CINEMA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL Com o tema “A natureza sou eu”, o 6º Cine. Ema - Festival de Cinema Ambiental do Espírito Santo, edição “Reserva Ambiental Águia Branca”, propõe em 2020, um olhar sobre a essência e responsabilidade de todo ser vivo. No período de pandemia da covid-19 e isolamento social, nossa Mostra de Cinema Ambiental, realizada todos os anos na mata, foi transferida para as telas de celular e computadores, e pode ser vista de qualquer lugar do Brasil. Já nossos estudantes e professores da região das Montanhas Capixabas se mobilizaram para mostrar a natureza vivenciada ao redor com o concurso de fotografia, vídeo e história. O Cine.Ema é um projeto cultural multiplataforma cujo objetivo é gerar consciência ambiental através do cinema, com difusão e premiação de obras audiovisuais. Inspirado na Pedra da Ema, ícone paisagístico e natural do distrito de Burarama, e no significado universal da Ema, mãe natureza, o evento foi realizado pela primeira vez em 2015. O projeto promove atividades de formação para crianças e adultos de comunidades que margeiam patrimônios naturais brasileiros, além de seminários ambientais reflexivos e temáticos que envolvem os desafios sustentáveis do nosso tempo. O Cine.Ema integra a rede de realizadores de festivais ambientais do Brasil e é o único festival de
cinema anual com este recorte temático realizado no Espírito Santo Para o Cine.Ema, repensar a “nossa” natureza é fundamental nesse período de isolamento social, onde a saúde e o bem estar da humanidade se colocam em primeiro lugar. Acreditamos que vivemos um momento de resgate, de reconexão, de reconstrução social, a busca pelo orgânico, pela vida natural e mais próxima da sustentabilidade de nossas comunidades, repensando valores e estratégias para promover a vida. A cultura também se coloca neste lugar. Os filmes exibidos pelo Cine.Ema ocupam um papel de destaque neste sentido porque o audiovisual é um teletransporte, uma janela para reflexões tão importantes do nosso mundo. Em breve estaremos juntos novamente: nas atividades de observação de aves, bate-papos acalorados e com muito, muito cinema. Mas enquanto isso, te convidamos a conhecer os pássaros de nossas matas, que incluem aves raras, projetos de conservação e história de empreendedores sustentáveis da Região das Montanhas Capixabas. Conteúdo que foi preparado com muito carinho por nossa equipe e colaboradores. Uma ótima leitura!
Edição 1 | Ano 1 | Cine.Ema 2020 Direção de conteúdo Sullivan Silva
Fotos de capa e contracapa: Gustavo Magnago
Direção Artística Léo Alves e Tânia Silva
Designer: Wilson Ferreira Diagramação e ilustração: Elielton Oliveira www.cineema.com.br
Impressão: Grafitusa Tiragem: 500
SUMÁRIO 04
SEIS DIMENSÕES PARA UM MUNDO SUSTENTAVEL POR SIDEMBERG RODRIGUES
05
SAÍRA-APUNHALADA: A AVE QUE RESOLVEU “DAR O AR DA GRAÇA” NO ESPÍRITO SANTO
POR GUSTAVO MAGNAGO E MARCELO RENAN SANTOS
10
UM REFÚGIO PARA AVES NAS MONTANHAS CAPIXABAS POR VITOR TAVEIRA
25
VILA DAS ABELHAS: MELIPONÁRIOS AJUDAM NA RECUPERAÇÃO DE ESPÉCIES NATIVAS DA MATA ATLÂNTICA POR ALINE LOBATO
30
CULINÁRIA NATURAL, ORGÂNICA E DE BEM COM A NATUREZA POR SARA PASSABON AMORIM
34
TURISMO E EMPREENDEDORISMO SUSTENTÁVEL NA REGIÃO DAS MONTANHAS CAPIXABAS POR NATÁLIA MESSINA
WWW.CINEEMA.COM.BR @CINE.EMA
/CINE.EMAFESTIVAL
SEIS DIMENSÕES PARA UM MUNDO SUSTENTÁVEL Por Sidemberg Rodrigues
A Ecosofia, conceito que aproxima atitudes ecológicas do pensamento abstrato (filosofia), descortina a relação existente entre o ser humano e a natureza; e também o caráter holístico da última. Às vezes, nossos esforços destinados a moldá-la de acordo com a nossa satisfação e conveniência torna o homem um predador cruel. Pioneira do pensamento ecológico ocidental, a escritora e bióloga estadunidense Rachel Carson (1907-1964), em seu livro “Primavera Silenciosa”, chama a atenção para a influência nefasta dos meios de produção na vida. Não podemos nos separar do meio ambiente porque nele vivemos, dele dependemos e porque o afetamos. Como observou o norueguês Arne Naess (1912-2009), cada ser vivo é dependente da existência de outras criaturas na complexa rede de interrelações que é o mundo natural. Essa interdependência é vital para o equilíbrio do conjunto. Seu conceito de “Ecologia Profunda” expõe o pragmatismo utilitário de governos e organizações privadas no trato superficial para com os impactos e demais questões ambientais. A proposta capitalista de um modelo para o ‘desenvolvimento sustentável’, que validasse a relação entre Economia e Ecologia, nasceu em uma escola de Administração. Nenhum ambientalista participou dessa construção e a natureza pode ter ficado em desvantagem. Contemporâneo de Rachel e Arne, o dinamarquês Ian Larson (1878-1962) propôs, em 1950, um esboço do que seria mais assertivo como modelo para o que hoje chamamos ‘sustentabilidade’. Infelizmente, adotado apenas na Europa do norte. No conceito de Larson, a complexa relação entre negócio e natureza é vista como a utopia de um equilíbrio entre seis dimensões em interação: Cultural, Ambiental, Social, Econômica, Política e Espiritual.
Na visão da filósofa Angelita Minélio, não se pode pensar a vida moderna sem considerar as questões culturais que nos identificam; nem a esfera social que nos engaja; as engrenagens econômicas que viabilizam; o meio ambiente que nos acolhe; a política que nos representa e a espiritualidade que nos une como individualmente partícipes de uma fraternidade universal. Eis a teia da vida! Não se pode separar uma dimensão da outra: o modelo é indivisível. E o ser humano está em todas as dimensões, inclusive na Ambiental, confirmando que a natureza sou eu. Assim como somos nós as memórias, experiências, histórias e lendas populares adormecidas no inconsciente coletivo das montanhas e de todas as espacialidades. As singularidades que habitam cada lugar na diversidade recortada em territórios inspiram a dimensão Cultural: raízes, referências, tradições e identidade. Beleza, sonoridade e poesia: o colorido da vida. A concretude da natureza ao redor e o olhar através de todas as janelas por onde se espia, inclusive quando olhamos para dentro de nós mesmos, remontam à dimensão Espiritual, que resgata as raízes emocionais da responsabilidade – a compaixão e a ecoternura. A Economia não anda sozinha. A dimensão Ambiental está aí para mostrar o quanto podem atrapalhar os ciclones, o excesso ou a falta de água; os gafanhotos... e as pandemias. A dimensão Social lembra que isso afeta os coletivos humanos. A dimensão Política explicita quão importante são as relações e representações, assim como as colaborações e o pensar coletivo. Tudo funciona em rede. E não tem como falar em meio ambiente desconsiderando qualquer dimensão. Devemos, sim, divinizar a natureza como um todo sagrado; porque, afinal, ela é tudo. E cada um.
Sidemberg é membro da Academia Brasileira de Direitos Humanos - ABDH e Sócio Fundador do Instituto Movimento pela Felicidade - BH/MG. É autor de 4 livros sobre Sustentabilidade, Mestre em Ciências Sociais PUC/SP, com MBA em Gestão de Empresas - FGV/RJ. Sidemberg atua ainda, como professor em cursos MBA de Integridade, Governança & Desenvolvimento Sustentável.
Saíra-apunhalada vista na Reserva Ambiental Águia Branca, em Vargem Alta - ES
Foto de Gustavo Magnago
SAÍRA-APUNHALADA A AVE RARA QUE RESOLVEU “DAR O AR DA GRAÇA” NO ESPÍRITO SANTO NOS ÚLTIMOS 20 ANOS A AVE FOI VISTA POR ORNITÓLOGOS E OBSERVADORES APENAS EM TERRITÓRIO CAPIXABA Por Gustavo Magnago e Marcelo Renan Santos De bico curto e pelagem vermelha no peito, a Saíra-apunhalada é conhecida por seus raríssimos avistamentos. Ela figura na lista de aves ameaçadas de extinção e há 20 anos dá o “ar da graça” apenas no estado do Espírito Santo, sendo vista e fotografada por pesquisadores, na região das montanhas capixabas. A ave rara é acompanhada pelo Programa de Conservação da Saíra-Apunhalada (PCSA), criado em dezembro de 2019, pelo Instituto Marcos Daniel de Preservação Ambiental em parceria com a Transmissora Caminho do Café (TCC). As áreas que correspondem ao projeto são remanescentes da Mata Atlântica, localizadas entre os municípios de Castelo, Conceição do Castelo, Santa Tereza e Vargem Alta.
CARACTERÍSTICAS E HISTÓRICO A Saíra-apunhalada leva esse nome por causa da mancha vermelha que possui na garganta, que faz parecer ter sido apunhalada. Sua altura se aproxima dos 12,5 centímetros e pesa cerca de 22 gramas, já na fase adulta. Ela possui pelagem na cor preta e detalhes azuis nas asas. Outra característica que chama atenção é a íris de coloração alaranjada e pernas e pés rosados. Os primeiros registros da espécie estão nos escritos de 1870, do biólogo alemão Jean Louis Cabanis, ano em que foi capturada no município de Muriaé, em Minas Gerais, e faz parte da coleção ornitológica do Museu de História Natural de Berlim. A Ornitologia é o ramo da zoologia que se dedica ao estudo das aves.
Em 1941, após 71 anos sem notícias de registros da Saíra-apunhalada, o ornitólogo alemão Hemult Sick, durante o período em que morou em Itarana, no interior do Espírito Santo, avistou um bando com 8 indivíduos na copa das árvores. Outra aparição foi registrada em 1995 pelo ornitólogo inglês Derek A. Scott, onde hoje é a Reserva Biológica Augusto Ruschi, em Santa Teresa. Anos depois, em 1998, ela foi vista e fotografada em Conceição do Castelo, e em 2003, em Castelo e Vargem Alta. Segundo o coordenador de campo do programa de conservação e fotógrafo de Natureza, Gustavo Magnago, a perda do habitat é possivelmente o fator determinante para que hoje, a Saíra-apunhalada só seja encontrada no Espírito Santo. “É uma espécie endêmica da Mata Atlântica e habita florestas maduras com altitude entre 800 metros a 1250 metros. Não sobraram muitas florestas com essas características no Brasil. Aliado a isso, a densidade populacional dela é muito baixa, tornando-se uma espécie rara e difícil de ser detectada mesmo, em locais que temos a certeza da presença dela”, explicou Gustavo. TRABALHO DE OBSERVAÇÃO DAS AVES Você já deve conhecer o nome saíra, pois existem várias espécies na natureza (Saíra-sete-cores, Saíra-militar, Saíra-amarela, Saíra-beija-flor, etc), mas diferentemente das demais saíras, a Saíra-apunhalada nunca foi observada alimentando-se de frutos. Até hoje, só foi vista se alimentando de pequenos insetos coletados nas copas das árvores
ou em galhos e troncos. Ela possui o hábito de inspecionar embaixo dos líquens e cascas das árvores, sempre à procura de algum alimento. Com o trabalho de monitoramento e registros fotográficos feito pelo programa de conservação, além dos hábitos alimentares, foi possível encontrar um ninho da espécie: com estrutura sobre galhos, construídos principalmente por musgos coletados das árvores. Um dos ninhos foi acompanhado por vários dias e nele foi registrado a presença de um filhote. PRESERVAÇÃO Todo ser vivo cumpre um papel na teia ecológica, e o pesquisador Gustavo Magnago destaca que se uma espécie for retirada do seu ambiente natural, outros animais ou plantas podem sofrer impactos nas suas populações por dependerem do papel ecológico da espécie que foi suprimida. Isso cria um efeito em cascata, levando ao declínio da biodiversidade, podendo trazer consequências danosas até para o ser humano. A Saíra-apunhalada é uma das aves mais ameaçadas do mundo e que hoje só existe em terras capixabas. Sabe-se muito pouco sobre a espécie devido à sua raridade e a dificuldade em estudar seus hábitos na floresta. Isso tudo soa como um grande desafio que motiva a equipe do PCSA a querer conhecer mais sobre as necessidades de sobrevivência da saíra, o que pode contribuir para conseguir salvá-la da extinção.
Saíra-apunhalada encontrada no ninho, nas Montanhas Capixabas
Foto de Gustavo Magnago
Nome científico: Nemosia rourei. A Saíra-apunhalada é uma ave passeriforme da família Thraupidae que mede entre 12,5 e 14 centímetros de comprimento e pesa cerca de 22 gramas. Sai em grupos e se alimenta de artrópodes. Habita florestas úmidas em altitudes de 700 a 1250 metros. O nome “Saíra-apunhalada” refere-se à mancha vermelha na garganta, que, em contraste com o peito branco, lembra uma mancha de sangue, como se o animal tivesse sido “apunhalado” no peito. Fonte: wikiaves
Foto de Gustavo Magnago
Gustavo explica que é importante cuidar de uma ave ameaçada de extinção para que a espécie possa ter a chance de sair da zona de risco e evitar que desapareça por completo da natureza; e que a preservação da Saíra-apunhalada ajuda na proteção de outras espécies de animais e vegetais da região. “Muitas vezes, uma espécie é rara por natureza, e essa característica somada a interferência humana, pode levar a espécie à extinção mais rapidamente. Para proteger uma espécie em risco de extinção, é importante conhecer suas características ecológicas para pautar as medidas que serão tomadas para sua conservação. Além disso, protegendo uma espécie ameaçada, sua área de ocorrência também é protegida”, disse o pesquisador. SOBRE O PROGRAMA DE CONSERVAÇÃO O Programa de Conservação da Saíra-Apunhalada foi elaborado pelo Instituto Marcos Daniel, para ser executado em duas fases: Com a coleta de dados para embasar e
definir as ações de conservação, de educação ambiental e engajamento comunitário, e desenvolvimento do turismo de observação, com o treinamento de condutores locais, para atender os observadores de aves de todo o país. O Instituto Marcos Daniel é uma associação privada sem fins lucrativos qualificada como OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), localizado em Vitória, Espírito Santo. Foi fundado em 15 de setembro de 2004 e foi presidida pelo ilustre médico capixaba Marcos Daniel Santos, até o seu falecimento em 2006. O instituto consolidou-se como centro formador de talentos voltados para a conservação da natureza baseados nos conceitos da Medicina da Conservação e no conceito One World – One Health, que compreende a saúde como a interação entre a saúde humana, animal e ambiental. O foco de atuação do Instituto é a elaboração e execução de projetos de conservação da biodiversidade e a formação de multiplicadores para a conservação da natureza, agindo localmente, mas pensando globalmente.
Gustavo Magnago é coordenador de campo do Programa de Conservação da Saíra-apunhalada, fotógrafo de natureza especializado em aves e atua como guia de turismo no segmento de observação de aves, organizando expedições que correm as matas capixabas em busca das mais raras e ameaçadas espécies. Marcelo Renan de Deus Santos é médico veterinário, Doutor em Ecologia de Ecossistemas. Fundador e presidente do Instituto Marcos Daniel. Foi professor universitário desde 1999 e hoje dedica-se exclusivamente à causa da conservação de fauna selvagem. No IMD também é coordenador do Projeto Chelonia mydas que monitora a saúde de tartarugas marinhas e do Programa de Conservação da Saíra Apunhalada.
Foto de Gustavo Magnago
A redescoberta: Primeiras fotografias e gravação do canto Avistamento em Itarana-ES
Desde 1870 (128 anos) não eram apresentadas provas da existência da Saíra-apunhalada. Existiam apenas os relatos de avistamento dos experientes ornitólogos H. Sick e D. Scott.
Após 71 anos sem notícias de registros da Saíraapunhalada, o ornitólogo alemão Hemult Sick, durante o período em que morou em Itarana no ES, avistou um bando com 8 indivíduos na copa das árvores na localidade de Jatibocas.
Em 1998 o ornitólogo J. Fernando Pacheco publicou uma nota informando que ele e sua equipe haviam não só encontrado um bando com pelo menos 4 Saíras em Conceição do Castelo no ES, mas que também teriam fotografado e gravado a vocalização das aves.
1941
1998
1870 Foi o ano da descrição da espécie O trabalho foi escrito pelo alemão Jean Louis Cabanis, baseado em uma saíraapunhalada capturada no município de Muriaé - MG. Essa saíra faz parte da coleção ornitológica do Museu de História Natural de Berlim.
1995 Novo avistamento após 54 anos Após outro longo período (54 anos) sem avistamentos, o ornitólogo inglês Derek A. Scott observou uma Saíra onde é hoje a Reserva Biológica Augusto Ruschi em Santa Teresa. Anos depois uma população de saíra-apunhalada foi confirmada no local com gravações e fotos.
Foto de Gustavo Magnago
Primeiro registro no município de Castelo - ES Durante uma pesquisa na região do Parque Estadual do Forno Grande, foram observadas 4 Saíras-punhaladas. Esse foi o primeiro registro no município de Castelo - ES.
2003 DEZEMBRO
2003
2020
SETEMBRO
O Programa de Conservação da saíra-apunhalada
Avistamento de grupo com 8 saíras Um grupo de ornitólogos e observadores de aves que visitavam as matas da localidade de Castelinho avistaram 8 Saíras no topo de uma árvore. Esse foi o primeiro registro de Saíraapunhalada no município de Vargem Alta - ES. O registro foi publicado em 2005 e trouxe muitas informações adicionais sobre a Saíra.
O IMD - Instituto Marcos Daniel e a empresa TCC - Transmissora Caminho do Café, iniciam o Programa de Conservação da Saíra-Apunhalada As ações previstas no plano de trabalho contemplam além das pesquisas de campo, ações de sensibilização,educação ambiental e engajamento comunitário nas práticas de conservação dos remanescentes de Mata Atlântica, das espécies existentes e também, envolver o turismo local, pois além da relevância ecológica, o local é um dos principais sítios turísticos do Espírito Santo.
UM REFÚGIO PARA AVES NAS MONTANHAS CAPIXABAS NA RESERVA ÁGUIA BRANCA VIVEM MAIS DE 350 ESPÉCIES DE AVES GRAÇAS À PRESERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA Por Vitor Taveira Muitos devem saber que o Brasil é um dos países com maior biodiversidade do mundo. A Mata Atlântica, caracterizada por vegetação densa e localizada na faixa litorânea do país, possui junto com a Amazônia a maior diversidade de fauna e flora, sendo que quase 40% das espécies animais encontradas são endêmicas, ou seja, existentes apenas na região. Porém, hoje resta-se menos de 10% do bioma original da Mata Atlântica. Por isso é que áreas como a Reserva Ambiental Águia Branca, com 2.225 hectares são de suma importância para a preservação da fauna e flora nativas que correm risco de desaparecer. Criada em 2017 no município de Vargem Alta como uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) pelo Grupo Águia Branca, abriga grande diversidade natural e conecta duas outras áreas de preservação ambiental do Espírito Foto de Léo Merçon
Santo, o Parque Estadual do Forno Grande, localizado em Castelo, e o Parque Estadual da Pedra Azul, em Domingos Martins. A flora abundante na reserva, com 396 espécies cadastradas, existe por conta de uma cobertura vegetal composta em 91% como florestas primárias ou em estágios avançados de regeneração, além de abrigar dezenas de nascentes e 11 cursos hídricos que fazem parte da bacia do Rio Itapemirim, uma das mais importantes da região Sul do Espírito Santo. Na reserva existem mais de 800 espécies de plantas e animais, sendo que alguns deles estão em risco de extinção devido ao desmatamento e uso predatório dos recursos naturais. Só entre as aves, já foram identificadas 357 espécies na Reserva Águia Branca. Isso faz com que a o local seja um espaço privilegiado para a Observação de Reserva Águia Branca, em Vargem Alta
Aves (também chamada Birdwatching ou Passarinhada), uma crescente alternativa de lazer e turismo ao ar livre que contribui e estimula a conservação dos ecossistemas nativos, já que deles depende a sobrevivência das espécies. Esta prática mobiliza pessoas do Brasil e de outros países para observar animais muito belos, alguns deles ameaçados de extinção, sempre em seus habitats naturais. Além de roupas e acessórios apropriados para caminhadas, os observadores também levam binóculos, lunetas e fotografias para registrar as aves e outros animais presentes na área de Mata Atlântica ou outros biomas. Na Reserva Águia Branca, com tantas espécies de aves, se fossemos falar de todas elas, mesmo que um pouquinho, exigiria no mínimo um livro inteiro. Então para uma breve introdução escolhemos seis espécies muito especiais que habitam essa área protegida. Elas vão desde os populares beija-flores e das relativamente conhecidas araponga e saracura do mato aos raros chibante e pixoxó e à raríssima saíra apunhalada, uma espécie de pássaro poucas vezes avistada e existente apenas na região das montanhas do Espírito Santo.
OBSERVADORES DE AVES NA REDE SAIBA MAIS Você pode encontrar informações sobre localização e hábitos das espécies nativas, fotos e seus sons gravados em áudio, na plataforma wikiaves. com.br. O site dá suporte às atividades de observação e ajuda a democratizar o acesso às informações sobre aves no Brasil. A página é uma referência importante na internet para quem quer saber mais sobre o tema. A plataforma possui no Espírito Santo 836 observadores cadastrados e 664 espécies registradas. www.wikiaves.com.br/estado_ES
Esses seis tipos de aves serão estrelas também da websérie audiovisual Aves da Montanha, a que tem roteiro e direção de Melina Leal Galante, obra disponível no instagram do Cine.Ema. Com utilização de fotos, ilustrações e colagens, cada um desses animais protagonizará um capítulo em vídeo de 3 minutos, que falará sobre suas características e hábitos, além da importância da região das Montanhas Capixabas.
Vitor Taveira é comunicador social com habilitação em jornalismo e mestrado em Estudos Latino-Americanos. Integra também projetos culturais e ecológicos como o Soy Loco Por Ti, Organização dos Cineclubes Capixabas e Horta Paraíso
Foto de Gustavo Magnago
CHIBANTE No dicionário “chibante” significa altivo, valentão, pomposo. Assim é conhecido o pássaro Laniisoma elegans, que no nome científico também espelha a elegância que despoja do alto de seus 20 centímetros, que o fazer poder ser considerado de porte médio, apresentando bicos de tipos variados. A Mata Atlântica é seu habitat, de onde se alimenta sobretudo de lagartas e também de pequenos insetos. Pode ser encontrado nos estados da Região Sudeste do Brasil. Traz em seu corpo, aliás, as cores principais da bandeira do país: tem seu peitoral amarelo e asas e cabeça cobertas com pêlos verde-escuro- e no caso dos machos pelagem negra no cocuruto. Mas ao contrário dos mais populares pássaros verde e amarelo do país, o chibante é um animal solitário e de difícil visualização, embora o macho da espécie cante insistentemente durante a manhã e o início da tarde. É uma espécie rara e como muitas outras, ameaçada pela destruição das vegetações nativas, que o coloca na lista de aves ameaçadas de extinção. Por sua beleza, é muito apreciada por observadores de aves e encontra refúgio na Reserva Águia Branca.
Foto de Gustavo Magnago
PIXOXÓ Pixoxó é o divertido nome do Sporophila frontalis, um cantador nato que assim se manifesta: pi-xo-xó-pi-xo-xó. Porém, esse dom infelizmente virou perigo. Por causa de sua melodia agradável cantada durante todo o dia enquanto se alimenta de taquaruçu, é um pássaro muito visado pelo tráfico de animais silvestres. O taquaraçu é uma espécie muito especial de bambu, que existe em relativa abundância por toda Reserva Águia Branca, o que faz do local um bom lar para o pixoxó, que é uma espécie especialmente granívora e tem esse bambu como principal fonte de alimentação. É um pássaro pequeno, que não passa de 13 cm e costuma andar em grandes bandos. Suas cores variam, mas geralmente vão do bege ao verde-oliva nas partes superiores, com as partes interiores brancas ou amareladas. Um de seus destaques é o fato de sua região malar, as maçãs do rosto, serem proeminentes. É encontrado na região próxima ao litoral brasileiro, desde o Rio Grande do Sul até a Bahia.
