Historical Stratifications

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Landscape dimension in contemporary city project

Rio de Janeiro

Historical Stratifications

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11 de julho a 04 de agosto de 2011 itinerรกrio de estudo na cidades do:

Rio de Janeiro

Grupo S.I.T.U - Unesp - Bauru

ยบ


Coordenador: Prof. Dr Adalberto da Silva Retto Jr. - Unesp Bauru/Professor Visitante da Universite Sorbonne Paris I do Master Erasmus Mundus Techiniques, Patrimoine, Terrotoires de l’industrie. Coordenador do Grupo de Pesquisa em Sistema Integrados Territoriais e Urbanos SITU Professores Colaboradores: Profa. Ms. Kelly Cristina Magalhães - Professora Assistente da Universidade Estadual Paulista - Júlio de Mesquita Filho. Profa. Dra. Marta Enokibara - Unesp Bauru e Vice-Coordenadora do Grupo de Pesquisa em Sistema Integrados Territoriais e Urbanos SITU. Profa. Dra. Norma Regina Truppel Constantino - Professora da Universidade Estadual Paulista - Júlio de Mesquita Filho.


ÍNDICE 1.0 A construção de um Itinerário de Pesquisa. A dimensão paisagística no projeto da cidade contemporânea: um itinerário de estudo na cidade do Rio de Janeiro ..................................................... 06 2.0 Percursos 2.1 Rio de Janeiro ................................................................... 09

4.0 Equipe ....................................................................................... 81





1.0 A construção de um Itinerário de Pesquisa A dimensão paisagística no projeto da cidade contemporânea: um itinerário de estudo na cidade do Rio de Janeiro. Partindo-se do princípio que a cidade contemporânea é formada por uma sobreposição de temporalidades e escalas – “um palimpsesto” nas palavras de André Corboz –, o curso proposto constituiu-se de as aulas de campo entendidos como percursos históricos, propiciando entender de um lado as estratificações pretéritas e de outro, como os projetos contemporâneos confrontam-se com a dimensão espaçotemporal a partir da resolução do fragmento. Os itinerários, dos quais o primeiro foi no Rio de Janeiro e agora Paris, Veneza e Roma (julho 2012), são entendidos como narrativas de experiências espaciais dentro desse cenário específico. O título do curso “A dimensão paisagística no projeto da cidade contemporânea” é, na realidade, uma hipótese de trabalho levada a cabo a partir de uma investigação de estratégias de intervenções das três últimas décadas, como um novo percurso para a interpretação e o projeto da cidade contemporânea (1). Nesse sentido, parte-se da chave de leitura intitulada “A paisagem dentro da cidade”, que aborda a reconfiguração de partes da cidade como paisagem, a partir dos projetos de reestruturações de áreas ferroviárias, tramas urbanas, centros históricos, partes de cidades e grandes eventos que começaram a delinear um percurso gradual que coloca o projeto de espaços abertos como conectores de estruturas urbanas e territoriais. O curso realizado entre 21 e 24 de junho de 2006, pela Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (Faac), UNESP, campus de Bauru, ofereceu uma leitura do projeto da cidade contemporânea, como metáfora da paisagem, através de indagações de objetos, temas e questões dentro de um contexto amplo e complexo. 

Foram desenvolvidos três módulos, sendo que o primeiro abordou as características do Parque Moderno, o segundo aprofundou o estudo das obras de alguns mestres do Movimento Moderno como Le Corbusier, Frank Lloyd Wright e Roberto Burle Marx, e o terceiro módulo analisou alguns processos de representação e de projetos contemporâneos na escala do grande parque urbano, onde os conceitos de memória, ecologia e jardin planetaire sugerem a necessidade de incluir no projeto da cidade os fragmentos de uma terceira paisagem.

Para complementar o curso, aconteceu a “Viagem de estudo” ao Rio de Janeiro realizada entre 25 e 27 de junho e foram visitadas obras como Jardim Botânico, Jardim Público, Ministério da Educação, Aterro do Flamengo e Sítio Roberto Burle Marx. A organização do curso foi do Grupo SITU (Sistemas Integrados Territoriais e Urbanos) com a cooperação da pesquisadora Barbara Boifava, do IUAV Instituto Universitário de Arquitetura de Veneza.


RIO DE JANEIRO


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Profa. Arq. Ms. Kelly Magalh達es (Unesp/Bauru)


As discussões, iniciadas a partir dos anos de 1970, em torno das crises ambientais evidenciaram a emergência da necessidade de um diálogo interdisciplinar acerca das ações humanas na natureza. Nessa perspectiva, colocamos em questão a análise projetos de parques como ferramenta de transformação da paisagem, cuja especificidade é a análise destes nhoque diz respeito ao tratamento da região de transição entre as áreas de uso humano intensivo e aquelas destinadas à proteção ambiental como forma de validação de um vasto repertório legal que vige em território nacional.

Na década seguinte, nos anos 1980, muitas inciativas no Brasil, do ponto de vista da legislação, visavam a acompanhar as mudanças nos paradigmas mundiais em relação à conservação do meio ambiente e o parque urbano assumiu uma nova roupagem, a de Parque Ecológico. Exemplos não faltam.


Algumas perguntas são fundamentais para nortear as posturas diante de um tema tão pertinente: Qual o significado do parque no âmbito da gestão de áreas de fronteira de preservação ambiental? Relação das áreas protegidas com as áreas antrópicas e densamente ocupadas ? Programa de atividades destas áreas e suas implicações no sistema de espaços públicos na cidade ? Uma leitura possível: qual a relação entre Localização, Dimensão, aspectos fisionômicos e funcionais destes espaços? Quais os principais elementos de projeto ? A seleção dos Parques aqui apresentados tem o objetivo de observar sobre a função do parque conforme as orientação do SNUC _ Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Parque: área destinada à proteção dos ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, onde podem ser realizadas atividades de recreação, educação e interpretação ambiental, e desenvolvidas pesquisas científicas.

http://www.mma.gov.br/areas-protegidas/sistema-nacional-de-ucs-snuc


De modo geral, o método de análise dá-se pela compreensão das ações projetuais/antrópicas – e suas consequências – sobre o meio ambiente. A análise dos parques aqui apresentado tem o objetivo de verificar se são melhor e mais perceptíveis nas zonas agrícolas, a área urbana e como estão os locais em relação aos impactos ambientais mais acentuados, para entender a efetiva participação do projeto que freia os impactos e estabelece novas formas da natureza se organizar. Os projetos foram interpretados a partir de seu potencial no âmbito de uma hierarquização do sistema de gestão e ação integrada que visem a preservação; ações de investimento para o desenvolvimento sócio-cultural do local onde se inserem; e qual o nível de sua integração com o suporte biofísico e urbano.


CLUBE NÁUTICO DE ARARAQUARA_ LUIZ ANTÔNIO MATTHEZ


PARQUE DAS MANGABEIRAS _ ROBERTO BURLE MARX


PARQUE DO BURACÃO_ ASSIS –SP Segundo dados da ABAP (Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas) o Projeto do Parque do Buracão é da autoria da Arquiteta Rosa Kliass, contudo não obtivemos esta informação na cidade. Tudo leva a crer que o cuidado com a análise biofísica do remanescente de espaço natural, as referências aos espaços construídos e o cuidado com a definição das áreas no parque foram realizadas com toda a acuidade.


PARQUE DO BURACÃO_ ASSIS –SP Por ser tratar de uma área de erosão grave, recorremos às orientações de Ab´saber para o tratamento de áreas de profundo impacto ambiental, em meio ao ambiente urbano. “Há que planejar, ao mesmo tempo, uma cirurgia urbanística, acompanhada por um enxerto de arquitetônica, adaptada a um tipo de sítio e dirigido para funções sociais.” Azis Nacib Ab´Saber.


A distribuição de dispositivos de Drenagem é a principal característica do projeto. Os dissipadores marcam sua presença a partir de uma conexão com a drenagem feita na cidade. Partimos da interpretação da topografia na média e baixa região da micro bacia, assim como as características da vegetação remanescente, e o sistema de drenagem presente nas imediações do parque.


Dois canais de drenagem superficial percorrem a extensão do parque e conduz a água até o leito do Rio na parte sul. Percebemos que a deposição de bancos de semente provocam alterações na paisagem e comportamento distintos das floradas na parte mais elevada da área de parque.


A vegetação mais marcante aparece em grupos de árvores de pequeno e médio porte, frutíferas, localizada na porção leste do parque nas imediações da Avenida que dá acesso à entrada principal.


A região do parque onde o deslocamento de terra se deu provocando a grande cicatriz é a área mais central do equipamento. Esta área foi destinada a acolher atividade de desporto e algumas medidas de controle foram estabelecidas para que não houve maior deslocamento de materiais superficiais. Uma quadra de areia e uma espécie de anfiteatro encontram-se nesta área.


A vegetação remanescente ainda pode ser observadas na grande área do parque. Esta serve como pano de fundo e perfaz as bordas do parque nas áreas sul e oeste.


A atividade desportiva está distribuída em várias parque. Um conjunto de quadras encontra-se na porta leste.

áreas

do


ROBERTO BURLE MARX E A NOVA VISÃO DA PAISAGEM BRASILEIRA 1

Profa. Arq. Dra. Marta Enokibara (Unesp/Bauru) O legado de Burle Marx Paulistano de espírito carioca, Burle Marx nasceu em 4 de agosto de 1909. Filho do alemão Guilherme Marx e da pernambucana Cecília Burle, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro aos quatro anos. Dos19 aos 22 anos foi morar com a família na Alemanha. Ironicamente, foi lá, onde estudava música, que conheceu a flora brasileira, enquanto passeava pelo Jardim Botânico de Dahlen. Acho que todos já ouviram falar desta história em livros ou nas palestras proferidas por Burle Marx, ou seja, este momento que marcou profundamente a visão de Burle Marx ao ver a beleza de nossa flora ali exposta e os caminhos que o fez seguir posteriormente estudando e valorizando o potencial paisagístico de cada diferente bioma presente no Brasil. Também suas famosas expedições tinham este objetivo, o de “ampliar o vocabulário jardinístico através da descoberta de novas plantas” 2 . Tudo isto “com uma rotina austera de observação, que incluía a coleta de espécies, documentação e catalogação, embalagem das plantas vivas, prensagem e secagem do material de 3

herbário” . Muitas destas composições naturais eram posteriormente ensaiadas no Sítio Santo Antônio da Bica e/ou tinham suas mudas reproduzidas nos viveiros (Fig. 1 a 4). Mas nestas expedições não se buscava só novidades, raridades ou espécies exóticas, buscava-se, como bem apontou Vera Beatriz Siqueira em seu livro sobre Burle Marx, valorizar aquelas espécies consideradas como “mato” em seus locais de origem. Acho que todos já também ouviram falar, mas nunca é demais lembrar, os vários episódios em que Burle Marx foi chamado para executar jardins e parques no exterior em que os contratantes achavam que ele iria usar, justamente, a flora do Brasil e não do lugar de origem dos projetos. Jardins Modernistas Mas não é só o uso de plantas nativas que torna Burle Marx uma referência para o Paisagismo Brasileiro, é a forma como ele usa estas plantas. Seus primeiros jardins coincidem com o período em que a arquitetura moderna brasileira (década de 1930), sob a influência das idéias de Le Corbusier, ganha corpo através dos projetos de Lúcio Costa e

1 O título vem de empréstimo do livro de Flávio Motta sobre Roberto Burle Marx intitulado “Roberto Burle

Marx e a nova visão da paisagem”, onde acresceu-se “paisagem brasileira” em função do texto se ater a alguns de seus projetos no Brasil.

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SIQUEIRA, Vera Beatriz. Burle Marx. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, 1ª reimp, p.7 Idem


Niemeyer. Neste período, Burle Marx é o único, talvez, a conseguir realizar um jardim moderno utilizando-se predominantemente de um vocabulário construtivo vegetal. E essa é uma idéia compartilhada por autoridades como Sigfrido Giedion4 e Jacques Leenhardt5 . Mas o que vem a ser um jardim moderno? Ou melhor, o que vem a ser um jardim filiado aos pressupostos da arquitetura moderna fundamentada nos princípios de Le Corbusier? O clássico livro de Corbusier denominado “Mamiére de penser L’Urbanisme” (Fig. 5), aqui traduzido pela editora perspectiva como “Planejamento Urbano” 6 , apresenta a evolução da divisão fundiária da quadra urbana até o que ele – Le Corbusier- julga mais adequado para o urbanismo moderno: a anulação da própria noção de quadra para a liberação total do solo ao pedestre. Trata-se de uma proposta urbanística que se efetiva pela aplicação de um dos 5 pontos propostos por Corbusier para a constituição do objeto arquitetônico: os pilotis. Uma vez liberado o edifício do solo e a possibilidade de constituir sua fachada de forma contínua graças à independência estrutural (e portanto da planta) também propiciada pelos pilotis, não há mais sentido falar em fachada, pois não há mais a noção de entrada. Se não há mais a noção de frente e fundo, não há sentido, naturalmente, falar em um jardim frontal ou quintal, pois a questão é a continuidade espacial. Pois bem, como fazer um jardim, ou melhor, propor um jardim em que a noção de continuidade espacial seja sua característica marcante? Aqui entra Burle Marx e aqui entra o status que ganham seus jardins seja no exterior como no Brasil pela integração entre objeto arquitetônico e paisagem. A residência para Edmundo Cavanellas (Fig. 6) é um dos exemplos marcantes para se entender esta noção de continuidade espacial no jardim. Implantada em um fundo de vale, Oscar Niemeyer habilmente tira partido desta situação e propõe uma laje levemente côncava na residência para acentuar o fundo de vale. Burle Marx, por sua vez, propõe uma grande superfície quadriculada que marca a presença do jardim através de seu contraste geométrico, mas por outro lado preserva o que é mais característico da paisagem e do objeto arquitetônico, a continuidade espacial do fundo de vale. A forração acontece em 2 tipos de altura, as gramíneas com 2 variedades: a clara é a Stenotaphrum secundatum Var. Variegatum e a mais escura a Stenotaphrum secundatum. Uma superfície mais elevada (que aparece do lado direito da imagem), aparecem as espécies Iresine herbstii (mancha escura) e Helichrysum petiolatum (mancha clara). Importante ressaltar que o percurso é um ingrediente fundamental para a compreensão total do arranjo espacial. Ou seja, não se tem a compreensão total do jardim se não o percorrer. Portanto, a noção de tempo, é um ingrediente também fundamental. Neste caso da residência de Edmundo Cavanellas o quadriculado não é tão grande, mas nos jardins do Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro, por exemplo, a superfície quadriculada atinge 6 x 6 m, exigindo um tempo para que o pedestre capture o arranjo espacial proposto – a grelha. Outro ingrediente fundamental nos projetos de Burle Marx quanto à inserção do objeto na paisagem é o diálogo que o jardim por vezes estabelece com um ponto marcante longínquo do jardim. Este recurso já era usado nos jardins chineses, que posteriormente passa a ser largamente utilizado pelos paisagistas ingleses no século XVIII, denominado

4 GIEDION, Sigfrido. Burle Marx e o Jardim Contemporâneo. In: QUEIROZ, Paulo e Lúcia Victoria Peltier; BOFF, Leonardo (orgs). Burle Marx. Homenagem à natureza. São Paulo: Editora Vozes, 1979, p.39-40. 5LEENHARDT, Jacques (org). Nos jardins de Burle Marx. São Paulo: Perspectiva, 1994. 6CORBUSIER, Le. Planejamento Urbano. São Paulo, Perspectiva, 1984, 3ª ed., p.91 – 94.


“catch eyes”. A residência de Odete Monteiro (Fig.7) é um exemplo já clássico para demonstrar este recurso paisagístico utilizado por Burle Marx, onde a montanha ao fundo é parte integrante da composição do jardim. Na planta deste jardim (Fig. 8) podemos ver, também, como o percurso faz descortinar diferentes paisagens compreensíveis no todo somente a partir do deslocamento do pedestre. Mas muitas vezes a paisagem onde se insere o objeto arquitetônico é por demais ampla, sem a possibilidade de estabelecer um diálogo, diluindo o objeto na paisagem. Nestes casos, Burle Marx habilmente se preocupa em dar uma escala para o objeto arquitetônico na paisagem circunscrevendo-o em um território que defina uma transição. O projeto para a antiga Tecelagem Parayba em São José dos Campos, com projeto arquitetônico de Rino Levi e Roberto de Cerqueira César, é um exemplo marcante para demonstrar esta operação estética. A área incluía além das indústrias, a residência de Olívio Gomes (Fig. 9). Nesta, a grande superfície do espelho d’água é quase uma dilatação dos planos da laje da residência através de sua reflexão. Até mesmo a vegetação escolhida cumpre esta proposta de “extensão”, onde o amarelo das folhas das vitórias-régias estabelecem um diálogo com o amarelo da laje da residência e onde as bananas d’água, brotando da superfície refletora cumprem o papel de elementos verticais em escala próxima à residência. Tudo isso circunscrito por uma aléia de Guapuruvus (Schizolobium parahyba) (Fig. 10), que dão o limite tênue entre o jardim e a paisagem plana e desimpedida à sua frente. Mesmo quando o jardim não tem um elemento característico na paisagem ou um objeto arquitetônico para estabelecer o diálogo, é a paisagem em si que ganha destaque, mas de outra forma. No jardim proposto para o Ministério do Exército em Brasília (Fig. 11), evidencia-se na composição plástica dois elementos – um mineral e outro vegetal – característico da região: o quartzo e os buritis (palmeira para áreas alagadas). É impressionante ver como elementos comuns e que passam desapercebidos na região justamente por estarem dispersos em grande quantidade, passam a ganhar valor estético nas composições de Burle Marx. Neste sentido, importante citar, também, seu procedimento gráfico de raciocínio projetual. A seqüência de croquis e a evolução dos testes de cores para o Largo da Carioca (Fig. 12), mostra cada cor representando os materiais vegetais e minerais a serem empregados: as áreas plantadas (verde), os espelhos d’água (azul), os empedrados (marrons, pretos) e o revestimento de concreto (cinza). Este procedimento naturalmente vem de um profundo conhecimento de Burle Marx da flora e do domínio plástico do espaço, sabendo “captar”, ou melhor, “abstrair” a plasticidade, por vezes, do próprio elemento vegetal. Isto pode ser visto em uma sequência de imagens onde Burle Marx parte do desenho figurativo de uma árvore (Pithecolobium tortum), até sua máxima abstração (fig. 13 a 15); e depois, a transposição deste raciocínio para os jardins, como é o caso da composição do jardim em frente ao MAM (fig. com jasmins-manga (Plumeria rubra). Considerado por muitos estudiosos o paisagista do século XX, Burle Marx, de fato, trouxe uma nova visão para a paisagem, particularmente a brasileira.


Referências Bibliográficas ADAMS, William Howard. Roberto Burle Marx: The Unnatural Art of the Garden. New York: The Museum of Modern Art, 1991. BARDI, Pietro Maria. The tropical gardens of Burle Marx. Amsterdam, Rio de Janeiro: Colibris Editora, 1964. CORBUSIER, Le. Planejamento Urbano. São Paulo, Perspectiva, 1984, 3ª ed. ELIOVSON, Sima. Os jardins de Burle Marx. Rio de Janeiro: Salamandra, 1991. GIEDION, Sigfrido. Burle Marx e o Jardim Contemporâneo. In: QUEIROZ, Paulo e Lúcia Victoria Peltier; BOFF, Leonardo (orgs). Burle Marx. Homenagem à natureza. São Paulo: Editora Vozes, 1979, p.39-40. LEENHARDT, Jacques (org). Nos jardins de Burle Marx. São Paulo: Perspectiva, 1994. MOTTA, Flávio. Roberto Burle Marx e a nova visão da paisagem. São Paulo: Nobel, 1983. SIQUEIRA, Vera Beatriz. Burle Marx. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, 1ª reimp.


FIGURAS

Fig. 01 e 02 – Região Granilítica de Pedra Azul, MG. Fonte: MOTTA (1983), p. 176.

Fig. 3 e 4 – Sítio Santo Antônio da Bica Fonte: MOTTA (1983), p.176


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Fig. 5 – Evolução fundiária da quadra, segundo Le Corbusier Fonte: CORBUSIER (1984), p.91-41.

Fig. 6 – Residência Edmundo Cavanellas (1954), RJ. Fonte: MOTTA (1983), p. 96.

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Fig. 7 – Residência Odete Monteiro (1947), RJ. Fonte: SIQUEIRA (2002), p.46.

Fig. 8 – Residência Odete Monteiro (1947), RJ. Implantação. Fonte: SIQUEIRA (2002), p.40.


Fig. 9 – Residência Olívio Gomes (1950), SP. Fonte: ADAMS (1991), p. 51.

Fig. 10 – Residência Olívio Gomes (1950), SP. Fonte: ADAMS (1991), p. 53.


Fig. 11 – Praça do Ministério do Exército (1970), Brasília. Fonte: MOTTA (1983), p. 141

Fig. 12 – Teste de cores para o Largo da Carioca (1981), RJ. Fonte: MOTTA (1983), p. 68.


Fig. 13 a 16 – Foto e seqüência de desenhos de Pithecolobium tortum. Roberto Burle Marx, 1961. Fonte: BARDI (1964), p.70-72.


Fig. 17 – Plantio de Jasmins-manga (Plumeria rubra) nos Jardins do MAM, RJ. Fonte: BARDI (1964), p.74.

Fig. 18 –Jasmins-manga (Plumeria rubra) e pedras nos Jardins do MAM, RJ. Fonte: BARDI (1964), p.74.


PARQUES DE FUNDOS DE VALE Estudos de caso

Profa. Arq. Dra. Norma Constantino (Unesp/Bauru)


Áreas ao longo dos córregos e rios nas áreas urbanas – os fundos de vale. Objetivos: ● reconhecer a complexidade de relações entre os rios e as cidades, seus conflitos e contradições, ao longo da história. ● traços, memórias de uma atividade produtiva, sinais de infraestruturas, monumentos arquitetônicos. ● Em algumas cidades , as linhas férreas acompanham os rios.

Botucatu - SP


O parque é o lugar onde a intervenção projetual coloca em cena a relação entre a água e o tecido urbano, através da natureza, da cultura e da história do lugar. Em alguns parques existentes, a forma da água vem sobreposta ou integrada aos elementos e aos materiais que compõem aquele espaço urbano, tornando-se uma marca, um elemento representativo, o fio condutor e estruturante do espaço.

Parque Celso Daniel, Santo André - SP


O rio constitui um elemento da paisagem natural e da paisagem urbana, intensamente transformado, muitas vezes por falta de conhecimento, ou por nĂŁo ser visualizado e apreendido pelos moradores da cidade.

Fundo de Vale Ă gua do Sobrado, Bauru-SP: um vazio entre lugares.


Fundo de Vale C贸rrego Barreirinho, Bauru-SP


Fundo de Vale rio Bauru e ferrovia, Bauru-SP


Para Owen Manning (1997), os rios são corredores e as pessoas usufruem dos canais, tanto quanto aproveitam o espaço ao longo de suas margens. A experiência estética possibilitada pelos rios é, sobretudo, sequencial. Caminhando ao longo dos rios podemos contemplar todas as transformações sofrida.

Parque Zerão, Londrina-PR

Parque Parrerão - Fortaleza-CE


Historicamente, entre os projetos de parques de fundos de vale mais conhecidos pela sua originalidade e inovação, encontra-se o Sistema de Parques de Boston, EUA, criado por Frederick Law Olmsted em 1881.

Sistema de Parques de Boston - Frederick Law Olmsted, 1881.


Entre os projetos de parques de fundo de vale da década de 90 considerados mais interessantes, tendo em vista a localização e vizinhança, uso, embasamento técnico e respeito aos sistemas ecológicos e ambientais, está o Guadalupe Riverfront Park, de autoria do arquiteto paisagista George Hargreaves. Segundo ele, “o que eu aprendi durante os 10 anos do desenvolvimento deste projeto é que sempre iremos encontrar, embutido na racionalidade de um projeto, principalmente quando envolve uma grande infraestrutura como este, um conjunto de idéias que evoluem constantemente. Mas o caráter do projeto como um todo permanece intacto – como um rio.”

Guadalupe Riverfront Park, Texas-USA – George Hargreaves -


CURITIBA

PLANO AGACHE 1943 Saneamento Descongestionamento Órgãos funcionais 4 vias em anéis, cruzadas por radiais

PLANO SERETE - 1964 - Eixos estruturais norte-sul e leste-oeste, tangenciando o anel central.


Decreto 400/1976 Regulamenta Setores Especiais de preservação dos fundos de vale Criação de parques com lagos para regular a ação dos rios no caso de enchentes rede de ciclovias ligando os parques, em 1979


O conceito de preservação de fundo de vale, aplicado inicialmente na cidade de Curitiba, possibilitou que muitos municípios repensassem suas ações em áreas sujeitas à degradação ambiental. A Prefeitura de Curitiba, passou a definir as faixas de drenagem e as de preservação de fundo de vale (não-edificáveis), além de possibilitar a preservação dos bosques e florestas no entorno dessas faixas. As áreas a serem loteadas e que apresentassem cursos de água de qualquer porte ou fundos de vale, deveriam receber as diretrizes de arruamento vinculadas às faixas de proteção. Até então os aterros e a canalização eram as únicas ‘soluções’, conhecidas e implantadas


PASSEIO PÚBLICO – 1886 a:6,9 ha origem: banhado insalubre Tradicional ponto de encontro, mini zoo, lanchonete, palco, ilhas.


Segundo o engenheiro sanitarista Nicolau Kluppel (CONSTANTINO, 2005), com a criação dos parques visava-se preservar as matas ciliares existentes e criar lagos para regular a ação dos rios em período de enchente. “Esse procedimento resultou numa mudança total na filosofia de uso e ocupação do solo. A economia em obras de drenagem foi substancial, uma vez que as obras resumemse em canais a céu aberto, exigindo obras em concreto armado apenas em travessias de ruas ou em áreas onde o processo preventivo seja inviável”.

PARQUE SÃO LOURENÇO (1972)

PARQUE BARREIRINHA (1972) - Curitiba

PARQUE DO IGUAÇU (1979)


PARQUE SÃO LOURENÇO – 1972 área: 20,3 ha antiga fábrica de cola / Centro de Criatividade(5 pavilhões reciclados) / Regula águas do Rio Belém / atividades esportivas


PARQUE BARIGÜI – 1972 área: 140 ha


PARQUE TANGUÁ (1995) Área: 45 ha Curitiba - PR


O Parque Barigüi, o Parque Tanguá e o Parque Tingüi formam hoje um grande parque linear, com 100 ha e 10 km de extensão ao longo do Rio Barigüi.

PARQUE TINGUI (1994)

área: 38 ha

PARQUE TANGUÁ


MEMORIAL UCRANIANO NO PARQUE TINGÜI

Buscando preservar a memória cultural da cidade, homenageando as colônias de diferentes etnias, foram criados parques e bosques “temáticos”. O primeiro foi o Bosque João Paulo II (48.000 m²), devido à visita do Papa em 1980.


BOSQUE PORTUGAL (1991) Área: 2,08 ha


BOSQUE PORTUGAL CURITIBA - PR


BOSQUE ALEMテグ Ruas laterais no Jardim Shaffer


BOSQUE ZANINELLI 1991 - รกrea: 5,8 ha Universidade Livre do Meio Ambiente


PARQUE PASSAÚNA 1991 Área: 650 ha Área de proteção de mananciais


PARQUE DAS PEDREIRAS - 1989 รกrea: 10,8 ha ร pera do Arame


JARDIM BOTÂNICO FRANCISCA RISCHBIETER (1991) área: 24,5 ha Proj.: Arq. Abrão Assad


É possível planejar com a paisagem ? Para a paisagem urbana fórmulas ou modelos a serem importados.

não

existem

receitas,

Está para ser construída através da experiência das pessoas que trabalham, conhecem e vivem a cidade; Com respeito aos processos naturais e à história do lugar, valorizando os FV e as linhas férreas; Levando em conta as necessidades estéticas, culturais e ambientais. (CONSTANTINO, 2005)

A construção da paisagem de Bauru está intrinsicamente ligada aos Fundos de Vale, pois o núcleo inicial da cidade ficava na área compreendida entre o Rio Bauru e o Ribeirão das Flores. Os córregos, componentes da bacia do Rio Bauru, eram as divisas das grandes fazendas que cercavam a área do patrimônio religioso, e pelo parcelamento das glebas das antigas fazendas, a cidade estendeu-se em malha de xadrez que parava ao chegar aos Fundos de Vale. A ferrovia, que teve um importante papel no desenvolvimento econômico da cidade, foi implantada ao longo do rio Bauru. Mesmo assim, a cidade não reconhece o potencial da paisagem dos Fundos de Vale, sendo visto como uma barreira natural que dificulta a circulação – um vazio urbano, um espaço a espera de um uso a ser definido (CONSTANTINO, 2005).



COMO ERA A PAISAGEM ORIGINAL ?

Fonte: CONSTANTINO, 2005


TRAVESSIA DO RIO BAURU, DÉCADAS DE 20 E 40

Passagem para a Bela Vista Década de 20

Passagem para a Vila Falcão Década de 10 CONSTANTINO, 2005)


O parcelamento das glebas originárias do desmembramento das antigas fazendas, justapõem-se à malha urbana existente. As propagandas, veiculadas nos jornais da cidade, dos empreendimentos implantados próximos aos fundos de vale, não demarcam os córregos, pois estes são considerados como elementos depreciativos, não qualificando os novos projetos, principalmente por receberem esgoto in natura. Este fato vem reforçar a idéia de que o rio “é um vazio entre lugares e não um lugar em si mesmo”. O desafio maior é o de re-descobrir a paisagem da cidade de Bauru, propondo formas de ocupação que compatibilizem as características físico-paisagísticas, compreendendo e interpretando sua apropriação pelos usuários e reconhecendo as marcas deixadas pela história.


COMO A LEGISLAÇÃO VEIO A INFLUENCIAR NA CONSTRUÇÃO DA

1850 - Lei das Terras: geometria regular em quadrados perfeitos (1854)

1934 Código das Águas: bem lucros p/setores que a utilizavam economicamente

público,

mas

gerando

1937 - Decreto Lei federal n.58: loteamento c/relação cronológica de títulos (30 anos); aprovação nas prefeituras; não penalizava loteamentos clandestinos; não determinava padrões mínimos de qualidade urbanística

1965 - Código Florestal: faixa marginal 5m (rios c/menos de 10m largura)

1979 - Lei Federal n.6766: parcelamento solos urbanos: faixa 15m

1989 - Lei federal n.7803: altera Lei n.4779: faixa 30 m

Avenida de fundo de vale em Bauru (córrego das Flores) : av. Nações Unidas


PARQUE DAS NAÇÕES – ANFITEATRO VITÓRIA RÉGIA, BAURU-SP


QUAIS OS IMPACTOS PROVOCADOS PELA URBANIZAÇÃO NA PAISAGEM?

Décadas 1900-1920: traçado em quadriculado contínuo

Décadas 1920-1940: parcelamento de glebas distantes

Década 1950-1980: conjuntos habitacionais na periferia; enchentes; erosões

Década 1990-2000: esgoto sem tratamento; enchentes; erosões


Rio Bauru canalizado, Bauru-SP.

Parque Ecológico em Indaiatuba-SP Não é mais aceitável pensar em retificar um rio, revestir seu leito vivo com calhas de concreto, e substituir suas margens vegetadas por vias asfaltadas, como uma alternativa de projeto para sua inserção na paisagem urbana. Estas propostas, que tinham como uma das bases conceituais a busca do controle das enchentes urbanas, são muito criticadas não só pela fragilidade sócio-ambiental no resultado final do projeto, como também pela pouca eficiência no controle destas mesmas enchentes.


Referências Bibliográficas

CONSTANTINO, Norma R.T. A Construção da Paisagem de Fundos de Vale: o caso de Bauru. São Paulo: 2005. Tese (Doutorado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. DAL CO, Francesco. De los parques a la región. – de la guerra civil al New Deal. Barcelona: GG, 1975.

In:

La ciudad americana

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REFORMA DO JARDIM PÚBLICO (1860-1862)

Projeto original: Valentim da Fonseca e Silva “Mestre Valentim” (1779-1783) Conservou os elementos arquitetônicos e artísticos originais, mas no lugar do traçado geométrico de Mestre Valentim, Glaziou introduziu caminhos sinuosos enfatizando não somente o papel expressivo do conjunto , mas também das partes. Supervaloriza a profusão ornamental , na forma de rocalhas, lagos, pontos, fontes metálicas, bancos, postes de iluminação, gradis e toda sorte de produtos para jardins.

Projeto: Mestre Valentim (1779-1783

Reforma Glaizou (1860-1862)


REFORMA DE GLAZIOU PARA O PASSEIO PÚBLICO DO RJ (1860-1862)

http://oriodeantigamente.blogspot.com.br/2011/01/pesseio-publico.html


REFORMA DO CAMPO DE SANTANA (1873-1880) Também chamado Campo da Aclamação (e Praça da República a partir de 1889)


Na foto vê-se a sede do Parque da Aclamação (Campo de Santana), prédio hoje ocupado pela Fundação Parques e Jardins (PCRJ). (Marc Ferrez, BN)


REFORMA DOS JARDINS DA QUINTA DA BOA VISTA (1869-1880) Residência da Família Real Portuguesa

Dentre as principais intervenções de Glaziou na Quinta da Boa Vista destaca-se a abertura da alameda das Sapucaias, que por sua forma retilínea, foge do padrão sinuoso que o paisagista privilegiava, com seu eixo colocado exatamente à frente do palácio.

http://www.casaruibarbosa.gov.br/glaziou/projetos2.htm




ATERRO DO FLAMENGO


ATERRO DO FLAMENGO – JARDINS EM FRENTE AO MAM


Projeto urbano e a noção de townscape: o salto de escala e a afirmação do fragmento na estrutura da metrópole contemporânea.

Prof. Dr. Adalberto da Silva Retto Junior (Unesp/Bauru) A reflexão arquitetônica e urbanística no pós-guerra em São Paulo segue um percurso que, antes de mostrar os seus limites e a necessidade de introduzir critérios de seleção adequados à fragmentação da cidade contemporânea, deslocase para o controle da intensa verticalização da área central e “centro novo”, que contrapunha-se à uma vigorosa compactação horizontal periférica, difusa. Entretanto, se a realização do Perímetro de Irradiação, acompanhado da qualificação do “centro novo” e afirmação do trânsito diametral (1945), por Prestes Maia (imagem 01, 02, 03), não conseguem estabelecer uma relação entre arquitetura e cidade aos moldes dos morfotipos propostos no Plano de Avenidas (imagem 04, 05, 06), o arranha-céu, resultado de uma fase de desenvolvimento e reorganização capitalista, não só equacionaria uma específica conotação funcional baseada na nova relação entre morfologia urbana e tipologia edilícia, como também, a partir dos anos de 1950, se afirmaria como uma estrutura urbana metropolitana. O arranha-céu desvela assim, a capacidade técnica do desenho da cidade e a afirmação de uma estrutura que se configura de forma ambígua. A absorção do programa metropolitano interiorizado no edifício, como pode-se notar pelo Copan, Edifício Itália e no Conjunto Nacionali, (imagem 07, 08 e 09) apresenta-se com características de espaço alternativo para localização de atividades, tradicionalmente, presentes na área central da cidade, conformando uma estrutura arterial preconizada pela Avenida Paulista, que seguiria um movimento cronológico na consolidação do mesmo vetor através da Av. Faria Lima e Av. Berrini, entre outras. Porém, a forma convencional de inserção com a via urbana demonstra, já no seu princípio, que o urbanismo progressista pôde responder aos particulares interesses econômicos e culturais, mas não, à um projeto de reforma urbana efetivaii. Segundo Manfredo Tafuri, a técnica do assemblaggio projeta na superfície vertical o tecido “aberto” da planimetria urbana: um campo de forças casualmente agregado se transforma na moldura de eventos multiformes. Apesar da “(...) afirmação da capacidade e esforço do regime” pós-revolucionário - desde 1930, “(...) na execução do programa de realizações” privilegiar o “centro novo” como alvo de implantação do seu programa cultural, com a qualificação da Praça Ramos de Azevedo, Largo do Arouche, Praça da República, e alargamentos da Xavier de Toledo e Vieira de Carvalho, além do prolongamento de vias como Major Sertório, Augusta, entre outras, em consonância direta com os governos autoritários e suas preferências pelas áreas centrais, no que tange às questões de urbanismo, assumiria outro patamar de discussões. A afirmação do sistema Y (Imagem 10), ao mesmo tempo que viria reforçar cada vez mais a diferenciação entre “centro histórico” e “centro novo”; tanto espacial, pois o triângulo se configurava uma área perfeitamente definida; como operacional, emblemática de uma especialização terciária e de uma concentração monofuncional - caracterizada por uma expulsão progressiva de residências, ele se conectaria à uma rede rodoviária, que em poucos anos se coligaria às estaduais e federais. Para essa nova síntese caminhou o discurso oficial de Vargas iii, em busca da construção do Estado e da Identidade Nacional, que passaria pela integração do território de “desmesurada grandeza geográfica” e, ao mesmo tempo, reconheceria o dinamismo econômico das metrópoles litorâneas, valorizaria o interior e a sua capacidade de preservação do “caráter nacional”. Tal orientação no sentido de resguardar os recursos nacionais refletia-se no plano da


produção cultural, no qual “a solidez arquitetônica da construção” era associada “(...) à obra de integração social”, como explicita o presidente Vargas na criação do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), em seu discurso de novembro de 1938 iv , encarregado de “estimular as atividades espirituais, colaborando com artistas e intelectuais brasileiros no sentido de incentivar uma arte e uma literatura genuinamente brasileiras” v . A criação do Instituto Nacional do Livro, o Serviço Nacional do Teatro, o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e o Instituto Nacional de Cinema Educativo, que nas palavras do Presidente Getúlio Vargas (1934), possibilitaria que os “sertanejos” vissem as “metrópoles, onde se elabora o progresso, e os citadinos, os campos e os planaltos do interior, onde se caldeia a nacionalidade do porvir” vi . Lamounier vii, ao analisar o pensamento autoritário, explica que o emprego do termo “organização” por autores como Alberto Torres, Oliveira Viana ou Gilberto Amado, assume forte conotação, por tratar-se “de dar forma ao que não possui (...) de imprimir forma, de produzir estrutura e diferenciação funcional numa sociedade percebida como amorfa, ameboide” vii . Vilanova Artigas salienta que, “(...) as posições culturais dos anos de 1940 e 1945”, levaram à “necessidade de olhar e de compreender a problemática política, e de estudar a própria nacionalidade”, como forma de “(...) tentar elaborar um programa cultural que faltava no Brasil” ix . O governo Kubitschek (1956-1961), ao consubstanciar a mudança da capital do País, nos anos de 1960, remontaria a escala de fundação ex nihilo da construção de Belo Horizonte, possibilitando o equilíbrio geográfico que viria preencher a lacuna que o programa arquitetônico moderno ainda não tinha suplementado: o mapa do Brasil, publicado na abertura do catálogo oficial da mostra “Brazil Builds, architecture New and Old” (1943), realizada no Museum of Modern Art de New York, o qual ainda, afirmava a supremacia litorânea. Assim, as condições políticas e organizacionais foram responsáveis, dessa forma, por uma nova lógica social, econômica e territorial para o país, aproveitando os caminhos abertos pela Constituição de 1937, amparada pelo Plano de Reaparelhamento Econômico (1951-1954) e o Plano de Metas (1956-1961), que priorizariam as redes de transportes necessárias à articulação inter-regional. A industrialização dentro desse quadro material, afirmar-se-á a partir das décadas de 1940 e 1950, como sinônimo de desenvolvimento marcado por uma atuação forte e centralizada do Estado, que planejou e executou grandes projetos de intervenções, no território e na própria produção industrial. Octávio Ianni afirma que a ideia de desenvolvimento econômico ou progresso econômico-social, de Vargas e Kubitschek, estava praticamente contida no conceito de industrialização, porém, com um diferencial: para Vargas a industrialização passava pela afirmação de um capitalismo nacional; em Kubitschek, passaria por uma política comprometida com o capital estrangeiro. Seria a definição de Anhaia Mello que nos daria a escala em que tal problemática fora levada a cabo, do ponto de vista urbanístico: “(...) é preciso considerar o problema urbanístico regional, que não se resolve com avenidas, viadutos e pracinhas ajardinadas. Se o urbanismo é a arte de correlação e integração - problema de função, de textura, de economia e síntese estética- só pode ser realmente praticado no plano regional e na maior de suas regiões - a Nação” x .


Em São Paulo, o ponto de partida da nova sucessão de discussão aparece no “Programa de Melhoramentos Públicos (1950)” de Robert Moses (Imagem 11), que ao estabelecer a analogia entre São Paulo e Nova York xi, delineava a escala dimensional das problemáticas que seriam debatidas nas próximas décadas: proliferação de subúrbios residenciais, congestão da área central, colapso do sistema de transporte coletivo, infraestrutura insuficiente e indústrias instaladas de forma caótica. Todavia, se o problema da congestão em New York, símbolo do “manhattanismo” e apologizada em “Delirious New York” de Rem Koolhaas (1978), como também, definido como uma das dificuldades do urbanismo por Le Corbusier, por ocasião da apresentação de sua Ville Radieuse (1933), Moses e os diversos Planos Urbanísticos para o município e área metropolitana (PUB, PMDI e PDDI) de São Paulo, debateriam tal problemática na direção de políticas de desconcentração da área central, a partir da implantação de subcentros periféricos e proposição de corredores de atividades múltiplas ao longo das linhas de transportes coletivos xii. Porém, tanto a solução multipolar, como a proposta de Moses, reforçariam o papel estrutural do centro da cidade, conforme notamos a seguir: 1. A solução multipolar - funcionaria como “unidades secundárias orgânicas”, com uma rede de vias e transportes que pudessem garantir rápida acessibilidade com as unidades terciárias, contudo, reforçando a imagem da cidade descrita por Ernani da Silva Bruno, como uma “teia de aranha, pelo ligamento das ruas em torno do núcleo central”. Dentro desse aspecto, teríamos como recomendação o Estudo Urbano da Aglomeração Paulistana realizado pela equipe da SAGMACS, com novos núcleos distintos que comporiam a metrópole multipolar. Entretanto, estas funcionariam diferentemente das “metrópoles de equilíbrio”: Les villes nouvelles xii, ou mesmo Goiânia e Brasília, que nasceram como dispositivos para contrabalançar os desequilíbrios territoriais provocados pela excessiva concentração edilícia das capitais, constituindo-se em pontos alternativos e autônomos. 2. A proposta de Moses - minimizaria a cidade, permitindo aos habitantes abandonar a cidade maldita por Deus, dando-lhes uma saída emergencial, ao ponto de legar-lhes a ilusão de realmente não viver em um aglomerado urbano; mas por outro lado, reforçaria o grande baricentro da métropole, o core, que pouco a pouco se afirmaria como um enorme nó de comunicações, em vários níveis, que passaria por uma singular transformação de caráter progressivo, devido a própria permanência do seu papel estrutural. É evidente que, o rigor retórico do plano de melhoramentos de Moses não poderia ser pensado como uma continuidade da estrutura bipolar anteriormente descrita (nem mesmo as propostas do SAGMACS), pois, ao acentuar as grandes artérias panorâmicas que permitiriam o deslocamento veloz às áreas recreativas (descongestionando a cidade) xiv , possibilitaria uma recuperação de terrenos “livres” e espaços de lazer, ligados à imagem de acessibilidade e velocidade, possibilitando à uma classe, que exploraria esta fronteira, identificar-se com o seu precioso símbolo de mobilidade e contemporaneidade, o automóvel, como forma de assegurar o individualismo e privacidade, logo uma alternativa à cidade. O que está em crise é o ideal de Totalidade e Universalidade do Plano, contra o qual, o próprio Moses se rebelaria. À ideologia do plano, o design aparece cada vez mais ligado à cidade como estrutura produtiva. Na essência, é a luta entre a arquitetura e a cidade, entre as instâncias da Ordem e o domínio do informe, como observado nas palavras de Tafuri, “Utopia como metáfora e collage city como fórmula”. Esses opostos deveriam constituir a dialética do futuro, em lugar da rendição total às certezas científicas e à mera extravagância do ad hoc. Essa nova dimensão é enfrentada pelos arquitetos de diversas formas, como ressalta Tafuri: hipóteses operativas afirmando a finitude das partes, pondo a arquitetura como protagonista absoluta, carregando a mesma de excesso de valores metropolitanos; ou ainda assumindo metáforas tecnológicas, transformando o fragmento em um sistema de serviços ou um artefato, cuja finalidade é exterior ao mesmo, que se afirma estabelecendo uma coerência com outros artefatos.


