Paladar eclético da falsa medideira

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Destaques

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Índice

Paladar eclético

Temida na cultura da soja, a lagarta falsamedideira registra explosão inédita de infestação também em milho

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Choque tecnológico

Como e quando o uso de fungicidas aliado à tecnologia de aplicação pode resultar em

Diretas

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Uso de fungicidas em cana

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Segurança de EPIs em agroquímicos

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Sequenciamento de Metarhizium rileyi

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Falhas e replantio em milho

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Capa - Falsa-medideira em milho

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Informe - Fertilizante contra nematoides

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Competição de daninhas em trigo

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Mistura de agroquímicos em soja

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Interação do glifosato com inoculação

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Parceria Corteva e Cubo Itaú

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Coluna Agronegócios

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Coluna Mercado Agrícola

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Coluna ANPII

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bom retorno econômico em cana

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Associação testada

Interações e efeitos da aplicação de fungicidas e inseticidas contra ferrugem-asiática e percevejo-marrom Cultivar Grandes Culturas • Ano XX • Nº 252 Maio 2020 • ISSN - 1516-358X Crédito de Capa: Eduardo Lima do Carmo Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300 Diretor Newton Peter www.grupocultivar.com contato@grupocultivar.com Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

Números atrasados: R$ 22,00 Assinatura Internacional: US$ 150,00 Euros 130,00 Nossos Telefones: (53) • Geral 3028.2000 • Comercial: • Assinaturas: 3028.2065 3028.2070 3028.2066 • Redação: 3028.2067 3028.2060

Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: contato@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

Expediente Fundadores: Milton Sousa Guerra, Newton Peter e Schubert Peter

REDAÇÃO • Editor Gilvan Dutra Quevedo

COMERCIAL • Coordenação Charles Ricardo Echer

• Redação Rocheli Wachholz Karine Gobbi Cassiane Fonseca

• Vendas Sedeli Feijó Miriam Portugal

• Design Gráfico e Diagramação Cristiano Ceia

CIRCULAÇÃO • Coordenação Simone Lopes

• Revisão Aline Partzsch de Almeida

• Assinaturas Natália Rodrigues

GRÁFICA: Kunde Indústrias Gráficas Ltda.

• Expedição Edson Krause


Diretas Gestão de crise

O Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb), em parceria com a Elevagro, realizou em abril o webinar “Economia e Gestão de Crise no Agronegócio”. A palestra on-line gratuita, primeira de uma série prevista para ocorrer nos próximos meses, ofereceu dicas sobre gestão de caixa e de crise em tempos de pandemia, além de abordar o cenário atual do agronegócio brasileiro. O encontro contou com a participação do presidente do Cesb, Leonardo Sologuren, e do mestre em Ciência, Agricultura e Gestão e Negócios Agrícolas, Antônio Carlos Ortiz, com mediação do membro-fundador do Cesb, Ricardo Balardin.

Leonardo Sologuren, Ricardo Balardin e Antônio Carlos Ortiz

Percevejo

Jacob Crosariol Netto

Trigo

A Ihara realizou em abril um webinar sobre manejo de percevejos na cultura da soja. O evento contou com a participação do pesquisador do Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt), Jacob Crosariol Netto. O especialista trouxe para o encontro a experiência acumulada em Entomologia, Fitotecnia e Fitossanidade, nas áreas de manejo integrado de pragas, controle químico e controle biológico de pragas.

Estudo realizado em parceria entre a Alltech Crop Science e a Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária (Fapa), em Guarapuava, Paraná, testou a efetividade do uso de aminoácidos, polissacarídeos e cobre bioativo durante a safra 2019 de trigo. Entre os resultados observados, constatou-se aumento de 52 sacas por hectare em relação à área não tratada, além de incremento na resistência da planta contra estresses. “Os aminoácidos e polissacarídeos têm o que chamamos de efeito nutricitor, pois auxiliam tanto na parte nutricional quanto na redução dos impactos por estresses térmicos e hídricos”, explicou o gerente técnico especializado em grãos da Alltech Crop Science, Vinicius Abe. Vinicius Abe

Lançamentos

A Syngenta apresentou em abril seu novo portfólio em inseticidas, fungicidas, herbicidas e tratamento de sementes por meio do evento on-line Estação Novas Tecnologias Digital. Entre os destaques esteve o fungicida Bravonil Top, uma combinação de monossítio com multissítio para o manejo de doenças. Em inseticidas a marca mostrou o Minecto Pro e o Ampligo Pro. Os herbicidas Grover e Calipen SC também estão entre os lançamentos da empresa. Em tratamento de sementes a novidade é o bioestimulante e nematicida Clariva Sky, que atua no manejo biológico de nematoides na cultura de soja.

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Errata

Na edição 250, na página 06, no Espaço Diretas, por equívoco constou a foto do gerente de Desenvolvimento Técnico do Mercado Sul da Basf, Rafael Milleo, como sendo do diretor de Negócios do Sul da Basf, Cássio Kirchner.

Cássio Kirchner


Cana Fotos Fernando Cezar Juliatti

Choque tecnológico

Como e quando fazer uso de fungicidas e da melhor tecnologia na cana-deaçúcar podem resultar em ganhos de produtividade e retorno econômico, em um cenário brasileiro marcado pela evolução de doenças fúngicas como ferrugem alaranjada, podridão vermelha, mancha parda e mancha anelar

A

cana é um cultivo agrícola muito importante para o Brasil e o restante do mundo. A área colhida na safra 2018/19, no Brasil, gira ao redor de 10,123 milhões de hectares, com produção de 620,41 milhões de toneladas e produtividade de 72,23t/ha e ATR (açúcar total recuperável) de 140,6kg/ha. Para cada tonelada de cana em média no Brasil, estima-se uma produção de até 80 litros de álcool de primeira geração. As lavouras de cana são a segunda no uso de defensivos agrícolas no País, ficando atrás apenas da soja. Na cultura, ênfase tem sido dada ao melhoramento genético de clones e variedades superiores e não existe a tradição ou o costume de se utilizar fungicidas foliares ou no tratamento da soqueira ou pós corte durante a brotação.

Em outros cultivos a prática é bem difundida, com amplos benefícios aos agricultores, garantindo a produtividade. As doenças importantes são manejadas, principalmente, pela utilização de variedades resistentes, roguing (erradicação de plantas doentes no viveiro de cana), mudas sadias e tratadas, escolha do clone mais adaptado ao local de plantio etc. O controle biológico é bastante utilizado no manejo de insetos – pragas, inseticidas, além de herbicidas e nematicidas. Nenhuma ênfase tem sido dada pelos órgãos de pesquisa no uso de fungicidas quanto à manutenção da área foliar sadia, tonelada de cana por hectare (TCH) e efeitos benéficos na manutenção da área foliar sadia e reflexos na qualidade da fotossíntese, acúmulo de fotoassimilados, brix, teor de sacarose e até

o rendimento industrial. Os programas de melhoramento de cana priorizam o desenvolvimento de materiais genéticos com resistência satisfatória aos agentes causais de doenças viróticas (mosaico e amarelinho), bacterianas (raquitismo e escaldadura) e fúngicas (carvão e ferrugem marrom). Na década de 1980 foi constatada no Brasil a ferrugem marrom (Puccinia melanocephala) e em 2009 o fungo Puccinia kuehnii (Figura 1), agente causal da ferrugem alaranjada. Recentemente tem se observado também a evolução da mancha anelar da cana (Leptosphaeria sacchari) (Figura 2) e a podridão vermelha ou antracnose (Colletotrichum falcatum) (Figuras 3 e 4), estria bacteriana e outras (Figuras 2 e 5). A podridão vermelha aumenta as perdas

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Figura 1 - Esporulação de Puccinia khuenii (ferrugem alaranjada) em folhas de clone suscetível

Figura 2 - Perda de área foliar em cana pela severidade de mancha anelar e estria bacteriana em cana-de-açúcar

Figura 3 - Sintomas da podridão vermelha em cana-de-açúcar

Figura 4 - Ciclo de vida do fungo da podridão vermelha da cana-de-açúcar

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pela inversão da sacarose na usina, reduzindo o rendimento do caldo ou mosto de cana. Embora a resistência genética seja a principal tática de controle, existem variedades que, apesar de apresentarem boas características agronômicas e industriais (produtividade e boa resistência a outras pragas etc.), permitem o desenvolvimento de algumas doenças, comprometendo a área foliar (Figuras 5 e 6). Os danos podem ser elevados pela redução da área foliar sadia, fotossíntese e acúmulo de sacarose nos colmos, ou seja, perda de produtividade por hectare (TCH) (Figura 6). O manejo integrado de doenças (MID) é uma ferramenta importante para manejo das principais doenças que ocorrem na cultura, incluindo a tomada de decisão para uso de fungicidas no momento correto e na dose/resposta adequada para cada situação ou clone cultivado. As interações entre fungicidas e controle de doenças são múltiplas, desde resposta de clones, efeitos fisiológicos e efeito na produtividade de cana (Figuras 6 e 7). Existem fungicidas registrados e com eficiência satisfatória contra todos os agentes causais fúngicos na cultura que tornam viável a sua utilização. Experimentos têm comprovado essa eficácia em vários ambientes, cultivares e condições climáticas. As culturas de grãos, como soja, trigo, feijoeiro e milho, que utilizam fungicidas, vêm apresentando constante aumento de produtividade e retorno ao agricultor. É necessário um choque tecnológico na cana-de-açúcar. Existem diversas inovações sendo disponibilizadas, como o material de propagação: utilização de mudas no lugar dos toletes etc. A vinhaça, que era um problema, hoje é solução para a oferta de potássio e outros nutrientes para os cultivos. Entre estas novas tecnologias, a utilização de fungicidas deve ser analisada com muita atenção e sem preconceitos ou tabus. Se em quase todos os demais cultivos é uma ferramenta importante e, em alguns casos, indispensável, pode ser bastante útil nesta nova fase de cultivo da cana no Brasil. Certamente, com o surgimento de novos produtos comerciais e formulações de fungicidas cada vez mais apropriadas, melhorias na tecnologia de aplicação, posicionamento adequado do produto durante o ciclo da cultura e condições ambientais tornam-se fundamentais na produção de


Fotos Fernando Cezar Juliatti

Figura 7 - Tabela com os 20 clones mais plantados no Brasil. Safra 2017-2018 Variedade 1° RB966928 2° RB867515 3° CTC4 4° RB92579 5° RB855156 6° CTC9001 7° RB855453 8° RB975201 9° CV7870 10° SP83-2847 11° IAC91-1099 12° CTC9002 13° CTC9003 14° CTC20 15° CV6654 16° SP80-3280 17° IACSP95-5000 18° RB928064 19° SP79-1011 20° SP78-4764 Outras Total

Figura 5 - Produção de cana, ocorrência de doenças e seu reflexo na produtividade

Variedade

Figura 6 - Aspectos fisiológicos da resposta de cana e suas interações múltiplas em relação ao uso de fungicidas

Figura 8 - Clones mais plantados no Brasil até o ano de 2019

cana no Brasil e somente assim será possível obter avanços significativos no cultivo. A Tabela 1 apresenta os resultados da avaliação da ferrugem alaranjada, a mancha anelar e a podridão vermelha na cultura da cana-de-açúcar safra 2018-2019.

Em 2017-18 a área plantada de cana-de-açúcar recebia a seguinte distribuição, conforme os clones mais utilizados (Figuras 7, 8 e 9) Os dez clones mais plantados estão apresentados na Figura 7. Todos os clones assinados apresentam uma ou mais patologias,

1° RB867515 2° RB966928 3° RB92579 4° CTC4 5° RB855156 6° RB855453 7° SP81-3250 8° SP83-2847 9° CTC15 10° RB855536 11° SP80-1842 12° CTC2 13° RB835054 14° SP80-1816 15° IACSP95-5000 15° SP80-3280 17° CTC20 18° SP79-1011 19° RB965902 20° CTC9001 Outras Total

Plantio Área (ha) 103,468 98,041 72,964 61,581 23,073 18,865 12,597 11,922 11,797 11,195 8,562 7,831 7,380 6,785 6,376 6,353 6,077 5,982 5,177 4,863 114,919 605,807

% 17% 16% 12% 10% 4% 3% 2% 2% 2% 2% 2% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 19% 100%

Cultivo Área (ha) 1.250,023 608,006 491,753 235,267 233,575 207,566 178,386 137,604 106,848 101,530 72,280 70,763 65,552 58,507 55,700 50,262 42,223 37,020 35,849 31,453 983,863 5.053,842

% 25% 12% 10% 5% 5% 4% 4% 3% 2% 2% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 19% 100%

reduzindo a sua área foliar se fazendo necessário o uso de fungicidas foliares. A resposta aos fungicidas em cana-de-açúcar tem sido estudada com o uso de drones, com câmeras multiespectrais e com leituras na faixa do infravermelho e as respostas múltiplas em inúmeras variáveis apresentadas nas Figuras 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18 e 19.

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Figura 9 - Clones em expansão no Brasil e no Sudeste

Figura 10 - Variáveis e componentes envolvidos na resposta de clones de cana-de-açúcar aos fungicidas. Clone SP81-3250 (segundo corte). Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação. Usina Aroeira. Tupaciguara. MG

Figura 11 - Resposta morfológica de RB867515 a duas aplicações de fungicidas no pós-corte (corte da soqueira) e durante o desenvolvimento vegetativo (5 folhas expandidas). Clone SP81-3250 (segundo corte). Usina Aroeira. Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação. Tupaciguara. MG

Figura 12 - Altura e número de colmos no Clone SP81-3250 (segundo corte). Usina Aroeira. Tupaciguara. MG. Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação

Figura 13 - Porcentagem de área foliar viva ou ativa (no dia da pulverização foliar e 30 dias depois. Clone SP81-3250 (segundo corte). Usina Aroeira. Tupaciguara. MG. Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação

Figura 14 - Porcentagem de folhas ativas até 60 dias após a aplicação dos fungicidas no clone. Clone SP81-3250 (segundo corte). Usina Aroeira. Tupaciguara. MG. Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação

Tabela 1 - Avaliação da severidade de doenças e reflexos na produtividade de cana no clone SP81-3250, safra 2018-2019, em Uberlândia - MG N° Trat. 1 2 3 4 5

AACPD da % de AACPD da % de AACPD da % de AACPD da % de podridão % de incidência de podri- % de severidade de podrii.a. mancha parda ferrugem alaranjada mancha anelar vermelha e fase vegetativa dão vermelha na colheita dão vermelha na colheita 384,25a Testemunha 640,25a 1005,50a 70,00a 18,75a 600,00a 91,50b azoxystrobina + ciproconazol-0,5l (5apl)¹ 155,75b 352,75b 22,50b 8,75b 12,25b 51,50b azoxystrobina + ciproconazol-0,5l (3apl)¹ 23,00b 439,25b 32,50b 10,00b 18,25b 50,00b azoxystrobina + ciproconazol-1,0l (5apl)¹ 48,00b 288,75b 17,50b 3,75b 0,00b 16,00b azoxystrobina + ciproconazol-1,0l (3apl)¹ 33,50b 444,25b 32,50b 8,50b 85,50b 58,50 CV (%) 74,51 39,95 32,99 52,31 81,79

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ID % Controle THC (Tonelada (%)² ABOTT (ID) de cana por ha) 14,00a 61,30b 2,00b 86,00 71,66a 2,75b 80,36 65,32ab 0,88b 93,75 73,66a 2,52b 82,00 66,62ab 90,97 17,61


Figura 15 - Resposta na área abaixo da curva de Progresso da doença (AACPD) de cana-de-açúcar, clone após duas aplicações de fungicidas. Clone SP81-3250 (segundo corte). Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação

CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

ta diretamente na produção (TCH)-t/ha; 4) Em clone suscetível como SP813250, o uso de fungicidas pode ser realizado entre três e cinco pulverizações com aplicações mensais; 5) A doença impacta ou reduz em até 12t/ha se o controle não for realizado na fase vegetativa ou formação do colmo; 6) Cada aplicação do fungicida azoxystrobina + ciproconazol aumentou em média 2,5t/ha de cana; 7) Ocorreu uma redução da severidade de ferrugem alaranjada, mancha parda e mancha anelar, melhorando a sanidade geral do canavial; 8) A aplicação de fungicida a partir do início das brotações apresenta uma vantagem econômica com retorno líquido de C até R$ 700,00 por hectare.

