O Assédio Sexual sob uma Perspectiva Pós-Estruturalista – Maria de Fátima Cabral Barroso de Oliveira – p. 1
A Regência Constitucional do Processo Civil Brasileiro e a Posição do Projeto de um Novo Código de Processo Civil – Sérgio Gilberto Porto – p. 15 A Cultura do Medo e a (In)Segurança do Direito Penal – Bernardo de Azevedo e Souza e Felipe Faoro Bertoni – p. 27 Educação Ambiental – Luiz Carlos Aceti Júnior e Eliane Cristine Avilla Vasconcelos– p. 40 Breves Ponderações Acerca do Redirecionamento de Ação de Execução Fiscal em Face de Representantes de Pessoa Jurídica Falida – Walter Alexandre Bussamara – p. 50 O Princípio da Publicidade no Procedimento Licitatório: Uma Crítica à Lei nº 12.462/2011 sob a Perspectiva Democrática – Gabriela Oliveira Freitas – p. 55 Superior Tribunal de Justiça – p. 67 Processo administrativo – p. 72
Jornal Jurídico
Da Ilegalidade da Investigação Preliminar Promovida pelo Ministério Público – Por Jader Marques – p. 76 Medida Provisória – p. 90 Normas Legais – p. 90 Indicadores – p. 91
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Doutrina
O Assédio Sexual sob uma Perspectiva Pós-Estruturalista MARIA DE FÁTIMA CABRAL BARROSO DE OLIVEIRA Especialista em Direito Penal e Criminologia pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), Mestre e Doutoranda na Área de Estudos Linguísticos e Literários em Inglês do Departamento de Letras Modernas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
RESUMO: O contexto contemporâneo lida com questões relacionadas à inclusão das minorias, nos próprios sistemas, que as marginalizaram e excluíram, e, de certa maneira, aposta nas reformas jurídico-legais, que objetivam a conquista de mudanças sociais na busca da justiça social, ora apostando no discurso de “igualdade” para todos, ora no discurso do reconhecimento das “diferenças”. Dessa maneira, no embate discursivo, a questão do gênero, ou da sexualidade, se torna um dos principais debates da sociedade hodierna, ainda que exista certa relutância no reconhecimento da importância da questão, e de que, mesmo apagadas e desconsideradas, as teorias feministas são aquelas que conseguem (re) pensar modos e conceitos teóricos de uma maneira mais “revigorada”. Uma das questões mais pertinentes do debate teórico sobre a igualdade/ diferença se refere ao fato de vários autores pós-estruturalistas atestarem a (im)possibilidade da representação do “feminino” no simbólico, pois todo e qualquer discurso é masculino. Então, como poderá um sistema jurídico “masculino” e “reformado” prover um lugar para o “feminino”, a fim de que novos mundos sejam (re)criados? PALAVRAS-CHAVE: Feminismos; sistema jurídico; assédio sexual; igualdade/diferença; gêneros.
INTRODUÇÃO O principal objetivo deste trabalho é desnudar o “masculino” de sistemas representacionais, mais especificamente do sistema jurídico-legal, que, se utilizando de certos conceitos universais, como “igualdade” e “justiça”, pretende incluir a “todos”. No entanto, percebemos que, em se tratando de sistema jurídico e, mais especificamente, do sistema jurídico-legal nacional, questões como “diferença” e “poder” estão limitadas: um exemplo disso é o próprio sexismo da linguagem jurídica (e na linguagem de maneira geral), sintoma de violência cultural, que reflete, mas também contribui, para a construção da desigualdade sexual na sociedade. Na visão de Mills (2003), a linguagem afirma, mas também contesta, o status quo, e as mudanças nas estruturas sociais necessitam de um “vocabulário e formas de expressão novas”; naquelas sociedades – de língua inglesa – onde a linguagem sexista foi mais tenazmente combatida, palavras como chairman foram substituídas por chair ou chairperson; fireman, por firefighter, e assim por diante. No entanto, uma vez que “sexismo”, na sociedade contemporânea, significa de modos diferentes, a sua definição, ou contextualização, também se tornou mais difícil se comparada com aquela da segunda onda feminista, que o definia como um conjunto de práticas, que reflete um determinado conjunto de atitudes em relação às mulheres (cf. Mills, op. cit.). O efeito de uma definição múltipla, ou a falta de definição, seria o “sexismo indireto”, que, nas palavras de Mills (2003): Now it seems that sexism in English is largely “indirect sexism”, that is, sexism which manifests itself at the level of presupposition, and also through innuendo, irony and humour, or which is prefaced by disclaimers or hesitation.1 (Mills, 2003, p. 1) 1
Tradução nossa: “Parece que, atualmente, o sexismo em inglês, trata-se do ‘sexismo indireto’, ou seja, o sexismo que se manifesta no nível das pressupo-
impasses da contemporaneidade sejam resolvidos e, em suas palavras, os homens (a palavra aqui está a definir as pessoas do sexo masculino, e não a “humanidade”) não buscam, de fato, o desenvolvimento cultural; esta é a razão pela qual a definição de humanidade se tornou simplista, o que, conseguintemente, gerou não só a “falta de uma religião apropriada aos tempos atuais”, mas também a falta de um “controle completo da linguagem, como um instrumento de troca social ou um meio de adquirir ou criar conhecimento”. Assim nos diz a autora: Our legislation is not adequate to regulate private, religious, national, and international conflicts, particularly when it comes to the protection of life. Therefore, we no longer have any God(s), any language, any familiar cultural landscape… What do we have, then, to base social groups upon? I know some people think that the great eve of universal well-being has arrived. But which universal? What new imperialism is there lurking in all this? And who will pay the price for it? There is no universal valid for all men and women aside from the natural economy. All other universals are partial constructions and, as a result, authoritarian and unjust.2 (Irigaray, 1993, p. 76)
Masculinos, os sistemas representacionais, então, têm a ver com a experiência “masculina” – e não “feminina” – de mundo, fazendo com que as leis, os processos e as decisões judiciais sejam “realizados” de acordo com a experiência dos homens, e não das mulheres; portanto, o direito é construído de acordo com “homem”, “masculino” e “masculinidade”. Em uma visão pós-estruturalista, as categorias baseadas nos gêneros sexuais são as fontes da injustiça social; assim, a construção “diferença sexual” é o produto e a condição necessária para que a heterossexualidade seja a norma sexual dominante da sociedade. Desse modo, podemos considerar que a experiência “feminina” está “fora” dos sistemas representacionais, não sendo legitimada também na linguagem jurídica. De acordo com Irigaray (1993), um sistema jurídico de equidade, para ambos os sexos, deve ser conquistado, a fim de que alguns sições, insinuações, ironia e humor, ou o qual é precedido por retratação ou hesitação” (Mills, 2003, p. 1).
Como o leitor pode perceber, as questões sobre “igualdade” – conceito muito valorizado, mas pouco praticado – envolvem as questões de “diferença”, questões essas que geram efeitos 2
Tradução nossa: “A nossa legislação não é adequada para regular os conflitos privados, religiosos, nacionais e internacionais, particularmente aqueles que se referem à proteção da vida. Portanto, não temos mais Deus(es), linguagens, nenhum cenário familiar... No que se fundamentam, então, os grupos sociais? Eu sei que algumas pessoas pensam que estamos na véspera de alcançar o bem estar universal. Mas, qual universal? Qual o novo imperialismo está lá a tocaiar tudo isso? E quem pagará o preço? Não existe um universal válido para todos os homens e mulheres além da economia natural. Todos os outros universais são construções parciais e, como efeito, autoritárias e injustas”.
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As relações entre os gêneros sexuais são negociadas em um contexto jurídico-legal, observando-se preceitos como “neutralidade”, “objetividade” e “igualdade” dos sexos, entre outros conceitos “universais”. No entanto, em português, como atestam muitos textos científicos, jornalísticos, jurídicos, etc., “homem” ainda é sinônimo de “humanidade”, o que contribui para a invisibilidade e exclusão da “mulher” dos sistemas representacionais; desse modo, o “homem” entendido como “norma” sedimenta a ideia de que “ele” é sexo “neutro”. Como procuraremos demonstrar, e concordando com a argumentação de vários autores pós-estruturalistas, essa “masculinização” ou “neutralidade” da linguagem não se trata apenas de um fato linguístico, mas de uma ficção jurídica, que gera efeitos políticos. Se a linguagem “tem sexo” e não é “neutro”, o discurso também é “sexuado” (cf. Irigaray, 1993).
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mais abrangentes, como a própria (re)definição de cidadania, de ética e de democracia. E uma questão está colocada: Como se transformam as relações entre o sexo “masculino” e o “feminino”, visando à justiça social, se os sistemas representacionais, mediados pela linguagem permanecem privilegiando somente um dos polos, isto é, o polo masculino?
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Como seria um conceito de direito, que permitisse à mulher ser reconhecida como a própria fonte de avaliação, e representação, da diferença sexual, e como tal conceito poderia ser justificado, é o que indaga Cornell (1998, p. 11), para quem as mulheres, para começar, devem ser avaliadas como “pessoas” livres e iguais. Assim diz essa autora:
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Following Kant, we should privilege the freedom of every member of society simply as a human being. For women, it is this freedom that has historically been denied. Second, we should demand the equivalent evaluation of our sexual difference, a demand clearly mandated by any fair theory of distributive justice. In the first instance, equivalent evaluation is a demand for women’s inclusion in the moral community of persons as an initial matter. On the second level, which follows because we have gained recognition as free and equals persons, it is a demand for fair, and thus, equitable treatment whenever and wherever our sexual difference needs to be taken into account. The fairness would ensure our equal ability to make use of the basic liberties guaranteed to all citizens and would require fair access to opportunities, goods, resources, or capabilities.3 (Cornell, 1998, p. 11) 3
Tradução nossa: “Seguindo Kant, nós deveríamos privilegiar a liberdade de cada membro da sociedade simplesmente como um ser humano. Para as mulheres, é este tipo de liberdade que foi historicamente negado. Em segundo lugar, nós deveríamos exigir a avaliação equivalente de nossas diferenças sexuais, uma exigência claramente mandatória por qualquer teoria justa de justiça distributiva. Em primeiro lugar, a avaliação equivalente é uma exigência para a inclusão da mulher na comunidade moral de pessoas como uma questão inicial. Em um segundo nível, que se segue por termos sido reconhecidas como pessoas iguais e livres, é a exigência por um tratamento justo e, portanto, equitativo, toda a vez que a nossa diferença sexual tenha que ser levada em consideração. Esta equidade
Se concordarmos que o direito constrói, mas também é construído pelo social, e se a experiência “feminina” não pode ser “legitimada” pela/na linguagem jurídica, “pessoa” não é um termo “neutro”, como seria de se esperar; se “pessoa” representa a experiência masculina, que é a “norma” para “todos”, a experiência “feminina” é diferente daquela que a linguagem jurídica apresenta.
OS UNIVERSAIS “DIFERENTES” DE IRIGARAY Gender difference mandates a new thought, a new discourse, that would solder together the division between the gods and the law. (Irigaray, 1993a, p. 140)
Irigaray (1985a, p. 133) critica a noção de sujeito universal, baseada no argumento de que “qualquer teoria do ‘sujeito’ sempre foi apropriada pelo ‘masculino’”, que “participa” da ordem simbólica. O “simbólico”, seguindo a visão lacaniana, é a capacidade que o sujeito tem de adentrar na linguagem, “masculina” e, portanto, que exclui “mulher”, exclusão esta necessária para a manutenção e o funcionamento da própria ordem simbólica. Assim nos diz essa autora: The question whether, in his logic, they can articulate anything at all, whether they can be heard, is not even raised. For raising it would mean granting that there may be some other logic, and one that upsets his own. That is, a logic that challenges mastery.4 (Irigaray, 1985, p. 90)
asseguraria a nossa capacidade igualitária de fazer uso das liberdades básicas garantidas a todos os cidadãos, requerendo um acesso justo às oportunidades, aos bens, aos recursos e a ser legalmente capaz” (grifo do autor). 4 Tradução nossa: “A questão é se alguma coisa possa ser articulada dentro da lógica deles, ou, se elas podem ser escutadas, não está nem colocada. Porque levantar este tipo de questionamento significaria reconhecer que talvez exista outro tipo de lógica, e uma que perturbaria a própria lógica masculina, isto é, uma lógica que desafia o próprio domínio”.
Irigaray (1985), o feminino não permaneceu o “gênero diferente”, mas se transformou no “não masculino”, uma realidade inexistente, a representação do “outro do mesmo”. Uma “alteridade radical”, o “outro do outro” conseguiria escapar àquela representação, mas não pode ter como origem as teorias “masculinas”. Irigaray diz (1993, p. 12): Sexual difference cannot therefore be reduced to a simple, extralinguistic fact of nature. It conditions language and is conditioned by it [...] Just as an actual woman is often confined to the sexual domain in the strict sense of the term, so the feminine grammatical gender itself is made to disappear as subjective expression, and vocabulary associated with women often consists of slightly denigrating, if not insulting, terms which define her as an object in relation to the male subject. This accounts for the fact that women find it so difficult to speak and to be heard as women. They are excluded and denied by the patriarchal linguistic order. They cannot be women and speak in a sensible, coherent manner.6
Na visão irigaraniana (1985), a teoria do espelho de Lacan nega à mulher a especificidade de seu relacionamento com o imaginário, porque está construído sobre o que o olhar masculino veria em um espelho “achatado”, que refletiria os órgãos sexuais das mulheres como, meramente, um “buraco”. Assim diz a autora (Irigaray, 1985, p. 95): Anything, at any rate, so long as she is not a “subject”, so long as she cannot disrupt through her speech, her desire, her pleasure, the operation of the language that lays down the law, the prevailing organization of power.5 (grifo do autor)
Para Irigaray (1985), as mulheres são, de facto, a “terra” sobre a qual os homens construíram as suas abstrações teóricas, o “espelho” no qual os homens veem uma cópia inferior deles mesmos; assim, o sujeito universal só se firma como “norma” quando tem um objeto apropriado e complacente: o “espelho” estático para refletir. Permitir ao objeto falar significa perturbar a unidade e a coerência do sujeito que precisou do mito da projeção e da inércia para se transformar no sujeito transcendental. Portanto, não há “diferença”, posto que, no sistema patriarcal, ser “diferente” significa ser “diferente do mesmo”, do “objeto do sujeito” ou da “cópia imperfeita”. Então, ainda parafraseando 5
Tradução nossa: “Qualquer coisa, desde que ela não seja o ‘sujeito’, desde que ela não perturbe através da fala, do desejo, do prazer, o funcionamento da linguagem que faz a lei, a organização do poder prevalecente”.
“MULHER” E A INCLUSÃO NO “HUMANO”/ “HUMANIDADE” Repetir, constantemente, que as mulheres são diferentes dos homens, que elas não são “iguais” a eles, pode causar certo desconforto na doutrina jurídica; a “inovação” não está na descrição do que seja “homem” ou “mulher”, mas de como “homem” 6
Tradução nossa: “A diferença sexual não pode, portanto, estar reduzida a um simples, extralinguístico, fato da natureza. Ela condiciona e é condicionada pela linguagem [...] Assim como uma mulher é frequentemente confinada ao domínio sexual no sentido restrito do termo, o gênero gramatical feminino também desaparece como uma expressão subjetiva, sendo frequente que o vocabulário associado com mulheres consista de termos levemente denegridos, quando não um insulto, que a define como um objeto em relação ao sujeito homem. Esse é o motivo da dificuldade que as mulheres encontram em falar e serem ouvidas como mulheres. Elas são excluídas e negadas pela ordem linguística patriarcal. Elas não podem ser mulheres e falar de uma maneira sensata e coerente”.
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A hegemonia da “masculinização do simbólico” e, portanto, da civilização ocidental é tão bem-sucedida que afeta as representações do imaginário “mulher/feminino”. Relembramos: “imaginário”, para Lacan, é o estágio da formação do ego, o momento em que o infante se reconhece, através do espelho, como um “todo”; porque este momento precede o simbólico – e a assimilação total da linguagem –, considera-se um momento autenticamente “feminino”.
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e “mulher” podem ser equiparáveis dentro do sistema jurídico-legal. Em outras palavras, atestar a “igualdade” ou a “diferença” é necessário, mas não suficiente, posto que a celebrada “igualdade” inexiste e “diferença” também significa o diferente da norma, o desvio, o outro e, portanto, o “não humano”. A resposta mais óbvia à pergunta: “Quem é igual perante a lei?” seria “cidadãos”, “sujeitos” ou “pessoas”, isto é, uma noção universal abstrata; aqueles indivíduos, sob a lei, serão tratados como igual a qualquer outro indivíduo na mesma circunstância, que, para tanto, serão designados de acordo com um modelo universal de sujeito de direitos.
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Assim, “todos” são iguais ao “sujeito de direitos” universal, sendo o termo “universal” utilizado para indicar que tal conceito deve ser, “justamente”, aplicado a “todos”.
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Na visão de Irigaray (1993, p. 14), os sujeitos não são os “mesmos” e nem “iguais” e, em assim sendo, têm o direito ao reconhecimento da “diferença”; se a dignidade humana é fundamental para todos, então, é a “diferença” que tem que ser valorizada, e não a “igualdade”. A definição de direito à “dignidade humana” para a autora (op. cit.), no entanto, pode causar estranheza, uma vez que significa: a) o fim do uso comercial e das imagens das mulheres; b) as representações válidas das mulheres em ações, palavras e imagens em todos os lugares públicos; e c) o fim da exploração da maternidade – uma parte funcional da mulher – pelos poderes civis e religiosos. Na argumentação de Irigaray (1993a, p. 118), as leis e os direitos são considerados “neutros”, mas, como foram realizados por um dos gêneros somente, na prática, essa neutralidade inexiste; o universal é culpado, então, por “matar” a vida, sem concebê-la de uma maneira mais completa; “entre o universal natural e o universal das leis, dos costumes e das verdades não há passagem, crescimento, transformação” (op. cit., p. 117). A representação no sistema jurídico dos direitos de cada gênero sexual, como
partes diferentes, a fim de que a mulher possa se tornar visível, em sua singularidade sexual, é a proposta de Irigaray (op. cit.), para quem os seres viventes são sexuais, e esta realidade não pode ser negada, sob pena de o universal ser uma obrigação abstrata, sem método de pensamento (Irigaray, 1993a, p. 140). O “universal ético” não pode ser garantido sem o “respeito às percepções de cada homem e mulher como sendo condições de vida espiritual e física”. Os sentidos, para Irigaray (1993a, p. 145), mediam os pensamentos e estão ligados à função elementar da vida social, que é o sexo, “um dos modos fundamentais da condição humana”. Assim nos diz ela: Our senses stand at the juncture between the individual and the social, the private and the public. The right to the senses is a private and public right, individual, familial, natural, and civil. Our governments don’t care much about hunger in the world, but they care even less about respect for our bodies as the meeting ground of the private and the public. Not much thought is given to ways in which the subjective as body and flesh might be experienced as the objective. A subjectivity that knows nothing about of itself as object cannot really be a subjectivity.7 (Irigaray, 1993a, p. 145)
No aspecto jurídico-legal, a “diferença” não é somente o contrário de “igual”: é também o contrário de “igualdade”. Para que a “diferença” excluída de Irigaray possa funcionar na teoria jurídica, ou no sistema liberal – que pressupõem a igualdade –, o modelo masculino não pode ser o pressuposto, teria que haver outro tipo
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Tradução nossa: “Os nossos sentidos se encontram na junção entre o individual e o social, o privado e o público. O direito aos sentidos é um direito privado e público, individual, familiar, natural e civil. Os nossos governos não se importam muito sobre a fome no mundo, mas se importam ainda menos com o respeito pelos nossos corpos como o lugar de encontro entre o privado e o público. Não se pensa muito sobre os caminhos pelos quais o subjetivo, como corpo e carne, devem ser experienciados como objetivo. A subjetividade que não se conhece como objeto não pode realmente ser uma subjetividade”.
Desse modo, Irigaray (1993) está a sugerir a instituição de um princípio de diferença que seja capaz de verificar a especificidade de cada indivíduo, em determinadas situações, ao invés de tentar enquadrar um modelo universal abstrato de subjetividade, ou de personalidade, modelo este que, de qualquer modo, não engloba a todos os indivíduos. A autora, como se observa, preocupa-se com uma intervenção prática, de como gerenciar certas questões legais que tem a ver com a especificidade das vidas “verdadeiras” das mulheres e, portanto, a simples mudança jurídico-legal de uma “igualdade” para uma “diferença formal” não seria viável. Irigaray (op. cit.) sugere que expor, teoricamente, um modelo supostamente neutro de sujeito universal, e de igualdade, faz uma diferença significativa para a vida das mulheres; um “universal” de “diferenças” que possa “mediar”, ao invés de “determinar” ou “legislar”, seria a proposta. Então, parafraseando a autora (1993, p. 04), a busca pela igualdade aos homens trata-se de um erro ético sério, uma vez que a exploração das mulheres está baseada na diferença sexual, e a solução para tal exploração só poderá ocorrer pela própria diferença sexual. Assim nos diz ela (op. cit.): To wish to get rid of sexual difference is to call for a genocide more radical than any form of destruction there has ever been in History. What is
important, on the other hand, is to define the values of belonging to a gender, valid for each of the two genders.8
“Genocídio” provavelmente se refere à eliminação final da raça e da cultura “mulher/feminino”, o resultado simbólico da perda do gênero “mulher/feminino” pela obtusidade jurídica ou cultural. Desse modo, podemos afirmar que a “solução” de Irigaray está na realização de leis – as representações públicas das diferenças sexuais – diferentes para os dois sexos; para a autora (1993, p. 5), a igualdade entre homens e mulheres não poderá ser alcançada sem uma teoria do gênero que seja “sexuada” e sem uma (re)elaboração dos “direitos e deveres de cada sexo qua different, nos direitos e nas obrigações sociais”. Assim continua Irigaray (idem, p. 79): All these misunderstandings could be resolved by the recognition that different laws exist for each sex and that the equivalent social status can only be established after these laws have been encoded by civil society’s elected representatives.9
Trata-se, então, da representação, e do reconhecimento, que tais leis permitiriam. Essa representação/reconhecimento seria uma “equivalência social” – não “igualdade” – que pode ser expressa como “igualdade”, desde que esteja baseada na “diferença”. Essa ideia, de diferenciação do “um” do “outro”, tem a ver com o projeto de “se tornar pessoa” de Cornell (1998), que
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Tradução nossa: “Desejar se livrar da diferença sexual é desejar um genocídio mais radical do que qualquer outra forma de destruição acontecida na história. O que é importante, por outro lado, é definir os valores de pertencer a um gênero, válido para cada um dos dois gêneros”. 9 Tradução nossa: “Todos estes desentendimentos poderiam ser resolvidos pelo reconhecimento de que leis diferentes existem para cada sexo, e que o status social equivalente, somente poderá ser estabelecido depois que estas leis forem codificadas pelos representantes eleito da sociedade civil”.
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de representação; uma nova maneira de “ver” e “ouvir”, capaz de reconhecer e valorizar a “alteridade radical” (já presente) em todos “os outros dos outros”, ainda não reconhecidos como “completo”, e nem como “pessoas de direito”. A “diferença” irigariana aniquila o conceito de “igualdade”, que privilegiou um modelo masculino de subjetividade. As teorias que produziram e aderiram à “igualdade” não deixaram de “excluir” e, portanto, se o sistema jurídico insistir na utilização de tal preceito, o próprio princípio tem que “reconhecer” que contribui para “exclusões”.
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pressupõe uma capacidade de definição (ou, autodefinição) da própria “pessoa”. Portanto, na visão irigariana, uma vez que a “justiça” social, ou sexual, não pode ser alcançada sem a alteração das leis da linguagem, e das concepções de “verdade e valores” que fundamentam a ordem social, seria importante entender e mudar os instrumentos socioculturais que regulam os direitos objetivos e subjetivos.
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Levando em consideração as colocações anteriores, analisaremos, a seguir, o comportamento do sistema jurídico quando este se depara com certos tipos legais, como o assédio sexual, por exemplo, uma inovação feminista que talvez pela primeira vez na história do direito “desafia” o sujeito “masculino” universal de direitos, pois se trata de um ilícito penal definido por mulheres.
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Primeiramente, seria interessante dizer que a Lei nº 10.224, de 15.05.2001, adicionou ao Código Penal brasileiro o art. 216-A no Capítulo dos Crimes Sexuais contra a Liberdade Sexual, assim descrevendo o crime de assédio sexual: “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função” (a pena é de detenção de um a dois anos). Além da tipificação penal, o assédio sexual gera responsabilidade civil, como as condenações por danos morais. Países como Espanha, Portugal, França e Itália também criminalizam o assédio sexual, e países como o Canadá somente consideram o assédio sexual crime quando for “grave”, isto é, se o assédio conduzir a alguma forma de violência (sexual assault) ou ao crime de stalking (criminal harassment)10. Desse modo, na esfera civil, uma vez que o 10 Stalking, no Brasil, seria uma perseguição constante, configurada pela contravenção penal de “perturbação da tranquilidade” (cf. Damásio de Jesus. Disponível em: www.damasio.com.br. Acesso em: 14 jan. 2011).
assédio sexual se vincula à relação de trabalho e, normalmente, se refere a pedidos de indenização por danos morais, os casos são (geralmente) tratados pela Justiça do Trabalho. Seria interessante ponderar que a definição norte-americana de assédio parece ser mais ampla, na medida em que define “local de trabalho” como: an office, a factory, a building, a private home, a school, a store (um escritório, uma fábrica, um prédio, uma casa, uma escola, uma loja)11. De acordo com Feijó , a alteração do Código Penal sofre críticas “por não abranger situações como o assédio praticado por padres, professores, parentes ou pastores, limitando-se aos casos de relação de trabalho com superioridade hierárquica”. Para ilustrar como o assédio sexual é tratado judicialmente, recorremos a decisões relacionadas a dois casos de assédio sexual: uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Rio Grande do Sul, confirmada pela 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em 01.06.2007, e outra do TRT da 8ª Região (Pará/Amapá). O primeiro caso diz respeito ao então secretário do Sindicato dos Estivadores do Porto de Rio Grande (RS), superior hierárquico de uma datilógrafa que, durante anos, recebeu vários cartões de amor e telefonemas com pedidos de “namoro”, fatos que não foram considerados suficientes para caracterizar o assédio sexual12. 11 Talking About Harassment: Extraído da Seção 1 da publicação Workplace Harassment Action Taskforce and Ontario Women’s Directorate’s: “Workplace Harassment: An Action Guide for Women”. Toronto, ON: Ontario Women’s Directorate, 1995. Disponível em: <www.womanprevention.com/ html/prevention/harassment.html#whatisharassment>. Acesso em: 14 jan. 2011. 12 Disponível em: <www.tudodireito.com.br/informações>. Processo nº RR 69178/2002-900-04-00.7.
No acórdão do TRT, a reparação pecuniária por dano moral na Justiça do Trabalho (aqui se trata do chamado assédio por intimidação, ou ambiental, que não é crime, mas permite a reparação por danos morais) foi negada porque a integridade física e/ou psicológica e a dignidade da empregada não foram consideradas afetadas (grifos nossos)13. “Pelo que se vê do quadro, o preposto do sindicato estava fascinado por dotes da empregada, que o atraíam”, disse o juiz que considerou a corte (a paquera) ocorrida dentro dos limites razoáveis, ponderando que o superior hierárquico não teve a devida sensibilidade para perceber que não era correspondido (grifo nosso). A empregada recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), que desconheceu tal recurso de revista, uma vez que o TRT consignara não haver prova de constrangimento, provocado na busca de favores sexuais; na esfera recursal, de acordo com a Súmula nº 126 do TST, não se pode revolver os fatos e as provas. 13 A ação indenizatória por dano moral está expressamente prevista na Constituição Federal de 1988, por seu art. 5º, inciso X, que diz: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
De modo oposto, em outro caso de assédio sexual o TRT da 8ª Região (Pará/Amapá)14 indenizou, por dano moral, uma bancária que, admitida em 1999 como escriturária de banco, exerceu as funções de caixa e de chefe de serviço sem, no entanto, receber qualquer alteração salarial pela função – diferenciada – exercida. Ao engravidar, essa funcionária comunicou o seu estado ao banco, que a dispensou do trabalho dois dias depois da comunicação. Como consequência, sofreu um aborto espontâneo. O chefe, de acordo com a reclamante, “realizava constantes investidas com conotação sexual, com propostas de vantagens e promoções”, além de ameaçá-la de demissão caso fosse barrado em suas “investidas”. Ficou provado, por meio de testemunhas, que o gerente tinha um interesse especial pela funcionária; ele a tocava nos ombros, no pescoço e nos cabelos, fazendo-lhe, de fato, convites para sair e viajar. A sentença apontou para a mudança de comportamento da autora da ação: de alegre e comunicativa para triste e calada, e a redução de produtividade comprovou o abalo emocional da funcionária. O banco, recorrendo ao TRT, argumentou que o assédio sexual implica em importunação séria, grave e ofensiva, e não em “simples gracejos ou paqueras”, e que o gerente agira de boa-fé, porque as suas intenções para com a funcionária eram claras, inclusive perante aos outros colegas de trabalho e que, além disso, as tais ameaças alegadas não tinham sido provadas no decurso processual. O TRT, reconhecendo o abalo emocional, o constrangimento e as humilhações sofridas no ambiente de trabalho, destacou que a indenização por dano moral visa a reparar a natureza íntima e pessoal do assediado (grifo nosso), “levando-se em conta o caráter pedagógico da pena e o fato de tratar-se de empresa de 14 Disponível em: <www.spaut.com.br/julgamento1.htm>. Processo nº AI-RR 251/2005-103-08-40.5, de 27.07.2007.
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Para o Tribunal, o assédio somente se configura quando “encerra condição imposta a quem procura o trabalho, deseja conservá-lo ou postula melhorar as suas condições, o que não é o caso da paquera”, de acordo com a tese defendida pelo Ministro Luiz Vicente Carnicchiaro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que afirma: “No galanteio, o homem se insinua, busca o consentimento da mulher; pode haver insistência, mas não há condição. A mulher é livre para aceitar, ou recusar” (grifo nosso).
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grande porte econômico e de empregada com mais de quatro anos de serviço”. No Tribunal Superior do Trabalho (TST), o banco não conseguiu reverter o resultado, pois, de acordo com a Súmula nº 126, novamente, na esfera recursal, não se reexamina os fatos e as provas definidos pelo Tribunal Regional15.
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Como pode ser observado, foram apresentadas duas soluções diferentes para casos similares, mesmo reconhecendo que, no segundo caso, uma “gravidade” maior possa ser constatada, vez que a “investida sexual” ficou caracterizada com as propostas de vantagens profissionais, diferentemente do que ocorreu no primeiro caso. No entanto, podemos indagar por que, no primeiro caso, houve o entendimento de que a vítima (ou melhor, a reclamante) não tenha se sentido tão humilhada, constrangida ou emocionalmente abalada quanto a reclamante do segundo caso? Afinal, a tipificação do assédio sexual e as condenações por danos morais produzem, supostamente, um efeito pedagógico, a fim da coibição de tais práticas (de assédio), as “sexualizações” desnecessárias que funcionam contra as mulheres em ambientes profissionais.
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A chance de uma ação privada que possa “reconhecer” o dano causado não parece ser uma opção tão questionável, mas, relembramos Irigaray (1993), quando afirma a existência de dois tipos de lei em funcionamento: a lei dos estados e a lei dos costumes sociais (ou lei religiosa), a família abriga as duas formas; mas a “lei dos estados” – que está baseada na propriedade, concentrando-se, portanto, no dinheiro – é a única reconhecida pelo direito civil ou constitucional. O Estado, portanto, que não está preocupado com o que a autora chama de “universal da mediação”, não pode “criar” direitos apropriados para as mulheres, uma vez que o objetivo principal do Estado é o dinheiro, 15 Apesar de crime de ação penal privada, ou seja, aquele em que cabe à vítima acionar o Poder Público por meio da queixa, tratou-se o assédio sexual aqui de indenização por dano moral e, portanto, de ação civil.
um fundamento vazio e abstrato para a lei. Irigaray argumenta que (1993a, p. 193): [...] the difference between the sexes has been reduced to a matter of money, just like everything else. The second major characteristic of patriarchal law, in fact, is that it is almost entirely concerned with questions of property. In law the individual is defined in terms of his relation to possession. He must submit to this. The race of men are blind to the meaning of their patriarchal foundations, and thus unaware that, originally, the privilege of capital concerns men alone. Politicians and scholars argue learnedly about the fact that wealth, which is supposedly genderless, must be divided equally. But wealth must be understood to mean the accumulation of goods through exploitation, and to be the outcome of one sex’s submission to the other.16
De acordo com Render (2006)17, as teorias feministas – assim como a chamada queer theory – têm se perguntado, nos últimos anos, o que estaria errado com o assédio sexual. Na opinião da autora, a queda do modelo de sexualidade “homem-sujeito/ mulher-objeto” e as discussões sobre os gêneros, isto é, o fato de o gênero per se não poder ser “utilizado” como categoria relevante para explicações, vez que é socialmente construído, 16 Tradução nossa: “[...] a diferença entre os sexos foi reduzida a uma questão de dinheiro, assim como tudo mais. A segunda maior característica da lei patriarcal, de fato, é que está praticamente inteiramente preocupada com questões relativas à propriedade. Na lei, o indivíduo está definido em termos de sua relação com a posse. Ele deve se submeter a isso. A raça dos homens está cega ao significado de sua base patriarcal e, portanto, desconhecedor do fato de que, originalmente, o privilégio do capital se relaciona somente com os homens. Os políticos e os teóricos argumentam, sabiamente, sobre a riqueza, que, supostamente, não tem gênero, dever ser dividida igualmente. Mas, a riqueza deve ser entendida como a acumulação de bens através da exploração, e como o resultado da submissão de um sexo pelo outro”. 17 RENDER, Meredith. Misogeny, Androgyny, and Sexual Harassment: Sex Discrimination in a Gender-Deconstruct World. Harvard Journal of Law & Gender, v. 29:1, p. 99-150, 2006. Disponível em: <www.harvard.edu/ students/orgs/jlg/vol291/99-150.pdf>. Acesso em: 9 jun. 2009.
deixaram um vazio no espaço conceitual do assédio sexual. Assim diz essa autora (op. cit., p. 102, tradução nossa):
at the root of the dominant paradigm’s picture of feminized-female-ascommodity.19
In this way, both feminist theory and queer theory gender and sexuality deconstruction have introduced a panoply of challenges to traditional understandings of sexual harassment as a form of sex discrimination. Where these two conceptual frameworks collide with sexual harassment doctrine, the doctrine, as currently constituted, appears to fare badly. In a post-modern light, the doctrine seems essentialist. It seems predicated on antiquated and even moralized notions of women and sexuality. It seems to perpetuate a victimization mythology. It seems to be overinclusive and underinclusive and, at all times, slightly repressive.
Para Render (2006), o paradigma dominante, “mulher feminilizada” como commodity, e as desigualdades históricas das categorias em relação a direitos é o que está errado na essência do assédio sexual, um “dano” que foi negligenciado pela teoria desconstrucionista que desconsidera a questão da “classe” – “qualquer um pode assediar, qualquer um pode ser assediado, não há distinções de categoria”, tendo sido o enfoque alterado para a questão do próprio dano per se, isto é, como reconciliar a doutrina do assédio sexual, a fim de que ela seja efetiva, para um número crescente de categorias não identificadas de vítimas? A autora (op. cit., p. 102) argumenta que a base teórica do assédio sexual tem que ser corrigida: trata-se de uma forma de discriminação do gênero, e a lei do assédio é necessária, uma vez que o comportamento sexual continua a ser usado como um instrumento de discriminação sexual e o número de vítimas anônimas crescente. Assim nos diz Render (idem, p. 150):
Apesar disso, na visão de Render (2006), a doutrina do assédio sexual funciona, parecendo levar em consideração e inibindo os danos que o “mundo real” causa às mulheres, que não têm as mesmas vantagens no mundo “masculino”. E por que isso acontece? Assim afirma essa autora (op. cit., p. 102): One potential answer is that social reality continues to reflect false social constructs despite the fact that these constructs have already been theoretically unraveled, which to some extent is undeniable. This Article, however, offers a second answer [...] feminist and queer gender and sexuality deconstruction evolved – and more importantly intersected – in such a way as to present an androcentric-assimilation model of female liberation, while failing to address (and in fact reinforcing) the animus 18 Tradução nossa: “Desse modo, a teoria feminista e a teoria queer – a desconstrução do gênero e da sexualidade –, introduziram uma série de desafios aos entendimentos tradicionais do assédio sexual, como uma forma de discriminação sexual. Aonde esses dois enquadramentos teóricos colidem com a doutrina do assédio sexual, a doutrina como constituída presentemente, parece passar mal. Sob a luz pós-moderna, a doutrina parece essencialista. Parece estar predicada em noções antiquadas e até mesmo moralizantes de mulher, e de sexualidade. Parece perpetuar a mitologia da vitimização. Parece ser simultaneamente, muito e pouco inclusiva, e, sempre, levemente repressiva. De repente, não faz sentido teórico”.
