Reflexões sobre a Corrupção na Administração Pública Brasileira Elói Martins Senhoras – p. 1
Lex Mercatoria e Sua Aplicação na Arbitragem Nacional e Internacional Ligia Guiçardi Cardoso e Eliane Maria Octaviano Martins – p. 6 Redirecionamento de Execução Fiscal contra os Responsáveis Tributários das Sociedades Empresárias Falidas Marcelo Braghini e Ricardo Braghini – p. 20 A Regulamentação do Uso das Algemas na Execução Penal Rômulo de Andrade Moreira – p. 31 Servidão Ambiental: Singelos Comentários à Redação do Artigo 9º-A da Lei nº 6.938/1981 Tauã Lima Verdan Rangel – p. 36 A Reforma Previdenciária e os Reflexos na Pensão por Morte Sérgio Reis Gusmão – p. 49 Acórdão na Íntegra Tribunal Superior do Trabalho – p. 58 Pesquisa Temática Sonegação Fiscal – p. 64 Em Poucas Palavras O Supremo Tribunal Federal e o Sigilo no Inquérito Policial Rômulo de Andrade Moreira – p. 68
Jornal Jurídico
Medidas Provisórias – p. 75 Normas Legais – p. 79 Indicadores – p. 80
Ju l h o / 2 0 1 7 – E d i ç ã o 2 4 4
Doutrina
Reflexões sobre a Corrupção na Administração Pública Brasileira ELÓI MARTINS SENHORAS
Professor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Especialista, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Ciências Jurídicas.
Compreendida como fenômeno oportunista que transborda efeitos negativos nas relações intranacionais e internacionais, a corrupção tem sido crescentemente objeto tanto de uma série de estudos normativos de natureza teórica, doutrinária e jurisprudencial quanto de pesquisas descritivas isoladas ou comparadas que levam em consideração a complexidade de sua natureza empírica. Internacionalmente, a corrupção tem sido compreendida como um fenômeno que compromete o desenvolvimento e a competitividade dos países em razão das pesquisas convênios e cooperações difundidas por uma ampla comunidade epistêmica de atores comprometidos com a temática, que inclui uma rede de pesquisadores, Estados Nacionais,
Organismos Supragovernamentais e Organismos Não Governamentais. Fruto da apreensão da sua apreensão como fenômeno internacional que se difunde informalmente por meio de redes oportunistas de capilaridade criminal tanto de natureza diplomática entres países e organismos multilaterais quanto de natureza paradiplomática entre atores descentralizados em diferentes países, a corrupção que tradicionalmente era apreendida como uma agenda marginal passa a adquirir crescente espaço nos debates, acordos e negociações internacionais. É neste contexto cada vez mais interdependente que emergem os esforços para a construção de um regime internacional de combate à corrupção, tendo sido os núcleos de epicentro desta empreitada a institucionalização da Organização Não Governamental Transparência Internacional, em 1993, e a promulgação da Convenção das Nações Unidas contra Corrupção, no ano de 2003. Em primeiro lugar, a Organização Não Governamental Transparência Internacional, fundada em 1993 por Peter Eigen, um funcionário aposentado do Grupo Banco Mundial, se tornou a base de construção multilateral de uma comunidade epistêmica para debater a temática sobre corrupção por meio da implantação de escritórios em diferentes países e o estabelecimento de métricas de comparação internacional sobre o estado de corrupção no mundo. Em segundo lugar, a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, aprovada em 2003, se tornou o primeiro e principal mecanismo institucional para se criar uma dinâmica de enforcement político-legal anticorrupção ao estabelecer um regramento vinculante aos países signatários por meio de um texto estruturado em 71 artigos e 8 capítulos, tendo entre os principais temas as
agendas de prevenção, penalização, recuperação de ativos e cooperação internacional contra a corrupção (UNODC, 2003). Figura 1 – Índice de Percepção sobre a Corrupção no Mundo
portuguesa, momento em que houve a instalação de uma Administração Pública patrimonialista, passando pela institucionalização republicana da Administração Pública burocrática no século XX, até chegar ao atual contexto democrático de construção da Administração Pública gerencial no século XXI (Senhoras; Souza Cruz, 2016). Na primeira periodização da Administração Pública, as elites políticas presentes no Brasil Colonial até a República das Oligarquias na década de 1930 enraizaram a corrupção como uma força profunda que foi replicada e ampliada por meio da manifestação de um poder patrimonialista de indistinção entre bens públicos e privados, fundamentando-se no personalismo das elites políticas e no subjetivismo de uma máquina pública com baixa racionalidade e profissionalização burocrática.
Nacionalmente, caracterizada como um fenômeno complexo de natureza oportunista que se materializa pela estruturação de ações de rentismo político por meio de ganhos políticos em razão da troca de favores, bem como de rentismo econômico por meio da transformação das ações e bens públicos em privados, a corrupção reflete a evolução histórica e o grau de institucionalização do Estado da Administração Pública existentes em um país. No caso do Brasil, o padrão difuso e sistêmico da corrupção na vida pública e privada do País pode ser compreendido como um fenômeno originário, presente em sua formação histórica como força profunda que se cristalizou em uma periodização de longa duração em três momentos, com início na colonização
Na terceira periodização, ainda em plena construção na Administração Pública brasileira, a letargia para avanço institucional de uma agenda gerencialista para a burocracia acontece em razão de o crescimento quantitativo e especializado do corpo de servidores públicos ter repercutido em uma complexa máquina pública com alto poder corporativista e que cada vez mais é suscetível ao oportunismo corruptivo, dadas a continuidade dos fisiologismos políticos promovidos pelos atores políticos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e a maior interação com atores descentralizados não estatais.
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Fonte: International Transparency (2015). Adaptações próprias.
Na segunda periodização da Administração Pública, os vícios culturais da corrupção passaram a se manifestar na máquina pública brasileira sob uma nova roupagem, não mais como um padrão de corrupção aberta, por meio de uma gestão patrimonialista, mas como um padrão de corrupção encoberta e latente, conformado por uma burocracia suscetível ao rentismo das agendas clientelistas e corporativistas, bem como dos anéis burocráticos endógenos com políticos e exógenos com atores não estatais.
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Conforme Senhoras (2013), a eventual difusão da corrupção no aparelho da Administração Pública no Brasil, desde a Constituição de 1988, está diretamente relacionada ao crescimento desmesurado da máquina administrativa, repercutindo, assim, em um desvirtuamento na prestação de trabalho do corpo burocrático devido tanto à contratação exacerbada de servidores comissionados quanto ao desenvolvimento de anéis burocráticos com políticos e atores não estatais.
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De um lado, o desvirtuamento corruptivo da Administração Pública devido à contratação exacerbada de servidores comissionados no País é fruto de uma relativa quebra do princípio da impessoalidade e, portanto, da própria lógica profissional da burocracia estatal, uma vez que, de modo sistêmico, em todos os níveis federativos (União, Estados e Municípios) e nos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), há uma subjetiva politização da máquina pública que não atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na contratação dos serventuários públicos.
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De outro lado, a evolutiva complexidade da Administração Pública ao longo do tempo a tornou uma caixa cinzenta com grande opacidade quanto ao seu funcionamento, estando suscetível à conformação de um conjunto de agendas autopoiéticas, criadas dentro da própria máquina pública (withinputs), que acaba respondendo aos interesses imediatos dos anéis burocráticos, conformados por relações endógenas entre políticos e burocratas, assim como por relações exógenas entre atores não estatais e burocratas. A conjugação supracitada dos efeitos de materialização da corrupção na Administração Pública se manifesta pela inversão dos valores da res publica em direção aos valores da res principis, uma vez que surge uma negativa dinâmica de rentismo político e econômico (rent seeking) que repercute na corrosão da agenda de atendimento ao interesse público primário (sociedade), em
detrimento a uma agenda corporativista de servidores públicos, presente para supostamente atender ao interesse público secundário (Administração Pública) ou aos anéis burocráticos consolidados junto a políticos e atores não estatais. Como fenômeno originário e hibridizado ao longo da evolução institucional da Administração Pública no Brasil, a corrupção materializa não apenas um alto custo ao Erário público, mas também uma baixa qualidade de prestação das políticas públicas executivas, legiferantes e jurisdicionais, uma vez que ela é sistêmica e altamente capilarizada, com uma dinâmica autopoiética crescente, dadas as lacunas existentes à sua fiscalização e controle. Embora os casos de corrupção sejam concentradamente encontrados no Poder Executivo, em razão de seu tamanho institucional e de volume de recursos destinado à implementação das políticas públicas, fica claro que, pelo fato de a reforma gerencial tê-las afetado preponderantemente, não é por acaso que os seus indicadores de transparência e controle social são muito superiores aos Poderes Legislativo e Judiciário, que ainda são muito fechados. (Moutinho; Senhoras, 2013, p. 140)
Hodiernamente, nos casos em que a corrupção no Brasil se materializa no âmago do aparelho de Estado, observa-se a conformação de padrões descentralizados de funcionamento da máquina pública, nos quais as relações viciadas são caracterizadas pela subjetividade e pela presença de anéis burocráticos de natureza não meritocrática, quebrando, assim, as pilastras axiológicas que regem a Administração Pública, presentes nos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (Brasil, 1988). Neste contexto, a institucionalização de uma agenda com medidas de combate à corrupção na Administração Pública brasileira surge muito tardiamente no País, com um lag temporal de três décadas após a promulgação da Constituição Federal de 1988, engendrada de maneira reflexiva ao boom de escândalos
Em um primeiro plano, as incrementais normas de construção da transparência estatal implementadas desde a Constituição Federal de 1988 – como a Lei nº 8.666/1993, de Licitações e Contratos (LLC); a Lei Complementar nº 101/2000, de Responsabilidade Fiscal (LRF); a Lei Complementar nº 131/2009, da Transparência (LT); e a Lei nº 12.527/2011, de Acesso à Informação (LAI) – foram indiretamente responsáveis por abrir a caixa cinzenta da Administração Pública, de modo a permitir uma crescente judicialização da própria corrupção no País, o que, por sua vez, se refletiu na proposição legiferante de instrumentos específicos para combate à corrupção (Moutinho; Senhoras, 2013). Em um segundo plano, a Lei Federal nº 12.846/2013, regulamentada pelo Decreto nº 8.420/2015, tornou-se o primeiro instrumento no ordenamento jurídico brasileiro a dissertar sobre a conduta de empresas corruptoras, com eficaz uso na chamada Operação Lava Jato, de modo a inovar em um amplo aparato legal que inclui a responsabilização objetiva das pessoas jurídicas que atentam atos corruptivos contra a Administração Pública; penas mais rígidas; possibilidade de acordos de leniência empresarial; bem como ampla abrangência de aplicação da lei na União, Estados, Municípios e no exterior (Brasil, 2013; 2015). Em um terceiro plano, o Projeto de Lei nº 4.850/2016, mobilizado pelo Ministério Público Federal e conhecido como 10 Medidas contra a Corrupção, em tramitação do Congresso Nacional no ano de 2016, se trata de um amplo guarda-chuva legal que corrobora como massa crítica legal no endurecimento ao combate à corrupção nas relações com a Administração Pública por meio de dez eixos temáticos estruturados a partir de 20 anteprojetos de lei, possuindo focalização em três flancos: prevenção de
crimes; endurecimento de penas; e efetivação das punições (Brasil, 2016). Embora a corrupção recorrentemente seja apontada com destaque nas listas dos principais problemas públicos existentes no País em diversas pesquisas de opinião ou em alguns momentos, o principal problema (CNI, 2016), se observa que a produção legiferante ainda é embrionária e aquém aos interesses primários da própria sociedade civil, uma vez que a dinâmica política do Parlamento Nacional persiste conservadora na manutenção do status quo existente na caixa opaca que se tornou a Administração Pública brasileira. Conclui-se com base nas discussões ora apresentadas que, a despeito de a corrupção ser um fenômeno originário, um velho conhecido que se estruturou na cultura brasileira e nas próprias instituições, a Administração Pública representa uma preocupante e dinâmica força rentista frente a um embrionário e incompleto quadro institucional que vem sendo construído no ordenamento jurídico nacional para o seu combate nas últimas décadas, demonstrando, assim, que se trata de um dos maiores dilemas para o adequado funcionamento da máquina pública e da própria saúde do Estado Democrático de Direito.
REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. ______. Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015. Brasília: Planalto, 2015. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 23 out. 2016. ______. Lei Federal nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Brasília: Planalto, 2013. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 23 out. 2016. ______. Projeto de Lei Federal nº 4.850, de 29 de março de 2016. Brasília: Planalto, 2016. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 23 out. 2016.
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nacionais de corrupção em função do avanço legiferante da transparência e dos mecanismos de controle interno e externo, desvelando o grau sistêmico, massivo e incremental da cristalização da corrupção no aparelho do Estado.
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CONFEDERAÇÃO Nacional da Indústria (CNI). Corrupção é o principal problema do País. Retratos da Sociedade Brasileira, n. 28, jan. 2016. INTERNATIONAL Transparency (IT). Corruption Perceptions Index 2015. Berlin: IT, 2015. Disponível em: <www.transparency.org/cpi2015>. Acesso em: 23 out. 2016. MOUTINHO, B. M.; SENHORAS, E. M. Balanço da transparência na Administração Pública brasileira entre 1993 e 2013. Cadernos de Finanças Públicas, n. 13, dez. 2013. SENHORAS, E. M. Controvérsias sobre as relações negociais com o setor público: um estudo sobre a terceirização no Brasil. Revista Scientia Iuris, v.. 17, n. 2, dez. 2013. ______; SOUZA CRUZ, A. R. A. O papel da Moral e do Direito na consolidação de distintos padrões éticos na Administração Pública. Revista Síntese Direito Administrativo, v. 125, maio 2016.
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UNITED Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). United Nations Convention against Corruption. Viena: UNODC, 2003. Disponível em: <www.unodc.org/unodc/en/treaties/CAC>. Acesso em: 23 out. 2016.
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Doutrina
Lex Mercatoria e Sua Aplicação na Arbitragem Nacional e Internacional Lex Mercatoria and Your Application Into National And International Arbitration LIGIA GUIÇARDI CARDOSO Universidade Católica de Santos, Graduada em Engenharia Elétrica pela Fundação Educacional de Barretos, Graduada em Direito pela Universidade Santa Cecília, Pós-Graduada Lato Sensu em Direito do Trabalho.
RESUMO: O presente artigo busca analisar, discutir e compreender a aplicação da lex mercatoria no âmbito das arbitragens nacional e internacional, levando-se em conta a discussão apresentada por importantes autores acerca de tal área de estudos. Contextualizando, inicialmente, a origem do termo apresentado, tal como o seu uso desde o período medieval, buscamos perquirir algumas das suas principais características com relação à sua aplicação nas arbitragens, levando-se em conta a importância de tal conceito e de sua respectiva prática para os desafios apresentados pelo mundo contemporâneo e globalizado, com uma nova aplicação do termo. Por ser considerada, a lex mercatoria, um sistema aberto, busca-se destacar a sua qualidade de realizar a autopoiese jurídica, visto que exequível, nos contextos sociais, políticos e econômicos. Ademais, objetiva-se compreender a relação entre a jurisprudência dos Tribunais Arbitrais Internacionais e a lex mercatoria enquanto possibilidade de renovação frequente e de sua aplicabilidade na arbitragem nacional brasileira. Destaca-se, entre importantes análises depreendidas deste estudo, o princípio da autonomia na arbitragem, além de ressaltar a possibilidade da aplicação da lex mercatoria, nas arbitragens supracitadas, de forma complementar, subsidiária ou, até mesmo, integral, de acordo com a sua dinamização e operacionalização processual.
PALAVRAS-CHAVE: Lex mercatoria; arbitragem nacional e internacional; comércio internacional; contratos-tipo.
ELIANE MARIA OCTAVIANO MARTINS Universidade Católica de Santos, Pós-Doutora pela Universidade Autônoma de Barcelona, Doutora pela Universidade de São Paulo (USP), Mestre pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Professora da UNISANTOS e de vários cursos de pós-graduação, Advogada e Parecerista, Presidente da Câmara de Arbitragem Marítima do Rio de Janeiro. Membro da Associação Brasileira de Direito Marítimo (ABDM), Membro do Instituto Ibero-americano de Direito Marítimo (IIDM). Autora dos livros Curso de Direito Marítimo, volumes I, II e III, e Vade Mecum de Direito Marítimo. Autora de diversos artigos publicados. Professora Coordenadora da Liga Universitária do Direito Unesp Estudos e Prática em Direito Marítimo e Arbitragem.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Lex mercatoria medieval; 1.1 Lex mercatoria nova; 2 Natureza jurídica da lex mercatoria; 2.1 Fontes da lex mercatoria; 2.2 Lex mercatoria e os usos e costumes do comércio internacional; 2.3 Lex mercatoria e os contratos-tipo; 2.4 Lex mercatoria e as Regras de Incoterms; 2.5 Lex mercatoria e seu processo de uniformização; 2.6 Lex mercatoria e o comércio internacional; 3 Arbitragem internacional; 3.1 Arbitragem internacional e sua regulamentação internacional; 3.2 Arbitragem nacional; Considerações finais; Referências.
INTRODUÇÃO Vivendo, atualmente, em relações globais interligadas, porém com profundas incongruências e diferenças culturais, modos de viver díspares (senão quase antagônicas), além do dialético antagonismo social, tem-se em destaque o comércio e a economia internacionais. Tais pontos se entrelaçam e conquistam o seu espaço em uma realidade paralela, transnacional, na qual as fronteiras geográficas e a noção de soberania dos Estados acabam por se relativizar. A resiliência deste comércio internacional encontra amparo em um conjunto de normas, princípios, regras procedimentais, contratos-padrão, usos e costumes e jurisprudência, que constroem uma teia jurisdicional de proteção transnacional, conhecida pela denominação de lex mercatoria.
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O objetivo deste trabalho é o estudo e compreensão da lex mercatoria, embasados em obras de grandes autores deste campo de atuação, e analisar o seu uso na arbitragem nacional e internacional. Com esse propósito, iremos perquirir alguns de seus aspectos, quais sejam: conceito, origem, história, evolução, elasticidade e sua dinamização.
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Ainda sobre a lex mercatoria, enfatizaremos, enquanto uma qualidade rara de um sistema, a sua capacidade de realizar sua peculiar autopoiese jurídica. Esta diferenciada autopoiese jurídica consagra-se como realidade exequível, pela razão de ser a lex mercatoria um sistema aberto, que responde aos estímulos dos constantes desafios trazidos pelas novas circunstâncias de seu meio político, econômico e social. Essa capacidade de resposta da lex mercatoria, vista como um sistema jurídico frente aos novos desafios, permite sua constante renovação que se dá, entre outras formas, através da jurisprudência dos Tribunais Arbitrais Internacionais.
Após traçarmos essa ponte de interdependência entre a lex mercatoria e a jurisprudência dos Tribunais de Arbitragem Internacional como forma de sua constante renovação, analisar-se-á a possibilidade de sua aplicação na arbitragem nacional, tendo como objeto de estudo e análise a Lei nº 9.307, de 23.09.1996. Ao final deste estudo, será possível concluir importantes constatações acerca da viabilidade e necessidade da aplicação da lex mercatoria no que tange às decisões dos Tribunais Arbitrais, para a constante renovação jurídica de suas normas, com o escopo último de possibilitar um comércio internacional, ou, dito de outra forma, transnacional, cada vez mais célere, menos custoso e mais eficaz, capaz de responder às novas necessidades desse novo mundo que se apresenta, mais integrado e não hegemônico. A despeito de tais características, possui relevantes inconsistências e incongruências, fontes permanentes e geradoras dos
1 LEX MERCATORIA MEDIEVAL A lex mercatoria possui, como base de sua origem remota, o direito dos mercadores e os diversos sistemas jurídicos, criados para o enfrentamento dos problemas advindos das relações comerciais internacionais (Amaral, 2004, p. 59). Sendo assim, estes sistemas jurídicos tinham o objetivo de criar uma uniformidade de procedimentos (uma base jurisdicional: normas, princípios e regras), a fim possibilitar a realização desse comércio internacional para além dos Estados. Convergindo nesse sentido, podemos citar alguns sistemas normativos, a saber: Lex Rhodia de Jactu (fenícios); a nauticum foenus (romanos); as Leis de Wisby (regulavam o comércio no mar Báltico, em 1350); o Consulado do Mar (coletânea de costumes do comércio marítimo reunida no século XIV pela Corte Consular de Barcelona). Com o incremento do comércio na Europa, deu-se o desenvolvimento da lex mercatoria medieval, que teve, como ponto de partida, as cidades da Itália e, em seguida, projetou-se pela França, Espanha e Inglaterra, abarcando o restante da Europa. Esse comércio medieval internacional desenvolveu-se em razão do deslocamento dos mercadores para as grandes feiras, grandes mercados e aos principais portos. Esses mercadores levavam consigo, além de suas mercadorias, seus usos e costumes que, dessa forma, incorporam-se às regras das diferentes cidades e portos, consubstanciando-se o seu perfil cosmopolita. O nascimento da lex mercatoria é fruto do trabalho dos comerciantes da Idade Média, que, objetivando a superação das re-
gras da época (inadequadas e obsoletas), que não atendiam às necessidades daquele comércio internacional incipiente, criaram um conjunto de normas e regras, uniformes e obrigatórias, para respaldar as relações comerciais internacionais, construindo assim uma lei mercantil, de perfil cosmopolita, fundada nos usos e costumes comerciais. As regras da lex mercatoria diferenciavam-se das regras locais, reais, feudais ou eclesiásticas, sendo que poderiam ser evidenciados cinco aspectos fundamentais, como bem destaca Antonio Carlos Amaral (2004, p. 59): i) eram regras transnacionais; ii) tinham como base uma origem comum e fidelidade aos costumes mercantis; iii) eram aplicadas não por juízes profissionais, mas pelos próprios mercadores, através de suas corporações ou das Cortes que se constituíam nos grandes mercados ou feiras; iv) seu processo era rápido e informal; e v) enfatizavam a liberdade contratual e a decisão dos casos ex aequo et bono.1
A partir do século XVII, na Inglaterra, a lex mercatoria entra em um processo de decadência. Os conflitos comerciais passam a ser resolvidos pela common law. Embora a lex mercatoria não tivesse sido abolida, suas regras, inicialmente, “[...] foram consideradas como usos e costumes e práticas comerciais a serem provadas em cada caso [...]” (Tavolaro, 2004, p. 7). Mas esse entendimento altera-se com o julgamento do caso Pillans v. Microp, no qual Lord Mansfield (1705-1793) considerou que as regras da lex mercatoria “[...] eram matéria jurídica a ser decidida pelos tribunais, não se tratando de usos e costumes [...]” (Amaral, 2004, p. 60). Desse modo, as leis dos mercadores passam a integrar a common law. A velha lex mercatoria inicia seu processo de decadência com o nascimento do Estado Nacional na Europa, que apregoa a plena soberania dos Estados em oposição evidente a velha lex
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constantes conflitos econômicos, sociais e políticos de todos os tempos da história da humanidade.
1 “Segundo a equidade e o bem.” (Tradução nossa)
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mercatoria, que representa um sistema de normas que propiciam um comércio internacional de perfil transnacional (Amaral, 2004, p. 60). Dessa forma, as legislações nacionais continentais mercantilistas, na Idade Moderna, ao mesmo tempo em que efetivaram o direito comercial, promoveram, através dos Códigos de Leis no século XIX, a extinção da velha lex mercatoria (Amaral, 2004, p. 60).
1.1 Lex mercatoria nova De outra sorte, o comércio internacional encontra-se em franco e rápido desenvolvimento. As legislações nacionais não se mostram adequadas para atender às necessidades dos comerciantes. As decisões dos tribunais nacionais, além de arbitrárias, não se coadunam com o incremento das práticas comerciais, o que leva ao reconhecimento da necessidade e aplicação das regras transnacionais da lex mercatoria.
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Dessa forma, tal como a ave Fênix2, após um período de quase extinção perante as legislações nacionais codificadas, renasce uma nova lex mercatoria, cujas regras visaram, novamente, a tornar possível e regular o comércio internacional, portando-se como um direito sem fronteiras, um direito transnacional.
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Encontra-se, a esse respeito, o momento oportuno para citar o entendimento de Eliane Maria Octaviano Martins (2013, p. 70) com relação à nova lex mercatoria: Ressurge, assim, uma new law merchant, contemplando um direito transnacional, um conjunto de normas jurídicas, escritas ou não, objetivando regulamentar as relações internacionais do comércio se con2 Fênix é um pássaro lendário da mitologia grega, que morria e, depois de algum tempo, renascia das suas próprias cinzas.
sagrando como fonte primordial do direito do comércio internacional e dos contratos.
Não há, entretanto, um conceito unânime de lex mercatoria. Há uma vasta diversidade conceitual, que vai desde as concepções fundamentais sobre as fontes, até as de natureza jurídica. Assim, é a partir da década de 1960 que afloram importantes estudos sobre “a nova lex mercatoria” e o novo direito do comércio internacional (Martins, 2013, p. 82). Irineu Strenger destaca, em sua obra (1996, p. 72), alguns aspectos da lex mercatoria abordados por Berthold Goldman, e preceitua: Para Goldman, a lex mercatoria é precisamente um conjunto de princípios, instituições e regras com origem em várias fontes, que nutriu e ainda nutre as estruturas e o funcionamento legal específico da coletividade de operadores de comércio internacional. A realização desse desiderato, segundo expõe, se deve: a) aos princípios gerais do direito; b) aos provimentos contratuais, como cláusulas especiais e novos tipos convencionais; e c) às decisões arbitrais que contribuíram para a elaboração de princípios do comércio internacional. A lex mercatoria seria, portanto, uma superação encontrada, principalmente, pelas partes contratantes, dos obstáculos provenientes das soluções submetidas aos sistemas nacionais de leis. Segundo Goldman, essas normas resultantes da autonomia da vontade, pela sua repetida aplicação e eficácia nas operações do comércio internacional e arbitragem, emanciparam os contratos das ordens jurídicas nacionais, formando um corpo autônomo de direito: a lex mercatoria.
E, no sentido de apresentar um conceito de lex mercatoria, Strenger (1996, p. 145) ainda afirma que: [...] a lex mercatoria é hoje extenso conjunto de regras emanado de entidades particulares, organismos internacionais, ou de origem convencional de natureza quase-legal, que atua desvinculada das jurisdições específicas ou de sistemas legais de qualquer país. A lex mercatoria pode ser considerada uma aglomeração coerente de normas, tomadas estas no sentido mais amplo do termo, com força jurídica para resolver as relações de comércio internacional, investindo-as de eficácia
Segundo Eliane Maria Octaviano Martins (2013), Berthold Goldman, considerado o precursor da nova lex mercatoria, apresentou, no decorrer de sua vida, duas posições referentes ao aspecto da autonomia da lex mercatoria, e aduz: Originariamente, em seu estudo de 1964, considerado um marco para o conceito moderno de lex mercatoria, Goldman inicialmente defendia ser a lex mercatoria um direito costumeiro internacional e autônomo, nascido das práticas comerciais internacionais, liberto e desvinculado de qualquer fronteira estatal. Sua posição originária propugnava que a lex mercatoria se configuraria como um verdadeiro direito supranacional. Contudo, inobstante a lex mercatoria se situar substancialmente e formalmente ao domínio do direito, propugna Goldman não se consubstanciar em um sistema jurídico completo, mas em regras gerais de direito. À época considerava que esse processo incompleto não se direcionava para a formação de um sistema legal. Em 1985, a concepção de Goldman é mais pragmática: abandona o enquadramento da lex mercatoria como um direito supranacional e propugna referir-se a lex mercatoria apenas a um conjunto de princípios e regras de costume, referidas espontaneamente ou criadas sob a égide do comércio internacional e sem referência a um sistema jurídico nacional determinado. O autor passa a considerar a lex mercatoria um direito transnacional, hierarquicamente superior às ordens jurídicas nacionais, mas não se consubstancia em direito supranacional. (p. 115)
Voltando-se para a análise de Irineu Strenger, há conceitos sintéticos sobre a lex mercatoria. Entre eles, encontra-se o de Langen, The rules of the game of international trade3. Esse conceito abarca todas as controvérsias que possam ser discutidas no jogo do comércio internacional, ou seja, ele pode “[...] ser entendido, nessa expressão, como o ramo de atividade submetido a muitas injunções imprevisíveis, como na realidade ocorre” (Strenger, 1996, p. 76). 3 “As regras do jogo do comércio internacional.” (Tradução nossa)
Neste sentido, encontra-se Benjamin Kaufmann (apud Strenger, 1996, p. 77), ao conceituar a lex mercatoria como “an international body of law, founded on commercial understandings and contract practices of an international community, composed principally of mercantile, shipping, insurance and banking enterprises of all countries”4. Por sua vez, Goldstajn (apud Strenger, 1996, p. 77) traz, como conceito de lex mercatoria, “the body of rules governing commercial relationships of a private Law nature involving different countries”5.
2 NATUREZA JURÍDICA DA LEX MERCATORIA A lex mercatoria, segundo Eliane Maria Octaviano Martins (2013, p. 108), é vista na esfera internacional como uma “doctrine of transnational commercial of Law”6. Questões polêmicas se abatem sobre o perfil jurídico da lex mercatoria, tais como: ser um direito transnacional e sobre a juridicidade de seus elementos; consubstanciar um ordenamento jurídico; ser um direito supranacional ou a-nacional; ser um direito substantivo dos contratos; admitir sua aplicabilidade direta ou designação tácita e admitir a coexistência da lex mercatoria com as normas estatais (Martins, 2013, p. 108). Há uma série de correntes doutrinárias que discutem sobre a natureza jurídica da lex mercatoria, as quais vão desde a defesa de seu perfil jurídico (mercatorists), até aquelas que rejeitam esse 4 “Um corpo internacional de normas, fundado em entendimentos comerciais e práticas contratuais de uma comunidade internacional, composta principalmente de atividades mercantis, de navegação, de seguros e operações bancárias por empresas de todos os países.” (Tradução nossa) 5 “O corpo de normas que regem as relações de natureza de uma lei de direito privado, envolvendo diferentes países.” (Tradução nossa) 6 “Doutrina de direito comercial transnacional.” (Tradução nossa)
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e coercitividade, destinando-se inclusive a solucionar questões entre particulares e Estados aos mixed State-contracts.
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perfil (antimercatorists), “nos litígios decorrentes dos contratos de comércio internacional” (Martins, 2013, p. 108). Entre as teorias defendidas pelos mercatorists, duas delas, fundamentais para a sua defesa, são destacadas, a saber: 1. A teoria positivista, que defende o sentido tradicional da lex mercatoria, ou seja, compreende-a como sendo de origem transnacional e sua existência se prende ao sistema de direito internacional dos Estados, que utilizam convenções e leis uniformes, ratificadas pelo direito doméstico e pelos usos comerciais (trade uses), harmonizados por instituições internacionais; e 2. A teoria autonomista, que consagra um entendimento avançado da autonomia do direito do comércio internacional, isto é, preceitua um sentido avançado, que entende ser a lex mercatoria enquanto um sistema jurídico completo, autônomo e independente das normas estatais. (Martins, 2013, p. 108-109)
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2.1 Fontes da lex mercatoria
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Vistas como as bases comuns de todas as fontes do direito do comércio internacional autônomo, além de conter múltiplas fontes, sobressaem-se duas teorias de elevada importância acerca das fontes da lex mercatoria, sendo que a primeira teoria preconiza uma abordagem mais ampla, ao situar a lex mercatoria como um direito do comércio transnacional e sustentar que todos os substratos das transações, referentes ao comércio internacional, a ela se incorporem (Martins, 2013, p. 85-88). Ainda segundo essa teoria, são consideradas como fontes da lex mercatoria os princípios do direito, as práticas comerciais, os usos e costumes do comércio, o direito consuetudinário, o direito internacional público, as convenções internacionais, as leis uniformes, a jurisprudência arbitral, os códigos de conduta, as regras de organizações internacionais e os contratos-tipo (Martins, 2013, p. 85-88).
A segunda teoria, por sua vez, consagra uma visão mais restrita, pois enaltece a natureza a-nacional, habitual e espontânea da lex mercatoria e, por conseguinte, não estatutária. Dessa forma, estão excluídas como fontes principais da lex mercatoria as convenções internacionais, as leis uniformes e outras leis estatutárias (Martins, 2013, p. 85-88).
2.2 Lex mercatoria e os usos e costumes do comércio internacional Não há uma definição precisa acerca dos usos e costumes internacionais. Com relação aos costumes internacionais, de forma doutrinária, são evidenciados alguns aspectos, apontados por Eliane Martins (2013, p. 98), tais como: i) elementos materiais, consubstanciados no uso geral, na prática e na multiplicação de precedentes; ii) elementos subjetivos, isto é, a opinio juris: consciência coletiva de sua força como norma e em regra, são apontadas as seguintes características: a) prática comum, ou seja, repetição uniforme de certos atos da vida internacional; b) prática obrigatória defendendo que o costume é direito e obrigatoriamente deve ser respeitado pela sociedade internacional; e c) prática evolutiva, considerando que os costumes internacionais são flexíveis, dotados de plasticidade que permite adequar-se às novas circunstâncias.
2.3 Lex mercatoria e os contratos-tipo Segundo Irineu Strenger, os contratos-tipo são instrumentos elaborados por associações profissionais internacionais, que abarcam todo o comércio internacional, no qual temos a formação de setores especializados, que são compostos por comerciantes de
Irineu Strenger destaca, para exemplificar essa realidade (dos contratos-tipo), [...] a atividade profícua da London Corn Trade Association, constituída em 1877 e reorganizada em 1886, que, no comércio de vendas de cereais, procurou dar certa unidade a essas operações para possibilitar a adoção de usos baseados em princípios justos e equânimes, principalmente para os contratos, cartas-partidas, conhecimentos e apólices de seguro, de modo a estabelecer a adoção de fórmulas-tipo para os contratos e diversos outros documentos utilizados na prática do comércio de cereais. (1996, p. 62)
Os usos e costumes comerciais internacionais, além de serem relevantes fontes do direito internacional, suplementam lacunas até então imprevistas, especialmente através das cláusulas-padrão dos contratos de compra e venda mercantil (Martins, 2013, p. 106). No plano do comércio internacional, são elaborados por organizações que defendem os interesses das comunidades comerciais “modelos regulatórios, regras de interpretação, e contratos-tipo” com o objetivo de uniformizar os “[...] procedimentos dos usos e costumes do comércio internacional”, e dessa forma integram com igual “eficácia a normatividade formal” (Martins, 2013, p. 106). Como exemplo dessa construção, na área marítima, podemos descrever os contratos de fretamento de navios, que são fre-
quentemente realizados por “contratos-tipo elaborados por instituições especializadas, entre as quais se destaca a BIMCO7”. A efetiva operacionalização dos contratos-tipo, mesmo nos casos em que a lei de regência do contrato tenha sido escolhida pelas partes, possibilita uma interpretação mais objetiva da intenção delas (as partes) e contribui para reduzir a “[...] incerteza e dúvida porventura suscitadas na aplicação dos métodos de conflitos de lei” (Martins, 2013, p. 106). Os contratos-tipo são uma realidade na seara comercial, e seu frequente uso torna pacíficas as revelações no sentido desses contratos-tipo intervirem, facilitarem e agilizarem as “transações negociais”. A par de toda sua importância, consolidam-se entendimentos que defendem que os contratos-tipo não podem criar certas normas jurídicas de direito no contexto do comércio internacional, mas são considerados, por sua vez, como “fonte de direito” (Martins, 2013, p. 106).
2.4 Lex mercatoria e as Regras de Incoterms As “Incoterms”, International Rules for Interpretation of Trade Commercial Terms, foram desenvolvidas, em 1936, pela Câmara de Comércio Internacional (International Chamber of Commerce – ICC), instituição não governamental cuja sede encontra-se em Paris, sendo apontada como uma das instituições mais atuantes na sistematização de regras da nova lex mercatoria (Martins, 2013, p. 71). Desse modo, as Incoterms são consideradas como regras internacionais privadas, de entendimento uniforme, pertencentes à terminologia dos contratos comerciais. Segundo Eliana Martins (2013, p. 107), basicamente, são regras que preceituam
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um mesmo ramo profissional, que elaboram os contratos-tipo, ou seja, contratos padronizados. Esses contratos padronizados têm, como objetivo, regular as condições de compra e venda, adotando princípios justos e equânimes, além de incluir normas editadas por inúmeras organizações particulares, por exemplo, como a Câmara de Comércio Internacional (1996, p. 62-64).
7 Baltic and International Maritime Council.
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[...] termos e cláusulas-padrão para interpretação universal e harmonizada das contratuais típicas utilizadas no comércio das mercadorias, definindo, com exatidão, as obrigações do vendedor (seller) e do comprador (buyer) sobre a mercadoria, objeto do contrato, sendo termos de comércio internacional de mercadorias também utilizáveis nos contratos domésticos.
As regras das Incoterms, referentes ao ano de 2010, contêm onze termos de comércio de mercadorias, sendo que sua última versão entrou em vigor em janeiro de 2011 (Martins, 2013, p. 107). Ainda no tocante a essas regras, é interessante como é considerado “incontestável” o entendimento que sustenta que as regras das Incoterms devem ser consideradas como “[...] regras supletórias de interpretação que devem ser analisadas em conjunto às demais cláusulas contratuais e a legislação do contrato” (Martins, 2013, p. 107).
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2.5 Lex mercatoria e seu processo de uniformização
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No sentido de promover a consolidação, uniformização e harmonização das regras do direito privado, consagra-se a nova lex mercatoria na seara do direito do comércio internacional. Convergindo nesse sentido, evidenciam-se: as leis uniformes, leis-modelos, que são conjuntos de regras e princípios que orientam o comércio internacional, advindas da Câmara do Comércio Internacional (International Chamber of Commerce – ICC), do Institut International Pour L’Unification du Droit Privé, da International Law Association (ILA), da Comissão das Nações Unidas para o Direito do Comércio Internacional (United Nations Commission on International Trade Law – Uncitral), da Liga das Nações8, da Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização Mundial do 8 A Liga das Nações, ou Sociedade das Nações, criada em 1919, tinha por objetivo precípuo manter a paz mundial, sendo extinta em 1942, e, em 1946, o organismo passou as responsabilidades para a ONU.
Comércio. No campo das vendas marítimas, temos as normas produzidas pela International Maritime Organization (IMO) e pelo Comitê Marítimo Internacional (CMI) (Martins, 2013, p. 71). No sentido de unificação do direito internacional privado, entre as entidades atuantes com este objetivo, evidenciam-se duas correntes: uma convergindo para a unificação regional do direito privado; a outra, concentrando seus esforços no sentido de uma unificação universal desse direito (Martins, 2013, p. 71). No espectro universal de unificação do direito privado, evidenciam-se: a Conferência de Haia de Direito Internacional Privado; o Unidroit, cujas regras são consideradas importantes “[...] fontes de codificação do direito do comércio internacional e da lex mercatoria” (Martins, 2013, p. 71); a Uncitral, que atua em espectro global e concentra sua atuação no antagonismo de leis do comércio internacional. No sentido de uma atuação regionalizada em relação à unificação do direito privado, encontra-se a Conferência Interamericana de Direito Internacional Privado, ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA) (Martins, 2013, p. 71). Nesse diapasão, consagram-se como normas de uniformização do direito internacional privado, conforme bem elucida Eliane Martins (2013, p. 72), a: [...] Lei uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias e a Lei de Cheques (Liga das Nações, 1930 e 1931); as Convenções de Haia (Uniform Law of International Sales e a Uniform Law on the Formation of Contracts for the International Sale of Gods, Unidroit, 1964), a Convenção Internacional sobre Compra e Venda Internacional (Convention on Contracts for the International Sale of Gods, Cisg, ONU, Viena, 1980), o General Agreement on Tariffs and Trade (GATT/OMC, 1947); a Lei Modelo de Arbitragem, da Uncitral, o Código de Bustamante (Código de Direito Internacional Privado, Havana, 1928) e a Convenção Interamericana sobre o Direito Aplicável aos Contratos Internacionais (Cidip, OEA). [...] Nas vendas marítimas [...] para se criar um direito do comércio
A Câmara do Comércio Internacional (International Chamber of Commerce – ICC) e o Unidroit, organizações de caráter privado, produzem, de forma contínua, regras de natureza universal, com o escopo de uniformizar e harmonizar as regras provenientes dos contratos internacionais de comércio. Dessa forma, a ICC e o Unidroit promovem, através da realização incessante de novas regras, a constante renovação e evolução da nova lex mercatoria (Martins, 2013, p. 73). Destacam-se, entre as normas da nova lex mercatoria, os Princípios dos Contratos Internacionais da Unidroit (1994); as Incoterms (Internacional Rules for Interpretation of Trade Commercial Terms), regras criadas pela Câmara do Comércio Internacional (ICC); os Uniform Customs and Pratice for Documentary Credits (UCP); e os Princípios Translex (Translex Principles), produzidos em 2006 e sistematicamente atualizados e revisados por Peter Berger, Professor da University of Cologne (Alemanha) (Martins, 2013, p. 73).
2.6 Lex mercatoria e o comércio internacional A lex mercatoria e o comércio internacional possuem uma estreita e profunda relação. A lex mercatoria, vista como um processo, origina-se em decorrência do dinamismo das relações comercias internacionais entre os Estados e da necessidade de se estabelecerem regras transnacionais eficazes para possibilitar a realização desse comércio internacional.
Assim sendo, o comércio internacional direcionou-se no sentido de estruturar uma nova ordem econômica mundial, que se traduz como o resultado do processo que construiu as bases da nova lex mercatoria, que “[...] se impôs como sustentação dos atos do comércio em geral” (Strenger, 1996, p. 165), gerando um “[...] sistema sólido e praticamente autossuficiente para o atendimento das reivindicações do comércio internacional” (Strenger, 1996, p. 165).
3 ARBITRAGEM INTERNACIONAL A arbitragem pode ser conceituada como um meio extrajudicial de solução de conflitos, em que as partes, por sua livre escolha, confiam a uma terceira pessoa (ou pessoas) a incumbência de solucionar a controvérsia por elas apresentada. Segundo Jacob Dolinger e Carmen Tiburcio, a arbitragem já se encontrava presente na “[...] história do povo judeu desde as narrativas do Pentateuco9, 3800 anos atrás, até os tempos modernos” (2003, p. 6-8). O Pentateuco traz o relato de vários conflitos, entre os quais se encontra aquele ocorrido entre Jacó e Labão10, que fo9 Pentateuco vem do grego “pentateuchos” e significa “cinco volumes”. É usada para designar os cinco primeiros livros da Bíblia. 10 A história do conflito entre Jacob e Labão, respectivamente genro e sogro, descrita na obra, aflorou em razão da desconfiança de Labão sobre a idoneidade de seu genro Jacob. Essa desconfiança se deu por causa da decisão tomada por Jacob, juntamente com a anuência de suas duas esposas, filhas de Labão, de retornar à casa de seus pais, Terra de Canaã, sem se despedir de Labão. O motivo para essa partida furtiva, por parte de Jacob, era para evitar que Labão opusesse obstáculos sobre sua decisão. Labão, ao tomar conhecimento da partida de Jacob, juntamente com suas duas filhas (esposas de Jacob), e com seus onze netos, arregimentou seus homens e partiu em perseguição. O encontro de Labão e Jacob é marcado pela profunda indignação de Jacob, diante das suspeitas de Labão, de que não teria agido honestamente, o que leva Jacob a propor, a Labão, que levasse essa suspeita de desonestidade ao conhecimento dos seus irmãos e dos irmãos de Labão para que eles decidissem, ou
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internacional, as convenções atinentes ao transporte marítimo de mercadorias, em especial a Convenção Internacional para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimento de Embarque (International Convention for Unification of Certain Rules Related to Bill of Ladings, Bruxelas, 1924, conhecidas como Regras de Haia) e respectivas alterações (Protocolo de Visby, Regras de Haia-Visby, 1979), as Regras de Rotterdam, entre outras.
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ram decididos através da conciliação, e faz referência à solução por meio da arbitragem. Nesse sentido, está o conceito de Manuel Pereira Barrocas sobre arbitragem, na qual ela “[...] constitui um modo de resolução de litígios entre duas ou mais partes, efetuada por uma ou mais pessoas que detêm poderes para esse efeito reconhecido por lei, mas atribuídos por convenção das partes” (2010, p. 31-32). Segundo Luiz Antonio Scavone Junior, a arbitragem voluntária e facultativa, no direito romano, era admitida e, até mesmo, estimulada (2014, p. 15). A arbitragem internacional, destinada ao comércio internacional, é fruto da inaptidão dos sistemas normativos nacionais estatais em resolver, de forma eficaz, os litígios advindos de contratos transnacionais.
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Dessa forma, a arbitragem internacional consolidou-se robustamente, tendo em vista o fato de que a ocorrência dos litígios, no comércio internacional, possui ligação com mais de um ordenamento jurídico nacional, ou com nenhum (Basso, 2012, p. 290-291). Assim, destaca Araminta de Azevedo Mercadante (Basso, 2012, p. 290-291):
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[...] a expressão arbitragem do comércio internacional designa aquela que tem pelo menos um elemento de conexão com um ou mais sistemas jurídicos estrangeiros, diverso daquele ao qual se vincula o negócio realizado. Assim, basta que um só elemento, material ou formal do litígio, tenha conexão com país estrangeiro, para que exista a arbitragem do comércio internacional. Por outro lado, o termo arbitragem comercial internacional, também designada transnacional ou a-nacional, é utilizada para indicar os que operam na comunidade internacional de comerciantes, e abrange o acordo de vontade das partes que convencionam submeter um litígio sobre matéria comercial que venha a urgir ou tenha surgido ao Juízo Arbitral, delimitando o objeto do litígio e indicando a seja, fossem os juízes entre Jacob e Labão.
lei aplicável, inclusive, princípios gerais de direito, usos e práticas do comércio internacional e lex mercatoria, nomeando para esse fim árbitro, árbitros ou uma instituição permanente de arbitragem, obrigando-se a atacar de boa-fé a decisão prolatada.
Dessa forma, em um mundo “globalizado e anárquico” (anárquico visto no sentido da ausência de um poder central, de um tribunal mundial mercantil), a arbitragem torna-se o meio de solução de litígios decorrentes das relações de comércio internacional mais praticado no mundo, em controvérsias ao direito privado, tanto no plano nacional, como no plano internacional (Dolinger; Tiburcio, 2003, p. 49). A comprovação desse entendimento, ainda segundo Dolinger e Tiburcio (2003, p. 49), encontra-se na “[...] existência de inúmeras [...] instituições que atuam no sentido de efetivar a sua realização, [...] e.g., a Câmara do Comércio Internacional (CCI), a Londom Court of International Arbitration (LCIA) e a American Arbitration Association (AAA)”. A arbitragem comercial internacional também se efetiva como “[...] fonte do direito internacional e de codificação da lex mercatoria” (Martins, 2013, p. 421). Irineu Strenger (1996, p. 130-131), de encontro a essa afirmação, aduz que: A arbitragem tem sido o ambiente mais fértil para o desenvolvimento da lex mercatoria. Sendo jurisdição desvinculada dos sistemas nacionais, tem ilimitada possibilidade de liberar sua criatividade e com isso contribuir para o avanço e aprimoramento das regras que conduzem o comércio internacional. A arbitragem é, sem dúvida, uma das principais fontes do direito do comércio internacional. [...] A arbitragem parece destinada a tornar-se a jurisdição do comércio internacional, na medida em que vai se tornando a opção preferida dos comerciantes, que já sedimentaram sua confiança nessa modalidade de solução para suas controvérsias. [...] Exatamente porque os árbitros não prolatam sentenças em nome de uma soberania nacional, sua possibilidade de aplicar ou criar, segundo as necessidades, regras adequadas ao comércio internacional é muito maior, o que explica o contínuo enriquecimento de suas formulações.
A Arbitragem Internacional, vista sob o seu aspecto de instituição, tem sua estrutura jurídica fundada, para além da lex mercatoria, em uma rica e densa normatização internacional, entre as quais se evidenciam: Protocolo de Genebra sobre Cláusulas Arbitrais (1923); Convenção de Genebra concernente à Execução de Laudos Arbitrais Estrangeiros (1927); Convenção de Washington para a Solução de Controvérsias sobre Investimentos entre Estados e Nacionais de outros Estados (1965); Convenção de Nova York sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras (1958), considerada “[...] um dos instrumentos fundamentais na normatização da arbitragem” (Martins, 2013, p. 422-423); Convenção Europeia sobre Arbitragem Comercial Internacional (Genebra, 1961); e Lei Modelo, sobre Arbitragem Comercial Internacional, da Uncitral, editada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1965 (Martins, 2013, p. 422-423). No sentido de contribuir de forma importante para a implementação de um regramento jurídico uniforme, com o intuito de promover soluções justas e eficientes, encontram-se a Lei Modelo, a Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras e as Regras de Arbitragem da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (1976) (Martins, 2013, p. 423). De outra sorte, na seara dos contratos internacionais do comércio, sobressaem-se o Regulamento da Corte Internacional de Arbitragem, da Câmara de Comércio Internacional (Internacional Chamber of Commerce – ICC), e as Regras de Arbitragem Internacional, da Associação Americana de Arbitragem (Comercial Meditation Rules, da American Arbitration Association – AAA) (Martins, 2013, p. 423).
Dolinger e Tiburcio, em sua obra, preceituam que há inúmeros exemplos de litígios internacionais, os quais foram julgados como arbitragem internacional. Essas arbitragens foram decididas, na sua essência, com fundamento nas regras da lex mercatoria, deixando-se de fora a aplicação de qualquer direito estatal, principalmente quando uma das partes envolvidas é algum Estado (2003, p. 102-104). Como exemplos dessas arbitragens, citadas pelos autores e decididas com base na lex mercatoria, encontram-se: 1. Um laudo arbitral, proferido no âmbito da Câmara do Comércio Internacional (CCI), em um litígio que envolvia um contrato de exploração entre um Estado africano e uma empresa alemã (Caso CCI nº 5030, de 1992, Journal de Droit International, p. 1004 – 1993), no qual foi decidido: “Contrat d’État. Droit applicable. Non applicabilité d’um droit étatique. Aplication dês príncipes généraux dês contrats internationaux”; 2. A decisão proferida, no âmbito do Tribunal Arbitral Irã-EUA, em caso que envolvia um consórcio de empresas petroleiras contra o governo do Irã, Mobil Oil Iran Inc. v. Islamic Republic of Iran (American Journal of International Law 82/136 – 1988), que recorreu aos princípios gerais de direito comercial e internacional para regular a questão; 3. Caso Norsolor, que trata de uma disputa entre uma empresa francesa, Norsolor, e uma empresa turca, Pabalk, em razão de rescisão de contrato de representação. Nesse caso, os árbitros desconsideraram todas as leis estatais envolvidas e decidiram aplicar a lex mercatoria (Laudo de 26.10.1979, Reuve de L’arbitrage, p. 525 – 1980). A empresa francesa, insatisfeita com a decisão, recorreu ao Judiciário austríaco, alegando que os árbitros extrapolaram os poderes que lhes foram concedidos ao julgarem a questão com base na lex mercatoria, por considerarem serem normas de conteúdo incerto e variável. A Corte Suprema da Áustria manteve a decisão arbitral, demonstrando que sua aplicação por tribunais arbitrais tem sido aceita pelo Judiciário.
3.2 Arbitragem nacional
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3.1 Arbitragem internacional e sua regulamentação internacional
O instituto da arbitragem é regulamentado pela Lei nº 9.307/1996 no Brasil, que ratificou importantes convenções internacionais
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sobre arbitragem comercial, quais sejam: a Convenção sobre Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras (Convenção de Nova York, 1958, ratificada pelo Decreto nº 4311/2002); a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional (Convenção do Panamá), produzida pela OEA e firmada no Panamá em 1975, ratificada pelo Decreto Legislativo nº 1902/1996; a Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros (Convenção de Montevidéu, 1979); o Acordo Comercial Internacional do Mercosul11 (Mercosul – CMC – 1998); e o Protocolo de Las Leñas, que estabelece normas no sentido de reconhecer e executar decisões judiciais e arbitrais entre os Estados-partes do Mercosul (Martins, 2013, p. 449-450). A Lei de Arbitragem nº 9.307/1996 trouxe importantes inovações, entre as quais se evidenciam, de acordo com Dolinger e Tiburcio (2003, p. 33-40): 1. Os efeitos da cláusula compromissória e do compromisso arbitral foram equiparados, tanto no plano do direito interno como no internacional, ou seja, a adoção da cláusula compromissória como um compromisso arbitral, em um contrato realizado entre as partes, obriga à instauração de um juízo arbitral, esse entendimento é revelado à medida que a Lei nº 9.307/1996 utiliza a denominação “convenção de arbitragem” para ambas as situações;
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2. A possibilidade de execução específica da cláusula compromissória;
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3. A equiparação do laudo arbitral a uma sentença judicial, dispensando, desse modo, o ato de homologação da autoridade judiciária; 11 Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai assinaram, em 26 de março de 1991, o Tratado de Assunção, com vistas a criar o Mercado Comum do Sul (Mercosul). O objetivo primordial do Tratado de Assunção é a integração dos Estados-Partes por meio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, do estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum (TEC), da adoção de uma política comercial comum, da coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais, e da harmonização de legislações nas áreas pertinentes.
4. No plano internacional, duas relevantes inovações foram introduzidas pela Lei de Arbitragem Nacional: o fim do sistema da dupla homologação dos laudos arbitrais proferidos no exterior e a admissibilidade da via postal para a citação da parte domiciliada no Brasil.
A lei pátria de arbitragem prestigiou o princípio da autonomia das partes, ao atribuir às partes contratantes a liberdade para escolher as normas de Direito aplicáveis ao procedimento e ao fundo da causa, como também à liberdade delas convencionarem que a arbitragem seja realizada com “[...] base nos princípios de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio”12, ou seja, as partes têm liberdade para escolher se a arbitragem a ser realizada será de direito ou de equidade (Araujo, 2004, p. 424). O § 2º, referente ao art. 2º da Lei nº 9.307, ao preceituar que as partes poderão estabelecer que a arbitragem será realizada com base nos princípios gerais de direito, usos e costumes e regras internacionais de comércio, está admitindo que elas, se assim pactuarem, poderão escolher pela aplicação da lex mercatoria na arbitragem. Convergindo nesse sentido, ou seja, de que a Lei nº 9.307/1996 admite o uso da lex mercatoria, se convencionada pelas partes, encontra-se Carlos Alberto Carmona, ao se referir à lex mercatoria e defini-la como “[...] um conjunto de princípios gerais e regras geradas pelo costume do comércio internacional, sem referência a um sistema legal específico” (2009, p. 73-75). 12 Lei nº 9.307/1996: “Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de equidade, a critério das partes. § 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública. § 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio”.
Também com relação a isso e possuindo, por fundamento, a lei de arbitragem nacional, encontra-se Beat Walter Rechsteiner, que afirma:
internacional constituem um corpo jurisdicional dinâmico, que está em constante evolução, para atender às novas e constantes necessidades do mundo globalizado.
A Lei nº 9.307, de 23.09.1996, dispõe que as partes poderão convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio. Assim, reconhece-se, expressamente, a faculdade das partes em socorrerem-se de regras da lex mercatoria, quando surgir, entre elas, uma lide a ser decidida por um tribunal arbitral. (2001, p. 98)
A realidade transnacional se fortalece e, por conseguinte, necessita das normas da nova lex mercatoria, assim como de todo o ordenamento jurídico internacional, elaborado a partir das convenções e tratados pelos Estados e organismos particulares, superando, dessa forma, as limitações impostas ao comércio transnacional pelos ordenamentos jurídicos nacionais de cada Estado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Após nos debruçarmos sobre as considerações dos autores citados, percebemos que os conceitos de comércio internacional, contratos comerciais internacionais, globalização, arbitragem e lex mercatoria estão entrelaçados e são interdependentes. Nesse sentido, representam elementos de outra realidade e, por se encontrarem além das realidades nacional e internacional, estamos diante de uma realidade transnacional. A arbitragem internacional representa uma “ponte dourada”, um meio que torna possível a interação dos Estados, de economias, culturas e políticas distintas, em nível do comércio internacional global, através da realização dos contratos internacionais. A lex mercatoria, de sua parte, seria um tecido fino que permeia toda essa estrutura, servindo e mantendo uma relação simbiótica com a arbitragem, como fonte de um sistema jurisdicional para ela e, desta, recebendo sua constante renovação através de sua jurisprudência. Dessa forma, a lex mercatoria e a arbitragem
Poderíamos ainda inferir e tomar como distintas as realidades do comércio nacional, internacional e transnacional, e até mesmo situá-las em dimensões sobrepostas e, respectivamente, poderíamos pensar em termos de três dimensões: a primeira, o comércio nacional; a segunda, o comércio internacional; por fim, a terceira, como o comércio transnacional. Diante disso, os conflitos resultantes do comércio, seja ele nacional, internacional ou transnacional, poderiam ser vistos e compreendidos, inicialmente, através de uma perspectiva para saber em qual das dimensões situa-se a contenda, e definir qual das normas que se mostram mais adequadas à situação. Tal modo seria factível caso fosse acordado pelas partes, ou seja, se as partes escolhessem a arbitragem como o meio para resolverem suas eventuais divergências. Desse modo, a sua resolução, por intermédio da arbitragem, dentro do contexto do comércio internacional e até mesmo do comércio nacional, é vista como o meio heterônomo mais adequado para dirimir os conflitos, quando comparado ao Poder Judiciário, por apresentar soluções mais eficientes e seguras para as partes, além de menos custosas, mais ágeis (no tocante ao prazo) e elaboradas por especialistas (os árbitros, eleitos livremente pelas partes).
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Dessa forma, a Lei nº 9307/1996, de arbitragem nacional, manteve-se receptiva às regras da nova lex mercatoria, prevendo expressamente a possibilidade de sua aplicação, caso assim escolham as partes envolvidas, em seu § 2º do art. 2º da referida lei.
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Deve-se destacar, ainda na seara da arbitragem, o princípio da autonomia, que possibilita às partes escolher livremente, entre outros, os árbitros, as normas de direito material e as de direito processual, além do local na qual será realizada a arbitragem.
RECHSTEINER, Beat Walter. Arbitragem privada internacional no Brasil: depois da nova Lei nº 9.307, de 23.09.1996. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
Dessa forma, ao concluirmos o presente trabalho, resta-nos evidenciar a total possibilidade de aplicação da lex mercatoria na arbitragem internacional e nacional, seja de forma integral, subsidiária ou complementar, e firmarmos o entendimento no sentido de considerar a lex mercatoria sob dois prismas: o primeiro, enquanto uma instituição dinâmica e em constante evolução, por congregar normas, princípios, usos e costumes do direito do comércio internacional; o segundo, por fim, como um meio eficaz no sentido de possibilitar a realização do comércio nacional, internacional e transnacional entre os Estados ou as partes provenientes dos diferentes Estados.
STRENGER, Irineu. Direito do comércio internacional e lex mercatoria. São Paulo: LTr, 1996.
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BARROCAS, Manuel Pereira. Manual de arbitragem. Coimbra: Almedina, 2010.
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Doutrina
Redirecionamento de Execução Fiscal contra os Responsáveis Tributários das Sociedades Empresárias Falidas MARCELO BRAGHINI
M e s t r a n d o e m D i re i t o C o l e t i v o p e l a Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP, Especialista em Direito Tributário pelo IBET, Pós-Graduado em Direito do Trabalho, Professor, Advogado.
RICARDO BRAGHINI
Pós-Graduado em Direito Constitucional Tributário pela PUC/SP, Especialista em Direito Tributário pelo IBET, Advogado.
RESUMO: O presente artigo visa a demonstrar que o procedimento da falência do devedor tributário não acarreta a presunção da dissolução irregular da sociedade empresária, atraindo, por si só, a aplicação imediata da responsabilidade tributária do art. 135, I e III, do CTN, independentemente da comprovação pela autoridade fiscal das condutas irregulares e fraudulentas previstas no texto complementar. A fundamentação desse posicionamento perpassa pela análise dos principais julgados do STJ sobre o tema, centrando-se a fundamentação
na decisão da 2ª Turma do STF (AgRg-RE 608.426/PR) que garante o contraditório e a ampla defesa no redirecionamento da execução fiscal ao sócio-falido, administrador ou não. A responsabilidade do sócio no Código Civil de 2002 e na Lei nº 6.404/1976 (S/A), bem como a regularidade da dissolução da sociedade havida nos moldes da Lei nº 11.101/2005 – presunção aqui que decorre do princípio da preservação da empresa e reabilitação do falido – são elementos indispensáveis ao suporte teórico do modelo econômico-constitucional da livre iniciativa, devendo as fraudes e irregularidades ser devidamente comprovadas, dentro da concepção da responsabilidade subjetiva (dolo ou culpa grave), a exemplo do que ocorre com a prática de crimes falimentares.
PALAVRAS-CHAVE: Redirecionamento da execução fiscal; sócio-falido; ônus da prova da Fazenda Pública.
ABSTRACT: This article aims to demonstrate that the procedure of the tax debtor’s bankruptcy does not require the assumption of irregular dissolution of the corporation, attracting alone the immediate application of the tax liability of the art. 135, I e III, the CTN, regardless of the evidence by the tax authority of the irregular and fraudulent conduct laid down in clear text. The basis of this analysis goes through the positioning of the main STJ judged on the subject, especially regarding the decision by the 2nd Team of the Supreme Court (AgRg-RE 608.426/PR) guaranteed contradictory and full defense in the redirection of tax enforcement to socio-manager, similar to the situation of the bankrupt partner. Analysis of the social responsibility of the Civil Code of 2002 and Law nº 6.404/1976 (S/A), as well as the regularity of the dissolution of society regarded in the pattern of Law nº 11.101/2005, presumption that follows from the principle of preserving the company and rehabilitation of the bankrupt, indispensable elements to support the theoretical economic model constitutional of free enterprise, frauds and irregularities should be properly supported, within the concept of subjective responsibility (fraud or malpractice), similar to what occurs with crimes bankruptcy.
KEYWORDS: Redirection of tax enforcement; socio-bankrupt; burden of proof of the Tax Authority.
SUMÁRIO: Introdução; 1 A responsabilidade tributária no Código Tributário Nacional; 2 Posicionamento do STJ em relação ao redirecionamento da execução fiscal ao sócio; 3 Responsabilidade do sócio no Código Civil de 2002 e Lei nº 6.404/1976; 4 Dissolução regular de sociedade comercial nos termos da Lei nº 11.101/2005; 5 Posicionamento do STF em relação ao contraditório e ampla defesa no redirecionamento da execução fiscal; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
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A atualidade do tema decorre da própria forma como os Tribunais Superiores vêm se posicionando sistematicamente sobre a matéria da responsabilidade do sócio perante os débitos tributários das sociedades empresárias, conforme exceção prevista no Código Tributário Nacional (“CTN”), possibilitando a execução forçada das dívidas do devedor contra o seu próprio patrimônio. Inclusive, como é cediço, tal norma excepcional subverte a regra de direito privado – segundo a qual existe uma ficção jurídica concedida às pessoas jurídicas em geral, segregando nitidamente o patrimônio da empresa e dos seus sócios –, devendo, em regra, cada qual suportar as dívidas voluntariamente assumidas.
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A exploração das atividades econômicas em geral se dá por intermédio da figura do empresário (art. 966 do Código Civil em vigor: aquele que empreende na atividade econômica), que consiste no alicerce da estrutura econômico-constitucional da livre iniciativa, justificando, assim, o tratamento dispensado ao empresário pelas vetustas regras do direito comercial (e atuais normas do direto empresarial) – como a limitação da responsabilidade dos sócios e administradores, exceto na hipótese de violação da lei –, e especialmente nos casos de falência ou recuperação
judicial em que o legislador intenta fomentar a preservação da empresa como unidade produtiva, bem como permitir a reabilitação do falido para que ele possa empreender novamente e estimular a economia nacional, indispensável à manutenção dos níveis de arrecadação exigidos pelo Estado Social. Neste contexto, a interpretação dos dispositivos da responsabilidade tributária prevista no CTN não deve ser feita em desfavor dessa realidade subjacente, principalmente no tocante ao redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-falido, administrador ou não. Na verdade, os Tribunais Superiores devem ponderar os valores disseminados ao longo da ordem jurídica, inclusive pelos demais ramos do direito, afetos à tributação, até mesmo pela equidistância da função jurisdicional, admitindo a intertextualidade na construção da norma jurídica justa, que necessariamente deverá ter como referencial os princípios constitucionais do Estado Moderno. Essas são, portanto, as diretrizes que irão nortear o presente trabalho, mesmo porque a interpretação dos textos de lei devem ser feitas a partir da unicidade do sistema jurídico, que apenas admite subdivisão para fins didáticos.
1 A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL Regra geral, e pela teoria da obrigação tributária, a responsabilidade pelos débitos tributários decorre da realização do fato gerador do tributo, sendo este reconhecido pelo sistema tributário nacional como o seu sujeito passivo, razão pela qual o seu patrimônio – subscrito e integralizado nas sociedades com responsabilidade limitada – deverá responder pela integralidade da dívida fiscal.
O próprio art. 142 do CTN4, ao tratar do lançamento tributário, o exige como ato privativo da autoridade administrativa para constituição do crédito, permitindo, inclusive, a identificação do sujeito passivo (leia-se a responsabilização dos demais coobrigados como previsto na norma tributária). A responsabilidade do sócio pelos débitos tributários da sociedade empresária depende da prova dos atos irregulares (fraudulentos) mencionados na lei tributária, apurada mediante a ampla defesa no âmbito administrativo, garantida por aquele mesmo dispositivo constitucional citado.
Não há dúvidas quanto à necessidade de a Fazenda Pública se incumbir do ônus da prova acerca da prática de atos irregulares (fraudulentos) como requisito essencial à responsabilização pessoal do sócio, inclusive na liquidação de sociedade de pessoas, exegese que se extrai do art. 134, VII, c/c art. 135, I, ambos do CTN2, sob pena de vulnerar os princípios constitucionais franqueados ao contribuinte, como o do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF)3.
Eis o posicionamento de Fabiana Del Padre Tomé a respeito da presunção de legitimidade do ato administrativo na teoria do ônus da prova em matéria tributária:
1 Prevê o art. 135, I e III, do CTN: “São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no parágrafo anterior; [...] III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”. 2 Dispõe o art. 134, VII, do CTN: “Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões que forem responsáveis: [...] VII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas”. Art. 135, I, do CTN: “São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultante de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social e estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior”. 3 Art. 5º, LV, da CF: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Essa presunção, entretanto, não exime a administração do dever de comprovar a ocorrência do fato jurídico, bem como das circunstâncias em que este se verificou. É que, sendo os atos de lançamento e de aplicação da penalidade vinculados e regidos, entre outros, pelo princípio da estrita legalidade e da tipicidade, tais expedientes dependem, necessariamente, da cabal demonstração da ocorrência dos motivos que os ensejaram, a motivação deve ser, portanto, respaldada em provas. Seguindo semelhante linha de raciocínio, conclui Paulo de Barros Carvalho: “Na própria configuração oficial do lançamento, a lei institui a necessidade de que o ato jurídico administrativo seja devidamente fundamentado, o que significa dizer que o fisco tem que oferecer prova concludente de que o evento ocorreu na estrita conformidade da previsão genérica da hipótese normativa”.5 4 Art. 142, caput, do CTN: “Compete privativamente à autoridade administrativa constituir crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível”. 5 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. São Paulo: Noesis, 2005. p. 231.
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Em virtude das práticas fraudulentas vivenciadas pela experiência nem tão recente das relações entre Fisco e contribuinte, o legislador passou a prever a possibilidade da responsabilidade de terceiro, admitindo a responsabilidade pessoal do sócio, administrador ou não, no art. 135, I e III, do CTN1, de forma a ampliar as hipóteses de recebimento dos créditos tributários devidos pela sociedade empresária, sob a ótica da responsabilidade subjetiva, que não prescinde da comprovação da prática de ato irregular (fraudulento), tendo em vista as condutas contrárias: à lei, ao estatuto ou contrato social.
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Ademais, é importante destacar o alerta de Humberto Teodoro Junior a respeito da impossibilidade de uma execução fiscal sem título, uma vez que o lançamento é ato administrativo indispensável para a constituição e higidez da dívida em desfavor do terceiro responsável, sob a pena de se admitir a execução forçada, via executivo fiscal, sem justo título, dado que a certidão de dívida ativa (“CDA”) é espelho do conteúdo do ato de lançamento, inclusive em relação à definição do sujeito passivo e demais coobrigados6. Reafirma-se: no tocante aos requisitos essenciais de validade da CDA, conforme art. 202, I, do CTN7, há necessidade de inclusão do devedor e demais responsáveis tributários no título extrajudicial, de forma individualizada, instruindo-se a respectiva execução fiscal com o processo administrativo fiscal (“PAF”) em que se discutiu a responsabilidade destes últimos.
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Neste ponto, a doutrina é uníssona quanto à necessidade de se discutir os elementos da responsabilidade no PAF, salientando Hugo de Brito Machado que não se pode imputar ao diretor, administrador ou sócio-gerente a prática de ato contrário à lei ou ao contrato social sem ofertar-lhe a oportunidade de defesa, havendo de existir prévio processo administrativo específico para esse fim, situação semelhante daquela vivenciada pelo sócio-falido, nos termos do art. 135, I, do CTN8.
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6 TEODORO JUNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 28. 7 Dispõe o art. 202, I, CTN: “O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I – o nome do devedor e, sendo o caso, o dos responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros”. 8 MACHADO, Hugo de Brito. Responsabilidade de sócios e dirigentes de pessoas jurídicas e redirecionamento da execução fiscal. São Paulo: Dialética, 2000. p. 142/143.
Logo, a responsabilidade de terceiro diante da insolvência da sociedade empresária devedora deve ser devidamente apurada e constituída antes da ação de execução fiscal (Lei nº 6.830/1980), permitindo o exercício legítimo do direito de defesa do coobrigado nos moldes propostos pela doutrina dominante.
2 POSICIONAMENTO DO STJ EM RELAÇÃO AO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL AO SÓCIO A celeuma decorrente da responsabilidade tributária de terceiro quanto à comprovação dos requisitos do CTN acarretou o posicionamento do STJ em diversas oportunidades na tentativa de uniformizar o entendimento em relação à interpretação da norma federal (art. 105, III, a e c, da CF), que pode ser sintetizado da seguinte maneira (principais julgados): I – Exigência de prova inconteste de que o débito tributário tenha decorrido de ato praticado pelo sócio, tendo em vista a responsabilidade subjetiva, exigência do dolo ou culpa (grave) nos termos dos arts. 186 c/c 927 do CC (AgRg-Ag 1.346.462/RJ – recurso repetitivo, EDcl-Ag 1150455/SC e AgRg-REsp 384.860/RS);9 II – O mero inadimplemento não configura a responsabilidade de terceiro nos moldes previstos no CTN, tendo em vista a responsabilidade patrimonial ordinária do art. 591 do CPC (AgRg-AREsp 16813/GO, REsp 9 “Processual civil e tributário. Execução fiscal. Art. 135, III, do CTN. Responsabilidade do sócio-gerente. Subjetividade. Comprovação da existência de ato praticado mediante fraude ou com excesso de poderes. Necessidade. Infração à lei. Mera inadimplência. Não caracterização. A jurisprudência deste eg. Tribunal consolidou-se quanto a ser subjetiva a responsabilidade do sócio-gerente pelo pagamento de tributo devido pela sociedade, ficando aquele obrigado pessoalmente pela dívida, somente quando restar provado ter ele agido com fraude ou excesso de poderes, não se consubstanciando em infração à lei, de per si, a mera inadimplência. Recurso especial a que se negou seguimento.”
Na situação jurídica do “débito declarado e não pago”, em que há o contribuinte que apura e transmite todas as informações levantadas antes de qualquer iniciativa do Fisco (tributos sujeitos ao lançamento por homologação), tal procedimento é suficiente para a constituição do crédito tributário, entendimento pacificado com a edição da Súmula nº 436 do STJ11. Inclusive, tal efeito está circunscrito à vinculação do débito com o sujeito passivo da obrigação tributária, pois, caso não pago o tributo pela devedora principal, não há como responsabilizar terceiro responsável, especialmente o sócio, posto que, como visto, a mera inadimplência não permite o redirecionamento da dívida a possíveis coobrigados. E, no caso de tentativa de responsabilização de terceiros por possível ato irregular (fraudulento), haverá necessi10 “Tributário. Recurso especial. Execução fiscal. Tributo declarado pelo contribuinte. Constituição do crédito tributário. Procedimento administrativo. Dispensa. Responsabilidade do sócio. Tributo não pago pela sociedade. 1. A jurisprudência desta Corte, reafirmada pela Seção inclusive em julgamento pelo regime do art. 543-C do CPC, é no sentido de que ‘a apresentação de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF, de Guia de Informação e Apuração do ICMS – GIA, ou de outra declaração dessa natureza, prevista em lei, é modo de constituição do crédito tributário, dispensando, para isso, qualquer outra providência por parte do Fisco’ (REsp 962.379, 1ª S., DJ 28.10.2008). 2. É igualmente pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa (EREsp 374.139/RS, 1ª S., DJ 28.02.2005). 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ nº 08/2008.” 11 Texto da Sumula nº 436 do STJ: “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do Fisco”.
dade de constituição do lançamento por autoridade competente, permitindo a possibilidade de controle e questionamento do ato praticado no contencioso administrativo fiscal, da forma como garantido pela Constituição Federal, sob pena da caracterização de “supressão de instância”, que é completamente abominada pelo Estado Democrático de Direito, modelo que se sobrepõe ao próprio sistema tributário nacional. Tal procedimento é similar à necessidade de lançamento do saldo remanescente nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação (art. 150, § 4º, do CTN)12, situação jurídica em que a autoridade administrativa não concorda com os valores e informações prestados pelo contribuinte via obrigação acessória, devendo o Fisco constituir título executivo extrajudicial quanto a este montante, situação essa idêntica à vinculação dos possíveis coobrigados com o débito. Por esses motivos, é possível afirmar que a presunção de certeza e legitimidade da CDA (art. 3º, parágrafo único, da Lei nº 6.830/1980)13, título executivo extrajudicial competente para lastrear a respectiva execução fiscal, somente poderá incluir terceiro responsável quando assegurado o direito de defesa 12 Prevê o art. 150, § 4º, do CTN: “O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador, expirado este prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação”. 13 “Art. 3º A dívida ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.”
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1.255.552/RS e REsp 1.101.728/SP – decisão em sede de recursos representativo da controvérsia, nos termos do art. 543-C do CPC).10
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dele, apurando-se a prática de atos irregulares (fraudulentos) em processo administrativo, e não por indícios e presunções, tendo em vista a ojeriza dos ordenamentos jurídicos contemporâneos com a presunção de culpa. Inegável, então, a importância da participação do devedor (responsável) na formação do título executivo extrajudicial que lhe é imputado, a qual foi reforçada pela declaração de inconstitucionalidade do art. 13 da Lei nº 8.620/199314, que permitia a responsabilidade pessoal dos sócios pelas contribuições sociais devidas sem a exigência de qualquer requisito de comprovação de conduta contrária: à lei, ao estatuto ou ao contrato social.
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Essa preocupação decorre do próprio princípio da segurança jurídica, que, em matéria tributária, assume maior relevância, dada a estrita legalidade e tipicidade cerrada que imperam nas relações jurídicas existentes em tal ramo do Direito, conforme lições do Professor Roque Antônio Carrazza:
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O Estado deve comprovar a culpabilidade do contribuinte, que é constitucionalmente presumido inocente. Esta é uma presunção iuris tantum que só pode ceder passo com um mínimo de provas produzidas por meio de um devido processo legal e com garantia de ampla defesa. Em síntese, o direito constitucional de ser presumido inocente acarreta para o Estado o dever incontornável de provar cabalmente a prática da infração (o ônus da prova é sempre do acusador). Não se pode exigir da defesa produção de provas referentes a fatos negativos (provas diabólicas).15 14 “Art. 13. O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada respondem solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social. Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores respondem solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.” 15 CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 442.
Em tais condições, e com supedâneo na doutrina acima, não há como exigir do contribuinte a prova negativa de sua irresponsabilidade, mesmo porque a própria presunção de veracidade do ato administrativo deve prestigiar a liberdade, e não os interesses públicos secundários do Estado (distinção de Renato Alessi), quando da análise dos atributos do ato administrativo, conforme entendimento de Gordillo segundo Maria Silvia Zanella Di Pietro16.
3 RESPONSABILIDADE DO SÓCIO NA LEI Nº 6.404/1976 E NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 A responsabilidade limitada nas sociedades de capital (sociedade anônima) ou de pessoas (Ltda.) não tem um valor absoluto por si só, ou seja, deve ser aplicada somente diante da comprovação da conduta contrária a lei; e, nos casos do sócio-quotista, acionistas e diretores da S/A, qualquer responsabilidade pessoal (suportada pelos bens pessoais) depende da comprovação do ato irregular (fraudulento). Eis o teor a previsão do art. 158 da Lei nº 6.404/1976: Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: I – dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; II – com violação da lei ou do estatuto.
No tocante à sociedade limitada, há um capítulo próprio que a regulamenta no Código Civil de 2002, devendo ser observada, nesse caso, a regra do art. 1.053, que determina a aplicação da lei de sociedade anônima no caso de lacuna, motivo pelo qual é possível concluir que a regra acima destacada incide nas duas espécies de modelo empresarial. 16 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 188.
Em termos gerais, se a sociedade limitada possuía o dinheiro para pagamento do tributo, mas o seu administrador o destinou para outras finalidades, este é responsável perante o Fisco; mas, se ela não dispunha do numerário, não é cabível a responsabilização do administrador. Para facilitar o exame da matéria, chamo a primeira situação de sonegação e a segunda, de inadimplemento. O art. 135, III, do CTN deve ser interpretado no sentido de imputar ao administrador a responsabilidade pelas obrigações tributárias da sociedade limitada em caso de sonegação, mas não do inadimplemento.17
Desse modo, é certo asseverar que a análise sistemática da norma comercial ou de direito empresarial em conjunto com a norma tributária demonstra a exigência inequívoca da comprovação do ato irregular praticado para permitir a responsabilização pessoal do sócio.
4 DISSOLUÇÃO REGULAR DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA NOS TERMOS DA LEI Nº 11.101/2005 A discussão da regularidade ou irregularidade da dissolução da sociedade empresária perpassa pela análise do teor da Súmula nº 435 do STJ, indicativo dos elementos admitidos pela jurisprudência para a caracterização desta situação jurídica, a saber: Dissolução irregular de empresa. Comunicação a órgão competente o funcionamento de domicílio fiscal. Redirecionamento da execução fiscal. Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.
Entre os posicionamentos pacíficos no STJ sobre a temática da responsabilidade tributária, citados no tópico 2 deste ensaio, destaca-se aquele referente ao mero inadimplemento, incapaz de gerar a responsabilidade do terceiro, no caso o sócio da 17 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2012. p. 479.
sociedade empresária. Não há dúvidas, portanto, de que esse Tribunal Superior admite a distinção entre a irregularidade na dissolução e a insuficiência financeira para pagamento dos tributos, ainda que decorrente da inabilidade dos seus administradores na gestão dos negócios, e desde que afastada a má-fé. Entretanto, parece sem efeito a regra sumulada, uma vez que os órgãos fazendários não admitem a baixa da inscrição da empresa sem a comprovação da quitação de todos os tributos supostamente devidos pela sociedade. Apesar disso, é possível identificar a existência de um conjunto de julgados controvertidos na 2ª Turma do STJ, quando da análise do redirecionamento da execução fiscal contra o sócio no contexto falimentar; ora entende-se que a insuficiência de bens para a liquidação do crédito tributário no processo falimentar comprova a irregularidade na condução dos negócios sociais (AgRg-REsp 1062571/RS, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamim, 2008), ou ainda, mesmo com a dissolução regular da pessoa jurídica por falência, admite-se o prosseguimento da execução contra o sócios que constam da CDA (AgRg-AG 1058751/RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, 2011) – sem esclarecer se a figuração do sócio nesse título executivo é precedida do lançamento com a oportunidade do processo administrativo para discutir-se a irregularidade da conduta. Diante dos julgados já destacados, subsistem as seguintes questões: a falência é ou não hipóteses legal de dissolução regular da sociedade empresária? Em caso positivo, essa regra de direito privado tem aplicabilidade no âmbito tributário? É possível o redirecionamento ao sócio que consta da CDA, independentemente da comprovação de conduta irregular nos termos do art. 135, I, do CTN? Antes da apresentação das respostas a essas indagações, é importante registrar a existência de decisões da mesma 2ª Turma do STJ sustentando posicionamento diverso, qual seja,
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Referida regra é esclarecida por Fábio Ulhoa Coelho:
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no sentido de que a mera falência não comprova a dissolução irregular (REsp 718.541/PR, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon), bem como que a simples quebra da empresa não admite a inclusão automática dos sócios no polo passivo do executivo fiscal, sem a comprovação da prática de atos com excesso de poderes (AgRg-AG 971741/SP, Rel. Min. Castro Meira, 2008). Em primeiro lugar, para que o sócio falido venha a ser responsabilizado pessoalmente, há a necessidade da sua permanência na administração da empresa no momento da ocorrência da dissolução (AgRg 127422/SP, STJ), bem como que haja a configuração dos poderes de gestão no momento da ocorrência dos fatos geradores dos tributos (AgRg 1005938/RS, STJ), premissas indispensáveis para a construção de qualquer tipo de raciocínio técnico sobre o assunto em pauta.
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Pelo fato de o direito tributário estar vinculado ao princípio da estrita legalidade, não deve a realidade encontrada em outros ramos do direito ser subvertida, desde que não haja previsão legal expressa em sentido contrário, mesmo porque o sistema jurídico é uno e indivisível, sendo cindível apenas para efeitos meramente didáticos18. Ou seja, a interpretação mais adequada é aquele que leva em consideração a totalidade do ordenamento jurídico.
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Dentro desse contexto, destaca-se que o CTN não caracteriza o que vem a ser considerado como dissolução irregular de sociedade. Contudo, como os termos técnicos devem ser entendidos na forma como prescritos em seu ramo jurídico próprio, assim como ocorre na distribuição da competência tributária no texto constitucional, atraindo a aplicação do art. 10919, ainda que, pela analogia do art. 108, I, ambos do referido Codex. 18 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 45/46. 19 Prevê o art. 109 do CTN: “Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para a pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus
Em outras palavras, para aplicação dos termos utilizados pelo direito tributário (ato contrário à lei, ao contrato social ou estatuto), devem-se buscar os conceitos de direito privado, a fim de aferir se há ou não a incidência da norma tributária em determinado caso concreto (art. 110 do CTN). Por outro lado, pertinente a assertiva de Eros Roberto Grau20 a respeito do princípio da livre iniciativa como cerne da ordem econômica na Constituição de 1988, mitigado pela livre concorrência, valorização do trabalho e dignidade da pessoa humana, deixando entrever o intuito da Lei nº 11.101/2005 no que diz respeito ao aspecto finalístico do instituto da falência, qual seja, a reabilitação do falido com a possibilidade de participação em novos empreendimentos, desde que não tenha sido configurada a prática de crimes falimentares (interregno mínimo de 10 anos), entendimento esse que comunga perfeitamente com a própria preservação da empresa em razão da sua função social. A propósito, vale destacar o posicionamento de Maria Rita Ferragut quanto à responsabilidade do sócio: Toda a linguagem é fundamental, pois a responsabilidade pessoal não pode ultrapassar a pessoa do infrator. Insistimos no raciocínio que vimos desenvolvendo: a pessoa física não pode ser responsabilizada nos termos do art. 135 do CTN simplesmente porque é sócia ou administradora; deverá ser plenamente comprovada sua autoria na prática do ato que lhe está sendo imputado, ou ao menos a sua decisão pela prática do ato.21 institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”. 20 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 127. 21 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002. São Paulo: Noeses, 2005. p. 135.
A falência é hipótese prevista em lei como dissolução regular de sociedades, dado que a insolvência não é por si só uma irregularidade apta a atrair a responsabilidade tributária do art. 135, I e III, do CTN, pois, caso contrário, o sócio-falido não manteria a prerrogativa de explorar ao seu talante qualquer outra atividade econômica independente do seu insucesso inicial ou anterior. De mais a mais, a ilicitude é a mesma a qualquer dos ramos do direito, pois ela surge da mesma fonte. A diferença está apenas nos efeitos, a exemplo da tipicidade em matéria penal e possibilidade de pena privativa de liberdade para essas condutas típicas, antijurídicas e culpáveis, de forma que somente com a caracterização do crime falimentar reconhecido por sentença transitada em julgado, mormente nos de natureza material, haveria a presunção quanto à ocorrência do ato irregular na forma do art. 135, caput, do CTN, até mesmo pela regra de comunicação de instância prevista no art. 935 do CC22. Importante é a observação de Fabiana Del Padre Tomé em relação aos limites da presunção em matéria tributária: Convém registrar que as presunções, no âmbito tributário, exercem importantes funções, servindo para (i) suprir deficiências probatórias, sendo empregadas nas hipóteses em que o Fisco se vê impossibilitado de provar certos fatos; (ii) garantir a eficácia à arrecadação; e 22 Art. 935 do CC: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”.
(iii) preservar a estabilidade social. O emprego das presunções no direito tributário, segundo Leonardo Sperb de Paola, está relacionado com a criação de mecanismos que dificultem a evasão fiscal e propiciem maior eficiência na arrecadação de tributos. São técnicas que, na visão de Misabel Abreu Machado Derzi, objetivam “evitar a investigação exaustiva do caso isolado, com o que reduzem os custos na aplicação da lei; dispensar a colheita de provas difíceis ou mesmo impossíveis em cada caso concreto ou aquelas que representam ingerência indevida na esfera privada do cidadão e, com isso, assegurar a satisfação do mandamento normativo”. Contrapostos, todavia, a essas funções, cuja relevância não se discute, existem direitos constitucionalmente assegurados aos contribuintes, como os princípios da legalidade, da tipicidade, da rígida discriminação constitucional das competências impositivas e da capacidade contributiva, exigindo a adoção de presunções seja realizada de forma compatível com mencionados direitos constitucionais.23
Com base nessas lições, que demonstram a aplicação de presunção em matéria tributária somente em hipótese remota e pontual, é possível afirmar que, para o caso em análise (redirecionamento de execução fiscal contra possíveis responsáveis), devem ser observados os requisitos já apresentados no item 1 deste trabalho, quanto à constituição de título executivo extrajudicial, especialmente no que se refere ao terceiro responsável, com a possibilidade do contraditório e ampla defesa no âmbito do processo administrativo fiscal. De fato, a execução concursal – que tem por finalidade satisfazer interesses creditórios nos limites dos ativos apurados (presume-se sua insuficiência perante o passivo) – é forma regular de liquidação da sociedade empresária, valendo transcrever, a esse respeito, o ponto de vista de Waldo Fazzio Junior: O interesse dos credores também não pode ser identificado com a realização de pronto dos seus haveres. Certo que o processo de insolvência não pode se protrair indefinidamente, mais importante é que a satisfação célere dos créditos deve observar os parâmetros da prelação adequada e de pagamentos satisfatórios. Prelação adequada significa equidade 23 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Op. cit., p. 140.
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Por meio dessa linha de argumentação, qualquer irregularidade somente terá efeitos tributários se devidamente comprovada no contexto da falência, uma vez que prevalece o entendimento da impossibilidade do redirecionamento da execução fiscal ao sócio falido, sob o argumento de que a falência geraria por hipótese a presunção da irregularidade da dissolução.
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no tratamento dos créditos. Pagamentos satisfatórios são aqueles que se aproximam do ideal de integral satisfação dos mesmos créditos.24
A regularidade do procedimento falimentar como modalidade de liquidação da sociedade é tão nítida, que o próprio legislador admite que o falido preserve o direito de empreender com: o pagamento dos credores privilegiados e metade dos quirografários; após 5 anos da decretação da quebra independentemente do percentual de satisfação dos créditos; e, até mesmo, na configuração de crimes falimentares, em que aquela condição é recuperada após o interregno de 10 anos. Também não há qualquer exigência na Lei nº 11.101/2005 quanto à satisfação integral dos créditos (senão desnecessária a ordem de preferência do art. 83 desse mesmo diploma legal), incluindo aqueles dos credores tributários, que também se sujeitam à execução concursal.
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Portanto, não restam dúvidas de que a falência é modo regular de dissolução das sociedades empresárias, devidamente prevista em legislação própria.
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5 POSICIONAMENTO DO STF EM RELAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA NO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL Confirmando as afirmações de Fabiana Del Padre Tomé, no sentido de que os direitos constitucionais dos contribuintes não devem ser desconsiderados pelas presunções, cumpre destacar o posicionamento do próprio Supremo Tribunal Federal (STF), mais especificamente da 2ª Turma, a partir do AgRg no Recurso 24 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 33.
Extraordinário nº 608.426/PR, que veio justamente preservar os primados e valores inseridos na Carta Magna e debatidos ao longo deste trabalho. Vide, a propósito, a ementa desse julgado: Agravo regimental. Tributário. Responsabilidade tributária. Ausência de correta caracterização jurídica por erro da autoridade fiscal. Violação do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Inexistência no caso concreto. Os princípios do contraditório e da ampla defesa aplicam-se plenamente à constituição do crédito tributário em desfavor de qualquer espécie de sujeito passivo, irrelevante sua nomenclatura legal (contribuintes, responsáveis, substitutos, devedores solidários etc.). Porém, no caso em exame, houve oportunidade de impugnação integral da constituição do crédito tributário, não obstante os lapsos de linguagem da autoridade fiscal. Assim, embora o acórdão recorrido tenha errado ao afirmar ser o responsável tributário estranho ao processo administrativo (motivação e fundamentação são requisitos de validade de qualquer ato administrativo plenamente vinculado), bem como ao concluir ser possível redirecionar ao responsável tributário a ação de execução fiscal, independentemente de ele ter figurado no processo administrativo ou da inserção de seu nome na certidão de dívida ativa (fls. 853), o lapso resume-se à declaração lateral (obiter dictum) completamente irrelevante ao desate do litígio. Agravo regimental ao qual se nega provimento.
Com efeito, na discussão desse caso concreto, o Ministro Relator Joaquim Barbosa consignou que os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa são indispensáveis na constituição do crédito tributário, prerrogativa inerente à figura jurídica do sujeito passivo (independentemente da nomenclatura adotada), sem distinguir o terceiro (responsável tributário). A excepcionalidade da responsabilidade pessoal do sócio, administrador ou não, e a modalidade subjetiva da responsabilidade não admitem o raciocínio de que as presunções têm a finalidade de desonerar a máquina administrativa – quanto à apresentação de provas difíceis, onerosas, e quiçá, impossíveis –, uma vez que o coobrigado não é o próprio sujeito passivo do débito tributário, de sorte que a sua responsabilização exige a contrapartida da comprovação da prática de ato irregular,
Por fim, é certo que o redirecionamento da execução fiscal ao sócio-falido depende de ter ele figurado no processo administrativo inaugurado com a finalidade da apuração dessa responsabilidade, com aplicação das garantias constitucional do contraditório e da ampla defesa, no qual seja demonstrada a responsabilidade pessoal do sócio-falido submetido à execução concursal pelo regular processo de liquidação da falência.
CONCLUSÃO Após os exaustivos argumentos apresentados, é possível concluir que a falência é uma hipótese regular de dissolução das sociedades, seja de capital ou de pessoas, uma vez que albergada pela lei e também porque a situação de insolvência surge de uma infinidade de hipóteses em que fica evidente ser a bancarrota não decorrente da prática de atos contrários à lei, ao estatuto ou contrato social, mas sim devido à complexidade das conjunturas financeiras e mercadológicas que permeiam a exploração de qualquer atividade econômica. Pelo fato de o direito tributário não prever em norma geral, via lei complementar (art. 146, III, da CF), aquilo que se entende por dissolução irregular de sociedade empresária ou comercial, com a finalidade de delimitar a responsabilidade do sócio-falido, imperiosa a aplicação dos conceitos arraigados no vetusto direito comercial e atual direito empresarial para tal finalidade (arts. 109 e 110 do CTN). O redirecionamento da execução fiscal ao sócio-falido depende da comprovação inequívoca dos requisitos previstos no art. 135, caput, do CTN, pela própria administração fazendária, exigindo-
-se a existência de prévio processo administrativo fiscal para apuração de responsabilidade a fim de permitir a inclusão de terceiro como coobrigado, assegurando, assim, os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, conforme posicionamento do STF, posto que a mera insolvência não é ato irregular apto a atrair a responsabilidade do sócio, sem a configuração cabal da ocorrência e demonstração no processo de falência da verificação de algum dos crimes falimentares previstos na Lei nº 11.101/2005, notadamente nas infrações de caráter material.
REFERÊNCIAS CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2012. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008. FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002. São Paulo: Noeses, 2005. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. MACHADO, Hugo de Brito. Responsabilidade de sócios e dirigentes de pessoas jurídicas e redirecionamento da execução fiscal. São Paulo: Dialética, 2000. TEODORO JUNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. São Paulo: Noesis, 2005.
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para, somente a partir de então, permitir o alcance dos efeitos previstos no rol taxativo previsto na norma tributária de exceção (art. 135 do CTN).
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Doutrina
A Regulamentação do Uso das Algemas na Execução Penal RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA Procurador de Justiça no Ministério Público do Estado da Bahia, Professor de Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Salvador – Unifacs.
Foi publicado no Diário Oficial da União do dia 27 de setembro o Decreto nº 8.858/2016, regulamentando o disposto no art. 199 da
Lei nº 7.210/1984 – Lei de Execução Penal, que trata do uso das algemas no processo de execução da pena. Segundo a norma legal, o emprego de algemas levará sempre em consideração o inciso III do caput do art. 1º e o inciso III do caput do art. 5º da Constituição Federal, que dispõem, respectivamente, sobre a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana e sobre a proibição de submissão ao tratamento desumano e degradante. Também devem ser observadas, doravante, a Resolução no 2010/2016, de 22 de julho de 2010, das Nações Unidas sobre o tratamento de mulheres presas e as medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras, as chamadas Regras de Bangkok, além do Pacto de San José da Costa Rica, que determina o tratamento humanitário dos presos e, em especial, das mulheres em condição de vulnerabilidade. Assim, observada tal normatividade, inclusive os referidos documentos internacionais, será “permitido o emprego de algemas apenas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, causado pelo preso ou por terceiros, justificada a sua excepcionalidade por escrito”, sendo expressamente vedado o seu emprego em mulheres presas em qualquer unidade do sistema penitenciário nacional durante o trabalho de parto, no trajeto da parturiente entre a unidade prisional e a unidade hospitalar e após o parto, durante o período em que se encontrar hospitalizada.
Nada obstante louvável a publicação do decreto, impressiona o tempo que se levou para regulamentar o art. 199 da Lei de Execuções Penais, o que permitiu, com muita frequência, a exposição de presos provisórios ou definitivos, homens e mulheres, conduzidos
Agora, além desse decreto, temos o art. 284 do Código de Processo Penal, que diz que “não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”. Esse dispositivo vem complementado pelo art. 292, que tem a seguinte redação: Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.
Ainda em nosso ordenamento jurídico, podemos utilizar o disposto no art. 234, § 1º, do Código de Processo Penal Militar: O emprego de força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga. Se houver resistência da parte de terceiros, poderão ser usados os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliares seus, inclusive a prisão do ofensor. De tudo se lavrará auto subscrito pelo executor e por duas testemunhas. § 1º O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o art. 242. (grifo nosso)
Vê-se, assim, que a utilização de algemas deve se restringir a casos excepcionais, quando haja, efetivamente, perigo de fuga ou resistência por parte do preso; fora daí, o uso desnecessário deste instrumento fere a dignidade da pessoa humana, representando uma ilegítima (e desautorizada) restrição a direito fundamental. A propósito, Gilberto Thums anota que “a violência simbólica se maximiza quando o réu é apresentado ao juiz precedido de aparato de segurança do Estado, algemado, e com ordens de olhar para o chão”1. 1 Sistemas processuais penais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 182.
Atente-se que a Lei de Execução Penal impõe a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios (art. 40). Logo, o uso abusivo e sem critério de algemas é conduta ilegal e, como veremos adiante, criminosa. Na verdade, mesmo que nada dispusesse a legislação ordinária, o certo é que o Texto Constitucional vedaria a utilização deste meio de força, sem que houvesse necessidade e indispensabilidade da medida, senão vejamos. A Constituição Federal é clara ao estabelecer como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana e como princípio a prevalência dos direitos humanos (arts. 1º, III, e 4º, II). Mais adiante, no art. 5º, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais, assegura “aos presos o respeito à integridade física e moral” e “que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante” (incisos III e XLIX). Ora, quando o direito interno inclui a dignidade entre os fundamentos que alicerçam o Estado Democrático de Direito, estabelece a dignidade da pessoa como ‘fonte ética’ para os direitos, as liberdades e as garantias pessoais e os direitos econômicos, sociais e culturais.2
Para José Afonso da Silva, “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”3. Segundo Étienne Vergès, “le principe de dignité de la personne humaine domine de três nombreux domaines du droit. Il a fait 2 ZISMAN, Célia Rosenthal. Estudos de direito constitucional – O princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Thomson IOB, 2005. p. 23. 3 Curso de direito constitucional positivo. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 106.
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sob algemas, independentemente de idade, sexo, condições físicas, etc.
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son apparition à l’issue de la seconde guerre mondiale dans les textes internationaux”4. Célia Rosenthal Zisman anota ainda que a consciência da dignidade do homem, a evolução da humanidade que se verifica com a aceitação da necessidade de respeito do homem como pessoa, leva ao entendimento de que a dignidade depende do respeito aos direitos fundamentais por parte de cada indivíduo da sociedade e também por parte do Estado.5 (grifo nosso)
O indiscriminado e excessivo uso das algemas viola, ademais, o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII). Nesse sentido, conferir Roberto Delmanto Junior6, que cita, a propósito, Sérgio Marcos de Moraes Pitombo: “O uso abusivo de algemas se constitui em prática atroz, bestial ou aviltante, podendo chegar à tortura”7. Canotilho explica que são
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princípios jurídicos fundamentais os princípios historicamente objectivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa ou implícita no Texto Constitucional. Pertencem à ordem jurídica positiva e constituem um importante fundamento para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo.8
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No plano internacional, podemos citar as “Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos”, documento adotado pelo 1º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime 4 Procédure pénale. Paris: LexisNexis Litec, 2005. p. 55. 5 ZISMAN, Célia Rosenthal. Op. cit., p. 39. 6 As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 67. 7 Idem, p. 114. 8 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 2002. p. 1151.
e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra, em 1955, e aprovadas pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas por meio das suas Resoluções nºs 663 C (XXIV), de 31 de julho de 1957, e 2076 (LXII), de 13 de maio de 1977. A Resolução nº 663 C (XXIV) do Conselho Econômico e Social, no item 33, recomenda, entre outras coisas, que a sujeição a instrumentos tais como algemas, correntes, ferros e coletes de força nunca deve ser aplicada como sanção. Mais ainda, correntes e ferros não devem ser usados como instrumentos de coação. Quaisquer outros instrumentos de coação só podem ser utilizados nas seguintes circunstâncias: a) como medida de precaução contra uma evasão durante uma transferência, desde que sejam retirados logo que o recluso compareça perante uma autoridade judicial ou administrativa; b) por razões médicas sob indicação do médico; c) por ordem do diretor, depois de se terem esgotado todos os outros meios de dominar o recluso, a fim de o impedir de causar prejuízo a si próprio ou a outros ou de causar estragos materiais; nestes casos o diretor deve consultar o médico com urgência e apresentar relatório à autoridade administrativa superior. (grifo nosso)
Devem ainda ser indicados dois pactos internacionais, ambos promulgados pelo Brasil, que também proclamam o respeito à integridade física e moral dos presos, o que impede a utilização indiscriminada de algemas: Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992 – art. 10) e Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, promulgado pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992 – art. 5º). Sobre a validade, no plano interno, desses documentos internacionais, veja-se o art. 5º, § 2º, da Constituição Federal: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. A propósito, Fábio Konder Comparato ensina que a tendência predominante, hoje, é no sentido de se considerar que as normas internacionais de direitos humanos, pelo fato de expressarem de
É o chamado princípio da prevalência da norma mais favorável. Segundo Perez Luño, este processo de afirmação internacional dos direitos humanos [...] abre – apesar de tudo – uma esperança em uma humanidade definitivamente livre do temor em ver constantemente violados seus direitos mais essenciais.10
Aliás, no Brasil, essa preocupação é antiga, pois o Decreto nº 4.824, de 22 de novembro de 1871, já determinava, no seu art. 28, que “o preso não será conduzido com ferros, algemas ou cordas, salvo o caso extremo de segurança, que deverá ser justificado pelo condutor”. Pergunta-se, então: caso haja abuso na utilização desse instrumento de força, sua utilização desnecessária e abusiva, qual a consequência para o sujeito que ordenou a medida odiosa? Sem dúvidas, incorre o funcionário público no crime previsto na Lei nº 4.898/1965 (arts. 3º, i, e 4º, a, b e h), delitos de ação penal pública incondicionada, com pena máxima de seis meses de detenção, além de multa, perda do cargo e inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos (art. 6º, §§ 3º, 4º e 5º). O art. 4º, h, da Lei nº 4.898/1965 estabelece ser crime de abuso de autoridade “o ato lesivo da
honra, ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal”. Comete esse delito a autoridade que age com o propósito de lesar a honra ou o patrimônio de uma pessoa, física ou jurídica. Essa lei tem dois objetivos primordiais: que a função pública seja exercida na mais absoluta normalidade democrática, no sentido de que os representantes da Administração Pública tenham um comportamento legal, portanto, sem abusos de qualquer ordem; de outro modo, que a lei também vise a proteger as garantias individuais inerentes à pessoa, aquelas mesmas postas na Constituição Federal. Na lição de Canotilho, no Estado Democrático de Direito, deve-se atentar para o princípio da proibição do excesso, impondo-se a observância de três requisitos: adequação, necessidade e proporcionalidade. Segundo o jurista português, a exigência da adequação aponta para a necessidade de a medida restritiva ser apropriada para a prossecução dos fins invocados pela lei (conformidade com os fins). A exigência da necessidade pretende evitar a adopção de medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias que, embora adequadas, não são necessárias para se obterem os fins de protecção visados pela Constituição ou a lei. Uma medida será então exigível ou necessária quando não for possível escolher outro meio igualmente eficaz, mas menos “coactivo”, relativamente aos direitos restringidos.
Para ele, “proibir o excesso não é só proibir o arbítrio; é impor, positivamente, a exigibilidade, adequação e proporcionalidade dos actos dos poderes públicos em relação aos fins que eles prosseguem”11. Norberto Bobbio afirmava que os
9 Apud STEINER, Sylvia Helena de Figueiredo. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos e sua integração ao processo penal brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 91. 10 Los derechos fundamentales. Madrid: Editorial Tecnos, 1984. p. 42 (tradução livre).
direitos do homem, a democracia e a paz são três momentos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem 11 CANOTILHO, J. J. Gomes. Op. cit., p. 455 e 1.151.
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certa forma a consciência ética universal, estão acima do ordenamento jurídico de cada Estado. [...] Seja como for, vai-se afirmando hoje na doutrina a tese de que, na hipótese de conflitos entre regras internacionais e internas, em matéria de direitos humanos, há de prevalecer sempre a regra mais favorável ao sujeito de direito, pois a proteção da dignidade da pessoa humana é a finalidade última e a razão de ser de todo o sistema jurídico.9
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reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos. Em outras palavras, a democracia é a sociedade dos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando lhes são reconhecidos alguns direitos fundamentais.
Por outro lado, continua o filósofo italiano, [...] os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.12
De toda maneira, e para concluir, não esqueçamos que, na sessão do dia 13 de agosto do ano de 2008, aprovou-se a Súmula Vinculante nº 11, nos seguintes termos:
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Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
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12 A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 01 e 05.
Doutrina
Servidão Ambiental: Singelos Comentários à Redação do Artigo 9º-A da Lei nº 6.938/1981 TAUÃ LIMA VERDAN RANGEL
Bolsista CAPES, Mestrando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais, Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo/ES, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo/ES. Autor de diversos artigos, voltados principalmente para o Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito Administrativo e Direito Ambiental.
RESUMO: Inicialmente, ao se analisar o tema colocado em debate, prima anotar que a servidão administrativa se apresenta como direito real público que permite a Administração utilizar a propriedade imóvel para viabilizar a execução de obras e serviços que atendam ao interesse público. Nesta toada, é verificável que, com a substancialização da servidão administrativa, ocorre o exercício paralelo de outro direito real em favor de um prédio, o qual passa a ser denominado de dominante, ou mesmo de uma pessoa, de modo tal que o proprietário não é mais o único a exercer os direitos dominiais sobre a res. No que toca ao instituto da servidão administrativa ambiental, este foi introduzido no ordenamento jurídico vigente pela Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de
1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências, ao introduzir o art. 9º-A à Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Consoante a dicção do dispositivo legal ora mencionado, o proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou jurídica, pode, por instrumento público ou particular ou por termo administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes, instituindo servidão ambiental.
PALAVRAS-CHAVES: Intervenção do Estado; servidão administrativa ambiental; interesse público.
SUMÁRIO: 1 Intervenção do Estado na propriedade: breve escorço histórico; 2 Ponderações introdutórias ao Instituto da Servidão Administrativa; 3 Fundamentos da servidão administrativa; 4 Breve painel à tutela e salvaguarda do meio ambiente natural: ponderações ao artigo 225 da Constituição Federal; 5 Servidão ambiental: singelos comentários à redação do artigo 9º-A da Lei nº 6.938/1981; Referências.
1 INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE: BREVE ESCORÇO HISTÓRICO Em uma primeira plana, o tema concernente à intervenção do Estado na propriedade decorre da evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo. Tal fato deriva da premissa de que o ente estatal não tem suas ações limitadas tão somente à manutenção da segurança externa e da paz interna, suprindo, via de consequência, as ações individuais. “Muito mais do que isso, o Estado deve perceber e concretizar as aspirações coletivas, exercendo papel de funda
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conotação social”1, como obtempera José dos Santos Carvalho Filho. Nesta esteira, durante o curso evolutivo da sociedade, o Estado do século XIX não apresentava essa preocupação; ao reverso, a doutrina do laissez-faire assegurava ampla liberdade aos indivíduos e considerava intocáveis os seus direitos, mas, concomitantemente, permitia que os abismos sociais se tornassem cada vez mais profundos, colocando em exposição os inevitáveis conflitos oriundos da desigualdade, provenientes das distintas camadas sociais.
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Quadra pontuar que essa forma de Estado deu origem ao Estado de bem-estar, o qual utiliza seu poder supremo e coercitivo para suavizar, por meio de uma intervenção decidida, algumas das consequências consideradas mais penosas da desigualdade econômica. “O bem-estar social é o bem comum, o bem do povo em geral, expresso sob todas as formas de satisfação das necessidades comunitárias”2, compreendendo, aliás, as exigências materiais e espirituais dos indivíduos coletivamente considerados. Com realce, são as necessidades consideradas vitais da comunidade, dos grupos, das classes que constituem a sociedade. Abandonando, paulatinamente, a posição de indiferente distância, o Estado contemporâneo passa a assumir a tarefa de garantir a prestação dos serviços fundamentais e ampliando seu espectro social, objetivando a materialização da proteção da sociedade vista como um todo, e não mais como uma resultante do somatório de individualidades. Neste sentido, inclusive, o Ministro Luiz Fux, ao apreciar o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo nº 672.579/ RJ, firmou entendimento que, 1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 24. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 711. 2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 661.
ainda que seja de aplicação imediata e incondicional a norma constitucional que estabeleça direitos fundamentais, não pode o ente estatal beneficiar-se de sua inércia em não regulamentar, em sua esfera de competência, a aplicação de direito constitucionalmente garantido.3
Desta feita, para consubstanciar a novel feição adotada pelo Estado, restou necessário que esse passasse a se imiscuir nas relações dotadas de aspecto privado. “Para propiciar esse bem-estar social, o Poder Público pode intervir na propriedade privada e nas atividades econômicas das empresas, nos limites da competência constitucional atribuída”4, por meio de normas legais e atos de essência administrativa adequados aos objetivos contidos na intervenção dos entes estatais. Com efeito, nem sempre o Estado intervencionista ostenta aspectos positivos, todavia, é considerado melhor tolerar a hipertrofia com vistas à defesa social do que assistir à sua ineficácia e desinteresse diante dos conflitos produzidos pelos distintos grupamentos sociais. Neste jaez, justamente, é que se situa o dilema moderno na relação existente entre o Estado e o indivíduo, porquanto, para que possa atender aos reclamos globais da sociedade e captar as exigências inerentes ao interesse público, é carecido que o Estado atinja alguns interesses individuais. Ao lado disso, o norte que tem orientado essa relação é o da supremacia do interesse público sobre o particular, constituindo verdadeiro postulado político da intervenção do Estado na propriedade. 3 Supremo Tribunal Federal, Acórdão proferido em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo nº 672.579/RJ: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito administrativo. Servidor público. Adicional noturno. Regime de plantão semanal. Necessário reexame da legislação infraconstitucional. Análise do contexto fático-probatório. Impossibilidade. Incidência da Súmula nº 279 do STF. Agravo regimental desprovido” (1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, Julgado em 29.05.2012, Publicado em 19 jun. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014). 4 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 662.
2 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS AO INSTITUTO DA SERVIDÃO ADMINISTRATIVA Inicialmente, ao se analisar o tema colocado em debate, prima anotar que a servidão administrativa se apresenta como direito real público que permite a Administração utilizar a propriedade imóvel para viabilizar a execução de obras e serviços que atendam ao interesse público. Nesta toada, é verificável que, com a substancialização da servidão administrativa, ocorre o exercício paralelo de outro direito real em favor de um prédio, o qual passa a ser denominado de dominante, ou mesmo de uma pessoa, de modo tal que o proprietário não é mais o único a exercer os direitos dominiais sobre a res. Com realce, insta ponderar que a servidão administrativa estabelecida em favor de prédio materializa a servidão real, ao passo que se beneficiar determinada pessoa constituirá a servidão pessoal. Afora isso, mister se faz sobrelevar que a servidão administrativa, consoante as lições apresentadas pelo festejado José dos Santos Carvalho Filho, consiste no “direito real público que autoriza o Poder Público a usar a propriedade imóvel para permitir a execução de obras e serviços de interesse coletivo”6. 5 Superior Tribunal de Justiça, Acórdão proferido em Recurso em Mandado de Segurança nº 27.428/GO: “Administrativo. Servidor público. Determinação de abertura de conta-corrente em instituição financeira pré-determinada. Recebimento de proventos. Possibilidade. Recurso ordinário improvido” (5ª T., Rel. Min. Jorge Mussi, Julgado em 03.03.2011, Publicado em 14.03.2011. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014). 6 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 717.
Não discrepa de tal entendimento Meirelles, que, com o destaque reclamado, coloca em evidência que a “servidão administrativa ou pública é ônus real de uso imposto pela Administração à propriedade particular para assegurar a realização e conservação de obras e serviços públicos ou de utilidade pública”7. Ressoando o sedimento doutrinário, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao apreciar a Apelação Cível nº 70039145073, já decidiu que a “servidão administrativa é direito real de uso, estabelecido em favor da Administração Pública ou de seus delegados, incidente sobre a propriedade particular”8. É plenamente observável, notadamente a partir do escólio adotado, que as servidões administrativas dão ao a um direito real público, eis que sua instituição decorre da atuação 7 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 688. 8 Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Acórdão proferido em Apelação Cível nº 70039145073: “Apelação cível e recurso adesivo. Servidão de eletroduto. A apelação interposta contra sentença que não foi alterada no julgamento dos embargos de declaração prescinde de ratificação para ser recebida pelo juízo de primeiro grau. Precedentes desta Corte. Ausência de previsão legal de ratificação da apelação interposta antes do julgamento dos embargos declaratórios. Recurso adesivo que se apresenta intempestivo e deserto. Não conhecimento. Servidão administrativa é direito real de uso, estabelecido em favor da Administração Pública ou de seus delegados, incidente sobre a propriedade particular. Sua instituição acarreta indenização dos prejuízos sofridos pelo particular, não se indenizando o valor total da propriedade, mas tão somente a diminuição do valor do imóvel. Acolhimento do laudo realizado pelo perito judicial, pois profissional equidistante das partes, observado o contraditório, a ampla defesa, e utilizado o método comparativo. Atualização do valor depositado para imissão provisória na posse até a data do laudo judicial, a fim de evitar o enriquecimento sem causa da demandada. Verba honorária minorada em observância ao disposto no art. 27, § 1º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, com a redação introduzida pela MP 1.997-33/1999. Rejeitaram a preliminar, não conheceram do recurso adesivo e deram parcial provimento à apelação” (3ª C.Cív., Relª Desª Matilde Chabar Maia, Julgado em 3 nov. 2011. Disponível em: <www. tjrs.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014).
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O princípio constitucional da supremacia do interesse público, como modernamente compreendido, impõe ao administrador ponderar, diante do caso concreto, o conflito de interesses entre o público e o privado, a fim de definir, à luz da proporcionalidade, qual direito deve prevalecer sobre os demais.5
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do ente estatal, com o fito primevo de atender a fatores de interesse público. Nesta senda, é observável, justamente, que o aspecto caracterizador que difere o instituto em tela da servidão decorrente do direito privado, norteada pelas disposições albergadas pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 20029, tendo como participantes da relação jurídica pessoas de iniciativa privada, descansa justamente na presença do ente estatal.
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Além disso, o núcleo fundamental de ambos os institutos ora mencionados se alicerçam no mesmo paradigma. Neste alamiré, em que pese a identidade de núcleos, perceptíveis são os aspectos distintivos da servidão privada e da servidão administrativa, quais sejam: a) a servidão administrativa busca atender a interesse público, ao passo que a servidão privada, respaldada pelo Estatuto Civil, visa a satisfazer interesse privado; b) a servidão administrativa sofre o influxo dos ditames e princípios do direito público, ao passo que as servidões privadas estão sujeitas aos cânones e corolários do direito privado. Constitui verdadeiro ônus real imposto a um imóvel, particular ou público, no interesse de satisfazer o interesse público. Ao lado disso, com efeito, cuida salientar que, em sede de servidão administrativa, o imóvel serviente poderá ser tanto o privado, o que ocorre comumente, ou mesmo o público. Afora isso, em se tratando de limitação singular, a constituição do instituto em tela é passível de indenização ao proprietário.
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3 FUNDAMENTOS DA SERVIDÃO ADMINISTRATIVA Ao se analisar a servidão administrativa, mister se faz aludir que o fundamento da instituição da intervenção do Estado na propriedade privada encontra descanso na supremacia do interesse público sobre o interesse privado, tal como a função social 9 Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014.
da propriedade, claramente delineada no art. 5º, inciso XXIII10, e art. 170, inciso III11, ambos da Constituição Federal de 1988. Assim, o sacrifício da propriedade cede lugar ao interesse público que inspira e norteia a atuação interventiva do ente estatal. Inexiste uma disciplina normativa federal específica acerca das servidões administrativas, sendo comumente utilizada a norma insculpida no art. 40 do Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 194112, que dispõe sobre desapropriações por utilidade pública. Com esforço interpretativo, contudo, podemos entender que o titular do poder de instituir as servidões é o Poder Público (que na lei é o expropriante) e que, em alguns casos, será observado o procedimento da mesma lei para a instituição do ônus real.13
São exemplos mais comuns da servidão administrativa a instalação de redes elétricas e a implantação de gasodutos e oleodutos em áreas privadas para a execução de serviços públicos. A acepção clássica do instituto em discussão envolve 10 Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br>. Acesso em: 26 out. 2014: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [Omissis] XXIII – a propriedade atenderá a sua função social”. 11 Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [Omissis] III – função social da propriedade”. 12 Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br>. Acesso em: 26 out. 2014: “Art. 40. O expropriante poderá constituir servidões, mediante indenização na forma desta lei”. 13 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 719.
No caso, não está em questão apenas a destinação futura da área, mas o uso atual, já efetivado, segundo os apelantes. O uso de imóvel para escoamento do esgoto municipal pode ser considerado como servidão administrativa, pois, nessa hipótese, não se efetiva a transferência da propriedade, configurando-se apenas um ônus especial ao bem. Sendo considerada servidão administrativa, embora os proprietários continuem com o domínio e a posse, cabível indenização se comprovado prejuízo decorrente da restrição de uso da propriedade. Nessas circunstâncias, não há como considerar a parte autora carecedora de ação por falta de interesse processual, pois necessita de tutela de utilidade jurídica. Sentença desconstituída. Deram parcial provimento ao apelo. Unânime. (TJRS, Apelação Cível nº 70037997202, 4ª C.Cív., Rel. Des. Alexandre Mussoi Moreira, Julgado em 13.06.2012) (destacou-se)
Ementa: Apelação cível. Servidão de eletroduto. Passagem de linha de transmissão de energia elétrica. Controvérsia quanto ao valor da indenização. A servidão administrativa enseja ao proprietário do imóvel o direito à justa e prévia indenização em dinheiro. Servidão administrativa é direito real de uso, estabelecido em favor da Administração Pública ou de seus delegados, incidente sobre a propriedade particular. Sua instituição acarreta indenização dos prejuízos efetivamente sofridos pelo particular, não se indenizando o valor total da propriedade. Laudo pericial realizado judicialmente que não apresenta irregularidades, devendo ser utilizado para fins de arbitramento da indenização pelos prejuízos sofridos pelo proprietário do imóvel serviente. Negaram provimento à apelação. (TJRS, Apelação Cível nº 70036651628, 3ª C.Cív., Relª Desª Matilde Chabar Maia, Julgado em 02.08.2012) (grifou-se) Ementa: Apelação. Indenização. Desapropriação indireta. Prolongamento de ruas projetado. Canalização de esgoto. Servidão administrativa.
“Algumas vezes as servidões administrativas são suportadas pelos particulares ou pelo Poder Público sem qualquer indenização, dado que sua instituição não lhes causa qualquer dano, nem lhes impede o uso normal da propriedade”14, a exemplo do que se verifica na afixação de placa de denominação de rua ou de gancho para sustentar fios de rede energia elétrica dos trólebus 14 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 891.
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a nomeada servidão de trânsito, isto é, aquela que provoca a utilização do solo, promovendo a redução da área útil do imóvel do proprietário. Farta é a jurisprudência, inclusive, que explicita a natureza de servidões administrativas as hipóteses apresentadas anteriormente, consoante se infere:
Ementa: Apelação cível. Condomínio. Ação de indenização. Corte de grama. Servidão administrativa de passagem. Ônus do proprietário do imóvel. 1. A servidão administrativa constitui-se em restrição ao uso da propriedade, imposta pelo Poder Público ao particular (neste caso) com o objetivo de resguardar interesse da coletividade, regendo-se ou por acordo firmado entre as partes, ou por sentença judicial. 2. No caso dos autos, houve acerto amigável formalizado através de Escritura Pública, da qual se extrai que os proprietários foram indenizados pela Petrobras pelos prejuízos (presentes e futuros) decorrentes da mencionada servidão, ocasião em que outorgaram plena e irrevogável quitação, declarando nada mais ter a reclamar “a qualquer título”. 3. Como se não bastasse os termos da quitação outrora outorgada, os proprietários permaneceram utilizando a área para circulação (inclusive para trânsito de veículos), devendo, portanto, suportarem os ônus decorrentes de sua conservação. Apelo desprovido. (TJRS, Apelação Cível nº 70046929196, 19ª C.Cív., Rel. Des. Eugênio Facchini Neto, Julgado em 27.03.2012) (grifou-se)
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em parede de prédio situado em determinados cruzamentos, bem como com a colocação de postes nas calçadas por concessionárias de serviço público. Com efeito, não se verifica nas situações explicitadas anteriormente qualquer interferência, por parte do ente estatal, que possa produzir prejuízos ao proprietário particular, não cabendo, portanto, em teoria, verba indenizatória.
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4 BREVE PAINEL À TUTELA E SALVAGUARDA DO MEIO AMBIENTE NATURAL: PONDERAÇÕES AO ARTIGO 225 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
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Em uma primeira plana, ao lançar mão do sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso I do art. 3º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 198115, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, salienta que o meio ambiente consiste no conjunto de condições, leis e influências de ordem química, física e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de fatores abióticos, provenientes de ordem química e física, e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas formas de seres viventes. Consoante os ensinamentos apresentados por José Afonso da Silva, considera-se meio ambiente “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”16. 15 Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. 16 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 20.
Nesta senda, ainda, Fiorillo17, ao tecer comentários acerca da acepção conceitual de meio ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada a fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com os componentes que cercam o ser humano, os quais são de imprescindível relevância para a sua existência. O Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.029/ AM, salientou, com bastante pertinência, que: [...] o meio ambiente é um conceito hoje geminado com o de saúde pública, saúde de cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz a Constituição, é por isso que estou falando de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é imbricado, é conceitualmente geminado com o próprio desenvolvimento. Se antes nós dizíamos que o meio ambiente é compatível com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a partir da Constituição, tecnicamente, que não pode haver desenvolvimento senão com o meio ambiente ecologicamente equilibrado. A geminação do conceito me parece de rigor técnico, porque salta da própria Constituição Federal.18
É denotável, desta sorte, que a constitucionalização do meio ambiente no Brasil viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que concerne, especificamente, às normas de proteção ambien17 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 77. 18 Supremo Tribunal Federal, Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.029/AM: “Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Federal nº 11.516/2007. Criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da Associação Nacional dos Servidores do Ibama. Entidade de classe de âmbito nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista Parlamentar. Inconstitucionalidade dos arts. 5º, caput, e 6º, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional. Modulação dos efeitos temporais da nulidade (art. 27 da Lei nº 9.868/1999). Ação direta parcialmente procedente” (Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, Julgado em 8 mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014).
Primeiramente, em decorrência do tratamento dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio ambiente foi içado à condição de direito de todos, presentes e futuras gerações. É encarado como algo pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma, não se admite o emprego de qualquer distinção entre brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não polui19 THOMÉ, Romeu. Manual de direito ambiental: conforme o novo Código Florestal e a Lei Complementar nº 140/2011. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2012. p. 116. 20 Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
ção. O art. 225, devido ao cunho de direito difuso que possui, extrapola os limites territoriais do Estado brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ, destacou que: A preocupação com o meio ambiente – que hoje transcende o plano das presentes gerações, para também atuar em favor das gerações futuras [...] tem constituído, por isso mesmo, objeto de regulações normativas e de proclamações jurídicas, que, ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de cada Estado soberano, projetam-se no plano das declarações internacionais, que refletem, em sua expressão concreta, o compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda a Humanidade.21
O termo “todos”, aludido na redação do caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988, faz menção aos já nascidos (presente geração) e ainda àqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo aos primeiros zelar para que esses tenham 21 Supremo Tribunal Federal, Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ: “Ação direta de inconstitucionalidade. Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/1998). Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa. Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga. Crime ambiental (Lei nº 9.605/1998, art. 32). Meio ambiente. Direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225). Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade. Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade. Proteção constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII). Descaracterização da briga de galo como manifestação cultural. Reconhecimento da inconstitucionalidade da lei estadual impugnada. Ação direta procedente. Legislação estadual que autoriza a realização de exposições e competições entre aves das raças combatentes. Norma que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna. Inconstitucionalidade” (Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, Julgado em 26 maio 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014).
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tal. Tal fato decorre da premissa de que os robustos corolários e princípios norteadores foram alçados ao patamar constitucional, assumindo colocação eminente, ao lado das liberdades públicas e dos direitos fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira, ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira dimensão, insculpir na redação do art. 225, conceder amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria de normas constitucionais, com elaboração de capítulo especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”19. Nesta toada, ainda, é observável que o caput do art. 225 da Constituição Federal de 198820 está abalizado em quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto, dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura o substrato de edificação da ramificação ambiental.
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à sua disposição, no mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato encontra como arrimo a premissa de que foi reconhecido ao gênero humano o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em ambiente que permita desenvolver todas as suas potencialidades em clima de dignidade e bem-estar. Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou seja, que ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o meio ambiente é um direito público subjetivo. Desta feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e protegido pelos organismos sociais e pelas instituições estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenunciável que se impõe, objetivando sempre o benefício das presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao Poder Público quanto à coletividade considerada em si mesma.
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Assim, decorrente de tal fato, produz efeito erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos, incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito público interno ou externo, ou mesmo de direito privado, como também ente estatal, autarquia, fundação ou sociedade de economia mista. Impera, também, evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a possibilidade de quantificar quantas são as pessoas atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão robusta de um poder deferido, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas em um sentido mais amplo, atribuído à própria coletividade social. Com a nova sistemática entabulada pela redação do art. 225 da Carta Maior, o meio ambiente passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a lesões perpetradas contra o ser humano para se agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de uso
comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser esmiuçado está atrelado ao meio ambiente como vetor da sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente; ao vincular a espécie humana, está se tratando do bem-estar e condições mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies). Por derradeiro, o quarto pilar é a corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever geral de se responsabilizar por todos os elementos que integram o meio ambiente, assim como a condição positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente, tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e preservar, asseverando que o meio ambiente permaneça intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar, que permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio ambiente, trabalhando com as premissas de desenvolvimento sustentável, aliando progresso e conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o meio ambiente com sua ação. Além disso, em razão da referida corresponsabilidade, são titulares do meio ambiente os cidadãos da presente e da futura gerações. No que concerne ao meio ambiente natural, cuida salientar que tal faceta é descrita como ambiente natural, também denominado de físico, o qual, em sua estrutura, agasalha os fatores abióticos e bióticos, considerados como recursos ambientais. Nesta esteira de raciocínio, oportunamente, cumpre registrar, a partir de um viés jurídico, a acepção do tema em destaque, o qual vem disciplinado pela Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências; em seu art. 2º, inciso IV, frisa que “recurso ambiental: a atmosfera, as
Consoante Rebello Filho e Bernardo, o meio ambiente natural “é constituído por todos os elementos responsáveis pelo equilíbrio entre os seres vivos e o meio em que vivem: solo, água, ar atmosférico, fauna e flora”24. Nesta senda, com o escopo de fortalecer os argumentos apresentados, necessário se faz colocar em campo os paradigmas que orientam a concepção recursos naturais como componentes que integram a paisagem, desde que não tenham sofrido maciças alterações pela ação antrópica a ponto de desnaturar o seu aspecto característico. Trata-se, com efeito, de uma conjunção de elementos e fatores que mantêm uma harmonia complexa e frágil, notadamente em razão dos avanços e degradações provocadas pelo ser humano. Ao lado do esposado, faz-se carecido pontuar que os recursos naturais são considerados como tal em razão do destaque concedido pelo ser humano, com o passar dos séculos, conferindo-lhes valores de ordem econômica, social e cultural. Desta feita, tão 22 Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. 23 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Op. cit., p. 78. 24 REBELLO FILHO, Wanderley; BERNARDO, Christianne. Guia prático de direito ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998. p. 19.
somente é possível a compreensão do tema a partir da análise da relação homem-natureza, eis que a interação entre aqueles é preponderante para o desenvolvimento do ser humano em todas as suas potencialidades. Patente se faz ainda, em breves palavras, mencionar a classificação dos recursos naturais, notadamente em razão da importância daqueles no tema em testilha. O primeiro grupo compreende os recursos naturais renováveis, que são os elementos naturais, cuja correta utilização propicia a renovação, a exemplo do que se observa na fauna, na flora e nos recursos hídricos. Os recursos naturais não renováveis fazem menção àqueles que não logram êxito na renovação, ou, ainda, quando conseguem, esta se dá de maneira lenta em razão dos aspectos estruturais e característicos daqueles, como se observa no petróleo e nos metais em geral. Por derradeiro, os denominados recursos inesgotáveis agasalham aqueles que são “infindáveis”, como a luz solar e o vento. Salta aos olhos, a partir das ponderações estruturadas, que os recursos naturais, independentemente da seara em que se encontrem agrupados, apresentam como elemento comum de caracterização o fato de serem criados originariamente pela natureza. Nesta linha, ainda, de dicção, cuida assinalar que o meio ambiente natural encontra respaldo na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 225, caput e § 1º, incisos I, III e IV. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; [Omissis]
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águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora”22. Nesta esteira, a expressão fatores abióticos abriga a atmosfera, os elementos afetos à biosfera, as águas (inclusive aquelas que se encontram no mar territorial), pelo solo, pelo subsolo e pelos recursos minerais; já a expressão fatores bióticos faz menção à fauna e à flora, como bem assinala Fiorillo23. Em razão da complexa interação entre os fatores abióticos e bióticos é que ocorre o fenômeno da homeostase, consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e o meio em que se encontram inseridos.
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III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.25
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Ora, como bem manifestou o Ministro Carlos Britto, ao apreciar a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.540, “não se erige em área de proteção especial um espaço geográfico simplesmente a partir de sua vegetação, há outros elementos. Sabemos que fauna, flora, floresta, sítios arqueológicos concorrem para isso”26. Verifica-se, assim, que o espaço
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25 Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br>. Acesso em: 26 out. 2014. 26 Supremo Tribunal Federal, Acórdão proferido na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.540: “Meio ambiente. Direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225). Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade. Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade. Necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio da coletividade, conflitos intergeneracionais. Espaços territoriais especialmente protegidos (CF, art. 225, § 1º, III). Alteração e supressão do regime jurídico a eles pertinente. Medidas sujeitas ao princípio constitucional da reserva de lei. Supressão de vegetação em área de preservação permanente. Possibilidade de a Administração Pública, cumpridas as exigências legais, autorizar, licenciar ou permitir obras e/ou atividades nos espaços territoriais protegidos, desde que respeitada, quanto a estes, a integridade dos atributos justificadores do regime de proteção especial. Relações entre economia (CF, art. 3º, II, c/c o art. 170, VI) e ecologia (CF, art. 225). Colisão de direitos fundamentais. Critérios de superação desse estado de tensão entre valores constitucionais relevantes. Os direitos básicos da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos (RTJ 164/158, 160-161). A questão da precedência do direito à preservação do meio ambiente: uma limitação constitucional explícita
à atividade econômica (CF, art. 170, VI). Decisão não referendada. Consequente indeferimento do pedido de medida cautelar. a preservação da integridade do meio ambiente: expressão constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental considerado este em seu aspecto físico ou natural. A questão do desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II) e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225): o princípio do desenvolvimento sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia. O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a
uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações. O art. 4º do Código Florestal e a Medida Provisória nº 2.166-67/2001: um avanço expressivo na tutela das áreas de preservação permanente. A Medida Provisória nº 2.166-67, de 24.08.2001, na parte em que introduziu significativas alterações no art. 4º do Código Florestal, longe de comprometer os valores constitucionais consagrados no art. 225 da lei fundamental, estabeleceu, ao contrário, mecanismos que permitem um real controle, pelo Estado, das atividades desenvolvidas no âmbito das áreas de preservação permanente, em ordem a impedir ações predatórias e lesivas ao patrimônio ambiental, cuja situação de maior vulnerabilidade reclama proteção mais intensa, agora propiciada, de modo adequado e compatível com o Texto Constitucional, pelo diploma normativo em questão. Somente a alteração e a supressão do regime jurídico pertinente aos espaços territoriais especialmente protegidos qualificam-se, por efeito da cláusula inscrita no art. 225, § 1º, III, da Constituição, como matérias sujeitas ao princípio da reserva legal. É lícito ao Poder Público – qualquer que seja a dimensão institucional em que se posicione na estrutura federativa (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) – autorizar, licenciar ou permitir a execução de obras e/ou a realização de serviços no âmbito dos espaços territoriais especialmente protegidos, desde que, além de observadas as restrições, limitações e exigências abstratamente estabelecidas em lei, não resulte comprometida a integridade dos atributos que justificaram, quanto a tais territórios, a instituição de regime jurídico de proteção especial (CF, art. 225, § 1º, III)” (Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, Julgado em 1º set. 2005, Publicado no DJe em 3 fev. 2006, p. 00014. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 26: out. 2014).
Diante do exposto, o meio ambiente, em sua acepção macro e especificamente em seu desdobramento natural, configura elemento inerente ao indivíduo, atuando como sedimento à concreção da sadia qualidade de vida e, por extensão, ao fundamento estruturante da República Federativa do Brasil, consistente na materialização da dignidade da pessoa humana. Ao lado disso, tal como pontuado algures, a Constituição da República estabelece, em seu art. 225, o dever de o Poder Público adotar medidas de proteção e preservação do ambiente natural. Aliás, tal dever é de competência político-administrativa de todos os entes políticos, devendo, para tanto, evitar que os espaços de proteção ambiental sejam utilizados de forma contrária à sua função – preservação das espécies nativas – e, ainda, promover ostensiva fiscalização desses locais.
5 SERVIDÃO AMBIENTAL: SINGELOS COMENTÁRIOS À REDAÇÃO DO ARTIGO 9º-A DA LEI Nº 6.938/1981 Oportunamente, cuida assinalar que o instituto da servidão administrativa ambiental foi introduzido no ordenamento jurídico vigente pela Lei nº 12.651, de 25 de maio de 201227, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e
27 Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014.
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territorial especialmente protegido do direito constitucional ao meio ambiente hígido e equilibrado, em especial no que atina à estrutura e funções dos diversos e complexos ecossistemas. Nessa esteira de exposição, as denominadas “unidades de conservação”, neste aspecto de afirmação constitucional, enquanto instrumentos de preservação do meio ambiente natural, configuram áreas de maciço interesse ecológico que, em razão dos aspectos característicos naturais relevantes, recebem tratamento legal próprio, de maneira a reduzir a possibilidade de intervenções danosas ao meio ambiente.
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dá outras providências, ao introduzir o art. 9º-A Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 198128, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Consoante a dicção do dispositivo legal ora mencionado, o proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou jurídica, pode, por instrumento público ou particular ou por termo administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes, instituindo servidão ambiental.
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Assim, cuida ponderar que, em sintonia com as ponderações de Édis Milaré, “a servidão ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente e envolve, basicamente, a renúncia voluntária do proprietário rural ao direito de uso, exploração ou supressão dos recursos naturais existentes em determinado prédio particular”29. Quadra frisar, ainda, que a própria legislação estabelece, de maneira clara, a estrutura e os requisitos da servidão ambiental, sendo interessante destacar que a servidão pode ser onerosa ou gratuita, temporária ou perpétua, conforme haja ou não remuneração e haja ou não fixação de tempo de vigência30. Em relação aos caracteres do instituto em comento, é interessante frisar que deve obedecer ao prazo mínimo de 15 (quinze) anos na servidão ambiental tem-
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28 Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. 29 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda., 2014. p. 882. 30 Neste sentido: Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. “Art. 9º-B. A servidão ambiental poderá ser onerosa ou gratuita, temporária ou perpétua”.
porária31, não sendo possível aplicá-la às áreas de preservação permanente e de reserva legal32. Há que se observar, ainda, que a limitação ao uso ou exploração da vegetação da área sob a servidão instituída em relação aos recursos florestais deve ser, no mínimo, a mesma afixada para reserva legal33. Igualmente, quadra anotar que a servidão ambiental deve ser averbada no registro de imóveis competente. Em se tratando de compensação de reserva legal, a servidão deve ser averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos. Convém, também, destacar que é vedada, durante o prazo de vigência da servidão ambiental, a alteração da destinação da área, nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites de propriedade. Assim, em que pesem as ressalvas cabíveis, insta salientar que a servidão ambiental, tal como ocorre com a servidão comum, afixa um ônus ao prédio serviente. Porém, os aspectos de diferenciação daquelas se dá em dois aspectos distintos, a saber: quanto à titularidade e quanto à origem. No primeiro aspecto, 31 Neste sentido: Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. “Art. 9º-B. [Omissis] § 1º O prazo mínimo da servidão ambiental temporária é de 15 (quinze) anos”. 32 Neste sentido: Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. “Art. 9º-B. [Omissis] § 2º A servidão ambiental perpétua equivale, para fins creditícios, tributários e de acesso aos recursos de fundos públicos, à Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN, definida no art. 21 da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000”. 33 Neste sentido: Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. “Art. 9º-A. [Omissis] § 3º A restrição ao uso ou à exploração da vegetação da área sob servidão ambiental deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva Legal”.
REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014 ______. Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de 34 Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014.
Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014. ______. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 24. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda., 2014. REBELLO FILHO, Wanderley; BERNARDO, Christianne. Guia prático de direito ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 26 out. 2014. SALLES, José Carlos de Moraes. A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009. THOMÉ, Romeu. Manual de direito ambiental: conforme o novo Código Florestal e a Lei Complementar nº 140/2011. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2012.
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o beneficiário da servidão comum é outro imóvel, nomeado de dominante, ao passo que na servidão ambiental é vago, indeterminado, representado pelas presentes e futuras gerações humanas. No segundo aspecto, a servidão comum pode ser legal ou voluntária, enquanto que na servidão ambiental será sempre voluntária. Consoante o § 2º do art. 9º-B da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 198134, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, a servidão perpétua equivale, para fins creditícios, tributários e de acesso aos recursos de fundos públicos, à Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). Conquanto o mecanismo não se encontre totalmente desenvolvido, salta aos olhos que o instituidor da servidão ambiental busca e tem direito a benefícios econômicos indiretos, personificados na concessão de crédito em situação mais vantajosa ou pelo enquadramento tributário diferenciado.
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Doutrina
A Reforma Previdenciária e os Reflexos na Pensão por Morte
conforme vem disposto no § 4º do art. 60 da Constituição Federal, ou seja, não será objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir (a) a forma federativa de Estado, (b) o voto direto, secreto, universal e periódico, (c) a separação dos Poderes e (d) os direitos e as garantias individuais, é justamente este último aspecto que analisamos no presente estudo.
SÉRGIO REIS GUSMÃO
Se existe limitação às propostas de emendas constitucionais apresentadas ao poder constituinte, resta sabermos então se a PEC 287/2016 encontra algum impedimento consoante o disposto no § 4º do art. 60 da Carta Magna.
Advogado, Mestre em Direito Previdenciário pela PUC/SP.
SUMÁRIO: Introdução; A pensão por morte; Critério material; Critério temporal; Critério quantitativo; Critério espacial; Risco protegido; Conclusão.
INTRODUÇÃO Iniciamos nosso trabalho dizendo que a atual Constituição que hoje vige no Brasil foi promulgada em 5 de outubro de 1988, e que, após entrar em vigor, inúmeras foram as alterações ao texto originário. A atual reforma apresentada pelo Presidente da República Michel Temer, conhecida como PEC 287/2016, ou Reforma da Previdência Social, visa uma ampla reforma no Sistema de Seguridade Social, em especial no Regime Geral de Previdência Social. Quando se apresenta uma emenda constitucional, o que se busca a bem da verdade é a reforma de certos aspectos do Texto Constitucional sem necessidade de convocação de uma nova assembleia constituinte. Porém, nem tudo pode ser alterado no Texto Constitucional por meio de emenda constitucional, e essas normas que não podem ser objeto de deliberação recebem o nome “cláusulas pétreas”,
Antes de mais nada, cabe aqui fazermos uma análise se a proposta de emenda constitucional apresentada pelo atual Presidente da República tenta de alguma forma suprimir determinado conteúdo expresso na Carta Constitucional voltado à proteção dos direitos sociais, ou seja, se a proposta de emenda constitucional é uma tentativa de retroceder ou mesmo usurpar os direitos sociais e se direito social pode ser tipificado como uma garantia individual. Neste sentido, Thais Maria Riedel de Resende Zuba1, citando texto do Professor Ingo Wolfgang Sarlet, diz que o princípio da vedação do retrocesso decorre implicitamente do ordenamento constitucional brasileiro, extraído das seguintes normas constitucionais: o princípio do Estado Democrático e Social de Direito (em que se destaca o princípio da segurança jurídica, a que necessariamente assenta a proteção da confiança e a manutenção de patamar mínimo de segurança contra medidas retroativas e atos retrocessivos em geral, considerando que as normas constitucionais expressamente dedicadas à proteção contra a retroatividade, onde se inclui o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito, que são insuficientes para alcançar todas as situações que 1 ZUBA, Thais Maria Riedel de Resende. O direito previdenciário e o princípio da vedação do retrocesso. São Paulo: LTr, 2013. p. 117.
A PENSÃO POR MORTE A PEC 287/2016 visa alterar os arts. 37, 40, 109, 149, 167, 195, 201 e 203 da Constituição, estabelece regras de transição sobre o Sistema de Seguridade Social e dá outras providências, porém, é objeto de nosso estudo aqui a pretensa alteração dos dispositivos que se referem à pensão originada pela morte do segurado da Previdência Social.
Será que o projeto de reforma tal qual foi apresentado não está de certa forma retirando ou reduzindo direitos sociais, tornando assim inviável a entrega de prestações que se dizem positivas, mas na verdade são negativas, já que se colocam devidas prestações abaixo de um nível mínimo de proteção devida? Será que direitos sociais não são garantias individuais? E como fica a questão do princípio da dignidade humana se o benefício for reduzido ao mínimo que não garanta a subsistência? Espera-se ao final trazer resposta a referidos questionamentos ou, na pior das hipóteses, fazer com que o leitor reflita sobre o tema, pois é de muita relevância e que atinge milhões e milhões de brasileiros.
Ao discorrer sobre os efeitos jurídicos da morte no Direito Previdenciário, Heloisa Derzi assim leciona: No Direito Previdenciário, de igual modo, a morte, ao lado de outros riscos ou contingências sociais, é evento passível de produzir efeitos que merecem a proteção previdenciária. Desde sempre o ser humano esteve sujeito a certos eventos danosos, que a História nos mostra, foram combatidos pelos próprios homens, reunidos em grupo, que, com a ajuda do Direito e seu instrumental normativo, ordenavam os fatos sociais. A Previdência Social, vinculada ao mundo do trabalho e com raízes no direito privado, tem função essencialmente reparadora frente aos riscos que ameaçam a cessação ou a redução de ganho do trabalhador. O estudo da Previdência Social, que adotou a técnica do seguro na sua estrutura conceptiva, não dispensa o seu forte conteúdo político, que
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integram uma noção mais ampla de segurança jurídica); o princípio da dignidade da pessoa humana (o qual determina a satisfação de uma existência condigna, ou seja, da proteção dos direitos sociais, por meio de prestações positivas que serão inviáveis se colocadas abaixo de um nível mínimo de proteção a eles); o princípio da máxima eficácia e efetividade dos direitos fundamentais (art. 5º, § 1º, da CRFB/1988), que também abrange a maximização da proteção dos direitos fundamentais; que também otimiza a eficácia e efetividade do direito a segurança jurídica, reclamando a maior proteção possível em detrimento às medidas de caráter retrocessivo. (Grifo nosso)
Para Heloisa Derzi, antepondo-se à vida, a morte sempre foi, é e continuará sendo o maior enigma da existência humana, o mais pujante desafio colocado perante o ser humano, a quem só é dado existir se e enquanto não for por ela colhido. Explica-nos de igual modo a Antropologia que o homem não é apenas um ser político, segundo a famosa definição de Aristóteles, em razão de viver na polis, mas também no sentido de viver com o “espírito dos ancestrais”, que é o fundamento unitário de todas as culturas. Estas se formaram em razão da não aceitação da destruição definitiva e total da vida humana, já que o fato morte é muito dramático para o ser humano, difícil de ser aceito como a ruptura radical de um ciclo de vida, e que traz muitos efeitos e consequências jurídicas aos dependentes do falecido.
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expressa a luta pelo reconhecimento dos direitos sociais, bem como a sua relevante função econômico-social, fundada na distributividade de renda entre os membros da sociedade, que é um dos mecanismos mais eficientes para a “redução das desigualdades sociais e regionais” proposto no art. 3º da Carta Magna como um dos objetivos fundamentais do Estado Brasileiro. O instrumental jurídico do seguro tradicional é montado para autuar nas situações danosas, agindo de forma eminentemente reparadora ou indenizatória. Quando se atinge o modelo institucional de Seguridade Social, as ações protetoras passam a ter finalidades distintas, atuando de forma preventiva ou mesmo reabilitadora. Desse modo, a técnica do seguro tradicional deixa de ser o instrumento jurídico adequado à proteção, e os elementos conceituais são reconstruídos para atender às novas funções.2
A morte caracteriza um risco social como evento gerador de necessidade social3, pois a morte do segurado acarreta uma necessidade social aos seus dependentes. O benefício pensão por morte é devido exclusivamente aos dependentes do segurado, sendo que a hipótese de incidência não ocorre se o segurado não deixar dependentes.
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Para o Professor Miguel Horvath Junior, trata-se de benefício exclusivo dos dependentes do segurado. Em princípio, não há discordância de tal afirmativa, tanto que o art. 16 da Lei nº 8.213/1991 diz serem beneficiárias do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, as seguintes pessoas:
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Art. 16. [...] I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; 2 DERZI, Heloisa Hernandez. Os beneficiários da pensão por morte. São Paulo: Lex, 2004. p. 36. 3 HORVATH JUNIOR, Miguel. Direito previdenciário. 10. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2014. p. 399.
II – os pais; III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave.
Da forma como vem disposto no art. 16 da Lei nº 8.213/1991, para que se faça jus ao benefício pensão por morte, há necessidade de que a pessoa que faça o requerimento do benefício demonstre ser dependente do segurado falecido. Mas tal qual vem disposto na PEC 287/2016, parece-me que outra conotação está sendo discutida, senão vejam como está inserido o texto em referido projeto: “Art. 201. [...] V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e aos dependentes”. Como se pode observar, o Texto Constitucional ainda em vigor (isto porque ainda não foi aprovada a PEC 287) preceitua que a Previdência Social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. Vejam bem, tal qual vem disposto no projeto de reforma, não existe a necessidade de o cônjuge ou companheiro comprovar dependência econômica do falecido, pois esta resta-se presumida; de toda sorte, entendemos também que não há necessidade de comprovação de dependência econômica dos filhos não emancipados, de qualquer condição, desde que sejam menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidos ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; bem como de acordo com o § 2º do mesmo artigo, ou seja, não há necessidade de referida prova: o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante prévia declaração do segurado falecido e desde
Ocorre que, da forma como vem disposto no atual texto da PEC, ao que parece, há uma revogação tácita do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, pois o cônjuge e companheiro não mais são dependentes do segurado falecido. Digo isso com base na terminologia utilizada “e aos”, pois, se a pensão será devida ao cônjuge ou companheiro “e aos” dependentes, de duas uma, ou os primeiros deixaram de serem considerados como dependentes ou abriu-se a possibilidade de mais dependentes que não aqueles previstos no art. 16 da referida Lei. Note-se que a dependência a que se refere o texto, para fins previdenciários, trata-se de dependência econômica.
CRITÉRIO MATERIAL Trata-se de um benefício que vem normatizado nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, e é um benefício destinado aos dependentes do segurado que era aposentado ou não, mas que mantinha a qualidade de segurado quando veio a falecer. A norma previdenciária, como leciona Heloisa Derzi, ao discorrer sobre o conceito genérico de morte – a negação da vida, o contrário da vida, ou, ainda, a ausência de vida –, refere-se à morte real e à morte presumida como evento fortuito que faz nascer a proteção social para os dependentes do segurado. Dessa forma, a morte é o fato relevante que permeia a estrutura do benefício em estudo. Em síntese, o critério material4 do benefício pensão por morte pode ser assim expresso: se ocorrer a morte, real ou presumida, 4 DERZI, Heloisa Hernandez. Os beneficiários da pensão por morte. São Paulo: Lex, 2004. p. 186.
do segurado, e se este deixar dependentes à data do óbito – não discutiremos aqui a hipotética situação em que um segurado eventualmente vier a falecer e deixar a esposa ou companheira grávida –, então deve ser entregue a prestação previdenciária, pois a pensão por morte tem como critério material sua hipótese de incidência deixar dependentes.
CRITÉRIO TEMPORAL De acordo com a regra ora vigente, a pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; do requerimento, quando requerida até trinta depois deste; ou da decisão judicial, no caso de morte presumida. Vale ressaltar que, com a ocorrência do óbito, inicia-se o prazo para reivindicar o benefício, consoante também se inicia o prazo prescricional. Contudo, esse prazo não corre quando se trata de beneficiários que não tenham capacidade civil para reivindicar seus direitos. Tal qual pretende o PEC, a pensão por morte do segurado, homem ou mulher, será concedida ao cônjuge ou companheiro e aos seus dependentes, nos prazos que dispõe o art. 77 e 78 da Lei nº 8.213/1991. Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em parte iguais. § 1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar. § 2º O direito à percepção de cada cota individual cessará; I – pela morte do pensionista; II – para filho, pessoa a ele equiparada ou irmão, de ambos os sexos, ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência;
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que comprovada a dependência econômica na forma prevista e estabelecida no regulamento da Previdência Social.
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III – para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez; IV – pelo decurso do prazo de recebimento de pensão pelo cônjuge, companheiro ou companheira, nos termos do § 5º. V – para cônjuge ou companheiro: a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas b e c; b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado; c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável: 1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade; 2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade; 3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade; 4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade; 5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade;
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6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade.
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§ 2º-A. Serão aplicados, conforme o caso, a regra contida na alínea a ou os prazos previstos na alínea c, ambas do inciso V do § 2º, se o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho, independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável. § 2º-B. Após o transcurso de pelo menos 3 (três) anos e desde que nesse período se verifique o incremento mínimo de um ano inteiro na média nacional única, para ambos os sexos, correspondente à expectativa de sobrevida da população brasileira ao nascer, poderão ser fixadas, em números inteiros, novas idades para os fins previstos na alínea c
do inciso V do § 2º, em ato do Ministro de Estado da Previdência Social, limitado o acréscimo na comparação com as idades anteriores ao referido incremento. § 3º Com a extinção da parte do último pensionista a pensão extinguir-se-á. [...] § 5º O tempo de contribuição a Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) será considerado na contagem das 18 (dezoito) contribuições mensais de que tratam as alíneas b e c do inciso V do § 2º. Art. 78. Por morte presumida do segurado, declarada pela autoridade judicial competente, depois de 6 (seis) meses de ausência, será concedida pensão provisória, na forma desta Subseção. § 1º Mediante prova do desaparecimento do segurado em consequência de acidente, desastre ou catástrofe, seus dependentes farão jus à pensão provisória independentemente da declaração e do prazo deste artigo. § 2º Verificado o reaparecimento do segurado, o pagamento da pensão cessará imediatamente, desobrigados os dependentes da reposição dos valores recebidos, salvo má-fé.
É oportuno ressaltar que perde o direito à pensão por morte, após o trânsito em julgado, o condenado pela prática de crime de que tenha dolosamente resultado na morte do segurado. Veja-se que, pelo que se extrai do comando normativo, perde o direito à pensão aquele dependente que dolosamente tenha causado ou contribuído para a morte do segurado. Isso significa dizer, pelo menos é o que extraímos da legislação, que, enquanto não transitar em julgado a decisão que condenar o dependente por crime doloso que resultou na morte do segurado, aquele pode receber o benefício em apreço. Também perde o direito à pensão por morte o cônjuge, o companheiro ou a companheira se for comprovada, a qualquer tempo, a simulação ou fraude no casamento ou na união estável, ou a formalização desses com o fim exclusivo de constituir benefício previdenciário.
Uma das alterações propostas pela PEC diz respeito ao critério quantitativo, ou seja, o percentual da pensão por morte, ou o valor da pensão por morte. O texto que vigora é de que o valor mensal da pensão por morte é de 100% (cem por cento) do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento. Muito se discutiu se a ausência do cônjuge exclui ou não o direito à pensão por morte, mas o que determina a lei é que, no caso de ausência do cônjuge, companheiro ou companheira, só se fará jus ao benefício a partir de sua habilitação e mediante prova de dependência econômica. O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes do segurado, e, no caso de existência de mais de um pensionista, o valor a ser pago será rateado entre todos em partes iguais. Consoante dispõe o § 1º do art. 77 da Lei nº 8.213/1991, “reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito a pensão cessar”, e esta será paga até que venha a ocorrer alguma das hipóteses previstas na legislação e que permite a cessão do benefício, o que pode ser aferido nos arts. 77 e 78 descritos no tópico anterior. O que pretende a PEC a bem da verdade é o mesmo que vinha originalmente na Medida Provisória nº 664/2014, ou seja, reduzir o valor do benefício pago aos dependentes do segurado com a extinção de cotas após a perda da qualidade de dependente – como se de fato esse fosse o grande problema da Previdência Social – o que sofreu alteração ao ser convertida na Lei nº 13.135/2015, senão vejam como ficou o texto: Art. 201. [...] [...]
§ 16. Na concessão do benefício de pensão por morte, cujo valor será equivalente a uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento), acrescida de cotas individuais de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o limite de 100% (cem por cento) do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito, observado o disposto nos §§ 7º-B e 7º-C, não será aplicável o disposto no § 2º deste artigo e será observado o seguinte: I – as cotas individuais cessarão com a perda da qualidade de dependente e não serão reversíveis aos demais beneficiários; e II – o tempo de duração da pensão por morte e as condições de cessação das cotas individuais serão estabelecidos conforme a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, nos termos da lei.
Vejam que, segundo vem disposto na PEC, as principais mudanças referentes à pensão por morte diz respeito ao valor do benefício baseado em sistema de cotas, com previsão de valor inicial de pensão diferenciado conforme o número de dependentes, na verdade pretende a desvinculação do valor do benefício ao salário-mínimo, isso significa que o valor da pensão poderá ser inferior ao salário-mínimo, ela também proíbe o acúmulo de duas pensões por morte, pelo beneficiário cônjuge ou companheiro, oriundas de qualquer regime previdenciário (próprio ou geral), não mais reverterá as cotas individuais de pensão ao dependente que permanecer. Conforme está disposto na PEC sobre as mudanças ocorridas nas regras de cálculo da pensão por morte, o benefício de pensão por morte terá um valor equivalente a uma cota familiar de 50% do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por incapacidade permanente, acrescida de 10% para cada dependente (mínimo de 60%), até o limite de 100%. Ou seja, se um segurado aposentado vier a falecer deixando esposa e dois filhos, o valor do benefício corresponderá a 80% do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse
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CRITÉRIO QUANTITATIVO
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aposentado por incapacidade permanente (50% acrescido de 3 cotas individuais de 10%). Em que pese a pretensa reforma, as regras de pagamento de pensão por morte a dependentes de segurados que faleceram antes da reforma não sofreram qualquer mudança, isto porque trata-se de ato jurídico perfeito e acabado, portanto é mantido o direito adquirido ao recebimento da pensão por morte segundo as regras vigentes no ato do falecimento. Nota-se: no ato do falecimento e não do requerimento. Apenas as pensões decorrentes de óbito ocorrido a partir da promulgação da emenda serão calculadas pelas novas regras. É bom que fique claro que a perda da qualidade de dependente à cota individual não mais será revertida para os demais dependentes se assim houver. Também cessará com a perda da qualidade de dependente, pois as cotas só serão revertidas se a data do óbito for anterior à promulgação da emenda.
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Uma das grandes dúvidas talvez seja se há possibilidade de acumular a pensão com outro benefício previdenciário, daí podemos explicar o seguinte: não haverá acúmulo de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro e de pensão por morte com aposentadoria. Contudo, será possível optar pelo benefício mais vantajoso.
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Porém, as acumulações já existentes não serão revertidas, pois as regras existentes antes da entrada em vigor da emenda constitucional deverão ser respeitadas. O cônjuge ou companheiro que trabalha poderá receber pensão por morte do segurado falecido junto com sua remuneração, pois as vedações referem-se à acumulação de pensões por morte ou pensão e aposentadoria. Não há restrição ao recebimento conjunto de salário ou remuneração pelo trabalhador com a pensão por morte. Da mesma forma, um filho menor de idade cujos pais
eram segurados poderá receber duas pensões por morte, pois a vedação ao recebimento de duas pensões por morte alcança apenas o cônjuge ou companheiro do segurado falecido. Atualmente o valor global do benefício não poderá ser inferior ao salário-mínimo – contudo diante da reforma pretendida pela PEC, isto poderá ocorrer, já que está sendo suprimida do texto a remissão ao § 2º do art. 201 da Carta Magna – nem superior ao limite máximo do salário-de-contribuição. A pensão por morte é um dos poucos benefícios previdenciários que podem ser acumulados com o recebimento de outro; logo, a pensão por morte de companheiro ou cônjuge poderá ser acumulada com a pensão por morte de filho.
CRITÉRIO ESPACIAL Consoante lições de Daniel Pulino5, a lei previdenciária não delimita o território em que deva ocorrer a materialidade; todavia, o autor faz um esclarecimento de que a lei previdenciária brasileira não terá aplicação para todas e quaisquer contingências sociais – e associadas a estas, quando for o caso, as situações de necessidade social, a carência e a causa – que ocorram, indistintamente, ao redor do mundo, prevendo o pagamento de prestações a todos os sujeitos acometidos por esses eventos. A proteção previdenciária se processa mediante filiação prévia dos sujeitos beneficiários. Notadamente, embora os eventos descritos no critério material possam ocorrer em qualquer ponto do espaço, a outorga das prestações previdenciárias restringe-se aos sujeitos protegidos e filiados ao regime geral. Como explica Daniel Pulino, hipóteses de extraterritorialidade que justifiquem a incidência da lei brasileira sobre relações de 5 PULINO, Daniel. A aposentadoria por invalidez no direito positivo brasileiro. São Paulo: LTr, 2001. p. 69.
RISCO PROTEGIDO A morte do segurado filiado ao regime geral de previdência social e que mantém qualidade de segurado é evento apto a provocar o nascimento da relação jurídica previdenciária e que irá culminar com a concessão do benefício pensão por morte, caso o falecido tenha deixado dependentes conforme previsto no art. 16 e seus incisos da Lei nº 8.213/1991, ou cônjuge ou companheiro e aos dependentes tal qual pretende o dispositivo contido na PEC 287/2016. A pensão por morte tem como critério material da sua hipótese de incidência o verbo morrer, deixando dependentes do regime geral. Perceba-se que, se houver a morte sem dependentes, não há que se falar no benefício previdenciário, mas tão somente em caso de existência de dependentes, que são para este tipo de benefício os beneficiários do sistema6. O risco morte certamente deixa reflexos na vida socioeconômica, na medida em que, havendo dependentes do segurado falecido, necessidades sociais poderão surgir em decorrência da ausência ou diminuição de recursos financeiros para a família do segurado. Percebe-se, assim, que o risco a ser protegido não são as necessidades geradas aos dependentes do segurado que vier a falecer e que, ao tempo do falecimento, estava filiado ao sistema previdenciário e tinha qualidade de segurado, pois o desaparecimento (morte) do segurado pode deixar a sua família ou pessoas que dele dependiam desamparadas, à míngua de recursos para prover o seu sustento. Esse, portanto, é o objeto 6 BALERA, Wagner; D’AVILA, Thiago Fernandes. Fundamentos da seguridade social. São Paulo: LTr, 2015. p. 125.
de proteção – o evento morte –, uma vez que o desequilíbrio financeiro pode causar à família do segurado a consequência geradora de necessidade e que permita a outorga da prestação de pensão por morte. É interessante ressaltar aqui que o Regime Geral de Previdência Social tem por finalidade a proteção de determinado risco social previamente estabelecido no ordenamento jurídico. Ou seja, não se alberga o estado de necessidade em si mesmo, mas sim aquele risco, escolhido pelo legislador como sendo o mais suscetível para atender ao princípio da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços conforme postulado no art. 194, inciso II, da Lei Maior7. Logo, havendo a materialização do risco morte, por se tratar de sistema contributivo, conforme já mencionado, mesmo se tratando da morte de um segurado afortunado, uma vez preenchidos os requisitos filiação e qualidade de segurado ao tempo do falecimento, a prestação previdenciária deve ser outorgada aos dependentes deste, se existentes.
CONCLUSÃO O bem-estar disciplinado no art. 3º da Constituição Federal quer significar o bem de todos, logo, nas palavras do Professor Wagner Balera8, política pública constitucionalmente válida será, portanto, o mesmo que dizer política erigida segundo os critérios baseados no bem-estar e na justiça sociais. Daí pode-se dizer que todos aqueles que renegam ou criam obstáculos à implementação dos direitos sociais inscritos na Carta Constitucional estarão violando a justiça social. 7 Idem, p. 127. 8 BALERA, Wagner. Lições preliminares de direito previdenciário. 2. ed. São Paulo: Quartier Latim, 2010. p. 25.
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trabalho que se estabelecem ou se desenvolvem fora do Brasil, por consequência, farão com que os trabalhadores que nelas figurem sejam também colhidos pela lei previdenciária brasileira.
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Será que a PEC tal qual foi formulada viola valores sociais? Se positivo, certamente essa norma não deva ingressar no universo jurídico brasileiro, pois contraria objetivos fundamentais da República. No entanto, seguindo ensinamentos do Professor Wagner Balera9, ainda que venham, serão repelidas pela ordem jurídica, por meio do devido processo legal. É forçoso concluir que a autêntica proteção social, que, nos tempos modernos, assume a fórmula da seguridade social, transformou-se em elemento indispensável para a garantia das melhores condições de vida de tantos quantos trabalhadores e dependentes.
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A história tem demonstrado, e isso não é segredo para ninguém, basta que pesquise em qualquer livro de história ou por meio de qualquer outro meio de pesquisa, inclusive pela Internet, que durante a grave crise econômica que os Estados Unidos da América enfrentava, quando então era chefe da nação o presidente Roosevelt, este deu como resposta a criação de programas sociais, e, por incrível que pareça, o Brasil atravessa por uma crise semelhante, e a resposta dada pelo atual presidente é justamente o contrário, ou seja, cortar e reduzir direitos sociais.
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Feitas tais considerações, podemos concluir que os planos de proteção social devem não apenas ser mantidos, como, principalmente, expandidos, a fim de que se atinja o ideal da universalidade da cobertura e do atendimento, como comanda o art. 194, parágrafo único, inciso I, da Constituição de 1988, segundo ensina o Professor Wagner Balera10. Direito social é um direito relacionado à dignidade humana, por isso um direito e uma garantia individual de cada ator social e que, a nosso ver, não poderão ser objetos de deliberação por meio de proposta de emenda constitucional se o objetivo for retirar ou reduzir direitos.
9 Idem, p. 39. 10 Idem, p. 54.
Acórdão na Íntegra
Tribunal Superior do Trabalho Processo nº TST-RR 1856-34.2010.5.02.0465 Acórdão 3ª Turma
RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 – TRANSCENDÊNCIA A aplicação do princípio da transcendência ainda não foi regulamentada no âmbito desta Corte, providência que se faz necessária em face do comando do art. 2º da Medida Provisória nº 2.226/2001 (DOU 05.09.2001). Recurso de revista não conhecido. TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL – ALCANCE – ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA E DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DE DOENÇA PROFISSIONAL (Arguição de violação dos arts. 5º, V, X e XXXV, da CF, 3º, 8º, 9º, 444, 477, §§ 1º e 2º, e 769 da CLT, 320 e 843 do CCB e 5º da LINDB, contrariedade à OJ da SBDI-1 270 e divergência jurisprudencial). É certo que o art. 840 do CCB veicula mandamento de extrema importância para a manutenção do equilíbrio social. Com efeito, o instituto da transação permite que quaisquer pessoas capazes possam, mediante concessões mútuas, solucionar ou prevenir litígios que porventura recaiam sobre um objeto que, embora certo no plano da existência, esteja acobertado pelo manto da incerteza jurídica. De fato, o efeito elementar da transação confunde-se com sua principal virtude – a conversão da res dubia em situação segura para as partes e para a comunidade. Entretanto, se a amplitude material das cláusulas do acordo extrajudicial encontra limite na própria legislação civil, que dirá na trabalhista. Note-se que o art. 841 do CCB restringe o objeto do ajuste aos direitos patrimoniais de caráter puramente privado. Logo, estão fora do alcance da transação os direitos extrapatrimoniais e aqueles que,
embora privados, interessem à ordem social. No caso dos autos, a transação envolveu, sob a ótica da empresa, a concessão de valor monetário em troca de que a trabalhadora se abstivesse de reclamar pela estabilidade prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/1991 e na cláusula 28ª do ACT, bem como por quaisquer danos provenientes de lesões originadas nos movimentos repetitivos realizados no ambiente de trabalho. Todavia, conquanto a estabilidade acidentária e a reparação pelos prejuízos decorrentes de doenças profissionais realmente possam ser convertidas em pecúnia e, por consequência, repercutir no plano patrimonial privado do empregado acidentado, há de se observar que a gênese de tais direitos encontra-se no núcleo essencial dos direitos sociais, constituindo-se em garantias indisponíveis aos trabalhadores. Assim, a compensação financeira pela violação de garantias protetivas à integridade física e emocional do trabalhador não deve ser objeto de transação extrajudicial e particular. Entendimento contrário admitiria a legitimidade de o empregado nutrir a expectativa de auferir vantagem monetária em troca da concessão de parcela de seu direito (indivisível) de laborar em ambiente seguro. Possível consequência mediata dessa perspectiva seria o próprio desestímulo dos sindicatos profissionais na defesa de tais garantias, enfraquecendo a força normativa do art. 8º, III, da CF. Conclui-se, portanto, que reclamada e reclamante, mesmo assistida pelo Sindicato profissional, invadiram direitos alheios à esfera de disposição dos trabalhadores. Acrescente-se que o valor transacionado – equivalente a pouco mais de doze meses de salários – encontrava-se claramente destinado a compensar apenas o rompimento do contrato, antecipando, em pecúnia, o decurso do período estabilitário, e não eventuais danos morais e patrimoniais decorrentes do próprio acidente de trabalho (doença profissional), o que denota equívoco ou erro substancial da trabalhadora – para não se falar em dolo do empregador – ao aceitar os termos do acordo. Caracterizado o erro essencial ou substancial tanto em relação ao objeto, quanto no tocante ao alcance material das cláusulas do instrumento de quitação, entende-se nula a transação no concernente ao alcance da quitação dada, nos termos dos arts. 848 e 849 do CCB. Recurso de revista conhecido por violação do art. 843 do CCB e provido. Conclusão: Recurso de revista parcialmente conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST-RR 1856-34.2010.5.02.0465, em que é recorrente Maria Isabel
Coelho de Aragão e são recorridas Colgate-Palmolive Comercial Ltda. e Interamericana Companhia de Seguros Gerais. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, pelo acórdão às fls. 446/450, negou provimento ao recurso da reclamante. A reclamante interpõe recurso de revista, pela petição às fls. 453/474, quanto aos temas: transcendência, nos termos do art. 896-A da CLT; transação extrajudicial – alcance – estabilidade acidentária e danos morais e materiais decorrentes de doença profissional, por violação dos arts. 5º, V, X e XXXV, da CF, 3º, 8º, 9º, 444, 477, §§ 1º e 2º, e 769 da CLT, 320 e 843 do CCB, 5º da LINDB, contrariedade à OJ da SBDI-1 270 e divergência jurisprudencial. Recurso admitido pelo despacho às fls. 476/479. Contrarrazões apresentadas às fls. 482/498. Sem remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do RITST. É o relatório.
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VOTO
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De início, importante considerar que o recurso de revista será analisado de acordo com a sistemática consolidada no período anterior à vigência da Lei nº 13.015/2014, tendo em vista que o acórdão recorrido foi publicado em 05.05.2011. ADMISSIBILIDADE – PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Satisfeitos os pressupostos referentes à tempestividade (acórdão publicado em 05.05.2011 – fl. 451; apelo revisional protocolizado
em 12.05.2011 – fl. 453), à representação (procuração à fl. 10) e ao preparo (desnecessário), passo à análise dos pressupostos intrínsecos do recurso.
1 CONHECIMENTO – PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 Transcendência A reclamante invoca a transcendência do seu recurso, em relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social e jurídica, nos termos do art. 896-A da CLT. Todavia, a aplicação do princípio da transcendência ainda não foi regulamentada no âmbito desta Corte, providência que se faz necessária em face do comando do art. 2º da Medida Provisória nº 2.226/2001 (DOU 05.09.2001). Não conheço.
1.2 Transação extrajudicial – alcance – estabilidade acidentária e danos morais e materiais decorrentes de doença profissional O Tribunal Regional registrou: Da carência de ação por falta de interesse de agir. A reclamante alegou na inicial que em virtude das condições precárias de trabalho a que foi submetida na reclamada: ambiente de trabalho agressivo com elevados índices de ruído, além do trabalho em posições incômodas e antiergonômicas, realizando movimentos intensos e repetitivos, adquiriu diversos males ocupacionais (tenossinovite e tendinite, síndrome do túnel do carpo, hérnia discal e varizes), por culpa da reclamada, já que não se preocupava com as regras de Medicina e Segurança do Trabalho, causando-lhe prejuízos, uma vez que se en-
contra debilitada fisicamente, razão pela qual pleiteia indenização por danos materiais, ou seja, pensão mensal vitalícia no valor de 50% do valor do salário que recebia na época em que adquiriu as moléstias do trabalho até completar o tempo para aposentadoria por idade, além de indenização por danos morais no valor de 200 salários mínimos.
Lei nº 8.213/1991, que gostariam de ser desligados da empresa com a obtenção de indenizações, realizou reunião na sede do Sindicato no dia 26.09.1997, às 18h30min, em que foi comunicada proposta de acordo para os empregados que manifestassem interesse em se desligarem da Kolynos. Asseverou também que o Sindicato:
Entretanto, a reclamada juntou aos autos o Instrumento Particular de Transação e Quitação (fls. 120/121), pelo qual a reclamante e a reclamada, de comum acordo, com base em reunião realizada pelo Sindicato da categoria profissional em que foi apresentada proposta de acordo para os empregados que manifestassem interesse em se desligarem da empresa, que ocorreu com a reclamante, firmaram o presente instrumento. Vale ressaltar que nas suas cláusulas 1ª e 3ª constou expressamente que:
“alertou-me expressamente que o desligamento e consequente concessão de benefícios implicará na outorga, à Kolynos, de ampla e geral quitação com relação à aludida estabilidade provisória e, também com relação a todos e quaisquer eventuais danos que eu possa ter adquirido em função de meu trabalho na Kolynos, inclusive qualquer eventual lesão por esforços repetitivos e respectivos danos morais” (Grifei).
“Cláusula 1ª: Kolynos pagará à Maria Izabel Coelho de Aragão a quantia de R$ 5.300,00, (cinco mil e trezentos reais), correspondente a 12,3 salários, a título de indenização pelo período de estabilidade no emprego e relativos à indenização por eventuais danos que possam ter resultado à estabilidade no emprego e relativos à indenização por eventuais danos que possam ter resultado à Maria Izabel Coelho de Aragão durante o período de trabalho na Kolynos, aí incluídos, a mero título exemplificativo, qualquer eventual lesão por esforços repetitivos e respectivos danos morais.” (Grifei)
Por fim, ainda declarou que:
“Cláusula 3ª: Através do pagamento supra, Maria Izabel Coelho de Aragão dá a Kolynos a mais ampla, geral e irrevogável quitação quanto ao contrato de trabalho mantido entre as partes, bem como quanto ao período de estabilidade no emprego referido na cláusula anterior e a quaisquer eventuais danos sofridos no curso do aludido contrato de trabalho, sem necessidade de emissão de documento ou recibo adicional, de tudo ficando Kolynos exonerada, para nada mais Maria Izabel Coelho de Aragão reclamar da empresa, seja a que título for, em juízo ou fora dele, reconhecendo Maria Izabel Coelho de Aragão, que foram amplamente indenizados e quitados todos os direitos em questão.” (Grifei)
E se não bastasse referidos documentos, a própria reclamante escreveu de próprio punho a declaração de fls. 122, em que afirmou que aceitava a proposta de acordo para desligamento da empresa, mesmo tendo sido advertida quanto à estabilidade provisória prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/1991 e cláusula 28ª do Acordo Coletivo de Trabalho vigente, de forma irrevogável e dando quitação do todo o período referente à estabilidade e a qualquer dano que possa ter resultado durante o período de trabalho. Como se vê, não se pode aceitar a tese autoral de que não houve participação do sindicato e que a reclamante não sabia as consequências do que estava assinando. Além do mais, não foi sequer mencionado ou provado que a autora tenha sido coagida a aceitar tal acordo. De modo que, houve quitação das verbas aqui pleiteadas e por isso está caracterizada a carência de ação por falta de interesse de agir. Correta a decisão de origem, que fica mantida. (fls. 447/450)
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Se não bastasse isso, a reclamante assinou a declaração de fl. 123, afirmando para fins de direito que o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Petroquímicas, Farmacêuticas, Tintas e Vernizes, Plásticos, Resinas Sintéticas, Explosivos e Similares do ABCD, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que é o Sindicato representativo de sua categoria profissional, atendendo a solicitações de vários empregados portadores da estabilidade provisória prevista no art. 118 da
“Mesmo alertado (a) das condições acima, declaro ter interesse em ser desligado da Kolynos mediante o pagamento no valor de R$ 5.300,00 (cinco mil e trezentos reais), a título de indenização e opto pelo valor pecuniário dos benefícios de assistência médica e cesta-básica, no valor de R$ 1.374,00 (mil trezentos e setenta e quatro reais), pagos também a título de indenização”. (Grifei)
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A reclamante sustenta que a transação extrajudicial que importa em resilição bilateral do contrato de trabalho, ante a adesão do empregado a plano de desligamento voluntário, deve ficar limitada à quitação apenas das parcelas e valores constantes do recibo correspondente, não implicando, conforme entendimento jurisprudencial expresso na OJ da SBDI-1 270, em renúncia de outros direitos decorrentes da relação de emprego. Invoca violação dos arts. 5º, V, X e XXXV, da CF, 3º, 8º, 9º, 444, 477, §§ 1º e 2º, e 769 da CLT, 320 e 843 do CCB, 5º da LINDB, contrariedade à OJ da SBDI-1 270 e divergência jurisprudencial. Ao exame.
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Trata-se de ação reparatória ajuizada na Justiça Comum, em que a autora persegue a condenação da primeira reclamada ao pagamento de indenizações pelo período de estabilidade acidentária e por danos morais e materiais decorrentes de doença profissional, bem como a condenação solidária das demandadas ao adimplemento de compensação relativa ao “Seguro de Vida e de Acidentes Coletivos”.
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O TRT entendeu pela inexistência do interesse de agir, uma vez que a empregadora juntou aos autos instrumento particular de transação pelo qual a demandante, em troca de valor pecuniário, declarou a quitação ampla, geral e irrevogável do contrato de trabalho. Nessa ordem, o Tribunal manteve a sentença, que julgou extinto o processo, sem julgamento do mérito. O quadro fático desenhado no acórdão noticia que o Sindicato profissional, motivado pelas solicitações de vários empregados portadores do direito à estabilidade acidentária, realizou reunião, na sede da entidade, a fim de comunicar a proposta de acordo da Kolynos aos trabalhadores que desejassem ser desligados da empresa. O que resultou no ajuste particular feito entre autora e ré, no qual restou estabelecido o pagamento de indenizações pelo período de estabilidade e pelos danos morais e materiais
decorrentes de lesão por esforço repetitivo, assistência médica e cesta-básica. A reclamante declarou, tanto no Instrumento Particular de Transação e Quitação, quanto em documento de próprio punho que aceitava o acordo para desligamento da empresa, mesmo com a advertência do Sindicato de sua categoria, de que a avença implicaria a outorga de ampla e geral quitação de todo o período de estabilidade, assim como de qualquer prejuízo que pudesse ser resultado do período de trabalho em favor da reclamada. Incontestáveis as circunstâncias fáticas do caso, notadamente o teor da transação e a extensão da participação do Sindicato profissional nas tratativas, bem como a validade formal do instrumento, conclui-se que o deslinde da controvérsia passa pela investigação do alcance material do acordo extrajudicial ora analisado. É certo que o art. 840 do CCB veicula mandamento de extrema importância para a manutenção do equilíbrio social. Com efeito, o instituto da transação permite que quaisquer pessoas capazes possam, mediante concessões mútuas, solucionar ou prevenir litígios que porventura recaiam sobre um objeto que, embora certo no plano da existência, esteja acobertado pelo manto da incerteza jurídica. De fato, o efeito elementar da transação confunde-se com sua principal virtude – a conversão da res dubia em situação segura para as partes e para a comunidade. Entretanto, se a amplitude material das cláusulas do acordo extrajudicial encontra limite na própria legislação civil, que dirá na trabalhista, em que o princípio da igualdade das partes é relativizado tanto na interpretação das cláusulas, como em seu alcance, diante do princípio protetivo. Note-se que no âmbito civil, o art. 841 do CCB restringe o objeto do ajuste aos direitos patrimoniais de caráter puramente privado. Logo, estão fora do alcance da transação os direitos extrapatrimoniais e aqueles que, embora privados, interessem à ordem social.
Não podem as partes transigir quanto aos direitos não patrimoniais [...]. Não podem ser objeto de transação questões que envolvam matéria de ordem pública, nem direitos de que os transatores não possam dispor [...]. (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011. p. 466)
Carlos Roberto Gonçalves, citando Orlando Gomes, dispõe que: “[...] todo direito de que o titular não pode dispor é insuscetível de transação (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v.3, 2016. p. 583)”. No caso dos autos, a transação envolveu, sob a ótica da empresa, a concessão de valor monetário em troca de que a trabalhadora se abstivesse de reclamar pela estabilidade prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/1991 e na cláusula 28ª do ACT, bem como por quaisquer danos provenientes de lesões originadas nos movimentos repetitivos realizados no ambiente de trabalho. Todavia, conquanto a estabilidade acidentária e a reparação pelos prejuízos decorrentes de doenças profissionais realmente possam ser convertidas em pecúnia e, por consequência, repercutir no plano patrimonial privado do empregado acidentado, há de se observar que a gênese de tais direitos encontra-se no núcleo essencial dos direitos sociais, pelo que a compensação financeira pela violação de garantias protetivas à integridade física e emocional do trabalhador não pode ser objeto de transação extrajudicial e particular. Entendimento contrário admitiria a legitimidade de o empregado nutrir a expectativa de auferir vantagem monetária em troca da concessão de parcela de seu direito (indivisível) de laborar em ambiente seguro. Possível consequência mediata dessa perspectiva seria o próprio desestímulo dos sindicatos profissionais na defesa de tais garantias, enfraquecendo a força normativa do art. 8º, III, da CF.
Conclui-se, portanto, que reclamada e reclamante, mesmo assistida pelo Sindicato profissional, invadiram direitos alheios à esfera de disposição dos trabalhadores. Acrescente-se que o valor transacionado – equivalente a pouco mais de doze meses de salários – encontrava-se claramente limitado, pelo próprio valor, apenas o rompimento antecipado do contrato, buscando compensar, em pecúnia, o decurso do período estabilitário, e não eventuais danos morais e patrimoniais decorrentes do próprio acidente de trabalho (doença profissional), o que denota equívoco ou erro substancial da trabalhadora – para não se falar em dolo do empregador – ao aceitar os termos do acordo. Erro substancial é, sabidamente, a falsa noção da realidade do bem que constitui um negócio jurídico. Leva à anulabilidade do negócio jurídico por não corresponder ao querer subjetivo do contratante. Justamente diante da realidade das relações de trabalho, o mero prejuízo decorrente das avenças faz presumir o erro (art. 468, da CLT). Ora, na transação são feitas concessões recíprocas. Quid pro quo. Abre-se mão de um direito em troca de uma vantagem. Foi o caso da reclamante abrir mão da estabilidade acidentária em troca de quantia pecuniária correspondente, com admissão do rompimento imediato do contrato. Foi disso que abriu mão. Sua vantagem foi o recebimento do valor dessa estabilidade sem precisar trabalhar. E para a empresa, a vantagem que recebeu em troca do pagamento efetuado foi a liberação do posto de trabalho. Concessões recíprocas. A cláusula que evidentemente exorbitou essa avença e não representou nenhuma vantagem para a reclamante, assim não fazendo materialmente parte do acordo, fruto de evidente erro de avaliação da parte mais fraca na relação, foi a quitação dos danos morais e materiais corres-
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Nessa linha de pensamento, é a lição de Caio Mário da Silva Pereira:
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pondentes à doença que levou à caracterização do acidente de trabalho e à estabilidade acidentária. Caracterizado o erro essencial tanto em relação ao objeto quanto no tocante ao alcance material das cláusulas do instrumento de quitação, entende-se nula a transação no concernente ao alcance da quitação dada, nos termos dos arts. 848 e 849 do CCB, restringindo-se-a apenas à quitação do período estabilitário. Conheço do recurso de revista, por violação do art. 843 do CCB.
2 MÉRITO 2.1 Transação extrajudicial – Alcance – Estabilidade acidentária e danos morais e materiais decorrentes de doença profissional
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Como consequência lógica do conhecimento do recurso de revista, por violação do art. 843 do CCB, dou-lhe provimento para afastar a premissa de quitação ampla, geral e irrevogável do contrato de trabalho e determinar a remessa dos autos a uma das Varas do Trabalho da 2ª Região, para que prossiga no julgamento dos pedidos declinados na inicial, como entender de direito.
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ISTO POSTO Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista somente quanto à transação extrajudicial – estabilidade acidentária e danos morais e materiais decorrentes de doença profissional, por violação do art. 843 do CCB, e, no mérito, dar-lhe provimento para afastar a premissa de quitação ampla, geral e irrevogável do contrato de trabalho e determinar a remessa dos autos a
uma das Varas do Trabalho da 2ª Região, para que prossiga no julgamento dos pedidos declinados na inicial, como entender de direito. Brasília, 30 de maio de 2017. Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001) Alexandre Agra Belmonte Ministro Relator
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Sonegação Fiscal Crime tributário – pessoa jurídica – omissão de receita – sonegação fiscal – efeitos “Penal. Processo penal. Crime contra a ordem tributária. Art. 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/1990. Omissão de receitas da pessoa jurídica. Movimentação bancária não informada à Receita Federal. Sonegação fiscal. Nulidade do processo administrativo. Inépcia da denúncia. Materialidade. Autoria e dolo. Comprovação. Reparação de danos. No crime material contra a ordem tributária (art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990), exige-se, para o início da ação penal, a consumação do delito que ocorre com o lançamento definitivo, consoante enuncia a Súmula Vinculante nº 24 do STF. No processo administrativo fiscal, frustradas as tentativas de notificação pessoal e via postal, é regular a notificação por edital, consoante previsão legal do art. 23, III, do Decreto nº 70.235/1972, alterado pelo art. 67 da Lei nº 9.532/1997. É legítimo o arbitramento do Imposto de Renda, com base em movimentação bancária não informada ao órgão fazendário, cuja origem não resta demonstrada por documentação hábil e idônea, nos termos do art. 42 da Lei nº 9.430/1996. Nos crimes societários, não se exige a descrição pormenorizada da conduta de cada réu na denúncia. Se a denúncia expõe claramente o fato delituoso, indicando os supostos responsáveis pela prática do delito e a classificação do crime, não há inépcia da peça acusatória. Materialidade delitiva demonstrada pela prova dos autos que demonstra a supressão tributária decorrente da omissão de informações fiscais, acerca da movimentação bancária, cuja origem não restou comprovada e sonegação fiscal dos tributos incidentes sobre os valores que a lei considera renda ou receita, caracterizando o crime contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. O elemento subjetivo do tipo penal do art. 1º da Lei nº 8.137/1990 é o dolo, sem mais, não sendo de indagar-se acerca de um especial estado de ânimo voltado para a sonegação. A Fazenda Pública, na qualidade de vítima do crime contra a ordem tributária, tem possibilidade de recuperar os valores sonegados mediante a inscrição em dívida ativa a execução fiscal, não sendo necessária a fixação de valor mínimo para reparação de danos ao ofendido, prevista no art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal.” (TRF 4ª R. – ACr 0032364-38.2008.404.7100/RS – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Márcio Antônio Rocha – DJe 23.01.2014 – p. 377)
Sonegação fiscal – comprovação – concurso formal – aplicabilidade “Penal e processual penal. Cerceamento de defesa. Inexistência. Prova pericial irrelevante. Art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Sonegação fiscal. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Tipicidade. Dolo genérico. Retroatividade da Súmula Vinculante nº 24. Responsabilização penal. Processo administrativo fiscal. Conjunto probatório suficiente. Consumação do delito. Concurso formal. Inaplicabilidade. Continuidade delitiva. Diminuição da pena privativa de liberdade. Substitutividade por duas penas alternativas. Redução proporcional da pena de multa. Prescrição. Inocorrência. Apelação criminal provida em parte. 1. Apelação criminal contra sentença que julgou procedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal para condenar o Apelante pelo crime previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 (sonegação fiscal) à pena de 07 (sete) anos de reclusão e 200 (duzentos) dias-multa, no valor unitário de 1/2 (um meio) do salário-mínimo vigente à época do fato. 2. Inocorrência de cerceamento de defesa, uma vez que a perícia nada acrescentaria ao deslinde do caso que se voltava exatamente à análise de conduta incriminada pela omissão de declaração de receita da empresa (sonegação fiscal), extraída da análise do fato típico (conduta omissiva), dos documentos e da resposta do réu, de modo que a diligência não teria o condão de afastar a tipicidade da conduta, o que afasta qualquer hipótese de nulidade da sentença. 3. Os fatos imputados na denúncia e devidamente comprovados nos autos são típicos, vez que previstos no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990, diante do que foi apurado na instrução processual, notadamente no processo administrativo fiscal apenso, evidenciando-se que a receita escriturada e informada pelo apelante à autoridade fiscal estava divergente em relação à movimentação bancária pessoal do agente, o que acarretou a redução do tributo devido, mediante a ocultação de informações pelo contribuinte. 4. O STJ já se posicionou no sentido de que o tipo
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penal descrito no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990, prescinde de dolo específico, de modo que a atuação do agente para ofender o bem jurídico (arrecadação tributária) prevista no tipo penal não depende de querer ou não o acusado prejudicá-lo, bastando o enquadramento nos limites da previsão feita pelo legislador (STJ, AgRg-REsp 1283767 SC 2011/0235253-1, Relª Min. Laurita Vaz, Data de Julgamento: 25.03.2014, T5 – 5ª T., Data de Publicação: DJe 31.03.2014). 5. Não se pode falar em responsabilização penal objetiva, à medida que a atuação do responsável tributário se encontra tipificada, tendo ele incorrido nas práticas previstas na legislação criminal, o que torna insubsistente a alegação de inexistência de dolo específico, já que devidamente configurado o fato típico atribuído ao agente responsável, cujo dolo genérico ao omitir a receita se mostra suficiente a autorizar sua responsabilização penal. 6. A Súmula Vinculante nº 24 do STF, que transcreve entendimento jurisprudencial, assim dispõe: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo. Tal entendimento representa a evolução e a solidificação do posicionamento jurídico da mais alta Corte do país sobre o tema, não se lhe aplicando a regra da non reformatio in pejus, por não ser norma legal. Recente julgamento do STF, publicado no Informativo nº 786, corrobora o entendimento sobre a aplicabilidade da Súmula Vinculante nº 24: RHC 122774, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., Julgado em 19.05.2015, Processo Eletrônico DJe-111, Divulg. 10.06.2015, Public.11.06.2015. 7. Diante do arcabouço probatório presente nos autos, evidencia-se a responsabilização do Recorrente em relação ao delito em exame, em razão de sua atuação na gestão financeira da empresa, ocultando valores da receita financeira que eram movimentados em sua conta pessoal, sendo insubsistente a alegação de responsabilização penal objetiva. 8. Na primeira fase da dosimetria da pena, merece nota apenas a culpabilidade considerada em grau intenso devido aos valores devidos a título de tributos (IRPJ, CSLL, Cofins e PIS) que foram objeto de sonegação, montante que chegou a cerca de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), sendo neutra a valoração dos demais elementos das circunstâncias judiciais. Fixação da pena-base no mínimo legal ‘o art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 prevê a pena de 02 (dois) a 05 (cinco) anos)’ já que apenas a culpabilidade foi analisada em desfavor do agente. 9. Tendo sido fixada a pena-base no mínimo legal, é de se invocar a Súmula nº 231, do STJ, segundo a qual ‘A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal’. Na segunda fase da dosimetria, inexistem circunstâncias agravantes a incidir sobre a pena-base. 10. Impossibilidade de reconhecimento da confissão, já que o agente se limitou a reconhecer a prática criminosa que já se encontrava patente nos autos, assumindo a existência de prática evidente, cuja configuração e enquadramento já independia de sua atuação. 11. Na terceira fase da dosimetria da pena, há de ser excluída a causa de aumento da pena relativa ao reconhecimento de concurso formal ao caso em exame, sob pena de se incorrer em bis in idem, conforme entendimento reiterado desta Corte. Precedente: ACr 10605/PE, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena, 1ª T., J. 09.04.2015). No caso em exame devem ser mantidas apenas duas causas de aumento de pena a incidir sobre a pena-base, quais sejam, a continuidade delitiva em face da prática dos atos nos exercícios-financeiros de 2002 e 2003 (aumento de 1/4) e a causa de aumento especial, decorrente do art. 12, I, da Lei nº 8.137/1990 (aumento de 2/5), o que resulta na fixação de uma pena definitiva em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pena pecuniária em 100 (cem) dias-multa. 12. A pena de multa deve ser aplicada em proporcionalidade com a pena privativa de liberdade (reduzida em cerca de 44%), com base nas circunstâncias judiciais e as causas de aumento de pena, de forma que deve ser reduzida para 100 (cem) dias multa. Haja vista a situação econômica do réu e os valores em função dos quais se deu o crime em desfavor dos cofres públicos, deve ser mantido o valor do dia-multa em 1/2 (um meio) salário mínimo vigente à época dos fatos, atualizado monetariamente. 13. Considerando o quantum da pena privativa de liberdade, é cabível a sua substituição por duas restritivas de direito, na forma prevista no art. 44, § 2º, 2ª parte, do Código Penal, devendo o apelante cumprir prestação de serviço a entidade pública, a ser definida pelo juízo da execução, além do pagamento de 1 (uma) cesta básica mensal, no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), para ser distribuída a entidade não governamental de assistência social, a ser designada pelo juízo da execução. 14. A hipótese específica dos autos apresenta consumação do delito em 14.06.2007 e 03.09.2008, com a conclusão dos dois processos administrativos fiscais e respectivo lançamento tributário. O recebimento da denúncia ocorreu em 05.08.2013 (data em que a decisão foi entregue em cartório), e a sentença foi prolatada em 03.04.2014 (publicação da sentença verificada com a entrega do processo nas mãos do escrivão). 15. Inocorrência da prescrição da pretensão punitiva, com base no máximo da pena cominada (05 anos) ou da prescrição superveniente, considerando a publicação da sentença recorrível com o trânsito em julgado para a acusação, mesmo considerando o teor da Súmula nº 497 do STF (Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação), incidindo-se em todas as hipóteses o art. 109, inciso III, do Código Penal. 16. A Lei nº 12.234/2010 vedou a possibilidade de a prescrição retroativa ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa, por se tratar de nova lei que constitui novatio legis in pejus, de forma que não pode ser aplicada aos delitos praticados antes de maio de 2010. No caso em exame, em que o delito foi consumado em meados de 2007 e 2008, continua sendo aplicada a prescrição retroativa ocorrida entre a data do fato criminoso e o recebimento da denúncia. Sendo assim, seja levando em conta a pena aplicada na sentença, sem o aumento decorrente da continuidade delitiva, também deve ser observado o prazo prescricional de 12 anos, previsto no inciso III do art. 109 do CP, já que a pena é superior a 04 (quatro) anos e não excede a 08 (oito) anos. 17. Afastada a prescrição da pretensão executória ou da condenação, já que calculada com base na pena concreta, nos termos da Súmula nº 604 do STF que preceitua, segundo a qual ‘A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade’. Tendo sido reduzida a pena aplicada ao agente e desconsiderando o aumento decorrente da continuidade delitiva, apenas para fins de contagem do prazo prescricional, incide o prazo previsto no inciso IV do art. 109 (oito anos se o máximo da pena é superior a dois e não excede a quatro). 18. A pena de multa prescreve no mesmo prazo da pena privativa de liberdade, quando for aplicada alternativamente ou cumulativa, conforme dispõe o art. 114, II, do Código Penal. Considerando que foram afastadas as teses de prescrição da pena privativa de liberdade, prejudicada está a análise da prescrição da pena pecuniária. 19. Apelação criminal parcialmente provida para reduzir a pena privativa de liberdade para 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e para fixar a pena pecuniária em 100 (cem) dias-multa.” (TRF 5ª R. – ACr 0008011-17.2013.4.05.8300 – (12075/PE) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos Rebelo Júnior – DJe 17.02.2016)
Transcrição IOB Lei nº 8.137/1990: “Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias.”
Sonegação – contribuição previdenciária – crime material – prévio esgotamento da via administrativa – necessidade “Penal. Processual penal. Sonegação de contribuição previdenciária. Art. 337-A do Código Penal. Crime material. Necessidade de prévio esgotamento da via administrativa. Ausência de constituição definitiva do crédito tributário, condição objetiva de procedibilidade para ação penal. Sentença absolutória mantida. Apelação criminal improvida. 1. A hipótese sob análise. Sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A, do CP). Configura crime omissivo material, caso em que a decisão definitiva do procedimento administrativo fiscal constitui uma condição objetiva de procedibilidade, razão pela qual a ausência de constituição do crédito tributário pela autoridade administrativa se apresenta como óbice à propositura da ação penal por falta de justa causa. 2. Sentença mantida. 3. Apelação criminal improvida.” (TRF 1ª R. – ACr 0043379-96.2005.4.01.3800 – Relª Juíza Fed. Conv. Rosimayre Gonçalves de Carvalho – DJe 25.06.2015)
Sonegação fiscal – indenização – anulação de condenação anterior – revisão criminal não reconhecida “Processo penal. Revisão criminal. Sonegação fiscal. Indenização em decorrência da anulação de condenação anterior. Reiteração de pedido já rejeitado. Coisa julgada. Impossibilidade de rescisão de decisum que não mais subsiste no ordenamento jurídico. Cabimento do pleito apenas perante a justiça cível. Revisão criminal não conhecida. 1. O requerente ajuizou anteriormente ação idêntica em que o Tribunal negou o pedido de indenização. Configurada coisa julgada na seara penal. 2. Não se trata de reiteração fundada em novas provas. A condenação foi anulada e, portanto, eventual discussão a respeito do conjunto probatório restou prejudicada. 3. A condenação a qual foi submetida o requerente não se trata de erro judiciário. À época em que foi julgado, não estava consolidado o entendimento esposado na Súmula Vinculante nº 24 do STF, ou seja, não se exigia a constituição definitiva do crédito tributário, bastando o auto de infração fiscal e os demais documentos que acompanhavam a representação da autoridade fazendária, os quais foram examinados pelo juiz sentenciante. 4. Depreende-se da interpretação conjunta dos arts. 621, 627 e 630, todos do CPP, que somente é possível o deferimento de indenização na esfera penal no caso de procedência da revisão criminal e se comprovados os prejuízos sofridos. No caso em tela, além de não caracterizada qualquer das hipóteses de cabimento da revisão criminal, a condenação foi anulada, inclusive tendo sido o recorrente ressarcido da multa, das custas e das prestações pecuniárias pagas na execução penal. Portanto, se mostra prejudicado qualquer questionamento a respeito do conjunto probatório ou de eventual vício no processo de conhecimento que culminou com a sentença condenatória, porquanto anulada. Não se pode rescindir decisum condenatório que não mais subsiste no ordenamento jurídico. 5. Resta ao requerente formular sua pretensão em desfavor da União no juízo cível, diante do descabimento da revisão criminal.” (TRF 4ª R. – RvCr 0000052-56.2014.404.0000/PR – 4ª S. – Rel. Des. Fed. Márcio Antonio Rocha – DJe 19.09.2014 – p. 4) Transcrição IOB Súmula Vinculante do STF:
Sonegação fiscal – IRPF – despesas fictícias com saúde – princípio da especialidade – aplicabilidade “Penal. Processo penal. Falsificação e uso de documento falso. Sonegação fiscal. Imposto de Renda Pessoa Física. Despesas fictícias com saúde. Delito tributário. Princípio da especialidade. Aplicação. 1. O uso de recibos ideologicamente falsos para comprovação de despesas fictícias com saúde informadas à Receita Federal é crime contra a ordem tributária e não se subsume aos tipos penais dos arts. 299 e 304 do Código Penal, uma vez que a conduta está inserida na lei especial (Lei nº 8.137/1990) (Precedentes da Turma). 2. Suspensa a exigibilidade do crédito tributário, não há que se falar em delito de sonegação fiscal (art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990) e, por consequência, a persecução penal está impossibilitada. Assim, a extinção da punibilidade é medida que se impõe (Precedente da Turma). 3. Apelação não provida.” (TRF 1ª R. – ACr 2004.38.03.007659-0/ MG – Relª Desª Fed. Monica Sifuentes – DJe 10.02.2016)
Sonegação fiscal – parcelamento do débito – exigibilidade do crédito tributário – suspensão da ação penal e da prescrição – cabimento “Penal. Crime contra a ordem tributária. Sonegação fiscal. Parcelamento do débito. Exigibilidade do crédito tributário. Suspensão da ação penal e da prescrição. Remessa dos autos à vara de origem. 1. Havendo informação de que o réu aderiu ao parcelamento de que trata a Lei nº 12.996/2014, cabível a suspensão da ação penal e do curso do
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“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo.”
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prazo prescricional. Precedente desta Corte. 2. Ressalva-se a possibilidade de retomada do feito, se descumpridos os termos e condições impostas pelo órgão fazendário. 3. O feito deve ser remetido à origem, cabendo ao órgão do Ministério Público que atua na primeira instância a fiscalização do cumprimento das condições do parcelamento.” (TRF 4ª R. – ACr 2006.71.05.009209-7/RS – 7ª T. – Relª Desª Fed. Cláudia Cristina Cristofani – DJe 26.03.2015)
Sonegação fiscal – redução da base de cálculo de tributos federais – isonomia de tratamento com instituições financeiras e revendedoras de veículos – inaplicabilidade “Penal e processual penal. Embargos infringentes e de nulidade. Crime contra a ordem tributária. Art. 1º da Lei nº 8.137/1990. Redução da base de cálculo de tributos federais. Inaplicabilidade da isonomia de tratamento com instituições financeiras e revendedoras de veículos. Dolo evidenciado. Embargos não providos. 1. O crime de sonegação fiscal consiste em toda ação consciente, espontânea, dolosa ou intencional do contribuinte, por meio da qual se efetiva a fraude contra a ordem tributária. 2. A incerteza em relação à forma de recolhimento tributário não permite ao contribuinte, mediante arbítrio, determinar o procedimento a ser adotado. 3. Ante a redução da base do cálculo dos tributos devidos por meio da adoção de critério particular e contrário à legislação pertinente, resta evidenciado o dolo da agente. 4. Embargos infringentes não providos.” (TRF 1ª R. – EI 0038255-52.2011.4.01.3500/GO – Rel. Juiz Fed. Conv. Guilherme Fabiano Julien de Rezende – DJe 14.03.2016)
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Sonegação fiscal – uso de comprovantes falsos – interrupção do prazo prescricional – nulidade processual – decretação – impossibilidade
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“Penal. Processo penal. Apelação. Ordem tributária. Sonegação fiscal. Uso de comprovantes falsos. Despesas médico, fisioterápicas, odontológicas fictícias. Prescrição intercorrente. Sentença penal recorrível. Concurso de agentes. Interrupção do prazo prescricional mesmo para os réus absolvidos. Inépcia da denúncia. Nulidade processual. Impossibilidade de decretação. Representação fiscal para fins penais. Ampla defesa e contraditório respeitados no âmbito administrativo. Requisitos de admissibilidade da acusatória preenchidos. Preclusão. Declaração retificadora. Exclusão de recibos antes do lançamento definitivo do crédito tributário. Condição objetiva de punibilidade. Enunciado vinculante STF. Absolvição. Falsificação de documento particular. Desígnios autônomos. Inexistência. Autoria e materialidade comprovadas. Dosimetria. Circunstâncias judiciais. Aumento da pena-base. Impossibilidade. Elementos ínsitos ao tipo incriminador. Participação de menor importância. Descaracterização. Multa. Redução do valor. Ausência de comprovação da hipossuficiência. Reparação de danos. Imposição sem ampla defesa. Exclusão de ofício. 1. A sentença penal recorrível interrompe o prazo prescricional para todos os réus, inclusive em relação àqueles que foram absolvidos (Precedentes do STJ). 2. Descabe suscitar inépcia da denúncia, quando foram respeitados o contraditório e a ampla defesa no procedimento administrativo que resultou no procedimento fiscal para fins penais, suporte da acusatória. 3. Os vícios da denúncia ficam acobertados pelo manto da preclusão com a prolação da sentença. 4. A denúncia conforme os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal e que está acompanhada de justa causa para a ação penal deve ser recebida. 5. De acordo com o Enunciado da Súmula Vinculante nº 24 do STF: não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo. 6. É de rigor a absolvição de réu acusado de sonegação fiscal, que apresenta declaração retificadora antes do lançamento definitivo do crédito tributário, ou seja, da lavratura do auto de infração, pois este é uma condição objetiva de punibilidade e prova da materialidade do crime. 7. Não pratica autonomamente o delito do art. 298 do Código Penal, o agente que providencia a confecção de recibos médicos inidôneos a fim de propiciar que outrem possa furtar-se do pagamento de tributos. 8. Incorre em bis in idem, o exame das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal que leva em conta, desfavoravelmente, elementos ínsitos ao tipo incriminador. 9. A participação de menor importância, descrita no § 1º do art. 29 do Código Penal, tem aplicação, apenas, nos casos de instigação e cumplicidade, e não nas hipóteses de coautoria. 10. A redução do valor da multa é corolário de prova da hipossuficiência do réu, sendo inaplicável àquele que é defendido durante todo o processo por advogado constituído e não fez nenhum pedido de benefício da justiça gratuita. 11. Exclui-se de ofício, do cômputo penal, o valor estabelecido na sentença a título de reparação do dano, pois somente se a parte ofensora tiver a oportunidade de se manifestar na instrução criminal em relação ao quantum debeatur, em respeito ao contraditório, poder-se-á falar na reparação do dano nos moldes do inciso IV do art. 387 do Código de Processo Penal, sendo-lhe pressuposto o requerimento da parte ou do Ministério Público de condenação à reparação, para evitar a surpresa e a ilegalidade da medida para quem a suportará. 12. Apelação do Ministério Público Federal não provida e apelações das defesas parcialmente providas.” (TRF 1ª R. – ACr 2004.38.02.001510-1/MG – Rel. Des. Fed. Ney Bello – DJe 15.03.2016)
Sonegação fiscal – uso de documento falso – quitação integral do débito – extinção de punibilidade “Penal e processual penal. Sonegação fiscal. Quitação integral do débito. Extinção da punibilidade. Uso de documento falso. Estelionato. Princípio da consunção. 1. O art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990, prevê, como conduta típica contra a ordem tributária, suprimir ou reduzir tributo, mediante elaboração de documento falso ou uso do documento contrafeito. Extinta a punibilidade da sonegação fiscal, pela quitação do débito tributário, fica afastada a incidência da lei geral que tipifica os crimes dos arts. 171, § 3º, 299 e 304, do Código Penal. 2. Se, nos crimes contra a ordem tributária, a contrafação ou o uso do falsum foram erigidos, pela Lei nº 8.137/1990, em elementos constitutivos de outro ilícito, tem-se delito único, que é o de suprimir ou reduzir tributo, mediante aquelas ações referidas no art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990, afastando-se os crimes previstos nos arts. 171, § 3º, 299 e 304, do Código Penal. 3. Recurso em sentido estrito não provido.” (TRF 1ª R. – RSE 0039617-91.2013.4.01.3800/MG – Rel. Des. Fed. Olindo Herculano de Menezes – DJe 25.07.2014 – p. 1260)
Em Poucas Palavras
O Supremo Tribunal Federal e o Sigilo no Inquérito Policial RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA
Promotor de Justiça, Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais do Ministério Público do Estado da Bahia, Ex-Assessor Especial do Procurador-Geral de Justiça, Ex-Procurador da Fazenda Estadual, Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador (Unifacs) na Graduação e na Pós-Graduação, Coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da Unifacs, Pós-Graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal), Especialista em Processo pela Unifacs (Curso coordenado pelo Professor Calmon de Passos), Membro da Association Internationale de Droit Penal, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais – ABPCP, Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático. Autor de livros.
Súmula Vinculante nº 14 do Supremo Tribunal Federal É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
COMENTÁRIO O Supremo Tribunal Federal aprovou, no dia 2 de fevereiro, súmula vinculante que garante a advogados acesso a provas já documentadas em autos de inquéritos policiais que envolvam seus clientes, inclusive os que tramitam em sigilo. A questão foi levada ao Plenário a pedido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
por meio de processo chamado Proposta de Súmula Vinculante, instituído no STF no ano passado. Essa foi a primeira PSV julgada pela Corte. Dos 11 Ministros, somente Joaquim Barbosa e Ellen Gracie foram contra a edição da súmula. Para os dois, a matéria não deve ser tratada em súmula vinculante. A maioria dos Ministros, no entanto, afirmou que o verbete trata de tema relativo a direitos fundamentais, analisado diversas vezes pelo Plenário. Eles lembraram que a Corte tem jurisprudência assentada no sentido de permitir que os advogados tenham acesso aos autos de processos. “A súmula vinculante, com o conteúdo proposto, qualifica-se como um eficaz instrumento de preservação de direitos fundamentais”, afirmou Celso de Mello. O Ministro Marco Aurélio destacou que “a eficiência repousa na transparência dos autos praticados pelo Estado”, reiterando que precedentes da Corte revelam que a matéria tem sido muito enfrentada. Ele afirmou que há pelo menos sete decisões sobre a matéria no STF. “Investigação não é devassa”, observou a Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha. O Ministro Peluso lembrou que a súmula somente se aplica a provas já documentadas, não atingindo as demais diligências do inquérito. “Nesses casos, o advogado não tem direito a ter acesso prévio”, observou. O Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator da matéria, afirmou que a súmula não significará um “obstáculo à tutela penal exercida pelo Estado” (Fonte: STF). Como se sabe, como principais características do inquérito policial podemos apontar o fato de ser um procedimento escrito (art. 9º do CPP), relativamente sigiloso e inquisitório, pois não admite o contraditório1 e a ampla defesa, o que não significa que o indicia1 O contraditório é exigido e impostergável na fase processual, pois não há devido processo legal sem o contraditório, que vem a ser, em linhas gerais, a garantia de que para toda ação haja uma correspondente reação, garantindo-se, assim, a plena igualdade de oportunidades processuais. A respeito do
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do não seja um sujeito de direitos; muito pelo contrário, sendo-lhe garantidos direitos outros, tais como o direito ao silêncio, o de não se autoincriminar, o de ser tratado com dignidade e respeito, etc. O que não se cogita, por evidente, é que se permita o contraditório e a ampla defesa em uma fase investigatória/policial, o que inviabilizaria qualquer investigação criminal2.
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contraditório, Willis Santiago Guerra Filho afirma: “Daí podermos afirmar que não há processo sem respeito efetivo do contraditório, o que nos faz associar o princípio a um princípio informativo, precisamente aquele político, que garante a plenitude do acesso ao Judiciário (cf. Nery Jr., 1995, p. 25). Importante, também, é perceber no princípio do contraditório mais do que um princípio (objetivo) de organização do processo, judicial ou administrativo – e, logo, um princípio de organização de um instrumento de atuação do Estado, ou seja, um princípio de organização do Estado, um direito. Trata-se de um verdadeiro direito fundamental processual, donde se poder falar, com propriedade em direito ao contraditório, ou Anspruch auf rechliches Gehör, como fazem os alemães” (Introdução ao direito processual constitucional. São Paulo: Síntese, 1999. p. 27). Segundo Étienne Vergès, a Corte Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) “en donne une définition synthétique en considérant que ce principe ‘implique la faculté, pour les parties à un procés penal ou civil, de prendre connaissance de toutes pièces ou observations présentées au juge, même par un magistrat indépendant, en vue d’influencer sa décision et de la discuter’ (CEDH, 20 févr. 1996, Vermeulen c/ Belgique, D. 1997, som. com. p. 208)” (Procédure pénale. Paris: LexisNexis Litec, 2005. p. 35). 2 Essa afirmação não impede, contudo, que seja deferida a juntada pelo indiciado de documento. Nesse sentido, veja-se esta decisão do Ministro Gilmar Mendes:
“Medida Cautelar em Habeas Corpus nº 92.599-5/Bahia, Rel. Min. Gilmar Mendes. Decisão: [...] Com relação à argumentação expendida pelo acórdão recorrido no sentido de que o inquérito policial seria procedimento investigatório e inquisitorial não envolto pelo contraditório, é pertinente traçar algumas considerações. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal (STF) tem assegurado a amplitude do direito de defesa mesmo que em sede de inquéritos policiais e/ou originários. Nesse particular, em especial no que concerne ao exercício do contraditório e ao acesso de dados e documentos já produzidos no âmbito das investigações criminais,
destaco os seguintes julgados:
‘EMENTA: ADVOGADO – Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5º, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/1994, art. 16 do CPPM e art. 26 da Lei nº 6.368/1976. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.’ (HC 88.190/RJ, 2ª T., Rel. Min. Cezar Peluso, unânime, DJ 06.10.2006)
‘Ementa: I – Habeas corpus prejudicado dado o superveniente julgamento do mérito do mandado de segurança cuja decisão liminar era objeto da impetração ao Superior Tribunal de Justiça e, em consequência, deste. Habeas corpus. Inviabilidade. Incidência da Súmula nº 691 (‘Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar’). III – Inquérito policial. Inoponibilidade ao advogado do indiciado do direito de vista dos autos do inquérito policial. 1. Inaplicabilidade da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa ao inquérito policial, que não é processo, porque não destinado a decidir litígio algum, ainda que na esfera administrativa; existência, não obstante, de direitos fundamentais do indiciado no curso do inquérito, entre os quais o de fazer-se assistir por advogado, o de não se incriminar e o de manter-se em silêncio. 2. Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado – interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial –, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994, art. 7º, XIV), da qual – ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas – não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade. 3. A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que
lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar e lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações. 4. O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. Lei nº 9.296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório. Habeas corpus de ofício deferido, para que aos advogados constituídos pelo paciente se faculte a consulta aos autos do inquérito policial e a obtenção de cópias pertinentes, com as ressalvas mencionadas.’ (HC 87.827/RJ, 1ª T., Rel. Min. Sepúlveda Pertence, unânime, DJ 23.06.2006)
Em idêntico sentido, registro ainda o julgamento do HC 88.520/AP (Pleno, Relª Min. Cármen Lúcia, maioria, Julgado em 23.11.2006, acórdão pendente de publicação), no qual, uma vez mais, o Plenário definiu novas amplitudes constitucionais com relação ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório (CF, art. 5º, incisos LIV e LV). Da leitura dos precedentes colacionados, verifica-se que tais julgados respaldam a tendência interpretativa de garantir aos investigados e indiciados a máxima efetividade constitucional no que concerne à proteção dos direitos fundamentais mencionados (CF, art. 5º, LIV e LV). Destarte, nos termos da jurisprudência colacionada, entendo não haver razão jurídica plausível para que a Corte Especial do STJ indefira pedido de juntada do laudo pericial requerida pela defesa do ora paciente. Ressalvado melhor juízo quando da apreciação de mérito, constato a existência dos requisitos autorizadores da concessão da liminar pleiteada (fumus boni juris e periculum in mora). Ante os fundamentos expostos, defiro o pedido de medida liminar para determinar a juntada dos Expedientes 00127270/2007 e 00126577/2007 aos autos do Inquérito nº 544/BA, em trâmite perante o STJ. Nessa extensão do deferimento, o representante do Ministério Público Federal oficiante deverá ser oportunamente intimado da juntada da documentação referida. Após, abra-se vista ao Procurador-Geral da República (RISTF, art. 192). Publique-se. Brasília, 6 de novembro de 2007.”
Por um lado, justifica-se o sigilo no inquérito policial por ser “instrumento mediante o qual se garante a inviolabilidade do segredo, e serve à autoridade condutora das investigações, visando à elucidação do fato, mas preserva ao mesmo tempo a intimidade, vida privada, imagem e honra das pessoas envolvidas na apuração”, como bem anotou o Ministro do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso, para quem a quebra do sigilo é “dos mais graves e intoleráveis”. Segundo ele, “processos que tenham sido decretados como sigilosos só podem tornar-se públicos em relação a acusados, defensores e à vítima”, e a divulgação de que “tais inconfidências, além de serem incompatíveis com os cuidados necessários à condução frutífera das investigações, trazem ainda danos gravíssimos à vida privada dos envolvidos, e sobretudo de terceiros meramente referidos, com sequelas pessoais gravosas e irremissíveis”, concluiu (Inq. 2424). Tal sigilo, no entanto, não pode ser oposto ao defensor do indiciado, pois, como afirmam Alberto Zacharias Toron e Maurides de Mello Ribeiro, a Lei nº 8.906/1994, no seu art. 7º, inc. XIV, é clara e, antes dela, o estatuto anterior (Lei nº 4.215/1963), igualmente o era. Constitui direito do advogado “examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito..., podendo copiar peças e tomar apontamentos; [...]”. Ante a clareza da lei é evidente que a restrição que se quer impor aos advogados que representam indiciados ou meros investigados, isto é, de examinar e extrair cópias de parte dos autos, mais que odiosa, é patentemente ilegal. De fato, se a lei assegura aos advogados o direito de poder ver os autos e copiar o que for importante, tal se encarta dentro de uma garantia maior que é a da ampla defesa. Sim, porque não se pode exercer esta sem que se conheçam os autos. Afinal, se dentro de um inquérito for determinada de forma abusiva um indiciamento ou, por outra, decretar-se a prisão de um cidadão, como irão os advogados hostilizar eventual coação se não podem ter acesso ao feito? Isto para não falar em toda sorte de abusos que se podem cometer em matéria de colheita de provas ou indícios. Não é à toa que Fauzi Choukr, promotor de Justiça em São Paulo, na monografia que lhe valeu a obtenção do título de Mestre pela Univer-
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Exatamente por isso é que as provas colhidas nessa fase precisam ser ratificadas em Juízo, a fim de que se legitime um decreto condenatório.
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sidade de São Paulo em Direito Processual Penal, com propriedade adverte: “[...] dentro de um Estado Democrático não há sentido em se falar de ‘investigações secretas’, até porque, na construção do quadro garantidor e na nova ordem processual acusatória, deve o investigado ser alertado sobre o procedimento instaurado” (Garantias constitucionais na investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 92). Até mesmo a famigerada Lei do Crime Organizado, que na obstinada pretensão de salvaguardar dados sigilosos, de forma inédita, prevê a realização de diligências pessoais pelo Magistrado, assegura ao advogado constituído acesso aos autos (art. 3º, § 3º). Na verdade, quando se garrotearem as prerrogativas profissionais dos advogados, atinge-se exatamente a garantia constitucional da ampla defesa em razão da falta de conhecimento do conteúdo de diligências ou atos praticados nos autos do inquérito policial, bem como o não-acompanhamento regular dos inquéritos policiais. E o direito à ampla defesa, remarque-se, está constitucionalmente previsto, inclusive na fase pré-processual (art. 5º, inc. LV). O que está em jogo não é apenas o interesse corporativo, mas, na verdade, cuida-se de resguardar, dando vida à garantia constitucional da ampla defesa, o cidadão. Tudo isso já seria mais do que suficiente para responder a todos aqueles que pensam em restaurar o sigilo absoluto do inquérito, tal como uma das odiosas regras das investigações promovidas pela Santa Inquisição. Ainda assim, há sempre quem possa defender o sigilo para que se viabilizem as investigações. Esta ideia chega a sugerir, ainda que obliquamente, a prática de crime no exercício da Advocacia, ou, por outra, um inadmissível desconhecimento do que significa o seu exercício. Aliás, considerando que a determinação de diligências normalmente é verbal e só são reduzidas a termo depois de efetivadas, convém perguntar-se: se forem lícitas as providências desencadeadas, por que escondê-las?3
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Aliás, mesmo nos Tribunais Estaduais esse entendimento já prevalecia, como vemos nesta decisão proferida em um mandado de segurança da lavra do Juiz de Direito Dr. André Andreucci (decisão confirmada à unanimidade de votos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo nos autos do Recurso de Apelação nº 31.228-3/SP): 3 Quem tem medo da publicidade no inquérito? Boletim IBCCrim, n. 84, p. 13/14, nov. 1999.
Toda autoridade que não respeitar as prerrogativas legítimas do advogado, no exercício regular este de seu legal ministério privado, será tida como arbitrária e deverá ter seu comportamento coibido pelo Judiciário, ontem, hoje e sempre, no Estado de Direito, a esperança dos que buscam Justiça, dos que esperam receber o que lhes é devido por lei. Se, no futuro, como esperam alguns, nova legislação mudar a orientação estampada na Lei nº 4.215/1963, permitindo a proibição que os impetrados pretenderam aplicar, ainda assim caberá ao Judiciário apreciar a questão que implicará violação das garantias constitucionais da ampla defesa e do regular exercício das atividades profissionais. [...] Dessa forma, não poderiam as autoridades impetradas desconhecer as prerrogativas e os direitos dos advogados, claramente inscritos na legislação pertinente. Como também não poderia desconhecer isso tudo o ilustre representante do Ministério Público que oficiou nos autos. O dispositivo legal que confere aos impetrantes o direito que buscam já foi bastante examinado, ao contrário do que afirma esse mesmo Doutor Promotor de Justiça. Dispensa o tema demorada abordagem, mas, em homenagem ao Direito, que se pretende regule as relações entre os homens e a Justiça, que deve presidir e garantir essas relações, alguns comentários têm que vir à tona, com ilustrações pertinentes. Numa sociedade, que se pretenda seja regida pelo menos com respeito aos mais simples princípios de respeito ao homem, à lei, à Justiça, não se pode
Tal entendimento deve prevalecer ainda que estejam juntadas no inquérito policial informações colhidas a partir de interceptação telefônica. Nesse sentido, por unanimidade, os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal confirmaram o entendimento de que a defesa deve ter acesso pleno aos autos de um inquérito policial, incluindo os dados obtidos a partir de interceptações telefônicas. Para o Relator do Habeas Corpus (HC) nº 92331, Ministro Marco Aurélio, “a busca de parâmetros não pode conduzir a manter-se, quando já compelido certo cidadão a comparecer para ser interrogado, ou para prestar esclarecimentos, o óbice ao acesso aos fatos que estariam a impeli-lo a tanto”. O HC 92331 foi impetrado no Supremo pela defesa de duas pessoas acusadas pela Polícia Federal, na Operação 274, de suposta formação de cartel no setor de vendas de combustíveis em João Pessoa, na Paraíba. Para a advogada dos suspeitos, a acusação contra seus clientes foi totalmente embasada nos conteúdos de interceptações telefônicas, mas
a própria Justiça paraibana negou o acesso da defesa a essas escutas, alegando a necessidade de preservar as investigações, porque ainda estariam em curso, mesmo tendo os investigados sido chamados para um interrogatório. O Ministro Marco Aurélio frisou logo de início em seu voto que o sigilo das diligências é a tônica da investigação policial, mas somente até que se chegue ao estágio em que os fatos apurados viabilizem a convocação para interrogar o investigado. Em seu entender, se já existem indícios para se convocar alguém a depor, deve-se dar acesso, à defesa do investigado, às informações que motivaram essa convocação. O inquérito policial é um procedimento administrativo, não um processo, mas deve, também, respeitar os direitos fundamentais do indiciado, como os de poder manter-se em silêncio, não produzir provas contra si mesmo, bem como o amplo acesso aos autos. “Fora disso é inaugurar época de suspeita generalizada, de verdadeiro terror”, frisou o Relator, lembrando do escritor Franz Kafka, que, em seu livro O processo, retrata exatamente a vida de um personagem que passa a ser investigado, sem, contudo, ser informado ou ter conhecimento dos motivos dessa investigação. O sigilo pode estar ligado às diligências, às investigações em andamento, disse o Ministro. Mas a partir do momento em que as informações passam a fazer parte dos autos – gravações e degravações de grampos legais, inclusive –, deve-se dar amplo acesso à defesa, sob pena de ferir de morte o devido processo legal. O Ministro votou no sentido de atender ao pedido da defesa, integralmente, e conceder a ordem de habeas para permitir o amplo acesso da defesa às peças constantes do inquérito. Ao acompanhar o voto do Relator, o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito disse entender que a interceptação telefônica, mesmo sendo legal, permite abusos que devem ser combatidos. Ele salientou que negar à parte o acesso aos dados obtidos dessa forma é cercear seu direito de defesa. “Aquilo que já não é objeto de diligência, já estiver completado e juntado aos autos do inquérito são peças públicas”, acrescentou a Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha,
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tolerar a arbitrariedade. “O poder do Estado para realizar seu objetivo, o bem público, é exercido, como já vimos, sob três modalidades: a função legislativa, a executiva e a judiciária”. “O Estado não tem direito de excluir nenhum cidadão da participação nos benefícios que a sociedade política tem por fim oferecer, principalmente quando se trata dos direito individuais. Não somente o Estado não deve oprimir ou perseguir esta ou aquela categoria social, mas, também, evitará toda e qualquer distinção odiosa em qualquer matéria civil, penal ou administrativa. E isso não somente por princípio de humanidade, mas também por um princípio social: igualmente membros da sociedade política, todos os indivíduos, seja qual for a sua classe, categoria ou opinião, têm igualmente direito, por parte do Estado, à mesma solicitude e benevolência” (cf. Darcy Azambuja, Teoria geral do estado, p. 386/389). No exercício do poder de polícia, o Estado, representado, no caso, pela autoridade policial, não pode, e mais do que isso, não deve, oprimir, perseguir, submeter à odiosa distinção, a classe dos advogados, notadamente quando seus integrantes estão no exercício regular de suas prerrogativas, no desempenho de suas atividades profissionais. O arbítrio que no passado foi sinônimo de violência, de constrangimentos indevidos, não mais se justifica. Os tempos são outros. A sociedade exige respeito ao ordenamento jurídico.
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também acompanhando o voto do Relator para deferir o habeas corpus. Ela lembrou que, mesmo em se tratando de inquéritos que estejam correndo sob segredo de justiça, esse sigilo não se aplica às partes, que devem ter amplo acesso a todas as peças. Já o Ministro Ricardo Lewandowski lembrou notícia veiculada hoje nos principais veículos de imprensa, que trata exatamente do aumento de interceptações telefônicas legais no País. Para o Ministro, o STF precisa estabelecer as balizas para esse procedimento. Ele votou pelo deferimento da ordem. O último a votar, também acompanhando o Relator, foi o Ministro Carlos Ayres Britto, para quem todas as peças que são juntadas aos autos em um inquérito passam a ser cobertas pelo princípio da comunhão das provas. “O que vem para os autos torna-se público, está sob as vistas do investigado”, disse Britto, ressaltando o caráter constitucional desse entendimento (Fonte: STF).
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Aliás, esse entendimento deve prevalecer mesmo quando se trata de um inquérito civil. Vejamos esta decisão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso:
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Trata-se de mandado de segurança oposto pela advogada [...] contra ato de lavra dos Excelentíssimos Senhores Promotores Públicos, Domingos Sávio Barros de Arruda e Ana Luiza Ávila Peterlini de Souza, que estariam a impedir a impetrante de ter acesso aos termos do inquérito civil instaurado contra a sua pessoa, pela suposta prática de atos de improbidade administrativa. Afirma que foi convocada a prestar esclarecimento nos autos do Inquérito Civil Público nº 000897-02/2005/MPE, em audiência a ser realizada na próxima segunda-feira, 12 de dezembro do corrente ano, às 09:00 horas, sem que lhe fosse oportunizado o acesso aos termos da investigação que se move contra ela, mesmo tendo constituído advogado para tanto. Relata que em agosto/2005 foi baixada a Portaria nº 34 da 21ª Promotoria Pública do Meio Ambiente, instaurando procedimento cível tendente a apurar denúncias de atos de improbidade administrativa perpetrados por ela, que na condição de Assessora Jurídica da Fundação Estadual do Meio Ambiente – FEMA, teria exercido advocacia administrativa para particulares contra os interesses do Órgão onde estava lotada. Dessa Portaria sucederam-se atos investigativos do Parquet Estadual, os quais a impetrante
nunca teve acesso nem conhece seu teor, sendo agora convocada a depor em procedimento que mais se assemelha a uma investigação criminal que propriamente a um inquérito de natureza civil. A par de questionar a própria legitimidade do MP para conduzir o inquérito, cuja feição amolda-se às funções da Polícia Judiciária Civil, já que as acusações são todas de fatos-tipos penais, persegue a concessão da medida liminar tão somente para franquear-lhe o acesso aos autos, no que diga respeito à sua pessoa, bem como assim permita-se que seja acompanhada de seus patronos quando de sua oitiva, garantindo-lhe, ainda, o direito constitucional do “silêncio”, caso entenda apropriado. De plano quanto a este segundo pleito não há a menor justificativa para a sua existência, já que no próprio despacho que designou a oitiva da impetrante constou a garantia de seu direito de permanecer calada quanto às perguntas que lhe seriam formuladas. De outro lado, inexiste qualquer indicativo de que os impetrados tenham impedido ou cerceado o direito dos patronos constituídos pela impetrante de assisti-la na audiência onde irá depor, o que caracteriza a ausência de qualquer ato coator a ser analisado nesse prisma. Resta, então, a questão do acesso aos termos do inquérito civil instaurado, o qual foi negado pelas autoridades coatoras sob o argumento de que o acesso prévio aos autos “trará enormes prejuízos à investigação” (sic – fl. 23/ TJ). A ordem deve ser concedida no particular. De há muito tempo livrou-se o ordenamento jurídico pátrio das investigações de porão, feitas ao arrepio da garantia constitucional de amplo acesso dos investigados em procedimento judicial ou administrativo ao contraditório e à ampla defesa. Não se está dizendo que nos procedimentos investigativos deve-se ter toda a parafernália jurídica de garantia do devido processo legal; tal conclusão retiraria toda a utilidade da investigação, que por sua natureza é mesmo sigilosa. Todavia, sigilo não significa surpresa, tocaia, onde o órgão investigador oculta seus atos e suas práticas, como a querer tomar de assalto as emoções do investigado, que se vê como uma marionete do procedimento a que está submetido. Franz Kafka já há tempos satirizava a figura do “processo” como algo abstraído da realidade, onde mais se importa a forma e os meios do que a finalidade do ato. Certo é que não se pode pretender esconder do investigado os termos do procedimento que contra si tramita, a não ser por razões justificadas e fundamentadas, conforme preconiza o § 1º do art. 7º da Lei nº 8.906/1994. Vale dizer, poderá o inquérito ser totalmente sigiloso, desde que haja justificativa fundamentada do órgão do processante do porquê o acesso do investigado poderia causar danos ou prejuízos à investigação. Essa é a exegese que decorre do entendimento da Superior Corte de Justiça:
“PROCESSUAL PENAL – RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA, INQUÉRITO POLICIAL, ADVOGADO, ACESSO, NECESSIDADE DE SIGILO, JUSTIFICATIVA, AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO – I – O inquérito policial, ao contrário do que ocorre com a ação penal, é procedimento meramente informativo de natureza administrativa e, como tal, não é informado pelos princípios do contraditório e da ampla defesa, tendo por objetivo exatamente verificar a existência ou não de elementos suficientes para dar início à persecução penal. Precedentes. II – O direito do advogado a ter acesso aos autos de inquérito não é absoluto, devendo ceder diante da necessidade do sigilo da investigação, devidamente justificada na espécie (art. 7º, § 1º, da Lei nº 8.906/1994). Nesse sentido: RMS 12.516/PR, Relª Min. Eliana Calmon, J. em 20.08.2002).” (STJ, EDcl-RO-MS 15.167/PR, (2002/0094266-9), Rel. Min. Felix Fischer)
Ministério Público e, portanto, coaduna-se com a intencionalidade da lei sob análise, especialmente porque esta espécie de inquérito não pode ser igualada ao inquérito penal – a partir do qual foi criado por analogia – por se tratar de procedimento muito mais abrangente do que o modelo do qual partiu, permitindo ao Ministério Público, que o preside, não só investigar (suspeita de lesão aos direitos que deve proteger), como chegar a exercer função jurisdicional –, ao firmar compromisso de ajustamento de conduta com o causador do dano, por exemplo. É a jurisdição se fazendo presente ante a solução encontrada para dirimir o conflito.4
Assim, não havendo qualquer demonstração de prejuízo ou periculosidade do acesso da investigada aos termos do procedimento que lhe é movido, defiro a liminar vindicada, apenas para garantir-lhe o direito de acesso aos termos da investigação, naquilo que lhe diga respeito, antes da realização da audiência em que será ouvida, sem carga dos autos nem cópias do inquérito. Defiro nesses termos. Cumprida a liminar, intimem-se as autoridades coatoras para apresentarem suas informações, no decêndio legal. Após, vistas à douta Procuradoria de Justiça para oferta de parecer. Intime-se. Cuiabá, 10 de dezembro de 2005. Des. Orlando de Almeida Perri – Relator. (Mandado de Segurança nº 47932/2005)
Buscando a correta interpretação da Lei da Ação Civil Pública (aqui se pretenderá demonstrar que seu sentido está na necessidade de evitar e/ou reparar lesões aos direitos coletivos e difusos, também chamados metaindividuais, com a máxima presteza e eficácia que requer a dimensão da lesão), nessa medida a lei dotou o Ministério Público, responsável pela proteção desses direitos, de instrumentos que lhe permitam esta presteza e esta eficácia, quais sejam (i) a ação civil pública e (ii) o inquérito civil, que devem viabilizar uma tomada de ação eficaz ante a situação da vida que se pretende proteger, nos limites da atuação do referido órgão. Nesse contexto, o contraditório, ao ser aplicado no inquérito civil, presta-se a prover a necessária eficácia à ação do
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Especificamente sobre o inquérito civil, assim se pronunciou Edgard Fiore:
4 O contraditório no inquérito civil. RT 811/35.
74
Medidas Provisórias Medida Provisória nº 784, de 07.06.2017 Dispõe sobre o processo administrativo sancionador na esfera de atuação do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários, altera a Lei nº 4.131, de 3 de setembro de 1962, a Lei nº 4.829, de 5 de novembro de 1965, a Lei nº 6.024, de 13 de março de 1974, a Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, a Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, a Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, a Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999, a Lei nº 10.214, de 27 de março de 2001, a Lei nº 11.371, de 28 de novembro de 2006, a Lei nº 11.795, de 8 de outubro de 2008, a Lei nº 12.810, de 15 de maio de 2013, a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, o Decreto nº 23.258, de 19 de outubro de 1933, o Decreto-Lei nº 9.025, de 27 de fevereiro de 1946 e a Medida Provisória nº 2.224, de 4 de setembro de 2001, e dá outras providências. (DOU de 08.06.2017)
Medida Provisória nº 782, de 31.05.2017 Estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios. (DOU – Ed. Extra de 31.05.2017 – Ret. DOU – Ed. Extra de 01.06.2017)
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Patrimônio Genético. Diversidade Biológica
2.187-13, DE 24.08.2001
Previdência Social. Alteração na Legislação
2.189-49, DE 23.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.190-34, DE 23.08.2001
Vigilância Sanitária. Alteração da Lei nº 9.782/1999
2.192-70, DE 24.08.2001
Proes. Bancos Estaduais
2.196-3, DE 24.08.2001
Instituições Financeiras Federais. Recuperação. Empresa Gestora de Ativos – Emgea
2.197-43, DE 24.08.2001
SFH. Disposições
2.198-5, DE 24.08.2001
Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
2.199-14, DE 24.08.2001
IR. Incentivos Fiscais
2.200-2, DE 24.08.2001
Infraestrutura de Chaves Públicas. ICP-Brasil
2.206-1, DE 06.09.2001
Programa Nacional de Renda Mínima
2.208, DE 17.08.2001
Estudante Menor de 18 Anos. Comprovação
2.209, DE 29.08.2001
Comercializadora Brasileira de Energia Elétrica – CBEE
2.210, DE 29.08.2001
Orçamento. Crédito Extraordinário
2.211, DE 29.08.2001
Orçamento 2001 e 2002. Diretrizes
2.213-1, DE 30.08.2001
Programa Bolsa-Renda. Estiagem
2.214, DE 31.08.2001
Administração Pública Federal. Recursos
Planos de Saúde. Alteração da Lei nº 9.656/1998
2.215-10, DE 31.08.2001
Militares das Forças Armadas. Reestruturação da Remuneração
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dinheiro Direto na Escola
2.220, DE 04.09.2001
Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU
2.224, DE 04.09.2001
Capitais Brasileiros no Exterior
2.179-36, DE 24.08.2001
União e Banco Central. Relações Financeiras
2.225-45, DE 04.09.2001
2.180-35, DE 24.08.2001
Advocacia-Geral da União. Alteração na Legislação
Servidor Público. Tráfico de Entorpecentes. Alteração das Leis nºs 6.368/1976 e 8.112/1990
2.181-45, DE 24.08.2001
Operações Financeiras do Tesouro Nacional
2.226, DE 04.09.2001
Alteração da CLT
2.183-56, DE 24.08.2001
Reforma Agrária. Alteração na Legislação
2.227, DE 04.09.2001
Plano Real. Correção Monetária. Exceção
2.184-23, DE 24.08.2001
Carreira Policial. Gratificação
2.228-1, DE 06.09.2001
2.185-35, DE 24.08.2001
Dívida Pública Mobiliária. Consolidação. Assunção. Refinanciamento
Cultura. Política Nacional do Cinema – Ancine. Prodecine. Funcines
2.229-43, DE 06.09.2001
Policiais Civis da União e DF. Alteração na legislação
2.156-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento do Nordeste – Adene
2.157-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA
2.158-35, DE 24.08.2001
Cofins, PIS/Pasep e IR. Alteração na Legislação
2.159-70, DE 24.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.161-35, DE 23.08.2001
Programa Nacional de Desestatização. Alteração da Lei nº 9.491/1997
2.162-72, DE 23.08.2001
Notas do Tesouro Nacional – NTN
2.163-41, DE 23.08.2001
Meio Ambiente. Alteração da Lei nº 9.605/1998
2.164-41, DE 24.08.2001
Alteração da CLT. Trabalho a Tempo Parcial e PAT
2.165-36, DE 23.08.2001
Servidor Público e Militar. Auxílio-Transporte
2.166-67, DE 24.08.2001
Código Florestal. Alteração da Lei nº 4.771/1965
2.167-53, DE 23.08.2001
Recebimento de Valores Mobiliários pela União
2.168-40, DE 24.08.2001
Cooperativas. Recoop. Sescoop
2.169-43, DE 24.08.2001
Servidor Público. Vantagem de 28,86%
2.170-36, DE 23.08.2001
Tesouro Nacional. Administração de Recursos
2.172-32, DE 23.08.2001
Usura. Agiotagem
2.173-24, DE 23.08.2001
Anuidades Escolares
2.174-28, DE 24.08.2001
União. Programa de Desligamento Voluntário – PDV
2.177-44, DE 24.08.2001 2.178-36, DE 24.08.2001
Normas do Juris SÍNTESE atingidas pelas Medidas Provisórias em vigor (até 30.06.2017)
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
770
27.03.2017-extra
3º
Lei nº 12.599/12
14
777
27.04.2017
14
Lei nº 9.365/96
2º
771
30.03.2017
17
Lei nº 11.356/06
15
777
27.04.2017
15
Lei nº 10.893/04
35
771
30.03.2017
17
Lei nº 12.396/11
777
27.04.2017
16
Lei nº 10.849/04
7º
772
30.03.2017
1º
Lei nº 7.889/89
2º
777
27.04.2017
18
Lei nº 8.019/90
3º e 9º
774
30.03.2017-extra
1º
Lei nº 12.546/11
7º-A, 8º e 8º-A
777
27.04.2017
18
Lei nº 9.365/96
3º
774
30.03.2017-extra
2º
Lei nº 10.865/04
8º
780
22.05.2017
10
Lei nº 10.522/02
10-A
774
30.03.2017-extra
2º
Lei nº 12.546/11
7º, 8º, 9º, Anexos I e II
780
22.05.2017
11
Lei nº 8.213/91
115
775
07.04.2017
1º
Lei nº 12.810/13
26 e 26-A
781
23.05.2017-extra
1
LC 79/94
1º, 3º, 3º-A, 3º-B, 3º-C e 3º-D
775
07.04.2017
1º
Lei nº 12.810/13
63-A
781
23.05.2017-extra
2
Lei nº 11.473/07
2º e 5º
776
27.04.2017
1º
Lei nº 6.015/73
15, 54 e 70
781
23.05.2017-extra
3
LC 79/94
2º e 3º
777
27.04.2017
13
Lei nº 8.019/90
7º
781
23.05.2017-extra
2
MP 755/16
Julho/2017 – Ed. 244
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76
Julho/2017 – Ed. 244
77
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
782
31.05.2017-extra
79
Lei nº 13.334/16
4º, 7º e 8º
2.158-35
27.08.2001
72
Lei nº 8.218/91
11 e 12
782
31.05.2017-extra
81
Lei nº 10.683/03
2.158-35
27.08.2001
73
Lei nº 9.317/96
1º e 64-A
782
31.05.2017-extra
81
MP 768/17
2.158-35
27.08.2001
73 e 93
Lei nº 9.317/96
9º e 15
782
31.05.2017-extra
81
Lei nº 13.334/16
2.158-35
27.08.2001
75
Lei nº 9.532/97
1º, 15 e 64-A
783
31.05.2017-extra
15
Lei nº 13.043/14
2.158-35
27.08.2001
82
Lei nº 8.981/95
29
784
08.06.2017
37
Lei nº 6.385/76
9º e 11
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.432/97
11
784
08.06.2017
41
Decreto nº 23.258/33
5º-A, 6º e 6º-A
2.158-35
27.08.2001
93
LC 70/91
6º e 7º
784
08.06.2017
42
DL 9.025/46
10
2.158-35
27.08.2001
93
LC 85/96
Revogada
784
08.06.2017
43
Lei nº 4.131/62
23, 25 e 58
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 7.714/88
5º
784
08.06.2017
44
Lei nº 4.829/95
21
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.004/95
Revogada
784
08.06.2017
45
Lei nº 6.024/74
19
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.493/97
7º
784
08.06.2017
46
Lei nº 9.069/95
66
2.161-35
24.08.2001
1º e 6º
Lei nº 9.491/97
2º, 4º, 5º, 6º e 30
784
08.06.2017
47
Lei nº 9.613/98
16
2.162-72
24.08.2001
6º
Lei nº 9.094/95
2º
784
08.06.2017
48
Lei nº 9.873/99
3º
2.163-41
24.08.2001
1º
Lei nº 9.605/98
79-A
784
08.06.2017
49
Lei nº 10.214/01
9º
2.164-41
27.08.2001
7º e 8º
Lei nº 7.998/90
784
08.06.2017
50
MP 2.224/01
1º
2º, 2º-A, 2º-B, 3º-A, 7º-A, 8º-A, 8º-B e 8º-C
784
08.06.2017
51
Lei nº 11.371/06
7º
2.164-41
27.08.2001
1º e 2º
CLT
784
08.06.2017
52
Lei nº 11.795/08
42
58-A, 59, 130-A, 143, 476-A, 627-A, 643 e 652
784
08.06.2017
53
Lei nº 12.810/13
29
2.164-41
27.08.2001
3º
Lei nº 4.923/65
1º
784
08.06.2017
54
Lei nº 12.865/13
11
2.164-41
27.08.2001
4º
Lei nº 5.889/73
18
784
08.06.2017
57
Lei nº 4.595/64
35, 36, 42, 43 e 44
2.164-41
27.08.2001
5º
Lei nº 6.321/76
2º
784
08.06.2017
57
DL 448/69
2.164-41
27.08.2001
6º
Lei nº 6.494/77
1º
784
08.06.2017
57
Lei nº 6.385/76
11 e 26
2.164-41
27.08.2001
9º
Lei nº 8.036/90
19-A, 20, 29-C e 29-D
784
08.06.2017
57
Lei nº 9.069/95
67
2.164-41
27.08.2001
10
Lei nº 9.601/98
2º
784
08.06.2017
57
Lei nº 9.447/97
9º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 7.418/85
1º
784
08.06.2017
57
MP 2.224/01
3º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 8.627/93
6º
784
08.06.2017
57
Lei nº 11.371/06
12
2.166-67
25.08.2001-extra
1º
Lei nº 4.771/65
1º, 3º-A, 4º, 14, 16, 37-A, 44, 44-A, 44-B e 44-C
784
08.06.2017
57
Lei nº 11.795/08
7º, 43 e 44
2.166-67
25.08.2001
3º
Lei nº 9.393/96
10
784
08.06.2017
57
Lei nº 4.595/64
34
2.167-53
24.08.2001
2º e 3º
Lei nº 9.619/98
1º e 4º-A
2.156-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º e 11
2.168-40
27.08.2001
13
Lei nº 5.764/71
88
2.156-5
27.08.2001
32
DL 2.397/87
12
2.168-40
27.08.2001
14
Lei nº 9.138/95
2º
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 8.034/90
1º
2.168-40
27.08.2001
18
Lei nº 10.186/01
7º
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 9.532/97
2º
2.170-36
24.08.2001
8º
Lei nº 8.212/91
60
2.157-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º
2.172-32
24.08.2001
7º
Lei nº 1.521/51
4º, § 3º
2.158-35
27.08.2001
2º e 93
Lei nº 9.718/98
3º e 8º
2.173-24
24.08.2001
1º e 2º
Lei nº 9.870/99
1º e 6º
2.158-35
27.08.2001
3º e 93
Lei nº 9.701/98
1º
2.177-44
27.08.2001
1º e 8º
Lei nº 9.656/98
2.158-35
27.08.2001
10 e 93
Lei nº 9.779/99
14 e 17
2.158-35
27.08.2001
19 e 93
Lei nº 9.715/98
2º e 4º
2.158-35
27.08.2001
34 e 75
Lei nº 9.532/97
1º e 64-A
2.158-35
27.08.2001
64
DL 70.235/72
1º, 25 e 64-A
1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 24-A, 24-B, 24-C, 24-D, 25, 26, 27, 28, 29, 29-A, 30, 31, 32, 34, 35, 35-A, 35-B, 35-C, 35-D, 35-E, 35-F, 35-G, 35-H e 35-I
2.158-35
27.08.2001
69
DL 1.455/76
1º, 9º, 10, 16, 18, 19 e 64-A
2.178-36
25.08.2001-extra
16
Lei nº 9.533/97
4º
2.158-35
27.08.2001
70
Lei nº 9.430/96
63
2.178-36
25.08.2001-extra
32
Lei nº 8.913/97
Revogada
8º e 10
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
2.180-35
27.08.2001
1º
Lei nº 8.437/92
1º e 4º
2.220
05.09.2001-extra
15
Lei nº 6.015/73
167, I
2.180-35
27.08.2001
4º
Lei nº 9.494/97
1º-A, 1º-B (CPC e CLT), 1º-C, 1º-D, 1º-E, 1º-F, 2º-A e 2º-B
2.224
05.09.2001
4º
Lei nº 4.131/62
6º
2.225-45
05.09.2001
1º
Lei nº 6.368/76
3º
2.225-45
05.09.2001
2º, 3º e 15
Lei nº 8.112/90
25, 26, 46, 47, 61, 62-A, 67, 91, 117 e 119
2.180-35
27.08.2001
6º
Lei nº 7.347/85
1º e 2º
2.180-35
27.08.2001
7º
Lei nº 8.429/92
17
2.180-35
27.08.2001
8º
Lei nº 9.704/98
1º
2.225-45
05.09.2001
4º
Lei nº 8.429/92
17
2.180-35
27.08.2001
10
CPC
741
2.225-45
05.09.2001
5º
Lei nº 9.525/97
2º
2.180-35
27.08.2001
14
Lei nº 4.348/64
4º
2.226
05.09.2001
1º
CLT
896-A
2.180-35
27.08.2001
21
Lei nº 10.257/01
53
2.226
05.09.2001
3º
Lei nº 9.469/97
6º
2.181-45
27.08.2001
45
Lei nº 8.177/91
18
2.228-1
05.09.2001
51
Lei nº 8.685/93
5º
2.181-45
27.08.2001
46
Lei nº 9.365/96
6º
2.228-1
05.09.2001
52 e 53
Lei nº 8.313/91
3º, II, a (a partir de 01.01.2007), e 18, § 3º
2.181-45
27.08.2001
52
Lei nº 10.150/00
1º
2.229-43
10.09.2001
72
Lei nº 9.986/00
22
2.183-56
27.08.2001
1º
DL 3.365/41
10, 15-A, 15-B e 27
2.229-43
10.09.2001
74
Lei nº 8.745/93
4º
2.183-56
27.08.2001
3º
Lei nº 8.177/91
5º
2.183-56
27.08.2001
4º
Lei nº 8.629/93
2º, 2º-A, 5º, 6º, 7º, 11, 12, 17, 18 e 26-A
2.187-13
27.08.2001
2º
Lei nº 6.015/73
80
2.187-13
27.08.2001
3º e 16
Lei nº 8.212/91
38, 55, 56, 68, 101 e 102
2.187-13
27.08.2001
4º e 16
Lei nº 8.213/91
41, 95, 96, 134, 144, 145, 146 e 147
2.187-13
27.08.2001
7º
Lei nº 9.639/98
1º, 2º e 5º
2.187-13
27.08.2001
16
Lei nº 9.711/98
7º, 8º, 9º, 12, 13, 14, 15, 16 e 17
2.189-49
24.08.2001
10
Lei nº 9.532/97
6º, II, 34 e 82, II, f
2.189-49
24.08.2001
11
Lei nº 9.250/95
10 e 25
2.189-49
24.08.2001
13
Lei nº 9.430/96
79
2.189-49
24.08.2001
14
Lei nº 9.317/96
9º
2.190-34
24.08.2001
7º e 8º
Lei nº 9.294/96
2º, 3º e 7º
2.192-70
25.08.2001-extra
23
Lei nº 9.496/97
1º, 3º, 6º, 7º-A e 7º-B
2.196-3
25.08.2001
12
Lei nº 8.036/90
9º
2.196-3
25.08.2001
14
Lei nº 7.827/89
9º-A
2.197-43
27.08.2001
3º e 8º
Lei nº 8.692/93
23 e 25
2.197-43
27.08.2001
4º e 8º
Lei nº 4.380/64
9º, 14 e 18
2.197-43
27.08.2001
5º
Lei nº 8.036/90
9º, 20, 23, 29-A e 29-B
2.199-14
27.08.2001
18
Lei nº 9.532/97
4º
2.211
30.08.2001
1º
Lei nº 9.995/00
35 e 70
2.211
30.08.2001
2º
Lei nº 10.266/01
18, 34, 38 e 51
2.214
01.09.2001-extra
1º
Lei nº 10.261/01
1º
2.215-10
01.09.2001
41
Lei nº 8.448/92
6º
2.215-10
01.09.2001
41
Lei nº 8.460/92
2º, 20, 25, 26 e 27, 5º, 7º-A, 13, 14, 14-A, 23, 24, 27, 28, 30, 32, 34-A, 38, 44, 51-A e 61-A
2.217-3
05.09.2001
1º
Lei nº 10.233/01
74, 77, 78-A, 78-B, 78-C, 78-D, 78-E, 78-F, 78-G, 78-H, 78-I 78-J, 82, 83, 84, 85-A, 85-B, 85-C, 85-D, 86, 88, 89, 100, 102-A, 103-A, 103-B, 103-C, 103-D, 113-A, 114-A, 15, 116-A, 118 e 119
Julho/2017 – Ed. 244
MP
78
Normas Legais Lei nº 13.460, de 26.06.2017 Dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públicos da administração pública. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.459, de 26.06.2017 Altera a Lei nº 12.086, de 6 de novembro de 2009, que dispõe sobre os militares da Polícia Militar do Distrito Federal e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.458, de 26.06.2017 Altera a Lei nº 11.482, de 31 de maio de 2007, para prorrogar o prazo de vigência da não incidência do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) previsto no art. 17 da Lei nº 9.432, de 8 de janeiro de 1997; a Lei nº 9.432, de 8 de janeiro de 1997; e a Lei nº 10.893, de 13 de julho de 2004. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.457, de 26.06.2017 Altera as Leis nºs 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, e 11.907, de 2 de fevereiro de 2009, que dispõe sobre a reestruturação da composição remuneratória da Carreira de Perito Médico Previdenciário e da Carreira de Supervisor Médico-Pericial; e institui o Bônus Especial de Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.456 de 26.06.2017 Altera o Programa de que trata a Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015, para denominá-lo Programa Seguro-Emprego e para prorrogar seu prazo de vigência. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.455, de 26.06.2017 Dispõe sobre a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao público em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado, e altera a Lei nº 10.962, de 11 de outubro de 2004. (DOU de 27.06.2017) Lei nº 13.454, de 23.06.2017 Autoriza a produção, a comercialização e o consumo, sob prescrição médica, dos anorexígenos sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol. (DOU de 26.06.2017) Lei nº 13.453, de 21.06.2017 Institui o Dia Nacional do Engenheiro de Custos. (DOU de 22.06.2017) Lei nº 13.452, de 19.06.2017 Altera os limites do Parque Nacional do Jamanxim e cria a Área de Proteção Ambiental Rio Branco. (DOU de 20.06.2017) Lei nº 13.451, de 16.06.2017 Dispõe sobre a competência da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) para regular e controlar a importação e o ingresso de mercadorias, com incentivos fiscais, na Zona Franca de Manaus, nas áreas de livre comércio e na Amazônia Ocidental e institui a Taxa de Controle de Incentivos Fiscais (TCIF) e a Taxa de Serviços (TS). (DOU de 19.06.2017) Lei nº 13.450, de 16.06.2017 Denomina Aeroporto de São Paulo/Congonhas – Deputado Freitas Nobre o aeroporto da cidade de São Paulo, capital do Estado de São Paulo. (DOU de 19.06.2017) Lei nº 13.449, de 16.06.2017 Institui o Dia Nacional do Policial e do Bombeiro Militares. (DOU de 19.06.2017) Lei nº 13.448, de 05.06.2017 Estabelece diretrizes gerais para prorrogação e relicitação dos contratos de parceria definidos nos termos da Lei nº 13.334, de 13 de setembro de 2016, nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário da administração pública federal, e altera a Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, e a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. (DOU de 06.06.2017)
Indicadores
I – Índices de Atualização dos Débitos Trabalhistas TABELA ÚNICA PARA ATUALIZAÇÃO DE DÉBITOS TRABALHISTAS ATÉ 31 DE JULHO DE 2017 – PARA 1º DE AGOSTO DE 2017* *TR prefixada de 1º julho/2017 a 1º agosto/2017 (Banco Central) = 0,06230% Mês/Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999 JAN 0,009270479 2,425396548 1,842689531 1,681514814 1,531643657 1,420900674
Mês/Ano 2006 2007 2008 2009 2010 2011 JAN 1,142472367 1,119656753 1,103704787 1,085951181 1,078305929 1,070929880
FEV
0,006554354 2,375480575 1,819893545 1,669096734 1,514291392 1,413602246
FEV
1,139821143 1,117211178 1,102591170 1,083956701 1,078305929 1,070164713
MAR
0,004686368 2,332261438 1,802544058 1,658126534 1,507566139 1,401968710
MAR
1,138995371 1,116406249 1,102323306 1,083468057 1,078305929 1,069604240
ABR
0,003303749 2,279829910 1,787991595 1,647719572 1,494126471 1,385873179
ABR
1,136639118 1,114315793 1,101872640 1,081912267 1,077452586 1,068309449
MAIO
0,002263307 2,203443146 1,776273518 1,637548757 1,487107325 1,377481561
MAIO
1,135668122 1,112900184 1,100821355 1,081421301 1,077452586 1,067915388
JUN
0,001545552 2,134145314 1,765876040 1,627209468 1,480381950 1,369591345
JUN
1,133528021 1,111023665 1,100011747 1,080935961 1,076903365 1,066241389
JUL
2,893793153 2,074275500 1,755171251 1,616644695 1,473144391 1,365347844
JUL
1,131336622 1,109964758 1,098752576 1,080227332 1,076269443 1,065054918
AGO
2,755307224 2,014045470 1,744961481 1,606076710 1,465082045 1,361354990
AGO
1,129359114 1,108336612 1,096653581 1,079093205 1,075032081 1,063747572
SET
2,697811466 1,962921188 1,732596006 1,596069355 1,459609967 1,357357572
SET
1,126614681 1,106714169 1,094930161 1,078880666 1,074055764 1,061543807
OUT
2,633575916 1,925578445 1,721201651 1,585802867 1,453053788 1,353682324
OUT
1,124903703 1,106324742 1,092777390 1,078880666 1,073302306 1,060480146
NOV
2,567961921 1,894247590 1,709989600 1,575478755 1,440247111 1,350623163
NOV
1,122798455 1,105062761 1,090045735 1,078880666 1,072795946 1,059823055
DEZ
2,495080616 1,867381571 1,696172578 1,551685214 1,431463650 1,347929999
DEZ
1,121360871 1,104411158 1,088284890 1,078880666 1,072435608 1,059139910
Mês/Ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 JAN 1,343900984 1,316307111 1,286898196 1,251815559 1,196208208 1,174844619
Mês/Ano 2012 2013 2014 2015 2016 2017 JAN 1,058148425 1,055091727 1,053080101 1,044107897 1,025691641 1,005455557
FEV
1,341019133 1,314507550 1,283572460 1,245738845 1,194679019 1,172640056
FEV
1,057234974 1,055091727 1,051895666 1,043191975 1,024339513 1,003749183
MAR
1,337904492 1,314023989 1,282071154 1,240632402 1,194132106 1,171513060
MAR
1,057234974 1,055091727 1,051331101 1,043016748 1,023360157 1,003446143
ABR
1,334911620 1,311762510 1,279821229 1,235958009 1,192012707 1,168434236
ABR
1,056107052 1,055091727 1,051051522 1,041666748 1,021146312 1,001924220
MAIO
1,333177156 1,309737656 1,276811783 1,230808307 1,190971798 1,166098540
MAIO
1,055867370 1,055091727 1,050569310 1,040549198 1,019816471 1,001924220
JUN
1,329863138 1,307349129 1,274133555 1,225111538 1,189133398 1,163159237
JUN
1,055373455 1,055091727 1,049935150 1,039350827 1,018255485 1,001159334
JUL
1,327023308 1,305445789 1,272121059 1,220028898 1,187043015 1,159688290
JUL
1,055373455 1,055091727 1,049447157 1,037469894 1,016179431 1,000623000
AGO
1,324973574 1,302266955 1,268751256 1,213397679 1,184730421 1,156709762
AGO
1,055221503 1,054871259 1,048342204 1,035084025 1,014534870 1,000000000
SET
1,322295924 1,297807688 1,265611274 1,208517685 1,182359790 1,152714454
SET
1,055091727 1,054871259 1,047711482 1,033155124 1,011959433
OUT
1,320924804 1,295699585 1,263141832 1,204465862 1,180320197 1,149682741
OUT
1,055091727 1,054787931 1,046797627 1,031175268 1,010368103
NOV
1,319188752 1,291936175 1,259655107 1,200608307 1,179013849 1,147273466
NOV
1,055091727 1,053818418 1,045712178 1,029332762 1,008753090
DEZ
1,317611571 1,289450115 1,256333361 1,198479807 1,177664246 1,145064637
DEZ
1,055091727 1,053600322 1,045207343 1,027999447 1,007314644
OBS.: Foram consideradas as divisões por 1.000 ocorridas em março/1986, janeiro/1989, agosto/1993, e por 2.750 ocorridas em julho/1994.
TABELA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO PARA APURAÇÃO DO SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO (Art. 175 do Decreto nº 3.048/1999) JUNHO/2017
Julho/2017 – Ed. 244
MÊS
81
jul/94 ago/94 set/94 out/94 nov/94 dez/94 jan/95 fev/95 mar/95 abr/95 maio/95 jun/95 jul/95 ago/95 set/95 out/95 nov/95 dez/95 jan/96 fev/96 mar/96 abr/96 maio/96 jun/96 jul/96 ago/96 set/96 out/96 nov/96 dez/96 jan/97 fev/97
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 7,655827 7,217032 6,843383 6,741585 6,618482 6,408910 6,271563 6,168548 6,108078 6,023152 5,909686 5,761612 5,658625 5,522765 5,467002 5,403778 5,329169 5,249896 5,164679 5,090359 5,054473 5,039857 5,004823 4,922132 4,862805 4,810372 4,810180 4,803935 4,793389 4,780005 4,738308 4,664607
MÊS mar/97 abr/97 maio/97 jun/97 jul/97 ago/97 set/97 out/97 nov/97 dez/97 jan/98 fev/98 mar/98 abr/98 maio/98 jun/98 jul/98 ago/98 set/98 out/98 nov/98 dez/98 jan/99 fev/99 mar/99 abr/99 maio/99 jun/99 jul/99 ago/99 set/99 out/99
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 4,645098 4,591833 4,564900 4,551246 4,519609 4,515545 4,515545 4,489059 4,473848 4,437021 4,406615 4,368175 4,367302 4,357280 4,357280 4,347281 4,335143 4,335143 4,335143 4,335143 4,335143 4,335143 4,293071 4,244262 4,063828 3,984926 3,983731 3,983731 3,943508 3,881787 3,826306 3,770874
MÊS nov/99 dez/99 jan/00 fev/00 mar/00 abr/00 maio/00 jun/00 jul/00 ago/00 set/00 out/00 nov/00 dez/00 jan/01 fev/01 mar/01 abr/01 maio/01 jun/01 jul/01 ago/01 set/01 out/01 nov/01 dez/01 jan/02 fev/02 mar/02 abr/02 maio/02 jun/02
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 3,700926 3,609603 3,565745 3,529741 3,523048 3,516717 3,512152 3,488777 3,456630 3,380237 3,319816 3,297066 3,284912 3,272151 3,247470 3,231635 3,220685 3,195124 3,159422 3,145582 3,100317 3,050893 3,023680 3,012233 2,969180 2,946784 2,941490 2,935911 2,930636 2,927416 2,907067 2,875153
MÊS jul/02 ago/02 set/02 out/02 nov/02 dez/02 jan/03 fev/03 mar/03 abr/03 maio/03 jun/03 jul/03 ago/03 set/03 out/03 nov/03 dez/03 jan/04 fev/04 mar/04 abr/04 maio/04 jun/04 jul/04 ago/04 set/04 out/04 nov/04 dez/04 jan/05 fev/05
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 2,825980 2,769212 2,705365 2,635780 2,529297 2,389736 2,326910 2,277488 2,241843 2,205236 2,196232 2,211046 2,226632 2,231094 2,217347 2,194306 2,184694 2,174257 2,162579 2,144778 2,136446 2,124337 2,115663 2,107234 2,096750 2,081555 2,071199 2,067684 2,064174 2,055132 2,037608 2,026060
mar/05 abr/05 maio/05 jun/05 jul/05 ago/05 set/05 out/05 nov/05 dez/05 jan/06 fev/06 mar/06 abr/06 maio/06 jun/06 jul/06 ago/06 set/06 out/06 nov/06 dez/06 jan/07 fev/07 mar/07 abr/07 maio/07 jun/07 jul/07 ago/07 set/07 out/07 nov/07 dez/07 jan/08 fev/08 mar/08
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 2,017184 2,002566 1,984507 1,970712 1,972882 1,972290 1,972290 1,969336 1,957980 1,947463 1,939705 1,932362 1,927927 1,922736 1,920432 1,917938 1,919282 1,917173 1,917556 1,914493 1,906296 1,898323 1,886626 1,877427 1,869574 1,861384 1,856557 1,851743 1,846020 1,840132 1,829339 1,824777 1,819319 1,811529 1,794126 1,781831 1,772790
MÊS abr/08 maio/08 jun/08 jul/08 ago/08 set/08 out/08 nov/08 dez/08 jan/09 fev/09 mar/09 abr/09 maio/09 jun/09 jul/09 ago/09 set/09 out/09 nov/09 dez/09 jan/10 fev/10 mar/10 abr/10 maio/10 jun/10 jul/10 ago/10 set/10 out/10 nov/10 dez/10 jan/11 fev/11 mar/11 abr/11
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 1,763795 1,752578 1,735914 1,720259 1,710339 1,706755 1,704199 1,695720 1,689301 1,684416 1,673704 1,668532 1,665201 1,656093 1,646216 1,639330 1,635569 1,634261 1,631651 1,627744 1,621744 1,617861 1,603748 1,592600 1,581372 1,569911 1,563190 1,564911 1,566007 1,567104 1,558687 1,544478 1,528732 1,519615 1,505463 1,497377 1,487559
MÊS maio/11 jun/11 jul/11 ago/11 set/11 out/11 nov/11 dez/11 jan/12 fev/12 mar/12 abr/12 maio/12 jun/12 jul/12 ago/12 set/12 out/12 nov/12 dez/12 jan/13 fev/13 mar/13 abr/13 maio/13 jun/13 jul/13 ago/13 set/13 out/13 nov/13 dez/13 jan/14 fev/14 mar/14 abr/14 maio/14
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 1,476926 1,468555 1,465331 1,465331 1,459202 1,452665 1,448032 1,439825 1,432519 1,425250 1,419713 1,417162 1,408150 1,400448 1,396816 1,390835 1,384605 1,375936 1,366236 1,358898 1,348916 1,336619 1,329705 1,321774 1,314021 1,309438 1,305782 1,307482 1,305393 1,301878 1,293985 1,287035 1,277834 1,269834 1,261759 1,251497 1,241811
MÊS jun/14 jul/14 ago/14 set/14 out/14 nov/14 dez/14 jan/15 fev/15 mar/15 abr/15 maio/15 jun/15 jul/15 ago/15 set/15 out/15 nov/15 dez/15 jan/16 fev/16 mar/16 abr/16 maio/16 jun/16 jul/16 ago/16 set/16 out/16 nov/16 dez/16 jan/17 fev/17 mar/17 abr/17 maio/17
FATOR SIMPLIFICADO (MULTIPLICAR) 1,234404 1,231203 1,229605 1,227395 1,221411 1,216787 1,210372 1,202914 1,185370 1,171778 1,154347 1,146209 1,134973 1,126300 1,119805 1,117013 1,111345 1,102853 1,090746 1,081016 1,064936 1,054914 1,050293 1,043614 1,033486 1,028651 1,022110 1,018951 1,018136 1,016408 1,015697 1,014277 1,010035 1,007617 1,004403 1,003600
Julho/2017 – Ed. 244
MÊS
82
ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO – TR – DIÁRIA (PRO RATA DIE)
Julho/2017 – Ed. 244
MÊS: JULHO ANO: 2017 TR: 0,06230%
83
DIA 1º 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 1º
MÊS Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Julho Agosto
Banco Central do Brasil, 04.07.2017
TR DIÁRIA 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% 0,002966% -
TR ACUMULADA 0,000000% 0,000000% 0,000000% 0,002966% 0,005932% 0,008898% 0,011864% 0,014830% 0,014830% 0,014830% 0,017796% 0,020762% 0,023729% 0,026695% 0,029662% 0,029662% 0,029662% 0,032628% 0,035595% 0,038562% 0,041529% 0,044496% 0,044496% 0,044496% 0,047463% 0,050430% 0,053398% 0,056365% 0,059332% 0,059332% 0,059332% 0,062300%
ÍNDICE 1,00000000 1,00000000 1,00000000 1,00002966 1,00005932 1,00008898 1,00011864 1,00014830 1,00014830 1,00014830 1,00017796 1,00020762 1,00023729 1,00026695 1,00029662 1,00029662 1,00029662 1,00032628 1,00035595 1,00038562 1,00041529 1,00044496 1,00044496 1,00044496 1,00047463 1,00050430 1,00053398 1,00056365 1,00059332 1,00059332 1,00059332 1,00062300
2 – Juros de mora (incidentes a partir da propositura da ação e aplicados sobre o principal corrigido): • Até 28.02.1987 – Juros simples – 0,5% ao mês; • De 01.03.1987 até 31.01.1991 – Juros capitalizados mensalmente – 1% ao mês; • De 01.02.1991 em diante – Juros simples – 1% ao mês.
Fórmula para cálculo da taxa efetiva (T) dos juros capitalizados: T = (1,01)n – 1, onde “n” é igual ao número de dias decorridos desde a data da propositura da ação, contidos no período compreendido entre 01.03.1987 e 31.01.1991, dividido por 30.
Juros Capitalizados Mensalmente Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16
1,0000 2,0100 3,0301 4,0604 5,1010 6,1520 7,2135 8,2856 9,3685 10,4622 11,5668 12,6825 13,8093 14,9474 16,0968 17,2578
17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32
18,4304 19,6147 20,8108 22,0190 23,2391 24,4715 25,7163 26,9734 28,2431 29,5256 30,8208 32,1290 33,4503 34,7848 36,1327 37,4940
33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 –
38,8690 40,257+6 41,6602 43,0768 44,5076 45,9527 47,4122 48,8863 50,3752 51,8789 53,3977 54,9317 56,4810 58,0458 59,6263 –
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.10.1989
NCz$
381,73
Decreto nº 98.211/89
02.10.1989
01.10.1990
Cr$
6.425,14
Port. 3.628/90
01.10.1990
01.11.1989
NCz$
557,33
Decreto nº 98.346/89
31.10.1989
01.11.1990
Cr$
8.329,55
Port. 3.719/90
01.11.1990
01.12.1989
NCz$
788,18
Decreto nº 98.456/89
01.12.1989
01.12.1990
Cr$
8.836,82
Port. 3.787/90
03.12.1990
01.01.1990
NCz$
1.283,95
Decreto nº 98.783/89
29.12.1989
01.01.1991
Cr$
12.325,50
Port. 3.828/90
31.12.1990
01.02.1990
NCz$
2.004,37
Decreto nº 98.900/90
01.02.1990
01.02.1991
Cr$
15.895,46
MP 295/91
01.02.1991
01.03.1990
NCz$
3.674,06
Decreto nº 98.985/90
01.03.1990
01.03.1991
Cr$
17.000,00
Lei nº 8.178/91
04.03.1991
01.04.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.143/90
24.04.1990
01.09.1991
Cr$
42.000,00
Lei nº 8.222/91
06.09.1991
01.05.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.352/90
23.05.1990
01.01.1992
Cr$
96.037,33
Port. 42/92
21.01.1992
01.06.1990
Cr$
3.857,76
Port. 3.387/90
04.06.1990
01.05.1992
Cr$
230.000,00
Lei nº 8.419/92
08.05.1992
01.07.1990
Cr$
4.904,76
Port. 3.501/90
16.07.1990
01.09.1992
Cr$
522.186,94
Port. 601/92
31.08.1992
01.08.1990
Cr$
5.203,46
Port. 429/90
01.08.1990
01.01.1993
Cr$
1.250.700,00
Lei nº 8.542/92
24.12.1992
01.09.1990
Cr$
6.056,31
Port. 3.588/90
03.09.1990
01.03.1993
Cr$
1.709.400,00
Port. Interm. 4/93
01.03.1993
Julho/2017 – Ed. 244
II – Evolução do Salário-Mínimo desde 1989
84
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.05.1993
Cr$
3.303.300,00
Port. Interm. 7/93
04.05.1993
01.04.2002
R$
200,00
Lei nº 10.525/02
28.03.2002
01.07.1993
Cr$
4.639.800,00
Port. Interm. 11/93
01.08.1993
01.04.2003
R$
240,00
Lei nº 10.699/03
10.07.2003
01.08.1993
CR$
5.534,00
Port. Interm. 12/93
03.08.1993
01.05.2004
R$
260,00
Lei nº 10.888/04
25.06.2004
01.09.1993
CR$
9.606,00
Port. Interm. 14/93
02.09.1993
01.05.2005
R$
300,00
Lei nº 11.164/05
19.08.2005
01.10.1993
CR$
12.024,00
Port. Interm. 15/93
04.10.1993
01.04.2006
R$
350,00
MP 288/06
31.03.2006
01.11.1993
CR$
15.021,00
Port. Interm. 17/93
03.11.1993
01.04.2006
R$
350,00
Lei nº 11.321/06
10.07.2006
01.12.1993
CR$
18.760,00
Port. Interm. 19/93
02.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
MP 362/07
30.03.2007-extra
01.01.1994
CR$
32.882,00
Port. Interm. 20/93
31.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
Lei nº 11.498/07
29.06.2007
01.02.1994
CR$
42.829,00
Port. Interm. 02/94
02.02.1994
01.03.2008
R$
415,00
MP 421/08
29.02.2008-extra
01.03.1994
URV
64,79
Port. Interm. 04/94
03.03.1994
01.02.2009
R$
465,00
MP 456/09
30.01.2009-extra
01.07.1994
R$
64,79
Lei nº 9.069/95
30.06.1994/30.06.1995
01.01.2010
R$
510,00
MP 474/09
24.12.2009
01.09.1994
R$
70,00
Lei nº 9.063/95
01.09.1994/20.06.1995
01.01.2011
R$
540,00
MP 516/10
31.12.2010
01.05.1995
R$
100,00
Lei nº 9.032/95
29.04.1995
01.03.2011
R$
545,00
Lei nº 12.382/11
28.02.2011
01.05.1996
R$
112,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2012
RS
622,00
Decreto nº 7.655/11
26.12.2011
01.05.1997
R$
120,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2013
R$
678.00
Decreto nº 7.872/11
26.12.2012
01.05.1998
R$
130,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2014
R$
724,00
Decreto nº 8.166/13
24.12.2013
01.05.1999
R$
136,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2015
R$
788,00
Decreto nº 8.381/14
29.12.2014
03.04.2000
R$
151,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2016
R$
880,00
Decreto nº 8.618/15
30.12.2015
01.04.2001
R$
180,00
MP 2.142/01 (atual 2.194-6)
30.03.2001
01.01.2017
R$
937,00
Lei nº 13.152/15
30.07.2015
Julho/2017 – Ed. 244
III – Previdência Social – Valores de Benefícios
85
Salário-de-benefício mínimo Salário-de-benefício máximo Renda mensal vitalícia Salário-família:
R$ 937,00 R$ 5.531,31 R$ 937,00 I – R$ 44,09 (quarenta e quatro reais e nove centavos) para o segurado com remuneração mensal não superior a R$ 859,88 (oitocentos e cinquenta e nove reais e oitenta e oito centavos);
II – R$ 31,07 (trinta e um reais e sete centavos) para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 859,89 (oitocentos e cinquenta e nove reais e oitenta e nove centavos) e igual ou inferior a R$ 1.292,43 (um mil e duzentos e noventa e dois reais e quarenta e três centavos). Benefícios a idosos e portadores de deficiência Um salário-mínimo (Decreto nº 1.744/1995)
INSS – JANEIRO 2017 Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso, a partir de 1º de janeiro de 2017 Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%)
Até 1.659,38
8%
De 1.659,39 a 2.765,66
9%
De 2.765,67 até 5.531,31
11%
Nota: Escala extinta, conforme o art. 9º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003, DOU 09.05.2003, e o art. 39 da Instrução Normativa DC/INSS nº 89, de 11.06.2003, DOU 13.06.2003.
IV – Imposto de Renda na Fonte TABELA PROGRESSIVA MENSAL Base de cálculo em R$
Alíquota %
Até 1.903,98
-
Parcela a deduzir do imposto em R$
O imposto de renda anual devido, incidente sobre os rendimentos de pessoas físicas, será calculado de acordo com a tabela progressiva anual correspondente à soma das tabelas progressivas mensais vigentes nos meses de cada ano-calendário.
-
De 1.903,99 até 2.826,65
7,5 142,80
De 2.826,66 até 3.751,05
15,0 354,80
De 3.751,06 até 4.664,68
22,5 636,13
Acima de 4.664,68
27,5 869,36
Dedução por dependente
TABELA PROGRESSIVA ANUAL
189,59
V – Limites de Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho NOVOS VALORES PARA DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO (Ato nº 326/2016 do TST, DJe de 18.07.2015, vigência a partir de 01.08.2016) Recurso Ordinário
R$ 8.959,63
Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória
R$ 17.919,26
Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.
Julho/2017 – Ed. 244
Salário-de-contribuição (R$)
ESCALA DE SALÁRIOS-BASE PARA OS SEGURADOS CONTRIBUINTE INDIVIDUAL E FACULTATIVO
86
VI – Indexadores Indexador INPC IGPM UFIR SELIC
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio 0,42 0,24 0,32 0,08 0,36 0,64 0,08 0,01 -1,10 -0,93 Extinta, a partir de outubro de 2000, pela MP 1.973-67, atual Lei nº 10.522, de 19.07.2002, DOU 22.07.2002, art. 29, § 3º.
TDA
1,09 0,87 1,05 Valor de Referência Base Maio/1992 – Cruzeiros 79.297,75 Emissão anterior a Jan./1989 79.297,75
0,79
Junho -0,30 -0,067
0,93 Valores nominais reajustados – Reais 91,87 Emissão anterior a Jan./1989 157,23
0,81
(*) Referente ao primeiro dia de cada mês.
VII – Índices de Atualização dos Débitos Judiciais
Julho/2017 – Ed. 244
Tabela editada em face da Jurisprudência ora predominante.
87
Mês/Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999
Mês/Ano 2000
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
3631,929071 13,851199 16,819757 5132,642163 14,082514 17,065325 7214,955088 14,221930 17,186488 10323,157739 14,422459 17,236328 14747,663145 14,699370 17,396625 21049,339606 15,077143 17,619301 11,346741 15,351547 17,853637 12,036622 15,729195 18,067880 12,693821 15,889632 18,158219 12,885497 16,075540 18,161850 13,125167 16,300597 18,230865 13,554359 16,546736 18,292849
18,353215 18,501876 18,585134 18,711512 18,823781 18,844487 18,910442 18,944480 18,938796 18,957734 19,012711 19,041230
19,149765 19,312538 19,416825 19,511967 19,599770 19,740888 19,770499 19,715141 19,618536 19,557718 19,579231 19,543988
19,626072 19,753641 20,008462 20,264570 20,359813 20,369992 20,384250 20,535093 20,648036 20,728563 20,927557 21,124276
2002
2003
2004
21,280595 22,402504 24,517690 21,410406 22,575003 24,780029 21,421111 22,685620 24,856847 21,448958 22,794510 25,010959 21,468262 22,985983 25,181033 21,457527 23,117003 25,203695 21,521899 23,255705 25,357437 21,821053 23,513843 25,649047 22,085087 23,699602 25,869628 22,180052 23,803880 26,084345 22,215540 24,027636 26,493869 22,279965 24,337592 27,392011
2001
28,131595 28,826445 29,247311 29,647999 30,057141 30,354706 30,336493 30,348627 30,403254 30,652560 30,772104 30,885960
31,052744 31,310481 31,432591 31,611756 31,741364 31,868329 32,027670 32,261471 32,422778 32,477896 32,533108 32,676253
2005 32,957268 33,145124 33,290962 33,533986 33,839145 34,076019 34,038535 34,048746 34,048746 34,099819 34,297597 34,482804
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2006 2007
2008
34,620735 35,594754 37,429911 34,752293 35,769168 37,688177 34,832223 35,919398 37,869080 34,926270 36,077443 38,062212 34,968181 36,171244 38,305810 35,013639 36,265289 38,673545 34,989129 36,377711 39,025474 35,027617 36,494119 39,251821 35,020611 36,709434 39,334249 35,076643 36,801207 39,393250 35,227472 36,911610 39,590216 35,375427 37,070329 39,740658
2009
2010
2011
39,855905 40,110982 40,235326 40,315796 40,537532 40,780757 40,952036 41,046225 41,079061 41,144787 41,243534 41,396135
41,495485 41,860645 42,153669 42,452960 42,762866 42,946746 42,899504 42,869474 42,839465 43,070798 43,467049 43,914759
44,178247 44,593522 44,834327 45,130233 45,455170 45,714264 45,814835 45,814835 46,007257 46,214289 46,362174 46,626438
Mês/Ano 2012 2013 JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2014
2015
2016
2017
46,864232 49,768770 52,537233 55,809388 62,102540 66,188858 47,103239 50,226642 52,868217 56,635366 63,040288 66,466851 47,286941 50,487820 53,206573 57,292336 63,639170 66,626371 47,372057 50,790746 53,642866 58,157450 63,919182 66,839575 47,675238 51,090411 54,061280 58,570367 64,328264 66,893046 47,937451 51,269227 54,385647 59,150213 64,958680 67,133860 48,062088 51,412780 54,527049 59,605669 65,263985 66,932458 48,268754 51,345943 54,597934 59,951381 65,681674 48,485963 51,428096 54,696210 60,101259 65,885287 48,791424 51,566951 54,964221 60,407775 65,937995 49,137843 51,881509 55,173085 60,872914 66,050089 49,403187 52,161669 55,465502 61,548603 66,096324
Observação I – Dividir o valor a atualizar (observar o padrão monetário vigente à época) pelo fator do mês do termo inicial e multiplicar pelo fator do mês do termo final, obtendo-se o resultado na moeda vigente na data do termo final, não sendo necessário efetuar qualquer conversão. Esclarecendo que, nesta tabela, não estão incluídos os juros moratórios, apenas a correção monetária.
Padrões monetários a considerar: Cr$ (cruzeiro): de out./1964 a jan./1967
NCz$ (cruzado novo): de jan./1989 a fev./1990
NCr$ (cruzeiro novo): de fev./1967 a maio/1970
Cr$ (cruzeiro): de mar./1990 a jul./1993
Cr$ (cruzeiro): de jun./1970 a fev./1986
CR$ (cruzeiro real): de ago./1993 a jun./1994
Cz$ (cruzado): de mar./1986 a dez./1988
R$ (real): de jul./1994 em diante
Exemplo: Atualização, até julho de 2017, do valor de Cz$1.000,00 fixado em janeiro de 1988 Cz$ 1.000,00 : 596,94 (janeiro/1988) x 66,932458 (julho/2017) = R$ 112,12
Out./1964 a fev./1986: ORTN Mar./1986 e mar./1987 a jan./1989: OTN Abr./1986 a fev./1987: OTN pro rata Fev./1989: 42,72% (conforme STJ, índice de jan./1989)
Abr./1989 a mar./1991: IPC do IBGE (de mar./1989 a fev./1991) Abr./1991 a jul./1994: INPC do IBGE (de mar./1991 a jun./1994) Ago./1994 a jul./1995: IPC-r do IBGE (de jul./1994 a jun./1995) Ago./1995 em diante: INPC do IBGE (de jul./1995 em diante), sendo que, com relação à aplicação da deflação, a matéria ficará sub judice
Mar./1989: 10,14% (conforme STJ, índice de fev./1989) Observação III – Aplicação do índice de 10,14%, relativo ao mês de fevereiro de 1989, ao invés de 23,60%, em cumprimento ao decidido no Processo nº G-36.676/2002.
Julho/2017 – Ed. 244
Observação II – Os fatores de atualização monetária foram compostos pela aplicação dos seguintes índices:
Fonte: DJe, TJSP, Administrativo, 10.07.2017, p. 2. * Aplicável aos cálculos judiciais, exceto para aqueles com normas específicas estabelecidas por lei ou com decisão transitada em julgado, que estabelece critérios e índices diferentes.
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