Os nossos mitos/As nossas crenças...
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Superstição da sexta-feira 13 Márcia Bertoluci, 12.08
!"#$%&'()'#*&'+,'#-%'%!./0"1'2"3"0'("'41"3567"8'&)9$":2)/0"';<='>".)0,'#)7)&&/("()'()'$)0'1)(%'()&$)' #?1)0%='>,'(!"&'3)#("&'()'@,'1!/$%&'"#%&'"$0,&'"&&%7/"("&'"')&$"'&!A)0&$/B-%C'D'A0/1)/0"'(/E/"'F!)'#!1' G"#F!)$)')&$"."1'A0)&)#$)&';H'()!&)&')'F!)I'&)1'&)0'7%#./("(%I'"A"0)7)!'J%K/'LM)!&'("'M/&7*0(/"I'(%' 2%N%')'("'1"3("()O'F!)'A0%.%7%!'"'1%0$)'"'P)3(%0I''F!)')0"'%'2".%0/$%'(%&'()!&)&C' D'&)N!#("'7%#$"'F!)'Q0/N"'L()!&"'(%'"1%0')'("'G)3)E"O'&)'$0"#&2%01%!')1'G0!9"'F!"#(%'"&'$0/G%&'#*0(/: 7"&'&)'7%#.)0$)0"1'"%'70/&$/"#/&1%C'R&$"I'A"0"'&)'./#N"0I'$%("&'"&'&)9$"&'2)/0"&'&)'0)!#/"'7%1';;'G0!9"&')' %'()1*#/%'A"0"'0%N"0'A0"N"&'"%&'@!1"#%&C Q%/'$"1G51'#!1"'&)9$":2)/0"'';<'()';<ST'F!)'%'0)/'("'Q0"#B"'1"#(%!'A)0&)N!/0'%&'$)1A3,0/%&')97%1!#: N"#(%:%&I'A)0&)N!/#(%:%&'%!''F!)/1"#(%:%&'#"'2%N!)/0"C' U%0'%!$0%'3"(%I''@,'F!)1'.)+"'%'#?1)0%';<'7%1%'&%0$)I''./&$%'F!)';V<WXI'7%00)&A%#()#(%'"%&'F!"$0%' elementos: terra, ar, água e fogo.
Sexta feira 13 – Fomos ver p’ra crer No passado dia 13 de abril (sexta-feira), a turma 1206 deslocou-se a Montalegre no âmbito do projeto interrogar a ciência (PIC). A participação neste projeto teve como motivação a vontade de vivenciar as atividades comemorativas do dia das bruxas, em Montalegre. A acrescentar a esta curiosidade, os alunos manifestaram interesse em participar no referido projeto, fazendo o máximo de registos para, em jeito “jornalístico”, dar conta da experiência e dos saberes adquiridos sobre mitos e crenças. À chegada a Montalegre, já era notório o ambiente festivo alusivo à ocasião, quer por parte dos habitantes, quer pelos inúmeros visitantes. As ruas já se encontravam animadas por vários grupos e decoradas com barraquinhas de artigos associados a esta comemoração. O grupo desde logo se sentiu envolvido pelo ambiente peculiar e aguardou com expectativa o espetáculo noturno. Apesar de as condições climatéricas não terem sido as desejáveis, a animação nas ruas não foi afetada. Durante o espetáculo, os participantes puderam assistir ao es!"#$%!&'()*!&+(,!&-./%(&0!"*(1&(&2(2(%&.&3$()4./.5&6 ."/!&.11)4&,)7%(1&/(&*!/!1& !1&4.,(18&9&6".,):.%&(1*(&%)*$.,5&.11)1*)$;1(&.&$4&(1+(*< $,!&+)%!4$1) .,&".1&4$%.,=.1&/!& .1*(,!8 Para uma melhor compreensão e contextualização da vivência deste ritual, o grupo agendou um encontro com o senhor Padre Fontes, para partilhar )/().1&(&%(>(?@(1&1!2%(&A)B" ).&(&-1($/! )B" ).5&./3$)%)/.1& !4&.&,()*$%.&/!& livro Um mundo Infestado de demónios de Carl Sagan. À inesquecível satisfação dos momentos noturnos, acrescia a expectativa de conhecer e conversar com o senhor Padre Fontes e saciar, através da entrevista, a curiosidade de todos. Num ambiente familiar, o nosso entrevistado abriu-nos o seu espaço (em Vilar de Perdizes) e recebeu-nos de uma forma tão espontânea e tão acolhedora que o calor que emanava da lareira apenas nos reconfortava o físico. Nesta atmosfera, a conversa não se fez esperar e à primeira oportunidade, as perguntas surgiram.
