ETA

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ETA

O terror que nunca morre Sentimento de ultranacionalismo deixa acsea a vontade de grupo armado a dissociar-se da Espanha, levando como bandeira os ataques teroristas ha 50 anos por Flavia Drago

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ntre o noroeste da Espanha e o sudoeste da França existe uma região que, com o passar do tempo, reivindica sua autonomia. Denominada Euskal Herria (País Basco), essa terra foi fiel à sua cultura e soube defender-se dos inimigos que tentaram impor novas tradições. Não conseguiram. O grupo ETA (Euskadi Ta Askatasuna- “Pátria Basca e Liberdade” em euskera), criado na Ditadura Franquista, é o sentimento máximo desse desejo, que procura, principalmente por meios de atentados nas cidades espanholas e francesas, a conseguir transformar sua terra em nação. ETA reivindica, em território espanhol, a região chamada Hegoalde ou País Basco do Sul, que é constituído por Álava, Biscaia, Guipúscoa e Navarra; também reivindica, em território francês, a região chamada Iparralde ou País Basco do Norte, que é constituído por Labour, Baixa Navarra e Soule. Considerado um grupo terrorista pela ONU, os militantes do ETA perdem hoje a popularidade do seu próprio povo, mas ainda estão dispostos em atingir o objetivo maior de sua ideologia- o reconhecimento do País Basco como independente por completo.

O País Basco Os bascos têm mais de cinco mil anos de história. A sua origem é desconhecida, mas sabe-se que defenderam a sua independência contra romanos godos e visigodos, na Antigüidade e Idade Média. Tudo se originou com a parte do País Basco que conhecemos hoje por Na-

varra. A terra dos navarros foi chamada pelos romanos pelo nome de Vasconia. É o berço da língua navarroum (língua dos navarros), que é a língua atual da região, o euskera (que mais ou menos quer dizer “falante basco”). Não somente a língua, mas dá a origem a toda cultura ao seu redor. Os bascos são descendentes diretos da civilização pré-histórica franco-cantábrica, que povoou todo o terço norte da península ibérica e metade sul da França, representando, então, o povo contínuo mais antigo de toda a Europa. Entre os séculos XV e XVI a região foi submetida à Espanha, finalizando o processo de formação do Estado Monárquico, que havia sido iniciado com o casamento dos reis católicos Fernando e Izabel. A própria língua é a principal prova da resistência do povo. Dizem pesquisadores que ela está na região antes mesmo que o latim- ou seja, não tem relação com nenhuma outra família linguística conhecida. É isolada e considerada a única língua pré-européia que ainda sobrevive. Recebeu, porém, influência da França, como o sistema vigesimal numérico. Com origens misteriosas surgem mitos, por exemplo: ser a língua mais difícil do mundo; ou então, que ninguém que não tenha nascido na região não consiga aprender o euskera. A língua é o maior símbolo de nacionalismo do País Basco- uma identidade que os habitantes não querem perder e uma chama para o sentimento de separatismo com o resto da Espanha e França.


Franquismo Não somente a língua, mas grande parte da cultura basca sofreu forte repressão durante o final da década de 30 e que se encerrou na década de 70, com a morte do general Francisco Franco (1892-1975). Nessa época, desenrolou-se a Ditadura Franquista, de caráter fascista e católico conservador. Mas foi, antes de tudo, um regime extremamente centralizador. Toda e qualquer manifestação autônoma das comunidades regionais sofria dura repressão. A língua basca foi proibida, e seu ensino constituía ato de subversão. O uso das cores branco verde e vermelho, da bandeira basca, era duramente punido. A partir dos anos 50, porém, grupos iniciaram clandestinamente o ensino de euskera para preservar a identidade cultural basca. O endurecimento da ditadura aflorou o pensamento de resistência dos bascos- dando início às revoltas contra o governo e ao próprio movimento do ETA. Com o fim dessa autocracia, a cena política mudou e a transição para a democracia- com o Rei Juan Carlos I- trouxe alguma autonomia para a região. Mas apesar do fato de a parte espanhola do País Basco gozar de alguma autonomia - tem seu próprio Parlamento, polícia, educação e coleta de seus próprios impostos - o ETA e seus partidários linha-dura estão determinados a lutar por independência total.

Francisco Franco (1892-1975) foi contra as manifestações autônomas na Espanha em seu regime.

