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Artigo
UMBANDA, UMA RELIGIÃO BRASILEIRA, COM CARACTERÍSTICAS REGIONAIS. Por Marcelo Soares
O
ser humano desde a sua criação é
agregados após seu surgimento. E como ainda não
cercado pelo imaginário da magia, pelo
se tem um estudo específico nesse sentido, além do
sobrenatural e pelo misticismo. O Brasil
uso bibliográfico faremos também o uso da
é um país de proporção continental e tem sua
oralidade e faremos isso através de documentários,
magia e misticidade proporcional ao seu tamanho.
palestras e programas direcionados à prática da
O país devido a sua colonização foi durante muito
Umbanda. E como é uma religião relativamente
tempo
católico1,
nova e está em constante modificação, os diversos
devido a isso muitas manifestações que já existiam
dirigentes poderão nos dar um panorama dessas
e outras que surgiram ao longo da história, criaram
modificações, pois “... se a história oral é entendida
diversas religiões nesse imenso universo de fé,
como um método, ele deve incluir-se na história do
crendices e paixões.
tempo presente...” 2
considerado
extremamente
Dentre as várias religiões baseadas na crença na reencarnação
escolhemos
trabalhar
com
Ao falarmos da Umbanda, estaremos falando de
a
várias culturas, pois de acordo com Fedrick Barth, a
Umbanda e suas variações de acordo com a região
cultura nunca é pura e está em constante
do país. Vamos ver como surgiu essa religião, sem
modificação, pois está sendo agregada ou
fazer biografia de seu fundador- não é esse nosso
agregando outra.3 A Umbanda é uma religião
interesse-, quais as fusões que ocorreram nesse
brasileira e estaria ela com sua identidade ainda em
processo e quais outros fundamentos foram
formação? Ou a sua identidade é justamente essa
1
3
HOORNAERT. Eduardo. Formação do catolicismo brasileiro 1550-1880, Petrópolis: Vozes, 1974, PP 31-65. 2 FERREIRA. Marieta de Moraes e AMADO. Janaína, Usos e abusos da história oral, Rio de Janeiro, FGV, 2006, P 34.
BARTH. Fedrick. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas, Rio de Janeiro: Tomke Lask UFPB, 2000, p 109.
G N A R U S | 201 capacidade de agregar outras culturas e religiões?
ainda não estavam inseridos na sociedade como
Se ela está em constante modificação, será ela
homens reallivres) buscavam a redefinição de sua
uniforme em todas as regiões do país? Vamos
cultura, principalmente a religiosa.6 E nesta busca
entender esse fenômeno que ultrapassou fronteiras
os pobres e principalmente os negros, abraçaram a
e quebrou barreiras religiosas com aglutinamento
Umbanda, já que sua religiosidade já estava
de tradições culturais.
mesclada com os santos católicos.
A Umbanda foi institucionalizada pelo médium
Então 15 de novembro de 1908, o médium Zélio
Zélio Fernandino de Moraes em 1908, que tinha
Fernandino de Moraes ao sentar-se a mesa onde
como guia incorporado o Caboclo das Sete
somente se manifestavam, segundo os kadercistas,
Encruzilhadas,4
o
espíritos “evoluídos” como médicos, engenheiros e
antropólogo Claudio Bertolli, “a Umbanda tem que
advogados, passaram a manifestar-se espíritos de
ser pensada numa perspectiva histórica”, pois no
indígenas e negros. Houve grande confusão e um
período colonial quando os escravos buscavam
dos médiuns-videntes fez a seguinte indagação:
porém
de
acordo
com
continuar sua religiosidade trazida da África,
“Afinal, porque o irmão fala nesses termos, pretendendo que esta mesa aceite a manifestação de espíritos, que pelo grau de cultura que tiveram quando encarnado, são claramente atrasados? E qual é o seu nome irmão?” E a resposta veio dando início a Umbanda. “Se julgam atrasados esses espíritos dos pretos e dos índios, devo dizer que amanhã estarei em casa deste aparelho, para dar início a um culto em que esses pretos e esses índios poderão dar a sua mensagem, e assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos encarnados e desencarnados. E, se querem saber o meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim.7 E assim se fez.
acabaram misturando suas tradições culturais e religiosas ao fundir-se com a cultura do branco.5 Após a Abolição e Proclamação da República, os negros ainda sentindo na pele a exclusão, (pois
E isso ocorre em um período que o Espiritismo de Alan Kardec (Hypolite Lion Léon Dénezard Rivail) está em grande evidência. Após ter surgido na França em 1857, o “Livro dos espíritos” chega ao Brasil e logo sua doutrina é difundida na década de Zelio Fernandino de Moraes, O precursor da Umbanda 4
AZEVEDO. Janaína. Tudo que você precisa saber sobre a umbanda, São Paulo, Universo dos Livros, 2010, p14. 5 CORTEZ. Gabriel, ROSICA. Jaime, BORGES. Maitê e NETO. Solon, Umbanda é Brasil, Bauru, UNESP, 2014.
