O5 Ética e Responsabilidade Social Setembro 2013 | Revista Gratuita
“Torna-te na mudança que queres ver no mundo.” Gandhi
O5 FICHA TÉCNICA Director e Editor Alves Jana jalvesjana@gmail.com Publicidade 968 404 380 Designer Clara Jana clarajana.design@gmail.com Redacção R. 5 de Outubro, 423 2200-371 ABRANTES Periodicidade Trimestral Registo na E.R.C. 126186
Í N DICE 002
Apresentação
004
Entrevista – Onésimo T. Almeida
014
Comentário à entrevista
018
TEMA
Ética, Alves Jana
021
Ética, Mário Pissarra
029
Ética, Luis Barbosa
034
Livro: Utopias em Dói Menor
037 040
Notícias
nº05 APRESENTAÇÃO
Dois factos significativos. Um: até há pouco tempo, a Ética era apresentada na opinião pública dominante como um vestígio obsoleto do passado, uma herança arqueológica de que era urgente desembaraçarmo-nos. E foram feitos inúmeros esforços para passar da opinião à acção consequente. E com consequências. Dois: hoje, neste tempo de crise, a opinião pública dominante avalia o que se passa em termos sobretudo éticos: corrupção, falta de vergonha, despudor, roubo, e assim sucessivamente. E a acusação de que muitos “donos” do mundo e do país se estão a aproveitar da crise para maximizar os lucros e subjugar aqueles que ficaram sem defesas. Afinal em que ficamos? Por outro lado, podemos olhar à nossa volta através das lentes da parábola evangélica do “bom samaritano” e darmo-nos conta de como há imensas pessoas, famílias e mesmo empresas que estão abandonadas na valeta, “espancadas” pela agressão por parte de poderes por quem parece que ninguém responde. Afinal, como é? O tema desta edição é apenas um pequeno contributo para a reflexão a haver neste campo. Que precisa de ser (re)pensado. E acreditamos que a filosofia tem uma palavra a dizer, uma palavra que precisa de ser dita. No mundo. No mundo, tanto universitário a partir da Brown, como no mundo da cultura portuguesa, tem feito ouvir a sua voz Onésimo Teotónio Almeida, que entrevistamos com todo o gosto. E de que fazemos a apresentação da obra-síntese do seu percurso. No mundo também, está a actuar, dentro das suas possibilidades, o Clube de Filosofia Al-Mu’tamid, que se reúne na Mesquita de Lisboa. Que clube é esse? Bem, tudo isto – e não só – está aqui, nesta edição, para descobrir. Vamos a isso. alves jana
ONÉSIMO T. ALMEIDA
O ALUNO EM PORTUGAL CHEGA À UNIVERSIDADE JÁ DEMASIADO PASSIVO. NÃO LÊ MUITO E NÃO TRABALHA BASTANTE NAS AULAS NEM FAZ INVESTIGAÇÃO OU TRABALHOS EM CASA RELACIONADOS COM A SUA APRENDIZAGEM. POR ALVES JANA
ONÉSIMO TEOTÓNIO ALMEIDA NASCIMENTO: 18 DE DEZEMBRO DE 1946 NATURALIDADE: PICO DA PEDRA, S. MIGUEL, AÇORES BACHARELATO: 1972, NA UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA MESTRADO (1977) E DOUTORAMENTO (1980) NO DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA DA BROWN UNIVERSITY (PROVIDENCE, RHODE ISLAND). ACTIVIDADE: PROFESSOR CATEDRÁTICO NO DEPARTAMENTO DE ESTUDOS PORTUGUESES E BRASILEIROS NA BROWN UNIVERSITY (PROVIDENCE, RHODE ISLAND) E NO WAYLAND COLLEGIUM FOR LIBERAL LEARNING, TAMBÉM DA BROWN UNIVERSITY, ONDE LECCIONA A CADEIRA THE SHAPING OF WORLDVIEWS. ||||||||||||||FILOSOFalando
O4
NO RECENTE LIVRO UTOPIAS EM DÓI MENOR (GRADIVA, 2012), UMA LONGA ENTREVISTA SUA A JOÃO MAURÍCIO BRÁS, APARECE COM PARTICULAR NITIDEZ O FILÓSOFO PROFISSIONAL ONÉSIMO TEOTÓNIO ALMEIDA. ATÉ ENTÃO ERA VISÍVEL ENTRE NÓS SOBRETUDO O CRONISTA, O COMUNICADOR EM ENCONTROS E CONGRESSOS SOBRETUDO DE TEMÁTICA LITERÁRIA. E QUEM TINHA O PRIVILÉGIO DO CONVÍVIO DIRECTO FALA DO EXÍMIO CONTADOR DE ANEDOTAS. NA VERDADE, ESTES ÚLTIMOS ONÉSIMOS NÃO SÃO UMA OUTRA FACETA DO MESMO FILÓSOFO? Espero bem que sim. Não me canso de dizer que não tenho nada em comum com o desdobramento pessoano em personalidades diferentes. Repito à exaustão que se trata de uma questão de roupagens: podemos estar de smoking, de fato e gravata, em traje de passeio, em calção, ou mesmo nus, e nem por isso deixamos (eu, pelo menos) de ser a mesma pessoa. Digo das minhas crónicas que são ensaios abreviados (ensaios em mangas de camisa, escrevi algures) e repito da ficção que se trata de uma maneira de mostrar o real ao vivo em vez de discorrer sobre ele num ensaio. NO REFERIDO LIVRO É NÍTIDA A SUA CRÍTICA AO SISTEMA PORTUGUÊS DO ENSINO SUPERIOR. QUAIS SERIAM AS PRINCIPAIS AQUISIÇÕES EM QUE ESTE DEVERIA INVESTIR PARA MELHORAR? Primeiro do que tudo, devo dizer que a universidade portuguesa de hoje não é a mesma de há quarenta, ou mesmo trinta anos. Transformou-se bastante, se bem que em vários aspectos para pior. Melhorou muito na área das ciências, todavia decaiu bastante na área das Humanidades. E claro que há universidades e universidades. A mais insistente crítica que tenho feito transcende a própria universidade. O aluno em Portugal chega à universidade já demasiado passivo. Não lê muito e não trabalha bastante nas aulas nem faz investigação ou trabalhos em casa relacionados com a sua aprendizagem. É ainda hoje objecto de um ensino – repita-se o
||||||||||||||FILOSOFalando
O5
adjectivo - muito passivo (não estou a referirme às ciências). E obviamente estou a comparar com as universidades que conheço melhor, as norte-americanas (o que inclui as canadianas), pois estas insistem muito na aquisição de capacidades que podem ser utilizadas em áreas diversas e no desenvolvimento de um espírito crítico, em vez da mera acumulação de conhecimentos eruditos. SE UM ALUNO PORTUGUÊS DE FILOSOFIA FOSSE PARA OS EUA CONTINUAR OS ESTUDOS, QUE CHOQUE(S) TERIA? Primeiro, o da língua. Porque mesmo que se considere falante de “direito natural”, precisa conhecer-lhe os recantos e as nuances para poder entrar nos meandros da argumentação filosófica. Depois, o conhecimento da tradição anglo-americana, que entronca na Grécia clássica mas após Kant passa decididamente para os autores e questões surgidas a partir do empirismo inglês (com algumas excepções). Depois, ainda, o reconhecimento da importância do contacto directo com os autores. Muito mais do que exposições, as aulas são um debate crítico sobre as obras lidas. Finalmente, a intensidade e tipo de escrita. A escrita é um elemento essencial da aprendizagem norteamericana. Os alunos têm de escrever muito (acredita-se que o melhor debate filosófico é feito por escrito) e a escrita é muito rigorosa e densa. A erudição quase não conta. Pode
A ESCRITA É UM ELEMENTO ESSENCIAL DA APRENDIZAGEM NORTE-AMERICANA. OS ALUNOS TÊM DE ESCREVER MUITO (ACREDITA-SE QUE O MELHOR DEBATE FILOSÓFICO É FEITO POR ESCRITO) E A ESCRITA É MUITO RIGOROSA E DENSA.
lá estar, evidentemente, mas não é apreciada quando supérflua, apenas para decoração ou, pior, exibição. Claro que há alunos portugueses já habituados a esse tipo de ensino, no entanto creio não estar desfocado se disser não serem a regra geral. A FILOSOFIA UNIVERSITÁRIA EM PORTUGAL É CONSIDERADA COMO DEMASIADO ALHEADA DO MUNDO. CONCORDA? Sim, concordo. O sistema universitário não colabora. A divisão das universidades em faculdades estanques e dos próprios cursos também (cada vez menos, mas ainda muito) estanques, é um empecilho. Num sistema como o norte-americano, os alunos de licenciatura podem fazer cursos em departamentos diversos e muitos incluem cadeiras de Filosofia nos seus
reside sobretudo na fama de serem muito exigentes e rigorosos e de disciplinarem a mente ensinando a pensar criticamente. Os alunos das boas universidades não procuram cursos fáceis. Os que são assim considerados, ganham facilmente má reputação entre os alunos, que evitam inscrever-se neles por saberem que isso lhes dá uma má imagem, a de quererem trabalho fácil, ou por acharem que estão sendo tratados com condescendência. Cursos que constituam um desafio intelectual são, em contrapartida, muito procurados. Quanto mais exigentes, maior para eles é o desafio. QUAL O LUGAR OU PAPEL DA FILOSOFIA NA VIDA SOCIAL (EXTRA-ESCOLAR) NOS ESTADOS UNIDOS? Haverá quem diga que não é muito significativo esse papel. Direi, no entanto, que embora muitos
A ATRACÇÃO DOS CURSOS DE FILOSOFIA RESIDE SOBRETUDO NA FAMA DE SEREM MUITO EXIGENTES E RIGOROSOS E DE DISCIPLINAREM A MENTE ENSINANDO A PENSAR CRITICAMENTE. currículos. Por exemplo, os alunos de Direito fazem com frequência cursos de Lógica. Os de Ciências Políticas, Medicina e mesmo Direito fazem cursos de Ética. Alunos de todos os campos frequentam cadeiras de Filosofia da Ciência, Epistemologia, Existencialismo. Há, por isso, uma permeabilidade maior e os problemas filosóficos e, sobretudo, a abordagem filosófica, que é sobretudo crítica, é utilizada e aplicada nas outras disciplinas. DÁ PARA PERCEBER QUE A FILOSOFIA TEM UM OUTRO LUGAR, MAIS TRANSVERSAL, NO ENSINO SUPERIOR AMERICANO. O QUE PROCURAM OS ALUNOS DE OUTROS CURSOS NAS DISCIPLINAS FILOSÓFICAS, ISTO É, QUE QUER A FILOSOFIA FAZER COM ELES? Para muitos alunos, são os problemas filosóficos em si: o do conhecimento; da causalidade, da liberdade versus determinismo, da ética; mas para outros a atracção dos cursos de Filosofia ||||||||||||||FILOSOFalando
O6
problemas filosóficos sejam debatidos apenas nas universidades, não podemos esquecer que os alunos passam vários anos nesse ambiente universitário, assistem a muitas conferências, seminários, colóquios, em que intervêm filósofos, os seus professores participam também, significando isso que nas universidades há uma conversação crítica com a participação de intervenientes das mais diversas disciplinas e os filósofos lá estão. Por isso, a sua influência acaba filtrando-se no discurso colectivo. O mesmo se diga das publicações sob a forma de livros ou revistas. Há, claro, as estritamente destinadas aos especialistas. No entanto, há depois outras em que os debates são alargados e os participantes vêm de quadrantes diversos. E há publicações como a New York Review of Books, que pretende dirigir-se a leitores com uma educação média de doutoramento. Nela surgem artigos sobre todas as disciplinas, gerando-se assim uma osmose intelectual de influência mútua.
Dir-se-á que tudo isso só toca as elites. Pois é verdade, mas está tudo aberto a todos e nessa pirâmide surgem depois planos intermédios com menos exigência mas com igual transversalidade. Acrescentarei que uma área da Filosofia que interessa a um público bastante vasto é a da Ética. As questões éticas são debatidas a variadíssimos níveis em todas as áreas do saber.