Foto de Gustavo Magnago
ARAPONGA Da área de visitação da Reserva Águia Branca é possível ouvir ressoar o canto da araponga (Procnias nudicollis), uma ave presente na abundante mata do local. Com som metálico marcante, seu canto lembra um ferreiro batendo numa bigorna, razão pela qual também é conhecido como ferreiro ou ferrador. Mas falando em profissões, o pássaro não tem nada a ver com espionagem, viu? Seu nome ficou assim associado após a novela Araponga de Dias Gomes, cujo personagem principal era um detetive que tinha este apelido. As arapongas são aves semeadoras, pois se movimentam bastante pelas florestas e ajudam a disseminar espécies vegetais a partir de frutos que comem e passam por seu fluxo intestinal sem que as sementes sejam prejudicada. Uma de suas sementes favoritas é a da palmeira jussara, bastante abundante na reserva, que oferece além da alimentação, a proteção necessária, servindo de local para viver. Além do canto particular, as arapongas também chamam atenção por sua beleza. Os machos adultos são brancos mas com a cabeça e a garganta sem plumas, ressaltando sua cor verde-jade. Já as fêmeas, possuem plumagem com traços de verde-oliva, amarelo e cinza. Espécie ameaçada, pode ser encontrada pela faixa litorânea brasileira do Rio Grande do Sul a Pernambuco e também mais adentro como no Mato Grosso do Sul e em regiões da Argentina e Paraguai. Porém, a caça e a destruição da natureza são os principais problemas que fazem da araponga uma espécie ameaçada de extinção.
Foto de Gustavo Magnago
SARACURA DO MATO Animal simpático é a saracura do mato, ave que costuma ter cerca de 35 centímetros, com canto característico e preferência por viver em áreas alagadiças, onde se alimenta de insetos, de ovos de perereca e até mesmo de anfíbios. Na Reserva Águia Branca, a Aramides saracura pode ser encontrada em praticamente toda área alagada, especialmente nas com vegetação de taboas, mas também nas que em que não há taboas. Ainda costuma desfilar bastante à vontade mesmo em áreas de visitação da reserva, sentindo-se seguras mesmo nessas zonas com intervenção humana. Seu canto característico faz com que seja muito conhecido dentro da cultura popular, sobretudo nos interiores das regiões Sul e Sudeste, onde é seu cantar ao nascer do sol o sinal de que é hora de acordar e se preparar para trabalhar na roça. Seu canto de fim de tarde também serve indício de fim do expediente de trabalho nos cultivos. É como um reloginho mesmo: se algum dia a saracura não canta na hora de sempre pode ser que mudem também os horários de trabalho.
Foto de Gustavo Magnago
BEIJA-FLORES As cores, o voar característico “parando no ar”, o bico longo e pontiagudo, e principalmente a delicadeza do ato de retirar com ele o néctar das flores que o serve de alimento, ao mesmo tempo em que contribui com a polinização. Esses são alguns dos fatores que fazem dos beija-flores pássaros extremamente admirados pelos seres humanos. Também conhecidos como colibris, eles estão presentes em diversos biomas por quase todo continente americano, do Alasca à Terra do Fogo. São a única ave que consegue parar no ar e até voar para trás. São aves pequeninas mas de apetite insaciável. Algumas espécies podem visitar mais de 2 mil flores por dia em busca de néctar, além de se alimentarem de forma complementar capturando pequenos insetos e aranhas. São atraídos especialmente por flores vermelhas e laranjas, mas visitam também flores brancas, como as de eucaliptos, e amarelas como as dos ipês. Em áreas preservadas como a Reserva Águia Branca, é possível avistar várias espécies diferentes de beija-flor num mesmo dia. Entre as que habitam a região estão o beija-flor topetinho vermelho, beija-flor estrelinha ametista, beija-flor de orelha violeta e o beija-flor rubi, que encantam por sua beleza.
Foto de Gustavo Magnago
SAÍRA-APUNHALADA A Nemosia rourei, conhecida como saíra apunhalada, é uma espécie de destaque na Reserva Águia Branca. Essa ave é extremamente rara e se encontra apenas no Espírito Santo, tendo na reserva um dos seus últimos lugares de refúgios. Depois de catalogada, esteve por mais de um século longe do avistamento humano até voltar a ser encontrada. Por ser tão bela e rara, a saíra apunhalada é um pássaro que observadores de ave do mundo inteiro sonham em vir tentar observar no que ainda resta de Mata Atlântica no Espírito Santo. A preservação de áreas de reserva é fundamental para garantir a continuidade da existência desta espécie, assim como o estudo de seus hábitos ainda pouco conhecidos para criar meios que permitam salvá-la da lista de aves ameaçadas de extinção. Agora, a pergunta que muitos devem se fazer é: por quê esse nome, saíra apunhalada? As fotos ajudam a entender. Além de sua plumagem com ventre branco, asas e cauda preta e faixas de cinza, possui da garganta descendo até o peito uma grande mancha de vibrante cor vermelha, que de longe dá a impressão de que o pássaro estivesse sangrando após levar uma punhalada. Na Reserva Águia Branca, há um projeto especial sendo desenvolvido sobre a saíra apunhalada, que você pode conhecer mais nas páginas a seguir.
Descubra a Reserva Águia Branca Um lugar de natureza protegida e cheio de encantos.
Trilhas ecológicas Educação ambiental
Visite a Reserva Ambiental Águia Branca nas montanhas capixabas e encante-se com as belezas de 2225 hectares preservados de Mata Altântica. Descubra paisagens que os olhos não se cansam de ver, espécies raras em seu habitat natural e um cenário que inspira tranquilidade. Esperamos por você.
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Vargem Alta/ES
VILA DAS ABELHAS
MELIPONÁRIOS AJUDAM NA RECUPERAÇÃO DE ESPÉCIES NATIVAS DA MATA ATLÂNTICA RESERVA ÁGUIA BRANCA ABRIGA MELIPONÁRIO DIDÁTICO E PROMOVE AÇÕES DE CONSERVAÇÃO DE ABELHAS NAS MONTANHAS CAPIXABAS. Por Aline Lobato O conhecimento sobre as abelhas sem ferrão nas Américas data dos primeiros povos que aqui viveram, que já utilizavam o mel como fonte de energia para longas caminhadas em busca de alimento. Ao longo dos séculos, esse conhecimento tradicional se traduziu em uma infinidade de técnicas de manejo, que nos revela não só a diversidade de espécies, como também, a diversidade cultural e ambiental na qual a prática da meliponicultura se insere. A conservação das abelhas é um tema global. Economicamente, abelhas são importantes não só pelos produtos que produzem, como mel, cera, pólen, própolis, entre outros, mas também por sua relevante contribuição na polinização – estima-se que até um terço da alimentação humana dependa direta ou indiretamente da polinização realizada por abelhas. Apesar de toda essa importância, as abelhas vem sofrendo uma redução significativa de suas populações, um fenômeno conhecido como “Síndrome do Colapso das Colônias” com causas não muito bem conhecidas, mas que provavelmente sejam uma combinação de fatores, como o uso de agrotóxicos, especialmente inseticidas de uso agrícola, doenças, perda de habitat e mudanças climáticas. E é certo que o desaparecimento das abelhas poderá trazer efeitos desastrosos para o meio ambiente, principalmente para a produção de alimentos, uma vez que são agentes importantes na polinização de inúmeras culturas agrícolas, como o café, tomate, morango, contribuindo anualmen-
te com bilhões de dólares na economia da região tropical. Nas florestas brasileiras, possuem grande importância, uma vez que se estima que até 90% dos vegetais da Mata Atlântica sejam polinizadas por essas espécies.
Polinizam 90% dos vegetais da Mata Atlântica Importantes na polinização de inúmeras culturas agrícolas Até o momento, o Brasil conta com aproximadamente 250 espécies de abelhas pertencentes à tribo Meliponini, chamadas popularmente de abelhas sem ferrão. Ao longo da história, muitas dessas abelhas sofreram exploração predatória, com manejo inadequado para a retirada do mel e consequente destruição das colônias, o que contribuiu para a diminuição das populações em algumas regiões. A boa notícia é que há alguns anos a exploração predatória vem cedendo espaço para a Meliponicultura, que além de permitir a produção dos diversos tipos de mel, ainda contribui para a conservação das diferentes espécies. A criação racional de abelhas sem ferrão traz a possibilidade de geração de renda para as comunidades rurais, reduz a necessidade de explorar outros recursos naturais e auxilia na conservação do meio ambiente.