1860, criando-se vários grupos de adeptos ao espiritismo. 6
Vários
médicos
da
época
se
CORTEZ. Gabriel, ROSICA. Jaime, BORGES. Maitê e NETO. Solon, Umbanda é Brasil, Bauru, UNESP, 2014. 7 AZEVEDO, Janaína. Tudo que você precisa saber sobre a umbanda, São Paulo, Universo dos Livros, 2010, PP 18-19.
G N A R U S | 202 converteram a prática, mas talvez o mais famoso
isso temos que voltar ao período colonial de nosso
tenha sido o médico Adolfo Bezerra de Menezes. E
país, quando aqui já existiam ritos e práticas
de acordo com Emerson Giumbelli todos os
religiosas nas tribos indígenas, contrariando a
espíritos que se manifestavam, quando encarnados
Companhia de Jesus que ao chegar ao Brasil em
tinham profissões privilegiadas na sociedade,
1549, tendo como líder Manuel da Nóbrega, que
fazendo com que a classe média tivesse também
afirmaram a ausência de religião entre os
uma grande adesão à religião.8
indígenas.10
Do Kardecismo, a Umbanda herdou a fé em Deus
Pode-se dizer que a Umbanda tem ramificações
e Jesus Cristo, seguindo uma doutrina cristã, a
no culto a Jurema Sagrada (também conhecida
caridade e o amor ao próximo. A crença na
como Catimbó), pois a mesma origina-se das
reencarnação onde os espíritos estão em busca de
práticas de pajelanças que os indígenas se
evolução também é uma das doutrinas que foi
utilizavam antes da colonização. De acordo com
fundida à Umbanda. E segundo o sacerdote
Ronaldo Vainfas, o trabalho de Jean de Léry deixa
umbandista Rodrigo Queiróz, “a Umbanda teve que
claro que os índios em comemoração a alguma
se embasar naquilo que Alan Kardec já havia trazido
festividade, dançavam em ritmo cadenciado e
que
fumando uma erva de nome “petim” em volta de
foi
o
entendimento
universal
da
mediunidade.”9 A Umbanda apesar de ter nascido praticamente em uma mesa Kardecista teve com certeza outras influências na sua composição. Para entendermos
ídolos de pedras, fazendo menções a seus ancestrais.11 E pelas descrições de vários estudiosos do culto da Jurema Sagrada, como o Juremeiro Freitas, é uma religião de tradições nordestinas que se iniciou pelo uso da planta de mesmo nome (jurema), que para os indígenas é uma árvore sagrada. E esse culto deu-se em 1532, com a junção da pajelança, do catolicismo, bruxarias europeias e das divindades da natureza dos negros bantos12, que neste período já desembarcavam como escravos no nordeste brasileiro. Nos séculos XVI, XVII e XVIII as capitanias do nordeste como Bahia e Grão Pará sempre sofriam perseguições de
Mesas girantes no início do Espiritismo de Allan Kardec.
inquisidores que buscavam as práticas de feitiçarias e curandeirismo que ocorriam naquele lugar, e conforme afirma Daniela Buono Calainho, a
8
GIUMBELLI, Emerson. Kardec entre nós, História do Brasil para ocupados (Organização: Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, 2013, p 138. 9 CORTEZ. Gabriel, ROSICA. Jaime, BORGES. Maitê e NETO. Solon, Umbanda é Brasil, Bauru, UNESP, 2014. 10 VAINFAS, Ronaldo. Exércitos de Cristo - História do Brasil para ocupados (Organização: Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, 2013, p 99.
11
VAINFAS, Ronaldo. Índios, hereges e rebeldes - História do Brasil para ocupados (Organização: Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, 2013, p 302-303. 12 FREITAS, Juremeiro. Palestra Jurema Sagrada, TV Despertar, Natal Rio Grande do Norte, 2013.
