Filosofalando 06

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revi s t a p o r t u g u esa d e fi lo so fia aplicad a

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A Democracia está em perigo? Janeiro-Março 2014 | Revista Gratuita

“A democracia já não é um dado adquirido”


re v i s t a po r t u gu e s a d e fi l o s o fi a a p l i c a d a

Ficha Técnica Director e Editor Alves Jana jalvesjana@gmail.com Publicidade 968 404 380 Designer Clara Jana clarajana.design@gmail.com Redacção R. 5 de Outubro, 423 2200-371 ABRANTES

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nº06

Zhi Xian, a líder de um novo partido recentemente criado na China, declarou: “Não estamos a tentar travar o domínio monopartidário. A concentração do poder mantém o país fora do caos, mas esta concentração deve ser feita de acordo com a lei”. Sabendo o poder, tanto económico como político, que a China está a afirmar no mundo, esta afirmação faz-nos pensar no que a mesma China vai defender como modelo de “boa” organização social e política. O estudo “A democracia já não é um dado adquirido” / “Democracy can no longer be taken for granted” alerta-nos para o facto de que a democracia está a andar para trás na Europa. Sobretudo, diz, na Grécia e na Hungria, na Bulgária e na Roménia. Mas nós sabemos o que se passa na França, com a subida da extrema direita, e na Espanha, com a tendência para a desagregação do todo político. E do Norte da Europa chegam-nos, de vez em quando, notícias pouco animadoras neste mesmo sentido. Sem falar do”inverno” muçulmano do Norte de África.

Registo na E.R.C. 126186

E cada vez mais estudos e autores nos vão alertando para os “perigos” que enfrenta a democracia ou mesmo para a ameaça do “fim da democracia”. Já vai longe tese do “fim da História”?

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Apresentação

Por isso decidimos dedicar o tema desta edição exactamente ao tema da democracia, nesta perspectiva. Porque o que nos interessa são os problemas. Que é necessário pensar. Para os quais é preciso encontrar vias de acção no mundo.

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Entrevista – Mendo Henriques

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Democracia | Alves Jana

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Mário Pissarra

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Nelson Carvalho

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Luis Barbosa

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PROJECTOS

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Radiosofando

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Notícias

Periodicidade Trimestral

Filosofia para Séniores

Comprometido com a acção no mundo tem estado Mendo Castro Henriques, professor da Universidade Católica, em Lisboa, mas que não se tem fechado no interior da Academia. Na entrevista deste mês fomos perguntar-lhe o que tem andado a fazer. E o mais que já é habitual em cada uma das nossas edições. Vamos a isso.

alves jana


MENDO HENRIQUES


à procura de uma sabedoria que só alcançamos se a partilharmos

por alves jana , via email

Mendo Castro Henriques NASCEU

(1953) e vive em Lisboa, onde é

professor na Universidade Católica. É licenciado (1977) e mestre (1985) em Filosofia pela Universidade de Lisboa e doutorado em Filosofia Política pela Universidade Católica Portuguesa (1992), a cujo Centro de Estudos de Filosofia pertence. Dirige aí a linha de investigação sobre Ética, Política e Sociedade. É neste âmbito que coordena os Colóquios Lonergan bem como a pósgraduação em Ética Das Organizações (2013). Em 2013 publicou, com Nazaré Barros, o Olá, Consciência!, um livro que faz rede com um portal e com iniciativas várias, procurando juntar uma “comunidade de filosofia” ||||||||||||||FILOSOFalando

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Olá, professor Mendo Henriques. Da licenciatura, mestrado e doutoramento em Filosofia é natural esperar-se encontrá-lo a leccionar na Universidade (UCP). Uma vez aí, já não é nada provável encontrá-lo a publicar um livro para o grande público. Pode sintetizar o seu percurso de formação e actividade profissional até chegar a este livro? Creio que era muito expectável que eu publicasse um livro de filosofia para o grande público. Por vários motivos. Uma boa parte das minhas atividades de lecionação foram sempre acompanhadas de numerosas conferências, nacionais e internacionais, e de intervenções na comunicação social. A minha especialização em filosofia política conduz, por natureza, a interessar-me pela coisa pública e pelas relações entre o público e o privado. Além disso, lecionei durante [anos] Filosofia no Ensino Secundário. E já publicara obras de divulgação sobre a filosofia de Bernard Lonergan em 2010. Para mim, a filosofia, desde que me recordo aos

A minha especialização em filosofia política conduz, por natureza, a interessar-me pela coisa pública e pelas relações entre o público e o privado. quinze anos ter decidido seguir esse percurso, nunca foi um exercício académico. Os meus ficheiros originais sobre o Olá, Consciência! - com este título - datam de 1998, com uma abordagem lonerganiana. Mas a verdade é que só após colaborar com a Nazaré Barros e de me aperceber da importância da filosofia dialógica de um Buber é que se deu a transformação que ||||||||||||||FILOSOFalando

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possibilitou a escrita do Olá. É um mesmo impulso que nos faz querer abraçar o mundo em todas as suas dimensões, com a música dos poetas, a sabedoria dos contemplativos, a sensibilidade dos criadores e a inteligência dos pensadores. Laços fortes e invisíveis ligam a humanidade universal, levamnos a aproximar do outro e a tratá-lo como um tu. Reconhecemos a humanidade do outro e por isso lhe queremos bem. Voluntários sem medo partem para locais longínquos e inseguros do planeta para acolher e cuidar de outros. É preciso cuidar. Sem medo. É preciso reconhecer. Na relação nos constituímos como pessoas, religamo-nos aos outros e ao mundo, em todas as suas dimensões. Que se propõe (com Nazaré Barros) com esta obra? E porquê este título? Olá, Consciência! é uma introdução à filosofia, editada em 2013, em Portugal e no Brasil e que tem tido um acolhimento muito significativo no grande público. Livro de iniciação aos temas da filosofia é, simultaneamente, um livro de filosofia aplicada aos temas da crise da época presente. Na heurística que adoptámos, consciência e eu são radicalmente distintos As neurociências apenas realçam certos aspetos da consciência; não a revelam. Para a filosofia, o eu é um fenómeno secundário, uma perspetiva entre outras que se apresentam na consciência. A consciência não é um fluxo no qual surge o eu que capta o mundo exterior; é, antes, a entidade em que dialogamos com os seres que se nos apresentam como objetos de conhecimento e sujeitos de reconhecimento. Como o “eu” implica um “tu”, e o eu, o tu e o “ele” implicam um “nós” e um “eles”, a filosofia tem pronomes, ao contrário do discurso científico. Tudo isto, creio que ajuda a evidenciar a escolha do título Olá, Consciência! É uma saudação ao diálogo, à procura de uma sabedoria que só alcançamos se a partilharmos. Creio que na sequência desta obra,


vimo-lo no projecto «A Sociedade Aberta – Encontros de Conhecimento», uma série de palestras na sede do Diário de Notícias. Que iniciativa foi essa e de quem? Como correu? A Sociedade Aberta é um consórcio criado por Luísa Sousa Otto, Suzana Ferreira e Ana PintoCoelho que tem promovido encontros desde o verão de 2013, na sede do Diário de Notícias. Ao sermos convidados – a Nazaré e eu - por estas pessoas, elas comunicaram-nos de forma que nos entusiasmou que o Olá, Consciência! era uma abordagem única para quem estava de fora da filosofia. E criaram-nos condições excepcionais para, em duas séries de palestras em Julho e em Outubro, falarmos sobre os poderes, os valores, os saberes e os amores. O público aderiu e esperamos que uma próxima edição tenha uma componente on line. Divulgar o apelo da filosofia foi o nosso objetivo.

à sociedade civil, num processo que levou a fundas modificações da CRP [Constitução da República Portuguesa], nomeadamente terminando com o Conselho da Revolução na revisão constitucional de 1982, sob a égide esclarecida do general Ramalho Eanes. Nos anos 80 e 90, com esse papel cumprido, a instituição militar procurou novos interfaces com a sociedade civil e foi nesse ambiente que eu fui convidado a integrar o IDN, após ter concluído o Curso de Defesa Nacional de 1992. Ao longo de vários anos, fui assessor, participando no Curso de Defesa Nacional, em Lisboa e Porto, nas áreas de Ciências Sociais e Políticas e no Factor sócio ¬cultural. Estava incumbido, juntamente com outros colegas, militares e civis, de preparar e participar em Mesas-Redondas, Seminários e Colóquios, nacionais e internacionais. Mais especificamente na área de Cidadania,

Tornar acessível o pensamento filosófico é partilhar um dos maiores patrimónios intelectuais da humanidade. Tornar acessível o pensamento filosófico é partilhar um dos maiores patrimónios intelectuais da humanidade. Por mais anos que passem, por mais crises que se sucedam, por mais voltas que o mundo dê, o apelo filosófico permanece inevitável. E consideramos decisivo que a divulgação filosófica ganhe visibilidade, fazendo circular ideias, e proporcionando uma tomada da consciência através da apropriação de temas filosóficos. Ocupou cargos de assessor e dirigente, entre 1993 e 2007, no Ministério da Defesa Nacional. Foi assessor do Instituto de Defesa Nacional (1993-2004) e ocupou o lugar de director do seu Departamento de Investigação (2004-2007). Um filósofo na Defesa? A fazer o quê? Numa palavra, a fazer cidadania. O IDN teve um papel histórico em Portugal no final dos anos 70, pois foi lá que se pensou e praticou a devolução do poder dos militares ||||||||||||||FILOSOFalando

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fui diretor dos Cursos de Formação para a Cidadania, em parceria com a UCP e Centros de Formação. Por eles passaram 427 professores do Ensino Preparatório e Secundário em 23 Cursos, realizados em várias cidades do país. A fim de coordenar tarefas entre o Ministério da Educação e Ministério da Defesa Nacional formou-se no IDP o Conselho da Formação Cívica, que contribuiu para a criação da disciplina de Formação Cívica, no Básico e Secundário, regulamentada pelos decretos 6/2001 e 7/2001, sendo ministro da Educação Guilherme Oliveira Martins. Coordenei ainda, no âmbito da Associação de Auditores de Defesa Nacional, o projeto Os cidadãos e o reordenamento da segurança e defesa em 1996, uma proposta para a substituição do serviço militar obrigatório pelo serviço militar voluntário, embora em termos diferentes do que passou a vigorar. Como parceria entre o IDP e a UCP - GEPOLIS coordenei o projeto Identidade Nacional no


Contexto Europeu. Tive ainda um papel relevante como diretor dos Cursos de Segurança e Defesa para Jornalistas, realizados em parceria com o CENJOR e como diretor da coleção Batalhas de Portugal, uma parceria entre a editora Tribuna e os ramos das Forças Armadas, de que resultaram 24 volumes. Também houve projetos sem sequência como o Dicionário de Segurança e Defesa. E em 2004, o ministro Paulo Portas recusou o Programa de Prospetiva que eu e o general Garcia Leandro, então diretor do IDN, tínhamos em mente. Com o advento do XVII Governo Constitucional de José Sócrates em 2005, não me renovaram em finais de 2006 o mandato de Diretor de Departamento pelo que regressei à escola. Um dos “seus” autores é Eric Voegelin (Colónia, 1901 – Palo Alto 1985; filósofo, historiador e cientista político alemão radicado nos EUA). Sobre ele publicou A Filosofia Civil de Eric Voegelin (1ªed. UCP, 1992, 2ª. Ed. UC Editora, 1994, 3ª ed. S. Paulo, 2010). Pode dizer-nos porque vale a pena ler este autor? Eric Voegelin foi um dos filósofos políticos mais influentes do século XX. A sua reputação começou quando exercia a cátedra de direito comparado na Universi¬dade de Viena mas, com a anexação nazi de 1938, teve de emigrar para os Estados Unidos. O seu livro A Nova Ciência da Política que expõe a teoria da representação em bases metodológicas anti-positivistas é o resultado e a síntese das investigações postumamente publicadas como História das Ideias Políticas, e cuja tradução estou a editar no Brasil, dado o desinteresse das editoras portuguesas. A monumental obra Ordem e História, levou a compará-lo a Hegel, Spengler e Toynbee. Voegelin actualiza uma linha de pensamento político que, partindo de Platão, Aristóteles e Cícero, passa por Tomás de Aquino e se revigora com Francisco de Vitória, Francisco Suarez, Johannes Althusius, Comenius, John Locke, Montesquieu e todos os que aceitam a ||||||||||||||FILOSOFalando

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perspectiva pluralista do político. Os autores modernos desta linhagem rejeitam a omnipotência do Estado, e os pessimismos e optimismos antropológicos de herança maquiavélica e hobbesiana. Nessa tradição clássica da liberdade, pouco importam as dicotomias entre conservadores e progressistas que ocupam habitualmente o centro dos debates. Para esta grande conversação, contribuem as correntes de matriz liberal, de marca ética, como Locke, Montesquieu, os federalistas norteamericanos, Benjamin Constant e o krausismo em Portugal e Espanha. As correntes de matriz socialista podem ir do federalismo de Proudhon e Antero à doutrina das guildes, às teses britânicas do self-govemment e ao cooperativismo de Sérgio. As correntes conservadoras podem reinterpretar o humanismo cristão através do neotomismo, do institucionalismo e do tradicionalismo e reagir contra a omnipotência do Estado soberano absoluto e indivisível. Mesmo algumas teses progressistas podem retomar as perspectivas da sociedade civil sem Estado, apreciar a auto-gestão e co-gestão dos germânicos e procurar no small is beautiful as clássicas teses da polis de há vinte e cinco séculos. É por tudo isto que Eric Voegelin se mantém vivo como filósofo político. Prestar atenção à sua teoria política da representação, que ele admirava na tradição constitucional angloamericana, permite recuperar outras tradições que a nós, portugueses, nos dizem muito. O ano de 1640 poderia ter sido o ponto de partida para uma ‘Portugalização’ de toda a Espanha, para usar uma imagem de Miguel de Unamuno. E, a partir de então, as teses da soberania popular, poderiam ter transformado a Europa do Sul e católica na vanguarda da Revolução Atlântica, precedendo as Revoluções Inglesa e Americana e evitando a ruptura de 1789. Não foi o que sucedeu. Mas a história é um processo em aberto, susceptível de inesperadas anamneses, um outro conceito da filosofia da consciência, acarinhado por Voegelin.


