ISSN 2238-1023
AGROENERGIA
em REVISTA
Esta é uma publicação da Embrapa Agroenergia
Ano III, nº 6, julho de 2013
Destoxificação e aproveitamento da torta de pinhão-manso e de mamona
EXPEDIENTE Esta é a edição nº 6, julho de 2013, da Agroenergia em Revista, publicação de responsabilidade da Núcleo de Comunicação Organizacional da Embrapa Agroenergia Chefe-Geral Manoel Teixeira Souza Júnior Chefe-Adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento Guy de Capdeville Chefe-Adjunto de Transferência de Tecnologia José Manuel Cabral de Sousa Dias Chefe-Adjunta de Administração Maria do Carmo de Morais Matias Jornalista Responsável Daniela Garcia Collares (MTb/114/01 RR) Revisão José Manuel Cabral de Sousa Dias Capa e projeto gráfico Maria Goreti Braga dos Santos Diagramação Goreti Braga e Vitor Dias (estagiário) Fotos da capa Arquivo Embrapa ISSN 2238-1023 Tiragem: 1.000 exemplares Impressão e acabamento Embrapa Informação Tecnológica Esta edição da Agroenergia em Revista foi impressa com recursos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução das matérias desde que citada a fonte. Embrapa Agroenergia Parque Estação Biológica - PqEB s/n°, Av. W3 Norte (final) Edifício Embrapa Agroenergia Caixa Postal: 40.315 70770-901 - Brasília (DF) Tel.: 55 (61) 3448 1581 www.embrapa.br/cnpae sac.cnpae@embrapa.br http://twitter.com/cnpae
Sumário
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Editorial
Panorama 6
A consolidação do estado da arte para as culturas do pinhão-manso e da mamona
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O potencial do pinhão-manso e da mamona na produção de biodiesel
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Destoxificação de tortas foi tema de Simpósio, em Brasília
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Aproveitar as tortas adicional de renda para os agricultores familiares
Pesquisa 16
Tortas: Fracionar as culturas para agregar valor
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Ensaios Biológicos: Tratamento microbiano da torta de pinhão-manso
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Ensaios Biológicos: UFV deposita patente de destoxificação fúngica da torta de pinhão-manso
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Métodos para detecção de toxinas e alérgenos de mamona e de pinhão-manso
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Métodos analíticos para avaliar a toxidez do pinhão-manso
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Pinhão-manso: Uso como fertilizante e melhoramento genético para aproveitamento da torta
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Vídeo mostra trabalhos com pinhão-manso atóxico
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Torta de pinhão-manso: Testes comprovam eficiência nutricional
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Ensaios Químicos e Físicos: Ensaios utilizam ratos para avaliar efeitos tóxicos da torta de pinhão-manso
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A Mamona
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Conheça as tecnologias da Embrapa Algodão para a cultura da mamona
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Torta de mamona destoxificada: Embrapa desenvolve tecnologia para controle de qualidade
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Torta de mamona: Alimento proteico e fertilizante natural
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Método biotecnológico reduz em 70% o teor de ricina em mamona
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Destoxificação da mamona é alternativa alimentar para ruminantes
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Programa de rádio fala do uso do farelo de mamona para pequenos ruminantes
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Extrusão termoplástica para destoxificação de torta de mamona
Mercado 56
Potencial da torta de mamona no mercado
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Empresa italiana investe em processamento industrial integrado de pinhão-manso
Editorial
4 ď ľ Agroenergia em Revista
O
aproveitamento integral das matérias-primas e da energia que elas contêm é uma diretriz fundamental da Embrapa Agroenergia. Diversos projetos têm esse objetivo e o uso de coprodutos e resíduos tem recebido atenção, com um olhar diferenciado para buscar aplicações nas quais os mesmos possam ser utilizados como matérias-primas para diferentes processos, aumentando o leque de possibilidades de utilização das culturas. As cadeias produtivas da mamona e do pinhão-manso, ainda que em estágios diferentes de desenvolvimento, para que se tornem viáveis, apresentam, em comum, a necessidade do aproveitamento econômico das tortas e farelos resultantes da extração de óleo. A utilização mais simples e frequente é usar tais coprodutos como fertilizantes. A presença de substâncias tóxicas e antinutricionais impede o uso das mesmas para arraçoamento de animais. Essa aplicação tem maior valor agregado e como vantagem adicional compatibiliza a produção de óleos a serem usados em diversas indústrias, inclusive na de biocombustíveis, com a produção de alimentos. Para efetuar a atualização das informações sobre o estágio do desenvolvimento das tecnologias relacionadas ao assunto, a Embrapa Agroenergia e a Embrapa Algodão, com apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, promoveram o Simpósio de Destoxificação e Aproveitamento das Tortas de Pinhão-manso e Mamona (SIDAT), em julho de 2012. O evento mostrou que diversas instituições brasileiras estão trabalhando com afinco nos assuntos abordados no Simpósio e que várias soluções já estão disponíveis
em nível de laboratório ou de escala-piloto. Entretanto, ainda há poucas iniciativas no sentido de efetivar a comercialização em escala maior, nem para a mamona, da qual já existe produção significativa de torta e farelo. A presente edição da Agroenergia em Revista retrata o atual estágio do desenvolvimento dos métodos e processos para o aproveitamento das tortas mencionadas. Destacam-se os vários estudos que estão sendo realizados para a eliminação das substâncias tóxicas e os métodos de detecção da presença dessas substâncias. A inocuidade das tortas é ponto-chave na possibilidade de utilização como rações e métodos físico, químicos e biológicos deverão ser utilizados para comprová-la. Durante a preparação desta edição da revista, fomos surpreendidos com a notícia do prematuro falecimento do Dr. Napoleão Beltrão, pesquisador da Embrapa Algodão e que ocupava a Chefia-geral da instituição. O Dr. Napoleão era um apaixonado defensor das culturas com que aquela Unidade trabalha: amendoim, algodão, gergelim, sisal e mamona. A última foi objeto da apresentação que fez no SIDAT em julho do ano passado e também é o tema do artigo de que é autor neste número da revista. Ao Dr. Napoleão Beltrão, o respeito e a saudade da equipe da Embrapa Agroenergia, com a certeza de que ele deixa uma lacuna importante na pesquisa agropecuária brasileira.
José Manuel Cabral de Sousa Dias Chefe-geral substituto.
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ARTIGO
Panorama
A CONSOLIDAÇÃO DO ESTADO DA ARTE PARA AS CULTURAS DO PINHÃO-MANSO E DA MAMONA Por: Clenilson Martins Rodrigues, pesquisador da Embrapa Agroenergia*
A diversificação da matriz energética para a produção de biodiesel, outros insumos energéticos e para a química fina é hoje uma realidade e muitos estudos buscam encontrar fontes renováveis alternativas, não alimentares e que não demandam expansão da fronteira agrícola. Dentro deste contexto, a mamona (Ricinus communis) e o pinhão-manso (Jatropha curcas) apresentam importantes características para esta abordagem. O óleo destas culturas exibe excelente qualidade química e por sua vez, o resíduo sólido, normalmente denominado de torta, possui significativos teores de nitrogênio, fósforo e potássio (NPK); potencial termoquímico com considerável poder calorífico; além de apresentar alto valor proteico. No entanto, são ainda culturas que carecem de pacotes tecnológicos que possam viabilizar economicamente as cadeias de produção, bem como o aproveitamento total de seus resíduos e coprodutos. Nos programas de melhoramento da Embrapa estão sendo efetuados estudos que visam estabelecer a domesticação destas culturas e oferecer, em médio prazo, cultivares que atendam a todos
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Estrutura 3D da ricina Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/e4/Ricin_structure.png
Foto: Embrapa Algodão
Fruto de mamona os requisitos de uma cultura energética comercial. No caso da mamona, este processo está adiantado e hoje existem algumas cultivares com boas características de produtividade. O pinhão-manso caminha neste mesmo sentido e se o objetivo preconizado é o aproveitamento do conteúdo proteico das tortas, além da evolução dos aspectos agronômicos, é necessário buscar, para ambas as culturas, a eliminação de determinados constituintes químicos que são apontados como fatores antinutricionais, alergênicos ou tóxicos. Nessa temática, estudos que envolvem o silenciamento de genes responsáveis pela biossíntese da ricina na mamona e
a incorporação de variedades de pinhão-manso sem a ocorrência de ésteres de forbol, estão sendo conduzidos para eliminar parte desses gargalos. A aplicação termoquímica dos resíduos dessas biomassas, em um primeiro momento, apresenta-se como uma alternativa atraente para potencializar o uso econômico das tortas de pinhão-manso e mamona. O processo de adensamento de biomassa residual, denominado de briquetagem, viabiliza a produção de material que pode ser usado como biocombustível para obtenção de energia térmica, processo que pode garantir a completa decomposição dos agentes tóxicos presentes nos
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ARTIGO
Panorama
Núcleo forbol Ilustração: Clenilson Martins Rodrigues
materiais de partida. Por outro lado, se o objetivo é buscar a máxima agregação de valor às tortas, processos anteriores poderão ser aplicados e o fracionamento deste tipo de biomassa, seguindo os conceitos preconizados nas biorrefinarias, pode fornecer outros produtos com alto valor de mercado. Em suma, seria possível obter moléculas-base, normalmente denominadas de blocos construtores, que são os principais precursores usados na indústria da química fina, ou ainda, substâncias de alta especificidade e com potencial aplicação para a indústria farmacêutica e de cosméticos, dentre outras.
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Medidas alternativas de curto prazo, as quais envolvem processos físico-químicos e biológicos de destoxificação, separados ou em conjunto, tentam viabilizar a utilização das tortas para nutrição animal. Alguns avanços promissores são reportados na literatura especializada, mas ainda é necessário alcançar processos altamente eficientes, realizar estudos de viabilidade técnica e econômica, além de garantir a utilização segura de potenciais produtos comerciais dessa natureza. Em consonância com todas essas variáveis, surge a necessidade de realizar o monitoramento específico e inequívoco
Foto: Bruno Laviola
de determinados marcadores químicos, tarefa que é bastante afetada por causa da grande deficiência dos métodos analíticos convencionais e, atualmente, empregados na avaliação dos agentes tóxicos dos produtos e coprodutos dessas culturas. Avanços nessa e em outras áreas são ainda necessários e a organização de arranjos interdisciplinares, bem como a realização de ações inovadoras, serão os alicerces fundamentais e responsáveis por garantir a entrega de produtos, baseados nas cadeias produtivas do pinhão-manso e da mamona, consolidados e seguros para a sociedade brasileira.
Foto: Daniela Collares
Fruto de pinhão-manso
*Graduado em Química e mestre em Química Analítica pela Universidade Federal de Goiás. Doutor em Química de Produtos Naturais pela Universidade Estadual Paulista. É pesquisador da Embrapa Agroenergia
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Foto: Arquivo Pessoal
ENTREVISTA
Panorama
O POTENCIAL DO PINHÃO-MANSO E DA MAMONA NA PRODUÇÃO DE BIODIESEL
O Coordenador do Departamento de Cana-de-açúcar e Agroenergia do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, Tiago Quintela Giuliani, concedeu entrevista a Agroenergia em Revista para falar das estratégias de diversificação de matérias-primas no contexto do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel – PNPB e quais as ações do MAPA para viabilizar e fortalecer essas culturas.
Agroenergia em Revista - Qual a política do governo para a inserção da mamona e do pinhão-manso no PNPB? Qual a perspectiva? Tiago Giuliani - Por se tratar de duas culturas em estágios de desenvolvimento diferentes, vou separá-las para facilitar o entendimento e argumentação. Desde a criação do programa, a cultura da mamona foi escolhida por possuir características importantes para o desenvolvimento do PNPB. As principais justificativas estavam ligadas à existência de um pacote tecnológico agrícola para a cultura, ao fato de a região Nordeste ser tradicionalmente produtora e, principalmente, por a produção estar vinculada aos agricultores familiares. Ao longo do desenvolvimento do programa, a mamona tem apresentado grandes
dificuldades para se consolidar como fonte de matéria-prima para a produção de biodiesel. Isto vem ocorrendo devido a alguns fatores como: a pequena escala e a dispersão da produção, a baixa produtividade em sementes e óleo, o baixo valor agregado dos subprodutos como a torta da extração do óleo e, nos últimos dois anos, a seca na região Nordeste. Esses fatores acarretam em um alto valor logístico de produção e de coleta e diminuem a rentabilidade da cultura quando comparada com outras como a soja, que possui uma indústria consolidada e alto valor de mercado de seus produtos e subprodutos. Diferentemente da mamona, o pinhão-manso não foi priorizado na criação do programa, mas surgiu como uma demanda do setor privado que acredita em sua produção
Foto: Bruno Laviola Foto: Daniela Collares
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como oleaginosa não alimentar alternativa à soja e de alta produtividade de óleo. Outra diferença é que o pinhão-manso ainda não possui pacote tecnológico agrícola comprovado que viabilize sua produção em grande escala. Por outro lado, o pinhão-manso possui, como a mamona, algumas características positivas que o credencia a fazer parte do PNPB, como o fato da produção ser mão-de-obra intensiva e passível de ser feita por agricultores familiares em diversas regiões do País. AR - Qual a importância da destoxificação das tortas para a inserção dos agricultores na cadeia do biodiesel? Tiago - Outra característica conjunta às duas culturas é o fato das tortas resultantes da extração do óleo serem tóxicas, o que diminui as possibilidades de aproveitamento em produtos como a ração animal e influenciam negativamente na viabilidade econômica dessas culturas. Para esse problema específico, a solução é desenvolver processos seguros de destoxificação das tortas, com baixo custo, e que possibilitem o uso das mesmas como ração animal. Isso propiciará maior agregação de valor a estes subprodutos. Pesquisas com estas finalidades já vêm sendo desenvolvidas. Para os demais gargalos produtivos das cadeias, a solução passa pela melhoria da produtividade agrícola, a busca de novas variedades, tecnologias produtivas, organização e capacitação dos produtores. Várias destas ações também já estão sendo desenvolvidas pelo Governo, entretanto, requerem tempo para que seus resultados apareçam.