G N A R U S | 203 como influências das forças da natureza e não como controladores. A sua liturgia tem uma dinâmica diferenciada do Candomblé, completa ele.15 Outras influências do Candomblé estão relacionadas à gastronomia, vestimentas e danças. E normalmente os Orixás cultuados pelos umbandistas são Oxalá, Ogum, Oxossi, Omulú, Xangô, Yemonjá, Nanã,
Dança Tapuia, própria dos indígenas no Brasil colônia, quando cultuavam seus Deuses.
Yasãn e Oxum que foram sincretizados com os santos católicos.
inquisição deixou vastos registros da presença de africanos no Brasil já neste período13 do surgimento do culto da Jurema Sagrada.
O catolicismo assim como o kardecismo, se tem Deus e seu filho Jesus Cristo como os seres supremos, e tendo a Umbanda essas influências
Outra influência que sofreu a Umbanda foi
também é uma religião cristã ao contrário do que
através das divindades africanas (Orixás, Nkisis e
muitos acreditam. Tem-se como base verdadeira o
Voduns), que os escravos trouxeram da África e
judaísmo, pois Deus é o ser superior e tem os santos,
cultuavam escondidos dos seus senhores nas
os anjos e arcanjos em uma escala inferior. E
senzalas das fazendas. Têm-se notícias de que o
mesclando mais uma vez com o Candomblé devido
primeiro Candomblé foi notificado no século XVIII
ao sincretismo religioso (Orixás com santos)16, a
com o nome de Calundu. E de acordo com João José
Umbanda toma essa fusão para si e tem seu culto
Reis, os praticantes do Candomblé sofriam
aos Orixás da seguinte forma: Oxalá=Jesus,
constantes perseguições, e apesar da maioria de
Ogum=São
chefes de terreiros serem libertos, por terem
Omulú=São Lázaro, Xangô=São João Batista,
nascidos livres ou conseguido sua alforria, sofriam
Yemanjá=Nossa
constantes investidas da polícia contrária às
Nanã=Senhora Santana, Yansã=Santa Bárbara e
Jorge,
Oxossi=São
Senhora
dos
Sebastião, Navegantes,
práticas de adivinhações e curandeirismo. O próprio Candomblé sofreu influências, pois com diferentes povos vindos do continente africano as culturas se mesclaram.14 De acordo com o sacerdote Rodrigo Queiróz, a influência do candomblé na Umbanda, é o culto aos Orixás advindos da nação Ketu, e que são cultuados como divindades e não como deuses. E ainda segundo
Imagens de santos Católicos com o sincretismo religioso.
Queiróz, essas divindades agem em nossas vidas 13 CALAINHO, Daniela Buono. Feitiços e feiticeiros, História do
Brasil para ocupados (Organização: Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, 2013, p 129. 14 REIS, José João. Candomblé para todos - História do Brasil para ocupados (Organização: Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, 2013, p 64-65-66-67.
15
CORTEZ. Gabriel, ROSICA. Jaime, BORGES. Maitê e NETO. Solon, Umbanda é Brasil, Bauru, UNESP, 2014. 16 AZEVEDO, Janaína. Tudo que você precisa saber sobre a umbanda, São Paulo, Universo dos Livros, 2010, p45.
G N A R U S | 204 Oxum=Nossa Senhora da Conceição. E cada um
entidades
com sua representatividade das forças da natureza.
Boiadeiros, Crianças e Cangaceiros.
Mas de acordo com a região o sincretismo pode ter suas variações, como por exemplo, na Bahia em que São Jorge é sincretizado com Oxossi e não com Ogum.
aparecem
também,
os
Baianos,
Com tantos elementos agregados fica inviável a Umbanda se manter uniforme, pois nem todas as casas se cultuam todos esses espíritos e mesmo tendo os seus princípios respeitados (“Amor e
A Umbanda com sua capacidade de agregar
Caridade”), a sua ritualística tem variações devido a
outras culturas e sempre aberta a receber outros
sua localização e diferentes influências. Diante
elementos em seus cultos, no decorrer de sua
disso a Umbanda no primeiro momento se revela
história absorveram outras entidades que passaram
uma religião sem identidade, sem uma definição ou
a se apresentar com o mesmo compromisso de
uma “cara”. Podemos verificar que existem “várias
caridade, e a busca pela evolução. Assim foi com os
Umbandas” pelo Brasil e mundo. Podemos
Marinheiros que
constatar
essa
trabalham
afirmação
no
na
linha de Yemanjá, como
documentário:
afirma
Umbanda,
Norberto
produzido
Peixoto, dirigente
pela
Universidade do
Católica
de
Grupo Umbanda
Pernambuco.
