COMISSÃO ESPECIAL DE DIREITO CIVIL
OAB SP (Gestão 2022/2024)
Diretoria OAB SP
Presidente:
Maria Patrícia Vanzolini Figueiredo
Vice-Presidente:
Leonardo Sica
Secretária-Geral:
Daniela Marchi Magalhães
Secretária-Geral Adjunta:
Dione Almeida Santos
Tesoureiro:
Alexandre de Sá Domingues
OAB SP (Gestão 2022/2024)
Diretoria ESA OAB SP
Presidente:
Flávio Murilo Tartuce Silva
Vice-Presidente:
Sarah Hakim
Coordenador Científico:
Carlos Eduardo Nicoletti Camillo
Coordenador Pedagógico:
Antônio Rodrigues de Freitas Júnior
Coordenador Geral das Áreas
Geográficas:
Sérgio Carvalho de Aguiar Vallim Filho
Organização da cartilha:
Flávio Tartuce
Nestor Duarte
Erik Chiconelli Gomes
Ruy Dutra
Comissão Especial de Direito Civil:
Presidente:
Nestor Duarte
Vice-Presidente:
Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade Nery
Relação dos Membros Efetivos Regionais:
Adelcio Euclydes Pietrobon Júnior
Andreia Olmedo Minto
Aracy Raquel Lousada Silva
Beatriz Gomes Freire
Bianca Frank Trevizan
Clarice Martins Vieira
Cristiane Paternost de Freitas Canato
Daniel de Leão Keleti
Danillo do Nascimento Ferreira Bezerra
Davi Marques de Araujo
Dayane Puente Castilho
Diego Dhiamaique Miranda da Costa Diogo do Nascimento Cardoso
Elisa Neri Ribeiro de Carvalho Romero Rodrigues
Felipe Barboza da Rocha
Flora Freitas de Faria
Gabriel Cardoso da Silva
Giovanna Magalhães Novais Correa
Gisele Rui de Almeida
Guilherme de Souza Amador
Guilherme Hansen Cirilo
Isola Anjos Saggioro de Almeida
Jean Raphael da Costa e Silva Baptista Petrone
Jéferson Pereira
Jessica Andrade Araujo
Juliana Magati Aguiar
Kaio Cesar Pedroso
Letícia Aparecida Ribeiro Franco
Letícya Simões dos Santos Oliveira
Lucas Fernandes Lima Ohara
Luís Rodolpho Furigo
Marcella Correa Aguiar
Marcia Cristina de Jesus Brandão
Marinilce Lacerda Pena Sakahida
Michelly Cristina Felix da Silva
Milena Sabatini Lazzuri
Miriann Thaise dos Anjos Mêira
Murilo Médici Batista Andrade
Nathalia Florêncio Oliveira
Nayara Medina
Paulo Henrique El Kadri Previato
Pedro Henrique Cândido de Azevedo
Rafael Gomes da Rocha
Roberta Carvalho dos Anjos Zuca
Rodrigo Anacleto dos Santos
Ruth Campos de Souza
Silmara Alves Santos Multini
Stenio Justino da Costa
Tiago de Souza Nogueira
Vanessa Macaubas de Sousa
Veronica Rodrigues de Miranda
Vitor Hugo Nunes Lourenço
Wendel Ricardo Graziano
Relação dos Membros Efetivos:
Adriano Correia de Castro
Afonso Alves Junior
Aldo Junior Alves Arcanjo
Alice Godinho Mendonça
Aline Neves Pereira
Amanda Nunes Costa
Ana Carolina Dias Faustino Rocha
André Nascimento Freire Junior
Antonio Augusto Garcia Leal
Ariel Simantob Sarue
Bárbara Gomes Navas da Franca
Bruna da Costa Teixeira
Bruna Rocha Silva
Caian Morenz Villa Deléo
Camila Felberg
Carla Campanez Santos
Carlos Rommel Andriotti Cruz de Oliveira
Caroline Gomes Fischer
Celso Augusto Coccaro Filho
Cesar Calo Peghini
César Durães dos Reis
Cinthya Machado da Silva
Cláudia Pellegrini Neves
Claudia Stein Vieira
Clecia Bruna Diniz Pereira
Damiana Ribeiro da Silva
Daniel Barboza Kinguti
Debora Emanuely de Paula Peixoto
Debora Norberto da Silva
Denny Militello
Diego Mathias
Ederson José da Graça Ju
Eduardo Alves Périco
Eliziane Maria Mittmann
Erika Cesario da Silva Aparecido
Evandro Annibal
Ezequias Francisco de Assis
Felipe Neto Queiroz
Felipe Rayman Rigby
Fellipe José Sanches Carneiro Rollo Fortes
Fernanda Gomes de Sousa Coelho
Fernanda Sousa dos Anjos Gabelini
Fernanda Tartuce Silva
Fernando Del Bianchi Jeremias
Fernando Franco Barbosa Filho
Fernando Gemelli Eick
Flávio Henrique Elwing Goldberg
Flávio Murilo Tartuce Silva
Franklyn Gallani
Gabriel Belarmino da Costa
Gabriel Moreira de Santana
Gabriel Siqueira Maciel
Gabriela Paiva Di Nuno
Geovanne Lucas Silva Ribeiro
Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka
Giselle Gazzola de Souza
Gleydson Delfino dos Santos
Grace Shella Zevallos Velasco
Gracilene Monteiro Gouveia
Gustavo Murad Rodrigues Oliveira
Hellen Medeiros Novicki Durães
Isabella Haüptli
Jessica Alves de Araujo
Jessica Alves Moreira Arce
João Alfredo Ribeiro Pereira
João Máximo Rodrigues Neto
Jorge Caram Sabbag Neto
José Fernando de Mendonça Gomes
Neto
José Fernando Simão
Kamila Celegatti Ortiz
Karina dos Santos Oliveira Adaniya
Lázaro Lima Souza
Leonardo da Silva Lima
Leonel Carlos Dias Ferreira
Ligia Martins Pereira
Luan dos Santos Freitas
Luciana da Silva Caseiro
Luiz Carlos de Andrade Junior
Luiz Gustavo Lopez Mide
Marcelle Abou Chalach
Marcelo Almeida Corrêa
Maria Alice Vega Deucher
Maria Eduarda de Miranda Freire
Maria Leticia Valério Indiani
Maria Maglane Torquato
Mario Gamaliel Guazzeli de Freitas
Mateus Campos Soares de Oliveira Matheus Colacino
Mauricio Baptistella Bunazar
Mauricio Testoni
Melissa Silva Ferreira
Micheline Carvalho Galvão da Silva
Mucio Roberto Neves Primo
Patricia Rezende
Paulo Armando Barros Fonseca Junior
Paulo José Liza Suarez
Priscila Santos Feitosa
Raphael Cesena Gutierrez
Rebecca Palermo Nunes
Renato Vinicius Caldas
Rita de Cassia Curvo Leite
Roberta Cristina Paganini Toledo
Rodolfo Gabrig Arbex
Rodrigo Ninive Caetano da Silva
Rosa Betania Soares
Stephany Almeida Reis de Souza
Thiago Gomes de Araujo Silva
Thiago Hamilton Rufino
Vanderlei Garcia Junior
Victor Helio Paes da Silva
Victor Rolim Marques
Vinícius Lima da Fonseca Neves
Vivian Dinorá Furlan
Viviane Rocha dos Santos
Wilson Seffair Bulbol Junior
Yasmin Abdul Hadi Hassan Zoghbi
Relação dos Membros
Correspondentes:
Any Kelly Moretes do Amaral Bentlin
Carlos Eduardo Elias de Oliveira
Ednalva Souza Coelho
Priscilla Curti Georges Pilavdjian
Marcelí de Souza Silva
Relação dos Membros Colaboradores:
Aldeir Oliveira Costa da Silva
Ana Julia Moscatini Pinto
Bruno de Souza Silva
Camila Gonçalves da Silva
Camila Laydiane Araujo
Carolina Hoefle de Freitas
Daniel Rodrigues de Lima
Dinamerica Soares Rodrigues
Ester Pereira de Sousa
Evelyn Medeiros Miranda
Fabiana Alves de Souza
Felipe Gabriel Oliveira Bonifácio
Fellipe Silva Copi
Fernanda Michelle Gonçalves Barberis
Gabriel Felipe de Oliveira
Gabriele Martins Silva
Gabriella Oliveira Pinto
Jennifer Dionizio de Lucena
Jennifer Silva Rodrigues
João Pedro de Sousa Brito
Julia Vitória dos Santos Lacerda
Juliana Carneiro de Araujo
Luana Lozano da Rosa
Luana Pereira Alves
Luana Souza Costa da Silva
Luany Nascimento Baldi
Marcella Leite Bezerra
Marcelo Correia Passos
Miqueias Rafael da Silva Santos
Naiara dos Santos Comandini
Renata Fontenele Padul Maciel
Thalita Ferreira Soares Espíndola
Thiago Alvarenga Pereira
Vinicius Caetano Pott
Vitória Castro Silva
Vitoria Christiny Araujo Professor
Estagiários:
Leonardo Monteiro da Silva Junior
Matheus de Moraes Grasselli de Oliveira
Samara Brito
Sumário
Apresentação
21 PARTE GERAL
1. O CLÁSSICO DEBATE SOBRE O INÍCIO E FIM DA PERSONALIDADE CIVI L
Fernando Franco Barbosa Filho
26 PARTE GERAL
3. AS PESSOAS JURÍDICAS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Lázaro Lima Souza
30 PARTE GERAL
5. BENS PÚBLICOS E PARTICULARES
Gleydson Delfino dos Santos
34 PARTE GERAL
7. NEGÓCIO JURÍDICO: ELEMENTOS ESSENCIAIS, REPRESENTAÇÃO
Camila Felberg
23 PARTE GERAL
2. AUSÊNCIA: SUCESSÃO PROVISÓRIA E SUCESSÃO DEFINITIVA
Fernanda Barberis
28 PARTE GERAL
4. BENS. CLASSIFICAÇÃO: CONSIDERADOS EM SI MESMOS E RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS
Celso A. Coccaro Filho
32 PARTE GERAL
6. BENS: MÓVEIS E IMÓVEIS (POR NATUREZA E POR LEI), FUNGÍVEIS, INFUNGÍVEIS, CONSUMÍVEIS, DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS (POR NATUREZA E POR LEI), SINGULARES E COLETIVOS
Dayane Puente Castilho
Benedicto Stipp Cruz Neto
36 PARTE GERAL
8. DEFEITOS DOS NEGÓCIOS
JURÍDICOS E CARACTERIZAÇÃO
DOS VÍCIOS: ERRO OU IGNORÂNCIA, DOLO, COAÇÃO, ESTADO DE PERIGO, LESÃO E FRAUDE CONTRA CREDORES
Maurício Testoni
40 PARTE GERAL
10. ATOS ILÍCITOS E EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
44 PARTE GERAL
12. PROVA DO NEGÓCIO
JURÍDICO: MEIOS DE PROVA
Luany Nascimento Baldi
48 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
2. OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS
Denny Militello
54 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
4. AS OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
Lázaro Lima Souza
38 PARTE GERAL
9. NULIDADE ABSOLUTA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Maurício Testoni
42 PARTE GERAL
11. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA: DISTINÇÃO ENTRE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA, INTERRUPÇÃO E SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL
Davi Marques de Araújo
46 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
1. DISTINÇÃO ENTRE DIREITOS SUBJETIVOS A UMA PRESTAÇÃO E DIREITOS SUBJETIVOS REAIS
Mauricio Bunazar
51 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
3. OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS: SOLIDARIEDADE ATIVA E SOLIDARIEDADE PASSIVA, DISTINÇÃO DE OBRIGAÇÕES INDIVISÍVEIS
Daniel de Leão Keleti
56 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
5. TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES: CESSÃO DE CRÉDITO E ASSUNÇÃO DE DÍVIDA; DEFINIÇÕES
Camila Felberg
59 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
6. ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES: CONCEITO DE PAGAMENTO, PROVA, LUGAR E TEMPO DO PAGAMENTO
Davi Marques de Araújo
63 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
8. DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
Kamila Celegatti Ortiz
67 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
10. ATOS UNILATERAIS: PROMESSA DE RECOMPENSA E GESTÃO DE NEGÓCIOS
Celso A. Coccaro Filho
71 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
12. CONTRATOS: DEFINIÇÃO, CONTRATOS CONSENSUAIS E CONTRATOS REAIS, ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO E PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO
Davi Marques de Araújo
61 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
7. ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES: DEFINIÇÕES DE PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO, PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO, DAÇÃO EM PAGAMENTO, IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO, COMPENSAÇÃO, CONFUSÃO, REMISSÃO DE DÍVIDAS
Davi Marques de Araújo
65 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
9. PAGAMENTO INDEVIDO E ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA NA ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL
Geovanne Lucas Silva Ribeiro
69 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
11. TÍTULOS DE CRÉDITO: TÍTULO AO PORTADOR, À ORDEM OU NOMINATIVOS
Fernanda Barberis
72 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
13. CONTRATOS: VÍCIOS REDIBITÓRIOS E EVICAÇÃO
Gabriel Siqueira Maciel
74 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
14. CONTRATO ALEATÓRIO, CONTRATO PRELIMINAR E CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR
Antônio Augusto Garcia Leal
78 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
16. CONTRATOS: ONEROSIDADE
EXCESSIVA – REVISÃO E RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Erika Cesario da Silva Aparecido
84 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
18. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
Fernanda Barberis
88 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
20. ESPÉCIES DE CONTRATO: MANDATO
Camila Felberg
92 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
22. CONTRATO DE DE DEPÓSITO
Fernanda Barberis
76 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
15. EXTINÇÃO DOS CONTRATOS: DISTRATO, CLÁUSULA
RESOLUTIVA EXPRESSA E TÁCITA E A EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO
Clarice Martins Vieira
81 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
17. ESPÉCIES DE CONTRATO: COMPRA E VENDA, PERMUTA, CONTRATO ESTIMATÓRIO E DOAÇÃO
Camila Felberg
86 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
19. CONTRATO DE EMPREITADA
Fernanda Barberis
90 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
21. MODESTO ESTUDO
CONCERNENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, EMPREITADA E DEPÓSITO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Lázaro Lima Souza
94 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
23. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO (MÚTUO E COMODATO)
Fernanda Barberis
96 RESPONSABILIDADE CIVIL
01. RESPONSABILIDADE CIVIL E
RESPONSABILIDADE PENAL
Ligia Martins
100 RESPONSABILIDADE CIVIL
3. RESPONSABILIDADE CIVIL –
DANO MORAL E DANO MATERIAL
Gisele Rui de Almeida
104 RESPONSABILIDADE CIVIL
5. LIQUIDAÇÃO DE DANOS: HOMICÍDIO E LESÃO CORPORAL
Milena Sabatini Lazzuri
108 DIREITO DAS COISAS
1. POSSE
Mauricio Bunazar
113 DIREITO DAS COISAS
3. AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE
MÓVEL: BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO CIVIL
Victor Rolim Marques
98 RESPONSABILIDADE CIVIL
2. RESPONSABILIDADE CIVIL E RESPONSABILIDADE PENAL
Andreia Olmedo Minto
102 RESPONSABILIDADE CIVIL
4. RESPONSABILIDADE CIVIL
POR ATO DE TERCEIRO: BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO CIVIL
Victor Rolim Marques
106 RESPONSABILIDADE CIVIL
6. RESPONSABILIDADE CIVIL POR INFIDELIDADE
José Fernando de Mendonça Gomes Neto
111 DIREITO DAS COISAS
2. PROPRIEDADE: AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL (USUCAPIÃO, REGISTRO E ACESSÕES)
Elisa Néri Ribeiro de Carvalho Romero Rodrigues
116 DIREITO DAS COISAS
4. PROPRIEDADE: AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL: USUCAPIÃO, REGISTROS E ACESSÕES
Milena Sabatini Lazzuri
118 DIREITO DAS COISAS
5. DIREITO DE VIZINHANÇA: USO ANORMAL DA PROPRIEDADE, PASSAGEM FORÇADA, ÁRVORES LIMÍTROFES
Thiago Gomes de Araujo Silva
123 DIREITO DAS COISAS
7. PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA NO CÓDIGO CIVIL E NA LEGISLAÇÃO
EXTRAVAGANTE: NOÇÕES GERAIS
Rommel Andriotti
127 DIREITO DAS COISAS
9. DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR DO IMÓVEL
Mauricio Bunazar
132 DIREITO DE FAMÍLIA
1. CASAMENTO: CAPACIDADE, IMPEDIMENTOS, CAUSAS SUSPENSIVAS, HABILITAÇÃO PARA O CASAMENTO
Camila Felberg
137 DIREITO DE FAMÍLIA
3. CASAMENTO ANULÁVEL E PRAZOS PARA ANULAÇÃO
Amanda Nunes Costa
120 DIREITO DAS COISAS
6. EXCLUSÃO DO CONDÔMINO ANTISSOCIAL
Matheus Colacino
125 DIREITO DAS COISAS
8. DIREITOS REAIS SOBRE COISA ALHEIA
Mauricio Bunazar
129 DIREITO DAS COISAS
10. DIREITOS REAIS DE GARANTIA: PENHOR, HIPOTECA E ANTICRESE E VEDAÇÃO DO PACTO COMISSÓRIO
Erika Cesario da Silva Aparecido
135 DIREITO DE FAMÍLIA
2. CASAMENTO NULO
Camila Felberg
140 DIREITO DE FAMÍLIA
4. DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO E DA SOCIEDADE CONJUGAL: HIPÓTESES
Dayane Puente Castilho
142 DIREITO DE FAMÍLIA
5. UNIÃO ESTÁVEL: CONFIGURAÇÃO, DISTINÇÃO DO CASAMENTO E DISTINÇÃO DO CONCUBINATO
Milena Sabatini Lazzuri
146 DIREITO DE FAMÍLIA
7. PARENTESCO: GRAUS DE PARENTESCO
Maurício Testoni
150 DIREITO DE FAMÍLIA
9. REGIMES DE BENS DO CASAMENTO E PACTO ANTENUPCIAL
Gisele Rui de Almeida
155 DIREITO DAS SUCESSÕES
01. DIREITO DAS SUCESSÕES –SUCESSÃO LEGÍTIMA E SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA (NOÇÕES GERAIS)
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
144 DIREITO DE FAMÍLIA
6. UNIÃO ESTÁVEL: CONFIGURAÇÃO, DISTINÇÃO DO CASAMENTO, DISTINÇÃO DO CONCUBINTATO
Maurício Testoni
148 DIREITO DE FAMÍLIA
8. PARENTESCO: FILIAÇÃO, RECONHECIMENTO DE FILHOS, PODER FAMILIAR E ADOÇÃO NO ECA
Dayane Puente Castilho
153 DIREITO DE FAMÍLIA
10. PROTEÇÃO DA PERSONALIDADE: TUTELA, CURATELA E TOMADA DE DECISÃO APOIADA –NOÇÕES GERAIS
Rita de Cássia Curvo Leite
Priscilla Curti Georges Pilavdjian
157 DIREITO DAS SUCESSÕES 02. ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA: SUCESSÃO EM LINHA RETA E NA LINHA COLATERAL
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
159 DIREITO DAS SUCESSÕES
03. HERDEIROS NECESSÁRIOS E PROTEÇÃO DA LEGÍTIMA
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
160 DIREITO DAS SUCESSÕES
04. DIREITOS SUCESSÓRIOS DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
162 DIREITO DAS SUCESSÕES
05. HERANÇA VACANTE E HERANÇA JACENTE
Camila Felberg
164 DIREITO DAS SUCESSÕES
06. A SUCESSÃO, POR AUSÊNCIA DO “TUTOR”, DE UM SER SENCIENTE NA FAMÍLIA MULTIESPÉCIE
Daniel Barboza Kinguti
167 DIREITO DAS SUCESSÕES
07. INDIGNIDADE E DESERDAÇÃO
Milena Sabatini Lazzuri
169 DIREITO DAS SUCESSÕES
08. INVENTÁRIO E PARTILHA: NOÇÕES GERAIS, INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL
Verônica Rodrigues Tagliari de Miranda Marques
Cartilha Digital Ano 2024
ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA
São Paulo, OAB SP - 2024 COORDENAÇÃO TÉCNICA
COORDENADOR GERAL
Adriano de Assis Ferreira
COORDENADOR ACADÊMICO
Erik Chiconelli Gomes COORDENADOR AUDIOVISUAL
Ruy Dutra
PROJETO GRÁFICO
Sarah Aimê
FALE CONOSCO
Rua Cincinato Braga, 37, 13º andar
São Paulo/ SP
Tel. .55 11.3346.6800
Publicação Trimestral
ISSN - 2175-4462
Direitos - Periódicos.
Ordem dos Advogados do Brasil
Apresentação
A Escola Superior de Advocacia da OABSP tem o prazer de apresentar a Cartilha da Comissão de Direito Civil da OAB da nossa Seccional, presidida pelo Professor Nestor Duarte. Trata-se de um esforço conjunto que reflete o nosso compromisso com a excelência educacional e a difusão do conhecimento jurídico. Esta cartilha é uma ferramenta valiosa para todos os profissionais e estudantes de direito, proporcionando uma visão abrangente e detalhada dos principais tópicos do Direito Civil.
A cartilha aborda temas essenciais que são fundamentais para a prática jurídica do Direito Privado, desde os princípios gerais do Direito Civil, como a definição de pessoa natural e jurídica, até questões mais complexas como a propriedade, os contratos, a responsabilidade civil e o Direito de Família e das Sucessões. Cada capítulo foi cuidadosamente elaborado para oferecer uma compreensão clara e prática pelos leitores.
Em temas relativos à Parte Geral do Código Civil, a cartilha abrange desde os fundamentos da pessoa natural, tratando de questões como o início e fim da personalidade, nascituro e morte presumida, até aspectos complexos da ausência, sucessão provisória e definitiva. Aborda também as pessoas jurídicas, diferenciando entre as de Direito Público e Privado, domicílio e representação. Os capítulos sobre classificação dos bens, incluindo móveis, imóveis, fungíveis, infungíveis, entre outros, são detalhadamente apresentados.
No texto “O clássico debate sobre o início e fim da personalidade civil”, Fernando Franco Barbosa Filho examina as questões relativas ao nascituro e em relação à morte presumida. O autor oferece uma visão abrangente sobre as implicações jurídicas dessas condições, considerando tanto os aspectos históricos quanto as interpretações contemporâneas do Direito Civil.
Em “Ausência: sucessão provisória e sucessão definitiva”, Fernanda Barbieres aborda esse importante instituto civil, explorando os procedimentos e as consequências jurídicas das sucessões provisória e definitiva. O trabalho detalha os passos necessários para se declarar a ausência e como isso afeta a administração e distribuição dos bens do ausente.
Lázaro Lima Souza, no artigo “As pessoas jurídicas no Código Civil de 2002”, analisa as classificações, os requisitos para a constituição e o funcionamento dessas entidades, destacando as diferenças e avanços em relação à legislação anterior.
No texto “Classificação dos bens (considerados em si mesmos e reciprocamente considerados)”, Celso Coccaro Filho explora as modalidades e classificação do objeto do Direito Civil, detalhando as categorias correlatas, suas características e as implicações legais de cada classificação, oferecendo uma visão detalhada e técnica sobre o tema.
Gleydson Delfino dos Santos, em “Bens públicos e particulares”, discute as diferenças entre as duas modalidades, com destaque para as restrições aplicáveis a cada tipo de bem, destacando a importância dessas diferenciações categóricas para a administração pública e para o Direito Privado.
Dayane Puente Castilho e Benedicto Stipp Cruz Neto, no artigo “Bens: móveis e imóveis (por natureza e por lei), fungíveis, infungíveis, consumíveis, divisíveis e indivisíveis (por natureza e por lei), singulares e coletivos”, investigam esses fundamentais institutos, debatendo as definições, características e implicações jurídicas de cada categoria, proporcionando uma visão abrangente e detalhada sobre essa temática.
Camila Felberg, em “Negócio Jurídico: elementos essenciais, representação”, aborda os elementos essenciais dos negócios jurídicos e a questão da representação. A autora detalha os requisitos para a validade dos negócios jurídicos e as formas de representação, oferecendo uma análise clara e concisa sobre o tema.
No artigo “Defeitos dos negócios jurídicos e caracterização dos vícios: erro ou ignorância, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores”, Maurício Testoni investiga os defeitos que podem viciar os negócios jurídicos em geral, analisando cada modalidade de vício, suas identidades e consequências jurídicas.
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas discute a nulidade absoluta dos negócios jurídicos, examinando as situações em que um negócio jurídico é considerado nulo de pleno direito, abordando os efeitos e consequências jurídicas da mais grave das invalidades, destacando a importância da conformidade legal nos negócios jurídicos. Na sequência, aborda, em outro artigo, “Atos ilícitos e excludentes de responsabilidade”.
Davi Marques de Araújo, no artigo “Prescrição e decadência: distinção entre prescrição e decadência, interrupção e suspensão do prazo prescricional”, analisa as diferenças entre os dois institutos, discutindo e expondo as controvérsias das situações em que se dá a interrupção e a suspensão do prazo prescricional.
Luany Nascimento Baldi, em seu artigo sobre a prova do negócio jurídico, aborda os diversos meios para se comprovar a existência e a validade dos negócios jurídicos. A autora explora os tipos de provas admissíveis e as respectivas regras aplicáveis.
Seguindo, em Direito das Obrigações, no texto “Distinção entre direitos subjetivos a uma prestação e direitos subjetivos reais”, Maurício Bunazar explora as diferenças fundamentais entre as duas categorias, estudando cada tipo obrigacional, e como ele se manifesta e se aplica no contexto jurídico, destacando as implicações práticas para os envolvidos com a relação jurídica correspectiva.
Em “Obrigações alternativas”, Denny Militello investiga as características e peculiaridades dessa modalidade obrigacional, explicando como essas obrigações funcionam e quais são os critérios para a sua execução.
Daniel de Leão Keleti, no artigo “Obrigações solidárias: solidariedade ativa e solidariedade passiva, distinção de obrigações indivisíveis”, explora a natureza dessas obrigações, com uma exposição bem clara e didática a respeito de como diferenciar essas categorias na prática.
No artigo “As obrigações solidárias no Direito Civil Brasileiro”, Lázaro Lima Souza investiga essa tão compreendida modalidade obrigacional, demonstrando os seus principais efeitos.
Camila Felberg, em “Transmissão das obrigações: cessão de crédito e assunção de dívida; definições”, examina os processos de cessão de crédito e de assunção de dívida, com abordagem das definições e dos procedimentos legais envolvidos com esses institutos.
Davi Marques de Araújo, no artigo sobre adimplemento das obrigações, aborda os conceitos fundamentais de pagamento, incluindo prova, lugar e tempo do pagamento. Explica como esses elementos são essenciais para o cumprimento das obrigações, detalhando as normas jurídicas aplicáveis para cada categoria correlata.
Em “Adimplemento das obrigações: definições de pagamento em consignação, pagamento com sub-rogação, dação em pagamento, imputação do pagamento, compensação, confusão, remissão de dívidas”, Davi Marques de Araújo segue explorando as diversas formas de adimplemento das obrigações, com a abordagem de cada método extintivo e suas implicações jurídicas, proporcionando uma visão completa sobre o tema.
Kamila Celegatti Ortiz, no texto “Do inadimplemento das obrigações”, discute o inadimplemento absoluto e a mora, e as suas consequências; com análise dos efeitos legais do não cumprimento das obrigações e as medidas que podem ser tomadas em resposta pelo credor.
Geovanne Lucas Silva Ribeiro, em “Pagamento indevido e enriquecimento sem causa na égide do Código Civil”, explora essas importantes fontes obrigacionais, debatendo as suas implicações jurídicas desses atos unilaterais, oferecendo uma análise detalhada sobre os temas.
Celso A. Coccaro Filho, no seu artigo sobre a promessa de recompensa e a gestão de negócios, aborda esses atos unilaterais. Explica o autor como são elas caracterizadas e as consequências legais para as partes envolvidas, destacando a importância desses atos para o Direito das Obrigações e suas decorrências.
Fernanda Barberis, no seu texto sobre títulos de crédito, explora os seus diferentes tipos: ao portador, à ordem e nominativos; analisando as características de cada figura e as suas principais implicações legais.
A respeito do Direito Contratual, Davi Marques de Araújo, no trabalho “Contratos: definição, contratos consensuais e contratos reais, estipulação em favor de terceiro e promessa de fato de terceiro”, examina os diferentes a definição desse importante instituto, bem como as figuras mencionadas.
Seguindo, em “Contratos: vícios redibitórios e evicção”, Gabriel Siqueira Maciel aborda dois clássicos e importantes institutos do Direito Contratual, fundamentais para a teoria e a prática do Direito Civil.
Antônio Augusto Garcia Leal, em “Contrato Aleatório, Contrato Preliminar e Contrato com Pessoa a Declarar”, discute os diferentes tipos dessas modalidades contratuais, explicando as peculiaridades de cada tipo, com grande relevo para o cotidiano do civilista.
Clarice Martins Vieira, em “Extinção dos contratos: distrato, cláusula resolutiva expressa e tácita, exceção de contrato não cumprido”, estuda os mecanismos que colocam fim aos pactos, expondo de forma necessária importantes diferenciações categóricas.
Em texto sobre a onerosidade excessiva, Erika Cesário da Silva Aparecido aborda a revisão e resolução dos contratos quando ocorre a desproporção superveniente, tema essencial para os tempos de crise, como se deu com a recente pandemia que atingiu toda a humanidade.
Camila Felberg, em “Espécies de contrato: compra e venda, permuta, contrato estimatório e doação”, examina esses relevantes contratos típicos, que estão entre os mais importantes para a prática do Direito Privado.
Em seu texto sobre o contrato de prestação de serviço, Fernanda Barberis examina uma das mais importantes figuras da atualidade, que igualmente envolve a atuação do advogado. Na sequência, a mesma autora traz texto sobre o contrato de empreitada, explorando as suas características e os seus efeitos, investigando como são eles estabelecidos pela legislação, destacando as obrigações das partes e as consequências legais do seu descumprimento.
Camila Felberg, em seu outro texto, sobre o contrato de mandato, discute as características e peculiaridades desse tipo de contrato, tão importante para a advocacia, explicando como são formados e executados esses negócios.
Lázaro Lima Souza, em seu artigo “Estudo concernente aos contratos de empréstimo, prestação de serviços, empreitada e depósito no Código Civil de 2002”, traz importante comparação entre os quatro contratos em espécie, com suas decorrências.
Por fim, em seu artigo sobre contrato de depósito, Fernanda Barberis estuda o seu conceito, sua natureza jurídica e suas características, com destaque para as obrigações das partes envolvidas. A mesma autora aborda o contrato de empréstimo, diferenciando o mútuo e o comodato.
No tocante à Responsabilidade Civil, o primeiro texto é de Lígia Martins, tratando das diferenças entre “Responsabilidade Civil e Responsabilidade Penal”. Da mesma forma, Andreia Olmedo Minto, em seu artigo, revisita as distinções entre essas duas modalidades.
Gisele Rui de Almeida, no artigo “Responsabilidade Civil – Dano Moral e Dano Material”, aborda esses dois tipos de danos e as suas correspondentes quantificações.
Victor Marques, em “Responsabilidade Civil por Ato de Terceiro: Breve Análise das Disposições do Código Civil”, investiga a responsabilidade civil indireta, com foco nos arts. 932 e 933 da codificação privada em vigor.
Milena Sabatini, no trabalho “Liquidação de Danos: Homicídio e Lesão Corporal”, examina o processo de fixação do quantum debeatur nessas duas hipóteses.
José Fernando de Mendonça Gomes Neto, em “Responsabilidade Civil por Infidelidade”, explora um tema cada vez mais debatido na prática do Direito Civil.
Ingressando nos temas de Direito das Coisas, Maurício Bunazar, em seu artigo sobre “Posse”, aborda os aspectos gerais deste instituto, regulado entre os artigos 1.196 a 1.224 do Código Civil.
Elisa Néri, no artigo “Propriedade: Aquisição de propriedade imóvel (usucapião, registro e acessões)”, discute importantes institutos, com destaque para a usucapião, um dos mais controversos na teoria e na prática do Direito Privado Brasileiro. A temática também é analisada por Milena Sabatini Lazzuri, em outro trabalho.
Victor Rolim Marques, em “Aquisição da Propriedade Móvel: Breve Análise das Disposições do Código Civil”, aborda as disposições do Código Civil sobre os institutos correlatos.
Milena Sabatini Lazzuri, em “Propriedade: Aquisição da Propriedade Imóvel: Usucapião, Registros e Acessões”, explora os importantes institutos jurídicos que regulam a aquisição de propriedade imóvel no Brasil, com ênfase nos aspectos relacionados ao usucapião, aos registros e às acessões.
Thiago Gomes De Araújo Silva, no texto “Direito de vizinhança: uso anormal da propriedade, passagem forçada, árvores limítrofes”, explora as normas que tratam das relações vicinais, tão conflituosas na prática.
Matheus Colacino, no artigo “Exclusão do condômino antissocial”, debate uma das mais controversas demandas da atualidade, que ainda não atingiu a necessária pacificação no âmbito dos Tribunais Brasileiros.
Rommel Andriotti, em “Propriedade Fiduciária no Código Civil e na Legislação Extravagante: Noções Gerais”, examina esse importante instituto, previsto não só na codificação privada, mas na legislação especial.
Maurício Bunazar, em outro texto, no artigo “Direitos Reais sobre Coisa Alheia”, explora a servidão, o usufruto, o uso e a habitação, detalhando as implicações jurídicas de cada um, proporcionando uma visão abrangente sobre o tema. Em “Direito do Promitente Comprador do Imóvel”, o mesmo autor aborda a promessa de compra e venda de imóveis registrada, outra importante categoria civil para a prática.
Erika Cesário da Silva Aparecido, no seu texto “Direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese e vedação do pacto comissório”, discute os diferentes tipos de garantias reais sobre coisa alheia, destacando as implicações jurídicas dessas garantias.
Em Direito de Família, Camila Felberg, no trabalho “Casamento: capacidade, impedimentos, causas suspensivas, habilitação para o casamento”, discute os requisitos legais para a efetivação do matrimônio e suas decorrências. Em outro texto, a mesma autora analisa as condições que levam à nulidade absoluta do casamento.
Amanda Nunes Costa, em “Casamento anulável e prazos para a anulação”, aborda as situações em que um casamento pode ter a nulidade relativa reconhecida e suas decorrências.
Dayane Puente Castilho, no artigo sobre “Dissolução do casamento e da sociedade conjugal: hipóteses”, explora os diversos motivos que podem levar ao fim da união e alguns de seus problemas práticos.
Milena Sabatini Lazzuri, no artigo sobre “União estável: configuração, distinção do casamento, distinção do concubinato”, discute as os elementos fundamentais da união estável e a sua fundamental diferenciação frente aos outros institutos citados. O tema também é tratado por Maurício Testoni, na sequência.
Em “Parentesco: Filiação, Reconhecimento de Filhos, Poder Familiar e Adoção no ECA”, Dayane Puente Castilho discute as diferentes modalidades de vínculo parental, com destaque para a parentalidade socioafetiva, tão de -
batida na atualidade. Ainda com a mesma temática, Maurício Testoni, no artigo sobre “Parentesco: graus de parentesco”, examina a classificação dos graus de parentesco, explicando como eles são estabelecidos.
Gisele Rui de Almeida, no seu artigo sobre “Regimes de bens do casamento e pacto antenupcial – noções gerais”, explora os diferentes regimes patrimoniais aplicáveis ao instituto e toda a sua problemática.
Priscilla Curti Georges Pilavdjian, em “Proteção da personalidade: tutela, curatela e tomada de decisão apoiada –noções gerais”, aborda as medidas de proteção da personalidade, com destaque para as mudanças decorrentes do Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Em Direito das Sucessões, Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas, estuda as normas gerais sobre sucessão legítima e testamentária. Na sequência, coube ao mesmo autor o estudo da “Ordem da vocação hereditária: sucessão em linha reta e na linha colateral”. Também coube a ele a abordagem dos herdeiros necessários e da proteção da legítima; e dos direitos sucessórios específicos do cônjuge e do companheiro.
Camila Felberg, no seu artigo “Herança vacante e herança jacente”, discute a destinação dos bens na ausência de herdeiros, conforme o artigo 1.844 do Código Civil de 2002, que determina que a herança seja devolvida ao Município ou ao Distrito Federal.
Daniel Barboza Kinguti, em seu texto sobre “A sucessão, por ausência do ‘tutor’, de um ser senciente na família multiespécie”, estuda um tema inovador e controverso, que já começa a ser debatido na prática do Direito Civil.
Milena Sabatini Lazzuri, no texto sobre “Indignidade e deserdação”, aborda as condições que levam à exclusão dos herdeiros, explicando seus fundamentos legais e as consequências jurídicas dessas medidas.
Verônica Rodrigues Tagliari de Miranda Marques, em artigo sobre “Inventário e partilha: noções gerais, inventário judicial e extrajudicial”, discute os procedimentos relativos à sucessão, com tratamento tanto no Código Civil como no Código de Processo Civil.
Como se pode perceber, esta cartilha é resultado do trabalho dedicado de muitos especialistas e reflete o esforço contínuo da ESA da OABSP em incrementar e fomentar o debate jurídico e a transmissão do conhecimento.
Agradecemos a todos os colaboradores deste belo trabalho, em especial ao seu coordenador, Professor Nestor Duarte e esperamos que este livro contribua significativamente para o aprimoramento do conhecimento e da prática do Direito Civil Brasileiro.
São Paulo, 11 de agosto de 2024.
Flavio Tartuce - Diretor da ESA da OABSP.
Erik Chiconelli Gomes – Coordenador Acadêmico da ESA da OABSP.
PARTE GERAL
O
CLÁSSICO
DEBATE SOBRE O INÍCIO E FIM DA
PERSONALIDADE CIVIL
Fernando Franco Barbosa Filho
No Brasil, “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (CC, art. 2º). Entende-se por nascituro “aquele que foi concebido e ainda não nasceu”1. Tradicionalmente, sempre foram intensos os debates sobre a personalidade do nascituro. A doutrina se divide entre: a teoria natalista, a teoria da personalidade condicional e a teoria concepcionista. Ao preservar quase integralmente a redação do art. 4º do Código Civil de 1916 no atual diploma civil, o legislador perdeu uma “oportunidade histórica” de resolver essa longa controvérsia doutrinária. 2
Os adeptos à corrente natalista, em interpretação literal da lei, defendem que o nascituro, por ainda não
1 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Lei de Introdução e Parte Geral. v.1. Rio de Janeiro: Forense, 2023. E-book. ISBN 9786559646951, p. 112. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559646951/. Acesso em: 21 mar. 2024.
2 FIÚZA, César. Código Civil anotado. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Porto Alegre: Síntese, 2004, p. 24.
ser uma pessoa, não é dotado de personalidade jurídica e, em razão disso, não possui direitos, mas mera expectativa de direitos. 3 A principal crítica doutrinária a essa corrente é que, além de não conferir uma proteção ampla aos direitos da personalidade – o que é uma tendência do Direito Civil pós-moderno – e se distanciar do surgimento das novas técnicas de reprodução assistida, ela não consegue responder à seguinte pergunta: “se o nascituro não tem personalidade, não é pessoa; desse modo, o nascituro seria uma coisa?”. 4
A teoria da personalidade condicional, que é um desdobramento da natalista, reconhece a “existência do ser humano a partir da concepção”, mas considera que os direitos do nascituro estão envoltos a uma condição suspensiva, qual seja, o nascimen -
3 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Introdução ao Direito Civil - Teoria Geral de Direito Civil. 34ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. E-book. ISBN 9786559644469, p. 184. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559644469/. Acesso em: 20 mar. 2024.
