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CONSELHO
Comissão Editorial Professora Doutora Ana Cristina Zadra Valadares Professor Mestre Anizio Viana da Silva Professora Mestra Cassiana Fagundes da Silva Professora Mestra Claudia do Carmo de Stefani Professora Mestra Elizane Andrade da Silva Professora Mestra Franciele Cristina Manosso Professor Mestre Gilmar Dias Professora Mestra Gislaine Vilma Vidal Kazeker de Siqueira Professor Doutor Guilherme Augusto Pianezzer Professor Mestre Guilherme Fonseca de Oliveira Professora Doutora Jaqueline Koehler Professora Mestra Lorete kossowski Mocelin Professora Mestra Maria Luiza Sobreira de Oliveira Professora Mestra Mirian Ramos Marques Pimentel Professora Doutora Mônika Christina Portella Garcia Kukolj Professora Mestra Noeli Pinto Steklain Professor Mestre Rafael Gemin Vidal Professora Mestra Renata Christovão Bottino Professora Mestra Rosana Schwansee Romanó Professora Mestra Susana Pitol Guasti
Comitê Científico Professor Doutor Antônio Charles Santiago Almeida Professora Doutora Clélia Peretti Professora Doutora Deisily de Quadros Professora Doutora Elaine Turk Faria Professor Doutor Marcos Mincov Tenório Professora Doutora Maria Fani Scheibel Professor Doutor Paulo José da Costa Professora Doutora Valéria de Meira Albach
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DADOS CATALOGRÁFICOS
Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. V857
Vivências Educacionais / Faculdade Educacional da Lapa. v.6, n.1 (jul.- dez. 2020) Lapa: Fael, 2020 Semestral ISSN: 2526-0529 1. Ensino Superior 2. Formação 3. Educação a distância 4. Gestão Pública CDD 370
Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.
Presidente do Conselho Prof. Me. Flávio Alves Pozzi
Diretores Diretoria Executiva Diretoria Operacional Diretoria Acadêmica
Luiz Borges da Silveira Filho Marcelo Antonio Aguilar Francisco Carlos Sardo
Editora Fael Diretoria de Inovação, Desenvolvimento e Qualidade Coordenação Editorial
Raquel Andrade Lorenz
Projeto Gráfico
Evelyn Caroline Betim Araujo
Arte-Final
Evelyn Caroline Betim Araujo
Capa
Rafael Luis Blanski de Menezes
Revisão
Editora Coletânea
Tradução
Alexandre Scussel
Infraestrutura TI
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Valmera Fátima Simoni Ciampi
Alexssandro Domingues de Lima Claudio Ney Lins Goslar
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APRESENTAÇÃO
A Revista Vivências Educacionais apresenta seu sexto volume e segue com o desafio de documentar as experiências de docentes e discentes externos e dos cursos da FAEL para todo o país. Amparada pelos grupos de pesquisa: cultura, tecnologia e aprendizagem, vinculado à área de ciências humanas e estratégia, sustentabilidade organizacional e empreendedorismo, vinculado à área de gestão, apresenta abrangência e pertinência com temas que dialogam com toda a realidade brasileira. Vale destacar que a revista conta com duas equipes de grande importância: a Comissão Editorial, formada pelos docentes da FAEL, e o Comitê Científico, formado por professores doutores de instituições externas, e que são responsáveis pela avaliação e aprovação/reprovação dos artigos que serão publicados na Revista Vivências Educacionais. Nesta edição, temos o prazer de apresentar a vocês, caros leitores, artigos com temas vastos. Temos certeza de que o leitor encontrará aqui um celeiro de informações que pode ajudar na sua formação pessoal e profissional. Fico também orgulhoso de apresentar mais essa produção intelectual da FAEL. Desejo uma ótima leitura e boas vivências educacionais.
Prof. Dr. Flavio Alves Pozzi Presidente da Comissão Editorial
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO................................................................................................................................................... 5 A CONTRIBUIÇÃO DA LITERATURA INFANTOJUVENIL NA FORMAÇÃO DE LEITORES NO ENSINO FUNDAMENTAL II................................................................... 9 The contribution of children’s literature for preparing readers in Fundamental Education II COELHO, Adriana Márcia Silva Santos KOEHLER, Jaqueline A DIFICULDADE DE ADAPTAÇÃO DO ALUNO SEM CONHECIMENTO DE INFORMÁTICA NO ENSINO A DISTÂNCIA ONLINE............................................... 16 The difficulty of adaptation of the student without computer knowledge in online distance education SCHIMALSKI, Paulino BOLFE, Juliana A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E AS DESPESAS COM PESSOAL NOS MUNICÍPIOS DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.................................................... 24 The fiscal responsibility law and personnel expenses in the cities of Espírito Santo state ZANONI, Patrick ZANETTI, Elizabeth A PESQUISA EM LETRAS NA FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DO PORTO (FLUP-PORTO) – EXPERIÊNCIAS DE INTERCÂMBIO.......................... 35 Research in Letters at the College of Letters of the University of Porto (FLUP-PORTO) – exchange experiences OLIVEIRA, Cristiano Mello de; AFROBETIZAÇÃO: CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA NA EDUCAÇÃO INFANTIL E NO ENSINO FUNDAMENTAL I....................................................................... 46 Afrobetization: african and afro brazilian culture in childhood education and Fundamental Education I MENDES, Christiane OLIVEIRA, Ana Cristina Cury Teodoro de CARÊNCIAS VIRTUAIS: O PROFESSOR E A AVALIAÇÃO DO ALUNO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA.................................................................................................... 61 Virtual needs: the teacher and the evaluation of students in distance education CÂMARA, Uipirangi; CÂMARA, Ivanete Faculdade Educacional da Lapa - FAEL
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SUMÁRIO
COMPORTAMENTO DE CONSUMO: GERAÇÃO X E Y EM RELAÇÃO AOS FILHOS.................................................................................................. 68 Consumption behavior: generation X and Y towards children DEICHMANN, Thiane Dorada VIVAN, Luiz Alberto POZZI, Flavio Alves JOGOS E BRINCADEIRAS DE ACORDO COM A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR PARA A APRENDIZAGEM E O DESENVOLVIMENTO DAS CRIANÇAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL...... 78 Games and playing according to the Common National Curricular Base for learning and development of kids in childhood education SILVA, Elizane A. da O SER HUMANO E AS REDES SOCIAIS – ALGUMAS DEFINIÇÕES............................................................ 85 Human beings and social networks – some definitions SANTOS, Rodrigo Otávio dos; ORIENTAÇÃO ARGUMENTATIVA DAS SEQUÊNCIAS DESCRITIVAS EM RESUMOS DE ARTIGOS ACADÊMICOS.................................................................................................................................... 91 Argumentative orientation of descriptive sequences in Abstracts of academic articles ANDRADE, Valter Zotto de; PROFESSORES DE FÍSICA EM TEMPO DE CIBERCULTURA: A UTILIZAÇÃO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NAS AULAS DO ENSINO MÉDIO NAS ESCOLAS DA REDE DE ENSINO PRIVADA.............................................................................. 96 Physics teachers in cyberculture time: the use of digital information and communication technologies in high school classes in private schools FERNANDES, Renato Izac BRITO, Glaucia da Silva PROPOSTA DE MODELO DE AVALIAÇÃO DE FORNECEDORES COMO FERRAMENTA PARA A FISCALIZAÇÃO DE CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE NATUREZA CONTINUADA: ESTUDO DE CASO EM UMA AUTARQUIA NO MUNICÍPIO DE MANAUS-AM...........106 Proposal of a supplier evaluation model as a tool for the supervision of continued service contracts: a case study in an autorchy in the city of Manaus/AM abstract BATALHA, Lucas de Souza GUASTI, Susana Pitol 8
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A contribuição da literatura infantojuvenil na formação de leitores no ensino fundamental II The contribution of children’s literature for preparing readers in Fundamental Education II COELHO, Adriana Márcia Silva Santos1 KOEHLER, Jaqueline2
RESUMO O presente artigo aborda a importância da contribuição da literatura infantojuvenil na formação de leitores no ensino fundamental II. Por meio de pesquisas bibliográficas e com base nas ideias defendidas pelos autores Almeida (2017), Coelho (2000), Silva (1986, 1991, 1998), entre outros, demonstrou-se que na literatura existem grandes possibilidades de o aluno explorar mais sua criatividade e aumentar sua autoestima, e que são várias as possibilidades de inseri-la na escola, em uma concepção mais global de inserção social na formação de leitores. Formar leitores requer condições favoráveis para a prática de leitura, que não se restringe apenas a textos literários, mas também a ler obras de arte, pois é fundamental para compreender aquilo que não foi escrito explicitamente, ativando os conhecimentos prévios, usando a imaginação e a criatividade. A literatura infantojuvenil, se for bem aplicada e compreendida, poderá contribuir para a formação de bons leitores, capazes de se envolverem e se interessarem no que há de melhor nas obras literárias. Ler obras infantojuvenis implica desvendar mistérios e compreender mundos, e ultrapassa qualquer ideia de se querer mensurar ou colocar limites de sentido. Tal postura caminha na direção de possibilitar a formação de bons leitores, que não só sintam o desejo de ampliar os saberes, mas que tenham o prazer pela leitura literária, uma prática que pode ser cultivada em nosso cotidiano, tanto na escola como fora dela. A literatura nos faz crescer. Palavras-chave: Literatura. Infantojuvenil. Leitores. Fundamental II.
ABSTRACT This article addresses the importance of the contribution of children’s literature for training readers in elementary school ll. Through bibliographic research and based on the ideas defended by the authors Almeida, Coelho, Silva and others, our studies show there are great possibilities for the students to further explore their creativity and increase their self-esteem, as well as there are several possibilities in order to insert the literature at school, based on a wider global conception of social insertion in preparing readers. Training readers requires favorable conditions for the practice of reading, which is not restricted only to literary texts, but also to reading works of art, as this is essential to understand what was not written explicitly, activating previous knowledge using imagination and creativity. Child and youth literature, if well applied and comprehended, can contribute for the formation of good readers, making them capable of being involved and interested in the best that literary has to offer. Reading children’s books implies unraveling mysteries and understanding worlds, and goes beyond any idea of measuring or placing limits on meaning. Such a posture moves forward to enabling the formation of good readers who will not only desire to expand knowledge, but also will have 1 2
Aluna do curso de graduação em Licenciatura em Letras Português e Espanhol da Faculdade Educacional da Lapa. Polo: Vilhena. E-mail: adrimarcia_coelho_vha@hotmail.com Professora, Doutora e mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná. Possui graduação em Letras pela Universidade Federal do Paraná (2003). Possui experiência em cursos de graduação e pós-graduação, na criação de material didático e em EaD.
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pleasure of literary reading, a practice that can be cultivated in our daily lives, both at in and outside school. Literature makes us grow. Keywords: Literature. Children and adolescents. Readers. Fundamental ll.
INTRODUÇÃO Este artigo abordará o tema “A contribuição da literatura infantojuvenil no ensino fundamental II”. A importância de discutir esse tema se justifica pelas possibilidades que a literatura pode trazer no sentido de ampliar, transformar e enriquecer a formação do leitor, não forçando a leitura, mas o despertar do imaginário, o enriquecimento da visão de mundo e a ampliação do universo cultural.
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Verificou-se que a literatura infantojuvenil levou à aproximação do aluno ao universo de leituras diversificadas, dando-o a oportunidade de construir e expressar habilidades e competências que podem ser aprimoradas em seu desenvolvimento, preparando-o para contribuir nas transformações sociais e na construção de relações interpessoais mais flexíveis e humanas, possibilitando a integração das diferentes áreas do conhecimento. A metodologia pautou-se em pesquisa bibliográfica, com enfoque qualitativo e descritivo, tendo como objetivo geral a contribuição da literatura para a formação de leitores, com intuito de promover uma leitura de qualidade e significativa, lançando desafios antes, durante e depois das leituras das obras, fazendo com que o aluno possa perceber que existem habilidades a serem desenvolvidas que colaboram para uma leitura mais crítica. A pesquisa buscou respostas às seguintes questões: a literatura contribuiu de forma significativa na formação de leitores no ensino fundamental II? Como foi verificar as práticas de leituras interessantes com bases nos recursos oferecidos com as novas tecnologias e materiais favoráveis que atendam à faixa etária dos alunos? Portanto, no decorrer da pesquisa foram apresentadas propostas e alternativas, pesquisadas em fontes diversas e citadas pelos autores Almeida (2017), Coelho (2000), Silva (1986, 1991, 1998), entre outros mencionados na pesquisa, as quais já foram utilizadas em outras localidades, alcançando bons resultados, além de serem adequadas à nossa realidade e que podem servir como alternativas viáveis para auxiliar os profissionais da área interessados em desenvolver trabalhos inovadores, buscando despertar interesse e o prazer dos seus alunos pela leitura infantojuvenil, não se esgotando, porém, em nossas abordagens, as possibilidades criativas para que tal fato se concretize com sucesso. A pesquisa foi organizada em partes: a primeira contemplou o tema a ser tratado, em seguida a introdução, a fundamentação teórica, as considerações finais e por fim as referências. É de suma importância que o leitor em formação receba estímulo constante para realizar interações com obras literárias, dos mais diversos gêneros, dos clássicos aos contemporâneos, dando-lhes a oportunidade de construir e expressar habilidades e competências que podem ser aprimoradas em seu desenvolvimento leitor.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Histórico da literatura infantojuvenil Nos anos 70, houve um expressivo crescimento da produção literária infantil brasileira, motivado, principalmente, pelos projetos educacionais, preocupados com o baixo índice de leitura dos alunos e decididos a fazer chegar às escolas um grande número de obras destinadas às crianças e aos jovens. A expansão do mercado dessas obras, além de provocar o aparecimento de novos títulos e autores, favoreceu o aperfeiçoamento das técnicas de editoração de recursos gráficos e visuais. Os temas moralizantes, conservadores e autoritários que predominavam em épocas anteriores, dão lugar ao humor, à narração de aventuras e de viagens espaciais, ao envolvimento dos personagens nos problemas sociais e na busca de soluções. O ponto de partida começa com a publicação, em 1921, da obra A menina do narizinho arrebitado, de Monteiro Lobato. 10
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Nos textos de Lobato destinados aos públicos jovem e infantil, a linguagem é bem próxima da realidade; é a linguagem das narrativas orais dos serões domésticos. A finalidade desses textos era mostrar o prazer de contar e ouvir histórias, de trocar ideias, de provocar soluções alternativas para os problemas do cotidiano e do mundo. De acordo com Maria Helena Zancan Frantz (1998, p. 68), “movimentando seus personagens num mundo fantástico e simultaneamente real, Monteiro Lobato inova completamente a literatura destinadas às crianças brasileiras”. Segundo a autora, é uma literatura instigante, nova, que propõe ao leitor uma reflexão sobre a realidade que o cerca. As obras de Lobato serviram de modelo a muitos escritores de sua época e inspiram até hoje autores que se preocupam em produzir obras que levem as crianças e os jovens a buscar significados, a criar e a descobrir.
A literatura infantojuvenil tem sido uma das temáticas mais abordadas nos últimos anos; o ensino da literatura tem uma dimensão muito perceptível, e ler é uma atividade recorrente em diferentes espaços sociais. As primeiras experiências de leitura costumam ocorrer das mais diversas formas, segundo as condições econômicas e sociais de acesso de livros e demais impressos que circulam na sociedade; vão além do prazer proporcionado por ouvir histórias. Os caminhos da literatura podem ser muitos e cada leitor pode descobrir ou construir o seu caminho. Tem-se uma vasta literatura destinada às crianças e aos jovens; são narrativas de grandes autores, tanto nacionais quanto internacionais, como Jean de La Fontaine, Charles Perrault, Hans Christian Anderson, Luiz da Câmara Cascudo, Ruth Rocha, Ziraldo, Eliardo França, Ana Maria Machado, dentre outros, que contribuíram e ainda contribuem com a produção literária. A leitura de obras infantojuvenis nas mais variadas manifestações (fábula, apólogo, conto de fadas, conto maravilhoso, poesia, lenda e romance) requer uma atenção maior do professor, para desenvolvimento do hábito da literatura. Tais obras possuem características importantes para o repertório dos alunos, ativando sua imaginação e estimulando sua capacidade de reflexão.
A literatura e sua exploração em sala de aula Um dos múltiplos desafios a ser enfrentado pela escola é o de fazer com que os alunos se interessem por textos literários; para isso, se faz necessário propor mudanças, posturas de pensamento, hábitos, como meio de construir os conhecimentos necessários para poder abordar as diferentes etapas da sua aprendizagem. Paulo Freire (1979, p. 58), nos lembra de que “para ocorrer uma mudança de postura é necessário que haja compromisso em querer mudar”. Faz-se necessário que o professor seja um leitor que pesquise e tenha conhecimento das obras infantojuvenis, para oferecer o que há de melhor para os alunos, propiciando uma nova visão da realidade, buscando respostas em diferentes meios de informação. Segundo Ezequiel Theodoro da Silva (1998, p. 30):
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Lobato discute temas históricos, narra inúmeros contos e lendas dos folclores e cria aventuras de um mundo imaginário, maravilhoso; traz para os universos infantis assuntos e temas que antes eram reservados ao público adulto.
[...] todo professor é um livro e, consequentemente, uma promessa de leitura para seus alunos, a questão é saber se esse livro se renova e se revitaliza na prática do ensino; de que maneira esse livro se deixa fruir pelos alunos-leitores e se esse livro se abre à reflexão e ao posicionamento dos leitores, permitindo a produção de muitos livros e textos.
Nesse sentido, ao trabalhar com a literatura infantojuvenil, o professor faz toda a diferença na sala de aula, formando cidadãos mais conscientes e responsáveis, proporcionando mudanças de pensamento, hábito e gosto pela leitura. Percebe-se que a literatura infantojuvenil passa por uma fase de grande desenvolvimento; ela cresceu mais e evoluiu nas últimas décadas; se mantém viva, em um processo contínuo. Trabalhar com a literatura infantojuvenil corresponde, de alguma forma, aos anseios do leitor e à sua identificação com ela. Dentre as várias formas de trabalhar a literatura em sala de aula, uma das maneiras simples e ao mesmo tempo eficiente é despertar o gosto pela leitura. Segundo José Nicolau Gregorin Filho (2009, p. 77), “trabalhar com a literatura Infantojuvenil em sala de aula é criar condições para que se formem leitores de arte, leitores de mundo, leitores plurais”. Em relação a essa atividade de leitura, não pode haver tantas cobranças e obrigações em sala de aula – o professor precisa ler com seus alunos e não simplesmente se colocar na posição de avaliador, uma vez que o hábito da leitura se faz em um processo constante, que se inicia com as famílias em casa, é reforçado na escola com os professores e continua ao longo da vida. A literatura infantojuvenil é uma leitura diferenciada que ajuda os alunos a se aprofundarem na leitura, desenvolvendo o imaginário, aumentando sua linguagem, deixando-os Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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mais participativos no meio social, com saberes linguísticos, e os ajuda a exercer a cidadania. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, p. 23): o domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos.
Nesse sentido, a literatura é fundamental no processo de formação de ideias e pensamentos do aluno, ajudando de forma ativa a construir leitores em uma sociedade que exige conhecimento e domínio de várias habilidades. A autora Nelly Novais Coelho (2000, p. 10) destaca que:
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em relação a essa formação pode-se afirmar que a literatura é mais importante das artes, pois a sua matéria é a palavra (o pensamento, as ideias, a imaginação), exatamente aquilo que distingue ou define a especificidade do humano. Além disso, sua eficácia como instrumento de formação está diretamente ligada a uma das atividades básicas do indivíduo em sociedade: a leitura.
No entanto, o interesse dos leitores se modifica no decorrer do tempo. Deve-se observar rigorosamente as fases de cada um, pois uma fase pode se alongar por mais tempo ou apresentar-se em conjunto com outra. E a pré-adolescência está em busca de se descobrir, conhecer sua identidade e seu lugar no mundo. A autora Veridiana Almeida (2017, p. 31) enfatiza que: a literatura voltada para o jovem entre 12 anos e 15 anos de idade, também chamada de literatura juvenil, é uma vertente literária que aborda fatos comuns. São temas de interesse do adolescente, muitas vezes polêmicos, como sexo, drogas, violência, relacionamento amoroso, aventuras, histórias sensacionalistas. As personagens geralmente são da mesma faixa etária dos leitores jovens, pois é a fase em que o pré-adolescente está em busca de si mesmo, de sua identidade e de seu lugar no mundo. Sugestões de leitura podem ser: Uma luz no fim do túnel (Ganymédes José), A droga da obediência (Pedro Bandeira), entre outros.
A literatura infantojuvenil abre um leque de possibilidades e aprendizados, trazendo para o leitor uma forma diferenciada de comunicação e expressão, visto que para a maior parte das crianças e dos jovens brasileiros, a escola é o único espaço que pode proporcionar acesso a textos e livros literários. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, p. 26): do ponto de vista linguístico, o texto literário também apresenta características diferenciadas. Embora, em muitos casos, os aspectos formais do texto se conformem aos padrões da escrita, sempre a composição verbal e a seleção dos recursos linguísticos obedecem à sensibilidade e a preocupações estéticas. Nesse processo construtivo original, o texto literário está livre para romper os limites fonológicos, lexicais, sintáticos e semânticos traçados pela língua: está se torna matéria-prima (mais que instrumento de comunicação e expressão) de outro plano semiótico na exploração da sonoridade e do ritmo, na criação e recomposição das palavras, na reinvenção e descoberta de estruturas sintáticas singulares, na abertura intencional a múltiplas leituras pela ambiguidade, pela indeterminação e pelo jogo de imagens e figuras.
Assim, precisamos valorizar a literatura infantojuvenil, com todas as formas de encantamento, pois são várias as possibilidades de inseri-la na escola, formando leitores que não só sintam o desejo de ampliar os saberes e informações, mas que sintam prazer nela. Essa prática pode e deve ser cultivada em nosso cotidiano, tanto na escola como fora dela.
Literatura todo dia A literatura infantojuvenil tem uma importância que vai além do prazer proporcionado por ouvir histórias – auxilia a iniciação das crianças nas complexidades das linguagens, ideias e sentimentos que conduzem a vida real; é o gênero literário que mais cresceu e evoluiu nas últimas décadas, e a escola ocupa um lugar fundamental na formação de leitores. Estudos apontam que a literatura infantojuvenil corresponde, de alguma maneira, aos anseios do leitor e à sua identificação com ele. O debate sobre da formação de leitores tem suscitado diversas iniciativas no contexto educacional. A autora Nely Novais Coelho (2000, p. 157) enfatiza que: quando oferecemos obras de literatura aos jovens leitores, permitimos que o aluno ao ler esses livros, encontre-se com personagens que tem aflições, sentimentos, desafios e relações corriqueiras, ou seja, obras que focam o convívio humano, dando ênfase às relações afetivas, sentimentais ou humanitárias. 12
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Ainda nessa trilha de pensamento, a autora Coelho (2000) relata que quanto mais é oferecida a literatura às crianças e aos jovens, mais eles estão capacitados a entender o texto, a interpretar, a valorizar e ativar os seus intertextos constituídos para o desenvolvimento de uma competência literária. Esse processo de formação de alunos em conjunto com a literatura é um trabalho desafiador; um leitor competente se forma por meio de uma prática constante de leitura de variados textos que circulam socialmente. Diferentes textos despertam diferentes expectativas no leitor. A esse respeito, deve-se criar condições para formar alunos leitores fluentes, capazes de interpretar, questionar e compreender o que está escrito de forma implícita ou explícita no texto. Ainda, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, p. 41) indicam que:
O professor, ao estimular o desenvolvimento da leitura, além de contribuir para a aprendizagem, amplia o acervo textual de cada aluno, sendo umas das formas de potencializar a aprendizagem de diferentes estratégias que ajudam os alunos na leitura de diversos gêneros discursivos. Quanto maior o acesso a autores e obras, mais facilmente o leitor amplia sua capacidade reflexiva e o domínio de seu idioma, formando um adulto criativo, contextualizado e intelectual. Ler em casa, na biblioteca ou em sala de aula, seja em silêncio ou em voz alta, todos os dias, permite o encontro do leitor com o livro. Assim, ao experimentar as emoções de diversos personagens consagrados, o leitor busca respostas para a própria vida, compreende melhor o mundo e se torna um escritor mais criativo. A sensibilização da escola e dos profissionais envolvidos é mais do que fundamental para a efetivação desse processo.
Metodologia do ensino de literaturas infantojuvenis A metodologia pautou-se em estudos bibliográficos com enfoque qualitativo e descritivo, baseados em livros, artigos e obras de referência que contribuem de forma significativa para identificar quais são as contribuições da literatura infantojuvenil na formação do aluno leitor. A autora Nelly Novais Coelho (2000) destaca que trabalhar com a literatura é fundamental para a formação de ideias e pensamentos do aluno. Ainda segundo a autora, esse despertar no educando e o fascínio pelo mundo da leitura propiciam o desenvolvimento em todas as áreas do conhecimento e fazem toda a diferença na formação de cidadãos mais conscientes. Outro ponto de partida destacado pelos autores são as estratégias que estabelecem relação entre livros e filmes que tratem do mesmo tema, para percepção de semelhanças e diferenças entre as obras. As pesquisas evidenciaram que, nesse processo, o professor como mediador deve deixar os alunos se sensibilizarem pela leitura, permitindo que se identifiquem com o que leem e estabeleçam relações significativas; ampliem sua capacidade reflexiva e o domínio de seu idioma e formem-se adultos criativos, contextualizados e intelectualmente críticos. Segundo a autora Joana Cavalcante (2002, p. 123), é importante que o professor “compreenda que trabalhar com a literatura infantojuvenil é formar sensibilidades, provocar olhares, desconstruir contextos, possibilitar caminhos que se abram para o múltiplo, poético e sagrado universo humano.” O professor tem um papel fundamental para que isso aconteça; precisa ser um leitor. Segundo Frantz, (1998, p. 15), o ponto de partida “é sempre um professor leitor, com um conhecimento amplo do acervo da literatura infantil disponível, que através do seu testemunho de amor ao livro possa ajudar seu aluno a também estabelecer laços afetivos com a leitura”. A finalidade da metodologia do ensino de literatura infantojuvenil é promover uma leitura de qualidade, para que o leitor possa se sentir fascinado. A autora Almeida (2017, p.65), enfatiza que é preciso “sensibilizar-se pela literatura, encontrar novas maneiras de fazer o livro chegar ao aluno, conscientizar-se da importância de o aluno se identificar com o que lê e principalmente acreditar na importância no ato de ler”. Diante dos fatos, percebe-se que o leitor em formação deve receber constantemente estímulos para interagir com obras literárias de diversos gêneros, o que terá reflexos em sua formação.
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[...] formar um leitor competente, supõe formar alguém que compreenda o que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser atribuídos a um texto [...]
Biblioteca e o espaço escolar O incentivo à leitura, a busca de livros e a frequência de ida a bibliotecas podem ocorrer tão logo as crianças comecem a entrar em contato com a escola, fazendo com que compreendam e valorizem a cultura escrita. Na biblioteca escolar, um aspecto importante é fazer com que o aluno descubra como pesquisar, como escolher Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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aquele livro que lhe atrai; quanto maior for a diversidade de títulos disponíveis, maior será a probabilidade de ampliação do universo de referências do leitor. Neste campo, é importante lembrar que o Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) tem assegurada uma ampla distribuição de literatura nas escolas. Conforme Silva (1991, p. 138):
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nenhuma outra instituição tem condições melhores para reunir e dinamizar material bibliográfico condizente com as aptidões de leituras de crianças do que a biblioteca escolar: a proximidade da sala de aula, a interação professor-bibliotecário-aluno, as orientações mais atuais do ensino que impelem a criança para a busca-descoberta através de diferentes textos.
Segundo o autor, mediar a leitura significa intervir para aproximar o leitor da obra e, nesse sentido, o trabalho com o professor assume dimensão maior, uma vez que explora experiências de vida dos alunos e do professor mediador. O professor deve dedicar um espaço nobre para a vivência da literatura nas aulas. Nesse sentido, o professor, antes de levar os alunos à biblioteca, deve preparar a visita, selecionando os livros voltados para crianças e adolescentes, para que os alunos tenham desejo de voltar. São necessários livros que atraiam, formando cantinhos de leitura, mais dinâmicos e móveis. Assim, verifica-se que o bibliotecário deve trabalhar junto com os professores, apontando as tendências de pesquisas e os livros mais procurados, divulgando materiais e as novidades da biblioteca à comunidade escolar, a fim de que sejam realizadas novas práticas no espaço. A importância de uma biblioteca bem aparelhada na escola cumpre a função de aproximar, orientar e facilitar o encontro dos alunos, dos professores e da comunidade escolar com o livro. Um ambiente confortável contribui para os alunos se entregarem ao enredo da história, à passagem do olhar de uma página a outra; o ato de folhear o livro faz com que o aluno seja atraído pela história, para enriquecimento de ideias e de experiências. É importante que as novas gerações conheçam e tomem consciência de que a literatura tem uma função transformadora; o contato com textos recheados de encantamento faz perceber quão importante e cheia de responsabilidade é toda forma de literatura.
CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como objetivo investigar se a literatura infantojuvenil contribuiu de forma significativa na formação de leitores no ensino fundamental II. Buscou-se verificar nos estudos de vários autores as práticas interessantes com base nos recursos oferecidos, materiais favoráveis à faixa etária, incentivo à leitura e à busca de livros, a função da escola, entre outros. Estudos teóricos demostraram que na literatura existem grandes possibilidades de o aluno explorar mais a sua criatividade, melhorar sua conduta no processo de ensino-aprendizagem e aumentar a sua autoestima, e que são várias as possibilidades de inserir a literatura na escola, em uma concepção mais global de inserção social, na formação de leitores que não só sintam o desejo de ampliar os saberes, mas que tenham o prazer pela leitura literária. A formação do leitor, seja ele aluno ou professor, depende da adoção de novas metodologias e de materiais favoráveis à propagação da leitura. Em virtude dos fatos mencionados, a literatura infantojuvenil, se for bem aplicada, poderá contribuir para a melhoria do ensino, quer na qualificação do aluno ou na formação crítica do educando, melhorando o relacionamento dos alunos com a sociedade, resgatando a dimensão lúdica e prazerosa da literatura. Essa postura caminha na direção de possibilitar a formação de bons leitores, capazes de formular hipóteses, experimentar surpresas, criar expectativas na construção de significados e de interessarem-se ao que há de melhor nas obras literárias; além disso, permite-se ao leitor ingressar no mundo de fantasias a ser descoberto, deparando-se com histórias que divertem, fazem sonhar, suscitam dúvidas e auxiliam na aquisição de novos conhecimentos. Literatura é a arte que nos permite vivenciar e recriar acontecimentos e experiências, experimentar sentimentos e emoções. Portanto, a literatura infantojuvenil contribuiu em todos os sentidos na formação do aluno leitor, mas é preciso valorizar essa prática com todas as formas de sedução; deve-se constantemente incentivar o desenvolvimento do gosto e do interesse pela literatura. Trabalhar com a literatura infantojuvenil é criar condições para a formação de leitores de arte, leitores de mundo e leitores plurais.
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A contribuição da literatura infantojuvenil na formação de leitores no ensino fundamental II
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A dificuldade de adaptação do aluno sem conhecimento de informática no ensino a distância online The difficulty of adaptation of the student without computer knowledge in online distance education SCHIMALSKI, Paulino3 BOLFE, Juliana4
RESUMO O presente artigo objetiva promover a reflexão sobre as dificuldades que os alunos sem conhecimento de informática encontram para permanecerem nos cursos de ensino a distância online. A busca por informações ocorreu por meio da pesquisa bibliográfica, apresentando o pensamento de diversos autores sobre o tema ensino a distância, comparando com a experiência vivenciada pelo autor como observador deste processo, inserido como participante natural, revelando que a evolução crescente deste modelo de ensino, que por um lado permite o ingresso de um grande número de estudantes que estavam excluídos do ambiente escolar, por outro lado está excluindo parte da sociedade sem o conhecimento de informática, pois é exigido cada vez mais que o aluno possua o domínio desta tecnologia para: acompanhar as disciplinas, desenvolver as atividades avaliativas, interagir com os professores e colegas, evoluir no seu aprendizado e adquirir a tão esperada autonomia na busca pelo conhecimento, um dos pilares do ensino a distância. A pesquisa bibliográfica está centrada nos trabalhos relativos à importância do ensino a distância para a democratização do ensino, sua evolução juntamente com o avanço tecnológico e as dificuldades enfrentadas por aqueles alunos que não têm o conhecimento para operar estas novas tecnologias. Por meio da experiência do autor como participante natural, foi possível enriquecer o trabalho com situações práticas vivenciadas, corroborando com o referencial teórico. Palavras-chave: Ensino a distância. Informática. Dificuldades enfrentadas.
ABSTRACT This article aims to promote reflection on the difficulties that students without computer knowledge face to remain in online distance learning courses. The search for information occurred through bibliographic research, presenting the thoughts of several authors on the subject of distance learning, comparing with the experience as an observer of this process of which this author is inserted as a natural participant, revealing that the evolution of this education type - on one hand allows the entry of a large number of students who were excluded from the school environment - on the other hand, is excluding part of society without knowledge of computers, as it is increasingly demanding that the student fully controls this technology in order to keep up with the disciplines, as well as the development of evaluation activities and the interaction with teachers and colleagues, the evolution in their learning and the long-awaited autonomy in the search for knowledge, one of the pillars of distance learning. Bibliographic research is centered on studies related to the importance of distance learning for the democratization of education, its evolution along with technological advances and the difficulties faced by those students who do not have the knowledge to operate these new technologies. Through experience as a natural participant it will be possible to enrich the work with practical situations experienced, corroborating with the theoretical framework. 3 4
Curso Superior em Gestão Pública – IFPR, Bacharel em Administração Pública – UFPR, especialização em Gestão Pública Municipal – UFPR. Professora orientadora.
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A dificuldade de adaptação do aluno sem conhecimento de informática no ensino a distância online
Keywords: Distance Learning. Informatics. Faced Difficulties.
INTRODUÇÃO
Dentro deste contexto, este trabalho buscou promover a reflexão sobre as dificuldades que os alunos sem conhecimento em informática enfrentam para se adaptarem aos modelos de ensino a distância (EaD) online. Para enfatizar a problemática, será demonstrado por meio de pesquisa bibliográfica sobre o tema como a falta de conhecimento em informática pode ser um fator que colabora para a evasão no transcorrer dos cursos e como pode ser também um fator que desmotiva o ingresso de novos alunos. Por meio desta pesquisa, também serão apresentados argumentos de autores renomados sobre a importância do conhecimento das tecnologias da informática para o aprendizado neste sistema de educação. Os dados demonstrados por meio da revisão bibliográfica se complementam com informações da experiência adquirida por este autor como participante natural do processo, seja como ex-aluno, após concluir duas graduações e duas pós-graduações no sistema EaD, ou exercendo atualmente a função de tutoria no ensino a distância online. Ao final desta pesquisa, analisando o que fora exposto sobre as dificuldades encontradas pelos alunos sem o conhecimento de informática no ensino a distância (EaD) online, será possível refletir sobre quais os caminhos que devem ser traçados para o resgate destas pessoas que têm neste modelo de ensino a oportunidade de qualificação, mas, ao mesmo tempo, se sentem excluídas pela falta de domínio da informática; ainda, será possível refletir se este é outro fator que limita a participação de mais pessoas neste modelo de ensino. Atualmente, o sistema de educação a distância tem recebido grande prospecção no cenário educacional, com foco na inclusão social, democratização do ensino e em facilitar o aprendizado. Assim, convergindo para esta linha de pensamento, não será possível admitir que um grupo social se sinta excluído deste sistema pelas dificuldades encontradas, não pelos conteúdos do curso, mas pelo uso da metodologia empregada, em que o uso da informática é imprescindível.
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A educação a distância (EaD) é um modelo educacional que possibilita a democratização do ensino, o ingresso de pessoas que não tiveram acesso aos modelos de educação presenciais existentes, principalmente por motivos de desigualdade social, quando necessitaram entrar no mercado de trabalho para ajudar no sustento de suas famílias. Atualmente, é fato que o avanço deste modelo de educação vem resgatando estas pessoas, devido a uma série de benefícios, porém, parte deste público que está tendo a oportunidade de concluir seus estudos, esbarra na dificuldade de não se incluir no processo de avanço da tecnologia ligada aos computadores; inclusive, muitos não são capacitados para trabalhar com as ferramentas da informática, cada vez mais exigidas no desenvolvimento do aprendizado na educação a distância no sistema (EaD) online.
DESENVOLVIMENTO A motivação para a realização deste trabalho de pesquisa relaciona-se com a problemática observada durante vários anos pelo autor como participante natural do sistema de educação a distância (EaD), seja como ex-aluno deste sistema ou, atualmente, como tutor online. Durante esta experiência, foi possível perceber que a dificuldade de muitos estudantes com a tecnologia da informática se apresenta como um dos motivos da desistência do educando logo no início do curso, devido ao fato de muitos não se sentirem seguros ou em condições de iniciar um curso sem possuir o domínio do computador. A problemática evidenciada por meio da observação natural, fundamentada pela pesquisa bibliográfica de autores renomados sobre o tema proposto, demonstrará ao final do artigo alguns pontos fundamentais, tanto para as instituições de ensino quanto para atores governamentais ligados à educação a distância (EaD), em relação à necessidade urgente da inclusão digital com ensino da informática em todos os segmentos da sociedade, o que consequentemente oportunizará a inclusão de mais pessoas no sistema de educação online. Neste sentido, a inclusão desta camada da sociedade que hoje se sente excluída das novas tecnologias terá impacto positivo para as instituições de ensino a distância (EaD), pelo aumento significativo de alunos; para o país, que apresentará evolução no seu grau de escolaridade; e benefício social da inclusão das pessoas no mundo acadêmico, gerando novas perspectivas de futuro. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A pesquisa bibliográfica apresentada neste trabalho está centrada nos trabalhos de pesquisa referentes à educação a distância (EaD), principalmente aos relativos à importância desta modalidade de ensino, sua evolução e exigência do uso de novas tecnologias e os problemas enfrentados por aqueles que não têm o conhecimento para operar a tecnologia da informática. Por meio da experiência como participante natural, será possível enriquecer o trabalho com situações práticas vivenciadas, corroborando com o referencial teórico.
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Vivemos a era da informação, e o desenvolvimento de novas tecnologias da informação e de comunicação (TIC) acontecem de maneira contínua e dinâmica. Para quem está acompanhando este processo de evolução tecnológica, não resta alternativa a não ser buscar conhecimentos novos constantemente, para não ficar desatualizado. As tecnologias da informação e de comunicação (TIC) podem ser entendidas como um “conjunto de tecnologias microeletrônicas, informáticas e de telecomunicações que permitem a aquisição, produção, armazenamento, processamento e transmissão de dados na forma de imagem, vídeo, texto ou áudio” (MARTINEZ, 2004, p. 96). Mas, o que falar daquela geração que foi apanhada de “surpresa” com todas estas mudanças e que agora necessita se adaptar a estas tecnologias? É inegável que o avanço tecnológico proporcionou melhorias para todos os segmentos, mas, também, não podemos deixar de refletir sobre as dificuldades que muitas destas novas tecnologias oferecem para quem não está capacitado para elas. Na área educacional, a tecnologia está quebrando diversos paradigmas dos modelos tradicionais de ensino, em que os processos se tornam transitórios e sofrem alterações de acordo com o contexto socioeconômico em que estão inseridos, ou pelas condições objetivas que se realizam, sendo necessárias constantes adequações para atender as necessidades dos alunos. Atualmente, o que se percebe é a necessidade cada vez maior de as pessoas se qualificarem para atender à demanda competitiva do mercado de trabalho, pois as mudanças advindas do avanço tecnológico exigem profissionais atualizados que precisam buscar meios de estar sempre aprendendo; porém, a sociedade atual exige que as pessoas exerçam as mais variadas atividades, impossibilitando a dedicação de um tempo específico para esses profissionais voltarem à sala de aula. Neste sentido, a educação a distância torna-se o modelo de ensino fundamental nesse processo. O avanço tecnológico da informação e da comunicação ocorrido nos últimos anos interferiu diretamente em todos os sistemas educacionais, mas as mudanças mais evidentes são notadas nos sistemas de educação a distância (EaD). Neste modelo de ensino, consolida-se a alternativa de proporcionar o acesso à educação para as diferentes regiões, democratizando a oferta do conhecimento. Segundo Gatti e Barreto (2009, p. 2): A principal inovação das últimas décadas na área da educação foi à criação, a implementação e o aperfeiçoamento de uma nova geração de sistemas de EaD que começou abrir possibilidades de se promover oportunidades educacionais para grandes contingentes populacionais, não, mais tão somente de acordo com critérios quantitativos, mas, principalmente, com base em noções de qualidade, flexibilidade, liberdade e crítica.
Neste modelo de educação, o uso do computador é sem dúvidas o diferencial responsável por essa evolução, permitindo o aumento do poder de processamento e armazenamento de dados; mas, principalmente, o acesso à rede mundial por meio da internet, a qual, além dos aspectos tecnológicos, quebrou o paradigma econômico-social. Atualmente, a educação a distância (EaD) praticamente pressupõe o uso do ambiente web, com a criação dos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA), os quais formam um conjunto de elementos tecnológicos disponíveis na internet, quebrando as barreiras geográficas, diminuindo a distância do acesso ao conhecimento. Com a introdução destas tecnologias, aumentou-se consideravelmente a interatividade entre os atores envolvidos, facilitando a mediação de tutores e especialistas; por outro lado, o desenho instrucional passou a se valer destes recursos para elaborar cursos mais flexíveis e personalizados. Todas estas mudanças são benéficas para a evolução cada vez maior dos modelos de educação a distância (EaD) em todo o mundo, devido a uma infinidade de ferramentas oferecidas para dinamizar os processos de ensino-aprendizagem, bem como para propiciar a interação entre os atores envolvidos. Estes benefícios se estendem também para o gerenciamento dos serviços básicos necessários aos administradores dos cursos, incluindo arquivos documentais e a inserção dos materiais acadêmicos. Sobre a ferramenta internet, Laudon e Laudon (1999, p. 7) discorrem: 18
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Devido a sua facilidade de uso e a sua capacidade de ligar pessoas a informações do mundo inteiro, a internet esta transformando a fisionomia da computação. Esta criando uma base para novos tipos de produtos, serviços e relações entre organizações. Esta mudando a forma como as pessoas acessam informação, conduzem negócios, se comunicam, colaboram e mesmo passam seu tempo livre.
Por outro lado, existe uma grande parcela da sociedade que, no seu tempo, ficou sem acesso ao conhecimento da tecnologia da informática, ou que ainda não está capacitada para trabalhar com esta tecnologia. De acordo com Hazan (2001), o grande problema do uso das novas tecnologias no mundo contemporâneo é a formação de dois grandes grupos sociais: os incluídos digitais e os excluídos da sociedade em rede, o que se caracteriza pela grande diferença entre a minoria dos que possuem e a maioria dos que não possuem acesso ao mundo tecnológico, ficando à margem da nova onda tecnológica e das oportunidades por ela proporcionadas. Entre estas pessoas estão aquelas que saíram do ambiente escolar há mais de quatro décadas, quando a inovação tecnológica ainda não estava presente no cotidiano; como também outros que estavam no ambiente escolar há bem menos tempo, mas que, devido a condições financeiras promovidas pelas desigualdades sociais, entre ricos e pobres, não tiveram acesso a estes equipamentos. Hoje, é possível que muitas destas pessoas se sintam motivadas a continuar seus estudos, a concluir o sonhado curso superior, mas a falta de conhecimento sobre como operacionalizar estas ferramentas tecnológicas as faz sentir cada vez mais excluídas dos sistemas online de ensino a distância (EaD). Dentro deste contexto, torna-se necessário o desenvolvimento de ações, seja por parte dos governantes ou das instituições de ensino a distância (EaD), visando o acolhimento e o apoio para a inclusão digital e o domínio da informática destas pessoas, oportunizando seu ingresso neste modelo de ensino. Diante do exposto, é impossível negar que o avanço da tecnologia da informação e comunicação (TIC) causou mudanças significativas no mundo todo, em todos os segmentos, o que não foi diferente nos modelos de educação, culminando na grande ascensão do sistema EaD. Observou-se também que, se por um lado o avanço da tecnologia propiciou infinitos benefícios, por outro, excluiu parte da sociedade sem este conhecimento. Está evidente que a revolução da educação a distância (EaD) está diretamente ligada aos diferentes meios tecnológicos para facilitar a interatividade e a construção do conhecimento. A partir destes benefícios, os cursos na modalidade de educação a distância (EaD) passaram a oferecer muito mais recursos para interação e o desenvolvimento de atividades, de maneira rápida, dinâmica e atrativa, impactando e influenciando o cotidiano dos educadores e dos educandos.
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Conforme foi observado, as mudanças ocorridas quebraram muitos paradigmas, entre eles, o de que “não sobra tempo para estudar”, pois, com a evolução do sistema EaD, o aprendiz não necessita estar fisicamente presente em um determinado ambiente para aprender. Lévy (1996) considera que há um desprendimento entre o “aqui” e o “agora”, com a possibilidade de se estar em qualquer lugar a qualquer tempo. Por meio da internet, a apropriação dos conteúdos se dá de forma que possibilita eliminar as distâncias geográficas e temporais. Estas características beneficiam principalmente os indivíduos inseridos no mercado de trabalho, que residem em locais distantes dos núcleos de ensino ou que não possuem tempo para frequentar cursos regulares, necessitando de modelos de ensino flexíveis, adaptados às suas necessidades.
Conforme afirma Kipnis (2009, p. 209), a EaD se vê diante de uma nova geração, em relação a outras anteriores definidas pela tecnologia da época, e as instituições demanda crescente por acesso ao conhecimento e a informação profissional para atuar em um mercado capitalista qualitativamente diferente.