Deste modo, o Governo tem trabalhado no sentido de viabilizar a produção de mamona, pinhão-manso e de outras oleaginosas, pois tem como meta a diversificação na oferta de óleos vegetais para o PNPB. Como resultado, espera-se que o desenvolvimento destas culturas e de suas cadeias produtivas levem a geração de emprego e renda aos produtores agrícolas, principalmente nas regiões mais necessitadas do país. AR -Quais serão os benefícios para os produtores na inserção dessas culturas? Tiago - Quanto aos ganhos dos produtores rurais com as culturas, além dos já mencionados, o PNPB criou um novo mercado para o consumo de óleos vegetais e o Selo Combustível Social trouxe maior estabilidade à produção e à comercialização das oleaginosas pelos produtores familiares, pois as empresas produtoras de biodiesel fornecem assistência técnica e comprarem a produção. AR - Qual o impacto do aumento da porcentagem de biodiesel no diesel? Tiago - Os impactos de um aumento na mistura de biodiesel no diesel foram discutidos internamente pelo Governo Federal junto à Comissão Executiva Interministerial do Biodiesel durante boa parte do ano passado. Dessa discussão resultou uma proposta de Marco Regulatório para o setor que foi encaminhado à Presidência da República para avaliação. Contudo, é inegável que o PNPB trouxe benefícios à população.
Foto: Arquivo Embrapa
Foto: Odilon Silva
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Panorama
DESTOXIFICAÇÃO DE TORTAS FOI TEMA DE SIMPÓSIO, EM BRASÍLIA Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia. Fotos: Vivian Chies
O tema central desta revista foi discutido em Brasília, de 3 a 4 de julho do ano passado, durante o Simpósio de Destoxificação e Aproveitamento de Tortas de Pinhão-manso e Mamona – SiDAT, promovido pela Embrapa Agroenergia e a Embrapa Algodão, com o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). O evento reuniu cerca de 100 pessoas e mostrou que a pesquisa avançou na busca de alternativas de uso dos coprodutos das duas oleaginosas. Tiago Giuliani, do MAPA, explica que, para o ministério, “foi estratégico o debate da comunidade
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científica a respeito dos principais gargalos que inviabilizam a utilização da torta de mamona e pinhão-manso na ração animal, o acompanhamento dos avanços científicos na destoxificação e a difusão das tecnologias aos pesquisadores, representantes dos setores públicos e privados, estudantes e produtores”. Na opinião do coordenador do Simpósio, o pesquisador da Embrapa Agroenergia, Clenilson Rodrigues, “para quem não acreditava em tortas, ficou muito claro que existe um espectro de possibilidades para pesquisar, tais como o aprofundamento das técnicas de
Harinder Makkar e Clenilson Rodrigues, durante o evento que reuniiu cerca de 100 pessoas
silenciamento dos componentes tóxicos por engenharia genética, o desenvolvimento de ensaios que garantam a qualidade e a segurança dos produtos gerados a partir dos coprodutos, o aproveitamento de substâncias de alto valor agregado e o avanço das aplicações termoquímicas para transformação da biomassa em energia renovável. Nós, da Embrapa, temos um grande trabalho a fazer e acredito que, com a parceria de outras instituições, vamos avançar em questões que ainda carecem de respostas científicas”. O chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroenergia, Guy de Capdeville, lançou um desafio para os participantes: apresentar, no próximo Simpósio, mais trabalhos voltadas à área de biorrefinarias. “Essas ações vão conferir valor agregado muito maior a essas oleaginosas”, disse. Nesse sentido, foi defendida, durante todo o evento, a busca de alternativas para o aproveitamento total da biomassa das culturas em questão, fortalecendo o conceito de biorrefinarias. Nesse tipo de indústria, diversas instalações utilizam a biomassa para dar origem, por meio de processos sustentáveis, a energia e vários produtos: biocombustíveis, rações, fertilizantes, produtos químicos. “Nós não
queremos perder um micrograma”, afirmou o diretor da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Harinder Makkar, sobre oportunidades para utilização do pinhão-manso. Ele acredita que os ésteres de forbol da oleaginosa possam ser empregados na fabricação de biopesticidas e aposta também no aproveitamento da lignina da casca, como combustível. A presença de Makkar e do pesquisador Samireddypalle Anandan, do Instituto Nacional de Nutrição Animal e Fisiologia da Índia (NIANP), foi destaque no Simpósio. Makkar desenvolveu o método analítico mais utilizado atualmente para determinação de ésteres de forbol – principal substância tóxica do pinhão-manso. Anandan, por sua vez, criou um processo industrial de referência para destoxificar a torta de mamona. O evento contou também com palestras de especialistas de diversas universidades, órgãos de governo e instituições de pesquisa brasileiros, além de unidades da Embrapa. As apresentações utilizadas por eles no Simpósio estão disponíveis para download no site da Embrapa Agroenergia: http://www. cnpae.embrapa.br/eventos/destoxificacao-eaproveitamento-pinhao-manso.
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Panorama
APROVEITAR AS TORTAS ADICIONAL DE RENDA PARA OS AGRICULTORES FAMILIARES Por: Daniela Collares, jornalista da Embrapa Agroenergia
De acordo com ele, em relação ao pinhão-manso, existem poucas experiências mapeadas de produção pela agricultura familiar. A sua produção ainda depende de respostas tecnológicas trabalhadas atualmente pela pesquisa, que são acompanhadas atentamente pelo MDA, reforça. “Nesse sentido, ressaltam-se as pesquisas com a cultura que a Embrapa Agroenergia vem conduzindo muito bem e de uma forma muito responsável”. No caso da mamona, ela representa uma importante e tradicional cultura para o agricultor familiar do Nordeste e Semiárido, por sua forte resistência ao clima do semiárido, sua característica de intensiva mão de obra, a possibilidade de consórcios com milho,
André Machado fala da importância das culturas para os agricultores familiares.
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Foto: ASCOM/MDA
“Apesar de diferentes graus de desenvolvimento tecnológico e consolidação das respectivas cadeias agroindustriais, a mamona e o pinhão-manso possuem muita sinergia com a produção familiar”, diz o coordenador geral de biocombustíveis do Ministério do Desenvolvimento Agrário MDA, André Grossi Machado. Neste sentido, o trabalho de destoxificação das tortas de mamona e pinhão-manso tem o potencial de criar um novo circuito comercial e uma nova dimensão econômica para esses coprodutos. Além dos potenciais já conhecidos na utilidade de adubos, a possibilidade de serem aproveitadas na ração animal traria um adicional na renda dos agricultores familiares e suas cooperativas produtoras dessas oleaginosas, e com desdobramentos e sinergias muito significativos para outras cadeias importantes para a agricultura familiar: produção de leite e carnes, aposta o coordenador. Isso se potencializa pelo fato de serem oleaginosas com potencial de produção no semiárido, local com reconhecida necessidade de opções viáveis e acessíveis para a alimentação animal.
mamona, dendê, girassol, canola, gergelim e amendoim. As compras de outros fornecedores são em geral soja (em grão e óleo) e algodão (caroço ou óleo). O programa ajudou a capacitar e a capitalizar milhares de famílias no meio rural brasileiro, levar uma cultura de profissionalização e gestão para as famílias, a revitalizar assentamentos da reforma agrária e comunidades rurais é alavancar o acesso a outras políticas públicas por parte das famílias e suas cooperativas. Para finalizar, André Machado reforça que, nesse sentido, o incentivo à criação de soluções tecnológicas para a produção agrícola e para a produção industrial de óleos e coprodutos são muito importantes e, sempre que possível, serão incentivadas pelo MDA.
Foto:Ubirajara Machado/MDA
feijão e outras culturas alimentares e a liquidez de mercado. Estima-se que entre 60 mil e 70 mil famílias cultivam a mamona no Nordeste anualmente, apoiadas pelos mercados do Selo Combustível Social e da ricinoquímica. O Selo Combustível Social é um criativo, importante e poderoso instrumento de inclusão produtiva da agricultura familiar na produção de biodiesel, reconhecido no Brasil e internacionalmente. Ajuda a compor um grupo de políticas públicas do MDA para a agricultura familiar brasileira, com importantes efeitos no acesso ao mercado, no acesso a tecnologias de produção e na geração de renda. As compras da agricultura familiar, de acordo com o MDA, envolvem principalmente as oleaginosas: soja (grão e óleo),
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Pesquisa
TORTAS
FRACIONAR AS CULTURAS PARA AGREGAR VALOR Por: Daniela Collares, jornalista da Embrapa Agroenergia
O cultivo de plantas oleaginosas tem sido preconizado nos últimos anos, em virtude da necessidade de mudança na matriz energética, principalmente no que concerne à substituição dos combustíveis fósseis e seus derivados por produtos de fontes renováveis. Neste rol de matérias-primas estão incluídas as culturas da mamona e do pinhão-manso, cujas sementes possuem óleo com potencial para diversos usos na indústria e também para produção de biodiesel. No entanto, devido às sementes dessas oleaginosas conterem compostos tóxicos e alergênicos, inovações tecnológicas para o aproveitamento integral das sementes, com agregação de valor aos produtos resultantes do processo de extração dos óleos, são de fundamental importância para a melhor estruturação destas cadeias produtivas, destaca a pesquisadora do Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL), Roseli Ferrari. A pesquisadora propõe algumas possibilidades de obtenção de derivados com maior valor agregado por meio do fracionamento dessas matérias-primas. O processo de fracionamento abrange o aproveitamento integral de todas as partes
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que compõem as sementes. Consiste basicamente em processamentos e isolamento de frações com diferentes características para destinações apropriadas, conforme descreve Roseli Ferrari. A primeira etapa do processo de fracionamento visa a melhorar as características dos produtos obtidos. Essa etapa, salienta a pesquisadora, consiste no descascamento das sementes antes da extração do óleo, com a remoção e separação de cascas e amêndoas. “Após a separação das cascas, uma possibilidade para o aproveitamento juntamente com as cápsulas que envolvem as sementes dessas culturas seria destiná-las para a geração de energia pelo processo de pirólise, na conversão para carvão, bio-óleo, extrato aquoso e gases”, explica Roseli. O carvão obtido poderá ser utilizado na agricultura como condicionador de solos e fertilizante de liberação lenta ou ter aplicação na indústria siderúrgica, assim como o extrato aquoso poderá ter aplicação agronômica. O óleo é um combustível renovável e poderá, de acordo com o processo de beneficiamento, ser convertido em produtos químicos e biodiesel. Os gases não condensáveis normalmente
Foto:Liv Soares
Foto:Daniela Collares
A torta da mamona (esquerda) e a do pinhão-manso correspondem a até 55% de peso das sementes. são queimados no processo fornecendo o calor necessário para integração com outros processos tecnológicos. Outra possibilidade para o uso das proteínas extraídas de farelos de oleaginosas é na formulação de filmes de biopolímeros. Para isso, o processo mais utilizado com tortas de oleaginosas envolve a solubilização das proteínas, normalmente em meios alcalinos, e sua separação por centrifugação. Roseli enfatiza que a expansão dos cultivos de mamona e pinhão-manso para extração de óleo no Brasil demanda, além do melhoramento genético das espécies, também o desenvolvimento de rotas tecnológicas que atendam às necessidades do setor produtivo. Nesta linha, o chefe de pesquisa da Embrapa Agroenergia, Guy
de Capdeville, ressalta que encontrar usos e destoxificar essas tortas é fundamental para fortalecer a cadeia produtiva dessas culturas. A torta da mamona e a do pinhão-manso correspondem a até 55% de peso das sementes, informa a professora e pesquisadora Olga Machado, da Universidade Estadual do Norte Fluminense - UENF. “Este valor pode variar de acordo com o teor de óleo da semente e do processo industrial de extração”, diz. Em relação ao rendimento industrial do processamento das sementes de mamona, para cada tonelada de óleo extraído, são gerados como coproduto aproximadamente 1,28 toneladas de torta. A expansão dos plantios tanto da mamona como do pinhão-manso para
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extração de óleo traz como consequência o aumento na geração de coprodutos, tanto na agricultura quanto na alimentação animal e também como energia, como é o caso da produção de briquetes e péletes. Olga Machado cita alguns usos das tortas. Tanto a de pinhão-manso quanto a de mamona podem ser utilizadas como fertilizantes, além de apresentar propriedades inseticidas e nematicidas. Roseli reforça que “a torta de mamona natural, sem ser destoxificada, tem sido utilizada para o controle de nematóides no solo em diversas culturas”. Essas tortas também podem ser usadas como matéria-prima para a produção de aminoácidos, plásticos, em especial os biodegradáveis, colas entre outros produtos. A pesquisadora da UENF alerta para os fatores tóxicos e alergênicos apresentados em ambas às tortas para o uso na alimentação animal, embora elas apresentem alto teor de proteínas. “A torta de mamona destoxificada e sem o alergogênico pode ser utilizada como complemento em rações animais, pois possui 42,5% de proteína bruta”, ressalta Ferrari.
