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Marielle Franco e a necrobiopolítica Brasileira: Marielle Presente Manuela D’Ávila e a violência das fake news em sua candidatura
Fragmentos de uma violência política de gênero a partir do Estado: uma necrobiopolítica “de gênero”
Fernanda Pattaro Amaral
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comunista, iniciaram uma necrobiopolítica, selecionando os que poderiam viver e condenando os que não com base no biológico-social. Assim, países como Argentina, Chile e Brasil mataram centenas de vítimas da ditadura - isto é, aplicaram uma política de vida e morte a seus cidadãos, escolhendo quais seriam capazes de sobreviver e quais seriam capazes de morrer. Em certas sociedades a polícia tem um poder forte na sociedade para se tornar um instrumento do Estado e agir com ou sem a sua validade, selecionando as pessoas que podem viver e aquelas que podem morrer (a seleção natural de Darwin, portanto, vira uma seleção social). No Brasil, por exemplo, a força policial do Rio de Janeiro é reconhecida por seu poder de aniquilar o Outro –aquele Outro, que geralmente é negro e pobre. As vidas dos pobres não servem para ser lamentadas como as dos ricos. Isso enquadra que o Estado também está a serviço do mercado– não é autônomo a este. Uma simples atitude “suspeita” é um convite a essa atuação do corpo policial legitimado pelo discurso da soberania –a ordem– do Estado. E a ordem é sempre de origem branca e de elite.
MARIELLE FRANCO E A NECROBIOPOLÍTICA BRASILEIRA: MARIELLE PRESENTE!
Atualmente, o mais recente ato de violência por parte do Estado foi em 2017, quando a vereadora do rio de Janeiro, Marielle Franco, foi assassinada em uma emboscada política. Franco2 denunciou a violência sistemática da polícia do Rio de Janeiro em relação aos moradores das favelas - a maioria negros. Ela tinha um dossiê que detalhava a política eugênica aplicada pelo governo do Rio de Janeiro. Ela foi assassinada em um crime político. Um crime do Estado. A pergunta que segue sem resposta agora é “Quem mandou
2 Marielle era uma das políticas mais atuantes da Câmara do Rio de Janeiro, tendo apresentado cerca de 16 projetos de políticas públicas em apenas um ano, com temas que versavam sobre o racismo, a homossexualidade e a misoginia (Carta Capital, 2018a).
Fragmentos de uma violência política de gênero a partir do Estado: uma necrobiopolítica “de gênero”
Fernanda Pattaro Amaral
matar Marielle?”, uma vez que já se descobriu o autor dos disparos contra o carro que levava Marielle naquela noite, e que ele é somente uma pequena peça desse quebra-cabeças. A vereadora afirmava que “a gente tem lado, tem classe e tem identificação de gênero” numa alusão à suas pautas de luta, e em relação às origens de Marielle que era oriunda da favela. E suas pautas eram: a defesa dos Direitos Humanos, os feminismos, o racismo e a homofobia, temas atualmente caros para a sociedade brasileira de forma geral. No momento de ceifarem sua vida, Marielle trabalhava fiscalizando justamente a atuação das polícias cariocas e monitorando as Forças Armadas no momento da intervenção que o governo Temer decretou no Rio de Janeiro. Ela foi nomeada para ser a relatora da Comissão de Representação da Câmara do Rio para representá-la em Brasília: Para acompanhar a Intervenção Federal na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro (...) 4 dias antes de ser assassinada, Marielle lançou luz sobre abusos cometidos em Acari pelo 41° Batalhão da Polícia Militar - o batalhão, que fica em Irajá, é o que mais mata no Estado. (Carta Capital, 2018a, 4°párr.)
A última reflexão compartilhada por Marielle na Câmara foi: Neste momento em que a democracia se coloca frágil, se questiona se vai ter processo eleitoral ou não, onde a gente vê todos os escândalos com relação ao Parlamento, falar das mulheres que lutam pela outra forma de fazer política no processo democrático é fundamental. (Carta Capital, 2018a, 8°párr.)
Seus assassinos planejaram o crime durante três meses, são eles dois policiais militares: Ronnie Lessa (vizinho do atual presidente Jair Bolsonaro) e Élcio
Fragmentos de uma violência política de gênero a partir do Estado: uma necrobiopolítica “de gênero”
Fernanda Pattaro Amaral
Vieira de Queiróz (Carta Capital, 2018b). Apesar disso, o Coaf (O Conselho de Controle de Atividades Financeiras) identificou um depósito de 100 mil reais depositados na boca do caixa na conta de Lessa (Carta Capital, 2018c). Os movimentos feministas e de mulheres afirmam que sua morte não foi em vão, uma Marielle morreu para centenas de outras marielles nascerem; e as palavras de ordem são “Marielle, presente!” As mesmas palavras que Marielle dizia todos os dias quando começavam os debates na câmara do Rio. Marielle ilustra nossa discussão sobre a necrobiopolítica, uma vez que ela mesma denunciava essa prática e foi vítima da mesma. Ela denunciava que a violência policial no Rio de Janeiro tinha um alvo certeiro: a população negra, marginalizada e favelada. Essa população insignificante ao Estado, e Marielle era parte desta população com um “agravante”, ela era lésbica. Ela era negra, feminista, homossexual e favelada. Ela era e ainda é parte da estatística da morte no Brasil, uma estatística fomentada pelo Estado através de suas políticas. A necrobiopolítica encontra no discurso da escalada da violência civil a justificativa para o Estado começar a trabalhar em um discurso de pânico para a sociedade, e uma sociedade que começa a acreditar em um discurso de medo pede mais proteção do Estado. Em outras palavras, o Estado, sob o pretexto da segurança nacional, incentiva políticas para usar a violência para garantir a ordem. As técnicas de vigilância permanente continuam enquadrando aqueles que têm acesso à vida e aqueles que têm acesso à morte.
O sociólogo Burgos (2018) em seu artigo chamado A indiferença com a violência nas favelas do Rio de Janeiro, publicado na Carta Capital, chama a atenção para um fenômeno cada vez mais recorrente na sociedade brasileira: a “resignação diante da violência ordinária” (Burgos, 2018, 9°parr.), e a forma mais evidente de se notar essa resignação do autor foi através da observação de manchetes de jornais informativos que quando informam sobre