A inovação tecnológica está cada vez mais presente na EaD, aumentando em ritmo acelerado, necessitando o acompanhamento constante de todas as suas formas de aplicação. Neste sentido, apesar de a EaD oportunizar a democratização do ensino-aprendizagem, a aplicação cada vez maior de novas tecnologias exige que os profissionais de educação estejam preparados para trabalhar com estas mudanças; o educando também deve estar preparado, pois, caso contrário, este avanço pode excluir aqueles que não possuem acesso ao mundo tecnológico. Com estas mudanças, o aluno necessita estar ciente de que ele será o agente transformador do processo de aprendizagem que estará centrado nele. Segundo Moran (2007, p. 34): Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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a educação deixa de ser centrada em conteúdos disciplinares (conteúdocêntrica) e passa a ser centrada no desenvolvimento de competências e habilidades. A educação deixa de ser centrada no ensino (didatocêntica) e passa a ser centrada na aprendizagem. A educação deixa de ser centrada no professor (magistrocêntrica) e passa a ser centrada no aluno. A educação deixa de ser algo passivo para o aluno e passa a ser algo no qual ele ativamente participa.
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Dentro deste contexto, de acordo com Mercado (2007), uma das grandes dificuldades destes alunos no primeiro contato com a EaD é a habilidade na utilização dos recursos computacionais que são necessários para o cotidiano desta modalidade de ensino. Como participante natural deste processo, por inúmeras vezes presenciei nos primeiros encontros promovidos nos polos alunos completamente motivados pela oportunidade de estarem ingressando no meio acadêmico; porém, depois de pouco tempo, alguns destes alunos já demonstravam desmotivação, por concluírem que não teriam a capacidade para acompanhar e desenvolver as atividades previstas devido à falta de conhecimento de informática, e que esta seria a principal ferramenta para acompanhar e desenvolver as atividades online. Em outros casos, foi possível observar que alguns alunos insistiam na continuidade, porém, sempre se valendo da ajuda de terceiros, o que comprometia totalmente a sua independência e autonomia no aprendizado, culminando em desistências precoces. Nos modelos atuais de educação a distância (EaD) online, o uso do computador e dos equipamentos eletrônicos tornou-se indispensável para a participação do educando, principalmente naqueles que se utilizam dos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA). O ambiente virtual de aprendizagem é a sala de aula online. É composto de interfaces ou ferramentas decisivas para a construção da interatividade e da aprendizagem. Ele acomoda o web-roteiro com sua trama de conteúdos e atividades propostos pelo professor, bem como acolhe a atuação dos alunos e do professor, seja individualmente, seja colaborativamente (SILVA, 2003).
Assim, o conhecimento básico da informática torna-se indispensável para quem optou pela modalidade EaD, permitindo o acompanhamento das disciplinas, a interatividade com o professor e os colegas e a realização das atividades avaliativas online. O aluno que não tem o conhecimento de informática não terá condições de se adaptar, por não usufruir da valiosa ferramenta que é o ambiente virtual de aprendizagem. O seu desenvolvimento também estará comprometido, pois não terá a segurança no manejo do editor de textos para elaborar as atividades discursivas, elaborar textos e formatar trabalhos acadêmicos; encontrará dificuldades para navegar na internet, indispensável para a realização de pesquisas. Sem este domínio, também se torna quase impossível elaborar planilhas de cálculos, gráficos e o uso de e-mail, que são alguns dos conhecimentos básicos que o aluno precisa dominar frente às TICs no sistema de educação online, permitindo a evolução do aprendizado e a tão esperada autonomia na busca pelo conhecimento, um dos pilares do ensino a distância. Fica evidente que aquelas pessoas que não tiveram a oportunidade de adquirir estes conhecimentos ficam excluídas deste modelo de educação, entre elas estão aquelas que por alguma situação social não tiveram as condições financeiras para concluir os cursos de informática ou, principalmente, aquelas que atualmente estão com a idade avançada e na sua idade escolar ainda não havia estas tecnologias. Entre estas pessoas com idade mais avançada, é possível perceber que muitas se sentem inibidas em frequentar os cursos de informática e serem discriminadas pelos demais participantes, na maioria adolescentes; também é corriqueiro ouvir deste público que muitos têm “medo” de computador. Nos últimos anos, nota-se que alguns programas governamentais de inclusão digital estão avançando consideravelmente, porém, muitos destes programas limitam-se ao fornecimento de computadores, principalmente para equipar os polos da UAB (Universidade Aberta do Brasil). Para Marques (1999, p. 35): não basta estar o computador disseminado na escola e disponível a cada aluno na sala de aula para que dele se copiem as informações acessadas. Fundamental e pertinente é estar à escola no computados para, sabendo o que quer, dizer-se a si mesma, dizerem-se uns aos outros os alunos e professores e dizerem-se a outros e outros, as salas de aulas a outras salas de aula, as escolas a outras escolas ao mundo.
Sendo assim, a solução para superar a falta de conhecimento em informática está longe de ser solucionada, pois, apenas a ferramenta computador não é o suficiente para solucionar o problema, havendo a necessidade 20
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de ações coletivas concretas para evitar que o avanço tecnológico aumente as diferenças existentes na sociedade. Ainda neste pensamento, está a colaboração de Luhrmann (apud Simonson et al., 1997, p. 106): “Para dizer a um computador o que você quer que ele faça você deve ser capaz de se comunicar com ele. Para fazer isso, você necessitará aprender uma linguagem de programação para escrever suas ideias, então você pode revê-las, mostrá-las a outros e melhorá-las (...)”. Hazan (2001, p. 1819) corrobora: “o homem deve ter a possibilidade de compreender os sistemas com o qual opera e não apenas utilizá-lo mecanicamente”.
Conforme exposto até o momento neste trabalho de pesquisa, o avanço tecnológico é uma realidade contemporânea, bem como as suas influências nos modelos de educação, particularmente, as influências positivas que causaram na evolução do sistema de ensino online. Por outro lado, levantou-se a problemática de que estes avanços tecnológicos, apesar de beneficiarem positivamente a educação, também podem ser um fator de exclusão. Tornou-se claro que no ensino online o aprendizado exige autonomia dos alunos, pois são eles os responsáveis pela pesquisa e busca para solucionar as atividades propostas pelos professores, resultando no processo de construção da aprendizagem. Neste sentido, o aluno que ingressar na modalidade EaD não tem como fugir do conhecimento da tecnologia da informática para ter sucesso neste sistema de ensino. Conforme afirma Rabello (2017) a falta e conhecimentos tecnológicos prévios é um dos fatores responsáveis pelo baixo desempenho dos alunos na modalidade EaD. Este pensamento de Rabello nos remete a refletir que muitas vezes o baixo desempenho dos alunos sem o conhecimento prévio da tecnologia exigida para concluir as atividades online não está na resolução ou no entendimento dos conteúdos da grade curricular, mas nas dificuldades em elaborar suas atividades usando as ferramentas tecnológicas. Muitas vezes presenciei como participante deste processo que o aluno tinha a expertise sobre o assunto abordado, mas não sabia como elaborar o trabalho utilizando-se do computador; em outros casos, a dificuldade estava até mesmo na utilização do próprio ambiente virtual de aprendizagem, em que o aluno utiliza os recursos tecnológicos disponíveis para interagir, trocar informações e compartilhar suas dúvidas. É por meio do auxílio, da interação e da cooperação entre professores e alunos e entre os próprios alunos que a aprendizagem estimula ainda mais a criatividade, proporcionando momentos de novas descobertas e conhecimentos.
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Neste sentido, o conhecimento da informática é fundamental para o uso do computador nos processos de criação e implantação, formulação de pesquisa, interesse e motivação, devido à necessidade da elaboração das atividades que exigem planejamento, formulação de hipóteses, tentativas, classificação e modificações, facilitando a aprendizagem por meio da exploração, compreensão e experimentação; assim, o computador, além de ser um arquivo documental, se torna por meio da internet um meio de comunicação e interação com o mundo. “A internet é um novo meio de comunicação, mas que pode ajudar-nos a rever, a ampliar e a modificar muitas formas atuais de ensinar e de aprender” (MORAN, 2006, p. 38).
No ensino online, o processo de interação é um ponto de suma importância para o progresso do aluno, principalmente por meio da interação mediatizada, em que se definem antecipadamente e organizam-se as formas de apresentação dos conteúdos didáticos. Para Belloni (1999, p. 59), a interação mediatizada oferece: [...] possibilidades inéditas de interação mediatizada (professor/aluno, estudante/estudantes) e de interatividade com materiais de boa qualidade e grande variedade. As técnicas de interatividade mediatizada criadas pelas redes telemáticas (e-mail, listas e grupos de discussão, web sites, etc.) apresentam grandes vantagens, pois, permitem combinar a flexibilidade de interação humana (com relação à fixidez dos programas informáticos, por mais interativos que sejam) com a independência no tempo e no espaço, sem por isso perder velocidade.
Analisando as informações acerca das tecnologias empregadas no ensino a distância, percebe-se que todas estas oportunidades oferecidas por meio destas tecnologias aos alunos do sistema de ensino online estão disponíveis por meio do computador, ferramenta que se torna indispensável neste processo de ensino-aprendizagem. Ainda sobre a importância do computador neste sistema de ensino, de acordo com Valente (2002, p. 2), quando ele é usado para passar a informação ao aluno, assume o papel de “máquina de ensinar”, e a abordagem pedagógica é a instrução auxiliada pelo computador. Neste contexto, torna-se evidente a importância do computador como ferramenta fundamental no processo ensino-aprendizagem no sistema EaD, sendo o meio entre quem ensina e Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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quem aprende, como também um canal diferenciado de pesquisa em que o próprio aluno, de maneira autônoma, pode ampliar seus conhecimentos por meio da pesquisa de elementos extracurriculares. Torna-se importante que o aluno domine em especial o ambiente que vai utilizar para viabilizar os seus estudos, tornando-se capaz para realizar as atividades recomendadas pelos cursos de EaD; só assim ele se tornará sujeito ativo, independente, tendo autonomia no seu aprendizado, sem a dependência de outras pessoas para se comunicar com o computador, o que, neste caso, muitas vezes acaba influenciando também na sua independência para elaborar suas atividades.
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Completando a ideia, Levy (1999) afirma que o computador proporciona a utilização de tecnologias intelectuais que se tornam extensoras das funções cognitivas. O autor vem corroborar com o pensamento de que o aluno da educação a distância necessita em primeiro lugar estar capacitado para trabalhar com o computador, não apenas saber usar as ferramentas básicas para a conclusão das atividades corriqueiras exigidas para a conclusão do curso, ou seja, não só fazer o uso da máquina de maneira robotizada, sem aproveitar suas potencialidades, mas, construir seu aprendizado fazendo uso de todas as possibilidades disponíveis para extrair o máximo de conhecimento que proporcione a sua evolução mental, influenciando sua maneira de pensar, analisar e concluir de maneira independente e crítica os assuntos do cotidiano; caso contrário, estará excluído desta inevitável mudança contemporânea de aprender e ensinar.
CONSIDERAÇÕES A utilização das tecnologias de informação e comunicação está cada vez mais presente no mundo contemporâneo. Os modelos de educação também acompanharam esta evolução e, neste cenário de transformação, um dos modelos que mais apresentou mudanças no decorrer do tempo foi o sistema de educação a distância, atingindo a fase chamada de educação online. Este novo formato de ensinar proporciona, por meio do uso do computador conectado à internet, a ampliação das possibilidades de aprendizagem e interação em uma mesma rede de informação. É notório que este sistema de ensino teve uma evolução considerável nos últimos anos, e que veio para democratizar o ensino, quebrar as barreiras geográficas e propiciar ao aluno a sua autonomia de tempo, como também sua participação no processo da sua própria aprendizagem; entretanto, este trabalho procurou mostrar que este modelo de ensino está centrado exclusivamente no uso do computador conectado à internet e, como foi visto por meio da pesquisa bibliográfica utilizada e da colaboração como participante natural deste processo, o uso desta tecnologia está excluindo parte da sociedade que ainda não tem o domínio sobre esta ferramenta. Atualmente as escolas, na sua maioria, já estão equipadas com computadores conectados à internet, cabendo aos profissionais de ensino disseminar estas tecnologias. Nas regiões mais abastadas, professores e alunos já estão expostos a estas tecnologias no seu cotidiano, assim, estas pessoas já saem do ambiente escolar do ensino médio preparados para entrar no ensino superior EaD; porém, nas regiões mais distantes dos centros urbanos ou com baixa renda, estas tecnologias ainda não chegaram, deixando estas pessoas à margem deste conhecimento. Outro ponto preocupante levantado neste trabalho se refere às pessoas com idade mais avançada: nas suas idades escolares estas tecnologias ainda não existiam, e depois não se sentiram “encorajadas” ou não tiveram a oportunidade de aprender. Atualmente, com a democratização do ensino por meio do EaD, estas pessoas se sentem motivadas a continuar os seus estudos, mas esbarram na falta do conhecimento em informática. Sendo assim, a reflexão que fica propõe novos debates sobre o tema, além de uma incessante pesquisa e troca de experiências entre os atores envolvidos no sistema de educação online sobre quais iniciativas de inclusão digital podem contribuir para aumentar a participação das pessoas que querem concluir seus estudos por meio do sistema de ensino online mas que, pela falta de conhecimento da tecnologia exigida, se sentem excluídas deste sistema de ensino.
REFERÊNCIAS GATTI, B. A. (coord.); BARRETO, E. S. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. 22
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A dificuldade de adaptação do aluno sem conhecimento de informática no ensino a distância online
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo The fiscal responsibility law and personnel expenses in the cities of Espírito Santo state ZANONI, Patrick5 ZANETTI, Elizabeth6
RESUMO Esta pesquisa foi realizada em face da importância do controle das despesas com pessoal nas entidades públicas, e teve como objeto de pesquisa geral analisar o nível de cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal para gastos com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo durante os exercícios de 2009 a 2018. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliografia e de campo, classificadas como exploratória e descritiva. Os dados foram coletados por meio da análise das informações sobre os municípios capixabas disponíveis na plataforma CidadES, presente no sítio eletrônico oficial do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo. Diante dos limites definidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal e do desempenho dos municípios, os resultados apurados apontaram um bom nível de cumprimento dos limites legais quanto ao Poder Executivo, devido a apresentarem uma média anual de 45,26% das prefeituras que evidenciaram gastos com pessoal abaixo de todos os limites legais, 22,69% no limite de alerta, 20,90% no limite prudencial e 11,15% extrapolaram o limite máximo. Em análise do Poder Legislativo, verificou-se um excelente nível de cumprimento, pois apresentaram um média anual de 99,87% das câmaras municipais com gastos abaixo de todos os limites legais e 0,13% no limite prudencial. Palavras-chave: Despesas com pessoal. Limites. Lei de Responsabilidade Fiscal. Município.
ABSTRACT This research was carried due to the importance of controlling personnel expenses in public entities. Its general research object was to analyze the level of compliance with the limits established by the Fiscal Responsibility Law for personnel expenses in the municipalities of the State of Espírito Santo at 2009 - 2018. The methodology used was bibliographic and field research, classified as exploratory and descriptive, where data were collected through the analysis of information on the Espírito Santo municipalities available on the CidadES platform, present on the Court’s official website of Accounts of the State of Espírito Santo. Due to the limits defined by the Fiscal Responsibility Law and the performance of the municipalities, the results showed a good level of compliance with the legal limits, as for the Executive Branch, due to presenting an annual average of 45.26% of the city halls that showed spending on personnel below all legal limits, 22.69% at the alerts limit, 20.90% at the prudential limit and 11.15% exceeded the maximum limit. In analysis to the Legislative Power, an excellent level of compliance was verified, since they presented an annual average of 99.87% of the municipal councils with expenses below all the legal limits and 0.13% in the prudential limit. 5
Bacharel em Ciências Contábeis-UNESC. Cursando Pós-Graduação em Contabilidade Aplicada ao Setor Público e Responsabilidade Fiscal. E-mail: patrickzanoni01@gmail.com.
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Mestre em Engenharia da Produção UFSC, Especialista em Psicologia de RH-UNICAMP, Bacharel em Administração de Empresas-FESP. Especialista/EAD. Orientadora e Avaliadora de TCC FAEL, UNINTER e UFTPR.
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo
Keywords: Personnel Expenses. Limits. Fiscal Responsibility Law. County.
INTRODUÇÃO As Despesas Públicas sempre ocuparam um papel de destaque nos sistemas de controle governamental, ainda mais quanto aos gastos com pessoal, que por anos alcançaram valores vultuosos, mesmo existindo ferramentas legais de controle, prejudicando o suprimento das necessidades públicas, função primordial do governo. O Brasil já se dispôs de leis que buscaram limitar os gastos com pessoal, mas por muitos anos não se atingiu os resultados esperados. Entretanto, esse cenário sofreu uma grande mudança a partir da vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que estabeleceu limites e restrições para todas as esferas governamentais.
O objetivo geral desta pesquisa é analisar o nível de cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal para gastos com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo durante os exercícios de 2009 a 2018. Para isso, foram adotados como objetivos específicos: analisar o percentual de comprometimento da Receita Corrente Líquida dos municípios com Despesas de Pessoal; verificar o quantitativo de municípios que se enquadram em cada limite estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal para gastos com pessoal; identificar os municípios que sempre se mantiveram abaixo de todos esses limites; e detectar os municípios que mais se mantiveram acima de todos os limites. Este estudo foi desenvolvido por meio de pesquisas bibliográficas e de campo. Os dados foram coletados por meio da análise das informações sobre os municípios disponíveis na plataforma CidadES, presente no sítio eletrônico oficial do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo. As informações obtidas foram organizadas e evidenciadas em quadros e tabela. A motivação desta pesquisa foi responder à seguinte problemática: qual o nível de cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal para gastos com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo durante os exercícios de 2009 a 2018? Como resultado direto, a pesquisa possibilitou construir um panorama dos gastos com pessoal dos municípios do Estado do Espírito Santo e, por conseguinte, avaliar o cumprimento dos limites de gastos com pessoal definidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
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Esta pesquisa surgiu diante da necessidade de confirmar o cumprimento dos limites de despesa com pessoal, definidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, por parte dos municípios do Estado do Espírito Santo, uma vez que esses gastos representam a maior parte das despesas públicas e a sua execução descontrolada pode comprometer a prestação de serviços públicos.
Este artigo está dividido em oito tópicos: introdução, na qual consta a apresentação, a justificativa e o objetivo da pesquisa; tópicos de despesa pública, evolução histórica dos limites da despesa com pessoal e Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), os quais está apresentada uma breve revisão literária e os principais conceitos abordados; tópico sobre procedimentos metodológicos, no qual estão explicitadas as técnicas e instrumentos utilizados na pesquisa; tópico de apresentação dos resultados; considerações finais; e referências.
Despesa pública As despesas públicas são todos os gastos realizados por entidades regidas pelo Direito Público, destinados a manter ativos os serviços públicos, seja para atender as necessidades advindas da população ou do próprio ente (SILVA, 2015). Dentre as diversas classificações para as despesas públicas, ressalta-se a sua especificação conforme a categoria econômica, que, com base no Manual Técnico de Orçamento (MTO) de 2019, apresentam-se como Despesas Correntes e Despesas de Capital (SOF, 2019). De acordo com o MTO de 2019, classificam-se como despesas correntes todas as despesas “que não contribuem, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital”. Já as despesas de capital, são “as que contribuem, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital” (SOF, 2019, P. 52). Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A estruturação dos gastos públicos sofre variações no decorrer dos anos e espelha a situação econômica do país. Destaca-se que em países mais pobres, as despesas correntes são predominantes, pois diante da escassez de recursos e do seu alto consumo para suprir os gastos dessa natureza, não sobram saldos financeiros consideráveis para aplicação em despesas de capital (SANSON, 2011 apud SILVA, 2015). Dessa forma, verifica-se a importância do controle dos gastos públicos, pois assim torna-se possível a redução das dívidas e a eliminação dos déficits. Uma lei que teve um papel fundamental para que fosse possível esse controle foi a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que estabeleceu limites para as Despesa Públicas, principalmente para os gastos com pessoal, com o intuito de melhorar os serviços públicos e fornecer uma margem maior de receita para ser aplicada em outras áreas (SANCHEZ; BISPO; PEREIRA, 2015).
Evolução histórica dos limites da despesa com pessoal
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A busca pelo controle dos gastos com pessoal, conforme disposto por Dias (2009), consta nos normativos brasileiros desde a Constituição Federal de 1891, que em seu artigo 34, 25°, atribuía poder privativo ao Congresso Nacional para dispor sobre os cargos públicos federais, limitando, dessa forma, a atuação do governante sobre a matéria. A Carta Magna de 1934 manteve a competência do Congresso Nacional em dispor sobre os cargos públicos, e definiu algumas prerrogativas aos funcionários públicos. Ademais, com o advento da Constituição de 1946, os direitos dos servidores foram expandidos e não houve “maiores preocupações com o controle dos gastos com pessoal” (DIAS, 2009, p. 3). A Constituição de 1967 foi o primeiro ato legal que buscou restringir as despesas com pessoal, apresentando um limite de gastos com base na Receita Corrente (DIAS, 2009). Em seu artigo 66, §4°, estabeleceu que “a despesa de pessoal da União, Estados ou Municípios não poderá exceder de cinquenta por cento das respectivas receitas correntes” (BRASIL, 1967). Na busca pelo controle das despesas com pessoal, a Carta Maior de 1988 estabeleceu regras para a posse de cargos e empregos na Administração Pública, além do teto remuneratório e da proibição de vincular ou equiparar os vencimentos dos servidores públicos. Ademais, em seu artigo 169, determina-se que os gastos com pessoal ativo e inativo dos entes federativos não poderão ultrapassar as limitações estabelecidas em Lei Complementar (DIAS, 2009). Enquanto a Lei Complementar estabelecida pelo artigo 169 da CF/88 não entrava em vigor, os limites da despesa com pessoal foram definidos pelo artigo 38 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (SOUZA; NETO, 2012). O artigo 38 da ADCT define que “até a promulgação da lei complementar referida no art. 169, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão despender com pessoal mais do que sessenta e cinco por cento do valor das respectivas receitas correntes” (BRASIL,1988). A primeira regulamentação definida pelo artigo 169 da CF/88, entrou em vigor com a Lei Complementar 82/1995, a chamada “Lei Camata I”, que determinou que os gastos com pessoal não poderiam comprometer mais de 60% das Receitas Correntes Líquidas (RCL). Além disso, apresentou regras a serem executadas pelos entes federativos que descumprirem o limite de despesas com pessoal e proibiu reajustes nos vencimentos dos servidores até o retorno dos gastos ao limite legal (DIAS, 2009). Em 1998, entrou em vigor a Emenda Constitucional n. 19, que modificou o artigo 169, apresentando inovações quanto ao controle de gastos com pessoal (DIAS, 2009). Diante disso, o artigo supracitado passou a ser regulamentado pela Lei Complementar 96/1999, a chamada “Lei Camata II”, que definiu novos limites de gastos com pessoal (DIAS, 2009). Conforme disposto em seu artigo 1°, o limite da despesa com pessoal passou a ser, no âmbito da União, de 50%, e nos Estados, Distrito Federal e Munícipios, de 60% da RCL (BRASIL, 1999). Em 4 de maio de 2000, foi promulga a Lei Complementar 101, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que revogou a “Lei Camata II”, mas manteve os mesmos limites de despesa com pessoal (DIAS, 2009). Destaca-se, que a LRF foi mais específica, pois apresentou percentuais restringindo os gastos com pessoal para os Três Poderes e o Ministério Público, pertencente ao ente federado (SOUZA; NETO, 2012). 26
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo
A evolução dos limites da despesa com pessoal consta sintetizada na Tabela 1. Tabela 1 – Evolução dos limites da despesa com pessoal
Normatização Constituição Federal de 1967 ADCT da Constituição Federal de 1988 LC n. 82/1995 – Lei Camata I LC n. 96/1999 – Lei Camata II LC n. 101/2000 – LRF RC: Receita Corrente; RCL: Receita Corrente Líquida
Base de Cálculo RC RC RCL RCL RCL
União 50% 65% 60% 50% 50%
Estados e Municípios 50% 65% 60% 60% 60%
Normas legais evidenciadas na tabela. Fonte: elaborada pelo autor.
A Lei de Responsabilidade Fiscal, conforme evidenciado no caput do seu artigo 1°, tem como função o estabelecimento de “normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal” (BRASIL, 2000). Por gestão fiscal responsável entende-se toda ação baseada no planejamento e na transparência, que busca a prevenção de riscos e correção de desvios que podem afetar o equilíbrio das contas públicas. Para atingir esse fim, a LRF evidenciou diversas normas a serem seguidas pelos gestores públicos; como exemplo, estipulou limites e condições para geração de despesas com pessoal (BRASIL, 2000). A Lei de Responsabilidade Fiscal colocou em evidência o equilíbrio das contas públicas, pois anteriormente só havia preocupação com o equilíbrio orçamentário que estava evidenciado pela Lei 4320/1964. O equilíbrio descrito pela LRF refere-se à busca pelo Resultado Primário Equilibrado, que consiste em dosar a execução da despesa de acordo com a realização das receitas, evitando dessa forma a contratação de operação de crédito, resultando em aumento da dívida pública. Destaca-se que a LRF não busca vedar as operações de crédito, mas somente controlá-las (NASCIMENTO; DEBUS, 2002). A Lei de Responsabilidade Fiscal impôs uma nova dinâmica à gestão pública brasileira, sendo considerada como um código de conduta a ser seguido pelos gestores públicos (SOUZA; NETO, 2012).
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A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL (LRF)
Receita Corrente Líquida (RCL) A LRF evidencia no artigo 2º, IV, que a Receita Corrente Líquida corresponde ao “somatório das receitas tributárias, de contribuições, patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também correntes”, considerando algumas deduções que variam conforme o ente federativo (BRASIL, 2000). No caso dos munícipios, as deduções correspondem aos valores referentes às contribuições dos servidores para o custeio do regime próprio de previdência e assistência social e às receitas oriundas da compensação financeira entre diferentes tipos de regime de previdência social (BRASIL, 2000). O artigo 2°, §1° da LRF também inclui no cálculo da RCL os valores pagos e recebidos relativos ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), ao qual se refere o artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (BRASIL, 2000). É importante destacar que diante do artigo 1°, § 13 da Emenda Constitucional n. 86 de 2015, o valor recebido pelos estados, Distrito Federal e municípios, por meio da transferência de verbas da União, advindas de emendas parlamentares individuais, “não integrará a base de cálculo da receita corrente líquida para fins de aplicação dos limites de despesa de pessoal” (BRASIL, 2015). Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Para a apuração da Receita Corrente Líquida, o artigo 2°, §3° da LRF define que deverão ser somadas “as receitas arrecadadas no mês em referência e nos onze anteriores, excluídas as duplicidades” (BRASIL, 2000).
Despesas com pessoal A Lei de Responsabilidade Fiscal conceituou a despesa com pessoal em seu artigo 18: Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência (BRASIL, 2000).
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A apuração da despesa total com pessoal, conforme §2°, do artigo 18 da LRF, deve ser efetuada “somando-se a realizada no mês em referência com as dos onze imediatamente anteriores, adotando-se o regime de competência” (BRASIL, 2000). O §1° do artigo 19 da LRF apresenta as despesas que não deverão ser consideradas na apuração dos limites legais. Em relação aos municípios, devem ser excluídas as despesas com indenização resultante da demissão de servidores ou empregados, as relativas a incentivos à demissão voluntária, as decorrentes de decisão judicial e da competência de período anterior ao da apuração, conforme expresso no § 2° do artigo 18 da LRF e os gastos com inativos cobertos por recursos advindos de fundos próprios (FREITAS; DAMASCENA, 2014). Os limites para as despesas com pessoal estabelecidos no artigo 19 da LRF foram definidos com base na Receita Corrente Líquida de cada ente federativo, sendo de 50% para a União e de 60% para os estados e municípios. Ademais, a partir desses percentuais, a LRF, em seu artigo 20, dividiu os limites entre os Poderes e o Ministério Público presentes nas esferas de governo (BRASIL, 2000). Na esfera municipal, a LRF definiu como limite máximo para as despesas com pessoal a alíquota de 60% da RCL, sendo 54% para o Poder Executivo e 6% para Poder Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver (BRASIL, 2000). A Lei de Responsabilidade Fiscal apresenta outros dois limites de gastos conhecidos como limite de alerta e limite prudencial. Destaca-se que esses termos não constam na LRF, mas fazem referência aos percentuais apresentados nos artigos 59 e 22, respectivamente (SOUZA; NETO, 2012). O limite de alerta refere-se ao disposto no § 1°, inciso II do artigo 59 da LRF, o qual atribui aos Tribunais de Contas o dever de alertar aos poderes e órgãos evidenciados no artigo 20 da LRF, quando a despesa total com pessoal ultrapassar 90% do limite máximo. Destaca-se que atingir este limite não gera penalidades aos gestores e entes públicos (BRASIL, 2000). O limite prudencial corresponde a 95% do limite máximo, conforme o parágrafo único do artigo 22 da LRF, o qual também destaca que seu descumprimento resulta ao poder ou órgão evidenciados no artigo 20 da Lei supracitada algumas restrições (BRASIL, 2000). Quanto ao descumprimento do limite máximo, o artigo 23 da LRF concede ao ente, um prazo de dois quadrimestres para eliminar o percentual excedente, sendo que no primeiro deve haver no mínimo a redução de um terço. Destaca-se, que o § 4° do artigo 23 da LRF evidencia que se o excesso acontecer no primeiro quadrimestre do último ano de mandato dos titulares dos poderes ou do órgão, as restrições ocorrem de forma imediata (BRASIL, 2000). A LRF foi alterada pela Lei Complementar 164/2018, possibilitando aos municípios excederem o limite de gasto com pessoal sem sofrerem punições. Entretanto, essa isenção só ocorrerá em casos definidos pela lei, relacionados à queda de receita (BRASIL, 2000). 28
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para o desenvolvimento deste artigo, foram adotadas pesquisas bibliográficas (baseadas em publicações de livros, artigos, monografias, dissertações, teses, jornais e demais materiais disponíveis na internet ) e de campo, classificadas como exploratória e descritiva. Os dados foram coletados por meio da análise das informações sobre os municípios do Estado do Espírito Santo disponíveis na plataforma CidadES, presente no sítio eletrônico oficial do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, com o intuito de poder identificar os gastos com pessoal realizado pelos entes. A partir dos dados obtidos, foi possível a realização de uma análise quantitativa, buscando expor o histórico de gasto com pessoal dos municípios. As informações obtidas foram organizadas em uma planilha no Excel, e posteriormente analisadas e apresentadas em forma de quadros e tabela, facilitando, assim, a compreensão.
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
Primeiramente foram analisados os percentuais de comprometimento da Receita Corrente Líquida com as despesas de pessoal de cada município. Diante disso, foi possível verificar o quantitativo de municípios que se enquadram em cada limite da LRF. Para uma melhor análise, a averiguação foi realizada separando o Poder Executivo, representado pelas prefeituras, e o Poder Legislativo, representado pelas câmaras municipais, conforme evidenciado nos Quadros 1 e 2, respectivamente, nos quais a Frequência Absoluta (FA) representa o quantitativo de municípios presentes em cada limite da LRF e a Frequência Relativa em Percentual (FR%) retrata em porcentagem o quociente da FA sobre o número total de municípios do Estado do Espírito Santo. Isto posto, destaca-se no Quadro 1 que o período de melhor desempenho no cumprimento aos limites da LRF por parte do Poder Executivo corresponde ao exercício de 2011, no qual somente 2 municípios (2,56%) extrapolaram o limite máximo e 58 municípios (74,36%) apresentaram um gasto com pessoal abaixo de todos os limites da LRF. Em análise ao pior desempenho, destacam-se os exercícios de 2015 e 2016; ambos evidenciam um número de 18 municípios (23,08%) que descumpriram o limite máximo, além de, no ano de 2015 constar o menor número de municípios com despesas dessa natureza abaixo de todos os limites da LRF, a saber, 16 municípios (20,51%). Ademais, de forma geral, o Poder Executivo dos municípios capixabas apresentou um bom desempenho quanto aos limites da LRF, visto que foi evidenciada uma média anual de 35,30 (45,26%) municípios com gastos com pessoal abaixo de todos os limites, 17,70 (22,69%) no limite de alerta, 16,30 (20,90%) no limite prudencial e 8,70 (11,15%) acima do limite máximo.
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Os resultados evidenciados neste capítulo estão em conformidade com os objetivos específicos da pesquisa. A amostra foi gerada considerando todos os municípios do Estado do Espírito Santo. Dessa forma, os 78 municípios capixabas formam a base deste estudo.
Quadro 1 – Tabulação de frequências dos municípios em cada limite da LRF – Poder Executivo
Exercício 2009 2010 2011
FA/FR%
Abaixo dos Limites
FA FR% FA FR% FA
Limite de Alerta
FA FR%
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Limite Máximo
∑
35
20
17
6
78
44,87
25,64
21,79
7,69
100
48
17
9
4
78
61,54
21,79
11,54
5,13
100
58
12
6
2
78
7,69
2,56
100
FR% 74,36 15,38 2012
Limite Prudencial
43
10
15
10
78
55,13
12,82
19,23
12,82
100 29
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Exercício
FA/FR% FA
2013
78
37,18
26,92
25,64
10,26
100
30
21
20
7
78
38,46
26,92
25,64
8,97
100
16
19
25
18
78
20,51
24,36
32,05
23,08
100
22
19
19
18
78
28,21
24,36
24,36
23,08
100
21
25
22
10
78
26,92
32,05
28,21
12,82
100
51
13
10
4
78
FR%
65,38
16,67
12,82
5,13
100
FA
35,30
17,70
16,30
8,70
78
FR%
45,26
22,69
20,90
11,15
100
FR% FA FR% FA FR% FA
2018 Média
∑ 8
FA
2017
Limite Máximo
20
FR%
2016
Limite Prudencial
21
FA
2015
Limite de Alerta
29
FR%
2014
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
Abaixo dos Limites
Fonte: Plataforma CidadES – TCE-ES (2009 - 2018). Elaborado pelo autor.
Em análise do Poder Legislativo dos municípios do Estado do Espírito Santo, conforme evidenciado no Quadro 2, destaca-se por um excelente desempenho, visto que durante o período estudado nenhuma câmara municipal extrapolou o limite máximo, e somente uma vez um Poder Legislativo municipal atingiu o limite prudencial, que ocorreu no ano de 2010. Ademais, conforme evidenciado na tabela supracitada, observa-se uma média de 77,90 Poderes Legislativos municipais (99,87%) com despesas de pessoal abaixo de todos os limites da LRF e 0,10 (0,13%) no limite prudencial. Quadro 2 – Tabulação de frequências dos municípios em cada limite da LRF – Poder Legislativo
Exercício 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 30
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FA/FR% FA FR% FA FR% FA FR% FA FR% FA FR% FA FR% FA FR% FA FR%
Abaixo dos Limites
Limite de Alerta
Limite Prudencial
Limite Máximo
∑
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
77
0
1
0
78
98,72
0,00
1,28
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo
Exercício 2017 2018 Média
FA/FR%
Abaixo dos Limites
FA
Limite de Alerta
Limite Prudencial
Limite Máximo
∑
78
0
0
0
78
100,00
0,00
0,00
0,00
100
78
0
0
0
78
FR%
100,00
0,00
0,00
0,00
100
FA
77,90
0
0,10
0
78
FR%
99,87
0,00
0,13
0,00
100
FR% FA
O Quadro 3 evidencia as prefeituras que durante os exercícios de 2009 a 2018 permaneceram com gastos com pessoal sempre abaixo dos limites da LRF. Destaca-se que o Município de Presidente Kennedy, durante todo o período em análise, obteve os menores índices de despesa com pessoal. Entretanto, é importante ressaltar que o baixo índice de gastos com pessoal do município sofre influência direta dos royalties do petróleo, que, conforme salienta Gomes apud Mendonça (2018), representa a maioria da receita corrente do município, e conforme entendimento do TCE-ES por meio do Parecer Consulta 003/2017, os royalties do petróleo não podem ser utilizados para cobrir despesas com pessoal permanente, com exceção a gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino, conforme exposto no artigo 5º da Lei Federal n. 12.858/2013. Dessa forma, os recursos dos royalties do petróleo acabam elevando a RCL, contribuindo para um percentual de despesa com pessoal muito abaixo dos limites, podendo não expressar a realidade dos gastos. Em análise aos demais municípios evidenciados no Quadro 3, observa-se que apresentam um percentual médio de gastos com pessoal anual semelhante, variando de 42,96% a 45,52%, indo ao encontro de uma gestão fiscal responsável. Quadro 3 – Municípios com DTP sempre abaixo de todos os limites da LRF – Poder Executivo
Exercícios
Alfredo Chaves
Aracruz
Domingos Martins
Linhares
Presidente Kennedy
2009
41,99
44,65
46,43
44,81
19,94
2010
46,56
42,25
47,99
41,33
17,87
2011
38,72
42,10
43,91
38,16
14,91
2012
40,78
41,14
44,76
40,04
11,58
2013
43,96
47,62
43,99
46,24
8,59
2014
41,81
48,07
46,36
43,51
12,13
2015
44,27
44,72
46,62
45,65
14,20
2016
47,44
45,49
46,42
47,76
22,39
2017
48,60
45,96
45,44
42,85
19,90
2018
43,83
42,42
43,25
39,23
17,54
Média
43,80
44,44
45,52
42,96
15,91
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
Fonte: Plataforma CidadES – TCE-ES (2009 - 2018). Elaborado pelo autor.
*Valores em % da DTP sobre a RCL; *DTP: Despesa Total com Pessoal. Fonte: Plataforma CidadES – TCE-ES (2009 - 2018). Elaborado pelo autor.
Conforme expresso anteriormente, durante o período em análise, praticamente todos os Poderes Legislativos Municipais permaneceram sempre abaixo de todos os limites da LRF, com exceção da Câmara Municipal de Atílio Vivácqua, que no exercício de 2010 teve gastos com pessoal de 5,81% da RCL, atingindo, dessa forma, o limite prudencial. O Quadro 4 demonstra os municípios que durante o período analisado apresentaram gasto com pessoal acima dos limites da LRF. Por meio dos dados evidenciados, observa-se que o Município de Água Doce do Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Revista Vivências Educacionais
Norte descumpriu oito vezes o limite máximo, além de evidenciar um histórico de sete anos consecutivos (2012 a 2018) de desrespeito ao mesmo limite, apresentar o maior gasto com pessoal entre os municípios capixabas – no exercício de 2017 correspondeu a 72,73% de sua RCL, e possuir um gasto médio anual de 62,67%, também acima do limite máximo. Nessa mesma linha de irregularidade, o Município de Muniz Freire também ganha destaque ao apresentar um histórico de sete anos (2012 a 2018) acima de todos dos limites as LRF. Quadro 4 – Municípios com DTP acima do limite máximo da LRF – Poder Executivo
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
Exercícios
Água Doce do Norte
Muniz Freire
Alegre
Barra de São Francisco
São Mateus
Bom Jesus do Norte
2009
58,63
49,30
53,68
52,45
58,42
47,54
2010
52,70
48,72
56,49
54,72
49,34
53,92
2011
50,71
47,18
50,59
48,86
53,82
48,99
2012
64,84
56,14
52,45
55,49
58,28
56,68
2013
66,41
59,58
56,95
53,87
52,05
58,02
2014
59,58
60,59
55,25
52,10
53,65
56,47
2015
68,39
64,12
54,65
66,12
57,33
51,07
2016
72,72
61,50
54,66
59,40
66,49
64,57
2017
72,73
60,91
56,87
67,62
55,47
58,98
2018
59,95
60,98
50,24
56,09
49,38
52,18
Média
62,67
56,90
54,18
56,67
55,42
54,84
8
7
6
6
5
5
Acima do Limite Máximo
4 vezes acima do limite máximo: Fundão e Pinheiros. 3 vezes acima do limite máximo: Alto Rio Novo, Guaçuí, Ibatiba e São José do Calçado. 2 vezes acima do limite máximo: Divino de São Lourenço, Jerônimo Monteiro, Mantenópolis, Marataízes, Nova Venécia, Rio Novo do Sul e Vila Pavão. 1 vez acima do limite máximo: Anchieta, Boa Esperança, Castelo, Dores do Rio Preto, Governador Lindenberg, Guarapari, Ibitirama, Laranja da Terra, Marechal Floriano, Mimoso do Sul, Muqui, Pedro Canário, Rio Bananal, Santa Leopoldina, Vargem Alta e Viana. *Valores em % da DTP sobre a RCL; *DTP: Despesa Total com Pessoal. Fonte: Plataforma CidadES – TCE-ES (2009 - 2018). Elaborado pelo autor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Os municípios do Estado do Espírito Santo, em relação ao Poder Executivo, apresentaram durante os exercícios de 2009 a 2018 um bom nível de cumprimento dos limites de gastos com pessoal definidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que, no período analisado, obteve-se uma média anual de 35,30 prefeituras (45,26%) com gastos com pessoal abaixo de todos os limites da LRF e 17,70 (22,69%) no limite de alerta; nesses dois casos, não há punições e restrições aos entes federados. Ademais, 16,30 prefeituras (20,90%) permaneceram no limite Prudencial e 8,70 (11,15%) extrapolaram o limite máximo. Diante disso, ambas as situações resultaram em punições e restrições aos municípios. Em análise ao Poder Legislativo, os municípios capixabas apresentaram um excelente nível de cumprimento aos limites legais, visto que durante todo o período estudado, somente a Câmara Municipal de Atílio Vivácqua apresentou uma única vez gastos dentro do limite prudencial, as demais entidades evidenciaram gastos sempre abaixo de todos os limites da LRF, resultando em uma média anual de 77,90 câmaras municipais (99,87%) abaixo de todos os limites legais. Como resultado direto da análise dos dados, quanto ao Poder Executivo, dos 78 municípios capixabas somente 5 (6,41%) sempre se mantiveram abaixo de todos os limites legais, são eles: Alfredo Chaves, Aracruz, 32
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Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A Lei de Responsabilidade Fiscal e as despesas com pessoal nos municípios do Estado do Espírito Santo
Domingos Martins, Linhares e Presidente Kennedy. É importante salientar que o Município de Presidente Kennedy apresenta o menor percentual de despesa com pessoal, uma média anual de 15,91% da RCL; entretanto, esse baixo índice de gastos sofre influência direta dos royalties do petróleo, que compõem a maioria das receitas correntes do município, mas esses recursos não podem ser utilizados para custear todos os tipos de despesa com pessoal. Dessa forma, a RCL fica com valores elevados, resultando em um baixo percentual de gasto. Quanto aos demais municípios, apresentam índices de gastos com pessoal semelhantes, variando de 42,96% a 45,52% da RCL. Em análise dos municípios que mais vezes extrapolaram o limite máximo da LRF, quanto ao Poder Executivo, observou-se que, dos 78 municípios, 2 1 município (1,28%) extrapolou 8 vezes o limite máximo. Município: Água Doce do Norte; 2 1 município (1,28%) extrapolou 7 vezes o limite máximo. Município: Muniz Freire; 2 2 municípios (2,56%) extrapolaram 6 vezes o limite máximo. Municípios: Alegre e São Mateus; 2 2 municípios (2,56%) extrapolaram 5 vezes o limite máximo. Municípios: Barra de São Francisco e Bom Jesus do Norte; 2 4 municípios (5,13%) extrapolaram 3 vezes o limite máximo. Municípios: Alto Rio Novo, Guaçuí, Ibatiba e São José do Calçado; 2 7 municípios (8,97%) extrapolaram 2 vezes o limite máximo. Municípios: Divino de São Lourenço, Jerônimo Monteiro, Mantenópolis, Marataízes, Nova Venécia, Rio Novo do Sul e Vila Pavão; 2 16 municípios (20,51%) extrapolaram 1 vez o limite máximo. Municípios: Anchieta, Boa Esperança, Castelo, Dores do Rio Preto, Governador Lindenberg, Guarapari, Ibitirama, Laranja da Terra, Marechal Floriano, Mimoso do Sul, Muqui, Pedro Canário, Rio Bananal, Santa Leopoldina, Vargem Alta e Viana. Destaca-se que os Municípios de Água Doce do Norte e Muniz Freire apresentaram um histórico de 7 anos consecutivos de descumprimento ao limite máximos, de 2012 a 2018. Diante do exposto, observa-se que o Poder Legislativo evidenciou uma excelente gestão fiscal perante os gastos com pessoal, mantendo de forma quase majoritária seus índices de despesa abaixo de todos os limites legais. Entretanto, ao se analisar o Poder Executivo, verifica-se muita volatilidade dos índices de gastos com pessoal, mas ainda se configura uma boa gestão, pois as variações estão predominantemente abaixo de todos os limites e no limite de alerta; diante disso, não houve punições ou restrições ao ente.
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
2 2 municípios (2,56%) extrapolaram 4 vezes o limite máximo. Municípios: Fundão e Pinheiros;
REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967, de 24 de janeiro de 1967. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 jan. 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Constituicao/ Constituicao67.htm. Acesso em: 5 set. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 5 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicaocompilado.htm. Acesso em: 5 set. 2019. BRASIL. Emenda Constitucional n. 86, de 17 de março de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 mar. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc86.htm. Acesso em: 11 set. 2019. BRASIL. Lei Complementar n. 82, de 27 de março de 1995. Disciplina os limites das despesas com o funcionalismo público, na forma do art. 169 da Constituição Federal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 mar. 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp82.htm. Acesso em: 5 set. 2019. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Revista Vivências Educacionais
BRASIL. Lei Complementar n. 96, de 31 de maio de 1999. Disciplina os limites das despesas com pessoal, na forma do art. 169 da Constituição. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 maio 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp96.htm. Acesso em: 5 set. 2019. BRASIL. Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 4 maio 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm. Acesso em: 5 set. 2019. DIAS, Fernando Álvares Correia. O controle institucional das despesas com pessoal. Textos para discussão 54. Brasília, 2009. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-deestudos/textos-para-discussao/td-54-o-controle-institucional-das-despesas-com-pessoal. Acesso em: 5 set. 2019.
