Galeria Pedestre

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Centro Universitário Belas Artes de São Paulo Curso Arquitetura e Urbanismo

Fernanda Brainer de Moura

Galeria Pedestre

Monografia

apresentada

ao

Centro

Universitário Belas Artes de São Paulo como parte da exigência para a obtenção do título de bacharel em Arquitetura e Urbanismo sob orientação da Prof. Dra. Aline Nassaralla Regino.

São Paulo 2021


Para minha família, para minhas irmãs.


Agradecimentos Este último passo da minha graduação, reflete muito o que sempre carreguei na faculdade como uma face da arquitetura que necessitava de destaque, a monografia sempre foi um desejo, assim como o estudo da cidade. Foi um caminho que mesmo tortuoso no início, me ensinou a ser uma pessoa mais solícita e calma durante estes cinco anos na faculdade. Uma das vontades de exercer a escrita foi realizada com a monografia, mas que na minha opinião nunca se afasta do projeto e da importância que ele teve na minha jornada como estudante de arquitetura. Sou extremamente grata a todos os professores e educadores que me acompanharam durante a graduação, aos meus colegas e amigos mais próximos. Ao Centro Universitário Belas Artes que nestes cinco anos tem sido o espaço de apoio e de aprendizado, que me auxiliou a produzir este trabalho com toda estrutura possível. Agradeço à minha orientadora Professora Doutora Aline Nassaralla Regino que me guiou por entre os percalços do trabalho, me incentivando e ajudando desde o começo, por todos os ensinamentos desde a minha primeira aula, aos conselhos e a paciência em lecionar o processo da monografia. No início o caminho foi difícil de encontrar, mas logo a professora Aline me explicou, sempre com muita clareza, respeito e afeto. Agradeço também a meus amigos e família que neste momento conturbado, fizeram o que estava ao alcance para me ajudar e me incentivar nesta última etapa da graduação. Minha família que nestes momentos compreendeu minha ausência, minha prima e melhor amiga e meus primos. Às minhas irmãs Alice e Rafaela que desde sempre foram um dos pilares que me motivaram a seguir em frente, me auxiliando em momentos de angústia e sendo minhas companheiras. Sou grata a meus pais que me acolheram quando chorei, e quando vibrei sempre mostrando o quanto eram orgulhosos do que estava construindo. Com muita ternura, agradeço à Ana Beatriz Brainer, Vitória Iarussi, Bianca Lopes, Taila Okano, Talita Marques, Ricardo Santos, Jack e Otto. Sou grata aos meus professores e professoras, pelos quais possuo enorme admiração. Agradeço imensamente ao professor Ricardo Martos, aos entrevistados Octavio Pontedura e Fernanda Prada, que me concederam um pouco de seu ponto de vista, ajudando o prosseguimento do trabalho. Por fim, agradeço a Sabrina Studart Fontenele Costa e Mônica Bueno Leme por suas contribuições como profissionais, e por estarem presentes na avaliação final desta monografia.


“A arquitetura é a mais social das artes. Pode-se compreender muitas coisas sobre as preocupações da sociedade olhando os edifícios que ela constrói.” Heliana Comin Vargas, 2018.


Resumo/ A seguinte pesquisa busca estudar a tipologia de edifícios de galeria comercial, com uma ordem cronológica, relacionando seu surgimento a transformações históricas da sociedade e da cidade. E este estudo é focado ao final, com a relação perpetuada entre o pedestre e as galerias comerciais desde sua origem na França até no excerto para estudo de caso no Centro Novo de São Paulo. O primeiro capítulo estuda como que o comércio por entre as construções se desenvolveu na Europa, seu lugar de origem. Utilizando uma divisão cronológica dos subcapítulos, o capítulo um desempenha um papel de gênese da tipologia. Em transição para o segundo capítulo, há a migração para a metrópole paulistana, conectando os dois capítulos com as influências do urbanismo europeu no Plano de Avenidas Prestes Maia e o Movimento Moderno. O desfecho, a partir do capítulo 3, utiliza estudos de caso para comparar as motivações entre as arquiteturas da Avenida São Luís e as primeiras galerias comerciais na França. Ambas necessitam de atividade humana inseridos nas transformações urbanas para obterem sucesso, e esta relação será explorada, principalmente as interações econômicas. No capítulo 3, foram escolhidos três edifícios marcantes da silhueta moderna do Centro Novo - Copan, Louvre e Metrópole - e suas galerias com diferentes vínculos com seu entorno e constância na dinâmica urbana. Para isso, o estudo de caso é feito, com entrevistas para dar voz ao pedestre e obter a percepção de quem frequenta o local e consegue observar características singulares.

Palavras Chave: galeria comercial, dinâmica urbana, transformação urbana, pedestre


Abstract/ The following research seeks to study the typology of commercial gallery buildings, with a chronological order, relating their appearance to historical transformations of society and the city. And this study is focused in the end, with the relationship perpetuated between the pedestrian and the commercial galleries since its origin in France until the excerpt for a case study in the Centro Novo of São Paulo. The first chapter studies how trade between buildings developed in Europe, its place of origin. Using a chronological division of subchapters, chapter one plays a role in the genesis of the typology. In transition to the second chapter, there is a migration to the metropolis of São Paulo, connecting the two chapters with the influences of European urbanism in the Prestes Maia Avenue Plan and the Modern Movement. The outcome, from chapter 3, uses case studies to compare the motivations between the architecture of Avenue São Luís and the first commercial galleries in France. Both need human activity inserted in urban transformations to be successful, and this relationship will be explored, mainly economic interactions. In chapter 3, three buildings that stand out in the modern silhouette of the Centro Novo were chosen - Copan, Louvre and Metropolis - and their galleries with different links with their surroundings and constancy in urban dynamics. For this, the case study is carried out, with interviews to give a voice to the pedestrian and obtain the perception of those who frequent the place and are able to observe unique characteristics.

Keywords: commercial gallery, urban dynamics, urban transformation, pedestrian


SUMÁRIO

Introdução

p. 8

1. Origem das Galerias Comerciais

p. 11

1.1 introdução à tipologia: de 1820 a 1880

p. 19

1.2 popularização: de 1840 a 1880

p. 26

1.3 gigantismo e descaracterização: de 1880 a 1900

p. 36

1.4 declínio: a partir de 1900

p. 38

2. Galerias Comerciais no Centro Novo em São Paulo

p. 45

2.1 Centro Velho ao Centro Novo: a partir de 1930

p. 49

2.2 Movimento da verticalização e a inserção das galerias

p. 60

2.3 Galerias comerciais da Avenida São Luís

p. 69

3. A cidade dos pedestres

p. 75

3.1 Edifício Copan

p. 77

3.2 Edifício Louvre

p. 88

3.3 Edifício Galeria Metrópole

p. 98

Considerações Finais

p. 114

Referências

p. 119


Introdução

O tema da monografia busca compreender como que desde o princípio da civilização as relações comerciais são geradoras de espaços, neste caso as galerias comerciais. Com influências europeias, a arquitetura comercial brasileira é sempre pautada em uma questão de inovação, e será possível a passagem por este tema. Além disso, com foco na problemática, após este estudo cronológico haverá o excerto geográfico em que as galerias de São Paulo, vão passar, em toda sua formação e estética arquitetônica, por uma análise das relações do espaço e do indivíduo, visto que, a arquitetura é contexto e toma sentido com a interação humana. O trabalho apresenta a relação entre cidade e indivíduo por um espaço, mais especificamente as galerias comerciais e pavimentos térreos dos edifícios de uso misto. Esta relação toma forma em um estudo de parte do bairro da República na contemporaneidade mais especificamente nos arredores da avenida São Luís, sendo possível a leitura de forma perceptiva utilizando a fotografia e a história. O mercantilismo, desde os primórdios, foi um ofício fundamental no processo de transformação, formando aldeias e grupos sociais conforme suas habilidades e tradições comerciais, no presente trabalho haverá a análise da cronologia da tipologia de galeria comercial, além das transformações urbanas necessárias para o seu funcionamento. A importância da economia para a formação das tipologias da galeria comercial se relacionam igualmente com as interações entre arquitetura, sociedade e a trajetória deste processo que será analisado com recorte espacial e temporal no Centro Novo de São Paulo, de 1930 até os dias de hoje. Os três principais conceitos a serem trabalhados a seguir são: evolução urbana, a galeria comercial e as arquiteturas comerciais. O primeiro capítulo faz a conexão entre as palavras galeria e comércio, de forma que explica como ao longo da história a relação entre comércio e os seres humanos em sociedade formou os espaços comerciais. Este panorama histórico é necessário de forma que termina na conclusão das origens da tipologia e as principais transformações e motivações que levaram ao aparecimento das galerias comerciais na Europa. Além disso, os cenários históricos estudados no capítulo 1 tem o objetivo de criar uma base sólida para os estudos das galerias comerciais em São Paulo, por conta das influências internacionais de planejamento urbano e os estilos arquitetônicos dos edifícios em questão. 8


Os três conceitos marcam os principais termos, visto que a formação da economia e das relações mercantis da cidade serão estudadas, com os princípios de evolução urbana, Galeria Comercial e Arquitetura Comercial. Após esta contextualização mais ampla, em transição para o capítulo 2, há uma escolha de área, de forma cronológica, ao falar dos impactos das transformações internacionais na formação de São Paulo, mais especificamente do Centro Novo da metrópole paulistana e suas atividades comerciais no século XX. Ocorre uma análise histórica acerca do urbanismo paulistano, partido desde as transformações do triângulo histórico, além dos desenvolvimentos econômicos que culminaram na valorização e refinamento da metrópole. Com o estudo a partir de 1900, no capítulo 2, há a cronologia de apresentação e avanço da indústria na cidade de São Paulo, além dos bairros e a expansão urbana. No segmento, o subcapítulo 2.1 identifica-se o amadurecimento dos lotes do Centro Novo das chácaras para os edifícios altos, consequentes ao Plano de Avenidas Prestes Maia em 1930 em que a cidade necessitava de maior infraestrutura para lidar com o crescimento da população e o avanço da sociedade. Em sequência no subcapítulo 2.2, há uma delimitação da área para base dos estudos de caso do trabalho. Inserida nas transformações urbanas expostas anteriormente, a Avenida São Luís, foi um dos focos do anel de irradiação do Plano de Avenidas, e a partir de 1940, seus palacetes foram substituídos pelos edifícios do período de verticalização da área central. As construções escolhidas no capítulo 3, permeiam a Avenida São Luís, se encontram em uma das quadras mais permeáveis do Centro Novo, possuem atrativos culturais correspondentes ao sucesso dos cinemas no século XX, e da atuação da arquitetura moderna na verticalização. Situados nos períodos entre 1952 e 1960, a maioria das obras manifesta, segundo Raul Juste Lores (2018) o milagre arquitetônico paulistano, com as galerias comerciais como uma das protagonistas. O percurso na extensão e por meio da Avenida revela uma valorização do pedestre, que pode facilmente atravessar a quadra, ou partir para a ruas no interior do Centro Novo, tudo isso inserido na tipologia de galeria comercial. E dessa forma, é colocado em cheque o motivo pelo qual estas galerias se tornaram obsoletas na cidade de São Paulo no século XXI, com o estudo dos caminhos. No capítulo 3, a partir do estudo da formação das galerias do Centro de São Paulo e da Avenida São Luís, foram escolhidos estudo de casos baseados no critério da problemática da monografia. Relacionando as motivações acerca da inserção das galerias, o capítulo 3 representa o destaque às atividades comerciais no Centro, e sua importância para o 9


desenvolvimento da sociedade. O espaço e o comércio são setores co-dependentes da cidade e também dependem da atividade humana, o que no processo de escolha foram as galerias dos edifícios: Copan; Louvre e Galeria Metrópole foi levado em consideração sua trajetória como galeria na dinâmica urbana e a maneira que sua arquitetura atuava entre quadras no modernismo paulistano. A justificativa para a escolha do estudo de casos é o fato de que na Avenida São Luís, a partir do projeto do Copan em 1952, foi ponto de partida, ou seja, o pioneirismo do Edifício projetado pelo arquiteto carioca Oscar Niemeyer foi determinante assim como o Plano de Avenidas, para a caracterização da avenida como parte do milagre arquitetônico paulistano. Portanto, a pergunta a ser respondida é: por que estas galerias comerciais são parte importante da relação entre edifício e espaço urbano em São Paulo no século XXI? Quais os principais motivos de seu desuso, e as razões da permanência das edificações no Centro de São Paulo? O objetivo foi questionar o que as galerias comerciais do centro de São Paulo representam hoje, em comparação com as galerias comerciais em sua origem e as transformações do Centro. Um dos tópicos a ser estudado é o fato das galerias que apresentam situações diferentes de conservação e permanência na dinâmica urbana, levando em consideração fatores importantes para a formação das galerias comerciais.

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1. A origem das galerias comerciais Ao se analisar por meio de princípios sociais, não há a possibilidade da existência de uma cidade sem a troca entre indivíduos e a comercialização de bens essenciais para o desenvolvimento das civilizações. O mercantilismo, desde os primórdios, foi um ofício fundamental no processo de transformação, formando aldeias e grupos sociais conforme suas habilidades e tradições comerciais. A origem do mercado está, portanto, no ponto de encontro de fluxos de indivíduos que traziam seus excedentes de produção para a troca, normalmente situado em locais equidistantes dos diversos centros de produção (VARGAS, 2012, p. 74).

Raquel Rolnik (1988) descreve a cidade como um imã, em que seus serviços são capazes de atrair a atividade humana, evoluindo para locais de permanência. Porém, há também a definição de cidade como mercado, sendo ela um desenvolvimento entre populações que gera parceria e “intensifica as possibilidades de troca e colaboração entre os homens, potencializando sua capacidade produtiva” (ROLNIK, 1988, p. 25). A importância das relações comerciais para a existência das cidades, é definida a partir do momento que a troca de mercadoria entre pessoas requer espacialidade, e assim se formam os mercados e o câmbio. Presentes nas configurações de civilizações antigas, o elemento social da troca era uma relação vinda da necessidade entre a subsistência e a garantia de sobrevivência a partir de bens, fossem eles: comida, roupas ou instrumentos de trabalho. Desde o início das civilizações, comércio e cidade têm uma relação de simbiose. Ou seja, não têm significado e definham quando separadas. Ambos são causa e efeito da mesma centralidade que pressupõe o encontro do fluxo de pessoas, mercadorias, idéias [sic.] e mensagens (VARGAS, 2012, p. 1).

Simultâneo à atuação do mercantilismo, houve o crescimento das civilizações a partir de fatores urbanos e sociais como: o transporte; as lutas por território; as rotas de comércio; e, a moeda - condições estas que permitiram um maior alcance de mercadorias do mundo todo. A atividade comercial advinha da trajetória de amadurecimento do trabalho e da serventia que, em alguns momentos, serviram como moeda de troca, parte de uma necessidade de sobrevivência e de boa relação com seus companheiros. Na Antiguidade Clássica, mais especificamente na Grécia, se constituíram alguns dos modelos de cidade mais importantes para a formação do que se conhece hoje sobre

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urbanização e sociedade. Os gregos possuíam localização privilegiada no mundo, estabelecendo influência política, econômica e cultural em diversas regiões de 1100 a.C, até 146 a.C. A economia das chamadas cidades-estado era baseada em insumos agrícolas, trabalho de artesãos e a comercialização em grande e pequena escala, além do comércio marítimo que estabelecia um diálogo entre: Grécia; Egito; as áreas litorâneas do mediterrâneo; e as colônias gregas existentes por toda a Europa. Na Acrópole ateniense eram localizadas as stoas, edificações que apresentavam espaços destinados ao comércio. A cidade de Roma, com início em 753 a.C, foi, segundo Fazio, Moffett e Wodehouse (2011) muito semelhante a Atenas em sua configuração urbana, que era caracterizada por heranças de um crescimento desordenado, sem desenho específico. Pompeia, fora do eixo da capital, possuía traçado em grelha e as atividades comerciais atuavam nas basílicas, além de outras cidades romanas que sofreram influências de guerras e heranças gregas. E estes conflitos e busca por territórios resultam em plantas padronizadas e “setores habitacionais eram distribuídos em blocos quadrados ou retangulares, com espaços reservados para mercados de bairro e equipamentos recreativos à medida que a cidade crescia.”(FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p.133) Mas o surgimento da cidade romana, segundo José Ramón Alonso Pereira (2010) foi baseada no melhoramento da qualidade viária das cidades-estados, que também passavam por uma grande expansão e transição do conceito de edifício para o planejamento de um conjunto de construções, responsáveis por atender política, econômica e socialmente as cidades romanas. A prática mercantil dos fóruns na Roma no século II (figura 1) era parte importante da dinâmica da cidade romana. E nas cidadelas que estavam em processo de centralização havia uma nova disposição da atividade comercial, sendo possível citar a Basílica Ulpia no Fórum de Trajano que possuía local reservado para o comércio. (figura 2).

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Figura 1 – Mercado público no império romano situado no fórum, foco na antiguidade romana. Fonte: VARGAS, 2018, p. 97

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Figura 2 – Fórum de Trajano e seu nível na cidade romana. A Basílica Ulpia e o mercado de trajano eram locais destinados à prática comercial. Fonte: UNGARO, 2008, n. p.

Heliana Comin Vargas (2018) ressalta, que a prática comercial sempre pertenceu às populações de classe social mais baixa, pois tanto “[...] na antiguidade como na Idade Média, o ócio fora considerado uma atividade dos privilegiados, da aristocracia e do clero” (VARGAS, 2018, p. 8). De acordo com a mesma autora, a competição entre níveis sociais era igualmente responsável pela mutação comercial das cidades e, mais tarde, do capitalismo. Com a queda do Império Romano no Ocidente, em 476 d. C, e as invasões germânicas a fragmentação do poder europeu se tornou inevitável, dando lugar aos feudos. O mercantilismo da Alta Idade Média na Europa, que ocorreu do século V ao XI, marcou a inauguração do sistema de gestão política, social e econômica denominado como feudalismo. As primeiras cidades medievais europeias eram caracterizadas por grandes muralhas que separavam o espaço urbano e rural, e neste contexto, o comércio entre cidades era feito pelos senhores feudais que necessitavam de uma fortaleza, formando os burgos. Os burgos eram estes espaços 14


de comércio local que depois se desenvolveram originando bairros, praças de mercado e setores independentes da cidade medieval. Já na Baixa Idade Média, dos séculos XI ao XV, houve o declínio da economia feudal, inserido em uma sociedade estamental. Este período presenciou um grande crescimento populacional, centralização do poder, potências de expansão, colonização de terras e domínio de portos. Sendo estimulado pelos senhores feudais a movimentação da economia no século XV revelou uma nova face do poder civil. Qualquer que seja sua origem e função urbana, esses burgos, vilas ou povoados com foro próprio têm um papel na estruturação do território que excede muito a propriamente administrativa. Todos eles foram trabalhando e estruturando o território europeu ao longo de muitos séculos a partir de uma trama em grande parte vigente ainda em nossos dias. Em suma, a estrutura urbana europeia se cristalizou nos séculos medievais (PEREIRA, 2010, p. 100).

Enquanto na Idade Média houve uma procura por equilíbrio e proteção da cidade, na Península Itálica do século XV existiu uma preservação dos feudos e cidades-estados que se mantiveram conforme o lucro daquela sociedade mercantil, e o Renascimento teve início no século XIV e fim XVI neste mesmo local, depois se expandindo para outros locais na Europa. Ocorreu uma explosão deste novo modelo de mercado europeu, em que os comerciantes passaram a valorizar sua posição e houve um amadurecimento das artes e da literatura. Este período marcou nas questões comerciais e sociais, a inserção de uma nova noção de individualidade, movimentos artísticos, ideológicos e religiosos. O Renascimento foi o período das praças que eram a extensão do centro da cidade na Idade Média, ou seja, por conta do crescimento do mercado elas se estabeleceram nos séculos seguintes como vitais para o andamento da economia e das vias de comércio. Em sequência, o período Barroco foi caracterizado por um progresso na vida cívica com menção às notórias praças italianas e aos jardins franceses. As cidades europeias no período barroco precisavam encontrar compatibilidade com a alta expressão de poder, de ordem e de controle sobre sociedade somado aos interesses burgueses. José Ramón Alonso Pereira (2010) no livro intitulado Introdução À História da Arquitetura - Das Origens ao Século XXI destaca as capitais do Barroco entre XVI e XVIII como: Entre as capitais do Barroco podem se distinguir dois tipos de cidades: em primeiro lugar, a que é basicamente governamental, como Roma, Madri, Paris ou Viena; e em segundo lugar, aquela essencialmente econômica e comercial, como Londres, Amsterdã ou Lisboa.(PEREIRA, 2010, p. 171).

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Foram se formando uma série de camadas presentes nas trocas entre produtores e consumidores, tornando a prática comercial em transição do século XVIII, capaz de gerar desigualdade social e uma disputa infinita por poder na cidade. Um grande marco da atividade comercial como poder político na Europa Ocidental, foram as transformadoras revoluções que surgiram a partir do fim do século XVIII, visto que existiu a necessidade de suporte à modificação do sistema econômico. Cronologicamente, em 1760, ocorreu na Inglaterra a primeira Revolução Industrial que modificou os processos de produção, trocando a manufatura e o artesão pela maquinofatura e a produção em massa, com auxílio das novas tecnologias e a expansão da indústria. Em seguida a Revolução Francesa, de 1789 a 1799, foi o processo em busca de reformas sociais e parte da motivação que causou a Revolução na França foram as crises econômicas, e a burguesia que passava a defender seus interesses. Sendo alguns deles: liberdade comercial, abolição das tarifas internas e diminuição do poder das companhias comerciais. E com isso, é possível contextualizar as galerias que localizadas de início na Paris em revolução, foram parte da grande movimentação deste período. O primeiro ensaio de uma galeria comercial foi aquela que se localizou no Palais Royal1, em Paris. De modo informal, o Príncipe Phillipe d’Orleans montou uma série de boutiques em seu quintal, e as fileiras de estabelecimentos deram origem à Galerie du Bois (figuras 2 e 3), parte importante do Palácio Real, inaugurada por volta de 1788. Esta galeria, porém, ainda se caracterizava em seu contexto como uma estratégia para “encontrar recursos para manter seu estilo de vida libertino”(VARGAS, 2018, p.129), tendo seu apogeu e consolidação como tipologia no século XIX em que as passagens foram inseridas para a promover a reorganização dos comércios e atividades na cidade.