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Foto: Geísa Guterres
Pesquisa
Proteínas extraídas de torta de mamona têm apresentado boas propriedades filmogênicas. Dessa forma, uma alternativa para a valorização desse produto pode ser sua utilização como matéria prima na tecnologia de filmes biodegradáveis. Na área médica, a ricina da mamona tem se mostrado promissora, pois estudos tem destacado sua atividade entre um grupo de proteínas tóxicas, que vêm sendo usadas com o objetivo de matar células indesejadas, tais como as cancerígenas. Já o pinhão-manso tem sido utilizado tanto para proteção do solo contra erosão
Foto: Claucia Honorato
como para estabelecimento de cercas vivas. Simone Mendonça e Bruno Laviola, pesquisadores da Embrapa Agroenergia, destacam que a torta desta oleaginosa é um excelente adubo orgânico, pois é rica em nitrogênio, fósforo e potássio. Eles reforçam que destinos poderiam ser dados às cascas dos frutos e das sementes, aproveitando a torta rica em proteína (53-63%) para uma aplicação de maior valor agregado. De acordo com a pesquisadora do ITAL, observa-se um elevado teor de potássio, fósforo e magnésio e reduzido teor de contaminantes inorgânicos, como níquel, cromo e zinco, o que é um
Fotos: Daniela Collares
MAMONA Fruto, casca, sementes, torta e óleo
Foto: José Reynaldo da Fonseca
Foto: Liv Soares
PINHÃO-MANSO Fruto, casca, semente, farelo, amendoa, torta e óleo
Fotos: Odilon Silva
Foto: Embrapa Algodão
Fotos: Roseli Ferrari
aspecto favorável para sua utilização como ingrediente de ração animal. Com todas essas possibilidades, afirma Roseli Ferrari, apesar de o óleo ser o produto principal de exploração comercial dessas culturas, o aproveitamento e agregação de valor aos coprodutos é de fundamental importância para viabilidade financeira dos produtores e das indústrias. O aproveitamento integral pode gerar melhor remuneração aos demais integrantes da cadeia produtiva, com consequente desenvolvimento sócio econômico e sustentabilidade para a cadeia produtiva dessas oleaginosas.
Foto: Máira Milani
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Pesquisa
ENSAIOS BIOLÓGICOS TRATAMENTO MICROBIANO DA TORTA DE PINHÃO-MANSO
Foto: Leonardo Ferreira
Foto: Carolina Poletto
Por: Daniela Collares, jornalista da Embrapa Agroenergia
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Com os fungos filamentosos isolados, fala Carolina, foram realizados testes enzimáticos qualitativos para produção de lipases. O mais promissor foi selecionado para realizar o tratamento microbiano da torta, porém utilizando condições de fermentação diferentes das anteriores. “A análise dos resultados mostrou que as novas condições empregadas não foram tão eficientes quanto a anterior”, revela. A maior taxa de degradação obtida neste segundo experimento foi de 68%, fornecida pelo fungo, sendo que ele teve seu desempenho prejudicado com apenas 50% de degradação. Esse fungo se mostrou promissor. “Futuramente será realizada a sua identificação” adianta, As pesquisas na Embrapa Agroenergia estão sendo otimizadas, buscando alcançar um processo que propicie melhores condições ao microrganismo para obter 100% de degradação do ester de forbol.
Foto: Leonardo Ferreira
Uma alternativa potencial para a destoxificação da torta de pinhão-manso é a utilização de microrganismos capazes de metabolizar e inativar as substâncias tóxicas presentes. Recentemente, foi demonstrado que os ésteres de forbol presentes no pinhão-manso são totalmente degradados pela microbiota do solo, sendo clivados em compostos inócuos. Com o objetivo de identificar microrganismos que apresentem capacidade de inativar os ésteres de forbol e tornar a torta utilizável em rações animais, a Embrapa Agroenergia realizou um amplo trabalho de isolamento, identificação e caracterização de fungos filamentosos, partindo-se da microbiota presente na própria torta de pinhão-manso. As equipes do Laboratório de Processos Bioquímicos - LPB e do Laboratório de Genética e Biotecnologia - LGB, realizaram um trabalho de bioprospecção que resultou no isolamento de diversos fungos filamentosos, que foram identificados por taxonomia clássica e por métodos moleculares. Um desses fungos foi capaz de degradar cerca de 80% dos ésteres de forbol. “os testes iniciais que realizamos com esses microrganismos indicaram que a degradação possivelmente se deve à produção de lipases expressas por esse fungo”, explica a engenheira de alimentos e analista da Embrapa Agroenergia, Carolina Poletto. De acordo com ela, novos experimentos de bioprospecção foram realizados utilizando tortas de pinhão-manso de diferentes regiões do país, com objetivo de obter uma maior diversidade de microrganismos capazes de realizar a destoxificação da torta.
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Pesquisa
ENSAIOS BIOLÓGICOS UFV DEPOSITA PATENTE DE DESTOXIFICAÇÃO FÚNGICA DA TORTA DE PINHÃO-MANSO Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia. Fotos: Maria Catarina Megumi Kasuya
Uma pesquisa conduzida pela professora Maria Catarina Megumi Kasuya na Universidade Federal de Viçosa (UFV) conseguiu reduzir em 99% o teor de ésteres de forbol na torta de pinhão-manso. O material destoxificado foi oferecido como alimento a caprinos, em um experimento que comprovou a eficiência da torta como substituta do farelo de soja na ração desses animais. O resultado foi obtido com a inoculação da torta de pinhão-manso, acrescida de casca ou serragem de eucalipto na proporção de 10%, com um fungo pré-selecionado e incubado por até 60 dias. Já aos 45 dias de incubação esse resíduo estava destoxificado. Catarina ressalta que “a remoção de éster de forbol a esse nível ainda não havia sido atingida, nem com tratamento térmico ou químico”. A UFV solicitou o pedido de patente para o método desenvolvido e está negociando com as empresas a comercialização do mesmo. Antes da incubação do microrganismo, o material passou por autoclavagem a 121 °C durante uma hora. “A composição dos substratos foi bastante alterada depois do tratamento térmico e,
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em geral, houve uma significativa redução da composição, principalmente de lignina, celulose, éster de forbol e fatores antinutricionais”, conta a professora. Nos testes com animais, a torta destoxificada foi adicionada à ração de 24 fêmeas caprinas da raça Alpina, em quatro proporções diferentes: 0, 7, 14 e 20%. O ensaio teve duração de 72 dias, sendo 12 para adaptação às dietas e 60 para coleta de dados. Os cientistas observaram que os animais aumentaram o consumo
de matéria seca e não apresentaram qualquer sintoma clínico de intoxicação ou alterações nos padrões hematológicos e bioquímicos do sangue. Além de reduzir a níveis não tóxicos o teor de ésteres de forbol, a colonização da torta de pinhão-manso pelo fungo testado produziu enzimas de interesse comercial, como tanases e fitases. Essas substâncias biológicas apresentam aplicações nas indústrias têxtil, vinícola, de alimentos, bem como em processos de biorremediação de poluentes industriais. “As pesquisas estão agora em fase de purificação e utilização das enzimas para eliminar compostos tóxicos e fatores antinutricionais da torta de pinhão-manso sem a necessidade de incubação com o fungo”, informa Catarina. A redução do tempo para obtenção do produto destoxificado e a ausência do tratamento de esterilização da torta, o que diminuiria o custo, são as principais vantagens do processo enzimático em relação à inoculação fúngica. Outra possibilidade em estudo é o uso da torta de pinhão-manso como substrato para a produção de cogumelos comestíveis. No entanto, os testes iniciais mostraram que estes podem absorver os ésteres de forbol. Nos experimentos realizados, a concentração dessas substâncias ficou abaixo dos níveis encontrados nas variedades de pinhão-manso atóxicas originárias do México, que são consumidas por humanos. Contudo, para que esses cogumelos possam ser produzidos e comercializados com segurança, outras pesquisas ainda são necessárias. A pesquisa foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG). Contou também com o apoio da Biovale Energy e da Fuserman Biocombustíveis.
Torta de pinhão-manso antes (acima) e depois (abaixo) da colonização por fungos.
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MÉTODOS PARA DETECÇÃO
DE TOXINAS E ALÉRGENOS DE MAMONA E DE PINHÃO-MANSO Por: Olga Lima Tavares Machado, professora da Universidade Estadual do Norte Fluminense
O óleo de mamona e de pinhão-manso são usados para diversos fins industriais, incluindo a produção de biodiesel. No entanto, as sementes destas oleaginosas contêm compostos tóxicos e alergênicos. Os componentes alergênicos também estão presentes no pólen destas oleaginosas, constituindo riscos não só para os que maipulam a torta como também para pessoas que residem próximas ao plantio dessas oleaginosas. Assim, é importante desenvolver métodos para detectar e controlar a dispersão destes alérgenos no ar. A utilização da torta de ambos, pinhão-manso e mamona, é, portanto, totalmente dependente de metodologias precisas e padronizadas para determinar a atividade tóxica e alergênica presente nesses coprodutos. Neste contexto, apresentamos um resumo de métodos existentes usados para a detecção de atividades tóxicas e alergênicas, das tortas das oleaginosas em análise. Os compostos tóxicos encontrados nas sementes de mamona e também na torta são: a proteína ricina (toxoalbumina) e o alcalóide volátil ricinina e uma fração alergênica que se trata de um conjunto de glicoproteínas denominado CB-1A - Castor-bean allergen. No pinhão-manso devemos os componentes tóxicos são os ésteres de forbol e a proteína curcina. O único alérgeno identificado até
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o momento é a proteína denominada Jat c 1, presente nas sementes e no pólen. A escolha dos métodos de identificação e quantificação pode estar focada na detecção do componente tóxico ou pode envolver a determinação da atividade biológica, tóxica, dessa molécula. Os métodos físicos e fisico-químicos demonstram a presença da molécula, mas não a atividade biológica. Entre eles podemos citar a análise eletrofotrética, a determinação por espectrometria de massas e técnicas imunoquímicas. A identificação da ricina por eletroforese vem sendo empregada por diversos pesquisadores, é simples e rápida. Ela serve como um primeiro rastreamento para investigar a Foto: Leonardo Ferreira
presença de ricina e a sua possível degradação por diversos processos de destoxificação. Esta técnica pode ser empregada também para a identificação da curcina. Um outro método fisico-químico é a detecção dos componentes tóxicos, ricina, curcina e esteres de forbol por espectrometria de massas. Comumente esta metodologia utiliza uma das duas abordagens: detecção de proteína intacta ou o mapeamento dos peptídeos gerados após hidrólise com a enzima tripsina. Um dos método mais antigos que foi empregado para a detecção da ricina foi o ensaio imunoenzimático (ELISA). Neste ensaio utiliza-se um anticorpo que reconhece a proteína ricina. Após revelações específicas é possível identificar e quantificar a proteína tóxica (ricina ou curcina).
Detecção da atividade tóxica por curcina e por ricina: • Inibição da síntese proteica - Ricina e curcina são proteínas tóxicas porque inibem a síntese proteica (RIP), contribuindo para a morte celular. Assim, o primeiro método para a detecção de actividade ricina baseou-se na medição da inibição da síntese protéica em um sistema de célula de reticulócitos de coelho. • Atividade enzimática - A inibição da síntese proteica provocada pela ricina e pela curcina ocorre pois estas proteínas catalisam reações de depurinação, ou seja a remoção de um resíduo de adenina do RNA ribossomal. Existem diversos trabalhos que associam a depurinação com a inibição da síntese protéica, tendo como
Ilustração: Vítor Dias
Estrutura da curcina
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consequência a morte celular. Assim, a determinação da atividade enzimática poderia refletir a atividade tóxica da ricina. Como substrato para a curcina e ricina fragmentos de RNA ou de DNA (aptâmeros) foram construídos. A atividade enzimática de depurinação, pode então ser medida pelo decréscimo na concentração do aptâmero ou pela quantificação da adenina liberada. • Viabilidade celular - A fim de aprimorar os métodos de detecção da atividade biológica da ricina foi proposto o uso de células Vero, uma linhagem celular derivada de rins de macaco (Chlorocebus sabaeus), com algumas características de células epiteliais para avaliar a toxicidade provocada pela ricina. Neste ensaio, os autores avaliaram a morfologia das células antes e após a incubação com ricina, e a atividade da enzima lactato desidrogenase (LDH) citoplasmática, liberada para o meio extracelular em função da morte celular. As células mortas são identificadas por visualização e microscópio ótico.