4 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Lei de Introdução e Parte Geral. Op. Cit., p. 112.
to com vida.5 Para Flávio Tartuce, “o grande problema dessa corrente doutrinária é que ela é apegada a questões patrimoniais, não respondendo ao apelo de direitos pessoais ou da personalidade a favor do nascituro”. 6
Por fim, a concepcionista, que tem sido adotada pela doutrina majoritária e pelo Superior Tribunal de Justiça7, reconhece o nascituro como pessoa – desde a concepção -, de modo a ter, inclusive, alguns direitos patrimoniais. 8 Desde a vigência do Código Civil de 1916, Silmara Juny de Abreu Chinelato e Almeida enfatizava que apesar de o art. 4º do revogado diploma civil estabelecer que o início da personalidade civil se daria a partir do nascimento com vida, “é possível conciliá-lo consigo mesmo e com todo o sistema agasalhado pelo Código, que reconhece direitos e estados ao concebido desde a concepção – nem sempre dependentes do nascimento com vida –, em harmonia com os diplomas legais de outros ramos do Direito”.9
Quanto ao fim da personalidade civil, ela ocorre com a morte (CC, art. 6º). A doutrina define que a
5 RIZZARDO, Arnaldo. Introdução ao Direito e Parte Geral do Código Civil. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. E-book. ISBN 978-85-309-6832-8, p. 189. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-309-6832-8/ Acesso em: 22 mar. 2024.
6 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Lei de Introdução e Parte Geral. Op. Cit., p. 113.
7 O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu o direito de uma mãe em receber indenização pela perda do nascituro do seguro DPVAT, entendendo que não apenas o Código Civil, mas o ordenamento jurídico brasileiro como um todo “alinhou-se à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro” (In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça (Quarta Turma). Recurso Especial nº 1.415.727-SC. Relator: Min. Luis Felipe Salomão, Data de Julgamento: 04/09/2014. Data de Publicação: 29/09/2014).
8 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1. São Paulo: Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553624535, p. 47 Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/ books/9786553624535/. Acesso em: 22 mar. 2024.
9 ALMEIDA, Silmara Juny de A. Chinelato e. Tutela civil do nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 349.
morte real ocorre a partir da morte cerebral (encefálica), como também consta do art. 3º da Lei nº 9.434/1997, que versa sobre a morte para fins de remoção de órgãos para transplante.10 O Código Civil também contempla a hipótese de morte presumida, seja com a declaração de ausência (CC, art. 6º), ou sem, em situações excepcionais (CC, art. 7º).
Após o falecimento, a lei protege “o corpo ou seus restos mortais, a memória do falecido, a sua imagem, os bens deixados, mas não remanesce a sua personalidade”.11 Ainda assim, é largamente reconhecido que apesar de a morte extinguir a personalidade em sentido subjetivo (aptidão para adquirir direitos e obrigações), a personalidade em sentido objetivo (conjunto de atributos essenciais da pessoa humana) permanece hígida, já que os direitos da personalidade se projetam para além da vida do seu titular, uma vez que a sua violação produz efeitos no meio social.12 Diante da necessidade de tutela post mortem da personalidade, o legislador definiu que o cônjuge ou parente colateral (até o quarto grau) possuem legitimidade para pleitear a adoção das medidas necessárias para impedir a transgressão dos direitos da personalidade da pessoa falecida (CC, arts. 12, parágrafo único e 20, parágrafo único), garantindo “proteção máxima para os atributos essenciais à condição humana”.13
10 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Lei de Introdução e Parte Geral. Op. Cit., p. 209.
11 RIZZARDO, Arnaldo. Introdução ao Direito e Parte Geral do Código Civil. Op. Cit., p. 190.
12 SCHREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade: Revista e Atualizada, 3ª ed. São Paulo: Grupo GEN, 2014. E-book. ISBN 9788522493449, p. 24-25. Disponível em: https://integrada. minhabiblioteca.com.br/#/books/9788522493449/. Acesso em 23 mar. 2024.
13 Idem, p. 25.
PARTE GERAL
02
AUSÊNCIA: SUCESSÃO PROVISÓRIA E SUCESSÃO DEFINITIVA
Fernanda
Barberis
Ausência no Direito Civil não tem o mesmo significado léxico comum, pois aquela configura uma situação jurídica relevante, especialmente, para o direito sucessório, como se vê das disposições constantes do Código Civil, a começar pela morte presumida do ausente, até sua sucessão definitiva (art. 6º e arts. 22 a 39). No Código Civil de 1916, o artigo 10 fazia as vezes do artigo 6º atual, porém, o desenvolvimento hoje constante dos arts. 22 a 39 estava no Livro do Direito de Família – Livro I da Parte Especial (arts. 463 a 484). Eram, também, no Código anterior, os ausentes, assim declarados, considerados absolutamente incapazes (art. 5º, IV).
Na definição de Rubens Limongi França1, “ausente é a pessoa que se afasta do domicílio sem dar notícia de seu destino. Juridicamente, porém, para que a ausência exista é preciso que seja declarada pelo magistrado mediante processo regular.” Ainda, segun -
1 Limongi França, R – Instituições de Direito Civil – p. 56 – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 1996.
do Clóvis Beviláqua 2, comentando o Código anterior, “há um período de ausência, seguido de outro de presunção de morte”.
Idêntica sequência é prevista no Código Civil de 2002, entretanto, este disciplinou uma outra situação, em que pode ser declarada a morte presumida, “sem decretação de ausência”, quando “for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida”, ou “se alguém, desaparecido em campanha, ou feito prisioneiro, não for encontrado até 2 (dois) anos, após o término da guerra”. Nessas hipóteses, a declaração da morte presumida “somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento” (art. 7º). Tal já encontrara previsão na Lei de Registros Públicos – Lei 6.015, de 31/12/1973 (arts. 85 e 88).
Pode o desaparecido ter ou não deixado representante ou procurador. Não o deixando, “o juiz a reque -
2 Beviláqua, Clóvis – Código Civil Comentado – vol. I – p.156 –10ª edição – Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1955.
rimento de qualquer interessado ou do Ministério, declarará a ausência” e nomeará curador (art. 22). Se deixou mandatário “que não queira ou não possa exercer ou contratar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes”, também se declarará a ausência e se nomeará curador. O mandato em termos gerais carrega em si uma insuficiência, pois não confere poderes para “alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária” (art. 661, e §§).
O magistrado fixará os poderes do curador, à semelhança do que fixa nos casos de tutela ou curatela de incapazes (art. 24). Existe uma ordem de preferência para a nomeação, iniciando-se pelo cônjuge do ausente não separado judicialmente, ou de fato por mais de dois (02) anos antes da declaração de ausência; na falta de cônjuge – aqui se devendo estender ao companheiro, na hipótese de união estável – a curadoria dos bens será cometida aos pais (não outros ascendentes) ou aos descendentes não impedidos, nesta ordem, preferindo os mais próximos aos mais remotos; por fim, não havendo parentes naquelas situações, “compete ao juiz a escolha de curador ”. O procedimento é de jurisdição voluntária (arts 744 e 745 do CPC), o que significa que a ordem de nomeação do curador pode ser afastada (art. 723, §u do CPC).
Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente (art. 745 do CPC), se não deixou representante ou três anos se deixou representante, os interessados poderão “requerer que, se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão” (art 26 do CC), cuja sentença só produzirá efeitos 180 (cento e oitenta) dias após sua publicação, “mas, logo que passe em julgado, proceder-se-á à abertura do testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens como se se o ausente “fosse falecido” (art. 28 do CC). À falta de interessados na sucessão provisória, re -
querê-la-á o Ministério Público. Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer o inventário, até 30 dias depois de passar em julgado a sentença que mandar abrir a sucessão provisória, far-se-á a arrecadação (art 28 e §§), no aguardo de eventual herdeiro, por isso se denomina herança jacente (art. 1.819 do CC) e, depois de expedidos editais, decorrido um (01) ano da primeira publicação, a herança será declarada vacante (art. 1.820 e ss), e, passados cinco (05) anos, “os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, ou da União” (art. 1.822). Nesse interregno de cinco anos, ainda os herdeiros poderão habilitar-se, contudo, os colaterais tem limitada essa faculdade apenas até a declaração de vacância (art. 1822, §u).
Essa regra, porém, não se aplica se o ausente retornar, pois, em tal hipótese, rege o artigo 39: “Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo.” Se, entretanto, nos 10 (dez) anos a que este artigo se refere “o ausente não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União, quando situados em território federal.”
Tirante as hipóteses de inexistirem ou não comparecerem herdeiros legítimos ou testamentários, conforme as disposições referidas na Parte Especial do Código, ou seja, havendo sucessores, desde logo conhecidos, aplicar-se-ão as regras dos artigos 37 e seguintes, de modo que dez (10) anos depois de passada em julgado a sentença que concede a su -
cessão provisória, poderão os interessados requererem a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas, para se imitirem na posse dos bens com a abertura da sucessão provisória (art. 30). Igualmente se poderá requerer a sucessão definitiva provando-se que o ausente conta 80 (oitenta) anos de idade e que de 5 (cinco) das últimas notícias dele.
Merece referência, também, a hipótese de retorno do ausente. Se ainda provisória a sucessão (art. 33), “o descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor provisório do ausente, fará seus todos os frutos e rendimentos dos bens que a este couberem; os outros sucessores, porém, deverão capitalizar metade desses frutos e rendimentos”, e prestar anualmente contas ao juiz competente, tendo sob fiscalização o Ministério Público, todavia: “Se o ausente aparecer, e ficar provado que a ausência foi voluntária e injustificada, perderá ele, em favor do sucessor, sua parte nos frutos e rendimentos”. Se retornar o ausente, “nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo” (arts. 38 e 39).
Importante questão surge quando o cônjuge do ausente vem a contrair novas núpcias, tendo em conta que a morte é presumida “nos casos em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva” (art. 6º). O Código Civil resolveu a celeuma no artigo 1.571, §1º “O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente”. Prevalecerão, portanto, as segundas núpcias, nada impedindo, porém, que o ausente e seu cônjuge voltem a casar, mas não é possível restabelecer o
vínculo anterior, pois não apenas a sociedade conjugal se dissolvera (art. 1.577 do CC).
PARTE GERAL
03
AS PESSOAS JURÍDICAS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Lázaro Lima Souza
INTRODUÇÃO
Em princípio, é necessário compreender o conceito da pessoa jurídica. Sendo assim, conceitua-se a referida pessoa como uma portadora de direitos e deveres jurídicos com personalidade diversa da dos indivíduos que a compõem.
Destacam-se as seguintes teorias concernentes à pessoa jurídica: teorias da ficção, da realidade objetiva e da realidade técnica.1 A primeira teoria ensina que a personalidade jurídica dos entes coletivos é uma criação de direito, ou seja, é diferente da personalidade dos entes individuais. A segunda teoria admite a existência real2 da pessoa jurídica. A teoria da realidade técnica tenta demonstrar que a personifi -
1 FERREIRA DA CAMARA, Maria Helena. Reflexões sobre o conceito de pessoa jurídica em Kelsen. https://www2. senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/181643/000419707. pdf?sequence=3&isAllowed=y Acesso em 12/03/2024.
2 Quando se fala em existência real da pessoa jurídica, entende-se que esta é um organismo autônomo real com atuação própria.
cação da pessoa jurídica é uma construção da técnica jurídica, e não uma criação artificial da lei, além de possuir atuação própria no meio social.
A seguir, abordar-se-á cada espécie de pessoa jurídica (artigo 40 do Código Civil de 2002 – CC/2002).
1. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO
São pessoas jurídicas de direito público interno a União, os Estados, O Distrito Federal, os Territórios, os Municípios, as autarquias, inclusive as associações públicas e as demais entidades de caráter público criadas por lei, com base no artigo 40 do CC/2002.
São pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo Direito Internacional Público, como é no caso da Santa Sé e das organizações internacionais, “verbi gratia” 3, de acordo com o artigo 42 do CC/2002 . 3 Significa “por exemplo”.
2. PESSOAS JURÍDICAS
DE DIREITO PRIVADO
Com base no artigo 44 do CC/2002, são pessoas jurídicas de direito privado as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos, sendo necessária a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, caso seja necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo (art. 45 do CC/2002).
3. DOMICÍLIO DAS PESSOAS
JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO E A REPRESENTAÇÃO DESTAS
O domicílio da pessoa jurídica de direito privado é o lugar onde as respectivas diretorias e administrações funcionarem ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos (art. 75 do CC/2002).
Caso a referida pessoa tenha diversos estabelecimentos (departamentos e agências, por exemplo) em lugares diferentes, cada um destes será considerado domicílio para os atos nele praticado (art. 75, § 1º do CC/2002).
Se a sede da Administração, ou diretoria, for no exterior, o domicílio será o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder, referente às obrigações contraídas por cada uma das suas agências (art. 75, § 2º do CC/2002).
A respeito da representação, como visto na introdução, a pessoa jurídica tem existência real na realidade técnica4, atuando por meio do agente (pessoa natural) que a lei ou o estatuto indicar. O poder de representação, que se origina da lei, permite ao repre -
sentante declarar vontade que afete o patrimônio jurídico do representado (no caso, pessoa jurídica)5
A representação legal (como espécie, e não gênero) não se confunde com o mandato porque decorre da lei 6, enquanto que o mandato decorre da vontade das partes e tem como instrumento a procuração.
O representante legal poderá assinar contratos, assumir obrigações e conceder procurações, por exemplo. A legislação e o contrato social, “verbi gratia”, demonstram os limites dos poderes concedidos a ele.
4. CONCLUSÃO
A pessoa jurídica possui atuação (representação) no meio social e é relevante para o estudo do Direito. Compreender os tipos de pessoa jurídica ajudará o operador do Direito nas suas funções de ofício.
4 Trata-se de uma realidade que é diferente das pessoas naturais..
5 ORLANDI CHAGAS, Carlos. Representação da pessoa jurídica e a teoria da aparência. USP, São Paulo, 2010. Dissertação de Mestrado. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/ disponiveis/2/2131/tde-10012011-144134/publico/Representacao_da_Pessoa_Juridica_e_a_Teoria_da_Aparencia.pdf Acesso em 14 de março de 2024.
6 Não será abordada a representação judicial (como é nos casos dos tutores e síndicos, por exemplo) porque o objetivo é tratar da representação da pessoa jurídica de direito privado.
PARTE GERAL
BENS. CLASSIFICAÇÃO:
CONSIDERADOS EM SI MESMOS E
RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS
Celso A. Coccaro Filho
Considerados isoladamente, pela própria natureza, os bens podem ser:
1. MÓVEIS OU IMÓVEIS
Bens imóveis são aqueles que não podem ser transportados, sem destruição, de um local a outro. São, segundo o art. 79 do Código Civil: o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Estes são os bens imóveis por natureza, que englobam também aqueles as acessões que o ser humano incorporar definitivamente à terra, como as edificações.
Há também os bens imóveis por acessão intelectual, cuja condição é determinada pela vontade humana, como máquinas de uma fazenda que, embora naturalmente móveis, podem ser consideradas, pela forma de sua exploração, como imóveis.
A finalidade do bem, mais uma vez ditada pela vontade humana, permite que bens móveis, como os ma-
teriais de construção, separados provisoriamente de um prédio, destinados a nele se reempregarem.
Finalmente, há os bens imóveis por definição legal, descritos pelo art. 80 do Código Civil.
Quanto aos móveis, há poucas dificuldades. O art 82 os define de maneira segura, como aqueles suscetíveis de movimento próprio ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social. Também há os bens móveis fictos, que são aqueles assim definidos pela lei (art. 83).
A destinação econômica também pode alterar a condição natural, assim como os materiais de construção que não foram empregados em construção, que são móveis, ao contrário daqueles que a ela se destinam que, como visto, a lei define como imóveis.
2. OS BENS PODEM SER
FUNGÍVEIS OU NÃO FUNGÍVEIS
Os primeiros admitem substituição, sem prejuízo da espécie, qualidade e quantidade, invertendo-se a mesma característica, quanto aos infungíveis. Bens fungíveis por ser transformadas em infungíveis, pela convenção ou natureza do uso, quando destacados pela singularidade, a exemplo de uma moeda rara.
3. CONSUMÍVEIS E NÃO CONSUMÍVEIS
Consumíveis são os bens cujo uso importa destruição imediata da substância. O critério adotado é do “primeiro uso”, que causa a redução ou destruição imediata, o que não ocorre com os não consumíveis.
4. DIVISÍVEIS E NÃO DIVISÍVEIS
Os primeiros podem ser fracionados sem alteração da sua substância e de suas qualidades essenciais, nem redução significativa de valor. Os indivisíveis não podem se partir, porque esta ocorrência os destrói.
5. SINGULARES E COLETIVOS
Singulares são os bens que, embora reunidos, são considerados em sua individualidade, enquanto os coletivos são considerados pelo todo, pelo conjuntam ao qual se agregam. Há universalidades de fato, como uma biblioteca e de direito, a exemplo do patrimônio ou da herança.
Os bens podem ser considerados em relação da influência que podem ter um sobre outro, ou seja, reciprocamente considerados. Distinguem-se, sob esta ótica, os bens principais e acessórios. Os primeiros têm existência própria e independente, enquanto a dos acessórios supõe a do principal. A título de exemplo a tampa (acessório) em relação à caneta (principal).
SÃO BENS ACESSÓRIOS:
1. Os frutos, que são utilidades periódicas, renováveis, da coisa. Podem ser naturais; industriais (resultam da ação humana) e civis, que decorrem da fruição do bem, como os rendimentos do capital, ou juros. Não devem ser confundidos com os produtos, que se extraem da coisa principal, mas diminuem-lhe a quantidade, a exemplo do carvão extraído de uma mina.
Os frutos também podem ser pendentes, percebidos ou percepiendos, ou, respectivamente, aqueles ainda unidos à coisa principal, já separados da coisa principal e que ainda a ela estão ligados, embora já devessem ter sido percebidos. Exemplos, tomando como base os frutos civis: aluguéis não vencidos, aluguéis vencidos e pagos, aluguéis vencidos, mas não pagos).
2. Benfeitorias, que são obras de melhoramento do bem principal, e que podem ser necessárias, úteis ou voluptuárias, a depender da sua função, de acordo com o art. 96 do CC.
3. Pertenças: são bens que, embora não constituam partes integrantes do principal, prestam-se ao seu uso, serviço ou aformoseamento, a exemplo dos bens móveis que guarnecem uma casa.
PARTE GERAL
05
BENS PÚBLICOS E PARTICULARES
Gleydson Delfino dos Santos
Destarte, no que tange a bens públicos e particulares é salutar que a Magna Carta de 1988 e o Código Civil de 2002 determina a presente classificação, assim diferenciando um instituto do outro.
Disto posto, a norma infraconstitucional 10.406/02 em seus dispositivos 98 a 103, reza que os bens públicos pertencem à pessoa jurídica de direito público interno, ou seja, aos entes federativos, na qual está sacramentado na Constituição Federal de 1988 como União, Estados, Distrito Federal e Municípios nos termos do art. 20 a 26 da CRFB/88.
Neste sentido, a própria legislação define que será de uso comum os rios, mares, estradas, ruas e praças, bem como, também classifica como uso especial os bens destinados a serviços ou estabelecimento dos entes públicos, assim os demais patrimônios sendo denominados e considerados como bens particulares.
Atualmente existem doutrinadores que consideram bens públicos apenas como bipartite, assim havendo sua divisão em uso comum e especial, entretanto há também um terceiro posicionamento na qual alguns doutrinadores entendem como tripartite, assim além das duas outras subdivisões, incluem a de uso dominical que é definida como um patrimônio que está disponível para o ente público, mas que não consta fomentado em legislação.
Ademais, os bens públicos de uso comum e especial por serem inalienáveis, não poderão ser vendidos ou usucapidos, uma vez que o Poder Constituinte instituiu na Magna Carta de 1988 em seu art. 183, §3°, tal como, reza o art. 102 da lei 10.406/02 no mesmo sentido, assim sendo fomentado para que houvesse segurança jurídica e dividir um patrimônio público dos particulares.
Concluindo, no que tange aos de uso dominical é possível ser alienado desde que seja definido em lei, conforme fixou o legislador no dispositivo 102 do código civil de 2002.
Neste diapasão, pode-se verificar que nas duas primeiras divisões, quais sejam, a de uso comum e especial será aplicada em face dos bens públicos dos entes federativos, enquanto a de uso dominical caberá à sociedade de economia mista e empresas públicas por ser considerados híbridos, ou seja, uma parte pertencente ao ente federativo e a outra ao particular, uma vez que o Conselho da Justiça Federal em seu enunciado n° 287 pacificou este entendimento.
Não obstante, no que tange aos bens particulares ou privados, este encontra-se definido como patrimônio de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, na qual estas adquiriram e serão gerenciadas por particulares, além de que poderão ser regulamentados pela lei 10.406/02.
É salutar que no caso de bens particulares ou privados, o patrimônio poderá ser alienado à terceiros, porém não será compartilhado, enquanto os bens públicos são inalienáveis e poderão ser compartilhados com terceiros a referida propriedade.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Função da lei. Diário Oficial da União, Brasília, DF, data de publicação do diário onde a lei foi divulgada 11.01.2002.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
CNJ, Conselho da Justiça Federal, Bens Públicos, Disponível em: https://www.cjf.jus.br/enunciados/ enunciado/258, acesso em 31.03.2024
FIGUEIREDO, Roberto, Distinção entre Bens Públicos e Particulares, Disponível em: https:// www.jusbrasil.com.br/noticias/qual-distincao-o-codigo-civil-brasileiro-estabelece-entre-bens-publicos-e
particulares/178971198, acesso em 31.03.2024.
OLIVEIRA, Daniela, Bens Públicos e Particulares, Disponível em: https://jurishand.com/civil/conceito/ bens publicos-e-privados, acesso em 01.04.2024.
TRILHANTE, Bens Públicos, Disponível em: https:// trilhante.com.br/curso/bens-publicos/aula/definicao-e classificacao-de-bens-publicos-2 , acesso em 31.03.2024
06
PARTE GERAL
BENS: MÓVEIS E IMÓVEIS (POR NATUREZA E POR LEI), FUNGÍVEIS, INFUNGÍVEIS, CONSUMÍVEIS, DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS (POR NATUREZA E POR LEI), SINGULARES E COLETIVOS
Dayane Puente Castilho
Benedicto Stipp Cruz Neto
Os bens são elementos fundamentais no direito civil e desempenham um papel crucial na vida cotidiana das pessoas, sendo eles todas as coisas materiais ou imateriais, que eventualmente possuam valor econômico (significativo ou não), podendo virem a ser objeto de eventuais relações jurídicas. Nasce do pressuposto de satisfação de necessidades humanas, tanto com relação à questões consumeristas, quanto com relação às necessidades básicas, como o deslocamento, moradia, comodidades gerais, etc, sendo essencial analisar as diferentes categorias de bens, incluindo móveis e imóveis, fungíveis e infungíveis, consumíveis e não consumíveis, divisíveis e indivisíveis, singulares e coletivos.
Bens Móveis e Imóveis são os classificados com base em sua natureza. Sendo os móveis aqueles que podem ser transportados de um lugar para outro sem causar danos significativos a si mesmos ou ao imóvel ao qual estão ligados, bem como não so -
frendo alteração com relação à sua própria existência. Exemplos incluem carros, roupas e móveis domésticos. Por outro lado, bens imóveis são aqueles que não podem ser movidos sem causar danos substanciais, como casas, terrenos e edifícios. Essa distinção é crucial no direito civil, pois os bens imóveis estão sujeitos a regras e regulamentações específicas. A título meramente informativo e exemplificativo, temos por exemplo que em caso de venda de veículos, a legislação e os costumes do povo impõem regras menos severas para a aquisição e venda. Exemplo: Reconhecimento de firma do documento de venda, tanto do comprador quanto do vendedor e realização de vistoria. Interessante destacar que, muitas vezes quando a compra e venda se dá por particulares, geralmente não há a confecção de um contrato de compra e venda (embora altamente recomendado). Curioso também destacar que os demais bens móveis, por mais valiosos que possam ser, em sua grande maioria (exceto demais conduções como embarcações, aeronaves etc.), não possuem qualquer tipo de registro de proprie -
dade e a efetiva comprovação da propriedade se daria tão somente por meio de contrato simples de compra e venda, novamente, o que entendemos altamente recomendável em qualquer caso. Já nos bens imóveis, por costume, no ato da compra ou venda, é necessário a emissão de certidões negativas de débitos e, em geral, todas as negociações são finalizadas em cartório, com a emissão de contratos e o registro respectivo na matrícula do imóvel.
Agora falando sobre os Bens Fungíveis e Infungíveis, estes podem ser classificados com base em sua natureza. Bens fungíveis são substituíveis por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, sendo intercambiáveis e não possuindo identidade própria, portanto cada unidade sendo considerada equivalente às outras. Um exemplo típico é o dinheiro; se você empresta uma nota de R$ 100,00 (cem reais) a alguém, espera receber outra nota de R$ 100,00 (cem reais) de volta. Bens infungíveis, por outro lado, são únicos e não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, sem que haja perda significativa de valor ou utilidade. Exemplo: Uma obra de arte de um artista famoso é um exemplo de bem infungível.
Quanto aos Bens Consumíveis e Não Consumíveis sua classificação diz respeito à capacidade de um bem ser consumido pelo uso regular. Bens consumíveis são aqueles que se esgotam naturalmente com o uso, de forma irreversível durante o uso ou ao longo do tempo, tal como alimentos, combustível ou energia elétrica. Bens não consumíveis são aqueles que não se esgotam pelo uso regular, como um veículo ou uma máquina.
Bens Divisíveis e Indivisíveis refere-se à capacidade de um bem ser dividido em partes sem que sua essência seja prejudicada, sendo caracterizados como divisíveis aqueles que podem ser divididos em partes independentes sem perderem sua utilidade,
como um estoque de mercadorias e os Bens indivisíveis, por outro lado, não podem ser divididos sem perderem sua utilidade, como uma casa.
Bens Singulares e Coletivos diz respeito ao número de elementos que compõem o bem. Bens singulares são únicos e indivisíveis por natureza, como uma pessoa ou um edifício específico. Bens coletivos, por sua vez, são compostos por várias partes, mas são tratados como uma unidade, como um rebanho de gado.
É importante observar que essas categorias não são mutuamente exclusivas. Um bem pode ser classificado de várias maneiras ao mesmo tempo. Por exemplo, uma fazenda (bem imóvel) pode conter gado (bem coletivo) e máquinas agrícolas (bens móveis e divisíveis).
Em resumo, a classificação de bens é fundamental no direito civil, pois determina os direitos e as obrigações dos proprietários, bem como as regras que regem a transferência de propriedade e o uso de bens. Compreender essas categorias é essencial para garantir relações legais claras e justas no mundo jurídico e na vida cotidiana.
PARTE GERAL
NEGÓCIO JURÍDICO: ELEMENTOS ESSENCIAIS, REPRESENTAÇÃO 07
Camila Felberg
1. CONCEITO DO INSTITUTO E SUAS PREVISÕES NORMATIVAS
O ordenamento jurídico brasileiro institui e disciplina o negócio jurídico no Código Civil (Lei nº 10.406/2002) especificamente nos artigos 104 a 184, no Livro III que trata “Dos Fatos Jurídicos”.
O Código Civil disciplina as regras gerais relacionadas ao negócio jurídico cabendo às legislações complementares o detalhamento das questões mais específicas inerentes a cada um dos tipos do negócio jurídico.
Seguindo linha adotada pelo Prof. Dr. Anderson Schreiber nos comentários destinados ao art. 104 do Código Civil, na obra denominada “Código Civil Comentado – doutrina e jurisprudência” 1 de autoria de renomados juristas, o negócio jurídico é espécie dos tipos de fatos jurídicos que, por sua vez, são quais-
1 Código Civil comentado – doutrina e jurisprudência / Anderson Schreiber ... (et al.) – Rio de Janeiro: Forense, 2019 (pág. 68).
quer fatos sociais que repercutem na esfera jurídica e podem se subdividir em fatos jurídicos naturais ou fatos jurídicos em sentido estrito que são aqueles que prescindem da vontade humana, já os fatos jurídicos humanos ou atos jurídicos são aqueles fatos juridicamente relevantes, que resultam diretamente da atividade humana, como expressamente menciona sua nominação.
Já os atos jurídicos se subdividem em duas espécies: os atos jurídicos em sentido estrito em que os efeitos jurídicos decorrem de ato voluntário do agente, mas, seus efeitos não guardam qualquer relação com a intenção dos agentes, que motivou sua celebração e os negócios jurídicos que nada mais são que declarações de vontade acolhidas pelo ordenamento para produzir efeitos jurídicos desejados pelos agentes. Assim, no negócio jurídico, ao contrário dos efeitos decorrentes dos atos jurídicos, a ordem jurídica concede ao agente exatamente o efeito que pretende obter.
O elemento distintivo do negócio jurídico dos demais atos jurídicos lato sensu, é a vontade de produção de efeitos jurídicos, elemento esse constitutivo da própria essência de um negócio jurídico. Segundo o entendimento de Silvio Salvo Venosa (2013,p. 342)2: “Trata-se de uma declaração de vontade que não apenas constitui um ato livre, mas pela qual o declarante procura uma relação jurídica entre as várias possibilidades que oferece o universo jurídico.”
Assim, diferentemente dos demais atos jurídicos, o negócio jurídico é um ato realizado com vistas a um certo efeito no campo fático do Direito.
I.1. Elementos essenciais
São os elementos indispensáveis para a verificação de sua ocorrência, sendo eles:
Capacidade do(s) agente(s):
Devem ser observadas as regras de capacidade civil insertas no art. 5º do Código Civil3. Entretanto, é possível a celebração de negócio jurídico por incapazes, desde que devidamente representados na forma que prescreve a lei.
Objeto lícito, possível, determinado ou determinável
O objeto tratado no negócio jurídico deve estar em conformidade com a ordem normativa, sendo observados seus princípios e regras com esteio, principalmente, nos valores constitucionais. Ainda, o objeto que serve de esteio ao negócio jurídico deve ser possível (nos planos fático e jurídico), ou seja, deve ser passível de ser realizado. Por fim, deve tratar de objeto determinado quando de sua celebração ou determinável ao longo do prazo estipulado para seu
2 Venosa, Sílvio de Salvo Direito civil: parte geral/ Sílvio de Salvo Venosa. -13. ed. -São Paulo: Atlas, 2013. -(Coleção direito civil; v. 1). 3 Código Civil. Art. 5 o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
aperfeiçoamento. O legislador se preocupou com a exequibilidade do negócio jurídico, portanto.
Forma prescrita ou não defesa em lei
É o meio pelo qual o agente exprime sua vontade, sendo comportada a interpretação mais liberal quanto a esse aspecto, podendo as partes decidirem a forma mais conveniente, desde que não haja forma específica e obrigatória para o negócio jurídico específico ou, ainda, que a forma escolhida não seja vedada pelo ordenamento jurídico.
I.2. Representação.
Trata de disciplinar a técnica de atuação jurídica em nome de um terceiro, sendo a esse terceiro gerados os efeitos decorrentes da celebração do negócio jurídico, sendo resultante da necessidade ou conveniência em alguma das partes de se fazer representada.
Há dois tipos de representação possíveis: a legal, que decorre de previsão legal e pode representar munus (quando há impossibilidade jurídica de incapazes proverem seus interesses) ou, ainda, a representação voluntária, decorrente de outro negócio jurídico (outorga de poderes por procuração, no caso de representantes legais de pessoas jurídicas ou de órgãos de classe entre outros instrumentos possíveis).
De qualquer forma e em todos os casos, os efeitos decorrentes da celebração do negócio jurídico recaem sobre aquele que estiver sendo representado.
08
PARTE GERAL
DEFEITOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS E CARACTERIZAÇÃO DOS VÍCIOS: ERRO OU IGNORÂNCIA, DOLO, COAÇÃO, ESTADO DE PERIGO, LESÃO E FRAUDE CONTRA CREDORES
Maurício Testoni
Trata-se de tema de suma importância dentro do direito privado, eis que aponta em quais circunstâncias é possível anular o negócio jurídico (nulidade reativa) caso estejam presentes os requisitos legais.
Nesse sentido, defeitos do negócio jurídico são imperfeições que nele podem surgir, decorrentes de anomalias na formação da vontade ou na sua declaração (Gonçalves, 2017).
Diante desse cenário é possível ainda dividir os defeitos em: vícios de consentimento, e, vícios sociais, sendo o primeiro a situação pela qual provoca uma manifestação de vontade dissociada com a real intenção do manifestante criando uma divergência entre elas, e a segunda, a declaração de vontade é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros, sendo por isso, considerada um vício social (Gonçalves, 2017).
O Erro é a falsa percepção da realidade, sendo que o agente se engana sozinho, já a ignorância , é o
completo desconhecimento da realidade. Em ambos casos o agente não celebraria o negócio ou até celebraria em circunstâncias diversas, desde que devidamente esclarecido (Gonçalves, 2017).
Por exemplo, um sujeito que ao receber uma oferta de venda de um imóvel em determinado endereço “aparentemente” em bairro nobre, imagina se tratar em local valorizado, porém, posteriormente descobre ser em local bem afastado do que imaginou e pouco valorizado.
Neste caso incorre em erro, pois, incorreu em falsa percepção da realidade, podendo o negócio ser anulado.
O Dolo é o artifício ou expediente astucioso empregado para induzir alguém à prática de um ato que prejudique e aproveite ao autor do dolo ou a terceiro, sendo que para tanto uma das partes age maliciosamente com a finalidade de extrair manifestação de vontade da outra parte que seja capaz de lhe trazer proveito ou a terceiro.
Diferencia-se do erro uma vez que neste o sujeito se engana sozinho, já no dolo o equívoco do sujeito é provocado por outro sujeito (Goncalves, 2017).
Por exemplo, um sujeito coloca seu imóvel à venda, entretanto não relata para o comprador que este bem sofre infiltração do imóvel vizinho, ofertando referido bem por um valor de como se estivesse em perfeitas condições, induzindo o comprador a celebrar o negócio jurídico, podendo neste caso, ser anulado o negócio celebrado.
Já a Coação é toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre um indivíduo para forçá-lo a praticar um ato um realizar um negócio contra sua vontade, se utilizando para tanto de violência psicológica para viciar à vontade (Gonçalves, 2017).
Neste caso, por exemplo, um sujeito obtém a manifestação da vontade de outro, após o primeiro ter ameaçado sua vida ou de sua família de morte, sendo este, motivo pelo qual o negócio foi celebrado, podendo neste caso anular o negócio jurídico celebrado.
O Estado de Perigo caracteriza-se pela situação de extrema necessidade que conduz uma pessoa a celebrar negócio jurídico contraindo obrigação desproporcional e excessivamente onerosa, com o intuito de salvar a si próprio ou pessoa de sua família de grave dano conhecido pela outra parte (Artigo 156 Código Civil).
Assim, neste caso, um exemplo clássico seria o sujeito que ao chegar ao pronto atendimento de um hospital para ser atendido em caráter emergencial, concorda em pagar alta quantia de honorários exigidos pelo médico para que, só assim, seu possível realizar atendimento, podendo neste caso, requerer judicialmente a anulação do negócio jurídico celebrado (Gonçalves, 2017).
A Lesão caracteriza-se pela situação na qual uma pessoa sob premente necessidade, o, por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta (Artigo 157 Código Civil).
Neste caso, a lesão ocorre quando a ‘premente necessidade’ é de natureza econômica, ou seja, de obter recursos para salvar o patrimônio do agente (Gonçalves, 2017).
Por fim, a fraude contra credores elencada como vício social não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e sua declaração de vontade, mas sim, a vontade manifestada com o intuito de prejudicar credores (Gonçalves, 2017).
Vale destacar que os vícios aqui elencados são anuláveis (nulidade relativa) e tal anulabilidade encontra supedâneo no Artigo 171, II do Código Civil.
Já em relação ao prazo para requerer judicialmente a anulação este é de 4 (quatro) anos, com fundamento no Artigo 178 do Código Civil.
REFERÊNCIAS
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, 1: Esquematizado: parte geral: obrigações e contratos. 7. Ed – São Paulo: Saraiva, 2017 Ed. Rev, atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2017.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 16 de setembro de 2023.
PARTE GERAL
09
NULIDADE ABSOLUTA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Maurício Testoni
Trata-se de tema de suma importância dentro do direito privado, eis que aponta em que circunstâncias é possível anular o negócio jurídico (nulidade absoluta) caso estejam presentes os requisitos legais.
Nulidade é a sanção imposta pela lei aos atos e negócios jurídicos que não observem os requisitos básicos, impedindo de produzir efeitos, assim, caso ofenda preceitos de ordem pública, a nulidade se faz presente, com a finalidade de afastar a produção dos efeitos próprios (Gonçalves, 2017).
Já a nulidade absoluta, além do interesse individual, atinge o social, eis que por violar preceitos de ordem pública atinge a coletividade como um todo, podendo ser arguida por qualquer interessado ou ministério público, devendo ser pronunciada de ofício pelo magistrado no momento oportuno com fundamento no Artigo 168, parágrafo único do Código Civil (Gonçalves, 2017).
Nesse sentido, o Código Civil preceitua as exigências para que um negócio jurídico seja considerado nulo:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Veja-se, que no dispositivo acima colacionado, os requisitos de nulidade absoluta se conectam com os mesmos objetivos determinantes da validade do negócio jurídico apontados pelo Artigo 104 do Código Civil:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
Assim, diante da característica de ordem pública da norma civilista, e, em relação ao tema em comento, tem-se que a observância estrita dos requisitos de validade, bem como a identificação de causas de nulidade absoluta estampadas no Artigo 167 do Código Civil visam proporcionar maior segurança jurídica para os contratantes.
Ainda nessa toada, a legislação civilista aponta como causa de nulidade absoluta a simulação, caracterizada como vício social e tipificada no Artigo 167 do Código Civil:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§1º. Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
§2º. Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.
Após análise do dispositivo acima mencionado, tem-se que embora caracterizada a simulação do negócio jurídico, serão ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé, em prestígio a segurança jurídica daqueles que são externos ao negócio simulado.
Por fim, vide abaixo quadro comparativo com as principais diferenças entre anulabilidade (nulidade relativa) e nulidade (nulidade absoluta):
Anulabilidade Nulidade
É decretada no interesse privado da pessoa prejudicada. Nela não se vislumbra o interesse público, mas a mera conveniência das partes.
É de ordem pública e decretada no interesse da própria coletividade. Pode ser suprida pelo juiz, a requerimento das partes (CC, art. 168, p. único, a contrario sensu), ou sanada, expressa ou tacitamente, pela confirmação (Art. 172). Quando resultar da falta de autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente (Art. 176).
REFERÊNCIAS
Não pode ser sanada pela confirmação nem suprida pelo juiz. O Código Civil atual, para atender à melhor técnica, substituiu o termo “ratificação” por “confirmação”.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, 1: Esquematizado: parte geral: obrigações e contratos. 7. Ed – São Paulo: Saraiva, 2017 Ed. Rev, atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2017.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 16 de setembro de 2023.
PARTE GERAL
10
ATOS ILÍCITOS E EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
O Código Civil não disciplinou de forma sistematizada, ampla e ordeira o tratamento do ato ilícito civil, entendido como o ato contrário à lei e que acarreta uma resposta sancionatória do ordenamento. Sob o epíteto “Dos atos ilícitos”, no Título III do Livro III da Parte Geral, o legislador apenas tratou parcialmente do fenômeno, que restou disperso pelo Código.
Assim, deve-se entender o art. 186 como mera espécie do gênero ato ilícito, que é aquela associada à responsabilidade civil, por isso, exige (i) ação ou omissão voluntária, praticada com dolo ou culpa; (ii) dano patrimonial ou extrapatrimonial; e (iii) nexo de causalidade, direto e imediato, entre a conduta e o dano sofrido pela vítima. Mas a categoria ato ilícito é muito mais ampla que o ato desconforme à lei que enseja o dever de reparar.
Dentro do gênero ato ilícito podemos, igualmente, incluir figuras cuja sanção, por exemplo, é invalidar certo ato jurídico, como ocorre no art. 171, II do Có -
digo Civil; ou promover a perda de um direito, como ocorre no art. 1.638, I do Código Civil. Para estas figuras não se exige, necessariamente, os mesmo requisitos prescritos pelo art. 186.
O legislador, contudo, foi além ao prever, no art. 187, que “[t]ambém comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Trata-se da figura do abuso de direito, que dispensa a verificação de dano ou a demonstração de culpa. Basta que se supere os limites ou fins econômicos e sociais do direito subjetivo exercido para que algo, antes lícito, seja considerado ato ilícito.
Por fim, não será considerado ilícito o ato praticado em legítima defesa, em estado de necessidade ou no exercício regular de um direito, para nos limitarmos ao que dispõe o art. 188 do Código Civil. Legítima defesa é a reação moderada para repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio. Estado de necessidade é a reação a ameaça
decorrente de dano iminente, cuja remoção implica lesão a direito de terceiro. Exercício regular de um direito é a ausência de contrariedade à ordem jurídica. Tais hipóteses rompem com a ilicitude da conduta, atuando como excludentes de antijuridicidade – um dos tipos de excludentes que impedem a configuração de ato ilícito.
PARTE GERAL
PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA: DISTINÇÃO ENTRE
PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA, INTERRUPÇÃO E SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL 1 1
Davi Marques de Araújo
Fundamentados principalmente na segurança jurídica, o tempo é a base dos institutos da prescrição e da decadência (esta também chamada de caducidade), para trazer a certeza de finitude das relações jurídicas.
No Código Civil de 1916 era tormentosa a distinção entre os institutos, sobretudo porque a decadência não era mencionada de maneira separada da prescrição. Desde uma obra de Agnelo Amorim Filho, na década de 19601, todavia, tornou-se mais precisa a distinção entre prescrição e decadência tendo em vista a distinção entre direito colaborativo e direito potestativo, e a natureza das ações correspondentes. Esse critério foi acolhido pelo Código de Defesa do Consumidor de 1990 e, posteriormente, pelo Código Civil de 2002.
1 AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição de decadência e para identificar as ações imprescritíveis. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 49, n. 300, p. 7-37, 1960.
Direito colaborativo é aquele relacionado a uma prestação (dar, fazer ou não fazer). Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, isto é, a faculdade de exigir a satisfação da prestação da outra parte por uma ação condenatória. Com essas premissas em vista, a prescrição é a extinção2 da pretensão de um direito colaborativo, exercível por uma ação condenatória, após o decurso de um lapso temporal definido pelo legislador; no Código Civil, previstos nos artigos 205 e 206.
Por outro lado, a decadência é a perda de um direito potestativo, que só se mantém por um lapso temporal definido pelo legislador. Isso porque, em algumas relações jurídicas, há tal estado de sujeição da outra parte, que o legislador decide determinar um prazo para o exercício do direito 3. Apenas dentro desse prazo, é possível ação constitutiva (positiva ou negativa), para a criação, a modificação ou a extinção de
2 A rigor, só há perda da eficácia da pretensão, e não extinção do direito; por isso, quem paga dívida prescrita paga dívida existente.
3 A decadência é prevista esparsamente ao longo do Código Civil, seja na Parte Geral (exemplo é o artigo 179 do Código Civil), seja na Parte Especial (exemplo é o artigo 1.560 do Código Civil).
uma relação jurídica, independentemente da concordância ou da colaboração do outro (direito potestativo).
O prazo prescricional pode ser suspenso ou interrompido, conforme disposições legais expressas; no Código Civil, nos artigos 197, 198, 199 e 202. Na suspensão, é retomado da data que parou; na interrupção, é reiniciado, sendo mais favorável ao credor.
Diferente situação ocorre quando se impede a prescrição, isto é, quando nem mesmo inicia. Apesar disso, note-se que o Código Civil trata das causas que impedem ou suspendem a prescrição juntamente (artigos 197, 198 e 199), porque as hipóteses podem ocorrer tanto antes do início, como durante o curso do prazo prescricional; logo, a depender do momento que ocorrer a violação do crédito, a prescrição será impedida ou suspensa.
No artigo 197 constam as causas subjetivas que impedem ou suspendem, e favorecem qualquer um dos mencionados no dispositivo. É o que ocorre entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; e entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
Por sua vez, no artigo 198, há causas subjetivas que só beneficiam uma das partes, e na posição de credor, para beneficiá-los. Assim, por exemplo, não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes, isto é, quando forem credores. Nesse ponto, importante lembrar que, após a Lei n. 13.146/2015 (EPD), as pessoas com deficiência não têm, pela lei, o benefício da suspensão ou impedimento como incapazes, pois são plenamente capazes.
Além disso, também não corre a prescrição contra os ausentes do país em serviço público, seja qual for a função; e nem corre contra os que se acharem ser-
vindo nas forças armadas, desde que em tempo de guerra; nesse ponto, não basta ser militar.
No artigo 199 constam as causas objetivas, relacionadas a situações jurídicas ainda pendentes, como a condição suspensiva, quando o prazo ainda não venceu (termo), ou quando ainda há ação de evicção. Nesses casos, a rigor, não há propriamente violação do direito, para se falar em prescrição.
Considerando as causas (na maior parte subjetivas), a suspensão da prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível. A suspensão ou impedimento, a princípio, só favorece as pessoas cujas condições impõem tal prerrogativa.
Diferentemente, as causas de interrupção envolvem uma postura ativa, diligente, do credor, ou de qualquer interessado, como o ajuizamento de ação, o protesto, o ato judicial que constitui em mora, entre outras previstas no artigo 202 do Código Civil. Por beneficiá-lo, devem ser interpretadas restritivamente e só podem ocorrer uma vez.
A princípio, os efeitos são pessoais, isto é, só atinge um credor e um devedor. Porém, a regra admite várias exceções (artigo 204 do Código Civil). A ressalva é solidariedade e a indivisibilidade; nessas hipóteses, a obrigação, por sua própria natureza, poderá ser exigida por inteiro de cada um dos devedores. Aqui, é lógico que a prescrição afete todos Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição. No Código de Defesa do Consumidor, há exemplo de disposição legal nesse sentido no artigo 26, §2º.
PARTE GERAL
12
PROVA
DO
NEGÓCIO JURÍDICO: MEIOS DE PROVA
Luany Nascimento Baldi
A presente Cartilha visa realizar uma análise da prova do negócio jurídico. A exploração do tema proposto é de suma relevância para os operadores do Direito.
A prova é o meio de que o interessado se vale para corroborar legalmente a existência de um negócio jurídico.
Busca-se evidenciar não o direito, mas um fato relacionado a ele, na busca pela autenticidade processual. Em nome da segurança jurídica, a prova é elemento essencial para a configuração da responsabilidade civil originada por um negócio jurídico.
Ao direito civil, cabe a deliberação das provas, a indicação do seu préstimo jurídico e as condições de admissibilidade; ao processo civil, caberá estudar o modo de constituir a prova e de produzi-la em juízo. (GONÇALVES, 2011, p. 535).
O Art. 212 do Código Civil apresenta os meios de provas dos atos negociais que permitirão a parte de -
monstrar em juízo a sua existência, com a finalidade de persuadir o juiz dos aludidos fatos.
São esses: I – confissão; II – documento; III – testemunha; IV – presunção; V – perícia. A confissão pode ser tanto judicial como extrajudicial e é a façanha pela qual a parte, espontaneamente ou não, corrobora a verdade sobre um fato contrário ao seu interesse e favorável ao adversário. (GONÇALVES, 2011, p. 537)
Os documentos são públicos ou particulares, detém apenas força probatória, representando um fato. Os documentos públicos são aqueles efetivados por autoridade pública no exercício de suas funções, como por exemplo guias de imposto, entre outros. Os documentos particulares são os feitos mediante atividade privada como por exemplo avisos bancários, cartas, fotografias, entre outros. (GONÇALVES, 2011, p. 537)
A testemunha é a pessoa convocada a depor sobre fato ou para atestar um ato negocial, atestando, pe -
rante outra, sua veracidade. Pessoa jurídica ou natural representada, que é estranha a relação processual, e que declara conhecer o fato arguido em juízo, por havê-lo testemunhado ou por ouvir algo a respeito. (GONÇALVES, 2011, p. 541)
A Presunção seria a inferência tirada de um fato sabido para asseverar outro desconhecido. Consequência que a lei ou o juiz auferem, tendo como ponto de partida o fato conhecido para chegar ao fato ignorado. (VENOSA, 2007, p. 581)
São perícias do Código de Processo Civil a vistoria e o exame. Em que exame é a apreciação de algo, através de peritos, para aclaramento em juízo. E vistoria é cerceada à inspeção visual. A prova de algum fato pode exigir a participação de um profissional especializado, quando não pode ser suprida exclusivamente por testemunhas ou documentos. (LOBO, 2011, p. 373). A partir destas asserções, é possível compreender a influência que o negócio jurídico desempenha na formação da relação jurídica e os efeitos que constitui entre as partes envolvidas.
Foi levantado os principais aspectos que envolvem a prova no negócio jurídico. E visto que no direito, praticamente tudo necessita da prova instituída. Logo, a confissão, os documentos, as testemunhas, a configuração da presunção e a perícia são fundamentais no negócio jurídico, e contribuem para a segurança jurídica.
REFERÊNCIAS
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 1.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. v. 2.
LOBO, Paulo Luiz Neto. O contrato: exigências e concepções atuais. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
DISTINÇÃO ENTRE DIREITOS SUBJETIVOS A UMA
PRESTAÇÃO E DIREITOS SUBJETIVOS REAIS 1
Mauricio Bunazar
Os autores que se dedicaram ao estudo dos direitos reais buscaram demonstrar sua distinção dos direitos obrigacionais por meio de vários critérios, tais como objeto de incidência, duração, determinação dos sujeitos, dentre outros.1
Não obstante, à maioria dos critérios pode opor-se exceção que, segundo se pensa, tornam-nos inúteis porque não distinguem os direitos subjetivos a uma prestação dos direitos subjetivos reais. Critérios distintivos prestam-se justamente a extremar situações próximas ao ponto de despertarem dúvidas quanto ao regime jurídico incidente.
O único critério que, aliado a uma opção do sistema normativo, parece capaz de fornecer uma distinção segura é o da estrutura do direito subjetivo sob análise. Os direitos subjetivos a uma prestação são sempre relativos, ao passo que os direitos sub -
1 Trecho de nosso livro Obrigação Propter Rem, Atlas, 2014. Suprimimos as notas de rodapé e as referências que podem ser encontradas na obra.
jetivos reais são, em sentido lato ou em sentido estrito, absolutos (no sentido de livre de vínculo). Quando o confronto se estabelece entre o direito subjetivo real absoluto em sentido estrito e o direito subjetivo a uma prestação não há qualquer possibilidade de dúvida.
O problema surge quando se está diante de direito subjetivo real absoluto em sentido amplo e direito subjetivo a uma prestação. Pense-se na hipótese de distinção entre o direito subjetivo vitalício do usufrutuário, com usufruto oneroso sobre um imóvel, e o direito subjetivo do locatário de imóvel, cujo contrato tem as seguintes características: duração de cem anos, permissão para ceder a posse direta de forma gratuita ou onerosa e cláusula de vigência devidamente averbada no Cartório de Registro de Imóveis competente. Do ponto de vista essencial, não há qualquer distinção entre as duas situações jurídicas, ficando sua caracterização como de direito subjetivo pessoal (obrigacional), ou real, por conta de uma verdadeira opção do sistema normativo.
Esse posicionamento coloca-se entre os que veem o direito subjetivo real como uma classe de direito subjetivo que se define exclusivamente por sua estrutura e consequências e os que entendem ter a distinção entre direito real e obrigacional fundamento histórico-cultural apenas. Os entendimentos extremos não se sustentam, pois ora distorcem as categorias jurídicas para que se encaixem na teoria adotada, ora desconsideram o dado racional obtido pelo esforço dos cientistas do direito. Adepto do primeiro entendimento, J. O. ASCENSÃO define os direitos reais como “direitos absolutos, inerentes a uma coisa e funcionalmente dirigidos a afetar vantagens intrínsecas desta ao titular”. Em total coerência com sua definição, o autor, no que é seguido por muitos juristas lusitanos, entende que o arrendamento, no direito português, é direito real. J. O. ASCENSÃO, então, após subsumir a categoria do arrendamento à sua definição, transfere à doutrina contrária o ônus de demonstrar que não se trata de um direito real. Todavia, o autor não prova que o arrendamento é direito real, apenas prova que a categoria se encaixa em sua definição de direito real. É que dizer que direito real é direito absoluto inerente a uma coisa e funcionalmente dirigido a afetar vantagens intrínsecas desta ao titular não significa dizer que todo direito subjetivo apresentando estes elementos definidores seja real. Essa constatação lógica, acrescida ao fato de a posição do autor, como ele mesmo reconhece, contrariar a legislação, e o entendimento doutrinário majoritário, permitem afirmar que ele não se desincumbiu do ônus de provar a teoria que sustenta. Por outro lado, A. MENEZES CORDEIRO assevera que a distinção dos direitos subjetivos em reais e pessoais não é racional, mas, sim, exclusivamente, fruto de uma tradição jurídico-cultural. Parece que o mais exato é adotar um posicionamento oriundo da conjugação desses entendimentos. Assim, à correta, mas insuficiente, definição de J. O. ASCEN -
SÃO se faz necessário acrescentar uma decisão sistemática: a opção normativa em qualificar o direito subjetivo como de direito real. A qualificação do direito subjetivo como direito real depende da conjugação dos elementos presentes na definição de J. O. ASCENSÃO com a decisão sistemática de assim o qualificar: qualquer deles isoladamente é insuficiente para tanto. Disso decorre que, ainda que possa haver direito subjetivo de crédito com todos os elementos eleitos por J. O. ASCENSÃO como definidores do direito subjetivo real, não é logicamente viável que o sistema qualifique como real um direito subjetivo despido daqueles elementos. Destarte, uma definição suficiente seria: direitos reais são os “direitos absolutos qualificados normativamente como direitos subjetivos reais, inerentes a uma coisa e funcionalmente dirigidos a afetar vantagens intrínsecas desta ao titular” .
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS 02
Denny Militello
A alternatividade no cumprimento de um dever ou uma obrigação está presente no ordenamento jurídico brasileiro em diversas disposições legais, envolvendo aquelas previstas de modo especial a determinados casos1 e as decorrentes do regime geral de obrigações, por força de lei ou em manifestações de vontade. É o caso das obrigações alternativas, prevista no livro especial de obrigações do Código Civil, que trataremos nesse trabalho2. Em prefácio a obra dedicada ao tema, G. E. Nanni lembra que as instituições jurídicas tradicionais, dentre as quais as obrigações alternativas, embora por vezes esquecidas,
1 A título de exemplo, os art. 441 et seq do CC e 18, §1º, do CDC que permitem ao comprador ou consumidor, respectivamente, quando houver vícios na coisa, optar por substitui-la por outra, a restituição da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço, conforme condições estipuladas por lei. O art. 210 da Lei nº 9.279/1996 que estabelece uma alternatividade nos critérios de apuração de lucros cessantes no dever de indenizar pela violação de direitos de propriedade industrial.
2 Dentro do escopo limitado desse trabalho, restringimo-nos a uma exposição bastante sucinta a respeito das obrigações alternativas, com a ressalva de que o tema merece um maior aprofundamento, dada sua relevância.
“... apresentam indiscutível interesse jurídico” 3. Vejamos abaixo, então, algumas considerações sobre i. / sua definição e função; e o ii. / regime de impossibilidade estabelecido por lei.
i./ Definição do conceito e função no sistema jurídico.
O texto legislativo não traz definição sobre o que é uma obrigação alternativa4, cabendo à doutrina a sua definição. Trata-se de um tipo de obrigação complexa5. Nesse tipo de obrigação, oportunamente, haverá um processo de escolha da prestação a ser adimplida, dentre opções pré-determinadas, para satisfação de apenas uma pelo devedor. Essa escolha deverá ser feita pelo devedor, normalmen -
3 LACAZ, Marina Vessoni Labate. Obrigações Alternativas: Características e Noções Fundamentais. 1aedição. São Paulo: Almedina, 2016, p. 8.
4 Limita-se a regular sua execução (CC. art. 252) e o caso de impossibilidade superveniente (CC. art. 253 a 256).
5 A obrigação será complexa se tiver mais de um objeto, dividindo-se entre conjuntiva e alternativa. SCHREIBER, Anderson et al Código Civil Comentado - Doutrina e Jurisprudência. 4aedição. Rio de Janeiro: Forense, 2022, p. 186.
te 6, como determina a lei. Ou, se assim ajustado, pelo credor ou por um terceiro nomeado pelas partes. Na falta de escolha ou pluralidade de credores ou devedores sem consenso a respeito, a escolha será feita por um juiz (CC. art. 252. §3º)7. Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação, parte em outra (CC. art. 252. §1º). Via de regra, a doutrina é contra qualificar como alternativa a obrigação cujo modo de cumprimento seja variado 8. Há demais divergências na doutrina jurídica sobre a obrigação alternativa, que não trataremos nesse trabalho9.
Uma das funções da obrigação alternativa é permitir que negócios jurídicos sejam concluídos para compor interesses futuros, que são ainda incertos10. Tem por função, ainda, aumentar “...as garantias do credor” 11, por possibilitar haver mais de uma prestação para adimplemento da obrigação.
O Superior Tribunal de Justiça entendeu haver casos de obrigação alternativa em: 1/ contrato de compra e venda de veículos, quando o comprador pode assumir, via cessão contratual, a dívida de financiamentos dos bens ou quitá-la, em nome da vendedora, junto a instituições financeiras12; e 2/ em venda de imóvel (terreno), quando o comprador pode optar
6 E, “anormalmente”, pelo credor, vide BEVILAQUA, Clovis. Direito das obrigações. Rio de Janeiro: Livraria Magalhães, 1896, p. 100..
7 No mesmo sentido, vide GOMES, Orlando. Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 92.
8 Ibid. e SCHREIBER, Anderson et al. Código Civil Comentado - Doutrina e Jurisprudência. op. cit., p. 186.
9 Dentre elas, como esclarece O. Gomes: i/ se seria uma obrigação única, com pluralidade de objetos ou um complexo de obrigações, que se concentram numa só, no ato do cumprimento; ii/ a respeito do momento da determinação do ato de escolha da obrigação, se com manifestação de vontade receptícia ou se com o cumprimento da prestação, bem como a respeito da produção de seus efeitos, se ex tunc ou ex nunc. (GOMES, Orlando. Obrigações. op. cit., p. 92–94)
10 VARELA, Antunes. Das obrigações em geral, v. 1. Coimbra: Almedina, 2000, p. 830.
11 VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil Interpretado. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 274.
12 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (3a Turma). REsp no 1.528.13-PR. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. j. 12/6/2018.
por pagar o preço em pecúnia ou em unidades de empreendimento a ser construído13 ii./ Impossibilidade. Os artigos 253 et seq do Código Civil, por sua vez, regulam o caso de impossibilidade superveniente de cumprimento da obrigação alternativa. Se uma prestação assumida se tornar impossível, subsistirá a outra (CC. art. 253). E, caso a impossibilidade de uma das prestações ocorra por culpa do devedor, se cabia a escolha da prestação ao credor, caberá o adimplemento da subsistente ou indenização pelo equivalente daquela que se tornou impossível, sem prejuízo de perdas e danos (CC. art. 255). Se ambas as prestações se tornaram impossíveis, extinguir-se-á a obrigação (CC. art. 256). Nesse caso, se houver culpa do devedor, deverá pagar o valor da que por último se tornou impossível, mais perdas e danos (CC. art. 254). Na jurisprudência, o STJ afastou a execução de prestação subsistente, quando a impossibilidade da prestação alternativa ocorreu depois de feita a opção pelo credor, mesmo tendo havido culpa do credor nesse resultado, ressalvado o direito à indenização14. Trata-se do denominado momento de escolha ou concentração, no qual, a partir dele, a obrigação alternativa deixa de ser complexa para se tornar simples, sendo assim regulado o seu inadimplemento15.
REFERÊNCIAS
BEVILAQUA, Clovis. Direito das obrigações. Rio de Janeiro: Livraria Magalhães, 1896.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (3a Turma). Recurso Especial no 1.528.13-PR. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. j. 12/6/2018.
13 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (4a Turma). REsp no 1.074.323-SP. Rel. Min. João Otávio de Noronha. j. 22/6/2010. 14 Ibid.
15 DO COUTO E SILVA, Clóvis V. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006, p. 161..
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (4ª Turma). Recurso Especial no 1.074.323-SP. Rel. Min. João Otávio de Noronha. j. 22/6/2010
DO COUTO E SILVA, Clóvis V. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006. GOMES, Orlando. Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
LACAZ, Marina Vessoni Labate. Obrigações Alternativas: Características e Noções Fundamentais. 1a edição. São Paulo: Almedina, 2016.
SCHREIBER, Anderson; TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando et al. Código Civil ComentadoDoutrina e Jurisprudência. 4aedição. Rio de Janeiro: Forense, 2022.
VARELA, Antunes. Das obrigações em geral, v. 1. Coimbra: Almedina, 2000.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil Interpretado. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2019.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS: SOLIDARIEDADE ATIVA E SOLIDARIEDADE PASSIVA, DISTINÇÃO DE OBRIGAÇÕES INDIVISÍVEIS
Daniel de Leão Keleti
Nas obrigações com diversidade de credores ou de devedores, em regra, utiliza-se o princípio da divisibilidade, ou seja, a obrigação será dividida, de forma igualitária, entre as partes envolvidas, salvo disposição contrária. O credor não poderá exigir além de sua quota como também o devedor apenas estará obrigado a cumprir a prestação até os limites de sua parte.
Por outro lado, haverá solidariedade, conforme art. 264 do Código Civil, “quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda”.
A solidariedade excepciona a regra da divisibilidade de obrigações com diversidade de sujeitos. Orosimbo Nonato1, menciona que o verbete solidário tem origem no latim solidum e representa a ideia de “totalidade, coisa íntegra, impartilhada”.
1 NONATO, Orosimbo, Curso de Obrigações, Vol. II, Editora Forense, 1ª. Edição, 1959, fls.90)
Nas obrigações solidárias com pluralidade de credores, o devedor poderá se libertar da prestação com o cumprimento integral em favor de quaisquer dos credores; já nas obrigações solidárias com pluralidade de devedores, o credor poderá exigir a integralidade das obrigações de qualquer um dos devedores.
Como visto, a regra geral para as obrigações com diversidade de credores ou de devedores é o princípio da divisibilidade. Para que a solidariedade seja aplicada deve haver a vontade das partes ou a determinação legal – a solidariedade decorre da lei ou da vontade das partes.
Também é possível que na solidariedade haja para um sujeito (credor ou devedor) obrigação pura e simples e para outro, obrigação condicional, ou a prazo, ou pagável em lugar diferente.
Nas obrigações solidárias com pluralidade de credores, haverá a solidariedade ativa e com pluralidade de devedores, a solidariedade passiva.
Na solidariedade ativa qualquer um dos credores pode exigir do devedor a integralidade do cumprimento da obrigação. J.M. de Carvalho Santos2 menciona que “costuma-se dizer que, na obrigação solidária ativa, cada credor solidário deve ser considerado, em suas relações com o devedor, como um só e único credor”.
Caso o devedor cumpra a prestação a um dos credores solidários a dívida será considerada extinta, até o limite do referido pagamento. Esta escolha do devedor não terá lugar no caso de um dos credores demandar contra o devedor comum. Questiona-se se demandar significa ajuizar demanda judicial ou cobrança extrajudicial. Orlando Gomes enfrentou tal questão e define que para que a escolha do devedor seja mitigada, necessária a propositura de ação judicial, sendo que “as medidas preventivas ou preparatórias da ação não têm esse efeito preventivo” 3
Na solidariedade ativa, o devedor comum com eventual exceção pessoal em relação a um credor não a estende aos demais. Recebida a dívida ou realizada eventual remissão por um dos credores solidários, este credor responderá perante os demais com a parte que lhes caiba.
Na solidariedade passiva, ou seja, com pluralidade de devedores, “o credor tem o direito de exigir toda a prestação de qualquer dos devedores, podendo fazê-lo extrajudicialmente, ou judicialmente se for o caso disso”4
Quando demandado, o devedor solidário apenas poderá levantar exceções que forem comuns a todos e as que lhe foram pessoais, no entanto, não po -
derá opor exceções pessoais a outro devedor solidário.
O credor pode escolher contra quem irá cobrar o cumprimento da obrigação, tanto assim, que se o credor exonerar um dos devedores, a solidariedade será mantida para os demais.
O devedor solidário que pagar a dívida em sua integralidade terá o direito de exigir dos demais devedores a sua quota, presumindo a igualdade entre eles e, para que não haja também enriquecimento sem causa, caso a dívida solidária seja de interesse exclusivo de um dos devedores, este responderá integralmente perante o devedor que a pagar.
Ainda há que se distinguir a solidariedade da obrigação indivisível. Nas duas espécies o credor por exigir de um dos devedores o cumprimento integral da prestação.
A indivisibilidade decorre da natureza da prestação e a solidariedade da lei ou da vontade das partes
Na solidariedade, caso a obrigação seja resolvida em perdas e danos, é mantida a solidariedade (ressalvado o art. 279, CC), já nas obrigações indivisíveis, caso a prestação seja revertida em perdas e danos, perde a qualidade de indivisível, passando a ser dividida em partes iguais entre os devedores.
REFERÊNCIAS
GOMES, Orlando, Obrigações, Editora Forense, 15ª. Edição, 2000;
GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, Vol. II, Saraiva, 2020;
LOTUFO, Renan, Código Civil Comentado, Vol. 2, Saraiva, 2003.
2 SANTOS, João Manuel de Carvalho, Código Civil Interpretado, Vol. XI, Livraria Freitas Bastos, 12ª. Edição, 1984, fls. 190. 3 GOMES, Orlando, Obrigações, Editora Forense, 15ª. Edição, 2000, fls. 65.
4 VARELA, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, Almedina, Vol. I, 10ª. Edição, 2003, fls. 767.
NONATO, Orosimbo, Curso de Obrigações, Vol. II, Editora Forense, 1ª. Edição, 1959;
SANTOS, João Manuel de Carvalho, Código Civil Interpretado, Vol. XI, Livraria Freitas Bastos, 12ª. Edição, 1984;
VARELA, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, Almedina, Vol. I, 10ª. Edição, 2003.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
AS OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS NO DIREITO CIVIL
BRASILEIRO
Lázaro Lima Souza
Introdução
O Código Civil brasileiro prevê a obrigação solidária, isto é, quando existe mais de um credor ou devedor na mesma obrigação, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda. Para compreender melhor a referida obrigação, é necessário analisar os assuntos relacionados a esta. Sendo assim, o presente artigo visa analisar, de forma breve, a obrigação citada.
Solidariedade ativa e passiva
Não é correto resumir a solidariedade ativa e passiva a pluralidade de credores ou devedores porque, no caso da ativa, cada um dos sujeitos deve estar legitimado a receber, individualmente, o valor integral da obrigação, enquanto que na passiva, cada sujeito deve prestar também individualmente o valor integral da obrigação, visto que, cada um obrigou-se pela dívida toda (art. 264 do Código Civil de 2002 –CC/2002).
Ademais, a solidariedade não se presume porque resulta da lei1 ou da vontade das partes2
Transmissão das obrigações
A respeito da transmissão das obrigações, o Código Civil demonstra dois modos: cessão de crédito e a assunção de dívida.
Na cessão de crédito, o credor transfere seus créditos a terceiro. Os pensadores jusnaturalistas reconhecem que o crédito é passível de circulação do mesmo modo que as outras riquezas que ao seu lado figuram3
Na cessão, o crédito é transferido da mesma maneira como foi contraído, ocorrendo uma alteração ape -
1 Um exemplo que resulta da lei é o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor concernente aos fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis.
2 É relevante a leitura do artigo 265 do CC/2002.
3 XAVIER LEONARDO, Rodrigo. A cessão de créditos: reflexões sobre a causalidade na transmissão de bens no direito brasileiro. Disponível em: https://egov.ufsc.br/portal/ sites/default/files/anexos/32645-40017-1-PB.pdf Acesso em 19/03/2024.
nas no sujeito ativo da relação 4, e independe da anuência do devedor.
A cessão será ineficaz em relação a terceiros se não for feita mediante instrumento público ou particular revestido das solenidades do § 1º do art. 654 do CC/2002. A respeito do devedor (cedido), a cessão apenas será eficaz se este for notificado 5
Sobre a assunção de dívida, trata-se de obrigação do devedor assumida por terceiro, com o consentimento expresso do credor, exonerando o devedor, salvo se o terceiro, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor não tinha ciência desse fato 6
Sobre as garantias especiais dadas pelo devedor primitivo, consideram-se extintas a partir da assunção da dívida, exceto se ocorrer assentimento expresso do devedor citado.
Caso a substituição do devedor seja anulada, restaurar-se-á o débito, com todas as garantias, exceto as que foram prestadas por terceiros, salvo se este conhecia o vício que inquinava7 a obrigação.
O novo devedor não poderá opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao devedor primitivo.
Se o assuntor assumiu uma dívida anulável por incapacidade do primitivo, não poderá alegar a invalidade em face do credor. Caso a exceção seja geral, poderá alegá-la8.
A respeito do adquirente de imóvel hipotecado, este poderá tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido, caso o credor (que fora notificado) não im -
4 Ou seja, mantem-se os juros, as multas e as garantias da dívida, exceto se existir disposição em contrário.
5 Dar-se-á por notificado o devedor que, em escrito público ou particular, declarou-se ciente da cessão feita.
6 É interessante notar que o legislador visou proteger o credor na assunção, visto que, uma insolvência do terceiro desconhecida pelo credor prejudicaria este. É importante a leitura do art. 299 do CC/2002.
7 Significa contaminar, infectar ou corromper.
8 Será assim quando a dívida estiver prescrita ou extinta por pagamento direito ou compensação, por exemplo.
pugnar em trinta dias a transferência do débito (entender-se-á dado o assentimento deste)9
Considerações finais
Com franqueza, as obrigações solidárias foram abordadas de forma concisa, visando uma compreensão clara e rápida sobre o assunto. Espera-se que o artigo seja útil aos leitores, principalmente aos operadores do Direito no ofício destes.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.
SCHREIBER, Anderson. Código Civil Comentado
Doutrina e Jurisprudência. 3.ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2021.
9 Recomenda-se a leitura dos Enunciados n. 353 da IV Jornada de Direito Civil e n. 424 do V Jornada de Direito Civil para melhor compreensão do assunto na prática advocatícia.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES: CESSÃO DE CRÉDITO E ASSUNÇÃO DE DÍVIDA; DEFINIÇÕES
Camila Felberg
I.1. Cessão de crédito - conceito do instituto e suas previsões normativas.
O ordenamento jurídico brasileiro institui e disciplina a cessão de crédito como um negócio jurídico bilateral ou sinalagmático, gratuito ou oneroso, onde uma das partes detentora de crédito (cedente) transfere a terceiro (cessionário) seu direito na relação obrigacional (o devedor é denominado cedido). É uma forma de transmissão de obrigação e independe de anuência do devedor (cedido) apesar de necessária sua ciência expressa para que possa destinar a quem de direito, o adimplemento. Encontra-se estabelecido pelo art. 286 do Código Civil que prevê:
Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
Em outras palavras, há créditos que não podem ser cedidos, como aqueles decorrentes de relações estritamente pessoais (dívidas alimentares ou direitos de personalidade) por ocasião de vedação legal ou, ainda, se no instrumento obrigacional consta cláusula de vedação cessionária (obrigação incessível), não podendo ser oposta ao terceiro de boa-fé, entretanto, a depender da análise concreta do caso.
Pode se instrumentalizar até verbalmente, entretanto para ter eficácia contra terceiros, deve necessariamente se dar de forma escrita, atendendo as regras impostas pelo art. 107 e 288 do Código Civil de 2002 e ser registrado em documento com eficácia e validade pública.
Quanto à origem, podem se classificar as cessões de crédito em: legal (decorrente de lei), judicial (decorrente de decisão judicial) e convencional (a mais comum; decorre de acordo firmado entre as partes, como no contrato de factoring, por exemplo1). Quan1 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das obrigações e responsabilidade civil – 17. Ed. – Rio de Janeiro, Forense, 2022 (Direito Civil; 2) pág.322.
to às obrigações que gera; a cessão de crédito pode ser a título oneroso (existência de uma remuneração e não apenas ocorrência de sub-rogação) e gratuita (ausência de caráter oneroso). Quanto à sua extensão, podem se classificar em cessão total (cedente transfere todo o crédito objeto da relação obrigacional) e cessão parcial (parte do crédito fica retido com o cedente) e; por fim, quanto à responsabilidade do cedente, se classificam em cessão pro soluto (que confere quitação plena e imediata do débito do cedente para com o cessionário, exonerando o cedente e não há responsabilidade do cedente pela solvência do cedido. É a forma da regra geral) e cessão pro solvendo (transferência do crédito extingue obrigação apenas quando crédito for efetivamente cobrado, devendo estar prevista pelas partes forma de responsabilização do cedente perante cessionário, pela solvência do cedido).
I.2. Assunção de dívida - conceito do instituto e suas previsões normativas.
A assunção de dívida é uma das modalidades de transferência de obrigação, exercendo função social semelhante à da cessão de crédito.
É o negócio jurídico bilateral pelo qual um terceiro, estranho à relação obrigacional, assume a posição de devedor, responsabilizando-se pela dívida, sem extinção da obrigação, que subsiste com os seus acessórios. Esse novo devedor, que assume a dívida, também é denominado terceiro assuntor2
Pode se operacionalizar de duas formas distintas:
Expromissão: caracterizada pelo contrato entre credor e um terceiro, que assume a posição de novo devedor, sem necessidade de comparecimento do antigo devedor. Essa forma de assunção pode ser: liberatória, quando o devedor primitivo se exonera da 2 VALENTE, Rubem. Direito civil facilitado / Rubem Valente. – 2. ed., rev., atual. e reform. – Rio de Janeiro: Método, 2022. Pág. 261.
obrigação; e cumulativa, quando o expromitente entra na relação como novo devedor, ao lado do devedor primitivo 3
Delegação: caracterizada pelo acordo entre o devedor originário (delegante) e o terceiro que vai assumir a dívida (delegatário), cuja validade depende da aquiescência do credor (delegado). Pode ser privativa, com exoneração do delegante, ocasião em que o terceiro assume integralmente a posição debitória; ou simples, quando o terceiro ingressa no vínculo obrigacional sem a demissão do delegante. Neste último caso, permanece vinculado o devedor originário, alterando-se apenas sua responsabilidade, que passa a ser subsidiária. Para o delegante, portanto, surge uma espécie de benefício de ordem, tal como ocorre com o cedente do crédito que assume responsabilidade pela solvência do devedor.
Em resumo, são possíveis duas situações na assunção cumulativa: dois novos devedores se responsabilizam pela dívida; ou o antigo devedor continua responsável, em conjunto com o novo devedor.
Entretanto, ficará sem efeito a exoneração do devedor primitivo se, ao tempo da assunção, o novo devedor era insolvente e o credor o ignorava.
Segundo o Código, com a assunção, consideram-se extintas as garantias especiais originariamente dadas pelo devedor primitivo ao credor, sendo consideradas como tais aquelas que não são da essência da dívida e que foram prestadas em atenção à pessoa do devedor, como por exemplo, a fiança, o aval, a hipoteca de terceiro. Neste caso, só subsistirão com a concordância expressa do devedor primitivo e, em alguns casos, também do terceiro que houver prestado a garantia. Já quanto às garantias reais prestadas pelo próprio devedor originário, entende parte
3 VALENTE, Rubem. Direito civil facilitado / Rubem Valente. – 2. ed., rev., atual. e reform. – Rio de Janeiro: Método, 2022. Pág. 262.
minoritária da doutrina (por todos, Maria Helena Diniz, 2019, por exemplo) que não são atingidas pela assunção, a não ser que o credor abra mão expressamente. Há certa controvérsia acerca das garantias legais, mas, considerando que costumam ser impostas em razão de uma tutela específica do credor, sua permanência pós a assunção parece em harmonia com sua função 3
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES: CONCEITO DE PAGAMENTO, PROVA, LUGAR E TEMPO DO PAGAMENTO
Davi Marques de Araújo
Obrigar-se é vincular-se juridicamente; adimplir é liberar-se. Em um sentido amplo, adimplemento é qualquer modo de liberação do devedor 1. Diferente é o conceito de pagamento, muito mais restrito, pois é o cumprimento das obrigações pecuniárias, de uma prestação específica (de dar dinheiro).
O Código Civil trata do tema no Título III do Livro I da Parte Especial, nos artigos 304 em diante. Note-se que o legislador empregou a expressão “pagamento” em um sentido mais amplo em diversos dispositivos do Capítulo I, no sentido de adimplemento. O devedor que paga tem direito a quitação regular. Trata-se de uma declaração enunciativa, escrita, emitida pelo credor, de ter recebido a prestação; é apenas uma prova do pagamento; o que extingue o vínculo é o adimplemento, e não a quitação.
1 Em um sentido restrito, adimplemento é a atribuição, a prestação, feita diretamente pelo devedor ao credor daquilo que é devido, o objeto da prestação (aquilo que se deve dar, fazer ou não fazer); é o mesmo sentido de cumprimento da obrigação.
Recibo não é sinônimo de quitação; é um instrumento de quitação, um suporte material que contém a quitação. É uma prova plena, pois não admite outra prova em sentido contrário, mas pode ser desconstituída (anulada ou nula), se não forem seguidos os requisitos gerais de validade (por exemplo, emitida por absolutamente incapaz, ou sob coação).
O lugar do pagamento (= adimplemento) é aquele convencionado entre as partes; se não houver, seguem-se as circunstâncias do negócio, aquilo que ordinariamente se faz. Lugar subsidiário estabelecido pela lei é o domicílio do devedor, salvo em relação a tradição de imóvel, hipótese em que far-se-á no lugar onde situado o bem, ou se houver motivo grave para fazer em outro (conceito jurídico aberto a ser avaliado pelo juiz conforme o caso concreto).
Nesse tema, importante efeito da boa-fé objetiva é a supressio (supressão do direito), quando reiteradamente o pagamento é feito em outro local, e acaba fazendo presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato.
Salvo disposição legal em contrário, não tendo sido ajustada época para o pagamento (termo), pode o credor exigi-lo imediatamente, apenas respeitado tempo razoável conforme a natureza da obrigação (artigo 134 do Código Civil).
Em alguns casos, o credor poderá cobrar a dívida antes do termo. São situações previstas pelo legislador como arriscadas ao crédito futuro, como no caso de falência, concurso de credores, penhora de bens garantidos, ou insuficiência de garantias (artigo 333 do Código Civil).
DIREITO DAS
OBRIGAÇÕES
07
ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES: DEFINIÇÕES DE PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO, PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO, DAÇÃO EM PAGAMENTO, IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO, COMPENSAÇÃO, CONFUSÃO, REMISSÃO DE DÍVIDAS
Davi Marques de Araújo
O devedor pode liberar-se sem prestar aquilo que é devido, ou do modo devido; há outros meios de adimplemento (em sentido amplo), nos artigos 334 a 388 do Código Civil. Um dos meios é o pagamento em consignação, por depósito judicial ou em estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma legais. É um meio exoneratório que se dispõe o devedor, quando não consegue fazer o adimplemento regular, quando o credor não quer receber a prestação, quando há dúvida sobre quem é o credor, ou quando não há como receber, pois, mesmo nesses casos, se o devedor não pagar, há inadimplemento.
A sub-rogação não é propriamente um meio de adimplemento alternativo; trata-se de um efeito do pagamento feito por terceiro (alheio à relação jurídica). Sub-rogar-se é “entrar no lugar de”, quando há mudança subjetiva na relação jurídica, e o novo credor passa a poder cobrar como se fosse o credor originário, com todos os direitos, ações, privilégios e
garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores.
Igualmente, não é meio de adimplemento alternativo a imputação do pagamento. É apenas o direito (no sentido de faculdade) de o devedor escolher qual é o débito pago, quando obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, se líquidos e vencidos.
O credor não é obrigado a receber coisa diversa, mas pode receber coisa diversa se quiser (há concordância entre credor e devedor); é dação em pagamento, quando recebe prestação diversa. Apesar de muito frequente, não é um instituto que gera conflitos, pois depende de concordância entre todos.
Outro meio de extinção é a novação, quando há ânimo de novar expresso ou tácito, e o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior; quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor; ou quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao
antigo, ficando o devedor quite com este. O mais relevante é haver ânimo, intenção exprimível da obrigação nova.
A compensação é um modo alternativo de adimplemento, que independe de previsão contratual. Em rigor, é apenas um efeito lógico: se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem, desde que entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.
De igual modo se opera a confusão: extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor (por exemplo, quando há sucessão causa mortis, e o de cujus era credor do herdeiro).
Por fim, o credor pode desonerar voluntariamente o devedor, por meio da remissão de dívida.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
Kamila Celegatti Ortiz
1. DO INADIMPLEMENTO ABSOLUTO E RELATIVO
O inadimplemento de uma obrigação é considerado uma exceção, enquanto o cumprimento da obrigação é a regra esperada. Pois, quando duas partes celebram um contrato ou assim uma obrigação legal, presume-se que ambas irão cumprir com as suas respectivas partes do acordo. Contudo, em algumas situações, uma das partes pode falhar em cumprir sua obrigação, constituindo o inadimplemento.
A doutrina majoritária conceitua o inadimplemento em duas espécies: o inadimplemento absoluto e o inadimplemento relativo.
O inadimplemento absoluto é definido pela ausência de cumprimento da obrigação devida, podendo ter ocorrido o perecimento do objeto ou ato proveniente de culpa do devedor. Em outras palavras, trata-se de
uma situação em que não existe mais a possibilidade de o credor receber aquilo que lhe é devido. Por outro lado, o inadimplemento será considerado relativo sempre que a obrigação for cumprida parcialmente. Neste caso, a prestação ainda poderá ser realizada, uma vez que não foi cumprida no tempo, lugar e forma pactuados. 1
Desta maneira, caso ocorra o inadimplemento da obrigação, o devedor fica sujeito a indenizar o credor pelos prejuízos causados, além da pagar juros e atualização monetária de acordo com os índices estabelecidos, bem como os honorários advocatícios. 2
1.1. DA MORA
A mora diz a respeito ao atraso no cumprimento das obrigações ou quando a obrigação não é cumprida
1 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de Direito Civil: Volume único- 2.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 385..
2 ALVIM, Agostinho Neves de Arruda. Da Inexecução das obrigações. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1972, p.07.
no lugar e forma estipulados na convenção contratual.
Segundo Agostinho Alvim, de acordo com a doutrina corrente, a mora pode ser distinguida do inadimplemento absoluto da seguinte maneira: “Há inadimplemento absoluto quando o devedor não mais pode cumprir a obrigação; há mora quando a possibilidade ainda persiste.” 3
Dessa forma, tanto o devedor quanto o credor podem incorrer em mora, desde que não tenha ocorrido um fato inimputável (caso fortuito, força maior ou fato que impeça o cumprimento da obrigação). Em geral, o devedor deve efetuar o pagamento no momento, local e forma acordados anteriormente, enquanto o credor deve receber a prestação devida no local e na forma definidos entre as partes. Se ocorrer o descumprimento por parte do credor ou do devedor, aquele que não cumpriu incorrerá em mora.4
Embora menos comum, a situação em que o credor incorre em mora quando ele se recusa a receber o pagamento no tempo, lugar e forma estabelecida. Portanto, quando o credor incorre em mora traz consigo a liberação do devedor, com isenção de culpa e responsabilidade pela conservação da coisa.
Ou seja, o credor não será reembolsado se o dano for causado por imperícia, negligência ou imprudência do devedor.
Sendo assim, as consequências para o devedor que não efetua o pagamento e para o credor que se recusa a recebê-lo na forma convencionada correspondem ao prejuízo causado pela mora, devendo-se incluir juros e correção monetária nos valores, bem como a obrigação de reparar os possíveis prejuízos decorrentes do inadimplemento.
3 ALVIM, Agostinho Neves de Arruda. Da Inexecução das obrigações. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1972, p.40.
4 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Volume 2. 38 e.d. São Paulo: Saraiva jur, 2023, 435.
REFERÊNCIAS
ALVIM, Agostinho Neves de Arruda. Da Inexecução das obrigações. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1972.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em 02 de agosto de 2023.
BRASIL. Lei nº10.406, de 10 de janeiro de 2002. Instituiu o Código Civil. Diário Oficial da União: Seção 1, DF, ano 139, n.8, p.1-74, 11jan 2002.PL634/1975. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/2002/l10406compilada.htm . Acesso em 15 de julho de 2023.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. I nstituiu o Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20152018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em 16 de julho de 2023.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Volume 2 – 38.e.d. São Paulo: Saraiva jur., 2023.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de Direito Civil: Volume único- 2.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
NA ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL 09
PAGAMENTO INDEVIDO E ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Geovanne Lucas Silva Ribeiro
A construção de uma sociedade livre, justa e solidária é um dos objetivos fundamentais da Constituição Federal (art. 3º, I). O Código Civil vigente, fiel ao programa constitucional, prevê que as relações jurídicas obrigacionais devem ser pautadas pela boa-fé (art. 113 e 422) e pelo mútuo respeito entre os sujeitos do negócio jurídico, em prol do equilíbrio conclamado pela justiça social (art. 421).
Sem correspondência no código anterior, o diploma civil contempla expressamente, no Título VII (Dos Atos Unilaterais), o princípio geral que veda o enriquecimento sem causa, conforme norma preconizada no art. 884, verbis: “aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários”. Já o parágrafo único do dispositivo positiva a regra subsidiária da fungibilidade da reparação, ao prever que “se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a
restituição se fará pelo valor do bem na época em que exigido”.
Referido dispositivo serve à tutela preventiva e repressiva do enriquecimento sem causa enquanto anomalia censurável da experiência social. Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que o aludido dispositivo “ deve ser lido não só como justa providência legal de restituição do indevidamente auferido, mas também, e com maior razão, como barreira preventiva para evitar a consumação da anomalia censurável ” 1
Observa-se que, de um modo geral, para efeito de reparação por enriquecimento sem causa, o legislador optou pela técnica legislativa das cláusulas gerais. Disto resulta a possibilidade de fundamentar a obrigação de restituição no referido artigo 884 ou em uma previsão legal específica, sem prejudicar o sentido funcional da restituição.
Dentre tais previsões específicas, o pagamento indevido, entendido como aquele sem lastro causali -
1 REsp 1.695.016/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/9/2020.
dade jurídica adequada, foi situado dentro do instituto do enriquecimento sem causa, com igual aptidão de gerar a obrigação de restituir. Dispõe o art. 876 do Código Civil que “todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição”.
O pagamento indevido constitui um caso típico de obrigação de restituir fundada no princípio do enriquecimento sem causa, segundo o qual ninguém pode enriquecer-se à custa alheia, sem causa que o justifique, afigurando-se “atribuição injusta, injustificada, indevida, indébita, ilegítima, obtida à custa alheia”. 2
Dessa forma, é indevido o pagamento que deixa de cumprir sua função natural de satisfação de obrigação e que, por falecer de causalidade, gera para o pagador a pretensão de ressarcimento, criando uma obrigação.
Em regra, a pretensão ressarcitória pode ser exercida por meio de ação específica de repetição, sem prejuízo do cabimento de ação reparatória genérica, de acordo com as especificidades da relação jurídica. Caio Mário da Silva Pereira anota que “[...] o pagamento indevido é tido, na moderna dogmática, como modalidade peculiar de enriquecimento sem causa, admitindo-se, todavia, que a ação de repetição seja específica, e só na sua falta caiba a de in rem verso genérica” 3
Quanto ao prazo para exercício, dispõe o art. 206 §3º, IV do Código Civil que prescreve em 3 (três) anos a pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa. Extirpando possíveis controvérsias, o Superior Tribunal de Justiça ao apreciar controvérsia referente ao prazo prescricional da pretensão restitutória deflagrada pela pronúncia de in -
2 NANNI, Giovanni Ettore. Enriquecimento sem causa. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 106.
3 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civilvol. 2, 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 172.
validade de cláusulas contratuais, reconheceu que pretensões dessa natureza devem se sujeitar ao prazo prescricional trienal.4
4 STJ, REsp 1.361.182/RS, 2ª S., Rel. p/ Acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, julg. 10.08.2016, publ. 19.09.2016
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
DE NEGÓCIOS 10
ATOS UNILATERAIS: PROMESSA DE RECOMPENSA E GESTÃO
Celso A. Coccaro Filho
1. Promessa de Recompensa
Consiste no ato unilateral praticado por alguém, que se obriga a recompensar pessoa indeterminada que tenha cumprido a condição objeto da promessa.
É um ato unilateral, porque independe da anuência do receptor para formar um contrato, como ocorre com a oferta (que se completa com o negócio jurídico bilateral, decorrente da aceitação).
Na Promessa de Recompensa, a obrigação já se forma no momento da publicação da declaração de vontade.
A obrigação do declarante resulta da concomitância de três elementos: a publicação da declaração, que deve ser dirigida a pessoas indeterminadas; a indicação da natureza recompensa; a indicação da condição a ser preenchida ou cumprida.
Também devem estar presentes os pressupostos de validade. Evidentemente, a promessa de recom -
pensa pela prática de um ato ilícito é inválida e incapaz de produzir efeitos.
A recompensa poderá ser exigida por aquele que cumpriu a condição estipulada, ainda que não o tenha efeito com o desígnio de recebê-la.
Se mais de uma pessoa tiver cumprido a condição, caso a multiplicidade seja possível, terá direito a reclamá-la aquele que primeiro a executou.. Se a execução for simultânea, a recompensa será dividida em partes iguais, não variáveis em função da participação de cada qual. Caso indivisível, deverá se proceder a sorteio, e neste caso o contemplado deverá ressarcir os demais dos valores dos seus quinhões.
A promessa vigora por prazo indeterminado, perdendo eficácia, porém, se tornado impossível o seu objeto. O promitente poderá revogar a promessa, mas deverá fazê-lo com a mesma publicidade adotada para a sua divulgação. Se tiver fixado prazo de validade, entende se que renunciou à faculdade de
revogação, mantendo-se a obrigação até o término do prazo estipulado.
A promessa pode envolver concursos públicos, em que serão contemplados, a título de exemplo, trabalhos, obras, ensaios. Neste caso, além dos demais pressupostos, é obrigatória a fixação de um prazo, ou seja, não é admitida a indeterminação temporal. É facultada a indicação de árbitros para julgamento, na falta do qual o promitente assumirá esta função. As obras não passarão para o domínio do promitente, a não ser que assim tiver sido estipulado.
2. Gestão de Negócios
É o ato unilateral – e, portanto, sem a autorização do interessado – de intervenção e direção (ou gestão) de negócio alheio, segundo o interesse presumido do seu dono, ficando o gestor responsável perante este e terceiros com quem tratar.
A Gestão de Negócios é definida por parte da doutrina como um quase-contrato; mas é concebida no regime do nosso Código Civil como ato unilateral, protagonizado pelo voluntarismo do gestor, sem que o dono do negócio tenha praticado qualquer ato de vontade. No que lhe diz respeito, a fonte de suas obrigações (art. 869) é legal, e não convencional.
Se a atuação do gestor se realizar de forma desapegada da vontade do dono, deverá indenizar os prejuízos que causou. Ao não excluir até mesmo os casos fortuitos, o Código definiu esta responsabilidade como sendo objetiva, isto é, dispensa a avaliação de elementos intencionais ou volitivos.
O domo da obra poderá exigir a restituição ao estado anterior, caso da intervenção do gestor resultem prejuízos que superam o proveito.
O gestor tem o dever de informar previamente o dono, velando pelo negócio de forma diligente, em
caso de perigo iminente ou até que venha a resposta.
A gestão poderá ser ratificada pelo dono da obra, hipótese na qual retroagirá até a data do seu início, regulando-se pelas normas do mandato.
Havendo conexão entre os negócios do gestor e do dono, de forma que não poderão ser geridos de forma independente, o gestor será tido como sócio do último.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
TÍTULOS DE CRÉDITO: TÍTULO AO PORTADOR, À ORDEM OU NOMINATIVOS 1
1
Fernanda Barberis
A matéria relativa aos títulos de crédito é entregue ao Direito Comercial, entretanto, o Código Civil de 2002, inovando em relação ao de 1916, trouxe disposições sobre ela, nos artigos 887 a 926. Primeiro, estabelece disposições gerais, ressalvado o que vier contido na legislação especial, o que, na verdade, apenas confirma o que já dispõe o artigo 2º, §2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.1 Em seguida, apresenta três espécies de título de crédito: 1) título ao portador, 2) título à ordem e 3) título nominativo.
O artigo 887 prende-se mesmo à definição de título de crédito exarada por Cesare Vivante, ou seja, “título de crédito é o documento necessário para exercer o direito literal e autônomo nele estabelecido”. 2
1 LINDB – Art. 2º -§ 2o A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
2 VIVANTE, Cesare – Trattato di Diritto Commerciale – t. III – p. 123 – 5ª ed. Milano: Casa Editrice Dott. Francesco Valhardi, 1935. V. III
Obedecem, entretanto, os títulos de crédito a várias classificações, não sendo possível, sem risco de omissão, abarcar a todas, tendo o Código Civil adotado o critério de forma de circulação, considerado o de maior importância. 3
Assim, título ao portador é aquele que circula por simples tradição, isto é, de mão em mão, de modo que a pessoa que o apresentar tem direito ao crédito nele mencionado, mas somente tem validade tais títulos quando autorizados por lei especial, tal qual o caso dos bilhetes de loteria. Evidentemente, sempre haverá o risco de perda ou dilaceração do título ao portador, hipóteses em que o possuidor poderá obter outro do próprio emitente, ou por decisão judicial (art. 259, II, do CPC).
Títulos nominativos são os emitidos a “ favor de pessoa cujo nome consta no registro do emitente” (art. 921), operando-se a transferência mediante termo no registro do emitente ou por endosso, com sub -
3 DE LUCCA, Newton. Aspectos da Teoria Geral dos Títulos de Crédito – p. 109 – São Paulo: Pioneira, 1979
sequente averbação no registro. Não é unânime a doutrina em considerar tais títulos como título de crédito 4, tendo de se reconhecer que a circulação é segura, mas dificultosa, dada a necessidade de termo de transferência.
De maior relevo são os títulos à ordem, cuja circulação se dá por endosso, sendo apenas facultativa a indicação do endossatário (art. 910), daí as expressões endosso em preto, também chamado à ordem, quando identificado o endossatário, e em branco, circulando ao portador, que se presumirá proprietário. 5 O endosso pode ser lançado no verso ou anverso do título; pode haver diversos endossos com ordem regular e ininterrupta, mesmo que o último seja em branco e também o endossatário em branco pode lançar seu nome, mudando-o para em preto.
O endossante não responde pelo cumprimento de obrigações salvo se se comprometer pelo pagamento, com ação de regresso contra os anteriores (art. 914 do CC), regra, entretanto, contrária à Lei Uniforme de Genebra, aprovada pelo Decreto 57.663, de 24/01/1966 (art. 15) e, por isso, tem recebido crítica6, eis que “ inverteu a ordem jurídica vigente desde a Idade Média”. A solidariedade do endossante hoje é a exceção, devendo ser expressa no título.
A circulação também se pode dar pelos meios de direito comum, a saber, a cessão, a sucessão hereditária, casamento conforme o regime de bens, fusão e dissolução de sociedades etc.
Evidentemente, endosso não se confunde com aval, pois este “é a declaração cambial cuja finalidade única é a de garantir o pagamento da letra de câm -
4 BORGES, João Eunápio – Títulos de Crédito – p. 32 – 2ª edição – Rio: Forense, 1971
5 AZEREDO SANTOS, Theophilo de - Do Endosso – p. 34 –São Paulo: Revista dos Tribunais, 1962
6 FORTES BARBOSA FILHO, Marcelo – Código Civil Comentado (coordenador Ministro César Peluzo) – p. 861 - 15ª edição
– Santana do Parnaíba: Manole, 2021
bio, da nota promissória e de outros títulos (cheque, duplicata), ou seja, o endosso é meio de fazer circular o título, podendo ou não o endossante se manter como responsável – segundo o Código Civil – enquanto aval é garantia de pagamento, nada impedindo, porém, que o avalista seja também um endossador, a despeito de controvérsia doutrinária anterior à Lei Uniforme de Genebra7, que se inseriu no sistema jurídico brasileiro, com hierarquia de lei ordinária.
7 BORGES, João Eunápio - ob. cit. Pags. 82/83
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATOS: DEFINIÇÃO, CONTRATOS CONSENSUAIS E CONTRATOS REAIS, ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO E PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO
Davi Marques de Araújo
Contrato é a comunhão de declarações de vontade recíprocas para estabelecer um vínculo jurídico, com o propósito de estabelecer efeitos jurídicos (criar, modificar ou extinguir relações jurídicas). É espécie de negócio jurídico bilateral, pois depende de declarações de vontade; e é fonte de obrigações, pois estabelece vínculo jurídico.
Na classificação dos contratos, relevante é a distinção antiga entre contratos consensuais e contratos reais, oriundas das fontes romanas.
Consensuais são os contratos que existem a partir do mero consenso; isto é, bastam as declarações de vontade convergentes, como o contrato de compra e venda, a locação, a prestação de serviços e o mandato. Diferente são os contratos reais, que se perfazem (passam a existir juridicamente) com a entrega da coisa, objeto do contrato, como no comodato e no depósito; antes, não há vínculo.
Em regra, os contratos obrigam apenas as partes, não produzindo quaisquer efeitos em relação a ter-
ceiros; é o antigo brocardo res inter alios acta. Há, porém, possibilidade de se estipular (contratar) em favor de terceiro e prometer fato de terceiro.
Na estipulação em favor de terceiro, o contrato produz efeitos em favor do terceiro, como no contrato de seguro de vida. Quando anui, o terceiro passa a integrar a relação, e pode exigir o cumprimento da obrigação. Se ao terceiro, em favor de quem se fez o contrato, se deixar o direito de reclamar-lhe a execução, não poderá o estipulante exonerar o devedor. Em qualquer caso, o estipulante pode reservar-se o direito de substituir o terceiro designado no contrato, independentemente da sua anuência e da do outro contratante.
A promessa de fato de terceiro não vincula o terceiro. Por isso, aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar. Quando o terceiro anui (consente), passa a integrar a relação; assim, nenhuma obrigação haverá para quem se comprometer por outrem, se este, depois de se ter obrigado, faltar à prestação.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
13
CONTRATOS: VÍCIOS REDIBITÓRIOS E EVICAÇÃO
Gabriel Siqueira Maciel
No vasto panorama jurídico que regula as relações comerciais, o Direito Contratual emerge como uma espinha dorsal, fornecendo os alicerces necessários para a estabilidade e segurança nas transações entre as partes. É através dos contratos que se formalizam os compromissos e obrigações, estabelecendo as bases para as trocas econômicas que impulsionam as atividades comerciais em todas as esferas da sociedade.
Nesse contexto, dois temas assumem particular importância: os vícios redibitórios (artigos 441 a 446 do Código Civil) e a evicção (artigos 447 a 457 do Código Civil). Ambos são essenciais para a garantia da equidade e proteção dos interesses das partes contratantes, na medida em que, nas palavras de Nardella-Dellova (2024, p. 189), estão relacionados com “garantias intrínsecas à própria relação jurídica”.
Em suma, vícios redibitórios são vícios ou defeitos ocultos que desvalorizam a coisa ou a tornam imprestável ao uso que se destina.
Assim sendo, o primeiro conceito a ser compreendido é o de vício oculto, que pode ser compreendido como aquele não perceptível por pessoa de diligência média. Desse modo, “não se caracterizam os vícios redibitórios quando os defeitos são facilmente verificáveis com um rápido exame e diligência normal” (GONÇALVES, 2018, p. 134).
Além do vício oculto, é necessário, ainda, que a coisa tenha sido recebida em virtude de um contrato comutativo, isto é, de um contrato bilateral e sinalagmático. Sendo o contrato aleatório, de risco ou sorte, a reclamação por vício oculto estará prejudicada. No mais, é indispensável que o vício seja grave o suficiente para tornar a coisa inútil ou diminuir substancialmente o valor. Caso o vício seja mínimo, não há que se falar em vício redibitório.
Uma vez preenchido todos esses requisitos e verificada a presença de vício redibitório, o comprador poderá pleitear a resolução do contrato através de uma ação redibitória ou o abatimento do preço através de uma ação estimatória. Caso fique comprova-
do que o alienante conhecia o vício, poderá ainda o comprador exigir indenização por perdas e danos, nos termos do art. 433 do Código Civil.
Se o vício redibitório está na coisa propriamente dita, a evicção, por sua vez, aduz sobre o vício no direito de estar com a coisa, ou seja, hipótese em que o agente perde a coisa porque não tinha o direito de estar com ela.
Conforme conceitua Cassettari (2019, 263), trata-se da “perda da coisa por força de decisão judicial, ou apreensão administrativa, adquirida em contrato oneroso, mesmo que em hasta pública”.
Neste caso, além de um alienante e de um adquirente, há, ainda, a figura de um terceiro (evictor), definido como aquele que detém melhor direito sobre a coisa e que tem a decisão judicial ou apreensão administrativa a seu favor.
Nos termos do art. 450 do Código Civil, o adquirente que perdeu a coisa em função da evicção terá direito de pleitear em desfavor do alienante o ressarcimento do que foi pago, acrescido de indenização e restituição de custas judiciais e honorários advocatícios.
Se a evicção ocorrer de forma parcial, o evicto terá direito somente à indenização pela parte afetada. Se a evicção for parcial, porém substancial, o comprador poderá optar entre receber uma indenização proporcional ao prejuízo ou resolver o contrato devido ao descumprimento.
Convém salientar que o Código Civil, através do seu art. 448, estabelece a possibilidade de que as partes pactuem livremente o reforço, a diminuição ou mesmo exclusão da responsabilidade por evicção, desde que o façam através de cláusula expressa nesse sentido.
Contudo, a alteração da responsabilidade a qual dispõe o art. 448 diz respeito tão somente às indeniza-
ções previstas no art. 450 do Código, de modo que o adquirente ainda assim terá direito a pleitear a restituição do preço que pagou pela coisa, a fim de que seja afastado o enriquecimento sem causa.
REFERÊNCIAS
CHRISTIANO, Cassettari. Elementos de direito civil: volume único. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos, tomo I: teoria geral. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
NARDELLA-DELLOVA, Giuseppe Pietro Buono. Direito civil: relações obrigacionais: o sistema das obrigações, contratos e responsabilidade civil em chave civilizatória constitucional e de direitos humanos. 1. ed. São Paulo: Scortecci, 2024.
DIREITO
DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATO ALEATÓRIO, CONTRATO PRELIMINAR E CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR 14
Antônio Augusto Garcia Leal
INTRODUÇÃO
O presente texto tem por objetivo tratar de breves considerações sobre contrato aleatório, contrato preliminar e contrato com pessoa a declarar, sob a sistemática do Código Civil Brasileiro de 2022.
1. Contratos Aleatórios
Disciplinado nos artigos 458 a 461, do Código Civil, o contrato aleatório tem como principal característica a álea, termo que remete a risco, a uma possibilidade de o contrato gerar prejuízo ou lucro a um dos contratantes.
O contrato aleatório pode ter por base a compra de coisas ou fatos futuros, cuja existência é incerta no momento da contratação, bem como a coisas ou fatos existentes e expostos a risco de perecimento.
Os contratantes podem ajustar, por exemplo, o pagamento de determinada quantia a coisa futura, cuja quitação deverá acontecer ainda que a coisa não
seja produzida, obviamente sem que exista culpa ou dolo do vendedor.
O mesmo raciocínio se aplica quanto à venda futura de determinada quantidade de coisa. Se produzida em menor ou maior quantidade à prometida, o pagamento deverá acontecer. Entretanto, se nenhuma quantidade for produzida, o alienante restituirá o preço recebido.
Se a coisa sujeita a risco de se perder vier a se deteriorar ou a se depreciar ao longo do tempo, o alienante ainda sim terá direito a receber todo o preço contratado. Entretanto, se o adquirente comprovar que o alienante sabia que o bem já não existia quando da contratação, o negócio será passível de anulação.
2. Contrato Preliminar
Previsto nos artigos 462 a 466, do Código Civil, o contrato preliminar exige que os contratantes nele definam as principais questões que embasarão o contrato definitivo.
O contrato preliminar obriga os contratantes a firmarem o contrato definitivo e pode gerar, inclusive, indenização por perdas e danos caso um dos contratantes se recuse a cumprir seus termos. É aconselhável que se faça o registro do contrato preliminar no registro competente.
Outras características envolvendo o contrato preliminar: a) a parte inadimplente poderá ter sua vontade suprimida judicialmente, de modo a conferir caráter definitivo ao contrato preliminar; b) o inadimplemento poderá gerar a rescisão do contrato, se o credor assim o desejar, com a possibilidade de gerar perdas e danos; c) o credor, a quem cabe a opção pela contratação, deverá fazê-la no prazo contratual ou, inexistindo, em prazo razoável.
3. Contrato Com Pessoa a Declarar
Tratado nos artigos 467 a 471, do Código Civil, o contrato com pessoa a declarar autoriza que um dos contratantes nomeie, após a conclusão do negócio, uma outra pessoa em seu lugar para dele adquirir direitos e assumir obrigações.
A indicação da pessoa pelo contratante deverá acontecer em até 5 dias da conclusão do negócio, salvo se do contrato não constar outro prazo. A aceitação deverá ser revestida da mesma formalidade usada para instrumentalizar o contrato.
A assunção dos direitos e obrigações pelo terceiro retroagem à data da efetivação do negócio.
Por fim, caso não haja nomeação de terceiro, caso o terceiro recuse a indicação, caso ele seja incapaz ou insolvente quando da nomeação, o contrato produzirá seus efeitos apenas entre os contratantes originários.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
EXTINÇÃO DOS CONTRATOS: DISTRATO, CLÁUSULA
RESOLUTIVA EXPRESSA E TÁCITA E A EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO
Clarice Martins Vieira
A extinção dos contratos está prevista nos arts. 472 a 480 do Código Civil Brasileiro de 2002 (“CC”). O ilustríssimo doutrinador Flávio Tartuce, em seu livro Manual de Direito Civil – Volume Único, expõe o fato de que apesar do Código Civil atual prever tal matéria, não há o esgotamento do tema ante todas as nuances trazidas sobre a extinção dos contratos1, neste artigo de forma breve e direta falaremos sobre o distrato, a cláusula resolutiva expressa e tácita e a exceção de contrato não cumprido:
I. DO DISTRATO
a) Resilição bilateral
O distrato está previsto no art. 472 do CC, e nada mais é do que o encerramento de uma relação contratual por acordo das partes contratantes. Devendo ser submetido a a mesma forma exigida para o contrato, ou seja, deverá obedecer às mesmas formali1 TATARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. – 9ª edição – [2. Reimp] – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019
dades do contrato, como exemplifica Flávio Tartuce2 que se o contrato foi celebrado por escritura pública, o distrato deverá obedecer à mesma formalidade. Porém, em respeito ao princípio do consensualismo e da autonomia da vontade, não havendo forma exigida para a substância do contrato, admite-se que o distrato seja pactuado de forma livre 3, desde seja possível comprovar de que as partes decidiram de comum acordo dar por encerrado o contrato.
b) Resilição unilateral
Prevista no art. 473 do CC, é forma de resilição excepcional e só é possível quando a lei permite de forma explicita ou implícita, se dá com a notificação da outra parte.
2 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. –9ª edição – [2. Reimp]. Pág. 609 – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019.
3 BRASIL, Enunciado n.º 584 da VII Jornada de Direito Civil. Conselho da Justiça Federal. Disponível em: < https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/835> Acesso em 29/03/2024
O parágrafo único do mesmo artigo é claro ao dizer que caso uma das partes tenha feito investimentos consideráveis para a execução daquele contrato, a resilição unilateral só terá efeitos decorrido prazo compatível com a natureza e o valor dos investimentos.
II. DA CLÁUSULA RESOLUTIVA
a) Cláusula resolutiva expressa
Trata-se de previsão de evento futuro e incerto, previsto em contrato, que pode causar a extinção do pacto e conforme previsto na primeira parte do art. 474 do CC a cláusula resolutiva expressa produzirá seus efeitos independentemente de pronunciamento judicial4, ressalvadas exceções, como por exemplo os casos de arrendamento mercantil 5
b) Cláusula resolutiva tácita
Prevista na segunda parte do art. 474 do CC, está relacionada a evento futuro e incerto, normalmente falamos sobre inadimplemento, a cláusula resolutiva tácita precisa de demanda judicial para ter efeitos jurídicos. A extinção do contrato, neste caso, é causada por fato que acontece depois de sua celebração e conforme dispõe o art. 475 do CC, a parte prejudicada pelo inadimplemento pode pedir a resolução contratual, caso não queira exigir seu cumprimento, sendo cabível também a indenização por perdas e danos.
III. DA EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO
A exceção de contrato não cumprido está prevista no art. 476, por este dispositivo, nenhum dos contratantes podem exigir o adimplemento da obrigação
4 BRASIL, Enunciado n.º 436 da V Jornada de Direito Civil. Conselho da Justiça Federal. Disponível em: < https://www.cjf. jus.br/enunciados/enunciado/336.> Acesso em 29/03/2024
5 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. –9ª edição – [2. Reimp]. Pág. 601 – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019
do outro até que cumpra com a sua obrigação, logo esse descumprimento mútuo poderá acarretar a extinção do contrato.
Por sua vez, o art. 477 do CC é potente meio de defesa aos contratantes, visto que assegura aquele que sofrer diminuição em seu patrimônio que comprometa ou torne duvidosa a prestação a que estava obrigado em contrato, poderá se recusar a cumprir sua parte, até que garanta o equilíbrio da relação contratual.
Diante das possibilidades de extinção contratual apresentadas, conclui-se que quanto melhor redigido é um contrato, menores serão as dificuldades enfrentadas para a sua extinção.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATOS: ONEROSIDADE EXCESSIVA – REVISÃO E RESOLUÇÃO DO CONTRATO 16
Erika Cesario da Silva Aparecido
No âmbito do direito das obrigações estabelecidas através de instrumento contratual, predominam os princípios da autonomia de vontade, compreendido como a liberdade de estipular livremente o contrato e seu conteúdo, bem como o princípio da força obrigatória dos contratos, consubstanciado na irretratabilidade dos direitos e obrigações pactuados entre as partes.
Entretanto, o Código Civil prevê uma hipótese de relativização do poder vinculante do contrato, associada à ideia de ocorrência de um fato imprevisível e extraordinário que resulte em uma dificuldade de cumprimento da obrigação, de modo a torná-la excessivamente onerosa.
Essa relativização é conhecida como teoria da imprevisão, a qual, como desdobramento da cláusula rebus sic standibus (obrigatoriedade de manutenção do pactuado desde que mantidas as condições no momento do acordo), prestigia os princípios da con -
servação do negócio jurídico e da função social do contrato, pressupondo uma alteração substancial entre o momento de formação do contrato (plano da existência) e o momento de sua execução ou cumprimento (plano da eficácia)1 , trazendo uma hipótese de revisão judicial dos contratos2
A teoria é tratada no Código Civil em seu artigo 317, o qual estabelece que:
Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
Para a incidência da revisão judicial do contrato, deverão estar presentes alguns pressupostos, como a) o contrato deverá ser bilateral, de execução futura, diferida ou continuada, no qual a obrigação será adimplida em momento posterior à sua origem; b) a presença de evento posterior à conclusão do contrato, imprevisível quando do nascimento da obri -
gação e que altera substancialmente as condições econômicas de sua execução; e c) o fato imprevisível acarreta desproporção exagerada entre o valor da prestação ajustada no momento da elaboração do contrato e o valor no momento da sua execução 3
Importante destacar que para que seja possível a revisão judicial do contrato, a onerosidade excessiva não poderá implicar em uma impossibilidade de cumprimento da obrigação, mas tão somente uma dificuldade extrema em proceder ao adimplemento4.
Isso porque a intervenção judicial na economia do contrato objetiva tão somente preservar o valor real da prestação no momento da constituição do contrato, equilibrando a equação do negócio jurídico.
Essa diferença é relevante na medida em que a onerosidade excessiva quando resultar em uma variação superveniente por fatos extraordinários e imprevisíveis, que acarrete extrema vantagem para a outra parte, poderá romper o vínculo da prestação, através da resolução contratual do ajuste.
A previsão legal de resolução contratual por onerosidade excessiva está contida nos artigos 478, 479 e 480 do Código Civil:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua
prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.
Importante destacar que para que seja deferida a resolução por onerosidade excessiva é essencial que a execução da prestação acarrete extrema vantagem para a outra parte, que não era previsível no momento da formação das bases de negócio do contrato, o que não inclui vantagens e desvantagens próprias do risco do negócio e do cumprimento natural do contrato5.
O princípio que tutela essa modalidade legal é o do equilíbrio econômico do contrato, que objetiva impedir que as prestações contratuais expressem um desequilíbrio real e injustificável, que acarretem um lucro exagerado em detrimento da parte devedora.
Caso o contrato venha a sofrer com fato imprevisível e extraordinário que resulte em extrema vantagem, o devedor poderá pedir a resolução do contrato, ou ainda, a resolução poderá ser evitada pela modificação equitativa das condições do contrato, possibilitando que a parte pleiteie a redução da prestação ou alteração do modo de execução, a fim de evitar a onerosidade excessiva.
REFERÊNCIAS
1. SCHREIBER, A., TARTUCE, F., SIMÃO, J. [et. al.]. Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Grupo GEN, 2021.
2. CASTRO, Adriano Augusto Pereira de. Desconstruindo a teoria da imprevisão: Parâmetros democráticos para a revisão judicial dos contratos sob a análise econômica do direito. 2020. Disponível em https://revistas.newtonpaiva.br/redcunp/wp-content/uploads/2020/05/PDF-D11-02.pdf, Acesso em 15.05.2022.
3. AGUIAR JR., Ruy Rosado de. In.: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários ao Novo Código Civil. v. VI. tomo. II. São Paulo: Grupo GEN, 2011.
4. GOMES, Orlando. Contratos. 24 ed. Rio de Janeiro: ed. Forense, 2001.
5. OLIVEIRA, James Eduardo. Código civil anotado e comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
17
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
ESPÉCIES DE CONTRATO: COMPRA E VENDA, PERMUTA,
CONTRATO ESTIMATÓRIO E DOAÇÃO
Camila Felberg
I.1. Compra e venda – elementos do contrato.
O ordenamento jurídico brasileiro institui e disciplina a compra e venda como um contrato pelo qual o vendedor se obriga a transferir ao comprador o domínio sobre coisa móvel ou imóvel, mediante remuneração denominada preço (fixação de um valor determinado ao objeto do contrato). Encontra-se estabelecida pelo art. 481 do Código Civil que prevê:
Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.
Os artigos 482 a 532 do Código Civil tratam das particularidades e regras inerentes a esse tipo de contratação, que tem como elementos constitutivos: partes capazes (aptidão) e legítimas (aptidão específica); objeto lícito (deve estar disponível no mercado para comercialização e se tratar de coisa lícita e bem corpóreo) determinado ou determinável (regu -
lando a contratação sobre coisa ainda não existente) e preço que deve ser justo, determinado e em moeda corrente e pode ser fixado de acordo com suas diversas modalidades; podendo ser por avaliação (art. 485 do CC), podendo se vincular à taxa de mercado ou de bolsa (art. 486 do CC), por cotação (art. 487 do CC), tabelado ou médio (art. 488 do CC) ou ainda, unilateral (art. 489 do CC).
Apesar de se nortear pelos princípios gerais contratuais existem restrições impostas ao contrato de compra e venda, discriminadas no art. 497 do Código Civil: venda de ascendente para descendente sem expressa anuência dos outros descendentes e cônjuge do vendedor (art. 496 do CC), venda de bens que se encontrem sob administração; venda de parte indivisa de condomínio, entre outras hipóteses.
Se existem restrições, também podem, eventualmente, a depender do tipo da compra e venda (imóvel, exemplificando) conter cláusulas especiais (os também denominados pactos adjetos): retrovenda
(art. 505 a 508 do CC), preferência (art. 513 a 520 do CC), venda com reserva de domínio (art. 521 a 528 do CC) e; finalmente, especificidades afeitas à venda sobre documentos (art. 529 a 532 do CC); aperfeiçoada pela mera tradição do título1
I.2. Permuta.
Diferencia-se da compra e venda, principalmente, pelo fato de que não há pagamento de remuneração, mas sim, troca de bem ou serviço entre os contratantes. Há uma compensação previamente ajustada entre as partes, sendo de sua essência, intrínseco à sua natureza jurídica ser bilateral (ou sinalagmático); comutativo; consensual; informal; traslativo e oneroso.
Se aperfeiçoa com a tradição do objeto do contrato.
Está estabelecido no art. 533 do Código Civil: Art. 533. Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações:
I - salvo disposição em contrário, cada um dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca;
II - é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante.
I.3. Contrato estimatório.
Trata do tipo de contrato cuja finalidade é a venda, em nome próprio, de bens móveis pertencentes à terceiros. Alguns doutrinadores o consideram como sendo modalidade de compra e venda. Também considerado como “venda em consignação”. Isso porque são consignadas determinadas coisas móveis com o objetivo de venda por preço estimado, 1 VALENTE, Rubem. Direito civil facilitado / Rubem Valente. – 2. ed., rev., atual. e reform. – Rio de Janeiro: Método, 2022. Pág. 393.
com a condição de devolução das que não vender, em determinado espaço de tempo (prazo determinado)2
Está previsto no art. 534 do Código Civil: Art. 534. Pelo contrato estimatório, o consignante entrega bens móveis ao consignatário, que fica autorizado a vendê-los, pagando àquele o preço ajustado, salvo se preferir, no prazo estabelecido, restituir-lhe a coisa consignada.
Os artigos do Código Civil, do art. 535 até o art. 537 tratam de particularidades afeitas ao tipo contratual elencado.
I.4. Doação.
Doação é a forma de contrato pela qual uma das partes se obriga a transferir gratuitamente um bem de sua propriedade para patrimônio da outra, que se enriquece na medida em que aquela empobrece. O sujeito que comete a liberalidade denomina-se doador; o outro, donatário. A doação é contrato unilateral, simplesmente consensual e gratuito. Unilateral, porque somente o doador contrai obrigações. Simplesmente consensual, porque não requer, para seu aperfeiçoamento, a entrega da coisa doada ao donatário. Desde que o acordo se realiza, o contrato está perfeito e acabado. É da aceitação do donatário que nasce para o doador a obrigação de entregar o bem. Gratuito, por excelência, porque o donatário enriquece seu patrimônio sem contrapartida3
Somente se aperfeiçoa com a verificação do aspecto subjetivo do doador, ou, o animus domini que se caracteriza pela vontade de enriquecer o donatário às expensas próprias. Se não há essa intenção o
2 GOMES, Orlando; atualizadores Edvaldo Brito [e coordenador], Reginalda Paranhos de Brito. . Contratos / 28. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2022.