Para a gama de resolução, corresponderia uma nova figura de projetista, que realizasse a unidade da arquitetura e urbanismo em uma mesma disciplina, através da unidade do método: as várias escalas da cidade, isto é, a do design, da arquitetura, do town design e do urbanismo, englobados na mesma matéria xv. Porém, isso equivale a dizer, segundo Tafuri, que da mesma forma que as exigências denunciadas pelas vanguardas históricas remetiam ao setor das comunicações visuais diretamente ligadas aos processos econômicos (arquitetura e design), a planificação enunciada pelas teorias arquitetônicas e urbanísticas reportavam-se a uma reestruturação da produção e ao consumo em geral, em outras palavras, a uma coordenação da produção. Nesse sentido, a arquitetura está entre realismo e utopia. A utopia reside na obstinação em esconder que, a ideologia da planificação pode desenvolver-se na produção construtiva, somente se indicar que o verdadeiro Plano poderá tomar forma quando deixa para trás a produção construtiva; deste modo, uma vez aceito o objetivo da reorganização da produção em geral, a arquitetura e o urbanismo serão objetos, e não sujeitos da planificação. O processo é naturalmente diferente daquele que guiou a realização das New Towns, na Europa dos anos cinquenta, pois movendo do geral ao particular, a posição do estruturalismo arquitetônico visava fixar elementos estáveis que se apoiassem numa “Espinha dorsal”. Pela primeira vez, faz-se alusão a uma possível desmaterialização da cidade e dos seus elementos: “todo o conceito de aglomeração, hoje, está perdendo o seu caráter psicovisual definitivo, e está adquirindo o significado de control device (instrumento de controle)”, concebido para manter as variáveis dentro dos limites desejáveis. As mudanças serão controladas da espinha dorsal e desta, se estenderão aos mais livres, menos definidos campos do habitat, do trabalho, etc. A escala paulista de realizações viria na construção de seu espaço mais considerável, o Parque do Ibirapuera (1954) (imagem 12, 13 e 14): “Primeiro porque aponta para um tipo de reflexão sobre um espaço significativo da metrópole, segundo porque revela a importância da construção de um parque na década de 50” (NEVES, C. S). Entretanto, se o Parque do Ibirapuera de Oscar Niemeyer iria além de um grande equipamento urbano articulado às redes de transportes e funcionaria também, no “perímetro de aglomeração” como uma “urbanização de complementação”, de modo a reequilibrar os valores fundiários relacionados com o quadro material da nova vida instituída, tendo como modelo de planificação urbana aquele da cidade-jardim. A Brasília de Lúcio Costa, nos daria a escala necessária para o enfrentamento do centro da metrópole congestionada. Dificilmente discordaríamos da afirmação de Mário Pedrosa, de que Brasília, não passava de uma “civilização oásis”, “(...) uma espécie de casamata impermeável aos ruídos externos, aos choques de opinião, como um estadomaior que se abrigasse em cavernas subterrâneas blindadas para, no comando das operações, escapar aos bombardeios e aos ataques dos teleguiados inimigos numa guerra atômica futura” xvi , pois a consolidação da periferia, assim a desenhou. Entretanto, não podemos esquecer também, que o gesto primário de Lúcio Costa (Imagem 15, 16, 17, 18, 19 e 20), afirmava uma estrutura linear, com um sistema de transporte de alta velocidade associado ao equacionamento do “centro cívico”, que abria-se à escala nacional, como “campo onde se estruturam, juntos, o olhar moderno e a natureza, no ato fundante da brasilidade”. A busca do genius loci e da centralidade pertencentes ao Team X, que não poderia ser pensada como estrutura linear fechada ao exterior, aos moldes daquelas dos anos de 1930 e 1940. Ao contrário, ver a Brasília de Costa sob este prisma, remonta a uma discussão do estruturalismo arquitetônico que propunha fixar alguns elementos estáveis que se apoiassem numa espinha dorsal de “facilidades”, que possibilitariam variações e flexibilidade, incremento otimizado dos elementos, numa sobreposição entre a influência individual e aquela da comunidade. Em reação ao princípio da separação das


partes e das atividades xvii , base da urbanística do Movimento Moderno, busca-se uma total integração física das partes desta espinha dorsal xviii , mesmo sendo compartilhada a necessidade de continuar a separar o tráfego dos pedestres, daquele dos veículos xix . Tal debate nos lançaria aos anos de 1970, momento em que as inovações tecnológicas, os diferentes sistemas de movimentos parecem maduros para uma reorganização da metrópole em que, o modelo radioconcêntrico do Plano de Avenidas, já considerado por Lodi, como “fechado e gerador de forte pressão sobre um único centro”, é posto em discussão em detrimento de uma solução linear, como forma de estabelecer outra escala de resolução, que consiste antes de tudo, em um esforço de denominação e colocação de materiais em novas imagens: a implantação das linhas de metropolitano (1970). Apesar de sua discussão estar presente desde 1927, por ocasião da apresentação do primeiro projeto de um metropolitano para a cidade, pela Light, a implantação da ligação leste-oeste ocorreu na gestão do prefeito Paulo Maluf (1969-1971), com a construção do elevado Costa e Silva sobre uma parte significativa da Av. São João, a transformação da Praça Roosevelt, a construção da nova Praça da Sé e a recuperação da superfície para os pedestres dos calçadões. Vale ressaltar que, a cidade linear xx , modelo de implantação reconhecido nos adensamentos ao longo dos percursos, parece prestar-se de modo particular à organização do trabalho em uma civilidade maquinista: “a cidade linear segue, assim, uma pista já escrita na geografia”. “(...) O princípio que a informa é aquele de alinhamento e não da dispersão”. Assim, maquinismo e organicismo se encontram na descrição da biologia da cidade linear industrial: as estradas constituem a espinha e as intervenções unitárias permitem as trocas entre os diversos sistemas de transporte. Assim, se de um lado a estrutura linear marcava o território, de outro, aparecia como resposta à incompreensibilidade da cidade na definição de um claro sistema infraestrutural à grande escala. “Daí”, nos diz Vilanova Artigas, “(...) podermos concluir que a ponte, a estação, o aeroporto, não são habitações, mas complementos, objetos complementares à habitação através dos quais o espaço da habitação se universaliza. A cidade é uma casa. A casa é uma cidade” xxi . Logo, a descontinuidade enunciada por Artigas, ao unir a casa à cidade, no âmbito formal, é aquele do edifício, que faz com que sua integração à cidade seja medida pela volumetria, que geraria uma ordem. Não é à toa que Artigas, ao falar de arte e técnica remonta a distinção aristotélica entre a natural being, a qual finalidade foi inerente para sua existência, e artefato, com finalidade instituída do exterior. Como condição primeira, ainda a topografia como resolução e os objetos técnicos na articulação da cidade. As conexões de alguns materiais viriam alinhavar uma cidade dispersa, muito explicitada no livro “Histórias e Tradições da Cidade de São Paulo (1953)”, do jornalista Ernani da Silva Bruno que, parafraseando o subtítulo de Can our Cities survive? xxii na esteira de alguns textos e projetos da Segunda Guerra - explicitava indiretamente, a fragmentação e a efemeridade da metrópole contemporânea. Um sistema de passarelas, que permitem a ligação do “centro novo” ao “centro histórico”, estacionamentos, etc., são as infraestruturas funcionais que gravitariam sobre esses polos de mensuração, a fim de anular a inércia da estratificação física do crescimento ilimitado, de uma sociedade de massa que, segundo os resultados dos censos demográficos de 1940, 1950, 1960, mostravam uma gradativa concentração aos arredores, e não na cidade. Temos também, outro movimento que trabalharia como forma de garantir, ainda, o papel estrutural da área central. Dentro desse contexto emergem duas propostas para o Vale do Anhangabaú em São Paulo: a concepção de Nestor Goulart Filho (1972) (Imagem 21) e a de Artigas (1974) (imagem 22, 23, 24, 25 e 26). As duas assumem tal escala na estruturação da cidade: urban infrastructures, isto é, estradas e serviços, objetos tecnológicos ou artefatos xxiii , em uma profecia piranesiana da cidade burguesa como “máquina absurda”. “Trata-se agora, da