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Sexta-feira 13...
!"!#$%&'(%#)#(*+()#*+#,+$-+.)&#-!*)$#)$#$+/-)$0#,+(0 &)$#123 Sendo padre, não é dia santo nenhum. Geralmente, os dias santos são marcados pelas igrejas a nível mundial. Há os dias santos que agora até querem cortar, mas nós aqui decidimos inventar um dia santo diferente, que não tem santo nenhum nem diabo nenhum, mas é uma mistura de santos e diabos. (risos) A razão de fazermos isto foi para promover o turismo, a nível local e regional. Com o pretextoo do tema aliciante da magia e bruxaria, a coincidência da sexta xtaa com o 13, que não sãoo muitas e criar aconntecimentos numa época em que não acoontece nada. É também ém para dar movimento to à restauração e à hotelaria e fomentar o crescimento, uma vez ez lass que quem vem classii6 .;"!1& !$& /(1 ,.11)1)6 .;"!18& C(& *(4& 2!4& 4& serviço voltam. Esta foi uma iniciaativa que caiu bem na nossa mentalidade celta, mítica, religiosa, pagã, supersticiosa, curiosa… Somos todos curiosos das coisas desta área, da bruxaria, do ocultismo, magia, mauolhado, inveja… essas atitudes que afetam a sociedade menos educada. É uma forma das pessoas se questionarem e brincar com aquilo que as aterroriza ou ameaça, e foi daí que nasceu, aqui em Vilar de Perdizes, a tradição da queimada. Fazíamos uma queimada, que nasceu à lareira da minha casa materna aos meus 5/10 anos. Quando estávamos gripados, os meus pais punham a caçarola ao lume com aguardente, chegavamlhe o fogo e à luz da candeia, nós tínhamos uma cor quase de desenterrados (risos), aquele azulado com um amarelado, e passávamos com a caçarola pela cara de cada um para vermos a cara que fazíamos, vendo as almas do outro mundo, vendo as bruxas. São coisas da minha infância. Mais tarde, como padre aqui em Vilar de Perdizes, rodeei-me de colegas galegos que tinham a mesma tradição, mas com mais aparato, com mais esconjuro.
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Um colega galego em 1973/72, participava em convívios e serões, aqui, e fazíamos os mesmos rituais. Ele ci tou um esconjuro dos galegos e assim me associei aos !"D%(11!1&/(&4(/) )".&+!+$,.%&(4&EF8&G!&64&/!1& !"gressos, que eram ao sábado, fazíamos uma queimada na rua, com uma caldeira de 40/50 litros de aguardente, no centro social, onde toda a gente podia participar. Fazíamos o esconjuro numa forma mais aportuguesada, e a partir daí realizávamos, todos os anos, esse ritual em Vilar de Perdizes. A H4.%.&1$D(%)$&3$(&6:I1semos isso mesmo em Montalegre, com publicidade chamativa e programa criativo, com grupos musicais e teatrais, feira de produtos, conseguiu chamar-se muita gente. A câmara viu que dava uma boa semente e aproveitou para semear no ano seguinte. Dá muitos frutos, sim dá! 4$-)$# 5!"+"!&)67+$# 8&+9*+"0$+#5!"#)#5&+90 6)# +"# :&%/)$;# 4<)$# +/0 ($-+"#"+$"!3 Tu é que sabes se e-xistes ou se não existes. (risos) Bruxas são uma crença medieval de pessoas que se diziam bruxas, que se embruxavam, que tinham poder, que tinham mau-olhado, que podiam atormentar as pessoas, animais e negócios. Fantasias que queremos /(14)*)6 .%& !4& (1*.& 2%)" ./()%.& /.1& 1(?*.1& JF& /).5& das bruxas. Em todas as aldeias havia dias das bruxas às sextas e terças. As bruxas juntavam-se num sítio (1+( K6 !8&93$)&(4&L),.%&/(&-(%/):(1&1M!&!1& .4+!1& de Valdim; em Montalegre é o Areal do Pereira, um sítio onde se acampava, numa encruzilhada qualquer, e ali faziam os combinados de patifarias que iam pregar aos homens ou mulheres, ou a quem fosse. Mas isso são tudo crenças! Como se dizia que o diabo andava à noite na rua, que não se podia andar na rua à noite, que não se podia assobiar à noite, pois chamava-se o diabo e que não se podia brincar com o lume, porque mijava-se na cama (risos). Há assim uma série de crenças que eram mais os pais que nos metiam esse medo para nos controlarem. Mas hoje já ninguém nos controla (risos).
