Grande Consumo N.º 62

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Número 62 | Março / Abril 2020 Revista Bimestral | Diretor: Bruno Farias

A REVISTA DOS NEGÓCIOS DA DISTRIBUIÇÃO

Retalho | Indústria | Consumo | Análise | Logística | Tendências

a r a d s o m Va volTa a ISTO !!! Covid-19: o vírus, a pandemia e a reação do mercado O contexto incontornável, a resposta possível e os caminhos futuros a trilhar. A pandemia do Covid-19 ainda não se encontra totalmente ultrapassada, mas urge antecipar o que poderão ser os caminhos futuros. Do retalho, da indústria, da economia, do consumo. Demasiadas questões a colocar num tão curto período de tempo, mas para as quais são necessárias respostas. A curto, médio e longo prazo. Para ler, nesta edição colaborativa da Grande Consumo, realizada em regime de confinamento. Vamos dar a volta a isto!

MERCACHEFE DE B2B A B2C

SANIDADE VEGETAL

PACTO PORTUGUÊS PARA OS PLÁSTICOS

De B2B a B2C, a resposta do primeiro

O papel das plantas, segundo a ANIPLA,

Saiba o que é a plataforma colaborativa, que

marketplace dedicado ao canal Horeca.

para acabar com a fome e alcançar a

tem como objetivo criar um compromisso

Ricardo Wallis, CEO do MercaChefe,

segurança alimentar, com base numa

entre os agentes da cadeia de valor dos

explica a missão da plataforma

agricultura sustentável

plásticos nacional, incluindo o Executivo


2 Grande Consumo


Editorial Nunca Eça de Queirós pensou que o famoso mandarim da sua obra homóloga pudesse, um dia, estar tanto nas bocas do mundo. Verdade é que Bill Gates já antevira que seria uma pandemia a matar mais pessoas, por esse mundo fora, do que propriamente as armas nucleares com que os países mais ricos, alguns também dos com mais dificuldades perante a ameaça invisível da Covid-19, se armaram até aos dentes para uma eventual agressão que chegou sobre outra forma menos tangível. Tal como a Alemanha, noutro muito fatídico contexto, também esta estirpe viral apanhou o mundo, literalmente, de costas, entre a bazófia dos ricos, a preocupação dos pobres e o desespero de muitos (demasiados). Refém da fraca formação humana, intelectual e social dalguns dos principais líderes mundiais, 2020 arrancou em falso com uma “bomba” bacteriológica que nunca ninguém pensou atingir as proporções que atualmente tem. Eu, seguramente. E o que diria Eça de Queirós se hoje fosse vivo? Categoricamente, muito. Ou, pelo menos, o suficiente para preencher diversas e prolíferas páginas que, provavelmente, redundariam em tantas outras fascinantes obras, não menos deliciosas de ler. E reler, muitas vezes. O seu sentido crítico, inteligência acima da média e traços de personalidade que deixava escorregar para a sua hábil escrita seriam muito úteis ao mundo cada vez mais ignorante e nivelado por baixo em que nos encontramos, presentemente, a viver. Onde se culpa os chineses desde Washington, mas se nega o óbvio porque, afinal, as eleições estão aí à porta e nunca se sabe o amanhã, se é que alguma vez se soube como se chegou ao “presente”. Entre a repressão do silêncio posta em prática por Pequim, a gripe chinesa, como tantos dizem, chama-se, essencialmente, imprevisibilidade. Caixa de Pandora aberta cujo impacto efetivo, consequência reais e possíveis rumos são ainda desconhecidos, sendo certo aquilo que Bill Gates (como seria bom ouvi-lo dialogar com Eça de Queirós, se tal fosse possível) quase messianicamente anteviu: afinal, foram mesmos os “micróbios” a gerar um genocídio ainda não concluído. Num mundo da tecnologia, que nos proporciona conforto e qualidade de vida, foi o lado mais biológico, a vida, que pereceu perante a o que nunca julgámos ser possível. Nunca pensei assistir ao que vivemos nestes últimos dois meses. Do susto à reação foram apenas alguns momentos, com uma onda solidária alguma vez nunca vista em Portugal, e que documentámos ao longo desse mesmo período em muitas, e boas, notícias, a demonstrar que, efetivamente, vivemos tempos excecionais. Onde o homem voltou a ser humano e onde foi percetível que a prosperidade de nada vale quando pode faltar a saúde. Quisemos ser Eça de Queirós e “espreitar”, aqui e ali, como se passou da perplexidade à reação, ouvimos pessoas e recebemos testemunhos. Vimos negócios prosperar e outros não tanto, fábricas fechar, trabalhadores em lay-off e rumámos às nossas casas para nos protegermos e estar perto das nossas famílias. Fizemos uma inversão completa dos conteúdos que tínhamos previsto para a edição que agora vos proporcionamos. Partimos do zero e com menos tempo, procurámos ser atuais na nossa plataforma digital, unimos esforços e muito mais haveria para dizer. De tudo aquilo que, em regime de exceção, vivemos, sentimos, receámos, ambicionámos. Tempos excecionais que nos fizeram dar mais de nós e onde - não raras exceções, felizmente -, o melhor de cada um veio ao de cima. Nesse sentido, escrever este editorial tornou-se fácil, sem não poder esquecer a equipa que tornou possível mais uma edição, em papel e digital, no meio de um novo normal que de rotineiro teve muito pouco ou nada. Quando tanto se fala da digitalização do negócio e são muitos, e bons, os exemplos, que colocaram na “berra” o e-commerce e o comércio de proximidade, são igualmente bons os que vêm dos grandes formatos, que de tudo fizeram para que o pânico da falta de alimentos não singrasse. O meu elogio ao contributo e agradecimento às muitas noites “quase” sem dormir de gerentes de loja, diretores de logística, repositores, operadores logísticos, motoristas, forças de segurança, toda uma imensa e complexa cadeia de valor que permitiu que, no desconhecimento, houvesse chão. Por último, e seguramente não menos importante, convido-vos a passar o telefone no QR do tema de capa e a ver, por intermédio da lente talentosa da nossa colega Sara Matos, algumas profissões, por vezes esquecidas, e que também estiveram na linha da frente. Aos anunciantes e parceiros de negócio, que permitiram que esta edição pudesse sair, o meu agradecimento público. Estes são tempos de exceção, mas há valores intrínsecos que serão, acredito, para sempre. Boas leituras!

Bruno Farias brunofarias@grandeconsumo.com

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O desperdício alimentar tem recebido,

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cada vez mais, atenção por parte de consumidores, produtores e operadores da distribuição moderna. Também em Portugal

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Tiago Oom, diretor da REDUNIQ, aborda as principais vantagens do mais recente serviço da marca: o REDQUNIQ @ Payments

Com o primeiro aniversário a ser comemorado num ano que vai entrar para os anais da história mundial pela pandemia de Covid-19, a missão do Dott faz ainda mais sentido

Índice 4

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A Martini anuncia o alargamento do portfólio com a inclusão de duas opções em bebidas não alcoólicas: Martini Vibrante e Martini Floreale Sem Álcool

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Carlos Ruivo, presidente da APIC, aborda o impacto da pandemia do coronavírus no sector cárnico e os esforços feitos para manter a entregas dos produtos alimentares em segurança

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Pode parecer um cliché já demasiado gasto e, com isso, tornar-se vulgarmente recorrente, mas falar da Kranemann Wine Estates é falar de um projeto nascido da paixão

Propriedade e Editor: Ana Cristina Simão Dias Nacionalidade: Portuguesa Rua Comandante António Feio, N.º 24, 3.º - 2800-255 Almada Diretor: Bruno Farias E-mail: brunofarias@grandeconsumo.com N.º Registo na E.R.C. – 125 837 Depósito Legal – 306507/10 Sede de Redação – Rua dos Lagares D’El Rei N.º 2B Porta 1 1700-268 Lisboa Redação - Avenida do Parque N.º 65 A, 2635-609 Rio de Mouro Tiragem média – 5.000 Exemplares Periodicidade – Bimestral Impressão – Lisgráfica - Impressão e Artes Gráficas S.A. Estrada Consiglieri Pedroso N.º 90 Casal de Santa Leopoldina, 2730-053 Barcarena Chefe de Redação - Carina Rodrigues carinarodrigues@grandeconsumo.com Colaboradores – Bárbara Sousa barbarasousa@grandeconsumo.com Departamento Comercial: 218 208 793 - geral@grandeconsumo.com Estatuto Editorial disponível em: https://grandeconsumo.com/estatuto-editorial/

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ESPANHA

Auchan Espanha permite compras por WhatsApp

REINO UNIDO

Aldi aventura-se no e-commerce

O Aldi vai, finalmente, aventurar-se no e-commerce, com a venda online, no Reino Unido, de cabazes com 22 produtos, durante a pandemia do coronavírus. O objetivo principal deste serviço de compra online é apoiar os consumidores que pertencem a grupos de risco. A cadeia oferece caixas contendo 22 produtos não refrigerados, como massa, desinfetante e papel higiénico, que os clientes podem encomendar online para entrega ao domicílio. Disponíveis no site do Aldi, estes cabazes custam 24,99 libras.

A Auchan Retail Espanha (Alcampo) integrou um novo serviço destinado a facilitar as compras de eletrodomésticos e produtos de tecnologia através do WhatsApp Business, que permite ligar diretamente o comprador com o vendedor através de chat, vídeochamada ou chamada de voz. O serviço destina-se aos clientes que desejam um atendimento personalizado, mas que, pelas atuais circunstâncias da pandemia por Covid-19, não podem comprar estes produtos fisicamente nas lojas.

Amazon autorizada a entrar no capital da Deliveroo

O regulador da concorrência britânico decidiu autorizar, de forma provisória, a entrada da Amazon no capital da Deliveroo, cuja continuidade no mercado britânico estava ameaçada pela pandemia da Covid-19. Recorde-se que a Autoridade da Concorrência e dos Mercados (CMA, pela sua sigla em inglês) tinha aberto, em dezembro de 2019, uma investigação profunda à operação. Contudo, “à luz da deterioração da posição financeira da Deliveroo como resultado do coronavírus”, em virtude do forte impacto negativo das medidas de isolamento aplicadas no Reino Unido, o regulador foi informado que, sem o apoio da Amazon, a empresa de entregas ao domicílio poderia ver-se forçada a abandonar o mercado britânico. “A CMA considera atualmente que a saída iminente da Deliveroo seria pior para a concorrência do que permitir o investimento da Amazon e, portanto, concluiu provisoriamente que o acordo deve ser autorizado”, anunciou.

Walmart suspende a venda da Asda

A Walmart suspendeu, temporariamente, a venda da sua participação maioritária na Asda, até que a crise pandémica esteja resolvida. A decisão responde à vontade de que a sua filial britânica se foque completamente na resposta à Covid-19. Recorde-se que, no passado mês de fevereiro, a Walmart anunciou a manutenção de negociações com potenciais compradores de uma participação na Asda. As empresas de capital privado Apollo Global Management, One Star Funds e TDR Capital apresentaram ofertas de primeira instância e foram convidadas para uma próxima ronda de licitação. Atualmente, não há uma data prevista para o reinício das negociações. Nos últimos meses, a Asda foi avaliada em 7.960 milhões de euros. O anúncio de venda aconteceu um ano após as autoridades britânicas terem bloqueado a fusão entre a Asda e a Sainsbury’s, por considerar que reduziria a concorrência no sector.

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PORTUGAL

DIA Portugal volta “ao verde” no 1.º trimestre

O Grupo DIA anunciou o progresso das vendas líquidas do primeiro trimestre, apuradas que estão as contas nos mercados onde se faz representar: Portugal, Espanha, Brasil e Argentina. E é, precisamente, da Península Ibérica que continuam a vir boas notícias para o operador espanhol presente em Portugal com a insígnia Minipreço, com a operação nacional a apresentar uma variação positiva de 4,3%, onde são consolidadas as vendas da marca Clarel, isto apesar de ter procedido a uma redução de 5% do parque de lojas detido e explorado no país, como consequência da concretização do plano estratégico definido. Em comparação com o homólogo de 2019, as vendas like-for-like subiram 9,3%. Em comunicado, a DIA aponta a subida das vendas comparáveis no período, com particular destaque para o mês de fevereiro, “a uma maior frequência de entrega de mercadoria nas lojas, bem como pela melhoria da oferta comercial de produtos frescos”.


ALEMANHA

Galeria Karstadt Kaufhof em processo de insolvência

A cadeia de grandes armazéns Galeria Karstadt Kaufhof apresentou no tribunal de Essen, na Alemanha, o pedido de proteção dos credores. O tribunal acedeu imediatamente ao pedido e deu início ao processo de insolvência, que vai permitir à department store continuar a funcionar enquanto trabalha num plano de recuperação. O grupo tinha já pedido ajuda ao Banco Estatal Alemão, mas não a obteve em tempo útil. Em comunicado, a administração da Galeria Karstadt Kaufhof refere que o processo de ajuda demorou muito tempo. O grupo vai utilizar a proteção judicial para manter os seus esforços de reestruturação. O Signa Group, proprietário da cadeia, promete também um financiamento adicional de algumas centenas de milhão de euros. Os grandes armazéns foram fortemente atingidos pela crise do novo coronavírus. As perdas superam os oito milhões de euros por semana, devido ao encerramento obrigatório. Na Alemanha, a Galeria Karstadt Kaufhof emprega mais de 28 mil pessoas.

McDonald’s e Aldi criam parceria para partilha de funcionários Na Alemanha, os funcionários do McDonald’s vão poder trabalhar no Aldi durante as próximas semanas e ajudar a lidar com o pico na afluência de clientes desencadeado pela crise do coronavírus. Devido à restrição na operação dos restaurantes, muitos funcionários do grupo de fast food não são atualmente necessários. Ao mesmo tempo, o Aldi procura urgentemente funcionários para vender e reabastecer as prateleiras. Deste modo, os colaboradores do McDonald’s que foram afetados pela limitação das operações devido à crise do coronavírus e que estão disponíveis vão ser direcionados para o Aldi, como parte da parceria, onde serão alocados conforme as necessidades e, temporariamente, nos termos habituais do retalhista. Após este período, os funcionários poderão voltar ao McDonald’s.

FRANÇA

CEO do Carrefour baixa salário em 25%

A administração do Carrefour decidiu reduzir o dividendo proposto para o ano fiscal de 2019 em 50%, devido ao “contexto excecional da pandemia de Covid-19”. De igual modo, o presidente do grupo, Alexandre Bompard, irá baixar o seu salário dos próximos meses em 25%. Concretamente, informa o Carrefour, o dividendo a pagar aos acionistas será de 23 cêntimos por ação. Os acionistas deverão decidir se o querem receber em dinheiro ou títulos, para que seja formalmente aprovado na assembleia geral a realizar no próximo dia 29 de maio. Além disso, tanto o presidente como os membros do conselho reduzirão os seus honorários, até ao final do ano, em 25%. Adicionalmente, Alexandre Bompard decidiu congelar a compensação fixa dos membros do comité executivo para o corrente ano e pediu que renunciem a 10% da sua compensação por um período de dois meses. Os valores correspondentes serão utilizados para financiar ações de solidariedade para os colaboradores do grupo, quer em França, quer a nível internacional.

CHINA

IKEA alia-se à Alibaba para abrir uma loja online no Tmall

ÍNDIA

Facebook investe 5,7 mil milhões de dólares para chegar ao pequeno retalho na Índia

O Facebook vai investir 5,7 mil milhões de dólares em 10% do negócio digital da Reliance Industries, com o objetivo de posicionar a sua plataforma WhatsApp na oferta de serviços de pagamentos digitais aos pequenos retalhistas na Índia. O negócio irá ajudar a Reliance a reduzir o endividamento que acumulou para assegurar a liderança do seu negócio de telecomunicações Jio Infocomm e a impulsionar o seu novo marketplace alimentar JioMart. “No futuro próximo, o JioMart e o WhatsApp irão apoiar perto de 30 milhões de pequenas mercearias a transacionar digitalmente com cada um dos clientes do seu bairro”, afirma Mukesh Amnani, CEO da Relliance Industries.

A IKEA começou a vender produtos através de terceiros, pela primeira vez nos seus 77 anos de história. Especificamente, a rede sueca vai comercializar o seu sortido através da plataforma chinesa de comércio eletrónico Tmall, propriedade do Alibaba, com o objetivo de expandir o seu alcance num país onde os clientes preferem comprar produtos pela Internet. A loja no Tmall oferece cerca de 3.800 dos mais de 9.500 produtos do catálogo IKEA, além de serviços disponíveis nos seus próprios canais de vendas, como entrega e montagem. A IKEA garante que a sua loja virtual vai ser testada durante seis meses nas províncias de Jiangsu, Zhejiang e Anhui e na cidade de Xangai, como um complemento às suas próprias lojas físicas, à sua plataforma de vendas na Internet e à sua aplicação móvel.

7 Grande Consumo


Um novo paradigma na alimentação

ALIMENTAR

TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock

Um fenómeno muito próprio da sociedade atual, assente no seu quotidiano consumista, nos últimos anos, o desperdício alimentar tem recebido, cada vez mais, atenção por parte de consumidores, produtores e operadores da distribuição moderna. Também em Portugal, o facto de milhões de toneladas de alimentos serem lançadas ao lixo anualmente levou à publicação de um conjunto de medidas no âmbito da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, para além de inúmeras iniciativas privadas. Hoje, existem no mercado nacional empresas que combatem, ativamente, esta problemática, lado a lado com os retalhistas que inovam no reaproveitamento de ingredientes e lançam estratégias que permitem diminuir o número de alimentos desperdiçados.

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Q

uando 2020 arrancou, todos falavam de sustentabilidade. Ao nível ambiental, na gestão dos recursos, nas práticas empresariais e comerciais, ao nível social, a nível alimentar. E, de repente, o que parecia impensável aconteceu. Um novo vírus, desconhecido por todos, rapidamente se propagou pelo mundo, infetando milhões, matando milhares, paralisando economias, colocando as vidas em suspenso. A tão apregoada sustentabilidade pareceu deixar de fazer parte do léxico mais utilizado, cedendo o seu protagonismo a outros valores de não menor importância: solidariedade, colaboração, entreajuda, segurança. O que não significa, necessariamente, que tenha deixado de fazer sentido falar de sustentabilidade. Muito pelo contrário. O que a atual pandemia veio destacar são, precisamente, outras faces da sustentabilidade. Um mundo mais sustentável tem de ser, necessariamente, um mundo mais solidário, mais colaborativo, onde todos, sem exceção, dos coletivos aos indivíduos, têm um papel a desempenhar na busca de soluções para os desafios que se colocam. Um mundo pós-Covid terá de ser, necessariamente,

um mundo mais sustentável. Uma das mudanças mais significativas catalisadas pela crise pandémica prende-se com a relação com os alimentos. Neste tempo em que muitos falam do papel da pandemia na “recuperação” do planeta, aludindo às informações sobre a descida drástica dos níveis de poluição, inclusive, mostrando como a camada de ozono parece estar a recuperar, seria um paradoxo que a sustentabilidade deixasse de fazer parte das agendas. “Um planeta saudável é também o reflexo de uma sociedade sã e segura e essa foi uma das maiores aprendizagens da circunstância da nossa atual realidade”, nota Madalena Rugeroni, Country Manager em Portugal da Too Good to Go, que se posiciona no combate ao desperdício alimentar e redução das emissões de CO2 que dele advêm. Até porque os indicadores não são nada bons. Recentemente, o economista-chefe do Programa Alimentar Mundial da Organização das Nações Unidas alertou que a pandemia de Covid-19 pode lançar mais de 130 milhões de pessoas, só em África, para uma situação de fome aguda. Esta estimativa pode duplicar o número de pessoas com necessidade profunda de assistência alimentar, que atualmente já afeta 135 milhões por viverem em países em conflito ou instabilidade económica e política, às quais se juntam cerca de 821 milhões de pessoas em situação de fome crónica. O mundo pós-Covid terá de ser, inexoravelmente, mais sustentável ao nível alimentar, terá de ser um mundo sem desperdício.

Desperdício alimentar

Foi a partir dos anos 1990 que a problemática do desperdício alimentar atingiu uma dimensão alarmante a nível mundial, descreve o estudo PERDA – Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar. “O estudo de Kantor et al. (1997) concluiu que cerca de 26% dos alimentos são perdidos na fase da distribuição e no consumo final; um outro estudo norte-americano estimou que as perdas ao nível das famílias seriam de cerca de 14%. A dimensão financeira do problema não se revela mais tranquilizadora: um estudo, encomendaPub

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do pelo Governo australiano, concluiu que os alimentos desperdiçados no ano de 2004 representavam 5,3 mil milhões de dólares australianos. Um estudo mais recente de Hodges et al. (2011) conclui que, dos 222 milhões de toneladas de alimentos para consumo humano produzidos nos Estados Unidos em 2008, 57,1 milhões de toneladas (26%) se perderam nas fases da distribuição e consumo”, refere o projeto. Em 2011, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) apresentou um outro

Cada português desperdiça em média 132 quilogramas de comida por ano, um valor elevado, embora abaixo do resto dos países europeus, cuja média representa 179 quilogramas per capita estudo, intitulado “Global food losses and food waste”, onde revelava que um terço da produção alimentar em todo o mundo é perdida ou desperdiçada, o que representa cerca de 1,3 mil milhões de toneladas de alimentos por ano. Na Europa, por exemplo, a quantidade de alimentos desperdiçada, anualmente, seria suficiente para alimentar 200 milhões de pessoas. A realidade é que, à escala global, os alimentos são desperdiçados em toda a cadeia de valor, desde o início, na produção agrícola, até ao consumo final das famílias. Nos países industrializados, uma grande parte dos alimentos produzidos vai para o lixo mesmo que ainda sejam adequados para consumo humano, refere ainda a FAO. E a organização realça que as perdas e desperdícios significativos ocorrem ao nível do consumidor final e da distribuição moderna. Já nos países em desenvolvimento, os alimentos são perdidos, principalmente, no estágio inicial e médio da cadeia, ou seja, nas fases da colheita, pós-colheita, processamento e armazenamento. Muito menos comida é desperdiçada no nível do consumidor. Hoje, o volume do desperdício alimentar representa uma parte significativa dos alimentos que são produzidos, pelo que é inegável o impacto ambiental que esse desperdício acarreta. Recursos naturais, como a água e o solo, são utilizados, e por vezes esgotados, ao serviço da produção de alimentos desperdiçados. Eurico Estêvão, Communication and Events Manager da Phenix App, confirma que este desperdício de alimentos, além de contribuir, grandemente, para as mudanças climáticas, equivale ao desperdício de recursos e trabalho. “Por este mundo fora, a sobre-exploração agrícola leva à desflorestação desenfreada. E em que medida o desperdício alimentar acaba por ter um impacto negativo? Basta pensarmos que 30% da terra que ocupamos com agricultura, no mundo inteiro, está dedicada a produzir alimentos que serão desperdiçados. Estamos a desflorestar, para desperdiçar. Tem também um impacto negativo nas emissões de gases com efeito de estufa. O CO2 gerado aquando da produção de um determinado alimento, e todo o custo ambiental que essa produção envolve, é emitido em vão ao desperdiçarmos o alimento. E ainda agravamos mais a situação quando esses alimentos desperdiçados têm de ser destruídos ou acabam em aterros sanitários, aumentan-

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do o seu volume. O custo ambiental é enorme e, infelizmente, é muito difícil de ser medido”. É este cenário, no entanto, que tem motivado empreendedores a unirem-se no combate ao desperdício alimentar, com iniciativas que trabalham para evitar os desperdícios ao longo de toda a cadeia de abastecimento alimentar, na exploração agrícola, nas lojas e nos restaurantes. Exemplo disso é, precisamente, o projeto Phenix, que surgiu em França, em 2014, quando dois jovens se depararam com um mercado de trabalho muito virado para o lucro e, assim, decidiram criar uma empresa que tivesse, acima de tudo, uma motivação social. “Defender um mundo melhor, onde reutilizamos todos os nossos objetos e produtos, alimentares e não alimentares. Porque haveremos de permitir que, por exemplo, uma fruta ou vegetal acabe no lixo, apenas e só porque não tem um ‘bom aspeto’? Afinal, quem define estes padrões? A loja, o comerciante? Ou será o consumidor, com a sua permanente exigência por consumir apenas o melhor e a um preço cada vez mais baixo? O que nos motiva diariamente é saber que quebramos estigmas e tabus acerca do que consumimos e fazemos ver às pessoas que o desperdício, apesar de estar presente nas nossas vidas, pode ser facilmente evitado”, adianta, por sua vez, Mariana Abreu, COO da Phenix App. Os responsáveis referem-se à entrada em Portugal, em 2016, como um “ato de fé”. Em falta estavam números e relatórios detalhados sobre este tema, com exceção do relatório de 2012, “Do Campo ao Garfo”. Ainda assim, já existia um regime de incentivo fiscal para as empresas que faziam doações, nomeadamente, de excedentes de produção e eram dados os primeiros sinais de despertar para esta matéria por parte do Governo, com a criação da Comissão Nacional para o Combate ao Desperdício Alimentar, também no ano de 2016. “A par disto, Portugal sempre se afirmou como um país com um forte cariz solidário, com uma relação especial com a comida e, sendo um país com 17% de desperdício alimentar, a mudança era necessária. Assim, implementámos em Portugal, de forma gradual, os serviços de doação, de valorização animal e a Phenix App”, diz Eurico Estêvão.

Em Portugal

Cada português desperdiça em média 132 quilogramas de comida por ano, um valor elevado, embora abaixo do resto dos países europeus, cuja média representa 179 quilogramas per capita, segundo dados apresentados pela Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar. De acordo com dados obtidos sobre perdas e desperdício na cadeia de aprovisionamento, o estudo PERDA estima que cerca de 17% dos alimentos que são produzidos, comercializados e consumidos são perdidos ou desperdiçados em Portugal, correspondendo a cerca de um milhão de toneladas de alimentos por ano. “Comparando com o desperdício mundial, o impacto de Portugal parece insignificante, contudo, somos dos países mais pequenos da Europa, em termos de


população e de produção alimentar. Em termos práticos, se o milhão de toneladas que anualmente desperdiçamos fosse aproveitado, esses alimentos seriam suficientes para alimentar metade da população portuguesa, durante um ano inteiro”, explica a COO da Phenix App. Este valor global resulta da soma de perdas e desperdícios nas diferentes etapas da cadeia de valor. É de realçar que a etapa mais eficiente na utilização dos produtos alimentares é a do processamento, onde as perdas são minimizadas e reaproveitadas noutros processos produtivos. Por outro lado, as fases inicial e final da cadeia são onde incide a quase totalidade das perdas, sendo que quase 75% são de produtos hortícolas, cereais,

frutos e lacticínios. Mas a Phenix App não é a única aplicação que, nos dias de hoje, auxilia os portugueses a combater o desperdício alimentar. Em setembro de 2019, entrou em Portugal a Too Good To Go, um movimento que pretende combater o desperdício alimentar através de uma app. Foi criada em 2016, na Dinamarca, por um grupo de jovens empreendedores que se aperceberam da quantidade de comida que era desperdiçada num restaurante buffet, apenas porque não tinha sido consumida nos horários de serviço. A Too Good To Go permite a restaurantes, supermercados e hotéis colocarem à venda num marketplace online todos os excedentes do final do turno ou do dia, através das chamadas Magic Boxes, caixas surpresa criadas pelos estabelecimentos. Atualmente, a Too Good To Go é uma empresa com selo B Corp. A aplicação já está presente em 14 países europeus e, no total, conta com mais de 36 mil

jeto é a prova disso”. A aplicação já está presente em três distritos (Lisboa, Porto e Faro), contando com mais de 90 mil utilizadores registados, e já “salvou” mais de 3.500 refeições. Em 2018, a FAO confirmou que o desperdício de alimentos nos Estados Unidos, Europa, China, Japão e Austrália ocorre, principalmente, durante a distribuição e no frigorífico dos consumidores. Portugal não se distancia muito deste cenário e do panorama típico dos países desenvolvidos. Segundo o estudo PERDA, o desperdício alimentar acontece em 32% na fase inicial de produção e em 31% na fase final, ou seja, no momento de consumo. Estes dados refletem que, em Portugal, o combate ao desperdício alimentar está muito mais perto do consumidor final e é aí onde se deve atuar. Contudo, a distribuição e o comércio (onde se incluem os restaurantes) ficam com uma fatia equivalente a 28%. Por isso, pode-se dizer que todos Pub

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estabelecimentos parceiros e mais de 18 milhões de utilizadores, que já salvaram mais de 26 milhões de refeições, evitando que 66 mil toneladas de CO2 fossem emitidas para a atmosfera. Segundo a empresa, também os consumidores portugueses estão cada vez mais conscientes sobre o desperdício de alimentos. “A adesão e interesse que temos sentido em relação ao nosso pro-

são responsáveis, em quota parte, pelo desperdício alimentar. É neste contexto que a Too Good To Go celebrou recentemente uma parceria com a Auchan Retail Portugal, no movimento de combate ao desperdício alimentar. A aplicação vai permitir que os excedentes do grupo retalhista sejam vendidos em Magic Boxes. Numa primeira fase de expansão, esta par-

Segundo o estudo PERDA, o desperdício alimentar em Portugal, acontece em 32% na fase inicial de produção e em 31% na fase final, ou seja, no momento de consumo

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ceria aplica-se apenas à loja Auchan no centro comercial Almada Fórum, sendo que, rapidamente, outras lojas do grupo se juntarão ao movimento. Nesta loja, já é possível comprar Magic Boxes, no valor de 3,99 euros, e recolhê-las no balcão de atendimento entre as 22h30 e a 00h00. Para já, estão disponíveis 10 Magic Boxes com produtos alimentares, de qualquer género, cujo prazo de validade esteja perto do fim, desde iogurtes, queijos, fiambre, pão, salgados, refeições frias, sandes e sumos do dia. Num comunicado enviado para a redação da Grande Consumo, Ricardo Macedo, diretor de Oferta e Dinâmica Comercial de Produtos Frescos, afirma que “a redução do desperdício é um compromisso da Auchan Retail Portugal. Por isso mesmo, procuramos sempre novas soluções que combinem a prevenção de desperdícios alimentares com a conveniência do melhor preço para o consumidor, sem prejuízo da qualidade dos produtos. É aqui que se insere esta parceria com a Too Good To Go, que se junta a uma série de iniciativas que já temos, como é exemplo a venda, a preços reduzidos, de produtos em aproximação de fim da data de validade, identificados com etiqueta laranja, bem como de frutas e legumes do self-discount, com características estéticas que, por norma, retiram estes produtos do circuito comercial”. Outro exemplo na distribuição moderna é o da GoodAfter. Nascida em 2016, ano que a Assembleia da República declarou como o do combate ao desperdício alimentar, a GoodAfter é um supermercado online dedicado à venda de produtos que se encontram perto ou fora da sua data de validade preferencial, com preços até 70% mais baixos. Segundo Chantal Camps de Gispert, diretora geral da GoodAfter. com, além de estarem mais conscientes sobre o desperdício de alimentos, os consumidores portugueses também são “cada vez mais conscientes de que existem dois prazos de consumo muito bem diferenciados na lei - ‘consumir até’ e ‘consumir de preferência antes de’ - que nada têm a ver”. Conhecimento importante quando se trata de evitar colocar no lixo alimentos em condições para serem consumidos. O prazo limite de consumo – “consumir até”– trata-se de um prazo máximo de consumo, a data a partir da qual os produtos não podem ser consumidos e comercializados. Este prazo aplica-se apenas aos produtos que, por razões de segurança alimentar, não podem ser consumidos ou vendidos após essa data, como é o caso dos frescos. Por sua vez, a data de consumo preferencial – “consumir de preferência antes de” – trata-se de um prazo mínimo de consumo, a data até à qual as marcas asseguram a qualidade ótima do seu produto. Esta data não tem que ver com segurança alimentar e, uma vez que esta não está em causa, é permitido o consumo e a venda destes produtos após a indicada. Até a GoodAfter existir não havia alternativa para os fornecedores e todos os produtos em condições problemáticas tinham de ir para destruição, com os respetivos custos de logística e eliminação. Este supermercado apresenta-se como uma alternativa para os produtos que não têm lugar nos canais habituais. “Deveríamos voltar à cultura de exigência sobre o que se consome e questionar-nos sobre aquilo que temos. Respeitar os recursos que temos e reutilizá-los. Voltar à cultura da escassez onde do pão duro se faz uma açorda. No fundo, deixar de considerar banal deitar fora coisas e comida.

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O grande desafio dos novos empreendedores é mudar as formas e rotinas do consumidor. Tornar ‘bem’ atos como comprar comida fora do ‘calibre’ e rejeitar o conceito ‘usar e deitar fora’. Há muitas oportunidades de negócio. Veja-se o projeto-piloto para a devolução de garrafas de plástico a troco de talões de desconto nos supermercados, que deverá arrancar nos próximos meses”, defende Chantal Camps de Gispert.

Reduzir o desperdício

Todos os anos, cerca de 20% dos alimentos produzidos na União Europeia são perdidos ou desperdiçados, causando danos sociais, ambientais e económicos inaceitáveis. Por este motivo, a prevenção do desperdício de alimentos foi identificada como uma das áreas prioritárias no Plano de Ação da Economia Circular adotado pela Comissão Europeia, em dezembro de 2015. Neste sentido, Bruxelas adotou uma metodologia comum para a prevenção do desperdício alimentar e promover a economia circular. A metodologia centra-se na avaliação dos resíduos alimentares para apoiar os Estados-membros na quantificação dos mesmos em cada fase da cadeia de abastecimento, permitindo a monitorização coerente em toda a União Europeia. Quanto ao que podem fazer empresas e indivíduos para reduzir o desperdício de alimentos, a diretora geral da GoodAfter.com diz que é preciso ter um consumo consciente. “Comprar aquilo que vamos consumir ao certo e não talvez. Porque o talvez pode não ser certo. Quanto às empresas, uma nova filosofia. Como sugere a FAO, porque é que os supermercados estão tão convencidos de que o consumidor irá rejeitar fruta e legumes fora dos standards a que nos habituaram? Veja-se o caso do Fruta Feia, que tem uma lista de espera de cinco mil clientes. Será que os agricultores não ajustam a sua oferta à realidade devido às penalizações da grande distribuição em caso de rutura?”, questiona. O projeto Fruta Feia evitou que, nos últimos seis anos, duas mil toneladas de frutas e legumes fossem parar ao lixo somente devido à sua aparência. A cooperativa aproveita cerca de um terço da fruta e vegetais que os supermercados desperdiçam por considerarem que não têm o aspeto perfeito que os consumidores procuram ou o calibre necessário. Quando arrancou, em 2013, o Fruta Feia abastecia 120 consumidores e salvava do lixo, por semana, cerca de 400 quilogramas. Em 2019, já faziam parte do projeto 235 agricultores, que tiravam do lixo, semanalmente, 15 mil quilogramas, e 5.500 associados. De facto, já existem inúmeras iniciativas e projetos que estão ao alcance de todos e que dão dicas e ferramentas para combater o desperdício alimentar. E, afirma o estudo PERDA, parece consensual que, seja por razões económicas, ambientais ou morais, este deve ser combatido. Contudo, o passo mais importante “é uma consciência coletiva ciente das consequências das opções e escolhas que fazemos enquanto consumidores. Um consumo mais consciente e sustentável certamente que ajudará, em muito, esta luta que nos toca a todos, enquanto sociedade e enquanto indivíduos, no presente e, principalmente, no futuro”, conclui a Too Good To Go.


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“Garantir alimentos suficientes para 10 biliões de habitantes amanhã será a grande corrida para todo o planeta” É pela preservação da saúde das plantas que se poderá atingir um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU): a erradicação da fome. António Lopes Dias, diretor executivo da Associação Nacional da Indústria para a Proteção das Plantas (ANIPLA), não tem dúvidas de que acabar com a fome e alcançar a segurança alimentar, com base numa agricultura sustentável, começa por prestar atenção às emergências fitossanitárias, que têm tido efeitos devastadores na agricultura, florestas e ecossistemas naturais, um pouco por todo o mundo. Do mesmo modo que a globalização acelerou a propagação da pandemia de Covid-19, a ausência de fronteiras no mundo também contribui para espalhar os problemas sanitários, que levam a que 40% das culturas sejam perdidas. Um dado que a ANIPLA quer sublinhar, numa altura em que se vive num clima de “quimiofobia” que tem levado ao aparecimento de vários mitos em torno da agricultura e do papel do agricultor. Com todo o planeta mobilizado na contenção de um vírus, existem outros desafios comuns aos quais urge dar resposta: assegurar alimentos para todos, sem esgotar os recursos naturais e garantindo a sobrevivência das espécies.

ENTREVISTA TEXTO Carina Rodrigues FOTOS D.R./Shutterstock

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G

rande Consumo - 2020 foi proclamado pela Organização das Nações Unidas como o Ano Internacional da Sanidade Vegetal. Que importância tem este reconhecimento, nomeadamente, para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável? António Lopes Dias - A celebração do Ano Internacional da Sanidade Vegetal pretende chamar a atenção de todos para o contributo fundamental da sanidade vegetal para erradicar a fome, reduzir a pobreza, proteger o ambiente e impulsionar o desenvolvimento socioeconómico. Propósitos que, em tudo, se alinham com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, também definidos pela Organização das Nações Unidas. Estamos certos de que acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, assegurando a melhoria da nutrição com base numa agricultura sustentável, começa precisamente por prestar atenção às emergências fitossanitárias que têm tido efeitos devastadores na agricultura, florestas e ecossistemas naturais, um pouco por todo o mundo. Num mercado com cada vez menos fronteiras, são muitas as oportunidades, mas também grandes os desafios que se colocam aos agricultores. Nos territórios com grande diversidade de culturas e espécies florestais, há uma enorme exposição à entrada, estabelecimento e dispersão de pragas e doenças nas plantas. Motivo pelo qual a sanidade vegetal e a disponibilidade de meios de luta eficazes, amigos do ambiente e seguros para o consumidor assumem um papel central numa política comum em defesa da agricultura, espaços naturais e pessoas. Como parte essencial das nossas paisagens, do oxigénio que respiramos, do carbono que capturam ou dos alimentos e bem-estar que fornecem aos seres humanos e animais, as plantas têm de ser protegidas. O Ano Internacional da Sanidade Vegetal vem lembrar-nos isso mesmo, enquanto iniciativa chave para destacar a importância da saúde vegetal para melhorar a segurança alimentar, proteger o ambiente e a biodiversidade e impulsionar o desenvolvimento económico, garantindo o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e, por isso, intimamente ligados. Proteger as plantas é proteger a vida.

GC - A data vem também lembrar que, ano após ano, a população continua a aumentar e que é preciso assegurar que a produção responde positivamente a este crescimento, sendo que, até 2050, terá de aumentar 60%. Mantendo-se o atual cenário, haverá o que comer para todos? Teremos acesso aos alimentos desejados? ALD - Além do cenário de pandemia que estamos a viver e de todas as dificuldades que o mesmo nos traz, vivemos também hoje uma época crítica, em que a perda da biodiversidade, ao nível global, atingiu valores sem precedentes, em que alterações climáticas, degradação de solos e habitats naturais, entre outros fatores de ameaça, têm um efeito devastador. É precisamente por isso, e porque sabemos que a densidade populacional só terá tendência a crescer, e por consequência precisaremos de produzir em maior quantidade, que é fundamental olhar para as ferramentas que temos à disposição e que nos permitem continuar a produzir de forma sustentável, superando desafios, como a defesa dos recursos naturais. A ciência, investigação e desenvolvimento, hoje, mais do que nunca, proporcionam sofisticadas soluções que nos permitem otimizar resultados e preservar a segurança e qualidade dos solos e, por isso, acreditamos que não faltará alimento à população.

Contudo, para que tal seja possível, chamamos à atenção: é necessário, cada vez mais, utilizar a ciência e tecnologia a nosso favor, para um melhoramento constante de processos e práticas agrícolas que nos permitam, de forma sustentável, reforçar a capacidade de produção dos solos sem os destruir, permitindo-nos alimentar toda a população eficazmente. GC - Sabendo-se que 40% das culturas mundiais são perdidas devido a pragas, doenças e infestantes, o combate ao desperdício alimentar faz-se também pela vertente da sanidade vegetal? Esta é também uma resposta na erradicação da fome? ALD - Esta questão remete-nos para a reflexão feita anteriormente: a sanidade vegetal vem relembrar-nos a importância de cuidar dos solos, de preservar os ecossistemas e respeitar as plantas, contribuindo para o cumprimento dos Objetivos

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“40% de culturas perdidas, um pouco por todo o globo, obrigam-nos a pensar no consequente e expressivo desperdício alimentar que daqui decorre e que é urgente evitar e prevenir” de Desenvolvimento Sustentável já mencionados, entre os quais encontramos a erradicação da fome. Não sendo uma resposta direta, é importante que se compreenda que a percentagem de culturas que se perdem, ano após ano, por serem completamente devastadas pela proliferação de infestantes, pragas e doenças, é muito elevada. 40% de culturas perdidas, um pouco por todo o globo, obrigam-nos a pensar no consequente e expressivo desperdício alimentar que daqui decorre e que é urgente evitar e prevenir. Basta pensar nas novas pragas e doenças que estão constantemente a chegar, como a Xylella fastidiosa que já é um problema concreto dos países do sul. GC - As mudanças climáticas e as atividades humanas têm vindo a alterar os ecossistemas e a reduzir a biodiversidade, criando condições propícias para a proliferação de pragas e doenças. Além disso, o transporte e o comércio internacional de produtos agrícolas de origem vegetal, que triplicaram na última década, ajudam a espalhar rapidamente os problemas fitossanitários. Face a isto, como é possível continuar a ter plantas saudáveis? É algo que podemos dar como certo? ALD - Uma das principais dificuldades com que o sector agrícola se tem debatido é, precisamente, a retirada contínua de substâncias ativas do mercado, sem que sejam disponibilizados substitutos que assegurem a proteção das plantas. Paralelamente, apesar de se estreitar cada vez mais o controlo e reforçar o rigor nas fronteiras, são ainda muitas as pragas que atingem as diferentes culturas, provocando efeitos potencialmente devastadores. Atendendo a estes constrangimentos, não sendo possível dar como certa a eterna vitalidade das plantas, o que podemos afirmar, sim, é que a ciência, a investigação e o desenvolvimento têm desempenhado um importantíssimo papel neste sentido, proporcionando sofisticadas soluções que podem ser utilizadas para combater os inimigos das culturas de forma eficaz. Soluções essas que têm de fazer parte do dia-a-dia de todos os agricultores e para as quais é necessário encontrar alternativas, quando retiradas do mercado. Assegurar a vitalidade das plantas passa por compreender que, tal como nós precisamos de vacinas, também estas necessitam dessa proteção, face a um universo onde as contaminações chegam de toda a parte, fruto de uma mobilidade cada vez maior de pessoas e bens, que aumenta a exposição do ambiente a potenciais perigos que é necessário combater.

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GC - Como se coordena essa proteção com a salvaguarda do ambiente e da saúde do ser humano e dos animais? ALD - Contribuir para a prosperidade económica e o bem-estar social, protegendo simultaneamente os recursos naturais, fauna e flora, promovendo a biodiversidade, é uma missão assumida também pelo sector agrícola. Com o apoio das mais avançadas tecnologias, mantemo-nos em constante atualização de práticas e ferramentas que permitam otimizar a produção, poupando ao máximo o ambiente e promovendo a biodiversidade. GC - O que comemos, hoje, é seguro? ALD - Sem dúvida. Nunca o que comemos foi tão seguro como o que hoje chega à nossa mesa. Por via do rigoroso controlo imposto, desde há muito, pela regulamentação europeia (EFSA – Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar), os alimentos produzidos em território europeu são dos mais seguros. GC - É possível quantificar os efeitos das emergências fitossanitárias na agricultura, na floresta e também nos ecossistemas naturais? ALD - É possível quantificá-los do ponto de vista percentual. Hoje, através de inúmeros estudos e investigações levadas a cabo, sabemos que, de uma forma geral, as pragas e doenças são responsáveis por perdas de culturas na ordem dos 40%. Mas, além disso, e indo um pouco mais fundo, sabemos que só a Xylella fastidiosa, por exemplo, num cenário de propagação por toda a União Europeia, pode causar perdas anuais de produção de 5,5 mil milhões de euros, afetando 70% do valor de produção de árvores de fruto GC - Todos sabemos o que temos na fruteira, mas talvez nem todos saibamos que 76% da produção de pera rocha, por exemplo, pode estar em risco. Que mais culturas estão ameaçadas e porquê? ALD - Todas as culturas têm o seu grau de risco resultante da perda de soluções fitofarmacêuticas. A tendência de crescimento populacional é um dado assumido e, por isso, estima-se que, até 2050, a produção alimentar tenha de aumentar em cerca de 60% de forma a dar resposta a este crescimento. Ora, produzir em maior quantidade, para alimentar um maior número de pessoas, obriga-nos a medidas redobradas de sustentabilidade e cuidado dos solos, de forma a evitar a destruição dos mesmos e, por consequência, de diversos ecossistemas e habitats naturais. Culturas como a pera, o tomate, o milho, o azeite e o vinho foram alvo de um estudo pormenorizado, realizado pela ANIPLA em conjunto com as respetivas organizações de produtores. Se não formos capazes de aliar ciência, investigação e desenvolvimento e proteger as explorações, otimizando as produções, o resultado desse estudo aponta para riscos de perdas de produção nessas culturas na ordem dos 76% da nossa pera rocha, 82% da produção de tomate, 60% da produção de milho, 56% da de azeite e 50% do vinho nacional.


GC - Vive-se hoje num clima de “quimiofobia”? ALD - Sem qualquer dúvida. Temos vindo a assistir, nos últimos anos, a um fenómeno que nos preocupa e que nos leva a reforçar, talvez mais do que nunca, a importância de confiar na ciência: a quimiofobia. A Europa vive num mundo em que 30% dos cidadãos referem ter medo de produtos químicos e em que 40% quer viver num mundo em que estes não existem. Contudo, 82% não sabe que o sal de mesa extraído do oceano ou produzido sinteticamente são a mesma coisa. Em 150 anos, a população mundial vai crescer quase quatro vezes mais e, por isso, é necessário tornar a forma de produzir cada vez mais eficiente e sustentável. Para o conseguir, é preciso que a população entenda que só podemos confiar na ciência: é preciso desfazer dezenas de mitos ligados à produção de alimentos, que mantêm a população num universo paralelo, longe do seu suporte, e onde alimentar toda a população mundial se torna, por consequência, impossível. GC - A atual pandemia por Covid-19 veio reforçar a confiança dos consumidores na ciência para a proteção da sua saúde, mas o mesmo não se passa ao nível da proteção fitossanitária. Porque é que se confia na ciência para uma coisa e não para outra? ALD - A reflexão que fazíamos anteriormente, sobre a quimiofobia, está intimamente associada à razão que leva os cidadãos a não acreditar na ciência aplicada à agricultura. O espaço que é dado para que se instalem mitos na alimentação é um dos maiores motivos pelos quais se desconfia tanto da ciência aplicada à produção agrícola. As ideias pré-concebidas e amplamente difundidas sobre boa agricultura e menos boa agricultura, e ainda, a influência de protagonistas que nada têm que ver com os métodos e técnicas de produção, mas que rapidamente espalham informação ligada ao que comemos, representam algumas das maiores preocupações. Há uma tendência da população para duvidar da forma como os agricultores utilizam os produtos fitofarmacêuticos, sem saber que o seu uso exige que os agricultores tenham formação técnica e

“Assegurar a vitalidade das plantas passa por compreender que, tal como nós precisamos de vacinas, também estas necessitam dessa proteção, face a um universo onde as contaminações chegam de toda a parte, fruto de uma mobilidade cada vez maior de pessoas e bens, que aumenta a exposição do ambiente a potenciais perigos que é necessário combater”

específica para tal. Facto que, todos os dias, nos esforçamos por combater com mais e mais informação e aproximando a sociedade daquilo que é o dia-a-dia do agricultor, que tem como prioridade a sanidade das plantas, porque sem elas não há vida. Mais uma vez, como dizíamos, a questão central está na ciência. Que é a mesma, perante um vírus que nos colocou a todos em suspenso, e perante outros que surgem, de múltiplas formas, com um potencial enorme de devastar o que produzimos. Se, no primeiro caso, se salvam vidas humanas, no segundo, salvam-se alimentos, os mesmos que nos mantêm vivos e com saúde.

GC – A existência de uma agricultura boa e outra menos boa é, efetivamente, um mito? ALD - É óbvio que é mais um mito. Esta é talvez uma das maiores lutas instaladas no sector e que, de facto, não passa de um enorme mito que é urgente desfazer. A dicotomia forçada que, há vários anos, se tem instalado entre as chamadas agriculturas “biológica” e “convencional” leva o consumidor a acreditar que existe uma agricultura da “Primeira Liga” e outra da “Liga de Honra”, ou ainda, uma agricultura boa e uma menos boa, quando, na verdade, esta está longe de ser uma afirmação justa. Seja qual for o método de produção utilizado, em qualquer um deles, estará presente o perigo da proliferação de pragas e infestantes que devastam culturas. Em qualquer um dos casos, o agricultor terá de se socorrer das ferramentas que tem à disposição, entre as quais os produtos fitofarmacêuticos, para evitar a destruição de culturas. Assim, e atendendo a uma legislação cada vez mais apertada e restritiva a este nível, em qualquer dos formatos, a preservação dos solos e explorações está garantida por apertadas normas de utilização de técnicas de combate a este tipo de pragas e infestantes. Sem diferenças e mantendo uma preocupação comum: produzir de forma consciente, responsável e, acima de tudo, sustentável. Um mito que temos vindo a tentar combater, talvez por ser o maior de todos, e aquele que mais afasta a população das reais preocupações que todos devemos ter quando falamos de produção alimentar. GC - Portugal esteve na génese do primeiro acordo internacional de sanidade vegetal, assinado em 1881 e visando, na época, estabelecer normas para se evitar a dispersão da

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filoxera, que dizimava as vinhas nacionais e europeias. Como tem evoluído o trabalho em torno da sanidade vegetal no país? ALD - A praga filoxera da videira foi, sem dúvida, um dos mais desafiadores flagelos de que se tem história no mundo agrícola. As videiras, um pouco por toda a Europa, coexistiram durante um longo período com estes agentes patogénicos que dizimaram, à época, 40% das culturas. Sem dúvida que, se não fossem os programas de apoio criados por inúmeras entidades e a investigação feita em torno do tema, as consequências poderiam ter sido ainda mais graves. Para a solução dos problemas causados por estes agentes, no caso específico português, têm contribuído apoios no âmbito de vários programas nacionais, como AGRO e VITIS, e internacionais, como o financiado pela NATO (PO – Plant Virus – Science for Stability), tendo sido desenvolvido um trabalho meritório na área do diagnóstico e prevenção das doenças, através de práticas sanitárias e de seleção.

“Se não formos capazes de aliar ciência, investigação e desenvolvimento e proteger as explorações, otimizando as produções, o resultado desse estudo aponta para riscos de perdas de produção nessas culturas na ordem dos 76% da nossa pera rocha, 82% da produção de tomate, 60% da produção de milho, 56% da de azeite e 50% do vinho nacional” A alteração da legislação quanto à rega da vinha e o apoio técnico das novas associações vitivinícolas, bem como o financiamento e acompanhamento de técnicos, no âmbito da proteção integrada, contribuíram também para uma maior aproximação do país aos padrões internacionais. O caso da filoxera é um bom exemplo do conceito deste tipo de proteção fitossanitária. A solução foi encontrada muito “simplesmente”, passando a plantar videiras em que a parte aérea é europeia, ou seja, que produzisse uvas com as características que desejávamos, enxertada numa variedade americana, integrando esta a parte subterrânea, uma vez que era resistente à filoxera. Ainda hoje é utilizada esta tecnologia. Na verdade, e neste domínio, Portugal tem tido, a partir dos anos 60, uma posição de destaque na investigação, com estudos pioneiros, realizados desde o início, e com a aplicação de estruturas e práticas, nos dias de hoje, que permitem o combate a este tipo de pragas e infestações que comprometem em absoluto as culturas. Por isso, acreditamos que

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o trabalho em torno da sanidade vegetal no país tem evoluído de forma contínua e positiva, sendo que o ano declarado pela ONU reflete a necessidade de olharmos para esse mesmo trabalho, valorizando-o e adicionando-lhe todos os “inputs” da ciência e modernidade, que possam contribuir para uma constante otimização dos métodos de produção, assegurando um uso sustentado dos recursos em prol do planeta. GC - A ANIPLA lançou a campanha “Considere os Factos”. Qual o seu público-alvo e a principal mensagem que visa transmitir? ALD - A campanha “Considere os Factos” foi dividida em duas fases, uma de sensibilização, a partir do já referido estudo de impacto na produtividade agrícola resultante da retirada de alguns produtos fitofarmacêuticos, e outra de apresentação de um estudo, este desenvolvido em parceria com a Universidade Católica, que surge, precisamente, a partir da necessidade de compreender o nível de conhecimento que os portugueses têm da realidade agrícola. Por isso, foi uma campanha dirigida a toda a população e teve na sua origem o objetivo de propor uma reflexão pública entre o sector agrícola e toda a sociedade civil, com todos nós enquanto consumidores. Numa primeira fase, procurámos aproximar a população dos principais desafios com que o sector agrícola se depara, concretamente, culturas que se encontram em maior risco e principais mitos ligados à alimentação. Num segundo momento, fomos testar o conhecimento da população portuguesa sobre esses mesmos mitos e percebemos, com os resultados obtidos, que existe um desconhecimento geral dos portugueses sobre alguns dos principais desafios colocados à atividade agrícola, o que manifesta também um claro afastamento entre consumidores e produtores. Este trabalho revelou-se especialmente pertinente e interessante, do ponto de vista da estratégia de comunicação do sector, que precisa de ser cada vez mais de dentro para fora. Os tempos difíceis que vivemos atualmente vieram também reforçar esta necessidade urgente de partilhar com a sociedade o trabalho dos produtores de alimentos, que continuam dia após dia a produzir, num negócio a céu aberto, e perante as adversidades de uma natureza que não para de nos surpreender. GC - Sabendo-se que, por um lado, a quantidade de terra arável disponível não vai crescer (nem é desejável que cresça, pesando na destruição de florestas) e, por outro, que dada a pressão demográfica, terá natural tendência para se reduzir, como será possível produzir mais e melhor, com menos? ALD - Otimizar. Se precisamos de produzir mais, preservando um terreno que não crescerá à medida da nossa vontade, teremos de rentabilizar ao máximo as ferramentas que a ciência coloca à disposição da agricultura moderna. Tendo como base fundamental a aplicação de medidas de mitigação e as boas práticas agrícolas, existem diversas estratégias que podem ser utilizadas pelos agricultores para combater os inimigos das culturas de forma eficaz, otimizando os resultados


da produção e benefícios dos produtos fitofarmacêuticos, promovendo a manutenção da biodiversidade sem comprometer os terrenos e florestas. Consciente do papel positivo que a indústria pode desempenhar neste processo, a ANIPLA tem implementado vários projetos que visam a adoção das melhores práticas agrícolas, estabelecendo o equilíbrio entre a produção necessária, a economia e a responsabilidade ambiental. A Smart Farm,

a quinta inteligente de demonstração e implementação de boas práticas agrícolas recomendadas pela indústria fitofarmacêutica, é um bom exemplo disso, ao englobar o desenvolvimento de projetos que asseguram a proteção da água e do solo (projeto TOPPS) e a promoção da biodiversidade (Estação de Biodiversidade). A Estação de Biodiversidade, na Smart Farm, é um dos melhores exemplos onde são demonstradas as melhores práticas a ser utilizadas pelos agricultores para combater os inimigos das culturas, otimizando os resultados da utilização de produtos fitofarmacêuticos. Algumas dessas práticas incluem as sementeiras das entrelinhas e bordaduras dos terrenos junto à cultura, com espécies atrativas aos polinizadores e não só. Estas estruturas são locais de proteção ambiental por excelência, que podem albergar uma enorme variedade de espécies, protegendo e melhorando as condições de infiltração da água no solo. Manter ou construir estruturas ecológicas que representem habitat e alimento para os insetos auxiliares, entre eles os polinizadores, como, por exemplo, faixas que contenham espécies vegetais com flor ou abrigos, é outra das técnicas aconselhadas pela indústria. Estes habitats represen-

tam uma dupla mais-valia: por um lado, são benéficos para as espécies de insetos polinizadores e, por outro, para as culturas e para o ecossistema envolvente à exploração agrícola. No fundo, técnicas que a indústria desenvolve e promove e que podem, a longo prazo, ajudar-nos a produzir de forma consciente e sustentável, garantindo os resultados desejados e protegendo aquilo que mais nos preocupa: o ambiente.

GC - A corrida aos supermercados a que assistimos nas últimas semanas e a possibilidade de haver falta de alimentos trouxeram a agricultura novamente para o centro das atenções dos portugueses. Como é que devemos pensar também na nossa independência alimentar? ALD - De facto, a pandemia que vivemos trouxe desafios acrescidos ao sector agroalimentar, que foi chamado a produzir mais alimentos, em menor tempo, e com uma articulação ainda maior entre produtores, logística e distribuição, sectores críticos e integrados na lógica de produtor/consumidor final. Paralelamente, atendendo ao contexto que vivemos, as dificuldades ao nível das importações e exportações entre países vieram atribuir uma maior relevância à capacidade de cada país atingir a independência alimentar, ou seja, a capacidade de produzir integralmente todos os alimentos de que necessita. Ainda assim, interligados, estes três sectores garantiram que, até agora, foi possível controlar essa mesma corrida aos supermercados, assegurando um fornecimento diário de todo o tipo de produtos essenciais, facto que é de destacar. Pensar em independência alimentar é um tema que tem atravessado décadas.

Portugal deu passos muito importantes, sendo hoje o principal produtor e exportador de alguns produtos, como azeite, vinho e frutas. Contamos hoje com um maior aproveitamento do terreno arável, um nível de exploração mais eficiente (graças à inovação e tecnologia), com laboratórios de estudo e seleção de sementes ao serviço do sector agroalimentar, com infraestruturas de rega e preservação de habitats, como acima comentávamos. Otimizámos equipamentos, colocámos a computorização ao serviço da agricultura e, por isso, sentimos que, apesar do caminho ainda ser longo, com o tempo, temos dotado o sector das ferramentas que necessita para que, um dia, possa atingir essa independência. GC - O paradigma da missão da agricultura está a mudar? É a adoção e reforço de práticas sustentáveis que marcará o futuro do sector? ALD - Não é só o paradigma da missão da agricultura que está a mudar. O do agricultor também. Uma tendência para a desinformação e uma visão errada sobre as suas práticas e atuação, sobretudo quando falamos da aplicação de produtos fitofarmacêuticos, adensa uma visão distorcida do sector e do seu verdadeiro papel enquanto produtor de alimentos. A extensão que ganham fenómenos como a quimiofobia ou a luta convencional versus biológicos tem que ser travada, através de uma comunicação que acontece a uma só voz e que partilha com o mundo o que está verdadeiramente a acontecer: retirada de substâncias ativas no mercado (sem substitutos), aparecimento crescente de novas pragas e um alerta urgente para compreender a importância e contribuição das plantas na preservação dos ecossistemas. Sem dúvida que o reforço de práticas sustentáveis e o constante relembrar das mesmas são a mais poderosa ferramenta que ciência, governos, produtores e todos os restantes envolvidos têm ao seu dispor na defesa da sustentabilidade. O grande desafio é comum a todo o planeta: garantir alimentos para sete biliões de habitantes, um número que continuará a crescer. Como produzir alimentos para todos, sem esgotar os recursos naturais do planeta e garantindo a sobrevivência das espécies, é a maior de todas as interrogações, para as quais a ciência, tecnologia e inovação têm prestado um incrível contributo. Garantir alimentos suficientes para sete biliões hoje e 10 biliões de habitantes amanhã será a grande corrida para todo o planeta. Que não está assim tão longe, é já em 2050.

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OPINIÃO

PEDRO PIMENTEL diretor geral da Centromarca

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SETE JANELAS PARA O HORIZONTE PÓS-COVID19 Não é fácil, quando se está ainda a lidar com o turbilhão de uma crise, pensar e projetar o pós-crise. Mais difícil ainda, quando se está perante um foco de crise inesperado, (ainda) curto no tempo, mas devastador no impacto. Ou quando ainda não “incorporamos” as respetivas implicações na nossa vida diária pessoal, familiar ou profissional. Sem querer parecer insensível, o que aí virá assemelha-se mais ao que aconteceria se tivesse havido um desastre natural à escala global (com a vantagem de não terem sido destruídas infraestruturas, acessos ou habitações), do que a uma réplica da crise de 2008 ou, por que nos é mais próximo no tempo e no espaço, o que ocorreu em Portugal em 2010/2011 e anos subsequentes à intervenção da Troika. E a recuperação em Portugal e no nosso mercado dependerá tanto de aquilo que conseguirmos internamente fazer, como do que ocorrer em países e mercados estratégicos, seja enquanto destino dos nossos produtos, seja, por exemplo, enquanto mercados emissores a nível de turismo. Esta crise, pelos seus contornos, mostrou algumas fragilidades do mundo atual, fragilidades que colocam em causa valores individuais que pareciam conquistados e irrenunciáveis, como a liberdade, mobilidade, humanismo ou a própria democracia. Mas também coloca em causa as relações internacionais, com focos de autoritarismo e autismo, mas também de apelo ao nacionalismo e ao protecionismo, e que colocam em questão o bilateralismo e os próprios equilíbrios internacionais. Muito do que vai acontecer no Mundo Pós-Covid19, muito do que vai acontecer em Portugal, dependerá de como forem reconstruídos esses equilíbrios, de como se processará (ão) o (s) ciclo(s) de recuperação económica, de como essa recuperação será mais homogénea ou assimétrica, de como a Europa e, especialmente, a Zona Euro sobreviverão a este grande embate. Colocando mais os olhos em Portugal e no ecossistema do grande consumo, há um conjunto de grandes janelas que nos permitem se não perpetivar em detalhe, pelo menos perceber onde - todos os que aí nos movemos – devemos concentrar o essencial da nossa atenção. A começar pelo fator que esteve na origem desta crise e de que depende a respetiva ultrapassagem: a SAÚDE. Será ela a definir e condicionar como a recuperação económica se processará e qual a velocidade a que ocorrerá. A nível nacional e no plano internacional. A ultrapassagem dos medos gerados por esta pandemia depende, em muito,

do comportamento consciencioso dos portugueses, mas também da capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde, que, pelo menos até agora, tem sabido dar uma boa resposta às necessidades e ultrapassar as dificuldades e constrangimentos antecipadamente conhecidos. Num mundo pós-Covid, em que o novo paradigma se estabelecerá combinando Segurança e Saúde, o reconhecimento interno e externo daquela resposta pode permitir uma mais rápida retoma, seja pelo mais rápido restabelecimento do funcionamento da economia, seja pela reocupação, por Portugal, de um lugar cimeiro enquanto destino turístico, apesar das incertezas que incidem sobre esse sector. De entre as muitas limitações e constrangimentos que esta crise gerou, a que mais implicações tem a nível económico e de mercado prende-se com um dos nossos valores mais fundamentais: a MOBILIDADE. A necessidade de uma elevadíssima parcela da população ser colocada em confinamento e os receios de contaminação associados aos atos de compra realizados em locais mais frequentados têm, como não poderia deixar de ser, um efeito terrível no mercado, que a compra online não consegue, por si só, compensar. Bem longe disso. Será o progressivo regresso a uma mobilidade, ainda que mais tímida e controlada, um dos mais importantes fatores para perspetivar a forma como decorrerá a recuperação do sector do grande consumo. Uma mobilidade limitada, seja por imposição administrativa, seja por nos sentirmos motivados para tal, funcionará sempre como um fator de inibição a essa recuperação. A digitalização das nossas vidas, nas mais diferentes áreas, é, de há muito, incontornável. Contudo, o DIGITAL parece ter ganho um impulso ainda maior com esta crise. Nas comunicações, na organização do trabalho, na reorganização das nossas vidas em casa, combinando profissão, ensino e lazer, ou no ato de compra, a conexão digital é a principal forma de combater o isolamento que, noutras circunstâncias ou noutras épocas, o confinamento obrigatoriamente provocaria. Alguns destes efeitos, na área laboral, da educação ou comercial, têm condições para saírem fortemente reforçados no final desta crise e gerar mudanças comportamentais importantes e com impacto nas empresas e no mercado. Mas terão também implicações em relação ao que será a necessidade de fornecimento de serviços dos operadores de telecomunicações, na


disponibilidade de equipamentos, na relação entre colaboradores e empresas ou, como veremos de seguida, na organização das operações logísticas. Esta crise veio colocar uma pressão inédita ao nível da SUPPLY CHAIN. Questões como o fecho de fronteiras e a criação de diversos obstáculos (e atrasos) ao transporte internacional de matérias-primas e produtos, a alteração abrupta do volume e do padrão de compra, em especial nas primeiras semanas de março, as necessidades específicas de aprovisionamento de muitos retalhistas, a reorganização apressada das operações ou a transferência de uma parcela das compras das lojas para entregas ao domicílio criaram uma forte entropia no funcionamento da cadeia de abastecimento. Fornecedores, operadores logísticos e insígnias foram sabendo ultrapassá-las, com alguns atrasos nas entregas, no caso do comércio online, mas sempre com a capacidade de dar ao consumidor uma razoável tranquilidade no que se refere ao acesso e disponibilidade a tudo o que é essencial. Não é fácil antecipar se o que ocorreu nestas semanas corresponde a algo atípico, mas perfeitamente entendível à luz da conjuntura atual, se algo com implicações futuras, mas parece certo que, por exemplo, a infraestrutura de distribuição capilar terá de sofrer um forte investimento e desenvolvimento no futuro próximo. Saúde, mobilidade, digitalização e supply chain interferem, obviamente, com o funcionamento do MERCADO. Um mercado que vinha apresentando, nos meses que antecederam esta crise, um comportamento razoavelmente positivo, mas que, com o que está a ocorrer nestas últimas semanas, deixa inúmeros pontos de interrogação a todos os operadores. Neste período convulsivo, houve aparentemente muitos ganhadores, mas também vários perdedores. Produtos, marcas, empresas, insígnias, canais tiveram vencedores e vencidos e, por vezes, situações muito díspares dentro de um mesmo universo. A paralisação do canal Horeca (e o impacto no canal grossista) gerou fortes problemas a todo o mercado, mas – como é fácil perceber – problemas mais profundos a quem depende fortemente desse canal. Mas mesmo o retalho convencional, ultrapassado o período de euforia que se prolongou por pouco mais de duas semanas, está já a enfrentar dificuldades, seja pela redução do número de visitas às lojas, seja pelo impacto, nas margens do negócio, de uma compra excessivamente programática e racionalizada, adaptada a um modo (ainda que pontual) de vida distinto do habitual. E esse impacto prolonga-se ao longo da cadeia, afetando produtores, fornecedores e marcas. É notório que o sector do grande consumo é, tradicionalmente, um dos mais resilientes em situações de crise, mas, na verdade, é fácil perspetivar que quebras substanciais no rendimento disponível das famílias e o forte impacto desta crise no futuro do turismo e do canal Horeca são argumentos suficientes para adivinhar tempos muito difíceis nos próximos meses.

As MARCAS mostraram amplamente neste período que são muito mais do que a identificação de um qualquer produto. A forma como encararam as suas obrigações enquanto fornecedoras de bens mais ou menos essenciais foi inquestionável, mantendo as operações em funcionamento, não obstante os riscos que tal envolvia, direcionando as suas produções para os bens mais prioritários, desenvolvendo uma ampla ação de responsabilidade social, apoiando causas, campanhas, instituições e ajudando a cobrir inúmeras brechas do sistema. Mas é também verdade que, ultrapassada esta fase mais fulminante da crise, as empresas que as detêm irão fazer contas à vida e terão que fazer opções relativamente à alocação dos seus orçamentos e não será descabido pensar que alguns dos que são os valores mais intrínsecos da marca, com destaque para a inovação e a comunicação, poderão ser fortemente prejudicados no curto/ médio prazo. E que rendimentos disponíveis menores afastarão os consumidores de valores que se vinham, nos últimos anos, recuperando, como diversidade, personalização ou experiência de compra, regressando-se a uma competição especialmente assente nos preços. Por tudo isto, é fácil perceber que o comandante do novo barco em que entraremos, quando sairmos desta fase de pandemia paralisante, será, como é sempre, o CONSUMIDOR. Um consumidor que está a passar, nestas últimas semanas, por uma prova de fogo, que é também uma prova de esforço e de resistência. Um consumidor a quem, legitimamente, foram gerados medos que demorarão a ser ultrapassados, medos que para alguns foram até confortáveis, mas que para outros geraram profundas alterações na forma como veem o seu futuro próximo, havendo até aqueles que, por esta altura, se sentem ameaçados pela simples presença de outro ser humano. Um consumidor que foi obrigado, abruptamente, a reorganizar a sua vida, sendo conduzido para um conjunto de comportamentos, até aqui, atípicos. Estou convencido que o comportamento de consumo a que estamos, nesta altura, a assistir não configura ainda qualquer “novo normal”, mas apenas o “normal” de uma situação de exceção, que motiva comportamentos de exceção. Mas não é ainda possível afirmar, sem receio de desmentido, que esta exceção não se converterá na nova regra. Parece-me, contudo, mais crível que saiamos deste período rumo a uma “regra” distinta, mais estática, racionalizada e digital, que incorpora tudo o que referi anteriormente, do que rumo a um regresso à “regra” pré-Covid. Em qualquer dos casos, os próximos tempos serão muito duros, muitas famílias portuguesas terão saudades da situação pré-Covid e tenho poucas dúvidas que a nossa vida enquanto seres humanos será, enquanto não regressarmos à normalidade, menos rica, menos cheia e menos feliz.

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TEXTO Carina Rodrigues FOTOS D.R./Shutterstock

“O CÉU É O LIMITE!” Dois milhões de produtos, o equivalente a mais de 20 hipermercados, 20 mil marcas e mais de 800 “sellers”. Correndo o risco de já estar desfasado, passados alguns dias desde a conversa com Gaspar D’Orey, CEO do Dott, assim se mede, em traços gerais, a representatividade do marketplace que nasceu em 2019, com o apoio de duas das maiores empresas nacionais – CTT e Sonae -, com o objetivo de ser o maior shopping de Portugal. E com a missão de ser dos portugueses e para os portugueses. Com o primeiro aniversário a ser comemorado num ano que vai entrar para os anais da história mundial pela pandemia de Covid-19, a missão do Dott faz ainda mais sentido. Pelo serviço, tem vindo a conquistar compradores e parceiros. E abraçou o compromisso de trazer para o canal online todas as empresas de retalho, principalmente as de menor dimensão e de comércio tradicional. Cumpre-se, assim, um dos objetivos fundadores do Dott, o de ajudar a digitalizar Portugal e a trazer para o digital o maior número de compradores possível.

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Eu, Câmara Municipal do Porto, Câmara Municipal de Lisboa, Associação Comercial de Braga, CIM Coimbra, entre outras”, detalha Gaspar D’Orey. “Sentimos que temos uma responsabilidade social para com a economia portuguesa, as PME do nosso país empregam mais de três quartos da força de trabalho nacional e, a permanecerem fechadas, serão sinónimo de abrandamento económico, indesejável a todos”. Face à crise económica derivada da pandemia por Covid-19, o Dott tem, na opinião do seu CEO, “a obrigação de ajudar”. Tanto mais que, dadas as restrições de movimentação necessárias para conter a enfermidade, O céu é o limite! Queremos sempre mais e melhor, para os nossos consumidores e para as empresas que connosco trabalham. Há umas semanas atrás, não imaginávamos estar a inaugurar uma feira online com a presença da senhora ministra da Agricultura”. A afirmação é de Gaspar D’Orey, CEO do Dott, quando questionado se é pelos serviços que o marketplace vai conquistar o seu espaço nos hábitos de consumo digitais dos portugueses. A feira a que se refere é a Feira do Queijo DOP, que decorreu online durante praticamente todo o mês de abril e parte de maio, em parceria com os CTT e a Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra. Uma iniciativa pioneira na promoção da atividade dos pequenos produtores de queijo DOP, cujas vendas sofreram fortes quebras devido ao isolamento social e ao estado de emergência decretado para conter a propagação da pandemia de Covid-19. Mas esta é apenas uma das muitas iniciativas desenvolvidas, nestes últimos meses, desde o início do surto epidémico, pelo marketplace que, em 2020, celebrou o seu primeiro aniversário. Desde programas para apoiar a integração de vendedores na sua plataforma a parcerias com o Cetelem para o financiamento das compras, à oferta de portes em determinadas categorias de bens essenciais, já em contexto de crise, ou, ainda, na colocação online dos lojistas dos centros comerciais da Sonae Sierra, que foram encerrados aquando do decreto do estado de emergência. Foram várias as estratégias do Dott para se adaptar à disrupção trazida pela pandemia. “O Dott adaptou-se rapidamente, primeiro aos consumidores e, a seguir, às empresas. Aumentámos a variedade de produtos, nomeadamente, de produtos ligados a bens de primeira necessidade e à categoria de supermercado, para que nada faltasse aos portugueses, e abraçámos o compromisso de trazer para o canal online todas as empresas de retalho, principalmente as do comércio tradicional, através de inúmeras parcerias com associações e empresas, como é o caso da ANJE, Portugal Sou

“Sentimos que temos uma responsabilidade social para com a economia portuguesa, as PME do nosso país empregam mais de três quartos da força de trabalho nacional e, a permanecerem fechadas, serão sinónimo de abrandamento económico, indesejável a todos”

o online passou a ter um grande impacto na vida dos consumidores. Uma tendência global à qual, tal como vírus que a potenciou, o país não escapou. Sendo certo que o retalho em Portugal ainda se encontra, de modo geral, pouco digitalizado e que, anteriormente, não havia entre os portugueses o hábito generalizado de comprar online, sobretudo bens alimentares, a pandemia veio configurar um “call to action” coletivo para a necessidade de reforçar as operações de e-commerce. Até porque, no entender de Gaspar D’Orey, Portugal ainda tem uma ampla margem de crescimento neste domínio. “Segundo o Eurostat, apenas 39% dos portugueses com acesso à Internet compraram online, em 2019, e este é um número baixo. De acordo com o mesmo, no Reino Unido, cerca de 87% da população com acesso à Internet já compra online, na Dinamarca 84%, na Noruega 82%, na Holanda 81% e até Espanha, aqui ao lado, já tem percentagens superiores, neste caso de 58%. Somos dos países com menor percentagem de compras online, pelo que ainda temos muito para crescer”, defende. Um potencial a capitalizar no mundo pós-pandemia, quando os estudos de mercado indicam a manutenção de muitos dos comportamentos adquiridos durante o

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surto. Recentemente, a Nielsen inquiriu consumidores de 29 países da Europa sobre o impacto da Covid-19 e apurou que, para muitos, este continuará a sentir-se, pelo menos, durante 12 meses. E sinalizou ainda que muitas das grandes mudanças a que se assistiram no consumo e no retalho irão manter-se no pós-pandemia. Antes da Covid-19, um conjunto de países europeus estava entre os menos recetivos ao e-commerce. A penetração das compras online no retalho alimentar não era elevada, com menos de um em cada cinco consumidores da Europa Ocidental e menos de um em cada 10 consumidores da Europa de Leste a usar este canal. Mas os novos hábitos adotados com o surto de Covid-19, acelerados pela necessidade de distanciamento social, trouxeram uma inversão no comportamento dos consumidores e potenciaram o forte crescimento das compras online neste período. Apesar dos desafios colocados à capacidade de entrega dos operadores pela procura sem precedentes, a mudança para o e-commerce mostra como os consumidores estão a adaptar o seu comportamento, quando as necessidades estão alinhadas com os benefícios.

Balanço positivo

Concretizado o primeiro ano de existência, e não obstante a situação excecional atualmente vivida, o balanço da evolução do Dott é, para Gaspar D’Orey, francamente positivo. “Construímos e colocámos no mercado, em apenas seis meses, um shopping online. Um ano passado, temos uma marca com resultados fantásticos, com um índice de recordação que chegou ao nível de outras marcas bem conhecidas e queridas dos portugueses e a cumprir os objetivos do seu plano de negócio”, defende. “Neste momento, orgulhamo-nos de dizer que já seis milhões de portugueses visitaram o Dott e que temos mais de dois milhões de produtos, o equivalente a mais de 20 hipermercados, 20 mil marcas e mais de 800 ‘sellers’”. O Dott nasceu para ser o maior shopping de Portugal, com a missão de ser dos portugueses e para os portugueses. “Aos poucos, temos imensos casos de pessoas que nunca tinham vendido online a fazê-lo e muitas mais que, por desconfiança ou desconhecimento, não compravam online e agora o passaram a fazer”. É que, entre os objetivos da plataforma, está a conquista de mesmo aqueles compradores mais céticos. “Acreditamos que essa também é uma das nossas missões, ajudar a digitalizar Portugal e trazer para o digital o maior número de compradores possível”. Uma missão onde em muito contribui o suporte de ter como acionistas duas das maiores empresas nacionais, como são os CTT e a Sonae. “Pen-

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so que soubemos alavancar em todos os aspetos dos nossos acionistas, onde havia um verdadeiro ‘expertise’, e noutros trilhámos o nosso próprio caminho. Acima de tudo, continuamos a trabalhar em parceria com os grupos onde faz sentido: com os CTT a elevar a fasquia do serviço de entregas e com a Sonae, por exemplo, na recente parceria com a Sonae Sierra a trazer os seus shoppings para o digital”. E é na variedade, proximidade e conveniência que Gaspar D’Orey diz residir o fator de diferenciação do Dott, que claramente se quer posicionar como uma porta de entrada para todos os que queiram vender pela Internet. Se é certo que, com o decretar do estado de emergência e fruto do aumento de parceiros, que permitiu oferecer uma ainda maior oferta, as vendas do marketplace aumentaram, também é um facto que esta tem sido, desde o início, a filosofia do projeto. “Desde o início que temos um espetro bastante alargado de vendedores, desde grandes a pequenas marcas, desde grandes vendedores àqueles que o consumidor só está habituado a ver nos pequenos mercadinhos de rua ou na sua conta de Instagram. Acreditamos na variedade e diversidade e isso não mudou. O Dott tem sempre a sua porta aberta para todos os que queiram fazer parte deste marketplace”. A crise sanitária não veio fazer recuar o investimento anunciado por parte dos dois promotores do Dott de 10 a 15 milhões de euros, nos próximos cinco anos, para revolucionar o crescimento do e-commerce em Portugal, com o CEO do marketplace a garantir que, para já, tudo se mantém. Há várias iniciativas na calha para este ano, mas que de momento ainda não pode falar. “Temos muitas, estamos em constante ebulição e transformação”. Com o primeiro aniversário a ser assinalado num clima de grande incerteza quanto ao futuro, Gaspar D’Orey deixa, no entanto, uma garantia. “O nosso único objetivo é continuarmos a cumprir a nossa missão, dos portugueses para os portugueses, superando os objetivos do plano de crescimento que traçámos”. Até porque o céu é o limite!


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TEXTO Bruno Farias FOTOS Sara Matos

“O MERCACHEFE SURGIU UM POUCO ANTES DO TEMPO” Com uma vida dedicada ao comércio, Ricardo Wallis é o rosto visível associado ao MercaChefe. O marketplace que abriu portas com essa mesma marca comercial, em 2015, e detido pela Buyin.PT, empresa que chamou a si a responsabilidade de criar o primeiro e-marketplace B2B nacional para o canal Horeca e retalho alimentar. Uma ideia inovadora para o canal a que se dirige, que passou, assim, a ter uma plataforma eletrónica de compra e venda de produtos alimentares, bebidas e produtos não alimentares para profissionais. Mas que, em virtude da pandemia da Covid-19, passou a estar disponível também ao consumidor final, com resultados surpreendentes.

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ssumindo-se, desde o seu arranque, como uma plataforma de comércio eletrónico grossista, cujo objetivo é desenvolver um modelo de mercado virtual equivalente ao dos mercados presenciais, ou seja, um B2B de alimentação de perecíveis, e com uma visão muito clara de ser “o marketplace virtual de alimentação da rede de grossistas”, o mercachefe.pt, decidiu, a título excecional, durante o período de pandemia, abrir os seus serviços a todos os particulares interessados. Uma forma solidária de poder ajudar a minimizar os eventuais problemas de abastecimento que pareceriam surgir no decorrer do mês de março, onde o açabarcamento registado nas lojas do retalho físico se apresentava como uma possível ameaça ao bem-estar comunitário. Assim, e a partir de dia 18 de março, foi possível a qualquer consumidor proceder a compras online em mercachefe.pt, assegurando a plataforma, dentro dos stocks existentes, a recolha direta dos produtos junto dos respetivos fabricantes e a logística de transporte para casa dos interessados. Disponíveis para entrega estiveram, e ainda estão, todos os artigos essenciais que os consumidores portugueses precisam: produtos de limpeza, produtos alimentares e bebidas, descartáveis, frigoríficos ou arcas congeladoras para conservar os seus alimentos, entre outros, assegurando a plataforma a cobertura de Portugal Continental. “O Mercachefe, na verdade, é uma empresa de serviços. Temos a parte tecnológica, as parcerias (os preços são sempre preços de revenda e não ganhamos nada com a logística). Ainda não sabemos se, no futuro, vamos voltar exclusivamente ao modelo B2B”, responde antecipadamente à questão Ricardo Wallis, CEO da Buyin.PT. A verdade que é o futuro se apresenta indefinido, sob vários prismas, e a recuperação do canal Horeca não será certa, como em outras atividades, pelo que se torna difícil fazer previsões. “Quanto a 2020 não esperamos nada. Não nos focamos em números, estes dependem do trabalho que fizermos, da credibilidade da marca. A marca tem de crescer sustentadamente, sem objetivos de números. Se não houver reclamações, ou se houver, mas forem devidamente tratadas, os compradores vão comprar porque têm uma ferramenta extraordi-

nária, um excelente serviço pós-venda e marcas e produtos de qualidade a bons preços. O sucesso só pode ser garantido. Para isto acontecer, temos de nos focar no atendimento ao cliente a 100%”, assevera o fundador da MercaChefe. Mas o caminho futuro será sempre, na perspetiva de Ricardo Wallis, por intermédio da digitalização, seja por venda “direct to consumer”, como nos sites de marca com opção de compra online, seja por via de marketplaces como o MercaChefe. Facto é que, desde o início desta pandemia, e em resposta aos múltiplos contactos recebidos de particulares para se registarem na plataforma, o marketplace sectorial passou a estar disponível também para usufruto do consumidor final. “Uma vez que tínhamos a plataforma tecnológica a trabalhar, com a logística a funcionar perfeitamente, uma equipa de pós-venda mais que treinada, decidimos que tínhamos que ajudar os compradores. Por outro lado, também

“Costumava dizer que, no fim de 2020, queríamos já ter bastantes vendas. Desde que abrimos o marketplace ao consumidor, houve um ‘boom’ impressionante. As vendas aumentaram mais de 100%. Estamos a fazer entregas todos os dias”

começámos a ser contactados por muitas empresas desesperadas que precisavam de vender os seus produtos, muitos deles perecíveis, e não tinham modo de o fazer, porque os seus clientes estavam encerrados”. Consequência imediata e visível das medidas de contenção colocadas em prática pelo Executivo e que levaram a que o MercaChefe, rapidamente, evoluísse de uma lógica operacional estritamente B2B para uma atuação B2C, mas sem descurar os critérios utilizados na adesão de novas empresas na plataforma que agora serve profissionais e consumidores. “Começámos a aceitar essas empresas que contactavam para poderem vender connosco, sem descurar o rigor no processo de integração de novos parceiros que sempre tivemos. Nomeadamente, dar-lhes a conhecer muito bem o modelo de negócio e assegurar que têm de ter stock, caso contrário, não podem vender no MercaChefe. Costumava dizer que, no fim de 2020, queríamos já ter bastantes vendas. Desde que abrimos o marketplace ao consumidor, houve um ‘boom’ impressionante. As vendas aumentaram mais de 100%. Estamos a fazer entregas todos os dias”.

Vantagem competitiva

Entre as vantagens competitivas deste modelo de negócio encontra-se o facto de operar sem stock próprio, o que faz com que nunca tenha rutura. “Pode acontecer o produtor não ter produto, mas, quando isso acontece, antes da venda,

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desativa-o, logo, não há rutura de stock”, detalha Ricardo Wallis. E desde que começou a pandemia da Covid-19 o número de pequenas empresas aceites no MercaChefe também tem aumentado. Com distintos perfis comerciais e necessidades diversas, a verdade é que, se ainda “há dois anos, eramos nós que ‘corríamos’ atrás das empresas, a explicar o nosso modelo de negócio, de modo a que percebessem que podiam vender online de modo direto através de nós, de há um mês para cá, são as empresas que ‘correm’ atrás de nós para vender no MercaChefe. A logística é um dos principais aspetos na distribuição, seja de que modelo for. O comércio eletrónico é só mais uma maneira de fazer comércio”. De forma simplificada, em suporte digital, com o processo de inscrição e compra no MercaChefe a ser simplificado, desde o registo, e respetiva

Apoiar a agricultura A Buyin.pt e a Oikos estabeleceram uma parceria para apoiar os pequenos e médios agricultores nacionais na comercialização dos seus produtos. Nesta parceria, a Oikos, através do SmartFarmer, um negócio social que tem vindo a ser incubado nesta organização, vai gerir uma “flagship store” na plataforma de comércio eletrónico MercaChefe.pt. O principal objetivo é aproximar produtores e consumidores através do comércio eletrónico, promovendo o consumo local das famílias e dos consumidores coletivos, nomeadamente instituições particulares de solidariedade social (IPSS), Misericórdias e câmaras municipais, disponibilizando um novo canal de escoamento aos agricultores. A MercaChefe.pt encarrega-se, dentro dos stocks disponíveis, de recolher diretamente os produtos junto dos respetivos produtores e entregar em casa dos clientes num prazo de 48 horas. Esta parceria permanecerá no pós-crise de saúde pública e continuará a ser dinamizada por uma crescente rede de parceiros nos territórios.

comprovação de que se trata, efetivamente, de um comprador, ao processo de compra em si, onde, ao fazer uma determinada encomenda, o utilizador fica logo a saber qual o dia da entrega (dia seguinte mais um) e liquida a sua compra. “Imediatamente, o software envia uma nota de encomenda para cada empresa a quem o comprador comprou com a descrição dos produtos. No dia seguinte, a transportadora vai levantar os produtos aos produtores, que podem estar localizados em qualquer parte de Portugal. Durante a noite é feita consolidação. E, no dia seguinte, é entregue ao comprador. Quem compra na segunda-feira, recebe na quarta. Trabalhamos com, praticamente, todas as empresas de logística. Insistimos muito que não pode haver falhas nem na recolha nem na entrega.

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Cada empresa de logística tem uma pessoa que só trabalha a nossa conta”, detalha Ricardo Wallis.

Parceria com a SIMAB

Não obstante a evolução que o MercaChefe apresentou nas últimas semanas, com natural destaque para uma maior presença junto do consumidor final, etapa incontornável para a sua afirmação no seu, ainda, curto percurso no mercado foi a parceria estabelecida com a SIMAB, entidade que gere a rede nacional de mercados abastecedores, e a startup tecnológica Buyin.PT, detentora da MercaChefe. Contrato de parceria para a promoção do comércio eletrónico que se propõe a envolver todos os mercados geridos pela SIMAB e que permitiu a todos os operadores, nesses mesmos mercados, ter acesso privilegiado às plataformas eletrónicas propriedade da Buyin. PT: MercaChefe.pt e BuyinPortugal.pt (e-marketplace B2B de apoio às empresas exportadoras portuguesas). Protocolo que tem como principais metas o incentivo ao comércio digital e reforço da cooperação económica e comercial entre as empresas portuguesas, que se revestiu de importância significativa para ambas as partes envolvidas. “A parceria com a SIMAB foi muito importante, para ambas as partes. São uma organização muito credível, com grandes operadores, com produtos que toda a gente compra. Para a SIMAB, também permitiu evoluir para um novo serviço de comércio. No futuro, os compradores deixarão de ter a necessidade de ir com as suas carrinhas carregar aos mercados abastecedores, porque podem fazer a sua compra online e esperar um dia ou dois pela entrega”. E se, aquando da assinatura desse protocolo, há pouco mais de dois anos, a maior parte dos empresários não estava ainda vocacionada para vender online, hoje, a realidade é distinta. “O MercaChefe surgiu um pouco antes do tempo, quando falava de marketplace, poucos sabiam ao que me estava a referir. Hoje, as pessoas já sabem o que é. Mas, pelo facto de ter sido lançado quando foi, deu-nos a possibilidade de ajustar, ouvir as pessoas e ir adaptando. Hoje, são muitas as empresas que vendem no MercaChefe, desde as grandes e detentoras de marcas reconhecidas, aos pequenos produtores de vinhos e frutas e legumes, por exemplo. Agora vão entrar várias empresas produtoras e distribuidoras de flores e estamos a negociar com empresas abastecedoras dos mercados de peixe do mar. Somos a maior loja de eletrodomésticos da Whirlpool, por exemplo, porque temos todo o seu catálogo para venda”, assume Ricardo Wallis. O que valida o papel e utilidade da plataforma sectorial especializada que não quer, ou queria, ser mais do que o que se propôs a ser desde o início: uma plataforma sectorial, dedicada, onde o objetivo é vender tudo o que faça sentido dentro do canal Horeca e do retalho alimentar. “O MercaChefe faz todo o sentido. Especializou-se só neste sector. Não quer vender roupas nem sapatos, a não ser que estejam relacionados com o sector. Nem as empresas nem os consumidores podem fugir ao comércio online. O comércio foi mudando. Há 50 anos, ia-se à Baixa de Lisboa, depois passou-se a ir às Avenidas Novas, depois aos centros comerciais, depois aos hipermercados e, agora, o comércio online começa a ‘roubar’ os compradores”, conclui. Resta saber que caminhos futuros o “novo normal” poderá trazer às atividades comerciais que tiveram capacidade de reagir e se adaptar a tempos de emergência e exceção.


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ENTREVISTA TEXTO Bruno Farias FOTOS D.R.

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“Esta pandemia fez com que muitas pessoas experimentassem, pela primeira vez, uma compra online” As palavras são de Tiago Oom, diretor da REDUNIQ, que em entrevista à Grande Consumo aborda as principais vantagens do mais recente serviço da marca: o REDQUNIQ @Payments, uma forma bastante simplificada de pagamentos remotos, dirigida a todo o tipo de comércio. Um dos muitos serviços prestados pela REDUNIQ para tornar o futuro do comércio ainda mais digital.

G

rande Consumo - Como é que a atual crise está a afetar o consumo e a atividade do sector retalhista? Que medidas é que a REDUNIQ implementou para apoiar a atividade comercial em Portugal? Tiago Oom - Esta crise está a ter enormes impactos no sector retalhista, à semelhança do que está a acontecer um pouco por todas as atividades e por todo o mundo. A REDUNIQ, por forma a apoiar a atividade comercial dos seus clientes, criou uma medida de apoio à digitalização dos seus negócios, oferecendo o custo de adesão do REDUNIQ @Payments, uma solução sem mensalidades ou custos fixos, que permite aos negócios receber pagamentos seguros através de um simples link. Para os negócios que mantém as portas abertas, o valor dos pagamentos em contactless sem PIN aumentou de 20 para 50 euros. GC - O ato de pagamento pode ser, ainda mais, simplificado, sobretudo no que ao comércio digital diz respeito? É possível ter o benefício transacional da loja digital sem ter uma loja online aberta? TO - Sem dúvida. Como referido anteriormente, com o REDUNIQ @Payments, qualquer negócio pode aceitar pagamentos seguros à distância de forma bastante simplificada para o negócio e para o seu cliente. O negócio apenas tem de ir ao backoffice da REDUNIQ para emitir o link de pagamento e enviar ao seu cliente (pode enviar por e-mail, SMS, WhatsApp, redes sociais, etc.). Após este passo, o cliente recebe um link que o encaminha para uma página segura da REDUNIQ, na qual faz o pagamento com os seus dados e, depois da transação ser concluída, o comerciante recebe uma confirmação de pagamento. Sabendo já que o mesmo foi efetuado, pode prosseguir com a entrega do produto, com a segurança do pagamento já efetuado.

GC - Este é o contexto ideal para penetração, efetiva, do comércio eletrónico nos hábitos de consumo dos portugueses? As vendas do comércio eletrónico foram as grandes beneficiadas, se é que se pode falar de benefício neste contexto, da pandemia da Covid-19? TO - Estamos seguros que sim. Esta pandemia fez com que muitas pessoas experimentassem, pela primeira vez, uma compra online e tendo sido esta uma experiência positiva. Após perceber os benefícios desta experiência, certamente que muitos dos consumidores passarão a adotar este método para muitas das compras que, até aqui, eram físicas. É minha opinião que este é um movimento sem retorno e que o futuro passa cada vez mais por pagamentos remotos, mesmo que sejam presenciais, pois a experiência de pagamento é tão mais simples e segura, que é o caminho natural. GC - Portugal tem condições, do ponto de vista de infraestruturas, “service providers” e meios eletrónicos de pagamento, para reforçar a taxa de compras online? Se sim, porque é que não se dá esse salto qualitativo? No seu entender, é uma questão geracional? De mentalidade? TO - Temos já “service providers” com capacidade de dotar a maioria dos negócios com soluções online. A REDUNIQ tem a presença e capilaridade nacional necessárias para que a maioria das empresas possam digitalizar os seus negócios e torná-los online, seja por via de um website com uma solução

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de e-commerce, seja com soluções de pagamento por link. Temos ainda uma equipa comercial de abrangência nacional que trabalha junto de cada cliente para perceber as suas necessidades e o apoiar na digitalização do seu negócio. Acreditamos que este salto qualitativo está a acontecer gradualmente, tanto do lado das empresas, que cada vez mais nos contactam no sentido de ter estas soluções, como do lado dos consumidores, que cada vez mais percebem a mais-valia das compras online, ou mesmo dos pagamentos por cartão em detrimento do dinheiro, pela rapidez, simplicidade e segurança que os mesmos oferecem. A atual pandemia acelerou definitivamente este movimento e, realmente, existem em Portugal todos os stakeholders para que este tipo de pagamentos funcione na perfeição. GC - Como é que está a ser vista e adotada a tecnologia de pagamentos contactless no país? Este é um meio de pagamento do “presente” ou do “futuro”? TO - Neste momento, e com esta pandemia, acreditamos que é um meio de pagamento cada vez mais “do presente”, mas que, no futuro, após a sua utilização pela maioria das pessoas, será um método totalmente massificado, como acontece já em quase toda a Europa e outros pontos do globo. Acreditamos que a massificação do contactless será uma feliz inevitabilidade, pela experiência de simplicidade que oferece. Cada vez mais, as empresas percebem também que este é um método de pagamento mais rápido para si, uma vez que evita a acumulação de filas. Estamos também a desenvolver, em parceria com a VISA e os Transportes Intermodais do Porto, uma solução de pagamento em transporte com esta tecnologia, que irá permitir que o cartão contactless de débito ou de crédito permita o acesso e pagamento à rede de transportes públicos. Com o lançamento desta solução, pioneira em Portugal, e tomando como exemplo outras cidades mundiais, acreditamos que a experimentação massificada do contactless, por parte da população, irá criar o hábito de utilização desta tecnologia em todos os momentos de pagamento do seu dia-a-dia e, uma coisa garanto, quando se experimenta o contactless, nunca mais se paga com contacto.

“Da mesma forma como fazemos compras através do nosso smartphone, será natural para todos que possamos também pagar com esse mesmo smartphone ou com, a título de exemplo, um relógio, numa loja física”

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GC - Os smartphones e os wearables serão a nova geração de suportes de pagamento? TO - Sim, especialmente nas camadas mais viradas à tecnologia. Cada vez mais, se assiste à desmaterialização do cartão bancário. Da mesma forma como fazemos compras através do nosso smartphone, será natural para todos que possamos também pagar com esse mesmo smartphone ou com, a título de exemplo, um relógio, numa loja física. Se até há poucos anos a pior coisa que podíamos perder era a nossa carteira, hoje em dia, para a maioria da população, será certamente o seu smartphone. Hoje, pode-se fazer tudo com um smartphone e o crescimento de pagamentos com este meio tem sido exponencial. GC - A mobilidade é compatível com a segurança exigível a uma transação financeira, a um pagamento? TO - Com os devidos cuidados, naturalmente que sim. Para os negócios presenciais, as transações realizadas através da tecnologia contactless seguem todos os critérios de segurança dos sistemas de pagamento internacionais e atua sobre o standard EMV, vulgarmente designado por chip e PIN. Para além disso, para evitar pagamentos duplicados ou furtos, as transações contactless sem introdução de PIN estão limitadas ao valor de 50 euros, até um máximo acumulado definido pelo emissor do cartão, habitualmente 150 euros. Uma vez atingido esse valor, é solicitada a introdução do código PIN para validação da transação. No que respeita ao online, a REDUNIQ promove a segurança de todas as transações através do protocolo 3DSecure da Visa e Mastercard. Somos ainda o único “acquirer” português certificado em PCI-DSS (Payment Card Industry Data Security Standards), um padrão de segurança da informação que tem como finalidade proteger os titulares de cartões de pagamento e as empresas de consequências financeiras e reputacionais adversas e uniformizar os requisitos de segurança a cumprir por todos os intervenientes na indústria de pagamentos. GC - Esta pandemia veio colocar à prova as formas existentes de pagamento e demonstrar que, com a mesma eficácia, existem alternativas viáveis no mercado? TO - Veio sim, e até com mais eficácia, talvez. Se até há pouco tempo o dinheiro parecia a forma mais simples e segura de fazer um pagamento, cada vez mais, toda a população percebe que não o é. As compras por dinheiro não ficam necessariamente registadas. Os roubos por dinheiro são difíceis de comprovar e reaver. Com os pagamentos eletrónicos, todo o processo de compra é detetável e qualquer roubo ou fraude é monitorizável e passível de devolução ao lesado. Para os negócios é uma forma de evitar o manuseamento de dinheiro e de ter a gestão da sua empresa mais organizada e com menos erros como, por exemplo, os trocos constantes que têm de dar aos clientes, que representam também uma grande potencial perda de tempo.


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OPINIÃO

ANTONIO FLORES CEO da Loop

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NÃO DEIXEMOS DE PEDALAR Estamos a receber o impacto deste novo contexto de incerteza gerado pelo coronavírus, em que a minha primeira conclusão é que, obviamente, vemos hoje o panorama como complexo e confuso. Mas, de qualquer das maneiras, e como em tudo nesta vida, de um modo ou outro, iremos entrar numa certa normalização e resiliência das pessoas com o ambiente. Na minha opinião, recorrendo à teoria da inovação, encontramo-nos perante aquilo que se conhece como um verdadeiro “cisne negro”, que nos obriga a evoluir e a adaptarmo-nos a uma nova realidade. Quando superarmos esta crise sanitária, o ambiente será diferente da situação de partida, onde algumas tendências já detetadas anteriormente irão acelerar no seu impacto e irão surgir novos atores e cenários. Não será só um “como dizíamos ontem”. Todos os níveis que superamos não vão ficar sem efeito. Vivemos outros cisnes negros na crise de 2008/2009 ou no 11 de setembro. Todos estes acontecimentos marcaram um antes e um depois, em muitos aspetos, para as pessoas, a sociedade, a economia e, consequentemente, para as empresas. Estou convencido de que estamos, de novo, perante uma circunstância que não vai devolver-nos à casa de partida e que nos obriga, a todos, a identificar a nossa nova posição e os novos “sistemas de ancoragem de segurança” que ela gera. É o facto de os enfrentarmos que nos irá devolver a segurança, não a situação da mudança em si mesma. Para além de pretender medir as consequências ou prever possíveis cenários, obviamente fora de um contexto sanitário que nos dominou em absoluto, a atualidade exige-nos refletir sobre o que ficará desta “crise do coronavírus” e que, neste sentido, repercutirá nos modelos de negócio de todos os sectores, potenciando-os ou deixando-os obsoletos de forma acelerada, sob uma visão pragmática e de curto prazo, mais além de um dado fundamental que é a duração da crise (o que ocorreu nos primeiros países impactados, como a China, dá-nos pistas da sua durabilidade). Dentro deste cenário, e para continuar a alimentar este espírito de reflexão e entregar um certo otimismo, creio que nunca é demais felicitar-nos por algumas coisas que se observaram estes dias: entrámos, de um dia para o outro, num ambiente de trabalho à distância (naqueles casos em que era possível) com que já estávamos familiarizados, mas que colocou à prova equipas e processos, confianças e relações, tudo isto com uma notável normalidade e agilida-

de. Alguém, há algumas semanas atrás, achava isto possível? Confiemos nas pessoas: o ambiente informativo não é, a priori, favorável para a concentração nem para a calma, já que somos bombardeados de maus augúrios. No entanto, abstraindo-nos do futuro incerto, o melhor que podemos fazer no presente ambiente profissional é confiar em nós mesmos, nas nossas equipas, no nosso trabalho e em tudo aquilo que fizemos muito bem no passado e que, sem dúvida, nos irá beneficiar no presente. Mantenhamos a calma e a concentração o tempo todo, somos nós quem tem que sair desta crise, mais ninguém nos tirará dela. Uma catedral constrói-se tijolo a tijolo. Não fiquemos obcecados com “o dia de amanhã”, só com o passar do “dia-a-dia” sairemos desta situação. Sejamos empáticos e compreensivos com nós próprios, com as nossas equipas e clientes, não exijamos compromissos que hoje pareçam uma montanha, ofereçamos tranquilidade, segurança e assertividade com o que estava acordado. Partilhemos esta vontade de seguir em frente. Hoje, mais do que nunca, potenciemos o custo de oportunidade. Já passámos por situações idênticas. Obviamente, vamos enfrentar coisas novas e desconhecidas, mas outras já as vivemos na crise de 2008/2009. Não pensemos que nos vamos destruir, mas também que nada nos irá impactar. Fiquemos preparados para, quando recebermos algum impacto no nosso dia-a-dia e nas nossas rotinas, sejamos capazes de contextualizar as coisas. Sabemos (de alguma maneira) o que nos espera e podemos fazer por o enfrentarmos, este é o momento de colocar o que aprendemos no passado em valor, “não tropecemos duas vezes na mesma pedra”. A nossa aprendizagem e o nosso dia-a-dia em consultoria de negócio dizem-nos que de todas a situações surgem novas oportunidades. Para além deste tópico, tenhamos uma atitude proativa em poder identificá-las, ainda que estejamos confinados a um contexto estranho, de nada nos serve queixarmo-nos. Devemos continuar a pedalar para que a bicicleta não caia!


Z19 MKT

grupodreammedia

IMAGINE O NOSSO ABRAÇO DEPOIS DE TUDO ISTO. #VAMOS TODOS ABRAÇAR PORTUGAL

FAÇA A ECONOMIA AVANÇAR.

Ainda pode ser cedo para avaliar as consequências do Coronavírus para o ambiente de negócios, mas certamente a partir de atitudes - todos fazendo a sua parte - construiremos bases mais sólidas através da lealdade, compaixão e compromisso. Esse companheirismo, durante e após a crise, desperta segurança nas pessoas e, uma forma de manter esse ACEDA À NOSSA PÁGINA PARA TROCARMOS IDEIAS QUE FARÃO A ECONOMIA DE PORTUGAL VOLTAR A AVANÇAR.

contacto, é com as mensagens de apoio da sua marca. Porque essa crise vai passar. Agora, imagine o abraço que os seus clientes darão à sua marca depois de tudo isto. Abrace Portugal. Somos todos fortes. Conte com a dreamMedia. #VamosTodosAbraçarPortugal

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Reputação das marcas para além da Covid-19 Este é um tempo em que as empresas estão sob pressão para proteger lucros, num momento de incerteza económica. No entanto, não deverão negligenciar o impacto das suas ações durante este período e os efeitos a longo prazo na sua reputação. É um desafio para as marcas, mas também uma oportunidade para fortalecer relações, tornando estes tempos incertos mais navegáveis.

ANÁLISE TEXTO Ipsos Apeme

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N

as últimas décadas, os consumidores/cidadãos habituaram-se a olhar para as grandes marcas como entidades poderosas, determinantes na evolução das sociedades e capazes de intervir na resolução de questões sociais de uma forma rápida e inovadora. Num estudo global realizado pela Ipsos antes do início da pandemia (Ipsos Global Advisor – 18.700 entrevistas online em 24 países), 77% dos entrevistados declaravam que, ao decidir sobre a compra de um produto ou serviço de uma empresa/organização, consideravam importante um elevado grau de responsabilidade social. Os consumidores importam-se com o comportamento das marcas e esperam destas uma ação adequada e consistente. No atual contexto, dominado pelos medos e pela insegurança, estão particularmente atentos à forma como as marcas respondem – e tudo o que estas


fazem (ou não fazem) é comunicação. Esta pandemia representa um desafio e uma oportunidade para as marcas alinharem o que dizem - a sua razão e propósito -, com o que fazem - o seu comportamento real e tangível. Espera-se que ajam de forma rápida, assumindo as suas responsabilidades e adotando medidas concretas que aliviem as dificuldades e a crescente ansiedade dos consumidores. As marcas que agirem de forma inequívoca no interesse dos seus funcionários, stakeholders e da sociedade em geral reforçarão a sua liderança e o vínculo que mantêm com os consumidores, sendo depositárias da sua confiança. O projeto multicliente “Comunidade Covid-19”, desenvolvido pela Ipsos Apeme numa base semanal, mostra que a crise do coronavírus está a ter um efeito particularmente positivo na confiança que os consumidores depositam no Governo e nos cuidados de saúde, mas também em sectores como a grande distribuição, a indústria farmacêutica ou os media de informação. Por outro lado, a banca parece estar a ser mais penalizada por este contexto, com 38% dos entrevistados a declararem que a sua confiança neste sector diminuiu.

Há valores que, quando cruzados com a questão da confiança, se destacam como particularmente relevantes. Inovação em produtos/serviços relevantes, ações que promovam a segurança de funcionários e clientes, bem como a promoção de produtos locais estão na base de um aumento de confiança na grande distribuição.

Por outro lado, olhando para a forma como as marcas têm atuado durante este período, o aspeto que os consumidores mais condenam é o aumento do preço dos seus produtos ou serviços. Aproveitar o momento para subir preços ou para reduzir o esforço promocional pode fazer muito pelos resultados, mas nada pela reputação das marcas. Da mesma forma, é notado com desagrado por muitos entrevistados que “algumas marcas fazem campanhas publicitárias em vez de tomarem medidas concretas de ajuda aos seus clientes”. Estes são alguns sinais a que as marcas deveriam estar particularmente atentas, evitando a perceção de discrepância entre discurso e ação num momento de crise, mas sobretudo para além dela.

Quando questionados sobre os aspetos que, atualmente, mais influenciam o envolvimento e a compra de produtos de uma marca, destacam-se a promoção dos produtos locais, a proteção do emprego e o respeito pelo ambiente.

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OPINIÃO

VANESSA ROMEU diretora de comunicação corporativa do Lidl Portugal

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GESTÃO DE REPUTAÇÃO EM TEMPOS DE COVID-19 Quem não sentiu a sensação de murro no estômago ao ver as escolas a fechar, escritórios vazios, restaurantes encerrados e ruas vazias? A pandemia trouxe consigo inúmeros desafios, mas também a oportunidade para os líderes e as marcas mostrarem a sua verdadeira essência. Em virtude da magnitude do impacto económico e social que a pandemia despoletou, foi exigido um foco redobrado das marcas, e o retalho alimentar não foi exceção, tendo sido catapultado para a linha da frente, praticamente na primeira hora. O Lidl não foi exceção e tem estado na linha da frente de atuação neste contexto provocado pela Covid-19, com a garantia de fornecimento de bens à população, mas, sobretudo, temos sido capazes de agir com rapidez e flexibilidade, adaptando processos, otimizando a gestão das equipas, reajustando investimentos em resposta à comunidade e, principalmente, garantindo uma comunicação transparente junto dos colaboradores e clientes. Com uma forte estratégia de proximidade e partilha de valor com a sociedade, não tivemos receios em tomar medidas imediatas com impacto nas nossas 258 lojas e mais de sete mil colaboradores, a grande maioria a efetuar atendimento ao público. Acreditamos que o sucesso do negócio está nas pessoas, pelo que foi prioritário garantir a segurança e uma correta informação e proteção dos nossos colaboradores. Tem sido de extrema importância a aposta numa comunicação interna forte, em permanente atualização, capaz de gerir os receios e comunicar os novos procedimentos coletivos. Os nossos esforços centram-se na disponibilização de informação útil e relevante, no esclarecimento antecipado de dúvidas e na rápida implementação de medidas, permitindo agir de forma eficaz para o exterior. Perante os nossos clientes, investimos numa comunicação imediata, assegurando o fornecimento de bens e a segurança no ato de compra, reforçando que o Lidl “não parou” e que continua ao lado dos portugueses em todos os momentos. Nas nossas plataformas digitais, fomos pioneiros nas comunicações de prevenção e na sensibilização para comportamentos responsáveis, ao mesmo tempo que investimos em conteúdos que respondessem às necessidades de quem se encontra em casa. Temos o privilégio de contar com 258 lojas espalhadas por Portugal, mas esse privilégio traz uma responsabilidade acrescida: a de marcarmos presença na vida da sociedade que tão bem nos

acolhe, de forma relevante e nos momentos em que somos mais precisos. Indo ao encontro da nossa essência, no apoio às comunidades locais, foi também fundamental uma intensificação de esforços, em resposta a quem está mais vulnerável. Estabelecemos uma parceria com a Federação Portuguesa de Bancos Alimentares, através da Rede de Emergência Alimentar, e temos dado resposta aos apelos dos profissionais de saúde, câmaras municipais e outras tantas entidades, como a Secretaria de Estado da Cidadania para a Violência Doméstica, com a doação de diversos bens alimentares e não alimentares. Continuamos igualmente a apoiar as pessoas carenciadas de todo o país através do nosso programa Realimenta. Aqui, não temos parado e não vamos parar. O nosso foco está em ação eficaz e comunicação transparente. Temos procurado ser aquilo que sempre nos propusemos a ser – parceiros próximos da sociedade, com respostas às suas necessidades, e um agente de impacto social e económico benéfico na comunidade portuguesa. Temos procurado ser fiéis à nossa essência, trazendo, mais que nunca, relevância à nossa marca pela capacidade de adaptação, eficácia e eficiência nas respostas. Acreditamos que é assim que se reforça reputação em tempos de crise.


OPINIÃO

LUÍS PEREIRA SANTOS CEO da McCann Lisboa

AGARREMO-NOS AO QUE É FUNDAMENTAL E NAVEGUEMOS Sim, este barco vai balouçar, por isso, segurem-se. Enquanto estiverem bem seguros, foquem-se no futuro a longo prazo e equacionem tudo o que será diferente e como podemos mudar para construir esse futuro melhor. Fixem-se na linha do horizonte e não ficarão enjoados. No curto prazo, a prioridade é garantir que as marcas estão disponíveis & relevantes. Disponíveis, não só no sentido de garantir que a operação se mantém e que as prateleiras dos supermercados estão cheias. Disponíveis no sentido que as marcas não desaparecem, não se calam ou se escondem, porque mesmo nestas circunstâncias a vida continua. Não é nestes momentos difíceis para todos que as marcas se devem calar. Bem pelo contrário. Sim, vai ser um ano (ou dois) difíceis e com um P&L complicado, mas quem o gerir melhor será quem recuperará mais forte e mais rápido. Não vão ser as marcas que hibernarem agora e despontem como se nada se tivesse passado. Não é que valha a pena fazer uns cóvideos disfarçados de anúncios a dizer o que já todos os outros dizem. É aí que entra a relevância. As grandes marcas, no sentido de as mais relevantes na vida dos seus consumidores, são as que estão, simultaneamente, à sua frente e ao seu lado. As que os guiam e os levam mais longe, mas de mão dada. Continuar ativo, como marca, é dar a mão. O que muda agora é o como. Claro que os hábitos de consumo de media mudaram, a disponibilidade de investimento não é a mesma e a abertura, para certas mensagens, tons e conteúdos por parte dos consumidores, é diferente de há uns meses atrás, mas cabe às marcas (e às suas agências) reencontrar esse papel relevante. Na McCann Lisboa temos tentado fazer isso mesmo para nós e para as marcas que trabalhamos. Mudámos, simbolicamente, de nome para WeCann Portugal, porque acreditamos que, juntos, conseguiremos dar a volta a esta crise sanitária e económica. Criámos uma nova linha de comunicação para a Navigator, Keep in Touch, que valoriza o papel como meio de comunicação e que integra uma ativação em que, à distância de um clique, se pode enviar um postal a um ente querido, em total segurança. Estamos a trabalhar com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social para fazer chegar a mais pessoas as medidas de apoio e prevenção. Ajudámos a Área Metropolitana de Lisboa a garantir o bom uso dos transportes públicos. Divulgámos o plano de assinatura digital do Credibom, que permite aceder a crédito pessoal sem sair de casa, porque a vida não para. E

relembrámos o que é o posicionamento de Fula, mostrando como estamos sempre juntos à mesa. Fazemos isto sem perder o foco no horizonte. Lá bem no fundo, sabemos que as necessidades humanas fundamentais não mudam. Todos procuramos, de uma forma ou outra, ligações, descobertas, amor, sucesso e propósito. É nesse pentágono que resumimos o que procuramos da vida e as marcas têm um papel nessa procura, seja qual for a fase de reação em que estivermos, seja ela negação, pânico, adaptação ou recuperação, agarremo-nos ao que é fundamental e naveguemos. Se é verdade que somos todos agentes de saúde, mesmo as marcas, sejamos também um agente de crescimento na parte que nos diz respeito.

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TEMA DE CAPA

a r a d s o Vam a a T l vo ! ! ! O IST

TEXTO Carina Rodrigues FOTOS Shutterstock

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“A pandemia pode tornar-se no melhor que podia acontecer à humanidade”. A afirmação é do investigador em psicologia social Jonathan Haidt, que faz uma análise histórica e social sobre o que pode e, sobretudo, deve mudar para melhor devido à pandemia. Numa altura de mudanças profundas, surgem muitas e distintas opiniões sobre os tempos vindouros, como a de Jonathan Haidt, e é inevitável um torcer de nariz perante este tipo de afirmações. Como é que um vírus, que está a matar milhões, pode ser o melhor que podia acontecer? Uma coisa é certa, tornou-nos, ou pelo menos recordou o que é ser, mais solidários. Nada será como antes, disso sabemos, mas sobre como será ainda persistem muitas dúvidas. Por isso, para ajudar, de algum modo, a balizar os tempos que se avizinham, compilámos os números, escutámos os estudiosos do consumo, fomos aprender com aqueles que já levam algum avanço a lidar com a pandemia e apontámos possíveis cenários. E, no fim do dia, até conseguimos compreender Jonathan Haidt: “quando reagimos, podemos ser muito criativos”. Mãos à obra. Vamos lá dar a volta a isto.


Os que não podem ficar em casa. Galeria da fotojornalista Sara Matos sobre algumas profissões que também estiveram, e estão, na linha da frente

Eça não foi um virologista, epidemiologista ou sequer um clínico geral, mas alertou-nos, há muito, para o efeito que a morte de um chinês poderia provocar nas nossas vidas. E fê-lo através de Teodoro, ávido de riqueza, que percebeu isso da pior forma, tendo vivido uma vida de tormento. No final, deixou o conselho: ‘Nunca mates o Mandarim’. A morte de um chinês, como atualmente e da pior forma se percebe, não é um acontecimento que diga única e exclusivamente respeito à China. É um transtorno mundial. Como alguém já deve ter dito, se a China espirra, o mundo constipa-se. E, no final, até ganha com isso, pois é o único país com capacidade para produzir, em tempo útil, material de combate. Daí que, já depois da doença, o melhor é mesmo seguir o conselho de Teodoro: ‘Nunca mates o Mandarim’, porque continuarás a precisar dele. O pragmatismo moderno diz que isto é a economia de mercado e o mercado a funcionar. Mas, como nos disse Vergílio Ferreira, na Aparição, se tudo isto fosse apenas e só economia, então nós seríamos apenas um amontoado de máquinas. A sedução pela economia, pelos números, pelo regresso ao trabalho, pela produtividade é forte, mas enquanto houver vidas em perigo nenhum passo em falso deve ser dado. Vai ter custos? Sim, vai. Mas se até hoje houve dinheiro para salvar buracos de bancos, cavados com a enxada da corrupção e do compadrio na alta finança, por que raio não há de haver para salvar pessoas?”. O texto de Carlos Rodrigues Lima, publicado na Sábado, ilustra bem os dias em que vivemos. De facto, a China espirrou e o mundo todo constipou-se. Quando 2020 arrancou, muita gente, até em jeito de brincadeira, dizia que estávamos a entrar nos loucos anos 20. Quem diria, então, que até nem estavam muito enganados e que 2020 iria ficar para os anais da História. Nesse arranque de ano, a economia estava no seu melhor nível da última década na Europa e nos Estados Unidos e até a já constipada China não tinha grandes razões de queixa, não obstante em desaceleração, muito devido à troca de galhardetes comerciais, durante o último ano, com os Estados Unidos. No dia em que este artigo é

escrito, quando da emergência já passámos à calamidade e começamos a tentar abrir a economia para evitar a catástrofe, sem pesar na saúde, essa mesma economia está a sofrer um choque triplo. Quer na Europa, quer nos Estados Unidos – a China, aqui, já vai numa etapa mais avançada, por ter sido também a primeira a senti-lo –, a procura, a oferta e a produção estão em choque. E não se sabe ainda por quanto tempo essas ondas de choque vão fazer-se sentir. Há estudos, previsões, modelos matemáticos e cenários traçados para todos os gostos e feitios, dos mais pessimistas aos menos e assim-assim, porque de otimismo não é possível falar, nestes dias estranhos que correm. Mas todas eles avisam: segurem-se que isto vai doer. Devíamos ter dado ouvidos a Bill Gates que, há cinco anos, alertava para os perigos de uma pandemia. Intitulada “O próximo surto? Não estamos preparados”, na palestra dada em 2015 para o Ted Talks, o fundador da Microsoft fez algumas análises e comparações que podem ser muito bem utilizadas no cenário atual. “Quando eu era criança, o desastre que mais temíamos era uma guerra nuclear. Hoje, o maior risco de catástrofe global não se parece com uma bomba, mas, sim, com um vírus. Investimos muito em armas nucleares, mas bem pouco num sistema para barrar uma epidemia. Não estamos preparados. Atualmente, o maior risco de uma catástrofe global está num vírus altamente infecioso, não uma guerra. Se algo matar 10 milhões de pessoas, nas próximas décadas, serão micróbios, não mísseis”, avisou. Ora, se calhar é conveniente prestar, agora, um pouco mais de atenção ao que Bill Gates nos tem para dizer e ele já deixou o alerta. Numa sessão de perguntas e respostas na rede social Reddit, admitiu estar preocupado e deixou dois avisos. Os países ricos, por um lado, deverão preparar-se para dois a três meses de “shut down” completo, mas quando o vírus chegar em força aos países mais pobres, os efeitos serão ainda piores. “A fase atual tem muitos casos em países ricos. Com as ações certas, incluindo os testes e o distanciamento social, que eu chamo de ‘shut down’, entre dois e três meses deverá permitir aos países ricos evitar os níveis elevados de infeção. Preocupa-me todo o dano que será feito à economia destes países, mas será ainda pior a forma como o vírus vai afetar os países em vias de desenvolvimento, que não conseguem cumprir o distanciamento social da mesma forma que os países ricos e cuja capacidade hospitalar é muito inferior”. O conselho mais prático que Bill Gates deixou foi mesmo o típico “lave bem as mãos com frequência e fique em casa, mantendo o distanciamento social que esta altura pede”. E aconselhou ainda a pôr os olhos no “mandarim”. O mesmo conselho é-nos dado por Francisco Veloso, um homem da ciência (é físico), mas que é também diretor da Business School do Imperial College, em Londres. O responsável pela análise que incentivou Donald Trump e Boris Johnson a tomarem medidas mais drásticas para conter a pandemia lembra também o exemplo da China e da Coreia do Sul, que mostraram que a supressão é possível a curto prazo. “Resta saber se é possível a longo prazo e se os custos sociais e económicos das intervenções adotadas até agora podem ser reduzidos”, questiona. Francisco Veloso admite que as decisões em curso, embora importantes, são muito difíceis. “As PME não têm sistemas financeiros para absorver a crise e pode haver implicações significativas na vida financeira das pessoas, do emprego à saúde

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Por esta altura, a produção da China é ainda 15% a 20% inferior aos níveis normais. As percentagens são ainda mais baixas para o consumo, resultado de uma menor procura externa onde cada um ver a sua liberdade limitada pode ser o que é menos aflitivo”. Já sobre o facto da análise prever a necessidade de distanciamento ou isolamento social até existir uma vacina, um cenário que pode ir, pelo menos, até 18 meses, defende que terão de ser vistas outras hipóteses, até de acordo com a evolução da doença, para não trazer um caos mais permanente à economia mundial. “Não é possível ter a atividade económica brutalmente cortada tanto tempo, senão vamos ‘acordar’ num mundo económico radicalmente diferente”. Lições vindas da China Sigamos, então, os conselhos de Bill Gates e de Francisco Veloso e olhemos, portanto, para o que se passa na China, primeiro país onde a Covid-19 fez estragos. Nos dois primeiros meses de 2020, o crescimento do comércio chinês foi o mais baixo desde 2016 e as exportações caíram 17,2%, enquanto as importações baixaram 4%. Ainda assim, o impacto da Covid-19 ficou bastante abaixo do provocado pela crise de 2008, quando, no espaço de apenas um mês, as exportações desaceleraram 26,5% e as importações 43,1%. Mas, feitas as contas ao primeiro trimestre, e no rescaldo de dois meses de uma quarentena que paralisou o país, o crescimento da economia chinesa teve uma quebra de 6,8%, depois de, no último trimestre de 2019, ter registado uma subida de 6%. De acordo com a Euler Hermes, prevê-se que o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), em 2020, se fique pelos 1,8%. As estimativas apontam para que, a partir de 2021, se verifique uma recuperação em forma de “U” e o crescimento do PIB seja de 8,5%. Os economistas da Euler Hermes explicam que, no

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entanto, há fatores cuja evolução pode afetar de forma significativa estas estimativas, nomeadamente, o surgimento de novos surtos da pandemia de Covid-19 (na China e/ou nos seus parceiros comerciais), a opção por políticas públicas de apoio ineficazes aos agentes económicos mais vulneráveis ou o facto da orientação da política orçamental não estar a ser suficientemente flexibilizada, dado que as autoridades chinesas se mantêm cautelosas quanto às vulnerabilidades estruturais do país. Nesta fase, e apesar de estimativas iniciais mais otimistas, prevê-se que a atividade económica chinesa retome totalmente apenas em junho, em consequência da evolução da procura interna e externa. Espera-se que as medidas públicas de apoio a implementar este ano sejam equivalentes a 6,5% do PIB, um estímulo orçamental que deverá ser composto, sobretudo, por investimentos públicos (em infraestruturas, saúde, políticas verdes, tecnologia, etc.), redução de impostos e de taxas para empresas. No plano monetário, o Banco Popular da China injetou liquidez no valor de 2,8% do PIB nominal, com especial

destaque para as pequenas e médias empresas. Esperam-se novas injeções no valor de, pelo menos, 1% do PIB. As condições de crédito deverão também ser mais facilitadas para as empresas. Por esta altura, a produção da China é ainda 15% a 20% inferior aos níveis normais. As percentagens são ainda mais baixas para o consumo, resultado de uma menor procura externa, devido às medidas de confinamento da população implementadas nos parceiros comerciais. Por outro lado, as medidas de distanciamento social e os cortes nos rendimentos, no primeiro trimestre, também levaram a uma diminuição do consumo privado a nível interno. Como primeiro país onde surgiu o novo coronavírus, a China leva algumas semanas de avanço face ao resto do mundo em termos de evolução da Covid-19 e respetivo impacto. Apesar das diferenças culturais, alguns dos comportamentos observados na recuperação da China podem ser um indicador útil para o resto do mundo. Uma análise da Kantar ao consumo na China indica que, após o início do surto, em janeiro, o mercado de bens de grande consumo chinês foi significativamente afetado, uma vez que os shoppers ficaram confinados nas suas casas. As vendas começaram a cair durante a semana do Ano Novo chinês, tendência que se manteve durante seis semanas consecutivas. A maior taxa de declínio foi observada na semana após a comemoração do Ano Novo, com as vendas a caírem 39% face ao período homólogo de 2019. Contudo, a partir da segunda semana de março, o mercado de grande consumo voltou aos crescimentos. “Numa altura em que normalidade começou a regressar em quase todo o território chinês, muitos fabricantes de bens de grande consumo e muitos retalhistas anseiam por saber quanto tempo irá demorar até o mercado recuperar totalmente e de que modo podem contribuir para acelerar esta recuperação”, afirma Jason Yu, managing director na divisão Worldpanel na


China Continental. A velocidade desta recuperação depende muito da natureza da categoria e durante quanto tempo foi impactada no pico da epidemia. De acordo com a Kantar, algumas categorias irão mostrar uma trajetória em “V”, que indica uma rápida recuperação, enquanto outras apresentarão mais uma curva em “U”. Além disso, existem categorias que não sofreram qualquer impacto negativo e muitas delas registaram um forte crescimento durante o surto epidémico. A análise conduzida pela equipa de Expert Solutions na Kantar Worldpanel China classificou 98 categorias de bens de grande consumo segundo um de quatro segmentos baseados no seu desempenho durante o pico da doença e se experimentaram uma recuperação rápida, ou lenta, nas semanas mais recentes, à medida que a situação epidémica melhorava. As categorias em crescimento encaixam em dois grupos principais. Um deles contempla os produtos ligados à saúde, como os desinfetantes, que cresceram 600% durante o pico da epidemia, e os produtos para lavagem das mãos, que reportaram um crescimento acima dos 200% durante algumas semanas de fevereiro. O segundo engloba os produtos que são utilizados para cozinhar no lar. “As categorias que se enquadram neste segmento têm um potencial real de aproveitar o inesperado movimento de crescimento, ao assegurar que os consumidores mantêm os novos hábitos que adquiriram durante a epidemia. A desinfeção e proteção face aos vírus será, sem sombra de dúvidas, uma preocupação maior dos consumidores no futuro, pelo que as marcas que apresentam estes benefícios, ou que têm a capacidade de os acrescentar, deverão apostar e investir neles em termos de media”, aconselha Jason Yu. Cozinhar em casa também deverá ser uma tendência para manter, já que muitas famílias irão sentir-se mais seguras em preparar as suas próprias refeições do que em encomendá-las ou ir fazê-las fora de casa, onde existe ainda um elevado risco percecionado de infeção. “Para as empresas alimentares, é importante relacionar as suas marcas com as ocasiões de refeição dentro do lar, segurança alimentar e tempo passado em família”, acrescenta. Já as categorias onde o impacto da Covid-19 foi limitado referem-se, sobretudo, a produtos considerados essenciais: pet food, artigos de higiene, leite infantil, água engarrafada e proteção sanitária. Estas são categorias que muitos lares não

podem dispensar, mas que não precisam necessariamente de reforçar a sua utilização só porque se está numa situação de epidemia. Outra característica das categorias onde o impacto foi limitado é que tendem mais a ser compradas online. 25% do gasto nestes produtos teve origem no online, face a 19% da média dos bens de grande consumo. As entregas desempenharam um papel essencial, não só ao assegurar que os consumidores recebiam os seus produtos durante a epidemia, mas também que se sentiam seguros no isolamento. “Perspetivando o resto do ano, uma consideração fundamental para estas categorias é quantos consumidores foram ganhos pelo canal online como resultado da epidemia. Sabemos que este canal teve um muito bom desempenho durante o surto, conquistando novos consumidores e

da epidemia ou pelo facto de muitos lares os terem considerado não essenciais durante uma ou duas semanas. Além disso, muitos consumidores tinham stock destes produtos. Nas categorias mais impactadas pelo surto da Covid-19, que sofreram uma descida considerável durante o pico da epidemia e que, seis semanas mais tarde, ainda não davam sinais de recuperação total, incluem-se os produtos de beleza, champô, espirituosas, vinho, cerveja, chocolates e doces. Muitos mercados de cuidados pessoais foram duramente atingidos pelo novo coronavírus, uma vez que o isolamento social reduziu a procura de maquilhagem e outros produtos de beleza. Muitos lares mantiveram a quarentena por dois meses, pelo que ainda é cedo para avaliar se estes produtos irão recuperar.

compras adicionais. Muitos shoppers irão manter este comportamento para este tipo de categorias, pelo que a colaboração com os retalhistas deste canal será estratégica em termos de crescimento, de modo a assegurar que as marcas conseguem captar este aumento na procura”, avança Jason Yu. No grupo daqueles que sofreram uma significativa descida nas vendas, desde a última semana de janeiro e até à primeira de fevereiro, mas que rapidamente recuperaram incluem-se categorias como os óleos alimentares, o leite pasteurizado, os iogurtes, as bolachas, os suplementos nutricionais e o detergente para a roupa. A razão pela qual estas categorias tiveram uma quebra acentuada prende-se com a limitada disponibilidade destes produtos nas lojas locais durante o pico

As descidas observadas nas bebidas alcoólicas devem-se ao facto dos consumidores estarem mais preocupados com a sua saúde durante o surto e quiseram manter-se o mais saudáveis possível na necessidade de terem de lidar com a doença. Ao que se junta o facto de muitas celebrações terem sido canceladas. “O fundamental para as marcas que operam nestas categorias é assegurar que conseguem atrair a procura ao enfatizar os benefícios que podem oferecer na nova era. Os consumidores estarão mais preocupados com a sua saúde, mas também quererão desfrutar de ocasiões em família e eventos sociais, ainda mais do que anteriormente, dado que não o puderam fazer durante dois meses”, reforça Jason Yu. “Nesse sentido, captar estes momentos de felicidade e de

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isto? Para ter uma noção do que podemos esperar, atentemos, então, aos estudos, previsões, modelos matemáticos e cenários traçados para todos os gostos e feitios, dos mais pessimistas aos menos e assim-assim. As previsões para Portugal indicam que poderá levar, na melhor das hipóteses, dois anos a recuperar da destruição da economia causada pela pandemia de

Os fabricantes terão de entender a procura futura e compensar a perda de ocasiões de utilização, quais os elementos do marketing mix que irão ajudar a catalisar as vendas após a epidemia

socialização pode favorecer tanto as marcas de snacks como de bebidas. A perceção da beleza será mais motivada pelo cuidado, pelo que produtos que estabilizam as condições da pele e proporcionam uma hidratação e cuidados extra irão recuperar mais rápido”, conclui. Segundo a Kantar, o padrão de recuperação será diferente para cada marca, uma vez que depende do modo como a sua categoria foi impactada pela Covid-19, mas também de como as necessidades dos consumidores irão evoluir no futuro. Assim, diz a consultora, os fabricantes terão de entender a procura futura e compensar a perda de ocasiões de utilização; quais os elementos do marketing mix que irão ajudar a catalisar as vendas após a epidemia (publicidade, promoções, atividades in-store e distribuição terão diferentes níveis de importância); identificar as novas ocasiões de utilização que apareceram como resultado do coronavírus, para captar a procura futura, e desenvolver novos produtos para responder a estas necessidades; otimizar o investimento de media, numa altura de orçamentos mais reduzidos; e entender de que modo os comportamentos mudam quando os consumidores compram através dos canais online e offline, de modo a identificar novas oportunidades de crescimento. Da China para Portugal Aprendidas as lições da China, viajemos, então, da Ásia para a Europa e, mais concretamente, para Portugal. O que podemos esperar do futuro mais próximo? E como podemos dar a volta a

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Covid-19. O Banco de Portugal avisa que a economia nacional poderá mergulhar, este ano, na pior recessão alguma vez registada. O turismo será das atividades mais afetadas e os pequenos negócios os mais penalizados. Ora, neste ponto, a Comissão Europeia já fez as contas e projetou uma redução de 50% na atividade turística na Europa, este ano, estimando “consequências prolongadas” no sector. E aponta Portugal

como um dos países mais afetados pela sua “dependência do turismo estrangeiro”. Nas previsões económicas da primavera do executivo comunitário, as primeiras projeções sobre o potencial impacto da pandemia na economia europeia refletem que, embora a crise gerada pela Covid-19 represente um choque simétrico, os “impactos diferem entre os Estados-membro, refletindo a gravidade da pandemia, o rigor das medidas de contenção e as diferentes exposições, por exemplo, à dimensão do sector do turismo”. Além disso, apesar de se esperar que estas medidas sejam gradualmente levantadas e que a procura global recupere, o comércio de serviços, particularmente o turismo, deverá retomar mais lentamente. Especificamente sobre Portugal, a Comissão Europeia antecipa “uma forte recuperação da economia após o choque inicial”, mas alerta para que, em alguns sectores, particularmente no turismo, se espera que os efeitos secundários se prolonguem. Recorrendo a dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) referentes a 2018, a Comissão Europeia destaca que Portugal é dos países mais dependentes do turismo, sector que representa 8% do PIB e 9,8% do emprego, apenas superado nesta dependência por Espanha.


Isto também levará a consequências no desemprego em Portugal, com Bruxelas a indicar que a “lenta recuperação esperada no turismo e em serviços relacionados deverá ter um impacto negativo na procura de mão-de-obra durante um período mais longo”. Questionado sobre os efeitos económicos da crise no turismo, o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni, referiu que “é preciso trabalhar para garantir que o turismo sobrevive ao verão”, mesmo que seja em condições diferentes. De acordo com as previsões económicas da Comissão Europeia, a economia da área do euro registará uma contração sem precedentes, equivalente a 7,7%, em 2020, que deverá ser seguida de um crescimento de 6,3%, em 2021. Por seu turno, a economia da União Europeia deverá contrair em 7,5%, em 2020, e crescer 6%, em 2021. Neste cenário, Portugal deverá cair menos que a média europeia, salientando o gabinete do ministro Mário Centeno, em comunicado, que, apesar do desempenho robusto da economia portuguesa até ao final do mês de fevereiro, a Comissão Europeia prevê uma quebra na atividade económica de 6,8% do PIB no final do corrente ano, abaixo das previsões para a área do euro e da União Europeia. “Em 2021, a econo-

mia deverá crescer 5,8%, mantendo o PIB em níveis abaixo dos registados em 2019. No conjunto dos dois anos, o desempenho da economia portuguesa será menos negativo do que o da média dos países da área do euro e da União Europeia”, refere.

de desemprego deverá regressar para valores acima dos 10%. “A pandemia corresponde a um choque económico adverso com efeitos muito significativos e potencialmente prolongados no tempo, em termos do bem-estar dos cidadãos e da

“Em 2021, a economia deverá crescer 5,8%, mantendo o PIB em níveis abaixo dos registados em 2019. No conjunto dos dois anos, o desempenho da economia portuguesa será menos negativo do que o da média dos países da área do euro e da União Europeia” Voltemos às projeções do Banco de Portugal, sabendo-se que, por esta altura, as exportações estão já a caminho da pior marca dos últimos 40 anos, segundo estima o Instituto Nacional de Estatística (INE). O banco central traçou dois cenários. O de base é menos destrutivo, mas existe outro, descrito como adverso. Em qualquer um deles, a economia portuguesa arrisca uma grave recessão, com uma quebra que pode ir dos 3,7% aos 5,7%. Em ambos os cenários, o nível

atividade das empresas”, pode ler-se no boletim divulgado pelo banco governado por Carlos Costa. Os economistas avisam ainda que mesmos estes dois não estão garantidos. “A incerteza exacerbada e a complexidade que caracterizam este exercício de projeção implicam que não seja possível apresentar um cenário mais provável para a evolução da economia portuguesa”. As projeções já integram os efeitos de algumas medidas públicas de suporte e de defesa da economia. No cenário base, em que as ajudas e os apoios públicos têm um efeito quase imediato no tecido económico e no mercado laboral, a economia afunda 3,7% em termos reais. Antes deste boletim, projetava-se um crescimento de 1,7%. O emprego recua 3,8%, o consumo das famílias 2,8%, o investimento 10,8%, as exportações mais de 12% e as importações quase 12%. No cenário mais adverso, a paralisação da atividade é mais prolongada, o que levará “a maior destruição de capital e perda de emprego”, e traduz-se numa contração de 5,7%. O emprego cai 5,2%, o consumo privado 4,8%, o investimento 14,9%, as exportações 19,1% e as importações 18,7%. Como dizia o diretor geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, “estamos num tempo de factos e não de medos”. Mas os factos são medonhos. No último dia de abril de 2020, Portugal estava em estado de emergência e tinha, de acordo com a Direção Geral da Saúde, 25.056 casos

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confirmados de Covid-19, dos quais, 968 estavam internados (172 em unidades de cuidados intensivos), 1.519 recuperados e 989 mortes. Nesse mesmo dia, a universidade Johns Hopkins contabilizaba que, a nível mundial, o novo coronavírus já tinha infetado mais de 3,2 milhões de pessoas e causado a morte a, pelo menos, 233 mil. Nos Estados Unidos, com o número de mortes a ultrapassar os 59 mil, a Covid-19 já matava mais do que a Guerra do Vietname e, na Europa, eram conhecidos os dados económicos relativos ao primeiro trimestre: uma queda de 3,5%, o pior desempenho trimestral desde que a União Europeia iniciou o registo de dados, em 1995. Também nesse mesmo dia, o coronavírus chegava ao Tajiquistão e já poucos países lhe escapavam.

Em três dias, o sistema político americano encontrava respostas numa dimensão três vezes superior a toda a reação obtida num ano no pós-crise de 2008, mas, na Europa, o consenso tardou. E ainda não é totalmente adquirido. Como notava a chanceler alemã Angela Merkel, “a União Europeia enfrenta o maior teste da sua história” O fim da globalização? O surto terá surgido em dezembro de 2019 (há relatos que pode ter sido mais cedo) na cidade chinesa de Wuhan, província de Hubei, e teve o seu primeiro registo na Europa a 20 de janeiro, em França. O mesmo dia em que se admite ter sido também registado, pela primeira vez, nos Estados Unidos. A pandemia entrou em África pelo Egito, a 15 de fevereiro, e dez dias depois chegou à América do Sul, pelo Brasil. Desde meados de março que a Covid-19 bloqueou o mundo. As projeções mais recentes da Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre o impacto da pandemia alertam para uma crise económica pior do que a de 2008. “A Covid-19 ameaça as vidas de milhões de pessoas no mundo e ainda que, acima de tudo, seja uma crise de saúde, a pandemia também terá um impacto inevitável na economia, nos empregos e no bem-estar”, afirmou Roberto Azevêdo, diretor geral da OMC, numa mensagem gravada em casa e divulgada pelos canais oficiais. Alertando para a necessidade de “uma resposta global para uma pandemia global”, o diretor geral da OMC salientou que “nenhum país é autossuficiente, por muito poderoso ou avançado que seja”. Salvar vidas ou salvar a economia? O dilema nem

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sequer se coloca. Sem vidas não há, pura e simplesmente, economia; sem saúde, não há produção. Defender a saúde pública é, também, defender a economia. A corrida à vacina, com equipas de investigação espalhadas por esse mundo fora (Estados Unidos, Reino Unido, China, Alemanha, Israel e Espanha), reflete bem a assertividade da afirmação de Roberto Azevêdo – “uma resposta global para uma pandemia global”. Há que ter a noção, contudo, que, por mais mobilizado que o mundo esteja em torno desta resposta ao nível da vacina, não chegará a tempo de resolver esta primeira vaga de emergência global, para conter uma doença que, em apenas dois meses, já matou muito mais que o Ébola na sua extensão total de dois anos, entre 2014 e 2016. O problema, contudo, está ao nível da resposta global ao nível político e económico, onde não se responde a uma só voz. Vejam-se os exemplos dos Estados Unidos da América e do Brasil, onde os respetivos presidentes, Donald Trump e Jair Bolsonaro, insistem em contradizer o que organizações internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a OMS, defendem, com os graves custos que esse desmentir acarreta. Nos Estados Unidos, pelo menos, houve a capacidade de tentar conter a avalanche económica que se avizinha com a aprovação, por parte do Congresso, de um pacote no valor de dois biliões de dólares de estímulo à economia e de ajuda direta às empresas e famílias. No dia seguinte à aprovação destas medidas, Wall Street conhecia o seu melhor dia em 87 anos e o Dow Jones valorizava em 11,4%, compensando as perdas das últimas sessões. Em três dias, o sistema político americano encontrava respostas numa dimensão três vezes superior a toda a reação obtida num ano no pós-crise de 2008, mas, na Europa, o consenso tardou. E ainda não é totalmente adquirido. Como notava a chanceler alemã Angela Merkel, “a União Europeia enfrenta o maior teste da sua história”. O tal triplo choque económico, onde procura, oferta e produção travam todas, e em simultâneo, a fundo, tem levado a que muitos usem a expressão de “economia de guerra”. Mas nem durante a guerra se travou tanto. O comércio mundial desacelerou, mas a produção, pelo contrário, aumentou exponencialmente nas diferentes áreas da indústria bélica e o pleno emprego foi atingido por excesso. O trabalho de Ana Relvas França e de Pedro Cordeiro, no Expresso, ajuda a perspetivar o momento histórico que atravessamos: “nos últimos 100 anos, não há 100 dias que se comparem a estes. Até durante a II Guerra Mundial havia cabarés abertos em Paris”. Como poderemos, então, dar a volta a isto? O filósofo e historiador israelita Yuval Noah Harari aponta caminhos num artigo publicado no Financial Times. “Tanto a epidemia em si mesma como a crise económica resultante são problemas globais. Só podem ser resolvidos eficazmente mediante cooperação global. Antes do mais, para derrotar o coronavírus, precisamos de partilhar informação globalmente. Um coronavírus


na China e um coronavírus nos Estados Unidos não podem trocar dicas sobre como infetar humanos. Mas a China pode ensinar aos Estados Unidos muitas lições valiosas sobre o coronavírus e como lidar com ele. Aquilo que um médico italiano descobre em Milão, ao início da manhã, pode bem salvar vidas em Teerão à noite. Quando o Governo britânico hesita em diferentes políticas, pode receber aconselhamento dos sul-coreanos que já enfrentaram um dilema similar há um mês. Mas, para isto acontecer, precisamos de um espírito de cooperação e confiança global”. Confiança global, quando tanto se apregoa que a globalização matou a globalização. Eis

e no comércio global de alimentos. De facto, a pandemia do novo coronavírus poderá gerar uma maior dificuldade no comércio global e uma nova crise alimentar. O Programa Mundial de Alimentos da ONU observou os primeiros cortes em algumas cadeias de abastecimento. “Uma crise pandémica prolongada poderá pressionar rapidamente as cadeias de abastecimento de alimentos, uma complexa rede de interações que envolve agricultores, unidades de processamento, transporte marítimo, retalhistas, entre outros. A indústria de navegação já mostrou uma desaceleração devido ao encerramento dos portos e os obstáculos logísticos poderão interromper as

a grande ironia de uma pandemia que se espalhou mundo fora porque “viajou de avião” e apanhou boleia das ligações globais e que, hoje, ameaça essa mesma globalização tal como a conhecemos. No final de abril, a OMS pedia uma maior capacidade para certas rotas aéreas, com o objetivo de aumentar os envios de testes de diagnóstico e equipamentos de proteção a áreas onde a Covid-19 está a expandir-se, nomeadamente América Latina e África. Se a proteção e o material não chegarem a estas regiões do mundo, alerta a OMS, o custo de vidas humanas poderá ser muito maior e as cadeias de abastecimentos alimentares ficarão em perigo em metade do mundo. Paul Molinaro, responsável pelas operações de apoio e logística da OMS, assegura que os envios mundiais de vacinas foram interrompidos, em abril, e que, se a situação se mantiver até maio, haverá lacunas nas vacinações e nas campanhas contra outros surtos de doenças, gerando graves consequências humanas, económicas

cadeias de abastecimento nas próximas semanas”, destaca um relatório recente da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO). Daí que se elevem cada vez mais vozes que defendem que a pandemia da Covid-19 irá representar uma mudança para uma outra forma de globalização e, muito provavelmente, para outro modo de vida. Uma delas é a de Emmanuel Faber, CEO da Danone, que em entrevista ao jornal espanhol El País insiste que, embora não seja desejável que o coronavírus termine com a globalização, esta necessitará de ser distinta. “Obrigatoriamente, isto traduzir-se-á numa maior tomada de consciência da importância e da urgência de duas coisas, em simultâneo: a justiça climática, por um lado, com a inclusão da agenda climática nas nossas atividades económicas e sociais, e a justiça social, por outro. Não pode haver uma sem a outra”. No entender de Emmanuel Faber, a perda da biodiversidade, a urbanização e a agricultura intensiva aproximaram

as espécies e ecossistemas selvagens dos habitats humanos, uma proximidade que acabou por facilitar a transmissão de vírus como o SARS-Cov-2, causa da doença Covid-19. “Há quem diga que o que está a acontecer agora não é, de modo algum, uma consequência da globalização. Mas penso que é a consequência de não se ter tido em conta, desde há um século, um fator essencial no nosso modo de desenvolvimento: a nossa relação com a natureza. Foi considerada como um recurso e mais nada, quando é muito mais do que isso: é o fundamento da nossa capacidade de viver, de desenvolver-nos e de sermos resilientes”, considera. Para o sector agroalimentar, o vírus tem um efeito mais imediato e tangível, com muitas empresas e trabalhadores a terem de, em situação de risco, continuar a produzir e a distribuir, ao mesmo tempo que tentam reorganizar-se. “Os restaurantes, as escolas, as cantinas das empresas estão encerrados. Os formatos, as receitas e os produtos não são os mesmos. Em todos os países, o isolamento traduziu-se numa forte acumulação de stocks por parte dos consumidores, que durou mais ou menos uma semana. Depois, chegou a digestão desses stocks, se podemos dizer assim, e o comércio recuou durante uma semana. E, de seguida, o ritmo do novo sistema entrou em marcha”. O encerramento das fronteiras na Europa levou o sector agroalimentar a ter de adaptar-se para manter a produção, o que leva Emmanuel Faber a insistir, ainda mais, num dos princípios que já proclamava antes desta crise: o carácter local da produção, mesmo tratando-se de empresas globais. “95% do que produzimos é consumido nos países onde é produzido. Esta crise, não apenas na fase de isolamento, mas também depois, acentuará este fenómeno de relocalização da agricultura e da alimentação. Isto não quer dizer que se tenham de encerrar as fronteiras. As fronteiras devem continuar abertas”, sustenta. Uma solução global, assente num novo equilíbrio local que vem também dar resposta a um novo modo de vida, onde esse local tem uma importância acrescida.

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TEMA DE CAPA

TEXTO Carina Rodrigues FOTOS Shutterstock

s o i r A n e c e u Q ? d i v o C POs-

aos núme , is a m z e v m mos, uma e s s e que possa r o g e d e R m o bstante íveis ros, não o de traçarmos poss id. Até es v t o n C a , r s a ó r p e o g o um mund e d s io al Ramalh r r á e n e cen G o “o omo dizia na RTP1, a t porque, c is v e r t rigação ua en s b o a n a , s s s e o n n Ea vel, mas é ão os númeá o z a r é o s med E porque . ” lo ossam p á e s u s a q p s a e r r o ult assustad is a tecipar e m n r a o p m e it ros, m e nos per u q , r e -Covid. c s e ó r p o pa d n para o mu preparar

O

s números: o indicador do sentimento sobre a economia global, nos próximos três meses, registou o valor de -39,2. À medida que a pandemia se expande, as empresas mostram-se mais pessimistas quanto à economia global do que sobre as suas próprias expectativas de negócio, segundo um estudo publicado pelo The Economist. O comércio mundial de mercadorias irá experimentar uma descida entre 13% e 32%, em 2020, indica a Organização Mundial do Comércio (OMC). Os economistas acreditam que a descida será provavelmente maior que a registada na crise financeira mundial de 2008-2009. A OMC prevê uma recuperação do comércio em 2021. Cada trimestre de interrupção do comércio internacional

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pode custar 700 mil milhões de euros, estima a Euler Hermes. Se as medidas se prolongarem por mais um mês, a fatura sobe. A Euler Hermes perspetiva que cada mês de medidas de contenção impacte entre 20% e 30% o crescimento das economias. O atual contexto de bloqueio da economia poderá levar à falência cerca de 7% das PME e “mid-caps” da zona euro: cerca de 13 mil negócios. Os gastos no retalho cairão, este ano, 5,1% nos Estados Unidos da América. Esta descida é mais do dobro da queda sofrida na crise financeira de 2008, segundo os dados da GlobalData. O segundo maior mercado de retalho do mundo experimentará, assim, uma das quedas mais pronunciadas, em valor, a nível global, encolhendo mais de 200 mil milhões de dólares face a 2019. Mesmo assim, este desempenho será melhor que o de Espanha, França e Itália.


Espera-se que os retalhistas europeus percam mais de quatro mil milhões de dólares devido à interrupção da atividade devido à emergência sanitária, estima a LearnBonds. Na semana em que o Eurogrupo acordou um pacote superior a 500 mil milhões de euros para responder à crise económica, os portugueses já percebiam efetivamente a magnitude desta situação e não tinham dúvidas de que vão sofrer quebras nos seus rendimentos, opinião de 99,1% apurada pela Marktest. A maioria dos líderes financeiros em Portugal (59%) está menos otimista em relação aos resultados financeiros das suas empresas, para 2020, quando comparado com as expectativas desenhadas no início do ano, revela a Deloitte. Mas nem todos os dados são negativos. De acordo com um inquérito realizado pela Hays, apenas 21% dos empregadores excluem a hipótese de continuar a contratar até final de 2020. Que cenários temos, então, pela frente? Um modelo matemático realizado pela Singapore University of Technology and Design, com base na tendência atual de casos de Covid-19, antevê o “fim teórico” da pandemia, a nível mundial, para 14 de dezembro. O modelo matemático, citado pelas agências internacionais, prevê ainda que 99% dos casos de infeção possam ser registados, a nível global, já a 21 de junho. Não é traçado o cenário de Portugal, mas, no caso de Espanha, o modelo matemático antevê o fim da pandemia para 9 de setembro. As projeções, feitas com base na tendência atual dos casos, indicam ainda que o fim da pandemia em Itália e no Reino Unido será, respetivamente, para 10 e 8 de setembro. Em França e na Alemanha chegará, respetivamente, a 8 e a 14 de agosto. Fora da Europa, o modelo matemático antevê que nos Estados Unidos, que são atualmente o país com mais mortos e mais casos de infeção confirmados, o fim será a 1 de outubro e no Brasil a 21 outubro. Mas e os efeitos económicos, quanto tempo se farão sentir? A Nielsen inquiriu consumidores de 29 países da Europa sobre quanto tempo a pandemia iria durar e a maioria acredita que o impacto irá prolongar-se pelos próximos 12 meses, sinalizando que muitas das grandes mudanças a que se assistiram no consumo e no retalho também irão manter-se. A maioria dos consumidores na Polónia, Itália, França e Irlanda está a reconsiderar a necessidade e a frequência da visita aos supermercados e a optar, sempre que possível, pelo online. Este sentimento, catalisado pela Covid-19, obriga retalhistas e fabricantes a fazer ajustamentos significativos às prioridades do negócio, com impactos ao longo de toda a cadeia, dos preços e promoções ao formato das lojas. De facto, está-se perante um momento-chave para o comércio eletrónico e o marketing digital e é por isso que muitas empresas do país estão a aproveitar o infeliz ensejo provocado pela Covid-19 para reverem as suas estratégias. “Nos últimos dias, e num momento em que o acesso à Internet

em Portugal aumentou cerca de 40%, temos ouvido bastantes lamentos por parte dos gestores e empreendedores de que deveriam ter investido mais cedo. Mas os que estão a começar ainda vão a tempo de desenvolver os seus projetos com sucesso. Acreditamos que muitas das mudanças de hábitos de agora vão influenciar a nossa decisão no futuro, enquanto consumidores, mas a experiência online tem de ser positiva, caso contrário, os clientes não repetirão a compra”, enfatiza Vera Maia, fundadora e CEO da plataforma Tudo sobre eCommerce (TSE). Oportunidade no digital Algumas marcas já se aperceberam que se está perante uma oportunidade, daí que tenham crescido exponencialmente o número de “lives” diários no Instagram, “webinars”, cursos online, vídeos e atividades de desporto e fitness em “livestream” e, de uma forma geral, outros conteúdos de interesse para quem está em casa atualmente. Os vinhos são lançados online, há ginásios nascidos em época de crise que são 100% online, produtos de cuidados pessoais são lançados no Instagram, cadeias de tecnologia fazem assistência técnica à distância, empresas de bacalhau, de padaria e pastelaria, de queijos, de bebidas e até de automóveis fazem entregas em casa. Basta passar em resumo o último mês e meio de notícias publicadas no site da Grande Consumo para se perceber que se contam pelos dedos de muitas mãos. Muitas mesmo. “Existem alguns mercados mais afetados por esta crise do que outros. Para aqueles em que os hábitos de consumo já passavam pelo online, esta crise surge como uma oportunidade para aumentar ainda mais as vendas. A Amazon, por exemplo, anunciou o recrutamento de 100 mil novos funcionários nos Estados Unidos da América para fazer face às necessidades de recursos que esta pandemia criou. E, dentro das nossas fronteiras, várias empresas começaram a reforçar, com recursos humanos, as suas áreas de comércio eletrónico e correspondentes cadeias logísticas”, nota Vera Maia. O único problema, porém, poderá ser o tempo necessário para implementar uma marca junto dos consumidores. “Pela análise que fazemos dos resultados dos nossos clientes, existem duas estratégias que estão a ter maior resultado”, explica a CEO do TSE. Primeiro, campanhas promocionais de desconto direto na compra, principalmente em marcas de baixa notoriedade; segundo, campanhas focadas na fidelização de clientes, em marcas com elevada notoriedade e base de dados de clientes. Neste momento, “o foco dos clientes, está nas marcas em quem mais confiam”. A fundadora do TSE acredita que o crescimento das vendas online será exponencial, principalmente nos mercados emergentes, como os do sul da Europa. “Prevemos que o e-commerce termine a subir pelo menos 30% este ano. Com repetição

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nos anos seguintes. E é necessário que as estruturas logísticas e de transportes acompanhem esta evolução, para que o serviço aos clientes não seja colocado em causa”. A pandemia da Covid-19 obrigou a todos a rever os seus mercados principais e o seu modelo operacional, reavaliando as preferências e comportamento do consumidor num momento que é de grande incerteza quanto à economia e ao futuro. Um estudo do Capgemini Research Institute, que analisa quais das mudanças de comportamento se manterão nos próximos meses, assinala que “a tecnologia será fundamental para enfrentar estes desafios. Isto vale tanto para a fase de recuperação, onde apoiará novas soluções inovadoras, como também para a fase de relançamento mais a longo prazo, para preparar a organização para uma nova realidade no futuro”. Novos comportamentos Até porque, fique bem claro, os comportamentos e as necessidades do consumidor irão alterar-se no rescaldo da pandemia por Covid-19, o que resultará em novos desafios para as marcas. De acordo com a consultora LLYC, irão acelerar algumas tendências, destacando-se 12 que será necessário considerar. Do lado das marcas, começa pela flexibilidade na estratégia. Estas terão de aumentar a sua capacidade de transformação e adaptação, quer das estratégias como também dos próprios modelos de negócio. Além disso, a necessidade de antecipação ganha relevância. Mais que nunca, as marcas vão procurar ter uma visão holística e estar um passo à frente. A análise preditiva ajudará a melhorar a capacidade de reação e a liderar a toma-

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da de decisões. A LLYC destaca ainda que as marcas pertencem às pessoas. As que ganharam em reconhecimento público na resposta à pandemia são as que adaptaram o discurso ao que os utilizadores estavam a promover nas redes sociais, tornando-se relevantes. Outra tendência é o envolvimento com a sociedade e o papel social das marcas, que complementa o dos órgãos públicos. Paralelamente, na fase do pós-crise, um dos grandes deveres das marcas será a construção de um verdadeiro e contínuo ativismo. Por último, a consultora indica que a crise está a tornar ainda mais relevante a necessidade de uma comunicação autêntica e transparente. Do lado dos consumidores, destacam-se também seis tendências. A evolução do comportamento do consumidor vai ficar marcada pelo isolamento social, pelo que, na fase do pós-crise, o consumo vai ser permeado de incertezas e da busca pela segurança, como aconteceu após a crise de 2008. Outra tendência é a consciência pessoal. As marcas vão ter de se adaptar às expectativas dos consumidores, que estão mais conscientes do que os rodeia e ainda mais preocupados com o seu bem-estar. Já se está a testemunhar um “boom” de conteúdos à volta do “mindfulness”, fitness ou ioga. Ao mesmo tempo, as conversas sobre conciliação entre o pessoal e o profissional estão a ser intensificadas. O isolamento acelerou também a digitalização. O lazer virtual, as compras online ou o teletrabalho, por exemplo, estão a reeducar os hábitos do consumidor. Por outro lado, estão a intensificar-se

os fenómenos de desintermediação, reduzindo obrigatoriamente o número de interações entre as pessoas. Em contrapartida, a grande “buzzword” do momento, a sustentabilidade, poderá vir a ser ofuscada por outras prioridades relacionadas com a saúde e segurança. Não obstante, o caso da China foi uma aprendizagem ao se desencadear um aumento da procura pelos produtos biológicos e uma crescente preocupação com o meio ambiente. Resta ver de que lado a balança vai cair quando o choque inicial da crise der lugar à reflexão. Mais uma nota: o nível de exigência dos consumidores vai aumentar ainda mais. Estes aprendem mais rápido, procuram marcas úteis e concentram-se naquilo que simplifica a sua vida. A necessidade de informação constante causada pela situação de pandemia vai também aumentar as expectativas dos consumidores quanto à transparência do processo. Assim como, hoje em dia, as autoridades não se cansam de exigir dos cidadãos um comportamento exemplar, necessário para superar a situação, essa mesma cidadania irá exigir de volta, não apenas das instituições, mas também das marcas com as quais se relacionam. Finalmente, irá surgir uma nova forma de empatia. A crise está a criar novas formas de entretenimento familiar e de aprendizagem da gestão das emoções, a reforçar a construção dos valores de equipa nas empresas e a importância do trabalho em conjunto para superar as adversidades. Um maior foco está também a ser colocado no bem-estar pessoal e relacional, sobre a acumulação ou o consumo desenfreado, em consonância com a previsível estagnação do crescimento económico. Paradoxalmente, a crise e a reclusão contínua também vão aumentar a sensação de isolamento e a explosão de sintomas próximos ao transtorno de stress pós-traumático. Ainda ao nível dos comportamentos, um outro estudo, desta feita da consultora Brandelicious, aponta algumas pistas a considerar para adaptar a oferta aos novos


hábitos sociais e de lazer. O inquérito feito em Espanha, mas cujas conclusões podem ser facilmente extrapoladas para Portugal, destaca que o medo de contrair a Covid-19 faz com que os consumidores prevejam uma mudança nos seus hábitos quanto à frequência dos estabelecimentos de hotelaria. Segundo o barómetro, 46,7% dos entrevistados manifestam que irão com menos frequência a bares e restaurantes do que faziam antes da Covid-19. 8,5% recusa-se mesmo a frequentá-los. Por outro lado, os jovens são cada vez mais tecnológicos e saem menos. A crise pandémica acentuou esta tendência, diminuindo a frequência de visita às discotecas. Os dados antecipam que três em cada 10 com idades entre 18 e 35 anos não irão a discotecas e quase quatro em cada 10 diminuirão a sua frequência. De igual modo, 25,9% assegura que não irá ao cinema e 46,3% irá, mas com uma frequência menor que antes da pandemia do coronavírus. Cenários Que novos cenários deverão, então, os negócios considerar para podermos dar a volta a isto? Especificamente sobre o sector do retalho, um estudo da Coto Consulting assinala que, não obstante, este sector caracterizou-se sempre por ser dinâmico e estar acostumado a adaptar-se rapidamente às mudanças nos hábitos de consumo e preferências do consumidor. Como consequência da crise, “o sector vai sofrer uma aceleração das mudanças sem precedentes, pondo à prova toda a estrutura empresarial, em todos os sectores e formatos. Mas, apesar dos muitos encerramentos previstos, tem uma capacidade de resiliência inata para sair fortalecido e reconhecido publicamente como um sector estrutural e elemento de coesão para a sociedade”. A Coto Consulting formula uma série de hipóteses sobre o cenário pós-Covid. No total, são 18 hipóteses validadas, das quais 12 correspondem ao impacto do novo coronavírus no retalho e seis às mudanças no consumidor. Entre os 12 cenários relacionados com o retalho está o reajustamento da oferta. Após este período, está previsto o encerramento definitivo de muitos estabelecimentos comerciais. As variáveis que determinarão o nível de resistência são a dimensão empresarial, o grau de especialização e o acesso a financiamento. O processo de reposicionamento

As marcas pertencem às pessoas. As que ganharam em reconhecimento público na resposta à pandemia são as que adaptaram o discurso ao que os utilizadores estavam a promover nas redes sociais, tornando-se relevantes estratégico, especialização e digitalização será acelerado e prevê-se que tenha um grande protagonismo para muitas empresas. Outro dos cenários é a conversão do ano de 2020 em Black Friday. O stock acumulado de produtos nos armazéns, propiciado pelo encerramento temporário das lojas físicas, e a falta de cash flow levarão a uma pressão para baixar os preços de modo a incentivar as compras, introduzindo novas campanhas de liquidação, aceleração dos saldos e de todo o tipo de descontos, a fim de reduzir o inventário disponível. Deste modo, o momento de regresso à atividade e de abertura das lojas será caracterizado por descontos e promoções agressivas de liquidação de stock, com margens reduzidas ou nulas, de modo a manterem-se no mercado, pelo que é muito provável que o que resta de 2020 seja convertido num Black Friday contínuo. Outro dos cenários previstos é o predomínio dos fatores preço-segurança. Devido à incerteza económica que se está a viver, prevalece a posição de conter o gasto e ser menos consumista, sendo previsivelmente uma tendência que se manterá num futuro próximo. Além disso, o fator de segurança será mais importante que o próprio preço. A experiência de compra converter-se-á em conveniência, entendida como uma compra rápida e direta onde a segurança transmitida ganha uma grande importância. O quarto cenário prende-se com a polarização digital e a aceleração omnicanal. A crise do coronavírus pôs a manifesto o estado do canal online, sendo que os

retalhistas que já contavam com um bom nível de digitalização e plataformas de vendas online puderam continuar a levar a cabo a sua atividade económica, parcial ou totalmente, vendo-se forçados a introduzir, em tempo recorde, melhorias na eficiência da sua gestão. Já aqueles cujo desenvolvimento era reduzido ou nulo, pararam praticamente a atividade. Como consequência, está-se a gerar uma maior polarização segundo o nível de digitalização, uma vez que uns viram-se obrigados a otimizar e melhorar a venda online e outros continuam iguais. A partir deste momento, será necessário incrementar os recursos dedicados a melhorar o marketing digital e ao nível da gestão de e-commerce, principalmente no controlo dos stocks e na logística para reduzir os gastos de envio, flexibilizar devoluções e potenciar novas formas de entrega de contacto zero. Outro dos cenários delineados relaciona-se com o encurtamento da cadeia de valor. Durante o período de isolamento, muitas marcas de todos os sectores levaram a cabo campanhas de comunicação proativas e fizeram várias atuações que lhes permitiriam continuar presentes e aproximarem-se ainda mais dos consumidores, tornando-se mais relevantes. Como tal, serão explorados canais de contacto direto com o cliente. O sexto cenário refere-se à otimização dos stocks e seleção dos fornecedores. A crise da Covid-19 pôs a claro a necessidade de um conhecimento exaustivo da

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disponibilidade de produtos em tempo real, tanto para evitar o excesso como a rutura de stocks. Nessa medida, as empresas deverão otimizar o seu stock e poder reabastecer-se de forma constante, pelo que a capacidade logística, financeira e o know-how dos fornecedores serão determinantes para não afetar a liquidez dos retalhistas. O resultado será uma carteira de fornecedores mais reduzida, mas também mais otimizada. Os líderes serão mais líderes, diz também a Coto Consulting. Tendo em conta as fontes consultadas a respeito das crises anteriores, como a de 2008, e os dados obtidos agora, espera-se que as empresas que gozassem de uma liderança prévia e que, durante a Covid-19 a mantiveram ou até aumentaram, melhorem o seu posicionamento e saiam fortalecidas no pós-Covid. O cenário número oito, por seu turno, traça um retalho físico mais próximo e sustentável. É possível que, após este período, se valorize ainda mais a compra de proximidade e o comércio de bairro, a capacidade de adaptação e personalização do serviço e o compromisso com o meio ambiente. Por isso, perante uma situação em que o preço se recuperará como principal fator de competitividade a grande escala, será vital que os mais pequenos possam concorrer apoiados nos valores da proximidade, empatia com o cliente, vinculação com a comunidade e compromisso com o meio ambiente, questões relacionadas com o marketing 3.0. O nono cenário indica o desenvolvimento de novos métodos de pagamento alternativos. A Covid-19 propiciou a utilização de alternativas ao dinheiro como método de pagamento, que poderão converter-se num hábito, pelo que o retalho deverá oferecê-los. Ao mesmo tempo, deverá ser feita uma monitorização constante da procura. Cada vez se dá mais importância a

As medidas de higiene e distanciamento social introduzidas para evitar a propagação do vírus manter-se-ão no regresso à normalidade. Esta hiper higienização representará um fator diferenciador e de competitividade, porque os shoppers procurarão os estabelecimentos onde se sentem seguros dispor de informação recente e entendê-la para responder às necessidades da procura. Existe uma grande quantidade de informação proveniente de várias fontes (web, redes sociais, loja, etc.), que será necessário analisar de forma conjunta, através de ferramentas modernas e ágeis, para conseguir que se converta em dados relevantes e úteis na tomada de decisão. O penúltimo cenário prende-se com a reação do associativismo empresarial. Nestes momentos, ficou patente o poder da união e do coletivo. Todas as organizações que não souberam tornar-se relevantes e não conseguiram fortalecer esse vínculo, acabarão por cair para se-

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gundo plano e algumas até desaparecer por não ter sabido reagir num momento crucial. Finalmente, há que contemplar o reposicionamento dos centros comerciais. A probabilidade é elevada de que sejam um dos formatos com maior descida no tráfego de clientes e com maior necessidade de adaptação, tanto em segurança e higiene, como no modelo de negócio. É provável que grande parte da população evite locais e momentos que possam levar a uma maior aglomeração, pelo que os centros comerciais serão afetados, provocando a reorientação da oferta. Shopper como agente de mudança No que se refere aos seis cenários relacionados com o shopper, a Coto Consulting avança, desde logo, uma hiper higienização do consumo. As medidas de higiene e distanciamento social introduzidas para evitar a propagação do vírus manter-se-ão no regresso à normalidade. Esta hiper higienização representará um fator diferenciador e de competitividade, porque os shoppers procurarão os estabelecimentos onde se sentem seguros. Outro dos cenários é a aceleração da mudança nos padrões de consumo. Embora a segurança seja o “driver” mais importante da compra, é previsível que se acelerem determinadas mudanças no período pós-Covid. Ao mesmo tempo, a compra será menos impulsiva. Devido à incerteza económica, prevalece a posição de conter o gasto e ser menos consumista, tal como sucedeu na crise de 2008. Por isso, é expectável que o orçamento familiar se destine ao considerado necessário nesse momento, com as compras a serem mais refletidas. O quarto cenário traça um ressurgimento do local. Devido ao receio de contágio, a segurança na compra será o fator mais importante para os clientes. Nesse sentido, e tendo em conta os padrões mentais de segurança, o ambiente mais próximo e conhecido é o que gera maior confiança e tranquilidade, pelo que, a priori, o shopper deverá optar pelos formatos de proximidade. Na mesma linha, no pós-Covid, haverá uma potenciação do “cocooning”. A sociedade teve que ficar em casa, o que levou a uma evolução na compra dos produtos alimentares. Este facto evidencia que a sociedade se está a habituar a consumir no lar e é possível que se potenciem tendências de uma menor socialização e de um maior refúgio em casa, convertida em fortaleza. O sexto e último cenário indica uma aprendizagem na utilização das novas tecnologias. A situação de isolamento refletiu o seu nível de conhecimento e utilização, o que originou


a necessidade, por parte dos menos familiarizados, de aprenderem a utilizar as novas tecnologias, introduzindo novos hábitos que já se vinham a verificar, como o recurso ao online para fazer as compras. Uma chamada de atenção, contudo. Se bem que muitos cenários façam paralelismos com a crise financeira de 2008, a saída da atual será distinta. Até porque ambas têm origens diferentes. “A de 2008 era uma crise financeira global, onde os consumidores se centraram nos números, já que teve um impacto direto nas suas carteiras. A da Covid-19 não só terá impacto nas suas carteiras, como também, e sobretudo, no seu modo de vida (mobilidade, teletrabalho, segurança), pelo que terão de repensar o seu modelo de vida”, afirma María Ángeles Zabaleta, Client Development Director na Nielsen Iberia. Após a crise de 2008, o consumidor conteve os seus gastos, comprando menos vestuário, consumindo menos fora de casa e procurando opções mais baratas nos produtos básicos. Agora, a conveniência converteu-se

também mais distância social e mais tempo em casa. Os cenários são, de facto, muitos, apontam várias pistas, mas, nem por isso, se desvanece a incerteza quanto ao desenrolar dos próximos meses. Que sirvam, pelo menos, de balizas, uma vez que, como denominador comum, têm o facto de sublinhar que vai ser um impacto difícil e que o “novo normal” será em tudo distinto do normal que estávamos habituados a viver. Fica a esperança de que a crise traga também algumas oportunidades que os profissionais deste sector, sábia e atempadamente, saibam antecipar e aproveitar. Como lembrava o primeiro-ministro, António Costa, “até a II Guerra Mundial trouxe grandes avanços para a humanidade na tecnologia e no conhecimento”. Não há volta a dar. A Covid-19 chegou e veio para ficar, não a podemos ignorar, a menos que façamos como no Turquemenistão, onde não há casos do novo coronavírus porque foi proibido por decreto. E

num básico e, após a Covid-19, o consumidor privilegiará a higiene, a saúde e a segurança. Em termos de sensibilidade aos preços e promoções, a saída de ambas as crises também não se faz do mesmo ponto de partida. María Ángeles Zabaleta recorda que, em 2009, em Espanha, a sensibilidade ao preço era de 52% e que, 10 anos depois, se situava nos 67%. Na crise financeira, a procura pelas promoções era de 48% e, em 2019, ascendia a 62%. Também em 2008, o consumidor optou pelas marcas de distribuição com o objetivo de reduzir os seus gastos. Hoje, assinala a consultora, a marca própria está noutro nível de quota e penetração. Ao contrário do que aconteceu em 2008, na etapa pós-Covid, o consumo será impacto por mudanças na forma de vida. O consumidor irá passar mais tempo em casa, o que implicará um aumento dos fenómenos de take-away, delivery e da opção por confecionar as refeições no lar. Existe, também, um consumidor muito mais conectado. De acordo com a Nielsen, os consumidores terão de procurar um novo equilíbrio entre três planos distintos: racional, emocional e social. No plano racional, o impacto económico levará a alguma contenção nos gastos, mas manterá as suas preocupações com os temas da saúde, rastreabilidade e segurança. Já no plano emocional, optará pelo que é local e próximo. “Além disso, vai ter de reinventar a experiência omnicanal”, alerta María Ángeles Zabaleta. Finalmente, na vertente social, nascerá uma nova sociabilidade, com mais conexão, mas

pandemias sempre existiram. Que a história de Emília Pinho Costa, moradora de Oliveira de Azeméis, nos sirva de inspiração e nos incuta alguma esperança para enfrentar os dias difíceis que se avizinham. Do alto dos seus 109 anos, já enfrentou e derrotou não uma, nem duas, mas três pandemias. “Sobrevivi à gripe espanhola e à tuberculose, tendo perdido o meu pai. Passei pela I e II Guerra Mundial e aqui estou. A graça do Senhor é grande: vamos vencer esta pandemia e ficar bem”, disse à SIC. É certo que estamos só a começar o período mais grave em três gerações, onde à maior pandemia se junta a potencial maior recessão. O modo como sairemos dele depende das escolhas que fizermos. “Vamos seguir a via da desunião ou adotar o caminho da solidariedade global? Se escolhermos a desunião, isso não só prolongará a crise, como resultará provavelmente em catástrofes ainda piores no futuro. Se escolhermos a solidariedade global, será uma vitória não só contra o coronavírus, mas contra todas as futuras epidemias e crises que possam assolar a Humanidade no século XXI”, voltamos a Yuval Harari. E se começámos com Eça de Queirós, terminamos com Jorge Palma: “Enquanto houver estrada para andar/ a gente vai continuar/ enquanto houver estrada para andar/ enquanto houver ventos e mar/ a gente não vai parar/ enquanto houver ventos e mar”.

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TEMA DE CAPA TEXTO Carina Rodrigues FOTOS Shutterstock

O imperativo da relevância Mais uns do que outros, de uma maneira ou de outra, nenhum sector escapou aos efeitos da pandemia de Covid-19. Se, no alimentar, o confinamento dos consumidores às suas casas e algum pânico inicial, refletido nas suas compras, se traduziu em mais vendas, outros, porém, tiveram um trimestre para esquecer. Os dois primeiros meses do ano até nem corriam nada mal, mas bastou março para tudo mudar. Mesmo assim, à medida das possibilidades de cada um e dos limites impostos pela triste circunstância, a opção generalizada não foi fazer como a avestruz e “meter a cabeça na areia”. Todos assistimos a exemplos heroicos de como as empresas se posicionaram para responder às necessidades do consumidor, da sociedade, do esforço coletivo de combate à pandemia e manter o mundo a girar. E há frutos que, passado o pânico, poderão vir a ser colhidos. Os estudos são unânimes: quem mantém a sua visibilidade e relevância durante uma crise perfila-se para uma recuperação mais rápida.

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omeçam a ser publicados os resultados das empresas referentes ao primeiro trimestre e, de uma maneira ou de outra, todos eles são influenciados pela pandemia de Covid-19. Naqueles sectores em que a atividade ficou mais paralisada, nos mais dependentes do turismo ou considerados não essenciais, o impacto do coronavírus é notório. Que o diga a Adidas, por exemplo, cujos lucros praticamente evaporaram. Com 70% das lojas encerradas, a nível mundial, os lucros da Adidas caíram 97%, isso mesmo, 97% e as vendas contraíram 19%. O único canal que se manteve totalmente operacional, na maior parte do mundo, foi o e-commerce, que cresceu 35%. Contudo, isso não foi suficiente para compensar as perdas financeiras, que já levaram a que a Adidas tivesse recebido uma ajuda estatal do governo alemão no valor de três mil milhões de euros. Já a Primark deu como perdida roupa no valor de 325 milhões de euros. Com todas as lojas encerradas, desde 22 de março, e sem canal de vendas online, a Primark perdeu vendas de 740 milhões de euros mensais, detalha a Associated British Foods (ABF), a empresa proprietária da cadeia de moda. Ainda na moda, veja-se o exemplo da H&M, cujas vendas, em março, caíram 46% em relação ao mesmo mês do ano anterior, devido ao impacto das medidas de contenção do coronavírus, que levaram ao fecho de 3.778 lojas de um total de 5.065. Na tecnologia, o cenário não é muito melhor. A Covid-19 passou também a fatura à Fnac Darty, que no primeiro trimestre faturou menos 7,9%, face ao mesmo período do ano anterior. Em termos comparáveis, a queda foi de 10,3%. Esta descida deve-se, fundamentalmente e, uma vez mais, ao encerramento de quase todas as lojas do grupo desde meados de março, o que fez com que, nesse mês, as vendas

tivessem diminuído cerca de 30%. Entre janeiro e fevereiro, as receitas acumuladas tinham crescido 2,8%. Quem está exposto ao canal Horeca também não tem histórias felizes para contar neste trimestre. O encerramento dos bares e restaurantes devido à pandemia de Covid-19 pesou negativamente nas vendas da Pernod Ricard, que caíram 13,3% no seu terceiro trimestre fiscal, para 1,74 mil milhões de euros. Numa base comparável, a queda foi de 14,5%. Também a cervejeira Carlsberg viu as suas vendas caírem 6,8% e os volumes a retrocederem 7,6%. Em Portugal, a associação do sector cervejeiro já veio alertar para o risco de sobrevivência de mais de 100 pequenos produtores. Neste subsector, o impacto da pandemia Covid-19 é ainda mais grave, pois só de forma marginal conseguem aceder ao canal alimentar. A atividade destas microempresas depende em mais de 95% do canal Horeca, das feiras e dos eventos de cerveja artesanal que foram, preventivamente, todos adiados e, no pior dos cenários, serão mesmo cancelados no decorrer de 2020. Mas o pior pode ainda estar para vir. “Se bem que começamos a ver sinais de recuperação no nosso maior mercado, a China, e sinais iniciais de que os governos levantam as restrições com cautela em alguns países da Europa Ocidental, os outros mercados permanecem bloqueados. Os requisitos de distanciamento social continuarão e afetarão o comportamento do consumidor. Consequentemente, os volumes diminuirão ainda mais no segundo trimestre”, alerta Cees ‘t Hart, CEO da Carslberg. Uma noção que vai de encontro à opinião do CEO da Adidas, Kasper Rorsted. A empresa alemã espera que o segundo trimestre seja

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ainda pior, com as vendas a poderem cair até 40%, uma vez que só aí se poderá sentir todo o impacto da crise da Covid-19. Sectores mais afetados De acordo com um estudo realizado pela Brand Finance, a economia mundial deverá perder um bilião de euros devido à pandemia por coronavírus. O sector da aviação será o mais afetado. As em-

Segundo a Moody’s, os cenários estimados para os sectores de atividade pressupõem uma normalização da atividade económica na segunda metade do ano.

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presas deste sector já perderam perto de 185 mil milhões de euros e só a Boeing registou perdas de 55 mil milhões de euros. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) prevê que a maioria das empresas do sector da aviação apresente quebras dentro de dois meses, como resultado do encerramento das fronteiras. A lista de sectores mais afetados conta ainda com o petróleo e gás, o turismo e lazer, a restauração e, por fim, o retalho. Quanto ao luxo, a Brand Finance indica que já está a sentir os efeitos imediatos da pandemia, uma vez que a maioria dos gastos tinha origem na China, onde o surto apareceu pela primeira vez. E, de facto, pelas contas da Bain & Company, as vendas globais de produtos de luxo deverão ter sofrido uma queda de 25% a 30% no primeiro

trimestre. As marcas de luxo sentiram os primeiros efeitos quando o surto do coronavírus se espalhou pela China, um país cujos cidadãos representam 35% do mercado global destes produtos e foram responsáveis por 90% do crescimento do sector, à escala global, em 2019. Quando o vírus chegou a Itália, onde muitas dessas marcas têm sede e principais fornecedores, enfrentaram o desafio adicional de operar como e onde era possível. Os resultados da Beiersdorf, cujas vendas caíram 3,6% no primeiro trimestre, são um reflexo disto mesmo. O colapso global no turismo penalizou muito o desempenho da marca La Prairie, que perdeu 36%, mas também dos protetores solares. Recorde-se que cerca de um quarto das vendas da marca premium de cuidados com a pele é feita no canal de viagens e, muito em particular, junto dos turistas chineses. Mas voltemos aos dados sobre os sectores mais afetados pela Covid-19. Segundo a Moody’s, os cenários estimados para os sectores de atividade pressupõem uma normalização da atividade económica na segunda metade do ano, mas a capacidade de algumas empresas suportarem os efeitos do surto do coronavírus dependerá da duração da pandemia. Os sectores do vestuário, fabricantes de automóveis, bens de consumo duradouros, jogos, alojamento, turismo e lazer, companhias aéreas, retalho (produtos não


alimentares) e encomendas são os que mais estão à mercê da evolução mundial da pandemia e, como tal, dão sinais de fragilidade quanto à sua sobrevivência num futuro próximo. E os números que são dados a conhecer confirmam esta perceção. Na semana de 16 a 22 de março, as vendas de livros caíram 65,8% em Portugal, dois terços do valor por comparação com o mesmo período do ano passado. Os dados são da consultora GfK, que confirma uma queda abrupta das vendas com o agravamento da situação epidemiológica causada pela Covid-19. Foram vendidos menos 121,6 mil livros, o que representa um recuo de 1,6 milhões de euros no mercado total. As livrarias e espaços dedicados à venda de livros foram os estabelecimentos mais atingidos, com uma descida de 73% nas vendas. Nos hipermercados, a redução foi mais suave, mas, ainda assim, de 40%. António Salvador, diretor geral da GfK Portugal, alerta que, “a continuar assim, será a pior crise que alguma vez existiu neste mercado”. No mercado automóvel, nem no tempo da troika se tinha vendido tão pouco. Em abril, o comércio automóvel caiu 84,6%, devido ao encerramento dos concessionários por causa do estado de emergência. No total, só foram matriculados 3.803 veículos. Só as vendas online e as entregas em casa evitaram que o cenário fosse ainda pior. Até ao mês de abril, o recorde em termos negativos pertencia a

fevereiro de 2012, quando a descida das vendas foi de 52,3% e foram matriculados 7.926 automóveis. Mesmo assim, mais do dobro do registado agora. Já a venda de brinquedos também desceu a dois dígitos. As compras online aumentaram 218% em Portugal, em março deste ano, no entanto, a venda total registou uma quebra de 24%, com as compras offline a assinalarem uma descida de 31%. Os dados são da GfK e resultam da comparação com o mês homólogo. Embate É um facto, a situação está complicada de um modo generalizado, mas há sectores particularmente afetados e para os quais, mesmo no melhor dos cenários, as vendas perdidas não irão ser recuperadas. A moda, de um modo muito específico, será, segundo a Moody’s, um dos mais penalizados. As lojas foram forçadas a fechar e a coleção de primavera arrisca-se a não ser vendida. Além disso, algumas cadeias não irão gerar receitas

suficientes para comprar as coleções de outono. Geralmente, os meses de março e abril são dos mais importantes para os retalhistas de moda e o e-commerce, quando existe, não tem sido suficiente para compensar a perda de receitas gerada pelos encerramentos. Deste modo, algumas marcas não sobreviverão à pandemia e outras terão que mudar o seu modelo de negócio, de modo a poder responder a um consumidor com novas preocupações e expectativas. “Este é um momento de mudança nos padrões de tráfego e consumo e, por isso, estamos a ajustar-nos, da melhor forma, às necessidades e a comunicar em conformidade com o período que vivemos”, atesta José António Ramos, CEO da Salsa. “São tempos duros, com muita gente a sofrer e a passar por momentos complicados e, por isso, todo o nosso apoio e carinho vai para essas pessoas: somos uma marca feita de pessoas, para pessoas, e é esse tato que nos tem movido. Obviamente, não nos podemos esquecer dos potenciais impactos desta crise na economia, mas ainda estamos no início daquilo que poderão ser as consequências da paralisação da operação em loja. Estamos a preparar e a trabalhar vários cenários”. O gestor não arrisca, para já, fazer qualquer tipo de previsões ao que será o futuro, até porque a duração desta pandemia é muito imprevisível. “Fizemos algumas alterações à coleção de Spring/ Summer 20, embora grande parte das peças esteja já disponível na loja online. Em função do regresso à normalidade das lojas, poderemos ou não transferir algumas peças para futuras coleções. As primeiras entradas da coleção de Fall/Winter 20 estão previstas, como é hábito, para meados do verão. Há, com certeza, muitas peças da coleção cuja produção parou, seja por indicação nossa ou porque o nosso fornecedor e os seus respetivos fornecedores também pa-

“O valor das marcas não é determinado apenas pelo seu desempenho financeiro, mas também pela sua reputação aos olhos dos consumidores”

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raram as operações. Continuamos a trabalhar de forma a encontrar soluções que se adaptem às necessidades e, neste momento, essa é uma avaliação quase diária, estamos sempre a receber nova informação e novos indicadores, não só do comportamento da pandemia, como também dos consumidores no pós-confinamento”. Reinvenção Também o sector da beleza está a sofrer com os efeitos da pandemia. Veja-se a gigante L’Oréal, cujas contas do primeiro trimestre mostram uma descida de 4,3% nas vendas. Mesmo assim, um desempenho mais positivo que o do mercado de cosmética, que, segundo Jean-Paul Agon, presidente e CEO da L’Oréal, registou uma descida de 8%. Perante factos, há que enfrentá-los e adaptar. Até no modo como se comunica com os consumidores, de modo a manter a relevância. “Tendo em conta o momento em que vivemos, tivemos de reinventar e apostar em novas estratégias de marketing que melhor respondessem às necessidades atuais de quem nos procura e que, ao mesmo tempo, mantivessem as características relacionais do negócio, num momento em que se impunha o distanciamento”, conta Sandra Castanheira, administradora e sócia fundadora do Grupo Concept, detentor das clínicas BodyConcept e DepilConcept. “Criámos e desenvolvemos o conceito de HomeCare para ambas as marcas, dando continuidade, em casa, aos cuidados dos nossos clientes. Através das nossas redes sociais e newsletters, partilhámos conselhos e orientações de tratamentos, temáticas para desenvolver em família, dicas de relaxamento e orientações para que todos possam continuar a cuidar da sua saúde e bem-estar, nas suas casas. Além da criação do conceito HomeCare, focámo-mos também no contacto direto. Os nossos colaboradores têm assegurado uma comunicação próxima, através de contacto telefónico, que se tem revelado muito importante para os nossos clientes, pois é desta forma que conseguimos continuar

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a dar o apoio aos seus tratamentos, responder às suas dúvidas e, muitas vezes, dar uma palavra de conforto. Criámos também um novo conceito de atendimento online, disponibilizando consultas de avaliação através de plataformas digitais, numa lógica de acompanhamento ‘one- to-one’, que dá continuidade aos métodos e génese das marcas”, detalha. A estratégia foca-se, então, em continuar presente e relevante na vida dos consumidores, ajustando a comunicação e ferramentas às condições excecionais que atualmente se vivem. E como é que uma marca, sobretudo de bens considerados não essenciais, se mantém relevante para os consumidores, numa altura em que as suas prioridades são claramente a segurança e a saúde? “Numa altura como esta, quisemos fazer sentir que somos uma marca feita de pessoas para servir a nossa comunidade”, reforça José António Ramos. Relevância Recentemente, foi conhecida a classificação das 75 maiores marcas de retalho a nível mundial. Um estudo feito pela Kantar e WPP que sublinha que, mesmo com a atual crise causada pela pandemia de Covid-19, o valor das 75 maiores cresceu 12%. À medida que as economias de todo o mundo lutam face às restrições causadas pelo novo coronavírus, o histórico do estudo BrandZ confirma que as detentoras de maior valor de marca recuperaram nove vezes mais rápido durante a crise financeira de 2008. “O relatório permite-nos mostrar que os negócios que investiram no sentido de se tornar uma marca forte estão potencialmente melhor posicionados para aguentar o choque atual. 22 anos de análise BrandZ confirmam de modo consistente que as marcas fortes ajudam os negócios a sobreviver aos tempos mais turbulentos”, sublinha David Roth, CEO da The Store WPP EMEA e Ásia e chairman do BrandZ. As marcas mais inovadoras e ágeis estão a tomar medidas para fazer a diferença nas vidas das pessoas que ficaram confinadas às suas casas e viram-se forçadas a mudar os seus hábitos. Os dados têm revelado que as marcas que mantêm a sua visibilidade e relevância durante uma crise perfilam-se para uma recuperação mais rápida. “O valor das marcas não é determinado apenas pelo seu desempenho financeiro, mas também pela sua reputação aos olhos dos consumidores”, nota Graham Staplehurst, Global Strategy Director para o BrandZ na Kantar. “O modo como se comportarem agora, em termos de ajudarem as pessoas a ultrapassar a crise, assim como o modo como tratarem os seus colaboradores e se escutam os conselhos das autoridades governamentais e de saúde será importante para a sua sobrevivência. Aqueles que demonstraram ativamente a sua relevância e utilidade e continuarem a fazê-lo numa altura em que as vidas dos consumidores começam a regressar à normalidade estarão melhor posicionados para fortalecer as relações com os clientes na fase de recuperação e no longo prazo”.


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OPINIÃO

FLORBELA BORGES Managing Director da multidados.com

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CO(VIDA) COMO A COVID-19 CONVIDA À NOVA VIDA DOS CONSUMIDORES? O coronavírus entrou na casa do consumidor e veio alterar por completo os seus hábitos de consumo para o lar, os seus hábitos de prática de desporto, o seu consumo de arte e cultura, a sua relação com a família, amigos e colegas de trabalho, as suas viagens profissionais e de lazer. Quando, em meados de março, nos foi pedido para não sair de casa, foi intuitivo por parte do consumidor recorrer às grandes superfícies e adquirir bens para uma possível estadia longa dentro do lar. Por essa razão, esgotou o papel higiénico nas prateleiras dos supermercados, não porque alguém disse para comprar, mas sim porque o consumidor proveu horas a mais dentro de casa, situação fora do comum para o dia-a-dia das famílias que, por consequência e por influência em massa, levou todas as famílias a fazer o mesmo. Hoje, já na fase do possível levantamento gradual das medidas de emergência para a proteção das pessoas e maior isolamento e controlo do vírus, questionamos como o consumidor irá atuar no seu dia-a-dia perante esta realidade vivida ou sentida. Acredito que, no pós-Covid, o consumidor, assim como a nossa vida em geral, nunca mais será a mesma. O consumo será claramente mais direcionado para as reais necessidades do consumidor, que já percebeu que não faltará nada nas prateleiras dos supermercados, mas faltará a sensação de segurança nos pequenos gestos e ações por parte de cada um. O consumidor será ainda mais fiel à sua marca, ao seu produto, ao seu local de compra, porque, no final, será essa relação emocional com a marca que irá transmitir confiança e segurança no momento de compra ou consumo de determinado produto. Assim, o consumidor irá voltar a fazer as compras do mês, criar a tradicional lista de compras de todo o agregado familiar, reunir todas as exigências e necessidades para que, apenas uma vez por mês, seja necessária a deslocação à grande superfície, mantendo os valores médios de consumo e apenas mudando o grau de exigência de qualidade e higiene. Quanto à prática de desporto, a mesma irá sofrer algumas alterações: aqueles que tinham por hábito recorrer ao habitual ginásio ou clube pensarão seriamente no peso do custo do mesmo, uma vez que a prática do desporto continuou para muitos, neste período de confinamento, com soluções mais económicas, mais liberais e igualmente motivadoras, quer nos exercícios em casa quer a prática de desporto na rua ou jardim. Assim, o serviço terá de ser reformulado e direcionado mais ainda para esta realidade das pessoas e das famílias. Acredito que a prática de

desporto passe a ser ainda maior que antes, mas com condicionantes de relação com os restantes membros do agregado familiar, o que pressupõe mais prática de desporto em casa, ou grupos de famílias a praticar em grupo nos ginásios ou clubes. A preocupação dos consumidores passará a ser mais direcionada para o aglomerado de pessoas, para o movimento em massa, pela preocupação de não se identificar quem é portador do vírus ou qual a superfície ou espaço mais higienizado ou não, limitando assim o acesso à cultura, como teatros, cinemas, museus, entre outros, e igualmente na presença de público em grandes palcos de música, como festivais de verão ou concertos, e grandes palcos de desporto, como estádios de futebol, ténis ou outros. Entrará no nosso dia-a-dia a prática de desinfetar as mãos várias vezes, assim como o uso de máscaras em locais fechados ou de risco, prática esta que já é utilizada noutros países, maiores que Portugal, há muitos anos, e só agora é uma realidade mais próxima para nós, criando aqui uma nova atitude de comportamento social e uma sensação de proteção e segurança. Hábitos de limpeza e higienizacão irão mudar e criar, assim, novos procedimentos e novas oportunidades de negócio. O grande pilar deste “convidar a uma nova vida do consumidor” assenta nas relações pessoais e nas emoções. O consumidor dará mais importância à figura da família, às relações pessoais, à confiança e segurança pessoal, procurará encontrar nas pessoas emoções que os liguem, princípios e objetivos comuns, quer pessoais, quer profissionais, e quem não estiver alinhado com esta realidade ficará fora deste grande núcleo de consumidores preocupados e emocionalmente ligados. Ligados por uma causa, por uma preocupação de não ver os seus entes queridos doentes, ou em situação complicada, ou ver a empresa onde trabalham debilitada e em estado precário por causa de um vírus. Assim, o importante é criar relações, emoções, em casa com a família, no trabalho com os colegas, gerir o tempo da melhor forma, encontrar sempre o momento certo e o local adequado para estar presente, utilizar as novas tecnologias para comunicar e para remotamente manter o trabalho e funções. Iremos recuperar a vida que hoje está em suspenso? Sim, claro, mas depende só de cada um de nós, como pessoas e consumidores informados.


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OPINIÃO

ANA PINTO DE MOURA professora auxiliar na Universidade Aberta, engenheira alimentar pela ESB-UCP e doutorada em Engenharia de Sistemas Industriais, pelo INPL. Investigadora do GreenUPorto e coordenadora do curso de Mestrado em Ciências do Consumo Alimentar da Universidade Aberta.

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IMPACTOS DA COVID-19 NO CONSUMO ALIMENTAR Devido à pandemia provocada pelo novo coronavírus (o SARS-CoV2), agudizou-se o sentimento de qualquer um estar exposto a contrair a doença por coronavírus (a Covid-19), à qual se associam, nos casos mais graves, sinais e sintomas como pneumonia grave, síndrome respiratória aguda grave, septicémia, choque séptico e eventual morte. Nesta continuidade, novos comportamentos alimentares surgiram na tentativa de o consumidor proceder ao melhor ajuste, à melhor adaptação no que diz respeito ao que comer e onde comprar os alimentos, tendo em conta a nova realidade: o recolhimento domiciliário obrigatório e o teletrabalho. Estas realidades e o facto de os restaurantes terem encerrado durante o estado de emergência (tendo-se mantido, contudo, os serviços de take-away e a entrega ao domicílio) forçaram o aumento marcado das refeições em casa. Logo à partida, surgiu a inquietação da contaminação ocorrer através dos alimentos, facto que, tendo em conta as diversas crises alimentares ao nível da segurança e da fraude alimentares, vivenciadas pelos consumidores europeus nas últimas décadas, suscitou sentimentos de dúvidas e incertas. A este propósito, a Autoridade de Segurança Alimentar Europeia (EFSA) e as suas congéneres, como foi o caso da ASAE, tranquilizaram os consumidores, assegurando de que os estudos científicos existentes até ao momento confirmam que não existe evidência de contaminação através da ingestão de comida. Uma vez que o vírus se transmite por contacto próximo de pessoa para pessoa, pelas gotículas emitidas pelos infetados quando tossem ou espirram e, depois, inaladas por outras pessoas, ou através de contacto com objetos contaminados essencialmente através das mãos, recomenda-se que devem ser mantidas e reforçadas as medidas de prevenção de higiene pessoal e da cozinha (higienização das superfícies e das hortofrutícolas consumidas em cru). Por outro lado, mesmo antes do anúncio do estado de emergência e mesmo do inicial estado de calamidade, surgiu por parte dos consumidores uma corrida aos supermercados, que visava garantir o abastecimento de produtos essenciais, nomeadamente alimentos menos perecíveis, logo passíveis de serem mais facilmente armazenados (caso das conservas, do arroz ou das massas) e produtos de higiene e limpeza (incluindo o “famoso” papel higiénico). Naturalmente que os agregados que apresentaram menores custos de armazenagem, por possuírem dispensa ou arrecadação bem dimensionada e com boas condições de arejamento ou arca congeladora, puderam reduzir as deslocações às lojas, comprando mais quantidade de produtos. Em causa estava a eventual perda de utilidade por não se comprar os alimentos e demais produtos,

perante circunstâncias incertas, desconhecidas e duradouras, facto que levou a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e as entidades oficiais a anunciarem a inexistência de rutura no abastecimento e a ausência da necessidade de racionamento das compras. Se bem que, tradicionalmente, em Portugal, os produtos mais comprados online sejam artigos de eletrónica, seguidos de vestuário, viagens, livros, artigos de beleza, alimentação e apostas, de acordo com um relatório elaborado pela Deloitte para a APED, neste tempo de pandemia, de acordo com a informação prestada pela SIBS, assistiu-se a um crescimento brusco da procura de alimentos pelos canais de e-commerce com a entrega ao domicílio ou diretamente nas próprias lojas. Registou-se, assim, um crescimento nas compras de 52% no sector food delivery e take-away de refeições e um crescimento de 45% nas compras online no sector do retalho alimentar, não obstante as dificuldades sentidas pelos maiores retalhistas no início da pandemia, seja ao nível do funcionamento dos sítios Web (por exemplo, páginas que demoravam a carregar ou operadores que tiveram de instalar filas de espera eletrónica) ou nas dificuldades no agendamento de entregas, podendo ultrapassar os dez dias da data da compra. De modo a minimizar o impacto negativo na perceção deste canal de venda, alguns retalhistas criaram cabazes com um número limitado de bens essenciais, para os quais garantem entregas em dois a três dias. De facto, ao possibilitar a aquisição de alimentos ou de refeições, mantendo os consumidores em casa, o e-commerce, desenvolvido desde a produção primária, passando pelos fabricantes, retalhistas e restauração, ajuda a mitigar a perceção do risco, consubstanciado em sentimentos associados à falta de controlo, ao elevado risco para as gerações futuras, à ocorrência de potenciais catástrofes, a consequências fatais, à inquietação ou mesmo ao medo. Criam-se, deste modo, novas oportunidades para o crescimento deste canal de retalho alimentar, com histórias de sucesso, como aquela do Cabrito Transmontano DOP, comercializado pela ANCRAS, que em período pascal relatou a sua preocupação com o escoamento de cerca de 800 cabritos e que, em poucas horas, recebeu milhares de encomendas, de norte a sul do país. Alerta-se, no entanto, que, ao contrário de muitas outras compras online de serviços ou de produtos não alimentares, no retalho alimentar existe um maior sentimento de urgência, como se a frescura dos alimentos dependesse desse mesmo prazo para a sua entrega, reforçando a importância de uma logística cuidada e remetendo novos desafios para os operadores económicos.


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ANÁLISE

TEXTO Marta Santos, Manufacturers

Sector Director da Kantar

FOTOS D.R./Shutterstock

Das cestas de sobrevivência às cestas de contingência Antes do confinamento devido à Covid-19, o padrão de compra dos portugueses já tinha começado a mudar, privilegiando a intensidade do ato de compra, ao invés da regularidade, exatamente o oposto do que vinha a ocorrer em 2019. Entre o período de confirmação do primeiro caso e a declaração do estado de emergência, registou-se uma enorme afluência às lojas, que se foi desvanecendo com o avançar das semanas. Das cestas de sobrevivência, no início, passámos para cestas de contingência, com o decorrer do tempo. Quais os desafios que se seguirão com o regresso à normalidade possível? Haverá novos comportamentos de consumo? Que novas dinâmicas irão ocorrer na distribuição? Estas são questões que ainda carecem de resposta, que terá de ser encontrada a cada dia, dada a imprevisibilidade dos tempos que vivemos. Mas olhar para o que foram estes primeiros dois meses pode ajudar a projetar os meses futuros.

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Semana em que a Covid-19 foi declarada como pandemia

N

o mais recente estudo Kantar de acompanhamento da opinião dos portugueses sobre a crise provocada pela Covid-19, aplicado entre os dias 27 e 30 de março de 2020, o número de pessoas que afirma uma elevada preocupação com a pandemia subiu de 81% para 90% (percentagem de respostas com a classificação de 8 ou mais, numa escala de 0 a 10). Este aumento de preocupação com a atual crise não se deve tanto ao possível contágio ou à compra de máscaras e desinfetantes, mas sim com o impacto negativo na economia (68%, mais 12 pontos percentuais versus a primeira vaga), o possível colapso da Segurança Social (34%, mais nove pontos percentuais versus a primeira vaga) e a perda de emprego (20%, mais 10 pontos percentuais versus a primeira vaga).

Semana de confirmação dos primeiros casos de Covid-19 em território nacional

No dia 2 de março, foram confirmados os primeiros casos em Portugal e a resposta dos portugueses não poderia ter sido mais pronta. No dia seguinte, verificou-se a maior afluência às lojas de 2020 (até à data), uma presença de compradores 51% acima da média diária verificada durante este ano, um cenário bastante atípico, sobretudo por se tratar de um dia de semana, deixando bem marcada a sua preocupação face à ameaça do vírus. Desde o dia 3 de março até ao final dessa semana, apesar de se ter verificado um aumento natural na compra de produtos alimentares, o principal objetivo desta compra foi, sobretudo, produtos de higienização, tanto para o lar como para cuidado pessoal, que registaram um número de produtos comprados 23% e 22%, respetivamente, acima da média semanal verificada até ao final do mês de fevereiro. No geral, do dia 3 ao dia 8 (domingo), foi registado um aumento no número total de produtos comprados para os lares na ordem dos 19%.

Apesar do pico atípico de afluência verificado no dia 3, foi na segunda semana de março que se verificaram as mudanças mais consistentes na compra e que maior impacto tiveram no panorama dos Fast Moving Consumer Goods (FMCG) em Portugal, mais precisamente a partir do dia 11 de março, quando a Covid-19 foi declarada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como pandemia. Do dia 11 ao dia 14, dia anterior à declaração das restrições no acesso e na afetação dos espaços nos estabelecimentos, verificou-se uma nova “onda” de deslocações às lojas. Neste período, a afluência de compradores esteve 24% acima da média diária de 2020. Com o número de recomendações para a permanência dentro de casa a expandir-se, os portugueses foram aumentando consideravelmente o tamanho da cesta por compra, sendo que, desta vez, o alvo principal não foram só os produtos de limpeza, mas também a procura pelo armazenamento alimentar, com um registo do número de produtos comprados 49% e 37%, respetivamente, acima da média “pré Covid-19” (até ao final do mês de fevereiro). Neste espaço de tempo, a quantidade diária de produtos comprados esteve 45% acima da média anual, representando, assim, o grande momento de stockagem das famílias portuguesas.

Das restrições ao acesso de estabelecimentos até à declaração do estado de emergência

A partir do dia 15 de março, quando o acesso às lojas foi restringido, ao mesmo nível que a afluência às lojas ia diminuindo consideravelmente, o tamanho das cestas aumentava na mesma proporção. Porém, nesta altura, deixaram de ser batidos recordes de compras e sentia-se o prenúncio da esperada retração, após a intensa procura verificada nas duas semanas anteriores. Prenúncio esse que foi efetivado a partir do dia 19, o dia seguinte à decretação do estado de emergência em Portugal. A afluência às lojas diminuiu drasticamente para os valores mais baixos de 2020 (até à data), tendo mesmo chegado no domingo, dia 22, ao nível de compradores mais baixo do ano, 42% abaixo da média diária do ano. Embora com uma grande diferença, o tamanho de cada cesta, nesta data, atingiu níveis máximos, mas mesmo assim foi inevitável a quebra abrupta das compras de FMCG.

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11 de Março | Covid-19 foi declarado pela OMS como pandemia

3 de Março | dia após confirmação dos primeiros casos do vírus em Portugal

A nova rotina dos portugueses face ao estado de emergência

Estabelecida uma “nova rotina de compra”

A partir do dia 19 verifica-se o maior nº médio de produtos por cesta e menor nº de compradores

Do dia 11 ao dia 14 foi verificado o maior número de produtos comprados em 2020

Foi o dia do ano com maior afluência às lojas em 2020

22 de Março a 5 de Abril | Crescimento exponencial do número casos confirmados

18 de Março | decretado o estado de emergência em Portugal

150

100

Janeiro

FMCG | Índice por dia vs média diária total de 2020 por:

Até ao dia 29

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Abril

Até ao dia 05

Compradores nº de produtos por cesta

Informação: Informação Painel de Lares Kantar Portugal de 6 de Janeiro e 6 de Abril de 2020

No cômputo geral, da terceira semana após a confirmação do primeiro caso do vírus, o saldo total de produtos comprados ficou na média, face ao período pré Covid-19, porém, numa tendência clara de decrescimento que se poderá agravar nas próximas semanas, até se encontrar um novo equilíbrio no padrão de compra. O que conseguimos, igualmente, retirar destas semanas é a “cesta de sobrevivência” dos portugueses, os produtos que foram priorizados neste momento de crise, onde não existiu tempo para um planeamento de compras muito antecipado. Quando comparadas as cestas de compra pré e pós Covid-19, dentro da alimentação, nas duas primeiras semanas, a aquisição de produtos frescos (sobretudo as frutas, as verduras e a carne) foi altamente prioritária. Porém, a menor capacidade de reposição face à procura fez com que nem todos os lares tenham tido o mesmo nível de acesso a estes produtos, resultando que, no global destas três semanas, a compra de produtos frescos tenha ficado na média face ao período antes da crise. De forma mais consistente, surgiu a procura de produtos básicos e de longa duração, destacando-se, como principais, as leguminosas, sobretudo grão e feijão, farinhas, peixes e legumes em conserva, massa e, num segundo plano, arroz, azeite, vinagre, sal, açúcar, bolachas e produtos congelados, desde salgados e verduras até à carne e peixe. Percebemos também a importância dos

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produtos básicos e de limpeza e higiene, sobretudo luvas domésticas/descartáveis, detergentes para roupa, lixívia e produtos de papel no geral, não só o papel higiénico, mas também lenços, rolos de cozinha e guardanapos. Sabonetes e fraldas foram as grandes prioridades na área da higiene pessoal.

Semanas de 22 de março a 5 de abril: surgimento de uma nova rotina de compra, a de contingência

Esta nova rotina rege-se pelo princípio da contingência, que implica ir às compras o menor número de vezes possível (no dia 5 abril, foi atingido um novo valor mínimo anual) e levar uma maior quantidade de produtos por cesta (registando o seu máximo de 2020 no dia 4 de abril), que evite a repetição da compra num curto espaço de tempo. Em relação à procura pelo canal online, que, até ao dia 20 de março, 10% dos portugueses já afirmavam estar a comprar mais neste canal, revela agora uma intenção de aumento de compra por parte de 17%, quando se fala em produtos alimentares. Estas foram as semanas em que abrandou a compra de produtos de higiene e limpeza e em que existiu uma maior dedicação do orçamento familiar ao abastecimento alimentar. As visitas nesta quarta e quinta semanas de período Covid-19, comparando com as três semanas anteriores, destacaram-se mais pela compra de produtos que permitam uma dose extra de prazer e conforto. Numa altura em que estamos privados de momentos de lazer e de socialização no exterior, ganham um particular destaque os doces e produtos para se confecionarem doces, assim como as bebidas alcoólicas, mas também alimentação congelada, desde a carne congelada até às refeições prontas congeladas.


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OPINIÃO

GONÇALO LOBO XAVIER diretor geral da APED

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COVID-19: SEGURANÇA PARA A RETOMA Mais de 160 empresas de distribuição de retalho, alimentar e não alimentar. Perto de 11% do PIB. Este é o universo que a APED representa. Um universo de múltiplas dimensões, sobre o qual o impacto da crise provocada pela Covid-19 também se refletiu em múltiplas consequências. Por isso, à questão que se coloca, “como reagimos perante este cenário?”, teremos certamente diversas respostas, considerando, no entanto, que será cedo ainda para retirarmos conclusões definitivas. Mas falemos do retalho alimentar. Esteve na linha da frente, desde o primeiro momento, sempre com uma missão: “Alimentar Portugal”. Superámos os desafios de uma vaga de procura inusitada. Adotámos, proativamente, novas medidas de segurança para garantir o bem-estar dos nossos colaboradores e clientes. Reforçámos a colaboração e cooperação entre todos os parceiros da cadeia de abastecimento, desde a produção e indústria, à logística e transportes, passando pela operação em loja e online. Criámos novas sinergias com produtores de bens agroalimentares nacionais e de proximidade, procurando, por um lado, disponibilizar aos consumidores produtos locais e, por outro, abrir a estes pequenos produtores novos canais para escoarem produtos outrora destinados a pequenos mercados, ao canal Horeca e à exportação, agora fechados. Estivemos em permanente contacto com todas as entidades públicas e governamentais competentes nas áreas da saúde, comércio e agricultura. Estes são apenas alguns dos exemplos da forma como a APED e os seus associados têm atuado, para garantir a possível tranquilidade e normalidade neste cenário e neste segmento. Agimos, fomos proativos, fomos responsáveis. Mas no universo APED existe um outro lado. O do retalho não alimentar especializado. Empresas que, na sua maioria, encerraram, mantendo apenas, e quando possível, sempre com todos os esforços, as operações online que, apesar de importantes, são residuais para sustentar as operações no global. Assumiram a missão conjunta, de um país, de salvaguardar a saúde pública e combater a pandemia provocada pela Covid-19. Contudo, como o grosso do tecido económico, estão a absorver o impacto negativo do abrupto encerramento da economia. Certo é que poderá haver uma primeira perceção de que este segmento não representa o que são chamados “bens essenciais”. Contudo, arriscamos dizer que essa é uma perceção definitivamente errada. São empresas que empregam mais de 40

mil colaboradores diretos e que, da tecnologia aos brinquedos, passando pelo mobiliário, reparação e auto e do-it-yourself, representam bens e serviços que fazem mover uma economia. São empresas que querem voltar a operar, legitimamente, pela sua sobrevivência e também pelo importante contributo que, nos últimos anos, têm vindo a dar para o desenvolvimento económico do país, criando emprego e receita e inovando na oferta ao dispor dos portugueses. E, perante este cenário, não se tratará apenas de reinventar o negócio em contexto de crise. Reconhecemos, naturalmente, os melhores esforços do Governo, na tentativa de mitigar os efeitos devastadores provocados pela recente crise pandémica, mas fazer face a este cenário terá de passar, obrigatoriamente, por adotar, acima de tudo, medidas que permitam preparar o futuro “faseado” dos cidadãos. Para colaborar neste sentido, a APED estará sempre disponível. Seja pelo retalho alimentar e pelo retalho especializado, como primeiro passo, teremos de reestabelecer a confiança do consumidor, num trabalho de um país a remar num só sentido, para assim revitalizar o consumo, as empresas e o país. O quanto antes e em segurança.


OPINIÃO

BORIS PLANER diretor de Go-To-Market Intelligence na Edge by Ascential

A EMERGÊNCIA DA NOVA FACE DO RETALHO Numa altura em que os diversos governos por todo o mundo continuam à procura de abordagens viáveis para lidar com o surto de coronavírus - considerando a saúde pública tanto quanto os limites de pressão tolerável nas finanças públicas, a interrupção dos negócios e a pressão nos mercados de trabalho, bem como nos orçamentos familiares - o Fundo Monetário Internacional (FMI) atualizou, há alguns dias, as suas perspetivas económicas mundiais, prevendo recessão para um total de 170 países. Os cenários esperançosos de uma desaceleração económica de curta duração ou de recessões ligeiras, das quais as economias recuperariam rapidamente, estão agora fora de alcance, pois os principais mercados - incluindo França e Itália anunciaram uma extensão até maio das políticas de isolamento existentes. É provável que, nos próximos dias, mais países sigam essa abordagem, com as respetivas taxas de crescimento do PIB em queda livre. O FMI espera que a economia dos Estados Unidos da América contraia 5,9% este ano, a da Zona Euro 7,5% e a do Reino Unido 6,5%. As perspetivas para Portugal são de uma contração de 8%, este ano, e de um crescimento de 5%, no próximo. Denote-se que as previsões do FMI surgem, necessariamente, com um elevado nível de insegurança, mas não se baseiam nos piores cenários. A profundidade do impacto no retalho, fornecedores e consumidores dependerá de quão bem a propagação do coronavírus possa ser contida e de quanto tempo durarem as medidas de bloqueio; da efetividade dos esquemas de apoio governamental e da rapidez com que atingirão as empresas (os Estados Unidos estão a começar a mostrar fragilidades preocupantes neste indicador) e, relacionado com isto, em que proporção as infraestruturas dos retalhistas e operadores de “food service” serão danificadas ou empurradas para fora do mercado pela próxima recessão. Num mundo globalizado, ninguém está agora imune ao efeito do coronavírus e os retalhistas, assim como os seus fornecedores, deverão operar, de forma razoável, num modo excecional nos próximos 12 a 24 meses. As perguntas que terão que fazer relacionam-se com o papel da loja e da inclusão de redes físicas nos esquemas de abastecimento hiper locais do comércio eletrónico; com o mix certo de produtos e serviços para um consumidor cujas prioridades estão a mudar num ritmo sem precedentes; com o papel da automa-

ção, numa altura em que retalhistas e fornecedores estão a apressar-se em realocar recursos para pontos críticos do negócio e em como criar lealdade, num momento em que as cestas de compras mudam para o online e as missões dos shoppers estão cada vez mais focadas no valor e no reabastecimento de bens essenciais. Também vale a pena notar que, nos próximos meses, a automação tornar-se-á numa força importante de mudança no retalho e na indústria. Embora, no passado, o uso crescente de robôs e de algoritmos tenha sido controverso, e visto como uma ameaça para os empregos, no futuro, a automação poderá desempenhar um papel crucial no apoio ao distanciamento social nas lojas e nas fábricas, além de acelerar os processos nas cadeias de abastecimento já sob pressão. De repente, a automação deverá ser mais amplamente aceite pelo público, enquanto que o trabalho humano será direcionado para funções críticas e voltadas para a segurança do cliente. No entanto, a questão que se coloca é o que acontecerá com os funcionários, quando a procura diminuir no momento em que as compras de abastecimento acabarem, cerca de 170 países entrarem em recessão e as suas funções anteriores forem assumidas por robôs e apps móveis. Obviamente, com o aparecimento de bench-marks, quanto às entregas rápidas no e-commerce alimentar, o impacto do surto de coronavírus será enorme no processo e na inovação em termos de formato no retalho. Mas, à medida que a indústria ambiciona emergir mais “lean” e eficiente, as sociedades também perderão um dos últimos sectores capazes de oferecer oportunidades de ascensão social a trabalhadores pouco qualificados. As respostas que os sistemas políticos encontrarem para uma participação individual mais limitada no desenvolvimento económico irão, por sua vez, definir o futuro da procura e, com ela, o futuro da paisagem do retalho, dos canais, dos formatos, dos produtos e das marcas.

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Ansiamos a bonança, mas é inquestionável que o mundo não voltará a ser o mesmo que conhecemos até à chegada da pandemia causada pelo novo coronavírus. A pandemia trouxe uma nova realidade aos mercados e aos consumidores e fez-se acompanhar por um conjunto de dúvidas e incertezas que nos levam a pôr em causa os comportamentos e prioridades que até aqui tínhamos adquirido e definido.

ANÁLISE TEXTO Rui Reis,

Key Account da GfK Portugal

FOTOS D.R.

Impacto Covid-19 nas vendas de bens tecnológicos 70 Grande Consumo


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de trabalho, potenciando o crescimento de famílias de produtos relacionados com o trabalho, tais como computadores portáteis, ratos, teclados, impressoras multifuncionais e monitores. O mercado da informática fez-se valer da nova necessidade do consumidor e conseguiu registar um crescimento de 14% em março, provando que, mesmo em tempos de crise, existirão sempre oportunidades de negócio.

Eletrónica de consumo: o sonho adiado

No reverso da medalha, e num nível inferior das novas prioridades do consumidor, a eletrónica de consumo caiu 17% em março, área de negócio onde se destaca o televisor como produto central de entretenimento. Sendo um produto que reage muito ive-se, hoje, perante uma mescla ANÁLISE positivamente aos grandes eventos desportivos, de sentimentos sobre o presente tudo previa que o ano de 2020 fosse de crescie o futuro, tornando pouco clara Covid-19Hoje, nas vendas mento no que toca a vendas destes equipamentos. aImpacto sua definição. o medodeebens a tecnológicos Para isso iriam contribuir o Campeonato Europeu preocupação assolam-nos consAnsiamos a bonança, mas é inquestionável que o mundo não voltará a ser o mesmo que de Futebol e os Jogos Olímpicos de Tóquio, eventos tantemente, tirando o lugar ao conhecemos até à chegada da pandemia causada pelo novo coronavírus. A pandemia trouxe estes adiados para 2021, como medida de contencontrolo e segurança que tínhauma nova realidade aos mercados e aos consumidores e fez-se acompanhar por um conjunto çãoem da causa Covid-19, eliminando, assim, da equação mos até há bem pouco tempo. de dúvidas e incertezas que nos levam a pôr os comportamentos e prioridades que mais um fator crucial para a performance positiva da O consumidor depara-se agora até aqui tínhamos adquirido e definido. categoria. com desafios que o obrigam a O mês de março em análise reflete ainda só duas seprofundas mudanças e constante Texto: Rui Reis, Key Account da GfK Portugal manas de confinamento e faz antever um ano difícil adaptação a uma nova realidade: Vive-se, hoje, perante mescla de sentimentos presente e ocom futuro, tornando a repara estasobre áreaode negócio, os televisores o isolamento social, ouma encerrapouco clara a sua definição. Hoje, o medo e a preocupação assolam-nos constantemente, gistarem uma queda de 22% em valor, comparativamento de comércio e serviços, o tirando o lugara ao controloPerante e segurança que tínhamos há bem homólogo, pouco tempo. O consumidor mente comaté o período e superior a 5% ao teletrabalho, telescola. depara-se agora com desafios que o obrigam a profundas mudanças e constante adaptação a final do primeiro trimestre. Tendo em consideração estes desafios, tornou-se evidenuma nova realidade: o isolamento social, o encerramento de comércio e serviços, o que abril refletirá um mêsuma inteiro de confinamento, te uma mudança nos hábitos dos teletrabalho, a telescola. Perante estes desafios, tornou-se evidente mudança nos hábitos e que alguma parte do comércio está encerrado, é de consumidores, nas suas rotinas e dos consumidores, nas suas rotinas e nas suas prioridades. esperar umaveio queda mais acentuada. nas suas prioridades. O trabalho a partir de casa, denominado Home Office, criarainda a necessidade iminente do Numa tentativa de minimização prejuízo e ode ir O trabalho atransformar partir de casa, consumidor a sua casa numa extensão do seu posto de trabalho,do potenciando crescimento de famílias de produtos com oda trabalho, tais como computadores ao encontro necessidade presente do consumidenominado Home Office, veio relacionados portáteis, ratos, teclados, impressoras multifuncionais e monitores. O mercado informática do dor, os retalhistas apostam agora nadadinamização criar a necessidade iminente do fez-se valer da nova necessidade e conseguiu registar um crescimento 14% mercado online, aproveitando o momentodemarcado consumidor transformar a sua do consumidor em março, provando que, mesmo em tempos de crise, existirão sempre oportunidades de pelo encerramento das lojas físicas e a predisposição casa numa extensão do seu posto negócio.

Eletrónica de consume: o sonho adiado No reverso da medalha, e num nível inferior das novas prioridades do consumidor, a eletrónica de consumo caiu 17% em março, área de negócio onde se destaca o televisor como produto central de entretenimento. Sendo um produto que reage muito positivamente aos grandes eventos desportivos, tudo previa que o ano de 2020 fosse de crescimento no que toca a Consumo vendas destes equipamentos. Para isso iriam contribuir o Campeonato Europeu de FutebolGrande e os Jogos Olímpicos de Tóquio, eventos estes adiados para 2021, como medida de contenção

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causadas pelo encerramento do mercado offline, mas, na última semana de março, o valor do online atingiu, pela primeira vez em Portugal, um terço do mercado, o que nos faz acreditar que o paradigma das vendas pode mudar após o regresso à normalidade.

ambiental que se faz sentir mundialmente, o do consumidorpós-traumático mais renitente em experimentar noO consumidor Das plataformas questões quede mais atormentam fabricantes retalhistas destacam-se qual minimalista o impacto daonde se vive com o estilo de vida vas compra, tanto de aquisiçãoe como pandemia no consumidor e quais os novos hábitos Como seráeaanova ameaça de uma crise iminente de pagamento. Esta é a oportunidade ideal para de consumo. essencial normalidade? poderão criar sérias barreiras ao consumo. fomentar a compra online através de um processo Muitas incertezas pairam neste sentido. Num primeiro cenário, fazendo à frasecorre-se do Noutro jus cenário, o risco de entrar rápido, transparente e prazeroso. romancista Charles Dickens, que refere “o homem é um animal de hábitos”, dois meses de num movimento denominado Revenge SpenO mercado online de eletrónica de consumo, em isolamento social e prática de novas experiências serão, por certo, determinantes para que se ding, através de comportamentos de compra Portugal, cresceu, em março, mais de 120%, commude o paradigma do consumidor. Também a recuperação ambiental que se faz sentir emocionais e desmedidos, parativamente com o período homólogo de 2019, mundialmente, o estilo de vida minimalista onde se vive com o essencial e a ameaça de uma querendo compensar-se pelo período em que se esteve imrepresentando 20% do mercado em valor, quando crise iminente poderão criar sérias barreiras ao consumo. pedido de o fazer livremente. Neste cenário, em fevereiro o valor rondava apenas 9%. O primeiro o consumidor recuperará os seus hábitos de trimestre do ano registou um crescimento de 41%. compra e consumo e não existirão mudanças As vendas online estão ainda longe de compensar significativas em valor após a crise. Na China, a perda de vendas causadas pelo encerramento do o mercado retomou 75% do seu volume de mercado offline, mas, na última semana de março, negócios médio semanal na oitava semana o valor do online atingiu, pela primeira vez em Porapós o início do confinamento em Wuhan. tugal, um terço do mercado, o que nos faz acreditar Ainda assim, assistiremos a uma mudança que o paradigma das vendas pode mudar após o nas sazonalidades de compra e uma adoregresso à normalidade. vez maior de novosRevenge modelosSpeending, de Noutro cenário, corre-se o risco de entrar ção numcada movimento denominado através de comportamentos de compra emocionais e desmedidos, querendo compra, seja por aquisição online,compensar-se “order O consumidor pós-traumático pelo período emfabricantes que se esteve o fazer livremente. cenário, o consumidor and collect” ou até a Neste utilização de modos de Das questões que mais atormentam e impedido de recuperará os seus hábitos de compra e consumo e nãodigitais. existirão mudanças significativas em pagamentos retalhistas destacam-se qual o impacto da pandemia valor após a crise. Na China, o mercado retomou 75% do seu volume de negócios médio no consumidor e quais os novos hábitos de consusemanal na oitava semana após o início do confinamento em Wuhan. mo. Como será a nova normalidade? Ainda assim, assistiremos a uma mudança nas sazonalidades de compra e uma adoção cada Muitas incertezas pairam nestede sentido. Num de compra, seja por aquisição online, “order and collect” ou até a vez maior novos modelos primeiro cenário, utilização de modos de pagamentos digitais. fazendo jus à frase do romancista Charles Dickens, que refere que “o homem é um animal de hábitos”, dois meses de isolamento social e prática de novas experiências serão, por certo, determinantes para que se mude o paradigma do consumidor. Também a recuperação

72 Grande Consumo


OPINIÃO

JOÃO PAULO PEIXOTO diretor geral da Staples Portugal

A EMERGÊNCIA DO TELETRABALHO COMO CATEGORIA DE NEGÓCIO Com a crise da Covid-19, seremos obrigados a reinventar um modelo económico que, num primeiro olhar, pouco teria que ser ajustado. Ao enfrentar-se o Covid-19, coletivamente, da forma como se enfrentou, melhor do que se estaria à espera, a reinvenção do modelo de negócio já começou a ser uma realidade. Na Staples, felizmente, foi possível não entrar em lay-off. Conseguiu-se reagir de forma rápida e eficiente, com um total de 120 colaboradores a serem colocados em teletrabalho em apenas semana e meia. Alguns dirão que é um processo fácil, não foi. No nosso caso, cujo “core business” é a venda de material de escritório, foi igualmente necessário proporcionar as condições necessárias para que o trabalho no lar fosse uma realidade. Numa altura em que as vendas de computadores portáteis dispararam, foi preciso recorrer ao mercado interno e externo para obter os equipamentos adequados, em termos de características e desempenho, para as tarefas a desenvolver por cada um. E, sim, somos uma empresa especializada na comercialização desse tipo de equipamentos profissionais. Mas não estávamos preparados para ter, no nosso stock, os portáteis em quantidades suficientes, e com as especificações necessárias para o cumprimento de determinadas tarefas, para servir todas as necessidades dos nossos clientes externos e internos. Desafio superado, cerca de 50 dias volvidos, encontramo-nos ainda a trabalhar desde casa. Olho para o passado recente e vejo que a empresa continua a funcionar. Mantemos 33 lojas em funcionamento (apenas tivemos que encerrar uma unidade), temos os nossos negócios de “contract” e online a trabalhar. Colocando a questão em perspetiva, tudo pareceu “sopinha no mel”, mas não foi. E apenas foi possível dar continuidade ao que centralmente se encontrava a ser feito graças a uma equipa extraordinária, mas muito particularmente aos colegas que se encontram nas lojas e nos armazéns, e que correram riscos, sempre com uma motivação incrível, superada que foi a fase inicial de natural apreensão. A reação à Covid-19 foi excelente. E o negócio no futuro, como será? A grande elação a tirar desta situação foi a necessária explosão do negócio online, à qual não estávamos preparados para dar resposta, com um aumento do volume de encomendas recebidas num rácio diário de até 150% mais face às nossas vendas quotidianas. De repente, este canal encontrava-se a crescer uns impensáveis 200%,

com uma procura desmedida em artigos que passaram a ser de primeira instância, casos de computadores portáteis, impressoras, tinteiros, álcool, máscaras, apoios de braço, auriculares, entre outros. Conseguimos adaptar-nos e reagir rápido, com o necessário adiamento do prazo de entregas para sete dias úteis. Ninguém estava preparado para isto. Não acredito que este crescimento exponencial do online vá passar a breve prazo, quando o regresso normalizado às lojas se tornar, de novo, uma realidade. Se há algo que devemos reinventar, de forma muito mais célere do que estávamos a fazer, é encarar o canal online como nunca foi percebido e percecionar o teletrabalho, e porque não a telescola, como uma categoria emergente de negócio. As empresas que não conseguirem reinventar-se e dar a aceleração necessária ao online para que o negócio cresça, devidamente suportadas por estrutura e serviços, não têm condições para sobreviver neste mercado. E se, antes, encarávamos este canal como algo que ia crescer naturalmente, agora é visto como um negócio que vai crescer rapidamente, com estas categorias emergentes a influenciarem o sortido disponível neste canal, como nas lojas físicas e corporate. O teletrabalho é algo também novo para nós, formatados a estar e a trabalhar no escritório, razão pela qual este mês e meio foi de aprendizagem. E aprendemos, rapidamente, que o teletrabalho vai ter que ser encarado como uma categoria, única, que engloba artigos específicos, e é uma dimensão que não vai recuar mais em Portugal. Na Staples, estamos a preparar o regresso ao trabalho no escritório central, mas com metade da equipa, de modo a assegurar a segurança dos colaboradores. Um processo de adaptação a um “novo normal”, com adoção de procedimentos específicos de segurança no trabalho, e de modo a proporcionar, igualmente, as condições para que o teletrabalho seja uma realidade fluída. Na Staples e em qualquer empresa. Queremos, assim, continuar a prestar o melhor serviço possível a quem nos prefere, com a ambição de ser uma empresa, cada vez mais, omnicanal em todos os procedimentos, superando as barreiras do digital e do físico, entregando tudo o que é necessário onde é, igualmente, requerido. Queremos fornecer os escritórios do futuro. Em muitos casos, esses escritórios serão no lar de cada um de nós. Não há volta a dar.

73 Grande Consumo


OPINIÃO

JOÃO POTIER diretor geral da Arrozeiras Mundiarroz

74 Grande Consumo

SUSTENTABILIDADE PRESENTE E FUTURA Até meados de fevereiro passado, a agenda da discussão pública era dominada pelo tema do desenvolvimento sustentável e pela preservação do planeta, bem como pelos impactos das mudanças climáticas e, consequentemente, a forma como as economias nacionais eram afetadas pela evidente mudança de paradigma que, de modo progressivo, impactava a sociedade moderna e o seu modo de vida. Por todo o lado, pedia-se que se acelerassem medidas contra as mudanças climáticas, de modo a gerar um ambiente mais limpo, ao mesmo tempo que se promovia a preservação da biodiversidade e a proteção do meio ambiente. O mês de março rapidamente chegou e, com ele, a emergência da crise mundial de saúde pública relacionada com a pandemia de Covid-19, que veio retirar do foco mediático a questão da sustentabilidade. Ou talvez não, uma vez que, hoje mais do que nunca, é um assunto que deve ser encarado, incontornavelmente, como prioritário. É, precisamente, na questão da sustentabilidade que entroncam questões que irão ser, necessariamente, discutidas no pós-pandemia e a indústria arrozeira não é exceção. Até porque lida com áreas sensíveis, como são a social, a ambiental e a energética, ou não fosse o seu objeto de negócio uma das mais importantes “commodities” alimentares à escala mundial. Existem, assim, alguns pontos prementes a resolver pela indústria arrozeira que irão marcar a realidade industrial deste sector. Desde logo, a questão de rutura de stocks de produto final, relacionada com o aumento da procura e a expectável redução parcial da eficiência das operações de produção e logística das empresas. Não duvido que será necessário repensar toda a produção industrial, nomeadamente, como conseguir otimizar produções sem pôr em causa a segurança individual decorrente das necessidades de confinamento. A solução passará por uma maior flexibilização das condições de trabalho, ao promover junto dos colaboradores a assunção de comportamentos que diminuam significativamente o risco de transmissão numa previsível segunda vaga da pandemia. O que permitirá, assim, manter postos de trabalho e assegurar que a produção não diminui, respeitando, em simultâneo, as regras de confinamento necessárias para o equilíbrio entre a saúde e a produção. A pandemia de Covid-19 teve o condão de apanhar a Europa desprevenida de stocks, uma vez que a campanha orizícola europeia decorre

de finais de abril até novembro e há uma forte dependência de importações. Portugal importa cerca de 60% do arroz que é consumido e a época de maio a setembro coincide, precisamente, com o pico das importações de matérias-primas provenientes dos países produtores do hemisfério sul. O abastecimento regular está, assim, necessariamente condicionado pela limitação das exportações praticada pelos países do sudeste asiático e os preços começam a subir para números inimagináveis há seis meses. A atual previsão é de que, até final do ano, os preços ainda venham a corrigir em alta com muita frequência. O complexo quadro acima descrito aponta, uma vez mais, para a necessidade da emergência de uma cultura sustentável, que permita, acima de tudo, conciliar o respeito pelo meio ambiente com a prosperidade económica e a empregabilidade. Não duvido que vamos ter que promover culturas sustentáveis em termos de variedades mais produtivas e menos exigentes no que aos recursos hídricos e de aplicação de produtos fitofarmacêuticos diz respeito. Promover o seu uso é uma responsabilidade de todos, já que a erosão dos solos é evidente e a sua rentabilidade menor face a outros períodos. Mas a sustentabilidade também é extensível ao capítulo humano, uma vez que, fruto da epidemia, quantas mais horas se trabalhar com menos pessoas, com a fatura energética vem, uma vez mais, um pesado “recibo” ambiental. A sustentabilidade emerge, assim, de novo como pedra de toque para o futuro, com a produção industrial a ter que ser equilibrada com o necessário aumento do uso de energia, feito para harmonizar uma gestão sustentável dos recursos humanos e da produção. Quanto tempo será este período de exceção ninguém sabe. Resta-nos espera que seja breve. O mais possível.


OPINIÃO

RICARDO ALVES administrador da Riberalves

COM OS COLABORADORES, OS PARCEIROS E OS CLIENTES De um momento para o outro, a vida como a conhecemos mudou radicalmente. E à nossa empresa, apenas mais uma neste ecossistema abalado pelo surto pandémico, colocaram-se dois objetivos imediatos, mas prioritários: defender os nossos colaboradores e a nossa missão; e apoiar os nossos parceiros e consumidores. Na Riberalves, a preocupação inicial foi essa, a de salvaguardar ao máximo a proteção de todos aqueles que não podiam entrar em teletrabalho e continuavam a operar diariamente nas nossas fábricas – e eram algumas centenas! Seguindo as indicações das autoridades, procurámos implementar as medidas ajustadas. Salvaguardar a segurança dos nossos colaboradores era, além da mais elementar obrigação, o melhor caminho para que pudéssemos prosseguir a nossa missão, enquanto empresa do sector alimentar e, já agora, especialista na mais apaixonante proteína de consumo português: o bacalhau. Apesar dos enormes desafios, acreditamos que a Riberalves irá continuar a abastecer a cadeia de distribuição, contribuindo para que os cidadãos continuem a ter acesso aos bens alimentares que produz. Perante a necessária reorganização do trabalho e das rotinas, de acordo com as normas de proteção necessárias, a resposta dos nossos colaboradores foi simplesmente extraordinária, no compromisso, no espírito de grupo e no empenho demonstrados. As empresas são as pessoas e é em cada uma delas que nasce a capacidade para que nos possamos ajustar. Mais do que numa qualquer ideia genial de reinvenção, acreditamos que somos mais fortes através destes heróis anónimos que, tal como muitos pelo país fora, honraram os mais nobres valores da “Nação valente e imortal”. Foi com esta força que nos focámos, também, nos nossos parceiros de sempre e nos nossos clientes. Se a empresa são as pessoas, o nosso futuro é o dos nossos parceiros e daqueles que confiam em nós. Da mais pequena loja aos “players” da grande distribuição, procurámos ajustar operações e estratégias, apoiando ao máximo a dinâmica possível. Aqui não existe uma receita para todos, porque cada caso é um caso, com as suas especificidades e complexidades. O que fizemos, e iremos continuar a fazer, é apoiar naquilo que cada parceiro necessitar e no que a Riberalves puder apoiar, com a máxima rapidez e olhando para o futuro. Temos a certeza de que sairemos deste contexto mais unidos e, por isso, mais fortes. Por fim, em sequência, mas a título excecional e

complementar, montámos uma inédita operação de entrega direta de produto, porta-a-porta, na Grande Lisboa, precisamente para ir ao encontro daqueles consumidores que teriam maiores constrangimentos na mobilidade. Vencemos o momento? Não. Mas estamos a enfrentá-lo. Vamos ser claros, não existe reinvenção imediata perante uma crise como a que nos foi imposta em consequência do surto pandémico. Tomamos decisões todos os dias e, porque a informação é escassa e dinâmica, por vezes não acertamos. Mas analisamos e corrigimos rapidamente. Vamos procurar continuar a adaptação, antecipando uma mudança em muitos pilares que julgávamos inabaláveis na nossa sociedade. Do ponto de vista económico, além de tudo o que vivemos até agora, aguardamos ainda consequências de gravidade desconhecida, mas que serão necessariamente duras para todos. Independentemente da capacidade de resposta do Governo, o ano que se avizinha será seguramente, para muitas empresas, o exercício mais difícil da sua história. Na Riberalves, cá estaremos para enfrentá-lo. Com a força das nossas pessoas, aliados aos nossos parceiros e aos nossos clientes.

75 Grande Consumo


“Um leite por inteiro, sem tirar nem pôr” Já chegou ao mercado o novo Leite Inteiro da Terra Nostra, que vem complementar a gama de Leite de Pastagem. Trata-se de um leite de “vacas felizes”, que vivem ao ar livre e comem erva fresca 365 dias por ano. Mas o seu fator mais distintivo é ser um leite onde não se retira a nata, nem é acrescentado qualquer ingrediente. Assim, retém todas as vitaminas de alto valor nutricional, é rico em proteína, cálcio e iodo, fonte de fósforo e vitamina B2.

ALIMENTAR TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock

76 Grande Consumo

E

m 2015, a Bel apresentou um programa de sustentabilidade que se mostrou decisivo em duas vertentes: para o futuro da sua categoria de leite e para a produção leiteira nos Açores. Trata-se, claro, do Programa Leite de Vacas Felizes que veio, acima de tudo, valorizar e diferenciar a origem açoriana deste leite, de forma a criar um negócio sustentável e gerar valor para a Bel, para os produtores de leite, para os Açores e para todo o ecossistema. “O percurso do Leite de Pastagem Terra Nostra tem sido exemplar para toda a categoria de leite, uma categoria madura e com dificuldades de crescimento, onde o Leite de Pastagem veio trazer dinamismo e aumento de valor. Um conceito inovador que hoje é seguido por outros operadores, dando origem a um novo segmento de mercado”, comenta Catarina Chaves, responsável na Terra Nostra pelas categorias de leite e manteiga. No seguimento deste programa, a marca lançou, recentemente, uma novidade. Este produto – o Leite de Pastagem Inteiro Terra Nostra – tem como objetivo reforçar o fator de inovação intrínseco à Terra Nostra, mas não só. Numa altura em que nos preocupamos cada vez mais com uma alimentação saudável, em que procuramos por um regresso às origens, àquilo que a natureza nos oferece sem interferências, nem manipulações, este leite vem responder a esta busca. Pois, o leite inteiro mantém as suas propriedades, tal como a natureza nos dá. “No leite inteiro, não só não retiramos a nata como não é


acrescentado qualquer ingrediente, retendo, assim, as vitaminas de alto valor nutricional, fonte de fósforo e vitamina B2. Um leite por inteiro, sem tirar nem pôr. Um leite naturalmente mais saboroso, que repõe as energias necessárias para os dias repletos de atividade e promove a saciedade. Um leite naturalmente rico em proteína e cálcio, em especial para os mais pequenos crescerem, parceiro da Associação Portuguesa de Nutrição. O Leite de Pastagem Inteiro Terra Nostra é produzido através dos mesmos critérios de qualidade, mas a este produto não lhe é retirada a nata, sendo um produto nutricionalmente igual ao que nos é entregue pelo produtor certificado”, refere a responsável. Em geral, o leite é um produto alimentar com um público abrangente, incluindo todas as faixas etárias. No entanto, no que se concerne ao leite inteiro, a Terra Nostra identificou a oportunidade de direcionar para um público mais jovem, dando destaque aos diversos benefícios nutricionais que este tipo de leite tem para oferecer. De acordo com Catarina Chaves, o consumidor português está, hoje, cada vez mais preocupado com a sua saúde e estilo de vida e isso reflete-se no bem-estar dos seus e a importância das crianças comerem bem e de forma equilibrada. “Vários estudos demonstram, ainda, que o consumo de leite inteiro está associado a um menor risco de desenvolvimento de obesidade na infância. Pelo facto do leite inteiro ter maior concentração de gordura, o organismo, após a sua ingestão, fica saciado por mais tempo, limitando a ingestão de outros alimentos, nomeadamente daqueles com maior riqueza em açúcares, sal e gorduras não saudáveis. Em muitos países europeus, o leite inteiro é a variedade mais consumida por toda a população”.

Fazer o bem, bem feito

O Programa Leite de Vacas Felizes está no coração da Terra Nostra e do seu propósito enquanto marca responsável. Nasceu com o objetivo de criar valor para os Açores e já conseguiu o reconhecimento internacional. Nomeadamente, pelo valor e diferenciação que o programa aporta, foi premiado como um exemplo a seguir pela organização não governamental Compassion in World Farming (CIWF). Todos os resultados positivos que se têm conquistado devem-se, em grande parte, ao elevado grau de exigência do programa e à sua diferenciação. “Acreditamos que estamos a fazer o bem, bem feito para toda a cadeia de produção, através das melhores práticas de produção leiteira, e não temos dúvidas que isso se reflete na performance e força da marca. Incentivamos a utilização de práticas agrícolas naturais, a pastagem com alimentação à base de erva fresca durante 365 dias

por ano. Recentemente, foi desenvolvido pela Terra Prima um estudo de pegada ambiental das nossas explorações, em comparação com explorações convencionais, onde os animais são mantidos em estábulo com alimentação à base de ração. O estudo confirma que as nossas explorações apresentam uma redução da pegada de carbono superior a 30%. A pastagem ao ar livre, para além de ser mais sustentável, é um método mais natural, contribui para uma melhor saúde das vacas (felizes), resultando também num produto com características nutricionais diferentes e nutricionalmente rico”, explica. Um dos objetivos da marca, em matéria da sustentabilidade, é aliar uma atuação responsável à criação de valor em toda a cadeia. Daqui resulta a missão da marca: fazer o bem, bem feito. Este é um pilar levado a sério nas mais diferentes áreas, desde a redução da pegada ambiental dos produtores de leite à redução energética da fábrica, à forma como é pensada a inovação, as embalagens, entre outros fatores. A Terra Nostra acredita que, acima de tudo, é necessária consistência em toda a marca e em tudo aquilo que esta faz para se conseguir mobilizar e promover uma mudança sustentável. “Estamos orgulhosos da caminhada que a marca tem feito, nos últimos anos, enquanto marca verde com elevados standards de sustentabilidade, contribuindo para a valorização dos Açores e dos nossos produtores de leite”, confessa Catarina Chaves.

Futuro

Para a Terra Nostra, no âmbito da produção leiteira, o caminho será continuar esta estratégia de valorização do sector dos lacticínios através do Programa Leite de Vacas Felizes. Ou seja, a melhoria contínua da cooperação com os produtores e com parceiros comprometidos com a missão da marca. “Contamos aumentar progressivamente o número de produtores certificados, contribuindo para a valorização da produção leiteira. Paralelamente, continuamos a trabalhar para reduzir a nossa pegada ecológica na ilha das vacas felizes e oferecer a todos o melhor da ilha, com a maior naturalidade possível”, afirma Catarina Chaves. O Leite de Pastagem Inteiro Terra Nostra é a mais recente aposta da marca na categoria do leite e irá contar com uma forte vaga de comunicação em digital e ponto de venda, mas a marca promete ter, em plano, vários lançamentos para o curto prazo. “O nosso principal objetivo é contribuir para um desenvolvimento sustentável das três categorias, queijo, leite e manteiga, respondendo às necessidades mais prementes do consumidor”, conclui.

77 Grande Consumo


ANÁLISE TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock

ANÁLISE

TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock

78 Grande Consumo

AC/DC no mercado dos lacticínios


Há manifestamente um antes e um depois Covid-19 nas vendas de lacticínios no mercado nacional. Duas das categorias que contam com uma enorme presença nos lares de Portugal Continental, leite e queijo apresentaram comportamentos distintos no período analisado pela Nielsen e, depois, em março, quando os efeitos da pandemia do novo coronavírus se faziam já sentir. O leite, que se encontrava em decréscimo, inverteu caminho com o confinamento obrigatório, que contribuiu para o aumento do consumo. Já o queijo, que era marcado por uma dinâmica positiva, fez o percurso contrário, muito penalizado com o encerramento dos estabelecimentos de restauração. De realçar que o preço, assim como a intensa atividade promocional continuam a ser um “driver” de crescimento para o mercado dos lacticínios, não obstante os segmentos com um benefício adicional atraírem cada vez mais consumidores.

N

26 de janeiro, 4% em volume, para atingir os 70,9 milhões o ano móvel findo a 23 de fevereiro, o leite de quilogramas. Já em valor, gerou 535,2 milhões de euros, apresentou uma ligeira evolução negativa, numa evolução também de 4%. “O mercado de queijos cotanto em termos de valor como de volume. meçou muito bem, com um crescimento bastante sustentado, Segundo o Nielsen Market Track, a categoria, até aparecer a pandemia. A partir do dia 13 de março tudo se que marca presença em 95% dos lares em alterou. A família dos queijos frescos caiu de uma forma bastanPortugal Continental, traduziu-se em 428 mite grande, mais de 25%, e os queijos regionais (leites de cabra lhões de litros comercializados, o que equie ovelha) caíram na mesma ordem de grandeza. Já os fatiados vale a um decréscimo de 1%. Em termos de cresceram mais de 30% e os ralados mais de 100%”, descreve valor, evoluiu, igualmente, de modo negativo Nuno Torgal, diretor comercial da Queijos Santiago. (-1%), atingindo os 264,5 milhões de euros. Também Dina Duarte, diretora geral da Montiqueijo, traça Mais eis que veio a pandemia por Covid-19. esta situação: um início de ano onde o mercado de queijo “No primeiro trimestre do ano, o segmento de registou crescimentos - “e isso deveu-se, em grande parte, às leite UHT registou o maior crescimento da última década. Entre janeiro e março, o segmento subiu, em termos homólogos, 13% em valor e 14% em volume. Em março, o confinamento obrigatório, como consequência da pandemia de Covid-19, contribuiu de forma significativa para o aumento de consumo destes bens alimentares”, atesta porta-voz da Milhões Lt. Milhões € Bel Portugal. %Var -1% -1% No queijo, contudo, o movimento foi inverso. A categoria cresceu, no ano móvel findo a Market Track (Hipers+Supers) | Ano Móvel findo a 23 de fevereiro de 2020

95%

dos lares em Portugal Continental compraram a Categoria no último Ano

21 vezes

5 Lt.

2,91€ por visita

HomeScan / Painel de Lares (Ano 2019)

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movimentações que, habitualmente, são provocadas pela distribuição, com a aposta em feiras de queijo dedicadas à produção nacional” -, seguido por uma situação que se inverteu, em março, devido à Covid-19. Neste contexto, foi necessário adaptar. A Marinhas, por exemplo, decidiu fechar, temporariamente, a habitual venda ao público nas suas instalações e deu início às entregas ao domicílio. “Desde esse período, o maior impacto que sentimos, ao nível das vendas, foi efetivamente o encerramento da restauração e hotelaria”, confirma Bárbara Bacelar Ferreira, diretora comercial e de comunicação da Marinhas. A responsável revela que este período de potencial retração não tem afastado os consumidores. “Como dispomos de uma gama completa de produtos, e alguns deles são muito específicos, como é o caso do queijo Marinhas Magro, que é um produto mais caro, considero que o nosso consumidor habitual não é o que está preocupado com o preço, mas aquele que privilegia a qualidade. Até ao momento, os nossos clientes habituais mantêm-se e ajustaram-se connosco a toda esta nova situação”. Até porque, sublinha Bárbara Bacelar Ferreira, o “crescimento não pode, ou não deve,

O mercado de queijos começou muito bem o ano, com um crescimento bastante sustentado, até aparecer a pandemia. A partir do dia 13 de março tudo se alterou. A família dos queijos frescos caiu de uma forma bastante grande, mais de 25%, e os queijos regionais caíram na mesma ordem de grandeza

80 Grande Consumo

dar-se pelo preço, mas sim pela qualidade e fiabilidade do produto e pela confiança que a marca é capaz de transmitir ao consumidor”. Não obstante, o preço é e continuará a ser um dos “drivers” da evolução destas categorias, seja pela busca de opções mais acessíveis, como as de marca própria, seja pela forte dinâmica promocional que tão bem caracteriza o mercado nacional.

Inovação vs preço

No entender de Nuno Torgal, é um erro as marcas próprias terem um sortido tão profundo. “Cabe às marcas da indústria apresentar as novidades e a profundidade das gamas. O consumidor, quando experimenta algo, tem sempre mais confiança nas marcas da indústria do que numa marca própria, mas este é um grande desafio para todos e era importante existir mais equilíbrio”. Por outro lado, continua o responsável, a pressão do preço, junto dos produtores, por um lado, e dos retalhistas, por outro, deixa muito pouca margem. Quanto maior for o “gap” de preços entre MDD e marcas da indústria, pior é, na sua opinião, a dinâmica de inovação e diferenciação. Muitas vezes, “o consumidor não entende essa dinâmica e os produtos das marcas da indústria, com ‘gaps’ de preços muito grandes face às marcas da distribuição, só vendem em promoção”. Até porque existe uma forte pressão promocional no universo dos bens de grande consumo e os lacticínios não são exceção. O shopper português vai às compras tendo já em consideração quando é que os produtos que gosta e precisa estão em promoção, de modo que escolhe os momentos de consumo de acordo com as alturas em que estes são mais benéficos financeiramente. De acordo com a Bel, e segundo dados da Nielsen, em 2018, Portugal foi o quarto país europeu em que a promoção adquiriu maior peso e quase metade das vendas (47%), no mercado nacional, foram realizadas em promoção. “Comprar em promoção faz parte da


Milhões Kg.

Milhões €

+4%

%Var

+4%

Market Track | Ano Móvel findo a 26 de janeiro de 2020

96%

dos lares em Portugal Continental compraram a Categoria no último Ano

26 vezes

0,43 Kg.

2,99€ por visita

HomeScan / Painel de Lares (Ano 2019)

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estratégia de poupança de muitos portugueses e, como resposta a este comportamento de escolha, vários fabricantes, nos últimos anos, intensificaram a sua atividade promocional como estratégia de recrutamento e retenção de consumidores. Em queijo, 36% da quantidade total comprada foi realizada em promoção, o que vem revelar a importância dada às marcas e aos produtos. Na categoria de leite, a importância atribuída pelo consumidor à existência de promoções é muito alta, sendo que 65% do volume de vendas no total dos hipers e supers é feito em promoção”, diz

porta-voz da empresa. As campanhas são, assim, uma realidade incontornável no mercado nacional, mas, no entender de Ludovic Reysset, Country Manager da Danone, trata-se tão simplesmente da tipologia do próprio mercado. Como tal, este fator não inibe o lançamento de inovações. “Pelo menos, não é esse o caso para a Danone”, refere. As mais recentes categorias no universo dos iogurtes, tais como os segmentos com um benefício adicional, por exemplo, Skyr, Kefir e Proteína, são muito valorizados pelos consumidores e estão em claro crescimento. “O segmento de proteicos, onde estamos muito presentes com Yopro e Corpos Danone, por exemplo, tem crescido bastante e já não é um segmento de nicho; é algo que entrou já na realidade diária de muitos portugueses. O mesmo vai acontecendo com segmentos como o Kefir ou Skyr, ainda que em menor escala”. Preço, mas também inovação, no fundo é isto que procura o shopper português na oferta das marcas. Sendo certo que o valor económico continuará a ditar algumas decisões de compra, já não é este o único fator de diferenciação entre as marcas. “Penso que a praticidade, a conveniência e o consumo consciente são tendências que vão continuar a marcar a evolução deste universo”, conclui Dina Duarte.

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OPINIÃO

MANUEL TARRÉ presidente do Conselho de Administração da Gelpeixe

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VALORIZAR A PRODUÇÃO NACIONAL, MAIS DO QUE NUNCA Se em tempos de normalidade já faria todo o sentido que os portugueses, no ato de compra, preferissem produtos nacionais, em ocasiões de exceção, de grande incerteza quanto ao futuro, como esta em que vivemos, e em que a solidariedade internacional não é dada como adquirida, ainda mais sentido faz que essa opção de comprar produtos produzidos em Portugal seja deliberadamente praticada. A preferência por bens alimentares oriundos das empresas portuguesas valoriza a produção nacional e contribui para a preservação de postos de trabalho, tão importantes e estratégicos nestes dias, assim como para a manutenção da nossa economia a funcionar o melhor que consigamos. Antevê-se que o desemprego, tão fustigante num passado não tão distante, e que, aquando do início do atual flagelo, se encontrava em níveis baixos, próprios de uma economia ativa, venha a subir significativamente, trazendo consigo grandes dificuldades para muitas das nossas famílias. A indústria agroalimentar tem estado bem atenta às necessidades do consumidor, adaptando-se à nova realidade do consumo, quer na oferta de produtos mais destinados a refeições em casa, quer no redimensionar das suas fábricas para satisfazer o abastecimento regular do mercado. De referir que, mercê de grande tenacidade e espírito de sacrifício de todos os que dela fazem parte – dirigentes, responsáveis de recursos humanos (com tarefa bem delicada) e trabalhadores no geral, que não podem seguir a norma comum de confinamento, expondo-se a alguns riscos acrescidos, pese embora todas as medidas de proteção que as empresas estão a impor -, está a ser possível garantir a normalidade, num período de tanta incerteza. As unidades industriais do sector do pescado, congelado, conservas e bacalhau, na sua maioria, encontram-se a laborar com normalidade, mas com variação de produção para o que seria normal. No peixe fresco, a realidade é diferente, face à redução do consumo, resultante do encerramento da restauração, dos hotéis sem hóspedes e do turismo paralisado. Portugal é o terceiro maior consumidor de pescado, a nível mundial, e são diversos os estudos que evidenciam o peixe como um alimento de fácil digestão e rico nutricionalmente. É entendimento das direções das associações de industriais de produtos alimentares, ANCIPA e ALIF, que não faz qualquer sentido taxar com IVA a 23% toda uma vasta gama de produtos alimentares, com mais

ou menos transformação, como se de produtos de luxo se tratasse. Solicitámos, em fevereiro passado, reuniões, ao senhor ministro das Finanças e aos diversos grupos parlamentares, para abordagem deste complexo tema para todos nós, agentes económicos e até para a Autoridade Tributária. Urge, sem dúvida, aligeirar o complexo quadro do IVA para os produtos alimentares e alterar em definitivo o enquadramento em que vivemos. O sistema do código português distribui os produtos alimentares por três taxas de IVA, sem qualquer fundamentação ou critério, que não existe, nem nunca foi invocado para as múltiplas alterações que se registaram ao longo dos anos, havendo vários produtos que já estiveram nos 6% e hoje se situam nos 23%. Compreendemos que o momento presente não é o mais adequado a este tipo de diligências, mas, face ao estado de exceção que hoje vivemos, impõe-se a aprovação de um orçamento suplementar e aí, sim, poderá ser o “timing” certo para que o Parlamento legisle no sentido de não figurarem mais quaisquer alimentos à taxa de 23%, mantendo-se os básicos na Lista 1 e, assim, a 6% e os restantes na Lista 2, a 13%. Seria uma medida justa e de largo alcance em benefício de todos, mas sobretudo dos consumidores que, hoje, mais confinados do que nunca às suas casas, são penalizados em 10% nos produtos que compram, como os pré-preparados, onde um pastel de bacalhau, uma bolacha Maria ou um congelado pagam 23%, quando comprados nas lojas de bairro ou supermercado, mas num restaurante pagam 13%. Se a restauração está abrangida pelos 13%, é um total absurdo que por quaisquer alimentos provenientes da indústria alimentar em Portugal tenham de pagar 23%. Note-se que a solução que é proposta, de não se aplicar mais taxa máxima em bens alimentares, é similar à seguida pelos legisladores espanhóis e franceses, onde, para a taxa que propomos passar a ser 13%, eles têm, respetivamente, 10% e 5,5%.


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ENTREVISTA TEXTO Bruno Farias FOTOS Sara Matos

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“A globalização terá que ser repensada, pelo impacto negativo que o corte dos canais de abastecimento internacionais provoca” O que aconteceria se parasse a distribuição? Que impacto poderia ter para a vida das pessoas e para a economia? Este foi o mote para a conversa com Carlos Ruivo, presidente da Associação Portuguesa dos Industriais de Carnes (APIC), sobre o impacto da pandemia do coronavírus neste sector e todos os esforços que têm sido feitos, por parte das empresas, para manter a entrega dos produtos alimentares em segurança. Com um “sentimento de missão”, o abastecimento e a segurança alimentar nunca estiveram em causa, apesar dos constrangimentos enfrentados por estas empresas para continuarem a laborar. Mas a crise não tem passado ao lado do sector, com 80% das empresas associadas da APIC a reportar perda de vendas. Numa altura em que se tentam traçar alguns caminhos para a recuperação, Carlos Ruivo sublinha a necessidade de privilegiar a produção nacional, para diminuir a dependência aos mercados externos em produtos que facilmente podem ser produzidos em Portugal. Um movimento que, seguramente, ajudará à recuperação mais rápida da economia nacional.

G

rande Consumo - Como é que a pandemia está a afetar o negócio do sector cárnico? Carlos Ruivo - Ainda não é possível medir o total impacto da pandemia no sector, mas já é possível ter uma ideia e o cenário não é nada animador. Se, numa primeira fase, nas primeiras semanas da crise, as vendas se mantiveram ou até subiram para algumas empresas e para determinada tipologia de produtos, nas últimas três semanas, as vendas têm vindo a diminuir, especialmente na última.

Tal como em outros sectores da economia, são as pequenas e médias empresas (PME) que mais estão a sofrer com a crise. Neste momento, temos alguns associados com 80% de quebras nas vendas e muitos que entraram em lay-off. Lamentavelmente, dependendo da duração da pandemia, algumas empresas poderão vir a fechar. GC - Qual é o peso percentual das lojas da distribuição moderna alimentar para as vendas dos associados da APIC? CR - A percentagem é muito variável e depende da estratégia de cada empresa e do mix de produtos de que estamos a falar, mas poderá variar entre os 40% e 60%. A verdade é que, quando analisamos o contributo para a rentabilidade, essas percentagens podem cair significativamente, chegando a menos de metade dos valores que referi.

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GC - Alguma vez esteve em causa o abastecimento das lojas? A alimentação dos portugueses, no que diz respeito à oferta de produtos cárnicos, alguma vez esteve em risco? CR - Nunca esteve em causa o abastecimento das lojas e muito menos houve risco de abastecimento das mesmas. Existe um sentimento de missão por parte da indústria e de fortalecimento das parcerias com os nossos clientes. Além disso, as grandes empresas do sector, apesar de alguns ajustes necessários, continuam a laborar com alguma normalidade, pelo que a alimentação dos portugueses nunca esteve em risco. GC - Quais foram os principais constrangimentos gerados pela Covid-19? Que soluções é que os associados da APIC encontraram? CR - Os principais constrangimentos sentidos pelas empresas do sector prendem-se com a falta de alguns equipamentos de

“Neste momento de pandemia Covid-19, pensamos que os governos e os decisores terão de repensar a sua estratégia e deixar de comprar mais barato, privilegiando a produção nacional para não estarmos dependentes dos mercados externos em produtos que facilmente podemos produzir” proteção individual, como luvas, máscaras e desinfetantes, que já eram utilizados na indústria alimentar antes desta crise de saúde pública, o que obrigou as empresas a recorrer a alternativas mais dispendiosas. Neste momento, a gestão é diária, sendo que um dos principais problemas prende-se com algumas matérias-primas auxiliares, como material de embalagem e gás (CO2) para conservação dos produtos. Além disso, devido às regras de distanciamento social impostas, as empresas tiveram de se reorganizar, criando mais turnos, para reduzir ao máximo ajuntamentos, para que fosse possível continuar com a produção sem colocar em causa a segurança dos seus trabalhadores, ainda que com impacto de aumento dos custos de produção. GC - Como é que está a ser garantida a segurança alimentar dos produtos comercializados pelos vossos associados? Que medidas foram tomadas para assegurar a habitual distribuição dos produtos? CR - A segurança alimentar e o controlo de qualidade sempre fizeram parte do dia-a-dia na indústria: a maioria das empresas do sector são certificadas em normas de qualidade e de segurança alimentar e há anos que são usadas toucas, máscaras e luvas para o fabrico dos produtos.

88 Grande Consumo

Nesta fase, as empresas continuam a trabalhar com elevados procedimentos de rigor de qualidade e da segurança dos produtos e os controlos oficiais, realizados pela Direção Geral de Veterinária, decorrem com normalidade. Para enfrentarmos a pandemia de forma mais eficiente, implementámos a estratégia de medir a temperatura de todos os trabalhadores à entrada das unidades de produção, foi imposto o distanciamento social nos espaços de refeição, foram introduzidos mais pontos de higienização. Todos os colaboradores que possam ter sintomas, como febre ou tosse seca, são imediatamente informados que não podem entrar nas unidades de produção, sendo acompanhados pela medicina do trabalho que decide quais os procedimentos a efetuar. GC - Portugal é um país deficitário na produção animal em alguns dos sectores de atividade. Como é que o sector consegue rivalizar com a concorrência vinda de Espanha, por exemplo, com os operadores do país vizinho a conseguirem colocar carne no nosso país a preços extremamente competitivos? CR - Portugal tem uma capacidade de produção suinícola de 60% para as necessidades do mercado em fresco e em produtos de charcutaria. Pelo facto de sermos deficitários na produção, as indústrias têm de recorrer a mercados externos, maioritariamente a Espanha. É, efetivamente, muito complicado rivalizar com um país como Espanha, que tem níveis de produção de, aproximadamente, 170%. Isto faz com que, muitas vezes, o mercado português consiga comprar carne de porco a um preço mais reduzido, inclusive face ao preço praticado no país de origem. Os espanhóis preferem vender para o exterior o excesso a um preço mais competitivo, salvaguardando o preço no mercado interno, que é o seu principal comprador. Nos últimos anos, o preço de venda dos porcos em Portugal é, em média, 10 cêntimos mais baixo que em Espanha, segundo dados da Bolsa Mercolleida. Neste momento de pandemia Covid-19, pensamos que os governos e os decisores terão de repensar a sua estratégia e deixar de comprar mais barato, privilegiando a produção nacional para não estarmos dependentes dos mercados externos em produtos que facilmente podemos produzir. Aliás, a globalização terá que ser repensada, pelo impacto negativo que o corte dos canais de abastecimento internacionais provoca. Ganharemos em termos de balança de transações e teremos reservas estratégicas, como, por exemplo, os alimentos. A dependência do exterior ficou evidente nesta crise com a situação das máscaras, pois tive-


mos que importar. Existiram momentos com muita escassez e o que estava disponível teve aumentos exponenciais. O que era impensável, aconteceu. Ninguém pode garantir que esta seja a última crise de saúde publica e, por isso, é necessário preparar o futuro com a devida antecedência. GC - Mesmo em contexto de pandemia, a carne importada que chega a Portugal consegue ser mais barata do que a produzida dentro de portas? CR - Sim. Tendo em conta que existem países como a Espanha, que continuam a ter níveis de produção elevadíssimos e preferem continuar a escoar o seu produto para fora. Sendo Portugal um país deficitário na produção, que sentiu ainda mais dificuldades durante esta crise de saúde pública, esta realidade continua a manter-se. GC - Não é contraditório, de alguma forma, que apesar de Portugal ser deficitário na produção animal, em alguns sectores de atividade consiga, ainda assim, exportar? O mercado exterior traz a valorização monetária que o mercado interno não aporta à produção cárnica nacional, ou é uma questão de escoamento de produto? CR - Não é contraditório. As empresas têm de encontrar soluções para se manterem ativas no mercado. Quando o seu produto não é valorizado, têm de, obrigatoriamente, procurar alternativas no mercado externo para conseguirem sobreviver e manterem os postos de trabalho. GC - Como é que se poderia resolver a questão da produção deficitária, aberta que está a porta da Ásia, com a abertura das exportações para a China e Coreia do Sul, em 2019? CR - A questão poderia ser resolvida incentivando ao aumento da produção suinícola. Será muito importante o apoio de alguns dos organismos públicos, que deveriam ser mais céleres a tomar decisões e colaborativos na resolução dos problemas que podem condicionar a produção nacional. O mercado asiático é, de facto, muito atrativo e poderia ser uma grande aposta para o tecido empresarial português. Porém, não basta ter vontade. É necessário que sejam criadas condições para que as empresas nacionais cresçam com consistência e regularidade, para que possam produzir mais, exportar mais e a preços mais competitivos. GC - Acredita que a pandemia da Covid-19 poderá trazer consigo maior apetência pelo consumo de carne nacional? Poderá haver um “game changer” com esta pandemia, uma vez que comprar e consumir local é uma questão de sustentabilidade económica, mas também social? CR - Tenho visto, com agrado, em muitas redes sociais, o apelo feito ao consumidor para consumir o que é fabricado em Portugal (560 no início do

código de barras). Se o consumidor fizer este movimento, seguramente ajudará a uma recuperação mais rápida da economia nacional, no entanto, também os associados da APED terão de seguir esta linha de pensamento. Se todos contribuirmos, mais rapidamente conseguiremos ultrapassar esta crise. GC - Tem-se observado a mudança dos hábitos de consumo, com, por exemplo, o aumento da venda de produtos fatiados, de baixa gramagem, em detrimento de embalados em maior volume. Acredita que é uma tendência a manter-se? A indústria soube reagir com formatos adequados e com inovação associada? CR - Na realidade, por uma questão de comodidade e de reduzir o tempo nas lojas, os consumidores tem preterido os produtos de charcutaria/corte pelos produtos de livre serviço ou embalagens de consumidor final. O Horeca está muito reduzido e as fábricas tiveram de se adaptar (as que tem condições para isso) para produtos de menos peso, ou seja, embalagens de consumidor final. Materializou-se, desde que estamos em período de quarentena, pelo incremento na venda de produtos fatiados e também nos produtos enlatados, pela maior facilidade de armazenamento e vida útil alargada. A inovação não é imediata, tem o seu processo temporal normal. Por exemplo, precisamos de uma vacina urgente para a Covid-19 e não sabemos se demora um ano ou mais. GC - Tem defendido a revisão da taxa de IVA nos últimos dias. Era uma medida importante para a vitalidade do sector? Que outras soluções seriam bem vistas pela APIC? CR - Uma redução, ainda que temporária, da taxa do IVA para 6% em produtos como o fiambre, chouriço ou presunto, entre outros, que são taxados a 23% atualmente, teria benefícios para empresas e consumidores. Temos um elevado número de desempregados no país e muitas famílias a viver no limiar da pobreza, pelo que qualquer baixa de preços ajudaria e muito. Também seria importante aumentar a disponibilidade de linhas de apoio à tesouraria para as empresas – já que estamos, neste momento, numa fase de formalização com as Sociedades de Garantia Mútua - e promover a venda de produtos produzidos em Portugal. GC - Aumentar os preços aos intermediários e, consequentemente, ao cliente final é uma medida fora de questão? Manter o valor justo é uma preocupação do sector? CR - Existe uma grande preocupação da indústria em não aumentar os preços dos produtos transformados, aos intermediários e ao cliente final. Poderá haver algum ponto de venda que tenha feito alguma especulação, como já aconteceu noutros mercados, mas a grande maioria das empresas tem mantido o valor justo dos produtos e o cuidado de não se aproveitarem desta situação pandémica que estamos a atravessar. Neste momento, os nossos clientes estão a comprar os produtos ao mesmo preço que os adquiriam anteriormente. GC - A reabertura dos mercados tradicionais e da restauração, mesmo que forma progressiva, seria um bom estímulo económico para o sector e não só? CR - A reabertura dos mercados tradicionais, cafés e restauração seria muito importante, principalmente para o segmento dos produtos tradicionais de charcutaria, como, por exemplo, os chouriços regionais, paios, presuntos, entre outros. Estes segmentos estão completamente parados e muitas empresas dependem dessas vendas para subsistirem. Defendemos um regresso progressivo da atividade económica, sempre com a máxima segurança e devida proteção (máscaras), pois isso irá estimular o sector, gerando vendas para as PME, além de ser também uma fonte de receita para as outras empresas que fazem retalho tradicional.

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Charcutaria cresce apesar da pandemia de Covid-19 O mercado da charcutaria não se demonstra afetado por este período que foi bastante desafiante e inesperado. Apesar de ainda ser prematuro avançar com dados sobre os primeiros meses de 2020, a análise da Nielsen, relativa ao ano móvel findo a 23 de fevereiro, revela crescimentos em valor nas três principais categorias: fiambre, presunto e salsichas em vácuo. Este universo é, particularmente, alavancado pelo crescimento a dois dígitos – em volume e valor – da categoria de salsichas em vácuo, que, ainda assim, só está presente em 18% dos lares em Portugal Continental. Não obstante, o mercado mantémse otimista e as marcas aguardam para ver se a pandemia de Covid-19 pode trazer alguma alteração nos padrões de consumo de produtos de charcutaria.

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ANÁLISE TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock


O

início do ano de 2020 foi marcado por novas subidas de preço da matéria-prima - carne de suíno – e pela movimentação dos preços de venda a público em sentido ascendente. O mês de março trouxe consigo grandes alterações provocadas pela crise da Covid-19, que afetou todo o retalho mundial e representou uma modificação abrupta nos hábitos de compra. “Conseguimos ver a evidência de que o consumo fora do lar, nomeadamente restauração e hotelaria, terá sofrido uma quebra sem precedentes, compensada pelos consumos efetuados no retalho moderno com recurso, ou não, ao online. Assistimos a crescimentos violentos no canal moderno, chegando alguns operadores a crescer mais de 100% relativamente ao período homólogo. Para nós, ao fecho do primeiro trimestre, o balanço foi positivo, uma vez que crescemos cerca de 20% comparativamente a 2019. Torna-se difícil perspetivar o que se irá passar ao nível dos consumos, uma vez que estamos todos a viver uma nova realidade”, introduz Rui Carvalho, diretor comercial da Porminho. De um modo geral, a pandemia de Covid-19 levou a uma quebra significativa do consumo, aliada ao encerramento de alguns mercados, e a uma mudança na rotina dos consumidores. Embora seja preciso esperar-se mais algum tempo para se estudar a tendência de mercado, fica claro que os padrões de consumo foram, forçosamente, alterados. “Estamos perante uma crise sanitária e económica que induz nos consumidores um crescente sentimento de incerteza e insegurança, que levará necessariamente a uma alteração dos comportamentos de compra. Apesar dos consumidores estarem de novo a voltar aos patamares mais baixos da pirâmide de Maslow, nomeadamente preocupando-se em satisfazer as suas necessidades alimentares, também é natural que se assista a um abaixamento do rendimento disponível das famílias e que isso tenha impacto no consumo”, destaca Marco Andrade, diretor de marketing do Grupo Montalva, que atua no mercado através da marca Izidoro, entre outras. O gestor descreve três grandes alterações no comportamento de compra em Portugal. A primeira foi a transferência de consumo do balcão para o livre serviço. A segunda foi a procura por soluções que oferecessem mais quantidade, como os packs familiares, decorrente da diminuição da frequência de visita às lojas. Por último, a preferência por produtos portugueses como fundamental para a recuperação da economia e como reconhecimen-

to das empresas portuguesas que se manifestaram solidárias com as famílias portuguesas e souberam responder às suas necessidades.

Salsichas puxam pelo mercado

Sendo ainda cedo para ter uma noção concreta de como a Covid-19 terá impactado o mercado da charcutaria, sabe-se, contudo, que, de acordo com os dados da Nielsen, vinha a apresentar uma evolução positiva no ano móvel findo a 23 de fevereiro, alicerçada, em parte, no receio de uma eventual escassez de bens, que levou ao incremento da procura transversal a todo o sector alimentar, onde se incluem os produtos de charcutaria. De facto, as três categorias analisadas pela Nielsen apresentam crescimentos. O fiambre, a categoria que marca presença em 89% dos lares em Portugal Continental, totalizou 19 milhões de quilogramas comercializados, o que equivale a uma diminuição de 1%. Não obstante, em termos de valor, contou com um aumento de 6%, ou seja, 160,9 milhões de euros. Por sua vez, a categoria de salsichas em vácuo foi a que mais alavancou este universo. É de destacar o aumento de dois dígitos das vendas em volume (+22%), onde totalizou 4,7 milhões de quilogramas comercializados, e das vendas em valor (15%), o que corresponde a 8,6 milhões de euros. Finalmente, a terceira categoria analisada, o presunto, contou com crescimentos em ambas as instâncias. Em valor, aumentou 7%, com 68,6 milhões de euros vendidos, e em volume apresentou uma evolução positiva de 3%, movimentando 4,9 milhões de quilogramas no mercado nacional.

Tendências de consumo

Os shoppers nacionais devem ser entendidos como vários conjuntos de consumidores que, em momentos diferentes, têm necessidades distintas. Tal significa que os consumidores de charcutaria, fruto das alterações dos seus estilos de vida e também da sua preocupação com o planeta, procuram produtos com menos calorias e sal, mais convenientes e sustentáveis, mas mantendo a exigência de sabor e qualidade. De facto, os estudos de consumidor indicam que um dos principais fatores de escolha dos produtos de charcutaria é a qualidade, sendo outro muito importante o sabor. Contudo, a evolução dos processos produtivos da maioria dos bens alimentares caminha no sentido de os tornar cada vez mais naturais, mantendo a “shelf life”, sendo a

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linear, tendo vindo a ganhar o seu espaço, a par dos produtos à base de porco. “É fundamental produzir e ter uma oferta de produtos de charcutaria de carnes brancas. Caso contrário, não se estaria a acompanhar as necessidades dos consumidores e a procura no mercado. Isso seria um erro por parte das empresas do sector e das suas marcas. O que é também essencial é oferecer produtos de carne branca com qualidade e tradição, no caso da charcutaria tradicional. A Fumeiro da Gardunha tem opções de chouriço de peru e frango 100% portugueses, produtos cujas vendas têm estado em franco crescimento nos últimos meses, o que demonstra que temos uma oferta adaptada aos gostos e necessidades dos nossos consumidores”, confirma porta-voz da Salsicharia da Gardunha – Fundão.

Preço 20 vezes

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questão da redução do sal um exemplo disso mesmo. “Os consumidores pretendem continuar a consumir os seus produtos preferidos, mas com atenção a alguns aspetos e o teor de sal é um deles, a par do teor de gordura ou da isenção de glúten e/ou lactose”, confirma Lia Oliveira, diretora de marketing da Nobre. Assim, para além de procurar desenvolver produtos que contenham o menor teor de sal e de gordura possível, sem nunca descurar o sabor, a Nobre tem também vindo, ao longo dos últimos anos, a reduzir gradualmente o teor de sal das formulações já existentes, de modo a que os produtos sejam o mais equilibrados possível. Quanto ao glúten e lactose, a grande maioria dos seus produtos já é isenta. Mas o consumo de charcutaria em Portugal foi também afetado pela tendência de uma alimentação à base de plantas. Mais do que afetar o mercado, as marcas veem esta tendência como uma oportunidade para inovar e criar novas gamas de produto e para gerar uma maior proximidade junto do consumidor. No caso da Nobre, as equipas de marketing e I&D trabalham de forma muito próxima, quer seja a nível da análise das tendências de consumo, da geração de ideias e novos conceitos relevantes para o mercado ou do desenvolvimento de novas formulações. “Prova disso foi a criação da gama Nobre Vegalia, que reinventa a oferta de produtos vegetarianos com formulações de sabor apelativas a todos os consumidores, que se destinam a toda a família e àqueles que procuram variar a sua alimentação. Esta gama disponibiliza produtos como as salsichas, hambúrgueres de espinafres, pimentos e beringela e nuggets Nobre Vegalia. Apesar de já existir uma linha de produtos base, trabalhamos diariamente com o objetivo de alargar a nossa oferta com novas soluções sempre saborosas. Esta foi também uma oportunidade para alargar a nossa oferta a proteínas alternativas à carne, complementando o nosso portfólio e recrutando novos consumidores”, afirma a diretora de Marketing da Nobre. O Grupo FTD, que é o resultado da fusão entre os Fumados Douro e os Fumeiros Terras do Demo, afirma que não tem notado a tendência de uma alimentação à base de plantas, embora já exista no mercado essa solução. Contudo, porta-voz do grupo confirma que “os consumidores já procuram alguns artigos mais saudáveis, com redução de sal, conservantes e gorduras, produtos mais naturais, aliados a formatos mais pequenos e económicos”. Outra tendência é a procura por produtos à base de carnes brancas, que hoje já têm uma oferta cada vez mais disponível no

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O preço continua a ser um “driver” de crescimento para este mercado, mas a inovação também é privilegiada pelos compradores nacionais? Para Rui Carvalho, a inovação é “muito mais um instrumento para acrescentar valor à oferta das marcas e explorar uma ligação afetiva com os consumidores, enquanto os produtos mais centrados no preço correspondem à satisfação de necessidades básicas da cesta alimentar dos consumidores”. Ainda assim, a atividade promocional continua a ter relevância, uma vez que que os portugueses adquirem cerca de 46% dos bens alimentares em promoção e cerca de 97% desses consumidores são influenciados pelas promoções nas suas decisões de compra, diz o responsável. Segundo o Grupo FTD, a inovação tem captado menos a atenção dos consumidores e os produtos tradicionais ainda representam a grande fatia do mercado. No entanto, no que se refere a novos formatos, estes estão a mudar para opções mais convenientes e económicas. Um fator importante são as famílias. Como as famílias são cada vez menores, a procura de formatos mais pequenos, para consumo imediato, também tem crescido. O porta-voz da Salsicharia da Gardunha adiciona que, “com a mudança de hábitos de consumo ou mesmo de estilo de vida, o consumidor procura, hoje, de forma mais responsável e informada, produtos de maior conveniência e menor probabilidade de desperdício. A gama de fatiados cresceu nos últimos anos e continua a evoluir de forma positiva, e é mesmo a que tem aumentado mais no cenário em que vivemos”.

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Painel de Retalho | Ano Móvel findo 23 de fevereiro de 2020

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3,37€ por visita


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Pet: um consumo cada vez mais humanizado À semelhança do que acontece nos restantes países europeus, e no mundo ocidental como um todo, em Portugal, os animais de estimação fazem cada vez mais parte da família, superando, por vezes, o número de filhos existentes no agregado e acentuando o dinamismo do mercado direcionado para a sua alimentação e bem-estar. Neste contexto, podemos mesmo falar de uma crescente “humanização” dos animais de estimação, uma tendência associada à preocupação em disponibilizar produtos e experiências com um grau de qualidade, diversidade e sofisticação que, em tempos, estaria apenas reservado a humanos.

ANÁLISE

TEXTO Ramiro Vaz,

Client Consultant Manager da Nielsen

FOTOS D.R.

A

“humanização” dos animais de companhia abre portas a novas oportunidades na indústria de “pet care”, conduz à inovação e leva à expansão da oferta no linear, à medida que marcas e retalhistas procuram responder a novas exigências de donos que se querem sentir, ainda mais, conectados com os seus animais de estimação.

Uma categoria com dinamismo assegurado A categoria Pet continua a ser sinónimo de grande dinamismo, tal como é visível nos valores para o ano móvel findo a 23 de fevereiro de 2020. A categoria cresce 7% em valor, no último ano móvel (mais 15,5 milhões de euros). Apesar do cão ser o animal doméstico predileto entre os portugueses, foi a alimentação de gato a mais dinâmica, crescendo 9% em valor face ao perío-

94 Grande Consumo


do homólogo (mais 5% para a alimentação de cão). Já no momento de comprar alimentos, se os donos de gatos dominam na frequência de compra, os alimentos para cães surgem à frente quer no volume adquirido, quer no valor gasto por visita à loja. Quase 60% dos lares portugueses compraram comida para cão ou gato durante este período. Também os acessórios para animais apresentaram um comportamento positivo no período em análise (mais 3% em valor), tal como nos últimos anos, estando este crescimento relacionado com a “premiação” dos animais, o que resulta da “humanização” da categoria e do elevado potencial deste universo. O maior dinamismo deste mercado está relacionado com o fator inovação e com um maior nível de customização da oferta, associado a uma crescente noção das diferentes necessidades dos animais e da disponibilidade para gastar em soluções que lhes sejam mais benéficas.

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Nielsen Market Track (Hipers, Supers e Tradicionais) | Ano Móvel findo a 23 de fevereiro, 2020

dos lares em Portugal Continental compraram a Categoria no último Ano

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Preocupação crescente com o bem-estar Assistimos a uma mudança notória na categoria, relacionada com uma progressiva preocupação dos donos em oferecer aos seus animais uma alimentação saudável. Desta forma, os consumidores pretendem que a alimentação dos seus animais seja, de alguma forma, semelhante à sua e procuram produtos com nutrientes mais naturais, nomeadamente receitas menos complexas, mais orgânicas, sem OGM’s ou sem glúten, por exemplo. O “mix feeding” também tem sido responsável pelo dinamismo desta categoria. Este tipo de alimentação vem dar resposta às diferentes necessidades dos animais, na medida em que é uma combinação dos vários tipos de alimento: comida seca, que é a base da alimentação de um animal; húmida, que serve de complemento à alimentação seca, sendo mais rica em minerais; e snacks, que funcionam como “treat”, complementando os anteriores. O “mix feeding” resulta em benefícios cientificamente comprovados, sendo rico em nutrientes e ajudando a reduzir a incidência da obesidade e de outros problemas de saúde entre os animais.

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Nielsen Market Track (Hipers, Supers e Tradicionais) | Ano Móvel findo a 23 de fevereiro, 2020

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4,66€ por visita

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ACESSÓRIOS PARA ANIMAIS

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Nielsen Market Track (Hipers, Supers e Tradicionais) | Ano Móvel findo a 23 de fevereiro, 2020

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Fricon desenvolve linha YWC para alimentação animal

NÃO ALIMENTAR TEXTO Bruno Farias FOTOS D.R.

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A Fricon anuncia ao mercado uma nova gama de arcas verticais desenhada especificamente a pensar na alimentação animal. Um desenvolvimento que promete potenciar o consumo de alimentação premium para animais de companhia, que, à semelhança da alimentação humana, precisa, em muitos casos, de refrigeração contínua para assegurar todas as suas propriedades.


Lançamento

A

tenta às dinâmicas do mercado alimentar como um todo, e com uma diversificada presença internacional, a Fricon produz e comercializa um conjunto alargado de soluções de refrigeração. Onde houver necessidade de conservar a temperatura negativa, a empresa vila-condense pode contribuir com o seu know-how. Ora desafiada pela indústria, ora por iniciativa própria, a empresa tem vindo a diversificar o seu portfólio com algumas soluções dirigidas a categorias de negócio consideradas emergentes. No caso do pet-food, a alimentação crua congelada, praticamente impensável há uns anos atrás, é hoje uma tendência real e em crescimento. Regime onde o pressuposto base é o princípio de que cães e gatos são biologicamente aptos para comer carne e ossos crus, dirigido a estômagos sensíveis ou animais com alergias, intolerâncias a alguns compostos ou que precisem de regular o seu peso. “Cada vez há um maior cuidado com a qualidade e também procura por diversidade na alimentação para animais de estimação. O contexto atual é o de uma relação cada vez mais atenta ao bem-estar e saúde animal, onde a alimentação tem uma relação direta e evidente, seja no tempo e qualidade de vida, seja na beleza do seu pelo ou saúde dentária. A Fricon reconheceu este potencial e averiguou o seu interesse concreto”, introduz Ricardo Pereira, diretor de marketing da Fricon. Tendência que, do ponto de vista operacional e produtivo, levou o devido tempo a amadurecer, sendo que o timing de lançamento no mercado se apresenta, naturalmente, estratégico para a sua introdução, momento este que é definido pela própria procura. E é no arranque do segundo trimestre de 2020 que a Fricon comunica a existência no seu portfólio desta gama de produtos dirigida, para já, a um mercado muito específico, mas que pode tornar-se mais abrangente no futuro. Em termos de possíveis canais de comercialização, em causa estão “lojas especializadas em alimentação e cuidados animais, algumas já de dimensão muito considerável. Mas falamos também em grandes superfícies, onde estes equipamentos possam estar presentes num futuro próximo”, reforça Ricardo Pereira. Até porque alimentos são sempre alimentos, sejam eles dirigidos à alimentação humana ou ao consumo animal. “Os processos de congelação ou refrigeração são naturalmente idênticos. Na Fricon, fazemos uma adaptação rigorosa dos nossos equipamentos e ajustamos as nossas soluções às condições climatéricas de cada país. A questão, compreensível, é que ao nível estético é fundamental existir um equipamento dedicado e não comum. Nesse sentido, propomos uma solução já pronta, a YWC, com a garantia da qualidade Fricon e um design especificamente pensado para estes produtos, mas que pode sempre ser customizado para cada cliente”, detalha o responsável.

Não sendo a grande novidade para o exercício de 2020, a linha YWC é, ainda assim, uma proposta diferenciadora dentro do portfólio da marca, não só em termos das respetivas características técnicas, como também no que respeita a geometria e design, eficiência energética e “ad-on” eletrónicos de usabilidade. Por outras palavras, e apesar da sua especificidade de utilização do ponto de vista concetual, não deixa de ser um produto que concilia “uma relação interdependente entre preço, conceito e eficiência. Tudo tem de funcionar em equilíbrio. Ou seja, primeiro a satisfação da necessidade, para saber se atende ou não, depois a eficiência em termos de consumo, seguida do design e, finalmente, o preço”. Razão pela qual a linha YWC está perfeitamente alinhada com o caminho de inovação que a marca tem vindo a traçar, onde o arrojo de criar novas propostas de valor para o mercado (este conceito já foi, igualmente, testado num “pet day” com uma

versão móvel mais reduzida) se concilia com a tão necessária sustentabilidade. “Este fator de sustentabilidade é indissociável da inovação, uma vez que não há qualidade de vida possível sem preservação ambiental, e esse é um elemento já intrínseco a todos os nossos equipamentos, pois são pensados de raiz para melhorar a eficiência energética e reduzir consumos, contribuindo também para um ciclo de poupança. Aliás, o lema do nosso fundador, Artur Martins Azevedo, foca precisamente esta característica: ‘o crescimento é o produto do futuro que fomos capazes de prever’”, conclui o diretor de marketing da Fricon.

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“Martini Time”, agora sem álcool

BEBIDAS

TEXTO Bruno Farias FOTOS D.R.

A Martini anuncia o alargamento do seu portfólio com a inclusão de duas novidades que se assumem como uma verdadeira alternativa para o momento do aperitivo e que prometem dar resposta ao aumento da procura por opções em bebidas não alcoólicas. Martini Vibrante Sem Álcool e Martini Floreale Sem Álcool são a resposta da icónica marca premium italiana para ir de encontro às mais recentes tendências de consumo, como é exemplo o “Mindful Drinking”. Com o crescente interesse na saúde e bem-estar, os consumidores estão também a fazer escolhas cada vez mais equilibradas e, por isso, a tendência de beber de forma consciente é também cada vez maior.

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I

nspiradas por mais de 150 anos de experiência em vinho e em ervas aromáticas, estas duas novas bebidas sem álcool (contêm somente 0,5% de álcool) foram criadas para os momentos em que os consumidores escolhem não beber álcool, mas continuam a querer desfrutar de uma bebida ou cocktail sofisticados e refrescantes. Com Martini Sem Álcool, a marca disponibiliza agora aos consumidores duas alternativas que, sem comprometer o sabor, são uma alternativa sem álcool, até mesmo para acompanhar refeições ligeiras, alargando, assim, o seu leque de potenciais ocasiões de consumo. Com o crescente interesse na saúde e no bem-estar a ser transversal a toda a indústria, a procura por escolhas mais equilibradas e a tendência para um consumo consciente tendem a aumentar, com o aperitivo não alcoólico da Martini a apresentar-se como uma extensão natural do seu imaginário, através de uma bebida que não compromete o sabor e constitui, simultaneamente, uma forma de reforçar o posicionamento de marca assente sobre a plataforma da amizade no “Martini Time”. “No coração da nossa marca está o conceito do ‘Martini Time’: juntar amigos para que possam aproveitar o fim de tarde à volta do aperitivo perfeito. E este lançamento vem reforçar, exatamente, este nosso posicionamento de marca: queremos oferecer novas possibilidades ao nosso consumidor, garantindo que toda a gente pode estar incluída dentro do ‘Martini Time’, bebendo álcool ou não”, introduz Francisca Gouveia, Brand Manager de Martini. É nesse sentido que a gama de Martini Sem Álcool é lançada este ano, como resposta a uma das últimas grandes tendências de mercado: o bem-estar e a moderação. Resultado de um profundo trabalho de desenvolvimento de produto e que influenciou o “timing” de lançamento destas novas referências que chegam ao mercado em 2020, Martini, a marca que se confunde com a própria categoria de vermute, entra, assim, em força num universo onde já é possível encontrar cerveja e vinho sujeitos a um processo de desalcoolização e que alarga, deste modo, as suas possíveis ocasiões de consumo. Um profundo trabalho de pesquisa e afinação de conceito feito pela equipa da marca, em Pessione, Itália. “Como diria o nosso Master Blender, Beppe Musso, ‘uma inovação bem feita é a tradição de amanhã’. E é, exatamente, isso que os novos Martini sem álcool pretendem ser: um lançamento que entrará na casa de todos os portugueses e que, acreditamos, fará parte das suas vidas”, considera. Atenta às tendências de mercado, e com o reforço do advento do “Mindful Drinking”, a Martini entra este ano no universo das bebidas sem álcool com

duas propostas complementares à sua oferta. Criadas para alargar a presença de marca a ocasiões de consumo, os novos Martini Sem Álcool terão um papel muito importante para a marca ao nível da inovação e de recrutamento de novos “targets”. Franjas de consumidores que a marca espera serem impactas por estas duas novas, e inovadoras, referências na categoria. “Com estas duas novas referências, queremos não só recrutar um público mais jovem, mas, mais do que tudo, consumidores que procuram um ‘lifestyle’ mais equilibrado e moderado. Muito importante de salientar também os novos momentos de consumo que serão abertos pelo Martini Vibrante e o Martini Floreale. No passado, decidir não beber álcool significava ter de beber uma água com gás, ou um refrigerante, enquanto os nossos amigos bebiam os seus cocktails; ou até mesmo ficar em casa, enquanto os nossos amigos estavam a aproveitar o seu momento de aperitivo fora de casa. Mas os tempos estão a mudar e os consumidores não querem sentir que estão a perder o momento por escolher uma forma de consumo mais moderada”.

Perfect serve

Referências que foram desenhadas de forma a captar a atenção de um público-alvo que procura “long drinks”, como parte da estratégia de inovação, a marca avança, como sugestão de apresentação, o Martini Sem Álcool & Tónico, uma bebida que combina 75 mililitros de Vibrante ou Floreale, com 75 mililitros de tónico sobre uma porção generosa de gelo, num copo de balão e uma rodela de laranja para decorar. Os Martini master blender também recomendam uma bebida simples de 75 mililitros de Martini Sem Álcool com adição de gelo, permitindo aos consumidores apreciar a profundidade e a complexidade deste aperitivo artesanal italiano. Desenvolvidos com os mesmos vinhos de qualidade utilizados nos clássicos vermutes da marca, no caso destas duas bebidas, o álcool é suavemente removido e infundido, naturalmente, com uma seleção de plantas de origem sustentável. O resultado é um aperitivo não alcoólico, ao estilo italiano, feito com ingredientes naturais. Disponível em duas variantes, o Martini Vibrante Sem Álcool é uma mistura de ingredientes botânicos naturais, equilibrados com Bergamoto Italiano para criar um aperitivo frutado que é característico da Martini. O Martini Floreale Sem

“Como diria o nosso Master Blender, Beppe Musso, ‘uma inovação bem feita é a tradição de amanhã’. E é, exatamente, isso que os novos Martini sem álcool pretendem ser: um lançamento que entrará na casa de todos os portugueses e que, acreditamos, fará parte das suas vidas”

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Álcool, por sua vez, vai buscar inspiração à doçura da Camomila Romana conjugada com ingredientes botânicos para criar uma experiência de degustação floral. Referências que vêm reforçar a oferta da marca em Portugal, nos vários canais de comercialização onde se encontra disponível. “Depois do lançamento da gama Martini Riserva Speciale, que responde não só à tendência de mercado da cocktaleria em Portugal, mas também à necessidade do consumidor atual de Martini de fazer um ‘trade up’ no seu consumo, lançámos, em 2019, o novo Martino Fiero. Um produto desenhado para se misturar na perfeição com água tónica (50% Fiero mais 50% tónica), oferecendo ao consumidor mais jovem uma bebida fácil de fazer e refrescante. Ainda dentro desta ótica, lançamos, este ano, os novos Martini Sem Álcool (Floreale e Vibrante) que foram criados como forma de resposta à tendência do “No/Low álcool”, mas também para oferecer ao consumidor a oportunidade desfrutar do seu aperitivo com os amigos num fantástico final de tarde, mesmo que não queira beber um bebida alcoólica, reforçando o posicionamento da marca”, detalha Francisca Gouveia. Novidades que, dada a situação atual de pandemia, apenas agora estarão disponíveis, nomeadamente, na

Martini Riserva Speciale Rubino, Martini Fiero, Martini Riserva Speciale Ambrato e Martini Sem Álcool (Vibrante e Floreale) constituem a gama de inovação da icónica marca de vermute italiana

As novas referências Sem Álcool foram desenhadas para um público-alvo que procura “long drinks”. A marca avança como sugestão de apresentação o Martini Sem Álcool & Tónico

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distribuição moderna, bem como em plataformas de venda online, numa estratégia de comercialização que visa, numa fase inicial, uma forte aposta no “off-trade”, reservando-se para mais tarde a entrada em força no canal Horeca.

Plano de negócios

Ajustes feitos ao plano de negócio previsto para este lançamento, com a Martini não só a adaptar-se ao máximo às medidas de contenção, mas também à nova realidade dos canais de venda e comunicação. Apanágio de uma marca líder cujo prestígio marcou o imaginário de consumo de muitas gerações passadas e cujas inovações presentes querem ser uma referência das gerações futuras, inovando com o propósito de oferecer “aos consumidores e ao mercado aquilo que precisam”. Até porque a “a tendência de ‘Mindful Drinking’ é gigante e acreditamos que, cada vez mais, ganhará relevância na vida dos consumidores. Como marca, queremos garantir que temos disponíveis as alternativas que fazem mais sentido”. Por enquanto, Martini Vibrante e Floreale serão as referências base do segmento sem álcool para a marca, com a Bacardi-Martini, empresa detentora da Martini, a assumir estar constantemente à procura de formas de inovar dentro das suas marcas, pelo que esta tendência será, naturalmente, tida em conta no processo de inovação a ocorrer no presente e futuro. Previsões à parte, a empresa assume que o contexto nacional e internacional está já a ter a devida influência direta no negócio, conduzindo a que as marcas tenham que se reinventar e procurar estratégias que possam compensar eventuais perdas de vendas decorrentes da pandemia da Covid-19. “Tendo encontrado esse caminho/ estratégia, um bom ano para a marca seria, claro, um ano de crescimento muito alavancado pelas referências de inovação, como Martini Fiero, Martini Riserva e Martini Sem Álcool. Mas não só. Acreditamos que um bom ano para a marca é um ano em que conseguimos também apoiar os nossos parceiros numa altura que o mercado está a sofrer como nunca, dando-lhes ferramentas úteis para que, juntos, possamos ultrapassar esta situação e continuarmos de forma saudável os nossos negócios. Sem dúvida, este ponto estará nas prioridades da marca Martini para este ano”, conclui.


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O%riginal: a nova marca de vinho sem álcool da JMF Atenta às tendências de consumo mundiais, 11 anos depois de introduzir no mercado o Lancers Free, a José Maria da Fonseca lança uma nova marca de vinho sem álcool: a O%riginal. Uma marca desenhada para utilizar códigos de comunicação próprios do mundo dos vinhos e que apresenta o aroma e sabor típico dos vinhos com álcool. Já disponível no mercado com um portfólio de três referências, branco, tinto e rosé, todos eles sem álcool, nascidos para posicionar a mais recente marca do portfólio da JMF num mercado que poderá atingir, até 2027, à escala mundial, os 9.260 milhões de euros, segundo um estudo da Fact.Mr.

VINHOS TEXTO Bruno Farias FOTOS D.R.

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O

consumo de vinho sem álcool será uma das principais tendências nos próximos anos, segundo um estudo da Fact.MR, que antecipa que este mercado atinja os 9.260 milhões de euros, em 2027. Entre 2a019 e 2027, a consultora prevê que o sector registe uma taxa de crescimento anual de 7%, impulsionado pelos novos hábitos de consumo. A Europa representou mais de 40% da procura total do mercado de vinho sem álcool, em 2018, mas a América do Norte será a região mais importante do mundo no período em análise, com uma taxa de crescimento de mais de 8%. “Durante a última década, a quota

de mercado do vinho sem álcool cresceu significativamente, com a preferência crescente das bebidas com baixo teor alcoólico”, diz a Fact.MR, que relembra que os fabricantes estão a rever as suas estratégias, focando-se em bebidas com baixo conteúdo alcoólico e sem álcool para aumentar as margens. E é a pensar em acompanhar as mais recentes tendências de mercado que a José Maria da Fonseca (JMF) apresenta ao mercado a marca O%riginal, numa renovada demonstração do pioneirismo com que o produtor de Azeitão sempre encarou o dinâmico mercado do vinho, ou não tivesse arriscado, há 11 anos, no lançamento do Lancers Free, uma primeira abordagem ao mundo do vinho


sem álcool. produto está reconhecido pelas entidades Anos volvidos, o contexto é, necessarianacionais e também internacionais como mente, outro, com a O%riginal a ser uma ‘Vinho sem Álcool’ e trata-se de um vinho marca “desenhada para utilizar códigos que foi vinificado exatamente da mesma de comunicação próprios do mundo dos forma que qualquer outro vinho, mas que vinhos, reforçando o posicionamento que passou por um processo físico de desalcooeste produto é realmente um vinho que foi lização, mantendo características de aroma desalcoolizado e tem, por isso, caracteríse sabor semelhantes à versão com álcool. ticas de aroma e sabor típicos dos vinhos Nesse sentido, parece-nos totalmente legíticom álcool. Nesse sentido, passamos a mo que este produto seja classificado como comunicar nesta marca tanto o ano de ‘Vinho sem Álcool’”, reforça António Maria colheita como a casta utilizada na vinifiSoares Franco. cação”, introduz António Maria Soares Syrah no tinto e rosé e Moscatel Galego Franco, administrador com o pelouro do nos brancos. Castas escolhidas a pensar marketing e comercial da José Maria da no resultado final do produto, quer em Fonseca. termos de aroma quer de sabor, que a Uma marca pensada e dirigida a todos marca acredita que “terá grande aceitação os enófilos que gostam de vinho, mas pelos consumidores”, com o processo de que, pelas mais variadas razões, preferem desalcoolização a poder ser aplicado a optar por uma bebida não alcoólica, com qualquer casta, sendo, a partir daí, uma a JMF a alargar, assim, a resposta a cada decisão puramente estratégica a sua vez mais situações de consumo. colocação no mercado. A O%riginal tem por base o mesmo proPelas suas características, a gama O%ricesso tecnológico do Lancers Free, mas o ginal proporciona uma melhor experiênpassar dos anos trouxe consigo a aprencia de consumo quando servido mais dizagem de melhoria do processo, de fresco. “Tal como existem vinhos tintos e forma a aproximar o produto final, o mais brancos que podem ter recomendações de possível, à versão com álcool. Razão pela serviço a temperaturas mais elevadas ou qual ostenta, inequívocamente, a chanmais baixas”, detalha o administrador da Preserve 1 de 02/05/2020JMF, 17:00 cela deAnuncio_210x149mm_AF.pdf vinho sem álcool. “Este tipo que antecipa que o alargamento da

gama, num futuro a médio/longo prazo, “é uma possibilidade, mas para já nada está planeado”. Com o potencial reconhecido a esta categoria, a JMF dá um passo concreto neste universo apesar da oportunidade de crescimento ser imprevisível, devido ao facto de ainda ser pouco trabalhado e explorado. “Olhando para a categoria de cervejas sem álcool, que valem cerca de 5% do mercado, acreditamos que o vinho sem álcool também poderá ter um comportamento semelhante”, acrescenta António Maria Soares Franco. Um lançamento feito a pensar no mercado interno, assim como nos mercados de exportação, tendo em conta a vocação exportadora da companhia que alarga, assim, o potencial de consumo dos seus vinhos a um maior número de ocasiões.

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VINHOS

TEXTO Bruno Farias FOTOS D.R.

Kranemann Wine Estates: projeto de paixão Pode parecer um cliché já demasiado gasto e, com isso, tornar-se vulgarmente recorrente, mas falar da Kranemann Wine Estates é falar de paixão. Do seu investidor e acionista, Christoph Kranemann, e do seu enólogo, Diogo Lopes, que encontrou numa das mais antigas quintas do Douro o cenário idilíco para expressar, a cada garrafa, um Douro distinto, um pouco irreverente, não apenas nos vinhos DOC, mas, de igual modo, nos vinhos do Porto.

A

ncorado na Quinta do Covento de São Pedro das Águias, na região do Vale do Távora, este foi o palco que seduziu, em primeira instância, o mentor do projeto, Christoph Kranemann. Viajado enófilo,

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tem palmilhado diferentes destinos mundiais de modo a conhecer, por perto, as mais distintas regiões vitivinícolas. Com o matrimónio com uma portuguesa, com o mesmo veio a descoberta mais aprofundada do país e da sua produção vínica. E o charme do Douro funcionou, uma vez mais, para que um estrangeiro quisesse ficar por cá. Para trás, ficou um possível investimento numa adega na Austrália. À beleza única da propriedade, onde


o expoente máximo é o seu convento datado do século XII, e com potencial para ser explorado numa vertente turística, junta-se o terroir único, onde se destaca a altitude, coadjuvado por uma adega moderna pronta a ser devidamente explorada e um vasto portfólio de vinhos do Douro e do Porto. Todos eles a funcionarem como critérios de razoabilidade para uma decisão de foro financeiro. “Para quem gosta de vinhos, arquitetura, história e geologia, como é o caso do Christoph Kranemann, a Quinta do Convento foi amor à primeira vista. Só aqui podia nascer a Kranemann Wine Estates”, introduz Diogo Lopes, enólogo do projeto. E se para o investidor está descortinado o porquê do enamoramento e da decisão tomada, no caso do enólogo, conhecido pela sua ligação a outros projetos vinícolas, como são exemplo a AdegaMãe (Lisboa) e a Herdade Grande (Alentejo), o que é que este projeto encerra de distinto e mobilizador ao ponto de ter aceite o desafio? “O desafio é essencialmente a herança de uma forte tradição de qualidade e exigência, não apenas nesta região fantástica que é o Douro, mas, em particular, neste projeto que é a Kranemann Wine Estates, ancorado numa das mais antigas quintas da região, a Quinta do Convento de São Pedro das Águias. Sempre tive o sonho de trabalhar no Douro e a Kranemann trouxe esta oportunidade, para mais num terroir muito particular, no Vale do Távora, que nos permite expressar um Douro diferente, distinto, não apenas nos vinhos DOC, mas, igualmente, nos vinhos do Porto. O desafio é cumprir esta oportunidade”. Introduções feitas, é altura de perceber os objetivos a atingir e o posicionamento da marca, não só no competitivo mundo do vinho, como na região onde se insere, onde tantas, e boas, marcas há muito se afirmaram como embaixadores ativos do país vinhateiro. Também aqui, a fazer fé pelas palavras de Diogo Lopes, não há grande espaço sobre o que a equipa da Kranemann almeja atingir. “Os objetivos e o posicionamento são muito claros. A Kranemann Wine Estates será um nome de referência do Douro se cumprir o desígnio de se assumir como uma bandeira dessa micro-região tão particular que é o Vale do Távora. Queremos honrar muito aquele terroir e expressá-lo através de vinhos únicos, diferenciadores, que respeitem o mercado acrescentando qualidade. Todo o projeto, desde o vinho ao enoturismo, vai concorrer para este objetivo”, acrescenta. Uma etapa de cada vez, naturalmente, mas com as novidades que este jovem projeto tem vindo a apresentar ao mercado, o seu percurso de construção está bem ativo. Com lançamentos devidamente programados, caso do Quinta do Convento

Branco 2018, ou inusitados, como é exemplo o Quinta do Convento 1999. Assim mesmo, sem gralha de escrita, um néctar branco datado, ainda, do século passado e que ajudou a “fazer-falar” da marca e do produtor duriense. “O Quinta do Convento 1999 foi uma espécie de tesouro que nos surgiu em plenas catacumbas do convento. Descobrimos esse branco fantástico quando estávamos em fase de inventário, depois provámos e percebemos que era um vinho imperdível, com uma evolução fantástica. Não fizemos mais do que engarrafá-lo e, com a Wine Concept, nosso parceiro de distribuição nacional, e os nossos parceiros internacionais, colocá-lo disponível no mercado. São apenas duas mil garrafas, mas têm que chegar aos consumidores: cada copo deste vinho será um grande embaixador do projeto, da marca Quinta do Convento, do terroir e exemplo do potencial de evolução que temos. É um vinho antigo que nos mostra o que pode ser o futuro. Adicionalmente, sim, ficámos também muito surpreendidos com os Porto que encontrámos, inclusivamente alguns Porto brancos, que nos permitirão mais umas surpresas futuras”, antecipa Diogo Lopes.

Uma descoberta feliz dirão alguns, e com razão, mas que ajuda a levantar a questão do porquê de, em Portugal, não se ter o hábito de guardar vinhos brancos, como tantas vezes se faz com os tintos, na expectativa de encontrar a etapa de evolução para poderem ser degustados na sua máxima expressão. Sobretudo, se tiver em linha de conta que não é por falta de propostas de valor, das mais diferentes regiões, que poderiam ser sujeitas a essa consideração e descoberta. “E não têm que ser necessariamente vinhos caros. Mas a perceção está a mudar, porque existe cada vez mais educação e conhecimento em torno da vinha e do vinho. O ‘vinho’ já não é apenas o ‘tinto’”, garante o enólogo da Kranemann Wine Estates.

Marca

Mas apesar desse feliz acontecimento, o percurso comercial da marca encontra-se perfeitamente definido. Não só porque a produção a si associada é escassa, como pelo facto de serem vinhos distintos. Sobretudo, quando colocado em analogia com o futuro Quinta do Convento Reserva Branco 2018, que será disponibilizado em breve no mercado e vem reforçar a oferta da marca nas franjas mais altas. Solo? Altitude? Vinhas? Mas, afinal, o que é que torna os brancos da Kranemann tão minerais, com frescura e acidez

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Leão da Rodésia inspira design português premiado internacionalmente A imagem do vinho Hasso, um DOC Douro do produtor Kranemann Wine Estates, sediado no Vale do Távora, arrecadou um Trophy, prémio máximo do The Wine Design Challenge 2020, para a categoria “new design of a Wine Brand”, na competição organizada pela revista inglesa Drinks International. A marca Hasso representa os vinhos jovens, frescos e gastronómicos deste projeto ancorado na Quinta do Convento de São Pedro das Águias. E nasce inspirada no fiel companheiro da família Kranemann, o Hasso, um Leão da Rodésia descontraído, divertido, fiel companheiro do dia-a-dia. A afirmação de um design “clean” e moderno, numa proposta descomplicada e divertida, são, precisamente, argumentos destacados pelo júri do concurso, que definiu este rótulo como “uma grande entrada” à competição. A criação da marca e rótulos Hasso tem assinatura do estúdio de design FBA – Ferrand, Bicker e Associados, sediado em Coimbra e responsável pela identidade visual de marcas da Kranemann Wine Estates. Para além da distinção à imagem do Hasso, foram ainda premiados os rótulos de dois vinhos do Porto das marcas Kranemann (Medalha de Prata na categoria “New Design for a Fortified Wine Brand”) e Senhora do Convento (Medalha de Bronze na categoria “Repackaged Fortified Wine Brand”), todas do portfólio Kranemann Wine Estates.

significativas? É apenas uma questão de terroir? É também uma aposta da enologia trabalhar vinhos com este perfil? Diogo Lopes simplifica a questão ao defender que os vinhos devem ser a expressão do terroir de onde nascem. E para essa visão, o Vale do Távora proporciona algo, segundo o enólogo, de diferenciador e genuíno, sendo tarefa da enologia potenciar esses mesmos atributos. “Costumamos dizer que estes são os vinhos mais fáceis de fazer, porque se impõem de uma forma muito natural”, recorda. E o fortuito lançamento do Quinta do Convento 1999 veio trazer, ainda mais, argumentos àqueles que defendem o potencial nacional para a produção de vinhos diferenciadores. Graças à originalidade e variedade das castas brancas portuguesas, devidamente orquestradas com diferentes regiões, desde os Açores a toda a costa atlântica continental, ou a alguns micro-climas interiores e de altitude. O que leva Diogo Lopes a afirmar que “Portugal é hoje, seguramente, um dos países com mais potencial a nível de brancos no mundo”. E se, de modo geral, os vinhos portugueses se encontram a granjear prestígio crescente nos mercados internacionais, o enólogo considera que os vinhos brancos nacionais poderão ajudar a subir ainda mais degraus nessa afirmação.

Portfólio

Mas a Kranemann não quer ficar refém de um único produto, de um lançamento oportuno ou feliz, seja ele um branco com mais de 20 anos, ou os tradicionais vinhos do Porto, capítulo no qual a Quin-

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ta do Convento de São Pedro das Águias tem uma forte tradição. A ambição, assim como as condições de produção, é para disponibilizar uma gama completa de produtos, devidamente distribuída entre tintos e brancos DOC Douro. Mas devido à tradição da região, e sem constituir exceção, também a Kranemann vê com bons olhos a comercialização de vinho do Porto, juntando-se à habitual doçura destes vinhos um interessante equilíbrio entre frescura e acidez. “Os nossos Tawny, colocados recentemente no mercado, são exemplo disso mesmo, despertando críticas extraordinárias. Sabemos que o mercado de Porto, em particular, é altamente competitivo, preenchido por ‘players’ e marcas de grande experiência, mas vamos definir o nosso espaço graças à qualidade que temos nas nossas caves e que lhes continuaremos a acrescentar.

Quanto a novidades, temos que destacar, sem dúvida, a declaração de 2018 como o nosso primeiro Porto Vintage. Neste anos, apenas algumas casas do Douro tiveram este reconhecimento”, relembra Diogo Lopes. Reconhecimento que se estende, igualmente, ao Kranemann Tawny 20 Anos que tem recebido excelentes notas dos provadores nos diferentes “tastings” onde tem marcado presença. “Esse vinho, em particular, o Kranemann Tawny 20 anos, resume de forma muito feliz os atributos mais diferenciadores do nosso terroir. É um vinho singular que tem colhido elogios extraordinários, outro grande embaixador da nossa marca”. Oferta que será reforçada a curto prazo, com os lançamentos previstos a chegarem ao mercado independentemente dos constrangimentos conhecidos, fruto também das parcerias de venda online (é uma das marcas, por exemplo, vendidas no Adegga, em destaque nesta edição). O exercício de 2020 fica marcado pela chegada ao mercado do Hasso Tinto, que vem fechar a oferta da marca em termos da gama de entrada, a que se juntam os já referidos Reserva Branco e Vintage 2018. Referências que vão ajudar a construir o percurso deste projeto nascido da paixão.


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“A evolução digital na indústria do vinho foi maior nas últimas seis semanas do que nos últimos 10 anos” VINHOS

TEXTO Carina Rodrigues FOTOS D.R.

Os lançamentos são feitos online. Do mesmo modo que se promovem brindes, provas e harmonizações. Já para não falar de vendas, que em período de confinamento têm crescido através deste canal. É um facto: o sector do vinho não ficou de fora da onda digital, que tem permitido, de certo modo, ainda que muito relativamente, mitigar os nefastos efeitos nas vendas causados pela crise gerada pela pandemia de Covid-19. Com as adegas repletas e as próximas vindimas já no horizonte, os produtores vitivinícolas e as garrafeiras têm-se socorrido do canal online para atenuar os prejuízos derivados das quebras na exportação e do encerramento do canal Horeca. Comprar vinho sem sair de casa tornou-se num hábito em 2020, confirmando a assertividade de projetos como o Adegga Wine Market, pioneiro no sector e que, desde 2006, ajuda o consumidor a descobrir novos produtores e novos vinhos através da Internet.

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Em 2006, durante umas férias em Londres, li um livro do editor chefe da revista ‘Wired’ que descrevia o fenómeno da ‘cauda longa’. O livro, que se tornou num dos mais influentes de sempre sobre os negócios da Internet, mostra, usando o mundo dos filmes, dos livros e da música, que a Internet deu origem a um novo universo, no qual a receita total de diversos produtos de nicho, com baixo volume de vendas, é igual à receita total de poucos produtos de grande sucesso. O mundo do vinho é, em muitas coisas, semelhante ao dos filmes, dos livros ou da música e foi dessa constatação que surgiram os primeiros esboços do que é hoje o projeto Adegga”, conta o fundador, André Ribeirinho. E foi assim que, nesse mesmo ano, surgia a plataforma que, desde então, tem ajudado o consumidor a descobrir novos produtores e novos vinhos, através da Internet. Ao longo de 15 anos, o Adegga criou uma das primeiras redes sociais de vinho no mundo, apoiado numa série de eventos inovadores, na tecnologia que está na base do “copo de vinho inteligente” e num mercado de vinhos online. Em suma, um conjunto de iniciativas que vieram responder às necessidades e exigências crescentes, tanto de produtores como de consumidores, ajudando a digitalizar um dos mais tradicionais sectores do agroalimentar nacional. “O Adegga tornou o mundo do vinho mais próximo e acessível e isso deixa-nos muitos satisfeitos”, sublinha André Ribeirinho, explicando que o Adegga é uma plataforma que responde à necessidade dos consumidores ao nível da informação e da compra, que é potenciada de forma fácil e cómoda, assim como de interação com os produtores, que é proporcionada de forma simples e, de alguma maneira, informal – “embora sempre profissional” - através de canais digitais e atuais. “O negócio do vinho não é diferente de outros, no sentido em que se alicerça na resposta a necessidades dos consumidores, pelo que, também neste sector, é importante acompanhar tendências de consumo e procurar dar-lhes resposta de forma inovadora e diferenciada”.

Experiência Adegga

Hoje, o Adegga MarketPlace conta com mais de 100 lojas de produtores, que disponibilizam mais de 700 vinhos de todos os estilos e de todas as regiões de vinhos do país, incluindo as ilhas dos Açores e da Madeira. O objetivo é apresentar ao consumidor uma seleção alargada dos melhores vinhos e produtores nacionais e nesse sentido, garante André Ribeirinho, existe o interesse por parte da plataforma em trabalhar com todos os produtores nacionais que cumpram estes critérios

de qualidade. Para os produtores, o Adegga MarketPlace é uma forma rápida de poderem passar a vender online através de uma loja tecnologicamente avançada e com uma audiência de clientes relevante e fidelizada. Os preços, as descrições e o posicionamento das lojas dos produtores no Adegga MarketPlace são determinados pelos próprios produtores e, para os que já detêm lojas online, funciona como canal de vendas adicional, que lhes dá acesso a uma audiência qualificada de novos consumidores de vinhos e à plataforma tecnológica de marketing e comércio digital. Já para os consumidores, o Adegga apresenta guias, eventos e um market-place para facilitar a descoberta, prova e compra dos melhores vinhos dos produtores nacionais. “A experiência do Adegga WineMarket mostra-nos que, num contexto de conforto, descontração e perante uma proposta de qualidade, os consumidores não só estão interessados em conhecer novos vinhos, como em adquiri-los e, posteriormente, em continuar a acompanhar as novidades das marcas e produtores com que contactam”. No panorama internacional, os vinhos portugueses não são ainda dos mais conhecidos, mas são muito respeitados e a sua qualidade e as características únicas têm ajudado a ganhar adeptos em todo o mundo. Ao mesmo tempo, uma enorme rede de embaixadores de vinho português constituída por produtores, importadores, lojistas, sommeliers e críticos tem feito um trabalho notável na promoção dos vinhos nacionais. “Os eventos Adegga surgiram como resposta a esse elevado nível de interesse internacional e, na última década, o Adegga organizou o Adegga WineMarket em Bruxelas, Berlim e Estocolmo, com enorme sucesso de visitantes e vendas”. Para já, face à situação de crise sanitária, os eventos previstos para este ano foram alvo de um reagendamento. “O evento Adegga WineMarket do Porto, que estava previsto para maio, acontecerá em outubro e o Adegga Festival - o festival de verão - será este ano organizado numa versão inovadora com provas presenciais e muitas novidades virtuais. O Adegga WineMarket de Lisboa está planeado para novembro. Estamos, naturalmente, a acompanhar o desenvolvimento da situação de pandemia e apenas iremos organizar os eventos Adegga, em Portugal, se estiverem reunidas as condições de segurança para que produtores e consumidores possam usufruir deles em pleno”. Com a conveniência e conforto associados ao canal do e-commerce, as restrições impostas pela Covid-19 vieram, de alguma forma, incentivar a experimentação do online, o que está a trazer muitos novos consumidores para o canal digital. Muitos destes consumidores, acredita André Ribeirinho, irão naturalmente passar a fazer as suas compras de vinho dessa forma. “A evolução digital na indústria do vinho foi maior nas últimas seis semanas do que nos últimos 10 anos. Quando bem implementados, os canais online de venda ao consumidor final são uma ferramenta poderosa para estabelecer relações e reforçar a comunicação. Foi a necessidade que levou muitos produtores a criarem lojas online e, seguindo o que aconteceu em quase todas as áreas de consumo, não estou surpreendido que tenha finalmente chegado ao vinho”, conclui.

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OPINIÃO

FLÁVIO GUERREIRO Country Manager da LPR Portugal

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A ADAPTABILIDADE DA SUPPLY CHAIN Que vivemos momentos de turbulência, incerteza e complexidade é algo adquirido e do conhecimento de todos. No entanto, é simultaneamente nestes momentos – mais que nunca – que a capacidade de adaptação, reação e flexibilidade se revelam cruciais e frequentemente distintivas face à concorrência e mercado em geral. A área de Supply Chain tem sido uma das mais afetadas no cenário atual, pois, independentemente da origem, destino ou tipologia das matérias ou produtos, uma coisa é certa, o seu abastecimento ao ponto de destino não pode falhar. E quando falamos de bens alimentares ou relacionados com a saúde, existe pouca ou nenhuma margem de falha. A capacidade de assegurar os níveis de stock, produção e distribuição, nos momentos de pico da procura, sobretudo quando estes mesmos picos são de difícil previsão e altamente inconstantes, torna-se uma tarefa extremamente difícil e, muitas vezes, quase impossível de alcançar. Aos profissionais de Supply Chain exige-se não só o assegurar dos níveis de serviço, mas, simultaneamente, a otimização dos custos de toda a cadeia, quando frequentemente estas duas variáveis seguem caminhos teoricamente distintos. Um claro exemplo atual deste paradigma é o crescimento exponencial – para além do normal e esperado – do comércio online, que somado ao açambarcamento generalizado registado no retalho físico, aquando do início da pandemia em Portugal, veio, de forma clara e inequívoca, pôr a nu toda a fragilidade da rede e modus operandis atual, como é o exemplo dos prazos de entrega das encomendas online, que, nalguns retalhistas, chegou a três a quatro semanas!?! Algo impensável e aceitável num passado muito recente. Como em qualquer ecossistema vivo e inteligente, esta “nova” realidade veio moldar ou mesmo reinventar o ADN de algumas empresas, as quais conseguiram, por um lado, claramente identificar as suas prioridades, como também vislumbrar oportunidades de negócio e assegurar a capacidade de satisfazer e fidelizar os seus clientes. Neste aspeto, o retalho tem vindo a assumir um papel central no combate à Covid-19, assegurando – entre outros apestos – que, apesar dos momentos difíceis e de confinamento que vivemos, teremos à nossa disposição os bens de que necessitamos, de forma a não possuirmos constrangimentos e preocupações diárias adicionais. Algo que, na fase inicial, na ótica da esmagadora maioria dos consumidores, não seria uma realidade garantida. Nesta perspe-

tiva, assistimos, por parte destas empresas, a uma série de medidas, como a flexibilização de horários de funcionamento; horários específicos de atendimento para determinados grupos de clientes; reforço de toda a sua estrutura online e de distribuição, de forma a responder ao aumento exponencial da procura online; criação de novos serviços, como o de refeições take-away com entrega ao domicílio, cabazes específicos de produtos (alimentares, higiene e limpeza) com prazos de entrega mais curtos, nomeadamente entre dois a cinco dias; políticas de comunicação reforçadas e dirigidas; políticas colaborativas mais efetivas que nunca (sobretudo, na área dos transportes, atendendo à elevada procura online, visando não só assegurar os volumes tradicionais dos seus clientes habituais, como também o de todos os novos clientes que, de uma forma ou de outra, se viram “obrigados” a efetuar as suas compras desta forma, em grande medida absorvendo uma parte substancial do volume do canal Horeca, entretanto moribundo); entre outras medidas, permitindo, de uma forma global, mitigar o risco de negócio no imediato e potenciar o mesmo para o futuro.


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“Queremos vir a ser parte da recuperação. Quando chegar esse momento” ENTREVISTA TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Sara Matos

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Para a memória de todos ficará a mudança sísmica nos hábitos de compra trazida pela pandemia da Covid-19 e a sua transferência do offline para o online, com as inerentes dificuldades em termos de capacidade de resposta. O que a crise pandémica veio demonstrar é que, mais do que nunca, as cadeias de abastecimento terão de ter uma eficiência à prova de imponderáveis, mas sem que, com isso, deixem de ser sustentáveis. É que os compradores estão cada vez mais conscientes do impacto ambiental dos produtos, embalagens e serviços que compram e utilizam, pelo que, mais do que uma tendência, a sustentabilidade é um requisito com que as cadeias de valor se comprometem, com projetos próprios e medidas de autorregulação. A GS1 Portugal tem acompanhado este compromisso e contribuído para a eficiência de todas as operações, com um sistema que, segundo o diretor executivo, João de Castro Guimarães, é um “enabler” da sustentabilidade.