QUAIS SÃO OS FILÓSOFOS QUE NOS USA MAIS PARTICIPAM DA VIDA PÚBLICA? QUAIS OS TEMAS OU DEBATES DE QUE OS FILÓSOFOS MAIS PARTICIPAM FORA DO MEIO ACADÉMICO? E SÃO CHAMADOS A PARTICIPAR OU “METEM-SE” NO ASSUNTO? É uma pergunta difícil de responder. Eles são tantos, e variadas bastante são as maneiras de participar na vida pública. Há algum tempo em Portugal, quando se falava em filósofos americanos, só se mencionava Richard Rorty. Grande filósofo, sem dúvida, estava, todavia, longe de ser único e sobretudo de ser o mais influente entre os seus pares. Tinha, na verdade, um grande público no mundo das Letras e Humanidades e até deixou de ensinar num Departamento de Filosofia indo para outro de Literatura Comparada. Poderia pôrme aqui a mencionar nomes atrás de nomes, contudo devo primeiro dizer que não existe hoje, nem sequer na Europa, o tipo de filósofo que Sartre representava em expoente máximo e que discorria sobre tudo. No mundo angloamericano, esse tipo de “intelectual público” não existe, pelo menos com aquela áurea de outros tempos. Houve, é claro, Bertrand Russell, mas mesmo esse era um caso diferente e até isolado. Por isso, há que falar-se em áreas. Sei que em Portugal Peter Singer é nome muito conhecido por causa do seu trabalho em Ética, sobretudo no que respeita a defesa de direitos dos animais. Aqui, ele também é muito influente. Depois, no Direito, por exemplo, faleceu há meses Ronald Dworkin, uma figura de grande prestígio graças aos seus livros sobre direitos. Na área das ciências cognitivas (e não só),
||||||||||||||FILOSOFalando
O7
há Daniel Dennett. Na Ética e na Literatura, Martha Nussbaum, que durante muitos anos foi professora aqui na Brown, publica imenso, colaborando regularmente na New York Review of Books, onde escrevem habitualmente os outrora chamados public intelectuals. Mas há ainda John Searle, Thomas Nagel, John Rawls, este último falecido e, além disso, alguém que aparecia pouco em público, mas cuja obra ainda hoje tem uma influência extraordinária na Ética e na Teoria Política. Um acutilante interventor é Colin McGinn, quando aparece a fazer uma crítica a um livro na New York Review of Books, é de se não perder. E só estou a mencionar alguns. A American Philosophical Association tem mais de 8 000 membros e muitos deles são intervenientes a diversos níveis, quer a nível regional quer nacional. Publica-se muitos livros de filosofia não propriamente fechada sobre si, mas sobre problemas reais. Ou quando não se trata de livros tecnicamente de filosofia são obras que passaram pela análise crítica de gente com formação filosófica. Entre os filósofos norte-americanos hoje publicados em Portugal está Saul Kripke, todavia ele não é um filósofo com grande intervenção social, o tema desta entrevista. Como o não são W.V. Quine, Donald Davidson, Wilfrid Sellars, ou Roderick Chisholm, meu professor, grandes nomes da filosofia do século XX nos EUA. Hesito também na referência a Noam Chomsky porque ele de facto é um linguista e não propriamente um filósofo, tornado famoso fora da disciplina pelas suas posições políticas e frequente intervenção pública. Embora muito do seu trabalho em linguística ande nas fronteiras da filosofia, a sua abordagem é a de um cientista da língua. UMA DAS PRESENÇAS, VISTAS DAQUI, DA FILOSOFIA FORA DA ESCOLA NOS EUA É A REPRESENTADA POR LOU MARINOFF. OUTRA DAS “NOVIDADES” É A FILOSOFIA PARA OU COM CRIANÇAS, NA PERSPECTIVA DE MATTHEW LIPMAN. SÃO FORMAS DE ACTIVIDADE FILOSÓFICA CUJOS ECOS CHEGAM ATÉ NÓS. QUE ACOLHIMENTO TÊM
NOS EUA? E O QUE PENSA ONÉSIMO DELAS, SE É QUE TEM DELAS CONHECIMENTO. Iniciativas como estas e outras do género têm muitos adeptos nas boas escolas. Não posso dizer quantas, mas as escolas enfatizam muito o desenvolvimento do pensamento crítico nas crianças e projectos deste tipo são óptimos auxiliares que muitas instituições e sistemas escolares tornam disponíveis e encorajam os professores a usarem. Note que os sistemas escolares nos EUA são completamente independentes. Cada estado tem o seu e cada escola privada decide qual deve ser o seu. Os pais constituem um enorme factor de decisão em matéria de currículos. QUE OUTRAS PROFISSIONALIDADES FILOSÓFICAS NÃO-DOCENTES PODEMOS ENCONTRAR NOS EUA? O QUE PENSA DELAS? Acho que responderei razoavelmente a esta pergunta se mencionar os blogues dedicados a questões filosóficas, alguns imensamente lidos e participados. Eles são um excelente exemplo da actividade de divulgação filosófica e de intervenção dos filósofos na conversação colectiva. Por exemplo, o New York Times mantem um blogue – The Stone - onde sobretudo filósofos, mas também outros intelectuais, publicam regularmente, em linguagem clara e incisiva, artigos sobre grandes temas e que provocam magníficos debates (http://opinionator.blogs.nytimes.com/category/ the-stone/). Public Reason é outro com bastantes leitores e dedica-se especialmente à filosofia política (http://publicreason.net). PEA Soup trata habitualmente de questões de filosofia moral, ou ética aplicada (http://peasoup.typepad.com). Outro muito lido é Philosophy Commons, aberto a questões diversas (http://philosophycommons. typepad.com). Há um filósofo muito popular, Peter Ludlow, que mantem um vivíssimo e altamente informativo blogue: Leiter Reports
||||||||||||||FILOSOFalando
O8
(http://leiterreports.typepad.com). Mas há muitos mais. Tudo isso são maneiras contemporâneas de levar o debate filosófico ao grande público e de contribuir para elevar o nível da conversação nacional. SE EXISTEM, QUE RELAÇÃO TÊM COM O ENSINO DA FILOSOFIA NA UNIVERSIDADE? Não posso generalizar. Muitos desses blogues são de professores, contudo há-os também de antigos estudantes de Filosofia que seguiram outros rumos e até de alunos de Filosofia. Philosophy, et cetera é de um estudante e tem uma enorme audiência. Toca uma miríade de problemas filosóficos. (http://www.philosophyetc. net). A universidade não é a única depositária da Filosofia. Há, aliás, muitos blogues dedicados à Filosofia liderados por não-universitários, todavia o problema é a dificuldade de se separar o trigo do joio. A blogosfera permite todo o tipo de charlatanice. Um exemplo de um blogue nãoacadémico e de grande qualidade é Think Tonk (http://claytonlittlejohn.blogspot.com) UMA DAS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS É A (QUASE) UNIVERSALIDADE DA FILOSOFIA PARA QUANTOS FREQUENTAM O ENSINO
A UNIVERSIDADE NÃO É A ÚNICA DEPOSITÁRIA DA FILOSOFIA.
SECUNDÁRIO. ISSO SIGNIFICA QUE TEMOS UMA BOA LITERACIA FILOSÓFICA? Não, porque infelizmente os professores do ensino secundário foram formados na antiga escola da erudição e por vezes ensinam Filosofia sem eles próprios saberem bem o que ensinam. Os alunos aprendem uma série de chavões, adquirem material para umas bocas que impressionam e lhes dão uns ares eruditos. Normalmente não lêem os autores e, quando o fazem, é apenas a leitura de alguns excertos. Se calhar estou profundamente desinformado mas, nos contactos que venho mantendo, é essa a impressão com que tenho ficado. Há, no entanto, experiências muito interessantes de professores inovadores em escolas que primam por se abrir e por os apoiar.
ser por esse nome. Os alunos treinados assim nas escolas quando chegam à universidade levam consigo uma utensilagem preciosa que lhes servirá em todas as disciplinas. E poderão aprofundar então alguns dos problemas com que se depararam nas aulas de Filosofia propriamente ditas. Mas não só aí. HÁ UMA DISCIPLINA FUNDAMENTAL NO ENSINO SECUNDÁRIO QUE TEM SIDO PESSIMAMENTE DESCURADA EM PORTUGAL: O DA LÍNGUA PORTUGUESA. SEM UM BOM CONHECIMENTO DA LÍNGUA, NADA FEITO, MUITO MENOS EM FILOSOFIA Portugal é um meio muito pequeno e pôr-me aqui a mencionar nomes só causará melindres. Devo porém referir um blogue onde com frequência
HÁ UMA DISCIPLINA FUNDAMENTAL NO ENSINO SECUNDÁRIO QUE TEM SIDO PESSIMAMENTE DESCURADA EM PORTUGAL: O DA LÍNGUA PORTUGUESA. SEM UM BOM CONHECIMENTO DA LÍNGUA, NADA FEITO, MUITO MENOS EM FILOSOFIA EM SÍNTESE, QUAL PODE OU DEVE SER O PAPEL DA FILOSOFIA NA AGORA CONTEMPORÂNEA, NO ESPAÇO PÚBLICO ACTUAL? E DE QUE MODOS? Creio que fica depreendido do que atrás disse. Há uma disciplina fundamental no ensino secundário que tem sido pessimamente descurada em Portugal: o da língua portuguesa. Sem um bom conhecimento da língua, nada feito, muito menos em Filosofia. Essa é a primeira grande falha desse erro de se deixar de ensiná-la para se passar a leccionar isso que se chama de Comunicação. Nenhum ensino decente nas Humanidades se consegue sem um bom domínio da língua. Depois, a Filosofia pode e deve ser um grande meio de ensinar os alunos a pensar. Há belíssimos livros que fazem isso, que filtram questões filosóficas na cabeça dos alunos. O termo “filosofia” afugenta muitos e, na verdade, há hoje maneiras de se ensinar a pensar criticamente no ensino secundário sem ||||||||||||||FILOSOFalando
O9
aparecem questões de filosofia e há muita discussão de ideias, sendo mantido por um bom leque de pessoas. Trata-se do De Rerum Natura. Procuro segui-lo regularmente e leio com gosto muitos dos textos que lá surgem. Seria indecente não mencionar um português ausente (vive e trabalha nos EUA) que não é propriamente um filósofo, mas que tem escrito bastante sobre questões filosóficas. Estou a referir-me obviamente a António Damásio. Há um professor de Filosofia que vem intervindo muito no debate público. Trata-se de Viriato Soromenho Marques. Tem uma grande capacidade de comunicar claramente as suas ideias. O mesmo acontece com Desidério Murcho, este cingindo-se sobretudo a temas mais estritamente filosóficos embora também com grande clareza. Mas, como disse, estou certamente a deixar atrás pessoas que deveria referir. Porque há, evidentemente, Miguel Real, um prodígio de conhecimento do que se tem escrito em Portugal em matéria de
HOJE EM PORTUGAL NÃO EXISTE MAIS O MEIO “LITERÁRIO” DAQUELE TEMPO EM QUE OS INTELECTUAIS SE EMBRENHAVAM EM ACESOS DEBATES, SE BEM QUE SOBRETUDO DE ORDEM ESTÉTICOPOLÍTICA ||||||||||||||FILOSOFalando
10
Filosofia e ele próprio um grande pensador. E há, evidentemente, Eduardo Lourenço, outra máquina pensante que veio da Filosofia. Pois aí está um exemplo de como alguém da Filosofia foi capaz de exercer uma importantíssima influência no pensamento em Portugal. Repito: estou a obliterar gente injustamente. Até porque há depois académicos muito bons sem expressão entre o grande público mas que têm publicado obra de qualidade. Conheço alguns e admiro-os. Faleceu recentemente um grande mestre meu, José Enes, um filósofo nato e de grande calibre. Publicou uma obra que não é para massas, mas mesmo os académicos não estabeleceram diálogo com ele. Infelizmente. O único estudo sobre a sua obra magna foi levado a cabo por Miguel Real poucos anos antes de José Enes falecer. Em vida dele, só ouviu silêncio. A ESSA MESMA DISTÂNCIA, DE UM OCEANO, OUVIU ECOS DE ALGUM DEBATE FILOSÓFICO EM PORTUGAL NOS ÚLTIMOS ANOS? QUE RETRATO FAZ? Na resposta anterior acabei entrando já na resposta já no domínio desta pergunta. Nos últimos anos não me tenho apercebido de debates filosóficos. Publiquei por exemplo o meu De Marx a Darwin – a desconfiança das ideologias em 2009 e o livro não provocou debate nenhum, muito embora tivesse recebido um prémio. Publiquei também há quase um ano Utopias em dói Menor, uma conversa com o filósofo João Maurício Brás, livro que me parece imensamente claro. E todavia não se lhe seguiu nenhum debate. Se recuar uns anos, só encontro debates políticos e, mais atrás, alguns estéticos. Houve, em tempos, um debate sobre a Filosofia Portuguesa. Escrevi sobre o assunto um longo ensaio em 1985. Moita. Nem uma palavrinha sobre ele. Hoje em Portugal não existe mais o meio “literário” daquele tempo em que os intelectuais se embrenhavam em acesos debates, se bem que sobretudo de ordem estético-política.
SEGUNDO OS SEUS TEXTOS, O “ALUNO AMERICANO” ESTUDA MUITO, LÊ IMENSO, APRENDE DESDE CEDO A SER INTELIGENTE. NO ENTANTO, OS AMERICANOS TÊM UMA FAMA QUE VAI EM SENTIDO CONTRÁRIO. “E HÁ VIDA INTELECTUAL AQUI?”, CONTA ONÉSIMO QUE UM INTELECTUAL PORTUGUÊS TERÁ PERGUNTADO. MAS A VERDADE ESTATÍSTICA, AO QUE PARECE, É QUE 10% DOS AMERICANOS NÃO ACREDITAM QUE “O HOMEM” TENHA IDO À LUA. E O CRIACIONISMO ENCONTRA NOS EUA UM CHÃO FÉRTIL. E A TEORIA DA CONSPIRAÇÃO TEM MAIS FORMAS QUE OS COGUMELOS. DIZ-SE TAMBÉM QUE OS EUA TÊM AS MELHORES UNIVERSIDADES, MAS TAMBÉM AS PIORES. QUAL É O PANORAMA? É exactamente esse. As sociedades são assim – piramidais. As democracias liberais não conseguem impor modelos igualitários e, infelizmente, muita da igualitarização acontece por baixo, isto é, baixando-se o nível. Daí que as sociedades modernas, sob o perigo de serem acusadas de favorecer elitismos, tenham de criar espaços para aquelas pessoas que querem passar além da mediania, ou mesmo muito além dela. Não é toda a gente que a tal aspira e não se pode impedir que lá cheguem os que pretendem elevar um pouco o seu nível intelectual e o nível dos que estão à sua volta. São essas elites (sim, eu escrevi “elites”) que conseguem segurar algumas das importantes estruturas de que as sociedades necessitam para se manterem estáveis e se desenvolverem. Nem toda a gente tem vocação para a filosofia, nem toda a gente tem vocação universitária, há muitas maneiras de ser culto e intelectualmente evoluído. E há muita gente que não se importa
nada de ficar pela mediania como há outra ainda que até a mediania despreza. Uma vez mais, nada disso deve obstar a que se assegure o espaço de liberdade para quem quiser ultrapassar essa dita mediania. Quanto a alegadas aberrações, elas existem em toda a parte, mas provavelmente com mais razão num país do tamanho de um continente habitado pelos mais heterogéneos representantes da espécie (zoológica...) humana. PARECE EVIDENTE, VISTA DE CÁ, QUE A VIDA POLÍTICA DOS CIDADÃOS AMERICANOS É SUBSTANCIALMENTE DIFERENTE DA DOS PORTUGUESES. CERTO? EM QUE SENTIDO, NOMEADAMENTE NA SUA RELAÇÃO COM O PODER? Nos EUA o poder político tem uma base local muito forte. É verdade que depois os lobbies dos grandes grupos de interesses conseguem atraí-lo e de algum modo manobrá-lo, mas nunca totalmente. É mais difícil um político aguentarse na carreira se não cumpre o essencial dos objectivos anunciados na sua campanha porque os cidadãos seguem-lhe o rasto e sabem em que causas vota e como. Em Portugal, as máquinas partidárias são muito fortes e a base local é bastante fraca. Depois, há nos EUA uma grande tradição de grassroots, movimentos a partir da base que seguem os canais legítimos e acessíveis a todos para lutarem denodadamente pelas causas em que acreditam e se empenham. Isso é muitas vezes feito à margem dos partidos e contra os próprios partidos. Está obviamente longe de ser um regime perfeito e tem problemas gravíssimos como têm todas as democracias. Creio, porém que a vastíssima maioria não está
NEM TODA A GENTE TEM VOCAÇÃO PARA A FILOSOFIA, NEM TODA A GENTE TEM VOCAÇÃO UNIVERSITÁRIA, HÁ MUITAS MANEIRAS DE SER CULTO E INTELECTUALMENTE EVOLUÍDO. E HÁ MUITA GENTE QUE NÃO SE IMPORTA NADA DE FICAR PELA MEDIANIA COMO HÁ OUTRA AINDA QUE ATÉ A MEDIANIA DESPREZA.
PARA TERMINAR, SE PUDER SER: Contacto via mail (para divulgar): onesimo_almeida@brown.edu
disposta a tentar nem o comunismo (nem mesmo à la China), nem as ditaduras para-religiosas à la regimes islâmicos. E AGORA, NUMA PERSPECTIVA MAIS PESSOAL. QUAIS OS PROBLEMAS FILOSÓFICOS QUE AGORA MAIS O OCUPAM? Os mesmos de sempre e sobre que sempre tenho escrito. Domina-me uma incontrolada vontade de ler sobre tudo e nem em Filosofia isso é possível. Direi que a questão dos valores continua a ser central para mim mais as consequências éticas da pluralidade de valores em que vivemos. A nível mais pessoal, a questão das mundividências continua a fascinar-me. Mas ela não pode ser estudada apenas através da Filosofia. É decididamente interdisciplinar. COMO CONSEGUE CONCILIAR AS AULAS, AS CONFERÊNCIAS, OS ESCRITOS, OS PROGRAMAS DE RÁDIO E TELEVISÃO, AS VIAGENS, E CERTAMENTE A FAMÍLIA? COMO É O SEU DIA NORMAL? Não consigo. VOU FAZENDO O QUE POSSO. COM MUITA ORGANIZAÇÃO, PARA EVITAR OS EXAGEROS DAS NATURAIS DISPERSÕES. Tenho cada vez mais a noção dos limites e a consciência de que a maior parte daquilo que eu pensei que poderia ler não chegarei a fazêlo. Para não falar do resto. A vida é demasiado curta, o que há a aprender é incomensurável. Todavia aprender é um fascínio que me tem acompanhado toda a vida. Ah! A família? Foi sempre para mim uma prioridade. Acho que os meus filhos concordarão nisso. Primum vivere, deinde philosophari, aprendi eu muito cedo (espero que não me passem o “i” de philosophari para “e”, porque se trata de um verbo depoente). As viagens? Têm sido uma grande fonte de aprendizagem. Nem só de livros vive o filósofo. E eu nem me considero filósofo. Fui sempre um estudante de Filosofia. Um viajante.
||||||||||||||FILOSOFalando
12
Lugar na internet onde pode ser encontrado: https://research.brown.edu/research/profile.php?id=1143144017 http://pt.wikipedia.org/wiki/Onésimo_Teotónio_Almeida http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/onesimo.htm http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/artigo10481.PDF http://www.ellipsis-apsa.com/pdfs/pdf_vol6/ellipsisV6RothwellOnesimo.pdf http://malomil.blogspot.pt/search/label/Onésimo%20 Teotónio%20de%20Almeida ALGUMA BIBLIOGRAFIA FILOSÓFICA EM PORTUGAL: De Marx a Darwin: a desconfiança das ideologias, Gradiva, 2009. Utopias em dói menor: conversas transatlânticas com Onésimo, Gradiva, 2012. Pessoa, Portugal e o Futuro (Lisboa: Gradiva, a sair em Novembro) “Filosofia portuguesa – Alguns equívocos”, Cultura–História e Filosofia, Vol. IV. (1985), pp. 219-255. “Modernidade, pós-modernidade e outras nublosidades”, Cultura História e Filosofia 22 (2006), pp. 49-69. “Marx e a ideologia - ou a ideologia em Marx”, Arquipélago/ Ciências Sociais, no. 7-8 (1992-93), pp. 135-161. “Da inevitabilidade da ética e do imperativo dialógico entre alternativas”, Revista de Comunicação e Linguagens, 15/16 (1992) 51-60. “Francisco Sanches: o “elo perdido’ entre os descobrimentos e a ciência moderna”, Cultura – Revista de História e Teoria das Ideias, Vol. XII, 2nd series (Spring 2001), pp. 221-229. “Ideologia – Revistação de um Conceito”, Revista de Comunicação e Linguagens, Número especial “Comunicação e Política”, nº 2122 (1995), pp. 69-79. “José Enes e a autonomia da arte: uma injustamente tardia revisitação”, In J. L. Brandão da Luz, ed., Caminhos do Pensamento. Estudos em Homenagem ao Professor José Enes”(Lisboa: Edições Colibri / Universidade dos Açores, 2006), pp. 29-42. Para além das obras em livro, tem centenas de escritos em revistas e livros colectivos. Fundou e dirige a editora GáveaBrown, dedicada à edição em inglês de obras de literatura e cultura portuguesas, que edita também a revista Gávea-Brown – a Bilingual Journal of Portuguese American Letters and Studies, que ele fundou e co-dirige. É co-editor do e-Journal of Portuguese History e de Pessoa Plural, ambas revistas electrónicas editadas em cooperação internacional e publicadas na Brown University. Desde 1979 mantém um programa bimensal no Portuguese Channel, de New Bedford, Massachusetts, e durante dois anos manteve um programa semanal – “Onésimo à conversa com…” – na RTP Açores. Foi colaborador regular n’ O Jornal e no Diário de Notícias. É colaborador regular na revista LER, na PNETLiteratura e no Jornal de Letras. Entre as organizações a que pertence, é membro da direcção da PALCUS – Portuguese-American Leadership Council of the United States. Foi Vice-Presidente do Rhode Island Council for the Humanities e da Associação Internacional de Lusitanistas. Foi agraciado pela Presidência da República com o grau de Oficial da Ordem do Infante. Foi eleito Membro da Academia Internacional de Cultura Portuguesa e da Academia da Marinha.
COMENTÁRIO À ENTREVISTA
A entrevista de Onésimo T. Almeida foi lida pelo seu amigo, José Henrique Silveira de Brito, professor de Ética na Universidade Católica de Braga, que lhe enviou um comentário. Não um comentário académico, mas uma reacção imediata e amiga, após uma leitura despreocupada mas atenta, expressão de uma camaradagem intelectual que merece ser reconhecida. Pedida autorização para a sua divulgação, e dada, aqui vai, como segue o… ||||||||||||||FILOSOFalando
Gostei do seu conteúdo, porque chama a atenção para alguns problemas que me preocupam e para os quais vai demorar a aparecer solução. Primeira questão, que é de base, o ensino do português. Enquanto os alunos não aprenderem bem a ler e escrever, não há nada a fazer e nunca sairemos da cepa torta. Agora nota-se uma preocupação das instâncias governamentais com a ciência. Acho muito importante uma boa educação científica, mas se os jovens não souberem ler e escrever, será essa educação possível? Como é evidente, não! E sobre a importância da ciência: recordome de uma conversa que tive com Adela Cortina. A filósofa perguntou-me pela Filosofia em Portugal. Respondi-lhe que na comunicação social e no discurso do Governo só se falava de ciência e tecnologia; ela comentou: mas eles ainda não repararam que os países ricos têm Filosofia? Como sabes, ao longo da escolaridade obrigatória há escritores que são de leitura obrigatória, o que à partida deveria ter
SERIA INTERESS TEMAS FILOSÓFIC AS PRINCIPAIS E
diversas formulações do imperativo categórico, sem perceberem o que estão a dizer. Houve uma altura em que o Professor Roque Cabral, como sabes professor jubilado da minha Faculdade, era convidado para fazer conferências sobre o ensino da Filosofia no ensino secundário. Ao falar da importância da Filosofia para ensinar a pensar, ele chamava a atenção para países, como a Inglaterra, que não têm a disciplina de Filosofia no liceu e não é por isso que os alunos deixam de aprender a pensar. Referia, por exemplo, que estudar História e Literatura permitem alcançar o mesmo objectivo, e dizia que estudar Shakespeare era uma óptima Introdução à Filosofia. Claro que isto não era dito numa linguagem de 2 X 2 = 4, mas era muito perceptível. consequências na aprendizagem do português. Pelo que vou constatando, grande parte dos alunos não lêem as obras, mas resumos apresentados em livrinhos pedagógicos. Os que efectivamente lêem, normalmente não apreciam, porque o modo como as obras são dadas, não ajuda nada ao prazer da leitura. Outro cancro do nosso ensino é o plágio. Para além da cópia pura e simples, é frequente, tanto quanto sei, os alunos pedirem a professores amigos da família para lhes fazerem trabalhos pedidos na escola, e esses professores fazem esses trabalhos, ou pedem a outros. Anda meio mundo a enganar o outro meio! Sobre o ensino da Filosofia. Quando estava ligado à formação de professores, costumava dizer que alguns docentes vacinavam os alunos contra a filosofia com uma eficácia absoluta. O ensino era de tal maneira motivador que, terminadas as aulas, os alunos deviam dizer para si mesmos: filosofia? Nunca mais! Na leccionação, não se procura que os alunos compreendam as problemáticas, pelo que, dadas as matérias, os alunos ficam a papaguear o que o professor disse. Imagina Kant, não há a preocupação de mostrar aos alunos o contexto cultural com que Kant se confrontou, quer no campo do conhecimento científico, quer no contexto da moral. Depois temos os alunos a papaguear as categorias e a declinar as ||||||||||||||FILOSOFalando
14
Há uns anos houve uma enorme polémica em torno da Filosofia no ensino secundário, quando o Ministério da Educação apresentou um programa preparado por uma equipa liderada pelo Manuel Maria Carrilho. A coisa era muito anglo-saxónica e levantou uma celeuma tremenda. A larguíssima maioria dos professores em funções não dominava aquele pensamento. O Ministério resolveu encomendar outro programa a uma equipa a que esteve ligado o Professor José Enes. Nesse programa, no 12º ano os alunos tinham que estudar 3 obras de períodos históricos diferentes. Quando o programa apareceu no Conselho Científico da minha Faculdade, para nos pronunciarmos, eu disse uma coisa que me parece chocou vários colegas. Afirmei que o programa
Para não me alargar mais, porque isto já vai longo, tu vais marcando a vida cultural portuguesa, o que é ótimo! As pessoas vão-te ouvindo pelo que é muito importante ires preparando a publicação dos teus textos de modo a que fiquem mais acessíveis. Como sabes, não conseguirás sozinho salvar a pátria, mas podes ajudar.
pressupunha que os professores de Filosofia eram filósofos e, em meu entender, na sua larguíssima maioria não era assim, pelo que o programa era um perigo. Nestas coisas de programas, penso que a minha mulher, a Amélia, tinha e tem toda a razão quando, numa comunicação apresentada na Faculdade de Letra da Universidade de Lisboa, disse que não há bom programa que resista a um mau professor, nem mau programa que impeça um bom professor de o ser! O problema está na formação dos professores e não será fácil de resolver. Em quase 50 anos de vida ligada ao ensino já vi imensa coisa e variadíssimas tentativas e as melhorias não têm sido muitas, se é que houve melhorias. A entrevista toca outros pontos centrais da nossa cultura como, por exemplo, o lugar dos filósofos na discussão do espaço público. De acordo com o que dizes sobre o Viriato Soromenho-Marques, que tem feito um trabalho notável nesta área, para além de outras que cultiva. Neste capítulo, a nossa comunicação social não ajuda muito; fazem perguntas de economia a um romancista ou a economistas que se esqueceram de que a economia é uma dimensão humana e, por isso, falam apenas em números, esquecendo-se das pessoas. ||||||||||||||FILOSOFalando
15
não conseguirás sozinho salvar a pátria, mas podes ajudar.