Sexta-feira 13... =+$-)# +9-&+>($-)?# 8&+-+9*+"!$# ,)@+&# %")# <(')6A!# +9-&+#)#5(B95()#+#)$#5&+96)$;#4$-)9*!#9!#$C5;#DDE?# +"#F%+#)#5(B95()#$+#)G&")#5)*)#>+@#")($?#F%)<#C#!# <%')&#*+$-+#-(8!#*+#5&+96)$3 A ciência ajuda a evolução no campo da cultura tradicional, das crenças. Há coisas que a ciência não atinge, o sobrenatural. Mas o que é natural, da nossa criação e da nossa imaginação, a ciência pode selecionar e dizer, isto é falso e isto é como 2+2 serem quatro, não é por brincar com o lume que vais mijar na cama, ou assobiar de noite que vai fazer o diabo vir atrás de ti. E é isso que a ciência vai esclarecer e ajudar a entender que nem tudo o tem fumo é fogo… H):+"!$# F%+# !&0 ')9(@)#!$#5!9'&+$0 $!$# # *+# "+*(5(9)# 8!8%<)&# *+$*+# 1IJ2?# +"#K(<)&# *+# L+&*(@+$;#M%)<#C#!# !:.+-(>!#*+$-)#(9(0 5()-(>)3 O primeiro foi só para alertar a região para não perder a tradição no campo da herbanária, dos chás como produto natural, saudável e equilibrado que os pode ajudar, e também para transmitir o conhecimento uns aos outros. A partir /(&JNEO5&(1*)7(&"!&1(%7)P!&4I/) !&/.&+(%)'(%).&(&63$()& encarregue de criar postos médicos e instalar os médicos nas aldeias. Consegui pôr aqui, nesta aldeia, um posto médico. Arranjei casa e espaço para o médico dar consultas e fui à casa dos padres das outras aldeias para fazerem o mesmo. Comecei a dar conta que as pessoas iam ao médico por pequenos problemas, pequenas gripes e trocavam o chá pelas pastilhas do médico. Achei que isso era um exagero e que quem era mais afetado eram os velhos e as crianças. Os velhos nunca tinham tomado dessas coisas e agora estavam
13 a tomar tudo e mais alguma coisa e as crianças, que eram virgens nesse campo, começavam a ser vítimas /)11!8&Q$&6:&$4&.,(%*.&(&*.42I4&'$)&7K*)4.8&R( (2)&$4& processo disciplinar, pois pus lá no consultório um letreiro a dizer “Pés quentes, cabeça fresca, canais a-bertos, boa urina, merda p’ra medicina. (risos) Como na sexta-feira 13, veio aí toda a comunicação social local, regional, revistas, televisões galegas e portuguesas, deu eco e toda a gente soube disso. E desde aí, continuamos. 4# )$# 8+$$!)$?# *+0 8!($# *+$$+$# "+$0 "!$#5!9'&+$$!$#*+# "+*(5(9)# 8!8%0 <)&?# *+(/)&)"# *+# (&# -)9-)$# >+@+$# )!# "C*(5!# 8!&# 5)%$)# *+# %")# '&(8+0 @(9N)3 Sim, depois passaram a conhecer mais os chás, a cultivá-los e a pô-los na horta. Fiz concursos de hortas várias vezes. H):+"!$# F%+# *+$0 *+#"+9(9!#$+"8&+#-+>+#%")#8)(/A!#8+<)$#8<)9-)$;# O5&+*(-)#9!$#$+%$#8!*+&+$3 &9&SK2,).&/):&T1(#.4&.1&%.K:(15&.1&'!,=.1&(&.1&>!%(1&!& teu elemento e o teu remédio”. É assim em todas as civilizações. Nós alimentamo-nos delas, ou comemos ou não comemos. Todos esses produtos nos mantêm saudáveis e equilibrados. L)&)#-+&"(9)&#+$-)#+9-&+>($-)?#F%+&+"!$#8+*(&0<N+# F%+#*+(/+#%")#"+9$)'+"#)!$#.!>+9$; O mundo e o futuro é vosso! Estamos à vossa espera! P%(-!#!:&(')*!?#$+9N!&#L)*&+#Q!9-+$?#8+<!#-+"8!# F%+#*($8!9(:(<(@!%#+#>)"!$#5!"#)#5+&-+@)##*+#F%+# +$-)#5!9>+&$)#>)(#8&!*%@(&#,&%-!$;
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Sexta-feira 13
