Convertidos Literários - Joseph Pearce

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CONVERTIDOS LITERÁRIOS



CONVERTIDOS LITERÁRIOS

JOSEPH PEARCE

Tradução: Fausto Machado Tiemann

Livraria Danúbio Editora Santa Catarina, 2017


Título original: Literary Converts Copyright © Joseph Pearce, 1999 Tradução © Fausto Machado Tiemann, 2017 FICHA CATALOGRÁFICA Pearce, Joseph. 1961Convertidos literários Balneário Camboriú, SC: Livraria Danúbio Editora, 2017. ISBN: 978-85-67801-09-4 1. Literatura e retórica. I. Título. CDD – 800

Edição

Diogo Fontana

Revisão

Rafael Salvi

Diagramação

Jefferson Bombachim

Arte

Leandro Costa Bezerra

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Os recursos para esta publicação são de origem privada e foram levantados por meio de financiamento coletivo. Nenhum centavo de dinheiro público ― municipal, estadual ou federal ― foi usado pela editora.


Sumário Prefácio ....................................................................................................................................................................................... 11 Wilde do Outro Lado do Espelho ............................................................................................................................ 15 Belloc, Baring e Chesterton .......................................................................................................................................... 23 O Filho do Arcebispo ....................................................................................................................................................... 31 O Filho do Bispo .................................................................................................................................................................. 43 Dawson e Watkin.................................................................................................................................................................. 51 O Apostolado de Benson em Cambridge ........................................................................................................... 57 A Atração da Ortodoxia.................................................................................................................................................. 63 Religião e Política ................................................................................................................................................................ 69 Knox e Benson ....................................................................................................................................................................... 83 Knox e Chesterton .............................................................................................................................................................. 97 A Guerra e a Terra Desolada ...................................................................................................................................... 111 Poesia em Comoção ........................................................................................................................................................ 125 Graham Greene, Cético Católico .......................................................................................................................... 139 Waugh e a Terra Desolada ........................................................................................................................................... 149 Chesterton e Baring ......................................................................................................................................................... 183 Guerra e Rumores de Guerra .................................................................................................................................... 195 Guerra de Palavras ............................................................................................................................................................ 207 Reações Nucleares ............................................................................................................................................................ 223 O Cultivo da Cultura...................................................................................................................................................... 241 Uma Rede de Mentes ..................................................................................................................................................... 253 Militantes em Busca da Verdade ............................................................................................................................. 265 Spark e Sitwell ..................................................................................................................................................................... 275 Alec Guinness ...................................................................................................................................................................... 285 Sassoon e Knox ................................................................................................................................................................... 293 Contra Mundum ............................................................................................................................................................... 303


Adeus à Velha Geração .................................................................................................................................................. 321 A Beleza do Pequeno ...................................................................................................................................................... 335 Atando as Pontas Soltas ................................................................................................................................................ 367 Pintando o Deus Greene .............................................................................................................................................. 377 Crepúsculo Celta ............................................................................................................................................................... 391 Índice Onomástico .......................................................................................................................................................... 409



Prefácio EM 1905, o jovem G. K. Chesterton publicou Hereges, volume de ensaios em que precocemente criticava vários de seus contemporâneos, com destaque para Shaw e Wells. Em resposta, um crítico declarou que o autor não deveria condenar as “heresias” alheias sem antes expor sua própria “ortodoxia”. Chesterton aceitou a crítica e lançou-se ao desafio. Em 1908 vinha a lume Ortodoxia, assentado sobre uma premissa central: a de que não há melhor forma de explicar os mistérios mais profundos da vida e da existência humana do que à luz do Credo dos Apóstolos. Chesterton “assumir-se” cristão foi de um impacto tremendo, de influência semelhante à cândida confissão de ortodoxia por Newman i, mais de meio século antes. Tratava-se, em muitos sentidos, do prenúncio de um renascimento literário cristão, que, estendendo-se por todo o século XX, representou uma evocativa resposta intelectual e artística ao agnosticismo reinante. A Dra. Barbara Reynolds, estudiosa de Dante e biógrafa de Dorothy L. Sayers, descreveu esse renascimento literário como “uma rede de mentes energizando-se umas às outras”. Além de Chesterton, seus principais protagonistas foram T. S. Eliot, C. S. Lewis, Siegfried Sassoon, J. R. R. Tolkien, Hilaire Belloc, Charles Williams, R. H. Benson, Ronald Knox, Edith Sitwell, Roy Campbell, Maurice Baring, Evelyn Waugh, Graham Greene, Muriel Spark, Dorothy L. Sayers, Alfred Noyes, Compton Mackenzie, David Jones, Christopher Dawson, Malcolm Muggeridge, R. S. Thomas e George Mackay Brown. Sua influência extrapolou em muito o âmbito da literatura. Alec Guiness, Ernest Milton e Robert Speaight foram algumas das figuras do teatro cujas vidas se entremesclaram com as de seus contemporâneos cristãos das letras. A publicação da encíclica papal Rerum Novarum ii, em 1891, teve profunda influência sobre Belloc e, por intermédio deste, sobre Chesterton. Isto assegurou ao renascimento literário cristão uma dimensão política. Ao socialismo de Shaw e Wells, Belloc e Chesterton contrapuseram a doutrina social da Igreja, que denominaram “distributivismo”. Eric Gill tratou de botar em prática o distributivismo esposado por Belloc e Chesterton, enquanto E. F. Schumacher o popularizou, em fins da década de 1970, com seu popularíssimo Small is Beautiful iii. Assim como a mescla de filosofia nietzschiana e socialismo marxista colore e caracteriza a obra literária de Shaw, a mistura de teologia cristã e o preceito da “beleza do pequeno”, propugnado pela Igreja, vieram a colorir e caracterizar boa parte das obras do renascimento literário cristão. Tomada como um todo, essa rede de mentes representou uma pujante resposta cristã à era da descrença. Produziu algumas das grandes obras-primas literárias do século e permanece um i

Cardeal John Henry Newman (1801-1890), sacerdote inglês que se converteu do anglicanismo ao catolicismo. “Sobre as coisas novas” em português. Encíclica do Papa Leão XIII que manifestava preocupação com a condição dos operários fabris, mas rejeitava as idéias socialistas e sociais-democratas. iii Publicado no Brasil como O Negócio é Ser Pequeno. ii

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duradouro testemunho do poder criativo da fé. A história da profunda influência que esses gigantes da literatura exerceram entre si e sobre a época em que viveram é mais que o estudo de um importante aspecto da literatura do século XX: é uma história de aventura, em que crença e descrença se chocam em colisão criativa.

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“A conversão é como um passo com que atravessamos a lareira e saímos de um mundo de espelhos – onde tudo é absurda caricatura – para entrar no mundo real criado por Deus; e é então que começa o delicioso processo de explorá-lo sem limites.” EVELYN WAUGH



Wilde do Outro Lado do Espelho EM 22 de janeiro de 1901, decorridas três semanas do novo século, morria em Osborne House a Rainha Vitória, após um reinado de mais de sessenta anos. A nação parou para velar o fim de uma era, e muitos sentiram algo de portentoso na solenidade da ocasião. O jovem G. K. Chesterton, ainda desconhecido do público leitor, chorou ao saber daquela morte. No dia do funeral da Rainha, declarou em carta à noiva: “Esta é uma hora grave e séria, e assim ela é sentida por toda a Inglaterra”.1 Além de um fim, contudo, o ocaso vitoriano também marcava um começo. O alvorecer da era eduardiana coincidia com a inauguração de um novo século e prenunciava o nascimento de uma nova geração de futuros escritores: C. S. Lewis, Evelyn Waugh, Malcolm Muggeridge e Graham Greene, para citar uns poucos. Bastante literalmente, o primeiro ano do século foi um novo começo para os orgulhosos pais do futuro escritor e historiador Hugh Ross Williamson, nascido no dia de Ano Novo de 1901. Com três semanas de idade, ele foi levado à praça do mercado de Romsey, Hampshire, onde o pai era ministro congregacional, para que ao menos pudesse ouvir, ainda que não compreender, a proclamação da morte da rainha.2 O mundo que essa nova geração herdava vinha tingido de ceticismo e dúvida religiosa. Christopher Dawson descreveu os últimos anos da era vitoriana como “um nadir do mundo cristão – a era de Combes e Signor Nathan e Giolitti: uma era de anticlericalismo, materialismo e socialismo fabiano, sem nenhum grande movimento da parte católica para compensar”.3 Embora essa concepção ignorasse o impacto profundo do Movimento de Oxford i, das conversões de Newman e Manning e da reação estética ao materialismo encarnada pelos pré-rafaelitas, era, não obstante, verdadeira no substancial. No início do século, o socialismo fabiano exercia uma influência colossal. Malcolm Muggeridge descreveria a atmosfera intelectual de sua infância, de fabianismo imperante, como uma em que a religião cristã fora relegada ao segundo plano, “substituída pela religião do progresso, em nome da qual os homens de boa vontade se preparam para assumir as rédeas […] Deus, na visão destes, já não é mais necessário. Deve ser considerado morto ou, para todos os efeitos, aposentado”.4 Em 1903, ano em que Muggeridge nascia, Bernard Shaw, campeão do otimismo fabiano, publicava Homem e Super-homem. Ataque espirituoso aos modos tradicionais de encarar o cortejo, o casamento e as relações entre os sexos, a peça ecoava no título a filosofia elitista de Nietzsche. Este morrera em 1900, após doze anos de demência, e fora o mais franco e tenaz adversário filosófico da Cristandade a surgir em fins do século XIX. Convencido da falência do cristianismo, Nietzsche proclamou a “vontade de poder” de Schopenhauer e enfatizou que somente os fortes haviam de sobreviver. Sustentava que a caridade cristã só servia para perpetuar a sobrevivência dos fracos e medíocres. Sua obra maior, Assim Falou Zaratustra, desenvolveu a idéia do super-homem ou além-homem (Übermensch), que haveria de subjugar a fraqueza humana e i

Movimento religioso da década de 1830, liderado por altos membros da hierarquia anglicana, em especial Edward Bouverie Pusey e o Cardeal John Henry Newman.

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triunfar sobre os tíbios. Em Além do Bem e do Mal, preconizou como fundamento da moral o axioma de que “nada é verdadeiro, tudo é permitido”, e prosseguiu com sua guerra aos fracos, sustentando que o sofrimento dos escravos é insignificante, pois “quase tudo o que chamamos de alta cultura baseia-se na espiritualização e intensificação da crueldade”. Não surpreende que muitos tenham visto a filosofia de Nietzsche como um pré-requisito para a ascensão do nazismo. O Cardeal Mindszenty, por exemplo, disse, a propósito de Hitler e o Terceiro Reich, que “o precursor desse terrível reinado foi Nietzsche, que proclamou que ‘Deus está morto’ e que devemos todos superar os antiquados conceitos de bem e mal. Que vida esplêndida eles levaram, esses seres humanos que dispensaram Deus!”5 Os nazistas, porém, não foram de modo algum os únicos seres humanos a dispensarem Deus. Na virada do século, a ascendência intelectual já era agnóstica havia algum tempo. Evelyn Waugh, por intermédio de seu personagem Charles Ryder em Memórias de Brideshead, i explicou a indiferença agnóstica que permeava a cultura de sua infância: Eu não tinha religião […] A visão implícita em minha educação era que a narrativa básica do cristianismo tinha sido exposta como um mito desde há muito tempo, e essa opinião encontravase dividida agora quanto a seus ensinamentos éticos reterem ou não algum valor presente, divisão esta em que o peso maior pendia para a negativa. A religião era um hobby, que alguns professavam e outros não […] Ninguém jamais me havia sugerido que essas pitorescas observâncias expressavam um sistema filosófico coerente e interpretações históricas intransigentes; nem, se o tivessem feito, eu teria me interessado muito.6

Mesmo nos círculos cristãos a filosofia evolucionária do progresso humano perpétuo exercia prestígio. Arnold Lunn recordou que o pai, outrora ministro metodista e missionário na Índia, “mantinha a sua garbosa crença no maior dos mitos vitorianos, a crença no progresso inevitável. Era impossível convencê-lo de que não existe uma tendência predeterminada em prol do melhoramento, que ao progresso se intercala o retrocesso, e que as civilizações nascem e chegam à maturidade para em seguida decaírem e morrerem”.7 Talvez o mais famoso expoente desse otimismo evolucionário tenha sido H. G. Wells, alçado à fama durante a última década do século XIX enquanto autor de fantasias científicas como A Máquina do Tempo e A Guerra dos Mundos. Sua obra História Universal, publicada em 1920, forneceu a exposição histórica definitiva do credo progressista. A defesa dos elementos mais humanos de Nietzsche, levada a cabo por Shaw, e o alardear de um admirável mundo novo dominado pela ciência, por parte de Wells, pareciam capturar o espírito da época. Juntos, davam a impressão de apresentar uma voz coesa, ainda que nem sempre unitária: um alvissareiro coro de alvorada a ressoar pelo novo século. Na década de 1890, os decadentistas, liderados pelo infatigável Oscar Wilde, haviam proporcionado um contraponto a Wells e Shaw. O ar medido e calculado de cinismo mundano adotado por Wilde tornara-se a síntese dos naughty nineties, os “licenciosos anos 90”. As circunstâncias de sua morte por sífilis no fim de 1900, seus estertores coincidindo com os do velho i Inicialmente lançado no Brasil com o título “A volta à velha mansão”.

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século, conferiram à era vitoriana um desfecho dos mais bizarros, fixando um exemplo inimaginável para as futuras gerações de escritores que seguiriam seus passos no decurso do novo século. Para espanto geral, Wilde, em seu leito de morte, fora acolhido na Igreja Católica. Difícil imaginar um convertido mais improvável. Contudo, Wilde, o autoproclamado arquipecador, o cínico arquetípico, tinha uma afeição pelo catolicismo que remontava à infância. A um correspondente do Daily Chronicle, três semanas antes de morrer, Wilde declarou que “muito da minha obliqüidade moral se deve a meu pai não ter permitido que eu me tornasse católico. A faceta artística da Igreja e a fragrância de seus ensinamentos teriam curado minhas degenerescências. Pretendo ser acolhido em breve”.8 Ainda jovem, chegara muito próximo da conversão em abril de 1878, quando abordou o Padre Sebastian Bowden no Oratório de Brompton. No dia seguinte, o Padre Bowden escrevia a Wilde afirmando que tinha sido a graça de Deus que o fizera “revelar a mim, sem restrições e por livre e espontânea vontade, a história de tua vida e o estado de tua alma”. A carta continuava: Permita-me então repetir, com toda a solenidade que me for possível, o que eu disse ontem. Possuis, como todo mundo, uma natureza má, e no teu caso ela se tornou mais corrupta pelas influências mentais e morais negativas e pelo pecado consentido; daí que fales como sonhador e cético, sem fé nenhuma em nada e sem propósito algum na vida. Por outro lado, Deus em Sua misericórdia não deixou que te contentasses neste estado. Ele provou-te o vazio deste mundo […] removendo assim um grande obstáculo à tua conversão. Ele permite que sintas o aguilhão da consciência e o anseio por uma vida santa, pura e sincera. Depende, pois, do teu livre-arbítrio a vida que levas. Lembra-te: assim como Deus o chama, Ele está fadado a dar-te os meios de obedecer ao chamado. Faze-o de pronto e com alegria e as dificuldades sumirão, e com a conversão começaria a tua verdadeira felicidade. Como católico, tu te verás um novo homem na ordem da natureza e da graça […] Confio que voltarás na quinta-feira para outra conversa; podes estar certo de que não o instigarei a fazer nada senão o que dita a tua consciência. Enquanto isso, reza com ardor e fala pouco.9

Não deu ouvidos aos conselhos do sacerdote. A André Raffalovich, também ele um convertido, o Pe. Bowden contou que Wilde não apareceu na quinta-feira, enviando porém um buquê de lírios – o qual, presume-se, valia por um pedido de desculpas. Dali por diante, seu estilo de vida mostrar-se-ia diametralmente oposto ao exortado pelo padre. Falou com ardor e rezou pouco, fez da afetação uma arte e esqueceu por completo da importância de ser prudente. O que disse posteriormente de Dorian Gray talvez valesse para si próprio: Correram boatos de que estava para ingressar na comunhão católico-romana; e decerto o ritual romano exercia sobre ele um grande atrativo […] Mas nunca caíra no erro de interromper o próprio desenvolvimento intelectual pela aceitação formal de algum credo ou sistema, ou de confundir, tomando por moradia permanente, uma hospedaria apta apenas à estada de uma noite sem estrelas e com a lua em gestação […] Em seu entender, nenhuma teoria da vida detinha a menor importância em face da vida mesma.10

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Uma das influências mais importantes para precipitar Wilde no decadentismo foi o romancista francês Joris-Karl Huysmans, cujo Às Avessas foi saudado como o guia definitivo para uma vida libertina. O herói do livro, Des Esseintes, dândi intelectual devotado à busca do prazer, tornou-se modelo de comportamento para uma nova geração de aspirantes a rebeldes. Tão logo publicado, Whistler correu congratular Huysmans pelo “livro maravilhoso”; Paul Valéry aclamouo como a sua “Bíblia e livro de cabeceira”; e Paul Bourget, na época amigo íntimo tanto de Huysmans como de Wilde, declarou-se um grande admirador. Contudo, havia poucos que admirassem Às Avessas mais do que o próprio Wilde. Numa entrevista ao Morning Post, Wilde afirmou que “esse último livro do Huysmans é um dos melhores que eu já vi”,11 e pode-se aferir sua influência sobre o caráter posterior de Wilde pelo modo como este caracterizou Dorian Gray. Gray lê um livro que se parece com o romance de Huysmans e “o herói, o jovem e maravilhoso parisiense […] tornou-se-lhe uma espécie de prefiguração de si mesmo. Com efeito, o livro todo parecia encerrar a história de sua própria vida, escrita antes que a vivesse”.12 Na concepção de Wilde, o herói de Huysmans em Às Avessas “passou a vida tentando […] como que sintetizar em si mesmo as várias formas que o espírito do mundo já assumira, amando por sua mera artificialidade aquelas renúncias que os homens tolamente chamavam de virtude, assim como as rebeliões naturais que os homens insistem em chamar de pecado”.13 Segundo André Raffalovich, Wilde ficara particularmente fascinado com o trecho em que o protagonista relembra uma proeza sexual que, sendo de cunho homossexual, era diferente de todas as outras que experimentara. Fica claro que o efeito de Huysmans sobre Wilde fora tão profundo quanto profano. O resultado foi uma completa inversão moral de papéis. As virtudes eram agora artificiais, enquanto o pecado era uma rebelião natural. O errado era o certo e o certo era o errado. Em suma, Às Avessas “era um livro venenoso”, do qual Wilde bebeu com gosto. O veneno também surtiu efeito sobre o autor do livro, visto que Huysmans passaria os próximos anos metido com satanismo, culminando em seu último romance, Além, em que dá mostras de um mórbido fascínio, e uma concomitante aversão, pelo misticismo satânico. Um ano depois da publicação de Além, em 1891, Huysmans professa ter-se reconciliado com a Igreja Católica Romana em sua autobiografia, A Caminho. Este retorno dramático ao cristianismo parece ter afetado Wilde também. Quando, em 1898, Maurice Maeterlinck informouo que Huysmans entrara para um mosteiro, Wilde respondeu com aprovação que “deve ser delicioso enxergar Deus pelos vitrais. Eu mesmo talvez acabe indo para um mosteiro”.14 Contudo, até os meses finais de sua vida, Wilde deu poucos sinais de alguma inclinação real de ingressar na Igreja. Recém-libertado da prisão onde cumprira dois anos de trabalho pesado – que a irrefletida e malograda ação por calúnia contra o Marquês de Queensberry lhe acarretara – afirmou: “A Igreja Católica é só para santos e pecadores. Para as pessoas respeitáveis, basta a Igreja Anglicana”. Exemplo perfeito de seu gênio epigramático, essa declaração não chega a valer por uma confissão de fé. Nesse ínterim, a uma fervorosa declaração do amigo Robert Ross de que o catolicismo era verdadeiro, Wilde retrucou com uma cândida negativa: “Não, Robbie, não é verdadeiro”.15 Em outra ocasião, quando perguntara a Ross se podia ver um padre, o amigo recusou, convencido de que não falava a sério. Dali por diante, Wilde o alcunhou “o querubim com a espada flamejante que me proíbe a entrada no Éden”.16 18


Ironicamente, foi Robert Ross quem tomou a decisão de chamar um padre ao leito onde Wilde jazia agonizante. Num primeiro instante hesitara, incerto da vontade do amigo. Mas a declaração de Wilde, muitos anos antes, de que “o catolicismo é a única religião na qual morrer”, e sua confissão de pesar a três semanas da morte, afirmando ter sido impedido de tornar-se católico quando criança, devem ter ajudado Ross a se convencer do desejo do moribundo. Ross sabia que Wilde “se ajoelhara como um romano” diante de um padre em Notre-Dame de Paris e demonstrara semelhante humildade diante de outro em Nápoles. Além disso, ficara comovido com uma recente visita a Roma na qual recebera a bênção do Papa. No dia 29 de novembro de 1900, véspera da morte de Wilde, Ross enfim tomou a resolução de trazer um sacerdote a seu leito de morte. Correu à Congregação dos Passionistas, trazendo consigo o Pe. Cuthbert Dunne. Ross perguntou se desejava ver Dunne, e Wilde, incapacitado de falar, levantou a mão em anuência. Indagado pelo Padre Dunne se desejava ser acolhido na Igreja, ergueu a mão novamente. Recebeu então o batismo condicional i e foi em seguida absolvido e ungido. Morreu no dia seguinte, à tarde. Na morte, Wilde enfim cumpria os proféticos versos de seu poema “Rome Unvisited”:

And here I set my face towards home, For all my pilgrimage is done, Although, methinks, yon blood-red sun Marshals the way to Holy Rome. [E aqui volto meu rosto para casa, Pois finda está minha jornada, Inda o sol cor de sangue indique O caminho da Roma sagrada.] Uma mudança de coração de última hora ainda mais bizarra deu-se na pessoa do Marquês de Queensberry, velho adversário de Wilde. Agnóstico convicto, Queensberry havia explicitado em seu testamento que “nenhuma pantomima ou patacoada cristã seja realizada sobre a minha cova, mas que eu seja enterrado como secularista ou agnóstico”. Surpreende, portanto, que antes da morte, em 31 de janeiro de 1900, Queensberry tenha, conforme se relatou, renunciado às concepções agnósticas, professado amor a Cristo – “a quem confessei todos os meus pecados” – e recebido a absolvição condicional ii de um padre católico.17 Após o amargo episódio da ação por calúnia em que Wilde e o Marquês de Queensberry se envolveram meros cinco anos antes, a reconciliação póstuma de ambos na mesma comunhão é digna da pena de um ficcionista. Pode-se imaginar Wilde sorrindo ante a idéia de o destino aproximar uma dupla tão improvável. Os últimos rescaldos do século XIX abrangiam assim as mortes de Nietzsche e de Wilde, os quais, cada um a seu modo, sintetizaram o espírito da época que se encerrava. Havia, porém, um outro membro do círculo de Wilde, bastante negligenciado e eclipsado pelos contemporâneos, e também ele um convertido ao catolicismo, cuja vida e produção literária i

O Batismo só pode ser recebido uma única vez. O Batismo condicional é administrado quando existe alguma dúvida acerca do Batismo anterior. ii Absolvição usada quando o confessor tem sérias dúvidas sobre as disposições do penitente.