A criação racional de abelhas sem ferrão possibilita a possibilidade de geração de renda para as comunidades rurais, reduz a necessidade de explorar outros recursos naturais e auxilia na conservação do meio ambiente. Nas matas e no campo, elas são agentes importantes na polinização de plantas e de inúmeras culturas agrícolas, como o café, tomate e o morango. EDUCAÇÃO AMBIENTAL De maneira geral, conservação da biodiversidade, sustentabilidade e empreendedorismo são temas presentes no universo da meliponicultura e a oportunidade de discuti-los de forma participativa com os atores envolvidos neste processo abre um leque de possibilidades de ações voltadas para o desenvolvimento sustentável local. A facilidade no manuseio e a docilidade da maioria das espécies permitem a utilização de colmeias em diversos espaços, oportunizando um rico momento de interação e aprendizado a partir de elementos da natureza. Foto de Nuno Perim
Toda essa importância e protagonismo fizeram com que as abelhas sem ferrão ganhassem um novo espaço: a “Vila das Abelhas”, meliponário instalado, na Reserva Ambiental Águia Branca, em Vargem Alta, na região Serrana do Espírito Santo. A “Vila das Abelhas”, é uma iniciativa da Reserva Ambiental, em parceria com a Associação de Meliponicultores do Espírito Santo, AME-ES com o objetivo de contribuir para a conservação de abelhas nativas sem ferrão na Reserva e comunidades do entorno. A ideia do meliponário surgiu a partir de um workshop de Meliponicultura realizado durante o Festival Ambiental das Montanhas Capixabas, em outubro de 2019. Inicialmente, foram implantadas três colmeias, e no início de 2020 essa parceria foi fortalecida com a adição de mais colmeias, a estruturação de um roteiro para vivências e discussão de temas relacionados ao desenvolvimento sustentável e conservação das espécies de abelhas sem ferrão. Além dos benefícios ecológicos, o meliponário servirá como sala de aula ao ar livre para escolas, universidades e comunidades aprenderem um pouco mais sobre criação racional e a importância da conservação das abelhas nativas. A parceria ainda prevê a realização de cursos de capacitação para produtores que estão iniciando ou que queiram aprimorar as técnicas de criação
Vila das Abelhas, na Reserva Ambiental Águia Branca, em Vargem Alta.
Abelha Uruçu-capixaba
das abelhas sem ferrão. O espaço contará com 15 colmeias de 6 espécies, dentre elas, Melipona capixaba, a uruçu-capixaba. CONSERVAÇÃO DA URUÇU-CAPIXABA Endêmica da região das montanhas capixabas, a Melipona capixaba, também conhecida como “uruçu-negra” ou “uruçu-preta” é uma espécie com uma restrita distribuição geográfica e ainda pouco conhecida da ciência. É uma espécie de porte robusto, fato que está associado ao seu nome comum: Uruçu, que vem do Tupi “eirusu”, que significa “grande abelha”. Devido ao seu endemismo e pequeno tamanho de sua população, a espécie só foi descoberta na década de 90 e atualmente é a única abelha social a integrar a Lista de Espécies Ameaçadas de Extinção na categoria “Vulnerável”. Estudos indicam que a espécie ocorra em pequenas áreas de distribuição nos municípios do Espírito Santo, em altitudes entre 800 e 1200 metros, com temperaturas médias anuais em torno de 18 a 23ºC e em áreas de florestas ombrófilas densas. Dentre as principais ameaças à espécie, estão os desmatamentos, que resultam em fragmentação e redução do seu habitat, redução dos locais de nidificação e diminuição das fontes de alimento, dificultando assim a so-
Foto de Felipe B. Fraga
brevivência das colônias remanescentes em sua área natural de distribuição. Portanto, “garantir a sobrevivência da espécie é essencial para a conservação do ecossistema das montanhas capixabas” é o que explica o professor Dsc. Helder Resende, da Universidade Federal de Viçosa. Coordenador de uma iniciativa pioneira com o apoio de diversos parceiros da região, o professor detalha que o projeto instalará Núcleos de Reprodução geneticamente assistida e posterior reintrodução da M. capixaba na natureza. O trabalho pretende determinar genótipos prioritários e métodos de manejo para a multiplicação efetiva de colônias da uruçu-capixaba, retornando com essas colônias para a natureza, em árvores protegidas nas Unidades de Conservação do corredor ecológico Pedra Azul – Forno Grande. De acordo com o professor, “medidas para aumentar o tamanho populacional dessa abelha, garantir o sucesso reprodutivo de colônias e reintroduzir a espécie em populações naturais protegidas contribuirão para deter a perda de biodiversidade e evitar a extinção desta espécie.”
A MELIPONICULTURA COMO GERAÇÃO DE RENDA A meliponicultura ainda é considerada um mercado tímido no Brasil, mas com grande potencial de geração de renda e resgate da identidade cultural, além de contribuir para a conservação das espécies. Com uma consistência mais líquida, o mel proveniente das abelhas sem ferrão possui diversas nuances de sabor, com diferentes níveis de acidez, além de aromas diversificados característicos das espécies que o produzem. O produto que tem sido utilizado por chefs na harmonização de diversos pratos e aos poucos tem conquistado a mesa dos brasileiros. No entanto, os benefícios não se resumem à produção do mel. O biólogo Nilton Emmerick Oliveira Filho explica que “o produtor rural ao se tornar meliponicultor pode produzir mel, pólen, própolis e cera. Além desses produtos de alto valor agregado, que podem ser utilizados pelos próprios
criadores, estes também podem produzir novos enxames a partir da multiplicação de colônias matrizes. Tudo isso, pode servir como uma ótima forma de complementar a renda do produtor rural sem riscos de acidentes com ferroadas.” No sul do país, por exemplo, criadores têm alugado suas colmeias para polinização dos pomares de macieiras na época de floração. Passado este período, as colmeias retornam às suas propriedades de origem. Esse tipo de atividade, além de melhorar a polinização, também melhora ajuda a aumentar a produção e a qualidade da produção agrícola. ASSOCIAÇÃO NO FORTALECIMENTO DA ATIVIDADE E foi nas Montanhas Capixabas, que em agosto de 2016, um grupo de apaixonados por abelhas sem ferrão, criou a Associação
Vila das Abelhas, na Reserva Ambiental Águia Branca, em Vargem Alta
Foto de Aline Lobato
Foto de Helder Canto Resende
dos Meliponicultores do Espírito (AME), que hoje, reúne mais de 162 associados. Um deles é Adailton Gonçalves Pinheiro, bancário aposentado, de 66 anos, e que possui um meliponário em sua propriedade rural, em Domingos Martins.
tia muito produtor rural que só tirava o mel para vender e não se preocupava com a preservação da abelha. Só extraía o que ela produzia”, concluiu.
Com a associação diversos produtores aprenderam técnicas de multiplicação de “Em 2016 existiam muitos amantes das enxames, e viram a produtividade de suas abelhas de forma solitária e em um batecolmeias aumentar. Os primeiros passos do -papo entre nós, surgiu a vontade de formar grupo foi conscientizar que meliponicultura a associação. A associação é uma das mais poderia ser um meio de preservação das novas do Brasil, mas com o maior número abelhas, mas também uma possibilidade de associados”, disse Adailton. de geração de renda com a multiplicação e a venda dos enxames. Nesses anos de Adailton destaca que na região das monta- atuação, a associação tem estimulado a nhas, existiam muitos produtores rurais que atividade de meliponicultura como fonte de antes da associação não possuíam técnicas geração de renda para diversas comunidade manejo com foco na preservação. “Exisdes nos municípios capixabas. Aline Lobato, bióloga e educadora ambiental. Trabalha há mais de 10 anos com áreas naturais protegidas. Atualmente, compõe a equipe da Reserva Ambiental Águia Branca, nas montanhas capixabas. Acredita que a vida é bem melhor com florestas.
CULINÁRIA NATURAL, ORGÂNICA E DE BEM COM A NATUREZA CONHEÇA RESTAURANTES E PROPRIEDADES RURAIS ONDE É PREPARADO VERDADEIRAS DELÍCIAS DA CULINÁRIA NATURAL E ORGÂNICA. Por Sara Passabon Amorim A Culinária, considerada como a “arte de cozinhar”, ganha notoriedade na contemporaneidade - dá asas à imaginação e combina classicismo com novos conceitos; as formas tradicionais de alimentação são atreladas às inovações tecnológicas. O ato de cozinhar é repensado na sociedade atual, e também dá ênfase à diversidade cultural e de plantas que podem ser utilizadas na culinária e proporcionam uma alimentação mais saudável, natural e sustentável. Paradoxalmente, no cotidiano da vida moderna, cozinhar dessa forma se estabelece como uma capacidade de dinamizar e potencializar a essência e a força que esse ato possui. Embora os termos “alimentação natural”, “alimentação nativa” e “de raiz” tenham se tornados corriqueiros no vocabulário moderno, a culinária se aplica desde tempos remotos e contextos os mais variados como em zona rural e/ou comuniFoto de Sara Passabom Amorim
dades tradicionais quilombolas e indígenas. E a representatividade dessas culturas, na contemporaneidade, ganha outras dimensões gastronômicas. Minha aproximação dessas práticas com certeza foi quando comecei a interagir mais com a zona rural e com a natureza – ao ir morar num sítio em Vargem Alta-, na região das Montanhas Capixabas. Logo, pude ter acesso a produtores rurais, à alimentação baseada nos produtos nativos como o palmito e orgânicos como o morango, e locais de produção como verduras e legumes fresquinhos. Também à alimentação tradicional da região, como a polenta, o café da roça moído e coado na hora, os queijos, pães, biscoitos e carnes/embutidos produzidos artesanalmente, e ainda ovos e galinha caipira, entre outros. Esses alimentos, nessa região, podem ser encontrados tanto nas propriedades rurais como comercializa-
Cozinha do restaurante “Domaine île-de-France - Estação Agroecológica
dos em feiras, empórios, cafeterias e lojas de artesanato e produtos do agronegócio. Entretanto, a tendência da culinária natural - com produtos nativos e orgânicos - que ganha destaque e status gastronômico na região das Montanhas Capixabas, ainda acontece de forma tímida quanto a popularização da sua prática e divulgação. Dentro de suas especificidades e características próprias, é mais comum alguns restaurantes e produtores artesanais de alimentos desenvolverem uma culinária natural. Porém as suas abrangências se limitam por fazeres e singularidades na produção de alimentos: seja de culinária natural, culinária orgânica e/ou baseada em produtos nativos, tradicionais, locais, ou mesmo uma gastronomia internacional. Nesse contexto podemos citar como exemplo; a Fazenda Domaine Île-de-France – Estação Agroecológica dos proprietários Isabelle Cicatelli e Joaquim Silva; o restaurante D’Bem das sócias Suely e Gabryela Faiçal, mãe e filha, o Sítio do Palmito, dos proprietário Maurício e Cássia Magnago. DA PRODUÇÃO NO CAMPO AO FAZER CULINÁRIO Mesmo que estejamos falando de uma culinária natural e orgânica, nesse quesito é importante que se esclareça, conforme aponta Isabelle Cicatelli “culinária natural é feita com produtos de origem da natureza, tudo simplesmente. E Culinária Orgânica é feita com alimentos de origem da natureza, mas produzido com parâmetros desde o plantio, tratos culturais, criação, colheita e transformação – sem qualquer agroquímico, antibióticos, tipo ou espécie de aditivos e corantes artificiais, privilegiando o sabor original dos alimentos e não simplesmente o sal e o açúcar, como a maioria dos produtos e alimentos convencionais, ditos “naturais”. E ainda Isabelle pondera que “O orgânico sempre é natural – mas o natural necessariamente não é orgânico. Além disso, o alimento orgânico deve ter na embalagem a marca federal de orgânico, com o produtor tendo a posse do certificado de conformidade orgânica expedido pelo Ministério da Agricultura”. Vale destacar que Isabelle Cicatelli, originária de Argenteuil France (região île-de-Fran-
ce), e com 50 anos de Brasil, de advogada à radialista, escolheu se dedicar exclusivamente à gastronomia juntamente com seu esposo Joaquim Silva nas Montanhas Capixabas. Ela produz há 20 anos produtos orgânicos e uma ecogastronomia. É sabido que esse empreendimento surgiu a partir de “um projeto escrito ainda na França”, quando ela e Joaquim viviam um período sabático. De volta, colocaram em prática esse objetivo. Para isso, adquirem uma propriedade nas montanhas, em Pedra Azul com 110 hectares – que atendesse aos seus pressupostos preliminares: que pudessem desenvolver corretamente produtos orgânicos e sustentáveis. Com características da ruralidade francesa e um ambiente com muita mata, água em abundância, fim de estrada, distância de vizinhos, com barreiras para os ventos não trazerem agrotóxicos, águas puras e autóctones. Hoje o seu empreendimento, “Domaine île-de-France – Estação Agroecológica”, compõem de uma produção orgânica certificada. É mais uma pousada e restaurante oferecendo, nesse contexto, o agro e ecoturismo de ótima experiência. A culinária franco-brasileira orgânica nesse local é desenvolvida há 20 anos, com a utilização de 100% de ingredientes orgânicos certificados produzidos em sua fazenda e também adquiridos de parceiros em todo o Brasil. Seus produtos abastecem suas lojinhas de orgânicos ENTREPÔ Pedra Azul-Enseada. Isabelle ainda acrescenta que seus pratos além de serem concebidos a partir de uma culinária natural e orgânica, também abrangem o que se cunhou chamar de “cozinha afetiva”, originada de uma fusão das culinárias tradicionais rurais da França, Itália e Brasil – países onde meus familiares nasceram, viveram e desenvolveram seus mundos mesclando sabores, e modos de fazer”. CULINÁRIA DE BEM COM A NATUREZA Independentemente da linha de alimentação: natural, vegetariana, integral ou não, todos queremos comer bem e ficar saudáveis. Vale reafirmar que a aposta em orgânicos e alimentação natural é tendência gastronômica na atualidade, mas a criatividade o charme e a forma de representar a
sua relação com a natureza também faz a diferença . Nessa filosofia e dinâmica, se faz presente o restaurante D’Bem, localizado em Pedra Azul, em Domingos Martins. Ele se dedica à culinária natural e com produtos orgânicos. Conforme Gabryela Faiçal nem sempre é possível oferecer os produtos 100% (cem por cento) orgânicos. “Inclusive, a dificuldade de encontrar orgânicos aqui em Pedra Azul é absurda, prezamos por isso, mas nem sempre conseguimos”. Como exemplo, ela nos fala, “se você comer morango no d’Bem será um morango orgânico certificado. Se não tiver morango orgânico no momento , não serviremos morango”. Esse restaurante apresenta um cardápio variado, inspirado na região das montanhas, especificamente, em Pedra azul. “Os pratos do d’Bem primam por leveza , qualidade, sazonalidade , respeito à natureza e um carinho todo especial pelo alimento”, afirma Gabryela. O d’Bem preza por uma experiência de uma culinária sofisticada e charmosa, onde a estética e a gastronômica dialogam, possíveis de serem apreciadas na apresentação de seus pratos. Utilizando-se amplamente de produtos concebidos na categoria dos orgânicos e os mais naturais possíveis, ou seja, privilegiando a produção agrícola e produtos da região das montanhas capixabas! Nessa perspectiva, os gostos, as escolha, as repulsas, os sentidos e significados alimentares são expressos numa cozinha onde o espaço de criação é confluência da cultura,
da sociedade e da natureza de forma mais intensa e consciente. Necessária para a desconstrução de hábitos alimentares – não muito saudáveis – da vida moderna. Importante destacar que no Brasil há uma imensa diversidade cultural e regional, mas também há variedades de ingredientes e plantas nativas que podem ser utilizadas na culinária. Fazem parte mais de 200 alimentos e ingredientes nativos que podemos usufruir e recolher em um dos seis biomas brasileiros - Amazônia, Cerrado, Caatinga, Pampa, Pantanal e Mata Atlântica. Através de chefs de cozinha, pesquisadores e pequenos produtores, esses ingredientes e alimentos começam a fazer parte da culinária dos principais restaurantes nacionais. No Espírito Santo, temos o privilégio de abrigar uma parte do bioma da mata atlântica com espécies de grande importância, tanto para os animais quanto para as pessoas, sobretudo as comestíveis divulgadas e disseminadas por nossos ancestrais. Como exemplo, destacamos as frutas como pitanga, grumixama jaracatiá, as folhagens como a taioba, o palmito e frutos da juçara. Entretanto, um maior aproveitamento das matérias-primas de espécies nativas esbarra em alguns desafios que precisam ser superados por todos os envolvidos na cadeia produtiva, como é o caso da exploração e utilização do palmito da palmeira Juçara - patrimônio natural da Mata Atlântica no Espírito Santo. Vale lembrar que essa espécie é símbolo de nosso estado tanto por sua importância ecológica quanto pelo seu símbolo cultural e interesse econômico. É necessário desenvolver uma exploração
Palmito e fruto da palmeira Juçara
Foto de Sara Passabom Amorim
consciente dessa palmeira, e também de outras espécies. Uma forma sustentável, nos parâmetros da agroecologia e respeitando a natureza.
ela desenvolve novas receitas e aperfeiçoa continuamente sabores confiáveis e de bem com a natureza.
