Adelino, Corpo e Alma | Caderno Biogrรกfico de Adelino Amaro da Costa
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Adelino, Corpo e Alma Caderno biogrรกfico sobre
Adelino Amaro da Costa Um caderno da responsabilidade do Gabinete de Estudos Gonรงalo Begonha e da autoria de Rafael Borges. -3-
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Adelino Amaro da Costa
Dentro da casa de pensamento, reflexão e posicionamento político que temos como nossa, e no espaço político que nos orgulhamos de ocupar, não há Amaro da Costa. Nunca houve. Há Freitas do Amaral e Lucas Pires, há Monteiro, Lowndes Marques e Adriano Moreira, mas não há Amaro da Costa: para nós, há o Adelino. Existe o Adelino que nos serve de inspiração, que nos dá força quando recordamos o cerco do Palácio de Cristal no Porto, que nos impele quando Portugal precisa de alguém que lute por ele, que nos move quando nos lembramos das sedes incendiadas pelo fanatismo e pela intolerância políticas e motiva quando é ao poço da memória que vamos buscar a água fresca que nos permite continuar, independentemente das dificuldades, independentemente das circunstâncias. Temos, para nós, apenas aquele Adelino que nos lembra de que há algo que nos sustenta e serve de base, de que o projecto que temos para Portugal não vem de ontem – e acima de tudo, de que nem sempre foi fácil vestir a camisola que hoje usamos com orgulho. Para nós, o Adelino foi – e continua a ser - caso único. É, de muitas referências, de muitas personalidades merecedoras da nossa admiração, a que mais se distingue. Não há outro fundador da nossa casa de pensamento que tratemos pelo nome próprio. Não há um “Diogo”, um “Francisco” ou um “Manuel”. Não há mais ninguém cujo sorriso exibamos nas paredes das nossas sedes, cuja retórica, consistência e convicção admiremos tanto, nem cuja perda lamentemos tantas vezes. Há ele, o Adelino que pensou o CDS, que o segurou quando esteve prestes a cair, que deu coragem aos seus membros e fundadores quando, nos tempos do PREC, o medo ameaçava pesar-lhes mais que a confiança num projecto que sendo deles, não era apenas para eles. Dele, não guardamos só o pensamento, a visão sobre o mundo e o projecto para Portugal. Guardamos - e reverenciamos -as atitudes, a forma de estar, o modo de viver: a coragem indefectível, a abnegação inquebrável, o patriotismo inabalável. E isso separa-o de outros mentores do espaço político que ocupamos – não são, naturalmente, poucos os homens que admiramos como políticos ou pensadores, filósofos ou proponentes de uma agenda política de que partilhamos - mas, nesses casos, admiramos-lhes fundamentalmente a obra, o legado político e a mensagem intelectual: e, possivelmente, não tanto quem foram sem ela, não tanto quem era o homem sem lhe considerarmos a obra. Não é isso que sucede com o Adelino. Ele definiu a estratégia do CDS e apontou-lhe uma direcção, mas não é meramente como estratega que o lembramos; ele legou-nos as nossas bases axiológicas, programáticas e doutrinárias, mas não é unicamente como pensador e autor
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que o recordamos; através do seu exemplo de probidade absoluta e serviço desinteressado, ele inspirou – e continua a inspirar – os que, sendo CDS, servem Portugal no desempenho de cargos públicos, mas foi, para nós, muito mais que um estadista. O Adelino foi – e continua a ser – tudo o que foi, tudo o que fez, toda a coragem que teve, todo o patriotismo que demonstrou e todo o amor pelas causas da Liberdade, da Democracia e do Pluralismo que revelou ao longo da sua vida. Sessenta e nove anos depois do seu nascimento e 32 depois da sua morte, o Adelino permanece toda a memória que nos deixou. Hoje, quase 7 décadas depois de ter nascido, continua a ser o homem que organizou a defesa do 1º Congresso do CDS contra as forças que cantavam o hino da tirania e, ao ombro, levavam o estandarte da opressão. Hoje, 69 anos passados, o Adelino continua a ser o nosso melhor parlamentar, o nosso exemplo e a nossa fonte de perseverança. Hoje, é ele que continua a brindar-nos com a sua presença cada vez que entramos no Caldas; é ele que inspira os nossos deputados e nos dá força para continuar a lutar pelo projecto que temos, pelo rumo que delineámos e pelos objectivos que escolhemos para Portugal. E é ele que, hoje, queremos voltar a recordar.
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Infância e juventude
Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa nasce a 18 de Abril de 1943, no número 91-A da Rua Luís de Camões, em Algés. Segundo filho de Manuel Rafael Amaro da Costa e de Joaquina da Conceição Duarte Lopes Nunes e Costa, o pequeno Adelino não vive muito tempo na terra que o vê nascer. Ainda bebé, muda-se com a família para a Madeira, em virtude da decisão do seu pai – que antes havia trabalhado no Ministério das Obras Públicas - de liderar a Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira, para onde foi construir o sistema de levadas da ilha. Na Madeira, a integração é rápida. Em pouco tempo, a família Amaro da Costa torna-se respeitada – e até acarinhada – pelas gentes do Funchal. Algo que, aliás, até se compreende: não há nada de mau que a família Amaro da Costa trouxesse à Madeira. Bem pelo contrário, o “técnico competentíssimo” – assim era visto o pai de Adelino -, traz com ele investimentos que em muito facilitam a vida dos madeirenses. O jovem Adelino passa dez anos da sua vida na Madeira, residindo no Funchal, visitando o Porto Santo e acompanhando o pai, o Engenheiro Manuel Amaro da Costa até aos locais de construção do sistema de levadas. Na escola, Adelino estreou-se no Liceu de Jaime Moniz, no Funchal, onde é colega de turma do actual Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim. Dele, disse Jardim, em 1981, recordar um aluno perspicaz, aplicado e extremamente sociável – ainda que pouco interventivo no recreio. Com o fim das obras na Madeira, o pai de Adelino é chamado a voltar ao continente, onde assumiu as funções de Director-Geral dos Serviços Hidráulicos, e, mais tarde, se tornou Subsecretário de Estado do Fomento Ultramarino. É esse facto, mas também o carácter particular de Adelino, que motivam a suspeita, entre os seus colegas de turma, de que seria um informador da PIDE. A esse mito – que chegou a dar-lhe alguns problemas -, Adelino reage sempre com um sangue-frio próprio de poucos. A adolescência passapor ele sem grandes sobressaltos. Rapaz estudioso, amante dos livros e do conhecimento, não há nada que sugira uma adolescência particularmente conturbada: o relacionamento com os pais mantém-se bom, não há registo de grandes conflitos – manteve-se o velho Adelino. O sempre presente gosto pela leitura mantém-se, e chega um novo – e, certamente, curioso – passatempo: o sapateado.
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Terminados os estudos no Liceu e com uma nota final de 16 valores, Adelino começa a licenciatura em Engenharia Civil no Instituto Superior Técnico, que terminará com uma nota final de 17. Entretanto, visitava regularmente a Residência de Estudantes das Avenidas, pertencente ao Opus Dei. Esse hábito, juntamente com o seu espírito fervorosamente religioso, acabará por ter uma influência maior na vida de Adelino Amaro da Costa. Ainda na universidade, Adelino funda um clube de retórica, em que os intervenientes discutiam todo o tipo de questões – algumas das quais mais absurdas que outras – com apenas um objectivo: melhorar a capacidade argumentativa dos participantes. Adelino conclui os estudos em 1966. Terminada essa fase da sua vida, decide dar um salto decisivo e abandona a casa dos pais, trocando-a pela Residência do Opus Dei, em Lisboa. Jovem profundamente religioso, há vários anos que Adelino sentia grande simpatia pela Obra, organização à qual pertenciam, aliás, vários dos fundadores do CDS. Na residência, partilhou morada com figuras como Mota Amaral, com quem fez amizade. No entanto, são, mais que as pessoas, os valores que adquire – ou reafirma – no Opus Dei que serão determinantes na sua vida. Tão determinante que a dedicação de Adelino à Obra continuará até ao seu casamento, anos mais tarde, com Manucha. Por ter pedido para cumprir o serviço militar obrigatório mais tarde de modo a não ter de interromper os estudos, Adelino só inicia a sua passagem pelas forças armadas em 1967. Quanto ao ramo das FA em que servir a Pátria, Adelino decide-se pela Marinha. E é lá que conhece um amigo que o acompanharia até à morte, em 1980, e com quem viria a fundar o CDS: Diogo Freitas do Amaral. No mesmo ano, Adelino aposta numa outra vocação, a paixão que, disse mais tarde, seria a única pela qual poderia, um dia, deixar a política: o jornalismo. Após um primeiro curso em Pamplona, Espanha, Adelino consegue a Carteira Profissional de Jornalismo em 1968. O jornalismo não era, aliás, algo estranho para Amaro da Costa. Já antes, durante a faculdade, se tinha estreado na área, com o jornal O Tempo, através do qual criticava o regime então vigente – e que lhe garante algumas dores de cabeça com a PIDE/DGS. Durante esse tempo não são, aliás, poucas as vezes em que Adelino é interrogado pela polícia política do Regime. Propondo, através d’O Tempo, a democratização do País e a resolução do problema ultramarino, e tendo, inclusivamente, chegado a relatar os acontecimentos do Maio de 68 através do jornal, Amaro da Costa tem ainda de lidar com o estrito controlo exercido pelo lápis azul sobre a publicação que coordena. Mas não só: também o seu pai, o Engenheiro Manuel Amaro da Costa, que na altura é já subsecretário de Estado no governo de Salazar, é várias vezes pressionado para controlar adequadamente o filho – o que, diga-se nunca acontecerá.
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Da Reforma de Veiga Simão aos primeiros passos no mundo da política
Impressionado com o jovem e promissor estudante, Fraústo da Silva, à data presidente do Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Educação Nacional (GEPAE), convida Adelino para integrar também a direcção do Gabinete. Com apenas 26 anos, ainda pouco mais que um recém-licenciado, Adelino Amaro da Costa, director do jornal O Tempo, passa a liderar a equipa que trabalha para apresentar ao país uma revolucionária reforma da Educação em Portugal, a Reforma de Veiga Simão, ao mesmo tempo que faz do GEPAE o principal planificador da actividade educativa em Portugal e o transforma num interlocutor respeitado até por organismos internacionais como a OCDE. Veiga Simão, um ex-estudante de Cambridge e ex-reitor dos Estudos Gerais de Moçambique (Universidade de Lourenço Marques), sucede a José Hermano Saraiva como Ministro da Educação Nacional em 1970. Homem inovador, dinâmico e profundamente reformista, Veiga Simão tinha já ensaiado em Moçambique, algumas das reformas do ensino superior que, mais tarde, estenderia a todo o país. Durante esse período, em que se desenvolve uma relação de grande proximidade entre Amaro da Costa e Veiga Simão, são conhecidos vários casos de colaboração entre ambos. Exemplo disso são as várias conferências e entrevistas que, promovidas ou coordenadas por Adelino, incluíram o futuro ministro. E a verdade é que, quando Marcello Caetano, na altura Presidente do Conselho de Ministros, apresentou a reforma da educação de Veiga Simão ao país e se referiu a ela como a prova de que o governo estava determinado a travar a “grande, urgente e decisiva batalha da educação”, boa parte desse trabalho era tanto responsabilidade de José Veiga Simão como de Adelino Amaro da Costa. Com a intenção expressa de democratizar o ensino e de o afastar dos trâmites da educação salazarista, eminentemente nacionalista, ruralista e retrógrada, a reforma do ministro Veiga Simão representou uma lufada de ar fresco na apodrecida estrutura do ensino do Regime. E, se é verdade que o jovem Adelino não é seu autor, também o é que o documento apresentado por Marcello Caetano em 1971 não teria sido possível sem a metódica, constante e persistente intervenção de Amaro da Costa nesse sentido. Comprometido com a causa da democratização do ensino em Portugal, será, aliás, Amaro da Costa, nessa altura ainda um jovem engenheiro de 26 anos, o primeiro a sugerir a criação e uma universidade em Aveiro – universidade essa que acabaria por ser fundada em 1973, precisamente pelo ministro Veiga Simão. -9-
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A reforma educativa é encarada pelo novo ministro e pelo grupo de colaboradores próximos – entre os quais se inclui Adelino – de que se faz rodear como uma mudança estratégica para o futuro de Portugal. Passada a tomada de posse, Veiga Simão, que já conhecia a capacidade de trabalho de Adelino de outras ocasiões, achou por bem reunir-se quase de imediato com o seu núcleo duro, do qual fazia parte o ex-reitor da Universidade de Lourenço Marques – e autor do convite que, endereçado a Adelino, rapidamente é aceite -, Fraústo da Silva e, claro, o próprio Amaro da Costa. Juntos, estudam, preparam e apresentam ao Portugal da época uma reforma que, mais que uma alteração profunda do estado da educação pós-salazarista, se transformou numa aposta na modernização do país, numa batalha entre os tecnocratas reformistas da Primavera Marcelista e os sectores mais reaccionários da vida política portuguesa de então. O extensíssimo trabalho realizado por Amaro da Costa no Gabinete deixou marcas indeléveis, decisivas tanto para o país que servia como para a sua evolução pessoal. Para ele, só a educação poderia levar à construção, em Portugal, da democracia liberal, aberta e pluralista que ambicionava para o país. A causa da educação tinha, assim, também um significado iminentemente político, de aplicação programática de uma agenda, de um modelo de desenvolvimento para Portugal. E o Presidente do Conselho de Ministros não era alheio a essa realidade. De facto, quando, em 1973, Fraústo da Silva se afasta, em virtude da sua nomeação para a reitoria da Universidade Nova de Lisboa, do GPAE, é o jovem engenheiro o escolhido para o substituir. E com razão, insistem muitos do que com ele trabalham. Todavia, a falta de confiança de Marcello Caetano no director d’O Tempo acaba por ditar o adiamento da nomeação, que só acaba por ocorrer a uns escassos dois meses da revolução de Abril.
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Do 25 de Abril à coligação PS/CDS
Quando, a 25 de Abril de 1974 o regime do Estado Novo salazaro-marcelista cai, uma multiplicidade de perspectivas, sonhos e objectivos invadem Adelino Amaro da Costa. Como a maioria do povo português, tem esperança na evolução da situação política portuguesa para uma democracia liberal e pluralista de tipo ocidental, ao mesmo tempo que receava – e com motivos para isso – uma radicalização das forças políticas do pósRevolução. Olhando, especialmente, para o facto de o PCP ser o único partido já organizado e implantado local e regionalmente, Adelino é célere em compreender os novos riscos que a recém-nascida democracia portuguesa terá de enfrentar. O que é certo, porém, é que, com ou sem receios, com ou sem apreensões, Adelino está sempre disposto a colaborar com o novo regime. Embora seja obrigado a demitir-se da direcção-geral do GEPAE/GEP dias após o golpe militar, é, sabe-se, Amaro da Costa que escreve, a convite de Veiga Simão, boa parte do Programa do I Governo Provisório. Entretanto, tanto ele como Freitas do Amaral pensam na criação de um partido político centrista ou de centro-direita, inspirado nos Tories britânicos e, principalmente, nos liberais franceses de Giscard d’Estaing. É, aliás, por isso Freitas do Amaral chega a ser abordado por sectores moderados do MFA de forma a avançar com a ideia que discutia com Adelino Amaro da Costa e a proceder à organização de um novo partido que ocupasse o espaço político do centro e da direita, algo que, porém, aquele que seria o futuro presidente do CDS começou por recusar. Com a radicalização, à esquerda, do processo revolucionário, Freitas e Adelino acabam por decidir-se quanto à necessidade de constituição de base humanista, centrista e democratacristã. O desejo anterior de ambos, a da constituição de um grande partido de forte expressão eleitoral que congregasse personalidades da antiga ala liberal e de outras mais à direita, esse, acaba por ser abandonado. O nome, fica decidido em pouco tempo: se, inicialmente, se pensou em Centro Democracia e Progresso, rapidamente se optou por outro diferente – Centro Democrático Social, ou CDS. Quanto a quem o lideraria, porém, a confusão é maior: se, para Adelino, o líder deveria ser Freitas, para Freitas o líder deveria ser Adelino. Mas, com ou sem confusão quanto à questão da liderança, a verdade é que a escolha final é conhecida: seria Freitas o primeiro líder do CDS. Adelino, por sua parte, seria o número 2 do partido. Seu primeiro secretário-geral e, logo a seguir, vicepresidente, é Amaro da Costa que melhor compreende – e mais se dedica – à implantação local e regional da nova formação centrista. - 11 -
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Logo após a sua fundação, a ideia de um partido livre dos dogmas do socialismo atrai muitos portugueses, e o CDS cresce em militância, em interesse e em actividade. Segundo partido da democracia portuguesa a requerer a sua legalização, o novo Centro Democrático Social, desdobra-se em iniciativas. Por mão, principalmente, de Amaro da Costa, o partido chega a todo o país. Mas as dificuldades não são pequenas: conotados com a extrema-direita salazarista e com indivíduos ligados ao anterior Regime – nos tempos em que, para o MRPP, o PCP era “social-fascista” e em que o PS já era de “direita” -, os militantes do novo partido são sujeitos a tantas humilhações e ataques públicos que, quando chegam as eleições, tem de ser Adelino pensar em formas de conseguir apresentar candidatos do partido em todos os círculos eleitorais. Entretanto, multiplicam-se os ataques, os incêndios e os incidentes contra comícios, sedes e propriedades ligadas ao partido. Desses casos, os mais proeminentes acabam por ser os ataques de manifestantes de esquerda à sede do CDS em Lisboa e ao seu primeiro congresso, no Palácio de Cristal, no Porto. Em ambos os casos, é Adelino que está presente, que organiza os militantes, prepara o partido, salva a situação. E, se aquando do ataque à sede nacional a única solução é a fuga, o mesmo não sucedeu no Porto. É lá que, face à gravidade da situação, a única coisa capaz de salvar as mais de 7 centenas de congressistas e convidados presentes no congresso acaba por ser a notável coragem dos militantes – e o sangue frio de Amaro da Costa que, olhando o caos nos olhos, contacta todas as pessoas de influência com quem o CDS mantém relações de amizade. Dos conservadores britânicos à CDU alemã, passando pela UDF de Valéry Giscard d’Estaing pela Democrazia Cristiana, não há ninguém na família política do CDS na Europa que não receba um desesperado pedido de ajuda. Os resultados, esses, tardam mas acabam por chegar: a coragem dos militantes do partido, o apoio dos parceiros internacionais do CDS e a obstinada, incansável e inabalável busca por apoios empreendida por Adelino Amaro da Costa. Mais tarde, o 11 de Março de 1975 traz novos desafios para o jovem engenheiro e, agora, político. Quando se dá a tentativa de intentona contra-revolucionária por militares afectos ao General Spínola, tanto Adelino como Freitas do Amaral encontram-se em Londres, onde iniciavam uma longa – e profícua – história de colaboração e amizade entre o CDS e os Tories britânicos. O falhanço do golpe e a ainda maior radicalização à esquerda do processo pós-revolucionário apanham os dois amigos e fundadores do CDS de surpresa. Divididos entre a vontade imediata voltar a Lisboa, vontade essa que acarretava consigo a possibilidade de prisão para ambos e a prudência que os aconselhava a ficar em Londres, acabam por decidir-se por um meio-termo: Freitas voltaria a Portugal e, se fosse preso, Adelino começaria, de Inglaterra, uma onda de protestos contra o governo português. Felizmente, porém, nada disso se concretizou – e, dias depois do regresso de Freitas do Amaral, voltou também a Portugal Adelino Amaro da Costa. Durante a campanha eleitoral que se segue, Adelino faz uma vida atribulada. Não descansa, não dorme em casa, nunca pára – nessa altura, Portugal não parava, e ele também não. As eleições para a Assembleia Constituinte e consequente resultado desiludem profundamente os dirigentes do partido, incluindo aquele que seria o seu primeiro líder parlamentar. Com um mero – e desapontante – 7%, um certo sentimento de falhanço acaba, inevitavelmente, por invadir os corações de muitos dos que tinham dado tanto de si ao e pelo partido. Mas a verdade é que o trabalho de implantação regional e local do CDS desenvolvido por Adelino Amaro da Costa, o seu brilhantismo na Assembleia Constituinte, a irreverência dos deputados do CDS e a sua oposição à Constituição socialista e socializante de 1976, aliadas à situação de anarquia em que cai Portugal durante o PREC (Período Revolucionário em Curso), acabam por ditar um enorme crescimento eleitoral do
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partido em 1976. Nas segundas eleições livres da jovem democracia portuguesa, o CDS salta de 7 para 16% e, talvez ainda mais relevante que isso, ultrapassa, em votação, percentagem e mandatos, o resultado do PCP. É na legislatura que se segue que Amaro da Costa conquista, não apenas o respeito, mas, mais que isso, a admiração dos restantes parlamentares. Reverenciado entre os seus colegas de bancada e estimado, com a admiração que, em democracia, não é fácil alcançar, por colegas de todos os outros partidos representados na Assembleia da República, Adelino vê a sua qualidade enquanto tribuno recompensada várias vezes pela honra de ser considerado parlamentar do ano. E, se Adelino sabe rapidamente distinguir-se – ou fazer-se distinguir – no parlamento enquanto parlamentar de excepcional qualidade, não demora tempo até que também o seu patriotismo, pragmatismo e sentido de estado sejam também considerados excepcionais. De facto, a verdade é que quanto mais o país se aproxima do final dos anos 70, pior fica a sua situação política, económica e financeira. Não demorou, desse modo, muito até o Partido Socialista, nessa altura liderado por Mário Soares, compreender que a única forma de garantir a estabilidade governativa de que o país precisava era a formação de uma coligação com um (ou mais) dos outros partidos políticos representados na AR. Mas a tarefa prometia não oferecer facilidades: se, por um lado, uma aproximação ao PCP daria um sinal de viragem à esquerda da situação política portuguesa, arrastando com ela, portanto, a possibilidade de comprometer as negociações de adesão à Comunidade Económica Europeia, por outro, o clima de guerrilha e instabilidade internas dentro do PSD também não permitia olhar pela os social-democratas como um partido capaz de oferecer calma governativa a Portugal. Essa multiplicidade de factores, juntamente com a receptividade de Adelino Amaro da Costa à ideia, acaba por fazer recair, no CDS, a escolha dos socialistas. Apesar das difíceis negociações entre os dois partidos, acaba por vingar, do lado do CDS, o pragmatismo recheado de sentido de Estado de Adelino Amaro da Costa. Como muitos socialistas, também muitos militantes do CDS vêem no acordo de coligação uma rendição às circunstâncias, um esquecimento cobarde e calculista das bases do partido. Como muitos socialistas, boa parte das bases do CDS sentem uma relativização de valores, uma banalização de princípios e, por isso, não apreciam a humilhação da ligação a um partido tão distante no espectro político. Mas a verdade é que, como Amaro da Costa aponta repetidamente, a situação objectiva do Portugal do fim da década de 70 exige esse esforço de ambos. Numa altura em que a ideia de bancarrota, de colapso do sistema financeiro e do Estado portugueses não é perspectivada como algo longínquo, quase irreal, a ideia de pôr o interesse partidário à frente do interesse nacional parecia ainda mais inconsciente – e é por influência, por um lado, de Adelino Amaro da Costa, e por outro, de Mário Soares, que tanto centristas como socialistas compreendem a necessidade imperativa de união para impedir o colapso financeiro de Portugal. A coligação PS/CDS não dura muito tempo. Apesar de ter sucesso na tarefa fundamental de impedir uma derrocada económico-financeira de Portugal e de correr, razoavelmente bem, a intervenção do Fundo Monetário Internacional, naquela que será a primeira de três intervenções do fundo na nação ibérica, o executivo PS/CDS não dura muito. A rápida duração do governo, que muitos atribuem, precisamente, a Amaro da Costa, abre, por um lado, caminho a uma série de governos de iniciativa presidencial e, por outro, a uma nova aproximação entre social-democratas e democratas-cristãos, que, tal como Adelino dissera antes da fundação de ambos os partidos, acabaria, necessariamente, por acontecer.
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Casamento, AD e morte
Membro de longa duração do Opus Dei, casar não estaria, certamente, nas prioridades de Adelino Amaro da Costa. Mas o casamento acabou por aparecer de forma quase tão rápida e surpreendente quanto tinha sido a entrada na Obra. Pouco depois de conhecer Maria Manuela Vaz Pires, uma professora da Faculdade de Ciências de Lisboa, Adelino casa-se com ela – aconteceu a 3 de Novembro de 1979, em Palmela. Esse curto período de tempo entre o momento em que se conheceram e aquele em que casaram mostra, aliás, o sentimento comum de terem encontrado alguém para a vida. Quanto a isso, sabe-se que, se estivesse só nas mãos de Amaro da Costa, o corte com a Obra e o casamento teriam vindo ainda mais depressa. Entretanto, por essa altura, está já Adelino fortemente envolvido na campanha da Aliança Democrática, uma coligação pré-eleitoral estabelecida entre o Partido Social Democrata de Sá Carneiro, o Centro Democrático Social de Freitas do Amaral e Amaro da Costa e o Partido Popular Monárquico, de Gonçalo Ribeiro Telles. A AD, como conceito e como realidade, parte essencialmente da visão de Amaro da Costa para o país. Como no pósRevolução, Amaro da Costa continuava certo de que a única forma de não oferecer à Esquerda uma vantagem política decisiva seria algum tipo de convergência e união à Direita. Assim, por iniciativa mais do CDS que do PSD, nasce a Aliança Democrática, a primeira grande experiência de cooperação interpartidária da democracia portuguesa. Depois de um almoço no restaurante do Museu do Traje, em Lisboa, em que participam altos-dirigentes tanto do PSD como do CDS, Adelino expõe a sua ideia do que deveria ser uma frente eleitoral comum que, unindo pessoas diferentes, encontrasse uma solução igual que desse ao país a estabilidade política de que tanto precisava. E, se é Amaro da Costa quem lança a ideia de convergência à Direita é ele que, mais que ninguém, a põe em prática. É Adelino que escreve o manifesto eleitoral da AD, que a relembra dos valores cristãos e humanistas sobre os quais tinha sido fundado o CDS, que faz dela uma alternativa credível para Portugal. Terminadas as negociações e assinado o acordo que faz da coligação uma realidade e após uma campanha eleitoral fulminante, imparável, a AD vence as Legislativas de 1979 com 42.5% dos votos. É a primeira vez que a oposição chega ao poder pela força das suas ideias e apoio dos portugueses e a primeira maioria absoluta da jovem democracia nascida em Abril de 1974. Esta vitória de uma frente comum de partidos empenhados em dar a - 15 -
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Portugal um novo rumo, talvez a maior das visões e realizações de Adelino, é, de todas, a que mais poderia ter revolucionado o país. E revoluciona, apesar da sua pequena duração: Adelino Amaro da Costa, de apenas 36 anos, torna-se o primeiro civil a desempenhar as funções de Ministro da Defesa e começa, de imediato, a desmilitarização da democracia e da vida política portuguesas, algo essencial para a normalização, salvaguarda e manutenção da III República Portuguesa. Para além disso, o executivo AD traz a Portugal o primeiro governo com a possibilidade real de governar Portugal até ao final do mandato. O período dos governos sucessivos, confusos no seu procedimento e vazios nas suas perspectivas, acaba. Termina a era dos governos para a sobrevivência, para um hoje sem certeza de amanhã, e dá-se a possibilidade a Portugal de começar a considerar o seu futuro. Agora ministro, Adelino Amaro da Costa toma em mãos a tarefa hercúlea de voltar a pôr os militares à ordem de civis e não da Presidência da República em conjugação com o Conselho da Revolução, de quem dependiam anteriormente. Mas, essa tarefa, para a qual Adelino dá, apesar do seu curto mandato enquanto Ministro da Defesa, um importante contributo, revela-se mais difícil que o esperado. Primeiro, devido à bem conhecida hostilidade do Presidente da República, à data António Ramalho Eanes relativamente a Adelino e, segundo, devido à apreensão dos próprios militares, para quem a diminuição de poderes para as Forças Armadas representava não só uma perda de influência no país mas também um afastamento definitivo das estruturas criadas logo após a Revolução. A curta passagem de Amaro da Costa pelo Ministério é, para além disso, prolífica em produção legislativa: documentos que, ainda hoje, marcam a vida das Forças Armadas, como a Lei de Defesa Nacional e a Lei Orgânica do Ministério da Defesa Nacional têm a marca de Amaro da Costa. Também a classe de navios que, hoje, continua a servir de espinha dorsal à Marinha Portuguesa, a Classe de fragatas Vasco da Gama, vê o seu processo de aquisição iniciado por Amaro da Costa, naquela que é uma enorme prova de compreensão, por parte de um responsável político sem particular ligação aos assuntos de defesa, das necessidades de futuro do braço naval das Forças Armadas. E é ainda enquanto Ministro da Defesa que Adelino Amaro da Costa descobre quem convidar para ser candidato da Aliança Democrática à Presidência da República: o General na reserva António da Silva Osório Soares Carneiro. O general, homem próximo da Direita militar – e, portanto, odiado pelos membros do Conselho da Revolução, onde imperava ainda um certo revolucionarismo abrilesco - e a cuja carreira o primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, prestava atenção já há algum tempo, acaba, no entanto, por relevar-se uma escolha difícil. Sem passado político conhecido – problema que, claro, não se punha a Ramalho Eanes - sabe-se daquele que seria o candidato presidencial da AD apenas que tinha tido uma carreira irrepreensível nas Forças Armadas. Isso embora existissem também relatos de abusos em Angola durante a Guerra do Ultramar perpetrados, precisamente, por Soares Carneiro. Após as Legislativas de 1981 e o consequente reforço da maioria absoluta da AD, cresce, em todos menos Adelino, a certeza de derrota de Soares Carneiro. Com as sondagens a garantirem, de forma quase unânime, a vitória de Ramalho Eanes na primeira volta das Presidenciais, a AD multiplica-se em esforços e iniciativas para dar a volta ao resultado. E, à cabeça dos que nunca chegam a perder as esperanças está, claro está, o Ministro da Defesa. Para ele, a escolha de Soares Carneiro como candidato da Direita às Presidenciais torna-se também uma aposta pessoal – aposta essa que não quer, nem está disposto a
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perder. Todavia, a verdade é que, com ou sem absoluto empenho e total entrega da coligação PSD/CDS/PPM à luta pela Presidência da República, as possibilidades de sucesso são cada vez menores. É, aliás, quando o sonho de Sá Carneiro de conseguir “uma Maioria, um Governo e um Presidente” começa a fraquejar que o Primeiro-Ministro chega a admitir a sua demissão em caso de uma derrota de Soares Carneiro. É precisamente a caminho de mais uma acção de campanha no Porto que Adelino Amaro da Costa acaba por morrer, a 4 de Dezembro de 1980. Acompanhado pelo PrimeiroMinistro, Francisco Sá Carneiro e pelas respectivas esposas, Adelino morre quando o avião em que segue se despenha sobre Camarate, em Loures. Se se tratou de um acidente, de um golpe dos destino capaz de ferir de morte um movimento que queria mudar um país e de roubar a Portugal 2 dos seus mais geniais políticos, estadistas e tribunos ou se, por outro lado, a queda do avião que transportava o Primeiro-Ministro e o seu Ministro da Defesa foi resultado de um atentado contra as vidas de Adelino, de Sá Carneiro ou de ambos, não se sabe. A verdade é que as numerosas – oito até agora - comissões de inquérito sobre o Caso Camarate nunca chegaram a conclusões palpáveis sobre a tragédia. Mas uma coisa é certa: os estranhos negócios realizados através do Fundo de Defesa do Ultramar que Adelino investigava por altura da sua morte, assim como os testemunhos de familiares, amigos e conhecidos do Ministro que garantem saber que ele recebeu ameaças de morte que levou a sério ao ponto de começar a andar armado, apesar de nunca terem provado a tese de atentado, parecem, certamente, sugeri-la. Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa morreu com apenas 37 anos. Encontra-se sepultado no Cemitério de São Martinho das Amoreiras, em Odemira.
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Adelino, Corpo e Alma | Caderno Biográfico de Adelino Amaro da Costa
Cronologia
1943 – Nasce em Algés Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa 1944 – Muda-se, com a família, para a Madeira, onde viva a infância. 1960 – Termina o curso do Liceu. 1966 – Acaba a licenciatura em Engenharia Civil. No mesmo ano, sai de casa para ir viver para uma Residência do Opus Dei em Lisboa. Viverá em casas da Obra até abandonar a organização católica, por ocasião do seu casamento, em 1979. 1967 – Começa a cumprir o Serviço Militar Obrigatório. É durante esse período da sua vida que conhece Diogo Freitas do Amaral, com quem mais tarde fundará o CDS. 1968 – Consegue a Carteira Profissional de Jornalismo. 1970– Já no Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa, coordena a Reforma Educativa de Veiga Simão. 1974 – Passa a liderar o Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa (GEPAE), ainda que por pouco tempo. No mesmo ano, funda, juntamente com Diogo Freitas do Amaral, o Centro Democrático Social, partido humanista, personalista e democrata-cristão. 1975 – Por ocasião do ataque da esquerda radical ao I Congresso do CDS, no Porto, Adelino Amaro da Costa contacta, in extremis, numerosos responsáveis políticos europeus com o intuito de forçar o Governo de Lisboa a intervir contra os manifestantes.
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1978 – Por intervenção sua, coligam-se o Partido Socialista e o Centro Democrático Social. No entanto, Adelino Amaro da Costa não desempenha quaisquer funções governativas durante o II Governo Constitucional. 1979 – Casa-se com Maria Manuela Vaz Pires, uma professora da Faculdade de Ciências de Lisboa e abandona o Opus Dei. Torna-se Ministro da Defesa. 1980 – Morre aos 37 anos, quando o avião em que segue se despenha em Camarate. 2001 – O livro O Crime de Camarate, de Ricardo Sá Fernandes, reforça a tese de atentado. 2004 – A VIII Comissão de Inquérito à Tragédia de Camarate conclui que a queda em que seguiam Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa resultou de um atentado. 2006 – Um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça reafirma a prescrição do caso Camarate.
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