Triângulo
culto nesta casa
da
Fraternidade de
em
Porto Alegre, Rio
dirigida
Grande do
Sul17.
Culto na Umbanda reverenciando a Jurema Sagrada.
Assim como os
O
Pernambuco pela
sacerdotisa “Irmã” Graça, é feito sem
Marinheiros vieram os elementos da Linha do
o uso do atabaque e o único instrumento utilizado
Oriente que é extensa, e nesta lista estão os Povos
é o “maracá”, de origem indígena utilizado nos
Ciganos do Oriente, o Povo Hindu, o Povo Médico
cultos de pajelanças. Suas roupas são bem próximas
e Cientista, a falange dos Árabes e Marroquinos, os
as que eram usadas nos cultos kardecistas e notam-
Japoneses, Chineses, Mongóis e Esquimós, a
se poucas imagens e as que se percebem são apenas
Falange dos Egípcios, Astecas e Incas, a Falange dos
dos Caboclos e Pretos-Velhos. As imagens do
Maias e Toltecas, Falanges dos Índios Caraíbas,
sincretismo religioso da igreja católica não se
Gauleses, Romanos e antigos povos europeus,
encontram no templo. O culto ao “pau” sagrado
como descreve a umbandista e pesquisadora
também é visto no meio do salão, culto tradicional
Míriam Prestes.18 E para completar essa gama de
da Jurema Sagrada ou Catimbó. Fica claro que as
17
18
PEIXOTO, Norberto, Umbanda Linha dos Marinheiros, Porto Alegre, Grupo de Umbanda Triângulo da Fraternidade, 2013.
PRESTES, Míriam. Umbanda: Crença, Saber e Prática, Rio de Janeiro, Pallas Editora e Distribuidoras, 2010, pp182-183.
G N A R U S | 205 entidades cultuadas são os Caboclos e Pretos-
utilizados em grandes escolas de sambas e blocos
Velhos e não se faz uso de sacrifício de animais, se
carnavalescos.21
aproximando
mais
da
Umbanda
que
foi
institucionalizada por Zélio Fernandino de Moraes e apesar de cultuar os Orixás, se afasta da prática de sacrifício de animais trazida pelos africanos. 19
Nesta mesma linha também encontramos a Tenda Espírita Santa Bárbara também em Teresina, dirigida pela sacerdotisa Eufrásia de Iansã, que mantém oficinas de artesanatos e grupos de danças
No templo de Umbanda Guerreiros de Oxalá em
além de trabalhar a religiosidade com um
Curitiba Paraná, dirigido pelo sacerdote Jair Souza
diferencial segundo ela, de humanização do ser. E
de Oliveira Filho, se faz o uso dos atabaques e
como no terreiro acima citado, este também se
notam-se a presença de várias imagens da igreja
aproxima muito dos cultos do candomblé, com suas
católica sincretizando os Orixás do Candomblé.
danças próprias das divindades africanas. Não se
Também se utilizam do defumador (queima de
percebe imagens dos santos sincretizados e nem os
ervas
tradicionais Caboclos e Pretos-Velhos. Na parte
usada
para
limpeza
espiritual),20
diferentemente da casa citada acima. Não podemos esquecer o amparo social que a Umbanda oferece em diversas casas como, o Santuário Sagrado do Pai João de Aruanda dirigido pelo sacerdote Rondinele Santos, que é articulador da rede estadual de cultos afro brasileiros em Teresina no Piauí. Onde além da religiosidade se
musical podemos verificar a utilização de atabaques, maracás e triângulos, instrumentos usados normalmente no estilo musical conhecido como forró22. Ficando nítida a inserção de cultura regional na religião, ou seja, a Umbanda irá se comportar de acordo com a necessidade de cada localização.
trabalha o lado cultural regional, tirando crianças e adolescentes das ruas e das drogas, através da música e da dança. Nesta casa de Umbanda se mantém o grupo Afro-cultural Abá. E em relação à diferenciação desta casa além da ação social notam-se a ausência de imagens e a grande aproximação com o Candomblé, pois suas danças nos remetem aos cultos dos Vodouns e Nkisis. A parte musical fica a cargo de um grande grupo de percussão onde se encontram atabaques, surdos de
Umbanda com cultos voltados para divindades africanas (Orixás).
