Abdicar de Pensar É Crime? Reflexões a Partir de Hannah Arendt – Antonio Baptista Gonçalves – p. 1
Lei Complementar nº 147/2014 e Seus Reflexos na Participação das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte nas Licitações Públicas – Edcarlos Alves Lima e Juliana Torresan Ricardino – p. 20 Legalização da Venda de Animais Silvestres: um Remédio para o Tráfico de Fauna? – Carolina Brandt Gualdi – p. 30 Pluralidade Sindical Oblíqua – Amauri Cesar Alves – p. 48 Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis e Direitos a Eles Relativos: Competência e Principais Caracterizações Constitucionais e Legais – Marcelo Kokke – p. 68 Parecer – INSS – Desoneração da Folha – Telecobrança – Roberto Moreira Dias – p. 74 Acórdão na Íntegra – Supremo Tribunal Federal – p. 80 Pesquisa Temática – Adicional de Insalubridade – p. 89 Jurisprudência Comentada – A Jurisprudência do STF e do STJ sobre Indenização de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em Desapropriações – Iara Alves de Paiva Lima – p. 94
Jornal Jurídico
Medida Provisória – p. 98 Norma Legal – p. 101 Indicadores – p. 102
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Doutrina
Abdicar de Pensar É Crime? Reflexões a Partir de Hannah Arendt
stop thinking as a way to do evil? Thus, it deprives a moral conscience and no longer reflect on the consequences of their actions. Analyze if the act of giving up thinking necessarily produces evil, so we will connect with the thoughts of Hannah Arendt on the issue of not thinking from the events analyzed by the author at the trial of Adolf Eichmann and which formed the basis of the film which bears the name of the author. PALAVRA-CHAVE: Pensamento; Hannah Arendt; criminologia.
ANTONIO BAPTISTA GONÇALVES
Advogado, Membro da Associação Brasileira dos Constitucionalistas, Pós-Doutor em Ciência da Religião pela PUC/SP, Pós-Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade de La Matanza, Doutor e Mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP, Especialista em Direitos Fundamentais pela Universidade de Coimbra, Especialista em International Criminal Law: Terrorism’s New Wars and ICL’s Responses pelo Istituto Superiore Internazionale di Scienze Criminali, Especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Universidade de Coimbra, Pós-Graduado em Direito Penal – Teoria dos Delitos pela Universidade de Salamanca, Pós-Graduado em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
KEYWORDS: Thought; Hannah Arendt; criminology. SUMÁRIO: Introdução; 1 Criminologia; 2 Eichmann e a questão do pensar em Hannah Arendt; 3 Abdicar de pensar é crime?; Conclusão; Referências. Para a Noite Inclina-te, tu consoladora, suavemente sobre meu coração Dá-me, silenciosa, o alívio das dores. Cobre com tuas sombras sobretudo a claridade Dá-me o cansaço e a fuga frente ao deslumbramento.
RESUMO: O ato de pensar nos parece tão automático que nem percebemos a possibilidade de não pensar. O ser humano e o pensamento estão ligados desde o surgimento do próprio homem na Terra. Porém, é possível que o ser humano deixe de pensar, como forma de praticar o mal? Assim, destitui-se de uma consciência moral e não mais reflete sobre a consequência de seus atos. Analisaremos se o ato de abdicar de pensar, necessariamente, produz o mal; para tanto faremos conexão com os pensamentos de Hannah Arendt sobre a questão do não pensar a partir dos acontecimentos analisados pela autora no julgamento de Adolf Eichmann, e que formaram a base do filme que leva o nome da autora. ABSTRACT: The thinking seems so automatic that do not even realize the possibility of not thinking. The human being and thought are linked since the dawn of man himself on Earth. However, it is possible that human beings
Deixa-me teu silêncio, o refrescante desprendimento Deixa-me no escuro ocultar o mal Se a claridade me atormenta com novas faces, Dá-me tu a força para constante ação.1 (Hannah Arendt) 1 “An die Nacht. Neig Dich, Du Tröstende, Leis meinem Herzen; Schenke mir, Schweigende, Lindrung der Schmerzen. Deck Deine Schatten vor Alles zu Helle – Gib mir Ermatten und Flucht vor der Grelle. Lass mir Dein Schweigen, die kühlende Löse, Lass mich im Dunkel verhüllen das Böse, Wenn Helle mich peinigt mit neuen Gesichten, Gib Du mir die Kraft zum steten Verrichten.” (ARENDT, Hannah. 1925-1926. An die Nacht. Disponível em: http://memory. loc.gov/cgibin/ampage?collId=mharendt_pub&fileName=05/053370/053370 page.db&recNum=26&itemLink=%2Fammem%2Farendthtml%2FmharendtF olderP05. html&linkText=7. Acesso em: 25 out. 2015)
Há pouco tempo, o cinema trouxe um filme dedicado a Hannah Arendt, com direção de Margarethe Von Trotta, que não teve o mesmo apelo comercial de um blockbuster americano, pois caminha em direção diametralmente oposta à questão do entretenimento. É um filme reflexivo, em que Von Trotta retrata a filosofia no julgamento de Adolf Eichmann, em 1961, em Jerusalém, enviada pela revista “The New Yorker”. Cenas reais do julgamento foram enxertadas no filme. De volta a Nova Iorque, Hannah escreveu uma série de cinco ensaios, hoje reunidos no livro Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal (Companhia das Letras, 1999). Sua ótica sobre o réu nazista chocou muitos leitores, em especial a comunidade judaica. Hannah escreveu que esperava encontrar um homem monstruoso, responsável por crimes atrozes como o embarque de vítimas do nazismo em trens rumo à morte nos campos de concentração. No entanto, ela se deparou com um ser humano medíocre, mero burocrata da máquina genocida comandada por Adolf Hitler. A grande culpa de Eichmann, segundo ela, foi demitir-se do direito de pensar. O que me deixou aturdida foi que a conspícua superficialidade do agente tornava impossível rastrear o mal incontestável de seus atos, em suas raízes ou em seus motivos, em níveis mais profundos. Os atos eram monstruosos, mas o agente – ao menos aquele que estava em julgamento – era bastante comum, banal, e não demoníaco ou monstruoso. Nele não se encontrava sinal de firmes convicções ideológicas ou de motivações especificamente más, e a única característica notória que se podia perceber tanto em seu comportamento anterior quanto durante o próprio julgamento e o sumário de culpa que o antecedeu era algo de inteiramente negativo: não era estupidez, mas irreflexão.2 2 ARENDT, Hannah. A vida do espírito. Trad. Cesar Augusto de Almeida;
Hannah Arendt apresenta o responsável pelas execuções nos campos de concentração, o que ficou conhecido como solução final3, como um ser humano absolutamente comum, igual a cada um de nós, o que, naturalmente, causa perplexidade, porque as pessoas tendem a ver os autores de grandes atrocidades como indivíduos problemáticos, violentos, agressivos, com algum distúrbio, como que uma justificativa para seu comportamento e seus crimes. Porém, não raro, os autores são pessoas simples e ordinárias. Adolf Hitler, por exemplo, era um homem de estatura mediana, em notório contraste com os altos alemães. No entanto, seria esta uma coincidência? É possível que o criminoso tenha um padrão físico ou comportamental? Que seja influenciado pelo meio em que vive? Que as condições sociais possam ser preponderantes para a criminalidade? Para responder tais indagações é necessário fazermos uso de matéria específica que analisa o tema, a saber, a criminologia. Antônio Abranches e Helena Martins. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. p. 18. 3 “Em 20 de janeiro de 1942, Heydrich chefiou uma reunião que ficou conhecida como a “Conferência de Wansee”, realizada num aprazível palacete à beira do lago Wansee, em Berlim, convocada para organizar, a mando de Hitler, o plano de extermínio total da população judaica da Europa, a “Solução Final” ou Endlösung der Judenfrage. A decisão foi comunicada aos 15 homens, de diferentes instituições e órgãos, presentes que depois foram lanchar num clima ameno e civilizado. Para realizar esta “tarefa” em tão grande proporção, toda uma burocracia, cuja missão era matar em grande escala, foi organizada. Seus membros, disciplinados e eficientes, para conseguir realizar o dever que lhes era atribuído, precisavam dissociar seu “trabalho” de suas consciências, não podendo ligar o papel preponderante na matança de seres humanos à autoimagem de boas pessoas, bons pais de família, bons cidadãos que, em suas casas, beijavam com carinho os filhos, acariciavam seus cachorros e julgavam linda uma flor e sublime um pôr do sol.” (KELSON, Ruth. Hannah Arendt e a abrangência do conceito de Banalidade do Mal. Tese de Mestrado em Ciências Sociais. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2011. p. 54)
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INTRODUÇÃO
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Assim, ao longo deste trabalho iremos analisar a questão do criminoso sob a compreensão da criminologia, isto é, o que vem a ser crime e sua relação com o agente, tendo como fio condutor os pensamentos de Hannah Arendt, mas com o viés apontado no filme sobre a autora na questão do pensar, em especial, acerca da banalização do mal e do julgamento de Eichmann.
1 CRIMINOLOGIA Criminologia é a ciência que estuda o crime e o criminoso, a vítima e o controle social do delito. Diferentemente do direito penal, a criminologia pretende conhecer a realidade para explicá-la e compreender o problema criminal, bem como transformá-la. Ao direito penal só preocupa o crime enquanto fato descrito na norma legal, para descobrir sua adequação típica.
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A criminologia objetiva, diferentemente do direito penal, não é a adequação de uma conduta a um fato típico, mas algo maior e mais profundo, isto é, a visão global do delito e do delinquente, a estrutura do crime, bem como as técnicas de prevenção e ao desenvolvimento de programas de intervenção a fim de recuperar o infrator.
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O termo criminologia foi usado pela primeira vez em 1879 pelo antropólogo francês Topinard. E a primeira vez que surgiu em uma obra científica foi em 1885: a Criminologia, de Rafaele Garofalo4. E o que vem a ser criminologia? Sobre o tema discorre Sérgio Salomão Shecaira: Criminologia é um nome genérico designado a um grupo de temas estreitamente ligados: o estudo e a explicação da infração legal; os meios formais e informais de que a sociedade se utiliza para lidar com 4 DIAS, Jorge Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa. Criminologia: o homem delinquente e a sociedade criminógena. Coimbra: Coimbra, 1997. p. 5.
o crime e com atos desviantes; a natureza das posturas com que as vítimas desses crimes serão atendidas pela sociedade; e, por derradeiro, o enfoque sobre o autor desses fatos desviantes. O estudo dos criminosos e de seus comportamentos é hoje um campo fértil de pesquisas para psiquiatras, psicólogos, sociólogos e antropólogos, bem como para os juristas.5
A criminologia, por despertar o interesse de várias áreas, propicia o estudo do criminoso em vários ramos e cada um com uma ótica própria, como a psicologia e a análise psicológica do criminoso, a sociologia e a influência do meio, a antropologia e o estudo do próprio ser humano, entre outros. Com isso é possível verificar brilhantes estudos com resultados bem diversos entre si, nos quais destacamos os de três autores emblemáticos para a criminologia6: Cesare Lombroso7, Enrico Ferri e Rafaele Garofalo8. Suas contribuições, como veremos, introduziram toda uma 5 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais: 2008. p. 37. 6 Em que pese todos os precursores e os debatedores dos autores citados, por uma questão de não querer aprofundar em demasia na análise da criminologia, por não ser nosso enfoque principal, nos ateremos aos três autores citados. Nenhuma escola ou pensamento, como a escola antropológica italiana (assim chamada na época) ou o positivismo italiano (nome hoje mais encontradiço), liderado por Lombroso, Ferri e Garofalo, tiveram maior repercussão para a criminologia; seja pelas polêmicas causadas, seja pelo marco histórico representado (idem, p. 96-97). 7 A antropologia criminal teve, como vimos, precursores diretos, imediatos, cujas obras aplainaram o terreno para o seu feliz advento. Mas, como ciência, ela surgiu com os monumentais trabalhos de César Lombroso, em que o genial sábio italiano, coordenando as observações esparsas e fragmentárias sobre os delinquentes, oriundas da intuição de alguns dos seus predecessores, estabeleceu e fixou princípios fundamentais da nova doutrina criminológica, alicerçados nas suas observações pessoais, feitas sobre a pessoa viva do criminoso, sujeita a rigoroso exame de dissecação anatômica, de análise fisiológica e psicológica (SODRÉ, Moniz. As três escolas penais. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1977. p. 47). 8 “No momento em que appareceu a nova escola italiana fundada por Lombroso, as doutrinas scientificas e philosophicas que circulavam eram
Sobre Lombroso, Álvaro Mayrink da Costa: Lombroso, médico alienista, julgou poder concluir que o criminoso é arrastado à prática do crime por um efeito necessário da sua natureza. Examinando, depois, alguns milhares de delinquentes e comparando-os com pessoas honestas, achou fundado o parecer – já, em tempos remotos, empiricamente afirmado – segundo o qual se encontram refletidos na especial conformação física de cada criminoso os impulsos depravados que lhe residem no ânimo. Não se contentando com estes resultados, Lombroso fez o estudo anatomo-patológico de vários crânios, cérebros e vísceras de criminosos, comparando-os com os de homens normais, e reconheceu que as anomalias aparentes do deliquente têm a confirmação nas suas anomalias interiores.9
Lombroso se preocupou em desenvolver uma classificação na qual fosse possível comprovar, cientificamente, aqueles que eram criminosos e separá-los dos que não eram10. E, para tanto, já tão differentes das que haviam dominado até então, tão diverso era o modo de conceber o homem, o Estado, a sociedade e toda a serie de phenomenos que se originam do grande facto social, que as concepções novamente elaboradas sobre a natureza do delinquente, sobre o crime, sobre a pena, sobre o complexo de instituições constitutivas do systema repressivo, deviam forçosamente contrastar, de modo profundo, com o conjuncto de concepções correspectivas que haviam dirigido a classe pensante e que tinham inspirado todos os codigos criminaes ou penaes existentes nesse momento e ainda no momento actual.” (EGYDIO, Paulo. Estudos de sociologia criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1941. p. 152) 9 COSTA, Álvaro Mayrink da. Criminologia. Rio de Janeiro: Rio, v. I, t. I, 1980. p. 194. 10 “Lombroso, no exame da pessoa viva do criminoso, não se limitou a indicar somente estigmas anatômicos e fisiognomônicos. Muito ao revés. Submeteu o delinquente a uma análise minuciosa, abrangendo todos os caracteres somáticos, patológicos e psíquicos.” (SODRÉ, Moniz. Op. cit., p. 50)
criou uma série de conceitos calcados em elementos físicos de identificação, como sua definição de criminoso-nato: pequena capacidade craniana, mandíbula pesada e desenvolvida, grande capacidade orbitária, índice análogo ao dos cretinos, arcadas sobreciliares salientes, crânio frequentemente anormal, assimétrico, pouca ou nenhuma barba, cabelos abundantes, orelhas em forma de asa11. Garofalo12 compartilha com a visão de que o criminoso tem traços específicos: Não se pôde determinar um só sinal exterior constante que permita distinguir o criminoso do homem honesto. Uma só coisa nos parece adquirida: é que, entre os criminosos, certos caracteres se encontram mais frequentemente em uma classe do que em outra. Os assassinos, por exemplo, como diz Lombroso – têm quase sempre “o olhar frio, cristalizado, algumas vezes o olho injetado de sangue, o nariz quase sempre aquilino ou adunco sempre volumoso, as orelhas compridas, os maxilares fortes, os zigomas espaçados, os cabelos crespos, abundantes, os dentes caninos assaz desenvolvidos, os lábios finos, muitas vezes tiques nervoso e contrações de um só lado da face que têm por efeito descobrir os dentes caninos, dando ao rosto uma expressão de ameaça ou de escárnio [...]”.
Importante destacar que Lombroso se preocupou em desenvolver uma análise comportamental no final do século XIX, e que, tanto Ferri quanto Garofalo, são seus contemporâneos e pertencem à mesma escola penal, portanto há similitudes e traços comuns em seus pensamentos, porém, também caminham em outras direções e avançam em seus estudos, desenvolvendo a criminologia sobremaneira. Cesare Lombroso, em suas conclusões, considerou que o criminoso é um ser atávico13, tese esta que foi refutada por Gabriel 11 COSTA, Álvaro Mayrink da. Op. cit., p. 194-195. 12 SODRÉ, Moniz. Op. cit., p. 148-149. 13 Lombroso, buscando a explicação científica do crime, havia asseverado que o delito é um fenômeno de atavismo orgânico e psíquico. A esta conclusão chegou após um estudo antropológico e análise confrontativa
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nova metodologia sobre o estudo do criminoso e propiciaram as bases, em que pese as várias controvérsias do que temos hoje como a criminologia.
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Tarde14. Enrico Ferri15 já caminhou em outra direção, ao introduzir a influência do meio como elemento que favorece ao cometimento de crime pelo delinquente:
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As influências das condições de ambiente ou físicas (clima, temperatura, condições telúricas, produção agrícola, etc.) ou sociais (miséria, educação, profissão, estado civil, vida urbana ou rural, etc.) sejam inseparáveis das congênitas e hereditárias condições individuais (orgânicas e psíquicas).16
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entre o homem selvagem e o homem delinquente, encontrando em um e em outro idênticos caracteres somáticos e psíquicos. O criminoso típico seria uma cópia, uma reprodução nas sociedades modernas, do homem primitivo, aparecido, pelo fenômeno do atavismo, no seio social civilizado, com muitos dos seus caracteres somáticos e os mesmos instintos bárbaros, a mesma ferocidade a mesma falta de sensibilidade moral (SODRÉ, Moniz. Op. cit., p. 108-109). 14 Polemista mordaz, refuta com veemência as assertivas segundo as quais o criminoso possuía uma regressão atávica. Afirma que isso o remeteria para um ser envolvido, portanto com menor peso e estatura. Segundo ele, não é o que ocorre (SHECAIRA, Sérgio Salomão. Op. cit., p. 95). 15 Sob o ponto de vista natural, não pode ser delinquente senão quem seja um anormal. Anormal por condições congênitas ou adquiridas, permanentes ou transitórias, por anormalidade morfológica, ou biopsíquica, ou por doença, mas sempre, mais ou menos, anormal. Se o homem normal é o homem adaptado à vida social, quem na vida social reagir aos estímulos externos com uma ação delituosa, não pode ser senão um anormal. OU se admite o livre arbítrio, segundo o qual o ato individual não é senão o fiat de uma vontade incondicionada, e então –e-se lógico em dizer que o delinquente pode ser um normal, mas se se nega o livre arbítrio (determinismo) ou mesmo se somente se admite – como atualmente, por todos – que este seja limitado e restrito e influenciado pelas condições fisiopsíquicas do indivíduo e pelas circunstâncias do ambiente, não se pode desconhecer que o fato de reagir com um crime indica uma anormalidade psíquica do indivíduo (FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime. Campinas: Bookseller, 1996. p. 201). 16 Idem, p. 245.
O autor ainda defendeu que os criminosos podem ser divididos em cinco grupos: natos17, loucos18, delinquente habitual19, delinquente ocasional20 e delinquente passional21. 17 O criminoso nato caracteriza-se, antes de tudo, pela vontade anormal, isto é, pela impulsividade desta, que, na debilidade congênita das energias de inibição, passa precipitadamente da ideia à ação e por motivos absolutamente desproporcionados à gravidade do delito; sobretudo distinguem-se pela falta ou debilidade do senso moral, que nos homens normais é a maior força de repulsão ao delito e não é um particular sentimento, mas é toda a tonalidade sentimental do indivíduo que determina o seu modo pessoa de reagir aos estímulos do ambiente nas relações sociais (idem, p. 254). 18 O delinquente louco é levado ao crime não somente pela enfermidade mental (se assim fosse, todos os loucos deveriam cometer crimes, enquanto que, na verdade, a maioria deles se abstém), mas também pela atrofia do senso moral (idem, p. 255). 19 O delinquente habitual tem uma fisionomia biopsíquica própria, que lhe caracteriza a grave periculosidade e a fraca readaptabilidade social. Esse, no seu tipo mais frequente, é um indivíduo que – nascido e crescido num ambiente de miséria material e moral, especialmente nos meios urbanos e, portanto, também com taras hereditárias, somáticas e psíquicas – começa de rapaz, com leves faltas (mendicidade, vagabundagem, furto simples etc.); depois – pela deletéria influência das prisões, e de encontrar um trabalho regular e, muitas vezes, pela improvidade da ação da polícia empírica – recai obstinadamente no crime (idem, p. 256). 20 O delinquente ocasional deve a própria atividade criminosa, raras vezes repetida, a uma forte influência de circunstâncias de ambiente – injusta provocação, necessidades familiares ou pessoais, facilidade de execução, comoção pública etc. – sem o que a sua personalidade não teria suficiente impelente iniciativa criminosa. No delinquente ocasional é menor a periculosidade e maior a readaptabilidade social; e, porque ele, na massa dos autores de verdadeiros e próprios crimes, representa a grande maioria, que se pode computar aproximadamente na metade do total dos criminosos (idem, p. 257-258). 21 Quando um indivíduo delinque, mesmo até ao homicídio, por honra ofendida ou amor contrariado, ou por afeto paterno ou filial, o alarme social é muito menor do que quando um indivíduo delinque por cobiça, por ódio, por vingança, já que nos primeiros casos cada um pensa que a agressão criminosa foi provocada por particulares relações da vítima com o ofen-
Rafaele Garofalo afirma que o crime sempre está no indivíduo, e que é a revelação de uma natureza degenerada, quaisquer que sejam as causas dessa degeneração, antigas ou recentes. Introduz o conceito de temibilidade que sustenta ser a perversidade constante e ativa do delinquente e a quantidade do mal previsto que se deve temer por parte do mesmo delinquente.22
Todavia, a maior contribuição de Garofalo, no que tange à criminologia, foi conceber um conceito de delito natural, isto é, uma violação do sentido moral a qual deveria ser sempre punível. Somados aos conceitos de Lombroso e Ferri, o substrato que podemos extrair é de que o crime passa a ser reconhecido como um fenômeno natural e social, sujeito às influências do meio e de múltiplos fatores, exigindo ao estudo da criminalidade a adoção do método experimental23. Com isso, a pena passa a ser a repressão para aqueles que desrespeitam os ditames e conjunto de regras sociais, já que o indivíduo convive com os demais na sociedade, sendo maior a pena quanto maior for a gravidade do delito. De tal sorte que, em brevíssima síntese do que vimos sobre a criminologia, podemos concluir que esta se ocupa, especialmente, de quatro questões: (1) Em que se funda a responsabilidade sor, enquanto que nos outros casos todo cidadão, sem ter tido qualquer relação com o delinquente, encontra-se exposto à agressão do homicida por depredação, ao salteador, ao incendiário, ao ladrão, ao falsário, ao embusteiro etc. Por consequência, delinquente passional é aquele que, antes de tudo, é movido por uma paixão social (idem, p. 259). 22 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Op. cit., p. 106. 23 Idem, p. 108.
penal do criminoso? (2) Que é crime, qual o seu conceito? (3) O criminoso é um homem normal24, igual ao comum dos indivíduos, ou um tipo anômalo, uma variedade distinta do gênero humano? (4) Qual o conceito e quais os efeitos da pena25? O importante trabalho de Lombroso, Ferri e Garofalo teve o condão de oferecer uma outra definição, que não a do direito penal, segundo a qual o criminoso é aquele que descumpre as regras de convivência social e, por isso, estará sujeito a uma pena. O que os autores citados buscaram é uma investigação mais profunda do que vem a ser criminoso, e cada um à sua maneira tentou edificar um caminho para justificar a opção de um indivíduo pela criminalidade. Assim, características físicas, psicológicas, influências do meio foram apenas alguns dos elementos considerados a fim de justificar a relação do delinquente com o crime. No entanto, nesta esteira da criminologia, se um criminoso decide, por livre e espontânea vontade, deixar de seguir as regras e preceitos sociais e opta por praticar um crime, ainda que seja um homem absolutamente normal e mediano. Neste caso, cabe à criminologia entender que o crime existirá, independentemente das características do indivíduo. Logo, a fim de seguir sua missão, deverá estudar os elementos que podem influenciar a presença do crime em dado espaço demográfico, atividade esta feita pela 24 “A escola fundada por Lombroso revelou-se em radical antinomia com a direcção e com os princípios consagrados pela escola dominante, a escola clássica. Para esta, o delinquente era, como todos os outros, um homem normal que, gozando de liberdade, dotado de livre arbítrio, praticava um acto immoral e injusto, o crime, não determinado por quaesquer motivos, intrínsecos ou extrínsecos, extranhos à sua vontade, mas sim pelo máo emprego de sua liberdade, pelo abuso de seu livre arbítrio: o criminoso era tal, porque queria sêl-o, e não porque o fizessem as anomalias do seu organismo e as influencias do ambiente physico e social em que elle vive.” (EGYDIO, Paulo. Op. cit., p. 155) 25 SODRÉ, Moniz. Op. cit., p. 55-56.
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Já Rafaele Garofalo defende que o criminoso não é um homem psiquicamente anormal; é um homem, como todos os outros, que cometeu uma ação proibida e punível, porém com uma ausência ou fraqueza do senso moral. Para o autor, o crime está no indivíduo, como afirma Sérgio Salomão Shecaira:
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Escola de Chicago26, em sequência ao trabalho desenvolvido pelos três autores por nós estudados.
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Percorrido o caminho da criminologia, voltemos a nossa premissa inicial, isto é, ao estudo de Hannah Arendt com a questão do julgamento de Adolf Eichmann. O que vimos, até o momento, foi a classificação e a tentativa de se entender o criminoso e o crime, missão preponderante da criminologia, mas ainda não temos a resposta do porquê um homem comum como Adolf Eichmann pode ignorar o fato de que seus atos propiciaram o extermínio de milhões de judeus. E mais: se apegar à questão do estrito cumprimento de seu dever.
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Então, uma nova etapa permeia nosso pensamento: Na visão da criminologia, Eichmann poderia ser considerado como um criminoso nato? Um criminoso habitual, já que praticou a mesma conduta de forma reiterada? Ou será que nosso enfoque deve ser outro? Expliquemos: e se não considerarmos que Adolf Eichmann cometeu esta série de atrocidades, mas sim que cumpriu com o seu dever, sem se importar com as consequências de seus atos? A primeira vista pode parecer absolutamente incongruente tal pensamento; todavia, e se Eichmann, efetivamente, acreditasse que não fez nenhum crime, mas sim abdicasse de uma análise ética de sua própria conduta? Assim, não se preocuparia com a consequência de seus atos, pois não parou para analisar a implicação que poderia ocorrer. O que podemos desenvolver, a partir de agora, é que Eichmann pode ter optado por não pensar e, portanto, apenas e tão somente cumpriu ordens. Sobre o tema, Hannah Arendt: 26 A escola de Chicago, também, conhecida por teoria da ecologia criminal, produziu grandes consequências metodológicas, por centrar o estudo em investigações empíricas dentro de cada cidade. Sua primeira e grande consequência é priorizar a ação preventiva, minimizando a atuação repressiva do Estado (SHECAIRA, Sérgio Salomão. Op. cit., p. 358).
A ausência de pensamento com que me defrontei não provinha nem do esquecimento de boas maneiras e bons hábitos, nem da estupidez, no sentido de inabilidade para compreender – nem mesmo no sentido de “insanidade moral”, pois ela era igualmente notória nos casos que nada tinham a ver com as assim chamadas decisões éticas ou assuntos de consciência.27
O que faremos agora é aprofundar mais esta questão.
2 EICHMANN E A QUESTÃO DO PENSAR EM HANNAH ARENDT Apresentamos no item anterior a criminologia a fim de possibilitar a desmistificação de que o mal se manifesta de forma determinada, isto é, que um assassino, um serial killer, possui características próprias e, por conseguinte, é facilmente identificável. Esse era o plano inicial da criminologia, porém, como vimos, com o passar do tempo o que se notou foi a influência de outros fatores no indivíduo a fim de que este se tornasse mais suscetível ao cometimento de delitos. O bem e o mal estão dentro de todos nós e o cometimento de um ou de outro perpassa pelos nossos próprios valores morais e, principalmente, com o se importar com o outro, isto é, não causar mal ao próximo, por me colocar na situação dele. O se colocar no lugar do outro é a consciência moral e o que impede o cometimento dos delitos, além, é claro, de outros elementos, como educação, influências externas, como vimos no item anterior. No entanto, para evitar a prática de um delito é necessário pensar sobre ele, isto é, pensar sobre as consequências que aquele ato pode produzir, porque, como veremos a seguir, o pensamento é um elemento vital para a vida em sociedade. 27 ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 19.
Então, de volta ao julgamento de Adolf Eichmann. O filme retrata de forma fidedigna como o nazista fora capturado na Argentina pelo Mossad28, a agência das forças especiais de Israel, e procura relatar, inclusive com imagens reais da época, o julgamento em Jerusalém. Este, aliás, confirma a imagem que as pessoas têm de um monstro, pois Eichmann fora colocado em uma jaula de vidro, sob o pretexto de protegê-lo da fúria dos populares, mas, em verdade, o que parecia, era que as pessoas tinham medo do grande monstro, talvez por causa das descrições dos psicólogos: Eichmann havia sido descrito pelos psiquiatras como um homem obcecado, com um perigoso e insaciável impulso de matar, uma personalidade pervertida, sádica29. Assim, de volta a Hannah Arendt e, especialmente a Adolf Eichmann, veremos que o responsável pelo envio de milhares de judeus aos campos de concentração e, portanto, para a morte, não tinha nada de atroz, de monstruoso fisicamente falando, ao contrário, pois se tratava de um homem comum, até mesmo 28 Em 23 de maio de 1960, o primeiro-ministro Bem Gurion anuncia ao Knesset, o parlamento israelense, que Adolf Eichmann foi raptado pelo serviço de segurança israelense na Argentina. Eichmann já se encontra em Israel e será julgado num futuro próximo, de acordo com as disposições da lei sobre a punição dos nazistas e de seus colaboradores (ADLER, Laure. Nos passos de Hannah Arendt. Trad. Tatiana Salem Levy e Marcelo Jacques. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 401). 29 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. Trad. José Rubens Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 37.
medíocre, que teve de ser protegido por paredes de vidro a fim de não ser agredido. Essa, na visão de Hannah Arendt, era sua verdadeira monstruosidade: É a normalidade de Eichmann que é monstruosa, nos diz Hannah. E essa normalidade se torna mais problemática por ter sido compartilhada por inúmeros outros, da mesma maneira monstruosamente banal: “O problema com Eichamnn era exatamente que muitos eram como ele, e muitos não eram nem pervertidos, nem sádicos, mas eram e ainda são terrível e assustadoramente normais”.30
No entanto, o que causou espanto, tanto em Hannah Arendt quanto em seus leitores após suas impressões sobre o julgamento, foi o fato de que Adolf Eichmann não se considerou culpado. E ela tampouco o considerou um monstro31, na acepção do imaginário popular, mas sim um homem extremamente comum: Aquele homem dentro da cabine de vidro construída pra a sua proteção: altura mediana, magro, meia idade, quase calvo, dentes tortos e olho míopes, que ao longo do julgamento ficava esticando o pescoço para olhar o banco das testemunhas (sem olhar nenhuma vez para a platéia), que tentando desesperadamente, e quase sempre consegue, manter o auto-controle, apesar do tique nervoso que lhe retorce a boca provavelmente muito antes do começo deste julgamento.32 30 ADLER, Laure. Op. cit., p. 460. 31 Ao acompanhar o julgamento, Arendt se indaga como esse homem pôde ser capaz de cometer tais monstruosidades. Ela se surpreende por ter diante de si alguém absolutamente comum, uma pessoa normal, que não se mostrava demoníaca. Não havia maldade na pessoa de Eichmann. Ele pouco tinha a ver com os “vilões” como geralmente os imaginamos, nem agiu, como esses, por fraqueza ou por inveja, cobiça ou soberba, apenas tinha cumprido sua função (ALMEIDA, Vanessa Sievers de. A distinção entre conhecer e pensar em Hannah Arendt e sua relevância para a educação. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n. 3, p. 853-865, set./dez. 2010). 32 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 15.
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Todavia, o não pensar, isto é, o não se importar com o próximo, o destituir-se de seu autoexame de consciência, implica necessariamente um indivíduo mal? Um infrator? O fato de um indivíduo se negar a pensar já enseja que ele será um criminoso? Eis a investigação que faremos a partir do pensamento e da visão de Hannah Arendt, e, para tanto, teremos como ponto de análise o julgamento de Eichmann em Jerusalém.
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O grande perigo deste julgamento era responsabilizar Eichmann pelo acontecido com os judeus, com as atrocidades do regime nazista, e não exatamente por seus feitos. Hannah Arendt deixa essa preocupação bem clara no princípio de seu livro Eichmann em Jerusalém33. O julgamento em si era muito importante para o Estado de Israel, uma vez que o comandante nazista era o responsável direto por colocar os judeus nos trens que iriam para os campos de concentração de Treblinka e Auschiwitz. Portanto, em tese, era ele o responsável por quem iria morrer nos campos de concentração, e o saldo não fora pequeno, visto que morreram entre 4,5 e 6 milhões de judeus. Antes do julgamento era, provavelmente, consenso de que Adolf Eichmann seria enforcado em decorrência de sua participação nas atrocidades nazistas que exterminou a vida de milhões de seres humanos.
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O julgamento fora cercado de muita expectativa, inclusive de Hannah Arendt, que pensava presenciar a história sendo feita34, porém tudo mudou quando Eichmann começou a ser interpelado na corte. Afinal, Hannah Arendt viu, repetidamente, o alemão afirmar que não havia matado um único judeu:
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A atitude de Eichmann era diferente. Em primeiro lugar, a acusação de assassinato estava errada: “Com o assassinato dos judeus não tive nada a ver. Nunca matei um judeu, nem um não-judeu – nunca matei nenhum ser humano. Nunca dei uma ordem para matar fosse um judeu fosse um não-judeu; simplesmente não fiz isso”.35 33 Idem, ibidem. 34 Tenho refletido há muitos anos, mais especificamente trinta anos, sobre a natureza do mal. E o desejo de me expor, não aos feitos os quais, no final das contas, eram do conhecimento de todos, mas ao próprio perpetrador do mal, foi provavelmente a minha mais convincente motivação por trás da decisão de ir a Jerusalém (ASSY, Bethania. Ética, responsabilidade e juízo em Hannah Arendt. São Paulo: Perspectiva, 2015. p. 2). 35 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 33.
Foi espantoso perceber a convicção de Eichmann no sentido de que não matara ninguém, apesar dos esforços da promotoria de ligá-lo às mortes dos campos de concentração. Ele reiteradamente afirmou que, apenas e tão somente cumpriu ordens, afinal as havia recebido e era sua obrigação cumpri-las36. E, igualmente, foi perquirido várias e diversas vezes se não tinha consciência para questionar estas ordens. A resposta era a mesma: um oficial não podia questionar as ordens! Ao jurar lealdade37, não mais deveria fazer outra coisa que não seguir o que lhe era mandado fazer. Como relata a biografia de Hannah Arendt: Hannah não contesta de modo algum a responsabilidade de Eichmann, mas explica sua falta de consciência de culpa pelo mecanismo do nazismo que havia posto o comando do Führer no centro absoluto de toda ordem jurídica. Eichmann era, portanto, um cidadão obediente à lei durante Hitler, e o que ele fez só constitui crime aos seus olhos retrospectivamente.38
A verdade é que Eichmann se negara a pensar, e sua obstinação em cumprir à lei fez com que abandonasse sua própria consciência, isto é, abriu mão do discernimento moral de identificar o mal e a crueldade quando não se questionou acerca das implicações éticas de suas ações. 36 Ele cumpria o seu dever, como repetiu insistentemente à policia e à corte; ele não só obedecia ordens, ele também obedecia à lei (ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 152. 37 Lealdade tão absoluta que o conduziu a nunca tomar decisões autônomas, pois necessitava executar rigorosamente ordens que lhe fossem dadas, jamais emitindo opiniões pessoais e sempre acolhendo as decisões emanadas de seus superiores, conforme a exigência de cumprir incontinente o juramento de irrestrita fidelidade ao partido que o designara oficial da Gestapo (SIQUEIRA, José Eduardo. Irreflexão e a banalidade do mal no pensamento de Hannah Arendt. Revista Centro Universitário São Camilo, 2011; 5(4): p. 392-400). 38 ADLER, Laure. Op. cit., p. 444.
A tarefa fundamental do pensar é descongelar as definições que vão sendo produzidas, inclusive pelo conhecimento e pela compreensão, e que vão se cristalizando na história. A tarefa do pensar é abrir o que os conceitos sintetizam, é permitir que aquilo que ficou preso nos limites da sua própria definição seja liberado. É livrar o sentido e o significado dos acontecimentos e das coisas da camisa-de-força dos conceitos.40
A fim de entender melhor a questão do pensar, Hannah Arendt analisou o tema na história filosófica do Ocidente, em especial na civilização grega e romana, a fim de compreender o próprio pensar e como que este fora definido e desenvolvido. A consequência foi que Hannah Arendt tratou da questão do pensar em muitas de suas obras, e dedicou uma parte específica ao tema em seu livro a Vida do Espírito. Para a autora, o pensamento é um atributo de todos os homens e pode ser exercido por qualquer um deles. O ato de pensar é uma faculdade do espírito (corpo, alma e espírito) e o questionamento que a autora se propõe a fazer é: existe relação entre fazer o mal com a não capacidade de pensar41? 39 ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 149. 40 CRITELLI, Dulce. O ofício de pensar. Revista Educação. Hannah Arendt pensa a educação. 4. ed. São Paulo: Segmento, 2008. p. 81. 41 Seria a incapacidade de pensar, a origem da capacidade de fazer o mal? Responder a esta pergunta foi o que a levou a escrever sua última obra, A Vida do Espírito. Foi, portanto, o que a obrigou a retomar a história filo-
Importante destacar que, apesar de o pensamento permear a vida humana desde sua própria existência, o ato de não pensar também é possível, mas é como se o ser humano deixasse de viver em sua plenitude, como se não fosse plenamente vivo. Sobre o tema, Hannah Arendt: O pensamento acompanha a vida e é ele mesmo a quintessência desmaterializada do estar vivo... Uma vida sem pensamento é totalmente possível, mas ela fracassa em fazer desabrochar a sua própria essência – ela não é apenas sem sentido; ela não é totalmente viva. Homens que não pensam são como sonâmbulos.42
É possível o homem não pensar, porém, ao fazê-lo, abre mão de uma parte de sua própria existência. Para Arendt, o ato de pensar enseja um afastamento como condição necessária à atividade do pensamento43. Esse afastamento permite um momento de reflexão sobre os acontecimentos e sobre as consequências das coisas e das ações praticadas. O ato de pensar consiste em o próprio homem compreender as coisas, refletir sobre os acontecimentos44. Sobre o tema Vanessa: O pensamento é algo como uma resposta às nossas experiências no mundo45. Lembramos do acontecido e procuramos compreendê-lo, sófica do Ocidente e recompreender o pensar, de que modo foi definido e desenvolvido, em suas heranças e consequências. 42 ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 143. 43 Pensar significa desligar-se provisoriamente do mundo das aparências para chegar a uma conclusão sobre o sentido das coisas, diante de uma dificuldade. É o parar para pensar. Não pensar protege a pessoa dos “perigos” desse exame, e é por isso que elas se apegam a posse das normas a serem aplicadas aos casos concretos, o que não exige a problematização do seu conteúdo (LAFER, Celso. Hannah Arendt: pensamento, persuasão e poder. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1979. p. 94). 44 A necessidade de buscar o significado de tudo o que é ou ocorre, como eu mesma disse, de modo não menos vago e geral (ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 188). 45 Esse “parar para pensar” não é de modo nenhum privilégio dos filósofos
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Eis o objeto de nossa análise: o deixar de pensar. Soa minimamente estranho uma pessoa afirmar que deixou de pensar em algo tão importante como o extermínio da vida de seres humanos, independente de serem judeus ou de qualquer outra raça. Eichmann abdicou de sua própria consciência, contudo, isto é possível? Ademais, uma pessoa pode simplesmente deixar de pensar? Ainda mais quando a necessidade do pensamento é contemporâneo ao aparecimento do homem na terra39. Sobre o pensar, Dulce Critelli:
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de modo que o ocorrido ganhe um sentido para nós. Assim, o pensar parte da experiência concreta, mas precisa distanciar-se dela para submetê-la à reflexão, ou, nas palavras de Arendt, precisamos “parar para pensar”. Isto significa que, por um momento, suspendemos as atividades em andamento e nos retiramos para um lugar no qual temos a calma e a distância suficientes para procurar compreender aquilo que não está mais diante dos nossos olhos, mas que podemos trazer para o nosso espírito. Assim nos retiramos da presença de coisas e pessoas e nos ocupamos com o que está ausente. Esse afastamento provisório do mundo possibilita que entremos numa relação conosco mesmos e procuremos responder às nossas indagações.46
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Quando abdica do ato de pensar, o homem deixa de refletir, de ponderar, de analisar as coisas em sua consciência47, atividade inerente a todos os homens48. É o que Hannah Arendt chamou da dualidade do debate silencioso do eu comigo mesmo49:
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ou dos intelectuais, mas uma experiência cotidiana. A cada acontecimento somos impelidos a refletir novamente, já que as perguntas que dizem respeito ao sentido não permitem respostas definitivas e sempre válidas (ALMEIDA, Vanessa Sievers de. A distinção entre conhecer e pensar em Hannah Arendt e sua relevância para a educação. Op. cit.) 46 Idem. 47 O pensamento em seu sentido não cognitivo e não especializado, como uma necessidade natural da vida humana, como a realização da diferença dada na consciência, não é uma prerrogativa de poucos, mas uma faculdade sempre presente em todo mundo; do mesmo modo, a inabilidade de pensar não é uma imperfeição daqueles muitos a quem falta inteligência, mas uma possibilidade sempre presente para todos – incluindo aí os cientistas, os eruditos e os outros especialistas em tarefas do espírito (ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 213 e 214). 48 A faculdade de pensar, em contraste com a sede de conhecimento, deve ser atribuída a todos; ela não pode ser considerada um privilégio de poucos (ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento..., p. 243). 49 O pensamento distancia o que está próximo e aproxima o que está distante, ao mesmo tempo em que retira aquele que pensa do convívio sensorial com as coisas do mundo e o conduz a uma “terra imaginária, terra dos invisíveis”, onde de fato não estou nem no mundo, nem em companhia de outras pessoas, mas me faço companhia a mim mesmo enquanto lido com imagens invisíveis (CORREIA, Adriano. Sentir-se em casa no mundo:
Para Sócrates, o principal critério para o homem que diz sua própria doxa com verdade é que ele esteja de acordo consigo mesmo – que ele não se contradiga e não diga coisas contraditórias, que é o que a maioria das pessoas faz, e, no entanto, o que cada um de nós de certa forma tem medo de fazer. O medo da contradição vem do fato de que qualquer um de nós, “sendo um”, pode ao mesmo tempo falar consigo mesmo (eme emautô) como se fosse dois. Porque já sou dois-em-um, ao menos quando tento pensar, posso ter a experiência de que um amigo, para usar a definição de Aristóteles, é como um “outro eu”. A condição é a de que ele esteja de comum acordo consigo mesmo (homognômonei heaut), porque alguém que se contradiz não é confiável. A faculdade da fala e a pluralidade humana se correspondem, não só no sentido de que uso palavras para a comunicação com aqueles com quem estou no mundo, mas também no sentido – até mais relevante, de que, ao falar comigo mesmo, vivo junto comigo mesmo.50
De tal sorte que o pensar é a possibilidade de se atribuir significação e, até, ressignificação51, isto é, atribuir um significado a partir da reflexão do eu comigo mesmo, o que, para Hannah Arendt, sempre implica em uma ação. Portanto, a postura de Adolf Eichmann é considerada por Arendt como uma ausência a vida do espírito e o domínio dos assuntos humanos na obra de Hannah Arendt. Tese de Doutorando. Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. p. 146). 50 ARENDT, Hannah. A dignidade da política. Trad. Helena Martins e outros. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993. p. 101. 51 O fato de que o estar-só, enquanto dura a atividade de pensar, transforma a mera consciência em si – que provavelmente compartilhamos com os animais superiores – em uma dualidade é talvez a indicação mais convincente de que os homens existem essencialmente no plural. E é essa dualidade do eu comigo mesmo que faz do pensamento uma verdadeira atividade na qual sou ao mesmo tempo quem pergunta e quem responde. O pensamento pode se tornar dialético e crítico porque ele se submete a esse processo de perguntas e respostas, ao diálogo do dialegesthai, o qual é, na verdade, uma “viagem através das palavras” (poreuesthai dia ton logon) em que constantemente levantamos a pergunta socrática básica: o que você entende por...? (ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 207 e 208).