Fernando Cezar Juliatti e Pedro Augusto Ferreira Faria Medeiros, UFU/Lamip/Iciag Breno Cezar Marinho Juliatti e Fernanda Cristina Juliatti, JuliAgro - B,G & P.Ltda Daine Anderlei Frangiosi, Fazenda Estância Cruzeiro Irmãos Frangiosi Isabela Gonçalves de Fátima e Márcio Gonçalves de Andrade Neto, Openeen Bioscience Marcela Eduarda Santos de Matos e Vinycius Naves Melo, Lamip/Iciag/UFU Marcos Matheus Nakamura de Jesus, Syngenta Victor Hugo Santana Silveira, Syngenta/GTEC Cana

Fotos Fernando Cezar Juliatti

1) A resposta aos fungicidas nos sistemas de produção de cana é uma ferramenta importante, mesmo aplicando após o corte da soqueira para reduzir o inóculo inicial de fungos necrotróficos como o da mancha anelar e da podridão vermelha que mais reduzem a sanidade e a produtividade do canavial; 2) O fungicida ciproconazol + azoxytrobina foi eficiente no controle da podridão vermelha (Colletotrichum falcatum) nas doses de 0,5 e 1L/ha; 3) As pulverizações devem ser iniciadas após o início das brotações para melhorar a emergência e a infecção inicial, o que impac-

Figura 16 - Produtividade de cana-de-açúcar (TCH) por ha no clone SP81-3250 (segundo corte). Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação

Figura 17 - Transpiração e carbono acumulado pelo uso de câmera multiespectral em diferentes fungicidas usados em campo no clone SP81-3250 (segundo corte). Primeira aplicação 7 meses após o corte e mudas oriundas do sistema Plene. Segunda aplicação 30 dias após a primeira aplicação (30 daa). As áreas verdes correspondem aos melhores tratamentos na fixação de carbono (ProriXtra- Azoxistrobina + ciproconazol, Nativo – trifloxistrobina + tebuconazol e Evos- Azoxistrobina + Flutriafol)

Figura 18 - Índice de vegetação (por câmera multiespectral – Red Edge). As áreas verdes correspondem aos melhores fungicidas (ProriXtra- Azoxistrobina + ciproconazol, Nativo – trifloxistrobina + tebuconazol e Evos- Azoxistrobina + Flutriafol), em duas aplicações 7 meses após o segundo corte)

Figura 19 - Índice de área foliar verde (GLI) (por câmera multiespectral – Red Edge). As áreas verdes correspondem aos melhores fungicidas (ProriXtra- Azoxistrobina + ciproconazol, Nativo – trifloxistrobina + tebuconazol e Evos- Azoxistrobina + Flutriafol), em duas aplicações 7 meses após o segundo corte)

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EPI

Qualidade certificada

Fotos Hamilton Ramos

A importância da pesquisa e a sua evolução no Brasil em busca de segurança em vestimentas para aplicadores de agroquímicos

P

assa ao largo de parte da sociedade a relevância de normas técnicas aplicáveis a equipamentos e produtos. Apesar de esforços da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e da International Standartization Organization (ISO), pouco se dá conta no Brasil de que a normatização beneficia cadeias produtivas e a classe trabalhadora. No setor agrícola, especificamente no trabalho com agroquímicos, a normatização está no centro de uma história de sucesso sobre segurança no trabalho rural. Com as primeiras aplicações de defensivos, na década de 1940, surgiram a preocupação com a segurança do trabalhador e a oferta de produtos atualmente chamados de EPIs (equipamentos de proteção individual). Até então, EPIs agrícolas constituíam adaptações de modelos industriais. Feitos com materiais pesados, nada confortáveis, levavam pouca segurança ao campo. Em 1977, quando não houvera ainda avanço na confecção de

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EPIs, a Lei 6514 obrigou o fornecimento destes produtos. Determinou ainda que os equipamentos fossem vendidos mediante Certificado de Aprovação (CA) do Ministério do Trabalho. Somente em 1990, técnicos da Fundacentro, fundação ligada ao Ministério do Trabalho, passaram a estudar EPIs para a agricultura. Chegaram, à época, as primeiras vestimentas de algodão com hidrorrepelente, base de vários modelos produzidos atualmente. Contudo, a ausência de normas técnicas ainda facilitava vendas de EPIs ineficazes para agroquímicos. Bastava uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) do fabricante para obter o CA do Ministério do Trabalho. No início dos anos de 1990, o Centro de Engenharia e Automação (CEA), do Instituto Agronômico (IAC), órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, mediou uma demanda entre o Ministério do Trabalho e uma agroindústria,


com o objetivo de verificar a qualidade de EPIs agrícolas. Na busca por normas que sustentassem o estudo, a surpresa: foram identificadas poucas normas americanas ASTM, aplicáveis a riscos químicos. Uma destas, selecionada, implicou reprovação das nove vestimentas analisadas. Esse fato também trouxe à luz uma questão central: tais produtos não tinham qualidade ou a norma era inadequada? Em 2004, frente à persistência da dúvida, o Comitê Brasileiro de Equipamentos de Proteção Individual (CB-32), coordenado pela Associação da Indústria de Material de Segurança e Proteção ao Trabalho (Animaseg) instituiu a Comissão de Estudos de Luvas e Vestimentas de Proteção para Riscos Químicos (CE-32:006.03). Formado por fabricantes de EPIs e pelo CEA/IAC, o grupo aprofundou estudos quanto a normas que embasassem análises sobre a qualidade de vestimentas. Chegou-se, inicialmente, à norma ISO DIS 16602, que estava em desenvolvimento especificamente para risco químico. Desdobramentos desse trabalho resultaram em mais uma questão-chave: frente a uma eventual publicação da ISO 16602, e sua conversão em lei, haveria sequer um EPI brasileiro capaz de atender às exigências da norma? Foi em busca de respostas efetivas para essas questões que ganhou vida e estrutura tecnológica o Programa IAC de Qualidade de Equipamentos de Proteção Individual na Agricultura (IAC-Quepia). O Quepia concluiu, ainda na fase inicial do programa, que a norma ISO 16602 não era compatível a EPIs para agroquímicos. A constatação veio após a análise de 52 materiais diferentes, tecidos e não tecidos, dos quais 75% foram reprovados. No tocante aos 25% aprovados, permaneceu a indagação sobre se havia segurança neste resultado, ou seja, se estes seriam representativos para avaliações de qualidade envolvendo produtos químicos similares a agroquímicos. Quepia e ABNT passaram a investigar, então, outra norma em desenvolvimento, a ISO 27065, específica para defensivos, que começou a ser elaborada em 2008 e foi publicada em 2011. Pouco antes, em 2009, o Ministério do Trabalho publicou a Portaria 121, extinguindo o CA por responsabilidade e adotando normas de qualidade para to-

Ensaio com Equipamento de Proteção Individual para aplicação de agroquímicos

dos os EPIs. Em relação a vestimentas de proteção para risco químico geral e com agroquímicos, esta portaria estabelecia o uso da ISO 16602. Entre 2010 e 2011, apoiado no trabalho do Quepia e da ABNT, o Ministério do Trabalho publicou duas novas Portarias (184 e 185), para modificar a 121. Essas decisões estabeleceram que a norma ISO 16602 é aplicável somente a vestimentas para risco químico em geral. Já a ISO 27065, ainda em fase de estudos à época, passou a nortear a qualidade de EPI para agroquímicos. Ambas deliberações fizeram do Brasil o primeiro país a contar com normas de qualidade da ISO para vestimentas de proteção para o trabalho com defensivos. Outro avanço da pesquisa veio em 2017, quando ABNT e Quepia participaram com destaque do processo de revisão da ISO 27065. Para se ter ideia da importância do Brasil nesse trabalho, vale lembrar que a substância utilizada nos testes até então era um agroquímico comercializado somente nos EUA. Este produto foi substituído por um líquido teste não tóxico, desenvolvido a partir de um corante. O trabalho inicial e a validação dessa nova substância foram integralmente realizados no laboratório avançado do Quepia em Jundiaí, em colaboração com técnicos e pesquisadores dos EUA e da Alemanha. O líquido-teste é atualmente a base das avaliações de qualidade da ISO 27065. Hoje perto de completar 15 anos, o Programa IAC-Quepia contabiliza dezenas de contribuições ao

setor produtivo de EPIs e ao trabalhado rural. Com o aprimoramento das certificações de qualidade do Quepia, a aprovação a EPI agrícolas fabricados no País saltou de 49%, em 2011, para 81%. A normatização amparada na pesquisa entrelaçou fabricantes, governo e sociedade e tornou mais seguro o trabalho rural. Urge estender o conceito da normatização a outros setores produtivos, sobretudo àqueles nos quais a inovação é ainda emergente. No próprio agronegócio há inúmeras oportunidades para aprimoramento de produtos e tecnologias. Boa parte delas está no radar do Quepia e também de outros programas do CEA/IAC, como a Unidade de Referência em Tecnologia e Segurança na Aplicação de Agrotóxicos e o C “Adjuvantes da Pulverização”. Hamilton Humberto Ramos e Viviane Corrêa Aguiar Ramos, Centro de Eng. e Automação do Instituto Agronômico Secretaria de Agric. e Abast. do Estado de São Paulo

Viviane e Ramos detalham a trajetória de evolução da segurança de EPIs

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Pragas

Genoma sequenciado Fungo Metarhizium rileyi, que possui excelente ação de controle natural em lagartas em soja, milho e algodão, tem potencial de utilização como bioinseticida alargado a partir do sequenciamento genético

À

Fotos Daniel R. Sosa-Gómez

semelhança dos seres humanos, populações de lagartas podem ser afetadas por agentes de controle natural em diversas culturas de importância econômica. Entre estes agentes, possivelmente um dos que apresentam o melhor efeito é o fungo Metarhizium rileyi. Esta espécie causa epizootias (a infecção e mortalidade das populações de lagartas com elevada prevalência é chamada de epizootia, analogamente a epidemias em populações humanas), comumente conhecida por doença-branca. Seu nome deve-se ao fato que, uma vez que o inseto é morto pelo fungo, apresenta um aspecto branco, tendo em vista que toda a superfície da lagarta é tomada pelo crescimento mice-

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lial (Figura 1). Posteriormente, na presença de umidade superior a 80%, o fungo forma esporos conferindo à lagarta a cor verde-claro, característica deste fungo. Esses esporos são as “sementes” que iniciam um novo processo de infecção em outras lagartas. O fungo pode permanecer no solo na forma vegetativa ou formando pequenos esclerócios (que são estruturas de sobrevivência), fechando assim seu ciclo vital. Até 2014 essa espécie era conhecida pelo nome científico Nomuraea rileyi, quando foi então transferida para o gênero Metarhizium por Kepler e outros autores. No Brasil, esse patógeno infecta a lagarta-da-soja (Anticarsia


Figura 1 - Fungo formado sobre a superfície do tegumento da lagarta, fase vegetativa branca

gemmatalis), as lagartas falsas-medideiras (Chrysodeixis includens, Rachiplusia nu e Trichopluisa ni), o curuquerê-do-algodoeiro (Alabama argillacea), entre outras espécies, ocasionando elevada mortalidade, que pode ser próxima a 100% nos indivíduos de uma determinada área. Casos com menor prevalência têm sido observados na lagarta do cartucho-do-milho, Spodoptera frugiperda, e em Helicoverpa armigera.

