6 minute read

TRANSGRESSÃO Nº13

Next Article
CAPA

CAPA

TRANSGRESSÃO Nº13/ MURRO#07 POR/ NEOMISIA SILVESTRE

EDSON CLARO A MOBILIDADE HUMANA

Advertisement

QUANDO O ADOLESCENTE Armando foi até a universidade se matricular no curso de Educação Física e, ao sair, regressou seduzido pela música que ressoava no ginásio: era Educação. Quando Vanessa, aos 17 anos, preocupou a família por preferir à Dança ao Direito, também era Educação. E quando o bailarino e coreógrafo Edson Claro apostou e incentivou esses jovens, era a certeza absoluta de que o corpo sempre surpreende quando começa a dançar.

Armando Duarte e Vanessa Macedo são Claro, paulista, professor doutor e criador do método Dança-Educação Física (MDEF), um marco na história da dança moderna brasileira. Ele também é responsável por introduzir conceitos de dança contemporânea em Natal e lá criar grupos como o Acauã Cia. de Dança (1988), Gaia Cia. de Dança (1990) e a Cia. de Dança dos Meninos (2000), além de incentivar artistas que se consolidaram na carreira artística.

“Todas as minhas referências em dança vieram do Edson. Eu era atleta, fazia ginástica rítmica, que tinha um trabalho forte de corpo, mas não voltado à dança. Depois de uma atividade de dez anos como ginasta e técnica de ginástica rítmica, entrei no grupo de dança que ele dirigia, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, hoje chamada de Gaia Cia. de Dança”, diz Vanessa, coreógrafa e diretora da Companhia Fragmento de Dança, sediada em São Paulo e que desenvolve pesquisa e criação em dança contemporânea desde 2002.

“Há 12 anos, época em que vim pra São Paulo – quando geralmente quem costuma se aventurar assim, deixar a família, são os homens –, tive o apoio dele. O Edson abria todos os caminhos que podia, sempre foi sionais de Natal, assim como eu, que tiveram esse contato com ele e fôlego de correr atrás, tinham seu total apoio. Era uma pessoa muito incentivadora. De repente, quando estava todo mundo focando no caminho mais fácil, ele sempre estava mais aberto para um caminho mais difícil”, recorda.

Como criador e educador, trabalhou na Faculdade Integrada de Guarulhos e instituiu

Professor aposentado pelo Departamento de Artes da UFRN, hoje com 63 anos, Edson lida há dez com a doença de Parkinson, mas faz dela um instrumento de motivação para a publicação do livro Dançando com Parkinson, referência para pacientes, neurologistas, terapeutas e bailarinos

o Curso de Especialização em Método DançaEducação Física; fundou e coordenou a PósGraduação Lato Sensu – Dança e Consciência Corporal (1995) e o Curso de Licenciatura em Dança (2009), na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Foi um dos criadores do Ballet Stagium e da Companhia de Dança Cisne Negro. Estudou e fez intercâmbio com diversos artistas, como o dançarino e coreógrafo alemão Rolf Gelewski (1930-1988); o bailarino afro-americano Walter Nicks; a psicóloga Bernadete Figueiredo; a bailarina, coreógrafa e professora Ruth Rachou; e o maestro Ricardo Ordoñes (1939-2009).

“Como ele sempre teve muitos contatos com coreógrafos do Brasil inteiro, levou muitas pessoas importantes da dança para coreografar para o grupo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), como o José Henriqueta, o Mário Nascimento e o Henrique Rodovalho. Desde muito cedo proporcionou esse contato com pessoas importantes”, completa Vanessa.

Estudos acadêmicos e vivências em diversos tipos de dança – desde o samba que ele já arriscava aos 5 anos de idade nas festas de família – potencializaram seu entendimento de corpo e fundamentaram a simbiose entre Dança e Educação Física enquanto processo educacional, com enfoque multidisciplinar aplicado por Edson em todos os trabalhos que desenvolveu, principalmente como no espetáculo de dança “Mão na Roda” (1998), sob sua coordenação artística e direção de Henrique Amoedo.