vanguarda interessada em atribuir-se a missão de organizar a Metrópole”, ressalta Artigas. Nestor Goulart Filho, citando o arquiteto inglês Peter Smithson xxix, “que acredita que toda ‘atividade gera tráfego’”, desenvolve um programa multifuncional, no qual uma “megaestrutura” preenche o vazio topográfico do Vale do Anhangabaú no sentido de congregar todas as atividades em um só sistema, sem separar “estacionamento de tráfego, de pedestres e de quaisquer outros usos”. O autor defende a tese de que as megaestruturas devem ser empregadas em São Paulo, não somente no Vale do Anhangabaú, mas, poderia estar seguindo o exemplo de algumas propostas de reabilitação do centro de algumas cidades do mundo, como Estocolmo. Tal formulação encontra nos shoppings centers seu exemplo mais acabado, pois o “espaço é usado em sua plenitude e, já que o centro da cidade se encontra vazio, pode ser a solução mais segura de reabilitação”. Dessa forma, a tecnologia revela a necessidade das seguranças fáceis que dominou uma notável porção do panorama internacional dos anos 50-60. Na proposta de Artigas, o que era uma área restrita para ser resolvida (1 km), passa a ser entendida em uma extensão de 13 km (Imagem 27). A articulação apresentada pelo projeto, como podemos ver no esboço elaborado pelo próprio Artigas, aparece os rios Tietê e Pinheiros e o “sistema Y”, que se articularia em um só processo, seguia a resolução das águas. A estruturação linear estaria associada aos “elementos pontuais e projetos incorporados na sua proposta”. Dramático é pensar o confronto entre homens e carros, dado pela sua “marcha a pé”, que resolve o fluxo da metrópole através da tecnologia assimilada, constituindo um tipo de paisagem. Poucos anos após o memorial do Concurso Público Nacional para Elaboração de Plano de Reurbanização do Vale do Anhangabaú - São Paulo (1981), seguindo a esteira da retomada da democracia, redireciona a problemática: detém-se ao desenho do vazio, dos espaços abertos, cada um dos quais é tratado como específico material da construção da cidade e do território e é dada a tarefa de reabilitar o espaço da cidade contemporânea propondo inovações espaciais, nas quais as modificações que ocorreram nas práticas sociais encontrem outras formas, como enfatiza o Team X no Team 10 Primer, retalhando diversamente e alargando o campo de investigação, recuperando aquilo que propõe Gordon Cullen xxv , em Townscape, ou estudado por C. Alexander em A pattern Language xxvi, explorando o espaço, na maior parte - óbvio – pelo qual nos movemos. No projeto vencedor de Jorge Wilheim e da paisagista Rosa Kliass (Imagem 28), as escalas metropolitana e local se afirmam cada uma dentro de sua lógica, através de uma radical segregação: aquela do pedestre liga-se àquelas dos calçadões e propõe eventos; a da via expressa, ao fluxo metropolitano; aquela das drenagens urbanas resolve-se localmente, perdendo-se no entendimento da própria escala da problemática (sucessivos alagamentos). O programa que privilegia o espaço do encontro, ou melhor, “do evento “ xxvii é resolvido como continuidade do urbano, criando uma “praça cívica” que articula a estrutura de pedestres ao espaço do acontecimento. A incorporação dos termos: evento e movimento, sem dúvida, foram influenciados pelo discurso Situacionista e pela era de 1968, nos quais os Lés événements, como foram chamados, eram “eventos” não só em ação, mas em pensamento. Contudo, se ao fetiche da participação durante a elaboração do concurso foi acrescentado o espectro obsessivo da cidade do sec. XVIII, no sentido de resolver a falência dos espaços livres dos fragmentos urbanos, os elementos que constituem o ambiente do novo Vale são tomados em consideração, como na experiência do Team X, nos termos da relação que entre eles se estabelecem, de diferenças e contraposições ao longo de uma linha de pesquisa, que não é muito distante daquela seguida por Wölfflin, com as Bildformen e as “... categorias visíveis antitéticas: linear - pictórico, superfície - profundidade, forma fechada - forma aberta...”. De fato, existe uma arte da relação da mesma forma que existe uma arte da arquitetura, escreve Cullen: a arte do espaço entre as coisas, das relações entre as coisas. À diferença dos Smithson, o fim não é aquele de impor, superpor


uma estrutura, mas modestamente de “... manipular dentro das tolerâncias” xxviii . Nos anos 70, na cultura arquitetônica e urbanística, constantemente foi reiterada a tese de que não há arquitetura sem evento, ação, atividades e funções; arquitetura deve ser vista como uma combinação de espaços, movimentos, eventos sem a hierarquia de precedência entre estes conceitos. Neste ponto, gostaria de ampliar a nossa discussão, retomando algumas referências fundamentais para nossa temática: a tradução da obra de Camillo Sitte “Der Städtebau nach seinen Künslerische Grundsätzen” (1965), elaborada por George e Christiane Collins, que na década de 1960 se transformou no símbolo de “retorno à cidade” e, ao mesmo tempo, a sustentação de uma nova corrente da arquitetura e do urbanismo contemporâneo. A perspectiva aberta a partir destes dois eixos pode ser guiada e sustentada, simultaneamente, com aportes iluminadores, confrontados com publicações da época: “Town design” (1953) de Frederick Gibberd; “L’urbanistica e l’avvenire delle città” (1959) de Giuseppe Samonà; “The Image of the City” (1960) de Kevin Lynch; “Studi per una operante storia di Venezia” (1960) de Saverio Muratori; “The Death and Life of Great American Cities” (1961) de Jane Jacobs; “Townscape” (1961) de Gordon Cullen; “The City in History” (1961) de Lewis Mumford; “Le origini dell’urbanistica moderna” (1963) de Leonardo Benevolo; “Notes on the Synthesis of Form” (1964) de Christopher Alexander; “Questioni di architettura e urbanistica” (1964) de Giancarlo De Carlo; “Origini e sviluppo della città moderna (1965) de Carlo Aymonino; “Urbanistica” (1966) de Giovanni Astengo; “L’ architettura della città” (1966) de Aldo Rossi; “Il territorio dell’architettura” (1966) de Vittorio Gregotti; “Immagine di Roma” (1969) de Ludovico Quaroni; “La città di Padova: saggio di analisi urbana” (1969), de Carlo Aymonino et all; e “Design With Nature” (1969), de Ian McHarg. Essa visão amplificada nos faz pensar na formação de dois processos com matizes que se consolidaram no curso desses últimos anos: a afirmação do âmbito disciplinar do town design, em resposta à crise de identidade da cidade ocidental; e a valorização do fragmento, que em muitos casos reflete-se no culto do Patrimônio Histórico. No campo dos estudos urbanísticos, a tradução de “Der Städtebau” pelos Collins participa de um momento de reavaliação do movimento moderno dos CIAM, que desmontaria inclusive, afirmações de Le Corbusier e de Gideon sobre o texto de Sitte, visto como símbolo de um convencionalismo retrógrado e de passadismo, que exprimia a nostalgia de um homem incapaz de compreender o próprio tempo e de reconhecer a revolução técnica e social que se apresentava diante dos seus olhos. Do ponto de vista projetual, coloca-se em crise o ideal de totalidade e universalidade do Plano que, em certa medida, alimentaria o debate da consolidação de um “salto de escala” na resolução da cidade. Em tempos recentes, a interpretação medievalista de Sitte obteve certo crédito, por exemplo, no livro “Storia dell’urbanistica: il novecento” (1985), de Paolo de Sica, no qual é estabelecida a associação entre o informal-natural-democrático-medieval, ou ainda, pelo debate sobre o denominado “New Urbanism”, como acena o estudo de Andrés Duany e Elizabeth Plater-Zyberk, “The New Civic Art: Elements of Town Planning.” xxix O que tem sido colocado em evidência quando remontamos ao elenco de publicações lançadas na época, não é o objeto singular a ser assumido como modelo, ao contrário, cada imagem em especial reporta a um conjunto de requisitos do espaço urbano, que não nascem autonomamente de uma bagagem técnica ideal, organizada pelo projetista e contida, por exemplo, na Carta de Atenas, mas das observações empíricas, da colheita de mínimos dados sobre a experiência do visível. Será no livro de Gordon Cullen que emergirá a centralidade do conceito de townscape, que além de individualizar o léxico e a sintaxe para a descrição e valorização do contexto, enuncia claramente critérios para a ação projetual. Logo, o townscape se baseia nos princípios relacionais das diferenças significativas, um contextualismo urbano que pesquisa o caráter, a identidade do sítio e, no limite, os lugares heterogêneos.


Isso pode ajudar a compreender a atenção da Itália, entre a metade e fim dos anos de 1950, para com o desenvolvimento de um momento peculiar de debate disciplinar voltado para categorias de interpretação do townscape, dando lugar às apreciações particulares. De um lado o universo italiano e francês, de outro, o norteamericano, o qual encontra na figura de Jane Jacobs um personagem chave. Entretanto, será o aporte inglês aquele em que a nova disciplina encontraria sua plenitude. Foi nas páginas da “Architectural Review” que Gordon Cullen, De Wolfe, Nairn, Richard, Browne, Crowe, De Maré e outros, exprimiram os desejos de urbanidade e complexidade urbana, em contraposição à expansão da cidade sem qualidade, contra a baixa densidade das New Towns realizadas com uma pobre linguagem urbana. O manual de Frederick Gibberd, dentro desse contexto, ganha particular significação por duas razões. Em primeiro lugar, porque se trata de um “guia” de town design que, em tempos modernos, se insere com clareza nas tradições dos manuais de Sitte, Unwin, Hegemann e com esses, estabelece um posicionamento não banal de continuidade, propondo a conciliação da tradição do civic design com as posições do Movimento Moderno. Em segundo lugar, porque Gibberd definirá de modo amplo os princípios do town design, evitando parar diante dos problemas contemporâneos, como em muitos textos de civic design. Os elementos urbanos são materiais a serem organizados dentro de uma ideia geral de cidade e “o town design compreende arquitetura, landscape e desenho das estradas, que perdem a sua individualidade para transformar-se em uma coisa nova: a cena urbana”. É evidente a semelhança das posições de Gibberd e Gordon Cullen. Na introdução de “Townscape”, Cullen estende à cidade inteira e aos seus habitantes a faculdade que Gibberd atribui a um conjunto de edifícios e aos elementos urbanos, ratificando a afirmação de que “a representação do plano da cidade é o primeiro degrau do town design, mas é frequentemente o último desenho do town planning”. Entender o conceito de townscape como uma arte, implica a leitura do ambiente urbano, evidenciando suas conotações estéticas. Definição que caracterizaria o modelo chamado por Françoise Choay de “culturalista” e que permeia os escritos de Camillo Sitte. Apesar do termo townscape, remontar a quase uma década antes da publicação do livro homônimo, ele encontra suas origens culturais no fim do segundo conflito mundial e tem como principal porta voz, a revista inglesa “Architectural Review”, que não apenas chamava atenção para a necessidade de retorno aos valores perceptivos da forma urbana, mas também, se tornou o berço e canal de divulgação das temáticas que embasariam a formação do corpus disciplinar daquilo que hoje definimos como urban design. Cada um dos manuais citados teve sucesso alternado. Entretanto, a arte que todos enunciam é uma que constrói o problema, não diretamente as soluções. As pesquisas e estudos progridem e desvelam novos conceitos relativos à “arquitetura urbana”, à “composição urbana” e ao “projeto urbano”. A palavra “urbano”, que adjetiva estes substantivos, exprime nada mais que a tensão dos pesquisadores e urbanistas em indicar novos âmbitos que colocam em crise aquela que parece ser, a “não-cidade” nascida depois dos modernos.