3 GOMES, Orlando; atualizadores Edvaldo Brito [e coordenador], Reginalda Paranhos de Brito. . Contratos / 28. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2022, página 242.
contrato não se aperfeiçoa. Mesmo que seja gratuito, é necessário que seja intencional.
Está prevista no art. 538 do Código Civil:
Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.
Do art. 538 ao art. 563 do Código Civil são disciplinadas diversas questões importantes afeitas à doação com a discriminação de suas diversas formas e previsão expressa de hipótese de revogação.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO 18
Fernanda Barberis
A prestação de serviço é regida pelo Código Civil1, quando não se sujeitar às leis trabalhistas ou outra lei especial (art. 393 do CC).
Reforça-se, porém, a exigência de que o serviço ou trabalho seja lícito (art. 594 do CC), o que já se continha no artigo 104, II.
Excluindo do âmbito da legislação civil o serviço prestado sob a égide da legislação trabalhista, igualmente é excluído o trabalho desinteressado, ou voluntário, sobre o qual dispõe a Lei 9608, de 18.02.1988.
Segundo Flavio Tartuce 2, “o contrato de prestação de serviços (locatio operarum) pode ser conceituado como o negócio jurídico pelo qual alguém - o prestador - compromete-se a realizar uma determinada atividade com conteúdo lícito, no interesse de outrem - o
1 O Código Civil de 1916 denominava Locação de Serviços - art. 1216 a 1236.
2 TARTUCE, Flávio - ob. cit. - p. 557.
tomador - mediante certo e determinada remuneração”.
Caracteriza-se o contrato de prestação de serviço, consoante Maria Helena Diniz3, pela: “1) bilateralidade (gerando obrigações para ambos os contratantes; 2) onerosidade, quando vantagens para os contratados e 3) consensualidade, aperfeiçoando-se com o acordo de vontades”. Há, no contrato, obrigação de fazer, “ou seja, a prestação de atividade lícita”. A remuneração é elemento essencial, conforme o ajuste entre os contratantes, mas, comumente, após a realização do serviço.
A referência a tratar-se de obrigação de fazer tem importância no âmbito processual, a partir da distinção entre serviço personalíssimo, o que só pode ser prestado pelo contratado, ou não personalíssimo, passível de realização por terceiros, conforme se vê, respectivamente, dos artigos 814, 817 e 821 do CPC 4).
3 DINIZ, Maria Helena - Curso de Direito Civil - vol. 3 - p. 313 e 55 - 30ª edição - São Paulo: Saraiva, 2014.
4 Art. 814. Na execução de obrigação de fazer ou de não fazer
Igualmente relevante é que o contrato de prestação de serviço tem prazo máximo fixado no Código Civil, embora ele possa ser renovado: “Art. 598. A prestação de serviço não se poderá convencionar por mais de quatro anos, embora o contrato tenha por causa o pagamento de dívida de quem o presta, ou se destine à execução de certa e determinada obra. Neste caso, decorridos quatro anos, dar-se-á por findo o contrato, ainda que não concluída a obra”. Para Clóvis Bevilaqua 5 essa regra que já se encontrava no Código Civil de 1916 (art. 1220), tem por fundamento “a inalienabilidade da liberdade humana. Uma obrigação de prestar serviço por mais de quatro anos pareceu ao legislador escravização convencional ou resultado de uma exploração do fraco pelo poderoso. E, para melhor defender a liberdade, limitou-a”. Não havendo prazo estipulado, nem podendo se inferir da natureza do contrato a resilição imotivada por qualquer das partes dar-se-á com aviso prévio dentro do prazo que fixa a lei (art. 599 do CC).
O Código Civil tratou da celebração do contrato de prestação de serviço por pessoa não alfabetizada, permitindo a assinatura a rogo e subscrito por duas testemunhas (art. 595 do CC).
Salvo convenção em sentido contrário a remuneração é paga depois de prestado o serviço (art. 597 do CC).
Por ser o contrato oneroso e sinalagmático, tratou a lei, também, de estabelecer consequência para o descumprimento.
fundada em título extrajudicial, ao despachar a inicial, o juiz fixará multa por período de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida. (---) Art. 817. Se a obrigação puder ser satisfeita por terceiro, é lícito ao juiz autorizar, a requerimento do exequente, que aquele a satisfaça à custa do executado. (---) Art. 821. Na obrigação de fazer, quando se convencionar que o executado a satisfaça pessoalmente, o exequente poderá requerer ao juiz que lhe assine prazo para cumpri-la. 5 BEVILAQUA, Clóvis - Código Civil Comentado - vol. IV - p. 335 - 10ª edição - Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1955.
Finalmente, não pode passar sem referência a vedação de aliciamento de prestador de serviços, autêntica repercussão do contrato em face de terceiro, conforme o artigo 608 do Código Civil 6 .
6 Art. 608. Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATO DE EMPREITADA 19
Fernanda Barberis
O conceito de empreitada é abrangente e se define como “o contrato mediante o qual uma pessoa (o dono da obra) pactua com outra (empreiteiro) a realização de uma obra, de acordo com as condições e preço que ajustarem1”. Trata-se de contrato bilateral, tendo o empreiteiro de realizar a obra e o dono de remunerá-lo. A obra pode consistir em coisa móvel ou imóvel, material ou imaterial, desde uma edificação ou sua demolição, um projeto, uma pintura etc. Trata-se de obrigação de resultado, não uma atividade, como a prestação de serviço.
A empreitada, segundo Maria Helena Diniz, contém as seguintes características: bilateralidade, havendo obrigações recíprocas, a do empreiteiro entregar a obra e do contratante, pagar o preço; comutatividade, pois as prestações se reputam equivalentes, onerosidade, pela transferência recíproca de direitos ou vantagens; consensualidade, não exigindo forma
1 LOBO, Paulo - Contratos - p. 368 - São Paulo: Saraiva, 2011.
especial, aperfeiçoando se com o acordo de vontades e, precipuamente, indivisibilidade, “visto que se objetiva a conclusão da obra”, não se permitindo, em regra, exequibilidade fracionada. Isso, entretanto, não impede a fixação da remuneração por valor fixo ou variável conforme as circunstâncias, por medida ou por partes concluídas, com preço máximo estabelecido, ou por custo2
O empreiteiro pode contribuir ou só com trabalho, ou com trabalho e materiais (art. 610 do CC), neste último caso correndo por sua conta os riscos, exceto se estiver em mora de a receber o dono da obra.
Se a empreitada for unicamente de lavor, perecendo a coisa “antes de entregue, sem mora do dono nem culpa do empreiteiro, este perderá a retribuição, se não provar que a perda resultou de defeitos dos materiais e que em tempo reclamara contra sua quantidade ou qualidade” (art. 613 do CC).
2 DINIZ, Maria Helena - ob. cit. -. 325.
De real importância é a medição, se a obra constar de partes distintas, ou se determinar por medida, podendo exigir-se os pagamentos proporcionais, mas: a) tudo o que se pagou presume-se verificado e b) o que se mediu presume-se verificado se, em trinta dias, não forem denunciados vícios ou defeitos (art. 614).
Terá o dono de receber a obra, se concluída de acordo com o pactuado ou o costume do lugar, mas poderá rejeitá-la se o empreiteiro se afastou das instruções ou regras técnicas (art. 615 do CC).
De especial importância é o prazo de garantia estabelecido no Código Civil: “Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo. Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito”. Essa responsabilidade é objetiva e o prazo considerado de garantia, sem prejuízo da indenização por perdas e danos em virtude de defeito da obra, dentro do prazo prescricional, sendo copiosa a jurisprudência a respeito (v. Súmula 194 do STJ, ressalvada a redução do prazo geral de prescrição para dez anos).
Estabelece o Código, ainda, regras sobre a variação do preço de materiais ou modificação do pagamento, bem como as hipóteses em que se admite a suspensão da obra (art. 619 e ss do CC).
Por fim, diferentemente do que ocorre na prestação de serviço, em que a morte do prestador extingue o contrato (art. 607 do CC), outra é a regra na empreitada: “Art. 626. Não se extingue o contrato de empreitada pela morte de qualquer das partes, salvo se
ajustado em consideração às qualidades pessoais do empreiteiro”.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
ESPÉCIES DE CONTRATO: MANDATO 20
Camila Felberg
Trata de espécie de negócio jurídico de representação tipificado nos artigos 653 a 692 do Código Civil1 e tem por finalidade a transferência de poderes de representação a outrem para a prática de atos ou a administração de interesses. As partes nesse tipo de contrato são denominadas como mandante, sendo aquele que transfere poderes à outrem; e mandatário, aquele que age sempre em nome de terceiro que lhe conferiu poderes nos limites dos poderes conferidos.
Não se pode confundir o mandato com a procuração, dada a diferença conceitual entre ambos, sendo o mandato, negócio bilateral enquanto a procuração, trata de ato jurídico unilateral com requisitos de validade intrínsecos e disciplinados pelo art. 654, § 1° do Código Civil2, sendo que para ter efeito erga omnes
1 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm <acesso em 30 de março de 2024> 2 Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante. § 1 o O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualifica-
(contra todos) necessária assinatura mediante reconhecimento de firma (§ 2° do art. 654 do Código Civil).
O mandato trata de contrato unilateral por atribuir obrigações somente a uma das partes 3. Assim, em regra o contrato de mandato é unilateral e tem natureza gratuita. Entretanto, na prática, se constata a existência em maior número dos instrumentos de mandato bilaterais e onerosos, geralmente decorrente da atividade profissional a ser desempenhada pelo mandatário 4 .
Com relação à forma de remuneração dos contratos de mandatos onerosos, decorrentes de serviços profissionais; caberá sempre a remuneração prevista em lei ou no próprio contrato. Na omissão, cabe, somente em última análise, pronunciamento judicial
ção do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.
3 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 2005. p. 284.
4 TARTUCE, Flávio. Direito Civil, Teoria Geral dos contratos e contratos em espécies – Vol. 03. 18ª edição. Rio de Janeiro, editora Forense, 2023, p. 633.
de fixação sendo observados usos e costumes decorrentes da localidade da contratação, aspectos afeitos à complexidade e aplicação de normas que contenham diretrizes que se refiram à precificação da atividade profissional. Alguns doutrinadores consideram esse tipo de contrato como sendo da categoria preparatória na medida em que serve para a prática de outro ato específico e discriminado.
É contrato consensual pois se manifesta com a manifestação de vontade das partes e comutativo pois as partes no momento de sua celebração sabem exatamente seus direitos e obrigações decorrentes da contratação. É instrumento informal e não solene, podendo ser verbal ou escrito portanto. A aceitação do mandato pode se dar de forma expressa ou tácita (com o início da prática dos atos em nome do mandante). A ausência de aceitação prejudica seu aperfeiçoamento.
Trata de contrato personalíssimo, fundado na confiança para agir em seu nome, decorrendo daí uma obrigação ao mandatário de natureza positiva (de dar ou de fazer algo, em nome do mandante).
É possível a aplicação da Lei 8.078/90 5 (Código de Defesa do Consumidor) a esse tipo de contrato, excluindo-se dessa interpretação aqueles específicos decorrentes de prestação de serviços advocatícios que devem seguir as disposições do Estatuto da Advocacia e da OAB – Lei 8.906/94, segundo entendimento mais recente das Cortes Superiores.
Podem ser quanto à forma: legal (decorre de lei e dispensa qualquer instrumento, ex. genitores e seus filhos, enquanto menores); judicial (é aquele conferido pelo poder judiciário, no curso de uma ação, ex. inventariante nomeado em processo de sucessão de bens); convencional (manifestação de autono -
mia privada, decorre de manifestação das partes, ex. procuração ad judicia, procuração ad negotia).
Os menores e incapazes podem tanto serem mandantes quanto mandatários, cabendo exigências especificas nesse tipo de contratação para aperfeiçoamento válido e eficaz do negócio jurídico.
O substabelecimento constitui uma cessão parcial de contrato onde o mandatário transmite os direitos que foram conferidos pelo mandante, a algum terceiro (desde que reúna condições e esteja habilitado para tanto). Pode ser com ou sem reserva de poderes, dependendo da intenção de se preservar o vínculo entre as partes; ou não.
A extinção do contrato de mandato, pelas próprias características já mencionadas, mereceu tratamento especial, estando disciplinado entre os artigos 682 a 691 do Código Civil. Pode se dar pela revogação do mandante ou pela renúncia do mandatário. Também se extingue com a morte ou cessão da capacidade civil de uma das partes, ou qualquer mudança de estado que prejudique a contratação e assunção de obrigação bilateral. Também pode se dar pela conclusão do negócio ou, se por prazo estipulado, pelo término do lapso temporal definido.
5 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm <acesso em 30 de março de 2024>.
2 1
DIREITO DAS
OBRIGAÇÕES
MODESTO ESTUDO CONCERNENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, EMPREITADA E DEPÓSITO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Lázaro Lima Souza
Introdução
O Direito contratual é o ramo que rege a execução e realização de todos os contratos. Estes são uma espécie de negócio jurídico que tem como elemento essencial um acordo de vontades. No presente artigo, os contratos de empréstimo, prestação de serviços, empreitada e depósito serão abordados de forma concisa, visando a compreensão destes.
Empréstimo
O empréstimo possui duas espécies: comodato e mútuo. No comodato, ocorre o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis, exigindo-se a tradição do objeto. Trata-se de cessão de uso e gozo gratuito da coisa. As características do comodato são a temporariedade, gratuidade, tradição e infungibilidade do bem. O comodatário deve conservar a coisa emprestada como se fosse o proprietário e não poderá recobrar do comodante as despesas feitas com
o uso e gozo da coisa emprestada1. Ademais, tratar-se-á de responsabilidade solidária se duas ou mais pessoas forem simultaneamente comodatárias de uma coisa.
No mútuo, o empréstimo é de coisas fungíveis. Ocorrerá a transferência do domínio da coisa ao mutuário, que será responsável pelos riscos desde a tradição. Recomenda-se a leitura dos artigos 589/592 do CC/2002 para saber como ocorre a cessão, garantia da restituição, fins econômicos (caso existam) e prazo.
Prestação de serviços
Está sujeita as disposições do Código Civil a prestação de serviços que não for regida pelas leis trabalhistas ou por lei especial. O prestador de serviços assume a obrigação de realizar alguma atividade
1 A lei evita que o comodatário tente se aproveitar do comodante porque este emprestou de forma gratuita a coisa. Não seria correto, por exemplo, que o comodatário reclamasse as despesas que teve com um imóvel ou automóvel emprestado sem ônus. O artigo 584 do CC/2002 não permite interpretação que ajude ao comodatário de boa-fé em casos de benfeitorias.
de sua especialidade para o tomador do serviço. A eventualidade do serviço a ser prestado é um elemento essencial do presente contrato2
Empreitada
Trata-se de contrato 3 em que o empreiteiro é contratado para realizar uma obra, mediante remuneração fixa ou proporcional ao serviço. A empreitada não se confunde com o contrato de prestação de serviços porque tem como objeto a obra em si4. Ademais, o empreiteiro assume os riscos da obra5, sem estar subordinado ao contratante.
Depósito
O depósito exige a tradição efetiva e temporária de uma coisa móvel 6. O contrato será gratuito, exceto se houver convenção em contrário7. O Código Civil prevê dois depósitos: o voluntário e o necessário. Não se pode olvidar que o depositante deverá pagar ao depositário as despesas feitas com a coisa, além dos prejuízos que do depósito provierem.
No voluntário, o depositário recebe um objeto móvel para guardar até que o depositante o reclame8. A respeito do necessário, refere-se a uma imposição
2 Recomenda-se a leitura dos artigos 593/609 do Código Civil de 2002.
3 É contrato consensual, bilateral, comutativo e oneroso, por prazo determinado.
4 CAVALCANTE DOS SANTOS, Carla. Contratos de empreitada em face o direito do consumidor. PUC-SP, 2014. Monografia para grau de especialista em contratos. Orientadora: Doutora Greice P. Fuller. Disponível em: https://repositorio. pucsp.br/bitstream/handle/33572/1/Carla%20Cavalcante%20 dos%20Santos.pdf Acesso em 27/03/2024
5 Percebe-se que existe uma obrigação de resultado na empreitada. Aliás, a respeito da obrigação de fornecer os materiais, resultar-se-á da lei ou da vontade das partes.
6 Recordar-se que se trata de coisa móvel, não fungível e não consumível.
7 É possível que o contrato seja unilateral (apenas uma parte possui ônus) ou bilateral imperfeito (originalmente, era unilateral, todavia, ao longo de sua execução, tornou-se bilateral acidentalmente).
8 O referido depósito será provado por escrito (art. 646 do CC/2002).
legal ou situação de calamidade provocada por força maior que obriga a pessoa a guardar e restituir a coisa quando esta for exigida pelo titular.
Considerações finais
Espera-se que esse singelo artigo seja útil no estudo dos contratos abordados, sobretudo para os profissionais da área jurídica.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.
SCHREIBER, Anderson. Código Civil Comentado Doutrina e Jurisprudência. 3.ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2021.
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATO DE DEPÓSITO 22
Fernanda Barberis
O conteúdo e finalidade do contrato de depósito acha-se expresso no Código Civil: “Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame.” Além dessa modalidade que se qualifica como depósito voluntário, outra há que se qualifica como necessário, em duas situações: no desempenho de obrigação legal e quando se efetiva por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, inundação, naufrágio ou saque (art. 647).
Caracteriza-se o depósito pela obrigação de custódia, distinguindo-se de outras figuras como o mandato ou comodato que não tem como causa a guarda.
Partes no contrato são depositante, a pessoa que entrega a coisa, e depositário o que a recebe para guardar.
São elementos característicos deste contrato, segundo Maria Helena Diniz1: “a) é contrato unilateral, por originar obrigações apenas para o depositário; b) gratuito, conquanto não lhe seja da essência a gratuidade (art. 628 do CC); c) real, aperfeiçoando-se com a entrega da coisa, não bastando o acordo das partes; d) “intuitu personae”, pois fundado na confiança no depositário, embora, hodiernamente essa característica não tem prevalecido. Objetivo do depósito tem de ser coisa móvel corpórea.”
Em várias modalidades se divide o contrato de depósito, algumas de interesse apenas processual, como no sequestro (art. 301 do CPC). Além do depósito de natureza civil, pode haver depósito resultante de atividade negocial ou profissional. Diz-se irregular, quando incidir sobre coisas fungíveis, “em que o depositário se obrigue a restituir objeto do mesmo gênero, qualidade e quantidade” e se regulará pelo disposto sobre o mútuo (art. 645 do CC).
1 DINIZ, Maria Helena – ob. Cit – p. 374
A classificação mais importante, entretanto, é a que os divide em voluntário ou convencional e necessário.
O depósito voluntário encontra disciplina nos artigos 627 e 646, só se prova por escrito e decorre da livre convenção das partes.
O depósito necessário independe de convenção e decorre de fatores externos, até mesmo imprevisíveis, levando o depositário a entregar a coisa para guarda, inclusive a pessoas que desconhece. Subdivide-se o depósito necessário em a) legal, no desempenho de obrigação ou dever legal (art. 647, I, do CC), exemplificando-se em várias passagens do Código Civil, como nos artigos 345 e 641, ou b) miserável, por ocasião de catástrofes (art. 647, II). Inclui-se na previsão do artigo 647, I, a bagagem de viajantes e de hóspedes de hotéis (art. 649).
O depósito necessário não se presume gratuito (art. 651) ao contrário do voluntário (art. 628). No caso das bagagens de hóspedes, a remuneração está incluída no preço da hospedagem.
Não mais prevalece, entretanto, a prisão civil do depositário infiel (art. 652) a despeito da exceção contida no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, em virtude do Pacto de São José da Costa Rica (Decreto 678, de 06/11/1992 – art. 7º, item 7), sobrevindo a Súmula Vinculante 25 do STF; “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito.”
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
23
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO (MÚTUO E COMODATO)
Fernanda Barberis
Na definição de Orlando Gomes1, “ é o empréstimo o contrato em que uma das partes recebe, para uso ou utilização, uma coisa que, depois de certo tempo, deve restituir ou dar outra do mesmo gênero, quantidade e qualidade”. Essa distinta finalidade do empréstimo recebe a qualificação, respectivamente, de uso e de consumo, sendo que aquele terá por objeto coisa infungível e é necessariamente gratuito (art. 579 do CC). Já o mútuo terá por objeto coisas fungíveis (art. 586 do CC), podendo ser gratuito, ou oneroso quando destinado a fins econômicos, vencendo juros (arts. 586 e 591).
O entendimento do que seja fungível ou infungível decorre da classificação dos bens encontrável na Parte Geral do Código: “Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade”, tal qual é o dinheiro ou são os cereais. Conquanto o artigo 586 do CC
1 GOMES, Orlando - Contratos - p. 384 - 26ª edição - Rio de Janeiro: Forense, 2008.
se reporte apenas a coisas fungíveis, também entram na consideração do contrato de mútuo os bens consumíveis, “cujo uso importa destruição imediata da própria substância”, como os alimentos, bem como os bens “destinados à alienação” (art. 86 do CC).
Didaticamente, Flávio Tartuce2 estabelece a distinção:
“a) Comodato - empréstimo de bem infungível e inconsumível, em que a coisa emprestada deverá ser restituída findo o contrato (empréstimo de uso)
b) Mútuo - empréstimo de bem fungível e consumível, em que a coisa é consumida e desaparece, devendo ser devolvida outra de mesma espécie e quantidade (empréstimo de consumo).”
Como todo contrato, o empréstimo tem uma função econômica, que é “propiciar para aquele que não é
2 TARTUCE, Flávio - Direito Civil - vol. III - p, 591 - 18ª ediçãoRio de Janeiro: Forense, 2023.
dono do que necessita, o uso - em regra, mas também a fruição, excepcionalmente - do que lhe pode ser disponibilizado, para a finalidade almejada. Dessa maneira o comodante não desembolsa valor para adquirir a coisa de que necessita para uso, nem o mutuante priva de se servir da vantagem de consumir uma coisa que não se encontra em seu patrimônio”, conforme Rosa Maria de Andrade Nery e Nelson Nery Júnior. 3
O comodato é contrato unilateral, porque só o comodatário terá obrigação, pois a entrega da coisa é elementar ao contrato, por isso se diz que o contrato é real e não meramente consensual. A exigência de o comodato implicar a entrega da coisa, porém, não confere ao comodatário direito real, trata-se de direito pessoal, observação que é relevante, também no campo do Direito Processual, porquanto, sendo pessoal o direito, mesmo sendo o objeto imóvel, não se exige a participação de ambos os cônjuges no processo (art. 73 do CPC).
Tem o comodatário a obrigação de bem guardar a coisa, usá-la para o fim estabelecido no contrato e restituí-la, no fim do prazo ou quando deixar de ser necessário para o fim concebido (art. 581 do CC).
Aplica-se, contudo, a regra de que a coisa perece para o dono, ou para o comodante, ressalvado o disposto no artigo 583 do CC: “Art. 583. Se, correndo risco o objeto do comodato juntamente com outros do comodatário, antepuser este a salvação dos seus abandonando o do comodante, responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir a caso fortuito, ou força maior”.
Já no mútuo, o empréstimo “transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário por cuja conta correm todos os riscos dele desde a tradição” (art. 587 do CC).
3 NERY, Rosa Maria de Andrade e NERY Júnior, Nelson - Instituições de Direito Civil, t. 2 - p. 717 - 2ª edição - São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
A lei reserva disposições especiais para o mútuo feito a pessoa menor, sem autorização daquele sob cuja guarda esteja, de modo a coibi-la em princípio, mas cuidando de atender os interesses do menor (artigos 588 e 589 do CC 4).
Quanto ao prazo, estabelece o Código regras, quando não tiver sido convencionado entre as partes (art. 592 do CC): “I - até a próxima colheita, se o mútuo for de produtos agrícolas, assim para o consumo, como para semeadura; II - de trinta dias, pelo menos, se for de dinheiro; III - do espaço de tempo que declarar o mutuante, se for de qualquer outra coisa fungível”.
4 Art. 588. O mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores. (---) Art. 589. Cessa a disposição do artigo antecedente: I - se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente; II - se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais; III - se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução do credor não lhes poderá ultrapassar as forças; IV - se o empréstimo reverteu em benefício do menor; V - se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.
RESPONSABILIDADE CIVIL
Ligia Martins
Responsabilidade civil é um conceito jurídico relativo à obrigação de reparar o dano causado a outra pessoa ou ao seu patrimônio, em virtude de uma conduta que viola um dever legal ou contratual. Esse conceito está presente em diversos ramos do direito, como no direito civil, no direito do consumidor, no direito ambiental, penal entre outros.
Em termos gerais, a responsabilidade civil é baseada na ideia de que todo indivíduo tem o dever de agir de forma razoável e prudente, evitando causar danos a terceiros. Quando essa obrigação é violada e ocorre um dano, a pessoa responsável pelo ato ilícito deve indenizar a vítima, reparando o prejuízo causado.
Nesse sentido, podemos conceituar o termo “responsabilidade” quanto à condição de uma pessoa ser responsável por algo, tendo como pressuposto a plena capacidade de consciência dos atos que causou ou praticou voluntariamente, ou seja, é imprescindível que consiga identificar as consequências
de sua vontade, antes de exercer sua conduta. Essa consciência da conduta resulta automaticamente na obrigação de reparar os danos causados a outros através da realização de seus atos, advindo, daí a ideia de culpabilidade ou punibilidade. Nesse sentido, podemos concluir que responsabilidade gera a obrigação de suportar as consequências jurídicas decorrente daquele ato restituindo ou ressarcindo algo.
A Responsabilidade Civil pode ser desmembrada como contratual ou extracontratual , sendo que a primeira necessita da existência de um contrato entrelaçado entre as partes e a segunda, aonde o agente viola uma lei vigente.
Nossa melhor doutrina também traz como elementos básicos da responsabilidade: (i) conduta humana como sendo o comportamento do agente podendo ser uma ação ou omissão; (ii) dano como sendo o prejuízo sofrido; (iii) nexo causal sendo o elo que liga a conduta do agente ao dano efetiva-
mente causado e (iv) culpa como ligação à negligência, imprudência ou imperícia.
Na esfera penal, o conceito segue na mesma definição de responsabilidade, no que tange à obrigação de um indivíduo enfrentar as consequências legais decorrente de suas ações criminosas envolvendo, assim, a imposição de sanções penais, como pena de prisão, multas, prestação de serviços à comunidade, entre outras medidas punitivas.
Oportuno destacar que a responsabilidade penal está baseada em princípios constitucionais como o da legalidade, que estabelece que ninguém pode ser penalizado sem que tenha cometido uma conduta previamente definida como crime em lei; o da culpabilidade, que exige que o agente tenha agido com dolo ou culpa para ser responsabilizado penalmente; e o da individualização da pena , que busca aplicar uma sanção proporcional à gravidade do delito e às circunstâncias do autor.
Inobstante a isso, podermos afirmar que a responsabilidade penal também pode variar de acordo com o sistema jurídico de cada país, podendo ser diretamente ligado à capacidade mental ou a idade do autor infrator, devendo, sempre preservar a ordem social e proteger os direitos e garantias individuais.
A principal distinção entre responsabilidade penal e responsabilidade jurídica está na natureza das condutas que são abrangidas por cada uma delas. Isto porque, a responsabilidade penal se restringe a condutas consideradas criminosas, enquanto a responsabilidade jurídica abrange um espectro mais amplo de condutas que podem gerar responsabilização legal.
Tanto a responsabilidade civil como a responsabilidade penal estão inseridas no contexto do sistema legal brasileiro e visam estabelecer a responsabilidade de um indivíduo por suas ações ou omissões.
Em resumo, a responsabilidade penal é uma categoria específica da responsabilidade jurídica, aplicável apenas a condutas criminosas, enquanto a responsabilidade jurídica engloba uma variedade de situações legais além do âmbito penal.
RESPONSABILIDADE CIVIL
02
Andreia Olmedo Minto
Responsabilidade, em Direito, reside na seara da concretude de direitos constitucionais fundamentais, como meio de efetivar preceitos principiológicos-normativos como a dignidade da pessoa humana e solidarismo constitucional.
Para o Direito Civil, quando ocorre um descumprimento obrigacional, oriundo de regras contratuais, atos ilícitos ou abuso de direitos, nasce a responsabilidade, como meio de obrigar alguém – o infrator –, a indenizar um dano injusto causado a outrem.
Em âmbito penal, a ideia de responsabilidade também parte de instrumento repressor e compensador de um dano causado a outrem pelas condutas antissociais, transgressoras da ordem social. Porém, o direito civil tem como foco principal a vítima, que deve ser compensada por determinados atos (nem sempre ilícitos); ao passo que o direito penal se concentra no réu, no comportamento do agente.
Em que pesem as diferentes searas, essas delimitações consequenciais nem sempre são tão claras, como bem obtempera Nelson Rosenvald em recente artigo publicado sobre o tema:
Se alguns sistemas oferecem contornos nítidos entre as responsabilidades civil e criminal, em outros o cenário é embaçado e as tensões mais evidentes. Todavia, mais importante do que extrair distinções, importa considerar como estas diferenças podem ser levadas em consideração, retirando-se lições e oferecendo explicações para o estado da arte no direito brasileiro e para onde caminha, conforme a sua história e tradição legal.1
O referido autor realizou um estudo comparativo entre os ordenamentos jurídicos brasileiro, espanhol, francês e inglês, abarcando, também, a Diretiva 2012/29/UE, documento internacional que estabeleceu padrões mínimos sobre direitos, apoio e prote -
1 https://www.migalhas.com.br/coluna/direito-privado-no-common-law/393263/uma-visao-comparatista-dos-veiculos-compensatorios. Acesso em 25/09/23.
ção a vítimas de crimes no sentido de centraliza-las como foco do sistema de justiça criminal.
Responsabilidade civil, nesse contexto, regra geral, é a consequência jurídica do descumprimento de uma obrigação civil. Nasce da presença de um ato ilícito ou do abuso de um direito, dividindo-se me contratual e extracontratual e tem caráter eminentemente patrimonial.
Estrutura-se pelo conjunto de: uma conduta humana, positiva ou negativa; um dano; e um nexo entre essa conduta e esse nexo, prevalecendo a chamada “teoria subjetiva” (artigos 186 e 927, Código Civil) como regra geral.
Responsabilidade penal, por sua vez, requer exata “tipificação” de condutas, ou seja, é necessária, para sua configuração, uma prévia e exata previsão e adequação de um fato concreto a um tipo penal anteriormente previsto em lei.
Por tutelar principalmente o direito à liberdade, esta responsabilização – penal - exige requisitos mais rígidos para sua configuração. Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL. INQUÉRITO. DENÚNCIA. CORRUPÇÃO PASSIVA. NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO PARA O PROCESSAMENTO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. SUSPENSÃO. EXTENSÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO DA C MARA DOS DEPUTADOS AO AGRAVANTE. IMPOSSIBILIDADE. DESMEMBRAMENTO DOS AUTOS. POSSIBILIDADE. INSURGÊNCIA DESPROVIDA. (...) 3. Em observância ao princípio da responsabilidade subjetiva que vigora no ordenamento jurídico-penal pátrio, no que tange à acusação do delito de corrupção passiva, caberá ao Ministério Público Federal produzir os elementos de prova capazes de demonstrar, em relação a cada um dos acusados, a perfeita subsunção das condutas que lhes são atribuídas ao
tipo penal que tutela o bem jurídico supostamente violado, em especial o seu elemento subjetivo, composto pelo dolo de aceitar promessa e efetivamente receber vantagem indevida em razão da função pública exercida. Por tal razão, o desmembramento não importa em responsabilização indireta do denunciado em relação ao qual a tramitação da denúncia permanece suspensa neste Supremo Tribunal Federal, não sendo possível falar, ainda, em indissolubilidade das condutas denunciadas. 4. Agravo regimental desprovido. (Inq 4517 AgR; Órgão julgador: Tribunal Pleno; Relator Min. EDSON FACHIN; Julgamento: 23/03/2018; Publicação: 21/05/2018).
Basicamente, tanto no ordenamento jurídico pátrio, quanto no direito comparado, as linhas definidoras da responsabilidade se delineiam nesse sentido, com ressalvas para o sistema espanhol, que unificou, sobremaneira, as duas searas, basicamente, direcionando vítimas de lides multitudinárias para a esfera criminal, em um sistema que vem sendo cada vez mais questionado quanto à sua funcionalidade e eficácia.
Nota-se, pela breve exposição, peculiaridades relevantes quanto aos requisitos de caracterização da responsabilidade em cada esfera jurídica abordada: civil e penal. E, nesse contexto, é importante considerar as experiências do direito comparado a fim de refletir e ajustar os parâmetros de aplicabilidade e efetividade de cada uma delas no ordenamento jurídico brasileiro como meio de aprimorar o sistema e tutelar adequadamente os anseios sociais que esse instituto, tão importante, pode atender.
RESPONSABILIDADE CIVIL
RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL E DANO MATERIAL 03
Gisele Rui de Almeida
A responsabilidade civil é um instituto jurídico essencial no campo do direito civil. Visa estabelecer a obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de ações, omissões ou condutas ilícitas, intencional ou por negligência, de pessoas físicas ou jurídicas.
Desempenha um papel crucial na garantia de proteção aos direitos e interesses dos cidadãos e na busca pela justa compensação, buscando estabelecer as bases para a reparação de danos. Por meio desse instituto, busca-se a justa compensação das vítimas e a prevenção de condutas prejudiciais à sociedade.
É um dos pilares do Direito Civil brasileiro, sendo regida principalmente pelo Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406/2002. Em seus artigos 927 a 954, define os requisitos para a configuração da responsabilidade civil, os tipos de danos indenizáveis, os respon -
sáveis, a transmissão, a indenização, entre outros pontos.
Para que reste configurada a responsabilidade civil, são necessários três elementos: conduta ou o fato, o dano causado e o nexo de causalidade entre o fato e o evento danoso.
Da Reponsabilidade civil, podemos destacar dos tipos de danos:
DANO MORAL
O dano moral, também conhecido como dano extrapatrimonial, diz respeito a lesões de natureza não econômica que afetam a honra, a dignidade, a privacidade e outros aspectos da esfera pessoal. Geralmente, envolve a violação de direitos fundamentais que não têm um valor financeiro mensurável. Refere-se a lesões que causam dor, sofrimento, angústia emocional etc.
É importante mencionar que o dano moral pode ser causado por ações deliberadas ou negligentes, e
não está comprometido com perdas financeiras diretas.
A comprovação do dano moral é muitas vezes desafiadora, uma vez que não pode ser quantificado da mesma forma que o dano material. Os Tribunais geralmente consideram fatores como a intensidade do sofrimento, a gravidade da ofensa e o todo o contexto que levou ao dano.
A compensação pelo dano moral visa compensar a vítima e, ao mesmo tempo serve para desencorajar a parte infratora de repetir o ato prejudicial.
II – DANO MATERIAL
O dano material, diz respeito às perdas financeiras ou prejuízos econômicos tangíveis que uma pessoa sofre devido a ações ilícitas de outra. Esses danos podem ser facilmente quantificados. Refere-se a danos econômicos ou patrimoniais que podem ser quantificados em termos monetários.
A prova do dano material é mais objetiva, pois envolve demonstrar as perdas econômicas específicas suportadas pela vítima. Os tribunais podem basear-se em documentos, perícias, testemunhos e provas tangíveis. A indenização por dano material visa restituir a vítima pelo valor exato das perdas sofridas, incluindo despesas comprovadas e oportunidades perdidas.
A responsabilidade civil engloba tanto o dano moral quanto o dano material, regulando a necessidade de compensar vítimas por danos causados por ações ilícitas de terceiros. Embora esses tipos de danos sejam distintos em sua natureza e forma de comprovação, ambos desempenham um papel importante no sistema legal, garantindo que as vítimas sejam devidamente compensadas e que os infratores enfrentem as consequências de suas ações. A compreensão das diferenças entre dano moral e dano material
é essencial para aplicação eficaz da responsabilidade civil no contesto jurídico.
Esses conceitos fornecem uma base sólida para garantir que as vítimas de danos sejam devidamente compensadas e que aqueles que causam danos sejam responsabilizados por suas ações.
RESPONSABILIDADE CIVIL
BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO CIVIL
Victor Rolim Marques
O Código Civil de 2002 (CC-02) elegeu 05 (cinco) situações nas quais determinadas pessoas deverão ser responsabilizadas pelos danos provocados por ato de terceiro, conforme previstas em seu artigo 932. Apesar de não se tratar de uma obrigação para vítima, pois poderá ajuizar ação indenizatória contra o próprio agente causador do dano, acionar o responsável mencionado no referido dispositivo legal é uma permissão do CC-02 que se alinha com a ampliação da proteção dos bens jurídicos e reparação dos danos, pois permite que o ofendido possa optar por demandar contra quem, na maioria das vezes, possui um patrimônio maior do que o do agente. Neste sentido é a regra do parágrafo único do artigo 942 ao estabelecer a solidariedade dos responsáveis com os autores e coautores diretos da conduta danosa.
Não se trata de uma presunção de culpa dos responsáveis, e sim de responsabilidade objetiva, na qual não se analisará dolo, imprudência, negligência
ou imperícia das pessoas indicadas pelo legislador. O artigo 933 expressamente prevê que aqueles referidos no artigo 932, “ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos”.
Contudo, os elencados pelo legislador somente serão responsabilizadas se houver a comprovação de culpa dos agentes que diretamente causaram o dano (também elencados no artigo 932). Ou seja, não se trata de uma responsabilização sem culpa, e sim de uma sistemática de responsabilidade civil na qual “responsável” e “ofensor” não se concentram na mesma pessoa, devendo se comprovar a culpa do ofensor para que se exija a reparação pelo responsável. Tal conclusão é refletida na possibilidade de regresso do responsável contra o ofensor, para reaver aquilo que pagou, conforme dispõe o artigo 934, salvo se o causador do dano for descendente do responsável.
O inciso I do artigo 932 determina que os pais serão responsáveis pelos atos ilícitos de seus filhos me -
nores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia. Diante do requisito legal de “autoridade”, a norma afasta, em regra, a responsabilização dos pais em caso de emancipação dos filhos (conforme previsão do artigo 1.635, inciso II). Já quanto ao requisito “companhia”, a doutrina sugere uma interpretação mais flexível ao termo, tendo em vista a natureza objetiva da responsabilização, pois exigir a presença física dos pais resultaria, em última análise, na verificação da chamada culpa “ in vigilando” 1. Conforme a expressão “que se acharem nas mesmas condições” do inciso II, estas regras se aplicam aos tutores e curadores, que serão responsáveis pelos atos de seus tutelados e curatelados, respectivamente.
A terceira hipótese do artigo 932 consiste na responsabilização dos empregadores ou comitentes pelos ilícitos cometidos por seus “empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”, conforme inciso III. Trata-se de responsabilidade decorrente de poder hierárquico ou de direção, devendo haver a confirmação no caso concreto de que o agente praticou o ato lesivo no exercício do seu trabalho ou por ocasião dele, sendo possível a responsabilidade do empregador no caso de acidente causado pelo subordinado que, apesar de não estar em horário de trabalho, dirige o carro da empresa. 2
Também respondem objetivamente os “donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação” pelos danos e atos ilícitos causados por “seus hóspedes, moradores e educandos”, na dicção do inciso IV do artigo 932. Apesar de a norma facilitar ao lesado a busca de indenização junto a ins-
1 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 219.
2 Cf. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 23. ed. rev. e atual., Barueri: Atlas, 2023, p. 894.
tituições previstas neste dispositivo, é preciso haver uma interpretação restritiva conforme o caso concreto, sob pena de as referidas instituições responsáveis serem acionadas em decorrência de ato que, embora praticado pelo hóspede, morador ou educando, fora realizado a uma distância considerável do hotel e congêneres ou fora do horário de ensino ou funcionamento das instituições de educação. 3 Por fim, o inciso V do artigo 932 estabelece que “os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime” serão responsáveis pela reparação civil, mas “até a concorrente quantia”. Destaca-se que a norma não se direciona aos que participaram do delito, que serão responsabilizados por seu ato direto, e sim ao inocente de conduta típica que tenha recebido um objeto produto de crime, devendo devolvê-lo 4, pois o contrário caracterizaria enriquecimento ilícito.