Identificação de atividades tóxicas provocadas por ésteres de forbol A determinação da atividade irritante causada por ésteres de forbol foi demonstrada pela primeira vez em 1984. em orelhas de rato. O método mais comumente usado para detectar e quantificar EF é a cromatografia líquida de alta eficiência com separação em fase reversa (RP-HPLC). Este método foi padronizado para detectar EF em diferentes acessos de pinhão-manso. Foi através deste método que a ausência dos ésteres de forbol foi detectada em um acesso não tóxico, as sementes do acesso mexicano Papantla.
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Semelhante aos métodos de detecção de ricina e curcina, a atividade biológica de ésteres de forbol deve ser testada para garantir a eficiência dos processos de destoxificação da torta de pinhão-manso. A avaliação dos processos de destoxificação tem sido feita frequentemente em animais vivos, tais como ratos, ovinos, porcos e peixes .. Além do teste de atividade tóxica dos EF contra lesmas hospedeiras, a susceptibilidade do parasita Schistosoma mansoni foi também ensaiada. Os crustáceos Artemia salina e Daphnia magna são também utilizados como indicadores de toxicidade aos EF
Detecção da atividade alergênicas provocadas por mamona e por pinhão-manso Sementes e pólen de mamoneira e de pinhão-manso apresentam proteínas alergênicas pertencentes à classe das albuminas 2S. Os principais alérgenos de Ricinus communis são denominados Ric c 1 e Ric c 3, e o único isolado, até o momento, de Jatropha curcas é denominado Jat c 1. Todos estes alérgenos são proteínas heterodiméricas com massa molecular entre 10 e 14 kDa. Possuem duas cadeias polipeptídicas, unidas por pontes de enxofre. A atividade alergênica destas albuminas 2S é resistente à desnaturação térmica e química, podendo, mesmo após alguns tratamentos de destoxificação, desencadear alergia por contato bem como por inalação Existem diversos ensaios para a detecção dos alérgenos que avaliam somente a interação destes com IgE específica, usando ensaios imunoenzimáticos (ELISA). Estes ensaios não avaliam a desgranulação celular mediada por IgE e, deste modo, podem demonstrar resultados falso positivos, ou seja, avalia-se somente a ligação entre o alérgeno e a IgE,
sendo caracterizado como ensaio de reconhecimento antígeno-anticorpo, não correspondendo aos eventos biológicos de transdução de sinal e, consequente liberação dos grânulos observados nos mastócitos ou basófilos
Ensaios de desgranulação de mastócitos ou de basófilos Neste ensaio, mastócitos isolados da cavidade peritoneal de ratos são empregados para avaliação da alergenicidade. Basófilos sanguíneos, obtidos diretamente de soros ou provenientes de culturas de células podem também ser empregados. Para avaliar a resposta biológica estas células devem ser inicialmente incubadas/armadas com 5 µL de soro anti-albumina 2S contendo IgEs específica. A seguir, são incubadas com o alérgeno e com solução de 0,1% de azul de toluidina, 10% de formaldeído e 1% de ácido acético, para evidenciar a desgranulação. A contagem diferencial das células, íntegras e desgranuladas é feita, em câmara de Neubauer, usando microscópio óptico. A Figura abaixo ilustra mastócitos íntegros e mastócitos desgranulados observados após o contato com alérgenos de mamona.
A
Foto: Arquivo Pessoal
Olga Lima Tavares Machado Possui graduação em Química, mestrado e doutorado em Bioquímica e pós-doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atualmente é professora titular da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro.
B
Figura A – Fotos obtidas por Microscopia ótica: A Mastócitos íntegros; B- Mastócitos desgranulados. Ambos corados com azul de toluidina.
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MÉTODOS ANALÍTICOS PARA AVALIAR A TOXIDEZ DO PINHÃO-MANSO Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia
O pinhão-manso é listado entre as plantas consideradas tóxicas pelo Sistema Nacional de Informações TóxicoFarmacológicas devido à presença de substâncias classificadas como ésteres de forbol. A toxidez não é empecilho para o uso do óleo para a produção de biocombustíveis, mas pode comprometer a viabilidade da cadeia produtiva, tendo em vista que impede o uso da torta como ração na nutrição animal, principal aplicação mercadológica dos coprodutos das oleaginosas. Os ésteres de forbol estão inseridos na classe de substâncias químicas dos diterpenos. Têm ação inflamatória e podem provocar diarreia, falta de ar, desidratação e até levar à morte animais ruminantes ou monogástricos. Alguns estudos também apontam que os ésteres de forbol são cocarcinogênicos, ou seja, existem comprovações
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científicas que evidenciam a ação destas substâncias no desenvolvimento de tumores em organismos que apresentam alguma predisposição. A concentração dessas substâncias na torta é pequena, mas a atividade biológica delas é muito alta. Mesmo com a redução de 80% da toxidez, a substituição de apenas 20% do farelo de soja pelo de pinhão-manso na dieta de ovinos provocou intoxicação nos animais (leia mais na página 36). Até o momento, foram identificados seis diferentes tipos de éster de forbol na semente da planta, mas há probabilidade de existirem outros. Conhecer melhor cada um deles é um desafio para a ciência, mais especificamente para a pesquisa em Química Analítica Instrumental. Esta é responsável pela identificação baseada na caracterização estrutural dessas substâncias, o posterior
monitoramento individual e as correlações entre ocorrência, estrutura e efeito. O pesquisador Clenilson Rodrigues, da Embrapa Agroenergia, explica que, dependendo do arranjo estrutural dos grupos funcionais do éster de forbol, ele pode ser mais ou menos tóxico. A identificação desses grupos pode ajudar os cientistas que estão desenvolvendo processos de destoxificação a direcionar seus esforços para os compostos mais importantes. “Nem sempre a substância com maior concentração é a mais ativa e tampouco os sítios ativos são aqueles mais susceptíveis a uma modificação ou bloqueio”, explica Rodrigues. O problema para o estudo dos diferentes tipos de éster de forbol presentes no pinhão-manso é que os métodos analíticos empregados atualmente não são totalmente eficientes. Por técnicas clássicas,
Ilustração: Clenilson Martins Rodrigues
Até o momento, foram identificados seis tipos de ésteres de forbol. Todos têm um núcleo comum e diferenciam-se pelas cadeias laterais ligadas à função éster, como mostra a figura. Dependendo desse arranjo estrutural, a substância pode ser mais ou menos tóxica.
é possível, por exemplo, confundir essa classe de substâncias com outras de comportamento semelhante durante as análises. Um grupo de pesquisadores da Embrapa Ag ro e n e rg i a , E mbr ap a
Agroindústria Tropical e Universidade Estadual de Campinas está trabalhando no desenvolvimento de metodologias ultrarrápidas para determinação desses compostos. A ideia é chegar
em protocolos que permitam identificar quantos e quais são os ésteres de forbol presentes na torta de pinhão-manso, determinando inequivocamente a estrutura de cada um deles.
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Para tanto, os cientistas estão se valendo da cromatrografia líquida de ultra eficiência (UPLC) e da espectrometria de massas (MS) com experimento de monitoramento de reações múltiplas (MRM). De acordo com a pesquisadora Patrícia Abdelnur, também da Embrapa Agroenergia, a utilização desses dois instrumentos analíticos gera mais de um dado sobre o material analisado. “A partir destes experimentos, é possível obter o tempo de retenção, a massa molecular, e o perfil de fragmentação para cada composto. Com o cruzamento dessas diferentes informações, é possível identificar, de maneira precisa e seletiva, quais substâncias estão presentes na amostra”, resume Patrícia. A expectativa é o que os métodos a serem desenvolvidos nesse trabalho também sejam utilizados para verificar, com maior especificidade, a eficiência e eficácia dos processos desenvolvidos em laboratório para destoxificação das tortas, constituindo assim uma ferramenta fundamental para afirmar se houve a eliminação completa ou para quanto os níveis de ésteres de forbol foram reduzidos. Com esses dados, seria possível minimizar os testes
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Foto: Vivian Chies
Diferentes espectrômetros de massas são utilizados na Embrapa Agroenergia para avaliar os ésteres de forbol. Na foto, a pesquisadora Patrícia Abdelnur utiliza um dos equipamentos para analisar amostra.
com animais e acelerar as pesquisas. As metodologias em estudo também devem reduzir o tempo de análise e a quantidade de efluentes gerada. Com os equipamentos que estão sendo utilizados, tanto o volume de amostras preparado quanto dos solventes empregados nas análises são menores. Isso reduz a quantidade de efluentes gerada e, consequentemente, o custo para o descarte correto dos mesmos. Rodrigues exemplifica com uma situação hipotética: “Se
em nossos laboratórios fosse implantada a metodologia convencional (80 minutos de análise com vazão de 1,5 mL/ min) e se considerarmos uma rotina laboral de 10 amostras/dia durante o ano, essa situação geraria 360 litros de efluente. Por outro lado, com a implementação das técnicas ultrarrápidas, tanto o tempo quanto a vazão são reduzidos (10 min e 0,45 mL/min), o que geraria apenas 13,5 L de efluentes. Em termos de custos aproximados e praticados no mercado para o tratamento
Imagens cedidas por Clenilson Rodrigues
Espectro de massas de amostra de pinhão-manso mostrando a ocorrência de ésteres de forbol (íon 733 em destaque) e outras substâncias. Dado gerado pela Central de Análises Químicas e Instrumentais (CAQ) a partir de análise por espectrometria de massas direta (DIMS).
Cromatograma de amostra de pinhão-manso na região de 2,80 a 3,80 minutos deste cromatograma, evidenciando a ocorrência de diferentes ésteres de forbol, representados pelo íon 733 (destacado no espectro de massas acima). Dado obtido por UPLC-MS na Central de Análises Químicas e Instrumentais (CAQ).
destes resíduos, teríamos um gasto de R$ 1.800,00/ano no primeiro cenário contra R$ 67,50/ano no segundo. Assim, fica evidente que há uma série de ganhos (analítico, econômico e ambiental) com a implementação das técnicas ultrarrápidas”. Essa economia de recursos e especificidade analítica serão particularmente importantes
nas análises de controle de qualidade dos processos de destoxificação, quando eles chegarem ao setor produtivo. As análises serão indispensáveis para impedir que, por falhas no processo, rações não totalmente destoxificadas cheguem ao mercado e sejam usadas para a alimentação de animais.
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PINHÃO-MANSO USO COMO FERTILIZANTE E MELHORAMENTO GENÉTICO PARA APROVEITAMENTO DA TORTA Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia
Estudos agronômicos e de genética do pinhão-manso estão apontando alternativas para que a torta resultante do esmagamento dos grãos para obtenção de óleo seja aproveitada sem necessidade de processos de destoxificação. Uma das opções é utilizá-la como fertilizante, o que já tem se mostrado viável. Os pesquisadores estão
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trabalhando também no melhoramento genético da planta, com o objetivo de desenvolver cultivares não tóxicas e altamente produtivas. O cultivo de pinhão-manso exige uma grande quantidade de nutrientes. O pesquisador Bruno Galveas Laviola, da Embrapa Agroenergia, explica que, quando os frutos
Foto: César Romagna
Fotos: Bruno Laviola
do pinhão-manso são colhidos, leva-se com eles os nutrientes que são retirados do solo para a sua formação. “Somente a estimativa da extração de Nitrogênio na colheita de frutos corresponde a 3,65 vezes a recomendação de N para a cultura da mamona” exemplifica. Estudos têm demonstrado, no entanto, que a torta de pinhão-manso é uma boa fonte para repor os nutrientes do solo. “Ela é um excelente adubo orgânico, com composição química superior à do esterco bovino e à da torta de mamona”, diz Laviola. A maior diferença está na concentração de Potássio (K). Enquanto o esterco bovino e a torta de mamona apresentam, respectivamente, 6,26 e 4,58 g/kg desse nutriente, a torta de pinhão-manso possui 17,68 g/kg. A quantidade de Nitrogênio é cerca de 50% maior. Considerando uma produção de 4.000 kg/ ha de grãos, cálculos indicam que o produtor rural poderia economizar anualmente cerca de R$1.200,00/ha com o retorno da torta ao campo como fertilizante.▶ Cascas e torta de pinhão-manso são trituradas e usadas como fertilizante em experimentos na Embrapa Agropecuária Oeste.
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Foto: Bruno Laviola
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Acesso não tóxico de pinhão-manso do Banco Ativo de Germoplasma da Embrapa.
Variedades atóxicas Sabe-se, contudo, que rações têm valor de mercado maior do que o de fertilizantes, de modo que, viabilizar o uso da torta na alimentação animal poderia aumentar o preço pago ao produtor pelos grãos. Uma forma mais barata de eliminar a toxidez seria o melhoramento genético da espécie a fim de obter cultivares com teor muito baixo ou nulo de ésteres de forbol nos grãos. A Embrapa, juntamente com sua rede de parceiros, também está trabalhando nessa linha. O banco ativo de germoplasma (BAG) de pinhão-manso mantido pela Embrapa Agroenergia e Embrapa Cerrados, em Planaltina (DF), conta com quatro acessos
não tóxicos da planta. No México, país onde se encontra a maior diversidade genética da cultura, comunidades utilizam as sementes atóxicas até na alimentação humana. “A existência de variabilidade genética para ausência de toxidez abre caminho para o melhoramento por técnicas convencionais”, afirma Laviola. Mas, por que, então, não utilizar as variedades atóxicas simplesmente? Ocorre que essas espécies produzem muito pouco, comparadas às demais. Enquanto os dez melhores genótipos do BAG da Embrapa proporcionam uma colheita de, em média, 2550 kg/ha de grãos aos 3,5 anos, as plantas sem toxidez produzem, quando muito, 900 kg/ha. Além disso, apresentam menor vigor e são suscetíveis a doenças que não acometem as outras. O estágio atual das pesquisas permite especular que a toxicidade esteja relacionada a apenas um ou poucos genes do pinhão-manso. Laviola explica que isso, para um programa de melhoramento genético, é muito positivo, pois facilita a transferência dessa característica para genótipos mais produtivos. A Embrapa está utilizando técnica avançadas de melhoramento genético que permitem obter resultados mais rapidamente. Contudo, outras estratégias para eliminar a toxidez da torta de pinhão-manso devem continuar a ser consideradas, na opinião de Laviola. “Os acessos atóxicos apresentam baixo vigor, o que irá demandar tempo para seleção de materiais genéticos de alta produtividade e livre de ésteres de forbol nos grãos”, lembra.
Esses trabalhos fazem parte do projeto BRJATROPHA - Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação em Pinhão-manso para Produção de Biodiesel, coordenado pela Embrapa Agroenergia com recursos da Finep. Conheça: http://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/bitstream/doc/910690/4/BRJatropha2011.pdf
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VÍDEO MOSTRA TRABALHOS COM PINHÃO-MANSO ATÓXICO No vídeo produzido pela Embrapa Informação Tecnológica em parceria com a Embrapa Agroenergia, você vai saber mais sobre os testes que estão sendo feitos com a espécie e que vantagens o produtor poderá ter com o pinhão-manso na alimentação animal. Assista a reportagem “pinhão-manso atóxico” no link: http://www.youtube. com/watch?v=d2FBhNCLXCM – e veja a
explicação da pesquisadora da Embrapa Agroenergia Simone Mendonça sobre os processos. Os testes com os acessos não tóxicos desenvolvidos pelo Centro de Pesquisa, começam no campo experimental, passam pelo laboratório e terminam na fazenda da Universidade de Brasília. Neste vídeo, Bruno Laviola, também cientista desta Unidade, apresenta o pinhão-manso atóxico.
Fotos extraídas do Video
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TORTA DE PINHÃO-MANSO
TESTES COMPROVAM EFICIÊNCIA NUTRICIONAL
Foto: Lorena Garcia
Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia
de proteína pode chegar a 60%. No entanto, por questões de redução de custo, o método mais usual no Brasil é a extração mecânica do óleo sem descascamento dos grãos. Por isso, a concentração de proteína é menor do que a citada e aumentam os teores de fibras. Isso pode ser um problema para a alimentação de animais monogástricos (aves e suínos, por exemplo), mas favorece a produção de rações para ruminantes como os ovinos e bovinos. Contudo, o maior empecilho para a inserção do pinhão-manso no mercado de rações é a toxidez que ele apresenta. Durante muito tempo, ela foi atribuída à presença de curcina Foto: Lorena Garcia
O alto teor de proteína da torta de pinhão-manso faz dela um potencial ingrediente de rações para animais. Entrar nesse mercado seria uma forma de viabilizar a cadeia produtiva dessa oleaginosa em que o setor de biocombustíveis tem apostado. Estimativas apontam que, mesmo com os métodos de extração mais eficientes, para cada tonelada de óleo obtida seriam geradas 2,76 toneladas de farelo. A concentração de proteína pode variar na torta de pinhão-manso de acordo com a genética do material, o método de extração e de pré-processamento do grão (com ou sem casca). No método mais eficiente de extração, com solventes e a partir do grão descascado, o teor
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na torta. Essa é uma molécula semelhante à ricina encontrada na mamona, porém é 1.000 vezes menos tóxica. “Isso porque ela não está ligada a uma substância chamada lectina, que promove a entrada da curcina na célula, necessária ao início da atividade citotóxica”, explica a pesquisadora Simone Mendonça , da Embrapa Agroenergia. Descobriu-se, então, que são os ésteres de forbol que conferem toxidez ao pinhão-manso, e variedades isentas desse composto passaram a ser consideradas atóxicas. Tendo isso em mente, uma equipe composta por cientistas da Embrapa Agroenergia, Universidade de Brasília (UnB) e Universidade de São Paulo (USP), utilizou a torta de uma variedade atóxica para testar o potencial nutritivo da torta de pinhão-manso em ovinos. Os pesquisadores substituíram parcialmente o farelo de soja pelo de pinhão-manso na alimentação de ovinos , durantes 60 dias, em proporções de 20%, 40% e 60% de torta de pinhão-manso. A torta utilizada foi obtida pelo método de extração mecânica do óleo. Ao final do período, os pesquisadores avaliaram os animais e concluíram que a oleaginosa pode ser uma boa fonte de proteína. “O resultado desse ensaio foi bastante animador porque todos os animais alimentados com pinhão-manso tiveram ganho de peso e qualidade de carcaça semelhante aos alimentados com concentrado de soja”, diz Simone Mendonça, que coordenou o experimento. Entretanto, a presença do éster de forbol não era o único fator que preocupava os Foto: Lorena Garcia
pesquisadores quanto à eficiência nutricional da torta do pinhão-manso. Ela também apresenta outros componentes antinutricionais, tais como fitatos e inibidores de tripsina. Esses componentes poderiam interferir na digestão e no aproveitamento dos nutrientes. “Uma vez que não havia éster de forbol na torta atóxica oferecida, pudemos avaliar o impacto dessas outras substâncias na nutrição animal”, explica Simone. As análises incluíram a pesagem periódica dos animais vivos e avaliação de parâmetros hematológicos e bioquímicos. Ao final do período experimental de 60 dias, os ovinos foram abatidos e a qualidade da carcaça analisada. Foram avaliados 12 parâmetros de qualidade da carcaça e, em todos eles, não houve diferença significativa em relação aos animais alimentados apenas com farelo de soja. Os resultados desse experimento estão publicados na revista Small Ruminant Research disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j. smallrumres.2013.05.007.
Tortas destoxificadas A Embrapa Agroenergia também vem testando diversos tratamentos de destoxificação da torta de pinhão-manso. Uma das estratégias adotadas foi a extração sequencial com solventes que conseguiu reduzir em aproximadamente 80% o teor de ésteres de forbol da torta. Esse material foi oferecido aos ovinos em um novo experimento. O teste mostrou que a redução da toxidez precisa ser ainda mais significativa do que o índice que a equipe havia obtido. Os testes precisaram ser interrompidos antes do período experimental estabelecido, uma vez que os animais começaram a apresentar sintomas de intoxicação. Novas estratégias, associando tratamento com solvente e microrganismos estão em curso, com objetivo de alcançar a destoxificação total da torta.
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ENSAIOS UTILIZAM RATOS PARA AVALIAR EFEITOS TÓXICOS DA TORTA DE PINHÃO-MANSO Por: Vivian Chies, jornalista da Embrapa Agroenergia. Fotos: Claucia Honorato
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O Centro Universitário da Grande Dourados - MS (Unigran) também desenvolve pesquisas com a torta de pinhão-manso. A professora Claucia Honorato tem utilizado ratos para avaliar o uso desse coproduto da produção de óleo como ração. Ela realizou ensaios com materiais in natura e destoxificados produzidos na Embrapa Agroenergia por dois métodos: um por processo químico e outro pela combinação de processo físico e químico. Claucia elegeu os ratos como cobaias pela facilidade de comparar os dados obtidos nos estudos com os valores de referência existentes para as principais enzimas relacionadas a intoxicação já descritos na literatura científica. Todos os ensaios foram conduzidos durante 21 dias. Nos ensaios realizados com a torta de pinhão-manso in natura, o consumo da dieta foi inversamente proporcional à inclusão da torta. Nesse estudo, com inserção de 10% da torta na alimentação, não ocorrem mortes, mas os ratos apresentaram sintomas de intoxicação, especialmente lesões no fígado.
Com uma dieta na qual foram acionados 10% de torta de pinhão destoxificada por processo químico, também foram diagnosticadas lesões hepáticas nos animais, uma vez que houve aumento na atividade das enzimas ALT (Alanina Amino Transferase) e AST (Aspartato Amino Transferase). “O processo de destoxificação químico ainda provoca alteração no metabolismo hepático e algumas alterações histo-patológicas em pequena proporção”, ressalta Claucia. Os melhores resultados foram obtidos com a torta destoxificada pela combinação de processos químico e físico. A adição da mesma proporção (10%) do material à dieta não provocou lesões hepáticas nos ratos. “A torta destoxificada por processos químico e físico causou menores taxas de alterações, no entanto, os estudos devem continuar, uma vez que, apesar de promissores, os resultados ainda não são satisfatórios”, conclui a professora.
Fotomicrografia de fígado de ratos Fotomicrografia de fígado de ratos
Fotomicrografia de fígado de ratos Wistar
Wistar alimentados com dietas acresci-
Wistar alimentados com dietas
alimentados com dietas acrescidas de
das de farelo de pinhão-manso detoxifi-
controle sem farelo de pinhão-
farelo de pinhão-manso a) grupo controle
cado (processo químico e físico) - fígado
-manso- fígado sem alterações
- Detalhe do fígado com alterações histo-
sem alterações histopatológicas, onde
histopatológicas, onde se observa
patológicas, onde se observa desarranjo
se observa arranjo cordonal dos hepa-
arranjo cordonal dos hepatócitos.
da estrutura cordonal dos hepatócitos.
tócitos, núcleo com coloração normal.
Coloração H/E aumento de 200x
Coloração H/E aumento de 200x
Coloração PAS/H aumento de 400x
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A MAMONA Por: Napoleão Esberard de M. Beltrão, Odilon Reny Ribeiro Ferreira da Silva e Waltemilton Vieira Cartaxo
Foto: Jany Cardoso
Com o incentivo à produção de biodiesel a partir de óleo de mamona, um grande volume de torta estará sendo gerado, oriundo da prensagem das sementes. A torta de mamona usada há muito tempo como fertilizante, tem diversas aplicações, como na produção de biogás, inseticida, na indústria fruticultura, horticultura, floricultura, nas culturas de café e cana-de-açúcar e na geração de bioetanol, devido seu alto teor de amido. Além disso, a torta de mamona tem grande potencial de uso na formulação de rações animais. Contudo, observa-se, pelo histórico das pesquisas recentes, a necessidade de se desenvolverem métodos de destoxificação e desalergenização apropriados para a escala industrial de produto e outros acessíveis ao pequeno produtor, uma vez que ainda não existe tecnologia consolidada para caracterização e medição da toxicidade e alergenicidade da torta e farelo de mamona. A mamoneira (Ricinus communis L.), da família das euforbiáceas, é uma planta de origem tropical, tolerante à seca e heliófila. Encontra-se praticamente em todo o território brasileiro, tendo já ocupado posição de destaque no agronegócio nacional, com potencial para contribuir com o desenvolvimento agrícola sustentável do País. A
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região Nordeste tem tradição no cultivo dessa planta e há cerca de três milhões de hectares aptos para a sua exploração, sendo os estados da Bahia e do Ceará os maiores produtores de bagas (sementes). A mamona é a única oleaginosa que produz o óleo glicerídico totalmente solúvel em álcool, o que dá uma característica incomum a essa oleaginosa. A industrialização da semente da mamona fornece dois produtos: o óleo bruto e a torta. A torta de mamona é um produto excelente e rica em nutrientes, em especial nitrogênio e fósforo, sendo um fertilizante orgânico de elevada qualidade, melhorando também a qualidade física do solo. Como ração animal, a torta da mamona, que possui alto teor de proteínas, só pode ser utilizada depois de destoxificada. No processamento industrial para extração do óleo das bagas de mamona, cada tonelada de óleo extraído corresponde a 1,28 tonelada de torta, que é tóxica, devido à presença da proteína ricina, uma das mais potentes fitotoxinas vegetais da natureza A ricina é encontrada exclusivamente no endosperma das sementes de mamona, não sendo detectada em nenhuma outra parte da planta.
Foto:Jany Cardoso
Foto: Jany Cardoso
Waltemilton V. Cartaxo
Odilon Reny da Silva
Possui graduação em
Possui graduação em Engenharia
Administração pela Universidade
Agrícola pela Universidade
Estadual da Paraíba e
Federal de Pelotas, mestrado
especialização em Marketing
em Engenharia Agrícola pela
para Gestão Empresarial pela
Universidade Federal de Viçosa
Universidade Federal de Santa
e doutorado em Engenharia
Catarina. Atualmente é analista da
Agronômica - Universidad
Embrapa Algodão.
Politécnica de Madrid. É pesquisador e atualmente exerce o cargo de Chefe-Adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Algodão.
Napoleão Esberard de M. Beltrão (in memoriam)
Foto:Vivan Chies
Engenheiro agrônomo, formado pela Universidade Federal de Pernambuco, possuía mestrado em Agronomia pela Universidade Federal do Ceará e doutorado em fitotecnia, área de concentração fisiologia da produção pela Universidade Federal de Viçosa, MG, e Pós-Doctor em Engenharia Agrícola na Universidade Federal de Campina Grande, PB. Atualmente dedicava-se à cultura da mamona com vinculação energética para a produção de biodiesel, sendo membro fundador da Rede Nordestina de Biodiesel. Em 14 de julho, durante o fechamento desta edição da Revista, Napoleão Beltrão faleceu. Ele, que era chefe-geral da Embrapa Algodão, deixa pelo Brasil afora uma grande legião de amigos, empregados, bolsistas e alunos que com ele conviveram e o admiravam. Deixa também, uma enorme contribuição à pesquisa agropecuária brasileira, em especial para as cadeias produtivas das espécies trabalhadas pela Unidade: amendoim, gergelim, mamona, sisal e algodão. Abre-se uma grande lacuna na pesquisa brasileira, e na área acadêmica. Colaboração: Jany Cardoso – jornalista Embrapa Algodão
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Pesquisa
CONHEÇA AS TECNOLOGIAS DA EMBRAPA ALGODÃO PARA A CULTURA DA MAMONA Por: Edna Santos, jornalista da Embrapa Algodão
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entanto, mostraram boa adaptação a diferentes ecossistemas desde que se utilize plantio e colheitas manuais e que recebam um volume de chuvas adequadas para o seu crescimento e desenvolvimento (em torno de 500 mm). As temperaturas adequadas para essas cultivares ficam entre 20°C e 30°C e a altitude mínima é de 300 metros. Ambas podem ser semeadas em sistemas de monocultivo ou consorciadas com outras culturas, desde que sejam de baixo porte, como amendoim e feijão caupi, para evitar a concorrência entre as culturas. A BRS Energia destaca-se pela precocidade, com seu ciclo de em média 120 dias (metade do tempo das outras cultivares). A cultivar foi testada e validada para a região Nordeste e o estado de Roraima. É indicada
Foto: Máira Milani
O uso adequado de cultivares melhoradas e de tecnologias de cultivo para a cultura da mamona pode elevar significativamente a sua produtividade média, aumentando também a lucratividade do produtor. Segundo a pesquisadora da Embrapa Algodão e melhorista da cultura da mamona, Máira Milani, em áreas experimentais é possível obter produtividades médias de 2.000 kg/ha, seguindo as recomendações de manejo de solo, adubação e uso de cultivares adequadas. "Considerando que em áreas de agricultores nem sempre serão encontradas as condições da pesquisa, ainda é possível aumentar consideravelmente a produtividade. Agricultores que tem seguido as recomendações de cultivo da Embrapa têm alcançado produtividades médias acima de 1500 kg/ha. Por isso, a difusão das tecnologias de manejo cultural são importantíssimas para consolidar a mamona como uma importante cultura nacional", avaliou. A Embrapa, em conjunto com instituições parceiras, desenvolveu quatro cultivares de mamona ― BRS Nordestina, BRS Paraguaçu, BRS Energia e BRS Gabriela ― e seus respectivos sistemas de produção, com recomendações de espaçamento e densidade, tipo de solo, época de plantio e desbaste, entre outras. A BRS Nordestina e a BRS Paraguaçu foram desenvolvidas para o semiárido brasileiro, no
para monocultivo e possui frutos indeiscentes (que se não abrem na maturação). A BRS Gabriela foi selecionada a partir de linhagens oriundas dos cruzamentos entre as cultivares BRS Nordestina e BRS Paraguaçu e possui altura inferior as essas cultivares. Foi testada em todos os estados da região Nordeste e ainda em Goiás, Roraima e Rio Grande do Sul, apresentando adaptação aos diferentes ecossistemas em que ocorram precipitação de pelo menos 500 mm. Pesquisas em andamento Com o objetivo de desenvolver genótipos superiores de mamona adaptados às regiões agroecológicas brasileiras de cultivo tradicional e também para áreas de expansão da cultura, a Embrapa coordena o projeto de pré-melhoramento e melhoramento da mamona,
que tem como principal objetivo obter materiais superiores passíveis de recomendação para diferentes condições edafoclimáticas do Brasil. Visando a aumentar a eficiência dos sistemas produtivos hoje utilizados para proporcionar maior sustentabilidade e competitividade da ricinicultura no Brasil estão sendo realizadas pesquisas na área de fitotecnia, matologia, fitossanidade e manejo de solo e água. As pesquisas envolvem avaliações em monocultivo ou consórcio, envolvem arranjos espaciais; épocas de semeadura; seletividade de herbicidas e manejo de plantas daninhas; dessecação; colheita mecanizada; manejo de nitrogênio, fósforo e calcário; necessidade hídrica e manejo da irrigação; dinâmica de pragas e incidência e severidade de doenças.
Foto:Odilon Silva
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ARTIGO
Pesquisa Foto: Jany Cardoso
TORTA DE MAMONA
DESTOXIFICADA EMBRAPA DESENVOLVE TECNOLOGIA PARA CONTROLE DE QUALIDADE Por: João Paulo Saraiva Morais, Everaldo Paulo de Medeiros, Máira Milani, Liv Soares, Napoleão Beltrão, pesquisadores da Embrapa Algodão
O óleo de mamona é um produto para uso industrial com excelentes propriedades químicas que o fazem único. Esse óleo vem sendo usado pela humanidade há pelo menos 6.000 anos como medicamento e para iluminação. Nos últimos séculos, ele também passou a ser empregado como matéria-prima para diversos produtos, de plásticos a lubrificantes especiais. A produção de óleo de mamona gera como principal coproduto a torta de mamona. Ela já vem sendo usada como adubo orgânico, devido à quantidade de nutrientes que pode liberar para as plantas. Esses
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mesmos nutrientes podem ser benéficos para a alimentação de animais. Assim, a torta de mamona poderia ser transformada em ração, desde que seja eficientemente tratada, para destruir as substâncias tóxicas presentes nela. Hoje, já existem métodos reconhecidamente eficientes para a neutralização dessas substâncias, ou seja, já existem métodos eficientes de destoxificação da torta de mamona, que se forem executados corretamente podem neutralizar a toxicidade da ricina, principal componente tóxico da torta. E como se pode verificar se um certo lote de torta de mamona foi corretamente destoxificado?
Para resolver esse problema, a Embrapa desenvolveu uma tecnologia simples e de baixo custo que permite fazer essa avaliação. Buscou-se desenvolver um método em que se necessite do mínimo de equipamentos e o mínimo de treinamento. Assim, para uma determinação rápida de vários lotes de torta de mamona tratadas com vapor ou com cal, é
Foto:Embrapa Algodão
Foto:Daniela Collares
Foto:Arquivo pessoal
Foto: Alexandre Oliveira
Foto:Arquivo pessoal
possível saber, com confiança, se elas foram tratadas corretamente. Basicamente, o método consiste em se preparar uma solução aquosa com as proteínas da torta, a partir de uma amostra de torta de mamona tratada. Então, essa solução é colocada em um frasco, com eletrodos para se aplicar uma voltagem sobre essas proteínas e, então, verificar-se a corrente elétrica resultante que é gerada pela interação entre as proteínas da torta de mamona e a voltagem. Conhecendo-se o padrão elétrico para uma amostra tóxica e o padrão
elétrico para uma amostra detoxificada de torta de mamona, no qual as proteínas sofreram alterações pela destoxificação, pode-se adaptar a técnica para uma produção industrial e, em menos de uma hora, desde o recebimento da amostra, ter-se a resposta se o lote foi tratado corretamente ou não. E, se no futuro surgirem outros métodos tão eficientes quanto esses para a destoxificação, com vantagens em relação aos padrões, esse procedimento poderá ser facilmente reajustado e reavaliado para essas novas metodologias.
João Paulo Saraiva Morais Possui graduação em Farmácia pela Universidade Federal do Ceará e mestrado em Bioquímica pela Universidade Federal do Ceará. Atualmente é pesquisador da Embrapa Algodão.
Everaldo Paulo de Medeiros é doutor em Química Analítica, UFPB e Bacharel em Química Industrial, UFPB. Atualmente é Pesquisador da Embrapa Algodão.
Máira Milani é engenheira agrônoma pela Universidade Estadual Paulista/Campus de Jaboticabal e mestre em Agronomia/Genética e Melhoramento de Plantas pela mesma universidade. Atualmente é pesquisadora na Embrapa Algodão, nas áreas de Recursos Genéticos e Melhoramento Vegetal de Mamona.
Liv Soares é Engenheiro Agrônomo, formado pela Universidade Federal do Ceará, Mestre em Fitotecnia pela Universidade Federal de Viçosa e Doutor em Agronomia pela Texas Tech University. É pesquisador da Embrapa Algodão.
Napoleão Beltrão
Métodos para promover a destoxificação e a desalergenização da torta de mamona • Cozimento por uma ou duas horas. O material resultante deve ser filtrado, lavado com água quente e seco. • Ferver, por curtos períodos de tempo, uma mistura de torta moída e água, com mudança da água após cada fervura. O material resultante deve ser filtrado, lavado com água quente e seco. • Uso do vapor d’água na pressão de 150 a 300 PSI (lb/pol2), seguida de descompressão abrupta (método de Chiego). • Autoclavagem a 125 ºC a seco, com camadas de torta de 2,5 a 3,0 cm de espessura, durante 15 minutos (método de Kodras et al. (1950). • Aquecimento da torta a 2050C, cozimento com soda (NaOH) a 2% em presença de formaldeído (10%), cozimento com 0,9% de HCl e 3% de formaldeído, cozimento com soda sob pressão de 20 PSI e cozimento com 1% de NaOH. • Método de Anandan: para a torta e o farelo. Usa-se o Ca(OH)2, 1 Kg para 9 litros de água, na quantidade de 40 g deste hidróxido por Kg de torta. A mistura do material deve ficar em repouso por 8 horas e depois seco por, pelo menos, 5 horas em secador a 60°C ou em terreiro em dia de sol.
Currículo já citado no artigo "A Mamona". 45
Pesquisa
TORTA DE MAMONA ALIMENTO PROTEICO E FERTILIZANTE NATURAL Por: Edna Santos, jornalista da Embrapa Algodão
Foto: Liv Soares Severino
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Entre 35% a 55% da semente da mamona é composta por um óleo bastante valorizado em diversos países por suas centenas de aplicações industriais. O produto é empregado na indústria de plástico, siderurgia, saboaria, perfumaria, tintas, lubrificantes, próteses, entre outras. Como principal coproduto da extração desse óleo origina-se a torta de mamona, que pode ser utilizada como ração animal e como fertilizante. Segundo o chefe-geral da Embrapa Algodão, pesquisador Napoleão Beltrão, a torta de mamona é uma importante fonte de proteína para os rebanhos bovinos, caprinos e ovinos, mas precisa passar por um processo de destoxificação para eliminar as sustâncias tóxicas presentes na semente, principalmente, a ricina. "A torta da mamona é muita rica em proteínas, no entanto possui uma toxina nas sementes, a ricina, que é considerada a
Foto: Embrapa Caprinos e Ovinos
substância mais tóxica que a natureza criou, além de várias proteínas alergênicas", afirmou. Um dos métodos mais utilizados para destoxificação da torta de mamona é a neutralização com o hidróxido de cálcio. "Esse processo, que foi criado na Índia e aprimorado no Brasil, neutraliza cerca de 90% da ricina e pode ser usado na fazenda sem maiores problema, sem extrusão, sem alta temperatura e pressão que eram os processos anteriormente utilizados", explicou Beltrão. Conforme o pesquisador, a torta de mamona também pode melhorar a capacidade produtiva dos solos. "A torta é um excelente fertilizante orgânico, muito utilizada em várias culturas, principalmente o fumo, fruteiras, como o mamoeiro, e a pimenta do reino”, declarou. Muito rica em nitrogênio (podendo chegar a 7 % do total) e fósforo, além de elevado teor de fibra (variando entre 25 a 35 % do total), atua como condicionador do solo, melhorando os aspectos físicos e químicos do mesmo”, afirma. Esberard explica que a ricina, substância tóxica da mamona, não é solúvel no óleo e, portanto, após o esmagamento, é encontrada apenas na torta. Já existem diversos processos para destoxificá-la, tornando possível o emprego na alimentação de aves pequenas e, principalmente, ruminantes, como fonte proteica. “Existem métodos físicos e químicos para retirar a ricina e outras proteínas e substâncias nitrogenadas da torta, como elevada temperatura e pressão, uso de reagentes químicos, etc. Pode ser usada também na indústria como fonte de proteínas, oligossacarídeos e outros produtos”, detalha. Os experimentos realizados por pesquisadores da Embrapa Algodão também identificaram utilidade para outro coproduto, a casca da mamona. "A torta de mamona apesar de ser um excelente fertilizante, muito rico em
nitrogênio e fósforo, é pobre em potássio que também é requerido em grandes quantidades pelas plantas superiores e, assim, para se ter um fertilizante orgânico ideal, tem-se que misturar a torta com outro tipo de adubo orgânico, como é o caso da casca de mamona que tem um bom teor de potássio", informou.