A ausência de pensamento, na análise de Arendt, não diz respeito a alguma limitação cognitiva, não tem a ver com estupidez (Dummheit) ou ignorância. Isso é válido também para outros nazistas, que, para cometer atrocidades, foram capazes de aplicar conhecimentos e tecnologias avançados, ou mesmo de produzir conhecimentos novos, mas foram incapazes de refletir sobre aquilo que estavam fazendo. Assim, mesmo que tenham feito uso de um saber e de um saber fazer, não pensaram, já que não pararam para se perguntar sobre o sentido de seus atos e não se indagaram o que tudo aquilo significava para eles, nem para as vítimas, nem para o mundo, lugar da convivência no plural.55
Ao cumprir cegamente as ordens, Adolf Eichmann se eximia da necessidade de pensar, refletir e fazer as considerações do eu consigo mesmo, portanto, não teria responsabilidade por seus 52 Aonde chegamos em relação a um dos nossos principais problemas – a saber, a relação à possível conexão entre a ausência de pensamento e o mal? Chegamos à conclusão de que apenas as pessoas inspiradas pelo eros socrático, o amor da sabedoria, da beleza e da justiça são capazes de pensamento e dignas de confiança (idem, p. 202). 53 O réu Eichmann nada tinha de defeitos morais, inclinações ideológicas, rancores raciais ou problemas de inteligência, por isso Arendt entendeu que ele possuía uma “simples” ausência de pensamento, o que permitia que suas ações fossem más, pois apesar de ele afirmar que apenas “cumprira ordens”, ele não possuía qualquer patologia mental, sequer qualquer distúrbio de caráter (ARENDT, Hannah. A condição humana. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 6). 54 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 62. 55 ALMEIDA, Vanessa Sievers de. A distinção entre conhecer e pensar em Hannah Arendt e sua relevância para a educação. Op. cit.
atos56, visto que, em verdade, não eram seus, mas sim de seus superiores, atos os quais somente cumpria. Logo, não há que se falar em consciência, ou em exame de consciência; Eichmann se mostrou sem consciência moral, isto é, sem capacidade para discernir sobre o que se deve e o que não se deve fazer, o que deve ser perdoado e o que não deve ser perdoado. Hannah Arendt separa a consciência do pensamento: A consciência não é o mesmo que o pensamento; os atos de consciência têm em comum com a experiência dos sentidos o fato de serem atos “intencionais” e, portanto, cognitivos, ao passo que o ego pensante não pensa alguma coisa, mas sobre alguma coisa; e este ato é silencioso. Sem a consciência, no sentido da consciência em si mesmo, o pensamento seria impossível.57
Exatamente por se recusar a questionar e a refletir é que Eichmann causou perplexidade em Hannah Arendt. Sua completa inaptidão à autorreflexão em decorrência de um apego cego e desenfreado a uma ordem deturpada de valores que buscou o extermínio. Mas Eichmann não se preocupava se as pessoas morreriam ou não, visto que sua função não era questionar, refletir e, muito menos, se importar; sua obrigação era cumprir com o seu dever. Portanto, a seu ver, não deveria ser julgado por seus atos como um assassino porque não o era, mas sim um fiel e bom cumpridor dos desígnios do regime nazista, no qual não se questiona as ordens de seus superiores. Essa ausência de consciência moral e de se recusar a pensar sobre as ordens que lhe eram dadas propiciou a Eichmann a 56 Arendt observou que o motivo pelo qual ele executara meticulosamente sua tarefa burocrática não fora inspirado por qualquer motivação ou convicção ideológica, mas antes pelo desejo cego de seguir a regra que lhe fora proposta e obedecê-la incondicionalmente, sem jamais parar para pensar sobre aquilo que estava fazendo (DUARTE, André. O pensamento à sombra da ruptura. São Paulo: Paz e Terra, 2000. p. 342). 57 ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 209.
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de pensamento52, visto que, na visão de Eichmann, ele estava sendo julgado por obedecer à lei e ser um bom funcionário fiel ao regime nazista. “Quanto mais se ouvia Eichmann, mais óbvio ficava que sua incapacidade de falar estava intimamente relacionada com sua incapacidade de pensar53, ou seja, de pensar do ponto de vista de outra pessoa”54.
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incapacidade de julgar seus próprios atos. Com isso, abdicou de um requisito deveras fundamental para a vida em sociedade: a capacidade de entender o outro, de se colocar em seu lugar, o que resulta em uma capacidade política por excelência. Eichmann era absolutamente indiferente à existência daqueles seres aos quais catalogava e colocava no trem para os campos de concentração. O que não significava ter ódio pelos judeus, mas sim que estava tão absorto em sua própria necessidade de cumprir com as regras que lhe foram impostas que sequer se preocupava em questionar acerca do mal que praticava continuamente. Sobre o tema, Hannah Arendt: Ele sempre dizia as mesmas coisas, expressas nas mesmas palavras. Quanto mais se ouvia, mais claro se tornava que sua inabilidade de falar estava intimamente relacionada com a sua inabilidade de pensar, especialmente de pensar em relação ao ponto de vista de outras pessoas. Não havia qualquer possibilidade de comunicação com Eichmann, não porque mentisse, mas porque estava “fechado” às palavras e à presença de terceiros58 e, portanto, à realidade como tal.59
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A consciência de Adolf Eichmann mais parece um computador que somente funciona por meio de binômios. No caso do alemão, o binômio era obediência/desobediência; se fosse possível algum tipo de punição, esta estaria ligada à desobediência, isto é, ao não cumprimento das ordens. Portanto, como cumpria cegamente as ordens, não havia por que ter remorso, uma vez
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58 Eichmann tornou-se o protagonista de uma experiência aparentemente ordinária, a ausência de pensamento crítico. O relato de Arendt começa com a descrição de suas características particulares, revelando uma série de elementos que a levaram a detectar em Eichmann uma ausência de senso crítico. Eichmann se comunicava utilizando um “dialeto” peculiar – um “oficialês” (Amtsprache) burocrático – por meio do qual ele se desculpava ao afirmar que esse era o resultado de seu trabalho. Tal linguagem burocrática de Eichmann se distinguia por sua falta de comunicabilidade, crucial para a pluralidade da vida social, refletindo sua incapacidade de revertê-la à fala comum (ASSY, Bethania. Op. cit., p. 8). 59 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 65.
que não fizera nada de errado, em uma completa ausência com o se importar com o outro Eichmann em momento algum, de fato, compreendeu o que fazia, pois não conseguiu distanciar-se de suas próprias ideias e manter um afastamento razoável que lhe permitisse a retirada do mundo das aparências, de modo a refletir sobre os seus atos, no que Hannah Arendt chamou de “diálogo consigo mesmo”. Ao não refletir sobre seus próprios atos se eximiu de qualquer exame de consciência, não se preocupou com consequências ou com aspectos éticos de suas condutas, pois, segundo ele, as ordens eram preponderantes. Então questionamos: seria a ausência de pensar a produção, necessária e consequente do mal? Expliquemos melhor: o fato de uma pessoa se recusar a discernir sobre algo, de verificar as consequências de seus atos e de não se colocar na posição do outro, necessariamente, ocasionará a produção de um ato lesivo a terceiros? Eis o que nos ocuparemos a seguir.
3 ABDICAR DE PENSAR É CRIME? Quando iniciamos este breve estudo com a pretensão de verificar se abdicar de pensar pode ser considerado crime, dedicamo-nos a um item no qual apresentamos o que vem a ser a criminologia. Este item, se comparado com os dois subsequentes, poderia ser considerado como sem conexão. Porém, a relação do homem com a criminalidade data de tempos muito distantes. As primeiras codificações das quais temos conhecimento já previam condutas repressoras para os praticantes de crimes contra os habitantes. Logo, a relação do homem com a criminalidade e, mais especificamente, com a prática do mal é muito antiga. Ao longo do tempo, estudiosos se dedicaram ao tema da criminalidade e, mais recentemente, à análise do crime em si, em uma tentativa
A criminologia teve seu início com a possibilidade de uma associação física do criminoso; posteriormente, quando o modelo se mostrou insuficiente, inseriu-se a influência de elementos externos. Agora, faremos um olhar sob outra perspectiva, a saber: é possível que o criminoso, ao decidir praticar um delito, simplesmente escolha por abdicar de pensar? Ao fazê-lo, simplesmente se recusa a refletir acerca de um ato de consciência moral, no impacto que sua conduta terá para com os demais que coabitam com o infrator na sociedade, tampouco se importa com a produção do dano e do mal em si. Hannah Arendt tratou do mal a partir do seu estudo sobre o totalitarismo e modificou seu enfoque quando do julgamento de Adolf Eichmann. Quando este proferia suas respostas, Hannah Arendt percebeu a ausência de reflexão, como já demonstramos, o que propiciou a ela concluir que o mal é banal, não sendo fruto da monstruosidade humana, mas da ausência de reflexão: O mal não se enraíza numa região mais profunda do ser, não tem estatuto ontológico, pois não revela uma motivação diabólica – a vontade de querer o mal pelo mal; o que aqui [no caso “Caso Eichmann”] se revela é a superficialidade impenetrável de um homem [Eichmann], para o qual o pensamento e o juízo são atividades perfeitamente estranhas, revelando-se assim a possibilidade de uma figuração do humano aquém do bem e do mal, porque aquém da sociabilidade, da comunicação e da intersubjetividade.60
Ao longo do julgamento foi possível notar que, em momento algum, Eichmann parou para refletir sobre o que efetivamente fazia, mesmo tendo a morte a sua espreita. Sua única preocu60 ARENDT, Hannah. Lições sobre a filosofia política de Kant. Trad. André Duarte de Macedo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993. p. 134.
pação era a obediência às regras e à execução de suas tarefas burocráticas. O se importar com os demais simplesmente inexistiu; a preocupação com o humano, com o bom, tampouco foi considerado, de sorte, que com a ausência do pensar, se abriu a porta para a ocorrência do mal. As dualidades bondade/maldade e permitido/proibido permeiam a humanidade desde que a mesma habita a Terra. A Bíblia já retratara a expulsão do paraíso de Adão e Eva em decorrência do consumo do fruto proibido. E o que fora tal conduta senão uma infração? Um descumprimento? Em verdade, o exercício do pensar consigo mesmo é a dificuldade de nossa sociedade atual. As condutas adquiriram uma velocidade e uma instantaneidade tais que as pessoas não mais se preocupam, ou quiçá, conseguem parar para refletir sobre seu próprio comportamento. As pessoas atualmente apenas se preocupam com seu próprio bem estar e deixaram de pensar no coletivo, no bem estar da comunidade. Portanto, somente o que me faz bem é considerado, nem que para isso eu tenha de tomar o bem de outro, tenha de invadir o espaço alheio, que a liberdade de terceiro seja limitada por minha conduta: isso simplesmente deixou de ser considerado. O ato de fazer mal a um terceiro virou uma consequência banal na defesa da felicidade individual, do não se importar com os demais. O fato de uma pessoa deixar de pensar sobre algo lhe propicia bloquear a capacidade que todos têm de dizer a si mesmo “isto é certo” ou “isto é errado”, e permite a vazão de seu desejo de fazer algo. Esse diálogo que travamos cotidianamente conosco, do eu e do eu mesmo, o que, possivelmente, levaria os homens a abster-se de fazer o mal, isto é, a atividade do pensar traria consigo o discernimento e julgamentos individuais, ligados à responsabilidade e à ação. Como a pessoa deixa de praticar sua própria consciência moral, o caminho para o mal ficou livre.
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de se identificar traços dos criminosos e, com isso, se reprimir e evitar a prática dos crimes. É o que apresentamos no primeiro item com Lombroso, Ferri e Garofalo.
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Nessa esteira temos a prática do mal como algo banal, corriqueiro e cotidiano. E causou grande espanto nos leitores de sua época, quando Hannah Arendt cunhou a expressão banalidade do mal61, o que nos parece mais uma má compreensão de seus argumentos62. Nós temos a visão cristã do mal, na qual se trata de algo demoníaco, monstruoso, porém, o que vemos cotidianamente é o mal cometido por pessoas absolutamente comuns em atitudes egoístas e que poderiam ser evitadas se houvesse uma reflexão com o olhar para o terceiro. Hannah Arendt trata da relação da monstruosidade do mal com a simplicidade do ser ao relatar o comportamento de Eichmann:
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Aprendemos que o mal é algo demoníaco; sua encarnação é satã [...] Aquilo com que me defrontei, entretanto, era inteiramente diferente e, no entanto, inegavelmente factual. O que me deixou aturdida foi que a conspícua superficialidade do agente tornava impossível retraçar o mal incontestável de seus atos, em suas raízes ou motivos, em quaisquer níveis mais profundos. Os atos eram monstruosos, mas o agente − ao menos aquele que estava agora em julgamento − era bastante comum, banal, e não demoníaco ou monstruoso. Nele não se encontrava sinal de firmes convicções ideológicas ou de motivações especificamente más, e a única característica notória que se podia perceber tanto em
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61 Expressão essa criada para retratar os últimos instantes de vida de Adolf Eichmann: Era como se naqueles últimos minutos, ele estivesse resumindo a lição que este longo percurso através da maldade humana nos ensinou – a lição da temerosa banalidade do mal, que desafia palavra e pensamento (ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém..., p. 274). 62 A “banalidade do mal” à qual a autora se referia não significava que o mal cometido fosse irrisório, como muitos críticos o interpretaram erroneamente, mas sugeria que, em sua dimensão política, o mal não se enraíza numa região mais profunda do ser, não tem estatuto ontológico, não revela uma motivação diabólica, isto é, a vontade de querer o mal pelo mal, e sim a superficialidade impenetrável de homens para os quais o pensamento e o juízo são atividades perfeitamente estranhas (DUARTE, André. Op. cit., p. 344).
seu comportamento anterior quanto durante o próprio julgamento e o sumário de culpa que o antecedeu era algo de inteiramente negativo: não era estupidez, mas irreflexão.63
Vanessa Sievers de Almeida questiona a relação do mal com a atividade do pensar: Será possível que o problema do bem e do mal [...] esteja conectado com a nossa faculdade de pensar? [...] seria possível que a atividade do pensamento como tal [...] estivesse dentre as condições que levam os homens a se absterem de fazer o mal, ou mesmo que ela realmente os “condicione” contra ele?64
A questão de não praticar o mal tem a ver com mais coisas do que o egoísmo, que permeia as relações sociais correntes, pois também devemos considerar a eticidade das pessoas, sua educação e formação além de seus hábitos e costumes. Como vimos por meio do estudo da criminologia, é possível que as pessoas que convivem com um indivíduo em dado espaço territorial o influenciem à prática do mal. Também outros fatores podem contribuir negativamente, como a ausência de uma educação adequada, más condições de existência, fome, pobreza, entre outros. De fato, o que temos de considerar é que o mal não possui, no cotidiano, o condão de ser demoníaco como pretende a visão cristã. Em que pese as agruras e consequências de um crime, a prática do mal está mais próxima da banalidade do que da equiparação ao demoníaco. Uma vida pode valer uns poucos trocados, ou um celular, ou até uma roupa. Hannah Arendt defende que o mal é raso: “É de fato minha opinião que o mal 63 ARENDT, Hannah. A vida do espírito..., p. 5-6. 64 ALMEIDA, Vanessa Sievers de. A distinção entre conhecer e pensar em Hannah Arendt e sua relevância para a educação. Op. cit.
nunca é radical, que é apenas extremo, e que não possui nem profundidade nem dimensão demoníaca”65.
consequências danosas a terceiros e, por conseguinte, poderiam ser evitadas se houvesse o parar para pensar.
Em outra passagem a autora relaciona a banalidade do mal com a sua ausência de profundidade:
Como no caso Eichmann, se este tivesse parado para pensar sobre o que seus atos iriam produzir de consequências, poderíamos ter um desfecho diferente à solução final proposta pelos nazistas? Em um regime totalitário como o nazista, provavelmente não, pois Eichmann seria substituído ou até morto se não obedecesse às ordens, porém, o se colocar no lugar do outro possibilita um pensar que abre possibilidades tanto para o mal, mas também para o bem, até então ausente.
Ainda sobre o tema, Sônia Maria Schio: Eu quero dizer que o mal não é radical, indo até as raízes (radix), que não tem profundidade, e que por esta mesma razão é tão terrivelmente difícil pensarmos sobre ele, visto que a razão, por definição, quer alcançar as raízes. O mal é um fenômeno superficial, e, em vez de radical, é meramente extremo. Nós resistimos ao mal em não sendo levados pela superfície das coisas, em parando e começando a pensar, ou seja, em alcançando uma outra dimensão que não o horizonte de cada dia. Em outras palavras, quanto mais superficial alguém for, mais provável será que ele ceda ao mal. Uma indicação de tal superficialidade é o uso de clichês, e Eichmann, [...] era um exemplo perfeito.67
A questão que se coloca é se a ausência de pensar pode ter alguma relação com o criminoso, isto é, se todo indivíduo que abdica de pensar necessariamente será um infrator. O fato é que, ao não pensar, uma pessoa não necessariamente pode cometer um delito, contudo, pode praticar ações que tragam 65 ARENDT, Hannah. The Jew as Pariah: Jewish identity and politics in the Modern Age. New York: Grover Press, 1978. p. 251. 66 ARENDT, Hannah. The Jewish writings.New York: Shocken Books, 2007. p. 471. 67 SCHIO, Sônia Maria. Hannah Arendt: história e liberdade (da ação à reflexão). Caxias do Sul: EDUCS, 2006. p. 70.
A análise não perpassa pelo regime totalitário e a própria Hannah Arendt modificou68 o seu enfoque sobre o tema com seu livro a Vida do Espírito, quando deixou de analisar as questões de massa e doutrinação para se ater ao próprio ato de pensar, inclusive o de não pensar. O se colocar no lugar do outro possibilita valorizar o próprio ser humano, sua existência e sua convivência para com os demais. O exercício de abdicar de pensar propicia uma ausência destas considerações, desconsidera-se a opinião dos demais; suas 68 Você tem bastante razão: eu mudei meu espírito e já não falo de mal radical. Faz muito tempo que nós no encontramos pela última vez, senão teríamos conversado, talvez, sobre esse assunto antes. (Consequentemente, eu não sei por que você chama meu termo “banalidade do mal” um bordão ou slogan. Até onde eu sei ninguém havia usado o termo antes de mim; mas isso não é importante). Minha opinião agora é a de que o mal nunca é “radical”, é apenas extremo e não possui profundidade nem qualquer dimensão demoníaca. Ele pode crescer demais e deteriorar o mundo todo precisamente porque ele se espalha como um fungo na superfície. Ele é “desafiador-do-pensamento”, como eu disse, porque o pensamento tenta alcançar alguma profundidade, chegar às raízes, e no momento em que ele se interessa pelo mal, ele se frustra porque não há nada. Essa é sua “banalidade”. Apenas o bem tem profundidade e pode ser radical (WAGNER, Eugênia Sales. Hannah Arendt Ética & Política. São Paulo: Ateliê, 2006. p. 161-162).
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A banalidade do mal estaria desvinculada das manifestações e explicações oferecidas pela tradição, não provindo de forças demoníacas e tampouco teria raízes identificáveis. O mal como raiz poderia ser cortado, impedido de se propagar, o que teria sido constatado historicamente com o termo do próprio totalitarismo, mas o mal banal seria praticamente sem limites, pois “pode crescer e devastar todo o mundo porque ele se alastra como um fungo sobre a superfície”.66
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necessidades ou condições são a desconsideração do plural para atender apenas aos desígnios individuais69. Importante destacar que esse abdicar de pensar não pode ser confundido com limitação cognitiva ou estupidez ou até mesmo burrice. Em verdade, trata-se de ser ignorante, isto é, ignorar os fatos, o próximo e a pluralidade em que vivemos. O fato de cometer uma conduta danosa, ainda que com perfeição; como assaltar um banco sem consequências físicas para si não significa que tenha pensado no próximo, mas sim que pensou nos passos, no plano para o sucesso da operação. No qual, para proteger a si, é possível considerar a existência de eventuais baixas, em um nítido não se importar com o cometimento do mal. Não há um momento de retiro para se perguntar sobre o sentido de seus atos e, inclusive, se indagar o que tudo aquilo significava para ele mesmo, para as vítimas, para o mundo, lugar da convivência no plural. Não há, ao se abdicar de pensar, um julgamento ético acerca de sua própria conduta, como afirma Sônia Maria Schio acerca do tema em Hannah Arendt:
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O julgamento, em Arendt, é aquele que prepara os dados pensados para serem decididos, para receber o impulso da vontade e adentrarem no mundo externo por meio da ação. O julgar, então, não existe sem o pensar. Para que haja conteúdos para o julgar, o pensamento precisa ter atuado previamente. Porém, o pensar tem a tendência a generalizar os
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69 Infelizmente, parece ser muito mais fácil condicionar o comportamento humano e fazer as pessoas se portarem da maneira mais inesperada e abominável do que convencer alguém a aprender com a experiência, como diz o ditado; isto é, começar a pensar e julgar em vez de aplicar categorias e fórmulas que estão profundamente arraigadas em nossa mente, mas cuja base de experiência foi esquecida há muito tempo, e cuja plausibilidade reside na coerência intelectual do que na adequação dos acontecimentos reais (ARENDT, Hannah. Responsabilidade e julgamento. Edição Jerome Kohn; revisão técnica Bethânia Assy e André Duarte; Trad. Rosaura Einchenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p.100).
elementos pensados. O julgar atua ligando, comparando, os subsídios do pensar com a situação particular em questão. É nesse sentido que Arendt entende que o julgar conjuga o particular e o geral, o mundo interno novamente com o externo; assim, também, o julgar se torna uma capacidade política, porque ele seleciona, organiza os (novos) dados para a escolha e para o impulso da vontade de torná-los ação no mundo externo.70
Se o abdicar de pensar pode propiciar a prática de um crime, então significa que a atividade do pensar seria capaz de evitar o mal? Para Hannah Arendt, creditar tal responsabilidade somente à atividade do pensar seria uma “crença ingênua”, mas a aposta na atividade do pensar traz à tona a possibilidade de uma ação mais responsável, menos automática, que exigiria do indivíduo moderno o desafio de estar em um constante diálogo do “eu comigo mesmo”, ou seja, de repensar os valores morais e a conduta moral sempre que se fizer necessário71, e, além disso, pensar na profundidade do outro, isto é, analisar, de fato, o impacto que sua conduta terá na vida dos terceiros, ver o outro a partir do olhar do mundo dele, e não seu. Todavia, além dessa prática contínua do diálogo do eu comigo mesmo, o indivíduo ainda teria de lutar, como vimos na criminologia, com as deficiências que podem perpetrar seu desenvolvimento, como a influência dos amigos, das tentações e do oferecimento de vantagens em troca de práticas criminosas. Contudo, essa resistência ocorreria e pode impedir a banalidade da prática danosa a terceiros e a propagação do mal. 70 SCHIO, Sônia Maria. Hannah Arendt: o mal banal e o julgar. Revista Veritas, Porto Alegre, v. 56, n. 1, p. 127-135, jan./abr. 2011. 71 Será que a natureza da atividade de pensar – o hábito de examinar, refletir sobre tudo aquilo que vem a acontecer, independentemente de qualquer conteúdo específico e de resultados – poderia ser tal que condiciona os homens a não fazer o mal? (ARENDT, Hannah. Responsabilidade e julgamento..., p. 227 e 228.
De tudo o que vimos ao longo desse breve estudo, podemos concluir que a criminologia não se preocupa com o mal em si, mas sim em identificar quem o comete. E faz um esforço no sentido de reunir elementos a fim de reconhecer os potenciais criminosos para evitar que novas condutas danosas sejam perpetradas. Já Hannah Arendt não relaciona o criminoso com a ausência do pensar, contudo, o abdicar de pensar pode propiciar o surgimento e a banalização do mal, visto que este se encontra na superfície. Destarte que a nossa proposta é que abdicar de pensar não é um crime, como nos mostrou a pensadora, contudo o mal não é exatamente identificável como pretende a criminologia, isto é, não se pode apontar que este ou aquele é ou será um criminoso, pois, o ato criminoso depende de outros elementos para se consumar. Não existe uma fórmula ou uma receita que pode se reproduzir e identificar perfeitamente este ou aquele por meros indicativos, é necessário mais. Assim, como o ato de não pensar não enseja a prática automática de um crime, mas possibilita seu surgimento, logo, o que podemos concluir é que a junção das duas visões viabiliza a análise de uma metodologia acerca do crime. Uma pessoa, ao deixar de pensar, não analisa as consequências de seus atos e, muito menos, o que sua conduta poderá impactar nas demais pessoas, os transtornos, os fatores psicológicos que podem advir de um assalto, de um assassinato ou de qualquer outro crime. Em verdade, só se ocupa de satisfazer seus anseios individuais, como se a banalidade do mal justificasse suas ações, como afirma Hannah Arendt: “Um assassino ou um ladrão não podem querer que mandamentos como ‘tu matarás’ ou ‘tu roubarás’ se tornem leis válidas para todos, já que ele teme,
evidentemente, pela própria vida e pela propriedade. Quem abre uma exceção para si mesmo se contradiz”72. A nossa proposta é que a criminologia continue como ciência a estudar o crime e o criminoso, porém, que se insira, também, como um dos elementos a serem considerados os indivíduos que tem como prática a ausência reiterada do pensar, o não se importar com o humano, o não se colocar no mundo do outro e verificar o impacto que sua conduta danosa irá produzir. Portanto, os preciosos ensinamentos de Hannah Arendt sobre a ausência do pensar devem ser incorporados à criminologia para a prevenção de novos crimes e o estudo do criminoso em si. O mal está presente em todos nós em maior ou menor grau e se manifesta de acordo com a própria permissibilidade do indivíduo que deixa se influenciar por fatores externos ou mostra uma falha de seu caráter, de sua educação. A dualidade bem e mal é inerente a todo e qualquer ser humano, o ato de pensar, de se sentir incomodado em sua consciência com a prática de algo errado, mal, e não conseguir esquecer é o que nos motiva a distinguir o certo do errado, o belo do feio; com isso, cabe a nossas decisões, nossas reflexões, no nosso diálogo consigo mesmo em optar pelo que é melhor para si e para a comunidade. E se a pessoa não se importa ou sequer se lembra do mal praticado, então nada conseguirá pará-lo, a tendência é que não se importe com a prática do mal e, por conseguinte, torne a praticá-lo; é a banalidade do mal, pois não há raízes que o impeça de se propagar e expandir. Enfim, tanto o bem quanto o mal estão presentes no ser humano e o quanto um ou outro irá se manifestar dependerá do quanto 72 ARENDT, Hannah. Pensamento e Considerações Morais. In: A dignidade da política..., p. 141.
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CONCLUSÃO
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o próprio indivíduo pensa a respeito de seus atos, o impacto deles em si mesmo e nos demais e o quanto deseja preservar as relações sociais de forma harmônica a fim do bem comum.
CORREIA, Adriano. Sentir-se em casa no mundo: a vida do espírito e o domínio dos assuntos humanos na obra de Hannah Arendt. Tese de Doutorando. Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. COSTA, Álvaro Mayrink da. Criminologia. Rio de Janeiro: Rio, v. I, t. I, 1980.
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Doutrina
Lei Complementar nº 147/2014 e Seus Reflexos na Participação das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte nas Licitações Públicas EDCARLOS ALVES LIMA
Advogado, Especialista em Direito Tributário pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Gestão Pública pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Consultor em Licitações e Contratos do Sebrae-SP. Autor de artigos jurídicos.
JULIANA TORRESAN RICARDINO
Advogada, Especialista em Processo Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em Contratos pela Fundação Getulio Vargas e em Direito do Trabalho pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais – IICS/CEU, Consultora em Licitações e Contratos do Sebrae-SP.
SUMÁRIO: Aspectos introdutórios; 1 Das alterações promovidas pela Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014; 1.1 Da figura do Microempreendedor Individual – MEI; 1.2 Da ampliação do prazo para comprovação da regularidade fiscal; 1.3 Ausência de norma específica do ente licitante: obrigatoriedade de aplicação da legislação federal; 1.4 Destinação exclusiva de licitação, subcontratação de MPEs e cota de contratação; 1.5 Alteração das disposições que tratavam da não aplicabilidade dos artigos 47 e 48 da Lei Complementar nº 123/2006; 1.6 Vacatio legis da Lei Complementar nº 147/2014; Conclusão; Referências.
ASPECTOS INTRODUTÓRIOS Inicialmente, ao nos debruçarmos sobre o estudo do tratamento constitucional conferido à empresa de pequeno porte, temos que ter por norte o princípio estampado no inciso IX do art. 1701, introduzido no Texto Constitucional pelo constituinte originário de 1988. Trata-se de um princípio que estabelece o tratamento favorecido às empresas de pequeno porte, tendo sido inserido no Título VII, que trata da ordem econômica e financeira. Seguindo adiante, no art. 179 da CF/1988, o constituinte encarregou a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, de conferirem efetividade ao princípio anteriormente citado, por meio de tratamento jurídico diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte. Vejamos o que dispõe o citado dispositivo do Texto Maior: Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei. (grifo nosso)
Percebe-se que o constituinte não elegeu, como havia feito em outras situações, o tipo de lei, se ordinária ou complementar, que efetivaria o tratamento favorecido e diferenciado às MPEs. A despeito disso, conforme se depreende da leitura da alínea d do inciso III do art. 146 da CF/1988, conferiu-se à lei complementar: [...] III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: 1 Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.
[...] d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (grifo nosso)
Não obstante ter se previsto a edição de lei complementar para tratar das normas gerais em matéria tributária, sobretudo no que diz respeito à definição de tratamento diferenciado e favorecido, o legislador infraconstitucional, no bojo do Estatuto Nacional das Microempresas e das Pequenas Empresas2, foi além, ao passo que instituiu novas regras para as licitações públicas, promoveu a alteração da CLT e tratou de outros assuntos.
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Não se objetiva, com o presente arrazoado, adentrar a discussão acerca do campo de aplicação do tratamento favorecido estabelecido pelo constituinte originário. Isso porque, para alguns, houve inovação, pelo legislador, ao estabelecer tratamento diferenciado no que concerne às licitações públicas, que são reguladas predominantemente pelas Leis Federais nºs 8.666/19933 e 10.520/20024.
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Pois bem. O fato é que a LC 123/2006 trouxe, no bojo dos arts. 42 ao 49, benefícios aplicáveis no campo das licitações públicas às empresas que se enquadrem como Micro ou Pequena, nos termos e condições ali disciplinadas. Pode-se resumir o conteúdo originário dos dispositivos anteriores nos seguintes benefícios: 2 Introduzido pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. 3 Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 4 Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002.
(i) Habilitação com irregularidade na documentação fiscal – art. 43 (rol previsto no art. 29 da Lei Federal nº 8.666/1993); (ii) Criação da situação de empate ficto, no qual a ME ou EPP que apresentar proposta de preço igual ou até 10% superior à proposta mais bem classificada terá direito de preferência. Na modalidade do pregão, o percentual é de 5% e o empate ficto se aplica ao final da fase de lances e antes da negociação – art. 44. (iii) Possibilidade de emissão da denominada “cédula de crédito microempresarial”, quando a ME ou a EPP for titular de direitos creditórios decorrentes de créditos liquidados não pagos em até 30 (trinta) dias contados da data de liquidação – art. 46. (iv) Possibilidade de ser realizada licitação destinada exclusivamente às microempresas e empresas de pequeno porte quando o valor estimado for de até R$ 80.000,00 – art. 48, inciso I. (v) Possibilidade de ser determinado aos licitantes a subcontratação de MPEs, desde que o percentual máximo do objeto a ser subcontratado não exceda 30% do total licitado – art. 48, inciso II. (vi) Possibilidade de estabelecer cota de até 25% do objeto para a contratação de MPEs em licitações para aquisição de bens e serviços de natureza divisível – art. 48, inciso III. Os valores relativos às contratações realizadas para o cumprimento do disposto no art. 48 não poderiam exceder a 25% do total licitado em cada ano civil, conforme previa o § 1º do referido dispositivo legal.
1 DAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI COMPLEMENTAR Nº 147, DE 7 DE AGOSTO DE 2014 Não é nosso objetivo, com o presente artigo, tratar dos aspectos tributários, financeiros e outros, melhorados ou ampliados pela LC 147/2014, pois o nosso estudo se restringe aos aspectos trazidos pelo legislador que são aplicáveis diretamente no âmbito das licitações públicas.
1.1 Da figura do Microempreendedor Individual – MEI A LC 147/2014 trouxe um fim ao debate em torno do enquadramento do Microempreendedor Individual, equiparando-o ao patamar de microempresa. No que se refere às licitações públicas, os maiores reflexos acerca da participação e extensão dos benefícios da LC 123/2006 aos Microempreendedores Individuais encontram-se no art. 18-E, sobretudo nos §§ 2º ao 4º, os quais transcrevem-se a seguir: Art. 18-E. O instituto do MEI é uma política pública que tem por objetivo a formalização de pequenos empreendimentos e a inclusão social e previdenciária. § 1º [...]
§ 2º Todo benefício previsto nesta lei complementar aplicável à microempresa estende-se ao MEI sempre que lhe for mais favorável. § 3º O MEI é modalidade de microempresa. § 4º É vedado impor restrições ao MEI relativamente ao exercício de profissão ou participação em licitações, em função da sua respectiva natureza jurídica.
Impende esclarecer que o art. 18-E não existia no escopo inicial da LC 123/2006. Havia questões obscuras relativamente à participação do MEI em licitações públicas. O legislador complementar sanou tais questões, estabelecendo que, primeiro, o MEI é uma modalidade de microempresa e, segundo e não menos importante, que não poderão ser estabelecidas quaisquer restrições que o impeçam de participar de licitações públicas. Diante disso, não só pode o MEI participar de licitações públicas, de forma ampla e irrestrita, como também poderá usufruir dos benefícios conferidos às microempresas e empresas de pequeno porte pela LC 123/2006.
1.2 Da ampliação do prazo para comprovação da regularidade fiscal Originalmente, o legislador complementar previu, no art. 43, § 1º, da LC 123/2006, o prazo de 02 dias úteis para que a micro ou pequena empresa comprove a sua regularidade fiscal. O termo inicial do prazo em questão corresponde ao momento em que a proponente for declarada vencedora do certame, prazo este que poderia, a critério da entidade licitante, ser prorrogado por igual período.
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Feitas essas considerações preambulares acerca do arcabouço normativo aplicável às micro e pequenas empresas, concernente à participação nas licitações públicas, passaremos ao breve estudo das principais alterações promovidas pela LC 147/2014.
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Não significa dizer que a micro ou pequena empresa pudesse deixar de apresentar seus documentos de regularidade fiscal para fins de habilitação no certame, mas sim que os apresentasse, ainda que deles constassem pendências. E, assim ocorrendo, deveria ser concedido o prazo para a MPE regularizar seus documentos de regularidade fiscal. Vale frisar que a regularidade passível de comprovação no prazo supraestabelecido se refere àquela prevista no art. 29 da Lei nº 8.666/1993, isto é, restringe-se aos documentos de regularidade fiscal, senão vejamos: Art. 29. A documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista, conforme o caso, consistirá em: I – prova de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Geral de Contribuintes (CGC); II – prova de inscrição no cadastro de contribuintes estadual ou municipal, se houver, relativo ao domicílio ou sede do licitante, pertinente ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual;
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III – prova de regularidade para com a Fazenda Federal, Estadual e Municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra equivalente, na forma da lei;
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IV – prova de regularidade relativa à Seguridade Social e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), demonstrando situação regular no cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei. V – prova de inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, mediante a apresentação de certidão negativa, nos termos do Título VII-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. (grifo nosso)
O rol do art. 29 da Lei nº 8.666/1993 foi ampliado para abarcar também a regularidade trabalhista como um documento necessário à habilitação da licitante no certame licitatório, que foi
instituída pela Lei nº 12.440/20115, com a inclusão do inciso V, anteriormente transcrito. Entendemos que a possibilidade de regularização prevista no art. 43 da LC 123/2006 se restringe à regularidade fiscal, que não abrange os débitos trabalhistas. E assim defendemos, por uma razão óbvia. Os débitos trabalhistas, cuja inexistência se comprova por meio da Certidão Negativa, ou Positiva com Efeitos de Negativa, de Débitos Trabalhistas – CNDT, emitida pelo Tribunal Superior do Trabalho, não possuem natureza fiscal, isto é, não se enquadram como tributos cujas competências são conferidas constitucionalmente aos entes federativos. Trata-se de débitos decorrentes de relações trabalhistas não adimplidos em sua regular fase processual. Voltando a questão do prazo concedido para tal regularização, o legislador complementar, por meio da LC 147/2014, ampliou tal prazo, que passou a ser de 5 (cinco) dias úteis, conforme se observa a seguir: Art. 43. [...] § 1º Havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal, será assegurado o prazo de 5 (cinco) dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da administração pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de negativa. (grifo nosso)
Assim sendo, a partir da publicação da aludida lei complementar, o prazo a ser concedido à microempresa ou pequena empresa declarada vencedora do certame é de 5 (cinco) dias 5 Lei nº 12.440, de 7 de julho de 2011.
1.3 Ausência de norma específica do ente licitante: obrigatoriedade de aplicação da legislação federal Não obstante a LC 123/2006 ter trazido inovações no campo das licitações públicas, a sua efetivação dependia de regulamentação própria editada pelo ente licitante, isto é, tornava-se inócua a aplicação do tratamento diferenciado estabelecido constitucionalmente. Corrigindo tal descompasso, o legislador complementar alterou o art. 47 da LC 123/2006 para estabelecer o dever de, nas contratações públicas, ser concedido tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte, senão vejamos: Art. 47. Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica.
A inovação no art. 47 constituiu exclusivamente na alteração da expressão “poderá” por “deverá”, conferindo, assim, caráter de obrigatoriedade e não de faculdade à Administração Pública em estabelecer, em suas licitações, critérios que efetivem o tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte. O legislador foi além. Estatuiu, no parágrafo único do precitado artigo, a obrigatoriedade de adoção da legislação federal até a edição de uma legislação ou regulamento próprio mais favorável à microempresa e empresa de pequeno porte. Vejamos tal disposição.
Parágrafo único. No que diz respeito às compras públicas, enquanto não sobrevier legislação estadual, municipal ou regulamento específico de cada órgão mais favorável à microempresa e empresa de pequeno porte, aplica-se a legislação federal. (grifo nosso)
Estabeleceu-se aqui uma regra de transição, a fim de que as disposições implementadas pela lei complementar não ficassem sem aplicabilidade imediata pelos órgãos e entidades integrantes da Administração Pública das demais esferas de governo. Assim, enquanto não sobrevier lei ou regulamento específico no ente licitante, deverão ser aplicadas, integralmente, as disposições da LC 123/2006, com as devidas alterações posteriores.
1.4 Destinação exclusiva de licitação, subcontratação de MPEs e cota de contratação Para dar efetividade aos objetivos delineados no art. 47 da LC 123/2006, objeto de breve estudo no tópico anterior, o legislador instituiu instrumentos para que o ente licitante os cumprisse. É o que se observa da previsão contida no art. 48, verbis: Art. 48. Para cumprimento do disposto no art. 47 desta lei complementar, a administração pública: I – deverá realizar processo licitatório destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); II – poderá, em relação aos processos licitatórios destinados à aquisição de obras e serviços, exigir dos licitantes a subcontratação de microempresa ou empresa de pequeno porte; III – deverá estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte. (grifo nosso)
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úteis, prorrogáveis por mais 5 (cinco) dias úteis, a fim de que esta regularize a sua situação fiscal perante o Fisco.
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O legislador alterou a expressão “poderá” por “deverá” nas hipóteses previstas nos incisos I e III do art. 48. Significa dizer que, a partir de agora, não se trata mais de faculdade do administrador público realizar uma licitação exclusiva às ME e EPP ou estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% do objeto para a contratação de MPEs, mas sim um dever legalmente imposto. Sendo assim, sempre que a administração estiver diante de um objeto cujo valor seja inferior à R$ 80.000,00, deverá ser realizada uma licitação exclusiva às microempresas e empresas de pequeno porte, dela podendo participar os Microempreendedores Individuais, já que o legislador os elevou à modalidade de microempresa6. Do mesmo modo, sempre que houver a aquisição de bens de natureza divisível, é dever da administração determinar, já no edital, a cota de até 25% para contratação de microempresa e empresa de pequeno porte.
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Insta destacar que as contratações feitas para cumprimento do disposto no art. 48 da LC 123/2006, ora analisado, encontrava um limitador previsto no § 1º, do referido artigo, o qual impunha que tais contratações não poderiam exceder a 25% do total licitado em cada ano civil.
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A despeito disso, agiu com total acerto o legislador complementar ao revogar, por meio da LC 147/2014, o percentual limitador anteriormente citado, o qual poderia ser tido como indevido,
já que o Texto Maior não impôs tal limitação para aplicação do princípio do tratamento favorecido às microempresas. Já na hipótese tratada pelo inciso II do art. 48 da LC 123/2006, doravante inexiste a imposição do percentual máximo, de 30% do objeto, que poderia ser destinado à subcontratação de microempresa e empresa de pequeno porte. Tal hipótese ainda constitui uma faculdade do administrador, que poderá ou não estabelecer, no instrumento convocatório, um percentual que deverá ser executado por microempresa e empresa de pequeno porte, por meio de subcontratação realizada pela licitante ao final declarada vencedora do certame.
1.5 Alteração das disposições que tratavam da não aplicabilidade dos artigos 47 e 48 da Lei Complementar nº 123/2006 Em total descompasso com o texto constitucional, havia previsto o legislador algumas hipóteses que, se verificadas, não ensejavam a aplicação dos benefícios estatuídos pelos arts. 47 e 48. Vejamos a redação original do art. 49 da LC 123/2006, verbis: Art. 49. Não se aplica o disposto nos arts. 47 e 48 desta lei complementar quando: I – os critérios de tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não forem expressamente previstos no instrumento convocatório;
6 Há que se levar em consideração, no que se refere à participação e eventual declaração do MEI como vencedora da licitação, que o seu faturamento não poderá exceder ao patamar estabelecido pela LC 123/2006, atualmente no valor de R$ 60.000,00. Cabe ao administrador, nesta hipótese, comunicar o MEI da necessidade de ser efetivado o seu reenquadramento.
II – não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório;
ser contratado; IV – a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos dos arts. 24 e 25 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. (grifo nosso)
A LC 147/2014, além de revogar totalmente o inciso I, promoveu uma alteração substancial no inciso IV, conforme veremos a seguir. O inciso I, que foi revogado, disciplinava a não aplicabilidade da LC 123/2006 quando o instrumento convocatório não estabelecesse expressamente os critérios de tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte. Esse inciso, vale anotar, contrariava o entendimento pacificado pelo eg. TCU, para o qual, mesmo quando o edital fosse omisso quanto ao tratamento diferenciado e simplificado, deveria ser aplicado o disposto na própria lei complementar que o disciplinou. Analisemos, a seguir, trechos de acórdãos do TCU a respeito do tema: [...] 19. Apesar da ausência de previsão editalícia de cláusulas que concedam a estas categorias de empresas os benefícios previstos nos arts. 45 e 46 da lei supradita, não há impedimentos para a aplicação dos dispositivos nela insculpidos. 20. Tais disposições, ainda que não previstas no instrumento convocatório, devem ser seguidas, vez que previstas em lei. Cometerá ilegalidade o Sr. Pregoeiro caso, no decorrer do certame, recuse-se a aplicá-las, se cabíveis.
21. Não se vislumbra, deste modo, a necessidade de inclusão, no edital, destes dispositivos, conforme requerido pela representante.7 (grifo nosso) [...] 2. É certo que para maior esclarecimento dos participantes as regras editalícias deveriam deixar claro o procedimento adotado para concessão da preferência legal, inclusive no que concerne ao disciplinamento da forma de comprovação da licitante para identificar-se como microempresa ou empresa de pequeno porte. 3. Entendo, contudo, conforme consignei no despacho concessivo da cautelar, que tal requisito não se fazia obrigatório. De fato, em uma análise mais ampla da lei, observo que seu art. 49 explicita que os critérios de tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte previstos em seus arts. 47 e 48 não poderão ser aplicados quando “não forem expressamente previstos no instrumento convocatório”. A lei já ressalvou, portanto, as situações em que seriam necessárias expressas previsões editalícias. Dentre tais ressalvas, não se encontra o critério de desempate com preferência para a contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte, conforme definido em seus arts. 44 e 45 acima transcritos. 4. A existência da regra restringindo a aplicação dos arts. 47 e 48 e ausência de restrição no mesmo sentido em relação aos arts. 44 e 45 conduzem à conclusão inequívoca de que esses últimos são aplicáveis em qualquer situação, independentemente de se encontrarem previstos nos editais de convocação. 5.Vê-se, portanto, que não houve mera omissão involuntária da lei. Ao contrário, caracterizou-se o silêncio eloqüente definido pela doutrina.8 (grifo nosso) (TCU, Plenário, Acórdão nº 2.144/2007, Rel. Min. Aroldo Cedraz) 7 TCU, Acórdão nº 702/2007, Rel. Min. Benjamin Zymler, Plenário, Data da sessão: 25.04.2007. 8 TCU, Acórdão nº 2144/2007, Rel. Min. Aroldo Cedraz, Plenário, Data da sessão: 10.10.2007.