Jogador de vôlei e adepto da prática do atletismo, a união da dança com o esporte acontece quando ele passa a frequentar aulas de expressão corporal de Jonatas Gama, em 1973, e percebe que seu método de ensino nascia também de uma necessidade de ampliar o conhecimento do próprio corpo enquanto mobilidade e de sua relação com os espaços internos e externos. “O corpo sempre reage de forma surpreendente quando a gente começa a dançar”, diz, em depoimento gravado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte para o programa “Figuras da Dança”, dirigido por Inês Bogéa, diretora artística da São Paulo Companhia de Dança.

“Edson Claro é um dos grandes incentivadores da produção artística no país. Rompeu barreiras, preconceitos e mudou a forma de se pensar a dança no país ao criar o Método Dança-Educação Física, apostando na multidisciplinaridade e acreditando na ligação entre dança e educação física como um processo de educação”, diz Inês. Produzido em 2012, o programa resgata a vivência do artista, entremeando suas experiências e motivações tistas e pessoas que trabalharam com Edson, além dele próprio falar de sua trajetória.

“Logo que comecei a dançar, fui fazer aula no estúdio de Ballet Cisne Negro. Fui pra Natal convidado pelo Edson para coreografar junto ao Acauã, o primeiro grupo de dança que ele montou em Natal. A segunda experiência foi no grupo Casa Forte, que ele montou em São Paulo, e eu tive a felicidade de coreografar”, diz o bailarino e professor da Universidade de Iowa, em Chicago, Armando Duarte.

Armando, assim como Edson, também é um dos fundadores do Cisne Negro. “Fiquei quase 15 anos ininterruptos com a Companhia, até quando me mudei para os Estados Unidos. Fui assistente de Hulda Bittencourt [diretora artística da Cisne Negro] por cinco anos e ao mesmo tempo desenvolvia minha carreira como coreógrafo. Mas o meu início na dança se deve muito ao que Edson começou na década de 1970, com um trabalho na Universidade de São Paulo. Sou dessa geração de bailarinos brasileiros que começou a dançar dentro da Universidade”, diz.

Da convivência com Edson, Armando rememora sua personalidade aplicada e exigente, mas cheia de entusiasmo, energia e de um carisma extremamente forte; elementos que o auxiliaram na propagação da metodologia da dança-educação física e também no sentido da dança praticada por um grande número de pessoas, independente da idade. “Eu o considero um dos maiores educadores do Brasil. Para todos que tiveram a oportunidade de interagir com ele, não aprendemos só a dança, mas também educação e cidadania, que são valores que carrego até hoje, nesses 36 anos que danço”, completa.

Professor aposentado pelo Departamento de Artes da UFRN, hoje com 63 anos, Edson lida há dez com a doença de Parkinson, mas faz dela um instrumento de motivação para a publicação do livro , referência para pacientes, neurologistas, terapeutas e bailarinos. Atualmente, vive em Natal, com a esposa Isabel, com quem é casado Edson atendeu a Murro em Ponta de Faca e disse que o livro está sendo produzido, devagar. Em paralelo a isso, ele, orgulhoso, diz que voltou a coreografar, dessa vez, para a Escola de Dança e Teatro Alberto Maranhão, no espetáculo Oremos, que tem estreia prevista para este ano. Em primeira mão, também contou que está em andamento um tango em homenagem Luis Arrieta.

Na breve entrevista, quando Isabel faz a trajetória artística, Edson brinca e responde: “Fenomenal”. Mas reconhece: “O trajeto foi árduo, com muito suor, trabalho, dedicação e muitas horas de estudos”. Isabel sorri e encerra a conversa com um: “Eita, o cara vai longe”.

This article is from: