década de 1990 ao lado de uma modelo [Lilian Ramos] que estava sem calcinha e por isso denunciado por crime de responsabilidade. Ou seja, é uma denúncia esdrúxula, foi direto para o arquivo. Mas o poder de ignorar, esse não está previsto em lugar nenhum, que é o que têm feito o Lira e antes dele o Maia – este tão recordista quanto Bolsonaro porque ignorou quase 100 pedidos. Foi o Rodrigo Maia que criou essa ideia de que denúncias de impeachment podem ser ignoradas. Antes dele o [Eduardo] Cunha havia inaugurado a ideia de que o presidente da Câmara é dono do impeachment, podendo usá-lo para seu benefício político e pessoal.

PODER: ESSA CONDUTA NÃO EXISTIA? RM: Antes os presidentes da Câmara recebiam os pedidos

e analisavam. Uns demoravam um pouco mais, outros menos, mas analisavam e, se fosse o caso, arquivavam. E o plenário decidia se mantinha o ato de arquivamento ou derrubava. O Lula teve seis denúncias apresentadas contra ele arquivadas pelo presidente da Câmara, houve recurso e o plenário manteve a decisão. O FHC três vezes. O impeachment Livro examina a fundo a utilização da prática no Brasil, do século 19 até os dias de hoje

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tem esse componente, da Câmara exercer um controle político. Mas quem exerce é a Câmara, não é o presidente da Casa. O que o Lira está fazendo não tem amparo nem no regimento, nem na lei e nem na Constituição. É um comportamento que revela abuso de poder. PODER: O QUE OS IMPEACHMENTS DE COLLOR E DILMA INDICAM SOBRE O CASO DE BOLSONARO E NO QUE A SITUAÇÃO DELE DIFERE DA DOS SEUS ANTECESSORES? RM: No caso do Bolsonaro há uma particularidade porque

ele desistiu de governar. Entregou esse poder na mão do Lira e mais recentemente para o Ciro Nogueira [ministro da Casa Civil]. Collor e Dilma nunca desistiram. O Collor continuou com a ideia de promover as reformas que queria, mesmo desgastado mandou um pacote de emendas constitucionais enorme para o Congresso. Ele nunca topou a ideia de entregar o governo na mão do Congresso. A Dilma muito menos. Não deixou na mão do PMDB em troca de indicações para abafar a Lava Jato, que era o grande temor do centrão na época. O que motivou parte do Congresso a embarcar no impeachment dela foi o desejo de trocar a Dilma por outro presidente que pudesse impedir o avanço da Lava Jato. Não fosse por isso o apoio ao impeachment não teria tido, dentro do Congresso, a força que teve.

PODER: SE OS IMPEACHMENTS ENVOLVEM ESCÂNDALOS POLÍTICOS, QUAL O MAIOR: O FINANCIAMENTO DE CAMPANHA DO COLLOR, AS PEDALADAS DA DILMA OU A GESTÃO DA PANDEMIA DO BOLSONARO? RM: O Collor é um caso clássico. Tinha um governo que

ia mal, teve um baita escândalo que envolvia a figura do presidente e o descontentamento popular contra ele foi impulsionado pela denúncia específica de corrupção. Tinha uma base muito estremecida no Congresso Nacional e foi detonado por um escândalo.

PODER: E O CASO DA DILMA? RM: O caso da Dilma é diferente porque embora ela

tenha sido afastada por pedaladas e decretos de crédito suplementar em desacordo com a meta fiscal, as manifestações contra o governo não tinham nada a ver com isso. Ela caiu por uma denúncia cujos fundamentos eram diferentes dos que levaram ao descontentamento popular contra o governo, que era sobretudo contra o partido da Dilma. A imagem do PT estava muito conspurcada pela ideia de corrupção e isso ajudou a colar o ônus na figura dela. É um caso único. Uma presidente não envolvida em corrupção, que sofre uma

FOTO DIVULGAÇÃO

PODER: JÁ SÃO MAIS DE 130 PEDIDOS DE ABERTURA DE PROCESSO DE IMPEACHMENT CONTRA BOLSONARO QUE NÃO FORAM APRECIADOS NEM POR RODRIGO MAIA, TAMPOUCO POR ARTHUR LIRA. COMO EVITAR O PODER ABSOLUTO QUE O PRESIDENTE DA CÂMARA TEM NO BRASIL? RM: A Constituição Federal não menciona a figura


denúncia por um fundamento que muita gente não entende. Parte da população até hoje acha que a Dilma caiu por corrupção, o que não é verdade. PODER: E AS ACUSAÇÕES CONTRA BOLSONARO? RM: Com Bolsonaro envolve saúde pública, que na

Constituição é uma competência dividida entre União, estados e municípios. Isso dá ao presidente uma margem para criar discursos em que ele distribua a culpa para os outros. Na economia você não tem como fazer isso. Quando o plano de inflação do Collor deu errado, ou quando a nova matriz econômica da Dilma deu errado, não havia como jogar a culpa no governador do Maranhão. Economia é um assunto que está nas costas do presidente, saúde pública não. Com Bolsonaro tivemos a recusa na compra de vacina para o Programa Nacional de Imunizações (PNI) e depois a questão da Covaxin que agregou elemento de corrupção – isso tem mais força do que entrar na gritaria se faltou oxigênio ou sobrou cloroquina. Isso tem ajudado Bolsonaro, porque o grande crime de responsabilidade dele diz respeito a uma matéria no qual o conflito de versões é possível de ser fabricado. PODER: QUAIS OS RISCOS AO POUPAR O PRESIDENTE BOLSONARO DE UM PROCESSO DE IMPEACHMENT? RM: O mais concreto é termos um processo eleitoral no

ano que vem com tudo para ser caótico e quase violento. É muito raro um país que tenha uma democracia sustentável quando 30% da população cujo candidato foi derrotado acredita que foi roubada. Isso é um cenário de conflito civil, não de transição pacífica de poder. Estamos encomendando uma bomba relógio nas eleições cujo desfecho é imprevisível. O segundo risco é o de normalizarmos como comportamento político aceitável a conduta do Bolsonaro. Não dá para acharmos que, no exercício da Presidência da República, ameaçar jornalistas, não aceitar resultado de eleição, instigar ataque contra autoridades, instituições, possa fazer parte do repertório político de uma democracia. O que estamos fazendo no Brasil é não apenas abrir mão do impeachment, como abrir mão da ameaça do impeachment. Estamos criando um cenário em que o presidente pode fazer absolutamente qualquer coisa em termos de ruptura dos pactos de civilidade política que existem em uma democracia. É justamente por isso que, tanto a Constituição quanto a Lei do Impeachment, exigem que o presidente aja de modo compatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo. Esse comportamento não pode ser normalizado.

PODER: NO PASSADO, EM QUE OUTROS MOMENTOS SE FALOU EM IMPEACHMENT NO BRASIL? RM: A primeira lei brasileira a prever crimes desse tipo foi

o estopim para a crise parlamentar que levou à renúncia do marechal Deodoro da Fonseca. Em 1891, quando ele viu que iriam aprovar uma lei de impeachment, tentou dissolver o Congresso, mas sem poderes para isso acabou renunciando. Ironicamente, nosso primeiro presidente republicano caiu indiretamente por causa do impeachment. Depois tivemos outros casos, como na época do Café Filho, mas foi somente após as ditaduras que os impeachments ganharam tração porque são jeitos de resolver grandes conflitos políticos sem ter que usar de alternativas menos democráticas.

PODER: VOCÊ ESCOLHEU UM TRECHO DE UMA MÚSICA DO PINK FLOYD, “COMFORTABLY NUMB”, NA EPÍGRAFE DO LIVRO: “EU ME TORNEI CONFORTAVELMENTE ANESTESIADO”. POR QUÊ? RM: Por circunstâncias da vida. Estava ouvindo muito

Pink Floyd quando escrevi o livro, músicas estimulantes e calmantes – acho “Comfortably Numb” a mais espetacular nesse sentido. E tem um significado que cabia de fundo, que é olhar com perplexidade para o fato de que muita gente normalizou a prática cotidiana, quase que orgulhosa, de agressões às instituições e autoridades, que são absolutamente elementares no regime democrático, e tem dado de ombros para isso, como se fosse um fato da vida pelo qual a gente não tivesse que lutar. Essa anestesia confortável de contemplar o absurdo e não fazer nada me deixa perplexo. n PODER JOYCE PASCOWITCH 33


NEGÓCIO

O PONTO G DAS SEXTECHS

POR NINA RAHE

Vibradores portáteis BIP, da Pantynova

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Em um mercado que movimenta mais de US$ 30 bilhões ao redor do mundo, com crescimento de 30% ao ano, e previsão de ultrapassar o valor de US$ 120 bilhões até 2026, sextechs brasileiras lideradas por mulheres crescem exponencialmente enquanto desmistificam tabus que envolvem o prazer feminino


E

m meados do século 20, um cartaz anunciava um vibrador que acalmava o “indivíduo levando-o a um relaxamento agradável”. A mensagem destacava as qualidades do produto que aliviava a tensão e poderia ser utilizado com ou sem cremes, além de ser absolutamente seguro para as áreas mais sensíveis do corpo, proporcionando satisfação. Mas, embora haja evidências de que as mulheres utilizavam os vibradores para a masturbação já nas décadas de 1900 e 1910, vender a peça abertamente como aparelho sexual era algo raro, uma vez que a prática foi durante muito tempo considerada obscena em vários países, com leis que impediam as companhias de anunciar produtos para o prazer sexual. Os itens, assim, apareciam como massageadores de costas ou pescoços. Mais de 100 anos depois, no entanto, as empresas que se voltam ao bem-estar sexual – as chamadas sextechs – ainda enfrentam problemas para a divulgação de seus produtos a despeito de o segmento movimentar mais de US$ 30 bilhões ao redor do mundo, com crescimento de 30% ao ano, e previsão de ultrapassar o valor de US$ 120 bilhões até 2026. “Todas as postagens que tento impulsionar foram bloqueadas porque as redes classificam como algo que infringe as normas da comunidade. Se você usa determinadas palavras, como vagina, ou mesmo bem-estar sexual, às vezes [a publicação] não passa”, explica Lídia Cabral, que fundou há um ano a plataforma Tech4Sex com o propósito de fomentar o ecossistema de sextechs no Brasil. “Essa é uma das bandeiras de quem trabalha nessa área: como você irá atingir o público se não consegue promover os posts?

Existe também um tabu para receber investimento e para alavancar um negócio você precisa de grana”, argumenta. Seu primeiro contato com o segmento aconteceu em 2020, quando teve a oportunidade de viajar para a Consumer Electronics Show (CES), considerada a maior feira de tecnologia do mundo. Ali, Lídia se deparou com uma série de empresas voltadas ao bem-estar sexual e começou a estudar esse mercado, à época quase inexistente no Brasil, chegando a se formar, também, na Sextech School, escola de Bryony Cole, autora de Future of

el. Com um investimento inicial de R$ 100 mil, e o desenvolvimento de pesquisas quantitativas e qualitativas para mapear como se lançar nesse terreno, ela passou a explorar questões sobre os produtos e a rotina de sexualidade, bem como os desafios que atingiam a intimidade dessas mulheres, a exemplo de candidíase, endometriose e ressecamento vaginal. “Temos poucos dados sobre sexualidade no Brasil, a última grande pesquisa data de 2017, e meu objetivo era entender se a demanda era por produtos, aplicativos ou conteúdos”, conta Marina. “Havia uma

“O mercado erótico existe há muito tempo, mas não com essa proposta com empresas que passam a ser passíveis de investimento” Lídia Cabral, fundadora da Tech4Sex Sex e considerada uma das principais lideranças no ramo. “O mercado erótico existe há muito tempo, mas não com essa proposta e com empresas que passam a ser passíveis de investimento. Esse é um tema novo, com poucas informações ainda”, explica. Foi também em uma viagem ao exterior, durante uma especialização em São Francisco, Califórnia, que a empresária Marina Ratton se viu em um encontro destinado a debater o papel das sextechs. A percepção do potencial dessa área, com a noção de que a tendência era incipiente no Brasil, fez com que Marina decidisse abandonar a empresa onde trabalhava para empreender no ramo com a marca Fe-

necessidade muito forte por produtos, principalmente para mulheres que estão na menopausa e no climatério, e que não se sentiam atendidas.” O estudo a que ela se refere, inclusive, foi realizado pelo Programa de Estudos em Sexualidade da Universidade de São Paulo (ProSex), na Faculdade de Medicina da USP, e concluiu que metade das brasileiras não tem orgasmo nas relações sexuais. Sem a mesma precisão metodológica, a pesquisa realizada por Marina apontou que 86% das entrevistadas não estavam felizes com os produtos disponíveis na gôndola. O que levou a empresária a lançar um gel lubrificante e hidratante à base de calêndula, aloe


vera e vitamina E. O produto, que tinha como projeção um estoque de 500 unidades que deveriam durar dois meses, acabou em duas semanas e, agora, menos de um ano após o lançamento, a startup conseguiu captar R$ 550 mil em sua primeira rodada de investimentos por meio da plataforma de equity crowdfunding Wishe, com 84% do financiamento liderado por investidoras mulheres. Além da captação, a Feel também atraiu a atenção do Grupo Boticário em fevereiro deste ano, quando foi selecionada para participar do progra-

ma de aceleração da empresa. Com o investimento, a ideia é lançar mais três produtos até o fim do ano, sendo dois deles voltados para mulheres acima dos 50. O mais urgente para Marina – que ganhou no processo as sócias Dani Junco e Marina Sampaio –, no entanto, é aumentar a produção e sair “do termo de sold out”. “Fizemos um pedido robusto, de 5 mil unidades, pela primeira vez, e faremos um repique ainda maior em setembro”, comemora. Como a Feel, a marca Lilit, que nasceu com a missão de ser a pri-

Acima, Izabela Starling e Heloisa Etelvina, fundadoras da loja de produtos eróticos Pantynova; abaixo Marília Ponte, que criou a Lilit com um investimento inicial de R$ 200 mil

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meira empresa brasileira de vibradores criados por e para mulheres, também está indo de vento em popa. Nos primeiros 11 meses de operação, a companhia faturou R$ 757 mil. De acordo com sua fundadora, Marília Ponte, a empresa nasceu de sua própria experiência (nada entusiasmadora) ao comprar o primeiro vibrador. “Quando decidi empreender, tinha vergonha de dizer que iria pedir demissão para criar um vibrador. O que me ajudou foram as pesquisas que mostravam o tamanho do mercado”, explica. Seus primeiros passos também foram sedimentados por um estudo com mais de 3 mil mulheres, que confirmavam a sua percepção inicial: do grupo de participantes que já havia tido um vibrador, apenas 10% delas havia ficado 100% satisfeitas com a experiência. Durante o processo de elaboração do Bullet Lilit, um minivibrador com cinco estágios de vibração, que é recarregável e resistente à água, além de pequeno e discreto, Marília se deparou com a falta de informação ao realizar um quiz com parte das entrevistadas e perceber que a minoria das mulheres tinha conhecimento sobre a anatomia do clitóris. “Começamos a notar que o vibrador era só uma pequena parte para olhar de uma forma mais prazerosa e com menos tabus”, diz ela. “O benefício não é o produto em si, mas o produto como ferramenta para o diálogo, para a educação e para trazer a sexualidade a um lugar diferente.” O lado positivo da pandemia, nesse sentido, é que nunca se consumiu tantos vibradores. De acordo com levantamento feito pelo portal Mercado Erótico, mais de 1 milhão desses brinquedinhos adultos foram vendidos entre março e agosto no Brasil, volume 50% maior se comparado


“O benefício não é o produto em si, mas ele como ferramenta para o diálogo, educação e para trazer a sexualidade a um lugar diferente” Marília Ponte, fundadora da Lilit

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Lídia Cabral, que fundou a plataforma Tech4Sex para fomentar o ecossistema de sextechs no Brasil (esq.); e Marina Ratton, fundadora da marca de produtos para intimidade feminina Feel

ao mesmo período do ano anterior. Assim, se o isolamento social possibilitou o aceleramento do e-commerce e derrubou uma das principais barreiras para as mulheres comprarem sextoys – a necessidade de entrar em lojas físicas –, também abriu espaço para redimensionar a importância do prazer feminino e dos tabus que persistem nessa área. Para Lídia Cabral, da Tech4Sex, tudo deve passar pela educação, a começar pelo fato de que a maioria das pessoas não entende o significado das sextechs e acha que o nome está relacionado à pornografia ou robôs. “Não é que não seja, também faz parte, mas o grande foco são soluções para melhorar a sexualidade e, quando você fala

de sexualidade, estamos abordando também a saúde e um conceito holístico de bem-estar”, explica. “Por um lado, é preciso mostrar a importância da educação sexual. Do outro, mostrar as oportunidades financeiras desse mercado que não é de nicho, se considerarmos que as mulheres são mais da metade da população.” Pioneiras nesse ramo, Izabela Starling e Heloisa Etelvina, que fundaram a marca Pantynova em 2018, registraram um crescimento de 554% em 2020: “Já vínhamos de um bem, mas crescemos anos em semanas. Só em março do ano passado foi 400% [em relação ao mesmo mês no ano anterior]”. Com destaque inicial para os strapons [brinquedo erótico constituído por um pênis artificial],

que vêm com design diferente dos modelos tradicionais, feitos em couro ou napa, e dildos com modelagem mais discreta, distantes das réplicas de pênis, a marca passou a lançar, neste ano, vibradores em parceria com seus fornecedores, cuidando da customização para tornar a apresentação deles mais adequada, e planeja modelos 100% autorais até 2022. “Nossa expectativa para o próximo ano é expandir tanto no B2B quanto no B2C”, diz Izabela, que passou a ter a marca comercializada nas lojas Amaro, Renner e Magazine Luiza. “As pessoas estão entendendo cada vez mais que a sexualidade é um importante pilar para o bem-estar, tanto quanto ter uma rotina de exercícios ou se alimentar bem”, conclui a empreendedora. n PODER JOYCE PASCOWITCH 37


GRAVIDADE

O CAMINHO Atuando há uma década no Brasil, o empresário Nana Baffour, de Gana, amplia o alcance de seus negócios globais na área de tecnologia com foco em diversidade POR ANGELICA MARI

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FOTO NILTON AKIRA/DIVULGAÇÃO

S

ilenciosamente, Nana Baffour escreve o próximo capítulo de uma trajetória que entrelaça negócios com impacto social. O ganês de 49 anos, que lidera um império em setores como tecnologia, mídia e moda, se prepara para levantar um fundo de investimento multimilionário focado em grupos sub-representados no ecossistema de inovação latino-americano. Fundador de empresas como a Qintess, multinacional de serviços de tecnologia sediada em São Paulo, Baffour foi escolhido para receber um aporte âncora do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para o novo veículo. Segundo apurou a reportagem de PODER, a proposta do empresário enfrentou a competição de mais de 100 agentes da região. O fundo, que deve ser lançado este ano, visa públicos como afroempreendedores e indígenas. Traçado em parceria com a gestora americana especializada em mercados emergentes Hawks Point Capital, o plano de Baffour apresentou um leque de potenciais oportunidades de investimento não só no Brasil, mas em países como Trinidad e Tobago, Panamá e Bolívia. “Será o primeiro fundo do tipo na região, que trará uma combinação única de capital global e experiência operacional, além de uma sensibilidade e compreensão do que significa ser ‘o outro’ no universo do empreendedorismo”, aponta o executivo. A escolha reflete um alinhamento de valores entre o empresário e o BID, diz Baffour. “Além de capital, fundadores – em especial os que vêm de grupos minoritários – precisam de alguém que acredite no potencial deles e saiba como se constrói um negócio”, pontua. “Sou o cara que já se preocupou em como pagar funcionários, como atrair talentos sendo uma pequena empresa, e continuou executando. Fiz tudo isso sendo um homem negro, o que adiciona outras camadas à minha experiência.” Neste ano, Baffour também deve fazer sua primeira incursão no mundo da mídia, com um título licenciado que vai lançar em parceria com um grupo global do setor: “Será algo sem precedentes no Brasil, um veículo que celebrará a diversidade a partir das questões de branding e tecnologia”.


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AVANÇANDO DIVERSIDADE

Orgulhoso de sua origem africana, Baffour diz que a experiência nos Estados Unidos teve um efeito “transformador” na forma como vê o mundo, em aspectos como diversidade, conquistas e ambição. Por outro lado, identifica no Brasil um mix de culturas que ajuda a explicar seu entusiasmo pelo país, mesmo em tempos desafiadores. “Me sinto totalmente à vontade. Elementos da cultura africana, que não são celebrados tanto quanto deveriam, estão em toda parte”, diz. No entanto, ele constata que o Brasil está muito atrasado em agendas como o combate à desigualdade racial. Por isso, na Qintess fomenta ações nes-

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“Nada do que faço é sobre mim, e sim sobre as pessoas envolvidas, o que podemos fazer juntos” se sentido, com inserção de jovens da periferia e outros grupos minoritários no setor de tecnologia, principalmente fora do eixo Rio-SP, por meio de treinamento, aceleração de negócios e investimento de capital semente. Ao avaliar esforços de outras companhias e coalizões, Baffour não acredita que o país está diante de um ponto de inflexão em relação ao racismo. “Não avançamos porque o mundo dos negócios sente que pode continuar fazendo o que faz, pois não tem sua receita impactada e não há uma forte demanda de consumidores por mudança”, explica. “Sempre que converso com CEOs, digo que eles não estão fazendo o suficiente [para endereçar o racismo estrutural]. O argumento é que isso leva tempo. A verdade é que deveriam fazer algo revolucionário, em vez de esperar que tudo aconteça de forma evolucionária.” Enquanto por aqui as corporações caminham a passos lentos rumo à igualdade racial, Baffour acelera seus múltiplos projetos centrados em diversidade, com o apoio de um poderoso networking global. “Nada do que faço é sobre mim, e sim sobre as pessoas envolvidas, o que podemos fazer juntos, os recursos que podemos trazer”, diz o executivo. “Quero ser lembrado como um homem africano que aproveitou todas as oportunidades apresentadas pelo mundo para fazer a diferença.” n

FOTO NILTON AKIRA/DIVULGAÇÃO

Filho mais velho de uma família de 12 irmãos, Baffour deixou Gana aos 20 anos, rumo aos Estados Unidos. Lá, estudou economia e arte, fez um MBA na Stern School of Business, da New York University, e trabalhou por anos no mercado de investimentos liderando processos de aquisição para gigantes do setor como Credit Suisse. No início dos anos 2000, em um escritório compartilhado em Manhattan, fundou a primeira de suas várias empresas de tecnologia. Em 2011, Baffour vendeu suas operações no mercado americano e escolheu o Brasil como base para seus negócios. Com apoio de grandes fundos, como o francês Blue Like an Orange, comprou três empresas de tecnologia: a Cimcorp, Resource e CSC Brasil, que, juntas, formaram a Qintess, hoje com um efetivo de 3.500 pessoas. Outros negócios controlados pelo ganês incluem a Roost, empresa de edge computing. O empresário também atua no segmento de lifestyle com a holding NVH Studios, detentora da marca de calçados brasileira Zeferino e a francesa Twins for Peace. Com esta última, firmou recentemente uma colaboração com a fundação My Good, criada pela cantora Macy Gray, que apoia vítimas de violência policial.


OPINIÃO

DEMOCRACIA COOPTADA POR TABATA AMARAL

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

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m 1988, o cientista político Sérgio Abranches cunhou a expressão “presidencialismo de coalizão” para descrever o modus operandi que regeria a relação entre os poderes Executivo e Legislativo a partir da Constituinte. Abranches defendeu que, por causa da fragmentação partidária brasileira e da existência de uma Presidência forte, mas minoritária em termos de representação parlamentar, qualquer governabilidade só seria possível com a criação de amplas coalizões multipartidárias. Cada vez mais, a construção dessas coalizões passou a ser amparada menos em concordâncias ideológicas e mais na troca de interesses, com destaque para as fatias do orçamento chamadas de emendas parlamentares. Não à toa, esse arranjo políticoinstitucional recebeu a alcunha de “presidencialismo de cooptação”. A reforma política que está sendo discutida agora no Congresso, se bem-sucedida, não só será a maior mudança das regras do jogo desde 1988, feita como se não estivéssemos em meio a uma pandemia, como também perpetuará o presidencialismo de cooptação como a principal, senão a única, forma de relacionamento entre o Executivo e o Legislativo. Primeiro porque ela é um ataque frontal à renovação política. Um dos retrocessos propostos é a instituição do distritão, um sistema eleitoral caro e personalista, adotado em apenas quatro países do mundo. Segundo nota técnica elaborada

pelo gabinete compartilhado que divido com o senador Alessandro Vieira e o deputado Felipe Rigoni, caso o sistema vigorasse em 2018, 17 deputados em reeleição teriam sido eleitos no lugar de novatos. No balanço total, a nossa única deputada indígena, negros e mulheres perderiam cadeiras. Além disso, a proposta em discussão traz a flexibilização da obrigação de que 30% dos candidatos sejam mulheres, assim como das regras de destinação proporcional dos recursos de campanha e tempo de propaganda a candidaturas femininas. Paralelamente a tudo isso, e com meu voto contrário, o Congresso aprovou a destinação de R$ 5,7 bilhões para o Fundo Eleitoral em 2022, mudança que, se não for revertida, dará ainda mais poder aos incumbentes atuais, especialmente se levarmos em conta que, via de regra, esse recurso é distribuído ao bel-prazer dos dirigentes partidários. Esse valor, que é cerca do triplo do que foi destinado no ano passado, fará com que o Brasil seja

o país que mais gasta dinheiro público com campanhas políticas. O presidente Bolsonaro, é claro, apoia todas essas frentes, pois se tornou um dos principais patrocinadores e beneficiários desse toma lá dá cá entre o Executivo e o Legislativo. Só na Lei Orçamentária Anual deste ano há R$ 48,8 bilhões destinados a emendas parlamentares – um recorde. É assim que, por meio de reformas pouco compreensíveis à população, lenta e imperceptivelmente, buscam eternizar o presidencialismo de cooptação e corroer ainda mais a nossa democracia. Diferentemente das mentiras que Bolsonaro repete descaradamente aos seus apoiadores, não serão seus vetos – sempre combinados com um Congresso pronto para derrubá-los – que impedirá tamanhos retrocessos, mas, sim, a nossa mobilização. n Tabata Amaral é deputada federal (sem partido), cientista política, astrofísica e ativista pela educação. Formada em Harvard, criou o Mapa Educação e é cofundadora do Movimento Acredito

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Enquanto o mundo se preocupa mais e mais com pautas sociais, a agenda ESG passou a ser questão de primeira ordem nas grandes corporações. Em algumas empresas, no entanto, a adoção de boas práticas não é novidade. Alinhada aos princípios de sustentabilidade, a UNIPAR, líder na produção de cloro, soda e PVC na América do Sul, vem conduzindo seus negócios há cinco décadas com o compromisso de respeito ao meio ambiente, integração comunitária e valorização dos cerca de 1.400 colaboradores instalados nos seus escritórios e plantas industriais em Cubatão e Santo André, em São Paulo, e Bahía Blanca, na Argentina. Nos últimos tempos a empresa aumentou o investimento no desenvolvimento profissional em busca da preparação das equipes para o futuro, criou programas como o Equilibre, para apoiar a saúde física e mental dos colaboradores e seus familiares, e estabeleceu um diálogo contínuo de proximidade e confiança com as comunidades onde atua. Entre as inúmeras ações sociais apoiadas e desenvolvidas pela Unipar, o Projeto Pescar é um dos destaques. A iniciativa auxilia o acesso de jovens de baixa renda ao mercado com o suporte de mais de 100 empresas que integram uma rede colaborativa. Em mais de 40 anos do programa, 30 mil pessoas concluíram o curso socioprofissionalizante que inclui noções de cidadania, preparação para inserção no mercado de trabalho e, especificamente no caso da turma apoiada pela Unipar, iniciação técnica em produção industrial, tudo para fomentar a inclusão e o desenvolvimento dos jovens participantes.

“A possibilidade de mudar a perspectiva de famílias inteiras por meio do processo educacional representa uma causa mais do que legítima para o apoio e o incentivo da companhia”, diz o diretor-executivo de RH da Unipar, Marcello Zappia, que, ao lado do controlador Frank Geyer Abubakir, é um dos embaixadores do projeto. “Mais do que garantir o abastecimento de diversos mercados no Brasil e na América Latina com cloro, soda e PVC, arrecadar tributos, gerar empregos e contribuir para o desenvolvimento dessas economias, o apoio a esses projetos representa a responsabi-

lidade e o compromisso da empresa com a sociedade”, conta Zappia. Em razão disso, durante a pandemia “a empresa que faz a química acontecer”, como diz o simpático slogan, fez também a solidariedade acontecer e apoiou a população onde está presente com doações de produtos e valores que superam R$ 17 milhões – somente com a tradicional Unipar Run Fábrica Aberta, que no ano passado bateu recorde de participantes em sua edição virtual, foram arrecadados 1,7 tonelada de alimentos não perecíveis. Depois, atendendo a um chamado público do Ministério da Economia, em apoio ao Ministério da Saú-

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QUÍMICA SOCIAL


Projeto Pescar: mais de 33 mil jovens já se beneficiaram do programa desenvolvido em parceria com grandes empresas como a Unipar

“A possibilidade de mudar a perspectiva de famílias inteiras por meio do processo educacional representa uma causa mais do que legítima para o apoio e incentivo da companhia” Marcello Zappia, diretorexecutivo de RH da Unipar

de, a Unipar integrou o grupo de 12 empresas que se uniram para doar mais de 5 mil concentradores de oxigênio – os equipamentos entregues em abril foram direcionados ao tratamento de pacientes com Covid-19 em suas próprias localidades, evitando o deslocamento e a sobrecarga de hospitais pelo Brasil. Para mais, a companhia também tomou a decisão de não demitir durante os meses mais críticos da pandemia como outra forma de suporte aos seus colaboradores e, por meio de seu Conselho Consultivo Comunitário, que reúne vizinhos, organizações sociais e representantes da empresa, realizou a série

de lives Diálogos Virtuais para debater assuntos importantes como saúde, saneamento básico e segurança no trabalho e em casa. Segundo o CEO Maurício Russomanno, ações como essas dão continuidade ao propósito social e a missão da Unipar de melhorar a qualidade de vida das pessoas, sobretudo em um momento tão delicado. “Avaliamos os nossos resultados e sucesso além do retorno financeiro. Investimos nas comunidades no entorno das nossas operações para ajudar no seu desenvolvimento”, explica. “Entendemos que isso faz parte do nosso papel na sociedade.”


ESPELHO

EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA POR CARLA JULIEN STAGNI

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em que cargos de liderança são ocupados em sua maioria por brancos, é fundamental que as pessoas procurem atualizar seu conhecimento e entendam como o chamado “privilégio branco” contribui para a desigualdade social. “Só vamos ser livres quando pudermos conhecer nossa própria história, incluindo aí os brancos, porque nossa história é preta, africana, indígena”, pontua. Recentemente, durante a pandemia, Jaqueline sentiu que o coletivo precisava de ajustes. Para alcançar seu projeto maior que é transformar o Di Jejê em uma universidade, ela decidiu comercializar o con-

teúdo da plataforma em esquema de assinaturas e está lançando uma campanha de financiamento coletivo. A meta é oferecer até mil bolsas para mulheres negras. “Meu maior público sempre foi de mulheres negras, que se deparam na universidade com essa ausência da história negra. De Erika Hilton a Taís Araújo, várias foram minhas alunas”, conta. “Comecei tudo isso por necessidade de ser escutada. Quando percebo que é uma necessidade coletiva, me dá orgulho. Há sete anos estou colocando água nessa plantinha para ela virar um baobá, e um baobá demora anos para ficar grande.” n

FOTO COLETIVO DI JEJE/DIVULGAÇÃO

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aqueline Conceição é daquelas pessoas que fazem a diferença na sociedade. Jovem, 35 anos, divorciada, mãe de dois garotos, nascida na periferia de São Paulo, ela é uma das vozes que mais reverberam quando o assunto é a emancipação política de mulheres negras por meio da educação antirracista. Criadora do Coletivo Di Jejê, instituto de pesquisa e formação sobre questões étnicorraciais e de gênero, Jaqueline é a essência da representatividade. Justamente por ter vivido dificuldades, sentiu a necessidade de abrir um canal de informação e troca com outras mulheres como ela. Para isso, cursou pedagogia e, ao se formar, foi incentivada por um professor a seguir a carreira acadêmica. Acabou fazendo mestrado na PUC-SP. “Era a única negra na turma”, lembra a agora professora, doutoranda em antropologia social, mestre em educação, psicanalista e empresária premiada pela ONU pela relevância de seu trabalho de educação antirracista. Com suas antenas voltadas integralmente em direção a esse propósito, Jaqueline e seu Di Jejê vão além. Uma das plataformas oferecidas pelo coletivo é destinada à formação de gestores: “Existe uma demanda por profissionais que tenham visão racial e de gênero mais adequadas às condições brasileiras. Como articular as questões de racialidade dentro do ambiente corporativo e como isso reverbera fora da empresa. Tem coisas que não são mais aceitáveis”, explica ela, que já trabalhou com multinacionais, entre elas, Google e Avon. Em um país com população predominantemente negra como o Brasil,


ESPECIAL

TECNOLOGIA Como a quinta geração da rede de internet móvel irá revolucionar nossa conexão, os dez anos do Vale do Silício mineiro e as poderosas que estão investindo bilhões para mudar a realidade das mulheres nas big techs


ESPECIAL

QUINTA GERAÇÃO DE OPORTUNIDADES Prevista para 2022, rede 5G de internet móvel promete mudar a forma como vemos e interagimos com o mundo. Entenda o que vem por aí e conheça as novidades

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POR NIVALDO SOUZA

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magine uma cirurgia em que o médico opera a distância, apenas como um holograma na sala, enquanto um robô controlado por ele executa os movimentos. Ou que você consiga sentir o cheiro de pólvora exalar do monitor durante uma partida do seu game de ação preferido. Considere ainda a possibilidade de percorrer os 2 mil quilômetros entre São Paulo e Salvador em um veículo autônomo sem tocar as mãos no volante. Tudo isso soa como fantasia ao estilo de filmes como Star Wars e Minority Report, mas pode se tornar realidade em alguns anos com a chegada da quinta geração da rede de internet móvel – mais conhecida como 5G. Até lá, porém, o Brasil precisará superar deficiências na infraestrutura de telecomunicações e agilizar o ambiente de negócios para turbinar investimentos. O primeiro passo esperado pelo mercado é a realização do leilão das frequências do 5G, previsto para ocorrer até o fim do ano. Tudo caminha para o prazo ser cumprido e a tecnologia ser instalada em algumas capitais até o primeiro semestre de 2022. Só falta o governo federal superar a celeuma diplomática em que se meteu na hora de avaliar os modelos tecnológicos americano, chinês e europeu. O pano de fundo foi a cisma de que Pequim poderia espionar o Brasil, como se as teles nacionais não tivessem capacidade técnica de se proteger. A tese já teria sido deixada de lado pelo Ministério das Comunicações, conforme especialistas ouvidos pela PODER. O Brasil está pelo menos dois anos atrasado na implementação. Países europeus, asiáticos e os Estados Unidos já deram passos consistentes na consolidação da

tecnologia. Há cerca de 300 milhões de chineses usando 5G em seus celulares neste momento. Por aqui, perdeu-se tempo devaneando sobre a possibilidade de espionagem por uma companhia chinesa, aventada pelo governo dos EUA, concorrente direta de empresas americanas e europeias na oferta da infraestrutura necessária para implantar a rede de quinta geração. “É muita teoria da conspiração achar que um país vai dominar o mundo”, afirma o coordenador do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da FGV-SP, Alberto Luiz Albertin. Em um mundo cada vez mais tecnológico, as teles dominam sistemas de firewall (segurança) para debelar ataques hackers. “Esse assunto [espionagem] já foi superado”, observa Márcio Kanamaru, sócio-líder de tecnologia, mídia e telecomunicações da KPMG. “Não existe qualquer restrição para o provedor de tecnologia X ou Y”, afirma.

ARQUITETURA TECNOLÓGICA

Outro debate superado foi da definição do modelo básico de arquitetura tecnológica a ser adotado pelo país. Ficou estabelecido o modelo standalone, que elimina qualquer possibilidade de as operadoras utilizarem partes do 4G para compor a estrutura da rede 5G. Isso significa que empresas fortes atualmente na oferta de internet terão de mudar completamente suas estruturas e que novos competidores possam surgir. “O 5G é uma tecnologia disruptiva. Não é uma tecnologia de continuidade, como foi do 3G para o 4G. Estamos falando da economia das máquinas, da indústria 4.0, de modelos de negócios totalmente conectados, de altíssima velocidade, de carros autônomos, de saúde com

‘‘Quase todos os segmentos da economia serão impactados” Márcio Kanamaru, Sócio-líder de tecnologia, mídia e telecomunicações da KPMG

holografia. Quase todos os segmentos serão impactados por essa economia”, resume Kanamaru. A quinta geração pode injetar US$ 1,2 trilhão em investimentos na economia brasileira até 2035, incluindo a instalação da rede e inovações em diversas áreas. O montante corresponde a algo em torno de 85% do produto interno bruto (PIB) do país no ano passado, quando a economia movimentou R$ 7,4 trilhões (cerca de US$ 1,4 trilhão). A estimativa consta em um estudo elaborado pela Nokia e a consultoria Omdia. Segundo o CEO da Nokia no Brasil, Ailton Santos, se levado em conta o aumento de produtividade com a economia digital, estamos falando de US$ 3,08 trilhões. PODER JOYCE PASCOWITCH 47


Alberto Luiz Albertin, coordenador do Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da FGV

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DAVIS E GOLIAS

As teles terão de competir com novos entrantes no mercado. É este o direcionamento esperado no edital do leilão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que está sob avaliação do Tribunal de Contas da União (TCU). “O importante é garantir que todos os pontos sejam ajustados entre as entidades (TCU, Anatel e Ministério das Comunicações) e que o leilão não tenha viés arrecadatório, mas foco em transformar o Brasil em um país ainda mais digital”, opina o vice-presidente B2B da Vivo, Alex Salgado (leia entrevista ao lado). Após aprovação do TCU, a Anatel irá colocar em licitação na primeira rodada de disputa quatro blocos nacionais de rede nas seguintes faixas de frequência: 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz. Cada faixa exigirá um compromisso de investimento. Calcula-se em cerca de R$ 44 milhões a arrecadação no certame pela agência reguladora. A disputa da Anatel promete acirrar a briga entre Claro, TIM e Vivo. A Oi desistiu ao vender sua operação móvel para as concorrentes. O mercado espera novos players disputando as frequências em leilão, incluindo pequenas operadoras de internet atu-

antes em áreas onde as grandes não estão. Operadoras que atendem no interior do país e em cidades menores próximas a centros urbanos são denominadas ISP (Internet Service Provider). Elas tendem a se beneficiar comprando fragmentos de frequência ou mesmo alugando partes da rede de companhias maiores. “Existem players interessados em comprar lote nacional [de rede 5G no leilão] para fragmentar para as ISP terem alguma fração para operar na sua região”, indica Kanamaru, que assessora empresas do setor. Segundo a Anatel, pequenas operadoras representam 41% dos acessos à banda larga no país e 65,8% em cidades com menos de 20 mil habitantes – existem pelo menos 32 milhões de brasileiros vivendo em cidades desse tamanho, de acordo com o IBGE. As ISP operam também em capitais e cidades médias pouco valorizadas pelas grandes operadoras. O movimento fez surgir empresas com capilaridade e porte expressivos e elas começam a chegar à bolsa de valores em busca de recursos para ampliar sua rede. Julho foi o mês das ISP na B3. Três empresas realizaram ofertas públicas iniciais de ações (IPO), movimentando R$ 2,96 bilhões. A cearense Brisanet gerou R$ 1,43 bilhão, a catarinense Unifique

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‘‘Não adianta o carro autônomo se não houver antenas com as quais ele possa ‘conversar’ para o funcionamento ser eficiente”


R$ 818 milhões e a Desktop, paulista de Sumaré, levantou R$ 715,2 milhões na bolsa.

ULTRAVELOCIDADE X FOSSO DIGITAL

Existe uma palavra que define a quinta geração: ultravelocidade. O 4G atual oferece a velocidade limite de 1 Gigabits por segundo (Gbps) para download, ao passo que no 5G serão 20 Gpbs. Ou seja, apenas alguns segundos para baixar um filme. Não

PAPO DE ESPECIALISTA com Alex Salgado, vice-presidente B2B da Vivo PODER: O que mudará com o 5G? A tecnologia 5G é fundamental para a digitalização do Brasil e com o potencial de mudar significativamente a forma como vivemos e como as empresas fazem negócios. De forma geral, espera-se que traga benefícios em três campos principais: internet móvel de alta qualidade, que possibilita experiências mais imersivas incentivando uma nova geração de aplicações e soluções cada vez mais envolventes – unindo o mundo virtual e o real; comunicações de missão crítica, que demandam uma conexão ultraestável, ultraconfiável e de baixa latência como, por exemplo, o controle remoto de infraestruturas em fábricas, carros autônomos e robôs industriais; e a Internet das Coisas (IoT), que possibilita a conexão massiva de sensores, com novas aplicações digitais para um grande número de indústrias. PODER: O que representa em possibilidades de negócios? No contexto industrial, as redes 5G terão papel preponderante devido a sua grande capacidade e confiabilidade para suportar e se adaptar a um universo de aplicações e requerimentos necessários à sua execução. Essas redes suportarão aplicações de missão crítica em ambientes extremamente agressivos onde a qualidade dos serviços, bem como sua disponibilidade, são essenciais para operações em linhas de montagem, chão de fábrica ou no campo, nas quais a produção não pode parar. Temos alguns casos com uso experimental das redes 5G em diversos setores. Anunciamos uma parceria com São Martinho e Ericsson, com foco na conectividade e desenvolvimento de novas aplicações para a agroindústria; conectamos a primeira agência bancária com redes 5G, em parceria com o Itaú; criamos um centro de soluções 5G, em parceria com a FEI, com foco na pesquisa e desenvolvimento de soluções e aplicações na indústria 4.0; além dos nossos projetos de redes privativas LTE on-shore e off-shore, com grandes empresas, como Vale e Petrobras, cuja infraestrutura estão preparadas para migração ao 5G.

haverá tempo nem de fazer a pipoca e pegar o refrigerante na cozinha antes de dar play. O mais importante: o aumento de velocidade tende a gerar uma redução no consumo de energia que pode chegar a 90%. A alta velocidade irá transformar o mundo como vemos hoje e será atingida com a redução do tempo de resposta entre as torres de telecomunicações, que deverão estar mais próximas para reduzir a latência (perda de sinal). Tal perda de velocidade no 4G varia, em média, de 35 a 52 milissegundos. Essa latência no 5G deve cair para 2 milissegundos. Porém, para oferecer uma quinta geração efetivamente real o país precisa superar problemas de infraestrutura evidenciados pela pandemia. Falhas como quedas de sinal, dificuldade de conexão e oferta de rede com velocidade mínima para assistir aulas on-line fazem parte da vida dos brasileiros. As falhas se devem, principalmente, pela baixa oferta de antenas distribuindo sinal de internet. De acordo com a Anatel, o Brasil soma 103.303 antenas em operação atualmente. A KPMG calcula que serão necessárias dez vezes mais. O país precisará, portanto, de mais 1,3 milhão de novas antenas para tornar o 5G palpável. Isso gera o desafio logístico em um país continental e, principalmente, estratégico se o Brasil quiser dinamizar a economia. “Não adianta o carro autônomo se não houver antenas com as quais ele possa ‘conversar’ para o funcionamento ser eficiente”, observa Albertin. n PODER JOYCE PASCOWITCH 49


DESENVOLVIMENTO DIGITAL Inauguração de Centro de Inovação para Ecossistema foca em soluções baseadas na tecnologia 5G dealizado para clientes e parceiros desenvolverem soluções baseadas na quinta geração de tecnologia móvel, a Huawei acaba de inaugurar em São Paulo o Ecosystem Innovation Technology Center (EITC), um centro de inovação para experimentação de soluções 5G. Há 23 anos no Brasil, a multinacional é líder global em tecnologia 5G e em segurança cibernética, e investiu R$ 35 milhões na criação do espaço com foco em diferentes setores da economia. “Queremos continuar a impulsionar a inovação no país. Estamos disponibilizando nossa infraestrutura de 5G, Cloud e Inteligência Artificial no Ecosystem Innovation Technology Center para todos que quiserem investir em novas soluções para a economia brasileira, a fim de acelerar a criação de um ecossistema de aplicações baseadas na tecnologia móvel 5G”, destaca Sun Baocheng, CEO da Huawei no Brasil. No EITC será possível transitar entre o espaço Huawei Legacy (Legado Huawei), que retrata a história de parceria da empresa com o país ao longo das últimas duas décadas; o ICT Foundation (Fundação TIC), que destaca os pilares da nova transformação digital, como tecnologia 5G, computação em nuvem e inteligência artificial; o Industry Vertical (Vertical Indústria), que vai apresentar aplicações reais para diversos setores, como agricultura, mineração, logística e

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mídia, que retratam o avanço da TIC (Tecnologia de Informação e Comunicação); e o Telco Top Gear, com portfólio de soluções de ponta a ponta de 5G, fibra óptica, micro-ondas e outros produtos. O Centro de Inovação estará aberto a todos os interessados em desenvolver, em conjunto, novas aplicações e provas de conceito em condições reais de uma rede 5G ponta a ponta. Nele, os parceiros da Huawei poderão se preparar para desafios futuros por meio de soluções de tecnologias avançadas com o uso integrado de 5G, Cloud Computing e Inteligência Artificial, que permitirão visualizar, em tempo real, o impacto da adoção de novas aplicações e serviços em seus negócios. Contribuir para a implementação de estratégias mais eficientes não só reduz os custos como melhora os resultados financeiros de todo o ecossistema. “Queremos nos tornar o condutor do desenvolvimento digital e o principal parceiro dos clientes na transformação digital, fundamental para o sucesso de futuros negócios. Com base em nosso foco principal de infraestrutura de TIC, queremos construir um ecossistema aberto, colaborativo e benéfico para todos os envolvidos”, completa. No mesmo espaço a empresa inaugura o T-Center (Trustworthy Center), centro de cibersegurança aberto onde clientes e parceiros, incluindo o poder público, poderão conhecer o processo de governança da companhia, as técnicas mais avançadas na cibersegurança dos produtos ao longo de todo o ciclo de vida, além de cenários relevantes de aplicação como rede 5G, sistemas de computação na nuvem, dispositivos inteligentes, carros conectados, entre outros.

Ecosystem Innovation Technology Center: Huawei investiu R$ 35 milhões no espaço para clientes e parceiros interessados em enriquecer ecossistema 5G

“Cibersegurança e proteção de dados são fundamentais no mundo digital, e prioridades máximas para a Huawei, que investiu mais de US$ 1 bilhão nesse segmento somente em 2020. Nosso T-Center traz as técnicas e processos mais avançados em ciberseguran-

ça e proteção de dados, colocando-os à disposição de clientes e parceiros, e facilitando a comunicação, troca de experiências, inovação conjunta e formação de ecossistemas locais”, finaliza Marcelo Motta, CSO da Huawei Brasil e América Latina. PODER JOYCE PASCOWITCH 51


ESPECIAL

BEM-VINDO A

SAN PEDRO VALLEY

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Já ouviu falar do Vale do Silício mineiro? Principal polo de tecnologia do Brasil, o bairro de São Pedro, na zona sul de Belo Horizonte, celebra dez anos de empreendedorismo digital com a sua primeira tropa de unicórnios

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FOTO GETTY IMAGES

POR PAOLA CARVALHO

Silicon Valley, na Califórnia (EUA), ganhou esse nome nos anos 1970 em razão da concentração de indústrias eletrônicas na região e em homenagem ao Silício (Si), elemento químico encontrado em abundância por lá e que serve de matéria-prima básica para a produção de circuitos e chips. Ainda hoje é o endereço das gigantes da alta tecnologia do Ocidente, as big techs. Em uma brincadeira com o termo, um grupo de empreendedores de Belo Horizonte, fundadores de startups, criaram o San Pedro Valley, quando se instalaram no bairro São Pedro e passaram a frequentar os mesmos bares dali, na vizinhança da badalada Savassi. Desse núcleo de novos amigos nasceram startups com capital aberto na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), caso da Méliuz, e unicórnios (aquelas com avaliação de mercado superior a US$ 1 bilhão), a exemplo da Hotmart. Completando dez anos em 2021, esse ecossistema tem fôlego para ir ainda mais longe. Consolidando-se como a principal comunidade de startups do país, o San Pedro Valley, ou apenas SPV, como é chamado por alguns integrantes, se movimenta de forma orgânica, não é uma instituição, não há presidente, mui-

to menos uma hierarquia, todos são porta-vozes. Em sua plataforma aberta (sanpedrovalley.org) estão registradas 514 startups, 67 agências de fomentos, nove aceleradoras, cinco incubadoras, dois hackerspaces e 28 coworkings. O objetivo de quem participa é se conectar com as pessoas, identificar sinergias, trocar conhecimentos, experiências, divulgar vagas e, por que não, fazer negócios. “A gente brincou de criar a marca na tampinha de uma cerveja, nem imaginávamos que San Pedro Valley, mais do que um símbolo, se tornaria uma espécie de espírito, mentalidade, ou melhor, uma cultura passada por gerações”, lembra Matt Montenegro, 35 anos, na época fundador da Beved e hoje sócio da Pingback, uma plataforma para criadores de conteúdos independentes que acaba de receber um aporte de R$ 2 milhões pelo fundo americano Saasholic Fund, Hotmart e pelo Investidor Anjo Amure Pinho. Nesse caminho, ele teve a VidMonsters, uma plataforma de videomarketing, que também foi comprada pela própria Hotmart, colega do SPV. Evolução de outras empresas, a Hotmart, de cursos on-line, nasceu junto com o San Pedro Valley em 2011, quando os fundadores apostaram as suas economias na divisão do aluguel de uma sala com outra startup, a Rock ConPODER JOYCE PASCOWITCH 53


tent. Naquele ano, receberam um primeiro aporte de R$ 300 mil do Buscapé. Agora, acabaram de lançar o Hotmart Challenge, um fundo de R$ 2 milhões para acelerar startups de empreendedorismo, educação e tecnologia, como aconteceu com eles uma década atrás. “É uma forma de retribuir o apoio que recebemos e, ao mesmo tempo, continuar fomentando o ecossistema”, afirma João Pedro Resende, o JP, 39 anos, CEO da Hotmart. A startup é hoje uma empresa global de tecnologia, líder em produtos digitais e avaliada em mais de US$ 1 bilhão. Tem escritórios em oito países, na América Latina, América do Norte e Europa. São cerca de 1,3 mil funcionários, mais de 420 mil produtos registrados e 29 milhões de usuários, entre produtores, afiliados e compradores. Na pandemia, a Hotmart viu o seu faturamento crescer mais de 160% e acaba de receber mais um aporte de US$ 130 milhões do fundo TCV com participação também da Alkeon Capital Management. Para Resende, San Pedro Valley é sinônimo de uma comunidade que hoje abraça a cidade de Belo Horizonte inteira. “Acredito que ainda veremos muitas outras startups bem-sucedidas se originando na

Unicórnio de Minas Gerais: Hotmart recebeu aporte de R$ 735 milhões

está a Méliuz, empresa que oferece o sistema cashback, de gifts cards e outros serviços financeiros para marcas e lojas se conectarem com seus clientes finais. Primeira startup ligada a fundos de venture capital a listar suas ações na bolsa brasileira no primeiro trimestre deste ano, comemorou a movimentação de R$ 844 milhões em seu marketplace, alta de 93% em relação ao trimestre anterior. São mais de 800 empresas parceiras e 7,1 milhões de clientes ativos. A receita líquida em 2020, ano de pandemia, foi de R$ 125,4 milhões.

tos demonstram a sinergia entre os integrantes do ecossistema de inovação da capital mineira, não só entre startups como também junto a grandes corporações. O hub de inovação Órbi Conecta, por exemplo, surgiu da união de empreendedores do SPV com Banco Inter, MRV e Localiza, em 2017.

‘‘Brincamos de criar a marca na tampinha de cerveja, nem imaginávamos que San Pedro Valley, mais do que um símbolo, se tornaria uma espécie de cultura passada por gerações” Matt Montenegro, fundador da Beved e hoje sócio da Pingback

região, na medida em que o conhecimento se espalha entre os empreendedores do local, bem como as gerações anteriores começam a reinvestir nas gerações mais novas de startups”, diz. Também completando dez anos

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Antes do IPO, a Méliuz, assim como a Hotmart, acabou adquirindo uma startup da primeira geração do SPV, a Melhor Plano, site que oferece ferramentas de comparação de preços e serviços de telecomunicações e financeiros. Esses movimen-

“O hub nasceu para conectar on-line e fisicamente pessoas e organizações que buscam relevância em tempos de intensas transformações. Atualmente, o Órbi atua em três frentes: formação de profissionais em habilida-


San Pedro Valley. O número integra o MinasTech, levantamento realizado pelo Distrito Dataminer, braço de inteligência de mercado da empresa de inovação aberta Distrito, com apoio da consultoria KPMG. Do total de startups mapeadas, 85% foram fundadas nos últimos dez anos, sendo

da chamada primeira geração do San Pedro Valley. Foram lembradas Méliuz, Sympla, Sambatech, Rock Content, Take, Hotmart, Siteware, Strider, Trybe e Sólides. Como parâmetros, foram levados em consideração o número de funcionários, faturamento presumido, investimentos captados e, ainda, métricas de redes sociais. “O ecossistema de inovação de BH

‘‘O ecossistema de inovação de BH está em um processo importante de maturação. Passamos a fase da euforia e entramos no momento da consolidação”

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Filipe Braga Ivo, embaixador do Singularity University Belo Horizonte Chapter

des digitais, transformação digital em corporações e programas de fomento ao ecossistema de startups brasileiro”, destaca Anna Martins, 30 anos, cofundadora e CEO do Órbi Conecta e mais um destaque no empreendedorismo digital mineiro. Na distribuição de startups pelo território nacional, Minas Gerais é o segundo estado que mais concentra essas jovens empresas de base tecnológica: são 782 delas em solo mineiro, sendo a maior parte em Belo Horizonte, mais especificamente no

394 (50%) delas desde 2016. Juntas, empregam cerca de 12,8 mil pessoas. Segundo o estudo, estão divididas em 34 setores. As healthtechs, como são chamadas aquelas voltadas para a área de saúde, são maioria (9,5% do total), e em seguida estão as fintechs (8,3%) e as adtechs (7,4%), que trazem soluções para os setores de finanças e marketing e comunicação, respectivamente. O MinasTech Report apontou ainda as dez startups que mais se destacam no estado, todas instaladas em Belo Horizonte, e, de novo, a maior parte Órbi Conecta, da CEO Anna Martins, trouxe novo conceito de apoio às startups

está em um processo importante de maturação. Passamos a fase da euforia e entramos no momento da consolidação e dos grandes casos de sucesso. Méliuz, Hotmart, Take, Buser, entre outras, alcançaram destaque no cenário brasileiro e internacional. Atraíram grandes investimentos e entraram em outra fase de maturidade, exposição e impacto”, avalia Filipe Braga Ivo, 37 anos, embaixador do Singularity University Belo Horizonte Chapter, uma espécie de unidade local de uma comunidade mundial criada pela universidade originada de uma parceria entre Google e Nasa, no Vale do Silício. E, claro, uma das forças do ecossistema de inovação da cidade. Para Ivo, a digitalização e a robotização de tudo, intensificadas pela pandemia, exigem mais do que nunca humanização. Comunidades como o San Pedro Valley extrapolam o universo digital e reforçam que negócios são feitos entre pessoas e são as pessoas que mudam um bairro, o mundo. n PODER JOYCE PASCOWITCH 55


A FROTA VERDE

ACELERA

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aquecimento global é uma realidade e, apesar da pandemia, o alerta não para de soar. Estudos feitos por pesquisadores do Centro de Meteorologia do Reino Unido preveem que 2021 será um dos seis anos mais quentes já registrados na história. Incêndios, secas e enchentes frequentes são alguns dos efeitos causados pelo aumento das temperaturas, exigindo urgência na implementação de medidas para frear esse processo. Em abril, lideranças de mais de 40 países se reuniram na Cúpula do Clima, organizada pelo governo dos Estados Unidos. Na pauta, a redução de emissão de gases na atmosfera. A queima de combustíveis fósseis foi citada como uma das principais causas do problema e esteve no foco do debate. Um dos assuntos mais comentados foi a eletrificação do setor de transportes. As grandes potências apostam alto em eletromobilidade e fabricantes de veículos vêm anunciando planos ambiciosos nessa área. No Brasil, o mercado de veículos elétricos começa a dar indícios de crescimento e bateu novo recorde de vendas no primeiro semestre deste ano. Os 13.899 eletrificados emplacados no período represen-

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tam 1,4% dos 1.006.685 veículos comercializados entre janeiro e junho, segundo a Federação Nacional da Distribuiçãode Veículos Automotores (Fenabrave). Segundo o presidente da ABVE (Associação Brasileira do Veículo Elétrico), Adalberto Maluf, um dos destaques do primeiro semestre é o expressivo crescimento das vendas de comerciais leves 100% elétricos. Essa tendência confirma o aquecimento do mercado de logística e indica uma opção das empresas do setor pelo transporte sustentável, com apoio de prefeituras municipais. “Tivemos um grande crescimento da eletrificação do transporte urbano de carga com a logística verde, de um lado, pelo trabalho das empresas que avançam suas agendas ESG e, de outro, pela liderança de prefeituras, como São Paulo e Rio de Janeiro”, diz Maluf, lembrando porém que, apesar do crescimento contínuo, o Brasil está longe dos principais mercados globais em matéria de eletrificação do transporte. Junho foi o melhor mês da série histórica da ABVE, com 3.507 emplacamentos, superando o resultado de maio (3.102).

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De olho no futuro e seguindo uma tendência global, empresas adotam veículos elétricos ou movidos a combustíveis de fontes renováveis com planos de zerar emissões de gases causadores de efeito estufa


Um bom exemplo entre as companhias que estão adotando frota verde é a JBS. Segunda maior empresa de alimentos do mundo e líder no setor de proteína, assumiu em março o compromisso de se tornar Net Zero até 2040, ou seja, zerar seu balanço líquido de emissões de gases causadores de efeito estufa e eliminar as residuais, e iniciou o transporte de carga da Seara com caminhão 100% elétrico. “Inovação e sustentabilidade são pilares fundamentais para a Seara e o projeto com caminhão elétrico reforça esse posicionamento, que também implementamos em nossa operação. Estamos sempre em busca de modais alternativos e limpos, e nosso objetivo é ampliar cada vez mais o alcance dessas soluções logísticas disruptivas, garantindo sempre qualidade e prazo das entregas para os nossos clientes”, ressalta Fabio Artifon, diretor de logística da Seara. O modelo, com tecnologia importada, é o primeiro a rodar na indústria de alimentos refrigerados do Brasil. Em termos comparativos, a cada Veículo Urbano de Carga (VUC) – utilizado atualmente e movido a diesel – retirado das ruas, 5 toneladas de monóxido de carbono deixam de ser emitidas mensalmente. Além disso, o caminhão elétrico apresenta, em média, um custo operacional até três vezes menor do que o VUC.

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SOLUÇÃO CORPORATIVA

Frota sustentável: acima, caminhão elétrico da Seara e, abaixo, o veículo movido a GNV da Friboi

A Ucorp, startup brasileira de tecnologia e soluções de mobilidade corporativa focada em veículos elétricos, realizou uma análise comparativa entre carros elétricos e à combustão, com o objetivo de demonstrar de maneira simples as mudanças e novas tendências. Foram levadas em conta a eficiência dos veículos quanto a gastos, valor de manutenção e emissão de CO2. Um veículo abastecido com gasolina, por exemplo, emite em média 150 gramas de gás carbônico por quilômetro rodado. Outros gases como o monóxido de carbono (CO), óxidos de nitrogênio (NOx), hidrocarbonetos (HC), dióxido de enxofre (SO2) e material particulado (MP) também são emitidos contribuindo para a poluição da atmosfera. A análise mostra ainda que o carro à combustão chega a produzir 3 toneladas de CO2 a cada 20 mil quilômetros rodados, enquanto em um carro elétrico esse valor é de cerca de 70 quilos. “Os EVs têm dez vezes menos peças e dez vezes menos custos com manutenção. Dentre os benefícios temos também a diminuição na produção de CO2 e maior eficiência quando colocado em movimento. Quando falamos de frotas eletrificadas temos melhora na gestão das empresas, diminuição de carros nas ruas e de multas, e economia na locação de carros, o que traz uma redução de gastos importante”, ressalta o CEO e fundador da Ucorp, Guilherme Cavalcante.

“O uso de veículos elétricos ou movidos a combustíveis de fontes renováveis faz parte do compromisso da JBS de ser Net Zero até 2040”, reforça Artifon. O objetivo é que a companhia tenha cada vez mais eletrificados em operação no Brasil. Na Seara, 30 caminhões do tipo já foram adquiridos e têm previsão de entrega até o fim do ano. Eles devem entrar em atividade até fevereiro de 2022. A expectativa é ter 40% da frota padronizada em até cinco anos. O grupo também adquiriu carretas sustentáveis movidas a gás natural veicular (GNV) – uma redução de 15% nas emissões de CO₂ em comparação ao diesel – que agora fazem parte de um projeto-piloto também na Friboi. PODER JOYCE PASCOWITCH 57


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ESPECIAL

UMA POR TODAS, TODAS POR ELAS Como poderosas do Vale do Silício estão investindo seus bilhões para mudar a realidade das mulheres que atuam nas big techs

FOTO GETTY IMAGESILUSTRAÇÃO DAVID NEFUSSI

POR ANDERSON ANTUNES

uando começou a estudar ciência da computação na prestigiada Universidade Duke, fundada em 1838 na Carolina do Norte e considerada uma das 20 melhores do mundo, Melinda Ann French provavelmente jamais sonhou que viria a se tornar a mulher mais poderosa do Vale do Silício um dia. E não apenas porque se casou com Bill Gates, passando a ser conhecida como Melinda Gates daí pra frente, mas, sobretuVista aérea da região do Vale do Silício, nos Estados Unidos do, porque sua forma de conduzir questões do chamado terceiro setor a tornaram uma das maiores experts do mundo diar a maior parte das empresas de tecnologia dos Estados Unidos. no uso da tecnologia de ponta para o bem. Assim como em várias outras indústrias, a Melinda, é claro, se tornou conhecida como a cofundadora da Bill & Melinda Gates Foundation, enti- de tecnologia trata as mulheres com certo desdade filantrópica que criou com seu agora ex-marido dém, por considerá-las incapazes de resolver e que é a maior do mundo entre as privadas. A funda- problemas matemáticos e coisas do tipo com a ção inovou em vários sentidos, sobretudo no quesito mesma facilidade que os homens. Mais do que erradicação de doenças em países pobres, e tem tido isso, das grandes empresas da área que fazem papel fundamental na luta contra o novo coronaví- sucesso hoje, nenhuma tem entre suas cofundadoras uma mulher. rus, para a qual já doou bilhões de dólares. Talvez a maior exceção nesse aspecto seja Meg Mas aquela que possivelmente se tornará a receptora da maior indenização por divórcio da his- Whitman, que não fundou a Hewlett-Packard (HP), tória – comenta-se que os Gates trocaram alian- mas foi responsável por tirar a companhia do buraças sem ter um acordo pré-nupcial devidamente co no começo dos anos 2010. Meg também é uma costurado, o que a torna uma forte candidata para das maiores acionistas do eBay e por último tentou, receber ao menos metade da fortuna de US$ 131 junto com Jeffrey Katzenberg, criar uma espécie de bilhões dele – é um caso raro no Vale do Silício, a Netflix para celulares, o aplicativo Quibi, que não região da Califórnia que ficou conhecida por se- mostrou a que veio e rendeu prejuízos de bilhões de PODER JOYCE PASCOWITCH 59


Em sentido horário: Chloe Sladden (blusa verde), que deixou o alto comando do Twitter para promover uma maior presença feminina nas big techs, e as donas do império MacKenzie Scott, Melinda Gates e Laurene Powell Jobs, investidoras pesadas em igualdade de gênero

Laurene Powell Jobs, viúva de Steve Jobs, usa US$ 21,5 bilhões para investir em negócios que beneficiem as mulheres no curto e no longo prazo, e prefere que essas iniciativas sejam tocadas por executivas blog para fundar o grupo #Angels, cujo objetivo é promover uma maior presença feminina nas empresas de tecnologia e também entre os investidores de venture capital. “Não teremos como evoluir se não agirmos em grupo”, disse Chloe, em entrevista ao canal de notícias econômicas CNBC. Um dos maiores empecilhos para as mulheres que atuam no Vale do Silício, ainda de acordo com Chloe, é que aquelas que conquistam grandes feitos acabam passando despercebidas da grande mídia. Mas as que erram na frente de todo mundo não apenas são massacradas em público como também são transformadas em “exemplos negativos”. Tome-se o caso de Elizabeth Holmes, que foi do céu ao inferno com sua startup de exames clínicos, a Theranos, que prometia amostras de sangue em tempo recorde e se provou uma fraude. “Um insucesso como o da Elizabeth representa anos de retrocesso para nós”, ponderou. Para a sorte delas, duas grandes mulheres têm usado os bilhões que herdaram de seus maridos gênios para tentar mudar essa situação. Viúva de Steve Jobs, Laurene Powell Jobs usa US$ 21,5 bilhões para investir em negócios que beneficiem elas no curto e no longo prazo, e prefere que essas iniciativas sejam tocadas por executivas. Já MacKenzie Scott, ex-mulher de Jeff Bezos, foca na educação, tendo doado desde seu divórcio do fundador da Amazon mais de US$ 10 bilhões para universidades americanas que têm programas de igualdade de gênero bem-sucedidos. De certa forma, é uma “vingança” mais elegante quando comparada àquela propagada por Ivana Trump, ex de Donald Trump, logo que se divorciou dele e gritou para quem quisesse ouvir que mulheres injustiçadas não deveriam ficar com raiva, mas sim com tudo. Melinda, Laurene e MacKenzie parecem pensar diferente: querem apenas provar que são tão capazes de grandiosidades quanto os homens que lhes fizeram sombra a vida inteira. n

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dólares. Ainda lhe restaram US$ 6,6 bilhões de patrimônio, que ela usa para investir em sua carreira na política, já que sonha ocupar o lugar de Joe Biden na Casa Branca (se promovendo como uma mulher de sucesso entre os “vilões” do Vale do Silício e de olho no crescente eleitorado feminino dos EUA). De acordo com dados atuais, as empresas do Vale do Silício estão investindo centenas de milhões de dólares para diminuir as diferenças de gênero em seus ambientes de trabalho. Inclusive porque elas performam melhor diante de tanta competição. “Precisei trabalhar em dobro para mostrar meu valor, mas consegui chegar aonde queria”, disse Bethanye Blount, cofundadora e CEO da startup de laboratórios Cathy Labs, em entrevista para a revista The Atlantic. De acordo com um estudo recente feito pela plataforma de pesquisas americana Carta, mulheres que trabalham no Vale do Silício ganham menos do que seus colegas homens, e também recebem menos “equity”, ou seja, participação nas empresas em que atuam, sempre que se destacam para tal. A Carta analisou os dados de 6 mil companhias que empregam 180 mil trabalhadores e são comandadas por 15 mil fundadores, e destes 91% eram homens. Das 9%, uma que se destacou foi Chloe Sladden, que já teve um alto posto de comando no Twitter e deixou o micro-


OPINIÃO

CONSELHO DE

MULHER POR MARLY PARRA

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

O

caminho para um futuro compartilhado será construído com diversidade e inclusão, uma vez que a complexidade, incerteza e a mudança tecnológica acontecem em ritmo alucinante. E para nos mantermos atualizados, precisamos de um extraordinário senso de percepção, sensibilidade e aceitação. Notamos que com o tempo a diversidade se torna essencial para a produtividade corporativa, performance e engajamento. E dessa forma vai superando o talento e a técnica. Times diversos têm melhor desempenho e resolvem melhor temas complexos, uma vez que a perspectiva individual enxerga os desafios de forma diferente. Na era da transformação, é preciso uma visão holística, a qual a mulher desempenha muito bem. O olhar para as pessoas, sejam colaboradores, fornecedores, clientes, investidores e a comunidade em torno, é o que fará a empresa construir sua reputação sólida a longo prazo, criando vínculos importantes com as novas gerações. Segundo dados do Estudo de Governança Corporativa do ACI Institute, pela primeira vez na história 54% das principais empresas da B3 possuem pelo menos uma mulher em seus conselhos de administração, porém apenas 11% dos cargos são de mulheres. As barreiras são históricas e culturais, com preconceitos sem fundamento, por isso o avanço é muito lento. A onda ESG fez com que grandes empresas analisassem a composição de seus conselhos de administração

estabelecendo objetivos de inclusão. Posso citar alguns exemplos, como a Vale, que contratou Rachel Maia, uma mulher negra para compor seu conselho com mais 12 homens. Percebem a disparidade? São 13 pessoas no conselho de uma das maiores empresas de mineração brasileiras, e apenas uma mulher. Já o Nubank decidiu “inovar” e contratou Anitta como conselheira, provocando um debate caloroso entre os profissionais de governança corporativa. É justo concorrer com influencers e artistas? Por outro lado, temos grandes exemplos no mercado que são inspiração para todos, como Leila Loria, presidente, Iêda Novais, vice-presidente, e as conselheiras Gabriela Baumgart e Claudia Elisa Soares, todas do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), que trabalham com afinco pela causa. Outra brilhante executiva é Ana Paula Pessoa, que agora preside o conselho do Credit Suisse European Bank, além das cadeiras nos conselhos da Suzano, Cosan, News Corp e da francesa Vinci. Como toda profissão, é preciso estudo, especialização e experiência para assumir o posto, e as instituições que trabalham há anos

para capacitação e certificação de profissionais, como o IBGC, do qual faço parte, a Escola de Negócios Saint Paul e a Fundação Dom Cabral, para citar algumas, contribuem para o desempenho sustentável das organizações por meio da geração e disseminação de conhecimento das melhores práticas de governança corporativa visando um mundo de negócios melhor, ético, transparente, com equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa com propósitos inspiradores. Enfim, para conquistarmos nossa cadeira é preciso estudo, dedicação e diversidade não apenas de gênero, mas também de conhecimento, ampliando a discussão para além do balanço financeiro e passando por inovação, brand experience, marketing, comunicação, engenharia de produtos, transformação digital, jurídico, recursos humanos e outras especializações do mercado. E, então, sua cadeira estará te esperando. n Marly Parra é conselheira de administração, membro da Comissão de Ética em Governança do IBGC e do Conselho da iHUB Investimentos XP

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Look total Ricardo Almeida, anéis e pulseiras Bvlgari


ENSAIO

MARESIA

Um dos maiores surfistas de ondas grandes da atualidade, Pedro Scooby trocou a pressão dos campeonatos pela liberdade do free surf, mas não deixou de vibrar ao ver nos Jogos Olímpicos a prova de que os melhores do mundo na modalidade são brasileiros. O atleta, que está no momento mais confortável da sua carreira, se lançou nos negócios para viver com essa mesma qualidade no futuro por nina rahe

A

fotos daniel kla jmic

styling cuca ellias

os 32 anos, Pedro Scooby não quer mais nada. Um dos maiores atletas de free surf da atualidade e sempre cotado entre os melhores da Liga Mundial (WSL) na premiação anual de ondas gigantes (XXL), ele diz ter chegado a um lugar tão confortável que só pode almejar “vida longa a essa vida”. Mas se antes da pandemia – e do casamento com a modelo Cíntia Dicker – era adepto ao estilo “deixa a vida me levar”, sem ter sequer endereço fixo, a chegada aos 30, segundo o próprio, “mudou uma chave” e o fez enxergar “para além do surfe”. Acostumado a recorrer ao apartamento de um amigo para ficar com os filhos Dom, Liz e Ben – que vivem em Portugal e são fruto de seu casamento com a atriz Luana Piovani –, Scooby sentiu a necessidade de um lar. “Eu viajava o mundo, estava em todos os lugares. Tinha tudo, mas não tinha nada”, diz o surfista, que comprou uma casa não apenas na praia de Cascais, em Portugal, mas terrenos em Minas Gerais e na Bahia. No meio desse processo, também se lançou nos negócios: investiu na marca de joias Sal, Água & Alma e se tornou sócio da startup de biotecnologia Visto.bio. “Minha carreira está em ascensão, mas tenho que cuidar para continuar com a mesma qualidade de vida”, explica. Sua cabeça, ele conta, não mudou nada. “Continuo achando que minha mochila é a minha casa”, resume. “Mudei faz um ano, mas se fiquei quatro meses em Portugal foi muito”, diz. Entre uma viagem e outra, foi da casa nova que acompanhou a estreia do surfe nos Jogos Olímpicos de Tóquio e vibrou com os atletas “arrebentando” e mostrando que “os melhores do mundo são brasileiros”. “Os dois [Ítalo Ferreira e Gabriel Medina] arrebentaram, o ouro do Ítalo foi merecido, mas era pra ser uma final brasileira, houve injustiça por parte dos juizes.” O que mais importa, segundo Scooby, é sempre o presente. E todos os pedidos que faz – de estrela cadente à aniversário – são sempre saúde e paz. A paz, vez ou outra, pode parecer interrompida. Seu relacionamento com Luana Piovani, com quem foi casado de 2013 a 2019,


está sempre na mídia: são desavenças que envolvem a criação dos filhos a namoradas como a cantora Anitta, que namorou o surfista em 2019. “Nunca fui atrás de pessoas famosas, mas a partir do momento que escolhi, sei que vão falar e tenho duas escolhas: me importar ou não”, resume Scooby, que diz expor sua vida pessoal para incentivar as pessoas a levar uma vida boa. “Quero ser lembrado como um cara que soube curtir a vida. Não me sinto uma celebridade, mas um bon-vivant da porra.” Quando olha para trás, inclusive, o atleta vê com bons olhos até as dificuldades. Criado em Curicica, zona oeste do Rio de Janeiro, ele conta ter encontrado no esporte sua salvação. De família pobre, foi por meio do surfe, aos 15 anos, que conseguiu ajudar no sustento de sua casa, após ver seu pai ser preso e “depois sumir”. A reconciliação dos dois, que não se falavam muito desde então, aconteceu apenas no ano passado. “É difícil chegar na frente de alguém e pedir desculpas, da parte dele, mas da minha também”, diz o atleta, que não entra em detalhes sobre a vida do pai. “Graças a Deus não foi tarde demais e hoje estamos bem.” Ainda que viva 100% o agora, Scooby não ignora de todo o futuro. Com Cíntia, ele planeja ter muitos filhos e tem como sonho viver uma vida mais tranquila na fazenda. “Já viajei tanto, acho que chegará o momento que vou querer ficar no meu cantinho”, revela o surfista, ainda que logo corrija: “É muito louco pensar no futuro. Na verdade, não sei nem o que quero fazer amanhã”. n

Camisa Quiksilver, calça Ermenegildo Zegna, colares acervo pessoal


“Quero ser lembrado como uma pessoa que soube curtir a vida. Não me sinto uma celebridade, mas um bon-vivant da porra”

Look total Ricardo Almeida, anéis e pulseiras Bvlgari


Look total Ricardo Almeida Beleza: Ale Fagundes (Capa MGT) Arte: David Nefussi Produção executiva: Ana Elisa Meyer Assistente de produção de moda: Marina Araújo Assistente de fotografia: Guilherme Arruda


CONSUMO POR ANA ELISA MEYER

SOFIA E FRANCIS COPPOLA

Dono de uma sensibilidade ímpar para contar grandes histórias, Francis Ford Coppola, 82 anos, é um dos maiores nomes do cinema mundial. Filho do compositor ítalo-americano Carmine Coppola, que colaborou em vários de seus filmes, o premiado cineasta dirigiu clássicos como a trilogia O Poderoso Chefão, Apocalypse Now, Vidas Sem Rumo, entre outros. Com o mesmo talento do pai, mas um olhar mais pop, Sofia, 50 – filha da documentarista Eleanor Coppola e a caçula de três irmãos – praticamente nasceu em um set de filmagens. Fez pontas em filmes durante a infância e adolescência, mas foi atrás das câmeras que encontrou seu lugar. Produtora, roteirista e diretora de longas como Encontros e Desencontros, As Virgens Suicidas e Maria Antonieta, segue a tradição da família acumulando reconhecimento e prêmios.

CASACO Ermenegildo Zegna preço sob consulta zegna.com

LUMINÁRIA Lumini R$ 8.190 lumini.com.br

ANEL Monte Carlo R$ 2.690 montecarlo. com.br

FOTOS REPRODUÇÃO; DIVULGAÇÃO

BOLSA Bottega Veneta R$ 11.230 bottegaveneta.com

BAR Breton preço sob encomenda breton.com.br

CAMISA YSL preço sob consulta ysl.com

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CANTO DE PODER POR CARL A JULIEN STAGNI

FOTOS PAULO FREITAS

BASICAMENTE SOFISTICADO

Ao entrar no apartamento de Luisa Strina, em um prédio antigo de Higienópolis, em São Paulo, nota-se que ali mora alguém com olhar diferenciado. Mais do que isso. Fomos recebidos por uma das galeristas mais conceituadas do Brasil. Expert em arte contemporânea, ela representa 40 artistas, entre nomes como Lygia Pape, Cildo Meireles, Robert Rauschenberg, Pedro Motta e Olafur Eliasson. Luisa respira arte – e sua casa também. Em um de seus cantos favoritos, a sala de estar em formato de ‘meia lua’ com janelão de ponta a ponta, que garante uma luminosidade especial, fica uma das

Acima, panorâmica da estante assinada por Claudia Moreira Salles, com livros e peças da coleção de Luisa Strina. Abaixo, outra parte do móvel, que acompanha a curvatura da janela, e à esquerda, revisteiro de Lina Bo Bardi com peça criada por Caetano de Almeida em parceria com a Bordallo Pinheiro

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Acima, cadeira de madeira de pau-brasil e, embaixo, a primeira parte da estante encomendada para acomodar os livros de Luisa

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Destaques do ‘canto’ de Luisa, com espreguiçadeira e luminária de Joaquim Tenreiro, e cadeira de Lina Bo Bardi. Abaixo, o pé de café que foi presente do pai da galerista e a conversadeira de Zanine Caldas

bibliotecas. Uma robusta estante de madeira abraça tudo em curvas que acompanham a planta do cômodo. “Moro aqui há quase 30 anos. Chamei a Claudia [Moreira Salles] para projetar uma estante, e ela fez uma primeira etapa do que se vê hoje. Mais tarde, pedi uma segunda parte do móvel,

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com lugar para obras, CDs, um bar. E, em um terceiro momento, foi feito o entorno da sala com a bancada embaixo da janela para acomodar mais livros. Aí fechou tudo”, explica. “O que mais gosto nas criações da Claudia é que são marcadas pela qualidade, limpeza das linhas e pela funcionalidade.” O resultado impressiona e o poderoso móvel envolve o ambiente, que guarda, entre outras preciosidades, peças assinadas por Lina Bo Bardi, além de uma cadeira do designer Joaquim Tenreiro e uma conversadeira de Zanine Caldas. “Gosto muito dessa peça”, diz Luisa, chamando a atenção para uma cadeira de madeira maciça criada a partir de um tronco de pau-brasil. “Não sei quem fez, mas é um trabalho incrível.” E um vaso gigante com um frondoso cafeeiro, presente do pai de Luisa, arremata o espaço que celebra a excelência do design brasileiro. n


CABECEIRA BARRAS, VILAS & AMORES Martinho da Vila

“Conta a infância do sambista em Barra Mansa, em uma fazenda na qual sua mãe era empregada. Depois, quando fica famoso, compra a tal fazenda. Também fala da Vila Isabel e de seus amores. Faz um relato tocante de passagens e mostra uma característica que nem todos conhecem: Martinho é um hábil escritor, com 13 obras publicadas e membro da Academia Carioca de Letras.”

FOTOS ROBERTO SETTON; DIVULGAÇÃO

ESTANTE

Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, JOSÉ VICENTE é um acadêmico. Fez dos livros seus aliados para deixar a infância pobre em Marília, no interior de São Paulo, onde, junto aos pais boias-frias, trabalhou nas plantações de café, algodão e cana. Não querendo que os filhos tivessem a mesma sorte, estudou até se formar em Direito. Advogou por um período e foi aprovado em concurso público para delegado. De volta às salas de aula, na tradicional Escola de Sociologia e Política de São Paulo, entrou em contato com militantes negros e, juntos, desenvolveram projetos de inclusão no espaço educacional. “Naquela época, entre 1996 e 1998, acompanhando o fim do apartheid e a situação dos negros americanos, em comparação com nossa democracia racial, que nos levou a ter apenas 2% de jovens negros nas universidades de São Paulo, percebemos que tinha algo muito errado. O que fazer? Os americanos resolveram esse problema com educação e conhecimento. Seguimos na mesma linha”, relembra. O sonho se tornou realidade em 2004, com a fundação da Unipalmares. A faculdade oferece acesso a todos, mas 50% das vagas são destinadas a afrodescendentes. “Foi o resultado de uma conscientização e do comprometimento de um grupo de jovens com um sonho na cabeça. Agora estamos ocupando espaço nos ambientes corporativos e até na política. Uma grande evolução.” Para estar afinado com o atual momento da discussão em torno de questões raciais, José Vicente indica livros que considera necessários para o melhor entendimento da história negra no Brasil. POR CARLA JULIEN STAGNI

QUARTO DE DESPEJO Carolina Maria de Jesus

CARTAS DA PRISÃO Nelson Mandela

“Um livro fabuloso que reúne as correspondências que Mandela trocou durante os 27 anos em que esteve preso na África do Sul. Em cada uma delas, um profundo aprendizado. Vale muito ler.”

CRUZ E SOUSA: O POETA DO DESTERRO Sylvio Back

“Personagem importantíssimo que, com sua poesia, conseguiu impactar muita gente, colocando o negro nesse ambiente da literatura e permitindo que parte de nossa história fosse registrada. Sua trajetória reverberou no Brasil e em diversas partes do mundo.”

“Carolina era uma favelada, que catava latinhas e papelão nas ruas. Uma mulher negra, que registrava sua rotina em um diário. Relatava o cotidiano e suas impressões sobre a vida. Tudo isso em uma data muito remota. E ela acabou se tornando a primeira grande escritora negra do Brasil. Este livro foi traduzido para mais de 20 idiomas.” RACISMO ESTRUTURAL Silvio Almeida

“Literatura necessária em um momento em que o país está debatendo o racismo em todas as suas dimensões e manifestações. Traz informações qualificadas para ajudar as pessoas a entenderem mais sobre o racismo estrutural, de que maneira ele se apresenta e se manifesta.” ESCRAVIDÃO 1 E 2 Laurentino Gomes

“É indispensável para qualquer pessoa que queira saber sobre si mesmo, porque lendo o livro entendemos o Brasil atual, a história do país, com seus erros e acertos. Quem ler esses dois livros com certeza vai estar mais conscientizado e capacitado para construir seus argumentos.”

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SOB MEDIDA POR DADO ABREU

AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO

Considerado um dos maiores advogados criminalistas do país, é um dos fundadores do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), conselheiro da Human Rights Watch, que realiza pesquisas sobre os direitos humanos, e do Innocence Project Brasil, a primeira organização especificamente voltada a enfrentar a grave questão das condenações de inocentes O QUE NÃO PODE FALTAR NO SEU CAFÉ DA MANHÃ: Café. MOMENTO DE MAU HUMOR: Manhãs são

sempre mais difíceis. UM MEDO: Avião.

COM O QUE SE PREOCUPA: Com a

democracia.

ONDE E QUANDO É MAIS FELIZ: Com meus

filhos, no mar.

PECADO GASTRONÔMICO: Nada que envolva

comida é pecado.

de Milton Nascimento, Lô Borges e Márcio Borges.

DEFENDER OS DIREITOS DOS OUTROS É:

Minha obrigação.

MELHOR DO BRASIL: O brasileiro. SER BEM-SUCEDIDO É: Ser feliz fazendo

o que gosta.

PRIMEIRA COISA QUE FAZ QUANDO CHEGA AO TRABALHO: Tomo um café. MELHOR HORA DO DIA: A madrugada. UMA CONTA PARA SEGUIR NO INSTAGRAM:

Pedro Monteiro @pedrocapedroca.

A ÚLTIMA COISA QUE EU COMPREI FOI: Um

alargador de sapatos.

UMA DESCOBERTA RECENTE: O canal Legal

Eagle no YouTube.

PESSOA QUE TE INSPIRA: Márcio Thomaz

Bastos [advogado criminalista e ex-ministro da Justiça, morto em 2014].

QUAL O SEU ESTADO MENTAL NESTE MOMENTO? Cansado. O QUE FALTA REALIZAR: Um monte de coisas. DESEJO PARA O FUTURO: Um governo

democrático, honesto e preocupado em diminuir a desigualdade social no nosso país.

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FOTOS PAULO FREITAS; GETTY IMAGES; LUCAS FAVRE/UNSPLASH; JACOB KHRIST/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

UMA MÚSICA: “Clube da Esquina nº 2”,


SEU LUGAR PREFERIDO NO MUNDO:

Nova York, Estados Unidos.

SONHO DE INFÂNCIA: Voar.

TRÊS DISCOS QUE VOCÊ LEVARIA PARA UMA ILHA DESERTA:

UMA FRASE: “A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade”, Rui Barbosa.

A Tábua de Esmeralda (1974), de Jorge Ben, Ten (1991), do Pearl Jam, e No Shouts No Calls (2007), do Electrelane.

UMA SÉRIE PARA MARATONAR OUTRA VEZ:

The Sopranos.

LIVRO DE CABECEIRA: O

Apanhador no Campo de Centeio, J. D. Salinger.

PEÇA DE ROUPA PREFERIDA: Um casaco

de couro.

QUE CANTOR (A) OU BANDA NÃO PODE FALTAR EM UMA PLAYLIST? Laurent Garnier.

MANIA: Pontualidade.

SE NÃO FOSSE ADVOGADO GOSTARIA DE SER... Um

UM HOBBY:

Correr.

O SENTIMENTO DE VENCER UMA CAUSA: De vitória da Justiça. UM FILME: Into the Wild

[escrito e dirigido por Sean Penn, com roteiro baseado no livro homônimo de Jon Krakauer].

pescador de caranguejo no Alasca (mas só por um dia).


PODER VIAJA POR ADRIANA NAZARIAN

VOSSA MAJESTADE

Aos fãs do Château de Versailles, eis um convite irresistível – a França está aberta aos brasileiros vacinados. O grupo Airelles transformou o Le Grand Contrôle, um dos edifícios do castelo construído para receber a elite cultural do país, em um hotel único. São 14 quartos e uma série de ambientes pensados de maneira minuciosa – do mobiliário do século 18 ao uniforme da equipe – para oferecer uma verdadeira viagem no tempo. A gastronomia, sob comando de Alain Ducasse, e o spa, com produtos by Valmont, estão à altura da realeza. E não faltam detalhes especiais: a estadia garante passeios por áreas inexploradas do palácio e a programação pode incluir experiências como jantar a dois no antigo apartamento das filhas de Luís 15 e degustação de macarons no canto preferido de Maria Antonieta. +AIRELLES.COM

Os viajantes comemoram: depois de muita espera, o museu Humboldt Forum acaba de abrir as portas em Berlim. O projeto cultural, considerado o mais ambicioso de toda a Europa, impressiona: pense em fachadas barrocas de um palácio restaurado ao lado de intervenções modernas do arquiteto Franco Stella. Lá dentro, a ideia é refletir sobre ciência, artes e cultura por meio de exposições, performances e filmes – são diversas telas e palcos. Entre as mostras de estreia estão uma retrospectiva sobre o marfim e outra interativa sobre tudo que envolve o ato de sentar. +HUMBOLDTFORUM.ORG

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EPICENTRO


CALENDÁRIO

Quem anda focado em viajar pelo Brasil tem mais um motivo para visitar a praia da Pipa. Isso porque a rua principal do vilarejo ganhou uma nova opção de hospedagem, o Île de Pipa. Novidade do grupo Accor, o hotel-butique é uma boa pedida para mergulhar no clima de sombra e água fresca: tem spa L’Occitane, academia, uma piscina deliciosa e sauna úmida. +ALL.ACCOR.COM

ERA UMA VEZ

Budapeste, século 19. Disposta a participar da alta roda da belle époque, a princesa Marie Clotilde encomendou a construção de um edifício às margens do rio Danúbio. Hoje, muitos e muitos anos depois, o local reconhecido pela Unesco como marco da cidade acaba de ser transformado no hotel Matild Palace. Detalhes do passado, como as cerâmicas da Zsolnay e os vitrais da artista Miksa Róth, foram restaurados, mas não faltam toques de modernidade ao projeto. Entre os destaques, tem restaurante comandado por Wolfgang Puck, cocktail bar no rooftop e, em breve, a chegada do Matild Café and Cabaret, que deve oferecer performances musicais intimistas, além de bolos e outras comidinhas. +MARRIOTT.COM.BR

VITRINE A We Do Not Work Alone é uma marca de design pari-

siense supercool, que cria objetos em edição limitada em parceria com artistas contemporâneos. Até o mês passado, suas criações eram encontradas nas lojas mais legais da França, mas a boa notícia é que seus fundadores acabam de inaugurar um espaço próprio no Marais. A novidade, que também fará as vezes de galeria de arte, estreia em grande estilo, com uma exposição dos hits criados ao longo dos últimos seis anos. +WEDONOTWORKALONE.FR

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HIGH-TECH POR FERNANDA BOTTONI

NO RETORNO AO OUTDOOR SURFE MODERNO

Se uma prancha de surfe com motor elétrico parece boa ideia, preste atenção nesta série 2 da Fliteboard que promete transformar rios, lagos e oceanos em playground. Com design refinado, ela turbinada permite que iniciantes flutuem sobre as águas – mesmo sem vento e sem ondas – com mais rapidez e facilidade, enquanto os esportistas mais experientes podem aproveitar uma gama de acessórios para alcançar seu potencial máximo. A prancha é feita de um material que combina alumínio aeronáutico e carbono para proporcionar leveza, força e rigidez. PREÇO: R$ 65 MIL FLITEBOARD.COM

Da evolução do skate elétrico à menor mobilidade do mundo, conheça os aparelhos que vão deixar sua volta ao ar livre mais inteligente, segura e radical

PREÇO: A PARTIR DE R$ 46.500 R-M.DE

CÁPSULA COM RODAS

No início dos anos 2000 a Segway revolucionou o mercado com o lançamento do primeiro Personal Transporter, aquele patinete elétrico com duas rodas em linha (lado a lado) utilizado por segurança em shopping centers. O produto se popularizou, tomou as ruas e agora a companhia chinesa desenvolveu um novo device. O S-Pod é uma cápsula de transporte, uma espécie de cadeira de rodas elétrica, operada por um painel de navegação intuitivo e fácil de dominar. A velocidade máxima é de 38 km/h e o objetivo é ser usado em espaços fechados como aeroportos, parques temáticos e campus de trabalho. PREÇO: NÃO INFORMADO SEGWAY.COM

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* PREÇOS PESQUISADOS EM JULHO, SUJEITOS A ALTERAÇÕES .

Ninguém precisa sofrer para pedalar a super e-bike da alemã Riese & Müller. Potente para longos passeios e segura e confortável para quem pilota, a Superdelite tem tecnologia de controle de suspensão total e o chassi é acoplado a uma bateria de 1.125 Wh que alimenta o motor CX Performance Line, da Bosch. A bicicleta vem com painel eletrônico Bosch Intuvia, perfeitamente integrado ao guidão e podendo ser adaptado para posição mais confortável ou esportiva. O fabricante oferece várias opções de customização, inclusive para o motor.

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SUPERBIKE


MINITRANSPORTE

A proposta deste simpático aparelho, considerado a menor mobilidade elétrica do mundo, é que você possa carregar seu veículo na bolsa. E não parece mesmo uma má ideia. Extremamente compacto e resistente, a principal estrutura é feita em material de carbono, dez vezes mais resistente e 1/4 mais leve que o ferro. Com isso, o Walkcar pesa apenas 2,9 quilos e pode ser transportado de um lado para outro como um laptop. A diferença é que, ao retirá-lo da bolsa, você não vai trabalhar, mas utilizar as quatro rodinhas para se transportar (ou divertir, por que não?) com velocidade de até 16 quilômetros por hora. PREÇO: R$ 10.300 COCOAMOTORS.COM

PEDAL SEGURO

Este capacete tem luzes brilhantes e dinâmicas para oferecer alta visibilidade nas ruas e tornar seus movimentos mais previsíveis para quem está perto de você – sejam pedestres, automóveis ou outros ciclistas. A versão urbana, chamada Lumos Street, é totalmente integrada com sinais de curvas e módulos de LED com cobertura 360 graus para garantir que você seja visto de todos os ângulos. Tanto seus faróis dianteiros quanto os painéis traseiros são blindados por policarbonato – o mesmo material durável e à prova de estilhaços usado para fazer janelas de aviões e cockpits de caças (nada mau, hein?). Para completar, o produto é compatível com Apple Watch. PREÇO: R$ 1 MIL LUMOSHELMET.CO

SKATE PÓS-ELÉTRICO

Desenvolvido em Santa Cruz, na Califórnia, o Onewheel+ XR é a evolução do skate elétrico com alta potência, capaz de alcançar velocidade superior a 30 km/h com autonomia para percorrer até 19 quilômetros. Como o nome já entrega, tem apenas uma roda e, segundo o fabricante, é adequado para qualquer terreno. Suas dimensões são de 241 mm x 292 mm x 750 mm e sua bateria pode ser recarregada em 100 minutos. PREÇO: R$ 10.500 ONEWHEEL.COM

ALTA TECNOLOGIA

Não é qualquer drone. Pesando apenas 600 gramas, o DJI Air 2S vem com um sensor de imagem de 1 polegada, grandes pixels de 2,4 μm e poderosas funções autônomas. Produz vídeos de 5,4 K / 30 FPS e 4K / 60 FPS, inclusive em ambientes escuros, e o perfil de cores de 10 bits grava até 1 bilhão de tons. E para garantir que ele permaneça com você por um bom tempo, os algoritmos do APAS 4.0 (Sistemas Avançados de Assistência de Pilotagem) tornam o aparelho capaz de evitar obstáculos de forma autônoma e em alta velocidade. Além disso, é equipado com o sistema de segurança AirSense, que recebe informações de localização de voo de sistemas de aviões e helicópteros próximos por meio de aplicativo. PREÇO: R$ 5.400 DJI.COM

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CULTURA INC. POR LUÍS COSTA

UMA SENHORA DE 70 ANOS Adiada em um ano pela pandemia, a Bienal de São Paulo chega à 34ª edição com programação estendida em mais de 20 instituições parceiras na cidade

A

os 70 anos, a Bienal de Arte de São Paulo quer ocupar a cidade. A 34ª edição da mais importante mostra de arte do país chega ao Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Ibirapuera, em 4 de setembro, com uma novidade. Será a primeira vez que o evento vem articulado com uma série de exposições em instituições culturais parceiras na capital. “A Bienal vai abraçar São Paulo”, diz o executivo e colecionador de arte José Olympio da Veiga Pereira, presidente da Fundação Bienal. Serão ao todo 21 eventos relacionadas à mostra principal em casas como o MAM (Museu de Arte Moderna) e MAC (Museu de Arte Contemporânea).

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Entre os artistas são 91 nomes de 39 países, representantes de todos os continentes (exceto a Antártida). A proporção entre mulheres e homens é equilibrada, e cerca de 4% dos artistas identificam-se como não binários. Esta será, ainda, a Bienal com a maior representatividade de artistas indígenas de todas as edições com dados disponíveis, com nove participantes de povos originários de diferentes partes do globo. Quando assumiu a FunO executivo e dação Bienal, em 2019, José colecionador de arte Olympio – neto do livreiro José Olympio da Veiga José Olympio, que deu nome Pereira, presidente da Fundação Bienal a uma das principais editoras


FOTOS JOSÉ A. FIGUEROA COURTESY OF THE BELKIS AYÓN ESTATE ; CORTESIA OLIVIA PLENDER; CLAUDE CAHUN COURTESY OF THE JERSEY HERITAGE; GIOVANNA QUERIDO FUNDAÇÃO BIENAL DE SÃO PAULO; LEO AVERSA/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

PODER É do país – pôs em ação a proposta de um evento estendido no espaço e tempo, uma Bienal que pudesse ser experimentada ao longo do ano e não apenas no Ibirapuera. Assim, ainda em fevereiro de 2020, as três primeiras exposições abriam a série de trabalhos que, em setembro do ano passado, deveriam culminar na mostra. A pandemia adiou os planos. “Esse tempo foi muito bem usado para debatermos mais os conceitos da Bienal”, diz José Olympio. A edição terá o que os curadores chamam de “enunciados”. “São objetos que não são necessariamente obras de arte, mas que trazem mensagens, significados.” Na mostra estarão o sino de Ouro Preto, que tocou no dia em que Tiradentes foi executado, e um meteorito que sobreviveu ao incêndio do Museu Nacional. Curador desta edição, o crítico italiano radicado no Brasil Jacopo Crivelli Visconti explica que os enunciados, em lugar dos tradicionais textos descritivos, permitem uma abertura de interpretação das obras e da própria exposição. “São elementos de outros âmbitos, não da arte especificamente, que vêm de outros contextos e que carregam histórias muito potentes para ajudar a pensar a exposição, para ler as obras que são depois colocadas fisicamente perto desses enunciados”, diz. “Nós não queríamos impor uma leitura das obras, mas sugerir leituras possíveis.” Desde 1951 até hoje, as 33 bienais já receberam 11.500 artistas ou coletivos de 140 países, mais de 70 mil obras e 8,5 milhões de visitantes. Os 70 anos vêm no turbilhão da maior crise sanitária global do último século. Para José Olympio, o título da mostra – Faz Escuro, mas Eu Canto –, verso do poeta Thiago de Mello, escolhido ainda antes da pandemia, é um sinal de alento que a arte pode traduzir. “É um momento difícil em todas as dimensões. É um título que reconhece a dificuldade, mas também a esperança. Eu canto por quê? Porque a manhã vai chegar, isso há de passar. É o que eu acho de mais bonito no que a gente está fazendo. É dar uma mensagem de que nem tudo está perdido”, conclui. n

DEBATE AMBIENTAL Com Cauã Reymond e Fernanda Montenegro, Piedade, rodado em 2019 por Cláudio Assis, chega aos cinemas. O filme, que ganhou o prêmio especial do júri do Festival de Brasília, narra o embate de uma comunidade tradicional em meio à chegada de uma petrolífera. CONFLITOS HUMANOS A vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura Ana Paula Maia lança o segundo volume da trilogia que teve início com Enterre Seus Mortos (Cia. das Letras , 2019). Em De Cada Quinhentos Uma Alma (Cia. das Letras, R$ 44,90), Edgar Wilson, personagem onipresente na obra da escritora, traz para o centro da narrativa conflitos humanos e explora as nuances do que significa fazer o bem. FAUNA E FLORA A Pinacoteca de São Paulo abriu a mostra John Graz: Idílio Tropical e Moderno. A exposição, com aproximadamente 155 itens, revisita a trajetória de um dos mais importantes nomes do modernismo no Brasil, com foco em sua atuação como artista visual e a dedicação de seus trabalhos às temáticas indígena, fauna, flora, história e cultura popular brasileiras. SINFONIA DA SAUDADE Em voz e violão, Alceu Valença apresenta Saudade, o segundo dos quatro lançamentos no formato que o artista apresenta ao longo de 2021. A faixatítulo foi composta durante o período de quarentena e Alceu expressa com suavidade e lirismo todo o espanto diante do medo, das despedidas, das desigualdades. “Saudade da estrada, saudade da rua”, canta. Disponível nas plataformas digitais. PODER JOYCE PASCOWITCH 79


O melhor desempenho do Brasil na história dos Jogos Olímpicos não traduz nem sintetiza o que foram, para os brasileiros, as duas semanas de competições em Tóquio. Mais do que as sete medalhas de ouro e as outras tantas de prata e bronze, o que se viu ali foi uma exibição do talvez anacrônico e populista slogan “sou brasileiro, não desisto nunca”. REBECA ANDRADE, primeira medalhista da ginástica brasileira, recebeu um ouro e uma prata mesmo tendo crescido em condições precárias, sem pai, filha de uma empregada doméstica que, por vezes sem trabalho, não conseguia pagar o ônibus para a filha chegar ao treino; o bronze de Bruno Fratus, na natação, certamente não expressa de imediato sua obsessão pelo pódio, fruto de um histórico de frustrações e de um processo depressivo; e mesmo as derrotas, como a da forte seleção masculina de vôlei, não entrega de cara a ascensão de um Douglas Souza, jogador abertamente gay num espaço tradicionalmente homofóbico, que se tornou, por sua espontaneidade, coragem e poder de comunicação, uma das grandes figuras dos Jogos. É curioso pensar que, por mais luminosa que tenha sido a performance brasileira, são os subtextos, as histórias subterrâneas, às vezes até as derrotas, que saltam aos olhos nessa já saudosa imersão brasileira em Tóquio.

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FOTO GETTY IMAGES

OLIMPISMO


O MELHOR DAS LIVES

FOTOS MAURÍCIO NAHAS; DIVULGAÇÃO INSTITUTO IGARAPÉ; BOB WOLFENSON; ROBERTO SETTON; GETTY IMAGES; REPRODUÇÃO; DIVULGAÇÃO

Acompanhe as entrevistas de Joyce Pascowitch com os personagens mais relevantes do país no Instagram @revistapoder

Ilona Szabó, cientista política

Luiza Helena Trajano, empresária

Ester Sabino, médica e pesquisadora

Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente

João Doria, governador de SP

Michel Temer, ex-presidente

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