Suplemento #2 - Junho 2021 - Boa ou má promoção: o que é? - Análise Kantar Worldpanel - Portugal líder na dependência promocional - Covid 19: um ano depois e as mudanças no retalho alimentar - Precificação dinâmica: sim ou não?
A REVISTA DOS NEGÓCIOS DA DISTRIBUIÇÃO
Retalho | Indústria | Consumo | Análise | Logística | Tendências
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SUPLEMENTO
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EDITORIAL A TEMÁTICA DAS PROMOÇÕES DESPERTA FRICÇÕES, POSIÇÕES ANTAGÓNICAS, RECEIO EM VERBALIZAR UMA OPINIÃO QUE, EVENTUALMENTE, poSSA SER MAL INTERPRETADA. MAS SERÁ QUE AS “MAL FADADAS” PROMOÇÕES NÃO TÊM, ATÉ ELAS, UMA IMPORTANTE DIMENSÃO SOCIAL ASSOCIADA?
QUEM GOSTA DE PASSAR AO LADO DE UM BOM NEGÓCIO? Por: Bruno Farias
debateu-se o modelo promocional, a margem, a elasticidade do preço, a sua eficácia e o incontornável “vício” dos portugueses nesta muleta comercial que começa a dar sinais de desgaste. Há quem advogue que é o modelo mais eficaz, há quem prefira uma estratégia de preços baixos todos os dias, no fundo, tudo depende do canal, do cliente e da dinâmica comercial. Na nossa conferência pudemos ouvir diferentes perspetivas de quem tem os canais e de quem tem os produtos para lá vender, seduzidos que estão clientes que ali se dirigem. Questiona-se a rentabilidade, questiona-se a eficácia, questiona-se o círculo vicioso de quem lá entra e continua a “alimentar” essa dinâmica.
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echámos o primeiro semestre com um balanço muito positivo da nossa atividade editorial. Criámos novos formatos, como este suplemento digital, apostámos em suportes videocast e podcast e promovemos uma conferência dedicada ao tema central deste suplemento: as promoções. Nesta nossa conferência, que reuniu, uma vez mais, indústria e retalho, assim como APED e Centromarca, além de uma sempre representativa participação do secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, João Torres,
A recente multa da Autoridade da Concorrência veio, de certo modo, colocar o dedo na ferida quando se fala de concertação de preços, ou, por outras palavras, de os preços e produtos em folheto serem, essencialmente, os mesmos, independentemente do operador. Esta vicissitude do mercado é, pensam muitos, uma forma da marca própria não entrar, ainda mais, dentro da casa de cada um, com a indústria a preferir entrar nesta verdadeira locomotiva, mas a continuar a vender, em detrimento de perder espaço e preponderância em prateleira. Mas não terão as promoções também um importante papel social, sobretudo num país com os contornos económicos como Portugal? Não serão, também elas, uma forma de democratização do consumo?
Será que são, efetivamente, a única forma de vender e continuar a assegurar rentabilidade, com o retalho a “piscar o olho”, por este intermédio, às margens mais atrativas da indústria? Muitas e pertinentes questões, entre muitas outras, que os diversos convidados que contribuíram para a concretização deste suplemento procuraram dar resposta, analisando não só o fator promocional em si, como, também, o impacto da promoção constante na perceção de valor da marca. Tenho consciência de que muitas questões ficaram, ainda, por responder, mas, perante o anúncio, pela voz do próprio secretário de Estado, de mais regulamentação para o sector, tenho a certeza de iremos ainda falar muito sobre o tema e de que esta nossa abordagem é uma, apenas, mais uma gotinha no imenso “oceano” do que se já se disse, escreveu e falou sobre este tema. Ciente de que nunca houve, nos últimos tempos, uma aproximação tão significativa no diálogo entre retalho e indústria, ressalva uma vez mais a nota de que é no equilíbrio, na transparência, e, porque não, no diálogo entre ambas as partes que o verdadeiro valor acrescentado pode ser gerado. Por muito boas que sejam as marcas próprias, e nunca foram tão boas e diversificadas, são as marcas que preenchem o nosso imaginário consumista que nos fazem largar os cordões à bolsa. Ainda que ninguém goste de passar ao lado de um bom negócio.
ÍNDICE 06
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O que é uma boa ou má promoção?
“Somos um retalhista discount de referência e queremos continuar a fazer a diferença”
12 As compras dos consumidores europeus no novo normal Promoções vs. Every Day Low Price. A análise da Kantar à dinâmica promocional em 2020
18 O rumo vai mudar? Estaremos à beira de uma mudança de rumo no que às estratégias comerciais diz respeito?
Artigo de opinião de Ricardo Santos Managing Director Marketing& Communication Aldi Portugal
50 As aventuras de Alice no País das Promoções Artigo de opinião de Armando Mateus, Chief Experience Officer da Touchpoint Consulting
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Promoção e preço no caminho da inovação
10 tipos de consumidor pós-Covid
Artigo de opinião de Rui Carmona, Sales Director Portugal Consumer Vileda
Compreender o comportamento e as pre-ferências do consumidor em todos os estágios da viagem de compras é fundamental
66 E os preços? Numa altura em que o consumidor está mais sensível aos preços, crescem os temores de uma onda inflacionista
Ficha técnica
Volvido mais de um ano de contexto pandémico, a Grande Consumo procurou apurar se tudo o que foi vivido, durante 2020, poderá levar a uma mudança de rumo na dinâmica do mercado português
Propriedade e Editor: Carina Inês Rocha Rodrigues Nacionalidade: Portuguesa Avenida do Parque, N.º 65 R/C B, 2635-609 Rio de Mouro Diretor: Bruno Farias E-mail: brunofarias@grandeconsumo.com N.º Registo na E.R.C. – 125 837 Depósito Legal – 306507/10 Sede de Redação – Avenida do Parque N.º 65 A, 2635-609 Rio de Mouro Redação - Avenida do Parque N.º 65 A, 2635-609 Rio de Mouro Chefe de Redação - Carina Rodrigues carinarodrigues@grandeconsumo.com Colaboradores – Bárbara Sousa barbarasousa@grandeconsumo.com Paginação – Carlos Ascensão carlosascensao@grandeconsumo.com Departamento Comercial: 218 208 793 - geral@grandeconsumo.com Estatuto Editorial disponível em: https://grandeconsumo.com/estatuto-editorial/ www.grandeconsumo.com
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Texto: Michael Delgado, Senior Area Manager, e Raquel Oliveira, Marketing Specialist da TouchPoint Consulting Foto: Shutterstock
O QUE É UMA BOA OU UMA MÁ PROMOÇÃO: COMO SABER?
Tanto se ouve falar na palavra promoção, que está tão presente no nosso quotidiano, mas o que é ao certo? É uma variável exclusiva do produto ou serviço, em que se associa um benefício temporário com impacto direto no curto prazo. Estimula-se o shopper através da ideia de oportunidade única (benefício) pela escassez (limite de stock, de tempo, ...) e urgência (curta duração).
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om quase metade das vendas (46%) em Portugal a ser realizado em promoção, o valor representa um aumento significativo face ao ano de 2010, onde as promoções em hipers e supermercados representavam apenas 21% das vendas. A utilização de técnicas promocionais foi importante para as famílias portuguesas, durante o período de crise que atravessámos ao longo de quase uma década, e, com isso, veio uma transformação do comportamento do consumidor, que se habituou a comprar em promoção. No entanto, este fenómeno não é exclusivamente nacional, estando também muito presente em toda a Europa, sendo que Portugal é o quarto país europeu onde a promoção adquire maior peso (Fig.1).
Figura 1: Peso promocional em 2018 Fonte: Nielsen, Winning into the Promo Jungle, 2019
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O desconto no preço e a oferta de (mais) produto são técnicas promocionais já muito conhecidas e utilizadas, mas existem várias, tais como a experimentação gratuita através da distribuição de amostras, de provas de produtos (degustação) e ensaio (demonstração); a oferta de prémios e brindes; concursos, jogos e sorteios. A redução de preço é uma técnica frequentemente utilizada, porque é um meio poderoso de facilitação e de estimulação de compras. Alguns exemplos desta técnica são baixa de preço temporária por meio do folheto do supermercado, reembolso de parte do preço em cartão, baixa do preço por compra de um formato com maior quantidade e distribuição de cupões aos consumidores, a descontar na caixa de saída com a compra do produto. Contudo, esta técnica tem também inconvenientes, sendo dois deles a degradação da imagem das marcas, se as reduções forem demasiado frequentes, e o facto de colocar em causa a (in)fidelidade dos consumidores. Tal como referido inicialmente, o peso das vendas em promoção é muito elevado (46%), consequentemente, o risco de as marcas ficarem “presas” às promoções é também muito alto. A verdade é que os portugueses já estão muito acostumados, senão viciados nas promoções. Num ranking de um estudo, realizado em 2011 pela Nielsen, que listou os 26 atributos mais importantes para a escolha de uma loja, as promoções e os preços baixos ocupavam, respetivamente, a 17.ª e a 18.ª posições. Cinco anos depois, no mesmo estudo, os preços baixos passaram para o terceiro lugar da tabela e as promoções para o sétimo.
Mas, afinal, quais são os objetivos das promoções? O mais óbvio e previsível é gerar lucro, vendendo mais. Todavia, uma promoção pode ter mais que um objetivo, como, por exemplo, levar os consumidores a experimentar o produto, transmitir uma mensagem ou reforçar um posicionamento, apresentar novos usos do produto, aumentar a frequência das compras, entre outros. As promoções exigem um grande investimento do lado dos fabricantes e retalhistas, mas são uma forma eficaz de impulsionar as vendas. Por isso, ter uma abordagem baseada em dados e medir os resultados irá mostrar que os investimentos em promoções estão, realmente, a criar valor. A definição e análise de métricas e indicadores-chave de desempenho (KPI’s) permitem melhorar resultados, ajustar processos, melhorar a alocação de recursos em linha com os objetivos organizacionais, além de oferecer benefícios adicionais:
Figura 2: Fases – Análise Promocional Fonte: TouchPoint Consulting
As promoções exigem um grande investimento do lado dos fabricantes e retalhistas, mas são uma forma eficaz de impulsionar as vendas. Por isso, ter uma abordagem baseada em dados e medir os resultados irá mostrar que os investimentos em promoções estão, realmente, a criar valor
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• Medir o desempenho do negócio em geral, passando pelos vários departamentos, marcas, artigos, clientes, equipas ou, até mesmo, os indivíduos; • Dar visibilidade aos colaboradores do que é importante para o negócio, mostrando as métricas que são avaliadas; • Identificar, em tempo útil, problemas que poderiam passar despercebidos, permitindo ganhos significativos de eficiência e produtividade. E como é efetuada uma análise promocional? O processo simplificado de Business Intelligence aplicado à análise promocional divide-se, essencialmente, em três fases distintas: estruturação e modelação dos dados, criação de relatórios com os KPIs mais importantes e análise de resultados.
A estruturação de dados, também conhecida como processo ETL, engloba recolha, tratamento e carregamento dos dados essenciais, incluindo o calendário promocional e as vendas ao nível de SKU/loja. Posteriormente, os dados alimentam um algoritmo para calcular as vendas baseline (excluindo efeitos de sazonalidade, vendas promocionais e atípicas), analisar o desempenho e determinar a eficiência e
Figura 4: Dashboard Evolução Promoção Fonte: RetailBI – Promotional Analysis 2020, TouchPoint Consulting
eficácia das promoções em todos os níveis de produto disponíveis. As métricas definidas são apresentadas em formato de relatório/dashboards, com uma visão geral dos principais indicadores de desempenho (KPIs) (Fig.2), permite ainda navegar para relatórios subjacentes com uma granularidade mais fina (Fig.3), com base nas necessidades de cada utilizador/ departamento. Alguns dos KPIs mais importantes para a análise promocional são: • Eficácia: Incremento Promocional Total = Vendas Incrementais + Efeito Halo - Efeito Canibalização - Efeito Pull-Forward
Figura 3: Métricas/Principais KPI´s Fonte: RetailBI – Promotional Analysis 2020, TouchPoint Consulting
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• Eficiência: Retorno do investimento (ROI) = Incremento do lucro líquido / Investimento promocional Para analisar uma promoção utilizam-se várias métricas, sendo que as vendas incrementais são a métrica que fornece uma visão mais imediata sobre o desempenho da promoção. Este KPI resulta da comparação das vendas resultantes da promoção com as vendas “baseline”. Para além do calendário promocional e das vendas, alguns indicadores de performance precisam de informação adicional para poderem ser avaliados, tais como os efeitos Halo, Canibalização e Pull-Forward. Para sabermos quais são as melhores promoções, é importante analisarmos várias campanhas semelhantes, que aconteceram no passado, e comparar as diversas métricas. Desta comparação queremos ver quais são as melhores/ piores promoções ao nível da categoria/ produto de forma a escolher quais são as campanhas que estão a gerar ou destruir valor. O investimento que é feito em campanhas promocionais é grande e, por isso, torna-se ainda mais importante escolhermos as melhores promoções de forma a maximizar o retorno por cada euro investido. O retorno não é somente imediato, mas também a médio e longo prazo. Para além de analisar as nossas promoções, é importante ter um Benchmarking da indústria, comparar com a concorrência, para saber onde nos encontramos e para onde devemos ir, consoante os objetivos definidos anteriormente. Apenas através da análise de resultados será possível às marcas e retalhistas tomar decisões informadas sobre questões estratégicas, fornecendo informações cruciais sobre o desempenho atual e histórico das promoções.
O investimento que é feito em campanhas promocionais é grande e, por isso, torna-se ainda mais importante escolhermos as melhores promoções de forma a maximizar o retorno por cada euro investido. O retorno não é somente imediato, mas também a médio e longo prazo
Glossário: Vendas Reais: vendas realizadas independentemente de serem promoções ou vendas normais; Vendas Sell in: vendas efetuadas aos retalhistas/canal de distribuição; Vendas Sell out: vendas efetivas para o cliente final; Vendas Baseline: estimativa de venda caso não tivesse ocorrido qualquer promoção.; Vendas Incrementais: Vendas originadas pelo efeito da promoção para além das vendas normais, ou seja, as vendas que dificilmente aconteceriam caso não houvesse qualquer promoção (diferença entre as vendas reais e as vendas “baseline”); Efeito Halo: ocorre quando a promoção de um produto nos influencia a comprar outro; Efeito Canibalização: quando um produto em promoção aumenta as suas vendas, mas diminui a venda de outro produto da mesma categoria que não foi promovido; Efeito Pull-Forward: quando um artigo está em promoção, o consumidor compra em grandes quantidades, assim, fica com stock por algum tempo e deixa de comprar até precisar de novo e espera pela promoção para comprar novamente.
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Marta Santos Client Services Director
Foto: D,R,
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PROMOÇÕES VS. EVERY DAY LOW PRICE A crise pandémica moldou a situação macroeconómica, provocando decréscimos nos vários indicadores económicos do país. O desafio será tentar perceber qual será o impacto da crise económica nas restrições e na gestão do orçamento das famílias. Em 2020, viveu-se a transferência do consumo de fora para dentro de casa e o sector de Fast Moving Consuming Goods (FMCG) revelou resiliência.
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omo os portugueses vivem as promoções? Para se perceber toda a dinâmica das promoções, considerou-se interessante recuar ao ano de 2019 e verificar alguns números de então. Nesse ano, 99,9% dos lares tinha comprado, pelo menos, uma promoção, mais de seis em cada 10 ocasiões de compra (61%) levavam produtos em promoção e quase metade das compras de marcas de fabricante era em promoção (45,5%), revelando a dependência que as marcas têm relativamente às promoções para se tornarem mais atrativas. Quanto às marcas da distribuição, a promoção representava 23,5% do total das vendas. Estes números demonstram que as promoções estão muito enraizadas nos hábitos de compra dos lares portugueses. Em 2020, a tendência de aumentar o peso das promoções nos atos de compra dos portugueses retraiu um pouco e 59,5% destas ocasiões de compra levava algum produto em promoção, cenário que se mantém, para já, em 2021 (59,4%). Ainda assim, de acordo com o estu-
do “LifeStyles” da Kantar, realizado em 2020, 72% dos lares portugueses admite que “quando as minhas marcas favoritas estão em promoção, aproveito para comprar mais”. Dentro das promoções que são mais escolhidas, sem dúvida que as que dão a sensação de poupança mais imediata são as que são mais procuradas. Nesse sentido, a escolha dos lares portugueses recai mais sobre promoções de Desconto Imediato, Temporary Price Reduction (TPR) e Preço Especial. Comparando a evolução face aos dois últimos anos, a Oferta de Unidades ou a Oferta de Brinde e Produto têm vindo a perder peso naquilo que é o foco das compras dos portugueses.
“Em 2020, Portugal ocupou o primeiro lugar relativamente ao peso que as promoções têm no total das vendas em FMCG, com uma quota de 31,1%”
Portugal líder na dependência promocional Portugal é líder na dependência promocional em FMCG. Comparando o nosso país com outras geografias, e pensando, não só em promoção, mas também no peso e na importância das marcas próprias, verifica-se que, no ano de 2020, Portugal esteve entre os países onde a marca da distribuição mais cresceu, a nível global, situando-se no quarto lugar, no que diz respeito à sua evolução positiva (2%), ficando apenas atrás da Colômbia, Roménia e Sérvia. Esta evolução positiva é muito significativa, uma vez que a marca própria, em Portugal, já representa 40,3% das vendas de produtos FMCG e, ainda assim, conseguiu crescer. Tendência contrária tiveram os Países Baixos, Alemanha e Grã-Bretanha, onde as marcas da distribuição não conseguiram crescer em 2020. Em 2020, Portugal ocupou o primeiro lugar relativamente ao peso que as promoções têm no total das vendas em FMCG, com uma quota de 31,1%. Ainda que as promoções tenham abrandado (como já se referiu anteriormente), Portugal continua líder na atividade promocional, mas também na procura desta por parte dos compradores. O ano de 2020 foi, efetivamente, diferente em todos os sentidos, mas também no que diz respeito à atividade promocional. Em 2018 e 2019, os FMCG cresciam alavancados, essencialmente, pelo contributo das promoções, mas, em 2020, o que trouxe maior crescimento ao sector foram as compras das famílias portuguesas feitas fora de promoção. Também na divisão entre marcas da distribuição e marcas de fabricante há diferenças em 2020, face a 2018 e 2019. Ou seja, nestes dois anos anteriores, havia sempre
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Com Promoções e Preço a liderar o top-of-mind
70%
63%
Promoção
57%
Conveniência
Preço
52%
60%
Sustentabilidade
52%
Inovação
41%
Marcas
Publicidade
Promoções muito enraizadas nos hábitos de compra Fonte: Estudo Kantar Worldpanel Lifestyles 2020 | % de respostas que demonstram maior concordância com preocupações relacionadas com o tema
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FMCG | As promoções em FMCG - 2019
61%
45,5% 23,5%
99,9% dos lares portugueses
compram pelo menos um produto em promoção
Mais de 6 em cada 10 ocasiões de compra levam produtos em promoção
MDD's
MDF's
Quase metade das compras de MDF’s eram em promoção
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De todas as categorias de FMCG, 42% é muito ligado a promoções. Ou seja, duas em casa cinco categorias têm um nível de dependência de promoções superior à média. No top deste nível de dependência estão categorias como cervejas e sidras, bebidas alcoólicas, refrigerantes com gás, peixe, marisco e carne frescos, azeite e óleo, produtos para bebés, leite UHT, bebidas quentes, iogurtes e tratamento de loiça e de roupa.
uma que se destacava face à outra na contribuição para a evolução dos FMCG (em 2018, foram as marcas de fabricante e, em 2019, as marcas da distribuição). No entanto, em 2020, houve um contributo igual de ambas para que os FMCG tivessem a performance positiva que tiveram. Apesar deste entorno, nem tudo são promoções, porque os frescos são muito importantes na geração de tráfego e visitas adicionais às lojas. Ao analisar, verifica-se que existe uma maior correlação entre frescos e o tráfego das lojas, do que entre as promoções e o tráfego das lojas. Em 2020, 79% das cestas levava produ-
tos frescos, enquanto 60% levava produtos em promoção. Promoções, qual a fórmula do equilíbrio para marcas e retalho? É, sem dúvida, importante repensar o futuro das promoções e o impacto que têm, tanto ao nível das marcas, como ao nível dos retalhistas. Utilizando um exercício muito simples, em que se faz uma dispersão dos compradores pela sua fidelidade às promoções em FMCG, existe uma diferença relativamente aos dois últimos anos: o grupo de Promo Lovers, que é o mais fiel às promoções, encolheu em 2020. Representa 39% dos lares portugueses e tem uma excessiva
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dependência promocional. São, sobretudo, jovens e casais com filhos pequenos, compram, essencialmente, em hipers e supermercados e, em 2020, compraram mais marca da distribuição do que promoções e procuraram mais o canal online. O grupo de compradores menos “promocional”, que não compra tantos produtos em promoção, representa 61% dos lares portugueses. Estão dispostos a pagar mais tanto por marca própria como por marca da distribuição, utilizam uma grande panóplia de lojas e procuram diferentes canais, sejam discounts, supers de proximidade, tradicionais ou online, para além dos hipers e supers. O facto de diversificarem na escolha das lojas leva a que comprem mais e que gerem mais visitas em FMCG. São um grupo de compradores com um perfil mais interessante pelo gasto que fazem. É importante também perceber o impacto que as promoções têm ao nível das categorias de FMCG. O facto de ser utilizado o painel de lares para esta medição permite entender o impacto tanto na clientela (penetração) das categorias, como também o desgaste e a fidelidade que pode gerar a curto e a longo prazo. De todas as categorias de FMCG, 42% é muito ligado a promoções. Ou seja, duas
em casa cinco categorias têm um nível de dependência de promoções superior à média. No top deste nível de dependência estão categorias como cervejas e sidras, bebidas alcoólicas, refrigerantes com gás, peixe, marisco e carne frescos, azeite e óleo, produtos para bebés, leite UHT, bebidas quentes, iogurtes e tratamento de loiça e de roupa. As categorias que têm um peso maior, tanto em marca própria, como em promoção, são chá gelado, gelados, cereais de pequeno-almoço, iogurtes, massas secas, leite sem lactose, leite UHT, barras de cereais, especialidades de café, caldos, maioneses e boiões infantis. Juntando o peso das marcas da distribuição ao peso das promoções, estas são as categorias que aportam menos crescimento aos FMCG. Resumindo, categorias onde a procura por marcas próprias e por promoção é superior à média contribuem menos do que as restantes para o crescimento em valor dos FMCG. Fazendo o exercício de mapear as marcas todas, para perceber se ganham compradores quando fazem promoções e se, no total, conseguem, efetivamente, ganhar compradores através das promoções que fazem, verifica-se que apenas 53% das marcas ganhou compradores através da promoção, ou seja, nem todas as marcas que fazem promoções conseguem ganhar compradores ou incrementar consumo. Destas, 87% conseguiu realmente alargar a sua base global de compradores. Existem marcas que não conseguem ganhar compradores ao fazerem promoções. Mesmo que, no fim, se consiga ganhar compradores quando se faz promoções, não resulta obrigatoriamente num saldo positivo de maior clientela.