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III – o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não for vantajoso para a administração pública ou representar prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a
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No mesmo sentido, ensina Marçal Justen Filho9: Não caberá negar a uma ME ou a uma EPP a possibilidade de beneficiar-se das regras previstas nos arts. 42 a 45 da LC 123, nem mesmo sob o argumento de ausência de regulamentação. Também não caberá afirmar que o ato convocatório não forneceu a solução cabível para o exercício e para o deferimento dos benefícios. Ainda que não haja regulamentação e não obstante o silêncio do edital, os benefícios previstos na LC 123 deverão ser reconhecidos, deferidos e aplicados – sob pena de configuração de nulidade da decisão denegatória. (grifo nosso)
Assim sendo, mesmo durante a vigência do inciso I, anteriormente tratado, o administrador público tinha o dever de aplicar o tratamento favorecido e diferenciado estabelecido pela LC 123/2006, haja vista que se trata de regras cuja aplicabilidade é imediata. Já o inciso IV do art. 49 da LC 123/2006 sofreu substancial alteração pela LC 147/2014, que passou a contar com a seguinte redação: [...]
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IV – a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos do art. 24 e 25 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, excetuando-se as dispensas tratadas pelos incisos I e II do art. 24 da mesma lei, nas quais a compra deverá ser feita preferencialmente de microempresas e empresas de pequeno porte, aplicando-se o disposto no inciso I do art. 48. (grifo nosso)
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O legislador inovou quanto a este ponto destacado no texto. Significa dizer que, sempre que a administração estiver diante de uma das hipóteses de dispensa de valor previstas nos incisos I (R$ 15.000,00 para obras e serviços de engenharia) e II (R$ 8.000,00 para outros serviços e compras) a contratada deverá ser, obrigatoriamente, microempresa (inclusive o MEI) ou empresa de pequeno porte, já que tais hipóteses de dispensa 9 O estatuto da microempresa e as licitações públicas. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2007. p. 21.
se encontram abaixo do patamar previsto no inciso I do art. 48 da LC 123/2006, qual seja, de R$ 80.000,00. Tal conclusão não se aplica aos casos em que o fundamento nuclear da contratação direta seja a inviabilidade de competição, ensejadora da inexigibilidade de licitação, pois, neste caso, ainda que o administrador esteja diante de objeto cujo valor seja inferior ao previsto para a dispensa de licitação fundada nos incisos I e II do art. 24 da Lei nº 8.666/1993, a regra tratada anteriormente está afastada. Isto é, não se impõe que a contratada seja microempresa ou empresa de pequeno porte. Aliás, o próprio legislador, no inciso IV do art. 49 da LC 123/2006, ora discutido, afasta o tratamento preferencial às microempresas e empresas de pequeno porte no caso de licitação inexigível (art. 25 da Lei nº 8.666/1993) ou dispensada (demais incisos do art. 24 da Lei Federal nº 8.666/1993).
1.6 Vacatio legis da Lei Complementar nº 147/2014 Regra geral, uma lei começa a vigorar, em todo território nacional, 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada, salvo disposição contrária, conforme preconiza o art. 1º, caput, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942)10. Tal prazo se denomina de vacatio legis, expressão em latim que significa “vacância da lei”. Trata-se de um prazo concedido para que todos tenham conhecimento da lei que entrará em vigor em determinada data, para não serem “pegos de surpresa”. No caso da LC 147/2014, o legislador tratou da vacância no art. 15, tendo estabelecido que: 10 Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942.
exceto no que se refere: I – ao § 14 do art. 3º, ao inciso VI do art. 17, ao caput e aos §§ 2º, 5º-D, 5º-F, 5º-I, 7º, 13, 14, 16, 17, 18, 18-A e 24 do art. 18, ao inciso I do § 4º do art. 18-A, ao caput do art. 19, ao § 3º do art. 20, aos incisos I, II e V do § 4º do art. 21 e ao Anexo VI, todos da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, na redação dada pelo art. 1º e Anexo Único desta lei complementar, ao art. 3º e aos incisos III a V do art. 16 desta lei complementar, que produzirão efeitos a partir de 1º de janeiro do primeiro ano subsequente ao da publicação desta lei complementar; II – ao § 15 do art. 3º, aos §§ 12 a 14 do art. 26, ao art. 38-B, à alínea a do inciso XIII do § 1º e aos §§ 7º e 8º do art. 13 e ao art. 21-A, todos da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, na redação dada pelos arts. 1º e 2º desta lei complementar, e ao inciso I do art. 16 desta lei complementar, que produzirão efeitos a partir de 1º de janeiro do segundo ano subsequente ao da data de publicação desta lei complementar. (grifo nosso)
Salvo as exceções feitas nos incisos I e II, anteriormente transcritos, que, em grande parte, tratam de questões tributárias e fiscais, os dispositivos trazidos pela LC 147/2014 entraram em vigor na data de sua publicação, a qual foi veiculada no DOU do dia 8 de agosto de 2014. Destaca-se que as disposições aplicáveis no âmbito das contratações públicas não se sujeitaram às vacâncias estabelecidas pelos incisos I e II, razão pela qual são de observância imediata.
CONCLUSÃO À guisa de conclusão, pode-se verificar que o legislador infraconstitucional buscou corrigir, por meio da LC 147/2014, algumas das impropriedades contidas na LC 123/2006. Além disso, tornou obrigatória, doravante, que as compras diretas por dispensa de licitação, fundadas nos incisos I e II
do art. 24 da Lei nº 8.666/1993, sejam realizadas por meio da contratação de microempresas, empresas de pequeno porte e microempreendedor individual. A política pública anteriormente instituída tende a fomentar ainda mais o segmento dos pequenos negócios. Isto porque, tendo por parâmetro o Estado de São Paulo, percebe-se que as compras diretas por Dispensa de Licitação Eletrônica, realizadas pelo site da Bolsa Eletrônica de Compras, respondem pelo montante acumulado de R$ 389.530.092,4111. Se considerarmos apenas o ano de 2014, o valor das dispensas somou a quantia de R$ 21.797.190,01. Outra tentativa de correção ocorreu em relação ao prazo para a regularização fiscal, que era de 2 dias úteis e passou para 5 dias úteis, nos termos do art. 43, § 1º, da LC 123/2006. Entendemos que, não obstante o legislador ter ampliado tal prazo, ainda sim não atendeu plenamente aos anseios do segmento. Ora, é inimaginável que o contribuinte consiga obter, perante a Fazenda, seja ela no âmbito federal, estadual, distrital ou municipal, o parcelamento de uma dívida tributária no prazo de 5 dias úteis, mesmo se considerarmos que tal prazo poderá, a critério do ente licitante, ser prorrogado por igual período. Como se sabe, para que se obtenha um parcelamento tributário, é necessário o cumprimento, pelo contribuinte, de vários requisitos e formalidades estabelecidos pelo Fisco, burocracias estas a ponto de tornar inócua a intenção do legislador na ampliação de tal prazo. 11 Dados a partir do ano de 2000 até 31.12.2014. Tabela de evolução anual da economia com dispensa de licitação. Disponível em: <http://www.bec. sp.gov.br/Publico/Aspx/Resultado_Ano.aspx>. Acesso em: 17 mar. 2015.
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Art. 15. Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação,
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Em linhas gerais, não se pode olvidar que a lei complementar ora estudada avançou no que concerne ao fomento aos pequenos negócios, por meio de mecanismos que garantem uma aplicabilidade mais efetiva do princípio trazido pelo Texto Maior.
REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 17 dez. 2014. ______. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 17 mar. 2015. ______. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 17 mar. 2015. ______. Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10520.htm>. Acesso em: 17 mar. 2015. ______. Lei Complementar nº 126, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm>. Acesso em: 17 mar. 2015. ______. Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp147.htm>. Acesso em: 17 mar. 2015.
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BOLSA Eletrônica de Compras do Estado de São Paulo. Tabela de evolução anual da economia com dispensa de licitação. Disponível em: <http:// www.bec.sp.gov.br/Publico/Aspx/Resultado_Ano.aspx>. Acesso em: 17 mar. 2015.
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JUSTEN FILHO, Marçal. O estatuto da microempresa e as licitações públicas. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2007. TRIBUNAL de Contas da União. Jurisprudência. Disponível em: <http:// portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/jurisprudencia>. Acesso em: 20 mar. 2015.
Doutrina
Legalização da Venda de Animais Silvestres: um Remédio para o Tráfico de Fauna?
Entretanto, até que ponto a legalização do comércio de animais silvestres é um remédio para tal problemática? O presente trabalho objetiva analisar as consequências da posse de animais silvestres como animais de estimação, de modo a instigar a realização de novos estudos que possibilitem a construção de um real embasamento para a tomada de decisão. Os aspectos discutidos remetem à conclusão de que a legalização, na verdade, tem trazido inúmeros problemas à sociedade e ao meio ambiente, fazendo-se iminente a revisão dos aspectos que permeiam o comércio e a posse de animais silvestres.
CAROLINA BRANDT GUALDI
PALAVRAS-CHAVE: Animais silvestres; tráfico de animais silvestres; animais de estimação.
Especialista em Direito Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS (2012), Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS (2008).
RESUMO: O tráfico de animais silvestres é uma das grandes ameaças à perpetuação das espécies, sendo motivado, principalmente, pelo ascendente mercado de animais de estimação. Entre as consequências desse tipo de tráfico encontram-se a transmissão de zoonoses, introdução de espécies invasoras, declínio populacional, impactos econômicos, recrutamento da população para a atividade ilícita, entre inúmeras outras de cunho ecológico, econômico e social. Com base no desenvolvimento sustentável, as principais ferramentas de contenção baseiamse na regulamentação do comércio, a exemplo da Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITES) e das normativas e por tarias do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
SUMÁRIO: Introdução; O enredo: tráfico de animais; A Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies de Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites); O Brasil frente ao tráfico de animais: aspectos legais envolvidos; Captura de animais; Introdução de espécies invasoras; Maus-tratos; Outras esferas do debate – Uma breve discussão; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO O tráfico de animais silvestres, uma das principais causas da perda de biodiversidade e da extinção de espécies1, é mantido 1 BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito Destinada a Investigar o Tráfico de Animais e Plantas Silvestres Brasileiros, a Exploração e Comércio Ilegal de Madeira e a Biopirataria no País – CPIBIOPI. Brasília/DF, 2006. 502 p. Disponível em: <http:// http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/cpi/Rel_Fin_CPI_Biopirataria. pdf>. Acesso em: 19 abr. 2012. p. 381. Também: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres. Vida Silvestre: o estreito limiar entre preservação e destruição – Diagnóstico do tráfico de animais silvestres na Mata Atlântica – Corredores Central e Serra do Mar. 1. ed. Brasília, 2007. p. 12. 199 p.
especialmente pelo fascínio que as pessoas têm por animais de estimação2, aliado ao momento em que a sociedade se encontra de extrema valorização ao consumo. Essa atividade envolve a aquisição, o transporte e a distribuição ilícita de animais e de suas partes ou derivados, violando as leis nacionais e estrangeiras e os tratados firmados3, sendo caracterizado como um crime transnacional, com consequências que ultrapassam os limites territoriais das nações4.
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Acredita-se que os fatores que têm levado ao incremento da atividade ilícita em questão sejam, entre outros: sua fusão com o narcotráfico, utilizando as mesmas rotas, técnicas e pessoas5; penalidades brandas aos envolvidos6; crescimento do comércio internacional e expansão dos meios de transporte sem o acom-
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2 LIMA, R. O tráfico de animais silvestres. In: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres. Vida silvestre: o estreito limiar entre preservação e destruição – Diagnóstico do Tráfico de Animais Silvestres na Mata Atlântica – Corredores Central e Serra do Mar. 1. ed. Brasília, 2007. p. 44-49, p. 47. 199 p. 3 WYLER, L. S.; SHEIKH, P. A. International illegal trade in wildlife: threats and U.S. Policy. Washington: Congressional Research Service, 2008. p. 1. 49 p. 4 ELLIOTT, L. Combating transnational environmental crime: “joined up” thinking about transnational networks. In: KANGASPUNTA, K.; MARSHAL, I. H. (Ed.). Eco-crime and justice: essays on environmental crime. Turin: Unicri, 2009. p. 55-78, p. 59. Ver também: BRASIL. Gabinete de Segurança Institucional. Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais. Seminário Faixa de Fronteira: Novos Paradigmas. Brasília, 2004. p. 85. 5 ZIMMERMAN, M. E. The black market for wildlife: combating transnational organized crime in the illegal wildlife trade. Vanderbilt Journal of Transnational Law, v. 36, n. 5, p. 1657-1689, 2003, p. 1671. Também: HERNANDEZ, E. F. T. Das redes e do tráfico de animais. Geografia, Londrina, v. 11, n. 2, p. 271-281, jul./dez. 2002, p. 277. 6 Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres. 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. Brasília, 2001. 108 p. Disponível em: <http://www.renctas.org.br/pt/trafico/rel_renctas.asp>. Acesso em: 20 jun. 2011, p. 16. Também: HERNANDEZ, 2002. p. 278.
panhamento de um aumento dos equipamentos e técnicas de fiscalização e controle7; globalização e facilidades oferecidas pelos meios de comunicação8; situação de extrema pobreza de grande parte da população9; alto valor dos espécimes, produtos e subprodutos no mercado nacional e internacional10. Por ser um país megadiverso, desde o seu descobrimento, o Brasil é alvo de cobiça e vem sendo saqueado em seus recursos naturais através do extrativismo, desmatamento e captura da fauna nativa para o abastecimento do comércio de animais silvestres, satisfação de colecionadores, ostentação, entre outros caprichos11. É evidente que tal exploração envolveu práticas cruéis de caça indiscriminada, abate, coleta, péssimas condições de cativeiro e transporte, o que, infelizmente, não é de se espantar que ocorresse (naquela época), visto a forma como se tratavam os “outros escravos”, os humanos12. Ambos eram 7 WYLER; SHEIKH, 2008, p. 6. Ainda: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2001, p. 16. Também: HERNANDEZ, 2002, p. 278-280. 8 HERNANDEZ, 2002, p. 274. 9 Ibidem, p. 275. Também: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2001, p. 28. 10 HERNANDEZ, 2002, p. 277. Ver também: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2001, passim. 11 Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2001, p. 12 e ss. Também: HERNANDEZ, 2002, p. 271-272. Ainda: SAAB, J. J. Tráfico ilícito de animais silvestres: a resposta penal segundo a Lei nº 9.605/1998. Revista Ciências Humanas, Taubaté, v. 12, n. 1, p. 61-66, jan./jun. 2006, p. 61-62; CALHAU, L. B. Da necessidade de um tipo penal específico para o tráfico de animais: razoabilidade da política criminal em defesa da fauna. [S.I.: s.n.], [2004?]. 8 p. Disponível em: <http://www.mma.gov. br/port/conama/processos/0B175B00/LelioPenalTrafAnim.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2011, p. 2. 12 Como expõe Santana: “Decerto que, no decorrer da história, escravos e animais foram submetidos a violências muito semelhantes, mas, salvo entre alguns povos primitivos, o homem ocidental não costuma se ali-
Atualmente, a criação e a manutenção de animais silvestres em cativeiro para fins científicos, comerciais, educacionais e conservacionistas são regidas no Brasil por meio de uma série de regulamentos, principalmente portarias e instruções normativas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que conduzem tais atividades de acordo com as leis brasileiras de proteção à fauna. De acordo com o Diagnóstico de Tráfico de Animais Silvestres na Mata Atlântica – Corredores Central e Serra do Mar: [...] a liberação quase indiscriminada das espécies passíveis de serem criadas para fins comerciais foi largamente justificada pelo Ibama, como forma de “conter o comércio ilegal de animais silvestres”. No entanto, apesar do modismo que leva à expansão do comércio especializado e que usa como propaganda a “legalidade” dos animais, os elevados números das apreensões apontam para a intensificação do tráfico.15
Essa alternativa, a criação de animais silvestres em cativeiro, é vista como uma forma de diminuir a captura e o comércio ilegal da fauna silvestre brasileira, pois, havendo alternativas economentar da carne dos seus prisioneiros” (SANTANA, H. J. Abolicionismo animal. Salvador: Instituto de Abolicionismo Animal, [200-]. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/abolicionismoanimal.pdf>. Acesso em 24 abr. 2012. Paginação irregular). 13 SANTANA, [200-], paginação irregular. 14 HOGEMANN, E. R. R. S. A ambiguidade da noção de pessoa humana e o debate bioético contemporâneo. In: Encontro Nacional do Conpedi, XIX, 2010, Fortaleza. Anais eletrônicos... 2010. Disponível em: <http://www. conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3023.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2012, p. 557-578, p. 565. 15 Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 128.
micamente viáveis, o consumo predatório dos recursos naturais reduziria, auxiliando na conservação do meio ambiente16. Nessa linha de pensamento, uma vez que existe demanda por um mercado de animais silvestres, estes deverão proceder de criatórios com tal finalidade, partindo-se do pressuposto que isso evitaria a retirada de espécimes do meio ambiente, promovendo a manutenção dos processos ecológicos e da biodiversidade17. Todavia, não podemos esquecer o ambiente em que tal situação hipotética está inserida: uma sociedade capitalista, consumista e imediatista. Restringindo a discussão somente ao comércio de animais de estimação, que, por sinal, é a modalidade que mais incentiva o tráfico de animais silvestres18, são inúmeras as consequências que a manutenção de animais silvestres em domicílios tem trazido para o meio ambiente e, evidentemente, para a sociedade. Focando na questão da saúde pública, por exemplo, as infecções zoonóticas representam cerca de 61% das doenças humanas e compõem 75% das doenças emergentes19. No caso da relação com animais de companhia, o risco de transmissão é 16 Ver, por exemplo: ANTUNES, D. A. A importância do comércio legal frente ao comércio ilegal de animais silvestres. In: Zootec 2004, Anais eletrônicos... Brasília, 2004. Disponível em: <http://www.abz.org.br/ publicacoes-tecnicas/anais-zootec/palestras/23116-importncia-comrcio-legal-frente-comrcio-ilegal-animais-silvestres.html>. Acesso em: 26 jan. 2012, p. 11. Também: ANTONIALLI, L. M.; SOUKI, G. Q.; TEIXEIRA, T. H. Estratégias para a criação comercial de aves silvestres: o caso de uma empresa autorizada pelo Ibama. In: Congresso da Sociedade Brasileira de Economia Rural (Sober), XLII, 2004, Cuiabá. Anais eletrônicos... Cuiabá, 2004. Disponível em: <http://www.sober.org.br/palestra/12/08O382.pdf>. Acesso em: 2 fev. 2012, p. 9 e 13. 17 ANTUNES, 2004, p. 6-7 e 11. 18 LIMA, R., 2007, p. 47. 19 TAYLOR, L. H.; LATHAM, S. M.; WOOLHOUSE, M. E. J. Risck factors for human disease emergence. Phil. Trans. R. Soc. Lond. B, v. 356, p. 983-989, 2001, p. 985-986.
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tratados de forma animalesca pelo animal humano considerado racional, vítimas de violência e demandas alheias13, ambos eram seres irracionais com o propósito de servir aos seres racionais14. Com o passar dos anos, parte desse pensamento mudou, mas infelizmente suas raízes ainda permanecem na sociedade.
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elevado, pois existe um alto grau de proximidade com o animal que, muitas vezes, não é aliado ao conhecimento necessário20. Além disso, a posse de animais de estimação (domésticos e silvestres) oferece riscos ao ambiente em função da soltura indiscriminada e da compra de animais sem origem conhecida, o que pode levar à introdução de zoonoses ao ambiente21. Pela falta de conhecimento ou responsabilidade no momento da aquisição de um animal de estimação, alguns proprietários decidem não permanecer mais com ele22. A parcela desses animais que é encaminhada para órgãos ambientais, tomando o mesmo rumo dos animais apreendidos do tráfico de fauna silvestre (Centros de Triagem ou Manejo de Animais Silvestres, principalmente)23, ainda gera um novo problema: que destino dar a tais espécimes?24
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Apesar disso, o mercado de animais de estimação cresce a cada ano no País25, intensificando as problemáticas descritas. Entre as principais motivações para aquisição de um animal de estimação estão: a companhia proporcionada por ele, a alegria que sua presença nos traz, a aprendizagem de valores como a responsabilidade, a necessidade de mais segurança, o ine-
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20 PICKERING, L. K. et al. Exposure to nontraditional pets at home and to animals in public settings: risks to children. Pediatrics, v. 122, n. 4, p. 876-886, 2008, p. 877-878. Ainda: LIMA, R., 2007, p. 48. 21 PICKERING et al., 2008, p. 877. Ver também: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 193. 22 PICKERING et al., 2008, p. 877. 23 Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 153 24 Ibidem, p. 138. 25 BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Reunião Ordinária da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Animais de Estimação, 1ª, 2012, Brasília. Ata de reunião. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, 2012. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/ arq_editor/file/Alimenta%C3%A7%C3%A3o%20Animal/1RO/Ata_pet.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2013, p. 2.
gável valor estético26, além da promoção de bem-estar e maior longevidade que a relação com outros animais nos propicia27. Porém, animais domésticos, como cães e gatos, há tantos anos domesticados e que, ainda assim, muitas vezes continuam sofrendo com a dificuldade humana de relacionamento intra e interespecífica (maus-tratos, abandono, etc.) já não cumprem esse papel perfeitamente? Frente ao exposto, fica a dúvida: a legalização da venda de animais silvestres como animais de estimação é um remédio efetivo para o tráfico de fauna? O objetivo deste trabalho consiste em analisar as consequências resultantes da posse de animais silvestres como animais de estimação, ao mesmo tempo em que se estabelece um paralelo com as normativas existentes. Sendo assim, não há pretensão de esgotar tão amplo e complexo tema. Pelo contrário, reflete o anseio de que novas pesquisas sejam feitas acerca do assunto, visto a relevância e urgência de sua discussão, bem como provocar a reflexão do leitor sobre as políticas públicas implementadas que declaram buscar a solução para problemas que atingem a tudo e a todos, mas que não tem recebido a merecida atenção e questionamento.
O ENREDO: TRÁFICO DE ANIMAIS O tráfico de animais silvestres é caracterizado por envolver o comércio e o contrabando de plantas, animais, recursos naturais e poluentes, violando leis e/ou acordos ambientais multilaterais28. 26 GUALDI, C. B. Vidas de estimação: a fauna mantida nos lares de Porto Alegre... 2008. 41 f. Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Ciências Biológicas) – Instituto de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. p. 31-32. 27 WELLS, D. L. The effects of animals on human health and well-being. Journal of Social Issues, v. 65, n. 3, p. 523-543, 2009, p. 525-526. 28 Ibidem, p. 59.
meio de formas comuns de ocultação, até grupos organizados envolvendo grandes remessas33. A motivação para o tráfico de “produtos” do meio ambiente é evidente: lucros altos e baixos riscos34. Além de serem poucos os recursos voltados para o seu combate, a aplicação da lei deixa a desejar e os agentes são pouco atentos e interessados em crimes ambientais, bem como pobremente treinados para reconhecer tais produtos ilícitos35.
Na área criminal, o crime ambiental transnacional envolvendo animais silvestres é uma das áreas que vem crescendo mais rapidamente, abarcando quantias entre 7,8-10 bilhões de dólares por ano, valor superado somente pelo mercado de drogas, de produtos falsificados, de seres humanos e de petróleo32. A atividade abrange formas oportunistas e informais, mas, de um modo geral, é altamente organizada e bem financiada, movimentando diariamente uma grande quantidade de mercadorias distribuídas entre contrabandistas que agem individualmente por
A estrutura do mercado que sustenta os crimes ambientais transnacionais em grande escala possui a forma de rede36. Este arcabouço tem como característica sua flexibilidade e dinamicidade; associando-se a outras atividades, substituindo integrantes, movendo-se para locais mais favoráveis, numa constante alteração37. O fato de possuírem diversos nós, dispersos e frouxamente ligados, favorece a atividade, tornando difícil sua detecção pelas autoridades38. A dificuldade é intensificada pelo uso de rotas complexas que possibilitam a “lavagem dos produtos”, o que inclui, até mesmo, a obtenção de documentação falsificada39. A rede também conta com a cooperação de agentes e oficiais do governo, e outros personagens que contribuem com serviços de dentro da economia lícita e ilícita40.
29 ELLIOTT, 2009, p. 59. 30 No âmbito nacional, o Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito para Investigar o Tráfico Ilegal de Animais e Plantas Silvestres da Fauna e da Flora Brasileira (CPITRAFI) destacou a necessidade de o Ibama intensificar ações internas visando ao combate à corrupção e ao envolvimento de seus servidores em irregularidades (BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito para Investigar o Tráfico Ilegal de Animais e Plantas Silvestres da Fauna e da Flora Brasileira – CPITRAFI. Brasília/DF, 2003a. 154 p. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/atividade-legislativa/comissoes/ comissoes-temporarias/parlamentar-de-inquerito/51-legislatura/cpitrafi/ relatorio/relatoriofinal.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2012, p. 65). 31 ELLIOTT, 2009, p. 59-60. Ver também: WYLER; SHEIKH, 2008, p. 17-22. 32 HAKEN, J. Transnational crime in developing world. Washington: Global Financial Integrity, 2011. p. 11 e 56.
33 ELLIOTT, 2009, p. 65. 34 Ibidem, p. 66. 35 Ibidem, p. 66. 36 Ibidem, p. 68-69. No mesmo sentido: HERNANDEZ, 2002, p. 274-275. 37 HERNANDEZ, E. F. T.; CARVALHO, M. S. O tráfico de animais silvestres no estado do Paraná. Acta Scientiarum Human and Social Sciences, v. 28, n. 2, p. 257-266, 2006, p. 258. 38 SANGIOVANNI, M. E. Transnational networks and new security threats. Cambridge Review of International Affairs, v. 18, n. 1, p. 7-13, 2005, p. 9. 39 ELLIOTT, 2009, p. 69. 40 HERNANDEZ; CARVALHO, 2006, p. 258. Também: ANDREAS, P. Ilicit international political economy: the clandestine side of globalization. Review of International Political Economy, v. 11, n. 3, p. 641-652, aug. 2004, p. 644.
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Pertencente à preocupante categoria dos crimes ambientais transnacionais, trata-se de um importante fator de ameaça ao meio ambiente e um tópico que merece prioridade em programas e políticas internacionais29. Além de impactos ambientais, o crime ambiental transnacional caracteriza-se pela crescente participação de grupos criminosos organizados (terroristas, traficantes de armas, de drogas, entre outros) que desafiam a autoridade e a segurança das nações, comprometem sua estrutura por meio de corrupção30 e, assim, geram capital para a manutenção de outras práticas criminosas, além de questões sociais e econômicas envolvidas e resultantes da atividade31.
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Nesse sentido, cabe citar o fenômeno da globalização. Ela trouxe vantagens para os empreendimentos de modo geral, inclusive os criminosos, aumentando a frequência e o volume de transferências de mercadorias, aumentando a dificuldade de fiscalização, facilitando o contato entre as pessoas, e até facilitando a “lavagem” de lucros41. Além das facilidades de transporte a preços acessíveis para as mais variadas localidades, atualmente temos a disposição uma poderosa ferramenta: a Internet. É claro que tal ferramenta também foi inserida no mundo do crime, trazendo o desafio de se combater criminosos de todo o mundo que têm a vantagem do anonimato e da rapidez na troca de informações ao seu lado42. Tal realidade é vivenciada tanto em transações particulares quanto em grandes empresas de comércio eletrônico, como o eBay e, localmente, o Mercado Livre43. A variedade de produtos encontrada é assustadora: dos clássicos animais vivos, peças de marfim, peles e couros, a bizarros bancos feitos com patas de elefantes praticamente inteiras44.
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Frente a tal problemática, fez-se necessária uma atuação também globalizada. Utilizando como estratégia o aprimoramento da proteção ao meio ambiente e da conservação ambiental por meio de diretrizes de produção, utilização e comércio, foram firmados acordos ambientais multilaterais para combater os crimes ambientais transnacionais45. Entre estes se encontram,
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41 ELLIOTT, 2009, p. 59. 42 No Relatório da CPITRAFI, foi enfatizada a problemática do uso da Internet para o comércio de animais (BRASIL, 2003a, p. 109). Sobre a questão, ver também: International Fund for Animal Welfare. Caught in the web: wildlife trade on the Internet. Londres, 2005. 41 p. Disponível em: <http://www. ifaw.org/sites/default/files/Report%202005%20Caught%20in%20the%20 web%20UK.pdf>. Acesso em: 19 abr. 2012, p. 1. 43 BRASIL, 2006, p. 377-379; International Fund for Animal Welfare, 2005, p. 6-7. 44 International Fund for Animal Welfare, 2005, p. 3. 45 ELLIOTT, 2009, p. 60.
por exemplo, a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção, aderida pelo Brasil em 1975, e a Convenção de Basileia sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos, ratificada pelo Brasil em 1993. Entretanto, como expõe Elliott, “é uma ironia que as consequências não intencionais dos regimes de regulação ou proibição estabelecidos por estes vários acordos tenha sido a criação de um mercado negro e o incentivo a atividade criminal”46.
A CONVENÇÃO SOBRE O COMÉRCIO INTERNACIONAL DAS ESPÉCIES DE FLORA E FAUNA SELVAGENS EM PERIGO DE EXTINÇÃO (CITES) Diante de um contexto de internacionalização dos problemas ambientais, percebeu-se a necessidade de regulamentar o comércio internacional da vida silvestre, o que impulsionou a negociação e a entrada em vigor, em 1975, da Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites)47. Com a sua implementação, tem-se um instrumento que, além de regrar a comercialização, dessa forma reprimindo o tráfico, também a fomenta, possibilitando o dito desenvolvimento sustentável48. 46 Tradução nossa. No original: “It is something of an irony that the unintended consequences of the regulation or prohibition regimes established by these various agreements has been the creation of a black market and the incentives for criminal activity that goes with it” (Elliott, 2009, p. 60). 47 LIMA, G. G. B. A situação da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – Cites – no Brasil: análise empírica. Prismas: Dir., Pol. Publ. e Mundial., Brasília, v. 4, n. 2, p. 97-113, jul./dez. 2007, p. 98. 48 SOLLUND, R. Expressions of speciesism: the effects of keeping companion animals on animal abuse, animal trafficking and species decline. Crime,
Law and Social Change, v. 55, n. 5, p. 437-451, 2011, p. 446. Também: LIMA, G., 2007, p. 100. 49 BRASIL. Decreto nº 3.607, de 21 de setembro de 2000. Dispõe sobre a implementação da Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – Cites, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 22 set. 2000, art. 2º. 50 Para meiores informações, vide: BRASIL, 2000, cap. II. 51 LIMA, G., 2007, p. 105.
tanto a função de órgão administrativo quanto a de órgão científico cabe ao Ibama, atuando em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e com o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro no segundo caso52. A Convenção abrange cerca de 34.000 espécies de animais e plantas, sendo que, para 97% destas (Anexos II e III), o comércio internacional é comumente permitido desde que os espécimes tenham origem legalizada e a atividade não ameace a sobrevivência de outras espécies53. Já para os 3% restantes (Anexo I), o comércio internacional de silvestres capturados é, de modo geral, proibido54. Porém, cabe destacar que a Cites, por si só, não torna o comércio ilegal de animais silvestres um crime, nem instaura sanções penais aos infratores, dependendo da implementação da legislação dos Estados-membros e do seu compromisso em denunciar casos de violação à Secretaria da Cites55. O descumprimento pode resultar em advertência, notificação ou sanção comercial, como a instrução para que seja suspenso o comércio com membros que infringiram preceitos, mas as sanções comerciais têm alcance limitado, não sendo possível saber realmente em que medida seu cumprimento ocorre56. Analisando o texto da Convenção, percebem-se algumas contradições, profundamente abordadas por Martins, que revelam 52 BRASIL, 2000, arts. 3º e 5º. 53 YEATER, M. Corruption and illegal wildlife trafficking. In: UNODC. Corruption, environment and the United Nations Convention against Corruption. Indonesia, 2012. p. 17-22. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/eastasiaandpacific/indonesia/publication/Corruption_Environment_and_the_UNCAC.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2012, p. 18. 54 Ibidem, p. 18. 55 WYLER; SHEIKH, 2008, p. 29. 56 Ibidem, p. 29. Também: REEVE, R. Wildlife trade, sanctions and compliance: lessons from the Cites regime. International Affairs, v. 82, n. 5, p. 881-897, 2006, p. 888-892.
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Focando no tráfico de animais, a Cites é principal ferramenta de controle no âmbito internacional. A Convenção regulamenta o comércio internacional, que inclui a exportação, reexportação, importação e introdução procedente do mar, de animais e plantas, vivos e mortos e suas partes e derivados, para que a atividade não ameace a sobrevivência e a conservação das espécies49. A regulamentação ocorre por meio de um sistema de vigilância conjunta que é compartilhado entre países de importação, de exportação e de reexportação de animais silvestres e seus produtos, através de licenças e certificados para o comércio de espécies em particular, as quais estão discriminadas em três anexos, de acordo com o seu estado de vulnerabilidade ao comércio e estado de conservação. Na prática, a Convenção estabelece que as espécies ameaçadas de extinção, que são, ou podem ser, afetadas pelo comércio internacional, somente poderão ser comercializadas em circunstâncias excepcionais (espécies do Anexo I); as espécies que, atualmente, não estão ameaçadas de extinção, mas podem se tornar em função do comércio internacional, terão a comercialização rigorosamente regulamentada (Anexo II); e espécies protegidas em pelo menos um País-membro contarão com a cooperação dos Países-membros para que a exploração seja impedida ou restrita (Anexo III)50. De acordo com os preceitos estabelecidos na Cites, as atividades comerciais que envolvam espécies compreendidas em seus anexos devem passar por um sistema de licenciamento para serem autorizadas, o que ocorre sob regulação dos órgãos administrativo e científico51. No Brasil,
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o caráter mercantilista de sua essência57. Como o autor destaca, tal característica pode ser percebida já em seu preâmbulo, por meio de expressões vagas, a exemplo de “certas espécies” e “excessiva exploração”, o que se repete ao longo do texto58. Assim, a falta de conceituações claras e delimitações precisas proporciona que diferentes interpretações sejam feitas de acordo com o interesse das partes59. Soma-se ao exposto o fato de que a composição do Anexo I não necessariamente esteja vinculada ao verdadeiro grau de ameaça das espécies, visto que há discrepâncias entre a Lista da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e o Anexo da Cites60, e que, por meio do Decreto nº 3.607/2000 (art. 27), o governo brasileiro reservou-se ao direito de obstar a passagem de espécies do Anexo II para o Anexo I, podendo não aceitar recomendações expostas durante a Conferência das Partes (embasadas em estudos realizados por um Comitê de Fauna) de que determinada transferência ocorra61.
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Desse modo, na tentativa de conter o comércio internacional de espécies ameaçadas de extinção, ao invés de promover a proibição de tal atividade, a Cites acaba por encorajar o comércio de animais silvestres, além de levar os consumidores a pensarem que, pelo fato de o comércio de animais silvestres estar regulado, sua aquisição é uma atitude que se encontra dentro dos padrões éticos, sem perceberem toda a teia de fatores envolvidos62. Como destaca Martins:
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57 MARTINS, T. S. A Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e Flora Selvagens em Perigo de Extinção (Cites) e sua implementação no Brasil: das expectativas de proteção à mercantilização da vida. 2007. 206 f. Dissertação (Mestrado em Direito), Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2007. p. 67-76. 58 MARTINS, 2007, p. 67-69. 59 Ibidem, p. 69. 60 Ibidem, p. 162-164 61 Ibidem, p. 185. 62 SOLLUND, 2011, p. 446-448.
Constata-se, no entanto, que muitas das Convenções que marcaram o advento do Direito Internacional do Meio Ambiente não se mostram efetivas, e o principal motivo dessa inoperância está no fato de que a função não declarada de tais instrumentos não é a preservação das espécies: seus textos revelam a lógica mercantilista segundo a qual a salvação de animais em perigo de extinção estaria, por exemplo, na mera regulamentação do comércio internacional.63
Assim, o comércio de animais em larga escala, principalmente sem as ferramentas adequadas para sua realização de forma controlada e segura, acaba por mascarar a atividade também em larga escala dos contrabandistas64-65. Ainda, o comércio estimula a aquisição, e esta ocorre independente dos meios, em um ciclo que custa a vida e o sofrimento de milhares de animais. “Se a procura é legal, é difícil assegurar que o fornecimento permaneça assim”66.
O BRASIL FRENTE AO TRÁFICO DE ANIMAIS: ASPECTOS LEGAIS ENVOLVIDOS No Brasil, não há lei específica ou uma política pública específica para o combate ao tráfico de animais silvestres, mas somente um conjunto de leis que orienta as ações operacionais realizadas por diferentes agentes, entre eles o Departamento de Polícia Federal, a Polícia Militar Ambiental, o Ibama, principalmente, além de diversas organizações não governamentais, com des63 MARTINS, 2007, p. 16. 64 Ibidem, p. 16 65 Segundo o exposto no Relatório Final da CPITRAFI, estima-se que 90% do comércio de animais silvestres no Brasil é ilegal (BRASIL, 2003a, p. 108). 66 Tradução nossa. No original: “If the demand is legal, it is difficult to ensure that the supply remains so” (United Nations Office on Drugs and Crime. The globalization of crime: a transnational organized crime threat assessment. Vienna, 2010. 303 p. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/ data-and-analysis/tocta/TOCTA_Report_2010_low_res.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2012. p. 169)
CAPTURA DE ANIMAIS Começando pela captura em si, merecem destaque a Lei nº 5.197/1967, a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) e o Decreto nº 6.514/2008, que tipificam condutas envolvidas neste ato (a caça, a perseguição e a apanha, por exemplo). Ao olharmos com atenção suas disposições, é possível perceber a contraditória relação estabelecida com a fauna e o incentivo a manutenção deles como objetos de adorno, comércio, diversão, por exemplo, ao se incentivar a formação e o funcionamento de clubes e sociedades amadoristas de caça e a construção de criadouros para criação de animais silvestres com fins econômicos e industriais na Lei nº 5.197/196768. A caça tem sua definição no art. 7º da lei citada como a “utilização, perseguição, destruição, caça ou 67 Para maiores informações sobre o assunto, ver: SERRA, C. R. O empreendedorismo na gestão ambiental: o caso do combate ao tráfico de animais silvestres. 2003. 114 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento e Gestão Ambiental), Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2003. p. 76-97. 68 É importante salientar que, ainda nos dias atuais, somente a caça profissional é proibida no País, de acordo com o art. 2º da Lei nº 5.197/1967, sendo permitida (de acordo com as especificidades contidas em regulamento) a caça de controle, de subsistência, científica e, somente há poucos anos, por determinação de proibição pelo TRF, a caça esportiva ou amadorista deixou de fazer parte deste grupo. Para maiores informações, vide: LEVAI, L. F. Ministério Público e a proteção jurídica dos animais. Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, [200-]. Não paginado. Disponível em:<http://www.forumnacional.com.br/ministerio_publico_e_protecao_juridica_dos_animais.pdf>. Acesso em: 17 abr. 2012.
apanha de espécimes da fauna silvestre”, quando consentidas na forma da lei em questão69. A atividade, associada pelo legislador a uma prática esportiva, continua estimulando, mesmo que indiretamente, a crueldade aos animais e a manutenção de uma visão distorcida do homem perante o meio ambiente70. Além disso, há incompatibilidade com os preceitos expostos na Constituição Federal de 1988, art. 225, que impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações71. Incompatibilidade também pode ser encontrada em relação à Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), art. 32, pois não é de esperar que em tal ambiente hostil não haja lugar para a prática de maus-tratos. O questionamento de tal contradição resultou, após alguns anos de tramitação e de luta, na proibição da caça amadora no Rio Grande do Sul, decisão proferida pela 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região em 2008. O colegiado considerou que não ficou comprovado o necessário controle da atividade por parte do Ibama e que, frente ao dever constitucional de preservar e proteger o meio ambiente, a caça amadora deve ser barrada72. A decisão do TRF foi uma grande vitória que continua 69 BRASIL. Lei nº 5.197, de 3 de janeiro de 1967. Dispõe sobre a proteção à fauna e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 5 jan. 1967. 70 LEVAI, [200-], não paginado. 71 Para maior aprofundamento, ver: DIAS, E. C. Tutela jurídica dos animais. 2000. Não paginado. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2000. Disponível em: <http://www.sosanimalmg.com.br/pdf/livros/tutela.pdf>. Acesso em: 30 maio 2012, cap. 4. 72 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4ª Região). Embargos Infringentes em AC nº 2004.71.00.021481-2/RS. Embargante: Associação União Pela Vida e Ministério Público Federal. Embargado: Federação Gaúcha de Caça e Tiro e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama. Relator: Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz. Porto Alegre, 13 de março de 2008d.
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taque para a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres – RENCTAS67. Apesar disso, o tráfico e a posse de animais silvestres, mesmo quando legalizada, envolve uma série de aspectos e consequências regulamentados pela legislação brasileira. Analisaremos alguns desses aspectos e as previsões legais envolvidas.
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se manifestando nas apelações que prosseguiram. Entretanto, ainda falta um dispositivo legal que expresse a irregularidade desta e de outras práticas culturais que contrariam qualquer evolução ética da sociedade, bem como preceitos constitucionais de proteção ao meio ambiente.
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Infelizmente, até mesmo trechos de dispositivos legais propiciam que outros regulamentos sejam, de certa forma, “burlados”, a exemplo do disposto no art. 24, § 5º, do Decreto nº 6.514/2008, que diz que, “no caso de guarda de espécime silvestre, deve a autoridade competente deixar de aplicar as sanções previstas neste decreto, quando o agente espontaneamente entregar os animais ao órgão ambiental competente”73, e, no § 2º do art. 29 da Lei nº 9.605/1998, que estabelece que, “no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena”74. Tais procedimentos demonstram, novamente, a falta de atenção concedida aos delitos em questão, estimulando uma visão distorcida dos ilícitos de cunho ambiental e, inclusive, contribuindo, de certo modo, para o descrédito quanto à justiça brasileira.
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Outra questão que merece análise é a presença, em mais de um momento, da expressão “sem a devida autorização”, ou outra do mesmo cunho, após a descrição do tipo penal no art. 29 da Lei nº 9.605/199875. Desse modo, a caracterização do delito está atada à 73 BRASIL. Decreto nº 6.514, de 22 de junho de 2008. Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 23 jul. 2008a – grifos nossos. 74 BRASIL. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília/ DF, 13 fev. 1998 – grifos nossos. 75 Tais expressões se repetem ao longo da norma em questão, mas restrin-
existência de um ato administrativo não abrangido pela normativa em questão76. Ainda sobre o art. 29, já na Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar o Tráfico Ilegal de Animais e Plantas Silvestres da Fauna e da Flora Brasileiras (CPITRAFI), ocorrida em 2003, observou-se que tal artigo traz um tipo penal múltiplo, não prevendo um tratamento diferenciado, com a necessária severidade, para os envolvidos no tráfico, o que resulta no fato de os grandes traficantes utilizarem, legalmente, os benefícios aplicáveis às condutas de menor potencial ofensivo, como a transação penal e a suspensão condicional do processo77. Assim, o único tipo penal voltado para o tráfico de animais trata situações com diferentes níveis de gravidade da mesma forma: amena78. Prosseguindo, sendo constatada alguma infração, o art. 107 do Decreto nº 6.514/2008 estabelece que, após a apreensão, a autoridade competente procederá com a libertação da fauna silvestre em seu hábitat ou entrega dos animais a centros de triagem, fundações, jardins zoológicos, entidades de caráter cientifico, criadouros regulares ou entidades assemelhadas, sob a responsabilidade de técnicos habilitados, podendo ainda resultar em guarda doméstica provisória. A Instrução Normativa Ibama nº 179/2008 regulamenta o tema, definindo as diretrizes e procedimentos envolvidos na destinação de animais silvestres e exóticos, apreendidos ou entregues espontaneamente às autoridades, além de detalhar os quesitos necessários para avaliação das áreas de soltura, levantamento clínico e diagnóstico dos animais, monitogimo-nos ao art. 29, por tratar do tema em discussão. 76 Ver: STIFELMAN, A. G. Alguns aspectos sobre a fauna silvestre na Lei dos Crimes Ambientais. [S.l.: s.n.], [200-]. 14p. Disponível em: <http://www.amprs. org.br/arquivos/comunicao_noticia/anelise1.pdf>. Acesso em: 19 mar. 2012. 77 BRASIL, 2003a, p. 11. 78 Sobre o mesmo tratamento dado a situações de gravidade distinta, ver o exposto por Antonio Herman Benjamin no Relatório da CPIBIOPI (Brasil, 2006, p. 56-57).