Os principais sintomas de envenenamento com a mamona são: Paralisia da respiração e sistema vasomotor, cólicas abdominais, diarreia, perda de apetite, aumento do ritmo cardíaco, ausência de coordenação dos movimentos, febre e hemorragia. A toxicidade pode ocorrer por diversas formas de administração, como: inalação, injeções intramusculares, endovenosa e intraperitoneal e por via oral. Casos de intoxicação por ingestão foram descritos em animais monogástricos (galinhas, suínos, cavalos, aves silvestres e peixes).
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Pesquisa
MÉTODO BIOTECNOLÓGICO
REDUZ EM 70% O TEOR DE RICINA EM MAMONA
Os estudos continuam e o objetivo é chegar a plantas transgênicas com menos 95% desta proteína, uma das mais tóxicas de origem vegetal. Por: Fernanda Diniz, jornalista da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia
A mamona é uma planta com grande potencial de exploração econômica, especialmente como matéria-prima para produção de biodiesel, por possuir elevada concentração de óleo nas sementes – cerca de 45% da constituição total. Paralelamente, é utilizada como insumo pelas indústrias: química, de cosméticos e lubrificantes, na composição de tintas, vernizes, plásticos entre outros. É uma opção de renda viável para o pequeno agricultor, já que não depende de muitos insumos, nem grandes investimentos em mecanização. É cultivada em quase todo o país, com exceção de alguns ecossistemas específicos, como o Pantanal, a Amazônia e locais muito frios e de baixa altitude. Além do óleo extraído das sementes (produto principal), a cadeia produtiva gera uma série de outros subprodutos, especialmente a torta de mamona, que pode se constituir em importante alternativa de renda para os produtores rurais, como adubo orgânico e na alimentação de animais. Entretanto, o uso da torta de mamona para a alimentação animal ainda é restrito em função do alto teor de ricina nas sementes. Por isso, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia
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está investindo em pesquisas de engenharia genética que buscam reduzir o teor desta proteína a níveis que não sejam prejudiciais aos animais e seres humanos. Os estudos, coordenados pelo pesquisador Francisco Aragão, se baseiam em novas estratégias de engenharia genética capazes de silenciar o gene da ricina nas plantas de mamona. Ou seja, o gene continua lá, mas fica inativo, perde a sua capacidade de expressão. Segundo Aragão, as primeiras plantas transgênicas de mamona geradas nos laboratórios da Embrapa apresentam redução de 75% no teor de ricina. “É um resultado significativo, mas ainda não ideal para consumo, tanto que não tivemos a intenção de testá-las na alimentação de animais”, explica. Por isso, os estudos continuam e o objetivo é conseguir uma redução superior a 90%. “O ideal seria 100%, é claro, mas 95% já torna o consumo seguro”, lembra o pesquisador. A metodologia é a mesma já utilizada com êxito no silenciamento de uma proteína anti-nutriticional da soja. Os testes realizados com estas plantas acusaram níveis
indetectáveis da proteína. “É exatamente isso o que pretendemos alcançar com a mamona”, completa Aragão. Próximo passo: testes com animais Até o momento, os estudos desenvolvidos pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia estiveram voltados para a compreensão, em nível celular, do processo de produção de ricina durante o desenvolvimento da
semente de mamona; identificação da melhor estratégia de transformação genética para bloquear a expressão do gene desta proteína e, por fim, geração das plantas transgênicas. Assim que chegarem ao nível desejado e seguro de redução da toxina, as plantas geneticamente modificadas (GM) serão testadas na alimentação de animais. Além disso, serão avaliadas também as descendências das plantas para confirmar a herança do silenciamento.
Foto: Cláudio Bezerra
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Pesquisa
DESTOXIFICAÇÃO DA MAMONA É ALTERNATIVA ALIMENTAR
PARA RUMINANTES
Foto: Adilson da Nóbrega
Por: Adilson da Nóbrega, jornalista da Embrapa Caprinos e Ovinos
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Uma das espécies energéticas que mais tem recebido incentivos de políticas públicas no país, a mamona também pode gerar benefícios para a alimentação de caprinos, ovinos e bovinos. Desde 2005, unidades da Embrapa têm trabalhado com técnicas que promovem a destoxificação de subprodutos da mamona para a alimentação de ruminantes, com resultados que demonstram que alimentos como a torta e o farelo podem entrar na dieta destes animais, com desempenho semelhante ao do farelo de soja. As pesquisas observam, também, a viabilidade da obtenção de alimentos de menor custo para a produção animal, especialmente no caso do Nordeste, ainda dependente da importação de commodities como farelo de soja e milho. O aproveitamento de resíduos da mamona, cultura mais desenvolvida na região, representa uma oportunidade de redução de custos para os sistemas de produção locais. “O Nordeste importa 780 mil toneladas de farelo de soja por ano, o que representa um custo anual de R$ 1 milhão para os produtores locais. O farelo de mamona é um alimento que tem potencial para ocupar este espaço”, ressalta o médico veterinário Marco Aurélio Bomfim,
pesquisador da área de Nutrição Animal da Embrapa Caprinos e Ovinos O aproveitamento dos subprodutos como componentes de ração animal, porém, tem necessariamente que envolver a destoxificação: a ricina, proteína da mamona, é considerada uma das mais tóxicas da natureza. Para isso, três diferentes técnicas desenvolvidas pela Embrapa e instituições parceiras já estão validadas. A de autoclavagem (em parceria da Embrapa Caprinos e Ovinos e Universidade Federal do Ceará), a de extrusão (Embrapa Agroindústria de Alimentos e Embrapa Caprinos e Ovinos) e a de uso do hidróxido de sódio (soda cáustica, também desenvolvida pela Embrapa Caprinos e Ovinos). As duas primeiras trabalham à base de variações de temperatura e pressão para eliminar a toxina e são adaptáveis por agroindústrias. Já a última tem sido uma alternativa tanto para pequenos produtores quanto para a produção em grande escala. “A destoxificação com o uso do hidróxido de sódio tem insumos baratos e de fácil aquisição, não traz riscos em sua manipulação e não deixa resíduos poluentes”, explica Marco Bomfim. A torta de mamona é misturada a uma solução de soda cáustica com uma
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Pesquisa
submetidos às dietas com farelos de soja e de mamona e os resultados não demonstraram qualquer alteração. E observe-se que estamos comparando a mamona destoxificada com o farelo de soja, fonte proteica considerada padrão no mundo”, destacou Marco Bomfim. Uma outra alternativa para contemplar pequenos produtores tem sido a experiência de validação da tecnologia junto à indústria de produção de óleos vegetais Olveq, situada em Quixadá, município do Sertão Central cearense. Lá, com a técnica de destoxificação, a indústria planeja aproveitar os subprodutos da mamona para destoxificação e produção do farelo tratado já em escalas para comercialização, inclusive para compra pelos produtores. “Estamos avaliando as possibilidades de validação da tecnologia para produção do farelo destoxificado em uma escala maior e que possa ser disponibilizado aos produtores, talvez de forma até mais barata que em um processo de destoxificação na propriedade rural”, afirmou o pesquisador. Foto: Embrapa Algodão
quantidade de 30 gramas para cada 100kg de torta ou farelo. A mistura reage por cerca de 8 horas e é então colocada para secar ao sol, estando disponível para o produtor. A rapidez e o baixo custo tornam a técnica de fácil aplicação, sem gerar grandes alterações para a rotina da mão de obra na propriedade rural. “Um processo de destofixicação pode ser realizado ao custo de R$ 0,20 de soda cáustica para cada quilo de mamona”, acrescenta Bomfim. A Unidade também tem acompanhado diretamente o desempenho de caprinos e ovinos submetidos a dietas em que o farelo de mamona substituiu o de soja. Os experimentos mostraram que não houve alteração em funções vitais e, principalmente, no desempenho produtivo, com a produção de leite caprino ou engorda de ovinos de corte permanecendo nos mesmos padrões com a nova dieta. O sabor e a aceitação do leite também não foram alterados com o uso do farelo de mamona. “Observamos a bioquímica sanguínea e funções de fígado e rins, comparando animais
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PROGRAMA DE RÁDIO FALA DO USO DO FARELO DE MAMONA PARA PEQUENOS RUMINANTES Por: Adilson da Nóbrega, jornalista da Embrapa Caprinos e Ovinos
A mamona mostra mais um potencial de utilização: como fonte de alimentação animal. Um de seus coprodutos, o farelo de mamona, é usado em pesquisas da Embrapa para nutrição de cabras leiteiras. As pesquisas mostram que o uso do farelo no composto da dieta de cabras leiteiras pode garantir produção média de até um litro e meio de leite por dia. Porém, para ser utilizado como fonte de alimentação animal, o farelo precisa passar por processos de destoxificação. No caso do Nordeste, região que concentra 93% do rebanho nacional de caprinos, o farelo destoxificado tem mostrado potencial de nutrientes para substituir o farelo de soja, evitando a importação deste produto e reduzindo custos para os produtores rurais locais. Nesta região, o aproveitamento do farelo promove a integração entre as cadeias
produtivas da caprinocultura leiteira e da mamona, relevantes para a economia da região. Trata-se de uma metodologia simples, que o pequeno produtor pode adotar. O incentivo do Governo Federal à cadeia do biodiesel traz a possibilidade de aproveitamento potencial de toneladas de material de resíduo da mamona. Saiba mais sobre o uso do farelo de mamona na alimentação de pequenos ruminantes ouvindo o pesquisador Marcos Bomfim no Prosa Rural, o programa de rádio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. O programa conta com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Acesse o link http://hotsites. sct.embrapa.br/prosarural/programacao/2013/ uso-do-farelo-de-mamona-na-alimentacao-de-pequenos-ruminantes/?searchterm=mamona para escutar este programa do Prosa Rural.