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“O grupo de compradores menos ‘promocional’, que não compra tantos produtos em promoção, representa 61% dos lares portugueses. Estão dispostos a pagar mais tanto por marca própria como por marca da distribuição, utilizam uma grande panóplia de lojas e procuram diferentes canais, sejam discounts, supers de proximidade, tradicionais ou online, para além dos hipers e supers”
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“Em 2020, Portugal ocupou o primeiro lugar relativamente ao peso que as promoções têm no total das vendas em FMCG, com uma quota de 31,1%”
É importante perceber porque é que isto está a acontecer, entendendo o que as promoções estão a trazer para cada marca: se estão a alimentar a “baseline” (compra antecipada, mas sem incrementar a compra da marca e não altera, de algum modo, o padrão de compra), se estão a canibalizar (compra em substituição da própria marca que já ia acontecer), se estão a roubar à concorrência (compra em substituição por concorrente), se estão a expandir (compra adicional), que deveria ser o principal desafio. É relevante também ver a contribuição que as promoções dão ao retalho. Pensando nos hipers e supers, que são o canal privilegiado para a compras de FMCG, verifica-se que 80% das ocasiões de compra leva um produto em promoção. Apesar do forte peso das promoções neste canal, e de estar bastante acima da média, não estão a gerar visitas adicionais. Antes pelo contrário, há uma perda de frequência de compra, mas também uma perda de fidelidade. Ou seja, este canal não está a conseguir gerar tráfego na loja, nem a desenvolver a relação com a clientela. É importante também perceber qual a dinâmica entre as promoções no canal online e o canal offline. Já se sabe que 2020 trouxe um “boost” ao canal online, com o digital a avançar bastante. No entanto, em Portugal, o “gap” existente entre as promoções que se fazem online e as que se fazem offline é grande. O mesmo não acontece, por exemplo, em países como China, Rússia, Reino Unido, Polónia, Alemanha, França, Brasil e México, onde o peso das promoções online é superior ao das promoções offline. O facto de existir este “gap” em Portugal pode ser interessante, porque na estratégia de desenvolvimento das promoções no canal online é possível “targetizar” a clientela e incidir mais taticamente sobre os compradores, porque se consegue identificá-los melhor do que no canal offline.
Analisando o que os vários canais têm feito, ao nível de promoções, mas também ao nível da marca própria, comparando 2019 e 2020, no caso dos líderes hipers e supers, consegue-se perceber que não desenvolveram tanto, em 2020, tudo o que seria a evolução das ocasiões de compra em promoção, mas, em contrapartida, desenvolveram mais a marca própria. Isto mostra que o seu caminho mais recente tem sido uma maior aposta na marca da distribuição, quando se verifica, por oposição, os smart discounts a trabalharem mais a promoção, na perspetiva de atrair mais compradores à loja e fidelizar mais os compradores, essencialmente, através das marcas de fabricante, mas sem perder o foco na marca da distribuição. Fazendo o exercício de mapear os retalhistas, como já se fez anteriormente, não se encontram os líderes do retalho, mas sim os smart discounts, no quadrante superior direito, o que significa que estas insígnias conseguem ganhar compradores quando fazem promoções e conseguem trazer compradores adicionais à sua loja. Estão a desenvolver a sua clientela, com base numa boa estratégia promocional, que permite expandir, mais do que estar a alimentar compras que já existiam dentro da loja e até mesmo roubando à concorrência.
Analisando o que os vários canais têm feito, ao nível de promoções, mas também ao nível da marca própria, comparando 2019 e 2020, no caso dos líderes hipers e supers, conseguese perceber que não desenvolveram tanto, em 2020, tudo o que seria a evolução das ocasiões de compra em promoção, mas, em contrapartida, desenvolveram mais a marca própria.
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Principais conclusões As promoções e preço estarão sempre no topo das prioridades dos portugueses e não são um fenómeno de agora.
As promoções são um elemento-chave para o canal hiper e super, que tenta competir com o posicionamento dos smart discounts, mas sem fidelizar a sua clientela. E ainda com espaço para explorar no online.
Promoções realizadas de forma contínua não ajudam a construir valor para as marcas, para as categorias e, em última análise, para o mercado. O “uplift” das promoções só ocorre a curto prazo, as promoções não têm efeito a longo prazo.
Negociar mais volume com os retalhistas, ter mais eventos promocionais e distribuídos por diferentes lojas para aumentar a penetração e otimizar o nível de incrementalidade: quanto mais expansível for a categoria, mais incrementais serão as promoções. Estes fatores deverão permitir encontrar a fórmula de equilíbrio na estratégia para uma boa atividade promocional.
Em 2020, as estratégias de “every day low price”, assim como promoções mais pontuais em marcas de fabricante foram mais atrativas. Mais de duas em cada cinco categorias têm forte dependência promocional, sem trazerem incrementalidade aos FMCG.
Os níveis de Promoções caíram de forma global, com Portugal entre os países mais dependentes de promoção FMCG* | % Peso Valor das Promoções | Anos
2019
2020
14,6 13,8
France
6,4
8,6 7,8
12,7
Spain
13,2
16,0
15,8 15,5
14,5 13,7
16,9 17,8
17,5
27,3 26,1
20,8
20,5 22,5
24,4
26,2
24,4 25,9
26,3
26,8 27,4
33,8 33,1
30,6
22,5 22,6
21,4
31,1
32,9 33,8
2018
Global
Portugal
UK
Poland
Russia
China
US
Germany
Brazil
Mexico
Fonte: Winning omnichannel: the future of FMCG and retail post-COVID-19, KANTAR study *FMCG não inclui Frescos s/EAN e Alimentação Animal
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Em 2020 o crescimento de FMCG dependeu menos das Promoções Contando tanto com o contributo das MDFs como das MDDs FMCG | % Contribuição das compras dentro e fora de promoção para o crescimento em valor
FMCG | % Contribuição das compras com MDF e MDD para o crescimento em valor
Marcas da Distribuição Marcas de Fabricantes
Em Promoção Fora de Promoção
2018
2018
2019
2019
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2020
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Ficha Técnica:
Todas as promoções que aparecem em folheto de todas as lojas; EAN’s promocionais; TPR: temporal price reduction algorithm é um processo automático no qual identificamos as compras com redução de preço temporal. O preço médio está a diminuir abaixo de um limite estatisticamente significativo durante, pelo menos, duas semanas no SKU e no nível do retalhista, para que possamos sinalizar essas compras como promoções
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Texto: Carina Rodrigues Foto: Shutterstock
“SEM RENTABILIDADE NÃO HÁ EMPRESA, SEM EMPRESA NÃO HÁ EMPREGO E SEM EMPREGO NÃO HÁ ECONOMIA” A temática das promoções desperta fricções, posições antagónicas, receio em verbalizar uma opinião que, eventualmente, possa ser mal interpretada. Mas será que as promoções não têm, até elas, uma importante dimensão associada? No rescaldo de um ano de pandemia, com tantas mudanças ao nível do comportamento do consumidor, estará também o rumo da atividade promocional a mudar? As respostas para esta e outras questões foram dadas por Cláudia Lourenço, diretora geral da P&G Portugal, Domingos Esteves, diretor geral da C&A para Espanha e Portugal, Inês Santos, diretora de relações externas do distrito de Lisboa e relações empresariais da Mercadona Portugal, e João Partidário, diretor de vendas da Nestlé Portugal, na conferência “Promoção vs Every Day Low Price: o rumo vai mudar?”.
O
mês de março de 2020 parece, já, distante no tempo, volvido que está mais de um ano de vivência pandémica. Certo é que representa um marco no retalho, na indústria e no consumo em Portugal. Recuando a esses tempos, todos nos recordamos da célebre corrida ao papel higiénico, que, de repente, começou a “desaparecer” das prateleiras dos supermercados e a ver os seus stocks esgotados. Apenas uma das muitas manifestações de uma preocupação de abastecimento por parte do consumidor, que, perante o desconhecimento do que estaria para vir, acorreu às lojas para encher a sua despensa, desafiando, quer o retalho, quer a indústria a ter de responder a uma procura que não tinha tido precedentes. “Tivemos que fazer face a uma procura imediata e es-
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palhada pelo mundo, porque temos fábricas que servem muitos países, mas também, muito rapidamente, adaptar o que estávamos a oferecer aos consumidores, porque as necessidades também alteraram e são mais sustentáveis no tempo”, introduz Cláudia Lourenço, diretora geral da P&G Portugal. Com o fator segurança elevado ao máximo expoente, retalho e indústria focaram-se na hercúlea tarefa de manter as prateleiras cheias de produto, quando os constrangimentos se sucediam. “Todos nos lembramos da cerca sanitária em Ovar, que afetou muito particularmente a Nestlé, porque ali detém produção. Ainda assim, conseguimos manter as fábricas a trabalhar e demonstrar que estávamos preparados para esse desafio. E muito disso se deve ao incremento da comunicação com os nossos clientes, nomeadamente da grande distribuição. Durante aquele período, os fluxos de comunicação aumentaram tremendamente e notou-se, de um modo muito claro, que todos estávamos focados em manter a cadeia a funcionar e a servir o consumidor da melhor forma”, testemunha João Partidário, diretor de vendas da Nestlé Portugal. A multinacional suíça sabe bem de que modo o consumo se alterou a partir de março de 2020. Com operação comercial, industrial e de retalho, através das Boutiques Nespresso, no mercado português, e com presença relevante quer no canal alimentar, quer no canal Horeca, testemunhou, em primeira mão, todas as alterações que se sucederam. “O consumo de café dentro do lar disparou de um modo incrível, a categoria de cereais de pequeno-almoço também teve um ‘plus’ muito grande, assim como as ajudas culinárias, porque as refeições passaram a ser feitas em casa. Em contrapartida, todos os produtos e categorias relacionados com o consumo ‘on the go’ ou de impulso foram penalizados. Foi um ano muito desafiante, que exigiu uma grande resiliência”. Resiliência essa que, se no caso do alimentar, foi necessária, no caso do retalho especializado, que não beneficiou da possibilidade de estar sempre de portas abertas, foi imprescindível. “De um momento para o outro, ficámos com uma grande quantidade de mercadoria parada nas lojas, sem saber durante quanto tempo. Os contentores de roupa ficaram bloqueados em diversas partes do mundo, alguns ainda no produtor, outros já na alfândega. E recorde-se que fevereiro e março são ainda
meses de roupa de transição entre o inverno e o verão e só abrimos em junho. Foi um desafio gerir as equipas, os stocks, mas também uma muito rápida mudança no comportamento do consumidor, com algumas categorias de produto, como a chamada roupa de trabalho, a pararem completamente e a ter de se desenvolver outras áreas, mais de roupa casual”, conta Domingos Esteves, diretor geral da C&A para Espanha e Portugal. Promoções 2020 foi, assim, um ano de grande aprendizagem e de necessidade de reação em curto espaço de tempo. Assim como investir, muito rapidamente, em soluções digitais e tecnologia, sem desequilibrar, sobretudo no retalho especializado, uma delicada gestão de tesouraria. “O têxtil, em concreto, tem vindo, desde 2011, a sofrer uma deterioração das suas margens. Por outro lado, o aparecimento de retalhistas que trabalham mais o preço baixo fez com que muitas marcas entrassem numa gestão promocional um pouco perigosa, do meu ponto de vista, e desestruturada”, defende Domingos Esteves. “Com a pandemia, tudo agudizou. A nossa mercadoria não é perecível, mas é como se fosse. Todos os meses, há novos temas e histórias nas nossas coleções e, se não houver um fluxo de caixa suficiente, não se pode trazer mais mercadoria. Como tal, a C&A optou, na reabertura após último confinamento, a 19 de abril, por não fazer nenhuma promoção. Aprendemos com os ensinamentos do ano passado, em que reabrimos com promoções até 70%, o que teve um impacto brutal a nível financeiro. Agora vendemos muito menos, mas tivemos uma rentabilidade superior. E sem rentabilidade não há empresa, sem empresa não há emprego e sem emprego não há economia”. Por opção estratégica, a Mercadona não faz promoções, mas não é isso que a tem inibido de conquistar e fidelizar clientes,
“A ‘guerra’ da Mercadona não é a do preço, mas a da qualidade, em primeiro lugar. E isso não é algo que se perceciona numa etiqueta de preço, implica experimentação. Com mais idas às nossas lojas, conseguimos dar a conhecer essa qualidade dos nossos produtos e que é transversal a várias categorias”
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desde que chegou a Portugal. E em 2020, esse processo reforçou-se, quer pelo facto dos clientes apreciarem o modelo de lojas que tem aberto, quer pela sua maior aproximação ao sortido, uma vez que, devido às maiores restrições à mobilidade, concentraram mais as suas compras numa única insígnia, com a Mercadona a saber capitalizar essa tendência. Mas também a estabilidade dos preços, fruto da sua estratégia de “every day low price”, explica esta maior fidelização. “A nossa estratégia de não fazer promoções e, em alternativa, oferecer sempre preços baixos acrescenta valor ao cliente, que passa a saber sempre com o que pode contar numa loja Mercadona. Não queremos que o cliente esteja dependente das promoções para fazer a sua compra. É muito importante esta estabilidade e previsibilidade no que vai gas-
tar relativamente ao que quer comprar”, considera Inês Santos, diretora de relações externas do distrito de Lisboa e relações empresariais da Mercadona Portugal. “A ‘guerra’ da Mercadona não é a do preço, mas a da qualidade, em primeiro lugar. E isso não é algo que se perceciona numa etiqueta de preço, implica experimentação. Com mais idas às nossas lojas, conseguimos dar a conhecer essa qualidade dos nossos produtos e que é transversal a várias categorias”. Alterações nos hábitos de consumo Visitar menos lojas foi apenas uma das muitas alterações nos hábitos de consumo potenciadas pela pandemia, a par da importância da proximidade e de um maior planeamento nas compras, com muitas cestas a privilegiarem marcas próprias, numa altura em que se sentiu uma menor intensidade promocional. “A dinâmica entre marcas da distribuição e marcas de fabricante depende muito da própria dinâmica dos canais, que oferecem mais de uma ou de outra, que alterou muito durante a pandemia. Algumas categorias foram mais expostas que outras, o que também se relaciona com a confiança que o consumidor deposita nas marcas, a sensibilidade ao preço e o valor acrescentado”, nota João Partidário. “Felizmente, temos no nosso portfólio marcas fortíssimas, nas quais os consumidores confiam e das quais não abdicam, mesmo que não estejam em promoção. Prevalece a
força da marca. Houve uma redução da intensidade promocional neste período, o preço estabilizou e, no final, a Nestlé alcançou uma quota de mercado muito reforçada”. Não obstante, tendo em conta a incerteza económica trazida pela pandemia, e as muitas dificuldades que são já vividas, existem categorias de produto que necessitarão de ser dinamizadas. Com a taxa de natalidade a ser fortemente afetada em Portugal, João Partidário destaca, no caso da Nestlé, a alimentação infantil como uma das que mais estão a ser penalizadas. “Preocupa-nos bastante, porque é, para a empresa, uma categoria prioritária. Estamos, neste momento, a perceber junto do consumidor como a evoluir e a estabelecer algumas parcerias, como a com a P&G, para a sua dinamização”. Dinamização das categorias que passa, inexoravelmente, por apostar na inovação, algo que, segundo Cláudia Lourenço, foi muito acelerado pela pandemia. “Por exemplo, a categoria de lixívias foi beneficiada pela pandemia, mas no início. Agora já existe tanta mais oferta de desinfeção que a lixívia é mais uma. O evoluir das necessidades e da inovação foi muito mais rápido. Nos produtos para barbear, acelerámos a inovação que já tínhamos preparada de Gillette para homens com barba”, detalha.
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Online A grande alteração no consumo, contudo, terá sido a grande aceleração do online, sobretudo no retalho especializado, que encontrou neste canal o único modo de chegar ao cliente, durante grande parte da pandemia. Em 2020, a C&A cresceu neste canal cerca de 200%. Mais de 30% dos clientes nunca tinha comprado na marca. “O online é um bom canal para oferecer diversidade, é a nossa maior loja, e, no rescaldo da pandemia, certamente que as lojas físicas terão de se redimensionar. Mas, na verdade, não começámos a fazer nada de novo. Agora, temos é a obrigação de ir mais rápido, porque senão não chegamos ao consumidor. Contudo, o online não compõe as contas”, avança Domingos Esteves. O diretor geral da C&A para Espanha e Portugal sublinha que a oferta da marca não assenta no preço. “Sempre nos categorizámos como ‘value retailer’, na assunção de melhor qualidade para o melhor preço. Tudo o que mudou na área da sustentabilidade encaixa na perfeição na C&A. 67% dos nossos produtos já é sustentável, ou porque feito de algodão orgânico ou porque é mercadoria reciclada. E sempre dizemos que o
cliente não tem de pagar mais por obter melhor. A compra responsável, quer do lado das empresas, quer do consumidor, vai mudar o paradigma: comprar menos, mas melhor e que dure mais. Nessa medida, as promoções pela simples promoção são algo que não pode continuar”. É neste contexto que o canal online irá continuar a crescer, para chegar, pelas contas de Domingo Esteves, aos 20% a 30% das vendas. O que significa que 70% a 80% ainda será feito nas lojas físicas, o que é muito relevante. “Temos muito para evoluir nesta área, o online terá de ser um canal rentável. Hoje, a entrega e as devoluções são, ainda, um custo brutal para as empresas e os prazos de entrega praticados por muitos não são, a meu ver, exequíveis. Na C&A, preferimos demorar um pouco mais e conseguir melhorar a experiência do cliente no online e, ao mesmo tempo, ser sustentável, em termos ambientais”. O rumo vai mudar? A pandemia veio, de facto, colocar o foco na saúde, mas também na sustentabilidade e na compra responsável, mas é inegável a dependência promocional que os consumidores portugueses apresentam. “É um facto, em Portugal, cerca de metade da compra que é feita em supermercados é em base promocional”, confirma Inês Santos. “Uma das perguntas que mais nos faziam, quando abrimos a primeira loja, é se pensávamos conseguir manter a política de sempre preços baixos. Já passaram quase dois anos e continuamos a não fazer promoções. Temos, sim, desde que abrimos a primeira loja, feito um grande trabalho de readaptação: já baixámos preços, já reformulámos produtos, sempre com base nos comentários dos clientes. Estamos satisfeitos com os resultados alcançados até aqui, conscientes de que temos apenas 20 lojas, nem sequer ainda aparecemos nos gráficos, mas também de que, e como o nosso administrador, Juan Roig, costuma muitas vezes dizer, ‘todo o elefante, quando nasce, é pequeno”. Inês Santos assegura, ainda, que o projeto da Mercadona em Portugal é de longo prazo. Este ano, irá somar mais nove pontos de venda ao seu parque de lojas e continuar apostada em dar-se a conhecer. “Para nós, o importante é que os clientes visitem as nossas lojas, experimentem os nossos preços e atestem a nossa qualidade. E regressem, novamente, para comprar. Para nós, é muito importante estar perto do cliente e ouvir o que nos tem para dizer. Daí a já referida descida de preços: abrimos as primeiras lojas em julho de 2019 e, no início de janeiro de 2020, tínhamos terminado de baixar cerca de dois mil preços”. Valor Sendo certo que a noção de valor, por parte do consumidor, é cada vez mais crítica, também o deverá ser a sua sensibilidade ao preço, numa altura de contração económica. Nesse sentido, importa saber se a mecânica promocional será a melhor arma para atuar nesse contexto ou se terá de imperar o diálogo entre quem
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Sendo certo que a noção de valor, por parte do consumidor, é cada vez mais crítica, também o deverá ser a sua sensibilidade ao preço, numa altura de contração económica. Nesse sentido, importa saber se a mecânica promocional será a melhor arma para atuar nesse contexto ou se terá de imperar o diálogo para que quem tem os produtos e quem tem os canais de venda possam continuar a dinamizar a economia
tem os produtos e quem tem os canais de venda possam continuar a dinamizar a economia. “Acima de tudo, temos todos, retalho e indústria, de perceber o valor que um consumidor está disposto a pagar por um determinado produto. Existem as promoções que a indústria faz, para dar visibilidade aos seus produtos, muito importante no caso da inovação. Convém não esquecer que a promoção também é uma experiência de compra, gera experimentação. Existe um retalho que aposta mais em promoção e outro que prefere os preços baixos. Existem consumidores que têm uma confiança tal nas marcas e não querem promoções e outros que as procuram avidamente. No final, importa servir bem o cliente final e perceber qual é a melhor proposta de valor, seja promoção ou não, seja inovação, baseado em informação sobre o que ele procura”, analisa João Partidário. O que é, então, uma boa promoção? Para o diretor de vendas da Nestlé Portugal, importa perceber que valor se está a gerar com uma promoção para a indústria, para o retalho e para o consumidor final. “Se entramos num clima de promoção só porque sim, esquecemos dos outros ‘Ps’ do marketing mix, que são tão relevantes como a promoção”. Com os portugueses tão habituados às promoções, as alterações trazidas pela pandemia poderão, no entanto, trazer um maior equilíbrio entre a atividade promocional e os preços sempre baixos. “Oferecer valor, seja de forma promocionada, seja com o preço sempre baixo, é muito relevante. Até porque existe um caminho que é irreversível e que implica para as empresas uma enorme revolução, que é o da sustentabilidade. Todo o nosso modelo de consumo tem de ser reformulado. Se, ao mesmo tempo, que temos de fazer essa transformação estamos a baixar o preço ao mínimo, algo vai falhar. Claro que temos de servir essa variável ao consumidor e, centrando na realidade portuguesa, temos uma franja da população que, de facto, está com o seu rendimento debilitado. Mas também outra franja que não está e, ao mesmo tempo, pessoas que procuram sustentabilidade. Todos os negócios têm de se transformar e todos, em conjunto, temos de investir nisso”, sublinha Cláudia Lourenço.
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Trata-se, no fundo, de um ecossistema onde todos estão interligados. Domingos Esteves salienta que, apesar do consumidor “mandar”, indústria e retalhistas fazem também parte do processo. “Se eu não pagar o preço correto ao produtor, não posso dar o valor correto ao consumidor. Acredito que o consumidor é inteligente e que, hoje, está mais informado do que antes e vai perceber da importância da sua decisão de compra”. O consumidor quer conveniência, quer preencher as suas necessidades e está disposto a pagar o preço certo. “A competição em preço retira valor à cadeia e ao mercado e gera um consumo pouco responsável. Compramos mais uma camisa só porque está em promoção, enchemos demasiado o frigorífico só porque sim”, sustenta João Partidário. Com a sustentabilidade a ter de estar na agenda de todos os negócios, e a ser transversal a todo o negócio, a Mercadona acredita que a sua política de preços sempre baixos é um fator de sustentabilidade não só para o cliente, como para o próprio produtor. “Toda a cadeia de valor tem de ganhar com o seu trabalho”, conclui Inês Santos. Não será, assim, expectável que se aproxime uma guerra de preços no retalho. A batalha, diz Domingos Esteves, será por proporcionar uma melhor experiência de compra e pela fidelização, numa altura em que esta é cada vez mais difícil. “Esta é uma guerra positiva que nos vai ajudar todos a crescer”.
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Texto: Carina Rodrigues Foto: Sara Matos / D.R.
Há muito que se discute sobre a falta de incrementalidade de valor das promoções em Portugal, mas é inquestionável o quão importante é esta alavanca das vendas na dinâmica do mercado. Que os portugueses são promodependentes ninguém já duvida, contudo, à luz de todas as mudanças e disrupções trazidas pela pandemia, é mais do que nunca urgente entender e analisar se o atual modelo deverá ser repensado. Aspetos como a cadência promocional, o seu papel no crescimento das marcas ou se estão apenas a subsidiar ganhos momentâneos de quota de mercado, que acabam por não gerar valor adicional, têm se ser equacionados, sem esquecer que as promoções podem ser uma âncora para a fidelização de clientes, o que ficou bem patente em 2020, com o crescimento de Aldi e Lidl.
PORTUGAL É LÍDER NA DEPENDÊNCIA PROMOCIONAL V
olvido mais de um ano de contexto pandémico, a Grande Consumo procurou apurar se tudo o que foi vivido, durante 2020, poderá levar a uma mudança de rumo na dinâmica do mercado português. Retalho e indústria reuniram-se e debateram o que foi o ano de 2020 e o que poderá ser o futuro no sector do grande consumo, na conferência “Promoção vs Every Day Low Price: o rumo vai mudar?”. E a grande questão que, ao dia de hoje, se coloca é se estaremos, de facto, à beira de uma mudança de rumo no que às estratégias comerciais diz respeito. O estudo feito pela Kantar no âmbito desta conferência confirma, efetivamente, a dependência que os portugueses têm das promoções, mas, ao mesmo tempo, aponta para uma redução da sua expansão, ao longo do ano transato, em que as estratégias de “every day low price”, assim como promoções mais pontuais em marcas de fabricante se revelaram mais atrativas. As pistas para 2021 foram dadas na mesa-redonda que juntou Gonçalo Lobo Xavier, diretor geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e Pedro Pimentel, diretor geral da Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca (Centromarca), ao secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, João Torres. Sendo certo que 2021 deverá ser um ano complexo, em termos económicos, o que poderá apontar para uma maior sensibilidade ao fator preço, trata-se de uma equação onde um dos denominadores é, incontornavelmente, a rentabilidade. “Se, na altura da Troika,
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a dinâmica promocional acabou por ser mais usada para reagir ao impacto da crise, estes são uma crise e um contexto diferentes”, nota Pedro Pimentel. No seu entender, 2021 trará, forçosamente, soluções distintas. “Portugal já atingiu uma profundidade promocional muito elevada. Temos já níveis, em termos de vendas totais, em que a promoção chega a atingir quase 50%. As promoções são essenciais ao mecanismo do mercado, não é possível pensar esta evolução sem considerar a questão das promoções, mas a alavancagem conseguida, ao longo de 2020, não é a mesma do período de 2012. Há, claramente, uma questão de efeito multiplicador que já não se atinge, temos muitas promoções que já não têm uma efetivação de vendas, muitas delas fazem apenas e só o que chamamos de canibalização da venda base. Substituem o que seria a compra normal do consumidor. Mas também é verdade que, num mercado como o português, não é pensável, nesta altura, fazer uma alteração tão profunda que reduzisse para parâmeros muito diferentes dos atuais”. Para Gonçalo Lobo Xavier, os consumidores tornaram-se mais informados para absorver informação e fazer as suas escolhas com base na informação que absorvem sobre os produtos, o serviço e o preço. Neste período, retalhistas e marcas terão de pensar em
estratégias diferentes, que não têm que envolver sempre a questão do preço como única variável, e onde aspetos como a inovação, a qualidade de serviço e a forma como se faz chegar o produto ao consumidor são amplamente valorizados. “Portugal é dos países na Europa com maior taxa de penetração das promoções. Tem a ver com as conveniências do consumidor e uma adaptação às suas necessidades. O sector do retalho é muito competitivo e essa competitividade é muito interessante para o consumidor, para o mercado e para a indústria. O que o consumidor quer são preços sempre baixos, seja pela promoção, seja pela própria definição de preço. Feito tudo dentro das regras, temos caminho para, no final do dia, termos consumidores com produtos de qualidade nas prateleiras e nas suas casas. É muito positivo para o país que haja esta competitividade e muitas empresas a competir por um mercado tão aguerrido”, defende. Regulação O elevado nível concorrencial levou, ao longo dos anos, ao aparecimento de algumas tensões, entre indústria e retalho, que motivaram a introdução de alterações legislativas em matéria de promoções, a última das quais em 2019. Gonçalo Lobo Xavier e Pedro Pimentel partilham da noção de que existe, hoje,
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Com alterações legislativas em matéria de promoções no horizonte, APED e Centromarca são unânimes em destacar o caminho feito, ao longo destes últimos 10 anos, de construção legislativa e de autorregulação
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uma maior maturidade no mercado para fazer face a essas mesmas tensões, não obstante o diretor geral da Centromarca salientar que o contexto, desde 2015, tem também sido favorável. “Quando o sol brilha, brilha para todos”, sublinha. “Vamos entrar num ciclo diferente, que trará dificuldades que a todos afetarão. É lógico que as tensões, nos momentos mais difíceis, tendem a mostrar-se mais fortemente. Há coisas que antes não eram aceitáveis e que continuam a não o ser, mas existe também o papel de instituições, como a Centromarca e a APED, de desarmadilhar o caminho”. Enaltecendo o papel que a autorregulação tem desempenhado, APED e Centromarca consideram que não há necessidade de mais legislação em matéria de promoções. “A exigência do consumidor e a sua necessidade em estar mais informado tem levado, também, a uma maior exigência de todos os elementos da
cadeia. Parece-nos que a legislação que existe é clara e suficiente. Legislação em demasia é, muitas vezes, prejudicial”, defende o diretor geral da APED. Contudo, avizinham-se algumas novidades nesse sentido. O secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor considera que as alterações em matéria de legislação introduzidas em 2019 foram positivas, mas são insuficientes. “O Governo não tem uma perspetiva paternalista sobre os modelos de negócio das empresas, portanto, não é o Governo que vai dizer se o modelo que vai vingar é o ‘every day low price’ ou a promoção. Haverá espaço para todos. Mas há algumas preocupações da parte do Governo. Duas fundamentalmente. A primeira é assegurar que as práticas com redução de preço não criam disrupções nas cadeias de valor. Em Portugal, temos um quadro muito
positivo em termos de interação entre os diferentes agentes da cadeia de valor, quer estejamos a falar do retalho ou da produção. Inclusivamente, com a legislação das PIRC, que já tem uma maturidade interessante, e no âmbito do que é estabelecido na plataforma de acompanhamento das relações da cadeia alimentar, temos procurado assegurar este primeiro vetor, que se prende com uma distribuição de valor ao longo da cadeia que não seja disruptiva de cada um dos seus elos”. A segunda preocupação manifestada pelo Governo, considerando positiva a altercação introduzida na legislação em 2019 para estabelecer um racional de comparação para a comunicação aos consumidores de um preço reduzido, incide sobre a forma como aqueles podem ajuizar a relação custo/benefício perante uma prática de redução de preço. “Ou seja, é uma questão de política pública de defesa do consumidor, mas esta é uma política económica, e trabalharemos no sentido de fazer mais para que, quando exposto a uma promoção, um consumidor tenha capacidade para melhor avaliar a relação custo/benefício da mesma. O Governo revisitará esta legislação, porque já temos algumas condições para avaliar o impacto da última alteração legislativa e, também, porque, até novembro de 2021, teremos de transpor uma diretiva de defesa do consumidor que vai interferir com várias peças do nosso ordenamento jurídico nacional e onde está criada uma regra específica que não é consentânea com a que temos neste momento em vigor”, avança João Torres. Com alterações legislativas em matéria de promoções no horizonte, APED e Centromarca são unânimes em destacar o caminho feito, ao longo destes últimos 10 anos, de construção legislativa e de autorregulação. “A liberdade contratual é muito importante, para que quer fornecedores, quer retalhistas sintam qual o momento adequado para fazer os seus movimentos, sejam promocionais ou de outro tipo”, conclui Pedro Pimentel.
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Pedro Tavares Partner e CEO da OnStrategy
Texto: Bruno Farias Foto: D.R.
“A PANDEMIA VEIO ALTERAR HÁBITOS E ATITUDES E MOTIVAÇÕES E COMPORTAMENTOS QUE DEVEM SER ALVO DE ANÁLISE”
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Pedro Tavares, Partner e CEO da OnStrategy, aborda o impacto da atividade promocional na reputação e marcas e retalhistas.
onstrategy brand value management
Vivemos um contexto em que as empresas e as marcas estão sob pressão para proteger os seus lucros, mas sem negligenciar o impacto das suas ações na sua reputação. É um equilíbrio difícil de alcançar? Se apenas tivermos como foco a dimensão de reputação, a resposta é que não é difícil alcançar o equilíbrio questionado. Contudo, o desafio que se coloca vai muito além de proteger a reputação e, sim, proteger a força das marcas. A gestão da força de marca é, em si, um verdadeiro desafio por impactar, de forma transversal e dinâmica, toda a organização, uma vez que coloca em jogo o equilíbrio de diferentes dimensões que têm efeitos cruzados entre si. O verdadeiro equilíbrio passa por ter indicadores permanentes e gerir, de forma contínua, seis macro dimensões: Relação Emocional com os stakeholders (notoriedade, admiração, relevância, confiança, preferência, intenção de compra, recomendação e defesa), Reputação (qualidade de produto, qualidade de serviço, inovação, ambiente de trabalho, cidadania, governo e liderança), Experiência (satisfação com produto, loja, digital, telefone e relação preço/valor), Presença e Atividade no Mercado (proteção legal, quota de mercado, quota de comunicação, cobertura e eficiência geográfica, referência de preço e eficiência da comunicação), Equipa (alinhamento, compromisso e resultados) e Saúde Financeira (receitas, margem, perspetivas de crescimento e avaliação de crédito). Qual o impacto das estratégias de preço e promoção na reputação de marcas e retalhistas? Estar sempre em promoção é um aspeto positivo para a reputação das marcas? E para quem promove esses mecanismos? Numa ótica de indústria, se se conseguir ter uma gestão de marca eficiente, integrando as dimensões anteriormente referidas, é possível trabalhar numa perspetiva estratégica que promove a construção da força de marca. Quando isso não sucede, a gestão de marca acaba por cair num nível mais tático e de curto prazo que, tradicionalmente, se reflete em ações de preço e promoção que, se ativados de uma forma permanente, acabam por colocar em causa a força e o valor das marcas. Se tivermos em linha de conta apenas
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três das dimensões (Reputação, Experiência e Atuação no Mercado), entendemos que uma gestão mais alinhada e integrada entre a Reputação (perceções e expectativas) e a Experiência (realidade) pode evitar atividades mais agressivas e com perda de valor na Atividade de Mercado. A título de exemplo, um indicador de reputação superior ao de experiência significa que posso estar a atrair clientes que podem sentir-se defraudados no contacto com a marca e isso originará um efeito ‘boomerang’ negativo na reputação (que não se resolve através de preço ou pro-
“na perspetiva do retalhista, e focando no retalho de bens de grande consumo, a componente de preço e promoção tornou-se um fator intrínseco e assumido, que impacta as dimensões de reputação e de experiência junto dos clientes e consumidores”
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moção, mas, sim, em serviço); ao contrário, um indicador de experiência superior ao de reputação mostra uma debilidade ao nível da estratégia de comunicação (que também não se resolve com preço ou promoção, mas, sim, em “touchpoints”). Já na perspetiva do retalhista, e focando no retalho de bens de grande consumo, a componente de preço e promoção tornou-se um fator intrínseco e assumido, que impacta as dimensões de reputação e de experiência junto dos clientes e consumidores. Contudo, até neste tipo de retalho, isto pode ser questionado se a qualidade de produto, serviço e inovação não for de excelência, sobretudo associada à marca própria. Questões como a responsabilidade social das marcas pesam na decisão de compra dos consumidores? Face às dificuldades económicas que já se vi-
“A gestão da força de marca, ou mesmo uma perspetiva meramente reputacional, reside numa dinâmica matricial de análise de variáveis e de públicos-alvo com diferentes pesos entre si e entre indústrias” vem e que se perspetivam virem a agudizar, este critério poderá perder relevância na mente dos consumidores? Face, por exemplo, ao preço e à oferta em promoção? O tema da responsabilidade social impacta conceitos de cidadania, ambiente de trabalho e governo e influencia comportamentos como a admiração, relevância, confiança, preferência, compra, recomendação, defesa perante crises, atração de trabalho e de investimento. Há também que ter em consideração que todas as dimensões que constroem a força de marca, e que foram anteriormente mencionadas, têm pesos diferentes, de acordo com os sectores de atividade, sendo o mesmo válido para os atributos que compõem cada dimensão. Dito isto, a responsabilidade social pode ter um impacto maior ou menor, de acordo com a indústria de atuação, e há que ter claro qual o peso desta na construção da dimensão reputacional e, consequentemente, na força
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de marca. Se focarmos novamente na indústria de bens de grande consumo, e considerando também as alterações motivacionais e comportamentais, é possível afirmar que existe uma associação direta da responsabilidade social com motivações e comportamentos mais emocionais, mas, para a racionalidade de compra, a qualidade de produto e de serviço e a inovação nestes ganhou mais peso. As questões reputacionais interessam a todas as gerações de modo semelhante? Este é também um paradigma da mudança dos hábitos de consumo? Para a construção de reputação contribuem questões emocionais (admiração, relevância, confiança, preferência e recomendação) e racionais (qualidade de produto, qualidade de serviço, inovação e diferenciação, ambiente de trabalho, cidadania, governo e ética, liderança e visão, resultados de negócio). Da mesma forma que os pesos destas dimensões e atributos são diferentes entre indústrias, também o são entre diferentes stakeholders (consumidores, clientes, jornalistas, colaboradores, reguladores, etc.). E se focarmos, por exemplo, nos consumidores e clientes, tal também se aplica de acordo com os intervalos de idade (gerações Silent, Baby Boomers, X, Y e Z). A gestão da força de marca, ou mesmo uma perspetiva meramente reputacional, reside numa dinâmica matricial de análise de variáveis e de públicos-alvo com diferentes pesos entre si e entre indústrias. Perante tudo isto, o que acontece a questões como a da sustentabilidade, as alterações climáticas ou a desigualdade social, às quais os consumidores estavam particularmente atentos antes da Covid-19 e pelas quais balizavam a sua relação com as marcas? Perdem ou ganham relevância? Todas estas temáticas mantêm-se relevantes. Há, contudo, que não as generalizar e, sim, enquadrá-las com os diferentes sectores de atividade e com os objetivos definidos para o negócio, de acordo com cada público-alvo. Era já uma evidência pré-pandemia que estas questões têm diferentes efeitos sobre as motivações e comportamentos (admiração, relevância, confiança, preferência, compra, recomendação, defesa perante crises, atração de trabalho e de investimento). A pandemia veio alterar hábitos e atitudes e, consequentemente, motivações e comportamentos que devem ser alvo de análise e monitorização e não de generalização entre diferentes indústrias e diferentes stakeholders.