Sexual harassment law inhibits involuntary sexualization at work, and it inhibits the potential of sexual attractiveness as a workplace commodity, in a culture where the commodification of sexual attractiveness at work still disproportionately disadvantages women, and all of this it does, not through an oppressive penal code, but through a private cause of action in which injured is assessed by a jury of peers.20 19 Tradução nossa: “Uma das respostas seria que a realidade social continua a refletir construtos sociais falsos mesmo apesar de estes construtos terem sido desvelados teoricamente, o que, em alguma medida, é inegável. Este trabalho, no entanto, oferece uma segunda resposta [...] a desconstrução feminista e queer [gênero e sexualidade] evoluíram, e mais importante: se intersectaram de tal modo, que apresentam um modelo de assimilação androcêntrica de liberação ‘feminina’, enquanto fracassam em considerar [e, de fato, reforçam] a hostilidade na raiz do entendimento do paradigma dominante da mulher feminizada como commodity”. 20 Tradução nossa: “A lei do assédio sexual inibe a sexualização involuntária no trabalho, e inibe o potencial da atração sexual como uma commodity
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It suddenly fails to make theoretical sense.18
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Como já visto, a autora (op. cit.) propõe corrigir a base teórica do assédio sexual, como uma forma de discriminação sexual (sob uma perspectiva de desconstrução do gênero “pós-feminista/ queer theory”) e, como tal, que padrões teóricos diferentes sejam realizados, a fim de que o “assédio sexual seja teoricamente viável e, pragmaticamente possível” (cf. Render). Cornell (1998, p. ix) teoriza sobre o “domínio imaginário”, termo cunhado pela autora, que seria o “direito” de ir além das definições patriarcais do “eu”, garantido pelas classes sociais, pela raça ou pelos gêneros; o ideal do “domínio imaginário” é a liberdade que o próprio indivíduo tem de se criar, como indivíduo sexuado, como “pessoa” de razão e de emoção; “pessoa”, portanto, é uma “possibilidade”, uma “aspiração que nunca se completa” (op. cit.). Assim afirma ela:
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To say that the imaginary domain is a right is to say that the freedom to be ourselves and the participation in the richness of life is not an arbitrary wish, but an essential right of personality. The imaginary domain can also help us to address the pressing political and ethical issues of prostitution, gay and lesbian marriage, adoption, reproductive rights and new technology, and fathers’ rights movement. Moreover, it provides us with a new way of including women’s issues in the international human rights agenda.21
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do trabalho, em uma cultura na qual a ‘comodificação’ da atração sexual no âmbito profissional, desproporcionalmente, ainda é desvantajoso para mulheres, tudo isso, não através de um código penal opressivo, mas através de uma ação privada na qual o dano é avaliado por um júri imparcial”. 21 Tradução nossa: “Dizer que o domínio imaginário é um direito, significa dizer que a liberdade de sermos nós mesmos, e que a participação na riqueza da vida, não é um desejo arbitrário, mas um direito essencial de personalidade. O domínio imaginário pode também nos ajudar a encaminhar os temas políticos e éticos urgentes como a prostituição, o casamento gay e lésbico, a adoção, os direitos sobre a reprodução e as novas tecnologias e o movimento dos direitos dos pais. Além do mais, nos abastece com um novo modo de incluir os temas relativos às mulheres na agenda internacional dos direitos humanos”.
Esse resultado final, isto é, a transformação do indivíduo em pessoa, estará garantido, desde que o espaço do “domínio imaginário” seja protegido. O que propõe Cornell (1998, p. xii), seguindo o pensamento irigaraniano, é uma redefinição da igualdade social, que estaria a serviço da liberdade sexual, isto é, um feminismo que defenda a “reconciliação de uma liberdade sexual com uma igualdade social”; a lei, para essa autora (op. cit.), não pode garantir o sucesso da transformação, mas pode prover as mesmas condições ou chances para todos na busca da “pessoa” ou da “personalidade” jurídica. Para isso, são necessárias três “condições mínimas de individuação”, descritas como: a proteção à integridade física, o acesso às formas simbólicas e a proteção do espaço do “domínio imaginário” per se. Assim, a lei não assumiria, e nem estabeleceria, os limites e as condições do pessoal, mas preservaria e protegeria as mínimas condições necessárias para que cada um lute, a seu próprio modo, pela própria definição pessoal. Assim nos diz a autora (1998, p. 8): The freedom to orient ourselves to our sexuate being is inspired by Immanuel Kant’s definition of freedom before the law, although we have learned much about “sex” since his time. Certainly, there is widespread agreement that sex is not just a simple fact of our natural being. Since sex, gender, and sexuality are not just given to us, we need the space to let our imaginations run wild if each of us is to have the chance to find the sexual orientation that can bring us happiness. To even aspire to selfrepresentation of our sexuate being we need freedom to explore without fear the representations that surround us. This place of free exploration of sexual representations, and personas, is the imaginary domain.22 22 Tradução nossa: “A liberdade que nos orienta para o nosso ser sexuado é inspirada pela definição de Immanuel Kant de liberdade na lei, apesar de termos aprendido muito sobre ‘sexo’ desde os tempos dele. Certamente, concorda-se amplamente que o sexo não é simplesmente um fato da nossa natureza. Desde que sexo, gênero, e sexualidade não nos são dados, simplesmente, precisamos do espaço para deixar a nossa imaginação livre se cada um de nós quiser a chance de encontrar a orientação sexual
Na visão de Cornell (1998), o direito pode ser “libertador”, na medida em que pode livrar as mulheres das “limitações legais impostas pelo patriarcado”, além de ter o “poder” de reconhecê-las como pessoas “livres” e “iguais”; tudo isto porque o direito, provendo o direito de “representar o nosso ser sexuado”, protegeria o “domínio imaginário como o espaço o qual necessitamos para contestar, imaginar e articular com os sentidos dados aos gêneros, ao sexo e à sexualidade” (op. cit., p. 24). No entanto, parafraseando a autora (op. cit.), o direito não consegue fornecer uma definição substantiva do que seja liberdade individual, pois, ao fazê-lo, o sistema jurídico-legal viola o direito do indivíduo à autorrepresentação do seu ser, que é sexuado. que trará felicidade. Para até mesmo aspirar a uma auto-representação do nosso ser sexuado, precisamos da liberdade de explorar sem temer as representações que nos cercam. Este lugar de explorar livremente as representações sexuais, e personas, é o domínio imaginário” (grifo nosso).
The “second” wave of feminism has successfully named experiences that prior to this naming could not be signified to others. A woman who is sexually assaulted on a date can now condemn what happened to her as date rape. A woman who has had to endure sexual advances on the part of her boss can now externalize as sexual harassment, as a wrong.23 (Cornell, 1998, p. 24, grifo do autor)
A concepção legal “igualdade sexual” não foi teorizada para enquadrar os crimes de violência sexual, ou as questões sobre a reprodução, porque a “teoria da igualdade foi escrita a partir da experiência do homem, e não das mulheres” (MacKinnon, 2007, p. 23) e, em certas jurisdições relacionadas ao direito civil, questões como o assédio sexual continuam mal interpretadas pelo direito e pela sociedade. MacKinnon (2007, p. 190) afirma: In jurisdictions where the claim for sexual harassment is not clearly located in law as a form of sex discrimination, as in France, the doctrine continues in society as well as law to be confused with traditional moral structures, and to be socially delegitimated by that confusion. In this setting, laws against sexual harassment are likely to be misconstrued as repressive, as restrictions on what is reflexively considered the sexual freedom of perpetrators, rather than as liberating and enhancing to the sexual freedom of those who need no longer be their victims.24 23 Tradução nossa: “A ‘segunda’ onda do feminismo conseguiu nomear, com sucesso, as experiências que, antes disto, não significava nada para outros. Uma mulher que sofre violência sexual em um encontro de namoro, agora, pode dizer que o fato foi estupro. Uma mulher que tenha recebido algum tipo de proposta com conotação sexual, por parte de seu chefe, pode agora externalizar o fato como assédio sexual, como um ilícito”. 24 Tradução do original: “Nas jurisdições onde o assédio sexual não está claramente estabelecido na lei como uma forma de discriminação sexual, como na França, a doutrina continua na sociedade e também no direito a ser confundida com as estruturas morais tradicionais, e a ser deslegitimada socialmente por essa confusão. Neste cenário, as leis contra o assédio sexual provavelmente serão erroneamente construídas como repressivas, como restrições ao que é reflexivamente considerada a liberdade sexual dos predadores, ao invés de libertar e ressaltar a liberdade sexual daqueles que não precisam mais ser as vítimas de tais desviantes”.
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“Pessoa”, “cidadão” ou “sujeito” têm direitos, mas tratam-se de termos “neutros” – nem feminino e nem masculino –, que existem de acordo com um modelo universal de “sujeito de direito” e se toda e qualquer teoria do “sujeito” sempre foi apropriada pelo “masculino”, de acordo com a afirmação de Irigaray (1985, p. 133), então “pessoa”, “cidadão” ou “sujeito”, na verdade, representam “homem” e “masculino”. E, além disso, podemos dizer que representam também, simultaneamente, um conceito que exclui e inclui, que não se aplica a todos os membros da estrutura social, nem nas sociedades consideradas mais democráticas. Assim, a problematização irigariana está em reconhecer que “universal” não é universal e, portanto, excluída está a possibilidade da diferença sexual, o que não implica ser ilegítimo o reconhecimento constitucional da diferença sexual, que representa a questão “mais” universal da contemporaneidade, seja no campo ético, político ou jurídico.
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Uma posição que parece ser dominante na doutrina nacional é a não intervenção do Direito Penal em casos como a prostituição, a pornografia, o adultério, o incesto, etc., quando os “participantes” forem adultos e, portanto, “autônomos” e “livres” para escolher, isto é, questões que se relacionam com a proteção penal da “liberdade” e da “autodeterminação” sexual: o bem jurídico protegido, então, seria o direito à liberdade e à autodeterminação sexual, e não à moral sexual, por assim dizer. Relevantes, essas questões parecem tratar de uma igualdade plena já alcançada em uma sociedade “perfeitamente” democrática e justa com os gêneros; no entanto, “mulher” “igual”, “emancipada” e “livre” é sistematicamente desmentida pela sociedade patriarcal e mais parece (ainda) personagem de ficção científica.
CONCLUSÕES
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Conceitos “liberais”, “radicais” ou “pós-estruturais” podem ser interrelacionados na discussão sobre “igualdade” e “diferença” sob a perspectiva da teoria feminista, como o leitor pôde bem perceber.
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Autores como Braidotti (2002), afirmando que a diferença sexual é um “fator positivo de assimetria entre homens e mulheres”, consideram também que as filosofias feministas da diferença sexual estão “historicamente incorporadas no declínio e crise do humanismo ocidental, na crítica ao falogocentrismo e na crise da identidade europeia” (op. cit., p. 12). Como pôde ser constatado, e concordando com esses autores que pensam “processos”, e não “conceitos”, a crítica iragariana, aqui fartamente utilizada, diz respeito ao falocentrismo que estrutura o pensamento teórico e à exclusão sistemática do “feminino” da representação teórica, em um esforço de “reinventar a imagem do sujeito como uma entidade totalmente imersa nas relações de poder, conhecimento e desejo” (Braidotti, 2002, p.
7), que se traduz na visão positiva de um sujeito, diferentemente daquela imagem racionalista da filosofia institucionalizada. De acordo com Braidotti (2002, p. 22), o “feminino” de Irigaray não se trata de uma entidade “essencializada”, e nem de uma entidade a qual se tenha um acesso imediato; na verdade, trata-se de uma “realidade virtual”, pois é “o efeito de um projeto, um projeto político e conceitual de transcendência da posição-sujeito mulher como o outro do mesmo, para expressar o outro do outro” (Braidotti, op. cit). Nas palavras da autora (idem, p. 267), “uma vez que o sistema-valor dos gêneros tem um papel normativo, a política dos gêneros, no tocante à diferença sexual, pode fornecer ‘figurações’ adequadas para as transformações sociais de nossos tempos”. Assim nos diz Braidotti (2002, p. 15): At both the micro – and the macro – levels of the constitution of subjectivity, we need more complexities both in terms of genders and across ethnicities, class and age. This is the social agenda that needs to be addressed. The inflationary discourse of the “feminine” has never proved particularly helpful for women and “others”, unless it is supported by a healthy dose of feminist consciousness.25
Para discutir algumas questões relacionadas à “igualdade”/“diferença” dos gêneros, recorremos a duas ilustrações, isto é, duas decisões judiciais, com a finalidade de verificar o comportamento da estrutura jurídico-legal, quando confrontado com o “feminino”, em um tipo de crime que ainda causa inúmeras controversas na doutrina jurídica e nas questões que se referem à liberdade sexual, à liberdade de escolha e à autonomia de homens e mulheres, ou do “masculino” e do “feminino”; estas questões teriam 25 Tradução nossa: “Em ambos os níveis, micro e macro, da constituição da subjetividade, precisamos de mais complexidades em termos de gêneros e de etnia, classe e idade. Esta é a agenda social que precisa ser encaminhada. O inflacionário discurso de ‘feminino’ nunca provou ser particularmente útil para mulheres, e para ‘outros’, a menos que fundamentado por uma dose saudável de consciência feminista”.
que estar interrelacionadas com questões relativas à moral e à ética, entre outras, questões que pertencem ao debate sobre o assédio sexual, mas que não eram pertinentes a este artigo.
REFERÊNCIAS
Apesar das controversas teóricas e doutrinárias, podemos entender que o assédio sexual é criminalizado, a fim de coibir as enormes desvantagens, e os abusos de poder, que as mulheres ainda sofrem na sociedade hodierna. As decisões “diferentes”, para casos similares, em nossa opinião, ocorrem porque, muitas vezes, aquele fundamento básico – coibir desvantagens e abusos de poder – é desconsiderado, e confundido, com o fim da sexualidade e do prazer (cf. Braidotti, 2002, p. 31), isto é, outros elementos entram na equação das decisões judiciais.
BRAIDOTTI, Rosi. Metamorphoses: Towards a Materialist Theory of Becoming. Cambridge, UK: Polity Press, 2002.
Além disso, podemos levantar a hipótese de que o sistema jurídico, trabalhando com certos estereótipos de mulher: “mães”, “esposas”, etc., ou privilegiando certas classes sociais, em detrimento de outras, trata de modo diferenciado as “pessoas”, os “cidadãos” e os “sujeitos” que se “encontram” em determinadas circunstâncias – como as judiciais –, corroborando com o posicionamento de autores que afirmam a (im)possibilidade de a “mulher” pertencer ao discurso e, portanto, de ser “ouvida”.
MILLS, Sara. “Third Wave Feminist Linguistics and the Analysis of Sexism”, Discourse Analysis Online, 2003. Disponível em: <http://www.shu.ac.uk/ daol>. Acesso em: 27 dec. 2005.
CORNELL, Drucilla. At the Best of Freedom: Feminism, Sex, and Equality. Princeton, New Jersey: Princeton University Press, 1998.
IRIGARAY, Luce. Je, Tous, Nous. New York; London: Routledge Classics, 1993. ______. Sexes and Genealogies. Trad. Gillian G. Gill. New York: Columbia University Press, 1993a. ______. This Sex Which Is Not One. Ithaca, New York: Cornell University Press, 1985. ______. Speculum of the Other Woman. Ithaca, New York: Cornell University Press, 1985a.
RENDER, Meredith. Misogeny, Androgyny, and Sexual Harassment: Sex Discrimination in a Gender-Deconstruct World. Harvard Journal of Law & Gender, v. 29:1, p. 99-150, 2006. Disponível em: <www.harvard.edu/students/orgs/jlg/vol291/99-150.pdf>.
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TORIL, Moi. Sexual-Textual Politics: Feminist Literary Theory. London/New York: Routledge, 1985.
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Doutrina
A Regência Constitucional do Processo Civil Brasileiro e a Posição do Projeto de um Novo Código de Processo Civil SÉRGIO GILBERTO PORTO
Doutor em Direito, Mestre e Especialista em Direito Processual Civil, Professor Titular da PUCRS dos Cursos de Doutorado, Mestrado e Graduação, Ex-Procurador-Geral de Justiça no Rio Grande do Sul, Advogado, Consultor Jurídico.
RESUMO: O presente ensaio aponta a dupla natureza jurídica do conteúdo processual da Constituição Federal. Demonstra que a Carta Federal ora contempla direito de natureza formativa, ora direito meio. Salienta que o primeiro constitui o sistema processual matriz que deve reger todos os segmentos processuais, especialmente o processo civil. Finalmente faz ver que o projeto de um novo Código de Processo Civil adota expressamente esta orientação.
garantias constitucional-processuais; III.a) O propósito das garantias na ordem jurídica processual; III.b) O fenômeno da relativização de garantias constitucionais; IV – O sistema constitucional-processual e a regência deste sobre o processo civil contemporâneo.
I – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES Após o esforço extraordinário de muitos no sentido de implementar reformas com o propósito de tornar a resposta judicial aos conflitos sociais mais ágil e efetiva, por meio da edição de diversas leis de natureza processual, amoldando institutos ou criando novos, conclui-se, agora, que o Código Processual Civil – CPC de 1973 encerrou seu ciclo de vigência e que, portanto, necessária se torna a elaboração de um novo Código. Abandona-se, pois, a política da reforma a conta-gotas e apresenta-se o desafio de editar um novo Código. Desimporta, nesta quadra da história processual, se a política de então foi correta, adequada ou não. O que, neste momento, objetivamente está posto é que há uma nova realidade.
ABSTRACT: The present article points to the double legal nature of the procedural content in the Federal Constitution. It demonstrates that the Federal Letter sometimes contemplates law of formative nature, and sometimes law as means. It accentuates that the first one constitutes the matrix procedural system that should rule all the procedural segments, specially, the civil process. Finally, it makes clear that the new Code of Civil Process expressly foster this orientation.
Cremos que o primeiro passo da nova reforma deva ser exatamente a identificação daquilo que deve ser aproveitado do sistema ainda vigente, pois não há como desprezar a experiência acumulada sob a égide do CPC de 1973, inclusive com todas as suas emendas. A reforma do sistema, com a busca de um novo Código, deve, também, introduzir ideias contemporâneas aptas a gerar a efetividade almejada pela comunidade jurídica aos efeitos de dar à sociedade resposta adequada na realização de direitos.
SUMÁRIO: I – Considerações preliminares; II – A dupla natureza jurídica do conteúdo processual da Constituição Federal; III – Direito formativo e
Como sabido, a dinâmica da existência responde presente na compreensão do Direito, e as reformas legislativas nem sempre
Agora, em época de novo Código, deve ser recolhida a oportunidade para concretizar legislativamente o intenso diálogo que tem havido entre constituição e processo. Nessa linha, a primeira iniciativa é de amoldar as novas regras aos primados constitucionais, e, para tanto, resta necessário identificar o conteúdo processual da Constituição Federal, para saber definir com clareza como esta deseja que seja compreendido o processo e desenvolvido o procedimento no debate judicial.
II – A DUPLA NATUREZA JURÍDICA DO CONTEÚDO PROCESSUAL DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL A Carta Magna representa o conjunto mais expressivo de direitos constituídos pela sociedade. Direitos estes, como se percebe de um simples exame objetivo, de diversos matizes. Entre essas variações, como sinalizado acima, emergem, também, direitos de índole nitidamente processual, circunstância que, por decorrência, naturalmente empresta conteúdo processual à Constituição Federal e faz nascer um verdadeiro direito processual fundamental1. 1
Neste sentido, CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. In: FUX, Luiz; NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Processo e constituição. Estudos em Homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
A Constituição Federal, se sabe, é o ponto de partida para a interpretação do direito e da argumentação jurídica, pois, hoje, mais do que uma simples Carta Política, face à sua reconhecida força normativa2, permeia toda a ordem jurídica. Com efeito, a Constituição, além de seu papel organizacional, também assegura direitos de natureza subjetiva. Contempla, por igual, instrumentos e disciplina temas vinculados ao exercício da jurisdição. Nessa linha, vale lembrar que são instrumentos oferecidos pela Constituição Federal: o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança, o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção, a ação popular e a ação civil pública, entre outros. Já na jurisdição constitucional, existem os mecanismos de controle de constitucionalidade representados pela ação declaratória de inconstitucionalidade, pela ação declaratória de constitucionalidade, pela arguição de descumprimento de preceito fundamental e pelo incidente de constitucionalidade. No que toca à sede recursal, estão instituídos os recursos de natureza extraordinária, representados pelo recurso especial, dirigido ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, e o recurso extraordinário, dirigido ao Supremo Tribunal Federal – STF. Há, também, no sistema recursal constitucional, o recurso ordinário. Afora isso, a Constituição Federal também rege matéria referente à competência do STF (art. 102 da CF), do STJ (art. 105 da CF), dos Tribunais Regionais Federais (art. 108 da CF), dos Juízes Federais (art. 109 da CF) e da Justiça do Trabalho (art. 114 da CF).
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Consultar, sobre o tema, com largo proveito, o estudo de HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991.
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acompanham as ideias no ritmo desejado, vez que estas estão submetidas ao devido processo legislativo e este também possui suas mazelas procedimentais. Nessa linha, cumpre destacar que enquanto o velho CPC de Buzaid lutava para atender às pretensões da sociedade coetânea, o direito processual mudava não apenas nas suas regras, mas especialmente na sua compreensão dentro da ordem jurídica, e não alheio ao movimento de constitucionalização do direito como um todo.
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Disciplina a legitimidade para propositura de ADIn e de ADC (art. 103 da CF), bem assim regula a atuação judicial do Ministério Público (art. 129 da CF) e da Defensoria Pública (art. 134 da CF). Consagra, por igual, direitos de aplicação genérica para serem exercidos em face da jurisdição, ao contemplar garantias de natureza constitucional-processual. Estas, de sua parte, formam um verdadeiro direito processual fundamental (principiológico), na macrocompreensão do sistema, pois representam primados constitucionais incidentes em todos os ramos processuais especializados (civil, penal, consumidor, tributário, etc.). Ou seja: são parâmetros constitucionais para a ordem processual. Não se trata, neste último aspecto, pois, de segmento do direito processual de regras, mas do direito processual de princípios, daí a razão pela qual também ser encontrada, em doutrina, a designação de princípios constitucional-processuais3.
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Atentos ao tema, Mauro Cappelletti e Denis Tallon coordenaram a publicação de ilustrativa obra que demonstra como o assunto tem merecido a atenção de vários países, reunindo ensaios de inúmeros juristas consagrados, como Fritz Bauer, Enrique Vescovi e tantos outros4.
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caracteriza um verdadeiro direito-meio ou direito-instrumento, por definir a forma de exercício de certos direitos (que caracteriza o direito processual-constitucional). Portanto, como se vê, o conteúdo processual da Constituição Federal apresenta-se com dupla natureza jurídica5.
III – DIREITO FORMATIVO E GARANTIAS CONSTITUCIONAL-PROCESSUAIS III.A) O propósito das garantias na ordem jurídica processual Inicialmente, deve ser observado que, no Brasil, aquele que vai a juízo não comparece desamparado, haja vista que o ordenamento constitucional lhe outorga certas garantias jungidas à jurisdição, mais conhecidas como garantias constitucional-processuais, ou seja, garantias oferecidas pela Constituição Federal ao cidadão para serem exercidas no curso ou em razão de processo judicial.
No Brasil, igualmente, o tema tem merecido atenção da doutrina, na medida em que o conteúdo processual da Constituição Federal vem expressado por um conjunto de direitos oferecidos ao cidadão. Estes ora vêm configurados como direitos propriamente ditos, ora como instrumentos. Na primeira hipótese, é direito formativo (uma espécie de direito processual-material, que configura o direito constitucional-processual); na segunda,
Efetivamente, bem examinada a Constituição, fonte originária de direito no sistema brasileiro, verificar-se-á que toda e qualquer demanda deve estar a esta adequada, sob pena de, se assim não for, padecer de vício superlativo. A Constituição Federal, como sabido, dada sua hierarquia, tem a virtude de permear todo o ordenamento jurídico, a ponto de, na medida em que encontre regras que tolham sua aplicação, derrogá-las, de acordo com o princípio da não recepção frente à ordem constitucional. Tal circunstância está hoje, mais do que ontem, representada
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Nesta linha, entre outros, por exemplo, NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. 9. ed. São Paulo: RT, 2009. 4 Les garanties fondamentales des parties dans le procès civil. Milano: Giuffrè, 1973.
A posição apresentada neste item II já foi por nós sustentada, com variações, juntamente com Daniel Ustarroz, em Lições de direitos fundamentais no processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. Esta é, entretanto, uma evolução daquela.
A existência de diversos comandos jurídicos, representados por regras e princípios, não pode comprometer a unidade do sistema. Para tanto, busca-se, por meio da criação de uma ordem jurídica hierarquizada, bem determinar qual comando deve prevalecer na hipótese de conflito. Vale dizer, há normas superiores e normas inferiores. As inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram mais acima, chega-se a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma suprema é a norma fundamental. Cada ordenamento tem uma norma fundamental. É essa norma fundamental que dá unidade a todas as outras normas, isto é, faz das normas espalhadas e de várias proveniências um conjunto unitário que pode ser chamado ordenamento. A norma fundamental é o termo unificador das normas que compõem um ordenamento jurídico. Sem uma norma fundamental, as normas de que falamos até agora constituiriam um amontoado, não um ordenamento.7
ser assegurado, à Justiça (art. 5º, XXXV), proibição da obtenção de prova por meio ilícito (art. 5º, LVI), a segurança decorrente da coisa julgada (art. 5º, XXXVI), a atuação do juiz e do promotor natural (art. 5º, LIII) e a duração do processo por tempo razoável (art. 5º, LXXVIII)8. Representam comandos inerentes ao processo contemporâneo que são observados, em maior ou menor escala, em vários ordenamentos das civilizações democráticas, como se pode perceber da obra antes citada e organizada por Cappelletti e Tallon. A obediência a tais comandos, em última análise, visa precipuamente a garantir um processo democrático, livre do arbítrio e capaz de alcançar os fins colimados pelo Estado de Direito e pela sociedade, via jurisdição.
Nessa medida, a Constituição da República, que é, no Brasil, a ordem jurídica unificadora, assegurou às partes determinados direitos a serem exercidos em razão do processo judicial ou no curso deste, ou seja, intraprocessualmente, tais como: a publicidade dos atos processuais (arts. 5º, LIII e 93, IX), a isonomia no trato das partes (art. 5º, caput), a motivação das decisões judiciais (art. 93, IX), o contraditório judicial (art. 5º, LV e LIV), a inafastabilidade de lesão ou ameaça de direito da apreciação do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV), o acesso, que a todos deve
Portanto, na medida em que se asseguram às partes, no conflito jurisdicional, um conjunto de garantias, vislumbra-se a ideia de que o conceito de cidadania plasmado na Carta Magna estende-se, evidentemente, também para o momento do litígio, daí, pois, que a compreensão da circunstância de o Estado assegurar direitos marcadamente constitucionais, para exercício em razão do processo judicial, enseja a ideia de cidadania processual, ou seja, assegura-se ao cidadão o exercício de direitos de índole fundamental, imaginados para o processo judicial e efetivados durante o processo judicial. Endoprocessuais, portanto. Vale dizer: o Brasil, embora socialmente injusto, é um País que possui uma ordem jurídica absolutamente civilizada e compatível com seu tempo, pois garante ao cidadão o exercício de direitos constitucional-processuais, que são da essência do Estado Democrático de Direito.
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Assim, o propósito das garantias, como e enquanto direito fundamental, é de assegurar o pleno exercício de cidadania no
Como exemplo da afirmação, ver, entre vários, CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na Alemanha. Revista Jurídica, Porto Alegre, n. 312, p. 7-22, 2003. 7 BOBBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6. ed. Brasília: UnB, 1982. p. 49.
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Enunciação meramente exemplificativa, eis que existem outras garantias expressas e outras implícitas.
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pelo fenômeno da constitucionalização do direito, e é debatida na doutrina contemporânea da maioria dos ordenamentos democráticos modernos6.
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processo judicial, assegurando às partes, também via jurisdição, o pleno gozo dos direitos inerentes ao Estado Democrático de Direito.
III.B) O fenômeno da relativização de garantias constitucionais As chamadas garantias constitucional-processuais, ainda que configurem direitos formativos, por vezes, sofrem mitigação. Assim, ao contextualizá-las na ordem jurídica, é indispensável que se ilumine, na medida do possível, o abrandamento de incidência. A relativização admitida obedece a certas exigências que, se bem compreendidas e adequadamente aplicadas, contribuem para o ajuste de soluções jurídicas. A relativização de garantias admitida pela ordem jurídica, portanto, não pode ser compreendida como a regra a preponderar, mas como a exceção admissível, frente a certas particularidades.
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Dessa forma, é oportuno balizar – ainda que objetivamente – o tema, haja vista que o mesmo, em ultima ratio, representa o modo de convivência do sistema processual matriz com os segmentos processuais especializados.
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Nessa linha, cumpre destacar que os atos jurídicos em geral são protegidos pelo primado constitucional da segurança jurídica. A teoria da segurança jurídica encontra-se, preferencialmente, plasmada no princípio da confiança do cidadão no Estado9. 9
Nesse sentido é a lição de J. J. Gomes Canotilho: “A segurança e a proteção da confiança exigem, no fundo: (1) fiabilidade, clareza, racionalidade e transparência dos actos do poder; (2) de forma que em relação a eles o cidadão veja garantida a segurança nas suas disposições pessoais e nos efeitos jurídicos dos seus próprios actos. Deduz-se já que os postulados
Como derivação desse propósito, foram inseridos na Constituição os subprincípios de proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da CF), ou seja, tais garantias foram contempladas pela Constituição para que, uma vez configuradas, gerem blindagem em desfavor de iniciativas contrárias àquilo que já se consumou. São, portanto, cláusulas imunizantes, essenciais ao Estado Democrático de Direito, visto que não há democracia nem direito onde não há segurança jurídica ou confiança do cidadão no Estado. Contudo, como sabido, há, hoje, movimento reconhecendo a possibilidade jurídica de mitigação de garantias constitucionais a partir da convicção de que não existe garantia constitucional absoluta. Afirma-se, nessa linha, que nem mesmo a vida é garantia absoluta, na medida em que, em determinadas hipóteses, poderá ser ceifada, desde que presentes circunstâncias que tornem lícita a conduta supressiva da vida de outrem, tais como a legítima defesa na seara criminal.
da segurança jurídica e da protecção da confiança são exigíveis perante qualquer acto de qualquer poder – legislativo, executivo ou judicial. O princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo, pois, a ideia de protecção da confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo tem do direito poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas por esses actos jurídicos deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico. As refrações mais importantes do princípio da segurança jurídica são as seguintes: (1) relativamente a actos normativos – proibição de normas retroactivas restritivas de direitos ou interesses juridicamente protegidos; (2) relatativamente a actos jurisdicionais – inalterabilidade do caso julgado; (3) em relação a actos da administração – tendencial estabilidade dos casos decididos através de actos administrativos constitutivos de direitos” (CANOTILHO. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, p. 256).
A possibilidade real de conflito entre propostas constitucionais, quiçá, já no distante 20 de julho de 1951, tenha inspirado o Professor da Universidade de Tübingen, Otto Bachof, a desenvolver sua instigante tese de que é possível existir normas constitucionais inconstitucionais (inválidas)10, vez que, na palavra do 10 BACHOF, Otto. Normas constitucionais inconstitucionais? Trad. José Manoel Cardoso da Costa. Coimbra: Almedina, 1994. Sobre a possibilidade jurídica aventada pelo ilustrado professor, vale referir, ainda que diga respeito à inconstitucionalidade formal de norma com status constitucional, a decisão do Pretório excelso assim ementada: “INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL – Julgado o mérito da ação direta ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores – PT contra a Emenda Constitucional nº 21/1999, que acrescentou o art. 75 do ADCT da CF/1988, autorizando a prorrogação da contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e créditos e de direitos de natureza financeira – CPMF. O Tribunal, por maioria, confirmando os fundamentos expendidos quando do julgamento da medida liminar, julgou procedente em parte o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 75 do ADCT, na redação dada pela EC 21/1999 (§ 3º: ‘É a União autorizada a emitir títulos da dívida pública interna, cujos recursos serão destinados ao custeio da saúde e da previdência social, em montante equivalente ao produto da arrecadação da contribuição, prevista e não realizada em 1999’). Entendeu-se caracterizada a inconstitucionalidade formal sustentada pelo autor da ação, uma vez que houve supressão de parte do referido parágrafo durante a apreciação da proposta da emenda constitucional pela Câmara dos Deputados sem que, após, o dispositivo tenha sido novamente apreciado pelo Senado Federal, ofendendo o art. 60, § 2º, da CF (‘A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros’). Quanto aos demais dispositivos da EC 21/1999, o Tribunal, por maioria, julgou improcedente o pedido pela ausência de inconstitucionalidade material sustentada pelo autor da ação – com fundamento nos arts. 5º, 7º, VI, 150, I e IV, e 154, I, todos da CF.
Vencido em parte o Ministro Ilmar Galvão, que, ressaltando a existência de intervalo entre a Lei nº 9.311/1996 (de vigência temporária e prazo já exaurido) e a mencionada Emenda, entendia não incidir a EC 21/1999 enquanto durasse a anterioridade nonagesimal, salientando, ainda, que a simples movimentação de conta bancária pelo seu titular não configuraria fato econômico suscetível de tributação” (STF, ADIn 2.031/DF, Pleno, Relª Min. Ellen Gracie, J. 03.10.2002). Nesta, todavia, se identifica a inconstitucionalidade material de Texto Constitucional alterado pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993: “Direito constitucional e tributário. Ação direta de inconstitucionalidade de emenda constitucional e de lei complementar. Imposto Provisório sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – IPMF. Arts. 5º, § 2º, 60, § 4º, incisos I e IV, 150, incisos III, b, e VI, a, b, c e d, da Constituição Federal. 1. Uma emenda constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é de guarda da Constituição (art. 102, I, a, da CF). 2. A Emenda Constitucional nº 3, de 17.03.1993, que, no art. 2º, autorizou a União a instituir o IPMF, incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no § 2º desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica ‘o art. 150, III, b e VI’, da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros): 1. O princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5º, § 2º, art. 60, § 4º, inciso IV e art. 150, III, b, da Constituição); 2. O princípio da imunidade tributária recíproca (que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que é garantia da Federação (art. 60, § 4º, inciso I, e art. 150, VI, a, da CF); 3. A norma que, estabelecendo outras imunidades, impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: [...] b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão. 3. Em consequência, é inconstitucional, também, a Lei Complementar nº 77, de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidência do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150, VI, a, b, c e d, da CF (arts. 3º, 4º e 8º do mesmo diploma, LC 77/1993). 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do
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Essa compreensão tem origem, até onde nos foi possível examinar, na constatação da efetiva existência de antinomias na ordem jurídica constitucional, vez que, realmente, em concreto, identificam-se hipóteses de tensão entre primados constitucionais.
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mestre, a onipotência do Estado tem limites. Em abono de sua posição, apresenta, no Capítulo IV de sua obra, as diferentes possibilidades de normas constitucionais inconstitucionais (inválidas), tais como (a) inconstitucionalidade de leis de alteração da Constituição, (b) inconstitucionalidade de normas constitucionais em virtude de contradição com normas constitucionais de grau superior, (c) inconstitucionalidade por infração dos princípios constitutivos não escritos do sentido da Constituição, (d) inconstitucionalidade por infração a direito constitucional consuetudinário, entre outros.
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Afastando o relevante debate destacado por Otto Bachof, na medida em que a antinomia em concreto não importa em qualquer inconstitucionalidade (invalidade da norma), mas apenas e tão somente na tensão de valores, a tendência doutrinária, que tem por suporte a ideia de que inexiste garantia constitucional absoluta, frente a eventual conflito que poderá existir entre uma e outra, fez nascer, em berço germânico11, a ideia de proporcionalidade, como forma de superar eventual confronto constitucional, em face do conflito entre garantias ou princípios, já que a lógica do tudo ou nada (all-or-nothing-fashion), consagrada por Ronald Dworkin, nesta sede, não se revela oportuna, muito embora possa ser razoável para o conflito de regras.
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Realmente, nas tensões entre garantias ou princípios, mais se apresenta adequada à ponderação de valores no custo/benefício em concreto. voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993” (ADIn 939/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, J. 15.12.1993, DJ 18.03.1994, p. 05165; Ement., v. 01737-02, p. 00160; RTJ, v. 00151-03, p. 00755). 11 Há quem sustente a origem suíça do princípio. Contudo, no contexto, máxima vênia, não se justifica decisiva incursão em torno da efetiva origem do chamado princípio da proporcionalidade.
N e s s a m e d i d a , o p r i n c í p i o d a p ro p o rc i o n a l i d a d e 1 2 (verhältnismässigkeitsprinzip)13 tem por escopo – como sua designação deixa antever – a vontade de evitar resultados desproporcionais e injustos, baseados em valores fundamentais conflitantes, ou seja, o reconhecimento e a aplicação do princípio permitem vislumbrar a circunstância de que o propósito constitucional de proteger determinados valores fundamentais deve ceder quando a observância intransigente de tal orientação importar na violação de outro direito fundamental ainda mais valorado no caso posto a exame. Nas palavras de Canotilho, o princípio da proporcionalidade encerra a ideia da proibição de excesso, vez que o cidadão tem direito a menor desvantagem possível, ou seja, meios e fins são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, a fim de avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim14. Cumpre, também, registrar a existência de corrente de pensamento que engloba, na compreensão do princípio da proporcionalidade, ao lado da proibição de excesso, a chamada proibição de insuficiência, a qual representaria, a grosso modo, um controle material das omissões legislativas, sejam parciais ou totais. 12 Sobre o tema, elucidativa a lição do Mestre Juarez Freitas, a qual, ainda que lançada no contexto do direito administrativo, em tudo e por tudo aplicável ao presente estudo: “O princípio da proporcionalidade quer significar que o Estado não deve agir com demasia, tampouco de modo insuficiente na consecução dos seus objetivos” (FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 56). 13 Segundo observa Gilmar Ferreira Mendes, com socorro em lição do Ministro Moreira Alves, o princípio da proporcionalidade tem assento constitucional na cláusula do devido processo legal (MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 177; ADIn 958, DJ 16.05.1994, p. 11675). 14 CANOTILHO, J. J. Op. cit., p. 382/383.
Na prática jurisprudencial, inclusive no âmbito do Tribunal Federal Constitucional, tem sido considerada mais como sendo uma técnica de controle. No que diz com este aspecto, cumpre lembrar outro exemplo extraído da jurisprudência constitucional. No caso concreto, cuidava-se de alguém processado criminalmente por delito de menor potencial ofensivo (crime de bagatela). A prova deveria ter sido obtida mediante a extração de líquido da coluna do acusado. Contra esta determinação, foi impetrada uma reclamação constitucional (verfassungsbeschwerde), alegando ofensa ao direito à integridade física e corporal (art. 2º, II, da Lei Fundamental). O Tribunal Federal Constitucional, ao apreciar o caso, considerou que a medida restritiva (invasiva de integridade física e corporal) não se afigurava como proporcional, relativa à gravidade da infração penal atribuída ao particular, o que parece uma conclusão ligada à proporcionalidade em sentido estrito. Com efeito, seria manifestamente desarrazoado alcançar a condenação de alguém por um delito de insignificante ofensividade, expondo-o a um risco tão expressivo para sua saúde de integridade física. Convém frisar, ainda neste contexto, que se poderá chegar ao mesmo resultado a partir do critério necessidade. O próprio Tribunal Federal Constitucional, na decisão ora tomada como exemplo, entendeu que as sequelas decorrentes da investigação e determinação da autoria e responsabilidade pelo delito não poderão atingir o autor de forma mais gravosa do que a sanção penal ser aplicada no caso (BverfGE 16, 194/202). [...] Na aferição da constitucionalidade de restrições aos direitos fundamentais, o Tribunal Federal Constitucional acabou por desenvolver, como método auxiliar, a teoria dos degraus (stufentheorie) e assim denominada teoria das esferas (sphärentheorie). De acordo com a primeira concepção, as restrições a direitos fundamentais devem ser efetuadas em diversos degraus. Assim, por exemplo, já se poderá admitir uma restrição na liberdade de exercício profissional (art. 12 da Lei Fundamental) por qualquer motivo objetivamente relevante (aus jedem sachlichen grund), ao passo que no degrau ou esfera mais profunda, o da liberdade de escolha da profissão, tida como sendo em princípio irrestringível, uma medida restritiva apenas encontrará justificativa para salvaguardar bens e/ou valores comunitários de expressiva relevância
de ameaças concretas, devidamente comprovadas ou pelo menos altamente prováveis15.