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O Palácio Real (Palais Royal, em francês) é um palácio que foi construído em 1624, funcionou como moradia de monarcas como a Rainha Mãe, Ana de Áustria e o jovem Luís XIV até a abertura para o público em 1788.

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Figura 2 - Galerie du Bois, dentro da Palais Royal. Quatro fileiras de lojas temporárias, com acesso noturno foram modelo para a criação das galerias europeias por conta de sua dinâmica com a cidade e poder social. Fonte: GEIST, 1985, p. 455

Figura 3 - Galeries du bois, Palais Royal. O fator social da Galerie du Bois reunia todas as classes sociais, personalidades das artes e intelectuais estando presente na vida noturna e boêmia de Paris. Fonte: GEIST, 1985, p. 453

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Inicialmente, a Galerie du Bois foi modelo para as outras arcadas e marcou o começo do uso desses importantes centros de movimento local e, mais tarde, da vida noturna parisiense, sendo possível a partir dela realizar um panorama de transformações ocorridas nesta tipologia. Após uma breve contextualização do momento histórico das galerias comerciais e suas motivações perante a cidade da Antiguidade até o século XIX, se inicia o estudo de seus estágios. Acerca da trajetória desta tipologia, Johann Friedrich Geist (1985, p. 65), divide os períodos das arcadas, de forma cronológica, em: 1. O Período da Invenção: até 1820 2. O Período da Moda: 1820-1840 3. Expansão: 1840-1860 4. A fase Monumental: I860-1880 5. O Movimento para o Gigantismo e a Imitação: 1880-1900 6. O Declínio do Conceito Arquitetônico: Pós-1900

Com a delimitação formal dos estágios das galerias comerciais é importante ressaltar que sua raiz se formou na Europa Ocidental, devido a diversos fatores que serão comentados a seguir. A divisão dos subcapítulos do primeiro capítulo do trabalho, é baseada neste desenvolvimento apresentado no livro intitulado Arcades, The History Of A Building Type por Johann Friedrich Geist (1985), que lista detalhadamente as construções e seu decurso da introdução até o declínio. Antes dar início ao desenvolvimento das galerias comerciais, é importante ressaltar que elas pertenciam antes de 1820, ao período, segundo Johann Friedrich Geist (1985) de invenção, ou seja, a tipologia ainda se localizava como despercebida pelo pedestre europeu, com alguns exemplos singelos em Paris e Londres, como por exemplo o Royal Opera Arcade (figuras 3 e 4) em Londres, e a Galerie du Bois citada anteriormente (figuras 2 e 3).

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Figuras 3 e 4- Royal Opera Arcade em Londres de 1816, ainda com dimensões tímidas a arcada possuía poucas lojas e era considerada por Johann Friedrich Geist um protótipo, uma consequência. Fonte: GEIST, 1985, p. 312-317

Porém, para que fosse possível o sucesso da tipologia, faltava ainda um fator para se aplicar além do caminhar: o caráter atrativo das passagens. Elas não poderiam ser, em um período industrial, somente vistas como caminhos nas diversas capitais em que foram implantadas, mas sim um destino que proporcionasse os mais diversos atrativos devido justamente ao período de desenvolvimento do capitalismo que estavam inseridas. Tudo se resumia a realização de um espaço ideal: tão procurado quanto os parques; seguro; confortável e lucrativo.

1.1 Introdução à tipologia: de 1820 a 1880 Este subcapítulo especifica o contexto de surgimento das galerias comerciais como tipologia no século XIX. Em sua obra The History of a Building Type Johann Friedrich Geist (1985) lista algumas das variações de nomenclatura das galerias em diferentes localizações, mas reforça que, apesar dos diferentes nomes, elas representavam a “força de organização do comércio varejista” e ofereciam “um espaço público em propriedade privada, atenuação do congestionamento de tráfego, um atalho, proteção contra o tempo e uma área acessível a todos os pedestres” (GEIST, 1985, p. 6).

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As arcadas, passagens ou galerias comerciais, a partir das colocações realizadas por Johann Friedrich Geist (1985) e Heliana Comin Vargas (2018), possuem estas oscilações de nome e as diferenças entre elas se dão a partir da mudança de público-alvo. Mas, reforçando que as três nomenclaturas são parte da formação da tipologia sendo que, Johann Friedrich Geist (1985) diferencia a arcada e a galeria por uma questão de formalidade e Heliana Comin Vargas (2018) trata das nomenclaturas de forma opcional, adotando a mesma origem para todas e definindo-as como: “coberturas de vidros que não pertencem, exclusivamente, nem a um espaço privado nem a monumentos públicos” (VARGAS, 2018, p. 134). Dando sequência aos acontecimentos, a partir de 1820, a cidade europeia foi apresentada a um novo sistema econômico - o capitalismo -

presenciou revoluções

modificadoras no contexto do século XIX, e se apropriou das dinâmicas urbanas de forma que a atividade comercial fosse parte consolidada da economia. Capitais como Paris, Madrid, Roma e Bruxelas se consolidaram a partir de uma necessidade de demanda para a população que estava em grande crescimento naquele período e o comércio não seria capaz de comportar os efeitos daquelas transformações. As consequências das duas revoluções, demográfica e econômica, vêm se manifestando gradualmente ao longo do século, sem que existam, na primeira metade deste, instrumentos eficazes para disciplinar sua implementação e sua distribuição territorial. Isso multiplica as densidades urbanas, mas sem uma expansão física das cidades, ou, o que é o mesmo, com expansões anteriores mediante a ocupação de vazios urbanos e a elevação das alturas edificadas (PEREIRA, 2010, p. 209).

Os mercados se instalaram a partir da especulação imobiliária e planejamento nas áreas mais valorizadas das cidades europeias, com a introdução e busca por: infraestrutura, salubridade, necessidades básicas como água, esgoto e eletricidade, além da transformação dos transportes com a grande utilização da ferrovia. A rua se tornou espaço importante para formação da dinâmica urbana e econômica da cidade no século XIX. As galerias comerciais, na Europa, tiveram seu maior sucesso devido ao aparecimento de uma vida noturna e vitalidade nos seus corredores, pois estes representavam um caminho acessível para todas as classes sociais e, como arquitetura, ofereciam conexão com a cidade existente naquela época. Na Avenue des Champs-Elysées, entre novos hotéis com nomes anglo-saxónicos, foram há pouco tempo inauguradas as arcadas, e a mais recente Passagem de Paris abriu as portas. Na inauguração, uma banda gigantesca, de uniforme, tocou em frente de canteiros de flores e fontes com repuxos (BENJAMIN, 2019, p. 33).

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Os espaços destas galerias eram igualmente destinados à exposição de produtos de luxo, mas também aos bares e cafés frequentados pela população operária que vivia em meio a diversas culturas e personalidades intelectuais. Por esta razão, as galerias se tornaram tão importantes como a rua, se consolidando como a via de comércio das cidades. E, a partir de uma sequência cronológica, é primordial salientar que essas edificações, tiveram princípio na grande explosão de atividade econômica em Paris, e já eram presentes antes do planejamento urbano realizado por Haussmann, inseridas como uma consequência da enorme ascensão econômica da cidade: O Arcade no Século XIX O fliperama nunca foi um objeto de instrução. Nunca foi escolhido como tema do Prix de Rôme. Não pode ser encontrado em livros didáticos contemporâneos como um exercício arquitetônico. O conceito arquitetônico da arcada é divulgado anonimamente, por meio de travelogues, relatórios boca a boca, observação direta e estudo do próprio local da arcada. É difícil reconstruir um curso inequívoco e demonstrável para o desenvolvimento da arcada ao longo do século. Faltamos, especialmente para os primeiros estágios, registros, nomes de arquitetos, planos de construção e qualquer declaração dos construtores a respeito de seus motivos (GEIST, 1985, p. 64).

A Galerie du Bois, segmento do Palays Royal, supracitada, foi pioneira e representou o arranque da possibilidade vista pelos empreendedores parisienses, além de pertencer ao período de invenção da tipologia das galerias, vide seu caráter experimental. De acordo com Heliana Comin Vargas (2018) , este ensaio deu início a um estudo acerca dos materiais que deveriam ser utilizados nas suas construções, iniciando as suas transformações. As arcadas consequentes ao Palays Royal se aproveitaram das inovações em materiais e técnicas construtivas da engenharia, introduzindo o vidro e o ferro nas construções no período entre 1820 e 1840 em que as arcadas atingiram a Fase de Tendência - conforme denominado por Johann Friedrich Geist (1985). Em 1830, a Galerie du Bois foi substituída pela luxuosa Galerie d’Orleans (figuras 5 e 6) que, em sua arquitetura, apresentou vedações em pedra, vidro na cobertura e estruturas de ferro, tornando-se referência para as próximas construções na Europa. Eram de grande destaque as fachadas e vitrines de vidro, assim como sua escala, que chamava atenção dos consumidores, características coerentes com a expansão comercial já mencionada. Este edifício funcionou na cidade de Paris como um espaço independente financeiramente, e com grande movimento de todas as classes sociais.

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Figura 5- Galerie d´Orléans, de 1830 e a utilização do vidro na cobertura e nas vitrines, atraindo mais a atenção da população mais rica. Fonte: GEIST, 1985, p. 527

Figura 6- Galerie d´Orléans, de 1830 eram criados caminhos por entre as galerias, promovendo interação social entre burgueses e aristocratas que frequentavam as lojas de luxo. Fonte: GEIST, 1985, p. 525

As galerias comerciais do período compreendido entre os anos de 1820 e 1840 foram construídas, em sua maioria, na capital francesa, centro do mundo naquela época. Dentro desse contexto, a partir de 1823, pode-se citar: a Passage de l’Opéra (figura 7); Galerie Vivienne; e, a Passage Choiseul - todas nomeadas levando em conta as ruas parisienses, espaços estes que se caracterizavam pela venda de mercadorias de luxo, e também funcionavam como local para encontros sociais.

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Figura 7 - Passage de l’Opéra 1822-1823 Fonte: GEIST, 1985, p. 484

Estas passagens possuem características típicas do período de desenvolvimento das técnicas construtivas com aço e vidro, e funcionavam como ruas internas dos edifícios. A Passage Choiseul (figuras 8 e 9), foi considerada a maior passagem parisiense, além de uma das galerias que pertencia ao grupo advindo do Palais Royal. Em sua implantação era possível observar seu caráter acessível, ou seja, a Passage tinha acesso por toda a quadra, abrindo caminho entre edifícios, de forma que “[...] duas fileiras de edifícios se opõem, conectadas apenas por um telhado de vidro visivelmente recuado. A caverna de 190 metros também exemplifica o elemento ilusório da arcada” (GEIST, 1985, p. 510).

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Figuras 8 e 9 - À esquerda a figura 8, uma fotografia tirada mais a frente da construção em 1825 da Passage Choiseul que possuía as estruturas de vidro, e uma conexão extensa na quadra, como pode-se observar na implantação, figura 9, do lado direito. Fonte: GEIST, 1985, p. 511-514.

Em paralelo ao aparecimento das galerias implantadas dessa forma, fora da capital francesa houve, a partir de 1826, um crescimento deste modelo, mas com diferentes particularidades na sua arquitetura. A Lowther Arcade (figura 10 e 11), localizada em Londres e construída entre 1829-1831, foi baseada na Royal Opera Arcade, e uma das primeiras construídas na Inglaterra. Marcado pela volta de utilização da linguagem clássica na arquitetura,neste período, era possível notar a presença de colunas, abóbodas e arcos nas edificações. A área em que foi construída estava amplamente influenciada pela ascensão da moda na capital inglesa. Em Milão, a Galleria Cristoforis (figura 12), construída em 1831 e financiada pela alta sociedade italiana, teve sua edificação baseada nas passagens francesas e inglesas, também marcada pelo estilo Neoclássico vigente à época.

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Figuras 10 e 11-Lowther Arcade, Londres 1829-1831, à esquerda na figura 10 é possível observar sua estética clássica com os arcos, e na implantação posicionada à direita a figura 11 mostra sua capacidade de união com a rua e traspassamento pela quadra. Fonte: GEIST, 1985, p. 329-333

Figura 12- Galleria de Cristoforis, Milão 1831-1832, que também atendia população influente e interessada nos produtos de luxo vendidos, e nas atividades socioeconômicas do local. Fonte: GEIST, 1985, p. 383

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Seguindo em crescimento por toda Europa, as galerias foram construídas com uma sutil mudança da tipologia conforme seu contexto e objetivos, fossem estes puramente comerciais ou para exposição de riquezas e luxo. Após esse período, essas edificações começaram um processo em que se moldaram de acordo com as transformações ocorridas nas áreas urbanas de Paris e foram construídas em outros locais da Europa, como as cidades de Berlim e Milão, parte de um período de propagação - momento este abordado a seguir.

1.2 Popularização: de 1840 a 1880 Este período, denominado por Johann Friedrich Geist (1985) de Popularização, foi caracterizado por uma difusão e expansão do modelo de galeria comercial pelas capitais europeias, com exemplares construídos em toda a Europa Ocidental. Além disso, houve em seus anos iniciais, como determinante das características da metrópole parisiense e do contexto das atividades comerciais, a proposta de planejamento urbano apresentada pelo, então prefeito, Barão George-Eugène Haussmann. Entre os anos de 1853 e 1870, esta proposta foi encomendada pelo chefe de estado, Napoleão 3º, responsável por “reorganizar” e restaurar a metrópole descrita como doente. Nota-se, portanto, que outras motivações acerca das intervenções do Barão Haussmann, deram origem a: [...] um tipo de cidade, um espaço configurado segundo a lógica da burguesia, que então se tornara a classe dominante; elas impuseram um modelo espacial específico que perdurou após Haussmann e condicionou o urbanismo no início da Terceira República (PANERAI; CASTEX; DEPAULE, 2012, p. 5).

Momentos antes da grande intervenção proposta, a capital francesa estava em ritmo frenético, e acabou por se desenhar por meio de um crescimento desordenado e grande quantidade de pessoas vindo da zona rural em busca de novas oportunidades oferecidas pela indústria. Este êxodo rural culminou em diversos problemas sociais e urbanos, tais como a ausência de saneamento básico e moradia; além de tornar mais evidente a desigualdade social existente (figura 13).

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Figura 13- Paris pré-Haussmann, com contrastes entre áreas mais insalubres com áreas residenciais em péssimo estado, além de ser um grande foco para proliferação de doenças. Fonte: MARVILLE, 2014, n. p.

Em busca de uma solução para os problemas supramencionados, foi proposto por Haussman um redesenho para a cidade de Paris com a ajuda de arquitetos e urbanistas como por exemplo, Gabriel Davioud. Nesta proposta de planejamento urbano foram abertos boulevards , além de: uma maior estruturação das áreas de periferia, reforma de edifícios, ruas e avenidas para obter uma cidade mais salubre e com mais infraestrutura em tempos de industrialização e riqueza. Sucedeu-se, então, a extinção da Paris medieval com suas ruas limitadas, dando origem ao desenho da metrópole, que abriu novos caminhos e outras atividades por meio desse planejamento urbano (figura 14).

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Figura 14. Georges Eugène Haussmann, Plano para Paris, 1851-1870. Plano indicando as novas ruas, os novos bairros e os dois grandes parques Bois de Boulogne e Bois de Vincennes. É possível observar a grande valorização da malha viária e a criação das rotatórias. Fonte: PANERAI; CASTEX; DEPAULE, 2012, p. 20.

É importante ressaltar que o fenômeno das galerias teve sucesso antes das propostas urbanas elaboradas por Haussmann, por conta de sua necessidade como tipologia e o nascimento de uma economia de grandes proporções, além do crescimento populacional, mas a menção do projeto de planejamento urbano definiu muitos dos caminhos acerca do comércio parisiense (figura 15).

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Figura 15- As galerias estavam presentes, mas em meio a uma cidade desorganizada. Fonte: MARVILLE, 2014, n. p.

Como um projeto de planejamento urbano, o plano Haussmann, previa um maior controle da articulação urbana entre vizinhos, construção de ferrovias, melhora de infraestrutura, valorização da economia visando as centralidades e o aproveitamento das vias. Porém é possível observar que assim como a indústria, a população operária migrava para as periferias e não faziam parte do público-alvo das transformações urbanas. E dessa forma as arcadas, em período de popularização, se adaptaram a uma cidade remodelada, e se transformaram em um espaço fechado de comércio varejista, sempre estrategicamente localizadas. O comércio interno das galerias não foi prioridade na implementação deste plano, e sim por conta dele, se tornaram cada vez mais moldadas à nova escala da cidade. A arquitetura das galerias, comprometida com os princípios dos anos de 1800, de dimensões acanhadas para o momento de transformação pelo qual passava a cidade, agonizou com a abertura das estações de trem e com a nova escala urbana. O caráter multifuncional, aglutinador e inovador para o início do século XIX, reunindo unidades de apartamentos, lojas e oficinas não respondia mais aos novos valores e costumes do século XX. (ALEIXO, 2005, p. 23)

Paris, como diversas outras cidades da Europa apresentou uma sequência de grandes mudanças, e de acordo com Heliana Comin Vargas (2018) houve, entre 1840 e 1880, um período de difusão e crescimento do modelo de galeria, que com origem na capital francesa se espalharam por toda a Europa, em cidades como Londres, Bruxelas, Milão e Hamburgo.

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Como exemplos deste trecho de popularização da galeria fora de Paris, temos a Passage Pommeraye em Nantes (figuras 16 e 17), construída entre 1840 a 1843, localizada no oeste da França. Nela foi marcado um desenvolvimento das vitrines e a criação de anúncios nos espaços internos da galeria, em que os arquitetos procuravam superar as passagens parisienses.

Figuras 16 e 17- A Passage Pommeraye tinha vários níveis como mostrado na figura 16 à esquerda, e escadas em seu centro, cobertura envidraçada e espaços centrais para encontros sociais. A implantação na figura 17 a direita mostra sua capacidade de atravessar a quadra, e os diversos acessos pelas escadarias. Fonte: GEIST, 1985, p.415-416.

Analisando de forma espacial, as galerias, fora da capital parisiense, não sofreram com os impactos da intervenção Haussmaniana, visto a ascensão do modelo em cidades como Milão e Bruxelas. Segundo Heliana Vargas (2018), em sequência houve o aparecimento da tipologia na cidade de Hamburgo com o Sillem’s Bazar (figura 18) e igualmente houve nesta época a construção de Royal Arcades, tanto em Londres quanto em Melbourne no ano de 1874.

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Figura 18- Sillem’s Bazar, em Hamburgo em 1845. Inspirado nas galerias francesas, vendia produtos de luxo em conjunto com um hotel, sendo um espaço importante para o comércio local. Fonte: GEIST, 1985, p. 279.

As galerias St. Hubert de 1847 (figuras 19 e 20) e a Queens Arcade de 1853 também são exemplos dessa difusão, com destaque para a St Hubert em Bruxelas. Importante por diversos fatores, esta galeria foi projetada pelo arquiteto Jean Pierre Cluysenaar2 e foi pioneira tanto em sua monumentalidade quanto na nova utilização de iniciativa pública para sua construção. A galeria era responsável por reunir pessoas de diversos setores burocráticos da cidade, com sua própria estrutura administrativa e sua arquitetura que revisitava os padrões renascentistas.

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Jean Pierre Cluysenaar foi um arquiteto belga, e importante para a história das galerias comerciais na Europa devido ao seu amplo estudo sobre as arcadas parisienses e seus projetos nas cidades belgas.

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Figuras 19 e 20-A Galeries St Hubert de 1847 era muito frequentada por todo tipo de classe social como mostrado na figura 19 à esquerda, a implantação na figura 20 a direita mostra a possibilidade de atravessar a quadra, além de sua escala, tomando suas quadras. Fonte: GEIST, 1985, p.202-211.

Pertencente ao ano de 1863, a passagem alemã Koningin Augusta Halle (figuras 21 e 22), após o Sillem’s Bazaar, foi a galeria de maior importância da Alemanha e seguiu os moldes franceses com o vidro e o aço na sua construção. Naquele espaço eram vendidos livros, artigos relacionados à arte e obras, sendo assim foco de cultura; além de sua implantação contemplar a conexão com três ruas, possuindo uma praça interna.

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Figuras 21 e 22-Suas características inspiradas nas galerias parisienses como mostrado na figura 21 à esquerda, a implantação na figura 22 a direita mostra as três possibilidades de se atravessar a quadra. Fonte: GEIST, 1985, p.245-247. Antes as galerias comerciais possuíam toda a infraestrutura e o público que necessitavam para se tornarem viáveis em um espaço único e central, mas com a expansão das cidades, o sucesso das lojas de departamentos passou a depender da localização em uma área de prestígio, servida por meios de transporte e próxima ao público que a pretendia atender (ALEIXO, 2005, p. 24).

Como citado anteriormente, a cidade de Bruxelas também foi um dos locais das galerias comerciais em seu momento de expansão, e estas foram implementadas devido a um capital imobiliário. Essas edificações representaram, em um período de independência belga, o triunfo econômico da cidade atuando também como parte do embelezamento urbano. Além das manifestações em cidades como Bruxelas, com a definitiva consolidação das galerias como um símbolo de modernidade e luxo em algumas cidades da Europa do século XIX, na Itália, a galeria Vittorio Emanuele II foi a primeira, com sua concepção em 1867, a representar uma questão política de nacionalidade, proveniente de um concurso, e a ter as lojas como principal atração do edifício.

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A Galleria Vittorio Emanuele II incorpora um arsenal de referências históricas. Representa uma tentativa de dar à cidade e à sociedade, com sua crescente consciência nacional, um novo centro. É a primeira vez na história do tipo arcada que se realiza um concurso e que a prefeitura é a proprietária. A arcada foi construída por um consórcio inglês denominado City of Milan Improvement Company, Ltd. Um engenheiro francês forneceu as especificações para a construção em ferro e um arquiteto italiano projetou o edifício. Consequentemente, o fliperama foi produto da cooperação internacional. Em 7 de maio de 1865, o Rei colocou a pedra fundamental no centro da rotunda octogonal; dois anos depois, o fliperama foi dedicado; só uma década depois foi o arco triunfal agora para a praça concluída, da qual o arquiteto caiu para a morte. O efeito da Galleria Vittorio Emanuele foi extraordinário e não pode ser comparado com a resposta de qualquer fliperama anterior (GEIST, 1985, p. 74).

De acordo com Johann Friedrich Geist (1985), essa galeria italiana situa-se no período de monumentalidade da história das arcadas , sendo caracterizada pela utilização de todas as inovações presentes na Europa industrializada. A Galeria Vittorio Emanuele II (figuras 22 e 23) era local de investimentos e “importante símbolo de Milão como capital moral da Itália e símbolo do seu progressivo ressurgimento” (VARGAS, 2018, p. 148).

Figura 22 e 23. Galeria Vittorio Emanuele II, de 1867, Milão. Símbolo de uma metrópole com seu poder econômico consolidado, com a utilização do aço e vidro como mostra a figura 22 a esquerda e a 23 a direita. Fonte: GEIST, 1985, p. 388 - 314

No fim do período de popularização situado entre 1840 a 1880 , pode-se dizer que no local de origem das galerias o planejamento da quadra, presente no plano para a cidade de Paris, ocasionou o apagamento das arcadas francesas, (figuras 24 e 25) devido ao seu caráter adaptativo e flexível fazendo parte de um mercado de especulação imobiliária, que funcionava

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mediante as vontades dos empreendedores. E dessa forma, os centros que antes pertenciam à boêmia e ao comércio seriam parte de uma divisão de setores em atividade em Paris. O grande anseio econômico presente na sociedade e na cidade industrializada, tornou a galeria comercial pequena perto de suas predecessoras.

Figura 24- A Rue des Moineaux em 1860, antes da intervenção de Haussmann, mostrando que o caráter diminuto e dinâmico das galerias se perde, havendo uma padronização de novos edifícios. Fonte: PANERAI, 2012, p. 8

Figura 25- A Avenue de l’Opéra na atualidade, com as mesmas configurações presentes na intervenção. Fonte: PANERAI, 2012, p. 9.

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1.3 Gigantismo e descaracterização: de 1880 a 1900 Seguindo de momentos de muita movimentação, a cidade de Paris, considerada como centro do mundo naquela época, recebeu um dos principais exemplos dos avanços da engenharia e arquitetura: a Torre Eiffel, construída entre os anos de 1887 e 1889 impressionou por sua precisão, sua escala e a rapidez de sua construção. Este foi um dos acontecimentos arquitetônicos que exemplificaria o caráter sublime adotado nas edificações e novas galerias, que se tornaram grandes estabelecimentos por consequência: do planejamento das cidades e valorização da economia em grande escala; a euforia da Belle Epóque em 1871; explosão de cultura e lazer; e, o aumento dos investimentos em expressões artísticas, como o teatro e as exposições de arte. As arcadas deste período seguiram frequentemente o modelo vitoriano advindo da França, com as coberturas de vidro e estruturas de aço. Este é o princípio do fim. Início do formato das arcadas que passaram a adotar cada vez mais, o formato de grandes estabelecimentos multifuncionais referindo-se mais às novas técnicas de venda num só empreendimento imobiliário focado na atividade comercial e de serviços do que a qualidade do espaço construído, onde o meio passará pouco a pouco a ser o argumento de venda (VARGAS, 2018, p. 150).

Como exemplo desta natureza grandiosa pode-se citar a galeria New Trade Halls que era parte de um grande complexo, o Grand Magasin Universal em Moscou (figuras 25 e 26), que seria considerado um dos maiores conjuntos de lojas, capazes de movimentar a cidade toda. Existem três entradas em cada um dos quatro lados, cada uma levando a três espaços de arcada longitudinais e aos três saguões laterais, que têm apenas dois andares de altura. Essas ruas internas dividem todo o quarteirão em dezesseis unidades, todas conectadas umas às outras nos três níveis por degraus, galerias e pontes. [...] Escadas em contra-rotação, que vão de um corredor longitudinal a outro, funcionam como centros estáveis, ligando os níveis de varejo à adega onde são feitas as entregas. Os dois blocos do meio têm, cada um, dois pátios internos quadrados e fechados [...] (GEIST, 1985, p. 403).

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Figuras 25 e 26- Ambas imagens, Grand Magasin Universal em Moscou, construída entre 1888 e 1893. Fonte: GEIST, 1985, p. 408-409.

Por conta dessa escala (figura 27), os ambientes internos da galeria passaram a necessitar de iluminação artificial, formando corredores e circuitos que funcionaram quase como uma pequena cidade. Ela abrigava trocas comerciais, mas também movimentações sociais e exposições inteiras, servindo como um destino acessado por toda a população russa.

Figura 27 - Uma fotografia tirada no Red Square mostrando a grandeza do complexo Grand Magasin Universal em Moscou. Fonte: GEIST, 1985, p. 406.

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Resta observar que estes aspectos de grandeza acabaram descaracterizando não só a arquitetura das galerias, mas igualmente suas atividades internas que passaram a se envolver com grandes investimentos e novos modelos de mercado. De acordo com Heliana Vargas (2019), a partir de 1880, houve uma descaracterização do modelo de galeria que, devido a busca por maiores escalas e edifícios proeminentes, acabou se fundindo ao mercado competitivo do final do século XIX, gerando os shopping centers nos Estados Unidos, e os grand magasins e as magasins de nouveautés na Europa.

1.4 Declínio: a partir de 1900 Este subcapítulo se inicia com o estudo acerca das relações entre os acontecimentos do final XIX e da virada para o século XX, destacando : a progressividade das atividades comerciais e a decadência do modelo de galeria perante a industrialização. Busca-se, portanto, explicar a transformação das atividades comerciais de forma cronológica na Europa e Estados Unidos da América, preparando para que, na sequência , ocorra o estudo da inserção das galerias no Brasil, abordadas especificamente no capítulo 2. Assim como delimitado por Johann Friedrich Geist (1985), a fase de apagamento das galerias na Europa a partir de 1900, ocorreu por conta da remodelação urbana proposta, que acabava por setorizar os usos, dispersando o caráter multifuncional e proibindo a construção das galerias em alguns locais. Além disso, houve a grande explosão do modelo de grandes lojas de departamento e as Grands Magasins que atendiam uma grande massa da população e representavam verdadeiros setores do poder civil. Em cidades como Londres, a descaracterização das galerias comerciais aconteceu em 1900 com o crescimento e centralização das atividades comerciais relacionadas à indústria. Sendo possível citar Friedrich Engels (1845) que descreveu, em sua obra intitulada Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra, de que forma a industrialização e a remodelação urbana culminaram em guerras, desigualdade social e problemas urbanos. As áreas residenciais da classe operária eram marcadas por insalubridade e condições péssimas de vida, além de se situarem próximas às indústrias - fatos estes que prejudicavam a qualidade do ar e da água nestes locais. Enquanto a população com maior poder comercial e capital, desfrutava das cadeias de lojas de luxo e monumentos comerciais da cidade. Heliana Comin Vargas (2018) explica que este afastamento do centro seria ocasionado, também, por um excessivo movimento pendular da população que necessitava de melhores

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condições de emprego. Pode-se dizer, portanto, que parte do prejuízo e esquecimento da galeria aconteceu na Europa por questões sociais e de expansão urbana desenfreada. Consequentemente a estes acontecimentos, como últimos exemplos de galeria comercial na Europa a partir de 1900 temos as passagens: Friedrichstrassenpassage (figura 28) de 1908 em Berlim; as Galerie Lafayette de 1912.

Figura 28- Uma das últimas manifestações da galeria comercial a ser construída na Europa a Friedrichstrassenpassage na capital alemã, de 1908. Fonte: VALENTINY, 2016, n. p.

As grandes lojas como os Grands Magasins nasceram simultaneamente ao sucesso da mecanização que ocasionou mudanças urbanas como: a inserção de ferrovias em 1830; o afastamento do campo; comércio livre consequente à revolução; direitos do comprador e a acessibilidade deste tipo de varejo. “A filosofia dos Grands Magasins assumia que quando uma senhora adentra o seu espaço, não deve haver razão alguma que a faça sair” (VARGAS,2018, p. 168). O declínio da tipologia também foi, em parte, por conta de uma mudança cultural em meio a grandes revoluções das capitais já consolidadas, em que a riqueza e o lucro se sobressaíram à espontaneidade presente nas relações comerciais das galerias. Além destas edificações serem parte de um ciclo pequeno, em que ocorria uma estagnação devido a movimentação de capital nos empreendimentos, não era possível, desse modo, um

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deslocamento nem adaptação radical do modelo que não fazia mais sentido em termos lucrativos. Outras consequências existiram após a segunda metade do século, com a Segunda Guerra Mundial e suas influências na arquitetura, com o Movimento Moderno, um novo planejamento urbano e reconstrução das ideologias perante a expansão das atividades socioeconômicas. As cidades da Europa em transição para o século XX, sofreram com o aumento da população e, em consequência, um congestionamento e queda da qualidade de vida em cidades como: Londres, Paris e Roma. As cidades européias, cada vez mais tomadas pela fumaça das fábricas, pelo congestionamento de pessoas e pela baixa qualidade de vida, passaram por um período de esvaziamento nas primeiras décadas do século XX, com parte de sua população mudando em direção aos subúrbios. As várias propostas urbanísticas geradas nesse quadro, como as da cidade jardim do inglês Olmsted propunham a fuga das cidades industriais e a construção de pequenas estruturas urbanas auto-sustentáveis, arborizadas e conectadas umas às outras por vias de transporte coletivo (ALEIXO, 2005, p. 34).

Devido aos problemas urbanos enfrentados pelas capitais europeias no fim do século , o frenesi em termos de desenvolvimento econômico se fez presente na América do Norte que, naquele momento, passou por processos de industrialização semelhantes. As galerias não atendiam mais à dilatação econômica da indústria, sendo substituídas na Europa e Estados Unidos pelos shopping centers e hipermercados. E consequentemente o comércio de bairro não conseguiu suportar a alta quantidade de produtos necessária para a população. O século XX será marcado por dois processos fortemente relacionados entre si e que se rebatem, diretamente, sobre o desenvolvimento varejista: o crescimento demográfico e a industrialização. Esses dois fenômenos, juntos, responderam pelo forte processo de urbanização e congestionamento das grandes cidades e pela deterioração ambiental e da qualidade de vida (VARGAS, 2018, p. 179).

Em relação à atividade econômica na Europa no contexto do século XX, houve a apresentação de novas tecnologias como os automóveis e os novos modos de conservação dos alimentos, fatores que modificaram totalmente a forma como aconteciam os serviços comerciais na dinâmica das cidades. Este avanço no processo de conservação dos alimentos causou uma padronização dos produtos vendidos, prejudicando os consumidores pequenos, e as pequenas lojas dentro das galerias que no século XIX tinham produção artesanal, foram substituídas por grandes mercados e atacados capazes de vender diversos produtos em grandes quantidades. De acordo com Heliana Comin Vargas (2018) a prática do varejo se tornou decadente e incompatível com a modernidade, ocasionando a introdução de novas formas de comércio 40


como o self-service e as grandes cadeias de lojas na Europa e, mais tarde, nos Estados Unidos da América. A atividade do comércio no século XX ilustrou o distanciamento de uma arquitetura presente na dinâmica urbana, já que para os grandes empreendedores com capital imobiliário, o único interesse era a capacidade de venda dos edifícios. Na Europa, a direção do planejamento urbano seguiu os princípios da Cidade-jardim, o que ocasionou em um programa de descentralização que obtivesse uma hierarquia de usos evitando o movimento pendular, em resposta aos excessos da industrialização. A reconstrução da metrópole europeia também teve motivação acerca dos efeitos da Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945). Na Europa, os Centros de Compras Planejados, construídos até 1968, fizeram parte de cidades inteiramente novas, edificadas por meio de políticas de descentralização urbana para fazer face a um crescimento da população, ou das cidades que haviam sido destruídas pela guerra embora o número de cidades incluídas nesta última categoria fosse reduzido.(VARGAS, 2018, p. 187).

A transformação do comércio ocorrida na Europa também aconteceu nos Estados Unidos da América, que passava por um mesmo período de introdução às máquinas. A mecanização modificou os Estados Unidos e suas cidades, em especial Nova Iorque, em territórios padronizados para receber as novas propostas urbanas e avanços da tecnologia. O grande aumento da população devido à industrialização ocorreu e, em termos de planejamento urbano, ocasionou em um processo de hierarquização, dividindo a cidade e as pessoas em diferentes setores, reproduzindo a segregação da população. Assim como Paris, a cidade de Nova Iorque também recebeu uma remodelação urbana em que o objetivo era a instalação do comércio em grande escala no centro da cidade, e a indústria passou a ser localizada nos subúrbios juntamente com áreas residenciais. Na cidade americana de Nova Iorque, acontecia o Regional Plan of New York and Its Environs, liderado por Thomas Adams, que visava o destaque da metrópole e seu crescimento, promovendo a ordem das áreas públicas e dos transportes. As propostas do plano para a cidade sofreram críticas por parte do grupo de filósofos e profissionais da arquitetura entre 1930 e 1940, entre eles Lewis Munford e Benton Mackaey que defendiam uma ideia de cidade mais humanista, inspirada nas cidades-jardins inglesas conceituadas por Ebenezer Howard. Houve este ensaio de uma cidade americana inspirada nos conceitos humanistas de recreação e inserção de áreas verdes, mas o crescimento populacional e a disseminação do automóvel tornavam as características do urbanismo americano voltadas para a produção de auto-estradas.

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As principais diferenças entre os conceitos dos que criticaram o plano regional de Nova Iorque e o planejamento em si eram a sua categorização: Howard defendia a ideia de que a cidade precisava preservar as áreas verdes, e estas ideias foram em 1903, efetuadas por Raymond Unwin e Barry Parker, na primeira cidade-jardim de Letchworth, Inglaterra.Inseriu-se as áreas verdes como recurso para a criação de pequenos sistemas autossuficientes para evitar o movimento pendular em excesso e promover uma cidade com menos problemas de infraestrutura. Howard propôs (figuras 28 e 29) um controle de uma população estimada para cada área valorizando a relação entre os espaços em oposição ao efetuado em Manhattan em 1932. O Regional Plan of New York and Its Environs (figura 30) colocava a rua em destaque como espaço e na relação entre comércio e cidade, além de promover um crescimento ainda maior das áreas metropolitanas, valorizando o automóvel e os arranha-céus.

. Figuras 28 e 29- A esquerda estimou-se um princípio correto para o crescimento da população e a comunicação entre os diferentes setores da cidade. E à direita a figura 29 mostra a abertura de maiores avenidas e um desenho das ruas com inserção das áreas verdes nas cidades jardins. Fonte: ANDRADE, 2003, n. p.

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Figura 30- Regional Plan of New York and Its Environs. A valorização do automóvel, 10% da área para recreação e parques, distritos de shopping preferencialmente conectados, avenida e ruas internas pequenas com acesso às lojas e aos centros comunitários. Fonte: WOLFE, 2018, n. p.

Importantes para o diagnóstico da falência do modelo de galeria, e centro comercial de menor porte, estes ocorridos mostram como que em oposição ao que ocorreu na Europa, as capitais americanas foram induzidas desde início a um pensamento voltado para a valorização da mecanização e do trabalho otimizado. Em paralelo com a consolidação da economia americana, houve a inauguração, em 1930, do primeiro supermercado na cidade de Nova Iorque: o King Kuller. Este estabelecimento ofereceu acessibilidade à população que passou a se abastecer mediante as grandes franquias de lojas, além da introdução de conceitos como o marketing e direitos trabalhistas que colocavam o comércio de bairro em segundo plano. As grandes estruturas geraram uma impessoalidade estética e foco somente no produto e no lucro que se obteve com os comércios varejistas de grande porte. A arquitetura do período torna-se pobre, monótona e sem expressão principalmente nas grandes lojas, super e hipermercados. A grande maioria dos shopping centers é semelhante, na forma e no conteúdo. As técnicas e vendas e estratégias dos negócios são a força do seu sucesso que desprezam a importância do lugar. (VARGAS, 2018, p. 207).

Nas capitais americanas houve a relevância das vias, local destinado ao comércio em grande expansão, simultâneos à concepção do automóvel. Em relação às trocas comerciais

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neste período, há a ascensão do modelo de shopping center, que eram categoricamente localizados de acordo com o planejamento urbano (figuras 32 e 33).

Figura 32- Nova Iorque em 1950, e o frenético movimento causado em parte pelas lojas de departamento e a valorização do comércio varejista. Fonte: CORTINA, 2013, n. p.

Figura 33- Nova Iorque em 1950, mostrando as grandes vitrines e outdoors, além dos automóveis em alta na época. Fonte: DONOVAN, 1953, n. p.

Heliana Comin Vargas (2018) ressalta como a valorização do grande centro de compras era observada, em que os conceitos de “shopping center (centro de compras)” se opunham ao “selling center (centro de vendas)”. Essa comparação ilustra como os novos shoppings centers, que tomavam conta das metrópoles tanto na América do Norte como na Europa, criavam uma 44


relação unilateral em benefício do consumidor, vendendo cada vez mais produtos de categorias variadas em grandes quantidades tornando a atividade comercial impessoal, que se distanciava ainda mais do conceito de galeria e a relação da cidade com o edifício. “Os shoppings centers, os mais significativos edifícios desse momento, nascem independentes, ignoram o lugar e marcam presença pela força do seu tamanho sem, no entanto, criar a diferença e o encantamento” (VARGAS, 2018, p. 207). O fim do capítulo representa a conclusão da formação da tipologia de galerias que adaptáveis, são parte da dinâmica urbana e essenciais para o desenvolvimento da economia ao longo da história, mas que em sua introdução no Brasil, vieram da influência destas movimentações internacionais vistas ao longo do capítulo 1.

2. Galerias Comerciais no Centro de São Paulo Com objetivo de contextualizar as galerias comerciais e seu surgimento na cidade de São Paulo é necessário fazer uma breve explicação sobre os "surtos urbanísticos" ocorridos em São Paulo, denominação esta que foi utilizada por Benedito Lima de Toledo (1996) ao descrever, de acordo com Prestes Maia, a a transformação urbana paulistana em quatro fases. O primeiro "surto" ocorreu durante a administração de João Theodoro entre 1872 a 1875 e foi caracterizada por intensa atividade na Várzea do Carmo e na estação da Luz. O segundo, no entanto, correspondeu ao período da administração de Antonio da Silva Prado de 1889 até 1911 com destaque para as renovações ocorridas após a construção do Viaduto do Chá(1892),com intervenções como: [...] Executaram-se vastas e custosas obras de saneamento, sobretudo na várzea do Tamanduateí; canalizaram-se os rios e ribeirões da cidade; garantiu-se, para a população, melhor e maior quantidade de água potável; rasgaram-se novas ruas e avenidas; ajardinaram-se as praças e pavimentaram-se, da melhor maneira possível, as ruas da parte principal da cidade . Disso tudo resultou uma nova cidade de São Paulo, bem diversa daquela que nos havia legado no século XIX (PETRONE, 1955, p. 139).

O terceiro surto urbanístico especificado por Prestes Maia e citado por Benedito Lima de Toledo (1996), sucedeu uma série de obras que estabeleceram novas configurações ao Centro de São Paulo, local de estudo dos próximos subcapítulos, com a construção do Centro Novo durante a gestão do prefeito e Barão de Duprat entre 1911 e 1914. E, por fim, o quarto surto ocorrido entre 1938-1945 que deteve:

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O quarto, no período 1938-1945, quando foi tentada uma remodelação mais radical e sob critérios gerais de coordenação. O período imediatamente anterior, do prefeito Fábio Prado, revelara uma visão administrativa nova, porém ainda tímida sob o ponto de vista urbanístico. Do período 1938-1945 data, entre outros empreendimentos, o Perímetro de irradiação, Ring ou circuito de bulevares destinado a desafogar e ampliar o centro comercial. Composto de diversas avenidas de larguras variáveis entre 33 e 45 metros, com numerosas praças intercaladas, essa obra mudou inteiramente a constituição e o aspecto do Centro e o seu esquema circulatório. Tratava-se justamente da seção urbana mais atrasada e a mais arriscada, devido à ereção contínua de grandes prédios, a comprometer-se definitivamente (MAIA, 1961 apud TOLEDO, 1996, p. 17).

Partindo desta delimitação de "surtos urbanísticos", o segundo capítulo realiza um panorama histórico-comercial da cidade de São Paulo a partir do quarto período supramencionado, pois, anterior a este momento a metrópole possuia características marcadas pelo desenvolvimento industrial e se formou a partir da imigração, com um crescimento da população. Segundo o geógrafo Pasquale Petrone (1955), a aparência de São Paulo nos primeiros 25 anos do século XX consistia em áreas urbanas bem delimitadas, divididas especialmente pelo Rio Tamanduateí. Apesar das diversas movimentações internacionais que ocorreram na Europa e Estados Unidos, a metrópole continuou em uma curva ascendente. Debalde a crise caféeira, que se seguiu ao crack da bôlsa de Nova-York (1929), abalou em seus alicerces a economia paulista. Debalde os acontecimentos políticos, como as revoluções de 1924 e 1930 e a revolução constitucionalista de 1932, além das vicissitudes que se lhes seguiram, convulsionaram e perturbaram a vida da população do Estado. Debalde a segunda Grande-Guerra (1934-1945), em seus reflexos sôbre o nosso país, criou problemas de tôda espécie, para o seu comércio e para sua atividade industrial. Nada disso foí capaz de interromper ou, mesmo, arrefecer o ritmo de crescimento e a expansão da metrópole paulista. As estatísticas referentes a êsse período dão saltos de assombrar. Alimenta ininterruptamente sua população, amplia-se cada vez mais sua área urbana, consolida-se sua posição na liderança econômica e cultural do Estado e até do país[sic.] (AZEVEDO, 1958, p. 154).

Em seus primeiros trinta anos, a expansão urbana da cidade de São Paulo foi consequente a diversos fatores, entre os quais é possível citar: novos empreendimentos; contribuição estrangeira ; prosperidade econômica e a consolidação da relação entre café e indústria. Com destaque também para os novos impostos sobre importação simultâneos ao sucesso da atividade industrial, que em 1930 já eram superiores à produção agrícola. Fatores estes que caracterizavam São Paulo como parte de um ampliação inconsciente, ou seja, houveram estímulos que cresceram a cidade de forma vegetativa e demográfica. Todos os fatôres citados, econômicos ou demográficos, palpitam bem vivos na capital paulista. Sentímo-los na potência de sua vida comercial, na quantidade e movimento de seus bancos, na fôrça de suas indústrias 46


variadíssimas, no ininterrupto despejar de gente que se presencia nas estações ferroviárias e rodoviárias. Sentímo-los, finalmente, na própria massa da população urbana, em que se encontram, de mistura [...] [sic.] (AZEVEDO, 1958, p. 159).

O parque industrial paulistano se instalou também no período posterior à década de 1930, em que houve a grande valorização dos produtos nacionais e consolidação da metrópole industrial como potência na América do Sul. Pode-se dizer que a indústria cresceu no entorno das ferrovias, inseridos em uma industrialização de substituição e forte exportação dos produtos brasileiros. O contexto socioeconômico da capital paulista fortaleceu o comércio em várias formas, em especial o setor varejista e constituiu processos de metropolização e conurbação. No filme intitulado São Paulo, Sinfonia da Metrópole de 1929, imagens mostram uma cidade de compra e venda, com vida financeira e uma dinamicidade, ilustrando bem esta curva ascendente da metrópole. As imagens variam entre os bondes e automóveis em funcionamento, e uma heterogeneidade marcante. A cidade é mostrada como mecanizada, uma força motriz e alavanca do progresso(figuras 34 e 35)

Figura 34- Anúncio do filme Sinfonia da Metrópole. Fonte: DELAQUA, 2013, n. p.

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Figura 35- Imagem de um dos excertos do filme Sinfonia da Metrópole, mostrando a predominância dos automóveis e o grande movimento. Fonte: https://youtu.be/0cumh-UD8GA

Em 1930 os bairros da metrópole abrigaram tanto as indústrias quanto as residências, e as vilas operárias se espalharam pela extensão da cidade, gerando áreas descentralizadas e mais tarde as subprefeituras, reflexo também do crescimento populacional e econômico. Nos bairros, predominavam as habitações de aspectos modestos, de um só pavimento, geralmente possuindo porões, dando diretamente para a rua e obedecendo a um estilo mais ou menos padronizado, sem ,nenhum encanto arquitetônico; assim eram as moradias da classe média e da população operária, de que perduram numerosos exemplos, notadamente na Bela Vista, em Vila Buarque, em Santa Ifigênia, na Barra Funda, no Bom Retiro e no Brás. Em contraposição, nos bairros aristocráticos predominavam as grandes mansões senhoriais e os ricos palacetes dos milionários do café e "capitães da indústria" [...]. Ao findar o primeiro quartel do século atual, São Paulo era, ainda, uma cidade baixa, que muito pouco crescera no sentido vertical e só excepcionalmente conhecia prédios de seis e sete andares (PETRONE, 1955, p. 146).

No início do século XX, foram construídos também os mercados públicos nas cidades brasileiras, mas que em sua maioria abasteciam as casas da população operária acompanhando o crescimento populacional. Segundo Vargas (2018) nesta época as grandes lojas de atacado e varejo - tal qual a filial da loja inglesa, Mappin - se instalaram no centro novo de São Paulo,

que estava em processo de verticalização e popularização. O centro da

metrópole concentrou a atividade de comércio, momento correspondente a uma fase de expansão urbana desenfreada entre 1925 a 1950, que originou os subúrbios e o desenvolvimento de regiões de Norte a Sul.

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2.1 do Centro Velho ao Centro Novo O Centro Velho de São Paulo foi local de início da história da cidade delimitado através dos rios Anhangabaú e Tamanduateí, que foram importantes formadores de rotas, além dos mosteiros Carmo, São Bento e de São Francisco que eram de uma colonização europeia além das ruas do Triângulo Histórico. É possível afirmar que as transformações urbanas desta área foram motivadas pela mudança da atividade em procura de minérios, para o triunfo do café que foi fundamental para o desenvolvimento econômico e urbano da cidade, a começar no ano de 1870. Neste período eram frequentes as construções de chácaras, e o adensamento da população que veio para o Centro em busca de melhores condições de mercado nas áreas previamente urbanizadas. O intenso parcelamento do solo e ocupação das periferias para a obtenção de propriedades causou uma alta necessidade de infraestrutura, serviços públicos nos núcleos urbanos e um sistema viário de maior qualidade. Dessa forma, houve a partir de 1870 um intenso processo de investimentos da elite cafeeira para obtenção de uma cidade aos moldes europeus. Sucedeu-se, nos anos seguintes, a divisão de lotes para um adensamento e a possibilidade de lucro com os aluguéis, somados ao nascimento de uma sociedade capitalista nas entrelinhas do café. O Centro Velho viveu através das edificações dos barões do café, mas que neste momento de expansão urbana, recebeu os aluguéis de comerciantes e investidores do final do século XIX até 1925. Um dos reflexos da procura por sucesso seguindo os passos da Europa foi a Galeria de Cristal (figuras 36 e 37) do arquiteto francês Jules Martin, construída em 1890, que coincide com as linguagens arquitetônicas utilizadas nas capitais europeias.

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Figuras 36 e 37- Galerias de Cristal, semelhantes às galerias comerciais italianas e belgas tanto em materialidade como se observa a esquerda quanto na implantação com diversos caminhos visto à direita na imagem 35. Fonte: TOLEDO, 1996, p. 60-61

Além disso, é importante ressaltar que as novas instalações comerciais do Centro existiram simultaneamente ao marco arquitetônico deixado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, inspiradas no triunfo dos europeus na arquitetura e urbanismo como por exemplo: o Teatro Municipal, construído entre 1908 e 1911. Representaram esta influência e busca por embelezamento com a aproximação às cidades europeias o Viaduto do Chá (figura 38), e a arborização (figura 39).

Figura 38- Viaduto do Chá, anterior a sua participação no Plano de Avenidas, o viaduto também marcou a divisão entre centro velho e centro novo na metrópole. Fonte: TOLEDO, 1996, p. 62

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Figura 39- Projeto de ajardinamento da Praça da República, 1901, com o engenheiro Carlos de Serico como responsável. Fonte: TOLEDO, 1996, p. 70

As transformações urbanas do período a partir da construção do Viaduto do Chá em 1892 foram benéficas para a metrópole de forma que destinaram em melhorias nos espaços públicos e eixos viários como: iluminação pública; pavimentação de ruas; melhorias de saneamento básico e aprimoramento dos transportes. A utilização de energia elétrica culminou na iluminação e utilização de bondes nas ruas de São Paulo, serviços estes que eram administrados pela empresa Light. O Centro Velho da cidade de São Paulo, também denominado Triângulo Histórico, era reconhecido como uma região comercial, em que predominavam os mercados varejistas e atacadistas consolidando ruas e focos específicos de atividade comercial: "No centro de São Paulo, no Triângulo — afirmou Wolfgang Harnisch — a vida pulsa numa atividade e num ritmo pouco tropical. Nessas ruas estreitas, de edifícios altos, os homens correm e se acotovelam como em qualquer capital da Europa . Nos seus rostos vemos estampada a mesma expressão de fadiga e intensidade". E conclui: "Aqueles que andam pelas ruas, que olham e gritam e vendem — sentem que ali está o centro de uma metrópole moderna, internacional de uma cidade de comércio e indústria" (HARNISCH, 1935 apud PETRONE, 1955)

Os bairros de São Paulo também se desenvolveram conforme aconteceram as instalações de imigrantes, e a cidade adotou caráter muito diversificado, com a presença de populações italianas, japonesas e espanholas que exerciam funções específicas na cidade e em seu sistema socioeconômico.

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A indústria teve papel fundamental no processo de inserção dos edifícios altos no Centro de São Paulo. Explicando melhor, ainda com influências europeias, o Centro Velho de São Paulo possuiu construções coerentes com o adensamento e crescimento demográfico da época. E assim como o que acontecera nas capitais europeias, São Paulo enfrentou problemas urbanos e sociais, como a falta de moradia ocasionados pela industrialização: Agora a elite industrial dita as regras do ideário estético, mas o desenvolvimento das atividades industriais agrava os problemas urbanos. A disponibilidade de redes de água, esgotos e eletricidade e a atração pelo centro financeiro da cidade são um incentivo para a localização das indústrias na capital, que buscam se instalar ao longo das vias ferroviárias, elevando os preços fundiários e intensificando o problema habitacional. (SOMEKH, 1997, p. 135)

De acordo com a arquiteta e urbanista Nadia Somekh (1997), as transformações do período a partir de 1930 foram resultados da ampla intervenção do Estado na busca por melhora na qualidade de vida e aumento dos espaços para demanda necessária através de intervenções. Segundo a autora, entre as décadas de 1920 e 1930 as edificações se formaram cercadas pelo novo ideal de modernização. A partir de 1920, a cidade se consolidou como local exclusivo de competição e consumismo em que imigrantes faziam parte de uma classe média com domínio de transações comerciais, além das operações urbanas serem estimuladas pelo capital financeiro. A verticalização foi uma das diversas consequências da economia industrial-capitalista em São Paulo, em que o Estado se responsabilizou como produtor e facilitador dos caminhos de mercado, e conjuntamente com a legislação transformaram a metrópole entre os anos de 1920 e 1940. A introdução das galerias comerciais favorecidas por atividade cultural em São Paulo ocorreu tardiamente, só em 1950, por conta de diversos fatores. O primeiro deles foi o grande sucesso dos formatos atacado e varejo, e os edifícios de mercado como a Loja Japão, descrita por Cynthia Aleixo (2004) como um dos agentes de venda de produtos em atacado e varejo, além da intensa comercialização de exportação e importação no Centro da cidade. As lojas de departamento também tiveram seu nível de popularidade, e a Rua Barão de Itapetininga (figura 40) foi uma das responsáveis por alavancar o comércio de luxo em outros contornos, além da grande influência estrangeira nas novas edificações para fins comerciais.

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Figura 40- Rua Barão de Itapetininga no final da década de 1920 Fonte: NASCIMENTO, 2021, n. p.

Para que seja possível entender o aparecimento das galerias comerciais, é necessário citar a formação do Centro Novo e seus pretextos para aparecimento da tipologia. De acordo com Sabrina Fontenele (2010), anterior ao lançamento dos arranha-céus no Centro Novo, haviam as chácaras de barões e, em 1920, os primeiros edifícios altos do Centro Novo apareceram devido a um loteamento e pavimentação realizado nos terrenos e ao redor das chácaras, ainda de forma desordenada. Com a abertura das novas vias, o Centro Novo ganhou destaque maior na dinâmica urbana e a área transformou-se em foco de interesse para novas construções. Prestes Maia se utilizou desta ideia para induzir o desenho da paisagem urbana desta área ao modificar a legislação existente (FONTENELE, 2010, p. 100).

Anterior ao aparecimento das galerias comerciais em 1950, transcorreu em 1930 nas gestões de Fábio Prado e Prestes Maia a intervenção urbana denominada Plano de Avenidas, que teve como principal foco a reordenação do Centro Novo e a ampla remodelação das articulações econômicas. O plano desenvolvido pelo urbanista e político Prestes Maia, propôs em conjunto com outros profissionais em 1930 a remodelação de vias do centro. Desenhado para que houvesse uma melhor circulação dos automóveis e a mudança de quadras com ideais

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baseados no urbanismo modernizador, que guiados pela intervenção Haussmaniana e das cidades americanas, introduziu as edificações de maior porte,verticalizando assim a cidade. Desse modo, propôs o adiamento do metrô, pois ele iria valorizar áreas do centro onde ruas deveriam ser futuramente alargadas. Isso seria custoso aos cofres públicos na hora de desapropriá-las para demolição. Desconsiderou exatamente o seu oposto: preservar o centro histórico. Era a visão modernizadora do arrasa quarteirão, tão marcante em Haussmann. (CUSTÓDIO, 2004, p. 92)

Proposto em 1930 por Prestes Maia e Ulhôa Cintra, o plano surgiu de um intenso processo de estudos, em que Prestes Maia começou a trabalhar na Secretaria de Viação e Obras Públicas. O plano manifestou diretrizes para o desenvolvimento urbano e a institucionalização de uma nova centralidade localizada no Vale do Anhangabaú. No plano apresentado aos vereadores nos anos anteriores a 1930, procurou-se descongestionar e estender as áreas dos centros comerciais além de “disciplinar a cidade e reordenar a área central” (TOLEDO, 1996, p. 14). Prestes Maia ofereceu, após a estabilização da metrópole industrial, em seus estudos sobre São Paulo, chances para se obter mobilidade, em que as avenidas se tornaram limites importantes no território paulista. Na gestão anterior de Fabio Prado, os primeiros conceitos do Plano de Avenidas foram brevemente aplicados e retomados com “a abertura das avenidas Rebouças e Nove de Julho, o alargamento da rua Xavier de Toledo e o prolongamento da rua Augusta” (FONTENELE, 2010, p. 52). Após a consolidação do que desejava aplicar à cidade, Maia elevou-se a prefeito entre os anos de 1938 e 1945 o que garantiu a efetivação de seus conceitos. Nos estudos acerca do Plano de Avenidas, foram atribuídos aspectos urbanos dos profissionais estrangeiros: o alemão Joseph Stübben e o francês Eugène Hénard. Este último defendia o perímetro de irradiação com caminhos para o centro da área urbana, com apoio de pequenas ruas e ampliação do centro. Similarmente, Joseph Stübben considerava as ruas radiais as principais , e destacava as conexões entre núcleo e entorno. Hénard tem como base teórica o perímetro de irradiação, e Stübben sistema radial perimetral que em união foram incorporados no Plano de Avenidas (figura 41).

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Figura 41- Esquema representando a produção de centralidades, Ruas e Avenidas inspiradas em modelos das cidades de Eugène Hénard. Fonte: TOLEDO, 1996, p. 122

Surgindo destas referências internacionais de planejamento urbano, as Avenidas Radiais do Plano de Avenidas eram as estruturas de desenho viário vindas a partir do centro, e conectavam com ruas importantes os focos comerciais da metrópole (figura 42).

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Figura 42- Esquema representando o centro, que concentrou o Perímetro de Irradiação, e as diversas ruas que ligavam as regiões mais movimentadas da cidade na metade do século XX. Fonte: TOLEDO, 1996, p. 160

O Perímetro de Irradiação tinha como principal foco a descentralização do Triângulo Histórico, expandindo as atividades comerciais e aliviando as vias de trânsito. O foco dessa expansão em todas suas propostas foram a Praça da República e o Parque Pedro II, que faziam parte de uma conexão entre quadras que necessitavam do alargamento de ruas (figura 43).

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Figura 43- Alargamento de vias e construção de uma avenida capaz de envolver o Parque Dom Pedro II até a Praça da República, com os bondes e luminárias elétricos. Fonte: ANELLI, 2007, n. p.

Entre as três fases do Perímetro de Irradiação, efetuou-se próximo à Praça da República um segundo desenho proposto ao Plano de Avenidas que previu a remodelação da Praça da Sé e a chegada a Praça da República pela Rua Timbras. A partir da Praça da República, mantém-se a idéia de se abrir uma avenida no quarteirão entre as ruas São Luís e 7 de Abril, ampliando-se sua área, já agora com uma praça rotatória ao centro, que iria implodir o quarteirão, dividindo-se em três avenidas no rumo sul. Uma delas é a que figurava no esquema anterior: Viaduto São Francisco, Rua Benjamim Constant, Ladeira do Carmo. A outra era o embrião do traçado que acabaria sendo executado, com alterações, anos depois. A avenida, mais ao sul, cortaria os dois vales onde, hoje, correm as avenidas 9 de Julho e 23 de Maio e passaria atrás da Catedral, continuando pela Rua Tabatingüera até o extremo sul do Parque Pedro II. (TOLEDO, 1996, p. 146)

Segundo Benedito Lima de Toledo (1996), o curso efetivo das Avenidas de Irradiação inseridas na mudança comercial para resultado do Centro Novo continha: a troca da Avenida Timbra para a Ipiranga; eixo da Rua São Luís; formação de viadutos (figura 44).

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Figura 44- Alargamento e construção de ruas entre os dois focos de expansão. Fonte: ANELLI, 2007, n. p.

Baseado na filosofia de diagnóstico da cidade, Prestes Maia, como urbanista, valorizou as obras ao mesmo tempo que esculpiu seus arredores. As áreas comerciais estavam em total desordem com a aglomeração de um comércio baseado no sucesso da imigração, e a intervenção do Plano de Avenidas, além de desenhar estas vias, destacou esta interação humana presente nas atividades econômicas. Vanderli Custódio (2004) caracteriza como uma das essências do Plano, justamente o edifício e a sua capacidade de se inserir uma realidade presente no cotidiano de quem frequentava o centro. Este processo de conceituação e implementação de planos que valorizassem a cidade e suas relações contou com a presença de diversos profissionais na intervenção em São Paulo: No primeiro escalão do que se poderia chamar de urbanistas paulistas – cujas práticas marcariam a cidade até os anos 1960 –, tem-se o próprio Victor da Silva Freire (1869-1951), João Florence de Ulhôa Cintra (1887-1944) e Francisco Prestes Maia (1896-1965). Em um segundo escalão, encontram-se Arthur Saboya e Saturnino de Brito, este último mais sanitarista do que urbanista propriamente dito. As idéias mais influentes foram as de Camillo Sitte (1943-1903), Joseph Stübben (1845-1936) e Eugène Alfred Hénard (1849-1923) (CUSTÓDIO, 2004, p.82)

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A transição de Centro Velho para o Centro Novo, foi parte de uma necessidade de mudança de foco, em que as potencialidades do entorno da Praça da República foram apresentadas com o objetivo de melhorar a qualidade viária e urbana da cidade como um todo. Apesar de externamente dar ênfase a elementos pertencentes a arquitetura clássica e mais tarde ao Art Déco americano, as edificações das quadras possuiam lotes estreitos e de grande profundidade com a exclusão de recuos e uma heterogeneidade de gabaritos. Esse processo de planejamento urbano apresentou novos pontos a legislação que atuou junto com os investidores para a construção de edifícios marcantes (figuras 45 e 46) e as galerias do Centro Novo. Os novos edifícios do centro de São Paulo no século XIX ainda apresentaram características do ecletismo arquitetônico, mas tiveram que seguir as inovações urbanas, parte de uma ideia que “[...] incentivava a ocupação dos lotes por edifícios que marcaram a paisagem, “seja pelo conjunto arquitetônico que se formaria ao longo das avenidas, seja pela ocupação dos lotes nos pontos focais do circuito ou pela implantação em grandes espaços aberto” (FONTENELE, 2010, p. 57).

Figura 45- O Perímetro de Irradiação entre o Parque Dom Pedro II ao canto esquerdo,até a Praça da República com o Instituto Caetano de Campos.

Fonte: TOLEDO, 1996, p.129

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Figura 46- O entorno da Praça da República ainda com os edifícios de 4 pavimentos, mas mostrando a singularidade da Avenida São João que conectou os dois núcleos. Fonte: TOLEDO, 1996, p.150

Houve claramente a união de uma expansão horizontal e vertical, visto que entre o Centro Novo e o Centro Velho, em 1930, ainda possuiam cerca de cinquenta edifícios mais altos, pertencentes ao fenômeno dominado pela iniciativa privada, explicando suas dimensões reduzidas no início do movimento. Constituindo as atividades de escritório e terciárias no Centro Novo, os novos edifícios fizeram parte de um movimento de verticalização gradual entre 1930 e 1945, com a aceitação do Movimento Moderno, além dos resultados das interferências de planejamento urbano.

2.2 Movimento da verticalização e a inserção das galerias no Centro Novo Para dar início ao estudo do movimento de verticalização do Centro Novo da cidade de São Paulo, é necessário pontuar de que forma o urbanismo e a tecnologia se encaixaram e atuaram como ativo preliminar nos investimentos verticais. Nadia Somekh (1997), cita que os principais fatores responsáveis por estimular a verticalização no século XX em São Paulo foram a: relação do espaço com a economia; o zoneamento; a tecnologia dos elevadores; o controle do estado sobre as terras e as influências internacionais de planejamento urbano.

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Ver-se-á adiante que a história do urbanismo e do planejamento urbano nasce da necessidade de controle do conflito de classes nas cidades industrializadas. [...] O mercado da terra urbana, atuando de modo imperfeito, demanda a ação do estado para liberar a terra para investimentos mais lucrativos. (SOMEKH, 1997, p. 30)

O desenvolvimento do arranha céu americano atuou como grande inspiração para a evolução da silhueta urbana em São Paulo. Nos Estados Unidos ocorreram avanços na utilização de estruturas metálicas no início do século XX, o que contribuiu, junto com a tecnologia dos elevadores para a construção de ícones arquitetônicos em cidades como Chicago e Nova Iorque. Exemplos de contemporaneidade e eficiência, os arranha-céus utilizaram estética Art Déco e o Estilo Internacional nos primeiros anos do século XX, mas que com a contribuição de arquitetos como Mies Van der Rohe se tornaram parte do Movimento Moderno e influenciaram nas edificações em São Paulo. Somado a estes fatores, no século XX na cidade paulista, houve um grande crescimento da população e a consolidação de bairros. Bairros vindos da consequência do zoneamento em que cada região exibiu específicas funções na cidade, em especial o centro que recebeu atividades comerciais e contemplou 70% dos edifícios pertencentes ao fenômeno da verticalização. Edifícios altos e verticalização não são consequências naturais da urbanização, mas opções possíveis de configuração no largo espectro das soluções urbanísticas (12). A verticalização constitui um dos traços característicos da urbanização brasileira. Primeiramente, pela própria intensidade com que ela se dá, mas também pelas formas que ela assume. São Paulo é o grande ícone desse fenômeno. Nessa cidade, ele adquiriu proporções de peso apenas a partir das décadas de 1960 e 1970. Antes disso, entretanto, edifícios altos e áreas verticalizadas constituíam uma simbologia que encontrou seu espaço na própria história da cidade. Eles eram associados à ideia de modernização, de progresso e aos êxitos econômicos da metrópole. Durante as décadas de 1920, 1930 e 1940, estabeleceram-se os alicerces para o desenvolvimento desse fenômeno. (SILVA, 2007)

Nadia Somekh (1997) na obra intitulada A (des)verticalização de São Paulo, divide este processo em períodos conforme o caráter das edificações. O primeiro período de 1920 a 1940, é caracterizado por uma grande influência europeia nas edificações em São Paulo, também com destaque para a criação da Lei n. 22.332 que prescreveu a utilização dos elevadores em 1920 mais tarde efetivada em 1940. Houve também estímulos por parte da legislação em que no Centro Novo, permitia edificações com até cinquenta metros de altura, com coeficientes de aproveitamento crescentes por conta da falta de recuos e a simultaneidade ao Plano de Avenidas tornavam as construções cada vez mais altas.

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Nos anos seguintes, entre 1940 e 1957, transcorreu a construção de edifícios residenciais na verticalização com influências americanas além do Centro da cidade. Influenciados por movimentações na economia como os financiamentos e a previdência, as propriedades faziam um sucesso entre a população que comprava o que consequentemente proporcionou um crescimento ainda maior nos bairros no entorno do centro. Na área central, a ocupação do solo urbano era praticamente total, sendo livres apenas as áreas internas dos grandes prédios. A existência de um terreno desocupado, em geral servindo de estacionamento, indicava que mais um “arranha-céu" estava para surgir. O mesmo fato repetia-se em proporções menores no “Centro Novo", recentemente integrado ao núcleo antigo (SOMEKH, 1992, p. 80).

Os anos entre 1957 e 1967, foram caracterizados por Nadia Somekh (1997) como pertencentes às evoluções causadas pelo automóvel e as mutações de coeficiente de aproveitamento, correspondendo aos índices: 4 em edifícios residenciais, e 6 nos comerciais. O quarto e quinto período de desenvolvimento da verticalização em São Paulo entre os anos 1967 e 1979 segundo a autora, foram manipulados por dois movimentos estatais: a criação do Banco Nacional da Habitação, que era responsável por financiar habitações populares; a Lei de Zoneamento de 1972 que permitia a multiplicação de solo que a longo prazo resultaram em problemas de mobilidade e moradia, e valorização de áreas mais elitizadas. O Banco Nacional da Habitação foi uma organização nacional, criada em 1964 e encerrada em 1986, responsável por auxiliar a população na compra de imóveis para habitação, e foi importante para o fenômeno da verticalização porque ele estimulava e auxiliava a população resolvendo seus empecilhos em financiamento. O Zoneamento, tornou intensivo o processo de verticalização, supervalorizando as terras e o controle das áreas e preços, mas causou problemas como: A segregação de usos na cidade, além de inflacionar os preços fundiários, reforça os problemas urbanos através da sobrecarga da infra-estrutura e do sistema viário. Regiões estritamente residenciais não oferecem trabalho, isto provoca o deslocamento da população para os centros de emprego sobrecarregando os transportes. Os quase vinte anos da aplicação da lei de zoneamento tornaram-na um instrumento além de complexo, bastante complicado. Em 1972 foram criadas 8 zonas. Hoje existem 27 modalidades diferenciadas, consolidadas em leis que ocupam mais de 700 páginas de um compêndio. A falta de clareza da legislação é um dos fatores que reforça o processo de clandestinidade da cidade. Além de ser antidemocrática, uma vez que pode ser compreendida por poucos abre espaço para possíveis e prováveis desvios (SOMEKH, 1992, p. 82).

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Além das interferências espaciais da lei de zoneamento como auxílio à consolidação da metrópole, sucedeu-se o Plano Diretor 91, que em conexão com as modificações urbanas da cidade e sua verticalização, procurou solucionar problemas de adensamento e de moradia resultados da industrialização. O Plano consistiu em uma série de determinações capazes de controlar as movimentações das empresas públicas e privadas na configuração da cidade. Englobando todas as esferas da atividade urbana, industrial, comercial, imobiliária e as necessidades por condições melhores de vida, a discussão procurou promover uma cidade mais democratizada e justa. Estes fatores presentes na articulação do Plano, estimularam o adensamento de forma compensatória e se relacionavam com a verticalização. A principal relação entre o Centro Novo de São Paulo e a verticalização, são as consequências destes fenômenos espaciais e sociais citados anteriormente e a grande transformação de desenho que foi o Plano de Avenidas Prestes Maia. A união destas transformações urbanas gerou uma cidade cosmopolita e segregada, além de sedimentar as evoluções comerciais a partir de novas estruturas viárias e edifícios (figura 47).

Figura 47- Avenida São João no ano de 1950, seguintes ao impulso da verticalização, plano Prestes Maia e reformas de legislação. Fonte: OLIVEIRA, 2014, n. p.

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A relação entre o Plano de Avenidas e a Verticalização no Centro Segundo Nadia Somekh (1997), Prestes Maia aplicava a ideia de uma divisão da cidade baseada no adensamento e verticalização inseridas de forma adequada no viário proposto, e este fenômeno era muito bem vindo vide o momento econômico e urbano da cidade em 1930. E com isso, é possível dizer que a verticalização estava presente no principal plano urbanístico da cidade, pois Prestes Maia defendeu a construção dos edifícios e o desenvolvimento do zoneamento a fim de controlar as modificações. A emergência da verticalização em São Paulo resulta da conjunção de uma série de condicionantes. A cidade passa a concentrar população e atividades, requerendo novas configurações espaciais. A atividade industrial, ampliando a divisão técnica do trabalho, necessita de novos espaços de escritórios. O desenvolvimento tecnológico decorre de novas necessidades: estruturas de concreto e a conseqüente provisão de cimento, além da disseminação dos elevadores. A divisão social do trabalho requer novos agentes. O capital imobiliário, em fase de constituição, exige a multiplicação do solo urbano (verticalização), muito mais em função de uma estratégia de valorização, que se compõe com a subdivisão do solo urbano (loteamento), do que efetivamente pela valorização fundiária da metrópole, incipiente (SOMEKH, 1997, p. 65).

O urbanismo em São Paulo buscou resolver problemas de capital imobiliário, tornar a cidade habilitada e setorizada, tudo isso somado com o interesse em contatos internacionais. De acordo com Heliana Vargas (2018), as galerias se inseriram em 1950 na metrópole devido a uma grande movimentação e crescimento de atividades culturais em associação com o adensamento. Este adensamento em muitos edifícios se tornaram residências, mas que dispunham também de espaços públicos. A legislação também permitiu a construção destes edifícios galeria de gabarito alto a partir de 1957, principalmente no centro de São Paulo. Prestes Maia, como comentado, aprovava a inserção dos edifícios altos no planejamento, mas sempre enfatizando a preservação de questões como embelezamento; silhueta; mobilidade e organização da cidade para o andamento da modernidade. Nadia Somekh (1997) descreveu o urbanismo paulistano como a busca por sucesso nas dinâmicas urbanas, funcionalidade da cidade e de sua economia, deixando de lado a importância das relações sociais para o desenvolvimento da cidade. Houve também a definição do urbanismo moderno como originado de um “[...] crescimento explosivo das cidades industriais, com a consequente concentração demográfica” (SOMEKH, 1997, p. 58). Mais especificamente o urbanismo moderno baseava-se na obtenção de uma cidade com processos mais igualitários, utilizando artifícios políticos para seu sucesso sendo possível relacionar o movimento às atuações do Banco Nacional de Habitação e o Plano Diretor.

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Disposto a solucionar os problemas de crescimento populacional e fatores sociais o urbanismo moderno segundo Nadia Cahen (2004) foi junto com os arquitetos do movimento, responsável por disseminar as ideias nos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, e nos processos legais como o zoneamento e loteamentos. Como dito anteriormente, os nomeados arranha-céus foram ponto importante para o desenvolvimento das galerias comerciais, onde a possibilidade de uma variedade de usos na edificação foi apresentada. E junto com as edificações de grande gabarito na Praça da República, também foram concebidas as galerias que, diferentemente do que foi visto na capital francesa, desempenharam um papel de recepção à nova população do Centro Novo vinda com a especulação imobiliária. A Praça da República, a maior área livre dessa nova porção da cidade foi adquirindo importância e assumindo a função de núcleo desse novo centro. Depois da construção do Viaduto do Chá e de várias intervenções da administração pública e da iniciativa privada, entre elas a reformulação de seus jardins e a construção, em 1892-94, da Escola Normal e seu Jardim da Infância, a praça tornou-se um dos espaços mais visitados da cidade. Nas décadas de 20 e 30, a região da praça abrigou algumas das mais concorridas salas de cinema, mantendo a sua vocação como espaço de lazer. Com as salas de projeção, vieram as confeitarias, floriculturas, cafés, charutarias, ateliês de moda, escritórios, enfim, todo um conjunto de atividades intensificadas nos anos 50. O Centro Novo tornou-se então um importante espaço cultural e intelectual da cidade (ALEIXO, 2005, p. 68-69).

Apesar de inseridas em um contexto similar de expansão urbana, as galerias de São Paulo se diferenciavam arquitetonicamente das passagens de Paris, e receberam destaque com a expansão econômica, mas também já eram parte da malha urbana com os mercados e as feiras mais populares. Com desfecho parecido, os arranha-céus e as galerias imprimiram na capital paulista uma nova vida em meio aos espaços públicos com destaque no bairro da República, em que todo o tipo de público passava, sendo a acessibilidade uma característica muito marcante das novas galerias. O arranha-céu, segundo Sabrina Fontenelle (2010), inserido neste contexto das galerias e da evolução no Centro Novo, diz mais sobre a característica de gabarito e as suas relações com a cidade visto que, a partir de 1940 os edifícios eram denominados desta forma. O grande prédio de escritórios apareceu nas nossas cidades como resultado das grandes transações, cuja tendência de se concentrar em pequenas áreas, produziu a super-valorização dos terrenos. Tornou-se assim interessante aumentar o espaço alugável no sentido vertical. A grande loja de departamentos, agora familiar em quase toda parte, não existia há 80 anos atrás. Hoje, para a conveniência do comprador reúnem-se inúmeras lojas num mesmo edifício e sob a mesma orientação. O grande prédio de apartamentos também é de desenvolvimento recente. Com os métodos 65


modernos de construção, torna-se mais barato construir um único prédio para cinqüenta famílias do que cinqüenta casas isoladas. Assim, não só os aluguéis são mais baixos, mas também a manutenção da casa mais fácil e econômica. Eis aí três novos problemas para o arquiteto. Se ele os resolver de maneira efi ciente e deixar que a forma se desenvolva naturalmente através da função, seus edifícios não se assemelharão a arquitetura alguma do passado; suas formas serão novas, porque suas funções são novas. Portanto, a atual maneira de viver é a base da nova arquitetura.(PILOTIS, 2005 apud FERRONI, 2008, p. 75)

O aparecimento dos edifícios galeria comercial se deu por conta de uma demanda econômica e a satisfação da elite paulistana, além da inserção de atividades culturais no Centro Novo (figura 48).

Figura 48- Transformações urbanas baseadas no sucesso dos arranha-céus. Fonte: FONTENELE, 2010, p. 70

Entre as diversas transformações da cidade nos anos de 1930 e 1940, a arquitetura moderna paulistana surgiu, ao mesmo tempo que passou a se valorizar a profissão de arquiteto 66


junto com as influências internacionais. As faculdades de São Paulo em 1930, como o Mackenzie e a Escola Politécnica, formavam engenheiros-arquitetos nacionais famosos por suas intervenções na cidade, podendo citar: Vilanova Artigas; Ícaro de Castro Mello; Oswaldo Corrêa Gonçalves; Eduardo Kneese de Mello e Oswaldo Bratke. Além dos profissionais estrangeiros como Jacques Pilon e Franz Heep. Os projetos defendidos pela arquitetura modernista brasileira se apoiaram em obras públicas, e representaram uma inovação que desfrutou dos prestígios do Plano de Avenidas e da mudança de estilo de vida. O aparecimento de vida cultural na metrópole paulistana foi determinante para a construção destes edifícios modernos, e o Centro Novo se tornou um dos focos desse desenvolvimento. A concentração destes edifícios na região apontava para o grande ponto de encontro que se formou neste período - uma vez que um grande número de pessoas habitava, estudava, trabalhava e divertia-se entre os diversos edifícios da região. Nos pavimentos térreos de muitos destes edifícios modernos, novos espaços de encontro eram construídos. Cafés, livrarias, galerias de arte eram lugares de permanência aos transeuntes que cruzavam caminho pelas galerias cada vez mais comuns do Centro Novo. A região era palco de uma nova cultura urbana onde as mais diversas tradições de diversos grupos se misturavam, dando origem ao que poderia se chamar de ar cosmopolita (FONTENELE, 2010, p. 79).

Em transição para o subcapítulo seguinte, o Centro Novo se tornou um local atrativo para os empreendimentos imobiliários, vide o seu caráter dinâmico e inovador. Além disso, esta área da cidade recebia um grande fluxo e as atividades comerciais e culturais, como os cinemas, todas direcionadas para o local a partir do ano de 1950, simultaneamente ao grande índice de adensamento por conta do aproveitamento de lotes e a possibilidade dos arranha-céus. A cidade buscava cada vez mais se tornar moderna, e todos os fatores favoreciam esta transição, com conceitos como organização espacial, economia e diversidade de usos. Com destaque para os bares e restaurantes que se formavam em meio aos edifícios, e os cinemas como o famoso Cine Piratininga. A partir destes diversos fatores sociais e urbanos vistos até o momento, é possível constatar que a origem das galerias comerciais em São Paulo se alimentou da mesma fonte que as galerias europeias e americanas: vitalidade urbana. Claramente, a viabilização destes espaços dependem das interações humanas e da afetividade com a vida pública sob as galerias. A paisagem mudou, abandonando aos poucos os ambientes reservados e protegidos da aristocracia para ganhar as ruas. As formas de encontro também mudaram, houve a mescla de tipos humanos: estrangeiros, migrantes e paulistas e a busca por respostas aos anseios sociais oriundos da vida na metrópole e com elas a construção de novos espaços. A vida moderna impunha uma outra relação no campo dos negócios, comércio, trabalho, aprendizado, moradia e cultura (ALEIXO, 2009, p. 91).

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Pode-se dizer que qualquer espaço público necessita do fator humano, mas em suas relações com a economia e a vida financeira, as galerias comerciais apesar de majoritariamente inseridas pelo poder da elite, abrigam todo tipo de atividade. As galerias comerciais foram capazes de acomodar as novas necessidades culturais da população, através das quadras do Centro Novo, espaços de convivência e diversidade cultural se formaram, além da apropriação dos arranha-céus que foram destinados aos serviços terciários de escritórios e as residências. Seu caráter acessível e popular é uma de suas diversas contribuições para as atividades coletivas, e em especial, será estudado e se questionará baseado nos conceitos estudados previamente: por que algumas galerias comerciais do entorno da Praça da República são parte importante da relação entre edifício e espaço urbano em São Paulo no século XXI e outras não? O que as galerias comerciais do centro de São Paulo representam hoje, e qual a importância do pedestre na vitalidade destes espaços? Assim como feito por Johann Friedrich, é relevante a identificação do que corresponde a “galerias comerciais” no contexto do Centro Novo de São Paulo. A definição desta tipologia, recebe variações e Sabrina Fontenelle (2010), destaca que o aparecimento das galerias comerciais em São Paulo, toma rumos distintos do que já se viu na Europa: No caso de São Paulo, o que se entende por "galeria comercial” apresenta um desenho que se diferencia da proposta original europeia, em especial a francesa. Configuram-se como corredores de ligação entre ruas (na maioria das vezes, duas) com frentes de lojas voltadas para o seu interior. Estas galerias ligavam vias com um fluxo alto de passagens de pessoas. Não apresentavam iluminação zenital, nem se destacavam pelo corredor central com pé-direito duplo ou triplo, porque, em geral, localizavam-se no pavimento térreo de edifícios de vários andares (FONTENELE, 2010, p. 148).

A autora Joana Sarue Machado (2008) atribui uma coexistência das galerias de São Paulo com a necessidade de espaços privados e acessíveis que a cidade passava, com exemplo das lojas de departamento. É definido que a galeria comercial se forma com bases estrangeiras, e afirma-se que onde mais se localizam as galerias comerciais é no Centro Novo de São Paulo, devido a fatores da transformação urbana: Em São Paulo as galerias comerciais surgiram no século XX, tendo como base a ideia francesa e com a intenção de aumentar as áreas "rentáveis" dos edifícios. A grande maioria delas existe até hoje e está localizada no Centro Novo da cidade. Com seus usos destinados ao comércio e serviços, muitas delas acabaram por se especializar em algum tipo de produto. São utilizadas também como passagem para os pedestres que querem apenas cruzar as quadras através de seu interior (MACHADO, 2008, p. 2).

De acordo com Heliana Comin Vargas (2018), na obra intitulada Espaço Terciário: o lugar, a arquitetura e a imagem do comércio, o aparecimento das galerias comerciais foi

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resultado do estabelecimento de uma cultura urbana, e “tornaram-se símbolos da modernidade por abrigarem no mesmo espaço funções urbanas diversas e oferecerem um espaço privado com características de espaço público” (VARGAS, 2018, p. 221). Além destes fatores, a autora supramencionada faz uma distinção a partir das galerias vistas anteriormente em edifício-galeria, edifício comercial e passagem porém no contexto do trabalho, cada galeria tem suas especificidades mas todas adotam objetivo comercial, assim como o abordado nas passagens parisienses. Ou seja, o termo galeria comercial se refere às possibilidades, permitidas pelas transformações urbanas e pela modernidade, de se permear o centro, além de desfrutar das arquiteturas com continuidade e multifuncionalidade. Dessa forma, Heliana Comin Vargas (2018) distingue as galerias comerciais em tipos, sendo eles: Edifício conjunto, capaz de reunir múltiplas funções como comércio e escritórios;

Edifício galeria, com acesso a lojas e

possibilidade de passagem; Edifício comercial, com sua totalidade atendendo comércios e serviços e a Passagem, que configura um atalho por entre a quadra com a presença de lojas. Sabrina Fontenele (2010) destaca as implantações dos edifícios do Centro Novo, situadas em grandes quadras; e Nadia Cahen (2004) caracteriza a Avenida São Luís como um dos focos de uma junção perfeita entre intenções comerciais padronizadas no Centro Novo e a prosperidade arquitetônica. Estes estudos e a junção dos últimos capítulos com suas respectivas referências justificam a escolha da quadra e da Avenida São Luís, de acordo com os critérios de morfologia urbana, permeabilidade e arquitetura da pesquisa.

2.3 Galerias comerciais da Avenida São Luís Para que seja possível a compreensão da relevância da Avenida São Luís para as dinâmicas urbanas do Centro da metrópole, é necessário uma breve contextualização histórica, e neste subcapítulo serão apresentados argumentos para as escolhas do estudo de casos. Nos anos anteriores à construção dos edifícios marcantes da avenida, ela foi, anterior à 1900, um dos núcleos de atividade da elite paulistana, que iniciou um processo de loteamento dando origem aos palacetes que pertenciam à família Souza Queiróz de 1860 até 1930. Nomeada como Rua a partir de 1881 por conta de suas chácaras, a São Luís era um eixo de passagem do centro histórico e importante via entre cidades na grande São Paulo, também destinando no século XIV ao transporte do café.

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A partir de 1930 as chácaras dos Barões da família foram vendidas e divididas por seus herdeiros para atender a necessidade de maior aproveitamento dos terrenos dos palacetes, que tinham caráter muito disperso. E de forma cronológica, paralelamente à criação de novas ruas e avenidas no Plano Prestes Maia, a Avenida São Luís se formou, sendo que antes de 1930 ela possuía grandes lotes (figuras 49 e 50) no Centro Novo de São Paulo.

Figura 49- Centro Novo em 1930, Mapeamento 1930 - Sara Base: GEOSAMPA, Mapeamento 1930 - Sara Desenho: autora (2021)

Figura 50- Rua São Luiz, Mapeamento 1930 - Sara Base: GEOSAMPA, Mapeamento 1930 - Sara Desenho: autora (2021)

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Os grandes lotes pertenciam às famílias mais influentes da década de 1920, com atenção para a grande escala dos lotes que ainda continham os palacetes vindos do sucesso da economia cafeeira, e o caráter da Rua era muito disperso e heterogeneizado (figura 51).

Figura 51- Loteamentos da Avenida São Luís em 1930, pré Plano de Avenidas. Fonte: CAHEN, 2004, p. 72.

Este caráter residencial dos lotes da via se modificou conforme o interesse de aproveitamento do eixo e dos terrenos no Plano de Avenidas Prestes Maia já apresentado anteriormente. A Avenida ainda tinha nome de Rua São Luís e a suas transformações urbanas foram: Começadas as obras, a então Rua de São Luiz foi regularizada, nivelada e alargada, passando de 13 para 33 metros, prolongando-se da Avenida Ipiranga até a Rua da Consolação (1942). As árvores existentes foram preservadas apesar do alargamento: as localizadas do lado par (Biblioteca Mário de Andrade) passaram a ficar no canteiro central da avenida; as do outro lado (EdifÌcio Italia), foram mantidas na calçada (CAHEN, 2004, p. 82).

A verticalização da Rua São Luís foi um processo presente nas inovações de Prestes Maia, que acreditava na padronização de estética ao longo das vias, com as modificações de zoneamento, foco na descentralização do centro histórico e popularização do Centro Novo.

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E com a transferência parcial do perímetro de irradiação do Plano de Avenidas para a até então Rua São Luís foi determinante para a caracterização da via, que recebeu este foco por conta da construção dos edifícios Esther (1938, arquitetos Adhemar Marinho, Álvaro Vital Brazil) e a Biblioteca Mário de Andrade (1942, arquiteto Ramos de Azevedo) a partir do ano de 1930. Doravante aos projetos citados, é possível seguir em uma conceituação cronológica da Avenida São Luís, renomeada de acordo com as transformações do Plano de Avenidas. Primeiramente o edifício Itália inaugurado em 1965, projetado pelo arquiteto alemão Franz Heep, foi um dos marcos da arquitetura verticalizada da área de estudo, além de adotar relações comerciais diferentes das abordadas no trabalho, com seu terraço e restaurante como ponto da boemia da década de 1970. O edifício Itália é caracterizado por Denise Xavier (1999) como privilegiado na cidade, capaz de conter uma série de atividades. Sua galeria comercial, localizada no térreo possuia catorze lojas com anexo de sobrelojas, mas é possível apontar que sua importância como variável urbana para as galerias não se sobressaia comparado com sua inovação arquitetônica. Ou seja, aspectos construtivos, estruturais, estéticos e de escala são os destaques da arquitetura. E por conta disso o edifício não se encaixa na proposta de estudo das arquiteturas, apesar de adotar prestígio na história das galerias. O desenho da galeria,no entanto, à revelia do que sugere a perspectiva de apresentação do empreendimento, funciona muito menos pelo caráter atrativo da elegância do espaço interno ou das lojas - de número muito reduzido para justificar o passeio — e muito mais pela possibilidade de encurtamento de caminho, uma vez que desenha um corte transversal no terreno ligando a calçada da avenida Ipiranga com a calçada da então rua São Luiz (XAVIER, 1999, p. 82).

Mais a frente na Avenida, encontram-se os edifícios Conde Silvio Penteado (1951, Engenheiro Ricardo Capote Valente), Louvre (1942, João Artacho Jurado) e o Conjunto Zarvos e Embaixador (1959, Julio Neves), além do edifício Copan (1952, Oscar Niemeyer) e do edifício Galeria Metrópole (1956, Gian Carlo Gasperini e Salvador Candia). Entre os citados, todos em algum momento possuíam a atuação como galeria comercial e neste momento é importante relatar suas trajetórias enquanto espaços públicos comerciais da Avenida São Luís (figura 52).

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Figura 52- 1-Edifício Itália, 2- Edifício Conde Silvio Penteado, 3- Edifício Louvre, 4- Edifício Copan, 5- Edifício Conjunto Zarvos e Embaixador e 6- Edifício Galeria Metrópole Base: GEOSAMPA Desenho: autora (2021)

O edifício Conde Silvio Penteado, com projeto de 1950, é um dos destaques da avenida por se apresentar como um dos caminhos entre quadra, se conectando com o Copan e segundo as definições de Heliana Comin Vargas (2004) definido como uma passagem que segue como percurso com focos comerciais de um ou dois lados. Com autoria do engenheiro Ricardo Capote Valente o edifício possui pavimentos residenciais em sua extensão e no térreo apresenta quatro lojas, com duas viradas para a avenida e duas para a parte interna da galeria. A junção dos caminhos com o Copan caracterizam a permeabilidade da quadra e refletem a relação arquitetura e cidade presente no Centro Novo e na intenção dos ideais do modernismo na época (figura 53).

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Figura 53- Edifício Conde Silvio Penteado e uma de suas passagens CUNHA JR, 2018, n. p.

Ao final do lado da quadra em questão, se encontra o Conjunto Zarvos e Embaixador projetado pelo arquiteto Arquiteto Júlio Neves em 1958 que se encaixa no subcapítulo devido novamente ao seu caráter de permeabilidade. Conectando a Avenida Consolação e a Avenida São Luís por dois níveis, o projeto possui pavimentos superiores com residências e antigamente acomodou o restaurante Paddock que oferecia música ao vivo com “seus salões amplos voltados para a avenida São Luís [...]” e um dos “endereços elegantes que sobrou no centro” (MELO, 2001, n. p.).Estes dois exemplos na Avenida São Luís, possuem pouca documentação e por conta disso não foram selecionados para o estudo de caso, além de suas galerias atualmente se encontrarem em situação instável com as lojas fechadas e sem atividade cultural considerável. O restaurante Paddock não persiste no percurso das galerias, e o edifício Conde Silvio Penteado está com a atividade comercial paralisada e acesso restrito. Ao se adentrar no percurso, estes edifícios formalizam uma falta de incentivo e recursos a favor da atividade comercial nas galerias, fato que será estudado mais a frente no estudo de casos. E por conta da ausência de material e afastamento da dinâmica urbana de forma dramática, os edifícios presentes na escolha dos estudos de caso são o Louvre, a Galeria Metrópole e o Copan. Explicando melhor, por pertencerem a arquitetos presentes arduamente na construção das volumetrias do século, os três edifícios do estudo de casos são mais 74


favoráveis a estudo por possuírem mais documentação e quantidade de lojas o que direciona melhor as análises conclusivas do trabalho.

3. Cidade dos pedestres Neste capítulo, propõe-se o estudo de como ocorre a apropriação dos espaços das galerias pelo pedestre, da concepção do projeto até sua atuação na dinâmica urbana da Avenida São Luís, Centro Novo de São Paulo. A explicação prática para a intitulação do capítulo é pautada nos estudos entre cidade e pedestre, baseado nos conceitos já vistos ao longo do trabalho. E o que seria da cidade, ou melhor, o que seria das galerias sem pelo menos a intenção de pertencimento do pedestre, neste momento, todo o estudo já feito acerca da formação tanto da tipologia, quanto dos entornos dos edifícios em questão são utilizados em larga escala. Cynthia Aleixo (2005) sinaliza que, em meio uma pesquisa solícita, infelizmente não há espaço para uma interpretação mais ampla das Galerias Comerciais no perímetro estudado, ou seja, não haverá a possibilidade de estudar todas as galerias comerciais do Centro Novo. E no presente capítulo é necessária a mesma observação. Visto que a escolha dos estudo de casos busca materializar a análise do comportamento social, econômico e arquitetônico dos projetos de galerias comerciais, baseadas na Avenida São Luís e seu entorno, e para isto serão selecionados três projetos. O estudo de casos tem como objetivo a leitura de forma mais reflexiva, da situação das galerias hoje, e como suas circunstâncias provocam a sensação de saudade do que não foi vivido, ou seja, o grande auge das galerias comerciais não é mais palpável. E dessa forma é possível questionar como a apropriação das galerias comerciais pelo pedestre, é algo que hoje em dia não acontece da mesma forma que na década de 1970, principalmente nos edifícios em questão. A partir do estudo da formação das galerias do Centro de São Paulo e da Avenida São Luís, foram escolhidos casos baseados no critério da problemática da monografia. Relacionando as motivações acerca da inserção das galerias, este capítulo representa o destaque às atividades comerciais no Centro Novo, e sua importância para o desenvolvimento das atividades urbanas em sociedade. Nadia Somekh conclui em sua obra A cidade vertical e o urbanismo modernizador que “o espaço é uma totalidade cuja a essência é social [...] a economia está no espaço como o espaço está na economia” (SOMEKH, 1997, p. 157).

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Fatores que no processo de escolha das galerias dos projetos Edifício Galeria Metrópole; Edifício Copan e Edifício Louvre foram levados em consideração além da maneira que sua arquitetura atuava entre quadras no Movimento Moderno na arquitetura paulistana e sua condição nos dias de hoje. Uma das justificativas para a escolha dos estudos de caso é o fato de que a Avenida São Luís, a partir do projeto do Copan em 1952, recebeu os outros edifícios em que o pioneirismo do projeto do arquiteto carioca Oscar Niemeyer, foi determinante, assim como o Plano de Avenidas, para a caracterização da avenida como parte do milagre arquitetônico paulistano. O desenho da galeria,no entanto, à revelia do que sugere a perspectiva de apresentação do empreendimento, funciona muito menos pelo caráter atrativo da elegância do espaço interno ou das lojas - de número muito reduzido para justificar o passeio — e muito mais pela possibilidade de encurtamento de caminho, uma vez que desenha um corte transversal no terreno ligando a calçada da avenida Ipiranga com a calçada da então rua São Luiz (XAVIER, 1999, p. 82).

Os edifícios Copan e Louvre se encontram em uma das quadras com mais presença de galerias comerciais no Centro Novo, e são conjuntamente com o edifício Galeria Metrópole, os projetos com mais registros para que ocorram os estudos de caso. Estes três projetos, apresentam uma forte relação com o pedestre, e passeios que embora diferentes, são uma das marcas do progresso do urbanismo e dinâmica urbana inserida nos edifícios da década de 1950. O Copan pela passagem do Edifício Conde Silvio Penteado marca uma quadra, "abrindo um espaço contínuo entre a rua e a galeria, entre o público e o privado ”(LORES, 2018, p. 91). E o Louvre em sua concepção buscou criar uma passagem agradável e útil paralela a Avenida São Luís bem como logo a frente junto com a Praça Dom José Gaspar, articulada com seu entorno por diversas formas, a Galeria Metrópole representa a galeria pertencente ao pedestre. Outra justificativa perante a escolha dos três casos é sua proximidade cronológica, o que consequentemente os torna resultado das ansiedades do Plano de Avenidas (1930), e da transformação da via. Os projetos possuem material suficiente para a análise da relação entre o pedestre e a galeria, sem excluir o fato de que são edifícios com programa diversificado e dotados de grande popularidade na época em que foram construídos e ainda nos dias de hoje. Outro fator presente no estudo destes projetos é sua trajetória construtiva, que ora turbulentas, definem o produto final e o resultado dos volumes inseridos na cidade. Como base da arquitetura e urbanismo serão examinados os percursos construtivos; as propagandas acima

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do empreendimento; os arquitetos; a influência arquitetônica; os desenhos; os moradores e os frequentadores. As perguntas a serem respondidas levando em consideração as bases da arquitetura e urbanismo paulistano estudadas até o momento são: por que estas galerias comerciais são parte importante da relação entre edifício e espaço urbano em São Paulo no século XXI? Quais os principais motivos de seu desuso no Centro de São Paulo e na dinâmica da cidade como um todo? 3.1 Edifício Copan Com projeto iniciado em 1951 pelo arquiteto Oscar Niemeyer, o Copan, fez parte da nova proposta de verticalização do entorno da Praça da República e expressava as ansiedades do modernismo e das novas referências arquitetônicas com o prestígio de um arquiteto em alta (figura 54).

Figura 54- Edifício Copan, localizado na Avenida Ipiranga, n.º 200 - República - São Paulo. Fonte: OUKAWA, 2020, n. p.

Além disso, ocorreu na época uma intensa campanha publicitária para o edifício de uso misto que comportava seiscentos apartamentos, galeria comercial ao longo de seu comprimento curvilíneo e representava a Companhia Panamericana de Hotéis e Turismo. A Companhia Pan-Américana Hotéis e Turismo foi criada pelo Banco Nacional Imobilário (BNI) para administrar o *maciço COPAN”. Como já foi citado anteriormente, havia o interesse de buscar investimentos para o aquecido mercado imobiliário paulistano da década de 50 . O estudo feito pelos arquitetos americanos Holabird, Root & Burgee (L'architecture d'aujourd'hui, 1952, p. 41), foi elaborado em associação com o arquiteto brasileiro Henrique Mindlin. Em 1952 vendo que o aguardado capital dos 77


EUA abandonou o estudo dos arquitetos americanos e chamou Oscar Niemeyer para desenvolver o projeto, que havia montado filial de seu escritório na capital paulistana, sob a coordenação do arquiteto Carlos Alberto Cerqueira Lemos (GALVÃO, 2007, p. 21).

Esta mudança de responsáveis deu origem ao marcante perfil do Copan, que Oscar Niemeyer modificou os volumes ortogonais propostos pelos americanos e segundo Carlos Alberto Cerqueira Lemos, entrevistado por Raul Juste Lores, “Só sei que ninguém gostou muito do projeto dos americanos, que seria caríssimo e era feio” (LORES, 2018, p. 79). O edifício foi um dos resultados dos anseios presentes na implementação do Plano de Avenidas, com sua implantação em maior escala, e seu destaque arquitetônico relacionado a localização e o prestígio do arquiteto responsável. Com presença também nos ideais modernistas do urbanismo já citados anteriormente, o projeto era inserido como importante empreendimento na Companhia Nacional de Investimentos. A maratona para construção de edifícios de hotéis páreos aos franceses, e capazes de comportar o evento de IV Centenário começou em 1950, ano de início das concepções acerca do projeto. Por isso o nome de "Maciço Turístico”, além de sua parte residencial que auxiliaria como provedora dos investimentos na hotelaria (figura 55).

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Figura 55- Edifício Copan anunciado em 1952 como parte do "Maciço Turístico”. CUNHA JR, 2018, n. p.

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Cynthia Aleixo (2004) apresenta o fato de que feito nas comemorações do IV Centenário da cidade de São Paulo, o Copan recebeu um destaque publicitário que apontava suas capacidades de receber a enxurrada de novas populações, e consequentemente o grande fluxo no recém repaginado Centro Novo. Sua realização passou por diversos processos turbulentos, a começar pela troca dos primeiros arquitetos americanos Burgee, Holabird e Root que desejavam associar a expansão imobiliária aos Estados Unidos em 1950, houve também após a domínio de Oscar Niemeyer a exclusão de um edifício de hotéis do programa, local onde hoje funciona o banco Bradesco, e a mudança de responsável de Niemeyer para Carlos Alberto Cerqueira Lemos. Além destes fatores, o Copan foi símbolo de diversas manifestações da cidade nos anos de 1950 sendo um “exemplo nacional mais autêntico dos princÌpios corbusianos que definiram a arquitetura autônoma das unidades de habitação” (CAHEN, 2004, p. 50) e fazendo parte do evento de IV Centenário da Cidade de São Paulo. Com 116.000 m² de área construída no total, o edifício Copan tem 1.160 apartamentos distribuídos em 6 blocos. Na divisão destes blocos de A a F do Copan, ocorreu a variação de metros quadrados dos apartamentos que no Bloco A possuem 90 m², no B 32 m², e nos C, D, E e F apartamentos com mais de 100 m² (figura 56).

Figura 56- Planta do Copan, com os apartamentos tipo e as entradas de blocos mostrando as metragens diferentes. Fonte: GALVÃO, 2005, p. 23

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O processo do arquiteto Oscar Niemeyer caminhava paralelamente ao sucesso da Avenida e a construção de edifícios atrativos no Centro Novo. Relacionado às diversas possibilidades de metragem, Niemeyer acreditava na possibilidade de integração de diversas classes sociais em um mesmo edifício, e que com esta variação de escala os empreendimentos poderiam atender a população como um todo. A proposta do Copan também foi consequente aos estudos modernistas de Le Corbusier e a Unité d'Habitation que realocou a população francesa após períodos conturbados e buscava uma autonomia com um cenário que atenda as necessidades de todos, com comércios nos pavimentos mais altos e metragens diferentes (figura 57).

Figura 57- Finalizado no ano de 1952, a Unité d’ Habitation de Le Corbusier é referência para projetos de vida comunitária e complexos residenciais autossuficientes. Fonte: KROLL, 2016, n. p.

Diferente da Unidade de Habitação de Marselha, o Copan propôs uma forte conexão com seu exterior, com as lojas no térreo que abertas à rua podem ser frequentadas por todos que passavam e passam pelo Centro. O que esperar, em termos de coesão social, de cidades que condenam seus professores, enfermeiros, policiais e bombeiros a gastar duas horas diárias no caminho para casa para o trabalho, e mais duas na direção oposta? Esse experimento de alta densidade com viabilidade financeira poderia ter respondido a esse desafio presente nas maiores metrópoles do mundo até hoje.(LORES, 2018, p. 80-81)

Muitas vezes o Copan é descrito como uma “cidade”, visto que comportando mais de cinco mil pessoas, sua extensão representa uma potencialidade e como Sabrina Fontenele (2010) expõe como que esta força do edifício como os diversos acessos a ele foram

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importantes para o funcionamento da galeria comercial por moradores e frequentadores do edifício e suas dependências. A galeria com suas 72 lojas ocupa o térreo do edifício, e foram utilizadas a partir dos anos 1970 com um baixo orçamento apresentando mercearias e comércios pequenos. O cinema funcionou somente até a década de 1980, cedendo em 1993 para o funcionamento do grupo religioso. A ausência do edifício de hotéis, proposto no estágio inicial do projeto, foi fundamental para o destaque momentâneo das galerias comerciais do térreo. A galeria, segundo Walter Jose Ferreira Galvão (2007), possui na totalidade do terreno 6.006,35 m² e apesar da baixa diferença de níveis entre ruas às galerias seguem por percurso sinuoso com alguns escalonamentos em frente às lojas. A partir do levantamento feito pelo autor supramencionado no ano de 2007 (figura 58) é possível constatar que comparado com a situação atual, as galerias apresentaram um avanço, a partir das novas lojas em funcionamento e locais de café.

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Figura 58- Levantamento dos espaços comerciais no Copan, pesquisa realizada em 07/03/2005 Fonte: GALVÃO, 2005, p. 27

Os acessos de pedestres pelo térreo são feitos relacionando os blocos, de acordo com a recepção dos apartamentos. Na visita in loco realizada para este trabalho, foi possível observar que a galeria do edifício possui restaurantes, cerca de três cafeterias, lojas de roupas e boutiques, além dos espaços religiosos e dos bares tradicionais. Obviamente a análise atual da galeria comercial do projeto deve ser fundamentada no processo da pandemia e suas consequências perante as relações entre edifício, cidade e pedestre. A partir de uma visita ao local de estudo, algumas enfermidades foram observadas a começar pela baixa circulação e interesse dos que passam pelas lojas internas da galeria, e um maior movimento nos espaços de bar e restaurante. De forma geral há um aproveitamento virtuoso dos espaços do térreo, mas em um domingo de sol no centro, os pedestres são atraídos pelas sessões alimentícias, ou seja, os bares e restaurantes são o principal foco de quem frequenta este espaço neste dia específico. Segundo levantamento feito por Oukawa (2010), o movimento noturno nos dias de fim de semana é devido aos bares e restaurantes do edifício e seus arredores, o fato dos escritórios e estabelecimentos estarem fechados aos sábados e domingos também influencia na queda de movimento no local. Diferentemente de segunda a sexta-feira em que o funcionamento dos

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escritórios no entorno do Copan é normalizado, e por conta disso há um movimento maior aos dias de semana, além de um público diferenciado. Os estabelecimentos Varanda, Bar Dona Onça, Livraria Megafauna, a padaria Santa Ifigênia, Eco Mercato, Café Pivô e Casa do Cafeteiro atualmente são os focos de movimento na galeria do Copan. Porém, a reportagem feita em 2020 pelo site de notícias UOL, intitulada Edifício Copan perdeu 20% dos moradores durante a pandemia, relata uma queda brusca de movimentação: Das 72 lojas da galeria comercial do Copan, apenas 12 estão funcionando. Com escritórios do edifício e da região central em esquema de home office e a visita ao terraço do prédio interrompida por tempo indeterminado, o movimento despencou de 22 mil pessoas para menos de 2 mil por dia no edifício.

Figura 59- Fotografia de uma das entradas do Copan no dia de domingo mostrando o Bar dona Onça ao fundo. Fonte: Foto da autora, 2021.

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Figura 60- Fotografia de um dos caminhos de pedestres por entre as lojas, que em um domingo se encontravam em sua maioria fechadas. Fonte: Foto da autora, 2021.

Figura 61- Fotografia da galeria, em que somente aos fundos a cafeteria está aberta. Fonte: Foto da autora, 2021.

Segundo Xavier (2007), as curvas do Copan, são resultado de uma concepção moderna do arquiteto, mas em relação às galerias, a utilização da curva proporciona um recálculo das travessias. Explicando melhor, as galerias do Copan são mais compatíveis com o andar orgânico do pedestre, que desacelerado, faz uma conexão entre as categorias privadas e públicas do projeto.

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A proximidade dos acessos com a rua e dos saguões com as lojas, fazem este percurso imperceptível e a diversidade de programas é um dos privilégios de se morar ou frequentar o edifício. Em sua proposta inicial o Copan, apresentava uma diversidade ainda maior de programas, com hotelaria no edifício em frente, teatros e cinema em suas galerias e ao longo do desenvolvimento do projeto a ligação do edifício com a cidade foi reforçada com seus entornos, como o edificio Conde Silvio Penteado que interliga as galerias comerciais com a Avenida São Luís, um dos instrumentos de estudo. O Copan também dispõe de um espaço de galeria de arte, que aos moldes do que acontece no Centro de São Paulo, é inserida de forma benéfica já que o perfil dos frequentadores do edifício e seus entornos, hoje, se encaixa na procura por arte contemporânea e exposições. A moradora Fernanda Prada, em reportagem retirada do site da imobiliária Refúgios Urbanos em 2019, descreve que a partir da pergunta mais frequente como é morar no Copan - que: Bem, como são muitas pessoas, imagino que cada uma tenha sua percepção do que significa morar por aqui. Para mim, significa estar conectada com tudo que necessito hoje: transporte e mobilidade, serviços e gente, muita gente. Gosto da praticidade de morar no centro da cidade e ter um pouco de tudo à disposição sem necessidade de grandes deslocamentos, de ter aquela lojinha de “tranqueiras” por perto, o barzinho, teatros, oficinas de teatro, biblioteca e um monte de cafeterias charmosas. Estação de metrô pertinho, o Minhocão para uma caminhada! Gosto muito da diversidade e de partilhar espaço com pessoas diferentes e me misturar[…](PRADA, 2019, n. p.).

Com o mesmo contexto, Fernanda Prada respondeu questionário rápido feito pela autora, e em depoimento expôs algumas das respostas com intenção de privilegiar o trabalho, iniciando pela pergunta: Houve algum motivo especial na escolha do Copan como local de moradia? Meus motivos especiais para escolha do Copan como moradia são variados, como a diversidade, integração com a região central, opções culturais no entorno para citar como exemplo. Dentre tantos motivos, um dos principais é a galeria no térreo do edifício com uma grande oferta de serviços.3

Continuando a entrevista, a questão de apropriação do pedestre da galeria foi explorada, questionando a Fernanda o que a atividade comercial na galeria representa hoje para quem a frequenta, e no caso a entrevistada reside e atua como corretora no edifício Copan.

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Depoimento cedido em 30/11/2021 por Fernanda Prada, corretora associada da imobiliária Refúgios Urbanos. 86


Para mim a galeria comercial do edifício representa: - Integração entre moradores e visitantes com uma ótima gastronomia, vida noturna e boas lojas. - Opções de serviços diversos para quem mora ou se hospeda no edifício sem precisar nem ao menos sair dele, o que representa muita facilidade.

Hoje a galeria conta com lojas diversas: cafeterias, padarias, restaurantes, floricultura, lavanderias, academias, livrarias, galeria de arte, entre outros. E relacionado com a questão dos fluxos, houve também a pergunta feita à corretora, sobre como hoje como moradora e ativa, observa o movimento nos dias de semana e nos fins de semana e feriados, a fim de estipular os fluxos e a procura destas galerias pelo pedestre em momentos do dia e da semana. O movimento é bastante intenso todos os dias, inclusive finais de semana e feriados. Durante a semana são serviços como academia, salão de cabeleireiro, petshop, lojinhas de roupas e cafeterias que mais movimentam o espaço. Aos finais de semana e feriados vemos um movimento intenso nos restaurantes como Bar e Restaurante da Dona Onça e Cuia bem como na Livraria Mega Fauna, na galeria Pivô e na padaria Santa Efigênia.

Em relação ao Copan, foram feitas duas perguntas contemplativas, para finalizar o subcapítulo com as principais percepções de quem frequenta as galerias diariamente. Ao longo deste trabalho, o termo memória afetiva será repetido e para que seja possível prosseguir com os depoimentos, deve-se esclarecer o que de fato se procura na realização desta pergunta. A pergunta seria: se de fato as edificações e seu entorno estão inseridas em alguma memória afetiva, portanto, segundo Sylvia Cavalcante e Gleice Elali (2018) somente conhecendo as relações entre espaço e sociedade, os sentidos acerca das existências pessoais e coletivas a realização de uma leitura e conclusão sobre as deficiências e qualidades dos ambientes é mais assertiva, compreendendo a “natureza do uso social”(CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 314). Logo, foi perguntado: as edificações e seu entorno estão inseridas em alguma memória afetiva? A região central de São Paulo e sua edificação sempre esteve presente no meu imaginário e sonhava em um dia poder morar e viver por aqui. Meu contato com o edifício Copan começou em 2010 quando me mudei para São Paulo e comecei a frequentar o centro da cidade com bastante intensidade, até que em 2011 aluguei meu primeiro apê por aqui para ficar alguns dias da semana. A partir deste convívio foi inevitável para mim não escolher o edifício como moradia quando em 2017 estava em busca de um novo lar em Sampa.

Complementando o caráter mais pessoal entre edifício e indivíduo, principalmente para uma assídua exploradora e moradora do Centro, a pergunta feita para Fernanda, que basicamente permeia o trabalho foi: para você, qual a importância das galerias comerciais para a cidade?

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Para mim são fundamentais as galerias comerciais, principalmente as inseridas em edifícios residenciais, proporcionando uso e ocupação dos espaços por diferentes pessoas, moradores, trabalhadores do edifício e passantes. O resgate deste tipo de edificação, com uso misto e fachadas ativas que o novo plano diretor implantado oferece, proporcionam que a cidade seja mais democrática e solidária, devido a sua ocupação por mais pessoas. A galeria do Copan oferece a possibilidade das pessoas ocuparem seu espaço e se tornarem parte deste edifício mundialmente conhecido, não apenas quem mora ou trabalha no edifício, mas também a quem passa por aqui, pois é aberta a público e se integra com as ruas onde está inserida (Rua Araujo, Avenida Ipiranga e Rua José Paulo Mantovan Freire).

A principal intenção destes depoimentos, foi de fato documentar outras perspectivas e constatar a importância destes espaços para o pedestre e vice-versa. A possibilidade de realizar estes diálogos faz parte da constatação do caráter afetivo e social que a arquitetura pode, e deve trazer a quem a frequenta. Muitas vezes a questão da conexão entre espaço e pedestre é despercebida, e por conta disso o trabalho busca abordar a arquitetura em busca de significado e percepção. Estas perguntas serão feitas novamente ao longo do trabalho, o que abre a oportunidade de observar cada particularidade dos projetos e de suas relações com o pedestre fundamentando as conclusões deste estudo. 3.2 Edifício Louvre O edifício localizado na Av. São Luís, no bairro da República, pertence à carreira profissional de João Artacho Jurado (1907-1983) e foi incorporado entre 1952 e 1967 pela construtora denominada Monções Construtora e Imobiliária S.A. Para atender o projeto de alargamento da rua São Luís, de 1942, elaborado na primeira gestão de Francisco Prestes Maia, que visava a melhoria da circulação de veículos no Centro, a chácara do senador Sousa Queirós foi loteada, formando-se então grandes terrenos .(FRANCO, 2008, p. 251).

Artacho Jurado atuou, em um primeiro momento, como letrista e era impedido de assinar seus projetos por não possuir diploma efetivo de graduação em Arquitetura e Urbanismo, e por conta disso, diversos engenheiros na época eram responsáveis pelas obras no papel. Devido a diversos conflitos por conta de sua situação profissional e de seus desenhos para os edifícios, Artacho Jurado sofreu repressão dos arquitetos atuantes a partir do ano de 1950, e isto lhe rendeu certa popularidade naquela época. A escolha das cores utilizadas por Jurado acumulou diversas críticas, como a do arquiteto Eduardo Corona que, em 1958, dizia que seus edifícios careciam de brasilidade (FRANCO, 2008). Em comparação com os projetos do Copan e Galeria Metrópole, o Louvre possui características diferentes das apresentadas pelo Movimento Moderno:

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Muito longe de considerar que o“ornamento é crime”, A. Jurado partia nos seus projetos para um uso exaustivo de materiais diversos de acabamento, assim como para a utilização de técnicas construtivas inteiramente arcaicas para atender a pretendida inovação formal. A insistência em não reconhecer a obra da Monções, e conseqüentemente de A. Jurado, rivaliza com a atual iniciativa de erguê-lo à posição de antimodernista e, de certa forma, de lhe oferecer o posto de precursor do pós-modernismo paulistano, ao longo de suas manifestações na década de 50.(MAYER, 1991, p. 40 apud FRANCO, 2008, p. 251).

Figuras 62 e 63- Fotografia da fachada cor de rosa e azul do edifício Louvre, Avenida São Luís.. Fonte: Foto da autora, 2021.

Atendendo novamente a prosperidade instalada na Avenida São Luís e nos anseios do mercado pós Plano de Avenidas, em 1960 ficou pronto o conjunto Louvre e Pedro Américo. Sua proposta de comunicação com a cidade foi determinante para as outras características do projeto, neste caso seu playground e piscina que neste edifício se localizavam na cobertura. A galeria de lojas comerciais no térreo e na sobreloja, que tem área para restaurante no mezanino, está atendida por escada rolante, “para melhorar o desempenho comercial, que, como se sabe, é altamente prejudicado por mudanças de nível de piso não estritamente obrigatórias para os usuários. A circulação é atendida, finalmente, por dezoito elevadores, que servem os apartamentos e parte da sobreloja. Novamente Artacho está preocupado com a cidade, na qual o espaço público e o privado retomam o diálogo no térreo (FRANCO, 2008, p. 256).

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Segundo Franco (2008) o edifício foi o maior projeto em escala do arquiteto Artacho Jurado e sua última obra, vindo também de uma jornada de descoberta dos condomínios e das áreas comuns dos edifícios pelo arquiteto. Assim como o Copan, a campanha publicitária sobre o empreendimento foi intensa e posterior a seu lançamento, em 1954, ele era foco de residências e locação reconhecido por conta de sua posição em uma das Avenidas mais verticalizadas da época, envoltos por desenvolvimento (figuras 64 e 65).

Figura 64- Anúncios da construtora Monções para promover o empreendimento desenhado por Jurado, publicado na Folha da Manhã em 25 de maio de 1952. Fonte: GIUFRIDA; VARRICHIO, 2021, n. p.

Figura 64- Folheto de cadernos da administração do edifício, “Desfrute dos jardins da Biblioteca” Fonte: GIUFRIDA; VARRICHIO, 2021, n. p.

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O edifício em questão possui dois edifícios de apartamentos: uma com uma das fachadas para a Avenida São Luís, chamada de Louvre, e outra torre, nos fundos do lote, denominada Pedro Américo, os dois edifícios estão ligados no pavimento térreo de galerias comerciais e na cobertura. As áreas comuns dos dois edifícios possuem 53.000 m2 no total, 374 apartamentos e 45 lojas e sobrelojas, com 23 pavimentos de unidades residenciais (figuras 66 e 67).

Figura 66- Planta do pavimento tipo do Condomínio Louvre – 21° ao 24° pavimento. Fonte: GALVÃO; ORNESTEIN, 2009, p. 181

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Figura 67- Imagem de drone, mostrando os dois edifícios que formam o condomínio. Fonte: NIZ, 2018, n. p.

As galerias com pé direito duplo, as varandas da fachada do edifício delineiam sua presença na Avenida, além de desfrutar da vista e proximidade da praça Dom José Gaspar e a Biblioteca Municipal Mário de Andrade. As cores pertencem a intenção de Artacho Jurado de expressar euforia e foi descrito por Rodrigo Brotero Lefèvre e citado por Ruy Eduardo Debs Franco (2008) como marcante na paisagem e único no seu gênero. Apesar de não apresentar planta livre, ou entradas por diversas extremidades, o térreo com as duas plantas de lojas oferece uma permeabilidade. As galerias do Louvre não atravessam a quadra como as do Copan, mas a importância da modificação da utilização de áreas públicas do edifício são relevantes neste caso, além das sobrelojas. A presença de lojas em dois pavimentos proporciona o uso das escadas rolantes ao centro, e na galeria, mais uma vez o caminho do pedestre é desenhado por quatro entradas na Avenida São Luís. Na planta da sobreloja (figura 68) é possível observar os halls dos elevadores, e as áreas de apoio aos frequentadores e proprietários de lojas, os pilares também atuam como direcionadores às vitrines e entradas dos estabelecimentos comerciais e a galeria comercial toma forma utilizando o espaço público abaixo de um edifício marcante da silhueta da Avenida. No edifício Louvre desde o 3° piso já existem apartamentos. No total são 164 apartamentos de 1, 2 e 3 dormitórios. O edifício Pedro Américo, por sua vez, tem apartamentos a partir do Figura 02 – Condomínio Louvre. Anais do 92


Simpósio Brasileiro de Qualidade do Projeto no Ambiente Construído IX Workshop Brasileiro de Gestão do Processo de Projeto na Construção de Edifícios | 18 a 20 de Novembro de 2009 | São Carlos, SP | PPG-AU EESC USP | 181 6° andar, já que do 3° ao 5° andar existem vagas para automóveis. Aqui existem 158 apartamentos de 1 e 2 dormitórios. No total o conjunto tem 322 apartamentos. Na cobertura (25° andar) existe área de lazer com piscina, playground e área livre utilizada para a prática de ginástica (GALVÃO; ORNESTEIN, 2009, p. 180-181).

Figura 68- Planta do mezanino no catálogo de venda de lojas no edifício Louvre. Fonte: GIUFRIDA; VARRICHIO, 2021, n. p.

Neste momento já é possível refletir como a proposta de atividade comercial abaixo de um edifício residencial influencia o pedestre, tornando a galeria comercial seu lugar. Servindo para os moradores como fator de segurança, apoio, desfrute e oportunidade; para os que simplesmente percorrem a Avenida como uma possibilidade de fachada ativa e conhecimento da arquitetura por justamente sua função comercial. O edifício Louvre possui nos dias atuais em suas galerias diversos tipos de serviços, entre eles: escritório de advocacia; galeria de arte; estúdio de pilates; ateliê de costura; gráfica; tabelião; agência de viagens; laboratório de exames; banco; entre outros. No presente momento, a galeria não abre aos domingos, o que é explicado por dispor de mais serviços 93


específicos, o que em oposição não acontece com as galerias do Copan, que seguem sendo abertas por conta de seus bares e restaurantes. Em suma, a questão de possuir estes estabelecimentos, a galeria do edifício Louvre é a mais prejudicada e algumas entrevistas a seguir auxiliam na análise. Ao visitar o entorno do edifício em um domingo (figura 67), se observou que o acesso às lojas não é disponibilizado, e sua conexão com a Avenida é mínima. A partir de entrevista realizada com a responsável pelo Ateliê de costura Estilo Atelier de Costura, Valéria Almeida relata que um dos motivos pelo qual a galeria não funciona em dia de domingo é a presença de serviços como o Banco que não funcionam fora da semana, e que de certa forma isso não prejudica os lojistas por conta do movimento de segunda a sexta, e a divulgação pela internet.

Figura 69- Fotografia mostrando a galeria fechada para acesso livre aos domingos.. Fonte: Foto da autora, 2021.

Houve também a possibilidade de um levantamento da questão de fluxos, ocorrendo segundo o corretor da imobiliária Imóveis Vintage o entrevistado Marcos Sena informa que o uso de transporte público é pelo metrô linha amarela, e a Consolação corredor de ônibus.

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Colocando que a Avenida é muito segura, Sena informa que a Praça Dom José Gaspar tem uma vida noturna até às 22 horas, com bares e restaurantes próximos. A partir de entrevista com um dos editores da Refúgios Urbanos4, o profissional Octavio Pontedura, sócio e proprietário da imobiliária, respondeu algumas perguntas relacionadas ao Louvre. Iniciando com a pergunta - Há algum motivo especial da escolha do edifício Louvre?Octavio Pontedura responde: Após trabalhar há algum tempo com imóveis do Louvre, uma questão muito clara para mim é que na maioria dos casos ele passa a ser procurado por conta de sua beleza como Arquitetura.O tanto que o prédio marca a Avenida, com suas cores, a volumetria, ele causa um impacto. Curiosamente, boa parte das pessoas conhecem a história do edifício, sabem do Artacho e do prédio. Mas tem algumas pessoas que não sabem, mas mesmo assim são impactadas pela arquitetura, pelo que o prédio se destaca. Então esta questão do motivo está relacionada ao tanto que o edifício se diferencia do resto dos edifícios da própria avenida e exagerando, da arquitetura da cidade, seja conhecedor ou seja leigo5

Logo já é possível constatar que a escolha das pastilhas por Artacho Jurado, é um fator importante de interesse do pedestre. Dando seguimento a entrevista, a pergunta feita: o que a atividade comercial na galeria do Louvre representa hoje para quem a frequenta? é respondida por Octavio da seguinte forma: Aqui faço uma ressalva: minha percepção com relação a galeria do Louvre é que ela é subutilizada, com muitos locais vazios, acredito que ainda há um potencial, e muita coisa a ser explorada. Ela é gigante e não tem um uso tão amplo quanto poderia, o que se tem é a mistura de vários tipos de serviço e conveniências, que para o morador pode ser útil. Observa-se que quando ela está aberta há um movimento de pessoas que não são moradores, com uma circulação muito diversa de pedestres. E no fim das contas a galeria cumpre sua função urbana, e ela representa pra mim está conveniência, com um caminhar bacana. As galerias representam um “descobrir” com as estéticas da escada fixa e das varandas, quem for desavisado no cartório é motivado por um ímpeto, a galeria do Louvre possui esta capacidade de instigar.

Para que haja a continuação da observação de fluxos na galeria, e balanço de utilização dos pedestres fez-se a pergunta: Como hoje você observa o movimento nos dias de semana? e nos fins de semana e feriados? A galeria funciona durante a semana em horário comercial, e aos finais de semana com bastante restrição. As grades ficam fechadas, deixando o acesso limitado. Logo, ao longo da semana é garantida esta conversa com a calçada sem nenhuma barreira. É curioso pois estes lugares onde existem 4

Depoimento cedido no dia 29/11/2021, por Octavio Pontedura, corretor responsável pela venda de apartamentos do edifício Louvre. 5

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estas passagens sutis entre o “fora” e o “dentro” as pessoas respeitam, entrando pelas laterais e pela guarita. Basicamente as relações de acesso às galerias mudam completamente nos dois períodos.

Com foco para a situação das lojas no edifício (figuras 70 e 71), como já dito, hoje em dia temos lojas diversas, mas com a perda de popularidade do edifício, a pergunta a seguir reforça: Foi percebida a mudança de lojas da galeria ao longo dos anos? Com certeza, um dos destaques foi por um tempo a presença na Avenida e na galeria de agências de turismo, casas de câmbio e joalherias. Mas hoje tem-se este movimento voltado para um público mais jovem, ligados à criatividade e descolados, vindo a galeria de artes, estúdio de pilates. Então hoje em dia acontece essa transformação para atender a outros públicos, mas ainda sim o morador do entorno.

Figura 70- Fotografia mostrando a um dos serviços do interior da galeria, e seu acesso à sobreloja. Fonte: ARDID, 2021, n. p.

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Figura 71- A nova galeria de arte, na sobreloja do Louvre Fonte: ARDID, 2021, n. p.

Outro componente da entrevista, foi a relação pessoal de Octavio Pontedura com o edifício Louvre, em que se questionou se a edificação está inserida em alguma memória afetiva, ou saudade, e como este vínculo é visto aos olhos do profissional: Absolutamente sim! Sou de Londrina, e chegando em São Paulo no ano de 1995, sempre fui um grande explorador da história e da arquitetura de todas as cidades onde morei, então chegando em São Paulo fiz a mesma coisa. E me lembro muito claramente de um dia estar na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, e me deparei com um livro do professor Lefévre, que conta a história da Avenida São Luís. A Avenida São Luís como um todo, e o Louvre em particular tem relevância na minha história, porque também fui impactado pela beleza do prédio, e pelo fato de ele ser totalmente distinto. O Louvre e a São Luís são o começo da minha exploração da arquitetura e da história da cidade, e ao trabalhar como corretor também tenho a oportunidade de adentrar e ver os detalhes da obra que vi no começo da trajetória como apaixonado pela história da cidade.

Por fim, uma pergunta de ordem mais reflexiva, mas que delineia as conclusões acerca da função e da importância destes espaços comerciais na cidade inseridos na galeria. Foi questionado ao entrevistado qual a importância das galerias comerciais para a cidade:

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A cidade para mim, precisa ser amigável, precisa ser acolhedora, principalmente em uma cidade tão grande como São Paulo. E a galeria comercial tem essa capacidade de permear o espaço público com o espaço privado de uma maneira muito fluida, sutil e agradável. Além de oferecer serviços e conveniências no “pé” da casa das pessoas, ela tem uma função urbana de tornar a cidade mais gentil, e também a função de oferecer cultura, lazer e comodidades. Uma cidade com mais galerias é uma cidade mais viva, onde se promove a convivência com espaços de encontro, de criatividade. A galeria comercial agrega as pessoas, e não as isola, são agentes em uma cidade mais agregadora.

A entrevista, pode proporcionar ao trabalho um ponto de vista mais amplo, e neste caso as declarações comprovam todas as possibilidades que a galeria comercial pode oferecer. Assim como os outros estudos de caso, a galeria do Louvre, possui adversidades como as citadas acima, mas a partir da percepção mostrada, sua permanência é assegurada de forma que somente sua intenção como espaço pode significar uma Avenida, ou uma cidade mais eficiente. O Louvre, com todas suas sutilezas, também se enquadra na forte relação entre cidade e indivíduo, assim como os outros edifícios com múltiplas funções ele proporciona conforto aos moradores que desfrutam dele “dos pés à cabeça". Em seus volumes, os pilotis atuam para suavizar a verticalidade do projeto, que respeitando o recuo oferece área para empreendimentos, e sombra para que circule paralelo as galerias na Avenida São Luís. Com a associação entre dois volumes ele de certa forma oferece um apoio a aqueles que moram, além de abrigar importantes fatores históricos por entre as lojas e em sua materialização. 3.3 Edifício Galeria Metrópole Situado em local de prestígio na Avenida São Luís (figura 72), esquina com a Praça Dom José Gaspar, o projeto de Salvador Candia (1924-1991) e Gian Carlo Gasperini (1926) possui uma função delimitada em um dos locais mais importantes do Plano de Avenidas de Prestes Maia (1930). Com projeto do ano de 1956 e construção entre 1959 e 1964, o edifício com quatro pavimentos de galeria, e mais acima de escritórios foi originado de uma proposta de concurso onde foram convidados em 1956 os arquitetos Jorge Wilheim (1929), David Libeskind (1928), Gian Carlo Gasperini (1926) e Salvador Candia (1924-1991).

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Figura 72 - Fotografia do Edifício Galeria Metrópole, ao lado das vegetações da Praça Dom José Gaspar. Fonte: LEONEL, 2020, n. p.

Denominado pelos patrocinadores do concurso de edifício Maximus, o projeto foi encomendado pela incorporadora e companhia Santista de Administração e Comércio e a construtora Sociedade Comercial e Construtora S. A, responsáveis por gerar esta competição para a construção do novo edifício e convidar os arquitetos supracitados. Os convites, segundo Jaime Cunha Jr (2007), foram um passo em direção ao interesse dos arquitetos nos espaços públicos e na construção civil no Centro de São Paulo, sempre em direção à arquitetura do Movimento Moderno. Citando mais uma vez o Plano de Avenidas de Prestes Maia, o caráter urbano do projeto foi consequência das intervenções na Avenida São Luís e do Perímetro de Irradiação. A Galeria Metrópole fez parte do processo de verticalização da avenida e seguiu representando uma das amostras da arquitetura moderna paulistana. As motivações e principais alcances dos desenhos do edifício eram em busca de passeios públicos e continuidade das volumetrias Centro Novo e da Avenida. A seleção deste marco para o estudo de caso ocorreu por conta do comprometimento do edifício e dos arquitetos com a comunicação e satisfação do ambiente que ele seria inserido. Adotando também ideias de outros participantes do concurso, Gian Carlo Gasperini (1926) e Salvador Candia (1924-1991), os selecionados ao final do concurso, buscaram projetar seguindo quocientes de diagnóstico urbano, por conta do contexto de transformação urbana do edifício. 99


Na trajetória projetual e análise dos projetos de cada arquiteto, o edifício como se conhece hoje (figura 73) tomou forma, sendo importante especificar os conceitos de cada profissional para o resultado conjunto.

Figura 73 - Edifício Galeria Metrópole. Fonte: KON, 2013 , n. p.

Gian Carlo Gasperini foi o arquiteto que desejava a conexão entre os novos espaços públicos com o edifício por meio de percursos, e além disso Jaime Cunha Jr (2007) descreve que as intenções de Gasperini giravam em torno da necessidade de “vitalidade das atividades comerciais, e seu valor na estruturação do partido arquitetônico, que originou, segundo as próprias palavras do arquiteto o “centro de gravidade” 5 de todo o edifício ” (CUNHA JR, 2007, p. 6). Além destes fatores, o arquiteto contemplou um programa dividido em dois edifícios, o que mais tarde evoluiu para a ideia de continuidade, com a união dos programas de escritório e galerias comerciais em um volume único, mas que ainda sim funcionavam de forma independentes (figura 74).

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Figura 74 - Croqui de Gasperini, mostrando o embasamento e as relações do volume com o entorno imediato.

CUNHA JR, 2007, p. 9 Porém, as propostas de Gasperini de embasamento e volume muito verticalizado receberam críticas e de início descritas pelo autor supramencionado como “uma solução incoerente'' (CUNHA JR, 2007, p. 10). Não houve o aproveitamento do volume embasado, e o seu gabarito rompia com a continuidade da Avenida. A partir destas movimentações sobre o partido arquitetônico, ocorreu a parceria de Gian Carlo Gasperini e Salvador Candia, em que os desenhos de Candia não propunham o edifício encostado à empena, nem a comunicação do edifício com as áreas públicas do entorno. Como Salvador Candia descreve: Ai veio o prédio da rua São Luís. Foi um concurso e o Gasperini e eu, com projetos diferentes, ganhamos. Na hora de executar, o projeto que parece que respondia mais às implicações não só econômicas, não só materiais, mas inclusive apresentava uma abordagem nova, era o meu. O que ele tinha de novo? Tinha torre solta, foi a primeira torre solta que se fez em São Paulo. Isto pode parecer uma coisa vulgar, mas não era na época. (CANDIA, 1979 apud CUNHA JR, 2007, p. 12)

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É inegável a contribuição do embasamento para as relações entre o edifício e seu entorno, e a função das galerias comerciais neste contexto, além de oferecer equilíbrio entre os volumes e as funções dos dois programas. A posição das lojas foi feita para direcionar o passeio, e tornar sutil a mudança da via e calçada para as galerias (figura 75).

Figura 75 - Edifício Galeria Metrópole, croquis de Salvador Candia das circulações e categorias propostas no projeto. LOBATO, 2009, p. 89

Uma torre com dezenove pavimentos de escritório, que procurava também atender a agenda cultural da época em que foi construído, compreendia os espaços privados e o embasamento com as galerias constitui o ambiente social com conexões importantes. As lojas oferecem ao pedestre uma nova alternativa, proporcionando a vitalidade do programa comercial, com fachadas urbanas e um eixo ininterrupto. Assim como aconteceu nos edifícios Copan e Louvre, a campanha publicitária acerca do evento que seria a Galeria Metrópole também aconteceu. Apresentado também como Centro Metropolitano de Compras, o projeto era coerente com a vitalidade da época, inserido no 102


imaginário do pedestre paulistano. Com diversas manifestações culturais, desde os músicos em bares, até o cinema dentro da galeria, o edifício foi muito esperado, além de carregar o fato de ser na época “ A maior concentração de lojas da América Latina”. (figura 76).

Figura 76 - Anúncio Galeria Metrópole datado de 21/06/1960 Fonte: SCHOLZ, 2014, n.p.

O edifício de escritórios e galerias é localizado em um ponto estratégico e de conexão entre a Praça Dom Gaspar, a Rua Basílio da Gama e a Avenida São Luís. Em uma breve contextualização, a Praça Dom José Gaspar era local de uma das chácaras da elite paulistana, anterior às modificações do Plano de Avenidas Prestes Maia. Com o melhoramento das ruas em 1938 e a desapropriação dos palácios e chácaras em 1944, conjuntamente com os edifícios da Avenida a Praça: A modernização vigente àquela época, cuja face mais conhecida é o imperativo da circulação, mostra aqui outro lado, em especial neste aspecto urbanístico – a criação de uma praça - por meio de uma cuidadosa operação, que envolve o enquadramento desta nos nexos do traçado circundante. Trata-se de uma operação de desenho urbano em que a praça torna-se 103


protagonista na medida em que o espaço livre não edificado é composto pela fachada das edificações em volta, aliás, como tradicionalmente se fazia nas cidades. Assim o fato novo – a praça, por meio do perfeito ajuste da inserção no tecido atinge o nível de estruturador do ambiente urbano, em outras palavras, estamos as voltas com o conceito de elemento primário da terminologia de Aldo Rossi em Arquitetura da Cidade. Neste caso, a escada rolante e o vazio com jardim são responsáveis pela comunicação entre pavimentos do projeto, que entre os três estudos de caso, é o que possui mais lojas, com cinco pavimentos de galeria.(AZEVEDO, 2009, p.12)

Por todo os pavimentos, há uma relação de usos semi-públicos, além das vistas do entorno imediato proporcionadas pelas varandas e circulação por escadas rolantes. O térreo do projeto inicia a conexão entre as duas ruas e a avenida, com lojas, restaurantes, sanitários e diversas opções de circulação vertical, uma das comunicações entre os pavimentos (figura 77).

Figura 77 - Corredor da galeria mostrando os restaurantes e o vazio. Fonte: GUERRA, 2017, n. p.

As plantas mostrando as lojas da Galeria Metrópole fazem parte da solução final do projeto, e oferecem ao pedestre diversas posições dentro do espaço, havendo a dúvida de quando se inicia o passeio público e privado. O edifício Metrópole assim os edifícios-galeria citados como "compensam" a estrutura urbana existente. Reproduzem no espaço dos lotes de forma ideal a diversidade urbana oferecendo um espaço privado com características de espaço público.’(MEYER, 1991 apud CUNHA JR, 2007, p. 108)

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Feitas para haver uma relação entre a atividade terciária e a conexão entre ruas, os pavimentos de lojas possuem volume consistente, com programa possuindo cinema, lojas e peças de auxílio ao pedestre como a escada rolante e os vazios. O vazio no edifício proporciona uma estruturação e iluminação dos espaços internos, além das sobre-lojas que auxiliam nos ambientes específicos dos lojistas (figura 78).

Figura 78- Planta do térreo do Edifício Galeria Metrópole, sem escala Fonte: CUNHA JR, 2007,p. 168

O primeiro pavimento com as lojas, possui quarenta espaços para venda, e as escadas de emergência e elevadores em distância correta pela norma de segurança. Quando se entra pela Rua Basílio da Gama, logo há a escada rolante ao lado do vazio com paisagismos, o mesmo acontece com as outras rua e Avenida, que nas calçadas se confundem com a entrada da galeria (figuras 79 e 80).

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Figura 79- Planta do primeiro pavimento com as sobre-lojas - Passeio Londres- sem escala Fonte: CUNHA JR, 2007, p. 170.

Figura 80- Fotografia mostrando os acessos pelas escadas rolantes, o vazio com o paisagismo e os corredores. Fonte: MAGALHÃES, 2017, n. p. Assim é que na implantação da Galeria Metrópole, as lojas no pavimento térreo e as circulações verticais do conjunto estão diretamente 106


associadas aos percursos de pedestres existentes no entorno urbano. A nova conexão proposta entre a rua Basílio da Gama e a praça Dom José Gaspar serve como eixo estruturador do projeto, organizando a disposição dos equipamentos de circulação que darão acesso aos pavimentos superiores da galeria comercial (FERRONI, 2008, p. 118)

Nestes pavimentos do embasamento e lojas, não há nenhum indicativo da mudança da calçada para o edifício, e a disposição das lojas cria um trajeto natural, em que as áreas de auxílio como os sanitários e elevadores ficaram em locais estratégicos, dando prioridade espacial às lojas (figura 81). É importante destacar também o grande aproveitamento da esquina pelo projeto, que torna o passeio por entre e envolta do edifício mais sutil e agradável, com as conexões com a Praça Dom Gaspar.

Figura 81- Planta do segundo pavimento com as sobre-lojas - Passeio Paris - sem escala Fonte: CUNHA JR, 2007,p.171

Além destes fatores apresentados, a materialidade e relações de luz e sombra do projeto também são favoráveis para um belo trajeto pelo indivíduo, fato que tem total conexão com o objetivo de estudo do trabalho. Traduzindo os costumes da população, o terceiro pavimento das sobrelojas dispõe de restaurantes e locais para sentar e conversar (figura 82), rotina altamente valorizada pelo paulistano frequentador do Centro.

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Figura 82- Planta do terceiro pavimento com as sobre-lojas - Passeio Capri - sem escala Fonte: CUNHA JR, 2007,p.172

Sustentando diversos debates sobre seu partido, o projeto é modificado no programa de escritórios em relação a sua estrutura e circulações, mas as galerias comerciais, em relação a compatibilidade de volume com o edifício mais alto, a estrutura também e aberturas para a Avenida. Um dos aspectos mais interessantes do projeto que permanece nos dias atuais são suas extremidades sem pilares, e as varandas nos pavimentos comerciais (figura 83).

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Figura 83- Fotografia mostrando a galeria fechada para acesso livre aos domingos, e a relação entre o térreo da galeria e seus pavimentos superiores, com as varandas e o fácil acesso. Fonte: Foto da autora, 2021.

As circulações da galeria e do volume de escritórios se mantiveram separadas, sendo que nas galerias foi modificada sua escala durante a concepção do projeto com alterações no tamanho do embasamento. Pode-se dizer que toda a trajetória projetual do edifício Galeria Metrópole foi benéfica para a ascendência das galerias, que receberam diversos avanços, podendo citar: as varandas; o vazio central; as escadas rolantes e os diferentes acessos. Ao percorrer as vias da galeria nos dias atuais, é sublinhada sua capacidade de se camuflar no contexto urbano, e na Praça Dom Gaspar (figura 84) que oferece um acesso fácil ao projeto. Além da oportunidade de se desfrutar do percurso, neste momento houve a entrevista com o professor Ricardo Martos que, além de ser frequentador assíduo da Galeria Metrópole, também possui um escritório profissional no local, podendo transmitir alguns questionamentos em relação ao subcapítulo em questão.

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Figura 84- Vista da Praça Dom José Gaspar, para o edifício Metrópole. Fonte: Foto da autora, 2021.

De início se questionou o motivo pelo qual o professor selecionou a arquitetura para locação de sua atuação como profissional de Arquitetura e Urbanismo, e a partir disso o professor diz que:

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[...] queríamos que o escritório fosse localizado em um edifício de nossa referência arquitetônica, que nos inspirasse, fosse bem localizado para o uso do transporte público e da cidade em seu entorno, isto é, que pudesse sintetizar muito do que acreditamos.6

Parte importante da entrevista, o professor Ricardo responde a partir de pergunta feita, como que a atividade comercial na galeria representa hoje para quem a frequenta, em aspectos atuais observados pelo mesmo: Houve uma nítida transformação de usos ao longo dos tempos, e a predominância comercial deu lugar a serviços, espaços culturais, escritórios e principalmente alimentação nos andares térreos, que se beneficiam do próprio atalho urbano que a galeria oferece. Vale registrar que as características do edifício e sua flexibilidade facilitaram a alteração de uso ao longo dos tempos.

Em entrevista também, o professor pôde expor o que o espaço da Galeria Metrópole significa a ele, afinal a arquitetura influencia em grande parte o comportamento do indivíduo seja em mera passagem, ou em atuação da arquitetura. Descrevendo a galeria como um edifício responsável por sustentar inspiração e qualidade arquitetônica, além de descrever a experiência de uma ótica diferente : Há também um aspecto comportamental interessante. Como as lojas viraram escritórios, acaba ocorrendo uma relação saudável de vizinhança entre os profissionais, que são comumente transformadas em parcerias. Particularmente, costumava vir ao centro trazido por meu avô, que tinha por hábito levar os netos para passear de metrô, e não raro acabávamos desembarcando por aqui. Lembro especialmente dos passeios por entre as galerias, onde entrávamos por uma porta e saindo por outra.

Este depoimento, só reforça como as galerias comerciais inseridas em seu contexto cultural e territorial são parte importante da memória afetiva e da relação entre pedestre e cidade. A Galeria Metrópole, com seu vocabulário de arquitetura do Movimento Moderno, visuais e vitalidade comercial, segue imprimindo uma variável marcante no Centro Novo. As soluções para circulação e comprometimento vindas desde o desenvolvimento projetual, garantem em parte esta presença do projeto como apropriação coletiva e afetiva na história de quem trabalha, mora ou somente passa pelo Centro Novo, e pela Avenida São Luís. Silvestre Mendes, funcionário da banca Corredor Cultural, localizado na Praça Dom José Gaspar, em frente a um dos acessos da Galeria Metrópole (figura 85) também foi um dos entrevistados.

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Depoimento concedido no dia 08/11/2021 por Ricardo Martos, Arquiteto na KSAA, professor e Coordenador de Lato Sensu do Centro Universitário Belas Artes e Professor da Universidade Mackenzie.

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Figura 85- Fotografia mostrando a galeria fechada, e a vista do acesso da galeria que a banca Corredor Cultural presencia. Fonte: LEONEL, 2020, n. p.

Trabalhando na banca de jornais há 25 anos, Silvestre recebeu perguntas similares às do professor Ricardo, mas neste caso a perspectiva e as respostas são diferentes. A primeira pergunta sendo: O que a atividade comercial na galeria metrópole representa para seu estabelecimento? Silvestre Mendes coloca: Confesso que meu ofício neste momento está ligado a galeria sim. Principalmente o edifício Metrópole. Em tempos em que o público da praça girava em torno de 300 mil pessoas, a galeria apenas completava,porém, em tempos pandêmicos, no qual as leis limitavam a circulação na galeria ,os comércios não ultrapassaram os 3% da capacidade.7

Baseado em uma convivência diária com vista para a Galeria, Silvestre Mendes relata os resultados da pandemia e o fluxo do local: As rudes regras fazem com que os eventos culturais cada dia se afastem mais, como os estabelecimentos: mandíbula, taperá, the week, metropol, entre outros. Ou seja, onde não se convém a cultura,não convém pessoas. Sendo assim,o espaço se limita.

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Depoimentos concedidos no dia 25/11/2021 por Silvestre Mendes, funcionário da banca de jornais Corredor Cultural.

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E finalmente, assim como o colocado anteriormente, a presença de memória afetiva em quem desfruta diariamente da arquitetura é fator essencial, e é da particularidade de cada um denominar a importância da arquitetura para sua história. Dessa forma, foi questionado ao comerciante, se houve, ou ainda há algum vínculo pessoal,alguma memória afetiva, ou saudade no cotidiano da galeria. As memórias são curtas e longas. Da glamurosa arquitetura que ainda se mantém a degradação que se vê. O fato é que a geração com 60,70 e 80 sempre haverá de lamentar dos tempos em que a galeria demonstrava não apenas sua mágica arquitetura mas a vitalidade das interações humanas e comerciais, hoje em dia só ocorre a falta de atrações e incentivos, o que fez até o cinema fechar.

Considerando o objetivo da pesquisa de levantar informações e experiências que relatam a importância da relação entre pedestre e galeria, é possível concluir que realmente, o imaginário das pessoas sobre a arquitetura são fundamentais para sua permanência. Explicando melhor, a partir de dois intensos depoimentos, pode-se dizer que a galeria tem internamente problemas de administração e funcionamento, mas a principal essência necessária existe, “Os pedestres, criam a cidade que percorrem”(CERTEAU, 1994, p. 71 apud CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 230). Agora ao final, será possível levantar algumas reflexões sobre como estes espaços são parte importante para a Avenida São Luís, por se conectarem com suas transformações e significarem uma integridade da vida urbana do pedestre. Outro aspecto interessante a se observar é a relação entre as vias de mobilidade e os edifícios, há 3 estações de metrô próximas, sendo que a República da linha amarela é a mais próxima (figura 86).

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Figura 86- Fotografia de satélite, mostrando os fluxos de automóveis, sendo que verde é rápido e laranja médio. Os ícones em azul representam os focos de transporte público e em amarelo os locais arborizados e públicos, as praças República, Dom José Gaspar e Franklin Roosevelt. Fonte: Google Maps, 2021. Desenho da autora, 2021.

Considerações finais Passando por todo o trabalho, o objetivo é sempre de ressaltar a trajetória da tipologia de galeria comercial, determinando algumas características e apontando suas vantagens para uma vida urbana bem sucedida. Os primeiros capítulos fazem uma base histórica das galerias comerciais, com destaque para as intervenções urbanas de Haussman no século XIX na Europa citadas no capítulo 1 e o Plano de Avenidas Prestes Maia de 1930 em São Paulo, explicado no capítulo 2.

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Sendo um dos focos da transformação urbana das vias de São Paulo, a Avenida São Luís, a Praça da República e seus entornos receberam edifícios influenciados por mudanças de legislação, preceitos do Movimento Moderno, expectativas imobiliárias e a verticalização. Após uma breve contextualização dos fatos ocorridos no decorrer do capítulo 2, a terceira e última parte da monografia utiliza três exemplos, com análises de como as galerias destes projetos atuam no centro da cidade e no dia-a-dia das pessoas. Utilizam-se depoimentos, desenhos, para explicar algumas questões importantes. Ao falar sobre o Perambular, Sylvia Cavalcante e a Gleice Elali (2018), apresentam a origem do termo que vindo da palavra francesa flâneur acontecia justamente no frenesi das galerias parisienses e logo destacam também a necessidade do pedestre de se movimentar, e questiona: “É possível se deslocar sem propósito? Que sentido pode adquirir o perambular na atualidade?.”(CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 223). Uma das principais categorias formadoras da conclusão, é propriamente o “perambular” ou melhor, a questão dos fluxos e interesse da população pelos espaços das galerias comerciais, neste caso as galerias da Avenida São Luís. As ferramentas para um bom fluxo existem, como mobilidade e segurança, e baseado também nos depoimentos, a arquitetura de uma forma geral é valorizada por quem frequenta, sendo que os edifícios são capazes de se adaptar às condições adversas vindas da mudança de público e de rotação de comércios. No instante em que a importância da relação entre o pedestre e a galeria é foco principal do trabalho, as vivências do ser humano arquiteto e do do ser humano reincidente são variáveis principais nesta análise. Instaurou-se uma possibilidade da mudança de experiência do indivíduo nas galerias após o Plano de Avenidas de Prestes Maia no Centro Novo, e estas transformações culminaram em uma nova ótica sobre o urbanismo paulistano. Além destes fatores, a competência publicitária dos empreendimentos também foi resultado desta nova percepção sobre como a cidade e seus novos caminhos mudariam o cotidiano do pedestre a partir de 1950. O anseio de pluralidade de usos em um só edifício, a utilização do lote com respeito aos recuos e conexões com as vias culminaram no grande sucesso das galerias comerciais que tornavam os edifícios mais atrativos a moradores, lojistas e empreendedores. Neste trabalho não cabe a definição do impacto dos Shoppings Centers para as relações urbanas, mas é certo que, a partir do estudo feito das galerias comerciais no presente trabalho, em comparação o outro modelo comercial edificado - os Shoppings Centers - excluem

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a cidade e a partir disso se questiona: como memórias se criarão a partir de um edifício efêmero e sem conexões com seu exterior? A galeria comercial gera um fator de identificação e presença histórica que não ocorre em outras edificações comerciais. O conceito de navegabilidade8, comunicado por Sylvia Cavalcante e a Gleice Elali (2018), se encaixa neste contexto, visto que a capacidade de um espaço oferecer navegabilidade depende da relação entre indivíduo e arquitetura, além do comportamento de cada um. A questão das novas centralidades devido ao aumento significativo da população apresentada por Cynthia Aleixo (2005) não exclui a urbanidade como o shopping, mas aplica um filtro à cidade e direciona o pedestre. Com outras palavras, a questão da distribuição populacional presente do desenvolvimento da cidade desde suas origens, também é responsável pelo esquecimento de alguns locais, como o Centro Novo e suas galerias comerciais. Com desenvolvimento similar ao do Centro Novo, e a presença de edifícios multifuncionais e galerias comerciais, a Avenida Paulista é um paradoxo interessante, visto que suas galerias são ativas na atualidade. Mas o fenômeno instaurado na Paulista não é obstáculo para a reconquista das galerias comerciais do centro, mas a ausência do pedestre na galeria é consequência de um “abandono da municipalidade“ (ALEIXO, 2005, p. 242). Talvez as grandes soluções para o esquecimento da vida urbana nas galerias, não estejam impressas em planos regionais ou operações urbanas, e sim em novas conexões práticas com a cidade e seus usuários. A reconquista do objetivo da galeria depende da sociabilidade somente dada por trocas humanas, quaisquer que sejam. Afinal, a galeria, desde sua origem, representava além de um foco de atividade terciária, um local de boemia e socialização, despido de segregação. Acredita-se que a essência do espaço urbano deve ser recuperada, e para que isso ocorra, diversas propostas vão surgir, mas o que ainda deve ser ressaltado é a capacidade de permanência de certos espaços. As galerias se formaram como consequência de períodos turbulentos; na explosão da indústria da França do século XIX e nas aspirações do urbanismo paulistano com heranças do Movimento Moderno. E a partir das conclusões de Nadia Cahen (2004), Cynthia Aleixo (2005), Sabrina Fontenele (2010) e Heliana Vargas (2018), a principal essência da galeria comercial é sua habilidade de se inserir no cotidiano das pessoas. ”[...] A história dos edifícios se mistura à história da própria cidade, que cria e recria novas centralidades, como também se mescla a 8

Navegabilidade, traduzido do wayfinding, significa a capacidade de caminhar, as possíveis estratégias de orientação pelo espaço físico, em que o indivíduo procura se deslocar com qualidade. 116


trajetória de muitos cidadãos que mantém viva uma área central e a sua imagem” (ALEIXO, 2005, p. 251) E assim como Cynthia Aleixo (2005), Heliana Vargas (2018) disserta que a construção dos espaços na cidade, neste caso as centralidades, são feitas pela circulação das pessoas, de diversas classes sociais e objetivos em comum. E que a partir disso a arquitetura e as atividades comerciais devem se completar, visto que a arquitetura se cria baseado em seu público. No que se refere ao campo da arquitetura, também há a necessidade de os arquitetos brasileiros envolvidos com projetos de áreas comerciais e terciárias melhor se instruírem sobre a lógica do espaço terciário (como o fizeram os arquitetos responsáveis pelas galerias comerciais na Europa, em sua fase inicial) para atuar de modo competente e ético na construção das cidades. Não é o melhor projeto aquele que supera o programa inicialmente proposto? Logicamente, os demais profissionais envolvidos com o comércio devem também se render à importância do projeto arquitetônico na otimização dos negócios.(VARGAS, 2018, p. 272)

Logo, sem a presença do fator humano, o objetivo da arquitetura se perde, e é necessário dimensionar a real influência que os edifícios possuem na vida urbana. As galerias se relacionam com o pedestre de forma que a galeria comercial, depende parcialmente desta atividade humana, isto é, a garantia de permanência da tipologia na cidade é construída a partir de interesses, mas as particularidades de cada arquitetura também são responsáveis por sua continuidade. Assim como a maioria dos espaços urbanos, a galeria é um local que pode oferecer além de comércios e oportunidades, atividades culturais, de lazer e comunidade. “As passagens cobertas se inseriram no ambiente urbano ligando ruas, proporcionando numerosos sons, odores, cenas e personagens próprios à cidade”(CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 227). A galeria comercial não possui característica de efemeridade, mas sim de adaptabilidade. Depois de enfrentar tempos de vitalidade, com os cinemas e as diversas manifestações culturais na década de 1960, suas atividades foram mudando, conforme a população se modificou. Hoje em dia o Centro de São Paulo recebe populações mais jovens, que procuram histórias e praticidade onde vivem e onde vão. O principal propósito das considerações finais, é o reconhecimento do pedestre como ser ativo na formação do espaço das galerias comerciais, em que sua parceria pode significar no desenvolvimento de cidades e centros urbanos mais eficientes.

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