3 Cf. SCHREIBER, Anderson [et al.]. Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2021, p. 185.
4 Cf. AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: teoria geral das obrigações e responsabilidade civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 365.
RESPONSABILIDADE CIVIL
LIQUIDAÇÃO DE DANOS: HOMICÍDIO E LESÃO CORPORAL
Milena Sabatini Lazzuri
O presente artigo tem como objetivo comentar sobre a liquidação de danos em casos de homicídio e lesão corporal.
Antes de adentramos ao tema, se faz necessária a diferenciação de responsabilidade civil objetiva e subjetiva.
A responsabilidade objetiva nas palavras de (FILHO E GAGLIANO1, 2020, p.934):
“segundo tal espécie de responsabilidade, o dolo ou na culpa na conduta do agente causador do dano é irrelevante juridicamente, haja vista que somente será necessária a existência de elo de causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável para que surja o dever de indenizar.”
1 FILHO E GAGLIANO - FILHO E GAGLIANO – Rodolfo Pamplona e Pablo Stolze – Manual de Direito Civil – Ed. Saraivajur – 4ª edição – 2020
Em contra partida, a responsabilidade subjetiva está prevista no art. 186 do Código Civil2: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Da leitura do dispositivo conseguimos verificar, que a responsabilidade subjetiva precisa de análise para concluir se o agente causador do dano tem culpa ou não.
Dito isto, temos que diferenciar responsabilidade civil, de responsabilidade penal, na primeira, o agente que causou o dano é obrigado a reparar o dano patrimonial ou moral causado, já na responsabilidade penal, o deve o agente sofrer uma sanção.
Nos casos de liquidação de danos por homicídio, o artigo 948 do Código Civil, traz duas hipótese de ressarcimento, sem a exclusão de outras reparações, no inciso I se dá com o pagamento das despesas com o tratamento da vítima, funeral ou do luto da fa -
2 BRASIL – Código Civil – Lei 10.406/2002
mília, e no inciso II, a prestação de alimentos ao dependentes do falecido levando-se em conta a expectativa de vida.
Já nos casos de indenização por lesão corporal, a previsão está nos artigos 949 e 950 do Código Civil, no primeiro, as indenizações serão relativas ao tratamento e lucros cessantes até o fim enfermidade, e outros prejuízos que o ofendido possa ter sofrido. No segundo, caso, o ofendido fique incapaz para o trabalho, ou tiver sua capacidade reduzida, além das despesas do artigo anterior, incluirá pensão correspondente ao trabalho que o inabilitou ou da depreciação que ele sofreu.
Diante disso, podemos concluir que nos casos de liquidação de danos por homicídio e lesão corporal, a responsabilidade do agente é objetiva, e pode sofrer as sanções tanto penal como cível sem non bis in idem.
RESPONSABILIDADE CIVIL
RESPONSABILIDADE CIVIL POR INFIDELIDADE
José Fernando de Mendonça Gomes
Neto
Como é cediço, a responsabilidade civil consiste na obrigação de reparar os prejuízos decorrentes de um ato ilícito (BRASIL, 2002, art. 1861 e art. 9272). Para que se configure o ato ilícito, é necessário a presença de dois requisitos: (i) violação ao direito; e (ii) cometimento de dano.
Muito se discute na jurisprudência a respeito da possibilidade de se obter indenização por dano moral em decorrência da infidelidade. Seria possível recorrer ao Poder Judiciário para ver reconhecido esse direito?
A resposta, como quase tudo no direito, é relativa. Embora a fidelidade recíproca seja um dos deveres do casamento (BRASIL, 2002, art. 1.566, inciso
1 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (BRASIL, 2002).
2Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.(BRASIL, 2002).
I3), a sua mera violação não constitui, por si só, ofensa à dignidade da pessoa humana, nem tampouco à honra da vítima, não gerando o dever de indenizar, sendo necessário para tanto a prova do ato lesivo à honra. Nesse sentido:
“RESPONSABILIDADE CIVIL – Indenização por danos morais – Infidelidade –Inexistência de dano moral indenizável – Ato que, de per si, não configura ato ilícito ou abuso de direito – Recurso desprovido”4 (g.n)
Tal entendimento é pacífico na jurisprudência, pois a frustração pelo fim de um relacionamento não pode ser convertida em obrigação de indenizar, especialmente considerando que não há como se impor ao companheiro o dever de amar, já que as relações
3 Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: I – Fidelidade recíproca (BRASIL, 2002).
4 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível: 1046853-91.2022.8.26.0224. Responsabilidade Civil. 5ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarulhos: 9ª Vara Cível. Relator (a): Moreira Viegas, 12 de maio de 2023. Disponível no sítio eletrônico do Tribunal.
amorosas não são contratos ad eternum, sujeitos a constante transformação.
A prática de infidelidade por parte de um dos companheiros, embora moralmente reprovável, é circunstância de cunho pessoal, não prevendo a lei qualquer sanção pela sua violação.
O direito à indenização por dano moral só nasce quando a infidelidade faz com que o outro passe por sofrimento excessivo, humilhação ou constrangimentos que vão além do mero desgosto e mágoa comuns e inerentes ao término de qualquer relacionamento.
A título exemplificativo, menciona-se recurso julgado pela 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, autuado sob o nº 1006948-33.2021.8.26.0477, em que o autor da ação descobriu que seu terceiro filho, registrado e criado como filho biológico, era, na realidade, filho de terceiro com quem a sua então esposa se relacionava há alguns anos.
No caso em tela, os desembargadores entenderam que:
“(...)além de certa e grande a afetação do psicológico da parte, configurando um dano moral subjetivo, há neste ponto, claro dano moral objetivo, a partir do momento em que, perante a sociedade, igualmente teve de ver a sua imagem afetada pelo registro e educação até então de filho que não sabia não ser seu”. 5
A conclusão, portanto, foi no sentido de que:
“não ocorreu apenas o sofrimento pela separação ou pelas traições sofridas, mas
5 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº 1006948-33.2021.8.26.0477. Responsabilidade Civil. Pretensão de ressarcimento em razão das consequências sofridas pela infidelidade da requerida. 2ª Câmara de Direito Privado; Foro de Praia Grande: 1ª Vara Cível. Relator: Álvaro Passos, 17 de abril de 2023. Disponível no sítio eletrônico do Tribunal.
sim devido ao gato de que foram anos de um relacionamento extraconjugal incontroverso que resultou no nascimento de um filho de terceiro, cuja origem biológica foi ocultada e resultou no registro em nome do autor, que igualmente adotou postura de pai em relação ao menor”.6
Conclui-se, portanto, que a jurisprudência brasileira entende que a quebra do dever de fidelidade, por si só, não caracteriza dano moral indenizável. Entretanto, haverá o direito à aludida indenização nos casos de infidelidade matrimonial em que se seja constatada a exposição da vítima a sofrimento e constrangimento que ultrapasse o mero desgosto inerente ao término do relacionamento.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Instituiu o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, [2002]. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm . Acesso em: 27 de setembro de 2023.
6 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº 1006948-33.2021.8.26.0477. Responsabilidade Civil. Pretensão de ressarcimento em razão das consequências sofridas pela infidelidade da requerida. 2ª Câmara de Direito Privado; Foro de Praia Grande: 1ª Vara Cível. Relator: Álvaro Passos, 17 de abril de 2023. Disponível no sítio eletrônico do Tribunal.
DIREITO DAS COISAS
0 1
POSSE
Mauricio Bunazar
A posse vem disciplinada entre os artigos 1.196 a 1.224 do Código Civil.
O Código Civil não define posse, mas define possuidor:
Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de qualquer dos poderes da propriedade. (art. 1.196)
Os poderes do proprietário são aqueles constantes do artigo 1.228 do Código Civil, quais sejam: usar, gozar (ou fruir), dispor e reaver a coisa de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
O Código Civil estabelece que possuidor é aquele que tem de fato qualquer dos poderes da propriedade, isto é, será possuidor ainda que não tenha o “direito” de estar com a coisa.
Por esta razão, de modo geral, pode-se dizer que todo aquele que estiver em contato com a coisa é,
em regra, possuidor. Só não será possuidor em 3 hipóteses:
1. Se for detentor (fâmulo/defensor) da posse - art. 1.198
Considera-se detentor quem, achando-se em relação de dependência para com outrem, conserva a posse em nome deste, seguindo ordens ou instruções suas.
O que caracteriza o detentor é ele estar em contato com a coisa atendendo ao interesse de outrem, que é o possuidor. Por exemplo: o chofer de carro alheio; motoboy em relação à coisa a ser entregue; caseiro
2. Se o contato com a coisa ocorreu por ato de (mera) permissão ou (mera) tolerância.
O adjetivo “mera” faz com que o contato com a coisa seja um completo irrelevante jurídico - art. 1.208 (parte 1)
Por exemplo: permito ou tolero que meu vizinho passe na minha propriedade para cortar caminho.
3. Se o contato com a coisa ocorreu por ato violento ou clandestino
Neste caso, somente nascerá posse após cessar a violência e a clandestinidade - art. 1.208 (parte 2), caso em que a posse oriunda desses atos se posse violenta ou clandestina, isto é, posse injusta.
Aquisição e perda da posse
A posse é um poder de fato sobre a coisa e, por isso, adquire-se a posse no momento em que se torna possível o exercício em nome próprio de qualquer dos poderes da propriedade; perde-se a posse quando esse exercício já não é mais possível.
Classificação da Posse
A posse pode ser classificada a partir de diversos critérios, sendo certo que os mais importantes são:
I. Quanto à justiça ou injustiça da posse:
A posse classifica-se em justa ou injusta. Injusta é a posse que for violenta, clandestina ou precária. Justa é a que não for violenta, clandestina ou precária.
II. Quanto à boa ou ma-fé do possuidor:
Trata-se, aqui, da boa-fé subjetiva.
A posse de boa-fé e a posse de má-fé são, ambas, posses injustas, no entanto, se o possuidor ignorar que possui mal (não conhece o vício ou obstáculo que impede a aquisição da coisa), será consideradopossuidor de boa-fé; se sabe possuir mal, será considerado possuidor de má-fé.
Efeitos da posse
Efeito indenizatório
O possuidor injusto perderá a posse, mas eventualmente terá direito à indenização. Esse direito variará conforme a posse seja de boa ou de má- fé.
O possuidor de boa-fé terá direito a:
• fazer seus os frutos colhidos
• ser indenizado pelas despesas de produção e custeio dos frutos pendentes
• terá direito a indenização pelas benfeitorias necessárias e úteis e poderá reter a coisa até receber a indenização
• quanto as benfeitorias voluptuárias, poderá levantá-las, desde que isso não acarrete dano ao principal.
Também não poderá levantá-las se o melhor possuidor quis elas para si, caso que pagará indenização.
Já o o possuidor de má-fé terá direito apenas a ser indenizado pelas despesas de produção e custeio dos frutos e pelas benfeitorias necessárias.
O princípio que orienta as regras de indenização por benfeitorias é o princípio de proibição do enriquecimento sem causa.
Efeito defensivo
Toda posse pode ser defendida nos termos do artigo 1.210 do Código Civil e da legislação processual. Por isso diz-se que toda posse é ad interdicta, isto é, dá direito aos interditos possessórios.
Efeito aquisitivo
Trata-se da usucapião.
Como já visto, toda posse pode ser defendida, mas nem toda posse dá direito ao usucapião. Para que
haja usucapião, a posse deve serqualificada. Isto é, a posse deve:
• ser exercida sobre coisa hábil (res habilis). A coisa deve ser passível de aquisição por usucapião. Eventualmente, para proteger determinadas pessoas, a lei impede a usucapião. Por exemplo, não pode haver usucapião de bens públicos, e nem dos bens dos absolutamente incapazes.
• ser sem oposição de quem poderia se opor (“mansa e pacífica”). A usucapião pressupõe negligência do titular do direito. Por isso que, se ele, titular do direito, queda-se inerte, perde seu direito.
• ser contínua. Durante todo o período necessário para a usucapião, o possuidor não pode perder o poder sobre a coisa.
• ser duradoura. A usucapião nunca é instantânea, ela exige tempo para a configuração. O tempo é previsto em lei e varia conforme a a modalidade de usucapião.
• ser ao modo de dono, isto é, o possuidor deve possuir a coisa como se sua fosse (animus domini ). O possuidor deve se comportar como dono.
Não se trata de mera intenção de ser dono, mas de efetivo comportamento.
DIREITO DAS COISAS
PROPRIEDADE: AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL
(USUCAPIÃO, REGISTRO E ACESSÕES)
Elisa Néri Ribeiro de Carvalho Romero Rodrigues
O CC/02 não tem artigo expresso enumerando os modos de aquisição da propriedade (como tinha o CC/16), mas os principais são: registro, acessão, usucapião e herança.
A propriedade de direitos reais ocorre pelo Registro Público de Imóveis, para tanto deve-se consultar a lei 6.015/73 (lei dos registros públicos). Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante permanece como dono do imóvel. Os princípios fundamentais dos registros de imóveis são: publicidade, presunção de fé pública, legalidade, territorialidade, continuidade, especialidade, prioridade, instância. Para a acessão, o CC/02 previu 5 modos, mas uma merece destaque: construções e plantações. Acessões são construções ou plantações autônomas, que aderem ao solo. Em regra, o solo é o principal em relação às acessões. Pela norma do “acessório segue o principal”, o proprietário do solo torna-se
proprietário do que é nele construído ou plantado. Mas, há situações que devem ser ressaltadas:
1. Quando a pessoa é dona do terreno, mas não é dona do material usado na construção da casa, o proprietário do solo torna-se dono da casa. Mas o dono dos materiais deve ser indenizado e, se os materiais foram utilizados de má-fé, também faz jus a perdas e danos.
2. Caso alguém construa ou plante com seu próprio material em terreno alheio, a construção ou plantação pertencerá ao dono do solo. Se a pessoa o fez de boa-fé, deverá ser indenizada; se construiu de má-fé, não terá direito à indenização.
3. Se a construção ou plantação exceder de forma considerável o valor do terreno, aquele que o fez de boa-fé adquirirá a propriedade do terreno, devendo indenizar o proprietário anterior.
Quanto à usucapião, temos que também é modo de aquisição de direitos reais, decorrente da posse pro -
longada no tempo, com fundamento na função social da propriedade. A ação reivindicatória é imprescritível, mas é ação inerente à propriedade; quando a pessoa perde a propriedade, também perde o direito à ação reivindicatória. Quando ocorre a usucapião, o possuidor adquiriu a propriedade, logo, o antigo proprietário não poderá mover tal ação. Porém, a usucapião poderá ser alegada em matéria de defesa.
Em regra, todos os bens são usucapíveis, salvo os bens fora do comércio e os bens públicos. Tem legitimidade para usucapir o possuidor ou os herdeiros, em caso de morte do antecessor; além disso, também pode o sucessor inter vivos (acessio possessionis é a soma do período de posse do antecessor com a do sucessor). O tempo na posse corre em favor do possuidor, e o prazo pode ser suspenso ou interrompido. A declaração judicial de aquisição da propriedade por usucapião é título hábil para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Como requisitos da usucapião, temos como gerais: posse ad usucapionem (animus domini), posse contínua, ininterrupta, pacífica e pública. Já os requisitos específicos variam a cada espécie de usucapião:
1. Extraordinária: após o prazo de 15 anos. Pode ser reduzido para 10 anos se houver moradia habitual ou obras de caráter produtivo.
2. Ordinária: com prazo de 10 anos se houver justo título e boa-fé. O prazo pode ser reduzido para 5 anos, se for usucapião tabular (quando o título for registrado e houver moradia habitual ou investimento de interesse social e econômico).
3. Especial urbana: para imóvel urbano de até 250 m², com prazo de 5 anos, estabelecida a moradia e não ter outro imóvel.
4. Especial rural: imóvel rural de até 50 hectares, prazo de 5 anos, estabelecido moradia, não ter
outro imóvel, e ter tornado a área produtiva com seu trabalho.
5. Especial urbana coletiva: área urbana com núcleo informal, cada ocupante com até 250 m², com prazo de 5 anos, não ter outro imóvel. Após, haverá a formação de condomínio.
6. Especial urbana familiar (entre ex-cônjuges ou ex-companheiros e um deles tenha abandonado o lar, cuja propriedade seja de ambos): imóvel urbano de até 250 m², prazo de 2 anos, não ter outro imóvel.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registro públicos, e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm>. Acesso em: 29 set. 2023.
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <https://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 29 set. 2023.
DIREITO DAS COISAS
AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL: BREVE ANÁLISE
DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO CIVIL
Victor Rolim Marques
A propriedade móvel pode ser adquirida de duas formas: originária, quando o proprietário não recebe a coisa móvel de outrem, advindo a propriedade de um fato jurídico em sentido estrito, ou derivada, quando decorre de um negócio jurídico1. O Código Civil de 2002 (CC-02) elencou nos artigos 1.260 a 1.274 as seguintes formas de aquisição: usucapião, ocupação, achado de tesouro, tradição, especificação, confusão, comissão e adjunção.
A usucapião de propriedade móvel ocorrerá quando o possuidor exercer a posse, como se fosse dono da coisa, de forma contínua e inconteste por 3 (três) anos, desde que haja um justo título e o possuidor esteja de boa-fé, conforme dispõe o artigo 1.260. Trata-se da usucapião ordinária, na qual se exige que o possuidor tenha um documento, ou possa comprovar autorização, que informe a razão pela qual recebeu de outrem a coisa (justo título), bem 1 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direitos reais. 17. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 222.
como que a posse não seja violenta, precária ou clandestina (boa-fé)2. Já a usucapião extraordinária dispensa a existência do justo título e da boa-fé, mas exige que a posse se prolongue por 5 (cinco) anos, nos termos do artigo 1.261. Ao possuidor ainda se aplicam as regras de acessão da posse (artigo 1.243) e as referentes às causas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição (artigo 1.244), em virtude do disposto no artigo 1.262.
Já a ocupação ocorre quando alguém se assenhora de coisa sem dono (“res nullius”) ou coisas abandonadas (“res derelictae”), adquirindo, desde já, a propriedade, conforme determina o artigo 1.263. A aplicação da regra se volta a animais, objetos, coisas cujo antigo dono renunciou ao seu direito de propriedade, bem como àquelas que nunca tiveram um titular. Como as situações autorizadoras da ocupação envolvem um comportamento de renúncia do antigo dono ou que a coisa não tenha até o momento per-
2 Cf. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: reais. 23. ed. rev. e atual., Barueri: Atlas, 2023, p. 416-417.
tencido a outrem, o dispositivo legal apresenta a única ressalva de a ocupação ser defesa por lei.
Semelhante solução é dada pelo CC-02 àquele que encontrar “depósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória” (artigo 1.264), mas o dispositivo determina a divisão da propriedade por igual entre quem achar o tesouro e o proprietário do prédio, ou ao enfiteuta, caso o tesouro se ache em terreno aforado (artigo 1.266). A exceção a esta sistemática ocorre quando apenas o proprietário do prédio no qual o tesouro foi achado ficará com a respectiva propriedade, que se dará nos seguintes casos, nos termos do artigo 1.265: se fora achado ele, ou em pesquisa que ordenou, ou quando o tesouro for achado por pessoa não autorizada.
A tradição consiste em um modo derivado de aquisição de propriedade móvel que, em função de título translativo decorrente de negócio jurídico, consiste na entrega do bem móvel pelo transmitente ao adquirente 3. Nestes casos, a transferência da propriedade somente ocorre com a tradição (artigo 1.267), que pode ser real (quando ocorre a efetiva entrega do bem), simbólica (quando se representa a transferência, entregando-se objeto que simboliza o bem transferido), ou ficta (quando a transferência da propriedade resulta de um negócio jurídico, mas não há qualquer alteração no plano fático), podendo esta última se dar por meio de constituto possessório (quando o proprietário possuía o bem em nome próprio e, por força de negócio jurídico, passa a possuir em nome alheio – exemplo: proprietário de veículo que aliena o bem, mas se mantém na posse direta, em função de locação celebrada no mesmo ato) ou por “traditio brevi manu ” (quando o possuidor do bem, em nome de terceiro, passa a ser o proprietário
3 FIGUEIREDO, Luciano; FIGUEIREDO, Roberto. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: JusPodivm, 2023, p. 1074.
e possuí-lo em nome próprio – exemplo: locatário do veículo que compra o bem).
Notadamente, a tradição deve ser feita por quem é o proprietário do bem móvel, sob pena de não ser transmitida a propriedade, mas o artigo 1.268 resguarda o direito do adquirente de boa-fé, seja quando a coisa for oferecida ao público, em leilão ou estabelecimento comercial, e transferida em circunstâncias nas quais o alienante se afigurar como dono (caput), ou quando o alienante, não sendo o proprietário do bem, adquire a propriedade deste posteriormente, sendo considerada ocorrida a transferência no momento em que o adquirente de boa-fé recebe a coisa (§ 1º). No entanto, determina categoricamente que a tradição não transfere a propriedade se o negócio jurídico for nulo (§ 3º).
Por sua vez, a especificação consiste na aquisição da propriedade móvel daquele que se utiliza de matéria-prima parcial ou totalmente alheia para obter uma espécie nova. Se a matéria-prima utilizada era em parte do especificador e a espécie nova não puder se restituir á forma anterior, então esta será de propriedade do especificador, conforme dispõe o artigo 1.269. Já no caso de a matéria-prima ser totalmente de outrem, deste será a propriedade da espécie nova se a redução ao “status quo ante” for possível, ou se a obtenção da espécie nova se deu por má-fé (artigo 1.270, § 1º); mas, a espécie nova pertencerá ao especificador se ele tiver agido de boa-fé, e não for possível a redução (art. 1.270, caput), bem como nos casos em que o valor de sua mão de obra superar consideravelmente o valor da matéria-prima, ainda que o especificador tenha agido de má-fé 4. O artigo 1.271 prevê o ressarcimento aos prejudicados, com exceção do especificador de má-fé (que sabia ser a matéria-prima de outrem e/ou conhecia
4 Cf. VENOSA, Op. Cit., p. 500.
algum obstáculo que impedisse a sua aquisição e ainda assim a utiliza).
Finalmente, o CC-02 disciplinou as hipóteses em que bens móveis se misturam, abrangendo os casos de confusão (mistura de coisas líquidas), comissão (ou comistão, que consiste na mistura de coisas sólidas) e adjunção (quando ocorre uma justaposição entre coisas sólidas em que a separação acarretará a destruição do bem formado). Nestes casos, os bens móveis envolvidos continuam a pertencer a seus respectivos proprietários (artigo 1.272, caput), salvo se não for possível a sua separação ou se esta exigir um dispêndio excessivo, ocasião na qual o todo passa a ser considerado indivisível, gerando um condomínio forçado entre os proprietários 5, no qual cada um terá um “quinhão proporcional ao valor da coisa com que entrou para a mistura ou agregado” (§ 1º). Se do agregado, resultar uma relação de bem principal e bem acessório, este último também pertencerá ao dono daquele, que deverá indenizar os demais proprietários (§ 2º).
Se a agregação se formou por má-fé, o artigo 1.273 faculta à outra parte a escolha entre adquirir a propriedade do todo, através do pagamento por aquilo que não for seu e com abatimento da indenização que lhe for devida, ou renunciar aquilo que lhe pertence, devendo receber a respectiva indenização.
Destaque-se que nesses casos de agregação, há apenas uma mistura, e não a formação de uma nova coisa, hipótese em que se estará diante de especificação, conforme previsão expressa do artigo 1.274.
5 Cf. SCHREIBER, Anderson [et al.]. Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2021, p. 265.
DIREITO DAS COISAS
PROPRIEDADE: AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL:
USUCAPIÃO, REGISTROS E ACESSÕES
Milena Sabatini Lazzuri
O presente artigo tem como objetivo explicar a forma de aquisição da propriedade por intermédio da usucapião, bem como, como proceder com os registros e suas acessões.
A usucapião é um modo originário de aquisição da propriedade, durante um período previsto em lei, e a posse seja mansa e pacifica e com animus de domini.
Existem algumas espécies de usucapião prevista no Código Civil, temos a usucapião extraordinária (1.238 do Código Civil), que prevê quinze anos de posse, sem interrupção e sem oposição e sendo o único bem imóvel do possuidor, independente de título ou boa-fé. O prazo pode ser reduzido para dez anos se o possuidor estabelecer no imóvel sua moradia habitual.
Já a usucapião ordinária, prevista no art. 1.242 do Código Civil, a propriedade é adquirida por aquele que tem a posse mansa e pacifica por dez anos,
com justo título e boa-fé. Pode também ser reduzido para cinco anos, se o imóvel tiver sido adquirido de forma onerosa, com registro no respectivo cartório.
Além das usucapiões previstas no Código Civil, temos as usucapiões constitucionais, a prevista nos artigos 191 e 183 da Constituição;
Temos também as usucapiões coletiva urbana (art. 10 do estatuto das cidades) e coletiva rural (art. 1.228, §§4° e 5° do CC), usucapião familiar (art. 1.240 – A do CC), usucapião indígena (Lei 6.001/73) e a usucapião administrativa (art. 1.071 do CPC).
Todas elas são modelos de aquisição originária da propriedade, desde que sejam preenchidos os requisitos legais.
Outra forma de aquisição da propriedade é por meio do registro do título, tem previsão na Lei de registro públicos, e nada mais é do que, de acordo com (FILHO E GAGLIANO1, 2020 p. 1.111):
1 FILHO E GAGLIANO - FILHO E GAGLIANO – Rodolfo Pamplona e Pablo Stolze – Manual de Direito Civil – Ed. Saraivajur – 4ª edição – 2020
“A matrícula, em linguagem figurada, é ´o número de batismo` do imóvel, em outras palavras, a matrícula é efetuada por ocasião do primeiro registro ser lançado na vigência da Lei de Registros Públicos. (...) a cada nova alienação, por sua vez, haverá um novo número de registro, mantendo-se a matrícula. Por fim averbação é qualquer anotação feita à margem de um registro para indicar as alterações ocorridas no imóvel.”
É o famoso ditado, quem não registra não é dono!
Já a acessão, nas palavras de MELO (2019, p. 888):
“À luz do direito positivo, a acessão pode ser definida como um modo de aquisição originária do direito de propriedade que se verifica com a junção de um bem imóvel a outro bem imóvel ou de bens moveis a imóveis, conduzindo a que a coisa principal atraia a assessoria, formando um novo bem ou modificando-o.”2
Verifica-se que a aquisição da propriedade por acessão, se dá pela junção de bens formando um novo bem ou modificando o já existente.
Existem vários tipos de acessões, a natural, por formação de ilhas, a por aluvião, avulsão, a álveo abandonado. E, acessão artificial, construções e plantações.
A acessão por construções e plantações é uma forma de aquisição da propriedade, que nas palavras dos autores já citados (FILHO E GAGLIANO,2020, p.1.119 ): “toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.”
Nota-se que há diferença entre as modalidades de aquisição da propriedade, enquanto na usucapião é necessário caracterizar a posse, mansa, pacifica e
2 MELO – MARCO AURÉLIO BEZERRA DE - Código Civil Comentado – Ed. Forense - 2019.
com ânimo de dono, nos registros, é necessário que se averbe na matrícula do imóvel, todos os registros de alterações feita no mesmo. Já a acessão se já pela junção dos bens.
DIREITO DAS COISAS
DIREITO DE VIZINHANÇA: USO ANORMAL DA PROPRIEDADE, PASSAGEM FORÇADA, ÁRVORES LIMÍTROFES
Thiago Gomes de Araujo Silva
O direito de vizinhança cuida das limitações impostas à propriedade nas relações entre vizinhos cujo comportamento de um implica, devido à proximidade espacial, interferências indevidas ou sacrifícios ao outro. O Código Civil disciplina o tema entre os arts. 1.277 e 1.313. De modo geral, busca-se escudar o interesse social de uma convivência pacífica e harmoniosa com a imposição de limites no direito de propriedade, por forma a, por exemplo, (i) fazer cessar as ingerências indevidas pelo uso anormal da propriedade; (ii) viabilizar a criação de passagem em terreno alheio para obter acesso à via pública; e (iii) delimitar a propriedade e a possibilidade de corte das árvores limítrofes. F. C. de San Tiago Dantas1 destrinchou a relação de vizinhos:
“Ora, a repercussão que pode ter dentro de um prédio o ato que um estranho pratica, dentro do seu, constitui inequivoca-
1 Conflito de Vizinhança e sua Composição, 2ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 19.
mente aquela “ingerência alheia” que o direito de propriedade autoriza a repelir. Tal seja a natureza da repercussão, a ingerência constituíra uma restrição das vantagens que o prédio oferece a seu dono ou uma admissão do estranho a essas vantagens”
O (i) instituto do uso anormal da propriedade é caracterizado pela intromissão derivada do uso anormal e não permitido com repercussão no imóvel alheio. Pela redação do art. 1.277, do CC, o uso anormal da propriedade poderá ser inibido ou reduzido, salvo em caso de interesse público – em que pode não haver cessação, mas pode haver “indenização”. Como norte para saber se há uso anormal e não permitido ou uso normal, recorre-se aos costumes; a legislação do município ou do estado que regula o uso regular de eventual ingerência na propriedade alheia com mira no tipo de local; existência de alvará de funcionamento; atividade do local; limites de decibéis etc. O direito romano já enunciava limites concernentes aos direitos de vizinhança:
Ulpiano, livro 17 ao edito D, 8, 5, 8, 5. 5. Aristão respondeu a Cerélio Vital que não pensava poder-se, por direito, lançar sobre os edifícios superiores o fumo proveniente de uma fábrica de queijos, salvo se esses edifícios estiverem sujeitos a uma servidão dessa natureza. Diz também ele que não é permitido lançar dos edifícios superiores sobre os inferiores água ou qualquer outra coisa. Pois cada um pode fazer o que quiser no que é seu, contanto que não lance coisa alguma sobre o alheio. Ora, lançar fumo é o mesmo que lançar água. Pode, portanto, o dono do prédio superior acionar o do inferior alegando não ter este o direito de fazer semelhante coisa. (...)2
Do fragmento, relevante um versículo que sintetiza o instituto e o espírito do texto: “pois cada um pode fazer o que quiser no que é seu, contanto que não lance coisa alguma sobre o alheio”. Nesse pendor, o art. 1.277, do CC, encadeia uma avaliação para saber se as imissões ou interferências promovidas estão em desacordo com a normalidade – o uso anormal perturbador é aferido pelos critérios já mencionados –, se aferidas, como exemplo por prova pericial, e, caso esteja em desacordo, se seguirá a obrigação de findar a conduta anormal. Cita-se o exemplo hipotético de um comércio em zona residencial que promove imissões sonoras no imóvel vizinho que ultrapassam o limite tolerado de decibéis; com base no caput do art. 1.277, o comércio terá de tornar ao uso normal e eventualmente compensar os danos morais ocasionados. Depreende-se a limitação propter rem do direito de propriedade inserida nas relações de vizinhos por força do instituto do uso anormal da propriedade.
O (ii) instituto da passagem forçada (art. 1.285 do CC), também designado como servidão legal, incide no caso de o proprietário de imóvel encravado, isto é, que não tem acesso à via pública, nascente ou porto, compelir o vizinho a lhe dar passagem, mediante pagamento de indenização. Tem como fundamento a atribuição de funcionalidade ao imóvel encravado; veja que sem acesso à via pública etc, o imóvel perderá utilidade. Ressalta-se que o instituto não cuida de comodidades e serve como preceito mínimo de convivência, de modo que (i) o imóvel que suportará a passagem é o que melhor a dispõe com facilidade; (ii) se surgir outra passagem, essa será desfeita; (iii) e se o encravamento derivar de alienação de parte do imóvel, o ônus é do comprador. O instituto é dessemelhante da servidão predial porque a servidão predial decorre de manifestação de vontade e a passagem forçada é uma imposição legal.
O (iii) instituto das árvores limítrofes (arts. 1.282 até 1.284 do CC) se subsome ao caso de existência de árvore nas extremas de dois imóveis. O regramento segue na seguinte lógica: (i) a árvore na linha divisória presume-se em copropriedade; (ii) o proprietário do terreno invadido por raiz e ramo de árvore pertencente ao terreno alheio e de propriedade alheia, poderá cortar a raiz e o ramo de árvore até o limite divisório de seu terreno; (iii) os frutos seguem a propriedade do solo de onde caiu sem a atuação direta e imediata da pessoa.
2 M. Cunha Lopes E Vasconcellos et al., Digesto ou Pandectas do Imperador Justiniano, vol. II, 1ª ed., São Paulo, YK, 2017, p. 157
DIREITO DAS COISAS
EXCLUSÃO DO CONDÔMINO ANTISSOCIAL 06
Matheus Colacino
A vida condominial não é de simples trato. Não raro, surgem inúmeros conflitos advindos da convivência cotidiana dos vizinhos. É por isso que os romanos já diziam, em expressão clássica, “condominium mater rixarum est”, isto é, o condomínio é a mãe das rixas. Por outro lado, há a sobejamente conhecida máxima de que “nosso direito vai até onde começa o de nosso semelhante”. O condômino antissocial, contudo, é aquele que, reiterada e injustificadamente, viola os deveres de convivência e de boa vizinhança. Caio Mário da Silva Pereira, ao se referir a essa figura, menciona a “nocividade elevada e habitual do mau comportamento”.1 Luiz Edson Fachin, por sua vez, diz que a conduta antissocial ocorre quando “a estabili -
dade das relações entre condôminos é gravemente ameaçada, inviabilizando a convivência social”. 2 Evidentemente, o proprietário ou possuidor de um imóvel tem direito a fazer cessar essas interferências prejudiciais oriundas da propriedade vizinha. É o que enuncia o artigo 1.277 do Código Civil, que menciona interferências à segurança, ao sossego e à saúde dos habitantes daquela edificação. Nesse sentido, a doutrina define que: (i) violação à segurança diz respeito à conduta ou omissão que gere um dano efetivo ou hipótese de perigo ao imóvel vizinho (como, exemplificativamente, o acúmulo de viciados em entorpecentes no imóvel vizinho); (ii) violação ao sossego refere-se a interferências que causem impressões sensitivas exacerbadas nos vizinhos (como o som, a luz, o cheiro, as sensações térmicas e as imagens); e (iii) violação à saúde representa uma interfe -
1 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. Atualizadores: Melhim Namem Chalhub e André Abelha. – 15. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2022, p. 170.
2 FACHIN, Luiz Edson. Comentários ao Código Civil. Volume XV. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 261.
rência prejudicial à higidez dos vizinhos, não só física, como mental. 3
O que consubstancia esse “fazer cessar” é que se revela a grande questão nos casos concretos. O que fazer com o condômino que reiteradamente descumpre esses deveres da boa convivência condominial? Por óbvio, o comportamento antissocial enseja sanção rigorosa e eficiente.
Nesse sentido, o Código Civil estabeleceu a multa prevista em seu artigo 1.337, o qual dispõe que, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, o condômino antissocial pode ser constrangido a pagar multa “correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem”. O parágrafo único do indigitado dispositivo cita, ainda, a possibilidade de majoração da multa “ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais”, até ulterior decisão assemblear. O artigo 21 da Lei n.º 4.591/64 menciona também a aplicação de multa prevista na Convenção ou no Regimento Interno, “sem prejuízo da responsabilidade civil ou criminal que, no caso, couber”.
Pode ser, entretanto, que tal sanção monetária não se revele suficiente in casu. O condômino antissocial muito abastado financeiramente poderá não se sentir intimidado em razão dessa punição pecuniária. O que fazer nessa hipótese? É possível a exclusão do condômino antissocial?
A doutrina se divide em duas posições absolutamente respeitáveis. De um lado, há quem afirme
3 LOUREIRO, Francisco Eduardo. Comentários aos artigos 1.277 e 1.337 do Código Civil. In: Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Coord. Cezar Peluso. - 15. ed. rev. e atual. – Santana de Parnaíba/ SP: Manole, 2021, p. 1.209.
que, diante da ausência de previsão legal expressa da exclusão, não se pode tolerar tamanha restrição ao direito de propriedade. Para essa corrente de entendimento, a exclusão significaria uma espécie de desapropriação ou mesmo suspensão do direito constitucional de propriedade. Se o legislador previu apenas o instrumento da majoração da multa como sanção para tais hipóteses, foi porque assim reputou conveniente e adequado para inibir o comportamento antissocial. Assim, a exclusão seria tão somente medida de lege ferenda. 4
Em outro extremo, relembra-se acertadamente que o direito de propriedade não é mais absoluto, exclusivo e perpétuo. Se a propriedade é relação jurídica complexa e funcionalizada, com a inserção da função social em seu núcleo, a exclusão do condômino antissocial é possível, desde que se dê apenas em situações extremas e com a observância de prévio contraditório. Tal corrente enxerga a discussão sob uma perspectiva civil-constitucional, até para que seja conferida efetividade às decisões judiciais. Importante ressaltar, por fim, que a exclusão apenas seria cogitada quando aplicadas previamente as sanções pecuniárias, mas sem sucesso em reprimir a conduta antissocial. 5
A segunda corrente, isto é, a que admite a exclusão do condômino antissocial é a que tem prevalecido no âmbito pátrio. Tanto assim, que foi editado o Enunciado n.º 508 da V Jornada de Direito Civil, de autoria de Marco Aurélio Bezerra de Melo, prevendo
4 SIMÃO, José Fernando; KAIRALLA, Marcello Uriel. Impossibilidade de exclusão do condômino antissocial. In: Revista Jurídica Luso-Brasileira, Ano 5 (2019), n.º 3.
5 MORSELLO, Marco Fábio. O condômino antissocial sob a perspectiva civil-constitucional. In: Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 109, jan./dez. de 2014.
a possibilidade de exclusão do condômino antissocial.6
A bem da verdade, como corretamente pontua Sílvio Venosa, o Código Civil optou por adotar uma posição “cômoda e simplista” 7, sendo lamentável a falta de intrepidez da lei nesse aspecto. A vida cotidiana demonstra hipóteses extremas que não serão resolvidas com simples aplicação de multa pecuniária. Espera-se que a Comissão de Juristas que, neste momento, elabora reforma ao Código Civil se debruce sobre o tema, a fim de estancar definitivamente qualquer dúvida sobre a questão.
6 “Enunciado n.º 508: Verificando-se que a sanção pecuniária se mostrou ineficaz, a garantia fundamental da função social da propriedade (Arts. 5º, XXIII, da CF/88 e 1.228, §1º do CC/02) e a vedação ao abuso do direito (Arts. 187, e 1.228, §2º, ambos do CC/02) justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior assembleia prevista na parte final do parágrafo único do artigo 1.337 do CC delibere a propositura de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal”. Disponível em: https://www.cjf.jus. br/enunciados/enunciado/577 (consulta realizada em 30/03/2024).
7 VENOSA, Sílvio de Salvo. Condomínio em edifício: teoria e prática. Indaiatuba/SP, Editora Foco, 2022, p. 66.
DIREITO DAS COISAS
07
PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA NO CÓDIGO CIVIL E NA
LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE: NOÇÕES GERAIS 1
Rommel Andriotti
A alienação fiduciária é um dos institutos de garantia mais importantes do Brasil atualmente. É tema indispensável do Direito Privado Brasileiro e interessa não só a advogados e outras carreiras jurídicas, mas também a empresários, investidores, ao mercado imobiliário e aos cidadãos em geral em seus negócios.1
A expressão alienação fiduciária é composta de duas palavras de raiz latina, alienare, que significa “tornar alheio, tornar do outro”2, e fiducia, que significa confiança, fidelidade, fidúcia. Assim sendo, alienação fiduciária3 significa “transferir algo com base na confiança”.
