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Anais do I Encontro Internacional Brasil-França-Alemanha :: VI Colóquio Brasil-Alemanha

Fernando Oliveira organizador

Encontro Internacional Brasil-França-Alemanha VI Colóquio Brasil-Alemanha 01.09.2006 a 05.09.2006 As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo

EDITORA FIB



Fernando Oliveira organizador

Anais do I Encontro Internacional Brasil-França-Alemanha VI Colóquio Brasil-Alemanha 01.09.2006 a 05.09.2006 As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo

Centro Universitário da Bahia - FIB Faculdade de Comunicação Social e Marketing Programa de Pós Graduação em Comunicação e Mídias

EDITORA FIB Junho 2007


ANAIS DO I ENCONTRO INTERNACIONAL BRASIL-FRANÇA-ALEMANHA, Editora FIB, Centro Universitário da Bahia - FIB, junho/2007. ISBN 85-88858-35-5

CENTRO UNIVERSITÁRIO DA BAHIA – FIB Reitor: Nelson Cerqueira Pró Reitor de Graduação: Tomm Joe Elliot t Pró Reitora de Pesquisa e Pós Graduação: Sylvia dos Reis Maia Pró Reitor de Ar te e Cultura: Heitor Reis Pró Reitor de Administração e Finanças: Osvaldo Alves de Araújo

EDITORA FIB Coordenação Editorial: Maria Vicentini (vicentini@fib.br) Endereço: Rua Xingu, 179 – Jardim Atalaia – Stiep 41770 130 – Salvador – Bahia – Brasil Telefone: 55 71 2107 8313 Fax: 55 71 2107 8322 www.nupe.fib.br/editora

DESIGN E PRODUÇÃO GRÁFICA Projeto Gráfico, Capa e Diagramação: Flavia Gil e Francisco Sampaio (amaisd@gmail.com)

IMPRESSÃO E ACABAMENTO Empresa Gráfica da Bahia


SUMÁRIO 4

APRESENTAÇÃO

8

ENTREVISTA

22

A AÇÃO POLÍTICA JUVENIL NA CONTEMPORANEIDADE Sílvio Benevides

34

COMPLEXIDADE E CULTURA: LEITURA DA AUTOPOIESIS Fernando Oliveira

46

O RAP AFRICANO: UMA FORMA DE RE-LIGAÇÃO COM A DIÁSPORA? Mahomed Bamba

62

HIP HOP - POLÍTICAS E POÉTICAS DE INTEGRAÇÃO SOCIOCULTURAL Célia Maria Antonacci Ramos


APRESENTAÇÃO A

sociedade

torna-se

pós-

em favor das imagens do produto

moderna quando uma de suas

anunciado,

principais atividades é produzir e

uma nova imagem da marca

consumir imagens, dessa forma,

anunciante.

elas passam a influenciar sobre-

Sem dúvida que a percepção

tudo a juventude, determinar os

visual é uma das mais excitantes

planos futuros, as crenças indi-

formas de conhecer o mundo,

viduais e coletivas, afetar as

todavia as informações captadas

escolhas na tomada de decisão,

e codificadas pela mente do indi-

ganhando status de um substi-

víduo, sistema aberto aos discur-

tuto cobiçado da experiência

sos midiáticos e políticos, se

autêntica de realidade, indispen-

destituída de um senso crítico

sável à manutenção da cultura, à

sobre os valores e as imagens

saúde da economia, à estabili-

ofertadas, poderá proporcionar

dade da política e a tão sonhada

tão somente o acesso a uma rea-

enquanto

vendem

felicidade humana. “Imagem não

lidade da imagem, ou a uma rea-

é nada; sede é tudo”, propõe o

lidade guiada pela cegueira do

anunciante de refrigerante na

envolvimento, que o impede de

tentativa de mobilizar a juventude

desenvolver meios próprios de

4

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


observação, distinto e distante da

vestir de sistemas de signos este-

problemática da realidade vivida

reotipados fruto do trabalho cria-

no cotidiano e mais realista dos

tivo de profissionais produtores

perigos que se têm de enfrentar

de imagens positivas ou negati-

no dia-a-dia das cidades.

vas, capazes de influenciar o olhar

Se a juventude deseja entender

do observador - expectador, con-

como se processa essa manipu-

sumidor ou leitor. É um erro acre-

lação através das imagens – seja

ditar que essas imagens ficam

por interesse de políticos, publici-

armazenadas na mente como

tários, jornalistas, etc - a última

fotografias numa caixa de sapa-

coisa a fazer é enevoar as distin-

tos. Ao invés disso são avaliadas

ções entre as coisas no mundo, e

e interpretadas, segundo o que

a nossa percepção dessas coisas

elas representam no contexto de

quando elas estão distantes de

uma dada compreensão, a cada

nossos olhos, ou simplesmente

circunstância vivida pelo jovem,

representada nas imagens men-

indissociável de sua relação com

tais que elaboramos dessas coi-

a experiência real. As

sas, das imagens físicas, a exem-

midiaticas podem se converter

plo de fotografias e desenhos.

em imagens mentais do indivíduo,

As imagens da mídia associadas

permitindo que sua experiência

ao consumo, aos negócios, seja

seja definitivamente afetada como

oriunda da TV, do jornalismo, da

pensamento, atitude, ação.

publicidade e da moda, podem se

O jornalista e semioticista ale-

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

5

imagens


Entrevista

A

ÁFRICA ME

MARGINALIZOU com o Prof. Dr.

Manfred F. Prinz

Justus-Liebig Universität Alemanha

O PROF. MANFRED F. PRINZ, NASCEU NA ALEMANHA , PROFESSOR, JORNALISTA , ORGANIZADOR DE EVENTOS CULTURAIS, ATUANDO NAS ÁREAS DE LITERATURAS E CULTURAS PERIFÉRICAS DE ÁFRICA , BRASIL , ALEMANHA , DE TODO TIPO DE MIGRANTE, APAIXONADO PEL AS MÚSICAS DE MANU CHAO, PELO INTERIOR, DO MATO E DO SERTÃO.


FERNANDO OLIVEIRA O profes-

tro Universitário da Bahia (FIB).

reiras e das dificuldades para a

sor Manfred Prinz, da Justus-Lie-

Esse

investigar

questão da cidadania, da sobre-

big Universität de Giessen, na

sobre a temática das culturas

vivência e melhores condições

Alemanha, está vindo ao Brasil

jovens e das expressões cultu-

de bem estar da juventude. Pro-

pela segunda vez consecutiva

rais, estéticas e artísticas que

fessor, eu queria que o senhor

neste ano de 2006. Retornou

mobilizam os jovens na atuali-

falasse um pouco desse projeto,

para tratar de um projeto de pes-

dade, e que para o professor

dessas idéias.

quisa

envol-

Prinz têm se constituído em

vendo sua Universidade e o Cen-

caminho de superação das bar-

MANFRED PRINZ Durante uma

nas instalações do projeto, mas

muito semelhante. Em todos os

estada de vários anos na África,

têm a possibilidade de exercer

países a juventude representa

primeiro no Senegal e posterior-

atividades, de formar-se e, com

uma maioria excluída, excluída no

interinstitucional

projeto

visa

mente em Moçambique, países

isso, viver em melhores condi-

sentido jurídico, econômico, bio-

onde a maioria da população vive

ções do que viviam em suas famí-

lógico e de formação. Os jovens

em condições muito precárias,

lias. Depois de ter testemunhado

são chamados de “menores”; esta

participei na criação de um pro-

estas situações de carência em

definição de ser “menor” existe

jeto para crianças de rua desam-

países africanos, me vi confron-

em quase todas as línguas e

paradas, um projeto chamado

tado com condições parecidas no

representa

MOSAICO, na cidade de Tete

Nordeste do Brasil e senti que,

negativa que remete à deficiência

(província central de Moçambi-

apesar da diferença nos parâme-

e à marginalidade. Este apelido

que),

ou

tros econômicos, no fundo, a situ-

em si já mostra que a juventude

seja, as crianças não dormem

ação da juventude é globalmente

possui algo que tem que ser visto

projeto

semi-aberto,

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

uma

9

denominação


de um outro ângulo, uma vez que

criminados pelos adultos. É, por-

Acredito que isto seja possível. A

juventude significa também uma

tanto, preciso tornar-se adulto,

juventude não é necessariamente

explosão, a explosão da criativi-

esquece-se de tudo isso. Os pais

confinada a um certo período na

dade, da produtividade e até da

têm sempre a mesma atitude em

vida humana ou a uma idade arit-

sexualidade. A juventude é o perí-

relação aos jovens, ou seja, a

mética. A juventude é antes um

odo mais interessante da nossa

ênfase exagerada no “desenvolvi-

estímulo na nossa vida, a cada

vida. Vivemos entre vários blocos

mento humano” com a finalidade

dia nós nos renovamos biologica-

dominantes que são os pais e a

de superar esta fase difícil. No

mente e intelectualmente através

escola - e nos revoltamos. Esta

entanto, eu acho que, para ter

de nossas experiências. Se nós

revolta é o interstício que cada

uma visão realista da nossa vida,

nos fechamos perante as trans-

um de nós viveu, mas com o obje-

nós deveríamos continuar a viver

formações, então não vivemos

tivo de ser superado, pela razão

esta situação intersticial, de pro-

mais. Eu acredito que sem esta

de que se trata de uma fase muito

dutividade, de criatividade, de

explosão, sem esta renovação,

difícil, durante a qual somos dis-

contradições, e de complexidade.

nós deixamos de viver.

FERNANDO OLIVEIRA Professor,

ísmo e outros mostraram a

as contribuições que vinham das

o senhor traz aí duas coisas que

importância de se valorizar as

transgressões lúdicas e infantis.

nos chamam a atenção. De um

linguagens

e

Então o senhor nos rememora

lado aquele olhar que a cultura

com essas linguagens de se

isso quando diz que estar lá nes-

alemã proporcionou ao mundo

valorizar aqueles elementos fun-

sas culturas marginalizadas, o

desde o começo do século XX,

damentais da existência humana

embrião de uma explosão de

quando movimentos das van-

e, sobretudo, levar em conside-

criatividade latente e que pode

guardas artísticas como o dada-

ração nessa escala de valores,

ser trabalhada e expandida atra-

10

marginalizadas,

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


vés das inúmeras linguagens

e que alimentam de fato a ordem

juventude e de outro lado essa

hoje acessíveis e que emergem

estabelecida que está presa às

renovação proporcionada pela

a todo instante, como eu teste-

suas tradições, aos rigores dos

chegada

munho o hip hop, o grafite, esses

seus estatutos e que morreriam

Como que o senhor observa essa

movimentos que os semioticistas

se não recebessem essa injeção

manifestação aqui na Bahia, por

da cultura chamam de movimen-

de novidade. Então de um lado

exemplo?

tos das bordas, das culturas das

esse elemento criativo, trans-

bordas, das culturas intersticiais,

gressor, lúdico que vem com a

dessas

novidades.

MANFRED PRINZ Primeiro gosta-

tude, se não a levamos a sério,

da Polônia ou dos Estados Uni-

ria falar do grande perigo que

então viveremos uma catástrofe.

dos, se falamos das formas já

consiste

Os

gravadas

explosão,

na

repressão

desta

desta

velhos

são

proprietários,

e

comercializadas.

originalidade,

donos e continuarão sendo os

Estas formas são menos interes-

desta criatividade. Uma explosão

donos, e os jovens são uma maio-

santes do que o núcleo, o berço

proibida e suprimida torna-se

ria pobre e excluída, uma maioria

do Hip Hop que é a marginalidade

mais perigosa, um problema cru-

de carentes em vários sentidos, e

vivida pelas pessoas, que criam e

cial das sociedades em toda parte

este abismo, esta divergência que

produzem em suas casas e em

do mundo e também aqui na

está sendo criada entre as gera-

seus bairros esta forma de pro-

Bahia. “Se a sociedade não con-

ções é o problema fundamental

testo. Eles, os menos conhecidos,

segue revalorizar, recuperar, res-

em todas as sociedades. Você

são os mais autênticos, e o nosso

gatar...” Eis um discurso que eu

está mencionando o hip hop na

projeto deveria mostrar que eles

não gosto! Pelo contrário, se não

Bahia. Na minha opinião, o Hip

estão na base deste processo de

estimamos esta força da juven-

Hop do Brasil é parecido com o

criação de uma forma de arte. O

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

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A AÇÃO POLÍTICA

JUVENIL

Sílvio Benevides

SOCIÓLOGO E PROFESSOR-PESQUISADOR DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DA BAHIA (FIB). DOUTORANDO EM SOCIOLOGIA PEL A UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA).

NA CONTEMPORANEIDADE

Expressivas transformações nas

uma intensa ampliação das redes

tramas das redes de sociabili-

de coexistência e interdependên-

dade estão ocorrendo na conjun-

cia humana, por meio de um

tura

contemporânea

acentuado dinamismo das insti-

marcada por dois fatores signifi-

histórica

tuições sociais cuja abrangência

cativos. O primeiro se refere aos

atinge escalas globais, provo-

intensos questionamentos sofri-

cando o que Giddens (2002)

dos pelo projeto unificador e uni-

chama de interconexão entre

versalizante

influências

da

modernidade

globalizantes

num

clássica, ou, como escreve Fea-

extremo e disposições pessoais

therstone (1996), pela gradual

no outro. Isso implica estabelecer

perda de confiança nesse pro-

um

jeto. O segundo, diz respeito a

emancipatória que incorpore as

novo

padrão

de

política


sobre quais direitos seriam fundamentais para a juventude, 58% dos entrevistados consideraram os direitos sociais como essenciais para os jovens, contra 29% das

respostas

que

incidiram

De acordo com Abramo (2005) a

sobre os direitos individuais.

idéia de direitos está bastante

Diante desse quadro, Abramo

presente entre os atuais jovens

(2005) conclui que os jovens

do Brasil. Pautando-se em dados

brasileiros de hoje estão conec-

especificidades dos diferentes

de uma pesquisa nacional reali-

tados ao seu tempo histórico, no

sujeitos sociais. Não por acaso, a

zada pelo Instituto Cidadania em

qual muito do debate político,

defesa dos direitos, de acordo

2003 sobre a juventude brasi-

das mobilizações e disputas

com Bobbio (1992), se tornou no

leira, ela observa que a maior

sociais ocorrem com o intuito de

contexto atual a tônica da preo-

parte dos entrevistados (50%)

salvaguardar os direitos sociais,

cupação

dos

atores

sociais.

aponta os direitos individuais

constantemente

Estes reivindicam uma liberdade

como

importantes,

pelas mudanças processadas

objetivada em nome da tolerância

enquanto 43% mencionam os

no interior das esferas econô-

e da diversidade, preservando,

direitos sociais como os mais

mica e política, sobretudo após

inclusive, a diferença, a plurali-

significativos. Destes, emprego,

a queda do Muro de Berlin,

dade e as minorias, e não mais

educação e saúde despontam

marco da derrocada socialista,

direitos voltados para uma inte-

como os de maior relevância.

e a conseqüente consolidação

gração como homogeneidade.

Todavia,

dos princípios neoliberais.

os

mais

quando

interrogados

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

23

ameaçados


No atual contexto, os novos con-

tude no singular, mas sim em

agente aglutinador e impulsiona-

flitos e antagonismos, expostos

juventudes no plural. Segundo

dor das lutas de transformação

pela atuação dos atores sociais,

ela, as variadas situações nas

social. Tal crise, por sua vez,

migraram para um terreno des-

quais a condição juvenil é viven-

possibilitou a emergência de

centralizado em oposição à polí-

ciada, os diversos recor tes refe-

novas e pequenas narrativas,

tica partidário-parlamentar, con-

rentes às diferenças de classe,

como ressalta Scherer-Warren

figurando-se

Melucci

gênero, etnia, religião, sexuali-

(2002),

(1989) define como os novos

no

dade, etc, devem ser considera-

especificidades dos sujeitos, a

movimentos sociais que perce-

dos.

percepção

exemplo do que fazem os movi-

bem a subjetividade como um

somente é possível após a emer-

mentos feministas, gays, ecoló-

valor de ação política, de organi-

gência de uma concepção mais

gicos,

zação e de objetivação de condu-

ampliada de política que, além

humanos, entre outros.

tas sociais. E como afirma Arendt

de questões relacionadas à con-

Conforme argumentei em outro

(2001), a condição humana, em

figuração estrutural da socie-

trabalho [1] , o contexto histórico

todos os seus aspectos, tem

dade, abarque também questões

atual

alguma relação com a política,

per tinentes à subjetividade dos

demandado dos agentes sociais,

mas a pluralidade é a condição

atores sociais.

aquilo

de toda a vida política.

Essa mudança talvez tenha ocor-

define de atitude da moderni-

Por conta desse processo de

rido por conta daquilo que Heller

dade. Trata-se de uma maneira

pluralização

e Fehér (1999) chamam de crise

de pensar, agir e se conduzir no

Abramo (2005) chama a atenção

das grandes narrativas históri-

mundo, de modo que tudo se

para o fato de hoje se fazer

cas, que privilegiavam um deter-

apresente como uma tarefa a ser

necessário falar não em juven-

minado sujeito coletivo como o

cumprida. Equivaleria, segundo

da

24

que

vida

política,

Ora,

essa

fundamentadas

étnicos,

tem que

pelos

nas

direitos

constantemente Foucault

(2000)

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


ele, àquilo definido pelos antigos

atores políticos, sejam eles os

organização como nos tempos

gregos como Êthos. Diante das

eleitores ou os eleitos, apresen-

atuais. Logo, diz o filósofo, ela

contínuas crises do mundo atual,

tando-se,

assevera

dispõe de amplos meios para

os agentes sociais vêm, pouco a

Domingues (2002), como um

atingir os seus fins, ou seja,

pouco, perseguindo esse Êthos,

sólido baluar te dos projetos de

melhorar a vida das pessoas

pois estão percebendo a impor-

dominação alavancados ao longo

tanto do ponto de vista material

tância de se tentar condensar em

da modernidade, sobretudo, na

quanto social. Resolver o pro-

posições e ações coletivas as

sua fase atual.

blema da falta de conexão entre

causas defendidas por cada um.

Mas os projetos neoliberais de

os meios e os fins é, segundo ele,

Essas novas maneiras de agir,

dominação,

salienta

a grande tarefa da política na atu-

perpetradas

tal

qual

conforme

agentes

Ribeiro (2004), não são os únicos

alidade. Se isso não for feito,

sociais contemporâneos, resul-

fatores responsáveis pelo declí-

como parece não estar sendo, ela

tam daquilo que Ribeiro (2004)

nio do prestígio da política na

se desmoraliza. Dessa desmora-

chama de uma séria crise no

contemporaneidade. Talvez não

lização advém o que Bauman

âmbito da política tradicional,

sejam sequer os mais significati-

(2000) chama de esvaziamento

uma vez que esta, seja de

vos. Para ele, o grande desafio da

do espaço político.

esquerda ou direita, já não con-

política atual é o de construir a

Mas se a política está em baixa

segue realizar suas promessas.

liberdade contra a necessidade,

e é alvo de constante descon-

Segundo ele, isso se deve, em

imposta pelo discurso econômico

fiança,

grande par te, ao predomínio das

dominante de alto teor consu-

para o seu exercício, a despeito

políticas neoliberais assim como

mista.

da

dessa realidade atual? Segundo

ao fato da economia ter reduzido

humanidade a política desfrutou

Ribeiro (2004), o sangue novo

sobremaneira a liberdade dos

de uma liberdade de expressão e

(motivação) para a política no

pelos

Nunca

na

história

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

quais

as

25

motivações


COMPLEXIDADE E

CULTURA:

Fernando Oliveira

PROF.DR. EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA , DIRETOR DA FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL E MARKETING DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DA BAHIA-FIB.

LEITURA DA AUTOPOIESIS

O século XVIII disseminou no seio

O legado do século XX para a

da sociedade européia a imagem

contemporaneidade foi a atuali-

da condição humana diante da

zação da imagem do sujeito, do

existência, em face da contínua

ator-indivíduo que passa agora a

tensão a que estavam submetidos

ser visto como uma sistema vivo

os indivíduos em sua luta cons-

– individual ou coletivo – no

tante pela preservação da própria

curso de uma evolução autopoi-

vida, como um desafio equivalente

ética. A organização autopoiética

ao enfrentado pelo ator-indíviduo

desenvolve-se como fluxo em

no “palco da vida”, cabendo a

movimento; mas um movimento

cada um a responsabilidade pelo

sustentado pela alternância entre

desempenho de seu papel como

a estabilidade da ação mecani-

ator de uma cena social.

cista e de um mundo previsível, e


dade presente em cada realidade, que se manifesta através do caráter singular, único e irreversível de cada acontecimento. A singularidade se opõe ao mecanicismo, pois o singular nunca se exercida pelo ambiente para que

repete exatamente igual ao ante-

a organização apresente novas

rior, mas apenas parcialmente. O

estratégias de configuração rumo

sistema, seja ele o indivíduo ou

à evolução, é o que chamo de

uma coletividade, mantém sem-

a instabilidade, em seu caráter

estratégicas autopoiéticas, res-

pre aberta a porta para o ambiente

de imprevisibilidade, da presença

postas criativas em termos do

externo, portador da informação

do acaso – das condições alea-

produto que responde pela cria-

nova e através do qual penetram

tórias – que orientam o desloca-

ção do criador, enquanto o sis-

os novos ingredientes da criativi-

mento do sistema rumo ao des-

tema permanece lutando pelas

dade e por onde se manifesta o

conhecido.

suas condições satisfatórias de

fenômeno

Quando o sistema parte para o

permanência no ambiente social,

podendo também se apresentar

desenvolvimento de novas idéias

no ambiente cultural, no ambiente

como turbulência, instabilidade,

e mudanças de rumos de posicio-

econômico mercadológico e no

crise, entropia, e acaso. Nesse

namentos estratégicos, surge a

ambiente

Sua

sentido, toda obra, toda criação é

possibilidade de conquistar saltos

autopoiesis é por natureza cria-

aberta, o sistema é aberto ao

de crescimentos, trajetórias de

tiva, espontânea, livre e singular.

ambiente social, cultural, econô-

expansão - contração e a pressão

É esta descoberta da singulari-

mico e às novas linguagens artís-

da

linguagem.

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

da

35

singularidade,


ticas, capazes de produzir um

com o presente, num jogo entre

nismos cada vez mais elabora-

novo contexto de conectividade

a estabilidade da organização e

dos, emprenhados com a evolu-

nas relações de cidadania.

instabilidade

do

ção do ambiente informacional

A reflexão sobre as manifesta-

ambiente externo, já que o sis-

para construir ai sua própria

ções culturais e políticas da

tema evolui e o rumo da criação

evolução. A permanência do ciclo

juventude deve levar em consi-

é aber to ao exterior, pois de lá

de vida dos seres vivos fica

deração as categorias e os parâ-

advém a novidade, que faz o sis-

assegurada somente enquanto a

metros que temos para analisar

tema evoluir.

organização se conserva, atra-

o homem, quando este se torna

A condição sistêmica tem caráter

vés das redes de autopoiesis

objeto de cultivo do próprio

de universalidade para quaisquer

produtora de complexidades.

dinâmica

apre-

que seja a natureza da informa-

É essa condição de contínua

senta-se assim sob uma pers-

ção e do sistema em questão,

produção de si mesmo, através

pectiva em que ela própria pre-

seja ele midiático, biogenético,

da contínua produção e renova-

cisa ser inteiramente redefinida.

digital, social, sócio-econômico,

ção de seus componentes, o que

O que é criação agora é fruto da

cultural ou de natureza cognitiva,

caracteriza os seres vivos e o

emergência do ambiente sistê-

cerebral. A alta complexidade

que se perde com os fenômenos

mico do invidivíduo, no desenvol-

dos signos e das linguagens que

da mor te. É essa condição a que

vimento de seu curso evolutivo

povoam os sistemas comunica-

me refiro ao dizer que os seres

que se altera a cada momento no

cional e psicossocial, decorren-

vivos são sistemas autopoiéticos

fluxo da ação, apontando para a

tes da engenhosa capacidade

e

homem.

A

criatividade

que

estão

vivos

somente

realidade que toma a configura-

que temos para a criação e a

enquanto estão em autopoiesis,

ção de um fluxo contínuo de

produção de linguagens signi-

como diz o biólogo Humber to

informação e sua conectividade

cas, permite estabelecer meca-

Maturana (1997, p:197).

36

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


É esta condição de contínua produção de si mesmo através de operações de produção e renovação de seus componentes, que determina seu contínuo evoluir produtivo, como sistema produtor de linguagens e signos, que engenha, comunica, desenvolve, elabora e gera conhecimento novo para se manter no ambiente sistêmico. É isto que possibilita a criação de estratégias autopoiéticas.

Os seres vivos participam dos fenômenos em que participam como

seres

vivos

somente

enquanto a organização que os define como seres vivos – organização autopoiética – estiver invariante. Em outras palavras: o sistema irá se desintegrar se as mudanças estruturais não preservam a organização do mesmo. Um relógio de corda perde sua

O que é vivo de um ser vivo está

humano, pessoa ou sistema vivo,

determinando em seu corpo, sua

capaz de par ticipar da comunica-

materialidade e não a forma dele.

ção e de produzir leituras de

Como assinala o biólogo Hum-

signos,

berto Maturana:

ambiente externo. O observador

interpretações

do

pode atuar e fazer distinções, Cada vez que os membros de um conjunto de seres vivos constituem com sua conduta uma rede de interação, que opera para eles como um meio no qual eles se realizam como seres vivos, e no qual, portanto, conservam sua organização e adaptação, e existem em um coderiva contingente com sua participação em tal rede de interações, temos um sistema social. Em outras palavras, sustento que a organização descrita acima é necessária e suficiente para caracterizar sistema social; e que um sistema particular definido por essa organização gera todos os fenômenos próprios de uma sistema social em um marco de conduta especificado pelo tipo de seres vivos que o integram (Maturana, H. 1997, p.199)”.

classificar, perceber igualdades e diferenças, estabelecer relações através da rede de conexões em relação a outro organismo ou coisa exterior, que assume a condição de “objeto observado”, por sua vez também constituído como um sistema aber to, uma entidade autônoma tomada como fonte de informação. Esta é uma nova concepção do fenômeno cultural. Ela produz a certeza de que o problema da criatividade não pode mais ser creditada ao sentido de virtude,

condição de ser relógio se uma minúscula modificação estrutural

Para Maturana a imagem do

antes vista como restrita a um

gera o rompimento de sua corda.

observador equivale à de um ser

mundo elitista e rebuscado, toda-

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

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O RAP AFRICANO: UMA FORMA DE RE-LIGAÇÃO COM A

DIÁSPORA? Mahomed Bamba

DOUTOR EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO PEL A USP E PROFESSOR NA FIB E NA UEFS

INTRODUÇÃO A adoção do hip hop pelos jovens

americana. A identificação cultu-

africanos procede, sem dúvida,

ral dos jovens africanos com o

de uma vontade de afirmação

hip hop se completa com um

identitária por par te de uma par-

sentimento de responsabilidade,

cela significativa das populações

e de compromisso com as for-

jovens nas grandes cidades afri-

mas

canas. Mas, por outro lado, per-

ancestrais já existentes no conti-

fila-se por trás deste fenômeno

nente

uma situação atípica de for te

destes dois sentimentos marca a

identificação cultural e afetiva

singularidade do processo de

com uma manifestação ar tística

apropriação e mediação do hip

proveniente da diáspora negra

hop na África.

culturais negro.

tradicionais A

e

ambivalência


mas musicais mais representativas da contra-cultura dos anos

MÚSICA NEGRA E

CULTURAL

esta realidade: enquanto o rock

IDENTIDADE

sessenta e setenta ilustram bem continua informalmente sendo ção, seguida da aceitação rápida

identificado na cena da musical

ou progressiva de um determi-

internacional como uma música

nado ritmo musical, pode decor-

“para os brancos”, o reggae e o

rer de um fenômeno de modismo

rastafarismo conquista alegre-

imposto pela indústria cultural

mente a sensibilidade e os cora-

Apesar da incessante internacio-

globalizada. Mas esta experiên-

ções de gerações sucessivas de

nalização das formas culturais

cia de consumo musical pode

populações negras no mundo

nesta ‘modernidade tardia”, as

transitar por um processo de

todo. Em todos os casos, estes

experiências ar tísticas do sujeito

aclimatação e naturalização do

dois ritmos encontram-se inseri-

moderno continuam dominadas

ritmo em questão na nova área

dos em novos ambientes sociais

pelo velho e insuperável senti-

geográfica e social.

em que eles respondem a outras

mento de identidade cultural que,

A recepção de uma forma musi-

necessidades.

em muitos casos, tem configura-

cal numa nova área cultural é

O movimento hip hop surge na

ções mais étnicas do que estéti-

muitas vezes reforçada por um

virada dos anos 70 e 80, e se

cas. No âmbito musical, o rela-

for te sentimento de identificação

afirma rapidamente como uma

cionamento do sujeito com cer tos

cultural, que pode se transformar

forma de expressão ar tística e

ritmos impor tados pela mídia é

num gesto de apropriação e de

de reivindicação identitária junto

ainda mais ambivalente. A recep-

mediação cultural. As duas for-

aos jovens negros nas grandes

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

47


cidades americanas, mas tam-

racial. Uma vez transformado e

proporcionam

bém na Europa e na América

adaptado ao contexto de países

oportunidade de repensar, no

Latina. Na virada dos anos 80 o

de terceiro mundo, o hip hop afri-

plano teórico, as ambiguidades e

hip hop aterrissa na África. Em

cano se tornou uma forma de

paradoxos que marcam as rela-

meados dos anos 90 muitos gru-

reivindicação e de protesto social

ções culturais e, consequente-

pos de rap começaram a se for-

das mais apropriadas para, pri-

mente, as identidades culturais,

mar longe dos meios de comuni-

meiro, retratar através da arte, a

que existem historicamente entre

cação de massa; muitos deles

dura condição de vida dos jovens

a África e suas diásporas.

na maioria dos países da África

nos ambientes sociais urbanos; e

Como sabemos, o conceito de

ocidental. Esse primeiro movi-

em seguida, para denunciar os

identidade

mento de aceitação e apropria-

problemas sociais e políticos que

chave para Stuar t Hall indagar a

ção do hip hop pelos jovens no

continuam assolando os países

complexidade do sujeito “frag-

continente negro acabou dando

africanos depois de mais de 50

mentado”, mas também para

lugar àquilo que é convencional-

anos de independência.

questionar a lógica que sustenta

mente chamado hoje de rap afri-

Se tivéssemos que refletir sobre o

a construção das culturas nacio-

cano francófone.

fenômeno de aceitação rápida do

nais na pós-modernidade. Nos

O

rap

africano

cultural

formidável

serve

de

a

hip hop na África, sem dúvida,

rastros da discussão sobre as

essência da cultural hip hop. Os

uma das razões deveria ser pro-

culturas

jovens africanos não somente se

curada no velho conceito de iden-

conta, podemos perguntar, como

deixaram fascinar pelo jeito de

tidade cultural, tão bem discutido

Hall, sobre a natureza real e as

ser americano no hip hop, bem

por Stuart Hall ao longo de seus

dinâmicas das culturas regio-

como se identificaram a esta

escritos. As experiências musi-

nais,

forma musical na base étnica e

cais do rap nos países africanos

defendidas pelo mundo afora por

48

conservou

uma

nacionais,

urbanas

e

afinal

étnicas

de

tão

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


determinados grupos. “No mundo moderno, as culturas nacionais em que nascemos se constituem em uma das principais fontes de identidade cultural. Ao nos definirmos, algumas vezes dizemos que somos ingleses ou galeses ou indianos ou jamaicanos. Obviamente, ao fazer isso estamos falando de forma metafórica. Estas atitudes não estão

ral para empreender uma insti-

ambíguas das diásporas negras com sua terra de origem. Mesmo separadas geograficamente, diz Hall, as comunidades caribenhas radicadas na Inglaterra continuam fazendo parte das nações caribenhas por se constituírem elas mesmas em “comunidades

gante

imaginadas”.

literalmente impressas em nossos genes. Entretanto, nós efetivamente pensamos nelas como se fosse parte de nossa natureza essencial.” (Hall: 2003; p.47).

Mais do que isso, Hall vai partir desta idéia de identificação cultureleitura

das

relações

O HIP HOP: MOVIMENTO CULTURAL DIASPÓRICO POR EXCELÊNCIA Muito se falou e se escreveu sobre

dos griots e outros poetas e trova-

nentes. Como as “nações negras”

as origens longínquas do rap na

dores que faziam crónicas da vida

situadas dentro e fora da África,

África. As raízes históricas do hip

cotidiana na África.

podemos considerar o conjunto

hop seriam múltiplas; elas são

Ao mesmo tempo em que estas

da cultura negro-africana como

indiretamente relacionadas com

teses são fascinantes e permitem

uma cultura “imaginada”, isto é,

as tradições africanas que os pró-

re-ligar quaisquer manifestações

representada simbolicamente a

prios criadores e perpetuadores

culturais diaspóricas com a terra

partir dos aportes da África e das

do movimento hip hop reivindicam.

de origem, que é a África, por

diásporas negras. Neste sentido,

Nesta ordem de raciocínio, o rap e

outro lado, elas incorrem no erro

a cultura negro-africana, igual à

o canto falado do MC seria uma

de reduzir a cultura negro-afri-

cultura judaico-cristã, passa a

nova declinação da arte oratória

cana a um único de seus compo-

ser entendida como um “sistema

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

49


HIP HOP POLÍTICAS E POÉTICAS PROFESSORA CEART/UDESC; COORDENADORA DO PROJETO “POÉTICAS DO URBANO”

Célia Mª Antonacci Ramos

DE INTEGRAÇÃO SOCIOCULTURAL As festas populares vêm sendo

gra a diversidade social dos gue-

um rito de agregação de diferen-

tos e hoje representa a identidade

tes povos que habitam os espaços

dos

de exclusão social nas grandes

urbanas. Os movimentos corpo-

cidades. A mais contemporânea

rais, as vestes, as pinturas grafi-

delas é a encenação do hip hop.

tes e as atitudes entre os rappers

Organizada como uma perfor-

adquirem uma nova forma de

mance teatral em torno do grafite,

comportamento e são sempre

da dança break, da música rap e

recriadas no seu uso. Dependendo

do DJ ou MC, que animam e inte-

do meio de vida e das ansiedades

gram os participantes da festa, o

do grupo social e politicamente

hip hop, mais do que unir a coleti-

engajado, as expressões discu-

vidade, é um porta-voz que inte-

tem as necessidades locais.

habitantes

das

periferias


mento do mundo, através da palavra canto, dos sons das pickups, do swing do corpo, dos desenhos e letras grafitadas. Os instrumentos musicais, a voz, o favelas, os hip hoppers criam seus territórios próprios, não só enquanto

espaço

especialmente Atualmente, o hip hop vai além das fronteiras estéticas, é um estilo de vida, um comportamento, uma cultura, mas também, e principalmente,

uma

manifestação

político-social. Nesse sentido, é um instrumento ativista que as novas gerações das periferias das grandes cidades encontraram para se auto-afirmarem enquanto cidadãos do mundo.

físico,

político.

mas Como

assinala Bakari Kitwana: “Com o passar do tempo o hip hop tornou-se muito mais do que uma performance, tornou-se um meio político de viver, de se vestir e de reclamar por espaço público. O estilo de roupa hip hop vem transformando os sneakers e swearts dos proletários em moda de alta costura. E completa, o hip hop é o maior movimento cultural do nosso tempo. Indubitavelmente sob a influência da música, da moda das atitudes e do estilo da linguagem.”. (KITWANA, 2002, p.196)

spray e as vestes são armas simbólicas para essa guerrilha de conhecimento, reconhecimento e de entrosamento dos indivíduos com pouco ou nenhum acesso aos meios de comunicação dominantes, tais como: rádio, televisão, jornais, escolas e, também, a político-partidária. Desde o começo do século, a música serviu de porta-voz para estabelecer as relações ente os diferentes sujeitos que integram a sociedade. O hip hop, especialmente no seu ritmo, expressão vocal e letra dá continuidade a

Geralmente reunidos nas praças

O hip hop é uma rebelião poética,

muitos protestos que tiveram a

ou

que busca produzir um conheci-

música como aliada, como por

centros

comunitários

das

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

63


exemplo: o blues, o reggae e as

“nação hip hop”, com seus códi-

rias. Apropriando-se do vocabu-

bandas punks.

gos próprios e senhas específi-

lário próprio da comunidade do

Hoje encontramos algumas pes-

cas. Para tanto, seleciono o grupo

Capão Redondo e criando um

quisas publicadas em livros aca-

Racionais MCs, rappers paulista-

estilo de encenar próprio da

dêmicos, e muitas reportagens

nos, do bairro de Capão Redondo,

comunidade, os Racionais MCs

em jornais e revistas especializa-

na zona sul paulistana, próximo

divulgam

das em cultura hip hop, principal-

ao bairro Jardim Ângela.

periferia paulistana, criam uma

mente nos USA.

Na palavra-canto dos rappers

nova forma de protesto via pala-

O objetivo deste estudo é analisar

Mano Brown e Edy Rock saliento

vra-canto e imprimem na língua

e promover uma reflexão a partir

algumas expressões e gírias

oficial

de algumas músicas de raps bra-

que dominam a cena das per for-

sinais. Isso acontece devido a

sileiros, que introduzem em suas

mances, e são divulgadas nas

grandeza e abrangência dos

letras inovações semânticas de

festas e shows do grupo e, pos-

sons do rap, que ultrapassam

suas comunidades - gírias e

teriormente, impressas em CDs

as fronteiras das culturas peri-

expressões vernáculas - e estão

e vídeos, que circulam no Brasil

féricas e são ouvidas, cantadas

territorializando um novo espaço,

todo através do radio, da T V, das

e praticadas até mesmo nas

ou seja, criando uma verdadeira

festas populares e das dancete-

mídias oficiais.

o

dia-a-dia

novas

dessa

expressões

e

HIP HOP EM CENA – BREVE HISTÓRIA O hip hop tornou-se subitamente

ticularmente entre os afro-des-

De

visível no bairro do Bronx, em

cendentes e rapidamente se espa-

manifestação

Nova York, nos anos 70, mais par-

lhou pelas Américas e Europa.

surgiu entre os jovens descen-

64

origem

jamaicana [1] ,

essa

comportamental

As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo


dentes da África negra que habi-

Herc, também jamaicano, que, na

seu mestre de cerimônias - MC, a

tavam as montanhas da Jamaica

mesma década, exportou e ino-

fim de introduzir e comentar as

e cultuavam, desde os anos 30, o

vou as batidas do reggae para o

trilhas sonoras que falavam da

então

Bronx, em New York.

violência e da situação política

Selassié, conhecido como RAS

Familiarizado com os sons nati-

das

TAFARI MAKONNEN, deus sol.

vos de seu país, Kool Herc come-

assuntos de interesse da comuni-

Interpretando esse deus sobe-

çou a tocar no Clube Hevalo e no

dade como sexo e drogas. Coke

rano como um profeta bíblico,

Executive Playhouse, no Bronx e

La Rock, segundo Nelson George,

esses jovens sonhavam com o

logo introduziu novas formas de

autor do livro Hip Hop America,

Zion negro, que se eclipsaria

musicalidade ao reggae, dando

não era muito eloqüente em seus

sobre a dominância branca e os

origem ao rap. Ao invés de sim-

slogans, mantinha-se mais numa

permitiria voltar para a África

plesmente tocar as trilhas exis-

balada jamaicana, mas acabou

natal. Procurando suas raízes, os

tentes, Kool Herc, que era um

criando algumas frases que se

elos que os ligassem ao passado,

grande colecionador de discos de

tornaram slogans do hip hop, tais

os

imperador

etíope

Hailé

favelas,

além

de

outros

ficaram

vinil, começou a pesquisar trilhas

como Ya rock and ya don’t stop,

conhecidos, se inspiravam na

antigas e tocá-los de maneira

Rock on my mellow!, To the beat

antiga cultura africana, particu-

inversa, quebrada, estendendo o

y’all!.. (GEORGE, 1999, 19)

larmente da Etiópia, e criaram,

som até parecer uma nova tri-

Essas

entre outras formas de comuni-

lha [2] . Scratching foi como ficou

seguindo as quebras do som do

cação, a música reggae, que se

conhecido esse som, e DJ (disck

vinil invertido deram origem à

internacionalizou no sucesso do

jockey) o músico que o comanda..

telecopagem das palavras, poesia

jamaicano Bob Marley, nos anos

Além disso, Kool Herc convidava

e estética da poesia do rap.

70. Mas foi especialmente Kool

seu amigo, Coke La Rock, como

Com o sucesso de suas apresen-

rastafaris,

como

Anais do I Encontro Internacional Brasil- França- Alemanha :: VI Colóquio Brasil- Alemanha

frases

65

pronunciadas


Esta publicação foi produzida em junho de 2007. Capa Papel Cartão Supremo 200 gr/m 2 Miolo Papel Off-set 90 gr/m 2 Tipografia Mercedes, NimbusSteD e Goethe Titel.



Anais do I Encontro Internacional Brasil-França-Alemanha :: VI Colóquio Brasil-Alemanha

Fernando Oliveira organizador

Encontro Internacional Brasil-França-Alemanha VI Colóquio Brasil-Alemanha 01.09.2006 a 05.09.2006 As expressões políticas e culturais da juventude no mundo contemporâneo

EDITORA FIB


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