MONOGRAFIA - Modos de Morar em São Paulo [4º semestre]

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sĂŁo paulo, sp

casa do bandeirante

um estudo sobre:



autores: BÁRBARA CATTA ERICA BORTOLETTO FERNANDO FRANÇA VICTOR D’AGOSTINO



Fig. 01. Detalhe da fachada sul da Casa do Bandeirante. Erosão próxima ao solo marca a técnica construtiva usada nessa edificação. Fotografia: Bárbara Catta, 2017.


CASA BANDEIRISTA Casa do Bandeirante


casas bandeiristas e suas características Através da identificação de constantes tipológicas em comum o arquiteto e pesquisador Luiz Saia, em seu artigo “Notas sobre a arquitetura rural do segundo século” de 1944, elaborou as primeiras caracterizações sobre as casas rurais paulistas sendo elas: planta regular; taipa de pilão como técnica construtiva, telhado de quatro águas; implantação à meia encosta, perto de um riacho; organização em três seções principais – social, familiar e serviço; fachada principal contendo um alpendre central e mais dois cômodos onde funcionavam uma capela e um dormitório para hóspedes. O arquiteto, classificou-as em “puras” as quais são as nitidamente seiscentistas e “tardias” nas quais ocorria ausência de algumas contastes em decorrência da alteração social e econômica consolidada na região. Segundo Luiz, o partido arquitetônico das casas estava ligado aos termos sociológicos de modo a exemplificar o caráter psicológico e social do fazendeiro paulista daquele tempo, diferenciando e potencializando o poder do colono seiscentista agenciador de bandeiras, dono das terras, da família e da escravaria, distribuidor de justiça e religião do ordinário bandeirante. De acordo com Saia,

da fase transitória dessa condição até a destruição total do prestígio paulista com a descoberta do ouro, o esquema arquitetônico também foi perdendo sua firmeza e definição sobretudo nas técnicas construtivas e na qualidade dos materiais empregados nas edificações já que a retirada dos paulistas para Minas escasseou a boa mão de obra que era antes farta. O fazendeiro nesse momento, mesmo rico, não estabelecia mais o mesmo status social que o colocava de maneira centralizadora no poder, na justiça e na religião. A arquitetura anteriormente perfeita repleta de originalidade nas adaptações das formas europeias às condições ambientais tropicais se sujeitou, portanto, a acolher soluções estranhas explicando assim a existência de exemplares desconformes com o padrão “puro”.


Fig. 02. Detalhe da fachada sul da Casa do Bandeirante. Fotografia: Bรกrbara Catta, 2017.


o modo de morar

No livro “Morada Paulista” também de Luiz Saia, evidencia-se o caráter feudal da morada paulista seiscentista fixado na fachada principal e denunciando os elementos fundamentais da organização familiar da época a qual consistia em resguardar muçulmanamente seus membros no interior da habitação. Segundo o autor, aos hóspedes, agregados, escravos e qualquer pessoa não pertencente à família era concedido um cômodo nesta fachada sem ligação com o interior da morada, desse modo sua presença era avulsa a rotina da família. Havia também um alpendre, peça mais característica deste tipo de habitação, onde o senhor, como um pretor, distribuía ordens e justiças ou se metia em briga entre famílias rivais. Ao seu lado se abria uma capela a qual só se tinha acesso o clero e gente da família, formando assim, a linha de frente que ligava a vida doméstica do bandeirista ao resto do feudo e do mundo. Hóspedes, escravos e agregados assistiam as celebrações do lado de fora, no alpendre. No interior da habitação, segundo o autor, organizava-se o espaço estritamente reservado a família. Quartos dispostos lateralmente e uma ou duas salas de distribuição na parte central. Não havia compartimento de sanitário e apenas os exemplares mais tardios encontrou-se vestígios interpretáveis de possíveis cozinhas, mas em sua maioria essa atividade era executada na parte externa da residência.


a casa do bandeirante

Localização - Praça Monteiro Lobato, s/n - SP Técnica construtiva - Taipa de Pilão Data da Construção – Desconhecida, séc. XVIII Autor - Desconhecido Data da Reforma - 1954 Autor - Luiz Saia, arquiteto e pesquisador, graduado em engenharia e arquitetura pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Foi diretamente responsável pela restauração de mais de 30 edificações seiscentistas rurais e pela proposição de tombamento de diversos monumentos e coleções de obras de arte, distribuídas pelos estados do sul do Brasil. Promoveu ainda duas grandes pesquisas sobre coleções de obras de arte e sobre a arquitetura do café. Foi coordenador de diversos cursos, entre os quais o de Especialização em Restauro de Bens Culturais e Conjuntos Arquitetônicos promovido pelo IPHAN e pela Faculdade de Arquitetura da USP, em 1.974. Professor Livre Docente da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, foi ainda responsável pelos Planos Diretores das cidades de Anápolis, Goiânia, São José do Rio Preto, Lins e Águas de Lindóia, além de grande número de projetos de residências, hospitais e pavilhões para exposições.


Fig. 03. Fachada Oeste da Casa do Bandeirante. Fotografia: Bรกrbara Catta, 2017.


origens

Reconhecida como uma autêntica relíquia arquitetônica do século XVIII, a Casa do Bandeirante é um exemplar típico de moradia rural paulista da época inicial do Ciclo do Ouro, o qual por iniciativa dos bandeirantes paulistas alargou as fronteiras do interior da pátria. Localizada além do rio Pinheiros, assim como todas suas terras vizinhas, seu lote apresenta questões controversas devida a complexidade topográfica da região. Márua Roseny Pacce, historiadora do Departamento do Patrimônio Histórico, considerou até recentemente que a área de seu lote pertenceu originalmente a Affonso Sardinha, antigo povoador paulista, que em 06 de setembro de 1584 recebeu por carta de sesmaria as terras entre os ribeirões Pirajussara e Jaguaré. Porém, através de pesquisas de documentos cartoriais foi esclarecido que se tratava de duas propriedades distintas.


De acordo com Lia Mayumi (2008, p.78):

Fig. 04 (esquerda) Casa indicada sobre promontório na várzea do rio Pinheiros. Mapa SARABRASIL, 1930. Fig. 05 (centro). A casa, na praça do loteamento City Butantã. O rio Pinheiros retificado. Ano 2000. Fonte: PMSP/SEMPLA. Fig. 06. (direita) Situação paisagística da casa do Butantã no início da década de 1980, que permanece até hoje com pequenas alterações. Acervo DPH/ Pres./ STPRC.