Início do movimento A formação da organização deu-se no ano de 1959 por dissidentes do Partido Nacionalista Basco (PNB) em que a maioria era estudantes. Os jovens se encontravam insatisfeitos com a falta de ação do PNB em relação ao Regime Franquista- estes faziam parte do PNB juvenil, o Euzko Gaztedi. Organizou-se, em primeira mão, um grupo universitário de estudos chamado Ekin (empreender em euskera), em Bilbao (capital do País Basco). Em 1956 as duas associações (Ekin e Euzko Gaztedi) fundem-se. Dois anos mais tarde (1958), os grupos separam-se por divergências internas, sendo que o Ekin converte-se em ETA no dia 31 de Julho de 1959. O historiador francês Bartolomé Bennassar, ao analisar o caso basco (“Pais basco: génesis de una tragedia, in Historia de los españoles. Vol II, 1989), identifica no desentendimento entre PNB e o ETA, um típico caso de conflito de gerações, em que os mais jovens rebelam-se contra o imobilismo dos mais velhos, no caso, os integrantes do PVB (em sua grande maioria ex-veteranos da Guerra Civil). Como não poderia deixar de acontecer, a nova geração foi estimulada pelos feitos revolucionários que então corriam o mundo (como a Revolução Cubana, que ocorrera em janeiro de 1959).No início, tinha como objetivo lutar por meios pacíficos, mas a política inicial se perdeu com o endurecimento do regime. E, por divergências ideológicas, desvinculam-se do PNB e decidem partir para a luta armada. Sua primeira assembléia aconteceu em 1962, no mosteiro de Belloc, na França. Suas resoluções eram:

A regeneração histórica, considerando a história basca como um pwrocesso de construção nacional. O que define a nacionalidade basca é a euskera, em vez da etnia, como fazia o PNB. Definem-se como um movimento não religioso, recusando a hierarquia da igreja ainda que utilizem a sua doutrina para a elaboração do seu programa social. Isto contrasta com o catolicismo do PNB. O Socialismo. A independência do País Basco, compatível com o federalismo europeu.


Primeiros ataques Grande parte dos assassinados pertencia às forças de segurança do Estado, mas houve também políticos, juízes, jornalistas, empresários e cidadãos comuns. Os métodos incluem especialmente carros-bomba, violência urbana e assassinatos selecionados. Não se sabe ainda qual foi o primeiro ataque do ETA, já que, no início, os militantes não assumiam os atentados. Porém, o primeiro que obteve grande repercussão, foi no dia 18 de julho de 1961, quando praticaram um atentado a bomba contra um trem carregado de veteranos franquistas em San Sebastian, dando início a fase mais violenta da luta. Em 1968 foi a vez do assassinato de Melitón Mananzas, chefe da polícia secreta de San Sebastián e torturador da ditadura franquista. Em 1970, vários membros de ETA são julgados e condenados à morte durante o processo de Burgos, mas a pressão internacional fez com que a pena fosse alterada, mesmo tendo sido aplicada a outros membros do ETA anteriormente. Estava ainda por vir, a ação mais espetacular e aplaudida por muitos exilados políticos foi o atentado que matou na hora o Primeiro Ministro, Almirante Luiz Carrero Blanco, provável sucessor de Franco, em 1973.

Novos tempos? Em 1978, a nova Constituição espanhola devolve algumas independências de direito ao País Basco, através de um Estatuto de Autonomia. A região ganhava órgãos de governo próprio e eram suspensas todas as restrições à divulgação da cultura dessa minoria nacional. As datas nacionais bascas passavam a ser livremente comemoradas e em muitas escolas o euskera voltava a ser ensinado. O processo de redemocratização do país fez com que

Os ataques continuam com o passar dos anos Se nos anos 70 a estratégia da organização foi “tiro na nuca” e suas principais vítimas eram militares, policiais e guardas civis, nos anos 80, durante o governo socialista, o ETA se dispôs a estender o terror mediante o uso indiscriminado de carros-bomba. Entre os ataques até os anos 2000, estão: 1 de fevereiro Morrem seis guardas civis em uma emboscada perto de Guernica

1984

(País Basco).

1980

23 de fevereiro É assassinado o senador socialista Enrique Casas, em São Sebastião.

1987

19 de junho Morrem 21 pessoas ao explodir uma bomba no estacionamento do supermercado Hipercor, em Barcelona. 11 de dezembro Explodem um carro-bomba contra a Casa de Quartel de Zaragoza, carregado com 250 quilos de explosivos, causando 40 feridos e a morte de 11 pessoas.