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se estenderiam longamente pelo novo século. John Gray despontara na cena literária na reta final da década de 1880 assinando um conto de fadas à maneira de Wilde intitulado The Great Worm, na primeira edição da revista The Dial. Wilde foi atrás de seu novo imitador e admirador, e logo se tornaram bons amigos. O fato de Wilde ter batizado Dorian Gray em sua homenagem dá uma medida da afeição e intimidade de que desfrutavam. Gray ficou lisonjeado, como seria de esperar, e doravante assinaria as cartas que escrevia a Wilde como “Dorian”. Perderam contato em algum momento por volta de 1892, e pouco depois Gray foi acolhido na Igreja Católica. Tornou-se seminarista em Roma e foi ordenado em 1901. Embora esteja hoje esquecido, seu biógrafo, Pe. Brocard Sewell, descreve-o como “um poeta admirável, e muito mais”.18 Em 1905, fez-se pároco em Morningside, Edimburgo, o que não parece ter interferido na sua produção literária. Só publicava edições pequenas, limitadas, mas sua obra “era admirada por John Masefield, Edmund Blunden e outros bons juízes”.19 Sua obra mais conhecida é provavelmente a novela Park: A Fantastic Story, impressa e distribuída por Eric Gill e René Hague em 1932. Faleceu em 1934. Segundo o Pe. Sewell, Gray “era completamente desprovido de qualquer influência chestertoniana! Não tinha grande admiração por G. K. C. ou Belloc. Preferia H. G. Wells”.20 Não surpreende que Sewell tenha concluído a primeira dessas sentenças com um ponto de exclamação. A trajetória de Gray ao catolicismo, passando por Wilde e Wells, era inusitada. Caminho bem mais comum para Roma, trilhado por muitos no século prestes a começar, era o que recebia a influência ao menos parcial dos escritos de Chesterton e Belloc. Com o ocaso vitoriano dando lugar ao alvorecer eduardiano, ambos estavam prestes a alcançar fama e notoriedade como campeões da “ortodoxia” em face dos “hereges”.

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NOTAS 1. Maisie Ward, Gilbert Keith Chesterton, Londres, 1944, p. 127. 2. Smith’s Trade News, 2 de setembro de 1972. 3. Maisie Ward, Insurrection versus Resurrection, Londres, 1937, p. 45. 4. Malcolm Muggeridge, Conversion: A Spiritual Journey, Londres, 1988, p. 25. 5. Cardinal Mindszenty, Memoirs, Londres, 1974, p. 289. 6. Evelyn Waugh, Brideshead Revisited, Londres, 1949, p. 69. 7. Arnold Lunn, Come What May: An Autobiography, Londres, 1940, p. 12. 8. Richard Ellmann, Oscar Wilde, Londres, 1987, p. 548. 9. ibid., p. 90. 10. ibid., p. 91. 11. ibid., p. 237. 12. ibid., p. 238. 13. ibid., p. 238. 14. ibid., p. 531. 15. ibid., p. 548. 16. ibid., pp. 548–9. 17. ibid., p. 542. 18. Padre Brocard Sewell, carta para o autor, setembro de 1996. 19. ibid. 20. ibid.

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Belloc, Baring e Chesterton QUANDO Sir James Gunn exibiu sua famosa conversation piece retratando G. K. Chesterton, Hilaire Belloc e Maurice Baring reunidos em torno de uma mesa, Chesterton, com humor característico, rotulou as três figuras como “Baring, over-bearing e past-bearing” i. Contudo, a tela de Gunn, hoje exposta na National Portrait Gallery de Londres, representava bem mais que uma simples reunião de amigos. Para o público leitor, aquelas três figuras literárias eram indissociáveis em muitos aspectos. Em comum tinham não só a amizade, mas uma mesma filosofia e uma mesma fé. Se não eram indivisíveis como a Santíssima Trindade, eram ao menos indomáveis, como os Três Mosqueteiros. No caso da quimera Belloc-Baring-Chesterton, cabia bem o grito de guerra de um por todos e todos por um. Seria correto, porém, dizer que o menos conhecido do trio era Baring, sendo ele freqüentemente ignorado. Foi ignorado quando Bernard Shaw comparou Chesterton e Belloc às duas metades de um “mui divertido elefante de pantomima” conhecido como Chesterbelloc. Em sua diatribe ao Chesterbelloc, em 1908, Shaw afirmara que as personas de G. K. Chesterton e Hilaire Belloc haviam se fundido e se transformado em meros porta-vozes de um monstro maior do que ambos. Como, então, tiveram início as inseparáveis amizades de Belloc, Baring e Chesterton, e em que medida as futuras conversões destes dois últimos foram influenciadas pelo primeiro, um católico de berço e militante, que nunca chegou a pôr em dúvida sua religião de infância? Chesterton e Belloc se conheceram em 1900, provavelmente instigados por Lucian Oldershaw, velho amigo de Chesterton dos tempos de escola. A importância desse encontro e seu impacto sobre o jovem e ainda desconhecido Chesterton estão condensados no modo como o próprio Oldershaw rememorou o episódio: “Perdi Gilbert pela primeira vez quando o apresentei a Belloc, depois quando se casou com Frances, e finalmente quando ingressou na Igreja Católica […] Embora talvez com tristeza maternal, exultei ante todas essas realizações”.1 A essa altura, Belloc era já um escritor consagrado, ao passo que Chesterton só tivera uns poucos artigos e poemas publicados e ainda estava por ver seu primeiro livro no prelo. Não surpreende, portanto, que se encontrasse um tanto deslumbrado com o colega mais experiente. Corroborando isso há uma carta sua endereçada à noiva Frances, datada de abril de 1900, na qual fulgura de admiração por Belloc: Você detesta discursos políticos: portanto não teria detestado o de Belloc. Tão logo ele começava a falar, nos sentíamos alçados da atmosfera saturada dos argumentos repetidos pela quadragésima vez, para uma de reflexões verdadeiramente ponderadas, nobres e originais versando sobre história e caráter.2

i A palavra “overbearing”, homófona de Baring, significa “dominador, avassalador”; ao passo que “past-bearing” é uma palavra inventada, no sentido de “supradominador”. (N.T.)

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Fica claro pelo tom dessa carta o quanto Belloc havia conquistado Chesterton e este caído em sua esfera de influência. O discurso tocara numa ampla variedade de assuntos, passando pela aristocracia inglesa, a Revolução Puritana e a Igreja Católica. Tais reflexões “ponderadas, nobres e originais” permitiram que Chesterton olhasse para a história e a teologia numa nova luz. A propósito desse primeiro encontro com Belloc, escreveu: “A conversa entrou noite adentro, deixando para trás um rastro luminoso de coisas boas […] O que ele nos infundiu ao sonho foi seu apetite romano pela realidade e pela razão em ação, e, quando assomou à porta, trouxe consigo o bafo do perigo”.3 Em sua Autobiografia, o relato deste primeiro encontro ilustra o quanto o intelecto em evolução de Chesterton estava maduro para as polêmicas de tipo bombástico de Belloc: “Conforme falava, Belloc de vez em quando disparava digressões bastante provocativas sobre o tema da religião […] Eu achava muita graça naquilo tudo, mas já estava consciente de uma curiosa inclinação íntima a simpatizar com ele, que muitos dos que estavam igualmente entretidos não sentiam […].”4 Ao fim do ano a relação já florescera a tal ponto que Chesterton se sentiu apto a acompanhar Belloc à Missa do Galo, na véspera de Natal. Foi quase com certeza a primeira missa católica a que assistiu. No começo de 1901, Chesterton começava a chamar atenção como escritor dotado de brilho próprio. Suas duas primeiras coletâneas de poemas tinham sido publicadas, e vinha ganhando reputação como jornalista na The Speaker e no Daily News. Aludiu à fama crescente numa carta a Frances, datada de 8 de fevereiro de 1901: Outra coisa bastante engraçada é o modo como o meu nome está se disseminando […] Belloc, aliás, revelou outra faceta de sua mente extraordinária. Parece ter tomado ao peito nosso casamento, pois fala comigo já não sobre jacobinos franceses e santos medievais, mas dos móveis e artigos de decoração mais baratos – no que, como em tudo mais, é uma mina de informação – garantindo-me, paternalmente, que “este tapete é a sua cara”. Imagino que você acharia graça nesse tom paternal.5

Se era indicativo do paternalismo de uma relação mestre-discípulo, com o passar dos anos esse tom foi se atenuando, conforme as duas metades do Chesterbelloc amadureciam e chegavam a uma relação de igualdade. Mais tarde, à medida que Chesterton consolidou sua fé cristã, Belloc tornou-se cada vez mais dependente da fortaleza de espírito do amigo. A relação entre Belloc e Baring teve início quase três anos antes. Em 31 de maio de 1897, Baring descrevia suas primeiras impressões do amigo: “Um orador e proseador brilhante […] que vive de expedientes”.6 Nesse primeiro contato, porém, na presença de Basil Blackwood, Belloc dissera ao jovem Maurice Baring que este “sem dúvida iria para o inferno”, de modo que ele considerou improvável que um dia virassem amigos. Ainda assim, concluiu “desde o primeiro instante em que o vi, que era um homem notável”.7 A primeira carta de Belloc a Baring de que se tem notícia, datada de 5 de julho de 1897, foi escrita em verso.8 Seu tom é a um só tempo afável e animado, indicando um maior afeiçoamento nos encontros subseqüentes em junho. Os encontros

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se deram em Oxford, onde Belloc, tendo-lhe sido recusado um fellowship i no All Souls College, ganhava a vida dando aulas particulares para bacharelandos. Nos meses e anos seguintes a amizade se consolidou. Assim, no início de 1900, quando Chesterton deixou-se encantar por Belloc, Baring já conhecia o francês suficientemente bem para formar um juízo mais objetivo de sua personalidade. De Paris, em 7 de fevereiro de 1900, escreveu a um amigo contando sobre o tempo passado na capital francesa com Belloc, pouco depois de este publicar seu estudo sobre Danton: Fomos ao Louvre e ao Concert Rouge, às Vésperas na Saint-Sulpice e à Bênção em NotreDame. Depois fizemos um longo, longuíssimo passeio na cobertura de um ônibus, em que Hilaire me apontou a casa de Danton, a prisão de Danton, o café e o boliche de Danton, a tabacaria de Danton. Atrevo-me a dizer que ele não sabia nada daquilo: mas sou do tipo que atura arqueólogos.9

Em carta a outro amigo, dois dias depois, afirmou que gostava de Belloc imensamente e o considerava “cheio de sacadas brilhantes e um deleite como companhia”, mas “bastante não-francês quando visto na França. Com efeito, o galicanismo dele é uma pose mal ensaiada e o catolicismo, uma opinião política. Na realidade, é brutalmente agnóstico. Também o galicanismo dele é uma opinião política, uma postura anti-Daily Mail”.10 Ao cabo de mais um quarto de século de amizade, Baring havia moderado esse ponto de vista. Numa carta a Ethel Smyth de 29 de agosto de 1925, deu mostras de uma funda compreensão das qualidades de Belloc, que escapavam a vários dos seus contemporâneos: À primeira vista, ele parece um rematado cabeça-dura; num segundo relance, e após alguma reflexão, você o julga um cabeça-dura incurável, com seus momentos e lampejos de bom senso, sim, mas que lástima! […] E aí, passados dez, quinze anos, você se dá conta, de repente, não que ele tinha razão esse tempo todo, mas que às vezes tinha razão justo naqueles pontos em que você o julgava mais equivocado e cabeça-dura – pontos estes que agora são admitidos por consenso universal.11

Embora a última frase padeça de um excesso de boa vontade ou wishful thinking, no todo esta exposição dos talentos multifacetados de Belloc revela-se bastante perceptiva. No início da amizade, porém, Baring não podia contar com o discernimento da visão retrospectiva. Estava satisfeito, e sem dúvida lisonjeado, com o aval do novo amigo a vários de seus sonetos, um dos quais Belloc havia copiado e pendurado na parede do quarto. Belloc também aprovara o rascunho de algumas paródias de autores franceses escritas em francês. Estas, Belloc verteu para o inglês e entregou a seus alunos, encarregando-os de retraduzi-las para o idioma original. A admiração era mútua: Baring encantou-se com vários dos primeiros versos e sonetos escritos por Belloc. Embora lamentasse que não tivessem produzido “nem um murmúrio de atenção na época”, consolou-se com o fato de alguns terem sobrevivido “e agora serem encontrados em muitas antologias, ao passo que a poesia recebida com estrépito de aplauso na época está quase toda não só morta, mas enterrada e completamente esquecida”.12 i O fellow é um bolsista de pós-gradução incumbido de ministrar aulas no bacharelado. (N.T.)

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Além da poesia, Belloc também se sobressaía na polêmica, é claro, e Baring rememorou os “maravilhosos jantares festivos” na King Edward Street, em que Belloc entoava “o Perigo Judeu i, a Igreja Católica, a Canção de Rolando, Ronsard e os Pireneus, com gosto e veemência indescritíveis”.13 Baring certamente simpatizava com as loas de Belloc à França e à literatura francesa, dedicando-lhe um soneto que consagrou:

To you who heard the blast of Roland’s horn, And saw Iseult set sail for Brittany. 14 [A vós que escutastes o soar da trompa de Rolando, E vistes Isolda içar velas rumo à Bretanha. ] Perguntamo-nos se seria esse o soneto que Belloc emoldurou e pendurou na parede de seu quarto. Menos convicção lhe inspirava a ruidosa e veemente defesa da Igreja Católica empreendida por Belloc. Durante o outono de 1899, Baring ficou “extremamente surpreso e desconcertado” quando Reggie Balfour visitou-o em Paris e “de chofre, afirmou sentir um intenso desejo de converter-se ao catolicismo”.15 Até aquele momento, só conhecia dois convertidos: sua irmã Elizabeth, que casara com o católico Conde de Kenmare, e um colega de faculdade, que havia explicado sua motivação em termos de uma necessidade de tudo ou nada. Ficou “abismado” ao saber do desejo de Balfour e tentou desencorajá-lo de uma resolução tão drástica. Argumentou que a religião cristã “não era assim tão antiga, apenas uma faixa bastante diminuta na infindável série de credos da humanidade […] Roguei-lhe que aguardasse”.16 Mesmo nesse estágio, porém, Baring compreendia a lógica da posição católica, afirmando a Reggie Balfour: “Meu problema é que não consigo crer na primeira proposição, fonte de todo o dogma. Se pudesse fazer isso, se conseguisse dizer a primeira mentira, entendo perfeitamente que todo o resto decorreria”.17 Apesar da descrença, acompanhou Balfour numa Missa Baixa ii celebrada em Notre-Dame des Victoires. Jamais assistira a esse tipo de missa antes e teve uma agradável surpresa: Impressionou-me imensamente. Havia imaginado que os cultos católicos eram sempre longos, complicados e revestidos de ritual. A Missa Baixa, descobri, era curta, extremamente simples, e por algum motivo me fez pensar nas catacumbas e reuniões dos cristãos primitivos. Tinha-se a sensação de se contemplar algo antiqüíssimo. A conduta dos membros da congregação e a expressão em seus semblantes também me impressionaram. Para eles, aquilo tudo era evidentemente real.18

Um significativo adendo a esse episódio talvez tenha sido tão determinante para a futura conversão de Baring quanto qualquer outra coisa que tenha discutido com Belloc. Ao regressar a Londres, Reggie Balfour remeteu-lhe um epitáfio, traduzido do latim para o francês: Refere-se ao fraudulento livro Protocolos dos Sábios de Sião. ii Refere-se à Missa Comum pré-conciliar, em oposição à Missa Solene. i

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Ci-git Robert Pechom, anglais, catholique, qui après la rupture de l’Angleterre avec l’église, a quitté l’Angleterre ne pouvant y vivre sans la foi et qui, venu a Rome y est mort ne pouvant y vivre sans patrie.19

[Aqui jaz Robert Peckham, inglês e católico, que após o rompimento da Inglaterra com a Igreja deixou a Inglaterra, não podendo aí viver sem a fé, e que vindo a Roma aqui morreu, não podendo viver sem pátria. ]

A tragédia de fundo desse epitáfio – que pode ser encontrado na igreja de São Gregório, em Roma – teve um efeito marcante e duradouro no modo como Baring encarava a Reforma. Dotado desde sempre de uma natureza melancólica, esse imaginário serviu-lhe de inspiração para vários de seus romances. Mais especificamente, o epitáfio forneceria o ponto de partida para a redação do romance histórico Robert Peckham, trinta anos depois. Vale notar que no começo de 1902 Baring já se sentia tão tocado pela Missa Solene católica, “longa, complicada e revestida de ritual” o quanto fosse, quanto outrora o fora pela Missa Baixa em Notre-Dame des Victoires. Em fevereiro de 1902, encontrava-se em Roma quando da celebração do jubileu do Papa Leão XIII. Assistiu à Missa Solene na Basílica de São Pedro e testemunhou o Papa sendo carregado na cátedra, dando sua bênção à multidão: Consegui um lugar sob o domo. Na elevação da Hóstia, ajoelhando-se numa perna, os membros da Guarda Suíça golpearam o chão de mármore com uma pancada seca e retumbante das alabardas, e prontamente ressoaram pelo domo os clarins de prata. Neste instante, voltei os olhos para cima e deparei com a inscrição em letras maiúsculas, perfazendo toda a volta: Tu es Petrus…, e refleti que a profecia certamente se cumprira do modo mais substancial e concreto […] A solenidade e majestade do espetáculo eram indescritíveis, mormente porque a lividez do rosto do Papa se afigurava diáfana, como se o véu de carne que o separa do outro mundo tivesse se refinado e atenuado ao máximo, até um limite quase sobrenatural.20

Baring agora sentia uma profunda atração emocional pelo catolicismo, mas intelectualmente continuava incapaz de crer. No início de 1900, escreveu a Ethel Smyth: “Quisera todos tivéssemos nascidos católicos romanos. Creio no espírito deles, mas me recuso a reconhecer-lhes a Supremacia Exclusiva de sua Igreja”.21 No mesmo ano, durante um passeio de bicicleta pelo campo, ouviu da amiga Ethel que ele um dia se converteria ao catolicismo. Na época, Baring tratou a predição com incredulidade, afirmando que “nada era mais impossível”. Mais tarde, quando a profecia se cumpriu, disse que aquilo era um exemplo da “intuição miraculosa” dela.22 Passados mais alguns meses, Baring escreveu a outro amigo, George Grahame: “Para mim, só há duas alternativas: o agnosticismo (na prática, ateísmo) ou o catolicismo romano”.23 Voltou a escrever alguns dias depois, esposando uma teoria pessoal a respeito do assunto. Desta vez parecia ter chegado a um assentimento não só emocional como intelectual: […] Ninguém que algum dia tenha atacado o catolicismo romano e seja religioso, e creia no cristianismo, jamais o abraçou de imediato. Newman chegou à conclusão puramente a priori.

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Tinha um espírito de ódio pelos católicos e jamais botara os pés numa igreja católica […] A maior parte das pessoas não chega a atacá-la, mas diz: “Ah, padres e idolatria”. Porém, os padres serem ou não ruins não altera a questão fundamental: qual é a Igreja Católica e Apostólica do Credo – a Romana ou a Anglicana? E eu acredito, enfaticamente, que a Romana a seja, e a Anglicana não a seja […]24

Em dezembro de 1900, chegou enfim ao ponto em que o intelecto conformou-se às emoções, a cabeça, ao coração. Numa carta a Hubert Cornish, descreveu o quanto havia mudado nos últimos doze meses. Antes sentia-se incapaz de realizar a “proeza acrobática”, o salto de fé necessário só para começar a ponderar a conversão: “Mas agora começo pelo outro lado. Creio no cristianismo, creio na redenção”.25 Ironicamente, para alguém tão diferente de Oscar Wilde em todos os sentidos imagináveis, Baring também foi influenciado pelo regresso de J. K. Huysmans à Igreja: “Se você leu A Caminho, de Huysmans, a luta que no fim ele trava com a própria razão é, palavra por palavra, aquilo que eu vivenciei em duas ocasiões, detalhe por detalhe”.26 Em que pese a luta com a razão estar praticamente encerrada, Baring ainda levaria o resto da década para dar o passo decisivo de ingressar na Igreja. Nesse ínterim, batalhou não tanto com grandes questões filosóficas quanto com preconceitos comezinhos. Em 1906, disse à Belloc que desprezava a política no Vaticano e o efeito da Igreja sobre as classes políticas da Itália e da França; também não gostava dos católicos ingleses em Roma e tinha dúvidas a respeito da educação católica.27 Três anos depois, enterrou essas dúvidas e abraçou a fé. Até então poderia dizer, com Huysmans, que estava en route.