Foto: Embrapa Caprinos e Ovinos
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Pesquisa
Foto: João Eugênio Diaz
Pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos, José Luis Ascheri (esquerda) e Carlos Piler de Carvalho
EXTRUSÃO TERMOPLÁSTICA PARA DESTOXIFICAÇÃO DE TORTA DE MAMONA
54 Agroenergia em Revista
Por: João Eugênio Diaz Rocha, jornalista da
Foto: Daniela Collares
Embrapa Agroindústria de Alimentos
Os esforços de pesquisa e desenvolvimento empreendidos em diversos centros de pesquisa e empresas em todo o mundo para a inativação de proteína tóxica (ricina) e compostos alergênicos presentes na mamona obteve resultado positivo com a utilização da tecnologia de extrusão termoplástica. A extrusão é uma tecnologia que, por meio da aplicação combinada e adequada de cisalhamento, alta pressão e temperatura é capaz de alterar a estrutura das matérias-primas. A tecnologia é vastamente utilizada na produção de materiais plásticos assim como na indústria de alimentos e rações. O grupo de pesquisa de extrusão da Embrapa Agroindústria de Alimentos (Rio de Janeiro, RJ), liderado pelos pesquisadores José Luis Ascheri e Carlos Piler de Carvalho, estabeleceu o processo que torna a torta da mamona (resíduo da extração do óleo das sementes) apta para a alimentação animal com segurança, ou seja, sem risco a sua saúde. O processo passa pela moagem da torta de modo a uniformizar o tamanho das partículas, e adição de um ingrediente alcalino a fim de neutralizar o componente tóxico presente e de água. Após este condicionamento da matéria prima, o material é introduzido na máquina extrusora de parafuso simples, com os parâmetros de velocidade, temperatura e pressão devidamente ajustados para se obter o resultado desejado. Quando sai da extrusora, o material extrudado pode ser cortado uniformemente, nos chamados pellets. Após o corte, o material tem que ser submetido à secagem para ficar com a umidade aproximada de 4% a 6%. Uma vez destoxificado, o produto, adicionado de outros nutrientes, foi oferecido a cabras, na Embrapa Caprinos e Ovinos. Os animais se alimentaram bem e os resultados positivos foram confirmados com a análise do leite produzido pelas mesmas. 55
ENTREVISTA
Mercado
POTENCIAL DA TORTA DE MAMONA NO MERCADO Por: Adilson da Nóbrega, jornalista da embrapa Caprinos e Ovinos
Foto: Arquivo Pessoal
A relação entre a Embrapa e o empresário Albano Silveira, da Olveq Indústria e Comércio de Óleos Vegetais Ltda, começou em 2008. Naquela época, o pesquisador Marco Aurélio Bomfim, da Embrapa Caprinos e Ovinos (Sobral-CE), procurava parcerias no Ceará para testar, em larga escala, tecnologias que permitissem o aproveitamento de subprodutos da indústria do biodiesel para alimentação de animais. A indicação da indústria de Albano veio a partir de contato com a Petrobras, que mantém em Quixadá,
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no Sertão Central cearense, usina de biodiesel: a Olveq produz óleos vegetais, usando como matéria-prima a produção de mamona vinda de agricultores familiares. Do contato, surgiu o interesse em estabelecer parceria com a Embrapa para investir na destoxificação da torta de mamona para utilização como componente da ração dos animais. Esse trabalho inicia suas ações, envolvendo também a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Fundação Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará (Nutec), que tem a Olveq entre suas empresas incubadas. O desafio será o de produzir a torta destoxificada em escala industrial para inserir o produto no mercado. Para isso, a Olveq entrará com o fornecimento da torta de mamona bruta e o desenvolvimento de equipamentos que permitam a produção da torta destoxificada em maior escala (cerca de 500 kg por vez) e a Embrapa com as alternativas químicas para o processo de destoxificação e os posteriores testes da torta destoxificada para a alimentação dos animais em seus rebanhos - estes, previstos para 2014. Em entrevista à Embrapa, Albano Silveira fala sobre o potencial da utilização da torta de mamona como ração animal, com benefícios para os criadores de animais e para a cadeia produtiva da mamona.▶
Agroenergia em Revista - Senhor Albano, qual o potencial da utilização da torta da mamona? Albano Silveira - Tem um potencial imenso. Estamos falando do mercado que o algodão e a soja ocupam hoje. Para que a mamona como ração animal entre nesse segmento, vamos ter que produzir em larga escala - estamos falando de milhões de toneladas. Então, realmente se for pelo fato do mercado, não seria nenhum empecilho. Qualquer ração animal que tem valor proteico como a soja e o algodão hoje tem mercado garantido. Logicamente que acompanhando o preço de mercado deles. AR - Atualmente, qual o destino da torta da mamona? Albano - Hoje utilizamos o subproduto como adubo orgânico, pois ele tem nitrogênio, fósforo e potássio. AR - O senhor acredita que, com essa tecnologia, que é capaz de destoxificar a torta de mamona, vai gerar boas oportunidades de negócios para quem trabalha nessa área? Albano - Exatamente, eu tenho certeza disso. A destoxificação dela, em si, já está praticamente dominada. Precisamos bater na tecla para que as pessoas desmistifiquem que a torta é tão maléfica. Para se ter uma ideia, nessa última seca que passamos, chegamos a dar até as cascas de mamona para alguns animais em substituição ao capim, 50% foi dado como casca triturada e não perdemos nenhum animal. Isso é um trabalho que eu entendo que
a Embrapa vai esclarecer, a Embrapa vai ter essa credibilidade de explicar para as pessoas que não há malefício no consumo. AR- Onde o senhor compra a mamona? Albano - A mamona é fornecida por milhares de agricultores familiares aqui no Ceará, no Rio Grande do Norte e parte do Piauí. Há um convênio feito pela Aprobio [Associação Brasileira dos Produtores de Biodiesel] com o Estado do Ceará e o produto é adquirido basicamente destas pessoas, mas uma parte também é adquirida de produtores independentes. AR - E como é feita a produção da torta da mamona? Albano - É o seguinte, a nossa indústria é uma indústria primaria. Você extrai a mamona na prensa, ela gera dois produtos: óleo e torta. O óleo, nós damos um trato especial nele que é triturar, secar e depois filtrar de novo, que é pra ele ter valor agregado. A torta, só pela extração já gera o adubo. AR - Essa torta já é vendida como adubo? Albano - Exatamente, ela hoje já é comercializada como adubo, porque não foi especificado o produto ração. Para eu comercializar a torta de mamona como ração animal, eu tenho que criar o rótulo, definindo [a eliminação da] toxina e vários outros parâmetros, como as proteínas, com a experiência da Embrapa e que vai dar comprovação e credibilidade à ração. Espero que vamos provar o potencial que é a torta de mamona como ração animal.
Fotos: Embrapa Algodão e Embrapa Caprinos e Ovinos
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Foto: Goreti Braga
ENTREVISTA
Mercado
Giovanni Venturini Del Greco CEO da Agroils
EMPRESA ITALIANA INVESTE EM PROCESSAMENTO INDUSTRIAL INTEGRADO DE PINHÃO-MANSO
No ano passado, o italiano Giovanni Venturini Del Greco cruzou o Oceano Atlântico e veio ao Brasil participar do Simpósio de Destoxificação e Aproveitamento das Tortas de Pinhão-manso e Mamona, promovido pela Embrapa Agroenergia e a Embrapa Algodão, com o apoio do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Ele é CEO da empresa Agroils, sediada em Florença, na Itália, que tem no pinhão-manso seu principal negócio. Nessa entrevista, concedida por e-mail, em inglês, ele fala sobre os usos que a empresa está estudando para a torta da oleagionosa. Agroenergia em Revista - Sua empresa está desenvolvendo tecnologias para usar a torta de pinhão-manso. Com quais usos vocês estão trabalhando? Giovanni - A Agroils desenvolveu um processo integrado para a produção de óleo de qualidade superior para a produção de biodiesel e biocombustíveis de aviação; torta destoxificada para ser utilizada como ração para ruminantes e, finalmente, proteínas valiosas e bioativos para aplicações técnicas/farmacêutica. AR - Que estratégias vocês estão usando? Estão tentando destoxificar a torta? Giovanni - Quanto ao óleo, a Agroils validou totalmente o processo, produzindo um óleo vegetal com características altamente desejáveis como baixa acidez, alta estabilidade e baixo teor de minerais. Nesse sentido,
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Agroenergia em Revista - Your company is developing technologies to use the Jatropha cake. Wich uses are you working with? Giovanni - Agroils has developed an integrated process for the production of a) a superior quality oil for biodiesel and biojet fuel production, b) a detoxified cake to be used as animal feed for ruminants and, finally, c) valuable proteins and bioactives for technical/ pharma applications. AR - What strategies are you using? Are you trying to detoxify the cake? Giovanni - Regarding the oil, Agroils has fully validated the process, producing a vegetable oil with highly desirable characteristics as low acidity, high stability and low minerals content. On this regard, we look forward to test our oil for the production of biojet fuel.
estamos trabalhando para testar o nosso óleo para a produção de biocombustível de aviação. Quanto à torta destoxificada, testamos com sucesso o produto com ruminantes e agora queremos estender o teste para espécies monogástricas. Finalmente, estamos animados com a possibilidade de usar proteínas de Jatropha também para aplicações técnicas, como para a produção de emulsificantes. Como empresa, nós acreditamos fortemente na colaboração com outras empresas e centros de pesquisa. Estamos colaborando ativamente com duas universidades europeias, mas também estamos buscando cooperação com organizações brasileiras, indonésias, chinesas e indianas. AR -Que método foi usado para destoxificar a torta de pinhão-mano? Giovanni - É um método físico e químico. AR -Nos testes conduzidos com ruminantes, quanto da ração tradicional foi substituída pela torta de pinhão-manso. Giovanni - Aproximadamente 25% AR - Sua empresa já está comercializando algum produto da torta? Giovanni - Nós começamos agora a comercializar o óleo, enquanto que, para o uso da torta para a formulação de rações, primeiro precisamos obter as autorizações necessárias. Nossa empresa iniciou o processo com a Comissão Europeia e estamos começando a olhar para os potenciais parceiros de outros países, especialmente onde o pinhão-manso é cultivado, como o Brasil, para replicar o processo. AR - Que papel o pinhão-manso tem nos negócios da sua empresa?
Regarding the detoxified cake we have successfully tested the product with ruminants and we are now interested in extending the test to monogastric species. We are finally thrilled by the possibility to use Jatropha proteins also for technical applications as for the production of emulsifiers. As company we truly believe in the possibility to collaborate with other companies and research centers. We are actively collaborating with two European University, but we look forward to cooperate with Brazilian, Indonesian, Chinese and Indian organizations. AR -What method had been used to detoxify the Jatropha cake? Giovanni - It is a physical and chemical method AR -In the tests conduced with ruminants, how much (%) of the traditional feed was replaced by the Jatropha cake? Giovanni - Approximately 25%. AR - Are you already commercializing any products from Jatropha cake? Giovanni - We have just started to commercialize the oil, while for the use of the cake for the formulation of animal feed, first we need to address regional regulatory frameworks to obtain the necessary authorizations. Our company initiated the process with the European Commission and we are starting to look at potential partners in other countries, especially where Jatropha is cultivated as Brazil, to replicate the process. AR - Tell us about the role of the Jatropha in your company business. Giovanni - Since 2011 Agroils has decided to focus on the technological breakthroughs of the Jatropha industry. After being involved in the development of Jatropha cultivation,
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ENTREVISTA
Mercado
Giovanni - Desde 2011, a Agroils decidiu se concentrar nos avanços tecnológicos da indústria de pinhão-manso. Depois de ter se envolvido no desenvolvimento do cultivo de pinhão-manso, especialmente em países africanos, percebemos que a rentabilidade da indústria da Jatropha, na ausência de uma opção válida para a valorização dos coprodutos (torta, proteínas), foi muito baixa. No entanto, com a aplicação do conceito de biorrefinaria ao pinhão-manso, um paradigma mais sustentável e rentável pode ser alcançado. AR - Em que países a empresa atua? Giovanni - Além dos nossos centros de pesquisa e desenvolvimento na Califórnia e na Itália, nós atuamos na República Dominicana e em Camarões. Na República Dominicana, temos provado o conceito da nossa tecnologia, trabalhando com parceiros locais. Agora é possível dizer que, na República Dominicana, nós estabelecemos a primeira biorrefinaria de pinhão-manso no mundo. Nós instalamos uma planta de processamento de pinhão-manso e o integramos a uma fábrica de biodiesel a partir de óleo usado. O biodiesel é vendido para os setores automotivo e de geração de energia. Na entrada da planta, estão as sementes de pinhão-manso e óleos residuais; na saída, biodiesel, eletricidade, sabão e ração animal. Todos os produtos já são comercializados. Em Camarões, estamos apoiando uma empresa local em um projeto financiado pela União Europeia para eletrificação da aldeia, com base no uso do óleo de pinhão-manso produzido localmente. O óleo é usado diretamente para movimentar uma plataforma multifuncional e fornecer eletricidade para o hospital local. Neste projeto, espera-se validar o enorme potencial do pinhão-manso para aplicações de pequena escala também.
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especially in African countries, we realized the profitability of the Jatropha industry in absence of a valid option for the valorization of the co-products (cake, proteins) was too low. On the contrary, by applying a biorefinery concept to Jatropha, a more sustainable and profitable paradigm can be achieved. AR - In wich countries are you working? Giovanni - A part from our R&D centers in California and in Italy, we have established a presence in Dominican Republic and Cameroun. In Dominican Republic we have proved the concept of our technology working with local partners. It is now possible to say in DR we have established the first Jatropha biorefinery in the World. We have installed a jatropha processing plant and integrated it within a waste oils to biodiesel factory. The biodiesel is sold to the automotive and power generation sectors. The input of the plant are Jatropha seeds and waste oils. The outputs are biodiesel, electricity, soap and animal feed. All products are being already commercialized. In Cameroun, we are supporting a local company on a EU funded village electrification project based on the use of locally produced Jatropha oil. The oil is directly used to run a multifunctional platform and to provide electricity to the local hospital. In this project, we expect to validate the tremendous potential of Jatropha for small scale applications too.
“Agora é possível dizer que, na República Dominicana, nós estabelecemos a primeira biorrefinaria de pinhão-manso no mundo.”
Publicações
Quer conhecer os resultados das pesquisas da Embrapa com pinhão-manso e mamona? Acesse artigos e outras publicações científicas nos repositórios on-line:
Infoteca-e: conteúdos editados na própria Embrapa (em forma de cartilhas, livros para transferência de tecnologia, programas de rádio e de televisão), com linguagem adaptada de modo que produtores rurais, extensionistas, técnicos agrícolas, estudantes e professores de escolas rurais, cooperativas e outros segmentos da produção agrícola possam assimilá-los com maior facilidade.
Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento
“Avaliação da Diversidade Genética do Banco de Germoplasma de Pinhão-manso por Marcadores Moleculares” – Embrapa Agroenergia “Árvore do conhecimento da cultura da mamona para a agricultura familiar nordestina” – Embrapa Algodão
“Análise de crescimento de cultivares de mamona semeadas em diferentes épocas” – Embrapa Clima Temperado
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Publicações
Alice: capítulos de livros, artigos em periódicos indexados, artigos em anais de congressos, teses e dissertações, notas técnicas, entre outros. http://www.alice.cnptia.embrapa.br/ Capítulo de livro
“Pinhão-manso: potencialidade, desafios e perspectivas do cultivo para produção de óleo no estado do Espírito Santo” – Embrapa Agroenergia
Artigos
“Conteúdo de éster de forbol vs. produção de grãos de pinhão-manso” – Embrapa Agroenergia “Análise bioeconômica da substituição do farelo de soja pelo de mamona para ovinos em confinamento” – Embrapa Algodão
http://www.embrapa.br/liv
Coleção 500 Perguntas 500 Respostas: Mamona
O Agronegócio da Mamona no Brasil 62 Agroenergia em Revista
Conheรงa as tecnologias que ajudaram a transformar o Brasil: www.embrapa.br/40anos