29 de maio Morrem nove pessoas ao explodir um carrobomba tele dirigido em no quartel da guarda civil na Cataluña.

1991


a população não visse mais sentido nos atos do ETAquanto mais eles sendo sangrentos. A partir desse ano, o movimento perde considerável apoio local, principalmente porque, o que era para ser considerada uma vitória após tanta reivindicação, praticamente não muda no modo de agir dos militantes fiéis. Querem mais: agora o desejo é a autonomia total da região. Ainda em 1978, os militantes se dizem contra a “pouca” autonomia que recebem do governo. Foram contra o Estatuto de Autonomia e continuam com suas atividades militares. Criam o braço político do ETA, o partido Herri Batasuna (HB).

1993 21 de junho Morrem sete pessoas ao explodir um carrobomba em Madrid.

19 de abril Tentativa de assassinato do então líder do partido de oposição PP, José Maria Aznar (atual primeiroministro), na explosão de um carro-bomba.

1995

Em 2003, o Batasuna seria declarado um partido ilegal pela própria ligação terrorista, tendo seu visto retirado pelo juiz Baltazar Gárzon. Alegou que o partido dava cobertura à facção Jarrai-Haika-Segi, que tem sido responsabilizado por inúmeros atentados. O Batasuna chegou a controlar 14 de um total de 75 cadeiras no governo. O seu banimento resultou no congelamento de suas contas bancárias, suas sedes e publicações. Em dezembro, numa tentativa de contornar a suspensão legal, o Batasuna forma os Socialistas Patrióticos, mas o governo da Espanha anula 1,5 mil candidaturas com supostas ligações ao ETA.

1997 8 de janeiro É assassinado o tenente coronel Jesús Agustín Cuesta. Recebe dois tiros na nuca no portão da sua casa, em La Estella. 12 de julho Sequestram e matam um conselheiro municipal basco, Miguel Ángel Blanco, provocando revolta popular e levando seis milhões de espanhóis a participar de protestos nas ruas do país conhecido como “ETA: BASTA YA!”.

2000 21 de janeiro Assassinato do tenente coronel Antonio García Blanco com a explosão de um carro-bomba em Madrid.


ETA ou Al-Qaeda? Foi no dia 11 de março de 2004 que a Espanha sofreu o maior ataque terrorista em sua história. As 07h30min, quatro comboios interurbanos foram alvos de explosões perto de três estações ferroviárias: Atocha, Santa Eugenia e El Pozo, em Madrid. De acordo com o ministro espanhol do Interior, Angel Acebes, que se deslocou a Atocha pouco depois dos atentados, quatro bombas colocadas nos comboios explodiram intervaladas em cinco ou seis minutos. Morreram 191 pessoas e mais de 1.700 ficaram feridas. Além disso, as forças de segurança encontraram mais três bombas, que segundo Acebes, estariam preparadas para explodir quando chegassem os primeiros socorros às vítimas. Era época de eleição na Espanha. José Luis Rodríguez Zapatero, candidato ao cargo de Primeiro-Ministro e líder do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) concorria com Mariano Rajoy, do Partido Popular (PP). O PP estava no poder já fazia oito anos. Os ataques foram cruciais para a vitória de Zapatero. De cara, acusou o ETA como responsáveis pelo atentado, visto que os bascos efetuaram atentados similares poucos dias antes das ultimas eleições legislativas, além dos explosivos serem semelhantes aos que o ETA costuma usar. Mas ao contrário dos atentados anteriores, desta vez os seus autores não enviaram avisos antecipados dos seus atos terroristas. Foi uma reviravolta na reta final da campanha. Acontece que, no dia seguinte, o ETA logo se apressou em afirmar através de um telefonema: “A organização ETA não tem nenhuma responsabilidade sobre os atentados de ontem.” Disse Arnaldo Otegi, dirigente do

partido político Batasuna. Não só afirmou a inocência, como condenou o ataque. De fato, não eram responsáveis, mas a polícia custou a acreditar. E havia uma grande dificuldade em encontrar os verdadeiros culpados pelo ato terrorista, pelo próprio fato de estarem em épocas de eleições. Com as provas, as acusações caíram em cima do grupo islâmico Al-Qaeda, entre elas: na tarde do atentado, foi encontrada, na região de Madrid, uma fita cassete com orações em árabe num carrinho com detonadores; logo à noite, foi divulgada a suspeita de que um homem-bomba suicida seguia a bordo de um dos comboios. Dia seguinte, o jornal “Al Quds Al Arabi” recebeu na sua sede em Londres uma carta que afirma que as Brigadas de Abu Hafs Al Masri, em nome da Al-Qaeda, é a organização responsável pelos atentados. Segundo a carta, o ataque seria um “velho ajuste de contas” com Espanha, “um dos pilares da aliança de cruzados contra o islão”. O que pouca gente sabia é que o grupo terrorista de Bin Laden tramava os ataques lançados contra Madri há meses, exatamente com o objetivo de forçar a retirada das forças espanholas do Iraque, estabelecendo um padrão em suas ações visando isolar os EUA na luta contra o terror. No seu discurso como Primeiro Ministro, Zapatero já fez saber que a sua primeira medida seria a de convocar as forças políticas espanholas a fim de que concentrem os seus esforços na luta contra o terrorismo. “O terror deve saber que nos vai encontrar a todos pela frente; unidos vamos derrotá-lo”, afirmou. Além disso, prometeu retirar as tropas do Iraque, visto que a Espanha não suportaria outro ataque como esse.


Cessar fogo

Promessas que acabam antes do fim Com a popularidade cada vez mais baixa, três anúncios de cessar-fogo foram feitos pelo ETA. O primeiro cessar fogo: Ocorreu em 1989 e foi protagonizado pelo governo socialista de Felipe González, mas durou apenas alguns meses.

A organização assumiu a explosão de um carro-bomba no Terminal 4 do aeroporto de BaMarço de 1998: Os principais partidos políticos da Espanha iniciam rajas, em Madrid. Ao connegociações em busca do fim da violência no País Basco. O governo não se envolve nas conversas. trário do que sucedera no passado, o ETA não anunciou Setembro de 1998: O ETA anuncia o seu primeiro cessar-fogo por o atentado previamente, protempo indefinido desde o início de suas atividades. vocando o desmoronamento de três dos quatro andares do prédio (o Maio de 1999: Representantes do governo espanhol e do mais recente terminal do aeroporto), ETA têm em Zurique, na Suíça, o primeiro e único encontro a suspensão do tráfego aéreo num dos realizado até hoje. dias mais movimentados do ano nos aeroportos europeus, deixando dezenove pessoas Agosto de 1999: O primeiro-ministro, José Maria Aznar, feridas e causando a morte de dois equatoriaacusa do ETA de ter “medo da paz” e pede ao grupo nos. (Este terminal viria a ser re-inaugurado em que mostre seu comprometimento. Em seguida, Setembro de 2007) o ETA confirma que as negociações com Madri foramcanceladas.

Novembro de 1999: O grupo separatista anuncia o final de seu cessar-fogo de 14 meses, culpando o governo pela falta de progresso nas negociações de paz. 22 de Março de 2006: A organização declarou um cessar-fogo permanente numa declaração em vídeo e a enviam ao canal espanhol TVE onde é anunciada a renúncia ao movimento armado, que foi rompido em 30 de Dezembro de 2006.

A partir de junho de 2007, a organização intensificou suas ações violentas, embora as polícias espanholas e francesas tenham detido dezenas de seus supostos membros, impedindo diversas operações.


Mikel Lejarza a.k.a. El Lobo “Serei um objetivo do ETA enquanto ele existir”.

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onhecido como Lobo, ele foi responsável pela queda de um quarto dos artistas terroristas da organização, representando 150 colaboradores - incluindo alguns membros das forças especiais e algumas figuras do grupo. A operação Lobo é a mais bem sucedida já feita pela polícia espanhola contra o ETA.

Mikel nasceu no País Basco, assim como seus pais. Na sua juventude, início dos anos 70, foi recrutado pelo serviço secreto espanhol com a finalidade de infiltrá-lo no núcleo dirigente do ETA. Isso ocorreu em uma época de transbordante ebulição política no País Basco e Navarra, quando amplos setores da sociedade basca seguiam vendo no ETA um movimento de resistência ante um regime ditatorial. Mikel chegou a ser um dos máximos responsáveis da infra-estrutura do ETA, curiosamente graças aos meios materiais e econômicos que os aparatos do Estado lhe proporcionavam. Lobo se dedicou a facilitar aos ativistas terras repartidas por toda a geografia espanhola, as quais estavam permanentemente controladas pelos serviços secretos. Assim foi como Lobo ganhou a confiança de ETA e se converteu, com o tempo, em uma parte fundamental da estrutura organizativa. Escolheram Mikel para a operação, pois conhecia, além do euskera, muitas pessoas da organização, embora não conhecesse a ideologia do ETA. O próprio afirma hoje em dia que, apesar de se interessar um pouco pela independência da região, nunca teve a intenção de se juntar aos militantes. Mas aceitou uma tarefa dificílima, de profissionalismo extremo. Em uma entrevista atual por e-mail para o jornal espanhol El País, Mikel diz que os jovens que compõem a organização são “jovens sem preparação e sem cabeça”. E que a ideologia mudou muito desde a criação do movimento. Diz ainda que jamais vai deixar de cumprir lealmente com sua função, mas, desde que fugiu do Espanha, vive uma vida difícil: “passo por riscos e tenho que tomar muitas medidas de segurança e digo que é uma vida muito pouco agradável porque não posso me aproximar das pessoas que quero me aproximar e que formam meu círculo afetivo”. Mais do que isso, se sente uma eterna caça: “serei um objetivo do ETA enquanto ele existir”.


Visão de quem vive o terror Txema Kontelaga tem 24 anos, nasceu em Estella (ou Lizarra), mas hoje mora em Bilbao, onde estuda Engenharia. Apesar de jovem, já presenciou muitas notícias a respeito do terror que o ETA já causou, além de ouvir muitas histórias de seu pai, Andoni, e dos seus tios. Txema se lembra do primeiro ataque terrorista que ouviu: “Foi um ataque em 1997. Eu tinha 12 anos, foi quando mataram um guarda com um tiro na cabeça enquanto ele jantava com sua esposa. Achei aquilo lá horrível, fiquei com medo. Foi o primeiro ataque que me lembro, ou, pelo menos, o primeiro que me chocou.” - O assassinato em questão era do guarda civil José García Fernández, no município de Zierbena. Txema estava vivendo, naquele ano, um dos mais ativos do ETA: 10 ataques. Na época, ainda morava em Estella, na região de Navarra. “Não me lembro de Navarra sofrer muito com esses ataques (ou eu não os vivi, pelo menos), mas teve uma época que todo mundo aqui em casa andava paranóico. Meu avô ficava com medo quando eu e meus irmãos íamos para a escola”. Segundo filho de quatro irmãos, começou a acompanhar, a partir de então, a política tanto do País Basco, quanto dos partidos separatistas. Mas nunca se disse revolucionário ou militante: “Não, nunca. Eu acompanho porque é uma realidade nossa e a gente sofre com isso. Mas só. Nunca passou pela minha cabeça me associar a esses movimentos. Onde eu estudo, já vi uns meninos e meninas que pregam esse separatismo e tentam nos influenciar. Não sei se são a favor do terrorismo, sinceramente nem prefiro saber” e ainda diz: “não sei como que a polícia não os pega!” A família de Txema já passou por um susto no passado. No grande ataque ao supermercado Hipercor (Barcelona, 1987), seu tio por parte de pai, Luiz Aguirre saiu levemente ferido. Luiz é de Barrakaldo, cidade perto de Bilbao, mas estava na capital catalã por motivo de trabalho. Contador de uma empresa de transportes, seu tio estava passando umas semanas pela cidade. Recém chegava ao supermercado quando aconteceu a explosão do carro-bomba. “Eu não sou religioso, mas só Deus explica como meu tio se salvou. Ele ouviu o barulho, e não

estava muito longe do carro. Diz meu tio que só teve tempo de se jogar no chão. Algumas peças do carro em chamas caíram em cima dele, mas por sorte foi só um susto, muito poucos arranhões. Mas meu tio é traumatizado até hoje, porque imagina... muita gente morreu ali, na frente dele...”. Assim que a família de Txema ficou sabendo que Luiz estava lá, entraram em pânico imediato. Depois do susto, o estudante pensou o porquê que o ETA atacaria outra região também separatista como a deles: “ah, tenho amigos da Catalunha, e eles são tão separatistas como nós, tenha certeza disso. Sofreram nas mãos de Madrid tanto quanto os bascos, e até hoje não vi sentido em enfrentar uma região que almeja o mesmo que nós e que não interfere muito na nossa política. Mas não que eu aprove atacar outros lugares.” Agora morador de uma cidade grande do País Basco, tornou-se mais comum em sua vida enxergar mais demonstrações de apologia ao movimento, mas garante que o apoio do povo diminuiu muito com os anos. De cinco anos pra cá, as pichações nos muros com frases “GORA ETA” (“Vamos, ETA!”) são coisas do passado: “até dá pra ver umas ou outras, mas apagam rápido e todas que ficaram são mais antigas. Antes eu via seguido. As pessoas agora enxergam que lutar de forma diplomática é a única forma”. Questionado sobre a própria independência do País Basco, Txema reflete: “olha, eu sou muito orgulhoso da minha origem. Sou vascohablante (‘falador de euskera’), torço pra Seleção Basca de futebol e gosto do Athletic Bilbao só aceitarem jogadores que tem nossas raízes. Mas isso é só na questão cultural; o fato de pertencermos à Espanha não nos tira o orgulho e não anula a cultura que cultivamos por séculos. E temos que pensar também que, apesar de termos muitas indústrias e uma economia interna boa, ter autonomia total pode ser perigoso. Creio que não aguentaríamos. Então, não acho que o separatismo seja solução pra nada.” Mas alerta: “é minha opinião, claro. Agora, se tu vai perguntar isso pra algum dos simpatizantes da minha universidade, é capaz de tentarem com que tu, uma brasileira, se junte à causa deles!”


Mais sobre o País Basco Capital: Vitoria Idioma: espanhol e euskera

O movimento hoje Tanto as reivindicações de 30 anos atrás, como os ataques, continuam muito presentes na vida de quem mora no norte espanhol. As buscas pelos militantes e líderes ligados ao grupo são constantes e também mais eficazes que nos anos anteriores- muitos atribuem esse avanço ao próprio governo de Zapatero. Em novembro de 2008, no sul da França, foi preso o até então chefe do ETA chamado Mikel Garikoitz Aspiazu Rubina, conhecido como Txeroki. Com 35 anos, Txeroki é conhecido como um líder carismático, mas também de sangue frio. Seus companheiros o adoravam por seus mimos. Não costumava participar das ações, mas sempre estava por perto dos ocorridos. Txeroki é considerado um “produto puro” da organização, pois entrou ainda muito jovem na luta. Desde 2003, quando virou o chefe do departamento mais importante da organização, o líder considerado responsável pela organização de todos os atentados cometidos pelo ETA desde então. Em 40 anos de existência, foram mais de 800 mortos pelo Euskadi Ta Askatasuna. As revoltas públicas contra a organização se tornaram cada vez mais frequentes, mas os militantes parecem irredutíveis em relação a sua forma de luta para a autonomia da sua terra. É compreensível a ânsia e o temor por algum dia perder o que tanto batalharam para deixar aceso: sua cultura. Os nacionalistas revolucionários consideram que a independência do País Basco não é apenas uma reivindicação histórica, mas uma via necessária para garantir o desenvolvimento econômico, cultural e social do povo basco. E, pelo visto, não será agora que Zapatero, ainda primeiro ministro espanhol, terminará com todas as manifestações dessa ideologia- sempre haverá um líder influenciando aspirantes pela união do povo mais antigo europeu e o reconhecimento devido do seu terreno que lhe é de direito.

Área: - Total: 7 234 km² -% de Espanha: 1,4% População: - Total (2005): 2 124 846 -% de Espanha: 5,0%Densidade: 293,73 hab./km² Gentílico: Basco (a)


Na tradição basca, Euskal Herria é formado por sete regiões tradicionais, quatro compõem Hegoalde e três compõem Iparralde. Hegoalde está localizado no território da Espanha, integrando quatro províncias: - Álava (Araba em basco) - Biscaia (Bizkaia em basco, Vizcaya em castelhano) - Guipúscoa (Gipuzkoa em basco, Guipúzcoa em castelhano) - Navarra (Nafarroa em basco)

Iparralde está localizado no território da França, integrando três províncias: - Baixa Navarra (Behe Nafarroa em basco, Basse-Navarre em francês) - Lapurdi (Labourd em francês) - Sola (Zuberoa em basco, Soule em francês)

Algumas palavras em euskera

Bom dia: Egun on Boa tarde: Arratsalde on, Arrasti on Boa noite: Gabon, gau on Bem-vindo: Ongi etorri, honki jin, onki xin Rua: kale, karrika Mãe: ama Pai: aita Filho: seme Filha: alaba Sim: bai Não: ez


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