Essa ideia básica, pode-se dizer, encerra a primeira onda de relativização de garantias fundamentais. Nesse cenário, tudo se opera no plano constitucional, vez que se admite a mitigação de certo direito constitucional frente a outro também de índole constitucional, que se revela mais relevante em determinado caso concreto, mas sem invalidar àquele superado, haja vista que é apenas submetido a mandamento de ponderação, aos efeitos de afastar um resultado desproporcional, pois, se assim não fosse, estar-se-ia prestigiando um direito de menor hierarquia para a hipótese. A ideia da possibilidade jurídica de relativização de garantias constitucional-processuais ou de que inexistem garantias constitucionais absolutas e que, portanto, todas são mitigáveis, no Brasil, goza de largo prestígio e obtém trânsito fácil, inclusive ensejando – consciente ou inconscientemente – a possibilidade de que leis infraconstitucionais arranhem, sem pejo, as garantias de assento constitucional, fazendo nascer uma verdadeira segunda onda de relativização. São vários os exemplos no âmbito do processo civil contemporâneo: a) as liminares inaudita altera pars, em face da garantia do contraditório, em que este, se diz, é postecipado; b) os prazos processuais beneficiados da Fazenda Pública e do Ministério Público, frente à garantia da isonomia; c) a decisão arbitral impeditiva de reexame pelo Judiciário, frente à garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional sobre as violações e ameaças de direito; d) o depósito prévio da rescisória, as custas judiciais e o preparo recursal, frente à garantia do acesso à 15 SCHOLLER, Heinrich. O princípio da proporcionalidade no direito constitucional e administrativo da Alemanha. Trad. e adap. Ingo Wolfgang Sarlet. Interesse Público, n. 2/93.
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Na linha da compreensão do tema, elucidativos, para a perfeita avaliação da ideia da proporcionalidade em sentido estrito, os exemplos trazidos por Heinrich Scholler:
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justiça; e) julgamento imediato, nas causas exclusivamente de direito, pelo Tribunal (art. 515, § 3º, do CPC), frente à garantia do duplo grau de jurisdição e do juízo natural colegiado e muitas outras hipóteses que podem ser identificadas na ordem jurídica nacional16.
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Assim, parece, do que se pode observar do comportamento do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, que vivemos também efetivamente uma segunda onda de relativização, ou seja, hipótese em que se identifica como possível, em determinadas casos, relativizar garantia constitucional por lei infraconstitucional. Primeiro, porque o Legislativo edita leis de tal índole; segundo, porque o Judiciário dá guarida a tais leis, frente a casos concretos que lhe são submetidos. Essa técnica que, aparentemente, contempla a desconsideração da chamada hierarquia de normas, em verdade, em certos casos, consagra a ideia de intervenção restritiva17 do legislador ordinário sobre direitos fundamentais e, por decorrência, como destacado, enseja outra possibilidade de relativização de garantias.
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Em suma: (i) a primeira hipótese de relativização de garantias decorre da ponderação de valores constitucionais em concreto, em que uma cede frente à outra, mediante mandamento de ponderação, e (ii) a segunda configura-se por meio de intervenções restritivas do legislador ordinário. 16 Em alguns casos, é verdade, se bem investigada a hipótese, encontrar-se-á suporte constitucional para a iniciativa legislativa, pois esta busca exatamente a proteção de um valor constitucional. Entretanto, vale lembrar que a lei é norma em tese e que a ponderação de valores é teoria de aplicação em concreto. 17 Neste sentido, ver, por exemplo, CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Dogmática de direitos fundamentais e direito privado. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 339 e ss.
Entretanto, o tema relativização de garantias constitucionais não se esgota no movimento de mitigação de garantia constitucional-processual por lei ou decisão jurisdicional originária, mas, também, por decisão jurisdicional substitutiva, configurando, pois, uma verdadeira terceira onda18 de relativização de garantias constitucionais. Efetivamente, identifica-se com facilidade na doutrina brasileira a tese da possibilidade jurídica de que a decisão jurisdicional supera a existência de coisa julgada19, uma vez presentes certas circunstâncias. A ideia básica consiste na hipótese de o juízo se deparar com uma situação de extrema injustiça concreta, perpetrada por decisão jurisdicional, passada em julgado.
18 Ideia retórica introduzida na literatura por Alvin Toffler (A terceira onda. Trad. João Távara. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1980. Título original: The third wave) e, no plano jurídico, consagrado por Mauro Cappelletti, por meio de sustentações de acesso à justiça. 19 Sobre a temática, ver, por exemplo, DINAMARCO, Cândido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. Ajuris, n. 83/33; THEODORO JÚNIOR, Humberto; DE FARIA, Juliana Cordeiro. A coisa julgada inconstitucional e os instrumentos processuais para seu controle. Revista do Ministério Público, n. 47, p. 115-147; DELGADO, José Augusto. Pontos polêmicos das ações de indenização de áreas naturais protegidas. RePro, n. 103/9; TEIXEIRA, Sálvio Figueiredo. REsp 226436/PR, J. 28.06.2001; DANTAS, Ivo. Da coisa julgada inconstitucional. Novas e breves notas. Interesse Público, n. 27, p. 60-71, 2004; THEODORO JUNIOR, Humberto. A reforma do processo de execução e o problema da coisa julgada inconstitucional (CPC, art. 741, parágrafo único). Revista Síntese de Direito Civil e Direito Processual Civil, n. 29, p. 5-27, maio/jun. 2004; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada. Hipóteses de relativização. São Paulo: RT, 2003; ZAMPROGNO, Alexandre. Meios processuais para desconstituir a coisa julgada inconstitucional. Interesse Público, n. 95-100.
Diante da situação concreta de flagrante injustiça, como dito, estaria o juízo autorizado a (re)julgar a causa, na medida em que a decisão anterior seria inconstitucional, pois estaria a violar o dever constitucional de distribuição de jurisdição justa. Estaria a ocorrer um conflito de valores. De um lado a segurança jurídica representada pela coisa julgada ou a confiança do cidadão no Estado e, de outro, em verdadeira tensão in concreto, a necessidade da existência de uma decisão justa prometida pela Constituição Federal. Na hipótese, para aqueles que entendem possível a relativização da coisa julgada, deveria esta ser superada e (re)julgada a causa com a prolação de nova decisão, face à contundência da prova oferecida e à flagrante injustiça da decisão anterior. Aqui, note-se, estar-se-ia a relativizar a garantia constitucional (processual) da coisa julgada não pela tensão de valores na formação da decisão originária nem em razão de lei mitigadora de garantia, mas por decisão jurisdicional substitutiva da originária. Daí a razão pela qual a hipótese configura situação diversa daquelas antes expostas e caracteriza, por igual, uma verdadeira terceira hipótese de relativização de garantia constitucional (processual). É sabido, outrossim, que a tese é controvertida, eis que parcela significativa da doutrina, com variações de fundamentos, resiste à possibilidade de relativizar ou desconsiderar a coisa
julgada20. Entretanto, embora a controvérsia, longe de dúvida, configura nova hipótese de mitigação de garantia constitucional (processual). Assim, cumpre, por derradeiro, neste capítulo, assentar que as garantias constitucionais na compreensão hodierna são efetivamente relativizáveis, seja (i) em concreto, na hipótese de tensão de valores, (ii) em tese, quando há intervenção restritiva da lei limitando a área de incidência da garantia e (iii) quando se revelar necessária decisão jurisdicional substutiva21. E, se as garantias são relativizáveis por mais de uma forma, como visto, é nesta medida que, igualmente, devem ser compreendidas no seio do direito processual civil.
20 Neste sentido, ver, com proveito, BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Considerações sobre a chamada “relativização” da coisa julgada material. Revista Síntese de Direito Civil e Direito Processual Civil, n. 33, p. 5-28, jan./fev. 2005; ASSIS, Araken de. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. Revista Jurídica, n. 301, p. 7-29, nov./2002; TESHEINER, José Maria Rosa. Relativização da coisa julgada. Revista do Ministério Público, n. 47, p. 104-114, 2002; PORTO, Sérgio Gilberto. Cidadania processual e relativização coisa julgada. Revista Síntese de Direito Civil e Direito Processual Civil, n. 22, p. 5-13, mar./abr. 2003; SILVA, Ovídio Baptista da. Coisa julgada relativa? Revista Jurídica, n. 316, p. 7-18, fev. 2004; MARINONI, Luiz Guilherme. O princípio da segurança dos atos jurisdicionais (a questão da relativização da coisa julgada material). Revista Jurídica, n. 317, p. 14-33, mar./2004. 21 Aqui cumpre registrar que a ação rescisória é o modo de relativizar a garantia constitucional da coisa julgada por nova decisão, e esta forma é aceita por unanimidade pela doutrina brasileira. Contudo, a ideia pós-moderna de relativizar a coisa julgada por nova decisão, independentemente da propositura prévia de demanda de invalidade do julgado, em face de eventual inconstitucionalidade da decisão que transitou em julgado, superando, inclusive o prazo de rescisória, é altamente controvertida, porém aceita por parcela qualificada da doutrina, como referido na nota 20.
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Frente a esse quadro estaria o novo juízo autorizado a (re)julgar a causa. É exemplo clássico a circunstância de que certa sentença passada em julgado entendeu improcedente uma demanda investigatória de paternidade. Entretanto, configurada a coisa julgada, sobrevém exame de DNA a atestar a certeza da paternidade negada pela sentença.
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IV – O SISTEMA CONSTITUCIONAL-PROCESSUAL E A REGÊNCIA DESTE SOBRE O PROCESSO CIVIL CONTEMPORÂNEO
sejam significativas), mas é, agora, nessa quadra de início de século, repensar o processo como instrumento de realização dos propósitos constitucionais, e não apenas como instrumento de realização do direito material infraconstitucional.
Contextualizado os temas pertinentes às ponderações que se seguirão, cumpre observar que a ideia matriz do presente ensaio é a de demonstrar que a Constituição Federal possui conteúdo nitidamente processual e que este repercute na compreensão do direito processual civil.
Nesse passo, emerge a necessidade de (re)compreender o processo civil contemporâneo, como forma de promover a solução dos conflitos de interesses sintonizada com os propósitos constitucionais.
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Nessa linha, cumpre destacar que o conjunto das garantias representa um verdadeiro direito processual fundamental que – por óbvio – permeia todos os sistemas vigentes e, como decorrência, estabelece a existência de um verdadeiro sistema processual matriz a reger todos os desdobramentos do direito processual, ou seja, fixa a incidência de primados constitucionais em todas as disciplinas processuais especializadas, especialmente no processo civil.
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De outro lado, como sabido, face às notórias deficiências do sistema processual civil, há no momento uma busca incessante pela efetividade do processo judicial e, com tal propósito, estavam sendo empreendidas no Brasil várias reformas no Código de Processo Civil, por meio da edição de um conjunto significativo de leis esparsas que modificavam e/ou introduziam institutos na ordem jurídico-processual civil. Muitos de extraordinário reflexo na condução dos processos judiciais (por exemplo, o instituto da antecipação da tutela), outros nem tanto, contudo, sempre com o propósito sincero da busca de um processo apto a dar a resposta que a sociedade coeva espera da ordem jurídica processual. Eram tantas as reformas legislativas que acompanhá-las se constituía em um verdadeiro desafio para o profissional do direito. Entretanto, o maior desafio para a comunidade jurídica, maxima venia, não é acompanhar as reformas legislativas (ainda que
A grande reforma, pois, não está na simples mudança legislativa, por mais profícua que esta possa ser, mas sim na mudança de pensamento, no modo de como compreender o processo civil moderno. E a maneira mais legítima de compreendê-lo, no Estado Democrático de Direito, é decifrá-lo sob a regência da Constituição. Assim, pode afirmar-se que o processo civil é composto de regras processuais próprias do microssistema que é, tal qual o direito processual penal, o direito processual do trabalho ou o processo pertinente a outros segmentos do Direito. Entretanto, muito embora as particularidades de cada ramo do direito processual, existem, além e antes destas peculiaridades, princípios (ou garantias) de ordem constitucional fundamental que iluminam o real entendimento que deve ser dispensado às regras processuais. Desse modo, pouco importa em que área de incidência e qual a disciplina processual presente, aos demandantes deve ser assegurado o gozo de certos direitos inerentes ao devido processo da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, tais como a ampla defesa, o contraditório, o direito à vedação da prova ilícita, a fundamentação das decisões, a publicidade, o exercício do duplo grau de jurisdição e tantos outros expressos ou implícitos na Constituição Federal.
Dito de outro modo, o macrossistema processual, que é representado pelo direito processual fundamental, entretém relações com os demais microssistemas processuais existentes, pois estes devem se amoldar àquele, sob pena de – se assim não for – gerarem vícios de ordem fundamental-processual, face à violação à Constituição, e, por consequência, invalidades na forma de prestar a adequada jurisdição. Desse modo, pode inferir-se que existem relações estreitas e energizadas entre constituição e processo. Mais do que isso:
existe subordinação da microdisciplina processual à macrodisciplina constitucional-processual. Há, portanto, um grande sistema de índole constitucional-processual voltado para o processo judicial e instituído obviamente pela Constituição Federal. Este tem por função reger todos os microssistemas processuais, de modo especial o processo civil, que deve a ele estar amoldado, sob pena de violação da grande cláusula do devido processo do Estado Democrático de Direito, chamado pela Constituição de devido processo legal (art. 5º, LIV) ou, redefinindo mais adequadamente sua denominação: devido processo civil constitucional. Essa é uma posição, hoje, acentuada pelo Projeto do novo Código de Processo Civil, quando este, na sua estruturação, no Livro I, Título I, dedica o Capítulo I aos princípios e garantias fundamentais do processo civil e reproduz, com adequações, várias garantias de índole originariamente constitucional. Porém, mais do que isso, em seu art. 1º, expressamente aduz que “o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil”.
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Esses, uma vez contemplados na Constituição Federal, constituem um verdadeiro sistema processual matriz que, como dito, regula todos os microssistemas processuais e, por decorrência, sobre estes incide e faz valer seus comandos, ou seja, no processo civil, modo especial, de nada vale deferir prazo de resposta ao réu se a seguir lhe é negado direito à plenitude de defesa nos termos da proposta constitucional, pois o direito de resposta deve, acima de tudo, amoldar-se exatamente aos propósitos da garantia constitucional-processual fundamental, ainda que esta possa, aqui ou ali, como visto, sofrer mitigação, face a esta ou àquela particularidade do caso concreto.
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Doutrina
A Cultura do Medo e a (In) Segurança do Direito Penal
society, as a political criminal movement. This dogmatic misrepresentation takes place in theoretical common sense and influence the perspective of the man in the street. In the background, will be assessed legitimizing bases of expansion, especially those related to the effectiveness of criminal law as a supposed mean of reducing crime in complex societies. KEYWORDS: Criminal law; expansion; symbolism; culture of fear.
BERNARDO DE AZEVEDO E SOUZA
Mestre em Ciências Criminais (PUCRS), Especialista em Ciências Penais (PUCRS), Advogado.
FELIPE FAORO BERTONI
Mestre em Ciências Criminais (PUCRS), Advogado.
RESUMO: O presente estudo pretende tecer algumas considerações acerca do fenômeno da crescente expansão do direito penal, suas consequências e sua efetividade. Do mesmo modo, procura-se entender sua representação e aplicação simbólica. Em primeiro plano, serão pontuados os processos que permitem a expansão do direito penal na contemporaneidade e a forma pela qual, como movimento político-criminal, se insere no senso comum do homem de rua e no senso comum teórico dos juristas. Em segundo plano, serão avaliados os fundamentos legitimadores da expansão, sobretudo os relacionados à efetividade do direito penal como instrumento redutor de criminalidade nas sociedades complexas. PALAVRAS-CHAVE: Direito penal; expansão; simbolismo; cultura do medo. ABSTRACT: This study is about the phenomenon of the increasing expansion of criminal law, its consequences and its effectiveness. Similarly, it aims to understand this phenomenon and its application and the utilization of criminal law with a symbolic representation. In one way, will be punctuated processes that allow the expansion of criminal law in the contemporary
SUMÁRIO: 1 Por um introito necessário; 2 A (demasiada) expansão do direito penal; 2.1 A transformação social (ou o surgimento de novos “riscos”); 2.2 A legitimação pelo medo e a sensação de insegurança; 2.3 A resposta para todas as perguntas (ou direito penal como remédio para todos os males); 3 O direito penal como anestésico social; Considerações finais; Referências.
1 POR UM INTROITO NECESSÁRIO De pronto, imperioso destacar o ponto de partida do presente escrito. Parte-se da ideia de que o crime é fator inerente a toda e qualquer sociedade, ou seja, sua ocorrência é pressuposto existencial. Assim, registra-se a superação do mito ainda presente de que o direito penal possui o condão de lidar de forma eficaz com a violência e demais fenômenos criminais. Entende-se sua incidência residual, limitada e essencialmente inefetiva. Todavia, ainda se constitui em instrumento necessário para a (tentativa) de resolução de conflitos e manutenção mínima da ordenação social. Há quem repute despicienda a advertência, mas reputamos oportuno consignar o aviso para os incautos. É esse o local de fala.
Não se ignora, por outro lado, que esta perspectiva amolda-se no âmbito de uma expansão não só do direito penal, mas também do direito como um todo. Há, cada vez mais, devido a fatores complexos – sensação social de insegurança, aceleração constante, necessidade de imediatismo, liquidez nas relações humanas – a premente busca por conforto e segurança, somente alcançada e atingida de forma simbólica pela intervenção do Estado todo poderoso, que serve para “nos proteger”. Essa perspectiva acaba por contradizer e colocar em xeque a vigência e validade de diversos princípios e valores anteriormente estabelecidos como alicerces do direito penal “clássico”. Vale dizer, a complexidade social influi diretamente na (in)segurança proporcionada por critérios, princípios e garantias dogmáticas, hoje em constante ameaça. No âmbito político-criminal, a agenda diária não pode ser levianamente estabelecida e, no mesmo sentido, a produção legislativa não deve ser incautelosamente levada a efeito. É necessário que se estabeleçam diretrizes coerentes e seguras, bem como se exija rigor científico, pautado pela elaboração de intensas e sérias pesquisas interdisciplinares1, com o escopo de estabelecer (pretensas) formas de controle no que tange às questões socialmente aflitivas. 1
Não se ignora a crítica realizada ao que se denomina de, por exemplo, “criminologia administrativa”. Todavia, o presente trabalho não possui o escopo de se aprofundar na temática.
Nesse sentido, importa também analisar quais podem ser as repercussões geradas pela utilização do direito penal como forma de resposta ao anseio do populismo punitivo. As consequências são inúmeras e variadas e, por certo, incompreensíveis em sua totalidade, mas ao mesmo tempo se tangenciam. Passam desde o atual problema do superencarceramento e a ausência de mínimas condições carcerárias, até a problemática concernente à violação excessiva de direitos e garantias fundamentais em detrimento de um utilitarismo desarrazoado. Com efeito, diante da atual conjuntura social, é de extrema importância que haja investigações sobre até que ponto os acontecimentos cotidianos veiculados (estrategicamente) pelos meios de comunicação – e que são, muitas vezes, adotados como coerentes alicerces jurídicos, políticos e legislativos – devem ser levados em conta no âmbito prático das ciências jurídicas e sociais. Não é demais exigir. Aliás, é o mínimo, que toda e qualquer ação tomada pelo Estado seja adequadamente estudada, de forma extremamente abrangente, em todas as suas particularidades, com o sopesamento de suas possíveis e prováveis consequências e efeitos colaterais. Pode soar leviano, mas não é demais advertir: “achismo” não deve servir como suporte para elaboração legislativa ou construção doutrinária e jurisprudencial.
2 A (DEMASIADA) EXPANSÃO DO DIREITO PENAL Na esteira do preconizado por Jesus-María Silva Sanchez2, delineiam-se aspectos que propiciaram (e continuam propiciando) o expansionismo do direito penal, que busca – e sem dúvidas 2
Os fundamentos ora estudados são expostos com clareza na seguinte obra do autor referido: SILVA SANCHEZ, Jesús-Maria. La expansión del derecho penal: aspectos de la política criminal en las sociedades postindustriales. Madrid: Civitas, 1999.
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Feito o registro, é notório que nas últimas décadas a utilização do direito penal vem sendo cada vez mais solicitada pela população, em conjunto com os veículos de comunicação, mormente em face de acontecimentos específicos e pontuais, geralmente chocantes e escandalosos. Ocorre que essa demanda tem sido, grande parte das vezes, atendida prontamente pelo Estado, por exemplo, com a edição de leis penais.
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encontra –, de forma assustadora, espaço para atuação nos mais variados ramos da sociedade, sofrendo profunda relativização e deformação em sua estruturação clássica. Em seguimento, será feita a ponderação acerca da legitimidade da utilização do direito penal como forma exclusivamente simbólica.
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Para melhor contextualização do fenômeno estudado, impende trazer à baila algumas características que, segundo David Garland, vigem, geralmente, em sociedades de alta criminalidade: “(i) altas taxas de criminalidade são tidas como fato social normal; (ii) o investimento emocional no crime é disseminado e intenso, abrangendo elementos de fascinação; (iii) temas criminais são politizados e regularmente representados em termos emotivos; (iv) a preocupação com as vítimas e com a segurança do público dominam as políticas públicas; (v) o sistema penal é visto como inadequado ou ineficaz; (vi) rotinas defensivas privadas são comuns, existindo um grande mercado de segurança privada, (vii) a consciência do crime está institucionalizada na mídia, na cultura popular e no ambiente circundante”3.
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Todos os aspectos mencionados possuem força potencializada, considerando que se vive um processo constante de globalização em que todos os aspectos da vida social possuem abrangência exacerbada e repercussão intensamente acelerada4. Nesse contexto, fatores tais como a integração econômica, o surgimento de modalidades delitivas transnacionais – entre outros – acabam por ensejar a utilização do direito penal como forma apressada de tentativa de regularização e controle de 3
GARLAND, David. A cultura do controle: crime e ordem social na sociedade contemporânea. Rio de Janeiro: Revan. 2008. p. 346. 4 Como indicação, para melhor compreensão acerca dos fenômenos produzidos pela transição da sociedade de produção para a sociedade de consumo, indicamos a leitura de: BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
fenômenos desconhecidos e emergentes. Ignora-se, contudo, que o tempo do direito é diferente do tempo dos fatos, mormente na atual complexidade. Assim, flagrante é a impossibilidade da ciência jurídica de acompanhar, na mesma velocidade, as alterações sociais.
2.1 A transformação social (ou o surgimento de novos “riscos”) Com o advento da globalização, diversas são as causas capazes de legitimar a hipertrofia do direito penal. Entretanto, as alterações diretivas, seja no âmbito legislativo, seja no âmbito de aplicação das leis, devem ocorrer sempre dotadas de racionalidade e do devido estudo (sistemático e interdisciplinar), evitando-se a instrumentalização total do direito penal. Outrossim, desde a perspectiva de que os direitos do homem constituem uma classe variável, ou seja, de acordo com o contexto histórico possuem maior ou menor elasticidade e relativização5, não pode se olvidar a consequente aparição de novos riscos e ameaças provenientes dos conflitos característicos da complexidade moderna. Contudo, essa maleabilidade deve ser sempre revestida de coerência e adequação. Com efeito, diversas são as condutas que, frente à nova realidade global, poderiam ensejar discussão acerca da tutela penal6. Da mesma forma, impende registrar que condutas já consideradas ilícitos penais, diante de fatos, acontecimentos e situações supervenientes, também merecem uma análise mais 5
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 16. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 18-20. 6 CARVALHO, Salo. Antimanual de criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 101.
Em que pesem as mencionadas transformações sociais, a utilização da ciência penal deve ficar adstrita aos princípios e garantias da dogmática penal, evitando, com isso, uma hipertrofia desarrazoada e sua total instrumentalização.
2.2 A legitimação pelo medo e a sensação de insegurança Jesús-Maria Silva Sanchez8 define a sociedade em que vivemos como a “sociedade do medo” ou a “sociedade da insegurança”. A cada dia, a globalização introduz no catálogo dos riscos9 e inseguranças novas e aterradoras formas que podem por eles ser assumidas10. Novos perigos são descobertos e anunciados a 7
Sobre o tema, indica-se a leitura de: SILVA SANCHEZ, Jesus Maria. Op. cit., p. 27-74. 8 “[...] nuestra sociedad puede definirse todavía mejor como la sociedad de la ‘inseguridad sentida’ (o como la sociedad del miedo). En efecto, uno de dos rasgos más significativos de las sociedades de la era posindustrial es la sensacíon general de inseguridad esto es, la aparición de una forma especialmente aguda de vivir el riesgo.” (idem, p. 32) 9 Para uma compreensão mais aprofundada do risco e seus reflexos na sociedade contemporânea, vide: BECK, Ulrich. La sociedade del riesgo. Hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paidós, 1998. Bem como GOLDBLATT, David. A sociologia do risco – Ulrich Beck. Teoria social e ambiente. Lisboa: Piaget, 1996. 10 WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Medo e direito penal: reflexos da expansão punitiva na realidade brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. p. 26.
todo o tempo11, a ponto de não sabermos quando, como e onde seremos alvejados. O ataque surge sempre sem aviso-prévio e no momento em que menos esperamos. A vida transforma-se, assim, em uma constante luta contra o medo, figura onipresente e indissociável que fomenta uma sensação geral de insegurança. O medo está em todos os lugares. Os sentimentos de insegurança e medo na sociedade contemporânea adquirem novas dimensões a cada dia, sendo influenciados diretamente pelos meios de comunicação de massa (utilizados como mecanismos para fomentar crenças, culturas, valores, bem como formar opinião sobre os mais diversos temas)12. Para sustentar os interesses que representa, a mídia explora a criminalidade em grau máximo: o medo de se tornar vítima de um delito é transformado em mercadoria da indústria13, criando uma preocupação social com as novas formas 11 BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 12. 12 Navarro assinala que a credibilidade desfrutada pela mídia nos dia de hoje se tornou evidente na noite de Halloween de 1938, nos Estados Unidos, quando um jovem chamado George Orson Welles fez uma adaptação da obra “A Guerra dos Mundos”, de H. G. Wells, pelo rádio, a partir de um pequeno estúdio em Nova York. Uma hora de narrativa fora o suficiente para milhões de ouvintes acreditarem que o país estava, de fato, sofrendo uma invasão alienígena. O rádio em si conseguiu, à época, propagar o medo a uma intensidade muito maior do que realmente havia – que, naquele caso, não existia. (NAVARRO, Susana Soto. La influencia de los medios en la percepción social de la delincuencia. Disponível em: <http:// migre.me/c3iWK>. Acesso em: 24 nov. 2012) 13 A mídia apropria-se bem do medo – aspecto mais primário do cidadão – e a violência transforma-se em espetáculo: o populismo punitivo vem a reboque. Todos querem “exemplar” e “rápida” punição do “mau”, se possível sua execução. Acontece um crime e contra o possível autor todos se unem: contra ele, tem-se a polícia que necessita encontrar culpados (ora, para isso ela existe); contra ele, tem-se o Ministério Público que precisa denunciar; contra ele, tem-se o judiciário que precisa condenar; contra ele, tem-se a mídia que necessita do espetáculo; contra ele, tem-se toda
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profunda e cautelosa acerca da intensidade da criminalização7. Nesse sentido, a título ilustrativo, refere-se à degradação que vem sofrendo a natureza e o meio ambiente com os processos de industrialização inerentes à sociedade globalizada, assim como os novos riscos produzidos pela criminalidade cibernética.
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de criminalidade. O medo difuso e constante do crime torna-se, então, infinitamente maior do que a possibilidade real de ser vítima de um delito: a vivência subjetiva dos riscos passa a ser claramente superior à própria existência objetiva dos mesmos. El miedo al delito puede definirse como la percepción que tiene cada ciudadano de sus propias probabilidades de ser víctima de un delito, aunque también se puede entender como la simple aprensión de sufrir un delito, si atendemos tan sólo al aspecto emocional y no a los juicios racionales de ese ciudadano. De hecho, la carga emotiva suele prevalecer, pues, según numerosos estudios empíricos, el miedo al delito no se relaciona con las posibilidades reales de ser víctima, esto es, no responde a causas objetivas y externas.14
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As consequências sociais decorrentes do medo do crime são, em verdade, mais graves que as da própria delinquência. Como sublinha Navarro15, em nível individual, o estilo e qualidade de vida dos cidadãos são absolutamente modificados, buscando-se, a todo tempo, evitar sofrer um crime, ser vitimizado. Em nível coletivo, as repercussões para a vida em comunidade podem ser igualmente prejudiciais: a interação social é mitigada, rompe-se o controle social informal e os espaços públicos são paulatinamente abandonados (para se sentirem “seguras”, pessoas permanecem “reclusas” em suas próprias residências).
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O sentimento geral de insegurança e medo, alimentado e acentuado pelos meios de comunicação, apresenta-se, pois, de maneira desproporcional em relação à existência concreta do risco, mesmo em se tratando de sociedades de maior complexidade. Como aponta David Garland, a gravidade do problema é inegável nos dias de hoje, a ponto de já estarem a sociedade que precisa aplacar seu medo. (CARVALHO, Amilton Bueno de. Eles, os juízes criminais, vistos por nós, os juízes criminais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 23-24) 14 NAVARRO, Susana Soto. Op. cit. 15 Idem.
sendo desenvolvidas políticas específicas mais com objetivo de reduzir os níveis de medo e insegurança do que propriamente mitigar o crime. Não obstante o fenômeno da percepção subjetiva da insegurança esteja inserido, de modo tendencialmente crescente, na dinâmica do sistema penal de nosso país e decorra igualmente da própria sociedade (que se pode denominar “de risco”), é inegável que sua potencialização se deva à influência da ação de alguns setores dos meios de comunicação. A percepção de aceleração do mundo contemporâneo projeta a sociedade global em uma matriz de incertezas, (re)produtora de uma cultura do medo – em grande medida difundida pelos meios de comunicação; e, nos rastros da sociedade do risco, a sensação geral de insegurança apresenta-se como um fator determinando desse medo.16
Constata-se, na realidade, uma distância abismal entre aquilo que é noticiado e a realidade dos acontecimentos: estatísticas irrisórias são transformadas em cifras atemorizantes, meras febres são transformadas em doenças mais graves17. As inquietudes legítimas passam a ser banalizadas enquanto que as preocupações questionáveis são engrandecidas18. A iniciativa dos meios de comunicação de massa de promover o falseamento de dados da realidade social decorre, em verdade, de 16 FAYET JÚNIOR, Ney; MARINHO JÚNIOR, Inezil Penna. Complexidade, insegurança e globalização: repercussões no sistema penal contemporâneo. In: FAYET JÚNIOR, Ney; MAYA, André Machado (org.). Ciências penais e sociedade complexa. Porto Alegre: Núria Fabris, 2009. p. 322. 17 “Os meios de comunicação prosperam graças ao crime e dão uma imagem distorcida do que está acontecendo. E as pesquisas refletem as opiniões superficiais que resultam dessa distorção que, por sua vez, fortalecem as tendências dos meios de comunicação.” (CHRISTIE, Nils. A indústria de controle do crime: a caminho dos Gulags em estilo ocidental. São Paulo: Forense, 1998. p. 152) 18 GLASSNER, Barry. Cultura do medo. Trad. Laura Knapp. São Paulo: Francis, 2003. p. 57.
A informação é uma mercadoria e, como tal, deve ser vendida ao maior número de interessados e também desinteressados, utilizando-se para isso todos os instrumentos de marketing sensacionalista (inclusive alterando a verdade) necessários para estimular e despertar o interesse. A manipulação da informação atende, na atualidade, não só a interesses econômicos, senão também a interesses políticos, cujos prejuízos para a investigação, o processo e a administração de justiça como um todo são patentes.20
Há um processo de eleição das matérias que serão veiculadas, daquelas que receberão destaque e, finalmente, daquelas que serão esquecidas. A predileção pelo sensacional e pelo espetacular – o furo jornalístico – é inegável. Ao investigar a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro, Fábio Martins de Andrade21 aponta a existência de uma cobertura mais ampla na fase pré-processual do crime (os motivos, a investigação e a prisão provisória), momento em que o sensacionalismo é 19 WERMUTH. Op. cit., p. 47. Nessa linha, Juremir Machado da Silva define nossa sociedade como midíocre: “A sociedade midíocre não é apenas a sociedade mediada ou determinada pela mediocridade absoluta da mídia em tempo integral, mas também e principalmente a sociedade em que a mídia é determinada pela mediocridade geral. [...] Na sociedade midíocre o que conta é a média: de audiência” (SILVA, Juremir Machado da. A sociedade midíocre: passagem ao hiperespetacular (o fim do direito autoral, do livro e da escrita). Porto Alegre: Sulina, 2012. p. 24-25). 20 LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade constitucional. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 180-181. 21 ANDRADE, Fábio Martins de. Mídia e poder judiciário: a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 255.
explorado em grau máximo. A consumação do crime e suas respectivas consequências acabam sendo os aspectos mais exibidos – quando não os únicos mostrados pela televisão. Daí por que, não raras vezes, a sociedade sequer toma conhecimento do restante da história. O que permanece na memória das pessoas é tão somente o retrato inicial: a primeira impressão (distorcida e incompleta) é a que fica no momento do desfecho do caso. Já a fase conclusiva do processo, por outro lado, não recebe a devida atenção da mídia, sobretudo em casos de absolvição. O interesse em explorar desfechos absolutórios é infinitamente menor, pois, aqui, não cabe tanto sensacionalismo. [...] pouco importa aos órgãos da mídia – e à opinião pública – o resultado do julgamento. Ao final do processo: se o réu for condenado, então todos já sabiam e lamentam a demora da sentença judicial, especialmente se comparada à “sentença da mídia” pronunciada anos antes; se, porventura, for absolvido, então os órgãos da mídia divulgam algumas notícias veiculando informações, opiniões e dados parciais que tendem a descredenciar a decisão do órgão constitucional e legalmente competente ao processo e julgamento da causa (inicialmente adstrito ao universo completo dos autos).22
O perigo reside justamente nessa ênfase dada pelos meios de comunicação aos riscos e perigos da criminalidade da sociedade contemporânea. O crime é vendido como um produto rentável e gera um alarmismo não justificado em matéria de segurança, o que conduz à sociedade a exigir a intervenção das instâncias de controle social na solução de conflitos. Esse sentimento de insegurança e medo é que justifica ao Estado tomar medidas simbólicas cada vez mais autoritárias, fortalecendo o imaginário da ordem, causando uma diminuição dos espaços sociais, o isolamento gradativo e voluntário das vítimas (qualquer um pode ser vítima, ou seja, medo de tudo e de todos – nisso reside a impossibilidade de ver o outro e, mais especificamente, como um inimigo que devemos 22 Idem, p. 256.
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interesses mercadológicos, em que se busca, a todo e qualquer custo, aumentar os índices de audiência19. Em se tratando de buscar o sucesso comercial, qualquer recurso pode ser utilizado, a ponto de a própria verdade ser deturpada em nome do sensacionalismo:
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excluir ou, na maioria das vezes, destruir), exacerbando o individualismo, característicos da sociedade contemporânea.23
A midiatização do medo da criminalidade24 estende-se igualmente à esfera política, resultando em uma verdadeira inflação legislativa: para atender aos clamores midiáticos, bem como oferecer à sociedade mais “proteção” e “segurança” (e menos impunidade), os Poderes Públicos são pressionados para elaborar, no menor período de tempo possível, legislações repressoras à criminalidade. Amplia-se, assim, o âmbito de interferência do direito penal.
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A formação da opinião pública pelos meios massivos de comunicação acerca dos medos, da insegurança e da necessidade de afastá-los por meio da intervenção do sistema punitivo deságua na pressão popular sobre os Poderes Públicos para que as reformas penais necessárias para fazer frente à “cada vez mais aterradora criminalidade” sejam efetivamente levadas a cabo.25
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Os cidadãos, na atualidade, possuem, de forma geral, dificuldade em assimilar e entender toda a complexidade social na qual estão inseridos. Isso gera, muitas vezes, uma grande insegurança institucional frente à violência suscitada todos os dias pelos mais variados (e difíceis de precisar) setores sociais. De fato, o simples fato de viver, automaticamente, gera insegurança, devido à complexidade das relações estabelecidas cotidianamente, implementando, destarte, um estado permanente de “medo líquido26”. 23 GRAZIANO SOBRINHO, Sergio Francisco Carlos. Globalização e sociedade de controle: a cultura do medo e o mercado da violência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 149. 24 O termo é utilizado por Wermuth. 25 WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Op. cit., p. 52. 26 Expressão cunhada e difundida por Zygmunt Bauman para definir a atual sensação social de temor em relação aos aspectos cotidianos, sem uma definição específica acerca de quais são, efetivamente, os aspectos causadores desses sentimentos. (BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido, p. 9-13)
Tal sentimento de insegurança é, como dito, constantemente propagado e ampliado pelos veículos de comunicação, de forma a acentuar a ótica do medo generalizado sobre aspectos que, muitas vezes, não possuem correlação concreta com a realidade dos fatos27. Diante desse panorama, “a promessa de segurança avança com os riscos e precisa ser, diante de uma esfera pública alerta e crítica, continuamente reforçada por meio de intervenções cosméticas ou efetivas no desenvolvimento técnico-econômico28”. É justamente com base nessa perspectiva, e de forma complementar, que se busca apoio no direito penal. Com efeito, em uma sociedade na qual os valores não são suficientemente fortes para orientar as condutas gerais, em que predomina a desorganização, aceleração e complexidade das relações sociais, associado ao interesse dos meios de comunicação em impregnar nas pessoas uma sensibilidade exacerbada, é natural que a reação social seja a de clamar por conforto – mesmo que ilusório – principalmente por meio do direito penal, não obstante que isso implique em relativizações ou, inclusive, exclusão total de garantias materiais e processuais clássicas29.
2.3 A resposta para todas as perguntas (ou direito penal como remédio para todos os males) O direito penal é considerado, não só pelo senso comum, mas também por parte do senso comum teórico, como a fonte de salvação da humanidade. Existe a crença mítica de que todos os conflitos existentes podem – e devem – ser resolvidos pela 27 ELBERT, Carlos Alberto. Novo manual básico de criminologia. Trad. Ney Fayet Júnior. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 223-6. 28 BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora 34, 2011. p. 24. 29 SILVA SANCHEZ, Jesús-Maria. Op. cit., p. 93.
Em uma primeira análise, sob um olhar apressado e desavisado, o expansionismo penal pode parecer legítimo, funcional e até mesmo necessário, ante os fatores anteriormente aludidos. Entretanto, mediante observação criteriosa, é possível perceber inúmeros aspectos e consequências prejudiciais à saudável manutenção do ordenamento jurídico. De fato, a hipertrofia desarrazoada acaba por operar a desconstrução dogmática dos fundamentos e pressupostos do direito penal, assim como promove uma alteração no estabelecimento de prioridades e diretrizes político-criminais. Nesse sentido, importa ressaltar que as medidas penais consubstanciadas, por exemplo, no enrijecimento de penas, incriminação de novas condutas, restrição de direitos e garantias fundamentais não se mostram, grande parte das vezes, como meios aptos à realização dos objetivos para os quais (supostamente) se propõem30. Na verdade, os impactos negativos à estrutura axiológica do ordenamento podem ser vitais, causando muito mais prejuízos do que benefícios à sociedade. Na matéria, Hassemer refere que “as três principais e drásticas consequências de todas as transformações do direito penal seriam: 1) o risco de um acentuado déficit operacional (inoperatividade); 2) o perigo de que o direito penal cumpra uma função puramente simbólica; e 3) o alto custo para os direitos e garantias fundamentais”31. 30 Nesse sentido, exemplificativamente pode-se citar o polêmico debate acerca da efetividade da Lei nº 11.340/2006 (Maria da Penha) para resolução dos conflitos conjugais. 31 HASSEMER, Winfried; CONDE, Francisco Muñoz. La responsabilidad por el produto en derecho penal. Valencia: Tirant lo Blach, 1995. p. 86-7.
Diante do panorama evidenciado, é necessário que se faça uma análise acerca da validade, legalidade e conformidade das medidas punitivistas adotadas atualmente com fulcro no suposto controle da criminalidade com a ordem constitucional-democrática estabelecida. Com base no exposto, percebe-se que a inflação do direito penal tornou-se algo comum na sociedade atual e pode ser expressa – entre outras – pelas seguintes ações estatais: a) criminalização de condutas de pouca relevância social; b) crescente enrijecimento de penas; c) elaboração de diversos tipos penais de perigo; e) edição constante de leis penais especiais. Concomitantemente a esse processo, as garantias penais e processuais sofrem redução na mesma medida em que aumenta a rigidez das punições, fato que merece atenção e não pode ser ignorado.
3 O DIREITO PENAL COMO ANESTÉSICO SOCIAL Todo esse processo expansivo é incentivado pelos meios de comunicação – que encontram no contexto da sociedade moderna o ambiente perfeito para a disseminação desses ideais – pela da enxurrada constante de violência (mais virtual do que real) que adentra as casas brasileiras pelos noticiários noturnos. A mídia possui papel de destaque na construção da realidade social, vez que possui discricionariedade na divulgação de informações, as quais são descritas por “dois mecanismos fundamentais: a seleção dos fatos que serão divulgados, e do enquadramento que será dado aos mesmos32”. De fato, os cidadãos já insegu-
32 ROCHA, Álvaro Filipe Oxleyda. Criminologia e teoria social: sistema penal e mídia em luta por poder simbólico. In: GAUER, Ruth (org.). Criminologia e sistemas jurídico-penais contemporâneos II. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2010. p. 52.
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intervenção punitivista. Exclui-se, de pronto, alternativas a esta violência institucionalizada.
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ros e temerários são prontamente impulsionados a clamar por segurança, consubstanciada na figura do direito penal33. Nesse sentido, acerca da dramatização da violência e espetacularização dos crimes e criminosos, afirma com propriedade David Garland:
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[...] A percepção de um público amedrontado e revoltado teve grande impacto no tipo e no conteúdo das políticas, nos anos recentes. O crime foi redramatizado. A imagem aceita, própria da época do bem-estar, do delinquente como um sujeito necessitado, desfavorecido, agora desapareceu. Em vez disto, as imagens modificadas para acompanhar a nova legislação tendem a ser esboços estereotipados de jovens rebeldes, de predadores perigosos e de criminosos incuravelmente reincidentes. Acompanhando estas imagens projetadas, e em reação retórica a elas, o novo discurso da política criminal insistentemente invoca a revolta do público, cansado de viver com medo, que exige medidas fortes de punição e de proteção. O mote aparente da política é agora mais a revolta coletiva e o justo reclamo por retribuição do que um compromisso com a construção de soluções sociais justas34.
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litativo dos tipos penais, os selecionados permanecem os mesmos. Enquanto muitos continuam “intocáveis”, impersecutíveis penalmente, outros são fregueses assíduos do sistema penal. As diretrizes da política criminal atual apontam para a configuração plena de um “Estado de prevenção” que interpreta de forma extensiva o conceito de bem jurídico, introduzindo para dentro do âmbito criminal qualquer conduta que julgue (in)conveniente. Destarte, o direito penal se transforma em um produto (viciante) fornecido hábil e estrategicamente (com a espetacularização da violência) pelos políticos e veículos de comunicação. Este produto acaba sendo prontamente aceito pela população que, inconscientemente, se torna dependente35. Ademais, é possível perceber que o direito penal vem sendo utilizado, por muitas vezes, como forma simbólica de controle social em resposta aos anseios imediatos da sociedade representada pelos veículos de comunicação massiva36.
Por outro lado, enquanto o Estado responde aos anseios sociais, anestesiando temporariamente o povo, não existem ações concretas e efetivas relativamente aos problemas sociais que demandam uma forma de abordagem lúcida e coerente, fundada em estudos científicos, sistemáticos, empíricos e valorativos, sempre resguardando a atuação do direito penal de forma residual.
Acerca do conceito de simbolismo e direito penal, no sentido crítico, pode-se pontuar que “é, por conseguinte, um direito penal no qual se pode esperar que realize através da norma e sua aplicação outras funções instrumentais diversas das declaradas, associando-se neste sentido com engano37”.
Na verdade, não há quase nenhuma alteração prática no contexto da criminalidade, visto que a seletividade do sistema jurídico permanece intacta. Não obstante o aumento quantitativo e qua-
Ainda, segundo Pierre Bourdieu, trata-se de uma forma de poder que, quando reconhecida, possibilita alterações, modificações, induções e construções, tais quais fossem realizadas por meio
33 RIPOLLÉS, José Luis Díez. De la sociedad del riesgo a la seguridad ciudadana: um debate desenfocado. In: CALLEGARI, André Luís (org.). Política criminal, estado e democracia: homenagem aos 40 anos do Curso de Direito e aos 10 anos do Curso de Pós-Graduação em Direito da Unisinos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 102. 34 GARLAND, David. Op. cit., p. 54.
35 CARVALHO, Salo. Op. cit., p. 18-9. 36 CERVINI, Raúl. Os processos de descriminalização. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 91-5. 37 ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 293.
Os programas políticos eleitorais consagram boa parte das suas promessas a tranquilizar o público e aos organismos colegiados da indústria e do comércio, oferecendo medidas drásticas – sempre repressivas e nunca preventivas – para conter uma maré que se anuncia como monstro crescente. Por seu lado, a imprensa causa alarme com a vistosidade dos títulos e das fotografias escatologicamente violentas da chamada página vermelha.40
Se, por um lado, é dever do Estado garantir a possibilidade de persecução e efetiva punição de um cidadão quando da prática de uma atividade delitiva, por outro, imperioso que esse dever ocorra em atenção aos estreitos limites estabelecidos pelas normas constitucionais, assim como todos os princípios inerentes ao direito penal e suas garantias materiais e processuais. Sobre o tema, já se manifestou Cornelius Prittwitz: Si no estamos satisfechos con los eufemismos de algunos políticos, que quieren hacer creer que los esperados benefícios de seguridade ‘no tienes que pagar un precio en la moneda de la libertad’, hay que reconocer que la liberalidade y la vigência del Estado de Derecho están amenazados mediante estas nuevas dimensiones de la representatividad. 38 BORDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992. p. 82-4 39 Por outro lado, o presente estudo não olvida os aspectos positivos da utilização simbólica do direito penal que podem ser exemplificados, em apertada síntese, como forma de proporcionar discussão pública sobre o tema ou, ainda, desviar a atenção da prática de medidas ilegais mais eficazes em razão da crença no sistema penal. Sobre o tema, sugerimos a leitura de: LARRAURI, Elena. La herencia de la criminologia crítica. 3. ed. Madrid: Siglo XXI Editores, 2000. p. 216-231. 40 CASTRO, Lola Anyar de. Criminologia da reação social. Rio de Janeiro: Forense, 1983. p. 31.
[...] Estoy convencido de que la ‘insostenible situación del derecho penal’, analizada desde Frankfurt em 1995, después de haber recorrido otros ‘caminos errados’, amenaza con convertirse en una intolerable situación más allá del derecho penal del Estado de Derecho. ‘Más mejor de los casos, como una alarma final, y en el peor, como umoituario.41
Enquanto toda a atenção e esforços são voltados para a elaboração de normas penais, outros mecanismos igualmente eficazes (ou ainda mais) na prevenção e contenção dos delitos restam abandonados. A atuação da sociedade civil, na forma de reivindicações esclarecidas e ações positivas, é fator de extrema relevância no que toca a questão da criminalidade. É necessário que se busque o resgate de valores esquecidos por meio de atividades integrativas frente à comunidade, freando, de certa forma, os avanços e danos causados pela globalização dos conflitos sociais. Da mesma maneira, alguns ramos do direito civil, principalmente no sentido da reparação de danos42, são também capazes de lidar e resolver com eficiência alguns conflitos precipitadamente (ou premeditadamente) englobados pelo direito penal. Ainda, a utilização do direito administrativo sancionador poderia ser considerada como alternativa à criminalização irresponsável de condutas. Da mesma forma, importa salientar o surgimento e 41 PRITTWITZ, Cornelius. La desigual competencia entre seguridade y libertad. In: CALLEGARI, André Luís (org.). Política criminal, estado e democracia: homenagem aos 40 anos do Curso de Direito e aos 10 anos do Curso de Pós-Graduação em Direito da Unisinos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 41-2. 42 SILVA SANCHEZ, Jesús-Maria. Op. cit., p. 60.
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da força física ou econômica, tamanha sua força persuasiva38. No ponto, cumpre esclarecer que Lola Anyar de Castro já vislumbrava e criticava com rispidez o paradigma simbólico39 ora sob análise, que se estende até os dias atuais:
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desenvolvimento crescente da Justiça Restaurativa43, que surge como alternativa à tutela penal. Ademais, importa registrar que possuímos exemplos negativos internacionalmente dos efeitos nefastos da cultura punitivista aplicada em escalas máximas, mormente nos Estados Unidos da América e, com menor difusão, na Inglaterra. Com efeito, a análise feita com propriedade por David Garland fornece precisos dados sobre a situação vivenciada nos países mencionados:
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O desejo por segurança, ordem, controle, pela administração de riscos e pelo contingenciamento de chances certamente está presente em qualquer cultura. Mas na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, nas décadas recentes, tal questão se tornou dominante, com consequências imediatas para os que são apanhados pelas demandas de repressão e com efeitos corrosivos mais difusos para todos nós. Controles do espaço, controles situacionais, controles gerenciais, controles do sistema, controles sociais, autocontroles – em um setor social depois do outro, deparamo-nos com a imposição de mais regimes intensivos de regulação, inspeção e controle; no processo, nossa cultura cívica se torna cada vez menos tolerante e inclusiva, cada vez menos capaz de confiar.44
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É necessário que as experiências ocorridas em outras regiões nos sirvam como parâmetros para as possíveis implicações da adoção de políticas semelhantes, evidentemente que sempre levando em consideração as peculiaridades regionais, culturais e econômicas. 43 No que diz respeito às práticas referentes à Justiça Restaurativa, vale consignar que tais medidas restaram oficialmente institucionalizadas no Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Porto Alegre, com a criação da Central de Práticas Restaurativas, instituída por meio da Resolução nº 822/2010 do Conselho da Magistratura. Para maiores informações sobre o tema, indicamos a obra: PALLAMOLLA, Raffaella da Porciuncula. Justiça restaurativa: da teoria à prática. São Paulo: IBCCrim, 2009. 44 GARLAND, David. Op. cit., p. 415.
Até o momento foi possível perceber, sobretudo, que as ciências sociais devem pautar as ações políticas e legislativas. É necessário o estudo sociológico, axiológico, interdisciplinar e sistemático das normas, analisando com coerência todas as suas possíveis e potenciais consequências, e não simplesmente o seu impacto social. Não se deve conceber a ideia de um direito penal de cunho populista (legislando exclusivamente com pauta na mídia e na sensação social de insegurança) e nem paternalista, que atua com base na imposição de valores sociais. Em suma, considera-se que o recurso a ideologias expansivas pressupõe, grande parte das vezes, medida exclusivamente política, como forma de resposta aos anseios sociais, resultando, não raras vezes, em atuação inadequada do Estado, despendendo gastos desnecessários, cujo condão precípuo é obter a satisfação popular imediata. Porém, “essa busca da efetividade a curto prazo não só deixa sem satisfazer seus objetivos pragmáticos declarados, senão que produz efeitos devastadores na estrutura de racionalidade do direito penal”45. De fato, importante lembrar que “o direito penal existe para cumprir finalidades, para que algo se realize, não para a simples celebração de valores eternos ou glorificação de paradigmas morais46”. Com efeito, pode-se concluir que a adoção de tal diretriz, a longo prazo se demonstra patológica para a manutenção do ordenamento e da democracia, uma vez que fere frontalmente sua base axiológica e ocasiona, entre outros problemas, a banalização de temas técnicos de extremo relevo e a omissão de 45 RIPOLLÉS, José Luis Díez. Op. cit., p. 102. 46 BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 8. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002. p. 20.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Como fecho, retoma-se o fato de que fatores como a extrema aceleração, imediatismo, complexidade e demais características das sociedades atuais proporcionam um descompasso entre o campo das ideias e o das necessidades práticas, trazendo à tona diversas sensações peculiares nunca antes experimentadas48. Desse modo, alguns fenômenos necessitam de amplo debate, sob diversas perspectivas, para que a multiplicidades de circunstâncias determinantes e relevantes sejam compreendidas não como verdade absoluta, mas sempre com uma pretensão de verdade ou, ainda, como mera possibilidade de compreensão de um fenômeno. Ademais, a Internet e os novos sistemas de comunicação são, ao mesmo tempo, facilitadores e barreiras à limitação da linguagem, projetando uma transição da nossa realidade para o que se poderia chamar de “Idade da Mente49”, cujas características ainda não restaram suficientemente desveladas. Nesse vértice, é fundamental a elaboração de pesquisas metódicas por meio de estudos sociais, políticos e econômicos, visando o foco gerador dos problemas, priorizando atuações concretizadoras de direitos fundamentais, e não restritivas. Ademais, é necessária a conscientização no sentido de frear a 47 ROCHA, Álvaro Filipe Oxleyda. Criminologia e teoria social: sistema penal e mídia em luta por poder simbólico. In: GAUER, Ruth. (org.). Op. cit., p. 56. 48 VIRILIO, Paul. Velocidade e política. São Paulo: Estação Liberdade, 1996. p. 54-7. 49 Sobre o tema, indicamos a leitura de: GAUER, Ruth. A fundação da norma. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2011. p. 92-103.
frenética expansão penal que nos assola de maneira crescente e devastadora, sob pena de cumprimento da profecia preconizada por Marco Aurélio Costa Moreira de Oliveira, já em 1997: [...] não está distante o momento em que bastará ao Estado totalitário editar uma só norma de cunho punitivo: Será punido com pena de reclusão (de tanto a tanto) quem descumprir suas obrigações para com a administração e a Fazenda Pública, assim como quem deixar de obedecer às normas protetivas do meio ambiente, do consumidor, da infância e juventude, das relações de família, do direito de propriedade, das obrigações legais e contratuais, de natureza civil ou comercial.50
Concluindo, reitera-se que – mesmo sabedores da impossibilidade de cognição plena de nossa complexidade social – faz-se necessária melhor análise e estudo das decisões tomadas, tanto na seara do direito penal quanto da política criminal, devendo as diretrizes ser estabelecidas mais pela técnica do que pelo oportunismo etéreo do clamor social. Efetivamente, a demanda social não pode ser olvidada, mas sua resposta não deve ser feita de forma apressada e meramente simbólica, desprovida de eficiência efetiva perante os problemas sociais. É imperioso agir com cautela, racionalidade e seriedade, de modo a suprir, verdadeiramente, as agruras sociais.
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graves problemas sociais intrinsecamente relacionados com a origem da criminalidade47.
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Doutrina
Educação Ambiental
tecnoindustrial, que se iniciou no século XIX, essa utilização passou a ser indiscriminada alterando e degradando significativamente o meio ambiente, comprometendo a vida no Planeta.
LUIZ CARLOS ACETI JÚNIOR
Quando falamos em meio ambiente, o conceito é bastante amplo, compreendendo este não só o equilíbrio natural (solo, água, ar atmosférico, fauna, flora, enfim, a interação entre os seres vivos e seu meio, onde se dá a correlação recíproca entre as espécies e as relações destas com o ambiente físico que ocupam), como também o meio ambiente artificial (compreendendo o espaço urbano construído, ou seja, o conjunto de edificações, ruas, praças e áreas verdes) e o meio ambiente cultural (patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico e turístico).
Advogado, Pós-Graduado em Direito de Empresas, Especializado em Direito Empresarial Ambiental, Professor de Graduação da FMPFM, Asmec, Professor de Pós-Graduação em Direito e Legislação Ambiental da UNIFEOB, FMPFM, Asmec, Fatece, Unifeg, ESDC, FalNatal, Unipinhal entre outras, Palestrante, Parecerista, Consultor de Empresas Publicas e Privadas na Área Jurídico-Ambiental. Escritor de Livros e Artigos Jurídicos em Direito Ambiental. Fundador e Consultor de www. mercadoambiental.com.br e www.pdca.org.br. Sócio da Aceti Advogados Consultoria Jurídico Empresarial Ambiental – www.aceti.com.br – e da ACDP – Ambiental, Comunicação e Desenvolvimento Profissional – www.acdp.com.br.
ELIANE CRISTINE AVILLA VASCONCELOS
Advogada, Pós-Graduanda em Meio Ambiente, Especialista em Gestão Ambiental, Especializada em Direito e Legislação Ambiental, Professora de Gestão Ambiental, Legislação e Direito Ambiental do Senac/SP, Palestrante, Parecerista, Consultora nas Áreas Jurídica e de Gestão Ambiental Empresarial. Escritora de Livros e Artigos JurídicoAmbientais. Sócia-Diretora da E. C. Avilla – Assessoria e Consultoria Jurídica e Ambiental. Parceira da ACDP – Ambiental Comunicação e Desenvolvimento Profissional – www.acdp.com.br.
Portanto, podemos entender meio ambiente como sendo um bem coletivo de relevância ímpar, essencial à própria existência humana. A vigente Constituição Federal brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, foi o primeiro diploma constitucional pátrio a introduzir em seu texto, de forma expressa e unitária, o tema meio ambiente, e dispõe em seu art. 225, caput, que
SUMÁRIO: Introdução; 1 A problemática ambiental; 2 Educação ambiental; 2.1 Definição; 2.2 Breve histórico; 3 Política nacional de educação ambiental; 4 O desenvolvimento sustentável; 4.1 Produção e consumo sustentável; conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO Historicamente, os seres humanos utilizam os recursos ambientais. Nos primórdios, em menores proporções, mas, após a Revolução
todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, considerado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as gerações presentes e futuras.1
Com base na Constituição Federal, surgiram outras leis de extrema importância para a proteção do meio ambiente, como, por exem1
BRASIL, Constituição Federal de 1988.
plo, a Lei nº 6.938/19812, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, e a Lei nº 9.605/19983, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. A legislação ambiental possui um caráter não só repressivo, mas principalmente preventivo, pois, em se tratando deste assunto, a prevenção é o que se tem de mais importante, já que, quando ocorre a degradação ambiental, dificilmente se consegue restabelecer o estado inicial. A humanidade precisa, com certeza, continuar evoluindo, desenvolvendo-se, mas de uma maneira sustentável. A capacidade de suporte para a vida humana e para a sociedade é complexa, dinâmica e variada de acordo com a forma segundo a qual o homem maneja os seus recursos ambientais. Ela é definida pelo seu fator mais limitante e pode ser melhorada ou degradada pelas atividades humanas.
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Dos inúmeros problemas ambientais encontrados na sociedade moderna em que vivemos, o consumismo e o desperdício acompanhados de uma grande quantidade de lixo gerado são extremamente preocupantes. Os recursos ambientais são cada vez mais utilizados, de maneira insustentável, comprometendo o equilíbrio do Planeta.
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A solução de grande parte do problema está no desenvolvimento socialmente sustentável, em que a participação das pessoas, promovendo a redução do consumo, da quantidade de lixo gerado, sua destinação correta, a separação do material reciclável, e a reutilização destes materiais, melhorando a qualidade de vida do Planeta, é de extrema importância, já que o meio ambiente é, também, de responsabilidade de toda a coletividade. 2 3
Lei da Política Nacional de Meio Ambiente. Conhecida popularmente como Lei de Crimes Ambientais.
O conhecimento da lei para entendimento dos deveres e prerrogativa dos cidadãos é imprescindível. O papel do Poder Público é oferecer subsídios para este desenvolvimento sustentado, promovendo a organização, a coleta seletiva do lixo, destinando-o corretamente, em uma área apropriada, tomando os devidos cuidados, protegendo o solo de contaminações e, consequentemente, as águas subterrâneas e reciclando esses materiais, incentivando a educação ambiental nas escolas e a conscientização sobre a necessidade de conservação e defesa do meio ambiente para as presentes e as futuras gerações.
1 A PROBLEMÁTICA AMBIENTAL Durante o período da Revolução Industrial, não havia preocupação com a questão ambiental. Os recursos naturais eram abundantes, e a poluição era consequência necessária do desenvolvimento a qualquer preço. O desenvolvimento desordenado e à custa dos recursos ambientais causa uma enorme intensidade dos impactos ambientais. Exemplos Atingimos uma fase de extremo desequilíbrio, e o aumento populacional mundial é um de seus maiores causadores, já que este aumento exige áreas maiores para a produção de alimentos e técnicas de cultivo que aumentem a produtividade da terra. Florestas inteiras cedem lugar a lavouras, criações, espécies animais e vegetais são domesticadas, muitas extintas e outras, ao perderem seus predadores naturais, multiplicam-se aceleradamente acentuando ainda mais o desequilíbrio no Planeta. Produtos químicos são utilizados para aumentar a produtividade e evitar predadores nas lavouras, mas acabam por matar micro-organismos decompositores, insetos e aves, reduzem a
As grandes cidades usam os recursos naturais em escala concentrada, quebram as cadeias naturais de reprodução desses recursos e reduz-se a capacidade da natureza de construir novas situações de equilíbrio. A sociedade moderna segue um modelo de desenvolvimento baseado no consumo e é o recordista em desperdício de recursos naturais. Automóveis, eletrodomésticos, roupas e demais utilidades planejados para durar pouco, para serem descartáveis, somando-se a extração de recursos naturais: embalagens e produtos descartáveis não recicláveis nem biodegradáveis aumentam a quantidade de lixo. São montanhas e montanhas de lixo que geramos todos os dias, contribuindo para a poluição dos rios, do solo e do subsolo. O uso de vapor aumenta a procura pelo carvão e acelera o desmatamento. A destilação do petróleo aumenta a emissão de gás carbônico e outros gases na atmosfera, e substâncias não biodegradáveis, como alguns plásticos que são criados. Temos, assim, a geração da poluição, que se caracteriza pela presença de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos em quantidade superior à capacidade do meio ambiente de absorvê-los. As diferentes formas de poluição afetam a composição e o equilíbrio da atmosfera, das águas, do solo e do subsolo, interferem na cadeia alimentar, alteram os mecanismos naturais de proteção do Planeta, prejudicam as espécies animais e vegetais existentes e podem ameaçar sua reprodução. O efeito estufa a cada dia se torna um problema mais grave. Sem o carbono na atmosfera, a superfície seria coberta de gelo, porém o excesso tenderia a reter mais radiações infravermelhas, produzindo o chamado efeito estufa.
Também o aquecimento global, que é a elevação da temperatura média a ponto de reduzir ou até acabar com as calotas de gelo que cobrem os polos. Há aumento do dióxido de carbono na atmosfera a um ritmo médio de 1% ao ano. A queima da cobertura vegetal nos países subdesenvolvidos é responsável por 250% desse aumento. A maior fonte, no entanto, é a queima de combustíveis fósseis, como o petróleo. As chuvas ácidas que ocorrem por consequência da queima de carvão e de combustíveis fósseis e outros poluentes industriais lançam dióxido de enxofre e de nitrogênio na atmosfera. Esses gases combinam-se com o hidrogênio presente na atmosfera sob a forma de vapor de água. O resultado é a chuva ácida, que apresenta ácido sulfúrico ou ácido nítrico. Ao caírem na superfície, alteram a composição química do solo e das águas, atingem as cadeias alimentares, destroem florestas e lavouras, atacam estruturas metálicas, monumentos e edificações. Em Cubatão, São Paulo, as chuvas ácidas contribuem para a destruição da Mata Atlântica e desabamentos de encostas. Os buracos na camada de ozônio são outro problema extremamente grave. O ozônio é um gás rarefeito cujas moléculas são formadas por três átomos de oxigênio. Concentram-se nas camadas superiores da atmosfera, a 15 km da superfície, e forma uma espécie de escudo, com cerca de 30 km de espessura, que protege o Planeta dos raios ultravioleta do Sol. Esse escudo vem perdendo espessura e apresenta um buraco de 31 milhões de km2 sobre a Antártida, área equivalente a 15% da superfície terrestre. A redução da camada de ozônio aumenta a exposição aos raios ultravioleta do Sol – resultando em câncer de pele e de doenças oculares, como a catarata. O CFC (clorofluorcarbono) usado como propelente em vários tipos de spray, em motores de aviões, refrigeração, chips de computadores e solventes utilizados pela indústria eletrônica, que decompõe as moléculas de ozônio e forma o gás cloro, é um dos poluentes que destroem a camada de ozônio.
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fertilidade da terra, poluem os rios e as águas subterrâneas e contaminam os alimentos.
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A água e o desafio do seu consumo sustentável: a água é um recurso natural essencial para nossa sobrevivência e de todas as espécies que habitam o Planeta. A falta de água permanente ameaça a própria existência de todos os seres vivos. O Brasil é um país privilegiado, pois possui de 8% a 12% de toda a água potável do Planeta, e 80% está concentrada na região amazônica. Como se não bastasse a utilização indiscriminada de água e o desperdício, ainda poluímos e contaminamos os cursos d’água com esgotos urbanos, efluentes líquidos industriais sem o devido tratamento, lixos domésticos, hospitalares e industriais, agrotóxicos e não damos destinação adequada para os resíduos sólidos e acabamos por contaminar os lençóis freáticos.
gerem o meio ambiente, na produção, no uso e na disposição final dos produtos.
Temos ainda os desastres ambientais, que podem ser definidos como sendo eventos inesperados que afetam, direta ou indiretamente, a segurança e a saúde da comunidade envolvida, causando impactos ao meio ambiente como um todo. Os acidentes ambientais podem ser classificados em dois tipos, de acordo com as suas origens:
2.1 Definição
1. Os acidentes ou desastres naturais, que são as ocorrências causadas por fenômenos da natureza, cuja grande maioria independe das intervenções do homem, como, por exemplo, tempestades, terremotos, vulcões, maremotos e furacões, entre outros. Fevereiro/2014 – Ed. 203
2. Os desastres tecnológicos, que são ocorrências geradas pelas atividades desenvolvidas pelo homem, como os acidentes nucleares, vazamentos durante a manipulação de substâncias químicas, entre outras.
A opinião pública está cada vez mais se tornando sensível às questões ambientais. A sociedade começa a exigir um maior controle da poluição e uma mudança na concepção de produto de consumo, de modo que a sua produção e uso não afete de maneira significativa o meio ambiente.
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Devemos esperar também que clientes e consumidores passem a considerar, cada vez mais, a capacidade de empresas prote-
Isso significa que, em muito breve, as organizações que não implementarem práticas adequadas de proteção ao meio ambiente correrão sérios riscos de perderem mercado, principalmente nos casos em que a produção cause impactos ambientais significativos, pois, além dos próprios clientes, serão fiscalizadas pelas comunidades afetadas, órgãos governamentais e as chamadas Organizações Não Governamentais (ONGs).
2 EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A educação não constitui a resposta absoluta para todos os problemas, mas, em seu sentido mais amplo, deve ser parte vital de todos os esforços que se façam para imaginar e criar novas relações entre as pessoas e para fomentar maior respeito pelas necessidades do meio ambiente. [...] A educação é, em síntese, a melhor esperança e o meio mais eficaz que a humanidade tem para alcançar o desenvolvimento sustentável.4
Podemos definir educação ambiental como sendo um processo de aprendizagem em que o indivíduo se conscientiza da importância do meio ambiente para sua existência, aprendendo a respeitar e a viver em harmonia com a natureza, sendo parte integrante dela e contribuindo para seu equilíbrio, retirando o que realmente é necessário para sua sobrevivência sem comprometer as futuras gerações. A educação ambiental tem o importante papel de fazer cada indivíduo entender que depende dos recursos ambientais para 4
Educação para um futuro sustentável. Documento base da Conferência Internacional Ambiente e Sociedade: Educação e sensibilização pública para a sustentabilidade. Brasília. Edição Ibama, 1999. p. 34-5.
sobreviver e que ele faz parte de uma coletividade e de um grupo de seres vivos que também dependem desse mesmo ambiente para existir.
curto, os patrimônios naturais formados lentamente ao longo de eras foram destruídos, causando desequilíbrios ecológicos irreversíveis.
É um processo pedagógico participativo, que busca manter o respeito dos seres humanos com o seu próprio meio e com os demais seres vivos existentes, partindo do princípio: agir localmente, pensando globalmente! O cuidado com o Planeta representa o global. O cuidado com o próprio nicho ecológico representa o local.
Para conter os danos ao meio ambiente de uma produção e consumo não sustentáveis e garantir a sobrevivência das futuras gerações, as sociedades atuais terão que mudar suas posturas e hábitos de consumo. Se avaliarmos com cuidado, veremos que boa parte do que compramos em nosso dia a dia é fruto de uma falsa necessidade, de um exagero criado pela cultura do consumismo e dos bens descartáveis.
A todo momento, em nosso dia a dia, nos deparamos com a problemática ambiental que diretamente nos afeta e que são causadas por nossas atividades. A questão ambiental impõe às sociedades a busca de novas formas de pensar e agir, individual e coletivamente, de novos caminhos e modelos de produção de bens, para suprir necessidades humanas, e relações sociais que não perpetuem tantas desigualdades e exclusão social e, ao mesmo tempo, que garantam a sustentabilidade ecológica. Isso implica um novo universo de valores no qual a educação tem um importante papel a desempenhar5. O processo de desenvolvimento dos países do globo se realiza à custa dos recursos ambientais essenciais para a vida, que são explorados de maneira indiscriminada, degradando o meio ambiente de maneira irreversível. Num prazo extremamente 5
Parâmetros Curriculares Nacionais. Temas Transversais. Brasília: MEC, 1998. p. 180.
O atual modelo de desenvolvimento que adotamos nos levará a destruição. Somente por meio da educação ambiental, criando a consciência ambiental em cada indivíduo, conseguiremos trilhar o caminho do desenvolvimento sustentável, assegurando a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a proteção da qualidade ambiental, atendendo às necessidades das gerações atuais sem comprometer as gerações futuras. O desenvolvimento sustentável não tem a sua base na produção, mas sim nas pessoas. Deve preservar o meio ambiente, mas também a cultura, a história e os sistemas sociais do local onde ele ocorre. Para viver nosso cotidiano de uma maneira mais coerente com os ideais de uma sociedade sustentável e democrática, precisamos de uma educação que nos conduza a repensar velhas fórmulas de vida e a propor ações concretas para transformar nossa casa, nossa rua, nosso bairro, nossas comunidades, sejam elas no campo, na fábrica, na escola, no escritório6.
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VIEZZER, Moema; OVALLES, Omar (Org.). Manual latino-americano de educação ambiental. São Paulo: Gaia, 1994. p. 21.
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Importante ressaltar que a educação ambiental faz parte de um processo contínuo, em que não se aprende apenas nas salas de aula, mas a toda hora e em qualquer lugar.
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2.2 BREVE HISTÓRICO7 A educação relativa às questões ambientais já possui uma longa história, na qual se destacam algumas conferências e encontros internacionais. O primeiro deles foi a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizada em 1972, na cidade de Estocolmo, capital da Suécia. Foi o primeiro grande encontro oficial da comunidade internacional sobre a questão ambiental. O dia da abertura, 5 de junho, foi consagrado como Dia Mundial do Meio Ambiente. Essa Conferência, entre outras resoluções importantes, propôs a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e de um Programa Internacional de Educação Ambiental.
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O segundo encontro foi o de Belgrado, que aconteceu em 1975, onde foi criado o Programa Internacional de Educação Ambiental.
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O terceiro foi a Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental, realizada em 1975, também conhecida como Conferência de Tbilisi, cidade da antiga URSS onde foi realizada. Definiu os princípios da educação ambiental seguidos até hoje em todo o mundo. Um quarto encontro foi a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, também conhecida como Rio-92 ou ECO-92. Teve como principais resultados a Agenda 21, conjunto de propostas de ação para o alcance da sustentabilidade, que trata 7
Caderno de Princípios de Proteção à Vida. Ministério do Meio Ambiente – Programa Nacional de Educação Ambiental. Brasília, 2001.
da educação ambiental em seu capítulo 36; a Carta da Terra; o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, produzido pelas organizações não governamentais. O quinto encontro foi a Conferência Ambiente e Sociedade: Educação e Sensibilização Pública para a Sustentabilidade, realizada em 1997, na cidade grega de Thessaloniki. Afirmou a necessidade de adoção de estilos de vida sustentáveis, mudando o modelo de produção e consumo. No Brasil, a educação ambiental está presente em documentos importantes como a Constituição da República Federativa do Brasil, os Parâmetros Curriculares Nacionais – que são documentos do Ministério da Educação que orientam os conteúdos e as metodologias que devem ser trabalhados em todas as escolas do País, em que o meio ambiente é apresentado como tema transversal, ou seja, que deve ser trabalhado por todos os professores, de todas as séries e disciplinas, pois é parte indispensável da formação do aluno para uma cidadania crítica e participativa – e a Lei da Política Nacional de Educação Ambiental, sancionada em 27 de abril de 1999.
3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL8 A obrigatoriedade de promover a educação ambiental é do Estado e está expressamente determinada na Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, § 1º, VI, que diz: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 8
Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999.
[...]
para compreender adequadamente as implicações ambientais do desenvolvimento econômico e social9. Cabe aqui definir conservação e preservação ambiental:
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.
A educação ambiental é essencial para a proteção ambiental, sendo utilizada como método preventivo, atendendo às determinações do mais importante princípio do direito ambiental, que é exatamente o princípio da prevenção. Tal princípio é a base de qualquer política moderna do ambiente e vem em lugar de destaque, dada a importância de se prevenir o dano ao meio ambiente, já que, na maioria das vezes, esse dano é de difícil ou de impossível recuperação.
Conservação é a proteção ambiental com a utilização racional dos recursos naturais com a finalidade de não prejudicar as gerações futuras. Preservação é a manutenção da integridade e perpetuidade dos recursos ambientais.
A Lei nº 9.985/200010, em seu art. 2º, incisos II e V, traz, respectivamente, uma definição para conservação e preservação: Art. 2º [...] [...] II – Conservação da natureza: manejo do uso humano da natureza, compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural, para que possa produzir o maior benefício, em bases sustentáveis, às atuais gerações, mantendo seu potencial de satisfazer as necessidades e aspirações das gerações futuras, e garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral.
A legislação ambiental não é só repressiva; seus objetivos fundamentais são preventivos, com o objetivo de evitar os danos ambientais que, como já dito, em geral, são irreversíveis. A Lei da Política Nacional de Educação Ambiental – Lei nº 9.795/1999 – veio contribuir para uma maior consciência em relação às questões ambientais, procurando estabelecer um processo de aprendizagem do indivíduo sobre a importância de se proteger o meio ambiente para a existência de todos os seres vivos existentes no Planeta. O art. 1º da referida lei dispõe que: Art. 1º Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.
Vale destacar que o citado artigo determina que o papel da educação ambiental é o de conservar o meio ambiente, e não preservá-lo, tendo a finalidade de capacitação plena do indivíduo
[...] V – Preservação da natureza: conjunto de métodos, procedimentos e políticas que visem a proteção a longo prazo das espécies, hábitats e ecossistemas, além da manutenção dos processos ecológicos, prevenindo a simplificação dos sistemas naturais.
A educação ambiental, nos termos da referida lei, é considerada um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal (processo institucionalizado que ocorre nas unidades de ensino) e 9
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 251. 10 Lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).
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§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
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não formal (realizado fora da escola, envolvendo flexibilidade de métodos e de conteúdos e um público alvo muito variável em suas características – faixa etária, nível de escolaridade, nível de conhecimento da problemática ambiental, etc.)11. O art. 3º da Lei da Política Nacional de Educação Ambiental traz expressamente as determinações para os diferentes agentes sociais, e, especialmente, incumbe ao Poder Público o dever de promover políticas públicas que integrem em seus conteúdos a educação ambiental e o engajamento da sociedade na conservação, na recuperação e na melhoria do meio ambiente.
É indispensável compreender que o ambiente é complexo e dinâmico, formado pela interação entre elementos físicos (que compreende a atmosfera, a hidrosfera (águas) e a litosfera (rochas e solos), que seguem as leis da física e da química), biológicos (a biosfera com todas as espécies da vida, que obedecem às leis da física, química, biologia e ecologia) e sociais (que compreende o mundo das máquinas e construções criadas pelo homem, governos e economias, artes, religiões e culturas, que seguem leis da física, da química, da biologia, da ecologia e também leis criadas pelo homem).
Os princípios básicos que regem a educação ambiental estão elencados no art. 4º da referida lei, quais sejam:
Todos têm direito à educação ambiental, pois ela trata da mais essencial de todas as questões: a vida!