Nesse quesito, Maurício Magnago nos relata que a palmeira Juçara, palmito-juçara ou palpiteiro sempre teve fortes laços culturais com os produtores rurais na região serrana e também no litoral do estado. Tudo se aproveita da juçara desde o caule, o palmito até os frutos. Uma de nossas delícias tradicionais, a torta capixaba, tem o palmito juçara como ingrediente essencial. Mas com a exploração predatória do juçara, que foi uma prática normatizada no estado, houve um grande impacto negativo no meio ambiente e no bioma da Mata Atlântica em nosso estado.
TURISMO LOCAL DE EXPERIÊNCIA Isabelle e Maurício ponderam que suas iniciativas estão intrinsecamente direcionadas ao turismo local de experiência, o qual eles vêm desenvolvendo e divulgando, sobretudo a experiência da culinária com o respeito aos produtos e produtores locais e com a natureza e meio ambiente.
Atualmente, Maurício, um dos representantes nessa categoria, nos fala que muitas técnicas de manejo e exploração dessa planta são fiscalizados por leis ambientais rígidas, e que tanto ele como outros agricultores da região serrana desenvolvem o manejo de palmitos de forma ecologicamente, sustentável e correta. Além da espécie da juçara, outras espécies como palmeira real, coqueiro, imperial,o patioba, a pupunha são produzidas em seu sítio. No sítio dos Palmitos, em Domingos Martins, ele vem colaborando com a divulgação da culinária com base no palmito e respeitando a natureza. Juntamente com sua esposa Cássia, que é a chefe, desenvolvem uma culinária com possibilidades gastronômicas vindas das diferentes espécies de palmeiras que eles cultivam junto com outros produtos da região. O respeito com o produtor local, a produção do palmito, o manejo e seu processamento são premissas em sua culinária. Mauricio enfatiza que nem todas as sementes dessas espécies são produzidas na nossa região, então ele e Cássia utilizam, muitas vezes, o que vem de fora , no caso o pupunha. A gastronomia diferente oferecida na cozinha da Cássia apresenta o palmito, sobretudo a pupunha - pela maior facilidade do seu acesso - de forma criativa e sustentável. Ela desenvolve deliciosas e inusitadas receitas e demonstra que é possível ser criativa e preparar de pratos principais até sobremesas. Cássia faz de sua cozinha, um verdadeiro laboratório de criação, onde
Outro objetivo é divulgar essa forma e filosofia de vida, como afirma Isabelle “Trabalhamos no fortalecimento do turismo local, ainda muito incipiente e fundado nos grandes hotéis. Meu esposo Joaquim Silva assume a Associação turística e outras entidades, é militante da causa orgânica nacional, tendo sido também o primeiro presidente da Associação Brasileira de Orgânicos (BrasilBio)”. Diante dessas experiências entende-se que a prática da culinária natural que vem sendo desenvolvida, divulgada e apreciada nas montanhas capixabas nos propõe um cardápio com produtos de qualidade, com respeito à vida, à natureza e à biodiversidade. Uma culinária natural, rica em alimentos pouco processados, de preferência sem aditivos químicos, produtos orgânicos e com ingredientes de preferência locais. Desenvolve uma alimentação em que há uma maior preocupação não só com o manejo, o preparo e descarte dos alimentos, mas com a qualidade e a origem do que oferecem para uma degustação saborosa. Maior preocupação com o que comemos, e com a sustentabilidade.
Sara Passabon Amorim é Pesquisadora e diretora teatral: dedica-se a produção, a formação e a assessorias artísticas e culturais. Mestrado e Doutorado em Artes Cênicas (PPGAC/UNIRIO) e na UEM - Universidade Eduardo Mondlane Moçambique. Pós-doutorado( em andamento) no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Territorialidades (PÓSCOM/UFES).
TURISMO E EMPREENDEDORISMO SUSTENTÁVEL NA REGIÃO DAS MONTANHAS CAPIXABA CONHEÇAS AÇÕES DE AGROECOLOGIA E TURISMO DE NATUREZA DESENVOLVIDO NO ESPÍRITO SANTO Por Natália Messina Ao pensar a sustentabilidade imaginamos imediatamente a sua dimensão ambiental. Isto ocorre por diversas causas, inclusive, pelas suas primeiras discussões sobre ações de crescimento econômico atrelado ao cuidado com a natureza, mas também, porque de fato, nós somos organismos constituintes do meio ambiente. Mais do que contidos; nós somos a Natureza! O Brasil é um dos 193 signatários da agenda 2030 da ONU (Organizações das Nações Unidas), que deve nortear os planos plurianuais brasileiros, nas três esferas governamentais, para incitar ações genuinamente locais. Tal concepção de escala macro, meso e micro (global, regional e local) é fundamental para o desenvolvimento territorial, em uma visão sistêmica, que considera a vida, em primeiro lugar. Os princípios da sustentabilidade são ou, ao menos, deveriam ser condicionantes fundamentais ao destino turístico, empreendimento ou produto. Foi baseado nestes princípios que na década de 1990 foi constituído o Centro de Desenvolvimento SusFoto de CDS Guaçu-Virá
tentável (CDS) Guaçu Virá, em Venda Nova do Imigrante, através do sonho de Júlio Duenas, somado à força coletiva da Associação de Amigos da Terra. Em uma área de 15 alqueires, com 80% da Mata Atlântica recuperada, o CDS Guaçu Virá atua com princípios sustentáveis que envolvem: cultura, sociedade, economia e meio ambiente. Equipamentos turísticos e atividades pedagógicas reforçam o pacote de atrativo do empreendimento, que conta com inovações e tecnologias alternativas para gerar maior autonomia à propriedade, como por exemplo: a energia fotovoltaica que supre o consumo do Centro de Convivência e; a agricultura natural praticada para o autoabastecimento e segurança alimentar do CDS. Tendo recebido diversos prêmios e o título de Polo de Educação Ambiental, concedido pelo IEMA/ES, o CDS Guaçu Virá funciona como um laboratório de práticas sustentáveis, perseverando os valores locais e promovendo ações de qualificação do indivíduo para a atuação comunitária. Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) Guaçu Virá
Quando o indivíduo presta um serviço colaborativo à comunidade e à natureza, o mesmo tem a chance de desenvolver suas aptidões e coevoluir, tanto quanto o seu entorno. Esta compreensão dos três níveis que se qualificam simultaneamente (humano, social e planetário) é uma das bases que fundamentam o paradigma Regenerativo. Tratamos aqui de uma perspectiva sistêmica da vida, que supera a visão mecanicista, reducionista, separatista, que acaba por distanciar o homem da natureza. As abordagens regenerativas aproveitam o movimento científico da Sustentabilidade e propõem-se a incluí-la e transcendê-la, discutindo e aprofundando questionamentos importantes para avançarmos integralmente. Com esta cosmovisão que regenera e sustenta a vida, “sem deixar ninguém para trás” (seguindo o lema da Agenda 2030), buscamos o olhar sensível da Agroecologia, uma ciência em plena evolução e um movimento social, que resgata práticas coletivas e ancestrais para inovar o presente. Muitos são os casos em que unidades familiares agrícolas passam a se tornar referência produtiva sustentável, ao adotarem o cultivo agroecológico. Esta é uma das missões atuais do campesinato do MPA Movimento dos Pequenos Agricultores, de abrangência nacional e com forte representatividade no Espírito Santo. Douglas Alvaristo, uma das lideranças estaduais do MPA, costuma mencionar que a força empreendedora, incentivada por programas institucionais, alavancou o movimento, trazendo maior sustentabilidade econômica aos negócios familiares, especialmente com o desenvolvimento da Cooperativa Mista de de Produção e Comercialização Camponesa do Espírito Santo. Das 500 famílias capixabas adesas ao MPA, 127 estão aptas a comercializarem seus produtos com declaração de orgânico, emitida pelo Ministério da Agricultura e do Abastecimento e cerca de 80 estão na transição agroecológica, alinhando-se às vivências da Rede Bem Viver/ Movimento dos Pequenos Agricultores (ES).