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NOTAS 1. Maisie Ward, Gilbert Keith Chesterton, pp. 211–12. 2. Maisie Ward, Return To Chesterton, Londres, 1952, p. 52. 3. Maisie Ward, Gilbert Keith Chesterton, p. 113. 4. G. K. Chesterton, Autobiography, Londres, 1936, pp. 116–18. 5. Maisie Ward, Gilbert Keith Chesterton, pp. 124–5. 6. The Chesterton Review, Vol. XIX, No. 1, p. 67. 7. Maurice Baring, The Puppet Show of Memory, Londres, 1930, pp. 222–3. 8. Robert Speaight (ed.), Letters from Hilaire Belloc, Londres, 1958, pp. 1–2. 9. The Chesterton Review, Vol. XIX, No. 1, p. 66. 10. ibid., pp. 66–7. 11. ibid., p. 70. 12. Maurice Baring, The Puppet Show of Memory, p. 223. 13. ibid., p. 223. 14. Maurice Baring, Collected Poems, Londres, 1925, p. 22. 15. Maurice Baring, The Puppet Show of Memory, p. 258. 16. ibid., p. 259. 17. ibid., p. 259. 18. ibid., p. 259. 19. ibid., p. 260. 20. ibid., p. 305. 21. Ethel Smyth, Maurice Baring, Londres, 1938, p. 185. 22. ibid., p. 14. 23. The Chesterton Review, Vol. XIX, No. 1, p. 86. 24. ibid., p. 86. 25. Emma Letley, Maurice Baring: A Citizen of Europe, Londres, 1991, p. 142. 26. ibid., p. 142. 27. The Chesterton Review, Vol. XIX, No. 1, p. 87.

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O Filho do Arcebispo QUANDO foi nomeado Arcebispo da Cantuária em 1882, E. W. Benson alcançou, para um clérigo zeloso, ferrenho defensor dos princípios do establishment anglicano, o ápice da realização terrena. À altura de sua morte, em 1896, o chefe da Igreja da Inglaterra não tinha como saber, mas era também o chefe de uma das mais ilustres famílias literárias britânicas do século XX. Seu primogênito A. C. Benson, reitor do Magdalene College de Cambridge, tornou-se um proeminente biógrafo, memorialista e crítico literário, escrevendo aclamados estudos sobre Rossetti, Fitzgerald, Pater, Tennyson e Ruskin, além de uma biografia do próprio pai. O filho do meio, E. F. Benson, também foi um autor prolífico. Sua produção abarcava desde esboços autobiográficos da sociedade inglesa sob os reinados de Eduardo VII e Jorge V até romances leves recortados sobre um pano de fundo erudito ou histórico. Na posteridade, talvez seja mais conhecido pelos romances satíricos de Mapp e Lucia, adaptados com êxito para a televisão. O caçula R. H. Benson, por sua vez, parecia destinado a seguir os passos do pai, tendo recebido as ordens sacras na Igreja da Inglaterra. Sendo assim, sua inesperada conversão ao catolicismo romano em 1903, e sua posterior ordenação, provocaram grande celeuma. A exemplo dos irmãos, também seguiu carreira literária: já tinha escrito quinze romances de grande sucesso em 1914 quando a morte o ceifou prematuramente, aos quarenta e três anos de idade. As circunstâncias que levaram Robert Hugh Benson à conversão são narradas com minúcias em suas autobiográficas Confissões de um Convertido, publicadas em 1913. Nascido em 1871, recebeu a ordenação anglicana em 1894, em grande parte para agradar ao pai. Quando este morreu (enquanto rezava na igreja de Hawarden durante uma visita ao Sr. Gladstone, ex-primeiro-ministro e amigo seu), foi Robert quem leu a litania no funeral, realizado na Catedral da Cantuária. A carreira eclesiástica de R. H. Benson teve início com sua designação para a igreja de Eton Mission em Hackney Wick, antes de ser transferido como cura para Kemsing, Kent, em 1896. No ano seguinte, atraído pelo ideal monástico, aderiu à Comunidade da Ressurreição, em Marfield. Foi ali que começou a nutrir dúvidas sobre a doutrina, a disciplina e a natureza da Igreja Anglicana. A expressão dessas dúvidas não passou despercebida. Antes de sua profissão de fé, em julho de 1901, o Dr. Gore – fundador da Comunidade, prestes a ser nomeado Bispo de Worchester – indagoulhe, para sua grande surpresa, se havia algum risco de ele se bandear para Roma. Naquele momento, negou a hipótese sem pestanejar, registrando que se sentiu apto a fazer a profissão de fé “sem alarme” e descrevendo a ocasião como “um dia extraordinariamente feliz”.1 Sua mãe estava presente na acanhada antecâmara do oratório para testemunhar os procedimentos: “Estava formalmente empossado; os confrades beijaram-me a mão; pronunciei meus votos e recebi a Comunhão, que valeram como chancela e jura de estabilidade. À tarde, segui para casa com minha mãe numa espécie de êxtase de contentamento”.2 O contentamento não estava destinado a durar. No verão seguinte, confessava à mãe que experimentara “hesitações romanas, mas que elas já o haviam abandonado”.3 Também não tardariam em retornar. Numa missa na igreja de São Patrício, em Birmingham, Benson recitou o 31


hino “Faith of our Fathers” i acrescido de uma observação: “Por Padres [fathers], refiro-me não a Cranmer, Ridley, Latimer e gente dessa estirpe.” ii 4 E num retiro, em novembro de 1902, pregou de tal modo que um dos presentes observou que “podia ser a pregação de um padre católico”.5 Ainda nesse retiro, recomendou aos ouvintes os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loiola, fundador dos Jesuítas, explicando que “é extremamente positivo não negligenciar o intelecto”.6 Numa carta tratando dessa forma de meditação, Benson deixa transparecer muito de sua personalidade: No tocante à depressão […] quis dizer que a causa da depressão é a subjetividade, sempre. Os Fatos Eternos da Religião permanecem exatamente os mesmos, sempre. Portanto, a saída para a depressão consiste em apegar-se às verdades exteriores que são verdadeiras em qualquer circunstância; e não no auto-exame ou em esforços voltados para “atos” da alma, que nessas horas somos incapazes de realizar. […] Eu diria que a “prece subjetiva”, a auto-reprovação e o apego às próprias atribulações temporais e espirituais não é bom nessas horas; mas que a prece objetiva – intercessões, adoração e dar graças aos Mistérios da Graça, por exemplo – é o tratamento correto para a alma. E, naturalmente, o mesmo se aplica a escrúpulos de qualquer espécie.7

Profundamente preocupado com as recorrentes dúvidas a respeito da doutrina e da catolicidade da Igreja Anglicana, Benson confessou suas dificuldades à mãe e ao Superior em Mirfield. Com espírito de obediência, “cumpri-lhes as recomendações ao pé da letra”, lendo todos os livros indicados da parte anglicana e consultando todas as autoridades vivas sugeridas. Em outubro de 1902, ainda não convencido, chegou a “tamanho estado de aflição” que pediu permissão do Superior para consultar e manifestar suas dúvidas a um ilustre padre católico. A permissão foi concedida, mas a resposta que recebeu só serviu para aumentar sua confusão. O padre declarou não se sentir apto a recomendar o ingresso de Benson na Igreja, pois tinha ele próprio sérias dúvidas quanto à doutrina da Infalibilidade Papal, donde concluía que o melhor seria Benson permanecer onde estava. Temporariamente, o caráter inesperado daquela resposta o “tranqüilizou e reconfortou”: O fato mesmo de eu ter escrito a um padre e recebido uma resposta de desencorajamento pareceu-me então […] um sinal evidente de onde se situava o meu dever. Parecia demonstrar ainda que mesmo dentro da Igreja Romana persistiam amplas divergências de opinião, e que lá não havia aquela Unidade que eu procurava. Os desdobramentos últimos da história desse padre, sua excomunhão e morte fora da Igreja, mostraram que as coisas não são assim, e que a ninguém é permitido representar a Igreja se nisto deturpa, ainda que de boa-fé, a sua doutrina.9

Benson não revelou o nome do tal padre, mas, tendo em vista sua atração pela espiritualidade jesuíta nesse período e a referência a uma subseqüente excomunhão e morte, é provável que tenha i Hino composto por Frederick Faber, sacerdote anglicano convertido ao catolicismo, em tributo aos mártires católicos da Reforma Inglesa. (N.T.) ii Cranmer, Latimer e Ridley, ditos mártires de Oxford, foram queimados na fogueira por Maria I (filha de Henrique VIII), que tentou restaurar o catolicismo na Inglaterra. (N.T.)

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se correspondido com o Padre George Tyrrell, cujo modernismo teológico resultou em sua expulsão da Ordem dos Jesuítas em 1906, e posterior excomunhão, vindo a falecer em 1909. Após o ingresso de Benson na Igreja, o Pe. Tyrrell (supondo-se que tenha sido ele) enviou-lhe uma carta, perguntando como havia superado a dificuldade mencionada. Benson respondeu: “Eu não podia deixar que distinções tão elaboradas me impedissem de me unir àquilo que, segundo minha convicção, era o centro da Unidade apontado por desígnio divino, tendo simplesmente aceitado o Decreto no sentido em que a própria Igreja o proclamou e aceita”.9 Em meio a essas atribulações, Benson ocupava-se de redigir A Luz Invisível, destinado a ser seu primeiro romance. Inicialmente inspirado em histórias contadas por seu irmão mais velho, o livro centra-se na figura de um homem tratado por “sacerdote católico”. Em momento algum fica claro se esse sacerdote pertence à comunhão romana ou anglicana, o que já basta para indicar o estado de confusão de Benson na época. Mais tarde, indagado quanto à denominação a que o sacerdote pertencia, respondeu que “a nenhuma em particular”: Minhas hesitações estavam ressurgindo de novo, por isso tentei não dar nenhuma pista que indicasse a comunhão de meu protagonista […] Não dispunha daquela confiança suprema na Igreja da Inglaterra que me permitiria dar-me por satisfeito em chamá-lo de anglicano e encerrar o assunto.10

John Inglesant, romance espiritual de Joseph Shorthouse, foi provavelmente a influência mais importante na escrita de A Luz Invisível. Publicado em 1881, foi lido com “absoluta paixão” por um Benson ainda jovem, auxiliando-o, conforme declarou, a desenvolver e guiar o seu senso de reverência: “Eu o lia de novo e de novo […] Minha impressão era a de ter encontrado, finalmente, o segredo daquelas vagas cerimônias religiosas às quais sempre me conformara com desinteressada equanimidade”.11 Por coincidência, Shorthouse morreu em 1903, ano da publicação de A Luz Invisível. Outro fator que concorreu para seu súbito desejo de escrever romances espirituais foi um gradual interesse pelo misticismo: “Afastei-me da contemplação fria do dogma e me empenhei em revesti-lo com as realidades candentes da experiência espiritual; e no livro, propriamente, procurei antes personificar o dogma que expressá-lo explicitamente”.12 Um ano depois do lançamento do livro, já seminarista em Roma, Benson respondeu à carta de um anglicano intrigado em saber se as histórias de A Luz Invisível eram verídicas: Eu dispunha de um grande número de histórias sobre coisas desse gênero que eram literalmente “verídicas”, e estava disposto a fazer um livro com elas. Calhei de mencioná-lo a um clérigo em cujo julgamento confiava, e ele foi tão enfático em afirmar que ninguém tinha o direito de tornar públicas essas coisas que acabei desistindo da idéia […] alguns elementos em várias delas são de fato verídicos. Pessoalmente, estou convencido de que a “ficção espiritual” se assemelha a qualquer outra “ficção”: está fadada a conter coisas que aconteceram ou poderiam acontecer a qualquer momento. O que eu tentei fazer foi pegar essas coisas que eu sabia serem verídicas e representá-las de um jeito que qualquer pessoa pudesse entender.13

A Luz Invisível foi o único livro que publicou enquanto anglicano. Em 1912, Benson comentou que a popularidade do livro parecia ter sido determinada pela denominação religiosa dos 33


leitores. Considerava “muito significativo” que ainda vendesse bem entre os anglicanos, ao passo que os católicos pareciam apreciar o livro em “um grau bem menor”: “Muitos católicos, eu mesmo incluso, consideram Richard Raynal, Solitary i muitíssimo mais bem escrito e muitíssimo mais religioso”.14 Mais tarde, julgando retroativamente, Benson diria que passou a antipatizar com A Luz Invisível “muito intensamente […] do ponto de vista espiritual”.15 Escrevera-o “com espírito febril e no que hoje reconheço ser um estado muito sutil de sentimentalismo”. Como na época estava “empenhado em renovar minha confiança nas verdades da religião”, assumira “um tom positivo e assertivo que era em grande parte insincero”. Ademais, era “um livro um tanto quanto nocivo, por implicar que aquilo em que eu então me esforçava por acreditar era [que] a intuição espiritual […] deve ser um elemento constitutivo da experiência religiosa”. Essa inspiração espiritual, sustentou, “não passava de imaginação”. Acreditava agora que essa modalidade intuitiva – e, portanto, subjetiva – de crença espiritual era inferior e menos confiável do que “a fé simples de uma alma que recebe a verdade divina de uma autoridade divina”. A atmosfera católica, por outro lado, é algo totalmente diverso disso tudo. Para os católicos, é quase indiferente se a alma compreende ou não, no sentido de conseguir visualizar, os fatos da revelação e os princípios do mundo espiritual: o que importa é que a Vontade assinta e a Razão consinta. Mas para os anglicanos, cuja teologia é fundamentalmente irracional, e entre os quais não existe Autoridade de fato, é natural que se coloque o centro de gravidade nas Emoções em vez disso, e “confunda-se […] a imaginação com a alma”. A Razão, para eles, deve ser continuamente reprimida, mesmo em sua esfera legítima; e a Vontade deve ser em grande parte autocentrada.16

Ao colocar a ênfase na Razão e na Vontade, aspectos objetivamente apreensíveis da espiritualidade, e não nas Emoções, que só podem ser experimentadas subjetivamente, Benson estava ecoando a linha de raciocínio que adotara no seu retiro de 1902. Na ocasião, havia contrastado a causa subjetiva de uma emoção – especificamente a depressão – com a natureza objetiva da verdade, os “Fatos Eternos da Religião”, que permanecem sempre os mesmos. Nisto estava essencialmente de acordo com Chesterton e Belloc, que enfatizavam a primazia da Razão na apreensão da verdade espiritual. Em 1903, porém, Benson ainda não tinha chegado a essa posição coesa. Suas “hesitações romanas” eram a causa de um turbilhão racional e emocional para o qual não parecia haver saída. Neste ponto, dois livros ajudaram-no a enxergar com maior clareza o caminho pela frente: Ensaio sobre o Desenvolvimento da Doutrina Cristã, de Newman, e Doctrine and Doctrinal Disruption [Doutrina e ruptura doutrinal], de Mallock. Esses livros, escreveu Benson, ajudaram a lançar por terra as duas “dificuldades específicas que se interpunham entre mim e Roma” e “os últimos resquícios de teoria que me prendiam à Igreja da Inglaterra”.17 O livro de Newman, em particular, “como num passe de mágica dissipou as brumas que ainda pairavam, permitindo que eu visse a Cidade de Deus em toda a sua força e beleza”.18

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Livro publicado em 1906, com prefácio de Evelyn Waugh. Não teve edição brasileira.

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Finalmente, mas não menos importante – ou, como disse Benson, “finalmente e supremamente” – foi a leitura das Escrituras que o satisfez “quanto à verdade das asserções de Roma”.19 No verão de 1903, após confessar à mãe a posição em que se encontrava, foi por ela instigado a consultar três “eminentes membros da Igreja da Inglaterra: um renomado pároco, um eminente dignitário e um não menos eminente leigo”.20 Em favor desses baluartes do anglicanismo é preciso dizer que nenhum tentou reprová-lo, acusando-o de não fazer jus à memória do pai: “Eles entenderam, como sói a qualquer um dotado de instintos cavalheirescos, que uma rusga desse tipo seria totalmente indigna”.21 Ainda assim, os três procuraram dissuadi-lo de dar o passo decisivo e final de converter-se a Roma. O “eminente dignitário” perguntou se havia alguma devoção na Igreja Católica que lhe causasse alguma repugnância; Benson respondeu que não se sentia à vontade com as devoções populares à Virgem Santíssima. O dignitário então reagiu com incredulidade à idéia de Benson considerar a sério a submissão a uma comunhão que o compeliria a adotar métodos de culto que desaprovava. O tiro saiu pela culatra, pois, como já observado, Benson era infenso a qualquer apelo à Emoção em detrimento da Razão. Em vão tentou explicar que a decisão nada tinha que ver com seu apreço ou desapreço por praxes, devendo-se antes a uma sólida crença de que a Igreja Católica era a Igreja de Deus. Logo, se suas opiniões relativas a pormenores divergiam do que preconizava a Igreja, tanto pior para ele mesmo, e era seu dever corrigir essas noções o quanto antes. Pretendia, ressaltou, “ir a Roma não na condição de crítico ou professor, mas como criança e aprendiz”.22 Sua réplica foi recebida com desprezo: “Acho que ele [o dignitário] considerou o meu ponto de vista imoral. A religião, para ele, parecia ser uma questão de escolhas e predileções pessoais”.23 “Esse diálogo”, escreveu Benson, proporcionou-me mais uma ilustração para a convicção que eu formara, de que como Corpo de Doutrina […] a Igreja da Inglaterra era irremediável. Ali estava um dos seus principais dirigentes assumindo quase como axioma que eu só devia aceitar os dogmas que porventura parecessem recomendáveis à minha razão ou temperamento.24

Em fins de julho, Benson recebeu um ultimato de Mirfield, “perfeitamente gentil e perfeitamente resoluto”: deveria retornar para a congregação anual da comunidade ou então deixar de considerar-se membro. O Confrade incumbido de escrever o ultimato servira como noviço ao lado de Benson, chegando a desfrutar com ele de “grande intimidade”. Segundo Benson, era óbvio o estado de angústia do Confrade ao redigir o ultimato. Na réplica, “escrita em semelhante angústia”, informou que não lhe seria possível, em boa consciência, regressar a Mirfield. Mais ou menos no mesmo período, Benson recebeu uma carta amargurada de “um dignitário da Igreja da Inglaterra, ocupante de uma histórica diocese episcopal e velho amigo da família”.25 O missivista, não tendo logrado convencer Benson do equívoco de sua posição, profetizou que uma destas três coisas aconteceria comigo: eu logo voltaria para a Igreja da Inglaterra, com a minha sanidade restaurada (conforme ele esperava); eu perderia totalmente a minha fé cristã (conforme ele temia); ou eu me tornaria um romanista obstinado e empedernido

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(conforme ele temia ainda mais, e com toda a razão). Em seu entendimento, era impossível que a fé e a abertura de espírito sobrevivessem à conversão.26

Aflito com a perturbação que evidentemente estava causando, Benson partiu numa viagem de bicicleta pelo interior do Sussex em busca de algum amparo. Sua primeira parada foi no Mosteiro Cartuxo de Parkminster, onde combinara de encontrar um dos Frades, também ele um clérigo convertido. Foi recebido “com muita cortesia”, mas a visita o deprimiu ainda mais: o anfitrião não entendeu que só o que buscava era “ser ensinado; que eu não vinha como crítico, mas como uma criança”.27 Em desespero, deu prosseguimento à viagem, passando o domingo num alojamento em Chichester, cidade onde fez sua última confissão anglicana numa igrejinha defronte à Catedral. Confiando ao clérigo que estava praticamente resolvido quanto à conversão, nada recebeu como conselho além da cândida recomendação de que “se animasse”. Com a oca mensagem ainda ecoando na mente, receberia a comunhão anglicana pela última vez na Catedral. No dia seguinte, pedalou até Lewes e dali para Rye, jantando no George Inn. Na terça, sob um sol abrasador, seguiu de volta para casa pela rota de Mayfield, “olhando os muros do convento com uma espécie de inveja atormentada e parando alguns minutos numa bela e soturna igrejinha católica com a qual deparei inesperadamente num vale”.28 Os pensamentos e emoções adversos e conflituosos que o acossaram durante a solitária viagem pelo Sussex estão descritos nas Confissões de um Convertido. Benson se afligia com a ansiedade da mãe e com seu conselho para que deixasse margem para “qualquer oportunidade possível de uma mudança de perspectiva”. Aliado a isso havia o seu próprio estado de agitação mental, pois “embora intelectualmente convencido, ainda estava num estado anormal”. Sentia como se a mente estivesse presa numa vasta e degradante aridez espiritual, em que, clara como uma visão antes da chuva, erguia-se a Cidade de Deus. Lá estava ela, diante de mim, vívida e imponente como uma revelação, e eu fiquei ali, contemplando-a, atento para a mais ínfima oscilação que a revelasse uma miragem ou o mais ínfimo vestígio de mal que a revelasse o edifício do diabo.29

Paradoxalmente, no recôndito de sua intimidade não sentia atração emocional por aquilo que o arrastava intelectualmente: Sabia perfeitamente bem que, além de divina, era humana, que crimes haviam sido cometidos no interior de seus muros; que os modos, costumes e linguajar de seus cidadãos seriam outros que os do aprazível e gracioso vilarejo que eu deixara; que ali encontraria dureza, condutas desconhecidas, até mesmo suspeita e reprovação. Mas à parte isso tudo, era divina […]30

Esse coquetel emocional de apatia e antipatia não reagiu bem com as conclusões do intelecto, e Benson viu-se “sem energia, sem sentimento de acolhida ou exultação […] Eu estava mortalmente saturado e cansado daquilo tudo”.31

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Por essa época, possivelmente durante a própria viagem de bicicleta, Benson escreveu um poema que deslinda melhor do que qualquer esforço subseqüente em prosa o enigma de sua condição no verão de 1903,:

I cannot soar and sing my Lord and love; No eagle’s wings have I, No power to rise and greet my King above, No heart to fly. Creative Lord Incarnate, let me lean My heavy self on Thee; Nor let my utter weakness come between Thy strength and me. I cannot trace Thy Providence and place, Nor dimly comprehend What in Thyself Thou art, and what is man, And what the end. Here in this wilderness I cannot find The path the Wise Men trod; Grant me to rest on Thee, Incarnate Mind And Word of God. I cannot love, my heart is turned within And locked within; (Ah me! How shivering in self-love I sit) for sin Has lost the key. Ah! Sacred Heart of Jesus, Flame divine, Ardent with great desire, My hope is set upon that love of Thine, Deep Well of Fire. I cannot live alone another hour; Jesu, be Thou my Life! I have not power to strive; be Thou my Power In every strife! I can do nothing – hope, nor love, nor fear, But only fail and fall. Be Thou my soul and self, O Jesu dear, My God and all!32 [ Alçar-me aos céus não posso, cantar o meu Senhor; Faltam-me as asas da águia, Forças para subir e saudar meu Soberano, O ânimo de voar.