“A mais antiga e conhecida referência documental sobre o sítio que deu origem ao atual loteamento City Butantã, onde se localiza a casa, data de 1822. O proprietário do sítio era Antônio Corrêa de Moraes, que o doou naquele ano aos seus afilhados Generoso e Francisco, filhos de Joaquim Aranha. Em 1843 os dois afilhados vendem a área a Joaquim José Mariano de Medeiros, casado com Albina da Luz. Com a morte de Joaquim de Medeiros, a viúva Albina e seu filho Marcelino herdam a propriedade. Em 1853 ambos, juntamente com a esposa de Marcelino, Anna Francisca, vendem a propriedade a Vicente Xavier de Medeiros, que a vende em 1864 ao Comendador Luiz Antônio de Souza Barros, casado com Felicíssima de Campos Barros. Nessa escritura de venda e compra o sítio aparece pela primeira vez com a denominação de “Rio Abaixo dos Pinheiros”, e pela primeira vez se faz referência a “casas”, quando são descritas benfeitorias existentes na propriedade tais como casas, moenda para cana e pastagens. Um ano depois, em 1865, o Comendador e sua esposa Felicíssima vendem o Sítio do Rio Abaixo de Pinheiros a Eugênio Vieira de Medeiros. Com o falecimento deste, sua esposa Rita Maria de Medeiros e seus herdeiros vendem a propriedade em 1911 à Companhia Edificadora de Villa América. Na ocasião consta ter a propriedade a extensão de cento e vinte e dois alqueires. No mesmo ano Edouard Fontaine de Laveleye adquire a propriedade, e no ano seguinte, 1912, vende-a à Companhia City of São Paulo Improvements and Freehold Land Company Limited13 que, ao lotear a gleba, doa à Prefeitura em 1944 o lote onde se situa atualmente a Casa do Butantã (PACCE 1980).”


a implantação

Fig. 07. Divisão da Casa do Bandeirante. Fonte: Guia da Casa do Bandeirante: Ensaio e recomposição do ambiente rural doméstico paulista de primórdios do século XVIII. Fonte: Guia da Casa do Bandeirante


01- Alpendre ou pretório 02- Quarto de hóspede 03- Capela 04- Quarto do dono da casa 05- Sala social da casa 06- Quarto das redes

07- Quarto de donzela 08- Sala Íntima 09- Quarto de Trabalho (Geniceu) 10- Alpendre dos Fundos 11- Quarto de ferramentas e dos arreios 12- Despensa

O interior da habitação segundo o artigo “Guia da Casa do Bandeirante: Ensaio e recomposição do ambiente rural doméstico paulista de primórdios do século XVIII” era constituído pelo Quarto de Dormir do Dono, o qual era caracterizado pela sua amplitude e por conter com um forro no qual eram guardados os principais valores da casa; a Sala Social; o Quarto das Redes o qual era usado pelos moços da casa; o Quarto de Donzela; a Sala Íntima de acesso restrito familiar; o Quarto de Trabalho (Gineceu) onde as mulheres e escravas da casa teciam e costuravam; Alpendre de Serviço onde era preparado a comida; Quarto de Ferramentas e Arreio onde ferramentas, muito preciosas na época, eram guardados dentro da casa; Dispensa onde era guardada os mantimentos, remédios caseiros e etc. Na parte externa encontravam-se as maquinas destinadas ao preparo de diversos produtos básicos da alimentação e sobrevivência como: farinhas, polvilho, açúcar, óleos e algodão. A Casa da Farinha era uma construção de pau-a-pique onde existiam maquinas para socar milho ralar mandioca, forno, pilão e diversos acessórios ligados a fabricação da farinha. Existia também a Casa da Moenda onde era espremida a cana de açúcar para transforma-la em garapa e depois em açúcar.


os cômodos

Fig.08. Fachada Leste (principal). Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.09. Quarto de Hóspedes, adaptado para sediar a administração da Casa do Bandeirante. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.10. Capela da Casa do Bandeirante. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017


Fig.12. Sala Social da Casa com vista para o Alpendre. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.13. Quarto das Redes com vista para Sala Social. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

os cômodos

Fig.11. Quarto do Dono da Casa com passagem para a Capela. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017


os cômodos

Fig.15. Quarto de Donzela. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.14. Sala Íntima com vista para Alpendre de Serviço e Quarto de Donzela. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.16. Quarto de Trabalho (Geniceu). Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017


os cômodos

Fig.17. Fachada Oeste (fundos) com Alpendre de Serviço e Fachada Sul. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017

Fig.18. Quarto de ferramentas e arreios. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017 Fig.19. Despensa com vista para Alpendre de Serviço. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017


a técnica construtiva

A edificação originalmente é inteira feita de taipa de pilão, técnica milenar registrada em todos os continentes. Segundo Chico Mendes em “Arquitetura no Brasil – de Cabral a Dom João VI”, utiliza-se o barro, água fibras vegetais e algum tipo de aglomerante, podendo ser estrume ou sangue de animais. Dentro de uma forma de madeira chamada “taipal”, confeccionada por tábuas com cerca de 0,4m de altura, coloca-se todos os componentes. A mistura é compactada em camadas de 0,2m em 0,2m, retirando assim, a umidade para assentar a mistura posterior. Devido a fragilidade da mistura, as paredes precisam ter, pelo menos 0,6m de espessura, proporcionando um bom isolamento térmico.


Todavia, devido a sua vulnerabilidade à água as paredes precisam ser protegidas por amplos beirais e construídas acima do nível do terreno, apoiada em fundações de pedra ideais para o clima tropical. O beiral em cachorrada é original da edificação, sua aplicação decorre da ausência de lajes, necessitando de uma amarração de peças independentes para que sua função principal seja cumprida. Os elementos de acabamento receberam entalhamento de marcenaria sofisticada trabalhadas em ornamentos. As esquadrias são previamente determinadas com a inserção de esteios de pedra ou madeira como guarnição das envasaduras, gerando nichos internos que posteriormente são ocupados com conversadeiras. Fig. 20. Devido ao processo construtivo, a taipa de pilão necessita de um contingente significativo de mão de obra para agilizar a linha de montagem: preparação e mistura da argamassa, transporte da massa, execução de fôrmas e vergas e apiloamento dentro do tempo mínimo necessário para evitar a completa secagem da argamassa, antes da aplicação da camada superior. Ilustração: Chico Veríssimo. Fonte: Arquitetura no Brasil de Cabral a Dom João VI, 2007 Fig.21. O processo de sustentação da fôrma para receber as camadas sucessivas de argamassa apiloada. Ilustração: Chico Veríssimo. Fonte: Arquitetura no Brasil de Cabral a Dom João VI, 2007 Fig.22. Execução do taipal e o processo de apiloamento da argamassa para adensamento da taipa. Ilustração: Chico Veríssimo. Fonte: Arquitetura no Brasil de Cabral a Dom João VI, 2007 Fig.23. Elementos construtivos do beiral em cachorrada. Ilustração: Chico Veríssimo. Fonte: Arquitetura no Brasil de Cabral a Dom João VI, 2007 Fig.24. Beiral da Casa do Bandeirante. Fotografia: Bárbara Catta, novembro 2017