A incidência de M. rileyi diminuiu a partir da década de 2000, provavelmente em decorrência do aumento do uso generalizado de fungicidas na cultura da soja para o controle da ferrugem-asiática, doença que foi detectada no Brasil em 2001. Metarhizium rileyi tem distribuição mundial, portanto, apesar da ausência de variabilidade morfológica é possível detectar elevada variabilidade genética entre isolados de diferentes locais. Essa variabilidade pode resultar na expressão de características diferentes, como sua agressividade, a capacidade de multiplicar-se e/ou sua capacidade de sobreviver a diferentes condições ambientais. Portanto, a diferenciação dessas cepas é de fundamental importância para desenvolver bioinseticidas com maiores possibilidades de sucesso no controle de pragas. Uma vez que a diferenciação das cepas com base em caracteres micro e macromorfológicos não é possível, a alternativa remanescente é a utilização de ferramentas moleculares obtidas a partir do conhecimento do seu genoma. Esse fungo tem potencial para ser utilizado como bioinseticida microbiano. Estudos realizados em condições de campo indicam que pode ser utilizado com eficiências variáveis, entre 40% e 100% de controle, dependentes da qualidade do material produzido, das condições ambientais, da suscetibilidade e do comportamento da praga-alvo. O conhecimento da sequência genômica permitirá diferenciar raças e realizar estudos comparativos entre as mesmas,

Figura 2 - Microfotografia da estrutura reprodutiva de Metarhizium rileyi que lembra a forma de pau-de-boliche, disposta em forma verticilada em torno da hifa, utilizada na identificação da espécie

determinando a variabilidade genética e localizando regiões no genoma que permitam a diferenciação entre elas. Portanto, o sequenciamento do genoma de M. rileyi permitirá o desenvolvimento de ferramentas que facilitarão a caracterização e a identificação de diferentes cepas do fungo. Também será possível a comparação entre genomas com outras espécies já conhecidas para, por homologia, reconhecer genes associados com características de interesse, como fatores de virulência, capacidade de esporulação, tolerância a fungicidas, taxa de crescimento e outros parâmetros de interesse, além de contribuir nos estudos de transformação genética. Uma perspectiva para melhorar a eficiência de fungos patógenos de insetos como agentes de controle biológico consiste na utilização de edição genética ou transformação genética. Assim, por exemplo, a transformação genética de outras espécies de fungos causadores de doenças em insetos tem auxiliado no aprimoramento do controle de algumas pragas, como é o caso do fungo Metarhizium pingshaense, melhorado geneticamente para controle de pernilongos transmissores de malária em Burkina Faso, África, país onde a doença é endêmica. Esse fungo modificado geneticamente apresenta maior virulência, ou seja, mata mais rapidamente, e as fêmeas de pernilongo infectadas reduzem significativamente o número de C ovos depositados. Daniel R. Sosa-Gómez e Eliseu Binneck, Embrapa Soja Claudia Lopez Lastra, CEPAVE

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Milho

Regina Sugayama

Falhas caras

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estande. Portanto, o monitoramento antes da dessecação é fundamental para decidir se é necessário incluir um inseticida nessa pulverização. Posteriormente ao plantio, o monitoramento durante e logo após a germinação também é necessário para garantir a sobrevivência das plantas e preservar o estande planejado. Nos grupos identificados anteriormente não foram incluídas as chamadas plantas dominadas. São plantas que desde o início já têm o desenvolvimento retardado, mas continuam competindo e ocupando o espaço físico na linha de plantio e se tornam improdutivas por vários outros fatores. Neste caso, como essas plantas competem com as plantas normais por um período de tempo, espera-se pouca ou nenhuma compensação de produtividade pelas plantas vizinhas. Nesse texto não se pretende esgotar o tema sobre a presença de falhas nas linhas de plantio, mas apenas chamar a atenção para os principais fatores e apresentar alguns dados que possam contribuir para a tomada de decisão quanto às condições de semeadura e estratégias para mitigar possíveis perdas na produção ou, ainda, na tomada de decisão do replantio devido ao número excessivo de falhas. Embora se dê muito valor à qualidade genética das sementes, promovendo grandes eventos a cada lançamento de um novo híbrido ou variedade, a tecnologia de produção, de armazenamento e a comercialização dessas sementes são igualmente importantes para se obter altas produtividades. Tanto as características genéticas quanto as qualidades fisiológicas, físicas e sanitárias das sementes afetam o potencial produtivo da lavoura. Para uma semente ser considerada de alta qualidade, não basta ter pureza, sanidade e alta taxa de germinação, deve também se desenvolver com vigor, com uniformidade e crescimento acelerado da plântula, em condições normais de campo. Resultados científicos mostraram que plântulas de milho com dez dias de atraso na emergência terão uma defasagem de duas folhas no seu estádio de desenvolvimento e, provavelmente, não produzirão espigas e cairão na categoria de plantas dominadas.

Na cultura do milho, geralmente a compensação de plantas vizinhas às falhas existe, mas não na proporção que se pode imaginar. Em alguns casos há vantagem econômica em realizar o replantio

Regina Sugayama

O

estabelecimento do estande (número de plantas/ha) ideal na lavoura é fator decisivo na obtenção de altas produtividades. O objetivo desse artigo é demonstrar ao produtor a importância do estande ideal, com o mínimo de falhas possível e, quem sabe, em função da porcentagem de falhas, ajudá-lo a tomar a decisão em fazer ou não o replantio. Pois a compensação em produção pelas plantas sobreviventes e próximas às falhas é limitada. Portanto, todos os cuidados no planejamento, nas ações antes, durante e após a semeadura são fundamentais para o sucesso da sua safra. Os fatores que afetam o estande da lavoura do milho foram organizados em quatro grupos. O primeiro está relacionado à escolha da semente, que deve ser adquirida de fonte idônea e com garantias de qualidade, pois, partindo de sementes sem qualidade genética e tecnológica, todos os demais investimentos serão em vão. O segundo grupo envolve o planejamento da semeadura: o preparo do leito de plantio, tanto nos sistemas convencionais (com preparo do solo), como no plantio direto; monitoramento de pragas de solo mesmo antes da dessecação; dessecação antecipada e controle de pragas se necessário; manejo das plantas tigueras; cuidados com as sementes no transporte e armazenamento antes do plantio; manutenção e regulagem das máquinas (quanto à uniformidade de distribuição e profundidade de sementes e adubos) e velocidade de plantio adequada às condições de semeadura. No terceiro grupo estão fatores ambientais como temperatura, precipitação e umidade do solo, antes e após a semeadura, sendo que sobre estes fatores, principalmente nas lavouras de sequeiro, o produtor não tem muito controle. O quarto grupo está relacionado aos cuidados na condução da lavoura, durante a germinação e o estabelecimento da cultura, quanto à incidência de pragas que podem causar morte de plântulas. Merecem destaque, como fator de redução de estande nas lavouras, as espécies-praga que atacam o milho, antes, durante e logo após a germinação. Mesmo antes da dessecação e/ou semeadura, várias espécies de insetos-praga podem estar presentes na área. Algumas espécies como larva-arame e peludinha podem atacar as sementes, destruindo o embrião, o que causa falha na germinação. As falhas podem, ainda, ser causadas por danos nas plântulas, logo após a emergência, devido ao ataque de percevejos e lagartas. Ainda podem ocorrer os corós, que atacam as raízes, levando até mesmo plantas mais desenvolvidas à morte. Embora a maioria dessas espécies tenha ocorrência esporádica, algumas, como o percevejo barriga-verde, têm sido recorrentes no milho safrinha. Assim, plantas com sintomas severos de danos do percevejo, como o perfilhamento de plantas, resultarão em falhas de

Falhas podem ser causadas por danos nas plântulas, logo após a emergência, devido ao ataque de insetos

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Figura 1 - Ilustração dos arranjos de plantas (Y) e falhas (0) utilizados no ensaio para avaliar a compensação das plantas de milho sobreviventes e vizinhas (referência) às falhas

Figura 2 - Porcentagem de perdas na produção final do milho devido às falhas em relação ao estande sem falhas

O estabelecimento final do estande por sementes vigorosas constitui a base para obtenção de plantas com alto grau de tolerância aos estresses e obtenção de alta produtividade. A uniformidade de germinação e desenvolvimento inicial já é um bom indicativo do potencial produtivo daquela lavoura. Portanto, para garantir o sucesso de sua lavoura, não se deve limitar a decisão da escolha da semente apenas com base no preço, mas principalmente com base em informações sobre todas as características da semente que se está adquirindo. A lucratividade é resultado da relação do custo de produção com a produtividade obtida. Portanto, uma pequena economia na semente pode resultar em redução significativa no resultado final. Em geral, cada planta de milho só produz uma espiga, assim, a produtividade da lavoura fica altamente dependente da densidade de plantas produtivas por unidade de área. Como as plantas respondem à competição entre elas, não se observam diferenças significativas entre intervalos próximos de densidade de plantio, pois as plantas estarão uniformemente distribuídas. Entretanto, quando ocorrem falhas, o nível de competição entre plantas, na mesma linha, é diferente e a redução em produtividade torna-se significativa. É necessário considerar que sempre haverá redução do estande durante o desenvolvimento da lavoura e uma perda de 5% a 8% tem sido considerada normal. Essa perda se torna cada vez mais significativa quanto maior for o potencial produtivo da lavoura, em função da tecnologia e/ou investimentos realizados. Portanto, o ideal é perda zero de estande. Sabe-se que os híbridos dentados, por apresentarem maior flexibilidade no crescimento das espigas que os híbridos duros, tendem a compensar mais a variação da densidade de plantas com espigas maiores. Assim, em função do nível de investimento na lavoura, todas essas considerações devem ser ponderadas. Independentemente das causas das falhas, elas sempre vão promover perdas na produção final. Entretanto, as plantas vizinhas às falhas acabam sofrendo menos competição por luz, água, nutrientes, entre outros fatores. Assim, podem produzir um pouco mais que as demais plantas (sob competição plena na densidade

de plantio utilizada) e compensar parte das perdas devido às falhas. A compensação das plantas sobreviventes e vizinhas às falhas é bem conhecida pelos produtores. No caso específico do milho, as plantas que perdem precocemente a competição das plantas vizinhas geralmente produzem uma espiga maior ou mesmo duas ou mais espigas, compensando parte da perda pela morte de uma ou mais plantas na sua vizinhança. A expectativa de uma compensação expressiva alivia a pressão sobre os produtores em investirem mais no estabelecimento das lavouras com as melhores opções de sementes, plantio e manejo fitossanitário inicial da cultura. Atualmente, com os novos recursos digitais, como imagens aéreas obtidas por drones, veículos aéreos não tripulados (Vants) ou satélites, tem sido bem mais fácil obter informações frequentes, fiéis e gerais das lavouras. As imagens permitem avaliar a uniformidade da lavoura ou identificar reboleiras de plantas com padrões de tamanho e coloração diferentes. Isso pode indicar falhas no plantio, na emergência das plantas, distúrbios fisiológicos, deficiências nutricionais e incidências de pragas, doenças e/ou plantas daninhas. Mesmo quando não é possível fazer o diagnóstico com base nas imagens, mas só a indicação dos pontos da lavoura a serem amostrados, já facilita e aumenta significativamente a precisão e diminui o custo do monitoramento. Para identificar áreas com falhas na lavoura, essas imagens são bastante eficientes, principalmente se observadas periodicamente para avaliar a evolução da lavoura. Entretanto, o diagnóstico preciso das causas das perdas de plantas ainda demanda observações e investigação in loco. O monitoramento por imagem, embora muito eficiente para detectar determinados problemas na lavoura, ainda não é suficiente para diagnosticar vários desafios no campo. Por exemplo, em algumas doenças sistêmicas, cujos patógenos são transmitidos por insetos-vetores, os sintomas só se manifestam depois de algum tempo, podendo levar a planta à morte. Essas doenças, como os enfezamentos (causados por mollicutes) e as viroses no milho, quando são observados os sintomas, já não há mais como mitigar as perdas. Nesse caso, o monitoramento do vetor (cigarrinha-do-milho) deve ser realizado visualmente ou com armadilhas, toman-

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do amostras em pontos aleatórios e, se necessário, tomar medidas de controle para preservar a sanidade das plantas. Portanto, o monitoramento convencional ainda continua sendo necessário em muitos casos para a condução das lavouras de milho para altas produtividades. Embora se conheça bem a capacidade das plantas de milho sobreviventes próximas a falhas compensarem as perdas, não há publicação quantificando essa compensação em condições de campo. A perda inicial de plantas, pelos diferentes fatores discutidos anteriormente, é muito comum no início de desenvolvimento do milho e um dos desafios do produtor é a tomada de decisão em fazer ou não o replantio devido à quantidade de falhas. Evidentemente, essa decisão envolve a perda de boa parte da adubação, do custo da semente, da operação de semeadura, retardamento do ciclo etc. Dependendo da porcentagem de falha, talvez não seja econômico esse replantio, considerando todos esses

custos adicionais. Portanto, qualquer indicação desse nível de equivalência (custo de replantio equivalente ao valor da perda em produtividade devido às falhas) pode ser de extrema utilidade na tomada dessa decisão. Um trabalho conduzido na Embrapa Milho e Sorgo, para corrigir a perda de estande, em área experimental, quantificou com razoável precisão a capacidade compensatória das plantas de milho sob diferentes níveis de competição devido às falhas. Com base nesse trabalho é possível inferir o nível de compensação das plantas de milho em função da menor competitividade entre as plantas próximas às falhas. Na Figura 1 estão ilustrados os tratamentos estudados pela simulação de falhas para avaliar individualmente as plantas sob diferentes níveis de competição na linha de plantio. Foram utilizados dez tratamentos distribuídos em dois grupos, com falhas uni e bilaterais. O primeiro grupo, com uma, duas e três falhas, apenas de um lado da planta-referência,

e no outro grupo, uma, duas e três falhas de cada lado (A e B), além de suas respectivas combinações, sempre em relação às plantas-referência, ou seja, aquelas vizinhas às falhas. Esses tratamentos foram utilizados em dois híbridos e em dois anos de estudo. Em geral, se observou que a compensação média das plantas-referência, para todos os tipos de falhas simuladas, foi de aproximadamente 23%, o que corresponde a uma perda média de 77% em relação à lavoura sem falhas (Figura 2). Assim, cada 1% de falhas no estande da lavoura resulta em 0,77% (77/100) de perda na produção final de grãos. Portanto, não adianta o produtor se iludir que o milho compensa essa perda de estande, pois essa capacidade de compensação é limitada. À medida que se aumenta o número de falhas, realmente a compensação de cada planta-referência sobrevivente vai aumentando, mas como essa compensação média é cerca de 23% da produção da planta perdida, a produtividade total da lavoura vai se reduzindo proporcionalmente. Por exemplo, uma lavoura com 10% de falhas produzirá cerca de 92% do seu potencial. Se


Tabela 1 - Estimativas de limiar de falhas para diferentes níveis tecnológicos considerando o preço de sementes e outros para o replantio

o investimento na lavoura foi para obter uma produtividade de 200 sacas de milho/ha, com as falhas produzirá apenas 184 sacas, ou seja, uma perda de 16 sacas/ha. Considerando as estimativas de perda devido às falhas, qual seria o limiar entre fazer ou não o replantio em função dos custos dessa operação e da porcentagem de falhas na lavoura? Obviamente, esse limiar varia de lavoura para lavoura, dependendo basicamente dos custos de replantio e da produtividade esperada, que é função dos investimentos em manejo cultural, das tecnologias utilizadas, das condições de solo e do ambiente. Como exemplo, considerando o custo de sementes = R$ 700,00/ha e os demais custos de replantio em R$ 500,00/ha, isso totaliza R$ 1.200,00/ha. Considerando, ainda, um preço médio (mercado futuro do milho na data da redação desse artigo) de R$ 50,00/saca, o custo de replantio equivale a 24 sacas de milho (R$ 1.200,00/R$ 50,00) e a produção com as falhas corresponderia a 88% da produção esperada, ou seja, 12% de perdas. Se para cada 1% de falha corresponde 0,77% de perda na produção (média das perdas – Figura 2), dividindo-se 12/0,77 encontra-se a porcentagem de falhas correspondente a esse custo, ou seja 15,6%. Portanto, para esses dados simulados, a observação de qualquer porcentagem de falhas acima de 15,6% é econômico replantar, e abaixo desse valor não compensaria o replantio. Esse cálculo foi como exemplo e para cada situação será necessário estimar a porcentagem de falhas, pois apesar de possíveis diferenças em função das densidades de plantio utilizadas em cada lavoura, as variáveis como produção, preço de comercialização esperado e o custo de replantio devem ser diferentes para cada caso. Esse cálculo pode ainda ser útil na previsão de safra do produtor em função do estande/falhas que obteve na sua lavoura. Na Tabela 1 está estimada a equivalência entre o custo de replantio e a porcentagem de falhas para lavouras com base em valores médios para diferentes níveis de tecnologia utilizada e produtividade esperada. Para estimar a porcentagem de falhas na lavoura é necessário fazer uma amostragem representativa da área. Como discutido anteriormente, as imagens obtidas através de drones, Vants ou satélites podem facilitar a identificação das áreas mais afetadas, economizando uma amostragem da área total da lavoura, mas a quantificação das falhas demanda avaliação in loco. O tamanho ideal dessa amostra depen-