I – enfoque humanista, holístico, democrático e participativo; II – a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade; III – o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinariedade; IV – a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais; V – a garantia de continuidade e permanência do processo educativo;
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VI – a permanente avaliação crítica do processo educativo;
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VII – a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; VIII – o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural.
Esses princípios estabelecem que a educação ambiental deve proporcionar aos indivíduos e aos grupos sociais a oportunidade de participarem responsável e eficazmente na prevenção e na solução de problemas ambientais e na gestão de qualidade do meio ambiente. 11 Idem.
A educação ambiental deve estruturar atividades em torno dos problemas concretos da comunidade, ajudando indivíduos e grupos sociais a adquirirem os conhecimentos necessários para compreendê-los e as habilidades necessárias para resolvê-los. Sua principal função é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e atuarem na realidade socioambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da coletividade, seja ela local, seja global12.
4 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (World Commission on Environment and Development – WCED) – define-o como o “desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas próprias necessidades”, podendo também ser empregado com o significado de melhorar a qua12 Parâmetros Curriculares Nacionais. Meio Ambiente e Saúde. Brasília: MEC, 1997. p. 29.
Os países devem procurar se desenvolver de forma sustentável, visando à qualidade de vida humana, conciliando progresso e qualidade ambiental, já que o desenvolvimento econômico-social e a sobrevivência da humanidade dependem dos recursos ambientais. A natureza morta não serve ao homem! A utilização dos recursos naturais, inteligentemente realizada, deve subordinar-se aos princípios maiores de uma vida digna, em que o interesse econômico cego não prevaleça sobre o interesse comum da sobrevivência da humanidade e do próprio Planeta. Este quadro poderá ser alterado, em primeiro lugar, por meio da educação ambiental.
4.1 Produção e consumo sustentável As agressões aos bens da natureza, pondo em risco o destino da humanidade, é um dos tremendos males que estão gerando o “pânico universal” que assombra a humanidade neste inquietante início de milênio. Por esse motivo, nos últimos anos, a humanidade vem acordando para a problemática ambiental, repensando o mero crescimento econômico, buscando fórmulas alternativas, como o desenvolvimento sustentável, cuja característica principal consiste na possível e desejável conciliação entre o desenvolvimento, a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida, três metas indispensáveis. Para que seja alcançado o desenvolvimento sustentável, é necessário que a proteção ambiental seja parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente deste13. 13 Princípio nº 4 da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio/92).
É falso o dilema “ou desenvolvimento ou meio ambiente”, pois o meio ambiente é fonte de recursos para o desenvolvimento, e estes devem harmonizar-se e completar-se. Desenvolvimento e meio ambiente devem andar de mãos dadas! Compatibilizar meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto social, cultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço. Deve-se ressaltar que, quando ocorre um impacto ambiental, este se reflete na economia e na sociedade, pois da natureza provém tudo do que necessitamos para nossa sobrevivência no Planeta. Não se atingirá o desenvolvimento sustentável se não se proceder a uma radical modificação dos processos produtivos, assim como do aspecto quantitativo e do aspecto qualitativo do consumo. Em decorrência, o desenvolvimento sustentável, uma vez desencadeado, facilitará processos de produção e critérios de consumo adequados à composição dos legítimos interesses da coletividade humana e do ecossistema planetário. A grande controvérsia reside nos padrões sustentáveis de produção e consumo, fatores esses estreitamente inter-relacionados. Consome-se o que se produz, produz-se o que é demandado para consumir.
Será que precisamos realmente de todos os produtos que consumimos?
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lidade de vida humana dentro dos limites da capacidade de suporte dos ecossistemas.
Se avaliarmos com cuidado, veremos que boa parte do que compramos em nosso dia a dia é fruto de uma falsa necessidade,
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Para conter os danos ao meio ambiente de uma produção não sustentável e garantir a sobrevivência das futuras gerações, a sociedade moderna terá de reformular alguns hábitos de consumo.
de um exagero criado pela cultura do consumismo e dos bens descartáveis. Há um nexo entre produção e consumo que se estimulam reciprocamente. No que tange aos modelos de produção, o postulado básico resume-se no desenvolvimento e emprego de tecnologias limpas que implicam menos consumo de matérias-primas e energia, menor produção de resíduos com maior capacidade de seu reaproveitamento e com menor volume para sua disposição final. Economia e uso racional de energia e matéria-prima, assim como na conservação dos recursos naturais dentro das características essenciais dos ecossistemas, de modo que a demanda sobre eles se contenha dentro dos limites da capacidade dos mesmos ecossistemas para se regenerarem e autorregularem.
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Educar o cidadão consumidor, capaz de modificar seus hábitos e atitudes (mudança de postura) e desencadear uma reação que alcance, ademais, os processos produtivos.
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A concepção do desenvolvimento sustentado tem em vista a tentativa de conciliar a preservação dos recursos ambientais e o desenvolvimento econômico. Pretende-se que, sem o esgotamento desnecessário dos recursos ambientais, haja a possibilidade de garantir uma condição de vida mais digna e humana para milhares de pessoas, cujas atuais condições de vida são absolutamente inaceitáveis.
CONCLUSÃO A educação ambiental é o método mais eficaz na proteção do meio ambiente. Somente por meio de processos contínuos de aprendizagem do indivíduo ele será capaz de entender a importância do meio ambiente para a existência do Planeta e deixar para trás antigos conceitos e culturas de que o desenvolvimento somente acontecerá por meio do domínio do homem em relação à natureza.
O atual modelo de desenvolvimento baseia-se no consumo e no desperdício de recursos ambientais vitais, que são finitos e estão se esgotando. A conscientização se dará por meio da educação ambiental, modificando posturas e alterando o atual modelo de desenvolvimento para o desenvolvimento sustentável, que procura atender a todas as necessidades das atuais gerações sem comprometer as futuras e as demais formas de vida existentes no Planeta.
REFERÊNCIAS ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: apresentações dos temas transversais 3º e 4º ciclos do ensino fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. ______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Meio Ambiente e Saúde. Brasília, 1997. MEC, p. 29. CADERNO de Princípios de Proteção à Vida. Brasília, 2001. DIAS, F. G. Educação ambiental: princípios e práticas. São Paulo: Gaia, 1992. EDUCAÇÃO para um futuro sustentável. Documento base da Conferência Internacional Ambiente e Sociedade: educação e sensibilização pública para a sustentabilidade. Brasília. Edição Ibama, 1999. JACOBI, P. Meio ambiente participação e cidadania. São Paulo: Gaia, 1995. (Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental). MERGULHÃO, M. C.; VASAK, B. N. G. Educando para a conservação da natureza. São Paulo: Educ, 1998. MINISTÉRIO do Meio Ambiente. Programa Nacional de Educação Ambiental. In: VIEZZER, Moema; OVALLES, Omar (Org.). Manual latino-americano de educação ambiental. São Paulo: Gaia, 1994. ORGANIZAÇÃO das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – Unesco. Educação para um futuro sustentável: uma visão transdisciplinar para ações compartilhadas. Brasília: Ibama, 1999.
Doutrina
Breves Ponderações Acerca do Redirecionamento de Ação de Execução Fiscal em Face de Representantes de Pessoa Jurídica Falida Walter Alexandre Bussamara
Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, Advogado em São Paulo.
RESUMO: O redirecionamento de ação judicial executiva fundamenta-se na ocorrência das diretrizes contidas no art. 135 do Código Tributário Nacional, em nada se associando, necessariamente, uma dada situação falimentar de empresa à alocação dos seus gestores no polo passivo de demanda legal tributária. PALAVRAS-CHAVE: Redirecionamento; ação tributária; tributo; responsabilidade; ilícito; empresa; gestores; falência. ABSTRACT: The redirection of a judicial tax proceeding is based on the article 135 of the National Tax Code with no regarding necessarily to a company’s bankruptcy context for one intended insertion of their managers as parties of the legal tax proceeding. KEYWORDS: Redirection; tributary proceeding; tribute; responsibility; illicit; company; managers; bankruptcy.
O fundamento legal do redirecionamento de cobrança executiva de crédito tributário em face de determinados representantes gestores de empresa originariamente devedora encontra-se bem delineado fundamentalmente no art. 135 do Código Tributário Nacional, da seguinte forma: Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: [...] III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Em qualquer que seja o contexto jurídico existente em determinado processo de execução fiscal, portanto, será o aludido dispositivo legal que deverá nos servir, na qualidade de operadores do Direito, como adequado parâmetro de interpretação quanto à possibilidade de um almejado redirecionamento. Queremos, com isso, significar que um eventual jurídico-falimentar de pessoa jurídica execontexto jurídicocutada judicialmente por suposta dívida tributária não servirá, apenas de per si, a nos conduzir a tal ou qual conclusão acerca de uma pretensão que se tenha de redirecionamento ou não da ação executiva em nome de seus representantes gestores. Com efeito, a exegese em torno da questão do redirecionamento dependerá, na verdade, de uma apropriada verificação da ocorrência das diretrizes e pormenores estabelecidos por aquele preceito normativo (art. 135 do Código Tributário Nacional) e que sejam habilitadores por si só de uma legítima alteração do polo passivo de uma demanda fiscal.
Encontrar-se em situação falimentar (que não se confunde com o evento da dissolução irregular empresarial), assim, não necessariamente justificará um dado ato de redirecionamento. Subsumir-se tal situação, porém, ao contexto do art. 135 do CTN, de seu turno, e apenas por aí, sim. Uma análise da simples literalidade do retromencionado artigo já nos imporia, então, uma primeira e clara consideração diante de nosso tema, qual seja, a de o instituto do redirecionamento dever se revelar absolutamente atrelado à ideia de um comportamento pessoal ilícito voluntário (“[...] excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”) por parte de representantes que estejam a gerir empresas suspostamente devedoras de tributos (“[...] diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”), e cuja gestão, por óbvio, tenha influenciado nas suas pendências de ordem tributária.
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Sem o pressuposto básico da ilicitude pessoal espontânea de tais representantes, de pronto já restaria descartado qualquer pensamento tendente à aproximação deles ao contexto da cobrança tributária realizada em face das empresas que administram. A injuridicidade em meio a tais pessoas, então, caminharia de forma incondicionalmente pari passu com o tema ora em comento, do redirecionamento de ação executiva.
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Pois bem. Premissa bem assentada, nos restaria determinar a quem incumbiria o dever, justamente, de produzir prova material no tocante à efetivação ou não de dado ato ilícito que pudesse vir a justificar a inclusão das pessoas elencadas no art. 135 do CTN no polo passivo de execução fiscal condizente a débitos tributários de suas respectivas pessoas jurídicas. Tal exegese, neste ensejo, nos tem sido apresentada pelo atual entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema, no sentido de que a inclusão originária dos nomes dos representantes de empresas nas certidões de dívida ativa que
fundamentem suas execuções fiscais verificar-se-ia de todo suficiente para, legitimando tal forma de redirecionamento1, imputar a tais gestores o dever processual de produzirem, eles próprios, toda e qualquer comprovação de suas não incidências em ilicitudes comportamentais pessoais – interpretação essa decorrente, segundo o aludido Tribunal, das próprias características inerentes às certidões de dívida ativa cuja presunção legal, ainda que relativa, seria sempre por sua liquidez e certeza, a teor dos arts. 3º, parágrafo único, da LEF2, e 204, parágrafo único, do CTN3 (REsp 1104900 e EDREsp 960456). Segundo o STJ, portanto, essa intrínseca presunção nuclear das certidões de dívida ativa se estenderia, por via oblíqua, à situação dos representantes de empresas cujos nomes já constassem originariamente do conteúdo delas, de sorte a restar justificada, então, para a aludida Corte, a inversão, em tais casos, do ônus da prova, a partir daí não mais do Fisco, mas, sim, daqueles. Entretanto, no caso de requerimento posterior da entidade pública exequente pela inclusão daquelas pessoas no conteúdo de certidão de dívida ativa, ou seja, no polo passivo de execução 1
Pensamos que o termo “redirecionamento” pode referir-se tanto à situação dos nomes de representantes já constarem de forma inaugural das CDAs, como no caso de este pleito ser feito apenas no curso da execução fiscal. Como a dívida originária pretendida, em nosso contexto, seria das empresas por aqueles geridas, o que teríamos, então, é uma situação de redirecionamento também originária, ou, apenas, posterior. Mas, em ambos os casos, uma forma de redirecionamento. 2 “Art. 3º A dívida ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.” 3 “Art. 204. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite.”
Já tivemos a oportunidade, porém, em outros breves trabalhos, de demonstrar nossa contrariedade, com a devida vênia, em face deste posicionamento exarado pelo colendo STJ4. Para nós, a variável hermenêutica que fora criada para se justificar a corresponsabilidade de representantes de empresas (“[...] constarem os seus nomes ou não em CDA”) não se encontraria, antes de tudo, nem mesmo delineada na norma que trata, justa e legitimamente, da situação processual de redirecionamento, consubstanciada no art. 135 do CTN, que, ex vi do art. 146, II e III, a e b, da CF5, haveria de nortear especificamente e de forma suficiente a equação pessoal tributária em sede de corresponsabilidade. Pensamos, ainda, em homenagem à preservação da segurança jurídica, que todo e qualquer crédito tributário não poderia prescindir de todas as fases que digam respeito ao seu próprio e regular ciclo de existência, desde o seu nascimento até a sua ulterior extinção. 4
“A inversão do ônus da prova a cargo de administrador”. In: Site Consultor Jurídico – Conjur, 17.04.2011; “Redirecionamento de dívida tributária”. In: Jornal Valor Econômico, 24.01.2012. 5 “Art. 146. Cabe à lei complementar: [...] II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários [...].”
Nascendo uma obrigação tributária, como sabemos, com a ocorrência no mundo fenomênico (fato imponível tributário) de uma materialidade prevista em lei tributária (hipótese de incidência), tornar-se-á a mesma exigível apenas e tão somente com a sua devida e regular constituição administrativa (art. 142 do CTN6) para, posteriormente, na ausência voluntária de um regular procedimento administrativo, ou, com o seu natural término, poder restar judicialmente exequível com a sua natural inscrição em dívida ativa7. Tudo isso nos serve de referência para podermos melhor verberar que qualquer cobrança tributária diante de pessoa jurídica, ou, ainda, de representante seu não estaria a permitir qualquer interrupção em tal ciclo de vida natural atinente à obrigação tributária, que não aceitaria, por sua vez, excluir-se do patrimônio jurídico daquele gestor empresarial os seus direitos constitucionais à ampla defesa (administrativa e judicial), ao contraditório e ao devido processo legal (art. 5º, LIV e LV, da CF8), coadunados 6
“Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.” 7 Salvo nos casos de autolançamento (lançamento por homologação), em que o próprio contribuinte antecipa ao Estado, espontaneamente, os elementos típicos da constituição do crédito tributário, permitindo a sua inscrição direta em dívida ativa caso não recolhido (“Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa”). 8 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LIV – ninguém será privado
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fiscal cuja certidão originária contivesse apenas a pessoa jurídica de que fossem representantes, aí, sim, permaneceríamos, de acordo com o STJ, diante da regra geral acerca do ônus da prova, cabendo à entidade exequente, e, somente a ela, a tarefa de comprovação da ocorrência de ilicitude pessoal que justificasse sua pretensão quanto ao redirecionamento da ação.
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sempre com a existência prévia de um lançamento administrativo de tributo que se pretendesse exigir, bem antes, ainda, de uma sua respectiva possiblidade de cobrança judicial. Aliás, sob tal espírito exegético, assim já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal: “Os princípios do contraditório e da ampla defesa aplicam-se plenamente à constituição do crédito tributário em detrimento de qualquer categoria de sujeito passivo (contribuintes, responsáveis, substitutos, devedores solidários etc.)” (AgRg-RE 608.426/PR, 2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, J. 04.10.2011). Pensamos, então, que a presunção legal relativa de liquidez e de certeza de uma certidão de dívida ativa está condicionada à necessidade também legal de que o próprio ato de inscrição seja realizado de forma regular, a teor da literalidade da mesma norma, aliás, que pugna por tal presunção.
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Noutro giro verbal, não seria a simples inscrição da dívida ativa propriamente dita, com a extração de sua respectiva certidão, que faria brotar qualquer presunção sua de liquidez e de certeza. O que assim o faria, antes de tudo, seria o regular ato dessa inscrição: “...a dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez”.9
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da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” 9 Para Misabel Machado Derzi, à regular inscrição “[...] é imprescindível prévio procedimento administrativo contencioso, no qual o sujeito passivo tenha oportunidade de impugnar e questionar a pretensão fazendária” (BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11. ed. atual. Misabel Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 1010. Citada por Maria Helena Rau de Souza. Código tributário nacional comentado. Doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS e ISS. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 1024).
Sem o aspecto da regularidade, fruto de um controle administrativo prévio da legalidade da cobrança (art. 2º, § 3º, da LEF10), não haveria como aceitarmos qualquer ideia de presunção de validade da certidão, ainda que relativa, salvo com reflexos danosos, ao final, ao próprio Texto Constitucional. A lei conferiu, relativamente, presunção de liquidez e de certeza não, simplesmente, às certidões de dívida ativa, mas, sobretudo, àquelas regularmente inscritas, ou seja, que assim o foram em observância aos comandos normativos atuais (controle administrativo de legalidade). Sem a referida regularidade, nem mesmo relativa será sua presunção de validade. Simplesmente, essa presunção nem mesmo existirá. Certidão de dívida ativa que carregue nomes de representantes de empresas sem respeito às fases próprias de existência de um pretenso crédito tributário, ou seja, sem que tenha havido sua devida e prévia constituição administrativa em nome daqueles, não pode restar objeto de qualquer presunção, ainda que relativa, de legitimidade. Faltaria, justamente, a regularidade legalmente pugnada ao ato de inscrição. No caso de alocação de corresponsabilidade tributária em face de representantes de empresas supostamente devedoras, o necessário controle de legalidade do ato de inscrição não poderá falhar diante da preservação daquele já aludido ciclo de vida de 10 “Art. 2º Constitui dívida ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. § 3º A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo” (grifos nossos).
Verificada tal lacuna procedimental legal, já cairia por terra pensar-se em qualquer forma de presunção. Fosse tão simples uma exegese em torno desta questão, bastaria ao Fisco, em todas as suas ações executivas (como, aliás, tem feito), listar previamente os nomes de todos os representantes de empresas nos títulos executivos de ações fiscais para que, literalmente, como que num passe de mágica, eles pegassem carona numa sutil presunção relativa e pontual de certeza e de liquidez de suas correspondes CDAs. Essa tarefa, aliás, sobremodo fácil, mormente nos atuais tempos de evoluída informática, em que uma mera consulta da Administração Pública junto aos órgãos comerciais (Juntas) lhe proveria com farta listagem dos nomes de todos os representantes legais passados, presentes e futuros de uma dada pessoa jurídica, por muitas vezes, nem mesmo contemporâneos aos pretensos créditos de origem tributária ou a quaisquer irregularidades condizentes com eventual ocorrência de dissolução indevida de tal ou qual pessoa jurídica. E, como sabemos, o “papel” tudo aceita, o que seria (como tem sido) muito cômodo ao Fisco. 11 Para Renato Lopes Becho, o processo administrativo “regular terá que respeitar o devido processo legal, por exigência constitucional (art. 5º, LV)”, significando que “a pessoa indicada como responsável tributário tem que ser formalmente acusada, com direito à ampla defesa e aos recursos postos à sua disposição”, devendo ser apontado prazo para que o responsável, ao fim do processo, possa recolher o tributo antes de inscrito em dívida ativa, sendo impostergável a necessidade de se “apurar a responsabilidade tributária antes de se inscrever em dívida ativa o eventual crédito fazendário” (Sujeição passiva e responsabilidade tributária. São Paulo: Dialética, 2000. p. 166 e 167).
Por sua vez, de forma diametralmente oposta, seriam as dificuldades dos próprios representantes empresariais muitas vezes absolutamente impossibilitados de comprovação acerca da inexistência de atos pessoais ilícitos seus, justamente por estes terem, simplesmente, inexistido, passando a ocupar, a partir de então, uma hercúlea situação de terem de comprovar aquilo que materialmente se mostra inviável de comprovação: os denominados fatos fenomênicos negativos. De qualquer forma, seja na trilha da hermenêutica já traçada pelo STJ, ou não, como acima argumentado, o fato é que o instituto do redirecionamento de dívida fiscal deverá estar sempre, de alguma forma, vinculado à determinada ideia de ato pessoal ilícito espontâneo que tenha contribuído ao não recolhimento de tributo, em nada se alterando se estivermos ou não em âmbito de situação empresarial falimentar, que continuará podendo ensejar o alcance de seus representantes em termos de corresponsabilidade tributária apenas e tão somente se diante de fato ilícito pessoal deles, relacionados ao não cumprimento de obrigação tributária (art. 135 do CTN). Noutras palavras, falida ou não, as regras do precitado art. 135 do CTN é que comandarão e deverão ser aplicadas em tema de redirecionamento de ação executiva. Verificadas as suas condições legais de aplicação, o redirecionamento será, pois, regular, restando-nos apenas, a partir daí, as já referidas discussões em relação a quem caberia o respectivo ônus probatório, caso já constassem ou não os nomes de seus representantes originariamente do conteúdo de suas certidões de dívida ativa. Vale dizer, seria o caso apenas de encamparmos ou não a tese sustentada atualmente pelo colendo STJ, o que, com extrema vênia, não o fazemos.
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um crédito tributário, mormente diante de sua fase administrativa condizente à sua formalização (constituição) pelo lançamento11.
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Doutrina
O Princípio da Publicidade no Procedimento Licitatório: Uma Crítica à Lei nº 12.462/2011 sob a Perspectiva Democrática GABRIELA OLIVEIRA FREITAS
Mestranda em Direito Processual pela PUC-Minas, Assessora Judiciária no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Professora da Faculdade da Cidade de Santa Luzia – FACSAL, Bacharela em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), Especialista (Pós-Graduação Lato Sensu) em Direito Processual pelo Instituto de Educação Continuada na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (IEC PUC-Minas) em Convênio com a Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF) do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), Pesquisadora do IMDP – Instituto Mineiro de Direito Processual.
RESUMO: O presente estudo tem por objeto a análise da aplicação do princípio da publicidade no procedimento licitatório, previsto na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, que regulamenta o art. 37, XXI, da Constituição da República, instituindo normas para licitações e contratos da Administração Pública. Assim, por estar a Administração Pública pautada no princípio da publicidade, um dos princípios essenciais para a concretização da democracia, este se reflete também no procedimento licitatório, nos termos do art. 3º, caput, da Lei nº 8.666/1993. No entanto, instaura-se a problemática a ser debatida diante da promulgação da Lei nº 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações, que prevê, em seu art. 6º, sigilo temporário quanto aos valores orçados, nas contratações referentes aos Jogos Olímpicos e à Copa do Mundo. Para o presente estudo, utilizarse-ão a pesquisa bibliográfica e o método dedutivo, partindo-se de uma
perspectiva macro para uma concepção microanalítica acerca do tema ora em estudo e, por fim, como procedimento técnico a análise temática, teórica e interpretativa, buscando sugestão para a solução da questão destacada. PALAVRAS-CHAVE: Administração Pública; princípio da publicidade; democracia; licitações, Lei nº 8.666/1993; Lei nº 12.462/2011. SUMÁRIO: Introdução; 1 Breves considerações sobre as licitações; 1.1 Modalidades de licitação; 1.2 Fases do procedimento licitatório; 2 Princípios da licitação; 2.1 O princípio da publicidade nas licitações; 3 O princípio da publicidade na Lei nº 12.462/2011; Considerações finais; Referências.
INTRODUÇÃO A licitação consiste em procedimento administrativo, previsto no art. 37, XXI, da Constituição da República e regulamentado pela Lei nº 8.666/1993, tendo como principal finalidade selecionar a proposta mais vantajosa para o órgão ou entidade que pretende contratar, com fulcro na supremacia do interesse público e na isonomia, garantindo, ainda, a participação popular nas atividades estatais. Em regra, o Estado somente pode efetuar obras, serviços, compras e alienações mediante o processo de licitação, que deve garantir igualdade de condições a todos os concorrentes, em observância aos princípios que regem a atuação do Estado. A verificação da proposta apresentada pelo licitante deve, necessariamente, ser realizada em conformidade com critérios objetivos previamente explicitados no instrumento convocatório, objetivando uma contratação totalmente impessoal, de acordo com o tipo de
Induvidoso, diante de tais considerações, que a licitação é procedimento criado em conformidade com os princípios que regem a Administração Pública, quais sejam, aqueles previstos no art. 37, caput, da Constituição de 1988 e repetidos no art. 3º da Lei nº 8.666/1993: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Entre os referidos princípios, o objeto principal do presente estudo é o princípio da publicidade e sua aplicação no âmbito das licitações, principalmente em razão da previsão contida no art. 6º da Lei nº 12.462/2011, que conferiu sigilo temporário aos valores orçados para as contratações referentes às obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos. Desse modo, revela-se necessário o estudo acerca da aplicação do princípio da publicidade no procedimento licitatório, visando a verificar a constitucionalidade do art. 6º da Lei nº 12.462/2011 – análise que será feita sob a matriz disciplinar1 do Estado Democrático de Direito.
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Informa Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias que, apesar de ter se tornado comum o uso da expressão “paradigma do Estado Democrático de Direito”, a expressão “paradigma” não seria correta para “expressar o conjunto de ideias determinantes e estruturadoras das figuras jurídico-constitucionais Estado de Direito e Estado Democrático de Direito”, para evitar compreender o Estado Democrático de Direito como “modelo ou padrão” (BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo constitucional e estado democrático de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p. 56).
1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE AS LICITAÇÕES Licitação é o procedimento administrativo, previsto no art. 37 da Constituição da República e regulamentado pela Lei nº 8.666/1993, realizado a fim de selecionar a melhor proposta (preço, técnica) para celebração de contratos com a Administração Pública. Assim, dispõe o art. 37, XXI, da Constituição de 1988: XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
A própria Lei nº 8.666/1993, em seu art. 3º, caput, tratou de conceituar a licitação: A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
Hely Lopes Meirelles define a licitação como “o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse”, que se desenvolve “através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos” (Meirelles, 2004, p. 266).
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licitação que é escolhido entre aqueles que a própria lei estabelece como possíveis: menor preço, melhor técnica, técnica e preço e maior lance ou oferta.
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Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, [...] a licitação é o procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental, pretendendo alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipuladas previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados. (Mello, 2007, p. 507)
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Tem-se, portanto, que a adoção, pelo texto constitucional de 1988, da obrigatoriedade da licitação para os contratos administrativos é decorrente da instauração no Brasil do Estado Democrático de Direito2, por permitir que os atos administrativos sejam construídos com participação popular e, principalmente, fiscalizado pelo povo.
Após definido o conceito de licitação, duas características do procedimento licitatório são relevantes para compreensão do referido conceito, quais sejam, a predeterminação de critérios objetivos para seleção da proposta e “a ampla participação dos interessados, com observância de todos os requisitos legais exigidos” (Justen Filho, 2008, p. 11).
Desse modo, somente pode ser considerada válida a contratação realizada mediante a devida observância ao procedimento administrativo preconizado na Lei nº 8.666/1993.
Desse modo, resta claro que a licitação consiste no procedimento adotado pelo Estado para garantir a igualdade, publicidade, impessoalidade e probidade em suas contratações, seja de obras, serviços, compras ou alienações.
A Lei nº 8.666/1993, em seu art. 22, prevê a existência de cinco modalidades de licitação: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão.
Nesse sentido, é a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
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procedimentos e dentro de certos limites específicos” (Justen Filho, 2008, p. 11).
1.1 MODALIDADES DE LICITAÇÃO
As três primeiras modalidades (concorrência, tomada de preços e convite) destinam-se à contratação de obras, compras e serviços, sendo o critério de opção o valor estimado dos contratos.
Destarte, atendem-se três exigências públicas impostergáveis: proteção aos interesses públicos e recursos governamentais – ao se procurar a oferta mais satisfatória; respeito aos princípios da isonomia e impessoalidade (previstos nos arts. 5º e 37, caput) – pela abertura de disputa do certame; e, finalmente, obediência aos reclamos de probidade administrativa, imposta pelos arts. 37, caput, e 85, V, da Carta Magna brasileira. (Mello, 2007, p. 507)
Destaque-se, ainda, que, em conformidade com o ensinamento de Marçal Justen Filho, “há uma íntima relação entre a democratização do Estado e a ampliação da utilização do contrato administrativo”. Prossegue o autor afirmando que, “[...] em um Estado Democrático de Direito, os bens e serviços os particulares somente poderão ser obtidos mediante a observância de certos
Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:
2
Segundo Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias, o Estado Democrático de Direito consiste em “um Estado submetido às normas do direito e estruturado por leis, sobretudo a lei constitucional, um Estado no qual se estabeleça estreita conexão interna entre dois grandes princípios jurídicos, democracia e Estado de Direito”, ou seja, é uma junção entre o Estado de Direito e o Princípio Democrático (BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo constitucional e estado democrático de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p. 54).
a) convite – até R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais); b) tomada de preços – até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais); c) concorrência: acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais); II – para compras e serviços não referidos no inciso anterior: a) convite – até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); b) tomada de preços – até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais); c) concorrência – acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais).
Assim, apesar de terem a mesma destinação, quais sejam, a realização de obras e serviços de engenharia, compras e serviços, poderá a licitação ser realizada por três procedimentos distintos, dependendo do valor previsto para a contratação: concorrência, convite ou tomada de preços.
das propostas, ou seja, ocorre uma antecipação da fase de habilitação, em que é avaliado o preenchimento dos requisitos previstos no instrumento convocatório. Sobre a tomada de preços, é a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello: A tomada de preços (art. 22, § 2º), destinada a transações de vulto médio, é a modalidade em que a participação na licitação restringe-se a) às pessoas previamente inscritas em cadastro administrativo, organizado em função dos ramos de atividades e potencialidades dos eventuais proponentes, e b) aos que, atendendo a todas as condições exigidas para o cadastramento, até o terceiro dia anterior à data fixada para o recebimento das propostas, o requeiram e sejam, destante, qualificados. (Mello, 2007, p. 538)
É também o ensinamento de Marçal Justen Filho, que destaca a sumariedade do procedimento, que, ao exigir o cadastramento prévio, suprime a fase de habilitação:
A concorrência consiste na “modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto” (art. 22, § 1º, da Lei nº 8.666/1993).
A finalidade da tomada de preços é tornar a licitação mais sumária e rápida. O prévio cadastramento corresponde à fase de habilitação. No cadastramento, a habilitação é antecipada para um momento anterior ao início da licitação. [...] No momento posterior, quando deliberar a realização da licitação na modalidade de tomada de preços, a Administração não necessita promover uma fase de habilitação específica. (Justen Filho, 2008, p. 247)
Em conformidade com o ensinamento de Marçal Justen Filho, “o que diferencia a concorrência é a amplitude de participação de interessados” (Justen Filho, 2008, p. 247), tendo em vista que qualquer um, tendo conhecimento do edital convocatório, que apresente comprovação dos requisitos mínimos de qualificação previstos no referido instrumento poderá participar do certame.
A terceira modalidade destinada à contratação de obras, serviços e compras é o convite, ainda mais restrito que a modalidade de tomada de preços, tendo em vista que os interessados são escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, podendo ser cadastrados ou não, dispensando a ampla publicação do instrumento convocatório.
Já a tomada de preços é um procedimento mais restrito, exigindo o prévio cadastramento do interessado ou comprovação do preenchimento dos requisitos até três dias antes do recebimento
O art. 22, § 3º, da Lei de Licitações garante, ainda, o direito de participação aos demais interessados, que estejam cadastrados no órgão licitante, ainda que não convidados.
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I – para obras e serviços de engenharia:
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O convite é o procedimento mais simplificado dentre as modalidades comuns de licitação. Prevê-se a faculdade de a Administração escolher potenciais interessados em participar da licitação. Esses convidados não necessitam estar cadastrados previamente. Mas admite-se a participação de quaisquer outros interessados “[...] que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas”, desde que cadastrados. [...] A faculdade de escolha pela Administração dos destinatários do convite deve ser exercida com cautela, diante dos riscos de ofensa à moralidade e à isonomia. Se a Administração escolher ou excluir determinados licitantes por preferências meramente subjetivas, estará caracterizado desvio de finalidade e o ato terá de ser invalidado. A seleção prévia dos participantes faz-se no interesse da Administração para a realização de suas funções. (Justen Filho, 2008, p. 247)
As outras duas modalidades previstas no art. 22, IV e V, da Lei nº 8.666/1993, o concurso e o leilão, destinam-se a fins específicos, sendo o primeiro destinado à escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores e o segundo somente para alienação de bens públicos, móveis ou imóveis, e de produtos legalmente apreendidos ou penhorados.
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Sobre o concurso é a lição doutrinária:
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O concurso pressupõe o interesse da Administração em selecionar trabalho técnico ou artístico, exteriorizador de habilidade físico-intelectual ou revelador de certas capacidades personalíssimas, seja para fins de incentivo ao desenvolvimento cultural, seja para obtenção de resultado prático imediato. O prêmio corresponde a uma contrapartida (econômica ou não) pela atividade técnica ou artística – até porque, em regra, o produto dessa atividade não será economicamente avaliável. O prêmio não significa uma mera liberalidade da Administração. No concurso, a premiação final funciona como um fato de incentivo aos possíveis interessados em participar do concurso. O prêmio tanto poderá consistir em bem economicamente avaliável como em uma honraria de outra natureza. (Justen Filho, 2008, p. 253)
Concurso (art. 22, § 4º) é uma disputa entre quaisquer interessados que possuam a qualificação exigida, para a escolha de trabalho técnico ou artístico, com a instituição de prêmio ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial. (Mello, 2007, p. 540)
No tocante ao procedimento do leilão, vale destacar o seguinte ensinamento: No leilão, os interessados comparecem em data preestabelecida para o ato, formulando verbalmente suas propostas. Ou seja, a regra do leilão é a inexistência de sigilo quanto ao conteúdo das propostas. Muito pelo contrário, é da essência do leilão que tais propostas sejam públicas e de amplo conhecimento. Os proponentes ficam vinculados por sua proposta até que outra, mais elevada, seja formulada. A formulação de proposta mais elevada por outro licitante retira a eficácia da proposta menos elevada, autorizando o interessado a formular outra proposta (desde que mais elevada que a última). Será considerada vencedora a proposta mais elevada. (Justen Filho, 2008, p. 254)
Assim, a Lei nº 8.666/1993 prevê as cinco modalidades, destinadas a três situações distintas. O art. 22 arrola cinco modalidades de licitação. O elenco não é, porém, homogêneo. Sob uma análise doutrinária, pode-se afirmar a existência de três modalidades de licitação. Há uma modalidade que poderia dizer-se “comum”, abrangendo as hipóteses dos incisos I a III. Além disso, existem duas modalidades especiais (incisos IV e V). Essa distinção deriva e que a modalidade dos incisos IV e V são destinadas a fins específicos. Não há cabimento de sua utilização para outros tipos de contratação administrativa senão àquelas para as quais são especificamente destinadas. O concurso somente se presta como procedimento de seleção para atribuição de prêmios ou seleção fundada em critérios muito específicos. Já o leilão se destina a selecionar a melhor proposta para alienação de bens ou direitos, nas hipóteses previstas em lei. Ao contrário, os procedimentos dos três primeiros incisos são utilizáveis para qualquer tipo de contratação. (Justen Filho, 2008, p. 246)
Vale, ainda, ressaltar uma sexta modalidade de licitação, o pregão, prevista na Lei nº 10.520/2002, destinada à aquisição de bens e serviços comuns, definidos como “aqueles cujos padrões
de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado”, podendo ser realizado presencialmente ou por meio eletrônico.
Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura de processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa, e ao qual serão juntados oportunamente:
1.2 FASES DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO
I – edital ou convite e respectivos anexos, quando for o caso; II – comprovante das publicações do edital resumido, na forma do art. 21 desta Lei, ou da entrega do convite; III – ato de designação da comissão de licitação, do leiloeiro administrativo ou oficial, ou do responsável pelo convite; IV – original das propostas e dos documentos que as instruírem;
A fase interna é aquela realizada pela própria Administração, sem a participação dos interessados, em que se define a necessidade da realização da licitação, seu objeto, modalidade e critérios de seleção, resultando na elaboração do edital.
V – atas, relatórios e deliberações da Comissão Julgadora;
Assim, tem-se que o procedimento licitatório “inicia-se na repartição interessada com a abertura do processo em que a autoridade competente determina sua realização, define seu objeto e indica os recursos hábeis para a despesa” (Meirelles, 2004, p. 279).
VIII – recursos eventualmente apresentados pelos licitantes e respectivas manifestações e decisões;
Destaca-se que a realização de uma licitação, para que se dê início a sua etapa interna, pressupõe a existência de “projeto básico disponível para exame dos interessados, orçamento detalhado em planilhas abertas que expressem a composição de todos os custos unitários e a previsão de recursos orçamentários” (Bicalho, 2011, p. 266). Nesse sentido, prevê o art. 38 da Lei de Licitações: 3
Segundo Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias, o procedimento “exige uma série de atos e uma série de normas, que os disciplinam, em conexão entre eles, regendo-lhes a sequência de seu desenvolvimento” (BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo constitucional e estado democrático de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p. 90).
VI – pareceres técnicos ou jurídicos emitidos sobre a licitação, dispensa ou inexigibilidade; VII – atos de adjudicação do objeto da licitação e da sua homologação;
IX – despacho de anulação ou de revogação da licitação, quando for o caso, fundamentado circunstanciadamente; X – termo de contrato ou instrumento equivalente, conforme o caso; XI – outros comprovantes de publicações; XII – demais documentos relativos à licitação.
Acerca da fase interna do procedimento licitatório, é o entendimento de Marçal Justen Filho: Na etapa interna, são praticados os atos necessários à definição da licitação e do contrato que se seguirão. É dita interna porque essa etapa se desenvolve no âmbito exclusivo da Administração, não se exteriorizando perante terceiros.
E prossegue o autor: [...] Sob um certo ângulo, é uma etapa “gestacional”. Durante seu decurso, são estabelecidas as condições que nortearão e regerão todo o desenvolvimento subseqüente do procedimento administrativo. As
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O procedimento3 licitatório consiste em uma sucessão de atos destinados à contratação pela Administração Pública, de bens, serviços, produtos, adotado na Lei nº 8.666/1993, que o divide em duas fases: interna e externa.
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exigências a que estarão sujeitos os participantes da licitação e as cláusulas do contrato serão delineadas nesta etapa. O desenvolvimento regular desta etapa é condição para o êxito da atividade posterior da Administração. Todos os demais atos praticados pela Administração, no curso da licitação, são reflexos das decisões e dos atos praticados na fase interna. (Justen Filho, 2008, p. 483)
Desse modo, a fase interna é uma fase preparatória da realização do certame, que se encerra com a elaboração e publicação do edital, que conterá as informações relevantes sobre o objeto contratado, a modalidade de licitação e os critérios objetivos para participação. Segundo Hely Lopes Meirelles, pode-se definir edital como “o instrumento pelo qual a Administração leva ao conhecimento do público a abertura de concorrência, de tomada de preços, de concurso e de leilão, fixa as condições de sua realização e convoca os interessados a apresentarem suas propostas” (Meirelles, 2004, p. 280).
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Após a elaboração do edital, inicia-se a fase externa do certame com a sua divulgação, sucedida pela habilitação, apresentação das propostas e documentos, classificação e julgamento, homologação e adjudicação, nos termos previstos no art. 43 da Lei nº 8.666/1993:
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Art. 43. A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos: I – abertura dos envelopes contendo a documentação relativa à habilitação dos concorrentes, e sua apreciação; II – devolução dos envelopes fechados aos concorrentes inabilitados, contendo as respectivas propostas, desde que não tenha havido recurso ou após sua denegação; III – abertura dos envelopes contendo as propostas dos concorrentes habilitados, desde que transcorrido o prazo sem interposição de recurso, ou tenha havido desistência expressa, ou após o julgamento dos recursos interpostos;
IV – verificação da conformidade de cada proposta com os requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados por órgão oficial competente, ou ainda com os constantes do sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente registrados na ata de julgamento, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis; V – julgamento e classificação das propostas de acordo com os critérios de avaliação constantes do edital; VI – deliberação da autoridade competente quanto à homologação e adjudicação do objeto da licitação.
Sobre a fase externa, ensina Marçal Justen Filho que poderão ser praticados atos “internamente no seio da Administração”, como “o exame das propostas, a efetivação de diligências, o exame da conveniência e da legalidade dos atos praticados” que, mesmo assim, integram a fase externa por se tratarem de atos destinados a “produzir efeitos perante terceiros” (Justen Filho, 2008, p. 483). Na fase de habilitação, deverão os interessados comprovar sua habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira, regularidade fiscal e trabalhista e cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição e 1988. Assim, considerar-se-á habilitado o candidato que “possuir os requisitos mínimos de capacidade jurídica, capacidade técnica, idoneidade econômico-financeira, regularidade fiscal e regularidade trabalhista, pedidos no edital; inabilitado ou desqualificado é o que, ao contrário, não logrou fazê-lo” (Meirelles, 2004, p. 288). Após a habilitação, serão abertos os envelopes com as propostas, que serão classificadas, em conformidade com os critérios editalícios, e julgadas. O julgamento (arts. 3º, 44 e 45) é o resultado do processo e do procedimento. É a decisão e o registro da proposta mais “vantajosa”, ordenando-se as demais de forma decrescente. Este ato é privativo da Comissão Permanente ou Especial, sendo vedado à autoridade
hierárquica alterá-lo. Segundo o rito, a Comissão julga, e a autoridade competente homologa e adjudica o objeto (art. 43, VI) desde que o procedimento decorra sem irregularidades. Registre-se que no art. 38, VII, a homologação vem após a adjudicação. Entretanto, no art. 43, fixador do rito procedimental, consignou-se como ato final a adjudicação. (Motta, 2005, p. 48)
O supracitado dispositivo legal acresce às licitações os princípios da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e o recentemente inserido pela Medida Provisória nº 495, de 19 de julho de 2005 – princípio da promoção do desenvolvimento nacional.
Desse modo, será selecionada a proposta mais vantajosa, pelos critérios de melhor preço, melhor técnica, ou melhor preço e técnica, de forma completamente imparcial e impessoal, sendo o resultado homologado pelo órgão administrativo responsável, encerrando-se a licitação com a adjudicação do objeto.
Merece destaque, para o presente estudo, o princípio da publicidade, que impede o sigilo nos atos administrativos, bem como nas licitações, visando a garantir a observância à supremacia do interesse público e permitindo a fiscalização de tais atos por todos os interessados.
A licitação rege-se pelos mesmos princípios4 aplicáveis à Administração Pública, quais sejam, aqueles previstos no art. 37 da Constituição da República: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Nesse sentido, prevê o art. 3º da já mencionada Lei de Licitações: Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. 4
Conforme ensinamento de Alécia Paolucci Nogueira Bicalho, “os princípios são pilares fundamentais sob os quais se erigem as normas, motivo pelo qual são absolutamente essenciais na instrumentalização do direito, visando ao controle da legalidade dos processos, em especial na hermenêutica jurídica” (BICALHO, Alécia Paolucci Nogueira. Licitação. In: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso prático de direito administrativo. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 229).
2.1 O princípio da publicidade nas licitações O princípio da publicidade encontra previsão expressa não só no art. 3º, caput, da Lei nº 8.666/1993, mas também em seu § 3º: § 3º A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.
Trata-se de importante instrumento de controle sobre a atividade estatal e essencial à concretização do Estado Democrático de Direito, uma vez que somente com a ampla publicidade permite-se ao povo fiscalizar a atividade praticada pelo Estado e assim participar dos atos públicos.
à divulgação do procedimento para conhecimento de todos os interessados, como também aos atos da Administração praticados nas várias fases do procedimento, que podem e devem ser abertas aos interessados, para assegurar a todos a possibilidade de fiscalizar sua legalidade. (Di Pietro, 2005, p. 317)
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2 PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO
Também conceitua o princípio da publicidade Carlos Pinto Coelho Motta, entendendo que “preconiza a visibilidade dos atos
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Sobre o referido princípio, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que este não se limita
da administração pra viabilizar o exercício pleno do controle por parte da sociedade” e tem por objetivo combater a “concepção segredista, instalada na burocracia administrativa, que dificulta o acesso a dados e documentos, proclamando a desnecessidade de motivar os atos” (Motta, 2005, p. 88).
A ausência de publicidade somente é admitida quando outros interesses públicos possam ser concretamente ofendidos. Existem contratações que envolvem questões sigilosas. Bem de ver que o sigilo não pode ser imposto de modo arbitrário, mas deve ser cumpridamente justificado. Em tais casos, o principio da publicidade poderá ser afastado. (Justen Filho, 2008, p. 73)
No âmbito das licitações, é o ensinamento de Rigolin e Bottino:
Em assim sendo, a abrangência revela-se desde a divulgação do aviso de sua abertura até o conhecimento do edital, o exame da documentação e das propostas, o fornecimento de certidões e a abertura dos envelopes, conforme ensinamento de Hely Lopes Meirelles:
[...] a publicidade é requisito absolutamente essencial à regularidade de qualquer licitação. Pensar-se em licitação não pública, secreta, realizada às escondidas, é tão ilógico quanto adjudicar o objeto ao último classificado. Mais que isso: licitação “oculta” será quase sempre viciada por dolo, desvio de finalidade, má-fé da Administração, dirigismo fraudulento – e por mais essa razão é racionalmente inconcebível. Toda licitação é, antes de mais nada, inteiramente pública, devendo ser literalmente, mesmo, escancarada aos olhos de qualquer cidadão, nela interessado diretamente ou não [...]. (Rigolin; Bottino, 2006, p. 116)
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No âmbito das licitações, a publicidade de atos é proeminente, não devendo haver procedimento sigilosos. Tal prática contrariaria o próprio objetivo do instituto, qual seja, buscar a formação de um futuro contrato vantajoso ao Estado e ao interesse público, de acordo com os critérios estabelecidos no instrumento convocatório, bem como concretizar a democracia, por meio da fiscalização popular dos atos públicos.
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Assim, leciona Marçal Justen Filho: A publicidade desempenha duas funções. Primeiramente, objetiva permitir o amplo acesso dos interessados ao certame. Refere-se, nesse aspecto, à universidade da participação no processo licitatório. Depois, a publicidade orienta-se a facultar a verificação da regularidade dos atos praticados. Parte-se do pressuposto de que as pessoas tanto mais se preocuparão em seguir a lei e a moral quanto maior for a possibilidade de fiscalização de sua conduta. Sendo ilimitadas as condições de fiscalização, haverá maior garantia de que os atos serão corretos. Perante a CF/1988, a garantia foi ampliada (art. 5º, XXXIII).
A publicidade dos atos da licitação é princípio que abrange desde os avisos de sua abertura até o conhecimento do edital e seus anexos, o exame da documentação e das propostas pelos interessados e o fornecimento de certidão de quaisquer peças, pareceres ou decisões com ela relacionadas. É em razão desse princípio que se impõe a abertura os envelopes da documentação e proposta em público e a publicação oficial das decisões dos órgãos julgadores e do respectivo contrato, ainda que resumidamente. (Meirelles, 2004, p. 267)
A falta de publicidade, nos termos legais, torna viciado o procedimento, sendo possível o reconhecimento de sua nulidade. A exceção, todavia, ocorre somente na fase do julgamento, podendo este ser realizado em ambiente fechado, conferindo à comissão de licitação uma maior tranquilidade para que possam discutir o mérito das questões a serem decididas. Após, o resultado deverá ser amplamente divulgado, possibilitando a interposição de recursos e o conhecimento do resultado a toda a população, tendo em vista o interesse público de tais contratações.
3 O PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE NA LEI Nº 12.462/2011 A Lei nº 12.462, promulgada em 4 de agosto de 2011, resultado da conversão da Medida Provisória nº 527/2011, instituiu o
Art. 1º É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização: I – dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e II – da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação – Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo – Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 – CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III – de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II.
Dispõe o art. 6º da referida lei: Art. 6º Observado o disposto no § 3º, o orçamento previamente estimado para a contratação será tornado público apenas e imediatamente após o encerramento da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas. § 1º Nas hipóteses em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, a informação de que trata o caput deste artigo constará do instrumento convocatório. § 2º No caso de julgamento por melhor técnica, o valor do prêmio ou da remuneração será incluído no instrumento convocatório. § 3º Se não constar do instrumento convocatório, a informação referida no caput deste artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e permanentemente aos órgãos de controle externo e interno.
Verifica-se, portanto, que o supracitado dispositivo legal consiste em exceção ao princípio da publicidade, permitindo que haja sigilo quanto aos valores orçados para a contratação, questão que faz parte da fase interna do procedimento licitatório. Para que seja possível verificar a adequação do preço do serviço contratado com os valores habituais de mercado, é realizada, pela Administração Pública, uma pesquisa de preço com empresas do ramo, as quais poderão participar do certame, definindo, por conseguinte, o valor orçado para a contratação que será realizada. Tendo em vista que os referidos orçamentos constituem parte do procedimento administrativo previsto nos arts. 38 e seguintes da Lei nº 8.666/1993, estes não podem ser acobertados pelo sigilo, como preconiza o art. 6º da Lei nº 12.462/2011. Ressalte-se que buscou justificar-se o referido sigilo pela suposta celeridade necessária para a realização das obras da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016. No entanto, não restou demonstrado ou devidamente justificado qualquer interesse público necessário para justificar o sigilo quanto ao preço das referidas contratações, motivo pelo qual se questiona a legalidade e a constitucionalidade do debatido dispositivo legal. É inegável que o princípio da publicidade pode sofrer limitações sempre que for necessário para o andamento do procedimento licitatório e para o interesse público, desde que de forma devidamente fundamentada, o que, porém, não é o caso do Regime Diferenciado das Contratações previsto na Lei nº 12.462/2011. Vale ainda frisar que o art. 40, § 2º, da Lei nº 8.666/1993 inclui o orçamento realizado pela Administração, bem como os preços como parte integrante do edital, sendo inviável existir qualquer
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Regime Diferenciado de Contratações Públicas, direcionados às obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, conforme previsto em seu art. 1º:
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sigilo que abranja o instrumento convocatório, sob pena de limitar, indevidamente, a competitividade no certame. § 2º Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: I – o projeto básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos; II – orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários; [...]
Não pode ser a licitação vista como uma espécie de “loteria”, cabendo ao administrador fazer constar do instrumento convocatório o máximo possível de informações para que o serviço possa ser oferecido e, eventualmente, prestado em conformidade com as expectativas da administração e também dentro das possibilidades da empresa licitante.
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Ressalte-se, ainda, que é direito fundamental, previsto no art. 5º, XXXIII, da Constituição da República, o direito de todos de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
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Sobre questão semelhante, reconhecendo a importância e a imprescindibilidade da publicidade, já decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais: Mandado de segurança. Licitação. Publicidade dos atos administrativos. Direito líquido e certo à informação do processo. Sentença confirmada. Ante a natureza pública dos atos administrativos, qualquer cidadão tem o direito subjetivo de acompanhar o desenvolvimento de qualquer licitação, desde que não interfira de modo a perturbar ou impedir a realização dos trabalhos, sendo abusiva a atitude da Administração que nega informações a respeito. (TJMG, AC 1.0028.06.011742-2/001, 6ª C.Cív., Rel. Des. Edilson Fernandes, DJ 21.08.2007)
A recusa de informação sobre os preços orçados, assim como a recusa de qualquer informação do processo licitatório, viola,
ainda, o princípio da isonomia e da impessoalidade, vez que garante às empresas fornecedoras do orçamento vantagem sobre as demais, pelo conhecimento do preço orçado, o que facilita a proposta, sem que haja preço acima do previsto. Desse modo, havendo a possibilidade de disputa entre os participantes, “impõe ao gestor público o dever de tratá-los de modo isonômico, oferecendo-lhes a oportunidade de propor negócios jurídicos que viabilizem a justa composição das tensões entre a demanda da coletividade e os lucros por eles visados” (FRANÇA, Vladimir Rocha. A licitação e seus princípios. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-8-NOVEMBRO-2006-WLADIMIR%2 0ROCHA.pdf>). Por derradeiro, induvidoso que a divulgação do preço permite a legítima fiscalização do povo acerca da adequabilidade da modalidade licitatória adotada, o que corrobora a ilegalidade e a inconstitucionalidade do sigilo acerca do preço orçado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante de todo o exposto, após analisado o conceito de licitação, seu procedimento e modalidades, é indubitável que as práticas administrativas, não só no tocante às licitações, mas em todos os atos administrativos, devem ocorrer no sentido de ampliar a verificação dos atos administrativos, possibilitar a efetiva responsabilização de seus agentes e, principalmente, concretizar o Estado Democrático de Direito, o que é garantido pela devida observância do princípio da publicidade. O princípio da publicidade possui previsão constitucional e legal (Lei nº 8.666/1993), não podendo ser afastado no procedimento licitatório, exceto em caso em que o interesse público o exija. Em se tratando de licitação, é essencial que o procedimento administrativo possa ser efetivamente fiscalizado tanto pelo Legis-
lativo e pelo Judiciário, quanto por todos os interessados (povo), motivo pelo qual se exige que todas as fases do procedimento licitatório sejam públicos e acessíveis a todos os interessados.
12.462/2011, por clara ofensa ao princípio da publicidade e contrariedade aos preceitos do Estado Democrático de Direito.
Obviamente, é preciso criar formas pelas quais cada cidadão possa acompanhar a atividade administrativa e dela participar, para que, então, possa promover a responsabilização dos transgressores da lei, perante os órgãos competentes, sejam eles do Legislativo (via Tribunais de Contas), sejam do Judiciário (via Ministério Público ou por Ação Popular).
REFERÊNCIAS
Resta claro, portanto, que o art. 6º da Lei nº 12.462/2011, ao determinar o sigilo quanto ao preço orçado das obras e serviços destinados à realização da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, ofende ao princípio da publicidade, vez que inexiste motivação amparada no interesse público que justifique o caráter sigiloso da informação na licitação. Desse modo, revela-se ilegal, arbitrária, inconstitucional e abusiva a recusa do órgão público em fornecer o preço orçado, sendo também inconstitucional o disposto no art. 6º da Lei nº
BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo constitucional e estado democrático de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. DI PIETRO, Maria Silvya Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. FRANÇA, Vladimir Rocha. A licitação e seus princípios. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-8-NOVEMBRO-2006-WLADIMIR%2 0ROCHA.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2011. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2008. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 10. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. RIGOLIN, Ivan Barbosa; BOTTINO, Marco Tullio. Manual prático das licitações. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
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Assim, a divulgação dos valores orçados, questão de interesse público por pretender a garantia da igualdade dos participantes do certame, bem como a adequação das propostas dentro do valor delimitado, visa a evitar que seja o procedimento frustrado pela desconformidade das propostas com o orçamento da Administração Pública.
BICALHO, Alécia Paolucci Nogueira. Licitação. In: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso prático de direito administrativo. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.
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Acórdão na Íntegra
Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial nº 1.323.219 – RJ (2011/0197988-8) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: José Luiz Marinho Soares Advogado: Viviane Mallet D’Avilla e outro(s) Recorrido: José Moreira da Silva Advogado: Emmanuel Bernardes Francisco Viegas e outro(s) EMENTA DIREITO CIVIL – CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CELEBRADO EM MOEDA ESTRANGEIRA E INDEXADO AO DÓLAR – ALEGADA INEXISTÊNCIA DO PACTO – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO – PAGAMENTO MEDIANTE CONVERSÃO EM MOEDA NACIONAL – CÁLCULO COM BASE NA COTAÇÃO DA DATA DA CONTRATAÇÃO 1. O recurso especial não pode ser conhecido quando a indicação expressa do dispositivo legal violado está ausente. 2. O art. 1º da Lei nº 10.192/2001 proíbe a estipulação de pagamentos em moeda estrangeira para obrigações exequíveis no Brasil, regra essa encampada pelo art. 318 do CC/2002 e excepcionada nas hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/1969. A despeito disso, pacificou-se no STJ o entendimento de que são legítimos os contratos celebrados em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em moeda nacional. 3. A indexação de dívidas à variação cambial de moeda estrangeira é prática vedada desde a entrada em vigor do Plano Real, excepcionadas as hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/1969 e os contratos de arrendamento mercantil celebrados entre pessoas residentes e domiciliadas no País, com base em captação de recursos provenientes do exterior (art. 6º da Lei nº 8.880/1994). 4. Quando não enquadradas nas exceções legais, as dívidas fixadas em moeda estrangeira deverão, no ato de quitação, ser convertidas para a
moeda nacional, com base na cotação da data da contratação, e, a partir daí, atualizadas com base em índice oficial de correção monetária. 5. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha. Brasília (DF), 27 de agosto de 2013 (data do Julgamento). Ministra Nancy Andrighi Relatora
RELATÓRIO O Exmo. Sr. Ministro Nancy Andrighi (Relator): Cuida-se de recurso especial interposto por José Luiz Marinho Soares, fundamentado na alínea a do permissivo constitucional. Ação (fls. 03/06, e-STJ): declaratória da existência de contrato de empréstimo, cumulada com ação de cobrança, ajuizada por José Moreira da Silva, em face do recorrente.
Sentença (fls. 301/306, e-STJ): o Juízo de 1º grau julgou procedentes os pedidos para declarar a existência do contrato de empréstimo celebrado entre José Moreira da Silva (credor) e José Luiz Marinho Soares (devedor) e condenar o recorrente ao pagamento da quantia de R$ 210.000,00 (duzentos e dez mil reais).
para fazer constar do aresto embargado que “não houve afronta ao art. 318 do CC/2002 e art. 1º da Lei nº 10.192/2001, eis que tais dispositivos vedam apenas a imposição de pagamento em moeda estrangeira, admitindo-se, portanto, quando do cumprimento da obrigação, sua conversão em moeda nacional”.
Acórdão (fls. 370/371, e-STJ): o TJ/RJ negou provimento ao recurso interposto por José Luiz Marinho Soares, nos termos do acórdão assim ementado:
Segundo recurso especial (fls. 498/508, e-STJ): interposto por José Luiz Marinho Soares, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional. Alega o recorrente que não há provas de que o recorrido lhe tenha emprestado dinheiro, e que os documentos apresentados por este são de formalidade duvidosa. Aduz que o acórdão impugnado, ao reconhecer a existência de contrato de empréstimo celebrado em moeda estrangeira e indexado a dólares norte-americanos, ofendeu o art. 318 do CC/2002 e o art. 1º da Lei nº 10.192/2001.
A vedação legal ao pagamento de obrigação em moeda estrangeira não impede o seu uso como indexador. A matéria não suscitada em sede de agravo retido não pode ser conhecida na apelação. Revelando-se correta a valoração das provas produzidas durante a instrução processual, impõe-se a manutenção do julgado. Recurso desprovido.
Embargos de declaração (fls. 378/379, e-STJ): opostos pelo recorrente, foram rejeitados pelo TJ/RJ. Primeiro recurso especial: dei provimento, monocraticamente, ao primeiro recurso especial interposto pelo recorrente (fls. 482/483, e-STJ), por violação do art. 535 do CPC, a fim de anular o acórdão que julgou os embargos de declaração opostos e determinar a devolução dos autos ao TJ/RJ para manifestação acerca da alegada violação dos arts. 318 do CC/2002 e 1º da Lei nº 10.192/2001 (REsp 1.058.937/RJ). Acórdão do TJ/RJ nos embargos de declaração (fls. 489/490, e-STJ): foram acolhidos, sem modificação no julgado, apenas
Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/RJ não admitiu o recurso especial (fls. 537/541, e-STJ), dando azo à interposição de agravo, do qual conheci e determinei a reautuação, nos termos do art. 34, XVI, do RISTJ (fls. 572, e-STJ). É o relatório.
VOTO O Exmo. Sr. Ministro Nancy Andrighi (Relator): Cinge-se a controvérsia a determinar: (I) a existência de dívida contraída pelo recorrente, de que é credor o recorrido; e (II) a validade do contrato de empréstimo celebrado pelas partes em moeda estrangeira, indexado à variação cambial do Dólar.
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Civil. Processual Civil. Ação declaratória e cobrança. Empréstimos indexados em moeda estrangeira. Possibilidade. Precedentes do STJ1. Agravo retido. Matéria não suscitada no âmbito desse recurso. Reexame de Prova. Convencimento do juízo formado pela livre apreciação, mostrando-se correta a aferição do conjunto probatório.
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I – DA EXISTÊNCIA DE DÍVIDA CONTRAÍDA PELO RECORRENTE (AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO) Sustenta o recorrente que não há provas de que o recorrido lhe tenha emprestado dinheiro, e que os documentos apresentados por este, para comprovar o negócio jurídico supostamente entabulado, são de formalidade duvidosa. Deixa de indicar, todavia, o dispositivo legal que teria sido violado pelo acórdão impugnado, o que impede o conhecimento do recurso especial neste ponto.
II – DA VALIDADE DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CELEBRADO EM MOEDA ESTRANGEIRA, INDEXADO PELA VARIAÇÃO CAMBIAL DO DÓLAR (VIOLAÇÃO DOS ARTS. 1º DA LEI Nº 10.192/2001 E 318 DO CC/2002) Fevereiro/2014 – Ed. 203
Alega o recorrente que, “em nenhuma hipótese, seria lícita a contratação, no Brasil, entre pessoas aqui residentes, de obrigações em dólares norte-americanos, ou a sua utilização como indexador, nos exatos termos do art. 318 do Código Civil e do artigo 1º da Lei 10.192/01” (fl. 504, e-STJ). Há, portanto, duas questões a serem decididas, que não se confundem entre si: (I) se é lícita a contratação de empréstimo em moeda estrangeira; e (II) se esse contrato pode ser indexado
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à variação cambial do Dólar.
I – Da contratação de empréstimo em moeda estrangeira O Tribunal de origem reconheceu que as partes celebraram contrato de empréstimo, comprovado pelos diversos “vales” rubricados pelo recorrente (fls. 14, 16 e 18, e-STJ), os quais totalizam a quantia de U$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil dólares). A propósito do tema, o art. 1º da Lei nº 10.192/2001 proíbe a estipulação de pagamentos em moeda estrangeira para obrigações exequíveis no Brasil, regra essa mantida pelo art. 318 do CC/2002, e excepcionada nas hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/1969. A despeito disso, o STJ pacificou o entendimento de que é legítimo o contrato celebrado em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em moeda nacional. Nesse sentido: REsp 1.212.847/PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª Turma, DJe de 21.02.2011; REsp 804.791/MG, minha relatoria, 3ª Turma, DJe de 25.09.2009; AgRg no Ag 1.043.637/MS, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, 4ª Turma, DJe de 16.03.2009; REsp 848.424/ RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJe de 18.08.2008; e REsp 194.629/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 22.05.2000. Vale dizer, exceto nas hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/1969, que autorizam a estipulação de pagamento em moeda estrangeira de obrigação exequível no Brasil, e dentre as quais, frise-se, não se inclui a situação em tela, o devedor somente é liberado da dívida pelo pagamento em moeda corrente nacional, forçando-se, com isso, o curso desta. Assim, não prospera a alegação do recorrente de que não é válido o negócio jurídico celebrado com o recorrido, por ter sido a dívida fixada em Dólares, cabendo apenas ressalvar que o pagamento deverá ser realizado pelo seu equivalente em Reais.
II – DA INDEXAÇÃO DO CONTRATO À VARIAÇÃO CAMBIAL DO DÓLAR
ma de resguardar a estabilidade monetária interna e a própria soberania nacional.
O TJ/RJ, ao apreciar a matéria, afirmou que não há “qualquer vedação legal ao uso da moeda estrangeira como indexador” (fl. 371, e-STJ).
No mais, qualquer conclusão em sentido contrário exigiria o revolvimento do substrato fático-probatório dos autos, circunstância que encontra óbice na Súmula nº 07/STJ.
Sucede, entretanto, que essa prática é vedada pelo ordenamento jurídico desde a entrada em vigor do Plano Real, excepcionadas, mais uma vez, as hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/1969, além dos contratos de arrendamento mercantil celebrados entre pessoas residentes e domiciliadas no País, com base em captação de recursos provenientes do exterior (art. 6º da Lei nº 8.880/1994).
Forte em tais razões, conheço em parte do recurso especial e, nessa parte, dou-lhe parcial provimento para determinar que, na data da quitação, a dívida do recorrente seja convertida em moeda nacional, com base na cotação do Dólar na data da contratação, e, a partir daí, atualizada de acordo com o índice oficial de correção monetária.
Diante disso, não obstante se reconheça, na hipótese, a impossibilidade de indexação à variação cambial, tal fato não implica nulidade do contrato firmado, mas impõe que, na data do pagamento, a quantia devida em Dólares seja convertida em Reais, tendo como referência a cotação do dia da contratação, e, em seguida, atualizada segundo o índice oficial de correção monetária vigente no país. Essa solução, sem dúvida, evita, de um lado, o enriquecimento ilícito do devedor, em detrimento do credor; e, de outro, protege o espírito do art. 1º da Lei nº 10.192/2001, encampado pelo art. 318 do CC/2002, de forçar o curso de nossa moeda, como for-
CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Número Registro: 2011/0197988-8 1.323.219/RJ
Processo Eletrônico REsp
Números Origem: 20022090079256 200600131021 200613518178 200801092806 201113707968 Pauta: 27.08.2013
Julgado: 27.08.2013
Relatora: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Maurício Vieira Bracks Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha
AUTUAÇÃO Recorrente: José Luiz Marinho Soares
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A propósito do tema, no julgamento do REsp 804.791/MG, em que se decidiu questão semelhante, a 3ª Turma firmou o entendimento de que, “havendo previsão de pagamento futuro, tais dívidas [fixadas em moeda estrangeira] deverão, no ato de quitação, ser convertidas para moeda nacional com base na cotação da data da contratação e, a partir daí, atualizadas com base em índice de correção monetária admitido pela legislação pátria” (minha relatoria, DJe de 25.09.2009 – grifou-se).
Advogado: Viviane Mallet D’Avilla e outro(s) Recorrido: José Moreira da Silva
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Advogado: Emmanuel Bernardes Francisco Viegas e outro(s) Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos
CERTIDÃO Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).
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Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
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Pesquisa Temática
Processo administrativo Processo administrativo – analogia in malam partem – inadmissibilidade “Mandado de segurança. Processo administrativo disciplinar. Analogia in malam partem no processo administrativo sancionador. Inadmissibilidade. Controle jurisdicional do processo administrativo. 1. No âmbito do direito administrativo sancionador, no caso de omissão do legislador quanto à determinada conduta, pode-se utilizar a analogia, vedada, entretanto, a aplicação da analogia in malam partem. 2. Na hipótese, afasta-se o uso da analogia para justificar a perda das prerrogativas inerentes a policial militar do impetrante, decretando-se a nulidade do despacho prolatado pelo comandante-geral da PMGO que as perpetrou com fundamento no Decreto nº 4.713/1996 e determinando a remessa dos autos relativos ao conselho de justificação à auditoria militar do Estado de Goiás, nos moldes do art. 15, IV, do Decreto nº 1.189/1976. 3. ‘Observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório na esfera administrativa, a atuação do Poder Judiciário no controle dos atos administrativos limita-se aos aspectos da legalidade e moralidade, sendo vedado o exame do âmbito do mérito administrativo’. 4. Segurança parcialmente concedida.” (TJGO – MS 201194548466 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Kisleu Dias Maciel Filho – DJe 10.09.2012)
Processo administrativo – audiência de oitiva de testemunha – intimação do acusado – ausência – presença do advogado – nulidade – inexistência “Constitucional e administrativo. Processo disciplinar. Audiência de oitiva de testemunha. Ausência de intimação do acusado. Presença do advogado constituído. Ausência de prejuízo. Nulidade. Não ocorrência. Aos litigantes em processo administrativo são asseguradas constitucionalmente as garantias do devido processo legal, acompanhado do contraditório e da ampla defesa. Contudo, o processo administrativo não se submete aos rigores do processo judicial, sendo o bastante a disponibilização de cenário justo e equilibrado ao acusado, de tal modo que se vigorou o entendimento de que, uma vez atingindo as metas democráticas impostas pela Constituição da República, não há de se inquinar nulidade aos atos, sem que tenha se comprometido as garantias asseguradas constitucionalmente. Deste modo, não há de se falar em nulidade o fato do acusado no processo administrativo não ter sido intimado para a ausência de oitiva de testemunha, quando foi representado por advogado legalmente constituído, máxime, quando comprovada a efetiva atuação do causídico na defesa da parte, revelando a inexistência de qualquer prejuízo.” (TJRO – EI 0004412-68.2012.8.22.0000 – C.Esp.Reun. – Rel. Des. Rowilson Teixeira – DJe 25.09.2012)
Processo administrativo – auxílio-transporte – suspensão – necessidade “Administrativo. Suspensão auxílio-transporte. Servidor. Processo administrativo. Contraditório e ampla defesa. I – Não é possível a suspensão, mediante alegação de constituir medida meramente acautelatória, de auxílio-transporte recebido por servidor, em função de diligências realizadas por grupo de trabalho instaurado no âmbito da Autarquia, com oitiva de modo informal e unilateral de pessoas, sem que haja a instauração prévia de processo disciplinar com a garantia do contraditório e do direito de defesa. II – Precedente desta Corte: AMS 200751010065020, Quinta Turma Especializada, Rel. Des. Fed. Fernando Marques, E-DJF2R 20.10.2010. III – Apelação conhecida e provida.” (TRF 2ª R. – AMS 2007.51.01.016131-8 – 7ª T. Especializada – Rel. Des. Fed. José Antonio Lisbôa Neiva – DJe 10.01.2012)
Processo administrativo – conselho da polícia civil – presença de dois promotores – Lei Complementar nº 98/2003 – constitucionalidade “Administrativo. Processo administrativo disciplinar. Composição do Conselho da Polícia Civil do Estado do Paraná. Presença de dois promotores. Lei Complementar nº 98/2003. Constitucionalidade. Nulidade. Ausência de demonstração do prejuízo. Inovação recursal. Impossibilidade. 1. Esta 5ª Turma já manifestou-se no sentido de que é constitucional o art. 6º da Lei Complementar Estadual nº 98/2003, segundo o qual o Conselho da Polícia Civil será formado por servidores advindos não só da instituição policial civil, como também de outros órgãos, afastando a homogeneidade em sua formação. Precedentes. 2. A presença de Promotor de Justiça e/ou de Procuradores do Estado no Conselho da Polícia Civil encontra amparo no texto constitucional, que não impede a participação de membros do Ministério Público em órgãos consultivos ou de deliberação, ressaltando que essa participação no Conselho de Polícia é compatível com a missão do Ministério Público de fiscalizar a legalidade e moralidade pública. 3. O reconhecimento de eventual nulidade processual exige a comprovação de prejuízo à defesa, o que, no presente caso, após detida análise dos documentos que instruem a impetração, verifica-se não ter ocorrido, atraindo a incidência do princípio pas de nullité sans grief. 4. As questões não articuladas na inicial do mandado de segurança e não discutidas pela instância de origem não podem ser apreciadas em sede de recurso ordinário, sob pena de violação do princípio tantum devolutum quantum appellatum. 5. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-Rec.-MS 24.145 – (2007/0107398-1) – 5ª T. – Rel. Min. Jorge Mussi – DJe 16.10.2012)
Processo administrativo disciplinar – abandono de cargo – retorno voluntário ao serviço – animus abandonandi – inexistência “Processo administrativo disciplinar. Servidor público. Abandono de cargo. Animus abandonandi. Inexistência. Retorno ao serviço. A infração administrativa de abandono de cargo pressupõe o elemento subjetivo do animus abandonandi. O retorno voluntário ao serviço, antes de instaurado processo disciplinar tendente à aplicação da penalidade, afasta, inequivocadamente, o ânimo de abandono. Sob outro prisma, conforme entendimento do superior tribunal de justiça a administração que acolhe o servidor, permitindo a continuidade da prestação de serviço, antes mesmo da instauração do processo administrativo, toma atitude contrária à pena d e demissão, implicando em perdão tácito, perdendo, assim, o direito de punir. Processo administrativo arquivado.” (TJGO – PAD 201194572545 – CSM – Rel. Des. Itaney Francisco Campos – DJe 18.06.2012)
Processo administrativo disciplinar – intervenção – afastamento cautelar – relação de parentesco – motivação – existência “Administrativo. Cartório. Processo disciplinar. Intervenção. Afastamento cautelar. Relação de parentesco. Competência da autoridade. Existência de motivação. Proporcionalidade e razoabilidade. Ausência de direito líquido e certo. 1. Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão que denegou a segurança em pleito para anulação do afastamento preventivo e cautelar da impetrante, das atividades em cartório, no qual seu irmão figura como titular e está sob investigação. 2. A autoridade impetrada figura como competente para a prática do ato impugnado, porquanto é Magistrado designado para a condução do processo administrativo disciplinar, em razão das férias da Diretora do Foro; inexiste qualquer violação do ‘princípio do juiz natural’ no caso concreto. 3. O ato foi devidamente motivado e é marcado pelo caráter cautelar, ou seja, visa impedir a ocorrência de problemas na condução do processo administrativo disciplinar e na intervenção que está em curso na unidade; existe precedente antigo no sentido da legalidade de ato congênere, que vise à efetivação de atividade correcional: RMS 15.948/PR, Relª Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, Julgado em 02.10.2003, DJ 28.10.2003, p. 232. Recurso ordinário improvido.” (STJ – RMS 33.508 (2011/0002558-3/PR) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 19.12.2011)
Processo administrativo disciplinar – Magistrada – pretensão punitiva – prescrição – reconhecimento “Processo administrativo disciplinar contra Magistrada. Observância do prazo de 140 dias para conclusão após o recebimento deste. Conhecimento do fato pela administração ocorrido em 17 de outubro de 2006 (art. 142, § 1º, da Lei nº 8.112/2990). Reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal. Extinção da punibilidade, mesmo que fosse aplicada qualquer das penalidades previstas nos arts. 42 da Loman, 1º da Resolução nº 30/2007-CNJ e 127 da Lei nº 8.112/1990, com exceção da pena de demissão, que, a meu ver, não se aplicaria ao caso em questão, o lapso temporal há tempo já excedeu.” (TJAC – PADServ. 0000034-30.2007.8.01.0000 – (6.603) – TPA – Rel. Des. Francisco das Chagas Praça – DJe 26.12.2011)
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Processo administrativo disciplinar – portaria de instauração – descrição minuciosa e individualizada – desnecessidade
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“Administrativo. Mandado de segurança. Servidor público federal. Processo administrativo disciplinar. Pena de demissão. Portaria de instauração. Descrição minuciosa e individualizada. Desnecessidade. Princípio da hierarquia. Observância. Secretário da Comissão. Termo de compromisso. Falta. Irrelevância. Interceptações telefônicas. Processo criminal. Prova emprestada. Possibilidade. Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Advento da Lei nº 11.457/2007. Redistribuição do cargo. Comissão processante. Alteração da competência. Não cabimento. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado no sentido de não ser imprescindível a descrição minuciosa dos fatos na portaria de instauração do processo disciplinar, tendo em vista que o seu principal objetivo é dar publicidade à constituição da comissão processante. A descrição pormenorizada dos fatos imputados ao servidor é obrigatória quando do indiciamento do servidor, o que ocorreu no caso. 2. A teor do disposto no art. 149 da Lei nº 8.112/1990, apenas o presidente da comissão processante deve cumprir o requisito de ocupar cargo de nível igual ou superior, ou ter escolaridade de grau igual ou superior, ao do servidor investigado. 3. Não implica nulidade a ausência de termo de compromisso do secretário da comissão do PAD, porquanto tal designação recai necessariamente em servidor público, cujos atos funcionais gozam de presunção de legitimidade e veracidade. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal encontra-se consolidada no sentido da possibilidade do aproveitamento, em processo disciplinar, de prova licitamente obtida mediante o afastamento do sigilo telefônico em investigação criminal ou ação penal, contanto que autorizada a remessa pelo juízo responsável pela guarda dos dados coletados, e observado, no âmbito administrativo, o contraditório. 5. O advento da Lei nº 11.457/2007, que, ao criar a Secretaria da Receita Federal do Brasil, redistribuiu o cargo ocupado pelo impetrante do Ministério da Previdência Social para o Ministério da Fazenda, não implica alteração da competência da comissão processante instaurada no âmbito do MPAS. O que se modifica é a autoridade julgadora do processo, que, no caso, passou a ser o Ministro de Estado da Fazenda, de quem, efetivamente, emanou o ato tido por coator. 6. ‘Ocorrendo a transgressão, fixa-se imediatamente a competência da autoridade responsável pela apuração dos ilícitos, independentemente de eventuais modificações de lotação dentro da estrutura da Administração Pública’ (MS 16.530, 1ª S., Rel. Min. Castro Meira, DJe 30.06.2011). 7. Segurança denegada.” (STJ – MS 14.797 – (2009/0221635-7) – 3ª S. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 07.05.2012)
Processo administrativo disciplinar – Procurador do Estado – pareceres e documentos – peça opinativa – punição – impossibilidade “Mandado de segurança. Procurador do Estado. Processo administrativo disciplinar. O profissional do direito, seja advogado público ou privado, não pode ser punido pelos pareceres e documentos que elabore no exercício do seu múnus, salvo, em situações especialíssimas, em que a peça opinativa seja apenas um ato, dolosamente preparado, para fins escusos.” (TJRO – MS 0012254-36.2011.8.22.0000 – C.Esp.Reun. – Rel. Des. Eurico Montenegro – DJe 16.03.2012)
Processo administrativo disciplinar – servidor – documento público – extorsão e falsificação – negativa de autoria – alegação – prova – inexistência “Administrativo. Servidor público estadual. Policial civil. Processo administrativo disciplinar. Pena de demissão. Prática de extorsão e falsificação de documento público. Alegação de negativa de autoria. Inexistência de prova. Ausência de direito líquido e certo. 1. Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão que denegou a segurança em writ impetrado com o objetivo de anular processo administrativo disciplinar que demitiu policial civil envolvido em extorsão e falsificação de documento público (mandado de prisão). 2. Os autos comprovam que o servidor agiu em conluio com outro policial civil, para extorquir cidadão, ofertando a possibilidade de obstar pretenso mandado de prisão, que falsificaram; O impetrante foi devidamente identificado, assim como a ocorrência do fato delituoso está evidenciada nos presentes autos. 3. Uma alegação grave como a negativa de autoria, em writ of mandamus impetrado contra processo disciplinar, deve ser acompanhada de robusta e convincente comprovação, já que incabível a dilação; não há provas nos autos que contradigam as conclusões da autoridade impetrada e do Tribunal de origem e, portanto, ausente o direito líquido e certo postulado. Precedente: RMS 32.296/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, Segunda Turma, DJe 07.12.2011. Recurso ordinário improvido.” (STJ – RMS 38.027 – (2012/0102369-9) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 28.06.2012)
Processo administrativo – princípio bis in idem – ofensa “Administrativo. Procedimento administrativo disciplinar. OAB. Ofensa ao princípio bis in idem. Comunicação às autoridades competentes. Honorários advocatícios. 1. Ofensa ao princípio bis in idem, uma vez que os fatos apurados pelo processo administrativo disciplinar em tela já foram objeto de análise em outro procedimento administrativo, com a devida imposição de pena disciplinar. 2. A comunicação aos órgãos competentes é medida administrativa que se impõe, para a atualização da situação cadastral do profissional, com fito ao regular exercício de sua profissão. 3. Honorários advocatícios majorados para R$ 2.000,00, seguindo entendimento da Turma julgadora. 4. Apelação da parte autora a que se dá parcial provimento. 5. Apelação da OAB a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – AC 0009106-36.2010.4.03.6104/SP – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marli Ferreira – DJe 01.08.2012)
Processo administrativo – professores grevistas – estágio probatório – sanção – aplicação – impossibilidade
Processo administrativo – ex-servidor – instauração – possibilidade “Processo administrativo disciplinar. Instauração contra ex-servidor. Possibilidade. Administrativo. Processo administrativo disciplinar. Instauração contra ex-servidor. Possibilidade. Apuração de irregularidades praticadas quando do exercício das funções públicas. Obrigatoriedade da apuração pela autoridade pública. 1. De acordo com o regramento legal, ao qual a Administração Pública está jungida em face da obediência ao princípio da legalidade, a responsabilidade civil-administrativa do servidor público federal, resultante de sua atuação no exercício do cargo, deve ser obrigatoriamente apurada pelo respectivo ente público, por meio da instauração de sindicância ou do processo administrativo disciplinar, nos termos do art. 143 da Lei nº 8.112/1990; sob pena de a autoridade competente incorrer no crime de condescendência criminosa, capitulado no art. 320 do Código Penal. Precedentes. 2. Na apuração da responsabilidade administrativa do servidor público, outros desdobramentos, diferentes da penalidade administrativa, podem advir, tais como: remessa do relatório ao Ministério Público para eventual propositura de ação penal, obrigatoriedade de a Advocacia-Geral da União de ingressar com ação de reparação de danos civis e registro nos assentamentos funcionais, para efeito de reincidência no caso de reingresso no serviço público. 3. O simples fato de o Indiciado em processo administrativo disciplinar não mais ostentar a condição de servidor público, por já ter sido anteriormente demitido, não implica o cessamento da apuração de irregularidades por ele praticadas quando do exercício de suas funções relativas ao cargo ocupado. 4. Segurança denegada.” (STJ – MS 13.916 – (2008/0234641-5) – 3ª S. – Relª Min. Laurita Vaz – DJe 23.02.2012)
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“Mandado de segurança. Processo administrativo disciplinar. Professores grevistas ainda em estágio probatório. Greve. Direito inserido na Carta Magna. Desconstituição do ato coator. Possibilidade. Estando o direito de greve assegurado na Constituição Federal (arts. 9º e 37), com aplicação da Lei Federal nº 7.783/1989, impossível aplicar sanção ao servidor que, mesmo em estágio probatório, aderiu ao movimento. Ademais, não se pode considerar sua participação em movimento grevista desabonador de sua conduta, mormente por estar equiparado ao servidor estável, conforme precedentes do STF. Segurança concedida.” (TJGO – MS 201291297979 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Carlos Alberto Franca – DJe 05.09.2012)
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Processo administrativo - servidor público - abandono de cargo - intimação - ausência - princípio da defesa plena - ofensa “Processo administrativo disciplinar. Servidor da Justiça Estadual. Abandono de cargo. Ausência de comunicação do faltoso para apresentar defesa preliminar. Norma especial. Princípio da especialidade. Ofensa à ampla defesa. Configura ofensa ao princípio da defesa plena a instauração de processo administrativo disciplinar contra servidor do Poder Judiciário Estadual, por abandono de cargo, sem a intimação, via edital, para apresentar defesa preliminar à acusação, consoante o art. 40, caput, da Lei nº 14.563/2003, norma especial, que subsiste em relação à de caráter geral, estatuto dos funcionários públicos civis do Estado de Goiás, atenção ao princípio da especialidade. Processo administrativo disciplinar anulado.” (TJGO - PAD 201292525045 - CSM - Rel. Des. Luiz Claudio Veiga Braga - DJe 25.09.2012)
Processo administrativo – sindicância – desnecessidade “Recurso administrativo. Processo administrativo disciplinar. Incidência das disposições da Lei Estadual nº 10.460/1988. Sindicância. Desnecessidade. Imparcialidade da comissão processante não demonstrada. Condenação mantida. Recurso ordinário improvido. I – O art. 39 da Lei Estadual nº 14.563/2003, sucedido pelo art. 46 da Lei Estadual nº 16.893/2010, revogou expressamente as normas da Lei Estadual nº 9.129, de 22 de novembro de 1981 (Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás), que dispunham sobre o regime disciplinar dos servidores do Poder Judiciário (arts. 125 a 153), impondo que seja observado o regime disciplinar estabelecidos no Estatuto Geral dos Servidores Públicos Civis do Estado de Goiás (Lei Estadual nº 10.460/1988). II – Consoante dispõe o art. 327 da Lei Estadual nº 10.460/1988, tem-se que o processo administrativo disciplinar prescinde do processamento da sindicância, sendo desta independente e autônomo, não havendo que se falar em cerceamento de defesa em razão da inexistência daquele procedimento preparatório. Precedentes desta Corte e do STJ. III – O acolhimento da alegação de imparcialidade de membro da comissão de processo administrativo disciplinar depende de prova robusta que demonstre a ocorrência de alguma das hipóteses de impedimento ou suspeição previstas no § 3º do art. 330 da Lei Estadual nº 10.460/1988, e deve ser suscitada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, conforme prescreve os arts. 98 e 108 do Código de Processo Penal, aplicado supletivamente por força do § 22 do art. 331 do Estatuto Funcional. Precedentes deste Tribunal de Justiça. IV – Inexistindo qualquer irregularidade formal no processo administrativo disciplinar, que teve seu regular desenvolvimento com a estrita observância dos princípios constitucionais inerentes e, por outro lado, estando devidamente comprovada a autoria e materialidade da infração disciplinar, bem como a voluntariedade do processado, deve ser mantida a condenação e confirmada a penalidade imposta, que é razoável à hipótese. Recurso administrativo desprovido.” (TJGO – RADM 201291039074 – CSM – Rel. Des. Carlos Alberto Franca – DJe 13.08.2012)
Processo administrativo – vereadores – Tribunal de Contas – intimação – ausência – ampla defesa – ofensa
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“Tribunal de contas falta de intimação em processo administrativo de veradores condenados à devolução de dinheiro aos cofres públicos ofensa à ampla defesa existente demanda anulatória procedente sentença confirmada.” (TJSP – Ap 0101578-31.2008.8.26.0000 – São Paulo – 4ª CDPúb. – Rel. Ricardo Feitosa – DJe 06.11.2012)
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Jurisprudência Comentada
Da Ilegalidade da Investigação Preliminar Promovida pelo Ministério Público POR JADER MARQUES
Advogado Criminalista, Professor de Direito Penal.