o restauro e seus processos Após a doação pela Companhia City à prefeitura em 1950, a casa foi invadida por diversas famílias que a ocuparam até o início das obras de restauração. Em 1954, próximo a sua data de restauro, a casa encontrava-se sem o madeiramento correspondente à área central da casa, com diversas patologias como: erosão das paredes perto do solo devido ao contato com a água da chuva; lacunas nas paredes devido a insetos, cabodás e desagregação localizada; fendas e trincas nas paredes; separação das paredes de taipa nos cunhais; envasaduras primitivas emparedadas com alvenaria de tijolos ou pau-a-pique; paredes primitivas desaparecidas e paredes não primitivas construídas posteriormente; esquadrias alteradas ou apodrecidas; cobertura alterada; revestimento ausente.

Fig. 25. Páteo formado no centro da construção, onde a cobertura fora removida. Fotografia: Germano Graeser, março de 1954. Acervo PMSP/DIM.

Fig. 26. Fachada Sul. Base de parede erodida por respingos de chuva. Esquadrias desaparecidas. Lacunas preenchidas com tijolos de barro. Fotografia: Germano Graeser, março de 1954. Acervo PMSP/DIM


O partido arquitetônico estabelecido para o restauro consistiu em reproduzir a feição primitiva conhecida do edifício, baseada na tese de 1944 de Luiz Saia sobre as casas rurais paulistas. A obra foi dividida em etapas, a primeira delas consistia na consolidação de vestígios que orientassem a recomposição da configuração prístina, ignorando marcas intermediárias entre o imaginado primitivo e o presente visível. Foi retirado também todo revestimento da taipa para examinar o estado de estabilidade estrutural e confirmar a presença das constantes típicas das residências bandeiristas. A primeira etapa da obra, portanto, consistiu na prospecção de paredes e pisos, removendo seus revestimentos, paredes não originais e divisórias.

Fig. 27. Desmontagem da parede de pau a pique que fechava o alpendre Leste, julho de 1954. Fonte: Caderno de Obras – Casa do Bandeirante. Acervo PMSP/Pres. Fig. 28. (direita) Vestígio de muro de taipa revelado após a demolição da parede que fechava o alpendre Leste, agosto de 1954. Fonte: Caderno de Obras – Casa do Bandeirante. Acervo PMSP/Pres. Fig. 29 (esquerda). Alicerce já descoberto, de parede que existiu no cômodo central, julho de 1954. Fonte: Caderno de Obras – Casa do Bandeirante. Acervo PMSP/Pres


o restauro

A segunda etapa consistiu na desmontagem do madeiramento leve do telhado e remoção das peças não originais que haviam na casa, examinando o sistema construtivo total e definindo o conceito de consolidação estrutural da obra. Após todo o levantamento foi constatado que o edifício, mesmo com muitos pontos lacunosos na taipa, não apresentava problemas estruturais. A estrutura do telhado foi reconstruída adotando a original intenção de não lançar nenhum esforço na lateral das paredes.

Fig. 30. Planta baixa e do telhado, antes da restauração, elaboradas com base no exame das fotografias e anotações do Caderno de Obras

Fig. 31. Planta baixa e do telhado, depois da restauração, elaboradas com base em levantamento no local.


o restauro Para terceira etapa foi preciso reparar as paredes que se encontravam separadas por falta de amarração optando pela introdução de uma cinta de concreto sobre o respaldo das paredes concêntricas. Uma vala no respaldo das paredes foi aberta para executar a cinta de forma que ficasse invisível, não alterando a altura do edifício.

Fig. 32. A Comissão do IV Centenário visita a obra, em 23-10-1954. Acervo DPH/ DIM.

Fig. 33. “Placas protetoras” de concreto prontas, nas bases das paredes, em outubro de 1954. Fonte: Caderno de Obras – Casa do Bandeirante. Acervo PMSP/Pres.

A quarta etapa compreendeu a restauração das esquadrias, reconstrução das paredes centrais e acabamentos. Logo em seguida a quinta etapa concluiu a obra com os revestimentos adequados para as paredes.


Fig. 34. Fachada Leste (principal) antes da restauração. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 35. Fachada Leste depois da restauração, revestida e caiada. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 36. Fachada Norte (lanço direito) antes da restauração. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 37. Fachada Norte depois da restauração, revestida e caiada. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008


Fig. 38. Fachada Oeste (posterior) antes da restauração. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 39. Fachada Oeste depois da restauração, revestida e caiada. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 40. Fachada Sul (lanço esquerdo) antes da restauração. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008

Fig. 41. Fachada Sul depois da restauração, revestida e caiada. Fonte: Taipa, canela preta e concreto, 2008


o museu

Em 30 de outubro de 1955, a casa transformou-se em um museu evocativo da época das bandeiras, com acervo próprio, a partir do recolhimento de móveis, utensílios e outros objetos históricos no interior de São Paulo, Minas Gerais e Vale do Paraíba. Hoje a casa faz parte do acervo do Museu da Cidade de São Paulo, sendo um ponto turístico, ícone de um passado histórico idealizado. Segundo a equipe do educativo disponível do museu, foram retirados, na atual gestão do Museu da Cidade, todos os objetos e mobiliários presentes anteriormente a fim de evidenciar apenas a arquitetura do edifício.



Fig 42. Detalhe da torre com cúpula arabesca que curiosamente não possuia entrada. Puramente um luxo frontal utilizado como cenário do palacete eclético de Joaquim Franco de Mello. Fonte: Haresdp, 2016.


PALACETE ResidĂŞncia Franco de Mello


o palacete

INFORMAÇÕES BÁSICAS Localização - Avenida Paulista, 1919 - Bela Vista, SP (antigo lote n.90) Técnica Construtiva: Alvenaria Estrutural de Tijolos de Barro Data da Construção - 1905 Autor - Antonio Fernandes Pinto, sem diploma de engenheiro ou arquiteto, pouco se sabe sobre o empreiteiro português. Após a obra, largou rapidamente sua profissão de construtor para viver de juros, à semelhança de seu antigo contratante, tornando-se proprietário de prédios de aluguel (Revista CPC, 205). Data da Reforma - 1921 Autor - Luiz Ferreira, construtor, e Armando Reimann, arquiteto elaborador dos desenhos das fachadas. Também pouco se sabe acerca da vida desses, a não ser que Armando trabalho no escritório Técnico Ramos de Azevedo durante a década de 1910 (DIAS, 2010).


“A residência para membros da elite era o quartel general da casa, de onde partia o agenciamento de seu status e dos negócios, conquistando a maturação social e autonomização econômica do novo núcleo familiar. Junto das recepções, as atribuições físicas da casa informavam aos outros os valores, a riqueza e as relações da família: a começar pela escolha do bairro, passando pela elegância de sua aparência, até a mobília que povoava o lar.” (REVISTA CPC, 2015, p.43)

Imagem: Avenida Paulista, 1902

Fig 43. Avenida Paulista, 1902. Fonte: Exposição Área Paulista


a vida da elite paulista

RIQUEZA E ARQUITETURA Em 1893, junto a implementação do serviço sanitário, formam-se os bairros e definem-se os modos de habitar. A arquitetura e a construção civil entram em pleno ecletismo. Os italianos que constituíam cerca da metade da população, introduziram sua cultura que se viu refletida no modo de vida elegante dos barões do café. Deste modo, os imigrantes, essencialmente europeus, imprimiram sua marca nos costumes, na culinária e nos linguajares paulistanos. O pacato burgo que já fora São Paulo, se encheu de vida. Com a industrialização e a geração de energia elétrica, vieram os bondes elétricos, a expansão urbana e a iluminação elétrica urbana. Surgiram as primeiras refinarias de açúcar e máquinas de beneficiar arroz e café. Dentro dessa conjuntura, ao mesmo tempo em que novas fortunas, aumentavam-se o número de palacetes. Algumas avenidas foram ocupadas e se transformaram em áreas exclusivas desse tipo de moradia. A avenida Paulista e ruas adjacentes, por exemplo, foram ocupadas por grandes in-

dustriais e famílias tradicionais de imigrantes. Os estilos eram os mais diversificados, sugerindo seus países de origem. Por parte do Estado e da prefeitura houve a continuidade de mecanismos que se adequassem a esse novo modo de vida. As habitações, agora construídas com alvenaria de tijolos autoportantes, eram implantadas sobre um porão baixo a fim de evitar a umidade no assoalho – apesar das outras funções que no dia-a-dia lhe eram atribuídas. No exterior, encontravam-se árvores floríferas e frutíferas, espaço para horta e jardim cujas flores poderiam ser utilizadas na decoração da residência. No seu interior, observavam-se mosaicos no piso, escadarias em mármore, portas-balcão, clarabóias, vitrais e uma grande quantidade de adornos. Dentre os cômodos, a sala de jantar dispunha de serviços anexos, como copa, cozinha e despensa. O hall, a sala de visitas e a sala de estar abrigavam estantes de livros que elucidavam o nível intelectual dos moradores. Todas características que tinham como finalidade afirmar a elegância, poder e prestígio do proprietário.


a família franco de mello MARIDO, ESPOSA E FILHOS

O Palacete localizado na principal avenida da elite cafeeira de São Paulo foi encomendado por Joaquim Francisco de Mello, de quem originou seu atual nome. Francisco, recém-casado com Lavínia Dauntre Salles de Mello, era envolvido com negócios imobiliários e atividades agrárias oriundas de seu patrimônio familiar, assim, era retratado nos jornais da época ora como capitalista ora como fazendeiro. Sobre o passado de sua esposa, Lavínia, sabe-se que ingressou na Escola Normal de São Paulo e foi nomeada professora da Escola de Veados em Colombo, entretanto após casamento dedicou-se inteiramente a administração do lar e da vida familiar.

Fig 45. D. Lavínia Dauntre Salles de Mello com os filhos Raul (à esquerda), Raphael (à direita) e Rubens (à frente). Fonte: Álbum de família.

Juntos, o casal tiveram 3 filhos, Raul, Raphael e Rubens, presentes na foto ao lado. Através da fotografia podemos perceber que apesar do rigor da vestimenta e a decoração ao fundo, a imagem traz a percepção de uma convivência saudável e harmônica entre a família.

Fig 44. Retrato de Joaquim Franco de Mello, 1937. Fonte: Fallecimentos. O Correio Paulistano, 10 dez. 1937


O antigo lote de número 90, atual número 1919 da Avenida Paulista, possuia dimensões de 118 por 40 metros, no entanto Joaquim dividiu-o em duas partes de 20 metros de largura. O lado mais próximo à Vila Fortuna seria utilizado para abrir um futuro negócio e o outro foi destinado para implantação da residência da família. A construção da residência ficou a cargo do empreiteiro Antonio Fernandes Pinto que não possuia diploma de engenheiro ou arquiteto. O projeto em estilo eclético demonstra um tom pitoresco por conta das suas características de chalé que marcavam

também o perfil da família e sua apreço pela simplicidade e tranquilidade. A técnica construtiva utilizada foi a alvenaria de tijolos autoportantes em oposição a tradicional taipa de pilão. A morfologia do palacete foi definida pelo formato retangular e estreito do terreno, com recuos de 7 e 5 metros nas laterais e um jardim contínuo que emoldurava o perímetro do lote. A residência com pé direito no térreo de 4,5 metros e 2 metros no porão possuia um programa que atendia as necessidades básicas da estrutura familiar da época setorizando seus usos e fluxos.

o lote n.90

IMPLANTAÇÃO E CONSTRUÇÃO

Fig 46. Residência Franco de Mello, palacete em 1913. O lote vazio deixado para negócio, aparece no mapa incorporado ao terreno de Thiollier. Fonte: SARA BRASIL 1930.