Outro dos “seus” autores é Bernard Lonergan (sacerdote jesuíta canadiano, 1904-1984). Da sua obra destaca-se, de 1957, Insight – Um ensaio sobre o conhecimento humano, traduzido por Artur Morão e Mendo Henriques (S. Paulo, É Realizações, 2011). Além disso, sobre este autor publicou Bernard Lonergan. Uma Filosofia para o Século XXI (S. Paulo, É Realizações, 2010). Pode ler-se que este foi (provavelmente) “um dos maiores filósofos do séc. XX”. Pode explicar-nos sumariamente porquê? (Ver, a propósito, bernardlonergan. wordpress.com) O pensamento filosófico do séc. XX faz-se de muitas abordagens e muitos autores. Segundo a indicação de I. M. Bochensky, essas abordagens vão desde as filosofias da matéria, às filosofias da vida, da essência e da existência, até às filosofias do ser, situando o homem no cosmos e além dele. Bernard Lonergan entendeu, como poucos, esta sequência de graus da realidade se repercute em gruas da consciência. O “provavelmente” indicado na pergunta é muito importante, porque evoca a relevância do conceito de probabilidade com que Bernard Lonergan entendeu refundar a ontologia de modo crítico. Conhecedor das origens gregas do filosofar, da tradição escolástica, do empirismo inglês e do idealismo alemão, foi criando uma teoria hermenêutica que serve de fundamento a todos os tipos de heurísticas, seja a do senso comum, da ciência ou da filosofia. A sua obra Insight (que se pode traduzir por evidência ou intelecção) propõe-se fazer exercícios de compreensão da consciência para a colocar ao serviço de um desenvolvimento pessoal e social. A intenção da obra é colocar cada um de nós a prestar atenção ao seu próprio conhecimento. Insight está estruturado para responder a duas questões: O que sucede quando estamos a conhecer? E o que conhecemos, quando isso sucede? A resposta à primeira questão viabiliza uma teoria cognitiva e uma epistemologia (caps.1-10). O capítulo 11 serve de enlace à segunda questão cuja ||||||||||||||FILOSOFalando

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resposta origina uma metafísica (caps.12-17) e a possibilidade da ética e da teologia (caps.18-20). Quem quiser, pode acompanhar Lonergan até às suas últimas conclusões. Quem quiser, pára pelo caminho, mas não sem ter antes penetrado a experiência da consciência. Que se pretende com os Colóquios Lonergan, que tiveram já seis edições? O último foi a 6 e 7 de Dezembro, sobre “Crise social e conhecimento de si”. Que balanço faz do que aí tem acontecido? A recepção de Lonergan em Portugal foi iniciada em 2007 pela Revista Portuguesa de Filosofia, dirigida por João Vila-Chã, com um conjunto de contributos nacionais e internacionais. Em 2010 foi lançada a edição portuguesa de Insight; Um ensaio sobre o Conhecimento, com edição minha, revisão científica de Artur Morão, e tradução de ambos. As traduções das obras de Bernard Lonergan Topics in Education e For a New Political Economy estão atualmente em curso. A difusão do pensamento de Bernard Lornegan tem sido levada a cabo através da organização dos Colóquios Lonergan na UCP com grande apoio de uma equipa em que se destacam Luís Lóia, Samuel Dimas, João Simas, e Joaquim Pinto. O 1º Colóquio Introdução ao pensamento económico de Bernard Lonergan teve lugar entre fevereiro e março de 2009; o 2º Colóquio Fórum Interdisciplinar Ciência, Filosofia, Religião decorreu de outubro de 2009 a fevereiro de 2010; o 3º Colóquio Os Valores não são Mentira em 01 de abril de 2011; o 4º Colóquio Bernard Lonergan em fevereiro e março de 2012; o 5º Colóquio Perspetivas Atuais de Filosofia Aplicada em 05 de fevereiro de 2013; e o 6º Colóquio Crise social e conhecimento de si, a 6 e 7 de dezembro de 2013. Em breve contamos que dará entrada nos prelos da UCE, uma obra que reúne o essencial destes eventos. Para além da relevância intrínseca da realização de encontros científicos, os Colóquios têm sido um importante meio de reunir colaborações de investigadores de filosofia e de outras áreas científicas, da Universidade Católica e de outras Universidades nacionais e internacionais, entre os quais estudantes de doutoramento e mestrado e de personalidades e organizações com trabalho de reflexão e intervenção


relevantes em áreas da filosofia aplicada - crianças, seniores aconselhamento, situações limite, organizações, empresas, cidadania, entre outras. Este caminho de reunir especialistas de diferentes áreas, escolas e métodos, para debates sob a égide de Bernard Lonergan tem demonstrado, para além de válido e concorrido, ser bastante pertinente e dotado de inegável atualidade. Uma dos seus mais recentes projectos na UCP é a pós-graduação em Ética das Organizações. Está em lançamento uma 2ª edição, o que supõe um balanço positivo. Como foi a 1ª edição, que já terminou? O Curso de Ética das Organizações, oferecido

2013, estando abertas as inscrições. Outro dos seus projectos é o Instituto da Democracia Portuguesa, de que é presidente da direção. www.idp. somosportugueses.com Qual é a filosofia e a missão deste Instituto? Fundado por escritura pública de 9 de Agosto de 2007, os objectivos do IDP são os de uma associação cívica que apresenta propostas inovadoras de políticas públicas. Queremos ver os direitos respeitados em concreto e não queremos um número crescente de pessoas a sofrer com o desemprego, a pobreza e a emigração. A transformação exige mudanças urgentes dentro do paradigma mas, sobretudo,

procuramos ultrapassar a reação padronizada de quem supõe a filosofia como um conjunto de abstrações, de escassa aplicação prática e de pouca valia no mundo competitivo pela Escola de Formação Avançada da FCH da UCP, visa capacitar os formandos a incorporar princípios de pensamento crítico e de responsabilidade individual e social nas suas vivências e procedimentos em organizações públicas ou privadas. Os formadores – Américo Pereira, Carlos Morujão, Carlos Marques, Joaquim Pinto, Nazaré Barros e eu mesmo - procuramos ultrapassar a reação padronizada de quem supõe a filosofia como um conjunto de abstrações, de escassa aplicação prática e de pouca valia no mundo competitivo, levando os destinatários a questionar a sua atuação, relativamente a colegas, funcionários, consumidores, parceiros e reguladores. Conforme o testemunho dos formandos, a 1ª edição que findou em Dezembro de 2013 atingiu esse objetivo, apresentando conceitos e metodologias de ética e pensamento crítico que obrigaram a uma reflexão abrangente e rica. A 2º edição começa em finais de fevereiro de ||||||||||||||FILOSOFalando

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exige um novo paradigma de governação em que os interesses comuns dos portugueses sejam promovidos. Pode dizer-se que o IDP nasceu com a percepção da crise mundial. O IDP seria um ‘think tank’, se vivêssemos num regime estabilizado. Mas tendo democracia política, Portugal não tem plena democracia económica nem social pelo que o IDP participa em, e apoia, movimentos da sociedade civil e da vida política. Com pouco mais de 400 associados e seis anos de actividade, e vivendo das quotizações, o IDP ainda está a ganhar maturidade. No portal www. democraciaportuguesa.com e nas redes sociais realiza informação. Os seus grupos de trabalho realizam eventos e relatórios sobre temas políticos, sociais e económicos. Os associados intervêm em fóruns sociais e entrevistas. Para falar da atividade mais recente, em novembro de 2012, o IDP publicou com a editora Bertrand, o livro PLANO C - O Combate da Cidadania. Após Lisboa, houve colóquios de


lançamento em mais 12 cidades. Em janeiro de 2013 promoveu o 1º Encontro Nacional de Movimentos Cívicos que reuniu 18 associações na declaração “O espírito de Miranda do Corvo” http://idp.somosportugueses.com/ site/?p=6066. Em outubro de 2013 foi lançada a iniciativa dos Clubes de Cidadania, que agrega sete mil pessoas, https://www.facebook.com/ groups/154234558082499 e que está a ultimar um conjunto de estudos e recomendações que darão origem ao livro PLANO C2 - Clubes de Cidadania, a ser lançado em Março de 2014.

a cidadania é a dimensão filosófica da política

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Em 25 de Novembro passado, vimo-lo na organização da Homenagem a Ramalho Eanes. Esta iniciativa tem também uma dimensão de exercício filosófico? Tem, certamente, uma dimensão de cidadania, como muito do que procuro fazer. E se consideramos que a cidadania é a dimensão filosófica da política, posso responder afirmativamente à sua pergunta. Tratou-se de resgatar o papel de alguém que estava a ser esquecido na história recente mas que é um exemplo vivo de valores éticos e cívicos, tão em falta atualmente. Num momento em que Portugal atravessa uma crise e mesmo uma emergência social, em que as famílias empobreceram, as empresas atravessam grandes dificuldades e o Estado ainda não se reformou a si próprio, ocorreu-nos criar um apelo e um estímulo para que cada um de nós, cidadãos, cumpra melhor o seu papel cívico. No testemunho público de 25 de novembro de 2013, nas intervenções dos oradores e na mobilização e adesão maciça de todo o país, confirmámos que o general Eanes desperta o que há de melhor em cada um de nós. A criação do Prémio Eanes, um “Nobel de cidadania” a ser atribuído a partir de 2014, com o valor de 50 mil euros, a uma pessoa ou a uma organização que tenham manifestado os valores que caracterizam Ramalho Eanes, será a garantia de que este espírito se vai reforçar.


Que pretende que seja o seu blogue “Duas Cidades” (duascidades.blogspot. pt)? Uma das suas ferramentas tem sido a Internet. Quais os problemas que tem encontrado e os resultados que tem tirado desta dimensão do seu trabalho? Agrego estas duas perguntas, uma vez que o blogue Duas Cidades foi uma intervenção que descurei, estando entregue aos cuidados do meu amigo André Bandeira, que lá publica. Desde a primeira página que mantive nos tempos do velho terravista.pt, até páginas pessoais que tenho e coletivas em que participo, à presença em várias plataformas e redes sociais - facebook, linkedin, youtube, twitter, academia. edu., e ao uso regular do e-mail, considero que tenho usufruído da minha identidade digital, e partilhado a mais maciça experiência de comunicação que a humanidade alguma vez viveu. Mesmo o curso de filosofia da área científica de filosofia da UCP, coordenado por Américo Pereira, tem um regime de b-learning, tornando-se uma experiência de vanguarda que está a atrair não só alunos portugueses como residentes do Brasil e de África. A internet é o nome corrente para o novo ambiente de comunicação das sociedades do séc. XXI. Na história, o único exemplo comparável é o surgimento da imprensa no séc. XVI, sem a qual não era pensável o mundo moderno. A internet com as suas plataformas e ferramentas está a moldar o mundo contemporâneo de uma forma nunca pensada. O pavor de um Big Brother, tão evidente em meados do séc. XX, foi eliminado pela inteligência coletiva e pela disseminação de informação na web. Os mestres da Google como Eric Schmidt e Jared Cohen em A Nova Era Digital (2013) chegam a falar de que, mercê da net, temos cada vez mais duas identidades, a física e a digital. Por tudo isto sou um admirador de Timothy Berneers-Lee que possibilitou a internet, ao inventar as ferramentas do browser, hipertexto e http. Mas creio que devemos distinguir entre informação, conhecimento e sabedoria. O

acesso à informação foi potenciado na web de uma forma espantosa e nunca antes possível.