1 Verbete escrito como contribuição à cartilha voltada para a atuação prática lançada pela Comissão de Direito Civil da OAB/ SP em 2023.
2 CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro/RJ (Brasil): Lexikon, 2012, p. 26. Versão Eletrônica (Kindle).
3 CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro/RJ (Brasil): Lexikon, 2012, p. 291. Versão Eletrônica (Kindle).
No Direito contemporâneo, é possível conceituar alienação fiduciária como a transmissão da propriedade resolúvel e temporária de um bem do devedor fiduciante para o credor fiduciário com a finalidade de garantir uma dívida, reservando-se o devedor na posse direta do bem e remanescendo como depositário da coisa enquanto o contrato é cumprido. A propriedade se diz “resolúvel” porque ela se “resolve” se o devedor fiduciante quitar a avença. Em outras palavras, se o devedor fiduciário cumprir o contrato, a propriedade daquele bem retorna para ele. Por isso a alienação fiduciária é “em garantia”: caso o contrato não seja cumprido, o credor fiduciário poderá utilizar esse bem que já é de sua propriedade para quitar o contrato em seu favor.
A alienação fiduciária gera a propriedade fiduciária, que é um direito real de garantia sobre coisa própria4. São duas expressões próximas, mas que não 4 GRAMSTRUP, Erik Frederico. Alienação fiduciária em garantia. Verbete. In: Enciclopédia Jurídica da PUCSP: Tomo Direito Civil. 1. ed. São Paulo/SP (Brasil): Portal da PUCSP, dez. 2021. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/471/ edicao-1/alienacao-fiduciaria-em-garantia - Acesso em 05 out.
se confundem. Uma é causa, a outra é efeito. E cada uma é regulada em dispositivos normativos diferentes.
Por sinal, o fato de a alienação gerar direito real de garantia sobre coisa própria é o principal traço distintivo que diferencia esse instituto de outros direitos de garantia, como a hipoteca, o penhor, a anticrese etc. Esses são direitos reais sobre coisa alheia. A alienação fiduciária é direito real de garantia sobre coisa própria. Por isso ela é tão mais poderosa que outras modalidades. Uma consequência gerada por essa faceta, por exemplo, é o crédito do credor fiduciário ser considerado extraconcursal em falências, recuperações judiciais e insolvências. Ele é pago com preferência até mesmo sobre os créditos mais privilegiados do sistema, como o trabalhista e o fiscal (cfr. arts. 83 e 84, da LFR – a Lei n. 11.101/2005).
E, por falar em dispositivos normativos, é importante tê-los mapeados. Como este artigo não tem a pretensão de exaurir o tema, mas apenas apresentá-lo, que sirva também para indicar onde estão os dispositivos a serem consultados por aqueles que desejam utilizar esse instituto. A propriedade fiduciária é tratada entre os artigos 1361 a 1368-B, do Código Civil de 2002. A alienação fiduciária em garantia de bens imóveis é tema de legislação específica, a Lei n. 9.514/1997. A alienação fiduciária em garantia no âmbito do mercado de capital está regulamentada no artigo 66-B da Lei n. 4.728/65 . E o Decreto-Lei 911, de 1969 regulamenta os aspectos procedimentais da alienação fiduciária de bens móveis, especialmente no que se refere à execução extrajudicial.
Como existem regras específicas para certos tipos de alienação fiduciária em garantia, a doutrina moderna5 classifica as alienações da seguinte forma:
• Alienação fiduciária de bem móvel
2023.
5 Ibidem.
• Alienação fiduciária de bem imóvel
• Dentro do sistema financeiro imobiliário
• Fora do sistema financeiro imobiliário
A título de conclusão desta breve exposição, pode-se reiterar que conhecer o instituto da alienação fiduciária em garantia é fundamental não apenas para os advogados e outros profissionais das carreiras jurídicas, mas também para os empresários, investidores, comerciantes e cidadãos em geral. Por suas características únicas, esse instituto tem tornado letra morta todas as outras garantias, como a hipoteca e o penhor, cada vez menos utilizadas, e se tornado o principal instrumento de garantia atualmente no Brasil.
DIREITO
DAS COISAS
DIREITOS REAIS SOBRE COISA ALHEIA 08
Mauricio Bunazar
Noção
Tradicionalmente a doutrina classifica os direitos reais em direitos reais sobre coisa própria e direitos reais sobre coisa alheia. O direito real sobre coisa própria é a propriedade, sendo todos os demais direitos reais sobre coisa alheia.
Com a positivação do direito real de laje (arts. 1.510-A a 1.510-E, do Código Civil) surgiu corrente que atribui à laje a natureza jurídica de direito real sobre coisa própria, mas a maioria da doutrina ainda a enquadra como direito real sobre coisa alheia.
Os direitos reais sobre coisa alheia se subdividem em três grupos:
I. Direitos reais de gozo ou fruição
São direitos que implicam a posse direta e que, por isso, têm por fonte constitutiva, além do negócio jurídico e da lei, a usucapião. São direitos reais de gozo ou fruição:
a) Superfície: artigos 1.369 a 1.377 do Código Civil e artigos 21 a 24 da lei 10.257/2001;
b) Servidões: artigos 1.378 a 1.389 do Código Civil;
c) Usufruto: artigos 1.390 a 1.411 do Código Civil;
d) Uso: artigos 1.412 e 1.413 do Código Civil;
c) Habitação: artigos 1.414 a 1.416 do Código Civil;
d) Concessão de uso especial para fins de moradia: leis: 11.481/2007 e 10.257/2001;
e) Concessão de direito real de uso: leis: 11.481/2007 e 10.257/2001;
f) Laje: artigos 1.510-A a 1.510-E do Código Civil;
II. Direitos reais de garantia
São direitos reais cuja função é a garantia de um crédito. Têm duas fontes, quais sejam o negócio jurídico e a lei. O regime jurídico geral consta dos artigos 1.419 a 1.430 do Código Civil. São direitos reais de garantia:
a) Penhor: artigos 1.431 a 1.472 do Código Civil;
b) Hipoteca: artigos 1.473 a 1.505 do Código Civil;
c) Anticrese: artigos 1.506 a 1.510 do Código Civil. A anticrese é sempre constituída mediante negócio jurídico.
Atenção: A alienação fiduciária não é um direito real de garantia. Trata-se do direito real de propriedade utilizado como garantia.
III. Direito do promitente comprador do imóvel
Trata-se do chamado direito real de aquisição.
O compromisso de compra e venda e o direito real de aquisição estão disciplinados nos seguintes diplomas legais: Decreto-lei n. 58 de 1937; Lei n. 6.766/79 e Código Civil, artigos 1.417 e 1.418.
DIREITO DAS COISAS
09
DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR DO IMÓVEL
Mauricio Bunazar
Conceito
É o direito real de aquisição, isto é, o direito subjetivo sobre coisa imóvel que permite ao promitente comprador do imóvel obrigar o promitente vendedor a transferir-lhe a propriedade do imóvel mediante registro do instrumento do negócio jurídico no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Fonte
O direito real de aquisição, ou, como o nomeia o inciso VII do artigo 1.225 do Código Civil, o direito do promitente comprador do imóvel tem como única fonte um determinado tipo contratual cujo nomem iuris (nome jurídico) é compromisso de compra e venda.
Formação do direito real de aquisição
O direito real de aquisição é de formação complexa, pois exige dois atos em momentos lógicos distintos. O primeiro ato é a celebração do contrato de compromisso de compra e venda entre o promiten -
te vendedor e o promitente comprador; o segundo, é o registro do instrumento deste contrato no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Desde o momento em quem as partes celebram o contrato, já há entre elas pretensões e obrigações recíprocas, isto é, o contrato existe, é válido e é eficaz. No entanto, como todo contrato, o compromisso de compra e venda somente produz efeitos entres as partes, como impõe o princípio da relatividade dos contratos (res inter alios acta).
Para que o contrato tenha eficácia perante terceiros e dê origem ao direito real de aquisição é mister que não contenha cláusula permitindo o arrependimento e seja registrado no Cartório de Registro de Imóveis.
Formado o direito real de aquisição, o promitente comprador do imóvel poderá exercer o direito de sequela, reivindicando o imóvel de quem quer que injustamente o possua ou detenha. O fato de o instrumento do contrato estar registrado na matrícula do imóvel impede que terceiros possam alegar boa-fé.
Regime jurídico
O compromisso de compra e venda e o direito real de aquisição estão disciplinados nos seguintes diplomas legais: Decreto-lei n. 58 de 1937; Lei n. 6.766/79 e Código Civil, artigos 1.417 e 1.418.
Súmulas do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 76:
A falta de registro do compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor.
Súmula 84:
É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.
Súmula 239:
O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda.
DIREITO DAS COISAS
1 0
DIREITOS REAIS DE GARANTIA: PENHOR, HIPOTECA E ANTICRESE E VEDAÇÃO DO PACTO COMISSÓRIO
Erika Cesario da Silva Aparecido
Com o intuito de regulamentar uma garantia ao adimplemento das obrigações por parte dos devedores, o Código Civil dispõe a respeito de duas espécies de garantia: a garantia pessoal ou fidejussória, no qual pessoa alheia à obrigação se comprometia a pagar o débito, em caso de inadimplência do devedor (por exemplo, a fiança e o aval) e a garantia real, no qual o devedor ou terceiro por ele indicado, designa parte ou todo seu patrimônio em caso de não pagamento da dívida, recebendo o bem de volta em caso de correto adimplemento1
Assim o direito real de garantia representa o poder dado ao credor de obter o pagamento de uma dívida com o valor ou renda de um bem aplicado exclusivamente para satisfação do débito 2
Em decorrência dessa garantia, são assegurados alguns atributos como o direito de preferência, no qual o credor tem direito a pagamento preferencial perante outros credores (com exceção dos credores tribu -
tários e trabalhistas, que são preferenciais), o direito à excussão da coisa, no qual é realizada a venda judicial em leilão público, para então se realizar o pagamento da dívida, o direito de sequela, no qual o vínculo da coisa dada em garantia permanece ainda que ela seja transferida para outrem, e a indivisibilidade do direito real de garantia, que assegura que o bem não pode ser alienado parcialmente, sendo inerente à dívida como um todo, sendo vedada sua desvinculação ainda que em caso de pagamento parcial3
Para que tenham eficácia de direito real, é necessário que atendam à algumas formalidades legais, quais sejam: a especialização, assim definida como a descrição pormenorizada do bem dado em garantia, do valor do crédito, do prazo fixado para pagamento e taxa de juros, e a publicidade, constituída por registro do título constitutivo no registro de imóveis ou no registro de Títulos e Documentos, por meio do qual é dada ciência a terceiros. Sem o atendimento às formalidades legais, as garantias não te -
rão eficácia de direito real, mas tão somente de direito pessoal, com validade somente entre as partes.
São direitos reais de garantia o penhor, a hipoteca e a anticrese, sendo direitos acessórios da obrigação que pretendem garantir.
Dispõe o art. 1.431 do Código Civil acerca da constituição do penhor:
Art. 1.431. Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que, em garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação.
Assim, pode-se definir o penhor como o direito real consistente na transferência efetiva de coisa móvel ao credor, pelo devedor ou terceiro por ele indicado, sujeitando o bem à guarda e retenção do credor enquanto não houver o pagamento da dívida1
Estabelece o Código Civil que são espécies de penhor o penhor rural, que pode ser agrícola e/ou pecuário, o penhor industrial e mercantil, o penhor de direitos e títulos de crédito, o penhor de veículos e o penhor legal, que resulta da lei, como o direito conferido a donos de hotéis, pensões e pousadas, ou de imóveis arrendados ou locados, de constituir penhor sobre bens móveis que hospedes ou locatários tenham no local, e reter estes bens para garantir o pagamento de despesas.
A hipoteca, nos termos do quanto estabelece o art. 1473 e seguintes do Código Civil, pode ser definida como o direito real de garantia constituído sobre bem imóvel, que permanece em poder do devedor ou terceiro, contudo, assegura ao credor o pagamento da dívida, conferindo a ele o direito de venda judicial e preferência sobe o crédito em caso de inadimplência1.
A hipoteca necessita de alguns requisitos formais para sua validade, como ser constituída por instru -
mento público (art. 108 do Código Civil) e ser registrada, seja no Cartório de Registro de Imóveis, seja por meio de registro especial (na Capitania dos Portos e na Agência Nacional de aviação no caso dos navios e aeronaves).
Podem ser objeto de hipoteca os imóveis e acessórios, o domínio direto (como enfiteuse), o domínio útil, as estradas de ferro, os recursos naturais, os navios, as aeronaves, o direito de uso especial para fins e moradia, a propriedade superficiária e os direitos oriundos da imissão provisória na posse quando concedida aos entes públicos.
Já a anticrese, nos termos do art. 1506 e seguintes do Código Civil, pode ser definida como o direito real sobre coisa alheia, no qual o credor passa a ter direito à posse e gozo de coisa frutífera, no qual fica autorizado a recolher os frutos e rendimentos da coisa para fins do pagamento da dívida4
Por fim, é importante destacar que para os direitos reais em garantia mencionados, o Código Civil veda o chamado pacto comissório (art. 1.428), que consiste na estipulação de cláusula em que o credor ficará com a coisa dada em garantia real, no caso de não pagamento da dívida no vencimento, sendo nula qualquer tipo de disposição nesse sentido entre as partes.
REFERÊNCIAS
1. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das coisas.36. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.
2. GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21ª ed. rev. e atual. por Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012.
3. TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das coisas. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022.
4. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas.v. 5.18. ed.São Paulo : SaraivaJur, 2023.
DIREITO DE FAMÍLIA
0 1
CASAMENTO: CAPACIDADE, IMPEDIMENTOS, CAUSAS SUSPENSIVAS, HABILITAÇÃO PARA O CASAMENTO
Camila Felberg
I. Conceito do instituto e suas previsões normativas.
O ordenamento jurídico brasileiro estabelece que as regras adotadas para celebração e regência do casamento são a do país em que contraído o matrimônio (art. 7º, § 1º da LINDB1).
O casamento celebrado no Brasil, é regulamentado pelo Código Civil (Lei nº 10.406/2002) e por outras normas complementares, federais, balizadoras dos requisitos materiais, tendo sido atribuída competência legislativa à União Federal, de acordo com as regras de distribuição de competência disciplinadas pela Carta Constitucional, nos moldes do art. 22 da Constituição Federal/882. Trata, portanto, de hipótese de competência privativa do ente federal.
1 Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Art. 7º. A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.§ 1o Realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades da celebração.
2 CF/88 – “Art. 22. Compete privativamente à União legislar so-
O Código Civil disciplina as regras gerais relacionadas ao casamento tais como: requisitos de idade (capacidade civil dos nubentes), impedimentos matrimoniais (legais), regimes de bens (aspecto inerente aos efeitos do instituto quanto ao patrimônio dos contraentes), habilitação (requisito formal para validade do ato), forma; e requisitos para sua dissolução (divórcio).
Ainda, no âmbito federal, outras normas complementares federais tratam dos efeitos e especificidades decorrentes do instituto do casamento: as regras da sua dissolução se encontram previstas na Lei do Divórcio (Lei 6.515/77), que, se interpretada à luz da Emenda Constitucional 66/2010, simplificou seu procedimento, dispensando o requisito da prévia separação por um lapso temporal específico, como condição para decreto de divórcio.
Finalmente, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) cuida das questões decorrentes da violência domésti -
bre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;(...)”
ca praticada no âmbito do núcleo familiar (que pode vir a ser constituído dentre outras modalidades, através do casamento), estabelecendo sanções a seu agente (que, na regra da experiência comum, costuma recair majoritariamente sobre o próprio cônjuge), além de prever todo um procedimento especial para a defesa da mulher, vítima dessa violência doméstica, seja ela da natureza que se apresentar (física, patrimonial, psicológica, para exemplificar). Importante mencionar que além das regras federais, os nubentes precisam se atentar para as regras inerentes aos Cartórios de Registros Civis 3 do estado eleito para celebrarem o casamento pois elas que disciplinam a forma pela qual a habilitação se aperfeiçoa, requisito indispensável para validade do ato (pagamento de taxas, custas cartorárias, casamento religioso e procedimentos diversos).
Os principais aspectos do casamento são:
I.1. Capacidade civil para o casamento
A idade mínima para se casar no Brasil é 18 (dezoito) anos, quando o indivíduo atinge plena capacidade civil (art. 5º do Código Civil4). Entretanto, é possível contrair casamento aos 16 (dezesseis) anos, desde que haja autorização expressa de seus representantes legais que são responsáveis pelo aperfeiçoamento da vontade daqueles que ainda não atingiram plena capacidade civil.
I.2. Impedimentos
Estão expressamente descritos no artigo 1.521 do Código Civil brasileiro:
Estão impedidos de casar: aqueles que não atingiram a idade mínima permitida aos nubentes; os ascendentes com seus descendentes, sejam eles de -
3 Código Civil. Art. 9º Serão registrados em registros públicos: I –os nascimentos, casamentos e óbitos; 4 Código Civil. Art. 5 o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
correntes de parentesco natural ou civil (pais e filhos naturais ou não); o adotante com o cônjuge do adotado e vice-versa; os irmão unilaterais ou bilaterais (de ambos os cônjuges ou não) os colaterais até terceiro grau, inclusive (primos, sobrinhos, tios, além dos irmãos já mencionados); o adotado com o filho do adotante; as pessoas casadas e, finalmente, o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou por sua tentativa contra seu consorte.
I.3. Causas Suspensivas
O art. 1.523 do Código Civil, por sua vez, delimita as causas que levam à suspensão temporária da permissão de casar nas seguintes situações: viúvos que concorrerem com filhos de cônjuges falecidos, enquanto não finalizada a sucessão e partilhados os bens, a viúva ou a mulher cujo casamento se desfez (nulo ou anulado), nos dez primeiros meses que iniciou essa condição, o divorciado enquanto não aperfeiçoada a partilha de bens decorrente da dissolução da sociedade conjugal, tutor e curador (assim como seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados e sobrinhos) com a pessoa tutelada enquanto vigente a tutela ou curatela.
Aqui, cabe mencionar que se justificada inexistência de prejuízos, tais pessoas podem ter reconhecido direito ao casamento mesmo nessas condições suspensivas decorrentes da lei.
I.4. Habilitação para o casamento
Trata das providências prévias e impositivas à celebração do casamento, sem as quais, ele não se aperfeiçoa. Basicamente, tem o condão de dar publicidade sobre a intenção dos nubentes em contraírem matrimônio para, assim, possibilitar a oposição por terceiros que também deverá estar devidamente motivada e documentada. As regras gerais a serem observadas encontram-se elencadas nos arts. 1.525 a 1.532 do Código Civil, além de encontrarem -
-se estabelecidas por atos normativos expedidos pelos Cartórios de Registros Públicos locais que disciplinam, dentro de seu limite territorial, exigências que podem ser variáveis de acordo com o estado da unidade federativa. A habilitação tem validade de noventa dias e deve se aperfeiçoar regularmente para possibilitar a regular celebração matrimonial.
DIREITO DE FAMÍLIA
CASAMENTO NULO 02
Camila Felberg
Tal qual qualquer negócio jurídico que padece de vícios no tocante aos seus requisitos de validade pode ser nulo, ou anulável, a depender da hipótese concreta. A principal diferença semântica entre tais conceitos, que se assemelham pelo fato de que tratam de hipótese e situação em que há comprometimento do negócio jurídico casamento, se identifica pelo fato de que a tanto a nulidade quanto a anulação do casamento decorrem de aspectos inerentes e indispensáveis à sua concreção, como bem descreve a professora Dra. Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka em sua obra que trata do tema.1
O Código Civil, no art. 1.548 estabelece a possibilidade de ser decretada a nulidade do casamento contraído se ocorrida qualquer infringência de impedimento legal . Tal decreto de nulidade opera efeitos ex tunc, ou seja, o decreto de nulidade retroage à data de celebração do casamento, tornando-o inválido
1 Código Civil. Art. 5 o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
desde então. Assim, consequência direta da decretação de nulidade do casamento, necessariamente decorrente de sentença judicial, é o fato de que se permite ao individuo que contraiu matrimônio decretado nulo, que ele volte a ostentar o mesmo estado civil que possuía antes de contrair o casamento, como se ele não tivesse existido.
Entretanto, importante destacar que esses efeitos retroativos de inexistência do negócio jurídico celebrado não podem incorrer em prejuízo a direito de terceiro de boa-fé, de forma geral e resguardados casos em sentido contrário, na forma disciplinada pelo art. 1.563 do Código Civil2
Relembrando; estão impedidos de casar, conforme regra taxativa do art. 1.548 do Código Civil: aqueles que não atingiram a idade mínima permitida aos nubentes; os ascendentes com seus descendentes, sejam eles decorrentes de parentesco natural ou civil (pais e filhos naturais ou não); o adotante com o 2 Código Civil. Art. 5 o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
cônjuge do adotado e vice-versa; os irmão unilaterais ou bilaterais (de ambos os cônjuges ou não) os colaterais até terceiro grau, inclusive (primos, sobrinhos, tios, além dos irmãos já mencionados); o adotado com o filho do adotante; as pessoas casadas e, finalmente, o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou por sua tentativa contra seu consorte.
Assim, caso o casamento tenha sido celebrado por quaisquer desses indivíduos legalmente impedidos, resta afetado, portanto, o aspecto inerente à condição de sua validade, permitindo a qualquer interessado (comprovada sua legitimidade) ao até mesmo ao próprio representante do Ministério Público promover ação de declaração de nulidade (art. 1.549 do Código Civil).
Ainda, deve ser averiguada a boa-fé dos nubentes que, de acordo com a regra do art. 1.561 do Código Civil, relativizam os efeitos do decreto ex tunc e, especificamente, sendo reconhecidos como nubentes de boa-fé, o casamento decretado nulo pode produzir seus regulares efeitos até a decretação de sua nulidade.
Importante destacar a consideração acerca dos efeitos do decreto de nulidade sobre os filhos tidos na constância desse casamento declarado nulo, pelo jurista Caio Mário da Silva Pereira que assim muito bem relembrou e orientou a questão tratada:
“A Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977 (art. 14, parágrafo único), corrigiu a injustiça, equiparando todos, e placitando desta maneira a doutrina, no sentido de que, independentemente da boa ou má-fé, eram legítimos todos os filhos do casamento anulado (cf. nº 393, infra). Sua tese foi fortalecida à vista do art. 227, § 6º, da Constituição, que igualou todos os filhos, proibindo referências discriminatórias.”
(pág. 168 - PEREIRA, Caio Mário da S. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. v.V. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2022. E-book. ISBN 9786559643417. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca. com.br/#/books/9786559643417/. Acesso em: 13 out. 2023).
Assim, é certo falar que as nulidades decorrentes do negócio jurídico casamento não são as mesmas atribuídas aos negócios jurídicos em geral e devem ser analisadas dentro e sob a ótica do sub-ramo do Direito Civil, dedicado ao Direito das Famílias e Sucessões, também observar as regras inerentes ao Direito Constitucional e o negócio jurídico casamento deve sempre estar em consonância com todas as normas e regras especiais que tratam de questões que possam se relacionar à matéria.
DIREITO DE FAMÍLIA
03
CASAMENTO ANULÁVEL E PRAZOS PARA ANULAÇÃO
Amanda Nunes Costa
De início, não é demasiado enfatizar que o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, nos termos do art. 1.511 do Código Civil (CC).
Na clássica lição do prof. º Flávio Tartuce “O casamento pode ser conceituado como a união de duas pessoas, reconhecida e regulamentada pelo Estado, formada com o objetivo de constituição de uma família e baseado em um vínculo de afeto.” (TARTUCE, 2023).1
Sob esse enfoque, há de salientar que entre algumas hipóteses de dissolução do matrimônio conjugal, existe a possibilidade do casamento nulo, bem como do anulável , cuja distinção tem como base os planos de validade e eficácia do casamento, tendo em vista que a diferenciação desses institutos dependerá da natureza do vício, assim como do grau de intensidade do impedimento violado
1 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil Volume Único. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda. (Fls. 2403)
Segundo o entendimento da ilustríssima prof.ª Desª Maria Berenice Dias: 2
Quando o casamento é celebrado ferindo apenas o interesse de quem o Estado tem o dever de proteger, por considerá-lo hipossuficiente, a reação do ordenamento jurídico é mais moderada. Como não há ameaça à ordem pública, dispõem as partes da possibilidade de intentar ação anulatória, pois ao legislador é indiferente a sobrevivência do casamento. 38 A lei não quer o matrimônio e, se foi contraído, autoriza sua dissolução. 39 Mas o silêncio das partes permite que um ato jurídico defeituoso convalesça, o que equivale a uma ratificação tácita, ou melhor, a uma ratificação presumida.
Assim, insta verificar que o Código Civil mediante o art. 1.150 dispõe o rol taxativo das hipóteses de anulação do casamento:3
2 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais LTDA. (Fls. 324)
3 Art. 1.550. É anulável o casamento:
I - de quem não completou a idade mínima para casar;
A primeira previsão legal remete a previsão de anulabilidade referente ao indivíduo menor de 16 anos, sendo essa a idade núbil considerada no Brasil tanto para mulheres, assim como para homens.
Neste prisma, o inciso “II” dispõe que é igualmente anulável o casamento dos menores relativamente incapazes – de 16 aos 18 anos, conforme art. 4º, I do CC – quando não possuírem consentimento dos genitores ou de seus representantes legais.
Já o inciso “III” faz referência ao denominado “ vício da vontade”, hipótese essa restritiva exclusivamente aos vícios de coação ou erro quanto à pessoa do cônjuge. O erro essencial quanto à pessoa diz respeito a fatos anteriores ao matrimônio, desconhecidos ou ignorados pelo outro cônjuge, que tornam insuportável a permanência da vida em comum. A título exemplificativo, o art. 1.557 do CC dispõe sobre o erro essencial, o art. 1.557 do CC dispõe:4
Por outro lado, no que diz respeito ao vício da coação, esse pode ser explicado quando o consentimento de um dos cônjuges ou de ambos, tiver sido captado mediante fundado temor de mal consi -
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;
IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;
V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
VI - por incompetência da autoridade celebrante.
4 Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:
I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;
III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;
derável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares, conforme art. 1.558 do CC.
A quarta hipótese, faz referência ao cônjuge que não consegue exprimir sua própria vontade através do consentimento, como por exemplo, os ébrios habituais ou viciados em substâncias tóxicas (art. 4, ª II do CC).
O inciso “V” preceitua sobre a revogação de procuração ou mandato. Frisa-se que a lei autoriza o casamento mediante procuração, desde que seja por instrumento público e detenha condições especiais para tanto. (art. 1.542 do CC). Dessa forma, ocorrerá a anulação quando o casamento tenha sido celebrado pelo outorgado, e ocorreu a revogação da procuração, sem que o representante e o outro cônjuge tivessem conhecimento dessa revogação.
Por fim, e não menos importante, é ainda o anulável o casamento que foi celebrado por autoridade incompetente para a ato.
Assim, a ação anulatória de casamento possui natureza de sentença constitutiva negativa, e deverá ser requerida apenas pelas pessoas legitimadas. De todo modo, o prazo para a apresentação da ação anulatória de casamento será decadencial e está disposto a partir do art. 1.560 do CC, vejamos:
Hipóteses Prazo decadencial
Coação 4 anos da celebração do casamento
Erro essencial quanto à pessoa 3 anos da celebração do casamento
Incompetência da autoridade celebrante 2 anos da celebração do casamento
Revogação do mandato 180 dias a partir da data em que o mandante tiver conhecimento ou ciência da sua celebração.
Do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento
Do casamento celebrado por absolutamente incapaz
180 dias da celebração do casamento
180 dias a partir de quando for atingida a idade núbil (16 anos)
Nada obstante, o efeito da ação anulatória de casamento será ex tunc, isso é, o casamento irá retroagir como se nunca tivesse existido, razão pela qual o indivíduo retornará com o status civil a quo do momento antes da celebração do matrimônio, conforme preceitua o art. 1.563 do CC.
DIREITO DE FAMÍLIA
DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO E DA SOCIEDADE
CONJUGAL: HIPÓTESES
Dayane Puente Castilho
O casamento é uma instituição que tem raízes profundas na história da humanidade. É um elo que une duas pessoas, não apenas legalmente, mas também emocionalmente e socialmente. No entanto, nem todos os casamentos perduram para sempre, e há diversas circunstâncias em que a dissolução do casamento se torna uma realidade inevitável. Neste artigo, exploraremos as hipóteses que podem levar à dissolução do casamento e da sociedade conjugal.
1. Divórcio por Consentimento Mútuo:
Uma das formas mais amigáveis de dissolver um casamento é por consentimento mútuo. Nesse cenário, ambos os cônjuges concordam que o casamento chegou ao fim e estão dispostos a se divorciar sem contestação. Isso é muitas vezes visto como a maneira menos dolorosa de encerrar um casamento, especialmente quando as partes conseguem
chegar a um acordo sobre questões como divisão de bens, guarda de filhos e pensão alimentícia.
Cabe ressaltar que sendo o divórcio por consentimento mútuo, e as partes não tiverem filhos menores de idade ou incapazes, não estando a parte em momento gravídico, poderão os cônjuges realizar esse divórcio de forma extrajudicial diretamente no cartório. Ainda assim as partes deverão estar acompanhadas por advogado.
Havendo filhos melhores, necessariamente o divórcio ocorrerá judicialmente, podendo ser requerido em petição, a qual poderá ser assinada por ambos os cônjuges, e poderá constar a partilha dos bens comuns, disposições relativas à pensão alimentícia entre os cônjuges, o acordo relativo à guarda dos filhos e o regime de convivência, bem como o valor da pensão alimentícia definida para os filhos menores.
Homologado esse pedido haverá a decretação do divórcio, momento em que será extraído mandado ao cartório de registro civil para a averbação do as-
sento de casamento e no de nascimento de ambos os cônjuges.
2. Divórcio Litigioso
Nesse tipo de dissolução não há o consentimento entre os cônjuges, devendo este ser realizado de forma judicial, ou seja, os cônjuges não conseguem chegar a um acordo sobre questões importantes relacionadas ao divórcio, como a divisão de bens, guarda de filhos e pensão alimentícia. Nesse caso, um juiz toma decisões em nome do casal após um julgamento.
3. Dissolução de União Estável
Para que haja a dissolução da união estável se faz necessário identificar qual a sua forma de constituição, se foi realizada formalmente, por escritura pública, ou informalmente pelas partes envolvidas.
Sendo por escritura pública, e as partes estarem em consenso, poderá seguir a mesma forma do Divórcio Consensual, ou seja, cumprindo as características necessárias, poderá ser realizado em cartório, de forma extrajudicial.
Porém, sendo a união estável estabelecida informalmente, se faz necessário antes da dissolução buscar em juízo o seu reconhecimento, e logo após a sua dissolução. Ressaltando que esse pedido pode ser realizado nos meus autos, na mesma petição.
Em conclusão, a dissolução do casamento e da sociedade conjugal pode ocorrer por várias razões, desde a infidelidade até a incompatibilidade irreconciliável e o abuso. É importante lembrar que cada caso é único e requer consideração cuidadosa das circunstâncias individuais. Quando todas as tentativas de reconciliação falham e a felicidade conjugal parece inatingível, o divórcio pode ser a melhor opção para permitir que ambas as partes sigam em frente e busquem uma vida mais feliz e saudável.
DIREITO DE FAMÍLIA
UNIÃO ESTÁVEL: CONFIGURAÇÃO, DISTINÇÃO DO CASAMENTO E DISTINÇÃO DO CONCUBINATO 05
Milena Sabatini Lazzuri
O presente artigo tem como objetivo explicar a configuração da união estável, apontando quais as diferenças entre o casamento, e o concubinato.
Nas palavras de FILHO e GAGLIANO1, (2020,4ª, p. 1.388): “Podemos conceituar a união estável como uma relação afetiva de convivência pública e duradoura entre duas pessoas, do mesmo sexo ou não, com o objetivo imediato de constituição de família.”
Por este conceito, podemos destacar elementos essenciais que caracterizam a união estável, são eles: a publicidade, que nada mais é do que a convivência pública, ou seja, não ser um relacionamento “as escondidas”, a continuidade que se caracterizada por uma convivência continua, as partes moram juntas, a estabilidade que é caracterizada por uma relação duradora, e por fim, o objetivo de constituir família , que é essencial para caraterização da união, é a
1 FILHO E GAGLIANO - FILHO E GAGLIANO – Rodolfo Pamplona e Pablo Stolze – Manual de Direito Civil – Ed. Saraivajur – 4ª edição – 2020
demonstração do casal, em permanecer juntos, ter filhos, etc.
Estes elementos estão elencados no art. 1.723 do Código Civil, e, embora, possa se assemelhar ao casamento, em razão dos requisitos, a união estável, é conhecida por ser uma relação irregular, tendo em vista que as partes envolvidas continuam com o estado civil de solteiras, mas conviventes em união estável.
Ao contrário do casamento, em que as partes envolvidas alteram o estado civil para casadas, e o casamento pode ser conceituado como, segundo TARTUCE2 (2019, p.1.136): “(...) a união de duas pessoas, reconhecidas e regulamentada pelo Estado, formada com o objetivo de constituição de uma família e baseada em um vínculo de afeto.”
Pelo conceito de casamento, mesmo ultrapassado, podemos notar a diferença entre casamento e união estável, pois, embora tenham o mesmo objetivo,
2 TARTUCE – Flávio – Código Civil Comentado – Ed. Forense - 2019
uma é regulamentada pelo Estado, por meio dos regimes de casamento, e das questões que envolvem a validade do casamento, enquanto outra, embora regulamentada pelo Código Civil, assim como, o casamento, ainda possui peculiaridades quanto ao regime adotado, e sua validade.
Nota-se que há uma proteção maior do casamento em relação a união estável, uma vez que no Brasil, o casamento é tido como uma instituição, quanto ao seu conteúdo, e um contrato, quanto ao seu formato. Tendo em vista, que ao celebrar um casamento, as partes assinam um pacto, que gera obrigações entre as mesmas.
Em contrapartida, o concubinato, nos termos do art. 1.727 do Código Civil: “As relações não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.”
Do conceito trazido pelo artigo, verifica-se que o concubinato, se caracteriza por uma relação eventual entre pessoas impedidas de casar, que, embora, possam morar juntas, como no casamento e na união estável, são impedidos de casar, por alguma razão, e não são tidos como uma entidade familiar.
Portanto, a diferença entre união estável, casamento e concubinato, está não apenas no reconhecimento ou não da entidade familiar, mas sim nas obrigações geradas entres as partes.
Podemos concluir que embora a união estável seja vista como uma entidade familiar “irregular”, ela se assemelha ao casamento, porque gera obrigações entres as partes, havendo divisão patrimonial, pedidos de alimentos, direitos sucessórios, e eventuais ações são propostas nas Varas de Família, ao contrário do concubinato, em que não há nenhuma obrigação entre partes, e eventuais ações são propostas na Varas Comuns.
DIREITO DE FAMÍLIA
06
UNIÃO ESTÁVEL:
CONFIGURAÇÃO, DISTINÇÃO DO CASAMENTO, DISTINÇÃO DO CONCUBINTATO
Maurício Testoni
Trata-se de tema de suma importância dentro do direito privado, especialmente no direito de família, haja vista que determina como se configura esse vínculo jurídico familiar, haja vista que a família tem especial proteção do Estado.
Nesse sentido, união estável encontra supedâneo legal do Artigo 1.723 ao 1.727 do Código Civil, e pode ser configurada pela convivência entre homem e mulher, desde que seja, pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituir família.
Assim, pela acepção legal de sua conceituação, observa-se que para que seja possível caracterizar união estável deve-se preencher três requisitos básicos (PINTO, 2017):
a) Publicidade, não sendo possível que seja uma relação clandestina;
b) Continuidade, não se descaracterizando pelos breves períodos de interrupção;
c) Estabilidade, para que seja possível demonstrar solidez e seriedade no relacionamento;
Assim, diferentemente no que a maioria da sociedade imagina, filhos e coabitação não são elementos essenciais para configuração da união estável.
Vale destacar que as principais diferenças entre casamento e união estável giram em torno da ausência de alteração do estado civil dos conviventes; não exigência de formalidade em sua celebração, podendo ser firmada por escritura pública ou mediante posterior sentença em ação declaratória de reconhecimento e dissolução de união estável; e não se sujeita aos impedimentos matrimoniais mencionados no Artigo 1.521 do Código Civil.
Já em o concubinato está previsto no Artigo 1.727 do Código Civil e estabelece que a união entre homem e mulher impedidos de casar é o que caracteriza concubinato.
Por fim, importante obtemperar que embora o Código Civil utiliza nomenclatura “homem e mulher”, há 12 anos – desde maio de 2011 – o Supremo Tribunal Federal (STF) por intermédio da ADI 4277 de forma unânime equiparou as relações entre pessoas do mesmo gênero às uniões estáveis entre homens e mulheres, reconhecendo, assim, a união homoafetiva como núcleo familiar (STF, 2023).
Diante desse reconhecimento, em 2013 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução nº. 175, impedindo que os cartórios de todo o País se recusassem a converter uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo em casamentos ou a celebrá-los (CNJ, 2022).
Assim, o casamento e a união estável entre pessoas do mesmo gênero são reconhecidas como entidade familiar não legislada, permitindo desta forma sua celebração e reconhecimento.
REFERÊNCIAS
PINTO, Cristiano Vieira Sobral. Direito Civil Sistematizado. 8. Ed. Ver., atual e ampl. – Salvador: Juspodivm, 2017.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm . Acesso em: 16 de setembro de 2023.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. STF. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=504856&ori=1#:~:text=Em%20maio%20de%202011%2C%20 o,homoafetiva%20como%20um%20n%C3%BAcleo%20familiar. Acesso em: 16 de setembro de 2023.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. CNJ. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/resolucao-re -
conhece-ha-nove-anos-casamento-entre-pessoas-homoafetivas/. Acesso em: 16 de setembro de 2023.
DIREITO DE FAMÍLIA
07
PARENTESCO: GRAUS DE PARENTESCO
Maurício Testoni
Trata-se de tema de suma importância dentro do direito privado, especialmente no direito de família, haja vista que determina como se configura esse vínculo jurídico nas relações familiares.
Nesse sentido, parentesco pode ser compreendido como um vínculo jurídico determinado pela consanguinidade ou por outra origem, dentre os quais: a) a consanguinidade ou naturalidade existe entre pessoas que descendem de um ancestral comum, de forma direta ou indireta; b) por afinidade: aquele existente entre um cônjuge ou companheiro e os parentes do outro cônjuge ou companheiro (Tartuce e Simão, 2007); c) Civil: aquele em que não há laços de sangue, como nos casos de adoção (Artigos 1.618 a 1.629 Código Civil), na reprodução assistida heterelóga (Artigo 1.597, V Código Civil) e na parentalidade socioafetiva (PINTO, 2017).
O vínculo de parentesco é estabelecido por linhas reta e outra colateral, contando-se os parentes por graus.
Em linha reta são os parentes conectados entre si por um vínculo de ascendência ou descendência, subindo ou descendo contando os graus um a um, como por exemplo pais e avós; filhos e netos, conforme preceitua os Artigos 1.591 e 1.594, 1ª parte do Código Civil.
Já os colaterais são aqueles que provém do mesmo tronco, entretanto, sem relação de ascendência ou descendência direta, como por exemplo irmãos, tios, sobrinhos, etc, limitando-se até o 4º (quarto grau), diferentemente dos parentes em linha reta que não se limitam, pois são infinitos (PINTO, 2017).
A forma correta de contagem de graus na linha colateral se dá subindo os graus até o parente comum de ambos, e, descendo até localizar o parente que deseja identificar.
Importante destacar que não existe relação de parentesco entre cônjuges e companheiros, existindo uma restrição legal a esse parentesco aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro, conforme dispõe o Artigo 1.595, §1º do Código Civil.