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Senhor Encarnado, Criador, deixa eu recostar Meu pesado ser em Ti; Não deixa a minha fraqueza atroz se instalar Entre Tua força e mim. Não sei rastrear Tua Providência e lugar, Nem bem compreender Que és Tu, Senhor, que é o homem, E qual a finalidade. Nesta árida imensidão, encontrar não posso O caminho que trilharam os Sábios; Concede-me repousar em Ti, Mente Encarnada E Verbo Divino. Amar não posso, meu coração se entranhou Trancafiou-se por dentro; (Eu, ave! Tão trêmulo de amor-próprio) foi o pecado Que sumiu com a chave. Ah! Sagrado Coração de Jesus, Chama divina, Ardente de grande desejo, Deposito minha sina em Teu amor, Infinito Manancial de Fogo. Não posso viver outra hora sozinho; Sê, Jesus, a minha Vida! Falta-me força para lutar; sê Tu a minha Força Em cada luta! Nada posso fazer – esperar, amar, temer, Mas tão-somente falhar e cair. Sê, Jesus, minha alma e ser, Meu Deus e devir. ]

Embora o mundo inteiro parecesse “pairar numa espécie de paralisia”, pôs em prática os princípios que esposara no retiro em novembro e subjugou as emoções. Lembrando que “a causa da depressão é a subjetividade, sempre”, voltou-se para os “Fatos Eternos da Religião”, sabendo que a saída para a depressão “consiste em apegar-se às verdades externas que são verdadeiras em qualquer circunstância, e não no auto-exame”. Ao fazer isso, venceu a inércia que o mantinha paralisado e foi impelido a agir. No começo de setembro, com o conhecimento de sua mãe, escreveu a um dos poucos católicos que de fato conhecia, um velho amigo que se havia convertido e ordenado padre. O amigo vinha cogitando a idéia de entrar para a Ordem Dominicana e recomendou Benson ao Pe. Reginald Buckler, O.P., então residente em Woodchester, Gloucestershire. No prazo de dois ou três dias, recebeu a notícia de que o aguardavam no Priorado e, na segunda-feira, 7 de setembro, em vestes de leigo, partiu em sua última viagem como anglicano. Seus pensamentos durante a longa viagem de trem foram externados numa prosa fria e poética: 38


Não imagino que alguém jamais tenha entrado na Cidade de Deus com menos emoção do que eu. A impressão que eu tinha era a de estar sumamente esvaziado de sentimento; não sentia alegria nem tristeza, tampouco medo ou excitação. Havia a Verdade, remota como um pico nevado, e eu tinha de abraçá-la […] Era como alguém que saísse do resplendor da luz artificial – do calor, da luminosidade e da afabilidade – para a pálida luz natural da certeza fria e taciturna.33

Mesmo após a chegada ao Priorado, mal chegou a melhorar o ânimo. Freqüentava a Missa todas as manhãs, outros ofícios “de vez em quando” e sempre as Completas (Oração Noturna). A única parte da rotina diária que lhe inspirava algo próximo do entusiasmo era a cerimônia dominicana do Salve Regina após as Completas, que descreveu como “primorosa”. Também demonstrou um modesto e desapaixonado interesse pela “semelhança do rito dominicano com o rito sarum em vários pontos”.34 Ao longo de todo o processo de acolhida, manteve-se nesse estado de espírito deslustrado, atenuado apenas por “uma certeza absoluta de que estava fazendo a vontade de Deus e adentrando as portas de Sua Igreja”.35 Tão logo chegou a Woodchester, escreveu à mãe explicando que não seria batizado, mesmo condicionalmente, graças à absoluta certeza de que seu batismo anglicano era válido na forma e na intenção. Como fora batizado pelo pai, e em vista do conhecimento e constante prática da liturgia pelo arcebispo, sua decisão não chega a surpreender. Não obstante, em 10 de setembro, a mãe responde que ficou aliviada com a notícia. A carta dava mostras de um amor devoto pelo filho e uma benigna resignação diante do inimaginável transmutando-se no inevitável: Meu bem, – Tua carta esta manhã é um maravilhoso reconforto, e podes compreender que estejamos famintos e sedentos por cada ínfimo detalhe […] Estou profundamente grata por não teres sido rebatizado […] Tudo me parece correto e simples – justo o que queremos; e que bom não haver pressa ou urgência – apenas dispõe as coisas diante de ti e vê exatamente o que significam e se podes aceitar tudo. Avisar-me-ás, bem sei, tão logo fores de fato admitido, ou ainda antes, se puderes, para que meu coração – nossos corações – possam estar junto de ti […]36

A mãe voltou a escrever no dia seguinte, presumivelmente em resposta a uma carta em que Benson informava a hora exata da acolhida, que se daria naquele mesmo dia, 11 de setembro: […] Não lamento que não haja tardança – Estou tão contente de não haver outro batismo […] Volta logo para casa. Avisei a todos na casa hoje, para que saibam a hora exata. E às cinco em ponto, hoje, estaremos especialmente juntos contigo, filho querido.37

Benson submeteu-se então às formalidades finais da conversão. Foi levado à Chapter House pelo Pe. Reginald Buckler e, lá, ajoelhando-se diante do assento do Prior, fez sua primeira confissão, juntamente com atos de fé, esperança, caridade e contrição. Após receber a absolvição, percorreu a igreja até o altar para uma ação de graças. Na manhã seguinte, recebeu sua primeira Sagrada Comunhão das mãos do Prior. Foi lacônico ao relatar as notícias à mãe: “aconteceu”. A resposta foi imediata: 39


Meu Queridíssimo Filho, – Recebi teu recado dizendo que “aconteceu” […] estás agora onde o teu coração sente que podes ser verdadeiramente leal, onde ele encontra o seu lar, aonde sentes no fundo da alma que Deus te conduziu. Confiamos-te a Ele com sumo amor e incontida esperança […] Só nos mantenha a par de tudo, sempre que te for possível – continua a ser sempre quem és […]38

No mesmo dia, 12 de setembro, recebeu uma carta de Lucy Tait, velha amiga da família: “Foi um grande reconforto que nessas últimas semanas tenhamos nos aproximado tanto. É como se o vínculo íntimo tivesse se estreitado ainda mais agora que o externo – como posso dizer – modificou-se?”39 Nem todos foram tão caridosos ou compreensivos. A imprensa refestelou-se com a história do filho do ex-Arcebispo de Archbury que se convertera ao catolicismo, e a revelação abalou os alicerces do establishment anglicano de modo reminiscente dos tempos do Movimento de Oxford e da conversão de Newman. A mãe de Benson escreveu contando que “está chovendo cartas […], como são superficiais algumas delas, e que extraordinário algumas pessoas se permitirem pensar que tu deixaste de observar algum fato momentoso e evidente que elas gentilmente nos apontam”.40 Benson perdeu a conta do número de cartas que recebeu após a divulgação da notícia. Eram “pelo menos dois malotes postais por dia”, e decepcionou-se ao ver que bem poucas eram de católicos. Longe de darem mostras de triunfalismo ante o que podia ser interpretado como um lance monumental para a Igreja, a resposta dos católicos foi de indiferença, ao menos se tomarmos como indício o volume de sua remessa postal. A vasta maioria das cartas provinha de anglicanos – clérigos, homens, mulheres e até crianças. Tudo ofereciam ao recém-convertido, exceto conforto: “a maioria […] julgava-me um traidor deliberado (mas estes foram bem poucos) ou então um tolo apaixonado, ou ainda um fanático impaciente, teimoso e ingrato”.41 Metodicamente, Benson tratou de responder a todas. A uma “mulher sincera”, que o instou a recordar um sermão sobre o Filho Pródigo e “apressar-se em retornar à casa do Pai”, disse que era exatamente o que tinha feito. Outra carta causou-lhe “considerável dor e espanto”, assinada por uma mulher de meia-idade que se considerava sua amiga sincera, “esposa de uma eminente autoridade da Igreja da Inglaterra”. “Curta, amarga e inflamada”, a missiva o reprovava pela desonra que infligira ao nome e à memória de seu pai. Claramente magoado de alguém se prestar a essa acusação, concluiu que fora escrita num “estado de ira cega”. Amparou-se desses ataques com a reação mais caridosa de um bispo anglicano, que declarou à sua mãe: “Lembra-te de que no fim das contas ele seguiu a própria consciência, e que outra coisa poderia querer o pai dele, senão isso?”42 Uma carta, ao menos, propiciou-lhe um grão de consolação. Um entusiasmado clérigo americano congratulava-o pela fortuna de ter encontrado o caminho para a “Cidade da Paz”. Oito anos depois, segundo Benson, esse clérigo anônimo foi acolhido na Igreja. Contudo, não há melhor síntese para o impacto avassalador da conversão de Benson sobre muitos que o conheciam e respeitavam, que as palavras de um amigo anglo-católico para o qual atuara como diretor espiritual:

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Padre Benson ia virar católico romano! Mas se não era católico agora na Igreja da Inglaterra, era o quê? E eu, o que era? […] Não é exagero dizer que os alicerces da Fé e de todas as realidades da Vida Espiritual foram abalados e tremeram ante a violência desse choque assaz inesperado […] Foi extraordinariamente difícil entender por que alguém que tínhamos na conta de um pilar do catolicismo “inglês” julgou necessário para sua salvação submeter-se à Igreja de Roma.43

Passado o choque inicial, o referido missivista e muitas outras pessoas propuseram-se a descobrir por que o seu mentor se sentira compelido a dar esse “tremendo passo”. O resultado foi que “muitos de nós fomos levados a estudar a questão sob o seu guiamento, depois que ele ingressou na Igreja, e acabamos nos tornando católicos também”.

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NOTAS 1. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, Sevenoaks, 1991 edn., p. 52. 2. ibid., p. 52. 3. ibid., p. 63. 4. C. C. Martindale, The Life of Monsignor Robert Hugh Benson, Vol. One, Londres 1916, p. 165. 5. Robert Hugh Benson, Spiritual Letters, Londres 1915, p. 2. 6. ibid., p. 2. 7. ibid., p. 3. 8. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, p. 65. 9. ibid., p. 64. 10. ibid., pp. 59–60. 11. ibid., p. 20. 12. ibid., p. 60. 13. Robert Hugh Benson, Spiritual Letters, pp. 55–6. 14. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, pp. 60–1. 15. ibid., p. 61. 16. ibid., pp. 61–2. 17. ibid., pp. 76–7. 18. ibid., p. 78. 19. ibid., p. 78. 20. ibid., p. 87. 21. ibid., p. 87. 22. ibid., p. 88. 23. ibid., p. 88. 24. ibid., pp. 88–9. 25. ibid., p. 90. 26. ibid., pp. 90–1. 27. ibid., p. 91. 28. ibid., p. 92. 29. ibid., p. 92. 30. ibid., pp. 92–3. 31. ibid., p. 93. 32. Robert Hugh Benson, Poems, Londres 1915, pp. 27–8. 33. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, p. 95. 34. ibid., pp. 96–7. 35. ibid., p. 97. 36. C. C. Martindale, The Life of Monsignor Robert Hugh Benson, Vol. One, pp. 251–2. 37. ibid., p. 252. 38. ibid., p. 253. 39. ibid., p. 253. 40. ibid., p. 253. 41. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, pp. 100–1. 42. ibid., pp. 101–2. 43. Robert Hugh Benson, Spiritual Letters, pp. 17–18.

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O Filho do Bispo NO OUTONO de 1903, com a notícia da conversão de Benson ainda ressoando nos ouvidos das autoridades eclesiásticas, Edmund Arbuthnott Knox, bispo sufragâneo de Coventry, foi transferido para a Diocese de Manchester. No Natal daquele mesmo ano, seu filho Ronald Arbuthnott Knox lia A Luz Invisível, de Benson. O livro causaria uma impressão indelével no rapaz e, embora o autor nunca tomasse ciência, seria de importância crucial para o seu futuro. Com efeito, a vida de Knox estava fadada a seguir um rumo paralelo à de Benson em muitos aspectos fundamentais. Filho do Bispo de Manchester, Knox recebeu sua educação primária em Eton, onde Benson, filho do Arcebispo da Cantuária, fora educado quase duas décadas antes. Ambos passaram pelo alto anglicanismo, experimentaram “hesitações romanas” e entraram para a Igreja Católica em circunstâncias controversas. Ambos eram caçulas de famílias literárias notáveis. Knox fora induzido a ler A Luz Invisível após uma discussão, em que foi confrontado pela primeira vez com os costumeiros argumentos em prol das doutrinas e práticas católicas, tais como a Presença Real e a natureza Sacrificial da Missa. “Com todo o zelo bruto de sua natureza combativa, tentou contestá-los”1, o que acabou por despertar-lhe o interesse nesses assuntos. Ciente do caráter polêmico da conversão de Benson ao catolicismo, começou a ler A Luz Invisível em espírito de curiosidade juvenil. Jamais voltaria a ser o mesmo: “[…] aquele Natal marcou uma guinada em minha vida. Foi o ambiente do livro – a capelinha em que o padre celebrava, os termos com que aludia à Mãe de Deus, a descrição das confissões ouvidas numa velha igreja paroquial – que me absorveu a atenção, mais ainda que o interesse psicológico”.2 Dali em diante, o catolicismo, que antes considerava “pérfido”, adquiriu uma atração própria. Segundo Evelyn Waugh, a leitura do primeiro romance de Benson foi tão importante para Knox que “o próprio Ronald apontava o Natal de 1903 como o nascedouro de seu catolicismo”.3 Outra etapa importante na evolução embrionária da espiritualidade de Knox, e outro paralelo com a trajetória de Benson, foi a leitura do romance John Inglesant, de Joseph Shorthouse. A exemplo de Benson, leu esse romance religioso quando ainda era um jovem impressionável, exprimindo admiração pela obra. A exemplo de Benson, moderaria essa admiração no futuro, mas fica claro que o livro ainda era uma influência importante. Embora Waugh descreva o Natal de 1903 como o nascedouro do catolicismo de Knox, isso só é verdade num sentido retroativo. Muitos anos ainda se passariam antes de seu ingresso na Igreja Católica. Não obstante, Knox considerava-se fundamentalmente transformado após a leitura de A Luz Invisível. Via aquele Natal como a sua “conversão”, e foi então que começou a tomar a comunhão anglicana toda semana.4 “A atmosfera do catolicismo” passou a dominar sua imaginação, ao passo que a história do Movimento de Oxford despertou-lhe o entusiasmo latente por causas perdidas. Por conseguinte, em algum ponto de 1904, Knox tornou-se um ardente ritualista. Leu um livro de “caráter severamente didático” chamado The Ritual Reason - Why, no qual encontrou “explicações elaboradas sobre o sentido místico simbolizado pelo amicto, o incenso e o sinal da Cruz”.5 No futuro, consideraria esses excessos caricaturais “distintamente 43


ritualísticos” e uma “nova maçonaria”, mas na época “refestelei-me com eles”, de modo que “todo símbolo era sagrado”. Assim, observou, “muito antes de assistir a um ofício ritualístico eu já me havia transformado num ritualista”.6 Conjugado e relacionado ao novo interesse pelo ritualismo e pelo Movimento de Oxford, descobriu a arquitetura gótica e a arte pré-rafaelita: “O espírito de renascimento em Holman Hunt e Rossetti conciliou-se com o espírito de renascimento em Pusey e Neale; curiosamente, na minha mente os dois movimentos estavam enxertados num mesmo caule”.7 O mergulho de pleno coração no mundo do anglo-catolicismo, em 1904, não parece ter encontrado resistência séria em casa. Isso surpreende na medida em que sua postura pró-Alta Igreja divergia nitidamente da posição do pai, simpatizante da ala evangélica. Segundo Knox, seus pontos de vista eram conhecidos em casa “e sem dúvida lamentados”, mas “nunca provocaram a menor interrupção nos sentimentos de ternura, de uma parte […] ou de respeito, da outra – não de afeição, decerto, de ambas as partes”.8 Em deferência ao pai, Knox jamais freqüentou nenhum culto que soubesse que o Bispo desaprovaria em Manchester; não obstante, ainda ficamos surpresos com a inexistência de sinais de atrito no lar dos Knox. Na opinião de Evelyn Waugh, isso indicava “que o Bispo não soube estimar a força das propensões de Ronald ou não se empenhou a fundo em mudarlhes o rumo”.9 Não que fosse fácil mudar os rumos de Knox. Era um jovem extremamente inteligente, talentoso e culto, cujos pontos de vista nunca se fundavam na ignorância. Waugh descreve a carreira de Knox em Eton em termos do mais elevado respeito: “Ainda em Eton, escreveu um livro de poemas leves em inglês, latim e grego, e mesmo hoje é lembrado no colégio como o rapaz mais inteligente que já passou por seus bancos […]”10 Indivíduos excepcionais costumam dar mostras de precocidade, como fica evidente num soneto religioso composto em 1904, aos dezesseis anos:

I have an errand on a stony way, That rises darkly to the mountain height, And, from that zenith, stretching thro’ the night Sinks to the valleys of eternal day. And yet I weary not; for God, my Stay Hath ever set before my straining sight Some earthly beacon, whose celestial light Tempts the numb-hearted traveller to delay. And here I meet old friends, whom I have tried Beneath the shadow of the chastening Sword, And quaff sweet draughts of Memory; or abide By the great gulf of Silence overawed, And worship, falling on my knees beside The everlighted beacons of the Lord. 11 [ Tenho uma missão numa estrada de pedras, Que sobe na escuridão até o ápice do monte, E, desse zênite, espraiando-se no breu da noite, 44


Mergulha nos vales do dia perpétuo. E porém não me aflijo; pois Deus, meu Esteio Sempre dispôs ante minha vista extenuada Um farol terreno cuja luz celestial Tenta o viajante entorpecido a protelar. E cá encontro velhos amigos, que julguei Sob a sombra da Espada que castiga, E doces tragos da Memória sorvo; ou paro Perante o golfo de Silêncio admirado, E prostrando-me de joelhos venero Os faróis do Senhor sempre iluminados. ] Se o primeiro romance de R. H. Benson excitara o precoce Knox no final de 1903, em março do ano seguinte é O Napoleão de Notting Hill, primeiro romance de Chesterton, que inflama suas paixões. Knox descreveu-se “um ginasiano que recém-começava a pensar” na época em que leu o livro. Passados muitos anos, ainda tentava deslindar sua mensagem de fundo: Quem está certo: o cínico que acha tudo divertido ou o fanático inteiramente desprovido de senso de humor? A resposta é que ambos são, na realidade, dois lóbulos do mesmo cérebro; é só quando o mundo sai dos trilhos que se dá a precipitação pura do cínico ou do fanático; o homem normal, vivendo em circunstâncias normais, é uma mescla dos dois.12

A partir desse momento, os escritos de Chesterton transformam-se numa compulsão, a ponto de os paradoxos chestertonianos logo se tornarem “platitudes do meu pensamento”. Em sua autobiografia, Knox concede a Chesterton o crédito maior por moldar suas concepções religiosas: “Em relação à ortodoxia, meus pontos de vista ao deixar Eton eram mais ortodoxos do que a média; G. K. Chesterton era o meu oráculo – e continua sendo”.13 Enquanto isso, Benson, o outro mentor de Knox, também lia Chesterton. De Roma, onde cursava o seminário e seria ordenado naquele ano, ele envia ao irmão A. C. Benson uma carta em 9 de maio de 1904, onde compara a biografia de G. F. Watts, escrita por Chesterton, ao estudo sobre Tennyson feito pelo irmão: “Li o Watts de Chesterton mais ou menos na mesma época, e gostei mais [do teu Tennyson] – ao menos alguns trechos eram excelentes, mas havia um pouquinho demasiado de Chesterton neles […] O livro de Chesterton fez eu sentir que ele era dolorosamente inteligente – o teu fez eu sentir que eu era”.14 Chesterton talvez aceitasse bem essas críticas, com cordialidade e de pleno coração. Tinha sentimentos conflitantes em relação a seus primeiros livros e considerava O Napoleão de Notting Hill o primeiro realmente meritório. A exemplo de Knox, Chesterton havia se tornado anglo-católico. Seu próximo livro importante, Hereges, publicado em 6 de junho de 1905, foi bastante influente no progresso intelectual de Knox e vários outros de sua geração. Um dos argumentos mais contundentes e avançados em Hereges dizia respeito aos méritos relativos de Ibsen e Dante:

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Se compararmos, digamos, a moralidade da Divina Comédia com a moralidade de Espectros, de Ibsen, poderemos contemplar tudo o que a ética moderna de fato realizou […] Dante

descreve três instrumentos morais: o Céu, o Purgatório e o Inferno – a visão da perfeição, a visão do aperfeiçoamento e a visão do fracasso. Ibsen só dispõe de um: o Inferno.15

Podemos imaginar o jovem Ronald Knox devorando esses ensaios de Chesterton e digerindo-os em “platitudes” do seu pensamento; e só podemos imaginar o deleite e aprovação entusiástica com que saudou sua defesa do ritual na religião: O mais feroz oponente das cerimônias cristãs terá de convir que, se o catolicismo não tivesse instituído o pão e o vinho, é muito provável que alguém mais o tivesse feito. Qualquer pessoa dotada de instinto poético irá admitir que o pão, para o instinto humano comum, simboliza algo difícil de simbolizar de outra maneira; que o vinho, para o instinto humano comum, simboliza algo difícil de simbolizar de outra maneira. Mas o uso de gravatas brancas à noite é uma coisa ritual, e apenas e tão-somente ritual. Ninguém iria pretender que vestir gravata branca à noite seja algo primordial e poético. Ninguém sustentaria que o instinto humano comum possui uma tendência a, em qualquer época ou país, simbolizar a idéia de noite com uma gravata branca.16

Empregando o exemplo de se tirar o chapéu ritualmente para uma dama, Chesterton pergunta: “O que pode ser mais solene e absurdo, considerado em abstrato, do que simbolizar a existência do outro sexo balançando um item do traje no ar?”17 Em seguida, o coup de grâce: “Todos os homens, portanto, são ritualistas, ainda que uns sejam ritualistas conscientes e outros inconscientes”.18 Enquanto isso, Ronald Knox, agora com dezessete anos e já um ritualista bastante consciente, estava a ponto de tomar outra decisão consciente de importância decisiva em sua trajetória de vida. Numa noite de 1905, ajoelhou-se e pronunciou um voto solene de celibato. Ciente de que o juramento podia ser mal interpretado, ainda mais partindo de um ginasiano, cuidou de contextualizar o ato em seu relato autobiográfico do período: “O pensamento mais elevado na minha mente não era o da virgindade: eu não estava fugindo da perversidade do mundo que via em torno de mim […]”19 Antes, era uma resposta à súbita constatação de que o anseio natural por simpatia e aprovação humanas, em especial “a simpatia e a aprovação mais afetuosas que adviriam de um matrimônio feliz”, tolheria sua capacidade de “servir ao Senhor”.20 Mesmo dispondo do benefício da visão retroativa, Knox confessou não ter “nenhuma idéia, humanamente falando, quanto a de onde surgiram esses impulsos ascéticos. Não consigo lembrar de nenhuma leitura feita até então que me os tivesse sugerido – quase não há traços em A Luz Invisível daquela atmosfera de mortificação que tanto inspira os escritos tardios do Monsenhor Benson”.21 Não obstante, os escritos de Benson continuaram a influenciar Knox durante esses anos formativos. Depois de A Luz Invisível, em 1903, Benson publicou dois romances históricos: By What Authority?, em 1904, e The King’s Achievement, em 1905, ambos ambientados na Inglaterra dos Tudor. Richard Raynal: Solitary, narrativa-pastiche da vida de um eremita do século XV, publicada em 1906, viria a tornar-se o livro predileto do autor. Benson o descreve como “muitíssimo mais bem escrito e muitíssimo mais religioso”22 que A Luz Invisível, e não resta dúvida de que contém muito daquela atmosfera de mortificação que Knox atribui a suas obras. Também contém 46


ecos da teologia profunda que Benson há muito vinha pregando, quer como anglicano ou católico, e alusões aos embates interiores que precederam sua conversão: […] havia aquele conflito que eu mencionei. Havia nele aquilo que denominamos Vontade, que se mantinha tensa e forte, debatendo-se contra o desespero. Nem mente nem coração podiam socorrê-lo naquela Noite. A mente dizia que incorrera no pecado mortal da presunção; o coração, em lugar algum encontrava Deus para amar. E isso tudo apesar de dizer-se a si mesmo que Deus era digno de amor e adoração, e que não podia cair no inferno senão por vontade e determinação próprias. E no entanto, a despeito de tudo, e quando tudo em torno havia falhado, sua vontade lutava contra o desespero (que é o anticristo da humildade) […]23

Outro de seus primeiros romances foi em parte inspirado por uma visita a Oxburgh Hall, lar da família Bedingfield em Norfolk. Os Bedingfield são uma das mais antigas famílias nãoconformistas da Inglaterra. O impacto da estadia de Benson entre eles fica evidente pelo entusiasmo com que os descreve: Rumo a Oxburgh. Ah!!!! […] um casarão vermelho, com fosso, torres, (cachorro no quintal), as armas de Cromwell nas torres […] Retratos além do crível! […] O quarto do Rei, lugar grandioso com chão de tijolos, pé-direito alto, tapeçaria do século XIV, uma vasta cama, trabalhada por Maria da Escócia; um quarto assombrado, de verdade, com o retrato da mulher que o assombra, uma italiana.24

A empolgação encontrou expressão no romance The Sentimentalists, de 1906, em que Oxburgh Hall aparece como a casa do protagonista, o Sr. Rolls. Nisto, naturalmente, Benson estava preparando o terreno para Evelyn Waugh, que tomaria um entusiasmo semelhante pela aristocracia católica e seus casarões como inspiração para Memórias de Brideshead. O quanto a ficção de Benson influenciou Knox é ilustrado por um conto que este escreveu em 1907, “à maneira de Hugh Benson”, durante uma viagem a Roma. A história baseia-se no diário de um sacerdote que, no afã de exorcizar um de seus paroquianos, acaba possuído por um mal hediondo e sem nome.25 Contudo, Knox não se impressionou muito ao conhecer Benson em carne e osso nos aposentos de um amigo em Oxford. Benson passou quase o tempo todo falando sobre estranhos casos de doença nervosa, e Knox recorda ter ficado “impressionado com a originalidade, mas não com o charme de sua conversa”.26 Outro que Knox conheceu em Oxford foi Arnold Lunn. Também não se deixou impressionar, descrevendo-o como “um dissidente amargo”.27 Lunn depois recordaria que a descrição era injusta, pois fora criado num lar anglicano e era agnóstico quando se conheceram. Eram coetâneos exatos, nascidos ambos em 1888, mas Knox estava um período letivo à frente no Balliol College. Precedeu Lunn como editor do The Isis, semanário da faculdade, e, como presidente da Oxford Union, nomeou Lunn oficialmente para o comitê da biblioteca. A exemplo de muitos de seus contemporâneos, Lunn estava algo deslumbrado com o fulgor de Knox. Recordou que “a marcha triunfante de Knox até a presidência jamais foi contestada a sério, pois tinha fama de gênio já no bacharelado”, e afirmou em sua autobiografia que Knox “era notadamente o orador mais brilhante. Por mais cuidadoso que fosse na preparação de seus 47


discursos, sua inteligência sempre parecia espontânea”.28 Em seu Diário de Oxford, Lunn registrou que, “a convite de Knox, assisti à apresentação de uma monografia (lida por Knox) no Shaftesbury. Trabalho brilhante”.29 Se curvava-se ao brilhantismo de Knox, porém, Lunn estava longe de curvar-se às suas crenças. Ficou tão indiferente a seu anglo-catolicismo ritualístico quanto ao assistir a uma missa católica pela primeira vez, em agosto de 1907. Na ocasião, considerou a missa “inferior, em matéria de ritual, a um funeral militar”.30 Nos anos seguintes, Lunn foi se afastando cada vez mais de Roma, na mesma proporção com que Knox se aproximava. Chegaram a terçar armas publicamente em um debate sobre religião, até que Lunn enfim capitulou e se converteu ao catolicismo. Nos tempos de Oxford, nenhum dos dois suspeitava que ao cabo de um quarto de século seria Ronald Knox, na condição de sacerdote católico, quem acolheria Arnold Lunn na Igreja.

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NOTAS 1. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, Londres, 1958 edn., p. 31. 2. ibid., p. 32. 3. Evelyn Waugh, The Life of Ronald Knox, Londres, 1962 edn., p. 55. 4. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, p. 38. 5. ibid., p. 34. 6. ibid., p. 34. 7. ibid., pp. 35–6. 8. ibid., p. 37. 9. Evelyn Waugh, The Life of Ronald Knox, p. 56. 10. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, p. v. 11. Evelyn Waugh, The Life of Ronald Knox, p. 57. 12. Claude Williamson, OSC (ed.), Great Catholics, Londres, 1938, p. 551. 13. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, p. 107. 14. C. C. Martindale, The Life of Monsignor Robert Hugh Benson, Vol. One, p. 343. 15. G. K. Chesterton, Heretics, Londres, 1905, pp. 29–30. 16. ibid., p. 248. 17. ibid., p. 249. 18. ibid., p. 250. 19. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, p. 43. 20. ibid., pp. 43–4. 21. ibid., p. 44. 22. Robert Hugh Benson, Confessions of a Convert, p. 61. 23. Robert Hugh Benson, Richard Raynal: Solitary, Londres, 1927 edn., p. 248

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Dawson e Watkin NUM estágio posterior da vida, rememorando mais friamente os seus dias à frente da presidência da Oxford Union, Ronald Knox confessou que a sociedade de debates se afigurava “menos calorosa e alentadora em retrospecto”. No entanto, também admitia que “ela deixa lembranças indeléveis”,1 como a de Winston Churchill “despejando uma cáustica invectiva sobre F. E. Smith, que o acompanhara na viagem de trem”, e a de Hilaire Belloc “revirando um charuto entre os dedos enquanto demolia a Câmara dos Lordes”.2 Outro que tinha memórias indeléveis dos animados debates em Oxford por essa época era Christopher Dawson, que ingressou no Trinity College em 1908. Dawson recordava-se da imponente figura de Belloc pronunciando-se no debate da Eights Week i, e de Ronald Knox fazendo “um discurso brilhante em que provava que os Stuarts eram socialistas desinteressados”.3 A exemplo de Arnold Lunn, Dawson estava um tanto deslumbrado com Knox, que além de pertencer à “turma dos sagazes de Balliol” e ser um dos líderes da “facção anglo-católica então em voga na universidade, era o fundador de um grupo chamado ‘The Spikes’, ii assim alcunhado em função de suas visões simpáticas à Alta Igreja”.4 Dawson começou a rondar as franjas do círculo anglo-católico de Knox, jamais chegando de fato a se afiliar aos Spikes, mas assistindo à Missa em Pusey House nos dias úteis. Era um convertido relativamente recente ao anglo-catolicismo, e pouco antes ainda se descrevia agnóstico. O ressurgimento de sua fé provinha em grande parte da amizade com Edward Ingram Watkin, anglo-católico que se convertera ao catolicismo romano no ano em que o próprio Dawson desembarcava em Oxford. Watkin, aluno do New College, havia se convencido de que Cristo instituíra uma única Igreja indivisa, algo que a Igreja Anglicana não alegava ser. Permaneceu, contudo, se não reconciliado, ao menos em paz com a comunhão em que fora educado. A propósito de sua acolhida na Igreja Católica, escreveu que “o catolicismo foi a concretização de tudo o que eu aprendi e prezava quando anglicano”, mas que ainda devia à Igreja da Inglaterra “um apreço ao culto e à oração litúrgicos, que me permitiram encontrar na liturgia católica tesouros que de outro modo eu talvez não descobrisse”.5 Nos anos seguintes, Watkin se tornaria autor de vários livros, que abarcavam desde teologia e filosofia até histórias populares da Igreja Católica na Inglaterra e estudos sobre a arte e a cultura católicas. Contribuição semelhante ao pensamento católico prestou Dawson, que, em parte ainda sob o influxo de Watkin, converteu-se ao catolicismo em 1914. Dawson escreveu livros pioneiros, particularmente no campo da filosofia da história, exercendo influência sobre vários contemporâneos, inclusive T. S. Eliot. i Eights Week era uma regata interuniversitária que Oxford abrigava anualmente. Debates eram realizados durante os quatro dias do evento. ii Gíria usada para satirizar membros da Igreja Anglicana preocupados com os rituais e a observância do anglocatolicismo. Designa indivíduos tidos como intrometidos e arrogantes.

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Dawson e Watkin se conheceram ainda garotos em Bletsoe, Bedforshire, no verão de 1905, para onde tinham sido mandados aos cuidados de um preceptor particular a fim de prosseguir os estudos antes do ingresso em Oxford. Christina Scott, filha e biógrafa de Dawson, descreveu a relação entre seu pai e Watkin como “a primeira e maior amizade de sua vida”.6 Segundo o próprio Watkin, o primeiro contato entre ambos foi “bem pouco auspicioso com vistas a uma futura amizade”, marcado por uma violenta rusga religiosa. Dawson estava passando por uma fase de ceticismo religioso, ao passo que Watkin era já um anglo-católico entusiástico. A volátil mistura resultou numa explosão de polêmicas, culminando em violência física quando o jovem anglocatólico jogou uma cadeira de jardim na direção da cabeça do agnóstico mais novo!7 Partindo desse início pouco promissor, a relação progrediu. Watkin chegou a Bletsoe com dezesseis anos, após uma infância solitária no País de Gales e uma educação não-convencional com tutores particulares dentro e fora de casa. De Bletsoe seguiu para a St Paul’s School, em Londres, onde Chesterton fora educado vinte anos antes, e conseguiu uma bolsa de estudos clássicos no New College de Oxford. Enquanto isso, Dawson – cujo avô materno, o arquidiácono Bevan, é uma figura central dos Diários de Kilvert i – fora enviado a Winchester, onde achou a religião “árida e sem vida” e as longas horas de instrução formal “mais de ética que de religião”. Dessa forma, a mais religiosa das public schools inglesas só lograra afastá-lo da “religião do establishment”. Mais tarde, descreveu o efeito deletério da educação religiosa em Winchester: “As brumas de vaguidão e incerteza que pairavam sobre os artigos mais fundamentais do dogma cristão […] O único critério de autoridade no mundo religioso protestante, a Bíblia, estava sendo assolado pela maré da nova crítica bíblica”.8 Desesperado em busca de uma fonte de autoridade, não logrou encontrá-la na Igreja Anglicana e menos ainda na ala anglo-católica da Igreja da Inglaterra, que era “fraca justo no ponto em que se pretendia mais forte. Faltava-lhe autoridade. Tratava-se do ensinamento não da igreja oficial, mas de uma minoria arrojada, que lançava mão de seus próprios critérios de ortodoxia”.9 Foi esse “conflito de autoridades”, em suas palavras, que o levou a perder a fé. “A corrente intelectual”, escreveu, “estava na realidade distanciando-se do cristianismo, e eu sofri a primeira influência daquela onda de paganismo que desde então varreu o país”.10 Essas palavras foram escritas em retrospecto, em 1926, mas seu diário de 1906 registrava o mesmo ponto de vista num tom menos distanciado: “A mim parece não haver nenhuma certeza exceto a da minha própria existência, e sem isso não é possível conceber nada”. No ano seguinte, escreveria: “Atualmente, o cristianismo me parece apenas mais uma entre várias possibilidades. Não tenho a menor convicção”.11 À altura do ingresso no Trinity College, em 1908, as dúvidas haviam refluído o suficiente para um retorno à crença no cristianismo, crédito que em parte pertencia à influência contínua de Watkin. Descontada a conflagração inicial, o que uniu Dawson e Watkin desde o princípio foi um interesse comum por livros. Em Bletsoe, Dawson apresentou Watkin ao John Inglesant de Shorthouse, que influenciou ambos, mais ou menos como havia influenciado R. H. Benson e Ronald Knox.

i Diários tratando da vida rural inglesa pelos quais ficou célebre na posteridade o clérigo anglicano Francis Kilvert (1840– 1879). (N.T.)

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Nos primeiros capítulos de John Inglesant, há uma descrição da comunidade anglicana de Little Gidding no século XVII e da igreja celebrada nos Quatro Quartetos de T. S. Eliot. No último ano letivo em Bletsoe, Dawson e Watkin fizeram uma viagem pelo campo até Little Gidding, onde constataram “uma atmosfera peculiar de paz e oração que reveste a igreja”.12 Watkin deixou Bletsoe em 1906, e Dawson logo em seguida, mas a amizade consolidou-se em Oxford e continuou pelos próximos sessenta anos. Watkin foi padrinho de batismo da filha de Dawson, Juliana, hoje freira da Congregação das Irmãs da Assunção em Hengrave Hall, Suffolk, a qual lembra que “eles perderam contato nos últimos anos”.13 Sua outra filha, Christina Scott, descreveu a natureza daquela amizade na biografia que escreveu do pai: Era uma daquelas raras amizades entre duas personalidades aparentemente opostas que sentem uma estreita conformidade de mente e espírito. Com Edward Watkin, que era extrovertido e conversador, a timidez e reserva de Christopher o abandonavam, e ele via que podia falar livremente ou ficar em silêncio se preferisse: tamanha era a afinidade de suas mentes que falar podia tornar-se desnecessário.14

Após os anos tranqüilos em Bletsoe, a vida em Oxford foi “um turbilhão social” para Dawson. Afora Watkin, conhecia uns poucos católicos romanos, e não cogitou a conversão por algum tempo. Todavia, a exemplo de tantos contemporâneos, era leitor dos romances de Benson, e, durante uma desventurada estada na Alemanha, comparou aquele país “pavoroso” à “situação da sociedade em O Senhor do Mundo”, romance de Benson sobre o apocalipse.15 Seu respeito por Benson perdurou, e vinte anos mais tarde estava incentivando os filhos a ler seus livros. Juliana Dawson relembra que “fui criada com os romances de Benson […] Eram um pouco exagerados, talvez, mas eu os apreciava muito”.16 Uma viagem a Roma em companhia de Watkin, durante o feriado de Páscoa de 1909, atuou “como uma revelação” para Dawson, abrindo-lhe os olhos “para todo um mundo novo de religião e cultura”.17 As impressões favoráveis que tivera de Roma, aos 19 anos, contrastaram asperamente com sua visão da Alemanha, onde se queixou que “as pessoas vivem tão bem sem religião” e “examinam o cristianismo como se fosse uma espécie de besouro”.18 Enquanto a Alemanha era “um lugar dos mais aniquiladores para a alma”, Roma excedeu suas expectativas, tendo sido bem menos estragada pela modernização do que imaginava. Escreveu uma carta cheia de entusiasmo para casa, descrevendo as igrejas barrocas como “todo revestidas de ouro e mármore colorido”. Um relato posterior de sua conversão ilustra a importância dessa primeira viagem a Roma: Para mim a arte da Contra-Reforma era puro deleite, e amei as igrejas de Bernini e Borromini não menos que as antigas basílicas. Isso, por sua vez, levou-me à literatura da ContraReforma, e vim a conhecer Santa Teresa e São João da Cruz, comparados aos quais mesmo os maiores escritores religiosos não-católicos se afiguram pálidos e irreais.19

De volta a Oxford, conheceu vários outros católicos e alguns sacerdotes, graças novamente à amizade com Watkin. Na Newman Society (sociedade católica para bacharelandos de Oxford), ouviu Wilfrid Ward discorrer sobre as circunstâncias em que Newman escreveu a Apologia pro Vita Sua. Foi mais ou menos nessa época que se interessou por Newman e o Movimento de Oxford 53


pela primeira vez, e a Apologia de Newman viria a ter um peso considerável em sua conversão. Segundo Christina Scott, “sua atitude como um todo era bastante semelhante à de Newman. Chegou à Fé por meio da história e do estudo dos Padres da Igreja”.20 Dawson continuou fascinado por Newman por toda a vida. Numa de suas últimas palestras em Harvard, descreveu as circunstâncias que conduziram o cardeal à conversão. Lembrou que, quando finalmente se viu diante da decisão, Newman achou-a “dificílima de tomar, e foram necessários quatro anos de agonizante exame intelectual e moral para romper os laços que o prendiam à Igreja da Inglaterra e a Oxford”.21 Dawson encontrava-se quase na mesma situação, e impressiona a similaridade de suas respectivas caminhadas. A exemplo de Newman, Dawson sentia-se preso à sólida tradição anglicana de sua família e, tal como no caso de Newman, perturbava-o saber que a conversão ao catolicismo romano o exporia à profunda desaprovação dos que lhe eram próximos. Sabia que a mãe, filha mais velha do Arquidiácono Bevan, de Hay Castle, iria opor firme resistência a que “se bandeasse para Roma”. Outro paralelo evidente entre as conversões de Newman e Dawson reside na longa postergação antes de darem o passo irrevogável. Dawson havia se referido aos quatro anos de embate espiritual de Newman antes da conversão. Ele próprio demoraria quase o mesmo tanto. Sobre Newman, escreveu que “nenhum convertido jamais se aproximou com tanto cuidado e tão conscienciosamente do catolicismo, experimentando cada passo, pesando cada alternativa e considerando cada objeção”.22 Dawson adotou o mesmo método, lançando-se num intenso estudo da Bíblia e dos Padres da Igreja, particularmente Atanásio, Irineu, Cipriano e Agostinho. “Os Padres fizeram de mim um católico”, escreveu Newman em carta a Pusey. Dawson poderia ter dito o mesmo. Em outro momento, Newman escreveu que “aprofundar-se na história é deixar de ser protestante”. O que ele quis dizer com isso, explicou Dawson, é que o acúmulo de fatos sobre o passado cristão levara-o à aceitação integral do presente católico: “Não havia senão dois caminhos: o da fé e o da descrença. Enquanto este levava ao ponto intermediário entre o liberalismo e o ateísmo, aquele conduzia ao ponto intermediário entre o anglicanismo e o catolicismo”.23 Embora escritas a respeito de Newman, essas palavras valem como uma vívida descrição dos sentimentos do próprio Dawson conforme se aproximava da conversão. Ironicamente, porém, foram os escritos de um teólogo protestante do século XIX que finalmente o convenceram da verdade do catolicismo. Adolf Harnack i, no Volume VII de sua História do Dogma [Dogmengeschichte], deixa claro que Lutero atacou por inteiro o ideal católico da perfeição cristã, operando uma ruptura do presente protestante com o passado cristão. Isso convenceu Dawson de que apenas a Igreja Católica Romana professava a fé verdadeira, numa tradição ininterrupta desde os Apóstolos. Foi com um sorriso nos lábios que expressou sua inesperada dívida de gratidão para com o teólogo protestante alemão, que involuntariamente o conduzira a Roma: “Harnack, um protestante liberal, nunca soube o quanto contribuiu para o meu processo de conversão à Igreja Católica! Ele nunca ouviu falar de mim, é claro, mas me pergunto se jamais lhe ocorreu que pudesse ajudar alguém nesta senda em particular”.24 A trajetória de Dawson até uma posição ortodoxa, passando pela rejeição de uma opinião “herética” alheia, assemelha-se à experiência de G. K. Chesterton na mesma época. Em 1909, Chesterton envolvera-se numa polêmica com Robert Dell, modernista católico-romano que i

Carl Gustav Adolf von Harnack (1851-1930), teólogo e historiador alemão.