ERA POSSÍVEL SALVAR A SÁ DA COSTA? Não. Já estava condenada há muito tempo. Não foi agora que ela foi condenada, nem foi esse rapazinho que foi para lá antes que estragou aquilo tudo. Foram os clientes. Os clientes que deixaram de ir à Sá da Costa e passaram a ir à Fnac, ao supermercado. Mais ao supermercado, porque a Fnac também vai falir, também há de fechar. Aí sim os editores entregam-se aos supermercados e só vai haver 200 títulos por ano [em vez dos actuais 15.000], que são aqueles que conseguem ter lá. Aí sim, nesse dia os editores ESTÁ A SER IRÓNICO. Não, realista. Eu digo-lhes isto há anos. Dão tiros nos pés. A nós [livreiros] fazem-nos 30 por cento de desconto, a eles fazem 45 por cento. Devia ser o contrário. E depois dizem que os pequenos livreiros não pagam. Desculpa? Pagam, pagam. Mas obrigam-te a pagar a 30 dias, à Fnac é a 180. Isto é tudo uma falsidade incrível. José Pinho, livreiro da Ler Devagar e do projecto de 8 livrarias em Óbidos, em entrevista a Ana Sousa Dias, na Ler, nº 127, Setembro 2013.
(ÉTICA)
1
Logo que o despertador toca, tenho de decidir: levanto-me ou fico? Não me apetece. Na maioria dos dias, levanto-me automaticamente. Mesmo nestes casos, logo que me vejo a levantar posso voltar a deitar-me. Apetece-me ficar no “bem bom”. Que me faz, então, ir à minha vida?
2
Dizem os entendidos que uma pessoa normal toma cerca de 260 escolhas por dia. Penso que são muitas mais, que estamos a decidir a cada momento. Mas sejam, então, 260 escolhas. Escolher é dizer sim a alguma coisa e não a outras. Escolher é sempre “decidir fazer ou não fazer, fazer assim ou de outro modo”. Não podemos não decidir. E da nossa decisão decorre um efeito no mundo. E são os efeitos das nossas acções no mundo que vão configurando o mundo em que vivemos. O mundo de hoje é muito diferente do de há 100 ou 500 ou 1.000 anos. E é-o em resultado da acção dos homens e mulheres no mundo.
3
Há quem defenda que o comportamento humano é determinado pela herança genética e pelas forças sociais em acção na história pessoal e no momento presente. Contudo, o determinismo pode ser uma bela teoria, mas não consegue viver na prática de acordo consigo mesma. Ou seja, podemos ser deterministas na teoria, mas ninguém aceita assumir o determinismo na prática. Uma sociedade que aceitasse reger-se pela tese determinista dissolviase no tempo de um fósforo. Por isso, não há grande mal se aceitarmos que cada ser humano pode decidir e que as suas decisões têm efeitos sobre o mundo.
4 ÉTICA É DECIDIR O MUNDO QUE QUEREMOS ||||||||||||||FILOSOFalando
ALVES JANA
18
Se os seres humanos estivessem determinados, o problema estava resolvido. Como o está para as abelhas e para os cães. Mas, se há escolhas, como escolher? o que escolher? que mundo havemos de fazer? Porque as hipóteses em escolha não são equivalentes. Nem para mim, nem para os outros.
5
mundo queremos? Essa é uma das grandes questões da vida humana.
Ao decidir, eu preciso de saber duas coisas: que efeito tem a minha escolha sobre mim e que me dizem os outros sobre a minha escolha (em virtude do efeito que a minha escolha tem sobre eles).
6
Eu preciso de decidir bem e não posso experimentar tudo antes de saber como decidir bem. Além disso, por mim próprio eu apenas tenho o meu ponto de vista, mesmo assim contraditório. A Ética apresenta-me o ponto de vista dos outros sobre a minha acção. Mesmo do outro que sou eu perante mim próprio. Quantas vezes eu não digo a mim mesmo: já fizeste asneira…
7
Dizem que “Deus morreu”. E mesmo que a notícia tenha sido um tanto exagerada, a secularização vem fazendo o seu funeral. Em sua substituição, a Razão quis ocupar o seu lugar, mas depressa foi denunciada essa pretensão. Essa Razão não era afinal mais que múltiplas razões em conflito, cada uma delas a pretender uma ordem diferente. Outros propuseram como solução o chão raso da natureza: a natureza é que diz como são as coisas, portanto é por elas que devemos decidir. Contudo, as ciências dizem-nos como é o mundo e que mundos são possíveis; a Ética diz-nos o mundo que queremos. As ciências dizem-nos como são as coisas, não podem dizer-nos como deve ser o mundo e a nossa vida nele.
8 9
– Devem ser?!!! Mas não percebeste que já não há deveres? Cada um faz como quer. – Mas, como há-de querer?
O mundo da natureza é o mundo da barbárie. Se não educarmos uma criança, ela fica selvagem. Se não introduzirmos ordem numa sala de aulas, ela não é um lugar de aprendizagem. Se não organizarmos a produção, a empresa vai à falência. Se eu não me entender contigo, acabamos por ir cada um para seu lado. Afinal, hoje apetece-me ficar na cama, porque hei-de levantar-me?
10
Se não há uma ordem transcendente – vinda de Deus ou da Razão –, então tudo é permitido? Sim, se a única fonte de ordem for transcendente. Não, se encontrarmos entre nós um princípio de ordem que nos torne a vida suportável e mesmo desejável, ou seja, melhor que apenas a ordem natural. Porque o problema é este: a natureza garante uma ordem, a ordem natural. Mas os seres humanos querem, precisam, procuram, uma outra ordem, que devemos chamar talvez cultural. Que ordem? Que
||||||||||||||FILOSOFalando
19
11
Saber que ordem, que mundo quero é o primeiro passo. Saber como posso realizar isso que pretendo é outro. O primeiro passo é ético-político. O segundo é técnico. Política sem técnica é vazia; técnica sem política é cega. (Onde é que eu já ouvi isto?)
12
Uma Ética é um projecto de mundo. A Ética é um manual de instruções sobre como viver bem no mundo. E é também um manual de instruções sobre como pedir contas a cada um dos que estão a construir o mundo que também é o meu. Uma ética é também uma convocatória para construir e defender a construção de um certo mundo, portanto para cuidar do mundo que estamos a construir.
13
A consciência ética é sempre o olhar de mim sobre mim e o olhar do outro sobre mim. O olhar de mim sobre mim quando me digo “já fizeste asneira”, quando avalio a minha acção, o que estou a fazer da minha vida e da vida dos outros. O olhar (ou a voz) do outro em mim: que vais fazer da minha vida? da nossa vida? do nosso mundo?
14
A Ética é a voz que apela à responsabilidade. Responsabilidade vem de responder. A Ética é o desafio a cada homem para responder por aquilo que faz. Responder a si, responder aos outros - próximos e distantes e mesmo futuros. Mas como alguém há-de responder se ninguém pergunta? Como pode alguém aprender a ser responsável se ninguém lhe foi perguntando, pedindo contas pelo que faz? O ser humano não é naturalmente responsável, bem pelo contrário. A Ética é um projecto de mundo e é também um projecto de homem, porque as duas coisas são uma só. Aquilo que os homens e mulheres precisam de construir não é o mundo natural, mas o mundo humano. A Ética é o projecto de humanidade que eu e os outros fazemos – para mim e para nós.
15
Se a Ética não é transcendente, terá de ser imanente. Ou de uma transcendência construída a partir da imanência. A Ética não é um dado, mas o resultado de uma procura e de uma construção.
16
“O homem é superior à mulher”, “a mulher é superior ao homem” e “o homem e a mulher são iguais em dignidade, apesar de quaisquer diferenças” são três princípios de ordem social, três éticas, que dão forma a três mundos humanos
diferentes. Que não têm mais fundamento que aquele que os membros de uma sociedade encontrarem para eles. Ou ainda: o nazismo, o comunismo e a democracia são três propostas de organização social, com as respectivas éticas, que se alimentam daqueles que as propõem, que as defendem, face àqueles que as rejeitam. Porque nenhuma proposta de ética equivale às outras e cada uma tem os seus beneficiários e os seus oponentes. E os seus resultados.
17
A Ética pode ser dita uma ciência experimental. Não como uma das ciências da natureza – que não é, não descreve como as coisas são – mas como um saber (ciência) sobre o projecto humano aferido na experiência da vida (não na experimentação em laboratório).
18
As normas éticas são instruções propostas para valerem como critério de decisão. Não são normas absolutas, dadas por uma entidade transcendente. São propostas de mundo cujo valor só se conhece através da avaliação do resultado do mundo que com elas se obtém.
19
A Ética está sempre sujeita às leis do tempo: do que é o mundo existente, do que é possível através da técnica, do que são as aspirações das pessoas em concreto. Do que são os poderes em presença. Enfim, do que são as circunstâncias da decisão e, logo, da construção do mundo. Mesmo que haja princípios permanentes e universais, porque todos somos membros da espécie humana, eles têm sempre a forma do tempo em que são vividos. Não é a mesma coisa viver hoje ou na Idade Média ou no Império Romano.
20
Ética vem do grego ethos, morada, residência, usos e costumes de um lugar. Daí também o carácter ou modo de ser de uma pessoa que se requer para fazer parte e por fazer desse lugar, dessa sociedade, desse mundo humano. Os romanos traduziram Ética por moral (de mos, moris, mores), usos e costumes de um lugar. Não há um mundo independente dos homens e mulheres que o formam e dos usos e costumes que lhe dão forma. “Eu sou eu e a minha circunstância”, ensina Ortega y Gasset.
21
“Ridendo castigat mores”: com o riso se castigam os (maus) costumes. Não há uma ordem ética estabelecida à partida, nem garantida por uma entidade transcendente. São os homens e as mulheres que têm de saber que mundo querem e cuidar de construí-lo. O que também significa estar atento àqueles que querem outro mundo ou que apenas não têm cuidado com o mundo em que vivemos (porque eles vivem no nosso mundo) e, por isso, podem destruí-lo. Em última análise, não há ética privada, porque vivemos uns com os outros num mundo partilhado – a família, a turma, a empresa, a cidade, o país, o mundo…
||||||||||||||FILOSOFalando
20
DECISÃO ÉTICA E RESPONSABILIDADE SOCIAL MÁRIO PISSARRA
1
O homem é um ser ativo. A sua ação tem várias dimensões. Ficou clássica a distinção de E. Mounier: o fazer técnico cujo valor maior é o poder produzir coisas exteriores ao agente e o critério de avaliação a eficácia; o agir ético-moral cujo resultado é a construção não de algo exterior, mas de si próprio e cujo critério de avaliação é o bem e o mal, o correto e incorreto; a ação teórica que consiste na produção de conhecimentos para compreender e explicar a realidade, avaliada segundo múltiplos critérios (poder preditivo, elegância, etc,) e a dimensão social da ação. Outros filósofos recorrem a outra terminologia para cobrir a mesma problemática; praxis e teoria, trabalho manual e trabalho intelectual, práxis teórica etc. O que nos interessa aqui sublinhar é, por um lado, a indissociabilidade das dimensões da ação humana e, por outro, a necessidade de uma filosofia da ação. É no interior dessa filosofia da ação que fará sentido analisar a especificidade da dimensão ético-moral e, por conseguinte, a relação entre ética e responsabilidade social. Um dos perigos de uma filosofia da ação humana é reduzir o homem a um feixe de funções, como preveniu e criticou Gabriel Marcel. Qualquer um de nós é peão, condutor, um profissional, condóminos, campista, jogador, voluntário, orfeonista, dador de sangue, etc. Assumir cada dimensão da ação humana isoladamente, perdendo as múltiplas dimensões transversais é hoje uma tentação. A consequência mais imediata é o comportamento pautar-se em cada situação de acordo com o estatuto e o papel. Um exemplo simples mostra a insustentabilidade desta visão: em certos desportos há uma nota técnica e uma nota artística. A ação humana é multidimensional e a sua dimensão ético-moral é transversal e está quase sempre presente, ainda que nem sempre seja o critério mais relevante para a sua avaliação. Não faz mais sentido, por exemplo, voltar aos debates da «arte pela arte»!