O percurso da maioria dos animais apreendidos segue para os Centros de Triagem ou Manejo de Animais Silvestres – Cetas81. A Instrução Normativa Ibama nº 169/2008 conceitua, em seu art. 3º, VIII, os Cetas como sendo aqueles empreendimentos autorizados pelo Ibama, unicamente de pessoa jurídica, com o propósito de “receber, identificar, marcar, triar, avaliar, recuperar, reabilitar e destinar animais silvestres provenientes da ação da
79 Insta salientar que, em geral, os animais apreendidos são aqueles que historicamente estão presentes nos domicílios e que, já há alguns anos, podem ser adquiridos legalmente (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 128). 80 BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Instrução Normativa nº 179, de 25 de junho de 2008. Define as diretrizes e procedimentos para destinação dos animais da fauna silvestre nativa e exótica apreendidos, resgatados ou entregues espontaneamente às autoridades competentes. Diário Oficial da União, seção 1, Brasília/DF, n. 121, p. 60-63, 26 jun. 2008c, art. 4º. Sobre a questão, cabe destacar que a falta de critérios para soltura foi apontada pela RENCTAS como um dos fatores que dificulta o enfrentamento do tráfico e demonstra o lamentável descaso com a fauna (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 118). 81 Ver dados da Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 112-115.
fiscalização, resgates ou entrega voluntária de particulares”82. Nesses locais, os animais se unem ao grande número de indivíduos abandonados ou entregues pelos próprios compradores, atitude fundamentada muitas vezes na falta de interesse pelo animal83. Infelizmente, os centros de triagem são poucos e enfrentam dificuldades técnicas e financeiras, prejudicando o tratamento e a destinação adequada dos animais84. Além disso, os animais vindos do tráfico, com raras exceções, sofreram maus-tratos, e, com as marcas deixadas, será muito difícil sua sobrevivência e retorno à natureza, de modo que uma parcela significativa, e ainda incerta, vem a óbito durante o processo de apreensão até o encaminhamento e tratamento85.
INTRODUÇÃO DE ESPÉCIES INVASORAS Entre as possíveis consequências da posse de animais silvestres, independente de serem provenientes de criatórios legalizados ou não, está a introdução de espécies. Como resultado da falta de responsabilidade com o animal, da ânsia de fazer um bem e ter a liberdade como definição para tal conceito (principalmente 82 BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Instrução Normativa nº 169, de 20 de fevereiro de 2008. Institui e normatiza as categorias de uso e manejo da fauna silvestre em cativeiro em território brasileiro. Diário Oficial da União, seção 1, Brasília/ DF, n. 35, p. 57-59, 21 fev. 2008b. 83 SOUZA, V. L. et al. Caracterização dos répteis descartados por mantenedores particulares e entregues ao Centro de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios – RAN. Revista de Biologia Neotropical, v. 4, n. 2, p. 149-160, 2007, p. 149. 84 Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 138. Ver também: BRASIL, 2006, p. 382-383. 85 Nos dados obtidos no Diagnóstico do Tráfico de Animais Silvestres na Mata Atlântica, a porcentagem variou de 0,51 a 22% entre os diferentes órgãos e estados, sendo que nem todos possuiam tal informação (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 83).
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ramento pós-soltura, entre outros79. De acordo com o art. 3º da instrução normativa citada, os espécimes da fauna silvestre terão como possíveis destinos: o retorno imediato à natureza, o cativeiro, programas de soltura (reintrodução, revigoramento populacional ou experimentação) e instituições de pesquisa ou didáticas. É importante esclarecer que os imprescindíveis requisitos para o retorno imediato de um espécime à natureza deveriam conferir singularidade a tal evento, pois deverá acontecer somente quando o espécime for recém-capturado na natureza, houver comprovação do local de captura, a espécie ocorrer naturalmente em tal local e o espécime não apresentar problemas que obstem sua sobrevivência ou adaptação à vida livre80.
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tratando-se de pássaros), da falta de espaço e de consciência, espécimes são abandonados ou fogem de seu cativeiro domiciliar, podendo desencadear a introdução de espécies invasoras86.
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Ao ser solto ou fugir para um novo ambiente, um animal de estimação pode ir a óbito por não se adaptar à nova condição de vida, busca de alimentos, abrigo, etc., ou pode conseguir se estabelecer, tornando-se parte do novo hábitat em que se encontra87. Em ambos os casos, pode ocorrer transmissão de zoonoses para outros indivíduos88. Caso o animal se estabeleça, ainda poderá ocorrer a invasão do ambiente, caracterizada pela expansão da espécie e impacto às espécies locais (competição por alimento e espaço, predação de espécies nativas, introdução de patógenos e parasitas), ao ecossistema como um todo, à saúde humana e de outros animais e ao desenvolvimento econômico89. A introdução de espécies invasoras da flora e da fauna ocorreu, e continua ocorrendo, inúmeras vezes durante o desenvolvimento da civilização, sendo reconhecida como a segunda maior causa de extinção de espécies90.
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86 Sobre a questão, ver: VIDOLIN, G. P. et al. Programa Estadual de Manejo de Fauna Silvestre Apreendida – Estado do Paraná, Brasil. Revista Cadernos da Biodiversidade, v. 4, n. 2, p. 37-49, dez. 2004, p. 40. 87 VIDOLIN et al., 2004, p. 42. Também: International Union for Conservation of Nature. Guías de la IUCN para la disposición de animales confiscados. Gland, 2000. 25 p. Disponível em: <http://data.iucn.org/dbtw-wpd/ edocs/2002-004-Es.pdf>. Acesso em: 26 abr. 2012, p. 2. 88 Ibidem, p. 2. 89 Ibidem, p. 2. Também: FISZON, J. T. et al. Causas antrópicas. In: Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. Fragmentação de ecossistemas: causas, efeitos sobre a biodiversidade e recomendações de políticas públicas. Série Biodiversidade, Brasília, n. 6, p. 65-99, 2003, p. 92-93. Também: Programa Global de Espécies Invasoras. A América do Sul invadida. 2005. 80p. Disponível em: <http://www.institutohorus.org. br/download/gispSAmericapo.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2011, p. 6-9. 90 Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. Espécies exóticas invasoras: situação brasileira. Brasília, 2006. p. 5. 24 p.
Visto a gravidade do problema, a Convenção sobre Diversidade Biológica estabelece, em seu art. 8, alínea h, que cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, “impedir que se introduzam, controlar ou erradicar espécies exóticas que ameacem os ecossistemas, hábitats ou espécies”91. Um exemplo infeliz ocorreu no Chile, em função da importação de inúmeras caturritas (Myopsitta monachus) para o comércio de animais de estimação. Por escaparem do cativeiro ou serem deliberadamente soltas, as aves se adaptaram ao novo ambiente, disseminando-se pelo território e causando uma série de inconvenientes92. Já no Brasil, muitos saguis (Callithrix jacchus e Callithrix penicillata) foram levados para o Rio de Janeiro como animais de estimação e, posteriormente, invadiram as florestas do estado, passando a competir por recursos com as espécies nativas da região93. A problemática exposta é tratada por uma série de dispositivos legais, entre eles a Lei nº 5.197/1967 (art. 4º), a Lei nº 9.605/1998 (art. 31) e o Decreto nº 6.514/2008 (art. 67). Ainda, frente a tal problemática, a Resolução Conama nº 394/2007 estabeleceu que o Ibama deveria publicar, no prazo de seis meses, uma lista de espécies passíveis de serem criadas e comercializadas como animais de estimação, levando em consideração o potencial invasivo das espécies, histórico de invasão e dispersão, risco potencial à saúde humana e animal, risco de abandono ou fuga das dos espécimes, condição de adaptabilidade e bem-estar da espécie para a manutenção como animal de estimação, entre outros. Além disso, a Resolução estabelece, em seu art. 7º, que a “reprodução dos espécimes adquiridos e mantidos como
91 Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. A Convenção sobre diversidade biológica. Série Biodiversidade, Brasília, n. 1, 2000. p. 12. 30 p. 92 Programa Global de Espécies Invasoras, 2005, p. 46. 93 FISZON et al., 2003, p. 93.
Embora o assunto conste nos dispositivos citados, carecemos de uma efetiva política pública nacional voltada para a questão e, consequentemente, de um tratamento adequado, visto sua gravidade, aos fatores que a permeiam95. Percebe-se, ainda, um cumprimento insatisfatório das recomendações da Resolução Conama citada, pois, apesar de suspensões temporárias de deferimento de solicitações de criadouros comerciais para criação de animais para o mercado de animais de estimação96, por exemplo, a autorização da manutenção de espécies como animais de estimação não parece ocorrer aliada a estudos que comprovem a satisfação dos requisitos citados, o que contraria o princípio da precaução, pondo em risco os animais, o meio ambiente e a sociedade. Além do mais, persiste a espera da citada lista das espécies que poderão ser criadas e comercializadas como animais de estimação, e o mesmo não ocorre com os efeitos decorrentes da criação e comércio inadequados desses animais. 94 BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução nº 394, de 6 de novembro de 2007. Estabelece os critérios para a determinação de espécies silvestres a serem criadas e comercializadas como animais de estimação. Diário Oficial da União, seção 1, Brasília/DF, n. 214, p. 78-79, 7 nov. 2007. 95 MACHADO, C. J. S.; OLIVEIRA, A. E. S. Quem é quem diante da presença de espécies exóticas no Brasil? Uma leitura do arcabouço institucional-legal voltada para a formulação de uma política pública nacional. Ambiente & Sociedade, v. 12, n. 2, p. 373-387, 2009, p. 384. 96 BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Instrução Normativa nº 31, de 31 de dezembro de 2002. Suspende, temporariamente, o deferimento de solicitações de criadouros comerciais para criação de répteis, anfíbios e invertebrados com o objetivo de produção de animais de estimação para a venda no mercado interno. Diário Oficial da União, seção 1, Brasília/DF, n. 4, p. 40, 6 jan. 2003b.
MAUS-TRATOS Em 1934, o Decreto Federal nº 24.645, também chamado Lei Juarez Távora, trouxe, para o universo jurídico, figuras típicas de maus-tratos, um grande avanço em termos de legislação que precisa ser relembrado. Posteriormente, a crueldade com animais foi vedada pela Constituição Federal brasileira em seu art. 225, § 1º, VII. Passados dez anos, a prática de maus-tratos foi criminalizada por meio da Lei nº 9.605/1998, que, em seu art. 32, dispõe ser crime “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”97. Os maus-tratos acompanham os animais envolvidos no tráfico durante toda a atividade, desde a captura, passando pelo transporte, distribuição, até a sua morte ou entrega ao consumidor final, podendo se estender também durante sua estadia em cativeiro domiciliar98. A título exemplificativo, pode-se citar, como práticas comuns nesse universo, dopar ou embriagar os animais, queimar suas córneas, serrar e/ou arrancar dentes e garras, resultando na morte de uma parcela significativa dos animais capturados99, o que já é previsto pelos traficantes que resolvem tal situação capturando um número maior de animais100. Como já foi dito, a posse de animais silvestres como animais de estimação, lamentavelmente, também pode resultar em maus-tratos, principalmente em função da falta de conhecimento acerca das necessidades fisiológicas do animal por parte de quem o está adquirindo. Entretanto, qual o conceito de crueldade? 97 Para maior aprofundamento sobre o tema na legislação brasileira, ver: DIAS, 2000, não paginado. 98 LIMA, R., 2007, p. 47. Também: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 193. 99 LIMA, R., 2007, p. 47-48. 100 International Fund for Animal Welfare, 2005, p. 1.
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animais de estimação deverá ser evitada e, uma vez ocorrendo, deverá ser comunicada ao órgão ambiental competente no prazo de trinta dias, para as providências cabíveis”94.
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O que são maus-tratos? A partir do momento em que existem pessoas tratando iguanas como cachorros, sem conhecimento sobre suas necessidades fisiológicas e, consequentemente, sem atendê-las, a caracterização de maus-tratos pode ser dada, ou não. Animais que passam o dia inteiro em gaiolas à espera de um comprador, fêmeas que emendam uma cria em outra graças à ganância de seus donos, o que falar então dos animais de produção? Pode-se dizer que são casos de maus-tratos? Novamente, a superficialidade dá margem a interpretações e a interesses.
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OUTRAS ESFERAS DO DEBATE – UMA BREVE DISCUSSÃO
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A estrutura brasileira ainda possui uma série de deficiências que impedem que o combate ao tráfico de animais silvestres seja efetivo, e um dos motivos é que, em sua base, existem problemas sociais que funcionam como um estímulo para os envolvidos nesse tipo de crime que são fortalecidos pela falta de consciência a respeito do tráfico de fauna por parte da sociedade101. O início da estrutura em rede que mantém o tráfico de animais se dá principalmente em populações rurais e de baixa renda no Brasil102, sendo de extrema importância colocar em prática ensinamentos de projetos exitosos, como o Projeto Tamar103 – para a criação de programas que envolvam a valorização do conhecimento das populações tradicionais –, a conscientização acerca da problemática do tráfico e o desenvolvimento de alternativas para sua subsistência104. Ainda, o fortalecimento de programas 101 R ede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2001, p. 28-29. 102 LIMA, R., 2007, p. 45. 103 Para mais informações sobre o Projeto, vide http://www.tamar.org.br/. 104 SERRA, 2003, p. 84. Como exposto pela RENCTAS: “Educação e repressão precisam caminhar juntas, bem como a implantação de projetos
de conscientização e educação ambiental pode possibilitar que a população atue como uma aliada no combate ao mercado ilegal, utilizando ferramentas como a Internet, por exemplo. O combate à atividade ilícita em questão exige que providências sejam tomadas para a identificação dos envolvidos. É necessário que medidas de segurança e de fiscalização sejam aperfeiçoadas nos portos, aeroportos, rodoviárias, faixas de fronteira, correios, sendo importante a efetivação de parcerias entre agências ambientais e órgãos que atuam nesses locais, ou sua presença permanente, quando possível105. Parcerias com países limítrofes focadas no combate ao tráfico de animais também se fazem cada vez mais necessárias, principalmente por meio de acordos bilaterais ou regionais, a exemplo dos países-membros da Associação das Nações do Sudeste da Ásia (Asean), que se uniram na luta contra o tráfico106, podendo se utilizar como base acordos já estabelecidos, como o Tratado de Cooperação Amazônica107, visto que a rede criminosa não se restringe a limites territoriais. de incentivo a atividades geradoras de renda para as comunidades que não impliquem em usos indevidos dos recursos naturais” (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 193). 105 O Relatório da CPITRAFI, em 2003, já enfatizou a necessidade de intensificar a fiscalização e de haver uma atuação conjunta entre os órgãos com tal responsabilidade (BRASIL, 2003a, p. 130). Sobre a questão, o Diagnóstico do tráfico de animais silvestres na Mata Atlântica, elaborado pela RENCTAS em 2007, também destacou a precária estrutura dos órgãos de fiscalização como um entrave para o enfrentamento da problématica e expôs a necessidade da atuação ocorrer de forma integrada (LIMA, R., 2007, p. 49; Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 125-126). Nesse sentido, ver também: BRASIL, 2006, p. 456-457. 106 ASEAN Wildlife Enforcement Network. Para maiores informações, vide http://www.asean-wen.org/. 107 Para maiores informações, vide Decreto nº 85.050, de 1980, que promulga o Tratado de Cooperação Amazônica.
Há ainda a questão da necessidade de um tipo penal específico para o crime de tráfico de animais110. O traficante de animais silvestres deve receber um tratamento mais condizente com o universo do tráfico, até porque a atividade está cada vez mais imbricada com crimes como o tráfico de drogas e armas, não havendo coerência que os envolvidos em atividades de tal magnitude usufruam os benefícios aplicáveis às condutas consideradas de menor potencial ofensivo111. Tal necessidade é intensificada pelo fato de as atuais sanções leves resultarem 108 R ede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 138-139. 109 BRASIL, 2006, p. 382-383. 110 CALHAU, [2004?], p. 7. 111 N esse sentido, o Relatório da CPITRAFI sugeriu a separação das condutas do art. 29 em tipos penais distintos, havendo penas mais severas para os envolvidos em crimes de grande escala (BRASIL, 2003a, p. 134). Já a RENCTAS sugeriu a introdução de um novo artigo na Lei de Crimes Ambientais que trate especificamente do tráfico de fauna e estabeleça penas suficientemente elevadas aos traficantes, de modo que eles não possam valer-se da transação penal e da suspensão do processo (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, 2007, p. 190).
em decisões de Magistrados que, com base no princípio da insignificância, não dão a necessária atenção para delitos praticados contra a fauna112. Os valores das fianças para liberdade provisória também devem ser reavaliados, pois sua irrelevância atual incita a prática de ilícitos ambientais e ainda colabora para o descrédito do processo penal113. Além disso, existem questões no que tange aos processos administrativos referentes às infrações ambientais que precisam ser sanadas. São disparidades entre o valor das multas aplicadas pelo Ibama e o valor pago, supressão irregular de multas, entre outras irregularidades que levam ao estímulo ainda maior da atividade criminosa e reforçam a necessidade de um combate à corrupção nos órgãos responsáveis pelo enfrentamento de um mercado ilícito tão lucrativo114. É essencial que se aumente o volume de recursos direcionados às autoridades para o combate à corrupção e que se foque nos órgãos que atuam na questão ambiental, visto a magnitude dos impactos. Voltando aos envolvidos na rede que forma o tráfico de animais, em sua base, porém no extremo oposto aos fornecedores de animais, está o mercado consumidor, até então praticamente inatingível pelas ferramentas punitivas. É fundamental ter em mente que o tráfico só existe porque há quem procure e compre os animais, de modo que, para coibir o comércio ilegal, há necessidade de, ao mesmo tempo em que se atua na repressão, atuar na conscientização e mudança no comportamento do consumidor115. 112 113 114 115
BRASIL, 2003a, p. 109. BRASIL, 2006, p. 441 e 453. BRASIL, 2006, p. 391-396. Sobre a questão, ver exposições do Coordenador da RENCTAS, Dener Giovanini, no Relatório da CPIBIOPI (BRASIL, 2006, p. 52-54).
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Paralelamente, no âmbito dos animais apreendidos, cabe salientar que o número de Cetas no País é insuficiente em relação à demanda108, a qual tende a aumentar, visto que o comércio de animais cresce cada vez mais, e muitos se encontram em situações precárias de funcionamento, de modo que o índice de mortalidade pode chegar a 50%, dependendo da forma como ocorre o acondicionamento e transporte dos animais109. É de extrema importância que mais Cetas sejam implantados, principalmente em locais estratégicos, para que se consiga atender bem os animais e a tempo, bem como se faz necessária a implantação de sistemas de controle da fauna que chega a tais centros e aos criadouros para que seja possível manter sua regularidade e avaliar sua efetividade.
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É de extrema importância questionar se há necessidade de manter animais silvestres em cativeiro por mero prazer humano (seja o ocasionado pela sua beleza, status, modismo), favorecendo e incentivando uma visão distorcida do homem perante o meio ambiente e colocando seres vivos numa situação que, muitas vezes, envolve sofrimento.
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CONCLUSÃO
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A resposta para a pergunta inicial quanto à legalização da venda de animais silvestres como animais de estimação ser um remédio efetivo para o tráfico de animais ainda permanece desconhecida. Baseando-se na premissa de que a falta de certezas científicas não deve ser usada como razão para postergar medidas, é de extrema necessidade a implementação de sistemas de informação que forneçam dados relativos à aquisição e destinação de animais e possibilitem o acesso a esses dados para que novas pesquisas possam ser feitas na busca de soluções no campo social, econômico, de saúde pública, criminal e, é claro, ambiental. Todavia, os aspectos discutidos remetem à conclusão que a legalização tem, sim, trazido inúmeros problemas à sociedade e ao meio ambiente (introdução de espécies invasoras, maus-tratos, abandono de animais) pela ausência de uma base legal, estrutural e, quiçá, até psicológica da sociedade, fazendo-se iminente a revisão dos aspectos que permeiam o comércio e a posse de animais silvestres. Infelizmente, ainda não se chegou a uma fórmula que acabe com tal problema; entretanto, o mais sensato a se fazer quando não se tem uma solução é interromper suas causas, e uma delas é o comércio de animais silvestres como animais de estimação. Sendo assim, é insensato combater o problema estimulando a causa, estimulando o mercado, buscando alternativas disfarçadas dentro de uma mesma lógica que resultarão no mesmo problema. A busca de soluções deve envolver ideias, princípios e resultados que não estejam implicados pelo problema, caso contrário deixará de ser válida, deixará
de ser um remédio, passando em muitos momentos, inclusive, a constituir uma nova problemática.
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Doutrina
Pluralidade Sindical Oblíqua1
INTRODUÇÃO
AMAURI CESAR ALVES
A realidade fática que influenciou a estruturação das regras celetistas sobre as relações coletivas de trabalho no início do século XX não se verifica hodiernamente. Como consequência, deve o Estado perceber a nova conformação social e atuar de modo coerente com tal situação, tendo como premissas a construção da justiça e a preservação dos direitos fundamentais do cidadão.
Doutor e Mestre em Direito pela PUC/Minas, Professor da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e da Fundação Pedro Leopoldo (FPL).
RESUMO: A realidade fática que influenciou a estruturação das regras celetistas sobre as relações coletivas de trabalho no início do século XX não se verifica hodiernamente. Como consequência deve o Estado perceber a nova conformação social e atuar de modo coerente com tal situação, tendo como premissas a construção da justiça e a preservação dos direitos fundamentais do cidadão. O número de sindicatos com registro ativo no Ministério do Trabalho e Emprego vem crescendo substancialmente nos últimos anos, força de uma atuação equivocada deste órgão bem como do Poder Judiciário. O critério de especialização, atualmente prevalente, não se presta à solução de conflitos envolvendo representação sindical e deve ser substituído pelo princípio da agregação. PALAVRAS-CHAVE: Sindicato; pluralidade sindical; Constituição da República; princípio da agregação. SUMÁRIO: Introdução; 1 Atuação do Ministério do Trabalho e Emprego e a proliferação de sindicatos; 2 Atuação do Poder Judiciário no que concerne à disputa de representação sindical; Referências. 1 O presente artigo é uma pequena parte da Tese de Doutorado apresentada pelo autor à PUC/Minas.
Há quem veja na estrutura positivada sobre o tema sindical no Brasil um entrave ao desenvolvimento das relações capital-trabalho no plano dos fatos. A CLT seria uma barreira de difícil transposição, que se tornaria imbatível em decorrência de uma opção constitucional pela manutenção da estrutura jurídica consagrada no início do século XX, que estabelece, ainda hoje e consoante doutrina dominante, unicidade sindical, representação básica por categoria e contribuição sindical obrigatória (imposto sindical). A Constituição da República promulgada em 1988 é também um marco para o sindicalismo brasileiro, pois trouxe regras e princípios que devem ser diretamente aplicados às relações coletivas de trabalho. A liberdade sindical preconizada no art. 8º da Constituição da República, ainda que aprioristicamente condicionada à unicidade, parece ter permitido a proliferação (oblíqua) de sindicatos, por fragmentação da representação, possibilitada por uma compreensão (equivocada) do Ministério do Trabalho e Emprego sobre a matéria, tema central do presente artigo. O Brasil experimentou crescimento significativo no número de sindicatos em períodos de relevante normatização heterônoma, como nas décadas de
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1930-1940 e 1980-1990, o que é aparentemente natural. Nos últimos anos, entretanto, o crescimento foi vertiginoso e muitas vezes desarrazoado, força de uma regulamentação permissiva do Ministério do Trabalho e Emprego sobre as possibilidades de desmembramento e cisão de sindicatos. Também o Poder Judiciário atuou no sentido de tentar equilibrar liberdade sindical com unicidade, mas o fez, majoritariamente, com conceito impróprio, de especialização, o que permitiu a artificial fragmentação de categorias e a pulverização prejudicial da representação. Na prática, a fragmentação hoje verificada pode ter sido tolerada por haver uma pressão pro-pluralidade, ainda que não revelada expressamente pelos atores sociais envolvidos. Tal pluralidade sindical oblíqua pode ter sido até mesmo influenciada, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego e do Poder Judiciário Trabalhista, pela Convenção nº 87 da OIT em seus valores básicos, mas sem que se estabelecessem critérios claros de fixação da representação decorrente de seus princípios. Não se pretende aqui, é claro, a defesa da unicidade
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sindical, mas a crítica à pluralidade oblíqua, que não consagra a possibilidade de concorrência na base de representação e de definição do sindicato mais representativo para efeito de negociação coletiva.
1 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO E A PROLIFERAÇÃO DE SINDICATOS Inobstante a compreensão teórica de prevalência da unicidade sindical no Brasil, a prática, sobretudo após 1988, aponta para uma pluralidade sindical de fato (oblíqua) e nociva, pois sem critérios sobre representatividade e fundada em superespecialização e não em agregação. A proliferação de sindicatos no Brasil, sobretudo após a Constituição da República de 1988, merece atenção dos pesquisadores sobre o tema sindical, tanto em seu aspecto jurídico como sociopolítico. Possível compreender o atual cenário institucional sobre a criação de sindicatos como um deficiente sistema de regulamentação sem peias, ou de desregulamentação prática. Não se trata, aqui, de reafirmar a unicidade como regra constitucional vigente ou necessária, mas de se estabelecer claramente qual é o sistema adotado pelo Brasil no contexto fático cotidiano das relações sociocoletivas2. Segundo a Pesquisa Sindical 2001 do IBGE, o número de sindicatos no Brasil evoluiu até então da seguinte forma, visto o período de fundação, conforme Tabela 1: 2 Também não se quer defender a inexistência prática de liberdade sindical no Brasil, nem tampouco a ideia superficial de que apenas a sua consagração possa melhorar ou piorar a atuação do ente coletivo representativo obreiro. Tão importante quanto liberdade sindical efetiva é a igualdade de fato entre os atores sociocoletivos, o que demanda, também, estabilidade no emprego e condições políticas e econômicas de afirmação desta liberdade com igualdade.
Tabela 1 – Sindicatos, urbanos e rurais, por período de fundação e tipo de sindicato – Brasil, 1930-2001. Sindicatos Grandes Regiões e tipos de sindicato
Período de fundação Total
Até 1930
1931 a 1940
1941 a 1950
1951 a 1960
1961 a 1970
1971 a 1980
1981 a 1990
1991 a 2000
2001
Sem declaração
Brasil
15.961
97
547
814
811
2.533
2.260
4.376
4.212
195
116
Urbanos
10.263
91
537
785
697
628
774
3.366
3.155
144
86
Empregadores
2.758
5
145
374
189
165
245
759
802
34
40
Empregados
6.070
49
314
324
417
340
312
2.233
1.949
97
35
Trabalhadores autônomos
585
4
15
22
35
61
70
132
230
11
5
Agentes autônomos
62
2
4
7
3
7
3
13
23
-
-
Profissionais liberais
483
6
26
42
22
19
108
165
88
1
6
Trabalhadores avulsos
305
25
33
16
31
36
36
64
63
1
-
Rurais
5.698
6
10
29
114
1.905
1.486
1.010
1.057
51
30
Empregadores
1.787
6
9
28
106
845
279
235
250
11
18
Empregados
3.911
-
1
1
8
1.060
1.207
775
807
40
12
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Sindical 2001.
Percebe-se aumento destacado dos números nos períodos posteriores à significativa normatização heterônoma sobre o sindicato ocorrida nas décadas de 1930 e 1980. No primeiro caso, o impacto pode ser imputado à implantação e reprodução do modelo sindical no Brasil no Governo Getúlio Vargas, e, no segundo, ao período de abertura política democrática que culminou com a promulgação da Constituição de 1988. Entre 1971 e 1980, houve a fundação de 2.260 sindicatos, número que quase dobrou na década seguinte, quando foram
criados 4.376, e se manteve em patamares elevados, 4.212, no período 1991 a 20003. Considerada a data de reconhecimento sindical, os números são os seguintes, trazidos na Tabela 2, seguinte:
3 Não há distinção entre sindicatos de trabalhadores na iniciativa privada e de servidores públicos, que provavelmente tiveram crescimento acelerado posteriormente a 1988.
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(1) “Corresponde á existência de uma quantidade não informada pelo sindicato”.
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Tabela 2 – Sindicatos, urbanos e rurais, por período de reconhecimento e tipo de sindicato – Brasil, 1930-2001. Grandes Regiões e tipos de sindicato
Sindicatos, por período de reconhecimento Total
1931 a 1940
1941 a 1950
1951 a 1960
1961 a 1970
1971 a 1980
1981 a 1990
1991 a 2000
2001
Sem declaração (1)
Brasil
11.347
41
915
560
2.042
1.803
2.373
2.864
327
422
Urbanos
7.397
41
913
555
517
559
1.709
2.549
279
275
Empregadores
2.161
11
396
150
138
195
385
737
76
73
Empregados
4.266
22
423
338
292
214
1.075
1.575
170
157
Trabalhadores autônomos
353
2
19
24
46
53
81
94
17
17
Agentes autônomos
51
1
6
2
7
2
8
20
2
3
Profissionais liberais
355
2
42
19
10
69
110
79
8
16
Trabalhadores avulsos
211
3
27
22
24
26
50
44
6
9
Rurais
3.950
-
2
5
1.525
1.244
664
315
48
147
Empregadores
1.412
-
1
4
803
220
191
143
12
38
Empregados
2.538
-
1
1
722
1.024
473
172
36
109
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Sindical 2001.
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(1) “Corresponde á existência de uma quantidade não informada pelo sindicato”.
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O crescimento no número de sindicatos criados não foi correspondente àquele dos reconhecidos no período 1981 a 1990 e 1991 a 2000, conforme se depreende dos dados supra. O reconhecimento de novas entidades não acompanhou, como visto, os números referentes à sua criação, embora se possa destacar, também aqui, os números expressivos do período 1981 a 2001. Como visto, em 2001 havia um total de 11.347 sindicatos com registro ativo junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, em um total de 15.961, com a seguinte distribuição geral, conforme Tabela 3:
Tabela 3 – Sindicatos, urbanos e rurais, por condição de registro junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, segundo o tipo de sindicato – Brasil, 2001. Sindicatos Tipo de sindicato
Total
Condição de registro junto ao MTbE Com registro (1)
Sem registro (2)
Brasil
15.961
11.347
4.614
Urbanos
10.263
7.397
2.866
Empregadores
2.758
2.161
597
Tipo de sindicato
Total
Condição de registro junto ao MTbE Com registro (1)
Sem registro (2)
6.070
4.266
1.804
Trabalhadores autônomos
585
353
232
Agentes autônomos
62
51
11
Professores liberais
483
355
128
Trabalhadores avulsos
305
211
94
Rurais
5.698
3.950
Empregadores
1.787
Empregados
3.911
Empregados
política socioeconômica dos Governos Lula e Dilma. Importante observar que, no período 2000/2010, segundo Censo Demográfico do IBGE, a taxa de crescimento médio/ano da população brasileira ficou em 1,17%4. Tabela 4 – População ocupada – empregada – com carteira assinada – RMs 2002-2013. (mil) Data
População ocupada – empregada – com carteira assinada – RMs (mil)
1.748
03/2002
7.944
1.412
375
03/2003
8.202
2.538
1.373
03/2004
8.181
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Sindical 2001.
03/2005
8.672
03/2006
8.965
(1) “Inclui apenas os sindicatos que possuem carta de reconhecimento (carta sindical) ou registro sindical no Ministério do Trabalho e Emprego – MTE”.
03/2007
9.334
03/2008
10.039
(2) “Inclui os sindicatos que possuem apenas registro em cartório e pedido de registro no Ministério do Trabalho e Emprego – MTE”.
03/2009
10.328
03/2010
11.069
03/2011
11.814
03/2012
12.125
Recentemente, em 18.04.2013, havia um total de 14.994 sindicatos com registro ativo (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013), o que revela um crescimento de 32,14% em pouco mais de uma década. No que diz respeito aos sindicatos de empregados (incluídas categorias diferenciadas) com registro ativo, o aumento no período é ainda mais significativo. Eram 4.266 sindicatos com registro ativo em 2001, número que passou para 7.748 (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013) em 18.04.2013, aumento expressivo de 81,62%. É fato que a massa assalariada formal (trabalhadores com vínculo empregatício e registro em CTPS) cresceu também significativamente no período 2002-2013 (referência março, Regiões Metropolitanas). O crescimento foi de 56,95%, passando de 7.944.000 de trabalhadores empregados com carteira assinada para 12.468.000, conforme tabela a seguir, graças, sobretudo, à
03/2013 12.468 Fonte: IBGE/PME. Disponível em: www.ipeadata.gov.br.
O índice de sindicalização, entretanto, não se alterou significativamente. O percentual de sindicalizados em relação ao total de empregados reduziu dos 18,5% em 2004 para 18,1% dos trabalhadores em 2009, segundo dados do IBGE divulgados pela OIT (Guimarães, 2012). Em 2011 foi mantida a tendência de redução, com 17,2% (IBGE) dos trabalhadores associados a sindicatos, não obstante tenha havido aumento no número abso4 “Refere-se à taxa média geométrica de crescimento anual, apresentada em percentual (%). A taxa é calculada para o período 2000/2010 e considera a população de 2010, incluindo a estimada para os domicílios fechados. A população considerada para 2000 foi a recenseada.” (IBGE, 2013)
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Sindicatos
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luto de trabalhadores sindicalizados nas duas últimas décadas (1999/2011), com destaque para o período até 20065.
posição do Ministério do Trabalho e Emprego sobre o tema por ocasião do Fórum Nacional do Trabalho em 2003:
O aumento substancial do número de sindicatos no Brasil, sobretudo em se tratando de representantes de empregados, é percebido pela doutrina justrabalhista brasileira, que busca compreender seus efeitos no plano da atuação sindical e do Direito Coletivo do Trabalho enquanto sistema jurídico.
Apesar do elevado grau de dinamismo sindical, o crescimento do número de sindicatos nos últimos anos resultou menos do avanço na organização sindical ou dos serviços prestados pelas entidades de classe e bem mais da fragmentação das já existentes, traduzindo-se numa pulverização que tem enfraquecido tanto a representação de trabalhadores quanto a de empregadores. O contraste entre o crescimento numérico de entidades e o ritmo mais lento da economia, com as já conhecidas pressões sobre o mercado formal de trabalho, indica, portanto, um certo artificialismo da vida sindical brasileira. (Horn, 2009, p. 60)
O que há, para o Professor Georgenor de Sousa Franco Filho (2004, p. 175), é uma pluralidade sindical oblíqua, que decorre da multiplicidade de sindicatos existentes no Brasil, pulverizados e enfraquecidos. “São tantos e de tal monta que, às vezes, há dúvida em saber o que afinal estão a representar”. O Professor Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1402) reconhece a existência de um processo de dissolução de categorias que acarreta a pulverização organizativa dos sindicatos e, consequentemente, “um cenário de negociações coletivas às vezes extremamente danosas aos trabalhadores, em vista da falta de efetiva representatividade dessas entidades enfraquecidas”.
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Carlos Henrique Horn trata da atomização sindical decorrente da alteração no marco regulatório do sindicalismo brasileiro após a Constituição da República promulgada em 1988 e relata a
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5 “Finalmente, em 2007, se iniciam uma desaceleração e queda no crescimento do total de associados, o que repercutiu negativamente na taxa de sindicalização. De fato, entre 2007 e 2011, houve um recuo, em relação a 2006, tanto no número de associados (queda de 547,7 mil pessoas), quanto na taxa de sindicalização – queda de 1,4 ponto percentual. [...] Para concluir, é possível afirmar que o Brasil foi um dos poucos países industrializados em que, ao longo das últimas duas décadas, se observou um crescimento no associativismo sindical. Os sindicatos brasileiros foram, pois, bem-sucedidos no recrutamento de filiados – especialmente entre 2001 e 2006. Entretanto, a partir de então, começaram a aparecer sinais de desaceleração e de reversão da tendência de crescimento.” (Pichler, 2013)
Cristiano Paixão percebe a imensa criatividade dos atores sociais envolvidos na situação posta e conclui: [...] por meio de práticas sociais, fundam novas entidades, a partir de desmembramentos, especificações ou mesmo fragmentação no interior das categorias, mas procurando se manter no marco da unicidade. Para tanto, os atores interpretam e deslocam determinadas categorias previstas na Constituição e nas leis. Isso significa afirmar que não mais existe o sistema de organização sindical implantado ao tempo da entrada em vigor da CLT. (Paixão, 2012, p. 53)
O que ocorre hoje é a diluição ou artificial superespecialização da representação sindical, ao contrário do que seria ordinário no contexto de unicidade ou de unidade6. A origem da atual proliferação de sindicatos no Brasil remonta necessariamente ao Texto Constitucional de 1988, que consagrou, no mesmo art. 8º, liberdade sindical, unicidade e registro por órgão público, mas vedadas ao Poder Público a 6 Poderia haver questionamentos sobre a vigência plena da liberdade sindical no Brasil, vista tal proliferação de sindicatos, como se pluralidade houvesse. Possível concluir, de antemão, negativamente: embora haja proliferação de sindicatos não se admite sua coexistência (concorrência) em uma mesma base de representação, bem como não há sua organização em estrutura de livre escolha da classe trabalhadora, vinculada que está às regras de agregação celetistas.
interferência e a intervenção na organização sindical. Em um primeiro momento posterior à promulgação da Constituição da República em 1988, o Ministério do Trabalho não se dava por competente para proceder ao citado registro, pois tal medida seria incompatível com o preceito constitucional de autonomia sindical e caracterizaria interferência e intervenção na organização sindical. Posteriormente, criou o Ministério do Trabalho um sistema de arquivo sindical, “que só nasceu arquivo para prevenir a reação que o registro poderia trazer”, mas que imediatamente revelou “sinais de incapacidade para preservar o princípio constitucional da unicidade sindical” (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013). A postura do citado Ministério foi alterada após reiteradas decisões do STJ e do STF sobre sua competência para proceder ao registro dos entes sindicais, tendo cuidado a Suprema Corte de ressalvar que não se trata de outorga discricionária do reconhecimento sindical, mas, sim, de simples registro, com o fito único de se garantir a imposição da unicidade sindical (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013). Nestes termos a seguinte decisão do STF: Ementa: I – Registro de entidades sindicais. Recepção, em termos, da competência do Ministério do Trabalho, sem prejuízo da possibilidade de a lei vir a criar regime diverso.
Considerando que a decisão mais abrangente dentro da jurisprudência vitoriosa é a do Supremo Tribunal Federal – Tribunal Pleno – no Mandado de Injunção nº 1.448/SP – Relator Ministro Sepúlveda Pertence, cuja ementa, em sua segunda parte, estabelece: “II – Liberdade e unicidade sindical e competência para o registro de entidades sindicais (CF, art. 8º, I e II): recepção, em termos, da competência do Ministério do Trabalho, sem prejuízo da possibilidade de a lei vir a criar regime diverso. 1. O que é inerente à nova concepção constitucional positiva de liberdade sindical é, não a existência do registro público – o qual é reclamado, no sistema brasileiro, para o aperfeiçoamento da constituição de toda e qualquer pessoa jurídica de direito privado –, mas, a teor do art. 8º, I, do texto fundamental, que a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato: o decisivo, para que se resguardem as liberdades constitucionais de associação civil ou de associação sindical, é, pois, que se trata efetivamente de simples registro – ato vinculado, subordinado apenas à verificação de pressupostos legais –, e não de autorização ou de reconhecimento discricionários.” [...]
(Supremo Tribunal Federal, RE 134.300-1/DF, Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 4 set. 2013) (Brasil, 1994)
Considerando que o acórdão prolatado pelo Superior Tribunal de Justiça, no Mandado de Segurança nº 29/DF, depois de referir-se à “persistência, no campo da legislação de regência das regras legais anteriores que não discrepam da nova realidade constitucional, antes dão-lhe embasamento e operatividade”, proclama a “atribuição residual do Ministério do Trabalho para promover o registro sindical, enquanto lei ordinária não vier dispor de outra forma”, com “atuação restrita, no caso, à verificação da observância ou não da ressalva constitucional que veda a existência de organização sindical da mesma categoria profissional em idêntica base territorial”. (Ministério do Trabalho, 1994)
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1. Conforme decidido pelo Plenário (MI 144, 28.05.1993), “a função de salvaguarda da unicidade sindical induz a sediar, si et in quantum, a competência para o registro das entidades sindicais no Ministério do Trabalho, detentor do acervo das informações imprescindíveis ao seu desempenho”.
registro sindical, oportunidade em que justificou tal prerrogativa com base em decisões do STJ e do STF, a seguir citadas com base na Instrução Normativa MTb nº 3, de 10.08.1994, em suas “considerações”:
Em um segundo momento, então, o Ministério do Trabalho passou a compreender sua competência constitucional para o
Na mesma linha as “considerações” lançadas na Instrução Normativa nº 1, de 17.07.1997, do Ministério do Trabalho:
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2. Recurso extraordinário não conhecido.
Considerando que o egrégio Supremo Tribunal Federal, ao interpretar a norma inscrita no art. 8º, item I, da Constituição Federal, firmou orientação no sentido de que o registro sindical no Ministério do Trabalho constitui “ato vinculado, subordinado apenas à verificação de pressupostos legais, e não de autorização ou de reconhecimento discricionários” (MI 144/SP, Tribunal Pleno; ADI-MC 1121/RS, Tribunal Pleno); Considerando que o registro sindical é ato meramente cadastral, para o fim de tornar pública a existência da entidade e servir como fonte unificada de dados a que os interessados poderão recorrer como elemento documental para dirimir suas controvérsias, por si mesmas ou junto ao Poder Judiciário (RE 35875-2/SP; MS 1045/DF); Considerando que a reiterada jurisprudência fixada pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça entende que “o princípio da unicidade não significa exigir apenas um sindicato representativo de categoria profissional, com base territorial limitada, mas, de impedir que mais de um sindicato represente o mesmo grupo profissional”, sendo “vedado ao Estado intervir sobre a conveniência ou oportunidade de desmembramento ou desfiliação”. (RE 74986/SP; RE 40267/SP; RE 38726/RJ; MS 1703/DF). (Ministério do Trabalho, 1997)
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Por fim, sobre o registro sindical junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, a Súmula nº 677 do STF menciona: “Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade” (Brasil, 2003).
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Parece não haver dúvidas quanto à competência e sobre as limitações decisórias do Ministério do Trabalho e Emprego para o registro sindical. Havendo discordância de qualquer ente sindical com relação à concessão ou não do registro pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a controvérsia é dirimida em primeiro grau de jurisdição pelas Varas do Trabalho (após a edição da Emenda Constitucional nº 45/2004). Em 10 de agosto de 1994, conforme citado, fixou o Ministério do Trabalho, por sua Instrução Normativa nº 3, regras para registro sindical (transcrição a seguir). Perceptível em tal texto a preo-
cupação em preservar a autonomia sindical face ao Estado no que diz respeito à criação de novos sindicatos, à dissociação de categorias e aos desmembramentos, o que também pode ter contribuído para potencializá-los7: Art. 3º O pedido de registro de sindicato será instruído com os seguintes documentos, impassíveis de apreciação pelo Ministério do Trabalho: I – edital de convocação dos membros da categoria para a assembleia geral de fundação da entidade, publicado em jornal de comprovada circulação na pretendida base territorial, bem como no Diário Oficial do Estado onde se realizará a assembleia; II – ata da assembleia geral a que se refere o inciso anterior; III – cópia do estatuto aprovado pela assembleia geral, que deverá conter os elementos necessários à representação pretendida e, em especial: a) a categoria ou categorias representadas; b) a base territorial; c) os órgãos da administração, sua composição, duração dos mandatos, regras para a eleição dos seus membros e critérios de substituição; d) fontes de receita e normas de controle das despesas, inclusive prestação de contas. § 1º Para efeito do registro, as profissões liberais são equiparadas a categorias profissionais diferenciadas. § 2º Na hipótese de sindicato a ser formado por dissociação de categorias ou desmembramento de categoria, a assembleia geral reunirá somente os associados integrantes do grupo que pretender constituir o novo sindicato. [...] 7 A indicação de “restrições” pode ter indicado os caminhos para as dissociações e desmembramentos.
Parágrafo único. A impugnação poderá ser também apresentada por qualquer entidade sindical, federação do correspondente grupo ou pela confederação do mesmo plano econômico ou profissional. Art. 7º O Ministro de Estado do Trabalho mandará ouvir a Confederação do ramo econômico ou profissional competente envolvido que terá o prazo de 25 dias para opinar sobre os seguintes aspectos: a) observância da unicidade sindical; b) regularidade e autenticidade da representação. (Ministério do Trabalho, 1994)
A regra do § 2º do art. 3º da Instrução Normativa nº 3, de 10.08.1994, certamente possibilitou a proliferação prejudicial de sindicatos no Brasil, ao permitir o desmembramento independentemente da vontade da coletividade dos representados. Ora, ouvir em assembleia para desmembramento somente os associados integrantes do grupo que pretende constituir o novo sindicato é o mesmo que dispensar a referida reunião, pois tal regra não contempla debates, embates e soluções harmoniosas que poderiam surgir decorrentes da controvérsia. De positivo a regra do art. 7º, que conferia democraticamente (em tese) às Confederações a prerrogativa de zelar pela unicidade sindical e pela regularidade e autenticidade da representação. A norma citada, transcrita parcialmente, foi revogada pela Instrução Normativa MTb nº 1, de 17.07.1997, que excluiu a regra do citado § 2º do art. 3º da Instrução Normativa nº 1, de 10.08.1994, e manteve, em essência, os demais parâmetros anteriores.
