EDIÇÃO ESPECIAL # 2 - RENDAS Domingo, 28 de março de 2010 - Fortaleza, Ceará eva@diariodonordeste.com.br
A arte de criar o belo
FAZER RENDA NO LITORAL OU NO SERTÃO DO CEARÁ É OFÍCIO E, ACIMA DE TUDO, ARTE. NA SEGUNDA EDIÇÃO DA SÉRIE “MÃOS QUE FAZEM HISTÓRIA”, O EVA MOSTRA A TRADIÇÃO DAS RENDAS DE BILRO, LABIRINTO E FILÉ, PASSADA, QUASE SEMPRE, DE MÃE PARA FILHA GERMANA CABRAL / CRISTINA PIONER
Editora / repórter
om muita paciência e habilidade, as rendeiras criam, nas almofadas ou grades de labirinto e filé, peças de extrema delicadeza. Somente o amor ao trabalho justifica tanta dedicação, pois a “renda”, agora com significado financeiro, na maioria das vezes, não compensa o tempo investido no ofício. Símbolo maior do artesanato cearense, a renda de bilro está concentrada em nosso extenso litoral. E tem razão de ser: é a principal ocupação das mulheres de pescadores que, para suportar a ausência dos maridos, buscam preencher a rotina na almofada. O som dos bilros ecoa mais forte em localidades de Aquiraz, Cascavel, Beberibe, Pindoretama, Trairi e Acaraú. Rendeiras como Francisca, Mestra da Cultura, Neci, Santa e Zeta abriram as portas de casa ou locais de trabalho para nos revelar suas vidas. Durante a prosa, demonstravam, com orgulho, o complexo emaranhado dos fios na almofada. Difícil aos nossos olhos, porém simples pelas suas habilidades naturais. Tão fascinante quanto a renda de bilro é o labirinto. Precisamos ficar atentas para entender como essas mulheres, num desafio à paciência, transformam o tecido, nu e cru, no belo. É tradicional nas praias de Aracati, Icapuí, Beberibe e Cascavel. De sorriso largo e coração aberto, dona Bia, de Majorlândia, é um raro exemplo de persistência nesse ofício. Maria de Lourdes, em Icapuí, com espírito renovador, faz labirinto utilizando a juta. Teté, de Canoa Quebrada, aos 94 anos, resiste à modernidade da pacata vila de pescadores de outrora. É até atração turística. Para nossa surpresa, conhecemos em Araripe, no Cariri, Toinha, que tem o labirinto como uma das ocupações. Embrenhando-nos pelo sertão, chegamos ao Vale do Jaguaribe, onde homens e mulheres produzem o filé. Na Serra dos Bastiões, em Iracema, um dos resquícios de quilombola do Ceará, encontramos dona Sinhá. Sua especialidade é fazer tela, a base para os pontos do filé. No entanto, é em Fortaleza onde mora Perpétua Martins, responsável pela reinvenção dessa renda com linhas coloridas e design contemporâneo. o
C
D I O luxo
impera na casa simples de dona Zeta, rendeira tradicional de Juritianha, distrito de Acaraú. Ela exibe a toalha de banquete, em renda de bilro, produzida por 12 artesãs FOTO: MARÍLIA CAMELO