O conhecimento pode-se adquirir na net, desde que haja critérios de relevância e de seleção dos materiais, o que supõe uma educação para as TIC. A sabedoria, essa não é um efeito da net; é um resultado da partilha e busca de conhecimentos em que o saber fazer nunca dispensará o saber questionar, olhos nos olhos, e procurando reconhecer o outro. Pode ler-se algures na Internet que, no âmbito da Filosofia Política prepara uma obra em 4 volumes “Animais Políticos: dos Megalitos aos Astronautas”. Pode levantar um pouco o véu? O que vai ser e quando? Atualmente, esse projeto dividiu-se em dois. Por um lado, a edição a meu cuidado, em 8 volumes da História das Ideias Políticas, de Eric Voegelin, pela É Realizações, de S. Paulo, dirigida por Edson Filho, um grande editor de cultura científica e filosófica. Já saíram os volumes 1,2 e 3 e deverá sair em 2014 o volume 4. Por outro lado, um volume final que servirá de complemento a aspetos da era arcaica da humanidade e do pensamento contemporâneo, que não chegaram a ser tratados por Eric Voegelin. Donde o subtítulo Dos Megalitos aos Astronautas, com ecos de Stanley Kubrick. No âmbito dos já referidos Colóquios Lonergan tem vindo a afirmar-se alguma reflexão sobre o que podemos chamar de Filosofia Aplicada ou Filosofia Prática.


Que entende por Filosofia Aplicada ou Filosofia Prática? Eu começo por dizer, algo ironicamente,

a ”Filosofia Aplicada” é “Filosofia, aplicada”. A vírgula diz muito. Significa que existe uma única filosofia mas com expressões multiformes que a conduzem ora à procura da máxima generalidade possível nas suas asserções, ora a afirmações ponderadas sobre instâncias concretas e particulares. Mas quer eu pense o que

geral, quer o particular, o ato de filosofar é um só, as referências e circunstâncias a invocar são as mesmas, os quadros conceptuais são idênticos. Os riscos, também. O impulso para o universal pode degenerar num pensar anónimo e imperativo, sobre o que afinal é plural, variado e único, caindo-se nas «visões do mundo» como as que os “semi-filósofos” atribuem a Descartes, Hegel, ou Sartre, ou um pensamento encapsulado nos “ismos” das correntes filosóficas que matam a espontaneidade da consciência. De modo inverso, a fixação no real individuado e concreto, por exemplo no que é só típico do Direito, da Arte, da Economia, do Ambiente, da Técnica, da Cultura, da Política, etc., tal como praticado pelas filosofias genitivas, “filosofias de”, pode mutilar a experiência da consciência. Posso extrair daqui várias conclusões. Em primeiro lugar, a “aplicação” da filosofia, para mim, nada tem a ver com a distinção entre teoria e prática, distinção que acarreta os equívocos de considerar a filosofia como inútil, ociosa, e desapegada do mundo, críticas que nasceram com o “primeiro filósofo”. “Tales caiu no poço”, sim. Mas, continua Diógenes Laércio, Tales alugou, sabiamente, lagares de azeite porque aplicou conhecimentos de meteorologia. A

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narrativa já não é o que era.

o filosofar também foi sempre um aconselhamento, uma ‘arte de tratar’ o ser humano em paralelo à «medicina da alma» , e foi sobretudo isso desde o tempo Significa ainda que

dos estóicos e epicuristas, as “filosofias” mais populares da Antiguidade. E o mesmo nas eras medieval, moderna e contemporânea. Tomás de Aquino fez filosofia aplicada quando usou o direito natural para redescrever a história de Israel. Pascal, Leibniz, Bergson e tantos outros fizeram filosofia aplicada nas respectivas “correspondências”– como Platão nas suas Cartas – ao dar conselhos éticos, políticos e pedagógicos. Camus e Ortega fizeram filosofia aplicada quando analisaram o “homem revoltado”. Wittgenstein fez filosofia aplicada nas investigações sobre a linguagem, Dewey sobre a educação, Lonergan sobre a economia. Os exemplos poderiam ser multiplicados, ad nauseam.

existem movimentos cíclicos que empurram a filosofia para remotas paragens académicas onde ela estiola; ou a puxam para a praça pública, onde concorre com as ideologias, as técnicas, e as sofísticas das várias épocas . As odisseias do Dito isto,

pensamento estão repletas de Cilas e Caribdis, de Circes, Nausicas, Cíclopes e Calipsos, que tentam capturar, prostituir, violar ou aniquilar a consciência. Aqui valem os avisos de Heidegger em prol da “experiência de pensar”, como valem os avisos de Martin Buber de que pensar o “isso” é muito diferente de pensar o “tu”. Reitero: para mim, “Filosofia Aplicada”, não é designação de “escola” ou corrente mas sim de atitude. Donde que os Colóquios Lonergan sejam


de Filosofia Aplicada. Como vê o estado da Filosofia Aplicada ou Filosofia Prática em Portugal? Considero-o promissor, desde que a filosofia aplicada seja atitude transversal a várias metodologias e não uma corrente específica. Curiosamente, mais do que procurar

trata-se de responder a apelos que vêm da educação, da gestão, da cidadania, da técnica, do direito, das ciências e da tecnologia, numa palavra: são as áreas de pensamento aplicado que exigem maior consciência de como operam e do que estão a fazer e, nesse sentido, requerem a presença da filosofia. A filosofia

campos de aplicação,

aplicada não precisa de se justificar; apenas carece de ser autêntica e superar as tentações da odisseia da consciência. Dito isto, gostaria de salientar o papel de José Barrientos-Rastrojo e, seguidamente, de Jorge Dias em trazer a filosofia aplicada para a universidade, tal como exposto na obra coordenada por Barrientos em A Filosofia Aplicada em Universidade. Trata-se imprimir um dinamismo à filosofia que ultrapasse os espaços das salas de aula, da investigação pura, e das conferências académicas. Na filosofia para crianças, desde que Zaza Carneiro de Moura trouxe para Portugal essa linha, vejo surgir os trabalhos de Teresa Santos, Dina Mendonça, Alice Santos, Maria José Figueiroa-Rego, Celeste Machado e Joana Sousa, lidando com paradigmas de tipo argumentativo e criando jogos de racionalidade. No aconselhamento filosófico, Jorge Dias e Nuno Lopes têm aberto caminho para terapias de integração e de resolução de conflitos. Na filosofia na gestão (na empresa), Joana Sousa

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com a sua tese de mestrado e agora Catarina Barosa com o Giro, Logo existo (2013) lançaram sugestões importantes. Alves Jana e Tomás Magalhães Carneiro têm sido pioneiros nos cafés filosóficos. A nossa experiência de ética das organizações, na UCP, com Joaquim Pinto e Nazaré Barros, entre outros, prepara novas edições. Esta lista não pretende ser exaustiva. Por exemplo, a chamada “filosofia portuguesa” possui no lema A experiência é a madre de todas as coisas uma fórmula que se me afigura de enorme valor no âmbito da filosofia aplicada. Como refletido nos dois recentes Colóquios Lonergan, de fevereiro e de dezembro de 2013, organizados pelo Centro de Estudos de Filosofia da Universidade Católica (CEFi), coordenado por Carlos Morujão, e cujos resultados vão ser publicados, a filosofia aplicada vive de quadros conceptuais abertos que cada “praticante” vai construindo. A vida profissional e de aplicação ao particular não tem que liquidar o amor à sabedoria, nem a academia pode esquecer a sabedoria do amor que nos aproxima da Filosofia, ou melhor, da multiforme experiência de filosofar. E no mundo? Admito que para o arranque das preocupações e ações da filosofia aplicada contemporânea tenham sido relevantes as obras de Seymon Hersh, The Counselling Philosopher (1980) bem como as de Lou Marinoff, Peter Raabe, Tim LeBon e Óscar Brenifier, vários deles, aliás, já presentes em colóquios e congressos em Portugal. Contudo, este arranque do «aconselhamento filosófico», «orientação» ou «consultoria filosófica», não esgota de modo algum o carácter aplicado do filosofar.

Nada mais longe da filosofia do que as pretensões de torná-la em «prática» útil e até rentável. Colocar a filosofia ao serviço de


um bem-estar – na saúde, no trabalho, na formação profissional, em situações limite – pode apenas ser, como adverte Carlos Silva, em texto a ser publicado, a «boa consciência» de quem pensa ajudar teoricamente, ou, no fundo, moraliza com inconfessa «má fé».

Nada é fácil, neste mundo de relações. Lutas pelo poder, guerra de vontades, aniquilamentos do outro. Humilhação, dor, sofrimento; variações ou distorções da relação. Incomunicabilidades. Conflitos, desprezo, maus tratos, não reconhecimento e não entendimento, nem atendimento do outro como um tu, como evidenciou Hegel na luta entre o senhor e o escravo. Mas o que a filosofia contemporânea trouxe ao de cima com Feuerbach, Buber, Baktin, Ricoeur, Lévinas e outros, é o papel do reconhecimento na vida humana. É preciso escutar a voz do outro. O reconhecimento não prescinde do outro. Pois é o outro que me torna em eu. O relacionamento é o nosso modo de ser. A solidão, a nossa dor e o nosso abismo. O isolamento, a nossa morte. Quais os filósofos – ou práticos – da Filosofia Prática, seja em Portugal ou no mundo, que considera mais importantes ou paradigmáticos? Creio que não me compete fazer essa apreciação, até porque não acredito em rankings de propostas filosóficas; a importância de cada filósofo depende do nosso ponto de partida e dos nossos objetivos. Pessoalmente, por exemplo, nunca atendi muito a Nietzsche porque tudo o que ele dizia já eu aprendera em Fernando Pessoa e o seu “drama em gente”; contudo, Pessoa foi influenciado por Nietzsche. Wittgenstein foi importante para mim porque ||||||||||||||FILOSOFalando

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me revelou que a filosofia não era um saber impressionista nem um mero humanismo anticientífico; assim, aos dezasseis anos decidi cursar filosofia, embora terminando o então 7º ano em Ciências, no Liceu Normal Pedro Nunes. Hoje em dia, Wittgenstein tem uma importância reduzida no que eu faço. O que vale sempre a pena é interrogar. Todos os dias, temos que recomeçar. Sem medo. Ser filósofo é saber colocar questões, e, sem medo, aventurar-nos na reflexão racional com a ousadia de ir para a outra margem. Voluntários sem medo do conhecimento e do reconhecimento. Voluntários da alegria. E, como diz Nietzsche em Assim falou Zaratustra, a alegria quer a eternidade, quer a profunda eternidade. Quer deixar uma palavra aos leitores da Filosofalando? Quero, em primeiro lugar, agradecer a Alves Jana esta ocasião de rever o que de exterior tenho feito. Mas quero, sobretudo, partilhar com os leitores da FILOSOFalando um encorajamento a seguir esta publicação, feita com um questionamento e uma capacidade de sustentação que dizem muito do que se espera da filosofia: não mais uma técnica de coaching intelectual, nem um empreendimento académico sobre a história do pensamento mas sim uma arte e uma sabedoria de questionar os quadros de referência com que vivemos e com que as sociedades se constroem. Creio que é esse questionamento o que mais importa. Sócrates deu o exemplo milenar do gnothì sautón, que traduzimos por “conhece-te a ti próprio”. Para mim, essa fórmula torna-se ainda mais exemplar quando inserida no âmbito do reconhecimento, que exige mais que um eu; exige o outro; exige a consciência.