Fig 47. Foto de pintura prospectada em cômodo frontal, no porão da residência. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.

as mudanças no palacete COTIDIANO, PROGRAMA DE NECESSIDADES E SEUS USOS 1905-1921-ATUAL


cotidiano, programa de necessidades e seus usos

O primeiro programa de necessidades da residência foi concebido através das necessidades de Joaquim e Lavínia e das suas expectativas acerca do futuro.

1905

ORIGEM

O segundo programa foi fruto da reforma feita em 1921, pelo construtor Luiz Ferreira e pelo arquiteto Armando Reimann que elaborou o desenho das fachadas. A reforma foi consequência do aumento da família – nascimento de Raphael, primeiro filho do casal – e do seu crescente enriquecimento. Com isso, além da ampliação da residência, o terreno ao lado originalmente comprado para negócios, tornou-se o jardim da casa. Mudando do estilo romântico para um estilo mais palaciano, o projeto definiu a volumetria e a maior parte dos elementos das fachadas atuais. A atenção se focou à fachada frontal e às laterais visíveis da rua, o que é ressaltado pela diferença entre a cobertura da frente e a dos fundos. A primeira exibia uma mansarda à francesa alta e a segunda um telhado mais baixo embutido em platibandas. Curiosamente, mesmo com toda imponência da mansarda, não havia caminhos que permitiam o seu acesso. “Para o mundo, integra-se o jogo da ostentação, no cotidiano, mantém-se o despojo.” (Revista CPC, 2015, p.53-54)

A hierarquização do programa do palacete ficou ainda mais evidente.

1921

REFORMA


Cozinha: sob o olhar de Lavínia, esse era o espaço onde todos os empregados realizavam todas as atividades para manter manutenção do lar. Latrina e Banheiro: percebe-se a presença de um único espaço de higiene, o que leva a afirmar que empregados, moradores e visitas utilizavam o local de higiene Copa: espaço destinado apenas à família para almoços Quartos: se comunicam entre si e com a sala de visitas o que mostra a possibilidade de arranjos internos entre os espaços visto que o casal ainda não possuia filhos.

Sala de Visitas: espaço destinado a receber os convidados onde eram servidos os chás e lanches para as visitas, sua decoração pretendia expor os traços familiares dos moradores.

Fig 48. Planta baixa da residência construída para Joaquim Franco de Mello em 1905. Desenho: Júlia Moreira, 2015 (estagiária na Revista CPC).

1905

ORIGEM

Despensa: espaço para armazenar alimentos e produtos Porão: com acesso próximo a despensa, aqui ficavam as dependências dos serviçais recordar os tempos da escravidão. Quarto: ao contrário dos outros quartos, esse não possui comunicação com outros cômodos, apenas com uma abertura para o corredor, assim destinava-se ao casal e marcava sua intimidade e resguardo.

Sala de Jantar: possuia mobília semelhante às do escritório o que reforçava a posição do homem como provedor da família, já a mulher cabia demonstrar a qualidade de tal investimento com a qualidade do serviço e boa comida.

Escritório: espaço laboral onde Joaquim exercia seu ofício, com decoração sóbria expondo a virtude racional do provedor da família.

Entrada: Funcionava como filtro para separar convidados, clientes e familiares.


1905 Fig 49. Foto da sala de jantar da residência Joaquim Franco de Mello, 2014. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.

Fig 50. Foto do porão da residência Joaquim Franco de Mello, 2014. Fotografia: Camila Raghi, 2014.


Copa e Cozinha: sem grande mudanças quanto a arquitetura, a renovação se deu pela instalação de novos equipamentos e a retira do fogão a lenha

Subsolo

Fig 51. Planta baixa da reforma da residência Franco de Mello realizada em 1921. Desenho: Júlia Moreira, 2015 (estagiária na Revista CPC).

1921

REFORMA

LEGENDA: Novas Contruções Demolições Mantido

Dormitórios e Quarto de Vestir: com novos dormitórios para os filhos e o casal, os mesmos eram ligados aos quartos de vestir, o que demonstra a importância dada ao vestir no vida da época

Hall: destinado principalmente à família, também funciona como filtro entre o setor social e íntimo da casa. A escadaria dá acesso ao subsolo, onde agora está instalado o escritório de Joaquim

Sala de Visitas e Saleta: ambiente que incorporou o antigo quarto, agora é destinado à vida familiar, esse cômodo era palco das exibições dos dotes musicais de Lavínia e Raul, com seu piano e violino, respectivamente

Sala de Jantar: também denominada como “sala dourada”, o próprio nome sugere o caráter deslumbre do cômodo

Subsolo: nos cômodos frontais, encontra-se o escritório de Joaquim, onde também funcionava sua biblioteca, depósito de plantas de loteamentos e armazenamento das chaves dos imóveis que alugava, esses eram mais ornamentados e cuidados, ao contrário dos cômodos posteriores onde ficavam quartos dos serviçais


mansarda renascentista que curiosamente não entrada para acesso

1921

Fig 52. Elevação frontal da Residência Franco de Mello em 2015. Desenho: Júlia Moreira, 2015 (estagiária na Revista CPC).

torre mourisca que curiosamente não entrada para acesso

telhas francesas ornamentações no estilo rococó da época de Luís XV

balustre

caixilho com influências francesas

capitéis estilo provençalurbano

portas com estilo art nouveau e art déco

construção feita sobre um porão com 2 metros de pé direito

escadaria que marca a entrada da residência


1921 Fig 53. Foto da lateral da residĂŞncia Joaquim Franco de Mello, 2014. Fotografia: Camila Raghi, 2014.

Fig 54. Foto do corredor da residĂŞncia Joaquim Franco de Mello, 2014. Fotografia: Camila Raghi, 2014.


1921 Fig 55. Foto da sala de estar da residência Joaquim Franco de Mello, 2014. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.

Fig 56. Foto do depósito e biblioteca de Joaquim Franco de Mello no subsolo de sua residência, com as colunas de inspiração oriental. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.