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Produção (sacas/ha) planejada 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160 170 180 190 200

Valor da produção Valor da produção Custo estimado Limiar entre custo de sem falhas com falhas de replantio (%) replantio e % de falhas* Baixa tecnologia (R$ 300,00 + R$ 500,00 = R$ 800,00)/ha (média 18,4) 3.000,00 2.450,00 26,7 34,6 3.500,00 2.950,00 22,9 29,7 4.000,00 3.450,00 20,0 26,1 4.500,00 3.950,00 17,8 23,1 5.000,00 4.450,00 16,0 20,8 Média tecnologia (R$ 500,00 + R$ 500,00 = R$ 1.000,00)/ha (média 15,2) 5.500,00 4.750,00 18,2 6.000,00 5.250,00 16,7 6.500,00 5.750,00 15,4 7.000,00 6.250,00 14,3 7.500,00 6.750,00 13,3 Alta tecnologia (R$ 700,00 + R$ 500,00 = R$ 1.200,00)/ha (média 13,4) 8.000,00 7.050,00 15,0 8.500,00 7.550,00 14,1 9.000,00 8.050,00 13,3 9.500,00 8.550,00 12,6 10.000,00 9.050,00 12,0

23,6 21,6 20,0 18,6 17,3 19,5 18,3 17,3 16,4 15,6

*Porcentagem de perdas de estande devido às falhas que provocam perdas na produtividade equivalentes ao custo aproximado de replantio.

de da uniformidade de ocorrência dessas falhas na área. Em geral, se considera razoável uma amostra de 10% do total a ser avaliado. Entretanto, nem sempre se utilizam os parâmetros ideais. Para o monitoramento da incidência de pragas na cultura do milho se tem adotado a avaliação de dez pontos de amostragem para cada 100ha. Nesses pontos são tomadas cinco amostras aleatórias de 10m de linha, contando-se o número total de plantas e as falhas observadas. A porcentagem de falhas na amostra pode ser calculada multiplicando o número de falhas por 100 e dividindo o resultado pelo número total de plantas esperadas na amostra (nº de falhas mais o de plantas), ou seja: % falhas = 100 x nº falhas/nº total (plantas + falhas). Fazendo-se a média das amostras em cada ponto e entre todos os pontos, se tem uma estimativa final da porcentagem de falhas na gleba considerada. Os resultados discutidos aqui se basearam apenas na compensação da perda de estande pela planta-referência (principal) e não foi considerada a compensação via perfilhamento. Em geral, o perfilhamento do milho é considerado uma característica indesejável, pois geralmente é improdutivo e rouba energia da planta principal, reduzindo sua produtividade. Um ou mais perfilhos comumente se formam quando o colmo principal é danificado ou morto por diferentes fato-

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res que afetam a cultura no início de seu desenvolvimento, como, por exemplo, granizo, geadas, insetos-praga, vento, pneus de trator etc. Em alguns híbridos, se o perfilhamento ocorrer cedo, esses perfilhos poderão desenvolver e produzir espigas que irão contribuir com a produtividade final. Finalmente, chega-se à conclusão de que, na cultura do milho, geralmente a compensação de plantas vizinhas às falhas existe, mas não na proporção que se pode imaginar. Todos os cuidados na obtenção do estande ideal da lavoura do milho é altamente relevante na obtenção de altas produtividades. Portanto, tomar todos os cuidados para o estabelecimento da cultura, com a densidade ideal de plantas, é essencial para se obter alta produtividade. Esses cuidados iniciam-se pelo planejamento antecipado, aquisição, transporte e armazenamento das sementes, bem como nas operações de plantio e tratos culturais durante a emergência das plântulas. Para a tomada de decisão, em fazer ou não o replantio, além de se considerar a porcentagem de falhas deve-se, ainda, ponderar o efeito da nova data de planC tio na produção esperada. José Magid Waquil UFSJ-Campus de Sete Lagoas Antônio Carlos de Oliveira Embrapa Milho e Sorgo


Milho

Paladar eclético C

onhecida popularmente como lagarta falsa-medideira, devido ao seu deslocamento dobrando o corpo em movimentos do tipo “mede-palmo”, por muito tempo, essa praga foi referenciada cientificamente como Pseudoplusia includens e, posteriormente, reclassificada no gênero Chrysodeixis includens (Goater et al, 2003). Sua distribuição geográfica está limitada ao ocidente, ocorrendo entre o extremo Norte dos Estados Unidos ao Sul da América do Sul. Pode ser encontrada em diversas culturas como feijão, fumo, girassol, hortaliças, tomate, dentre outras. Todavia, no Brasil, é comum nas regiões produtoras de soja, simultânea ou mais tardiamente em relação às populações da lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis), uma vez que o aumento do número de indivíduos está geralmente relacionado ao cultivo de algodão em localidades próximas. Relativo ao ciclo de desenvolvimento na soja (Figura 1), a mariposa realiza posturas isoladas, com ovos globulares, medindo cerca de 0,5mm de diâmetro, de coloração creme-clara logo após a oviposição e marrom-clara próximo à eclosão das larvas. O desenvolvimento embrionário se completa em torno de três dias. As lagartas que eclodem são de coloração verde-clara, com listras longitudinais brancas e pontuações pretas, atingindo de 40mm a 45mm de comprimento em seu último estádio larval. Dentro de cada instar, enquanto se alimenta, a lagarta sofre uma perceptível mudança na coloração, de verde amarronzada clara, para verde-limão translúcida. A injúria na planta é caracterizada pela desfolha de aspecto “rendilhado”, em que as nervuras são preservadas. Após o último instar larval, se transforma em pupa que ocorre sob uma teia, em geral, na face abaxial das folhas. A coloração da pupa vai de amarelo-pálida a verde-clara no início do desenvolvimento, com pigmentação dorsal irregular até 48 horas antes da emergência do adulto com duração média de 7,4 dias. Com o passar dos dias, as pupas tornam-se mais escuras, posto que a coloração é afetada pelo tipo de dieta que a lagarta consumiu. Os adultos são mariposas com 35mm de envergadura de asas dispostas em forma inclinada. As anteriores são de coloração escura, com duas manchas prateadas brilhantes na parte central e as posteriores de coloração marrom. Considerada praga secundária até o final da década de 1990, raramente exigia medida específica de controle, pois era naturalmente mantida em equilíbrio por epizootias. Assumiu importân-

Eduardo Lima do Carmo

Temida pela capacidade de provocar danos, associada à dificuldade de controle na cultura da soja convencional, a lagarta falsa-medideira, caracterizada também pelo hábito de polifagia, foi encontrada na cultura do milho convencional em infestação numericamente inédita. Produtores rurais e técnicos devem ficar atentos contra eventuais prejuízos econômicos. Identificar e associar práticas de manejo já utilizadas e consolidadas podem auxiliar no controle

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cia agrícola no Brasil e status de praga-chave com o advento da doença ferrugem-asiática (Phakopsora pachyrhizi) na cultura da soja (2001/2002), visto o desequilíbrio do agroecossistema causado pelas aplicações sequenciais de fungicidas associadas ao uso de pesticidas não seletivos, os quais prejudicam a ação de controladores biológicos, como os fungos entomopatogênicos, predadores e parasitoides, respectivamente (Bueno et al, 2007). Adicionado a isso, há dificuldade de obter eficiência de aplicação, visto a lagarta surgir e posicionar-se com maior abrangência no terço médio das plantas em avançado estádio de desenvolvimento vegetativo. Contudo, a expressiva introdução de materiais geneticamente modificados suprimiu sua ação de desfolha na oleaginosa, eficazmente.

Contrariamente, o cultivo de híbridos de milho convencional tem se intensificado nos últimos anos devido ao custo de aquisição de sementes, bem como pela ineficácia de controle que algumas tecnologias transgênicas estão apresentando. Embora já relatada a presença da falsa-medideira na cultura do milho convencional, apenas como hospedeira (Endris, 1973), no Brasil, casualmente pode ser também observada em número não expressivo, tampouco, prejudicial ao cultivo do cereal. Entretanto, na safrinha de 2020, lagartas dessa espécie foram observadas em diferentes áreas cultivadas com um mesmo híbrido de milho convencional consorciado com Brachiaria ruziziensis no Sudoeste goiano. Mais precisamente, nos municípios de Caiapônia, Montividiu e Rio Verde em infestações jamais constatadas (20% a 30% das plantas com presença do inseto). Curioso foi o fato de se alimentarem do estilo-estigma, popularmente denominado de “cabelo da espiga de milho”, promovendo “roletamento” e corte total dessa estrutura (Figura 2AB). Apesar disso, não foram encontradas lagartas perfurando a espiga ou mesmo se alimentando dos grãos. Mas, dependendo do estádio de desenvolvimento da planta, essa ação do inseto pode interferir no processo de polinização/fecundação, prejudicando a formação de grãos e, consequentemente, diminuindo a produtividade. Um produtor rural, comum às localidades de cultivo mencionadas, praticou o manejo de pragas focado no controle da lagarta-do-cartucho do milho (Spodoptera frugiperda), por sua vez, a principal praga da cultura. Visto a pressão de infestação, realizou em intervalo médio de 12 dias aplicações terrestres de espinosina associada a triflumurom, lufenurom e baculovírus Spodoptera, sequencialmente, em taxa de 92L/ha. Por fim, metomil (via aérea), 10L/ha. Após essa última pulverização, percebeu a presença da lagarta falsa-medideira e observou que áreas de cultivo vicinais às instalações das propriedades e matas estavam mais infestadas pelo inseto, pelo fato de a aeronave não aplicar próximo a estes locais. Logo, presume-se que no restante das áreas houve controle dessa lagarta, porém não quantificado em termos de eficácia. Observou-se, também, que áreas vizinhas tratadas com aplicações consecutivas de benzoato de emamectina, embora com eficácia de controle inferior para S. frugiperda, não foram infestadas pela

Apesar da presença do inseto, não houve identificação de lagartas perfurando a espiga ou se alimentando dos grãos

As lagartas que eclodem são de coloração verde-clara, com listras longitudinais brancas e pontuações pretas

Figura 1 - Ciclo de desenvolvimento da lagarta falsa-medideira em soja. Fonte: Reide; Greene (1973); Vásquez (1988)

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Fotos Eduardo Lima do Carmo

A

B

Figura 2 - Lagarta falsa-medideira se alimentando do “cabelo da espiga de milho”

lagarta falsa-medideira, bem como áreas com híbridos transgênicos. Vale ressaltar que todas essas áreas foram cultivadas com soja Bt antecessora (safra verão) ao milho, dado que não foi detectada a presença da lagarta falsa-medideira. Ficou, portanto, a dúvida do produtor em relação ao híbrido implantado ou seu manejo quanto à questão de favorecer, coincidentemente, o surgimento da lagarta nos distintos locais de cultivo, pois não há informações consistentes sobre sua mobilidade nas condições tropicais, salvo que é considerada praga migratória no Hemisfério Norte (Harding, 1976). Assim como na cultura da soja, o comportamento dessa lagarta no milho foi semelhante, pois surgiu em estádio de desenvolvimento avançado da cultura posicionando-se em local de difícil controle, comprometendo, assim, a eficiência da aplicação de inseticidas. Outro aspecto a ser analisado, com muito cuidado, é a possibilidade do consórcio com forrageiras influenciar na infestação da falsa-medideira, pois ambiente de cultivo

diferenciado é constituído com adoção dessa técnica. No tocante a essa informação, atualmente, em algumas regiões do próprio Sudoeste do estado de Goiás, pecuaristas estão com dificuldades em reformar suas pastagens devido à infestação inicial de lagartas, principalmente do complexo Spodoptera sp., tanto em plantas do gênero Panicum sp., quanto Brachiaria sp. A aplicação de produtos químicos constitui-se como a principal ferramenta de controle nas principais culturas como algodão, feijão e soja. Conjuntamente, há mais de uma centena de produtos indicados para o controle da lagarta falsa-medideira/Pseudoplusia includens/ Chrysodeixis includens. Para a cultura do milho, entretanto, não há nenhum produto registrado nacionalmente. Não obstante, apenas a simples ideia de usar inseticidas para o controle de lagartas e outras pragas, em geral, não é o suficiente, em decorrência de várias falhas que podem ocorrer dentro de um sistema de cultivo. Outras ferramentas, como a tec-

nologia de aplicação, devem ser consideradas no intuito de otimizar o uso dos inseticidas, de forma a obter melhor eficácia de controle, evitando, assim, excesso de aplicações, resistência de pragas e contaminação ambiental. Para tanto, é preciso atenção a aspectos práticos como o tipo de ponta hidráulica a ser utilizado, a calibragem e a regulagem de equipamentos pulverizadores, a taxa de aplicação correta, o horário de aplicação, o uso de adjuvantes, entre outros. Distintas formas de combater a falsa-medideira como o cultivo de materiais modificados geneticamente, assim como a liberação e a aplicação de controladores biológicos (predadores, parasitoides e micro-organismos), podem alcançar níveis de eficácia de controle satisfatórios. Os últimos, desde que utilizados harmoniosamente com outras ferramentas de manejo, como a aplicação de pesticidas seletivos. Estudos relacionados à presença da falsa-medideira na cultura do milho convencional como nível de ação, dano econômico, tecnologia de aplicação, bem como a possível influência do consórcio com plantas de cobertura, inexistem. Havendo necessidade de controle, cabe aos setores agrícolas relacionados cooperarem com troca de informações de forma a auxiliar na descoberta de medidas práticas operativas, visto que em outras culturas agrícolas, essa lagarta constitui-se como praga extremamente agressiva, C capaz de causar danos irreparáveis.