Entendemos que o MP não tem poder ou atribuição para presidir inquérito relativamente a fatos de natureza criminal.
EMENTA DELEGADO DE POLÍCIA – NOTIFICAÇÃO DE COMPARECIMENTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO – HABEAS CORPUS – CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL – INCONSISTÊNCIA DA POSTULAÇÃO 1. Não constitui constrangimento ilegal o ato de representante do MP que, no exercício da atribuição conferida pelo art. 129, VII, da CF/1988, invocando os arts. 8º, I, e 9º da LC 73/1993, e em consonância com as normas internas da repartição, requisita a notificação de delegado de polícia ao respectivo Superior hierárquico, sem impor cominação em caso de inatendimento.
4. Ordem denegada. (TRF 1ª R. – HC 2002.01.00.030162-8/DF – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Hilton Queiroz – DJU 17.12.2002 – p. 107)
COMENTÁRIO Pode o MP dar início à investigação de possível prática delitiva, promovendo a apuração da autoria, da materialidade e das circunstâncias do fato? Essa discussão entrou, definitivamente, na pauta do debate jurídico nacional, especialmente depois de voto prolatado pelo Ministro Nelson Jobim, do STF, cujo entendimento foi no sentido da ilegalidade da atuação do MP na investigação criminal. O voto do Ministro Nelson Jobim foi prolatado em sede de recurso ordinário interposto para reforma da decisão que vai aqui transcrita e que dá ensejo ao debate ora proposto (TRF 1ª R., HC 01000301628/ DF, 4ª T., Rel. Des. Fed. Hilton Queiroz, DJU 17.12.2002, p. 107).
2. Também não o constitui a instauração de procedimentos investigatórios, no âmbito interno da repartição, para tornar efetiva a competência outorgada pelo citado dispositivo da Lei Maior, como função institucional do MP.
Entendemos que o MP não tem poder ou atribuição para presidir inquérito relativamente a fatos de natureza criminal. Não pode instaurar procedimento investigatório criminal, realizar diligências, tomar depoimentos, enfim, formar uma espécie anômala de IP, para o fim de alicerçar a propositura da ação penal. É nula toda a prova produzida neste procedimento.
3. A Portaria nº 799, de 21.11.1996, que cria e instala o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial, no âmbito do MPDF e Territórios, e que não foi invocada como fundamento da notificação impugnada, é ato interno da repartição, independendo de publicidade em Diário Oficial, até porque não se destina a traçar normas de conduta para os administrados.
Preceitua a Constituição Federal, em seu art. 144, § 4º, que “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”.
A CF determinou quem dirige a apuração de infrações penais. E, veja-se que se trata de norma de eficácia plena, não podendo lei infraconstitucional ampliar ou restringir a sua aplicação. A norma constitucional já é regulamentada e de aplicação imediata. É necessário um olhar atento em relação ao art. 4º do CPP, diante do que consta na CF a respeito da legitimidade para a apuração de infrações penais. Como ensina o Professor Luiz Alberto Machado1, [...] a lei não pode cometer as funções de elaboração de inquérito policial e de investigações criminais a quem não se revista expressamente de autoridade policial, segundo a CF. A leitura que se deve fazer dessa atribuição administrativa constitucional é ser uma garantia individual, a garantia da imparcialidade e impessoalidade do MP, dominus litis e que, por isso, não deve, e não pode, investigar ou coligir informações para o exercício da ação processual criminal.
Mais adiante, assevera que:
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A obediência a esse princípio, do monopólio da investigação criminal pela polícia civil, dirigida por delegado de polícia de carreira, é imposição do princípio da legalidade, sintetizado por Celso Antônio Bandeira de Mello como a obrigação de a Administração Pública só agir quando um texto de lei específico a autorize a agir.
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Como parte acusadora, não pode assumir a investigação preliminar, sob pena de transformá-la numa atividade puramente voltada para a acusação, com gravíssimos inconvenientes para o sujeito passivo. Por derradeiro, o modelo causa sérios prejuízos para a defesa e gera a desigualdade das partes no futuro processo. Atribuir ao MP a direção da investigação preliminar significa dizer que a fase pré-processual não servirá para preparar o processo, informando à acusação, à defesa e também ao juiz, senão que será uma via de mão única: serve somente para a acusação.
Rômulo de Andrade Moreira3, ao tecer comentários sobre o tema, cita decisão pertinente ao caso: Ministério Público. Impedimento de seus órgãos. Nulidade da denúncia. O membro do MP que atua na fase inquisitorial, apurando pessoalmente os fatos, torna-se impedido para oficiar como promotor da ação penal (inteligência dos arts. 252, I, e 258 do CPP). Nula, portanto, é a denúncia ofertada se inobservado esse aspecto. (EJTJAP, v. 1, n. 1, p. 91)
Marcelo Caetano Guazzelli Peruchin 4 faz uma percuciente avaliação do tema, em seu ensaio intitulado “Da ilegalidade da investigação criminal exercida”, exclusivamente, pelo MP no Brasil, no qual principia questionando: Seria constitucionalmente válida uma investigação criminal realizada exclusivamente pelo Ministério Público? Seria ou não exclusiva a atribuição da Polícia Judiciária para realizar atos de investigação criminal? O exercício do controle externo da atividade policial, pelo MP, autorizaria a substituição da autoridade policial pelo órgão do Parquet na presidência do IP?
Assim, tem-se que a atividade preliminar, representada pela investigação, só pode ser presidida por delegado de polícia.
Consoante é consabido, a CF/1988, ao dispor sobre o MP, em seu Título IV, Capítulo IV, Seção I (arts. 127 a 130), mais especificamente no art. 129, VII, estabeleceu como uma de suas funções institucionais o controle externo da atividade policial, nos seguintes termos: “Exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior”. A mencionada lei complementar surgiu em 1993, qual seja, a LC 75/1993, a qual a seguir examinaremos.
Aury Lopes Júnior , ao dissertar sobre o assunto, faz severas críticas ao modelo que legitima a investigação preliminar presidida pelo MP: 2
1 2
Direito administrativo e constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 442. Sistemas de investigação preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 95.
3 4
Direito processual penal. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 213. FAYET, Ney (org.). Ensaios penais em homenagem ao Prof. Alberto Rufino Rodrigues de Souza. Porto Alegre: Ricardo Lenz, 2003. p. 538.
Porém, cortejando-se o dispositivo constitucional citado com o art. 144, § 1º, IV, e § 4º da mesma CF já é possível alcançar uma importante leitura da matéria em questão. No primeiro deles, ao regular a instituição da polícia federal, disciplina a Carta Maior: “A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se: [...] exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União” (art. 144, § 1º, IV, da CF – grifo nosso). Logo adiante, no art. 144, § 4º, da CF, consta a seguinte previsão: “Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares” (grifo nosso).
Controle Externo da Atividade Policial a fim de ser interrogado em procedimento administrativo investigatório supletivo.
Portanto, é de clareza insofismável que a CF/1988 previu a expressa exclusividade dos atos de investigação criminal à Polícia Judiciária, não tendo feito qualquer ressalva no tocante à previsão de tal atribuição a nenhum outro órgão, nem mesmo ao MP, a quem foi incumbida a promoção da ação penal pública (art. 129, I), e o aludido controle externo da atividade policial (art. 129, VII), dentre outras funções.
A revista Consultor Jurídico publicou a íntegra do voto do Ministro Nelson Jobim, cuja transcrição segue abaixo (voto ainda não revisado e não publicado):
Dito isso, impende demonstrar-se que o exercício do referido controle externo pelo Parquet não se traduz – nem poderia ser constitucionalmente confundido – com substituição da autoridade policial na presidência do inquérito policial, atribuição exclusiva desta, repita-se. O que se quer sustentar é que o exercício do controle externo da atividade policial, pelo MP, não afasta, em absoluto, a exclusividade dada pela CF à Polícia Judiciária, para a realização da investigação criminal, no curso do procedimento inquisitorial denominado IP, dentro do qual os atos (administrativos) processuais de investigação são desenvolvidos.
SEGUNDA TURMA
No voto proferido no RHC 81.326-7, o Ministro Nelson Jobim reformou a decisão ora transcrita, a qual considerava válida a requisição expedida pelo MPDF para que o recorrente, delegado de polícia, comparecesse ao Núcleo de Investigação Criminal e 5
RE 205473-9/AL (Rel. Min. Carlos Velloso, J. 15.12.1998, v.u., DJU 19.03.1999).
RHC 81.326-7/DF Relator: Ministro Nelson Jobim Recte.: Marco Aurélio Vergílio de Souza Advogado: Sebastião José Lessa Recorrido: Ministério Público Federal
RELATÓRIO Ministro Nelson Jobim (Relator): O recorrente Marco Aurélio Vergílio de Souza, delegado de polícia, foi notificado pelo representante do MPDF, para comparecer ao Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Ativi6
Precedentes citados: RE 233.072/RJ (DJU 03.05.2002) e RE 205.473/AL (DJU 30.08.1999), RHC 81.326/DF, Rel. Min. Nelson Jobim, 06.05.2003, (RHC 81326) (Informativo nº 307 do STF).
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A Segunda Turma do STF5 vem decidindo que o MP não pode efetuar investigação criminal diretamente, por ser esta uma atribuição exclusiva da Polícia Judiciária, somente sendo lícito ao órgão ministerial a condução de inquéritos civis.
No voto, que ainda não foi publicado, ficou assentado que o MP não tem poderes para realizar diretamente investigações, mas sim requisitá-las à autoridade policial competente, não lhe cabendo, portanto, inquirir diretamente pessoas suspeitas da autoria de crime, dado que a condução do inquérito policial e a realização das diligências investigatórias são funções de atribuição exclusiva da Polícia Judiciária6.
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dade Policial, a fim de ser ouvido no Procedimento Administrativo Investigatório Supletivo – PAIS, através do Ofício nº 313/00, de 11 de abril de 2000 (fls. 03 e 57). Este procedimento tem por finalidade apurar fato que, em tese, configura crime não esclarecido. Contra essa requisição, o recorrente impetrou HC no TJDF (fl. 03). O mesmo foi indeferido (fl. 56). O recorrente impetrou habeas substitutivo de recurso ordinário no STJ (fls. 02/18). O STJ indeferiu (fl. 95). Está na ementa: “Tem-se como válidos os atos investigatórios realizados pelo MP, que pode requisitar esclarecimentos ou diligenciar diretamente, visando à instrução de seus procedimentos administrativos, para fins de oferecimento de denúncia.” (fl. 95)
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Contra essa decisão, interpôs o presente recurso (fls. 98/115). Nele, reproduz os argumentos deduzidos no habeas do STJ. Está nas razões:
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“No ofício notificação (Ofício nº 313/00-NICCEAP, do MPDF, de 11.04.2000, que veio desacompanhado de contrafé, e sem os requisitos do art. 352(1), do CPP, está evidentemente implícito, o crime de desobediência (art. 352, CPP) e a condução coercitiva (art. 218, CPP(2)), posto que requisita a apresentação do corrente. A Portaria nº 799, de 21.11.1996, do chefe do MPDF, que criou e instalou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial, não foi publicada no Diário Oficial, contrariando os seguintes dispositivos legais que preconizam o princípio da publicidade: art. 37, caput (3), CF; art. 5º, I, h (4), LC 75/1993; art. 5º, V, b (5), LC 75/1993; art. 1º (6), LICC, DL 4.657/1942; art. 6º (7), LICC, DL 4.657/1942. A nossa tese é no sentido de que o Parquet não pode realizar, diretamente, tais investigações, mas requisitá-las à autoridade policial [...]” (fls. 100 e 105)
“[...] o acórdão impugnado não tratou, em momento algum, da legalidade ou ilegalidade da portaria do MPDF e Territórios que criou o Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial. Tampouco mencionou a legalidade ou ilegalidade da notificação do paciente para que comparecesse ao referido núcleo. [...] deveria o recorrente ter oferecido embargos declaratórios para que o STJ se manifestasse sobre o tema. Não o tendo feito, a defesa deixou que a tal matéria precluísse, não podendo ser objeto de apreciação neste recurso. A intenção da defesa, ao alegar a ausência de publicidade da portaria que criou o Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial, é anular a notificação feita pelo membro do Parquet para que o paciente comparecesse à sede do MPDFT para ser ouvido. [...] independentemente da legalidade ou ilegalidade da portaria em questão, a LC 75/1993 permite aos membros do MP da União ‘expedir notificação e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar [...]’ (art. 8º, VII (8)). [...] amparado o ato notificatório em LC, torna-se inócua a discussão a respeito da publicidade da portaria de criação do núcleo de controle da atividade policial. Com relação aos poderes investigatórios do MP, ressalta-se que o inquérito policial tem como destinatário o membro do Parquet, porquanto o MP é o titular da ação penal pública. [...] pode o Parquet ‘notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; requisitar informações e documentos a entidades privadas; realizar inspeções e diligências investigatórias, expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar’ (incisos I, II, IV, V, VI, VII, do art. 8º (9), da LC 75/1993). A CF, art. 129, I(10), diz competir, privativamente, ao MP promover a ação penal pública. Esta atividade depende, para o seu efetivo exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do crime e indícios de que o denunciado é o seu autor. A obtenção destes elementos pode ser feita diretamente pelo MP, pela Polícia Judiciária ou por outros órgãos que, em razão de suas atividades, possa colher elementos embasadores de uma ação penal.
A PGR opinou no sentido do não provimento do recurso (fls. 142). É o relatório.
VOTO Ministro Nelson Jobim (Relator): O recurso tem por objetivo modificar a decisão do STJ que reconheceu validade à requisição expedida pelo MP/DF. Essa requisição pretendia fazer o recorrente comparecer ao Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial, a fim de ser ouvido em Procedimento Administrativo Investigatório Supletivo (PAIS). Analiso os fundamentos.
1 FALTA DE PUBLICIDADE DA PORTARIA A falta de publicidade da Portaria nº 799, de 21 de novembro de 1996, que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial, no âmbito do MP, embora suscitada perante o STJ, não foi examinada (fls. 03 e 24). Leio, no parecer do MP: “[...] o acórdão impugnado não tratou, em momento algum, da legalidade ou ilegalidade da portaria do MPDF e Territórios, que criou o Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial. Tampouco mencionou a legalidade ou ilegalidade da notificação do paciente para que comparecesse ao referido núcleo... deveria o recorrente ter oferecido embargos declaratórios, para que o STJ se manifes-
tasse sobre o tema. Não o tendo feito, a defesa deixou que a tal matéria precluísse, não podendo ser objeto de apreciação neste recurso [...]” (fls. 120). Confirmo no Voto do Relator, Ministro Gilson Dipp: “[...] Trata-se de HC contra decisão do TJDF e Territórios, que denegou ordem impetrada em favor do paciente, visando ao trancamento do procedimento administrativo contra ele instaurado pelo MP local, para a apuração de crime que, em tese, o paciente teria cometido. Em razões, reitera-se alegação de ausência de justa causa para constranger o paciente e comparecer ao Núcleo de Investigação a fim de depor. Sustenta-se, da mesma forma, que o procedimento instaurado pelo MP seria inconstitucional, afrontando ao princípio do devido processo legal, eis que a apuração do fato caberia à polícia, por meio de IP. [...]” (fl. 85)
O recorrente não lançou mão dos embargos para sanar a omissão. Ressuscitar a matéria, agora, caracterizaria supressão de instância. Precedentes: HC 66.825, Carlos Madeira; HC 71.603, HC 73.390 e HC 70.734, Carlos Velloso; HC 76.966, Maurício Corrêa; HC 79.948, Nelson Jobim e HC 81.458, Sepúlveda Pertence. Ocorreu a preclusão.
2 FALTA DE LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO Quanto à falta de legitimidade do MP para realizar diretamente investigações e diligências em procedimento administrativo investigatório, com fim de apurar crime cometido por funcionário público, no caso delegado de polícia, a controvérsia não é nova. Faço breve exposição sobre sua evolução histórica.
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Entender-se que a investigação dos fatos delituosos é atribuição exclusiva da polícia, na verdade, inverteria os papéis constitucionalmente definidos, tornando as polícias, civil e federal, no âmbito das suas atribuições, em verdadeiros titulares da ação penal, na medida em que o MP somente poderia denunciar aqueles fatos ilícitos que as polícias entendessem por bem investigar, cabendo-lhes decidir, em última análise, em quais casos, quando e como, o MP poderia agir. [...]” (fls. 120/122)
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Em 1936, o Ministro da Justiça Vicente Ráo tentou introduzir no sistema processual brasileiro a instituição dos juizados de instrução. A Comissão da Segunda Secção do Congresso Nacional do Direito Judiciário, composta pelos Ministros Bento de Faria, Plínio Casado e pelo Professor Gama Cerqueira, acolheu a tese no anteprojeto de reforma do CPP. (11) Ela, entretanto, não vingou. Na exposição de motivos do CPP, o Ministro Francisco Campos ponderou acerca da manutenção do inquérito policial. Leio em parte a ponderação: “[...] O preconizado juízo de instrução, que importaria limitar a função da autoridade policial a prender criminosos, averiguar a materialidade dos crimes e indicar testemunhas, só é praticável sob a condição de que as distâncias dentro do seu território de jurisdição sejam fácil e rapidamente superáveis [...]”. (12)
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Prossigo. A Polícia Judiciária será exercida pelas autoridades policiais, com o fim de apurar as infrações penais e a sua autoria (CPP, art. 4º). (13)
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O IP é o instrumento de investigação penal da Polícia Judiciária. É um procedimento administrativo destinado a subsidiar o MP na instauração da ação penal. A legitimidade histórica para condução do inquérito policial e realização das diligências investigatórias é de atribuição exclusiva da polícia. (14) Nesse sentido, leio em Espínola Filho: “[...] a investigação da existência do delito e o descobrimento de vários participantes de tais fatos, reunindo os elementos que podem dar a convicção da responsabilidade, ou irresponsabilidade dos mesmos, com a
circunstância, ainda, de somente nessa fase se poderem efetivar algumas diligências de atribuição exclusiva da polícia, [...]” (15) Com essa orientação, há precedente de Nelson Hungria, neste Tribunal (RHC 34.827). Leio, em seu voto: “[...] o CPP [...] não autoriza, sob qualquer pretexto, semelhante deslocação da competência, ou seja, a substituição da autoridade policial pela judiciária e membro do MP na investigação do crime [...]”. Até a promulgação da atual CF, o MP e a Polícia Judiciária tinham seus vasos comunicantes na esfera infraconstitucional. A harmonia funcional ocorria através do CPP e de leis extravagantes, como a LC 40/1981, que disciplinava a carreira do MP. Na Assembléia Nacional Constituinte (1988), quando se tratou de questão do Controle Externo da Polícia Civil, o processo de instrução presidido pelo MP voltou a ser debatido. Nesse sentido, leio voto que proferi no RE 233.072, do qual fui Relator para o acórdão: “[...] quando da elaboração da CF/1988, era pretensão de alguns parlamentares introduzir texto específico no sentido de criarmos, ou não, o processo de instrução, gerido pelo MP. Isso foi objeto de longos debates na elaboração da Constituição e foi rejeitado [...]”. Ao final, manteve-se a tradição. A CF assegurou as funções de polícia judiciária e apuração de infrações penais à polícia civil (CF, art. 144, § 4º (16)). Na esfera infraconstitucional, a LC 75/1993 cingiu-se aos termos da CF no que diz respeito às atribuições do MP (arts. 7º e 8º). (17) Reservou-lhe o poder de requisitar diligências investigatórias e instauração do IP (CF, art. 129, inciso VIII). (18)
“[...] Mas, o tema voltou a ser discutido quando, em 1993, votava-se no Congresso Nacional a lei complementar relativa ao MP da União e ao MP dos Estados, em que havia essa discussão do chamado processo de instrução que pudesse ser gerido pelo MP. Há longa disputa entre o MP, a Polícia Civil e a Polícia Federal em relação a essa competência exclusiva da polícia de realizar os inquéritos. Lembro-me que toda essa matéria foi rejeitada, naquele momento, no Legislativo [...]”
Mas, a polêmica continuou. Leio: “[...] Proposta de Emenda Constitucional em trâmite no Congresso Nacional brasileiro, relacionada com a questão do controle externo da atividade policial, [...] a de nº 109, também de 1995, de autoria do Deputado Federal Coriolano Sales, que se propõe a alterar a redação dos incisos I e VIII do art. 129 da CR. A exemplo da anterior, em 3 de junho de 1997, esta também foi apensada à Proposta de EC 059/1995. Com a alteração da redação do inciso I do citado art. 129 da CR, a Proposta pretende incluir a instauração e direção do inquérito como uma das funções institucionais do MP. [...] Em março de 1999, o Senador Pedro Simon apresentou nova Proposta de EC, sob o nº 21, acrescentando parágrafo único, ao art. 98, da CR, disciplinando que nas infrações penais de relevância social, a serem definidas em lei, a instrução será feita diretamente perante o Poder Judiciário, sendo precedida de investigações preliminares, sob a direção do MP, auxiliado pelos órgãos da Polícia Judiciária.” (19)
Prossigo eu. O Controle Externo da Polícia, concedido ao MP pela constituição foi regulamentado pela Resolução nº 32/1997, do Conselho Superior do Ministério Público Federal. Esses diplomas não lhe deferiram poderes para instaurar inquérito policial (Resolução nº 32/1997, art. 2º). (20) A CF dotou o MP do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de IP (CF, art. 129, VIII). (21)
A norma constitucional não contemplou, porém, a possibilidade do mesmo realizar e presidir inquérito penal. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas, requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Assim decidiu a Segunda Turma (RE 233.072, Rel. p/o Ac. Nelson Jobim). Está na ementa: “[...] O MP (1) não tem competência para promover inquérito administrativo em relação à conduta de servidores públicos; (2) nem competência para produzir inquérito penal sob o argumento de que tem possibilidade de expedir notificações nos procedimentos administrativos; (3) pode propor ação penal sem o inquérito policial, desde que disponha de elementos suficientes. Recurso não conhecido”. Outro precedente: RECR 205.473, Velloso. O recorrente é delegado de polícia. Autoridade administrativa, portanto. Seus atos administrativos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria, etc.
3 DECISÃO Dou provimento ao recurso. Notas referentes ao acórdão transcrito (1) CPP: “Art. 352. O mandado de citação indicará: I – o nome do juiz; II – o nome do querelante nas ações iniciadas por queixa; III – o nome do réu, ou, se for desconhecido, os seus sinais característicos; IV – a residência do réu, se for conhecida; V – o fim para que é feita a citação; VI – o juízo e o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer; VII – a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.”
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Ainda assim, a matéria estava longe de ser pacificada. Leio, ainda, no RE 233.072:
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(2) CPP: “Art. 218. Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública.”
(3) CF: “Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]”
(4) LC 75/1993: “Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União: I – a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis, considerados, dentre outros, os seguintes fundamentos e princípios: [...] h) a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a publicidade, relativas à Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União; [...]”
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(5) LC 75/1993:
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“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União: [...] V – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto: [...] b) aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade; [...]”
(6) Código Civil: “Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o País 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada.”
(7) Código Civil: “Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.”
(8) LC 75/1993:
“Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: [...] VII – expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; [...]”
(9) LC 75/1993: “Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I – notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; II – requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; [...] IV – requisitar informações e documentos a entidades privadas; V – realizar inspeções e diligências investigatórias; VI – ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio; VII – expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; [...]”
(10) CF: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]” (11) ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. 5. ed. Editora Rio, Histórica, v. 1, p. 242.
(12) Idem, p. 245. (13) CPP: “Art. 4º A Polícia Judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.”
(14) ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Op. cit., p. 247. (15) Idem, p. 246/247. (16) CF: “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e
(17) LC 75/1993: “Art. 7º Incumbe ao Ministério Público da União, sempre que necessário ao exercício de suas funções institucionais: I – instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos correlatos; II – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, podendo acompanhá-los e apresentar provas; III – requisitar à autoridade competente a instauração de procedimentos administrativos, ressalvados os de natureza disciplinar, podendo acompanhá-los e produzir provas. Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I – notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; II – requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; III – requisitar da Administração Pública serviços temporários de seus servidores e meios materiais necessários para a realização de atividades específicas; IV – requisitar informações e documentos a entidades privadas; V – realizar inspeções e diligências investigatórias; VI – ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio; VII – expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; VIII – ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública; IX – requisitar o auxílio de força policial.”
(18) CF: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; [...]”
(19) GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. Curitiba: Juruá, 2002. p. 160-163.
(20) Resolução nº 32/1997: “Art. 2º O controle externo da atividade policial compreende: I – a verificação e análise dos livros de registro; a) de ocorrência; b) de inquéritos policiais; c) de remessa de autos de inquérito policial; d) de objetos apreendidos; e e) de fianças; II – o acesso aos dados e ao andamento de todos os procedimentos inquisitoriais iniciados no âmbito policial, ainda que sob a forma preliminar; III – a fiscalização do cumprimento da requisição de diligências investigatórias à Polícia Federal, com ou sem inquérito policial instaurado; IV – a requisição a qualquer tempo, dos autos de investigação policial em curso, devendo o requisitante restituí-los à autoridade policial federal no prazo máximo de 10 (dez) dias; V – a fiscalização do cumprimento das promoções, inclusive quanto aos prazos, exaradas nos autos de inquérito policial, ou de investigação preliminar; [...]”
(21) CF: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; [...]” (Revista Consultor Jurídico, 7 maio 2003)
Não há qualquer dúvida de que a atividade investigativa levada exclusivamente pelo MP não encontra amparo na CF, na LC ou na Legislação Ordinária, de tal forma que resta violado o Princípio da Legalidade Estrita e/ou Princípio da Tipicidade dos Atos Administrativos. O acusador que determina instauração de investigação no âmbito da promotoria ou Procuradoria de Justiça com certeza ignora o dever de fidelidade aos princípios que regem a atuação de todo o funcionário público. A atividade do Promotor de Justiça é vinculada, sendo indispensável a verificação da tipicidade do ato administrativo, como forma de resguardar a observância ao princípio da legalidade.
Fevereiro/2014 – Ed. 203
da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: [...] § 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de Polícia Judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.”
84
Decorre do princípio da legalidade a necessidade de ser prevista em lei toda a atividade a ser praticada pelo membro do Poder Público7.
instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais”. Ao MP, por óbvio, não é lícito investigar fatos delituosos de forma direta e exclusiva.
Vale destaque a lição doutrinária apresentada por Maria Sylvia Zanella di Pietro8:
Nesse contexto, as provas produzidas pelo MP são nulas. Antes de terminar, vale referir os votos vencedores prolatados no RE 233.072-4/RJ, Julgado em 18.05.1999, nos quais ficou decretada, por maioria, a ilegitimidade do MP para a realização de investigação preliminar.
Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite. Em decorrência disso, a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei.
Sobre o princípio da legalidade, ainda, destaca o Jurista Alexandre de Moraes9:
Fevereiro/2014 – Ed. 203
O tradicional princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da CF e anteriormente estudado, aplica-se normalmente na Administração Pública, porém de forma mais rigorosa e especial, pois o administrador público somente poderá fazer o que estiver expressamente autorizado em lei e nas demais espécies normativas, inexistindo, pois, incidência de sua vontade subjetiva, pois na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza, diferentemente da esfera particular, onde será permitido a realização de tudo que a lei não proíba. Esse princípio coaduna-se com a própria função administrativa, de executor do direito, que atua sem finalidade própria, mas sim em respeito à finalidade imposta pela lei, e com a necessidade de preservar-se a ordem jurídica.
85
A CF, quanto à função do MP na investigação preliminar, determina a função de “requisitar diligências investigatórias e a 7
“Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]” (Redação dada ao caput pela Emenda Constitucional nº 19/1998) 8 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13. ed., 2001, p. 68. 9 MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 11. ed., 2002, p. 311.
O Ministro Maurício Corrêa, em seu voto, destaca com propriedade: Se, de um lado, não é obrigatória a existência de inquérito para a instauração da ação penal, por outro, quando se fizer necessário, é mister que seja realizado de acordo com as normas vigentes, sob pena de nulidade. Não vejo impedimento para que o MP requisite algum documento ou mesmo um processo administrativo para melhor fundamentar a ação penal que irá propor; o que não pode é que solitariamente realize investigação criminal à margem de qualquer controle. Isto porque o MP só poderá proceder investigações preliminares criminais, quando houver no sistema jurídico positivo normas que venham a presidir a sua atuação, regrando-a; não pode ele, entretanto, motu proprio, criar normas e ignorar as existentes, sob pena de comprometer a segurança jurídica da sociedade, e, mais, a dele própria.
O Ministro Marco Aurélio Mello, por seu turno, no mesmo julgamento, deixou assentado que: “O MP não pode fazer investigação, porque ele será parte na ação penal a ser intentada pelo Estado e, também, não pode instaurar um inquérito”. Finalmente, o Ministro Nelson Jobim afasta qualquer possibilidade de dúvida ao assinalar que: O MP exorbitou, no caso concreto, de suas funções. Não tem ele competência alguma para produzir um inquérito penal, sob o argumento de que tem possibilidade de expedir notificações nos procedimentos administrativos. [...] Não esteja sujeita a defesa a ações unilaterais da acusação, no sentido de promover no seu próprio prédio, isolado, sem possibilidade alguma de qualquer tipo de participação no inquérito,
ter o mesmo status do MP. Faremos divergência perante o juízo, mas não exerceremos a divergência fora do juízo, porque quanto à polícia sabe-se o que fazer, contra o MP pouco se tem a fazer.
Deixamos, nestas breves e despretenciosas linhas, nossa posição no sentido de que não há amparo legal para a atuação isolada do agente do MP, em nível estadual ou federal, instaurando e promovendo investigações criminais relativamente à prática de fato em tese típico. Perguntas estão a exigir respostas. Poderá o MP investigar e, depois, oferecer a denúncia com base no material produzido? Há base legal para esse procedimento administrativo? Se o MP exerce a fiscalização da atividade policial, quem fiscaliza a atuação do MP investigador?