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
FREITAS, Valdirene Alves de; DAMASCENA, Luzivalda Guedes. A Lei de Responsabilidade Fiscal e a limitação da despesa com pessoal no município de Catolé do Rocha – PB. Alumni - Revista Discente da UNIABEU. v. 2, n. 3, 2014. Disponível em: https://revista.uniabeu.edu.br/index.php/alu/article/view/1418/1103. Acesso em: 5 set. 2019. MENDONÇA, Maira. Presidente Kennedy deve dois meses de salário a 516 servidores. Gazeta Online, 2018. Disponível em: https://www.gazetaonline.com.br/noticias/politica/2018/05/presidente-kennedy-deve-doismeses-de-salario-a-516-servidores-1014131536.html#. Acesso em: 9 out. 2019. NASCIMENTO, Edson Ronaldo; DEBUS, Ilvo. Entendendo a Lei de Responsabilidade Fiscal. Secretaria do Tesouro Nacional. Brasília. 2. ed. 2002. Disponível em: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/documents/10180/0/ EntendendoLRF.pdf. Acesso em: 6 set. 2019. SANCHEZ, A. F. C.; BISPO, C. S.; PEREIRA, M. Q. Gestão Pública: gestão dos recursos com gastos de pessoal nos 10 Municipios mais populosos do Estado de São Paulo. 2015. Disponível em: http://convibra.com. br/upload/paper/2015/38/2015_38_11862.pdf. Acesso em: 26 ago. 2019. SILVA, Giselle Oliveira da. Despesas públicas. Jus. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/38889/ despesas-publicas. Acesso em: 26 ago. 2019. SOF. Secretaria de Orçamento Federal. Manual Técnico de Orçamento. Brasília, 2019. Disponível em: https:// www1.siop.planejamento.gov.br/mto/lib/exe/fetch.php/mto2019:mto2019-versao8.pdf. Acesso em: 26 ago. 2019. SOUZA, Paula de; NETO, Orion Augusto Platt. A composição e a evolução das despesas com pessoal no Estado de Santa Catarina de 2000 a 2011. Revista Catarinense da Ciência Contábil – CRCSC, v. 11, n. 33, 2012. Disponível em: http://revista.crcsc.org.br/index.php/CRCSC/article/view/1301/1270>. Acesso em: 26 ago. 2019. TCE-ES – Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo. CidadES - Controle Informatizado de Dados do ES. Disponível em: https://cidades.tce.es.gov.br/. Acesso em: 15 out. 2019. TCE-ES – Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo. Parecer Consulta TC-003/2017 – Plenário. Disponível em: https://www.tce.es.gov.br/wp-content/uploads/2017/08/PC003-17.pdf. Acesso em: 9 out. 2019.
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A pesquisa em Letras na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP-PORTO) – experiências de intercâmbio Research in Letters at the College of Letters of the University of Porto (FLUP-PORTO) – exchange experiences OLIVEIRA, Cristiano Mello de7; 8
RESUMO O presente artigo relata a experiência de intercâmbio acadêmico-cultural na Universidade do Porto-Portugal. Entre os meses de abril e agosto de 2015, um pesquisador brasileiro da área de Letras, por meio de sua pesquisa individual, participou de proposta de Estágio PDSE-Capes. A motivação maior do pesquisador foi encontrar subsídios bibliográficos, assistir a aulas com autoridades científicas, participar de reuniões em grupos de pesquisas correlatos, participar de encontros científicos, e, junto a isso, conhecer aspectos culturais e artísticos gerais de Portugal. Ao longo do semestre, o jovem pesquisador realizou pesquisas intensas a fontes bibliográficas nas seguintes instituições: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Biblioteca Nacional de Espanha na cidade de Madrid, e Biblioteca Almeida Garrett, localizada no Porto. A pesquisa desenvolvida possui como temática o Novo Romance Histórico brasileiro – partindo das principais teorias e formulações acerca do subgênero literário – assim como as relações interdisciplinares entre a História e a Literatura. O contributo maior desse artigo é informar sobre as ações desenvolvidas pelo pesquisador com os discentes antigos e novos dos cursos de Pós-Graduação em Literaturas da Universidade Federal de Santa Catarina, buscando sintonizá-los com as articulações profissionais existentes na área de Letras, no campo da docência e da investigação, entre Brasil e Portugal. Palavras-chave: Pesquisa na área de Letras e História. Universidade do Porto. Experiências de intercâmbio em Portugal. Visitas a países europeus. Novo Romance Histórico brasileiro.
ABSTRACT This article reports on the experience of academic-cultural exchange at the University of Porto-Portugal. Between April and August 2015, a Brazilian researcher in the area of Letters, through his individual research, participated in a proposal for the PDSE-Capes Internship. The researcher’s main motivation was to find bibliographic resources, to attend classes with scientific authorities, to attend meetings in related research groups, to participate in scientific meetings, and, along with this, to know general cultural and artistic aspects of Portugal. Throughout the semester, the young researcher carried out intensive research to bibliographic sources in the following institutions: Faculty of Letters of the University of Coimbra, Faculty of Letters of the University of Porto, National Library of Spain in the city of Madrid, Almeida Garrett Library, located in Port. The current research developed has as its theme the New Brazilian Historical Romance - starting from the main theories and formulations about the literary subgenre - as well as the interdisciplinary relations between History and 7
Gostaria de realizar os devidos agradecimentos aos amigos Leonardo Coutinho de Carvalho Rangel (doutorando em História – UFBA) e Edilson (doutorando em História – Unicamp) pela devida interlocução e leitura do artigo.
8
Professor na área de Humanas – Faculdade Educacional da Lapa. Pós-doutorando em Letras Vernáculas – UFRJ. Doutor em Letras pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: crisliteratura@yahoo.com. Autor da tese: O Novo Romance Histórico brasileiro em travessias: A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca. A pesquisa foi defendida em agosto de 2016.
Revista Vivências Educacionais
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Revista Vivências Educacionais
Literature. The major contribution of this article is to inform about the actions developed by the researcher the old and new students of the Post-Graduation courses in Literature of the Federal University of Santa Catarina, seeking to tune them with the professional articulations existing in the area of Literature, in the field of Literature teaching and research, between Brazil and Portugal. Keywords: Research in the area of Literature and History. University of Porto. Exchange experiences in Portugal. Visits to European countries. New Romance Brazilian history.
INTRODUÇÃO
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O presente artigo objetiva narrar as principais etapas do estágio PDSE-Capes realizado na Faculdade de Letras, da Universidade do Porto, cidade do Porto, Portugal. Entre os meses de abril a agosto de 2015, um pesquisador brasileiro da área de Letras desenvolveu a continuação da sua pesquisa intitulada O Novo Romance Histórico brasileiro em travessias: A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca. Optou-se pela metodologia do relato etnográfico da visita a algumas cidades de Portugal, da Espanha, da França, da Itália, do cotidiano acadêmico, da visita a museus e instituições de pesquisa, da participação em eventos científicos, do encontro com novos estudantes, da apreciação da culinária local, da experiência de residir em uma residência universitária, do contato com o orientador estrangeiro, com outros pesquisadores, entre outros. O objetivo da estada em território português foi plural e dinâmico: encontrar subsídios bibliográficos nas distintas bibliotecas espalhadas, entrevistar pesquisadores da área, agregar conhecimento cultural-histórico cujo mote é trabalhado nos romances investigados, participar de grupos de pesquisa correlatos, participar de encontros e congressos voltados à área de investigação, dentre outros. A título de exemplo, na Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, o estudioso encontrou duas referências indispensáveis à pesquisa da teoria do romance histórico e, por consequência, das relações perturbadas entre a História e a Literatura. Para situar o leitor nos subtítulos sequentes, foram formuladas algumas questões pertinentes acerca do assunto: como nasceu a proposta da minha pesquisa e quais foram os desencadeamentos que me motivaram a dar continuidade ao assunto? Quais foram as circunstâncias dimensionais que envolveram o período de maturação da minha investigação? Quais foram as principais lembranças daquele período tão importante na minha formação como pesquisador na área de Literatura Brasileira? E, por último, quais foram os resultados e os contributos alcançados durante o período de Estágio PDSE-Capes? É importante alertar que não pretendo refletir sobre os aspectos burocráticos exigidos pelas agências de fomento científico, situação já delineada por outros pesquisadores nas suas experiências de intercâmbio9, ou seja, o objetivo aqui é relatar aspectos embrionários da pesquisa e, por consequência, escrever alguns detalhes do curto período que ela se solidificou em Portugal.
SOBRE A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA – ENFIM, É SUBSTANCIAL FORMULAR UMA TESE Sempre fui apaixonado pela História Nacional e das outras nações da América Latina. Com esta frase, posso resumir a minha atual paixão ao tema que venho investigando desde a minha defesa de doutorado. A compreensão da História via romance histórico é mais prazerosa, lúdica e, ao mesmo tempo, inteligente. No último quinquênio, estudei incansavelmente História (com “H” maiúsculo, sendo inteiramente um autodidata) como não o fizera desde meus anos de escola. Por conta disso, fui atrás de muitas referências sobre a historiografia brasileira e portuguesa com vistas a tomar embasamento sobre os assuntos (chegada da família Real Portuguesa e a Inconfidência Mineira, séculos XVIII e XIX), que abrangiam os romances investigados nesta pesquisa. Investigar os pressupostos do romance histórico tradicional, bem como as respectivas evoluções teóricas, é muito instigante por vários motivos. 9
Ver: SOUSA, Feitosa Lucyneide. Leituras, reflexões e descobertas: experiências vividas no doutorado sanduíche. Revista Geografar Curitiba, v. 6, n. 2, p.203-216, 2011.
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O romance histórico, por meio da literatura, revela, com maior tensão, a História Oficial, como dizia o recém-falecido historiador Nicolau Sevcenko, no seu livro Literatura como missão (1984). Diante dessa reflexão, é lícito apontar que quando terminei o mestrado10, não desejava explorar o mesmo assunto; por isso, enveredei na leitura de muitos romances históricos, visando compreender os fatos da ditadura militar no Brasil e, por curiosidade própria, da História dos séculos XVIII e XIX, como é o caso dos romances históricos que venho investigando.
Não falarei sobre a pesquisa de mestrado, defendida em dezembro de 2011, pois ela não teve ligação direta com a investigação de doutorado. Notadamente, o projeto de pesquisa inicial visou encontrar por meio de múltiplas abordagens o conceito generalizado da “metaficção historiográfica” nas obras apontadas; no entanto, foram necessários alguns envergamentos teóricos mais diferenciados, visando aprimorar o objeto da tese de doutorado junto às ferramentas teóricas existentes. Ou seja, eu ainda estava teoricamente imaturo para identificar alguma chave de leitura (deveria ser criada e aperfeiçoada) a qual pudesse dar conta de ler os romances. A propósito, o projeto piloto almejava explorar os romances O Proscrito (2004), de Ruy Tapioca, e Desmundo (1996), de Ana Miranda. Naquele período (2012), cheguei a participar de congressos e eventos científicos correlatos, publicando artigos sobre o assunto. Convém, agora, explicar por quais motivos foi escolhido A República e Conspiração e não estes romances. Com o surgimento do recorte específico de análise sob a ótica da autorreflexividade dos fatos históricos ou da articulação entre passado e presente (chave de leitura da tese), acreditei que o romance Desmundo se deu de forma insuficiente para realizar esse tipo de análise. Este em questão, o enredo, o narrador, o cenário e as personagens ficam reclusos no passado remoto do século XVI, distanciados de uma possível relação com o presente da escritura e da leitura. Ao verificar esse fator, resolvi satisfazer a minha leitura, alterando o corpus literário para A República dos Bugres e Conspiração Barroca. É possível notar que, nos últimos anos, o trato interdisciplinar das relações curiosas entre História e Literatura, no ambiente acadêmico, é muito bem-vindo. Investigar os romances históricos A República dos Bugres (1999) e Conspiração Barroca (2008) foi sintomático, pois ambos abarcam episódios significantes da realidade brasileira dos séculos XIX e XVIII, respectivamente. Devo salientar que a atualidade crítica de A República e Conspiração está, sobretudo, na articulação crítica entre passado e presente. Conjecturei que, no decorrer da minha pesquisa (diante de algumas leituras teóricas contidas nas referências da tese), as obras mencionadas discorrem sobre a perspectiva da desconstrução da História Oficial, da ironia constante, da marca do discurso filosófico do fazer literário e histórico, da articulação entre o passado e o presente dos fatos históricos durante o desenrolar dos episódios, dos discursos culturais entrelaçados, e da paródia representativa.
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Como nada na vida é por acaso, foi no fim do ano de 2011 que tomei conhecimento da obra do escritor baiano Ruy Reis Tapioca. Esta foi apresentada pelo pesquisador Dr. Wilton Fred Cardoso de Oliveira (UTFPR-Curitiba)11. No decorrer da leitura do romance O Proscrito, primeiro romance lido de Tapioca, eu fui gradativamente sendo contagiado pela obra do autor baiano. À época, duas questões estimularam o meu pensamento: o conteúdo sarcástico e o lastro histórico representando na figuração do enredo e da trama, dos cenários e das personagens. É importante lembrar que naquele período eu estava envolvido com o término de uma especialização sobre “Literatura Brasileira e História Nacional”, e fui incumbido a terminar a disciplina “Romance Histórico Contemporâneo”, ministrada pelo pesquisador anteriormente citado, com a redação de um artigo sobre o romance histórico O Proscrito (2004).
Tendo em vista que o gênero romanesco, empreendido nas respectivas obras literárias, oferta uma ampla gama de possibilidades para uma arguta análise da mescla subjetivada entre os variados mecanismos de enredo, cenários, ação, trama e personagens, nas palestras e cursos que ministrei em algumas instituições pelo Brasil 10 Durante o mestrado, investiguei as crônicas de viagens de Mário de Andrade publicadas no Jornal Diário Nacional de São Paulo em 1927 e 1928. O livro foi intitulado O Turista
Aprendiz, e foi publicado oficialmente em 1976 pela pesquisadora Dra. Tele Ancona Lopez. Na minha investigação, parto do pressuposto de que Mário deixou “contribuições sociais” ao visitar as precárias condições de moradia e trabalho das cidades do Norte e Nordeste. Maiores detalhes ver: OLIVEIRA, Cristiano Mello. Considerações sobre a construção intelectual de Mário de Andrade: O turista aprendiz. Universidade Federal de Santa Catarina (Dissertação de Mestrado) 2011.
11
Ver: OLIVEIRA, Wilton Fred Cardoso. Imaginários de nação no romance brasileiro contemporâneo: Os rios inumeráveis e a República dos Bugres. Florianópolis, UFSC, 2005.
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afora, pude notar um grande interesse do público pelo assunto. Por meio dessa forma de divulgação científica, o assunto da minha pesquisa não ficou apenas nas formulações descritas na redação da tese, mas saltou para o meio daqueles que desejavam debater o assunto estudado, dialogando, dessa forma, com pesquisadores de áreas correlatas. Resumindo: o objeto da minha pesquisa partiu da análise da articulação entre o passado e presente nos romances A República dos Bugres (1999) e Conspiração Barroca (2008), de Ruy Reis Tapioca. Desse modo, a chave de leitura para compreender esses romances foi a de que os tempos se articulam em vários episódios, gerando um olhar retrospectivo crítico ao passado.
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Conforme levantamento apontado na redação da tese, vale lembrar que ambos os romances carecem de pesquisas na academia. O mais curioso é que esses romances sequer despertaram atenção no público leitor atual. É necessário apontar que ambos os romances não usufruíram de uma boa campanha publicitária, pois Tapioca não faz muita questão de dar entrevistas ou aparecer em feiras literárias – possivelmente pela falta de divulgação comercial, pois ambos não tiveram o devido apelo por parte do escritor e do mercado editorial. O segundo título – Conspiração Barroca (2008) – foi publicado somente em Portugal, favorecendo um maior intercâmbio com o Brasil, uma vez que investiguei em maior grau como esse romance foi recebido em terras lusitanas. Parte da minha pesquisa resultou na compreensão das motivações do público leitor contemporâneo pela leitura de romances históricos, que atualmente integra o subtítulo 2.2 da minha tese. Enfim, explorei também esse último assunto por meio de um ensaio específico.
O DEPOIMENTO DO PESQUISADOR – UMA NARRATIVA PAUTADA NA MEMÓRIA O grande insight para realizar este estágio e, justamente escolher a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, nasceu em um dia ensolarado de pesquisa no Real Gabinete Português de Leitura, localizado no centro da cidade do Rio de Janeiro. Local privilegiado para muitos pesquisadores, embora este ainda careça de infraestrutura que possa dar fôlego às horas debruçadas sobre algumas obras12. À época, ao consultar o livro O Romance Histórico em Portugal (1999), da autora Maria de Fátima Marinho (obra que me serviu de aporte teórico-metodológico), pude perceber que boa parte da sua produção científica era extremamente indispensável para trabalhar com alguns conceitos sobre o Novo Romance Histórico. Ou seja, a ideia era observar como Marinho trabalha nos romances históricos publicados em Portugal, realizando, por alusão, o uso das ferramentas analíticas nos romances brasileiros. Por ironia do destino, o livro da pesquisadora podia ser emprestado apenas aos sócios do Real Gabinete. Foi a partir daí que a minha inquietação incansável por descobrir as demais referências dessa autora foi aumentando gradativamente. Não à toa, busquei tomar conhecimento do seu correio eletrônico, e, por meio deste, tomei a iniciativa de manifestar o meu interesse por ser orientado por ela. Figura 1 – Museu Romântico do Porto – Porto- Portugal (11 de abril de 2015)
Fonte: Cristiano Mello de Oliveira.
12 Na semana em que eu estava realizando a pesquisa, o Instituto, infelizmente, não possuía energia elétrica para ligar os computadores na tomada. 38
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O meu relato científico descrito neste texto faz parte da minha memória13. Digamos que este relato será memorialístico. Embora faça três anos que tudo ocorreu, sempre tive a certeza de concluir mais esta etapa de produção de escrita. Respeitando as condições físicas de um suposto esquecimento, recorri aos dados anotados em um pequeno caderno, esboços esparsos guardados em pastas, assim como demais documentos, recibos e fotos tiradas durante a minha estada em Portugal. Dessa forma, tudo começou basicamente no mês de julho de 2014. Obviamente que no próprio projeto de pesquisa eu justifiquei a minha ida a Portugal. Em primeiro lugar, o meu interesse partiu em uma primeira reunião de supervisão de tese com a professora Dra. Rosana Kamita. No seu gabinete, localizado no prédio do Centro de Comunicação e Expressão, fiz o possível para criar argumentos que fossem suficientes para empreender a minha jornada científica em Portugal. Naquele período, eu tive total apoio (financeiro, com bolsa PDSE) da Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Ao chegar à cidade do Porto, percebi, tão logo, que se tratava de uma cidade densamente histórica – cuja estrutura arquitetônica14 era guarnecida de um passado tão remoto do espaço, representado nos romances históricos do escritor Almeida Garret. Logo no primeiro dia (fazia frio e existia uma névoa densa que escondia boa parte da cidade), ao me adaptar no fuso horário local, fiz questão de caminhar (no fim da tarde) pelas ruas e vielas do Porto. Neste fim de tarde, visitei, por curiosidade, o Museu de Fotografia, localizado onde outrora havia a antiga cadeia pública da cidade. Lá há uma estátua histórica de Camilo Castelo Branco, provavelmente simbolizando o clássico Amor de Perdição. Após a visita, resolvi por conta e risco conhecer a Ribeira da cidade – a principal margem do Rio Douro – que separa as cidades portuguesas do Porto e Vila Nova de Gaia. A primeira amizade feita foi com o porteiro Fernando, funcionário da residência estudantil. De forma paciente, ele deu-me várias instruções das normas internas do alojamento e mostrou-me o caminho até o Instituto de Letras da Universidade do Porto. Logo no primeiro dia tomei um susto, porque ele demorou a dar às caras na frente da residência quando eu toquei a campainha. Preocupado e cansado da longa viagem, tentando me adaptar ao fuso horário local, eu não via a hora de arrumar as minhas coisas e descansar bastante. Mas, depois do ocorrido, ele se mostrou bastante atencioso. Guiou-me até o quarto e ajudou-me a carregar a minha mala de aproximadamente 32 quilos. As demais amizades também foram feitas gradativamente – com alguns estudantes brasileiros, italianos, portugueses e de outras nacionalidades. O idioma inglês era a língua oficial praticada por todos nós, sendo que raramente falávamos português.
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Confesso que foi bastante árduo ingressar na oportunidade de estágio PDSE, oferecida pela Capes. O número de vagas é um pouco restrito a cada programa de Pós-Graduação, e, por sequência, é necessário ter condições mínimas aprovadas pelo Colegiado para garantir sua vaga. Utilizo o vocábulo “árduo” porque foram gastos dias e dias para realizar o trâmite burocrático exigido pela agência de fomento brasileira. À época, necessitei acompanhar outros trâmites semelhantes – não raro, indaguei vários conhecidos sobre as etapas do intercâmbio. O primeiro (e o principal) deles foi argumentar com a minha orientadora Dra. Rosana Cássia Kamita sobre a motivação e a justificativa de residir durante um período em Portugal para que eu pudesse desenvolver em maior profundidade a minha atual pesquisa. Dentre outros documentos necessários: cotação e compra de passagens aéreas, reserva de vaga na Moradia Estudantil da Universidade do Porto, cálculo das distâncias efetuadas e percorridas, encontros com a orientadora/professora Dra. Zulmira Santos, dentre outros correlatos.
A residência Alberto Amaral alberga boa parte dos estudantes oriundos de diversas cidades e lugares do mundo, sendo a maior parte oriunda dos programas Erasmus, estudantes europeus, ou Ciência sem Fronteiras, como é o caso dos brasileiros. A residência se encontra em um prédio anexado à própria Faculdade de Letras da Universidade. Esta possui vários quartos mistos (até dois estudantes), separados por duas camas de solteiro. O banheiro é privado e bem espaçoso. O prédio conta com bastante segurança interna e externa – disponibilizando câmeras de vigilância e dois vigilantes que se revezam entre a portaria principal e os corredores das habitações. A parte do interior do prédio conta com uma cozinha compartilhada (equipada com micro-ondas, geladeira e alguns utensílios domésticos), um hall com televisor, uma sala espaçosa de estudo e elevadores entre os andares. Minha preocupação maior ainda era a de encontrar a minha suposta orientadora. 13 A respeito da conceituação do vocábulo memória e de suas delimitações históricas, ver: GOFF, Jacques Le. História e Memória. Campinas: Unicamp, 2003, pp. 419-472. 14 A cidade do Porto (em especial o centro Histórico) se constitui como Patrimônio Mundial da Humanidade. O projeto foi aprovado no dia 5 de novembro de 1996. Ver: PROCESSO de candidatura da cidade do Porto à classificação pela Unesco como Patrimônio Mundial da Humanidade, Unesco CMP, 1993.
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À noite eu já estava de volta ao meu novo lar. Não à toa, atualizei a minha residência no meu perfil do Facebook. Concomitantemente, fiz questão de “matar a saudade”, aproveitando para dialogar via Skype com os meus pais, Walter Condack e Luzia Mello. Fiz a minha primeira compra (alimentos e itens de higiene) no Supermercado Continente, local que nos meses seguintes passei a frequentar com maior intensidade. De forma espontânea, fiz questão de visitar as redondezas do Instituto de Letras da Universidade do Porto. Naquela noite, fazia muito frio e uma densa névoa cobria parte dos prédios da Instituição. Adentrei junto ao prédio principal, mas desisti de seguir adiante porque nas demais dependências físicas a iluminação estava muito fraca.
Figura 2 – Hall de entrada da Residência Alberto Amaral – Porto, Portugal (11 de abril de 2015)
No dia seguinte, fiz um grandioso passeio pelas avenidas, ruas e vielas da cidade do Porto. Após visitar alguns lugares históricos magní- Fonte: acervo do autor. ficos, fui atrás do cartão transporte e do comprovante de endereço. Este último daria a chance de abrir uma conta corrente na agência local do Banco do Brasil. Para resolver este assunto, resolvi comparecer à loja do Cidadão – localidade pública (espécie de subprefeitura da cidade) onde serviços públicos são feitos e agendados. Neste mesmo dia, aproveitei a oportunidade de visitar o famoso Estádio do Dragão – local consagrado por albergar as partidas de futebol do time do Porto. No terceiro dia, eu já estava completando o meu cadastro no setor de Relações Internacionais com a ajuda da técnica Carla Augusto, responsável pela área de Letras. Ela também me orientou sobre a participação da reunião na Reitoria da Universidade do Porto. A partir de então, depois de assistir uma palestra introdutória no prédio da Reitoria e reconhecer algumas prerrogativas e normativas, eu poderia ter convicção da minha efetiva matrícula na Instituição. Na segunda semana, eu resolvi explorar os arredores da cidade do Porto e o norte de Portugal. O planejamento (com a finalidade turística e cultural) foi esboçado no Brasil. Comprei passagens de trem para Guimarães, Braga e Viana do Castelo. A tríade citadina merecia uma melhor atenção durante a minha estada no Porto, devido às circunstâncias históricas que elas possuíam: igrejas históricas, construções do período romano, museus de arte sacra, casario colonial arquitetônico, dentre outros. Para cada cidade, dediquei a visitação de um dia inteiro, realizando o percurso como se fosse um “bate e volta”. Em cada visita, dei preferência para conhecer os museus, as igrejas, as bibliotecas e os castelos, como foi o caso do Castelo de Guimarães. Embora soubesse que seria importante a minha permanência por mais dias nessas cidades, o indispensável foi cumprido da melhor forma possível. 40
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Figura 3 – Fachada principal do Castelo da cidade de Guimarães, Portugal (11 de abril de 2015)
Fonte: Cristiano Mello de Oliveira. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Ainda nesta semana de estada no Porto, encontrei-me com a minha orientadora, Dra. Zulmira Santos, no seu gabinete. No dia agendado, eu estava bastante ansioso, pois era ela que dirigia os meus estudos na terra de Camões. Foi neste dia também que encomendei ao livreiro da faculdade o romance histórico Personae, de Ruy Reis Tapioca. Na ocasião, ela ditou algumas orientações acerca do funcionamento do estágio, em particular, fez questão de abordar o meu devido interesse pela cultura portuguesa e as relações históricas entre Brasil e Portugal. Ela salientou sobre a minha total autonomia de estudo, embora devesse cumprir algumas formalidades (de caráter regulamentário) durante o estágio. Por conseguinte, me perguntou se eu tinha interesse em participar de suas aulas como aluno e posteriormente anunciou a possibilidade de ministrar algumas palestras e aulas, caso ela tivesse que viajar.
No início da terceira semana, comecei a assistir às aulas da professora Dra. Zulmira e, paralelamente, também assisti às aulas do professor Dr. Francisco Topa. Ambos eram docentes bastante experientes na área de História e de Literatura Portuguesa. Estar a par das aulas dessas autoridades foi o principal compromisso assumido por mim naquele período. Foi com muito desejo e curiosidade que eu assistia às aulas, tentando identificar de alguma maneira como o assunto podia fortalecer o entendimento das questões nacionais abordadas nos romances históricos de Ruy Reis Tapioca. A orientadora Zulmira expandiu o olhar dos alunos sobre o período do arcadismo na Literatura Portuguesa e Brasileira (Gregório de Matos e Padre Antônio Vieira); já ele falou sobre a literatura brasileira moderna, contracenando a obra poética Orfeu, de Vinícius de Moraes, com o panorama urbano da cidade do Rio de Janeiro. Figura 4 – Interior da biblioteca do Centro de Investigação Transdisciplinar (Cultura, espaço e memória) – CITCEM (31 de julho de 2015)
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Neste dia, também aproveitei para conhecer a biblioteca da Faculdade de Letras. Lá, encontrei um ambiente bastante agradável, onde poderia passar horas, devidamente confinado, com o propósito de manter os estudos em dia. O local era ligeiramente limpo e bem arejado – proporcionando, dessa forma, um ambiente propício ao deleite e estudo. Além disso, as salas de estudo individuais eram silenciosas e organizadas. Não raras vezes (após o almoço na cantina da faculdade) eu escolhia um livro ao acaso e começava a ler de forma espontânea. Das enormes janelas da biblioteca, o estudante podia apreciar a paisagem pitoresca da cidade do Porto: o rio Douro, com o seu sublime espelho d’água azul, que cortava esta belíssima cidade histórica.
À direita, a investigadora Paula Almeida; à esquerda, minha co-orientadora Dra Zulmira Santos. Fonte: acervo do autor.
No meio da terceira semana, resolvi visitar a cidade de Santiago de Compostela, localizada, no noroeste da Espanha. Eu, juntamente com alguns moradores estudantes da Residência Alberto Amaral, resolvi viajar por meio de uma agência de excursão local. O encontro de saída foi no ponto de ônibus localizado na frente do Palácio de Cristal. Durante a viagem de aproximadamente três horas, o guia Joaquim (proprietário da empresa) guiava-nos (por um microfone) sobre os principais pontos turísticos e algumas etapas da viagem. Almoçamos na cidade de Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Vigo (Espanha) e de lá seguimos viagem rumo à terra de centenas de peregrinadores. Ao chegar à cidade, fomos visitar a grandiosa Catedral e caminhamos nas ruas históricas para relaxar a cabeça. Por ocasião, adquiri o livro El espacio en la novela realista. Paisages, miniaturas e perspectivas, da autora Maria Teresa Zubiaurre. Esta referência serviu como aparato teórico para a formulação do projeto de pós-doutorado. Enfim, foi uma oportunidade única de observar como a cultura espanhola e lusitana se entrecruzam, tamanha proximidade das cidades.
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A esta altura, cabe frisar que não temos a intenção de detalhar todos os percalços da minha estada na cidade do Porto, mas apenas dar conta dos principais momentos de algumas viagens no continente europeu, que se tornaram parte integrante da própria duração do estágio. Uma delas foi a visita às cidades de Coimbra e Lisboa. A primeira foi única e bastante indispensável. Por meio do site de hospitalidade Couchsurfing, eu fiquei hospedado pelo período de quatro dias na “terra do conhecimento”. Ela recebe esse epíteto porque lá chegam estudantes de diversas partes do mundo na constante busca por aperfeiçoamento educacional. A anfitriã Rafaela recebeu-me na sua residência, sabendo que eu tinha uma missão científica a ser cumprida naquele período. A biblioteca de Letras da Universidade de Coimbra possui um vasto acervo de crítica e análise literária. Naquele período, uma das obras essenciais para dar continuidade aos assuntos abordados na minha tese foi Telling the truth – the theory and practice of documentary fiction, da autora Barbara Foley. Por alusão, muitas das minhas pesquisas se intensificaram nas últimas semanas em território português, tornando-se um jogo obsessivo e ao mesmo tempo prazeroso, como foi o caso de visitar várias vezes a Biblioteca São Lázaro. Naquele saudoso local, li e reli alguns compêndios de Gilberto Freyre e o clássico Labirinto da Saudade, de Eduardo Lourenço. Praticamente nos últimos dias, pouco antes de voltar, tiver a sorte de encontrar nas bancas um exemplar do Jornal de Letras (agosto de 2015), com matéria sobre Romances Históricos publicados em Portugal. Parte da sugestiva pauta acerca do gênero foi a entrevista feita pelo crítico Miguel Real (e respondida por 13 romancistas), que girava em torno da questão da voga do subgênero. Não à toa, compilei e glosei boa parte da pauta em notas de rodapé da minha pesquisa, em especial o segundo capítulo, que versa sobre a motivação do público leitor brasileiro e português acerca dos romances históricos. A minha curiosidade também era conhecer particularmente alguns centros acadêmicos localizados em outros países europeus. Devido à proximidade, a razão maior do deslocamento seria também por questões de cunho cultural. Por deliberação progressiva da minha orientadora, também realizei visitas acadêmicas a países vizinhos, tais como Itália, Espanha, Holanda, Bélgica e França, objetivando conhecer outros centros de pesquisa, bem como contribuir para a difusão de novas incursões no universo teórico do Novo Romance Histórico. A título de exemplo, a Universidade de Bolonha (grupo de pesquisa liderado pelo brasilianista prof. Dr. Roberto Vecchi) e a Universidade de Córdoba (grupo de pesquisa liderado pela professora. Dra. Celia Fernandez Prieto) foram centros de pesquisas visitados com vistas a adquirir base teórica para outros desdobramentos acadêmicos. Em última análise, na visita aos países nomeados, foi possível também conhecer os principais museus e instituições culturais: Museu do Vaticano, Galeria Borguese, Galeria do Ofício, Museu do Prado, Museu do Louvre, Rijksmuseum. Todos esses foram responsáveis pela ampliação cultural e histórica acerca das humanidades.
PRODUÇÃO ACADÊMICA DURANTE O ESTÁGIO PDSE-CAPES É, no entanto, presumível que o leitor a esta altura esteja criando um questionamento sobre outras produções que abordam novas perspectivas didático-científicas para o trato do seu objeto de pesquisa. Um melhor manejo sobre como a pesquisa envolve o pesquisador e vice-versa pode ser discutido nas linhas adiante. Objetivando melhor o nosso encaminhamento, outra publicação a que tive acesso naquele mesmo período foi o livro A arte da pesquisa (2008), escrito por três autores que também conjugam olhares bem semelhantes ao outro já citado. Estruturado de forma bem explicativa, o livro estabelece um profundo diálogo com aquele leitor-pesquisador mais curioso sobre o assunto. Disposto a elucidar os principais percalços da pesquisa acadêmica, focando seus métodos para estudantes de Letras e História, o livro objetiva traçar um verdadeiro esquema para aqueles pesquisadores que estão dispostos a percorrer os liames da pesquisa acadêmica. É interessante notar que a linguagem abordada no livro busca de forma curiosa conversar com o leitor e fazer dele um possível interlocutor, em que este possa definir seus principais caminhos. Logo no prólogo, os 42
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autores escrevem: “Se você já leu este livro uma vez, então está pronto para iniciar seu projeto. Mas, antes de ir à biblioteca, faça um planejamento cuidadoso” (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS, 2008, p. 36). Tentando ao máximo conduzir aquele pesquisador que deseja abarcar o quanto antes a sua pesquisa acadêmica, o livro ainda se propõe a diagnosticar sobre os variados perfis que determinam cada tipo de pesquisador, algo semelhante às questões estabelecidas pelo autor Umberto Eco, no seu clássico Como se faz uma tese. Antes de finalizarmos esses comentários, outro fragmento que conduz o olhar daquele pesquisador que deseja almejar um bom problema para sua dissertação ou mesmo tese: “Você sempre pode encontrar um problema de pesquisa quando lê criticamente. Consultando uma fonte, repare onde você sente que existem contradições, inconsistências, explicações incompletas” (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS, 2008, p. 79).
Reticências à parte, gostaria neste momento de citar algumas etapas decisivas para a minha pesquisa, em especial as que foram ancoradas com muito sacrífico e suor intelectual. Na banca de qualificação, fui questionado a respeito de o Romance Histórico ser considerado um gênero ou subgênero. Em pesquisa na biblioteca da Flup-Porto, encontrei por acaso a resposta desse problema. Aos interessados, em geral, o assunto é bem desenvolvido pela professora Dra. Maria de Fátima Marinho, no capítulo “Uma obra em Busca de um Gênero (Considerações sobre o Romance Histórico enquanto gênero)”, do livro O gênero literário – norma e transgressão (Munchen: Martin Meydenbauer, 2006). Citamos uma frase que elucida tal proposta, mesmo que insatisfatoriamente, a saber: “Perante estas considerações, torna-se claro que, se a definição de romance enquanto gênero estava longe de ser uma classificação baseada em critérios uniformes, o romance histórico (gênero ou subgênero, pouco importa) encontra ainda mais dificuldades em se estabelecer coerentemente” (MARINHO, 2006, p. 140, grifo nosso). É importante relatar que durante o período de Estágio-PDSE tive o interesse de ler o maior número de romances históricos possíveis. Naquele período, não podia reclamar da falta de tempo, pois tive livre acesso ao controle deste, e, para isso, resolvi emprestar um livro por semana, na condição de cumprir tais metas. Assim, estabeleci algumas prioridades (de forma autônoma e às vezes aleatória) que foram úteis para fechar um acordo sobre o entendimento do gênero em terras lusitanas. De fato, foi indispensável na minha pesquisa poder compreender os mecanismos criativos estabelecidos por alguns romancistas – fortalecendo, dessa forma, a assimilação das estratégias utilizadas por estes. E também confesso que sempre tive curiosidade intelectual sobre alguns procedimentos da História de Portugal. Alguns poderiam ser brevemente elencados: O primo Basílio, Eça de Queiroz; Arco de Santana, Almeida Garrett; A Sibila, Augustina-Bessa-Luís; A monja de Lisboa, Augustina-Bessa-Luís; Eurico o Presbítero, Alexandre Herculano; O bobo, Alexandre Herculano, e Personae, Ruy Reis Tapioca.
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Quem assistiu ao filme O óleo de Lorenzo (1992), baseado em fatos, cuja história narra a doença crônica de um jovem menino chamado Lorenzo, percebeu que a família do jovem não ficou nada convencida em relação à notícia do triste diagnóstico pronunciada pelo primeiro médico consultado. Não convencidos com o avanço da doença do filho, pai e mãe percorreram vários ambientes acadêmicos (bibliotecas, centros de pesquisa, instituições etc.) buscando sondar algumas pistas que elucidassem a doença crônica do próprio filho. Nessa manobra extensiva e frenética, os pais dialogaram com vários pesquisadores, médicos e farmacêuticos e, inclusive, fundaram uma associação a qual buscasse métodos eficientes para alcançar algum tipo de resultado. Em linhas gerais, o resultado de toda pesquisa, para quem já entendeu a lição, significa persistência e força de vontade.
Para concretização da minha pesquisa, não hesitei na visita de acervos indispensáveis à redação da tese, conforme já foi mencionado. A visitação de alguns desses locais significava algo também ligado à conjuntura simbólica de um pesquisador na área das humanidades. Por exemplo, visitar o Panteão de Paris e saber que o mausoléu do escritor francês Victor Hugo está lá, é uma oportunidade única, mesmo que ela não tenha tanto apelo direto na minha pesquisa. Por outro viés, como ainda achava que os acervos mantidos nas cidades do Porto e Coimbra não eram por completo suficientes, fui à busca de novas referências nos países vizinhos a Portugal. De fato, algumas dessas instituições foram certeiras na formulação da redação da pesquisa. Para citar algumas, foram elas: Biblioteca Nacional de Espanha, Biblioteca Almeida Garrett, Biblioteca São Lazaro, Biblioteca de Letras da Universidade do Porto, Biblioteca Nazionale Marciana, Biblioteca de Letras da Universidade de Sorbonne – Paris III, e Biblioteca de Letras da Universidade de Coimbra. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Outro fator importante durante a minha estada em Portugal foi a produção de artigos que pudessem lograr êxito na publicidade da minha investigação. Diariamente eu vasculhava congressos, colóquios e seminários, os quais poderiam erguer a minha investigação em território europeu. Por falta de sorte ou simplesmente naquela ocasião, poucos eventos científicos surgiram para que eu pudesse inserir alguma temática na qual minha pesquisa se encaixasse. Afinal de contas, bastava apenas um evento que pudesse iluminar o meu trabalho. E, de fato, foi o que ocorreu. No período de estadia (abril a agosto de 2015), participei do evento Estudos de Literatura Brasileira, divulgando e publicando o artigo A representação dos excêntricos no Novo Romance Histórico Brasileiro: uma leitura dos romances A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca. O artigo foi fruto parcial da minha pesquisa de doutoramento. Ainda faltando duas semanas para regressar ao Brasil, tive a oportunidade de participar de um evento no Centro de Investigação Transdisciplinar (Cultura, espaço e memória) – CITCEM, assistindo a apresentação “Sucessão Filipina e Monarquia Portuguesa na Historiografia Franciscana do século XVII”, no dia 31 de julho de 2015, proferida pelo pesquisador Dr. Moreno Pacheco da Universidade Federal da Bahia. No fim de 2015, os artigos, parte integrante da minha tese e da dissertação de mestrado, A representação do cenário no Novo Romance Histórico Brasileiro – A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca e O Turista Aprendiz e a máquina fotográfica como estratégia de aproximação social, foram publicados na revista Millenium do Instituto Politécnico de Viseu, em Portugal. Em sequência, o capítulo de livro A representação dos excêntricos no Novo Romance Histórico Brasileiro: uma leitura dos romances A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca foi publicado no livro Estudos de Literatura Brasileira em Portugal: Travessias, coordenado/organizado pelos professores doutores Francisco Topa, Joelma Santana Siqueira e Solange Fiuza Cardoso de Oliveira. Enfim, os resultados da pesquisa anterior e posterior acabaram se reproduzindo em terras lusófonas, chamando atenção para a publicidade e possível diálogo com as pesquisas no estrangeiro.
ALGUMAS CONCLUSÕES O principal objetivo deste artigo foi se debruçar nas lembranças etnográficas do meu estágio PDSE-Capes realizado na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Fazia tempo que eu desejava escrever algo sobre esse período tão fértil da minha formação como pesquisador na área de Literatura Brasileira Contemporânea. Embora o lastro temporal de escrita tenha demorado, creio que consegui dar conta dos principais pontos relevantes deste relato. Durante o decorrer deste tempo (agosto 2015 ao período atual), pude apresentar parcialmente alguns resultados dessa experiência tão gratificante. Um deles foi durante a XI Semana de Letras da Universidade Federal de Santa Catarina, em junho de 2017. Naquela época, o formato da minha apresentação foi uma espécie de palestra expositiva sobre os resultados do estágio – abordando as principais etapas científicas envolvidas durante minha estadia. Durante a minha abordagem, duas perguntas de natureza burocrática alimentaram o debate: de que modo eu consegui realizar a minha candidatura no programa, e como eu consegui superar os desafios da pesquisa em Portugal. Para finalizarmos, sem conclusões definitivas, poderíamos enumerar alguns resultados obtidos durante o relato argumentativo aqui descrito: 1. as teorias de autoria da Dra. Maria de Fátima Marinho foram extremamente úteis durante a formulação da minha investigação. Por meio delas, dentre outras, consegui responder a algumas inquietações sobre a chave de leitura utilizada em ambos os romances; 2. as referidas questões históricas e culturais tratadas em ambos os romances de Ruy Reis Tapioca foram enriquecidas e mais bem interpretadas durante o período de estágio em Portugal; 3. o contato e a troca de experiências com algumas autoridades/pesquisadores portugueses durante a minha participação no evento “Estudos de Literatura Brasileira em Portugal: Travessias”, favoreceu alguns possíveis diálogos e interfaces da minha pesquisa; 4. embora muitos pesquisadores realizem o estágio PDSE-Capes enclausurados nos centros de pesquisa aos quais estão vinculados, a minha participação se ofertou de forma contrária, pois foi na visita de muitas instituições externas que tive a chance de conhecer outras realidades acadêmicas; 44
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A pesquisa em Letras na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP-PORTO) – experiências de intercâmbio
5. no meu retorno ao Brasil, pude realizar diversas apresentações (sobre o período de estadia em Portugal e sobre o tema da minha pesquisa) e, por consequência, continuar a experimentação das minhas hipóteses investigativas. Diante do exposto, conclui-se que o estágio foi gratificante em vários níveis, conforme citamos. Foi indispensável para que eu pudesse viver inteiramente da pesquisa, ou seja, praticar em regime full-time os experimentos das possíveis hipóteses de trabalho, assim como aperfeiçoar o aprimoramento dos capítulos e subtítulos os quais foram esboçados no início da tese. Apenas uma breve ressalva: se eu tivesse que voltar no tempo, gostaria de ter aproveitado melhor (com mais profundidade) o clima acadêmico ligado às humanidades que a Faculdade de Letras oferece a todo e qualquer estudante. Para terminar a discussão aqui proposta, gostaria de citar Roland Barthes como provocação ao ato da pesquisa. Ele conjuga seu olhar para aquele intelectual que deseja refletir sobre a perseverança e a determinação que qualquer pesquisa implica na sua completa resolução. Nas suas palavras: “O trabalho (de pesquisa) deve ser assumido no desejo. Se essa assunção não se dá, o trabalho é moroso, funcional, alienado, movido apenas pela necessidade de prestar um exame, de obter um diploma, de garantir uma promoção na carreira” (BARTHES, 2009, p. 99).
BARTHES, Roland. O rumor da língua. Rio de Janeiro: Martins Fontes, 2009. BOOTH, C. Wayne. COLOMB, G. Gregory. WILLIAMS, M. Joseph. A arte da pesquisa. São Paulo: Martins Fontes, 2008. FOLEY, Barbara. Telling the truth – the theory and practice of documentary fiction. New York: Cornell University Press, 1986. GOFF, Jacques Le. História e memória. Campinas: Unicamp, 2003. MARINHO, Maria de Fátima. Uma obra em busca de um gênero. (Considerações sobre o Romance Histórico enquanto gênero). In: O gênero literário – norma e transgressão. Muchen. Alemanha: Martin Meidenbauer, 2006, pp. 131-146. OLIVEIRA, Cristiano Mello de. O novo romance histórico em Travessias: uma leitura dos romances A República dos Bugres e Conspiração Barroca, de Ruy Reis Tapioca, 2016. 432 p. Tese de Doutorado, UFSC, Florianópolis. OLIVEIRA, Cristiano Mello. Considerações sobre a construção intelectual de Mário de Andrade: o turista aprendiz. Universidade Federal de Santa Catarina. (Dissertação de Mestrado) 2011.
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REFERÊNCIAS
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Afrobetização: cultura africana e afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I Afrobetization: african and afro brazilian culture in childhood education and Fundamental Education I MENDES, Christiane15 OLIVEIRA, Ana Cristina Cury Teodoro de16
RESUMO Este artigo tem como objetivo mostrar a necessidade e importância de incluir a história da cultura africana e afro-brasileira, aqui chamada de “afrobetização”, atuando como formação de identidade na educação infantil e no ensino fundamental I, valorizando assim a cultura africana e afro-brasileira com aulas multidisciplinares, garantindo a implantação da Lei n. 10.639/03. Afrobetização é a construção de uma pedagogia pautada nos valores e saberes da cultura africana, passada de maneira positiva para todas as crianças, em especial as crianças negras, que lidam com o preconceito ao iniciarem sua ida à escola; os professores estarão difundindo a cultura africana e afro-brasileira, ajudando a combater a discriminação, o preconceito, saindo dos livros de história que relatam tempos sombrios dos navios negreiros, senzalas e troncos, implantando na educação infantil e anos iniciais do fundamental o lúdico, com atividades que façam todos vivenciarem esta cultura, como danças populares, cantos e contos africanos, culinária, capoeira, etc. Assim, crianças em formação de opinião aprenderão a verdadeira história dos negros no Brasil, enraizada em nosso cotidiano e que com certeza deixarão frutos. “A educação é a chave-mestra do universo, com ela você abre qualquer porta” (Carlos Eduardo Ribeiro de Souza). Palavras-chave: Afrobetização. Lei n. 10.639/03. Cultura afro-brasileira. Criança negra. Abayomi.
ABSTRACT This article aims to show the need and importance of including the history of African and Afro Brazilian culture - here called Afrobetization- acting as identity construction in Early Childhood and Elementary Education l, thus valuing African and Afro Brazilian culture with multidisciplinary classes, ensuring the implementation of Law 10.639/03. Afrobetization is the construction of a pedagogy based on the values and knowledge of African culture passed in a positive way to all children, especially black children, who deal with prejudice when starting at school. Teachers will be spreading African and Afro Brazilian culture, helping to combat discrimination, prejudice, leaving the history books that report dark times of slave ships, slave quarters and trunks, implanting – in a playful way - in early childhood education and early years of elementary activities that make everyone experience this culture as popular dances, African songs and tales, cuisine, ‘capoeira’, etc., so children which are in formation of opinion will learn the true history of black people in Brazil, rooted in our daily lives and that certainly built a foundation. “Education is the master key of the universe, with which you can open any door” (Carlos Eduardo Ribeiro de Souza) Keywords: Afrobetization. Law 10.639/03. Afro-Brazilian Culture. Black Children, Abayomi. 15 Aluna(o) do curso de Graduação em Pedagogia da Faculdade Educacional da Lapa. Cidade: Caruaru. Polo: Caruaru. 16 Professora, Mestre em Educação. Currículo Lattes disponível em: http://lattes.cnpq.br/9942326358435968. Revista Vivências Educacionais
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Afrobetização: cultura africana e afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I
INTRODUÇÃO Os livros escolares de História contam que os negros foram arrancados de suas terras, sofreram muito, e isto não pode ser negado; porém, estes negros efetivamente ajudaram a construir a história do Brasil, e esta ausência de referência positiva em sala de aula impede que alunos negros afirmem sua etnia, associando-se a escravos, com sentimento de inferioridade, baixa autoestima e sendo vítimas de piadas, discriminação e preconceito por quem também não conhece tais referências. Assim, o tema e o contexto deste trabalho vêm expandir, desmitificar e esclarecer sobre uma cultura tão rica em nosso país, começando com mudanças de concepção pelos professores sobre a história do negro e sua verdadeira contribuição em nossa cultura, na qual antes se tinha conhecimento tão somente de negros escravizados.
Este artigo foi baseado em estudos bibliográficos de obras de autores que discutem o assunto, como: Layla Maryzandra Costa Silva – militante negra, pedagoga, educadora popular, especializada em educação em direitos humanos e história e cultura afro-brasileira e africana; Daniela Maroja Ribeiro – mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Goiás (UFG), graduada em Direito pela PUC/GO, e orientadora da Especialização (EaD) em Direitos Humanos para Diversidade e Cidadania (NDH/UFG); Carlos Alberto Lima de Almeida (2013); Roberto Benjamim (2003); Pretagogia: Construindo um referencial teórico-metodológico, de base africana, para a formação de professores (UFC, 2013); e complementando com a pesquisa de campo do tipo quantitativo. Houve coleta e comparação de dados tendo como ponto de partida a Secretaria da Educação Municipal e Estadual da cidade de Caruaru, além de escolas e entrevistas com o corpo discente, pontuando as dificuldades, necessidades e atividades sobre o tema. A pesquisa teve como objetivo geral fomentar na educação interdisciplinar, de maneira intensa, a cultura africana e afro-brasileira. Nos objetivos específicos, a pesquisa pretendeu alcançar três pontos: (1) apresentar os principais conceitos da cultura afro-brasileira historicamente e na contemporaneidade; (2) analisar como acontece a afrobetização e a cultura afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I e (3) valorizar a prática da afrobetização e da cultura afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I, com a pretensão de realmente contribuir e agregar a educação tanto para o alunado quanto para o corpo docente, para uma formação democrática, tolerante e sem preconceito.
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Hoje sabemos que os africanos fizeram parte da construção de nossa história, e que a afrobetização vem ser uma formação de identidade na educação infantil e nos anos iniciais, uma pedagogia pautada nos valores e saberes da cultura africana, não só para afirmar a identidade da criança negra, que lida com o preconceito quando inicia os estudos, mas, também, passar essa informação de maneira positiva para todas as crianças, legitimando o importante papel que os africanos tiveram na construção da história e cultura de nosso país, valorizando a cultura africana e afro-brasileira com aulas multidisciplinares e garantindo a implantação da Lei n. 10.639/03.
Haja vista que para formarmos crianças sem preconceito e tantas outras que se aceitem negras, se faz necessário que todos nós nos conscientizemos sobre a importância da raça negra em nossa história, que a desigualdade racial existe na sociedade e que a educação é o caminho transformador para igualdade e o respeito às diversidades. “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar” (Nelson Mandela, Long Walk To Freedom, 1995).
O CONCEITO DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA HISTORICAMENTE E NA CONTEMPORANEIDADE POR MEIO DA AFROBETIZAÇÃO No livro A África está em nós – história e cultura afro-brasileira (BENJAMIM, 2003), o autor diz que “a história e a cultura dos povos africanos são, efetivamente, parte da história do Brasil, tal como a história dos índios e as dos colonizadores europeus, esta última sempre privilegiada pela escola brasileira”. O Brasil é o país com maior população negra fora da África, logo, é de grande importância valorizar em sala de aula desde o início a contribuição que este povo deu para a construção do país, mas não há como falar Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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do povo africano sem que se mencione a escravidão no Brasil, tornando assim as aulas angustiantes, constrangedoras e de grande sofrimento para as crianças. Muitos adultos de hoje, quando crianças em fase escolar, desenvolveram vergonha de suas origens negras, pelo fato de verem em aulas de história imagens que remetiam os negros a humilhações e sofrimentos, pois sempre foi ensinado que eles eram descendentes de escravos. Essas crianças não viam nessas aulas alguém de que pudessem se orgulhar e “querer ser quando crescer”. Nos livros de história, contava-se somente da suposta inferioridade dos negros africanos. Os africanos já eram dotados de estrutura estatal, atingiam um estado civilizatórios mais refinado que o da maior parte das sociedades americanas da época, possuindo notável progresso na agropecuária e no artesanato, especialmente no trabalho com metais. Metalurgia africana, sob muitos aspectos, encontrava-se mais adiantada que a dos europeus da época em todas as sociedades africanas referidas independente do nível de desenvolvimento das forças produtivas, a propriedade comunal da terra e as formas diversas de trabalho coletivo predominavam (LOPES,1987, p. 17).
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Para Freire (1999, p. 67). “o combate ao racismo e ao preconceito deve acontecer constantemente nos ambientes escolares pois a escola é um ambiente que promove reflexão e visa formar cidadãos que respeite a diversidade étnico- racial”. Deve-se partir da compreensão de que, assim como a pedagogia, a afrobetização é um conjunto de técnicas, métodos e estratégias de ensino que estimulam de maneira intensa a cultura africana e afro-brasileira, desde os primórdios até os dias de hoje, tanto na educação infantil quantos nos anos iniciais do ensino fundamental, e não somente em momentos pontuais, como o 13 de maio e o 20 de novembro, e assim mesmo aplicados somente no ensino médio regido pela Lei n. 10.639/03. LEI nº10.639, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. (BRASIL, 2003).
Na alfabetização, a criança adquire habilidades de comunicação em seu meio, por meio da leitura, da escrita e de atividades de base necessárias para avançar outros níveis escolares; a afrobetização agrega na educação infantil e no ensino fundamental I instrumentos que contribuem com esta formação, incluindo as heranças legitimas deixadas pelos africanos e que usamos no cotidiano, desconstruindo a imagem do negro como somente escravo, contribuindo para aceitação de crianças negras e sua identidade e para demais crianças o respeito a esta cultura e etnia. Em Educação Infantil e Práticas Promotoras de Igualdade Racial (2012, p. 29) diz que as crianças percebem as diferenças físicas, principalmente a cor da pele e o tipo de cabelo. Desse modo, ao reivindicarmos que é necessário abordar na educação infantil aspectos que tratem das relações raciais, é porque as marcas raciais, cor, cabelo, aspectos culturais são elementos presentes no cotidiano das crianças nesta faixa etária suscitando-lhes curiosidades e conflitos que não podem ser desconsiderados. Muitas vezes, a educadora percebe prontamente esses conflitos e curiosidades, e age sobre eles (...). Outras vezes cala-se por medo de tocar num assunto que a sociedade brasileira quis esconder sentindo-se despreparada para abordá-lo. (DIAS; SILVAR JR. apud EDUCAÇÃO Infantil e..., 2012, p. 29).
A afrobetização vem protagonizar os negros e negras da nossa história em sala de aula o ano todo, saindo das aulas “engessadas”, com diversas formas de expressões da cultura afro, reconhecendo a contribuição cultural dos povos africanos, a importância dos saberes inseridos no nosso cotidiano, em que professores e crianças dos anos infantis e iniciais atuarão ativamente de uma maneira fora do convencional, com uma nova pedagogia. Na apresentação inicial do livro A África está em nós – história e cultura afro-brasileira, do autor Roberto Benjamim (2003) diz que “o conteúdo do livro vem de forma interdisciplinar de modo que ele possa ser inserido transversalmente no currículo escolar, sendo utilizados em disciplinas tão diversas, como Geografia, História, Educação Artística, Educação Física, Literatura e os estudos de Língua Portuguesa e desta forma atendendo à Lei n. 10.639”. Para Vanessa Andrade17, em seu projeto Afrobetizar (2015), não basta contar quem foi Zumbi e Maria Carolina de Jesus. Essas crianças precisam viver uma experimentação positiva para que elas interiorizem esse sentimento de valorizar a própria cultura.
17 Psicóloga, doutoranda, coordenadora do Projeto Afrobetizar e moradora do morro Canta Galo-RJ. 48
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Entendemos que (...) a Afrobetização, é baseada no respeito e as diferenças são nossos agentes de integração (...) salvo a igualdade dos direitos a vida e de oportunidades humana de ser sem exclusão. Tendo em vista que a população negra nunca usufruiu desses direitos (...) Afrobetizar se faz preciso para mudança desse quadro/ lacuna social. Mais do que falar de negritude, essa forma de educar não é linear, não está nos padrões das escolas brasileiras e aplica em suas atividades o reconhecimento das inteligências múltiplas unido a produção partilhada do conhecimento. Todas as formas de inteligências são válidas (físicas, exatas, poéticas, humanas, artísticas, linguística etc.) e somam para a formação das aulas onde nenhuma aula é um planejamento só do professor o aluno é construtor e participante ativo estabelecendo uma comunicação horizontal de valorização. Aulas de danças populares, capoeira angola e brinquedoteca, são interligadas a alguns traços que caracterizam o Afrobetizar como um tronco que ramatiza outras qualidades de ações, como: roda de bate papo, rima, leitura dramatizada, desenho e pintura, entre outras, tendo como protagonista de cada aula o próprio aluno dentro da sua realidade atual projetado para sua realidade de ascensão futura.
A necessidade de profissionais é grande para contribuir com a demanda, porém, existem aliados fundamentais para a prática da afrobetização: profissionais negros que vivenciaram situações de preconceito e discriminação na prática, em sua vida enquanto crianças e até mesmo como adultos, e hoje utilizam sua experiência de vida para somar ao ensino, juntamente com demais materiais ou até mesmo produzindo material próprio, utilizando a licenciatura como uma ferramenta para relatar suas experiências e como conseguiram dar a volta por cima, por meio de relatos, palestras, livros, projetos etc. Em uma entrevista para o site Geledés18, Vanessa Andrade ainda pontua que: É preciso provocar a criança e ajudá-las assumir espaços nos quais tradicionalmente não estão inseridas, e que mesmo que exista uma lei que estabeleça a história da cultura africana na educação, para ela ser respeitada é necessário potencializar a descoberta da metodologia e aplicá-la, Afrobetizar é uma real possibilidade de educação (ANDRADE,2015).
Geranilde Silva19, (2013) em sua tese para o doutorado em Educação, cujo título é Pretagogia: construindo um referencial teórico-metodológico, de base africana, para a formação de professores/as, diz que a “pretagogia” “(...) permite criar, dentro da escola, novos espaços de aprendizagem em que crianças possam utilizar esse referencial literário para pensar o ser negro” (SILVA, 2009, p. 32). Vindo ao encontro do mesmo raciocínio da afrobetização, a professora utilizou o termo pretagogia para formação de professores de educação infantil e fundamental I, elaborando uma proposta curricular de literatura oral e produção didática.
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Em quase dois anos de projeto o maior resultado não tem sido uma alta performance física nas atividades, mas principalmente a elevação da autoestima de cada criança, expansão do olhar para o mundo e a possibilidade de escolha do futuro (ANDRADE, 2015).
Analisar como acontece a afrobetização (cultura afro-brasileira) na educação infantil e no ensino fundamental I Considerando a relevância da temática que hoje é discutida em todos os espaços educacionais, a proposta foi analisar como acontece, e se acontece a afrobetização (cultura africana e afro-brasileira) na educação infantil e no ensino fundamental I, já que a Lei n. 10.639/03, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB n. 9394/96, inclui nesta a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura afro-brasileira nos estabelecimentos somente do ensino fundamental e médio, em especial nas áreas de Educação Artística, Literatura e História; porém, nestes mesmos espaços por onde passei, tive a oportunidade de realizar várias conversas informais, em que foi possível adquirir diversas afirmações, com alguns educadores que consideram imprescindível para os alunos de todas as idades a inclusão da cultura afro na educação, mas, afirmaram também, que existem bem poucos profissionais capazes para esta formação em sala de aula. 18 GELEDÉS: Instituto da Mulher Negra fundada em 30 de abril de 1988. É uma organização da sociedade civil que se posiciona em defesa de mulheres e negros por
entender que esses dois segmentos sociais padecem de desvantagens e discriminações no acesso às oportunidades sociais em função do racismo e do sexismo vigentes na sociedade brasileira.
19 SILVA, Geranilde Costa e. Tese (Doutorado) – UFC, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação em Educação, Fortaleza, 2013. Área de concentração: Educação.
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Para tanto, foi necessário buscar algumas informações da cidade de Caruaru e das atividades aplicadas pela Secretaria da Educação. Caruaru é um município brasileiro do estado de Pernambuco, situado na região Nordeste do país, pertence à mesorregião do Agreste Pernambucano. Está a 127 km da capital Recife; é a maior cidade do interior e a quarta maior do estado, conhecida como “a capital do agreste”. A sua população em 2017 era de 356.128 habitantes, sendo a mais populosa cidade do interior pernambucano e a terceira mais populosa do interior nordestino. Caruaru conta, atualmente, com 138 escolas, 2.350 professores e mais de 41 mil estudantes (WIKIPEDIA, 2020).
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A Secretaria de Educação de Caruaru (SEDUC) tem como foco melhorar a qualidade do ensino e garantir a todos os estudantes acesso, permanência e sucesso, além de melhorar os índices dos resultados das metas projetadas exigidas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que ainda são preocupantes na cidade; por isso, implantou-se o projeto “Juntos pela Educação”, em que a proposta pedagógica é, além de escolas municipais de tempo integral, formação continuada para os professores com métodos de inovação tecnológica para o aperfeiçoamento do ensino (CARUARU, 2020). Em minha visita na Secretaria da Educação da cidade, conheci um professor militante do movimento negro atuando com projetos na SEDUC. Vem trabalhando a Lei n. 10.639/03 desde 2010, e em 2015 uma professora também da SEDUC se uniu a ele, ampliando o projeto de direitos humanos. Hoje, essa “dupla” desenvolve e aplica nas escolas da rede municipal de ensino de Caruaru atividades relacionadas ao tema, com o objetivo de aplicar a Lei Federal n. 10.639/2003, que obriga o ensino da história afro-brasileira e da África nas unidades educacionais, e também a Lei Municipal n. 5.482/2014, que institui a Semana Municipal da Capoeira e do Capoeirista na rede de ensino, com mesas redondas, apresentações culturais, recital de poesias, exposições e conferência magna aos estudantes, professores e público em geral. As atividades sempre são ministradas por militantes negros da cidade, das mais diversas áreas: advogados, professores, sacerdotes de religião de matriz africana, artistas, e inclusive esta acadêmica; enfim, cidadãos negros que tenham algo para passar de suas vivências que provoque uma reflexão no alunado e no corpo docente. Dessas atividades, os professores constroem outras com os alunos, em cima do tema apresentado pelos convidados, despertando nas crianças a reflexão acerca do cotidiano de todos os palestrantes e suas histórias. Existe uma preocupação do poder público municipal em trabalhar a cultura afro-brasileira nas escolas da cidade, só que em momentos pontuais, a exemplo destas articulações realizadas por estes dois servidores da SEDUC; mas, são atividades diretamente aos alunos, não acontece uma formação antecipada para os professores, a participação deles é concomitante à dos alunos e, só então, por meio desta experiência, espera-se que desenvolvam outras atividades com o tema. Vale ressaltar o pioneirismo de dois profissionais da educação, servidores da SEDUC, negros de uma cidade pequena do nordeste, com esta iniciativa, contribuindo para visibilizar a cultura afro com outro olhar, trazendo à tona a luta diária do preconceito e discriminação nas escolas, contribuindo para que a afrobetização aconteça; mas é de extrema importância, antes de chegar primeiro ao aluno, chegar antes ao professor, com formações continuadas bem antes destas datas; a afrobetização deve tocar o professor para ele tomar propriedade do tema, das atividades, diariamente. A princípio, para realizar a análise de como acontece a afrobetização (cultura afro-brasileira) na educação infantil e no ensino fundamental (anos iniciais e finais), elaborei um questionário virtual, que foi aplicado em um grupo de professores de uma rede social, mas como não obtive o resultado esperado em números e também não tinha certeza da veracidade das respostas, elaborei um novo questionário que foi realizado diretamente com os profissionais da educação nas escolas. Os participantes desta pesquisa foram professores da educação infantil e do ensino fundamental anos iniciais e coordenadores responsáveis pelo planejamento destas turmas. A investigação com os coordenadores, dentre outras questões, foi sobre a organização da agenda pedagógica anual da escola, sobre como é feita, quais 50
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Afrobetização: cultura africana e afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I
são os materiais utilizados e como é construída esta agenda; com os professores, a investigação foi na atuação desta agenda, na aplicabilidade do tema em sala de aula, nas dificuldades na execução, na dificuldade em encontrar materiais para trabalhar, além de se concordam com o termo afrobetização.
De 20 pesquisas deixadas em cada escola, foram entregues com resposta as de 3 coordenadoras pedagógicas, 7 professoras de educação infantil e 11 professoras de ensino fundamental I. Dentre as questões da pesquisa de campo para os professores e coordenadores, destaquei algumas, como: se o profissional conhece a Lei n. 10.639/03. Onze responderam que sim e deram uma pequena explanação sobre a lei, e 3 disseram que não, todos de uma mesma escola. Somente 7 profissionais responderam que a escola possui alguns materiais e não possui dificuldade na aplicação; 6 disseram que têm dificuldade em aplicar atividades por falta de material. Somente 3 profissionais disseram que já ouviram falar sobre a afrobetização por meio da internet, e todos concordam na inclusão da afrobetização na agenda escolar anual, além da necessidade de mais formações continuadas. “Para se apropriarem do tema há a necessidade de mais formações, seminários, oficinas, palestras, etc.”, acrescenta a coordenadora pedagógica do CMEI Helena Martins Gomes (Pesquisa de campo/ TCC, 2018). As palavras mais usadas por todos para responder por qual motivo a afrobetização na educação infantil e no ensino fundamental I é importante, foram: identidade, bullying, preconceito, valorização, diversidade, intolerância, diálogo, diferenças, igualdade, respeito e fortalecimento. Uma das professoras do CMEI Helena Martins Gomes pontua: “(...) é de suma importância que haja atividades de afrobetização, para que nossas crianças conheçam de fato toda história, pois vivemos num país plural (...)”. Acrescenta que “(...)inserir toda comunidade escolar e familiar, como forma de conscientização, usufruindo do leque de informações possíveis de se alcançar nos dias de hoje (...) (MENDES, 2018).
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Foi realizada pesquisa em três escolas públicas da cidade, da mesma região urbana, de famílias de baixa renda. Todo o quadro de funcionários das mesmas foi trocado no início de 2018. Também atendem às etapas de ensino propostas pela tese do artigo, educação infantil e ensino fundamental I ou anos iniciais do 1ª ao 5ª ano. O motivo de terem sido visitadas somente escolas públicas é que, além de atenderem a maior parte de toda população, o que normalmente ocorre no Brasil, lá também está concentrado o maior número de afrodescendentes. O público-alvo para se trabalhar a aceitação da identidade foi o da Escola Municipal Professor Amaro Mathias Silva. A escola Professor Altair Nunes Filho é integral desde 2013 para ensino fundamental do 1º ao 5º ano e à noite é ofertado o EJA (ensino para jovens e adultos). Atende em média 900 alunos e possui 61 funcionários, dos quais 40 são professores; também a Escola de educação infantil Centro Municipal de Ensino Infantil Helena Martins Gomes, com creche e pré-escola que atendem crianças de até 5 anos de idade; possui em média 20 funcionários e 150 alunos; por fim, visitei a escola Amaro Mathias Silva, uma escola que atende ambas as etapas de ensino da pesquisa, em média 600 alunos no total, porém, as turmas de educação infantil ficam em outro local, um anexo da escola para acomodar as turmas; esta escola possui em torno de 50 funcionários.
A professora da EMP Amaro Mathias Silva afirma que “alguns professores negros não se reconhecem como negros, praticando o racismo entre outros colegas de profissão da raça negra, e acrescenta a necessidade de uma preparação, levantando esta discussão com eles sobre o tema – só assim poderão conscientizar os alunos”. Da escola de tempo integral Professor Altair Nunes Porto Filho, a coordenadora destacou em suas sugestões para o preparo dos profissionais sobre o tema que haja “atividades como rodas de conversa sobre a importância das cores e da diversidade, oficina de contação de histórias, cânticos e danças tudo que possa contribuir para acabar com preconceito valorizando a importância de cada ser humano em sua história”.
Valorizar a prática da afrobetização e da cultura afro-brasileira na educação infantil e no ensino fundamental I A valorização por uma infância sem racismo e preconceito se faz promovendo a igualdade, e na escola é possível professores que sejam transformadores e que tragam para sala de aula a cultura, resgatando a identidade afro-brasileira. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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O professor tem um papel fundamental na construção e desenvolvimento da subjetividade do aluno”. Seu papel é proporcionar um bom ensino não somente verbal, mas em vários outros aspectos. Essa relação esta pautada na transmissão de conteúdo e estímulo das relações sociais, no sentido de que a produção de conhecimento nele envolvida se realiza através de uma relação entre pessoas. Esse processo ainda envolve um caráter político e histórico. (PAVÃO, 2015, s/p).
Por causa da existência da Lei n. 10639/03, é possível encontrar inúmeros materiais pedagógicos, para aulas transformadoras de afrobetização, tanto para a educação infantil e ensino fundamental I quanto para formação continuada para os professores; esses materiais, em sua maioria, são idealizados e produzidos também por afrodescendentes ou por pessoas preocupadas por esta transformação social.
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Existem livros como Cabelo de Lele, A menina bonita do Laço de Fita, O tambor e a menina, entre outros, matérias em DVD, como Ser Diferente é Normal, de Jair Oliveira, e desenhos animados como Guilhermina e Candelário, músicas como Menina Pretinha, de MC Sofia, Bonecas pretas, de Larissa Luz e contadoras de história como O Adeola – projeto de duas estudantes que contam histórias afro para crianças nas escolas; mas há de se pensar no resgate de heranças legítimas como a capoeira, jongo, congada, culinária e o vocabulário, palavras utilizadas em nosso cotidiano que podemos encontrar no Alfa Bantu e alfabeto do Quilombo , instrumentos, cantos e danças envolvendo professores, alunos e comunidade na formação de afoxés, maracatus, enfim, usar o lúdico e a interatividade para a criança colocar em prática toda esta riqueza da cultura afro. A diretora Cibele Racy, da escola pública Nelson Mandela, em uma entrevista para o Bial (GLOBO, 2018) disse: “Observar as diferenças e dar visibilidade para estas crianças também é educação...”. A escola ganhou cinco prêmios, frutos de um projeto sobre racismo, introduzindo os princípios do líder africano que dá nome a escola; a cada ano a escola se recicla – em 2017, apostou em classes mutisseriadas incentivando a diversidade, além de convidar os pais para formações junto com os professores, acreditando que a diferença se faz em uma escola aberta, sendo um ponto cultural para todos. “Grande parte da nossa comunidade escolar é negra”, disse a diretora (GELEDÉS, 2017). O compartilhamento de conhecimento e saberes na comunidade escolar junto com os pais dos alunos também é uma maneira de valorizar a cultura e resgatar a identidade, fortalecendo e elevando a autoestima das crianças. Gomes (2002) enfatiza que “[...] quando pensamos a escola como um espaço específico de formação inserida num processo educativo bem mais amplo, encontramos mais do que currículos, disciplinas escolares, regimentos, provas, testes e conteúdos” (GOMES, 2002, p. 39). Outra forma de valorizar a cultura afro-brasileira nas escolas é mostrar que anualmente temos uma manifestação muito rica em ritmo, letras, adereços, instrumentos... são os sambas-enredo de escolas de samba, em que muitas vezes são contadas histórias do negro no Brasil de uma maneira lúdica, artística e inteligente, podendo se tornar uma pratica pedagógica, despertando a criatividade da criança de várias maneiras: desde a dança em si, como atividade física, desenvolvendo a coordenação motora; figurinos como as fantasias com materiais reciclados, entrando na área da sustentabilidade das aulas de meio ambiente; as maquiagens, conhecendo as pinturas de cada povo africano, cada tribo e cada momento no qual usavam as pinturas; a confecção de instrumentos, além de aprender tocá-los; as aulas de história de uma maneira fácil, pois está musicada, facilitando o aprendizado do tema, inclusive sobre como se originou este gênero musical aqui no Brasil, quais os povos que trouxeram e sua evolução; apresentado imagens, desde as primeiras escolas até os dias de hoje; e com vídeos pela internet, promovendo também a inclusão digital. Em seu artigo A importância da cultura afro-brasileira dentro das escolas: utilizando a educação musical através das cantigas de domínio público do samba de terreiro, Fabiano Paula Camilo e Carlos Geovane Nunes (2015) afirmam: Ao abordar esta prática (...) nas escolas contribuímos para afirmação de uma representatividade afro-brasileira e sua importância histórica e cultural, tornando-se um instrumento que pode ser utilizado na produção de ações e pensamentos pedagógicos pautados nas tradições africanas e afro-brasileiras.
A valorização também pode ser feita por meio de visitas em comunidades quilombolas, anotando as histórias dos mais velhos, resgatando a pedagogia oral – muito utilizada pelos nossos ancestrais, inclusive em 52
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religiões de matriz africanas. Outra proposta é a visita a terreiros de candomblé20 e umbanda 21; seus adeptos se aprofundam nas histórias das divindades africanas e sempre têm muito a contar e contribuir para toda a comunidade escolar.
Afrobetização na prática
As imagens que seguem fazem parte de registro de oficina de bonecas abayomi22 realizado com professores e alunos de diversas instituições de ensino. Com os professores, é apresentada a história da boneca, logo após uma roda de diálogo é formada para compartilhar ideia de matérias para introduzir a cultura afro para as crianças e, por fim, todos os professores confeccionam suas próprias bonecas com retalhos trazidos por eles mesmo. Já com as crianças, eu, caracterizada de africana, conto a história de uma maneira mais lúdica, com músicas e adivinhações de palavras africanas utilizadas em nosso cotidiano, além de incluir também a oficina das bonecas, estimulando a coordenação motora e a criatividade, fazendo com que reflitam sobre a riqueza da raça negra e da cultura africana. Figura 1 – Oficina com os professores responsáveis pelas bibliotecas de algumas escolas da cidade, realizada na Escola Professor José Florêncio Neto Machadinho. Caruaru, 05/2017
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Desde 2015, são realizas visitas a escolas, em sua maioria da rede pública de ensino, da cidade de Caruaru, aplicando o projeto com atividades para crianças, mas também para professores, coordenadores e gestores. O grande objetivo é que os participantes tornem-se multiplicadores deste projeto, além de saírem enriquecidos com a vivência que as atividades proporcionam.
Fonte: acervo da autora.
20 É uma das religiões de matriz africana mais praticadas, tendo mais de três milhões de seguidores em todo o mundo, principalmente no
Brasil. Também é possível encontrar o chamado “povo do santo” em outros países como Uruguai, Argentina, Venezuela, Colômbia, Panamá, México, Alemanha, Itália, França, Portugal e Espanha.
21 Religião nascida no Rio de Janeiro, entre o fim do século XIX e o início do século XX, que originalmente congeminava elementos espíritas e bantos, estes já plasmados sobre elementos jeje-iorubas, e hoje apresenta-se segmentada em variados cultos caracterizados por influências muito diversas (p.ex., indigenistas, catolicistas, esotéricas, cabalísticas etc.). (Fonte Wikipédia, Dicionário Online).
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Abayomi é uma boneca negra, feita com retalhos de tecidos, sem costura ou cola, moldada com nós. Abayomi, em Yorubá, poderia ser traduzido como “encontro precioso”.
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Figura 2 – Exposição de bonecas abayomi na Escola Mariana Lima, realizada por alunos, após uma professora ter participado da oficina, multiplicando o que absorveu no encontro da Brigada Leitora. Caruaru, maio/2017
Fonte: acervo da autora. Figura 4 – Escola Municipal Dr. Amaro de Lira e César – CAIC. Depois da contação de história, a retribuição de uma criança que sentiu a importância da representatividade. Caruaru, nov./2016
Figura 3 – Contação de história para várias turmas da Escola Municipal José Clemente de Souza, em Cachoeira Seca, Distrito de Caruaru. Nov./2016
Fonte: acervo da autora.
afrobetização na prática. Há um carinho especial pela última foto, pois a criança me abraçou e me chamou de abayomi, dizendo:“Tia Abayomi! Á senhora é bonita como a história da boneca, ensina eu fazer uma para não esquecer mais da senhora...”. Neste momento, não tive mais dúvidas sobre o poder transformador da afrobetização, pois entre tantas crianças, um menino gravou o nome da boneca, a história e ainda queria aprender a fazê-la! Jamais esquecerei este momento, e isto é emoção, é troca, é resgate de identidade. Foram visitadas escolas particulares e públicas, sempre com uma atenção especial para as públicas, pois é nelas onde se encontram crianças com situações de risco e fragilidade, um número maior de crianças negras que vivenciam o preconceito e o racismo no seu dia a dia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fonte: acervo da autora.
Estas imagens foram escolhidas entre tantas escolas que foram visitadas; expressam a gratidão desta troca. A oficina de professores, a exposição dos alunos para homenagear a pesquisadora e os abraços das crianças demostram o quão é importante e necessário para o ensino infantil e fundamental a história dos negros afro-brasileiros e africanos pela cultura, ou seja, a 54
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Ao final do presente trabalho, percebeu-se sobretudo o quanto se faz necessária a implementação da afrobetização: cultura afro-brasileira e africana na educação infantil e no ensino fundamental I. Os professores que para este artigo foram entrevistados deixam claro o seu relato de que consideram uma questão social familiarizar as crianças com a cultura afro desde cedo. Isso porque esta ação ajudará cada brasileiro em sua própria identificação e, consequentemente, em sua autoafirmação. O conhecimento a respeito da cultura africana beneficia em especial as crianças negras, motivando-as a se aceitarem e também Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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os demais alunos, estimulando-os a respeitarem e admirarem a diversidade cultural proporcionada com a convivência entre pessoas de origens distintas. No entanto, infelizmente, como qualquer outra pesquisa, foram encontradas limitações. Era fundamental que todos os professores das escolas visitadas respondessem ao questionário, contribuindo para esta investigação, porém muitos recusaram. Diante deste obstáculo, foi possível elaborar a seguinte reflexão: por mais que exista uma lei que obrigue a trazer o tema para as salas de aula, se o professor não tiver uma mudança de concepção sobre a visão do negro, tomando para si essa consciência de valorização, conhecimento, respeito e, especialmente, se apropriando da riqueza da cultura africana e afro-brasileira, haverá resistência para que haja evolução no ensino do Brasil. Verifica-se que, maior que a dificuldade em executar as atividades propostas na ação educativa analisada neste artigo, está a dificuldade de os professores modificarem suas concepções históricas preconcebidas de escravidão e desconsideração de direitos. Contrário a isto, a ampliação do conhecimento histórico contribui para o ganho de ferramentas e possibilidades de trabalhar com a educação infantil e o ensino fundamental I, que foi o objetivo do projeto.
A atuação dessas pessoas vem servindo de estímulo para muitas escolas, ajudando os profissionais da educação a realizarem com mais segurança e eficácia atividades referentes à cultura afro. Contudo, é importante que a temática seja inserida no planejamento escolar de acordo com a realidade da escola e que seja observada a participação e a evolução de toda a comunidade escolar. É importante destacar que não se trata de mudar o foco do ensino, mas de ampliá-lo nos currículos escolares para a diversidade cultural, racial e social. Importa ainda destacar que a escola sempre será um considerável veículo de transmissão de conhecimento e ideologia. Vale destacar que a autora deste artigo, enquanto mulher negra, conhece bem o efeito do racismo e do preconceito na primeira infância em fase escolar, e hoje relata com propriedade a importância destas iniciativas educacionais. A importante visão do educador e sua iniciativa para abertura de construir processos pedagógicos positivos da identidade da criança negra é essencial para a ressignificação da educação, estimulando mudanças, gerando valores atribuídos que durante muito tempo não estavam sendo apontados como importantes. Conclui-se que o grande desafio da escola e do educador é superar todas as dificuldades que se fizerem presentes. Ter consciência de sua responsabilidade social é necessário para sua mudança de concepção e seu desenvolvimento, no sentido de acreditar em um ensino de combate ao racismo, ao preconceito e à discriminação.
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Como aspecto positivo, evidencia-se que são inúmeros os profissionais chamados de multiplicadores, transformadores e militantes, de ONGs e de outras organizações, que colocam em prática a afrobetização.
Nesta perspectiva, cabe às escolas incluir no contexto dos estudos atividades que proporcionem reflexões diariamente, assim como estimular a participação de formações continuadas, sugerindo atividades que saiam dos livros e do papel em favorecimento da experiência, pois a vivência dos professores pode ser transmitida às crianças com mais propriedade, provando com toda a certeza que a educação evolutiva existe e pode contribuir para que haja uma sociedade igualitária e justa. Por fim, este artigo vem ressaltar a verdadeira possibilidade de transformações de pensamentos e atitudes por meio da educação. Enquanto mulher negra e acadêmica em pedagogia, a autora deste artigo possui experiências tristes de quando criança em escola. Como exemplo, a aula de história era a mais sofrida: era dolorido ouvir sobre os negros escravizados, especialmente neste momento que apareciam risos e olhares direcionados aos alunos negros. Lamentavelmente, hoje ainda existem crianças que possuem este mesmo sentimento. O constante desenvolvimento nos estudos, atualmente em forma da conclusão de sua graduação é, para a autora, a ferramenta ideal para gerar na sociedade a mudança de visão em relação à cultura afro-brasileira e africana. Percebe-se o brilho no olhar das crianças ao verem uma professora negra de turbante e contando histórias de reis e rainhas negras, contando um lado bonito dos nossos ancestrais africanos; estas crianças conhecerão a contribuição desta cultura, se vendo futuramente em um artista, cantor, juiz, professor etc. e que hoje algumas histórias inventadas pelos opressores foram desfeitas. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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O processo de luta, o orgulho na contribuição do olhar de reafirmação de identidade étnica brasileira a partir da valorização cultural africana presente no país deve ser destacada e prevalecer no ensino da história. Isso é a resistência, peculiaridade do povo negro.
ANEXOS Anexo I – História das bonecas abayomi
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Figura 5 – Bonecas abayomi
Fonte: acervo da autora.
Há muito tempo, quando seres humanos eram comercializados e vendidos como objetos, famílias eram trazidas da África em enormes navios negreiros ou tumbeiros. Eram navios escuros e sem nenhum cuidado com a higiene. Conviviam no mesmo local a fome, a sede, as doenças, a sujeira, os agonizantes e os mortos. Negros africanos eram arrancados de sua terra natal, de sua identidade, sequestrados e separados de suas famílias para serem escravizados no Brasil. Homens, mulheres e crianças acorrentados como animais em seus porões, eram trazidos de diferentes lugares do continente africano, causando o encontro de várias etnias. Seus corpos eram marcados pelas correntes, as fezes e a urina eram feitas no mesmo local onde os alimentos simplesmente eram jogados, os mortos permaneciam ao lado dos vivos por muito tempo e eram lançados ao mar junto com os moribundos e as crianças. Estas, por sua vez, choravam desesperadas, não entendiam o porquê de tanto sofrimento... além de passarem fome, dormirem no chão amontoadas e acorrentadas, não entendiam por que seus reis e rainhas eram chicoteados e maltratados, por que foram separados de suas mães e por que não podiam mais ser crianças em toda a sua essência. Choravam tanto que incomodavam os traficantes de escravos, que simplesmente jogavam-nas ao mar, cessando o choro e cometendo infinitos assassinatos no decorrer da massacrante viajem. 56
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Fonte acervo da autora.
As mulheres negras eram encarregadas dos mais diversos serviços, sendo alvo principal de abusos sexuais constantes e, embora cercadas de toda a violência possível e imaginável, um ato de resistência brotava, fazendo de escudo a si mesmo e aos demais. As negras, em situação de escravidão, presenciando todo o sofrimento daquelas crianças, muitas sem filhos por terem praticado o aborto para assim livrar seus filhos do cativeiro, em uma atitude de proteção, rasgavam partes de suas saias, muitas vezes a única peça de roupa além de seus turbantes, e com os retalhos criavam as bonecas abayomi para entreter as crianças e cessar aquele infanticídio. Essas bonecas são de retalhos e somente de amarrações, com nós, que formam a cabeça, corpo, pés e mãos, não utilizando cola nem agulha para serem feitas, mesmo porque naquela situação não havia este tipo de material. Figura 7 – Confecção de bonecas abayomi
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Figura 6 – Boneca abayomi
Fonte acervo da autora. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Ao confeccionar as bonecas, as crianças se distraíam de todo aquele terror; cessando o choro, existia a união dos povos. A boneca não possui demarcação de olhos, boca e nariz, e isto mostra a pluralidade das etnias, deixando a mensagem de que todos eram um só povo. Abayomi vem dos Yorubá, e podemos traduzir como “Encontro Precioso”: Abay = encontro, Omi = precioso, mas também significa “aquela que traz alegria, felicidade e proteção”, objetivo daquelas mulheres – proteger as crianças.
Figura 8 – Confecção de bonecas abayomi
Fonte acervo da autora. Figura 9 – Título de Notório Saber, 2017
É um ato nobre presentear alguém com uma abayomi, pois além de se perpetuar a história, é como se você estivesse tirando parte de sua roupa para proteger o seu próximo. A história das bonecas abayomi começou com Lena Martins, artesã de São Luiz do Maranhão, educadora popular e militante do Movimento de Mulheres Negras e, assim outras arte-educadoras foram ministrando e multiplicando esta história milenar das bonecas negras de pano. 58
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Fonte acervo da autora. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A pesquisadora deste artigo, além de acadêmica em pedagogia é cantora, artesã, Mametu ria Nkisi e também militante do movimento negro. Natural de São Paulo e morando desde 2013 em Caruaru-PE, ganhou sua primeira abayomi em 2015, de sua Mametu ria Nkisi 23, Mãe Caçulinha (in memorian)24. Pesquisou sobre a boneca e começou a confeccioná-la, a princípio somente para presentear os amigos, se tornando pioneira em Caruaru ao trazer a história das bonecas e a oficina das abayomi. Palestrando e participando de exposições e mostras culturais na cidade, recebeu da prefeitura o título de Notório Saber, em 2017, pela atuação.
Anexo II – Instituições onde foram aplicadas a afrobetização na prática 2 Escola Prof. José Florêncio Neto Machadinho: escola pública municipal, atende ensino infantil, ensino fundamental, EJA (oficinas com professores); 2 Escola Professora Mariana de Lourdes Lima: ensino fundamental anos finais (contação da história performática e exposição das bonecas feitas pelos alunos); 2 Escola Municipal Professor José Clemente de Souza: ensino infantil, ensino fundamental, EJA (contação de história da boneca abayomi e exposição de bonecas, com alunos e professores);
2 Escola Municipal Integral Professor Altair Nunes Porto Filho: ensino fundamental, EJA (roda de diálogo com alunos do EJA); 2 Escola Municipal Professor Leudo Valença: ensino infantil, ensino fundamental, EJA (roda de diálogo e oficina de bonecas com as mães de alunos no mês das mães); 2 Escola Municipal Duque de Caxias: ensino infantil, ensino fundamental, EJA (roda de diálogo com professores sobre materiais a serem trabalhados com alunos e oficina da boneca abayomi); 2 Secretária da Educação Municipal de Caruaru: roda de diálogo com coordenadoras das escolas sobre implantação da Lei n. 10639/03, encerramento com cantigas de jongo; 2 Colégio Sagrado Coração: escola particular que assume uma educação evangélica libertadora com ensino infantil, ensino fundamental e ensino médio (contação de história, vídeos e músicas que trabalham o preconceito); 2 Sesi Caruaru: ensino infantil, ensino fundamental, ensino médio, EJA (roda de diálogo e oficina de abayomi com alunos);
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2 Escola Municipal Dr. Amaro de Lira e César – CAIC: educação infantil, ensino fundamental anos iniciais (contação performática da boneca abayomi, músicas afro com alunos e professores);
2 Escola Estadual Professor José Bione de Araújo: escola pública de ensino fundamental, médio e EJA (roda de diálogo após apresentação de curta sobre preconceito); 2 Externato Caruaru: escola particular de ensino infantil e fundamental (contação performática da história da boneca abayomi).
REFERÊNCIAS ALMEIDA, Carlos Alberto Lima de. Educação escolar e racismo: a Lei 10.639/03 entre práticas e representações. Recife, 2014. ANDRADE, Vanessa. Projeto Afrobetizar. 2015. Disponível em: http://institutotear.org.br/afrobetizar-aeducacao-no-brasil/. Acesso em: nov. 2018. 23 Mametu-de-inquice, Mametu Nkisi Mam’etu ria mukixi é o cargo de sacerdotisa, mãe de santo do Candomblé Bantu ocupado por mulheres. Equivalente ao cargo de Iyalorixá do Candomblé Ketu. Os homens são Tata-de-inquice.
24 Dª Carlita Gomes 07/10/1927 + 26/03/2016 Sacerdotisa de candomblé angola. A inauguração oficial de sua casa deu-se em 28/05/1966, mas seus serviços como mãe de santo já eram disputados de longa data.
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BENJAMIN, Roberto Emerson Câmara. A África está entre nós: história e cultura afro-brasileira. João Pessoa, 2003. CAMILO, Fabiano Paula e Nunes; GEOVANE, Carlos. A importância da cultura afro-brasileira dentro das escolas: utilizando a educação musical através das cantigas de domínio público do samba de terreiro. Revista Formação Docente, v. 7, n. 1, 2015. Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-izabela/index. php/fdc/article/download/759/668. Acesso em: nov. 2018. KOFILABA. Histórico. [S.d.]. Disponível em: http://kofilaba.wixsite.com/kofilaba/abassa-oxum-oxossi. Acesso em: 15 nov. 2018. MENDES, Christiane. Imagens e ações de afrobetização. Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/ cp070875.pdf. @bonecasabayomi. Acesso em: nov. 2018.
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SILVA, Geranilde Costa. Pretagogia: construindo um referencial teórico-metodológico de matriz africana para a formação de professores/as. Ceará: UFC, 2013. Disponível em: http://www.repositorio.ufc.br/handle/ riufc/7955. Acesso em: nov. 2018.
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Carências virtuais: o professor e a avaliação do aluno na educação a distância Virtual needs: the teacher and the evaluation of students in distance education CÂMARA, Uipirangi25; 26 CÂMARA, Ivanete27
RESUMO O presente trabalho traz os desafios do cenário de educação superior a distância no Brasil, quando se têm em perspectiva a avaliação de aprendizagem. Considerada um dos grandes problemas da educação no Brasil em todos os níveis educacionais, principalmente no ensino superior, a avaliação, mesmo com todos os avanços tecnológicos e com as novas contribuições da psicologia da aprendizagem, tem sido usada para medir prioritariamente a capacidade de reter informações, e não necessariamente o aprendizado adquirido. O principal mecanismo utilizado para medir o aprendizado no Brasil é um questionário composto por um misto de perguntas de resposta curta e perguntas abertas, agrupadas por tema ministrado, cujo resultado esperado é medido pela pontuação média de acertos e erros. O principal pressuposto deste modelo é que notas mais altas significam aquisição de aprendizagem. Nesse cenário, os professores fingem ensinar, os alunos fingem estudar. O suporte teórico que fundamentará a análise das principais suposições sobre a relação entre avaliação e aprendizagem virá de Luckesi (2011), Saviani (2011), Hadji (2001), Bourdieu (1998; 2014), Boyer (1997) e Brookfield (1995). Palavras-chave: Avaliação. Aprendizagem. Educação Superior. Educação a distância.
ABSTRACT This present work addresses the challenges from the Higher Education scenario in distance learning at Brazil, mainly regarding the learning assessment. This is a national problem when we talk about education at Brazil in all segments, especially at the higher education, the assessment has been used to measure primarily the capacity to retain information and not necessarily the learning acquired. The overwhelmingly mechanism used to measure the learning at Brazil is a questionnaire consisting a mix between short-answer and open-ended questions, grouped by the taught topic, which the expected result is measured by the average score of wrong and right answers. The key assumption of this model is that higher grades means learning acquirement. In this scenario, teachers pretend to teach, students pretend to study. The theoretical support which will substantiate the analysis of the mainly suppositions about the relation between Assessment and Learning will come from Luckesi (2011), Saviani (2011), Hadji (2001), Bourdieu (1998; 2014), Boyer (1997), Brookfield (1995). Keywords: Assessment. Learning. Higher Education. Distance Learning. 25 O presente texto, apresentado em formatos e versões diferentes em Congressos e Simpósios, é retomado agora e adaptado para privilegiar, principalmente, a discussão sobre o processo de avaliação no Ensino Superior. Uma primeira versão do mesmo foi apresentada na Revista Ânima, em 2019, sob o título Educar no Direito: uma reflexão sobre a aprendizagem no Ensino Superior no Brasil.
26 Doutor em Ciências da Religião, Especialista em Tecnologias Educacionais e Professor na Faculdade Educacional da Lapa. E-mail: uipirangicamara@fael.edu.br. 27 Psicóloga, psicopedagoga clinica e institucional. E-mail: ivanetecamara@gmail.com. Revista Vivências Educacionais
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INTRODUÇÃO Avaliar o ensino e a aprendizagem na educação a distância já não é mais um exercício de reflexão sobre outros contextos28, ou, ainda, jogo de predição, aposta ou suposição, como há pelo menos duas décadas atrás29. É possível, no Brasil, dado que as experiências em EaD de instituições brasileiras têm avançado sobremaneira, pelo menos detectar algumas das principais carências de ensino e aprendizagem, sobretudo marcando a relação virtual de professores e alunos. O presente artigo, portanto, figura em um contexto mais amplo de reflexão sobre a relação e os desafios no processo ensino e aprendizagem em EaD, uma vez que delineará algumas percepções da prática docente e profissional dos autores.
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Em 2007, quando o Ministério da Educação, por meio de consulta pública, incorporou uma série de contribuições de diversas instituições brasileiras sobre a educação a distância no documento denominado Referenciais de Qualidade para EaD30, a ideia de parametrizar a qualidade dos processos de ensino e aprendizagem não presenciais ou semipresenciais passou a vigorar nas dimensões de semântica e sintaxe dos projetos educacionais das diversas instituições públicas e privadas no Brasil31. Dessa maneira, os cursos deveriam incorporar não apenas uma linguagem permeada por adjetivos que indicassem qualidade, mas, sobretudo, deveriam expressar aspectos qualitativos na concepção e estrutura de seus cursos. Isso deveria presumir, minimamente, uma dada concepção pedagógica instrucional que pudesse ser viabilizada por uma estrutura majoritariamente não presencial, ou seja, que transcendesse o modelo presencial marcado, em última instância, pela referência física de alunos e professores em um espaço comum. Apesar dos avanços significativos implementados pelo Ministério da Educação visando a qualidade do ensino e aprendizagem, as instituições, na perspectiva desses pesquisadores, ainda têm como desafio maior o processo de avaliação. De todos os desafios que circundam estes polos, nenhum tem tido um impacto maior na prática docente quanto a avaliação. Como medir de fato se os alunos têm aprendido ou não? Ao longo desses anos, os docentes se perguntam se estão avaliando a aprendizagem ou as características de seus alunos, sua história de luta, personalidades e capacidade comunicativa. Boa parte dos docentes ainda, supõe-se, foram formados na velha tradição brasileira de aplicar provas para medir aquisição de informações, ou medir apenas o raciocínio lógico-matemático sem considerar qualquer outra variável com mais cuidado. Mesmo quando se pensa em inovação, supõe-se que ainda vigora, em grande parte dos contextos educacionais, a manutenção de um padrão que possa garantir, por um lado, ausência de preocupação com reclamações, e por outro, que os melhores ou mais aptos sigam em frente. Percebe-se, de forma mais acentuada e com maior impacto, que exatamente essa carência de clareza do que se avalia na educação superior, e quem se avalia, tem implicações profundas tanto no desempenho do aluno quanto na sua formação. A experiência na docência de cursos na modalidade a distância proporcionou a percepção de que os diversos educadores precisam não apenas conscientizarem-se desse dilema (medir ou ensinar), mas, sobretudo, construir uma possibilidade de oferecer uma solução que dê conta de minimizá-lo. Nesse sentido, esse artigo pretende, a partir da relação entre aprendizagem e avaliação, problematizar questões que possam nortear a discussão da avaliação no ensino a distância no Brasil.
UM CENÁRIO PERSISTENTE: DISCURSOS INICIAIS SOBRE A NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO Uma primeira sinalização de que a avaliação no ensino superior no Brasil precisava ser colocada sob crítica surge com A Educação Nova ou Escola Nova (CÂMARA, 2013, 2019). A crítica básica era de que se fazia neces28 Tomando como ponto de partida as pesquisas em aprendizagens virtuais desenvolvidas por Rena Pallof e Keith Pratt, quando ambos gerenciaram o Crossroads
Consulting Group. Entre suas obras de referencia figuram: Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço: Estratégias eficientes para a sala de aula on-line e O aluno Virtual: Um guia para trabalhar com estudantes on-line, ambas lançadas pela ARTMED em 2002 e 2004, respectivamente.
29 Momento em que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9394 de 1996) estabelece a possibilidade de uso da modalidade de educação a distância em todos os níveis de ensino.
30 Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/legislacao/refead1.pdf. Acesso em: 29 jun. 2015. 31 Em 20 de dezembro de 2005, com a publicação do Decreto 5.622, ficam garantidas as políticas de qualidade “no tocante aos variados aspectos ligados à modalidade de educação a distância”.
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Em sua jornada como educador, Paulo Freire (2013) pontuou vários problemas na base filosófica que amparava o fazer educacional e que precisavam ser corrigidos (CÂMARA 2013, 2019). Isso incluía tanto a crítica à diferença social e econômica que produzia a exclusão quanto à produção de discursos ideológicos que a justificavam, transferindo de maneira cruel a responsabilidade de superação dessas diferenças não a uma mudança no sistema que as criava, mas a uma jornada solitária do sujeito excluído: “em discursos eloquentes e cheios de esperteza, os dominantes insistem em que o que vale é a coragem de trabalhar, é a disciplina, a vontade de crescer, de subir. Vence, portanto, quem trabalha com afinco, sem reclamar, quem é disciplinado, e por disciplinado se deve entender quem não cria dificuldade ao patrão” (FREIRE, 2013, p. 54). A educação, nesse sentido, como denuncia Freire, não é instrumento de libertação, mas de adequação, de produção de opressão e sujeitos oprimidos. Uma pedagogia transformadora, a pedagogia da esperança, como insistia Freire (2011b), deve atuar na formação de sujeitos que se assumam críticos do conhecimento e da ação transformadora do mundo, os quais não podem figurar como meros recipientes de informações, resultado de uma educação bancária (FREIRE, 2011a). Um saber libertador envolve todos os atores do espaço pedagógico e também a própria conceituação desse espaço. Desse modo, docentes e alunos se tornam críticos também de sua prática, da teoria que defendem (FREIRE, 1996) e da realidade que pretendem sancionar ou modificar (FREIRE, 2011b). Esse tipo de saber não pode ser ingênuo e descomprometido, pois, de acordo com Freire (2013, p. 40), precisa enfrentar a “perversidade de uma realidade injusta e negadora do que, cada vez mais, me parecia ser a vocação ontológica do ser humano: a de ser mais”. O conceito de educação bancária, na perspectiva de Freire (CÂMARA, 2013, 2019), traduzia-se na compreensão de que havia uma ação pedagógica no ensino brasileiro que se caracterizava pela mera transmissão de conhecimentos, na qual o professor, detentor do saber, transferia para os alunos, meros receptores, as informações que considerava importantes. Os alunos eram impedidos, por tal prática, de se desenvolverem como cidadãos críticos e de atuarem como protagonistas de uma nova história, de um novo saber, de uma nova realidade social (FREIRE, 2011a).
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sário uma renovação não apenas da maneira de lecionar, dos conteúdos a serem ministrados, mas, acima de tudo, da visão sobre que tipo de cidadão e para que tipo de sociedade a educação elabora o seu saber, por meio de seus diversos afazeres (SAVIANI, 2011, p. 213, p. 214) Dois aspectos importantes sobre os ideais que anteparavam a busca por um novo modelo de se fazer educação precisam ser postos em relevo. O primeiro é o da educação como compromisso de formar cidadãos, e não operários. O segundo aspecto tinha relação direta com a crítica à organização do espaço escolar como mediatizador da aprendizagem: Como é possível exigir crescimento e livre expressão se a escola não favorece, por sua concepção estrutural e de modelo, que isso se efetive? As classes devem deixar de ser locais onde os alunos estejam sempre em silêncio, ou sem qualquer comunicação entre si, para se tornarem pequenas sociedades, que imprimam nos alunos atitudes favoráveis ao trabalho em equipe (DEWEY, 1959;1950).
NOVOS CENÁRIOS: PRINCÍPIOS CONDUTORES PARA A MUDANÇA NO PROCESSO DE AVALIAÇÃO Apesar das insistentes propostas para uma renovação do modelo de avaliação, de maneira geral, percebe-se ao longo da história educacional brasileira uma dificuldade de mudança (CÂMARA 2013, 2019). A zona de conforto em um processo que coloca todo o peso da avaliação sobre a capacidade de reter e compartilhar as informações recebidas sobre o aluno não pode persistir. O ensino superior não pode, no processo avaliativo, ignorar a necessidade de encarar as identidades sociais, históricas, culturais e políticas particulares dos envolvidos no processo educacional (BOURDIEU, 1998, 2014). Um educador precisa ter consciência de que a busca pelo conhecimento transcende os espaços formais, tradicionalmente considerados espaços de transmissão do conhecimento, como a escola. Deve ter ciência, também, de que os saberes não se resumem e tampouco se circunscrevem às matrizes curriculares devidamente chanceladas pelos órgãos governamentais dedicados às questões educacionais formais (CÂMARA, 2013, 2019). Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Entretanto, mesmo consciente disso, o educador precisa compreender as definições acordadas sobre o fazer educacional formal e atuar com base nelas; portanto, não pode fugir das demandas que se impõem sobre a educação tendo um único modelo como espaço privilegiado de formação do saber (CÂMARA, 2013, 2019; BOYER, 1997; BROOKFIELD,1995).
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A avaliação de aprendizagem na educação superior à distância deve ser entendida como um projeto que necessariamente precisa suplantar uma relação de hierarquia, em que em um polo se encontra o detentor do poder, e no outro um sujeito subserviente, que deve se amoldar para garantir um passe para a próxima etapa. Por outro lado, isso também não significa desconsiderar-se a relação de saber acumulada ao longo de uma jornada o que, justamente, garante a posição de professor e aluno. Nesse sentido, essa relação deve se dar como um acordo mútuo que vai se desenvolvendo em um ambiente de apoio e cooperação em que todos crescem, se aperfeiçoam e fazem da tarefa do conhecer, embora repleta de desafios, uma aventura prazerosa. No caso da educação a distância no Brasil, principalmente quando se tem em mente a avaliação, alguns princípios parecem ser apropriados para garantir uma aprendizagem relevante. De maneira geral, segundo a abordagem construtivista, a aprendizagem é um processo de invenção na qual o aprendiz é o agente responsável. Lidar com a coleta de informações e, consequentemente, focar nos dados coletados para a construção do conhecimento, não são tarefa fácil em nenhuma área. Entretanto, apesar disso, é preciso perguntar como é possível, a partir dos dados disponíveis, a construção de um conhecimento seguro, como é possível aprender e, sobretudo, como medir a experiência de aprendizagem. A avaliação precisa ser compreendida em uma perspectiva multimendisonal (HADJI, 2001), em que o ato de avaliar não se restrinja apenas como a responsabilidade de mensuração por parte do professor de um conjunto de informações dominadas pelo aluno; para ele, avaliar envolve um processo de negociação. Nesse processo, não há como se ignorar o caráter subjetivo do professor enquanto o sujeito que tem a tarefa de corrigir. Ou seja, não há neutralidade diante do contexto escolar e social (FREIRE, 1996), esse contexto se dá em um ambiente afetivo e emocional. Disso decorre a relação de expectativa entre professor e aluno tão profundamente influenciadora do processo de avaliação. Moskowitz (2005) e Olson, Roese e Zanna (1996) entendem essa dimensão de expectativa que está presente no processo de avaliação como um conjunto de ações ou atitudes que se antecipa em relação a uma outra pessoa, ou seja, uma expectativa é um tipo particular de crença que tem como referente uma ação relativa a um estado futuro de coisas. De modo geral, a principal fonte de influência das expectativas sobre o desempenho escolar reside nas crenças estereotipadas sobre a inteligência ou a habilidade acadêmica do estudante. Neste sentido, os estereótipos podem ser interpretados como expectativas, pois uma característica fundamental de uma crença estereotipada é a busca de eventos que confirmem a crença, bem como a tendência a inibir a expressão de casos que rejeitem os estereótipos. Segundo Hadji (2001) não há como se minimizar o fato de que a avaliação é um ato baseado na intuição do avaliador, portanto, subjetivo a ser expresso de forma quantitativa. Nesse sentido, entendendo-se a presença de subjetividade, caberá ao avaliador a tarefa de interpretar a realidade à qual deve pronunciar-se. Pode-se até afirmar que há um entendimento comum por parte dos teóricos de que a ação de uma expectativa exerce um impacto decisivo sobre o processo de avaliação. Parece claro que as expectativas do professor exercem um papel nada desprezível no incremento ou na redução do desempenho de estudantes rotulados como promissores ou não (BLAINE, 2007). A questão é saber se o professor está consciente do seu papel de diminuir o impacto da influência das suas expectativas a respeito do estudante. Segundo Luckesi (1994), acostumamo-nos com explicações do senso comum relacionadas ao fazer pedagógico, entre elas, suposições tomadas como certas sem a devida avaliação crítica de seus pressupostos. O autor nos indaga: “será que para direcionar os nossos trabalhos pedagógicos temos permanentemente nos perguntado quem é o educando e o que ele significa? O que é o conhecimento? Quais são os conteúdos que veiculamos em nossas aulas? Será que questionamos o material didático que utilizamos?” (LUCKESI, 1994, p. 96). Quando pensamos na formação de nossos alunos, é preciso refletir sobre que tipo de resultados, em termos pedagógicos, obtemos ao fazer as coisas como sempre fizemos ou como tradicionalmente as recebemos/assimilamos (CÂMARA, 2013, 2019). 64
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Um dos mecanismos mais importantes para conhecer o que de fato nossas concepções pedagógicas têm possibilitado a nossos alunos em termos de conhecimento é o que caracterizamos como avaliação de aprendizagem. Infelizmente, tradicionalmente os processos avaliativos são pontuais, na maioria das vezes medindo apenas aspectos ligados ao raciocínio lógico-matemático ou a uma espécie de saber enciclopédico (GOLEMAN, 1995; FREIRE, 2011a). Um processo avaliativo não pode se dar à parte de um projeto pedagógico, como se fosse algo estanque. A avaliação é o meio para que se atinja o que foi definido no planejamento pedagógico e, portanto, antes de a estabelecermos, devemos perguntar pelos fundamentos filosóficos da escola que pretendemos formar (CÂMARA, 2013). Nesse sentido, algumas pedagogias não darão conta de um processo de avaliação dinâmico se conceberem o educando como um dado pronto, ou seja, “se o ser humano é dado pronto, não faz sentido investir na sua autoconstrução” (LUCKESI, 2011, p. 21).
CENÁRIOS E MUDANÇAS: UMA AVALIAÇÃO RELACIONAL E IDENTITÁRIA A ação avaliativa precisa pressupor agentes que amem o conhecimento e, motivados por esse amor, busquem superar as próprias dificuldades (CÂMARA 2013, 2019). Se a avaliação exigir participações mecânicas, treinadas, pode gerar falsos sentimentos em relação ao potencial de aprendizado, como recorda Paulo Freire (2013, p. 45): “entender um texto era sobretudo decorá-lo mecanicamente, e a capacidade de memorizá-lo era vista como sinal de inteligência. Quanto mais, então, me sentia incapaz de fazê-lo, tanto mais sofria pelo que me parecia ser a minha rudeza insuperável”. Se um educador compreender seu fazer de maneira equivocada, pode causar dados irreparáveis, como sugere Alves (1986, p. 8). Fugindo ao estereótipo de um educador que obedece a certo rigor acadêmico no trato das questões educacionais, Rubem Alves aparece como um transgressor, pensando filosoficamente as questões que fundamentam o fazer profissional de educação que tem marcado a sociedade contemporânea: “educadores, onde estarão? Em que covas terão se escondido? Professores há aos milhares. Mas professor é profissão, não é algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao contrário, não é profissão; é vocação. E toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança” (ALVES, 1986, p. 11).
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É importante que se destaque, com base na perspectiva de um conhecimento comprometido com a formação de cidadãos críticos e autônomos e, consequentemente, capazes de construir ou transformar a própria história, que um processo pedagógico deve pressupor uma avaliação que transcenda os aspectos puramente disciplinares, programáticos (BROOKFIELD, 1995) conteudistas, levando em consideração a realidade dos alunos, pois, do contrário, corremos o risco de medir fracassos, impossibilidades e exclusões (SAVIANI, 2011, p. 429-431).
A relação mediada pelo educador é dialógica, porque se dá entre sujeitos que buscam, antes de tudo, sentir-se no mundo, com expectativas, medos, esperanças. É o contrário da relação entre professor e aluno marcada por mera funcionalidade, ou seja, aquela que espera do aluno tão somente que ele “adquira um crédito cultural (...) numa disciplina identificada por uma sigla, sendo que, para fins institucionais, nenhuma diferença faz aquele que a ministra” (ALVES, 1986, p. 13). É preciso que se insista na diferenciação entre professor e educador também por uma visão ontológica, segundo a qual o ser humano é um ser para o mundo, ou seja, sua identidade brota de dentro pra fora, e não ao contrário, por um crachá, um diploma, notas ou resultados acadêmicos (CÂMARA 2013, 2019). Os processos avaliativos tradicionais, centrados, em sua maioria, em uma visão burocratizante da educação, têm falhado radicalmente com seus alunos. Isso ocorre, entre outras coisas, pelo fato de essas instituições dissociarem da vida humana os saberes necessários (amar a vida, apaixonar-se, sonhar etc.), por insistirem em processos cansativos, engessados, conteúdos curriculares em excesso e por estarem comprometidas com uma visão “de fábrica”, ou seja, de formação em massa (FREIRE, 2013; ALVES, 1986; SAVIANI, 2011; CÂMARA, 2013, 2019). Não é o mercado que faz o ser humano, pois este precisa, antes, deixar-se fazer, ao se iniciar em uma aventura prazerosa rumo ao conhecimento. E, nesse processo, apenas alguém com paixão, com vocação, pode ser o mediador por excelência. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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É preciso a percepção de que a educação a distância ainda é a oportunidade que muitos têm de atualização, de repor um tempo perdido ou ainda de conquistar um aperfeiçoamento maior, talvez em função de expectativas no trabalho. Sendo assim, esse público tem algumas peculiaridades, como por exemplo, o fato de ser um público adulto, na média de meia idade. É um público experiente, com um ritmo de vida acelerado. É um público que sabe o quer, ainda que não tão acostumado com o manejo de recursos tecnológicos. Por ser um público mais maduro, a abordagem precisa ser criteriosa, tanto nos contatos quanto na proposta pedagógica. A aprendizagem se dá no nível em que o aluno está e compreende, portanto, conhecer e levar em conta sua realidade educacional é sumamente importante para uma aprendizagem e ensino significativos (CÂMARA, 2013, 2019).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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O processo de avaliação de aprendizagem predominante na realidade brasileira ainda é formal, programático, somativo e, no caso da educação a distância, segue um modelo de fábrica: padronizado para grandes públicos. As diferenças regionais, sociais, de conhecimento, são minimizadas em um processo que se firma no binômio “decore e repita”. Esse cenário assume dimensões ainda mais críticas quando os professores precisam optar por manter os modelos de avaliação padronizados, já que os mesmos garantem o funcionamento das grandes instituições e de seus projetos. Nesse sentido, docentes e discentes se tornam engrenagens de uma grande fábrica. A ideia de busca pelo conhecimento, de um saber promotor de libertação e autonomia, cede lugar à nota que classifica como adequado ou inadequado para obtenção do diploma ou certificado. De qualquer maneira, a missão e a vocação dos educadores permitem que o sonho de uma formação que valha a pena possa modificar o caminho usual pelo qual a avaliação e aprendizagem se dão nestes contextos. O que parece cada vez mais fazer sentido é a percepção de que o processo de ensino e aprendizagem vai se assumindo como tarefa conjunta de educadores e alunos e, aí, parece que a avaliação ganha um aspecto de autonomia – alunos recebem condições de avaliar sua trajetória em razão de suas escolhas didáticas. Há muito o que se avançar, há muito o que se sonhar.
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Carências virtuais: o professor e a avaliação do aluno na educação a distância
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KEARSLEY, G. Theory into Practice. Disponível em: http://www.planetaeducacao.com. br/suporteaoprof/ pedagogia. Acesso em: 23 maio 2000.
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos Consumption behavior: generation X and Y towards children DEICHMANN, Thiane Dorada32 VIVAN, Luiz Alberto33 POZZI, Flavio Alves34
RESUMO Tendo em vista as mudanças que o mundo passou com a chegada da internet e o fácil acesso ao universo digital, as gerações X e Y passaram por transformações, e enquanto alguns aprenderam a lidar com essa nova realidade ainda na adolescência, outros tiveram que se adaptar já na fase adulta. O comportamento como consumidor também sofreu ajustes, e as crianças ganharam, com o passar do tempo, mais voz no processo de decisão de compras da família. Este artigo tem como finalidade comparar as duas gerações citadas com base na influência que as mídias digitais têm sobre seus filhos, com idade entre 3 e 10 anos. Por meio de uma pesquisa quantitativa estilo survey, foram coletados dados que apontam que a rotina de uso da internet dos filhos é muito parecida nos dois tipos de família, e o processo de decisão de compra também não sofre muitas variações; apenas quando o assunto é relacionado a jogos, os pais da geração X são mais permissivos. É possível notar que os filhos opinam e são ouvidos em muitos itens na hora da compra da família, e que sofrem influência da internet e dos amigos quando pedem por algum produto. Palavras-chave: Comportamento do consumidor. Decisão de compra familiar. Influência digital. Consumo. Geração X. Geração Y.
ABSTRACT Given that the world changed after internet arrived and the easy access to the digital universe, generations X and Y have undergone transformations and, while some learned in adolescence, others had to adapt in adulthood to this new reality. Consumer behavior has also undergone adjustments and children have gained more voice in the family’s purchasing decision process. This paper aims to compare the two generations based on the influence that digital media have on their children, aged between 3 and 10 years. Through a quantitative survey, data were collected that show that the children’s Internet use routine is very similar in both types of family and the purchase decision process does not suffer many variations, except when the subject is related to games that Generation X parents are more permissive about. It is possible to notice that the children opine and are heard on many items when family are buying and, that they are influenced by the internet and friends, when they ask for a product. Keywords: Consumer behavior. Family purchase decision. Digital influence. Consumption. Generation X. Generation Y. 32 Especialista em Comunicação Digital. 33 Doutor em Administração. 34 Doutor em Engenharia de Produção. Revista Vivências Educacionais
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos
INTRODUÇÃO As crianças são alvo da publicidade há muitos anos, e isso se deve ao fato de que elas podem influenciar diretamente os processos de decisão de compra da família. Elas são cada vez mais vistas como consumidoras que adquirem, trocam, colecionam, compartilham experiências e interagem com a marca; têm sido percebidas por passar muito tempo consumindo conteúdo na internet, muitas vezes sem a presença dos pais, tornando o acesso da publicidade diretamente com elas muito mais fácil. A maior exposição à mídia direcionada ao público infantil despertou ainda mais o desejo de posse (SCHOR, 2009).
Os autores Berey e Pollay (1968) também enfatizavam três razões principais do porquê é importante a atenção ao papel da criança no mercado, quais sejam: o tamanho do mercado infantil está aumentando rapidamente; as crianças influenciam na tomada de decisão da família; o comportamento do consumidor adulto é diretamente antecedido pelo comportamento do consumidor infantil. A influência, na maior parte das vezes, acontece dentro de casa, tendo como base o comportamento de consumo dos pais; ou na escola, com a troca de experiências no convívio com outras crianças. Pode ocorrer por meio dos influenciadores digitais, que ganharam muita força nos últimos anos. Estudos apontam que dois terços das mães acreditam que os filhos estejam atentos às marcas aos três anos de idade e um terço delas admite que isso possa ser verdade aos dois anos. O uso de personagens e símbolos torna as marcas de fácil memorização e o excesso de anúncios nos canais infantis, sejam eles na televisão ou nos meios digitais, reforça o diálogo (SCHOR, 2009). Muito se fala sobre as crianças terceirizadas – que os pais trabalham fora e os cuidados com a rotina ficam a cargo da escola, babás ou familiares – e o quanto isso está ligado ao consumo familiar, pois acredita-se que os pais querem compensar o período de afastamento com os itens de desejo e consumo dos filhos, a fim de trazer felicidade a eles e eximir a culpa de sua ausência. Segundo a pesquisa realizada pela Viacom International Media Networks, distribuidora do canal Nickelodeon no Brasil, as crianças confiam muito na internet e na televisão para obter informações, visto que “82% das crianças declararam a internet como a principal fonte de 13 pesquisas, seguida dos comerciais de TV, com 70%” (REVISTA PONTOCOM, 2011). De acordo com essa mesma pesquisa, as crianças não exercem influência apenas em produtos para seu próprio uso, mas também influenciam nas compras para a família. Na maioria das vezes, as decisões são tomadas em conjunto – os pais ouvem e costumam levar em consideração as opiniões das crianças (MURAD, 2011).
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Em 1920, as marcas vendiam produtos para as crianças por meio de uma aliança com as mães – deveriam convencer as mães de que o produto era benéfico para os filhos. Hoje, criam conexões diretamente com as crianças, afinal, elas se tornaram consumidoras autônomas, desempenhando papel de autoridade dentro da família (KARSAKLIAN, 2011). A mãe que assiste à televisão com seu filho tende a ceder mais facilmente aos pedidos da criança, logo, a publicidade também precisa atingir as mães, para que elas se sintam mais seguras em relação à marca e passem a comprar o produto escolhido pelos filhos (BEREY; POLLAY, 1968).
A relação entre pais e filhos tem ganhado mais proximidade, principalmente para os pais da geração Y ou millenials. O Youtube realizou a pesquisa “Pais millenials do Youtube”, para entender o que os torna diferentes e o que isso significa para marcas que estão tentando entrar em contato com eles. Os pais millenials assumem um papel mais íntimo e menos hierárquico com seus filhos do que os pais das gerações anteriores. Para isso ocorrer, eles querem um diálogo aberto e honesto com seus filhos. Segundo a pesquisa, 74% dos pais millenials envolvem seus filhos nas decisões domésticas. Isso é significativamente maior se comparado aos pais da geração X. Eles não usam o Youtube apenas para se sintonizar, mas também para sintonizar o que seus filhos observam e amam. Anúncios e conteúdos podem ser um estímulo para essas conversas, o que abre oportunidade para as marcas desempenharem um papel mais assertivo. Essa geração procura um conteúdo, especialmente quando precisa de uma resposta (GROSS; O’NEIL-HART, 2017). Tendo em vista os dados presentes nesta seção e a importância dos meios digitais para a geração Y, este trabalho objetiva verificar de que forma a comunicação digital influencia o comportamento de consumo das Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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crianças e de que forma os pais adaptam seu comportamento de consumo às demandas das crianças, comparando pais da geração X e geração Y de crianças de 3 a 10 anos.
QUADRO TEÓRICO Diferenças entre geração X e Y em relação ao consumo
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O Grupo Abril (2017) realizou uma pesquisa intitulada “O X da questão” sobre o comportamento de consumo da geração X (grupo de pessoas que nasceram do início dos anos 60 a meados dos anos 80), e aponta que ela mistura as mídias offline tradicionais às novas mídias da internet, e também está mais disposta a se aprofundar no conteúdo que os millenials (geração Y, nascidos por volta de 1981 a 1994). Na pesquisa, são pontuadas as principais diferenças entre essas gerações com relação ao consumo: a geração X foca mais nas características do produto ou serviço (77%) do que nas ideias ou na causa (23%), prefere simulações do serviço ou produto na vida real (85%) ao invés de cenários inspiradores e que façam sonhar (15%); quanto ao consumo, está mais disposta a consumir conteúdo criado pelas marcas. Nas propagandas, gostam de material que ensine mais sobre o produto ou categoria; é a geração X a que influencia, consome e paga a conta. Um exemplo disso está no dado de que entre os consumidores de e-commerce, a média de idade é de 43 anos, e que sete em cada 10 compras são realizadas por pessoas com mais de 35 anos. Em “Eles – um retrato sobre os homens”, da editora Abril (2015) (REVISTA VIVA S/A, 2017), um dado chama a atenção: para homens de 35 a 50 anos, a família é o que mais dá prazer em gastar dinheiro. Já os millenials, ou geração Y, são mais idealistas e gostam de ter uma ligação maior com o contexto, em lugar de apenas focar no produto, e estão abertos às causas modernas de sustentabilidade e diversidade de gênero, além de preferirem conteúdo rápido e de impacto, que apele mais para o lado da identificação pessoal e, por isso, se ligam tão facilmente aos influenciadores que possuem um discurso despojado e direto. Outra pesquisa realizada pela MindMiners, em 2016, denominada “Estudo de gerações: visões sobre o trabalho, tendências sociais e comportamento – uma comparação entre a geração Y e a geração X”, analisou o grau de importância em possuir alguns bens: casa própria (X 93% e Y 92%); plano de saúde (X 85% e Y 76%); smartphone (X 72% e Y 74%); notebook (X 59% e Y 59%); carro (X 66% e Y 57%) e televisão (X 67% e Y 49%). Nos mesmos relatórios, é possível ver que é alta a incidência de pessoas que prefere consultar o celular a um vendedor, em caso de dúvidas – 40% das duas gerações.
O consumo infantil O perfil da criança consumidora é formado pela socialização, a qual atinge alguns fatores como aquisição de habilidades, de conhecimentos e de atitudes relevantes para sua atuação no mercado (SOLOMON, 2002). As diferenças de idade são completamente evidentes, por exemplo, na maneira como as crianças formam categorias de produto (ROEDDER et al., 1993). Segundo Santos (2000), a criança passa por três fases de idade. De 0 a 2 anos, dá-se a fase do “universo das observações”, na qual ela passa a conhecer o que é comprar, sendo acompanhada pelos pais, sem diferenciação de produtos e marcas. Dos 3 aos 5 anos, inicia-se a fase do “eu quero”. É quando desperta na criança o desejo de comprar, fazendo assim o pedido aos pais. Nesta fase, ela já é capaz de distinguir marcas e embalagens. Quando a criança atinge a fase dos 6 aos 12 anos de idade, ela assume uma postura mais ativa e seletiva em relação às suas escolhas, passando a imitar seus pais, também acompanhados dos amigos. É quando ela começa a entender valores, escolhas e comunicação. A propaganda é capaz de produzir três tipos de comportamento nas crianças: compra, tendência a comprar e comportamento antissocial. A compra poderá não ser imediata, porque a criança deve desenvolver e armazenar, em sua memória, muitas das orientações e normas refletidas na propaganda, até que ocorra uma oportunidade de compra. O mesmo autor afirma que a propaganda pode influenciar a maneira como as crianças veem o mundo dos adultos e tentam criar modelos e conceitos apropriados, para a vida presente e para o futuro. O 70
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos
consumidor infantil também é enquadrado como futuro consumidor, pois as marcas que conseguirem criar um relacionamento neste estágio da vida dos pequenos terão mais chances de desenvolver uma fidelidade futura (MCNEAL, 1999). As crianças podem ser persuadidas pela propaganda, e essas mensagens afetam a escolha do produto. Esse experimento evidencia que as habilidades cognitivas em crianças jovens (até 10 anos) são tais que elas podem acessar uma quantidade limitada de informações em sua memória. Elas podem também acessar e comparar um pequeno número de alternativas que se diferem mercadologicamente uma da outra (ROEDDER et al., 1983).
As crianças e o processo de compra
E é justamente quando eles estão assistindo televisão juntos que as crianças se interessam mais por produtos, de acordo com 83% dos pais ouvidos. Na maioria das vezes, os pais pedem a opinião dos filhos sobre produtos a serem comprados, principalmente dos filhos mais velhos (74%). A influência das crianças às vésperas da compra é ainda maior: 97% dos pais conversam com seus filhos antes de sair às compras, sendo que 91% declararam que são eles mesmos que iniciam o diálogo. Segundo estudo online realizado pelo Ipsos Media CT e comissionado pelo Facebook, chamado ‘MeettheParents’, as crianças têm exercido grande influência nas decisões de compra da casa, e 59% dos pais afirmam que seus filhos têm mais impacto nas decisões de compra do que eles tinham durante o seu crescimento, com suas famílias. As mães da geração millennials, por exemplo, usam seus telefones móveis para tomar decisões de compras com base em informações. As redes sociais criam um contexto diferente para essa troca e consumo de conteúdo. Ainda segundo esses dados, existe uma influência forte dos filhos para grande parte das famílias na hora de decidir sobre viagens (65%), cosméticos e higiene pessoal (73%), refeições (70%), investimentos e serviços financeiros (70%) e dispositivos eletrônicos (88%) que se compram. Ou seja, a maior parte dos setores da indústria, comércio e serviços é afetada pelo fato de as pessoas terem ou não filhos e a idade em que esses filhos se encontram. Além disso, as crianças preferem compras online, já que 81% dos pais entrevistados afirmam que seus filhos os influenciam a consumir no e-commerce.
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Estudo realizado pela Viacom Networks Brasil, intitulado “O Poder da influência da criança nas decisões de compra da família” (MURAD, 2011), apresentou dados que mostram o quanto os filhos estão fazendo parte das decisões de consumo da casa. Para 51% dos pais, a decisão final é tomada por eles mesmos, mas sempre ouvindo a opinião dos filhos, enquanto 49% afirmam que decidem juntos com as crianças. Mesmo quando o produto é para os pais, a opinião dos filhos é levada a sério. Na categoria automóvel, por exemplo, 60% dos pais dizem que foram influenciados pelos filhos.
A influência da comunicação digital no comportamento de compra das crianças Voigt (2007, p. 75) aponta que a “proliferação da Internet e sua ampla utilização em meios profissionais, educacionais e familiares expõe a criança ao uso diário da tecnologia”. As crianças deixaram de ser apenas alvos da publicidade passiva, consumindo as informações, e passaram a fazer parte de uma comunicação corporativa, definida pelo Instituto Alana como toda e qualquer atividade de comunicação comercial para a divulgação de produtos e serviços independentemente de suporte, mídia ou meio utilizado. Assim, ela abrange publicidade, anúncios impressos, comerciais televisivos, spots de rádio, banners e sites na Internet, embalagens, promoções, merchandising, assim como a disposição e a exposição dos produtos nos pontos de vendas (INSTITUTO ALANA, 2011).
É impossível falar de crianças na internet sem falar do poder do Youtube. Segundo a pesquisa “Geração YouTube”, conduzida pela publicitária Luciana Corrêa, no ESPM Media Lab, em 2015, as visualizações de crianças até 12 anos na plataforma totalizavam 26 bilhões. Esse número saltou para 117 bilhões em 2017. Dos cem canais brasileiros com mais visualizações, 52 são produzidos para crianças até essa idade; na mesma data, seis dos dez mais populares eram focados nessa faixa etária. É muito comum, por exemplo, que empresas enviem Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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seus produtos aos youtubers – muitos deles, crianças – a fim de que divulguem os itens recebidos em seus canais, gerando publicidade a outras crianças. Os quinhentos vídeos mais vistos pelo mesmo público ultrapassam 117 bilhões de visualizações. Os dados desse relatório também apontam que as crianças brasileiras estão entre as que mais assistem vídeos na internet e que conteúdos como o unboxing (em que o produto é desembalado e apresentado em frente às câmeras) cresceram 300% no último ano. A internet tem sido o alvo preferencial da publicidade que se dirige à criança, e lá a distinção entre entretenimento e publicidade fica ainda mais nebulosa. Os youtubers mirins, crianças que têm canais no Youtube e uma legião de fãs, ganharam fama entre o público infantil e também “presentes” das marcas. Uma das táticas adotadas pelas empresas foi o envio de produtos para blogueiros, vlogers e youtubers mirins antes do lançamento para que essas crianças os promovessem nas suas redes sociais (INSTITUO ALANA, 2011).
Assim, podemos compreender que as crianças não são apenas receptoras e espectadoras de conteúdo, mas também assumem a condição de sujeitos ativos, como produtoras de material audiovisual.
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METODOLOGIA O objetivo deste estudo foi analisar o comportamento de consumo das famílias que tenham filhos com idade entre 3 e 10 anos. A coleta de dados foi feita com pesquisa quantitativa, estilo survey, com escala de 7 pontos e análise comparativa de dois grupos: pais da geração X (38 a 58 anos) e pais da geração Y (24 a 37 anos). As hipóteses são: 2 H1 – os pais da geração Y são mais permissivos na educação dos seus filhos do que os pais da geração X. 2 H1a – os pais da geração Y são mais permissivos com seus filhos com relação ao uso da internet. 2 H1b – os pais da geração Y são mais permissivos com seus filhos em relação à decisão de compra dos próprios filhos. 2 H1c – os pais da geração Y aceitam mais a opinião dos filhos em relação à escolha de produtos e marcas.
ANÁLISE DE DADOS A coleta foi realizada por meio de pesquisa online. Foram obtidas 357 respostas, sendo 274 respostas válidas. Na amostragem obtida, 78,46% correspondem ao grupo da geração Y e 21,54% da geração X; 0,4% possuem ensino fundamental, 9,8% ensino médio, 12,8% superior incompleto, 33,2% superior completo, 6,2% pós-graduação incompleta e 37,6% pós-graduação completa; 59,1% ganham acima de 5 salários-mínimos. Com base nos dados (tabela 1), é possível apontar que tanto os filhos dos pais da geração X (M=5,12; DP=1,69) quanto os filhos dos pais da geração Y (M=5,34; DP=1,76) possuem acesso à internet. O teste de Kruskall-Wallis (p=0,31) aponta não haver diferença estatística na comparação entre as médias, indicando que tanto a geração X quanto a Y apresentam o mesmo comportamento em relação ao acesso da internet dos seus filhos. A pesquisa mostra que a média dos pais que acompanham os conteúdos que os filhos consomem na internet é alta (geração Y: M=6,56; DP=1,06 e geração X: M=6,32; DP=1,25). Nesse item consideramos que há diferença estatística em relação à comparação (p=0,05), o que confirma que as duas gerações de pais se preocupam e são atentas com a rotina de uso da internet de seus filhos. Em relação ao acesso às redes sociais, os pais da geração X (M=2,47; DP=2,15) são mais permissivos que os pais da geração Y (M=1,63; DP=1,56). Comparando as médias, temos diferença estatística (p=0), dando importância à diferença dos valores analisados. 72
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos
As duas gerações apresentam o mesmo comportamento em relação ao acesso dos filhos ao Youtube (geração X: M=5,21; DP=1,95 e geração Y: M=5,17; DP=1,73). O teste de Kruskall-Wallis (p=0,56) aponta não haver diferença estatística. Ainda sobre o Youtube, tanto os pais da geração X (M=4,08; DP=2,22) quanto os pais da geração Y (M=4,32; DP=2,15) percebem o interesse dos filhos em relação aos produtos que os youtubers apresentam nos seus vídeos (p=0,66). Sobre assistir um tipo específico de vídeo, os dados apontam que a média dos filhos da geração Y (M=4,51; DP=2,03) é maior do que a dos filhos da geração X (M=3,96; DP=2,21) em relação aos vídeos estilo unboxing (pessoas abrindo brinquedos). Analisando com o teste Kruskall-Wallis, não existe diferença estatística (p=0,20). Os filhos dos pais da geração X (M=3,53; DP=2,31) têm mais acesso a jogos online se comparados aos filhos dos pais da geração Y (M=2,12; DP=2,01). A diferença estatística é comprovada (p=0), logo, podemos concluir que os pais da geração X são mais permissivos nesse quesito. Os dados obtidos na pesquisa sobre vídeos de demonstração de games apontam que a média dos filhos dos pais da geração X (M=3,30; DP=2,42) é maior que a dos filhos da geração Y (M=2,74; DP= 2,24), não existindo diferença estatística (p=0,24).
GY Média Meu filho tem acesso à internet 5,12 Acompanho os conteúdos que meu filho consome na internet 6,56 Meu filho tem acesso a redes sociais 1,63 Meu filho tem acesso ao Youtube 5,17 Meu filho demonstra interesse pelos produtos que os youtu4,32 bers mostram nos vídeos Meu filho assiste vídeos de outras pessoas abrindo brinquedos 4,51 Meu filho tem acesso a jogos online 2,12 Meu filho assiste vídeos de demonstração de games 2,74
DP 1,69 1,06 1,56 1,73
GX Média 5,34 6,32 2,47 5,21
DP 1,76 1,25 2,15 1,95
KW p= 0,32 0,05 0,00 0,56
2,15
4,08
2,22
0,66
2,03 2,01 2,24
3,96 3,53 3,30
2,21 2,31 2,42
0,20 0,00 0,24
Fonte: elaborada pelos autores.
Sobre o processo de decisão de compras da família (tabela 2), os dados apontam que tanto os pais da geração Y (M=4,69; DP= 1,56) quando os pais da geração X (M=4,41; DP=1,40) aceitam a opinião dos filhos quando o produto é destinado a eles mesmos. O teste de Kruskall-Wallis (p=0,33) afirma que não há diferença estatística. Já em relação à aceitação da opinião dos filhos na compra de produtos para a família a média é menor; o comportamento de ambos os grupos é muito parecido (geração Y: M=3,43; DP=1,64 e geração X: M=3,30; DP=1,52) e também não é comprovada a diferença estatística (p=0,62).
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Tabela 1 – Rotina de uso da internet da criança
Segundo os dados, quando vão às compras, o comportamento dos pais das duas gerações é similar em relação à influência dos filhos na escolha do modelo do produto (geração Y: M=3,66; DP=1,55 e geração X: M=3,17; DP=1,41; p=0,11), da marca (geração Y: M=2,47; DP=1,62 e geração X: M=2,37; DP=1,40; p=0,90), da cor (geração Y: M=3,66; DP=1,50 e geração X: M=3,20; DP=1,41; p=0,11) e da loja (geração Y: M=1,86; DP=1,38 e geração X: M=2,00; DP=1,45; p=0,20). Referente à opinião dos filhos na compra de brinquedos, os dados apontam que o comportamento é bem semelhante – os filhos da geração Y (M=4,87; DP=1,52) e os filhos da geração X (M=4,76; DP=1,46) opinam na hora da compra. Não foi constatada diferença estatística (p=0,81). Nesse tipo de produto, os dados sobre a aceitação dos pais trazem médias muito próximas da opinião feita pelos filhos (geração Y: M=4,76; DP=1,45 e geração X: M=4,74; DP= 1,30; p=0,43). Na compra de alimentos, os dados demonstram que não há diferença em relação à opinião dos filhos da geração Y (M=3,49; DP=1,51) e da geração X (M=3,72; DP=1,32), sem diferença estatística segundo o teste Kruskall-Wallis (p=0,48). Os valores da aceitação dos pais na hora da compra são proporcionais aos valores dos Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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que aceitam essa opinião, tanto na geração Y (M=3,90; DP=1,52) quanto na geração X (M=4,04; DP=1,11), considerando que não há diferença estatística (p=0,22). Na pesquisa, os dados sobre a opinião dos filhos dos pais da geração Y (M=1,59; DP=1,17) e dos pais da geração X (M=1,74; DP=1,29) apontam que na compra de vestuário para os pais o comportamento dos filhos não varia muito. A diferença estatística não existe (p=0,13). A aceitação da opinião dos filhos para roupas dos pais também é muito parecida – tanto os pais da geração X (M=1,70; DP=1,22) quanto os pais da geração Y (M=1,79; DP=1,34) aceitam na mesma média, sem diferença estatística (p=0,84).
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Quando a compra do vestuário é destinada aos próprios filhos, a diferença entre os valores sobre a opinião dos filhos da geração Y (M=3,87; DP=1,70) e da geração X (M=3,81; DP=1,57) demonstra que o comportamento é o mesmo. O teste Kruskall-Wallis afirma que não há diferença estatística considerável (p=0,94). A aceitação dos pais da opinião dos filhos para o vestuário sugere também que a dinâmica na decisão é a mesma tanto nas famílias cujos pais são da geração Y (M=4,10; DP=1,62) quanto da geração X (M=4,20; DP=1,37), sem diferença estatística (p=0,26). Para a escolha de equipamentos eletrônicos, os dados da pesquisa apontam que os filhos das duas gerações têm o mesmo comportamento (geração Y: M=1,71; DP=1,40 e geração X: M=1,96; DP=1,49; p=0,08). A aceitação da opinião dos filhos nesse tipo de produto é também equilibrada (geração Y; M=1,89; DP=1,45 e geração X: 1,94 ; DP=1,29; p=0,24). Na decisão de compra de jogos, os filhos de pais da geração X (M=3,28; DP=2,25) opinam mais que os da geração Y (M=2,46; DP=2,01), e o teste Kruskall-Wallis confirma essa diferença (p=0,01). Sobre a aceitação da opinião dos filhos para realização da compra, temos médias que acompanham os dados sobre qual filiação opina mais, sendo geração X: M=3,07; DP=1,98 e geração Y: M=2,51; DP=1,90, e o teste de diferença estatística (p=0,03) afirma essa diferença no comportamento. Em relação à compra de veículos, ambos apresentam dados com valores muito próximos – os filhos de pais da geração X (M=1,41, DP=0,94) e da geração Y (M=1,36; DP=1,017) têm médias baixas na escala. O teste Kruskall-Wallis (p=0,19) não aponta diferença estatística. A aceitação da opinião dos filhos nessa compra também traz dados que os colocam no mesmo tipo de comportamento (geração Y: M=1,42; DP=1,18 e geração X: 1,39; DP=0,92; p=0,50). Por último, sobre a compra de produtos de higiene e limpeza, os filhos têm pouco envolvimento nessa decisão (geração X: M=1,85; DP=1,30 e geração Y: M=1,98; DP=1,56; p=0,74). A aceitação da opinião na escolha desse segmento também é aproximada nas famílias da geração X (M=1,98, DP=1,40) e da geração Y (M=2,21; DP=1,71), com teste Kruskall-Wallis valor p=0,64. Tabela 2 – Processo de decisão de compra da família
GY
GX
KW
Média
DP
Média
DP
p=
Aceito a opinião do meu filho nas decisões de compra quando o produto é destinado a ele mesmo
4,69
1,56
4,41
1,40
0,33
Aceito a opinião do meu filho nas decisões de compra quando o produto é destinado à família
3,53
1,64
3,30
1,52
0,62
Quando vou às compras, a opinião do meu filho influencia a escolha do modelo do produto
3,66
1,55
3,17
1,41
0,11
Quando vou às compras, a opinião do meu filho influencia a escolha da marca do produto
2,47
1,62
2,37
1,40
0,90
Quando vou às compras, a opinião do meu filho influencia a escolha da cor do produto
3,66
1,50
3,20
1,41
0,11
Quando vou às compras, a opinião do meu filho influencia a escolha da loja
1,86
1,38
2,00
1,45
0,20
74
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos
GX
KW
Média
DP
Média
DP
p=
Meu filho opina na compra de brinquedos
4,87
1,52
4,76
1,46
0,81
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de brinquedos
4,73
1,45
4,74
1,30
0,43
Meu filho opina na compra de alimentos
3,49
1,51
3,72
1,32
0,48
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de alimentos
3,90
1,52
4,04
1,11
0,22
Meu filho opina na compra de vestuário dos pais
1,59
1,17
1,74
1,29
0,13
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de vestuário dos pais
1,79
1,34
1,70
1,22
0,84
Meu filho opina na compra do seu próprio vestuário
3,87
1,70
3,81
1,57
0,94
Eu aceito a opinião do meu filho na compra do seu próprio vestuário
4,10
1,62
4,20
1,37
0,26
Meu filho opina na compra de equipamentos eletrônicos
1,71
1,40
1,96
1,49
0,08
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de equipamentos eletrônicos
1,89
1,45
1,94
1,29
0,24
Meu filho opina na compra de jogos
2,46
2,01
3,28
2,25
0,01
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de jogos
2,51
1,90
3,07
1,98
0,03
Meu filho opina na compra de veículos
1,36
1,07
1,41
0,94
0,19
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de veículos
1,42
1,18
1,39
0,92
0,50
Meu filho opina na compra de produtos de higiene e limpeza
1,98
1,56
1,85
1,30
0,74
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de produtos de higiene e limpeza
2,21
1,71
1,98
1,40
0,64
Eu aceito a opinião do meu filho na compra de vestuário dos pais
1,79
1,34
1,70
1,22
0,84
Fonte: elaborada pelos autores.