i A escala paulista de realizações viria no programa o seu espaço mais representativo, com obras públicas do IV Centenário de Fundação da Cidade de São Paulo, que dentre outras coisas, teve a inauguração do Parque Ibirapuera (1954)i: “Primeiro porque aponta para um tipo de reflexão sobre um espaço significativo da metrópole, segundo porque revela a importância da construção de um parque na década de 50” (NEVES, C. S). O Parque do Ibirapuera, de Oscar Niemeyer (1951), mesmo aparecendo como projeto no Plano de Prestes Maia, explicita: um grande equipamento urbano articulado às redes de transportes e à marquise linear articuladora. O novo parque cria um "perímetro de aglomeração" - a aglomeração é composta de um centro urbano e da sua periferia, destinado a indicar as zonas para uma "urbanização de complementação", de modo a reequilibrar os valores fundiários relacionados com o quadro material da nova vida instituída, tendo como modelo de planificação urbana, aquele da cidade-jardim. O fenômeno do zoning, inscrito na paisagem, nas maneiras mais concretas, precisa considerar essa segmentação da intervenção pública em todas as consequências, do fracionamento, dos financiamentos às incompatibilidades das redes normativas e regulamentares, e não somente aos efeitos perversos das doutrinas arquitetônicas. ii Manfredo Tafuri. iii Durante a inauguração do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. VARGAS, Getúlio. A nova política do Brasil, v. VI, p. 117. iv Em novembro de 1938, pelo presidente Vargas, que associava "a solidez arquitetônica da construção à obra de integração social" e reforçava a condição que a arquitetura assumia dentro desse quadro: "não valia apenas como expressão arquitetônica, mas como afirmação da capacidade e esforço do regime na execução do programa de realizações". VARGAS, Getúlio. A nova política do Brasil, v. VI, p. 267 v Decreto-lei nº 1915/39, art. 2º, letra "I", In: Lex, 1039, p. 667. vi Discurso proferido em 1934, ver Oliveira, L.L. et alii. Estado Novo - ideologia e poder. Rio de Janeiro: Zahar, 1982, pp. 26 e 28. vii LAMOUNIER, Bolívar. "Formação de um Pensamento Político Autoritário na Primeira República. Uma interpretação". In: História geral da civilização brasileira, o Brasil Republicano. Tomo III, 2º v. São Paulo/Rio de Janeiro: Difel, 1977. viiiLAMOUNIER, Bolívar. "Formação de um Pensamento Político Autoritário na Primeira República. Uma interpretação". In: História geral da civilização brasileira, o Brasil Republicano. Tomo III, 2º v. São Paulo/Rio de Janeiro: Difel, 1977, p. 362. ix Entrevista Dr. João Batista Vilanova Artigas, Fundação Vilanova Artigas, sem referência, p.1. x "É preciso considerar o problema urbanístico regional, que não se resolve com avenidas, viadutos e pracinhas ajardinadas. Se o urbanismo é a arte de correlação e integração - problema de função, de textura, de economia e síntese estética- só pode ser realmente praticado no plano regional e na maior de suas regiões - a Nação". "Plano Regional de São Paulo”, (Uma contribuição da universidade para o Estudo de um Código Lícito de Ocupação do Solo). "1954-", p. 2. xi Analogia também colocada por Lambert, Impressões de São Paulo/Código de obras também consolida uma postura americana até então percebida na construção da cidade. xii Constatou-se, no entanto, um acentuado adensamento na coroa interna da cidade, configurando uma área consolidada de intensa urbanização, apresentando-se como uma das áreas mais bem servidas de transporte e infraestrutura, favorecendo não somente as atividades comerciais e de serviços, mas de habitação e de lazer. Apesar de uma grande concentração no horário comercial, temos um esvaziamento fora desses horários. Isso fez com que esta área fosse alvo de alguns programas de incentivo a habitação, ordenação das vias de circulação e revalorização dos espaços públicos. A circulação de veículos está intimamente ligada ao problema dos transportes coletivos e seus respectivos pontos de embarque e desembarque. Esse aspecto da circulação deve ser visto sempre de maneira mais ampla, pois as vias transcendem aos limites da área central. Nesse sentido o tráfego de veículos não pode ser resolvido apenas dentro deste perímetro, no entanto, alguns de seus aspectos podem receber um tratamento mais adequado, como no caso dos pontos de embarque e desembarque. Essas estações, ou terminais de ônibus, instalaram-se tradicionalmente nas praças e largos mais representativos da cidade. Muitos dos terminais de ônibus atuais foram antigos pontos das linhas de bondes. Deve-se imaginar, então, dentro de um programa de circulação, a implantação de terminais


adequados ao fluxo atual, entretanto, deve-se tomar cuidado para não descaracterizar locais da cidade possuidores de algum valor paisagístico, histórico ou cultural. A introdução de novas tecnologias não se deve fazer em detrimento de elementos significativos de outras épocas, culturas e conhecimento. xiii A nova dimensão - a cidade-região - contrapõe diversos modelos de um contínuo urbanizado, uma aglomeração de centros que conservam a sua autonomia, um artifício formal para resolver os problemas da congestão, para depois sustentar que essa deve ser concebida como uma relação dinâmica dentro de um processo de planificação. Architectural Review está contra a cidade-região: "Not result on the land surface, sprawl, arcadian in conception, in practice a false synthesis". xiv A produção de espaços públicos de lazer, em meados da década de 1960, ganha significativo impulso, devido à criação de políticas públicas melhor estruturadas dentro das prioridades do planejamento urbano. Essas foram concepções diretoras que levaram à construção efetiva de uma política de lazer pública em São Paulo, através da criação de programas de uso do tempo livre, bem como a produção de espaços públicos de lazer, tais como os Centros Esportivos Educacionais, os Balneários e os Parques urbanos. A distribuição dos equipamentos culturais na cidade de São Paulo reforça esse fenômeno, onde o Centro Histórico e o Centro Expandido concentram 43% desses equipamentos para 14% da população residente. Assim como o lazer, desde a década de 1970, o discurso ecológico ganha atenção maior em São Paulo (acompanhando as mesmas tendências das demais metrópoles), pois criticava um modelo de desenvolvimento, que além da desigualdade, produzia uma cidade mais desumana e árida. xv In: ARTIGAS, Vilanova. Vilanova Artigas. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi/Fundação Vilanova Artigas, 1997. pp. 17, 20, 24, 26, 28. (É uma compilação a partir de diversos depoimentos organizados por Rosa Camargo Artigas). xvi PEDROSA, Mário. Acadêmicos e modernos: textos escolhidos III. São Paulo: Edusp, 1998. pp. 391392. Reflexões em torno da nova capital. xvii Em 1953 no CIAM em Aix-en-Provence, os Smithson se opuseram às quatro categorias funcionais indicadas na Carta de Atenas, uma hierarchy of human associations, que se exprime em quatro classes: house, street, city, district. Uma comunidade deveria assim constituir-se, a partir de uma hierarquia de elementos que representem os diversos níveis associativos da casa, primeiro "elemento definido", da cidade à estrada, segundo "elemento definido", à cidade. A hierarquia de associação se move dentro de um "continuum modulato que representa a real complexidade da associação humana"; os termos estrada, distrito devem ser entendidos como ideia de formas associativas para reinterpretação, das quais devemos encontrar o equivalente adequado à sociedade contemporânea. xviii Pela primeira vez, faz-se alusão a uma possível desmaterialização da cidade e dos seus elementos: "todo o conceito de aglomeração está hoje perdendo o seu caráter psicovisual definitivo e está adquirindo o significado de "control device" (instrumento de controle)", concebido para manter as variáveis dentro dos limites desejáveis. (...) As mudanças serão controladas da espinha dorsal e desta se estenderão aos mais livres, menos definidos campos do habitat, do trabalho, etc. O processo é naturalmente diferente daquele que guiou a realização dos New Towns dos anos cinqüenta, mas os novos materiais são ainda vagos, se trata de conceitos, como aquele de "Espinha dorsal", ao qual é difícil dar uma definição formal precisa. xix Giancarlo de Carlo observa, nos mesmos anos, os limites do plano construído por zoneamento e a necessidade de novos instrumentos que facilitem a compreensão do caráter do território contemporâneo. A interpretação de De Carlo, cujo plano de Urbino e o projeto dos Colégios Universitários são publicadas no Team 10 Primer, foi que a tendência à mistura das funções e o desfalecimento das hierarquias tradicionais modifiquem o conceito de subúrbio; que a dissolução das zonas especializadas, o esmagamento do território agrícola e a livre instalação das funções, aparentemente caótico, levem a uma organização territorial diversa, com respeito a qual, deve-se interrogar sobre as possíveis relações entre materiais urbanos e uma ideia de estrutura. De Carlo distingue entre "forma da estrutura urbana e estrutura da forma urbana" considerando a primeira "materialização tridimensional dos grandes parâmetros da organização espacial, modelos lógicos" e a segunda, "urdidura (armação) que serve de trama compositiva, ritmos, sequências, esquemas de referência". xx Le Corbusier desenha uma cidade linear produtiva somente em 1942. Dos trabalhos de Ascoral derivam as teses sustentadas dos Três Estabelecimentos Humanos: uma unidade de desenvolvimento agrícola, uma cidade linear industrial, uma cidade radiocêntrica, centro de cultura e dos negócios.