Ivan Brucelli, Furtunato Leão Cabral e Eduardo Lima do Carmo, Universidade de Rio Verde (UniRV) Luiz Fernando Ribeiro Júnior e João Vitor Alves de Sousa, Gapes/UniRV

Brucelli, Cabral, Carmo, Ribeiro Júnior e Sousa chamam a atenção para quantidade incomum da falsa-medideira em milho

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Paulo Sergio dos Santos Phytus Club

Informe

Efeito em nematoides

Fertilizante aplicado via tratamento de sementes ativa mecanismos de defesa das plantas de soja e pode ser uma boa alternativa para auxiliar no manejo de Meloidogyne javanica na cultura da soja

O

s nematoides estão entre os principais limitantes da produtividade da soja no Brasil, com prejuízos anuais estimados em aproximadamente R$ 16 bilhões. Dentre

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os nematoides que causam os maiores prejuízos, estão os nematoides das galhas (Meloidogyne javanica e M. incognita) e o das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus). O controle destes nematoides

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é dificultado, principalmente, pela ampla distribuição geográfica e pela gama de hospedeiros, o que dificulta a escolha de materiais para rotação de culturas. Desta forma, nos últimos anos, tem crescido o


interesse por métodos alternativos de manejo. Pesquisas realizadas ao longo dos últimos anos em parceria com instituições de pesquisa mostraram que o produto Pack Seed apresenta potencial para o manejo de nematoides, por ativar mecanismos de defesa na

planta, que melhoraram a lignificação da parede celular, reduzindo a penetração e a sua reprodução. Pack Seed é uma complexa mistura de compostos de natureza bioquímica diferente e biodegradável com registro para tratamento de sementes de soja, milho, trigo e feijão. É um produto diferenciado, pois além dos tradicionais Co e Mo, fornece macros e micronutrientes, enraizantes e aminoácidos. É uma formulação completa para tratamento de sementes, e uma alternativa promissora no manejo de nematoides, aplicado isolado ou associado a outros produtos. Como todos os métodos de controle apresentam limitações, é necessária a investigação para compor o manejo integrado, como o estudo da nutrição de plantas, haja vista que o conhecimento do modo de ação de cada produto pode explicar se agem isoladamente ou em sinergia, otimizando o controle de nematoides em plantas. Portanto, dada a escassez de alternativas de controle de nematoides em soja, fazem-se necessárias pesquisas que avaliem novas tecnologias. Diante disso, realizou-se um trabalho em parceria com a Fundação ABC para verificar a eficiência de Pack Seed, via tratamento de sementes na dose de 3ml/kg, no manejo de Meloidogyne javanica na cultura da soja. A metodologia utilizada para a avaliação dos tratamentos foi por meio da contagem da população do nematoide M. javanica em raízes de soja e também seu efeito sobre a produtividade. Considerando-se a coleta realizada no estádio R2 (Figura 1), o tratamento com Pack Seed apresentou redução significativa no número de espécimes de M. javanica em 10g de raiz em relação à testemunha. Esse efeito pode ser atribuído ao fato de o produto ativar os mecanismos de defesa das plantas, como o aumento da síntese de metabólitos secundários, tais como as enzimas peroxidase e fenilalanina-amônia-liase, relacionadas principalmente ao enrijecimento da parede celular, o que dificulta a penetração, a movimentação e o sítio de alimentação do nematoide. Com relação à produtividade da soja (Figura 2), houve um incremento de 5,22 sacas a mais por hectare, em relação à testemunha, uma resposta natural da cultura em função da melhor nutrição e sanidade, proporcionada pelo Pack Seed. O Pack Seed, além de nutrir as plantas com os principais macros e micronutrientes, enraizantes e aminoácidos para a máxima expressão de seu potencial produtivo, é uma alternativa promisC sora no manejo do nematoide M. javanica.

Figura 1 - Efeito do tratamento sobre o número de indivíduos de Meloidogyne javanica em 10g de raízes em plantas de soja aos 50 dias (R2) após a emergência

Figura 2 - Produtividade da cultura da soja em resposta ao tratamento com Pack Seed

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Trigo

Competição crítica Saimom Sozo

Em trigo, a definição do potencial produtivo ocorre logo no início do desenvolvimento da cultura, o que demanda o estabelecimento em área limpa, sem interferência de daninhas, plantas que exigem muita atenção ao controle e manejo de resistência

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A

região Sul do Brasil apresenta algumas características climáticas peculiares, sendo uma delas a distribuição das chuvas durante o ano todo, o que permite a implantação de culturas de interesse econômico. Dentre essas culturas, os cereais de inverno como trigo, cevada, centeio, aveia, detêm papel de destaque. Uma das principais culturas plantadas tem sido o trigo, para a comercialização com os objetivos de diluir os custos e obter melhor aproveitamento da área. A produtividade média de trigo no Brasil na safra 2019 foi de aproximadamente 2.526 quilos por hectare (42,1 sc/ha) conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab, 2019). Apesar disso, dentre os fatores responsáveis por perdas de produtividade na cultura do trigo, estão a ocorrência de plantas daninhas, que podem interferir de forma negativa devido à sua competição direta por água, luz e nutrientes, e em alguns casos, até efeitos alelopáticos. As plantas daninhas encontradas com maior frequência na cultura do trigo são buva (Conyza sumatrensis, Conyza bonariensis e Conyza canadensis), azevém (Lollium perene spp. muliflorum) e nabo (Raphanus raphanistrum e Raphanus sativum). Outras plantas guaxas ou tigueras podem ocorrer, como a aveia-preta (Avena strigosa) e a aveia-branca (Avena sativa). A presença de biótipos resistentes aos principais mecanismos de


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ação utilizados no manejo da cultura do trigo (Tabela 1) tem aumentado a complexidade do manejo em função das poucas opções de herbicidas disponíveis e seletivos à cultura, além de aumentar o custo de produção. A resistência de plantas daninhas a herbicidas é a habilidade de caráter hereditário de uma planta sobreviver e se reproduzir após a exposição a uma dose de herbicida normalmente letal (Heap, 2020). O uso consecutivo de um mesmo herbicida exerce uma alta pressão de seleção sobre uma população, controlando os biótipos suscetíveis e deixando apenas os resistentes. Os mecanismos que conferem resistência aos herbicidas são classificados como alteração no local de ação, que pode ser via substituição de um ou mais aminoácidos na enzima-alvo ou superexpressão da enzima-alvo, e não alteração do local de ação, via redução na absorção e translocação, metabolização e compartimentalização do herbicida. Vale lembrar que a resistência pode ser simples, cruzada e múltipla, aumentando a complexidade do manejo em ordem crescente. Para a correta adoção das estratégias do manejo integrado é de extrema importância a identificação das espécies presentes na área. As espécies de nabo são plantas com crescimento vegetativo inicial rápido, grande produção e viabilidade das sementes, elevada dispersão temporal de emergência, tolerância a baixas temperaturas, apresentando uma grande capacidade competitiva com a cultura do trigo. Cabe salientar que esta planta daninha é amplamente encontrada nas diferentes regiões produtoras, nos cultivos de inverno e verão, em que era facilmente manejada pelos herbicidas inibidores da ALS na cultura da soja (clorimuron-etílico, cloransulam-metílico e imazetapir), milho (nicosulfuron) e trigo (metsulfuron-metil e iodosulfuron-metílico). Em função da pressão de seleção exercida pelo uso contínuo do mesmo mecanismo de ação selecionaram-se biótipos resistentes em ambas as espécies, em algumas regiões (Costa, 2017). A resistência é do tipo cruzada,

Nabo emergindo na cultura do trigo

sendo que o mecanismo que confere resistência é a mutação na enzima-alvo, este tipo de resistência afeta negativamente o manejo desta planta daninha na cultura de soja, milho e trigo com herbicidas inibidores da ALS. Já o azevém apresenta crescimento bastante agressivo, alta capacidade de perfilhamento e de polinização cruzada que favorece a evolução da resistência em função da maior variabilidade genética, sendo tolerante a baixas temperaturas. Porém, não se adapta em climas tropicais (mesotérmica), o banco de sementes inicia a sua germinação no final ou após a colheita da soja, quando as temperaturas começam a baixar. É considerada planta de difícil controle na pós- emergência da cultura do trigo, devido às poucas

opções de herbicidas seletivos à cultura. Em função da aplicação repentina dos mesmos mecanismos, selecionaram-se biótipos resistentes aos herbicidas inibidores de EPSPS, ALS e ACCase em algumas regiões, dificultando o controle com herbicidas. Estas resistências podem ser dos tipos simples e múltipla. No caso dos herbicidas inibidores da EPSPS, alguns estudos indicam como mecanismo de resistência a translocação diferencial entre os biótipos suscetíveis e resistentes, já para herbicidas inibidores da ALS e ACCase, o mecanismo de resistência é do tipo alteração nos aminoácidos que codificam a enzima-alvo, conferindo ao biótipo altos níveis de resistência. As espécies de buva são plantas daninhas amplamente disseminadas nos diferentes sistemas agrícolas brasileiros, causando prejuízos em diversas culturas

Tabela 1 - Casos de resistência de cereais de inverno no Brasil (Heap, 2020)

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Figura 1 - Gráfico do sistema de produção

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com a elongação do colmo principal, variando de acordo com a cultivar. São responsáveis pela definição do número potencial de espiguetas, que influencia diretamente no número de grãos por metro quadrado, portanto, durante estes estádios, qualquer tipo de competição com plantas daninhas compromete a construção do potencial produtivo. De maneira prática quando se pensa em ambientes de alto potencial produtivo, a cultura deve Daniel Müller

de interesse econômico. Apresentam germinação em condições de temperaturas do solo amenas próximas a 20°C. São classificadas como fotoblásticas positivas, ou seja, dependem da luz para germinar. Têm alta produção de sementes, que são leves e facilmente disseminadas pelo vento. Apresentam alta complexidade de manejo, principalmente após a detecção da resistência ao herbicida glifosato, amplamente disseminada no Brasil. A resistência da buva aos mecanismos inibidores da ALS e mimetizadores de auxina é das mais prejudiciais no manejo de plantas daninhas no trigo, pois, são as únicas opções de controle na pós-emergência da cultura. Porém, já foi diagnosticada resistência em outras culturas aos mecanismos de ação inibidores da Protox e Fotossistema I, com distribuição mais regionalizada. Para o manejo correto de plantas daninhas, com o objetivo de maximizar a produtividade com rentabilidade econômica nos cereais de inverno, é necessário entender alguns conceitos relacionados à matocompetição e qual o seu impacto negativo sobre os componentes da produtividade. Diante disso, tem-se por conceito o período crítico de prevenção à interferência (PCPI), em que as plantas de interesse econômico devem permanecer livres de competição com plantas daninhas, pois o impacto negativo sobre a produtividade é maior, de acordo com a espécie e a densidade de plantas infestantes, e a duração do período de competição. A definição do potencial produtivo do trigo ocorre logo no início do desenvolvimento da cultura, no estádio de duplo anel, que normalmente ocorre com duas a quatro folhas, e espigueta terminal que coincide

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Lavoura de trigo infestada por azevém e buva

ser estabelecida no limpo. Na escolha das estratégias a serem utilizadas no manejo das plantas daninhas de difícil controle, o conhecimento do histórico da área, do sistema de produção e das práticas de manejo utilizadas permite identificar os gaps e as oportunidades de manejo. O sistema de produção nas regiões que cultivam cereais de inverno (Figura 1) apresenta um vazio outonal entre a colheita da cultura de verão e a implantação da cultura de inverno, que favorece a emergência e o estabelecimento de plantas daninhas, em função da baixa quantidade de palha deixada pela cultura da soja associado a temperaturas amenas e umidade favorável para a germinação das espécies infestantes, como exemplo a buva, o azevém e o nabo. Portanto, é uma etapa do ciclo produtivo importante na construção de um manejo eficiente de plantas daninhas, com objetivo de reduzir os fluxos de emergência do banco de sementes no solo e também eliminar as plantas remanescentes (rebrotes) da cultura de verão, associando controle químico e controle cultural, através da implantação de plantas de cobertura, ou seja, eliminando o “pousio zero”. Nesse cenário de complexidade, o cultivo de plantas de cobertura no vazio outonal é uma prática já consolidada por alguns produtores, que além de seus benefícios aos sistemas de produção como um todo, reduz a emergência de novos fluxos de plan-

Teston alerta para período crítico de competição de daninhas em trigo


tas daninhas, principalmente as que necessitam de luz para germinar. Além disso, ajuda a reduzir a amplitude térmica, a produção de compostos alelopáticos, permite a formação de uma barreira física sobre o solo, impedindo ou retardando a emergência de plantas daninhas com sementes pequenas com pouca reserva, dentre outros benefícios. Para o sucesso desta prática, alguns cuidados devem ser considerados, se no momento da colheita da soja tem-se a presença de plantas infestantes estabelecidas que são cortadas pela colhedora. Devem ser manejadas antes da implantação da cultura de cobertura com uso de herbicidas. Já em áreas sem presença de plantas daninhas no momento da semeadura da planta de cobertura, porém com histórico de infestação (banco de sementes do solo), pode-se optar por plantas de coberturas com efeito alelopático e com algum nível de seletividade aos herbicidas que necessitam ser utilizados. A implantação de um sistema de rotação de culturas potencializa o manejo das plantas daninhas, principalmente pela rotação de diferentes modos de ação dos herbicidas, reduzindo a seleção direcional de biótipos com algum nível de resistência, associado à introdução de práticas que desfavoreçam a biologia das plantas daninhas, reduzindo o estabelecimento da infestação, multiplicação e o aumento do banco de sementes na área. A introdução de herbicidas pré-emergentes no sistema de produção, tanto na cultura antecessora de verão (soja e milho) como na implantação da cultura do trigo, é uma prática eficiente, que contribui para a redução no banco de sementes, além de retardar e uniformizar a emergência e o desenvolvimento inicial das plantas daninhas na cultura do trigo, facilitando o manejo com herbicidas na pós-emergência da cultura, pois as plantas daninhas estarão jovens, permitindo, em muitos casos, a redução no número de aplicações de herbicidas. Práticas culturais como adubação nitrogenada, ajuste populacional, qualidade de semeadura, que favorecem o crescimento e o fechamento rápido do dossel tanto em plantas de cobertura quanto na cultura do trigo, potencializam a capacidade competitiva da cultura e suprimem o desenvolvimento das plantas daninhas. Após a implantação da cultura, restam poucas alternativas de herbicidas para o manejo do complexo de plantas daninhas. Por isso é importante estabelecer a cultura livre de infestações de plantas daninhas, priorizando o manejo de dessecação pré-plantio da cultura, principalmente em áreas com histórico de plantas resistentes ou de difícil controle. Os herbicidas registrados para uso pós-emergente na cultura do trigo são inibidores da ALS (que controlam mono e dicotiledôneas), inibidores da ACCase (específicos para monocotiledôneas), mimetizadores de auxina (específicos para dicotiledôneas), inibidores do fotossistema II (que controlam algumas espécies mono e dicotiledôneas). O controle químico de nabo e buva na cultura do trigo é realizado com herbicidas pertencentes ao mecanismo dos inibidores da ALS. Destacam-se os ingredientes ativos metsulfuron-metil, iodosulfuron-metílico e piroxsulam. Outras