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Rafael Cerveira Pinto
Managing Partner, Squadra – marketing & sales consultants
À medida que os retalhistas perguntam se os “preços baixos todos os dias” podem ser úteis na luta contra as lojas de desconto, consideramos que a análise deve ser mais abrangente e profunda.
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OPINIÃO PREÇOS BAIXOS TODOS OS DIAS OU PROMOÇÃO?
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detergentes para a roupa, a marca Skip apresenta uma proposta de valor, perceção de qualidade e desempenho acima da média, logo, tem um preço de venda superior ao dos seus concorrentes. Na política de preços, as promoções são vitais, já que os estudos mostram que a maioria dos negócios geram um valor de vendas incremental para a marca, ou seja, as variações de preços provocadas pela atividade promocional são uma forma segura de aumentar as vendas.
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a minha opinião, este assunto deve ser analisado na perspetiva estratégica, ou seja, a partir do posicionamento competitivo das marcas, sejam elas insígnias da distribuição ou marcas de fornecedor. No âmbito das insígnias da distribuição, temos, tipicamente, dois tipos de posicionamento, os retalhistas da distribuição moderna e as lojas desconto. Enquanto os “retalhistas” desenvolvem uma política orientada para mais serviço/mais sortido, com uma política de preço mais dinâmica, com descontos promocionais pontuais, como, por exemplo, o Continente e a Auchan, as “lojas desconto” praticam preços baixos todos os dias, como, por exemplo, o Lidl ou Aldi. O posicionamento “every day low price” (EDLP) é atrativo para os clientes/ compradores, assente numa mensagem simples e na promessa de preços baixos sempre, em oposição a preços promocionais que mudam continuamente. Por outro lado, estudos recentes mostram que as promoções “high-low” (HiLo) beneficiam os retalhistas, quer na geração de volume como de valor; se é verdade que uma promoção pontual pode originar que o comprador opte pelo artigo em promoção, em vez da sua marca habitual, os estudos mostram que em duas em cada três promoções há um incremento do valor das vendas. Para a marca de fornecedor, o ponto de partida de uma estratégia de marketing também é o seu posicionamento competitivo. Por exemplo, nos
Ainda na perspetiva da marca de fornecedor, é de destacar que a realidade atual obriga, cada vez mais, a uma maior sofisticação das funções de gestão comercial/ vendas para acompanhar todas estas dinâmicas; há marcas que, para afastar uma comparação direta de preços, optam por negociar diferentes referências (SKUs) para diferentes canais/insígnias. Em resumo, não há uma única resposta à pergunta: preços baixos todos os dias ou promoção? Há prós e contras associados a cada opção estratégica; adotar o EDLP como posicionamento significa nunca alterar o seu preço, enquanto os concorrentes podem adicionar eventos promocionais à sua vontade. Em média, um quarto das vendas em promoção de uma marca é “roubado” diretamente dos concorrentes. O pior cenário é que a novidade da EDLP se esgote, a concorrência se intensifique e as marcas fiquem sem espaços de resposta. Ao contrário de um plano HiLo, onde potencialmente a profundidade e a frequência dos descontos podem ser flexíveis, o EDLP clássico significa nunca mudar. O plano tático é fixo e, se não funcionar, as opções são limitadas. Ambas os conceitos são válidos (EDLP, HiLo ou até um híbrido), mas o importante é ter um modelo de negócio robusto e consistente, com uma marca/proposta de valor clara e relevante ao comprador/ cliente. Por fim, é importante também ter um modelo de análise que acompanhe as dinâmicas promocionais, bem como procurar interesses conciliáveis entre as três partes envolvidas, o fornecedor, o distribuidor e o cliente final.
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“na perspetiva da marca de fornecedor, é de destacar que a realidade atual obriga, cada vez mais, a uma maior sofisticação das funções de gestão comercial/ vendas para acompanhar todas estas dinâmicas; há marcas que, para afastar uma comparação direta de preços, optam por negociar diferentes referências (SKUs) para diferentes canais/insígnias”
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Rui Carmona
Sales Director Portugal Consumer Vileda
Foto: D.R.
OPINIÃO
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PROMOÇÃO E PREÇO NO CAMINHO DA INOVAÇÃO Muito se tem falado, nos últimos tempos, sobre o fim da era das Promoções H/L (High/ Low) no mercado de FMCG e da sua substituição pelo modelo de EDLP (Every Day Low Price) em Portugal.
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ntes de mais, importa entender as principais diferenças entre os dois modelos. Nas Promoções H/L, fornecedores e retalhistas definem, em conjunto, momentos promocionais em que determinados produtos irão estar em promoção, em função de uma série de métricas que ambos avaliam. O objetivo último será crescer em volume, abdicando de margem percentual, ganhando ambos em margem absoluta. Da parte do consumidor, é lhe oferecida a possibilidade de adquirir produtos com redução de preço significativa, num determinado período. No caso do modelo EDLP, fornecedores e retalhistas definem um determinado preço para um produto, que se deverá manter estável ao longo de um período significativamente longo no tempo. Esse preço estará algures entre o preço mais baixo promocional e o preço mais alto fora de promoção, de modo que o modelo possa ser viável do ponto de vista de rentabilidade. O consumidor, neste caso, abdica de poder comprar ao mais baixo preço em troca de um preço médio constante ao longo do tempo.
Percebe-se, facilmente, que, em ambos os casos, o fator preço é de extrema relevância para todos os operadores de mercado, incluindo, obviamente, o consumidor, que terá comportamentos de compra díspares num modelo e no outro. Se, no modelo EDLP, o consumidor não alterará grandemente os seus hábitos de compra, quer de produtos, quer em quantidades, dado que o preço se mantém constante, já no modelo H/L, o consumidor tenderá a experimentar mais a nível
“o factor preço é de extrema relevância para todos os operadores de mercado, incluindo, obviamente, o consumidor, que terá comportamentos de compra dÍspares num modelo e no outro”
de produtos, bem como assumirá maior elasticidade ao preço, no sentido de tentar aproveitar mais determinados períodos, para comprar mais quantidade, em que o produto se apresenta com o preço mais baixo. Já do lado de fornecedores e retalhistas, qualquer dos modelos oferece um desafio comum que se relaciona com rentabilidade. Recordando-nos do velho ditado popular que diz que “não se pode ter sol na eira e chuva no nabal”, parece óbvio que, num modelo EDLP, é inviável ter o preço mais baixo, enquanto no modelo H/L, é impossível tê-lo sempre. Qualquer alteração à natureza destes modelos converge para perdas de rentabilidade que não serão sustentáveis no tempo. Então, porque razão o modelo H/L tem vingado, um pouco por toda a Europa, e o modelo EDLP tem sido usado a espaços e apenas por alguns operadores? Creio que a razão, uma vez mais, é bastante intuitiva. Todos aprendemos, ao longo da nossa vida académica, que a promoção é uma das quatro variáveis que constituem a estratégia de um produto/serviço, a par do preço. Ora, se no modelo H/L ambas variáveis são usadas, de forma plena, por fornecedores e retalhistas nos seus planos de negócio, com o intuito de criar valor junto dos seus consumidores, no modelo EDLP, a variável promoção é banida da equação, usando apenas o fator preço na construção da proposta de valor.
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À primeira vista, o modelo EDLP poderia sugerir maior simplicidade da operação, mas o facto de apenas se trabalhar três variáveis, em vez de quatro, coloca enormes desafios a quem o adota, dado que tem menos opções disponíveis para se poder afrontar, nomeadamente, as primeiras crises de crescimento.
“É, precisamente, em alturas de crise que fornecedores e retalhistas precisam de trabalhar em conjunto, fazendo-se valer de todos os instrumentos que possam usar para se Reinventar, na busca incessante pelo crescimento dos seus negócios”
Com efeito, no modelo EDLP, o nível de interação com o consumidor é reduzido, dado que o espaço dado à inovação é baixo e, na maioria das vezes, apenas se conta com os lineares para apresentação da oferta. A dinâmica do sortido permanente é dramaticamente reduzida, o que consequentemente, baixa a atratividade ao consumidor em visitas subsequentes à loja. Todos sabemos que é, precisamente, em alturas de crise que fornecedores e retalhistas precisam de trabalhar em conjunto, fazendo-se valer de todos os instrumentos que possam usar para se reinventar, na busca incessante pelo crescimento dos seus negócios. É, por isso, que a variável promoção, nomeadamente o modelo H/L, em conjunto, obviamente, com as restantes, é de extrema importância em diversos cenários económicos. Em alturas de crise, para oferecer maior poder de compra aos consumidores, em momentos de recuperação, onde se podem oferecer propostas promocionais associadas a volumes, e em momentos de expansão económica, onde o modelo H/L poderá ajudar a dinamizar a inovação e, consequentemente, a criação de valor para as categorias. Falando, precisamente, de inovação, não é coincidência que os países com os maiores rácios de vendas em promoção sejam também aqueles que apresentam as maiores taxas de inovação. Com efeito, fornecedores e retalhistas sabem que, no longo prazo, a única forma de tornar o negócio de FMCG sustentável, ao longo do tempo, é apostando incessantemente na inovação, procurando criar valor nas categorias existentes, ou mesmo criar novas categorias, através de produtos inovadores, que proporcionem respostas às necessidades de consumidores cada vez mais exigentes.
Como em qualquer indústria, o fator inovação adiciona valor à oferta, tornando-a dinâmica, mas o caminho entre a conceção de uma ideia e o seu reconhecimento por parte dos consumidores nem sempre é linear. Pode-se mesmo dizer que são necessárias várias boas ideias para alcançar uma inovação bem-sucedida, ou, por outras palavras, é fundamental existir espaço para falhar se queremos ter uma verdadeira cultura de inovação. No mercado de FMCG, um dos instrumentos disponíveis, que fornecedores e retalhistas têm, para proporcionar a tal cultura da inovação é, precisamente, o uso da promoção através do modelo H/L. Com efeito, consegue-se, através deste modelo, salvaguardar o sortido permanente devidamente planogramado, mas, ao mesmo tempo, criar condições para que a inovação floresça, através do apoio e teste de novos produtos em promoção. Haverá, depois, através de análises post-mortem, produtos que não funcionaram, que, como já vimos, fazem parte do processo e são fundamentais para se encontrar a verdadeira inovação, reconhecida e valorizada pelos consumidores e que permitirá o tal crescimento sustentável e duradouro. Parece claro que, quanto maior for a aposta neste círculo virtuoso, entre fornecedores e retalhistas, maior será a taxa de sucesso da inovação e, consequentemente, se reforçarão os resultados de médio e longo prazo dos intervenientes. Nesse sentido, fornecedores e retalhistas devem centrar os seus esforços nas iniciativas top do ano de forma integrada, assegurando que a aposta não se limita apenas à variável preço promocional.
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Por último, e não menos importante, a integração da imagem criada em folheto no espaço promocional em loja que seja visualmente impactante, gera um efeito multiplicador da promoção que a torna mais eficaz. Sabemos que o consumidor português gosta de ser surpreendido e, nesse sentido, quanto melhor for a sua experiência de compra de um novo produto, numa determinada loja, maior será a probabilidade desse consumidor voltar à loja em busca de novas experiências, bem como recomendar à sua família e amigos essa loja. Tal efeito gera fidelização não apenas pelo preço que, já se sabe, é um fator relativamente fácil de contornar, mas pela soma de fatores que trabalhados de forma holística, tornam apetecível a compra, em determinadas lojas em detrimento de outras. Para que todos os fatores possam funcionar de forma harmoniosa alavancando assim a Promoção H/L, em termos de vendas incrementais, é necessário que fornecedores e retalhistas assegurem que no período da campanha sejam cumpridos determinados pressupostos. Parece uma tarefa fácil, mas, de facto, não o é. É necessário alinhamento estratégico e planeamento, bem como o envolvimento interdepartamental entre fornecedores e retalhistas para que se garanta, por exemplo, a massificação da campanha, evitando assim ruturas inesperadas, que possam colocar em risco todo o potencial da ação. Outro exemplo será poder usar o folheto promocional, não apenas para comunicar preço, mas aproveitar para poder comunicar os principais benefícios do produto, de modo que o consumidor possa associar a necessidade à oportunidade de um preço mais baixo.
Em jeito de conclusão, a experiência que advém da promoção H/L, nomeadamente com novos produtos, permite a fornecedores e retalhistas conhecer melhor os seus consumidores, acabando por ser muito rica do ponto vista profissional para as equipas envolvidas. Para fornecedores, porque têm oportunidade através dos departamentos de R&D desenvolver novos conceitos e, consequentemente, às equipas comerciais definir fontes de crescimento para os seus negócios. Para os retalhistas, dado que alimenta as suas iniciativas em termos de categorias a apostar, criando dinâmicas que vão muito além do preço, acompanhando e liderando as últimas tendências em termos de consumo, oferecendo experiências de compra diferenciadas e completando, assim, a suas próprias proposta de valor. Aquelas empresas que saibam automatizar processos e, sobretudo, tenham no seu ADN a tal cultura de Inovação, conseguirão garantir a agilidade necessária, de forma a maximizar o fator promoção, reconhecendo igual importância, que aos demais P’s do marketing. Como se costuma dizer, a sorte dá muito trabalho. O modelo de promoção H/L é, de facto, mais complexo que o modelo EDLP, seja pela exigência que coloca a nível logístico, seja pela complexidade a nível comercial. Mas, a verdade, é que se for usado de forma competente, apoiando a Inovação, oferece a fornecedores e retalhistas mais soluções de crescimento sustentável no médio e longo prazo. As novas gerações de consumidores agradecem.
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“Como se costuma dizer, a sorte dá muito trabalho. O modelo de promoção H/L é, de facto, mais complexo que o modelo EDLP, seja pela exigência que coloca a nível logístico, seja pela complexidade a nível comercial. Mas, a verdade, é que se for usado de forma competente, apoiando a Inovação, oferece a fornecedores e retalhistas mais soluções de crescimento sustentável no médio e longo prazo”
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“O EQUILÍBRIO É O CERNE DA QUESTÃO” José Faísca
Diretor Comercial Fromagerie Bel Portugal
OPINIÃO Existem duas coisas que os portugueses adoram: marcas e promoções. Esta combinação faz parte do ADN de qualquer shopper português, apenas variando na respetiva “dosagem”, e não sê prevê qualquer alteração deste quase “receituário”.
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mercado da grande distribuição, nas últimas duas décadas, já experienciou realidades e modelos estratégicos baseados quase nos extremos destas duas tendências e, efetivamente, não são modelos que, aplicados de uma forma espartana, tenham conseguido sucesso a longo prazo. De um lado, temos, por vezes, uma dinâmica “monocromática” da oferta ao shopper, sem qualquer “surpresa” de proporcionar um excelente negócio, aquilo que todos os portugueses adoram assumir e partilhar quando o fazem, e passamos para uma compra e oferta muito mais racional, efetiva e focada na necessidade básica e, muitas vezes, sem desvios “à lista” de compras.
Do outro lado da equação, temos a “promoção” como a única “estratégia” em todo o modelo de gestão e onde só dentro desta “regra” se consegue comunicar ao longo de toda cadeia de “valor”. Atividade promocional é relevante em todo o processo de comercialização e é aplicada praticamente em todas as áreas das nossas vidas, atualmente, até o imobiliário tem campanhas promocionais. Mas a promoção, a ser aplicada, e assumida, como a única estratégia, é um risco elevado, com consequências de degradação da cadeia de valor, pois uma desvalorização progressiva não permitirá espaço para a inovação e expansão sem um risco crescente de perdas efetivas, em todos os stakeholders. E aqui chegados, qual modelo aplicar? Em face da tipologia de shopper no nosso mercado, o equilíbrio será a chave para se continuar a gerar valor! O valor é o cerne da questão! Se toda a cadeia o gera, poderemos criar meios que contri-
buem para um equilíbrio, permitindo que a inovação/investigação/expansão seja partilhada por uma comunidade muito mais alargada, onde o risco e o empreendedorismo fazem parte da dinâmica positiva dos mercados. Por vezes, os “extremos” são aparentemente as soluções mais fáceis e onde as teóricas “zonas de conforto” são facilmente identificáveis, por cada um dos lados. Acredito que é no equilíbrio da implementação das estratégias de competitividade de base, com uma atividade promocional eficiente, que se poderá gerar valor efetivo, transversal e resultando em dinâmicas vencedoras, com impacto em todos nós! Será fácil este equilíbrio?...Não, não será!! Pois, se fosse fácil, estariam cá outros.
“É no equilíbrio da implementação das estratégias de competitividade de base, com uma atividade promocional eficiente, que se poderá gerar valor efetivo, transversal e resultando em dinâmicas vencedoras”
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“SOMOS UM RETALHISTA DISCOUNT DE REFERÊNCIA E QUEREMOS CONTINUAR A FAZER A DIFERENÇA”
OPINIÃO Ricardo Santos
Managing Director Marketing & Communication Aldi Portugal
“Algumas destas lojas vão trazer novidades e, prova disso, é a ALDI Picoas, que é a nossa primeira loja de proximidade em Portugal, onde os clientes podem encontrar uma oferta otimizada, que continua fiel à essência ALDI”
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Nada fazia prever que, de um dia para o outro, todos seríamos impactados por uma realidade para a qual ninguém estava preparado. Uma crise que veio impactar, em simultâneo, a oferta e a procura, onde todos tivemos de nos adaptar e reinventar.
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s eventos sociais e o contacto com amigos, familiares e colegas passaram a ser feitos em formato digital. Adaptámos rotinas, hábitos de higiene e, até, a forma como vivemos o nosso dia-a-dia. Uma das a alterações que sentimos foi a maior procura por produtos nacionais. O consumidor começou a dar mais valor ao “made in Portugal” e, por isso, na Aldi temos aumentado o apoio ao que é feito por cá: não só através de produtores locais de fruta, legumes, carne e peixe, mas também nas nossas marcas próprias, como é o caso do azeite biológico Gut Bio ou o Senhor do Lagar, ambos produzidos em Portugal. A aposta na produção nacional, para além de ser uma resposta às necessidades do cliente, é também uma forma de atuação sustentável: a oferta de produtos locais contribui para a diminuição dos níveis de CO2 emitidos, na medida em que evita deslocações mais longas. Sabemos isto porque a sustentabilidade é uma das nossas preocupações. Enquanto retalhistas, sabemos a responsabilidade que temos para com os nossos clientes e para com a sociedade. Temos apostado na redução do plástico de utilização única e reforçado o investimento em materiais recicláveis. Procuramos ter alternativas mais eficientes, em termos de consumo energético, nas nossas lojas e, mesmo ao nível do nosso sortido, temos aumentado a oferta de produtos biológicos, cuja produção contribui para
a proteção do ambiente e da biodiversidade. Por outro lado, continuamos a investir na qualidade dos nossos produtos. Prova disso são os vários prémios que temos conquistado: Sabor do Ano (22 produtos distinguidos em 2021), Superbrands, Escolhas DECO e, mais recentemente, a nossa marca Gut Bio foi eleita Escolha do Consumidor, como melhor marca de distribuição alimentar biológica. Todos estes resultados são fruto do trabalho e dedicação das nossas equipas, da preocupação que temos em proporcionar a melhor experiência de compra possível aos nossos clientes. Somos um retalhista discount de referência e queremos continuar a fazer a diferença, ao proporcionar aos portugueses produtos de qualidade a preços acessíveis, onde quer que eles estejam e a qualquer altura. Em relação à nossa presença a nível nacional, continuamos a crescer e a dar seguimento ao nosso plano de expansão: temos previstas 25 novas lojas, em 2021,
O Aldi Portugal tem um novo canal de entregas ao domicílio, através de uma parceria com a plataforma Glovo, que permite aos clientes de algumas zonas da Grande Lisboa fazerem as suas compras de forma fácil e conveniente, através da aplicação, e receberem os produtos em casa, em cerca de 30 minutos.
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e outras 25, em 2022. Algumas destas lojas vão trazer novidades e, prova disso, é a Aldi Picoas, que é a nossa primeira loja de proximidade em Portugal, onde os clientes podem encontrar uma oferta otimizada, que continua fiel à essência Aldi: produtos frescos, saborosos e diferenciadores, que prometem uma verdadeira experiência de descoberta. Para reforçar e acompanhar este crescimento, estabelecemos uma parceria com a Glovo nas lojas da Grande Lisboa e vamos ter a abertura do novo centro logístico da Moita, já no primeiro trimestre de 2022. Para além disto, já estamos à procura de uma localização para uma plataforma no norte do país. Sobre a comunicação, esta teve e vai continuar a ter um papel fundamental. Após o lançamento da nossa assinatura “Faz a diferença”, em outubro do ano passado, temos mantido uma presença regular, com campanhas multimédia, para que o consumidor nos conheça melhor. Neste momento, sabemos que a notoriedade da marca Aldi aumentou e, para nós, é claro o interesse crescente por parte dos clientes, que querem saber mais sobre o nosso sortido e onde vão ser as próximas lojas. Tem sido um trabalho estruturado e consistente de todos os departamentos da Aldi Portugal. O nosso objetivo é claro: queremos crescer, chegar a novas localidades e dar-nos a conhecer. Vamos continuar a apostar e a investir num crescimento sustentável como temos feito. Queremos reinventar-nos, ser uma opção relevante pela qualidade dos nossos produtos e, claro, continuar a fazer a diferença.
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Alexandre Real Partner Sfori
Antes de dissertar sobre o tema gostaria de fazer um preâmbulo que o artigo é escrito no âmbito da minha particularidade de ser um pai de uma família numerosa.
“INVESTIR NA EMOÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE EMPRESAS E AS PESSOAS”
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or várias vicissitudes, sou quem realiza a maioria das compras para casa, nesse sentido, partilharei o meu exemplo concreto de tomada de decisão para selecionar qual a superfície comercial a escolher para realizar as nossas compras.
Depois, há dias em que vou comprar algo que só existe naquele supermercado e, ao contrário do que se possa pensar, a exclusividade de produto é um dos fatores que influencia, em média, 30% da minha tomada de decisão de onde realizar as minhas compras.
Quanto aos critérios de escolha e tomada de decisão, tenho vários parâmetros.
A novidade, os produtos regionais e produtos diferentes também são algo que valorizo quando sou surpreendido numa superfície comercial.
Antes de mais, já tenho na minha mente uma catalogação de banda de preços de vários produtos que, invariavelmente, estão em promoção de 40% a 60% e que, verdadeiramente, não estão em promoção. O preço destes mesmos produtos é o valor indicado falsamente por uma grande menção a promoção/desconto. São produtos que, ciclicamente, estão a preços de promoção e que, nesse sentido, é apenas comprar quando têm o seu real valor, que é o da promoção. Depois, tenho os produtos que considero que têm um valor justo de qualidade/preço e que vou comprando regularmente, sem estar à espera de grandes baixas de preços.
Por último, algo muito importante, e que é raro, são os laços emocionais e relacionais com os funcionários das superfícies comerciais. São poucos os locais onde tenho um relacionamento emocional com os mesmos, por vezes, são pessoas que vemos que estão ali só por estar, com pouca alegria, a olhar para o relógio para ver quantos minutos faltam para sair. Certamente, a culpa não será dos funcionários, mas, sim, de um sistema que está criado e que não estimula este tipo de interação e a satisfação dos colaboradores. Só para adicionar que a minha maneira de ser é muito dada a este tipo de relacionamento comercial.
Quando tenho que tomar a decisão de qual superfície escolher, é sempre em função do tipo de cabaz de compras que tenho que realizar, ou seja, o que vou comprar maioritariamente: carne, peixe, legumes, detergentes, bens de higiene pessoal, etc.
Tenho a noção de que apenas sou um dos muito milhares de clientes que frequentam estabelecimentos comerciais e que as variáveis que invoco não são universais, mas se me desafiassem a pensar um conceito de superfície comercial investiria em:
“A chave será investir na emoção entre as empresas e as pessoas e nas relações entre funcionários e clientes. Quase que diria que, num futuro próximo, tanto serão importantes, para as superfícies comerciais, bons gestores e marketeers como bons psicólogos e sociólogos”
• Funcionários felizes e que criassem relação com os clientes; • Produtos de qualidade superior a preço justo; • Produtos exclusivos da minha superfície comercial; • Promoções de produtos não óbvios e promoções flash. Hoje, os clientes são inteligentes e não vale a pena tentar inebriar com falsas promoções de “Xico Espertismo”, pois estas descredibilizam as próprias empresas e dotam os clientes de um sentimento de desconfiança. A chave será investir na emoção entre as empresas e as pessoas e nas relações entre funcionários e clientes. Quase que diria que, num futuro próximo, tanto serão importantes, para as superfícies comerciais, bons gestores e marketeers como bons psicólogos e sociólogos.
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MAIS RAZÕES PARA VIVER ONDE SE VIVE E NÃO SÓ DORMIR ONDE SE VIVE Todos temos mais ou menos a ideia ou a experiência da evolução do comportamento dos consumidores, nos últimos 18 meses: mais compras para a casa, mais compras para consumo em casa; mais compras online; elevada percentagem de ocasiões de compra com artigos promocionados (mais de 60%), mas de tudo o que penso ser o maior incremento, e que veio para ficar, é comprar onde me é mais conveniente e isso significa a melhor otimização de preço, horários e proximidade física possível.
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este cruzamento de eixos, surge o formato que mais valor terá, na minha visão, para os próximos anos: a conveniência.
lojas de conveniência PRIO e Shell, em Portugal, de que os preços dos artigos são, hoje, bem mais próximos do que alguma vez foram dos praticados nos super e hipermercados.
Os portugueses perceberam que têm cada vez mais razões para viver onde se vive e não só dormir onde se vive. Perceberam que, ao optarem pelas soluções que lhes estão fisicamente mais próximas, encontram um maior ajustamento entre o que realmente precisam e a oferta que lhes é proporcionada.
As lojas de conveniência estão abertas, em grande parte dos casos, cerca de mais 25% do tempo que outros espaços de consumo. A gama disponibilizada é cada vez mais eficaz, pois nos 50/60 metros quadrados de área média de vendas o consumidor encontra as categorias, marcas e artigos que mais se vendem no país.
Falo por experiência pessoal das funções que desempenho com responsabilidade sobre a gestão das redes de
A atividade promocional e oportunidades de compra de artigos alimentares e não alimentares também se encon-
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tram. Por exemplo, se um consumidor visitar as lojas PRIO ou Shell nas próximas semanas, não se surpreenda com uma oferta de pequenos domésticos, som portátil, óculos de sol, artigos de praia, bem convenientes e a preços bastante atrativos. Sim, a conveniência “is the new black”, disso não tenho dúvidas, pois, para além da oferta alimentar e não alimentar disponível a preços bem mais atrativos do que antes, dos horários alargados, da existência de outros serviços não possíveis ou comuns noutros formatos (lavagem/secagem de roupa, serviços de entregas de encomendas passíveis de serem levantadas 7/7 dias em, na maioria dos casos, mais de 16 horas por dia), as lojas de conveniência estão cada vez mais atraentes, flexíveis, dinâmicas e confortáveis para o consumidor. Estou certo de que o/a leitor(a) se reviu nestas linhas e, por isso, concordará comigo na evolução e crescimento certo deste formato, nos próximos anos. Neste particular contexto, a minha visão é que a venda promocionada será tanto menor quanto os retalhistas de conveniência continuarem a perseguir a sua maior eficiência operacional e a negociar de forma a que o consumidor não veja a conveniência como um custo, mas, sim, como um serviço acrescido para que os portugueses possam comprar melhor nos locais onde vivem.
Miguel Rangel
Diretor Operações Non-Oil PRIO e Shell
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“INDEPENDENTEMENTE DO CONTEXTO, AS MARCAS DEVEM FOCAR-SE EM GERAR CONFIANÇA, EXPERIÊNCIAS E BENEFÍCIOS DIFERENCIADORES PARA O CONSUMIDOR” Texto: Bruno Farias Foto: D.R.
A pandemia motivou crescimentos de vendas para as marcas de fabricante? E o que aconteceu no “confronto” entre as vossas marcas e as marcas próprias? A GSK é uma companhia farmacêutica global, impulsionada pela ciência, com um propósito especial: ajudar as pessoas a fazerem mais, sentirem-se melhor e viverem mais tempo. Na GSK, procuramos ajudar o consumidor a cuidar melhor da sua saúde, dotando-o de várias ferramentas (informação, produtos inovadores e de qualidade superior, amplitude de portfólio e treino aos nossos parceiros de negócio, para que possam fazer uma recomendação baseada em factos científicos) para que o consumidor tome decisões conscientes que o ajudem a cuidar da sua saúde.
A GSK viu a sua posição reforçada, quer no canal alimentar, quer nas farmácias, no rescaldo da pandemia. Em tempos de incerteza, o consumidor tende a privilegiar as marcas em que confiam, que saem vencedoras do “confronto” com as marcas próprias.
Nestes tempos de muita incerteza, uma companhia como a nossa, líder mundial em Consumer Health, teve a preferência do consumidor que optou por escolher as marcas em que tem maior confiança. Como tal, vimos a nossa posição reforçada, quer no caso do canal alimentar, quer nas farmácias, onde o comportamento do consumidor foi idêntico. Em geral, a nossa quota de mercado cresceu em marcas como Voltaren, Centrum, Sensodyne, Paradontax, Vibrocil, etc. Nas categorias onde operamos, tanto as marcas próprias do canal alimentar, como os genéricos nas farmácias perderam algum peso.
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“há inovações que irão garantir o futuro e a evolução das marcas, até porque todas as crises terminam um dia, e é preciso sair fortalecido das mesmas”
vavelmente, ainda, uma herança dos tempos da Troika. Categorias como saúde oral têm uma “promo share” acima dos 60%, pelo que tentámos não incrementar o nível promocional, mas, sempre, procurando soluções para cooperar com as dinâmicas promocionais dos nossos clientes. Assim, não considero que a promoção tenha sido a forma de reação mais importante, nem a mais efetiva. Acredito, sim, que a inovação ao nível de produto, iniciativas de desenvolvimento de categoria e educação do consumidor trazem maiores e mais sustentáveis taxas de crescimento, mesmo em tempos de crise.
Nelson Patrício
Head of Sales GSK Consumer Health
Na crise da Troika, a dinâmica promocional acabou ser a forma mais utilizada de reagir ao impacto da economia sobre o consumo. Essa ferramenta será, igualmente, a mais relevante no contexto atual? Esta crise foi distinta da da Troika, esta pandemia ensinou-nos a todos a importância de proteger a nossa saúde. A prevenção também é uma forma de cuidar da nossa saúde e o consumidor sabe que, com as nossas marcas, vai proteger a sua saúde. Para nós, esta foi a prioridade, assegurando distribuição e ferramentas para que todos possam cuidar melhor da sua saúde. Em termos de promoção, o mercado português já tem das maiores taxas, a nível mundial, pro-
A sensibilidade dos consumidores às propostas de valor vai tornar-se mais crítica. A sensibilidade aos preços ainda maior... Será a mecânica promocional a melhor arma para atuar no atual contexto de mercado, isto no caso do canal alimentar? Quando tanto se fala das alterações no consumo potenciadas pela pandemia, de que modo essas mesmas alterações se refletiram no sector farmacêutico? No canal alimentar, a promoção é usada, na maior parte dos casos, para aumentar vendas. Neste contexto de mercado, pode parecer a solução mais eficaz para inverter resultados, mas, na minha opinião, deve ser apenas mais uma ferramenta a utilizar na medida certa e, seguramente, não é “a solução”. Abusar da frequência promocional retira valor às marcas e categorias, o consumidor deixa de perceber a oportunidade e passa a ser a sua expectativa comprar apenas em promoção. Independentemente do contexto, as marcas devem focar-se em gerar confiança, experiências e benefícios diferenciadores para o consumidor e a promoção deve ser usada como uma “ferramenta” para dar a conhecer esses benefícios, premiar a fidelidade e acrescentar valor ao produto ou à categoria. No sector farmacêutico, verificámos que as
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marcas com maior notoriedade foram a escolha preferencial para a maioria dos consumidores, aumentando, em geral, a sua quota de mercado. A primeira grande mudança foi ao nível da experiência de compra na farmácia. Inicialmente o atendimento era feito através de um postigo e, posteriormente, já dentro da farmácia, mas numa fila ordenada, onde o mais importante era satisfazer o pedido do cliente rapidamente e passar ao cliente seguinte. Pode dizer-se que a compra se tornou num ato funcional, sem a possibilidade de navegação dentro do ponto de venda, a escolha foi, essencialmente, planeada, havendo pouco ou nenhum espaço para compras não planeadas ou por impulso. Outra grande alteração foi o decréscimo exponencial de algumas patologias. Com o recolhimento e o uso de máscara, houve uma quebra
Após mais de um ano de crise pandémica, a saúde converteu-se numa das principais preocupações dos consumidores, situando-se, mesmo, como um fator determinante na sua tomada de decisão. Esta é uma das principais conclusões do estudo “The Current State of Consumer Trust”, realizado pela Morning Consult. O papel das empresas do sector da saúde na gestão da pandemia fez com que tivesse aumentado a confiança nas mesmas, com um em cada cinco inquiridos a indicar confirmar mais nas mesmas face há um ano.
de consumo de produtos para gripe, constipação, tosse, entre outros. Obviamente, esta perda foi parcialmente mitigada pela procura de produtos relacionados com a pandemia, mas, em geral, foi um 2020 e um início de 2021 muito difíceis para o sector. O primado da marca faz-se sentir, com especial relevo, no canal farmacêutico? É possível apresentar inovação, mesmo em tempos de crise? Na GSK, a inovação é um dos nossos pilares estratégicos. Durante este período de pandemia, nada mudou para nós nesse sentido. Lançámos oito novos produtos no mercado. Na minha opinião, não só é possível como é necessário continuar a apostar em inovação. Por um lado, pode haver novas necessidades, como exemplo,
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lançámos o Centrum Immuno C, que é um produto que ajuda a fortalecer o sistema imunitário e, portanto, é muito relevante neste cenário pandémico. Por outro lado, há inovações que irão garantir o futuro e a evolução das marcas, até porque todas as crises terminam um dia e é preciso sair fortalecido das mesmas. A proximidade que sempre marcou a farmácia saiu ainda mais reforçada do contexto pandémico? Como se consegue manter esta proximidade numa altura em que o digital assume tamanha relevância? Para a GSK, a nossa relação e parceria com as farmácias é essencial. Neste contexto tão difícil, a nossa prioridade foi garantir que os nossos clientes tinham o suporte de qualidade que estão acostumados por parte da nossa equipa comercial. Para tal, tivemos de encontrar formas adicionais de os apoiar, pois os desafios eram maiores e alguns novos. Tivemos que encontrar novas formas de fazer uma visita, novas ferramentas digitais para facilitar a comunicação e, simultaneamente, ferramentas para simplificar a nossa relação comercial. Era fundamental garantir a segurança e saúde de todos, pelo que seguimos escrupulosamente todas as recomendações da Direção-Geral de Saúde e deixámos de visitar os clientes fisicamente, a equipa rapidamente adaptou-se a comunicar de forma remota, através de video calls, que não substituem a relação cara a cara, mas garantem uma presença e uma disponibilidade permanentes. Nestes tempos, fizeram-se contratos, negociaram-se atividades promocionais, lançaram-se novos produtos e resolveram-se os problemas de sempre e os novos, enfim, nada parou. A equipa da GSK adaptou-se muito rápido a novas formas de trabalhar e, em geral, conseguimos atender mais clientes por dia que anteriormente. Creio que este foi apenas um pequeno passo, é excelente poder voltar a visitar as farmácias dos nossos clientes, mas o digital está para ficar e, como normalmente, a evoluir a uma velocidade vertiginosa. Estou seguro de que vamos conseguir manter a nossa proximidade com os clientes e reforçá-la através do uso de mais e melhores tecnologias que nos simplifiquem a vida a todos. Em resumo, a nossa proximidade com a farmácia sai reforçada, por nos termos apoiado mutuamente durante um momento difícil e por termos desenvolvido novas formas de trabalho, que podemos combinar com as anteriores, sendo mais efetivos e prestando um melhor serviço.
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AS AVENTURAS DE ALICE NO PAÍS DAS PROMOÇÕES Armando Mateus
Chief Experience Officer
Foto: Sara Matos
OPINIÃO
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Falar de promoções em Portugal é como a estória de Alice, quando, ao seguir o Coelho Branco, cai numa toca que a transporta para um lugar fantástico povoado por estranhas criaturas, revelando uma lógica do absurdo, característica dos sonhos. Bem-vindos às aventuras de Alice no País das Promoções!
A
procura da pequena chave dourada para o maravilhoso mundo das promoções fez com que, hoje, Portugal seja dos países da Europa com maior peso da atividade promocional, a rondar metade das vendas, longe dos valores da década anterior (20%). Olhar para as prateleiras de um supermercado, para a quantidade de produtos em oferta e para a diversidade de dinâmicas promocionais é como quando Alice quer entrar na pequena porta que conduz ao jardim e bebe a poção para diminuir de tamanho, esquecendo-se, por completo, do mais importante, a chave, a sua real necessidade. A apetência pela obtenção de “um bom negócio” pelo consumidor conduziu a uma alteração de hábitos de compra, havendo categorias de produto a atingirem mais de 65% do peso das promoções, o que significa que a compra é adiada quando não existe promoção, que a quantidade média de embalagens comprada aumenta e que o consumidor opta por ter mais stock em casa. Mas será que o consumidor está, realmente, a poupar e manter o seu cabaz de compras ou, tal como Alice, vai crescendo e aumentado de tamanho e continua a gastar o mesmo? O orçamento do consumidor muda com a sua disponibilidade financeira, não muda com o pre-
ço efetivo dos produtos! Logo, Alice segue o conselho da Lagarta Azul e vai comendo um pouco de cada um dos lados do cogumelo e experimentando qual o tamanho certo, qual a melhor combinação de promoções e de preços sempre baixos. A realidade das promoções não é apenas algo característico do mundo do retalho e do grande consumo, é uma epidemia que já contagiou outros sectores, fazendo com que todas as ofertas venham embrulhadas num grande sorriso característico do Gato de Cheshire. Mas este é um mundo em que todos parecem loucos, onde é necessário um mapa para navegar e onde as contas não são tão sim-
“A REALIDADE DAS PROMOÇÕES NÃO É APENAS ALGO CARACTERÍSTICO DO MUNDO DO RETALHO E DO GRANDE CONSUMO, É UMA EPIDEMIA QUE JÁ CONTAGIOU OUTROS SECTORES, FAZENDO COM QUE TODAS AS OFERTAS VENHAM EMBRULHADAS NUM GRANDE SORRISO CARACTERÍSTICO DO GATO DE CHESHIRE”
ples como quando Alice pergunta ao Grifo quantas horas ele estuda por dia e este responde “Dez horas no primeiro dia, nove no seguinte e assim por diante”, concluindo-se: “nesse caso, no décimo-primeiro dia era feriado?”. Ainda recentemente, deparei com uma promoção de viagens em Portugal com 14 datas possíveis e quatro opções de hotéis, mas cujo enigma era tal que, nas três primeiras datas só no hotel mais barato, as quatro seguintes nos dois hotéis mais baratos e aí por diante, até que o hotel mais caro só estava disponível em apenas uma data em outubro… uma verdadeira escala logarítmica invertida! Mas de quem é a responsabilidade deste nível de loucura? Das marcas? Dos retalhistas? Quem faz o papel da Rainha de Copas que quer cortar a cabeça de todos e quem faz o papel do Rei de Copas que vive na sombra da rainha e que a todos vai perdoando? Como em tudo na vida, a resposta não é simples, existem os Chapeleiros Loucos que tudo pedem e tudo dão, existem os Arganazes que permanecem adormecidos durante a maior parte do tempo, como se nada fosse com eles, olhando e assobiando para o lado, numa expressão de altivez. Mas, piores talvez sejam os Coelhos Brancos, que de tudo têm medo, que de tudo fogem e que, no fim, se tornam manipuladores. A dura realidade mostra que mais de metade das promoções são ineficientes e que, nas restantes, poucas vendas adicionais são geradas. Então, porque se continua a fazer o mesmo? Porque não se para e se avalia o que deve ser repetido e o que deve ser abandonado? A resposta está, certamente, na síndrome do “first mover”, onde todos sabem que o devem fazer, mas têm medo de o fazer porque os restantes podem não o fazer e, assim, perder a sua posição. Desta forma, o que está reservado para o futuro de Alice no País das Promoções? Será que o consumidor, tal como Alice, terá de ultrapassar ainda mais obstáculos, tal como as etapas de um jogo de xadrez, para se tornar rainha? Ou será que, tal como o reflexo no espelho, tudo será invertido e o consumidor se afastará cada vez mais das promoções, ficando no mesmo lugar a aguardar a lógica mais simples do preço barato todos os dias? A palavra cabe ao rei e à rainha de copas, às marcas e aos retalhistas!
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A crescente perda de poder de compra por parte das classes mais baixas está a obrigar as empresas a repensar a sua equação de valor/ preço. Desde os anos 1980 que a brecha entre os mais ricos e os mais pobres tem aumentado, um fenómeno que se observa a nível mundial e que tenderá a ampliar, ao longo da próxima década. Segundo a Bain & Company, para as empresas nos mercados de consumo, o preço mais acessível e o serviço são, obrigatoriamente, termos daquela equação, uma vez que muitos dos segmentos têm de servir, também, os consumidores de menores rendimentos. Se algumas famílias privilegiam, sobretudo, a conveniência e outras baseiam as suas escolhas na ligação emocional que mantêm com as marcas, outras ainda buscam avidamente por descontos.
SERVIR O CONSUMIDOR NUMA ALTURA DE DESAPARECIMENTO DA CLASSE MÉDIA
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ntender de que modo os consumidores de menores rendimentos percecionam a noção de valor, e ser capaz de o entregar economicamente, mesmo em épocas mais turbulentas, será essencial para que o retalho supere um dos seus mais importantes desafios, o da fidelização. A pandemia e os confinamentos e encerramentos de vários negócios estão a pressionar quer as famílias na base da pirâmide de rendimentos, quer a própria classe média. Contudo, nota a Bain & Company, para as empresas nos mercados de consumo, será um erro considerar o preço baixo como o único argumento a usar ao servir aqueles lares. Os consumidores com menores rendimentos também têm necessidades, desejos
Foto: Shutterstock Texto: Carina Rodrigues Foto: Shutterstock
e prioridades tão variados como os que se situam nos estratos mais acima. A Covid-19 tem vindo a complicar o desafio das empresas se ligarem aos consumidores e entregarem valor ao preço certo. Nos últimos meses, os consumidores valorizaram, ainda mais, aspetos como a segurança, a redução da ansiedade e o sentimento de pertença como valores que privilegiam nas marcas. Mas, a par destas prioridades, as empresas deverão considerar a tendência de longo prazo da divisão social, que afeta vários aspetos da vida económica e em sociedade, da alimentação aos cuidados de saúde. A consultora nota como são cada vez mais as pessoas que recorrem aos bancos alimentares. Segundo as estimativas do Banco Mundial, a crise económica derivada da pandemia irá empurrar entre 88 milhões e 115 milhões de pessoas
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para a pobreza extrema, o que significa que sobrevivem com menos de 1,9 dólares por dia, ou seja, menos de 1,56 euros por dia.
cana identificou um outro segmento de consumidores, para quem a conveniência é tão ou mais importante que o preço.
Independentemente de quando a pandemia acabe ou da forma e ritmo da recuperação económica, esta crescente divisão entre os mais ricos e os mais pobres irá forçar as empresas a realinhar as suas propostas. Terão de entregar diferentes formas de valor a um grupo de menores recursos financeiros que não para de aumentar, mas também a um outro grupo mais pequeno, que conseguiu aumentar as suas poupanças e dispõe de mais poder de compra.
Até porque, apesar de, a nível individual, os consumidores com menores rendimentos gastarem menos que os mais abastados, o seu poder de compra coletivo irá continuar a crescer, assim como as suas expectativas. “Retalhistas como o Aldi têm sido bem-sucedidos a servir estes consumidores através de inovações na distribuição, na cadeia de abastecimento, na formulação dos produtos, no packaging e nos serviços digitais. Em qualquer dos níveis da pirâmide, entender como os consumidores percecionam o conceito de valor e ser capaz de entregar esse valor economicamente, mesmo em tempos turbulentos, é essencial para conquistar a sua fidelidade”, alerta a consultora.
Erosão da classe média Segundo a Bain & Company, a classe média está em erosão, apesar de muitas pessoas ainda se identificarem como pertencendo a este estrato social. Os consumidores cuja situação financeira se tornou mais precária terão de se adaptar, o que obrigará as empresas a reconsiderarem as suas estratégias, de modo a continuarem a servi-los. “Começando pelo mais óbvio, o preço dos produtos e os serviços têm de ser acessíveis para os lares com um orçamento mais constrangido. Contudo, preços baixos não significam encetar um nivelamento por baixo, mas, sim, usar ferramentas como as compras em volume, os descontos e os preços dinâmicos para definir os posicionamentos de preço”, diz a consultora. Emoções e conveniência também importam Do mesmo modo que os consumidores mais abastados, os shoppers com menores rendimentos são também motivados por outras prioridades que não somente o preço. Também eles se acostumaram a uma maior variedade de escolha e têm ligações emocionais com certas marcas. Em algumas categorias, também optam por comprar produtos biológicos e locais. A pesquisa da Bain junto de dois mil consumidores norte-americanos revelou que, apesar de uma larga maioria dos lares economicamente mais afetados ter revisto os seus gastos, durante a pandemia, cerca de 40% continuou a dar-se a certos luxos que considerava especiais, em categorias consideradas premium, equilibrando os orçamentos através da compra de marcas próprias e de produtos low cost nas categorias que não consideravam tão importantes. A Walmart reconheceu particularmente bem esta dinâmica. Com base na observação do comportamento dos consumidores nas suas lojas, a retalhista norte-ameri-
Promoções Sendo as promoções um elemento essencial desta equação, um outro estudo da Bain & Company sustenta que as mudanças potenciadas pela pandemia no comportamento dos consumidores irão, também, permitir ao retalho repensá-las. “O recurso excessivo das promoções prejudicou a sua eficácia para muitos retalhistas, afetando significativamente a sua rentabilidade e potenciando uma erosão da perceção de valor por parte dos consumidores”, sublinha. A consultora alerta que uma nova abordagem às promoções poderá gerar um aumento de 2% na margem bruta. Segundo a Bain & Company, os retalhistas têm apenas uma compreensão limitada de que promoções geram um maior retorno do investimento, quais as que atingem meramente o break-even e quais as que perdem dinheiro. Além disso, defende, os retalhistas frequentemente utilizam as promoções pelos motivos errados, como, por exemplo, atingir os objetivos semanais de vendas, em vez de se considerarem os objetivos de longo prazo da fidelização. As pesquisas conduzidas pela Bain & Company indicam que, no rescaldo das disrupções trazidas pela pandemia, os consumidores tenderão a comprar mais online no futuro, pelo que as estratégias promocionais deverão integrar esta maior proeminência do e-commerce.
Com base na observação do comportamento dos consumidores nas suas lojas, a Walmart identificou um outro segmento de consumidores, para quem a conveniência é tão ou mais importante que o preço
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Em 2020, a dunnhumby lançou o primeiro dos seus estudos globais “Consumer Pulse”, projetados para acompanhar as mudanças no comportamento do consumidor como resultado da pandemia. 12 meses depois, ainda estamos a lidar com o impacto da Covid-19. Entrámos em 2021 com progresso na luta contra o vírus, com programas de vacinação bem-sucedidos a oferecerem uma luz no fim do túnel em muitos países. Contudo, o vírus ainda persiste. Em muitas regiões, as taxas de infeção estão a aumentar, ao mesmo tempo que os governos realizam o maior programa de vacinação da história. Assim, é pertinente voltar-se a analisar o quanto as coisas mudaram para os retalhistas e os consumidores e o que, se alguma coisa, permaneceu igual.
COVID-19: UM ANO DEPOIS E AS MUDANÇAS NO RETALHO ALIMENTAR Texto: Bárbara Sousa Foto: Shutterstock
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ma das principais questões em que a pesquisa da dunnhumby se concentrou, no ano passado, foi a atitude global geral em relação à pandemia. Expressa na forma de um “Worry Index” (“índice de preocupação”), essa pontuação reflete até que ponto os consumidores dizem estar preocupados com a propagação do vírus. De uma alta de 34%, em março de 2020, o Worry Index reduziu constantemente, ao longo de 2020, conforme os consumidores se adaptaram à vida pandémica, com alguns países a verem uma redução nos casos. No entanto, desde novembro, com o aumento das taxas de infeção e o aparecimento das novas variantes, também aumentou o nível de preocupação dos consumidores. A pontuação global permaneceu constante em 2021, com um quarto dos consumidores a classificar-se como “preocupado”. Para os retalhistas, este é um indicador claro de que as preocupações dos clientes não desapareceram e mostra que, agora, não é hora de relaxar, prescreve a dunnhumby. Embora haja uma luz no fim do túnel, muitos consumidores ainda estão a ser cautelosos e as respostas dos retalhistas devem refletir isso mesmo. Por exemplo, durante a pandemia, os retalhistas foram pressionados a perder negócio de clientes que não quiseram usar máscaras, em oposição a clientes que apenas frequentam lugares que as exigem, e esse desafio é ainda mais acentuado porque várias regiões estão a começar a eliminar as restrições relativas ao seu uso. Recentemente, quando o estado norte-americano do Texas acabou com as restrições quanto às máscaras, em 10 de mar-
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ço, tanto o H-E-B quanto a Kroger anunciaram que ainda exigirão que todos os funcionários e clientes as usem, até que todos os colaboradores tenham acesso à vacina contra a Covid-19. O nível de preocupação do consumidor varia entre os países. A Coreia continua a ser o mercado com maior nível de preocupação, com a Noruega e a China do lado oposto. Apenas os Estados Unidos da América mostram uma mudança significativa no nível de preocupação, desde novembro, caindo de 32% para 23%. Embora a maioria dos consumidores já não concorde que restaurantes e bares devam estar fechados, ainda estão a tomar precauções individuais e estão a fazê-lo em níveis semelhantes aos do início da pandemia. Shoppers procuram valor Segundo a dunnhumby, três fatores estão a comprimir os orçamentos familiares e a colocar o valor na frente do processo de tomada de decisão dos clientes: os consumidores estão a gastar mais com comida para casa do que antes da pandemia, estão a ver aumentos nos preços e estão preocupados com a sua situação
financeira pessoal, bem como com a economia do seu país. Assim, os shoppers estão a procurar, cada vez mais, encontrar valor. Comprar em lojas de baixo custo e pesquisar online as melhores vendas são os exemplos mais frequentes que os clientes dão como estratégias para economizar dinheiro, com mais de 80% dos compradores a usar, pelo menos, uma delas. Muitos retalhistas líderes responderam antecipadamente, como a Tesco, que redefiniu a sua oferta de valor, investindo na correspondência de preços com os discounters. As marcas de fabricante também desempenham um papel fundamental na procura por valor, com um em cada quatro consumidores a preferir esta opção, aproximadamente o mesmo número que afirma estar a comprar marcas com o preço mais baixo. Na verdade, os dados mais recentes da Nielsen indicam que, desde o início da pandemia, nos Estados Unidos, as vendas de marcas de fabricante cresceram 29%, ultrapassando as vendas de produtos de marca própria, que cresceram 24%. Na Colômbia, a Éxito viu a sua marca Fres-
A pandemia de Covid-19 trouxe vários desafios para fabricantes e retalhistas, mas também criou novas oportunidades, em algumas áreas, com a marca própria a posicionar-se como uma potencial vencedora deste período, onde os consumidores optaram por visitar menos lojas e consumir mais em casa. Segundo a IGD, os confinamentos levaram ao teletrabalho e este criou novas oportunidades na área dos snacks. Os novos comportamentos refletiram-se em várias categorias, com os retalhistas a apostarem na inovação para destacarem as suas marcas, preparando-se para o esperado ambiente mais competitivo após se dissipar o impacto inicial da pandemia. Os dados do estudo ShopperVista mostram que a perceção dos produtos de marca própria cresceu, em 2020. A título de exemplo, na Grã-Bretanha, 71% dos shoppers manifestou-se muito satisfeito com a qualidade dos produtos de marca própria, com 66% a indicar confiar tanto nestes produtos como nos de marca de fabricante.
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campo crescer 30% durante a pandemia. E, durante a crise, cerca de um quarto dos consumidores experimentou marcas próprias, pela primeira vez. Online vai ficar A mudança para o online foi acelerada pela Covid-19 e essa tendência não mostra sinais de reversão. Em março de 2020, aumentou o número de clientes que compram online e, ao contrário de outros comportamentos de compra, a tendência ficou mais forte. O canal digital é particularmente forte na maior parte da Ásia e América Latina, onde parceiros de entrega, como a HappyFresh no sudeste asiático e Weee na Coreia, Grab na Malásia e Rappi na Colômbia, permitiram que os supermercados aumentassem a sua capacidade online. É de realçar que os serviços de entrega ao domicílio emergiram como o tipo de oferta online utilizada com mais frequência. Três mercados asiáticos lideram em quota, enquanto os mercados da Europa Central (e Irlanda) estão na extremidade inferior, com uso menos frequente. A entrega é o modo dominante na maioria das compras, com o “click and collect” a ser usado com mais frequência na China e em França. Ainda assim, o número de idas à loja aumentou, o que corresponde ao crescimento geral das viagens semanais de compras. É provável que seja o resultado dos clientes se sentirem cada vez mais confortáveis com as compras na loja, o seu desejo de retornar ao normal pré-pandémico e a experiência na loja a melhorar, conforme demonstrado pelo aumento do nível de satisfação. Também é notável que os consumidores afirmam estar tão felizes com as suas experiências online quanto com a experiência na loja. Os retalhistas estão, claramente, a ter um bom desempenho, visto que o nível de satisfação aumentou em todas as opções, afirma a dunnhumby.
Consumo em casa Enquanto os restaurantes permanecerem fechados, ou com capacidade limitada, as aventuras gastronómicas continuarão em casa. Os dados recentes mostram que o consumo de comida no restaurante, seja no restaurante ou via entrega, aumentou (embora também tenha diminuído desde o pico de setembro), enquanto o número de clientes que afirmam estar a comer em casa mais do que antes do início da pandemia tem diminuído. À medida que as visitas a restaurantes aumentam, o consumo em casa perde participação. Mas quatro em cada 10 compradores continuam a dizer que comem em casa mais do que antes.
A IGD destaca que a evolução dos comportamentos de compra, durante os confinamentos e restrições implementadas durante a pandemia, representou uma oportunidade real para fazer crescer a notoriedade e a experimentação dos produtos de marca de distribuição. Para capitalizar este contexto, o retalho apostou na melhoria dos produtos e no packaging para se destacarem nas prateleiras e ativou as suas marcas de novas formas quer nas lojas, quer online, de modo a aumentar a sua visibilidade junto dos shoppers.
A Covid-19 tornou as pessoas mais conscientes do que nunca da importância de um estilo de vida saudável e existe, claramente, uma mudança na forma como compram. Um em quatro compradores diz que está a comer mais alimentos biológicos e um em cada três compra produtos com foco em manter-se saudável. Destaca-se que são os consumidores pontuados como preocupados no Worry Index os mais propensos a comprar produtos para se manterem saudáveis. Confiança Enquanto navegamos esta crise, o público precisa de confiar que as instituições farão o que é acertado, sejam as autoridades governamentais ou o supermercado. Ao longo deste estudo, a dunnhumby descobriu que as lojas costumam ser mais confiáveis do que os órgãos governamentais. E, embora a confiança em ambos tenha diminuído, continuamente, à medida que a pandemia evoluiu, as lojas permanecem 20 pontos acima dos governos aos olhos dos consumidores. O estudo da dunnhumby mostra que certas ações dos retalhistas, como falta de stock, limites de quantidade ou redução de horas, tiveram um ligeiro impacto negativo na satisfação do cliente. Embora os compradores de hoje estejam menos propensos a notar essas ações, três em cada quatro reportam ter visto, pelo menos, uma. Os compradores reconhecem que são necessárias, mas, ainda assim, saem menos satisfeitos com a sua experiência. Depois de um ano a viver numa pandemia, há sinais de fadiga. Para ajudar os compradores no que se espera ser o início do fim, os supermercados precisam trilhar um caminho estreito entre a satisfação e a segurança do cliente. O sector de retalho alimentar mudou significativamente, nos últimos 12 meses, e muitas dessas mudanças, sem dúvida, vieram para ficar. Mas, ao colocar o cliente em primeiro lugar em cada decisão, os retalhistas podem continuar a manter a confiança e a lealdade dos seus shoppers.
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10 TIPOS DE CONSUMIDOR NO PÓS-COVID Texto: Bárbara Sousa Foto: Shutterstock
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caminho para a compra abrange os hábitos de compra e a tomada de decisões dos consumidores, desde os “drivers” iniciais e motivações, até os canais de compra preferidos e características influentes. Assim, para a Euromonitor, compreender o comportamento e as preferências do consumidor em todos os estágios da viagem de compras é fundamental, permitindo que as empresas criem estratégias de marketing e vendas direcionadas. Com os consumidores a receberem mensagens constantes sobre novos produtos e serviços, as empresas precisam de alinhar as suas ofertas e a experiência de compra com as necessidades dos consumidores para se destacarem da concorrência e permanecerem bem-sucedidas. Nesse sentido, a Euromonitor apresenta uma segmentação baseada nas atitudes e características pessoais dos consumidores, como o consumo de media, comportamentos de compra e aspirações individuais, capacitando as empresas a pensarem criativamente sobre os seus clientes potenciais e a criarem produtos e campanhas adaptados aos interesses e atitudes.
Agrupar consumidores, exclusivamente, por dados demográficos, para analisar o seu comportamento de compra e de tomada de decisão, pode dar uma visão distorcida dos seus hábitos diários e escolhas a longo prazo. Assim, a série anual “Consumer Types” da Euromonitor International vai além da demografia padrão, traçando 10 perfis distintos de consumidores, determinados pela sua personalidade e estilo de vida, a nível global e nacional.
Impulsive Spender O Impulsive Spender está interessado nas últimas tendências (66%) e tenta acompanhá-las por meio da atividade nas redes sociais e envolvimento com a marca. No entanto, é muito mais propenso a valorizar experiências em vez de posses materialistas. Este consumidor gosta de fazer compras e está disposto a navegar as lojas online e offline, mesmo quando não planeia comprar. Porém, a sua experiência de compra precisa de ser adaptada às suas necessidades e características individuais. Embora seja cauteloso ao partilhar informações pessoais online, está disposto a fazer concessões se isso lhe permitir aceder e experimentar produtos e serviços que atendam às suas necessidades e valores. Quando compram, os Impulsive Spenders são movidos por preços baixos, valor e qualidade (53%), muitas vezes, fazendo compras impulsivas se acreditarem que encontraram uma pechincha. Juntamen-
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Devido à incerteza financeira, perda de empregos e recessões económicas, muitos consumidores focaram-se no seu próprio bem-estar pessoal e segurança financeira futura, participando de mais hábitos de poupança e dando importância à felicidade individual
te com a probabilidade de experimentar novos produtos, estão abertos a comprar produtos de marca própria a par dos de marcas conhecidas e itens de luxo, se estiverem dentro do seu orçamento e tiverem características que se alinham com os seus valores pessoais. Os consumidores nesta categoria procuram conveniência nas suas vidas e, frequentemente, estão dispostos a pagar para o conseguir. O seu estilo de vida é uma mistura perfeita de plataformas e serviços online com atividades da vida real. Marcas e empresas que ofereçam uma experiência de compra “cross-channel”, adaptada às necessidades do consumidor, vão ressoar positivamente. Minimalist Seeker O Minimalist Seeker concentra-se em viver um estilo de vida simples e dá muita importância à sustentabilidade e aos temas comunitários. Raramente compra produtos não essenciais (44%) e é improvável que tome decisões de compra impulsivas, muitas vezes, gastando tempo a pesquisar produtos e serviços antes de fazer uma compra. Além de estar aberto a experimentar novos produtos, não tem grande lealdade a marcas e produtos específicos, portanto, irá mudar os seus hábitos de compra. Os Minimalist Seekers querem qualidade e estão dispostos a pagar mais por isso, se isso significar que as suas compras terão longevidade. O foco na longevidade e na redução do desperdício significa que tendem a reparar produtos, em vez de comprar novos, e a comprar em segunda mão. Adicionalmente, este tipo de consumidor valoriza o tempo, muitas vezes, privilegiando serviços convenientes e rápidos que lhes permitam viver um estilo de vida bem equilibrado. E colocam muita ênfase em atividades, como exercício regular, cozinhar, passar tempo com eles próprios e com a família imediata ou amigos íntimos (79%). É improvável que invistam na sua imagem e status pessoal, ou sigam as tendências mais recentes. Portanto, são um público-alvo perfeito a quem apresentar inovações em produtos, novas marcas e empresas se estiverem alinhados com os seus valores.
Secure Traditionalist O Secure Traditionalist é, acima de tudo, determinado. É improvável que dê importância à sua imagem e, raramente, segue as tendências mais recentes. Este tipo de consumidor pode ser difícil de influenciar, pois poucas vezes faz compras por impulso ou experimenta novos produtos e, geralmente, limita-se a comprar itens essenciais. Estes consumidores são frugais nos seus hábitos de compra, frequentemente concentram-se em preços baixos e dão grande importância à poupança de dinheiro. Os descontos e ofertas, às vezes, podem influenciar os seus hábitos de compra, levando-os a escolher a alternativa mais barata (20%). Os Secure Traditionalists não apreciam a experiência de compra (21%), portanto, quanto mais convenientes e eficientes os retalhistas e as marcas tornarem o processo de compra, maior será a probabilidade de os consumidores dessa categoria fazerem compras repetidas. Embora tenham-se tornado mais confortáveis com o uso da tecnologia, nos últimos anos, ainda valorizam os serviços de compras na loja e são mais propensos a fazer as suas pesquisas e compras na loja física. Nos anos anteriores, o Secure Traditionalist tem aumentado, progressivamente, o uso de tecnologia e plataformas de Internet, no entanto, a Covid-19 acelerou esta utilização, o que abre uma nova oportunidade e um novo canal para as empresas atingirem este consumidor. Empowered Activist O Empowered Activist valoriza o seu bem-estar pessoal e também as questões globais, geralmente, procurando produtos com características ou reivindicações “verdes” e de sustentabilidade e investindo tempo a pesquisar produtos que se alinham com os seus valores (67%). Os produtos e serviços devem ser claramente rotulados e ter preços competitivos para chamar a sua atenção.
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mente itens premium e conhecidos, mesmo que precisem de pagar mais.
Embora estes consumidores sejam movidos por uma boa relação qualidade/preço e custos baixos, também se mantêm leais à marca e ao produto. Além disso, limitam-se a compras que foram testadas e comprovadas e estão dispostos a pagar mais por produtos que sabem que vão funcionar. Consumidores com esse perfil investem em experiências e tendem a gastar o seu tempo e dinheiro em atividades que promovam a sua própria felicidade. Isso pode ser por meio de férias e experiências culturais, bem como ajudar os necessitados através de trabalho voluntário, apoio a caridades e participação em protestos. Estes consumidores expressam os seus valores em questões globais e, muitas vezes, esperam que as empresas e marcas que compram partilhem estes valores. Os Empowered Activists priorizaram sempre questões globais, como política, direitos humanos e ambiente (78%). No entanto, as suas prioridades mudaram ligeiramente para questões mais locais e bem-estar pessoal desde a pandemia. Undaunted Striver Os Undaunted Strivers aproveitam a vida e não se preocupam muito em planear o futuro. Em vez disso, preferem gastar dinheiro em vez de economizá-lo e fazem compras impulsivas, regularmente. Investem e priorizam o seu status e imagem para se distinguir (83%), dando grande importância ao que os outros pensam, além de se manterem atualizados com as últimas tendências e estilos. Em comparação com outros tipos de consumidores, os Undaunted Strivers são mais despreocupados nos seus hábitos de consumo. Estes consumidores gostam de experimentar novos produtos e experiências com marcas diferentes, além de procurarem ativa-
A consciência da imagem e o interesse contínuo nas últimas tendências podem facilitar a tarefa de influenciar este consumidor. Embora tenha grande probabilidade de ser influenciado por todos os canais de marketing, tem um interesse crescente no digital, nas redes sociais e no aval de celebridades. Estas plataformas, geralmente, apresentam um estilo de vida que os Undaunted Strivers desejam reproduzir. Também é possível que levem em consideração gostos e preferências pessoais, como quem seguem nas redes sociais, tornando mais provável que as campanhas tenham repercussão. Este tipo de consumidor também tem grande probabilidade de priorizar experiências (87%) e posses materialistas, muitas vezes, procurando experiências culturais à medida e centradas no consumidor. Conservative Homebody Os Conservative Homebodies são cuidadosos com a forma como gastam dinheiro. É pouco provável que procurem ativamente marcas conhecidas e produtos premium ou se preocupem em seguir as últimas tendências. Em vez disso, geralmente, limitam-se a compras essenciais e dão muito mais importância a gastar tempo em si mesmos e ente queridos, do que com bens materiais (73%). Embora possam não estar necessariamente a gastar dinheiro, os Conservative Homebodies aproveitam a experiência de compra e navegam pelas lojas. Experiências de compra memoráveis e únicas, como promoções especiais, lojas pop-up e coleções por tempo limitado, podem atrair estes consumidores e levar a compras por impulso ocasionais. Adicionalmente, consideram as crenças espirituais uma parte importante da sua vida (44%). Estes consumidores não têm lealdade a um produto ou marca, portanto, produtos novos no mercado ou empresas podem prosperar nesta categoria se tiverem preços competitivos e fornecerem as mesmas características que as suas compras regulares. Inspired Adventurer Os Inspired Adventurers são cautelosos, muitas vezes, procurando produtos de qualidade, como marcas bem conhecidas e premium, e uma boa relação qualidade/ preço. É improvável que este consumidor
dê importância à sua imagem ou status pessoal. Em vez disso, as suas decisões de compra são influenciadas pelo preço e, por isso, tende a oscilar entre marcas e produtos, dependendo do custo. Estes consumidores estão dispostos a experimentar novos produtos e serviços, especialmente se tiverem preços competitivos e contiverem as mesmas características das suas compras habituais. Os Inspired Adventurers estão focados no futuro, muitas vezes, economizando dinheiro e planeando com antecedência. Adicionalmente, são continuamente inspirados a aprimorarem-se (66%), seja por meio da sua carreira, saúde, questões globais ou relacionamentos com familiares e amigos. O bem-estar físico e mental é muito importante e fazem, frequentemente, exercício, tomando medidas preventivas contra o envelhecimento, como o consumo regular de vitaminas e suplementos, e seguindo uma dieta equilibrada (47%). Estas metas de vida são extremamente importantes e têm grande probabilidade de influenciar as suas ações e comportamentos, em geral. O Inspired Adventurer dá importância às experiências, mas é improvável que invista muito dinheiro nas mesmas. Também é improvável que goste de fazer compras, geralmente. conduzindo pesquisas online antes de comprar. Os consumidores com estas características também preferem transações rápidas e serviços de compras convenientes. Cautious Planner Os Cautious Planners, muitas vezes, decidem o que vão comprar antes de fazer uma compra e é improvável que se desviem das suas listas para fazer compras por impulso em itens não essenciais (61%). Além disso, são altamente propensos a realizar pesquisas aprofundadas online e na loja antes de fazer compras, para garantir que estão totalmente cientes das características e das ofertas de valor, muitas vezes, dedicando tempo para ver de perto as etiquetas e avaliações adicionais, antes de tomar a sua decisão de compra (49%).
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É improvável que os Cautious Planners sejam influenciados pelas últimas tendências ou sintam a necessidade de acompanhar os desenvolvimentos de novos produtos. Embora atribuam importância à qualidade e a marcas bem confiáveis, economizar dinheiro é extremamente importante para estes consumidores e estão dispostos a desviar-se das suas compras habituais se um produto alternativo tiver uma melhor relação qualidade/preço. Por fim, é altamente provável que se concentrem no futuro e, frequentemente, procuram maneiras de economizar dinheiro para um futuro financeiro melhor. Self-Care Aficionado O Self-Care Aficionado coloca muita importância e foco em si mesmo. Isso inclui priorizar a sua saúde e bem-estar, com exercício físico regular (56%) e ingestão vitaminas e suplementos, juntamente com uma dieta equilibrada. O seu foco interior não é apenas físico e é propenso a priorizar o tempo para si próprio e amigos próximos e familiares, bem como procurar a espiritualidade nas suas escolhas diárias (85%). A maioria dos Self-Care Aficionados está contente com a vida e não se preocupa muito com a sua imagem pessoal, simplificando a sua vida ou usando a tecnologia. Embora prefiram conveniência e gostem de usar tecnologia de vez em quando, esta não é a força motriz da sua vida. Também é improvável que sejam influenciados por questões globais, como a sustentabilidade, ao invés disso, concentram o seu tempo e energia em si mesmos. Embora seja improvável que este tipo de consumidor gaste muito com bens materiais, prioriza os gastos com viagens internacionais e experiências culturais. Balanced Optimist Os Balanced Optimists são consumidores pragmáticos e cautelosos com a forma como compram, mas também dão muita importância à sua felicidade pessoal (73%), frequentemente, fazendo pequenas compras impulsivas para oferecer a amigos e à família, ou mesmo a si próprios. Embora estes consumidores procurem marcas fortes e produtos premium, ocasionalmente, também valorizam os preços baixos e procuram produtos com preços competitivos. Além disso, também gostam de experiências, muitas vezes, preferindo enriquecer as suas vidas aprendendo sobre diferentes culturas, e valorizam o tempo que passam consigo mesmos, bem como com a família e amigos próximos, e as atividades de lazer.
Os Balanced Optimists são indiferentes às compras e, provavelmente, vão procurar experiências e serviços simples e convenientes que lhes permitam fazer a tarefa rapidamente, simplificar as suas vidas e permitir que dediquem mais tempo às atividades que valorizam (62%). Este tipo de consumidor tende a concentrar-se na sua própria vida, em vez de dar importância a questões globais, como sustentabilidade ou a política. E está particularmente otimista de que as suas ações atuais lhe proporcionarão um futuro brilhante, muitas vezes, citando que será mais feliz e melhor financeiramente nos próximos cinco anos. Impacto da Covid-19 Tendo em consideração o número de questões políticas, ambientais e de direitos humanos que foram descobertas em 2020, mais consumidores sentiram que precisavam de agir, este ano. Como resultado, a análise de 2021 da Euromonitor International mostra que houve um aumento no número de consumidores que foram categorizados como Undaunted Strivers e Empowered Activists. Alternativamente, devido à incerteza financeira, perda de empregos e recessões económicas, muitos consumidores focaram-se no seu próprio bem-estar pessoal e segurança financeira futura, participando de mais hábitos de poupança e dando importância à felicidade individual. Estas mudanças no comportamento podem ter resultado no aumento do número global de Secure Traditionalists e Balanced Optimists. Com os cenários político, social e online em rápida mudança, é mais importante do que nunca para as marcas e empresas se alinharem com os valores e estilos de vida dos consumidores, para terem sucesso no futuro, conclui a Euromonitor International.
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Digital Enthusiast Embora nas análises de 2019 e 2020 se tenha identificado um Digital Enthusiast, com grande afinidade com o mundo digital, muitas vezes, escolhendo experiências virtuais em vez da vida real e preferindo plataformas online para fazer compras e também para comunicar, este encontra-se ausente em 2021. Devido à pandemia, muitos consumidores foram forçados a alterar os seus hábitos e comportamento devido aos confinamentos e outras políticas governamentais que restringiram o movimento. Assim, as compras online, a comunicação e os eventos virtuais foram procurados por muitos consumidores que queriam uma forma de se conectar com o mundo. Devido ao aumento do uso da Internet pela maioria dos consumidores globais, as características que definiam o Digital Enthusiast deixaram de ser exclusivas deste tipo de consumidor e, em vez disso, foram aplicadas a todos os 10 perfis de consumidor.
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O FUTURO DO RETALHO ALIMENTAR NA EUROPA Texto: Bárbara Sousa Foto: Shutterstock
As mudanças no consumo estão a criar uma oportunidade atraente para o retalho alimentar capturar quotas de mercado nos próximos dois a três anos, garante uma análise da McKinsey. No entanto, tanto o crescimento do online quanto a tendência por procurar mais valor vão colocar maior pressão sobre as margens dos supermercados, especialmente considerando que o mercado geral pode encolher com o regresso, em pleno, dos restaurantes e do sentimento de segurança. Assim, o retalho alimentar vai ter que se esforçar para obter mais eficiência e encontrar novas formar de gerar margem, para crescer com rentabilidade.
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ma pesquisa, realizada pelo EuroCommerce e pela McKinsey, em toda a Europa, identificou quatro tendências principais que devem moldar o retalho alimentar nos próximos anos. O online torna-se essencial, a procura por valor volta a reinar, parte do consumo volta a transferir-se para fora de casa e o estilo de vida do consumidor impulsiona a procura, através do foco em saúde, sustentabilidade e conveniência. A combinação do crescimento online contínuo, após o pico de penetração, em 2020, com a procura de valor, assim como a reabertura dos restaurantes e a reativação do consumo fora de casa, provavelmente, colocará maior pressão na rentabilidade do
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A pesquisa da McKinsey identifica o “downtrading”, ou uma maior sensibilidade ao preço, como a tendência mais influente. É amplificada por uma expectativa de mais qualidade e valor acrescentado dos consumidores, ao nível do preço de entrada, colocando pressão nos retalhistas a nível do preço e da qualidade dos seus produtos retalho alimentar, nos próximos anos. Vai Os consumidores indicam que vão manter 18/05/2021 The future of grocery retail: New ways for growth | McKinsey ser necessário aumentar a eficiência, aleralguns dos seus comportamentos alterados ta a McKinsey, por meio da automação, por na era pós-Covid, revela a pesquisa da McKinexemplo, ou de um negócio online evoluísey. Em particular, até 10% dos consumidodo, e entrar em novas fontes de for margem, resthe diz CEOs que pretende continuarwe a gastar mais Following a record year sales in 2020, and consumers surveyed por meio da análise ou uma mudança para em supermercados e menos noutros canais that the European grocery stagnate do or decline over next one produtosexpect mais diferenciados e premium. “A market de will alimentação, que antes dathe Covid-19. O to velocidade e a magnitude destas mudanças que indica que os consumidores estão mais twoasyears as do COVID restrictions lifted. However, consumers planou to esperam keep irão mudar regras jogo 19 e criar novos are acostumados a cozinhar em casa vencedores e derrotados. Os retalhistas que continuar a trabalhar de modo remoto mais spending more on groceries after the pandemic subsides compared with before the tomem medidas eficazes para fazer face a frequentemente do que no passado. grandes pandemic, mudanças, suggesting como o crescimento that the do market will not return fully to pre-COVID 19 levels but canal online e o interesse dos consumidores Online torna-se “core” por produtos saudáveis, terão uma The oportuA magnitude pandemia of acelerou as of will remain slightly larger. timing and the likelydramaticamente future contraction nidade única de ganhar quota de mercado, vendas online de alimentos, uma tendência marketpela are highly uncertain and dependent on severalApós factors to aprovathe further ainda quethe a pressão eficiência se manteque vai manter-se. umalinked taxa de nha alta”, afirma Ana Paula Guimarães, Asção excecional nas compras online em 2020, evolution the COVID 19 crisis. sociate Partner na of McKinsey & Company. os consumidores estão ansiosos para fazer ainda mais compras em 2021. Assim, ganhar No entanto, consumidores planeiam quota de the mercado sem ganharwill no worsen online torIn lineoswith this, nearly half of CEOs expect that market situation in 2021 continuar a gastar mais em alimentação, na-se cada vez mais difícil. 25% dos consumisugerindo o mercado não retornadores anticipate que compraram através do will comércio andque remain highly uncertain. Just 26 percent that the situation improve. rá totalmente aos níveis pré-Covid-19, eletrónico, pelo menos ocasionalmente, quer The words ligeiramente CEOs most commonly with their expectations for 2021 mas permanecerá maior. O associate aumentar as suas compras online. E, are a pes“timing” e a magnitude da provável conquisa concluiu, quanto mais os consumidores “challenging,” “uncertain,” “price-focused,” “competitive,” “online” (Exhibit 2). tração futura do mercado são altamente compraram online and em 2020, maior a probabiincertos e dependem de vários fatores lilidade de aumentarem a sua participação nas gados à evolução da crise pandémica. compras online. Exhibit 2
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Consumers indicated that they plan to maintain some of their changed behaviors in the postpandemic era. In particular, up to 10 percent of consumers said they intend to keep spending more on grocery stores and less on other food channels than they did preNo entanto, a tendência de crescimento do e-commerce não se estende a todos os grupos de consumidores. Os consumidores que, no passado, raramente compravam produtos alimentares online (10%) planeiam cortar os seus gastos online (-4%). E dos consumidores que não compraram online em 2020 - a maioria, com 65% - apenas 7% disse que pretende começar a comprar online em 2021.
COVID 19.em This2020. couldNabeEuropa, because consumers have become more accustomed to em 2021, do que 34% dos consumidores inquiridos indicou que at home or because they expect to keep working from home more than they deseja cooking economizar dinheiro nas compras, em 2021, em comparação com 2020. Endid in the past (Exhibit 3). quanto 27% planeia pesquisar promoções de forma mais ativa e 17% deseja mudar para produtos Exhibit 3 mais baratos.
Os compradores online menos frequentes podem ter tido que recorrer a este canal, em 2020, e ter considerado a experiência dececionante, o que pode explicar a sua relutância, argumenta a McKinsey. Quando questionados sobre o que os impede de comprar online, 49% indicou que prefere o contacto pessoal nas lojas, 33% considera que as taxas de entrega são muito caras e 22% disse que os requisitos mínimos dos pedidos são muito altos. Em Portugal, 15%, dos consumidores tem intenção de comprar mais produtos online, sendo inferior à percentagem de consumidores que tenciona comprar menos (24%). A principal razão para consumidores portugueses não comprarem produtos online é a preferência pelo contacto pessoal nas lojas (62% dos consumidores identifica esta como uma das principais razões). Valor volta a reinar A pesquisa da McKinsey identifica o “downtrading”, ou uma maior sensibilidade ao preço, como a tendência mais influente. 56% dos CEOs questionados lista esta tendência como uma das suas três principais prioridades. A tendência de “downtrading” é amplificada por uma expectativa de mais qualidade e valor acrescentado dos consumidores, ao nível do preço de entrada, colocando pressão nos retalhistas a nível do preço e da qualidade dos seus produtos. Desde o início da pandemia, os consumidores gastam, consideravelmente, mais em produtos alimentares, devido à dificuldade de consumir fora de casa (restaurantes, cafetarias e cantinas nos escritórios). Ao mesmo tempo, os confinamentos limitaram a capacidade de gastarem dinheiro de outras formas, levando a uma maior despesa com a alimentação. Contudo, de acordo com o inquérito aos consumidores, espera-se que esta tendência se inverta e que os consumidores gerem uma maior poupança,
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Exhibit 5
Key trends shaping the industry Based on both CEO surveys and consumer research, we identi�ed ten trends that we believe will shape the industry over the next years. This analysis is based on what CEOs see as the key industry-shaping changes (Exhibit 4) and the shopping intentions of consumers (Exhibit 5).
https://www.mckinsey.com/industries/retail/our-insights/the-path-forward-for-european-grocery-retailers
percent of consumers who already bought online at least occasionally want to increase their online purchasing even further. The more often consumers bought online in 2020,
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the more likely they seem to be to increase their share of online buying (Exhibit 6). Exhibit 6 Estilo de vida impulsiona a procura A crise da Covid-19 acelerou a procura por produtos mais saudáveis, sustentáveis e locais, sem nenhuma desaceleração aparente, até agora. Em 2021, na Europa, 50% dos consumidores inquiridos planeia adaptar os respetivos gastos alimentares para melhor se adequarem ao seu estilo de vida. 30% dos consumidores vai concentrar-se mais em alimentação e nutrição saudáveis, em comparação com 2020, 24% planeia gastar mais em produtos regionais e locais e 19% em produtos ecológicos. 18/05/2021
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Higher-income segments tend to be less price conscious and more willing to spend on healthy eating and nutrition. In contrast, lower-income segments focus more on saving money and are less concerned about healthy food choices (Exhibit 7). Exhibit 7
However, the trend toward increased online shopping does not extend to all consumer groups. Consumers who rarely purchased food online in the past (10 percent of all consumers) said they plan to cut rather than increase their online spending (–4 percent net intent). And of the consumers who did not shop online in 2020—the clear majority at 65 percent—only 7 percent said they intend to start buying online in 2021.
https://www.mckinsey.com/industries/retail/our-insights/the-path-forward-for-european-grocery-retailers
34% dos consumidores inquiridos indicou que The consumer survey results con�rm CEOs’ expectations of overall trends toward price deseja economizar dinheiro nas compras, em sensitivity and healthy products. The �ndings also illustrate the continued polarization 2021, em comparação com Enquanto 27%to across consumer segments seen in 2020, with2020. lower-income consumers expecting planeia pesquisar mais ativa focus more on saving money andpromoções overall downtrading,de whileforma higher-income segments’ preferences may drive them to overall uptrading despite increasing price e product 17% deseja mudar para produtos mais baratos sensitivity.