2 | |||||||||||||FILOSOFalando ||||||||||||||FILOSOFalando
O homem por ser um ser social desde sempre criou padrões de comportamento e os qualificou: bons/maus, corretos/incorretos, aceitáveis/censuráveis, etc. Uma das padronizações, que perdura ao longo dos tempos desde as pequenas comunidades à atual sociedade anónima, é a moral. Assim nasceram os costumes que poderíamos chamar de bons hábitos ou comportamentos virtuosos, solidificados em tradições e que oferecem um cimento estabilizador à identidade da comunidade e um modelo de ação às novas gerações. Estes modelos mostram os seus limites sempre que surgem problemas novos, situação muito frequente nas nossas sociedades da tecnociência. Viver numa sociedade é interiorizar, respeitar e transmitir às novas gerações esses padrões locais, verdadeiros modelos ‘únicos’ de ação. Garantir a manutenção e a perpetuação destes modelos é uma responsabilidade individual e social. O contacto com outras comunidades levou, desde muito cedo, à descoberta da variação das morais no espaço e no tempo. Por mais que os homens, perante esta estranheza, se tenham interrogado «como é que se pode ser diferente?», a diversidade invadia o seu horizonte visual e era inegável. O diferente dentro duma comunidade podia combater-se com pressões, condicionamentos e formas de ostracismo, mas o de «fora» destruía-se pela conquista ou recorria-se a estratégias de isolamento de convivência. Outra forma de padronização, bem mais tardia foi o direito. Inicialmente foi uma
22
proteção garantida apenas a parte da população de um povo ou de um império: os cidadãos. São disso exemplo a Grécia e Roma. A exigência de direitos humanos para todos os homens é uma conquista da modernidade e, em certo sentido, uma consequência do Estado moderno se ter de situar acima da diversidade religiosa. Cada um pode ter a sua opção religiosa, mas o Estado tem de garantir tratamento igual para todos os seus cidadãos seja qual for a sua opção religiosa. O Estado moderno é autónomo e laico e aparece como árbitro e poder que se sobrepõe às opções religiosas dos seus cidadãos. Convém ter em conta neste domínio a diferença entre os estados que conquistam a sua autonomia contra a religião associada ao Antigo Regime e os Estados que se formam após as guerras religiosas. O laicismo e o anticlericalismo estão sempre latentes nas primeiras a par das reivindicações de privilégios das Igrejas sociologicamente maioritárias, enquanto nas segundas, as várias religiões podem ser tratadas, genericamente, como associações sociais legalmente enquadradas. A moral inspirada no cristianismo tem aspirações universalistas: já não há judeus, gregos, romanos, etc., mas todos os homens são iguais porque filhos de Deus. Só que a expansão do cristianismo levava com esta pretensão universalista um conjunto de normas morais não universalizáveis. (faça-se um exercício simples: dos dez mandamentos quantos são universalizáveis? Ou o que é que no cristianismo não é especificamente cristão?) O direito também tem as suas dificuldades na materialização da sua universalização. É fácil proclamar o seu universalismo, mas difícil garantir a sua execução. O Homem dos direitos humanos iluministas é um ser abstrato e o homem concreto cresce sempre numa determinada comunidade. Não é só o debate entre universalistas e comunitaristas, o universalismo e a autonomia do Estado, são, sobretudos, as garantias da sua implementação prática no terreno. Isto é mais evidente nos chamados direitos humanos da segunda e da terceira geração (socioculturais). Os estados autoritários e totalitaristas limitam-nos ou ignoram-nos e muitas tradições culturais não os reconhecem. É comum aceitar os termos ética e moral como sinónimos. Há bons argumentos, sobretudo de índole etimológico para esta sinonímia. Contudo, prefiro reservar o uso da palavra ética para o plano da decisão pessoal. Sempre que eu me limito a seguir o padrão comportamental da comunidade em que estou inserido, a minha decisão não me traz incómodos: posso sempre argumentar que me limitei a seguir a tradição ou o costume e não serei censurado por isso. As sociedades tradicionais homogéneas e monolíticas não toleravam opções éticas divergentes da moral reinante, mas houve sempre nas margens algumas franjas para caminhos pessoais. A situação agravou-se nas sociedades contemporâneas democráticas e pluralistas. A par da coexistência e coabitação de múltiplas tradições e morais, um pluralismo político e uma cultura assente no indivíduo foi o cimento propício para uma amálgama relativista e cética, dando guarida a todos os tipos de laxismos e das éticas indolores e sem dever. A perda de força das religiões e das morais incrementou, por um lado, aquilo a que J. Habermas chamou a jurisdicionalização das relações humanas e isso permitiu a muitos considerar o direito como a única instância normativa social; tornou possível, por outro lado, que cada um justifique as suas opções com a sua ética pessoal. É óbvio que estas pretensões são
||||||||||||||FILOSOFalando
23
um exagero. Um ex-ministro da economia português afirmou publicamnete: «na República a moral é a lei». O acantonamento na ética pessoal significou, a maior parte das vezes, um «não tenho que dar satisfações a ninguém, pois eu cá tenho os meus princípios». Por outras palavras: não ter que responder e de se responsabilizar perante os outros, como se a ética fosse apenas uma questão do foro privado de cada um. As relações entre a esfera da moral e a do direito sempre foram complexas e o seu poder normativo, e sobretudo impositivo, díspar. Mas, à medida que o positivismo jurídico ganhou terreno, o seu afastamento tornou-se mais fácil e visível. A esfera da ética, como a concebo, delimitada apenas ao plano da decisão pessoal tem uma relação diferente com as outras duas esferas. Mantém uma margem de liberdade de decisão que se situa para além da normatividade moral e/ou jurídica. Julgamos as ações dos políticos e das outras pessoas utilizando critérios morais, mas também julgamos as morais utilizando critérios éticos. Entre nós, os julgamentos em sede de justiça não têm condenado muitos políticos, mas as reprovações morais por parte dos cidadãos não param de aumentar considerando alguns comportamentos e atitudes inaceitáveis e irresponsáveis. No extremo, podemos imaginar leis hediondas, iníquas, imorais e ilegítimas. Um regime totalitário pode atuar no estrito cumprimento da legalidade! Legal, mas ilegítimo e imoral!
4 ||||||||||||||FILOSOFalando
É tempo de perguntar: «e, então a responsabilidade social», que dá título a estas reflexões? A responsabilidade social é inquestionável na dimensão moral, legal, política e empresarial entre outras. Por muitas razões, mas logo na sua origem: a moral, os costumes, as tradições e o direito visam manter as condutas dentro de certos limites definidos pela comunidade/sociedade e a política governar essa mesma comunidade/sociedade. Sem a obediência e respeito por esses parâmetros comportamentais socialmente definidos, a comunidade/sociedade corre riscos: desestabilização, desordem, violência, criminalidade, desagregação, caos, anomia, etc. Retomo o conceito de responsabilidade no seu sentido mais elementar: ser responsável é responder pelas suas ações/condutas. No plano moral e legal é óbvio que respondemos pelas nossas opções comportamentais perante os outros, a sociedade. As sanções sociais por comportamentos imorais ou de duvidosa moralidade são bem diferentes das penas que o direito estabelece. Ser criticado, censurado, ostracizado socialmente é penoso, mas muito diferente de ser condenado a apresentações, multas ou privação da liberdade. Nas sociedades modernas, ao contrário das pequenas comunidades rurais, há tendência a reduzir as múltiplas relações sociais à sua dimensão jurídica. A responsabilidade política, embora seja social como a moral e legal, carece de outro tipo de análises e reflexão. A sociedade moderna tem um dos seus pilares básicos no indivíduo. A argumentação teórica seguiu o seu caminho nas academias; as transformações sociais, como hoje sabemos, deparam com inúmeros obstáculos e são muito mais lentas. A corrosão dos diferentes laços sociais e religiosos foi um processo muito lento e estes demoraram a ceder e/ou desparecer. Lentamente, o Estado foi penetrando a vida social, fazendo recuar as outras instâncias (presença das autoridades e da administração, serviços vários, educação, saúde, etc.), quase
24
a monopolizando, exceto nas sociedades liberais. Este percurso favoreceu, por um lado, o aumento do poder legal e estatal e, por outro, a afirmação mais radical do individualismo, mesmo do egoísmo mais feroz. Exemplos do primeiro caso são as respostas frequentes de que o Estado é totalmente responsável pela saúde e todos têm de ter direito a tudo neste domínio ou a atribuição total da responsabilidade com os idosos ao Estado. O segundo caso, torna-se cada vez mais visível entre nós nas gerações pós 25 de Abril: a geração do «eu acho», «tenho direito a tudo», etc. É compreensível, pois não conheceram outro mundo e não tiveram de lutar por quase nada. Tudo lhes foi entregue num hedonismo laxista sem a correspondente exigência de trabalho e da luta para conquistar o que quer que seja; sem responsabilidade social ou responsabilização pessoal. Mas o mais preocupante é que a pura compreensão não resolve os problemas e esta geração são os pais e os professores da futura … É urgente, parece que precisamos de um milagre, reabilitar a responsabilidade social e a responsabilização pessoal para além da sua dimensão jurídica.
5
E a responsabilidade ética, mesmo reduzida à dimensão da decisão pessoal ao agir, implica também ela uma dimensão social? A resposta é inequivocamente, SIM! A dimensão social da moral, do direito e da política vêm de fora. A dimensão ética vem de dentro. Os outros julgam-me a partir de normas e critérios exteriores e as minhas ações são julgadas enquanto factos pelos outros. A dimensão ética da ação, o tomar uma decisão ou a sua omissão, tem o seu campo de conflitualidade e enredo motivacional dentro de mim. Como, então, a responsabilidade social? A questão pode ser abordada de outro prisma: como estão presente os outros na minha decisão ética? Limito-me a evocar dois episódios bem conhecidos. Sócrates defendia que preferia sofrer a injustiça a cometê-la. Argumenta que sofrer uma injustiça é um episódio que acontece num espaço de tempo limitado. Não é agradável, como é óbvio, mas quer as consequências quer a lembrança serão apagadas pelo tempo. Pelo contrário, quem comete uma injustiça por decisão própria terá a sua consciência ao longo do tempo sempre a acusá-lo. Terá sempre dentro de si, mesmo que a sociedade nunca o tenha acusado de cometer uma injustiça, uma testemunha acusatória. Mais grave: ele sabe perfeitamente que é verdade! Não há lugar para dúvidas. O outro, objeto da injustiça, não me larga! O outro episódio é o conhecido mito platónico do anel de Giges (República, livro II). Aquele pastor modelo de comportamental moral – um poço de virtudes -- após descobrir, ao rodar o seu anel para dentro, que se tornava invisível, foi incapaz de resistir às suas inclinações, pulsões e desejos. Seduz a esposa do rei seu amo a quem prestara sempre contas do seu rebanho, com ela conluiado mata-o e usurpa o seu poder. Será que todos somos como Giges? Se fossemos invisíveis -- tal como ele -- tornar-nos-íamos nuns patifes, nuns bandidos da pior espécie? Se assim for, só nos resta uma conclusão: a presença dos outros é o verdadeiro travão e limite dos nossos comportamentos! Que assim é já o havíamos visto, na moral, no direito e na política. Mas como sustentar a tese: no plano ético da decisão pessoal os outros estão sempre presentes e na decisão há sempre uma responsabilidade social? Não podemos esquecer que no plano ético e moral, a ação humana está sob os holofotes do bem e do mal, do correto-incorreto, consoante a linguagem adotada. ||||||||||||||FILOSOFalando
25
6
Normalmente considera-se que o peso máximo na avaliação ética da ação humana pressupõe que ela seja: consciente, racional, intencional, livre, voluntária, ponderada e deliberada. É evidente que estes atributos se implicam mutuamente e se recobrem, pelo menos, parcelarmente. Todavia, esta exigência máxima não pode esquecer a existência do inconsciente e de múltiplas condicionantes (biológicas, psicológicas, educacionais, sociais, epocais, situacionais, etc.). Nenhuma ação humana é 100% racional, Voluntária, racional … Também não podemos esquecer os recentes contributos dos estudos sobre a lógica e a racionalidade da decisão humana, da teoria da mente na Filosofia da Mente, da psicologia genética (J. Piaget e L. Kohlberg e outros) e da psicologia evolucionária (a moral e a ética são ganhos evolutivos), das neurociências mormente os trabalhos de António Damásio e a sua equipa (sobre o lugar das emoções na decisão e na racionalidade, e a teoria dos marcadores somáticos), as experiências de Benjamim Libet, etc. Aqui será tido em consideração exclusivamente o plano ético. Se se perfilhar uma orientação deontológica de inspiração kantiana, o outro estará sempre presente no momento da decisão porque o dever impõe que o seu tratamento sempre como pessoa e nunca como meio e, por outro lado, a minha máxima deve passar pelo crivo da universalização: tornar-se numa lei válida para todos os seres racionais. Se se orienta a conduta inspirando-se nas éticas do cuidado, tão reclamadas pelas feministas, o outro é o objeto do cuidado. A decisão de se pre-ocupar com ele, prestando-lhe atenção, dando-lhe carinho, garantido o seu conforto e bem-estar e satisfazer as suas necessidades, proporcionando-lhe uma boa qualidade de vida. No momento de decidir responsabilizar-se por alguém, ele passa a ter uma presença muito forte na nossa mente e na nossa vida. Tome-se como exemplo a responsabilidade de cuidar de um filho ou de um familiar para aquilatar da força dessa presença nas nossas decisões, não exclusivamente no plano ético. Nas éticas consequencialistas, os outros entram sempre na ponderação dos prós e dos contras de qualquer decisão, na análise dos ganhos e perdas das opções possíveis em análise. Os que centram a sua análise ética da decisão no conceito de justiça a sua grande preocupação é tratar o outro com equidade. Quando se coloca a tónica na intenção/teleologia, o outro está presente sempre na preocupação de não lhe fazer mal. Mesmo no caso da chamada ética das virtudes, o que se pretende é criar a prática do bem, transformando-a num hábito de agir em prol do ser humano. O caso das éticas defensoras dos animais e cosmocêntricas merecem outro tipo de análise. Todavia, no que importa aqui, nada se altera, pois o que se alarga é a noção de sujeito de moral por parte do homem: os animais, a Natureza, o Cosmos.