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Nabo implantado pós-colheita da soja

opções são os herbicidas mimetizadores de auxina, 2,4D e MCPA e inibidores do fotossistema II, neste caso a bentazona. Nas plantas monocotilédones, como azevém e aveia, o controle químico é realizado com herbicidas pertencentes ao mecanismo dos inibidores da ALS, como iodosulfurom-metílico e piroxsulam. Outro grupo que pode ser usado no manejo são os inibidores da ACCase, com destaque para o clodinafope-propargil. A escolha do herbicida deve levar em consideração o histórico de plantas resistentes na área. Além disso, para que os herbicidas sejam eficientes no controle deve-se respeitar alguns critérios técnicos, como o tamanho das plantas daninhas, que devem estar nos estádios iniciais de desenvolvimento de três a quatro folhas para dicotiledôneas e de um a dois perfilhos para monocotiledôneas, além de dose, temperatura, condições fisiológicas da planta daninha, condições ambientais anteriores e posteriores à aplicação, misturas de tanque e tecnologia de aplicação. No tocante a isso, o estádio fenológico da cultura do trigo no momento da aplicação deve também ser levado em consideração, para garantir a seletividade dos herbicidas à cultura, buscando evitar injúrias e efeitos negativos na produtividade. Portanto, a construção de ambientes de alto potencial produtivo em trigo depende de um correto manejo de plantas daninhas, principalmente em um cenário onde exista a ocorrência de plantas resistentes, uma vez que o sistema de produção deve ser considerado para um manejo eficiente. Além disso, são necessários a adoção de plantas de cobertura, a utilização de herbicidas pré-emergentes, o manejo de dessecação pré-plantio, observar a qualidade de semeadura, o ajuste de população, a adubação nitrogenada, dentre outras práticas que suprimem o crescimento das plantas daninhas e maximizam a capacidade competitiva da cultura, permitindo a construção e a expressão do máximo poC tencial produtivo. Renan Teston, Instituto Phytus

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Soja

Associação testada

Adotada em 95% das pulverizações realizadas pelos agricultores, a mistura de agroquímicos tem se popularizado cada vez mais no Brasil, ao mesmo tempo em que cresce a necessidade de entender melhor a interação e os efeitos destes produtos associados, como a aplicação de fungicidas e inseticidas para controle da ferrugem-asiática e do percevejo-marrom na soja

A

soja é a principal cultura de verão do Brasil, segundo maior produtor e o maior exportador da commodity no mundo. A continuidade e a evolução dessa produção passam pelo uso de diversas tecnologias que, cada vez mais, devem trazer sustentabilidade para a cadeia produtiva. A ocorrência de doenças e de insetos em lavouras de soja é um dos principais problemas para o seu cultivo e requer a adoção de medidas de manejo fitossanitário. Entre essas práticas, o controle quí-

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mico tem sido necessário para o controle de doenças, como a ferrugem-asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, e de insetos, como o percevejo-marrom, Euschistus heros. Algumas das pulverizações realizadas para o controle da ferrugem-asiática podem coincidir com a necessidade de controle do percevejo-marrom em soja, mas mesmo quando tecnicamente essa necessidade não coincide, considerando os preceitos do Manejo Integrado de Pragas (MIP) e de Doenças (MID), tem sido comum a realização de misturas

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dessas e de outras classes de produtos em tanque, com o objetivo de aproveitamento da operação de pulverização. Segundo dados de pesquisa, a mistura de agroquímicos em tanque é adotada em 95% das pulverizações realizadas pelos agricultores, utilizando-se de dois a cinco produtos na calda de aplicação, sendo que a associação mais frequente (31%) é de fungicidas com inseticidas (Gazziero, Planta Daninha, v. 33, p. 83–92, 2015). As associações de diferentes produtos podem gerar um efeito aditivo (a ação é a


Fotos Rafael Soares

soma das qualidades individuais de cada formulação), sinérgico (a ação é superior à soma das qualidades individuais de cada formulação) ou antagônico (a ação é inferior à soma das qualidades individuais de cada formulação). O antagonismo pode ocorrer em razão da incompatibilidade física e/ou da incompatibilidade química entre produtos, alterando a qualidade do controle obtido com as pulverizações. As características físicas como solubilidade, constante de ionização (pKa) e coeficiente de partição octanol-água (Kwo) costumam ser as primeiras interações que ocorrem e, somente após essas reações, ocorrerão as interações químicas (Ikeda, Informe Agropecuário, v. 34, n. 276, 2013). Além disso, a associação de diferentes produtos em uma única aplicação é uma prática que pode trazer outros benefícios econômicos, pois a redução do número de entradas na lavoura pode levar a menor compactação do solo, menor amassamento de plantas, economia de água, de combustível e de tempo de trabalho. Durante muitos anos, mesmo sendo frequentemente utilizada pelos agricultores, a prática de mistura em tanque não era regulamentada em lei, deixando na ilegalidade quem a realizasse. A partir da publicação da Instrução Normativa nº 40, de 11 de outubro de 2018, a prática foi regulamentada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), ficando o engenheiro agrônomo responsável pela recomendação das misturas em tanque e sua forma de aplicação, por meio do receituário agronômico, bem como por responder por quaisquer consequências adversas que essa recomendação possa causar. Um gargalo existente em todo esse processo encontra-se no fato de não ser necessário o registro de misturas por parte das empresas desenvolvedoras de produtos químicos, aumentando a incerteza do que diferentes misturas possam ocasionar na pulverização, bem como o risco de prejuízos para o agricultor e ao engenheiro agrônomo que assina o receituário. Por isso, é de grande importância a realização de pesquisas para o maior conhecimento sobre as mais diversas misturas que possam ser realizadas durante o manejo da cultura da soja. No entanto, a

Folha de soja com sintomas de ferrugem-asiática (esquerda) e presença de percevejo-marrom sobre vagem (direita)

grande quantidade de produtos químicos registrados para a cultura, torna quase impossível o teste de todas as combinações que vêm sendo utilizadas no campo. Além disso, dificilmente uma única pesquisa consegue abordar os diversos aspectos das misturas, sendo eles as interações físico-químicas dos produtos, o efeito sobre a tecnologia de aplicação, o efeito sobre a cultura (fitotoxicidade) e a eficiência biológica sobre os diferentes alvos de acordo com os produtos misturados (herbicidas, fungicidas, acaricidas e/ ou inseticidas, entre outros). Resta então à pesquisa ir testando o máximo possível de misturas e avaliar os seus diferentes aspectos, com o objetivo de minimizar os riscos das pulverizações. Neste sentido, foram realizados experimentos para avaliar a associação de fungicidas e inseticidas, recomendados para o controle da ferrugem-asiática e do percevejo-marrom, respectivamente, em relação à eficiência de controle da doença. Os experimentos foram conduzidos durante duas safras no campo experimental da Embrapa Soja, em Londrina, no Paraná

EXPERIMENTO 1

A semeadura foi realizada no dia 24 de novembro de 2018, com a cultivar

DM 66I68RSF IPRO. Neste experimento os tratamentos consistiram em dois programas de controle químico para a ferrugem-asiática com diversos fungicidas, adicionados ou não de inseticidas recomendados para o controle do percevejo-marrom, todos nas doses recomendadas na bula (Tabela 1). Os princípios ativos descritos entre parênteses na Tabela 1 são misturas comerciais. Foram feitas três aplicações em cada tratamento (Tabela 1). O delineamento experimental foi em blocos casualizados, com quatro repetições. As parcelas experimentais possuíam seis linhas de 7m de comprimento, espaçadas em 0,45m entre linhas. As aplicações foram feitas com pulverizador costal pressurizado por CO2, com barra de pulverização com quatro pontas de jato leque, modelo XR110.02 e volume de 150L/ha. Avaliou-se a severidade da ferrugem-asiática coletando-se dez folíolos da soja em cada repetição, na altura do terço médio das plantas. A partir dessas avaliações calculou-se a área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD). Também foi avaliada a porcentagem de desfolha das plantas. Foram realizadas a análise de variância dos dados e a comparação de médias pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Os primeiros sintomas da doença na testemunha foram observados na primeira quinzena de janeiro, no estádio R2, e a severidade manteve-se baixa até o final do mês, evoluindo a partir de fevereiro de forma ace-

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Fotos Rafael Soares

Experimentos foram conduzidos durante duas safras no campo experimental da Embrapa Soja, em Londrina, no Paraná

lerada. No momento da primeira aplicação, a ferrugem-asiática estava com 5% de incidência na área, ou seja, a cada 100 folíolos coletados, cinco estavam com sintomas iniciais das doenças. As aplicações foram realizadas nos estádios R2, R4 e R5.2. Foram feitas avaliações de severidade nos estádios R2, R4, R5.2, R5.4 e R6. A desfolha foi avaliada no estádio R7. Nas avaliações entre R4 e R5.4 a testemunha apresentou maior severidade em relação aos demais tratamentos, e entre esses não ocorreram diferenças significativas. Na avaliação em R6, a testemunha apresentou maior severidade que os demais tratamentos e, entre esses tratamentos, o de número 5 apresentou maior severidade que o de número 3. No entanto, considerando a comparação entre os tratamentos que diferiram apenas na adição ou não dos inseticidas, não houve diferença significativa entre esses (Tabela 1). As avaliações de desfolha e AACPD mostraram diferença significativa apenas entre a testemunha e os demais tratamentos, sem diferença entre os tratamentos com aplicação dos controles químicos.

EXPERIMENTO 2

Neste segundo experimento, a semeadura foi realizada no dia 3 de dezembro de 2019, com a cultivar BRS 318RR. Não foi testado um programa de controle para a ferrugem-asiática, mas sim misturas específicas para o combate da doença, que foram repetidas em três aplicações em cada tratamento, com ou sem a adição de inseticidas para o controle do percevejo-marrom (Tabela 2). É importante salientar que não se recomenda repetir mais que duas vezes a aplicação dos mesmos ingredientes ativos, para não aumentar a seleção de populações do fungo resistentes aos fungicidas. Portanto, as três aplicações realizadas das mesmas misturas foram feitas com objetivo experimental e não se constituem recomendação de programa de controle para a ferrugem-asiática. O delineamento experimental, os métodos de aplicação e de avaliação foram os mesmos descritos no experimento anterior. A ferrugem-asiática incidiu no experimento na segunda quinzena de janeiro, no estádio R3, e a severidade evoluiu de forma lenta durante todo o ciclo da cultura, em decorrência do volume de chuvas abaixo do normal, configurando inclusive um cenário de seca que prejudicou o desenvolvimento da cultura. No momento 30

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da primeira aplicação a ferrugem-asiática estava com 53% de incidência na área e severidade média de 1%, nos folíolos coletados no baixeiro das plantas. As aplicações foram realizadas considerando a ocorrência da doença, nos estádios R4, R5.2 e R5.4. Foram feitas avaliações de severidade nos estádios R5.2, R5.4 e R6. Todas as avaliações de severidade da doença, bem como as avaliações de desfolha e AACPD, mostraram diferença significativa apenas entre a testemunha e os demais tratamentos, sem diferença entre os tratamentos com aplicação dos controles químicos (Tabela 2).

CONCLUSÕES GERAIS

A associação dos inseticidas e dos fungicidas, utilizados nas condições dos dois experimentos, não afetou o controle da ferrugem-asiática em relação à severidade da doença. É importante ressaltar que, embora as misturas em tanque possam apresentar as vantagens descritas nesse texto, e no caso dos ensaios descritos, sem problemas para a eficiência dos fungicidas, é imprescindível a utilização de critérios técnicos para decidir a necessidade da colocação dos produtos no tanque. Nos dois experimentos, na primeira aplicação para a doença, não havia a necessidade de controle do percevejo-marrom, sendo que a mistura só foi realizada para atender o objetivo do experimento, mas não havia necessidade para


Tabela 1 - Severidade da ferrugem-asiática ao longo do desenvolvimento da cultura, desfolha e área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD). Média de quatro repetições Tratamento 1. 2.

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Testemunha 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + (ciproconazol+difenoconazol) + óleo mineral 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + mancozebe + óleo mineral 3ª.(ciproconazol+difenoconazol) + mancozebe + óleo mineral 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + (ciproconazol+difenoconazol) + óleo mineral + acefato 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + mancozebe + óleo mineral + acefato 3ª.(ciproconazol+difenoconazol) + mancozebe + óleo mineral + acefato 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + (ciproconazol+difenoconazol) + óleo mineral + tiametoxam 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + mancozebe + óleo mineral + tiametoxam 3ª.(ciproconazol+difenoconazol) + mancozebe + óleo mineral + tiametoxam 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal 3ª.(picoxistrobina+ciproconazol) + mancozebe + óleo mineral 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + acefato 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + acefato 3ª.(picoxistrobina+ciproconazol) + mancozebe + óleo mineral + acefato 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + tiametoxam 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + tiametoxam 3ª.(picoxistrobina+ciproconazol) + mancozebe + óleo mineral + tiametoxam CV(%)

R2 0,0

Severidade média (%) R5.2 R4 R5.4 18,0 a 1,8 a1 37,6 a

R6 72 a

Desfolha (%) 95 a

1141 a

0,0

0,2 b

1,2 b

5,8 b

42 bc

53 b

322 b

0,0

0,3 b

0,9 b

4,7 b

37 c

51 b

277 b

0,0

0,2 b

1,1 b

4,6 b

41 bc

51 b

302 b

0,0

0,4 b

2,1 b

7,6 b

51 b

54 b

407 b

0,0

0,2 b

1,5 b

6,4 b

45 bc

58 b

353 b

0,0

0,7 b

2,1 b

5,5 b

48 bc

58 b

366 b

27

34

32

9,9

8,4

16

AACPD

1Médias seguidas pelas mesmas letras, minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Tabela 2 - Severidade da ferrugem-asiática ao longo do desenvolvimento da cultura, desfolha e área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD). Média de 4 repetições Tratamento 1. 2.

3.

4.

5.

6.

7.

Testemunha 2. 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral 3ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral 3. 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorantraniliprole 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorantraniliprole 3ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorantraniliprole 4. 1ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorfenapir 2ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorfenapir 3ª.(benzovindiflupir+azoxistrobina) + clorotalonil + óleo mineral + clorfenapir 5. 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal 3ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal 6. 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorantraniliprole 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorantraniliprole 3ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorantraniliprole 7. 1ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorfenapir 2ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorfenapir 3ª.(trifloxistrobina+protioconazol) + mancozebe + óleo vegetal + clorfenapir CV(%)

R5.2 0,19 a1

Severidade média (%) R5.4 12,8 a

R6 27,7 a

Desfolha (%) 91 a

413,7 a

AACPD

0,06 b

2,2 b

10,0 b

70 b

108,4 b

0,04 b

1,3 b

5,7 b

63 b

62,9 b

0,07 b

1,5 b

5,9 b

78 b

66,4 b

0,04 b

0,4 b

7,2 b

64 b

56,6 b

0,04 b

0,6 b

6,3 b

66 b

54,0 b

0,05 b

0,9 b

7,2 b

73 b

65,2 b

72,0

105

26,2

8,75

48,6

1Médias seguidas pelas mesmas letras, minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

aplicação do inseticida, devido à ausência de percevejos. Para as demais aplicações havia a necessidade de fazer o monitoramento com “pano de batida”, para determinar a necessidade do controle químico do percevejoC -marrom. Rafael Moreira Soares e Samuel Roggia, Embrapa Soja, Londrina www.revistacultivar.com.br • Maio 2020

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Soja Germison Tomquelski

Herbicida e inoculação De que modo interagem a biotecnologia utilizada no manejo de plantas daninhas com a aplicação de glifosato em área total de soja RR e o suprimento de nitrogênio através da fixação biológica com estirpes de Bradyrhizobium

A

soja geneticamente modificada (Glycine max (L.) Merril) Roundup Ready (RR), resistente ao glifosato, é um dos produtos biotecnológicos economicamente mais importantes desenvolvidos nos últimos 20 anos. Essa variedade recebeu um gene de outro organismo (bactéria) que lhe confere resistência ao herbicida glifosato, utilizado no Round-Up Ready, para o combate de ervas daninhas. Por ser resistente a esse elemento, toda a plantação pode ser pulverizada com glifosato, sendo que somente as plantas invasoras (indesejáveis) serão eliminadas. A cultura da soja ocupa posição de grande destaque no cenário agrícola brasileiro, fato demonstrado pelo crescimento da área de cultivo, conforme dados da Conab

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(2019). A área plantada total em 2018/19 deve crescer 2,1%, passando de 61,72 milhões de hectares em 2017/18 para 63,03 milhões de hectares em 2018/19. No Brasil, 96,5% de toda a área plantada com a oleaginosa é transgênica e muito pouco da área sob cultivo atualmente é convencional. A soja tem sido tradicionalmente produzida em sistemas que incluem o uso de herbicidas, e é exatamente aí que a soja transgênica oferece vantagem ao produtor, especialmente pela facilidade do manejo que proporciona, possibilitando a aplicação do glifosato em área total, com boa eficiência de controle de plantas daninhas. A redução da aplicação de outros defensivos também influencia na utilização do produto, além da economia do maquinário


Fotos Nadia Poloni

para pulverização desses produtos, impactando no menor consumo de combustível. A expansão do sistema de plantio direto e os recentes avanços biotecnológicos que resultaram em plantas tolerantes ao glifosato levaram a um aumento nas vendas e uso do herbicida glifosato em agroecossistemas, aumentando a presença dessa molécula no ambiente, especialmente no solo. Concomitantemente ao aumento do uso desses produtos, maior tolerância a herbicidas tem sido desenvolvida em espécies daninhas, levando ao maior e mais frequente uso de herbicidas do que o recomendado pelos fabricantes.

Experimento foi conduzido com vasos a céu aberto, em área experimental da Universidade Estadual Paulista

FIXAÇÃO BIOLÓGICA DE NITROGÊNIO E GLIFOSATO

Para produzir uma tonelada de grãos de soja são necessários cerca de 80kg de nitrogênio. Esse nutriente é o mais requerido pela cultura e pode ser obtido gratuitamente na natureza, por meio de algumas bactérias do gênero Bradyrhizobium (rizóbios). Elas são capazes de capturar o nitrogênio (N2) presente no ar e transformá-lo em uma forma assimilável pelas plantas. Esse recurso é conhecido como fixação biológica de nitrogênio (FBN) e considerado o mais importante processo biológico do planeta. Trata-se de uma verdadeira “fábrica biológica”, capaz de suprir as necessidades de várias leguminosas como a soja, dispensando a adubação química nitrogenada. Esse é um processo que viabiliza a produção dessa cultura nos trópicos e também é de grande importância na agricultura de baixa emissão de carbono. O uso de inoculantes é a maneira ambiental e economicamente mais eficiente para fornecer nitrogênio para a soja. Estudos confirmam que a reinoculação anual da soja proporciona um incremento médio no rendimento de grãos de 8,4% em relação às áreas que não são inoculadas anualmente. A fixação biológica de nitrogênio (FBN) pode ser prejudicada pelo gli-

fosato, por efeitos tanto diretamente no rizóbio quanto indiretamente na planta hospedeira, o que pode reduzir sua eficácia. Em experimento com vasos conduzidos a céu aberto, em área experimental da Universidade Estadual Paulista (Unesp) da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, São Paulo, foram avaliados os efeitos de doses do herbicida glifosato sobre estirpes de Bradyrhizobium e a fixação biológica de nitrogênio em plantas de soja BMX Potência RR. Foi utilizado um inoculante líquido comercial. Os tratamentos

A

constituíram-se na ausência e presença das bactérias das estirpes de Bradyrhizobium elkanii (Semia 5019) e Bradyrhizobium japonicum (Semia 5079), inoculadas via semente e quatro doses do herbicida glifosato via foliar (0; 1, 2 e 4 L/ha do produto comercial) e aplicadas no estádio fenológico V3, simulando um período normal de aplicação deste herbicida em cultivos comerciais. Outras variáveis foram analisadas no final do estágio R2, quando as plantas foram coletadas dos vasos por um corte basal do caule. Avaliaram-se a altura da planta, o número de nós do tronco principal, o número de ramos, o número de folhas e

B

Figura 1 - A - Plantas de soja RR apresentando amarelecimento após 15 dias da aplicação de glifosato. B - Corte basal da planta de soja em R2 quando seguiu para análises

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Tabela 1 - Valores médios do conteúdo foliar de nitrogênio das folhas, altura de planta, número de nós, ramos e folhas, massa seca total da parte aérea e índice de clorofila foliar com base nos tratamentos utilizados Tratamento Sem inoculação Com inoculação

Nitrogênio das folhas (g/kg) 36.49 b 45.48 a

Altura de planta (cm) 63.03 b 78.66 a

N° de nós 16.75 16.75

N° de ramos 9.09 10.12

N° de folhas 37.94 b 59.40 a

Massa seca total da parte aérea (g/planta) 17.65 b 34.28 a

Índice de clorofila foliar 19.71 b 26.89 a

Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey a 0,05 de probabilidade

volvimento da planta, além de ser parte estrutural de moléculas como a clorofila, que atuam diretamente na produção de fotoassimilados que são usados nas atividades metabólicas da planta. Essas variáveis são fatores intrínsecos à distribuição vegetal e espacial das plantas, uma vez que algumas cultivares de soja apresentam efeito compensatório, adaptando-se em diferentes ambientes e sistemas. Para o teor de nitrogênio foliar, as plantas inoculadas apresentaram maiores valores devido à eficiência de fixação biológica de nitrogênio (FBN), o que resulta na produção de ureídos (alantoína e ácido alantoico) nos nódulos (Tabela 1). Estes são enviados para a parte aérea, onde são dissociados em outras formas de nitrogênio, contribuindo para o bom funcionamento fisiológico e bioquímico da planta. Com relação à aplicação do glifosato, não foi observado efeito significativo em nenhum parâmetro agronômico estudado, indicando que, para as cultivares que possuem o gene de resistência ao glifosato (RR), não houve dano de-

Nadia M. Poloni, João W. Bossolani, Edson Lazarini, João V. T. Bettiol e Matheus M. Negrisoli, Unesp João A. Fischer Filho, Imesb

Fotos Nadia Poloni

a massa seca da parte aérea obtida após secagem em estufa. Como resultados desse estudo, foi observado um amarelecimento inicial das plantas de soja resistentes ao glifosato (RR) devido ao acúmulo do primeiro metabólito fitotóxico do glifosato, o ácido aminometilfosfônico (Ampa), e esse efeito clorótico foi mais pronunciado nos primeiros dias após a aplicação do herbicida na ausência de inoculação. Já na condição inoculada, o efeito não ocorreu (Figura 1A). Tal efeito também foi observado em outros estudos, que afirmaram que apesar da alteração da cor, pelo efeito glifosato, não houve mudança no índice de clorofila foliar. A fixação biológica de nitrogênio via inoculação levou a um aumento nos valores observados para altura de plantas, número de folhas e massa seca total de plantas, obtida após secagem em estufa a 65°C por 72 horas, quando comparadas com as plantas não inoculadas. Somente o número de nós por planta e o número de ramos que não apresentaram resultados significativos (Tabela 1). Isso se deve também ao maior acúmulo de nitrogênio na parte aérea, necessário para inúmeros processos de crescimento e desen-

vido às aplicações durante o ciclo da cultura. Outro fator que influencia a ausência de efeitos negativos do herbicida na eficiência da FBN das bactérias simbióticas é que a maior parte do glifosato aplicado que chega ao solo é fortemente adsorvida nos coloides, contribuindo para sua inativação e indisponibilidade às plantas. Constatou-se que a soja RR inoculada não altera o índice de clorofila foliar pela aplicação de glifosato e independentemente da inoculação, possui a capacidade de se recuperar da aplicação do produto, não prejudicando seu desenvolvimento. O glifosato é um dos herbicidas mais utilizados na agricultura, e vários autores consideram ser um dos herbicidas menos tóxicos para nodulação e subsequente FBN. Alguns estudos indicam que os micro-organismos do solo possuem a capacidade de se adaptar à aplicação deste herbicida, obtendo, ao longo do tempo, baixa sensibilidade à sua presença e crescendo adequadamente para simbiose mesmo em concentrações mais altas C de produto.

C

Foram avaliados os efeitos de doses do herbicida glifosato sobre estirpes de Bradyrhizobium e a fixação biológica de nitrogênio em plantas de soja BMX Potência RR

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Empresas

Tecnologia empreendedora Corteva Agriscience se torna a mais nova mantenedora do Cubo Itaú e é a primeira empresa do agronegócio presente no hub. Parceria pretende encontrar soluções para desafios do setor

vimento do agronegócio no Brasil, seja pelo alto grau de burocracia e exigências, prazo para recebimento do dinheiro ou ainda pela dificuldade de avaliação do perfil de risco, principalmente considerando um setor que é tão dependente de fatores climáticos. “Estamos aqui para encontrar maneiras de o produtor acessar crédito de uma forma mais dinâmica, mais economicamente viável, e que ele consiga se beneficiar de um recurso mais acessível, já que ele é o responsável pela gestão e pela produção”, enfatizou Ribeiro. Ainda na linha de acesso a financiamentos, o barter é outro desafio da indústria. No agronegócio, ele consiste em um mecanismo de financiamento no qual o pagamento pelo insumo é feito por meio da entrega do grão na pós-colheita, sem intermediação monetária. “O barter permite ao produtor associar passivo com ativo, e atualmente 20% do Brasil já realiza o processo, porém de uma forma burocrática e desafiadora. Daqui procuramos viabilizar o barter de uma forma mais harmônica, com o apoio das fintechs e em conjunto com a nossa experiência de mercado”, concluiu. Por fim, a Corteva busca dar escala a um projeto social-econômico chamado Prospera, que tem o objetivo de capacitar pequenos agricultores que trabalham com milho grão e silagem. “O Prospera nos enche de orgulho. Atuamos em Pernambuco desde 2017, começamos com 40 produtores, evoluímos para 900 e estamos aqui no Cubo para encontrar maneiras de levar o projeto a 50 mil agricultores. Queremos conectá-los com a cadeira de valor da produção e comercialização de milho, e no Cubo procuramos ferramentas para potencializar esse processo”, explicou o executivo. Com o Prospera, pequenos produtores tiveram acesso a conhecimento técnico de alto nível, que resultou em produtividade C e conhecimento na hora de comercializar a produção. Divulgação

C

om foco em solucionar desafios do agronegócio, a Corteva Agriscience se tornou a primeira empresa do agro a ser mantenedora do Cubo Itaú, hub de empreendedorismo tecnológico localizado em São Paulo. A parceria pretende estabelecer conexões com startups para encontrar soluções que beneficiem produtores rurais, canais de distribuição, cooperativas e outros elos da cadeia produtiva. Segundo o diretor de Marketing da Corteva, Douglas Ribeiro, estar presente em um ambiente que não é unicamente agrícola estimula o contato com soluções desenvolvidas para outros setores, que podem ser estendidas ao universo do agronegócio. “Estamos extremamente contentes por ser a empresa que trouxe o agro para esse centro de inovação. Queremos agregar ao nosso DNA uma forma de encontrar soluções mais rápidas e isso se conecta com a nossa razão de existir, que é trazer inovação para a agricultura”, disse Ribeiro. Projeto que foi inaugurado em setembro de 2015 pelo Itaú Unibanco em parceria com a Redpoint eventures, o Cubo Itaú é o maior hub de fomento de empreendedorismo da América Latina, uma organização sem fins lucrativos que acelera a conexão e a criação de negócios entre grandes empresas e startups. “O que a gente acredita é em conexão com curadoria, ou seja, colocar um empreendedor bom na frente de outro, com vontade de fazer negócio, é o que tem poder transformacional e poder de fomentar o ecossistema empreendedor no Brasil”, disse o co-head do Cubo Itaú, Pedro Prates. Desde o princípio, a iniciativa realiza um processo seletivo para cada startup presente no hub. A avaliação segue critérios de qualidade do empreendedor, escalabilidade da tecnologia e tamanho de mercado ao qual a tecnologia está endereçando. Atualmente, o Cubo comporta, entre os espaços digital e físico, mais de 300 startups, em torno de 130 no espaço físico e mais de 170 no espaço digital; além de 28 mantenedoras de 16 setores. Em média, oito eventos ocorrem diariamente com o objetivo de fomentar o diálogo dentro do ecossistema. Neste primeiro momento, a chegada da Corteva ao Cubo Itaú está focada em três grandes desafios, que são o acesso ao crédito, a utilização de barter e a capacitação de pequenos agricultores. “Queremos resolver problemas de impacto da agricultura atual. Nesse primeiro passo, estamos bastante focados nesses três desafios”, afirmou Ribeiro. A dificuldade de acesso ao crédito é uma barreira ao desenvol-

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Coluna Agronegócios

RNA interferente (RNAi) na agricultura

O

RNA interferente (RNAi) é um método de bloqueio da função gênica, obtido pela inserção de sequências de ácido ribonucleico (RNA) que corresponde a uma sequência do gene-alvo, de maneira a inativá-lo. A técnica permitirá controlar pragas (insetos, fungos, bactérias, vírus nematoides), introduzir ou magnificar características desejáveis em plantas e aumentar o rendimento das culturas. Nos estudos precursores usando o RNAi, os cientistas desenvolveram tabaco livre de nicotina, amendoim não alergênico, café descafeinado e milho enriquecido com nutrientes, entre outros.