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depois deixou a Igreja para tornar-se um inflamado agnóstico e socialista revolucionário. Em resposta a Dell, Chesterton concluiu que “nunca me senti tão próximo da comunhão do Sr. Dell quanto após ler o ataque que ele assestou contra ela”.25 Dois anos depois, Chesterton acabaria dando um empurrãozinho em Dawson, aproximando-o da Igreja Católica. Este se encontrava em meio a seu embate espiritual, em agosto de 1911, quando saiu A Balada do Cavalo Branco. Passados mais de vinte anos, Dawson escreveria a Chesterton reconhecendo a influência do livro: “Anos atrás, quando eu estava na graduação, seu A Balada do Cavalo Branco trouxe-me o primeiro suspiro de vida àquele período”.26 Não obstante, a influência de Chesterton foi relativamente pequena se comparada à de Newman, por um lado, e à de seu aprofundado estudo da história, por outro. Foi este último que o convenceu, gradativamente, de que a Reforma tinha raízes em erros fundamentais: Foi um exemplo clássico de jogar fora o bebê com a água do banho. Os reformadores rebelaram-se contra o externalismo da religião medieval, e por isso aboliram a Missa. Protestaram contra a falta de santidade pessoal, e por isso aboliram os santos. Atacaram a riqueza e a autoindulgência dos monges, e por isso aboliram o monasticismo e a vida de pobreza e ascetismo voluntários. Não tinham intenção alguma de abandonar o ideal da perfeição cristã, mas tentaram realizá-lo pelo puritanismo, em vez do monasticismo, e pelo pietismo, em vez do misticismo.27

Por fim, não foi Newman nem o estudo da história que o convenceram da verdade da Igreja Católica, mas sim uma leitura minuciosa da Bíblia. Nisto trilhou um caminho análogo ao de R. H. Benson: Foi pelo estudo de S. Paulo e S. João que vim a entender pela primeira vez a unidade fundamental entre a teologia católica e a vida católica. Percebi que a Encarnação, os sacramentos, a ordem exterior da Igreja e o trabalho interior da graça santificante, tudo era parte de uma mesma unidade orgânica, uma árvore viva com raízes na natureza divina e cujo fruto é a perfeição dos santos […]28

Outra influência fundamental, menos profunda mas igualmente potente, foi conhecer Valery Mills numa festa em Oxford, no verão de 1909. Sentiu-se “imediata e irremediavelmente apaixonado” pela católica de dezoito anos. Noivaram após quatro anos e no ano seguinte Dawson abraçou a fé da noiva. Antes, porém, teve de enfrentar a oposição da mãe, protestante ferrenha que nunca se conformou com sua mudança de religião. A conversão também gerou atrito no relacionamento com a irmã, anglo-católica devota que jamais deu mostras de compreender ou aceitar seus motivos para ingressar na Igreja romana. Com efeito, a admissão na Igreja “provocou uma fissura entre ambos, de modo que o convívio próximo da infância jamais se restaurou completamente”.29 Christopher Dawson foi acolhido na Igreja pelo Padre O’Hare, S.J., na igreja St Alysius de Oxford, em 5 de janeiro de 1914, véspera da Epifania do Senhor. Bastante apropriadamente, Edward Watkin, velho amigo e companheiro de fé, participou da cerimônia na condição de padrinho.

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NOTAS 1. Ronald Knox, A Spiritual Aeneid, p. 52. 2. Ibid. 3. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, Londres, 1984, p. 39. 4. ibid., pp. 41–2. 5. Matthew Hoehn, OSB (ed.), Catholic Authors: Contemporary Biographical Sketches, 1930– 1947, Newark, EUA, 1948, pp. 775–6. 6. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, p. 36. 7. ibid., p. 37. 8. ibid., p. 37. 9. ibid., p. 37. 10. ibid., p. 37. 11. ibid., pp. 37–8. 12. ibid., p. 38. 13. Irmã Juliana Dawson, entrevista com o autor, Hengrave Hall, Suffolk, 09 de dezembro de 1996. 14. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, pp. 38–9. 15. ibid., p. 40. 16. Irmã Juliana Dawson, entrevista com o autor. 17. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, p. 47. 18. ibid., p. 40. 19. ibid., p. 48. 20. Christina Scott, entrevista com o autor, Kensington, 28 de dezembro de 1996. 21. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, p. 62. 22. ibid., pp. 62–3. 23. ibid., p. 63. 24. ibid., p. 63. 25. Church Socialist Quarterly, Julho de 1909. 26. The Chesterton Review, Vol. IX, No. 2, p. 136. 27. Christina Scott, A Historian and his World: A Life of Christopher Dawson, p. 64. 28. ibid., p. 64. 29. ibid., p. 65.

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O Apostolado de Benson em Cambridge EM 1º de agosto de 1907, Hilaire Belloc escreveu a A. C. Benson expressando grande admiração pelo seu irmão R. H. Benson. Encontrara-o uma ou duas vezes e gostara dele “enormemente”. Na mesma carta, confessava ainda grande simpatia pelos romances históricos de Robert: “Está traçado. Será ele a escrever um livro que nos dará alguma idéia do que se passou na Inglaterra entre 1520 e 1560”.1 Cada vez mais frustrado com o viés protestante dos historiadores whig, Belloc logo tomaria a iniciativa de estudar o período por conta própria. No futuro, publicaria estudos sobre figuras centrais dos séculos XVI e XVII, como Wolsey, Cromwell, Jaime I, Carlos II e Cranmer. Como Ocorreu a Reforma, publicado em 1928, foi um esforço de contextualização desse período. Benson, porém, seguiu por um caminho diverso. Embora ainda viesse a escrever mais dois romances históricos – Come Rack! Come Rope! e Oddsfish – o grosso de sua futura ficção trataria de dilemas contemporâneos, ou, como em O Senhor do Mundo, de 1907, de visões apocalípticas do futuro, antecipando as distopias de Admirável Mundo Novo, de Huxley, e 1984, de Orwell. Ademais, Benson não era apenas romancista. Fora ordenado em 1904, e, após voltar de Roma no mesmo ano, retornou a Cambridge, onde cursara a graduação. Shane Leslie, que chegou a conhecê-lo bem durante aquele primeiro período em Cambridge, escreveu sobre esse retorno com um refinado senso de ironia: Entre as poucas – e patéticas – referências a Robert Hugh Benson na bem-fornida biografia de seu pai, o Arcebispo da Cantuária, há um relato da ocasião em que caminhou de Cambridge a Lambeth i com um amigo no curso de um único dia. A viagem de retorno a Cambridge, via Roma, revelou-se um progresso mais longo e solitário.2

Esse aparte anedótico fornece outro elo inesperado com Belloc, uma vez que este reivindicara para si o recorde, como aluno da instituição, de caminhar de Oxford a Londres em onze horas e meia. Ademais, a viagem ciclística pelo Sussex feita por Benson antes da conversão suscita comparação com a peregrinação de Belloc pelo mesmo condado em 1902, que lhe serviria de inspiração para a redação de The Four Men. Em 1905, Benson ofereceu-se ao Reitor de Cambridge para assumir as funções de um novo curato. Foi aceito, mas as novas responsabilidades não se acomodaram bem sobre seus ombros: depois de Roma, sentia-se sufocado no novo ambiente. “Ele havia se convencido”, escreveu Shane Leslie, “da atmosfera irreligiosa e materialista de Cambridge, que, costumava reclamar, pesava-lhe como chumbo, e decidiu erguer sua voz, fina porém acusatória, diante dos portões dessa cidade matemática […] Não obstante, moveu renhido combate a suas brumas enquanto lá esteve”.3 Uma dessas brumas era o culto do espiritismo, então a pleno vapor em Cambridge e por toda parte. Em dada ocasião um grupo de jovens, tomados de pânico após verem uma aparição, i Lambeth é um bairro central de Londres onde se situa a sede da Igreja Anglicana.

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forneceu-lhe o material que desenvolveria no romance The Necromancers. Benson estava ciente dos perigos do espiritualismo e chegou a escrever que “freqüentar uma sessão espírita com boas intenções é como organizar um smoking concert i num paiol de pólvora em prol de um orfanato”.4 Essas palavras teriam vibrado uma corda sensível em G. K. Chesterton, cuja esposa começara a se envolver com espiritismo após o suicídio do irmão. Sua desaprovação ganhou expressão no poema “The Crystal”, cujos sentimentos refletem os de Benson com exatidão:

You whom the pinewoods robed in sun and shade You who were sceptred with the thistle’s bloom, God’s thunder! What have you to do with these The lying crystal and the darkened room? [Você, que os pinheiros banharam de sol e sombra Você, investida que foi do florir dos cardos, Deus do Céu! Que tem você que ver com isso tudo O cristal falacioso e o quarto escurecido? ] 5 A síntese de perspectiva nas obras de Chesterton e Benson foi ilustrada pelo jesuíta C. C. Martindale, biógrafo de Benson. Martindale, que havia se convertido em 8 de maio de 1897 e em 1901 sido enviado a Oxford pelos jesuítas, escreveu que os Papers of a Paria, de Benson, eram notáveis por sua “qualidade chestertoniana”: “O Sr. Chesterton nunca se cansa de nos dizer que não enxergamos aquilo que vemos: se existe um planeta ainda por descobrir é a nossa Terra […] E Benson lia muito o Sr. Chesterton, e o admirava com reservas”.6 Mais surpreendente, talvez, seja a “desconcertante afinidade” que Martindale enxergou entre os Papers of a Paria de Benson e De Profundis de Wilde: Benson tinha – e Wilde estava resolvido a ter, ou assim pretendia – aquele olhar franco para a cor, a linha e a textura que os gregos possuíam […] em sua extração direta de emoção natural desde elementos simples e belos como o fogo e a cera, assim como em sua descrição das cerimônias da Páscoa, [Benson] alcança, em alguns momentos, uma identidade quase que palavra por palavra com Wilde.7

O elevado conceito que tinha de Hereges fornece um bom indício da influência de Chesterton sobre Benson. “Você já leu”, perguntou a um missivista em 1905, “um livro de G. K. Chesterton chamado Hereges? Se não, trate de ver o que acha. A mim parece que o espírito que subjaz ao livro é esplêndido. Ele não é católico, mas tem o espírito […] Fazia tempo que eu não me comovia tanto […] É um verdadeiro místico, de um gênero insólito”.8 Mais afinidades com Chesterton vieram à tona em 22 de março de 1907, quando Benson respondeu a uma consulente que dizia ter andado “meio caminho do agnosticismo para o catolicismo, mas não conseguia avançar”. Os sermões pronunciados por Benson na Quaresma i Os smoking concerts eram saraus descontraídos, típicos do período vitoriano, em que os homens se reuniam para ouvir música, fumar e debater política.

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tinham-na convencido de que ele sabia tudo a respeito dessa “terra limítrofe” onde ela e muitos outros se achavam emperrados. Sua principal dificuldade provinha do postulado católico de que os dogmas da Igreja eram verdadeiros tanto historicamente quanto espiritualmente, de modo que para os católicos a Ascensão era tão “verdadeira” quanto a Armada. Nisto ela simplesmente não podia acreditar, e tampouco achava que importasse, pois só a linguagem mística era inteligível na religião. Em sua resposta, Benson demonstra um sólido domínio do aristotelismo que embasa muito do tomismo, o mesmo domínio que Chesterton exibiria com grande eficácia na redação de Santo Tomás de Aquino, muitos anos depois. Sua dificuldade principal parece residir no velho e eterno problema da relação entre matéria e espírito, interior e exterior, Idéias e História. Ora, é claro que estou de pleno acordo que o Espírito, o interior e a idéia são primordiais, e portanto não preciso me deter nesse ponto. Mas em seguida vem o fato de que essa Faceta Interior efetivamente se expressa de maneiras exteriores. “Deus é Espírito”, mas “o Verbo se fez carne”. Ademais, é bastante evidente que o exterior nunca se conforma ao interior. Porém, embora não se conforme ao Espírito, isso não significa que não se conforme a nossas concepções do Espírito necessariamente, nem que suas analogias não sejam “verdadeiras”. Aquilo, pois, em que crêem os católicos no tocante a essas coisas é: (a) o princípio espiritual, (b) que o princípio espiritual efetivamente se expressou em termos (materiais). E tanto mais contemplamos os Evangelhos, mais fica evidente que nenhuma outra religião do mundo vincula de maneira tão admirável os pensamentos mais profundos que podemos receber de Deus com os acontecimentos exteriores enquanto expressão deles.9

Além de demonstrar um domínio sólido das bases filosóficas do cristianismo católico, a carta à cândida consulente dá mostras de sua vocação como paciente professor de aspirantes à conversão. Esta faceta da personalidade de Benson é descrita em detalhes por Shane Leslie num ensaio sobre seu “Apostolado em Cambridge”: “Nenhum indivíduo jamais percorreu uma carreira tão meteórica e extática num prazo tão curto. Ali permaneceu por apenas quatro anos. E hoje é uma lenda entre alguns que já eram velhos quando chegou. Mas para muitos que o conheceram ainda quando estudantes, permanece para sempre um símbolo de suas juventudes espirituais”.10 Em seu livro autobiográfico The End of a Chapter, Shane Leslie retorna a suas memórias de Benson em Cambridge, descrevendo-o como “uma flor em meio a espinheiros controversos”: Parecia estranho para o filho do Arcebispo da Cantuária tornar-se um sacerdote católico. Todavia, nunca uma crisálida eclodiu com celeridade tão radiante como na transformação do Benjamin do Palácio de Lambeth i em freelancer a serviço do Vaticano. Como cura em Cambridge, ele pronunciou uma nota ascética em pleno lar do “cristianismo combativo”. Não obstante, Hugh Benson soube entender a mistura de temor e riso que compõe a fórmula da verdadeira religião. Com fecundo fervor, verteu uma série de romances que poderíamos descrever como as Epístolas de Hugo, o Pregador – aos anglicanos, aos convencionalistas, aos sensualistas, etc.11

i

O Palácio de Lambeth é a residência oficial do Arcebispo da Cantuária em Londres.

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Leslie lembrou Benson “sentado à luz da lareira do meu quarto, no King’s College, deslindando uma história esquisita de possessão demoníaca, os olhos fixos na chama e os dedos nervosos em comichões para batizar o próximo estudante que pudesse maravilhar ou arrebatar para o rebanho de Roma”.12 Leslie também traçou um paralelo perceptivo e bem-humorado entre Benson e Winston Churchill: Sua carreira foi a de um Winston Churchill eclesiástico, com quem suscitava um paralelo até mesmo pela gagueira. E, no entanto, ambos sabiam reter a atenção irritadiça dos mais velhos quando se punham a falar. Os dois eram filhos de pais célebres tornados memoráveis pela celebridade dos filhos. Foi o Arcebispo Benson quem deu aos anglicanos a senha de resistir à “Missão Italiana”, e foi Randolph Churchill quem ensinou os tories a bradar que “Ulster irá à luta e Ulster terá razão”. Que curioso denouement, escutar os filhos virando de cabeça para baixo a sabedoria dos pais. Winston pregou o Home Rule i em Belfast e Hugh Benson defendeu o Papa em Cambridge – dois casos da velha palavra grega peripateia, que pode ser traduzida como a divina cambalhota!” 13

Alguns acontecimentos na vida do próprio Shane Leslie também encontram paralelos curiosos nas vidas de Benson e Churchill. Leslie converteu-se em 1908, um dos bacharelandos arrebatados por Benson para o rebanho de Roma. Nascera como John Randolph Leslie em 1885, filho mais velho do Coronel Sir John Leslie, segundo baronete de Glaslough, Condado de Monaghan. Após a conversão, alterou o nome para “Shane”, forma irlandesa de John, em consideração a sua outra conversão: ao nacionalismo irlandês. Em 1910, concorreu como nacionalista pelo distrito de Derry, rompendo com a tradição familiar de unionismo ii, assim como antes rompera com o anglicanismo da família. No King’s College, Leslie dobrou-se à influência de Benson e “Mugger” Barnes, ambos convertidos fervorosos e, a exemplo do próprio Leslie, egressos de Eton. A propósito de sua conversão, escreveu: “Meu sentimento mais vigoroso, então e ainda hoje, consiste num agudo desejo de morrer no rebanho católico e ser enterrado num canto anônimo porém consagrado de um mosteiro”.14 No futuro, Shane Leslie seria conhecido como versátil homem de letras, autor de poemas, romances, biografias, diários de viagem, estudos históricos e tratados de apologética católica. Tornou-se o mais ilustre dos convertidos de Robert Hugh Benson no período que ele mesmo denominou seu “Apostolado em Cambridge”.

i Autonomia ou independência da Irlanda em relação à Coroa britânica. ii O unionismo é uma corrente favorável à manutenção de alguma forma de união política entre a Irlanda e o Reino Unido.

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NOTAS

p. 47.

1. C. C. Martindale, The Life of Robert Hugh Benson, Vol. Two, p. 45. 2. Shane Leslie, ‘The Cambridge Apostolate’ in Memorials of Robert Hugh Benson, Londres, 1915,

3. ibid., p. 53. 4. ibid., p. 66. 5. Joseph Pearce, Wisdom and Innocence: A Life of G. K. Chesterton, Londres, 1996, p. 104. 6. C. C. Martindale, The Life of Robert Hugh Benson, Vol. Two, p. 90. 7. ibid., pp. 90–1. 8. ibid., p. 90. 9. ibid., pp. 258–9. 10. Shane Leslie, ‘The Cambridge Apostolate’, p. 69. 11. Shane Leslie, The End of a Chapter, Londres, 1917, p. 67. 12. ibid., pp. 66–7. 13. ibid., p. 68. 14. Matthew Hoehn, OSB (ed.), Catholic Authors: Contemporary Biographical Sketches, 1930– 1947, Newark, EUA, 1948, p. 428.

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A Atração da Ortodoxia EM 1908, Chesterton produziu um de seus livros mais influentes. Lançado em 25 de setembro, Ortodoxia foi escrito em resposta a um resenhista de Hereges, seu livro anterior, que o censurara por condenar a teologia e a filosofia dos outros sem antes explicitar as suas próprias. “Com toda a solenidade da juventude”, escreveu Chesterton, “aceitei aquilo como um desafio. E expus, em linhas gerais, minhas razões para acreditar que a teoria cristã, tal como sumarizada no Credo dos Apóstolos, pode ser entendida como uma crítica à vida mais contundente do que qualquer uma daquelas que eu havia criticado”.1 Ortodoxia foi o primeiro título explicitamente cristão de Chesterton. Sua biógrafa Maisie Ward considera-o tão importante, que “há mais a ser dito sobre esta do que sobre todas as suas demais obras”.2 O pai de Maisie, Wilfrid Ward, cuja conferência em Oxford tanto fizera para estimular o interesse de Christopher Dawson por Newman, proclamou-a um marco maior na evolução do pensamento cristão. Num artigo a respeito do livro e do seu autor, na Dublin Review, Ward escreveu: Classifico o seu pensamento – embora não o seu estilo – ao lado do de homens como Burke, Butler e Coleridge […] O espetáculo desse intelecto moderno, intensamente ativo e sério […] recorda-nos o quanto de indispensável, no legado da Cristandade, nossa época deixou de perceber adequadamente e corre o risco de abandonar com leviandade.3

A força de Ortodoxia, e a chave para seu sucesso, estava no modo como o autor tornou o assunto atraente para seus leitores. Dorothy L. Sayers, que o leu pela primeira vez aos quinze anos, ainda na escola, extraiu grande inspiração e estímulo da imagem que Chesterton faz da Igreja, como uma carruagem celestial “a atravessar as eras com estrondo, derrubando e prostrando as maçantes heresias enquanto a implacável verdade, cambaleante, continua de pé”. Essa visão revigorante reacendeu-lhe a fé num período em que a dúvida adolescente e a crescente desilusão com o puritanismo da Baixa Igreja, a que já se habituara, ameaçavam extingui-la. “No livro chamado Ortodoxia”, escreveu Sayers, “há vislumbres deste outro cristianismo – belo, aventureiro e singularmente pleno de honra”.5 Anos depois, diria a uma amiga que, não fosse a visão chestertoniana da ortodoxia, e talvez tivesse abandonado o cristianismo por completo nos tempos de estudante.6 Em 1952, expressaria o mesmo ponto com mais eloqüência: “Para os jovens da minha geração, G. K. C. foi uma espécie de libertador cristão. Explodindo qual uma bomba benigna, ele lançou para fora da Igreja uma porção de vitrais de um período muito pobre, deixando entrar lufadas de ar fresco em que as folhas mortas da doutrina dançavam com toda a energia e escândalo do Malabarista de Nossa Senhora”.7 Em 1956, Arnold Lunn expressou-se na mesma linha. O mundo moderno, escreveu, corria o risco de ignorar a dívida que tantos tinham para com Chesterton, “de esquecer o impacto que seus livros produziram sobre as mentes dos jovens infectados pela falácia do racionalismo vitoriano”.8 63


Outro escritor profundamente marcado por Ortodoxia foi Theodore Maynard, que o leu pela primeira vez aos dezenove anos: “Ainda me parece uma obra das mais extraordinárias, tendo se assentado bem fundo na minha mente […] O próprio Chesterton ainda demoraria treze anos para ingressar na Igreja […] muito antes disso, já tinha feito de mim um católico”.9 Theodore Maynard era um brilho literário menor, jamais destinado a ganhar a reputação internacional de Chesterton ou Dorothy Sayers, mas gozou de renome como poeta e biógrafo no período entre as duas guerras. Ao longo de toda a carreira literária, reconheceu continuamente “a enorme influência de G. K. Chesterton sobre seu pensamento e escritos, e em menor grau a de Hilaire Belloc”.10 Outras figuras literárias menores reunidas em torno da chama da ortodoxia por essa época foram: Ernest Messenger, acolhido na Igreja em 1908, que largou uma carreira de jornalista na Fleet Street i sob a chefia de T. P. O’Connor para estudar num seminário, tornando-se em seguida escritor de teologia popular e tradutor de obras filosóficas do francês; Naomi Jaboc, convertida aos dezoito anos, em 1907, que se tornaria uma das romancistas mais prolíficas e populares da Inglaterra com suas ficções leves, tratando principalmente da delineação do caráter; e Lewis Watt, acolhido em 1906, que entrou para a Ordem dos Jesuítas e foi autor de vários livros sobre a doutrina social católica. Não está claro se Ortodoxia teve alguma influência direta na iminente conversão de Maurice Baring, mas, a considerar sua admiração pelos primeiros trabalhos de Chesterton e crescente afeição pelo autor, seria surpreendente que não tivesse lido a obra nos meses que precederam seu ingresso na Igreja, em 1º de fevereiro de 1909. Em janeiro de 1906, em São Petersburgo, Baring escreveu a Vernon Lee perguntando se ele havia lido O Napoleão de Notting Hill e Hereges, e afirmando que “gosto das idéias dele”,11 mas tudo indica que Chesterton e Baring não se tornaram bons amigos antes do final de 1907. Uma vez que ambos eram amigos de Belloc desde a virada do século, trata-se de algo surpreendente. Em março de 1908, Baring escrevia a Chesterton de Moscou, reivindicando uma maior intimidade na relação:

Dear Gilbert may I leave out the Chesterton? (Prince, may I call you by your Christian name?) (Your surname is so solemn & so long:– Prince may I call you by your Christian name?) I hope to be back in London this week. (Prince, let us meet & swallow wine & beer.) I hope to see you very soon on my return. (Prince, there is no one like you in the East.) I hope you & I & Hilaire may meet.12 [Caro Gilbert, posso deixar de fora o Chesterton? (Príncipe, posso chamá-lo pelo nome de batismo?) (Seu sobrenome é tão solene, tão longo:– i

Fleet Street tornou-se epônimo para a imprensa britânica. Nesta rua estavam situados vários dos grandes jornais londrinos de circulação nacional.

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Príncipe, posso chamá-lo pelo nome de batismo?) Espero estar de volta a Londres esta semana. (Príncipe, vamos nos reunir, tragar vinho e cerveja.) Espero vê-lo muito em breve ao retornar. (Príncipe, não há ninguém igual a você no Ocidente.) Espero possamos, eu você e Hilaire, nos reunir. ]12 O lento progresso da relação estava bastante relacionado com as longas ausências de Baring da Inglaterra, em lugares tão diversos quanto Paris, Copenhague, Roma, Moscou e Manchúria; mas uma vez iniciada, a amizade fortaleceu-se com o passar dos anos. A certa altura, Frances Chesterton diria que, “dos amigos do meu marido”, não há nenhum que ele ame mais que Maurice Baring. Baring foi acolhido na Igreja Católica no Oratório de Brompton pelo Pe. Sebastian Bowden, o mesmo que Oscar Wilde abordara mais de três décadas antes. O evento foi registrado laconicamente em sua autobiografia, The Puppet Show of Memory [O teatro de fantoches da memória], como “o único ato da minha vida do qual com toda certeza eu jamais me arrependi”.13 À parte o candor dessa linha solitária, o assunto é dado por encerrado, sem nenhum comentário adicional. Trata-se de uma reticência atípica e surpreendente para um autor que faria destemido uso da ficção para exprimir sua fé. Os sentimentos que não pôde ou não quis expressar em prosa, porém, expressou-os em verso e de forma admirável, particularmente na seqüência de sonetos “Vita Nuova”, divididos numa trinca cronológica. O primeiro soneto trata da aproximação inicial da conversão: “Encontrei a pista que não procurei, na noite, enquanto vagava por um inóspito labirinto de sombras […]” O segundo soneto descreve o ato da conversão em si:

One day I heard a whisper: ‘Wherefore wait? Why linger in a separated porch? Why nurse the flicker of a severed torch? The fire is there, ablaze beyond the gate. Why tremble, foolish soul? Why hesitate? However faint the knock, it will be heard.’ I knocked, and swiftly came the answering word, Which bade me enter to my own estate. I found myself in a familiar place; And there my broken soul began to mend; I knew the smile of every long-lost face – They whom I had forgot remembered me; I knelt, I knew – it was too bright to see – The welcome of a King who was my friend.14 65


[Um dia escutei um sussurro: “Por que esperas? Por que te demoras numa varanda isolada? Guardando o bruxuleio de uma tocha desgarrada, Quando o fogo arde adiante, além das cancelas? Por que tremes, alma tola? Por que hesitas? Ainda a batida mais leve será ouvida.” Bati, e a galope veio a resposta, Instando-me a entrar em minha própria morada. Encontrei-me em um lugar familiar; Onde minh’alma começou a se emendar; Conhecia o sorriso em cada antiga face – De mim se lembraram os que havia esquecido; Ajoelhei, pois entendi – era claro demais para ver – A acolhida de um Rei que era meu amigo. ]14 O soneto final fala da esperança da eternidade para além do jazigo, onde “Aquele porto tranqüilo aguarda reluzente […]”15 Num empenho de explicar as razões de sua conversão, escreveu que “cheguei, no meu íntimo, à conclusão direta de que a vida para mim era divina, e que dentro de mim havia algo imortal em contato com um Espírito Eterno. Não havia outra trilha aberta diante de mim senão tornar-me católico”.16 A Ethel Smyth, amiga íntima e confidente, explicou que sua fé era uma fusão de vontade e necessidade: “Sinto que a vida humana, quase intolerável do modo que é, seria totalmente intolerável sem isso, que para mim não é narcótico, mas alimento, ar e água”.17 Não surpreende, portanto, que Smyth descreva a conversão de Baring como “o ato crucial de sua vida”, e que ao saber dela tenha tido “a sensação de que a peça faltante de um complicado quebra-cabeça, ou antes a única chave capaz de destrancar um cofre de ferro, fora afinal encontrada”.18 O escritor francês Raymond Las Vergnas tinha um ponto de vista semelhante. Em seu estudo crítico acerca de Chesterton, Belloc e Baring – traduzido para o inglês pelo Pe. Martindale – escreveu que a fé cristã de Baring foi a “poderosa força unificante” responsável por “harmonizar as complexas tendências” de seu temperamento artístico.19 A notícia da conversão de Baring foi recebida com júbilo por Hilaire Belloc, que por mais de uma década observara o progresso do amigo, lento porém constante. Três anos antes, em 19 de abril de 1906, Belloc lhe escrevera uma carta em rima, encorajandoo em sua vacilante caminhada na direção da fé:

My ardent love Accompanies your soul and on the whole I doubt if all the saints could roll your soul 66


One tittle faster to the Faith than He Who made your soul is rolling it. H.B. [Meu ardente amor Acompanha a tua alma, e duvido Que os santos todos, unidos, Pudessem empurrar-te à Fé mais rápido, que Aquele que te fez e espera, ávido. H.B. ]20 Emma Letley, biógrafa de Baring, intitulou sua obra Maurice Baring: um cidadão da Europa, e não é difícil entender por quê. Baring fez extensas viagens pela Europa como diplomata, jornalista e bon vivant. Sabia latim, grego, francês, alemão, italiano e russo, e era amplamente versado nas literaturas dessas línguas. Era o europeu quintessencial. Tendo isso em vista, as palavras de Belloc na Carta Aberta a Propósito da Decadência da Fé, publicada em 1906, devem ter alcançado Baring com particular ressonância: Desejo lembrar-te de que somos a Europa; de que somos um grande povo. A fé não é um acidente entre nós, nem uma imposição, tampouco uma vestimenta; é sangue do nosso sangue e carne da nossa carne: uma filosofia que nós fizemos e que nos faz. Nós a adornamos, explanamos, ampliamos; demos-lhe uma forma visível. É o serviço que nós europeus prestamos a Deus. Ele retribuiu fazendo-nos cristãos.21

Após a conversão de Baring, Belloc enviou uma carta em tom celebratório a Charlotte Balfour, que fora acolhida na Igreja em 1904: “Eles chegam de todas as direções, qual um exército que se ajunta, homens de todos os tipos, cada um trazendo consigo uma nova força: a de Maurice é sua impressionante acuidade mental, que provém de sua grande virtude de fidedignidade”.22 Ao menos em parte, o crédito pela reunião desse exército de convertidos pertencia a seu amigo G. K. Chesterton. Mais do que nenhum outro escritor na primeira década do século, Chesterton enfrentara os secularistas, movendo combate a “hereges” como Shaw e Wells com uma jovialidade bonachona e contagiante. O cristianismo de Chesterton pegava, e por meio de seus percucientes paradoxos e seu quixotesco entusiasmo, muitos começaram a descobrir a atração da ortodoxia.

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NOTAS 1. G. K. Chesterton, Autobiography, Londres, 1936, p. 177. 2. Maisie Ward, Gilbert Keith Chesterton, p. 181. 3. Maisie Ward, Resurrection versus Insurrection, Londres, 1937, p. 206. 4. G. K. Chesterton, Orthodoxy, Londres, 1908, p. 169. 5. Barbara Reynolds, Dorothy L. Sayers: Her Life and Soul, Londres, 1993, p. 57. 6. ibid., p. 74. 7. Dorothy L. Sayers, Preface to Chesterton’s play, The Surprise, Londres, 1952, p. 5. 8. Arnold Lunn, Now I See, Londres, 1956, p. 51. 9. John A. O’Brien (ed.), The Road To Damascus, Londres, 1949, p. 114. 10. ibid., p. 105. 11. The Chesterton Review, Vol. XIX, No. 1, Fevereiro de 1988, p. 2. 12. Emma Letley, Maurice Baring: A Citizen of Europe, p. 140. 13. Maurice Baring, The Puppet Show of Memory, Londres, 1922, pp. 395–6. 14. Maurice Baring, Collected Poems, Londres, 1925, pp. 65–6. 15. ibid., p. 67. 16. Emma Letley, Maurice Baring: A Citizen of Europe, p. 144. 17. ibid., p. 144. 18. Ethel Smyth, Maurice Baring, Londres, 1938, pp. 39–40. 19. Raymond Las Vergnas, Chesterton, Belloc, Baring, Londres, 1938, p. 95. 20. Robert Speaight (ed.), Letters from Hilaire Belloc, Londres, 1958, p. 7. 21. Karl G. Schmude, Hilaire Belloc: His Life and Legacy, Melbourne, Australia, 1978, p. 5. 22. Robert Speaight, The Life of Hilaire Belloc, Londres, 1957, p. 245.

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Índice Onomástico Beerbohm Max, - 160 -, - 186 -, - 188 -, - 297 Bell Clive, - 154 -, - 256 Belloc, Hilaire, - 11 -, - 20 -, - 23 -, - 24 -, - 25 -, - 26 -, - 28 -, - 29 -, - 34 -, - 51 -, - 57 -, - 64 -, - 66 -, - 67 -, - 68 -, 69 -, - 70 -, - 71 -, - 72 -, - 73 -, - 74 -, - 75 -, - 76 -, - 77 , - 78 -, - 79 -, - 80 -, - 81 -, - 82 -, - 93 -, - 98 -, - 100 -, 102 -, - 103 -, - 104 -, - 108 -, - 111 -, - 117 -, - 118 -, 119 -, - 120 -, - 121 -, - 122 -, - 123 -, - 124 -, - 131 -, 144 -, - 153 -, - 156 -, - 160 -, - 167 -, - 168 -, - 169 -, 170 -, - 172 -, - 173 -, - 175 -, - 179 -, - 180 -, - 184 -, 186 -, - 187 -, - 190 -, - 191 -, - 193 -, - 194 -, - 204 -, 216 -, - 226 -, - 232 -, - 233 -, - 234 -, - 265 -, - 266 -, 267 -, - 269 -, - 281 -, - 296 -, - 297 -, - 299 -, - 308 -, 327 -, - 336 -, - 338 -, - 342 -, - 370 -, - 372 Bennett Arnold, - 175 -, - 176 Benson E.W., - 31 -, - 32 -, - 33 -, - 34 -, - 35 -, - 36 -, - 37 -, - 38 -, - 39 -, - 40 -, - 41 -, - 42 -, - 43 -, - 45 -, - 46 -, - 47 -, - 49 -, - 53 -, - 57 -, - 58 -, - 59 -, - 60 -, - 61 -, - 83 -, - 84 -, - 85 -, - 86 -, - 87 -, - 88 -, - 90 -, - 91 -, - 93 -, - 94 -, - 95 -, - 97 -, - 154 -, - 163 -, - 165 -, - 190 , - 229 -, - 270 -, - 271 -, - 274 -, - 327 -, - 363 -, 366 -, - 367 -, - 368 -, - 374 -, - 375 Robert Hugh, - 31 Benson, R.H., - 11 -, - 31 -, - 45 -, - 52 -, - 55 -, - 57 -, - 84 -, - 94 -, - 95 -, - 270 Betjeman Penelope, - 230 -, - 231 -, - 309 -, - 312 Blackwood, Basil, - 24 Blamires David, - 325 -, - 334 Bloy Léon, - 167 Blunden, Edmund, - 20 -, - 295 -, - 307 -, - 318 -, - 322 Blunt

A Acton Harold, - 93 -, - 154 -, - 160 -, - 219 -, - 310 -, - 311 -, 312 -, - 332 Aeschliman Michael D., - 370 Aldington Richard, - 161 Alighieri, Dante, - 11 -, - 45 -, - 46 -, - 125 -, - 126 -, - 127 -, - 128 -, - 132 -, - 135 -, - 158 -, - 190 -, - 214 -, - 242 , - 243 -, - 259 -, - 271 -, - 325 -, - 339 -, - 349 -, - 352 -, - 363 Aquino Sto. Tomás, - 59 -, - 135 -, - 174 -, - 183 -, - 184 -, - 186 -, - 234 -, - 260 -, - 278 -, - 279 -, - 281 -, - 282 -, 338 -, - 341 Asquith Herbert, - 89 -, - 111 -, - 295 -, - 296 -, - 297 -, - 299 -, - 315 Ayer Alfred Jules, - 174 -, - 217 B Babbit Irving, - 125 Bader Ernest, - 336 Balfour, Reggie, - 26 -, - 67 -, - 169 Barfield Owen, - 69 -, - 70 -, - 82 -, - 131 -, - 132 -, - 138 -, - 211 -, - 212 -, - 221 Baring, Maurice, - 11 -, - 23 -, - 24 -, - 25 -, - 26 -, - 27 -, 28 -, - 29 -, - 64 -, - 65 -, - 66 -, - 67 -, - 68 -, - 78 -, - 98 , - 99 -, - 100 -, - 101 -, - 102 -, - 103 -, - 104 -, - 107 -, 111 -, - 120 -, - 124 -, - 160 -, - 183 -, - 189 -, - 190 -, 191 -, - 192 -, - 193 -, - 194 -, - 226 -, - 242 -, - 244 -, 252 -, - 315 -, - 316 -, - 370 -

409


Wilfred Scawen, - 118 -, - 119 -, - 120 -, - 121 -, - 122 -, - 123 -, - 124 -, - 296 Bourget, Paul, - 18 -, - 85 Bouyer Padre Luis, - 309 Bowden, Padre, - 17 -, - 65 -, - 78 Brewer Derek, - 254 Brooke Rupert, - 140 Brown George Mackay, - 399 -, - 402 Brown, George Mackay, - 11 -, - 391 -, - 392 -, - 393 -, 398 -, - 400 -, - 403 -, - 404 -, - 405 -, - 406 Browne Edward G., - 120 -, - 383 Browning Robert, - 131 -, - 142 -, - 143 -, - 144 Burroughs William, - 324 -

Chesterton, G.K., - 11 -, - 15 -, - 20 -, - 23 -, - 24 -, - 25 -, 29 -, - 34 -, - 45 -, - 46 -, - 49 -, - 52 -, - 54 -, - 55 -, - 56 , - 58 -, - 59 -, - 61 -, - 63 -, - 64 -, - 65 -, - 66 -, - 67 -, 68 -, - 69 -, - 70 -, - 71 -, - 72 -, - 73 -, - 75 -, - 76 -, - 77 , - 78 -, - 79 -, - 80 -, - 81 -, - 82 -, - 85 -, - 87 -, - 89 -, 93 -, - 97 -, - 98 -, - 99 -, - 100 -, - 101 -, - 102 -, - 103 -, - 104 -, - 105 -, - 106 -, - 107 -, - 108 -, - 109 -, - 112 -, 113 -, - 114 -, - 115 -, - 116 -, - 118 -, - 120 -,- 121 -, 123 -, - 124 -, - 131 -, - 133 -, - 134 -, - 135 -, - 137 -, 138 -, - 139 -, - 141 -, - 142 -, - 143 -, - 144 -, - 152 -, 153 -, - 154 -, - 155 -, - 156 -, - 157 -, - 159 -, - 165 -, 167 -, - 168 -, - 169 -, - 170 -, - 171 -, - 172 -, - 173 -, 174 -, - 176 -, - 183 -, - 184 -, - 185 -, - 187 -, - 188 -, 189 -, - 190 -, - 191 -, - 192 -, - 193 -, - 194 -, - 195 -, 200 -, - 204 -, - 206 -, - 208 -, - 210 -, - 211 -, - 216 -, 220 -, - 226 -, - 232 -, - 233 -, - 234 -, - 241 -, - 242 -, 248 -, - 249 -, - 250 -, - 252 -, - 267 -, - 269 -, - 270 -, 273 -, - 295 -, - 307 -, - 324 -, - 332 -, - 335 -, - 336 -, 338 -, - 341 -, - 345 -, - 354 -, - 362 -, - 370 -, - 373 -, 374 -, - 375 -, - 384 -, - 385 -, - 401 -, - 402 Child Maurice, - 83 Churchill Winston, - 51 -, - 60 -, - 114 -, - 303 -

C Calabria Don, - 254 -, - 255 -, - 263 Campbell Roy, - 195 -, - 196 -, - 197 -, - 199 -, - 209 -, - 244 -, 245 -, - 251 -, - 278 -, - 303 -, - 304 -, - 305 -, - 306 -, - 307 Campbell, Roy, - 11 -, - 195 -, - 197 -, - 198 -, - 199 -, 206 -, - 209 -, - 244 -, - 252 -, - 278 -, - 280 -, - 289 -, 303 -, - 307 -, - 318 Caraman Padre Philip, - 95 -, - 276 -, - 278 -, - 279 -, - 280 -, 282 -, - 283 -, - 316 Carew Dudley, - 152 -, - 158 -

C Cocteau Jean, - 168 Connan Doyle Arthur, - 175 Connolly Cyril, - 128 -, - 333 Copleston Frederick C., - 174 -, - 217 -, - 259 -, - 260 -, - 265 -, 341 -, - 399 Cornish, Hubert, - 28 Coulton Dr. G.G., - 184 -, - 185 Crashaw Richard, - 135 Crowley Aleister, - 153 -

Ch Champion Edmund, - 198 Cheshire Cap. Leonard, - 82 -, - 237 -, - 288 Chesterton, - 11 -

410


D

F

D’Arcy Martin, - 161 -, - 162 -, - 163 -, - 167 -, - 168 -, - 201 , - 204 -, - 217 -, - 228 -, - 246 -, - 279 -, - 280 -, 281 -, - 282 -, - 295 -, - 305 -, - 315 -, - 316 -, - 323 -, - 325 Darrow Clarence, - 167 Davidman Joy, - 237 Dawson Christopher, - 51 -, - 52 -, - 53 -, - 54 -, - 55 -, - 56 -, 142 -, - 170 -, - 199 -, - 201 -, - 202 -, - 209 -, - 216 -, - 219 -, - 220 -, - 222 -, - 253 -, - 254 -, - 260 -, 263 -, - 265 -, - 266 -, - 267 -, - 299 -, - 309 -, - 310 -, - 318 -, - 328 -, - 329 -,- 334 Dawson, Christopher, - 11 -, - 15 -, - 51 -, - 55 -, - 56 -, 63 -, - 170 -, - 199 -, - 201 -, - 202 -, - 206 -, - 209 -, 216 -, - 217 -, - 219 -, - 222 -, - 253 -, - 254 -, - 259 -, 260 -, - 263 -, - 266 -, - 299 -, - 309 -, - 318 -, - 328 -, 329 -, - 334 -, - 337 -,- 356 de la Mare Walter, - 140 -, - 141 -, - 186 -, - 188 Deedes Bill, - 357 -, - 370 -, - 373 de-la-Noy Michael, - 165 -, - 246 -, - 252 -, - 326 Dell Robert, - 54 -, - 55 Derrick Christopher, - 78 -, - 82 -, - 187 -, - 213 -, - 221 -, - 258 -, - 259 -, - 263 -, - 296 -, - 301 -, - 345 -, - 346 -, 350 Drinkwater John, - 141 -, - 175 Dudley Owen Francis, - 90 -, - 152 -, - 158 -, - 194 -