Cláudio e, principalmente, em Domingos Martins, nas comunidades de São Rafael, Aracê, Tijuco Preto, Perobas e Rio Ponte. Esta última é onde habita a família Wruck, que pratica o Bem Viver como “um jeito de ser, viver e produzir”. AGROECOLOGIA COMO BASE FAMILIAR A agroecologia está na base da família Wruck, desde a primeira geração alemã-pomerana, que migrou para o Brasil e sitiou estas terras. O jovem Joelson Orlando Wruck conta que seus descendentes já praticavam a agricultura de base ecológica, com a cafeicultura, milho, feijão, hortaliças e outros cultivares. A partir do pacote da chamada “revolução verde”, que mecanizou o campo e induziu ao uso intensivo de insumos externos mercantilizados, a família Wruck aderiu ao processo, tão difundido, que se tornou convencional. Joelson conta que todos sentiram o mal estar deste tipo de produção, ao ponto de sua mãe, Josélia passar por um processo de intoxicação que quase a levou ao óbito, no ano de 2005. Foi quando decidiram abandonar os agrotóxicos, retomando práticas ancestrais da família para o cultivo natural, mas, ainda, com o uso da adubação química, esta, que, por sua vez, foi utilizada até os anos de 2015/2016. Neste período, além da família Wruck passar a utilizar mais significativamente as técnicas agroecológicas, ela, ainda, veio a aderir ao MPA, o que fortaleceu não apenas as trocas de saberes camponeses, como também o escoamento da produção, com novas frentes de mercado. Atualmente, os Wruck’s desfrutam das benesses do sisteFamília Wruck com o café especial
Na Região das Montanhas Capixabas, destacam-se as famílias produtoras de orgânicos e agroecológicos, situadas em Afonso Foto do acervo Família Wruck
ma agroecológico, integrando a Rede Bem Viver (MPA/ES). A unidade familiar agrícola é referência para várias escolas do entorno, vindo a cumprir também uma função pedagógica, na medida em que recebe visitas de turmas escolares, estagiários e consumidores/clientes que desejam conhecer a produção. AGROFLORESTAS Em contrapartida à larga presença de cafezais e outras monoculturas na região, a família Wruck faz uso de diversas técnicas agroecológicas, dentre as quais, o Sistema Agroflorestal (SAF), que valoriza a diversificação biocultural. A agrofloresta é uma técnica que vem sendo amplamente difundida pela Mata Atlântica e em outros biomas brasileiros, como alternativa sustentável, regenerativa e resiliente a eventuais crises. É fundamental que o eixo sociocultural seja tão bem investido, quanto o econômico e o ambiental. Neste sentido, além do caso da família Wruck, do MPA, trazemos o exemplo da Agrofloresta Apeninos, que vem se constituindo na comunidade de nome homônimo, no município de Castelo. Camila Siqueira conta que ela e seu companheiro, Danilo, iniciaram há pouco o cultivo agroflorestal em uma propriedade de 1 hectare, cujo solo estava degradado, em função de uma antiga pastagem ociosa um cenário reproduzido em vários terrenos vizinhos. Para a implementação do SAF, utilizaram abordagens educativas, como curso e mutirão (uma prática milenar que vem sendo resgatada por movimentos sociais). Com o trabalho coletivo, em dois dias, foram introduzidas mais de vinte espécies, Fotos de João Pedro Zanardo
entre frutíferas, leguminosas, tuberosas, arbóreas nativas, exóticas e outras de variados estratos, como: mulungu, quaresmeira, ingá (as três nativas da Mata Atlântica), mandioca, café, graviola, eucalipto, banana prata, milho, etc. Dessa forma, a Agrofloresta Apeninos, além de restaurar o ambiente, vem buscando produzir ativos, com inclusão social. É muito comum ouvir que a melhor maneira de recuperar uma área é deixando-a isolada da sociedade, sem intervenção humana. No entanto, os agroflorestores comprovam que esta é mais uma prática cultural, que regenera e sustenta a vida humana no planeta. Florestas alimentícias, medicinais, ornamentais, paisagísticas e de outras ordens produtivas devem ser incentivadas e tomadas como referência biomimética para modelos de negócios, acelerando a virada cultural emergente. As características salutogênicas e sistêmicas de organizações inteligentes, como estas aqui levantados, devem ser levadas em conta na hora de empreender. Vivemos um momento delicado em que a pandemia do coronavírus anuncia outras tensões porvir e, ao mesmo tempo, acelera cenários futuros físico-digitais, nos quais o humano é inteiramente conectado à natureza, como ser regenerante e regenerador. É preciso se ater às iniciativas locais e regionais para que tenhamos efetividade e um bom desempenho global em 2030, como prevê a ONU. TURISMO DE AVENTURA Embora a orientação para ficar em casa ainda esteja em vigência, o setor do turismo vem se preparando para a retomada dos fluxos, como menciona o empreendedor Oswaldo Baldin: “Estamos readaptando os roteiros para este novo cenário e pretendemos [atender a todas as] orientações [oficiais]”. Baldin é fundador, diretor, guia e instrutor da Planeta Vertical, pioneira em aventuras no Espírito Santo, inovadora na cultura da escalada e sempre envolvida com a SETUR nos processos de qualificação, certificação, etc. O fundador da empresa, junto ao seu ‘bando’, foi o responsável por abrir mais de 150 vias de escalada no Espírito Santo, em busca dos picos rochosos mais aventurosos.
Pedra dos Cinco Pontões, município de Laranja da Terra - ES
A vista área das Montanhas Capixabas, nos conduz ao cume de 1250 metros do Pontão Grande, um dos 5 que compõem a afloração rochosa mais famosa de Laranja da Terra. Na mesma região que desencadeia outras relevos sinuosos, é inevitável não repousar o olhar sobre a Pedra do Lagarto, com seus 350m de altitude e beleza exuberante. Ambos os monumentos são desbravados com escalaminhadas e rapel, que exigem esforços físicos, mas que a Planeta torna tudo mais simples. Difícil mesmo é escolher para qual roteiro seguir! Como cita Baldin em livro de autoria própria,“(...) mais difícil do que conquistar uma montanha no Espírito Santo, é escolher qual montanha conquistar.” (BALDIN, 2020). O guerreiro da escalada conclui a entrevista, demonstrando a gratificação por representar uma ponte para que mais pessoas se aventurem e conheçam os cumes capixabas. Com o exemplo do autodesenvolvimento que conduz ao sucesso não apenas de si próprio, mas simultaneamente à coletividade e ao contexto biocultural, esperançamos, então, suscitar projetos sustentáveis e colaborativos, que criem as condições ideais para que todos os indivíduos e ecossistemas possam co-evoluir, em escala planetária!
Fotos de Sandro Souza / Arquivo Planeta Vertical
Estratégias políticas para o Turismo No Espírito Santo, a SETUR coordena o programa, mediante 10 Instâncias de Governança, responsáveis pelas regiões turísticas capixabas, sendo que “Associação Montanhas Capixabas Turismo & Eventos” é a certificada para auxiliar na administração e operacionalização de iniciativas locais. Integram as Montanhas Capixabas os seguintes municípios: Laranja da Terra, Brejetuba, Afonso Cláudio, Conceição do Castelo, Castelo, Venda Nova do Imigrante, Vargem Alta, Domingos Martins, Marechal Floriano.
Nathália Messina: Canela-verde, Turismóloga (UVV/ES), mestra em Urbanismo (UFPE) e especialista em Agroecologia (SERTA/PE). Apaixonada pelos processos criativos de base comunitária, tem como propósito catalisar a coevolução local, com abordagens ecológicas para a regeneração em escala.
“Segundo o budismo, todos trazemos em nós uma fonte inesgotável de compaixão e sabedoria. Tudo que precisamos fazer é nos conectar com nossa natureza essencial que está encoberta por emoções negativas e percepções errôneas. Existem inúmeras formas de restabelecermos esta conexão. Dentre elas estão a meditação, a oração, a recitação de mantras com conexão com a natureza. A cultura do budismo traz seus valores universais na não-violência e a clareza interior”
Fotos de Léo Merçon
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