xxi "Arquitetura e Construção", em ARTIGAS, Vilanova. Caminhos da Arquitetura. São Paulo: Fundação Vilanova Artigas/Pini, 1986. p.104. xxii SERT, Josep Lluis. Can our cities survive? Cambridge Mass.: The Havard University Press, 1942, da edição de 1947. xxiii Em 1978, talvez impressionados pelo grande fluxo de carros no centro, chegando a 5000 veículos/hora, a Companhia de Engenharia e Tráfego elaborou um projeto que previa a construção de passarelas provisórias para a travessia de pedestres. Estas seriam construídas enquanto a Estação Anhangabaú do Metrô não fosse concluída, sendo retiradas então, uma vez que o Metrô restituiria a segurança aos pedestres em um dos mais perigosos cruzamentos da cidade - Vale do Anhangabaú, Avenida 23 de Maio e Nove de Julho. As passarelas possibilitariam a eliminação dos semáforos junto a estas duas últimas, facilitando o livre trânsito dos automóveis, normalmente congestionado no local, e prejudicado ainda mais, pela interdição de algumas faixas para a execução das obras do Metrô. Propiciaria ainda a redução no tempo de viagem dos pedestres, dos carros e dos ônibus. Havia ainda os benefícios marginais como: redução do índice de acidentes, redução do nível de poluição e melhoria das condições de vida da população em geral. Foi assim que as passarelas provisórias foram construídas, em estrutura metálica e pranchões de madeira, como solução temporária para evitar desastres e mortes por atropelamentos, se transformando, dia a dia, na segurança definitiva. O Vale do Anhangabaú, o antigo orgulho dos paulistanos, havia se transformado no miolo divisor de todo o sistema viário Norte-Sul-Oeste da capital, pois, apesar de sua grande importância, era extremamente conturbado. Além disso, nada mais significava senão um grande retângulo de 32 mil m2, próximo ao centro, duas largas pistas, cada uma com seis faixas de tráfego no sentido Sul-Norte; paralelas a estas pistas, uma avenida e uma rua. A avenida era a Anhangabaú com três faixas de tráfego no sentido Sul-Norte, A rua era a Formosa com quatro faixas no sentido Norte-Sul. Dentro dos 32 mil m2 de vale, restaram apenas 5.567 m2 de áreas ajardinadas. Era ainda, local com 34 terminais de ônibus, oito bancas de jornal, uma loja de discos, uma casa de artesanato em couro, oito bares e restaurantes diversos, uma banca de livros usados, duas papelarias, duas padarias, duas lojas de roupas, uma relojoaria, onze prédios comerciais, um cinema (sempre com dois filmes em cartaz), um estacionamento, três bancas de quinquilharias na calçada, duas agências de caixas econômicas (estadual e federal), seis bancas de frutas na calçada, dois bancos, dois magazines, uma grande galeria e um banheiro público. Era este amontoado de atividades que, em 1974, levariam uma estudante a classificar o Vale do Anhangabaú como uma “porcaria, o fim do mundo. Tanto em termos de trânsito, não vale nada. Volta e meia o Vale está todo congestionado, com os carros buzinando, fazendo barulho infernal. E os pedestres andam como se estivessem fugindo de alguma coisa de tão apressados. Ninguém ri, ninguém tem calma. É deprimente”.(Jornal da Tarde, 17/5/1974.) xxiv Em relação à difusão da instalação, o comportamento dos Smithson se mantém ambíguo: de um lado, esta é considerada emblemática do novo estilo de vida; do outro, a necessidade de habitações e de condições vivíveis para a massa requer, numa sociedade industrial altamente desenvolvida, big forms. Todavia, para dar identidade a uma comunidade não é necessário a densidade e, não é nem mesmo preciso, excluir a baixa densidade do centro da cidade. Este conceito se opunha, seja a neighbourhood isolada e separada das estradas, seja as unités lecorbusianas que operavam um rígido isolamento de seções arbitrárias das comunidades totais. A comunidade é compreensível por definição e assim deveriam ser as suas partes, cada unidade é diversa em função dela. O novo localismo chega até à habitação: o grupo ATBAT de Candilis, Woods, Bodiansky, afirmava no Doorn Manifesto (1954), que a casa não pode ser distinta da sua comunidade e vice-versa. Habitat refere-se uma casa particular em uma peculiar comunidade. As reflexões sobre associação e identidade conduzem ao desenvolvimento de sistemas de edifícios coligados entre eles, que respondem de melhor modo às redes de relações sociais, do que as formas urbanas tradicionais. xxv Em 1949, um longo artigo publicado na Architectural Review, intitulado “Townscape: A place for an english visual Philosophy”, foi acompanhado do casebook, uma coleção de imagens e esboços ordenados segundo categorias como vista: incident, pattern, roofscape, e outras pelo Gordon Cullen. Nos anos que transcorrem entre 1949 e 1961, Cullen amplia a "Townscape Imaginnery, (...) acumulando exemplos de experiências individuais, a função dos quais é de adestrar antes de tudo a faculdade criativa, depois de fornecer exemplos para serem disseminados: o casebook of out there." O olho como articulador de uma projetação urbana baseada em valores visuais que procura precedentes, não princípios: sobre esta base se exprime uma posição radical que coleciona exemplo individual de civic


design, construindo uma estética moderna, a living idiom, sobre a base de inumeráveis juízos individuais. O casebook assume o landscape na sua totalidade como campo da visão. A projetação urbana como arte visível, definida por Thomas Sharp, Civic Design, foi rebatizada pela Architectural Review como townscape. xxvi Alguns aspectos do A Pattern language, texto sob certos aspectos anômalo e excepcional, devem ser sublinhados. O primeiro: a estrutura do texto é à miroir (enunciação do problema e proposta); a solução é sempre expressa sob a forma de instrução, seguida de um diagrama que indica os seus componentes principais. O segundo: a ideia é construir uma linguagem composta de pedaços de frases que são sequências espaciais, pedaços de cidades; a ideia sugere a construção como montagem de pedaços e como jogo combinatório. O terceiro ponto se refere aos materiais utilizados: as relações que se estabelecem entre as coisas nas diversas escalas, todas diversamente interpretadas à luz da noção de conforto e de rendimento. No momento do projeto os pattern são submetidos à verificação e avaliados através de critérios standards e requisitos de rendimento. As dimensões de rendimento implicam um recurso às regras abstratas: fazer uma bow window é uma coisa diferente de pretender que seja possível para aqueles que estão na sala ver bem a estrada nas duas direções. E se deixam espaço à inovação, mas podem-se revelar extremamente difíceis para governar. Para isto, é necessário recorrer a um vocabulário dado, a "um stock de modelos ambientais (...): vielas cegas, saída de segurança, fundações, grandes fazendas, seção de estradas, centros cívicos, artérias com comércio (...). Para ser de qualquer utilidade, uma teoria deve ser em grau de correlacionar os próprios anunciados a estas óbvias e indispensáveis imagens mentais...". xxvii Depois de Foucault, Derrida expandiu a definição de "evento" chamando-a de "emergência de uma multiplicidade desigual" num texto sobre os folies do Parc de la Vilette. Os chamados folies são pontos de atividades, programas e de eventos. Derrida elaborou este conceito propondo a possibilidade de uma "arquitetura do evento" que eventualizaria ou abriria, o que na nossa tradição histórica, é entendido de maneira fixa, monumental, essencial. xxviii Segundo Kevin Lynch, os Patterns de Alexander são uma série muito elaborada de "modelos ambientais", que atravessam todas as escalas do projeto, como aquelas recolhidas em uma dos apêndices de Projetar a Cidade: "Estes modelos são como materiais da construção que podem ser usados em várias combinações e em diversos fins". Cada um dos modelos analisados interessa aos possíveis componentes físicos de uma cidade. Os limites desta construção estão em tudo aquilo que são excluídos na finitude do vocabulário: "Os modelos de forma podem ser considerados unicamente como um arsenal de possibilidade. A sistemática análise crítica dos precedentes e a elaboração e estudo de novos protótipos constituem os empenhos maiores para o projeto da cidade". A dificuldade está em adequar conceitos fundamentalmente estáticos a fenômenos que tem uma dinâmica temporal, utilizações temporâneas e usuários eventuais. O modelo deveria tratar de forma, de processo e de instituição contemporaneamente: "o armazém do projeto empobreceu e certas estantes estão vazias. (...) A obra de Alexander constitui um início em tal propósito". xxix Duany, Andes e Elizabeth Plater-Zyberk e Robert Alminana. The New Civic Art - Elements of Town Planning. Ed. Rizzoli, 2003.
















EQUIPE

Prof. Dr Adalberto da Silva Retto Jr. Profa. Dra. Marta Enokibara Profa. Ms. Kelly Cristina Magalh達es Profa. Dra. Norma Regina Truppel Constantino


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Adalberto da Silva RETTO JUNIOR

Atua como Professor de Desenho Urbano e História do Urbanismo na Universidade Estadual Paulista Unesp e como Professor Visitante no Master Erasmus Mundus TPTI (Techiniques, Patrimoine, Territoire de l Industrie: Histoire, Valorisation, Didactique) da Universitè Panthéon-Sorbonne Paris I , na Universidade de Évora; Possui Pós-doutorado no Doutorado de Excelência do Istituto Universitario de Arquitetura de Veneza Italia (2007); Doutor pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e pelo Departamento de História da Arquitetura e Urbanismo do Instituto Universitario de Arquitetura de Veneza (2003). Pesquisador na linha de pesquisa “Conhecimento Histórico Ambiental Integrado na Planificação Territorial e Urbana” alimentado por duas sub-linhas: História da Cidade e do Territorio e Planejamento e Projeto da Cidade, do Território e da Paisagem. Na sub-linha de pesquisa de História da Cidade e do Território: Coordenou o Grupo de pesquisa da Unesp (Bauru) no Projeto Temático Fapesp (2006-2011) Saberes Eruditos e Técnicos na Configuração e re-configuração do Espaço Urbano: Século xIX e XX ; Coordenou o I Congresso de História Urbana (2004) Camillo Sitte e a circulação dos saberes em estética urbana: Europa e América Latina 1880-1930; Na sub-linha de pesquisa Território e Planejamento e Projeto da Cidade, do Território e da Paisagem: Coordenou o I e II Workshop Internacional Conhecimento histórico ambiental integrado na Planificação territorial e Urbana: um contributo de Bernardo Secchi (2004 e 2006); Coordenou a elaboração do Plano Diretor Participativo do Município de Agudos SP (20042006), e a revisão do Plano Diretor do Município de Jaú (2010-2011), o Plano Estrutural de Pirajuí (2013) e Coordenador do Plano Diretor do Município de S. Manuel - SP (2014-2015). Coordenador da pesquisa e Curso Internacional de Extensão Universitária A dimensão Paisagistica no projeto da cidade contemporânea: itinerários nas cidades Rio de Janeiro (percuso 01), Paris, Veneza e Roma (percurso 2), Berlim, Barcelona e Atenas (percurso 3) , que objetiva analisar os projetos que assumiram um valor estrutural nas transformações urbanas no campo do urbanismo e do paisagismo durante as três últimas décadas do século XX onde a reconfiguração de partes da cidade assumem uma escala da paisagem, a partir dos projetos de reestruturações de áreas ferroviárias, tramas urbanas, centros históricos e partes de cidades, que começaram a delinear um percurso gradual que coloca o projeto de espaços abertos como conectores das estruturas urbanas e territoriais. Consultor ad hoc Ministero dellIstruzione, dellUniversità e della Ricerca Direzione Generale per il coordinamento e lo sviluppo della Ricerca. Avaliador dos cursos de arquitetura e urbanismo do Ministério de Educação e assessor ad hoc da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp.

Marta ENOKIBARA

Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (1991) e doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (2003), na área de Estruturas Ambientais Urbanas. Atualmente é pesquisadora do Projeto Temático FAPESP “Saberes eruditos e técnicos na configuração e reconfiguração do espaço urbano. Estado de São Paulo, séculos XIX e XX”, inserida no sub-tema 3, equipe UnespBauru, “Saberes técnicos e teóricos na configuração e reconfiguração das cidades formadas com a abertura de zonas pioneiras no Oeste do Estado de São Paulo”. É professor assistente doutor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, onde leciona as disciplinas de História do Paisagismo, Trabalho Projetual Integrado II (área de paisagismo) e Projeto Executivo de Paisagismo. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, atuando nas seguintes linhas de pesquisa: Paisagismo, História da Cidade e do Território e Projeto Urbano.


Kelly Cristina MAGALHÃES

Graduada em Arquitetura e Urbanismo pelo Centro Universitário Moura Lacerda (1997), desenvolveu Mestrado junto ao PPGEU, na Universidade Federal de São CarlosUFSCar em 2002. Atualmente é Professor Assistente da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em História e Projeto Urbano, atuando principalmente nos seguintes temas: planejamento urbano, planejamento paisagístico, projeto urano, políticas públicas, ferrovia e urbanismo.

Norma Regina Truppel CONSTANTINO

Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Paraná (1979), mestrado em Planejamento Urbano e Regional Assentamentos Humanos pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1994) e doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (2005). Atualmente é professor assistente doutor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho no Curso de Arquitetura e Urbanismo e no Mestrado Acadêmico em Arquitetura e Urbanismo. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Projetos de Espaços Livres Urbanos, atuando principalmente nos seguintes temas: paisagem urbana, paisagismo, espaços livres urbanos e história da cidade e do território


Projeto Grรกfico: Adalberto Retto Junior - Eriton Tantini


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