Uma última palavra sobre as éticas ambientais, por vezes levadas a extremos no mínimo discutíveis pela deep ecology. Hans Jonas chamou a atenção para o facto de nas nossas decisões éticas termos em conta apenas o que acontece a curto prazo. Contudo, as nossas decisões, por vezes têm consequências a longo prazo; umas previsíveis, outras não. O modo como nos relacionamos e tratamos a Natureza e o Cosmos podem por em causa as gerações futuras. Somos responsáveis, nas decisões que hoje tomamos, pela vida e pela qualidade de vida das gerações futuras. Não podemos continuar a relacionar-nos com a natureza como seus senhores, tratando-a como um depósito energético, criando desequilíbrios e destruindo-a, como nos advertiu Martin Heidegger.
||||||||||||||FILOSOFalando
26
7
Objetar-se-á: como podem estar presentes na decisão ética as gerações futuras se elas ainda não existem? Como falar em direitos das gerações vindouras se elas ainda não existem? A objeção não é sustentável. O filho desejado e programado, antes de existir fisicamente, está bem presente em muitas das decisões parentais. Os bons hábitos ecológicos são uma preocupação recente; é verdade que já existe alguma legislação de proteção ambiental, mas ainda não entraram no domínio da moral e da tradição um conjunto de normas socialmente estabelecidas. Assistimos ao nascimento dessa normatividade moral, mas hoje é, ainda e sobretudo, uma questão ética, de decisão pessoal. Todavia, a presença do outro, mormente em nome da solidariedade, exige-nos uma conduta ética. Ninguém pode agir eticamente, relativamente ao meio ambiente, sem responsabilidade social.
||||||||||||||FILOSOFalando
19
ÉTICA
EA
A“
RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS”
luislmb@gmail.com
LUÍS MARQUES BARBOSA
UM TEMA DOS NOSSOS DIAS
Introdução: de que nos ocupamos, têm sido concebidos constituindo problemas actuais, são muitas vezes assuntos complementares aos desenvolvimentos teóricos e práticos de disciplinas académicas, entendidas nucleares dos cursos ministrados nalgumas das nossas academias. Pensar o Humano como factor produtivo, intuir as Organizações onde impacto da Revolução da Tecnologia da Informação sobre as variáveis anteriores, analisar as propostas de construção da sociedade actual enquanto rede de interacções e descortinar como a identidade se assume, ou se esbate, enquanto factor determinante da nova organização planetária mundial, eis algumas das preocupações que por nos parecerem objecto do trato anterior propomos sejam assumidas como problemática a merecer olhar generalizado mas Sentindo nós que não raro acontece que as questões são abordadas de forma redutora, e sem que se analise a sua estreita ligação ao imenso leque global de preocupações que constituem os cenários de fundo onde todas elas se interligam, sugerimos sempre que a sua particular análise se oriente no sentido de proporcionar sucessivas visões alargadas sobre o Homem, o Mundo e a teia que esta interacção pressupõe. Assim, ao pensar nos temas que enunciamos no programa destes seminários fazemolo no respeito por uma lógica sistémica em que cada uma das partes mais não é que uma unidade de um todo que pensamos coerente. Por isso, propomos que o façamos partindo da análise às características da natureza humana para que, vendo como estas determinam a emergência dos cenários sociais, se consiga vislumbrar como, na inversa, as determinantes da sociedade conformatizam o humano. Algumas questões de partida: a que pretendemos chegar devem, sem dúvida, questionar o pensar antigo do Homem mas, havendo sugere-se um esforço no sentido de ver melhor
||||||||||||||FILOSOFalando
29
como o pensamento moderno, vindo na sequência do anterior, concebe na actualidade a sistemática interacção Homem/Sociedade. Ao realizar-se o investimento anterior achamos pertinente analisar a forma como as Organizações, enquanto realidades construídas pelo Homem, se apresentam universos desenhar muito do esforço de liberdade a que o indivíduo tanto anseia, são também o lugar de muitas de desenvolvimento. Preocupamo-nos então em proporcionar aos nossos alunos um enquadramento claro sobre as responsabilidades sociais e individuais a oportunidade de termos criado e desenvolvido conceitos próprios nesta matéria, lançamo-lhes o sem entrar em linha de conta com a problemática da existência do indivíduo como pessoa. Utilizando o conceito de “Extensibilidade de Si” (já tratado em revista anterior) é timbre dizermos nas nossas aulas que:
“A “Extensibilidade de Si” é então o exercício prático de que a mente se serve não só para procurar os traços, indispensáveis ao agir mas, também, para ordenar ao cérebro que o faça tendo em conta as metodologias apropriadas a esse mesmo agir. Claro que no quadro da vida dita normal acontecerá o mesmo a cada indivíduo já que qualquer caminhar pela vida impõe a quem o faz que desenhe o seu próprio processo metodológico de acção. Ora se caminhar é como também já vimos um necessidades, e se a mente exige que nesse contexto as mais latentes passem progressivamente a explicitadas, então este mecanismo serve para que o Homem, qualquer homem, vá evoluindo de maneira a cumprir a exigência anterior. É um exercício obrigatório já que se a “Extensibilidade de Si” é o esquema interactivo que permite ao Homem relacionar-se com o Mundo em cada momento da vida, os indicadores de que a mente se serve para pôr em marcha esse mesmo esquema têm de estar intimamente adaptados não apenas aos contextos onde o Homem evolui mas, também, às situações que lhes são palco”.
Do individuo às empresas e destas à ética: a perspectiva ética parece-nos aqui bem em evidência e a pergunta é: como então escamotear a sua implicação em todos os actos de gestão? Recorramos a propósito a outras perspectivas: “A ética, longe de ser periférica à empresa, constitui a sua verdadeira fundação. A ética é o conjunto de princípios morais e não escritos, através dos quais a empresa opera ao seu nível nuclear. A ética de uma empresa determina o modo como ela trata os seus empregados, clientes e fornecedores; como desenvolve os seus produtos e processos; e como participa na comunidade mais vasta. (…) Ignorando ou minimizando a dimensão ética dos negócios, estamos involuntariamente a encorajar ou a perdoar os abusos éticos e a gerar uma força de trabalho literalmente desmoralizada. Em vez de ser silenciada, a ética deve ser falada abertamente, colocando-a no al.: Gestão ética e socialmente responsável – Teoria e prática; Lisboa, Editora RH, Ldª.: 2007, 2ª ed.”.
É do programa de leccionação da disciplina de “Ética ” que extrapolamos agora alguns indicadores de análise que nos parecem poder extensa. Um deles versa sobre o chamado “Contrato psicológico”. É tema que muitos psicólogos gostam de abordar. Com razão diga-se, porque de facto a Porquê? Porque o mesmo funda-se no pressuposto de que por detrás de cada função existem implícitas expectativas e necessidades de quem as executa, logo, este contrato torna-se uma rede que envolve todos os actores em situação professional implicando que cada pessoa tenha expectativas em relação a: salários, vencimentos, horas de trabalho, benefícios, ainda que a organização espere: melhoria da imagem junto do público, lealdade dos e para com os colaboradores e esforço continuado em prol da empresa. A questão é que o “Contrato psicológico” altera-se com o tempo e na medida em que as pessoas mudam. Schein é bem claro a esse respeito quando
||||||||||||||FILOSOFalando
30
diz que: “As organizações são conjuntos ordenados de actividades humanas, mas só passam a funcionar depois das pessoas terem sido recrutadas para ocupar determinados papéis e executar determinadas actividades”, (in Schein, Psicologia das Organizações, p.16). Porém uma coisa é pensar-se a empresa na sua interioridade outra é concebê-la como um instrumento social em tudo sujeito às vicissitudes do dia-a-dia. A dimensão ética alarga-se aqui já que torna-se indispensável entrar em linha de conta com os chamados problemas centrais da sociedade: desigualdades sociais, modelos de desenvolvimento insustentáveis, aumento da pobreza, aumento da exclusão, escassez de recursos naturais, desequilíbrio ambiental, gestão e aplicação de recursos públicos de trabalho e ou do processo produtivo. Assim, a função social das empresas ganha dimensão cimeira. Porquê? Porque se é verdade que a maximização dos lucros tem de ser preocupação determinante do seu funcionamento, facto é que tal deve acontecer não apenas em função dos sinais dos chamados mercados mas sobretudo tendo em conta os que a própria sociedade transmite. É então importante orientar as estratégias interventivas das empresas para as oportunidades de mercado, claro, sem dúvida, mas bom será que se tenha em conta a necessidade determinantes tecnológicas. Porém, não sem ter em conta o crescimento populacional, os efeitos da globalização, da urbanização e a existência de novos e diferentres padrões de consumo. Acautelem-se contudo os gestores porque a desigualdade social no mundo actual é grande (ONU 2008), muitos milhões de crianças e adolescentes entre os cinco e os dezasseis anos trabalham em todo o planeta (Unicef 2008), continua a haver trabalho escravo e exploração de pessoas, e muitas regiões do planeta estão em estado de guerra. Mas não param aqui as preocupações sociais que os gestores das empresas devem ter, já que a cada dia que passa são descartados dois milhões de lixo domiciliário, o ritmo de destruição das ano (relatório do Fundo Mundial para a Natureza, 2009) e dentro de vinte anos, dois terços da população mundial
não terá acesso a água (relatório da ONU/2000). Isto para não se falar do facto de que a temperatura da do século (Lester Braun, Eco-Economia). O contraste é enorme já que o crescimento da produção de bens e serviços aumentou de seis para quarenta e três milhões de US$ entre 1950 e 2000, o desemprego estrutural cresceu e as desigualdades entre países pobres e ricos também. Mas mais: 1/3 das áreas agrícolas perdeu a camada superior do solo, 2/3 das regiões pesqueiras dos oceanos estão a ser exploradas além das suas capacidades e aumenta o consumo inadequado de água com uma utilização superior à capacidade de renovação dos reservatórios naturais. Ética e responsabilidade social: que têm então as questões anteriores a ver com uma ética empresarial? A resposta impõe sem dúvida que se comece por tentar saber o que a própria ética é. Eis cinco interrogações que os estudiosos desta problemática colocam quase sempre quando iniciam a abordagem ao tema: O que ética nos negócios? Quais os benefícios da ética nos negócios? Qual a dimensão da responsabilidade social das empresas? As respostas permitem voltar de novo ao que os gregos disseram. A palavra ética ou costume e modo de ser ou carácter. A tradução posterior do vocábulo para o latim acabou por valorizar mais a primeira designação já que o termo “mos” ou “ moris” veio a ter mais aplicação. Seja como for o termo tem um sentido eminentemente prático e primeira orientarem-se para o bem comum e para a satisfação das necessidades sociais, torna-se óbvio que o interesse geral se sobrepõe aqui ao individual. ética viessem sempre a ser feitas por boas razões. Porém muitos dos estudiosos na matéria advogam que quando se apela sonoramente a este exercício nem sempre é porque o homem viva nos melhores dos mundos. De facto muitos de nós não acreditamos naquilo em que gostaríamos de acreditar. Olhando à volta é enorme a ausência de transparência nos chamados actos públicos e a globalização parece ter vindo ainda complicar mais as nossas vidas, sobretudo no que à organização empresarial respeita. Porém, nem tudo são más notícias. Muitos estudos dão conta ||||||||||||||FILOSOFalando 31
gestão dos aspectos éticos nas sociedades vindo-se a descobrir que as preocupações éticas no trabalho individuais e colectivos. Em geito de conclusões: ser-se ético é então uma preocupação que deve estar na ordem do dia. Porém, cuidado, porque esta forma de estar na vida implica: veracidade, ou seja, apresentar os factos tal como eles ocorrem e procurar explicações para as suas causas, liberdade de pensamento e acção, o que implica que o agir arrasta sempre uma dimensão íntima, privada e pública e capacidade para saber relativizar os factos. Claro que os dilemas éticos são muitos que tanto as relações com os fornecedores como com os empregados e os clientes, como as que se têm de manter, obrigatoriamente, com os governos, os estados e as sociedades em geral, interferem na dinâmica concorrencial em que toda a organização empresarial está envolvida. Tenha-se porém em mente que os diversos códigos éticos e deontológicos que se criem, não devem ser entendidos como catecismos substitutos das tomadas de decisão, já que estas no tempo e no espaço. Fernandez, em 2004, dizia em
seis
princípios:
respeito pelo enquadramento legal das pessoas. Parece-nos que a deixa aqui enunciada pelo autor é boa e está bem apropriada ao nosso momento presente. Sem pretendermos ser moralistas deixemos expressa a esperança que para lá de todas as vicissitudes a ética prevaleça mesmo que, pontualmente, pareça que a espécie segue por caminhos opostos. BIBLIOGRAFIA DE APOIO Araújo, L., ( 2005), “Ética - uma introdução, 1ª. Edição, Lisboa, INC Editora. Samuel Mercier, (2003) “Ética nas empresas”, Lisboa, Afrontamento Editora. Arménio Rego, Miguel P Cunha e outros,(2007) “Gestão ética e socialmente responsável” 2ª Edição, Lisboa, Editora RH. Lisboa, Universidade Lusíada Editora. Gago, Carlos Correia et al. (2005), “Responsabilidade Social das Empresas Portuguesas” , Lisboa, AIP/Companhia das Cores. GRACE (2004) “Primeiros Passos - Guia Prático para a Responsabilidade Social das Empresas”, Lisboa, Grace Editora. BARBOSA, L. (2006, 2ª ed.), A Escola Sensível e Transformacionista – Uma Organização Educativa para o futuro; Chamusca, Edições Cosmos. BARBOSA, L. (2002), Ensaio sobre o Desenvolvimento Humano – De uma Teoria Emergente de Prática ao Mundo como Implicação; Lisboa, Instituto Piaget.
PENSO, LOGO EXISTO. DESCARTES
MARIA DIZ QUE EU EXISTO E ASSIM EIS QUE EU TAMBÉM ME APERCEBO DE QUE EXISTO. PERGUNTO-ME: NÃO PODIA APERCEBER-ME SOZINHO DE QUE EXISTO? PARECE QUE NÃO. PARECE QUE É PRECISO QUE SEJA OUTRA PESSOA A AVISAR.
||||||||||||||FILOSOFalando
ERRI DE LUCA, MONTEDIDIO, P. 78
28
UTOPIAS EM DÓI MENOR. CONVERSAS TRANSATLÂNTICAS COM ONÉSIMO MÁRIO PISSARRA
1.- Este livro é constituído por um conjunto de entrevistas que percorrem os grandes temas da produção literária do autor, dando unidade às conversas de cada capítulo: Portugal, quase uma obsessão; linhas de coser o mundo; percurso ora a pé, ora de livro; sobre alguns ismos do nosso quotidiano; a ética muito para além da etiqueta ou do salamaleque; modernices do passado, modernidades do futuro? O livro contém ainda um apêndice com os conteúdos lecionados pelo autor nos cursos que dá na – Onésimo ou a nossa consciência crítica de José Eduardo Franco. É possível que o leitor caia no erro comum, como eu, de considerar Onésimo um homem da área das Literaturas e/ ou dos Estudos Portugueses. Seu leitor desde o início da sua assídua e já longa colaboração no Jornal de Letras, sempre me admirou a sua sólida e vasta informação
disfarçados maniqueísmos – sendo o seu pano de fundo o pluralismo; o pensador da história intelectual portuguesa em que Antero Quental e Fernando Pessoa têm lugar de destaque na sua vasta e variada produção ensaística. O conselho do professor José Enes foi certeiro: a inserção e participação no meio intelectual luso faz-se no domínio da estética e da literatura. Apraz-me registar a gratidão e carinho com que o professor José Enes é referido. Efetivamente também eu lamento que a sua obra, sobretudo na sua vertente ontológica e hermenêutica não tenha tido a atenção que merecia. Embora tenha lido as suas obras relativamente cedo, só na divergências em relação às opções programáticas para o e admiração pela sua pessoa e obra. É minha convicção que as linhas mestras da introdução ao programa de
formação base e muitos dos conteúdos que leciona são (aristotelismo e neotomista do seminário, o pensamento francês e alemão da Universidade Católica de Lisboa, e do doutoramento nos USA), colocando-o no lugar de duplo tradutor e observador: um vaivém constante entre o panorama intelectual português e as múltiplas andanças que a diáspora propicia e solicita e a que Onésimo procura responder. A ponte que estabelece entre Portugal e os Estados Unidos nunca é a de um estranho, mas a de alguém que para além de permitir o trânsito nos dois sentidos está sempre dentro e fora. O seu olhar de observador participante em ambos os lados não anula o distanciamento que o Atlântico cria. Estas conversas que nunca são a dois, pois são férteis campos de cultivo de inúmeras referências plurais, ilustram bem o triplo Onésimo: o escritor e contador de histórias bem informado em muitos domínios, recusando sempre as abordagens dicotómicas – visões a preto e branco ou
||||||||||||||FILOSOFalando
34
Onésimo Teotónio Almeida e João Maurício Brás, Utopias em Dói Menor. Conversas Transatlânticas com Onésimo, Gradiva, 2012, 316pp.
saíram da sua pena. Ao longo da entrevista – o mesmo acontece na deste número de Filosofalando –, Onésimo Teotónio Almeida utiliza estratégias de rodeio: em vez de responder diretamente ou mostrar que não concorda com o modo de formular o problema pelo entrevistador, parece divagar, mas por outros caminhos reposiciona o problema e as questões mais de acordo com o seu posicionamento que a abordagem visa uma resposta dicotómica. Uma estratégia duplamente elegante: para o tema e para o entrevistador. Aliás esta forma de estar é coerente com a caracterização que faz do meio intelectual português: ausência de discussão, espírito laudatório (em nome galináceas subserviências em vez da nobre capacidade de dizer não, como nos ensinou Alain) e um olímpico desconhecimento, mal disfarçando uma incapacidade de afrontar e assumir a discordância, polvilhado ora pela ignorância, ora pelo desprezo ou condimentado pela maledicência. Onésimo é um leitor atento sem espírito de capela e não gosta nem de endeusar, nem de dizer amém. Conciliador quanto baste para evitar melindres. Todavia, por vezes, é frontal. Sirva de exemplo a reação à tese de inspiração weberiana sobre a ética protestante. Negando a pretensa novidade da posição, acaba por chamar ignorante a Arturo Pérez-Reverte (p. 44 ss). O mesmo acontece em certos momentos da conversa acerca da modernidade e pós modernidade, no cap. 7. Importante a sua chamada de atenção para a necessidade de conhecimento e domínio da língua materna e da sua gramática, a prática da leitura de obras de referência dos são certeiras e a impreparação dos alunos que chegam à universidade é uma constatação largamente partilhada. Mas, como salienta, o mais grave é a falta de iniciativa e de espírito crítico e uma predisposição para um ensino/ aprendizagem que privilegia o debitar e assimilar em vez da pesquisa e do ensaio. Não se pense que este defeito é apenas do ensino secundário. O espírito de capela habita as nossas academias e muitos internéticos sítios, preferindo o armazenamento acrítico às acrobacias do voo desviante e criativo. Em síntese: muito se abocanha e repete, pouco se digere e ganha dimensão pessoal e, por conseguinte, escasseiam os estímulos à criatividade e à enriquecedora divergência. Também me parece oportuna a chamada de atenção para Somos, genericamente, pouco equilibrados na apreciação de nós mesmos como povo e cultura. Oscilamos, tal como no futebol, bipolarmente, entre os melhores do mundo e os «desgraçadinhos». As opiniões expressas sobre este tema
||||||||||||||FILOSOFalando
35
por Onésimo são sensatas e mais racionais do que é usual. Onésimo gosta de se considerar um cientista social, mas chama a atenção para o conteúdo deste conceito no meio intelectual dos Estados Unidos. Implica o Sociologia, da Antropologia, da Psicologia, da Literatura, da Linguística, etc. Os temas estudados são complexos e, necessariamente, interdisciplinares. A atividade nos Estados Unidos nesta área é menos estanque quer para os alunos quer para os docentes. Não poderei deixar de referir três aspetos que me chamaram a atenção: a exigência de rigor e clareza da linguagem bem como a análise lógica dos argumentos e a caça às falácias. Uma prática que só um longo convívio abandono do projeto terapêutico de aniquilar ou superar a metafísica através da análise da linguagem não diminuiu a exigência da análise lógica da mesma. Esta exigência está bem longe dos estudos de argumentação da nova retórica de Ch. Perelman ou da retoricidade da própria linguagem. Um outro aspeto é a relevância do tema da ideologia e das mundividências. Em relação a este último conceito estranhei a não referência a Karl Jaspers, pois as suas estes dois temas mostram quanto a sua formação de base continental continuam vivas e bem vivas nas suas obras. – pós-modernidade. As suas observações sobre alguns críticos da modernidade alertam-nos para a necessidade de não colocar no mesmo plano a discussão europeia deste tema e a sua discussão nos Estados Unidos. A chamada de atenção de que nos Estudos Culturais há uma tradição crítica de inspiração marxista e igualitária (p. 205) e que nos Estudos Literários a perda de peso da estilística e da estética em detrimento do peso da ideologia (p.209) preparam-nos para uma forte ligação entre pósmodernidade e desconstrucionismo, estudos de género, epistemologia anarquista, ataques à ciência, relativismo, ceticismo, etc. Onésimo não deixa que as inúmeras sombras (promessas não cumpridas e desvarios) escondam as conquistas e luzes da modernidade. Mais uma vez proclama a necessidade da universalidade de certos valores (ideais), visão com muito peso na sua formação clássica e continental, e recusa a interpretação reducionista de John Gray: modernidade ou barbárie. Onésimo estará mais próximo da dicotomia de J. Habermas na discussão deste tema: esquerda defensora da modernidade e direita defensora da pós-modernidade. Onésimo estará mais próximo das teses habermasianas, mas longe de qualquer dicotomia deste tipo. É na compreensão aprofundada desta discussão que está a chave para compreender o feliz título : Utopias em Dói Menor.
“
HOJE, A PRESSÃO MEDIÁTICA PEDE AOS FILÓSOFOS QUE SEJAM PERITOS. EU CREIO QUE OS FILÓSOFOS DEVEM SER DESPERTADORES, PESSOAS QUE COLOCAM QUESTÕES.
“
“
EU NÃO PENSO QUE A FILOSOFIA POSSA TORNAR-SE POPULAR. EU NÃO ME SITUO NEM NA LINHA DOS FILÓSOFOS MEDIÁTICOS COMO MICHEL ONFRAY OU ANDRÉ COMTE-SPONVILLE, NEM, POR OUTRO LADO, UMA HEIDEGGERIANA ORTODOXA, QUE SE FECHA NUMA CAPELA E NÃO FALA A NINGUÉM. É NECESSÁRIO ENCONTRAR UMA VIA INTERMÉDIA SENDO MUITO CAUTELOSA E EXIGENTE NAQUILO QUE SE FAZ. É UMA QUESTÃO DE RESPEITO.
“
||||||||||||||FILOSOFalando
Françoise Dastur, Philosophie Magazine, Setembro 2013
apresentado em Janeiro do presente ano
CLUBE DE FILOSOFIA
AL-MU’TAMID MUNDO – SOCIEDADE – RELIGIÃO – CULTURA J an t ar e s – Te r t ú l i a na Mesq ui ta C entr a l d e L i sb oa
A realeza está no manejo dos livros Deixa as correias da soldadesca! Al-Mu’tamid
Na base das culturas do Mediterrâneo depararmonos com os espaços de encontro, de afirmação e de disputa de ideias. Seja o megaron micénico ou a casa comunitária castreja, seja a sinagoga ou a eclesia, sempre a ideia de encontro e de assembleia esteve no que de mais essencial afirmou uma identidade ao longo de milénios. Primeiro acolhe-se, dá-se alimento, afirma-se o dever de hospitalidade, depois questiona-se a identidade, de onde vem e para onde vai. Aberto, livre, assim será o espaço desta tertúlia, onde pretendemos marcar uma forma de estar e de discutir. Reunindo uma área científica, académica, que se debruça sobre o Fenómeno Religioso, e uma comunidade religiosa, temos como objectivo ultrapassar os constrangimentos que muitas vezes a sociedade tem em relação ao religioso, e propiciar o encontro. Sem revivalismos e sem utopias ou falsas memórias, teremos como horizonte o espaço de encontro de culturas que foi o Al-Andaluz onde conviviam muçulmanos, judeus e cristãos, evocando o nome do Al-Mu’tamid, o Rei-Poeta de Silves. Contudo, esta tertúlia não se centrará em questões religiosas. Os temas a abordar são do espectro largo da cidadania e das grandes questões que moldam a actualidade. São cívicos os debates, onde todos terão lugar, quer como oradores, quer como participantes. Nunca será olhada a religião ou a ideologia de quem fala. São ideias o que se quer. Mahomed Abed
||||||||||||||FILOSOFalando
Paulo Mendes Pinto
37
Assinatura do protocolo, de constituição do Clube de Filosofia Al-Mu’tamid na Mesquita de Lisboa
CLUBE DE FILOSOFIA
AL-MU’TAMID PARA FAZERMOS O PONTO DA SITUAÇÃO E OBTER ALGUNS ESCLARECIMENTOS, FOMOS SABER MAIS ALGUMA COISA JUNTO DE UM DOS ORGANIZADORES, PAULO MENDES PINTO, RESPONSÁVEL PELA ÁREA DE CIÊNCIA DAS RELIGIÕES DA UNIVERSIDADE LUSÓFONA O “Clube de Filosofia Al-Mu’tamid” é uma iniciativa conjunta de: Comissão Sócio Cultural e Formação da Comunidade Islâmica de Lisboa Área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona
COM QUE OBJECTIVOS
Fomentar a reflexão e a participação cívica, mostrando que a Religião em nada é obstáculo para o debate.