Fevereiro/2014 – Ed. 203
O presente comentário, por certo, não tem o objetivo de encerrar o debate, mas, ao contrário disso, tem o escopo declarado de suscitar a discussão para esse ponto tão relevante do processo penal brasileiro.
86
Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com. 2.186-16, DE 23.08.2001
Patrimônio Genético. Diversidade Biológica Previdência Social. Alteração na Legislação
2 .156-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento do Nordeste – Adene
2.187-13, DE 24.08.2001
2.157-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA
2.189-49, DE 23.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.158-35, DE 24.08.2001
Cofins, PIS/Pasep e IR. Alteração na Legislação
2.190-34, DE 23.08.2001
Vigilância Sanitária. Alteração da Lei nº 9.782/1999
2.159-70, DE 24.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.192-70, DE 24.08.2001
Proes. Bancos Estaduais
2.161-35, DE 23.08.2001
Programa Nacional de Desestatização. Alteração da Lei nº 9.491/1997
2.196-3, DE 24.08.2001
Instituições Financeiras Federais. Recuperação. Empresa Gestora de Ativos – Emgea
2.162-72, DE 23.08.2001
Notas do Tesouro Nacional – NTN
2.197-43, DE 24.08.2001
SFH. Disposições
2.163-41, DE 23.08.2001
Meio Ambiente. Alteração da Lei nº 9.605/1998
2.198-5, DE 24.08.2001
Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
2.164-41, DE 24.08.2001
Alteração da CLT. Trabalho a Tempo Parcial e PAT
2.199-14, DE 24.08.2001
IR. Incentivos Fiscais
2.165-36, DE 23.08.2001
Servidor Público e Militar. Auxílio-Transporte
2.200-2, DE 24.08.2001
Infraestrutura de Chaves Públicas. ICP-Brasil
2.166-67, DE 24.08.2001
Código Florestal. Alteração da Lei nº 4.771/1965
2.206-1, DE 06.09.2001
Programa Nacional de Renda Mínima
2.167-53, DE 23.08.2001
Recebimento de Valores Mobiliários pela União
2.208, DE 17.08.2001
Estudante Menor de 18 Anos. Comprovação
2.168-40, DE 24.08.2001
Cooperativas. Recoop. Sescoop
2.209, DE 29.08.2001
Comercializadora Brasileira de Energia Elétrica – CBEE
2.169-43, DE 24.08.2001
Servidor Público. Vantagem de 28,86%
2.210, DE 29.08.2001
Orçamento. Crédito Extraordinário
2.170-36, DE 23.08.2001
Tesouro Nacional. Administração de Recursos
2.211, DE 29.08.2001
Orçamento 2001 e 2002. Diretrizes
2.172-32, DE 23.08.2001
Usura. Agiotagem
2.213-1, DE 30.08.2001
Programa Bolsa-Renda. Estiagem
2.173-24, DE 23.08.2001
Anuidades Escolares
2.214, DE 31.08.2001
Administração Pública Federal. Recursos
2.174-28, DE 24.08.2001
União. Programa de Desligamento Voluntário – PDV
2.215-10, DE 31.08.2001
Militares das Forças Armadas. Reestruturação da Remuneração
2.177-44, DE 24.08.2001
Planos de Saúde. Alteração da Lei nº 9.656/1998
2.220, DE 04.09.2001
Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU
2.178-36, DE 24.08.2001
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dinheiro Direto na Escola
2.224, DE 04.09.2001
Capitais Brasileiros no Exterior
2.179-36, DE 24.08.2001
União e Banco Central. Relações Financeiras
2.225-45, DE 04.09.2001
Servidor Público. Tráfico de Entorpecentes. Alteração das Leis nºs 6.368/1976 e 8.112/1990 Alteração da CLT
2.180-35, DE 24.08.2001
Advocacia-Geral da União. Alteração na Legislação
2.226, DE 04.09.2001
2.181-45, DE 24.08.2001
Operações Financeiras do Tesouro Nacional
2.227, DE 04.09.2001
Plano Real. Correção Monetária. Exceção
2.183-56, DE 24.08.2001
Reforma Agrária. Alteração na Legislação
2.228-1, DE 06.09.2001
2.184-23, DE 24.08.2001
Carreira Policial. Gratificação
Cultura. Política Nacional do Cinema – Ancine. Prodecine. Funcines
2.185-35, DE 24.08.2001
Dívida Pública Mobiliária. Consolidação. Assunção. Refinanciamento
2.229-43, DE 06.09.2001
Policiais Civis da União e DF. Alteração na legislação
Normas do Juris SÍNTESE atingidas pelas Medidas Provisórias em vigor (até 31.01.2014) Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive as medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com.
87
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
627
12.11.2013
2º
DL 1.598 de 1977
7º, 8º, 8º-A, 12, 13, 15, 17, 19, 20, 21, 22, 23, 24-A, 24-B, 25, 27, 29, 31, 33 e 38-A
627
12.11.2013
38
Lei nº 4.506 de 1964
57
627
12.11.2013
49
Lei nº 9.718 de 1998
3º
12.11.2013
50
Lei nº 10.865 de 2004 15 e 27
627
12.11.2013
5º
Lei nº 9.430 de 1996
2º, 25, 27, 29 e 54
627
627
12.11.2013
8º
Lei nº 9.249 de 1995
9º, 13, 15, 20 e 21
627
12.11.2013
51
Lei nº 10.637 de 2002 1º e 3º
32 e 51
627
12.11.2013
52
Lei nº 10.833 de 2003 1º e 3º
627
12.11.2013
9º
Lei nº 8.981 de 1995
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
627
12.11.2013
92
Lei nº 12.865 de 2013 39 e 40
632
26.12.2013
17
Lei nº 11.907 de 2009 310
627
12.11.2013
94
Lei nº 9.249 de 1995
25
632
26.12.2013
18
Lei nº 8.112 de 1990
53, 97 e 206-A
627
12.11.2013
99
Lei nº 4.506 de 1964
58
632
26.12.2013
19
Lei nº 8.745 de 1993
4º e 7º
627
12.11.2013
99
Lei nº 6.099 de 1974
15
632
26.12.2013
24
Lei nº 11.356 de 2006 Art 15
627
12.11.2013
99
DL 1.598 de 1977
8º, 15, 20, 27, 29, 31, 32, 33, 34 e 38
632
26.12.2013
25
Lei nº 12.528 de 2011 11
627
12.11.2013
99
Lei nº 8.218 de 1991
18
632
26.12.2013
27
DL 2.179 de 1984
627
12.11.2013
99
Lei nº 8.981 de 1995
31
632
26.12.2013
27
MP 2.174-28 de 2001 8º, 9º, 10, 11, 18, 19 e 20
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.249 de 1995
21 e 31
632
26.12.2013
27
Lei nº 11.539 de 2007 13
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.532 de 1997
1º
632
26.12.2013
27
Lei nº 10.871 de 2004 15 e 22
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.718 de 1998
3º
632
26.12.2013
27
Lei nº 10.768 de 2003 8-A
627
12.11.2013
99
MP 2.158-35 de 2001 74
632
26.12.2013
27
Lei nº 8.112 de 1990
627
12.11.2013
99
Lei nº 11.941 de 2009 15 a 24, 59 e 60
633
1º
Lei nº 12.096 de 2009 1º
627
12.11.2013
100
Lei nº 10.637 de 2002 55
26.12.2013 – Ed. Extra
628
29.11.2013
5º
DL 880 de 1969
633
26.12.2013 – Ed. Extra
2º
Lei nº 12.409 de 2011 1º-A
630
26.12.2013
1º
Lei nº 12.462 de 2011 1º, 4º, 9º
634
27.12.2013
1º
Lei nº 8.167 de 1991
630
26.12.2013
2º
Lei nº 12.462 de 2011 9º
634
27.12.2013
3º
Lei nº 10.865 de 2004 8º
631
26.12.2013
1º
Lei nº 12.340 de 2010 Ementa
634
27.12.2013
4º
Lei nº 12.350 de 2010 36
631
26.12.2013
2º
Lei nº 12.340 de 2010 1º-A, 4º, 5º-A, 7º, 8º, 9º, 10 e 15-A
634
27.12.2013
5º
Lei nº 12.546 de 2011 9º
631
26.12.2013
3º
Lei nº 12.340 de 2010 11, 12, 13 e 14
634
27.12.2013
6º
Lei nº 12.859 de 2013 1º
632
26.12.2013
1º
Lei nº 10.871 de 2004 15-A, 15-B, 15-C
635
27.12.2013
6º
Lei nº 10.954 de 2004 2º
632
26.12.2013
2º
Lei nº 10.768 de 2003 8º-B
636
27.12.2013
10
Lei nº 8.629 de 1993
632
26.12.2013
3º
Lei nº 10.871 de 2004 Anexos IV, V, VI e VII
636
27.12.2013
13
Lei nº 10.696 de 2003 9
632
26.12.2013
4º
Lei nº 10.768de 2003
638
20.01.2014
1º
Lei nº 12.715 de 2012 40, 41-A, 42 e 43
632
26.12.2013
5º
Lei nº 11.357 de 2006 Anexos XIV, XIV-C e XIV-D
2.156-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º e 11
632
26.12.2013
6º
Lei nº 10.882 de 2004 Anexo III
2.156-5
27.08.2001
32
DL 2.397/87
12
632
26.12.2013
8º
Lei nº 11.539 de 2007 7º, 8º, 9º, 12, 13, 13-B, 16,
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 8.034/90
1º
632
26.12.2013
9º
Lei nº 12.094 de 2009 14 e 23
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 9.532/97
2º
632
26.12.2013
10
Lei nº 12.800 de 2013 14, 15 e 16
2.157-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º
632
26.12.2013
11
Lei nº 11.171 de 2005 Anexo VII
2.158-35
27.08.2001
2º e 93
Lei nº 9.718/98
3º e 8º
632
26.12.2013
12
Lei nº 12.702 de 2012 Anexo XLV
2.158-35
27.08.2001
3º e 93
Lei nº 9.701/98
1º
632
26.12.2013
13
Lei nº 10.550 de 2002 Anexo III
2.158-35
27.08.2001
10 e 93
Lei nº 9.779/99
14 e 17
632
26.12.2013
14
Lei nº 11.046 de 2004 Anexos II, V, VI-A, VI-B, VI-C e VI-D
2.158-35
27.08.2001
19 e 93
Lei nº 9.715/98
2º e 4º
632
26.12.2013
15
Lei nº 11.784 de 2008 Anexos LXII e LXV
2.158-35
27.08.2001
34 e 75
Lei nº 9.532/97
1º e 64-A
632
26.12.2013
16
Lei nº 11.907 de 2009 Anexo LXXXIII
2.158-35
27.08.2001
64
D nº 70.235/72
1º, 25 e 64-A
DL 880 de 1969
Anexos I e I-A
ALTERAÇÃO
DL 2.179 de 1984
60-C
2º
17, 18, 24
Fevereiro/2014 – Ed. 203
ALTERAÇÃO
88
Fevereiro/2014 – Ed. 203
89
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
2.158-35
27.08.2001
69
DL 1.455/76
1º, 9º, 10, 16, 18, 19 e 64-A
2.166-67
25.08.2001-extra
1º
Lei nº 4.771/65
2.158-35
27.08.2001
70
Lei nº 9.430/96
63
1º, 3º-A, 4º, 14, 16, 37-A, 44, 44-A, 44-B e 44-C
2.158-35
27.08.2001
72
Lei nº 8.218/91
11 e 12
2.166-67
25.08.2001
3º
Lei nº 9.393/96
10
2.158-35
27.08.2001
73
Lei nº 9.317/96
1º e 64-A
2.167-53
24.08.2001
2º e 3º
Lei nº 9.619/98
1º e 4º-A
2.158-35
27.08.2001
73 e 93
Lei nº 9.317/96
9º e 15
2.168-40
27.08.2001
13
Lei nº 5.764/71
88
2.158-35
27.08.2001
75
Lei nº 9.532/97
1º, 15 e 64-A
2.168-40
27.08.2001
14
Lei nº 9.138/95
2º
2.158-35
27.08.2001
82
Lei nº 8.981/95
29
2.168-40
27.08.2001
18
Lei nº 10.186/01
7º
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.432/97
11
2.170-36
24.08.2001
8º
Lei nº 8.212/91
60
2.158-35
27.08.2001
93
LC 70/91
6º e 7º
2.172-32
24.08.2001
7º
Lei nº 1.521/51
4º, § 3º
2.158-35
27.08.2001
93
LC 85/96
Revogada
2.173-24
24.08.2001
1º e 2º
Lei nº 9.870/99
1º e 6º
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 7.714/88
5º
2.177-44
27.08.2001
1º e 8º
Lei nº 9.656/98
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.004/95
Revogada
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.493/97
7º
1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 24-A, 24-B, 24-C, 24-D, 25, 26, 27, 28, 29, 29-A, 30, 31, 32, 34, 35, 35-A, 35-B, 35-C, 35-D, 35-E, 35-F, 35-G, 35-H e 35-I
2.161-35
24.08.2001
1º e 6º
Lei nº 9.491/97
2º, 4º, 5º, 6º e 30
2.178-36
25.08.2001-extra
16
Lei nº 9.533/97
4º
2.162-72
24.08.2001
6º
Lei nº 9.094/95
2º
2.178-36
25.08.2001-extra
32
Lei nº 8.913/97
Revogada
2.163-41
24.08.2001
1º
Lei nº 9.605/98
79-A
2.180-35
27.08.2001
1º
Lei nº 8.437/92
1º e 4º
2.164-41
27.08.2001
7º e 8º
Lei nº 7.998/90
2º, 2º-A, 2º-B, 3º-A, 7º-A, 8º-A, 8º-B e 8º-C
2.180-35
27.08.2001
4º
Lei nº 9.494/97
1º-A, 1º-B (CPC e CLT), 1º-C, 1º-D, 1ºE, 1º-F, 2º-A e 2º-B
2.164-41
27.08.2001
1º e 2º
CLT
58-A, 59, 130-A, 143, 476-A, 627-A, 643 e 652
2.180-35
27.08.2001
6º
Lei nº 7.347/85
1º e 2º
2.180-35
27.08.2001
7º
Lei nº 8.429/92
17
2.180-35
27.08.2001
8º
Lei nº 9.704/98
1º
2.180-35
27.08.2001
10
CPC
741
2.180-35
27.08.2001
14
Lei nº 4.348/64
4º
2.180-35
27.08.2001
21
Lei nº 10.257/01
53
2.181-45
27.08.2001
45
Lei nº 8.177/91
18
2.181-45
27.08.2001
46
Lei nº 9.365/96
6º
2.181-45
27.08.2001
52
Lei nº 10.150/00
1º
2.183-56
27.08.2001
1º
DL 3.365/41
10, 15-A, 15-B e 27
2.183-56
27.08.2001
3º
Lei nº 8.177/91
5º
2.183-56
27.08.2001
4º
Lei nº 8.629/93
2º, 2º-A, 5º, 6º, 7º, 11, 12, 17, 18 e 26-A
2.187-13
27.08.2001
2º
Lei nº 6.015/73
80
2.187-13
27.08.2001
3º e 16
Lei nº 8.212/91
38, 55, 56, 68, 101 e 102
2.164-41
27.08.2001
3º
Lei nº 4.923/65
1º
2.164-41
27.08.2001
4º
Lei nº 5.889/73
18
2.164-41
27.08.2001
5º
Lei nº 6.321/76
2º
2.164-41
27.08.2001
6º
Lei nº 6.494/77
1º
2.164-41
27.08.2001
9º
Lei nº 8.036/90
19-A, 20, 29-C e 29-D
2.164-41
27.08.2001
10
Lei nº 9.601/98
2º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 7.418/85
1º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 8.627/93
6º
Normas Legais
Janeiro/2014 Lei nº 12.952, de 20.1.2014
Estima a receita e fixa a despesa da União para o exercício financeiro de 2014. (DOU 21.01.2014)
Medidas Provisórias Medida Provisória nº 638, de 17.01.2014 - DOU de 20.01.2014 Altera a Lei nº 12.715, de 17 de setembro de 2012, que institui o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores - Inovar-Auto.
Indicadores I – Índices de Atualização dos Débitos Trabalhistas (Vigência: Janeiro/2014 – Atualização: Fevereiro/2014)
1 – Índice de Atualização Monetária até 28 de fevereiro de 2014 – Decreto-Lei nº 2.322/1987 combinado com a Lei nº 7.738/1989 (incluindo a Lei nº 8.177/1991 – TR – a partir de fev. 1991) – TR prefixada de 1º jan./2014 a 1º fev./2014 (Banco Central) = 0,05370% 1991
1992
1993
1994
1995
1996
2003
2004
2005
2006
2007
2008
JAN
Mês/Ano
0,014932156
0,002852087
0,000227037
0,008817849
2,306976883
1,752720460
JAN
1,190695830
1,137803501
1,117482986
1,086691305
1,064989661
1,049816547
FEV
0,012421332
0,002272942
0,000179107
0,006234339
2,259498051
1,731037484
FEV
1,184915811
1,136348974
1,115386061
1,084169527
1,062663491
1,048757303
MAR
0,011608722
0,001809523
0,000141699
0,004457557
2,218389083
1,714535084
MAR
1,180058689
1,135828764
1,114314090
1,083384074
1,061897862
1,048502516
ABR
0,010699283
0,001456122
0,000112629
0,003142444
2,168517517
1,700693142
ABR
1,175612523
1,133812845
1,111385589
1,081142864
1,059909472
1,048073854
MAIO
0,009822163
0,001202611
0,000087841
0,002152801
2,095860327
1,689547200
MAIO
1,170714254
1,132822758
1,109163934
1,080219277
1,058562980
1,047073899
JUN
0,009011986
0,001003766
0,000068263
0,001470091
2,029945952
1,679657377
JUN
1,165295630
1,131074118
1,106368142
1,078183666
1,056778082
1,046303819
JUL
0,008237647
0,000829216
0,000052478
2,752504087
1,972999274
1,669475247
JUL
1,160461149
1,129085797
1,103066663
1,076099262
1,055770876
1,045106127
AGO
0,007485368
0,000670398
0,040252829
2,620779715
1,915709967
1,659763968
AGO
1,154153699
1,126886116
1,100233562
1,074218306
1,054222224
1,043109616
SET
0,006686349
0,000544066
0,030188112
2,566091179
1,867081821
1,649413896
SET
1,149511969
1,124631230
1,096433324
1,071607869
1,052678996
1,041470341
OUT
0,005725594
0,000433934
0,022424686
2,504991921
1,831562333
1,638566585
OUT
1,145657976
1,122691220
1,093549634
1,069980429
1,052308584
1,039422679
NOV
0,004780491
0,000346953
0,016424732
2,442581521
1,801761203
1,626499585
NOV
1,141988766
1,121448655
1,091257992
1,067977970
1,051108218
1,036824397
DEZ
0,003662650
0,000281412
0,012062817
2,373258636
1,776206914
1,613357177
DEZ
1,139964190
1,120164946
1,089157008
1,066610575
1,050488430
1,035149525
Mês/Ano
Mês/Ano
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2009
2010
2011
2012
2013
2014
JAN
1,599415076
1,456861358
1,351525388
1,278285196
1,252038591
1,224065562
JAN
1,032929759
1,025657785
1,018641871
1,006484469
1,003577013
1,001663605
FEV
1,587603308
1,440356315
1,344583304
1,275544052
1,250326893
1,220902205
FEV
1,031032659
1,025657785
1,017914063
1,005615617
1,003577013
1,000537000
MAR
1,577168727
1,433959422
1,333517774
1,272581483
1,249866942
1,219474200
MAR
1,030567873
1,025657785
1,017380955
1,005615617
1,003577013
1,000000000
ABR
1,567269883
1,421175945
1,318208105
1,269734737
1,247715880
1,217334127
ABR
1,029088044
1,024846107
1,016149382
1,004542765
1,003577013
MAIO
1,557595656
1,414499507
1,310226207
1,268084959
1,245789889
1,214471617
MAIO
1,028621050
1,024846107
1,015774561
1,004314786
1,003577013
JUN
1,547761181
1,408102497
1,302721230
1,264932746
1,243517981
1,211924153
JUN
1,028159406
1,024323702
1,014182295
1,003844986
1,003577013
JUL
1,537712232
1,401218312
1,298684917
1,262231571
1,241707572
1,210009917
JUL
1,027485376
1,023720730
1,013053753
1,003844986
1,003577013
AGO
1,527660228
1,393549608
1,294887013
1,260281915
1,238683944
1,206804644
AGO
1,026406623
1,022543782
1,011810238
1,003700453
1,003367310
SET
1,518141481
1,388344704
1,291084769
1,257735001
1,234442400
1,203817972
SET
1,026204460
1,021615134
1,009714072
1,003577013
1,003367310
OUT
1,508376253
1,382108630
1,287588965
1,256430826
1,232437225
1,201469100
OUT
1,026204460
1,020898463
1,008702343
1,003577013
1,003288050
NOV
1,498556214
1,369927237
1,284679166
1,254779536
1,228857563
1,198152613
NOV
1,026204460
1,020416827
1,008077335
1,003577013
1,002365873
DEZ
1,475924389
1,361572627
1,282117495
1,253279361
1,226492884
1,194993052
DEZ
1,026204460
1,020074082
1,007427545
1,003577013
1,002158426
Mês/Ano
OBS.: Foram consideradas as divisões por 1.000 ocorridas em março/1986, janeiro/1989, agosto/1993, e por 2.750 ocorridas em julho/1994.
* NOTA DO TRT DA 2ª REGIÃO SOBRE O ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA A atualização de débitos trabalhistas é definida no art. 39 da Lei nº 8.177/1991, que não sofreu alteração com a Lei nº 12.703/2012: tal lei modificou os parâmetros para cálculo dos rendimentos da caderneta de poupança, mas não alterou a TR, índice-base para atualização monetária. A TR tem sido calculada com valor “zero” desde setembro de 2012, o que não é nenhuma discrepância, dados os valores mais baixos da Taxa Selic. Observamos que, nas poupanças “novas” (abertas após a Lei nº 12.703/2012), o rendimento tem sido inferior a 0,5%, o que significaria, matematicamente, TR negativa (por isso a TR fica “zerada” nas tabelas de atualização). Lembramos, ainda, que a TR vem apresentando valor mensal muito baixo há muitos anos: o que, efetivamente, garante a preservação do valor dos débitos trabalhistas é a taxa de juros, que, ultimamente, tem sido superior à Selic – daí a TR “negativa” das poupanças novas. A alteração da TR como índice de atualização oficial das tabelas só poderá ser efetuada se houver mudança da legislação, já que a tabela é unificada nacionalmente. Até o fechamento desta edição, a tabela não foi divulgada pelo Tribunal.
2 – Juros de mora (incidentes a partir da propositura da ação e aplicados sobre o principal corrigido): • Até 28.02.1987 – Juros simples – 0,5% ao mês; • De 01.03.1987 até 31.01.1991 – Juros capitalizados mensalmente – 1% ao mês; • De 01.02.1991 em diante – Juros simples – 1% ao mês.
Fórmula para cálculo da taxa efetiva (T) dos juros capitalizados: T = (1,01)n – 1, onde “n” é igual ao número de dias decorridos desde a data da propositura da ação, contidos no período compreendido entre 01.03.1987 e 31.01.1991, dividido por 30.
Juros Capitalizados Mensalmente Nº Meses 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16
% Efetivo 1,0000 2,0100 3,0301 4,0604 5,1010 6,1520 7,2135 8,2856 9,3685 10,4622 11,5668 12,6825 13,8093 14,9474 16,0968 17,2578
Nº Meses 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32
% Efetivo 18,4304 19,6147 20,8108 22,0190 23,2391 24,4715 25,7163 26,9734 28,2431 29,5256 30,8208 32,1290 33,4503 34,7848 36,1327 37,4940
Nº Meses 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 –
% Efetivo 38,8690 40,257+6 41,6602 43,0768 44,5076 45,9527 47,4122 48,8863 50,3752 51,8789 53,3977 54,9317 56,4810 58,0458 59,6263 –
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Valor
Norma Legal
DOU
01.10.1989
Vigência
NCz$
381,73
Decreto nº 98.211/89
02.10.1989
VigênciaMoeda 01.09.1990
Cr$
6.056,31
Port. 3.588/90
03.09.1990
01.11.1989
NCz$
557,33
Decreto nº 98.346/89
31.10.1989
01.10.1990
Cr$
6.425,14
Port. 3.628/90
01.10.1990
01.12.1989
NCz$
788,18
Decreto nº 98.456/89
01.12.1989
01.11.1990
Cr$
8.329,55
Port. 3.719/90
01.11.1990
01.01.1990
NCz$
1.283,95
Decreto nº 98.783/89
29.12.1989
01.12.1990
Cr$
8.836,82
Port. 3.787/90
03.12.1990
Cr$
12.325,50
Port. 3.828/90
31.12.1990
01.02.1990
NCz$
2.004,37
Decreto nº 98.900/90
01.02.1990
01.01.1991
01.03.1990
NCz$
3.674,06
Decreto nº 98.985/90
01.03.1990
01.02.1991
Cr$
15.895,46
MP 295/91
01.02.1991
01.04.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.143/90
24.04.1990
01.03.1991
Cr$
17.000,00
Lei nº 8.178/91
04.03.1991
Cr$
42.000,00
Lei nº 8.222/91
06.09.1991
01.05.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.352/90
23.05.1990
01.09.1991
01.06.1990
Cr$
3.857,76
Port. 3.387/90
04.06.1990
01.01.1992
Cr$
96.037,33
Port. 42/92
21.01.1992
01.07.1990
Cr$
4.904,76
Port. 3.501/90
16.07.1990
01.05.1992
Cr$
230.000,00
Lei nº 8.419/92
08.05.1992
01.08.1990
Cr$
5.203,46
Port. 429/90
01.08.1990
01.09.1992
Cr$
522.186,94
Port. 601/92
31.08.1992
Fevereiro/2014 – Ed. 203
II – Evolução do Salário-Mínimo desde 1989
92
VigênciaMoeda
Valor
Norma Legal
DOU
Valor
Norma Legal
DOU
01.01.1993
Cr$
1.250.700,00
Lei nº 8.542/92
24.12.1992
VigênciaMoeda 03.04.2000
R$
151,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.03.1993
Cr$
1.709.400,00
Port. Interm. 4/93
01.03.1993
01.04.2001
R$
180,00
MP 2.142/01 (atual 2.194-6)
30.03.2001
01.05.1993
Cr$
3.303.300,00
Port. Interm. 7/93
04.05.1993
01.04.2002
R$
200,00
Lei nº 10.525/02
28.03.2002
01.07.1993
Cr$
4.639.800,00
Port. Interm. 11/93
01.08.1993
01.04.2003
R$
240,00
Lei nº 10.699/03
10.07.2003
01.08.1993
CR$
5.534,00
Port. Interm. 12/93
03.08.1993
01.05.2004
R$
260,00
Lei nº 10.888/04
25.06.2004
01.09.1993
CR$
9.606,00
Port. Interm. 14/93
02.09.1993
01.05.2005
R$
300,00
Lei nº 11.164/05
19.08.2005
01.10.1993
CR$
12.024,00
Port. Interm. 15/93
04.10.1993
01.04.2006
R$
350,00
MP 288/06
31.03.2006
01.11.1993
CR$
15.021,00
Port. Interm. 17/93
03.11.1993
01.04.2006
R$
350,00
Lei nº 11.321/06
10.07.2006
01.12.1993
CR$
18.760,00
Port. Interm. 19/93
02.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
MP 362/07
30.03.2007-extra
01.01.1994
CR$
32.882,00
Port. Interm. 20/93
31.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
Lei nº 11.498/07
29.06.2007
01.02.1994
CR$
42.829,00
Port. Interm. 02/94
02.02.1994
01.03.2008
R$
415,00
MP 421/08
29.02.2008-extra
01.03.1994
URV
64,79
Port. Interm. 04/94
03.03.1994
01.02.2009
R$
465,00
MP 456/09
30.01.2009-extra
01.07.1994
R$
64,79
Lei nº 9.069/95
30.06.1994/30.06.1995
01.01.2010
R$
510,00
MP 474/09
24.12.2009
01.09.1994
R$
70,00
Lei nº 9.063/95
01.09.1994/20.06.1995
01.01.2011
R$
540,00
MP 516/10
31.12.2010
01.05.1995
R$
100,00
Lei nº 9.032/95
29.04.1995
01.03.2011
R$
545,00
Lei nº 12.382/11
28.02.2011
01.05.1996
R$
112,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2012
RS
622,00
Decreto nº 7.655/11
26.12.2011
01.05.1997
R$
120,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2013
R$
678.00
Decreto nº 7.872/11
26.12.2012
01.05.1998
R$
130,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.012014
R$
724,00
Decreto nº 8.166/2013
01.05.1999
R$
136,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
Fevereiro/2014 – Ed. 203
III – Previdência Social – Valores de Benefícios (Janeiro/2014)
93
1 – Salário-de-benefício mínimo: R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais) 2 – Salário-de-benefício máximo: R$ 3.916,20 (três mil, novecentos e dezesseis reais e vinte centavos) 3 – Renda mensal vitalícia: R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais) 4 – Auxílio-funeral*
– R$ 31,22 (trinta e um reais e vinte e dois centavos) para o segurado com remuneração mensal não superior R$ 608,80 (seiscentos e oito reais e oitenta e centavos); – R$ 22,00 (vinte e dois reais) para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 608,80 (seiscentos e oito reais e oitenta e centavos) e igual ou inferior a R$ 915,05 (nocentos e quinze reais e cinco centavos).
5 – Auxílio-natalidade*
7 – Benefícios a idosos e portadores de deficiência: Valor de um salário-mínimo (Decreto nº 1.744/1995).
6 – Salário-família:
* Benefícios extintos a partir de jan. 1996 (Lei nº 8.742/1993, art. 40).
8 – Tabela de contribuição (empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso) para pagamento de remuneração Salário-de-contribuição (R$) Até R$ 1.317.07
Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%)
8,00*
De R$ 1.317,08 até 2.195,12
9,00*
De R$ 2.195,13 até 4.390,24
11,00*
9 – Escala de salários-base para os segurados contribuinte individual e facultativo Nota: Escala extinta, conforme o art. 9º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003, DOU 09.05.2003, e o art. 39 da Instrução Normativa DC/INSS nº 89, de 11.06.2003, DOU 13.06.2003.
* Alíquota reduzida para salários e remunerações até três salários-mínimos, em razão do disposto no inciso II do art. 17 da Lei nº 9.311, de 24.10.1996, que instituiu a Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e de Direitos de Natureza Financeira – CPMF.
IV – Imposto de Renda na Fonte Base de cálculo em R$
Alíquota %
Parcela a deduzir do imposto em R$
-
-
De 1.787,78 até 2.679,29
7,5
134,08
De 2.679,30 até 3.572,43
15,0
335,03
De 3.572,44 até 4.463,81
22,5
602,96
Acima de 4.463,81
27,5
826,15
Até 1.787,77
O imposto de renda anual devido, incidente sobre os rendimentos de pessoas físicas, será calculado de acordo com a tabela progressiva anual correspondente à soma das tabelas progressivas mensais vigentes nos meses de cada ano-calendário.
V – Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho Novos valores para Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho (Ato nº 506/2013 do TST, DJe de 17.07.2013, vigência a partir de 01.08.2013) Recurso Ordinário
R$ 7.058,11
Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória
R$ 14.116,21
Fevereiro/2014 – Ed. 203
TABELA PROGRESSIVA MENSAL
TABELA PROGRESSIVA ANUAL
Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.
94
VI – Indexadores Indexador
Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
Janeiro
INPC IGPM UFIR SELIC
0,16 0,71
0,27 0,71
0,61 0,81
0,54 0,29
0,72 0,60
0,63 0,85
0,79
0,48
Extinta, a partir de outubro de 2000, pela MP 1.973-67, atual Lei nº 10.522, de 19.07.2002, DOU 22.07.2002, art. 29, § 3º.
0,15
1,50
0,86
0,72
Valor de Referência Base Maio/1992 – Cruzeiros 79.297,75 Emissão anterior a Jan./1989 79.297,75
TDA
Valores nominais reajustados – Reais 91,87 Emissão anterior a Jan./1989 157,23
(*) Referente ao primeiro dia de cada mês.
VII – Índices de Atualização dos Débitos Judiciais Tabela editada em face da Jurisprudência ora predominante.
Fevereiro/2014 – Ed. 203
Mês/Ano
95
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1.942,73 2.329,52 2.838,99 3.173,71 3.332,71 3.555,33 3.940,38 4.418,74 5.108,95 5.906,96 7.152,15 9.046,04
11.230,66 14.141,65 17.603,52 21.409,40 25.871,12 32.209,55 38.925,24 47.519,93 58.154,89 72.100,44 90.897,02 111.703,35
140.277,06 180.634,78 225.414,14 287.583,35 369.170,75 468.034,68 610.176,81 799,392641 1.065,91 1.445,69 1.938,96 2.636,99
3.631,93 5.132,64 7.214,96 10.323,16 14.747,66 21.049,34 11,346741 12,036622 12,693821 12,885497 13,125167 13,554359
13,851199 14,082514 14,22193 14,422459 14,69937 15,077143 15,351547 15,729195 15,889632 16,07554 16,300597 16,546736
16,819757 17,065325 17,186488 17,236328 17,396625 17,619301 17,853637 18,06788 18,158219 18,16185 18,230865 18,292849
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
1997
1998
1999
2000
2001
2002
18,353215 18,501876 18,585134 18,711512 18,823781 18,844487 18,910442 18,94448 18,938796 18,957734 19,012711 19,04123
19,149765 19,312538 19,416825 19,511967 19,59977 19,740888 19,770499 19,715141 19,618536 19,557718 19,579231 19,543988
19,626072 19,753641 20,008462 20,26457 20,359813 20,369992 20,38425 20,535093 20,648036 20,728563 20,927557 21,124276
21,280595 21,410406 21,421111 21,448958 21,468262 21,457527 21,521899 21,821053 22,085087 22,180052 22,21554 22,279965
22,402504 22,575003 22,68562 22,79451 22,985983 23,117003 23,255705 23,513843 23,699602 23,80388 24,027636 24,337592
24,51769 24,780029 24,856847 25,010959 25,181033 25,203695 25,357437 25,649047 25,869628 26,084345 26,493869 27,392011
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2003
2004
2005
2006
2007
2008
28,131595 28,826445 29,247311 29,647999 30,057141 30,354706 30,336493 30,348627 30,403254 30,65256 30,772104 30,88596
31,052744 31,310481 31,432591 31,611756 31,741364 31,868329 32,02767 32,261471 32,422778 32,477896 32,533108 32,676253
32,957268 33,145124 33,290962 33,533986 33,839145 34,076019 34,038535 34,048746 34,048746 34,099819 34,297597 34,482804
34,620735 34,752293 34,832223 34,92627 34,968181 35,013639 34,989129 35,027617 35,020611 35,076643 35,227472 35,375427
35,594754 35,769168 35,919398 36,077443 36,171244 36,265289 36,377711 36,494119 36,709434 36,801207 36,91161 37,070329
37,429911 37,688177 37,86908 38,062212 38,30581 38,673545 39,025474 39,251821 39,334249 39,39325 39,590216 39,740658
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2009
2010
2011
2012
2013
2014
39,855905 40,110982 40,235326 40,315796 40,537532 40,780757 40,952036 41,046225 41,079061 41,144787 41,243534 41,396135
41,495485 41,860645 42,153669 42,45296 42,762866 42,946746 42,899504 42,869474 42,839465 43,070798 43,467049 43,914759
44,178247 44,593522 44,834327 45,130233 45,45517 45,714264 45,814835 45,814835 46,007257 46,214289 46,362174 46,626438
46,864232 47,103239 47,286941 47,372057 47,675238 47,937451 48,062088 48,268754 48,485963 48,791424 49,137843 49,403187
49,76877 50,226642 50,48782 50,790746 51,090411 51,269227 51,41278 51,345943 51,428096 51,566951 51,881509 52,161669
52,537233 52,868217
Observação I – Dividir o valor a atualizar (observar o padrão monetário vigente à época) pelo fator do mês do termo inicial e multiplicar pelo fator do mês do termo final, obtendo-se o resultado na moeda vigente na data do termo final, não sendo necessário efetuar qualquer conversão. Esclarecendo que, nesta tabela, não estão incluídos os juros moratórios, apenas a correção monetária.
Padrões monetários a considerar: Cr$ (cruzeiro): de out./1964 a jan./1967
NCz$ (cruzado novo): de jan./1989 a fev./1990
NCr$ (cruzeiro novo): de fev./1967 a maio/1970
Cr$ (cruzeiro): de mar./1990 a jul./1993
Cr$ (cruzeiro): de jun./1970 a fev./1986
CR$ (cruzeiro real): de ago./1993 a jun./1994
Cz$ (cruzado): de mar./1986 a dez./1988
R$ (real): de jul./1994 em diante
Exemplo: Atualização até dezembro de 20134do valor de Cz$ 1.000,00, fixado em janeiro 1988. Cz$ 1.000,00 : 596,94 (jan./1988) x 52,537233 (janeiro/2014) = R$ R$ 88,01
Out./1964 a fev./1986: ORTN Mar./1986 e mar./1987 a jan./1989: OTN Abr./1986 a fev./1987: OTN pro rata Fev./1989: 42,72% (conforme STJ, índice de jan./1989
Abr./1989 a mar./1991: IPC do IBGE (de mar./1989 a fev./1991) Abr./1991 a jul./1994: INPC do IBGE (de mar./1991 a jun./1994) Ago./1994 a jul./1995: IPC-r do IBGE (de jul./1994 a jun./1995) Mar./1989: 10,14% (conforme STJ, índice de fev./1989)
Ago./1995 em diante: INPC do IBGE (de jul./1995 em diante), sendo que, com relação à aplicação da deflação, a matéria ficará sub judice) Observação III – Aplicação do índice de 10,14%, relativo ao mês de fevereiro de 1989, ao invés de 23,60%, em cumprimento ao decidido no Processo nº G-36.676/2002. Fonte: DJe, TJSP, Administrativo, 09.12.2013, p. 4. * Aplicável aos cálculos judiciais, exceto para aqueles com normas específicas estabelecidas por lei ou com decisão transitada em julgado, que estabelece critérios e índices diferentes.
Fevereiro/2014 – Ed. 203
Observação II – Os fatores de atualização monetária foram compostos pela aplicação dos seguintes índices:
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