A pesquisa buscou também avaliar a rotina de compra da família (tabela 3). Quando os filhos pedem que os pais comprem algo, o comportamento dos pais da geração X (M=3,88; DP=0,67) e dos pais da geração Y (M=3,96; DP=0,68) é o mesmo (p=0,20). A média dos pais da geração X (M=3,34; DP=0,67) e dos pais da geração Y (M=3,78; DP=1,44) que compram os produtos das marcas preferidas dos filhos demonstra que ambos atendem de maneira parecida às preferências dos filhos, tendo diferença estatística comprovada pelo teste Kruskall-Wallis (p=0,03).
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Quando dizem não, os dados apontam que os filhos aceitam a negativa da compra dos produtos da mesma maneira nos dois formatos de família (geração Y: M=5,22; DP=1,56 e geração X: M=5,10; DP=1,64), sem diferença estatística (p=0,73). O estudo aponta que os pais da geração X (M=3,91; DP=1,35) e da geração Y (M=4,30; DP=1,56) compram produtos que não tiveram na infância para os seus filhos na mesma proporção, tendo diferença significativa (p=0,004) comprovada. Sobre as influências que os filhos das duas gerações recebem, temos os seguintes valores: televisão (geração Y: M=4,23; DP= 1,82 e geração X: M= 3,67; DP=1,58; p=0,03), internet (geração Y: M=4,24; DP= 1,87 e geração X: M= 3,93; DP=1,61; p=0,17), e amigos (geração Y: M=4,07; DP= 1,81 e geração X: M= 3,93; DP=1,37; p=0,44), apontando que não há muita diferença entre elas. O filho associa consumo com diversão da mesma maneira, tanto os de pais da geração X (M=3,90; DP=1,75) quanto da geração Y (M=3,57; DP=1,90), sem diferença estatística (p=0,30). Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Quando crianças, os pais das duas gerações não opinavam muito nas decisões de compra da família. Os dados obtidos enfatizam que a geração X (M=1,97; DP=1,29) tinha o mesmo poder de opinião que a geração Y (M=2,30; DP=1,53), sem diferença estatística (p=0,20). Tabela 3 – Rotina de compra da família
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GY
GX
KW
Média
DP
Média
DP
p=
Quando meu filho pede que eu compre algo, eu atendo seu pedido
3,96
0,68
3,88
0,67
0,20
Compro os produtos das marcas preferidas do meu filho
3,78
1,44
3,34
1,37
0,03
Quando digo não, meu filho aceita a negativa de compra do produto
5,22
1,56
5,10
1,64
0,73
Compro produtos que não tive na infância para o meu filho
4,30
1,56
3,91
1,35
0,04
A televisão influencia o desejo do meu filho por determinado produto
4,23
1,82
3,67
1,58
0,03
A internet influencia o desejo do meu filho por determinado produto
4,24
1,87
3,93
1,61
0,17
Os amigos influenciam o desejo do meu filho por determinado produto
4,07
1,81
3,93
1,37
0,44
Meu filho é estimulado a querer coisas que não precisa
3,75
1,96
3,72
1,86
0,94
Meu filho associa consumo com diversão
3,57
1,90
3,90
1,75
0,30
Quando criança eu opinava nas decisões de compra da família
2,30
1,53
1,97
1,29
0,20
Fonte: elaborada pelos autores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS O comportamento das duas famílias, com pais da geração X e Y de filhos com idade entre 3 e 10, são semelhantes. Percebemos diferença no que diz respeito ao acesso a redes sociais, que é maior para os pais mais velhos, e também na compra e acesso a jogos – esse mesmo grupo de pais demonstra ser mais permissivo no processo de decisão de compra. A parte da pesquisa sobre a rotina de uso da internet das crianças obteve valores acima da média na escala e demonstra que, nessa faixa etária, os filhos têm acesso a internet, e os pais acompanham o conteúdo. Também notamos que o Youtube é um canal muito utilizado para entretenimento, pois, dos que assistem aos canais, a grande maioria demonstra interesse pelos produtos que os youtubers apresentam, e também pelos vídeos de outras pessoas que abrem brinquedos durante a gravação (unboxing). Nas compras feitas em família, a opinião dos filhos influencia na escolha do modelo e da cor; já a decisão de marca e loja ficam a critério dos pais. No processo de decisão, os filhos dão mais opinião quando o produto é destinado a ele mesmo, como na compra de vestuário e brinquedos, sendo ouvidos pelos pais. Quando se trata de alimentos, as crianças demonstram interesse acima de média e também têm a aceitação dos pais. As duas gerações de pais afirmam que os filhos aceitam o ‘não’ como resposta quando pedem algo durante as compras. Os dois grupos notam a influência da internet, da televisão e de amigos nos pedidos das crianças.
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Comportamento de consumo: geração X e Y em relação aos filhos
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Jogos e brincadeiras de acordo com a Base Nacional Comum Curricular para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças da educação infantil Games and playing according to the Common National Curricular Base for learning and development of kids in childhood education SILVA, Elizane A. da35
RESUMO Este trabalho visa apresentar a importância dos jogos e brincadeiras no currículo da Educação Infantil, de forma a garantir o aprendizado e o desenvolvimento físico e psicológico das crianças de zero a cinco anos e 11 meses de idade, de acordo com os seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento estabelecidos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A BNCC define seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento na Educação Infantil: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se. Desta forma, serão apresentadas as formas com que jogos e brincadeiras podem ser realizados, a fim de garantir os direitos da aprendizagem e o desenvolvimento das crianças da Educação Infantil previstos na BNCC, bem como as formas de incorporação na prática docente e o papel do educador frente a este contexto. Palavras-chave: Jogos. Brincadeiras. BNCC. Aprendizagem. Educação Infantil.
ABSTRACT This work aims to show the importance of games and playing in the curriculum of Early Childhood Education, in order to guarantee the learning and physical and psychological development of children from zero to five years and 11 months old, according to the six learning rights and development, established by the National Common Curricular Base - BNCC. The National Common Curricular Base - BNCC, defines six rights of learning and development in Early Childhood Education, they are: Living, Playing, Participating, Exploring, Expressing, Knowing Yourself. In this way, it is presented in this article the ways in which games and playing can be adopted, in order to guarantee the rights of learning and development of children in Early Childhood Education, foreseen in the BNCC, as well as the forms of incorporation in practice in the teaching routine and the role of the educator in this context. Keywords: Games. Playing. BNCC. Learning. Early Childhood Education.
INTRODUÇÃO Os jogos e brincadeiras fazem parte do cotidiano de todas as crianças, e é por meio do lúdico que elas se relacionam com o mundo e com as pessoas que estão à sua volta e desenvolvem suas habilidades cognitivas, sensoriais e motoras. Destaca-se que, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) tratam sobre as interações, experiências e brincadeiras importantes e necessárias para a construção do conhecimento e do desenvolvimento da Educação Infantil; e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) tem em suas premissas a educação infantil 35 Mestre
em Formação Docente e Novas Tecnologias; Graduada em Pedagogia. Atualmente é professora na Faculdade Educacional da Lapa – FAEL. E-mail: elyzandrade33@gmail.com
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– obrigatória para crianças entre 4 e 5 anos e 11 meses. Diante deste contexto, o trabalho do educador com jogos e brincadeiras poderá tornar o aprendizado e o desenvolvimento das crianças cada vez mais significativo e inspirador. Por meio dos jogos e das brincadeiras, a criança poderá demonstrar seu conhecimento de mundo e desenvolver seu aprendizado, de acordo com o contexto ao qual está inserida. No brincar e jogar, as crianças aprimoram seus movimentos, fazem associações, estimulam o desenvolvimento cognitivo, melhoram a linguagem e a compreensão de mundo. A partir dos princípios apresentados nas legislações, pode-se considerar que, por meio do brincar, também é possível educar. A BNCC (2017) define seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento, essenciais para garantir o respeito ao modo como as crianças aprendem e se desenvolvem, São eles: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se. Considera-se desta forma que, por meio de jogos e brincadeiras, é possível garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças da Educação Infantil.
DESENVOLVIMENTO De acordo com a BNCC (2017), “a entrada na creche ou na pré-escola significa, na maioria das vezes, a primeira separação das crianças dos seus vínculos afetivos familiares para se incorporarem a uma situação de socialização estruturada”. Desta forma, compreende-se que, por meio de jogos e brincadeiras, a adaptação dos pequenos seja mais leve e rápida. Outro fator relevante é que os jogos e as brincadeiras fazem parte do cotidiano de todas as crianças, e se fazem presentes em todos os momentos. Para melhor compreender de que forma os jogos e as brincadeiras surgiram, faz-se necessário realizar uma abordagem histórica sobre eles. Ainda de acordo com a BNCC (BRASIL, 2017), as crianças são sujeitos ativos, que constroem seus saberes interagindo com as pessoas e culturas do seu tempo histórico. Nessas relações, elas exercem seu protagonismo e, assim, desenvolvem sua autonomia - fundamentos importantes para um trabalho pedagógico que respeita suas potências e singularidades. Nas interações com culturas e saberes, elas constroem suas identidades, suas preferências e seus modos de ver o mundo.
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Nesse sentido, é importante que professores que atuam na Educação Infantil busquem metodologias de ensino e aprendizagem prazerosas, para que o desenvolvimento da criança aconteça de forma integral, lúdica e significativa. Para tanto, faz-se necessário aprofundar os estudos acerca dos jogos e brincadeiras adequados a cada faixa etária das crianças da educação infantil, a forma como os professores podem incorporá-los como prática e o papel dos professores diante deste contexto.
Os jogos e as brincadeiras são universais e fazem parte da vida de todas as crianças, desde os tempos mais remotos. Os jogos e as brincadeiras de outros tempos ainda estão presentes no cotidiano das crianças, no espaço cultural em que estão inseridas. Apresentam-se talvez em formas diferentes, visto que com as mudanças e avanços ao longo dos anos tem-se espaços geográficos e culturais inerentes ao desenvolvimento das crianças. Os jogos e as brincadeiras são universais e fazem parte da história e da cultura de um povo. Jogos de demolir e construir, rolar aros, cirandas, pular obstáculos, são exemplos de brincadeiras existentes desde a antiguidade (FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO, 1992). Considera-se ainda que, de acordo com a BNCC (BRASIL, 2017), são os eixos de sustentação de toda a prática pedagógica: As interações com pessoas (seus pares e com os adultos) e objetos em diferentes contextos e situações, que favorecem a ampliação do repertório cultural das crianças, potencializando as aprendizagens e o desenvolvimento e, as brincadeiras, pois é brincando que as crianças representam o mundo e simulam as relações existentes imitando, repetindo, transformando e ampliando suas experiências.
Desta forma, a adoção de jogos e brincadeiras poderá auxiliar nos eixos de sustentação previstos na BNCC, pois permite a interação entre as crianças e adultos, bem como crianças e crianças, favorecendo a ampliação do repertório cultural das crianças, bem como auxiliando na potencialização de sua aprendizagem e desenvolvimento. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Segundo Wajskop (2007, p. 231): a brincadeira, desde a antiguidade, era utilizada como um instrumento para o ensino, contudo, somente depois que se rompeu o pensamento românico passou-se a valorizar a importância do brincar, pois antes, a sociedade via a brincadeira como uma negação ao trabalho e como sinônimo de irreverência e até desinteresse pelo que é sério.
Percebe-se que as brincadeiras, desde os tempos passados, eram vistas como forma de aprendizagem dos educandos; contudo, com o passar dos anos, elas tomam corpo e ganham espaço nos ambientes educacionais, tornando-se parte do processo de aprendizagem de forma prazerosa e divertida. Neste período, as principais brincadeiras eram: piões, cavalinhos de pau, bola etc. (KISHIMOTO, 1990).
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A partir desse período, inúmeros pesquisadores e estudiosos começaram a pesquisar e desenvolver propostas pedagógicas com jogos e brincadeiras. Dentre eles, pode-se citar Decroly, que desenvolveu materiais pedagógicos próprios para crianças com problemas de aprendizagem, tendo como objetivo o desenvolvimento do raciocínio, da motricidade e da percepção. Outro estudioso que pode ser citado como pioneiro na aplicabilidade de jogos e brincadeiras como forma de aprendizagem foi Froebel, que defendia a educação fundamentada nos jogos e nas brincadeiras. Ainda, pode-se citar uma das pesquisadoras mais importantes para a história da educação: Maria Montessori, que elaborou uma metodologia voltada à implementação de uma educação sensorial. No século XX, outros pesquisadores começam a discutir sobre os jogos e as brincadeiras, entre eles Piaget (1978), afirmando que a partir da brincadeira a criança pode demonstrar o nível cognitivo que se encontra, além de permitir a construção de conhecimentos; e Vygotsky, que compreendeu a brincadeira (como qualquer outro comportamento humano) como resultado de influências sociais que a criança recebe ao longo do tempo. De acordo com Vigotski (1984), o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança, e por meio dele ela obtém suas maiores aquisições. Com isso, pode-se dizer que as crianças, ao mesmo tempo em que brincam, conseguem adquirir novos conhecimentos, realizar novas descobertas e desenvolver-se de forma mais dinâmica, prazerosa e divertida. Os jogos e as brincadeiras evoluíram de forma que acompanham o desenvolvimento cognitivo, emocional e físico das crianças. Para Goldfeld (2004), fonoaudióloga e doutora em distúrbios da comunicação humana, a evolução dos jogos e brincadeiras segue uma cronologia que inicia com brincadeiras motoras e de construção, as quais seguem a motivação de estímulos externos. Nesse sentido, o professor deve ser um conhecedor de como se inicia o processo de ensino e aprendizagem das crianças por meio dos jogos e das brincadeiras; para tanto, precisa compreender as fases de desenvolvimento da criança e os jogos que realmente irão contribuir para que a aprendizagem se torne realmente significativa às crianças de zero a cinco anos e onze meses de idade. Destaca-se que, para o desenvolvimento deste trabalho, foram realizadas pesquisas bibliográficas acerca do desenvolvimento da criança de zero a cinco anos e onze meses de idade; o papel do professor diante desse contexto; e os jogos e as brincadeiras adequadas a cada faixa etária foco deste estudo.
RESULTADOS DA PESQUISA Para o desenvolvimento do referido trabalho, foram realizadas pesquisas bibliográficas acerca do desenvolvimento da criança de zero a cinco anos e onze meses de idade, as determinações da BNCC para este público, os benefícios dos jogos e das brincadeiras adequadas a cada faixa etária estudada, bem como o papel do professor diante desse contexto. Destaca-se que a BNCC estabelece campos de experiência a serem trabalhados pelos educadores na Educação Infantil, os quais foram pensados para assegurar os direitos das crianças, garantindo o seu desenvolvimento cognitivo. Esses princípios prezam pela interação entre o sujeito e o mundo, fortalecendo ainda mais o papel do educador, que é o de fazer com que as crianças enxerguem novas formas de ver as coisas ao seu redor. 80
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Vale destacar que é essencial que o educador reconheça cada um desses campos apresentados pela BNCC, de forma a trabalhar com cada um deles de maneira particular, em que as crianças precisam ser subdivididas de acordo com a sua idade. O primeiro campo de experiência citado na BNCC como “O eu, o outro e o nós”, tem como objetivo iniciar na criança a busca por sua identidade, ou seja, o educador precisa trabalhar com as temáticas de: “quem sou eu”, “quem é o outro” e “o que nós somos juntos”.
No campo de experiência tratado na BNCC como “Corpo, gestos e movimentos”, a criança precisa desenvolver a sua percepção com relação ao próprio corpo e suas possibilidades, bem como reconhecer a importância de gestos e movimentos, para se ter uma vida mais saudável. Neste campo de experiência, várias são as possibilidades de trabalhar com a orientação espacial do aluno, em que ele aprenderá os limites de espaço. Este campo pode ser trabalhado por meio de brincadeiras dinâmicas, músicas, danças, cantigas de roda, entre outras atividades que exigem movimento e interação com o outro. Por meio desses campos de experiência estabelecidos pela BNCC, o educador tem a possibilidade de trabalhar de forma lúdica. Para Santos (1999, p. 49), a ludicidade é uma experiência vivenciada que nos dá prazer ao executá-la. Por meio da ludicidade a criança se relaciona com o outro e aprende a ganhar e perder, a respeitar a ordem na fila, a aceitar as frustrações, e a expressar as suas emoções. Qualquer atividade que cause uma experiência positiva, divertida e prazerosa pode-se chamar de lúdica. Percebemos a importância de oportunizar ao educando momentos de prazer e de experiências lúdicas, experiências que são capazes de contribuir para o convívio social na escola e na sociedade.
Desta forma, brincar e jogar fazem parte das crianças da Educação Infantil, facilitando a compreensão do mundo em que estão inseridas. Outro campo destacado pela BNCC é o campo de experiência “Traços, sons, cores e formas”. Aqui, o educador tem o papel de estimular as crianças a produzirem, a usarem a criatividade, a participarem de manifestações artísticas, em que a música, a dança, a pintura, a fotografia, os jogos e as brincadeiras são metodologias que estimulam o desenvolvimento do senso crítico e estético delas. Desta forma, os educadores têm a possibilidade de desenvolver muitas atividades lúdicas, para atender a determinação da BNCC, que é a de trabalhar com o campo de experiência, chamado de “Traços, sons, cores e formas”.
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De acordo com a BNCC (BRASIL, 2017): “Ao mesmo tempo em que participam das relações sociais e dos cuidados pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso de autocuidado”. Assim, o educador assume o papel de estimulador do desenvolvimento das crianças, especialmente com relação ao convívio social, na descoberta de sua identidade. O educador precisa atentar-se para o convívio das crianças em sala, orientando e desenvolvendo atividades que estimulem o respeito pelas diferenças e pela diversidade, evitando assim o preconceito e a discriminação entre elas. No campo de experiência “O eu, o outro e o nós”, é importante também que, o educador promova o autoconhecimento, de forma a estimular autocuidado, como por exemplo os hábitos de cuidado com a higiene pessoal.
Vale destacar que a visão de mundo da criança é diferente da do adulto – ela, ao realizar uma pintura, por exemplo, retrata o seu sentimento, a forma como ela enxerga o mundo. Vale destacar que, de maneira especial, na educação infantil tem-se contatos complexos com diferentes estruturas linguísticas, em que tudo é novidade. Desta forma, a contação de histórias poderá instigar na criança a curiosidade e a necessidade de questionamentos, e ter seus primeiros contatos com a escrita. Embora nesta fase a criança não diferencie a leitura da escrita, ela irá se familiarizar com ela e desenvolver habilidades e competências para a leitura e a escrita futura. Outro desenvolvimento previsto neste campo de experiência é o estímulo à criatividade e o interesse pelo conhecimento; mesmo que por meio de rabiscos e desenhos sem sentido para adultos, a criança busca interagir e colocar em prática o que aprendeu, ou seja, procura colocar em seu “desenho” a história ouvida. Outra etapa importante, estabelecida na BNCC, trata-se dos espaços, tempos, quantidades, relações e transformação estabelecidos pela BNCC – a criança irá aprender a trabalhar com o mundo físico e sociocultural. De acordo com a BNCC, Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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a educação infantil precisa promover interações e brincadeiras nas quais as crianças possam fazer observações, manipular objetos, investigar e explorar seu entorno, levantar hipóteses e consultar fontes de informação para buscar respostas às suas curiosidades e indagações (BRASIL, 2017).
Desta forma, o educador pode, por meio das brincadeiras, estimular e desenvolver na criança todos os campos de experiência estabelecidos pela BNCC, de forma a garantir, conforme estabelecido na BNCC (BRASIL 2017), “os Direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação infantil”. Ou seja, quando o educador tem o objetivo de garantir essa aprendizagem e desenvolvimento nas crianças, ele tem a possibilidade de pensar e criar atividades voltadas a atender esses campos de experiência, de forma a estruturar e oportunizar o aprendizado e a interação dentro da sala. Dentro das garantias estabelecidas pela BNCC para as crianças na Educação Infantil estão: o conviver, o brincar, o participar, o explorar, o expressar e o autoconhecimento. 2 Conviver: neste direito, o objetivo é garantir o conhecimento ao outro, de forma a aprender a relacionar-se, a conviver com as pessoas de forma harmônica, promovendo a interação entre crianças e adultos. Este processo de conviver pode ser trabalhado pelo educador de forma lúdica, por meio de jogos, brincadeiras e atividades práticas, de forma individual e/ou em grupos. Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
2 Brincar: na Educação Infantil, o brincar é um direito estabelecido pela BNCC; desta forma, o educador precisa usar seu conhecimento e criatividade, buscando o desenvolvimento de brincadeiras diversificadas, dinâmicas e interativas. No brincar, o professor pode estabelecer objetivos aliados ao desenvolvimento da criança, de forma a estimular a criatividade, a imaginação e as emoções. 2 Participar: a participação da criança no processo é um direito garantido na BNCC. Portanto, ao planejar suas atividades, o educador precisa pensar em atividades que garantam a participação de todos, mesmo aqueles que possuem dificuldades. Neste caso, o educador precisa adaptar a atividade, de forma a garantir que todos participem. 2 Explorar: a exploração é um direito garantido às crianças na Educação Infantil. Por isso, o educador tem a possibilidade de instigar os pequenos, por meio de atividades lúdicas, a explorarem o mundo, a arte, a tecnologia e a ciência, ou seja, o mundo que os rodeia. 2 Expressar: as crianças precisam aprender a expressar seus sentimentos, suas dúvidas, suas emoções, seus questionamentos, os quais podem ser estimulados por meio de diversas atividades lúdicas, brincadeiras e jogos. 2 Conhecer-se: a criança precisa conhecer-se, aprender a cuidar de si mesma, se gostar, se respeitar. Desta forma, começará a criar sua identidade, tornando-se uma pessoa única dentro da sociedade, aprendendo a conviver e a interagir com diferentes personalidades, expressando-se de forma clara. Desta forma, compreende-se que todos os direitos previstos na BNCC para as crianças da Educação Infantil podem ser trabalhados pelo educador de forma dinâmica, lúdica, prazerosa e significativa.
BENEFÍCIOS DOS JOGOS E BRINCADEIRAS Sabe-se que jogos e brincadeiras são importantes e trazem inúmeros benefícios para o desenvolvimento das crianças da Educação infantil. Neste tópico, trata-se apenas dos considerados mais relevantes para o cumprimento dos objetivos propostos no trabalho. Um dos benefícios dos jogos e brincadeiras é o estímulo ao desenvolvimento cerebral precoce; brincar pode promover o desenvolvimento cerebral da criança de muitas maneiras, incluindo proporcionar experiências de vida cruciais para estabelecer as bases para o crescimento do cérebro. O cérebro infantil está equipado com uma superabundância de conexões de células cerebrais, as chamadas sinapses. A superprodução de sinapses permite que a informação capturada desde os primeiros anos de vida construa uma base para o cérebro. 82
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Um ambiente enriquecido com materiais lúdicos proporciona experiências de vida perfeitas para construir uma boa base para o desenvolvimento da criança. Se essas experiências estiverem ausentes, as sinapses relacionadas serão perdidas. Os neurocientistas descobriram que o enriquecimento com brinquedos, jogos e brincadeiras pode alterar a química e a fisiologia do cérebro. A área cerebral associada ao maior processamento cognitivo (o córtex cerebral) pode se beneficiar do enriquecimento ambiental e do brincar mais do que outras partes do cérebro. Outro benefício é a melhoria da inteligência, pois o jogo precoce está associado à inteligência superior mais tarde na vida. Um estudo da Universidade do Arkansas mostra que a oferta regular de brinquedos a crianças para brincar leva a um QI mais elevado aos três anos de idade. Mais tarde, o psicólogo Edward Fisher analisou 46 estudos feitos sobre brincadeiras. Ele descobriu que brincar pode melhorar o desenvolvimento cognitivo, linguístico e social de uma criança.
A imaginação alimenta a criatividade, e alguns estudos também descobriram que adolescentes criativos tendem a ter amigos imaginários na infância. Os jogos e as brincadeiras também visam melhorar a comunicação, o vocabulário e a linguagem, pois a ligação entre o jogo precoce e as capacidades de comunicação posteriores também são perceptíveis nas pesquisas bibliográficas realizadas. A brincadeira é especialmente benéfica, porque permite que crianças pequenas pratiquem seu vocabulário quando falam e tentam entender os outros. Durante as brincadeiras sociais, elas frequentemente retribuem as palavras e ações umas das outras para chegar a acordos. Outro benefício importante dos jogos e das brincadeiras é a promoção do controle de impulsos e o equilíbrio emocional. O equilíbrio emocional é uma das habilidades mais essenciais para a prontidão escolar. Crianças bem equilibradas podem esperar por uma mudança, resistir à tentação de pegar objetos de outras crianças, controlar emoções negativas e persistir em atividades desafiadoras. Os jogos e as brincadeiras também aumentam a competência social e a empatia. Desta forma, pode-se dizer que brincar é crucial para melhorar o desenvolvimento social das crianças. Brincadeiras ativas não estruturadas com outros – incluindo pais, irmãos e pares –, são uma oportunidade significativa para cultivar habilidades sociais. Enquanto brincam, o ato de negociar com os colegas aumenta as habilidades sociais das crianças.
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Os jogos e as brincadeiras possibilitam o desenvolvimento do pensamento criativo; talvez o benefício mais óbvio de brincar seja o de que aumenta a criatividade de uma criança. A criatividade está intimamente ligada ao pensamento divergente, que explora muitas soluções possíveis e gera ideias criativas. Muitos estudos têm descoberto que brincar está altamente associado a pensamentos divergentes.
Brincar também oferece oportunidades para as crianças aprenderem a interagir socialmente. Enquanto brincam juntas, as crianças aprendem a cooperar, a seguir regras, a desenvolver o autocontrole e, em geral, a dar-se bem com outras pessoas. As crianças brincalhonas tendem a ser mais felizes, mais ajustadas, mais cooperativas e mais populares entre os seus pares do que as que brincam menos. Desta forma, educadores podem trabalhar com muitas possibilidades de jogos e brincadeiras – autodirigidos; autosselecionados; em aberto; voluntários; agradáveis; flexíveis; motivadores; individuais ou em grupo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme visto no decorrer deste trabalho, os jogos e as brincadeiras são atividades importantes para o desenvolvimento das crianças da Educação Infantil, nas quais elas podem criar, recriar, inventar e manter seu equilíbrio com o mundo externo. Compreende-se que as crianças que brincam mais também desenvolvem mais empatia, outro elemento essencial que faz avançar as habilidades sociais. Essas crianças crescem para ter uma melhor compreensão dos sentimentos e das crenças de outras pessoas. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Outro aspecto relevante a ser considerado é a melhoria da saúde física e mental, pois a brincadeira promove equilíbrio emocional, que é vital para a resiliência e a saúde mental de uma criança. As brincadeiras que envolvem atividades físicas promovem as capacidades motoras, força e resistência, o que beneficia a saúde física. Como já visto, muitos são os direitos de aprendizagem, com diversas utilidades na formação da criança, indo desde o desenvolvimento de autoconhecimento por parte do aluno até a criação de senso crítico e visão de mundo. Para isso, é preciso que a criança receba estímulos de todas as formas, seja para desenvolvimento de uma história fantasiosa, estimulando e desenvolvendo sua criatividade, ou uma pintura que retrate sua realidade, fazendo com que a criança recrie sua visão de mundo em papel e tinta. Diante disso, é necessário garantir a prática de tais direitos estabelecidos pela BNCC dentro das redes de ensino, pois essas formas de aprendizagem visam garantir que o aluno desenvolva o senso crítico e tenha menos preconceito com o diferente, ao interagir socialmente com as demais crianças e pessoas ao seu redor.
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Assim, uma criança que tiver todos os seus direitos garantidos pela BNCC se desenvolverá como um cidadão melhor e mais preparado para o mundo a sua volta. Portanto, deve-se ter como uma das principais obrigações de uma instituição assegurar que a Base Curricular seja aplicada dentro de sua rede de ensino.
REFERÊNCIAS BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/ abase/#infantil. Acesso em: 6 ago. 2020. FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO. Professor da pré-escola. 2. ed. São Paulo: Globo, 1992. KISHIMOTO. O brinquedo na educação: considerações históricas. In: O cotidiano na pré-escola, n. 7. São Paulo: FDE, 1990. PIAGET, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. 3. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978. REVISTA Correio da UNESCO, julho de 1991. “Brincadeiras e jogos” n. 170. p.5, artigo “Um Oásis de felicidade”, de Martine Mauriras-Bouquet/ p.14, Um impulso vital. de Chalva Amonachvili. VYGOTSKI, L.S. A formação social da mente. São Paulo, Martins Fontes, 1984. WAJSKOP, G. O Brincar na Educação Infantil. Cadernos de Pesquisa, v. 92, p. 62-69, 1995.
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O ser humano e as redes sociais – algumas definições Human beings and social networks – some definitions
SANTOS, Rodrigo Otávio dos36; 37
RESUMO O presente artigo visa apresentar algumas definições que parecem ser caras a diversas pesquisas que versam acerca da sociabilidade humana, das redes sociais e das plataformas digitais que delas se utilizam. Para tanto, o artigo se vale basicamente de referências bibliográficas e pesquisa empírica em redes sociais. O principal resultado são as definições de rede social e plataforma de rede social digital. A principal conclusão é a percepção da influência de tais redes e plataformas na contemporaneidade. Palavras-chave: Redes sociais. Plataformas de redes sociais digitais. Ciências Sociais.
ABSTRACT This article aims to present some definitions that seem to be expensive for the various researches that deal with human sociability, social networks and digital platforms that use them. Therefore, the article basically uses bibliographic references and research empirical in social networks. The main result is the definitions of social network and digital social network platform. The main conclusion is the perception of the influence of such networks and platforms in contemporary times. Keywords: Social networks. Social media. Social sciences.
O SER HUMANO COMO ANIMAL SOCIAL A raça humana é uma raça gregária, e o ser humano é um animal social. Ou seja, pessoas desta espécie precisam de outras da mesma espécie para continuarem existindo. Desde a gênese da espécie, há aproximadamente 200 mil anos, na África Ocidental (HARARI, 2015), precisamos de outros como nós para que consigamos fazer o básico, que é sobreviver. Basta dizer que o ser humano é, de todos os mamíferos superiores, o mais frágil. A criança precisa de cuidado, e sem ele fatalmente sucumbirá. Da mesma forma, um indivíduo, mesmo adulto, se estiver sozinho, tem pouca possibilidade de enfrentar todos os desafios naturais e permanecer vivo. O grupo é, portanto, mais importante que o sujeito. Assim, nossa espécie vive em bando. E o bando, desde o início do nosso tempo, garantia nossa sobrevivência, promovendo segurança, alimento e fortalecendo laços sociais, o que mais tarde nos tornaria a espécie dominante no planeta. Afinal, podem existir vários animais dominantes em diversas regiões, mas apenas um consegue estar em todos os continentes e, mais do que isso, alterar o próprio ambiente em que vive de forma permanente. É interessante destacar, porém, que não somos a única espécie que necessita do grupo para sobreviver. Desde as pequeninas formigas em seu quintal até os enormes elefantes que vivem na Índia, inúmeras espécies 36 O presente artigo é um excerto do livro Redes sociais digitais na educação brasileira: seus perigos e suas possibilidades a ser lançado em 2021. 37 Professor titular do Programa de Pós-Graduação em Educação e Novas Tecnologias da UNINTER. Lattes: http://lattes.cnpq.br/0668156094746596. Revista Vivências Educacionais
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necessitam do grupo para sua sobrevivência. Entretanto, apenas a nossa raça é capaz de compreender conscientemente a força do grupo ao qual pertence, e reagir além do instinto. O grego Aristóteles, então, diz que o homem é um animal político, uma vez que é imperfeito e carente, e sem o grupo não consegue atingir a completude (ARISTÓTELES, 2016). Cerca de 1600 anos depois, São Tomás de Aquino, a partir da obra de Aristóteles, pondera que o homem é um animal social, e por isso aparta-se do natural, criando uma série de novas regras forjadas por ele mesmo, diferente dos animais, cujas regras são criadas apenas pelo instinto. Mais do que isso, “o homem é, por natureza, animal social e político, vivendo em multidão” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, p. 4).
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É o bando, o grupo, que sustentou nossa espécie até o presente momento. Sem este construto social, não existiria a estrutura mais importante da raça humana: a cultura. E é ela que faz todo o resto da espécie sobreviver. É na cultura que as regras de convívio estão postas para que todos em determinada comunidade consigam conviver de forma relativamente harmônica. “Cultura”, porém, é um termo muito difícil para se definir. A antropologia se debruça sobre esse tema há anos, e ainda não há uma definição concreta do que seja cultura – e aparentemente nunca haverá. Entretanto, para este artigo, consideraremos a definição comprimida de Clifford Geertz, que diz que o homem é um animal amarrado a teias de significado que ele mesmo teceu, e, portanto, a cultura é cada uma dessas teias e também sua análise (GEERTZ, 2008). Cultura, portanto, são todas as relações entre os seres humanos, tudo o que a raça humana produziu e produz, desde a linguagem até os grandes e emaranhados entroncamentos que nos ligam uns aos outros em um mundo desordenado, no qual buscamos um certo entendimento cultural. Assim, podemos dizer que as culturas são múltiplas, e com diversas camadas superpostas. Um indivíduo pode, ao mesmo tempo, ter a cultura de seu país, da sua profissão e da sua família. Tudo isso sintetizado em uma mesma criatura, que ora responde a uma cultura global, ora a uma cultura local (HALL, 2004). No mundo pós-moderno, ou seja, em um mundo mais fluido (BAUMAN, 2007), altamente conectado pela rede mundial de computadores e cujas ideologias estão mais afastadas da política governamental dos países e seus líderes (CASTELLS, 2018), um sujeito brasileiro pode, ao mesmo tempo, gostar de macarrão, típico da cultura italiana, ler histórias em quadrinhos estilo mangá, típicas da cultura japonesa, dançar samba, típico da cultura brasileira, e usar calças jeans, típicas da cultura norte-americana. Podemos dizer, então, que este animal social possui uma necessidade imperativa de se conectar com outros membros da mesma espécie e que mantenham pelo menos alguns elementos da mesma cultura. Parece haver, inclusive, uma necessidade crescente deste tipo de vínculo. Afinal, quanto mais nos conectamos com o mundo virtual, mais precisamos desta conexão. Assim, forjamos regras e normas de conduta, criamos padrões éticos – formas para que consigamos nos manter unidos, sem muitos conflitos e sem a possibilidade de quebra da sociedade. A necessidade dessas regras é tão antiga quanto a própria noção de sociedade. Herbert Spencer disse que “a sua liberdade termina onde começa a do próximo” no século XIX (MENDONÇA; FIALHO, 2020), mas muito antes disso as regras já estavam postas, por meio de leis, códigos ou mandamentos. Hamurabi, por exemplo, elaborou seu código provavelmente 1776 anos antes de Cristo. E os Dez Mandamentos de Moisés apareceram publicados pela primeira vez por volta de 620 a.C.(HARARI, 2015). As regras e os códigos têm a função de sustentar a sociedade onde se encontram. Sem tais regras, explícitas ou implícitas, a chance de cooperação entre os indivíduos é muito dificultada. O animal social precisa de normas de conduta que, de certa forma, homogeneízem seu comportamento perante os demais membros do grupo. É a partir daí que se iniciam as cooperações. Essas cooperações formam estruturas mais ou menos integradas e que visam promover o bem-estar de todos os membros daquele grupo. Talvez a primeira das estruturas de cooperação é a própria família. Antes um amontoado de pessoas sem laços consanguíneos, uma vez que o próprio termo “família” deriva do latim famulus, que quer dizer o conjunto de dependentes e servos de um senhor (PRADO, 1985), foi se fechando para apenas aqueles que tivessem algum tipo de relação parental. 86
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Outra estrutura muito importante de cooperação é a cidade. Ela é uma criação dessas redes de colaboração entre os homo sapiens. Desde que o ser humano inventou a agricultura, a cidade já despontava como uma forma mais ou menos resiliente de estrutura social (LEWIS MUMFORD, 2008). É nas cidades que a sociabilidade se extrema. Se antes tínhamos a família, com dez ou doze componentes, os clãs ou as tribos com algumas dezenas de pessoas, a partir das cidades, temos acúmulos de milhares e, desde meados do século XX, milhões de pessoas. Atualmente, é simplesmente impossível conhecer todas as pessoas de uma cidade. Ela é um organismo vivo, é a floresta do animal social. Na cidade, percebemos a existência de várias comunidades, muitas delas diferentes entre si, chegando a desafiar a imaginação pensar em como elas se relacionavam em um passado mais longínquo. Em boa parte das cidades brasileiras, por exemplo, há bairros inteiros de imigrantes, ou comunidades formadas por apenas uma família. Há, ainda hoje, comunidades que não falam português, preferindo falar a língua do país da origem de seus avós e bisavós. Essa estrutura, que podemos chamar comunidade, pode ser entendida como uma rede, que liga pessoas. Uma rede de sociabilidade. Uma rede social.
Como vimos, várias estruturas das quais os indivíduos participam cotidianamente podem ser vistas como redes sociais. Então, é interessante destacar o que efetivamente são essas redes. Muitos dos agrupamentos recorrentes de seres humanos podem ser chamados de rede social. Rede social é o emaranhado de conexões que, tal qual uma teia de aranha, liga diversos indivíduos que possuem alguma forma de vínculo social. Normalmente, diversas dimensões compõem uma rede social, e podemos citar: tamanho, dispersão geográfica, densidade e integração dos contatos, homogeneidade entre os membros, simetria e enraizamento social. As redes sociais promovem uma relação entre indivíduos pautada pela dinâmica entre seus componentes e a flexibilidade de sua estrutura. Normalmente é desprovida de uma hierarquia muito rígida, e seus laços são forjados por interesses mútuos. Além disso, nas redes sociais os vínculos tendem a ser mais fluidos, com fácil criação e também fácil dissolução (MARTINO, 2015). Ou seja, podemos definir as redes sociais como o conjunto das relações que um indivíduo faz com outros indivíduos e estes com o primeiro, normalmente mediadas por uma estrutura relativamente flexível. É a dinâmica entre os indivíduos que efetivamente faz a rede social. Isso porque a forma de interação entre eles e a quantidade e tipos de conexão estabelecidos pelos participantes é o que vai definir como tal rede vai se comportar, seu tamanho e suas potencialidades.
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REDES SOCIAIS
Assim, podemos afirmar que as redes sociais ajudam a moldar o indivíduo. É nas relações com os demais membros que o sujeito se forma (ou deforma), uma vez que o outro nos completa (BAKHTIN, 2006). Neste ir e vir de informações, temos a capacidade de forjar nossa personalidade, de definir o que somos e, mais importante, quem somos. Este raciocínio é muito importante, porque as novas estruturas de redes sociais, que chamaremos de plataformas de redes sociais digitais e definiremos adiante, ajudam a formar o caráter e a personalidade das pessoas. Da mesma forma como o grupo de amigos de infância, o grupo feito nas redes sociais digitais tem enorme influência na vida do sujeito. Entretanto, não podemos, como faz a grande mídia e o senso comum, acreditar que redes sociais surgiram no alvorecer do século XXI. Muito pelo contrário, como já demonstrado, as primeiras redes sociais surgiram nos primeiros agrupamentos humanos. O homo sapiens interage em redes sociais desde sua gênese. Do ponto de vista histórico, as primeiras redes estabelecidas com estranhos foram as trocas comerciais. Pessoas tinham interesses em trocar ou comprar coisas com outras pessoas e, para tanto, precisavam saber quem vendia e quem comprava, onde estavam e quanto custava cada coisa. A seguir, vieram as cidades e, com elas, as Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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inúmeras formas de relacionamento que as pessoas possam ter, desde as mais formais, como a escola ou a fábrica, até as mais informais, como a turma de meninos e meninas que se juntam para uma partida de esconde-esconde. Com a cidade forma-se uma nova organização, mais formal, da sociedade. Os citadinos, agora assentados em suas casas, quarteirões e bairros, mal conhecem o restante das ruas e seus habitantes, mas conhecem suas redes. Assim, mesmo que o indivíduo não conheça nenhum de seus vizinhos, ele se relaciona com o feirante da feira que fica a duas quadras, que lhe traz verduras. Estes mantimentos, por sua vez, vêm de um fazendeiro, que mora a vinte quilômetros da feira, e que comprou as sementes de uma empresa que as produz em outro país. A rede social deste comprador, portanto, atravessa continentes. As redes têm tamanhos diferentes, desde uma dupla que se une para jogar vôlei de praia, até o aumento de um grupo de corrida de rua, chegando à torcida de um grande time de futebol. Virtualmente, é possível qualquer tamanho de rede social, desde que abranja mais de uma pessoa. Não existe rede social individual.
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Outra questão importante a ser discutida é a densidade e a integração dos contatos, ou seja, qual nível de contato o indivíduo tem com os demais integrantes daquela rede. Em um grupo de trabalho, é de se esperar que o contato seja muito estreito, com alta densidade. Não se pode dizer o mesmo, porém, do verdureiro, com quem há pouca integração e densidade, haja vista que o propósito social é meramente comercial. A homogeneidade entre os membros e a simetria entre eles também são dignas de nota, uma vez que podemos perceber se os integrantes daquela rede se respeitam e se tratam de forma igualitária ou se, nas relações de poder, há um indivíduo ou grupo que possui primazia. Podemos exemplificar com a forma como fiéis se portam na igreja. Ali, pelo menos naquele momento ritual, todos são semelhantes, iguais entre si. Há uma simetria entre eles. Se todos pertencem mais ou menos à mesma comunidade, também há homogeneidade. Este quadro muda quando em um mesmo ritual existem pessoas de culturas diferentes, como católicos e judeus visitando os mesmos lugares sagrados. Não há, ali, homogeneidade. Também não há simetria entre o líder religioso e os fiéis. Há, pelo contrário, relações e ritos de poder secularizados (MICHEL FOUCAULT, 2008). Há também o enraizamento social, ou seja, a identificação do indivíduo com seu meio. Existem pessoas que são mais dispostas a pertencer a mais de uma rede social, como os peregrinos que exploram o mundo em busca de uma vida mais plena, ou, pelo contrário, as pessoas que vivem na mesma terra há centenas de anos, na propriedade que foi herdada do pai, que herdou do avô, que herdou do bisavô e assim por diante. Outra das questões mais importantes das redes sociais, como já dissemos, é a dispersão geográfica. No início da jornada do homem sobre a Terra, só era possível interação social com pessoas que estivessem à distância de alguns quilômetros, que poderiam ser feitos a pé. Com o passar do tempo e das mudanças tecnológicas, o homem aprendeu a cavalgar, a criar carros e, por último, aviões. Além disso, e principalmente depois do cálculo da órbita geoestacionária e da invenção dos satélites, os dispositivos comunicacionais passaram a fazer parte do nosso cotidiano, ampliando gigantescamente as possibilidades de contato além do nosso pequeno espaço geográfico (MCLUHAN, 1998). Assim, aumentando a possibilidade de comunicação, aumenta-se também a possibilidade da construção de laços mais ou menos rígidos, ou seja, a oportunidade de criação de redes sociais. Esta busca pela ampliação do espaço geográfico não é, de forma alguma, coisa recente. Praticamente desde a gênese do ser humano como indivíduo há uma tendência à exploração. Seja por sede de conquista, como Alexandre, ou pela mera curiosidade, como Marco Polo, o ser humano sempre buscou conhecer novos lugares, pessoal ou virtualmente. O que há de novidade nas últimas décadas é a criação, por meio da internet, de plataformas de redes sociais digitais. Este fenômeno mostra a força do advento da rede mundial de computadores, na qual pessoas das mais variadas localidades podem se encontrar em um mesmo local virtual. Seres humanos que nunca se encostaram ou sentiram o cheiro um do outro, desenvolvem laços sociais, amizades, amor ou ódio. Os relacionamentos amorosos, por exemplo, não mais são efetuados apenas na presença física, mas contam também com a presença virtual. Ainda que as trocas de correspondência tenham sido um importante elemento de aproximação social até o século XIX, atualmente o conceito se expandiu, uma vez que um e-mail chega ao destinatário em poucos segundos, uma ligação telefônica tem a possibilidade de fazer ouvir a voz do outro e as vídeo-chamadas possi88
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bilitam ver e ouvir. Assim, podemos dizer que há uma nova possiblidade de criação e manutenção de relacionamentos: as plataformas de redes sociais digitais.