A Instrução Normativa nº 1, de 17.07.1997, foi expressamente revogada pela Portaria nº 343, de 4 de maio de 2000, sem pontos relevantes para a presente análise, naquilo que concerne à atuação do Ministério do Trabalho e Emprego sobre o registro sindical8. A Portaria nº 186, de 10 de abril de 2008, revogou a Portaria nº 343/2000 e deu ao Ministério do Trabalho e Emprego maior poder decisório no que diz respeito ao registro sindical de novas entidades, o que ensejou a proliferação sindical mais recente. Os textos normativos anteriores eram no sentido da atuação meramente cadastral/registral do Ministério do Trabalho, deixando as controvérsias quanto ao mérito de eventuais litígios envolvendo desmembramento ou dissociação a cargo do Poder Judiciário, o que demandava maior tempo de análise e ônus para todos os interessados. Nos casos de impugnação aceita pelo Ministério do Trabalho (análise de aspectos formais dos documentos exigidos, regra geral), havia, até então, a vedação do registro pretendido, com a solução da controvérsia pela via judicial9. O 8 “Art. 6º [...] Parágrafo único. O exame de admissibilidade da impugnação restringir-se-á tempestividade do pedido, à representatividade do impugnante, nos termos do caput do art. 5º, á comprovação de seu registro no Ministério do Trabalho e Emprego e de recolhimento do valor realtivo ao custo da publicação, não cabendo a este Ministério analisar ou intervir sobre a conveniência ou oportunidade do desmembramento, desfiliação, dissociação ou situações assemelhadas.” (Ministério do Trabalho e Emprego, 1994) 9 “Art. 8º Findo o prazo a que se refere o § 1º do art. 7º, o Secretário de Relações do Trabalho terá quinze dias para proceder ao exame de admissibilidade e fazer publicar, no Diário Oficial da União, o despacho de conhecimento, ou não, da impugnação.
§ 1º O exame de admissibilidade da impugnação restringir-se-á à tempestividade do pedido, à representatividade do impugnante, nos termos do caput do artigo 6º, à comprovação de seu registro no Ministério do Trabalho e de recolhimento do valor relativo ao custo da publicação.
§ 2º No caso de a impugnação ser conhecida, caberá às partes dirimir o
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Art. 6º Protocolizado o requerimento, o pedido de registro será imediatamente publicado no Diário Oficial da União, correndo as despesas por conta do interessado, abrindo-se o prazo de quinze dias para impugnação por sindicato cuja representatividade coincida, no todo ou em parte, com a do requerente.
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Ministério do Trabalho não analisava o mérito da pretensão, que ficava a cargo do Poder Judiciário. O novo texto, entre outras inovações procedimentais, deu ao Secretário de Relações de Trabalho competência para arquivar pedido de impugnação de sindicato pretensamente prejudicado pela criação de novo ente representativo em situações importantes, como se infere da regra do art. 10 da Portaria nº 186, de 2008, o que, na prática, poderia facilitar a obtenção de novos registros: Art. 10. As impugnações serão submetidas ao procedimento previsto na Seção III deste Capítulo, exceto nos seguintes casos, em que serão arquivadas pelo Secretário de Relações do Trabalho, após análise da CGRS: I – inobservância ao prazo previsto no art. 9º; II – ausência de registro sindical do impugnante, exceto se seu pedido de registro ou de alteração estatutária já houver sido publicado no Diário Oficial da União, mesmo que se encontre sobrestado, conforme § 5º do art. 13; III – apresentação por diretoria de sindicato com mandato vencido;
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IV – inexistência de comprovante de pagamento da taxa de publicação;
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V – não coincidência de base territorial e categoria entre impugnante e impugnado. VI – impugnação apresentada por entidade de grau diverso da entidade impugnada, salvo por mandato; conflito pela via consensual ou por intermédio do Poder Judiciário.
Art. 9º Até que o Secretário de Relações de Trabalho seja notificado do inteiro teor do acordo ou da sentença final que decidir a controvérsia, o pedido de registro será pré-anotado para o fim exclusivo de precedência.” (Ministério do Trabalho e Emprego, 1997)
VII – na hipótese de desmembramento, que ocorre quando a base territorial do impugnado é menor que a do impugnante, desde que não englobe o município da sede do sindicato impugnante e não haja coincidência de categoria específica; VIII – na ocorrência de dissolução de categorias ecléticas, similares ou conexas, para a formação de entidade com representação de categoria mais específica. IX – ausência ou irregularidade de qualquer dos documentos previstos no art. 9º; e X – perda do objeto da impugnação, ocasionada pela retificação do pedido da entidade impugnada. (Ministério do Trabalho e Emprego, 2008)
Arquivada a impugnação por ato do Secretário de Relações do Trabalho, com análise do mérito da pretensão, o registro era concedido, cabendo ao sindicato prejudicado buscar a preservação de sua base junto ao Poder Judiciário, como se infere da regra do art. 14, inciso II, da Portaria nº 186/2008: Art. 14. O registro sindical ou de alteração estatutária será concedido com fundamento em análise técnica da SRT, nas seguintes situações: [...] II – arquivamento das impugnações, nos termos do art. 10; [...]. (Ministério do Trabalho e Emprego, 2008)
Na prática, havia a criação de um fato jurídico consistente na criação e no registro de nova entidade sindical, o que poderia trazer ao Poder Judiciário dificuldades metajurídicas para dirimir a controvérsia intersindical. A Portaria nº 186/2008 permitia ao Ministério do Trabalho e Emprego juízo de mérito quanto à análise de coincidência de base territorial, de coincidência de categoria específica e do que viria a ser categoria mais específica. Tais possibilidades, próximas à discricionariedade, permitiram a criação de sindicatos carto-
e 27, III, da Portaria GM/MTE nº 326/201311. As decisões de arquivamento sumário da impugnação a cargo do Secretário das Relações de Trabalho perderam parte do caráter discricionário da regra anterior, como se infere: Art. 18 As impugnações serão arquivadas pelo Secretário de Relações do Trabalho, após análise pela CGRS, nas seguintes hipóteses:
A Portaria nº 186/2008 foi substituída pela Portaria GM/MTE nº 326, de 01.03.2013, no que concerne aos entes representativos de primeiro grau, em aparente tentativa de disciplinar a desordem amplificada em 2008, conforme se depreende de seu texto. Houve a revogação do disposto nos citados incisos V, VII e VIII do art. 10 da Portaria nº 186/2008, na forma como ali consagrado. O novo texto sobre registro sindical, atento à proliferação de “sindicatos-fantasmas”10, exige a apresentação de contrato de trabalho dos dirigentes que pretenderem constituir sindicato, além de determinar que as novas entidades fixem “objetivamente a categoria e a base territorial pretendida, não sendo aceitos os termos como afins, conexos e similares, entre outros” (art. 3º, VI, c) (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013). Outro ponto que deve ser destacado diz respeito à necessidade de convocação de assembleia sempre que um sindicato promova junto ao Ministério do Trabalho e Emprego a impugnação da nova entidade, o que, em tese, permitirá maior debate e publicidade sobre a criação de ente sindical. Nestes termos as regras dos arts. 19 10 “O ministro do Trabalho, Brizola Neto, disse nesta terça que pretende criar novas regras para regulamentar o registro sindical. Em sua primeira reunião com lideranças de centrais sindicais, o ministro foi cobrado a respeito do assunto pelos dirigentes, que afirmam haver uma ‘fábrica de sindicatos’ no País. ‘Queremos acabar com a fábrica de sindicatos fantasmas, sem representatividade’, disse o ministro, ressaltando que a falta de regras claras sobre a questão enfraquece a legitimidade de sindicatos ‘de lutas históricas’. Somente no ano passado, o ministério recebeu pedidos para a criação de mais 1,2 mil sindicatos. De acordo com Brizola Neto, existem hoje quase dez mil sindicatos em todo o País.” (Brizola..., 2013)
I – inobservância do prazo previsto no caput do art. 17; II – insuficiência ou irregularidade dos documentos apresentados, na forma do art. 17; III – não coincidência de base territorial e categoria entre as entidades indicadas como conflitantes; IV – perda do objeto da impugnação, ocasionada pela retirada do conflito; V – desistência da impugnação pelo impugnante; VI – se o impugnante alegar conflito preexistente ao objeto da alteração estatutária; VII – se apresentada por diretoria de sindicato com mandato vencido, exceto quando, no momento da impugnação, a entidade comprovar ter protocolizado a atualização de dados de Diretoria, e esta atualização ter sido validada; 11 “Art. 19 Nos casos em que a impugnação recair sobre processos de dissociação e desmembramento, a SRT notificará a entidade impugnada para realizar nova assembleia, no prazo máximo de noventa dias da notificação, para ratificar ou não o pedido, cumprindo os requisitos previstos nos incisos II, III e VII do art. 3º, no que couber.”
“Art. 26 O Secretário de Relações do Trabalho arquivará o pedido de registro sindical ou o registro de alteração estatuária, com base em análise fundamentada da CGRS, nos seguintes casos:
[...]
III – se a entidade impugnada, nos termos do art. 19, não realizar a assembleia ou se a categoria não ratificar o desmembramento ou dissociação.” (Brasil, 2013)
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rários, sem representação efetiva e incapazes de negociar em benefício dos trabalhadores. Cediço que a disputa das Centrais Sindicais pelo controle do Ministério do Trabalho e Emprego durante os Governos Lula e Dilma teve foco na possibilidade da criação de sindicatos em consonância com seus ideais, quaisquer que sejam eles.
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VIII – quando o impugnante deixar de apresentar comprovante de pagamento da taxa de publicação; ou IX – na hipótese de impugnação apresentada por entidade de grau diverso da entidade impugnada, salvo por mandato. (Ministério do Trabalho e Emprego, 2013)
Visto, então, que o Ministério do Trabalho e Emprego teve que lidar diretamente com as contradições constitucionais decorrentes da previsão concomitante de liberdade, autonomia, unicidade e registro sindicais, o que na prática acabou por permitir, durante mais de 20 anos, a pluralidade sindical oblíqua. Ocorre que, recentemente, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal parece ter contrariado a jurisprudência consolidada até então, ao fixar a competência do registro sindical pelos cartórios de registro civil das pessoas jurídicas: Ementa: [...]
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SINDICATO – EXISTÊNCIA JURÍDICA – O registro versado no inciso I do art. 8º da Constituição é o civil das pessoas jurídicas, não se podendo cogitar de observância da formalidade presente Poder ou Órgão público, ou seja, o Ministério do Trabalho. (Supremo Tribunal Federal, RE 291.822/RS, Relator Ministro Marco Aurélio. Disponível em: www.stf.jus. br. Acesso em: 4 set. 2013) (Brasil, 2013)
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Não obstante tal decisão12, a Súmula nº 677 do STF ainda hoje define a competência do Ministério do Trabalho e Emprego para o registro sindical. De todo modo e como visto, o Ministério do Trabalho e Emprego tem cuidado do registro sindical para controle da unicidade, embora reconheça também o STF
12 Embora não se confunda personalidade jurídica, advinda do registro civil, com personalidade sindical, decorrente do registro no Ministério do Trabalho e Emprego, a decisão fixada na ementa e reproduzida na íntegra do acórdão parece contrariar a jurisprudência dominante no STF.
a desnecessidade de submeter tal análise à Comissão de Enquadramento Sindical referida no art. 576 da CLT: Ementa: I – Registro de entidades sindicais. Recepção, em termos, da competência do Ministério do Trabalho, sem prejuízo da possibilidade de a lei vir a criar regime diverso. 1. Conforme decidido pelo Plenário (MI 144, 28.05.1993), “a função de salvaguarda da unicidade sindical induz a sediar, si et in quantum, a competência para o registro das entidades sindicais no Ministério do Trabalho, detentor do acervo das informações imprescindíveis ao seu desempenho”. 2. Recurso extraordinário não conhecido. II – Comissão de Enquadramento Sindical. Interesse da impetrante na continuidade de seu funcionamento. Inexistência. 1. Desde que as atividades de registro sejam retomadas pelo Ministério do Trabalho, pouco importa à impetrante que, internamente, o órgão encarregado de aferir a observância do requisito da unicidade sindical seja, ou não, a Comissão de Enquadramento Sindical. (Supremo Tribunal Federal, RE 134.300-1/DF, Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 4 set. 2013) (Brasil, 2013)
Outro instrumento oblíquo de proliferação sindical tem sido a regulamentação das mais diversas profissões pelo Estado brasileiro, muitas vezes sem maiores critérios que não sejam meramente políticos e eleitorais. Havia, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego atualizados até abril de 201213, 67 profissões regulamentadas14, conforme Quadro 1, considerada aqui a norma heterônoma estatal que primeiro regulamentou a profissão: 13 Depois de abril de 2012, exemplificativamente, foram publicadas as Leis nºs 12.619/2012, que trata da profissão de motorista profissional, e 12.790/2013, que dispôs sobre a regulamentação do exercício da profissão de comerciário, que não constam do rol do Ministério do Trabalho e Emprego (CBO). 14 Empiricamente, é possível perceber número ainda maior do que o trazido pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
PROFISSÃO Administrador
Legislação PROFISSÃO Lei nº 4.769/1965 Jornalista
Advogado
Lei nº 8.906/1994 Leiloeiro
Aeronauta Arquivista e Técnico em Arquivo Artistas e Técnico em Espetáculos Assistente Social
Lei nº 7.183/1984 Leiloeiro Rural Lei nº 6.546/1978 Massagista
Legislação Decreto-Lei nº 972/1969 Decreto nº 21.981/1932 Lei nº 4.021/1961 Lei nº 3.968/1961
Lei nº 6.533/1978 Médico
Lei nº 3.268/1957
Lei nº 8.662/1993 Medicina Lei nº 5.517/1968 Veterinária Atleta de Futebol Lei nº 6.354/1976 Mototaxista e Lei nº 12.009/2009 Motoboy Atuário Decreto-Lei nº Museólogo Lei nº 7.287/1984 806/1976 Bibliotecário Lei nº 4.084/1962 Músico Lei nº 3.857/1960 Biomédico Lei nº 7.017/1982 Nutricionista Lei nº 6.583/1978 Biólogo Lei nº 7.017/1982 Oceanógrafo Lei nº 11.760/2008 Bombeiro Civil Lei nº 11.901/2009 Odontologia Lei nº 4.324/1964 Cabeleireiro, Barbei- Lei nº 12.592/2012 Orientador Lei nº 5.564/1968 ro, Esteticista, ManiEducacional cure, Pedicure, Depilador e Maquiador Contabilista Decreto-Lei nº Pescador Decreto-Lei nº 9.295/1946 Profissional 221/1967 Corretor de Imóveis Lei nº 6.530/1978 Peão de Rodeio Lei nº 10.220/2001 Corretor de Seguros Lei nº 4.594/1964 Psicologia Lei nº 4.119/1962 Despachante Aduaneiro Economista Economista Doméstico Educação Física Empregado Doméstico
Portaria MTb nº 209/1980
Publicitário e Agenciador de Propaganda Lei nº 1.411/1951 Químico Lei nº 7.387/1984 Radialista
Lei nº 4.680/1965
Lei nº 9.696/1998 Relações Públicas Lei nº 5.859/1972 Repentista
Lei nº 5.377/1967
Lei nº 2.800/1956 Lei nº 6.615/1978
Lei nº 12.198/2010
PROFISSÃO Enfermagem
Engenheiro, Arquiteto e Agrônomo Engenharia de Segurança Enólogo Estatístico Farmacêutico
Legislação PROFISSÃO Lei nº 7.498/1986 Representantes Comerciais Autônomos Lei nº 5.194/1966 Secretário
Legislação Lei nº 4.886/1965
Lei nº 7.410/1985 Sociólogo
Lei nº 6.888/1980
Lei nº 11.476/2007 Sommelier Lei nº 4.739/1965 Taxista Lei nº 3.820/1960 Técnico em Administração Fisioterapeuta e TeDecreto-Lei nº Técnico em rapeuta Ocupacional 938/1969 Radiologia Fonoaudiólogo Lei nº 6.965/1981 Técnico em Prótese Dentária Garimpeiro Lei nº 11.685/2008 Técnico Industrial Geógrafo Lei nº 6.664/1979 Tradutor e Intérprete de Libras Geólogo Lei nº 4.076/1962 Turismólogo Guardador e LavaLei nº 6.242/1975 Zootecnista dor de Veículos Instrutor de Trânsito Lei nº 12.302/2010
Lei nº 7.377/1985
Lei nº 12.467/2011 Lei nº 12.468/2011 Lei nº 4.769/1965 Lei nº 7.394/1985 Lei nº 6.710/1979 Lei nº 5.524/1968 Lei nº 12.319/2010 Lei nº 12.591/2012 Lei nº 5.550/1968
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de “Profissões Regulamentadas – Leis, Decretos-Leis, Decretos e outros atos específicos, compilação dos textos, atualização e notas”. Adriano Campanhole, Hilton Lobo Campanhole – 7. ed. Atlas 99. Atualização/Fonte: Setor de Documentação/MTE – Bsb, abr. 2012. Disponível em www.mte.gov.br. Acesso em: 28 maio 2013.
A regulamentação profissional pela norma heterônoma permite a criação de novos sindicatos de categorias profissionais diferenciadas, que têm em tal especificidade seu principal elemento definidor da agregação sindical, conforme entende Delgado (2013, p. 1364) quando trata dos sindicatos por ofício ou profissão, que se organizam a partir, “por exemplo, da existência de lei específica regulando o funcionamento da profissão, não prevalecendo, mais, simplesmente, o antigo critério administrativo”. Há ainda em tramitação no Congresso Nacional vários
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Quadro 1 – Profissões regulamentadas (legislação).
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projetos de lei que pretendem regulamentar profissões, o que abre espaço para uma multiplicidade de novos sindicatos, sem que haja, necessariamente, melhora na representação coletiva.
2 ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NO QUE CONCERNE À DISPUTA DE REPRESENTAÇÃO SINDICAL
Tal realidade desafia os analistas do sindicato no Brasil a compreender o alcance prático da regra constitucional de unicidade. José Carlos Arouca, ao tratar da unicidade sindical no Brasil, faz necessária crítica:
Visto que a disputa por representação sindical se resolve em diversas situações fáticas com a atuação do Poder Judiciário, que decide principalmente sobre dissociação e desmembramento. Há desde 1988 aparente consenso no sentido de que a especialidade deve dirimir a controvérsia entre os sindicatos envolvidos no litígio. Algumas decisões são consubstanciadas nas regras dos arts. 570 e 571 da CLT, ainda que extinta a Comissão do Enquadramento Sindical no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego. Também desponta aparente consenso no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário interferir na vontade dos interessados na organização sindical, especificamente no que diz respeito à cisão e ao desmembramento.
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A farra ou farsa em que se tornou a criação de sindicatos deve-se, fora de qualquer dúvida, ao estímulo dado pela contribuição sindical e ao apoio decisivo do Ministério do Trabalho dirigido pela aliança CUT/FS ou PT-PDT. No Censo do IBGE de 2001 eram 15.961 sindicatos, 11.354 de trabalhadores; em 2007 pulou para 23.726 entidades, além de 5.529 pedidos de registro em tramitação. Mas, tirando servidores públicos e trabalhadores rurais, os números não revelam a realidade político-social, nada de sindicatos verdadeiramente novos, mas apenas fragmentação com a divisão artificial de trabalhadores já organizados, fora, é claro, absurdos ou pilhérias como o sindicato dos artistas sertanejos ou dos proprietários de cavalos puro sangue de corridas. Aliás, seria um paradoxo a unidade através de sindicato único implicar em multiplicidade, inerente ao pluralismo. (Arouca, 2013, p. 109)
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Na prática, a fragmentação hoje verificada pode ter sido tolerada por haver uma pressão pro-pluralidade, ainda que não revelada expressamente pelos atores sociais envolvidos. Especificamente no que se refere aos sindicatos, provavelmente tal proliferação tem razão na arrecadação possibilitada pela “contribuição sindical obrigatória”. Tal pluralidade sindical oblíqua pode ter sido até mesmo influenciada, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego e do Poder Judiciário Trabalhista, pela Convenção nº 87 da OIT em seus valores básicos, mas sem que se estabelecessem critérios claros de fixação da representação decorrente de seus princípios.
Inicialmente, a jurisprudência do TRT da 3ª Região, exemplificativamente: EMENTA: SINDICATO – DESMEMBRAMENTO – ATIVIDADE ESPECÍFICA – POSSIBILIDADE – A existência de um determinado sindicato não constitui óbice intransponível à formação de outros de menor abrangência ou mais específicos em relação às atividades desenvolvidas, caso seja a vontade da categoria, não havendo, portanto, a figura do direito adquirido em relação à base territorial ou à representatividade. O desmembramento da categoria em sindicatos visando a uma melhor representação de seus interesses é comum no meio sindical, fruto da autonomia e liberdade garantidas constitucionalmente como também da realidade que se forma pela manifestação dos grupos profissionais e econômicos. (TRT 3ª R., RO 01523-2011-013-03-00-4, 2ª Turma, Rel. Luiz Ronan Neves Koury, Rev. Jales Valadão Cardoso, Divulgação: 28.08.2012; Publicação: 29.08.2012, DEJT, p. 50. Disponível em: www. trt3.jus.br. Acesso em: 5 jun. 2013) (Brasil, 2012) EMENTA: REPRESENTAÇÃO SINDICAL – DESMEMBRAMENTO – Comprovado nos autos a regularidade do edital convocatório e da assembléia que o constituiu, o desmembramento de um Sindicato intermunicipal, que representa a categoria em diversos Municípios, em um novo Sindi-
EMENTA: LIBERDADE SINDICAL – UNICIDADE – DESMEMBRAMENTO – POSSIBILIDADE – A liberdade para a criação de sindicatos esbarra no limite imposto pelo princípio da unicidade sindical, consoante o art. 8º, II, da CR/1988, que dispõe que “é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial”. Todavia, não se pode olvidar de que a regra supra possui exceção, tendo a CLT criado disposição específica sobre a possibilidade de desmembramento, na mesma base territorial, de um sindicato mais amplo em outro que represente mais especificamente a categoria profissional ou econômica (art. 571). Assim como se admite o desmembramento em razão da especificidade da categoria, também é possível o desmembramento sindical geográfico, atuando o novo sindicato em parte do território que antes estava coberto por outro, desde que a base territorial do sindicato originário abranja mais de um município e que seja preservada a unidade mínima territorial na base deste sindicato desmembrado. (TRT 3ª R., RO 01008-2011-018-03-00-6, 7ª Turma, Rel. Conv. Jose Marlon de Freitas, Rev. Conv. Antonio G. de Vasconcelos, Divulgação: 15.03.2012, Publicação: 16.03.2012, DEJT, p. 206. Disponível em: www.trt3.jus.br. Acesso em: 5 jun. 2013) (Brasil, 2012)
A especificidade ou especialização de categorias, nos termos das decisões citadas, tende à fragmentação da representação coletiva e à consequente fragilização do sindicato frente ao seu contraponto empregador, o que acaba por mitigar a igualdade entre os pactuantes coletivos, que é essencial ao Direito Coletivo do Trabalho. Não obstante tal compreensão, em síntese e exemplificativamente, o entendimento majoritário do Tribunal Superior do Trabalho:
SINDICATO – CRIAÇÃO POR DESMEMBRAMENTO – BASE TERRITORIAL – LIMITE MÍNIMO – UNICIDADE SINDICAL 1. É sabido que o princípio da liberdade sindical assegurado pela Constituição da República na cabeça do seu art. 8º é mitigado pelo princípio da unicidade sindical consagrado no inciso II do mesmo dispositivo. Esse princípio, por sua vez, não afasta a possibilidade de que ocorra o Desmembramento de determinado sindicato, que passa a abranger base territorial reduzida em virtude da criação de novo ente sindical, limitando-se o comando constitucional a vedar que a abrangência dos novos sindicatos seja inferior à área de um município. Precedentes do Supremo Tribunal Federal, bem como do Tribunal Superior do Trabalho. 2. À vista de tais considerações e do registro feito pela Corte de origem, no sentido de que foram preenchidos os requisitos exigidos para o desmembramento – premissa fática intangível, a teor da Súmula nº 126 deste Tribunal Superior –, não se caracteriza a alegada violação do art. 8º, II, da Constituição da República. 3. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST, AI-RR 540-47.2006.5.13.0003, 1ª Turma, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, Julgamento: 17.04.2013, DEJT 26.04.2013) (Brasil, 2013) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – DESMEMBRAMENTO – REGISTRO DE ENTIDADE SINDICAL – Não há falar em violação do art. 8º, II, da Constituição Federal, uma vez que o Tribunal Regional deixou expresso que a dissociação dos trabalhadores abrangidos pela base territorial representada pelo Sindicato-Autor, criando um novo sindicato, não violou o princípio constitucional da unicidade sindical, porque, no caso dos autos, se trata de desmembramento, e não criação de base sindical de mesmo grau na mesma base territorial. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST, AI-RR 152-67.2010.5.03.0041, 2ª Turma, Relª Desª Conv. Maria das Graças Silvany Dourado Laranjeira, Julgamento: 20.03.2013, DEJT 26.03.2013. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2013) AGRAVO DE INSTRUMENTO – ADMISSIBILIDADE – RECURSO DE REVISTA – LIBERDADE SINDICAL – FEDERAÇÃO – CISÃO – DESMEMBRAMENTO DE SINDICATO – CRIAÇÃO DE NOVA FEDERAÇÃO COM BASE TERRITORIAL MENOS ABRANGENTE – POSSIBILIDADE – NÃO VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL – Deve ser confirmada a negativa de seguimento do recurso de revista quando não preenchidos os seus requisitos de admissibilidade. Agravo de instrumento desprovido. (TST, AI-RR 94800-85.2008.5.04.0007, 5ª Turma,
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cato, que venha a representar os trabalhadores de somente um Município, como no caso em tela, não é vedado pela lei. Ao revés, tal prática deve ser até incentivada, mormente, em casos como o da presente controvérsia, onde é óbvio que um ente sindical que vai representar a categoria somente a base de um Município, terá muito mais eficácia na sua atuação, do que outro, que tem de dividir suas atenções em 145 cidades. (TRT 3ª R., RO 01476-2011-129-03-00-2, 6ª Turma, Rel. Conv. Eduardo Aurelio P. Ferri, Rev. Jorge Berg de Mendonça, Divulgação: 07.12.2012, Publicação: 10.12.2012, DEJT, p. 256. Disponível em: www. trt3.jus.br. Acesso em: 5 jun. 2013) (Brasil, 2012)
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Rel. Min. Emmanoel Pereira, Julgamento: 24.04.2013, DEJT 03.05.2013. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2013)
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AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – AÇÃO DE COBRANÇA CUMULADA COM AÇÃO DE CUMPRIMENTO – CONTRIBUIÇÕES SINDICAIS E ASSISTENCIAIS – ENQUADRAMENTO SINDICAL – A Corte a quo, entendendo que o desmembramento de um sindicato em outro mais específico não acarreta ofensa ao princípio da unicidade sindical, e com base no contexto probatório dos autos, concluiu que o SINDIFAST seria o legítimo representante dos empregados da empresa reclamada, por representar categoria mais específica em relação àquela representada pelo Sindicato reclamante. Violações legais e constitucionais não constatadas. Incidência da Súmula nº 126 do TST. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST, AI-RR 34300-28.2008.5.02.0001, 8ª Turma, Relª Min. Dora Maria da Costa, Julgamento: 24.04.2013, DEJT 26.04.2013. Disponível em: www.tst.jus. br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2013)
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AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – AÇÃO DE OPOSIÇÃO – REPRESENTATIVIDADE SINDICAL – DESMEMBRAMENTO – CATEGORIA MAIS ESPECÍFICA – A Corte a quo, entendendo que o desmembramento de um sindicato em outro mais específico não acarreta ofensa ao princípio da unicidade sindical e considerando as disposições constantes dos estatutos sociais trazidos aos autos, concluiu que o sindicato reclamante (Sindex) seria o legítimo representante dos empregados rurais da empresa Plantar S.A., por representar categoria mais específica em relação àquela representada pelo sindicato ora opoente. Violações legais e constitucionais e contrariedades a verbetes jurisprudenciais desta Corte não constatadas. Incidência da Súmula nº 126 do TST. Agravo de Instrumento conhecido e não provido. (TST, AI-RR 1499-32.2010.5.03.0140, 8ª Turma, Relª Min. Dora Maria da Costa, Julgamento: 13.03.2013, DEJT 15.03.2013. Disponível em: www.tst.jus. br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2013) RECURSO DE REVISTA – ENTIDADE SINDICAL GENÉRICA – DESMEMBRAMENTO – CRIAÇÃO DE ENTIDADE SINDICAL ESPECÍFICA – POSSIBILIDADE – PRINCÍPIO DA UNICIDADE – VIOLAÇÃO – AUSÊNCIA – É garantia individual assegurada constitucionalmente o direito à liberdade de pensamento, à reunião pacífica, à liberdade associativa e à criação de associações de qualquer natureza, em conformidade com o disposto no art. 5º, IV, XVI, XVII, XVIII e XX, da Constituição da República. Além disso, o próprio art. 8º, caput, da Carta Magna assegura a livre associação profissional e sindical. Partindo desse ponto, o princípio
da unicidade sindical, estabelecido no art. 8º, II, da Carta Magna, não é absoluto e não resguarda, incondicionalmente, a intangibilidade do sindicato mais antigo, sendo permitida a criação de novos sindicados por desmembramento da base territorial ou da categoria mais específica, nos termos dos arts. 570 e 571 da CLT. Dessa forma, é absolutamente legítima a criação de novo ente sindical representativo da categoria profissional mais específica em sua base territorial. Recurso de revista conhecido e provido. (TST, RR 204800-95.2009.5.08.0205, 4ª Turma, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Julgamento: 31.10.2012, DEJT 09.11.2012. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2012) DISSÍDIO COLETIVO – LEGITIMIDADE ATIVA – SINDICATO – DISSOCIAÇÃO – 1. Sindicato profissional que representa diversos segmentos de trabalhadores na indústria de alimentação. Superveniência de novo sindicato, representativo de um segmento dos trabalhadores do antigo sindicato (trabalhadores nas indústrias de beneficiamento de castanha de caju e amêndoas vegetais). 2. Se sobrevém novo sindicato, que logra obter registro sindical, sem impugnação, no Ministério do Trabalho, para representar categoria profissional mais específica (art. 8º, inciso II, da CF/1988) e, além disso, ultimamente vem celebrando convenções coletivas de trabalho com a categoria econômica, não há por que não lhe reconhecer, com exclusividade, a representatividade da categoria dissociada. 3. Recurso ordinário a que se nega provimento. (TST, RODC 179340-16.2002.5.07.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Rel. Min. João Oreste Dalazen, Julgamento: 10.03.2005, DJ 01.04.2005. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2005)
As decisões do TST parecem contemplar uma liberdade sindical “maior” do que aquela inicialmente preconizada na Constituição da República, pois enfraquecidas as amarras da unicidade, porém “menor” do que aquela prevista na Convenção nº 87 da OIT, pois, em vez de propiciar unidade de representação, igualdade entre os sujeitos coletivos e melhor capacidade negocial, acarreta a fragmentação da classe trabalhadora em prejuízo de seus interesses. O Supremo Tribunal Federal, em decisão recente de sua 1ª Turma, reconhece a mitigação do princípio da unicidade sindical (embora não admita pluralidade) por força da liberdade de as-
sociação (Constituição da República, art. 5º, XVII) e da liberdade sindical (Constituição da República, art. 8º), o que justificaria uma maior possibilidade de fracionamento da base de representação sindical, desde que respeitado o limite mínimo do município:
e impõe a sindicalização por categoria. Incólumes os arts. 8º, I, da Constituição Federal, 570 e 571, da CLT. Recurso de revista conhecido e não provido. (TST, RR 118700-51.2007.5.10.0012, 1ª Turma, Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa, Julgamento: 17.10.2012, DEJT 19.10.2012. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 29 maio 2013) (Brasil, 2012)
Quanto à matéria de fundo propriamente dita, atentem para a liberdade de associação prevista no inciso XVII do art. 5º da Constituição Federal. Sendo esta um grande todo, nota-se a mitigação do princípio da unicidade sindical. O art. 8º da Lei Maior revela livre associação profissional ou sindical e encerra a desnecessidade da autorização do Estado para a criação de sindicato, remetendo ao registro no órgão competente, vedada a interferência e a intervenção do Poder Público. A alusão a registro no órgão competente direciona àquele das pessoas jurídicas e, no acórdão proferido, ficou consignada a ocorrência. No inciso II do citado art. 8º, apenas há obstáculo ao surgimento do mesmo sindicato em área geográfica representada por município. Então, desde que o novo sindicato seja criado em município diverso, é possível placitá-lo. (Supremo Tribunal Federal, RE 291.822/RS, Rel. Min. Marco Aurélio. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 4 set. 2013) (Brasil, 2013)
Ora, o que se pretende da representação sindical em um contexto de liberdade é o fortalecimento da classe trabalhadora, que, em igualdade de condições negociais com o patrão, possa melhorar os contratos de emprego e a vida dos trabalhadores. Assim, a identidade entre os trabalhadores tende a ser potencializada quanto maior e mais representativa for a categoria, e não o contrário.
RECURSO DE REVISTA – DESMEMBRAMENTO DE SINDICATO – ENTIDADE PRÉ-EXISTENTE – PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL – INDEFERIMENTO DE REGISTRO – 1. O art. 8º, II, da Constituição Federal, ao manter o enquadramento sindical por categoria, profissional ou econômica, impôs condicionante à criação de sindicatos. 2. Consoante precedente do Supremo Tribunal Federal, a criação de sindicato por meio de desmembramento da entidade sindical preexistente terá de observar os requisitos impostos pela norma trabalhista (arts. 570 e 571, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho). 3. Assim, embora os trabalhadores interessados sejam livres para determinar a base territorial do sindicato, não poderão definir o enquadramento ou escolher a categoria a que pertencem, sobretudo tratando-se de servidores do Poder Judiciário. 4. Os oficiais de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte possuem identidade com os outros servidores públicos que se vinculam ao Poder Judiciário e possuem regime próprio em razão de suas atividades previstas em lei específica. 5. Nesse contexto, o órgão do Ministério do Trabalho e Emprego, ao indeferir o registro postulado pelo Sindicato dos Oficiais de Justiça do Rio Grande do Norte, observou o princípio da unicidade sindical (art. 8º, II, da Carta Magna), que impede a criação de mais de um sindicato na mesma base territorial
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO – DESMEMBRAMENTO DE SINDICATO – ENTIDADE PRÉ-EXISTENTE – MONOPÓLIO DA REPRESENTAÇÃO SINDICAL EM DETERMINADA BASE TERRITORIAL – PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL – POSSIBILIDADE DECISÃO – NORMAS DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO – 1. Acolhendo o princípio da não intervenção e não interferência estatal na organização sindical (CF, art. 8º, I), o legislador constituinte outorgou aos trabalhadores e empregadores interessados a capacidade para definir a base territorial da entidade que não poderá ser inferior à área de um Município, afastando a competência do Ministério do Trabalho para delimitá-la na forma prevista no art. 517, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho. 2. Unicidade sindical. A norma constitucional estabelece que é livre a associação profissional ou sindical, vedando à lei a exigência de autorização estatal para a instituição de sindicato, ressalvado o seu registro no órgão competente (Ministério do Trabalho) a quem cumpre zelar pela observância do princípio da unicidade sindical em atuação conjunta com os terceiros interessados (sindicatos), de conformidade com as disposições contidas nas Instruções Normativas nºs 5/1990 e 9/1990, que lhes facultam, no prazo nelas fixado, a impugnação do registro de fundação da entidade, competindo à Administração Pública anular o ato se julgada procedente a alegação. 3. Art. 571 c/c o art. 570, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho. Possibilidade de cisão do sindicato principal
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Em sentido contrário à tese majoritária recente decisão do TST:
A jurisprudência majoritária do STF parece privilegiar a especificidade ou especialização de categorias, ainda que fundamente seus julgados com base em liberdade sindical com unicidade:
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com o objetivo de constituir entidade sindical específica, desde que observados os requisitos impostos pela norma trabalhista. 3.1 Em face das disposições contidas nos incisos I e II do art. 8º da Constituição Federal não mais prevalecem as restrições previstas na CLT. 4. Criação de sindicato por meio de desmembramento da entidade sindical preexistente. Verificação da regular decisão tomada pelos trabalhadores e comprovação de que a base territorial da nova entidade não é inferior à área de um Município. Reexame de provas. Incidência da Súmula nº 279/STF. Agravo regimental não provido. (STF, RE 207910-AgRg/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Maurício Corrêa, Julgamento: 17.04.1998, Publicação: 26.06.1998. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: jun. 6 jun. 2013) (Brasil, 1998)
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RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO – INVIABILIDADE – Tratando-se de interposição de recurso extraordinário a partir de alegada ofensa à Carta Política da República, descabe cogitar do conhecimento e desprovimento. Verificada a transgressão, a hipótese sugere a ultrapassagem da preliminar e o provimento. Uma vez afastada, caminha-se, simplesmente, para a declaração de não-conhecimento. SINDICATO X ASSOCIAÇÃO – UNICIDADE – Não se há de confundir a liberdade de associação, prevista de forma geral no inciso XVII do rol das garantias constitucionais, com a criação, em si, de sindicato. O critério da especificidade direciona à observação do disposto no inciso II do art. 8º da Constituição Federal, no que agasalhada a unicidade sindical de forma mitigada, ou seja, considerada a área de atuação, nunca inferior à de um município. Superposição inconstitucional, considerados os sindicatos dos empregados em empresas de prestação de serviços, colocação e administração, de mão-de-obra, trabalho temporário, leitura de medidores e de entrega de avisos do Estado de São Paulo (primitivo) e o dos trabalhadores temporários e em serviços terceirizados do Estado de São Paulo. (STF, RE 207858/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, Julgamento: 27.10.1998, Publicação: 14.05.1999. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 6 jun. 2013) (Brasil, 1998) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO – SINDICATO – DESMEMBRAMENTO – ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL – IMPROCEDÊNCIA – 1. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não implica ofensa ao princípio da unidade sindical a criação de novo sindicato, por desdobramento de sindicato preexistente, desde que o território de ambos não se reduza a área inferior a de um município. 2. Agravo regimental desprovido. (STF, RE 573533-AgRg/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Ayres Britto,
Julgamento: 14.02.2012, Publicação: 19.03.2012. Disponível em: www. stf.jus.br. Acesso em: 6 jun. 2013) (Brasil, 2012) ORGANIZAÇÃO SINDICAL – LIBERDADE – BASE TERRITORIAL – Uma vez respeitada a unicidade quanto a certa base territorial, descabe impor exigências incompatíveis com a liberdade de associação. Óptica prevalecente, a uma só voz, considerado o voto do relator, lastreado no parecer da Procuradoria Geral da República. Redação do acórdão por vogal ante a aposentadoria do Relator, Ministro Carlos Velloso. (STF, RMS 21053/SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, Julgamento: 24.11.2010, Publicação: 24.03.2011. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 6 jun. 2013) (Brasil, 2010) I – Sindicato: unicidade e desmembramento. 1. O princípio da unicidade sindical (CF, art. 8º, II) não garante por si só ao sindicato a intangibilidade de sua base territorial: ao contrário, a jurisprudência do STF está consolidada no sentido da legitimidade constitucional do desmembramento territorial de um sindicato para constituir outro, por deliberação dos partícipes da fundação deste, desde que o território de ambos não se reduza a área inferior à de um município (v.g., MS 21.080, Rezek, DJ 01.10.1993; RE 191.231, Pertence, DJ 06.08.1999; RE 153.534; Velloso, DJ 11.06.1999; AgRg-RE 207.910, Maurício, DJ 04.12.1998; RE 207.780, Galvão, DJ 17.10.1997; RE 180222, Galvão, DJ 29.08.2000). 2. No caso, o Tribunal a quo assentou que não houve superposição sindical total, mas apenas um desmembramento que originou novas organizações sindicais regionais cuja área de atuação é menor do que a do agravante, o que não ofende a garantia constitucional da unicidade. II – Recurso extraordinário: descabimento: ausência de prequestionamento do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal: incidência das Súmulas nºs 282 e 356. (STF, RE 154250-AgRg/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Julgamento: 15.05.2007, Publicação: 08.06.2007. Disponível em: www. stf.jus.br. Acesso em: 6 jun. 2013) (Brasil, 2007)
A preocupação do STF parece ser preservar concomitantemente os princípios de liberdade sindical e unicidade na base territorial mínima de um município, o que acaba por possibilitar fragmentações da representação em um cenário de liberdade sem preocupação com igualdade negocial e com a preservação da força da maioria.
Em sentido oposto ao da corrente majoritária, recente decisão da 3ª Turma do TST, da lavra do Relator Ministro Maurício Godinho Delgado, paradigmática por afirmar o princípio da agregação em sentido contrário ao da especificidade para se fixar a representação e, principalmente, por se referir ao sindicato mais representativo: RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO SINDICATO-AUTOR SINTHORESP – RECURSO DE REVISTA – AÇÃO DECLARATÓRIA E DE COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL E ASSISTENCIAL – REPRESENTAÇÃO SINDICAL – INFERÊNCIA DO SINDICATO MAIS REPRESENTATIVO E LEGÍTIMO, AFIRMATIVO DA UNICIDADE CONSTITUCIONALMENTE DETERMINADA – PRINCÍPIO DA AGREGAÇÃO SINDICAL COMO DIRETRIZ REGENTE DESSA ANÁLISE – SINDICATO OBREIRO MAIS AMPLO, ABRANGENTE, FORTE E REPRESENTATIVO, USUALMENTE MAIS ANTIGO, EM DETRIMENTO DO SINDICATO MAIS RESTRITO E DELIMITADO, USUALMENTE MAIS RECENTE – AGREGAÇÃO SINDICAL PRESTIGIADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – 15 Há ainda controvérsia sobre a extensão da Assembleia de fundação de novo sindicato: se deve se restringir aos imediatamente impactados pelo novo ente ou se toda a categoria deve se reunir para decidir, parecendo ser majoritário o primeiro entendimento, ainda que equivocado, data maxima venia. 16 Poderia haver questionamentos sobre a vigência plena da liberdade sindical no Brasil, vista tal proliferação de sindicatos, como se pluralidade houvesse. Possível concluir, de antemão, negativamente: embora haja proliferação de sindicatos não se admite sua coexistência (concorrência) em uma mesma base de representação, bem como não há sua organização em estrutura de livre escolha da classe trabalhadora, vinculada que está às regras de agregação celetistas.
Decidindo o TRT o conflito intersindical com suporte no princípio civilista da especificidade, em contraponto ao princípio da agregação, deve ser reformada a decisão regional. Isso porque deve ser identificado como mais legítimo e representativo o sindicato com categoria profissional o sindicato obreiro mais amplo, com maior número de segmentos laborativos representados, além de mais antigo, que na hipótese é o SINTHORESP, de 1941, em contraponto ao SINDIFAST, de 2000, invocado pelo Regional. Esse entendimento ajusta a interpretação ao melhor e mais consistente sentido objetivado pelo Texto Máximo de 1988 (art. 8º, I, II e III, da CF). A diretriz da especialização pode ser útil para a análise de certos aspectos de outras relações jurídicas, sendo porém incompatível para a investigação da estrutura sindical mais legítima e representativa, apta a melhor realizar o critério da unicidade sindical determinado pela Constituição (art. 8º, I e II, da CF/1988) e concretizar a consistência representativa que tem de possuir os sindicatos (art. 8º, III e VI, da CF/1988). Para esta investigação sobre a legitimidade e representatividade dos sindicatos torna-se imprescindível, portanto, o manejo efetivo e proporcional do princípio da agregação, inerente ao Direito Coletivo do Trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (TST, RR 260400-74.2009.5.02.0074, 3ª Turma, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, Julgamento: 29.05.2013, DEJT 07.06.2013. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 7 jun. 2013) (Brasil, 2013)
A decisão citada é emblemática ao afirmar a liberdade sindical condicionada à ampliação da representação sindical, e não à sua fragmentação, além de consagrar no Direito Coletivo do Trabalho brasileiro o princípio da agregação, em oposição ao da especificidade, e a ideia de sindicato mais representativo. Percebe-se, em síntese, a preocupação do Poder Judiciário, compreensível, em preservar as estruturas sindicais consagradas no Brasil desde a Consolidação das Leis do Trabalho (1943), não obstante sejam perceptíveis as transformações sociais, econômicas, políticas e, principalmente, normativas (regras e princípios constitucionais) posteriores. A unicidade sindical serviu aos interesses do Estado brasileiro enquanto pretendeu controlar a classe trabalhadora no sistema corporativista, bem como favoreceu trabalhadores e empregadores em um momento posterior de tentativa de unidade de classes. Hoje, como
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Ora, se não cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego ou ao Poder Judiciário interferir na vontade da classe trabalhadora15 sobre sua organização coletiva, sobretudo no que concerne às cisões e aos desmembramentos, e se o critério da especialidade parece ser majoritário, então não há limites à criatividade humana para a formação de novos sindicatos no Brasil e consagrada está, portanto, a pluralidade sindical oblíqua16.