O palacete, pertencente às três gerações da família Franco de Mello, passou por diversas modificações ao longo dos anos. Dentre as principais alterações, as mais significativas podem ser rapidamente exemplificadas pela mudança na organização interna da residência e nas aberturas das portas, o novo banheiro, o fechamento do terraço, a ampliação dos quartos, a desapropriação de 10m do recuo frontal para o alargamento da avenida Paulista, a divisão do terreno entre os irmãos Franco de Mello, o processo de tombamento pelo Condephaat, o desinteresse na preservação das demais construções em virtude do potencial construtivo da área, os muros de divisa que separou o terreno em dois lotes, a demolição da edícula para construção do Edifício Parque Paulista, a descaracterização do jardim externo pela retirada das árvores de médio e grande porte para exploração do imóvel como estacionamento pela empresa Multipark e os novos usos dados à residência que para tanto realizadas algumas adaptações sem o planejamento e cuidado necessários. A descaracterização do original palacete Franco de Mello foi dada pela transformações tanto do imóvel quanto do entorno, afetando sua imponência e estilo. “Além de centro comercial e financeiro, a Avenida Paulista tornou-se também, sobretudo a partir dos anos 1980, palco de manifestações, encontros culturais e eventos esportivos. Pelos usos que abrigou, a Residência Franco de Mello se tornou uma referência também nesse novo contexto e, não por acaso, abrigará o Centro de Cultura, Memória e Estudos da Diversidade Sexual do Estado de São Paulo. Em conjunto com o Parque Mario Covas, ele se consagrará como um marco importante da Avenida Paulista.” (Revista CPC,2015, p. 70)

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NO DECORRER DOS ANOS...


Fig 58. Imagem do jardim depois da intervenção do Multipark. Fonte: Processo de Tombamento da Residência n.1919 da Av. Paulista. Condephaat, 1982.

JARDIM DO PALACETE

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Fig 57. Imagem do jardim antes da intervenção do Multipark. Fonte: Processo de Tombamento da Residência n.1919 da Av. Paulista. Condephaat, 1982.


Fig 60. Residência Franco de Mello com Edifício Market Paulista. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.

O ENTORNO

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Fig 59. Residência Franco de Mello com Edifício Parque Paulista ao fundo. Fotografia: Pedro Napolitano, 2015.



Fig 61. Detalhe do adorno entre as casas da Vila Operária. A pintura marca o traço da individualdiade de cada residência, apesar da igualdade plástica que existe entre elas. Fotografia Fernando França, 2017.


VILA OPERÁRIA Argos Nova, Jundiaí


a vila operária

INFORMAÇÕES BÁSICAS

Localização - Rua Plínio Martins Bonilha Rua Profa. Ana Rita Ludke Rua Agenor Carlos da Silva Rua Luiza Bloch da Silva Rocha Técnica construtiva - Alvenaria Estrutural de Tijolos de Barro Data da Construção – Década de 1940 Autor - Devido a grande quantidade de construtores que trabalharam na obra, não se encontra vestígio da autoria do projeto


a história

A Argos Industrial S.A. foi fundada em 27 de fevereiro de 1913 com a tecelagem como sua principal produção, famosa por sua gabardina (tipo de tecido com seus fios muito juntos) e o verde-oliva que vestia o exército brasileiro. Com o sucesso a empresa conquistou vendedores em todo o país e ganhou destaque ao investir em benefícios sociais para seus funcionários, a empresa possuía: creche, escola de fiação e tecelagem, curso pré-vocacional para os filhos dos funcionários, refeitório, cinema, parque infantil, capela e uma pequena biblioteca. O próximo passo foi construir aos arredores da fábrica uma vila industrial, no final dos anos 20, onde famílias de funcionários poderiam alugar as casas e morar mais perto do trabalho, juntando tais benefícios e o fato de que muitos italianos estavam imigrando para a cidade a Argos se tornou a maior empregadora de Jundiaí na primeira metade do século XX, com o aumento do número de funcionários uma segunda vila foi pensada nos anos 40.

Fig 62. Creche e Escola do Complexo em aproximadamente em 1950. Fonte: Acervo Maurício Ferreira, Sebo Jundiaí.


“A Vila Argos nasceu em função da Argos Industrial, considerada como a grande mãe da população dos que residiam por lá. Uma sociedade formou-se com a efetiva ocorrência de correntes migratórias e imigratórias do período pós-2ª Guerra, proporcionando à cidade uma ampla diversidade de experiências sociais que acumulavam culturas de várias regiões do país e do mundo.” ( L. ESCAPIN, Jussania Rita. A História sob os Degraus. Jundiaí. 2013 ) Fig 63. Argos Industrial S.A. no início do século 20. Fonte: Trabalho de Graduação, FFLCH-USP.


o modo de morar As casas da vila eram geminadas, com exceção das casas de esquina, que eram um pouco maiores, tornando o estilo de vida das pessoas que moravam nelas muito parecido, a maioria era de imigrantes italianos e todos trabalhavam no mesmo lugar, até mesmo os círculos sociais eram os mesmos, por mais que tenham tido experiências diferentes no passado a condição atual era a mesma. Na vila nova as casas tinham um pouco mais de ornamentação externa do que na velha, mas o interior continuava simples, somente com o essencial para uma família viver, sem muito

conforto. Isso fazia com que o tempo de permanência pelos próprios residentes no espaço fosse muito pouco. Os adultos passavam o dia trabalhando na empresa, quando batiam o cartão muitas vezes preferiam ficar sentados na calçada conversando com os vizinhos, já as crianças e adolescentes iam para a creche ou escola e depois passavam o resto do dia brincando nas ruas entre a vila e o complexo onde fábrica, escritórios, escola, etc estavam localizados ou no campinho de futebol de terra batida onde hoje há o Hospital Paulo Sacramento.

Fig 64. Vista da Rua Profa Ana Rita Ludke sentido Rua XV de Novembro. Fotografia Fernando França, 2017.


a implantação

Fig 65. Implantação do Complexo Argos Industrial. Fonte: Google Maps.