A ignorância ou o pior de todos os demónios … Atualmente, a ciência parece progredir rapidamente, mas, quando olhamos para ao passado, damos conta que os estudos rigorosos de Galileu sobre a velocidade da luz foram incipientes, já que estavam condicionados pela ciência da época. Coube a A. Fizeau, mais de 200 anos após Galileu, a glória de determinar a velocidade de propagação da luz pelo “Método da Roda Dentada”. A ciência constrói hipóteses que podem ser testadas em busca de um conhecimento temporariamente duradouro, não procura o nosso acordo nem vai ao encontro dos nossos pré-conceitos, apela à criatividade e à especulação, ao colocar hipóteses, que serão testadas até se concluir qual a que mais se aproxima da verdade em determinado momento. G!&("*."*!5& !4!&.6%4.&A.%,&C.D."5&/(7(4!1&(1*.%& !"1 )("*(1&/.1&"!11.1&,)4)*.P@(1& e o cientista deve continuar à procura de novos dados. Deve manter a mente aberta +.%.&3$(&.&7(%/./(&"M!&63$(& !4+%!4(*)/.5&#<&3$(&.1&7(%/./(1& )("*K6 .1&1M!&1(4+%(& provisórias. Ante as descobertas, oscilamos entre o deslumbramento acrítico e o ceticismo pseudoinformado pelas notícias, quantas vezes, incapazes de detetar argumentos falaciosos e fraudulentos. A mediatização das notícias e a especulação jornalística adulteram frequentemente os conteúdos. Resumem e sintetizam, reduzindo, por vezes, a um título o que pretendem vender. Quem lê?! Uma população cada vez mais afastada do que são a ciência e a termino,!D).& )("*K6 .5&.,=().&.!&)"1$ (11!&(&.!&(%%!5&4.1& ./.&7(:&4.)1&)"*(%(11./.&"!1&%(1$,*./!15&".1&/(1 !2(%*.1&(&".1& promessas de eterna juventude e outros mundos. Vítimas do buraco na camada do ozono, das alterações climáticas, da poluição e /.&*.,)/!4)/.5&!,=.4!1& !4&/(1 !"6."P.&+.%.&.& )B" ).5&3$(5&.,)./.&U&/(1 %("P.& na razão humana e ao relativismo que constitui uma tendência da atualidade, 4(%D$,=.&!&1(%&=$4."!&(4&:!".1&/(&/(1 !"6."P.&(&*%(7.18 Empurramos os nossos medos para o subconsciente e eles povoam os nossos sonhos sob todas formas. Mas, para quê questionar a ciência se é mais fácil aceitar a superstição e pseudociência? A impotência da medicina atira-nos para a fé e o silêncio desta, para a crença em curandeiros e bruxas. Dantes, os demónios escolhiam os ímpios e os descrentes. Hoje, os descrentes escolhem a ignorância e alimentam os seus próprios demónios com medo do conhecimento. Somos assolados pelas trevas da nossa ignorância e temos sonhos povoados por demónios privados que em festas e romarias exorcizamos. Afastamos o burro no 1º de maio, festejamos o dia 13 e o dia das bruxas e dizemos que certas ações parecem obra do demónio. Ao longo dos séculos, substituímos curandeiros por médicos, mezinhas por remédios, possuídos por esquizofrénicos, demónios por extraterrestres e raptos por abduções e, surpresa das surpresas, continuamos mergulhados na escuridão da nossa ignorância, com medo de demónios, piores que os de outrora. 9=V&W.1&($&"M!&. %(/)*!&(4&/(4X")!1V&Y&96%4.4!1& !"7) *!18 Porém, não acreditarmos nos demónios não nos protege deles, devemos sim, identi6 <;,!1&+.%.&!1& !42.*(%8 Z%D(&. .2.%& !4&.&),)*(%. ).& )("*K6 .8&9&)D"!%H" ).&(&.&+(%1)1*B" ).&".&%(,.*)7):.PM!& /.&)4+!%*H" ).&/(& !"=( (%4!1&.&*(%4)"!,!D).& )("*K6 .&/(7(4&. .2.%8&-("1.;1(&3$(& aquele que não acredita na ciência não acredita em nada. Mas é um erro, aquele que não acredita na ciência acredita em quase tudo o que é pseudociência e vive não em função da experiência, mas da crença.
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