PEIXE GRANDE: HISTÓRIAS DE PESCADOR

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PEIXE GRANDE HISTÓRIAS DE PESCADOR

EDITORA OLYMPIA

F825 Franco, Carlos (organizador)

Peixe Grande: histórias de pescador, Editora Olympia, Uberlândia, MG, 2023

ISBN 978-65-86241-10-5

Pág. 138

Também o peixe é meu amigo. Nunca vi nem ouvi falar de um peixeassim.Mastenhodeomatar. Agrada-mepensarquenãotemos dematarasestrelas.”

Ernest Hemingway em O Velho e o Mar

Sumário

Apresentação/Carlos Franco/Pág.7

O dia do pescador/Humberto de Campos (in memoriam) /Pág. 12

O anzol invisível/Brígida de Almeida Guimarães/Pág. 16

Em um mundo de pescadores, nós somos os peixes pescados!/Cláudio Moreira da Silva/Pág. 22

Aprendendo a pescar com o meu herói do rio/Daniela Demena Trindade/Pág. 28

A profecia da Deusa do Mar/Daniela Demena Trindade/Pág. 34

Entre redes e panelas: as aventuras de Aldo e Gena/Denise Camargo Lancia/Pág. 39

O eco do Rio Doce: a saga de João e a luta pela vida/Jean Javarini/Pág. 41

Os tesouros da Lagoa Juparanã: a jornada de uma família capixaba/Jean Javarini/Pág. 52

Minhas histórias com pescadores e pescarias/Jeanne Salgado Pipa/Pág. 62

Pescador de ilusões/José Leandro de Souza

Lima/Pág. 69

Pescando memórias/José Leandro de Souza

Lima/Pág.71

O mistério do Homem-Peixe do Rio Pomba/Júlio

César Oliveira Souza/Pág. 74

O rio das conexões: causo e lições da professora pescadora/Katia Aparecida Chagas/Pág. 79

Maré Alta: causos, aventuras e laços de amizade/Katia Aparecida Chagas/Pág. 90

O peixe Chupa-Cabras/Marcelo Pires/Pág. 97

A extraordinária pescaria de Augusto Ribas/Olivaldo Júnior/Pág. 104

O mensageiro alado do apocalipse/Paulo Ismar Mota Florindo/Pág. 116

Nas águas da aventura, a saga de um jovem pescador na Amazônia/Rui Ferrer Trindade/Pág. 123

O ancião pescador, Capitão Velho Jaquim/Rui Ferrer Trindade/Pág. 128

Primeiro causo/William R. F. Ramires/Pág. 133

Apresentação

A pesca desde tempos imemoriais está presente na trajetória da humanidade e tem importante papel na literatura mundial servindo como metáfora poderosa e tema central de diversas obras. Desde as epopeias antigas até romances e contos, a pesca é frequentemente usada para explorar a relação do ser humano com a natureza, a luta pela sobrevivência e as reflexões filosóficas sobre a vida.

Na magistral obra poética de Homero, a "Odisseia", a pesca é parte integral da vida dos personagens, refletindo a dependência da pesca pelos gregos antigos. São inúmeras as referências à atividade na jornada heroica de Ulisses retratada nesta obra do século VIII a.C. Muito antes de Homero, no entanto, a pesca já estava presente no período paleolítico, quando os primeiros humanos começaram a pescar com ferramentas simples, como lanças e anzóis rudimentares. Já no período neolítico, o desenvolvimento da agricultura e da domesticação de animais levou a uma maior dependência da pesca como fonte de alimento e técnicas mais sofisticadas, como redes e armadilhas, foram desenvolvidas.

Já as civilizações antigas como egípcios, gregos, romanos, chineses e outras desenvolveram técnicas de pesca mais avançadas, incluindo o uso de barcos e redes. Os povos originários da América do Sul e Central também desenvolveram suas técnicas que

muito contribuíram para a evolução da pesca em harmonia com a natureza ao redor.

Por esse motivo a pesca também é tema recorrente na Bíblia, sobretudo no mundo cristão que se inaugura com o chamado Novo Testamento, quando vários dos discípulos de Jesus Cristo, como Pedro, pedra fundamental das bases do cristianismo no mundo, são recrutados entre pescadores. O evangelho vai ainda mais longe e a pesca se torna uma metáfora para a missão apostólica de "pescar" almas. A multiplicação dos peixes e a pesca milagrosa são episódios que sublinham a importância espiritual e material da atividade. Por isso mesmo, o cristianismo passou a ser representado na antiguidade por um peixe.

A atividade exercia e ainda exerce hoje enorme importância econômica como fonte de alimentos essenciais para a sobrevivência humana. Hoje, sabese, por exemplo que o ômega 3, presente nos peixes, é vital para o reforço do sistema imunológico, diminuição da pressão arterial e prevenção e combate às doenças cardiovasculares.

A pesca presente no cotidiano dos povos originários das Américas resultou ainda no convívio com as correntes migratórias como europeus e africanos em atividades cantadas em prosa e versos. É o cotidiano de pescadores o pano de fundo de muitos dos livros clássicos do baiano Jorge Amado e das belas canções do também baiano Dorival Caymmi.

Livros como "O Velho e o Mar" do norte-americano

Ernest Hemingway são exemplos de como a pesca está intimamente ligada à vida do homem. Nesta

novela curta, mas poderosa, Hemingway conta a história de Santiago, um velho pescador cubano que trava uma batalha épica com um enorme marlim. A obra é uma meditação sobre a perseverança, a dignidade na luta e a conexão profunda entre o homem e a natureza. Hemingway utiliza a pesca como uma metáfora para a luta humana e a resistência diante das adversidades.

Outro norte-americano, Herman Melville, é autor do famoso “Moby Dick", romance épico que narra a busca obsessiva do Capitão Ahab pela grande baleia branca. A pesca de baleias é um pano de fundo para explorar temas como vingança, destino e a luta do homem contra forças incontroláveis da natureza.

Muitas são as obras literárias que usam a pesca como uma metáfora para a busca do conhecimento, a introspecção e a meditação. Em "Walden", de Henry David Thoreau, a pesca no lago Walden representa a busca pela simplicidade e autossuficiência. Thoreau descreve a pesca não apenas como uma atividade prática, mas também como uma forma de contemplação e conexão espiritual com a natureza.

Em “Peixe grande”, obra cinematográfica de Tim Burton, de 2003, baseada no livro “Big Fish: A Novel of Mythic Proportions” (Peixe grande: uma novela de proporções míticas, em tradução literal) de Daniel Wallace, a pesca surge de forma fantástica numa narrativa que tem tudo a ver com a luta do homem pela sobrevivência, onde o terreno dos sonhos e da imaginação é a isca, o gatilho para uma vida plena que um pai deseja a um filho.

É através das lentes da pesca que diversas manifestações culturais nos oferecem uma visão mais profunda da vida, explorando temas universais de maneira tangível e acessível. Seja nas águas calmas de um lago ou nas tempestades furiosas do oceano, a pesca continua a inspirar.

A pesca é, portanto, uma atividade ancestral que desempenhou e continua a desempenhar um papel crucial na sobrevivência, desenvolvimento econômico e cultural da humanidade. O anzol como escreveu o escritor maranhense Humberto de Campos (1886-1934) foi essencial para garantir que essa importante fonte de alimento e renda se tornasse real pelas mãos dos pescadores que celebram o seu dia em 29 de junho, o dia do pescador Pedro que encerra os festejos juninos.

Por fim, nos cabe ressaltar, em nome da Editora Olympia, a importância de pescarmos textos brilhantes como os aqui reunidos nesta antologia, que reforçam o papel que a pesca exerce em nossas vidas alimentando as mesas, a história e a cultura em suas mais diferentes manifestações.

“Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não palavra – a entrelinha – morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma vez que se pescou a entrelinha, poder-se-ia com alívio jogar a palavra fora. Mas aí cessa a analogia: a não palavra, ao morder a isca, incorporou-a. O que salva então é ler distraidamente”, nos convida Clarice Lispector no livro “Água Viva” publicado em 1973.

O convite da escritora é tão atual que dele fazemos uso aos que encontram prazer na pescaria das palavras e aos que as apreciam enquanto iguaria.

Odiadopescador

Humberto de Campos (in memoriam)

Os sociólogos consideram uma das horas de maior significação na história do progresso humano aquele em que o Homem inventou a roda. Com ela, resolveu o problema da remoção dos pesos e o das viagens. Com ela, podia ele transportar os madeiros, e vencer as distâncias sem ferir os pés nos caminhos. Ela inaugurava, pare ele, a era de escravização da rena, do boi e do cavalo. A roda abria, em suma, os novos horizontes do mundo. Ainda não houve, todavia, quem assinalasse o papel representado pelo anzol na evolução da Humanidade. E este é, no entanto, quase tão considerável como o da roda.

O primeiro anzol foi, provavelmente, fabricado de osso. O bárbaro trabalhou-o com a pedra, como se fizesse uma ponta de flecha. E lançou-o ao rio, com uma fruta ou um pedaço de carne de alce. E que alegria teria sido a sua, quando puxou a corda fina e grosseira, tecida com os seus próprios cabelos, e viu, debatendo-se na extremidade, o peixe aprisionado! Nessa noite acendeu-se uma fogueira. Guardados da Memória nova em frente à gruta do troglodita. E o nosso antepassado dançou e urrou, feliz, festejando a conquista de mais um engenho que o viria libertar da fome e da morte.

A comemoração, amanhã, do Dia do Pescador, vem pôr em relevo a importância do anzol como fator de

Civilização. Quando o homem conseguiu fundir o metal, dobrou-o, e o anzol foi aperfeiçoado. O aparecimento da barbela representa um progresso considerável na arte da pesca. O homem primitivo que introduziu essa modificação no benemérito instrumento de pesca não ligou o seu nome a essa descoberta. Ela foi, entretanto, mais útil ao seu tempo do que, ao nosso, orádio ou a aviação. Graças à barbela o peixe não saiu mais do anzol, depois apanhado. E isso facilitou ao bárbaro o problema da alimentação, que era, aliás, o problema capital da espécie humana.

Olhando, hoje, um anzol, tão singelo na sua curvatura, enfeitado apenas pela sua barbela, ninguém imagina o que representa aquilo de esforço mental, de espírito inventivo. Ele vai ser, porém, amanhã, abençoado festivamente, pelo CardealArcebispo, diante do mar e dos homens. E, nesse ato, o homem reconhece quanto lhe deve. E não somente como arma de guerra contra a fome, mas como instrumento do seu próprio aperfeiçoamento moral. O anzol tem, na verdade, atuação importante na formação do caráter humano. Seria difícil, hoje, verificar se foi a paciência que inventou o anzol, ou se foi o anzol que inventou a paciência. Quando o homem aprendeu a pescar, aprendeu a esperar. O troglodita sabia os caminhos da selva por onde passaria o urso. Mas não conhecia os caminhos da água por onde passaria os peixes. Quem pesca é como quem vai para o campo vazio colher o que não semeou. Por isso mesmo o pescador é, de todos os trabalhadores, o de destino mais vago. Quem lança o seu anzol à água não sabe nunca o peixe que vem. Não sabe, mesmo, se virá peixe algum. E foi, talvez,

pelo que há de sonho na profissão, que Jesus, escolhendo entre os apóstolos o que devia ser o seu representante na terra, escolheu aquele que era pescador. O cristianismo nascente fez do peixe o seu símbolo. Quando, em Roma ou em Antioquia, um homem calado queria dar-se a conhecer a outro, desenhava lentamente na areia, com a ponta do seu cajado, um peixe.Se o outro desenhava,em resposta, a mesma figura, é que se tratava de dois cristãos. Aproximavam-se, então e entendiam-se. Não obstante isso, o cristianismo decretou a perseguição irremissível ao peixe. Cada quaresma representa, no fundo dos mares ou dos rios, um édito de Nero ou de Deocleciano. Jesus dizia ter vindo ao mundo para pescar as almas, e os homens, que ele veio pescar, o mataram. O peixe faz o mesmo. Quando apanha um pescador, faz com ele, mais ou menos, o que faz o pescador quando apanha um peixe. Nas selvas, há o dia da caça e o dia do caçador. Nas águas o peixe quase não tem dia nenhum. Até o de hoje, que podia ser o dele, é do pescador, isto é, daquele que o persegue e o destrói. Um anel será abençoado pelo representante de Cristo e lançado às águas. Diante desse anel de ouro, o peixe terá um movimento de alta sabedoria filosófica. Ao descobrir uma pérola no terreiro, o galo de La Fontaine declara que preferiria um grão de milho. Ao encontrar o anel de ouro, o peixe reflete que melhor seria se lhe tivessem atirado uma minhoca. E, nessa reflexão, ele não faz, no fundo das águas, senão repetir o pensamento dos proletários aqui de cima, aos quais os que governam atiram de vez em quando uma porção de direitos, quando eles preferiam que eles lhes atirassem um pedaço de pão. Amanhã, cedo, as igrejas bimbalharão os sinos miúdos, em todos os outeiros

católicos da cidade. Barcos de velas novas cruzarão a Baía. São Pedro, padroeiro dos que pescam, terá a sua procissão no mar. Sacerdotes, vestindo a sua paramenta de festa, rezarão alto diante das ondas. Será o Dia do Pescador. Tu, porém, irmão peixe, tremerás no fundo das tuas águas natais. Vai começar a devastação. No tempo de Santo Antônio, ainda vinhas à tona, escutar-lhe a pregação. Agora, quando te chegas a voz de um orador sacro, mais fundamente mergulhas. E fazes bem. Deus, antigo amigo dos peixes e de quem os peixes eram amigos, está, hoje, do lado dos que têm o anzol.

OAnzolInvisível

Brígida de Almeida Guimarães

Depois do nascimento do meu primeiro filho, desde quando ele ainda tinha apenas meses, constantemente me pegava pensando nos meus pais. Como é caro ter um filho! E não digo financeiramente, isso conta, com certeza, o trabalho passou a ter um ar mais sério, as decisões passaram a ser tomadas mais devagar, mas penso nas noites sem dormir, quão caras! Sair de casa pela manhã e deixar tudo ali para reencontrá-las só depois de um dia inteiro. Em qualquer pequena oportunidade eu queria estar em casa, contemplando a simplicidade e a preciosidade da família reunida. E lembrava dos meus pais, seus pequenos gestos de amor eu via agora como eram grandes.

Meu pai era motorista particular e tinha uma agenda movimentada, fazia viagens todos os dias. Minha mãe uma vez por semana fazia pães para vender e diariamente cuidava de uma senhora já bem idosa, nossa vizinha. As tardes, sozinho em casa, demoravam para passar, entre televisão, tarefas, sonecas e brincadeiras os anos tinham muitos,muitosdias.Bons,comoparatoda criança, eram os finais de semana e feriados, onde saía a rotina e entravam as reuniões com os parentes e os passeios. Muitas dessas lembranças eram de dias

em que logo de manhã, no domingo, meu pai avisava que iríamos pescar.

Havia um ritual: preparar o lanche de pão com mortadela, uma garrafa de café com leite bem adoçado e ir ao supermercado comprar pedaços de frango e salsichas, iscas destinadas aos peixes grandes. Depois vinha o momento de separar os equipamentos: iscas de minhoca, de massa, varas de bambu, de molinete, linhas, anzóis, boias, alicate, passaguá. Sempre me equipava com um tênis velho, roupas que pudesse sujar e boné. Já meupainemvestiacamisaeusavachinelosapenas para dirigir, chegando no pesqueiro logo ficava descalço

Com tanta preparação parecia que o dia ia ser de rede cheia, mas frequentemente voltávamos com peixes comprados do criadouro, que minha mãe preparava empanados e comíamos com arroz, feijão e farinha de milho, para não engasgar. Por algum motivo nunca associei minha falta de habilidade com a pesca ao meu pai, até hoje. Na minha imaginação ele era um aventureiro, meu herói das histórias que contava da infância. Meus avós tiveram oito filhos, era difícil sustentar bem a todos e por isso meu pai saia pelas fazendas ao redor para se alimentar na casa de conhecidos, assistir televisão e pescar no rio. Ouvi muitas vezes a mesma história quando ele precisava assinar um documento e a caligrafia saía quase ilegível: “Fiz só até a quarta série e ainda me formei porque a professora gostava de mim, ao invés de ir pra aula, eu ia pescar e levava os peixes pra ela”.

Como toda criança, minha fé no meu pai era inabalável. Quando era dia de celebrar o folclore na escola e as crianças ficavam se perguntando se o saci ou o lobisomem eram verdade, eu defendia firmemente que sim, era tudo verdade, pois meu pai via até curupira quando ia pescar no meio do mato. Era certeza absoluta.

Além das histórias, ele contava também dos seus sonhos. Dizia que, se não tivesse sido pelo casamento com minha mãe, estaria na floresta amazônica, tinha nascido para viver assim. Dizia também que, um dia desses, ia pescar no Pantanal, de barco. Essas ideias me fizeram crescer com a esperança de um dia poder realizar os desejos do meu pai, pois naquele momento ele estava se sacrificando para a família, os desejos eram contados com humor, como brincadeira, porque estavam distantes das suas possibilidades.

Íamos em muitos pesqueiros, a facilidade do meu pai em fazer amizades era surpreendente, ele sempre conhecia um lugar novo onde “pegava bem”. Um desses pesqueiros era do Seu Mazzeto. Um italiano bem claro, de olhos também claros, que cheirava a leite. Lá havia dois lagos: o primeiro só tinha tilápias. Era onde eu podia pescar. Ficava ao lado do curral. No tanque maior haviam peixes maiores, esses o meu pai é que perseguia. Em uma das vezes que fomos, meu pai entrou em uma disputa com um peixe. Gritou para eu correr levar o passaguá, a linha estava quase estourando. Enfiou a mão na água e no susto bateu o dedo mindinho. Odedoficou inclinado, inchado, seria necessário colocar no lugar e entalar, mas

meu pai não quis ir ao médico. Esse era outro traço curioso no meu herói: seu tendão de Aquiles. Podia pegar aranhas e cobras sem qualquer hesitação, brigava de socos com homens mal encarados,atéarmados, masduascoisas eramseus medos oficiais e públicos: o escuro e o hospital. Como não procurou consertar o dedo, ficou o resto da vida com ele torto, que acabou grudando assim depois de desinchar. Era mais um dos seus charmes o mindinho inclinado para frente. O pior mesmo foi que o peixe escapou.

Depois da morte do Seu Mazzeto passamos a ir no pesqueiro do Edu. Ele tinha dois filhos pequenos que ajudavam no pesqueiro, serviam os clientes, cuidavamdascriaçõese atélimpavamospeixesna hora da pesagem, eu tinha inveja daquelas crianças. Podiam fazer todos os dias o que eu fazia só de vez em quando. Um pouco mais velho comecei a entender melhor a pescaria. Algumas pessoas sentavam por alguns minutos e já tiravam os peixes, enquanto eu passava a tarde com as manhosas, como eles chamavam, as tilápias que comiam a isca devagarinho e não pegavam no anzol. Parecia uma questão muito simples: eles tinham massas melhores. Passei a pedir para meu pai comprar massas de misturas específicas quando íamos pescar, até comprei eu mesmo quando já era adolescente, e isso resolveu parcialmente o problema. Alguns peixes até vinham, mas não eram muitos como os das outras pessoas do pesqueiro. No fim, passei a acreditar que eu tinha um certo azar com a pescaria, então ao menos ia me divertir.

Conforme fui crescendo o número de pescarias foi diminuindo, era preciso pedir ao meu pai para que fossemos pescar. Minha mãe não gostava de ir, quando ia era para fazer companhia. Mesmo sabendo que não íamos voltar com tantos peixes, aquele era meu tempo com meu pai. Ele ia bebendo uma dose ou duas de pinga durante o dia, pedia uma cerveja de vez em quando e eu, bom de boca, aproveitava os petiscos, os salgadinhos, tomava refrigerante. Durante a semana eu precisava lavar as mãos antes das refeições, mas na hora da pescaria comia com a mão manchada de terra ou lavada no tanque. As regras eram só duas: não fazer barulho e não pegar muitos peixes a ponto de conseguirmos pagar.

Nas tardes no pesqueiro o Sol que batia na pele queimava diferente, o tempo passava devagar, nenhuma preocupação me encontrava. Eu estava seguro, meu pai estava ali, sossegado, descalço, era só questão de esperar o peixe acordar, o peixe dormir, a sombra, o calor, a chuva… qualquer explicação dada pelo meu pai para a baixa de peixes daquele dia. E eu podia esperar, tudo podia esperar.

Depois, na vida adulta, os dias começaram a correr. O trabalho consome a maior parte do dia, as obrigações, os afazeres. E de repente o rosto das crianças muda, elas aprendem coisas novas, nos surpreendem. Nos domingos, quando vão visitar o avô, podem ouvir as mesmas histórias que eu ouvia, mas agora soavam diferente para mim. Eram ainda mais impressionantes, meu herói era real.

Tudo se transforma em memórias, chegará um momento, fico pensando, em que o anzol invisível vai nos fisgar. Ele que fica dentro da vida, a vida toda, e de repente nos espeta e tira para fora dela de uma vez. Mas meu pai, ah, o meu pai é, como minha mãe diz, um bagre ensaboado.

Emummundode

pescadores,nóssomosos peixespescados!

Eu sou um pescador. Daqueles que não precisa contar histórias absurdas para te convencer, leitor, dos grandes peixes que eu pesco. Eu digo isso porque aqui perto da minha casa tem uma imensa lagoa,com águalímpida edaboa,deonde eutrago peixes frescos todos os dias... A maior prova de que eu sou um pescador acima da média é justamente o tamanho acima da média dos meus peixes! Eu pareço ter um GPS em forma de isca, que não só detecta os melhores peixes como os encanta e os fazem vir atrás somente da minha vara! Você acredita nisso?

Os outros pescadores que sentam ao meu lado ficam todos intrigados de como eu consigo tamanhas proezas. Eles com seus peixes miúdos e eu com os meus enormes, de tal forma que eu nem tenho mais permissão para participar de competições. Eu sou uma espécie de “persona grata dos peixes” e “persona non grata” dos meus próprios “amigos” pescadores. E olha que esta não é mais uma história de pescador!

Só que dia destes eu andei afastado da pesca, de olho apenas nas coisas ao meu redor e ai fui

percebendo que o mundo é como uma lagoa, aliás nos meus tempos de criança, a professora já dizia que esse mundão todo, em forma de bola em sua maioria era coberto só de água. E que de terra mesmo onde nós moramos era bem pouca coisa, E ai lembrando desses tempos de escola eu comecei a meditar aqui com meu botões e arpões:

A água do mundo cobre a maioria do mundo, certo? E perante a este mundo de água nós somos assim como os peixes que na água são a menor parte. Vivemos cercados de água, e os peixes dentro d’água também, mas se nós pescamos os peixes alguém certamente nos pesca também!

Efoiaiqueminhaimaginaçãoseagitoucomouma tempestade em alto mar. Eu ali o tempo todo a pensar: Quem estaria pescando a nós seres reles humanos? Quem seriam os pescadores ardilosos com suas iscas enganosas fisgando os homens em sua ingenuidade subaquática?

E o resultado deste oceano de reflexão foi um resultado que me fez ter mais certeza de que ora quem diria:

O mundo é uma imensa pescaria!

Senão vejamos: Lá vem os golpes em que caímos como peixes-dourados acreditando nas vantagens das falsas iscas de resultado dobrado! Nas iscas que prometem riqueza da noite para o dia, vamos mordendo estas iscas feita de lorotas e belas porcarias.

Alguns de nós se acham peixes mais atentos: E gostam de bater no peito dizendo que não serão

fisgados a qualquer momento! Para depois velhos e enfermos descobrirem que caíram na pesca predatória da rede de tantos corruptos homens e governos. Como peixes velhos e aposentados tendo que voltar a nadar em outros lagos... Sim amigos eu andei estes dias olhando de perto como o mundo é feito de desumanas pescarias. Alguns pescam a boa-fé dos incautos como eu já citei, outros são peixes cheios de autoconfiança de que a isca nunca será eles mesmos, o que eu bem sei... Meu vizinho José por exemplo é um típico sardinha iludido, toda semana morde a isca da aposta na loteria e sai no final com o bolso um pouco menos nutrido. Aliás, esta loteria é uma autêntica pesca de arrasto: Arrasta milhões de sardinhas assanhadas por morder uma isca quase sem rastro. A maioria das sardinhas voltam a morder a isca semana após semana, e de tanto serem fisgadas cavam a própria sepultura e desarrumam o bolso e a cama.

Existemtambéméclaro ospeixesde águasalgada, tubarões enormes que não aceitam ser fisgados, mas pescam no fundo do mar sem aceitar voltar sem nada a mercê do próprio nado. Os tubarões, ao contrário das sardinhas iludidas, são em menor quantidade, ainda bem! Mas ainda assim o dano que estes grandes tubarões em nosso mundo causam não é surpresa para ninguém.

Os dias foram passando e eu comecei a faltar ao clube de pesca e os amigos que debochavam e não acreditavam em mim até de mim perguntavam com pressa! Não entendiam como eu, que havia

sidoumgrandepescador,aorefletirsobreoquanto o mundo era uma imensa lagoa e nós éramos peixes de todos os tipos sendo fisgados uns pelos outros, já não via mais sentido em fisgar os peixes de verdade.

De repente, o vizinho agiota que fisgava gente da ruacomoumtubarãomarteloemprestando10 para receber 100 em 1 mês, havia se tornado um examigo a ser evitado. E as sardinhas vizinhas amigos e amigas desta lagoa humanidade eram ao mesmo tempo vítimas e responsáveis por morder aquela isca de mentira com voracidade.

Minhamulhernãoentendiaoquehaviaacontecido comigo. Ela me olhava e reclamada por eu estar tão calado e chegada a falar e soltar tantas bolhas destas que os peixes expelem, como se ela própria fosseum peixe de nossa casa-aquário temendo que eutivesse adotado umapeixepiranha eme tornado um otário! Quem disse que “as peixes-esposa” não podiam ser ciumentas?

Um mês exatamente depois cheguei à conclusão de que não queria ser mais pescador. O truque de usar uma isca por si era uma farsa. Assim como as milhares de farsas que usamos ao longo da vida para fisgar nossos semelhantes. O cigarro, o álcool, drogas, promessas miraculosas, conversar furadas em verso e prosa...

Tudo para mim agora era claro: Todos nós éramos como peixes, o tempo todo na lagoa da humanidade sendo fisgados a toda hora e pela eternidade. O golpe aplicado em nós peixes

humanos, era idêntico ao que aplicávamos nos peixes piscianos: Nós os enganávamos, fisgávamos a fim de consegui-los. E assim a humanidade parecia funcionar: Nós humanos pescadores de outros humanos jogávamos ora nossas varas em pequenos truques de anzol ou em redes de arrasto imensas em truques maiores com consequências piores ao luar ou ao sol!

Foi doloroso, mas joguei fora meus apetrechos de pesca. E ao menos em relação aos meus semelhantes passei a encará-los como pérolas e não como peixes para pesca predatória. Havia algo dentro de cada amigo, vizinho e em todos uma chance de brilhar. Se eu, invés de uma isca, lhes atirasse uma oferta de ajuda na forma de um sincero aviso vindo de um autêntico amigo!

E foi aí que o inimaginável aconteceu: De peixes fisgáveis, eles passaram a parceiros brilhantes e juntos seguimos adiante, imaginando soluções para os problemas deles e até os meus! Logo descobrimos que não precisávamos nos fisgar, nos usar, se antes de tudo lembrássemos que por mais iscasquetrouxéssemosnamente,nósajudássemos primeiramente, com alguma ajuda para ofertar em primeiro lugar.

Bem, o final desta história é simples: Continuámos a viver nesta mesma lagoa chamada humanidade, mas ninguém mais lançava iscas para fisgar uns aos outros sem necessidade. A fome, o perigo, as doenças eapobreza équenofundo eramosnossos verdadeiros inimigos com certeza. E não foi difícil verqueestasameaçaseramsimospescadorescom

suas iscas amargas a nos querer fisgar em nossas aflições e dores.

E quer saber de verdade o fim desta história de pescador? Foi a primeira vez que descobri que o maior peixe por mim pescado foi o amor. O amor de desarmar minha rede e iscas para meus semelhantes e que a única e válida isca era a de ajudá-los antes.

Eu sei que você vai dizer que não passa de mais uma história exagerada de pescador, mas eu te perdoo amigo, até as histórias exageradas contém uma dose sincera de amor: Ao próximo!

Sendoassim...seestiverbomparavocêebompara mim: Até a próxima!

Aprendendoapescarcomo meuheróinorio

Era mais um dia ensolarado na Amazônia, e eu, uma menina pequena de oito anos de idade, nativa da região, estava animada para viver uma aventura de pesca, com o meu pai, um exímio pescador e sábio na arte de pescar.

Nós íamos pescar um pirarucu, um dos maiores peixes de água doce do mundo, e eu, mal podia esperar para ver aquele peixe gigante, nadando nas águas escuras do rio.

Ia embarcar com o meu pai, na sua canoa comprida, de madeira, de extremidades bicudas, a remos, com todo o equipamento necessário, as varas para varar, as canas improvisadas de bambu e outros artigos, que normalmente utilizava e seguia nas suas pescarias.

Foi quando me virei, para o meu pai e disse: "Pai, então, vamos logo! Estou ansiosa para pescar um pirarucu hoje" disse, pulando de alegria.

O meu pai sorriu e carinhosamente me colocou a mão na minha cabeça e respondeu:

"Calma, filha, vamos preparar tudo primeiro";

Pegámos em tudo, nas nossas redes de pesca e subimos para o barco de madeira.

O rio estava calmo e sereno, essa calmaria refletia-se nas árvores e vegetação verdejantes ao redor que se mantinham estáticas.

O som dos pássaros, nas árvores, que piam e os macacos que guincham, na floresta, sons que ecoam ao longo das margens, e criam uma sinfonia natural, que acalma a minha alma.

Entretanto, já a navegar no rio, o meu pai, chama a minha atenção, dizendo:

"Filha, hoje vamos ficar muito atentos. O pirarucu, é um peixe possante, muito esperto e forte. Precisamos de agir com cuidado e paciência".

De tudo o que me disse, eu concordei com ele, sentámo-nos em silêncio, observámos atentamente a água turva, praticamente escura, procurando qualquer tipo de movimento estranho.

O calor do sol aquecia a nossa pele, enquanto o barco deslizava suavemente, pela superfície do rio, fazendo ondas leves, que se formavam como por inércia.

De repente, sentimos a linha de pesca tremer e o meu coração disparou, de tão empolgado que estava.

Naquele instante, gritei: "Pai, acho que pescámos algo!"; puxando a linha com força.

Era o peixe, que lutava com bravura, saltava da água, em pulos constantes, tentando escapar da minha

rede. Eu, esforcei-me, com a ajuda do meu pai, para o segurar e não o deixar fugir.

Estava a concentrar toda a minha força e habilidade, para apanhar aquele peixe majestoso, naquela pescaria.

O meu pai, na ajuda que me deu, guiou a minha linha e incentivou-me, e disse-me para não desistir:

“Minha querida filha, não desistas de algo, mesmo que leve tempo”;

Finalmente, aquele peixe cheio de realeza, emergiu das águas escuras. Era um pirarucu enorme, com escamas brilhantes e olhos curiosos.

Eu fiquei maravilhada, com a beleza daquele peixe, senti uma relação, que passava a ser profunda, que não conseguia descrever e disse ao meu pai, com os meus olhos a brilhar de felicidade:

"Pai, olha como ele é lindo! Nunca apanhaste um pirarucu tão grande como este";

O meu pai sorriu e mostrou ter bastante orgulho em mim e elogiou-me, como bom pai que sempre demonstrou ser:

"Fizeste um ótimo trabalho, filha. Estou muito feliz contigo, por teres pescado este peixe comigo";

Com cuidado, retirámos o pirarucu da rede e colocamos no nosso barco, que parecia imaculado com a sua presença, pois as suas escamas, com os raios de sol a tocar-lhe, pareciam criar uma aura brilhante à sua volta, iluminando por completo toda a embarcação, como um clarão.

Ele ainda estava vivo, respirava lentamente, como se estivesse a tentar recuperar da sua luta pela sobrevivência.

Eu acariciei as suas escamas, de cor vermelha e senti a textura áspera sob meus dedos, agradeci à mãe natureza aquela dádiva, murmurando, numa prece silenciosa:

"Obrigada, pirarucu, te deixares pescar. Prometo que vamos honrar o teu espírito e agradecer pela tua generosidade";

Depois, voltámos para casa, levámos o pirarucu como uma recompensa, estávamos satisfeitos, da nossa jornada de pesca.

A minha mãe estava à nossa espera, na beira do rio, com um sorriso acolhedor no rosto e exclamou, abraçando-nos com carinho:

"Parabéns, minha querida! Hoje, conseguiram pescar um belo peixe";

Juntos, preparamos o pirarucu para o jantar, cozinhando-o com ervas e os habituais temperos locais.

O seu aroma delicioso espalhou-se por toda a casa.

O meu pai decidiu, convidar os vizinhos para se juntar a nós na celebração daquela pesca bemsucedida.

Enquanto comíamos o peixe fresco, contei a todos sobre a nossa aventura. Uma estória, em que compartilhei todos os detalhes emocionantes da pescaria.

Cada palavra, era repleta de gratidão e respeito pela natureza, pela vida e pelos ensinamentos que o rio me tinha proporcionado.

Naquela noite, deitada na minha rede, olhei para as estrelas que cintilavam no céu, senti-me em paz e numa imensa serenidade.

A Amazónia era o meu lar, o meu santuário, onde os deuses renasciam e o meu refúgio de amor e harmonia.

O rio tinha-me ensinado várias lições valiosas, como a paciência, a humildade e o respeito pela vida selvagem que ali habita. Cada peixe, é uma dádiva, um presente da natureza, que eu recebo com gratidão.

Durante a pescaria, pude observar os pássaros majestosos, que voavam sobre as águas, os macacos que brincavam nas árvores e os jacarés que se escondiam entre os juncos.

Cada ser vivo naquele ecossistema, é essencial para o equilíbrio do ambiente.

Naquele momento de tranquilidade, senti uma profunda ligação com a natureza, como se eu fizesse parte de algo maior e mais grandioso.

Naquele momento, a minha alma se fundiu com a de todos os seres, que habitavam aquele lugar mágico.

Agradeci à mãe-natureza por me deixar vivenciar essa tamanha beleza e renovei o meu compromisso de proteger e preservar aquele pedaço de paraíso.

A pesca era apenas uma desculpa para me conectar com a natureza, comigo mesma e com o universo.

Adormeci, embalada pelo assobio suave do rio, pela cantoria dos grilos e pelo batimento do meu coração, grata por um bom dia de pesca na Amazónia, com a mente repleta de ensinamentos do rio, ao lado do meu querido pai, o meu herói e o meu sábio mentor.

Era ali, na Amazônia, que eu encontrava a minha verdadeira essência e paz interior.

AprofeciadaDeusadoMar

Há muitos anos, numa pequena vila costeira de África, vivia um pescador chamado José. Ele sempre foi conhecido pela sua coragem para enfrentar as águas calmas e perigosas do mar, com as suas armadilhas mais distintas e peculiares. Porém, uma antiga profecia rondava pela vila, que dizia, que um dia a Deusa do Mar enviaria um peixe temido por todos, como uma punição aos pescadores que se afoitassem, para muito longe.

José, sempre ouviu falar e comentar essa profecia, mas não acreditava sequer no que se dizia. Para o José, o mar era o seu lar, a sua casa, onde se sentia feliz e não havia peixe grande demais, que ele não pudesse pescar.

Certo dia, meteu na cabeça que ia desafiar a Deusa do Mar e aventurar-se para além das águas conhecidas, nas águas da incerteza, na busca do famoso peixe, que era temido por todos.

Saiu de madrugada, com o seu pequeno barco a remos, remou com força e coragem em direção ao mar desconhecido.

Enquanto o sol começava a aparecer e a raiar, José avançava sem medo, determinado a provar que a profecia não passava de um simples mito.

As horas foram-se passando e o pescador encontrava-se longe da vila, tinha entrado em águas nunca antes navegadas. Deixou as águas calmas, deparou-se com o mar que estava bem agitado e as ondas violentas, batiam contra o seu pequeno barco, mas nada a fazia desistir.

Tinha lançado a sua linha de pesca à água e aguardava sobre as ondas daquele mar agitado.

O ar era pesado, a sua respiração arfava sem parar, os seus pulmões queimavam de cansaço, mas a sua determinação era maior, do que o seu estado físico.

Finalmente, avistou uma sombra imensa que se aproximava sob as águas, movimentava-se com vigor, puxando a linha com força, testando a sua resistência.

O seu coração ficou acelerado e quase vomitou, com um misto de medo e excitação, que tomou conta da sua mente.

Ficou a pensar, se era a sombra do famoso peixe, que todos temiam, enviado pela Deusa do Mar como sendo o seu castigo.

Com as suas mãos calejadas, José puxou a linha com toda a sua força, um impulso que lhe vinha, com determinação.

A resistência era imensa, o peixe debatia-se e o barco balançava perigosamente, mas ele não desistia, mantinha-se firme.

Por fim, o peixe gigante emergiu das funduras, revelando-se diante dos seus olhos surpresos.

Era um ser magnífico e assustador ao mesmo tempo, o seu corpo reluzia como ouro, sob os raios solares, que batiam nas suas escamas, brilhavam como joias preciosas e os seus olhos pareciam observar a alma do José. Era na realidade, o peixe temido por todos, cujo nome era segredo entre os pescadores da região.

Num pequeno instante de coragem, e até de instinto, José lançou a rede sobre o peixe, prendendo-o e puxando-o para dentro de seu barco. O seu peso era comportável, mas imenso, e novamente o pequeno barco balançava, ameaçando virar a qualquer momento.

Apesar da sua força, José não conseguia lidar sozinho com aquele peixe gigante. sabia que precisava de ajuda e, com muita dificuldade, lá conseguiu voltar à vila com a sua preciosa carga.

Os habitantes estavam chocados, ao ver o famoso peixe, sendo carregado por José, mas logo perceberam que algo estava errado.

E porquê? Porque, a Deusa do Mar nunca iria deixar em vão, que o seu castigo fosse ignorado.

E logo se notou, ao pôr do sol, uma tempestade furiosa se abateu sobre a vila, destruindo casas, barcos e plantações. As ondas formaram-se rapidamente, eram gigantes, varriam a costa, levando consigo tudo o que encontravam pelo caminho.

Os pescadores fugiam amedrontados, para locais mais altos, famílias tropeçavam ao fugir, mas felizmente com a entreajuda, se conseguiam refugiar perante a calamidade.

Foi estranho, porque depois da destruição, a tempestade continuava sem cessar.

José, percebeu que tinha desafiado a Deusa do Mar e que o seu ato de orgulho, tinha colocado todos em perigo. Desesperado, ele procurou a ajuda do mais sábio ancião da vila, que lhe disse que a única maneira de acalmar a fúria da deusa, era devolver o peixe gigante ao mar.

Sem hesitar, ele pegou no peixe, atravessou a tempestade, correndo o risco de virar o seu barco e se afogar, o levou de volta às águas profundas. Chegado ao local, largou o peixe no mar, e com um suspiro de alívio, ele viu a tempestade se acalmar lentamente, as águas se aquietando e a paz voltando à vila.

A profecia da Deusa do Mar, tinha sido cumprida e José aprendeu que o respeito pela natureza e pelos seus mistérios era essencial para ela poder sobreviver.

Olhou para o horizonte, agradecendo à Deusa do Mar, por ter guiado os seus passos e lhe ter mostrado a importância, de preservar o equilíbrio entre os seres vivos e o meio ambiente.

A vila inteira se reuniu para comemorar a salvação, agradecendo a coragem e sabedoria de José.

Os pescadores fizeram as suas oferendas de gratidão ao mar, prometendo cuidar dele com o maior respeito e amor.

Desde então, a vila prosperou, com o peixe abundante e colheitas férteis.

José tornou-se um líder respeitado, ensinando a todos, a importância da harmonia com a natureza.

E assim, a lenda de José, o pescador que desafiou a tempestade e salvou a sua vila, foi contada de geração em geração, como um exemplo de como o respeito e a gratidão pela natureza, podem trazer a prosperidade e a paz para todos.

Entreredesepanelas:as aventurasdeAldoeGeva

Aldo era um pescador conhecido não só por sua habilidade em lançar a rede, mas também por suas histórias tão coloridas quanto o pôr do sol que tingia o céu de sua pequena vila de pescadores. Dizia-se que ele podia conversar com os peixes, e que cada um lhe contava um segredo que ele transformava em contos.

Sua esposa, Geva, era a cozinheira mais talentosa da região. Com as mãos de uma artista e o coração de uma verdadeira amante da culinária, ela transformava os peixes trazidos por Aldo em pratos que pareciam pinturas vivas. Seu prato assinatura era o "Mar em Chamas": um salmão grelhado cuja pele crocante brilhava em tons de âmbar e dourado, repousando sobre um leito de arroz negro como a noite. O aroma era uma mistura de alho torrado e ervas frescas, que lembrava a brisa do mar ao amanhecer. Ao provar, o sabor suave do peixe se fundia com o picante sutil da pimenta rosa, uma explosão de sabores que fazia os clientes fecharem os olhos e se imaginarem navegando em mares distantes.

Juntos, eles mostravam que a verdadeira magia engrandece as relações humanas quando talentos individuais se unem para criar algo maior do que a

soma de suas partes, assim como os peixes que nadam em harmonia com o mar.

Aldo, com suas histórias, trazia sonhos e esperanças, enquanto Geva, com sua culinária, nutria o corpo e a alma. Na cozinha ou na vida, o amor e a criatividade são os ingredientes que transformam o ordinário em extraordinário. Portanto, entre redes e panelas, a vida deles se entrelaçava como a pesca e os contos de Aldo e os sabores que Geva tecia em sua cozinha.

OecodoRioDoce:asaga deJoãoealutapelavida

Jean Javarini

No coração do Espírito Santo, onde o Rio Doce serpenteia preguiçosamente pela cidade de Linhares, em Regência e em Povoação, vivia um pescador capixaba chamado João. Ele era conhecido por todos como um verdadeiro mestre da pesca, uma figura que todos admiravam e respeitavam. Desde jovem, João havia aprendido a arte da pesca com seu pai. Ele sabia como manusear uma vara de pesca com maestria, como lançar a linha de pesca com precisão usando um molinete ou carretilha, e como escolher entre isca viva e isca artificial conforme a necessidade. Seu pai havia lhe ensinado que cada tipo de peixe, seja um surubim, dourado, traíra, lambari, tucunaré, piau, bagre, corvina, tilápia, tambaqui, bicuda, baiacu, pirarucu ou piranha, exigia uma técnica e um equipamento específicos. Numa manhã de verão, João decidiu que era hora de explorar uma nova área do Rio Doce, próxima à Povoação. Ele preparou sua caixa de pesca meticulosamente, garantindo que não faltasse nada: anzóis de todos os tamanhos, boias, chumbadas, um alicate de pesca, e a indispensável licença de pesca. Ele também encheu sua bolsa térmica com sanduíches e água, vestiu sua camiseta UV, chapéu de pesca e

óculos polarizados, pronto para enfrentar o sol brilhante. Com o barco ancorado na margem, João sentia uma mistura de sentimentos – satisfação, alegria, e uma tranquila empolgação. O som das ondas suaves contra o casco do barco trazia-lhe uma serenidade imensa, enquanto ele colocava a iscavivanoanzol.Cadalançamentodelinhatrazia uma sensação de expectativa e paciência, esperando pelo momento em que a boia desapareceria na água. Naquele dia, o Rio Doce estava generoso. Primeiro, ele fisgou um robusto dourado, que lutou com determinação antes de se render. A captura trouxe um sorriso de orgulho ao rosto de João. Ele continuou pegando uma traíra, um lambari, e até mesmo um tímido piau. A variedade de peixes que habitavam aquelas águas era fascinante e cada captura trazia uma nova euforia. Por volta do meio-dia, com o sol a pino, Joãodecidiufazerumapausa.Enquantocomia,ele refletia sobre sua vida e sentia uma profunda gratidão pela simplicidade e paz que a pesca lhe proporcionava. A tranquilidade do rio, o canto distante dos pássaros, e a brisa suave traziam uma sensação de nostalgia, lembrando-o dos tempos passados com seu pai. De volta ao trabalho, João sentiu uma forte puxada na linha. Ele sabia que algo grande estava do outro lado. Com concentraçãoepaciência,eletrabalhouomolinete, deixandoalinhacorrere puxando-adevagar.Após uma batalha intensa, emergiu um impressionante surubim. A realização de capturar um peixe tão majestoso era indescritível. Com o sol começando a se pôr, João recolheu suas coisas, sentindo uma paz profunda e uma felicidade serena. Ele havia

passado um dia perfeito, imerso na natureza, com o Rio Doce como seu companheiro constante. Enquanto navegava de volta para Regência, ele sentiuumaondadeliberdadeeinspiração. Apesca não era apenas um hobby; era sua vida, sua conexão com o passado e seu caminho para a felicidade. AhistóriadeJoãoé ahistóriademuitos pescadores capixabas que, dia após dia, encontram na pesca uma fonte inesgotável de satisfação, determinação e alegria. E assim, o Rio Doce, com suas águas ricas e paisagens deslumbrantes, continuava a ser um refúgio para aqueles que, como João, buscavam mais do que peixes –buscavam a própria essência da vida.

Enquanto João remava de volta para Regência, o brilho dourado do pôr do sol refletia nas águas tranquilas do Rio Doce, criando um espetáculo de cores que só a natureza poderia proporcionar. O barco deslizava suavemente, e João sentia o cansaço do dia se transformar em uma sensação de realização e paz interior. Ao chegar em Regência, João foi recebido com sorrisos e cumprimentos dos moradores locais. Ele era uma figura querida, e suas histórias de pesca sempre fascinavam a todos. Naquela noite, ele decidiu compartilhar sua mais recente aventura com seus amigos no pequeno bar da vila, onde a comunidade se reunia para ouvir suas histórias e trocar experiências. Sentado em uma mesa de madeira gasta pelo tempo, com seu viveiro de peixes ao lado, João começou a contar sobre o surubim, o dourado e os outros peixes que havia capturado naquele dia. Os olhos dos ouvintes brilhavam de interesse e

admiração. Enquanto narrava cada detalhe, desde o lançamento da linha de pesca até a captura final, a atmosfera no bar se encheu de empolgação e nostalgia.Osmaisjovensouviamatentos,ansiosos para aprender com o mestre pescador. Após a história, João abriu a bolsa térmica e compartilhou os sanduíches que havia levado. A camaradagem era palpável, e a troca de histórias e risadas continuava noite adentro. Entreum gole de cerveja eoutro,ele falavasobrea importânciadepreservar o Rio Doce e seus habitantes, destacando a necessidade de pescar com responsabilidade e de respeitar asleis,incluindoaobtençãodalicençade pesca.Aconversafluíanaturalmente,eJoãosentiu uma onda de gratidão pela comunidade unida em torno de um amor comum pela pesca e pela natureza. Cada rosto amigo e cada história compartilhada reforçavam seu sentimento de pertencimento e de que estava exatamente onde deveria estar. Enquanto a noite avançava, João começou a pensar no futuro. Havia muito que queria ensinar e passar adiante. Decidiu que organizaria uma oficina de pesca para os jovens da região, onde poderia ensinar não só as técnicas, mas também o respeito pela natureza e pela tradição da pesca capixaba. Ele sentia uma inspiração crescente, uma vontade de fazer mais pela sua comunidade e pelo Rio Doce que tanto amava. Nos dias seguintes, João colocou seu plano em ação. Anunciou a oficina de pesca, e para sua alegria,muitosjovensseinscreveram.Noprimeiro dia da oficina, ele começou com os fundamentos –desde como manusear a vara de pesca, usar o molinete e a carretilha, até a escolha correta das

iscas artificiais e vivas. Com paciência e dedicação, ele ensinou cada detalhe, explicando a importância de cada equipamento, desde a boia até o alicate de pesca. O entusiasmo dos jovens era contagiante. João sentia uma alegria profunda ao ver seus aprendizes capturando seus primeiros peixes, sentindo a mesma satisfação e euforia que ele sentia. Ele os ensinou a respeitar os peixes e a natureza, promovendo práticas sustentáveis para garantir que o Rio Doce continuasse a ser uma fonte de vida e beleza para as futuras gerações. Ao final de cada dia de oficina, João sentia uma realização imensa. Ele estava não apenas perpetuando uma tradição, mas também criando novas memórias e fortalecendo os laços de sua comunidade.Apesca,paraele,eramaisdoqueum simples passatempo – era uma ponte que unia gerações, um elo que conectava as pessoas à natureza e umas às outras. E assim, a história de João e do Rio Doce continuava a ser escrita, dia após dia, com cada novo pescador que aprendia, cada peixe que era capturado e devolvido ao rio, e cada sorriso que iluminava os rostos dos jovens aprendizes. No coração do Espírito Santo, a magia da pesca e a beleza do Rio Doce viviam e respiravam através das ações e do espírito de João e de sua dedicada comunidade.

Alguns meses se passaram desde que João começou suas oficinas de pesca. A comunidade de Regência estava mais unida do que nunca, e as histórias das jornadas de pesca se espalhavam, atraindo curiosos de outras partes do Espírito Santo. Foi então que chegaram a Regência dois

novos personagens que mudariam a história de João e do Rio Doce para sempre. Lucas, um jovem jornalista de Linhares, estava investigando o impacto ambiental no Rio Doce e ouvira falar de João e suas oficinas de pesca. Fascinado pelas histórias, ele decidiu ir até Regência para documentar a vida do pescador e a relação da comunidade com o rio. Acompanhado de Clara, uma bióloga marinha de Vitória, ele esperava encontrar inspiração e conhecimento para um artigo que destacasse tanto os desafios quanto as belezas do Rio Doce. Ao chegarem a Regência, Lucas e Clara foram recebidos calorosamente.

João, sempre disposto a compartilhar suas histórias, levou-os para um passeio pelo rio, mostrando os melhores pontos de pesca e explicando a importância de cada área para a vida aquática.Clara, comseu equipamentodepesquisa, ficou encantada com a biodiversidade local e começou a coletar dados que pudessem ajudar na preservação do rio. Durante uma dessas expedições, Clara notou algo preocupante. Havia sinais de poluição e diminuição de algumas espécies de peixes. Ela explicou a João e Lucas que, embora a pesca sustentável estivesse sendo promovidapelacomunidade,haviaoutrasameaças ao rio, como o desmatamento e a mineração. Lucas, com seu espírito investigativo, decidiu que essa era uma história que precisava ser contada. ComaajudadeJoão,Claraorganizouumareunião comunitária em Regência. Moradores, pescadores e autoridades locais se reuniram para discutir o futuro do Rio Doce. Clara apresentou seus achados, e Lucas começou a entrevistar os

presentes, capturando suas histórias e preocupações. A comunidade estava determinada a proteger o rio, mas sabiam que precisavam de mais apoio. Inspirados pela determinação da comunidade, Lucas escreveu uma série de artigos que foram publicados em jornais locais e nacionais. As histórias de João, suas oficinas de pesca e a luta pela preservação do Rio Doce ganharam atenção e mobilizaram pessoas de toda parte. A campanha chamou a atenção de ONGs e instituiçõesambientais,quesejuntaram aoesforço de proteção do rio. Com o aumento da conscientização, novos personagens entraram na vida de João. Rafaela, uma professora de Linhares, trouxe seus alunos para aprender sobre a pesca sustentável e a importância da conservação ambiental. Marcos, um engenheiro ambiental, começou a trabalhar em projetos de recuperação de áreas degradadas ao longo do rio. Juntos, eles formaram uma rede de apoio que fortaleceu ainda mais a comunidade de Regência. O impacto foi visível. As águas do Rio Doce começaram a mostrar sinais de recuperação, e as espécies de peixes voltaram a prosperar. João, agora um herói local e símbolo de resistência e amor pelo rio, continuava suas oficinas, ensinando não só a arte da pesca, mas também a importância de cuidar do meio ambiente. Num dia especialmente bonito, João levou Clara, Lucas e um grupo de jovens aprendizes para uma expedição de pesca. O rio parecia mais vivo do que nunca. O som das águas, o brilho dos peixes saltando e a risada dos jovens enchiam o ar. João, com sua vara de pesca, molinete e anzol, lançou a linha e sentiu uma forte

puxada. Todos assistiam com expectativa e emoção.

Após uma breve luta, João puxou um impressionante tucunaré. A alegria foi contagiante,eelesoltouopeixedevoltaaorio,um gesto que simbolizava a nova era de respeito e cuidado com a natureza. Clara, emocionada, anotava cada detalhe, enquanto Lucas capturava o momento com sua câmera. Ao final do dia, sentados na margem do rio, com o sol se pondo, João, Clara, Lucas e os jovens refletiam sobre a jornada que haviam trilhado. A luta pela preservação do Rio Doce unira a comunidade e trouxera novos amigos e aliados. João sentiu uma profunda gratidão e uma sensação de paz. A históriadoRioDoceestavalongedeterminar,mas ele sabia que, juntos, estavam escrevendo um futuro brilhante para as próximas gerações. A magia do Rio Doce, com suas águas serenas e biodiversidade rica, continuava a inspirar todos aqueles que o conheciam. E assim, com cada novo dia, a história de João e sua dedicada comunidade seguia adiante, um testemunho da resiliência e do amor pela natureza que definia a alma capixaba.

Com o passar do tempo, a notoriedade de João e seu trabalho com o Rio Doce atraíram mais atenção do que ele jamais poderia ter imaginado. Documentários foram feitos, e sua história foi até tema de conferências ambientais internacionais. MasoverdadeirotesteparaJoãoesuacomunidade estava prestes a começar. Um dia, enquanto João conduzia uma das suas oficinas, recebeu uma visita inesperada. Era Pedro, um representante de

uma grande empresa mineradora. Pedro anunciou planos de expansão da mineração na região, prometendo empregos e desenvolvimento econômico.Emboraapromessadeprogressofosse tentadorapara alguns, João e muitos outrossabiam que isso poderia significar a destruição do Rio Doce. A notícia causou uma divisão na comunidade. Alguns moradores, seduzidos pela promessa de empregos e dinheiro, apoiaram o projeto da mineradora. Outros, liderados por João, Clara, Lucas e seus novos aliados, se opuseram veementemente, temendo pelo futuro do rio e das tradições que haviam lutado tanto para preservar. Clara e Lucas trabalharam incansavelmente para reunir dados científicos que mostrassem os danos potenciais do projeto. Enquanto isso, João e os jovens que haviam aprendido com ele começaram uma campanha de conscientização, realizando protestos pacíficos e utilizando as redes sociais para espalhar sua mensagem. A situação estava cada vez mais tensa. Numa noite chuvosa, um evento inesperado abalou a comunidade. Um deslizamento de terra causado por práticas de mineração ilegal revelou um grande vazamento de resíduos tóxicos que estavam sendo armazenados secretamente perto do Rio Doce. A poluição resultante ameaçava não só a vida aquática, mas também a saúde dos moradores. A comunidade se uniu para enfrentar a crise. Clara organizou uma equipe de emergência para analisar a extensão do dano e buscar soluções imediatas. João, com a ajuda de Lucas, convocou todas as pessoas que conhecia, incluindo pescadores, moradores e aliados de outras regiões, para ajudar na limpeza e

contenção da poluição. Foi nesse momento de adversidade que uma reviravolta surpreendente ocorreu. Pedro, o representante da mineradora, horrorizado pela magnitude do desastre e tocado pela dedicação de João e sua comunidade, decidiu se juntar a eles. Ele revelou informações críticas sobre a mineradora, expondo práticas ilegais e negligentes que ajudaram a comunidade a pressionar as autoridades para uma intervenção. Com as provas em mãos, João e seus aliados conseguiram mobilizar uma ação legal contra a mineradora. A notícia do desastre e a luta da comunidade de Regência ganharam destaque nacional, e a pressão pública forçou o governo a intervir. A mineradora foi obrigada a cessar suas operações e a financiar um projeto de recuperação ambiental. O tempo passou, e a comunidade de Regência, liderada por João, Clara e Lucas, iniciou a recuperação do Rio Doce. A mineradora, agora sob nova administração, foi transformada em uma força positiva, financiando programas de recuperação ambiental e desenvolvimento sustentável. Num dia ensolarado, enquanto o rio começava a mostrar sinais de revitalização, João conduziu uma última grande oficina de pesca. Ele estava cercado por Clara, Lucas, Pedro e os jovens pescadores que tinham aprendido tanto com ele. Cada um lançava suas linhas com esperança e determinação, sentindo a renovação das águas e das suas próprias vidas. João, agora com cabelos grisalhos e um brilho de satisfação nos olhos, lançou sua linha e sentiu uma puxada. Ao puxar o peixe, um majestoso pirarucu emergiu das águas, simbolizando a renovação e o futuro promissor do

Rio Doce. Ele soltou o peixe de volta ao rio, um gesto de gratidão e esperança. A comunidade celebrou sua vitória, sabendo que, apesar das reviravoltas, tinham preservado algo mais valioso do que ouro – a vida, a natureza e as tradições que os conectavam ao Rio Doce. E assim, a história de João, o pescador capixaba, e seu amado Rio Doce continuava, como um testemunho eterno da força e resiliência de uma comunidade unida pelo amor à natureza e pela determinação em protegê-la para as futuras gerações.

Enquanto o sol se punha sobre o Rio Doce, lançando reflexos dourados sobre as águas tranquilas, João olhou ao redor, vendo os rostos sorridentes de sua comunidade. Sentiu uma profunda paz e uma sensação de missão cumprida. O rio, agora revitalizado e protegido, era um símbolo de esperança e renovação. Ele sabia que, com cada nova geração de pescadores, a história de resiliência e amor pelo Rio Doce continuaria a ser escrita, refletindo o espírito indomável e a determinação daqueles que, como João, haviam dedicado suas vidas a proteger o coração pulsante do Espírito Santo.

E assim, enquanto as últimas luzes do dia se despediam no horizonte, João sorriu, sabendo que o eco do Rio Doce continuaria a ressoar, inspirando gerações vindouras a proteger e honrar a preciosa dádiva da natureza.

OstesourosdaLagoa

Juparanã:ajornadadeuma famíliacapixaba

Jean Javarini

Numa ensolarada manhã em Linhares, Espírito Santo, Maria, uma pescadora capixaba apaixonada pela vida e pelas águas da Lagoa Juparanã, preparava-se para mais um dia de aventuras. Junto com seu filho, Pedro, e seu pai, Seu Antônio, ela pegou seus barcos e equipamentos de pesca, ansiosa para criar novas histórias naquele lugar encantado. Enquanto navegavam pelas águas tranquilas da lagoa, Maria compartilhava suas histórias favoritas de pescaria com Pedro, lembrando-se dos dias de sua infância, quando pescava lambaris e traíras nas margens da lagoa com seu avô. O sol brilhava no céu azul, refletindo-se nas águas cintilantes, enquanto pássaros voavam sobre as árvores e a areia branca das praias. Com suas varas de pesca em mãos e os olhos atentos, Maria, Pedro e Seu Antônio lançaram suas linhas, ansiosos para pegar alguns dos peixes mais famosos da região, como dourados, tucunarés e tilápias. A empolgação de Pedro era contagiante, enquanto ele esperava pacientemente pelo momento certo de fisgar um grande peixe. Enquanto pescavam, uma brisa suave soprava do mar, trazendo consigo uma

mistura refrescante de calor e frio. Maria sorria para seu filho, sentindo uma profunda gratidão por momentos como aquele, onde podiam desfrutar da natureza juntos, longe das preocupações do dia a dia. Seu Antônio, com seus anos de experiência, compartilhavasuasabedoriasobreapescaeavida, enchendooambientecomsuaserenidadeealegria. De repente, Pedro sentiu uma forte puxada em sua linha. Com uma mistura de excitação e concentração, ele começou a recolher devagar, sentindo a força do peixe do outro lado da linha. Com a ajuda de Maria e Seu Antônio, ele conseguiu finalmente trazer o peixe para o barcoum belo dourado, reluzindo ao sol como um tesouro brilhante. A alegria de pegar aquele peixe foi compartilhada por todos a bordo. Maria sentiu uma onda de euforia e orgulho ao ver seu filho segurando o peixe com um sorriso radiante no rosto. Seu Antônio, com um brilho nos olhos, abraçou o neto com gratidão, sentindo uma felicidade indescritível por estar ali, naquele momento único e especial. Enquanto o dia avançava e o sol começava a se pôr no horizonte, Maria, Pedro e Seu Antônio recolheram suas linhas, guardando as lembranças daquele dia inesquecível em seus corações. Enquanto navegavam de volta para a costa, eles sabiam que haviam vivido mais uma história para contar, uma história de satisfação, alegria e amor compartilhado pela pesca, pela família e pela natureza exuberante do Espírito Santo. E assim, com cada pôr do sol sobre a Lagoa Juparanã, eles encontravam uma nova inspiração para continuar

sua jornada, repletos de gratidão, determinação e um profundo sentimento de paz.

Enquanto retornavam à costa, uma chuva repentina começou a cair do céu, trazendo uma sensação revigorante de frescor e renovação. Maria, Pedro e Seu Antônio não se abalaram com a mudança no clima; pelo contrário, eles abraçaram a chuva como uma bênção adicional da natureza, uma oportunidade para se conectar ainda mais com o ambiente ao seu redor. Enquanto as gotas de chuva dançavam na superfície da lagoa, refletindo as últimas luzes do dia, a sensação de alegriaeliberdadeerapalpávelabordodosbarcos.

Maria pegou o chapéu para proteger-se da chuva, enquanto Pedro e Seu Antônio riam e brincavam, sentindo a água fresca escorrer por seus rostos. Ao chegarem à costa, eles desembarcaram com os corações leves e sorrisos radiantes. Mesmo molhados pela chuva, eles sentiam uma paz profunda e uma gratidão imensa pela oportunidade de vivenciar momentos tão preciosos juntos. Com o calor do dia se transformando em frescor da noite, eles se despediram da lagoa, sabendo que voltariam em breve para criar novas memórias e contarnovashistórias.Enquantocaminhavampela areia macia, iluminados pelo brilho suave da lua, Maria, Pedro e Seu Antônio sentiam-se unidos não apenas pelo vínculo familiar, mas também pela paixão pela pesca, pela natureza e pela vida. Eles sabiam que, não importasse o que o futuro reservasse, enquanto estivessem juntos, sempre encontrariam alegria, serenidade e inspiração nas águas da Lagoa Juparanã e nos momentos simples,

mas preciosos, que compartilhavam como uma família capixaba.

Enquanto se aproximavam de casa, Maria, Pedro e Seu Antônio foram recebidos pelo aroma reconfortantedeumarefeiçãopreparadacomamor pela esposa e mãe de Maria. Sentados à mesa, compartilharam suas histórias do dia, rindo das aventuras na lagoa e das travessuras da chuva inesperada. Após o jantar, enquanto o calor do fogão a lenha aquecia a casa, a família se reuniu ao redor da lareira, enrolados em seus cobertores. Seu Antônio, com sua voz tranquila e calorosa, começouacontarumahistóriaantigasobrealenda dos peixes da Lagoa Juparanã, uma narrativa repleta de magia e encantamento que capturava a imaginação de Pedro. Enquanto escutavam atentamente, Maria olhou para seu pai com um sorriso de gratidão. Ela sabia que as histórias dele não eram apenas contos, mas lições de vida transmitidas de geração em geração, conectandoosàsuaherançacapixabaeaovínculoespecialque compartilhavam como família. Enquanto a noite avançava e o fogo crepitava na lareira, a família se aconchegou ainda mais, apreciando a sensação de calor e segurança que apenas o lar pode proporcionar. Com o coração cheio de alegria, gratidão e amor, Maria olhou para seus entes queridos ao seu redor, sentindo-se infinitamente abençoada por cada momento compartilhado naquela noite. E assim, enquanto as estrelas cintilavam no céu noturno e a chuva lá fora continuava a cair suavemente, Maria, Pedro e Seu Antônio adormeceram, envolvidos pelo calor do

lar e pelos laços indissolúveis que os uniam como uma família capixaba. Para eles, não havia maior tesouro do que o amor, a harmonia e a felicidade encontrados nos simples prazeres da vida, como a pesca, as histórias compartilhadas e os momentos preciosos em família.

Na manhã seguinte, ao acordarem com os primeiros raios de sol, Maria, Pedro e Seu Antônio foram recebidos por um novo dia cheio de promessas e aventuras. Decidiram que era hora de explorar uma ilha misteriosa que sempre havia despertado sua curiosidade na Lagoa Juparanã. Com seus barcos carregados de suprimentos e equipamentosdepesca,partiramemdireção àilha, ansiosos pela emoção do desconhecido. Enquanto navegavampelaságuascalmasdalagoa,avistaram pássaros coloridos voando entre as árvores e sentiram a brisa fresca da manhã acariciar seus rostos. Ao desembarcarem na ilha, foram recebidos por uma paisagem deslumbrante, com praias de areia branca e florestas exuberantes. Pedro correu para explorar enquanto Maria e Seu Antônio preparavam o equipamento de pesca. Logo, estavam todos ocupados lançando suas varas de pesca na água cristalina, ansiosos para ver que tesouros aquelas águas escondiam. Enquanto pescavam, Pedro avistou algo brilhante entre as árvores e correu para investigar. Para sua surpresa, encontrou um antigo baú coberto de musgo e hera. Com olhos arregalados de excitação, chamou seus pais e avô para verem sua descoberta. Com cuidado, abriram o baú e encontraram dentro dele um tesouro de histórias antigas, contos e lendas

que remontavam aos tempos dos primeiros colonizadores da região. Entre os pergaminhos e mapas amarelados pelo tempo, encontraram relatos de piratas, tesouros perdidos e segredos escondidos nas profundezas da lagoa. Fascinados pelas histórias e pela aventura que se desdobrava diante deles, decidiram explorar mais a ilha em busca de mais pistas sobre o tesouro perdido. Enquanto isso, continuaram a pescar, compartilhando risadas e histórias enquanto esperavam os peixes morderem a isca. Ao final do dia, com o sol se pondo no horizonte, decidiram retornar para casa, levando consigo não apenas os peixes que haviam pescado, mas também as memórias de um dia mágico passado na ilha da Lagoa Juparanã. Enquanto navegavam de volta para a costa, Maria, Pedro e Seu Antônio sabiam que haviam encontrado um verdadeiro tesouro naquele dia - não apenas o tesouro das histórias e aventuras,mastambémo tesourodauniãofamiliar e da felicidade compartilhada. E assim, com o coração cheio de alegria e gratidão, eles sabiam que as melhores histórias ainda estavam por vir, esperando para serem descobertas nas águas brilhantes da Lagoa Juparanã.

À medida que navegavam de volta para casa, o céu começou a se tingir de tons dourados e rosados, pintando uma paisagem deslumbrante sobre a lagoa. Maria, Pedro e Seu Antônio se maravilharam com a beleza do entardecer, sentindo-se abençoados por fazerem parte daquela cena espetacular. Enquanto se aproximavam da costa, avistaram uma família de golfinhos

brincando nas águas próximas. Pedro ficou encantado com a visão e clamou para se aproximar. Maria e Seu Antônio, compartilhando do encanto do garoto, direcionaram o barco na direção dos dóceis animais. Os golfinhos pareciam dançar ao redor do barco, saltando graciosamente e emitindo sons alegres. Pedro estendeu a mão para tocar suas nadadeiras, sentindo uma conexão instantânea com esses magníficos seres marinhos. Maria e Seu Antônio observavam com sorrisos radiantes, sentindo uma profunda gratidão por testemunharem a magia da natureza. Enquanto o sol mergulhava no horizonte e a lua começava a surgir no céu, Maria, Pedro e Seu Antônio chegaram em casa, levando consigo as memórias de um dia extraordinário na Lagoa Juparanã. Juntos, compartilharam uma refeição simples, mas repletadeamoregratidão,enquantoreviviamcada momento especial da jornada. Enquanto se aconchegavam sob o cobertor, sentindo o calor do lar e o abraço da família, Maria, Pedro e Seu Antônio adormeceram com sorrisos nos rostos, sabendo que aquele dia ficaria para sempre gravado em seus corações. Pois naquela terra abençoada de Linhares, Espírito Santo, onde a pesca e as histórias se entrelaçam, a verdadeira riqueza reside nos laços de amor, na beleza da natureza e nas memórias compartilhadas com aqueles que mais amamos. E assim, enquanto a noite se desenrolava suavemente ao redor deles, Maria, Pedro e Seu Antônio entregaram-se aos sonhos, ansiosos pelas aventuras que o amanhã traria.

Na manhã seguinte, Maria acordou com o brilho suave do sol filtrando pelas cortinas. Sentiu uma energia renovada pulsando em seu peito, ansiosa pelo que o novo dia traria. Ao lado dela, Pedro e Seu Antônio ainda dormiam tranquilamente, envoltos em sonhos de novas aventuras. Decidida a aproveitar ao máximo o dia, Maria preparou um delicioso café da manhã capixaba, com bolos de milho frescos e café quente. O aroma acolhedor encheu a casa, despertando seus entes queridos para mais um dia de descobertas e alegrias. Após o café da manhã, Maria propôs uma nova atividade:umacaminhadapelasmargensdaLagoa Juparanã, explorando trilhas escondidas e descobrindo os segredos da natureza ao redor. Pedro e Seu Antônio concordaram prontamente, ansiosos por mais uma aventura em família. Com mochilas nas costas e sorrisos nos rostos, partiram em sua jornada pela natureza. O sol brilhava no céu azul, enquanto pássaros cantavam nas árvores e borboletas dançavam entre as flores silvestres. O ar fresco da manhã envolvia-os como um abraço caloroso da mãe natureza. Ao longo do caminho, Maria contava histórias sobre a flora e fauna da região,compartilhandoseuconhecimentoepaixão pela vida selvagem com Pedro e Seu Antônio. Eles admiravam a beleza das borboletas coloridas e escutavam atentamente os cantos dos pássaros, sentindo-se parte integrante do ecossistema vibrante que os cercava. Enquanto exploravam as margens da lagoa, avistaram um grupo de capivaras brincando nas águas rasas. Pedro ficou encantado com os adoráveis roedores, enquanto Seu Antônio explicava como eles faziam parte da

rica biodiversidade da região. Ao longo do dia, caminharam por trilhas sinuosas, atravessaram riachos cristalinos e descobriram vistas deslumbrantes da lagoa e seus arredores. Cada momento era uma oportunidade de se conectar com a natureza e entre si, criando memórias que durariam para sempre. À medida que o sol começava a se pôr no horizonte, Maria, Pedro e Seu Antônio retornaram para casa, cansados, mas felizes. Enquanto compartilhavam o jantar, reviveram as aventuras do dia, rindo das histórias engraçadas e compartilhando a gratidão pelo presentedeestaremjuntos,cercadospelabelezada natureza e pelo amor da família. Enquanto a noite avançava e as estrelas pontilhavam o céu escuro, Maria, Pedro e Seu Antônio se aconchegaram sob o céu estrelado, sentindo-se gratos por cada momento daquela jornada extraordinária. Pois naquelecantoespecialdeLinhares,EspíritoSanto, ondeabelezadanaturezaseentrelaçacomoslaços familiares, a verdadeira felicidade reside na simplicidade dos momentos compartilhados e na gratidão pelo presente da vida. E assim, enquanto o mundo lá fora adormecia sob a luz da lua, Maria, Pedro e Seu Antônio entregaram-se aos sonhos, ansiosos pelas aventuras que o amanhã traria.

Naquela noite, enquanto as estrelas cintilavam no céu e a brisa suave sussurrava através das árvores, Maria, Pedro e Seu Antônio adormeceram, envoltos em um profundo sentimento de paz e contentamento. Em seus sonhos, reviveram as aventuras do dia, sorrisos dançando em seus rostos enquanto lembravam dos momentos de alegria

compartilhados em família. Ao amanhecer, a luz dourada do sol inundou o quarto, despertando Maria, Pedro e Seu Antônio para um novo dia cheio de promessas. Juntos, decidiram que continuariam explorando as maravilhas da Lagoa Juparanã, alimentando sua conexão com a natureza e fortalecendo os laços que os uniam como família. E assim, enquanto o sol ascendia no horizonte e os pássaros entoavam suas canções matinais, Maria, Pedro e Seu Antônio saíram em mais uma jornada de descoberta e aventura. Pois naquelas águas brilhantes, entre as areias douradas e as árvores antigas, encontraram não apenas a beleza da natureza, mas também o verdadeiro tesouro da vida: o amor, a alegria e a união de uma família capixaba, unida pela magia da Lagoa Juparanã.

E assim, enquanto navegavam pelas águas serenas da Lagoa Juparanã, Maria, Pedro e Seu Antônio sabiam que estavam vivendo os melhores dias de suas vidas. Cada momento compartilhado era um presente precioso, uma lembrança eterna gravada em seus corações. Enquanto avançavam em sua jornada, sabiam que, não importasse para onde o destino os levasse, sempre teriam uns aos outros e as memórias preciosas que haviam criado juntos, um legado de amor, alegria e gratidão que perduraria para sempre.

E assim, enquanto o sol se punha no horizonte, a famíliacapixabanavegouemdireçãoaohorizonte, abraçados pelo calor do amor e pela eterna beleza da natureza que os rodeava.

Jeanne Salgado Pipa

Chegou o domingo, o dia mais esperado para levar as crianças para pescarem.

Andamos quilômetros para encontrar o local mais limpo e adequado para a tão sonhada pescaria, saímos do asfalto e entramos na estrada de chão, andamos muito para encontrar um ponto bom.

Quando chegamos os olhinhos deles brilharam e com as garrafas de pets cortadas no gargalho era possível encher com lambaris que estavam na beira do Rio, um cardume imenso que pulava e fazia alegria das crianças, no raso da beira rio ele pegaram os peixinhos.

Um dia lindo ensolarado que seria a primeira de muitas pescarias para a família que unida estavam aguardando o peixe grande morder a isca.

Estávamos no encontro dos Três Rios em Paraíba do Sul.

Um rio enorme, largo com possibilidades de pesca farta e divertida.

No meio do Rio um encontro de pedras largas e uniformes que nós possibilitou de montar nossa barraca, e decidimos por ali ficar, as crianças

adormeceram no conforto do carro, e eu com esposo no silêncio ao som dos ruídos e barulhos da noite que estava clara com a lua cheia.

Ali sobre a pedra decidimos montar um mini churrasqueira que ia assar os peixes que já estavam mordendo a isca, e esperançosos ficamos.

Usamos coração de boi para atrair os peixes, isca de plástico e cupim que pelos pastos íamos quebrando as casas de barro e pegando para atrair os peixes que adora o petisco.

Quando a noite caiu e chegou a madrugada pegamos alguns peixinhos que pra churrasqueira acesa com gasolina, pois havíamosesquecido doálcool,e o meu receio de comer o peixe q sobre carvão com gasolina estava, me contive com medo de uma reação no organismo, meu esposo sem preocupar comeu com gosto o peixinho assado e com entusiasmo do momento tão único para um pescador deslumbrado se enfartar comendo e apreciando toda aquela paisagem.

Sem esperar por qualquer perigo eu estava sentada na pedra segurando minha vara, quando de longe avistei um bicho grande com duas cabeças, comecei a gritar e o marido do outro lado das pedras sem entender me xingava pois estava caçando traíra com a fisga, e dentro de um pequeno bote com outro pescador que por ali estava fazendo a caçada.

Eu gritei e mais eu chorava de medo do bicho que ia me comer viva e os homens não estavam querendo ver o perigo que estava se aproximando.

Quando meu marido viu que eu estava desesperada pensou ser uma cobra e correu para me acudir, e no escuro um bicho preto de duas cabeças chegava perto.

Concluímos que correr e deixar tudo para trás seria o mais certo e assim fomos sem olhar para trás, pulando de uma pedra em outra sem avaliar a distancia que as separava ligados na adrenalina de fugir dali e sem fôlego desesperados alcançamos o carro e entramos com os corações pulando.

Com uma lanterna meu marido clareou o Rio de longe para observar o bicho que subiu nas pedras onde estávamos.

Ufa!!! Escapamos!

Era um casal de lontras. Rsss

No dia seguinte acordamos com sol se pondo e com as crianças famintas, dei o alimento que levei, tody com biscoitos e frutas.

Sem planejar que íamos passar a noite e como marinheiros primeira viagem e prontos para encontrar um restaurante ou quitandas por perto para reforçar não levei alimentos suficientes, mas arriscamos ficar por mais umas horas, estendendo o passeio.

Na beira do Rio eu coloquei um banquinho e sentei para pescar tranquila, de repente senti o puxar na linha da vara eu pesquei e sem força para puxar e sem saber nadar o banco virou e meu esposo foi o herói me agarrou e me puxou com rapidez e êxito, quando eu olhei para vara vi um peixe cobra que

acabou alegria do domingo e juntei tudo para sair dali.

Na volta pensamos em pegar um atalho e com isso andamos por horas sem encontrar civilização e as crianças com fome tudo o que eu tinha era uma lata de milho verde que era para pescar que distraiu as crianças até chegarmos algum lugar para comermos.

O aperto foi muito, mas ao invés de termos traumas e pavor, passamos apreciar a prática da pescaria com mais vontade, e começamos nos organizar melhor a fim de aproveitar cada minuto sem preocupações e medos.

Meu marido era fanático por pescaria e quando casamos, na lua de mel ele me deixou presa no apartamento, pois estava grávida e cheia de enjoos e passou toda lua de mel sobre as pedras na praia pescando e daí ele com chegada dos filhos sempre íamos pescar trazendo contos e histórias hilárias para compartilhar.

Tínhamos em casa uma enorme e funda caixa d’água onde colocamos os bagres africanos que pescamos, e lá viveram por muito tempo para divertir as crianças, eram enormes

Uma certa noite meu esposo saiu para pescar com o amigo, e eu com as crianças ainda pequenas sem poder ir, fiquei em casa inconformada porque eu descobri que tinha na cidade uma festa, liguei as pressas para a esposa do amigo que intrigada deles não contarem sobre a festa, e rapidamente contratei uma babá e fomos atrás, chegando na cidade ficamos nas pontes do Rio Preto em Porto das Flores gritando por eles, o rio escuro não avistamos

nenhum pescador, corremos para a festa e vimos o carro que eles foram, de vigia ficamos toda noite a espera deles, e com receio de estarem nos traindo, a madrugada chegou e um primo do amigo aproximou e falou que eles realmente estavam pescando longe dali e nós duas não tínhamos como ir antes de amanhecer com o único meio de transporte que chegava onde eles estavam que era o caminhão de leite.

E fomos convidadas passar a noite na casa do homem, sem saída aceitamos, e quando chegamos a mulher dele andava segurando a barriga e nos contou ter sido

Esfaqueada pelo marido, desesperadas e sem ter como sair dali resolvemos deitar e no fundo do quarto tinha um chiqueiro, noite toda porco gritava e nós também com medo do tal anfitrião nos atacar, a madrugada foi tenebrosa , amanheceu e nós na boleia seguimos para o sítio afastado onde encontramos nossos maridinhos pescando feito anjos, rsss

Uma certa tarde fomos aoaçude de uma propriedade particular de amigos e aí sem paciência para pescar meu amigo resolveu nadar e deixou a vara armada, de repente a vara começou balançar e meu esposo foi ver e ao puxar sentiu dificuldade achando que o anzol estava preso nas pedras, gritou o amigo que veio recolher a molinete e para surpresa um pacu de 27kg.

Verdade ou mentira?

Verdade!!! E aí o amigo que tinha horror de pescaria e preferiu nadar foi contemplado com o tamanho e peso do peixe Rss

Na outra vez a mulher do amigo querendo boicotar o passeio, e voltar por causa dos inúmeras picadas dos pernilongos começou a empurrar, colocamos então um peixe grande na vara dela sem que ela percebesse e a alegria da surpresa foi o motivo de ficarmos em alto mar em Ilha Bela por cinco dias pescando peixe espada.

Que acabou no lixo depois de limpo porque esquecemos de pôr no freezer, aí sim choramos.

Voltando a mais uma viagem com objetivo de pescar,

Tranquilos no porto de Guarapari, armando os molinete e próximo do mangue estávamos até que avistamos uma jiboia a bicha estava entrando no canal e a pescaria foi adiada, minhas mãos trêmulas e pavor de ver aquela serpente me fez sair dali sem chão.

A pescaria se tornou hábito, lazer, hobby e eu diariamente pescava para dar aos meus gatinhos peixe fresco do açude do meu sítio que adquirimos por amar a vida no campo.

Porém eu não tirava o peixe do anzol e eu tinha várias de bambu, que eu deixava com o peixe no tanque até o marido chegar e tirar para a panela.

Com o tempo perdi o medo e passei usar a luva, para retirar.

Minhoca de isca nem pensar, me deixava aflita e com medo, então eu usava massinha.

A relação minha com os peixes do açude se tornou íntima, e com ração e pães eu tratava na boca de uma carpa vermelha que cresceu demais e mansinha ficava na beira do açude do meu lado, ela parecia um boto rosa e a impressão que eu tinha que ela falava comigo e eu respondia, rss até que uma enchente arrebentou o açude e os peixes foram embora eu fiquei arrasada gritando na beira do correio por ela, eu a chamava por Nena.

Ficaram somente as rãs que meu esposo comia com gosto e eu morria de dó de ver aquele bichinho com um corpinho tão bonitinho nas panelas.

Com passar dos anos eu descobri que meu marido que saia quase todos finais de semana com desculpa para pescar a noite era desculpa para me trair e decepcionada voltei morar na cidade e parei com a vontade de pescar, hoje eu apenas lembro com saudade de momentos felizes.

A pescaria liberta, os momentos na beira da água energizam a alma e ajuda revitalizar e consequentemente cria vida no mundo dos sonhos.

Dentro dos Rios, mares, lagoas, açudes, carregos, temos alevinos, peixes e tubarões,

E os verdadeiros pescadores são de cumbaca que nada pescam, mas as histórias saem sempre da imaginação para o grupo de amigos que confiaram nos heróis dos anzóis que não pegam nada e fazem contos mentirosos e exagerados.

Pescadordeilusões

O frio de junho já dava o ar da graça, os vestuários tão tradicionais daquela época do ano já foram tirados do guarda roupa, higienizados e engomados para aquela grande noite.

Em uma quinzena anterior, todos os dias por volta das quinze horas no pátio da Escola Estadual, os pares eram unidos como andorinhas no verão, a sincronia de passos era nítida, uma vez ou outra errara um passo, ou dois, da “quadrilha junina”.

Relembrando os tempos de infância: em especial as noites de São João, regadas a adivinhações, comidas típicas, namoros às escondidas e pescarias.

Sim, pescarias, não aquelas em rios, ou açudes, mas, aquelas que existiam nas festinhas de escola, onde esperávamos ganhar algum brinde, e ou um beijo de nosso par de quadrilha.

O figurino estava impecável, quantas vezes fora provado, e em frente ao espelho, em sua mente, ilusões, para aquele dia era imaginada, já fazia planos para um namoro futuro, quem iria convidar pro casamento, nome dos dois filhos, e até mesmo, onde ficaria nosso pequeno lar doce lar.

Se dirigira até a barraca da pescaria, com suas mãos trêmulas, e olhares tímidos em direção a dita cuja, que se encontrava comendo uma maça do AMOR, e

nem notara que sua boca estava suja, com a cor da paixão, vestígio de duas ou três mordidas, no fruto da discórdia, onde Eva e Adão se desentenderam.

Depois de duas tentativas, conseguira pescar, e um brinde foi oferecido, e ao abrir o embrulho, de cores mistas, se surpreendera, era um lindo diário com cadeado, logo foi em direção a Clarice, malsabia, que naquelas linhas cinzas, ela iria desenhar um coração troncho, com marcas de batom, e dentro as iniciais: C e F, ou seja, uma das primeiras ilusões da adolescência seria cumprida.

Pescandomemórias

José Leandro de Souza Lima

Feriado sempre é bem esperado por todos, anzóis e iscas separadas, o lanche fora preparado pela esposa na noite anterior, o filho mais velho quase nem dormia de tamanha ansiedade para a primeira pescaria com o pai, essa viagem estava marcada a semanas para o sítio do Tio Cícero, tão cheio de graça e causos, guardados na memória para ser contado e recontado.

As mulheres da casa, iriam passar o dia no Salão de Beleza, ajeitando as unhas e cabelos, e com certeza na volta passaria no Shopping e faria umas comprinhas, não planejadas, estourando o limite do cartão das mesmas, uma vez que além de belas eram independentes financeiramente.

O repelente, de uma marca famosa, fora introduzido na mochila de Caio quase que na marra, pois, marcas não poderiam ficar naquela pele tão alva e sensível, pois já sabia dos problemas anteriores que tivera, quando acampou com os colegas da Escola no verão passado.

Um checklist mental, foi realizado cautelosamente antes de partir, além da verificação de segurança no carro, as garrafas de água potável aos montes, a caixinha de primeiros socorros recém comprada na Black Friday, que o pai rezava para nunca precisar usar.

Ao adentrar no carro, a mão foi logo sintonizando a estação de rádio favorita, por mais que tivesse a opção de conectar a conta do Spotify, preferiu ouvir o Jornal Matinal e suas canções que relembrava as traquinagens de moleque e namoricos de adolescência.

Depois de exatos quarenta minutos, e passar por diversos caminhos de chão batido e curvas sinuosas, onde em cada alpendre uma memória era desbloqueada, vindo a sua mente as faces dos moradores antigos, finalmente, chegara à chácara de Tio Ciço, como seus filhos carinhosamente chamavam.

Ao descer do carro, Caio já foi bombardeado por perguntas diversas: “e as namoradinhas?’, “já pensou em qual curso superior irá fazer? então, uma cara carrancuda e fechada já se pode perceber.

Enquanto, Tio Cicero, mostrava com gosto a reforma do celeiro, e os novos animais adquiridos no último Leilão, pelo jeito, essa estória de pescaria não ia dar em nada, e então foi quando, ouviu:

- Vamos pra pescaria?!!!

Andaram alguns metros e do nada, chego até o lago, e aquela atmosfera fez esquecer até os boletos que tinham para pagar, e a poluição que na cidade tanto adoecia pessoas e animais.

Ao preparar a primeira isca, Caio já machucou o dedo, e seu tio e pai falavam: “Esse menino não tem jeito”!!, porém com o passar das horas, até que a conversa ficou agradável, e nem fome sentiram, o nome dos familiares mais próximos foram

proferidos, e em seguida uma atualização dos últimos acontecimentos: namoros, casamentos, traições, mortes, e com isso, um laço invisível fora criado entre pai e filho, coisa que não se via desde a infância, onde o cantar dos pássaros foram testemunhas deste momento inesperado.

OmistériodoHomem-

PeixenoRioPomba

“Não é possível, nem um peixe, ainda”! Disse Durval ao companheiro Zé Pescador. “Vamos tentar do outro lado, talvez a sorte mude”. Respondeu Zé pescador. Ambos eram pescadores no Rio Pomba, na cidade de Cataguases. Zé pescador e Durval sempre pescavam corvinas, dourados, inclusive o pintado que está em extinção.

Naquela madrugada fria, eles ainda não haviam pegado nenhum peixe, por isso, resolveram lançar a rede do outro lado do rio. Mal arremessaram e escutaram uma gargalhada horripilante. Durval e Zé Pescador ficaram aturdidos, entretanto, perseveraram na pescaria. Minutos depois ouviram outra carcalhada, porém, agora, mais intensa. Perturbado, Zé Pescador apanhou um facão que estava no fundo do barco, enquanto Durval direcionou a luz da lanterna à margem do rio. Mas enquanto estavam em pé no barco, concentrados, uma mão agarrou o tornozelo de Durval que sobressaltado esbravejou: “São Jerônimo, o que é isso?”. Durval olhou para trás e se deparou com uma criatura sobrenatural de aparência monstruosa. Zé Pescador não hesitou: “É o homem–peixe!”. A criatura possuía aparência de homem, com barbatanas e escamas pelo corpo e mãos. Na cabeça e nas costas

possuía uma nadadeira dorsal. O espavento foi tão exorbitante que Durval caiu n`água virando o barco. Zé Pescador foi parar debaixo da canoa. Durval ao ver aquele terrível monstro ficou estático por um instante, mas conseguiu sair do rio. Zé Pescador, não teve a mesma sorte. Ao encarar aquela criatura horrenda, desmaiou e afundou-se.

A polícia e o corpo de bombeiros chegaram antes das 5h da manhã. Eles fizeram as buscas durante todo o dia, mas não encontraram Zé Pescador. O Jovem pescador fora levado para o fundo do rio pelo Homem-Peixe. A criatura morava numa gruta na entranha do arroio. A caverna subterrânea possuía sua entrada atrás de uma rocha colossal. No vestíbulo da caverna havia dois homens-peixes com lanças na mão que permitiram a passagem daquela criatura forte com o Zé Pescador em seus braços, desacordado. Eles não se falaram, apenas emitiram um som como grunhir de animais selvagens.

Quando Zé Pescador acordou, ele quase enfartou ao ver centenas de criaturas estranhas. Um deles, que parecia ser o líder, estava sentado numa pedra dourada em formato de um trono ao lado uma encantadora sereia, que parecia ser sua esposa. Zé conjecturava estar sonhando. Então observou que as paredes eram douradas. O líder gesticulou e grunhiu apontando uma direção. Um dos homens-peixes, com uma lança em uma das mãos conduziu o pescador por uma passagem estreita.

Zé Pescador foi conduzido a uma cela. A criatura abriu a grade e jogou o homem lá dentro, trancandoa novamente. No interior, havia vários pescadores como o Zé, inclusive um amigo de infância, o João

Perneta. “Nossa, o Zé também foi capturado!” Bradou

João Perneta. “Sim, fui capturado quando pescava com o Durval!”. Respondeu Zé Pescador. “O que vocês estão fazendo aqui?”. “Que lugar é este”? Continuou Zé Pescador olhando para todos. “Após sermos capturados, trouxeram-nos para cá para nos tornar escravos. Quebramos pedras em busca de ouro. Depois o derretemos numa fornalha. Aqui neste subsolo há toneladas de ouro”. Comentou Onofre. “E o que eles fazem com tanto ouro”? Perguntou novamente Zé pescador. Não sabemos. Mas o João Perneta desconfia que eles negociam com homens poderosos lá em cima, pois certa vez quando estava sentado atrás de uma enorme pedra, enquanto almoçava, escutou um desses homens esquisitos conversando em língua portuguesa através de aparelho estranho... Completou Onofre. “Sério, isto? E sobre o que conversavam”? Indagou Zé Pescador. “Pode deixar que eu explico”. Disse João Perneta. “Eu escutei ele dizendo que estavam prontas umas mercadorias para subir para os homens de língua no umbigo”. “Homens de língua no umbigo”? “O que deve ser isto”? Indagou Zé. “Não sabemos, mas provavelmente deve ser alguém que usa gravatas”. Concluiu Onofre.

“Aqui há também muitas sereias prisioneiras na cela ao lado”. Comentou Onofre. “Não tem como sair daqui?” Questionou Zé Pescador. “Não, é praticamente impossível. E quando alguém tenta fugir, eles açoitam até matar!”. Respondeu João Perneta. “E o que vocês comem aqui?”. Indagou Zé Pescador? “Peixes. Três vezes ao dia, e mais nada”. Replicou Onofre.

Ao amanhecer, Zé pescador foi levado para o trabalho braçal junto comos demais prisioneiros.Ao passar em frente à cela das sereias, ele avistou uma próxima a grade com calda de peixe de cor esmeraldina. Ela era encantadora. Todas eram

lindas, entretanto, aquela era pulquérrima. Zé sentiu uma atração sobrenatural. E o mais impressionante era que a sereia parecia sentir o mesmo. Ambos se olharam até Zé Pescador fazer a curva e entrar na sala onde teria que quebrar pedras em busca de ouro. A cena virou rotina para ambos. Todas as vezes que Zé Pescador passava pelo corredor da caverna, deparava-se com a exuberante sereia. Os olhos de ambos ao fitar-se luziam-se descomedidamente. Parecia um sentimento platônico.

Certa manhã, enquanto Zé e seus companheiros quebravam pedras sob o olhar de homens-peixes, a sereia jururu e agora enamorada, começara a cantar. Quanto mais a tristeza governava seu coração, mais ela aumentava a intensidade. Repentinamente começou a cantar com tanto vigor que o teto da gruta começou a despencar sem que ela percebesse. As colegas de cela ao ver o teto desabando principiaram a cantar também de forma aguda e intensa. Neste instante, a cela se rompeu. Apavorados, os homens-peixes correram para se salvarem. Os prisioneiros aproveitaram a circunstância para fugir. Pedaços de rochas douradas caíam sobre as criaturas que desabavam no chão desacordados. Zé Pescador e seus companheiros desvaneceram-se da gruta. Nadaram até a superfície. Exauridos, eles sentaram num banco de areia debaixo de uma árvore para respirarem.

Enquanto tomavam fôlego, Zé Pescador observou que a sereia estavasentada numa pedra do outro lado do rio, e ao ver Zé, iniciou-se uma linda canção. “Tape os ouvidos, rápido, Zé, ela vai te enfeitiçar e te levar para o fundo do rio!”. Disse Onofre. Mas Zé ignorou, e ficou compenetrado na melodia. Minutos depois, a

belíssima sereiaenamorada acenou para Zé Pescador despedindo-se dele, e mergulhou-se nas águas doces do Rio Pomba.

Oriodasconexões:causoe liçõesdaprofessora pescadora

Katia Aparecida Chagas

Numa pequena cidade à beira do rio, havia uma professora muito queridapelos alunos. Seu nomeera

Dona Clara. Ela não era apenas uma mestra na sala de aula, mas também uma contadora de causos e aventuras. Dona Clara adorava pescar nas horas vagas. Seu amor pela pesca era tão grande quanto sua paixão por ensinar. Quando não estava com a caneta e o caderno na mão, estava com o anzol e a linha, pronta para mais uma jornada nas águas tranquilas do rio. Com sua mochila repleta de histórias e sua varinha de pescar, Dona Clara embarcava em seu barco em busca de novas experiências. Levava consigo também um estojo com iscas coloridas e uma lanterna para as noites de pescaria. Certa vez, enquanto pescava, DonaClara começou a contar aos alunos reunidos ao redor da fogueira uma história sobre uma pescaria inesquecível que teve. Ela descrevia cada detalhe com tanto entusiasmo que todos ficavam hipnotizados. Ao longo da narrativa, os alunos se imaginavam na embarcação, sentindo a brisa suave do rio e ouvindo o som das águas batendo no casco do barco. Dona Clara sabia como prender a atenção de todos com seus relatos

emocionantes. Enquanto pescava, Dona Clara também ensinava lições valiosas sobre paciência, perseverança e gratidão. Ela compartilhava sua sabedoria com os alunos, mostrando que a vida é cheia de desafios, mas também repleta de momentos de felicidade e gratificação. No final da pescaria, todos se reuniam ao redor da fogueira para saborear um delicioso churrasco de peixe. Era um momento de celebração, onde as histórias se misturavam com o aroma da comida e a alegria da amizade. Assim, entre cadernos e redinhas, Dona Clara seguia sua jornada, deixando um legado de sabedoria, diversão e união por onde passava. Ela era muito mais do que uma professora ou pescadora. Era uma verdadeira inspiração para todos ao seu redor. E assim, com um sorriso no rosto e o coração cheio de boas lembranças, Dona Clara continuava sua pescaria, sempre pronta para mais uma aventura nas águas do rio, compartilhando suas histórias e ensinamentos com aqueles que cruzavam seu caminho.

Em uma tarde ensolarada, enquanto preparava sua linha de pesca, DonaClaracomeçoua contar um dos seus causos favoritos aos alunos que a acompanhavam:

"Havia uma vez um pescador chamado João, que estava determinado a capturar o peixe mais lendário do rio. Ele ouvira muitas histórias sobre esse peixe misterioso, mas ninguém jamais conseguira vê-lo de perto. Determinado a desvendar esse mistério, João partiu em sua jangada, munido apenas de sua varinha de pescar e uma dose extra de coragem."

"Durante dias, João remou rio acima, explorando cada canto e recanto das águas. Ele enfrentou desafios, como fortes correntezas e tempestades repentinas, mas sua determinação não vacilou. Finalmente, numa noite de lua cheia, João avistou uma sombra gigantesca nadando sob a superfície do rio."

Os olhos dos alunos brilhavam enquanto Dona Clara continuava a narrativa, envolvendo-os completamente na aventura de João em busca do peixe lendário. Cada detalhe era contado com tanto entusiasmo que parecia que estavam vivendo a história junto com o protagonista.

"E quando todos pensavam que João estava prestes a desistir, ele lançou sua linha de pesca com toda a determinação que tinha. E para sua surpresa, o peixe lendário mordeu a isca! Foi uma batalha épica, mas no final, João emergiu vitorioso, segurando o peixe mais impressionante que já vira."

Os alunos aplaudiram entusiasmados, completamente imersos na história. Dona Clara sorriu, satisfeita por ter conseguido capturar a imaginação deles mais uma vez. Enquanto o sol se punha no horizonte e o aroma do churrasco de peixe começava a se espalhar pelo acampamento, Dona Clara percebeu que aquelas eram as melhores lembranças que poderia desejar: momentos compartilhados com seus alunos, envoltos em histórias e aventuras que jamais seriam esquecidas. E assim, entre risadas e conversas animadas, a noite se transformou em mais uma página da história da professora pescadora.

Dona Clara reuniu os alunos ao redor da fogueira, o crepitar das chamas trazendo uma sensação acolhedora ao ambiente. Ela começou:

"Esta é a história de uma pescaria como nenhuma outra. Era uma manhã tranquila, o sol mal despontava no horizonte, pintando o céu com tons de laranja e rosa. Eu estava navegando rio abaixo, desfrutando da serenidade da natureza ao meu redor."

"De repente, avistei algo incomum nas águas calmas do rio: uma movimentação estranha, como se algo grande estivesse se aproximando. Intrigada, me aproximei cautelosamente, e então vi: um cardume de peixes dourados reluzindo sob os primeiros raios de sol!"

"Eu mal podia acreditar na minha sorte. Com os olhos brilhando de empolgação, preparei minha linha de pesca e lancei o anzol com habilidade. Em questão de segundos, senti a força de um peixe mordendo a isca, dando início a uma batalha épica entre pescadora e presa."

"Por horas, lutamos, eu e o peixe dourado, cada um determinado a sair vitorioso. As águas do rio testemunharam nosso embate, enquanto o sol subia alto no céu. E finalmente, com um último esforço, consegui trazer o magnífico peixe para o barco."

"Mas o mais surpreendente ainda estava por vir. Ao examinar mais de perto minha captura, descobri algo incrível: uma mensagem enigmática presa em uma bolsa presa ao peixe. Era como se o próprio rio

estivesse me presenteando com um mistério para desvendar."

Os alunos ouviam atentamente, envolvidos na narrativa de Dona Clara. Ela continuou:

"Decidi levar a mensagem de volta à cidade e descobri que ela indicava o paradeiro de um tesouro perdido há décadas nas profundezas do rio. Aquela simples pescaria se transformou em uma aventura cheia de emoção e mistério, mostrando que, às vezes, os maiores tesouros estão onde menos esperamos."

Ao término da história, os alunos aplaudiram, admirados pela habilidade de Dona Clara em transformar suas pescarias em narrativas emocionantes. Enquanto o aroma do churrasco de peixe pairava no ar, eles sabiam que aquela noite ao redor da fogueira seria mais uma lembrança para guardar com carinho, graças aos causos da professora pescadora.

Numa manhã ensolarada, Dona Clara decidiu levar seus alunos para uma pescaria especial. Todos estavam animados com a ideia de passar o dia ao ar livre, aprendendo com a natureza e ouvindo os causos da sua professora. Enquanto navegavam pelo rio, Dona Clara começou a contar uma história sobre uma pescaria incomum que tivera tempos atrás.

"Numa tarde como essa, eu estava aqui mesmo, no rio, com meu barco e minha varinha de pescar. Decidi explorar um braço do rio que raramente

visitava. Estava tranquilo, aproveitando o silêncio e a beleza ao meu redor, quando de repente senti algo puxando minha linha com força."

Os alunos se inclinaram para frente, ansiosos para ouvir o desenrolar da história.

"Eu puxei com toda minha força, e para minha surpresa, o que surgiu da água não foi um peixe, mas uma antiga caixa de equipamentos de pesca. Dentro dela, encontrei relíquias de tempos passados, como anzóis de prata e iscas artesanais. Era como se o rio estivesse me presenteando com uma parte da sua história."

"Enquanto examinava os tesouros encontrados, me dei conta de algo ainda mais especial: um velho livro empoeirado, cheio de contos e fábulas sobre as aventuras dos pescadores que vieram antes de mim. Aquelas páginas guardavam segredos e ensinamentos que transcenderam o tempo."

Os alunos ouviam atentamente, fascinados pela história. Dona Clara continuou:

"Naquele dia, aprendi que a pescaria não se trata apenas de capturar peixes, mas também de mergulhar nas histórias e memórias que o rio tem para oferecer. Cada anzol, cada isca, carrega consigo uma parte da nossa jornada, uma parte da nossa conexão com a natureza."

Ao terminar sua narrativa, Dona Clara olhou para seus alunos, vendo o brilho de admiração em seus olhos. Sabia que aquele dia na água não seria apenas

uma simples pescaria, mas uma experiência que eles levariam consigo para sempre, enriquecida pelos causos da professora pescadora. Em uma tarde tranquila à beira do rio, Dona Clara reuniu seus alunos para uma pescaria educativa. Enquanto lançavam suas linhas na água, ela começou a contar uma história emocionante sobre uma de suas aventuras mais memoráveis.

“Certa vez, durante uma pescaria solitária, encontrei algo inesperado preso na minha linha de pesca. Era um pequeno livro antigo, quase perdido nas profundezas do rio. Curiosa, decidi abri-lo e descobri que estava cheio de histórias e contos de pescadores do passado.”

Os alunos ouviam atentamente enquanto Dona Clara continuava sua narrativa, mergulhando-os na magia das palavras.

“Enquanto folheava as páginas amareladas, fui transportada para um mundo de aventuras e descobertas. Cada conto revelava os desafios e triunfos dos pescadores que vieram antes de mim, ensinando lições valiosas sobre paciência, perseverança e gratidão.”

“À medida que o sol se punha no horizonte, percebi que aquelas histórias não eram apenas palavras no papel, mas uma parte viva da minha jornada como pescadora. Elas me lembraram da importância de honrar a tradição e respeitar o rio que tanto nos dá.”

Os alunos aplaudiram, inspirados pela história da professora pescadora. Enquanto compartilhavam

risos e histórias ao redor da fogueira, sabiam que aquele dia na água seria lembrado como muito mais do que uma simples pescaria - seria lembrado como uma lição de vida, ensinada pelas histórias e experiências de sua adorada professora. Enquanto Dona Clara preparava seus equipamentos de pesca, seus alunos se reuniam ao seu redor, ansiosos para ouvir mais um de seus emocionantes causos.

"Desta vez, vou contar sobre uma pescaria que se transformou em uma incrível aventura de resgate", começou Dona Clara, capturando a atenção de todos.

Ela continuou: "Estava eu navegando tranquilamente pelo rio quando avistei algo flutuando na água. Aomeaproximar, percebi que era um balde com uma rede presa nele. Curiosa para ver o que havia dentro, peguei-o e comecei a içar a rede. Para minha surpresa, havia um peixe preso nela, mas não era um peixe comum. Era um peixe tão grande e majestoso que parecia ter saído de uma fábula!"

Os olhos dos alunos se arregalaram de espanto e admiração enquanto Dona Clara prosseguia com sua narrativa.

"Decidi libertar o peixe, mas, ao tentar fazê-lo, percebi que ele estava ferido. Sem hesitar, peguei minha lanterna e meu estojo de primeiros socorros, e comecei a cuidar do peixe da melhor maneira que pude. Passamos a noite juntos, o peixe e eu, compartilhando histórias e experiências."

"No dia seguinte, o peixe estava pronto para voltar ao rio. Com lágrimas nos olhos, vi-o nadar de volta para as profundezas, grato pela ajuda que lhe fora prestada. Aquela pescaria não foi apenas sobre pegar peixes, mas sobre compaixão, cuidado e conexão com a natureza."

Ao terminar sua história, Dona Clara olhou para seus alunos, vendo neles não apenas rostos curiosos, mas mentes inspiradas e corações tocados. Eles sabiam que, embora aquela pescaria pudesse ter sido uma aventura única, as lições que aprenderam com ela durariam para sempre. Enquanto a noite caía sobre o rio, um som distante chamou a atenção de Dona Clara e seus alunos. Um barco se aproximava rapidamente, com uma luz fraca brilhando em meio à escuridão. Preocupada, Dona Clara acendeu sua lanterna e sinalizou para o barco, que logo atracou ao lado deles. Do barco emergiu um pescador desconhecido, chamado Miguel, com um semblante preocupado. Ele explicou que estava procurando por seu filho, que havia se perdido nas águas turbulentas do rio duranteuma pescaria. Dona Clara, sem hesitar, ofereceu sua ajuda. Com a ajuda de seus alunos, eles embarcaram no barco de Miguel e começaram a vasculhar o rio em busca do garoto desaparecido. Depois de horas de busca angustiante, avistaram uma figura solitária na margem do rio. Era o filho de Miguel, encharcado e exausto, mas seguro. Ele havia se perdido durante a pescaria e vagado rio abaixo até encontrar terra firme. Com lágrimas nos olhos, Miguel agradeceu a Dona Clara e seus alunos por sua ajuda. Eles o levaram de volta ao barco, onde foram recebidos com alívio e gratidão por parte da família do menino. Ao retornar à margem, Miguel

convidou Dona Clara e seus alunos para uma refeição em sua casa, como forma de agradecimento pelo resgate. Enquanto compartilhavam histórias ao redor da mesa, Dona Clara percebeu que aquela pescaria havia sido muito mais do que uma simples aventura - fora um testemunho da força da comunidade e da importância de estender a mão ao próximo. E assim, enquanto o rio continuava a fluir serenamente ao redor deles, Dona Clara e seus alunos aprenderam uma valiosa lição sobre empatia, solidariedade e compaixão. Eles sabiam que, embora o rio pudesse ser imprevisível e desafiador, também poderia unir pessoas de diferentes origens em um espírito de camaradagem e cuidado mútuo. E assim, entre risos e lágrimas de gratidão, terminou mais uma jornada emocionante na vida da professora pescadora.

À luz do fogo crepitante, sob o brilho das estrelas, Dona Clara e seus alunos trocaram sorrisos de gratidão e vínculos de amizade. Naquela noite, eles não apenas compartilharam histórias de pescaria, mas também testemunharam a beleza da compaixão e da união em tempos de adversidade. Enquanto se despediam de Miguel e sua família, Dona Clara sentiu-se renovada em sua missão de ensinar e inspirar, sabendo que o verdadeiro tesouro da vida está nas conexões que fazemos e nos momentos que compartilhamos. E assim, com o coração cheio de gratidão e esperança, eles partiram, prontos para novas aventuras que o rio e a vida ainda tinham a oferecer.

Sob o manto da noite estrelada, eles navegaram rio abaixo, sabendo que, juntos, poderiam enfrentar qualquer desafio que a vida lhes reservasse.

Maréalta:causos,aventuras elaçosdeamizade

Katia Aparecida Chagas

Em um mundo onde a pesca era reconhecida como um esporte olímpico, a expectativa era alta para o grande evento. Pescadores e pescadoras de todas as partes do globo se reuniram na pequena cidade costeira de Aquamarina, onde o clima estava perfeito para a competição. O evento prometia ser um espetáculo de tradição, elegância e graça, reunindo os melhores contadores de causos, mestres da fisga e da linha. No dia da largada, o sol brilhava intensamente, refletindo seusraiosnaáguacristalinadomar profundo.As ondas dançavam suavemente, oferecendo um cenário ideal para os competidores. Entre eles, estava João, um humilde pescador da vila de Maré Alta, conhecido pelosseuscausosepelasuahabilidadeemfisgarpeixes grandes. Sua missão: trazer o ouro para casa. O cronômetro foi acionado, e os pescadores partiram em busca do peixe perfeito. João sabia que cada segundo contava. Com movimentos precisos e uma concentração profunda, ele lançou sua linha ao mar, esperando que a sorte estivesse a seu favor. Os sinais de peixes abaixo da superfície indicavam que a competição seria acirrada. Conforme o dia avançava, o clima começou a mudar. Nuvens escuras se aproximaram, e uma tempestade começou a se formar no horizonte. O impacto do clima extremo testava a resistência e a habilidade dos pescadores. Para muitos, a pesca se tornou uma luta contra o tempo e os elementos. A busca pelo ouro agora era também uma

provadesobrevivência.Joãomanteve-se firme.Apesar do dilúvio iminente, ele sentia que estava perto de fisgar um prêmio. De repente, sentiu um puxão forte na linha.Eraumpeixeenorme,talvezomaiorquejáhavia encontrado. A batalha foi intensa, mas, com determinação e técnica, João conseguiu trazer o peixe à tona. Seu coração batia acelerado enquanto ele segurava sua captura, imaginando o impacto que teria na competição. No fim do dia, os pescadores retornaram à base. A chegada foi triunfante para muitos, mas a dúvida sobre o vencedor pairava no ar. Após a pesagem e avaliação, João soube que seu esforço havia valido a pena. Ele tinha fisgado o maior peixe do evento, garantindo-lhe a medalha de ouro. O sabor da vitória era inigualável. No dia seguinte, os jornaislocaiseinternacionais narravam ahistóriaépica da competição, destacando João e sua incrível captura. Ele se tornara uma fonte de inspiração para pescadores ao redor do mundo, e seu nome entrou para a história dos eventos olímpicos. A cerimônia de premiação foi emocionante. João recebeu sua medalha de ouro com orgulho, enquanto os medalhistas de prata e bronze o aplaudiam com respeito. Aquela competição, marcada pelo clima extremo e pela extrema habilidade dos competidores, seria lembrada por muitos anos. Depois de tudo, João voltou para sua vila, onde foi recebido como um herói. Ele sabia que, independentemente de futuros eventos, aquela vitória seria eternamente celebrada. E assim, na pequena vila de Maré Alta, os pescadores continuaram a contar os causos daquele dia inesquecível, perpetuando a tradição com sabor e alegria.

À medida que os dias passavam, João se tornava ainda mais lendário entre os pescadores locais. Reunidos ao redor das fogueiras à noite, eles compartilhavam novos causos, inspirados pela grande vitória de João nas

Olimpíadas da Pesca. Em uma dessas noites, João decidiu contar sobre a vez em que enfrentou uma tempestade ainda mais extrema do que aquela da competição olímpica. Ele descreveu como as ondas gigantes quase o engoliram, mas sua determinação o manteve firme, lutando contra os elementos até conseguir voltar para casa são e salvo, com uma pesca abundante como recompensa. Outro pescador, chamado Carlos, compartilhou seu próprio causo, repleto de suspense e emoção. Ele contou sobre uma vez em que ficou preso em uma rede de corais profundos, lutando para se libertar enquanto tubarões circulavam ao seu redor. Seu relato deixou todos boquiabertos,imaginandooperigoiminentequeCarlos enfrentara. Mas não eram apenas os causos de perigo e aventura que enchiam as noites na vila de Maré Alta. Também havia espaço para histórias engraçadas e momentos de camaradagem. Joana, uma das pescadoras mais habilidosas da região, compartilhou um causo sobre a vez em que fisgou um peixe tão grande que o arrastou para o mar, deixando-a pendurada na linha como uma pipa desgovernada. As gargalhadas ecoaram pela praia enquanto todos imaginavam a cena hilária. E assim, a tradição de contar causos entre os pescadores continuou alimentando a alma da pequena vila costeira. Cada história trazia consigo um pouco do sabor do mar, da emoção da pesca e da graça da vida simples junto ao oceano. E João, o herói olímpico, continuava a inspirar não apenas com suas conquistas, mas também com sua humildade e generosidade ao compartilhar suas experiências com os amigos e vizinhos.

Uma noite, enquanto as estrelas pontilhavam o céu e o som das ondas quebrando na costa ecoava ao longe, os pescadores se reuniram em torno da fogueira para mais uma rodada de causos. Dessa vez, era a vez de Miguel,

um pescador veteranocom anos de experiência nomar, compartilhar suas aventuras. Com um brilho nos olhos, Miguel começou a contar sobre a vez em que se viu frente a frente com uma criatura misteriosa das profundezas. Ele descreveu como, em uma manhã nebulosa, enquanto lançava suas redes em águas desconhecidas, avistou algo se movendo sob as ondas. Era como se uma sombra gigantesca se aproximasse lentamente de seu barco, deixando-o em estado de pura admiração e um leve temor. Com uma eloquência habilidosa, Miguel descreveu a criatura como uma mistura entre um peixe e uma lenda marinha, com escamas brilhantes reluzindo à luz do sol e olhos profundosquepareciamcontersegredosancestrais.Ele contou como, por um instante, se sentiu como um explorador destemido desbravando territórios desconhecidos, e como aquela experiência o fez perceber a verdadeira essência da vida no mar. Os outros pescadores ouviam em silêncio, hipnotizados pela história de Miguel. Alguns balançavam a cabeça em admiração, enquanto outros trocavam olhares de incredulidade. Mas todos concordavam que, independentemente de ser verdade ou apenas uma fantasia tecida pela mente criativa de Miguel, a história capturava a essência da vida dos pescadores: a constante busca por aventura, a conexão com o mar e a eterna admiração pelas maravilhas da natureza. E assim, a noite passou entre risadas, suspiros e murmúrios de aprovação. Os pescadores sabiam que, enquantotivessemhistóriasparacompartilhareamigos para ouvir, a vida na pequena vila de Maré Alta seria sempre repleta de emoção, camaradagem e, é claro, muitos causos para contar.

À medida que as noites se sucediam, os pescadores de Maré Alta continuavam a compartilhar suas experiências e causos à beira-mar. Desta vez, foi a vez

de Rosa, uma pescadora conhecida por sua destreza e coragem, tomar a palavra. Com um sorriso travesso, Rosa começou a contar sobre a vez em que desafiou uma tempestade para resgatar um grupo de golfinhos encalhados em uma praia distante. Ela descreveu como as ondas furiosas batiam contra o barco, ameaçando virá-lo a qualquer momento, enquanto ela e sua tripulaçãolutavamcontraoventoeachuvaparachegar ao local do incidente. Com determinação e habilidade, Rosa guiou o barco através da fúria do mar, navegando por entre as ondas como uma verdadeira capitã. Quando finalmente alcançaram a praia, ela e os outros pescadores correram para a água, enfrentando as correntezas e os destroços que obstruíam o caminho, até alcançarem os golfinhos em apuros. Com um misto de técnica e compaixão, Rosa e sua equipe conseguiram resgatar os golfinhos, devolvendo-os ao mar onde pertenciam. A sensação de dever cumprido e a gratidão dos animais foram recompensas suficientes para todos os envolvidos na operação de resgate. Enquanto Rosa terminava sua história, os outros pescadores olhavamparaela com admiraçãoerespeito. Sua coragem e compaixão haviam sido postas à prova naquela noite tempestuosa, e ela havia emergido como uma verdadeira heroína do mar. Após um momento de silêncio reverente, os pescadores começaram a compartilhar suas próprias histórias de bravura e camaradagem, criando uma atmosfera de solidariedade e amizade à luz das estrelas. E assim, a tradição de contar causos na vila de Maré Alta continuou alimentando o espírito de comunidade e aventura dos habitantes daquela pequena comunidade à beira-mar.

Enquantoanoiteavançava,maiscausosfluíamentreos pescadores, tecendo uma teia de aventuras, amizades e memórias à beira-mar. Marcos, um pescador jovem e vibrante, compartilhou sua própria história, repleta de

suspense e emoção. Ele relatou sobre a vez em que enfrentouumatempestaderepentinaduranteumapesca solitária no alto mar. As ondas pareciam gigantes furiosos, prontos para engolir seu pequeno barco a qualquer momento. Mas em meio ao caos, Marcos manteve a calma e a determinação, lembrando-se das liçõesaprendidascomosmaisexperientesdavila.Com habilidade e coragem, ele navegou pelas águas tumultuadas, confiando em sua intuição e conhecimento do mar. E, no momento mais crítico, quando tudo parecia perdido, ele avistou uma luz distante, uma bússola de esperança em meio à escuridãodatempestade.Seguindo-a,eleencontrouum abrigo seguro em uma enseada escondida, onde esperou pacientemente até que o temporal passasse. Sua história ecoou entre os pescadores, cada um encontrando inspiração na coragem e na determinação de Marcos em face da adversidade. E assim, sob o brilho das estrelas e o som das ondas, a noite se transformou em uma celebração da vida no mar, onde cada causo contado era uma homenagem à força e à beleza dos oceanos. Enquanto a fogueira diminuía lentamente e os pescadores se preparavam para voltar para suas casas, eles sabiam que aquela noite permaneceriavivaem suasmemórias por muitotempo.

Pois ali, naquela pequena vila à beira-mar, a tradição de contar causos eramais do queumasimples formade passar o tempo - era uma maneira de honrar o passado, celebrar o presente e inspirar o futuro. E assim, sob o brilho das estrelas cintilantes, os pescadores de Maré Alta se despediram, ansiosos pelo próximo encontroao redor da fogueira, onde novos causos seriam tecidos e a magia do mar continuariaa alimentar suas almas para sempre.

Na manhã seguinte, enquanto o sol despontava no horizonte e pintava o céu com tons dourados, os

pescadores deMaré Alta partiram para omar mais uma vez, alimentados pela camaradagem, pelas histórias compartilhadas e pela eterna busca por novas aventuras. Sabiam que, independentemente dos desafios que o oceano lhes reservasse, estavam unidos pela paixão pela pesca, pela tradição de contar causos e pela profunda conexão com a vida no mar. E assim, com os remos na mão e os corações cheios de esperança,navegaramemdireçãoaohorizonte,prontos para mais um dia de descobertas e desafios, onde cada onda era uma oportunidade e cada peixe fisgado era uma vitória celebrada.

Enquanto cortavam as águas azuis, sabiam que, juntos, formavam uma comunidade unida pelo amor ao mar e à vida, pronta para enfrentar qualquer desafio que o oceano lhes reservasse.

Marcelo Pires

Opeixe

Chupa-Cabras

Em uma noite quente e estrelada de verão, à beira do rio mocho, algo acabou de dar errado, uma cadeira estava vazia próxima ao rio, juntamente com as botas do pescador, e sua cacimba de beber água, mas o lampião não ficou para trás. Nas águas escuras do rio mocho, Jão, o maior pescador de todos os tempos passou por dificuldades que, nenhum homem bom de pesca deveria passar, mas ele não arregou e enfrentou seus desafios, e para atingi-los pulou sem pensar nas águas turvas, e para melhor enxergar, levou consigo seu lampião, e após ter mergulhado, somente era possível ver o rastro de luz do lampião, em baixo das águas, para lá e para cá, as vezes em alta velocidade. Jão já estava mergulhado fazia 02 horas, atrás do peixe de olhos vermelhos, que havia tirado sua paciência.

No começo daquele dia, Jão havia encontrado seu melhor amigo Zé Brejeiro, que havia dito para ele não ir ao rio mocho, pois uma fera estava nadando por lá, o maior peixe jamais visto. Zé brejeiro estava chorando, com as calças rasgadas na altura dos joelhos, com sua vara de pescar quebrada e arrastando a coleira de seu cachorro caramelo, desesperado não avisou somente à Jão e sim à todos do vilarejo de Borbajão, pois havia sido atacado pelo

peixe gigante e raivoso, ao qual apelidou de peixe

Chupa-Cabras. Zé Brejeiro era um dos melhores pescadores da região de Borbajão, tendo em seu currículo a pesca de um lambari de um metro e meio de tamanho, que havia pescado usando como isca seu vira-lata caramelo, que era seu parceiro de pescaria, pois tinham uma estratégia invencível. Em suas pescarias, o plano utilizado por Zé Brejeiro consistia em instigar o Caramelo à pular no rio, enquanto jogava seu anzol com a isca nas águas, o Caramelo bocava a linha eesperava o passeio radical, quando a pesca era boa, o peixe grande fisgava o anzol, e o Caramelo não perdia tempo, montava nas barbatanas do peixão e mordia, para se firmar, e cavalgava até o grandão cansar, e foi assim que juntos pegaram o lambarizão de um metro e meio.

Mas naquele dia fatídico, no rio mocho, Zé Brejeiro conheceu a dor da perda de seu melhor amigo, o Caramelo, pescador de lambarizão. De manhã, acordaram cedo, o Caramelo fez sua última refeição, comeu o ovo da galinha furtado quando passeava no terreiro, e já levou o primeiro golpe do dia, uma esporada violenta da mãe traída do ovo, gritando “cocóricó”. Zé brejeiro preparou seu borná de pesca, colocou algumas iscas de pão duro, e uma garrafinha de cachaça para calibrar a mão na pesca, então montaram na bicicleta sem freio, e partiram em velocidade louca e descontrolada, em direção ao rio mocho, para garantirem o almoço com a pesca. No caminho, Caramelo sofreu mais um incidente, na curva do boi morto, Zé Brejeiro passou muito rápido, e se desequilibrou, antes de cair da garupa da bicicleta, Caramelo arregalou os olhos, e deu dois latidos, enquantos fazia piruetas no ar, até cair em

cima do seu inimigo principal, o gato rajado da Maria futriqueira.

Os dois se levantaram muito envergonhados, e perceberam que o gato rajado estava desacordado, e Caramelo quis se aproveitar da situação, mordendo o rabo do gato, mas Zé brejeiro cheio de conceitos não deixou, abriu asuagarrafa de pinguinha e passou o líquido que passarinho não bebe, próximo às narinas do rajado, e não é à toa que dizem que a pinga desperta até defunto, o gato acordou vesgo, e saiu correndo, mas antes deu uma arranhada no focinho do caramelo. Montaram na bicicleta novamente e desceram sem freio, chegando na ribanceira do rio, Zé brejeiro percebeu que algo estava errado com suas botas, elas haviam perdido as solas utilizadas para frear a bicicleta, Zé não titubeou, pediu para o Caramelo pular antes que ele caísse no rio, mas Caramelo ficou estático, com os olhos estalados de medo, não abandonou a bicicleta, e olhou para trás vendo o Zé com a boca cheia de terra acenando para ele saltar, mas já era tarde demais, a bicicleta decolou na ribanceira, e mergulhou no rio, com o caramelo de passageiro, afundando nas águas do rio, e ressurgiu triunfante, na margem, se chacoalhando para secar seus pelos, se aprontando para a pescaria.

Zé Brejeiro, como todo dia fazia, estendeu sua vara, e jogou sua isca no rio, o pão velho, e fez sinal para o Caramelo pular na água e ficar pertinho do anzol e da isca, e depois de alguns minutos a água começou a se mexer, mas havia algo estranho, o Caramelo sentiu algo errado, pois aquele dia ele já não estava com sorte, havia apanhado da Galinha, caído da bicicleta na curva, levou um arranhão do gato,

perdeu o freio da bicicleta e mergulhou violentamente no rio, e agora, parecia estar em uma situação pior, embaixo dele, sentia algo grande se movendo, mas caramelo estava acostumado a abocanhar o lambarizão, e em pouco tempo viu a fera saindo com a cabeça fora da água, era o peixe Chupa-Cabra, gigante de olhos vermelhos, engoliu a isca e metade do corpo do caramelo, que segurou firme, dando uma mordida nos lábios do peixe cruel. Zé brejeiro não sabia o que fazer, a única coisa que podia jogar no peixe era sua bicicleta, e o fez, acertou a boca do peixão, mais precisamente acertou em cheio um dos olhos do Caramelo que estava se segurando precariamente com sua mordida nos lábios do peixe. Caramelo uivou lamentando enquanto escorregava junto com a bicicleta para dentro do estômago do peixe.

Zé Brejeiro gritava desesperado, e pulou no rio atrás da fera, mas nada encontrou, o peixe Chupa-Cabras havia afundado nas águas turvas do rio mocho, e desaparecido. Jão ouviu de longe seu amigo Zé chorando desesperadamente, e correu com sua vara de pescar ao seu encontro, e chegando a cena do desaparecimento, ouviu de Zé, que ele não deveria entrar no rio, pois havia uma fera nas águas, muito diferente e mais perigosa que o lambarizão, que havia pegado no passado. Jão era amigo pessoal do Caramelo e não se conformou com a situação, queria dar um enterro digno ao seu amigo, embaixo do pé de mangueira, onde o periquito leão também havia sido enterrado. Jão não pensou duas vezes, posicionou sua cadeira de pesca, e amarrou em seus pés, sua vara de pescar de bambu verde, e fez mais, amarrou a ponta de sua linha de anzol em sua

cintura, se fazendo de isca para atrair o peixão Chupa-Cabra, e como já estava escurecendo, pulou nas águas do rio mocho, com seu lampião, para enxergar embaixo das corredeiras. Zé brejeiro vendo a loucura do amigo Jão, tentou impedir a ação, mas não conseguiu, e então jogou para Jão a garrafinha de cachaça para servir de consolação.

Jão esperou por um tempo, até que sentiu algo grande passar embaixo de seus pés, era o monstro que Zé havia falado, ele veio em grande velocidade, e saltou, passando muito perto de meu ouvido direito, pude escutar as latidas do Caramelo dentro do estômago do peixão. No retorno do salto do peixão, ele mirou a cabeça de Jão, querendo engolila, mas Jão já deixou o primeiro presente para ele, antes de enfiar a garrafa de cachaça em sua boca, ele deu uma golada para ajudar aguentar aquela situação, e o restante enfiou na guela do Chupa-Cabra do rio, que saiu quente, com os olhos arregalados e mais vermelhos que o normal, ele estava com muita raiva, e queria dar à Jão, o mesmo fim do Caramelo, e não demorou para conseguir, tomou velocidade, e mirou Jão, abriu a boca e engoliu-o, mas havia um detalhe de azar para o peixão, Jão estava amarrado em sua cintura pelo anzol de pesca, ligado ao molinete de sua vara. Jão escorregou e chegou no estômago do peixão, com o lampião na mão, foi iluminando o caminho da onde vinha os latidos de seu amigo, e ao chegar na barriga, encontrou Caramelo assustado se segurando fora do líquido digestivo, apoiado na garupa da bicicleta que também havia sido engolida.

Jão agarrou o Caramelo, e amarrou sua linha na bicicleta, e dava vários puxões na linha de anzol de sua vara, para que o Zé Brejeiro entendesse que

deveria puxá-lo juntamente com a bicicleta, para fora daquele lugar, ao mesmo tempo fisgando o peixão Chupa-Cabras. Zé percebeu que a cadeira estava sendo puxada para o rio juntamente com a vara amarrada, e ao segurá-la, sentiu o peso da força do peixão nas mãos, mas o peixe não subia, usava sua força para se manter embaixo da água, então Jão decidiu usar seu lampião para produzir uma fogueira, dentro do estômago do peixe, para a fumaça forçalo a abrir a boca e subir à superfície, e o plano deu certo, o peixão Chupa-cabras começou a se desesperar, enquanto o Caramelo fazia xixi na língua da fera, para irritá-lo e convencê-lo a abrir a boca. Zé puxava rápido e enrolava a linha no molinete, quando perceberam que a boca do peixe já estava para fora da água, abrindo e fechando muito rápido, evitando que eles conseguissem sair, então Jão teve a idéia mais louca, pegou a bicicleta de Zé, e prendeu a linha ao estômago com sua faca, e colocou Caramelo na garupa da bicicleta, esperando a boca começar a abrir, pedalou rápido pela língua, como nunca havia conseguido em sua vida, estavam quase conseguindo saltar da boca do monstro, mas a boca começou a fechar, Jão decidiu frear, mas já era tarde demais, ele lembrou que a bicicleta não tinha freio, e eles continuaram em alta velocidade, até se chocarem com os dentes, quebrando-os, e abrindo uma fenda para a fuga.

Ao caírem no rio, viram uma cena aterrorizante, o peixe gigante pegando fogo por dentro, e Zé Brejeiro puxando-o com a vara verde, para a beira do rio. O gigante foi abatido e o melhor, já ficou assando na beira do rio. Jão, Zé e Caramelo somente tiveram que esperar o ponto da carne, deitaram na

prainha à beira do rio, e descansando, davam intensas gargalhadas do caramelo e seus olhos arregalados, degustando peixe assado, e ouvindo as histórias de pescador do Zé Brejeiro, que estava fazendo pouco da proeza conquistada com o trabalho em grupo, dizendo que o peixe ChupaCabras era muito pequeno, comparado ao peixe grande lambarizão, que seu pai havia pescado, quando ele era criança, mas o Caramelo e Jão não estavam ali para duvidarem de Zé, e sim contarem a lenda, para quem quiser acreditar, sobre o peixão Chupa-Cabras, o monstro que eles pescaram no rio mocho.

Aextraordináriapescariade

AugustoRibas

Parte I: O que cair na rede nem sempre será peixe

Já estava quase anoitecendo quando o jovem Augusto Ribas ainda estava ao pé do Rio das Pedras, que circundava a Fazenda Minas, que, embora esse nome tivesse, não ficava em Minas Gerais, mas em São Paulo mesmo, perto da cidade de Dourados, que, também embora essenome tivesse, tinha um rio em que davam muitos lambaris, que, bem fritinhos, eram bons.

Augusto era moreno, dono de quase um metro e oitenta de altura, corpo relativamente atlético, o que o ajudava a apanhar café na fazenda, onde d. Aninha Ribas, sua mãe, uma perfeita cabocla, também labutava, domando as panelas e fazendo nascer as famosas quitandas de d. Ana, que não só eram disputadas, mas também vendidas pelo filho na feira da Cidade. O pai, seu Dito Ribas, tinha falecido pela picada fugaz de uma cascavel.

É hoje que eu pesco a janta pra mãe fazer! e, com a alegria de quem, apesar da pobreza, tocava o céu da vida aos vinte anos, jogava a vara e ficava quieto. Seria noite de lua cheia, e o clima de abril, nem muito quente, nem muito frio, iniciado o outono, favorecia a pesca.

Na verdade, inocente e, mesmo sem saber, poético, Augusto, ou apenas “Gusto”, ficava pensando que os peixes também tinham pais, que ficariam órfãos dos filhos que ele pescasse, mas era a lei do mais forte, então, já que o peixe não pescava o homem, o homem o pescava.

De repente, como um redemoinho se formara, a vara quase se solta das mãos de Augusto, que, também num súbito, fica em pé e, com toda a força, apesar dela, sente a linha se romper. Ele, com o rompimento, cai com tudo no chão, pouco entendendo o que estava por acontecer, pois, de dentro do rio, como se uma porção de lambaris prateados lhe fizessem uma cama, vê uma espécie de sereia, mas, como ali não era mar, só podia, só podia, só podia mesmo era ser…

Prazer, moço lindo, sou eu mesma, Iara e, mal podendo acreditar no que ele via, Augusto se curvou e, de joelhos, de frente para a visagem, bela morena com rabo de peixe, cabelos como os de uma indígena cobrindo os seios, escamas em furta-cor, cuja luz da lua cheia deixavam ainda mais líricas, de frente para Iara, Augusto se sentia agraciado com aquela visão. Que foi? Um gato comeu sua língua? Sou eu mesma.

Perdão, d. Iara, é que… e, ao ouvir aquele garoto chamá-la de dona, Iara dera uma líquida gargalhada que fez os sapos coaxarem e os grilos cricrilarem juntos, em uníssono a ela.

Sou dona de nada, não, moço, mas lhe posso dar tudo. Isto é, desde quenãoquebre as regras donosso trato. Até mesmo os lambaris que não pescou, até mesmo isso, se você quiser… e Augusto, que já vinha mesmo cansado de sonhar, mas nunca conseguir grande coisa além do ganha-pão de cada dia, aceitou a proposta da entidade. Pois bem, já que temos um trato, pedirei que espete o dedo no anzol que tem no cesto e o devolva ao rio. A minúscula gota de seu sangue amargo nas águas doces desse rio será sua assinatura. A minha, um fio do meu cabelo, que ora atiro a ele. Faça e lhe direi minha única regra.

Mais do que depressa, antes que pensasse estar sonhando, Augusto fez o que Iara lhe pediu, mesmo não sabendo se poderia atendê-la em tudo, vendo a rede ao seu lado encher-se de peixes na mesma hora, maravilhando-se com a fartura.

Pois bem, você aceitou o trato. Darei a você condições de dar a sua mãe a vida que ela sempre quis. Pode até ser que não sejam ricos, mas terão fartura. Porém, uma única coisa eu lhe peço: um dia, aparecerá em seu caminho uma pessoa que lhe fará um pedido bem difícil, mas você não poderáse negar a atender a esse pedido. Fique atento, não quero que se esqueça disso e, maravilhado com a nova oportunidade de vida, foi concordando, sem prestar muita atenção ao que Iara dizia. De quando em

quando, em sonhos, vou lhe mandando senhas. Agora, vá.

E, como se a lua e as estrelas se voltassem só para ela, vagalumes ao seu redor, Iara foi descendo para o fundo do rio, com grilos em festa, sapos e demais insetos ainda mais cantantes do que em situações comuns. Tanto que, no meio do rio, lambaris, outrora nem vistos, davam pulos e mais pulos, sinalizando de que tinham visto a mãe.

Augusto, com o cesto cheio de peixes, guardou seus apetrechos de pescaria e, com sebo nas canelas, subiu na magrela e lá se foi para casa. Chegando, feliz da vida, contou à mãe tudo que houve, quase sem acreditar no que contava. Estavam em 2004, mas, como eram da roça, a ingenuidade ainda era parte da alma deles. Iara era deusa.

Toc, toc, toc! batiam à porta.

Ué, mãe! Quem será a essa hora?

Não sei, “fio”, vá ver já dando um jeito nos cabelos e tirando o avental amarrotado.

E, imponente, com uma cara de quem tinha pressa, seu Antunes, homem grande, gordo, que, fosse inverno, fosse verão, não abria mão do terno, era ele, o dono da Fazenda Minas, quem insistentemente batia. O que queria ele àquela hora? E, ao abrir a porta, o jovem “Gusto” não sabia, mas teria sua vida mudada para sempre. Iara? Ai, ai…

Parte II: Quando a rede fica cheia, nem sempre é cheio o coração

À porta da nova casa onde o agora dr. Augusto Ribas e sua mãe, d. Ana Ribas, moravam, lia-se o pequeno poema cuidadosamente encomendado ao melhor poeta da cidade de Dourados, em que, aliás, ficava o mediano, mas para lá de confortável sobrado, agora ocupado pelos dois.

O canto doce da Iara por Silva Gomes

Doce Iara, mãe das águas

Cujos olhos são lendários

Fazem crer no que não dizem

Os seus lábios incensários

Que chamuscam quem escuta

Seus discursos temerários.

Me conceda, doce Iara

Toda a vida que sonhei

Mas não tire a boa sorte

Nem meu destino de rei

Livrando-me, mãe, da morte

Por tudo que eu já penei!

Assim, em tom profético, devocional, o poeta Silva Gomes, um poeta gorducho, com relativo reconhecimento municipal, decretou seu poema à Iara. Augusto e a mãe o adoraram, e era com esse poema, devidamente emoldurado, que recebiam todos ali, já que o jovem tinha se tornado administrador da Fazenda Minas, tudo por conta de um recém-descoberto parentesco mal explicado entre as famílias Ribas e Antunes. Porém, houve gente má dizendo que se tratava mesmo é de mais um caso de paternidade não assumida, pelo menos, não em público, e, ficando o dito pelo não dito, seu Antunes fez com que o então quase analfabeto “Gusto” estudasse e, em pouco mais de cinco anos, estivesse à frente da “Minas”.

Não, não lhes faltava nada, mais nada. A mãe é que tinha empregadas, e o filho andava chique, num carro bom, fazendo inveja aos poucos amigos.

No entanto, mesmo tendo de tudo, Augusto se sentia triste, vazio como aquele cesto sem peixes, momentos antes de ter conhecido a Iara. Por quê?

Parte III: O rio tem caminhos que só mesmo o rio que conhece

Foi que, um dia, quase ao cair da tarde, apareceu à porta de d. Aninha uma moça pedindo emprego. Feia, suja e maltrapilha, estava quase morta de tanta fome, precisando passar a noite.

Quem é essa, mamãe? quis saber o então dr. Augusto, que, justamente àquela hora, quando a jovem andarilha era acolhida em casa pela mãe, chegava em casa.

Uma moça a quem daremos pouso e acolhimento. Ela não tem ninguém no mundo, não podemos lhe virar as costas, você sabe que…

‘Tá, ‘tá, ‘tá, não precisa vir com aquela ladainha de que também já fomos pobres, mãe, mas, agora, olha, agora é diferente, a gente é…

A gente é o que sempre foi, filho. E vamos acolher esta moça.

Augusto, muito contrariado, mediu a moça dos pés à cabeça, não vendo nela absolutamente nada que lhe pudesse agradar, mas não fez caso.

Morena, até que eu gosto, mas com essa cara! Cruz-credo! Nariz torto, boca fina, e o seu cabelo?

Nunca viu a cara de um pente, aposto! dizia o jovem mentalmente para si mesmo, enquanto, olhando a lua, tentava pegar no sono. E, no sono, estava quem? Pois é, a Iara, que, da mesma forma em que lhe aparecera àquele fim de tarde, lá no rio, reapareceu de novo, perguntando a Augusto se ele por acaso tinha esquecido o trato…

Parte IV: Uma única regra, mas o bem nem sempre vence o mal

A moça, de nome Alzira, bem poético até, pois quer dizer ornamento, beleza, ou a visitadora, de origem árabe, combinava bem com a nova empregada da

casa, cujos dotes eram vários. Porém, de beleza primária, ou melhor, física, devo lhe dizer, era pobre. Pobreza que o impetuoso Augusto fazia questão de não se esquecer, nem deixar a ninguém da casa que se esquecesse disso, pois, quando não estava Alzira por perto, ria dela, caçoando de seu aspecto.

Alzira, certa vez, flagrou-o dizendo que era melhor que ele se casasse com uma mula do que com uma mulher como a “empregadinha” era.

Assim, entre insultos e xingamentos, passaram-se alguns meses, e, com eles, a barriga de Alzira começou a ficar maior, denotando que algo estava de fato acontecendo: ela estava grávida. Ah, mas Augusto não pensou duasvezes, quis pô-la para fora, com mala e cuia, impedido pela mãe e, mais ainda, por uma força que lhe congelara momentaneamente a mão, já prestes a tocar a maçaneta dourada da porta colonial da sala! “Uh, uh”..., ouvia Augusto, ao longe, de quando em quando, desde que Alzira lá chegara. Um canto triste.

Seu Augusto, eu lhe pedi para falarmos a sós, pois quero lhe fazer um pedido. Um só.

Se for para ficar disse o jovem, já se levantando da cadeira, sendo seguido por ela, ambos no escritório do senhorzinho Ribas saiba que…

Quero que se case comigo e dê um nome para meu filho e, ouvindo isso, ao longe, aquele canto ululante fez-se ouvir por Augusto, mas…

‘Cê deve estar ficando louca! Quem você pensa que é? Eu sempre desconfiei de que você era dessas!

Uma oportunista, aninhada em casa, igual à cascavel que…

Matou seu pai disse Alzira, baixando os olhos, mãos sobrepostas à frente da saia.

Como, como sabe? Quem é você?! Estudou a gente? Fora! Fora daqui! Mãe!!! e, no mesmo instante, o canto ficou mais forte em seus ouvidos, um vento estranho arrebatou as cortinas e, sem saber bem o que estava havendo, d. Aninha adentrou a sala e, enquanto tentava entender o que estava acontecendo com o filho, que, com os ouvidos tapados, gritava impropérios, a jovem Alzira pegou a sua trouxa e, sem olhar para trás, tomou seu rumo e partiu.

Parte V: Não basta saber pescar, é preciso saber viver, ou O peixe morre pela boca

Depois do acontecido entre Augusto e Alzira, as coisas não foram mais como eram antes. D. Aninha, subitamente, adoeceu, não havendo médico, nem curandeiro que a fizessem melhorar. Até que, numa noite sem lua, o último suspiro de d. Aninha voou da boca para uma nuvem e, de lá, nunca mais voltou, deixando Augusto tão triste como nunca se viu. Nem mesmo a visita de seu padrinho, seu Antunes, então prefeito de Dourados, pode consolar aquele homem. Era um final.

Andando, vagando pela casa, os dias que se seguiram o fizeram tudo que até então nunca tinha sido: triste, soturno e sem sonhos. Sentia falta do pai, da mãe e,

estranhamente, lhe viera à mente a imagem de ninguém mais, ninguém menos do que Alzira, a “empregadinha” que ele enjeitara, mas de quem nunca mais se esquecera. Nem notara, aliás, que, a partir daquele dia, o quadro com o poema na frente da casa tinha mudado sua terceira palavra e, em vez de doce, lia-se a partir da rejeição de Augusto a Alzira triste, passando a se chamar O canto triste de Iara.

“Já sei, vou pescar!”, pensou Augusto consigo mesmo e, com o velho cesto, relíquia, nas mãos, em sua caminhonete mais nova, foi-se para o rio.

Chegando lá, quase ao fim daquela tarde, também de outono, como a estação daquela tarde que lhe mudara a vida, sentou-se à margem, ficou à espera e, num átimo, o som ensurdecedor daquele canto que lhe tomava os ouvidos, se fez mais alto do que nunca, fazendo-o se levantar e, quando ficou de joelhos, Iara, novamente rodeada por lambaris prateados, surgiu.

Ora, ora, se não é o jovem “Gusto”, ou melhor, Augusto… Olhem, peixes, rãs e toda sorte de seres do rio, aquele homem tão fino, curvado, com dor nos ouvidos, cheios de música, mas uma música triste, uma música de uma nota só, que se chama remorso!... Peço que cesse a música em seus tímpanos, para que me escute! e a música nos ouvidos de Augusto, ajoelhado em frente à Iara, subitamente, parou, e ele, chorando, abriu os olhos e, sem entender, parou. Pensei que fosse vê-lo acompanhado de uma nova moça, mais ainda, de uma nova moça e de seu lambarizinho, que, não sei se soube, veio a morrer e Augusto, ouvindo Iara,

lembrou-se de Alzira. Então, então, tudo estava claro! Alzira era a regra.

Perdão, senhora, perdão, não fiz por mal, eu fui fraco, eu não sou assim, perdão!... e, dessa vez, foi Iara quem o mediu dos pés à cabeça, mãos na cintura, flores orvalhadas de mel nos cabelos, dona de si, mas triste por dentro, muito triste.

Olha, moço, eu tentei ajudá-lo da melhor forma possível. Este rio é testemunha, a lua, os pequenos insetos e animais que nos olham e nos ouvem agora. Você não cumpriu o trato. Mas, como não sou má, muito pelo contrário, vou lhe dar uma nova chance. Tente reparar o erro. Não será com Alzira. Veja como ficou a vida dela depois que saiu de sua casa a pontapés por você e, nas águas do rio, Augusto enxergou Alzira pelas ruas, o filho nascendo morto, Alzira ficando louca, indo parar num manicômio, até à morte por suicídio. Você precisa se perdoar. E ajudar dito isso, o redemoinho se fez, Iara voltou para dentro das águas, e Augusto chorou tudo que nunca tinha chorado na vida, o cesto de peixes ainda vazio.

De volta ao sobrado, deitou-se na cama e sonhou com a mãe, que, mesmo ao longe, lhe fez ver que estava bem e, como se numa espécie de orfanato estivesse rodeada de… crianças!

Rosa, Rosa! acordou Augusto, mal amanhecia o dia. Quero que chame meu padrinho. Temos algo a fazer, não dá pra esperar! e, olhando pra cima: Obrigado, mamãe!

Hoje, na cidade de Dourados, o “Orfanato d. Aninha Ribas” abriga mais de quinhentas crianças, vindas de todas as partes do País e até mesmo do mundo. Ele, Augusto, gerencia tudo ao lado da esposa, Ofélia, que já lhe deu o pequeno Augusto Ribas Júnior, herdeiro dos dois.

Domingo, filho, vamos pescar. Você já tem sete anos. Aliás, já ouviu falar na… Iara?...

Omensageiroaladodo apocalipse

A chuva não cessava. O mar não cedia. O barco a chacoalhar, aquela ânsia a me matar. Eu não morreria por um simples enjoo causado pelo mar batido. Embarquei naquela traineira por gosto. Desde a primeira vez em que andei por lá, com meus pais, eu senti uma vontade louca de presenciar uma pesca de dourado em alto-mar. Naquele último dia de feriado, realizei o meu antigo sonho. Anália não quis me acompanhar. Preferia o conforto e a segurança do quarto da pousada. Afinal, no outro dia, tudo voltaria à rotina. Escola, agência, as cobranças, tanto dos chefes quanto das contas. É da vida, assim como é do mar, o balanço.

Estávamos quase passando pela ponta da Joatinga. O mestre Pedro me avisou. Porque, se dependesse do meu senso de direção, diria apenas que estávamos próximos a Paraty, quase divisa com São Paulo. O comandante do barco ea tripulação eram pescadores experientes, herdeiros de uma tradição que passa de geração em geração. Enquanto eu me segurava, tanto literal quanto metaforicamente, o Pedro e os colegas preparavam o espinhel que seria lançado ao mar, para fisgar os dourados.

Eu, acostumado a pescar da beira da praia ou das pedras, com vara e carretel, estava adorando a nova experiência. Fora o bucho estrebuchando, o resto era só alegria.

Vem aqui, seu Marcelo, vem ver como se faz com as linhas e anzóis do espinhel. Não usamos ferro, a gente larga o espinhel e deixa a corrente levar a linha com as iscas. Assim é que fazemos. Não é nenhum segredo, mas funciona desde que os indígenas caiçaras aprenderam a usar linha e anzol.

Enfrentando o sobe e desce das ondas me aproximei de Pedro para conferir o espinhel e a apurada técnica de iscar os anzóis, e ir arranjando a linha para que não se enroscasse. Enquanto eu admirava a habilidade dos pescadores, fiquei pensando o quanto valia a pena pagar alguns cruzeiros para viver aquela experiência. A gente come peixe, diz que gosta de pescar, que ama a vida ao ar livre, mas ignora locais e histórias como a dos povos originais do nosso país. Abandonei meus devaneios antropológicos e turísticos e continuei a me segurar firme para não cair e não vomitar.

Desde o embarque na aldeia o tempo já começara a mudar, começando uma chuva leve. Quando a chuva espertou, chegou uma ventania e a visibilidade se resumia a poucos metros de distância. Eram quase duas horas da tarde. Não tem como esquecer aquela insistente locução da Rádio Relógio: “agora, treze horas, cinquenta e sete minutos” logo depois de uma curiosidade de almanaque, novamente “agora, treze horas, cinquenta e oito minutos”. Após eu me

distanciar da tortura radiofônica, embarquei no barco e naveguei nas lembranças da minha querida mãe. Toda a manhã, antes de eu ir para escola, ficava ouvindo o toc-toc dos segundos e a dona Loraine me empurrando para fora de casa, gritando para eu não perder a hora do colégio.

O barco seguia seu curso mar adentro, quando uma luz piscante e um ruído característico chamaram a atenção de todos nós. Ao longe, uma aeronave em baixa altitude circulava pela área. Pedro pegou um binóculo e confirmou se tratar de um helicóptero de cor escura. Devido ao tempo fechado e a distância, não foi possível distinguir prefixo, se tinha alguma identificação de táxi aéreo ou algo parecido. Perguntei a um dos pescadores se ele sabia que horas eram. O homem olhou para o céu, mas não tinha sol para se guiar, mesmo assim chutou três e quarenta da tarde. Piscou o olho e me mostrou o pulso de um colega dele que estava ao lado.

Depois de alguns minutos e outro tanto de ânsias e solavancos no mar agitado, vimos o tal helicóptero vir em direção ao barco. Não se aproximando muito, deu a volta e retornou ao local anterior. Olhei para o Pedro e comentei que achava muito estranha aquela cena. Seguimos adiante, já estávamos próximos do local de lançar os espinheis.

É aqui, gente boa, este é o pesqueiro que vai encher nossas caixas de peixe. Vem, Marcelo, tenha a honra de ajudar a lançar a linha, nesta tua primeira pescaria de verdade. Eu agradeci e gritei que

assistir já era uma honra. Eu mal podia me acomodar na borda da traineira.

Enquanto eu observava e tentava fotografar aquela cena, uma onda mais forte me jogou ao chão e vi a minha amada ecaracâmera reflex virarsouvenir para os peixes. Eu já estava começando a me arrepender de tal pescaria. Além do mais, sabia que não poderia ver o resultado do esforço dos caiçaras. Aqueles espinheis seriam deixados com boias e somente no outro dia eles iriam retirar as linhas e ver quantos peixes fisgaram. Após lançarem as linhas, Pedro manobrou o barco e retomamos o rumo do litoral.

Ao meio do caminho, ouvimos um estouro. Olhei para o lado e um clarão ao longe chamou nossa atenção. Todos correram para estibordo e ficaram se perguntando se foi um trovão depois de um raio ou um raio depois de um trovão. Um dos pescadores mais velhos disse que o trovão vem bem depois do raio. Portanto, não poderia ter sido um raio e seu trovão. Eu lembrei-me do helicóptero, ao mesmo tempo que lamentei a falta da câmera. Poderia ter registrado aquele momento, ter sido testemunha de algum acidente, queda de um avião, de um óvni, quem sabe? Ou seria o mensageiro alado do apocalipse?

Pedro esquadrinhou o perímetro com o binóculo, uma, duas, três vezes. Uma curiosidade ansiosa tomou conta da tripulação. Antes que alguém perguntasse, o mestre Pedro disse que o mesmo helicóptero escuro avistado antes, se distanciava do local onde espocou o clarão. Se não foi acidente

envolvendo aquela aeronave, o que teria acontecido?

Colisão não poderia ter sido. Vimos somente o helicóptero. Dificilmente outro avião ou qualquer aeronave se manteria no ar após um choque com uma possível explosão.

Desviar a rota para conferir mais de perto o que poderia ter acontecido seria muito imprudente. No litoral, perto das seis da tarde, já é quase noite, por isso a prioridade era chegar na aldeia antes do pôr do sol.

Aportamos na aldeia, a garotada foi correndo saudar os pescadores e ajudar a atracar a traineira. Aproveitei que ainda tinha alguns minutos de licença, antes que a Anália começasse a me xingar à distância, fui conhecer a família de Pedro. Agradeci a acolhida e a inesquecível experiência enquanto me despedia daquela gente muito legal.

Devido à chuva, a trilha que levava até à pousada ficou quase intransitável. Mal andei umas centenas de metros e o meu Corcel II quase atolou depois de derrapar uma dúzia de vezes. Resolvi não arriscar e retornei para a aldeia.

Pedro, meu novo bom amigo, vou me convidar para passar a noite por aqui. Meu carrinho não vai dar conta de atravessar esse lodaçal. Tem hospedagem para este pescador e piloto de rali frustrado?

Claro, seu Marcelo! Como digo aos turistas argentinos, “mi casa és su casa”.

Aproveitei a hospitalidadeda aldeiae dormi que nem um anjo, acordando com o burburinho da preparação para a partida dos pescadores para a retirada dos espinheis do mar. Saltei da cama. Observei que o sol se apresentava meio tímido, mas era promessa de tempo bom. Abusei mais um pouco da boa acolhida e comi um típico café da manhã caiçara. Para minha surpresa, o cardápio era bem variado, cuscuz, tapioca, garapa e café com leite tirado da vaca de criação do Pedro. Mas um detalhe: o cuscuz é um biscoito.

Novamente, me despedi do Pedro e de seus colegas, lamentando mais uma vez o fato de não poder conferir o resultado da “nossa” pescaria. Comentei com o mestre pescador a possibilidade de transformar em atividade turística aquele estilo de vida tão próprio e cheio de cultura e história. Pedro acenou com a cabeça e disse que iria pensar.

Retornei para a pousada e encontrei Anália no saguão, de malas prontas e bufando de raiva.

Então, seu Marcelo, isso são horas? Você me prometeu chegar antes do anoitecer, para jantarmos e aproveitarmos a última noite do feriadão de Nossa Senhora Aparecida. E você me apronta essa?

Depois de muita conversa, explicações e pedidos de desculpas,consegui amansar a fera. Já em paz,Anália me pergunta, apontando para o noticiário na televisão:

Meu amor, você está sabendo? O helicóptero do Dr. Ulysses desapareceu no mar, aqui por perto. Não era lá para o lado da tua pescaria?

Virei-me para trás, prestando atenção nas imagens. Em sobrevoo sobre o mar de Paraty, ao longe dava para avistar uma traineira. Era o barco de Pedro, com certeza.

Enquanto o repórter falava direto do helicóptero da emissora, explicando as possíveis causas do acidente, eu respondia para Anália:

Eu vi, meu bem, eu vi.

Naságuasdaaventura,a sagadeumjovempescador naAmazónia

Era uma manhã quente e húmida, própria dos climas tropicais, no coração da floresta densa da Amazónia, no Brasil, quando um jovem aventureiro, determinado e entusiasta pescador, de nome Adão, herdeiro do capricho do seu pai, que era aficionado pela pesca desportiva. Chegou finalmente ao rio, na companhia de dois, dos seus amigos portugueses e de um guia nativo, Adilson, conhecedor da região e experiente na pesca do Pirarara.

Ele tinha uma embarcação, conhecida por todos, como “A luz da vida”. Ele era uma lenda viva, na arte da pesca, devido às suas aventuras no rio e peripécias na própria floresta.

Agora, todos iriam entrar nesta aventura, de resiliência, paciência e superação.

Embarcavam naquela embarcação, com todos os seus apetrechos e artigos de pesca, como as suas canas e iscos, escolhidos a preceito, pelo próprio Adilson.

Deslocavam-se no pequeno barco, de madeira, de pequeno porte, com ambas as extremidades afiadas,

com quatro lugares, guiado por remos, orientado ao leme pelo Adilson.

Ao alto avistavam-se garças de cor branca e tons de amarelo, de chapéu preto ebico alongado de cor azul claro, com suas asas majestosas, espécies próprias daquela região, que voavam, pareciam dançar em círculos.

Pareciam saudar a canoa e os seus ocupantes, a qual parecia pairar sob as águas, entre as ondas calmas e rimadas do rio.

No meio da floresta, ouviam-se sons de todo o tipo, desde o folhear das plantas, do crescimento da vegetação, aos grasnar e assobios dos pássaros, que ecoavam até à bacia do rio.

Era uma melodia alinhada, proporcionada pelos seus tons suaves e sonantes até ao ouvido mais desatento.

Estavam todos empolgados com esta aventura, que o próprio Adão, tanto aguardava, depois da sua longa viagem de avião, desde os píncaros dos Açores, em Portugal até ao território brasileiro.

Ele estava decidido, a levar esta aventura avante e a pescar o peixe mais temido e respeitado, daquela região, a pirarara.

Ter nas suas mãos, um ser tão colossal e belo, de proporções extraordinárias, uma majestosa criatura, era o seu objetivo.

Com a sua cana de pesca nas mãos e o coração cheio de expectativas, Adão lançou o isco, nas águas escuras da bacia do rio Amazonas. O sol brilhava de tal forma, forte no céu, refletindo o seu brilho, em

cada onda calma do rio, que a canoa provocava, tornando assim uma paisagem ainda mais deslumbrante.

Enquanto esperava, paciente, sentado, num dos bancos da canoa, pela mordida voraz daquela criatura, pensava na lenda conhecida e contada pelos anciãos nativos daquela zona, a qual cercava a estória da pirarara. Dizia-se que o majestoso peixe, com as suas manchas escuras e o seu tamanho impressionante, era um dos mais difíceis de ser capturados na região. Além disso, o peixe pirarara era conhecido, pela sua força e agilidade, deixando os próprios pescadores, a se desafiarem por cada tentativa.

As horas passavam lentamente, a pirarara não se avistava, mas Adão não desanimava. Ele estava determinado a enfrentar o desafio e a provar a si mesmo, que a sua habilidade como pescador, era um dom, que tinha ganho do seu pai. Então, repentinamente, a sua cana começou a balançar, e ele soube que estava na hora de lutar, com toda a sua bravura.

Reuniu toda a sua força e concentração, e enquanto o animal se debatia na água escura e profunda, vindo à tona, por diversas vezes, balançando a própria canoa, com os seus embates e no meio dos seus puxões vigorosos.

Os seus amigos e o guia, continuavam a agarrar-se às extremidades do barco, para não tombarem nas águas do rio.

Adão, continuava a puxar a linha, com vigor e robustez, sentindo a resistência do peixe, que se

continuava a debater, do outro lado da linha, mostrando a sua voracidade.

Era uma batalha de titãs, emocionante e ao mesmo tempo perigosa, punha todos em risco. Durou uns largos e longos minutos, que pareciam não chegar ao fim, uma eternidade. Até que por fim, o peixe se cansou. O peixe surgiu das profundezas do rio, puxado com a ajuda de todos, exibindo a sua imponência e beleza.

O peixe era verdadeiramente colossal, com mais ou menos dois metros de comprimento e um peso impressionante, que contrariava a própria inércia da embarcação.

Adão mal podia acreditar, na sua sorte, segurava o pirarara, enquanto este se tentava soltar, batendo as suas nadadeiras peitorais, como duas asas, parecendo querer voar, e se soltar do seu captor. Com orgulho e admiração, Adão, manifestava o seu agrado.

Ele sabia que aquela seria uma memória inesquecível, uma experiência que o marcaria para sempre, para toda a vida.

Depois de registar o momento, com algumas fotos, soltou o pirarara de volta às suas águas, agradecendo pelo desafio e pela boa oportunidade de ter vivenciado aquela emocionante aventura. Ele sabia que aquela pescaria, não era apenas sobre capturar um peixe, mas sobre superar limites, testar a sua própria compreensão e ligar-se de corpo e alma, à mãe natureza de uma forma única.

Com o coração cheio de gratidão e a mente repleta de lembranças felizes, voltou para a margem do rio, sabendo que aquela jornada de pesca desportiva, nas bacias daquele imenso rio, havia sido verdadeiramente especial.

Naquele momento, enquanto o sol se põe no horizonte, promete a si mesmo, que voltará em breve para viver novas e emocionantes aventuras no coração daquela região tão abençoada, pelas suas boas gentes e lindas criaturas.

Oanciãopescador,Capitão VelhoJaquim

Era uma tarde de verão, em que o sol bravo, se proclamava, sobre as casas de uma pequena vila de pescadores, chamada, “Maré Alta”.

O ancião Capitão Velho Jaquim, conhecido por todos como um sábio e experiente pescador de altomar, que se preparava para mais um dia de pesca no mar.

Homem de uma envergadura robusta, olhos de serenidade azul, calmos, com longos cabelos brancos e barba afunilada da mesma cor e rugas profundas e pronunciadas, tinha a sabedoria e a experiência de muitos anos dedicados à pesca, passados no mar.

Os outros pescadores da vila, sempre o consideraram como um deus da pesca, procuravam sempre os seus conselhos, cuja habilidade na arte da pesca era reconhecida por todos.

Diziam que sabia ler nas entrelinhas, das águas do mar como ninguém, conhecia os hábitos dos peixes, falava com eles, na sua linguagem, como seus amigos mais próximos, ou de longa data, nada escapava aos seus dotes de conhecimento sobre os mares. E para além de tudo, ainda um conhecedor de todo o tipo de embarcações, ou mesmo da sua construção.

Naquela tarde, o sábio e devoto Jaquim, decidiu sair sozinho, no seu barco, em busca de um desafio maior, do que antes havia experienciado.

Tinha uma bateira, um barco pequeno, com um pequeno motor, com casco em madeira, um convés espaçoso, para acomodar os tripulantes e bem apetrechado, com os seus equipamentos de navegação e segurança, bem como bússolas, coletes salva-vidas, lanternas e extintores de incêndio e ainda, compartimentos para guardar equipamentos de pesca, iscos e mantimentos. Embora fosse de tamanho pequeno, já tinha enfrentado tempestades, ventanias ou trovoadas, criaturas marinhas, mais vorazes.

Ele tinha ouvido várias estórias, sobre uma criatura marinha misteriosa, que habitava as profundezas do mar e decidiu que era a hora de enfrentar essa criatura lendária.

Com a curiosidade, sempre à flor da pele e o arrepio da aventura, a subir pela espinha, ia aventurar-se em alto mar, para pescar tamanha criatura, que não o demovia, por receio ou medo.

Com a sua embarcação e os seus equipamentos de pesca em mãos, partiu em direção ao suposto lugar, onde tinha sido avistada. O sol brilhava no céu azul e o mar estava calmo, parecia que o tempo tinha parado, momento perfeito para a pesca.

Ele como sempre determinado e concentrado na sua missão, dirigia o seu barco, sem hesitação.

Depois de várias horas de navegação, sem pressas ou promessas, avistou uma longa sombra escura, que se movia abaixo da superfície do mar.

O seu coração palpitava, até acelerou de emoção ao perceber, que possivelmente era a criatura marinha, que tanto procurava. Com cuidado e precaução, lançou a sua rede de tresmalho, composta por três panos de rede retangular sobrepostos, largou seus iscos presos nas redes e aguardou pacientemente.

As horas iam se passando e Jaquim permanecia focado na sua pescaria.

Repentinamente, sentiu o peso da criatura lutando contra as próprias redes, conseguia perceber os seus saltos, tentando libertar-se da armadilha. Com habilidade e determinação, ele começou a puxar devagar, com paciência, consciente de que estava lidando com algo muito maior, do que já alguma vez havia pescado.

Seria uma luta de força e resistência, em que uma das partes teria que ceder e porque desistir não fazia parte do seu reportório.

Finalmente, a criatura emergiu da zona funda do mar, revelando-se diante dos olhos surpresos e maravilhados, perante este ser.

Afinal, tratava-se de um enorme espadarte negroazulado, de focinho alongado que forma uma espada achatada, largo e robusto, majestoso e imponente, voraz e agressivo, com a sua gigantesca cauda em forma de meia-lua, movendo-se violentamente na água.

Jaquim ficou bastante impressionado, com a beleza da criatura, apesar da sua agressividade e sentiu um profundo respeito por aquele ser magnífico. Ele sabia que não podia ferir o espadarte, pois aquilo ia contra tudo em que acreditava.

Tinha uma noção bastante alargada, sobre o equilíbrio e a harmonia da natureza, com quem bem se relacionava.

Com cuidado e delicadeza,cortou algumas das linhas da rede, em que estava envolvido, libertando o espadarte, para que este pudesse continuar a sua viagem pelos mares. Ele sabia que aquele encontro era um presente da natureza, uma prova da beleza e da grandiosidade do mundo marinho.

Ao voltar para a vila, Jaquim, tinha muito para contar, tendo sido recebido com aplausos e admiração pelos outros pescadores. Eles queriam saber o que ele tinha pescado, e ele sorriu ao contar a estória do espadarte e como o havia escolhido para o libertar, em vez de o capturar e matar.

As noites na vila ganharam um novo encanto, com as estórias de Jaquim ecoando pelas ruas estreitas. Os jovens reuniam-se ao redor do fogo, ansiosos para ouvir as aventuras e lições do velho pescador.

Os pescadores ouviram atentamente, maravilhados com a coragem e a sabedoria de Jaquim.

Eles sabiam que tinham muito para aprender com aquele ancião, cujo respeito pela natureza e pelos seres vivos, era uma lição viva e valiosa para todos.

Lições que ficariam gravadas para sempre, nos corações dos habitantes daquela comunidade.

Nos dias que se seguiram, continuou a pescar no mar, compartilhando sempre as suas estórias e conhecimentos, uma aprendizagem contínua para os mais jovens da vila.

A sua sabedoria e experiência, eram um tesouro inestimável, era respeitado por todos como o velho sábio pescador, um mestre e guia espiritual para todos que o conheciam.

E a vida naquela pequena vila de pescadores continuou, com o Jaquim a guiar e inspirar, todos aqueles que viviam em seu redor, sempre em sintonia com a natureza e os mistérios do mar.

E o espadarte permaneceu, como um símbolo de respeito e admiração, fazendo lembrar a todos, a importância de preservar as maravilhas dos nossos oceanos.

Primeirocauso

William R. F. Ramires

Meu avô gostava de pescar, mas tinha poucos dias para fazer este passatempo. Saia de casa cedo e quando voltava, sempre trazia peixes. Às vezes eram grandes, em outras ocasiões pequenos. Morávamos próximo da represa, mas este passatempo de pesca ele não podia fazer sempre. Somente em alguns domingos se permitia sair pela manhã e pescar.

Minha mãe não permitia que acompanhasse meu avô, dizia que eu era muito pequena, mas o sábio senhor sempre dizia:

Deixe estar minha netinha, logo você cresce e vamos nós dois pescar. Vou te ensinar tudo o que sei.

Minha avó quando ouvia aquilo logo respondia:

Já vai ensinar a neta a inventar histórias? De pescador, seu avô é um ótimo mentiroso.

Falava isso dando uma risada gostosa, meu avô também caia na gargalhada. Mas uma coisa aquele velho senhor era bom: contar histórias.

Principalmente de pescarias e quando se empolgava não parava mais, passava a noite inteira contando histórias.

Meu avô continuava trabalhando e ocasionalmente pescava.

Logo ele se aposentou, então as pescarias aumentaram de frequência. Saia de manhã e voltava antes do almoço, quase todos os dias, sempre com um peixe. Muitas vezes durante as tardes me contava histórias de pescadores.

Ficávamos na sala. Minha avó sentava na cadeira de balanço para tricotar, eu sentava num tapete no chão e meu avô sentava na poltrona e os causos começavam.

Falava de antigas pescarias em alto mar. Nestas histórias, sempre começava com os dias de enjoo, mas que logo era superado. Tubarões-martelos, arraias, linguado, sardinhas e outros tantos, contava com detalhes a preparação das iscas, as ondulações do mar, as visitas das baleias e as corridas com saltos dos golfinhos.

Os olhos de meu avô brilhavam, ele se transportava para longe, atravessando oceanos longínquos, navegando por mares às vezes sossegados, outras vezes em plenas tormentas.

Começava a ouvir aquelas histórias e acabava navegando ao lado de meu avô, para mares a serem explorados. Passando em volta de ilhas de náufragos piratas, navegava sobre baleias gigantes, via as lulas bailando no infinito azul, golfinhos passavam saltitando sobre a água, o barco flutuava pairando na tênue divisória entre o céu e mar.

Em meus pensamentos as fantasias continuavam. No anzol às vezes subia o estranho tubarão-martelo, outras vezes por acidente uma tartaruga marinha se prendia na rede, porém, logo era devolvida ao oceano.

Lembro, um dia, que comi uma arraia e imediatamente a imagem daquele fascinante ser, começou a circular ao meu redor, a arraia bailava no ar, com aquele fino, imenso e perigoso rabo.

Meu avô contava seus causos e minha avó dava aquele sorrisinho com o canto da boca, num tom de ironia e sarcasmo. Não entendia o que aquilo queria dizer, muitas vezes ficava chateada com a atitude de minha pobre avó.

O amável velho nem se importava continuava contando suas histórias. E eu me deliciava com aquilo, as tardes eram prazerosas ouvindo aqueles eventos.

Finalmente o tempo passou e cresci. Chegou o dia de me aventurar e sair com meu avô desbravando os sete mares. Imaginava que pelo menos um tubarãomartelo, a gente iria pescar ou quem sabe uma arraia, para a vovó fazer uma deliciosa moqueca.

Me arrumei toda com roupa de pescadora, chapéu, protetor solar, repelente contra inseto, remédio para enjoo. Sabia que iríamos para a represa, onde normalmente não dá enjoos, mas estava preparada para tudo. Minha mãe repassou cada detalhe, umas quinze vezes.

Fomos caminhando, aquele senhor teve a astúcia de sair de casa com um caixa de iscas, anzóis, linhas e duas varas de pesca. As varas eu carregava. Fui saltitante e feliz, quando chegamos na praia da represa, meu avô se dirigiu para uma barraca onde outros senhores grisalhos ansiosos o aguardavam.

Pegou as varas de minhas mãos e colocou de pé encostada num canto da parede com outras varas de pesca, olhei para a mesa ao lado e sobre ela havia várias caixas com iscas e anzóis. Os idosos reclamaram do atraso do meu avô e logo se acomodaram em suas cadeiras e a jogatina de dominó começou.

Olhei sem entender para meu avô, ele apontou para outras crianças que brincavam na beira da represa. Corri para lá e me enturmei rápido me divertindo na beira da água.

Observei um rapaz, que parecia um pescador, chegava dos confins da represa de mansinho, flutuando sobre a água com o barco. Chegou na praia, puxou a pequena embarcação e foi em direção ao grupo de jogadores de dominó. O jovem pescador estava com vários peixes amarrados na ponta de um pau, seguiu caminhando e foi se aproximando dos idosos, logo o jogo parou, os idosos saíram da mesa ligeiros, apontando para os peixes presos na vara do rapaz. Meu avô foi o mais rápido e pegou um bonito tucunaré.

Antes do almoço, como de costume, voltamos para casa.

Meu avô carregava em seu semblante um feliz sorriso, fiquei com a tarefa de carregar a vara de pesca com o peixe bem amarrado.

Voltava pronta para inventar minha primeira história de pescadora, tinha a aventura na ponta da língua, olhei com ar de cúmplice para aquele gentil senhor, que retribuiu o meu olhar e soltou uma gostosa gargalhada.

Enfim, para uma primeira pescaria com meu avô, o resultado havia sido um sucesso.

Brígida de Almeida Guimarães, Carlos Franco, Cláudio Moreira da Silva, Daniela Demena Trindade, Denise Camargo Lancia, Humberto de Campos (in memoriam), Jean Javarini, Jeanne Salgado Pipa, José Leandro de Souza Lima, Júlio César Oliveira Souza, Katia Aparecida Chagas, Marcelo Pires, Olivaldo Júnior, Paulo Ismar Mota Florindo, Rui Ferrer Trindade e William R. F. Ramires convidam para uma pescaria nas águas tranquilas, por vezes turbulentas, das palavras de onde emergem peixes grandes e grandes histórias de pescadores.

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