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rande Consumo - Qual a ligação da GS1, enquanto especialista em cadeias de valor, à sustentabilidade? João de Castro Guimarães - Na qualidade de entidade parceira de confiança do tecido empresarial português e das demais organizações, a GS1 Portugal acompanha este compromisso e prevê a sustentabilidade enquanto uma das linhas orientadoras do seu Plano Estratégico para o triénio 20192021, sendo transversal a todos os projetos e iniciativas da organização. O nosso sistema de standards é um “enabler” da sustentabilidade, na medida em que potencia a eficiência dos processos ao longo de toda a cadeia de valor. De forma tangível, e no que nos diz diretamente respeito, instalámos painéis fotovoltaicos na nossa sede, em 2019. A autossuficiência energética não é um objetivo, mas a solução instalada tem permitido, em média, que 20% da energia elétrica consumida seja produzida por esta central solar fotovoltaica. De um modo mais abrangente, mas ainda no domínio da sustentabilidade, a GS1 Portugal representa, desde 2019, um novo projeto que visa a promoção da sustenta-

bilidade pela redução de emissões de dióxido de carbono nas operações logísticas das organizações, o projeto Lean & Green. Esta iniciativa, concebida por um parceiro empresarial localizado na Holanda, está presente em 12 países e conta com mais de 600 empresas participantes, entre algumas das maiores multinacionais. Trata-se da maior plataforma europeia de colaboração com vista à redução de emissões de CO2 associadas a operações logísticas. Na prática, incentiva as organizações a alcançar um nível de sustentabilidade mais elevado pela redução de emissões de CO2, assente na adoção de medidas que permitam a redução do impacto ambiental, assim como a diminuição de custos. O registo dos progressos registados e das metas atingidas, com base num cronograma de implementação, traduz-se na atribuição de estrelas Lean & Green que as empresas e entidades participantes podem utilizar na respetiva comunicação. A avaliação do progresso é da responsabilidade de entidades independentes: três auditoras de reconhecida credibilidade. A este projeto aderiram já várias empresas, de dimensão variável, nacionais e internacionais, a operar em vários sectores que, através do mesmo, têm acesso às boas práticas implementadas noutros mercados. GC - Em termos práticos, como é que as soluções da GS1 ajudam a criar um mundo mais ligado à sustentabilidade? Como geram eficiências nos diversos sectores em que atuam? JCG - Quando os operadores aplicam um código GTIN (Global Trade Item Number) aos seus produtos e uma etiqueta logística GS1-128, por exemplo, em ativos tais como paletes, caixas e outras unidades logísticas, consegue-se ter visibilidade e garantir a rastreabilidade de todo o circuito, do produtor ao centro de distribuição ou armazém do retalhis-

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ta. Trata-se de um exemplo prático de como os standards GS1 permitem a articulação harmoniosa, eficiente e sinérgica dos vários elos das cadeias de valor, permitindo as melhores práticas de identificação, captura e partilha de dados. Este sistema de standards corresponde a uma “linguagem global dos negócios” com base na qual as cadeias de valor se tornam mais eficientes e mais colaborativas, oferecendo formas comuns de medir, descrever ou classificar produtos ou serviços. Os standards uniformizam e normalizam a complexidade das trocas entre as empresas e organizações. Os standards GS1 são utilizados, no mercado global, há 40 anos e, em Portugal, há 34. Essa uniformização faz-se com recurso ao histórico código de barras, que introduzimos em Portugal, mas também com a capacitação de todos os operadores nas várias cadeias de valor para o comércio eletrónico, através de serviços como o Validata, o nosso serviço de captação de dados de produto, e de plataformas tecnológicas de disponibilização desses dados, como a nossa plataforma SyncPT. GC - Como é que a GS1 apoia as marcas na sua resposta às exigências acrescidas de transparência e envolvimento dos consumidores de hoje? JCG - Os sistemas de rastreabilidade alimentar são elementos chave para a manutenção da qualidade e segurança ao longo de toda a cadeia de valor. Por exemplo, sendo detetada uma inconformidade ou um problema de qualidade, os standards GS1 permitem chegar à origem do problema ou da fraude, identificando a localização do produto, ao detalhe da localização num determinado armazém, palete e unidade, o que se revela determinante numa situação de necessidade de retirar um produto do mercado. No sector da saúde, um sector estratégico para a

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GS1 Portugal, os nossos standards globais podem também dar um importante contributo para a prossecução da salvaguarda da qualidade dos cuidados de saúde por via da segurança, assim como para a sustentabilidade dos sistemas de saúde, por via de ganhos de eficiência. Um estudo liderado pelo professor Augusto Mateus, em 2014, destacava precisamente isso. A implementação destes princípios na Unidade de Cascais do Grupo Lusíadas Saúde, em 2016, permitiu a constatação de ganhos substanciais. Foi possível concluir que a adoção de codificadores únicos no circuito do medicamento, em contexto hospitalar, permitiu uma redução de 28% no tempo médio por utente gasto na administração de medicamentos pela equipa de enfermagem. Com base nestes valores, a nível individual, cada enfermeiro, por turno de oito horas, passou a dispor de mais 22 minutos e meio para a prestação de outros cuidados de saúde e dedicação ao utente. Isto significa que, em termos gerais, para além do impacto na sustentabilidade do sistema, estas medidas têm também um impacto na qualidade do serviço prestado pelos profissionais de saúde, libertando-os de procedimentos administrativos, criando mais disponibilidade para a prestação de cuidados assistenciais e para o relacionamento com o doente. Este projeto piloto foi citado pelo estudo “Connected HeathCare: Análise de Impacto”, publicado em 2019, uma iniciativa da COTEC no âmbito da implementação das medidas da Estratégia Nacional para a Digitalização da Economia – Programa Indústria 4.0, no âmbito de uma parceria com o Ministério da Economia. Um outro instrumento de apoio às empresas e operadores económicos na sua resposta às exigências de transparência do consumidor são os nossos serviços de consultoria materializados nos nossos Estudos de Níveis de Serviço, que designamos por Estudos de Benchmarking. GC - Há alguma solução internacional que a GS1


Portugal irá implementar a curto prazo? JCG - Sim, vamos implementar, até final de 2020, uma solução internacional com um impacto determinante na garantia da qualidade de dados. Em 2019, a GS1 Portugal contribuiu decisivamente para projetos estratégicos da GS1 a nível global, de suporte à transformação digital das empresas e da economia e que preveem soluções para confirmar a identidade, a rastreabilidade e a gestão da qualidade de dados. Essas soluções passam pela implementação de uma plataforma global integrada que permita criar, armazenar e verificar chaves de identificação (GCP, GLN e GTIN), bem como estruturar dados. Destas soluções, a saber, respetivamente, Registry Platform, Activate, Verified by GS1 e Global Data Model, muito se ouvirá falar em 2020, uma vez que a GS1 Portugal foi convidada a integrar a segunda vaga de países participantes na sua implementação. No que à Registry Platform se refere, trata-se de uma plataforma de dados global para chaves GS1, uma infraestrutura que permite o armazenamento e o acesso a dados disponibilizados por “brand owners” através das organizações-membro da GS1, para fins de validação, controlo de contrafação ou falsificação de produtos. Esta plataforma define as regras associadas ao armazenamento e acesso a dados, serviços e soluções para responder a necessidades de negócio dos associados. GC - Diversas marcas ligadas ao mundo da moda, como H&M e Nike, mas também ligadas ao alimentar, como a Walmart e a Nestlé, consideram a criação de uma etiqueta que divulga o impacto ambiental dos produtos. Qual poderia ser o papel da GS1 neste processo? JCG - A GS1 Portugal estará sempre disponível para ser um parceiro da comunidade empresarial em temas relativos à eficiência e competitividade na cadeia de valor, a partir de uma posição neutra. A nossa área “core” – o nosso sistema de standards -, permitindo a rastreabilidade do produto até à origem, aplica-se já noutros sectores, permitindo aferir se determinada peça de mobiliário ou solução de pavimento é produzida com matéria-prima originária de florestas protegidas, por exemplo. Por maioria de razão, os mesmos princípios de rastreabilidade e visibilidade da cadeia de valor poderiam aplicar-se a outro tipo de codificação que incidisse sobre o impacto ambiental de produtos. GC - Qual a importância, do ponto de

vista ambiental, da adoção de métodos que permitam a rastreabilidade de produtos ou serviços? JCG - A adoção de métodos que permitam a rastreabilidade de produtos ou serviços, do ponto de vista ambiental, é da maior importância. Não só responde a uma tendência manifestada pelos consumidores, como também aos imperativos de eficiência das empresas e organizações. É uma garantia de qualidade e segurança ao longo de toda a cadeia de valor, assegura a respetiva visibilidade e interoperabilidade. A rastreabilidade permite perceber, por exemplo, a origem dos produtos e serviços, bem como os procedimentos inerentes ao processo de produção e distribuição. GC - Que novos desafios enfrenta o sector de codificação e marcação no novo contexto de mercado digital? JCG - Estamos no limiar de uma nova era. O final do primeiro trimestre de 2020 fica marcado pela imperativa necessidade de se fazer face, mundialmente, à maior pandemia dos últimos 70 anos. Em Portugal, foram adotadas medidas excecionais para diminuir drasticamente o potencial de contágio, foi recomendado isolamento social e decretado estado de emergência e preparado, pelo Governo, um plano de operacionalização. É incontornável um impacto na economia sem precedentes. Esse será,

imperativa e que a sincronização de dados para uma eficiente gestão da procura era determinante. Era evidente a importância da dimensão experiencial, com os Millennials a constituir a maioria dos consumidores de hoje. Cada vez mais retalhistas procuravam transformar as compras numa experiência envolvente e as nossas soluções são - e deverão continuar a ser - um contributo determinante nesse sentido. Não obstante os desafios que a recuperação económica e social colocará, a personalização da inteligência artificial e machine learning será parte da solução. Dados de qualidade, trabalhados com algoritmos sofisticados, têm um potencial inimaginável. A otimização de todos estes contributos depende, em larga medida, de uma “supply chain” mais eficiente. Novas tecnologias, incluindo pickers robôs, dispositivos RFID, tecnologias blockchain e qualquer outra tecnologia que possa tornar a “supply chain” mais eficiente, com base em dados, poderá ter um efeito catalisador e transformacional. Em todos estes aspetos temos uma palavra a dizer, podemos acrescentar valor e demonstrámos que somos um parceiro a ter em consideração. Queremos vir a ser parte dessa recuperação. Quando chegar esse momento. Até lá, servimos os nossos associados e a comunidade portuguesa em geral, como sempre servimos.

“A adoção de métodos que permitam a rastreabilidade de produtos ou serviços, do ponto de vista ambiental, é da maior importância. Não só responde a uma tendência manifestada pelos consumidores, como também aos imperativos de eficiência das empresas e organizações. É uma garantia de qualidade e segurança ao longo de toda a cadeia de valor” certamente, o maior de todos os desafios para o sector da codificação e para todos os outros. Fica cada vez mais claro o papel inexorável da transformação digital e do e-commerce. A GS1 Portugal tinha percebido, há bastante tempo, que a omnicanalidade do retalho se tornara a norma, que a presença física e online dos retalhistas se tinha tornado

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Grande Consumo


OPINIÃO

LUÍS PEDRO Managing Director Logistics da Torrestir

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COVID-19 E OS DESAFIOS DA LOGÍSTICA A humanidade evoluiu, nos últimos 40 anos, centenas de vezes mais, senão milhares, do que em toda a sua história, mas a realidade é que, perante um cenário de pandemia várias vezes vivido no passado, ficámos condicionados como então. Enfrentamos, hoje, desafios sem precedentes em mais de um século e, pelo que se assiste diariamente, não estávamos totalmente preparados para este cenário global. O sentimento de incerteza e insegurança que, enquanto indivíduos, sentimos, neste momento, é o mesmo que sentimos enquanto profissionais e gestores em relação ao futuro da economia e das empresas. Nas últimas semanas, muitas empresas viram-se obrigadas a mudar radicalmente a sua atividade de um dia para ou outro. Em sectores onde é possível, generalizou-se o recurso ao teletrabalho, dividiram-se equipas em turnos diários ou semanais, para evitar contágio generalizado, assegurando a continuidade da atividade. Uma larga maioria das micro e pequenas empresas foi mesmo forçada, por decreto, a fechar portas, condicionando a sua viabilidade futura e o normal funcionamento da sua atividade económica. Por fim, as entidades e empresas ligadas aos sectores da saúde, segurança e satisfação de necessidades básicas da população tiveram de reagir como puderam à incerteza e à ausência de histórico ou planeamento que permita dar a melhor resposta aos desafios que a Covid-19 lhes coloca. Aproveito para deixar uma palavra de apreço aos profissionais de saúde que, de forma heroica, lutam diariamente para salvar vidas. OBRIGADO! A logística, com o papel de garantir a cadeia de abastecimento, é um dos sectores envolvidos na resposta a este desafio e são muitos os que enfrenta. Por um lado, o comportamento errático dos consumidores que, para além da já famosa corrida ao papel higiénico, decidiram, nas duas primeiras semanas de confinamento, transferir os armazéns do retalho e das farmácias para as suas casas, colocando uma pressão à cadeia várias vezes superior aos volumes habituais para a época. Desafiaram-se os colaboradores para várias “milhas extra”, neste período, face às adversidades na capacidade produtiva por verem as equipas reduzidas, em alguns casos, de forma muito significativa, devido ao encerramento das escolas, baixas médicas, licenças de apoio à família ou, mesmo, suspeitas de contágio e, consequente, quarenta de grupos inteiros de colaboradores. Não menos importante, o desafio

de manter as equipas coesas devido a alguma instabilidade emocional que apresentam. Após as já referidas duas primeiras semanas de confinamento, lidar com uma acentuada diminuição no consumo que obrigou, em muitos casos, a uma adequação em baixa da força de trabalho, isto após vários sacrifícios pedidos. Por outro lado, as necessidades das empresas em manterem a sua atividade, tanto quanto possível, fez disparar o e-commerce e o canal B2C, desafiando o sector logístico a encontrar respostas céleres e adequadas nas atividades de handling em armazém, assim como nas redes de distribuição. A Covid-19 poderá ter sido o “trigger” que faltava para o aumento de compras por e-commerce e consistentes alterações de comportamento dos consumidores a este nível, solidificando e dinamizando o crescimento futuro deste segmento. Por fim, e não menos importante, o desafio que todos iremos enfrentar no futuro face ao impacto que esta pandemia terá na economia global. Aproveito para felicitar e agradecer o sentido de responsabilidade social que todos os profissionais da logística assumiram no desempenho das suas funções, neste período tão conturbado da nossa história. Bem hajam!


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OPINIÃO

EDUARDO PINHEIRO ANTUNES City Manager da Acciona

A ECONOMIA DE PARTILHA E A MOBILIDADE URBANA: UMA TEMPESTADE PERFEITA Uma tempestade perfeita é, por norma, um fenómeno meteorológico onde ocorre uma rara combinação de circunstâncias. Ora, no caso da Economia de Partilha, com particular ênfase para a respeitante à mobilidade urbana, esta conjuga necessidades económicas (em larga medida, resultantes da última grande crise financeira) com uma evidente alteração das mentalidades (em especial, nas gerações nascidas entre 1980 e 1995), às quais se soma, mesmo no olho do furacão, a revolução digital. A Internet democratizou-se, passou a ser o cerne de muitos negócios, os consumidores são agora mais sofisticados e procuram uma miríade de plataformas para usufruir de bens e serviços. Ainda que, em muitos casos, o formato físico ainda seja dominante ou relevante para determinadas atividades, o smartphone é cada vez mais a ligação entre o consumidor e o fornecedor. Quando um dia se contar a história económica e social dos anos 10 do século XXI, muitos olhares perplexos vão questionar-se como tanto mudou num período tão curto de tempo. Quais artefactos perdidos na penumbra da memória, por vezes relembramos aquelas notícias que davam conta de plataformas mais ou menos rudimentares onde automobilistas procuravam parceiros de viagem, com os quais partilhariam os gastos da deslocação. Hoje, tudo é mais simples e imediato. Muito se redefiniu no que diz respeito às trocas comerciais. A geração Millennial ascendeu enquanto estrato da sociedade relevante e isso mudou diversos paradigmas no marketing e consumo. Assistiu-se, pois, à ascensão da Economia da Partilha, da qual não podemos dissociar conceitos como sustentabilidade ambiental, económica, social ou energética.

Alternativas de mobilidade

Ao assinar o Pacto de Mobilidade da cidade de Lisboa, a Acciona viu reforçada a sua posição de vanguarda ao nível de uma estratégia de sustentabilidade urbana. Desde logo, porque esta tem que ser a resposta a um problema identificado e que deve ser colmatado. Ou seja, como fazer face a uma mobilidade que se aproxima cada vez mais do caos urbano conflitual à la Blade Runner, mas sem a perspetiva sonhadora e sci-fi dos veículos aéreos? Tal implica uma revolução nos hábitos de todos, em busca de uma forma viável de enfrentar desafios energéticos e urbanísticos que se colocam para as próximas

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décadas. Exemplo mais evidente desta (r)evolução nos hábitos de consumo, as plataformas de carsharing e motosharing permitem que qualquer pessoa aceda a um serviço sem ter que contactar qualquer operacional de uma dessas empresas. Basta aceder à aplicação e criar uma conta que ficará ativa depois de verificada a sua identidade e carta de condução, permitindo-lhe conduzir qualquer um dos veículos que a app tem disponíveis na cidade. Este conceito chegou há alguns anos a Portugal e veio para ficar, fazendo com que mais e mais pessoas repensem a sua necessidade de ter viatura própria dentro dos grandes centros urbanos. As vantagens são várias e toda a cidade ganha com a redução de emissões poluentes, pois na sua generalidade estes veículos são elétricos e a sua energia tem origem renovável, mas também com a redução do congestionamento de tráfego urbano e ocupação de lugares de estacionamento, sendo que estes fatores se veem amplificados no caso de os veículos em partilha serem motos. Crescem as plataformas onde os interessados navegam e pesquisam as soluções mais ao encontro das suas necessidades. Para quê ter o automóvel ou a mota parados à porta de casa 90% do tempo, se pode utilizar um veículo de transporte disponibilizado por um fornecedor, em condições impecáveis e com garantia de sustentabilidade? De que serve pagar uma prestação pelo seu veículo, o seu seguro, manutenção e correspondentes impostos, quando tem ao seu dispor uma deslocação entre dois pontos, por um valor previamente definido, sem demais preocupações que não sejam a escolha do percurso e o estacionamento adequado no final da viagem? Apesar de já terem sido vistos como fruto da crise e da necessidade de encontrar alternativas laborais, a crescente tensão a que se assiste em Lisboa e que visa a diminuição da pegada ecológica resultou que os meios partilhados de transporte sejam agora parte integrante e muito relevante da paisagem das grandes cidades. Mais ainda, tornaram-se fulcrais para qualquer estratégia de mobilidade que assuma objetivos congruentes para uma realidade urbana altamente complexa como aquela em que vivemos.


Espere. E se o fizéssemos assim? Proteja o seu produto com um Packaging Estratégico As nossas melhores ideias resultam do trabalho conjunto com os nossos clientes, a partir da compreensão das suas necessidades e do nosso conhecimento do mercado. Surgem dos workshops e das sessões de intercâmbio de ideias que realizamos. São impulsionadas pelos “E se…” e “Porque não..?”, assim como por um desejo partilhado de criar algo novo e de estarmos preparados para ver as coisas de uma nova perspetiva.

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ENTREVISTA TEXTO Carina Rodrigues FOTOS D.R.

“O mercado português é extremamente orientado para a inovação e para temas de peso 122 como a sustentabilidade” Grande Consumo


A pandemia da Covid-19 obrigou todos os sectores, de um modo geral, a rever os seus mercados principais e os seus modelos operacionais, reavaliando as preferências e comportamento dos consumidores, num momento que é de grande incerteza quanto à economia e ao futuro. O que a pandemia não mudou foi o foco na sustentabilidade. Um estudo do Capgemini Research Institute sobre o mundo pós-Covid confirma que 67% dos inquiridos serão mais cautelosos sobre a escassez dos recursos naturais e 65% terá mais consciência sobre o impacto do seu consumo, uma vez terminada esta fase epidémica. Numa altura em que todos pensam em como acelerar a recuperação económica após a crise económica, a prática de políticas de gestão orientadas para o desenvolvimento sustentável poderá ser um ponto de partida importante para o sucesso do tecido empresarial nacional. É esta a convicção de Ramiro Ortiz, diretor geral da Tetra Pak Ibérica, que partilha com a Grande Consumo algumas das iniciativas que a empresa tem vindo a liderar para tornar o planeta mais positivo.

G

rande Consumo - O que motivou o lançamento da nova iniciativa Planeta Positivo? O que está na sua origem? Ramiro Ortiz - A Tetra Pak foi fundada com base no princípio de que uma embalagem deve economizar mais do que o custo que lhe estiver associado. Foi com este pensamento que o nosso fundador, Ruben Rausing, estabeleceu a sustentabilidade como prioritária na nossa atividade, antes de esta se tornar o tema atual, urgente e imperativo que é hoje. O compromisso com o meio ambiente e a minimização do impacto no planeta é uma prioridade que assumimos todos os dias. Por acreditarmos que, juntos, podemos fazer mais, decidimos ir além do proposto nas nossas iniciativas e lançar um movimento que una toda a indústria em torno de um Planeta Positivo. Esta ação incentiva as empresas a implementarem práticas e políticas sustentáveis para que, através de medidas coletivas, façam a diferença e enfrentem os desafios ambientais que se impõem. Estamos a falar de uma nova forma de pensar que pretende inspirar fornecedores, consumidores e restantes partes envolvidas em toda a cadeia de valor a unirem-se em prol de uma visão sobre a sustentabilidade que vai além da reciclagem e da reutilização. Esta visão contempla, por exemplo, o impacto das emissões de carbono nas matérias-primas utilizadas e nos processos de produção, isto é, procura conseguir o máximo possível com o mínimo impacto associado para o nosso planeta.

GC - O que é necessário para se fazer parte do Planeta Positivo? RO - Para ser parte deste movimento conjunto, é necessário, fundamentalmente, implementar políticas e ações que vão ao encontro desse princípio. Na prática, passará por apoiar uma economia circular baixa em emissões de carbo-

no e em ter como foco a minimização do impacto provocado no planeta pelos vários processos que integram os negócios. Passa por procurar expandir a perspetiva sobre a sustentabilidade, contemplar medidas como a gestão responsável, reutilização e renovabilidade dos recursos utilizados, mas também repensar aspetos como o impacto de emissões de carbono associado às matérias-primas e aos processos de fabrico. Trata-se de explorar novas formas de “descarbonizar” a economia, reduzir o desperdício alimentar e os resíduos e minimizar o impacto sobre os recursos que são utilizados, desde a água até outros recursos. É, no fundo, ter uma visão global sobre cada negócio e o impacto ambiental que é causado, em todas as suas dimensões. GC - Quais são os desafios ambientais atuais a que a indústria alimentar e de bebidas pode dar resposta? RO - Entre os desafios ambientais considerados mais urgentes, posso começar por destacar o clima. Descarbonizar processos e garantir o controlo e a minimização das emissões de CO2, e de gases com efeito de estufa (GEE) para a atmosfera, é um passo essencial nas medidas que afetam as alterações climáticas. A gestão responsável de recursos é outro tema fundamental. Uma utilização responsável e assente exclusivamente em matérias-primas renováveis, provenientes de fornecedores credíveis e certificados, está na base da diferença. Minimizar o impacto de todos os recursos utilizados, desde os terrenos de plantação até à água utilizada, e reduzir o desperdício em todos os processos é uma prioridade para a indústria. Por outro lado, a produção de produtos sustentáveis, que sejam recicláveis e totalmente provenientes de matérias-primas renováveis e produzidas de forma responsável, garantindo a qualidade e segurança dos mesmos, deve estar no centro da atenção dos gestores e decisores de negócio. Uma das estratégias mais completas para abordar

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esta questão é analisar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, perceber a forma como os desafios ambientais, sociais e económicos se interligam e estabelecer um compromisso para com os mesmos. Na Tetra Pak, comprometemo-nos a apoiar os 17 ODS, dando prioridade estratégica aos que se aplicam na nossa atividade direta, tendo em vista o futuro sustentável do nosso planeta e o sucesso a longo prazo dos nossos clientes. GC - Que medidas, práticas e políticas sustentáveis pretendem que sejam implementadas pelo sector? RO - Nesta área, posso partilhar um pouco daquela que é a nossa experiência e o nosso contributo. Na Tetra Pak, protegemos o planeta e contribuímos para uma economia circular baixa em emissões de carbono, ao recorrermos a recursos renováveis para a produção das nossas embalagens, provenientes de fontes certificadas e geridas de forma responsável. Garantimos a total reciclabilidade das nossas embalagens e temos como objetivo produzir embalagens 100% provenientes exclusivamente de matérias-primas renováveis e/ou recicladas. Trabalhamos a par e passo com entidades independentes e temos atingido metas que muito nos honram. Em 2019, tornámo-nos pioneiros na utilização de polímeros de origem vegetal totalmente rastreáveis, com certificação Bonsucro. Ultrapassámos, no mesmo período, o marco histórico de 500 mil milhões de embalagens comercializadas com o selo de certificação do Forest Stewardship Council (FSC). Paralelamente, assumimos metas como manter as emissões de CO2 em toda a cadeia de valor aos mesmos níveis de 2010. Tendo por base os valores de 2015, anunciámos também a redução das emissões de GEE operacionais em 42%, até 2030, e 58%, até 2040. Por outro lado, a compra de energia renovável permitiu que evitássemos emissões que rondam as 400 mil toneladas de CO2 desde 2005, valor que equivale ao total das emissões das operações globais ao longo de um ano inteiro. Associámo-nos, também, à iniciativa RE100, que se traduz no compromisso de aumentarmos a utilização de energia renovável de 50%, valor atual, para 100%, em 2030, em todas as operações a nível global.

“A nível económico, os indicadores do mercado não deixam margem para dúvidas: os consumidores procuram cada vez mais as soluções que apresentem uma melhor relação entre a qualidade do produto e o seu alto perfil ambiental”

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GC - Como se comunica uma marca que, por “embalar” outras, acaba por não ter visibilidade direta? RO - Essa pergunta é curiosa… Ao refletir sobre ela, chego à conclusão de que aquela que, à partida, pode ser tida como uma posição ingrata em termos de visibilidade, pelos motivos que refere, no nosso caso, acaba por se revelar extremamente gratificante. Isto porque não sentimos que a visibilidade direta, ou falta dela, seja uma questão ou uma realidade para nós e acredito que isso diz muito sobre a Tetra Pak. A nossa comunicação é focada nos nossos públicos-alvo (clientes, indústria, colaboradores, administração e outras organizações relacionadas com a nossa atividade), com enfoque no Business to Business (B2B), como é natural numa empresa com as nossas características. A inovação e excelência que nos caracteriza, a qualidade do nosso portfólio, a procura e entrega das melhores soluções para os nossos clientes, o compromisso com o planeta que assumimos e cumprimos, a relação que construímos com os nossos fornecedores, clientes e consumidores e o facto de assegurarmo-nos, todos os dias, que concretizamos a missão de “proteger o que é bom”, disponibilizando produtos seguros em todo o mundo, estão na base dos princípios e diferenciais pelos quais nos regemos. GC - É fácil angariar apoio para questões como o clima e o desperdício alimentar, dentro do sector alimentar e de bebidas? RO - Existe um conjunto de entidades credíveis e independentes que estão ligadas ao sector em prol destas questões. Cabe-nos a nós, enquanto sector, estar atentos e procurar estabelecer ligações com as mesmas, o que já é uma realidade em Portugal, dado que a indústria já demonstra preocupação em torno destes temas e procura por implementação de soluções otimizadas. Na Tetra Pak, temos como forte aposta o desenvolvimento de uma rede consolidada de parcerias e trabalhamos em conjunto com fornecedores, organizações não governamentais, clientes e outras partes interessadas para o desenvolvimento de questões como a gestão florestal responsável ou a rastreabilidade, através de certificação e rotulagem independentes. Entre os exemplos mais assinaláveis, posso destacar o facto de integrarmos a lista A do Programa de Florestas CDP, a High Conservation Value Resource Network (HCVRN) – Rede de Recursos para a Conservação das Florestas de Elevado Valor, somos parceiros da World Wide Fund for Nature (WWF), há mais de uma década, e atingimos recentemente, como já referi, o patamar de mais de 500 mil milhões de embalagens comercializadas com a certificação FSC. GC - Que passos concretos está a Tetra Pak a seguir para tornar o planeta mais positivo? Que medidas tem implementado? RO - São várias as ações que a Tetra Pak tem implementado com vista a conseguir um planeta positivo, como parte


“A economia circular representa uma oportunidade notável para as empresas portuguesas, ao combinar melhores resultados económicos com o otimizar da utilização de recursos. A prática de políticas de gestão orientadas para o desenvolvimento sustentável é um ponto de partida importante para o sucesso do tecido empresarial nacional”

natural do nosso compromisso com o investimento e a inovação na área da sustentabilidade. Em primeiro plano, surge o objetivo de atingirmos uma economia circular baixa em emissões de carbono, o que passa por um foco em duas frentes: clima e recursos. No primeiro passo, estamos focados em garantir zero emissões de gases com efeito de estufa (GEE) nas nossas operações, até 2030, e ao longo de toda a cadeia de valor, até 2050, seguindo o princípio base de desenvolvermos as soluções mais eficientes e baixas na emissão de CO2, produzindo embalagens recicláveis, baseadas em matérias-primas renováveis e que tenham um impacto ambiental mínimo. Ao nível dos recursos, estamos a apostar na incorporação e transição progressiva para materiais renováveis e recicláveis, reciclados e/ou de origem vegetal. As nossas embalagens são compostas maioritariamente por cartão, de origem renovável e proveniente, como já referi, de florestas geridas de forma responsável e de outras fontes controladas, certificadas pelo FSC. Garantimos que toda a matéria-prima utilizada pela Tetra Pak cumpra os mais altos requisitos ambientais, represente o mínimo impacto ambiental possível e privilegie a economia circular, assente em baixas emissões de carbono, que estamos a construir. O lançamento de embalagens como a Tetra Rex Bio Based, a primeira embalagem composta unicamente por materiais de origem vegetal, inclusivamente o plástico utilizado nas capas de proteção e nas tampas da embalagem, comprova os progressos que temos registado na construção de um planeta positivo. GC - Que metas estabeleceu a Tetra Pak para contribuir para uma indústria mais “verde”? RO - A par com as metas e ações concretas que já fui partilhando, julgo importante notar que a Tetra Pak contribui para uma indústria mais “verde” e orientada

para temas referentes à sustentabilidade, desde a sua fundação. Há mais de duas décadas que reportamos as nossas iniciativas ambientais, com o nosso primeiro relatório de sustentabilidade a ser publicado em 1999. Ao longo dos anos, temos conquistado distinções como termos sido a primeira empresa na indústria a cumprir os objetivos da iniciativa Science Based Targets (SBT) na redução do impacto ambiental, em 2016; integrarmos a lista A do Programa de Florestas CDP e sermos pioneiros na utilização de polímeros de origem vegetal com certificação Bonsucro, no final do ano passado. Temos estabelecido metas nesta área, desde o início, e permaneceremos ambiciosos nas que se avizinham. GC - Quais os principais desafios de atingir metas de sustentabilidade no mercado português? RO - O mercado português é extremamente orientado para a inovação e para temas de peso como a sustentabilidade. Os nossos clientes têm demonstrado uma enorme recetividade aos produtos que estamos a desenvolver e têm trabalhado connosco para promover a implementação de soluções disruptivas no mercado nacional. A abertura dos consumidores nesta área, que cada vez mais transita para uma exigência nos processos de decisão de compra e na relação com as marcas e as organizações, acaba também por funcionar como um incentivo importante para a procura e adoção de soluções inovadoras pelas empresas. Por outro lado, a economia circular representa uma oportunidade notável para as empresas portuguesas, ao combinar melhores resultados económicos com o otimizar da utilização de recursos. A prática de políticas de gestão orientadas para o desenvolvimento sustentável é um ponto de partida importante para o sucesso do tecido empresarial nacional. GC - O mercado ibérico é importante para a Tetra Pak? RO - O mercado ibérico é fulcral para a Tetra Pak, a nível global, sendo que é um dos cinco mercados mais relevantes do grupo e o segundo da Europa. Este é, com efeito, um mercado que conheço bastante bem, fruto das oportunidades que tive de trabalhar com Portugal e Espanha no contexto dos diversos cargos que desempenhei na empresa. Através deles, compreendi a relevância da Tetra Pak Ibéria para o grupo e a forma como é uma das referências de primeira linha para o desenvolvimento de projetos assinaláveis, a par com a implementação de iniciativas e ações inovadoras. GC - Que mudanças, a nível de sustentabilidade, se podem antever no sector para o próximo ano? RO - A nível económico, os indicadores do mercado não deixam margem para dúvidas: os consumidores procuram cada vez mais as soluções que apresentem uma melhor relação entre a qualidade do produto e o seu alto perfil ambiental. Esta realidade ajuda a explicar o porquê de as empresas estarem tão comprometidas com a sustentabilidade dos seus produtos e, apesar de ainda existir um longo percurso pela frente, a tendência que se antevê nesta área é de grande crescimento.

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“O Pacto Português para os Plásticos é muito mais do que a soma das entidades que o constituem”

PACKAGING

TEXTO Bárbara Sousa FOTOS Shutterstock

Extrair, fabricar, consumir, deitar fora. É esta a equação predominante no atual modelo linear de produção. E é este o sistema que a chamada economia circular propõe, eventualmente, substituir por completo. Cada vez mais, colocamos em prática a expressão de que “nada se perde, tudo se transforma”, com modelos mais sustentáveis e sem desperdício. Em fevereiro, foi lançado o Pacto Português para os Plásticos, focado em impulsionar a transição para a economia circular dos plásticos. Uma plataforma colaborativa, que tem como objetivo criar um compromisso entre os diferentes agentes da cadeia de valor dos plásticos nacional, incluindo o Governo, as universidades e organizações não governamentais, definindo metas e objetivos ambiciosos para 2025.

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A

sustentabilidade tem sido uma das grandes tendências dos últimos anos e muitas empresas já mudaram para alternativas mais ecológicas, como substituir materiais plásticos e remover embalagens de uso único. Contudo, desde o início do surto de Covid-19, as empresas têm recorrido a embalagens plásticas para combater a propagação da pandemia, colocando, aparentemente, um travão no aspeto da sustentabilidade. Segundo a GlobalData, as preocupações com a higiene e segurança alimentar devido à Covid-19 podem aumentar a intensidade das embalagens plásticas, o que provavelmente prejudicará os esforços de sustentabilidade, no curto prazo. Os alimentos pré-embalados, como saladas ou fruta, mas também garrafas de água, estão a ser alvo de uma forte procura. O plástico é um fator de conveniência, mas também de segurança. Aqui, o facto da embalagem ser de uso único funciona contra a contaminação cruzada: menos pessoas estão a manipular uma embalagem que vai, depois, ser descartada. Da mesma forma, os recipientes para take-away e os sacos de plástico estão a ser utilizados num esforço para ajudar os consumidores e para retardar a propagação do vírus. Encontramo-nos num momento específico da história em que se equilibra a substituição do plástico contra a ameaça do rápido crescimento da Covid-19. Ainda assim, uma pesquisa da Ipsos mostra que 71% dos consumidores globais concordam que os produtos de plástico de

“Todos os anos, a poluição de plásticos gera custos significativos para as empresas e para a sociedade, seja pelo custo de limpeza de praias, seja pelo custo de danos causados por plásticos à deriva no mar” utilização única deveriam ser banidos o mais rápido possível. As empresas que integram o plástico na sua cadeia de abastecimento

enfrentam um escrutínio cada vez maior, até a nível governamental, mas, diz a Ipsos, a maior ameaça é, de facto, o risco reputacional. Três quartos dos consumidores, a nível global, querem comprar produtos com o menor packaging possível e 63% afirma ter vontade de mudar de local de compra se isso significar usar menos embalagens. Um relatório da Fundação Ellen MacArthur e do Programa Ambiental das Nações Unidas confirmou um nível de transparência sem precedentes sobre como cerca de 200 negócios e governos estão a trabalhar para encontrar alternativas ao plástico. Intitulado “New Plastics Economy Global Commitment”, o relatório mostra que, em 2025, as empresas irão apostar cinco vezes mais no aumento do uso de plástico reciclado. Isto será equivalente a 25 milhões de barris de petróleo por ano. Entre as empresas que estão a liderar este movimento estão a Unilever, a Mars e a PepsiCo, que já anunciaram reduções significativas no uso de plástico virgem até 2025. É neste contexto que a Associação Smart Waste Portugal vem liderar o Pacto Português para os Plásticos, que visa solucionar, na origem, os problemas associados a este material, em direção a uma economia circular dos plásticos no país. O pacto veio juntar os principais agentes da cadeia de valor, num esforço coletivo essencial para garantir as metas de âmbito nacional que se pretendem atingir até 2025, de forma a concretizar uma visão de uma nova economia dos plásticos, onde estes nunca se converterão em resíduos. À data da entrevista com Pedro São Simão, vogal da Smart Waste Portugal e coordenador do Pacto Português para os Plásticos, a iniciativa, lançada em fevereiro de 2020, juntava 76 entidades, das quais 33 empresas, ao longo da cadeia de valor dos plásticos nacional. Desde os distribuidores de matérias-primas, indústria transformadora e de embalagens, empresas de distribuição e retalho, recicladores e entidades gestoras de resíduos, entre outras. A estas, somam-se as universidades, os centros tecnológicos, as associações sectoriais, as organizações não governamentais, os municípios, as agências e institutos públicos, bem como o Governo, através do apoio institucional dos Ministérios do Ambiente e Ação Climática, Economia e Transição Digital e Mar, contando também com o alto patrocínio do Presidente da República.

Entrada em Portugal

Em 2018, foi constituído o Grupo de Trabalho para os Plásticos na Economia Circular, envolvendo representantes da cadeia de valor dos plásticos, nomeadamente, empresas, academia e associações. A criação desse grupo foi coincidente com o lançamento do primeiro pacto nacional para os plásticos, o UK Plastics Pact. “Inspirados pela visão desta iniciativa, e pela sua capacidade em juntar, de forma colaborativa, toda uma cadeia de valor num compromisso firme por uma economia circular para os plásticos, os membros deste grupo de trabalho consideraram que uma iniciativa similar seria essencial para garantir o mesmo resultado em Portugal, sendo uma forma eficaz de dar resposta ao problema da poluição dos plásticos no nosso país”, refere Pedro São Simão, vogal da associação sem

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fins lucrativos fundada em 2015. “Essa proposta foi de imediato acolhida pela direção da Smart Waste Portugal, que se desdobrou em esforços para garantir a implementação desta iniciativa em Portugal, nomeadamente, através do contacto com a Fundação Ellen MacArthur, responsável pela iniciativa”. Um ano e meio depois da primeira abordagem, o Pacto Português para os Plásticos converteu-se em realidade,

Uma vez no mar, a ação da luz solar, do vento e das ondas decompõe os resíduos de plástico em pequenas partículas, geralmente com menos de um quinto de polegada de diâmetro. Esses chamados microplásticos estão espalhados por toda a coluna de água e podem ser encontrados em todos os cantos do globo, desde o Monte Everest, o pico mais alto, até à Fossa das Marianas, o ponto mais profundo. Adicionalmente, milhões de animais são mortos por plásticos todos os anos, de pássaros a peixes e outros organismos marinhos. Sabe-se que quase 700 espécies, incluindo as ameaçadas de extinção, foram afetadas por plásticos. E quase todas as espécies de aves marinhas comem plástico. É importante realçar que, além do impacto ambiental crescente, e dos possíveis efeitos na saúde humana, este género de poluição é um desafio económico significativo. “Todos os anos, a poluição de plásticos gera custos significativos para as empresas e para a sociedade, seja pelo custo de limpeza de praias, seja pelo custo de danos causados por plásticos à deriva no mar, por exemplo, nos motores danificados.

“Os esforços da cadeia de valor dos plásticos são essenciais, mas a sua relevância e eficácia perde-se quando os consumidores não acompanhem esses esforços através das suas atitudes de consumo, reduzindo, reutilizando e reciclando”

contando com o apoio da referida fundação e do Governo português, sendo uma das iniciativas, a nível internacional, que reúne maior número de membros e, talvez, aquela que reúne uma maior representatividade da cadeia de valor.

Poluição dos plásticos

Uma realidade que afeta todos os países, Portugal não é exceção quanto ao problema da poluição dos plásticos. Cada vez é mais evidente que o modelo económico atual em que assenta a cadeia de valor dos plásticos não é sustentável e, de acordo com as projeções atuais da Fundação Ellen MacArthur, se nada for alterado, estima-se que em 2050 haverá mais plástico do que peixe no oceano.

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São inúmeros os exemplos do impacto económico negativo. Por outro lado, a transição para uma nova economia do plástico, uma economia circular dos plásticos, onde estes nunca se convertem em resíduos, apresenta inúmeras oportunidades. Em primeiro lugar, garante a preservação do ambiente, ecossistemas e animais que deles dependem, tão importante para o equilíbrio da natureza e para todos nós, que dependemos dela. Em segundo lugar, a oportunidade de prevenir a contaminação dos seres humanos com microplásticos e as potenciais consequências para a saúde associadas. Finalmente, uma oportunidade económica, estimada pela Fundação Ellen MacArthur em 80 a 120 mil milhões de dólares”, defende Pedro São Simão.

Estas oportunidades e, sobretudo, os problemas associados a uma economia linear dos plásticos exigem uma resposta concreta e concertada de toda a cadeia de valor. Ao nível nacional, o Pacto Português para os Plásticos pretende dar essa resposta e, por isso, “é tão importante para o futuro económico, social e ambiental de Portugal”. A Smart Waste Portugal acredita que esta pode ser uma iniciativa inspiradora para as demais cadeias de valor em Portugal. “A sua capacidade de dinamizar uma ação colaborativa de vários intervenientes da cadeia de valor dos plásticos, alguns deles concorrentes diretos, em prol de uma visão comum, unindo esforços, individuais e coletivos, para criar uma economia circular para os plásticos, poderá facilmente inspirar outras cadeias de valor – por exemplo, alimentação, construção, têxtil – em promover iniciativas similares. Apenas uma iniciativa conjunta poderá promover a transição para uma economia circular para os plásticos”.

Colaboração

Um dos desafios a que o Pacto Português para os Plásticos pretende dar resposta é à capacidade de colaboração. “Colaboração entre concorrentes diretos. Colaboração entre diferentes sectores dentro da cadeia de valor dos plásticos, por exemplo, entre recicladores e produtores de embalagens. Colaboração entre entidades públicas e privadas. Colaboração entre empresas e universidades”, especifica o coordenador do Pacto Português para os Plásticos. É de realçar que as empresas, e também os membros institucionais do Pacto Português para os Plásticos, já desenvolvem vários esforços e atividades individuais para promover uma economia circular para os plásticos. Estes têm reduzido o consumo de plástico de uso único, têm apostado em embalagens de plástico reciclável, têm incorporado plásticos reciclados nas suas embalagens e produtos em plástico. Muitas destas empresas já tinham assumido compromissos internos e externos, como o Global Commitment, com metas ainda mais ambiciosas do que aquelas a que se propõe o Pacto Português para os Plásticos. Assim, esta iniciativa permite, acima de tudo, promover a colaboração e, dessa forma, garantir sinergias essenciais para uma transição rápida e eficaz. Com um conhecimento crescente da cadeia de valor dos plásticos, cada um dos mem-


bros será capaz de promover ações que beneficiam toda a cadeia, a montante e a jusante da sua organização. Para Pedro São Simão, “o Pacto Português para os Plásticos é muito mais do que a soma das entidades que o constituem. É uma iniciativa capaz de promover uma mudança sistémica na cadeia de valor, privilegiando a colaboração e as parcerias para a solução daquele que é um problema comum – a poluição dos plásticos – e garantindo que essas soluções são sustentáveis e geram um crescente valor económico e social”. Junto das insígnias, o pacto vai explorar de que forma será possível, em termos práticos, seguros e económicos, criar soluções de reutilização de algumas das embalagens de plástico que hoje são descartáveis. Dispensadores de produtos secos e postos de reabastecimento de água são exemplos da aplicação da reutilização de embalagens ou redução das embalagens de plástico. Acrescenta o responsável que “é fundamental garantir que estas novas soluções de reutilização não criam outros desafios no futuro, sendo essencial uma avaliação detalhada da sua performance durante todo o ciclo de vida. Este grupo de trabalho, ao envolver cadeias de distribuição, produtores de embalagem, marcas de produtos, universidades, entre outros, terá a capacidade de estudar os modelos já implementados e avaliar a implementação de novos modelos. Este processo colaborativo tornará mais fácil, por exemplo, a aplicação de projetos piloto

bem-sucedidos para o processo comercial”. Por sua vez, os consumidores – de hoje e de amanhã – são uma parte essencial do Pacto Português para os Plásticos, sendo uma das metas para 2025 desta iniciativa garantir a sensibilização e educação dos cidadãos portugueses para o consumo responsável, sustentável e circular dos plásticos. “Os esforços da cadeia de valor dos plásticos são essenciais, mas a sua relevância e eficácia perde-se quando os consumidores não acompanhem esses esforços através das suas atitudes de consumo, reduzindo, reutilizando e reciclando. Se não reciclarem as embalagens, de nada vale que estas sejam 100% recicláveis; se substituírem produtos de uso único em plástico por produtos de uso único noutro material, pouco impacto terão os esforços desenvolvidos da cadeia de valor; se preferirem embalagens em plástico 100% virgem, ainda que existam opções em plástico reciclado que garantam a mesma funcionalidade e segurança, a investigação e inovação promovida pelos nossos membros serão em vão. Por isso, consideramos o papel dos consumidores central para a concretização das metas e visão do Pacto Português para os Plásticos”, afirma o responsável. Nesse sentido, uma das primeiras ações do Pacto Português para os Plásticos passa pelo desenvolvimento de uma campanha de comunicação orientada para o consumidor, a ser implementada no próximo verão. Esta campanha tem como objetivo dar a conhecer a iniciativa

e garantir que o consumidor percebe que o seu papel e os seus comportamentos de consumo são fundamentais para garantir uma economia circular para os plásticos em Portugal.

Política europeia

A política europeia tem sido determinante no processo de transição dos plásticos para uma economia circular. Em dezembro de 2015, a Comissão Europeia adotou um Plano de Ação para a Economia Circular. Nesse plano, identificou os plásticos como uma grande prioridade e comprometeu-se a preparar uma estratégia que aborde os desafios colocados pelos plásticos ao longo da cadeia de valor e que tenha em conta todo o seu ciclo de vida. Em 2017, a Comissão Europeia confirmou a sua tónica na produção e utilização de plásticos, bem como em ações para assegurar, até 2030, que todas as embalagens de plástico sejam recicláveis. E a 16 de janeiro de 2018, adotou a primeira grande Estratégia Europeia sobre Plásticos, definindo-se um caminho concreto para o processo de transição para uma economia circular para os plásticos a nível europeu. Segundo Pedro São Simão, este progresso resultou na aprovação, em tempo recorde, em 2019, da Diretiva Europeia para os Plásticos de Uso Único, definindo ações concretas a tomar pelos Estados-membro com vista à eliminação

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e redução de consumo dos plásticos de uso único mais problemáticos. “Para além destas ações, a Comissão promoveu também a iniciativa ‘Circular Plastics Alliance’, com vários membros da cadeia de valor dos plásticos europeia, com vista ao incremento da incorporação de plástico reciclado na indústria”, explica. “Este caminho de crescente foco na aceleração da transição para uma nova economia dos plásticos na Europa prevê-se ainda que seja reforçado com a nova Comissão Europeia, tendo já sido divulgado o ‘European Green Deal’ e o novo ‘Plano de Ação para a Economia Circular’ para a União Europeia. De facto, não é a legislação europeia que se alinha com o pacto, mas é o Pacto Português para os Plásticos que tem de acompanhar a legislação”.

Metas 2025

O Pacto Português para os Plásticos pretende, até ao final de 2025, atingir cinco importantes metas. A primeira passa pela definição de uma listagem de plásticos de uso único desnecessários e/ou problemáticos, até ao final de 2020, e criar medidas que garantam a sua eliminação na economia portuguesa até 2025, substituindo-os por materiais alternativos mais sustentáveis. A segunda meta corresponde a garantir que todas as embalagens dos membros do Pacto Português para os Plásticos serão reutilizáveis ou, quando tal não seja

possível, 100% recicláveis ou compostáveis, quando tal seja apropriado e mais sustentável. A terceira meta passa por garantir que, em média, 30% do material que compõe as novas embalagens de plásticos das empresas membro da iniciativa será plástico reciclado. A quarta meta está associada à reciclagem das embalagens de plástico e tem como objetivo incrementar, de forma significativa, a taxa de reciclagem das embalagens de plástico em Portugal e atingir, até 2025, uma taxa superior a 70%. A última meta – e que consideram fundamental para a concretização de todas as outras e para a visão do Pacto Português para os Plásticos – é a sensibilização e educação dos consumidores em Portugal. Será fundamental ter-se uma sociedade civil mais consciente do seu papel nesta transição, adotando práticas de consumo cada vez mais sustentáveis. “O ano 2020 será um ano muito importante, pois será o ano base, em que iremos conhecer, pela primeira vez, a performance dos nossos membros em relação às Metas 2025 do Pacto Português para os Plásticos. Estamos confiantes que as ações colaborativas promovidas através do pacto, ao longo do ano, aliadas às ações individuais que cada um dos nossos membros tem vindo a implementar ao longo dos últimos anos, irão apresentar um cenário que reforça a nossa confiança no cumprimento das Metas 2025”, sustenta Pedro São Simão. “Apesar de algumas restrições impostas pela situação atual, resultante da pandemia de Covid-19, terminando este momento extraordinário, estamos convictos que os nossos membros, e todos os consumidores portugueses, irão voltar às suas vidas com uma motivação e vontade reforçadas de promover um novo paradigma, o paradigma da nova economia dos plásticos, onde estes nunca se convertem em resíduos”, conclui.

“Apesar de algumas restrições impostas pela situação atual, resultante da pandemia de Covid-19, terminando este momento extraordinário, estamos convictos que os nossos membros, e todos os consumidores portugueses, irão voltar às suas vidas com uma motivação e vontade reforçadas de promover um novo paradigma”

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