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visto, dada a especificidade ou especialização, e presente a pluralidade sindical oblíqua, a unicidade perde razão de ser a cada dia, pois não consegue unir a classe trabalhadora, que se fragmenta com respaldo do Ministério do Trabalho e Emprego, e impede a implementação de uma liberdade sindical mais efetiva, que consagre igualdade negocial, autonomia sindical e representação decente. Diante do exposto, é necessária uma releitura dos conceitos de agregação do trabalhador ao sindicato, vistas a pluralidade sindical oblíqua e a liberdade sindical que se espera possível no Brasil.
REFERÊNCIAS AROUCA, José Carlos. Organização sindical no Brasil: passado – presente – futuro(?). São Paulo: LTr, 2013. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: LTr, 2013. FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa. Organização sindical. In: FREDIANI, Yone; ZAINAGHI, Domingos Sávio. Relações de direito coletivo Brasil-Itália. São Paulo: LTr, 2004.
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GUIMARÃES, José Ribeiro Soares. Perfil do trabalho decente no Brasil: um olhar sobre as Unidades da Federação. Brasília: OIT, 2012.
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HORN, Carlos Henrique. A crescente atomização sindical no Brasil: continuidades e singularidades. In: HORN, Carlos Henrique; SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da (Org.). Ensaios sobre sindicatos e reforma sindical no Brasil. São Paulo: LTr, 2009. PAIXÃO, Cristiano. A Convenção nº 87 da OIT no Direito brasileiro: caminhos para sua vigência a partir da Constituição de 1988. Revista do TST, v. 78, n. 2, abr./jun. 2012.
Doutrina
Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis e Direitos a Eles Relativos: Competência e Principais Caracterizações Constitucionais e Legais MARCELO KOKKE
Procurador Federal da Advocacia-Geral da União, Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional – PUC-Rio, Pós-Graduado em Processo Constitucional, Professor da Faculdade de Direito Pitágoras.
(Spagnol, 2004, p. 48) referentes ao tributo em questão, principalmente, no que tange à hipótese de incidência, aos aspectos material, pessoal e temporal, e no que tange aos aspectos do mandamento, ao quantitativo, com consequente concentração sobre a base de cálculo e alíquota.
1 ITBI: CONFORMAÇÃO CONSTITUCIONAL O ITBI está elencado como tributo da espécie, imposto conferido em competência constitucional aos municípios, que hão de normatizá-lo tendo em conta a competência constitucional concorrente em matéria tributária, conforme estabelece o art. 24, inciso I, da Constituição da República. Neste sentido, cabe à norma complementar, nos termos do art. 146, inciso I, alínea a, da Constituição, estabelecer normas gerais quanto ao tributo, bem como definir seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes. A expressão da competência constitucional do ITBI presente está no art. 156, inciso II, da Constituição da República:
INTRODUÇÃO
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
O presente trabalho destina-se a abordar os principais elementos normativos e posicionamentos jurisprudenciais relacionados ao ITBI (Imposto sobre a transmissão inter vivos de bens imóveis e direitos a eles relativos). A abordagem concentra-se em uma acepção constitucional do imposto, assim como no posicionamento jurisprudencial presente no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, congregando assim diretriz analítica, focando sua concentração sobre as bases normativas relativas ao tributo.
[...]
A tomada do ITBI, em sua conformação normativa, e respectiva apreensão jurisdicional parte dos aspectos da norma tributária
II – transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; [...].
Em sequência, a Constituição estabelece balizas configuradoras para exercício da competência constitucional atribuída aos municípios, donde o ITBI encontra-se delimitado em sua conformação de legitimidade aos seguintes pilares, postos no art. 156, § 2º:
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] § 2º O imposto previsto no inciso II: I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil; II – compete ao Município da situação do bem.
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A norma constitucional traça, conjuntamente, os caracteres de incidência e não incidência qualificada do ITBI, definindo igualmente a competência constitucional de seu exercício e legitimidade. A base constitucional firmada guiará a interpretação normativa, exaltando-se aqui o princípio da supremacia constitucional, donde a legislação infra-constitucional adquire significado hermenêutico a partir da própria norma constitucional. Neste teor, as disposições contidas nas leis complementares que tratem do ITBI hão de levar em conta a própria base constitucional em seu significado, abrangendo de relevância a tomada das disposições presentes no CTN quanto à matéria.
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O primeiro ponto de significância constitucional é que o ITBI é um imposto de transmissão inter vivos, fator maior de distinção em relação ao ITCMD, que compete aos Estados e tem seu fato gerador adstrito à transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos, art. 155, inciso I, Constituição. As relações jurídicas que determinam a incidência do ITBI são assim passadas em transferências patrimoniais inter vivos, mas não quaisquer transferências, restringindo-se àquelas que tenham como objeto a transmissão de bens imóveis. A transmissão do bem imóvel passível de incidência de ITBI é aquela ocorrida em relação jurídica onerosa, excluindo-se aqui as transmissões
gratuitas de bens, sendo, desta forma, imprescindível que a relação jurídica derive em ônus recíprocos para ambas as partes contratantes, sem que seja necessária a equivalência entre as contraprestações (Nader, 2005, p. 45-46). A configuração de incidência do ITBI refere-se a bens imóveis, tanto por natureza quanto por acessão física. A acessão é definida no Código Civil como forma de aquisição de propriedade, art. 1.248, destacando Venosa que “nosso regulamento regulou a acessão como modalidade de aquisição da propriedade em cinco espécies: formação de ilhas, aluvião, avulsão, abandono de álveo e construções e plantações em terreno alheio” (2003, p. 270). Igualmente, a transmissão de direitos reais sobre imóveis é objeto de incidência de ITBI, incluindo aqui a cessão de direitos a sua aquisição, não obstante excluída esteja a possibilidade de incidência sobre direitos reais de garantia, abrangendo a não incidência, segundo José Eduardo Soares de Melo (2007, p. 467), as servidões. O Código Civil explicita os direitos reais: Art. 1.225. São direitos reais: I – a propriedade; II – a superfície; III – as servidões; IV – o usufruto; V – o uso; VI – a habitação; VII – o direito do promitente comprador do imóvel; VIII – o penhor; IX – a hipoteca; X – a anticrese.
XI – a concessão de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
é expressa pelo próprio CTN, em sua função constitucional de lei geral complementar:
XII – a concessão de direito real de uso. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição.
Tendo em conta a base de incidência do ITBI, estabelecida constitucionalmente, a própria diretriz da Carta dispõe que o tributo em questão é pertencente ao município em que se situe o bem, cujas relações de direito real a ele se refiram. Estabelece, ainda, a Constituição, hipótese de não incidência qualificada, de imunidade, que exclui a competência de incidência do ITBI quando em questão a formação patrimonial de pessoas jurídicas, assim como as hipóteses de transformação empresarial: não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. A configuração de atividade preponderante para fins de configuração da imunidade
§ 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo. § 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição. § 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data. § 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante.
Apresenta-se ainda, como imunidade tributária, a previsão constitucional constante do art. 184, § 5º, segundo a qual não incidem impostos municipais nas operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. Sob a luz constitucional, a disciplina geral do ITBI está presente no CTN, cuja redação há que ser tomada sob os pilares da própria Constituição, destacando-se a competência dos municípios para o imposto, cujos fatos geradores são delineados no art. 35 da norma complementar:
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Ao teor do comando constitucional, excluem-se os direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese. Advém da regra-matriz tributária do ITBI, a inafastável necessidade de uma transmissão do bem ou do direito real que seja fruto de uma interação de partes derivada de convenção entre as partes, determinação legal ou mesmo judicial, como no caso de arrematação, mas em todos os casos, apresentando-se um vínculo de ação ou vontade entre o cedente e cessionário. Destarte, não se configura como transmissão de propriedade para fins de incidência de ITBI a desapropriação ou mesmo o usucapião.
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Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:
atrelada ao valor da arrematação e não ao valor da avaliação judicial do imóvel:
I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;
TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE TRANSMISSÃO INTER VIVOS – BASE DE CÁLCULO – VALOR VENAL DO BEM – VALOR DA AVALIAÇÃO JUDICIAL – VALOR DA ARREMATAÇÃO
II – a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia;
I – O fato gerador do ITBI só se aperfeiçoa com o registro da transmissão do bem imóvel. Precedentes: AgRg-Ag 448.245/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 09.12.2002, REsp 253.364/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 16.04.2001 e RMS 10.650/DF, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ 04.09.2000. Além disso, já se decidiu no âmbito desta Corte que o cálculo daquele imposto ‘há de ser feito com base no valor alcançado pelos bens na arrematação, e não pelo valor da avaliação judicial’ (REsp 2.525/PR, Rel. Min. Armando Rolemberg, DJ 25.06.1990, p. 6027). Tendo em vista que a arrematação corresponde à aquisição do bem vendido judicialmente, é de se considerar como valor venal do imóvel aquele atingido em hasta pública. Este, portanto, é o que deve servir de base de cálculo do ITBI. II – Recurso especial provido. (STJ, REsp 863893/PR, 2006/0141866-4, 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 17.10.2006, Data da Publicação/Fonte: DJ 07.11.2006, p. 277)
III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II.
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O CTN refere-se ainda à base de cálculo e aos contribuintes do imposto, disciplinando que estes podem ser quaisquer das partes da operação tributada, nos termos do art. 42, e expressando que a base de cálculo é o valor venal do bem objeto da relação posta em fato gerador. Não obstante a caracterização do valor venal do imóvel como base de cálculo, destacável a posição doutrinária e mesmo jurisprudencial que resguarda a diferença de valores entre a avaliação da municipalidade e o valor da transação negocial do bem, impedindo uma superavaliação do valor do bem e assim da base de cálculo. Destaca José Eduardo Soares de Melo:
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A circunstância de a Municipalidade estipular um valor para o imóvel (embasado nos preços correntes das transações e das ofertas no mercado imobiliário, face às características do bem e da região em que se situa), não pode significar que referido valor deve ser obrigatoriamente utilizado para cálculo do ITBI. Não se pode ignorar que, apesar de se encontrarem adstritas ao bem imóvel, trata-se de situações distintas (propriedade e alienação), razão pela qual a base imponível deve refletir superiores princípios da capacidade contributiva e da vedação de confisco. (Melo, 2004, p. 246)
O valor da base de cálculo está assim afeto ao inerente conteúdo da relação negocial, donde concluiu o STJ que, mesmo em casos de arrematação judicial, a base de cálculo do ITBI está
A fixação da base de cálculo por meio da análise negocial da relação jurídica que se configura como fato gerador não impede, no entanto, a Fazenda Pública de interpelar as partes do real conteúdo da mesma, desconsiderando as bases estatuídas, sob a dinâmica do devido processo legal, e procedendo, a partir daí, ao lançamento por arbitramento, nas situações dispostas no art. 148 do CTN, ou seja, quando sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado. Neste sentido, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: TRIBUTÁRIO – ITBI – BASE DE CÁLCULO –POSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO PELO FISCO – 1. Constituindo o valor venal do bem transmitido a base de cálculo do ITBI, caso a importância declarada pelo contribuinte se mostre nitidamente inferior ao valor de mercado, pode o Fisco arbitrar a base de cálculo do referido imposto, desde que atendida a determinação do art. 148, do CTN. 2. Recurso parcialmen-
O caráter de incidência do fato gerador está ainda imanente ao efetivar da transmissão de propriedade do bem ou transmissão do direito real, posto em relação negocial onerosa. Neste teor, o fato gerador concretiza-se com a transmissão efetiva via registro da propriedade do bem, e não com relações negociais prévias, como promessas de compra e venda, ou seja, concretiza-se o fato gerador somente com a transferência do bem junto ao cartório imobiliário, a partir de quando é devido o ITBI, não se admitindo a antecipação jurídica presumida do fato gerador, prevista no art. 150, § 7º, CR, tendo em conta antagonismo com o próprio aspecto material fixado a partir da Constituição, segundo o qual a base de transmissão da propriedade imóvel é o registro e não o ato negocial que lhe precede. Assim, não obstante posições diversas, como destaca Daniela de Andrade Braghetta (2005, p. 1130), o ITBI tem seu momento de conformação, devido a partir do registro imobiliário que procede à transferência de propriedade. É, neste sentido, que transita a Jurisprudência do STJ: PROCESSUAL CIVIL – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – INOCORRÊNCIA – (TRIBUTÁRIO – ITBI – DIFERENCIAÇÃO DE ALÍQUOTAS E PROGRESSIVIDADE – FATO GERADOR – PROMESSA DE COMPRA E VENDA RESCINDIDA). 1. O fato gerador do ITBI é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel motivo pelo qual não incide referida exação sobre o registro imobiliário de escritura de resilição de promessa de compra e venda, contrato preliminar que poderá ou não se concretizar em contrato definitivo. 2. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 3 Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg-AgRg-REsp 764808, 2005/0110886-6, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJ 15.03.2007, Data da Publicação/Fonte: DJ 12.04.2007, p. 217)
O Supremo Tribunal Federal veio a posicionar-se no mesmo sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO DO BRASIL – CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – NÃO INCIDÊNCIA DO ITBI – 1. Controvérsia decidida à luz de normas infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição do Brasil. 2. A celebração de contrato de compromisso de compra e venda não gera obrigação ao pagamento do ITBI. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF, AI-AgR 603309/MG, 2ª T., Rel. Min. Eros Grau, J. 18.12.2006, Publicação: DJ 23.02.2007, p. 00030, Ement. v. 0226508, p. 01552. Partes: Agte.: Município de Belo Horizonte; Adv.: Cristiano Reis Juliani e outro(a/s); Agdo(a/s).: Alyne de Matteo Vaz e outro(a/s); Adv(a/s).: Renata Faria Silva Lima)
A disciplina normativa do ITBI confronta igualmente a relação do princípio da capacidade contributiva para com a progressividade de alíquotas. A progressividade é concebida como o crescente evoluir das alíquotas em função da crescente e proporcional elevação da base de cálculo do tributo. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal veio a consolidar que a relação entre capacidade contributiva e alíquota somente é envolvida com a progressividade nas hipóteses expressamente permitidas pela Constituição da República, ao que a ausência de previsão normativa constitucional quanto à progressividade de determinado tributo desemboca na impossibilidade da mesma, mantendo-se a relação entre tributação e capacidade contributiva apenas no plano crescente do montante final, resultado da incidência da alíquota não progressiva sobre a base de cálculo crescente. Sob este teor, o STF consolidou a impossibilidade de norma municipal, estabelecendo progressividade de alíquotas em relação ao ITBI: “É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel” (Súmula nº 656).
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te conhecido e, nesta parte, improvido. (STJ, REsp 261166/SP, REsp 2000/0053436-6, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ 12.09.2000, Data da Publicação/Fonte: DJ 06.11.2000, p. 192. JBCC, v. 186, p. 87; RDDT, v. 65, p. 181; RSTJ, v. 141, p. 126)
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Destarte, a alíquota do ITBI não pode variar, sendo que, no caso de legislação sobrevir e dispor quanto a alíquotas progressivas, o reconhecimento de inconstitucionalidade derivará a aplicação das alíquotas previstas anteriormente àquela. Ou seja, o reconhecimento da inconstitucionalidade restaura a força impositiva da legislação anterior:
a) o aspecto material do ITBI encontra-se lastreado na necessidade de uma transmissão do bem ou do direito real, com efetivo registro imobiliário;
ITBI – PROGRESSIVIDADE – LEI Nº 11.154/1991 DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO – INCONSTITUCIONALIDADE – A inconstitucionalidade, reconhecida pelo STF (RE 234.105), do sistema de alíquotas progressivas do ITBI do Município de São Paulo (Lei nº 11.154/1991, art. 10, II), atinge esse sistema como um todo, devendo o imposto ser calculado, não pela menor das alíquotas progressivas, mas na forma da legislação anterior, cuja eficácia, em relação às partes, se restabelece com o trânsito em julgado da decisão proferida neste feito. (STF, RE 259339/SP, 1ª T., Rel. Min. Sepúlveda Pertence, J. 09.05.2000, Publicação: DJ 16.06.2000, p. 00040, Ementa v. 01995-05, p. 00981. Partes: Recte.: José Maurício Bicalho Dias; Advdos.: Rodolfo Funcia Simões e outros; Recdo.: Município de São Paulo; Advdo.: Walter Angelo Di Pietro)
c) o aspecto quantitativo, no que tange à base de cálculo, é marcado pelo valor venal do bem posto em suporte ao fato que deriva o aspecto material: o valor da base de cálculo está assim afeto ao inerente conteúdo da relação negocial;
b) o aspecto material é delimitado constitucionalmente e em comunhão com o Código Tributário Nacional;
d) não se admite a progressividade de alíquotas em relação ao ITBI.
REFERÊNCIAS
Por fim, conjugando momento temporal do fato gerador, aspecto material, alíquota e base de cálculo, tem-se que reconhecida a inconstitucionalidade da norma referente à progressividade de alíquotas; o fato gerador deve ser considerado a partir do registro da transferência do bem, pela alíquota prevista na legislação anterior, já que normatizações inconstitucionais não podem impedir a produção de efeitos de normas forjadas sob os ditames constitucionais.
BRAGHETTA, Daniela de Andrade. ITBI e ITCMD: estudo das regras-matrizes de incidência. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
CONCLUSÃO
SPAGNOL, Werther Botelho. Curso de direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
A partir dos apontamentos e diretrizes performáticas estabelecidas ao presente trabalho, tem-se como conclusão os seguintes pontos basilares:
MELO, José Eduardo de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2007. NADER, Paulo. Curso de direito civil: contratos. Rio de Janeiro: Forense, v. 3, 2005.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Código civil comentado: direito das coisas, posse, direitos reais, propriedade. In: AZEVEDO, Álvaro Villaça (Coord.). São Paulo: Atlas, v. XII, 2003.
Doutrina
Parecer – INSS – Desoneração da Folha – Telecobrança ROBERTO MOREIRA DIAS
Advogado, Contabilista, Especialista em Direito Tributário pelo IBET-IBDT (USP) e Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Impostos pela Faculdade Trevisan.
E informa que objetivando a redução de seus riscos, já está segregando na sua escrituração contábil e fiscal as receitas de i) telecobrança e ii) cobrança presencial, emitindo, inclusive, notas fiscais de serviços referente a cada atividade que desenvolve; além de estar pagando duas contribuições: uma via GPS (Guia da Previdência Social – código 2100) e outra via Darf (Documento de Arrecadação de Receitas Federais – código 2985). Posto isto, a Consulente deseja saber se a atividade de telecobrança enquadrar-se-ia na sistemática de recolhimento da contribuição previdenciária patronal sobre a receita bruta, à alíquota de 2% (dois por cento), em substituição à contribuição previdenciária de 20% (vinte por cento) sobre a folha de salários, sendo destacado que as Contribuições a Terceiros não sofreram qualquer modificação. Ou seja, se está agindo de acordo com a legislação vigente, ao segregar essas receitas e recolher dois tributos e não um, previsto no art. 22, I, da Lei nº 8.212/91.
CONSULTA TRIBUTÁRIA
PARECER
A empresa Consulente, por intermédio do seu ilustre Advogado [...], honra-nos sobre a seguinte consulta:
A Consulente pretende saber, em síntese, se a atividade de telecobrança que exerce está sujeita à desoneração da folha de salários, nos termos do art. 7º da Lei nº 12.546/2011 (com alterações sofridas pela Lei nº 13.043/2014).
Para o exercício de suas atividades, a Consulente enquadra-se na condição de sujeito passivo de contribuições previdenciárias, as quais sofreram diversas alterações desde a entrada em vigor da Lei nº 12.546/2011, com a então chamada “desoneração da folha de salários”. Narra que sua prestação de serviços consiste em: i) telecobrança e ii) cobrança presencial. E apresenta, conforme solicitado, fotos do estabelecimento da sua matriz, através das quais fica caracterizada a presença de diversas unidades de Pontos de Atendimento (PAs), utilizados pelos seus colaboradores para telecobrança ativa e passiva em favor dos seus clientes. Envia-nos, ademais, a minuta de seu contrato de prestação de serviços, do qual consta que recebidos os documentos dos seus clientes, “iniciará de imediato os procedimentos de recuperação do crédito através de notificação extrajudicial, telecobrança e cobrança presencial, em qualquer parte do País, visando o rápido retorno dos créditos”. Sendo que tais atividades constam expressamente do objeto do contrato social da Consulente.
Iniciaremos a nossa análise sobre o conceito de call center, com objetivo de demonstrar que o exercício de atividade de telecobrança exercido pela Consulente está englobado por aquele instituto. Após, teceremos considerações sobre os procedimentos a serem adotados pela Consulente, eis que deverá segregar as receitas de telecobrança daquelas de cobrança presencial, para, respeitada certa proporcionalidade, recolher dois tributos: um de 2% (dois) sobre a receita bruta referente à telecobrança; outro de 20% (vinte por cento) sobre a folha de salários, no que tange à cobrança presencial.
1 CONCEITO DE CALL CENTER: TELECOBRANÇA É UMA DAS HIPÓTESES DESSA ATIVIDADE NO CASO DA CONSULENTE Resta agora conceituar prestação de serviço de call center, já que essa hipótese não está expressamente prevista na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003. Na inexistência de definição legal (mesmo se houvesse, poderia ser falaciosa – estabelecer a forma, mas não a substância dessa atividade econômica), buscamos no mundo dos negócios esse conceito. A Gazeta Mercantil1, em estudo sobre o setor de serviços de call center, apresentou a seguinte definição: Call centers, ou centrais de atendimento, são centrais telefônicas de empresas ou instituições estabelecidas com o propósito de oferecer algum tipo de serviço para seus clientes, usuários, associados, filiados, enfim, para o “público externo”.
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Nesse sentido, diferencia-se de outra central telefônica, também presente em empresas ou instituições, a central privada de comunicação (PBX), que simplesmente concentra as chamadas recebidas do exterior, distribuindo-as para ramais, e permite chamadas telefônicas internas sem passar pela rede de telefonia pública, ou seja, é voltada para o “público interno”.
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[...] A operação de um call center pode ser montada para trabalho receptivo (resposta a chamada atendida) ou ativo (chamada que se antecipa ao contato do consumidor ou cliente). Um mesmo operador pode desenvolver tanto operações receptivas quanto ativas. [...] 1 Análise Setorial: Call Centers. Estrutura e Mercado. São Paulo: Panorama Setorial, v. I, abr. 2002, p. 7.
A utilização mais conhecida do call center é o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), mas ele pode realizar diversos outros serviços, tais como prospecção e clientes e negócios, pesquisa de satisfação de clientes, telemarketing, venda de produtos e serviços, serviços 0900, escritório virtual (fax, secretária eletrônica, correio eletrônico) e busca de fidelização do cliente (veja detalhes sobre os serviços na página 115).
Dessa definição desde logo já podemos mencionar que, para a prestação de serviços de call center, a presença do elemento humano é indispensável, já que aquela ocorre quando “o atendente recebe uma ligação telefônica (serviço receptivo) ou quando efetua a ligação (serviço ativo) para um cliente ou usuário”2. E que tem relação com a atividade do tomador, tais como marketing, venda e atendimento pós-venda, telecobrança, além de incluir assistência técnica via telefone, esclarecimento de dúvida e recepção de reclamação. E de permitir “ainda a realização de tarefas de interesse da empresa, tais como pesquisa de mercado, tentativa de retenção de clientes, campanhas publicitárias, apoio a vendedores externos, cobrança, atualização de cadastros de consumidores, verificação de crédito e captação de fundos”3 (g. n.). O call center representa uma prestação de serviço, porque se resume em um fazer para outrem, mediante remuneração redutível à moeda, com a presença de um elemento humano, por meio do qual são concretizadas chamadas telefônicas, personalizadas, ativas e/ou passivas, refletidas em obrigações várias, inclusive a de telecobrança. Essa obrigação de fazer poderá ser cumprida com ou sem o auxílio de meios físicos, que poderão representar algumas utilidades (meio) para o serviço-fim que é o call center. 2 Idem, p. 115. 3 Idem, ibidem.
Em suma a interpretação teleológica e axiológica ativa a participação do intérprete na configuração do sentido. Seu movimento interpretativo, inversamente ao da interpretação sistemática que também postula uma cabal e coerente unidade do sistema, parte das conseqüências avaliadas das normas e retorna para o interior do sistema. É como se o intérprete tentasse fazer com que o legislador fosse capaz de mover suas próprias previsões, pois as decisões dos conflitos parecem basear-se nas previsões de suas próprias conseqüências. Assim, entende-se que, não importa a norma, ela há de ter, para o hermeneuta, sempre um objetivo que serve para controlar até as conseqüências da previsão legal (a lei sempre visa aos fins sociais do direito e às exigências do bem comum, ainda que, de fato, possa parecer que eles não estejam sendo atendidos). (grifos no original)
Até o presente momento, analisamos o conceito de call center sob a ótica do direito tributário. Sobre os olhos da Justiça do Trabalho, o Juiz do TRT da 1ª Região, Doutor Alexandre Agra Belmonte5, foi categórico: Os call centers ou centros de atendimento visam a estabelecer um canal direto de comunicação entre cliente e empresa, por meio de interface telefônico-informática. [...] Atualmente predomina a utilização terceirizada, mas voltada também, entre outras finalidades, para a divulgação e venda de produtos e serviços, agendamento de serviços, cancelamento de contratos, atendimento de reclamações, comunicação de extravio e roubo de cartões de crédito, formação de cadastro e atendimento de consultas sobre carteira de pedidos, faturamento, crédito e títulos, histórico de compras e disponibilidade de estoque, etc. [...]
4 Introdução ao estudo do direito – Técnica, decisão, dominação. São Paulo: Atlas, 2001, p. 289. 5 Revista TST, Brasília, v. 75, n. 4, out./dez. 2009, p. 25-41.
Há vedação à terceirização da atividade-fim, na qual estão compreendidos os serviços especializados, assim entendidos os principais ou existenciais, porque a extensão aos serviços especializados corresponderia a uma prestação deslocada ou à distância de atividades das empresas tomadoras Enfim, às empresas de call center é vedado desenvolver o objeto social da empresa que lhe contrata serviços. [...] No Brasil, segundo o Código Brasileiro de Ocupações, operador de telemarketing é aquele que atende usuários, oferece serviços e produtos, presta serviços técnicos especializados, realiza pesquisas, faz serviços de cobrança e cadastramento de clientes, sempre via teleatendimento. (g. n.)
O que se expõe ratifica o raciocínio de que os clientes da Consulente não realizam serviços de telecobrança, pois não são suas atividades-fim. Dessa feita, terceirizam esses serviços, valendo-se da estrutura que a Consulente tem de call center para realizar essa telecobrança. É de nosso conhecimento a posição adotada pela Receita Federal do Brasil em definir que atividade cobrança não se confunde com atividade de call center (no qual inclui-se o serviço de telecobrança praticado pela Consulente). Vejamos a Solução de Consulta Disit/SRRF01 nº 16, de 10 de abril de 2013: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE RECEIRA BRUA (CRPB) − COBRANÇA − CALL CENTER − A atividade de cobrança não se confunde com atividade de call center, e não está abrangida pela substituição previdenciária instituída pela Lei nº 12.546, de 2011.
Contudo, entendemos que essa resposta da Receita Federal atinge parte da atividade da Consulente, qual seja: a cobrança presencial. Já a telecobrança, após análise do contrato social da Consulente, do ambiente de trabalho do seu estabelecimento matriz, dos contratos de prestação de serviços, dos seus livros contábeis e documentos fiscais (incluindo-se notas fiscais) nas
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Estaríamos fortes, para elaboração dessa interpretação teleológica, nos dizeres do Professor Tercio Sampaio Ferraz Jr.4:
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quais constam a atividade de call center (telecobrança), não estaria atingida por essa análise do Disit/SRRF01 nº 16/2013. Por fim, neste tópico, é de se ressaltar que, ao realizarmos pesquisa de qual seria a Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE) para a atividade de telecobrança, ela mesma veio negativa6. Ou seja, não há uma CNAE específica para telecobrança.
2 DA VIGÊNCIA DA DESONERAÇÃO DA FOLHA DE SALÁRIOS PARA ATIVIDADE DE TELECOBRANÇA (CALL CENTER) DESENVOLVIDA PELA CONSULENTE Está previsto no art. 7º, I, da Lei nº 12.546/2011 (alterada recentemente pela Lei nº 13.043/2014)7 que:
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[...] § 4o Para efeito do caput deste artigo, consideram-se serviços de TI e TIC: I – análise e desenvolvimento de sistemas; II – programação; III – processamento de dados e congêneres; IV – elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos;
Art. 7º Contribuirão sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, à alíquota de 2% (dois por cento):
V – licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação;
I – as empresas que prestam os serviços referidos nos §§ 4º e 5º do art. 14 da Lei nº 11.774, de 17 de setembro de 2008; (g. n.)
VII – suporte técnico em informática, inclusive instalação, configuração e manutenção de programas de computação e bancos de dados, bem como serviços de suporte técnico em equipamentos de informática em geral; e
Já do art. 14, §§ 4º e 5º, da Lei nº 11.774/2008, consta, verbis:
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Art. 14. As alíquotas de que tratam os incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, em relação às empresas que prestam serviços de tecnologia da informação – TI e de tecnologia da informação e comunicação – TIC, ficam reduzidas pela subtração de 1/10 (um décimo) do percentual correspondente à razão entre a receita bruta de venda de serviços para o mercado externo e a receita bruta total de vendas de bens e serviços, após a exclusão dos impostos e contribuições incidentes sobre a venda, observado o disposto neste artigo.
VI – assessoria e consultoria em informática;
VIII – planejamento, confecção, manutenção e atualização de páginas eletrônicas. 6 Disponível em: <http://www.cnae.ibge.gov.br>. 7 Antes de finalizarmos este parecer, fomos surpreendidos com a publicação da Medida Provisória nº 669, de 26 de fevereiro de 2015, a qual veio a aumentar a alíquota da desoneração da folha de pagamento para empresas de call center de 2% para 4,5%, a partir de junho do exercício corrente nos seguintes termos: “Art. 7º Poderão contribuir sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, à alíquota de 4,5% (quatro inteiros e cinco décimos por cento)” (g.n.).
§ 5º O disposto neste artigo aplica-se também a empresas que prestam serviços de call center e àquelas que exercem atividades de concepção, desenvolvimento ou projeto de circuitos integrados. (g. n.)
Da leitura dos veículos normativos citados resta óbvio e ululante que as empresas que prestam serviços de call center – o que é o caso da Consulente no desenvolvimento de uma de suas atividades (telecobrança) – estão sujeitas à desoneração da folha de salários, representada pela incidência de outra contribuição
E essa contribuição sobre a receita bruta, que estaria extinta em 31 de dezembro de 2014, teve a sua incidência prorrogada pela Lei nº 13.043/2014 para a partir de 1º de janeiro de 2015, sem o estabelecimento de qualquer prazo de vigência. Em eventual consulta sobre o tema à Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB), o que recomendamos seja feita, ad cautelam, a resposta pode vir no sentido de que a desoneração da folha de salários não atingiria a atividade de call center da Consulente na telecobrança que realiza. Contudo, temos para nós que se esse for o raciocínio da SRFB, a mesma estará equiparando a Consulente a uma sociedade de advogados, o que feriria de morte o previsto no Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994), sobremodo o art. 1º, incisos I e II: Art. 1º São atividades privativas de advocacia: I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais; II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.
Inferimos desse preceito normativo que somente escritórios de advocacia podem exercer telecobrança, via assessoria jurídica, sem estar na qualidade de empresa que tem a atividade de call center como um dos seus objetivos sociais. Em outras palavras, a atividade empresarial organizada de call center, quando praticada para cobrança de créditos de clientes, via integração telefone-computador – o que ficou demonstrado pela Consulente – será uma telecobrança via utilização de call center, repita-se! E a Classificação Nacional de Atividade Econômica a ser adotada, smj, pela Consulente, para esse serviço, será a 8220-2-00.
3 OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS E CÁLCULO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DEVIDAS PELA CONSULENTE Nos termos da Resolução Concla nº 1/2008, o objetivo social principal de uma empresa “é a atividade de produção de bens ou serviços, destinada a terceiros, que traz maior contribuição para a geração do valor adicionado da unidade de produção; como prática geral, toma-se a receita operacional da atividade como aproximação do conceito de valor adicionado”. Consta dessa mesma Resolução que a atividade secundária é aquela exercida para produção de bens ou serviços, destinada a terceiros, exercidas na mesma atividade de produção, além da atividade principal. Dessa feita, considerando-se a análise feita do contrato social da Consulente, do ambiente de trabalho do seu estabelecimento matriz, dos contratos de prestação de serviços, dos seus livros contábeis e documentos fiscais (incluindo-se notas fiscais) nos quais constam a atividade de call center (telecobrança), a nossa recomendação é que a CNAE (Classificação Nacional de Atividade Econômica) principal adotada pela Consulente, qual seja, o 8291-1-00 (“Atividades de cobrança e informações cadastrais”), passe a ser secundário. E que a Consulente lance como CNAE principal o 8220-2-00 (“Serviço de call center”). Outrossim, que continue a recolher duas contribuições previdenciárias, respeitas as regras da proporcionalidade estabelecidas no art. 6º do Decreto nº 7.828/20128. 8 “Art. 6º No caso de empresas que se dediquem a outras atividades, além das previstas nos arts. 2º e 3º, até 31 de dezembro de 2014, o cálculo da contribuição obedecerá: I – ao disposto nos arts. 2º e 3º, em relação às receitas referidas nesses artigos; e II – quanto à parcela da receita bruta relativa a atividades cuja contribuição não se sujeita às substituições
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previdenciária: 2% (dois por cento) da receita bruta atrelada a essa atividade.
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Por derradeiro, destacamos que a Consulente poderá, nos termos do art. 1º da Medida Provisória nº 669/2015, optar pela desoneração da folha ou pelo pagamento de sua contribuição previdenciária referente à atividade de call center (telecobrança) com arrimo no art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991, anualmente, valendo, para tanto, a quitação da primeira guia: Darf ou GPS. Lembrando que o regime adotado valerá para todo ano-calendário. No nosso sentir, foi criada mais uma hipótese de planejamento tributário que decorre de previsão legal, tal como ocorre, e.g., nos casos de opção pelo lucro real, presumido etc., para fins de IRPJ, CSL, Cofins e Contribuição ao PIS.
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Este é o nosso parecer, salvo melhor juízo.
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previstas nos arts. 2º e 3º, ao disposto no art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, reduzindo-se o valor das contribuições referidas nos incisos I e III do caput do mencionado art. 22 ao percentual resultante da razão entre a receita bruta de atividades não relacionadas aos serviços de que trata o caput do art. 2º ou à fabricação dos produtos de que trata o caput do art. 3º e a receita bruta total. § 1º Nos meses em que não auferirem receita relativa às atividades previstas nos arts. 2º e 3º, as empresas a que se refere o caput deverão recolher as contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, sobre a totalidade da folha de pagamentos, não sendo aplicada a proporcionalização de que trata o inciso II do caput. § 2º Nos meses em que não auferirem receita relativa a atividades não abrangidas pelos arts. 2º e 3º, as empresas deverão recolher a contribuição neles prevista, não sendo aplicada a proporcionalização de que trata o inciso II do caput. § 3º O disposto neste artigo aplica-se às empresas que se dediquem a outras atividades, além das previstas nos arts. 2º e 3º, somente se a receita bruta decorrente dessas outras atividades for superior a cinco por cento da receita bruta total. § 4º Não ultrapassado o limite previsto no § 3º, as contribuições a que se referem os arts. 2º e 3º serão calculadas sobre a receita bruta total auferida no mês.”
Acórdão na Íntegra
Supremo Tribunal Federal Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 898.716/Paraná 29.09.2015 Primeira Turma Relatora: Ministra Rosa Weber Agte.: Petróleo Brasileiro S/A Petrobras Advs.: Candido Ferreira da Cunha Lobo e outro(a/s) Agdo.: Ministério Público Federal Proc.: Procurador-Geral da República Intdo.: Instituto Ambiental do Paraná – IAP Intdo.: Estado do Paraná Proc.: Procurador-Geral do Estado do Paraná EMENTA DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – RESPONSABILIDADE POR DANO AO MEIO AMBIENTE – VAZAMENTO DE ÓLEO DO OLEODUTO DA REPAR QUE ATINGIU O RIO IGUAÇU – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL FIRMADA NO ACÓRDÃO DE ORIGEM – REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA – PROCEDIMENTO VEDADO NA INSTÂNCIA EXTRAORDINÁRIA – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – NULIDADE – INOCORRÊNCIA – RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL – ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA – DEVIDO PROCESSO LEGAL – NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL
DA CONTROVÉRSIA – SÚMULAS Nºs 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 13.04.2010 1. Inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes. 2. Obstada a análise da suposta afronta aos incisos LIV e LV do art. 5º da Carta Magna, porquanto dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, procedimento que refoge à competência jurisdicional extraordinária desta Corte Suprema, a teor do art. 102 da Magna Carta. 3. Cristalizada a jurisprudência desta Suprema Corte, a teor das Súmulas nºs 282 e 356/STF: “Inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”, bem como “o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”. 4. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região firmou ser da Justiça Federal a competência para analisar as questões quanto ao acidente de trabalho provocador do dano ambiental de grande dimensão – vazamento de 4 milhões de óleo do oleoduto da Repar (Refinaria Presidente Getúlio Vargas), que atingiu o Rio Iguaçu – e quanto à proteção ao meio ambiente do trabalho, “pois não há como dissociar o acidente do seu entorno, ou seja, as matérias estão entrelaçadas e devem ser decididas conjuntamente. O objetivo da ação civil pública é maior, que é o de alcançar, com a compatibilização do meio ambiente de trabalho, meios eficazes para prevenir novos danos ao meio ambiente e, diante deste contexto, não há como cindir o processo. Não se trata, portanto, de analisar questões meramente trabalhistas, da seara do direito do trabalho”. Divergir desse entendimento exigiria o revolvimento do
quadro fático delineado no acórdão de origem, procedimento vedado em sede extraordinária. 5. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 6. Agravo regimental conhecido e não provido.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Relatora. Não participou, justificadamente, deste julgamento o Senhor Ministro Marco Aurélio. Brasília, 29 de setembro de 2015. Ministra Rosa Weber Relatora
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RELATÓRIO
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A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Contra a decisão por mim proferida, pela qual negado seguimento ao recurso, maneja agravo regimental a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras). A matéria debatida, em síntese, diz com a competência da Justiça Federal em caso de acidente de trabalho em refinaria de petróleo que gerou dano ambiental de grande dimensão. No caso, trata-se do vazamento de 4 milhões de óleo do oleoduto
da Repar (Refinaria Presidente Getúlio Vargas), que atingiu o Rio Iguaçu, a fauna e a flora. Ataca a decisão agravada, ao argumento de que a violação dos preceitos da Constituição Federal se dá de forma direta. Afirma o prequestionamento e alega a usurpação da competência da Justiça do Trabalho, uma vez que “[...] o acórdão recorrido merece ser reformado na via extraordinária, por violação frontal aos arts 37; 114, inciso IX; 170, § 1º; 173, incisos II e III, § 1º, todos da CR/1988, seja pela ingerência do Ministério Público Federal em assuntos que competem única e exclusivamente aos gestores da agravante (contratação de pessoal, operação de planta industrial, análise de riscos do negócio), seja pela adoção de critério vago e sem respaldo legal para a fixação de competência judiciária, em flagrante usurpação da competência da Justiça do Trabalho [...]” (doc. 08, fl. 04). Sustenta afronta ao art. 93, IX, da Constituição da República, pois “[...] o acórdão recorrido trouxe entendimento no sentido de que o ‘entorno’ deve ser analisado no caso concreto, haja vista não se tratar de questão trabalhista, mas de prevenção para evitar novos danos futuros decorrentes de causas similares, sendo essa a omissão apontada nos embargos de declaração – significado da expressão ‘entorno’ – não foi corrigida. [...] Assim a recorrida prestação jurisdicional se omitiu na apreciação de questões de meridiana importância para a solução da demanda [...]” (doc. 08, fls. 03-4). Aduz a não aplicação do óbice da Súmula nº 279/STF, “[...] posto que a irresignação recursal que apontou as citadas violações não pretendeu resolver matéria fática, mas discutir a aplicação do direito ao caso concreto, particularmente quanto à inadequação do critério utilizado para fixação de competência (‘entorno’) [...]” (doc. 08, fl. 07). Insiste na tese da afronta aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa. Reitera a afronta aos arts. 5º, LIV e LV, 37, II, 93, IX, 114, IX, 170 e 173, § 1º, II, da Lei Maior. Requer o provimento do recurso.
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – SIMETRIA DE OBJETOS – MULTA – COMPETÊNCIA CONCORRENTE – IBAMA – IAP – INTEMPESTIVIDADE – INOCORRÊNCIA 1. Manifestamente improcedente a arguição de intempestividade pela agravada. Conforme consta no recurso, os autos da ação originária foram recebido na Procuradoria da República de Curitiba/PR em 29 de agosto de 2002, sendo que o ciente posto pelo Procurador República, de próprio punho, data de 18 de setembro de 2002 e não 18 de agosto de 2002, como está a afirmar a recorrida. Assim, considerando qualquer das datas referidas, 29 de agosto (protocolo da Procuradoria) ou 18 de setembro de 2002, o agravo de instrumento é tempestivo. 2. A Justiça Federal é competente para analisar às questões referentes ao meio ambiente do trabalho, pois não há como dissociar o acidente do seu entorno, ou seja, o acidente provocador do dano ambiental. Não se trata de analisar questões meramente trabalhistas, da seara do direito do trabalho. O objetivo da ação civil pública é maior, que é o de alcançar, com a compatibilização do meio ambiente de trabalho, meios eficazes para prevenir novos danos ao meio ambiente e, diante deste contexto, não há como cindir o processo. As matérias estão entrelaçadas e devem ser decididas conjuntamente. 3. Na ação principal não foi postulada a ‘declaração de inexistência de relação jurídica entre a ré e a Petrobrás e o réu IAP’; ao contrário, afirmou-se que o IAP detinha competência para aplicar a multa de R$ 40.000.000,00 em relação aos danos ocorridos na área de várzea existente nos fundos da Repar e do Rio Barigui, ambos bens estaduais, que deveria, por sua vez, ser aplicada cumulativamente com a multa imposta pelo Ibama em razão de o dano ter afetado também o Rio Iguaçu, bem federal. 4. Afirmou-se, também, que, diferentemente do que constou na ação cautelar, havia um fundo a ser destinado o valor da multa, ou seja, o Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos, criado, inclusive, em razão da propositura da ação cautelar. Tudo isso, destaque-se, pelo fato de terem sido alteradas as circunstâncias fáticas no momento da propositura da ação principal.
5. Por fim, cabe consignar que a pretensão de reversão da quantia ao Ibama vai de encontro à noção da competência concorrente entre os entes federativos para legislar sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente.” (doc. 04, fls. 176-7)
Acórdão recorrido publicado em 13.04.2010. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça conheceu em parte do recurso especial e, nessa parte, negou provimento. Transcrevo o acórdão, em decisão com trânsito em julgado: “ADMINISTRATIVO – DIREITO AMBIENTAL – PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – COMPETÊNCIA – JUSTIÇA FEDERAL – VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC – INEXISTENTE – TEMPESTIVIDADE DO RECURSO NA ORIGEM – FATO DOS AUTOS – EXISTÊNCIA DE PEDIDO NO QUAL SE DEMANDA A CONTRATAÇÃO DE PESSOAL – CONSEQUÊNCIA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA – TEMA CONEXO – DESNECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA COMPETÊNCIA – PRECEDENTE – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL – AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA 1. Recurso especial interposto pela Petrobras S/A contra acórdão que julgou agravo de instrumento e firmou que a competência para o processamento da ação civil pública de proteção ao meio ambiente, ajuizada em razão da contaminação dos rios Barigui e Iguaçu, deveria ser processada na Justiça Federal, e não na Justiça Trabalhista. 2. Não há falar em violação do art. 535, II, do Código de Processo Civil se o exame do acórdão recorrido demonstra que a lide foi apreciada de forma integral com fundamentação lógica e completa. O tema da competência da Justiça Federal foi dirimido, ainda que não tenham sido explicitados os dispositivos alegadamente violados. 3. O acórdão recorrido bem esclareceu não ter havido intempestividade na interposição do agravo de instrumento. 4. A existência de um pedido, no rol de pleitos, da ação civil pública que verse sobre a contratação de pessoal, seja por parte da empresa, seja por alguma subsidiária, não justifica a remessa da controvérsia à Justiça Trabalhista, porquanto fica claro que o tema laboral é uma consequência em meio ao debate de proteção ao meio ambiente.
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O Tribunal Regional Federal da 4ª Região julgou a controvérsia em decisão cuja ementa reproduzo:
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5. A Primeira Seção do STJ examinou uma situação complexa semelhante, na qual a ação civil pública ambiental (coleta de lixo) estava justaposta com suas consequências trabalhistas. No caso em questão, foi firmado que a competência seria da Justiça Federal, uma vez que a questão trabalhista seria decorrente da questão ambiental, ainda que tenha grande relevância (CC 116.282/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 06.09.2011). 6. Os julgados trazidos no dissídio jurisprudencial não ostentam similitude fática com o caso dos autos, uma vez que neles estava se tratando diretamente do meio ambiente de trabalho, e não de um dano ambiental, no qual a ação civil pública contém um pedido do qual se deduzem consequências trabalhistas, na forma de contratação de pessoal. Não havendo similitude fática, não deve ser conhecido o recurso interposto pela alínea c do permissivo constitucional. Precedente: AgRg-REsp 1.303.817/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 23.03.2015. Recurso especial conhecido em parte e improvido.” (doc. 05, fls. 33-4)
É o relatório. VOTO
Preenchidos os pressupostos extrínsecos. Da detida análise dos fundamentos adotados pelo Tribunal de origem, por ocasião do julgamento do apelo veiculado na instância ordinária, em confronto com as razões veiculadas no extraordinário, concluo que nada colhe o recurso. Da leitura dos fundamentos do acórdão prolatado na origem, constato explicitados os motivos de decidir, a afastar o vício da nulidade por negativa de prestação jurisdicional arguido. Destaco que, no âmbito técnico-processual, o grau de correção do juízo de valor emitido na origem não se confunde com vício ao primado da fundamentação, notadamente consabido que a disparidade entre o resultado do julgamento e a expectativa da parte não sugestiona lesão à norma do texto republicano. Precedentes desta Suprema Corte na matéria: ‘Fundamentação do acórdão recorrido. Existência. Não há falar em ofensa ao art. 93, IX, da CF, quando o acórdão impugnado tenha dado razões suficientes, embora contrárias à tese da recorrente.’ (AI 426.981AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 05.11.2004; no mesmo sentido: AI 611.406-AgR, Rel. Min. Carlos Britto, DJe 20.02.2009)
“Vistos etc. Contra o acórdão prolatado pelo Tribunal de origem, maneja recurso extraordinário, com base no art. 102, III, da Lei Maior, o Petróleo Brasileiro S/A Petrobras. Aparelhado o recurso na afronta aos arts. 5º, LIV e LV, 37, II, 93, IX, 114, IX, 170 e 173, § 1º, II, da Constituição Federal.
‘O que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão judicial seja fundamentada; não, que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo
Preenchidos os pressupostos genéricos, conheço do agravo regimental e passo ao exame do mérito. Março/2016 – Ed. 228
Decido.
‘Omissão. Inexistência. O magistrado não está obrigado a responder todos os fundamentos alegados pelo recorrente. PIS. Lei nº 9.715/1998. Constitucionalidade. A controvérsia foi decidida com respaldo em fundamentos adequados, inexistindo omissão a ser suprida. Este Tribunal fixou entendimento no sentido de que o magistrado não está vinculado pelo dever de responder todo s os fundamentos alegados pela parte recorrente. Precedentes. Esta Corte afastou a suposta inconstitucionalidade das alterações introduzidas pela Lei nº 9.715/1998, admitindo a majoração da contribuição para o PIS mediante a edição de medida provisória. Precedentes.’ (RE 511.581-AgR, Rel. Min. Eros Grau, DJe 15.08.2008)
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora):
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É o relatório.
Nada colhe o agravo. Transcrevo o teor da decisão que desafiou o agravo:
prequestionamento. Agravo a que se nega provimento.’ (AI 265.938AgR, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª T., DJ 15.09.2000)
A matéria constitucional versada nos arts. 37, II, 170 e 173, § 1º, II, da Lei Maior não foi analisada pelas instâncias ordinárias e, embora ventilada nos embargos de declaração opostos, não foram oportunamente levadas ao conhecimento do Tribunal de origem quando do julgamento do recurso das fls. 119-34, doc. 04, o qual ensejou o manejo do recurso extraordinário. Consoante a jurisprudência desta Suprema Corte, os embargos de declaração inovatórios não suprem o requisito do prequestionamento. Aplicável, na hipótese, o entendimento jurisprudencial vertido nas Súmulas nºs 282 e 356/STF: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão suscitada’ e ‘o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento’. Nesse sentido transcrevo:
‘AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA CONSTITUCIONAL – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO – 1. O cumprimento do requisito do prequestionamento dá-se quando oportunamente suscitada a matéria constitucional, o que ocorre em momento processualmente adequado, nos termos da legislação vigente. A inovação da matéria em sede de embargos de declaração é juridicamente inaceitável para os fins de comprovação de prequestionamento. Precedentes. 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que, ainda que a questão verse sobre matéria de ordem pública, é necessário o prequestionamento.’ (RE 593.505-AgR, Relª Min. Cármen Lúcia, DJe 13.11.2009)
‘RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PREQUESTIONAMENTO – CONFIGURAÇÃO – RAZÃO DE SER – O prequestionamento não resulta da circunstância de a matéria haver sido arguida pela parte recorrente. A configuração do instituto pressupõe debate e decisão prévios pelo Colegiado, ou seja, emissão de juízo sobre o tema. O procedimento tem como escopo o cotejo indispensável a que se diga do enquadramento do recurso extraordinário no permissivo constitucional. Se o Tribunal de origem não adotou tese explícita a respeito do fato jurígeno veiculado nas razões recursais, inviabilizado fica o entendimento sobre a violência ao preceito evocado pelo recorrente. AGRAVO – ART. 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – MULTA – Se o agravo é manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do art. 557 do Código de Processo Civil, arcando a parte com o ônus decorrente da litigância de má-fé.’ (AI 827.894-AgR/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, unânime, DJe 07.11.2011)
O exame de eventual ofensa aos princípios da proteção ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º da Lei Maior), demanda, em primeiro plano, a interpretação das normas infraconstitucionais aplicáveis à espécie, de tal modo que, se afronta ocorresse, seria indireta, o que não atende à exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste egrégio Supremo Tribunal Federal, verbis:
‘Para que haja o prequestionamento da questão constitucional com base na Súmula nº 356, é preciso que o acórdão embargado de declaração tenha sido omisso quanto a ela, o que implica dizer que é preciso que essa questão tenha sido invocada no recurso que deu margem ao acórdão embargado e que este, apesar dessa invocação, se tenha omitido a respeito dela. No caso, não houve omissão do aresto embargado quanto às questões concernentes aos incisos XXIII e do art. 5º da Carta Magna, sendo elas invocadas originariamente nos embargos de declaração, o que, como salientou o despacho agravado, não é bastante para o seu
‘RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Alegação de ofensa ao art. 5º, XXII, XXIII, XXIV, LIV e LV, da Constituição Federal. Violações dependentes de reexame prévio de normas inferiores. Ofensa constitucional indireta. Matéria fática. Súmula nº 279. Agravo regimental não provido. É pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República, e, muito menos, de reexame de provas.’ (STF, AI-AgR-495.880/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, 1ª T., DJ 05.08.2005) ‘Recurso extraordinário: descabimento: acórdão recorrido, do Tribunal Superior do Trabalho, que decidiu a questão à luz de legislação infraconstitucional: alegada violação ao texto constitucional que, se ocorresse, seria reflexa ou indireta; ausência de negativa de prestação jurisdicional ou de defesa aos princípios compreendidos nos arts. 5º, II, V, LIV e LV, e 93, IX, da Constituição Federal.’ (STF, AI-AgR-436.911/SE, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª T., DJ 17.06.2005)
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do acórdão, está satisfeita a exigência constitucional.’ (AI 402.819-AgR, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 05.09.2003)
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‘CONSTITUCIONAL – RECURSO EXTRAORDINÁRIO: ALEGAÇÃO DE OFENSA À C.F., art. 5º, II, V, VI, LIV e LV – I – Ao Judiciário cabe, no conflito de interesses, fazer valer a vontade concreta da lei, interpretando-a. Se, em tal operação, interpreta razoavelmente ou desarrazoadamente a lei, a questão fica no campo da legalidade, inocorrendo o contencioso constitucional. II – Decisão contrária ao interesse da parte não configura negativa de prestação jurisdicional (CF, art. 5º, V). III – A verificação, no caso concreto, da existência, ou não, do direito adquirido, situa-se no campo infraconstitucional. IV – Alegação de ofensa ao devido processo legal: CF, art. 5º, LIV e LV: se ofensa tivesse havido, seria ela indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais. E a ofensa a preceito constitucional que autoriza a admissão do recurso extraordinário é a ofensa direta, frontal. V – Agravo não provido.’ (STF, RE-AgR –154.158/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 20.09.2002)
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Quanto à competência da Justiça Federal para julgar o feito, o entendimento adotado no acórdão recorrido não diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, razão pela qual não se divisa a alegada ofensa aos dispositivos constitucionais suscitados. Nesse sentido:
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‘AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROMOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – ART. 109, I E § 3º, DA CONSTITUIÇÃO – ART. 2º DA LEI Nº 7.347/1985 – O dispositivo contido na parte final do § 3º do art. 109 da Constituição é dirigido ao legislador ordinário, autorizando-o a atribuir competência (rectius jurisdição) ao Juízo Estadual do foro do domicílio da outra parte ou do lugar do ato ou fato que deu origem à demanda, desde que não seja sede de Varas da Justiça Federal, para causas específicas dentre as previstas no inciso I do referido art. 109. No caso em tela, a permissão não foi utilizada pelo legislador que, ao revés, se limitou, no art. 2º da Lei nº 7.347/1985, a estabelecer que as ações nele previstas ‘serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa’. Considerando que o Juiz Federal também tem competência territorial e funcional sobre o local de qualquer dano, impõe-se a conclusão de que o afastamento da jurisdição federal, no caso, somente poderia dar-se por meio de referência expressa à Justiça Estadual, como a que fez o constituinte na primeira parte do mencionado § 3º em relação às causas de natureza previdenciária, o que no caso não ocorreu. Recurso conhecido
e provido.’ (RE 228.955, Rel. Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, DJ 24.03.2001) ‘RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL – CONCURSO PÚBLICO – MANDADO DE SEGURANÇA – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA – AUTORIDADE FEDERAL – COMPETÊNCIA – JUSTIÇA FEDERAL – RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO – REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA – REAFIRMADA A JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE SOBRE A MATÉRIA.’ (RE 726.035-RG, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe 05.05.2014) Outrossim, o Tribunal de origem, na hipótese em apreço, lastreou-se na prova produzida para firmar a competência da Justiça Federal, razão pela qual aferir a ocorrência de eventual afronta aos preceitos constitucionais invocados no apelo extremo exigiria o revolvimento do quadro fático delineado, procedimento vedado em sede extraordinária. Aplicação da Súmula nº 279/STF: ‘Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário’. Nesse sentir, não merece seguimento o recurso extraordinário, consoante também se denota dos fundamentos da decisão que desafiou o recurso, aos quais me reporto e cuja detida análise conduz à conclusão pela ausência de ofensa direta e literal a preceito da Constituição da República. Nego seguimento ao recurso extraordinário (CPC, art. 557, caput).”
Irrepreensível a decisão agravada. Tal como consignado na decisão agravada, inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988. Na compreensão desta Suprema Corte, o texto constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões de seu convencimento; sem necessidade, contudo, do exame detalhado de cada argumento esgrimido pelas partes. Cito precedentes: “Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3º e 4º). Alegação de ofensa aos incisos V e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrência. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem deter-
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – MATÉRIA FÁTICA E LEGAL – O recurso extraordinário não é meio próprio ao revolvimento da prova, também não servindo à interpretação de normas estritamente legais. RE LEGAL – CURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – DEVIDO PROCESSO – Se, de um lado, é possível ter-se situação concreta em que transgredido o devido processo legal a ponto de se enquadrar o recurso extraordinário no permissivo que lhe é próprio, de outro, descabe confundir a ausência de aperfeiçoamento da prestação jurisdicional com a entrega de forma contrária aos interesses do recorrente. AGRAVO – ART. 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – MULTA – Se o agravo é manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do art. 557 do Código de Processo Civil, arcando a parte com o ônus decorrente da litigância de má-fé.” (ARE 721.783-AgR/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJe 12.3.2013)
Acresço que a discussão travada nos autos não alcança status constitucional. O exame da alegada ofensa ao art. 5º, LIV e LV, da Constituição Federal dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, o que refoge à competência jurisdicional extraordinária prevista no art. 102 da Constituição Federal. Cito precedentes: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA SOLIDÁRIA – ANÁLISE DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS – OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA – AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.” (RE 679.676-AgR/PR, Relª Min. Cármen Lúcia, 2ª Turma, DJe 19.02.2013) “A afronta aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional, quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de
normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição da República.” (AI 745.285-AgR/PE, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., unânime, DJe 01.02.2012)
Noutro giro, tal como consignado na decisão agravada, a matéria constitucional versada no recurso extraordinário – arts. 37, II, 170 e 173, § 1º, II, da Lei Maior – não foi analisada pelas instâncias ordinárias, e, embora ventilada nos embargos de declaração opostos, não foram oportunamente levadas ao conhecimento do Tribunal de origem quando do julgamento do recurso das fls. 119-34, doc. 04, o qual ensejou o manejo do recurso extraordinário. Consoante a jurisprudência desta Suprema Corte, os embargos de declaração inovatórios não suprem o requisito do prequestionamento, a atrair o óbice das Súmulas nºs 282 e 356/STF: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada” e “o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”. Cito precedentes: “Agravo regimental no agravo de instrumento. Prequestionamento. Ausência. Reexame de legislação local. Impossibilidade. Precedentes. 1. Não se admite o recurso extraordinário quando os dispositivos constitucionais que nele se alegam violados não estão devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STFL. 2. O recurso extraordinário não se presta ao reexame de matéria ínsita ao plano normativo local. Incidência da Súmula nº 280/STFL. 3. Agravo regimental não provido.” (AI 853.128-AgR/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., DJe 21.05.2012) “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282 E 356/STF – AUSÊNCIA DE QUESTÃO CONSTITUCIONAL – LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA – SÚMULA Nº 279/STFL – A questão alegada no recurso extraordinário não foi objeto de análise pelo Tribunal de origem. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STFL. De todo modo, o exame da alegação pressuporia uma nova apreciação dos fatos e do seu enquadramento à legislação processual que disciplina, de forma específica, o instituto
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minar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral” (AI 791.292-QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, por maioria, DJe 13.08.2010)
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da coisa julgada, o que atrai a incidência da Súmula nº 279/STF. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE 639.238-AgR/PR, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe 13.09.2013)
Constato, ademais, que o Tribunal de origem, na hipótese em apreço, lastreou-se na prova produzida para firmar seu convencimento quanto à competência da Justiça Federal para analisar as questões referentes ao dano ambiental, ao meio ambiente do trabalho e à aplicação de multa administrativa. Logo, aferir a ocorrência de eventual afronta aos preceitos constitucionais invocados no apelo extremo exigiria o revolvimento do quadro fático delineado, procedimento vedado em sede extraordinária. Aplicação da Súmula nº 279/STF: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”.
Por esses motivos, acredita-se que houve uma impropriedade técnica na formulação do pedido de confirmação do valor da multa requerido na ação cautelar, razão pela qual não há como ser acolhido o recurso nesse ponto, merecendo ser mantida a decisão agravada. [...].” (fls. 1.036-1.040).
Oportuna a transcrição parcial do voto do acórdão recorrido:
[...]” (doc. 04, fls.)
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“[...] não há como dissociar o acidente do seu entorno, ou seja, o acidente provocador do dano ambiental. Não se trata de analisar questões meramente trabalhistas, da seara do direito do trabalho. O objetivo da ação civil pública é maior, que é o de alcançar, com a compatibilização do meio ambiente de trabalho, meios eficazes para prevenir novos danos ao meio ambiente e, diante deste contexto, não há como cindir o processo. As matérias estão entrelaçadas e devem ser decididas conjuntamente.
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constou na ação cautelar; ao contrário, afirmou-se que o IAP detinha competência para aplicar a multa de R$ 40.000.000,00 em relação aos danos ocorridos na área de várzea existente nos fundos da Repar e do Rio Barigui, ambos bens estaduais, que deveria, por sua vez, ser aplicada cumulativamente com a multa imposta pelo Ibama em razão de o dano ter afetado também o Rio Iguaçu, bem federal (fls. 89 à 93 do traslado). Afirmou-se, também, que, diferentemente do que constou na ação cautelar, havia um fundo a ser destinado o valor da multa, ou seja, o Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos, criado, inclusive, em razão da propositura da ação cautelar. Tudo isso, destaque-se, pelo fato de terem sido alteradas as circunstâncias fáticas no momento da propositura da ação principal.
[...] No voto condutor, quanto aos recursos de apelação protocolados pelos Ministérios Públicos Federal e do Estado do Paraná (conjuntamente) e pelo Ibama, foi adotado como razões para decidir o parecer do Ministério Público Federal, de lavra da Dra. Samantha Chantal Dobrowolski, que assim se manifestou: [...] Vale dizer, na ação principal não foi postulada a ‘declaração de inexistência de relação jurídica entre a ré e a Petrobrás e o réu IAP’, como
Colho precedentes de ambas as Turmas desta egrégia Corte: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito Ambiental. Vazamento de óleo. Dano ambiental. Dever de indenizar. Pressupostos. Demonstração. Discussão. Legislação infraconstitucional. Ofensa reflexa. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. Inadmissível, em recurso extraordinário, a análise da legislação infraconstitucional e o reexame dos fatos e das provas dos autos. Incidência das Súmulas nºs 636 e 279/STFL. 2. Agravo regimental não provido.” (ARE 808.356-AgR/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, DJe 20.08.2015) “DIREITO AMBIENTAL – RESPONSABILIDADE CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – DANO AMBIENTAL – CONTROVÉRSIA QUE DEMANDA ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL – NECESSIDADE DE REAPRECIAÇÃO DOS FATOS E DO MATERIAL PROBATÓRIO DOS AUTOS – SÚMULA Nº 279/STFL – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO – 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ausência de questão constitucional, rejeitou preliminar de repercussão geral relativa à controvérsia sobre suposta violação aos princípios do
“Agravo regimental em agravo de instrumento. 2. Administrativo. Meio Ambiente. 3. Alegação de ofensa ao princípio da reparação integral do dano. Necessidade de análise e interpretação de normas infraconstitucionais e de revisão do conjunto fático-probatório dos autos. Impossibilidade. 4. Incidência do Verbete nº 279 da Súmula do STFL. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI 808.549-AgR/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., DJe 05.03.2013) “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO AMBIENTAL – OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E DO REEXAME DE PROVAS (SÚMULA Nº 279) – OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA – AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO – Imposição de multa de 5% do valor corrigido da causa. Aplicação do art. 557, § 2º, c/c arts. 14, incisos II e III, e 17, inciso VII, do Código de Processo Civil.” (AI 709.291-AgR/SP, Relª Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 06.02.2009)
As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.
PRIMEIRA TURMA EXTRATO DE ATA Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 898.716 Proced.: Paraná Relatora: Ministra Rosa Weber Agte.: Petróleo Brasileiro S/A Petrobras Advs.: Candido Ferreira da Cunha Lobo e outro(a/s) Agdo.: Ministério Público Federal Proc.: Procurador-Geral da República Intdo.: Instituto Ambiental do Parana – IAP Intdo.: Estado do Paraná Proc.: Procurador-Geral do Estado do Paraná DECISÃO A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Relatora. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julgamento, o Senhor Ministro Marco Aurélio. Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber. 1ª Turma, 29.09.2015. Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Marco Aurélio, Luiz Fux, Roberto Barroso e Edson Fachin. Subprocurador-Geral da República, Dr. Odim Brandão Ferreira.
Agravo regimental conhecido e não provido.
Carmen Lilian Oliveira de Souza
É como voto.
Secretária da Primeira Turma
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contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal (Tema 660 – ARE 748.371-RG, julgado sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes). 2. A solução da controvérsia demanda a análise da legislação infraconstitucional pertinente e a reapreciação dos fatos e do material probatório constante dos autos (Súmula nº 279/STF), procedimentos inviáveis neste momento processual. 3. O acórdão recorrido está devidamente fundamentado, embora em sentido contrário aos interesses da parte agravante. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE 871.655-AgR/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, DJe 05.06.2015)
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Pesquisa Temática
Adicional de Insalubridade Adicional de insalubridade – atividade a céu aberto – exposição ao sol e ao calor – pagamento devido “Adicional de insalubridade. Atividade a céu aberto. Exposição ao sol e ao calor (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012). Res. 186/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012. I – Ausente previsão legal, indevido o adicional de insalubridade ao trabalhador em atividade a céu aberto, por sujeição à radiação solar (art. 195 da CLT e Anexo 7 da NR 15 da Portaria nº 3.214/1978 do MTE). II – Tem direito ao adicional de insalubridade o trabalhador que exerce atividade exposto ao calor acima dos limites de tolerância, inclusive em ambiente externo com carga solar, nas condições previstas no Anexo 3 da NR 15 da Portaria nº 3.214/1978 do MTE (OJ SDI1 173/TST, grifou-se).” (TRT 18ª R. – RO 0001602-53.2013.5.18.0128 – Relª Juíza Silene Aparecida Coelho – DJe 31.10.2014 – p. 1469)
Adicional de insalubridade – balconista de farmácia – aplicação de injeções – pagamento devido “Balconista de farmácia. Aplicação de injeções. Possibilidade de contato com pacientes e materiais infectocontagiantes. Risco de contágio de infecções e doenças. Adicional de insalubridade devido. A atividade da autora, de aplicar injeções em pacientes, caracteriza o contato com pacientes e com materiais infectocontagiosos e a ré, como farmácia e oferecendo os serviços de aplicação de injeções, enquadra-se como estabelecimento destinado ao cuidado da saúde humana. Portanto, as especificidades do caso ora em análise enquadram-se, perfeitamente, no Anexo 14 da Norma Regulamentadora nº 15 (Portaria nº 3.214/1978 do Ministério do Trabalho em Emprego), que estabelece como devido o adicional de insalubridade em grau médio por exposição a agentes biológicos a quem trabalha em contato permanente com pacientes ou material infectocontagiante em estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana. Mesmo considerando que o contato da reclamante com pacientes e com materiais infectocontagiosos não ocorria de forma permanente, a insalubridade caracteriza-se pelo risco de contágio de infecções e doenças, para o qual basta um único contato.” (TRT 2ª R. – Proc. 0000080-66.2013.5.02.0441 – (20150839426) – Rel. Valdir Florindo – DJe 28.09.2015)
Adicional de insalubridade – câmara frigorífica – pagamento devido “Agente insalubre frio. Exposição do empregado. Direito ao adicional. Faz jus ao adicional de insalubridade o trabalhador que labora no interior de câmara frigorífica ou ambiente similar, sem o intervalo do art. 253 da CLT, ainda que com o adequado uso de EPIs.” (TRT 24ª R. – RO 0001063-03.2013.5.24.0005 – Rel. Des. Nicanor de Araújo Lima – DJe 21.09.2015 – p. 82)
Adicional de insalubridade – constatação de nocividade no ambiente de trabalho – pagamento devido “Recurso da reclamada. Adicional de insalubridade. Constatação de nocividade no ambiente de trabalho, sem a devida proteção. Agente físico ruído. A argumentação da reclamada em torno da inexistência de nocividade em decorrência do contato do empregado com o frio mostra-se em descompasso com a matéria tratada nos autos. Na verdade, o adicional de insalubridade foi reconhecido com base na presença de ruído no ambiente de trabalho, para o qual, segundo a conclusão da perita, a empresa não proporcionou ao reclamante a
adequada proteção. Ao contrário do que afirma a reclamada, a exposição contida no laudo é consistente, plausível e suficiente ao reconhecimento do direito vindicado pelo autor, não havendo que se cogitar da reforma da sentença, quanto ao aspecto enfocado. Recurso não provido. Recurso adesivo do reclamante. Adicionais de insalubridade e periculosidade. Acumulação. Inovação recursal. Em sua exposição recursal, o reclamante insurge-se contra o fato de o Juízo de origem haver determinado que se faça, após o trânsito em julgado, a opção pelo recebimento do adicional de periculosidade ou do adicional de insalubridade, pugnando pela acumulação das duas parcelas. A pretensão tem contornos inovatórios, impondo-se ressaltar que, na peça inicial, o próprio demandante cuidou de formular pedido alternativo, requerendo que, caso não fosse conhecido o direito ao adicional de periculosidade, a reclamada fosse condenada a pagar-lhe o adicional de insalubridade. Não houve, portanto, pleito de acumulação, tendo o Juízo de origem decidido em conformidade com a lei e com a própria exposição inicial, permitindo que o empregado venha a optar por um dos dois adicionais, à vista do disposto no art. 193, § 2º, da CLT. Sentença mantida. Recurso não provido.” (TRT 13ª R. – RO 0046800-35.2014.5.13.0026 – Rel. Des. Francisco de Assis Carvalho e Silva – DJe 06.07.2015 – p. 6)
Adicional de insalubridade e periculosidade – cumulação – impossibilidade “Adicional de insalubridade em grau máximo. Pacientes portadores de doenças infectocontagiosas. Adicional de periculosidade. Radiações ionizantes. O contato com pacientes potencialmente portadores de doenças infectocontagiosas e a exposição a radiações ionizantes (raio-X), quando devidamente comprovados por meio de laudo técnico, não desconstituído por prova em contrário, dão direito, respectivamente, à percepção do adicional de insalubridade em grau máximo e do adicional de periculosidade. Sendo inviável a cumulação dos adicionais, cabe à reclamante optar por aquele adicional que entender ser mais benéfico.” (TRT 4ª R. – RO 0000388-69.2014.5.04.0261 – 4ª T. – Rel. Des. João Pedro Silvestrin – DJe 26.06.2015)
Adicional de insalubridade – eficácia do EPI – creme de proteção – pagamento devido “Adicional de insalubridade. Eficácia do EPI. Creme de proteção. É relativa a eficácia dos cremes de proteção aplicados com a finalidade de elidir a ação nociva de agentes químicos, na medida em que além de não encobrirem devidamente todas as partes do corpo que eventualmente possam ter contato com o agente insalubre, a camada protetiva por eles formada acaba vulnerada pelo atrito das mãos com as peças manuseadas, exigindo constante e plena reposição, que se torna inviável na prática.” (TRT 4ª R. – RO 0000550-20.2013.5.04.0384 – 11ª T. – Relª Desª Maria Helena Lisot – DJe 05.06.2015)
Adicional de insalubridade – exposição ao frio – fornecimento de EPI – irrelevância – pagamento devido “Recurso de revista. Adicional de insalubridade. Frio. Fornecimento de EPI. A eg. Corte Regional concluiu, com base no laudo pericial, que havia contato com agente insalubre e que não houve prova da entrega de EPIs capazes de eliminar ou neutralizar a insalubridade. Incide a Súmula nº 126 do TST. Honorários advocatícios Os honorários de assistência judiciária são devidos desde que preenchidos os requisitos dos arts. 14 a 16 da Lei nº 5.584/1970, o que não ocorre neste caso, pois a parte não está assistida por sindicato da categoria profissional. Súmulas nºs 219 e 329 do TST. Recurso de Revista conhecido parcialmente e provido.” (TST – RR 136-29.2013.5.04.0802 – Rel. Des. Conv. João Pedro Silvestrin – DJe 10.10.2014)
“Recurso de revista da reclamante. Adicional de insalubridade. Fornecimento de EPIs aptos a neutralizar a ação do agente insalubre. In casu, o Regional, com amparo na prova pericial, foi categórico ao afirmar que a reclamante não tem direito ao pagamento do adicional de insalubridade, pois o laudo técnico é contundente no reconhecimento de que os EPIs fornecidos pela empregadora foram suficientes para neutralizar o agente insalubre solvente, apurado na perícia realizada. Ficou consignado, no laudo pericial transcrito pelo Regional, que, a despeito de a reclamante ter mantido contato com substância insalubre, foi informado pela Reclamada e confirmado pela Reclamante a utilização de duas luvas consecutivas, sendo a luva pigmentada por baixo e a luva PVC por cima, não sofrendo enquadramento legal ensejador de insalubridade. Com efeito, a jurisprudência prevalecente nesta Corte superior, consubstanciada na Súmula nº 289, firmou-se no sentido de que o simples fornecimento de aparelho de proteção pelo empregador não o exime do pagamento de adicional de insalubridade. Cabe-lhe tomar as medidas que conduzam à diminuição ou eliminação da nocividade, entre as quais as relativas ao uso efetivo do pagamento pelo empregador (grifou-se). Denota-se, pois, que a parte final do verbete sumular mencionado preconiza ser indevido o adicional de insalubridade nos casos em que a ação do agente insalubre for eliminada pela utilização do EPI fornecido pela empresa. Desse modo, considerando que, na hipótese dos autos, o Regional, instância soberana na análise do conjunto fático-probatório, registrou, com base na prova técnica, que a reclamada forneceu os EPIs e que a própria reclamante confessou a sua utilização, não há falar no pagamento do adicional de insalubridade nem em contrariedade à Súmula nº 289 do TST, mas em sua observância. E,
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Adicional de insalubridade – fornecimento de EPIs aptos a neutralizar os agentes nocivos – irrelevância – pagamento devido
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diante da conclusão firmada na decisão recorrida, para se chegar a entendimento diverso, seria necessário o reexame do conjunto fático-probatório, procedimento que não se compatibiliza com a natureza extraordinária do recurso de revista, conforme os termos da Súmula nº 126 do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista não conhecido. Recurso de revista da reclamada. Horas extras. Minutos residuais. A decisão recorrida harmoniza-se com o entendimento consubstanciado na Súmula nº 449 do TST (antiga Orientação Jurisprudencial nº 372 da SBDI-1 do TST), que preceitua: minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho. Lei nº 10.243, de 27.06.2001. Norma coletiva. Flexibilização. Impossibilidade. A partir da vigência da Lei nº 10.243, de 27.06.2001, que acrescentou o § 1º ao art. 58 da CLT, não mais prevalece cláusula prevista em convenção ou acordo coletivo que elastece o limite de 5 minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho para fins de apuração das horas extras. Recurso de revista não conhecido. Honorários advocatícios. Parte não assistida por sindicato de sua categoria profissional. Não é devido o deferimento de honorários advocatícios à parte não assistida por seu sindicato, consoante o disposto no item I da Súmula nº 219 do TST, que assim dispõe: Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST – RR 0032000-19.2012.5.17.0007 – Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta – DJe 30.01.2015 – p. 81)
Adicional de insalubridade – frigorífico – pagamento devido “Frigorífico. Atividade que consistia em adentrar a câmara frigorífica várias vezes ao dia. Insalubridade constatada em laudo técnico. Tendo a prova técnica constatado o trabalho em condições insalubres, pela exposição a inversões térmicas na câmara frigorífica, o trabalhador faz jus ao intervalo para recuperação térmica (art. 253 da CLT).” (TRT 3ª R. – RO 0010073-41.2014.5.03.0031 – Rel. Juiz Conv. Lucas Vanucci Lins – DJe 15.05.2015 – p. 95)
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Adicional de insalubridade – lavouras de cana-de-açúcar – exposição ao calor acima dos limites de tolerância – pagamento devido
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“I – Agravo de instrumento do empregador. Recurso de revista. Adicional de insalubridade. Lavouras de cana-de-açúcar. Exposição ao calor acima dos limites de tolerância. Orientação Jurisprudencial nº 173 da SBDI-1. Esta e. Corte, em sessão do Tribunal Pleno, realizada em 14.09.2012, alterou a redação da Orientação Jurisprudencial nº 173 desta Subseção para, interpretando o Anexo 3 da NR-15 da Portaria nº 3.214/1978 do MTE, garantir o adicional de insalubridade ao trabalhador submetido a calor acima dos níveis de tolerância, inclusive em ambiente externo com carga solar. No caso, o deferimento do adicional de insalubridade não está alicerçado na radiação solar, mas sim na exposição ao calor acima dos limites de tolerância, nos exatos termos do item II da Orientação Jurisprudencial nº 173 desta Subseção. Os arestos transcritos estão superados pela jurisprudência atual desta Corte, nos termos da Súmula nº 333/TST e do art. 896, § 7º, da CLT. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. II – Agravo de instrumento do empregado. Horas in itinere. Previsão em norma coletiva. Remuneração de forma simples sem acréscimo de adicional e reflexos. Diante de possível contrariedade à Súmula nº 90, I e V, do TST, necessário o provimento do agravo de instrumento para o exame do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. III – Recurso de revista do empregado. 1. Troca de talhão. Tempo à disposição do empregador. Cortador de cana-de-açúcar. Não há contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 235 da SBDI-1. Tal verbete não contém, em seu conteúdo, disciplina alguma sobre o tempo referente à troca de eitos ou talhões para os empregados cortadores de cana. Os modelos transcritos não viabilizam o conhecimento da revista por divergência jurisprudencial. Recurso de revista não conhecido. 2. Horas in itinere. Previsão em norma coletiva. Remuneração de forma simples sem acréscimo de adicional e de reflexos. A discussão dos autos diz respeito à validade da norma coletiva que prevê o pagamento das horas in itinere de forma simples, sem reflexos e sem adicional. A decisão recorrida está em consonância com o entendimento desta Corte, pois, apesar de os instrumentos coletivos poderem limitar as horas in itinere, independentemente do percurso feito pelos empregados da empresa para chegarem à frente de trabalho, ante o que dispõe o art. 7º, XXVI, da Constituição Federal, não podem, todavia, alterar a natureza jurídica da parcela, de forma que é inválida a norma que determina o seu pagamento de forma simples, sem reflexos e sem adicional. Recurso de revista conhecido por contrariedade à Súmula nº 90, I e V, do TST e provido. Conclusão: Recurso de revista parcialmente conhecido e provido.” (TST – ARR 0000759-81.2013.5.09.0567 – Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte – DJe 28.08.2015 – p. 1438)
Adicional de insalubridade – limpeza de banheiros utilizados por expressivo número de usuários – agentes biológicos – pagamento devido “Adicional de insalubridade. Limpeza de banheiros utilizados por expressivo número de usuários. Agentes biológicos. A tarefa de limpeza de banheiros destinados a grande número de usuários assegura o direito à percepção do adicional de insalubridade em grau máximo, em razão do potencial contato com agentes biológicos, na forma do Anexo 14 da NR-15 da Portaria nº 3.214/1978. Aplicação da Súmula nº 448, II, do TST.” (TRT 4ª R. – RO 0001557-58.2011.5.04.0403 – 7ª T. – Relª Desª Denise Pacheco – DJe 23.01.2015)
Adicional de insalubridade – odontólogo – pagamento devido “Trabalhista. Odontólogos. Adicional de insalubridade. Devido. Honorários advocatícios. Deferimento. Adicional de insalubridade. Demonstrada a insalubridade por laudo colhido em prova emprestada, devido o adicional postulado, nos termos do art. 192, CLT, e norma regulamentadora NR 15/MTE. Honorários advocatícios. Preenchidos os requisitos da Súmula nº 219, III, do C. TST, agindo o sindicato na qualidade de substituto processual, defere-se a verba honorária. Recurso ordinário conhecido e improvido.” (TRT 22ª R. – Proc. 0001864-70.2013.5.22.0102 – Rel. Des. Wellington Jim Boavista – DJe 30.01.2015 – p. 55)
Adicional de insalubridade – operadora de telemarketing – uso do fone de ouvido – pagamento devido “Recurso de revista. Adicional de insalubridade. Operadora de telemarketing. Uso do fone de ouvido. Observe-se que as atividades desenvolvidas pela reclamante não se enquadram naquelas descritas no Anexo 13 da NR-15 da Portaria nº 3.214/1978 do Ministério do Trabalho. De outro lado, a jurisprudência desta Corte uniformizadora, cristalizada na Orientação Jurisprudencial nº 4, I, da SBDI-1, consagra tese de que somente é devido o adicional de insalubridade quando a atividade insalubre encontra-se descrita na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (art. 190 da CLT), não bastando a constatação de insalubridade por laudo pericial ou interpretação extensiva da norma. Recurso de revista conhecido e provido. Enquadramento sindical. O Regional, soberano na análise dos fatos e provas, registrou ser incontroverso nos autos que a atividade preponderante da reclamada é o telemarketing. Nesse sentido, entendeu serem aplicáveis à reclamante as normas coletivas da categoria profissional dos operadores de telemarketing, firmadas pelo Sintratel, e não aquelas originadas da relação com o Sintetel, que representa os trabalhadores em empresas de telecomunicações e operadores de mesas telefônicas, reformando a sentença da vara de origem no particular. Desta feita, correto o enquadramento sindical, levando-se em consideração a especificidade da categoria econômica da empresa reclamada. Nesse contexto, ao contrário do quanto alegado pela reclamada, além da decisão estar em consonância com o art. 581, § 1º, da CLT, a aferição da alegação recursal no sentido de que a atividade preponderante desenvolvida é o teleatendimento e não a prestação de serviços de telemarketing ou da veracidade da assertiva do Tribunal Regional depende de nova análise do conjunto fático-probatório, procedimento vedado nesta instância recursal, nos termos da Súmula nº 126 do TST. Recurso de revista não conhecido. Adicional de periculosidade. Armazenamento de líquido inflamável no prédio. Consoante extrai-se do acórdão regional, no tocante ao trabalho realizado sob condições de periculosidade, a Corte Regional decidiu com base no laudo pericial, o qual registra que a reclamada armazenava inflamáveis na edificação em que o reclamante trabalhava em quantidade em muito superior à permitida pela Portaria nº 3.214, fato que, por si só, autoriza o deferimento do adicional em comento, conforme recomenda a OJ 385 da SBDI-1 desta Corte Superior. Desse modo, o contexto registrado no acórdão regional está em harmonia com a OJ 385, da SBDI-1 do TST, sendo inviáveis as alegações de violação de dispositivo legal e de divergência jurisprudencial. Incidência da Súmula nº 333 do TST e do art. 896, §§ 4º e 5º, da CLT, com a antiga redação, vigente à época da interposição do recurso de revista. Superados os arestos tidos por divergentes, afastadas a contrariedade da Súmula nº 364, do TST, e a violação do art. 193, da CLT. Recurso de revista não conhecido.” (TST – RR 0177500-29.2008.5.02.0087 – Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho – DJe 25.09.2015 – p. 2561)
“Agravo regimental. Fungibilidade. Recurso recebido como agravo legal. Direito administrativo. Servidor público. Município de Jurema. Adicional de insalubridade. Necessidade de prova pericial. Recurso desprovido. Decisão unânime. 1. Das decisões terminativas cabe o recurso do art. 557 do Código de Processo Civil, de forma que, com base no princípio da fungibilidade recursal, recebo o presente como agravo legal. 2. Ainda que o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/1998, não faça menção ao inciso XXIII do art. 7º do mesmo diploma legal, não restou afastado o direito dos servidores públicos de receberem adicional de insalubridade, desde que exista Lei Ordinária que assim estabeleça. 3. Consoante o contexto normativo supra, há disposição legal expressa no Município de Jurema, com previsão do pagamento do adicional de insalubridade, perseguido de acordo com as regras utilizadas em Lei federal (CLT). 4. Com efeito, a demonstração dos fundamentos fáticos e jurídicos das alegações do autor, desde a petição inicial, depende, no caso concreto, da oportunidade de perícia judicial. 5. Recurso desprovido. Decisão unânime.” (TJPE – Ag-Ap 0000177-04.2013.8.17.0860 – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Erik de Sousa Dantas Simões – DJe 01.09.2014 – p. 267)
Adicional de insalubridade – risco químico – laudo pericial – pagamento devido “Laudo pericial. Fundamentação técnica correta. Anexo nº 13 da NR-15. Análise qualitativa. Suficiência. Condições insalubres de trabalho. Constatação. Adicional. Deferimento. Na fabricação de artigos de borracha, faz-se mister a avaliação qualitativa do risco químico, nos moldes do Anexo nº 13 da NR-15, não havendo qualquer conflito das normas nele previstas com aquelas prescritas nos Anexos nºs 11 e. 12. Sentença mantida. Recurso desprovido.” (TRT 13ª R. – RO 0131047-55.2014.5.13.0023 – Relª Ana Maria Ferreira Madruga – DJe 30.09.2015 – p. 10)
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Adicional de insalubridade – prova pericial – necessidade
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Adicional de insalubridade – salário mínimo – base de cálculo – efeitos “Recurso de revista interposto pela reclamada. Base de cálculo de adicional de insalubridade. I – Na Reclamação nº 6.266/STF, o Ministro Gilmar Mendes esclareceu que o adicional de insalubridade deve continuar sendo calculado com base no salário mínimo, enquanto não superada a questão da não recepção da vinculação por meio de lei ou de ajuste coletivo. II – O posicionamento adotado pela Corte de origem, no sentido de determinar a utilização do salário pago à Autora como base de cálculo do adicional de insalubridade, não se harmoniza com o entendimento deste Tribunal Superior e do Supremo Tribunal Federal. III – Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. II – Recurso de revista adesivo interposto pela reclamante. Honorários advocatícios. I – Conforme o entendimento consagrado na Súmula nº 219, I, desta Corte, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, na Justiça do Trabalho, não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato de sua categoria profissional e comprovar que se encontra em situação econômica que não lhe permita arcar com o pagamento das despesas e custas do processo, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família. II – Para o deferimento de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho deve haver a ocorrência concomitante dos requisitos mencionados, que não foram preenchidos pela Reclamante, porquanto não está assistida pelo sindicato da categoria profissional. III – Recurso de revista de que não se conhece.” (TST – RR 0061200-34.2009.5.09.0093 – Rel. Min. Fernando Eizo Ono – DJe 03.07.2015 – p. 515)
Adicional de insalubridade – submissão do empregado ao agente insalubre “ruído” – prova pericial convincente – pagamento devido “Adicional de insalubridade. Submissão do empregado ao agente insalubre ‘ruído’. Prova pericial convincente. Laudo pericial elaborado em consonância com o disposto no art. 429 do CPC, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho, autorizada pelo art. 769 da CLT. Deferimento. Manutenção da sentença. Impõe-se a manutenção da sentença, em que houve o deferimento do adicional de periculosidade, no grau médio, tendo em vista que o empregado comprovou, de forma satisfatória, que estava sujeito ao agente insalubre ‘ruído’, através de prova pericial, ressaltando-se que o laudo foi elaborado em conformidade com os ditames do art. 429 do CPC, de aplicação subsidiária ao Processo do Trabalho autorizada pelo art. 769 da CLT.” (TRT 20ª R. – RO 0000503-89.2010.5.20.0001 – 2ª T. – Rel. Des. Jorge Antônio Andrade Cardoso – DJe 17.06.2015)
Rurícola – trabalho a céu aberto – exposição ao calor excessivo – adicional de insalubridade – não configuração
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“Direito do trabalho. Remuneração. Trabalho rural a céu aberto. Exposição ao calor excessivo. Adicional de insalubridade. Não configuração. O trabalho rural a céu aberto enseja o pagamento do adicional de insalubridade, em razão da exposição ao calor acima dos limites de tolerância, nos termos dos quadros 1 a 3 do Anexo 3 da NR-15. Aplicação do art. 192, CLT. No caso, embora haja comprovação nos autos do fornecimento de equipamentos de proteção individual para a Reclamante, é evidente que eles não são suficientes para neutralizar todos os efeitos do calor excessivo. O uso dos EPIs obrigatórios dificulta as trocas térmicas, agravando a hipertermia, o que implica diversos riscos, inclusive o de morte. Assim, a sobrecarga térmica somente pode ser neutralizada por meio da observância dos limites de tolerância dos índices de IBUTG, que constam no quadro 1, do Anexo 3, da NR-15. Assim, embora tenha exercido, durante a vigência do pacto laboral, atividades moderadas, cujo Anexo 3, da NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, prevê o limite máximo de temperatura permitido de 26,7º, o valor médio encontrado pelo Sr. Perito foi de 25,15º, abaixo dos limites de tolerância, portanto, sendo indevido o adicional de remuneração. Recurso da Reclamante a que se nega provimento.” (TRT 15ª R. – RO 0002396-21.2013.5.15.0011 – (44849/2015) – Relª Luciane Storel da Silva – DJe 21.08.2015 – p. 1205)
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Jurisprudência Comentada
A Jurisprudência do STF e do STJ sobre Indenização de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em Desapropriações IARA ALVES DE PAIVA LIMA
Advogada, Alves de Paiva Advogados Associados.
RESUMO: O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm posicionamentos diferentes quanto à possibilidade de indenização de cobertura florística de áreas de preservação permanente em caso de desapropriação. Enquanto o Supremo Tribunal Federal entende que a cobertura florística deve ser indenizada, o Superior Tribunal de Justiça entende no sentido de que não há direito a tal indenização. A intenção do presente artigo é explicitar os fundamentos que cada uma das Cortes apresenta para seu posicionamento. Ademais, o artigo ressalta que os casos até agora analisados por aquelas Cortes Superiores tinham regência no antigo Código Florestal (Lei nº 4.771/1965), cabendo, então, indagar se o dissenso permanecerá sob a égide do novo Código Florestal (Lei nº 12.652/2012), ou se passará a haver consenso. PALAVRAS-CHAVE: APP; cobertura florística; indenização; desapropriação; tribunais superiores. ABSTRACT: The Supreme Federal Court and the Superior Federal Tribunal disagree as to whether the expropriation of vegetation should be compensated when the land being expropriated consists of an area of permanent preservation (APP). On one hand, the Supreme Federal Court’s opinion is that there should be a compensation in such cases, whereas the Superior Federal Tribunal’s opinion goes in the opposite direction.
