GRUPO / HUMANAS 2 / FILOSOFIA

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[Filosofia II]

FILOSOFIA SUMÁRIO Unidade 1 – FILOSOFIA 1.1. Ética .......................................................................................................................................................... 3 1.2. Filosofia Política........................................................................................................................................ 13 1.3. Teoria do Conhecimento .......................................................................................................................... 25 1.4. Estética .................................................................................................................................................... 31

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1.1. Ética A ética (também chamada filosofia moral) é uma disciplina central da filosofia. Na sua acepção mais abrangente, é o estudo dos princípios que permitem a vida boa. Era esta a acepção de ética dos filósofos da antiguidade grega, como Epicuro ou Aristóteles. Mais tarde, tornou-se comum uma perspectiva mais restritiva da ética, segundo a qual esta estuda a questão de saber como temos o dever de agir. Era neste sentido que, tal como muitos filósofos contemporâneos, Kant e Mill entendiam a ética. A ética divide-se em três grandes áreas: a metaética, a ética normativa e a ética aplicada. Em metaética estuda-se a natureza da própria ética. Trata-se de saber qual é a natureza dos juízos éticos; por exemplo, serão os juízos éticos relativos à cultura? Será a ação intrinsecamente egoísta? Na ética normativa estuda-se dois problemas centrais relacionados: O que é o bem último? O que é uma ação correta? No primeiro caso trata-se de saber quais são os bens últimos, distinguindo-os cuidadosamente dos bens instrumentais. A felicidade, por exemplo, ou a vontade boa, são candidatos muito discutidos ao título de bens últimos. No segundo caso trata-se de saber o que faz uma ação correta ser correta. Por exemplo, será que no que respeita à correção de uma ação tudo o que conta é as suas consequências? Ou conta também, e sobretudo, a intenção com que foi executada? A ética aplicada é o estudo dos problemas práticos da ética; por exemplo, será sempre incorreto fazer um aborto, seja qual for a circunstância? As palavras “ética” e “moral” são hoje em dia geralmente usadas como sinônimas (mas não o eram por Hegel, no séc. XIX), dado que originalmente o termo latino moralis foi criado por Cícero a partir do termo mores para traduzir o termo grego ethos; e tanto mores como ethos significam “costumes.” (Aires Almeida e Desidério Murcho, Pensar com os Filósofos)

O QUE É UMA AÇÃO? Uma ação é algo que uma pessoa faz voluntaria ou intencionalmente. Isso significa que nenhum acontecimento involuntário é uma ação e que todo acontecimento voluntário é uma ação. Se há deliberação (capacidade de escolha) racional, podemos dizer que quando a ação escolhida é um meio adequado para o fim desejado e quando escolhemos satisfazer os desejos que consideramos mais importantes. A deliberação não racional é aquela que nos faz comer bastante chocolate quando pretendemos perder peso.

NOSSAS AÇÕES SÃO LIVRES? Podemos pensar que nossas ações são livres porque deliberamos, escolhemos fazer uma coisa ou outra, chamamos isso de livre-arbítrio. Contudo, se tudo no universo físico estiver determinado, também nossas deliberações estão determinadas e nesse caso parece que não temos o livre-arbítrio.

Determinismo radical Libertismo Determinismo moderado ou compatibilismo

O determinismo é compatível com o livre-arbítrio? Não Não Sim

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Temos livre-arbítrio? Não Sim Sim


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DETERMINISMO E LIBERDADE: É POSSÍVEL A CONCILIAÇÃO? • •

Poderá haver liberdade onde instinto comanda? Que abertura e imprevisibilidade poderá haver se o instinto natural conduz a vida dos animais?

Falar em liberdade implica falar em consciência e em poder de relativo distanciamento diante das determinações da natureza. Essa parece ser uma realidade e um desafio especificamente humanos. Incorremos em engano semelhante ao considerarmos que o ser humano é capaz de liberdade absoluta, pois sempre estará também submetido tanto a determinismos naturais quanto aos condicionamentos físicos e culturais. O ser humano, em sua natureza animal, encontra-se também preso a determinismos: tem um corpo sujeito às leis da física e da química; é um ser vivo que pode ser compreendido pela biologia; é um ser que tem necessidades biopsicossociais, determinismos constitutivos de sua natureza. Não há como negar os determinismos.

TIPOS DE DETERMINISMO: a) Naturalismo (As regras da natureza) b) Fatalismo (Era para acontecer) c) Tudo está escrito (por exemplo, determinado por Deus)

DETERMINISMO E CAUSALIDADE Por exemplo, a queda dos corpos acontece devido à lei da gravidade; ou seja, o efeito é a queda dos corpos que acontece devido a uma causa, a lei da gravidade. (Ciências Naturais) Nos acontecimentos do universo humano, também podemos falar em relativa causalidade. Por exemplo: o aumento do desemprego é um motivador de maior violência. (Ciências Humanas) Será que as nossas ações são de fato “livres”? Ou toda ação humana está marcada por uma força que a motiva e orienta? "A alma (...) não pode ter uma faculdade absoluta de querer ou de não querer; mas deve ser determinada a querer isto ou aquilo por uma causa que é determinada por sua vez por outra causa, a qual é também determinada por outra, e essa outra, por sua vez, por outra, etc." (Livro II, proposição 48) "Os homens se consideram livres porque são conscientes das suas ações e ignorantes das causas pelas quais são determinados; e além disso que as decisões da alma nada mais são que os próprios apetites, e, por conseguinte, variam segundo as variáveis disposições do corpo " (livro 3, escólio da proposição 2). (ESPINOSA, Ética. Tradução de Joaquim Ferreira Gomes, São Paulo, Abril Cultural, 1974) RASCUNHO

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Fonte: Revista Época Foto: Um macaco bebê e uma pomba – Livro amizades improváveis

A ideia de determinismo é fortalecida por essa ilustração na medida em que explica como nossas “escolhas” na realidade são manifestações cerebrais. Tal posicionamento acaba por fundamentar a tese de que não somos livres, argumento comum dos neurocientistas.

LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E ANGÚSTIA No interior desse cenário (Existencialismo) a pergunta que não cala é: “Quem é esse homem?”; “O que é a existência humana?”; “Qual é o sentido da vida?”; “Tem a vida algum sentido?” Cenário: Pós Segunda Guerra (ganhou maior importância) Teóricos mais importantes: Heidegger e Jean Paul Sartre Para o existencialismo, o homem é um ser finito, “lançado no mundo”, continuamente dilacerado por situações problemáticas ou absurdas. Assim, existir, é projetar-se, lançar-se, destinar-se, fazer-se. Por isso, a existência não pode ser conhecida nela mesma como um dado objetivo da ciência: o caráter essencial da existência é a subjetividade e a imprevisibilidade.

LIBERDADE E IMPREVISIBILIDADE HUMANA “Teses” ou “Conclusões”:...a não identificação da realidade com a racionalidade... •

...uma vez que a realidade vem vinculada com a projeção imprevisível do homem, único responsável por sua história.

O que define o homem é a sua projeção, sempre provisória e imprevisível.

Cada um de nós ao nascer é recebido em um mundo que é muito maior do que nós e que já existia antes de nós.

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[Filosofia II] ...pois o ser humano é abertura, é nada, nada certo, nada estabelecido, nada previsível, dada a essencial liberdade humana. Assim, temos a possibilidade como modo de ser constitutivo da existência. Dada a centralidade da existência, o homem não foi planejado por alguém para uma finalidade, como os objetos que o próprio homem cria, mediante um projeto. O homem se faz em sua própria existência. (Considere o texto de Jean Paul Sartre: “O existencialismo é um humanismo”)

JUÍZOS DE FATO E DE VALOR Imagine que Maria Joaquina afirma que a música da Adele é melhor do que a da Beyoncé e que Cirilo discorda. Perante essa situação, muitas pessoas afirmam que os gostos não se discutem. O que querem dizer é que não há uma maneira objetiva de decidir quem tem razão; cada pessoa tem a sua opinião e nada mais há a dizer. Isto contrasta com a afirmação de Maria Joaquina que Paris é uma cidade brasileira. Neste caso, Cirilo pode mostrar objetivamente que ela está enganada. E por isso ninguém reage à afirmação de Maria Joaquina dizendo que os gostos não se discutem. Neste caso, não é uma questão de gosto: é uma questão de fato. Imagine agora que Cirilo afirma que Temer não é boa pessoa e que alguém reage exclamando: “Isso é um juízo de valor!”. O que está em causa é que talvez outras pessoas considerem que Temer é uma boa pessoa e não há fatos que nos ajudem a decidir objetivamente quem tem razão. Mas se Cirilo afirmar que Temer tem um metro de cabeça, isso já não é um juízo de valor: é um juízo de fato. Neste caso, há fatos que nos ajudam a decidir objetivamente se ele está enganado ou não. Primeira distinção importante: entre afirmações descritivas e normativas • Numa afirmação descritiva procuramos • Numa afirmação normativa procuramos adequar o que pensamos ao mundo adequar o mundo ao que pensamos • A direção da adequação é do mundo para o • A direção da adequação é do que pensamos que pensamos. para o mundo. Segunda distinção importante: entre juízos de fato e juízos de valor • Os juízos de fato são descrições objetivas. “O aborto é considerado crime no Brasil, salvo exceções da lei.”

• Os juízos de valor são julgamentos que podem ser subjetivos. “O aborto é típico da perversão humana.”

www.ivancabral.com (acesso dia 03/01/18)

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ÉTICA APLICADA ou AS TEORIAS ÉTICAS “Os juízos morais têm de se basear em boas razões. Se eu disser que uma dada ação é incorreta, o leitor tem o direito de perguntar por que razão é incorreta; e se eu não tiver uma boa resposta, o leitor pode considerar que o meu juízo não tem fundamento. Isto é o que separa os juízos morais de meras declarações de preferência. Se eu digo que gosto de queijo, não preciso de uma razão: pode ser apenas um fato sobre mim que eu gosto de queijo, e é tudo o que há a dizer sobre isso. Mas seu eu digo que o leitor deve comer queijo, tenho de ter alguma razão que sustente a minha afirmação. Uma teoria adequada sobre a natureza da ética tem, assim, de fornecer uma explicação plausível de forma que as razões apoiem os juízos morais.” James Rachels https://alexxavier.wordpress.com/2008/03/27/aristoteles-e-cia

A ÉTICA DAS VIRTUDES DE ARISTÓTELES A filosofia aristotélica constitui uma visão sistemática e integrada do conhecimento, com a valorização da ciência empírica, da ética e da política. Aristóteles divide o conhecimento da seguinte forma: prático (práxis), produtivo (poiesis) e teórico. O conhecimento prático abrange principalmente o estudo da ética e da política. A ética é um saber prático e pressupõe três elementos fundamentais da filosofia aristotélica: o uso correto da razão, a boa conduta (eupraxia) e a felicidade (eudaimonia). Aristóteles desenvolveu uma reflexão ética perguntando-se sobre o fim último do ser humano. Para o quê tendemos? E respondeu: para a felicidade. Todos nós buscamos a felicidade. E o que Aristóteles entende por felicidade? Uma atividade conforme a razão – realização do que há de mais característico do ser humano – e a virtude (ARISTÓTELES, 1987, Livro I). “A felicidade é, para Aristóteles, a atividade da alma segundo sua virtude (excelência). E tal virtude, ou excelência, reside na sua atividade racional”.

raciocínio Excesso (vício)

AÇÃO

Teórica Fazer bem feito.

Equilíbrio (virtude) Falta (vício)

Prática experiência (hábito)

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Pode levar a EUDAIMONIA (felicidade)


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O QUE É VIRTUDE? A tábua das virtudes de Aristóteles

A virtude é a excelência de algo. A excelência ou virtude de um pianista é tocar bem piano. A excelência ou virtude de um ser humano é a excelência do raciocínio prático e teórico. • O raciocínio prático diz respeito à ação. • O teórico diz respeito ao conhecimento. Em vez de construir uma teoria que nos diga o que devemos fazer ou não fazer, Aristóteles diz-nos que gênero de caráter temos que ter para ajuizarmos, corretamente cada caso. E defende que a virtude se desenvolve através do ensino e da prática. É esta a ideia sagaz central da ética das virtudes.

A ÉTICA DEONTOLÓGICA (DO DEVER) DE KANT "A ética kantiana está centrada na noção de dever. Parte das ideias da vontade e do dever, conclui então pela liberdade do homem, cujo conceito não pode ser definido cientificamente, mas que tem de ser postulado sempre, sob pena de o homem se rebaixar a um simples ser da natureza. Kant também reflete, é claro, sobre a felicidade e sobre a virtude, mas sempre em função do conceito de dever. É famosa, na obra de Kant, sua formulação do chamado “imperativo categórico”, nas palavras: “Age de tal modo que a máxima da tua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo como princípio de uma legislação universal”. - Kant reconhece que esta é apenas uma fórmula, porém ele, que gostava tanto das ciências e que não tinha a intenção de criar uma nova moral, estava apenas preocupado em fornecer-nos uma forma segura de agir. Sua ética é, pois, formal, - alguns até dirão formalista. Ora, o nosso pensador alemão, com seu imperativo categórico, nos forneceu, na prática, um critério para o agir moral. Se queres agir moralmente, (isto é, para Kant, racionalmente,) - o que aliás tu tens de fazer - age então de uma maneira realmente universalizável. Pois aqui está o segredo da ética kantiana: A universalização das nossas máximas (em si subjetivas) é o critério. A moral kantiana, de certo modo, também pressupõe um conceito de homem, como um ser racional que não é simplesmente racional. Portanto, um ser livre, mas ao mesmo tempo atrapalhado por inclinações sensíveis, que ocasionam que o agir bom se apresente a ele como uma obrigação, como uma certa coação, que a sua parte racional terá de exercer sobre sua parte sensível. O dever obriga, força-nos a fazer o que talvez não quiséssemos ou que pelo menos não nos agradaria, porque o homem não é perfeito, e sim dual. Mas o dever, quando nos força, obriga a fazer aquilo que favorece a liberdade do homem, porque o homem é um ser autônomo, isto é, sua liberdade, no sentido positivo, consiste em poder realizar o que ele vê que é o melhor, o mais racional. Poder realizar significa: causar por vontade própria um efeito no mundo, ao lado das causas naturais que pertencem, como diz Kant, (à maneira newtoniana,) ao mecanismo da natureza. O homem, neste sentido, é legislador e membro de uma sociedade ética: é legislador porque é ele que vê o que deve ser feito, e é membro ou súdito porque obedece aos deveres que a sua própria razão lhe formula. Neste sentido, ele não tem um preço, mas uma dignidade, e é por isso que a segunda fórmula do imperativo categórico diz para agirmos de modo a não tratar jamais a humanidade, em nós ou nos outros, tão-somente como um meio, mas sempre pelo menos também como um fim em si. É o que Tugendhat chamaria uma ética do respeito à pessoa." Prof. Dr. Alvaro L. M. Valls (Dep. Filosofia - UFRGS)

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[Filosofia II] OS IMPERATIVOS Um imperativo é uma ordem, algo que temos de fazer. Se um imperativo está condicionado a algo, é hipotético. Se não está condicionado, é categórico. Um imperativo é hipotético quando é algo que   temos de fazer para obter outra coisa que  queremos.  • Para ir ao cinema tenho de me deslocar para lá.  •Deslocar-me para o cinema é um imperativo  hipotético.  •Os imperativos hipotéticos surgem da  racionalidade instrumental: a capacidade para 

Um imperativo é categórico quando é algo que temos de fazer por si mesmo e não como meio para outra coisa. •Os imperativos categóricos surgem da capacidade para determinar finalidades à luz da razão. •Um imperativo é categórico quando a máxima de ação que podemos retirar dele não é incoerente.

saber que meios são adequados para os fins que temos em vista.