ONDE E QUANDO FUNCIONA ONDE
Terceira terça feira de cada mês, no Refeitório da Mesquita Central de Lisboa.
QUANDO
COM QUE LIGAÇÕES INSTITUCIONAIS
refeitório da Mesquita Central de Lisboa Todas as terceiras terças-feiras do mês
O QUE É Um espaço actualidade.
de
reflexão
sobre
questões
da
COMO NASCEU E QUANDO
Nasceu de uma ideia lançada aquando de uma visita ao Colégio Islâmico de Palmela, em 2011. Depois dessa primeira conversa, outras conversas tiveram lugar, e chegou-se ao modelo que se efectivou através de um Protocolo assinado entre a Universidade Lusófona, a sua área de Ciência das Religiões, e a Comunidade Islãmica de Lisboa, através da sua Comissão Sócio Cultural e Formação. O Protocolo foi assinado em Janeiro de 2013.
PORQUÊ COM ESSE NOME
Para recordar este personagem, um misto de monarca e de poeta, é dar vida ao esforço de diálogo e de afirmação do debate como forma de criar respeito. Usamos bastante uma frase que é atribuída a este rei-poeta:
||||||||||||||FILOSOFalando
A realeza está no manejo dos livros Deixa as correias da soldadesca! Al-Mu’tamid
38
Área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona e da Comissão Socio Cultural e Formação da Comunidade Islâmica.
O QUE TEM FEITO
Foram já vários os debates: Dia 19 / 2 – Construir um futuro: estamos atados a uma ideia de crise? Com André Barata, Miguel Real e Henrique Pinto (estiveram presentes 70 pessoas). Dia 19 / 3 – Religião e Poder, com Catalina Pestana, José Eduardo Franco e Sheik David Munir (estiveram presentes 70 pessoas). Dia 14 / 4 – Primavera Árabe, com António Dias Farinha, José Manuel Anes e Teresa Almeida e Silva (estiveram presentes 90 pessoas). Dia 18 / 6 – Diálogo entre e com as Religiões, com Jorge Sampaio, Henrique Pinto e Paulo Borges (estiveram presentes 105 pessoas).
QUE BALANÇO DO PERCURSO ATÉ AO MOMENTO As sessões que tiveram lugar superaram as expectativas. Foram excelentes as intervenções e conseguimos quebrar o medo do diálogo e da intervenção. São longos e profícuos os debates.
CONTACTOS E POSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO Para a própria mesquita, ou directamente para o e-mail: pmpgeral@gmail.com
ECOS NA REDE
Em Jantar-tertúlia na Mesquita de Lisboa Jaime Ramos apresentou projeto do templo ecuménico mirandense O presidente do Conselho de Administração da Fundação ADFP, Jaime Ramos, apresentou num jantartertúlia do Clube de Filosofia Al-Mu’tamid, na Mesquita de Lisboa, o projeto do templo ecuménico de Miranda do Corvo, dia 18 de Junho. A apresentação, que já tivera lugar na Conferência Diálogos Inter-Religiosos, no Cinema de Miranda do Corvo, a 18 de Maio, decorreu no refeitório da Mesquita, seguido de debate em torno de uma questão fulcral na definição do lugar social das religiões no século XXI, a inclusão social. Esse foi o tema para o encerramento do primeiro ciclo destes jantares-tertúlias, uma parceria entre a Área de Ciência das Religiões e a Comunidade Islâmica de Lisboa, que teve início em Fevereiro sobre os mais variados temas sobre a Religiosidade em Portugal Jaime Ramos abordou também a ideia, aliás bem recebida, do lançamento da 1ª pedra do templo, previsto para a encosta subjacente ao Parque Biológico da Serra da Lousã, ser efectuado com a presença de crianças de todas as comunidades religiosas da capital e focou o papel da Fundação ADFP na inclusão social. Neste jantar-tertúlia foram também oradores Jorge Sampaio, ex-Presidente da República de Portugal e anterior Alto Representante da ONU para a Aliança de Civilizações, assim como Henrique Pinto - Presidente da CAIS e Paulo Borges, representante da União Budista. O debate foi moderado por Paulo Mendes Pinto, diretor da área de Ciência das Religiões na Universidade Lusófona. O “Clube de Filosofia Al-Mu’tamid” é uma iniciativa conjunta da Comissão Sócio Cultural e Formação da Comunidade Islâmica de Lisboa e da Área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona. Aberto, livre, é o espaço desta tertúlia, onde se pretende marcar uma forma de estar e de discutir, reunindo uma área científica, académica, que se debruça sobre o Fenómeno Religioso, e uma comunidade religiosa com o objectivo de ultrapassar os constrangimentos que muitas vezes a sociedade tem em relação ao religioso, e propiciar o encontro, sem revivalismos e sem utopias ou falsas memórias. Como horizonte o Clube tem o espaço de encontro de culturas que foi o Al-Andaluz onde conviviam muçulmanos, judeus e cristãos, evocando o nome do Al-Mu’tamid, o Rei-Poeta de Silves.
||||||||||||||FILOSOFalando
I n ht t p://w w w.quint a da pa iv a .pt /sa r t igo/inde x.php?x =350
39
NOTÍCIAS CLUBE DE FILOSOFIA DE ABRANTES Já no segundo ano, o Clube de Filosofia de Abrantes retoma o seu Café Filosófico, todas as segundas-feiras, no café 53 by Trincanela, em Abrantes, das 21h00 às 23h00. O Livro do Mês, na rádio Antena Livre, Conferências temáticas, mini-cursos e colaboração nesta revista são as actividades que estão pensadas para o presente ano.
CICLO DA CONSCIÊNCIA A 8 de Outubro (“Os poderes”), 15 de Outubro (“Os valores”), 22 de Outubro (“Os saberes”) e 29 de Outubro (“Os amores”), Mendo Henriques e Nazaré Barros, professores e autores do livro Olá Consciência!, asseguram este ciclo de conferências. No edifício do Diário de Notícias, Av. Da Liberdade, 266, das 18h30 às 20h00.
FORMAÇÃO AVANÇADA EM ÉTICA DAS ORGANIZAÇÕES UNIVERSIDADE CATÓLICA por Filosofia na Católica Escola de Pós-Graduação e Formação Avançada da FCH Coordenação Científica do Curso – Prof. Doutor Mendo Henriques Horário: Sábados – 14h30 – 18h30 Calendário: de 28 de setembro a 14 de dezembro Telefone: 21 721 41 99 Carla Cardoso – ccardoso@fch.lisboa.ucp.pt Acerca do conteúdo, Dr. Joaquim Pinto joaquim.pinto@fch.lisboa.ucp.pt http://www.fch.lisboa.ucp.pt
||||||||||||||FILOSOFalando
Pela primeira vez em Portugal, os códigos de ética das grandes empresas e de organizações públicas serão objeto de uma análise na perspectiva da questionamento, aprofundamento e implementação desses marcos de uma sociedade em mudança. De forma inovadora, o Curso de Formação Avançada em Ética das Organizações levará os participantes em organizações públicas e privadas a questionar e aprimorar o que pensam ser correto na sua atuação, relativamente a colegas, funcionários, consumidores, parceiros e reguladores. A Formação Avançada em Ética das Organizações visa capacitar os destinatários a incorporar princípios de pensamento crítico e de responsabilidade individual e social nas suas vivências e procedimentos, por forma a motivar pessoas, criar valor e dinamizar ações. E como será de Ética que se vai tratar, e de levar as pessoas a interrogarem-se sobre o que os outros formação inovadora em 12 semanas em regime intensivo, recorrendo às TIC. A lecionação termina
40
NOTÍCIAS UM DINAMARQUÊS UNIVERSAL: SØREN KIERKEGAARD A mostra reúne bibliografia publicada em Portugal de e sobre Søren Kierkegaard (1813-1855) e um conjunto de 16 painéis descritivos da sua vida e obra, que assinalam e celebram o bicentenário do seu nascimento. Além da Biblioteca Nacional de Portugal e das instituições culturais dinamarquesas responsáveis pela sua conceção, tuteladas pelos Ministérios da Cultura e dos Negócios Estrangeiros da Dinamarca, a mostra conta com o apoio da Embaixada da Dinamarca em Lisboa e do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa.
COLÓQUIOS LONERGAN Os Colóquios Lonergan, levados a cabo desde 2009 pela Área de Filosofia da Universidade Católica, têm privilegiado áreas de filosofia aplicada, tais como economia, cidadania, códigos de ética, gestão de recursos humanos, organização escolar, filosofia para crianças e consultoria filosófica. Entende-se a obra de Bernard Lonergan como um quadro de referência aberto e com uma heurística compatível com diversas metodologias filosóficas praticadas pelos especialistas que têm enriquecido os Colóquios com os seus contributos. O próximo colóquio ocorrerá em 6 e 7 de Dezembro de 2013 ! Informação em http://congressofilosofiaaplicada.wordpress.com/coloquio-lonergan/
PRÉMIO DE ENSAIO FILOSÓFICO Estão abertas as candidaturas para a edição de 2013 do Prémio de Ensaio Filosófico da Sociedade Portuguesa de Filosofia. Nesta edição, a área seleccionada é a Filosofia Política e a questão proposta é a seguinte: Quais são os nossos deveres em relação às gerações futuras? O prémio terá um valor de 3.500 euros e o ensaio vencedor será depois publicado na Revista Portuguesa de Filosofia. As candidaturas poderão ser apresentadas até ao dia 31 de Dezembro de 2013. Para concorrer, consulte o anúncio integral do prémio e o seu regulamento, disponíveis em http://spfilosofia.weebly.com/
||||||||||||||FILOSOFalando
41
NOTÍCIAS
PHILPAPERS PhilPapers é uma base de dados internacional e interactiva de artigos académicos para profissionais e estudantes em Filosofia. É um projecto conjunto do Centro para a Consciência da Australian National University (Universidade Nacional da Austrália, ANU) em Camberra e do Instituto de Filosofia da Escola de Estudos Avançados, University of London (Universidade de Londres). Metaphysics and Epistemology (96,665) Epistemology (13,604) Metaphilosophy (1,948) Metaphysics (14,460) Philosophy of Action (9,318) Philosophy of Language (17,798) Philosophy of Mind (25,745) Philosophy of Religion (13,712) M&E, Misc (69) Value Theory (141,237) Aesthetics (18,290) Applied Ethics (49,266) Meta-Ethics (5,054) Normative Ethics (11,088) Philosophy of Gender, Race, and Sexuality (6,628) Philosophy of Law (5,710) Social and Political Philosophy (32,846) Value Theory, Miscellaneous (2,355) Science, Logic, and Mathematics (89,794) Logic and Philosophy of Logic (14,648) Philosophy of Biology (9,684) Philosophy of Cognitive Science (19,592) Philosophy of Computing and Information (1,084) Philosophy of Mathematics (4,241) Philosophy of Physical Science (5,889) Philosophy of Social Science (13,528) Philosophy of Probability (2,290) General Philosophy of Science (6,599)
||||||||||||||FILOSOFalando
42
Philosophy of Science, Misc (1,021) History of Western Philosophy (99,789) Ancient Greek and Roman Philosophy (21,751) Medieval and Renaissance Philosophy (6,965) 17th/18th Century Philosophy (24,426) 19th Century Philosophy (13,487) 20th Century Philosophy (29,679) History of Western Philosophy, Misc (139) Philosophical Traditions (25,036) African/Africana Philosophy (725) Asian Philosophy (11,372) Continental Philosophy (3,907) European Philosophy (4,418) Philosophy of the Americas (2,216) Philosophical Traditions, Miscellaneous (1,188) Philosophy, Misc (1,559) Philosophy, Introductions and Anthologies (38) Philosophy, General Works (1,207) Philosophy, Miscellaneous (268) Other Academic Areas (21,791) Natural Sciences (105) Social Sciences (489) Cognitive Sciences (597) Formal Sciences (507) Arts and Humanities (19,665) Professional Areas (182) Other Academic Areas, Misc (77)
FILOSOFalando É UMA REVISTA GRATUITA . AGRADECE A SUA DIVULGAÇÃO . POR FAVOR, PASSE A OUTRO, PARA QUE PASSE A OUTRO .