Franco General Francisco, - 197 -, - 198 -, - 303 -, - 304 G Gandhi Mahatma, - 345 -, - 353 -, - 359 Gardner Evelyn, - 159 Ghéon Henri, - 167 Gill, Eric, - 11 -, - 20 -, - 75 -, - 79 -, - 82 -, - 153 -, - 167 -, 168 -, - 186 -, - 188 -, - 194 -, - 199 -, - 200 -, - 202 -, 216 -, - 233 -, - 267 -, - 269 -, - 336 -, - 373 -, - 397 -, 401 Gilson Etienne, - 174 -, - 341 Goossens Eugene, - 154 Gosse Sir Edmond, - 126 -, - 129 -, - 130 -, - 132 Graves Robert, - 116 -, - 126 -, - 322 -, - 333 Gray, John, - 20 -, - 77 -, - 169 Green Julian, - 90 -, - 147 -, - 150 -, - 210 -, - 221 -, - 229 -, 238 -, - 335 -, - 349 -, - 365 -, - 366 -, - 367 -, - 396 -, - 402 -, - 406 Greene, Graham, - 11 -, - 15 -, - 139 -, - 147 -, - 197 -, 204 -, - 206 -, - 245 -, - 247 -, - 275 -, - 276 -, - 284 -, 295 -, - 330 -, - 333 -, - 341 -, - 343 -, - 349 -, - 356 -, 367 -, - 374 -, - 379 -, - 384 -, - 389 -, - 390 -, - 391 Gresham William, - 237 Grisewood Harman, - 266 -, - 274 -, - 333 Guiness, Alec, - 11 -, - 280 Gunn, James, - 23 -

E Eliot, T.S., - 11 -, - 51 -, - 53 -, - 129 -, - 130 -, - 133 -, - 138 -, - 154 -, - 158 -, - 170 -, - 188 -, - 209 -, - 212 -, - 238 , - 250 -, - 252 -, - 253 -, - 265 -, - 267 -, - 268 -, - 269 -, - 270 -, - 274 -, - 277 -, - 325 -, - 335 -, - 356 -, - 374 -, 386 -

H Halifax Lord, - 91 -, - 97 Harnack Adolph, - 54 -

411


Harrison George B., - 222 -, - 229 -, - 230 Havard R.E., - 217 -, - 254 Heseltine George, - 169 Heygate John, - 160 -, - 161 Hitchens Robert, - 86 Hitler Adolf, - 16 -, - 195 -, - 197 -, - 198 -, - 203 -, - 204 -, 205 -, - 337 -, - 357 -, - 368 Hollis Christopher, - 154 -, - 155 -, - 156 -, - 157 -, - 158 -, 162 -, - 164 -, - 165 -, - 167 -, - 198 -, - 295 Hooper Walter, - 130 -, - 138 -, - 210 -, - 213 -, - 221 -, - 222 -, - 238 -, - 255 -, - 256 -, - 258 -, - 259 -, - 263 -, - 349 -, - 366 -, - 374 Hopkins Gerard Manley, - 199 -, - 247 -, - 267 -, - 394 -, - 397 -, - 399 Horner David, - 111 -, - 279 Hugessen Maurice, - 83 Huxley Aldous, - 57 -, - 73 -, - 126 -, - 177 -, - 187 -, - 324 -, 356 Huysmans, Joris-Karl, - 18 -, - 28 -, - 85 -, - 245 Hyde Douglas, - 78 -, - 146 -, - 217 -, - 231 -, - 232 -, - 233 , - 234 -, - 235 -, - 236 -, - 237 -, - 238 -, - 239 -, 351 -, - 370 -, - 388 -

J Jaboc Naomi, - 64 Joad C.E.M., - 177 -, - 178 -, - 180 -, - 217 -, - 260 -, - 261 , - 263 -, - 265 -, - 272 Johnston Edward, - 153 -, - 398 Jones, David, - 11 -, - 199 -, - 201 -, - 204 -, - 206 -, - 265 , - 272 -, - 274 -, - 321 -, - 322 -, - 325 -, - 329 -, - 333 -, - 334 -, - 335 -, - 349 -, - 396 -, - 397 -, - 399 -, - 406 Joyce James, - 134 -, - 144 -, - 267 K Kaye-Smith Sheila, - 167 Keynes John Maynard, - 337 Kingsmill Hugh, - 69 -, - 187 Kipling Rudyard, - 133 -, - 137 -, - 176 Kirk Russell, - 244 -, - 250 -, - 252 -, - 374 Knox Ronald, - 43 -, - 44 -, - 45 -, - 46 -, - 47 -, - 48 -, - 51 -, 78 -, - 83 -, - 84 -, - 86 -, - 88 -, - 89 -, - 90 -, - 91 -, 92 -, - 93 -, - 94 -, - 95 -, - 97 -, - 98 -, - 99 -, - 100 -, - 101 -, - 102 -, - 107 -, - 108 -, - 111 -, - 112 -, - 113 -, - 124 -, - 152 -, - 154 -, - 155 -, - 157 -, - 158 -, 170 -, - 171 -, - 175 -, - 176 -, - 177 -, - 178 -, - 179 -, - 184 -, - 187 -, - 219 -, - 220 -, - 224 -, - 225 -, 243 -, - 244 -, - 246 -, - 248 -, - 249 -, - 251 -, - 254 -, - 271 -, - 279 -, - 293 -, - 294 -, - 295 -, - 296 -, 297 -, - 307 -, - 308 -, - 353 -, - 394 -, - 406 Knox, Ronald, - 11 -, - 46 -, - 48 -, - 49 -, - 51 -, - 52 -, - 56 -, - 73 -, - 82 -, - 83 -, - 88 -, - 95 -, - 98 -, - 100 -, - 107 , - 108 -, - 124 -, - 151 -, - 167 -, - 170 -, - 171 -, - 178 -, - 180 -, - 181 -, - 187 -, - 188 -, - 193 -, - 194 -, - 198 -, 215 -, - 217 -, - 219 -, - 222 -, - 224 -, - 226 -, - 229 -, 233 -, - 238 -, - 252 -, - 254 -, - 290 -, - 293 -, - 295 -, 301 -, - 307 -, - 318 -, - 341 -, - 353 Krog

I Ibsen Henrik, - 45 -, - 46 Ingrams Richard, - 365 -, - 366 -, - 367 -, - 368 -, - 370 -, - 375 Isaacs Godfrey, - 78 -, - 79 -, - 113 -, - 137 -

412


Helge, - 196 Küng Hans, - 312 -, - 321 -, - 383 -, - 384 -

M MacDonald Ramsay, - 75 -, - 211 -, - 392 Mackenzie Compton, - 398 Mackenzie, Compton, - 11 -, - 90 -, - 98 -, - 226 -, - 277 , - 333 -, - 397 -, - 398 -, - 406 Macmillan Harold, - 295 Maeterlinck, Maurice, - 18 Mallock William Hurrell, - 34 Manning Edward, - 15 -, - 171 -, - 373 -, - 397 -, - 398 Maritain Jacques, - 136 -, - 167 -, - 174 -, - 198 -, - 229 -, - 338 , - 341 Marlowe Christopher, - 268 Martindale C.C., - 42 -, - 49 -, - 58 -, - 61 -, - 66 -, - 88 -, - 91 -, - 92 -, - 93 -, - 95 -, - 156 -, - 161 -, - 170 -, - 171 -, - 187 -, - 204 -, - 205 -, - 244 -, - 276 -, - 323 -, - 327 -, 334 -, - 378 Masefield, John, - 20 Masters Brian, - 86 -, - 95 -, - 358 -, - 359 Mauriac François, - 167 -, - 191 -, - 198 -, - 356 Maurois André, - 190 Maurras Charles, - 125 -, - 126 Maynard Theodore, - 64 -, - 337 McLeod Irene, - 126 McNabb Pe. Vincent, - 77 -, - 78 -, - 79 -, - 82 -, - 104 -, - 108 -, - 120 -, - 121 -, - 122 -, - 187 -, - 216 -, - 345 McReavy Monsenhor, - 315 Merton Thomas, - 125 -, - 247 -, - 248 -, - 252 -, - 341 Messenger

L Las Vergnas Raymond, - 66 -, - 68 Lawrence Guy, - 89 -, - 90 -, - 91 -, - 97 -, - 112 -, - 288 Lee Vernon, - 64 Leslie Shane, - 57 -, - 59 -, - 60 -, - 61 -, - 88 -, - 121 -, - 140 -, - 147 -, - 377 -, - 389 -, - 397 -, - 398 Letley Emma, - 29 -, - 67 -, - 68 -, - 194 Leverson Ada, - 154 Lewis, C.S., - 11 -, - 15 -, - 70 -, - 130 -, - 132 -, - 138 -, 185 -, - 194 -, - 209 -, - 210 -, - 213 -, - 216 -, - 217 -, 220 -, - 221 -, - 222 -, - 226 -, - 237 -, - 238 -, - 241 -, 253 -, - 258 -, - 259 -, - 263 -, - 324 -, - 341 -, - 349 -, 362 -, - 370 -, - 373 -, - 374 Lindsay Kenneth, - 156 Longford Elizabeth, - 121 -, - 124 -, - 228 -, - 229 -, - 238 -, - 295 -, - 362 -, - 366 -, - 367 -, - 369 -, - 370 -, - 372 -, 373 -, - 375 Lovat Lady, - 91 -, - 97 -, - 98 -, - 102 -, - 124 -, - 191 -, - 192 -, - 194 -, - 252 -, - 282 Luce Clare Boothe, - 228 -, - 238 -, - 248 Lunn Arnold, - 47 -, - 48 -, - 69 -, - 70 -, - 71 -, - 72 -, - 170 -, - 171 -, - 172 -, - 173 -, - 174 -, - 175 -, - 176 -, - 177 -, - 178 -, - 179 -, - 183 -, - 260 Lunn, Arnold, - 16 -, - 47 -, - 48 -, - 51 -, - 63 -, - 68 -, - 69 -, - 70 -, - 82 -, - 170 -, - 174 -, - 178 -, - 180 -, - 181 -, 183 -, - 187 -, - 188 -, - 198 -, - 208 -, - 217 -, - 222 -, 260 -, - 263 -, - 397 -

413


Ernest, - 64 Meynell Wilfrid, - 131 Milton Ernest, - 126 -, - 285 -, - 286 -, - 363 Milton, Ernest, - 11 -, - 141 -, - 285 -, - 325 -, - 397 Mindszenty, Cardeal, - 16 Mitchell E. Rosslyn, - 166 Moncreiffe Sir Ian, - 187 Morton J.B., - 120 -, - 133 -, - 188 -, - 193 Moult Thomas, - 305 Mowrer Edgar Ansel, - 136 Muggeridge, Malcolm, - 11 -, - 15 -, - 139 -, - 147 -, - 275 -, - 333 -, - 351 -, - 365 -, - 366 -, - 370 -, - 373 -, - 375 , - 377 -, - 378 -, - 380 -, - 388 -, - 389 -, - 400 Muir Edwin, - 244 -, - 392 -, - 393 -, - 394 -, - 406 -

Charles, - 167 Pepler Hilary, - 78 -, - 82 -, - 168 -, - 169 -, - 188 -, - 217 -, 232 Picasso Pablo, - 168 Plomer William, - 277 -, - 333 Poe Edgar Allan, - 133 Pound Ezra, - 128 -, - 134 -, - 154 -, - 202 Q Queensberry, Marquês de, - 18 -, - 19 -, - 79 R Raffalovich, André, - 17 -, - 18 -, - 77 -, - 169 Rainha Vitória, - 15 -, - 118 Richards I.A., - 136 Richmond Kenneth, - 140 Roberts Harold, - 131 -, - 336 Roper Hugh Trevor, - 217 -, - 268 Ross, Robert, - 15 -, - 18 -, - 19 -, - 267 -, - 268 -, - 269 -, 270 -, - 271 -, - 272 -, - 274 -, - 276 -, - 325 -, - 327 -, 328 -, - 333 -, - 334 -, - 335 -, - 349 Rossetti Dante Gabriel, - 31 -, - 44 -, - 98 -, - 158 Royde-Smith Naomi, - 140 -, - 141 Russell Bertrand, - 174 -, - 177 -, - 229 -, - 230 -, - 244 -, - 250 -, - 252 -, - 259 -, - 260 -, - 357 -, - 374 -

N Nichols Robert, - 126 Nietzsche, Friedrich, - 15 -, - 16 -, - 19 -, - 75 -, - 249 Noyes Alfred, - 131 -, - 132 -, - 133 -, - 134 -, - 137 -, - 152 Noyes, Alfred, - 11 -, - 72 -, - 82 -, - 131 -, - 132 -, - 133 -, - 137 -, - 138 -, - 167 -, - 198 O O’Connor T.P., - 64 -, - 99 -, - 101 -, - 103 -, - 104 -, - 105 -, - 107 -, - 108 -, - 186 -, - 189 -, - 194 -, - 200 -, - 201 -, 269 -, - 367 -, - 369 -, - 372 -, - 375 Oldershaw, Lucian, - 23 -

S P

Sackville-West Edward, - 165 -, - 245 -, - 246 -, - 247 -, - 252 -, - 281 -, - 326 -, - 334 -, - 379 Salter Elizabeth, - 278 -, - 284 -, - 291 -, - 292 -, - 293 -

Padre Pio, - 380 -, - 386 Papini Giovanni, - 167 Péguy

414


Santayana George, - 125 São Vítor Ricardo de, - 135 Sassoon, Siegfried, - 11 -, - 116 -, - 117 -, - 118 -, - 119 -, 120 -, - 123 -, - 124 -, - 126 -, - 129 -, - 131 -, - 133 -, 137 -, - 138 -, - 141 -, - 199 -, - 223 -, - 225 -, - 272 -, 293 -, - 294 -, - 295 -, - 296 -, - 297 -, - 298 -, - 299 -, 301 -, - 303 -, - 318 -, - 322 -, - 323 -, - 327 -, - 334 Sayers, Dorothy L., - 11 -, - 63 -, - 64 -, - 68 -, - 69 -, - 82 , - 167 -, - 174 -, - 187 -, - 194 -, - 207 -, - 208 -, - 209 -, - 210 -, - 213 -, - 214 -, - 215 -, - 216 -, - 217 -, - 218 -, 219 -, - 220 -, - 221 -, - 227 -, - 242 -, - 243 -, - 244 -, 251 -, - 252 -,- 256 -, - 257 -, - 258 -, - 259 -, - 263 -, 265 -, - 267 -, - 271 -, - 274 -, - 338 -, - 339 -, - 340 -, 349 Schopenhauer, Arthur, - 15 Schumacher, E.F., - 11 -, - 336 -, - 345 -, - 346 -, - 349 -, 361 -, - 400 Scott Christina, - 52 -, - 53 -, - 54 -, - 56 -, - 92 -, - 202 -, 206 -, - 222 -, - 253 -, - 263 -, - 318 -, - 319 -, - 333 -, - 334 -, - 336 -, - 382 -, - 392 -, - 397 -, - 406 Scott-Moncrieff Charles, - 92 -, - 392 -, - 406 Sewell Brocard, - 20 -, - 167 -, - 168 -, - 169 -, - 180 -, - 229 Shaw, George Bernard, - 11 -, - 15 -, - 16 -, - 23 -, - 67 -, 69 -, - 70 -, - 75 -, - 78 -, - 79 -, - 104 -, - 108 -, - 172 -, 176 -, - 187 -, - 194 -, - 267 -, - 288 -, - 352 Sheed Frank, - 108 -, - 169 -, - 170 -, - 175 -, - 180 -, - 183 -, 187 -, - 224 -, - 238 -, - 253 -, - 279 -, - 294 -, - 295 Sherry Norman, - 140 -, - 147 -, - 206 -, - 378 -, - 380 -, - 388 -, - 389 -, - 390 Shorthouse Joseph, - 33 -, - 43 -, - 52 Sitwell Edith, - 126 -, - 129 -, - 131 -, - 132 -, - 133 -, - 137 -, 141 -, - 154 -, - 223 -, - 225 -, - 237 -, - 275 -, - 276 -, - 277 -, - 278 -, - 279 -, - 280 -, - 281 -, - 282 -, 283 -, - 291 -, - 293 -, - 297 -, - 304 -, - 305 -, - 306 -, - 324 -, - 325 -

Sitwell, Edith, - 11 -, - 126 -, - 128 -, - 130 -, - 132 -, - 137 -, - 138 -, - 141 -, - 142 -, - 154 -, - 223 -, - 238 -, - 270 , - 274 -, - 276 -, - 277 -, - 279 -, - 280 -, - 281 -, - 282 -, - 284 -, - 285 -, - 288 -, - 291 -, - 292 -, - 293 -, - 301 -, 304 -, - 305 -, - 318 -, - 324 -, - 325 -, - 334 Smyth, Ethel, - 25 -, - 27 -, - 29 -, - 66 -, - 68 -, - 111 Soljenítsin Alexander, - 361 -, - 362 Southwell Robert, - 198 -, - 229 -, - 382 Spark, Muriel, - 11 -, - 161 -, - 275 -, - 276 -, - 284 Speaight, Robert, - 11 -, - 29 -, - 68 -, - 76 -, - 82 -, - 108 -, - 124 -, - 167 -, - 180 -, - 190 -, - 191 -, - 194 -, - 214 -, 216 -, - 218 -, - 222 -, - 235 -, - 267 -, - 274 -, - 296 -, 331 -, - 334 Stallworthy Jon, - 117 Stead William Force, - 130 Stevenson Robert Louis, - 134 Strachey Lytton, - 154 -, - 158 -, - 397 -, - 398 T Temple Dr. William, - 84 -, - 167 -, - 256 -, - 286 Thomas. R.S., - 11 -, - 403 -, - 407 Thompson Francis, - 76 -, - 77 Titterton W.R., - 187 -, - 324 Tolkien, J.R.R., - 11 -, - 70 -, - 210 -, - 212 -, - 213 -, - 221 -, - 227 -, - 254 -, - 330 -, - 393 -, - 397 -, - 405 Tolstói Liev, - 190 -, - 244 -, - 362 Tomkinson Rev. Cyril, - 286 Tree Viola, - 126 Trethowan Padre Illtyd, - 308 Trevelyan R.C., - 125 -, - 126 -, - 259 Tyrrell

415


Weil Simone, - 361 Wells, H.G., - 11 -, - 16 -, - 20 -, - 67 -, - 71 -, - 75 -, - 78 -, 103 -, - 104 -, - 155 -, - 176 -, - 177 -, - 370 -, - 401 Whistler, Charles, - 18 -, - 176 White T.H., - 187 -, - 280 -, - 330 -, - 334 Whitehead Alfred North, - 173 -, - 208 Whitehouse Mary, - 133 -, - 351 Whittaker Edmund Taylor, - 167 -, - 169 Wilde, Oscar, - 15 -, - 16 -, - 17 -, - 18 -, - 19 -, - 20 -, - 28 , - 58 -, - 65 -, - 77 -, - 79 -, - 153 Williams, Charles, - 11 -, - 187 -, - 208 -, - 209 -, - 214 -, 217 -, - 227 -, - 242 -, - 267 Williamson, Hugh Ross, - 15 -, - 267 -, - 268 -, - 269 -, 272 -, - 274 -, - 276 -, - 325 -, - 333 -, - 334 -, - 335 Wilson Edmund, - 82 -, - 225 Winsness Erling, - 196 Wodehouse P.G., - 160 -, - 161 -, - 187 -, - 194 Wolfe Gregory, - 351 -, - 354 -, - 356 -, - 361 -, - 362 -, - 365 -, - 366 -, - 368 -, - 373 -, - 374 -, - 375 -, - 377 -, 389 Woodard Nathaniel, - 151 -, - 153 Woodruff Douglas, - 155 -, - 156 -, - 157 -, - 162 -, - 175 -, - 187 -, - 295 -, - 312 -, - 321 Woolf Virginia, - 136 -, - 191 -, - 193 -, - 386 Wyndham Lewis B.B., - 120 -, - 128 -, - 134 -, - 187 -, - 188 -, - 193 -, 196 -, - 356 -

George, - 33 -, - 171 Padre, - 33 U Undset Sigrid, - 167 V ValĂŠry, Paul, - 18 -, - 128 van Zeller Padre Hubert, - 295 -, - 316 Vidler Alec, - 351 -, - 352 -, - 353 -, - 354 -, - 365 -, - 370 von le Fort Gertrud, - 167 W Wall Bernard, - 78 -, - 333 Walpole Hugh, - 175 Ward Wilfred, - 29 -, - 53 -, - 63 -, - 68 -, - 82 -, - 85 -, - 93 -, 95 -, - 99 -, - 106 -, - 108 -, - 124 -, - 144 -, - 169 -, 183 -, - 187 -, - 191 -, - 194 -, - 206 -, - 216 -, - 224 -, - 253 -, - 263 -, - 295 -, - 345 -, - 346 -, - 347 Warren Robert Penn, - 325 Watkin Edward Ingram, - 51 -, - 52 -, - 53 -, - 55 -, - 170 -, 209 -, - 309 -, - 310 -, - 318 -, - 328 -, - 329 -, - 333 -, - 341 Watt Lewis, - 64 Waugh, Evelyn, - 11 -, - 15 -, - 16 -, - 43 -, - 44 -, - 47 -, - 49 -, - 89 -, - 92 -, - 94 -, - 95 -, - 108 -, - 112 -, - 124 -, - 149 -, - 164 -, - 165 -, - 168 -, - 170 -, - 176 -, - 178 -, - 180 , - 187 -, - 194 -, - 198 -, - 202 -, - 205 -, - 206 -, - 219 -, - 222 -, - 225 -, - 228 -, - 230 -, - 238 -, - 243 -, - 244 -, 245 -, - 252 -, - 272 -, - 276 -, - 280 -, - 283 -, - 284 -, 285 -, - 290 -, - 294 -, - 295 -, - 301 -, - 310 -, - 318 -, 319 -, - 321 -, - 325 -, - 326 -, - 327 -, - 328 -, - 333 -, 334 -, - 356 -, - 377 -, - 379 -, - 380 -, - 381 -, - 383 -, 389 -, - 399 -

Z Zangwill Israel, - 175 -

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Este Livro foi composto em Adobe Garamond Premier Pro Display, em corpo 11/18. Foi impresso em março de 2017 para a Livraria Danúbio Editora




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