MÁXIMAS UNIVERSALIZÁVEIS *Uma máxima é um princípio que nos diz como agir. *Uma máxima é moral quando é universalizável. *Uma máxima é universalizável quando podemos querer que seja uma lei da natureza seguida por todos os seres racionais.

O PAPEL DA RAZÃO Kant dá à razão um papel central na moralidade. É irracional ser imoral, no sentido em que implica uma contradição lógica. Por exemplo, Kant pensa que é irracional não cumprir promessas, mas ao mesmo tempo querer que os outros cumpram as suas. Qual é a alternativa? Uma posição oposta a esta no que respeita ao papel da razão é defendida por Hume. Ele defende que não é irracional ser imoral. A razão determina apenas os meios para atingirmos os fins que queremos, mas não determina os fins em si. Quem é moral, tem fins benevolentes, e usa a razão para os alcançar. Quem é imoral, tem fins malévolos e usa também a razão para os alcançar. E o que está em causa? Será uma exigência da racionalidade agir não apenas segundo as nossas preferências mas segundo os ditames da ética? Será um imoral irracional, ou apenas uma má pessoa? O que importa não é a consequência da ação para Kant, mas a intenção em seguir as regras da razão. 

A FORMULAÇÃO DO IMPERATIVO CATEGÓRICO “Há apenas um imperativo categórico, e é este: Age apenas de acordo com aquela máxima que possas ao mesmo tempo querer que se torne uma lei universal.” (Fundamentação da Metafísica dos Costumes) RASCUNHO

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Particulares (subjetivos) Máximas

Racional

Universais

Motivo da ação

(Lei moral) Categóricos

Dever (deontologia)

Hipotéticos (subjetivos)

Vale para todos os seres humanos

Imperativos

DEVER

Conforme o dever (HETERONOMIA)

Por dever (AUTONOMIA ou LIBERDADE)

hetero + nomia

diferente

Lei

UTILITARISMO O utilitarismo é uma doutrina ética defendida principalmente por Jeremy Bentham e John Stuart Mill que afirma que as ações são boas quando tendem a promover a felicidade e más quando tendem a promover o oposto da felicidade. Filosoficamente, pode-se resumir a doutrina utilitarista pela frase: Agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar (Princípio do bem-estar máximo).Trata-se então de uma moral eudaimonista, mas que, ao contrário do egoísmo, insiste no fato de que devemos considerar o bem-estar de todos e não o de uma única pessoa. Antes de quaisquer outros, foram Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873) que sistematizaram o princípio da utilidade e conseguiram aplicá-lo a questões concretas – sistema político, legislação, justiça, política econômica, liberdade sexual, emancipação feminina, etc. Em Economia, o utilitarismo pode ser entendido como um princípio ético no qual o que determina se uma decisão ou ação é correta, é o benefício intrínseco exercido à coletividade, ou seja, quanto maior o benefício, tanto melhor a decisão ou ação será.

PRINCÍPIO DA UTILIDADE “Por princípio da utilidade, entendemos o princípio segundo o qual toda a ação, qualquer que seja, deve ser aprovada ou rejeitada em função da sua tendência de aumentar ou reduzir o bem-estar das partes afetadas pela ação. (...) Designamos por utilidade a tendência de alguma coisa em alcançar o bem-estar, o bem, a beleza, a felicidade, as vantagens, etc. O conceito de utilidade não deve ser reduzido ao sentido corrente de modo de vida com um fim imediato." Jeremy Bentham

OQUE O UTILITARISMO NÃO É • Uma teoria que declara quaisquer meios legítimos para a obtenção dos nossos fins. • Uma maneira utilitária de conceber a vida. • Utilitário é diferente de utilitarista; • Uma visão economicista e desumana das coisas. CONSEQUENCIALISMO: Uma ação é primitivamente correta ou incorreta exclusivamente em função das suas consequências, e não das intenções ou do caráter do agente.

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UTILITARISMOS Utilitarismo clássico ou hedonista: uma ação é correta se maximiza a quantidade de prazer no universo e minimiza a quantidade de dor.

Utilitarismo das preferências: uma ação é correta se maximiza as preferências dos agentes morais.

UNIVERSALISTA: O utilitarismo promove a maior felicidade para o maior número de pessoas. Mas nenhuma pessoa tem mais valor moral do que qualquer outra. Logo, a minha felicidade não tem prioridade sobre a felicidade alheia.

HEDONISMO: Epicuro (341-271 a.C.): o bem último é o prazer. Mas Epicuro não era hedonista no sentido básico que hoje se associa ao termo. Distinguia os prazeres de curto prazo, que muitas vezes são de evitar porque são obstáculos aos prazeres de longo prazo.

HEDONISMO TRANSFIGURADO: Mill distingue os prazeres inferiores dos superiores. Os prazeres inferiores dizem respeito à satisfação das necessidades primárias (comida, água, sexo, etc.) Os prazeres superiores dizem respeito à satisfação das necessidades mentais sofisticadas, como a leitura, reflexão e o estudo. Mas será que ainda assim é prazer? Uma crítica a Mill é que está abusando da palavra “prazer”. O que ele chama “prazeres superiores” não são realmente prazeres, mas apenas preferências e preferências que só algumas pessoas têm. Como Epicuro, Mill tem uma visão naturalista dos seres humanos.

NATURALISMO: o bem último dos seres humanos resulta da natureza humana, e não da existência de uma alma imortal que tem uma natureza diferente dos seres humanos enquanto seres naturais. Faz parte da natureza humana as capacidades para o estudo, reflexão, etc., e é por isso que essas coisas são preferidas pelas pessoas que tiverem oportunidade de experimentá-las. Assim, essas coisas são preferíveis por estarem de acordo com a natureza humana. Mill tem uma concepção otimista dos seres humanos, considerando que todos darão mais valor à vida espiritual se tiverem oportunidade para isso, em detrimento de uma vida de porco, dedicada aos prazeres inferiores.

IRRELEVÂNCIA MORAL DOS MOTIVOS “O motivo nada tem a ver com a moralidade da ação, embora tenha muito a ver com o valor do agente. Quem salva um semelhante de se afogar faz o que está moralmente correto, quer o seu motivo seja o dever, ou a esperança de ser pago pelo seu incômodo; quem trai a confiança de um amigo, é culpado de um crime, ainda que o seu objetivo seja servir outro amigo para com o qual tem deveres ainda maiores.” John Stuart Mill, Utilitarismo Para o complemento dos seus estudos, assista esses vídeos via QR code:

Utilitarismo - Luis Alberto Peluso Justiça - O que é fazer a coisa certa Michael Sandel - aula 1 de 24 – Prof. de ética da Puc SP

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A ética de Aristóteles - Clóvis de Barros Filho - Aula 1 de 3


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BIOÉTICA A Bioética é um ramo da ética que estuda os conflitos, controvérsias, pesquisas e práticas que visam esclarecer e resolver questões éticas dentro da medicina e da biologia. O seu surgimento foi baseado no impacto, por exemplo, das experiências feitas em seres humanos e animais e a utilização de técnicas desumanas como a clonagem. O termo foi utilizado pela primeira vez na década de 70 pelo professor e pesquisador norteamericano Van Rensselaer Potter, no livro 'Bioética: Ponte para o Futuro' e significava a conduta da sociedade como participante da evolução cultural e biológica. Hoje esse conceito é bem diferente. Esse tema ganhou maior destaque quando os cientistas decifraram o código genético humano, considerando a responsabilidade dos cientistas com relação as suas pesquisas e práticas. Os temas mais polêmicos dentro dessa área são a eutanásia, os testes em animais, o aborto, a fertilização in vitro e a clonagem. Esses temas surgem devido aos avanços da ciência e é papel da sociedade ter uma posição sobre eles, pois a partir desses debates, novos projetos de lei são reformulados e aprovados, devendo os legisladores observarem sempre a bioética. Esses experimentos e descobertas podem beneficiar ou não a sociedade e o planeta, e por isso, essas questões devem ser avaliadas por um comitê que analise as desvantagens e vantagens da utilização dessa nova tecnologia. O comitê é formado por profissionais de diversas áreas como direito, filosofia, teologia, medicina, veterinária, sociologia, etc.

CINCO PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA: 1. Princípio da Beneficência: consiste em assegurar o bem estar dos indivíduos, afim de evitar danos e garantindo que sejam supridas suas necessidades e interesses. 2. Princípio da Autonomia: o profissional deve respeitar as crenças, a vontade e valores morais do sujeito e do paciente. 3. Princípio da Justiça: igualdade da repartição dos benefícios e bens em qualquer área da ciência. 4. Princípio da Não Maleficência: assegura a possibilidade mínima ou inexistente de danos físicos aos sujeitos da pesquisa (pacientes) de ordem psíquica, moral, intelectual, espiritual, cultural e social. 5. Princípio da Proporcionalidade: defende o equilíbrio entre os benefícios e os riscos, sendo maior benefício às pessoas. O objetivo de estudo da bioética é a criação de uma ponte entre o conhecimento científico e humanístico, a fim de evitar os impactos negativos sobre a vida. RASCUNHO

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1.2. Filosofia Política Em toda reflexão na filosofia política temos perguntas primordiais a serem feitas: a) b) c)

Deve existir um governo? Se há governo, qual é a forma correta de governar? Quem deve governar?

Esse capítulo tenta responder a essas perguntas através do pensamento clássico da filosofia política, de modo que o aluno possa também intervir nesse debate de mais de 2500 anos. O que foi feito aqui é um trabalho voltado para as principais instituições que adotam a filosofia no seu processo seletivo para o acesso as universidades. O que é igualdade? O que é liberdade? São metas que valem a pena? Como podem ser alcançadas? Que justificativa se pode dar para o Estado restringir, como faz, as liberdades dos infratores da lei? Há alguma circunstância em que se deveria infringir a lei? Estas perguntas são importantes para qualquer um. Filósofos políticos tentaram esclarecê-las e respondê-las. A filosofia política é uma disciplina vasta, superpondo-se à ética, economia, ciência política e história das ideias. Os filósofos políticos geralmente escrevem em reação às situações políticas nas quais se encontram. Nesta área, mas do que na maioria das aéreas, o conhecimento dos antecedentes históricos é importante para se entender os argumentos de um filósofo. (WARBURTON, Nigel. O básico da Filosofia, Editora José Olimpo, 2008)

ESTADO E LEGIMITIDADE DO PODER Entre tantas formas de força e poder, as que nos interessam aqui são as referentes à política e, em especial, ao poder do Estado que, desde os tempos modernos (século XVII), configura-se como a instância por excelência do exercício do poder político em várias áreas da vida pública. Embora a força física seja condição necessária e exclusiva do Estado para o funcionamento da ordem na sociedade, não é condição suficiente para manutenção do poder. Ele precisa ter legitimidade, que se configura pelo consentimento dos governados. Ao longo da história humana foram adotados os mais diversos princípios de legitimidade do poder:  Nos Estados teocráticos, o poder legítimo vem da vontade de Deus;  Nas monarquias hereditárias, o poder é transmitido de geração a geração e mantido pela força da tradição;  Nos governos aristocráticos, apenas os melhores exercem funções de mando; o que se entende por melhores varia conforme o tipo de aristocracia: os mais ricos, os mais fortes, os de linhagem nobre ou, até, os da elite do saber;  Na democracia, o poder legítimo nasce da vontade do povo. A discussão a respeito da legitimidade do poder é importante na medida em que a obediência é prestada apenas ao poder consentido, situação na qual é voluntária e, portanto, livre. Caso contrário, abrese a brecha do direito à resistência.

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UMA REFLEXÃO SOBRE A DEMOCRACIA A palavra democracia é formada etimologicamente por dois termos gregos, demos e kratia, “governo do povo”. No sentido mais primitivo, demos designava os diversos distritos que constituíam as dez tribos em que a cidade de Atenas fora dividida por ocasião das reformas de Clístenes (séc. VI a. C.), procedimento que pôs fim à tirania. Com o tempo, demos significou genericamente “povo” ou “comunidade de cidadãos”. O termo kratia deriva de kratos, que significa “governo”, “poder”, “autoridade”. Hoje em dia, entendemos democracia como “governo do povo”, “governo de todos os cidadãos”. Se política significa “o que se refere ao poder”, resta-nos perguntar: onde é o lugar do poder na democracia? Segundo Marilena Chauí, as determinações constitutivas do conceito de democracia são as ideias de conflito, abertura e rotatividade. Quino, Mafalda.

 Conflito: para muitos, o conflito carrega um sentido pejorativo, como algo que devesse ser evitado a qualquer custo. Ao contrário, divergir é inerente à sociedade pluralista. Se a democracia respeita o pensamento divergente, isto é, os múltiplos discursos, ela também admite uma heterogeneidade essencial; portanto, o conflito de poderes é inevitável. Se evitamos os conflitos de poderes corremos o risco de camuflá-los, ou reduzi-los a mera oposição pela oposição. Na sociedade democrática, o conflito é trabalhado pela discussão e pelo confronto; é assim que a história se faz, nessa aventura em que o cidadão se lança em busca do possível, a partir de dificuldades e imprevistos.  Abertura: na democracia a informação circula livremente e a cultura não é privilégio de alguns. A circulação não se reduz ao mero consumo de informação e cultura, mas pressupõe também a produção de cultura, que a enriquece. Um povo instruído é um povo que aumenta seu poder de reivindicação: daí a necessidade da ampla extensão da educação.  Rotatividade: o poder na democracia não privilegia grupo ou classe, mas permite que todos os setores da sociedade sejam legitimamente representados. Por isso o filósofo francês Claude Lefort diz que o lugar do poder é o lugar vazio, ou seja, é o lugar com o qual ninguém pode se identificar para que seja exercido transitoriamente por quem for escolhido para tal.

A FRAGILIDADE DA DEMOCRACIA Embora a democracia seja a antítese de todo poder autocrático, o exercício do poder muitas vezes perverte-se nas mãos de quem o detém. Por exemplo, a transparência é um atributo do espaço democrático, por isso o jurista e filósofo italiano Norberto Bobbio prefere definir a democracia como o “poder público”, justamente no sentido de que os governantes devem tomar suas decisões às claras, para que os governados “vejam” como e onde as tomam. No entanto, Bobbio diz:

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“O poder tem uma irresistível tendência a esconder-se. Elias Canetti escreveu de maneira lapidar: “O segredo está no núcleo mais interno do poder”. É compreensível também porque: quem exerce o poder sente-se mais seguro de obter os efeitos desejados quanto mais se torna invisível àqueles aos quais pretende dominar”. BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de Janeiro: Campus, 2000. p. 389.

Aceitar a diversidade de opiniões, o desafio do conflito, a grandeza da tolerância, a visibilidade plena das decisões é exercício de maturidade política. Por isso mesmo, a democracia é frágil e não há como evitar o que faz parte da sua própria natureza. Se ela permite a expressão de pensamentos divergentes, entre eles surgirão os que combatem a democracia, por identificá-la à anarquia ou porque desejam simplesmente impor seu ponto de vista; haverá também aqueles que pretenderão homogeneizar os pensamentos e ações. Um dos riscos é o totalitarismo, como consequência de determinados grupos sucumbirem à tentação de restabelecer a “ordem” e a hierarquia, ou seja, um governo autoritário.

O AVESSO DA DEMOCRACIA: TOTALITARISMO E AUTORITARISMO Na história do mundo sempre existiram tiranias. Em virtude de privilégios, o faraó do Egito, o césar romano e o rei cristão medieval apropriam-se do poder identificando-o com seu próprio corpo e se tornam intermediários entre os indivíduos e Deus, ou intérpretes da Suprema Razão. Identificado com determinada pessoa ou grupo, o poder personalizado não é legitimado pelo sentimento da maioria e depende do prestígio e da força dos que o possuem. Trata-se da usurpação do poder, que perde o seu lugar público quando é incorporado na figura do governante.

LIBERDADE COMO AUTONOMIA Na modernidade discutiu-se um rol crescente de direitos considerados naturais e inatos, universais e atemporais, a começar pelo direito à vida e à segurança (Thomas Hobbes), até chegarmos aos direitos à liberdade (John Locke) e à igualdade (Jean Jacques Rousseau). Essas teorias foram tecendo os conceitos de liberdade e autonomia, que tiveram sua expressão mais clara no Iluminismo (século XVIII), sobretudo com o pensamento do filósofo alemão Immanuel Kant.

LIBERDADE NEGATIVA E POSITIVA Nas esferas política e filosófica, a modernidade forjou o ideal de liberdade negativa e liberdade positiva (ou política):  Liberdade negativa: é a liberdade de uma gama de direitos, como liberdade de pensamento, expressão, culto religioso, associação, iniciativa comercial, entre outros, que devem ser respeitados pelo Estado. Por que o adjetivo negativo? Porque esses direitos coincidem com a esfera dos comportamentos não regulados por leis, portanto, trata-se de uma liberdade de não impedimentos. Por exemplo: não há lei que regulamente a liberdade de uma pessoa frequentar um culto religioso, de expressar um pensamento, de casar-se com quem quiser.  Liberdade positiva (ou liberdade política) é a liberdade no Estado: ao cidadão é garantida por lei a possibilidade de participar ativamente no exercício dos poderes estatais, sejam eles legislativos, executivos ou judiciários. Trata-se da liberdade como autonomia, na explicação de Norberto Bobbio: “A primeira ampliação do conceito de liberdade ocorreu com a passagem da teoria da liberdade como não impedimento para a teoria da liberdade como autonomia. [...] Com o conceito de autonomia, a liberdade não consiste mais na ausência de leis, mas sim na presença de leis internamente desejadas e internamente estabelecidas.” BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de janeiro: Campus, 2000. p. 489. 1

CANETTI, Elias. Massa e poder. São Paulo: Companhia das letras, 2005.

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[Filosofia II]

A DEMOCRACIA ATENIENSE A democracia em que Platão e Sócrates viveram na Grécia era marcadamente diferente das democracias atuais. Primeiro, os direitos políticos só eram concedidos aos cidadãos homens – ou seja, homens livres nascidos em Atenas, o que excluía os escravos, aqueles de que ambos os pais não fossem cidadãos e, naturalmente, as mulheres. Em segundo lugar, os membros dos governos não eram eleitos, mas sorteados, porque se acreditava que as eleições discriminavam antidemocraticamente os que não fossem populares. Finalmente, todos os cidadãos do sexo masculino podiam participar do debate público e as decisões da assembleia, e eram até estimulados a fazer isso sendo pagos pela frequência. Platão temia que a capacidade de vencer por meio da oratória tivesse pouco a ver com a força do argumento apresentado, e que a retórica e o carisma superassem a razão e sabedoria – talentos especiais dos filósofos. Na mesma linha, ele argumentava que um governo sábio não seria possível até que os reis se tornassem filósofos, ou os filósofos, reis. É na obra A República que Platão apresenta suas críticas a democracia: governar é uma capacidade, e é melhor deixar o exercício das capacidades para os especialistas. Ora, na democracia é o povo que governa, e o povo não é especialista; portanto, a democracia é irracional. Em essência, há duas maneiras de responder a Platão. Primeiro, precisamos enfrentá-lo em seu próprio campo, argumentando que a democracia – pelo menos nas circunstâncias corretas – pode produzir decisões muito boas. Se escolhermos representantes para tomar as decisões políticas ao invés de votar diretamente em determinadas políticas como acontecia na assembleia ateniense, talvez possamos obter resultados mais satisfatórios. Podemos também argumentar que a democracia não deve ser julgada pela qualidade de suas decisões, mas em outros termos – talvez com base na ligação que ela promove entre os indivíduos e as decisões da sociedade como um todo e na promoção do sentimento de pertencer a uma sociedade. Nessa segunda abordagem, o valor da democracia deriva de seu papel como autogoverno coletivo, que como tal engloba as ideias de igualdade, comunidade e livre-arbítrio.

A SOFOCRACIA DE PLATÃO Se para Platão a política é a arte de governar as pessoas com o seu consentimento, e o político é aquele que conhece essa difícil arte, só poderá ser chefe quem conhece a ciência política. Por isso, a democracia é inadequada, porque a igualdade só é possível na repartição dos bens, mas nunca no igual direito ao poder. Para o Estado ser bem governado, é preciso que “os filósofos se tornem reis, ou que os reis se tornem filósofos”. Portanto, Platão propõe um modelo aristocrático de poder, não uma aristocracia da riqueza, mas aquela em que o poder é confiado aos mais sábios. Ou seja, trata-se de uma sofocracia. A esse respeito, diz Platão: “Será então o momento de conduzir à consumação final aqueles que, aos cinquenta anos, tiverem saído ilesos das provas a que se submeteram. Os que tiverem distinguido em todos os atos de sua conduta e em todos os ramos do conhecimento serão compelidos a dirigir o olhar da alma para o ser que ilumina todas as coisas; a enxergar o Bem em si e a utilizá-lo como modelo para governar, cada um por usa vez, e durante o resto de sua vida, a Cidade, os particulares e a si próprios. Deverão consagrar à filosofia uma grande parte do seu tempo e, chegando a sua vez, carregar nos ombros o peso das funções políticas e da direção das questões públicas tendo em mira apenas o bem da Cidade, com a convicção, não de que executam uma função honrosa, mas de que cumprem um dever iniludível”. PLATÃO. A República. Livro VII. Brasília: UNB, 1985. p. 84. O rigor do Estado concebido por Platão ultrapassa em muito a proposta de educação. Como a virtude suprema é a obediência à lei, o legislador tem de conseguir seu cumprimento, em primeiro lugar, pela persuasão, aguardando a atuação consentida dos cidadãos livres e racionais. Caso não o consiga, deve usar a força: a prisão, o exílio ou a morte. Do mesmo modo, a censura é justificável quando visa à manutenção do Estado.

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[Filosofia II] AS FORMAS DE GOVERNO Platão foi o primeiro pensador a refletir sobre a melhor forma de governo, a sofocracia. Mas, observando a política real de seu tempo, alerta para o poder degenerado, em que o governo não respeita as leis nem tem por objetivo a justiça coletiva, e sim o interesse de pessoas ou grupos. Está mesmo convencido de que, após uma série de governos justos, a tendência é decair, devido à negligência dos magistrados das cidades, è dissidência interna ou às guerras. As formas de governos degenerados são quatro, descritos no Livro VIII de A República:  A timocracia, em que o culto da virtude é substituído pelo impulso guerreiro;  A oligarquia, na qual o exercício do poder é destinado aos mais ricos;  A democracia, em que o poder é atribuído aos mais pobres. Para Platão, nessa forma de governo acaba prevalecendo a demagogia, característica do político que manipula e engana. No Livro VIII de A República, Platão critica a democracia por que, por definição, o povo é incapaz de adquirir a ciência política. A pretensão à igualdade democrática é falaciosa, porque a verdadeira igualdade baseia-se no valor pessoal, que é sempre desigual, já que uns são melhores do que outros.  A tirania, que resulta geralmente dos abusos da democracia, o que exige um guia que assuma todos os poderes. Com o tempo, o tirano abusa desse poder em proveito próprio, gerando a pior forma de governo, exercida pela força de um só e sem ter por objetivo o bem comum.

ARISTÓTELES E O HOMEM COMO ANIMAL POLÍTICO Os filósofos políticos sempre se interessaram em saber até que ponto os homens são “naturalmente compatíveis” com a vida em sociedade. Em termos biológicos, poderíamos perguntar: “Os seres humanos são animais em rebanho?” Os antigos gregos faziam distinção entre natureza e coisas que existem de acordo com a natureza e coisa que existem por causa da ação humana. A distinção pode se aplicar à sociedade humana. Os Estados e sociedades humanas são naturais ou artificiais? Nós inventamos ou eles são parte inevitável da existência humana? Aristóteles não tinha dúvida sobre o assunto, e alegava que é “evidente que o Estado é criação da natureza, e o homem é por natureza um animal político”. (Política, livro I). Segundo esse ponto de vista, os homens não têm outra escolha a não ser viverem em qualquer sociedade, e em sociedades de natureza política. Qualquer pessoa que por natureza não se adapte a viver sob um Estado deve ser “miserável ou mais que homem”, diz Aristóteles, comparando esse “pária social” a uma peça isolada em um jogo de tabuleiro. Conceber um indivíduo completamente fora da sociedade, porém, não faz sentido: tal pessoa simplesmente não seria um ser humano. “Derivado do adjetivo de polis, significando tudo aquilo que se refere à cidade, e portanto ao cidadão, civil, público e também sociável e social, o termo ‘política’ foi transmitido por influência da grande obra de Aristóteles, intitulada Política, que deve ser considerada o primeiro tratado sobre a natureza, as funções, as divisões do Estado, e sobre as várias formas de governo, predominantemente do significado de arte ou ciência do governo, isto é, de reflexão, não importa se com intenções meramente descritivas ou também prescritivas, sobre as coisas da cidade. (...) O conceito de política, entendida como forma de atividade ou práxis humana, está estritamente ligado ao conceito de poder. O poder foi definido tradicionalmente como “consistente nos meios para se obter alguma vantagem” (Hobbes, Leviatã, cap. X) ou, de modo análogo, como o ‘conjunto dos meios que permitem conseguir os efeitos desejados’ (Russell B., O Poder – Uma nova análise social).” ( BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política, pg 159, 161)

Sofocracia: do grego sophós, “sábio”, e kratia, “poder”.

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[Filosofia II] ARISTÓTELES: QUEM É CIDADÃO? Já que a democracia grega excluía da cidadania os estrangeiros, as mulheres e os escravos. Aristóteles também o faz, mas na obra Política propõe-se discutir o que se pode entender por cidadania. Esta depende do direito de participar da vida pública. Assim ele afirma: “...um cidadão integral pode ser definido por nada mais nem nada menos que pelo direito de administrar justiça e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são limitadas quanto ao tempo de exercício, de tal modo que não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de certos intervalos de tempo pré-fixado; para outros encargos não há limitações de tempo no exercício de funções públicas (por exemplo, os jurados e os membros da assembleia popular)”. ARISTÓTELES. Política. Livro III, capítulo I, 1275b. Em seguida, Aristóteles adverte que há outros tipos de cidadania, dependendo da constituição aceita pela cidade, assim como o governante deve ser um bom cidadão, embora as funções de um e de outro sejam diferentes. Embora na Atenas democrática os artesãos estivessem entre os cidadãos, caso fossem homens livres e nativos da cidade, na sua teoria política Aristóteles prefere excluir da cidadania a classe dos artesãos, comerciantes e trabalhadores braçais em geral. Em primeiro lugar, porque a ocupação não lhes permite o tempo de ócio necessário para participar do governo; e em segundo lugar porque, reforçando o desprezo que os antigos tinham pelo trabalho manual, esse tipo de atividade embrutece a alma e torna quem o exerce incapaz da prática de uma virtude esclarecida. Vale lembrar ainda a polêmica justificativa de Aristóteles à escravidão: “Se as lançadeiras tecessem e as palhetas tocassem cítaras por si mesmas, os construtores não teriam necessidade de auxiliares e os senhores não necessitariam de escravos”. ARISTÓTELS. Política. Livro I, capítulo II, 1254a. Para Aristóteles, os homens livres e concidadãos aprisionados em guerras não deveriam ser escravizados, mas sim os “bárbaros” – nome genérico atribuído aos não gregos – que, por serem “inferiores”, possuíam disposição natural para a escravidão. Recomendava apenas que o tratamento do senhor ao servo não fosse cruel, devendo mesmo ser estabelecidos laços afetivos, como nas antigas famílias dos tempos homéricos, quando os escravos pertenciam ao lar.

AS FORMAS DE GOVERNO Enquanto Platão privilegia a matemática, ciência abstrata por excelência, Aristóteles, filho de médico, sofre influencia da biologia. Daí seu gosto pela observação e classificação sobre 158 constituições existentes. Além de descrever as diversas constituições, Aristóteles estabelece uma tipologia das formas de governo que se tornou clássica. Aristóteles usa os seguintes critérios de distinção: a) Segundo o critério da quantidade, o governo pode ser monarquia (governo de um só), aristocracia (governo de um pequeno grupo) e politeia (governo constitucional da maioria). b) Conforme o critério axiológico (de valor), as três formas são boas se visam ao interesse comum; e são más, corrompidas, degeneradas, se têm como objetivo o interesse particular. Portanto, a cada uma das três formas boas descritas correspondem respectivamente três formas degeneradas: a tirania, em que o governo de um só visa ao interesse próprio; a oligarquia, na qual vence o interesse dos mais ricos ou nobres; e a democracia, pela qual a maioria pobre governa em detrimento da minoria rica. O quadro a seguir esclarece a classificação: FORMAS DE GOVERNO Critérios do Valor

Critérios do número

Boas

Corrompidas

Um

Monarquia

Tirania

Poucos Muitos

Aristocracia Politeia

Oligarquia Democracia

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[Filosofia II] A melhor forma de governo é, para Aristóteles, uma mistura entre democracia (governo da maioria) e da aristocracia (governo dos melhores). Devemos destacar ainda que para este filósofo a sociabilidade humana – nossa característica de viver em sociedade, é algo natural, já que tendemos à busca da felicidade e isso é mais possível em conjunto com outros do que isoladamente. “Um regime só é político se for instituído por um corpo de leis publicamente reconhecidas e sob as quais todos vivem, governantes e cidadãos. Em suma, é político o regime no qual os governantes estão submetidos às leis. Quando a lei coincide com a vontade arbitrária do governante, não há política, mas despotismo e tirania. Quando não há lei de espécie alguma, não há política, mas anarquia.” (CHAUÍ, M. Convite à filosofia. Ed Ática, 1997.)

IDADE MÉDIA: POLÍTICA E RELIGIÃO No primeiro período da Idade Média, o Império Romano esfacelou-se em diversos reinos bárbaros. O desejo de unidade de poder, de restauração da unidade perdida, expressou-se na difusão do cristianismo, que passou a representar o ideal de Estado universal. Não por acaso, os intelectuais pertenciam às ordens religiosas e, conseguentemente, as principais questões filosóficas baseavam-se nas relações entre fé e razão, esta sempre subordinada àquela. Porque, se a fé o conhecimento mais elevado e o critério adequado da verdade, não cabe à filosofia buscar a verdade, mas apenas demonstrar racionalmente essa verdade. De início, os religiosos receavam os textos gregos, por serem obras pagãs, mas com as devidas interpretações e adaptações à fé cristã, os pensadores medievais aderiram inicialmente ao platonismo e depois ao aristotelismo. Ao contrário das concepções da Antiguidade, em que a função do governo era assegurar a vida boa, na Idade Média predominou a concepção negativa do Estado. Por ser a natureza humana sujeita ao pecado e ao descontrole das paixões, caberia ao Estado o papel de intimidação para todos agirem retamente. Daí a estreita relação entre política e moral, que exige a formação do governante justo, não tirânico, capaz de obrigar todos a obedecer aos princípios da moral cristã. Segundo essa concepção religiosa, configuram-se duas instâncias de poder: a do Estado e a da Igreja.  A natureza do Estado é secular, temporal, voltada para as necessidades mundanas, e sua atuação é exercida pela força física;  A Igreja é de natureza espiritual, voltada para os interesses da salvação da alma, e deve encaminhar o rebanho para a religião por meio da educação e da persuasão.

A POLÍTICA DE MAQUIAVEL Vimos que para os gregos há uma inseparabilidade entre ética e política, mas isso muda de figura nas teorias políticas depois de Maquiavel. Nicolau Maquiavel (1469–1527) é sempre lembrado pela famosa frase “os fins justificam os meios” (a partir do que se originou o assim chamado “maquiavelismo”, e o termo “maquiavélico”) usada para designar atitudes que visam a astúcia na manutenção do poder a todo custo. É importante discernir o adjetivo maquiavélico da real teoria política de Maquiavel. O maquiavelismo está associado a uma idéia de que os fins justificam os meios, porém Maquiavel não considera o Estado como fim absoluto e não o julga dotado de existência superior à do indivíduo, ele enaltece a honestidade e a lealdade na vida civil e política. Seu objetivo principal era formular regras eficazes de governo, tendo como base a experiência política antiga e nova, considerando essa eficácia independente do caráter moral ou imoral das regras. Do ponto de vista da teoria política a obra de Maquiavel é o marco decisivo da separação entre ética e política. Para Maquiavel, o bom político é aquele que possui fortuna (sorte) &virtú (a virtude política, a capacidade de aproveitar as oportunidades para a conservação ou aumento do poder político), ou seja, a arte política não deve se preocupar mais tanto – como para os gregos – nem com a regulação justa das relações políticas, nem com a promoção da boa vida dos cidadãos, mas com as regras para o governo que preza pela manutenção do ESTADO.

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[Filosofia II] “(...) sua preocupação em todas as suas obras é o Estado. Não o melhor Estado, aquele tantas vezes imaginado, mas que nunca existiu. Mas o estado real, capaz de impor a ordem. Maquiavel rejeita a tradição idealista de Platão, Aristóteles, (...) sua regra metodológica: ver e examinar a realidade tal como ela é e não como se gostaria que ela fosse. A substituição do reino do dever ser, que marcara a filosofia anterior, pelo reino do ser, da realidade, leva Maquiavel a se perguntar: como fazer reinar a ordem, como instaurar um Estado estável?” (Maria Tereza Sadek, Os Clássicos da Política.)

“O governo é o agente da atividade política de um Estado. Sendo um agente da política, esta impõe as condições e as exigências. Para ser governo é preciso se subordinar à lógica própria da atividade do Estado, em todos os seus detalhes. Esta é autônoma em relação ao seu agente, que precisa conhecê-la em detalhes, porque depende dela. Através de seu agente, a atividade política do Estado realiza-se concretamente, pelo exercício do poder do governo. O acesso à atividade política, portanto, depende da capacidade de se tornar agente. O nobre se torna nobre na medida em que se torna agente de uma atividade nobre: a política. O livro de Maquiavel [O Príncipe] é um conjunto de lições para que se conquiste ou mantenha um principado. Independente de se adquirir o principado por roubo, por herança ou por mérito, a sua posse faz do seu agente um príncipe. Não é o nobre que faz política, mas a política que faz o nobre, assim como a religião faz o monge, a guerra faz o militar e o trabalho define o trabalhador.” (VALLS, Álvaro. O que é Política, p. 36)

OS CONTRATUALISTAS O desenvolvimento das ideias na época moderna acerca da origem do mundo e das coisas, advindas do distanciamento entre a produção do conhecimento e a moral católica, engendrou a procura por novas explicações acerca do surgimento da sociedade civil. Como surgiram as primeiras sociedades? Foram famílias que cresceram e formaram os primeiros agrupamentos humanos, que mais tarde deram origem às vilas e, posteriormente às cidades? E o Estado? Como surgiu? O Estado antecedeu a sociedade, ou a sociedade veio antes do Estado? Qual o fundamento que explica o surgimento do Estado e, consequentemente, por que as pessoas devem obedecer às ordens emanadas no âmbito do Estado? Como poder-se-ia justificar e legitimar o poder do Estado sobre os indivíduos? A doutrina contratualista procurou responder a algumas dessas perguntas. Apesar das divergências existentes entre cada autor contratualista, há um liame que "amarra" suas teorias, e que por fim, acaba por caracterizá-los como tal, como contratualistas. Começaremos primeiramente com a teoria do Estado de Thomas Hobbes.

HOBBES Hobbeséo pensador da Soberania do Estado, o teórico do absolutismo, que representa uma mudança significativa com relação ao pensamento político tradicional. É só lembrar que para Aristóteles a cidade é o lugar onde o homem deve realizar o ideal de felicidade. Para Hobbes, um crítico do sistema político aristotélico, não é bem assim que as coisas funcionam.

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[Filosofia II] Thomas Hobbes (1588-1679) é um dos mais influentes filósofos políticos da Inglaterra. Segundo sua própria avaliação, ele foi provavelmente o filósofo mais importante do seu tempo, se não da história, já que ele acreditava ser o primeiro a descobrir uma verdadeira "ciência da política." Alicerçado sobre o método infalível de geometria, a sua ciência política deveria demonstrar verdades políticas com a certeza de uma prova geométrica. Acreditava Hobbes, que tal ciência era desesperadamente necessária para seus companheiros, os cidadãos ingleses, porque divergências políticas e conflitos foram destruindo seu país. Segundo Hobbes, a guerra civil é causada principalmente por diferentes opiniões sobre quem é a autoridade máxima política em uma comunidade. Naquele tempo, a alegação de que o rei têm a palavra final em questões políticas foi posta dúvida pelos membros do Parlamento. Por exemplo, quando o Rei Charles tentou levantar fundos para uma guerra contra a Espanha e a França, em 1626, o Parlamento negou seu pedido. Em resposta, o rei usou um "empréstimo forçado" a força de sujeitos individuais para financiar suas necessidades. Essa ação contribuiu para o aumento das tensões entre o rei e o Parlamento, as tensões que finalmente irromperam na guerra civil. Segundo Hobbes, a única forma para fugir à guerra civil e para manter um estado de paz em uma comunidade é a instituição de um poder absoluto e soberano imparcial que é a autoridade final sobre todas as questões políticas. Hobbes acredita que a sua própria filosofia política cientificamente comprova tal conclusão. Se o argumento político de Hobbes é tão bom como uma prova geométrica, então a sua própria estimativa de sua importância filosófica não pode ser exagerada. “O soberano de uma República, seja ele uma assembléia ou um homem, não está absolutamente sujeito às leis civis. Pois tendo o poder de fazer ou desfazer as leis, pode, quando lhe apraz, livrar-se desta sujeição revogando as leis que o incomodam e fazendo novas.” HOBBES, Leviatã(1651) Sua filosofia política: 1) RECUSA A CONCEPÇÃO ANTIGA DA FINALIDADE DA CIDADE, e portanto da política; a cidade é, para ele: “uma multidão de homens, unidos numa pessoa única por um poder comum, para sua paz, sua defesa e seu proveito comuns”, fazendo do poder do soberano o “cimento” do corpo político, que visa aos indivíduos: a) SEGURANÇA; b) POSSIBILIDADE DE GOZAR AO MÁXIMO , EM PAZ, DE TODAS AS “COMODIDADES DA VIDA”.

2) CONSIDERA O DIREITO COMO O QUE É ÚTIL (sendo portanto um UTILITARISTA) – “Antes da lei, não havia injustiça”; “É a autoridade, não a verdade, que faz a lei” 3) RECUSA DA HIERARQUIA NATURAL: a) não há sociabilidade natural, a associação entre os homens é consenso livre; b) o estado natural é de guerra, e o Estado ajuda na conservação da vida. Para Hobbes, a politização do homem, sua entrada na sociedade civil, está ligada à sua introdução no maquinário estatal, e não mais à sua educação como indivíduo ético, que participa de uma comunidade política indissociável da comunidade ética. Ele fará, assim como Rousseau, referência ao estado de natureza (uma hipótese) no qual os homens se encontrariam em guerra de todos contra todos, pois teriam igual direito a todas as coisas. A cidade não é mais uma “comunidade”, mas “societas”, um grupo de pessoas que não tem por objetivo o bem comum, mas a manutenção da paz para que seja possível a realização do exercício da sociedade. Pode-se dizer que Hobbes, portanto, tem um modelo político mecânico, pois considera o Estado, o Leviatã, funciona independentemente dos fins de cada coisa na natureza – como era para Aristóteles – seu utilitarismo o leva a admitir o poder de decisão e legislação como necessário à instituição estatal.

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[Filosofia II]

(HOBBES, DO PONTO DE VISTA POLÍTICO,É“ANTI-ARISTOTÉLICO”) “Sem dúvida, a teoria da Soberania é um modelo político que, seguramente, supunha o surgimento ou a existência de uma sociedade mercantil. Mas se tomamos essa teoria em sua forma pura – na forma que Hobbes lhe deu - , é impossível dizer que o poder por ela definido esteja, exclusivamente, a serviço desta sociedade. Hobbes instaura um modelo de dominação política que é condição sine qua non para o funcionamento de toda a sociedade moderna.” (VALLS, Álvaro. O que é Poder, p. 60) Começam a importar aqui, no esclarecimento dos conceitos da política moderna, as ligações entre as transformações políticas e econômicas que ocorreram a partir do século XVI, na Europa, e as teorias que surgem na mesma época: “Por um lado a centralização e, simultaneamente, a burocratização do poder, transformando o aparelho estatal do governo dos príncipes – por outro lado,a expansão da circulação capitalista das mercadorias e uma progressiva perturbação do modo de produção baseado na família”. (Jürgen Habermas, Teoria e Prática. A Doutrina Clássica da Política. In: O que é Poder, p. 30) Os homens começam a viver em sociedade (ou seja, estabelecem o assim chamado CONTRATO SOCIAL) pelas necessidades (alimentação, moradia, etc), sendo a principal delas a necessidade de proteção. Em estado de natureza há um medo constante de perder a própria vida, o que fundamenta a justificativa de Hobbes para o surgimento da sociedade civil.

John Locke

Outros dois pensadores importantes da época moderna são John Locke (1632- 1704) e Jean-Jaques Rousseau (1712 1778). Suas teorias foram muito influentes nas teorias políticas posteriores, pois propuseram, cada uma seu modo, novos padrões para a avaliação do exercício do poder político e apresentaram justificativas para o surgimento da dominação de uns homens sobre os outros.

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J.J. Rousseau


[Filosofia II] A TEORIA POLÍTICA DE LOCKE John Locke (1632 – 1704), filósofo inglês, era médico e descendia de burgueses comerciantes. Refugiado na Holanda por ter-se envolvido com acusados de conspirar contra a Coroa, retornou a Inglaterra no mesmo navio que viajavam Guilherme de Orange, símbolo da consolidação da monarquia parlamentar inglesa. Locke assumiu papel importante na discussão sobre a teoria do conhecimento, tema privilegiado do pensamento moderno a partir de Descartes. A respeito desse assunto escreveu Ensaio sobre o entendimento humano, em que defende a teoria empirista. Com a obra Dois tratados sobre o governo civil, tornou-se o teórico da revolução liberal inglesa. Suas ideias políticas fecundaram todo o século XVIII, dando o fundamento filosófico das revoluções liberais ocorridas na Europa e nas Américas. Assim como Hobbes e posteriormente Rousseau, Locke partiu da concepção pela qual os indivíduos isolados no estado de natureza unem-se mediante contrato social para constituir a sociedade civil. Segundo essa teoria, apenas o pacto torna legítimo o poder do Estado. Diferentemente de Hobbes, porém, Locke não descreve o estado de natureza como um ambiente de guerra e egoísmo. O que então levaria os indivíduos a abandonar essa situação, delegando o poder a outrem? Para Locke, no estado natural cada um é juiz em causa própria; portanto, os riscos das paixões e da parcialidade são muito grandes e podem desestabilizar as relações entre os indivíduos. Por isso, visando à segurança e à tranquilidade necessária ao usufruto da propriedade, todos consentem em instituir o corpo político. Locke segue a tendência jusnaturalista e, nesse sentido, está convencido de que os direitos naturais humanos não desaparecem em consequência desse consentimento, mas subsistem para limitar o poder do Estado. Justifica, em ultima instância, o direito à insurreição: o poder é um depósito confiado aos governantes – trata-se de uma relação de confiança –, e, se estes não visarem ao bem público, é permitido aos governados retirar essa confiança e oferecê-la a outrem, posição que distingue Locke e Hobbes. Como representante dos ideais burgueses, Locke enfatiza que os indivíduos abandonam o estado de natureza para preservar a propriedade. Mas o que ele entende por propriedade? Em um sentido muito amplo, é “tudo o que pertence” a cada indivíduo, ou seja, sua vida, sua liberdade e seus bens. A primeira coisa que a pessoa possui, portanto, é o seu corpo: todo indivíduo é proprietário de si mesmo e de suas capacidades. O trabalho de seu corpo é propriedade dele; portanto, o trabalho dá início ao direito de propriedade em sentido estrito (bens, patrimônio). Isso significa que, na concepção de Locke, todos são proprietários: mesmo que não possua bens, é proprietário da sua vida, de seu corpo, seu trabalho e, portanto, dos frutos do seu trabalho.

O LIBERALISMO CLÁSSICO Embora Hobbes defenda o governo absoluto, vimos que ele não aceita a teoria do direito divino dos reis. Ao contrário, por ser contratualista, afirma que o governo legítimo é o que resulta do pacto, da vontade dos indivíduos. Podemos dizer que a Revolução Gloriosa, na Inglaterra, foi um conquista burguesa, que exigia do rei a convocação regular do parlamento, sem o que ele não podia fazer leis ou revogá-las, cobrar impostos ou manter um exército. Instituiu-se o habeas corpus (proteção ao direito de liberdade de locomoção quando ameaçado por autoridade), a fim de evitar prisões arbitrárias; a partir de então, nenhum cidadão podia ficar preso indefinidamente sem ser acusado diante dos tribunais, a não ser por meio de denuncia bem definida. Tais ideias subverteram as concepções políticas nos séculos XVII e XVIII.

CONCEITO DE LIBERALISMO Afinal, que ideias novas são essas? Na linguagem comum costumamos chamar de liberal a pessoa tolerante e generosa, tanto no sentido de não controlar gastos quanto no sentido de não ser autoritária. Chamamos também de liberais os profissionais como médicos, dentistas, advogados quando trabalham por conta própria.

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[Filosofia II] Aqui, no entanto, não nos interessa esses significados da palavra liberal, mas sim os que indicam o conjunto de ideias éticas, políticas e econômicas da burguesia, em oposição à visão da nobreza feudal. À burguesia interessava separar Estado e sociedade, entendendo nesta última o conjunto das atividades particulares dos indivíduos, sobretudo as de natureza econômica. Essa separação reduziria igualmente a interferência do privado no público, já que o poder procurava outra fonte de legitimidade diferente da tradição e das linhagens de nobreza.

ROUSSEAU E A DEMOCRACIA DIRETA A concepção política de Rousseau de certo modo seguiu a tendência iniciada no século anterior por Hobbes e Locke, de crítica ao absolutismo real que propunha o pacto social para legitimar o governo. Há, no entanto, uma diferença fundamental em sua teoria, qual seja, a novidade da democracia direta. Rousseau resolveu a questão da legitimidade do poder fundado no contrato social ao criar a hipótese segundo a qual os indivíduos viviam em estado de natureza, sadios, cuidando de sua própria sobrevivência, até o momento em que surgiu a propriedade e uns passaram a trabalhar para os outros, gerando escravidão e miséria. Rousseau parece demonstrar extrema nostalgia do estado feliz em que vive o “bom selvagem”, antes de ser introduzida a desigualdade, a diferença entre rico e pobre, poderoso e fraco, senhor e escravo e a predominância da lei do mais forte. O indivíduo que surge da desigualdade é corrompido pela sociedade e esmagado pela violência. Trata-se de um falso pacto social, esse que coloca as pessoas sob ferros. Há que se considerar a possibilidade de outro contrato verdadeiro e legítimo, pelo qual o povo esteja reunido sob uma só vontade. O contrato social, para ser legítimo, deve se originar do consentimento necessariamente unânime. Cada associado se aliena totalmente, ou seja, abdica sem reserva de todos os seus direitos em favor da comunidade. Como todos abdicam igualmente, na verdade cada um perde, pois: “*...+ este ato de associação produz, em lugar da pessoa particular de cada contratante, um corpo moral e coletivo composto de tantos membros quantos são os votos da assembleia e que, por esse mesmo ato, ganha sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua vontade” ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 39.

Pelo pacto, o individuo abdica de sua liberdade, mas como ele é parte integrante e ativa do todo social, ao obedecer a lei, obedece à si mesmo e, portanto, é livre: “A obediência à lei que se estatui a si mesma é liberdade”. Isso significa que, para Rousseau, o contrato não faz o povo perder a soberania, pois não é criado um Estado separado dele mesmo. Sob certo aspecto, essa teoria é inovadora por distinguir os conceitos de soberano e governo, atribuindo ao povo a soberania inalienável. Cada associado, mesmo quando se aliena totalmente em favor da comunidade, nada perde de fato, porque, na qualidade de povo incorporado, mantém a soberania. Ou seja, soberano é, para Rousseau, o corpo coletivo que expressa, por meio da lei, a vontade geral. A soberania do povo, manifesta pelo legislativo, é inalienável, isto é, não pode ser representada. Segundo a concepção rousseauniana de democracia, toda lei não ratificada pelo povo em pessoa é nula. Por isso, o ato pelo qual o governo é instituído pelo povo não submete este àquele. Ao contrário, não há um superior, pois os depositários do poder não são senhores do povo, podendo ser eleitos ou destituídos conforme a conveniência. Os magistrados que constituem o governo estão subordinados ao poder de decisão do soberano e apenas executam as leis, devendo haver inclusive boa rotatividade na ocupação dos cargos. Rousseau preconiza, portanto, a democracia direta ou participativa, mantida por meio de assembleias frequentes de todos os cidadãos. Também distingue dois tipos de participação na comunidade. Como soberano, o povo é ativo e considerado cidadão. Mas exerce igualmente uma soberania passiva, assumida na qualidade de súdito. Então, o mesmo indivíduo, enquanto faz a lei, é cidadão, mas é súdito enquanto a ela obedece e se submete. “Aquele que recusar obedecer à vontade geral a tanto será constrangido por todo um corpo, o que não significa senão o que o forçarão a ser livre, pois é essa a condição que, entregando cada cidadão à pátria, o garante contra qualquer dependência pessoal”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Abril Cultural, 1973.p. 42.

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1.3. Teoria do Conhecimento Agora vamos nos ocupar da teoria do conhecimento, ou epistemologia (epistéme, em grego, quer dizer ciência, conhecimento teórico das coisas por meio de raciocínios, provas e demonstrações; conhecimento teórico por meio de conceitos necessários (isto é, daquilo que é impossível que seja diferente do que é; o que não pode ser de outra maneira, ser diferente do que é) e universais (isto é, válido para todos em todos os tempos e lugares)2. A teoria do conhecimento tem uma história tão longa quanto a da própria filosofia – o que pode-se inferir da definição originária de filosofia como busca/ amor pelo saber/ conhecimento – e há várias maneiras de investigar o tema: os filósofos pré-socráticos, por exemplo, tinham uma preocupação científica (em oposição às construções mitológicas) em descobrir qual era o princípio explicativo do funcionamento do mundo, sua origem comum. “A maior parte dos primeiros filósofos considerava como os únicos princípios de todas as coisas os que são da natureza da matéria. Aquilo de que todos os seres são constituídos e de que primeiro são gerados e em que por fim se dissolve, tal é para eles o elemento, o princípio dos seres; e por isso julgam que nada se cria nem se destrói, como se tal natureza subsistisse para sempre... Tales, o fundador de tal filosofia, diz ser a água o princípio e por isso também declarou quer a terra está sobre a água. (Aristóteles, Metafísica)”3 Os filósofos anteriores à Sócrates são designados de físicos justamente por causa das suas tentativas de explicar a physis (natureza) de modo racional. Aos nossos olhos, muitas vezes, suas explicações parecem tão absurdas quanto os mitos sobre a origem do universo e dos homens. Diante disso, é sempre bom situar essas explicações em seu contexto histórico e lembrar que esses homens estavam fazendo algo inédito na história: inaugurando o pensamento científico ocidental. Sabemos que com a filosofia socrática as questões se voltam com mais força para a vida humana, os modos de convivência, a origem das virtudes e do próprio conhecimento. O famoso “Só sei que nada sei”, de Sócrates, insere-se nesse contexto de busca pelas coisas que são e que não são possíveis de conhecer, os modos de conhecimento, e também o seu valor. Começaremos analisando os diferentes tipos de conhecimento, mostrando suas semelhanças e diferenças. Depois, estudaremos as principais características de um dos modos de conhecimento, o proposicional, avaliando as diferenças entre seus desdobramentos: o senso comum e o conhecimento científico.

MODOS DE CONHECER Devemos ter em mente que o conhecimento é uma relação entre um sujeito que conhece e um objeto quer é conhecido (podemos pensar que isso é inevitável dado o suo gramatical do verbo conhecer: ele precisa de um complemento; a frase “X conhece” é incompleta, para fazer sentido é preciso especificar o que X conhece. O modo como usamos cotidianamente as palavras SABER e CONHECER pode nos fornecer alguns indícios a respeito dos diferentes modos de conhecimento que estudaremos agora. Geralmente dizemos coisas do tipo: 1. “Sim, conheço o Rodrigo Santoro”; 2. “Eu não sei fazer comida”; 3. “Conheço Fernando de Noronha”; 4. “Ainda não nos conhecemos direito”; 5. “Eu sei que a Revolução Francesa aconteceu em 1789 ”; 6. “Ela sabe dançar melhor do que eu”. 7. “Sei responder esta questão”. 2

Vocabulário extraído de: CHAUÍ, M Introdução à história da filosofia – Dos pré-socráticos à Aristóteles. 2ª. Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. 3 Idem anterior.

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[Filosofia II] Podemos perceber que as ocorrências das ideias de saber e conhecerestão nos mais variados contextos. Há algo que não difere de uma ocorrência para outra: o fato de que em qualquer dos contextos acima, saber ou conhecer implica um sujeito (em geral um “eu”, mas no caso de 6 um sujeito da terceira pessoa do singular) e um objeto. Os objetos do conhecimento podem ser de diversos tipos: a) pessoas e lugares, no caso das proposições 1, 4 e 3, b) atividades no caso de 2 e 6, c) proposições no caso de 5 e 7. (Saber responde uma questão implica saber que certas proposições são verdadeiras e outras são falsas) Tais diferenças podem ser pensadas em termos da seguinte pergunta: quais condições devem ser satisfeitas para que eu possa dizer que conheço uma pessoa ou um lugar? a resposta provável é: ter algum tipo de contato com a pessoa ou com um lugar, de modo que quanto maior e melhor o contato (em termos de tempo despendido junto com a pessoa ou no lugar, do modo de relacionar-se com a pessoa ou o lugar, explorando suas qualidades e relações), tanto melhor será o conhecimento. Por outro lado poder-se-ia perguntar: o que é necessário para saber fazer alguma coisa (andar de bicicleta, por exemplo)? A resposta mais provável é: experimentar, praticar, exercitar-se. Do mesmo modo podemos perguntar: quais são as condições necessárias para o conhecimento de proposições (lembrando sempre que proposições são os pensamentos expressos por sentenças declarativas, que podem ser verdadeiros ou falsos)? É interessante notar em que medida esta pergunta se conecta com a tradição antiga, ou seja, que já em Platão e Aristóteles o questionamento a respeito das condições de possibilidade do conhecimento é uma questão central. Platão, por exemplo, deixou através de um de sus diálogos, o Teeteto, a seguinte definição de conhecimento: Conhecimento é toda crença que além de verdadeira é justificada. Platão

UMA OUTRA VERSÃO PARA O MITO DA CAVERNA DE PLATÃO Todos nós conhecemos a alegoria da caverna, na qual Platão ilustra (A República) o processo de aquisição da verdade através da saída de um prisioneiro do fundo escuro da caverna. No livro O Porco Filósofo encontramos a seguinte versão:

Fora da bolha de vidro (capítulo 19 de “O Porco Filósofo”) Membros da bizarra seita Weatherfield viviam uma vida muito reclusa na Casa Santa Hilda. Todos, à exceção do líder, eram proibidos de fazer qualquer contato com o mundo exterior e eram ensinados que a realidade era o mundo retratado nas telenovelas – os únicos programas de televisão aos quais tinham a permissão de assistir. Para os weatherfieldianos, como eles eram conhecidos, Coronation Street, The Bold and the Beautiful, EastEnders e Neighbours4 não eram obras de ficção, mas documentários que mostravam a realidade. E como a maioria dos membros era nascida na comunidade, não era difícil manter a mentira. Um dia, porém, o discípulo Kenneth, que sempre tinha sido um pouco rebelde, decidiu deixar a comunidade e visitar os lugares que tinha visto tantas vezes nas caixas altares. Claro que isso era terminantemente proibido. Mas Kenneth conseguiu escapar. O que ele encontrou o deixou pasmo. O maior choque ocorreu quando conseguiu chegar à Coronation Street e descobriu que ela nem ficava em Weatherfield, mas era um cenário nos estúdios Granada. Mas quando ele voltou escondido para casa e contou aos outros discípulos o que tinha descoberto, foi considerado um lunático. – Você nunca deveria ter partido – disseram a ele –. Não é seguro á fora, sua mente prega peças em você! Depois disso, eles o expulsaram da comunidade e o proibiram de voltar. Fonte: A alegoria da Caverna em A República de Platão. 4

Novelas populares na Grã-Bretanha.

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[Filosofia II] A história dos weatherfieldianos é sem dúvida uma alegoria. Mas o que representam seus vários elementos? Há muitas maneiras de traduzir a parábola. Alguns afirmam que o mundo da experiência comum é uma ilusão, e que as portas para o mundo real são abertas por drogas ou práticas sagradas de meditação. As pessoas que afirmam terem visto a verdade dessa maneira normalmente são consideradas drogadas ou malucas; mas elas acham que nós somos os tolos, aprisionados como estamos no mundo limitado das experiências dos sentidos. De forma mais prosaica, os weatherfieldianos da vida real são aqueles que não questionam aquilo que dizem a eles, e simplesmente aceitam como realidade tudo o que a vida lhes apresenta. Podem não acreditar literalmente que as novelas são verdade, mas aceitam sem criticar a sabedora recebida. O que isso é depende de como exatamente eles foram socializados. Então, por exemplo, algumas pessoas acham loucura acreditar que o presidente dos Estados Unidos pode ser culpado de terrorismo. Outros acreditam que é uma loucura igual afirmar que, na verdade, ele é um cara muito inteligente. Isso levanta a questão de qual é a contrapartida do mundo para a Casa Santa Hilda. Geralmente, nós não nos isolamos com tijolos e argamassa, mas confinamos os limites de nossas experiências de maneiras bem mais sutis. Se em toda a sua vida você leu apenas um jornal, está limitando radicalmente o espaço intelectual em que habita. Se só discute política com pessoas que compartilhem de suas opiniões gerais, está erguendo outra cerca metafórica ao redor de seu ponto de vista, está se recusando a olhar além dos muros do mundinho confortável que construiu para si mesmo. Talvez maior dificuldade que encaremos nesse aspecto é identificar o Kenneth entre nós. Como diferenciar os tolos iludidos que têm visões de mundo loucas dos que realmente descobriram uma dimensão oculta da vida que nos passou despercebida? Não podemos dar o benefício da dúvida a todos os que acreditamter descoberto verdades escondidas, eles não podem estar todos certos. Mas se os rejeitarmos muito rapidamente, corremos o risco de ser como os tolos e ingênuos weatherfieldianos, condenados a aceitar uma vida de ilusão em vez de uma vida de realidade. *******************

O que nos interessa com a referência à filosofia de Platão não é tanto a alegoria da caverna e sim a definição de conhecimento presente em, outro diálogo, o Teeteto: Sócrates: Diz-me, então, qual a melhor definição que poderíamos dar de conhecimento, para não nos contradizermos? [...] Teeteto: A de que a crença verdadeira é conhecimento? Certamente que a crença verdadeira é infalível e tudo o que dela resulta é belo e bom. [...] Sócrates: O problema não exige um estudo prolongado, pois há uma profissão que mostra muito bem como a crença verdadeira não é conhecimento. Teeteto: Como é possível? Que profissão é essa? Sócrates: A desses modelos de sabedoria a que se dá o nome de oradores e advogados. Tais indivíduos, com sua arte, produzem convicção, não ensinando, mas fazendo as pessoas acreditar no que quer que seja que eles queriam que elas acreditem. Ou julgas tu que há mestres tão habilidosos que, no pouco tempo concebido pela clepsidra5 sejam capazes de ensinar devidamente a verdade acerca de um roubo ou qualquer outro crime a ouvintes que não foram testemunhas do crime? Teeteto: Não creio, de forma nenhuma. Eles não fazem senão persuadi-los. Sócrates: Mas para ti persuadir alguém não será levá-lo a acreditar em algo? Teeteto: Sem dúvida. Sócrates: Então, quando há juízes que se acham justamente persuadidos de fatos que só uma testemunha ocular, e mais ninguém, pode saber, não é verdade que, ao julgarem esses fatos por ouvir dizer, depois de terem formado deles uma crença verdadeira, pronunciam um juízo desprovido de conhecimento, embora tendo uma convicção justa, se deram uma sentença correta? Teeteto: Com certeza. 5

Agulha de um relógio de sol; Sócrates está se referindo justamente ao tempo marcado pelo relógio.

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[Filosofia II] Sócrates: Mas, meu amigo, se a crença verdadeira e o conhecimento fossem a mesma coisa, nunca o melhor dos juízes teria uma crença verdadeira sem conhecimento. A verdade, porém, é que se trata de duas coisas distintas. Teeteto: Eu mesmo já ouvi alguém fazer essa distinção, Sócrates; tinha-me esquecido dela, mas voltei a lembrar-me. Dizia essa pessoa que a crença verdadeira acompanhada de razão (logos) é conhecimento e que desprovida de razão (logos), a crença está fora do conhecimento [...].

A TEORIA DA CRENÇA VERDADEIRA JUSTIFICADA (TEETETO) Suponhamos que o conhecimento requer estas três condições. Será que isto é suficiente? Será que estas condições não são apenas separadamente necessárias, mas também conjuntamente suficientes? Chamarei CVJ à teoria que afirma que assim é. Esta teoria diz que ter conhecimento é a mesma coisa que ter crenças verdadeiras justificadas: (CVJ) Para que qualquer indivíduo S e para qualquer proposição p, S conhece p se e somente se 1. S acredita em p 2. p é verdadeira 3. a crença de S em p está justificada A Teoria CVJ afirma uma generalização. Diz o que é o conhecimento para qualquer pessoa e para qualquer proposição p. Por exemplo, suponhamos que S és tu e que p = “A Lua é feita de queijo verde”. A teoria CVJ diz o seguinte: se sabes que a Lua é feita de queijo verde, então os enunciados 1, 2 e 3 devem ser verdadeiros. E se não sabes que a Lua é feita de queijo verde, então pelo menos um dos enunciados de 1 a 3 deve ser falso. Tal como na definição de solteiro discutida antes, a expressão “se, e somente se” diz-nos que são dadas condições necessárias e suficientes para o conceito definido.

EMPIRISMO E RACIONALISMO Na filosofia, empirismo foi uma teoria do conhecimento que afirma que o conhecimento vem apenas ou principalmente, a partir da experiência sensorial. Um dos vários pontos de vista da epistemologia, o estudo do conhecimento humano, juntamente com o racionalismo, o idealismo e historicismo, o empirismo enfatiza o papel da experiência e da evidência, experiência sensorial, especialmente, na formação de ideias, sobre a noção de ideias inatas ou tradições; empiristas podem argumentar, porém, que as tradições (ou costumes) surgem devido às relações de experiências sensoriais anteriores. Empirismo na filosofia da ciência enfatiza a evidência, especialmente porque foi descoberta em experiências. É uma parte fundamental do método científico que todas as hipóteses e teorias devem ser testadas contra observações do mundo natural, em vez de descansar apenas em um raciocínioa priori, a intuição ou revelação. Filósofos associados com o empirismo incluem Aristóteles, Alhazen, Avicena, Ibn Tufail, Robert Grosseteste, Guilherme de Ockham, Francis Bacon,Thomas Hobbes, Robert Boyle, John Locke, George Berkeley, Hermann von Helmholtz, David Hume, Leopold von Ranke, John Stuart Mill e Nicolau Maquiavel. O racionalismo é a corrente filosófica que iniciou com a definição do raciocínio como uma operação mental, discursiva e lógica que usa uma ou mais proposições para extrair conclusões, ou seja, se uma ou outra proposição é verdadeira, falsa ou provável. Essa era a ideia central comum ao conjunto de doutrinas conhecidas tradicionalmente como racionalismo. O racionalismo é em parte, a base da Filosofia, ao priorizar a razão como o caminho para se alcançar a Verdade. O racionalismo afirma que tudo o que existe tem uma causa inteligível, mesmo que essa causa não possa ser demonstrada empiricamente, tal como a causa da origem do Universo. Privilegia a razão em detrimento da experiência do mundo sensível como via de acesso ao conhecimento. Considera a dedução como o método superior de investigação filosófica. René Descartes, Baruch Spinoza e Gottfried Wilhelm Leibniz introduzem o racionalismo na filosofia moderna. Georg Wilhelm Friedrich Hegel, por sua vez, identifica o racional com o real, supondo a total inteligibilidade deste último.

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[Filosofia II] O racionalismo é baseado nos princípios da busca da certeza, pela demonstração e análise, sustentados, segundo Kant, pelo conhecimento a priori, ou seja o conhecimento que não é inato nem decorre da experiência sensível mas é produzido somente pela razão. O racionalismo é a corrente central no pensamento liberal que se ocupa em procurar, estabelecer e propor caminhos para alcançar determinados fins. Tais fins são postulados em nome do interesse coletivo (commonwealth), base do próprio liberalismo anglo-saxónico, contribuindo também para estabelecer a base do racionalismo. O racionalismo, por sua vez, fica na base do planejamento da organização econômica e espacial da reprodução social. Origem do conhecimento

Empirismo

Racionalismo Razão Universalidade e necessidade Reminiscência e dedução

Experiência A mente

Conhecimento limitado - Associação de ideias

É uma tábua rasa

Possui ideias natas

CRITICISMO (A TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO) A duas correntes filosóficas tinham fraquezas, através do empirismo pode-se dizer muito sobre o mundo, mas “sacrifica” as certezas. Já o racionalismo traz certezas indubitáveis, porém fala pouco sobre o mundo. Eis aí um problema a ser solucionado. Kant distinguiu duas formas de conhecimento, o a priori e o a posteriori. • a priori: conhecimento puro, que dispensa qualquer prova empírica para sustentá-lo. Exemplo: Se A, então B, e Se B, então C, logo, Se A, então C. (lógica) • a posteriori: nesse caso é preciso recorrermos `a experiência. Exemplo: “As características que as plantas apresentam são determinadas por elementos hereditários.” Juízos analíticos – “O quadrado tem quatro lados e quatro ângulos internos.” Fundados no princípio de identidade, o predicado aponta um atributo contido no sujeito. Independem da experiência e são universais e necessários. Forma: A=A (juízos analíticos) Forma: A=B (juízos sintéticos) Problema: Que juízos constituem a ciência físico-matemática? Caso fossem analíticos, a ciência não seria informativa (sempre diria o mesmo – tautologias). E, se fossem sintéticos a ciência seria apenas um amontoado de informações corriqueiras (afirmações sem fundamento). Os juízos da ciência devem ser, ao mesmo tempo, a priori, quer dizer, universais e necessários, e sintéticos objetivos, fundados na experiência. Trata-se, pois, de saber como são possíveis os juízos sintéticos a priori na matemática e na física, e se são possíveis na metafísica. Kant vai mostrar que tempo e espaço são formas fundamentais de percepção (formas da sensibilidade) que existem como ferramentas na mente, mas que só

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[Filosofia II] podem ser utilizadas na experiência. Tente imaginar alguma coisa que existe fora do tempo e que não tem extensão no espaço. A mente humana não pode produzir tal ideia. Não podemos conhecer fora do espaço e do tempo. Além das formas da sensibilidade, Kant vai nos dizer que há também o entendimento, que seria uma faculdade da razão. O entendimento nos fornece as categorias com as quais podemos operar as sínteses do diverso da experiência. Assim, como são possíveis juízos sintéticos a priori? São possíveis porque há uma faculdade da razão (o entendimento) que nos fornece categorias a priori (causa e efeito) que nos permite emitir juízos sobre o mundo.

CONHECIMENTO COMUM É, por exemplo, o conhecimento que temos sobre o funcionamento de algumas ervas medicinais. São as crenças que partilhamos com os outros e que quando justificadas SE BASEIAM NA EXPERIÊNCIA DO DIA-A-DIA, TRANSMITIDAS ATRAVÉS DAS GERAÇÕES SEM JUSTIFICATIVAS RACIONAIS (com argumentos do tipo dedutivo ou indutivo), MAS SIM JUSTIFICATIVAS QUE RECORREM À TRADIÇÃO. Ele é o resultado das nossas necessidades mais básicas e imediatas, o que é o mesmo que dizer que possui um caráter fortemente prático. É claro que o conhecimento comum é o ponto de partida da ciência, pelo menos historicamente. É só pensarmos que a geometria, por exemplo, surgiu da necessidade de medir as terras, bem como a astronomia surgiu da necessidade de marcar um calendário regular, etc. Mas as diferenças que existem entre o conhecimento comum e o conhecimento científico são grandes. É o que veremos a seguir: a caracterização do conhecimento científico.

CONHECIMENTO CIENTÍFICO A diferença entre senso comum e conhecimento científico não é dada pela utilidade de um e de outro e sim no modo como explicam os fatos. Quando se pergunta para um vendedor de ervas, desses que encontramos nas ruas, como ele sabe que determinada planta pode ajudar no tratamento da hipertensão, a explicação que ele dá dificilmente será do mesmo tipo que a explicação de um farmacêutico. Isso porque muito provavelmente o vendedor ambulante de ervas medicinais adquiriu os seus conhecimentos em um contexto familiar, ou outro qualquer que não consistia na definição de certas substâncias, sua classificação em diferentes grupos, na experimentação, na demonstração de hipóteses, na recorrência a certas leis. São as EXPLICAÇÕES CIENTÍFICAS que recorrem a esse tipo de procedimento. As características básicas da explicação científica, que são explicações das CAUSAS dos fenômenos (sejam eles fenômenos físicos, químicos, bioquímicos ou biológicos): - elas possuem uma estrutura SISTEMÁTICA: em geral, a explicação de um fenômeno particular (a dilatação de um pedaço de cobre, por exemplo) recorre a regularidades, expressas por leis (no caso do exemplo, explica-se que um determinado pedaço de cobre dilatou por que o cobre é um metal e todos os metais dilatam quando aquecidos). Esse tipo de explicação tem a forma de uma dedução, na qual a premissa universal é a lei (que em grego se diz nomos) da natureza sob a qual é subsumido o caso particular, e por isso é denominado de MODELO NOMOLÓGICO-DEDUTIVO de explicação nas ciências. Outra característica básica da explicação científica é a PREVISÃO dos fenômenos, a partir das descrições dos dados, sua subsunção em leis, que por sua vez se encaixam e teorias. Às vezes não é possível prever com absoluta certeza um acontecimento ou fenômeno futuro. Nesses casos as explicações científicas recorrem à probabilidade de que os fenômenos ocorram, recorrendo a certas leis estatísticas. (o que mostra a fundamental conexão entre as ciências naturais e a ciência exata por excelência, a matemática). “A ciência prevê, e é porque prevê que pode ser útil, e servir de regra de ação. Sei bem que suas previsões são muitas vezes desmentidas pelo evento; isso prova que a ciência é imperfeita, e se acrescento que continuará sempre assim, estou certo de que esta é uma previsão que, pelo menos ela, jamais será

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[Filosofia II] desmentida. De qualquer modo, o cientista se engana com menos freqüência do que um profeta que fizesse predições ao acaso. Por outro lado, o progresso é lento, mas contínuo, de modo que os cientistas, embora cada vez mais ousados, ficam cada vez menos decepcionados. É pouco, mas é o bastante.” (Henry Poincaré, O valor objetivo da ciência)

QUINO, J. L. Toda Mafalda. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

Os pressupostos das explicações científicas, sejam elas dedutivas ou estatísticas, são: A DEFINIÇÃO dos CONCEITOS para a descrição dos fenômenos, para expressar as relações entre eles. Por exemplo: não se pode estudar genética sem entender a relação de hereditariedade entre genes. Ou seja, é preciso ter uma definição, um princípio de classificação, de hereditariedade, que levará à necessidade de definir gene, e assim por diante. Outros exemplos são as definições básicas da física, como as de corpo, de tempo, de movimento, referencial e trajetória. A formulação de HIPÓTESES, ou conjecturas a serem verificadas ou refutadas. Uma hipótese é uma proposição que só pode ser comprovada ou verificada a partir de suas consequências, ou seja, é uma explicação provisória de um fenômeno. A construção de TEORIAS, que são, metaforicamente falando, como o esqueleto da ciência, dado que contêm as definições, os princípios, as leis, as regras de inferência que permitam previsão de fenômenos.

1.4. Estética A estética faz parte do núcleo dos assuntos práticos da filosofia, assim como a ética e a filosofia política. Ela não tem sentido fora do mundo plural humano, ela não se faz sozinha. A existência dela só é possível a partir da produção criativa humana e tem sentido na medida em que é julgada por alguém, se não há julgamento sobre o objeto criado ela não tem o menor sentido estético. Nesse caso estamos adentrando em um dos problemas da estética, o sentido estético ou o sentido da arte. Os filósofos da arte deram várias respostas para esses problemas, desde Platão até Arthur Danto, não é nosso problema analisar todas as respostas, mas algumas delas, isso demonstra a heterogeneidade da estética. A estética tem sido encarada de três diferentes maneiras na história, como teoria do belo, como teoria do gosto ou como teoria da arte. A teoria do belo se resume na arte enquanto beleza, ou seja, se algo é belo é um objeto artístico. Para isso é necessário definir o que é beleza, mas antes disso, podemos pensar que talvez nem toda obra de arte seja bela, isso significaria que os artistas necessitam criar algo belo para que sejam considerados artistas. Dentro dessa perspectiva a obra “O urinol” de Duchamp, ou a exposição “Queer museu – cartografias etnográficas”, não poderiam ser consideradas artísticas, pois suscitam outras perspectivas para além do ideia de “belo”. No caso da estética como teoria do gosto temos o mesmo problema, pois a arte pode depender exclusivamente do arbítrio de cada um? Casa um pode definir o que é arte ou o que é belo? Se isso fosse aceito, não seria necessário discutir arte, ou também, minha tia que pinta panos de prato poderia alegar que sua “arte” é bela e as obras de Michelangelo não. Essas exposições sobre estética tentam mostrar que não há saída para interpretá-la a não ser assumi-la como filosofia da arte.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. INCONTRI, Dora e BIGHETO, Alessandro Cesar. Filosofia: Construindo o Pensar. 3 Ed. São Paulo: Escala Educacional, 2010 CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. 14 Ed. São Paulo: Ática, 2010 ___________ Introdução à História da Filosofia. São Paulo: Companhia das Letras.2010 (4 vol.) COMPARATO, Bruno Konder. Sociologia Geral. 2 Ed. São Paulo: Escala Educacional, 2010. COTRIM, Gilberto e FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 1 Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. ____________________________________ Filosofar. 1 Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. JOHNSON, Allan G. Dicionário de Sociologia: Guia Prático da Linguagem Sociológica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. TOMAZI, Nelson Dacio. Sociologia Para o Ensino Médio.2 Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

*Material

didático elaborado pelo professor Andrei Vieira Cerentine, Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Dá aula desde 2006 em colégios e cursinhos preparatórios para vestibulares e ENEM.

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EXERCÍCIOS: ENEM + vestibulares Com base no texto e nos conhecimentos sobre o pensamento de John Locke, assinale a alternativa correta. a) O ser humano deve superar o estado de natureza fundando a sociedade civil e o Estado, cedendo seus direitos em prol da paz social. b) Os indivíduos, no estado de natureza, são juízes de si mesmos, fundam o Estado para garantir segurança e direitos individuais por meio das leis. c) O poder do Estado deve ser absoluto para a garantia dos direitos naturais da humanidade, como a vida, a liberdade e a propriedade. d) O pacto ou contrato social é o garantidor das liberdades e direitos, sendo o poder legislativo o menos importante, já que é possível sua revogação por aqueles que participam do poder executivo. e) O ser humano se realiza como um ser possuidor de bens, sendo sua posse o que garante tolerância religiosa, livre-iniciativa econômica e liberdade individual.

UNIDADE 1 - FILOSOFIA 1. (Enem PPL 2016)

A figura do inquilino ao qual a personagem da tirinha se refere é o(a) a) constrangimento por olhares de reprovação. b) costume importo aos filhos por coação. c) consciência da obrigação moral. d) pessoa habitante da mesma casa. e) temor de possível castigo.

3. (Enem PPL 2018) Uma criança com deficiência mental deve ser mantida em casa ou mandada a uma instituição? Um parente mais velho que costuma causar problemas deve ser cuidado ou podemos pedir que vá embora? Um casamento infeliz deve ser prolongado pelo bem das crianças?

2. (Uel 2019) Leia o texto a seguir. Por conseguinte, todo homem, ao consentir com outros em formar um único corpo político sob um governo único, assume a obrigação, perante todos os membros dessa sociedade, de submeter-se à determinação da maioria e acatar a decisão desta. Do contrário, esse pacto original, pelo qual ele, juntamente com outros, se incorpora a uma sociedade, não teria nenhum significado e não seria pacto algum, caso ele fosse deixado livre e sob nenhum outro vínculo além dos que tinha antes no estado de natureza.

MURDOCH, I. A soberania do bem. São Paulo: Unesp, 2013.

Os questionamentos apresentados no texto possuem uma relevância filosófica à medida que problematizam conflitos que estão nos domínios da a) política e da esfera pública. b) teologia e dos valores religiosos. c) lógica e da validade dos raciocínios. d) ética e dos padrões de comportamento. e) epistemologia e dos limites do conhecimento.

LOCKE, J. Dois tratados sobre o governo. Trad. Julio Fischer. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 470.

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[Filosofia II] 4. (Enem PPL 2018) O justo e o bem são complementares no sentido de que uma concepção política deve apoiar-se em diferentes ideias do bem. Na teoria da justiça como equidade, essa condição se expressa pela prioridade do justo. Sob sua forma geral, esta quer dizer que as ideias aceitáveis do bem devem respeitar os limites da concepção política de justiça e nela desempenhar um certo papel. RAWLS, J. Justiça e democracia. São Paulo: Martins Fontes, 2000 (adaptado).

6. (Enem (Libras) 2017) TEXTO I Aquele que não é capaz de pertencer a uma comunidade ou que dela não tem necessidade, porque se basta a si mesmo, não é em nada parte da cidade, embora seja quer um animal, quer um deus. ARISTÓTELES. A política. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

TEXTO II Nenhuma vida humana, nem mesmo a vida de um eremita em meio à natureza selvagem, é possível sem um mundo que, direta ou indiretamente, testemunhe a presença de outros seres humanos. ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

Segundo Rawls, a concepção de justiça legisla sobre ideias do bem, de forma que a) as ações individuais são definidas como efeitos determinados por fatores naturais ou constrangimentos sociais. b) o estudo da origem e da história dos valores morais concluem a inexistência de noções absolutas de bem e mal. c) o próprio estatuto do homem como centro do mundo é abalado, marcando o relativismo da época contemporânea. d) as intenções e bens particulares que cada indivíduo almeja alcançar são regulados na sociedade por princípios equilibrados. e) o homem é compreendido como determinado e livre ao mesmo tempo, já que a liberdade limita-se a um conjunto de condições objetivas.

Associados a contextos históricos distintos, os fragmentos convergem para uma particularidade do ser humano, caracterizada por uma condição naturalmente propensa à a) atividade contemplativa. b) produção econômica. c) articulação coletiva. d) criação artística. e) crença religiosa.

5. (Enem PPL 2017) Dado que, dos hábitos racionais com os quais captamos a verdade, alguns são sempre verdadeiros, enquanto outros admitem o falso, como a opinião e o cálculo, enquanto o conhecimento científico e a intuição são sempre verdadeiros, e dado que nenhum outro gênero de conhecimento é mais exato que o conhecimento científico, exceto a intuição, e, por outro lado, os princípios são mais conhecidos que as demonstrações, e dado que todo conhecimento científico constitui-se de maneira argumentativa, não pode haver conhecimento científico dos princípios, e dado que não pode haver nada mais verdadeiro que o conhecimento científico, exceto a intuição, a intuição deve ter por objeto os princípios. ARISTÓTELES. Segundos analíticos. In: REALE, G. História da filosofia antiga. São Paulo: Loyola, 1994.

7. (Enem PPL 2016) Estamos, pois, de acordo quando, ao ver algum objeto, dizemos: "Este objeto que estou vendo agora tem tendências para assemelhar-se a um outro ser, mas, por ter defeitos, não consegue ser tal como o ser em questão, e lhe é, pelo contrário, inferior". Assim, para podermos fazer estas reflexões, é necessário que antes tenhamos tido ocasião de conhecer esse ser de que se aproxima o dito objeto, ainda que imperfeitamente. PLATÃO, Fédon. São Paulo: Abril Cultural, 1972.

Na epistemologia platônica, conhecer um determinado objeto implica a) estabelecer semelhanças entre o que é observado em momentos distintos. b) comparar o objeto observado com uma descrição detalhada dele. c) descrever corretamente as características do objeto observado. d) fazer correspondência entre o objeto observado e seu ser. e) identificar outro exemplar idêntico ao observado.

Os princípios, base da epistemologia aristotélica, pertencem ao domínio do(a) a) opinião, pois fazem parte da formação da pessoa. b) cálculo, pois são demonstrados por argumentos. c) conhecimento científico, pois admitem provas empíricas. d) intuição, pois ela é mais exata que o conhecimento científico. e) prática de hábitos racionais, pois com ela se capta a verdade.

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[Filosofia II] 8. (Enem 2ª aplicação 2016) Fundamos, como afirmam alguns cientistas, o antropoceno: uma nova era geológica com altíssimo poder de destruição, fruto dos últimos séculos que significaram um transtorno perverso do equilíbrio do sistema-Terra. Como enfrentar esta nova situação nunca ocorrida antes de forma globalizada e profunda? Temos pessoalmente trabalhado os paradigmas da sustentabilidade e do cuidado como relação amigável e cooperativa para com a natureza. Queremos, agora, agregar a ética da responsabilidade. BOFF, L. Responsabilidade coletiva. Disponível em: http://leonardoboff.wordpress.com. Acesso em: 14 maio 2013.

10. (Enem 2ª aplicação 2016) A justiça e a conformidade ao contrato consistem em algo com que a maioria dos homens parece concordar. Constitui um princípio julgado estender-se até os esconderijos dos ladrões e às confederações dos maiores vilões; até os que se afastaram a tal ponto da própria humanidade conservam entre si a fé e as regras da justiça. LOCKE, J. Ensaio acerca do entendimento humano. São Paulo: Nova Cultural, 2000 (adaptado).

De acordo com Locke, até a mais precária coletividade depende de uma noção de justiça, pois tal noção a) identifica indivíduos despreparados para a vida em comum. b) contribui com a manutenção da ordem e do equilíbrio social. c) estabelece um conjunto de regras para a formação da sociedade. d) determina o que é certo ou errado num contexto de interesses conflitantes. e) representa os interesses da coletividade, expressos pela vontade da maioria.

A ética da responsabilidade protagonizada pelo filósofo alemão Hans Jonas e reivindicada no texto é expressa pela máxima: a) “A tua ação possa valer como norma para todos os homens.” b) “A norma aceita por todos advenha da ação comunicativa e do discurso.” c) “A tua ação possa produzir a máxima felicidade para a maioria das pessoas.” d) “O teu agir almeje alcançar determinados fins que possam justificar os meios.” e) “O efeito de tuas ações não destrua a possibilidade futura da vida das novas gerações.”

11. (Enem PPL 2016) A importância do argumento de Hobbes está em parte no fato de que ele se ampara em suposições bastante plausíveis sobre as condições normais da vida humana. Para exemplificar: o argumento não supõe que todos sejam de fato movidos por orgulho e vaidade para buscar o domínio sobre os outros; essa seria uma suposição discutível que possibilitaria a conclusão pretendida por Hobbes, mas de modo fácil demais. O que torna o argumento assustador e lhe atribui importância e força dramática é que ele acredita que pessoas normais, até mesmo as mais agradáveis, podem ser inadvertidamente lançadas nesse tipo de situação, que resvalará, então, em um estado de guerra.

9. (Unicamp 2016) Por que a ética voltou a ser um dos temas mais trabalhados do pensamento filosófico contemporâneo? Nos anos 1960 a política ocupava esse lugar e muitos cometeram o exagero de afirmar que tudo era político. (José Arthur Gianotti, “Moralidade Pública e Moralidade Privada”, em Adauto Novaes, Ética. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p. 239.) A partir desse fragmento sobre a ética e o pensamento filosófico, é correto afirmar que: a) O tema foi relevante na obra de Aristóteles e apenas recentemente voltou a ocupar um espaço central na produção filosófica. b) Os impasses morais e éticos das sociedades contemporâneas reposicionaram o tema da ética como um dos campos mais relevantes para a Filosofia. c) O pensamento filosófico abandonou sua postura política após o desencanto com os sistemas ideológicos que eram vigentes nos anos 1960. d) Na atualidade, a ética é uma pauta conservadora, pois nas sociedades atuais, não há demandas éticas rígidas.

RAWLS, J. Conferências sobre a história da filosofia política. São Paulo: WMF, 2012 (adaptado).

O texto apresenta uma concepção de filosofia política conhecida como a) alienação ideológica. b) microfísica do poder. c) estado de natureza. d) contrato social. e) vontade geral.

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[Filosofia II] 12. (Enem 2ª aplicação 2016) Texto I Até aqui expus a natureza do homem (cujo orgulho e outras paixões o obrigaram a submeter-se ao governo), juntamente com o grande poder do seu governante, o qual comparei com o Leviatã, tirando essa comparação dos dois últimos versículos do capítulo 41 de Jó, onde Deus, após ter estabelecido o grande poder do Leviatã, lhe chamou Rei dos Soberbos. Não há nada na Terra, disse ele, que se lhe possa comparar. HOBBES, T. O Leviatã. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

(Nicolau Maquiavel, O Príncipe. São Paulo: Nova Cultural, 1997, p. 73-85.) A partir desse excerto da obra, publicada em 1513, é correto afirmar que: a) O jogo das aparências e a lógica da força são algumas das principais artimanhas da política moderna explicitadas por Maquiavel. b) A prudência, para ser vista como uma virtude, não depende dos resultados, mas de estar de acordo com os princípios da fé. c) Os princípios e não os resultados é que definem o julgamento que as pessoas fazem do governante, por isso é louvável a integridade do príncipe. d) A questão da manutenção do poder é o principal desafio ao príncipe e, por isso, ele não precisa cumprir a palavra dada, desde que autorizado pela Igreja.

Texto II Eu asseguro, tranquilamente, que o governo civil é a solução adequada para as inconveniências do estado de natureza, que devem certamente ser grandes quando os homens podem ser juízes em causa própria, pois é fácil imaginar que um homem tão injusto a ponto de lesar o irmão dificilmente será justo para condenar a si mesmo pela mesma ofensa. LOCKE, J. Segundo tratado sobre o governo civil. Petrópolis: Vozes, 1994.

14. (Enem PPL 2016) Os ricos adquiriram uma obrigação relativamente à coisa pública, uma vez que devem sua existência ao ato de submissão à sua proteção e zelo, o que necessitam para viver; o Estado então fundamenta o seu direito de contribuição do que é deles nessa obrigação, visando a manutenção de seus concidadãos. Isso pode ser realizado pela imposição de um imposto sobre a propriedade ou a atividade comercial dos cidadãos, ou pelo estabelecimento de fundos e de uso dos juros obtidos a partir deles, não para suprir as necessidades do Estado (uma vez que este é rico), mas para suprir as necessidades do povo. KANT, I. A metafísica dos costumes. Bauru: Edipro, 2003.

Thomas Hobbes e John Locke, importantes teóricos contratualistas, discutiram aspectos ligados à natureza humana e ao Estado. Thomas Hobbes, diferentemente de John Locke, entende o estado de natureza como um(a) a) condição de guerra de todos contra todos, miséria universal, insegurança e medo da morte violenta. b) organização pré-social e pré-política em que o homem nasce com os direitos naturais: vida, liberdade, igualdade e propriedade. c) capricho típico da menoridade, que deve ser eliminado pela exigência moral, para que o homem possa constituir o Estado civil. d) situação em que os homens nascem como detentores de livre-arbítrio, mas são feridos em sua livre decisão pelo pecado original. e) estado de felicidade, saúde e liberdade que é destruído pela civilização, que perturba as relações sociais e violenta a humanidade.

Segundo esse texto de Kant, o Estado a) deve sustentar todas as pessoas que vivem sob seu poder, a fim de que a distribuição seja paritária. b) está autorizado a cobrar impostos dos cidadãos ricos para suprir as necessidades dos cidadãos pobres. c) dispõe de poucos recursos e, por esse motivo, é obrigado a cobrar impostos idênticos dos seus membros. d) delega aos cidadãos o dever de suprir as necessidades do Estado, por causa do seu elevado custo de manutenção. e) tem a incumbência de proteger os ricos das imposições pecuniárias dos pobres, pois os ricos pagam mais tributos.

13. (Unicamp 2016) Quanto seja louvável a um príncipe manter a fé, aparentar virtudes e viver com integridade, não com astúcia, todos o compreendem; contudo, observa-se, pela experiência, em nossos tempos, que houve príncipes que fizeram grandes coisas, mas em pouca conta tiveram a palavra dada, e souberam, pela astúcia, transtornar a cabeça dos homens, superando, enfim, os que foram leais (...). Um príncipe prudente não pode nem deve guardar a palavra dada quando isso se lhe torne prejudicial e quando as causas que o determinaram cessem de existir.

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[Filosofia II] 15. (Uel 2015) Leia os textos a seguir. A arte de imitar está bem longe da verdade, e se executa tudo, ao que parece, é pelo facto de atingir apenas uma pequena porção de cada coisa, que não passa de uma aparição.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, assinale a alternativa que indica, corretamente, a ordem em que Aristóteles apresentou as causas primeiras. a) Causa final, causa eficiente, causa material e causa formal. b) Causa formal, causa material, causa final e causa eficiente. c) Causa formal, causa material, causa eficiente e causa final. d) Causa material, causa formal, causa eficiente e causa final. e) Causa material, causa formal, causa final e causa eficiente.

Adaptado de: PLATÃO. A República. 7.ed. Trad. de Maria Helena da Rocha Pereira. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1993. p.457.

O imitar é congênito no homem e os homens se comprazem no imitado. Adaptado de: ARISTÓTELES. Poética. 4.ed. Trad. De Eudoro de Souza. São Paulo: Nova Cultural, 1991. p.203. Coleção “Os Pensadores”.

Com base nos textos, nos conhecimentos sobre estética e a questão da mímesis em Platão e Aristóteles, assinale a alternativa correta. a) Para Platão, a obra do artista é cópia de coisas fenomênicas, um exemplo particular e, por isso, algo inadequado e inferior, tanto em relação aos objetos representados quanto às ideias universais que os pressupõem. b) Para Platão, as obras produzidas pelos poetas, pintores e escultores representam perfeitamente a verdade e a essência do plano inteligível, sendo a atividade do artista um fazer nobre, imprescindível para o engrandecimento da pólis e da filosofia. c) Na compreensão de Aristóteles, a arte se restringe à reprodução de objetos existentes, o que veda o poder do artista de invenção do real e impossibilita a função caricatural que a arte poderia assumir ao apresentar os modelos de maneira distorcida. d) Aristóteles concebe a mímesis artística como uma atividade que reproduz passivamente a aparência das coisas, o que impede ao artista a possibilidade de recriação das coisas segundo uma nova dimensão. e) Aristóteles se opõe à concepção de que a arte é imitação e entende que a música, o teatro e a poesia são incapazes de provocar um efeito benéfico e purificador no espectador.

17. (Ufsm 2015) Revoltas e movimentos sociais, como os ocorridos recentemente no Brasil, estão frequentemente envolvidos no aperfeiçoamento da vida social e podem ter papel adaptativo. Na história da filosofia política moderna, alguns filósofos conceberam seres humanos como átomos individuais movidos por apetites ou desejos guiados pelo prazer e dor, sendo o apetite fundamental do homem a autopreservação. Numa situação de escassez de bens, com pessoas guiadas exclusivamente por desejos antecipadores de prazer e voltados à autopreservação, haverá, inevitavelmente, conflito social. Que alternativa(s) racional(is) soluciona(m) o conflito? I. Uso da força e violência. II. Uso da ideologia e controle da informação. III. Acordo e deliberação coletiva. IV. Apelo à tradição e costume. Está(ão) correta(s) a(s) alternativa(s) a) I e II apenas. b) I, II e III apenas. c) III apenas. d) III e IV apenas. e) IV apenas.

18. (Unicamp 2015) A maneira pela qual adquirimos qualquer conhecimento constitui suficiente prova de que não é inato. LOCKE, John. Ensaio acerca do entendimento humano. São Paulo: Nova Cultural, 1988, p.13.

16. (Uel 2015) Leia o texto a seguir. É pois manifesto que a ciência a adquirir é a das causas primeiras (pois dizemos que conhecemos cada coisa somente quando julgamos conhecer a sua primeira causa); ora, causa diz-se em quatro sentidos: no primeiro, entendemos por causa a substância e a essência (o “porquê” reconduz-se pois à noção última, e o primeiro “porquê” é causa e princípio); a segunda causa é a matéria e o sujeito; a terceira é a de onde vem o início do movimento; a quarta causa, que se opõe à precedente, é o “fim para que” e o bem (porque este é, com efeito, o fim de toda a geração e movimento).

O empirismo, corrente filosófica da qual Locke fazia parte, a) afirma que o conhecimento não é inato, pois sua aquisição deriva da experiência. b) é uma forma de ceticismo, pois nega que os conhecimentos possam ser obtidos. c) aproxima-se do modelo científico cartesiano, ao negar a existência de ideias inatas. d) defende que as ideias estão presentes na razão desde o nascimento.

Adaptado de: ARISTÓTELES. Metafísica. Trad. De Vincenzo Cocco. São Paulo: Abril S. A. Cultural, 1984. p.16. (Coleção Os Pensadores.)

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[Filosofia II] 19. (Uel 2015) Leia o texto a seguir.

dar uma direção à presente inclinação, na medida em que fornece o meio para alcançar o que é desejado. d) O ponto de partida dos juízos morais encontra-se nos “propulsores” humanos naturais, os quais se direcionam ao bem próprio e ao bem do outro. e) O princípio supremo da moralidade deve assentar-se na razão prática pura, e as leis morais devem ser independentes de qualquer condição subjetiva da natureza humana.

As ideias produzem as imagens de si mesmas em novas ideias, mas, como se supõe que as primeiras ideias derivam de impressões, continua ainda a ser verdade que todas as nossas ideias simples procedem, mediata ou imediatamente, das impressões que lhes correspondem. HUME, D. Tratado da Natureza Humana. Trad. De Serafim da Silva Fontes. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. p.35.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre a questão da sensibilidade, razão e verdade em David Hume, considere as afirmativas a seguir.

21. (Ufsm 2015) A necessidade de conviver em grupo fez o homem desenvolver estratégias adaptativas diversas. Darwin, num estudo sobre a evolução e as emoções, mostrou que o reconhecimento de emoções primárias, como raiva e medo, teve um papel central na sobrevivência. Estudos antigos e recentes têm mostrado que a moralidade ou comportamento moral está associado a outros tipos de emoções, como a vergonha, a culpa, a compaixão e a empatia. Há, no entanto, teorias éticas que afirmam que as ações boas devem ser motivadas exclusivamente pelo dever e não por impulsos ou emoções. Essa teoria é a ética a) deontológica ou kantiana. b) das virtudes. c) utilitarista. d) contratualista. e) teológica.

I. Geralmente as ideias simples, no seu primeiro aparecimento, derivam das impressões simples que lhes correspondem. II. A conexão entre as ideias e as impressões provém do acaso, de modo que há uma independência das ideias com relação às impressões. III. As ideias são sempre as causas de nossas impressões. IV. Assim como as ideias são as imagens das impressões, é também possível formar ideias secundárias, que são imagens das ideias primárias. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e IV são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas.

22. (Enem PPL 2015) Na sociedade democrática, as opiniões de cada um não são fortalezas ou castelos para que neles nos encerremos como forma de autoafirmação pessoal. Não só temos de ser capazes de exercer a razão em nossas argumentações, como também devemos desenvolver a capacidade de ser convencidos pelas melhores razões. A partir dessa perspectiva, a verdade buscada é sempre um resultado, não ponto de partida: e essa busca inclui a conversação entre iguais, a polêmica, o debate, a controvérsia.

20. (Uel 2015) Leia o texto a seguir. As leis morais juntamente com seus princípios não só se distinguem essencialmente, em todo o conhecimento prático, de tudo o mais onde haja um elemento empírico qualquer, mas toda a Filosofia moral repousa inteiramente sobre a sua parte pura e, aplicada ao homem, não toma emprestado o mínimo que seja ao conhecimento do mesmo (Antropologia).

SAVATER, F. As perguntas da vida. São Paulo: Martins Fontes, 2001 (adaptado).

KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Trad. de Guido A. de Almeida. São Paulo: Discurso Editorial, 2009. p.73.

A ideia de democracia presente no texto, baseada na concepção de Habermas acerca do discurso, defende que a verdade é um(a) a) alvo objetivo alcançável por cada pessoa, como agente racional autônomo. b) critério acima dos homens, de acordo com o qual podemos julgar quais opiniões são as melhores. c) construção da atividade racional de comunicação entre os indivíduos, cujo resultado é um consenso. d) produto da razão, que todo indivíduo traz latente educativo. e) resultado que se encontra mais desenvolvido nos espíritos elevados, a quem cabe a tarefa de convencer os outros.

Com base no texto e na questão da liberdade e autonomia em Immanuel Kant, assinale a alternativa correta. a) A fonte das ações morais pode ser encontrada através da análise psicológica da consciência moral, na qual se pesquisa mais o que o homem é, do que o que ele deveria ser. b) O elemento determinante do caráter moral de uma ação está na inclinação da qual se origina, sendo as inclinações serenas moralmente mais perfeitas do que as passionais. c) O sentimento é o elemento determinante para a ação moral, e a razão, por sua vez, somente pode

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[Filosofia II] 23. (Ufsm 2015) O biólogo Edward Wilson sustenta que a teoria da evolução explica não apenas a evolução das características físicas predominantes em uma espécie, mas também a evolução de traços sociais (como a divisão social do trabalho, a evolução da linguagem e da moralidade). Se isso é verdade, então aquilo que hoje tendemos a considerar moralmente correto pode ser um produto de nosso passado evolutivo. Se nosso passado evolutivo tivesse sido diferente, é possível que nossa sensibilidade moral hoje também fosse diferente.

25. (Enem PPL 2015) Suponha homens numa morada subterrânea, em forma de caverna, cuja entrada, aberta à luz, se estende sobre todo o comprimento da fachada; eles estão lá desde a infância, as pernas e o pescoço presos por correntes, de tal sorte que não podem trocar de lugar e só podem olhar para frente, pois os grilhões os impedem de voltar a cabeça; a luz de uma fogueira acesa ao longe, numa elevada do terreno, brilha por detrás deles; entre a fogueira e os prisioneiros, há um caminho ascendente; ao longo do caminho, imagine um pequeno muro, semelhante aos tapumes que os manipuladores de marionetes armam entre eles e o público e sobre os quais exibem seus prestígios.

Observe as afirmações a seguir, considerando as que são compatíveis com o enunciado da questão.

PLATÃO. A República. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2007.

I. O fato de hoje tendermos a valorizar atos de bondade e compaixão e a desvalorizar atos de crueldade é um traço biológico de nossa espécie que deve ter trazido vantagens adaptativas aos nossos antepassados. II. Há um conjunto de normas morais que não mudam e que sempre foram adotadas universalmente. III. A evolução moral está correlacionada com a capacidade adaptativa dos indivíduos e grupos ao ambiente em que vivem. Está(ão) correta(s) a) apenas I. c) apenas I e III. e) I, II e III.

Essa narrativa de Platão é uma importante manifestação cultural do pensamento grego antigo, cuja ideia central, do ponto de vista filosófico, evidencia o(a) a) caráter antropológico, descrevendo as origens do homem primitivo. b) sistema penal da época, criticando o sistema carcerário da sociedade ateniense. c) vida cultural e artística, expressa por dramaturgos trágicos e cômicos gregos. d) sistema político elitista, provindo do surgimento da pólis e da democracia ateniense. e) teoria do conhecimento, expondo a passagem do mundo ilusório para o mundo das ideias.

b) apenas II. d) apenas II e III.

24. (Unicamp 2015) Apenas a procriação de filhos legítimos, embora essencial, não justifica a escolha da esposa. As ambições políticas e as necessidades econômicas que as subentendem exercem um papel igualmente poderoso. Como demonstraram inúmeros estudos, os dirigentes atenienses casam-se entre si, e geralmente com o parente mais próximo possível, isto é, primos coirmãos. É sintomático que os autores antigos que nos informam sobre o casamento de homens políticos atenienses omitam os nomes das mulheres desposadas, mas nunca o nome do seu pai ou do seu marido precedente.

26. (UFPA) Tendemos a concordar que a distribuição isonômica do que cabe a cada um no estado de direito é o que permite, do ponto de vista formal e legal, dar estabilidade às várias modalidades de organizações instituídas no interior de uma sociedade. Isso leva Aristóteles a afirmar que a justiça é “uma virtude completa, porém não em absoluto e sim em relação ao nosso próximo” ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 332.

De acordo com essa caracterização, é correto dizer que a função própria e universal atribuída à justiça, no estado de direito, é a) conceber e aplicar, de forma incondicional, ideias racionais com poder normativo positivo e irrestrito. b) instituir um ideal de liberdade moral que não existiria se não fossem os mecanismos contidos nos sistemas jurídicos. c) determinar, para as relações sociais, critérios legais tão universais e independentes que possam valer por si mesmos. d) promover, por meio de leis gerais, a reciprocidade entre as necessidades do Estado e as de cada cidadão individualmente. e) estabelecer a regência na relação mútua entre os homens, na medida em que isso seja possível por meio de leis.

Adaptado de Alain Corbin e outros, História da virilidade, vol. 1. Petrópolis: Vozes, 2014, p. 62.

Considerando o texto e a situação da mulher na Atenas clássica, podemos afirmar que se trata de uma sociedade a) na qual o casamento também tem implicações políticas e sociais. b) que, por ser democrática, dá uma atenção especial aos direitos da mulher. c) em que o amor é o critério principal para a formação de casais da elite. d) em que o direito da mulher se sobrepõe ao interesse político e social.

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[Filosofia II] 27. (UEMA) Kant definiu a Estética como sendo ciência. E completando, Alexander Brumgarten a definiu como sendo a teoria do belo e das suas manifestações através da arte. Como ciência e teoria do belo, a Estética pretende alcançar um tipo específico de conhecimento que é aquele captado a) pela lógica. b) pela razão. c) pela alma. d) pelos sentidos. e) pela emoção.

é condenada na esfera privada e é proibida na esfera pública. 16) Para Aristóteles, as amizades de um homem dependem da pessoa que se é, resultando, se ele for um homem justo e correto, no coroamento de todos os bens: a felicidade. Por isso, a filosofia moral de Aristóteles é uma eudemonia (do grego: “boa vida”, “vida feliz”).

30. (Ufsm) Há diversos indícios empíricos da evolução das espécies. Alguns desses indícios são conhecidos desde Darwin, tais como o registro fóssil, as variações entre indivíduos de uma mesma espécie e a distribuição geográfica das espécies. Outros indícios provêm de estudos mais recentes, notadamente em genética. O conjunto desses indícios torna a teoria da evolução mais provavelmente verdadeira que qualquer outra hipótese alternativa. Essa inferência, em que se parte de indícios empíricos e se conclui com teorias ou enunciados gerais, é comumente chamada de inferência: a) lógica. b) dedutiva. c) analógica. d) indutiva. e) biológica.

28. (UNCISAL 2012) A bioética é uma ética aplicada que trata de conflitos e controvérsias morais no âmbito das Ciências da Vida e da Saúde, envolvendo valores e práticas. Suas reflexões abordam temas que atingem a vida de forma irreversível. As opções a seguir apresentam temas tratados pela Bioética, exceto: a) políticas públicas na área de saúde e combate à mortalidade infantil. b) aborto e clonagem. c) eutanásia e uso de órgão de animais em seres humanos. d) fertilização artificial e conservação do corpo humano após a morte. e) produção de transgênicos e engenharia genética humana.

29. (UEM) A reflexão sobre a ética apresenta, na antiguidade clássica, três características principais: a) a fusão do sujeito moral com o sujeito político, pois só enquanto cidadão ou membro de uma comunidade política pode-se pensar a moralidade; b) a discussão de princípios éticos metafísicos, pois a moral fundamentase a partir de conceitos que descrevem uma interrogação sobre a essência do ser (o que é virtude, o que é a felicidade, o que é a verdade, etc.); c) a separação entre o domínio privado e o domínio público. A partir dessa reflexão sobre a ética na antiguidade grega, assinale o que for correto. 01) A fundação platônica da cidade ideal, em A República, dá-se sob o signo de uma moralidade subjetiva, isto é, relativa à boa vontade dos indivíduos, seja qual for sua classe social ou política. 02) Por ser precursor do pensamento político democrático, Platão defende os interesses dos escravos, dos metecos, das mulheres e das crianças. 04) Na Ética a Nicômaco, Aristóteles defende os princípios de uma ética relativista, já que, ao defender o “justo meio”, acaba por defender a medida individual de cada sujeito. 08) A ética, na cidade-Estado grega, acompanha seu fundamento político, razão pela qual a violência não

GABARITO 1.C 8.E 15.A 22.C 29.24

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2.B 9.B 16.C 23.C 30.D

3.D 10.B 17.C 24.A

4.D 11.C 18.A 25.E

5.D 12.A 19.B 26.E

6.C 13.A 20.E 27.D

7.D 14.B 21.A 28.A


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