Os lotes estavam numa área muito plana, próxima do Complexo Industrial, na várzea dos rios Jundiaí e Guapeva, com a linha férrea passando bem ao seu lado, linha a qual era uma das mais importantes do país; a São Paulo Railway ligava as fazendas cafeicultoras ao porto de Santos, passando pela capital paulista, ou seja, era uma área excelente para a época, pois a própria estação de trem estava a menos de um quilómetro dali. O sistema construtivo em que as casas foram levantadas foi em tijolos de barro auto-portantes, revestidos com argamassa e pintura, com cobertura de telhas de cerâmica capa-e-canal sobre estrutura de madeira, em 2 águas, com platibanda.


partido O partido não podia ser mais simples, colocar o maior número de casas germinadas numa quadra, todas as casas têm a fachada da rua direto na calçada, sem recuo nenhum e são térreas, mas possuem um quintal dos fundos. O maior atrativo das casas era os ornamentos externos, que representavam um ideal de ‘beleza’ ou ‘high society’ na época, em cima das janelas da rua , no topo da casa, além de uma coluna coríntia espiral que marca um dos pontos onde dividem-se as casas. Fig 66. Vista Residências da Rua Plínio Martins Bonilha. Fotografia Fernando França, 2017.

programa de necessidades Sala de estar: principal ponto de so-

cialização na casa, tanto para a família quanto com convidados; reuniam-se lá para conversar, descansar ou ouvir o rádio. Quarto: percebe-se que mesmo possuindo apenas dois quartos a maioria das famílias usavam um deles para ser só do casal. Quarto: o outro quarto era destinado para as crianças, havendo uma, duas, ou o número que fosse. Cozinha: não havia sala de jantar, a mesa geralmente era colocada na própria cozinha. Banheiro: havia um banheiro só, para o casal, filhos ou convidados. Alpendre: nos fundos da casa, como se fosse uma transição entre a casa e o quintal, havia um alpendre que servia, provavelmente como área de serviço.


conclusĂľes


as implantações os partidos

A vila operária possui traços demarcados com áreas planas próxima à indústria, devido ao tamanho do lote, a vila também conseguia ter conexões com a ferrovia que ligava as fazendas de café. As edificações eram simples com a maior quantidade de casas possíveis em uma quadra para abrigar uma grande quantidade de residências. Completamente diferentes das implantações da casa bandeirista e do palacete, as quais ambas possuíam um terreno extenso e apenas uma edificação como centro das atividades. A casa bandeirista tinha sua particularidade de ser um lote com um sítio no centro do terreno e no seu entorno uma grande parte do lote com áreas de poucas atividades, um exemplar típico de moradia rural paulista, o tamanho de suas moradias se devia pelo fato da procura do ouro pelos bandeirantes. Os palacetes já eram diferentes, eram lotes gigantescos nos centros urbanos com jardins abertos ao público e configuravam um ‘’presente’’ para a cidade onde muitos destes jardins e áreas verdes se tornaram parques para o público.

As vilas operárias possuíam fachada direto na rua, sem recuo, direto na calçada. Existia a necessidade de conseguir o maior número de casas germinadas na quadra e por conta disso a vila era constituída de moradias muito simples. O maior atrativo das casas era os ornamentos externos, em cima das janelas da rua, no topo da casa, além de uma coluna coríntia espiral que marca um dos pontos onde dividem-se as casas. Diferente das casas bandeiristas onde permaneciam com um caráter feudal seiscentista. O partido arquitetônico dessas casas estava ligado aos termos sociológicos de modo a mostrar o caráter social do fazendeiro paulista daquele tempo, mostrando o poder do colono agenciador de bandeiras, dono das terras, da família e da escravaria, distribuidor de justiça e religião. O palacete possuía uma característica da elite paulistana que enriqueceu com o café, eles queriam trazer o estilo europeu para suas moradias e o art noveau tomou conta dos edifícios, muitas edificações possuíam colunas e adornos extravagantes, janelas com grandes ornamentações.


os programas as moradias

A casa bandeirista era simples e se dividia em espaços religiosos e em quartos íntimos. O domicílio dos bandeirantes continha uma forma que era constituído pelo Quarto de Dormir do Dono, o qual era caracterizado pela sua amplitude e por conter com um forro no qual eram guardados os principais valores da casa; a Sala Social; o Quarto das Redes; o Quarto de Donzela; a Sala Íntima de acesso restrito familiar; o Quarto de Trabalho; Alpendre de Serviço onde era preparado a comida; Quarto de Ferramentas ;Arreio e Despensa. Era muito parecido com a vila dos operários onde suas residências possuíam o básico para moradias porém em tamanhos diferentes ,sendo a moradia dos bandeirantes muito maior e com pé direito de mais de 4 metros em sua sala principal proporcionada pelo telhado de quatro águas. As casas da vila operaria também possuíam um banheiro e uma cozinha, programa esse que não existia na moradia dos bandeirantes, as vilas também possuíam um alpendre que interligava a cozinha ao quintal da casa. Porém no palacete era diferente , com características únicas como a quantidade de ambientes dentro de sua edificação, possuía muitos cômodos como escritórios, copa, sala de jantar , despensa , porão e diferente dos outros partidos, copiava o modo de vida dos europeus.

Na casa bandeirista se encontrava um caráter feudal, existia uma parte intima apenas para o bandeirante, outra para sua mulher e filhos dormiam em quartos separados, modelo arcaico de estrutura familiar . Na vila operária e nos palacetes as famílias passaram a ter uma maior representatividade onde tinham mais harmonia e convivência em conjunto. Nas vilas geminadas dos imigrantes italianos, por exemplo, eles não possuíam muito conforto e acabavam sentados a rua nas calçadas com seus vizinhos desenvolvendo suas interações sociais e de lazer. Possuíam uma convivência muito grande com os moradores do entorno, havia igrejas e mercados fazendo parte do dia a dia dos residentes. Completamente diferente eram os palacetes, onde a elite paulistana possuía energia elétrica, maior conforto e higiene, com banheiros próprios e latrina. Tudo com a finalidade para afirmar a elegância e poder do prestígio do proprietário. O modo de vida entre eles era extremamente diferente, os operários viviam no centro da cidade, com uma grande quantidade de pessoas e vizinhos, tinham muito contato entre si. Os cafeicultores, também viviam nos centros porém um pouco isolados das grandes massas de pessoas. Já os bandeiristas passavam grande parte do tempo apenas com suas famílias e empregados isolados das cidades em seus sítios desbravando o interior das cidades.


as técnicas construtivas conclusões gerais

Os palacetes eram feitos de alvenarias de tijolos autoportantes usando o mesmo método das técnicas de construção das vilas operárias, eram revestidos com argamassa e pintura. A casa bandeirista se difere muito no seu levantamentos , a edificação originalmente é inteira feita de taipa de pilão, utiliza-se o barro, água fibras vegetais e algum tipo de aglomerante, podendo ser estrume ou sangue de animais.