This article intends to explicit the reasons that each court holds to bear its opinion. Besides, the article intends to show that the cases that have been adjudicated so far by the Courts were examined under the former Forest Code (Statute n. 4.771/1965). This gives room for wondering as to whether the disagreement will continue under the new Forest Code (Statute n. 12.652/2012) or will there be consensus. KEYWORDS: APP; vegetation; compensation; expropriation; superior tribunals. SUMÁRIO: Introdução; 1 Supremo Tribunal Federal; 2 O Superior Tribunal de Justiça; 3 Definição legal de área de preservação ambiental; 4 Perspectivas.
INTRODUÇÃO Em que pese a relevância indiscutível do tema, a indenização de áreas de preservação permanente (APPs) em desapropriações é um ponto em que os tribunais superiores ainda não alcançaram consenso. Para bem da exatidão, é necessário precisar os termos da discórdia: ambos admitem que o solo deva ser indenizado, a não ser que a área de preservação permanente (APP) se situe em terra pública. Também há concordância quanto à ausência do direito à indenização por APPs devastadas ou descaracterizadas, uma vez que só pode haver indenização se houver cobertura florística. Esses são os aspectos convergentes. Quanto ao mais, há discórdia. O presente artigo examinará as diferenças de entendimento entre Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça. Ao final, será traçado um prognóstico sobre esse dissenso, isto é, se ele deverá ou não permanecer.
1 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL O último julgado do STF sobre o tema ilustra com fidelidade a posição da Corte: O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que as áreas referentes à cobertura vegetal e à preservação permanente devem ser indenizadas, não obstante a incidência de restrição ao direito de propriedade que possa incidir sobre todo o imóvel que venha a ser incluído em área de proteção ambiental. (1ª T., AI 653062-AgRg/SP, J. 11.11.2014; no mesmo sentido: 2ª T., AI 677647-AgRg/AP, J. 20.05.2008)
O raciocínio empregado pelo Supremo é bastante simples. A cobertura florística é imóvel por acessão (art. 1.253 do CC); assim sendo, sua propriedade cabe ao dono do solo. Por mais que a lei lhe vede a utilização do bem, ele continua sendo seu dono. Dessa forma, uma vez que a desapropriação é uma modalidade de perda do domínio em favor do Poder Público (art. 1.275 do CC), cabe indenização, pois há perda de patrimônio.
2 O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Em fevereiro de 2015, o STJ marcou mais uma vez sua posição sobre o tema, em termos bastante claros:
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Nas demandas expropriatórias, é incabível a indenização da cobertura vegetal componente de área de preservação permanente. Recurso especial provido. (REsp 1090607, 1ª T., J. 05.02.2015; no mesmo sentido: AgRg-REsp 872879/AC, 2ª T., J. 03.05.2012 e REsp 848577/AC, J. 10.08.2010)
A linha mestra do julgamento ficou delineada pelo voto do relator, Ministro Sérgio Kukina, seguido pela unanimidade de seus pares: Partindo-se da compreensão de que o conceito de indenização pressupõe a existência de um decréscimo patrimonial, não é possível vislumbrar a possibilidade de se compensar a cobertura vegetal que não poderia ser explorada economicamente pelo proprietário do imóvel, porquanto localizada em área de preservação permanente.
Em outras palavras, a posição do STJ é de que, embora o dono do solo seja também dono da cobertura florística, indenizá-lo por algo que ele não poderia explorar economicamente importaria em enriquecimento sem causa (art. 884 do CC). Mas o entendimento do Superior Tribunal de Justiça não é uniforme. Houve um caso referente à desapropriação de uma grande área que seria inundada para se tornar reservatório de uma usina hidrelétrica. Em casos como esse, é estritamente necessário, por motivos ambientais e de engenharia de usinas, remover as árvores que, se não cortadas, ficarão no fundo do reservatório e entrarão em decomposição, poluindo o reservatório, ameaçando a icteofauna e podendo danificar as turbinas. No caso em comento, em que a cobertura florística seria necessariamente cortada e, por consequência, explorada economicamente, o STJ decidiu pela indenização florística da área de preservação permanente (REsp 1.016.840/SC, 1ª T., J. 17.11.2011).
A totalidade dos casos julgados até o momento pelo STF e STJ disse respeito ao Código Florestal anterior (Lei nº 4.771/1965). Seu art. 1º, § 2º, II, definia APP nos seguintes termos: área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; [...].
Além da definição, havia diversas outras disposições sobre APP no antigo Código Florestal, todas notavelmente restritivas à sua utilização econômica (p. ex.: art. 4º, caput). Até mesmo o acesso às áreas era limitado (art. 4º, § 7º: “É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente, para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa”).
a utilização econômica, das APPs, nos seguintes termos: “Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada, exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008”. Já o art. 68, § 12, estabelece que: Será admitida a manutenção de residências e da infraestrutura associada às atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural, inclusive o acesso a essas atividades, independentemente das determinações contidas no caput e nos §§ 1º a 7º, desde que não estejam em área que ofereça risco à vida ou à integridade física das pessoas.
Portanto, entre o Código atual e o anterior, a normatização das APPs foi bastante alterada. A ressalva de que apenas se consideram consolidadas áreas ocupadas até 2008 não tem maior relevância prática. A grande maioria das glebas hoje ocupadas já o era em 2008. Assim, um imenso contingente de terras cuja utilização econômica era vedada pela legislação agora pode ser utilizada, observadas as restrições e finalidades estabelecidas por lei.
Área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; [...] (art. 3º, II).
Neste tópico, cabem três observações finais. Não há exigência legal de que a pessoa que estava na APP consolidada (2008) seja a mesma que lá está hoje. A exigência legal (art. 3º, III e IV, c\c art. 61-A do Novo Código Florestal) é no sentido de que, em 22 de julho de 2008, a terra estivesse ocupada, sem exigir que, desde então, não tenha havido transmissão da propriedade ou posse do imóvel, inter vivos ou causa mortis.
Todavia, há diferenças cruciais. No Código atual (Lei nº 12.652/2012), há um dispositivo que cria as áreas consolidadas nos seguintes termos: “Área de imóvel rural com ocupação antrópica [humana] preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção do regime de pousio; [...] (art. 3º, IV)”. Adiante, o Novo Código Florestal admite explicitamente
Uma segunda observação indaga se uma gleba que, em 22 de julho de 2008, estava sem cultivo desde agosto de 2003 pode ser considerada área consolidada. A resposta é positiva. O art. 3º, II, do Código Florestal foi explícito ao estabelecer que o imóvel rural com ocupação antrópica [humana] preexistente a 22 de julho de 2008, “com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção do
A definição de APP do atual Código Florestal (Lei nº 12.652/2012) é bastante similar à da lei anterior:
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3 DEFINIÇÃO LEGAL DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL
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regime de pousio; [...]”. Mais à frente, inciso XXIV do mesmo art. 3º define pousio como “prática de interrupção temporária de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais, por no máximo 5 (cinco) anos, para possibilitar a recuperação da capacidade de uso ou da estrutura física do solo”. Assim, se a não utilização da terra nos anos imediatamente anteriores a 22 de julho de 2008 se deu por razão de pousio, não haverá óbice a que a área seja tida por consolidada. Como terceira e última observação, é interessante notar que o legislador não exigiu que as atividades a serem desenvolvidas em APPs em área consolidada sejam de baixo impacto ambiental. O art. 68, § 12, fala em atividades agrossilvipastoris, ecoturismo e turismo rural, sem fazer referência ao grau de impacto ambiental dessas atividades. Vale ressaltar que o Código Florestal define baixo impacto ambiental expressamente (art. 3º, X). Assim, se fosse intenção do legislador limitar as atividades das APPs em áreas consolidadas a atividades com baixo grau ambiental, bastaria ter remetido ao art. 3º, X, o que não foi feito.
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4 PERSPECTIVAS
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Conforme abordado no item 3 deste trabalho, os julgados do Superior Tribunal de Justiça que negam indenização por cobertura florística em APPs desapropriadas partem do pressuposto de que os donos dessas áreas são proibidos por lei de aproveitá-las economicamente. Tais julgados tiveram por base o Código Florestal anterior (Lei nº 4.771/1965), que, de fato, restringia drasticamente as possibilidades de uso econômico de APPs. Entretanto, não tardarão a chegar ao STJ processos regidos pelo Novo Código Florestal, que apresenta visão bem distinta quanto à utilização econômica de APPs. Conforme isso for acontecendo, gradativamente, a tendência é que jurisprudência do STJ assuma teor semelhante à já exarada pelo Supremo Tribunal Federal.
Medida Provisória
Medida Provisória nº 712, de 29.01.2016 Dispõe sobre a adoção de medidas de vigilância em saúde quando verificada situação de iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do Vírus da Dengue, do Vírus Chikungunya e do Zika Vírus. (DOU de 01.02.2016)
Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com. 2.186-16, DE 23.08.2001
Patrimônio Genético. Diversidade Biológica
2.187-13, DE 24.08.2001
Previdência Social. Alteração na Legislação
2.189-49, DE 23.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.190-34, DE 23.08.2001
Vigilância Sanitária. Alteração da Lei nº 9.782/1999
2.192-70, DE 24.08.2001
Proes. Bancos Estaduais
2.196-3, DE 24.08.2001
Instituições Financeiras Federais. Recuperação. Empresa Gestora de Ativos – Emgea
2.197-43, DE 24.08.2001
SFH. Disposições
2.198-5, DE 24.08.2001
Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
2.199-14, DE 24.08.2001
IR. Incentivos Fiscais
2.200-2, DE 24.08.2001
Infraestrutura de Chaves Públicas. ICP-Brasil
2.206-1, DE 06.09.2001
Programa Nacional de Renda Mínima
2.208, DE 17.08.2001
Estudante Menor de 18 Anos. Comprovação
2.209, DE 29.08.2001
Comercializadora Brasileira de Energia Elétrica – CBEE
2.210, DE 29.08.2001
Orçamento. Crédito Extraordinário
2.211, DE 29.08.2001
Orçamento 2001 e 2002. Diretrizes
2.213-1, DE 30.08.2001
Programa Bolsa-Renda. Estiagem
2.214, DE 31.08.2001
Administração Pública Federal. Recursos
2.215-10, DE 31.08.2001
Militares das Forças Armadas. Reestruturação da Remuneração
2.220, DE 04.09.2001
Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU
2.224, DE 04.09.2001
Capitais Brasileiros no Exterior
2.225-45, DE 04.09.2001
Servidor Público. Tráfico de Entorpecentes. Alteração das Leis nºs 6.368/1976 e 8.112/1990
2.226, DE 04.09.2001
Alteração da CLT
2.227, DE 04.09.2001
Plano Real. Correção Monetária. Exceção
Carreira Policial. Gratificação
2.228-1, DE 06.09.2001
Dívida Pública Mobiliária. Consolidação. Assunção. Refinanciamento
Cultura. Política Nacional do Cinema – Ancine. Prodecine. Funcines
2.229-43, DE 06.09.2001
Policiais Civis da União e DF. Alteração na legislação
2 .156-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento do Nordeste – Adene
2.157-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA
2.158-35, DE 24.08.2001
Cofins, PIS/Pasep e IR. Alteração na Legislação
2.159-70, DE 24.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.161-35, DE 23.08.2001
Programa Nacional de Desestatização. Alteração da Lei nº 9.491/1997
2.162-72, DE 23.08.2001
Notas do Tesouro Nacional – NTN
2.163-41, DE 23.08.2001
Meio Ambiente. Alteração da Lei nº 9.605/1998
2.164-41, DE 24.08.2001
Alteração da CLT. Trabalho a Tempo Parcial e PAT
2.165-36, DE 23.08.2001
Servidor Público e Militar. Auxílio-Transporte
2.166-67, DE 24.08.2001
Código Florestal. Alteração da Lei nº 4.771/1965
2.167-53, DE 23.08.2001
Recebimento de Valores Mobiliários pela União
2.168-40, DE 24.08.2001
Cooperativas. Recoop. Sescoop
2.169-43, DE 24.08.2001
Servidor Público. Vantagem de 28,86%
2.170-36, DE 23.08.2001
Tesouro Nacional. Administração de Recursos
2.172-32, DE 23.08.2001
Usura. Agiotagem
2.173-24, DE 23.08.2001
Anuidades Escolares
2.174-28, DE 24.08.2001
União. Programa de Desligamento Voluntário – PDV
2.177-44, DE 24.08.2001
Planos de Saúde. Alteração da Lei nº 9.656/1998
2.178-36, DE 24.08.2001
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dinheiro Direto na Escola
2.179-36, DE 24.08.2001
União e Banco Central. Relações Financeiras
2.180-35, DE 24.08.2001
Advocacia-Geral da União. Alteração na Legislação
2.181-45, DE 24.08.2001
Operações Financeiras do Tesouro Nacional
2.183-56, DE 24.08.2001
Reforma Agrária. Alteração na Legislação
2.184-23, DE 24.08.2001 2.185-35, DE 24.08.2001
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Normas do Juris SÍNTESE atingidas pelas Medidas Provisórias em vigor (até 29.02.2016)
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Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive as medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com. MP 692 692 693 693 696 698 699 700 700 700 700 700 700
DOU 22.09.2015 22.09.2015 30.09.2015-extra 30.09.2015-extra 05.10.2015 23.10.2015-extra 11.11.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015
ART 1º 3º 1º 2º 2º 1º 1º 1º 2º 3º 4º 5º 6º
NORMA LEGAL Lei nº 8.981/1995, MP 685/2015 Lei nº 12.780/2013 Lei nº 10.593/2002 Lei nº 10.683/2003 Lei nº 11.977/2009 Lei nº 9.503/1997 Decreto-Lei nº 3.365/1941 Lei nº 6.015/1973 Lei nº 10.406/2002 Lei nº 9.514/1997 Lei nº 6.766/1979 Lei nº 12.787/2013
ALTERAÇÃO 21 2º 18-A, 23-A, 23-B e 23-C 5º-A 1°, 3°, 5°, 6°, 16, 25, 27, 29 e 54 6º-A 253-A, 271-A e 320-A 2º, 4º, 4º-A, 5º, 7º, 15-A, 176-A, 176-B, 195-B, 221, 235, 1.225, 1.473 22 26 38
MP 700 701 701 701 701 701 703 703 703 705 706 707 707
DOU 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 21.12.2015 21.12.2015 21.12.2015 24.12.2015 28.12.2015 31.12.2015 31.12.2015
ART 7º 1º 2º 3º 4º 5º 1º 2º 2º 1º 1º 1º 2º
NORMA LEGAL Lei nº 6.015/1973 Lei nº 6.704/1979 Lei nº 9.818/1999 Lei nº 11.281/2006 Lei nº 12.712/2012 Decreto-Lei nº 857/1969 Lei nº 12.846/2013 Lei nº 8.429/1992 Lei nº 12.846/2013 Lei nº 12.722/2012 Lei nº 12.783/2013 Lei nº 12.096/2009 Lei nº 12.844/2013
ALTERAÇÃO 235 1º, 4º 5º 2º 56 2º 15, 16, 17, ,17-A, 17-B, 18, 20, 25, 29, 30 17 16 4º 11 1º-A 8º, 9º
DOU 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 27.08.2001
ART 32 32 32 32 32 2º e 93 3º e 93 10 e 93 19 e 93 34 e 75 64 69 70 72 73 73 e 93 75 82 93 93 93 93 93 93 1º e 6º 6º 1º 7º e 8º
NORMA LEGAL DL 1.376/74 DL 2.397/87 Lei nº 8.034/90 Lei nº 9.532/97 DL 1.376/74 Lei nº 9.718/98 Lei nº 9.701/98 Lei nº 9.779/99 Lei nº 9.715/98 Lei nº 9.532/97 D nº 70.235/72 DL 1.455/76 Lei nº 9.430/96 Lei nº 8.218/91 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.532/97 Lei nº 8.981/95 Lei nº 9.432/97 LC 70/91 LC 85/96 Lei nº 7.714/88 Lei nº 9.004/95 Lei nº 9.493/97 Lei nº 9.491/97 Lei nº 9.094/95 Lei nº 9.605/98 Lei nº 7.998/90
2.164-41
27.08.2001
1º e 2º
CLT
2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.165-36 2.165-36 2.166-67
27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 25.08.2001-extra
3º 4º 5º 6º 9º 10 13 13 1º
Lei nº 4.923/65 Lei nº 5.889/73 Lei nº 6.321/76 Lei nº 6.494/77 Lei nº 8.036/90 Lei nº 9.601/98 Lei nº 7.418/85 Lei nº 8.627/93 Lei nº 4.771/65
2.166-67 2.167-53 2.168-40 2.168-40 2.168-40 2.170-36 2.172-32 2.173-24 2.177-44
25.08.2001 24.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 27.08.2001
3º 2º e 3º 13 14 18 8º 7º 1º e 2º 1º e 8º
Lei nº 9.393/96 Lei nº 9.619/98 Lei nº 5.764/71 Lei nº 9.138/95 Lei nº 10.186/01 Lei nº 8.212/91 Lei nº 1.521/51 Lei nº 9.870/99 Lei nº 9.656/98
2.178-36 2.178-36 2.180-35
25.08.2001-extra 25.08.2001-extra 27.08.2001
16 32 1º
Lei nº 9.533/97 Lei nº 8.913/97 Lei nº 8.437/92
ALTERAÇÃO 1º e 11 12 1º 2º 1º 3º e 8º 1º 14 e 17 2º e 4º 1º e 64-A 1º, 25 e 64-A 1º, 9º, 10, 16, 18, 19 e 64-A 63 11 e 12 1º e 64-A 9º e 15 1º, 15 e 64-A 29 11 6º e 7º Revogada 5º Revogada 7º 2º, 4º, 5º, 6º e 30 2º 79-A 2º, 2º-A, 2º-B, 3º-A, 7º-A, 8º-A, 8º-B e 8º-C 58-A, 59, 130-A, 143, 476-A, 627-A, 643 e 652 1º 18 2º 1º 19-A, 20, 29-C e 29-D 2º 1º 6º 1º, 3º-A, 4º, 14, 16, 37-A, 44, 44-A, 44-B e 44-C 10 1º e 4º-A 88 2º 7º 60 4º, § 3º 1º e 6º 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 24-A, 24-B, 24-C, 24-D, 25, 26, 27, 28, 29, 29-A, 30, 31, 32, 34, 35, 35-A, 35-B, 35-C, 35-D, 35-E, 35-F, 35-G, 35-H e 35-I 4º Revogada 1º e 4º
MP 2.180-35
DOU 27.08.2001
ART 4º
NORMA LEGAL Lei nº 9.494/97
2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.181-45 2.181-45 2.181-45 2.183-56 2.183-56 2.183-56 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.189-49 2.189-49 2.189-49 2.189-49 2.190-34 2.192-70 2.196-3 2.196-3 2.197-43 2.197-43 2.197-43 2.199-14 2.211 2.211 2.214 2.215-10 2.215-10
27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 25.08.2001-extra 25.08.2001 25.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 30.08.2001 30.08.2001 01.09.2001-extra 01.09.2001 01.09.2001
6º 7º 8º 10 14 21 45 46 52 1º 3º 4º 2º 3º e 16 4º e 16 7º 16 10 11 13 14 7º e 8º 23 12 14 3º e 8º 4º e 8º 5º 18 1º 2º 1º 41 41
Lei nº 7.347/85 Lei nº 8.429/92 Lei nº 9.704/98 CPC Lei nº 4.348/64 Lei nº 10.257/01 Lei nº 8.177/91 Lei nº 9.365/96 Lei nº 10.150/00 DL 3.365/41 Lei nº 8.177/91 Lei nº 8.629/93 Lei nº 6.015/73 Lei nº 8.212/91 Lei nº 8.213/91 Lei nº 9.639/98 Lei nº 9.711/98 Lei nº 9.532/97 Lei nº 9.250/95 Lei nº 9.430/96 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.294/96 Lei nº 9.496/97 Lei nº 8.036/90 Lei nº 7.827/89 Lei nº 8.692/93 Lei nº 4.380/64 Lei nº 8.036/90 Lei nº 9.532/97 Lei nº 9.995/00 Lei nº 10.266/01 Lei nº 10.261/01 Lei nº 8.448/92 Lei nº 8.460/92
2.217-3
05.09.2001
1º
Lei nº 10.233/01
2.220 2.224 2.225-45 2.225-45
05.09.2001-extra 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001
Lei nº 6.015/73 Lei nº 4.131/62 Lei nº 6.368/76 Lei nº 8.112/90
2.225-45 2.225-45 2.226 2.226 2.228-1 2.228-1
05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001
15 4º 1º 2º, 3º e 15 4º 5º 1º 3º 51 52 e 53
2.229-43 2.229-43
10.09.2001 10.09.2001
72 74
Lei nº 9.986/00 Lei nº 8.745/93
Lei nº 8.429/92 Lei nº 9.525/97 CLT Lei nº 9.469/97 Lei nº 8.685/93 Lei nº 8.313/91
ALTERAÇÃO 1º-A, 1º-B (CPC e CLT), 1º-C, 1º-D, 1ºE, 1º-F, 2º-A e 2º-B 1º e 2º 17 1º 741 4º 53 18 6º 1º 10, 15-A, 15-B e 27 5º 2º, 2º-A, 5º, 6º, 7º, 11, 12, 17, 18 e 26-A 80 38, 55, 56, 68, 101 e 102 41, 95, 96, 134, 144, 145, 146 e 147 1º, 2º e 5º 7º, 8º, 9º, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 6º, II, 34 e 82, II, f 10 e 25 79 9º 2º, 3º e 7º 1º, 3º, 6º, 7º-A e 7º-B 9º 9º-A 23 e 25 9º, 14 e 18 9º, 20, 23, 29-A e 29-B 4º 35 e 70 18, 34, 38 e 51 1º 6º 2º, 20, 25, 26 e 27, 5º, 7º-A, 13, 14, 14-A, 23, 24, 27, 28, 30, 32, 34-A, 38, 44, 51-A e 61-A 74, 77, 78-A, 78-B, 78-C, 78-D, 78-E, 78-F, 78-G, 78-H, 78-I 78-J, 82, 83, 84, 85-A, 85-B, 85-C, 85-D, 86, 88, 89, 100, 102-A, 103-A, 103-B, 103-C, 103-D, 113-A, 114-A, 15, 116-A, 118 e 119 167, I 6º 3º 25, 26, 46, 47, 61, 62-A, 67, 91, 117 e 119 17 2º 896-A 6º 5º 3º, II, a (a partir de 01.01.2007), e 18, § 3º 22 4º
Março/2016 – Ed. 228
MP 2.156-5 2.156-5 2.156-5 2.156-5 2.157-5 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.161-35 2.162-72 2.163-41 2.164-41
100
Norma Legal
Lei nº 13.256, de 04.02.2016 Altera a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para disciplinar o processo e o julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial, e dá outras providências (DOU de 05.02.2016)
Indicadores
I –Índices de Atualização dos Débitos Trabalhistas TABELA ÚNICA PARA ATUALIZAÇÃO DE DÉBITOS TRABALHISTAS ATÉ 31 DE MARÇO DE 2016 - PARA 1º DE ABRIL DE 2016* *TR prefixada de 1º março/2016 a 1º abril/2016 (Banco Central) = 0,2168%
Mês/Ano 1993 1994 1995 1996 1997 1998 JAN 0,000233748 0,009078502 2,375170453 1,804530370 1,646693324 1,499925759
Mês/Ano 2005 2006 2007 2008 2009 2010 JAN 1,150515460 1,118813586 1,096470447 1,080848821 1,063462864 1,055975932
FEV
0,000184402 0,006418624 2,326288160 1,782206452 1,634532403 1,482932832
FEV
1,148356550 1,116217265 1,094075516 1,079758265 1,061509686 1,055975932
MAR
0,000145888 0,004589321 2,283964023 1,765216245 1,623789378 1,476346848
MAR
1,147252893 1,115408594 1,093287256 1,079495948 1,061031161 1,055975932
ABR
0,000115959 0,003235334 2,232618268 1,750965140 1,613597927 1,463185495
ABR
1,144237826 1,113101135 1,091240090 1,079054614 1,059507589 1,055140261
MAIO
0,000090437 0,002216437 2,157813352 1,739489726 1,603637733 1,456311704
MAIO
1,141950499 1,112150246 1,089853796 1,078025100 1,059026791 1,055140261
JUN
0,000070281 0,001513546 2,089950568 1,729307564 1,593512555 1,449725600
JUN
1,139072064 1,110054464 1,088016136 1,077232258 1,058551501 1,054602414
JUL
0,000054029 2,833867312 2,031320562 1,718824453 1,583166561 1,442637920
JUL
1,135672995 1,107908445 1,086979158 1,075999162 1,057857547 1,053981619
AGO
0,041442691 2,698249205 1,972337800 1,708826112 1,572817422 1,434742532
AGO
1,132756148 1,105971888 1,085384728 1,073943634 1,056746906 1,052769881
SET
0,031080464 2,641944093 1,922272220 1,698170094 1,563017304 1,429383772
SET
1,128843576 1,103284288 1,083795883 1,072255904 1,056538768 1,051813782
OUT
0,023087553 2,579038759 1,885702786 1,687002140 1,552963419 1,422963362
OUT
1,125874645 1,101608741 1,083414521 1,070147713 1,056538768 1,051075927
NOV
0,016910242 2,514783525 1,855020743 1,674578443 1,542853102 1,410421890
NOV
1,123515263 1,099547090 1,082178673 1,067472626 1,056538768 1,050580053
DEZ
0,012419390 2,443411476 1,828711077 1,661047549 1,519552288 1,401820321
DEZ
1,121352174 1,098139275 1,081540564 1,065748245 1,056538768 1,050227177
Mês/Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Mês/Ano 2011 2012 2013 2014 2015 2016
JAN
1,391476087 1,316070937 1,289048489 1,260248587 1,225892455 1,171436643
JAN
1,048752630 1,036235859 1,033242460 1,031272491 1,022486088 1,004451203
FEV
1,384328798 1,313248766 1,287286195 1,256991721 1,219941580 1,169939121
FEV
1,048003308 1,035341324 1,033242460 1,030112584 1,021589133 1,003127075
MAR
1,372936173 1,310198623 1,286812648 1,255521505 1,214940883 1,169403534
MAR
1,047454442 1,035341324 1,033242460 1,029559711 1,021417534 1,002168000
ABR
1,357173955 1,307267729 1,284598001 1,253318172 1,210363289 1,167328025
ABR
1,046186464 1,034236759 1,033242460 1,029285921 1,020095491 1,000000000
MAIO
1,348956114 1,305569184 1,282615078 1,250371047 1,205320229 1,166308671
MAIO
1,045800564 1,034002040 1,033242460 1,028813695 1,019001084
JUN
1,341229292 1,302323793 1,280276013 1,247748281 1,199741432 1,164508341
JUN
1,044161230 1,033518354 1,033242460 1,028192667 1,017827528
JUL
1,337073668 1,299542771 1,278412089 1,245777461 1,194764045 1,162461247
JUL
1,042999329 1,033518354 1,033242460 1,027714780 1,015985547
AGO
1,333163499 1,297535484 1,275299084 1,242477441 1,188270148 1,160196544
AGO
1,041719056 1,033369549 1,033026557 1,026632709 1,013649085
SET
1,329248861 1,294913284 1,270932161 1,239402483 1,183491211 1,157875004
SET
1,039560928 1,033242460 1,033026557 1,026015048 1,011760129
OUT
1,325649722 1,293570558 1,268867713 1,236984179 1,179523294 1,155877648
OUT
1,038519293 1,033242460 1,032944955 1,025120118 1,009821272
NOV
1,322653911 1,291870457 1,265182237 1,233569658 1,175745624 1,154598353
NOV
1,037875810 1,033242460 1,031995519 1,024057147 1,008016922
DEZ
1,320016518 1,290325936 1,262747660 1,230316701 1,173661201 1,153276698
DEZ
1,037206812 1,033242460 1,031781940 1,023562766 1,006711218
OBS.: Foram consideradas as divisões por 1.000 ocorridas em março/1986, janeiro/1989, agosto/1993, e por 2.750 ocorridas em julho/1994.
ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO - TR - DIÁRIA (PRO RATA DIE)
Março/2016 – Ed. 228
MÊS: MARÇO ANO: 2016
103
DIA 1º 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 1º
MÊS MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO MARÇO ABRIL
TR DIÁRIA 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% -
TR ACUMULADA 0,00% 0,01% 0,02% 0,03% 0,04% 0,04% 0,04% 0,05% 0,06% 0,07% 0,08% 0,09% 0,09% 0,09% 0,10% 0,11% 0,12% 0,13% 0,14% 0,14% 0,14% 0,15% 0,16% 0,17% 0,18% 0,18% 0,18% 0,18% 0,19% 0,20% 0,21% 0,22%
ÍNDICE 1 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,001 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002 1,002
2 – Juros de mora (incidentes a partir da propositura da ação e aplicados sobre o principal corrigido): • Até 28.02.1987 – Juros simples – 0,5% ao mês; • De 01.03.1987 até 31.01.1991 – Juros capitalizados mensalmente – 1% ao mês; • De 01.02.1991 em diante – Juros simples – 1% ao mês.
Fórmula para cálculo da taxa efetiva (T) dos juros capitalizados: T = (1,01)n – 1, onde “n” é igual ao número de dias decorridos desde a data da propositura da ação, contidos no período compreendido entre 01.03.1987 e 31.01.1991, dividido por 30.
Juros Capitalizados Mensalmente Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16
1,0000 2,0100 3,0301 4,0604 5,1010 6,1520 7,2135 8,2856 9,3685 10,4622 11,5668 12,6825 13,8093 14,9474 16,0968 17,2578
17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32
18,4304 19,6147 20,8108 22,0190 23,2391 24,4715 25,7163 26,9734 28,2431 29,5256 30,8208 32,1290 33,4503 34,7848 36,1327 37,4940
33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 –
38,8690 40,257+6 41,6602 43,0768 44,5076 45,9527 47,4122 48,8863 50,3752 51,8789 53,3977 54,9317 56,4810 58,0458 59,6263 –
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.10.1989
NCz$
381,73
Decreto nº 98.211/89
02.10.1989
01.09.1990
Cr$
6.056,31
Port. 3.588/90
03.09.1990
01.11.1989
NCz$
557,33
Decreto nº 98.346/89
31.10.1989
01.10.1990
Cr$
6.425,14
Port. 3.628/90
01.10.1990
01.12.1989
NCz$
788,18
Decreto nº 98.456/89
01.12.1989
01.11.1990
Cr$
8.329,55
Port. 3.719/90
01.11.1990
01.01.1990
NCz$
1.283,95
Decreto nº 98.783/89
29.12.1989
01.12.1990
Cr$
8.836,82
Port. 3.787/90
03.12.1990
Cr$
12.325,50
Port. 3.828/90
31.12.1990
01.02.1990
NCz$
2.004,37
Decreto nº 98.900/90
01.02.1990
01.01.1991
01.03.1990
NCz$
3.674,06
Decreto nº 98.985/90
01.03.1990
01.02.1991
Cr$
15.895,46
MP 295/91
01.02.1991
01.04.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.143/90
24.04.1990
01.03.1991
Cr$
17.000,00
Lei nº 8.178/91
04.03.1991
Cr$
42.000,00
Lei nº 8.222/91
06.09.1991
01.05.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.352/90
23.05.1990
01.09.1991
01.06.1990
Cr$
3.857,76
Port. 3.387/90
04.06.1990
01.01.1992
Cr$
96.037,33
Port. 42/92
21.01.1992
01.07.1990
Cr$
4.904,76
Port. 3.501/90
16.07.1990
01.05.1992
Cr$
230.000,00
Lei nº 8.419/92
08.05.1992
01.08.1990
Cr$
5.203,46
Port. 429/90
01.08.1990
01.09.1992
Cr$
522.186,94
Port. 601/92
31.08.1992
Março/2016 – Ed. 228
II – Evolução do Salário-Mínimo desde 1989
104
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.01.1993
Cr$
1.250.700,00
Lei nº 8.542/92
24.12.1992
03.04.2000
R$
151,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.03.1993
Cr$
1.709.400,00
Port. Interm. 4/93
01.03.1993
01.04.2001
R$
180,00
MP 2.142/01 (atual 2.194-6)
30.03.2001
01.05.1993
Cr$
3.303.300,00
Port. Interm. 7/93
04.05.1993
01.04.2002
R$
200,00
Lei nº 10.525/02
28.03.2002
01.07.1993
Cr$
4.639.800,00
Port. Interm. 11/93
01.08.1993
01.04.2003
R$
240,00
Lei nº 10.699/03
10.07.2003
01.08.1993
CR$
5.534,00
Port. Interm. 12/93
03.08.1993
01.05.2004
R$
260,00
Lei nº 10.888/04
25.06.2004
01.09.1993
CR$
9.606,00
Port. Interm. 14/93
02.09.1993
01.05.2005
R$
300,00
Lei nº 11.164/05
19.08.2005
01.10.1993
CR$
12.024,00
Port. Interm. 15/93
04.10.1993
01.04.2006
R$
350,00
MP 288/06
31.03.2006
01.11.1993
CR$
15.021,00
Port. Interm. 17/93
03.11.1993
01.04.2006
R$
350,00
Lei nº 11.321/06
10.07.2006
01.12.1993
CR$
18.760,00
Port. Interm. 19/93
02.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
MP 362/07
30.03.2007-extra
01.01.1994
CR$
32.882,00
Port. Interm. 20/93
31.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
Lei nº 11.498/07
29.06.2007
01.02.1994
CR$
42.829,00
Port. Interm. 02/94
02.02.1994
01.03.2008
R$
415,00
MP 421/08
29.02.2008-extra
01.03.1994
URV
64,79
Port. Interm. 04/94
03.03.1994
01.02.2009
R$
465,00
MP 456/09
30.01.2009-extra
01.07.1994
R$
64,79
Lei nº 9.069/95
30.06.1994/30.06.1995
01.01.2010
R$
510,00
MP 474/09
24.12.2009
01.09.1994
R$
70,00
Lei nº 9.063/95
01.09.1994/20.06.1995
01.01.2011
R$
540,00
MP 516/10
31.12.2010
01.05.1995
R$
100,00
Lei nº 9.032/95
29.04.1995
01.03.2011
R$
545,00
Lei nº 12.382/11
28.02.2011
01.05.1996
R$
112,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2012
RS
622,00
Decreto nº 7.655/11
26.12.2011
01.05.1997
R$
120,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2013
R$
678.00
Decreto nº 7.872/11
26.12.2012
01.05.1998
R$
130,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2014
R$
724,00
Decreto nº 8.166/13
24.12.2013
01.05.1999
R$
136,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2015
R$
788,00
Decreto nº 8.381/14
29.12.2014
Março/2016 – Ed. 228
III – Previdência Social – Valores de Benefícios (Abril/2015)
105
Salário-de-benefício mínimo Salário-de-benefício máximo Renda mensal vitalícia Salário-família:
R$ 788,00 R$ 4.663,75 R$ 788,00 I - R$ 37,18 (trinta e sete reais e dezoito centavos) para o segurado com remuneração mensal não superior a R$ 725,02 (setecentos e vinte e cinco reais e dois centavos);
II - R$ 26,20 (vinte e seis reais e vinte centavos) para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 725,02 (setecentos e vinte e cinco reais e dois centavos) e igual ou inferior a R$ 1.089,72 (um mil e oitenta e nove reais e setenta e dois centavos). Benefícios a idosos e portadores de deficiência Um salário-mínimo (Decreto nº 1.744/1995)
INSS – JANEIRO 2016 TABELA DE CONTRIBUIÇÃO (EMPREGADO, EMPREGADO DOMÉSTICO E TRABALHADOR AVULSO) PARA PAGAMENTO DE REMUNERAÇÃO A PARTIR DE 1º DE JANEIRO DE 2016 Salário-de-contribuição (R$)
Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%)
até 1.556,94
8%*
de 1.556,95 até 2.594,92
9%*
de 2.594,93 até 5.189,82
11%*
ESCALA DE SALÁRIOS-BASE PARA OS SEGURADOS CONTRIBUINTE INDIVIDUAL E FACULTATIVO
Nota: Escala extinta, conforme o art. 9º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003, DOU 09.05.2003, e o art. 39 da Instrução Normativa DC/INSS nº 89, de 11.06.2003, DOU 13.06.2003.
* Alíquota reduzida para salários e remunerações até três salários-mínimos, em razão do disposto no inciso II do art. 17 da Lei nº 9.311, de 24.10.1996, que instituiu a Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e de Direitos de Natureza Financeira – CPMF.
IV – Imposto de Renda na Fonte TABELA PROGRESSIVA MENSAL Alíquota %
Até 1.903,98
-
Parcela a deduzir do imposto em R$ -
De 1.903,99 até 2.826,65
7,5 142,80
De 2.826,66 até 3.751,05
15,0 354,80
De 3.751,06 até 4.664,68
22,5 636,13
Acima de 4.664,68
27,5 869,36
Dedução por dependente
O imposto de renda anual devido, incidente sobre os rendimentos de pessoas físicas, será calculado de acordo com a tabela progressiva anual correspondente à soma das tabelas progressivas mensais vigentes nos meses de cada ano-calendário.
189,59
V – Limites de Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho NOVOS VALORES PARA DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO (Ato nº 397/2015 do TST, DJe de 13.07.2015, vigência a partir de 01.08.2015) Recurso Ordinário
R$ 8.183,06
Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória
R$ 16.366,10
Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.
Março/2016 – Ed. 228
Base de cálculo em R$
TABELA PROGRESSIVA ANUAL
106
VI – Indexadores Indexador INPC IGPM UFIR SELIC
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
Janeiro
Fevereiro
0,51 0,77 1,11 0,90 1,51 0,95 1,89 1,52 0,49 1,14 Extinta, a partir de outubro de 2000, pela MP 1.973-67, atual Lei nº 10.522, de 19.07.2002, DOU 22.07.2002, art. 29, § 3º. 1,11 1,11 1,06 1,16 1,06 Valor de Referência Base Maio/1992 – Cruzeiros 79.297,75 Emissão anterior a Jan./1989 79.297,75
TDA
1,00 1,29 0,95
Valores nominais reajustados – Reais 91,87 Emissão anterior a Jan./1989 157,23
(*) Referente ao primeiro dia de cada mês.
VII – Índices de Atualização dos Débitos Judiciais
Março/2016 – Ed. 228
Tabela editada em face da Jurisprudência ora predominante.
107
Mês/Ano 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Mês/Ano 1999
JAN 140.277,063840 3631,929071 FEV 180.634,775106 5132,642163 MAR 225.414,135854 7214,955088 ABR 287.583,354522 10323,157739 MAIO 369.170,752199 14747,663145 JUN 468.034,679637 21049,339606 JUL 610.176,811842 11,346741 AGO 799,392641 12,036622 SET 1065,910147 12,693821 OUT 1445,693932 12,885497 NOV 1938,964701 13,125167 DEZ 2636,991993 13,554359
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
13,851199 16,819757 14,082514 17,065325 14,221930 17,186488 14,422459 17,236328 14,699370 17,396625 15,077143 17,619301 15,351547 17,853637 15,729195 18,067880 15,889632 18,158219 16,075540 18,161850 16,300597 18,230865 16,546736 18,292849
18,353215 18,501876 18,585134 18,711512 18,823781 18,844487 18,910442 18,944480 18,938796 18,957734 19,012711 19,041230
19,149765 19,312538 19,416825 19,511967 19,599770 19,740888 19,770499 19,715141 19,618536 19,557718 19,579231 19,543988
2002
2003
19,626072 21,280595 22,402504 24,517690 19,753641 21,410406 22,575003 24,780029 20,008462 21,421111 22,685620 24,856847 20,264570 21,448958 22,794510 25,010959 20,359813 21,468262 22,985983 25,181033 20,369992 21,457527 23,117003 25,203695 20,384250 21,521899 23,255705 25,357437 20,535093 21,821053 23,513843 25,649047 20,648036 22,085087 23,699602 25,869628 20,728563 22,180052 23,803880 26,084345 20,927557 22,215540 24,027636 26,493869 21,124276 22,279965 24,337592 27,392011
2000
2001
28,131595 28,826445 29,247311 29,647999 30,057141 30,354706 30,336493 30,348627 30,403254 30,652560 30,772104 30,885960
2004 31,052744 31,310481 31,432591 31,611756 31,741364 31,868329 32,027670 32,261471 32,422778 32,477896 32,533108 32,676253
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2005 2006 2007
2008
32,957268 34,620735 35,594754 37,429911 33,145124 34,752293 35,769168 37,688177 33,290962 34,832223 35,919398 37,869080 33,533986 34,926270 36,077443 38,062212 33,839145 34,968181 36,171244 38,305810 34,076019 35,013639 36,265289 38,673545 34,038535 34,989129 36,377711 39,025474 34,048746 35,027617 36,494119 39,251821 34,048746 35,020611 36,709434 39,334249 34,099819 35,076643 36,801207 39,393250 34,297597 35,227472 36,911610 39,590216 34,482804 35,375427 37,070329 39,740658
2009
2010
39,855905 40,110982 40,235326 40,315796 40,537532 40,780757 40,952036 41,046225 41,079061 41,144787 41,243534 41,396135
41,495485 41,860645 42,153669 42,452960 42,762866 42,946746 42,899504 42,869474 42,839465 43,070798 43,467049 43,914759
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2011 2012 2013
44,178247 46,864232 44,593522 47,103239 44,834327 47,286941 45,130233 47,372057 45,455170 47,675238 45,714264 47,937451 45,814835 48,062088 45,814835 48,268754 46,007257 48,485963 46,214289 48,791424 46,362174 49,137843 46,626438 49,403187
2014
2015
2016
49,768770 52,537233 55,809388 62,102540 50,226642 52,868217 56,635366 63,040288 50,487820 53,206573 57,292336 63,639170 50,790746 53,642866 58,157450 51,090411 54,061280 58,570367 51,269227 54,385647 59,150213 51,412780 54,527049 59,605669 51,345943 54,597934 59,951381 51,428096 54,696210 60,101259 51,566951 54,964221 60,407775 51,881509 55,173085 60,872914 52,161669 55,465502 61,548603
Observação I – Dividir o valor a atualizar (observar o padrão monetário vigente à época) pelo fator do mês do termo inicial e multiplicar pelo fator do mês do termo final, obtendo-se o resultado na moeda vigente na data do termo final, não sendo necessário efetuar qualquer conversão. Esclarecendo que, nesta tabela, não estão incluídos os juros moratórios, apenas a correção monetária.
Padrões monetários a considerar: Cr$ (cruzeiro): de out./1964 a jan./1967
NCz$ (cruzado novo): de jan./1989 a fev./1990
NCr$ (cruzeiro novo): de fev./1967 a maio/1970
Cr$ (cruzeiro): de mar./1990 a jul./1993
Cr$ (cruzeiro): de jun./1970 a fev./1986
CR$ (cruzeiro real): de ago./1993 a jun./1994
Cz$ (cruzado): de mar./1986 a dez./1988
R$ (real): de jul./1994 em diante
Exemplo: Atualização, até março de 2016, do valor de Cz$1.000,00 fixado em janeiro de 1988 Cz$1.000,00 : 596,94 (janeiro/1988) x (março/2016) = R$ 106,60
Out./1964 a fev./1986: ORTN Mar./1986 e mar./1987 a jan./1989: OTN Abr./1986 a fev./1987: OTN pro rata Fev./1989: 42,72% (conforme STJ, índice de jan./1989
Abr./1989 a mar./1991: IPC do IBGE (de mar./1989 a fev./1991) Abr./1991 a jul./1994: INPC do IBGE (de mar./1991 a jun./1994) Ago./1994 a jul./1995: IPC-r do IBGE (de jul./1994 a jun./1995) Ago./1995 em diante: INPC do IBGE (de jul./1995 em diante), sendo que, com relação à aplicação da deflação, a matéria ficará sub judice)
Mar./1989: 10,14% (conforme STJ, índice de fev./1989) Observação III – Aplicação do índice de 10,14%, relativo ao mês de fevereiro de 1989, ao invés de 23,60%, em cumprimento ao decidido no Processo nº G-36.676/2002. Fonte: Site do TJSP * Aplicável aos cálculos judiciais, exceto para aqueles com normas específicas estabelecidas por lei ou com decisão transitada em julgado, que estabelece critérios e índices diferentes.
Março/2016 – Ed. 228
Observação II – Os fatores de atualização monetária foram compostos pela aplicação dos seguintes índices:
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Jornal Jurídico Março/2016 – Edição 228