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Modernismo Liberdade, poesia, natureza, estética
LIBERDADE, POESIA, NATUREZA, ESTÉTICA
Foto: Acervo Itaú Cultural Fala, Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti
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O diálogo do passado com o futuro, ressignificando o período. Este é o desafio de contemporâneos e suas artes dentro da processual evolução sociopolítica-cultural do País
Por Letícia Cotta Fotos JP Rodrigues
O que vertentes do conhecimento humano, como História e Arte, têm em comum? Já se perguntou isso? Esses ramos compartilham o objetivo mútuo da disrupção, a exemplo da efervescente Semana de Arte Moderna de 22, que há cem anos desestabilizou o Brasil e reacendeu o debate sobre conceitos artísticos em todo o território nacional, dando início a novos movimentos.
E pensar que essa contracultura surgiu não de uma classe simplória e sem voz, mas sim de uma turma elitista do Sudeste, estudada e refinada, que queria muito expandir sua liberdade criativa, até então aprisionada nas fazendas dos portentosos barões do café da época. Aliada a este contexto cultural, a Semana de Arte Moderna veio de encontro a fortes movimentos políticos, como o surgimento do emergente Partido Comunista, sequenciado pela Revolução Constitucionalista até culminar na ditadura, 15 anos depois. A resposta a esta catarse foi uma primeira fase modernista com forte influência das vanguardas europeias, até criar uma identidade própria, rompendo com padrões estéticos estrangeiros. E, assim, fazer surgir nomes como Anita Malfatti, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Graça Aranha, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida, Heitor Villa-Lobos, e Di Cavalcanti.
O tempo passou, o legado permaneceu. E se acentuou. Dessa forma, um modo de celebrar os precursores da arte DNA do Brasil foi criar a exposição Brasilidade Pós-Modernismo, de curadoria de Tereza de Arruda, em itinerância pelo Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Dessa vez, no entanto, os artistas serão outros, a citar Adriana Varejão, Anna Bella Geiger, Arnaldo Antunes, Cildo Meireles, Daniel Lie, Ernesto Neto, Ge Viana, Jaider Esbell, Rosana Paulino e Tunga.
O desafio destes profissionais é justamente fazer esse diálogo do passado com o futuro, e ressignificar, enquanto homenagem, o período. Quem sabe não surge um novo movimento artístico, do qual estaremos falando anos a
Atualizações traumáticas de Debret, Ge Viana
Vista da exposição ‘Brasilidade Pós-Modernismo
Ex Cord, Flávio Cerqueira
As velas e os girassóis, Francisco de Almeida
fio novamente? “Foi necessário um centenário e um longo processo de reconhecimento, conscientização, assimilação, integração e desbravamento para chegarmos à essência da arte contemporânea brasileira com artistas representantes de diversas etnias, gerações e procedências geográficas”, explica Tereza para GPS.
E complementa: “Esta exposição não é idealizada com o olhar histórico, mas sim focada na atualidade, com obras produzidas a partir de meados da década de 1960 até os dias de hoje, sendo algumas inéditas, ou seja, já com um distanciamento histórico dos primórdios da modernidade brasileira”.
R. Mutt, da série Quem é quem?, Nelson Leirner
O Pós-modernismo provoca inúmeras reflexões. De que maneira o visitante conseguirá se conectar com essa questão?
O indivíduo brasileiro enaltece em toda sua história a busca por um perfil, uma identidade, imersa em contradição e em dualidade. Sabemos hoje que esta é diversificada e consequentemente envolta em desigualdade a partir de um europeísmo proveniente do período colonial a ofuscar o nativismo original, o popular e o regionalismo. As obras deste segmento apresentam uma brasilidade com diversas facetas da população brasileira e, em muitas representações, imersa em seu universo cotidiano que a molda. Essa população é, por vezes, despercebida, ofuscada ou camuflada por ícones, padrões e tradições preestabelecidas.
De que maneira a Semana de 22 vem como guia para a narrativa curatorial?
Todo movimento de frente, inovador, audacioso, tem um toque de radicalismo. Mudanças se fazem necessárias como respostas às novas perguntas da evolução sociopolítica-cultural de ordem global e continuada. A Semana se concretizou como um desses exemplos sob diversas perspectivas, sem delegarmos a plenitude do “início” do modernismo no Brasil ou mesmo o seu “auge”. Seus protagonistas usavam da potencialidade do momento e de seus universos particulares para arriscar, em passos largos, conquistas almejadas em nome de uma inspiração coletiva, respaldada na utopia de um novo futuro para a brasilidade.
Cada núcleo temático da exposição conta com um peso de argumentação visual próprio. De que maneira eles se relacionam?
A mostra é dividida em seis núcleos, que norteiam um percurso individual, porém interligado às questões da atualidade. Repare, olhe, observe, note! Estamos reparando, revendo, restaurando, renovando! A exposição não é elaborada como um ponto-final, mas como um ponto de partida, assim como foi a Semana para uma discussão inovadora para atender a demanda. Hoje, a atitude, a ideia por trás do artista, é decisiva. Tem uma atuação significativa não somente na busca do meio de expressão do artista, mas também na formação de opinião e de sua propagação. A função da arte atende a metamorfose de nosso tempo.
Falar sobre modernidade e apresentar a mostra em Brasília faz todo sentido?
Um exemplo de futuro construtor considerado como um dos maiores êxitos do modernismo no Brasil foi a criação de capital, tida, inicialmente, como uma ideia utópica. A vertente modernista era urbanista. Não nos delimitamos exclusivamente a Brasília, mas também a outros centros urbanos, pois a arquitetura e a cidade em si exercem, em geral, um grande papel como construtores de ideologias e ideais responsáveis pela consciência social. Exemplar é a obra de Lina Bo Bardi, que, igualmente como arquiteta, foi futurista ao executar a transformação de uma fábrica em um centro cultural, como é o caso do SESC Pompéia. Os protagonistas das obras aqui expostas enfatizam este contexto com seus desenhos, pinturas e ideais de criação. São eles Oscar Niemeyer, Lucio Costa, Jorge Bodanzky, Joaquim Paiva, Márcia Xavier e Lina Bo Bardi.
Brasilidade Pós-Modernismo Centro Cultural Banco do Brasil Brasília Até 5 de junho de 2022