marcação, tarol, tantan e repique, instrumentos
19
PACHECO, Luca.Umbanda, Observatório Transdiciplinar das Religiões do Recife, Universidade Católica de Pernambuco, 2010. 20 TOLENTINO, Suyanne. Religare Umbanda Sagrada, Grupo Independente, Curitiba, 2011. 21 COUTINHO, Cleginaldo. No universo da Umbanda, Set Filmes, Programa Recontar, TV Assembleia, Teresina Piauí, 2013.
22
COUTINHO, Cleginaldo. No universo da Umbanda, Set Filmes, Programa Recontar, TV Assembleia, Teresina Piauí, 2013.
G N A R U S | 206 Na mesma cidade encontramos também a Tenda
Também em São Paulo precisamente em
São Francisco de Assis dirigido pelo Pai de Santo
Itanhaém, Pai Rivas de Ogiyan dirige a Tenda
Francisco das Chagas, um terreiro simples, mas
Umbandista Oriental que é outro segmento da
segundo ele de muita fé, onde suas características
Umbanda, a chamada Umbanda Esotérica, um
estão muito voltadas para o culto da Jurema
templo onde não se percebe imagens de santos, o
Sagrada ou Catimbó, onde são cultuados os
chão é coberto por areia e o altar é composto por
Mestres e Mestras da Jurema, ou Juremeiros.
uma cruz, flores, velas e alguns rabiscos que
Também se tem a ausência das imagens tradicionais
parecem palavras escritas em árabe. Na Umbanda
da Umbanda carioca, dos santos sincretizados. Na
Esotérica seguem-se três doutrinas, a doutrina da
música percebesse o uso de atabaques e
luz ou da sabedoria cósmica, a doutrina do som ou
triângulos.23
do amor cósmico e a doutrina do movimento ou da
Já na Tenda Coração de Jesus que fica em
ação cósmica.26
Uberlândia Minas Gerais, encontramos grande
Nesta mesma linha encontramos a “Tenda de
semelhança com a Umbanda praticada no Rio de
Umbanda Caboclo 7 Pena Azul”, dirigida pelo
Janeiro, pois no altar ou congar se encontram as
Mestre Alexandre B. de Oliveira onde questiona as
imagens sincretizadas da igreja católica, as dos
entidades que se apresentam na Umbanda.
Caboclos e Preto-Velhos, a defumação e a
Segundo ele as únicas entidades que realmente são
energização de água para ser distribuída entre os
de Umbanda, de acordo com a raiz de Pai Thomaz
médiuns e consulentes. Os instrumentos também
são, os Caboclos, os Pretos-Velhos, as Crianças e os
são os mesmos, o atabaque e chocalho.24
Exus. Onde as Crianças representam a pureza, os
Da mesma forma encontramos no Grupo Espírita Caboclo Cobra Coral em Santos, características semelhantes ao Rio de Janeiro, com imagens sincretizadas, imagens de Caboclos e PretosVelhos. Na música também é igual, onde se utilizam de atabaques, chocalhos e agogôs. E de acordo com o Pai de Santo Marcio de Ogum, na casa se cultuam além dos Caboclos, Pretos-Velhos, Crianças e Exus, se cultuam os Baianos, Marinheiros, Boiadeiros e
Caboclos a simplicidade, os Pretos-Velhos a humildade e os Exus representam o auxilio nos trabalhos dentro dos terreiros de umbanda. Oliveira se diz pertencente da Umbanda esotérica, adepto de uma Umbanda tradicional, mas ele se contradiz quando fala de entidades oriundas da Umbanda tradicional, pois na umbanda de Zélio Fernandino de Moraes, as únicas entidades eram Caboclos e Pretos-velhos.27
Ciganos. Percebesse também uma festa a Nossa
Oliveira afirma que todas as demais entidades não
Senhora de Aparecida, culto que raramente se é
são de Umbanda, e sim enfeixados, ou seja,
encontrado em outras casas.25
reunidos na Umbanda de acordo com cada região.
23
25
COUTINHO, Cleginaldo. No universo da Umbanda, Set Filmes, Programa Recontar, TV Assembleia, Teresina Piauí, 2013. 24 ALUNOS, Comunicação Social, Brasilidade e Identidades, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2014.
FOSALUSA, Felipe, A Religião Brasileira, Santos, Camaleão Produções Audiovisuais, 2013. 26 OGIYAN, Pai Rivas de, Umbanda Esotérica, Santos, TUO, 2014. 27OLVEIRA, Alexandre B, Entidades de Umbanda “Enfeixados”, Tenda de Umbanda Caboclo “7 Pena Azul”, Cosmópolis, 2015.
G N A R U S | 207 E isso acabou dando um novo nome à religião, a
Quando alguém fala de Umbanda Nagô ou
Umbanda Popular, onde várias entidades se
Umbanda Angola, nada mais é do que herança,
juntaram aos que já estavam para trabalhar a
afirma Kaim. Isso ocorre em 1910 quando o culto a
caridade. Essas entidades seriam os Boiadeiros,
Umbanda está em grande crescimento, e muitos
Marinheiros,
Árabes,
pais e mães de santo do Candomblé migram para a
Cangaceiros entre outros. Outro questionamento é
Umbanda com o desejo de fazer a caridade através
a manifestação dos Orixás na Umbanda, para
dos espíritos e acabaram trazendo costumes e
Oliveira quem se manifesta são Caboclos da linha
tradições do Candomblé, como firmezas dos Orixás,
de cada Orixá e não o Orixá propriamente dito,
cores de velas, toques de atabaques, oferendas de
muitos afirmam que são falangeiros e não Orixás.
animais, danças africanas e formas litúrgicas de
Como por exemplo, um Caboclo de nome 7
conduzir uma casa de santo. Logo as nomenclaturas
pedreiras, ele se intitula Xangô 7 Pedreiras, assim
se deram de acordo com a nação que cada
como o Caboclo Beira- Mar, que trabalha na linha
sacerdote veio. Também se tornou muito comum,
de Ogum, ele será chamado de Ogum Beira- Mar.28
sacerdotes herdarem terreiros e nem saberem por
Médicos,
Ciganos,
Mas há quem discorde das nomenclaturas dadas às divisões da Umbanda, como o sacerdote Marcio
que a casa tem tal nomenclatura, só sabem dizer que é tradição da casa, afirma Kaim.30
Kaim, o qual afirma que Umbanda só tem uma e o
Depois de analisarmos documentários, vídeos de
que ocorre são variações de acordo com quem a
palestra e programas direcionados a Umbanda, nós
dirige. E independente da variação que se tenha na
podemos concluir que realmente a Umbanda é uma
Umbanda, o que vai importar é a manifestação do
só, porém o que existe é uma grande variação
espírito pela caridade. Kaim afirma ainda que as
características de acordo com a regionalidade e
nomenclaturas usadas como Umbanda Sagrada, Pé
formação religiosa de cada dirigente de terreiro.
no Chão, Carismática, Nagô, Angola entre outras,
Vale lembrar que existe uma necessidade de um
vão se dar por três motivos. O primeiro seria por
estudo mais profundo, para que possamos ter uma
uma busca de trabalhar com uma Umbanda sem
visão mais ampla sobre o assunto. Precisamos
influências de outros espíritos que não sejam
estudar os terreiros de todas as cidades do país,
aqueles do início da Umbanda de Zélio Fernandino,
individualmente, fazendo uso da micro-história,
essa Umbanda é chamada de Umbanda Limpa. O
pois de acordo com Ronaldo Vainfas, Geovanni Levi
segundo motivo seria a junção de pedras e cristais,
afirma que “... na micro-história prevalece no
o uso de cromoterapia que daria o nome de
tocante à delimitação do campo social estudado...”
Umbanda Carismática ou Esotérica. E o terceiro
“... mais do que a definição geral da classe ou de
motivo e o mais usual, a
28 OLVEIRA, Alexandre
herança.29
B, Entidades de Umbanda “Enfeixados”, Tenda de Umbanda Caboclo “7 Pena Azul”, Cosmópolis, 2015. 29 SEVERINO, Nilton Luiz, Tipos de Umbanda, Programa Umbanda de Boa, São João da Boa Vista ,2014.
grupo ao qual pertence.” 31
30
SEVERINO, Nilton Luiz, Tipos de Umbanda, Programa Umbanda de Boa, São João da Boa Vista, 2014 31 VAINFAS, Ronaldo. Os protagonistas Anônimos da HistóriaMicro-História, Rio de Janeiro, Campus/Elsevier, 2002, p 117.
G N A R U S | 208 Diante
desta
afirmação
constatamos
a
necessidade de se reduzir o foco de observação, com o objetivo de tentar localizar um aspecto não percebido antes por uma abordagem geral. Fazendo isso conseguiremos entender melhor os espíritos ou entidades que se manifestam em alguns terreiros ou templos que em outros não, como os Cangaceiros que se manifestam nos terreiros do nordeste, porém nos do sudeste e sul não se tem registro, com exceção de São Paulo que tem uma gama de terreiro onde essas entidades se manifestam. Poderemos entender as heranças na construção das casas de Umbanda, que tem características de Candomblé, Jurema, Kardecismo entre outras, mas temos também entender qual a concepção de Umbanda para os terreiros que afirmam ser de Umbanda, mas tem características de outros cultos. Seria mesmo Umbanda ou simplesmente uma variante de outro culto com interesses próprios de quem está dirigindo a casa? A Umbanda tem sim uma identidade, que é justamente
essa
democracia,
não
se
tem
preconceito com outras religiões e está sempre aberta a novos encontros e casamentos. A Umbanda tem sua identidade fixada na sociedade como democrática. Ela é uma fonte quase inesgotável de culturas, pois está em constante transformação,
absorvendo
novos
traços
e
informações. Não importa as variações que ela apresenta e sim a sua doutrina, que é trabalhar com os espíritos para o amor, a caridade e a humildade em prol da humanidade. Saravá, Axé! Marcelo Soares é licenciado em História pelas Faculdades Integradas Simonsen.
Bibliografia. AZEVEDO, Janaína, Tudo o que você precisa saber sobre a Umbanda, São Paulo, Universo dos livros, 2010. BARTH, Fedrick, O guru, o iniciador e outras variações antropológicas, Rio de Janeiro, UFPB, 2000. CALAINHO, Daniela Buono, Feitiços e feiticeiros, História do Brasil para ocupados (organização Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2013. FERREIRA, Marieta de Moraes e AMADO, Janaína, Usos e abusos da história oral, Rio de Janeiro, FGV, 2006. GIUMBELLI, Emerson, Kardec entre nós, História do Brasil para ocupados (organização Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2013. HOORNAERT, Eduardo, Formação do catolicismo brasileiro 1550-1880, Petrópolis, Vozes, 1974. PRESTES, Miriam, Umbanda: crença, saber e prática, Rio de Janeiro, Pallas Editora e Distribuidoras, 2010. REIS, José João, Candomblé para todos, História do Brasil para ocupados (organização Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2013. VAINFAS, Ronaldo, Os protagonistas anônimos da História, Rio de Janeiro, Campus/Elsevier, 2002. ___________________, Exército de Cristo, História do Brasil para ocupados (organização Luciano Figueiredo), Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2013.
Documentários e Programas de Umbanda: ALUNOS, Comunicação Social, Brasilidade e Identidades, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2014. CORTEZ. Gabriel, ROSICA. Jaime, BORGES. Maitê e NETO. Solon, Umbanda é Brasil, Bauru, UNESP, 2014. COUTINHO, Cleginaldo. No universo da Umbanda, Set Filmes, Programa Recontar, TV Assembleia, Teresina Piauí, 2013. FOSALUSA, Felipe, A Religião Brasileira, Santos, Camaleão Produções Audiovisuais, 2013 FREITAS, Juremeiro. Palestra Jurema Sagrada, TV Despertar, Natal Rio Grande do Norte, 2013. OGIYAN, Pai Rivas de, Umbanda Esotérica, Santos, TUO, 2014. OLVEIRA, Alexandre B, Entidades de Umbanda
“Enfeixados”, Tenda de Umbanda Caboclo “7 Pena Azul”, Cosmópolis, 2015. PACHECO, Luca. Umbanda, Observatório Transdiciplinar das Religiões do Recife, Universidade Católica de Pernambuco, 2010. PEIXOTO, Norberto, Umbanda Linha dos Marinheiros, Porto Alegre, Grupo de Umbanda Triângulo da Fraternidade, 2013. SEVERINO, Nilton Luiz, Tipos de Umbanda, Programa Umbanda de Boa, São João da Boa Vista, 2014. TOLENTINO, Suyanne. Religare Umbanda Sagrada, Grupo Independente, Curitiba, 2011.