PLATAFORMAS DE REDES SOCIAIS DIGITAIS O senso comum costuma atribuir a empresas como Twitter ou Facebook o rótulo de redes sociais. Entretanto, como já vimos anteriormente, diversas outras atividades humanas podem ser consideradas como tal, e não parece adequado colocarmos na mesma seara coisas tão diferentes quanto um grupo de pessoas em uma partida de futebol e uma discussão sobre política no Twitter. Também, como vimos antes, uma rede social é o conjunto das relações que um indivíduo faz com outros indivíduos e estes com o primeiro, normalmente mediada por uma estrutura relativamente flexível. Assim, o senso comum pode admitir que o Instagram, por exemplo, de forma ampla, é uma plataforma que pode ser utilizada para constituir ou fomentar uma rede social.
Para início de nossa explicação, é importante destacar que estes instrumentos são plataformas, ou seja, não fazem apenas uma função, e possuem dentro de si uma série de ferramentas, com inúmeros recursos, de diferentes ordens e modelos, com díspares funções e objetivos. Além disso, são entendidas como meio autônomo, ou seja, fazem com que o meio real (o aparelho de telefone, o computador ou o tablet) “desapareça” nas mãos de seus usuários. O suporte da informação deixa de ser o aparelho físico (smartphone, televisão) e passa a ser o aparelho digital, intangível (Instagram, TikTok). Estas plataformas também se valem da interação entre as pessoas e entidades para poderem existir e cada vez mais influenciar os indivíduos ao redor do globo. Uma plataforma de rede social digital normalmente tem alguns elementos em comum, tais como a capacidade de construção de perfil individualizado, a possibilidade de encontrar e interagir com outros perfis e ver conexões entre perfis. É com base nesse “motor” que as plataformas digitais usam as redes sociais já existentes, ao mesmo tempo que forjam novas redes a todo momento, conforme o interesse ou gosto do usuário. Assim, elas se movem de acordo com a interação entre os indivíduos e ganham enormes quantidades de dinheiro com este movimento. A partir das elucubrações anteriores, apresentamos nossa definição de plataforma de rede social digital: suporte digital, normalmente com fins lucrativos, que agrega inúmeros recursos e atua como centralizador das redes sociais de pessoas e entidades. As plataformas de redes sociais digitais, então, agem como conectores, como elos entre pessoas e empresas. Normalmente é muito simples encontrar uma pessoa em qualquer uma dessas redes; melhor dizendo, essas redes foram construídas com este intuito. A ideia primordial de todas elas é encontrar e tornar encontráveis seres humanos e entidades (SANTOS, 2020).
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De forma estrita, porém, estas ferramentas podem ser confundidas com as demais formas de interação humana, o que não é nem um pouco interessante para o estudo dessas plataformas.
As plataformas de redes sociais digitais estão em praticamente todos os lugares, seja no computador, seja – principalmente – nos smartphones. Elas ajudam a conectar as pessoas, a fazer com que as redes sociais se ampliem, unindo pessoas por meio de interesses comuns. Naturalmente, essas plataformas não o fazem de graça, sendo que há diferença na forma de gerar receita em cada uma delas. Se algumas são totalmente gratuitas, outras podem cobrar por serviços exclusivos. Mas mesmo as gratuitas têm alto faturamento com a comercialização de publicidade. Seus algoritmos são tão poderosos que conseguem estratificar possíveis consumidores, gerando anúncios mais assertivos e focados em um público potencial muito mais restrito e, portanto, com mais possibilidade de uma real compra do produto ou serviço (SUMPTER, 2019). Assim, além de serem poderosas entidades do ponto de vista comunicacional, também o são do ponto de vista econômico. As empresas que gerenciam tais redes são extremamente lucrativas, uma vez que os anúncios são produzidos especialmente para cada grupo de indivíduos, sendo muito mais assertivos do que uma publicidade televisiva, por exemplo. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Assim, as plataformas de redes sociais digitais estão insidiosamente dominando nossa forma de pensar, se valendo de nossas redes sociais para nos dar aquilo que necessitamos enquanto indivíduos, que é a presença de outros como nós, de pessoas que comungam dos mesmos interesses. A partir de nossos laços, desenvolvem continuamente nossa personalidade, nos colocando em uma “bolha” algorítmica que impossibilita um olhar menos parcial (LANIER, 2018) e, com isso, provocando rachaduras sistêmicas na tessitura social, que serão difíceis de consertar em um curto espaço de tempo (BRIDLE, 2019).
CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao fim e ao cabo deste artigo, podemos considerar que redes sociais são uma coisa mais ampla do que as plataformas de redes sociais digitais; entretanto, estas se confundem com aquelas no imaginário popular. Isso acaba provocando a sensação de que estar fora de uma plataforma de rede social digital é estar fora de uma rede social, o que não é verdadeiro.
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O principal intuito deste artigo foi justamente desmitificar certos conceitos e, principalmente, lançar luz ao tema da sociabilidade humana em tempos tão complexos e com tantos desafios. Sugerimos, entretanto, novas e mais aprofundadas pesquisas neste sentido. Se este artigo define termos e conceitos, esperamos encontrar novas pesquisas com o mesmo foco, explorando de forma mais precisa e mais contundente este novo campo da sociabilidade humana.
REFERÊNCIAS AQUINO, T. de. Do governo dos príncipes ao rei do Cipro. São Paulo: Edipro, 2013. ARISTÓTELES. Ética a Nicômano. São Paulo: Martin Claret, 2016. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2006. BAUMAN, Z. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. BRIDLE, J. A nova idade das trevas: a tecnologia e o fim do futuro. Sao Paulo: Todavia, 2019. CASTELLS, M. Ruptura. Rio de Janeiro: Zahar, 2018. FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2008. GEERTZ, C. Interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. HARARI, Y. N. Sapiens: uma breve história da humanidade. Porto Alegre: L&PM, 2015. LANIER, J. Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais. São Paulo: Intrínseca, 2018. MARTINO, L. M. S. Teoria das mídias digitais: linguagens, ambientes e redes. Petrópolis: Vozes, 2015. MCLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1998. MENDONÇA, S.; FIALHO, W. C. G. Educação moral em tempos de conservadorismo: a retomada da filosofia de Herbert Spencer. Atos de Pesquisa em Educação, v. 15, n. 3, p. 950–972, 2020. MUMFORD, L. A cidade na História: suas origens, transformações e perspectivas. São Paulo: Martins Fontes, 2008. PRADO, D. O que é família? São Paulo: Brasiliense, 1985. SANTOS, R. O. dos. Algoritmos, engajamento, redes sociais e educação. Acta Scientiarum Education, v. 42, n. 2020, p. 1–19, 2020. SUMPTER, D. Dominados pelos números. São Paulo: Bertrand Brasil, 2019. 90
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Orientação argumentativa das sequências descritivas em resumos de artigos acadêmicos Argumentative orientation of descriptive sequences in Abstracts of academic articles ANDRADE, Valter Zotto de38; 39
RESUMO Este artigo tem como objetivo verificar como se dá a orientação argumentativa em sequências textuais descritivas no gênero resumo de artigo acadêmico. Buscou-se evidenciar a função argumentativa que tais sequências assumem no gênero em análise. Este estudo é apresentado na seguinte sequência: 1) apresentação da teoria das sequências textuais, conforme os estudos de Adam (2011); 2) identificação e análise das sequências descritivas nos resumos selecionados; 3) reflexões sobre a orientação argumentativa das sequências analisadas. Os resultados demonstram que as sequências descritivas em estudo expressam a mesma funcionalidade, qual seja a de apoio para a defesa de um ponto de vista a respeito do corpus investigado pelo pesquisador. A análise empreendida pode contribuir para um entendimento mais abrangente do descritivo e de suas funções em textos do gênero resumo acadêmico. Palavras-chave: Resumo. Sequências descritivas. Orientação argumentativa.
ABSTRACT This article aims to verify how the argumentative orientation is given in descriptive textual sequences in the academic article summary genre. We sought to highlight the argumentative function that such sequences assume in the genre on screen. This study is presented in the following sequence: 1) presentation of the theory of textual sequences, according to the studies of Adam (2011); 2) identification and analysis of the descriptive sequences in the selected abstracts; 3) reflections on the argumentative orientation of the analyzed sequences. The results demonstrate that the descriptive sequences under study express the same functionality, which is to support the defense of a point of view regarding the corpus investigated by the researcher. The analysis undertaken can contribute to a more embracing understanding of the descriptive and its functions in texts of the academic summary genre. Keywords: Summary. Descriptive sequences. Argumentative guidance.
INTRODUÇÃO A orientação argumentativa das sequências textuais descritivas em gêneros textuais no artigo de opinião foi objeto de estudo de Aguiar (2013). Em busca de ampliarmos a variedade de gêneros em estudo, neste artigo, analisamos a estrutura composicional de textos pertencentes ao universo acadêmico, com foco nas sequências textuais descritivas e seu caráter argumentativo em resumos de artigos acadêmicos. No intuito de desenvolvermos o tema proposto − as sequências descritivas e sua orientação argumentativa em resumos acadêmicos −, estabelecemos a seguinte pergunta de pesquisa: como se manifesta a orientação argumentativa das sequências 38 Este artigo é um recorte da tese de doutorado intitulada Resumo de artigo acadêmico: um estudo sobre organização retórica e sequências textuais, defendida pelo autor em 2017, na PUC-SP.
39 Prof. Dr. em língua portuguesa pela PUCSP, 2017. Atua como orientador na pós-graduação da Faculdade Educacional da Lapa. Revista Vivências Educacionais
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descritivas em resumos acadêmicos? Em vista desse questionamento, temos por objetivo identificar e analisar as sequências descritivas presentes em textos do gênero resumo acadêmico, com foco na orientação argumentativa desses segmentos. Para empreendermos esse exame, selecionamos dois resumos acadêmicos publicados em periódicos da área de Letras, quais sejam: Revista da Anpoll e Signum. A análise que empreendemos fundamenta-se nos pressupostos teóricos da Linguística Textual, na vertente da Análise Textual dos Discursos, especificamente no que se refere às sequências descritivas, abordadas por Adam (2011). Essa investigação caracteriza-se como bibliográfica, de caráter descritivo e base interpretativa. Os procedimentos metodológicos adotados foram os seguintes: 1) seleção de dois resumos acadêmicos; 2) identificação das sequências descritivas e 3) análise das sequências descritivas. No que se refere à organização, iniciamos nossa exposição pela apresentação da fundamentação teórica relacionada às sequências textuais descritivas; em seguida, elencamos as sequências identificadas e evidenciamos seu caráter argumentativo nos resumos em estudo; por fim, tecemos as considerações finais.
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SEQUÊNCIAS TEXTUAIS DESCRITIVAS Adam (2011) atribui à sequência o status de estrutura, caracterizada por dois aspectos: a) como rede relacional hierárquica, constitui-se por segmentos textuais que se ligam entre si e que estão relacionados ao todo textual que compõem; e b) como entidade relativamente autônoma, é dotada de uma organização interna própria, baseada em uma relação de dependência-independência com o conjunto mais amplo do qual faz parte – o texto (ADAM, 2011, p. 205). Tal estrutura corresponde [...] a cinco tipos de relações macrossemânticas memorizadas por impregnação cultural (pela leitura, escuta e produção de textos) e transformadas em esquemas de reconhecimento e de estruturação da informação textual. As sequências são unidades textuais complexas, compostas de um número limitado de conjuntos de proposições-enunciados: as macroproposições (ADAM, 2011, p. 205).
O autor explica que as macroproposições que formam uma sequência dependem de combinações pré-formatadas de proposições, as quais denomina descritiva, narrativa, argumentativa, explicativa e dialogal. Tais combinações correspondem a cinco tipos de relações macrossemânticas, memorizadas por meio da escuta, da leitura e da escrita de textos e que passam, assim, a compor esquemas de reconhecimento e de estruturação da informação textual. Apesar de um texto ser constituído por diferentes sequências, organizadas de modos diversos, sua caracterização resulta do efeito dominante de uma das sequências textuais. Dessa forma, todo texto pode ser caracterizado como predominantemente narrativo, descritivo, dialogal, explicativo ou argumentativo (ADAM, 2011). No que diz respeito à compreensão da sequência descritiva, que abordamos neste artigo, Adam (2011) explica que a descrição, própria ao exercício da fala é, inicialmente, identificável por meio de enunciados mínimos. Dessa forma, a base do conteúdo proposicional descritivo envolve a atribuição mínima de um predicado a um sujeito. Tal atribuição não é aleatória; ao contrário, revela o posicionamento do enunciador, sua subjetividade e, consequentemente, a visada do discurso, ou seja, a orientação argumentativa dada pelos segmentos descritivos. Independentemente da extensão de um dado conteúdo descritivo, sempre estão envolvidas na composição textual operações de base, a que Adam (2011) denomina macro-operações. As quatro macro-operações descritivas identificadas pelo autor – operações de tematização, operações de aspectualização, operações de relação e operações de expansão por subtematização – agrupam diversas operações, responsáveis por gerar uma dezena de tipos e operações descritivas de base (ADAM, 2011), como detalhamos a seguir. 92
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Operações de tematização Os três tipos de operações de tematização ocorrem por meio da denominação: 2 pré-tematização (ou ancoragem) − denominação imediata do objeto que inicia um período descritivo e anuncia um todo; 2 pós-tematização (ou ancoragem diferida) − denominação do objeto se dá no curso ou no final da sequência; 2 retematização (ou reformulação) – nova denominação do objeto, que é redefinido. Essa operação implica a existência de uma primeira nomeação do objeto do discurso.
Operações de aspectualização Há duas operações de aspectualização, que se baseiam na tematização: 2 fragmentação (ou partição) − envolve a seleção de partes do objeto descrito, para descrevê-lo de forma mais específica;
Operações de relação Essas operações ocorrem por meio da caracterização de um referente para compor outro. Há dois tipos: 2 relação de contiguidade – o objeto do discurso situa-se de modo temporal (objeto do discurso situado em um tempo histórico ou individual) ou espacial (relações de contiguidade entre o objeto do discurso e outros objetos suscetíveis de se tornarem o centro de um procedimento descritivo). Essa dupla operação pode ocorrer de maneira implícita. Além disso, no texto escrito as relações temporais podem estar no cotexto anterior ou posterior; 2 relação de analogia – nesse caso, a comparação e a metáfora servem para descrever o objeto; esses recursos permitem a descrição do todo em partes, colocando-as em relação com outros objetos.
Operações de expansão por subtematizações Nesse tipo de operação, a extensão da descrição se dá pela adição de qualquer operação a uma operação anterior, o que a torna potencialmente infinita, uma vez que ocorre de maneira sucessiva.
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2 qualificação (ou atribuição de propriedades) – são evidenciadas propriedades do todo e/ou das partes selecionadas na fragmentação.
SEQUÊNCIAS DESCRITIVAS COM ORIENTAÇÃO ARGUMENTATIVA Considerando o objetivo deste artigo, qual seja verificar como se dá a orientação argumentativa em sequências textuais descritivas presentes em dois resumos acadêmicos, apresentamos, a título de exemplificação, dois textos intitulados Grande sertão, invenção e arte (Texto 1) e Os enunciados de comando da prova do ENEM e sua relação com competências e capacidades para a resolução de situações-problema (Texto 2), ambos pertencentes ao gênero resumo acadêmico, extraídos de dois periódicos brasileiros da área de Letras, a saber: Revista da Anpoll e Revista Signum, respectivamente. Nesses textos, destacamos três sequências descritivas cuja função é argumentativa, como buscamos demonstrar ao longo da análise que procedemos adiante.
Texto 1 O desafio enfrentado por Guimarães Rosa em Grande sertão foi transferir para a narrativa longa os recursos de linguagem que havia experimentado com êxito em textos mais curtos. Os apelos ao narratário, a incorporação de arcaísmos e a transfiguração da sintaxe provocam os efeitos de deslocamento que, ao invés de Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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obscurecerem o texto, dão-lhe o ritmo necessário para alcançar logo o êxito de obra rara, como procuramos mostrar neste texto.
O segmento sublinhado é um exemplo de sequência descritiva, que está assim constituída: o objeto os efeitos de deslocamento é pré-tematizado; em seguida, por meio da operação de qualificação, é caracterizado no segmento: em vez de obscurecerem o sentido do texto, dão-lhe o ritmo necessário para alcançar logo o êxito de obra rara.
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Texto 2 Este trabalho é uma reflexão sobre a Prova do ENEM como um gênero textual de avaliação, visto não apenas como uma construção estrutural codificada por elementos da língua com mero propósito de avaliação de “competências” leitoras e produtoras de texto “apreensíveis” nas respostas dadas às questões, mas como uma relação dos múltiplos aspectos que envolvem a ação de linguagem de um agente, que se dá sob a forma de um texto – materialidade empírica, cujas propriedades organizacionais internas são determinadas por essa ação que o gerou. Disponível no arquitexto (BRONCKART, 2006, p. 145) de nossa comunidade, buscamos analisar sob a perspectiva do interacionismo sócio-discursivo [sic] a complexidade das operações de linguagem que em grande número permeiam a Prova e configuram o gênero. Considerando que o ENEM avalia até certo ponto o ensino, pressupomos que, buscar uma melhor percepção dos mecanismos operantes entre ensino/aprendizagem e avaliação, reveste-se de grande importância social, pois pode significar iniciativas para revisão e reavaliação dos PCNEM, do material fornecido pelo Plano Nacional do Livro Didático (PNLD) e da própria estruturação curricular elaborada pelas escolas que desenvolvem trabalho com ensino médio.
No primeiro segmento em destaque, considerado uma sequência textual descritiva de grande extensão40, identificamos quatro operações descritivas, assim constituídas: em a Prova do ENEM, temos a operação de pré-tematização, já que há denominação imediata do objeto o qual é, por meio da relação de analogia (Pd – R Analog) , caracterizado como um gênero textual de avaliação. Esse gênero, de acordo com o conteúdo do texto, é visto não apenas como uma construção estrutural codificada por elementos da língua com mero propósito de avaliação de “competências” leitoras e produtoras de texto “apreensíveis” nas respostas dadas às questões (subtematização), mas como uma relação dos múltiplos aspectos que envolvem a ação de linguagem de um agente, que se dá sob a forma de um texto (subtematização). Mais adiante no resumo, identificamos outra sequência descritiva em: as operações de linguagem que em grande número permeiam a Prova e configuram o gênero. O segmento: as operações de linguagem, que constitui uma operação de pré-tematização, com denominação imediata do objeto, é, posteriormente qualificado por meio da operação de qualificação, uma vez que o autor evidencia as propriedades do referido objeto.
ORIENTAÇÃO ARGUMENTATIVA DAS SEQUÊNCIAS DESCRITIVAS IDENTIFICADAS Com base nas reflexões e na análise que empreendemos foi possível responder à pergunta de pesquisa que inicialmente apresentamos, qual seja: como se manifesta a orientação argumentativa das sequências descritivas em resumos acadêmicos? Notamos, por meio dos segmentos analisados, que as sequências descritivas constituem porções textuais que orientam a argumentação nos textos selecionados. 40 Vale frisar que a sequência descritiva selecionada pode ser fracionada em outras sequências descritivas, que integram a sequência maior. Seria apropriado destacarmos
a operação de pré-tematização, representada pelo termo [um gênero textual], qualificado por meio da operação de relação por analogia (Pd – R Analog), seguida de uma operação de subtematização, já que uma nova caracterização, que se dá, também, por relação de analogia (Pd R Analog), é adicionada à operação anterior. Contudo, optamos por considerar a sequência descritiva de um modo mais amplo, o que nos parece mais adequado para evidenciar o caráter argumentativo da sequência textual selecionada.
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As sequências descritivas analisadas funcionam tanto como dados (premissas/fatos) quanto como apoio à tese dos pesquisadores. É o que acontece, por exemplo, no Texto 1: o autor se apoia nos efeitos de deslocamento da obra de Graciliano Ramos para sustentar sua afirmação de que Grande sertão: veredas é uma obra rara; no Texto 2, as autoras, apoiadas nas operações de linguagem que destacaram no estudo sobre a prova do ENEM, concluem que se trata de um gênero que traz ações de linguagem de um agente, que se dá sob a forma de um texto, o que o torna mais significativo do que um simples instrumento de avaliação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Tais reflexões nos permitem fazer algumas generalizações em relação à funcionalidade das sequências textuais descritivas no gênero resumo de artigo acadêmico: tais sequências parecem ter papel fundamental na apresentação inicial da investigação, uma vez que conduzem o leitor à aceitação da linha de raciocínio empreendida pelo pesquisador a respeito de sua pesquisa.
REFERÊNCIAS ADAM, J.M. A linguística: introdução à análise textual dos discursos. Trad. Maria das Graças S. Rodrigues et. al. São Paulo: Cortez, 2011. AGUIAR, A. P. S. O papel das sequências descritivas no encaminhamento da orientação argumentativa. 2017. Disponível em: https://silo.tips/download/o-papel-das-sequencias-descritivas-no-encaminhamento-daorientaao-argumentativa. Acesso em: 4 out. 2020. ANDRADE, V. Z. de. Resumo de artigo acadêmico: um estudo sobre organização retórica e sequências textuais. São Paulo, 2017. 228 f. Tese (Doutorado em Língua Portuguesa) – Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes, Universidade Católica de São Paulo. NASCIMENTO, E. L.; ZIRONDI, M. I. Os enunciados de comando da prova do ENEM e sua relação com competências e capacidades para a resolução de situações-problema. Revista Signum, v. 9, n. 2, 2006. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/signum/article/view/3958. Acesso em: 4 out. 2020.
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A partir do estudo que, por ora, concluímos, é certo que se abrem inúmeras possiblidades de exploração do tema em muitos outros gêneros acadêmicos, como a seção Introdução de artigos acadêmicos ou a resenha acadêmica, entre outros, o que traria aos estudos da Análise Textual dos Discursos uma visão mais ampla da funcionalidade das sequências textuais descritivas em textos do universo acadêmico.
SANTOS, P. B. Grande sertão, invenção e arte. Revista da Anpoll, v. 1, n. 24, p. 352 - 360, 2008. Disponível em: http://www.anpoll.org.br/revista/index.php/revista/article/view/37/20. Acesso em: 4 out. 2020.
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Professores de física em tempo de cibercultura: a utilização das tecnologias digitais da informação e comunicação nas aulas do ensino médio nas escolas da rede de ensino privada Physics teachers in cyberculture time: the use of digital information and communication technologies in high school classes in private schools FERNANDES, Renato Izac41 BRITO, Glaucia da Silva42
RESUMO O avanço da tecnologia promove mudanças de hábitos e transformações na sociedade contemporânea. No contexto educacional, espera-se que a inserção das tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC) possam alterar práticas pedagógicas com o propósito de potencializar o processo de ensino-aprendizagem. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário que o professor desenvolva determinadas habilidades e competências. Frente a esse cenário, buscamos identificar quais desafios os professores de física do ensino médio de uma rede privada de ensino de Curitiba-PR enfrentam para implantar as tecnologias nas suas aulas e investigar a apropriação das TIC/TDIC incorporadas à prática pedagógica. A pesquisa aponta que os professores com mais tempo de docência se encontram em uma fase de apropriação, em que as novas metodologias convivem com as tradicionais, na busca de ganhos pedagógicos. Palavras-chave: Tecnologias digitais da informação e comunicação. Ensino médio. Física. Prática de professores.
ABSTRACT The advancement in technology promotes corresponding changes in habits and transformations in contemporary society. In the educational context, it is expected that the use of digital information and communication technologies (DICT), can change pedagogical practices in order to enhance the teaching-learning process. However, in order for this to happen, it is vital that the teacher has the necessary skills and competences. It defines the research problem: what challenges do high school physics teachers, from private schools in Curitiba, face with new Technologies. The results show that teachers have different levels of technological appropriation. The results show that teachers have different levels of technological appropriation. Teachers with more teaching time are in the second phase of appropriation since new methodologies coexist with traditional ones in the search for pedagogical gains, and technology is no longer used only because it is technology, the class is well planned and the objectives are clear and defined. The institutions are providing training, but they are not reaching the expectations of teachers, as the teacher is not yet heard of their real needs. Keywords: Digital information and communication technologies. High school. Physics. Teacher practice.
INTRODUÇÃO Este artigo é resultado da dissertação de mestrado que teve como objetivo investigar a inserção e apropriação das TDIC na prática pedagógica dos professores de física do ensino médio da rede privada de ensino de Curitiba-PR. 41 Me. em educação, pela UFPR. Integrante do grupo de pesquisa GEPPETE-UFPR. Email renatoctbapr@hotmail.com 42 Professora e Pesquisadora na graduação de Comunicação Social e na Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: glaucia@ufpr.br. Orcid número https://orcid.org/0000-0003- 3874-4323
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Partimos da premissa de que a rede privada de ensino conta com uma infraestrutura técnica e operacional, com funcionário responsável pela TI, manutenção e equipamentos disponíveis, boa conexão à internet, ambiente propício, plataforma digital e outros aparatos tecnológicos com objetivo de potencializar o processo de ensino-aprendizagem. Iniciamos uma pesquisa no banco de dissertações disponibilizadas na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), no período de 2003 a 2019, utilizando como palavras-chave: TIC/TDIC, professor de física, ensino médio, simuladores e desafios. Assim, foi possível realizar uma análise das dissertações dos trabalhos publicados sobre informática no ensino da física. Com isso, pudemos constatar que somente três escolas particulares foram objetos de estudo, uma em Campinas-SP, uma em Porto Alegre-RS e outra em Salvador-BA.
REVISÃO DE LITERATURA Com isso, foi possível chegar a um total de 95 publicações, aplicando o critério de exclusão para termos como educação física, abordagem histórica da ciência, física nos anos iniciais e educação superior. Assim, foram descartados aqueles que não atingiam o objetivo da pesquisa. Ao final, chegamos a 14 dissertações divididas em 2 temas, conforme quadros a seguir. Após identificar o material que nos era mais significativo, dividimos as dissertações em dois temas: o primeiro tema envolvendo o professor de física e as TIC/TDIC; e o segundo tema, a utilização das TIC/TDIC. Nessa parte da pesquisa, trouxemos um levantamento com relação ao professor de física do ensino médio e a utilização das tecnologias – uma análise mais voltada ao professor e à sua percepção em relação ao aluno. Ao analisar as publicações cujo foco é a aplicação das tecnologias na educação, notamos que os termos utilizados vão, ao longo do tempo, sofrendo alterações e atualizações. Isso ocorre em função da velocidade com que as tecnologias vão aparecendo e sendo aperfeiçoadas frente a um cenário social, comercial e educacional. A utilização das tecnologias exige que o docente seja capacitado por novas concepções e metodologias de ensino que fujam do tradicional. Mais do que isso, é necessário que os professores atentem para a relevância de sua utilização e a maneira mais adequada de usá-las, evitando que se transformem em um recurso meramente técnico, sem finalidade e objetivos definidos.
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Iniciamos nossa pesquisa na BDTD utilizando como palavras-chave: TIC/TDIC, professor de física, ensino médio e simuladores.
A comunidade escolar se depara com três caminhos a seguir em relação à tecnologia: repeti-los e tentar ficar fora do processo, apropriar-se da técnica e transformar a vida em uma corrida atrás do novo; ou apoderar-se dos processos, desenvolvendo habilidades que permitam o controle das tecnologias e de seus efeitos (BRITO; PURIFICAÇÃO, 2015, p. 25). Na utilização das TIC/TDIC no ensino de física, observamos a aplicação das diversas tecnologias digitais da informação e comunicação como instrumento potencializador na aprendizagem da física dos fluídos; ensino e aprendizagem da astronomia apoiada pelas TIC; experiência da integração do Moodle à dinâmica, hidrostática e física térmica; elaboração de uma sequência didática para as Leis de Kepler e a utilização de vídeos simuladores. O aprendizado está relacionado à motivação do aluno. Nesse caso, o uso de simuladores promove uma metodologia de ensino diferente daquela rotineira de giz, quadro e apagador, criando um ambiente fértil ao aprendizado. Dentro da física, uma das tecnologias da comunicação e informação mais utilizadas apresentadas nas dissertações são os simuladores. Uma importante característica das TDIC é a capacidade de animar objetos na tela, em substituição ao lápis e papel (VALENTE, 2014). Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Os simuladores de vídeo podem trazer diversos benefícios para o ensino de física, principalmente no estudo da mecânica (ramo da física responsável pelo estudo dos movimentos), possibilitando uma análise mais detalhada dos fenômenos e um estudo das leis fundamentais por meio de atividades, estando o aluno inserido como sujeito ativo do processo (BRYAN, 2010). Rosa (2012) utilizou 11 encontros de 3 horas cada, enquanto Oliveira (2014) desenvolveu a atividade com um número reduzido de 10 alunos em atividades extraclasse, duas vezes por semana, em encontros que totalizavam 2 horas. Dentro do cenário real, a disponibilidade apresentada pelo planejamento não contempla esse número de aulas, tampouco uma sala com reduzido número de alunos.
Formação continuada do professor de física Vivemos na sociedade da informação e comunicação, em que professor necessita de formação não somente para o domínio da técnica em relação ao manuseio das tecnologias, mas também em como associar essas tecnologias a diferentes linguagens e conteúdos programáticos.
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Segundo Nóvoa (2001) o professor necessita de novas competências para atuar na sociedade do século XXI. O docente não é mais um mero transmissor de conhecimentos como ocorria em séculos anteriores, é um organizador de aprendizagens via novos meios informáticos e novas realidades virtuais. Além de organizador, cabe ao professor a competência de conhecer e (re)elaborar o conhecimento, de maneira a compartilhar com os diferentes alunos que compõem o grupo. O professor tem utilizado as tecnologias para acesso às redes sociais, pesquisas, leitura de jornais e revistas digitais, com necessidade de encontrar espaços de interação entre as dimensões pessoais e profissionais, de maneira a dar sentido a sua história de vida. A necessidade do pertencimento por parte do professor e profissionais da educação com o ambiente de trabalho e recursos tecnológicos tem levado os profissionais da área a buscar uma formação continuada em busca da apropriação das tecnologias da informação e comunicação. Dessa maneira, processos de formação continuada devem ser previstos e planejados com objetivo de capacitar o corpo docente a exercer suas atividades (MAZIERO; BRITO, 2015). Para que isso seja efetivo, se faz necessário ouvir o corpo docente, quais suas reais necessidades e anseios em relação ao curso a ser ministrado, de modo que esse trabalho resulte em uma apropriação por parte do professor, promovendo ações significativas no exercício da docência. Uma formação continuada para o uso das tecnologias na educação pode ser realizada de diferentes modos, segundo Diogo e Gobara (2017): 2 fechadas – planejadas, roteiro definido e não levam em consideração a experiência prévia dos professores. 2 fechadas e renováveis – apesar de planejadas antecipadamente, são revistas e adequadas ao término de cada oferta. 2 abertas – não são concebidas com um roteiro rígido, levam em consideração o perfil dos participantes (processo colaborativo, trocas). Mas todo esse processo só é realmente efetivado se o curso de formação trouxer ao professor uma apropriação real e significativa da tecnologia como um meio de alcançar um objetivo-fim e promover reflexões sobre as estratégias de ensino (DIOGO; GOBARA, 2017). Fica evidente o interesse e a disposição dos professores em agregar novos conhecimentos em relação ao uso das TIC, por meio de oficinas de aplicativos, cursos de curta duração, mas que auxiliam o docente a desenvolver novas práticas pedagógicas em sala de aula ou possibilidades apresentadas nos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA), Google sala de aula, plataforma Edmodo para inserção de questões e vídeos, Socrative, Kahoo, Canva, mapas conceituais, o uso didático do celular em sala de aula, entre outros. 98
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Entretanto, para Borges e Goi (2017), uma formação continuada que exige um tempo maior de dedicação, como o mestrado acadêmico ou profissional, que estabelece uma interlocução com especialistas, traz consigo um aprofundamento de conhecimentos, práticas reflexivas e estratégias de ensino que acabam não retornando ao meio no qual o docente estava inserido ao iniciar sua capacitação, mas migrando para o Ensino Superior ou Institutos Federais de Educação, Ciências e Tecnologia.
Cibercultura: relações entre a técnica e cultura dentro de uma sociedade A cibercultura surge da apropriação da tecnologia (MAZIERO; BRITO, 2015). Assim, nasce como um conjunto de técnicas e atitudes que vão se desenvolvendo em conjunto com o crescimento do ciberespaço (LÉVY, 1999).
É importante que o homem esteja cada vez mais próximo das tecnologias que o permeiam, conheça a estrutura e a funcionalidade desses artefatos. Além disso, é preciso que tenha a percepção de que o desenvolvimento da tecnologia modifica a forma de interação do indivíduo com a cultura e a sociedade e é, ao mesmo tempo, por ela modificada. Para Lemos (2015), o desenvolvimento tecnológico pode ser classificado em três fases: 2 1º fase – até a Idade Média, caracterizada por uma mistura de arte, religião e ciência. A vida social gira em torno do sagrado. Ciência e tecnologia não são privilegiadas nessa fase. 2 2º fase (modernidade) – fase em que a ciência substitui a religião no monopólio em busca da verdade e a tecnologia centraliza a ação do homem. Ocorre a transformação e o controle da vida social, além da conquista do espaço e utilização de fontes de energia. Porém, o sonho da tecnologia na constante busca da melhoria da qualidade de vida trouxe também poluição, desigualdades sociais e violência. 2 3º fase – a última das fases é a equidade pós-moderna, fase da simulação da cibercultura. Esta simulação da cibercultura se dá a partir de uma análise social, a qual constitui uma “cibersociedade”, ou seja, o social utilizando as ferramentas tecnológicas disponíveis no ciberespaço, pois a cibercultura forma-se precisamente da convergência entre o social e o tecnológico, sendo por meio da inclusão da sociedade na prática diária da tecnologia que ela adquire seus contornos mais nítidos. Não se trata obviamente de nenhum determinismo social ou tecnológico, e sim de um processo simbiótico, no qual nenhuma das partes determina imperiosamente a outra (LEMOS, 2015, p. 90).
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Nesse sentido, Lemos (2015) vê no surgimento da cibercultura uma relação mais estreita e visceral entre tecnologia, ciência e sociedade, pois a tecnologia produzida pela ciência modifica a sociedade, da mesma forma que uma sociedade “tecnologizada” transforma a ciência, formando um ciclo.
Lévy (1999) e Lemos (2015) apresentam em suas obras princípios que orientam o crescimento do ciberespaço dentro da cibercultura. Para Lévy (1999), a conexão sempre será preferível ao isolamento. Um segundo princípio diz respeito às comunidades virtuais que se apresentam apoiadas na interconexão construída sobre interesses e atividades afins, em um processo colaborativo. Cada navegação pode conduzir a um mundo novo a ser explorado, “portanto, a melhor guia para web é a própria web” (LÉVY, 1999, p. 85). Essa navegação conduz ao ciberespaço, compreendido como um hipertexto mundial e interconectado, onde cada autor pode adicionar, retirar ou modificar partes de uma estrutura, como um texto vivido. A emergência do ciberespaço resultou em uma cibercultura, que traz consigo informações não finalizadas na sua totalidade (LÉVY, 1999). Ou seja, qualquer que seja a mensagem, devido à comunicação disponível no ciberespaço, está sujeita a comentários de pessoas que apresentam afinidades ao tema disponibilizado, estabelecendo uma das formas de comunicação virtual. A comunicação virtual não substitui os encontros físicos – se apresenta como mais uma forma de comunicação, que não desaparece no ciberespaço e que leva à formação da inteligência coletiva, o que cria uma nova Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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relação com o saber, bem como formas de o homem pensar e compartilhar seus conhecimentos com outras pessoas utilizando a tecnologia (LEVY, 2015). Para Lemos (2003), a cibercultura tem leis e elas são apresentadas da seguinte maneira: a primeira lei seria a lei da reconfiguração. Devemos evitar a lógica da substituição ou do aniquilamento. Em várias expressões da cibercultura, trata-se de reconfigurar práticas, modalidades midiáticas, espaços, sem a substituição de seus respectivos antecedentes. A segunda lei seria a liberação do polo da emissão. As diversas manifestações socioculturais contemporâneas mostram que o que está em jogo, como o excesso de informação, nada mais é do que a emergência de vozes e discursos anteriormente reprimidos pela edição da informação pela mass media. A liberação do polo da emissão está presente nas novas formas de relacionamento social, de disponibilização da informação e na opinião e movimentação social da rede. Assim chats, weblogs, sites, listas, novas modalidades midiáticas, e-mail, comunidades virtuais, entre outras formas sociais, podem ser compreendidas por essa segunda lei. A terceira lei é a lei da conectividade generalizada, que começa com a transformação do PC em CC, e do CC em móvel. As diversas redes sociotécnicas contemporâneas mostram que é possível estar só sem estar isolado. A conectividade generalizada põe em contato direto homens e homens, homens e máquinas, mas também máquinas e máquinas, que passam a trocar informação de forma autônoma e independente. Nessa era da conexão, o tempo reduz-se ao tempo real e o espaço transforma-se em não espaço, mesmo que por isso o espaço real, como vimos, e o tempo cronológico, que passa, tenham suas importâncias renovadas (LEMOS, 2003, p. 21). Essas leis se refletem em transformações também no campo educacional, na busca de informações, conteúdos e matérias por meio das mais diversas fontes — tais como Youtube, videoaulas, sites. O digital é parte do cotidiano das pessoas, quer seja pela necessidade do uso ou pela cultura do uso. Por exemplo, podemos ver alunos como produtores de conhecimento, criando vídeos e compartilhando na rede, passando a ser um polo emissor de informação. Quando o uso é cultural, existe um rompimento com as rotinas e as vivências passadas para a transformação das atividades, do pensar e do agir. A cultura do digital promove a necessidade da criação de mais tecnologias digitais (CAMAS et al., 2013).
METODOLOGIA Os instrumentos adotados foram o questionário e a entrevista semiestruturada, e para o desenvolvimento dessa pesquisa optamos por uma abordagem qualitativa, que evidencia “[...] características dos indivíduos e cenários que não podem ser facilmente descritos numericamente” (MOREIRA; CALEFFE, 2006, p.73). Procuramos, por meio dos instrumentos (questionário e entrevista semiestruturada) obter informações a respeito das significações que os professores pesquisados trazem sobre o tema: a utilização das TIC/TDIC nas aulas de física do ensino médio nas escolas da rede de ensino privada. Apresentamos a pesquisa organizada em cinco etapas: 6. elaboração do questionário; 7. aplicação do questionário; 8. descrição dos resultados do questionário online; 9. critérios para seleção dos participantes da entrevista semiestruturada; 10. entrevista semiestruturada. Iniciamos nossa pesquisa com um questionário composto por 19 questões, no Google Forms43, criando um link44 para ser encaminhado aos professores. 43 Google Forms: aplicativo que possibilita criar e compartilhar documentos online, como textos, apresentações, planilhas ou formulários. 44 Link questionário: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSc5lPUAQ59txxL9tyN7jxE39loyj_zmyQ4HBGUjx9mqf_WhA/viewform?usp=sf_link 100
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Professores de física em tempo de cibercultura
Buscamos por meio deste obter informações para compor o perfil do docente, que caracterize seu desempenho em relação as TDIC. Levamos em consideração fatores como gênero, idade, formação acadêmica, tempo de atuação, uso do computador e outros recursos tecnológicos na prática social e pedagógica. Por meio do site da Secretaria da Educação do Estado do Paraná45, foi possível realizar a consulta das escolas, acessando o núcleo de educação46. Obtivemos um total de 1286 registros da rede de ensino municipal, estadual, federal e privada de Curitiba-PR. Dentro desse universo, selecionamos 72 escolas, tomando como filtro escolas particulares e com ensino médio. Seguindo o mapeamento adotado pela Secretaria de Educação – Núcleo Regional de Educação de Curitiba (NRE), dividimos a região de Curitiba em nove setores, conforme quadro a seguir. Quadro 1 – Mapeamento de Curitiba por áreas e respectivos bairros
Bairros
Centro (área 1)
Ahú, Alto da Glória, Batel, Bigorrilho, Rebouças, Bom Retiro, Cabral, Centro, Centro Cívico, Juvevê, São Francisco, Hugo Lange.
Boa Vista (área 2)
Abranches, Atuba, Bacacheri, Barreirinha, Bairro Alto, Boa Vista, Cachoeira, Pilarzinho, Santa Cândida, Tingui, São Lourenço, Taboão, Tarumã.
Santa Felicidade (área 3)
Augusta, Butiatuvinha, Campina do Siqueira, Campo Comprido, Lamenha Pequena, Mossunguê, Orleans, Riviera, Santa Felicidade, São Braz, Santo Inácio, São João, Seminário, Vista Alegre.
Portão (área 4)
Parolin, Campo Comprido, CIC, Fanny, Fazendinha, Guaíra, Portão, Água Verde, Lindoia, Novo Mundo, Santa Quitéria, São Miguel, Vila Izabel.
Cajuru (área 5)
Capão da Imbuia, Cajuru, Jardim das Américas, Guabirotuba, Uberaba.
CIC (área 6)
Cidade Industrial, São Miguel, Augusta, Riviera.
Pinheirinho (área 7)
Capão Raso, Pinheirinho, Novo Mundo, Lindoia, Fanny.
Boqueirão (área 8)
Alto Boqueirão, Boqueirão, Hauer, Xaxim.
Tatuquara (área 9)
Tatuquara, Campo de Santana, Caximba.
Bairro Novo (área 10) Ganchinho, Sitio Cercado, Umbará. Fonte: elaborado pelo autor.
Dentre essas 72 escolas, algumas redes de ensino apresentam o mesmo quadro docente nas mais diversas unidades distribuídas na cidade.
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Setor
Na segunda quinzena de janeiro de 2019, fizemos contato telefônico com as escolas, utilizando as informações catalogadas na planilha, reduzindo a amostra para 63 escolas em função do quadro docente se repetir em outras instituições. Disponibilizado o link aos colégios e professores, obtivemos um retorno de 28 respondentes.
Critérios aplicados no momento da escolha do professor participante da entrevista Dentro da nossa amostra, encontramos professores com as características necessárias para atender aos nossos objetivos: identificar quais as tecnologias estão sendo utilizadas na prática pedagógica e identificar a apropriação do uso das tecnologias como atribuição do trabalho docente. Para selecionar os professores, aplicamos os seguintes critérios: 2 faixa etária – a fim de investigar as apropriações das TDIC por parte dos professores em diferentes faixas etárias, selecionando professores até 29 anos, entre 30 e 39 anos e acima dos 40 anos. 45 Link da secretaria da educação: http://www.comunidade.diaadia.pr.gov.br 46 Link consulta: escola, núcleo de educação - http://www.consultaescolas.pr.gov.br Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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2 selecionar os professores que utilizam ao menos 50% das tecnologias físicas e 50% das mídias digitais (disponibilizadas no questionário online) em sua prática pedagógica. 2 disponibilidade dos professores em aceitar participar da entrevista semiestruturada. Seguindo os critérios apresentados, dentro de cada faixa etária, identificamos qual professor utiliza uma maior diversidade dentro das tecnologias físicas e mídias digitais na sua prática pedagógica. Para codificação das informações, utilizamos para aparato tecnológico (equipamento físico) a sigla TF e para as mídias digitais MD. Classificamos aqui como mídia digital todo produto utilizado na exibição: imagens, vídeos, jogos, música e software, que tem como suporte, para exibição ou captura de imagem, um equipamento físico. Para o professor ser selecionado, verificamos a utilização mínima de 50% das tecnologias físicas e 50% das mídias digitais. Quadro 2 – Nomenclaturas utilizadas na pesquisa
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Tecnologia Física – TF
Mídias Digitais – MD
TF1 – data show
MD1 – imagens
TF2 – lousa digital
MD2 – vídeos
TF3 – filmadora/câmera digital
MD3 – músicas
TF4 – computador
MD4 – sites
TF5 – notebook
MD5 – jogos
TF6 – TV
MD6 – softwares educativos
TF7 – aparelho de DVD
MD7 – textos
TF8 – tablets
MD8 – CD rom
TF9 – laboratório de informática TF10 – smartphone Fonte: elaborado pelo autor.
Definidos os participantes, fomos a campo realizar as entrevistas que nos apontassem dados e auxiliassem a identificar quais as tecnologias estão sendo utilizadas na prática pedagógica, a apropriação do uso das tecnologias como atribuição do trabalho docente e investigar quais os motivos que dificultam, nas práticas pedagógicas, o uso mais frequente das tecnologias. Os professores selecionados serão representados pela sigla PE (professor entrevistado) e PR (professor respondente da pesquisa online). Quadro 3 – Dados do perfil dos professores entrevistados – PE
Identificação por siglas
Faixa etária
Formação acadêmica
Tempo de atuação profissional
PE1 (PR26)
Até 29 anos
Especialização em curso
1 a 5 anos
PE2 (PR13)
30 a 39 anos
Especialização concluída
5 a 10 anos
PE3 (PR27)
>40 anos
Doutorado concluído
> 20 anos
Fonte: elaborado pelo autor.
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS Apontamos os principais recursos tecnológicos utilizados e a apropriação das TIC/TDIC como atribuição do trabalho docente. Considera-se que o simples uso da tecnologia em sala de aula não é sinônimo de inovação, nem de mudança na prática docente. 102
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O Datashow/PowerPoint é a ferramenta que mais se destaca dentre todas as tecnologias físicas, talvez em função da disponibilidade do equipamento pelas instituições ou a familiaridade com o equipamento por parte dos professores. Nesse sentido, o PE2 argumentou dizendo que: “às vezes você pega e usa o Datashow como se fosse uma lousa, ele não é uma coisa tecnológica [...] só que eu acho válido”. Porém, a utilização do Datashow como ferramenta tecnológica para fins pedagógicos nas escolas, mesmo que como uma lousa, traz contribuições por meio de recursos audiovisuais, motivando e despertando o interesse do aluno. PE3 justificou, considerando sua experiência pessoal: “no 3º ano eu trabalho com o Datashow direto, em função do volume da quantidade maior de conteúdo, mais pela praticidade, você consegue explorar outras coisas e vira uma ferramenta a partir desse momento”.
O entrevistado P1 é o que apresenta uma maior desenvoltura para “criação”, o que provavelmente está diretamente ligado à idade do entrevistado, que nasceu em uma cultura conectada de jovens nascidos após a Revolução Digital: “O impacto que traz aos alunos, na hora eu até brinco: ‘gente, sou mestre do PowerPoint’. A princípio os alunos acharam que era só um vídeo, quando comecei a girar, ‘vejam que lado vocês querem que gire a figura’, visto o quanto era complicado (a visualização na lousa), eu consegui simplificar. O triângulo para desenhar no quadro seria mais difícil, mas no powerpoint a visualização facilitou” (PE1). A utilização dos celulares pelos jovens, dentro da sociedade contemporânea, é algo incontornável. Portanto, cabe ao professor desenvolver meios e mecanismos de como inserir esses dispositivos dentro de suas práticas pedagógicas a favor de novas metodologias de ensino (JUNIOR, 2012). Nesse sentido, P1 e P2 demonstram – a princípio – em suas falas, que têm receio do uso de celular em sala de aula, afirmando que apesar do uso pedagógico, em algum momento o aluno vai estar envolvido em alguma rede social, mesmo que por um breve período. O PE3 traz um olhar diferente quanto ao uso do celular em sala de aula – tem consciência de que por vezes o lado pedagógico é esquecido: “[...] nossa batalha é mostrar, veja isso é legal, vamos com calma porque a transição não é fácil” (P3). O acesso à internet, bem como às redes sociais e a outros aplicativos são fatores que dificultam a ação do professor em sala. Por isso, é preciso orientar e educar o aluno sobre o momento oportuno da utilização dos aparelhos.
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Ainda que as aulas sejam expositivas e tradicionais, o Datashow amplia as possibilidades de trabalhar o conteúdo em sala de aula e o processo se torna mais dinâmico, desde que o professor tenha feito um planejamento com objetivos claros e bem definidos (SILVA, 2017).
Para Lemos (2009), a mobilidade é um fenômeno que nos acompanha desde as civilizações nômades e uma das dimensões da mobilidade é a informacional-virtual, que faz circular o fluxo de informações em rede. Compreendemos nesse contexto que mobilidade, ubiquidade e conectividade podem propiciar às práticas pedagógicas, além da desvinculação do acesso às tecnologias via laboratório de informática, a imersão na cultura contemporânea, cibercultura, transformada por uma nova relação com o espaço e com o tempo [...] (SANTOS, 2013, p. 289).
Mídias digitais são apontadas como recurso bastante utilizado apontado pelos professores entrevistados, mesmo que seja em um momento de descontração, uma conversa informal que apresente algum ganho pedagógico. Reconhecer nos filmes mudanças qualitativas na ecologia dos signos, bem como a possibilidade de um novo ambiente que resulta da extensão das redes de comunicação para a vida educacional e cultural, é necessário (LÈVY, 1999). A utilização dos simuladores como recurso tecnológico aplicado ao processo de aprendizagem tem como objetivo tornar mais eficiente a fixação de conteúdos que seriam difíceis de apresentar na prática, ou até mesmo inviáveis. O PE3 relatou que considera o simulador como “um laboratório online”, em que se pode “[...] alterar parâmetros, testar hipóteses”. Ainda, classificou-o como “um material investigativo”. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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De forma geral, os professores durante a entrevista apontaram a utilização do simulador PhET na sua prática pedagógica, de maneira demonstrativa. Conforme a fala do professor 1: “[...] são mais proveitosos os simuladores demonstrativos, são mais eficientes no que diz respeito ao ensino-aprendizagem” (PE1). Simuladores trabalham basicamente em torno de um modelo e permitem que os alunos testem todas as possibilidades da realização de um problema, o que não seria possível em uma situação real (BRITO; PURIFICAÇÃO, 2015).
CONSIDERAÇÕES FINAIS Iniciamos as considerações finais desse artigo relembrando o objetivo da pesquisa: investigar quais desafios os professores de física do ensino médio, das escolas privadas de Curitiba, enfrentam para implantar as tecnologias em suas aulas. Partimos da ideia inicial de que a rede privada de ensino conta uma infraestrutura técnica e operacional adequada ao uso tecnológico.
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Os resultados mostraram que os desafios dos professores estão na dificuldade da realização do planejamento e na execução de atividades com a inserção das TDIC na sua prática pedagógica. Para alcançar esse resultado, identificamos quais tecnologias estão sendo utilizadas pelos professores em sua prática pedagógica e a apropriação do uso das tecnologias como atribuição do trabalho docente. Nas entrevistas e questionário, pudemos identificar que as TDIC mais utilizadas pelos docentes na sua prática pedagógica são o projetor multimídia, os smartphones e os simuladores. Constatamos que o projetor multimídia está sendo utilizado aquém das possibilidades oferecidas pelo equipamento; isso demonstra que o professor tem acesso à ferramenta, mas não sabe como obter um ganho pedagógico, executar uma atividade que vá além da simples substituição de uma tecnologia física, o quadro negro, por um recurso digital. Em relação aos dispositivos móveis – smartphone e tablet –, evidenciamos a preocupação do professor em relação à atenção e ao comprometimento do seu aluno durante as aulas frente às redes sociais. O professor tem consciência da sua importância como agente de transformação na conduta do aluno, por meio de mediação e conscientização. Pudemos também constatar a preocupação do professor em inserir na sua prática pedagógica o simulador virtual. O docente tem consciência da importância desse recurso no ensino de física, mas acaba utilizando essa ferramenta de maneira demonstrativa, privando o aluno de executar e testar possibilidades. Identificamos também que cursos e palestras ofertados pelas instituições não têm alcançado a expectativa dos docentes, pois falta o professor ser ouvido quanto às suas reais necessidades. Há necessidade de reuniões e capacitações direcionadas a grupos por áreas afins, com objetivo de atender as necessidades específicas dentro de cada área do conhecimento. Percebemos professores com diferentes graus de apropriação em relação às tecnologias. Professores com intuito de melhorar sua prática pedagógica utilizam recursos, como apresentações eletrônicas e editores de texto, com claro objetivo de evidenciar a inserção das TDIC na sua prática pedagógica. Entretanto, outros docentes se encontram em outro estágio em relação à apropriação das TDIC – novas práticas pedagógicas convivem com as tradicionais na busca de ganhos pedagógicos.
REFERÊNCIAS BRITO, G. S.; PURIFICAÇÃO, I. Educação e novas tecnologias um repensar. 2.ed. Curitiba: Intersaberes, 2015. 104
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DIOGO, R. C.; GOBARA, S. T. Formação continuada para o uso das tecnologias no ensino de Ciências : mudança no sentido pessoal de uma professora. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 9., 2017, Florianópolis. Anais... Florianopolis: UFSC, 2017. https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4697/1. Acesso em: 23 mar. 2019. JUNIOR, J. B. B. Do Computador ao Tablet: Vantagens Pedagógicas na Utilização de Dispositivos Móveis na Educação. Revista Educação Online, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 125-148, 2012. LEMOS, A. Cibercultura – tecnologia e vida social na cultura contemporânea. 8. ed. Porto Alegre: Sulina, 2015. LEMOS, A; CUNHA, P. (ORG). Olhares sobre a Cibercultura. Sulina, Porto Alegre, 2003. LÉVY, P. Cibercultura 1. ed. São Paulo: Editora 34, 1999.
MOREIRA, H.; CALEFFE, L. G. Metodologia para o professor pesquisador. Rio de Janeiro: Editora DP&A, 2006. NÓVOA, A. Escola nova. A revista do Professor. Ed. Abril. 2002. OLIVEIRA, T. T. Uso das TICs no ensino de biologia: um olhar docente. 2013. 35 f. Monografia (Especialização em Educação) – Setor de Educação, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Medianeira. 2013. Disponível em: http://repositorio.roca.utfpr.edu.br/. Acesso em: 11 set. 2019. ROSA, R. S. Tecnologias da informação e comunicação como recurso instrucional para uma unidade didática sobre a relação entre força e movimento. 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado Profissional de Ensino em Ensino em Física) – Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2012. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/83674. Acesso em: 14 mar. 2019. SANTOS, R. P. Sequência didática para o ensino de cinemática através de vídeo análise baseada na teoria da aprendizagem significativa. 2016. 125 f. Dissertação (Mestrado Profissional de Ensino em Ensino em Física), Universidade Federal Fluminense, Volta Redonda. 2016. Disponível em: SILVA, D. O. As tecnologias e suas linguagens: possibilidades do uso didático de fragmentos de filmes, áudios e imagens. Cadernos PDE (Governo do Estado do Paraná), v. 2, 2016.
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MAZIERO, S. M. B; BRITO, G. S. Conceitos de tecnologia e cultura digital: implicações no cotidiano das escolas do Paraná. In: CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 12., 2015. Anais... eletrônico... Disponível em: https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2015/18524_8602.pdf. Acesso em: 25 mar. 2019.
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Proposta de modelo de avaliação de fornecedores como ferramenta para a fiscalização de contratos de prestação de serviços de natureza continuada: estudo de caso em uma autarquia no município de Manaus-AM Proposal of a supplier evaluation model as a tool for the supervision of continued service contracts: a case study in an autorchy in the city of Manaus/AM abstract BATALHA, Lucas de Souza47 GUASTI, Susana Pitol48
RESUMO O presente trabalho teve como objetivo propor uma ferramenta efetiva de fiscalização dos contratos de prestação continuada celebrados pela autarquia do município de Manaus-AM por meio de um aprimoramento na avaliação de fornecedores. Para tanto, as necessidades foram identificadas junto aos fiscais contratuais para servir de subsídio para a elaboração da avaliação, bem como foram estabelecidos os quesitos a serem avaliados e a nota mínima para identificar os fornecedores qualificados. O fiscal contratual deve estar capacitado para exercer a fiscalização, pois a má execução contratual pode ensejar responsabilização a este agente da Administração Pública. A avaliação de fornecedores, requisito importante da ISO 9001, pode auxiliá-lo na tarefa. Para atingir os objetivos do trabalho, foi realizado um fichamento para elaboração do referencial teórico da pesquisa. Em seguida, a pesquisa bibliográfica aprofundou-se para buscar referências de avaliação de fornecedores já existentes no âmbito da Administração Pública. Dentre elas, foi adotado o modelo do Governo do Estado de Minas Gerais. A pesquisa de campo foi efetuada com auxílio de um questionário fechado para os fiscais dos contratos da autarquia. Ao analisar os dados obtidos pelo questionário, optou-se por elaborar um formulário de avaliação fechado, para atribuir as pontuações automaticamente à medida em que o fiscal marcasse a opção mais pertinente para cada item avaliativo. A nota mínima de 70 pontos estabelecida para definição de fornecedor qualificado, sugerida neste trabalho, pode ser aumentada à medida em que os fiscais participem das etapas de planejamento e tenham mais consciência da correta fiscalização na execução contratual. Palavras-chave: Avaliação de fornecedores. Fiscalização. Serviços de natureza continuada.
ABSTRACT The present work focused on proposing an effective tool of inspection of the contracts of continuous provision celebrated by the municipality of Manaus, Amazonas State, through an improvement in the Evaluation of Suppliers. For this, the needs were identified with the contractual inspectors in order to to serve as a subsidy for the preparation of the evaluation, as well as the items to be evaluated and the minimum score to identify qualified suppliers were established. The contractual inspector must be able to exercise supervision; as poor contractual execution may give rise to accountability for this Public Administration agent. Supplier 47 Graduado em Engenharia Civil pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA (2014). 48 Mestre em Educação pela Universidade Tuiuti do Paraná, UTP (2009); Especialista em Administração e Marketing pelo Instituto de Ciências Sociais do Paraná (2002); Graduada em Administração de Empresas pelo Instituto de Ciências Sociais do Paraná (2000). Professora da FAEL.E-mail: susana.guasti@fael.com.br.
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ssessment, an important requirement of ISO 9001, can assist you in the task. In order to achieve the objecA tives of the work, a form was prepared in order to elaborate the theoretical framework of the research. Then, the bibliographic research was carried out to search for references of evaluation of suppliers already in the scope of Public Administration. Among them, the Minas Gerais State Government model was adopted. The field research was carried out with the help of a closed questionnaire for the inspectors of the autarchy contracts. When analyzing the data obtained by the questionnaire, it was decided to elaborate a closed Evaluation form, to automatically assign the scores as the inspector selected the most relevant option for each evaluation item. The minimum score of 70 points established for the definition of qualified supplier, suggested in this work, can be increased as the inspectors participate in the planning stages and are more aware of the correct inspection in the contractual execution. Keywords: Supplier Evaluation. Inspection. Continued Services.
Para o funcionamento da máquina pública, a Administração necessita celebrar contratos com outras pessoas jurídicas. O artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal de 1988 determina como regra que as obras, serviços, compras e alienações deverão ser contratados mediante procedimento licitatório, ressalvados os casos especificados na legislação. A Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993, que instituiu normas para licitações e contratos da Administração Pública, foi sancionada para regulamentar o artigo supracitado. O artigo 55, parágrafo 1º da referida lei define que os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para a sua execução expressas em cláusulas que definam os direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam. O artigo 67 do mesmo diploma estabelece que a execução do contrato deverá ser fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado. A finalidade do artigo 67 da Lei n. 8.666/1993 é assegurar que os anseios da Administração quanto às contratações pretendidas sejam cumpridos, sendo que tais anseios devem sempre primar pelo interesse público. O objeto contratual deve ser plenamente atendido, conforme cláusulas constantes do instrumento convocatório, do termo de referência ou projeto básico, do contrato e da legislação pertinente. Ainda, deve ser garantido o bom uso do dinheiro público, promovendo os resultados esperados com o menor custo possível. No atual contexto, em que a sociedade como um todo amplia a vigilância sobre os atos do Estado, torna-se imperiosa a especial atenção em relação às atribuições dos fiscais contratuais. Os recentes acórdãos do Tribunal de Contas da União “n. 1224/2018 – TCU – Plenário” e “n. 1225/2018 – TCU – Plenário” consagram este entendimento, em que detectaram, como não atendimento da legislação em vigor em um caso concreto, a não elaboração de instrumento equivalente ao livro de registro de ocorrências durante a fiscalização de contratos, bem como a necessidade de a Administração verificar se o fiscal do contrato a ser designado detém as competências necessárias para cumprir o encargo.
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INTRODUÇÃO
Para fiscalizar um contrato, o fiscal designado deve sentir-se capacitado para a realização da função. Não basta apenas o conhecimento técnico do objeto do contrato. O fiscal deve ter conhecimento das cláusulas e das boas práticas de fiscalização, ser proativo e estar comprometido com suas atribuições. A má execução contratual pode ensejar sanções ao fiscal nos âmbitos penal, civil ou administrativo. Entretanto, por muitas vezes os fiscais não são devidamente preparados para realizar tamanha atribuição. Embora o dirigente máximo de um órgão ou entidade tenha a prerrogativa de nomear um servidor para fiscalizar o contrato, ele também deve propiciar ao fiscal a devida capacitação para realizar a função. A importância do fiscal fica mais evidente quando da fiscalização de contratos de serviços de prestação continuada. Estes contratos envolvem serviços que, em caso de interrupção de sua prestação, podem acarretar prejuízos significantes à Administração Pública. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Neste contexto, uma ferramenta que pode ser aplicada na fiscalização contratual é a avaliação de fornecedores. Ela é um importante requisito da ISO 9001, que é a norma que certifica um sistema de gestão da qualidade. A avaliação de fornecedores busca garantir a qualidade do produto a ser entregue ao cliente, que no caso é a própria Administração Pública. Foi realizado um estudo de caso em uma autarquia, integrante da Administração Pública do município de Manaus-AM. A organização possui certificação ISO 9001, que tem como um de seus pressupostos a melhoria contínua. Consequentemente, a organização possui sua avaliação de fornecedores conforme preconiza a norma da qualidade, que pode ser aprimorada para a melhor fiscalização contratual. O objetivo geral deste trabalho é propor uma ferramenta efetiva de fiscalização dos contratos de prestação continuada celebrados pela autarquia do município de Manaus-AM, baseada na realidade da organização, por meio de um aprimoramento na avaliação de fornecedores já existente na autarquia. Já os objetivos específicos deste trabalho são:
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2 identificar os fatores críticos e as necessidades junto aos fiscais contratuais, para servir de subsídio para a elaboração da avaliação de fornecedores; 2 definir os quesitos a serem avaliados por meio da avaliação de fornecedores, relacionados com a qualidade e atendimento da empresa; 2 estabelecer nota mínima para identificar os fornecedores qualificados. Como metodologia para atingimento do objetivo proposto, primeiramente foi realizado um fichamento, após pesquisa bibliográfica em obras de autores renomados no ramo do Direito Administrativo, para elaboração do referencial teórico da pesquisa. Em seguida, a pesquisa bibliográfica aprofundou-se para buscar referências de avaliação de fornecedores já existentes no âmbito da Administração Pública. A pesquisa de campo foi efetuada com auxílio de um questionário fechado para os fiscais dos contratos da autarquia, a fim de subsidiar a elaboração da avaliação de fornecedores estabelecendo os quesitos e as notas mínimas necessárias para a elaboração da avaliação de fornecedores com base no modelo do Governo do Estado de Minas Gerais. Uma pesquisa aplicada foi realizada, visto que a proposta de avaliação de fornecedores foi elaborada com o intuito de melhorar, na prática, a fiscalização de contratos administrativos. Quanto aos objetivos, a pesquisa é descritiva, pois é considerada a necessidade de aprimoramento da fiscalização contratual e de proposição de solução para o problema dentro da organização estudada. Quanto à abordagem, é uma pesquisa qualitativa, considerando que as informações coletadas junto aos fiscais foram interpretadas para a elaboração da avaliação de fornecedores. O método utilizado nesta pesquisa é o hipotético-dedutivo.
REFERENCIAL TEÓRICO Fiscalização contratual Segundo Santos Filho (2015, p. 177), pode-se definir contrato administrativo como o “ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma forma, traduza interesse público”. Devido à necessidade de satisfazer o interesse público nas contratações firmadas pelo poder público, Santos (2015) esclarece que, em razão disto, são atribuídas ao poder público certas prerrogativas exorbitantes. Uma destas prerrogativas é a fiscalização contratual. Sobre este tema, é preciso considerar que: a prerrogativa, que possui a administração, de controlar e fiscalizar a execução do contrato administrativo é um dos poderes a ela inerentes e, por isso, a doutrina assevera estar esse poder implícito em toda contratação pública, dispensando cláusula expressa. De qualquer forma, a Lei 8.666/1993 expressamente 108
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enumera como prerrogativa da administração a fiscalização da execução dos contratos administrativos (art. 58, III) (PAULO; ALEXANDRINO, 2014, p. 550).
Para os contratos de serviços de natureza continuada, a fiscalização deve ser ainda mais rigorosa, pois, de acordo com o Tribunal de Contas da União: o caráter contínuo de um serviço é determinado por sua essencialidade para assegurar a integridade do patrimônio público de forma rotineira e permanente ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do ente administrativo, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional (BRASIL, 2008).
Conforme ensina Justen Filho (2014), o agente da Administração deve acompanhar o desenvolvimento da atividade que é decorrente do objeto do contrato. Para isso, ele deve anotar todas as ocorrências relevantes e documentar eventuais faltas contratuais. Então, “cabe a este agente determinar as medidas que deverão ser adotadas pelo contratado para regularizar as faltas eventualmente constatadas na execução do contrato, de modo a assegurar a sua perfeita execução” (VARESCHINI, 2014, p. 391).
O registro da fiscalização, na forma prescrita em lei, não é ato discricionário. É elemento essencial que autoriza as ações subsequentes e informa os procedimentos de liquidação e pagamento dos serviços. É controle fundamental que a administração exerce sobre o contratado (BRASIL, 2009).
Diante da relevância da tarefa, Santos Filho (2015) ressalta para a importância de o fiscal ser devidamente orientado e capacitado para o regular exercício da função, devendo ter pleno conhecimento de todas as cláusulas que norteiam o contrato fiscalizado. Por outro lado, Santos Filho (2015, p. 189) pontua que estruturas administrativas menores que “tenham em execução um número reduzido de contratos simultaneamente podem exercer o controle satisfatoriamente pela indicação de representante designado (fiscal) tão somente”. A autarquia estudada possui aproximadamente 90 servidores em seu quadro, o que deve ser considerado na elaboração da avaliação de fornecedores em relação à sua complexidade.
Avaliação de fornecedores Para os fiscais avaliarem as empresas que prestam serviços para a Administração Pública por meio dos contratos administrativos, um bom método pode ser a avaliação de fornecedores, prevista na ABNT NBR ISO 9001:2008.
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A importância dos registros da fiscalização é ressaltada pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União, conforme a seguir:
A organização deve avaliar e selecionar fornecedores com base na sua capacidade em fornecer produto de acordo com os requisitos da organização. Critérios para seleção, avaliação e reavaliação devem ser estabelecidos. Devem ser mantidos registros dos resultados das avaliações e de quaisquer ações necessárias, oriundas da avaliação (ABNT, 2008).
Macohin (2012) leciona que neste método são definidos aspectos e critérios de avaliação como qualidade, pontualidade, entre outros. Tais aspectos devem estar bem definidos, tanto para a Administração contratante quanto para os fornecedores e prestadores avaliados, pois é por meio deles que será realizada e compilada a efetiva avaliação dos fornecedores. O autor menciona que a avaliação e qualificação de fornecedores têm seu início quando do processo de aquisição. Isso quer dizer que os fornecedores devem ser informados, desde o início, sobre como será avaliado seu desempenho dentro da organização. Macohin (2012, p. 54) ainda cita que “avaliar e qualificar os fornecedores são desafios constantes e, na maioria dos casos, tornam-se o calcanhar de Aquiles das organizações”. A prática de avaliar empresas e identificar falhas na execução pode inibir alguns comportamentos prejudiciais em uma relação contratual. Para a Administração Pública, é importante ressaltar que: a avaliação dos fornecimentos e dos fornecedores (após o fornecimento), na Administração Pública, só terá valor se houver embasamento jurídico. A Lei nº 8.666/93 descreve, nos artigos 86 a 88, as sanções administrativas para o caso de inexecução dos contratos. Toda avaliação dos fornecedores deverá ter Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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como base a letra da referida lei, que prevê: a) advertência; b) multa (prevista no contrato); c) suspensão temporária de participação em licitações (prazo máximo de dois anos); d) declaração de inidoneidade para licitação (com direito à reabilitação). Todas fundamentadas em critérios objetivos e devidamente formalizadas (COSTA, 1998, p. 6).
Logo, ao propor uma ferramenta de avaliação, a Administração Pública deve sempre levar em consideração o princípio da legalidade, ou seja, ela deve realizar seus atos sempre em conformidade com a legislação em vigor.
DESCRIÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA
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A organização estudada é uma autarquia, ou seja, faz parte da Administração Pública Indireta do município de Manaus-AM. De acordo com o Decreto-Lei n. 200/1997, autarquia é um “serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios para executar atividades típicas de Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”. A organização possui aproximadamente 90 servidores em seu quadro funcional, o que dá para caracterizá-la como uma entidade pública com uma estrutura administrativa reduzida. A organização possui a certificação ISO 9001 – Sistema de Gestão da Qualidade, sendo que, em agosto de 2018, recebeu a recomendação da manutenção da certificação com a transição aprovada para a versão ISO 9001:2015, que é a mais recente do sistema. Desde 2014, a autarquia possui uma avaliação de fornecedores que é aplicada a cada seis meses nos contratos de serviços de prestação continuada. A autarquia tem 30 contratos de serviços de natureza continuada, sendo que estes são distribuídos entre 20 servidores. Os contratos envolvem os mais diversos serviços, como limpeza, manutenção de condicionadores de ar, manutenção de sistemas da informação, vigilância orgânica e eletrônica, call center, consultorias etc.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O procedimento realizado, após pesquisa bibliográfica, teve por intuito analisar o processo de avaliação de fornecedores existente, visto que já havia uma avaliação de fornecedores aplicada na autarquia. Foi verificado até que ponto ela atendia às necessidades da organização e, principalmente, quais indicadores são importantes para a avaliação. Observou-se, então, que a avaliação abrangia quesitos de qualidade e pontualidade. A avaliação de fornecedores da autarquia abrange quatro itens, que são: prazo de execução dos serviços, disponibilidade do prestador quando solicitado, atendimento e prestatividade da empresa quanto a eventuais questionamentos e atendimento às especificações contidas no projeto básico ou termo de referência. Os dois primeiros itens possuem peso 3, enquanto os dois últimos possuem peso 7. Os fiscais atribuem notas de 0 a 10 para cada item. Se a nota final, considerando a aplicação dos pesos, tiver a média acima de 7,0 (sete) pontos, o fornecedor pode ser considerado um fornecedor qualificado. Em paralelo, foi feito o questionário fechado junto aos fiscais da autarquia. Para fins desta pesquisa, considerou-se como população-alvo 20 servidores que desempenham a função de fiscal de contratos de serviços continuados que estão em andamento na instituição. Tendo em vista que o universo da pesquisa é pequeno, não foi definida amostra. Por se tratar de uma pesquisa de natureza voluntária, 16 dos 20 questionários foram respondidos no período de 29 a 31 de agosto de 2018. Em relação aos não respondidos, não restou outra alternativa senão respeitar a decisão dos fiscais. De fato, houve um retorno de 80%, índice que pode ser considerando bastante representativo para a pesquisa. O objetivo do questionário foi entender a percepção dos agentes acerca de suas atribuições de fiscalização dentro da organização e verificar qual a importância, para eles, da melhoria da avaliação de fornecedores na autarquia. A partir disso, foram estabelecidos os indicadores importantes para avaliação, no âmbito da organização, e qual deve ser o nível de importância de cada um deles para atribuição das notas mínimas. 110
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Proposta de modelo de avaliação de fornecedores como ferramenta para a fiscalização de contratos de prestação de serviços
O questionário foi feito com questões fechadas, dividido em duas partes. A primeira parte é o mero preenchimento de dados pessoais, enquanto a segunda parte aborda as opiniões do fiscal sobre suas tarefas de fiscalização e sobre a importância da avaliação de fornecedores. Após estes procedimentos, foi elaborada a proposta de avaliação de fornecedores propriamente dita.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS Resultados do questionário aplicado As respostas aos questionários foram coletadas, e os dados do levantamento de campo estão dispostos a seguir: Tabela 1 – Resultados do questionário – dados pessoais
Perguntas
Qtde
%
Feminino
4
25,00%
Masculino
12
75,00%
Total
16
100,00%
2. Faixa etária
18 a 29 anos
2
12,50%
30 a 39 anos
9
56,25%
40 a 50 anos
3
18,75%
Mais de 50 anos
2
12,50%
16
100,00%
3. Formação
Ensino Médio
1
6,25%
Ensino Superior Incompleto
1
6,25%
Ensino Superior Completo
4
25,00%
Especialização ou MBA
9
56,25%
Mestrado ou doutorado
1
6,25%
16
100,00%
4. Há quanto tempo trabalha na autarquia?
Menos de 1 ano
-
-
Entre 1 e 2 anos
1
6,25%
Entre 2 e 3 anos
9
56,25%
Mais de 3 anos
6
37,50%
16
100,00%
Total
Total
Total
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1. Sexo
Fonte: dados da pesquisa.
Em relação ao gênero, observa-se que 75% dos entrevistados pertencem ao sexo masculino. Entretanto, tal diferença não é significativa para o resultado da pesquisa. Quanto à idade, 87,5% possuem no mínimo 30 anos de idade, o que sugere que a população de fiscais é formada por pessoas que possuem know-how para exercer as atribuições. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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Quando questionados sobre o nível de escolaridade, os mesmos 87,5% possuem, no mínimo, ensino superior completo, sendo que a maior parte possui especialização ou MBA. Esse resultado possui um significado relevante para a pesquisa, pois a qualificação profissional dos fiscais foi levada em consideração para a elaboração da avaliação de fornecedores. A expressiva maioria dos fiscais possui, no mínimo, dois anos trabalhando na autarquia. Eles equivalem a 93,75% da população estudada, o que sugere que boa parte dos fiscais já está acostumada com a cultura da ISO 9001 na organização, que prevê a avaliação de fornecedores em paralelo com a fiscalização contratual. A seguir, são apresentados os demais resultados do questionário: Tabela 2 – Resultados do questionário – conhecimento e percepção dos fiscais acerca das atribuições de fiscalização
Perguntas
Qtde
%
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5. Há quanto tempo você atua como fiscal de contratos? Menos de 1 ano
4
25,00%
Entre 1 e 2 anos
7
43,75%
Entre 2 e 3 anos
2
12,50%
Mais de 3 anos
3
18,75%
16
100,00%
1
11
68,75%
2
2
12,50%
3
1
6,25%
Mais de 3
2
12,50%
16
100,00%
7. Você sempre tomou ciência de que seria fiscal do contrato antes da formalização do ato de sua designação?
Sempre
9
56,25%
Às vezes
5
31,25%
Nunca
2
12,50%
Total
16
100,00%
8. Você já participou de algum evento de capacitação (fórum, seminário, curso ou treinamento) sobre fiscalização de contratos?
Sim
3
18,75%
Não
13
81,25%
Total
16
100,00%
Sim
2
12,50%
Não
1
6,25%
Não se aplica
13
81,25%
Total
16
18,75%
Total 6. Quantos contratos você fiscaliza?
Total
8.1 Se sim, você entende que o(s) evento(s) de capacitação forneceu(forneceram) conteúdo suficiente para realizar as atribuições de fiscalização?
112
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Qtde
%
9. Como você classifica o seu conhecimento na Lei de Licitações e Contratos n. 8.666/1993?
Suficiente
3
18,75%
Insuficiente
13
81,25%
Total
16
100,00%
10. Você anota, em registro próprio, todas as ocorrências do contrato que são relevantes?
Sim
2
12,50%
Não
9
56,25%
Parcialmente
5
31,25%
16
100,00%
Sim
10
62,50%
Não
5
31,25%
Parcialmente
1
6,25%
16
100,00%
Sim
12
75,00%
Não
4
25,00%
Total
16
100,00%
14
87,50%
A maioria
1
6,25%
A minoria
1
6,25%
Nenhum
0
0,00%
16
100,00%
14. Você possui dificuldades para conciliar a função de fiscal de contratos com outras atribuições da sua rotina de trabalho como servidor público?
Sim
0
0,00%
Não
14
87,50%
2
12,50%
16
100,00%
Total 11. Você possui ou estão disponibilizadas para você as cópias do Projeto Básico/Termo de Referência, do Contrato, dos termos aditivos, da proposta da contratada e dos demais documentos indispensáveis à fiscalização?
Total 12. Você mantém contato com a empresa contratada (com o preposto ou diretamente)?
13. Em relação aos contratos que fiscaliza, quantos abrangem sua área de atuação? Todos
Total
Parcialmente Total 15. Você possui qual grau de conhecimento das cláusulas constantes nos instrumentos contratuais e nos projetos básicos/termos de referência?
Acima do satisfatório
-
Apenas o necessário Insuficiente Total Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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10
62,50%
6
37,50%
16
100,00%
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Perguntas
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Perguntas
Qtde
16. Você possui qual grau de conhecimento acerca da legislação que trata dos serviços constantes do contrato? Acima do satisfatório Apenas o necessário Insuficiente Total 17. Você acredita que a melhoria na avaliação de fornecedores pode contribuir para a fiscalização contratual? Sim Não Total
%
1 10 5 16
6,25% 62,50% 31,25% 100,00%
16 0 16
100,00% 0,00% 100,00%
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Fonte: dados da pesquisa.
É importante destacar que, dos 16 entrevistados, 5 fiscalizam dois contratos ou mais. Não há limitação legal quanto ao número de contratos que cada servidor pode fiscalizar. Contudo, é importante evitar que este quantitativo exceda um contrato por servidor, de modo a garantir: a efetiva fiscalização contratual; o cumprimento, por parte do contratado, das obrigações acordadas; e a imposição da adoção de medidas corretivas no tempo oportuno, caso sejam identificadas falhas. Boa parte deles já atua como fiscal de contratos há mais de um ano, que equivalem a um montante de 75% dos fiscais. Mesmo assim, 81,25% nunca participaram de nenhum evento de capacitação sobre fiscalização de contratos. O mesmo montante considera que os seus conhecimentos sobre a Lei de Licitações e Contratos n. 8.666/1993 são insuficientes para o exercício das atribuições. A maioria dos entrevistados também relatou que não anota, em registro próprio, as ocorrências do contrato (56,25%). Por outro lado, a maioria dos fiscais possui as cópias dos documentos pertinentes ao contrato para auxílio na fiscalização, mantém contato com a empresa contratada, fiscaliza contratos que abrangem a sua área de atuação, não possui dificuldades em conciliar a função de fiscal com as demais atribuições e possui conhecimento necessário sobre a legislação e as cláusulas que regem o contrato. O resultado mais expressivo, que abrange o tema central desta pesquisa, é que 100% dos fiscais consideram que a avaliação de fornecedores pode contribuir para a melhoria na fiscalização contratual. Este trabalho busca propor um modelo visando o atingimento deste objetivo.
Proposta de avaliação de fornecedores Ao analisar a avaliação de fornecedores existente na autarquia, averiguou-se a necessidade de uma maior objetividade na avaliação. Além disso, observou-se que a avaliação não abrangia questões como a verificação documental, que, a título de exemplo, em caso de irregularidade da empresa perante seus tributos, pode acarretar até interrupção da prestação do serviço. Justen Filho (2010) leciona que, em alguns casos, a Administração pode ser responsabilizada pelo descumprimento das obrigações tributárias da contratada e que o ente público possui a prerrogativa de verificar e exigir a comprovação da regularidade fiscal. A partir das respostas dos questionários, vislumbrou-se a possibilidade de elaborar um formulário fechado, que atribuísse as pontuações automaticamente à medida em que o fiscal marcasse a opção mais pertinente para cada item avaliativo. Também se notou uma necessidade de estabelecer uma periodicidade máxima de 6 meses para que a avaliação fosse preenchida, bem como que a avaliação propiciasse a oportunidade de os fiscais colocarem as ocorrências contratuais, visto que a maioria não costuma utilizar o registro próprio conforme preconiza a Lei de Licitações e Contratos n. 8.666/1993. Após ampla pesquisa, um modelo de avaliação de fornecedores aplicado pelo Governo do Estado de Minas Gerais foi adotado para servir como referência para elaboração do formulário de avaliação. 114
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Proposta de modelo de avaliação de fornecedores como ferramenta para a fiscalização de contratos de prestação de serviços
Figura 1 – Avaliação de fornecedores Período avaliado:
FICHA DE AVALIAÇÃO DE SERVIÇO CONTINUADO
DADOS DA EMPRESA AVALIADA Nome do prestador, nº processo, nº do empenho, descrição dos serviços RESPONSÁVEIS PELA AVALIAÇÃO Nome do(a) gestor(a)
Nome do(a) fiscal
Portaria de Fiscalização nº
AVALIAÇÃO PARTE 1 – COMPETÊNCIA DO FISCAL QUESITO 1: Índice/Resolução das ocorrências Subquesito 1: Índice de ocorrências registradas que o prestador deu causa 1. Alto índice de ocorrências registradas, ou qualquer ocorrência de alta criticidade.
(
2. Médio índice de ocorrências registradas.
(
3. Baixo índice de ocorrências registradas.
(
) Combinar este subquesito “Índice de ocorrências registradas” com o subquesito ) “Resolução das ocorrências registradas” ) para apuração da nota parcial.
(
)*
4. Sem ocorrências.
QUALIDADE
Subquesito 2: Resolução das ocorrências registradas. a) O prestador resolveu as ocorrências, sem gerar prejuízos.
(
)
b) O prestador resolveu as ocorrências, mas gerou algum tipo de prejuízo.
(
)
c) O prestador não resolveu as ocorrências.
(
)
*Caso esta opção seja marcada,não necessita preencher o item “Resolução das ocorrências registradas”).
Verificar nota a ser aplicada para o quesito na tabela 3.
Observações, sugestões, elogios, reclamações (em relação às ocorrências registradas)
(
)
Nota Parcial = 30
2. O prestador prestou um atendimento inadequado de baixa criticidade.
(
)
Nota Parcial = 15
3. O prestador prestou um atendimento inadequado de alta criticidade.
(
)
Nota Parcial = 0
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QUESITO 2: Pessoal envolvido, mão de obra, materiais e equipamentos adequados 1. O prestador prestou um atendimento adequado.
Observações, sugestões, elogios, reclamações (em relação ao atendimento do pessoal envolvido, mão de obra, materiais e equipamentos envolvidos)
VERIFICAÇÃO DOCUMENTAL
AVALIAÇÃO PARTE 2 – COMPETÊNCIA DO GESTOR QUESITO 3: Nota fiscal e documentação complementar 1. Nota Fiscal/Documentação complementar corretas na 1ª análise.
(
)
Nota Parcial = 15
2. Nota fiscal/Documentação complementar necessitaram de ajustes na 1ª análise, mas o prestador resolveu tempestivamente e não comprometeu o prazo de pagamento.
(
)
Nota Parcial = 10
3. Nota fiscal e/ou documentação complementar necessitaram de ajustes na 1ª análise, mas o prestador não resolveu tempestivamente e comprometeu o prazo de pagamento.
(
)
Nota Parcial = 0
Observações, sugestões, elogios, reclamações (em relação à Nota Fiscal e documentação complementar)
QUESITO 4: Certidões negativas válidas 1. As certidões negativas permaneceram válidas durante todo o período de contratação
(
)
Nota Parcial = 15
2. Alguma das certidões negativas venceu no decorrer do processo, mas não prejudicou a contratação, a execução ou pagamento do prestador.
(
)
Nota Parcial = 10
3. Alguma das certidões negativas venceu no decorrer do processo, e prejudicou a contratação, a ( execução ou o pagamento do prestador.
)
Nota Parcial = 0
Observações, sugestões, elogios, reclamações (em relação às certidões negativas)
Data da avaliação do gestor: _____/_____/______
Assinatura do gestor:
AVALIAÇÃO PARTE 3 – APURAÇÃO DA NOTA FINAL QUESITOS
NOTA
1: Índice/Resolução das ocorrências 2: Pessoal envolvido, mão de obra, materiais e equipamentos adequados 3: Nota fiscal e documentação complementar 4: Certidões negativas válidas NOTA FINAL (SOMA DAS NOTAS PARCIAIS) NOTA FINAL MÍNIMA Supervisão:
70
Aprovação:
Fonte: dados da pesquisa. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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A avaliação de fornecedores possui 4 quesitos, sendo 2 referentes ao item “qualidade” e 2 referentes ao item “verificação documental”. Na autarquia, por ter uma estrutura administrativa mais enxuta, o gestor é quem possui a atribuição de realizar a verificação documental da empresa, que inclui a nota fiscal e as certidões, embora a recente Instrução Normativa n. 05/2017 orienta que é o fiscal administrativo que deve realizar este tipo de conferência. A avaliação de fornecedores da autarquia possui o item “prazo de execução”. Optou-se por retirar este item da proposta de avaliação de fornecedores de que trata o presente trabalho, pois serviços contínuos, “por sua natureza, não são passíveis de avaliação quanto a este critério” (GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, 2013). A avaliação consiste em notas que vão de 0 até 100 pontos, que são atribuídas à medida em que o fiscal e o gestor do contrato ponderam e marcam qual é a alternativa que mais se encaixa dentro do período avaliado, que não pode ultrapassar 6 meses de execução. A nota final mínima para um fornecedor ser considerado fornecedor qualificado é 70 pontos.
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Para totalizar os 100 pontos, o quesito 1 possui nota máxima de 40 pontos, o quesito 2 possui nota máxima de 30 pontos, o quesito 3 possui nota máxima de 15 pontos e o quesito 4 possui nota máxima de 15 pontos. O quesito 1, “índice/resolução das ocorrências”, busca verificar as ocorrências negativas que houveram durante o período avaliado e a forma como a contratada agiu em relação a essas ocorrências. Uma nota é atribuída quando o fiscal avalia os dois subquesitos, que são o índice das ocorrências registradas e a resolução das ocorrências registradas. Para saber qual é a nota, o fiscal deve consultar a tabela a seguir: Tabela 3 – Quesito 1: índice/resolução das ocorrências
Nota parcial Itens
a) Resolução sem b) Resolução das ocorrências, c) Não gerar prejuízos gerando algum tipo de prejuízo resolução
1. Alto índice de ocorrências registradas, ou qualquer ocorrência de alta criticidade.
15
0
0
2. Médio índice de ocorrências registradas.
30
10
0
3. Baixo índice de ocorrências registradas.
40
20
0
4. Sem ocorrências.
40
Fonte: dados da pesquisa.
O quesito 2, “pessoal envolvido, mão de obra, materiais e/ou equipamentos empregados”, tem o intuito de verificar se o pessoal envolvido, os materiais e/ou os equipamentos empregados estão conforme especificações do edital/contrato, em quantidade e qualidade. Devido à diversidade de tipos de contratos da autarquia, este quesito necessitou ser mais abrangente. O quesito 3, “nota fiscal e documentação complementar”, visa verificar se o prestador apresentou, tempestivamente e após a finalização dos serviços, a nota fiscal e a documentação complementar de forma correta. Já o quesito 4, “certidões negativas válidas”, tem o objetivo de verificar a regularidade fiscal e trabalhista da empresa no momento da contratação, da execução e do pagamento dos serviços. Para cada preenchimento nos quesitos, exceto o quesito 1 que necessita consultar a tabela, a própria avaliação de fornecedores já indica qual é a nota parcial a ser aplicada à contratada. Assim, é possível apurar de forma prática, ao fim da avaliação, a nota final da empresa. O campo das observações também serve aos fiscais para que registrem as ocorrências do contrato, a fim de cumprir o dispositivo legal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa buscou propiciar aos fiscais da autarquia um modelo de avaliação de fornecedores prático e eficiente, para que, a partir dele, a organização possa ter elementos para a tomada de decisão em relação a cada 116
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Proposta de modelo de avaliação de fornecedores como ferramenta para a fiscalização de contratos de prestação de serviços
contrato, bem como criar indicadores de desempenho e adequar-se ainda mais ao sistema de gestão da qualidade proposto pela norma ABNT NBR ISO 9001:2015. A avaliação de fornecedores pode ser aprimorada ao estabelecer critérios de julgamento, ao ter sua periodicidade ajustada ou ao esclarecer alguns pontos que podem ser feitos em trabalhos futuros ou na própria organização. Durante o trabalho, também buscou-se estudar o panorama dos fiscais dos contratos dentro da organização. Percebe-se que eles possuem qualificação profissional para exercer a função. Conforme Santos (2015), os fiscais devem fiscalizar diuturnamente e buscar a execução satisfatória do objeto do contrato. Entretanto, questões específicas da legislação que rege o tema de contratos ainda estão obscuras, o que demanda que a organização providencie capacitações na área de fiscalização contratual a fim de evitar e solucionar quaisquer transtornos durante a execução do contrato e atender às exigências do Tribunal de Contas da União.
Para ser implantada a nova avaliação de fornecedores, também se torna necessário um treinamento específico, a fim de que a cultura da avaliação fique cada vez mais evidente para o auxílio na fiscalização dos contratos de prestação de serviços de natureza continuada.
REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS E TÉCNICAS. NBR ISO 9001:2008. Sistemas de gestão da qualidade – requisitos. Rio de Janeiro, 2008. BRASIL. Decreto-Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 fev 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-Lei/Del0200.htm. Acesso em: 31 jul. 2018. BRASIL. Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21 jun 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8666cons.htm. Acesso em: 1 jul. 2018. BRASIL. Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Secretaria de Gestão. Instrução Normativa n. 05, de 26 de maio de 2017. Dispõe sobre as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 mai. 2017.
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A nota mínima de 70 pontos para definição de fornecedor qualificado, sugerida neste trabalho, pode ser aumentada à medida em que os fiscais participem das etapas de planejamento e tenham mais consciência da correta fiscalização na execução contratual.
BRASIL. Tribunal de Contas da União. 2ª Câmara. Recurso de reconsideração. argumentos parcialmente procedentes. Sujeição do grupo Petrobras à lei de licitações. Caracterização de serviços contínuos. Provimento parcial. Acórdão n.º 132/2008 – TCU – 2ª Câmara. Interessado: Petrobras Transporte S/A - Transpetro. Relator: Min. Aroldo Cedraz. Brasília, 12 de fevereiro de 2008. Disponível em: https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHighLig ht?key=41434f5244414f2d434f4d504c45544f2d3337323435&sort=RELEVANCIA&ordem=DESC&bases= ACORDAO-COMPLETO;&highlight=&posicaoDocumento=0&numDocumento=1&totalDocumentos=1. Acesso em: 1 jul. 2018. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Levantamento de auditoria. DNIT. Execução contratual. Acompanhamento deficiente. Multa. Pedido de reexame. Ausência de elementos capazes de desconstituir a deliberação recorrida. Conhecimento e não provimento. Acórdão n. 226/2009 – TCU – Plenário. Interessado: Gilberto Massucheto. Relator: Min. Walton Alencar Rodrigues. Brasília, 18 de fevereiro de 2009. Disponível em: https://contas.tcu.gov.br/pesquisaJurisprudencia/#/detalhamento/11/*/KEY:ACORDAOCOMPLETO-1123423/DTRELEVANCIA%20desc/false/1. Acesso em: 3 jul. 2018. Faculdade Educacional da Lapa – FAEL
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BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Relatório de auditoria no âmbito da FOC realizada sobre a governança e gestão das aquisições das universidades e institutos federais. Irregularidades e impropriedades identificadas na entidade auditada. Determinações. Recomendações. Plano de ação. Ciência das ocorrências. Acórdão n. 1.224/2018 – TCU – Plenário. Relator: Min. Walton Alencar Rodrigues. Brasília, 30 de maio de 2018. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/redireciona/acordao-completo/%22ACORDAOCOMPLETO-2299551%22. Acesso em: 31 jul. 2018. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Relatório de auditoria no âmbito da FOC realizada sobre a governança e gestão das aquisições das universidades e institutos federais. Irregularidades e impropriedades identificadas na entidade auditada. Determinações. Recomendações. Plano de ação. Ciência das ocorrências. Acórdão n. 1.225/2018 – TCU – Plenário. Relator: Min. Walton Alencar Rodrigues. Brasília, 30 de maio de 2018. Disponível em: https://contas.tcu.gov.br/pesquisaJurisprudencia/#/ detalhamento/11/%252a/NUMACORDAO%253A1225%2520ANOACORDAO%253A2018/ DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/false/1/false. Acesso em: 31 jul. 2018.
Revista Vivências Educacionais | ISSN: 2526-0529 | v.6 n.1
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