A DESCOBERTA DO RNAI

Em 1990 a equipe de Carolyn Napoli foi surpreendida: a introdução de várias cópias de um gene que codifica para flores roxas em petúnias não produziu flores de roxo mais intenso – o esperado -, mas flores brancas ou variegadas (ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12354959). Os genes da flor roxa já existente foram “silenciados”! Silenciamento é o mecanismo que leva à regulação negativa da expressão de um gene, ou seja, não há mais a transmissão de “ordens” para produzir determinada substância. O mecanismo era desconhecido até que a equipe de Andrew Fire (citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.458.2 627&rep=rep1&type=pdf) descobriu que a introdução de ácidos ribonucleicos de fita dupla (dsRNA) no nematoide Caenorhabditis elegans, silenciava os genes com sequências idênticas às do dsRNA introduzido. Por essa descoberta, Fire e Mello receberam o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina (2006).

FUNCIONAMENTO DO RNAI

Imagine, em tempos de antanho, alguém que recebesse, ao mesmo tempo, duas cartas do mesmo remetente. A primeira dizia: não vá para o Norte, há salteadores na estrada. A segunda dizia: não vá para o Sul, há salteadores na estrada. A pessoa paralisaria, não iria a lugar algum, porque as instruções eram contraditórias. Veja a similaridade. O ingresso de uma cadeia dupla e longa de RNA, como um transgene intencionalmente introduzido, ou um intruso injetado por um vírus, ativa a via de RNAi. Esta desencadeia um processo catalisado pela enzima Dicer, que divide o dsRNA em fragmentos curtos, chamados RNA interferente pequeno (siRNA). Um processo denominado silenciamento complexo induzido por RNA (Risc, na sigla inglesa) separa os filamentos de siRNA em senso (contendo exatamente a mesma sequência que o gene-alvo) ou antissenso (que é a imagem invertida da sequência original do RNA). O RNA antissenso se acopla ao RNA senso, formando uma fita dupla. Isso impede que o RNA senso seja lido pelos ribossomos e inicie a produção da proteína especificada pelo gene. Bingo! O gene é silenciado.

APLICAÇÕES DO RNAI

De posse do mapeamento genômico de um organismo, a téc36

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nica de RNAi oferece especificidade e eficácia no silenciamento de um gene ou de uma família de genes. Além disso, a expressão de dsRNAs, com promotores induzíveis, pode controlar a extensão e o momento do silenciamento. Assim, podemos determinar que ele ocorra apenas nos estágios da planta ou nos órgãos vegetais que sejam importantes para atingir determinado objetivo. O RNAi pode ser usado para gerar esterilidade masculina, fundamental na produção de sementes híbridas. Já foram desenvolvidas linhas masculinas de tabaco estéril inibindo a expressão do TA29, um gene necessário para o desenvolvimento do pólen (ncbi. nlm.nih.gov/pubmed/17914195). Uma das aplicações mais importantes é aproveitar as estratégias de defesa de plantas contra ataques de vírus, que imitam mecanismos naturais de silenciamento de RNA. Isso foi demonstrado pela primeira vez quando as equipes de Mansoor (ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17030144) e de Qu (jvi.asm.org/content/81/12/6690) desenvolveram plantas resistentes a um vírus que ataca a batata, o qual expressa transcritos de RNA de um gene da proteinase viral. Desde então, foi demonstrada imunidade a outros vírus, como o vírus do mosaico do pepino e do tabaco, o vírus da murcha manchada de tomate, o vírus do mosaico dourado do feijão, o vírus do mosaico da banana e o vírus baciliforme do arroz, entre muitos outros. Essa abordagem também foi utilizada para desenvolver variedades resistentes aos nematoides das galhas (ncbi.nlm.nih. gov/pubmed/16985000), à lagarta-do-algodão (nature.com/ articles/nbt1352) e à broca da raiz do milho (ncbi.nlm.nih.gov/ pubmed/17982443). Este último evento já está disponível no mercado norte-americano (genuity.com/corn/Pages/SmartStax-RIB-Complete.aspx).

RNAI É FUTURO

Devemos considerar que estamos no limiar de um novo paradigma tecnológico, portanto é difícil antever todas as aplicações futuras. Muitos estudos objetivam resistência ou tolerância de plantas a estresses bióticos e abióticos. Porém, inúmeras outras aplicações já estão sendo investigadas, como melhoria nutricional (antioxidantes, vitaminas, aminoácidos), menor produção de alcaloides (redução de produtos narcóticos ou carcinogênicos), fitorremediação (sequestro de metais pesados), redução da produção de polifenóis, regulação da sensibilidade ao etileno (controle da maturação pós-colheita), redução da alergenicidade, entre outros. Em suma, a agricultura subirá alguns degraus na sustentabilidade, na eficiência e no atendimento das necessidades sociais, com o C uso da técnica do RNAi.

Decio Luiz Gazzoni O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja.


Coluna Mercado Agrícola

Aumenta demanda por alimentos e formação de estoques

A

pandemia do coronavírus tem aumentado a demanda por alimentos. Já provocou a disparada dos preços do arroz na Ásia e a falta de ofertas, e devido a isso, países estão controlando as exportações para evitar escassez interna. China, Indonésia, Índia, Vietnã e grande parte dos outros países estão revendo suas estratégias alimenta-

res e correndo para formar ou aumentar estoques. A China, que neste início de temporada registrava os estoques de soja mais baixos desde 2013, bateu recorde histórico de compras no Brasil nos primeiros quatro meses do ano. De janeiro até abril, o Brasil já embarcou aproximadamente 35 milhões de toneladas de soja, sendo que somente para China foram cerca de 25 milhões de

MILHO

do milho em reais são considerados bons e A colheita do milho da safrinha ou se- lucrativos para os produtores. gunda safra começou e o clima neste ano SOJA não foi o ideal. Há perdas na produtividade O mercado da soja mostra neste ano em grande parte das regiões produtoras e com isso a projeção inicial entre 80 e 85 muitos recordes em exportação, ritmo de milhões de toneladas caiu para no máximo comercialização e cotações nominais em 75 milhões de toneladas. Mas este fator so- reais. Tudo isso faz os negócios girarem rapizinho não é garantia de cotações maiores damente. A safra se encaminha para fechar no mercado deste ano, porque o milho te- em 120 milhões de toneladas. Fica abaixo ve forte queda nos indicativos em Chicago dos dados do Departamento de Agricultura e os patamares nos portos, de 170 dólares dos Estados Unidos (USDA), estimados em por tonelada caíram para 150 dólares por 124,5 milhões de toneladas, o que serve tonelada. Desta forma, mesmo com o dólar de bom fundamento para as cotações em em níveis recordes, a saca não tem supera- Chicago. Os portos negociaram entre R$ do valores entre R$ 44,00 e R$ 46,00, ser- 108,00 e R$ 113,00 a saca nos melhores vindo de balizador para o mercado interno momentos. Pode ser que os níveis em re(que no momento ainda trabalha acima ais já tenham batido os recordes possíveis destes níveis, mas tenderá com a colheita a neste ano, mas em dólar o mercado deve se alinhar à exportação). Mesmo em queda melhorar à frente com a volta dos chineses como visto neste ultimo mês, os indicativos ao mercado americano.

toneladas. Outra informação recente é de que a China investe forte em novos armazéns para garantir espaço para estoques de garantia. Isso vale para soja, arroz, milho e trigo entre os grandes alimentos que devem ter uma fase de aumento de estoques de segurança.

ARROZ

O mercado do arroz observa a colheita em fechamento com cotações em patamares nominais recordes. No Rio Grande do Sul o valor varia de R$ 50,00 a R$ 60,00 a saca, em função da corrida das indústrias para se abastecer, formar estoques e atender à forte demanda no varejo. Em março houve recorde histórico de vendas de gôndola e em abril a demanda do setor seguia forte. A distribuição do corona-voucher para aproximadamente 70 milhões de brasileiros, no valor de R$ 600,00, em três parcelas, terá impacto neste mercado, porque grande parte deste dinheiro será utilizada para o C consumo de alimentos. Vlamir Brandalizze Twitter @brandalizzecons www.brandalizzeconsulting.com.br

Curtas e boas TRIGO - O mercado do trigo viu o dólar bater recorde histórico e com isso o grão importado atingir valores de mais de R$ 1.300,00 por tonelada, alavancando o mercado interno, que alcançou valores entre R$ 1.050,00 e R$ 1.200,00 por tonelada. Deve seguir firme neste ano porque a moeda norte-americana não dá sinais de que irá recuar muito e o trigo mostra fôlego altista em Chicago. EUA - Os produtores estão plantando muito rapidamente e de modo antecipado neste ano. Com isso, devem ter a safra toda plantada no período considerado ideal para uma boa colheita. Os indicativos são de mais de 38 milhões de hectares de milho e pouco mais de 34 milhões de hectares de soja. Neste começo de temporada, o clima tem sido favorável. CHINA - O governo projeta a importação de soja em 94,5 milhões de toneladas, acima do estimado pelo USDA. Mas

importações devem superar até mesmo as projeções do governo chinês, podendo chegar a 96 milhões de toneladas. O consumo cresce a todo vapor, o setor de suínos, prejudicado pela peste suína, está voltando em ritmo acelerado e o governo dá sinais de que vai aumentar os estoques de segurança. ARGENTINA - A safra dos argentinos está em colheita, com boas condições das lavouras neste ano. Mostra a soja com projeção de 49,5 milhões de toneladas, enquanto o USDA estimava 52 milhões de toneladas. Para o milho, a projeção é de 50 milhões de toneladas. Os produtores continuam limitando as vendas na expectativa de forçar o governo para que retire o aumento das retenciones que foi ajustado de 30% para 33% no caso da soja, sendo o maior imposto cobrado por um grão de exportação no mundo. www.revistacultivar.com.br • Maio 2020

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Coluna ANPII

Sempre ciência Seja no aumento da produtividade agrícola ou no enfrentamento da atual pandemia de coronavírus, a resposta está na ciência

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stamos escrevendo este artigo em plena ocorrência da passou para um país não só com suficiência alimentar, como um pandemia de Covid-19. Tomado de surpresa, o mundo exportador de comida para todo o mundo. E esta mudança de espanta-se com o que só se via em filmes de ficção patamar se deve, basicamente, ao investimento na geração de científica. Mudanças bruscas, destruindo as verdades nas quais conhecimentos, na transformação destes conhecimentos em acreditávamos como fazendo parte, indelevelmente, de nossas tecnologia e no uso, na transmissão e no emprego no dia a dia, vidas. Como não poder viajar? Como ficar em casa por dias, sema- destas tecnologias por parte do agricultor. nas? E sem abraçar, visitar, ir em grupos a bares e restaurantes? Há toda uma história, um acúmulo de conhecimentos ao E de onde está vindo o alívio para os doentes nos hospitais? longo dos anos, por parte das universidades, dos institutos de De onde vêm os remédios, que embora ainda de forma tentati- pesquisa, das empresas do ramo agrícola e, mais recentemente, va, estão salvando vidas? por parte da Embrapa. Isto permitiu que a soja passasse de uma Enquanto isso, centenas, milhares de cientistas, pelo mundo a produtividade de 1.500kg/ha para mais de 4.000kg/ha. “No pefora, buscam os mais eficazes meios para desenvolver remédios ríodo de 1975 a 2016, o crescimento médio da produtividade foi e, o melhor, para prevenir a doença, o desenvolvimento de uma de 3,85% ao ano. Esse resultado reflete o que tem sido feito em vacina. De onde surgirão as soluções para que, o mais rápido pesquisa, e o uso de novos sistemas de produção, entre eles o possível, se consiga vencer mais esta etapa plantio direto que trouxe aumento exdolorosa da humanidade? Somente com uma pressivo na produtividade de milho, soestrutura de ciência muito bem alicerçada em ja e algodão (Embrapa Soja Londrina).” equipes de alto desempenho, em laboratórios Gasques et al – Ipea – Carta de Conjunpúblicos e privados bem equipados e com histura, No 38. 1o trimestre, 2018. De um país tórico de consistência em pesquisas ao longo No caso específico da fixação biode muitos anos, será possível encontrar as lógica do nitrogênio, a geração de coimportador soluções para este e outros problemas que, nhecimentos por parte da área oficial líquido de certamente, virão ao longo do tempo assolar de pesquisa foi, e é, fundamental para alimentos, o o ser humano. o desenvolvimento da atividade. Os coA pesquisa não se faz aos saltos, por “esnhecimentos gerados nas instituições Brasil passou talos” de gênios. Isto ocorre, mas muito raoficiais, somados com a tecnologia para um país ramente, em algumas questões pontuais. A gerada pelas empresas produtoras de pesquisa é feita pelo acúmulo dos conheciinoculante, levaram o Brasil a ser o líder não só com mentos. O que Pasteur descobriu há quase na utilização do nitrogênio via biológica suficiência dois séculos ainda serve de base para muitos para leguminosas, atualmente se estenalimentar, conhecimentos de microbiologia. As novas dendo para outras famílias de plantas. descobertas ao longo de 200 anos foram Mais de 80% dos plantadores de soja como um se acumulando, se superpondo, se comutilizam o inoculante como fonte de niexportador de pletando e o resultado é o conhecimento trogênio em suas lavouras. Isto significa acumulado que permite o atual estágio de uma economia substancial para o agricomida para ciência e tecnologia no qual vivemos, e de cultor, para diminuição das importações todo o mundo onde vêm e virão as soluções para muitos de e, de fundamental importância, para o nossos problemas, em todos os segmentos meio ambiente, que se beneficia com o de vida humana. uso de um insumo natural, totalmente O que hoje temos de avanços na ciência e compatível com os atuais critérios de tecnologia, o que atualmente desfrutamos de sustentabilidade na agricultura medicamentos, de procedimentos, em qualAssim, uma sólida estrutura de pesquer das atividades humanas, são fruto de pesquisas conduzidas quisa é a segurança de que a evolução será contínua, trazendo, há dez, 20 anos. A persistência, a continuidade até mesmo de ao longo de gerações, mais saúde, mais alimentos, mais conC equipes que se sucedem ao longo do tempo, geraram os beneforto para o ser humano. fícios que agora utilizamos. Na área de agricultura conhecemos muito bem este camiSolon Araújo, nho. A produtividade agrícola brasileira é um exemplo para todo Consultor da ANPII o mundo. De um país importador líquido de alimentos, o Brasil

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Maio 2020 • www.revistacultivar.com.br




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