PUBLICAÇÕES - LIVROS 2013 – Olá, Consciência!, – Co-autor com Nazaré Barros, Lisboa, Objectiva, 463 pp. Olá, Consciência! (Edição brasileira) S. Paulo, É Realizações, 425 pp. 2012 – Plano C – O Combate da Cidadania, Lisboa, Bertrand Editora, Coordenador e Co-autor com mais 23 autores, 352 pp. 2010 - Insight – Um ensaio sobre o conhecimento humano, trad. de Artur Morão e Mendo Henriques, S. Paulo, É Realizações, 728 pp. 2010 - Bernard Lonergan. Uma Filosofia para o Século XXI, S. Paulo, É Realizações. 2010 – Vencer ou Morrer, (romance histórico) Lisboa, Objectiva, 330 pp 2010 – 1910 a Duas vozes, Co-autor com Fernando Rosas, Lisboa, Bertrand Editora, 224 pp 2009 - Vitória e Pirenéus, 1813 - O Exército Português na Libertação de Espanha, Lisboa, Tribuna da História, 142 pp. 2009 – A Filosofia Política de Eric Voegelin, livro e vídeo livro, S. Paulo, É Realizações, 98 pp. 2008 - Dossier Regicídio; o processo desaparecido – Coordenador e Co-autor com João Mendes Rosa, Maria João Medeiros e Luiz Alberto Moniz Bandeira, Lisboa, Tribuna da História, 2008, 214 pp. 2ª edição com Prefácio do Juiz Rui Rangel, 223 pp. 2007 - Rodney Stark, A Vitória da Razão, Como o Cristianismo gerou a liberdade… e o milagre económico do Ocidente, Lisboa, Tribuna da História, 2007, – Coordenador e Prefaciador de “Introdução à edição Portuguesa”, pp. 17-40 2007 - O Erro da Ota e o Futuro de Portugal – Coordenador e Co-autor com mais 22 autores. “Em nome do interesse nacional” pp. 7-12 , , Lisboa, Tribuna da História, 2007, 272 pp. 2006 - Dom Duarte e a Democracia, Lisboa, Bertrand Editora. 2006 - Educação para a cidadania - saber & inovar, Mendo Castro Henriques, João Reis e Luís Loia. 2006 - Security and Migrations in the Mediterranean - Playing with Fire, Edited by Mendo Castro Henriques, Mohamed Khachani, IOS PRESS, Amsterdam, ISBN 1-58603-618-1 NATO Science Series, V: Science and Technology Policy. 2005 - Panorama da cidadania , Mendo Castro Henriques (Portugal) Edição em quatro línguas (Português, Espanhol, Francês e Inglês) da conferência de 22 Julho 2004, Luanda, ANGOLA, Fédération Universitaire des Universités Catholiques, Centre de Recherches, Paris. 2004 - De Legibus - Tradução da edição original de Coimbra, 1612, em latim, por Gonçalo Moita e Luís Cerqueira. Introdução de Gonçalo Moita. Apresentação de MCH, 1ª ed. Setembro, Lisboa, Tribuna, 2004 2002 - Salamanca 1812 - Companheiros de Honra – Autor Lisboa, Prefácio, 2002, 104 pp. (2ª edição revista e aumentada em 2005) 2001 - La Lys 1918 - Os Soldados Desconhecidos – Co-autor Co-autoria de António Rosas Leitão, Lisboa, Prefácio, 2001, 96 pp. 1999 - Educação para a Cidadania - em colaboração com João Reis, Arlindo Gonçalves Rodrigues e Filipa Pitta da Cunha. Prefácio de Jorge Sampaio e Apresentação de Guilherme d' Oliveira Martins Lisboa, Plátano. 1999 - Bem Comum dos Portugueses - em colaboração com Jorge Braga de Macedo e José Adelino Maltez, Lisboa, Vega. 1999 - A Monarquia Portuguesa - em colaboração com Gonçalo Ribeiro Telles, Henrique Barrilaro Ruas, Augusto Ferreira do Amaral, António Mª de Castro Henriques, João Aguiar e outros) Lisboa, Reader's Digest. 1998 - Introdução à Política de Aristóteles e bibliografia, Lisboa, Vega. 1996 - Estudos de Ideias Políticas *** De Erasmo a Nietzsche, De Eric Voegelin. Tradução e abreviação de M. C. Henriques, Lisboa, Ática, 1996 . 1996 - A Filosofia Civil de Eric Voegelin, Lisboa, Universidade Católica Editora. 1988 - Bibliografia Filosófica Portuguesa 1931-1987, Lisboa, Verbo. 1987 - A Filosofia Política no Integralismo Lusitano (Prémio Almeida Braga - Fundação Calouste Gulbenkian) (Em colaboração com Nazaré Barros, Luís Bernardo, José António Cunha) Lisboa, Ed. dos Autores. 1985 - As Coerências de Fernando Pessoa, Lisboa, Verbo. ID digital • netmendo@gmail.com • mendohenriques@fch.lisboa.ucp.pt • facebook.com/mendo.henriques • https://twitter.com/mendohenriques

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Nas nossas cidades modernas (…) as decisões que se tomam parecem apontar para uma intenção de suicídio coletivo. A consciência da unidade não existe. Ponto final. A água

não se recolhe. A comida não se divide de forma equitativa. A desconexão de uns com os outros é generalizada. A maioria dos seus habitantes defende os seus interesses individuais e de grupo. Os governantes também. Favorecem os seus amigos e destroem os seus inimigos – ou adversários, como lhes chamam elegantemente – sem se importarem com as consequências. (…) … os partidos políticos e os governos do mundo inteiro (…) Decretam bloqueios económicos,

destroem florestas, atiram para o lixo toneladas de comida que daria para alimentar milhões, e assim por diante. O resultado disto: estamos prestes a enfrentar uma crise mundial devido ao nosso egoísmo extremo.

Quando não se trabalha nem se pensa no benefício da maioria, trabalha-se como uma célula cancerígena. Tudo

aquilo que não une, separa. simples quanto isso.

Laura Esquível, Escreva a sua própria história, Asa, 2013, p.130-131.

Tão


DE MO CRA


A

democracia

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alves jana

não é o jogo


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A democracia não é o jogo, é a regra do jogo.

O futebol da Primeira Liga e da Distrital nem têm comparação, mas as regras são as mesmas.

No futebol como na democracia, as regras não são tudo, apenas definem as condições em que os jogadores podem fazer o jogo. Jogo que depende sobretudo da arte e da técnica dos jogadores.

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e actuam junto da opinião pública; a comunicação social, que não é apenas um espaço público mas também aqueles que nele actuam; as mais variadas organizações, que são outras estruturas de poder; e outros que aqui faltam, como a cultura instalada, os agentes externos e assim sucessivamente.

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A democracia não é nem nunca foi o “poder do povo”. Nem em Atenas, em que era o poder dos membros do Demos. Ou seja, em Atenas os senhores diziam “em nossa casa mandamos nós”. E mandavam. E mandaram matar Sócrates.

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Pode acontecer que em democracia a regra faça parte do problema e não parte da solução? Pode. Nesse caso, o problema é complicado.

A democracia tem sido, em muito, pensada como um bem metafísico, um bem em si, que acabará por impor-se por si próprio. Mas mostra a História que é um bem bastante raro e muito frágil.

A democracia é a melhor forma de governo de um povo quando esse povo tem os melhores cidadãos. E as melhores organizações. Perverte-se quando não os tem.

A democracia é uma criação humana, não uma criação dos deuses, absoluta. Por isso tem as fragilidades próprias de tudo quanto é humano.

Mas a democracia também faz um certo tipo de cidadãos: cidadãos democráticos. A democracia faz os cidadãos e os cidadãos fazem a democracia. É uma relação circular, mas não é tautológica.

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A democracia permitiu que Hitler subisse ao poder. E na Guiné Bissau as instituições democráticas não lograram ganhar raízes. Mesmo que Churchill tenha razão, ou talvez por isso mesmo – “a democracia é o pior dos sistemas de governação, à excepção de todos os outros” – parece que ela não garante grande coisa. Nem sequer se garante a si mesma.

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A mesma regra de jogo não garante o mesmo tipo de jogo com jogadores honestos e com jogadores desonestos. O mesmo com os juízes.

A democracia é a regra do jogo, mas o jogo depende sobretudo do que, com ela, vão fazer os jogadores. E os juízes.

Os jogadores na democracia são de vários tipos: os cidadãos, que votam, têm opinião e participam de outras organizações e estruturas; os partidos, que disputam o poder, o usam nos seus vários domínios e vigiam o seu uso; os especialistas, que participam das várias estruturas de poder

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A democracia está sempre sujeita à acção, interna e externa, daqueles que a fazem e daqueles que a desfazem. Ela é dinâmica por natureza. E mostra a História que nasce, cresce e morre. Nuns casos é mais forte e duradoura, noutros menos.

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A democracia não é um bem em si mesmo. Um bem em si mesmo é o ser humano, a pessoa. Por isso a democracia deve estar ao serviço das pessoas e não estas ao serviço daquela. Mas há quem pense diferente, muito diferente.

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Uma democracia em que 25% das pessoas (quando não é mais) vivem na pobreza, ainda é democracia? Uma democracia em que 50% dos 250.000 desempregados nunca mais voltarão a trabalhar ainda é democracia? Uma democracia em que… quantos por cento? dos jovens nunca terão ao longo da vida um trabalho digno ainda é democracia? Uma democracia em que o jogo instalado leva a que alguns poucos tenham “tudo” enquanto cada vez mais não tenham o mínimo necessário ainda é democracia? E não se trata apenas de dinheiro.


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A China, que tem cada vez mais poder no mundo, não pensa que a democracia seja uma boa forma de governar. E é de acordo com o que pensa que vai usar o crescente poder que vai ter no mundo. E apontando para si própria dirá que um poder forte e centralizado é muito mais eficaz. Que lhe vão responder os eventuais democratas?

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Se a democracia é “a melhor forma de governo”, porque é que não resolve os nossos problemas? Será porque não somos democráticos? Se não, então porquê?

Os que têm poder – pessoas ou organizações – usamno a seu favor. E parece normal que assim seja. Em democracia como noutra situação qualquer. Os múltiplos poderes, alguns deles grandes poderes, jogam no tabuleiro da democracia para fazerem valer os seus interesses. Porque haveriam de fazer valer os interesses de outros? Porque é que a minoria dos poderosos haveria de cuidar dos interesses da maioria dos menos poderosos, ou mesmo da outra minoria dos marginalizados da sorte social? Esta é uma questão decisiva.

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Uma das chaves da democracia é justamente esta: como é que alguém que tem poder pode chegar a pensar naqueles que não o têm? Não apenas, nem sobretudo, o poder político, mas qualquer poder – económico, cultural… – num contexto democrático.

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As regras da democracia supõem que somos todos iguais. Mas é uma suposição, não é um facto. Nem mesmo quando, na câmara de voto, parece que a regra é “um homem um voto”. Apenas parece. Porque nem todos os votantes são iguais, por exemplo em informação sobre o que está em jogo. Além disso, do resultado da votação não se segue um dado efeito, uma vez que o exercício de facto do poder político está condicionado pelo exercício, também de facto, de todos os outros poderes. Que, por vezes, ditam as regras, ou seja, fazem as leis.

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Quando, em democracia, os poderosos, ainda que por interpostos agentes, fazem as regras, fazem as jogadas e ainda fazem de árbitros, isso ainda é democracia?

As regras da democracia supõem que somos todos iguais. Mas a verdade dos factos é que em democracia somos todos diferentes e temos poderes diferentes. Será que a democracia é um regime ingénuo?

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A regra não faz o jogo. Mas com outras regras, o jogo é outro. Não se joga futebol com as regras do andebol. Só há democracia se as regras forem as da democracia. E não se resumem ao “cada cidadão, um voto”.

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A democracia só funciona como democracia quando alguns, suficientemente fortes, cuidam de que as regras não sejam viciadas. E sobretudo fazem com que os interesses dos menos poderosos sejam tidos na devida conta. Mas por que razão hão-de fazê-lo? E donde pode vir, em concreto, a força para fazê-lo?

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E, no entanto, di-lo a História, a democracia tem enormes potencialidades. Mas com que limitações? Não é verdade que tudo o que é humano é, por natureza, limitado? Mas é próprio do humano, di-lo também a História, esforçar-se por superar essas limitações.


a morte da democracia Breves notas sobre

mรกrio pissarra


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1. Aceita-se hoje, como uma evidência, que tudo o que é humano é histórico, isto é, surge num tempo, permanece, vai sofrendo alterações e, naturalmente, é desaparece. Isto não significa um aniquilamento, pois a sua duração no tempo deixa diferentes tipos de marcas e fecunda novas realidades que vão emergindo. Mais que um aniquilamento, as mortes em história implicam mutações, reconfigurações, permanências e superações, abandonos e fecundações de novos modos de ser e de estar. Estranha-se, pois, a preocupação com a morte da democracia. Conceptualmente parece uma preocupação e uma pergunta desnecessária. O que aconteceu a outros regimes políticos? Muitos transformaram-se e outros morreram. Por que haveria de ter a democracia um sorte diferente? Será que é mesmo de morte que falamos? Não deixa de ser irónico e paradoxal discutir este tema quando o número de países que se consideram consensualmente democráticos tem vindo a crescer. (1.ª vaga: final do século XVII – 29 democracias, recuando para 12 no início da II Guerra Mundial; 2.ª vaga: 36 em 1945, reduzindo-se para 30 em 1962; 3.ª vaga: inicia-se em meados dos anos 70 e acelera-se com a queda dos regimes comunistas em 1989.) Uma reflexão sobre o mistério da morte revela-nos que a morte não é problema. Os problemas são da vida. Os mortos não têm problemas, mas os vivos têm e muitos! Se assim for, então não há nenhum problema com a morte da democracia, mas muitos com a sua vida e o seu estilo de vida.

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É verdade que uma morte prefigura sempre separação, perda e sofrimento. Uma morte anunciada gera a angústia e a incerteza porque a suprema ameaça para a vida. A raiz deste mal-estar com o que alguns consideram o declínio ou mesmo o estertor da democracia reside no desejo profundo de preservar o que consideramos um bem. Muitos lutaram pela democracia e fizeram dela uma das razões da sua vida. Outros abraçaram-na como ideal e como a melhor forma de organizar e viver em sociedade, apesar de todos os seus defeitos. Esquecemos por vezes que tudo o que não tem defeitos não é humano. Na pior das hipóteses é o melhor regime de entre os maus. Como dizia Churchil, é mau, mas nenhum é melhor! Seja sob que aspeto for, quem a considera um bem preocupa-se com o seu declínio e eventual desaparecimento. Significa também que as grandes conquistas da democracia (o estado de direito, a liberdade de movimento dentro e fora do país, direito à propriedade, liberdade de pensamento, a liberdade de expressão, o direito de reunião, o direito de eleger, etc.) continuam a ser estimadas e desejadas. Significa ainda que continuamos a considerar vantajosos os sistemas democráticos em relação a todos os outros: a democracia ajuda a evitar a autocracia, garante os direitos fundamentais ausentes ou não garantidos nos outros sistemas, assegura aos cidadãos ampla margem de liberdade, ajuda as pessoas a proteger os seus interesses fundamentais, oferece uma oportunidade máxima para o exercício da responsabilidade moral, encoraja o desenvolvimento humano mais completo do que qualquer alternativa possível,

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promete um grau relativamente elevado de igualdade, tem sido a garantia para uma paz duradoira e tem garantido uma maior prosperidade, etc.. Mas será que falar na morte da democracia significa a deceção das pessoas porque a democracia não garantiu a todos: a abundância, a riqueza, a felicidade, a sabedoria, a saúde, a igualdade e a justiça? Adiante exploraremos esta hipótese. Neste caso, não será preferível falar em disfuncionalidades, fraquezas e debilidades, degradação e desregulação, captura e pirataria – considero os grandes grupos económico -financeiros verdadeiros haekers da democracia – em vez de morte da democracia? Há quem considere a democracia, sobretudo na sua forma liberal, o fim e a consumação da história. Após a queda do muro de Berlim em 1989, cegos pela ilusão de um mundo monopolar, apressaram-se a proclamar a chegada do seu paraíso na terra: a DEMOCRACIA LIBERAL. Agora era apenas uma questão de tempo, pois, ela tornar-se-ia ecuménica, cobriria toda a terra habitada. Esta euforia foi sol de pouca dura. O mundo monopolar revelou-se multipolar e a exigência de democratização nas intervenções dos Estados Unidos noutros países transformaram-se na mascarada de realizar eleições; as novas potências emergentes, na cena mundial, nem sempre podem ser consideradas democracias. Enquanto Gilles Lipovetsky, acredita convictamente, na reconciliação da humanidade pelo milagre das máquinas comunicantes, da panóplia tecnológica e dos direitos humanos, os arautos do mundo monopolar veem essa reconciliação na mundialização da democracia liberal. Nos dois casos estamos perante uma ideia perigosa, oriunda das religiões do livro, reinterpretada pela modernidade: universalismo. Mas este é entendido como a mundialização do Ocidente. A ideia de cultura-mundo 1 de G. Lipovetsky não passa de um véu de ilusão que cobre a realidade, escondendo os conflitos de interesses, os confrontos das potências e a luta entre as várias forças. Por outro lado, as vozes a suscitar dúvidas e críticas à democracia nos Estados Unidos e as preocupações sobre o seu poder no e sobre o mundo vão aumentando. Sirvam dois exemplos insuspeitos: a obra do prémio Nobel da economia de Joseph Stiglitz O Preço da Desigualdade 2. Escolhi duas citações para ilustrar o que afirmo: «O capitalismo moderno tornou-se um jogo complexo, e os que o vencem têm de ter mais do que um pouco de inteligência. Porém, os que vencem costumam também ter menos características admiráveis: a capacidade de contornar a lei, ou de moldar a lei a seu favor, a vontade de tirar vantagem dos outros, até dos mais desfavorecidos, e de jogar sujo quando necessário» (p.99). Mas não são só as regras e o jogo que estão viciados, é a alteração do coração da democracia. «Por que motivo a classe média não tem tido a influência política que as teorias comuns previram que deveriam ter, e por que razão o nosso sistema atual parece operar com «um dólar, um voto» em vez de «uma pessoa, um voto»? (…) Verificámos como os mercados são moldados pela política: as políticas determinam as regras do jogo económico, e o campo de jogo está inclinado para os 1% do topo. Se isto acontece, é porque as regras do jogo político também são moldadas por esse 1%. Esta história tem dois elementos fulcrais: a forma como a percentagem das pessoas é moldada, fazendo com que 99% assumam como seus os interesses dos

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G. Lipovetsky e Hervé Juvin (2011). O Ocidente Mundializado. Controvérsia sobre a Cultura Planetária. Lisboa, Edições 70.

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Joseph E. Stiglitz (2013). O Preço da Desigualdade. Lisboa, Bertrand Editora.

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1% (…); e os mecanismos políticos e económicos da própria votação» (p.192). O autor refere-se aos EUA, mas entre nós muitos, como recentemente o presidente nacional da Caritas, vêm alertando para a sobreposição da dívida, dos interesses económicos, etc. às pessoas. A austeridade pode matar as pessoas (e a morte tem muitas dimensões e caras…), mas os direitos do capital financeiro têm de estar garantidos. Além disso, quem não tem culpa pelo sucedido, está a pagar ao Estado - por imposição democrática e (querem convencer-nos) para nosso bem - para este garantir a irresponsabilidade especulativa dos bancos e as rendas e prémios dos responsáveis pela situação. O outro exemplo é tirado do livro recente de um antigo vice-presidente dos EUA - O Futuro. Seis Forças que Irão Mudar o Mundo de Al Gore 3. «Pior do que isso – desde a década de 90 do século XIX que a tomada de decisões do governo dos EUA não tem sido tão débil, disfuncional e submissa a interesses das grandes empresas e outros interesses particulares como atualmente. A gravidade do perigo representado por esta degradação da democracia americana continua a não ser compreendida pela maioria das pessoas. A subordinação da análise baseada na razão à influência do dinheiro e do poder na tomada de decisões dos Estados Unidos tem conduzido a escolhas políticas catastróficas, a um processo decisório esclerótico e a um enfraquecimento significativo da influência dos americanos no mundo.”

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Porém, hoje ouvimos falar no fim do Ocidente 4. Segundo Hervé Kempf o fim do Ocidente significa que um novo mundo é possível. Tendo a democracia, seja de que tipo for, o seu berço no Ocidente, poder-se há perguntar se o fim do Ocidente acarreta consigo a morte da democracia. Neste caso, o ocaso do Ocidente equivaleria à extinção de uma das suas mais nobres invenções e construções, a democracia. Pela mão do Ocidente o mundo tornou-se global. Historicamente o Ocidente colonizou pela força ¾ do planeta; politicamente, propôs a democracia e o Estado de direito ao resto do mundo; economicamente torna-se na primeira superpotência comercial do mundo. Mas é precisamente agora que a mundialização se consuma, que tudo parece entrar em crise e se anuncia a morte da democracia. Será que a democracia encontra um balão de oxigénio ou uma nova oportunidade no regresso aos nacionalismos do Estado-nação? É hoje óbvio que este não poderá ser o caminho seguro para a Europa... Mas não terá a democracia um valor universal? Dou a palavra a H. Kempf: «a democracia não é um valor ocidental – até porque o Ocidente derivou para um regime oligárquico, conservando da democracia apenas as suas formas externas, inclusivamente quanto às instituições e ao regime eletivo, já que a realidade do poder está nas mãos dos senhores das finanças. A democracia é um ideal vivo a que aspiram quer os ocidentais, destituídos da sua liberdade de agir devido à pressão financeira, quer os povos pobres, fartos de ter de suportar a exploração daqueles que os dominam 5.” Neste caso não estaremos perante a morte da democracia, mas daquilo em que os ocidentais a transformaram. O estertor e a agonia da democracia é a afirmação de uma desilusão e de uma incapacidade interna de se regenerar, As promessas não cumpridas sujeitaram a democracia e os seus ideais a uma erosão tal que os cidadãos deixaram de ter esperança

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Al Gore (2013). O Futuro. Seis Forças que Irão Mudar o Mundo. Lisboa, Actual.

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Hervé Kempf (2013). O Fim do Ocidente e o Nascimento do Mundo. Lisboa, Editorial Presença.

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O.C., pp.108 - 109.


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nela e de lhe dar credibilidade. Ou será que por detrás da retórica da morte da democracia se esconde uma outra preocupação: o declínio do domínio do Ocidente. O Domínio do Ocidente é o título de uma obra ilustrativa e significativa de Ian Morris 6. Como é a nossa imagem do futuro? Será que as nossas decisões do presente lhe garantem um futuro risonho como até há ainda bem pouco tempo se acreditava? Esse futuro preservará os nossos valores matriciais mais profundos e melhorará as nossas condições de vida? As sombras que envolvem esse futuro trazem já uma certeza: o ocidente não será o único centro do mundo. Assim a anunciada morte da democracia pode significar a perda de confiança na liderança dos Estados Unidos e da Europa, que tem acelerado a mudança no equilíbrio de poder no mundo 7. Estamos no fim de um ciclo. Um mundo bipolar - China e EUA? Um mundo pluripolar instável e mais perigoso? Neste contexto, a discussão sobre a morte da democracia é um tema que só preocupa os intelectuais do ocidente.

A democracia prometeu distribuir o poder, mas temos vindo a assistir progressivamente à sua concentração; convenceu os cidadãos que seriam representados, mas a representação derrapa, torna-se opaca e impotente; em vez de derrotar o poder oligárquico criou novas oligarquias; muitos espaços da vida social ainda não foram penetrados pelo espírito e pela vida democrática; a igualdade quer de oportunidades quer de participação na riqueza produzida não passa duma miragem e o crescimento das desigualdades tornam-se cada dia mais visíveis; o acesso de todos à justiça, à saúde, a uma educação de qualidade são mitos proclamados mais do que uma realidade efetiva; etc. O aumento das desigualdades faz perigar, inequivocamente, a democracia. Quem promete mais do que dá, dececiona. Um outro dos fenómenos mais corrosivos da democracia é a descarada e despudorado promiscuidade e corrupção reinante. A corrupção prejudica a fé na nossa democracia. A perceção da morte da democracia não se deverá a tudo isto? Todavia, podemos perguntar: o erro não estará nas promessas? Não terá a democracia prometido o que não poderia dar? Se a resposta for afirmativa, então poderemos e deveremos reequacionar a construção da democracia, mais do que proclamar a sua morte. A crescente desigualdade, a promiscuidade do poder político e económico-financeiro com a consequente corrupção, a captura do poder político pelo capital financeiro e pelas sociedades de advogados tornou-nos a todos prisioneiros. Tudo se foi tornando opaco, O ocidente, berço da razão crítica e vigilante, deixou que os poderosos se apropriassem dos próprios meios com que pretendem convencer-nos - e ao que parece com êxito – de que tem de ser e só pode ser assim. A agiotagem, a apropriação através de rendas imorais, a modelação legal dos seus interesses e o desprezo pela pessoa e pela sua dignidade são mascarados e justificados como o melhor para todos, a ausência de alternativa. Recuso-me determinantemente a aceitar a conclusão para que querem conduzir-me, como se se tratasse puramente de uma questão lógica: pior do que ser explorado é não ser explorado. A conclusão é inaceitável, mas devemos é questionar as premissas que nos são apresentadas como evidências inatacáveis. Uma das regras de ouro da lógica é: a lógica só pode preservar a verdade! Reequacionar a construção da democracia exige que se preste atenção a duas das causas da sua debilitação: a erosão do Estado-nação, por um lado, e a globalização, por outro. ||||||||||||||FILOSOFalando

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Ian Morris (2013). O Domínio do Ocidente. Lisboa. Bertrand Editora.

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Al Gore, O. C., p. 139.


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Quer a erosão do Estado-nação quer a globalização são normalmente apresentadas como uma perda de força das democracias. A democracia de um dólar ou um / euro um voto, em vez de uma pessoa um voto, a internacionalização empresarial e a globalização financeira retiraram ao Estado-nação as principais forças de controlo político sobre o poder económico. Isto aconteceu tanto com a globalização comercial (movimentação de bens e serviços) como com a globalização dos mercados de capitais (integração do mercado financeiro internacional). Abas contribuíram para a crescente desigualdade e a exigência de uma reconstrução da geopolítica e da geoestratégica. Com a globalização as grandes empresas aumentaram o seu poder negocial com os trabalhadores -constantemente ameaçados pelo desemprego – e sobre o poder político exigindo pagar menos impostos – ameaçando constantemente com a deslocalização para onde são mais baixos. O seu poder é tanto que as suas influências políticas lhe permitem moldar o mercado em função dos seus interesses, nunca revelando o jogo todo e, sobretudo, manipulando e enviesando a perceção da realidade de modo a tornar os explorados seus defensores. [Creio que uma forma de a filosofia se tornar mais presente na nossa sociedade é prestar mais atenção aos enviesamentos da perceção e do conhecimento8.] Nunca ouviremos as grandes empresas e os grupos financeiros dizer que a globalização os favorece ou que enriquecem à custa do empobrecimento dos mais pobres e das rendas exigidas aos erários públicos. Usam argumentos enganadores e falaciosos, fazendo passar a ideia de que toda a sociedade sairá beneficiada com a globalização. Procupam atirar para longe a escada por onde subiram e tentam convencer-nos que devemos fazer como nos dizem e não como eles fizeram e fazem. A globalização tem sido gerida, como Joseph E. Stiglitz mostra à saciedade na obra citada, «em prol dos 1% do topo, providencia um mecanismo que simultaneamente facilita a evasão fiscal e impõe pressões que dão às elites ricas a vantagem de negociar tanto numa empresa (…) como na política. Esta tendência não é limitada aos Estados Unidos; é um fenómeno global9». Ora esta situação gera a perceção de que se dá «um poder desproporcional às elites económicas, de um modo que fortalece ainda mais o poder económico dos do topo – reforça a alienação política e o sentimento de falta de poder e a sensação de desilusão. O sentimento de falta de poder ocorre em vários níveis da relação com o Estado10». Em resumo, a globalização estreita e nega as alternativas ao dispor das democracias, dificulta políticas mais igualitárias e justas, entrega o poder aos credores, turva a realidade apresentando-se como uma fatalidade, deixando, de facto, as democracias de mãos atadas, Significa isto que repensar e reconstruir a democracia em vez de anunciar a sua morte será tentar retomar o controlo sobre as forças que fugiram ao controlo do Estado-nação em finais do século XX? Não! A democracia não poderá ser pensada e reconstruída sem atender às novas realidades científicas e tecnológicas e aos novos contextos. A democracia não se pode alear das forças que estão a mudar o mundo e será a partir delas que irá esboçando o seu futuro e não a partir exclusivamente do seu passado. A democracia do Estado-nação não foi a democracia da Cidadeestado. A democracia do futuro (não simpatizo com o conceito de ciberdemocracia) não será como a democracia do Estado-nação. Não me atrevo a imaginar os seus rostos futuros. Esses possíveis rostos ainda estão enevoados e são irreconhecíveis e incertos. Mas serão, com toda a certeza, cativantes e capazes de, como ontem, seduzir os que acreditam que só na solidariedade de todos os seres humanos e no respeito pela Natureza se construirá uma vida digna de ser vivida. Com Hegel aprendemos na 9

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Joseph E. Stiglitz (2013). O Preço da Desigualdade. Lisboa, Bertrand Editora:218.

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O. C., p.206.


sua dialética do senhor e do escravo que o senhor nunca será livre sem a libertação do escravo. Os tempos que correm exigem que sejamos capazes de construir uma dialética da igualdade e da fraternidade para uma sociedade laica. Não se tratará, neste caso, de superar a religião, mas de manter os valores cristãos da igualdade e da fraternidade numa sociedade que se pensa e organiza sem tomar as referências religiosas como fundamento, pois teremos de construir uma cidadania do mundo, respeitando a ausência de referência religiosa e o seu pluralismo. Apesar das debilidades, fraquezas, piratarias e limites da democracia, pessoalmente, gostaria de ser considerado um anónimo cabouqueiro dos alicerces de uma democracia do futuro em que as conquistas da liberdade fossem acompanhadas por uma fraternidade e igualdade crescentes.

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EA

O FIM DA DEMOCRACIA NELSON CARVALHO


Quando, em 1989. Francis Fukuyama escreveu o artigo “The End of History”, e o retomou em 1992 com o livro “The End of History and the Last Man”, estava longe de pensar que muito pouco tempo depois a História lhe bateria estrondosamente à porta. Tinha sido a queda do Muro de Berlim e dissolviase diante de todos a grande contradição que tinha alimentado a História de um século: capitalismo / comunismo. Essa dissolução, com a implosão do universo da exURSS, abria caminho a uma nova fase: o triunfo da democracia liberal ocidental, que se generalizaria a todos os cantos do mundo, levando consigo o livre comércio e com ele a prosperidade e o bem estar a todos os povos de todos os continentes. Em 2008 Robert Kagan responde com “The Return of History and the End of Dreams”: a grande História regressa em força com novas contradições e novas linhas de fractura: democracia / autocracias (sob várias formas: China, da Rússia, Irão …) ou democracia / cleptocracia (sobretudo em África e Ásia) ou a questão do fundamentalismo - terrorismo fundamentalista islâmico /infiéis … Afinal a generalização da democracia liberal a todos os cantos do mundo não se verificava e outros regimes não democráticos (autocráticos) tomavam para si lugar no palco da História mundial, competindo com as democracias europeia e americana e ameaçando ocupar o seu lugar como actores principais. Em simultâneo, sim, o livre comércio, a globalização da economia e do sistema financeiro cria uma situação inteiramente nova e uma nova contradição que hoje se revela diante de nós. A soberania e poder do Estado – e falamos ainda do Estado Moderno, nacional por definição, soberano dentro das suas fronteiras – é hoje desafiado pelo poder do Mercado Mundial. A Política e a Economia, o Estado e o Mercado, a Democracia e o Dinheiro são hoje os novos deuses que se enfrentam na História do mundo. E se o Mercado é um deus maior, internacional, global, mundial, o Estado não deixou ainda de ser um deus menor, nacional, soberania confinada às suas fronteiras. ||||||||||||||FILOSOFalando

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E esta nova contradição é, em si mesma, ameaçadora e anuncia o vencedor. O Estado, a Política, o Povo a Democracia, a Soberania sofrem de uma crise de incomensurabilidade: na sua escala nacional são impotentes para regular, fiscalizar, sancionar, a realidade mundial do Mercado, da Economia, do Sistema Financeiro, do Dinheiro. A decisão política, o poder dos Estados, procura a consonância com os tecnoburocratas de Bruxelas, do FMI, do BCE como fonte de legitimação … a desfavor da legitimação perante o Povo e a soberania popular. Parece que entre o Povo e os Mercados a (não) escolha é: os mercados. A democracia em fim de linha? Ou ainda vamos a tempo de acelerar a integração política, construir grandes espaços regionais de soberania política que suportem, como disse Jacques Attali, um Forum Mundial Democrático, talvez apoiado numa moeda mundial, num Baco Central Mundial e num Tesouro Planetário?

Uma utopia democrática num tempo sem utopias? …


ESTÁ A

DEMOCRACIA EM PERIGO?

luislmb@gmail.com

LUÍS MARQUES BARBOSA


Confesso que o tema sobre a perenidade da democracia me deixa sempre uma certa perplexidade. Primeiro porque começo logo por pôr uma primeira questão que, ao invés do que muitos pensam, me parece aquela que de início se devia colocar, mas que, curiosamente, não vejo nunca aflorada, mesmo por parte daqueles que tão ferverosamente se dedicam à vida política. A curiosidade é que tendo já tentado perguntar a uns quantos, qual a ideia que fazem deste conceito, vejoos, ora tímidos nas respostas, ora dando prova de grande convicção sobre o seu conteúdo procurando dar mostras de um enorme domínio do mesmo. O interessante é que um remate mais ou menos circunstancial que todos, ou quase todos dão, é expressarem que a democracia é o sistema político onde, quem manda é o povo. Fico-me sempre na posição de quem ouve sem questionar os interlocutores. Não por que os mesmos me não me mereçam respeito, mas porque a resposta deixa-me de facto a pensar. Primeiro, porque a pergunta se a democracia está em perigo, tanto quanto me apercebo, ocorre quase sempre quando as sociedades, ditas democráticas, oscilam nas suas formas de estruturar o poder. Depois, porque quando se sente que esse mesmo poder estar a resvalar para outras formas, que em conta partida se avizinham não democráticas, e depois porque face à instabilidade se gera o medo de transformações que ninguém adivinha quais sejam. Porém, o que me torna mais perplexo, é que não sendo eu alguém que se considere um céptico, tenho destas coisas, uma visão que me leva a não ser assim tão crente nas coisas que vou constatando. Por isso, não estando nem do lado daqueles que pensam que a Democracia, e aqui nem me refiro à que neste momento sustenta o nosso sistema político, está em perigo, nem dos outros que por ventura possam pensar que ela, enquanto regime político muito usado, veio para ficar. Então a pergunta é, também para mim incomodativa. Primeiro porque correndo os livros vejo que a história nos conta que mesmo quando governadas por gentes e povos entendidos sabedores, lá veio um dia em que ||||||||||||||FILOSOFalando

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uns desarranjos sociais ditaram a reviravolta. Depois, porque ouvindo gente sábia, quase todos, senão todos, nos deixaram nos seus escritos, o alerta de que o maior perigo para as democracias é o poder financeiro. Contudo existe ainda uma outra questão que me deixa sempre a pensar mais que outras! Quando se fala de democracia como regime em que o povo manda, falase de quem? De todo o povo que compõe o mapa dos habitantes de um país? De todas as classes sociais que o timbra? De oligarquias que se apoderaram de gentes e territórios? De elites que a pretexto de terem visto sufragados, em urnas, uns quantos votos, se sentem no direito de se exibirem representantes do povo? Se estas são as primeiras perguntas que se podem fazer para avaliar a legitimidade de uma qualquer democracia, comecemos então por fazer um exercício simples. Neste momento, em Portugal metade da população do país não vota, a percentagem dos que vota nas tais elites não ultrapassou, nos melhores dos resultados 20%, para conseguirem governar é preciso que dois grupos parlamentares se juntem, para que através de casamentos de circunstância, façam passar as leis que lhes interessa, e por fim, veja-se bem, quando se anda na praça pública ouvem-se os maiores impropérios face ao que acabam por decidir. Mais intrigante ainda é que perante a declarada incapacidade de governar o país, declaração feita pelas ditas elites que chegaram ao poder, estas tiveram de pedir a “pseudo técnicos” estrangeiros, pertencentes a outros países, que viessem dizer como organizar a casa. Ponho então departe os livros que acima fiz referência, deixo de lado os que avisam que as democracias implodem por razões financeiras e limito então, como certamente muitos outros cidadãos do mundo o fazem a esperar que o mundo corrija as condutas humanas Mas atenção, enquanto jovem não foi assim que pensei, nessa altura agi com muita fé em torno da convicção de que a democracia era o melhor dos mundos, e até pensei que a tal ida para a Europa era de facto o caminho das gentes responsáveis, enganei-me, paciência. Hoje interrogo-me quanto ao facto de assistir, diariamente, à paulatina destruição de um sistema político a que uns quantos chamam democrático.


… esta é uma crise de descontinuidade. O modelo partiu e o passado não servirá para explicar o futuro nem serão válidas as opiniões de quem ainda vive nesse modelo antigo, dado que nem elas conseguirão apresentar opções válidas para o futuro. Paulo Carmona, Executive Digest, dez. 2013

Papa Francisco, Exortação apostólica Evangelii Gaudium, nº55

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As democracias nacionais são desmanteladas, porque os governos nacionais tornaramse, de facto, cada vez mais dependentes dos imperativos sistémicos de um ambiente global que já não controlam.

Presentemente, os cientistas políticos estão perplexos com um conjunto de atitudes ambivalentes dos cidadãos das democracias ocidentais contemporâneas. Enquanto a quebra da participação eleitoral, da militância partidária e de outras formas de participação política indicam a propagação da apatia política e, de modo mais geral, da alienação da política, minorias ativas e grupos de protesto reclamam uma democracia mais direta. Deixem-me chamar a esta paradoxal simultaneidade de reações contrastantes – indiferença política crescente e envolvimento intensificado – a síndrome da ‘pós-democracia’. Jürgen Habermas, “A democracia na Europa de hoje”, Atual / Expresso, 11.1.2014

A crise financeira que atravessamos faz-nos esquecer que, na sua origem, há uma crise antropológica profunda: a negação da primazia do ser humano. Criámos novos ídolos. (…) A crise mundial, que investe as finanças e a economia, põe a descoberto os seus próprios desequilíbrios e sobretudo a grave carência de uma orientação antropológica que reduz o ser humano apenas a uma das suas necessidades: o consumo.

Jürgen Habermas, “A democracia na Europa de hoje”, Atual / Expresso, 11.1.2014


pROJECTOS FILOSOFIA COM SENIORES OU A ARTE DE PODAR COM* Na última edição dos Colóquios Lonergan, na Universidade Católica (Lisboa, Dez 2013), Luísa Borges apresentou uma comunicação a partir do seu trabalho filosófico na Universidade Sénior de Azeitão. É esse texto que publicamos, dando assim a conhecer outro projecto de trabalho filosófico em contexto social. * Esta reflexão que propomos resulta do projecto do grupo de trabalho coordenado por Joaquim Pinto, constituído por Fernando Bento, Helga Ribeiro, Filipa Sítima e Luísa Borges Filosofia Com Seniores é uma designação que adoptamos, não necessariamente em oposição, mas paralelamente a, isto é, como coisa Outra, relativamente à designação de Filosofia Para Crianças. As razões desta destrinça de trilhos escolhida e, por conseguinte, de diferença de metodologias reflectidas e ponderadas, prende-se com a especificidade dos sujeitos convocados ao desafio que a tarefa de filosofar sempre significa. Nos Estados Unidos, a partir dos anos 50, as reflexões, investigações, propostas e práticas de Lipman, que estiveram na origem da Filosofia Para Crianças e na sua rápida disseminação pelo Ocidente Europeu, prendiam-se com as mudanças culturais e estruturais que haviam de marcar tão fundamente o Ocidente, ao longo dos anos 60 e 70. A partir daqui, torna-se porventura mais fácil de entender a originalidade e as diferenças de uma Filosofia Com Seniores. Nos últimos anos têm surgido, um pouco por toda a parte, comunidades de saber, sob a designação de Universidades Sénior, a que se juntam professores e formadores – em regime de voluntariado – das mais diversas idades, áreas e origens… Existe, pois, uma demanda por parte desta “geração” a que convencionámos chamar “sénior” de educação, conhecimento, cultura. Uma espécie de avidez intelectual associada a um desejo de partilha do seu próprio saber, ambas mescladas numa forma lúdica de vivência e construção destes projectos culturais. Temos, portanto, muitos sujeitos que pertencem a um vasto grupo geracional que procuram determinados serviços culturais e que – não os encontrando, inicialmente, na oferta local – os criam eles próprios, e neles se recriam. Quem são estas pessoas? A que geração, de facto pertencem? Como se constitui a sua consciência identitária de pertença – e de pertença específica a uma geração? E cada um de nós, a que geração pertence? De que “referenciais”, isto é, a partir de que “conjuntos de valores e princípios” orientou a sua vida ? De que raízes brotou esta consciência? De que paisagens se desenraizou? Que livros leu? Que roupas veste e vestiu? Como caminha? Levou reguadas na escola? Fez trabalhos de grupo? Havia visitas de estudo? Como eram as idas à praia e ao campo? Que músicas ouve e ouvia? Ainda são as mesmas? Que filmes viu e apreciou? Que filmes é capaz de ver e apreciar - ainda? Como era? Como foi o que viveu? Também aqui há uma revolução em curso, uma revolução de posturas e de mentalidades, porventura menos ruidosa, menos aparatosa do que as revoluções estudantis dos anos 60… Segundo Ortega Y Gasset “(…) em todo o presente existem três gerações: os jovens, os homens maduros, os velhos” (1971: 26) , necessariamente contemporâneos mas não coetâneos. Isto é, partilhando o mesmo espaço-tempo actual mas não a mesma experiência subjectiva de ser-se. Por que razão? Tempos diferentes podem “com existir” num mesmo espaço, como diferentes idades, sobrepostas como camadas. Que idade ou idades de facto teremos? Ser sénior significa uma determinada vivência e entendimento do tempo que se plasma e cristaliza numa determinada consciência. Esta construção, dinâmica e dialógica de e com referenciais, deve ser entendida, antes de mais, como uma duração longa. Como uma justaposição recíproca de mesmidade e de diferença em que se é sempre, paradoxalmente, o mesmo e outro de si mesmo. É-se um ser que dura no tempo, um ser que se estende, se dobra e se desdobra, se transforma, permanecendo, não obstante, o mesmo. Poder-se-ia objectar que a pós-modernidade transformou também a noção de juventude, paradoxalmente prolongando e encurtando a vivência da infância e da adolescência – ou mesmo da idade dita adulta. Mas também aqui nos parece específica a condição que ser-se sénior significa. A longevidade torna mais aguda a percepção do corpo e das suas metas e fronteiras substanciais e essenciais, enquanto consciência de si como ser múltiplo e uno, que percorreu e percorre diferentes espaços e tempos e a todos refere a si, na típica expressão, “no meu tempo”. Expressão que só adquire sentido, na medida em que é dita num aqui e agora em que se integra e que se antagoniza. Esta vivência agudíssima do tempo joga-se em sentimento de saudade dolorida – não apenas entendida como nostalgia – mas como juízo ou ajuizamento do que se fez; e expectativa relativamente ao que se pode ainda fazer, num futuro entendido como inadiável presente, como inexorável momento do aqui e do agora.

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Para melhor explanarmos esta condição, que viver-se ou conviver-se sénior significa, recorremos a uma metáfora literária, parafraseando o poeta Teixeira de Pascoaes em A Beira (Num Relâmpago). Metáfora porventura aborrecida da sua existência monótona, nas páginas de um livro sem leitores (1994: 79) e que, por meio deste artifício, emigra para a vida luminosa desta sala. No livro ou na situação “real” que este descreve, o poeta e alguns amigos percorrem a Beira numa alucinante viagem de automóvel e fazem uma breve paragem cerca de Oliveira de frades, onde a sede os aperta. Avistam uma “pastora de écloga camoniana”, no dizer de Pascoaes, e pedem-lhe água que os dessedente. A jovem assente e logo regressa, com um cântaro repleto de água fresca. Mas já não é a jovem pastora de há pouco, sendo não obstante a mesma, metamorfoseou-se: “É agora uma pobre velha, de cântaro à cabeça!”, nas palavras de Pascoaes. E nela vive e revive a jovem pastora de há pouco. Esta imagem clarifica o que pretendemos dizer. Existe um ser-se no tempo sénior de reinscrição de si mesmo que é, então, necessariamente, um tempo de regresso e revisitação a uma paisagem sua e de si essencial e primordial. Será desse modo, de igual forma, um tempo de reavaliação de si em termos de projecto de vida e de reordenamento de referenciais e de prioridades. Durante este processo, não existe ingenuidade, existe até, por vezes, um juízo implacável do que se fez que pode ou não ser acompanhado de mais ou menos intensidade de lucidez extrema e de sentimentos de frustração, na reconsideração das metas atingidas e por atingir. Gerando assim sentimentos de alguma ambivalência, entre a negatividade da frustração sentida e a satisfação pelos objectivos realizados. Mas, se não existe ingenuidade neste processo, existe já uma reconfiguração de si, nesta espécie de autocrítica radical e metódica de si mesmo. Tenderá a existir neste processo uma subjugação do pensamento ao sentimento (Pinto, 2013). Que ficou por cumprir das promessas da idade de ouro da infância e juventude? Que foi sufocado e submetido às exigências pragmáticas de uma idade da razão em que se era parte activa da geração, dita produtiva, dita “vigente”? E a conclusão poderá bem ser invariavelmente esta: a libertação é a finalidade afectiva que vale a pena (Pinto, 2013) A idade adulta poderá ser reconhecida como uma fase de integração social mas de alienação de si, produtiva apenas para outros, como o que será mais terrível, para outros de si que não a promessa da criança que se foi. E que jaz, perdida para sempre numa morte de si, dentro de um labirinto de si do qual se perdeu a chave. Reencontrar de novo esta chave, na paisagem labiríntica da consciência, é a tarefa a que se propõe a Filosofia Com Seniores. Mas como fazê-lo? No dizer de Ortega Y Gasset “O pensamento é o verdadeiro, o único automóvel” (1971: 124): o único veículo disponível, presentificando, e actualizando a metáfora de Pascoaes. A Filosofia Com Seniores poderá então ser entendida como uma viagem com (Pinto,2013), como uma aventura de riscos partilhada, em todo o seu rigor, em que o objecto se desobjectiva. Isto é, como uma demanda que não poderá ser vivida como coisa estática e solitária, mas como uma rigorosa ou socrática autopoiesis (Pinto, 2013). O que se propõe aqui é um regresso a uma atitude filosófica radical que implica a totalidade do ser como pensarse a si mesmo. Atitude de filosofia que abriga, contém e liberta, numa mesma espiral, “formando” e “formador” ou “reformando” e “reformador”. Entende-se assim esta prática de filosofia não como uma arte de semear, de lançar sementes a uma terra bravia e inculta, mas como uma arte de contar uma história ao contrário. Como quem procedesse dos ramos ressequidos de uma árvore para o seu tronco rugoso e deste para as sua raízes profundas. E depois, de saber empreender um caminho de volta, como uma arte de poda. Trata-se de renutrir e de reconstruir (Pinto,2013) todo um percurso de vida, toda uma história. Tudo se passa como se, nesse processo e desse processo de recontarse, brotasse uma nova floração, uma nova história, numa amorosa e platónica anamnese. Recordo-me de tudo o que fui e nesse recordar-me sou já outro de mim, recuando e recuando ascendo pelo “caminho rude e íngreme” ([Platão, República, 515e] 1976: 319) da filosofia a essa Idade de Ouro da infância perdida. Como Empédocles, nas Purificações (frg.115 Diels) afirma “Pois já fui rapaz e fui donzela, / fui planta e ave, e um peixe mudo que sai das ondas” (1990: 207). Uma metodologia possível: através do diálogo, ao invés de se apresentarem narrativas ou novelas já escritas, incentivarse-á a escrita de testemunhos ou histórias ou ficções de vida – na primeira pessoa. Procurar-se-á dar corpo a esses textos editando-os em algum tipo de suporte virtual ou tradicional (AA.VV.: 2013). A construção a par e passo de uma Filosofia Com Seniores implica uma desconstrução e atualização de referenciais cristalizados e calcinados pela vivência subjectiva do tempo, no tempo de cada um. E de uma concomitante reconstrução de si, que é também uma espécie de redenção (Pinto, 2013), um retomar do projecto essencial de si. Também aqui a Filosofia Com Seniores caminha sobre as fronteiras e desbrava perigosamente os caminhos, tropeça em escolhos que povoam as suas margens. Os obstáculos que se perfilam nesse caminho de irmandade entre ascentes (Pinto, 2013) (isto é, entre “reformadores” e “reformandos”) são inúmeros e tão diversos entre si, quanto os sujeitos que empreendem esse trilho. Haverá que percorrer e combater em paisagens agrestes, sitiadas por densas florestas de senso comum, mas

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também por matas espinhosas de bom senso. Paradigmas escarpados e profundos e aprazíveis vales de preconceitos serão outras tantas tentações para o repouso e a quietude. Adormecer nestas certezas estará fora de questão. Querer, poder, ousar e… falar, escrever e comunicar, por qualquer meio, serão a metodologia a imprimir aos passos. Mais do que deparar-se com obstáculos epistemológicos, o obstáculo maior com que o viajante destas paragens se confrontará será, obstinadamente, entranhadamente, ontológico (Pinto, 2013). Pois estará alojado e calcinado – irredutível, mas não inamovível – bem no âmago do ser de cada um de nós. Como poderão ser transpostos estes muros? Como poderá o ser – essa árvore criada e feita – conhecer-se a si mesmo, ser-se a si mesmo e exceder-se ou transcender-se nessa busca de si? Dois princípios que podem ser uma das bússolas possíveis nesta senda. O Primeiro: “O meu amor é o meu peso. Para qualquer parte que vá, é ele que me leva”(Santo Agostinho,1984: 363). O segundo: “Se me engano é porque existo”(Santo Agostinho, 2000:1051) Dois inícios de viagem que pedimos emprestados a Santo Agostinho. Será o peso das emoções a reconduzir os passos até à raiz, e a guiar as mãos até ao início dos troncos nodosos, até ao emaranhado conceptual e labiríntico dos ramos ressequidos. O caminhante é o juiz e o réu de si mesmo (Pinto, 2013) que renasce da consciência do erro, como condição de redenção e renovação de si mesmo, enquanto projecto de vida ainda por cumprir. Numa paisagem disfuncional, o caminhante reconquista não uma nova funcionalidade, mas uma refruição essencial de si mesmo em consciente liberdade. Redescobre o Outro em si, num processo onde se explicita a questão da vida – da sua vida – como projecto: como se dá agora com o Outro ou consigo mesmo? Como se entrega, recebe, como se recria e frui nesse Outro de si, nessa Alteridade absoluta? Questão de vida fundamental que já não se perfila sob a égide da coexistência, da contemporaneidade ou da coetaneidade, mas sim na intencionalidade e na intensidade da convivência (aqui, literalmente, vivência com) e da generosidade. A comunidade de saber – ou de ser – que se reconhece no polo irradiante de cultura e de cidadania que as Universidades Sénior representam constitui-se, então, como uma irmandade (Pinto, 2013), uma verdadeira, uma autêntica Companhia da Filosofia. Luísa Borges* *Licenciada em Filosofia pela Universidade de Lisboa, Mestre em Cultura e Literatura Portuguesa pela Universidade Nova de Lisboa, Doutorada em Literatura Portuguesa pela Universidade de Lisboa. Foi colaboradora nas revistas ColóquioLetras e O Escritor. Algumas publicações: O Lugar de Pascoaes. Epifanias da Saudade Revelada (ed. Caixotim), O Rio Secreto. A Senhora da Fonte (Chiado Editora). Professora na Universidade Sénior de Azeitão desde 2011. Obras de Referência: AA.VV. 2013 Plural-Idades, Testemunhos e Reflexões na Universidade Sénior de azeitão, 2012-2013 Coordenação de Joaquim Pinto, USAZ- Associação Cultural de Azeitão, 2013. EMPÉDOCLES 1990 Helade. Antologia da Cultura Grega, organização e tradução de Maria Helena da Rocha Pereira, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Instituto de Estudos Clássicos, Coimbra. ORTEGA Y GASSET 1971 Que É Filosofia, tradução de Luís Washington Vita, Livro ibero-Americano, LTA., Rio de Janeiro.. PINTO, Joaquim 2013 “Filosofia com Seniores”, transcrição de entrevista a Fernando Bento. PLATÃO 1976 A República, tradução e notas de Maria Helena da Rocha Pereira, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. SANTO AGOSTINHO 1984 Confissões, tradução de J. Oliveira Santos e A. Ambrósio de Pina, prólogo de Lúcio Craveiro da Silva, Livraria Apostolado da Imprensa, Porto. 2000 A Cidade de Deus, Volume II (Livro IX a XV), tradução, prefácio, nota biográfica e transcrições de J. Dias Pereira, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. TEIXEIRA de PASCOAES 1994 A Beira (Num Relâmpago). Duplo Passeio, introdução de António Mega Ferreira, Assírio & Alvim, Lisboa.

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pROJECTOS A filosofia na rádio: Radiosofando “Radiosofando transmite filosofía por radio para el filósofo que todos llevamos dentro.“

Assim se apresenta na cidade do México, o Radiosofando, um programa de “rádio pela Internet”, na Radio APyT, com assinatura de Victoria Carrasco. Dedicado à “reflexión, análisis y entrevistas de corte filosófico”, pode ser ouvido em www.radioapyt.com , aos sábados, das 10 às 11 hs e das 18 às 20 hs (horário central do México) e pode ouvir-se ainda “a través de la descarga gratuita de 4 Shared” em http://www.4shared.com/u/7Dtz4fuD/Radiosofando.html. Demos a palabra a quem sabe. Obrigado a Victoria Carrasco pelo contributo que nos enviou.

Antecedentes En 1982 se inauguró la Central de Abasto de la Ciudad de México con el propósito de lograr una mayor eficiencia en la comercialización de productos agroalimentarios, asegurando el abasto básico en condiciones adecuadas de calidad, cantidad y precio, para los habitantes de la zona metropolitana de la Ciudad de México y de otras regiones de la República. En octubre de 2010, se crea Radio Central de Abasto, dentro del Fideicomiso para la Construcción y Operación de la Central de Abasto de la Ciudad de México, con la finalidad de atender la necesidad cultural que requiere la operación del fideicomiso. Dentro de este marco cultural se crea el programa RADIOSOFANDO CON VICTORIA CARRASCO; programa radiofónico que es un espacio de reflexión crítica donde se propone, se analiza y se dialoga desde el punto de vista filosófico; sobre las principales problemáticas de nuestro tiempo. Se transmite en vivo desde abril de 2011 al mundo desde la ciudad de México a través de Radio Central de Abasto (hoy Central Radio) estación radial por internet del complejo central mayorista más grande del mundo.

Presentación RADIOSOFANDO CON VICTORIA CARRASCO surge como un programa de opinión, que desde el punto de vista de la filosofía aporta una visión nueva a los medios masivos de comunicación como lo es la radio por internet; ya que nuestro entorno cultural actualmente está regido por los medios de comunicación. La prensa, radio, televisión, cine, gráficos y medios electrónicos tienen una presencia y una influencia indiscutible y preponderante sobre nuestras vidas, que nos crean ciertos parámetros de formas de vida y aspiraciones que no siempre se adecuan a nuestra realidad sociocultural. Ya que nuestra forma de pensar, de sentir, de creer, la manera de expresarnos y dirigirnos al mundo tiene que ver con

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pROJECTOS lo que observamos y aprendemos directa o indirectamente a través de estos medios. Uno de estos medios es la radio, que nace por la necesidad de comunicar y transmitir cultura, ideas, noticias y entretenimiento. En México, la radio no se queda atrás con esta interacción y desde sus inicios, ha contado con un gran auge e importancia; tanto es así que ha sido la inspiradora de la televisión mexicana. De ella han surgido personalidades que aun son ejemplo a seguir dentro de este medio y que la han hecho estar a un nivel capaz de competir en el ámbito internacional. Estos iniciadores marcaron la pauta y las características esenciales que todo miembro de este gremio debía tener en cuanto a escala cultural, lenguaje y formas de comunicarse a la audiencia; a ellos se les llamó locutores y entregaron en gran medida, su vida y esfuerzo al engrandecimiento de la radio de nuestro país. Lamentablemente este ideal de llevar lo mejor al auditorio, en la actualidad ha degenerado a llevar sólo un vago entretenimiento y sensacionalismo que ha tomado preponderancia en el medio radiofónico; sin importar el contenido de la programación, sino cuanto y a cuantos radioescuchas, ésta es capaz de vender. Por lo que llevar un espacio de reflexión crítica a la radio resulta fundamental en nuestros días, el auditorio necesita tener a la mano el enfoque de especialistas de diferentes áreas, para tener buena información, de primera mano y que en la cotidianeidad no está disponible; para así poder tener un mejor retroalimentación de lo que pasa en su entorno y obtener de esta manera un juicio personal bien cimentado. Por ello la Asociación Nacional de Locutores de México A. C., que desde sus inicios fue formada para engrandecer a la radio mexicana; y a través de su Presidenta Nacional, la Dra. Rosalía Buaún Sánchez, auspicia un programa radiofónico de debate donde se analiza, se profundiza, se hace conciencia y sobre todo se dan propuestas sobre los tópicos principales de la sociedad actual. Este programa es conducido, producido y dirigido por Victoria Carrasco Sánchez, productora de radio desde hace 25 años quien ha trabajado en programas de Radio Red, ABC Radio, Radio Acir, Radio Tribuna, entre muchos otros. Además de contar con la licencia de locución desde 1998 y ser egresada de la Facultad de Filosofía y Letras de la UNAM.

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A História da Filosofia em gráfico O bloguer britânico Simon Raper, do blog Drunks & Lampposts, criou um gráfico onde pretende representar as contribuições doa vários filósofos ao longo da História e as relações entre eles. “Ele usou um algoritmo para processar dados extraídos da Wikipédia e montar o gráfico, onde cada filósofo é representado por um nó na rede e as linhas entre eles representa as respectivas influências. O algoritmo que produziu o gráfico foi programado para colocar os nós mais conectados no centro do diagrama, assim vemos os nomes dos filósofos mais influentes em tamanho maior e agrupados no centro. As cores representam as diferentes escolas e tradições filosóficas.” “Simon Raper publicou sua fantástica contribuição no ano passado em seu blog. Na ocasião, ele disse ainda que, no futuro, pretende “adicionar também a direção de influência com uma ponta de seta nas linhas”. Como se não bastasse o magnífico trabalho, Raper, por seu espírito perfeccionista, parece não estar completamente satisfeito com sua criação, sobre a qual ainda aponta algumas falhas. “A deficiência, porém, é que essa avaliação só leva em conta as linhas diretas de influência. Influência indireta através de outra pessoa na rede não entrará nele. Isso provavelmente explica por que Descartes está menor do que você pensa. Também seria melhor se os nódulos fossem dimensionados apenas pelo número de conexões externas, embora eu acho que, em geral, as diferenças seriam pequenas”, diz Raper.” Veja mais informações no blog dele (em inglês): http://drunks-and-lampposts.com/2012/06/13/graphing-the-history-of-philosophy/

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Onésimo Honoris Causa A Universidade de Aveiro assinalou no passado dia 16 de Dezembro os 40 anos de existência. Na sessão comemorativa, Onésimo Teotónio Almeida, que os nossos leitores encontraram na última edição (nº 5) desta revista, recebeu o Doutoramento Honoris Causa. Na ocasião, o homenageado começou a sua intervenção de agradecimento com as seguintes palavras: «A Europa pode ter deixado de brilhar no nosso horizonte colectivo, mas o que não pode deixar de continuar a nortear-nos são os valores que séculos de história europeia e ocidental nos moldaram, fazendonos sair de obscurantismos, de guerras fratricidas, de totalitarismos e da barbárie. Esses valores são os da modernidade, que vozes pessimistas contemporâneas julgam ultrapassados sem terem algo melhor a oferecernos como substituição.» (Discurso disponível em http://uaonline.ua.pt/upload/ med/joua_m_2514.pdf) A Filosofalando congratula-se com o reconhecimento do trabalho que Onésimo Teotónio de Almeida vem desenvolvendo há décadas, como tivemos oportunidade de brevemente testemunhar nestas páginas.

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PRIMER CONGRESO INTERNACIONAL JOSÉ BARRIENTOS: LA FILOSOFIA APLICADA DESDE LA EXPERIENCIA El pasado 4, 5 y 6 de septiembre [2013], en las magníficas instalaciones de la Universidad Tepantlato, en la Ciudad de México, cuna de Magistrados, Jueces de Distrito y destacados Juristas, se desarrolló el PRIMER CONGRESO INTERNACIONAL JOSÉ BARRIENTOS: LA FILOSOFIA APLICADA DESDE LA EXPERIENCIA, dentro del cual participó el Programa Radiosofando, que se transmite todos los sábados con la producción y locución de miembros de la Asociación Nacional de Locutores de México. Cabe señalar que dicho Congreso se transmitió en vivo por internet a todo México, a España, Portugal, Argentina, Perú, entre otros países, contando con la participación de diversas personalidades en el ámbito de la cultura tanto de México como de Europa, así como destacados comunicadores a nivel nacional. Dentro de ese marco cultural, el Comité Organizador del Congreso, liderado por la Dra. Rosalía Buaún Sánchez, Presidenta de la Asociación Nacional de Locutores de México, quien además formó parte del Comité Científico de dicho congreso , conformado por prestigiosos catedráticos de Universidades como la de Sevilla y Valladolid en España; Algave, Evora y U.C.P. de Portugal, entre otras; quienes invitaron a los locutores y Productores del Programa Radiosofando, Victoria Carrasco y Pedro Tello, como ponentes por la labor de difusión de la filosofía en la radio mexicana, la cual no sería posible sin el invaluable apoyo de la Asociación Nacional de Locutores de México, el FICEDA y Radio APyT, lo cual fue mencionado, reconocido y valorado dentro del Congreso Internacional. Dicho congreso estuvo encaminado a analizar, profundizar y difundir la filosofía aplicada, la cual ha sido desarrollada ampliamente por el Dr. José Barrientos Rastrojo, catedrático de la Universidad de Sevilla, director de la Red Iberoamericana de Investigación en Filosofía Aplicada y codirector de la cátedra de Hermenéutica Anagógica en España. Para poder dimensionar la importancia de este Congreso Internacional, hay que mencionar que además de que el Dr. Barrientos, además de haber sido invitado en más de 4 ocasiones al Programa Radiosofando, es también asiduo radioescucha. Victoria Carrasco

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