Estas novas expectativas são também acompanhadas por uma maior procura por valor e por preços baixos. 26% dos consumidores na Europa diz que tanto quer poupar na compra como mudar os hábitos de compra em alimentação para uma melhor adaptação ao estilo de vida, refere a McKinsey. Em Portugal, os consumidores destacam-se por uma maior intenção de poupar na compra de alimentos (59% dos consumidores). No que diz respeito aos produtos locais, 37% dos consumidores portugueses prevê aumentar as despesas com produtos regionais. Quanto a opções saudáveis, este ano, 45% dos consumidores em Portugal diz estar a optar por esta escolha no cesto de compras. Consumo fora de casa Segundo Ignacio Marcos, Senior Partner da McKinsey & Company e líder da prática de consumo na região ibérica, “sem dúvida que a situação atual está a gerar novos padrões, a todos os níveis, e a mudar a forma de trabalhar em todos os sectores de consumo.8/12 No início da pandemia, a compra de alimentos ou de bens essenciais para o lar cresceu substancialmente. Após o pico de vendas resultante do efeito de ‘acumulação’, prevê-se que a evolução se estabilize e volte ao normal, à medida que a indústria hoteleira e de restauração recupere e que voltemos a reativar o consumo fora de casa”. Ainda vai demorar algum tempo até a ocupação na restauração voltar aos níveis pré-crise, contudo, o inquérito indica uma forte recuperação assim que as restrições forem reduzidas. Consequentemente, as lojas alimentares vão perder uma parte considerável dos seus lucros. Esta diminuição da procura de produtos alimentares nos supermercados e outras superfícies de venda é amplamente esperada pelos executivos da indústria: 49% acredita que a situação do mercado piorará, em 2021, relativamente a 2020.
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E OS PREÇOS? N
a Europa Ocidental, são esperados desafios económicos na maior parte dos mercados, em 2021, pelo que se perspetiva que os retalhistas se foquem no aspeto do preço, para se manterem competitivos.
Numa altura em que o consumidor está mais sensível e preocupado com os preços, esperados que são os desafios económicos em vários mercados, crescem os temores de uma onda inflacionista. Em maio, os preços dos alimentos atingiram o máximo de 10 anos e dizem os economistas que a sua subida está apenas no início. Mais um aspeto a considerar na altura de definir as estratégias promocionais e de modo a assegurar a competitividade dos negócios.
De acordo com a consultora IGD, o sector do retalho alimentar crescerá, a nível mundial, 3,1%, no período de 2020 a 2022, gerando 371,43 mil milhões de euros adicionais em vendas. Este valor é consequência de um crescimento excecional, no ano transato, nos 20 principais mercados mundiais, que incrementaram as suas vendas em 8,8%. O desempenho do retalho alimentar foi impulsionado pela mudança nos gastos dos consumidores, que transferiram o seu consumo para dentro do lar, fruto do confinamento para conter a pandemia. Do lado do consumidor, com a chegada do novo normal, após a vacinação, haverá também uma maior preocupação com o preço dos produtos. Aos poucos, o consumo fora de casa e outras possibilidades de gasto estão a recuperar, por isso, o consumidor precisa de priorizar onde gasta o seu dinheiro. Assim, o preço torna-se, neste contexto, uma ferramenta útil para o reter e atrair. Consumo mais racional O consumidor atual gasta menos, poupa mais, é mais seletivo e prefere os produtos locais (mais 41,4% que antes da pandemia) e sustentáveis (mais 16,7%). Assim o conclui a terceira edição do estudo “O impacto da Covid-19 nos estados de espírito, expectativas e hábitos de consumo”, feito pela EAE Business School. “Isto é indicativo de um compromisso relativamente a contribuir para a recuperação económica e uma maior sensibilidade ao fator preço na compra. Mais 22,4% de consumidores compara os preços antes de comprar face à época pré-Covid”, assinala Pablo Contreras, autor do estudo e professor naquela escola de negócios. O estudo salienta que os consumidores procuram informar-se mais do que o que faziam antes da pandemia, sendo mais refletidos e racionais na compra. Como tal, não compram tanto pela confiança geral na sua marca habitual, mostrando-se mais dispostos a mudar da marca.
41,4% dos inquiridos viu a sua situação económica afetada e 47,9% diminuiu o consumo. As intenções de gastos em atividades de lazer encolheram para 68%, assim como em hotelaria (-68,9%), em artigos de luxo ou premium (-68,2%), em espetáculos (64%), em moda e acessórios (-57,7%) e em férias (-50%). E os preços? Uma crescente sensibilidade ao preço que acontece no meio de uma onda generalizada de temores inflacionistas. Foram conhecidos os mais recentes dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) que dá conta de uma subida de 39,7% nos preços dos alimentos, alcançando o máximo de 10 anos. Por detrás deste aumento está o apetite da China pelos cereais básicos, como o trigo e a soja, a grave seca no Brasil e a subida dos preços dos óleos vegetais para responder à procura de biodiesel. As pressões inflacionistas, assim como a progressão da vacinação e as previsões de reabertura das economias estão a afetar o preço das matérias-primas, sendo as “commodities” as primeiras a ter de se adaptar às mudanças na oferta e na procura. Os economistas da FAO advertem que o aumento dos preços vai afetar, sobretudo, as economias mais pobres, altamente dependentes da importação de matérias-primas. E o Fundo Monetário Internacional (FMI) acredita que os preços dos alimentos vão continuar a subir, refletindo-se no preço ao consumidor durante este e o próximo ano. Christian Bogmans, Andrea Pescatori e Ervin Prifti, economistas do FMI, publicaram uma nota na qual analisam o que se está a passar com os alimentos e lançam as suas próprias previsões. Os especialistas comentam que, apesar da produção de cereais e de outros alimentos estar a atingir níveis recorde, o que, em teoria, deveria forçar os preços a descer, a sua utilização também se está a intensificar. Um maior consumo humano, a estratégia de acumulação de alguns países e a procura para a
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alimentação animal são fatores que estão a potenciar a subida das cotações. “Não obstante, esta tendência nos alimentos internacionais apenas está a começar a refletir-se nos preços pagos pelo consumidor em cada país”. O FMI cita quatro fatores que explicam a subida dos preços dos alimentos, a nível global. Em primeiro lugar, a inflação, que já aumentava antes da pandemia. Durante o verão de 2018, a China viu-se afetada por um surto de peste suína africana, que acabou com grande parte das suas criações de porcos, correspondente a 50% de todos os porcos no mundo. Isto fez com que os preços da carne de porco na China tenham atingido, em meados de 2019, máximos históricos, o que gerou um efeito dominó nos preços da carne de porco e de outras proteínas animais em muitas regiões do mundo. A situação foi, também, agravada pela introdução de tarifas à importação na China sobre a carne de porco e a soja norte-americana, durante a disputa comercial entre Washington e Pequim. Outro dos fatores a considerar são os primeiros confinamentos para conter a Covid-19 e as interrupções que causaram nas cadeias de abastecimento. No início da pandemia, estas interrup-
Texto: Carina Rodrigues Foto: Shutterstock
ções, as alterações nos hábitos das famílias, como deixar de comer fora do lar, e a acumulação de stocks por parte dos consumidores, juntamente com a forte valorização do dólar americano, provocaram uma subida nos índices dos preços dos alimentos ao consumidor em muitos países. O terceiro fator a impulsionar a subida dos preços é o aumento dos custos de envio e de transporte. As tarifas do frete marítimo, medidas pelo Baltic Dry Index, aumentaram duas a três vezes nos últimos 12 meses, enquanto a subida dos preços dos combustíveis e a escassez de semicondutores para camiões, em algumas regiões, estão a elevar o custo do transporte rodoviário. Espera-se que alguns destes fatores persistam no tempo, o que poderá prolongar a subida dos preços dos alimentos. Finalmente, os preços nos produtores de alimentos estão a atingir máximos, a nível mundial. Desde que registaram os valores mínimos, em abril de 2020, aumentaram 47,2%. Sem descontar o efeito da inflação, estão ao nível mais elevado de sempre. Entre maio de 2020 e maio de 2021, os preços da soja e do milho subiram, respetivamente, 86% e 111%.
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os preços nos produtores de alimentos estão a atingir máximos, a nível mundial. Desde que registaram os valores mínimos, em abril de 2020, aumentaram 47,2%. Sem descontar o efeito da inflação, estão ao nível mais elevado de sempre. Entre maio de 2020 e maio de 2021, os preços da soja e do milho subiram, respetivamente, 86% e 111%
Os economistas do FMI creem, assim, que, tendo em conta estes fatores,
é bastante provável que a inflação dos alimentos chegue ao consumidor ainda este ano e em 2022. “De facto, o forte aumento recente dos preços internacionais dos alimentos já começou a influenciar, lentamente, os preços ao consumidor interno em algumas regiões, à medida que os retalhistas, incapazes de absorver os custos crescentes, passam esses aumentos ao consumidor final”. O FMI crê que esta tendência irá agudizar-se, com os preços internacionais dos alimentos a aumentarem, aproximadamente, 25% em 2021 e, embora estabilizem, este incremento irá infiltrar-se nos preços finais nos seis a 12 meses seguintes. “Uma transferência de 20% (13% em 2021 e 7% em 2022) implicaria, portanto, um aumento da inflação dos preços dos alimentos ao consumidor de, aproximadamente, 3,2 pontos percentuais e 1,75 pontos percentuais, em média, em 2021 e 2022, respetivamente. Não obstante, poderá somar-se um ponto percentual adicional à inflação mundial dos alimentos em 2021, pelo encarecimento do transporte”.
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PRECIFICAÇÃO DINÂMICA, SIM OU NÃO?
Texto: Cariina Rodrigues Foto: Shutterstock
As companhias aéreas e os hotéis há muito que o fazem. Feriados, estações do ano, época, níveis de ocupação servem de guia para saber quando o preço pode ser aumentado ou quando está na hora de conceder um desconto. A Amazon, por exemplo, também o faz. Aliás, há muito que é uma referência em precificação dinâmica no e-commerce, mudando o preço de milhões de artigos numa questão de minutos. De uma maneira simplificada, a precificação dinâmica assenta na utilização de algoritmos para gerir os preços. As vantagens desta prática não são exclusivas das companhias aéreas, do e-commerce e das aplicações de “ride sharing” e podem também beneficiar o retalho físico. Mas há vários aspetos a considerar e, de entre uma série de “sins” surgem também alguns “nãos”.
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tualmente, uma das principais dificuldades do sector é ter uma política comercial bem fundamentada. É comum ver-se a oferta de descontos apenas para se obter um volume adicional de vendas, sem critérios claros bem definidos para a definição do preço. Vender mais não significa, necessariamente, ganhar mais, até porque existem produtos que acabam por ser comprados, estejam ou não em promoção. A estratégia de preço é, assim, um aspeto crucial do negócio, uma vez que afeta diretamente o inventário, as vendas e a rentabilidade. Se os preços estiverem muito elevados, os clientes poderão optar por comprar na concorrência, mas preços demasiado baixos também têm as suas implicações, nomeadamente, ao nível das receitas. Uma estratégia de precificação dinâmica aponta ao preço ótimo num dado momento. “As mudanças no preço podem basear-se na perceção de quanto um consumidor está disposto a pagar, num determinado momento, pelo produto, nos preços da concorrência e noutras variáveis”, descreve a Unleashed, empresa tecno-
lógica que oferece visibilidade e controlo sobre a cadeia de abastecimento até às vendas. No decurso do ano transato, com o confinamento, de modo a conter a propagação do vírus que causa a Covid-19, os consumidores viraram-se para o online para comprar de tudo, desde desinfetantes a alimentos, a equipamento desportivo, mobiliário e tecnologia. E foram relembrados do quão fácil é comparar os preços na Internet. “Com apenas alguns cliques, um shopper pode ficar a saber que retalhista vende um produto particular ao preço mais baixo. E porque a mudança para o e-commerce deverá continuar na era pós-pandemia, o preço tornou-se numa ferramenta cada vez mais importante para os retalhistas. Em particular, a precificação dinâmica deverá ser uma das principais capacidades que irá diferenciar os vencedores no cenário futuro do retalho”, nota, por sua vez, a McKinsey. Vantagens Ambas organizações consideram que a precificação dinâmica aporta vantagens aos retalhistas, sejam eles online ou com lojas físicas. A começar pelo
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sa no preço quando tornarem a comprar um novo par”, alerta a consultora. aumento das vendas. De acordo com a Unleashed, apesar de, geralmente, ser vista como uma ferramenta para os negócios aumentarem os preços, a precificação dinâmica também serve para os baixarem. “Existem alturas em que um preço mais baixo pode converter mais vendas, ajudando o negócio a cumprir com os objetivos de vendas de um determinado período de tempo”.
vão comprar noutro lado.
De igual modo, ajuda na maximização dos lucros. Se a concorrência está a oferecer o produto ou serviço a um preço substancialmente mais elevado, então, a precificação dinâmica permitirá ajustar o preço com base nos padrões de compra dos potenciais compradores. “Tomemos como exemplo um cliente que quer comprar uma caneta. A concorrência vende canetas a três dólares cada, enquanto a sua empresa vende a um dólar cada. As estratégias de precificação dinâmica permitir-lhe-ão vender aquela caneta ao cliente que está a comprar a um dólar e meio, dando-lhe a perceção de poupou dinheiro”, explica a tecnológica.
Estratégias Para uma melhor compreensão da dinâmica de alteração de preços, algumas estratégias devem ser levadas em conta, diz a McKinsey. A começar pelo foco no custo geral e não apenas no preço de venda do público, uma vez que os shoppers não consideram apenas este último, mas sim o custo total, considerando o preço do produto, os impostos e os custos com uma eventual entrega. Isso significa fazer escolhas não apenas sobre os preços dos produtos, mas também sobre promoções, ofertas personalizadas, prazos e taxas de envio, entre outros aspetos. “Um retalhista de mobiliário, por exemplo, testou taxas de entrega mais baixas e prazos mais longos, na hipótese de que os consumidores não querem, necessariamente, que a sua nova mobília seja entregue no imediato; querem, sim, que a sua nova mesa de jantar seja entregue a um sábado, em vez de no meio da semana. O retalhista apurou que esse prazo de entrega mais dilatado não afetou significativamente as taxas de conversão, dando-lhe a flexibilidade para otimizar as entregas tendo em conta os aspetos da capacidade e custo. Oferecer algoritmicamente a possibilidade de esperar até ao fim-de-semana por determinados produtos, e passando essas poupanças para o consumidor, revelou ser uma maneira eficaz para converter mais clientes”, descreve a McKinsey.
Outra das vantagens é a geração de uma maior procura, razão pela qual as companhias áreas recorrem há muito a esta estratégia. Se próximo da data do voo existem ainda lugares disponíveis, então, poderão ser vendidos a um preço mais baixo, permitindo maximizar as receitas. Desvantagens Mas existem algumas desvantagens. “Os consumidores não gostam”, avança, desde logo a Unleashed. “Os consumidores aceitam que os preços mudam, mas detestam quando são atingidos por uma estratégia de precificação dinâmica. Apesar de poder ser utilizada para que o consumidor poupe dinheiro, é geralmente usada para aumentar as margens do negócio. Isso significa que os consumidores sentem que estão a pagar mais do que deviam e, se souberem que outros pagaram bem menos, poderá afetar a sua fidelização”. Outra das desvantagens é uma potencial perda de vendas. Uma vez que muitos consumidores pesquisam os produtos na Internet antes de avançar para a compra, se se depararem, na loja, que o preço está mais elevado do que quando pesquisaram, simplesmente, saem e
E a Unleashed alerta ainda para as indesejadas guerras de preços. “Um negócio pode baixar o preço dos seus produtos, o que levará a concorrência a baixar os seus ainda mais, por sua vez. Este processo perpetua-se até que um dos negócios chegue a um ponto em que não lhe seja mais sustentável”.
Certos produtos são melhores candidatos a mudanças frequentes nos preços. No vestuário, por exemplo, os preços dos produtos tendência de moda podem variar semanalmente, mas os de peças básicas, como as t-shirts lisas e roupa interior, devem ficar mais estáveis. Há que considerar as expectativas do consumidor para cada tipo de produto e a duração do ciclo de compra. “Os clientes que, há anos, compram meias brancas lisas não devem ter uma surpre-
A McKinsey considera que a precificação dinâmica tem tanto de arte como de ciência. O que significa que é preciso testar, aprender e refinar. Para entender o cliente, é preciso que se façam testes, durante as fases iniciais, apenas numa categoria de produto ou região e assumir que algumas coisas podem não resultar. É importante investir tempo para formular as próximas etapas, antes de fazer a transição para alterações automatizadas de preço. Além disso, é necessário entender a posição competitiva atual da empresa no mercado e as perceções dos consumidores sobre o preço da marca. A consultora alerta ainda para o que não se deve fazer ao se implementar uma estratégia de precificação dinâmica. “Erros comuns” como os caracteriza e que vão desde a introdução de preços que alienam os clientes, a mudar os preços com demasiada frequência e a tomar decisões com base em informações erradas. Não se pode, jamais, “insultar o cliente”, sublinha a McKinsey, sustentando que os preços não devem flutuar drasticamente, para não confundir os clientes, e que pode ser necessário estabelecer barreiras de proteção, pois se o consumidor perceber as mudanças de preço como aleatórias ou injustas, comprará, provavelmente, num concorrente. “Os consumidores esperam que as tarifas aéreas mudem constantemente, mas esperam que o preço de um frasco de molho ou de champô se mantenha relativamente consistente”, exemplifica. Os preços também devem ser consistentes ao longo dos vários canais e não devem ser alterados sem um propósito bem definido. Em algumas categorias, a sazonalidade ou os lançamentos de novos produtos são gatilhos justificáveis para mudanças nos preços. Mas se os custos, os preços da concorrência ou outros motores da procura não se alterarem, não há necessidade de mexer nos preços. Finalmente, dados enviesados não devem fundamentar as decisões. As tecnologias atuais permitem um controlo preciso e centralizado dos preços e a sua rápida mudança, mas dados enganadores poderão prejudicar até a melhor das estratégias de precificação dinâmica. Por exemplo, os custos dos produtos, taxas de entrega e o serviço ao cliente são, geralmente, amortizados por vários SKUs, mas, na realidade, também afetam de um modo diferente a economia dos produtos individuais, criando atrativas margens artificiais. Nalguns casos, os algoritmos podem recomendar a redução dos preços, mas essas reduções de preço, se implementadas, podem resultar em grandes perdas de margem.
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