Como apontamentos finais é possível concluir que o palacete e as casas bandeiristas revelam uma elite , uma formada por um caráter mais religioso com cômodos íntimos e separados por funções , outra formada por uma elite cafeicultora que copia modelos europeus tentando mostrar a sua independência e seu poder. No que mais se difere entre eles é a vila operária que pela quantidade de pessoas que moravam no mesmo lote foi possível uma transformação no terreno, surgiu uma vila com muitas transformações na cidade. A vila possuía muito mais ecletismo do que a moradia dos bandeirantes por exemplo. Devido a grande necessidade de mão de obra para as indústrias, a vila foi surgindo e com isso um caráter de hierarquia se formou onde a classe operária vive entre sí com consciente coletivo e abarrotada de pessoas , e no topo da hierarquia os grandes fazendeiros e cafeicultores em seus gigantescos lotes para pequenas famílias. Ou seja , no mesmo lote onde viviam uma ou duas famílias com grandes riquezas , era possível a convivência de muitas famílias de operários. É possível também observar a diferença de arquitetura entre as edificações, a casa bandeirista foi feita por mão de obra escrava e usava uma técnica construtiva milenar, taipa de pilão, tornando a edificação simples porém completa e adequada aos padrões requisitados na época. As moradias dos operários e cafeicultores eram tecnologicamente melhores com alvenarias de tijolos, caixilharia de vidro e revestimentos. Havia um certo conforto e eram mais agradáveis para a moradia, diferente das casas bandeiristas que eram mais duráveis e não tinham um caráter temporário, possuíam também características particulares de cada morador abrindo a possibilidade de estender seu programa adequando-o ao uso de seu dono.


fontes CASAS BANDEIRISTAS E SUAS CARACTERISTICAS Fig. 01, 02. Fotografia Bárbara Catta, 2017.

A HISTÓRIA Fig. 03. Fotografia Bárbara Catta, 2017.

ORIGENS Fig. 04. Mapa SARA-BRASIL, 1930. Fig. 05. Fonte: PMSP/SEMPLA. Fig. 06. Acervo DPH/ Pres./ STPRC.

IMPLANTAÇÃO Fig. 07. Fonte: Guia da Casa do Bandeirante.

OS CÔMODOS Fig. 08, 09, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19. Fotografia: Bárbara Catta, 2017.

A TÉCNICA CONSTRUTIVA Fig. 20, 21, 23, 24. Fonte: Arquitetura no Brasil de Cabral a Dom João VI, 2007

O RESTAURO E SEUS PROCESSOS Fig. 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41. Fonte: Caderno de Obras – Casa do Bandeirante. Acervo PMSP/Pres


fontes RESIDÊNCIA FRANCO DE MELLO Fig 42. Haresdp. Residência Joaquim Franco de Mello. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/ wiki/File:Resid%C3%AAncia_Joaquim_Franco_de_Melo_15.jpg> Acesso em: 17 nov. 2017

A VIDA DA ELITE PAULISTA Fig 43. Fotografia da Exposição Área Paulista. Carla Caffé. Disponível em: <http://manoeldebritofotografias.blogspot.com.br/2014/03/> Acesso em: 19 nov. 2017

A FAMÍLIA FRANCO DE MELLO Fig 44. Acervo dos periódicos Diário Nacional, A república, O Combate e o Correio Paulistano, digitaliza-

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Fig 45. Álbum de Família Franco de Mello. Disponível em: <https://spcity.com.br/serie-avenida-paulis-

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O LOTE N.90 Fig 46. Mapeamento Aerofotométrico SARA BRASIL, 1930. Extraído da Revista CPC, São Paulo, n. 20, p. 44, dec. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/102599> Acesso em: 11 nov. 2017.

AS MUDANÇAS NO PALACETE Fig 47, 49, 55, 56, 59, 60. Fotografias Pedro Napolitano. Extraído da Revista CPC, São Paulo, n. 20, p. 49, 57, 60, 66, dec. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/102599> Acesso em: 11 nov. 2017.

Fig 48, 51, 52. Desenho de Júlia Moreira, 2015. Extraído da Revista CPC, São Paulo, n. 20, p. 46, 52, dec. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/102599> Acesso em: 11 nov. 2017.

Fig 50, 53, 54. Fotografias Camila Raghi, 2014. Extraído da Revista CPC, São Paulo, n. 20, p. 49, 56, 57, dec. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/102599> Acesso em: 11 nov. 2017.

Fig 57, 58. Processo de Tombamento da Residência n.1919 da Av. Paulista. Condephaat, 1982. Extraído da Revista CPC, São Paulo, n. 20, p. 67, dec. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/cpc/article/ view/102599> Acesso em: 11 nov. 2017.


fontes A VILA OPERÁRIA Fig. 61. Fotografia Fernando França, 2017.

A HISTÓRIA Fig. 62. Acervo Maurício Ferreira, Sebo Jundiaí. Disponível em: <http://www.yaridimoveis.com. br/blog/?p=384> Acesso em 24 de nov. 2017. Fig. 63. Argos Industrial S.A. Extraído do Trabalho de Graduação, FFLCH-USP. Disponível em: <http://lemad.fflch.usp.br/node/7989> Acesso em 24 nov. 2017.

O MODO DE MORAR Fig. 64. Fotografia Fernando França, 2017.

IMPLANTAÇÃO Fig. 65. Edição sob o Web Mapping Google Maps. Acesso em 24 nov. 2017.

PARTIDO e PROGRAMA DE NECESSIDADES Fig. 66. Fotografia Fernando França, 2017.

CONCLUSÕES Fig 67. Fotografia Bárbara Catta. Fig 68. Fotografia Fernando França, 2017 Fig 69. Foto da residência Joaquim Franco de Mello feita do passeio da Av. Paulista, em meados dos anos 1930. Fonte: MELO, Arnaldo de. Remanso na Avenida. Trabalho Final de Graduação – Escola da Cidade, São Paulo, 2006.


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referências

VILA OPERÁRIA ESCAPIN, Jussania Rita Lamarca. A História Sob os Degraus: memória e revitalização do Escadão de Jundiaí – SP como espaço público de lazer e eventos- Jundiaí: Edições Brasil, 2013. Patrimônio Histórico e Cultural de Jundiaí. Planejamento e Meio Ambiente. Capa. Prefeitura de Jundiaí. Disponível em: <https://www.jundiai.sp.gov.br/planejamento-e-meio-ambiente/ wp-content/uploads/sites/15/2014/08/Argos-Industrial.pdf> Acesso em: 24 de novembro de 2017. Jundiaí Agora. ARGOS do trabalho duro, sucesso, respeito aos funcionários e falência. Disponível em: <http://www.jundiagora.com.br/argos-sucesso-falencia/> Acesso em 24 de novembro de 2017.




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