Por fim, vale obtemperar que na linha reta o vínculo de afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável, assim como preceitua o §2º do Artigo 1.595 do Código Civil.
REFERÊNCIAS
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, 1: Esquematizado: parte geral: obrigações e contratos. 7. Ed – São Paulo: Saraiva, 2017 Ed. Rev, atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2017.
PINTO, Cristiano Vieira Sobral. Direito Civil Sistematizado. 8. Ed. Ver., atual e ampl. – Salvador: Juspodivm, 2017.
TARTUCE, Flávio e SIMÃO, José Fernando. Direito Civil para concursos. 2. Ed. São Paulo: Método, 2007. V. 5.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm . Acesso em: 16 de setembro de 2023.
08
DIREITO DE FAMÍLIA
PARENTESCO: FILIAÇÃO, RECONHECIMENTO DE FILHOS, PODER FAMILIAR E ADOÇÃO NO ECA
Dayane Puente Castilho
O parentesco é um conceito fundamental nas relações familiares e legais em qualquer sociedade. No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é a legislação que regula muitos aspectos do parentesco, especialmente quando se trata de crianças e adolescentes.
1. Filiação
A filiação é o vínculo legal e biológico entre pais e filhos. O ECA reconhece a importância deste vínculo e estabelece regras para proteger os direitos da criança. Além da filiação biológica, o ECA também reconhece a filiação socioafetiva, que é a relação estabelecida por laços de afeto e convivência. Isso permite que, em casos de adoção, a criança seja considerada legalmente filho dos adotantes.
2. Reconhecimento de Filhos
O reconhecimento de filhos é um ato legal pelo qual um pai ou mãe declara oficialmente a paternidade ou
maternidade de uma criança. O ECA estabelece que o reconhecimento deve ser feito voluntariamente e pode ser feito a qualquer momento, desde que não prejudique o melhor interesse da criança. Isso garante que a criança tenha direitos legais, incluindo direitos à herança e ao suporte financeiro.
3. Poder Familiar
O poder familiar, também conhecido como autoridade parental, refere-se aos direitos e responsabilidades dos pais em relação aos seus filhos. O ECA estabelece que o poder familiar é intransferível e deve ser exercido em benefício do bem-estar da criança. Isso inclui o direito à educação, à saúde e ao cuidado geral da criança. Se os pais não cumprirem suas responsabilidades, o Estado pode intervir para proteger o melhor interesse da criança.
Não cumprindo com essas obrigações para com a criança e/ou adolescente há possibilidade dos pais perderem o poder familiar.
A perda do poder familiar, também conhecido como perda da guarda ou autoridade parental, refere-se à situação em que os pais perdem seus direitos legais e responsabilidades em relação aos seus filhos. Essa é uma medida extrema que é tomada quando se considera que os interesses e o bem-estar da criança estão em risco devido às ações ou omissões dos pais. As hipóteses de perda do poder familiar variam de acordo com as leis de cada jurisdição, mas algumas das razões mais comuns incluem negligência ou abuso infantil, abuso de substâncias, abandono, condenação criminal grave, incapacidade mental ou física, alienação parental, abuso sexual, incumprimento de obrigações parentais entre outros.
4. Adoção (ECA)
A adoção é um processo pelo qual uma criança é legalmente incorporada a uma nova família. O ECA estabelece regras rigorosas para garantir que a adoção seja realizada no melhor interesse da criança. Isso inclui avaliações psicossociais dos adotantes, acompanhamento pós-adoção e garantia de que a criança seja informada sobre sua adoção, dependendo de sua idade e maturidade.
Vários são os tipos de adoção, estando entre elas a adoção de menores, adoção de adultos, adoção nacional e internacional, adoção aberta e fechada.
Uma vez que a adoção seja concluída, os pais adotivos têm os mesmos direitos e responsabilidades legais que os pais biológicos. Isso inclui cuidados, educação, saúde e bem-estar da criança. Os pais adotivos também são responsáveis pelo apoio financeiro da criança.
A adoção é um processo complexo e emocional que requer preparação, compromisso e amor. Proporcionar um ambiente seguro e acolhedor para uma criança através da adoção pode ser uma experiên -
cia incrivelmente gratificante para todos os envolvidos.
O ECA também promove o princípio da prioridade absoluta dos direitos da criança em todas as decisões relacionadas ao parentesco. Isso significa que o bem-estar da criança deve estar no centro de todas as considerações legais e familiares.
Em resumo, o parentesco, a filiação, o reconhecimento de filhos, o poder familiar e a adoção são áreas cruciais regulamentadas pelo ECA no Brasil. Essas medidas buscam proteger os direitos das crianças, promovendo o desenvolvimento saudável e seguro em ambientes familiares. É essencial que pais, adotantes e a sociedade em geral compreendam essas leis para garantir que as crianças cresçam em um ambiente amoroso e de apoio, independentemente de sua origem biológica.
DIREITO DE FAMÍLIA
REGIMES DE BENS DO CASAMENTO E PACTO ANTENUPCIAL
Gisele Rui de Almeida
O Código Civil Brasileiro estabelece que o regime de bens do casamento, que começa a vigorar desde a data do casamento, é o conjunto de regras que determinam como os bens do casal serão administrados ao longo da união e ao término desta.
O regime de bens do casamento é uma questão fundamental para todos os casais que decidem oficializar sua união. Antes de celebrar o casamento, os nubentes estipulam o que lhes aprouver, quanto aos seus bens, em um cartório de registro civil.
Prevê o Código Civil em seus artigos 1.639 e seguintes, quatro regimes de bens para o casamento:
1. Comunhão parcial de Bens (artigos 1.658 e seguintes): Neste, os bens que o casal adquire durante o casamento são considerados comuns, enquanto os bens anteriores ao casamento ou recebidos por doação ou herança permanecem como bens individuais. Cada um tem direito à metade dos bens adquiridos durante o casa-
mento. Exclui-se as exceções previstas no artigo 1659, do Código Civil. Este é o regime de bens padrão no Brasil, artigo 1.640 do diploma mencionado.
2. Comunhão Universal de Bens (artigos 1.667 e seguintes): Neste, todos os bens, sejam adquiridos antes ou durante o casamento, se tornam comuns ao casal. Isso inclui bens pessoais, como imóveis e dinheiro. No caso de subsídio ou falecimento de um dos beneficiários, os bens adquiridos antes quanto depois do casamento, são considerados comuns ao casal. No caso de concessão, todos os bens são divididos igualmente entre as partes envolvidas, exceto por heranças e doações com cláusulas de incomunicabilidade. Exceções expressas no artigo 1668, do Código Civil.
3. Participação Final nos Aquestos (artigos 1.672 e seguintes): Esse regime combina características de comunhão parcial de bens com separação de bens. Durante o casamento, os bens
são considerados de propriedade individual de cada participação, mas. No momento do relato ou falecimento de um deles, os bens adquiridos durante o casamento são partilhados de acordo com a contribuição de cada um para a aquisição desses bens. Este regime é uma variação da comunhão parcial de bens. Nele, os bens adquiridos durante o casamento são considerados propriedade individual de cada participante, mas no momento do tributo ou falecimento, os parceiros têm direito a uma parte dos bens acumulados durante a união, de acordo com as regras condicionais da lei.
4. Separação de Bens (artigos 1.687 e seguintes): Nesse regime, cada pessoa mantém sua propriedade separada, não havendo comunhão de bens adquiridos durante o casamento. Isso significa que, em caso de inventário, cada um mantém o que é seu, sem partilha de bens adquiridos durante o casamento. Cada indivíduo mantém sua propriedade individual de todos os bens, tanto antes quanto durante o casamento. Não há partilha de bens adquiridos durante a união, a menos que haja acordos específicos estabelecendo o contrário. Esse regime de bens será obrigatório, sem a escolha dos nubentes, em caso de inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; se a pessoa for maior de 70 (setenta) anos; em todos os que dependerem de suprimento judicial, para casar (artigo 1.641 do C.C.).
Importante destacar que o Código Civil também permite a alteração do regime de bens durante o casamento, desde que haja concordância de ambos os parceiros e autorização judicial, ressalvados os direitos de terceiros. Essa flexibilidade permite que os casais reavaliem sua situação financeira ao longo do tempo e façam ajustes conforme necessário.
Os nubentes dentro dos parâmetros legais, podem escolher qual regime adotar, podendo adequar às suas necessidades, através da confecção de regimes híbridos, mistos, personalizados. Há plena liberdade de escolha de regime de bens, com exceção daqueles que devem se submeter ao regime da separação obrigatória disposto no artigo 1641 do Código Civil.
O pacto antenupcial é um instrumento legal importante que permite aos noivos personalizar o regime de bens de acordo com suas necessidades e preferências. Está regulamentado no Código Civil, artigos 1.653 a 1.656.
Através de um Pacto antenupcial, que é um contrato pré-nupcial, um acordo formal celebrado entre os noivos, as partes têm a liberdade de escolher o regime de bens que desejam adotar, as regras que regerão o regime de bens do casamento. Esse contrato permite que os casais personalizem as regras de seu casamento, desde que estejam de acordo com a legislação vigente. Os requisitos de validade do pacto antenupcial, são a escritura pública e a efetivação do casamento.
Nesse contrato, devem os nubentes, indicar claramente, qual o regime de bens que desejam adotar durante o casamento.
Pode estabelecer o pacto antenupcial, regras específicas para a administração de bens do casal, como a gestão de contas bancárias conjuntamente e aquisições de bens em conjunto. Pode determinar como heranças e doações serão tratadas no casamento. Pode ainda ser usado para proteger o patrimônio de um dos parceiros em caso de separação, evitando que ele seja compartilhado com o outro parceiro.
Cláusulas que violem direitos e garantias fundamentais, ou que afrontem a Lei, não serão aceitas. Caso ocorra, as cláusulas serão consideradas nulas, e o
pacto antenupcial continua sendo válido em relação às demais cláusulas.
Após a lavratura da escritura pública de pacto antenupcial junto a um Tabelionato de Notas, os nubentes devem apresentá-lo, juntamente com a certidão de casamento, ao Registro de Imóveis do primeiro domicílio do casal de modo a conferir publicidade erga omnes ao ato, passando a valer perante terceiros.
O uso adequado do pacto antenupcial pode ajudar a evitar conflitos futuros e proteger os interesses financeiros de ambas as partes no casamento.
DIREITO DE FAMÍLIA
PROTEÇÃO DA PERSONALIDADE: TUTELA, CURATELA E TOMADA DE DECISÃO APOIADA – NOÇÕES GERAIS 10
Rita de Cássia Curvo Leite
Priscilla Curti Georges Pilavdjian
Introdução
O advento da Lei 13.146/15 alterou as regras das capacidades do Código Civil, passando a conferir plena capacidade a todas as pessoas que sejam portadoras de deficiência física, mental ou intelectual, proporcionando-lhes plenos poderes para os atos da vida civil, seja no âmbito dos direitos patrimoniais, como, também, no ambiente dos direitos pessoais.
Sendo-lhes conferida plena capacidade, referidas pessoas passaram a poder atuar em juízo, sem qualquer representação legal, o que implica dizer que terão plena capacidade, inclusive, no âmbito processual, CEJUSC e JEC, que permitem o ingresso sem representação por advogado, bem como em um negócio jurídico processual (art. 190 CPC).
A inclusão da pessoa com deficiência é, pois, garantia decorrente da aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, vale dizer do reconhecimento
dos direitos mais basilares do indivíduo, sendo retrógrada a ideia de que portadores de deficiências devam ser excluídos da vida em sociedade, privando-os de receber educação e afeto.
Curatela
Não obstante as pessoas com deficiência terem sua plena capacidade garantida, certo é que, em alguns casos, de forma excepcional, o art. 4º, CC prescreve que são relativamente capazes aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade, assim como também, os pródigos.
Muito se discutiu e ainda ressoam vozes no sentido de dizer que a Interdição deixou de existir no nosso ordenamento jurídico após o advento do referido Estatuto. Contudo, ousamos divergir, porquanto a Interdição se mantém em nosso ordenamento, inclusive prevista nos arts. 747 a 763 do Código de Processo Civil. Talvez, melhor seja nominá-la de forma diversa, tal qual Pedido de Curatela, mas isso não modi -
fica seu desiderato primordial, qual seja nomear um curador ao incapaz assim considerado com base em exame biopsicossocial preliminar conclusivo realizado por equipe multidisciplinar.
A Curatela é, assim, meio de proteção da pessoa com deficiência que, não podendo manifestar sua vontade, e, principalmente, dispor com segurança de seus bens, recebe do curador uma assistência. Trata-se de modo atualizado para um contexto social em que o curatelado somente será representado quanto aos seus direitos patrimoniais e negociais, não estendendo-se para questões existenciais, sendo medida excepcional, conforme dispõe o art. 85, § 1º da Lei 13.146/15.
TDA – Tomada de Decisão Apoiada
A TDA – Tomada de Decisão Apoiada, é novidade introduzida ao ordenamento pátrio pelo art. 84, § 2º da Lei 13.146/15 que incluiu o art. 1.783-A ao texto do Código Civil.
Por meio da TDA, a pessoa com deficiência nomeará pelo menos 2 (duas) pessoas para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre certos atos da vida civil, restritos, porém, a natureza negocial e patrimonial. O Apoiado perde a legitimação para realizar, sozinho, os atos descritos nos termos da TDA, podendo realizá-los em conjunto com o Apoiador. Ex: pessoa com dislexia que nomeia apoiadores para auxiliá-la na leitura de contrato de compra e venda de imóvel.
A pessoa com deficiência participa do negócio, utilizando-se de outras pessoas, por ela mesma indicada, para tomar certas decisões, conservando o Apoiado sua plena capacidade.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Renata Barbosa de. Direito Civil: famílias/Renata Barbosa de Almeida, Walsir Edson Rodrigues Júnior. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2012.
ALVIM, Arruda. Novo contencioso cível no CPC/15/Arruda Alvim - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
LAGRASTA Neto, Caetano. Direito de Família: novas tendências e julgamentos emblemáticos/ Caetano Lagrasta Neto, Flávio Tartuce, José Fernando Simão. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2012.
NERY, Rosa Maria de Andrade. Manual de direito civil: família. 1. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil – Vol. V/Atual. Tânia da Silva Pereira. – 25. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.
TARTUCE, Fernanda. Processo civil no direito de família: teoria e prática /Fernanda Tartuce. - 3. Ed. - Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2018.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 6. Ed. ver., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.
0 1
DIREITO DAS SUCESSÕES
DIREITO DAS SUCESSÕES – SUCESSÃO LEGÍTIMA E SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA (NOÇÕES GERAIS)
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
O Direito Brasileiro só admite a sucessão decorrente da lei ou da vontade do morto. No primeiro caso, tem-se a sucessão legítima ou legal; no segundo, a sucessão testamentária. Entre nós não é comum diferenciar, mas a sucessão legítima em sentido amplo é composta por dois subtipos: a sucessão necessária e a sucessão legítima em sentido estrito.
Há sucessão necessária se existirem herdeiros necessários, a quem é reservada a legítima, porção indisponível do patrimônio e que, como regra, não pode ser atingida pelo testador. Trata-se de sucessão com caráter obrigatório, a que contrasta o caráter não vinculante ou supletivo da sucessão legítima em sentido estrito, que, por sua vez, ocorre quando não houver herdeiro necessário, nem testamentário; ou quando, embora exista testamento, ele não abrange todos os bens do acervo ou é irregular (art. 1.788 do Código Civil). A existência de um regime sucessório supletivo se justifica, na medida em que,
pelo princípio da saisine (art. 1.784 do Código Civil), não se admitem patrimônios sem um titular.
Já a sucessão testamentária ocorre quando o próprio autor da herança, por meio de declaração de vontade expressa em testamento ou codicilo, divide a porção disponível de seu patrimônio, podendo contemplar desde herdeiros necessários a prole eventual ou pessoas jurídicas, mesmo que ainda não providas de personalidade, na forma do art. 1.799 do Código Civil. Há, porém, certos limites objetivos e subjetivos à liberdade de testar, como a legítima e as hipóteses de incapacidade sucessória do art. 1.801 do Código Civil, respectivamente. Destaca-se, no mais, que um testamento não serve apenas para fins patrimoniais, podendo trazer, igualmente, disposições extrapatrimoniais.
Não há qualquer impedimento para que a sucessão legítima em sentido amplo conviva com a sucessão testamentária, sendo, inclusive, comum que uma concorra com a outra, como, por exemplo, nos casos em que o testador não dispôs sobre a totalidade
dos bens ou, na situação oposta, quando extrapolou os limites legais da quota disponível e, por essa razão, as disposições excedentes devem ser reduzidas (art. 1.967 do Código Civil).
DIREITO DAS SUCESSÕES
ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA:
SUCESSÃO EM
LINHA RETA E NA LINHA COLATERAL
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
Na ausência de disposição testamentária, o legislador determinou, no art. 1.829 do Código Civil, a ordem em que devem ser chamados os sucessores.
Em primeiro lugar, herdam os descendentes, independentemente da origem e sem limitação de grau, observada, porém, nesse particular, a restrição do art. 1.833 do Código Civil. Eventualmente, os descendentes podem concorrer com o cônjuge ou com o companheiro sobrevivente do autor da herança (RE 878.694/MG e 646.721/RS), se o vínculo conjugal estiver conservado ao tempo da abertura da sucessão e for regido, no que toca ao regime de bens, pela separação convencional ou, caso seja pela comunhão parcial ou pela participação final nos aquestos, desde que o falecido tenha deixado bens particulares (Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil).
Não havendo descendentes, são chamados, em segundo lugar, os ascendentes do morto, em qualquer
grau (art. 1.836, § 1º do Código Civil), também em concorrência com o companheiro ou com o cônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens, bastando que o vínculo conjugal esteja preservado.
Em terceiro lugar, herda o cônjuge ou o companheiro sobrevivente, também independente do regime de bens, mas desde que ao tempo da morte do outro, não estivessem divorciados, separados judicialmente, extrajudicialmente ou de fato (art. 1.830 do Código Civil). Desde a Emenda Constitucional n. 66/2010, não se exige lapso de dois anos para o reconhecimento da separação de fato, nem se debate a culpa mortuária.
Em quarto e último lugar, são chamados os colaterais até o quarto grau (art. 1.839 do Código Civil). Conforme o art. 1.840 do Código Civil, os mais próximos excluem os mais remotos, salvo direito de representação, conferido, exclusivamente, aos sobrinhos. Se os colaterais forem irmãos ou sobrinhos, a natureza do parentesco importa, pois concorren -
do irmãos (ou sobrinhos) bilaterais e unilaterais, estes recebem metade do quinhão destinado àqueles (arts. 1.841 e 1.843, § 2º do Código Civil).
Residualmente, como não pode haver patrimônio sem um titular, na hipótese de não haver nenhum herdeiro legítimo, a Lei chama o Estado para herdar em caráter irrenunciável (art. 1.844 do Código Civil).
DIREITO DAS SUCESSÕES
03
HERDEIROS NECESSÁRIOS E PROTEÇÃO DA LEGÍTIMA
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
Herdeiros necessários, no nosso direito, são os descendentes, ascendentes e o cônjuge sobrevivente (art. 1.845 do Código Civil). Desde a promulgação do Código Civil de 2002, questiona-se se o companheiro sobrevivente também seria herdeiro necessário, tendo a tese ganhado maior fôlego com o julgamento dos RE 878.694/MG e 646.721/RS, ainda que o Supremo Tribunal Federal não a tenha declarado expressamente.
Diferentemente dos herdeiros facultativos (parentes colaterais), os herdeiros necessários têm direito à legítima, correspondente à metade do patrimônio do morto (art. 1.846 do Código Civil), da qual, como regra, não podem ser excluídos, nem ter reduzido o seu quinhão, salvo se incorrerem em alguma das causas de indignidade ou deserdação. Além disso, enquanto garantia aos herdeiros necessários, a legítima sequer pode ser livremente gravada com cláusulas restritivas. Tanto é assim que só se admitem cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade ou
impenhorabilidade, que forem, devidamente, justificadas (art. 1.848 do Código Civil).
Na hipótese de a legítima ser desrespeitada, o Código previu alguns remédios protetivos, como a redução de disposições testamentárias que extrapolem a quota disponível (art. 1.967 do Código Civil), ou a nulidade da doação quanto à parte que exceder à que o doador poderia dispor em testamento (art. 549 do Código Civil).
04
DIREITO DAS SUCESSÕES
DIREITOS SUCESSÓRIOS DO CÔNJUGE E DO
COMPANHEIRO
Mário Gamaliel Guazzeli de Freitas
O Código Civil de 2002, diferentemente do Código de 1916, positivou direitos sucessórios ao cônjuge e ao companheiro, mas o fez na contramão dos progressos conquistados no sistema anterior, graças às Leis nº 8.971/94 e nº 9.278/96, na medida em que, em lugar de manter ou desenvolver o equilíbrio entre os direitos sucessórios de tais herdeiros, privilegiou o cônjuge, em flagrante violação ao texto constitucional.
Ao cônjuge, além de alçar à condição de herdeiro necessário, conferiu-se concorrência sucessória em propriedade plena com descendentes e ascendentes (art. 1.829, I e II); a possibilidade de ser chamado, em terceiro lugar na ordem de vocação hereditária, para recolher a totalidade da herança, na falta das duas classes anteriores (art. 1.829, III); direito real de habitação, independentemente do regime de bens (art. 1.832); a garantia da quarta parte da herança, se concorrer com descendentes comuns, ou quinhão
igual ao dos descendentes exclusivos do morto (art. 1.832).
Ao companheiro, por outro lado, o art. 1.790 apenas possibilitava suceder sobre os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável (caput); não garantia a quarta parte se a concorrência fosse com filhos comuns (inciso I); previa recebimento de metade do quinhão devido aos descendentes exclusivos do morto, se concorresse com estes apenas (inciso II); estabelecia concorrência com colaterais, hipótese em que teria direito a um terço da herança (inciso III), e, só na falta deles, seria herdeiro exclusivo (inciso IV).
Com o julgamento dos RE 878.694/MG e 646.721/ RS, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil e fixou tese de repercussão geral, segundo a qual “[é] inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o
regime do art. 1.829 do CC/2002” (Temas n. 809 e 498). Não houve declaração do STF a respeito da inclusão do companheiro no rol dos herdeiro necessário, no entanto, esta tem sido a posição prevalecente na doutrina e nas cortes estaduais.
Destaca-se, porém, que, para serem sucessores, o vínculo conjugal deverá estar mantido no momento de abertura da sucessão e, se concorrer com descendentes, ainda deverá ser analisado o regime de bens, conforme destacado anteriormente.
DIREITO DAS SUCESSÕES
HERANÇA VACANTE E HERANÇA JACENTE
Camila Felberg
O objetivo primordial do Direito das Sucessões é destinar os bens do falecido aos seus herdeiros, cumprindo sua vocação social. Certo é que o Direito das Sucessões prioriza a família, combinando propriedade e família como fatores primordiais da existência social.
Destinação dos Bens na Ausência de Herdeiros
Quando o falecido não deixa herdeiros, o artigo 1.844 do Código Civil de 2002 (CC/2002) determina que a herança seja devolvida ao Município ou ao Distrito Federal.
Mudanças Legislativas
A Lei 8.049 de 1990 instituiu que os bens vagos sejam destinados ao Município e Distrito Federal, em detrimento dos Estados, que eram os sucessores segundo o Código Civil de 1916. Essa mudança revogou tacitamente a disposição do artigo 1.143 do Có -
digo de Processo Civil de 1973, que determinava que a herança vacante seria incorporada ao domínio da União, dos Estados ou do Distrito Federal.
Situação em São Paulo
Antes da Lei 8.049/1990, os bens no Estado de São Paulo eram destinados à Universidade de São Paulo (USP) e, a partir de 1985, também à Universidade Estadual Paulista (UNESP) e à Universidade de Campinas (UNICAMP). Com a legislação de 1990, esses decretos foram revogados, e os bens passaram a pertencer ao Município.
Primazia da Família
A família tem primazia no destino da herança, sendo os bens atribuídos ao Estado apenas na ausência de herdeiros. Assim, a ordem de vocação hereditária reflete o conceito de família e, na ausência desta, a sucessão do Fisco.
Procedimentos de Herança Jacente e Vacante
A lei define procedimentos para heranças jacentes e vacantes, que são conjuntos de bens sem personalidade jurídica. O Município, Distrito Federal ou União não são herdeiros, mas sucessores irregulares não sujeitos ao direito de saisine. A jurisprudência confirma que o princípio da saisine não se aplica ao ente público.
Impactos do CPC/2015
O Código de Processo Civil de 2015 trouxe mudanças nos procedimentos de arrecadação e administração de bens da herança. O artigo 1.819 do CC/2002 preceitua que, na ausência de testamento e herdeiros, os bens ficam sob a guarda de um curador até a entrega ao sucessor habilitado ou à declaração de vacância.
Procedimentos de Arrecadação
O artigo 738 do CPC/2015 reproduz a regra do CPC/1973, determinando que o juiz proceda imediatamente à arrecadação dos bens da herança jacente. A herança jacente é guardada e administrada por um curador até a entrega ao sucessor habilitado ou à declaração de vacância. O curador tem várias responsabilidades, incluindo representar a herança em juízo, conservar os bens e prestar contas.
Mudanças no CPC/2015
O artigo 740 do CPC/2015 unificou procedimentos de arrecadação, facilitando o processo. O juiz pode requisitar à autoridade policial a arrecadação dos bens, e a intimação do Ministério Público e da Fazenda Pública foi considerada desnecessária. Durante a arrecadação, o juiz ou a autoridade policial inquirirá os moradores sobre o falecido e seus bens.
Publicação de Editais
Após a arrecadação, editais são publicados na internet para que os sucessores se habilitem no prazo de seis meses. Se reconhecida a habilitação do herdeiro ou testamenteiro, a arrecadação converte-se em inventário. Decorrido um ano sem herdeiros habilitados, a herança é declarada vacante.
Declaração de Vacância
A declaração de vacância é definitiva para a destinação dos bens. Credores podem pedir o pagamento das dívidas reconhecidas, e a declaração não prejudica os herdeiros que se habilitarem posteriormente.
A jurisprudência permite a discussão sobre usucapião de bens vagos antes da declaração de vacância, destacando a necessidade de destinação social dos bens.
Conclusão
O Direito das Sucessões prioriza a família na destinação da herança, com o Estado sendo sucessor apenas na ausência de herdeiros. Procedimentos legais garantem a administração e destinação adequada dos bens, com mudanças legislativas e jurisprudenciais buscando eficiência e justiça no processo sucessório.1
1 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Sucessões. v.6. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559646975. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559646975/. Acesso em: 09 ago. 2024.
DIREITO DAS SUCESSÕES
A SUCESSÃO, POR AUSÊNCIA DO “TUTOR”, DE UM SER
SENCIENTE NA FAMÍLIA MULTIESPÉCIE
Daniel Barboza Kinguti
Recentemente, uma popular empresa, internacional, transmissora de vídeos, pagos, com o auxílio da internet, divulgou o anúncio de um seriado, baseado em uma animação, ficção, onde o Estado é ausente, e um ser (?), armado, caçava outro ser (?), ambos, de povos, culturas, desconhecidos. Diante deste cenário, onde as mensagens identificáveis, dentre outras, são o controle de natalidade, o controle de experimentos com seres vivos e o ego, afim de evitar sofrimentos, houve, na sociedade, uma evolução no tocante aos costumes das pessoas, as quais começaram a vislumbrar algo o qual estava oculto no meio social em que vivem ou seja, enxergar o animal de estimação como uma vida em formação, e um meio de suprir uma carência da pessoa. Nisso, na sociedade, foram surgindo termos novos, sem tipificação legal, para designar situações preexistentes, tais como família multiespécie, seres sensitivos, “tutor”, e outros. A sociedade leiga nomeou o possuidor do animal de estimação de “tutor”, por entender que o
ser vivo não pertence a ninguém. Neste artigo jurídico é feita a exposição sobre a sucessão do animal na ausência do “tutor”e sobre alguns projetos de lei para agregar os novos termos.
A família multiespécie é designada como entidade, de várias espécies, formada por seres humanos e animais, onde há afeto entre eles. Em um julgado, houve o conceito: “[...]rede de interações entre animais e humanos onde os seus membros se reconhecem e se legitimam. [...] destacando-se a proximidade e afetividade como liame agregador dos integrantes dessa nova família, sejam eles humanos ou animais” 1 O termo seres sencientes significa seres com sentimentos e um julgado estabeleceu: “[...] Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, tam -
1 Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Processo nº502437207.2022.4.04.0000/PR, Agravo de Instrumento. Julgado: 26/07/2022.
bém devem ter o seu bem-estar considerado[...] ”2 Vale salientar que várias decisões judiciais, de Estados diferentes, tratam dos temas, havendo insegurança jurídica por terem respaldo nos costumes sociais, inexistindo lei, na época em que proferidas, tratando destes termos, tampouco sobre a relação, subjetiva, de afeto entre pessoas e animais de estimação, com a possibilidade de formarem precedentes para haver a equiparação dos animais de estimação com outros bichos, e nos projetos de lei não há menção de quais animais podem ser de estimação, pois se não for de tráfico, ou criador clandestino, o bicho silvestre poderá integrar o rol.
No Antropocentrismo, dentre outros entendimentos, a existência de tudo ao redor do ser humano, racional, existe para servi-lo, pois o mesmo é dotado de inteligência, sendo os animais irracionais. Os projetos de lei (pl) 145/2021, 27/2018, 4.375/2021, mencionam “animais não humanos”, e tratam da guarda de animais, da capacidade, destes, de serem partes em juízo, atribuindo a eles natureza jurídica de sujeitos de direito despersonificados. O pl 179/2023, trata da família multiespécie; eutanásia de animais; restrição de liberdade de animais; poder familiar sobre o animal, o qual será filho e terá o nome e sobrenome registrado em cartório, com chip implantado, com a guarda para o tutor; representação em juízo pelo promotor, defensor; se o animal tiver bens responde pelos danos causados; pensão alimentícia; prestação de contas, do tutor, do patrimônio próprio do animal; crimes contra o animal. No Código Civil, atual, o animal tem natureza jurídica de bem semovente, no artigo 82, dos Bens, na Parte Geral, pois o mesmo possui valor de mercado, útil, não é gratuito, e nem gerado pelo ser humano, sendo que o correto não é o termo “tutor” e sim posse direta ou detenção, os quais não
2 Superior Tribunal de Justiça. RECURSO ESPECIAL Nº 1.713.167 - SP (2017/0239804-9). Julgado: 19/06/2018.
são direitos reais, direitos das coisas, para designar o contato dele com o possuidor direto ou detentor, pois o animal de estimação depende do auxílio deles para sobreviver, por ser domesticado e irracional, havendo uma hierarquia, não podendo ser integrado na natureza, para não desequilibrá-la. Esta classificação legal é uma opção do legislador o qual, deduz-se, preferiu não tratar de fatos desconhecidos, valendo mencionar que o Direito é a ciência do dever ser, sendo tratado o animal como bem por política legislativa, sendo notório tratar-se, na prática, de um ser vivo. No caso, já existem leis especiais, no Brasil, as quais protegem os animais em harmonia com a concepção da posição hierárquica do ser humano, e os juízos de valor expressos em uma lei estrangeira podem diferir dos entedimentos de outro país. Na sucessão, atual, há a transmissão de responsabilidades e direitos, após certo prazo, de uma pessoa desaparecida, a um terceiro. Se uma pessoa desaparecer, os herdeiros, por intermédio do juiz, irão obter uma declaração deste estado de fato, surgindo a curadoria e arrecadação dos bens, e após 1 ano, se não houver a nomeação de um procurador, advém a sucessão provisória dos bens e obrigações do defunto. Após 10 anos surge a sucessão definitiva, dos citados encargos e benefícios. Além disso, pode haver a sucessão definitiva, sem a curadoria dos bens do ausente e a sucessão provisória, se o defunto possuir 80 anos, e transcorrer 5 anos das últimas notícias dele. Há tambem o caso de presunção de morte, a ser declarada pelo juiz, se o ausente encontrava-se em perigo de vida ou desaparecido, ou prisioneiro, numa guerra, não for encontrado após 2 anos do término, estando estas regras dispostas nos artigos 6, 7, 22 à 39, do Código Civil, valendo salientar que se o ausente regressar nos 10 anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, receberá os bens no estado em que se encontram, e se não hou -
ver herdeiros ou interessados o patrimônio será incorporado ao Poder Público.
Atualmente, 15/03/2024, na sucessão do desaparecido, na 1ª fase, de curadoria e arrecadação dos bens, em função do animal ser um bem semovente vivo, útil, com valor de mercado, visando o bem estar dele, se não houver um testamento favorecendo o animal, indiretamente, com a parte disponível do ausente, respeitando as legítimas, nomeando uma pessoa, a qual poderá ou não receber uma liberalidade, com o encargo de cuidar do animal, o herdeiro tem a opção de posse direta do animal e o dever de partilhar o restante do valor de custo do animal com os outros herdeiros, se existirem, excluindo a fração, em dinheiro, do que ficou com o animal, nomear uma pessoa para ficar com a custódia do animal, enquanto não há sucessão provisória, ou, se não existirem herdeiros, o animal poderá ser destinado a um abrigo de animais, do Poder Público, ou vendido, doado. Se houver a reforma legal, segundo o texto do projeto, o qual não menciona se o animal, terá valor econômico e direito a legítima, e figurará no artigo 1.829, 1845, da lei civil ou haverá disposição própria, será considerado como sujeito de direitos, de fato, com capacidade de parte, em processos judiciais, representado pelo promotor; poderá herdar bens, da parte disponível do ausente, no respectivo nome; o poder familiar, do animal, pode ser conferido para qualquer pessoa; ao invés de custódia ou posse direta, haverá a guarda do animal, chamado de filho, com direito a pensão alimentícia; poderá ser adotado; haverá prestação de contas do patrimônio em nome dele o qual precisará pagar tributos advindos da sucessão; se o animal desaparecer, pode deixar bens por sucessão, mas apenas para animais ou para o fundo público; será proibido partilhar o animal como bem. Há risco de fraude, pois este animal pode ser registrado como filho durante o casamento e ficar com terceiros, havendo a possibilidade de
desvio de patrimônio, na sucessão da parte disponível do “tutor” desaparecido, para o terceiro alheio à família multiespécie.
DIREITO DAS
SUCESSÕES
INDIGNIDADE E DESERDAÇÃO 07
Milena Sabatini Lazzuri
O presente artigo tem como objetivo diferenciar indignidade e deserção, os dois institutos são pertencentes a exclusão na sucessão, mas com diferenças quanto a forma da exclusão.
Para melhor entendermos, a indignidade é decorrente de um crime cometido pelo herdeiro, causando assim sua exclusão na sucessão, sem a necessidade de ter previsão no testamento.
A exclusão por indignidade está disposta no art. 1.814 do Código Civil1 são:
“Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorre1 BRASIL – Código Civil – Lei 10.406/2002
rem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.”
Nos termos do artigo acima, a exclusão por indignidade, é uma punição, ainda que de natureza cível, não podendo passar da pessoa do ofensor, pois, conforme art. 1.816 do Código Civil, os sucessores do excluído, o sucedem como se morto estivesse o ofensor.
Um caso conhecido que foi aplicado a exclusão por indignidade, foi o da Suzane Von Richtofen, em razão de ter participado do homicídio dos pais.
Já deserdação nas palavras de SIMÃO2 (2019, p. 1525): “ é o instituto pelo qual o herdeiro necessário é privado de sua legítima e, por decorrer da vontade do morto, só pode ser efetuada por testamento.”
2 SIMÃO – José Fernando – Código Civil Comentado – Ed. Forense – Ed. 2019
O Código Civil em seu artigo 1.691, elenca as hipóteses de deserdação, são elas: ofensa física, injúria grave, relações ilícitas com a madrasta e/ou padrasto, por fim por desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.
Como dito antes, tanto a indignidade como a deserdação são institutos que excluem os herdeiros da sucessão, com a ressalva de que a punição pela indignidade abrange tanto os herdeiros necessários (filhos, netos, pais, cônjuge) como os herdeiros facultativos (sobrinhos, tios, primos, etc.). Já a pena de deserdação só atinge os herdeiros necessários.
DIREITO
DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES
INVENTÁRIO E PARTILHA: NOÇÕES GERAIS, INVENTÁRIO
JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL
Verônica Rodrigues Tagliari de Miranda Marques
Com o falecimento da pessoa natural opera-se a abertura da sucessão, em razão do princípio da Saisine, um dos princípios basilares do Direito sucessório, o qual preconiza que com a morte se verifica a transferência da herança de forma imediata aos sucessores legítimos e testamentários. O princípio possui origens no Direito romano, visto que desde os primórdios sempre se objetivou impedir que o patrimônio deixado pelo de cujus ficasse sem titular, passando os herdeiros a viver uma relação condominial, observando-se o condomínio dos bens em comunhão, verdadeiro condomínio hereditário.
Para que ocorra a transferência definitiva dos bens do falecido aos sucessores, com a divisão patrimonial conforme a distribuição dos quinhões hereditários, há a necessidade de arrecadação e liquidação do condomínio via inventário, havendo a divisão de bens para a partilha destes aos herdeiros.
Havendo litígio entre os herdeiros, necessidade da obtenção de documento ou informação atinente aos bens deixados pelo falecido ou ainda a existência de herdeiros incapazes necessário será o ajuizamento da ação de inventário, disciplinada nos artigos 1.991 a 2.017 do Código Civil, bem como nos artigos 610 a 673 do Código de Processo Civil. A competência para o ajuizamento do inventário judicial encontra disposição no artigo 48 do Código de Processo Civil1, o qual determina que deverá ser proposto no foro do domicílio do falecido, mesmo tendo falecido no estrangeiro, possuindo também disposição no artigo 1.785 do CC2
1 Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. Parágrafo único. Se o autor da herança não possuía domicílio certo, é competente: I - o foro de situação dos bens imóveis; II - havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes; III - não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do espólio.
2 Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.
O artigo 23 do CPC 3 determina que compete a autoridade judiciária brasileira proceder à confirmação de testamento particular e o inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional, seguindo o princípio da territorialidade. Os bens eventualmente deixados no exterior deverão seguir as regras sucessórias do país em questão, pelo princípio da pluralidade de juízos sucessórios.
Paralela à modalidade de inventário judicial, a Lei nº 11.441 de 2007 ainda possibilitou a realização de inventário e partilha por via administrativa, mediante a lavratura de escritura pública perante o Tabelionato de Notas. Os requisitos para a realização do procedimento de inventário extrajudicial estão presentes no artigo 610 do CPC 4 e exigem herdeiros capazes e concordes. Importante frisar que o inventário extrajudicial poderá ocorrer em qualquer Tabelionato de Notas do Brasil, uma vez que não se observa a competência para o inventário judicial imposta pelo artigo 48 do CPC.
No tocante à existência de testamento, que anteriormente representava impeditivo para a modalidade extrajudicial do inventário, atualmente foi alterado
3 Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional; III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.
4 Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. § 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras. § 2 o O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
mediante decisão da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, o qual entendeu ser “possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente.”5 Para se obter a informação de existência ou não de testamento basta a realização de pesquisa perante o Colégio Notarial do Brasil, a fim de se obter a Certidão de Inexistência de Testamento.
Com relação ao prazo para a abertura do inventário, seja judicial ou extrajudicial, o artigo 611 do CPC 6 determina que deverá ser ajuizado dentro de 2 meses, a contar da abertura da sucessão, representando verdadeiro prazo tributário, vez que a não observância de referido prazo irá implicar no cômputo de juros e de multa sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD, imposto estadual incidente sobre a transmissão de bens oriunda da abertura sucessória.
5 STJ. 4ª Turma. Resp 1.808.767 – RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2019.
6 Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte.