Revista Keyboard Brasil 2016 número 32

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Revista

Keyboard ANO 4 :: 2016 :: nº 32 ::

Brasil

:: Seu canal de comunicação com a boa música!

www.keyboard.art.br

MARCOS VALLE

O desbravador dos mares musicais

O MENINO E O MUNDO: Qualidades e defeitos musicais do filme de animação brasileiro

OUTROS SONS: Uma seção dedicada aos músicos que não tocam teclas. Estreando Rubén de Lis!

IGNACY PADEREWSKI: Muito mais do que uma estrela da música clássica. Uma das figuras mais importantes da história da Polônia!

MÚSICA DELIVERY: Na cidade de São Paulo, Ilca Leanza leva a música até sua casa!

KEITH EMERSON: O adeus às teclas bombásticas do Rock Progressivo

E MAIS:

As dicas de Murilo Muraah, Mateus Schanoski, Luiz Carlos Rigo Uhlik, Luiz Bersou e Antonio Carlos da Fonseca Barbosa e as novidades: Sergio Ferraz e Hamilton de Oliveira, novos colaboradores, segmentos diferentes!




Editorial A cada mês, uma novidade! E isso é maravilhoso! Bom, começo dizendo pela brincadeira lançada via facebook para adivinhar quem seria nossa capa e, assim, ganhar o CD Flutuando sobre as Ondas de Sergio Ferraz. Parabéns Caique Lima!! E é essa a intenção: buscar a interatividade com os leitores e não somente curtidas! Capa e entrevista mais do que aguardada! Marcos Valle é cultuado no mundo todo por suas belas canções mas, depois dessa entrevista, minha admiração foi muito além! Aqui não caberia meus elogios a essa grande pessoa que, desde o início de nossos contatos, demonstrou (ele e sua esposa Patrícia Alví) solicitude, coisa que falta em algumas ‘estrelas’. Grande emoção também em informar nossas novas conquistas: Sergio Ferraz e Hamilton de Oliveira, novos colaboradores de segmentos diferentes e grandes no que fazem! Outra novidade: a partir desse mês e, após receber muitos pedidos, uma nova seção surge em nossa revista: Outros sons. Músicos que utilizam outros instrumentos musicais agora terão seu espaço em nossa publicação! Este mês, Rubén de Lis, violonista espanhol em terras tupiniquins! Seguindo as novidades, esse mês você vai conhecer um projeto que está dando o que falar na cidade de São Paulo, é o Música Delivery idealizado pela tecladista Ilca Leanza e ideal para os tempos de hoje. Nossa parceria com o site tecladistas.com traz, nesta edição, exercícios de Mateus Schanoski. Dentre as grandes perdas para o mundo da música deste mês de março, Amyr Cantusio Jr presta uma bela homenagem a

Expediente

Heloísa Fagundes - Publisher

Keith Emerson, o virtuoso que misturava música clássica, Jazz e Rock de maneira única na história da música. Maestro Colarusso discorre sobre as qualidades e os defeitos musicais do encantador e premiado filme de animação O Menino e o Mundo. Se você não conhece uma das figuras mais importantes da história da Polônia, muito mais do que uma estrela da música clássica, prepare-se para uma matéria completa sobre Ignacy Paderewki. Além destas, a revista Keyboard Brasil traz as dicas de Murilo Muraah, Luiz Carlos Rigo Uhlik, Luiz Bersou e Antonio Carlos da Fonseca Barbosa. Mais conteúdo, mais colaboradores, mais cultura! Obrigada equipe, colaboradores, leitores, anunciantes. Excelente leitura!

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Março / 2016

Keyboard Revista

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Brasil

Editora Musical

Revista Keyboard Brasil é uma publicação mensal digital gratuita da Keyboard Editora Musical. Diretor: maestro Marcelo D. Fagundes / Publisher: Heloísa C. G. Fagundes Caricaturas: André Luiz / Marketing e Publicidade: Keyboard Editora Musical Correspondências / Envio de material: Rua Rangel Pestana, 1044 - centro - Jundiaí / S.P. CEP: 13.201-000 / Central de Atendimento da Revista Keyboard Brasil: contato@keyboard.art.br As matérias desta edição podem ser utilizadas em outras mídias ou veículos desde que citada a fonte. Matérias assinadas não expressam obrigatoriamente a opinião da Keyboard Editora Musical. 04 / Revista Keyboard Brasil


Estou na capa da 31ª edição da Revista Keyboard Brasil!! Muito honrado de ser convidado para a matéria de capa e entrevista da Revista Keyboard Brasil de fevereiro: ANDRÉ YOUSSEF - O Blues man da cena paulistana. Maior publicação do gênero do país. Com direito a matéria e entrevista minha e da minha banda, a Tritono Blues. Matéria e entrevista, por Heloísa Godoy Fagundes. Obrigado Editora Keyboard! Obrigado Heloísa pelo convite! Ficou muito bom!! Obrigado a todas as pessoas que me parabenizaram, estou muito feliz! André Youssef – via Facebook Parabéns André... top demais Editora Keyboard! #VivaMúsica (Referente à matéria de capa de André Youssef) Rafael Sanit – via Facebook Parabéns pela entrevista de André Youssef, Lolo! Lia Raquel Fagundes – via Facebook Na edição de fevereiro a REVISTA KEYBOARD traz uma super matéria sobre minha trajetória como artista além de uma excelente entrevista! Sergio Ferraz Não tenho palavras para agradecer ao músico Amyr Cantusio Jr. e a Heloísa Godoy da Editora Keyboard por essa maravilhosa e incrível matéria super completa sobre meu trabalho!! Muito obrigado meus queridos!! Vocês podem ler e baixar a revista gratuita no link : http://vp.virtualpaper.com.br/keyboard?e=42&l=1 Sergio Ferraz – via Facebook Já baixei! Logo leio! Sami Abadi – via Facebook Com gratidão a Deus, Família e amigos... comunico oficialmente a parceria com a Revista Keyboard Brasil!!! Maior publicação do gênero no País! Muito obrigado a toda equipe, colaboradores, leitores e anunciantes da Revista Keyboard Brasil!!! Obrigado Heloisa Fagundes! Honrado e feliz com essa parceria... Rafael Sanit, nosso novo colaborador, para a região Norte e Nordeste do Brasil – via Facebook Muito conteúdo interessante, vale ler! Todas as matérias disponíveis no novo Blog da Editora Keyboard! Patrícia Santos – via Facebook

Espaço do Leitor Parabéns, Helô (Editora Keyboard)! Colocando música na vida das pessoas! Isto, sim, é que é uma grande referência! Avante! Colocando música na vida das pessoas! Isto, sim, é que é uma grande referência! Avante! Muitas Emoções! Luiz Carlos Rigo Uhlik – via Facebook Los invito a leer la nota que me realizo la editora de la Revista Keyboard Brasil, de Brasil, en la pagina 68, saludos! Luis Lugo Piano de Cuba I – via Facebook Podemos ouvir esses dois lados: um é extremamente emocionante se prestarmos atenção a cada detalhe e dá para dançar também quem não gosta de valsa (é o start para dançar junto ao sexo oposto), por outro lado, dançamos e extravasamos nossos estresses e ainda dá para se emocionar com obras primas dos Bee Gees, ABBA entre outros, podemos ser sérios ouvintes ou descolados mas sem excessos como Glitch Music (vertente da música eletrônica ou algo parecido com música) ou porno-pedófilo funk-nacional (que é algo parecido com música também) acima de tudo, temos que ter equilíbrio. (Referente à matéria de Joêzer Mendonça: Música Clássica x Música Pop - Essa briga é covardia! Edição nº 31). Dj Axell – via Blog Tony Banks é um dos meus tecladistas favoritos do rock, o cérebro por trás da mais emblemática canção do Genesis: "Firth of Fifth" gravada no meu disco favorito deles - Selling England by the Pound (1973) na minha opinião o melhor disco do rock progressivo ao lado de Dark Side of the Moon. Banks também crava neste disco seu longo solo de teclado em "The Cinema Show", pra mim a melhor música de toda a carreira do Genesis. Salve Tony Banks! (Referente à matéria de Amyr Cantusio Jr sobre Tony Banks, Edição nº 31). Igor Maxwel – via G+ Buenas Helô, sempre parabéns à revista e a todos os colaboradores! Maga Lee Craveiro – via G+ A Revista Keyboard Brasil alcançando novos ares! sempre de bom gosto! Bjks Heloísa Godoy Fagundes. O Cartomante Cartomante – via Facebook Revista Keyboard Brasil / 05


Índice

08

26

MATÉRIA DE CAPA: Marcos Valle - por Heloísa Godoy Fagundes

LANÇAMENTO: Baby Shoes, de Paulo Moreira

ESPECIAL: Keith Emerson - por Amyr Cantusio Jr.

50

TECLADISTAS: Técnicas Básicas e Diárias - por Mateus Schanoski

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56 OUTROS SONS: Rubén de Lis - por Heloísa Godoy Fagundes

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74

80

MEMÓRIA: Ignacy Jan Paderewski - por Heloísa Godoy Fagundes

POR DENTRO: Ilca Leanza e o Música Delivery® - Da Redação

NOVIDADE: Hamilton de Oliveira - por Heloísa Godoy Fagundes

84 REVOLUÇÃO MUSICAL: A Música Visionária de Stockhausen - por Sergio Ferraz

06 / Revista Keyboard Brasil

CULTURA: O Menino e o Mundo por Osvaldo Colarusso

54

APRENDA AGORA: Home Studio: A Sala, Parte 3 - por Murilo Muraah

PONTO DE ENCONTRO: O que estamos fazendo com a classe média - parte final por Luiz Bersou

46

28

98 A Vista de meu Ponto: Música! Música! Música! - por Luiz Carlos Rigo Uhlik

102 OPINIÃO: Antes de pensar no sucesso, ame a Música! - por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa


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MatĂŠria de Capa

08 / Revista Keyboard Brasil


O desbravador dos mares musicais COM MAIS DE 50 ANOS DE CARREIRA, ATRAVÉS DE SUAS CANÇÕES DE ESTILO INOVADOR, O CARIOCA MARCOS KOSTENBADER VALLE É, SEM DÚVIDA, UM DOS MAIORES COMPOSITORES DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. OUVINTE ATENTO, SENTAVA-SE AO PIANO DA MÃE PARA EXPERIMENTÁ-LO. E, ASSIM, SURGIU SEU INTERESSE PELA MÚSICA – DESCOBERTO NA INFÂNCIA – E ESTUDOU, POR 13 ANOS, PIANO CLÁSSICO EM CONSERVATÓRIO. A VONTADE EM APRENDER VIOLÃO VEIO AINDA ADOLESCENTE, QUANDO DESCOBRIU A BOSSA NOVA, ESTILO QUE ADOTOU E O AJUDOU A GANHAR O MUNDO. AOS 72 ANOS E INCANSÁVEL, MARCOS VALLE PERCORRE OS QUATRO CANTOS DO PLANETA COMO SE FOSSE DAQUI-ALI, REALIZANDO GRANDES TURNÊS. A REVISTA KEYBOARD BRASIL DESTE MÊS TEM A HONRA DE TRAZER UMA ENTREVISTA COM UM DOS MAIORES MESTRES DA BOSSA NOVA EM ATIVIDADE NO MUNDO. Por Heloísa Godoy Fagundes

Revista Keyboard Brasil / 09

Foto: Quinho Mibach

MARCOS VALLE


Fotos: Arquivo pessoal

Foto maior: Marcos Valle é autor de mais de 500 composições, dentre elas “Samba de Verão”, “Viola Enluarada” e “Black is Beautiful”. Fotos menores (da esquerda para a direita): (1) Marcos Valle começou a tocar piano ainda criança. (2) Antonio Carlos Jobim ao piano e Marcos Valle no violão. (3) Marcos com Eumir Deodato na gravação do disco 'samba 68', Nova Iorque, 1967.

C

ompositor, cantor, violonista e grande pianista, Marcos Valle conquistou o respeito e a admiração no Brasil e no

exterior. Muitas de suas mais de quinhentas músicas já foram gravadas por artistas como Elis Regina, Tim Maia, Roberto Carlos, Bebel Gilberto, Sarah Vaughan, Chicago, Dizzy Gillespie, Stacey Kent, Diana Krall, Emma Bunton, entres muitos outros. 10 / Revista Keyboard Brasil

Trajetória ... Nascido em Copacabana, filho e neto de advogados, de mãe e avó pianistas clássicas, vizinho de Tom Jobim e frequentador da casa de Vinícius de Moraes, Lula Freire e tantos outros bambas da era dourada da música brasileira. De uma Rio de Janeiro tomada pela Bossa Nova não foi difícil para Marcos Valle preferir a música ao invés da profissão de Direito, cursada por um ano na PUC-Rio.


Foto maior: Sylvia Telles, Antonio Carlos Jobim, Roberto Menescal e Marcos Valle em 1964 na RCA Victor Studios. Fotos menores (da esquerda para a direita): (1) Marcos Valle, Quarteto em Cy (as “Girls from Bahia”), com Marcos Valle no programa de Andy Williams, em Los Angeles, 1966. (2) Marcos Valle e Henry Mancini em 1967. (3) Seu irmão Paulo Sérgio com quem fez inúmeras músicas.

Considerado um dos integrantes da segunda geração de um dos movimentos mais influentes da história da música popular brasileira – a Bossa Nova – Marcos Valle iniciou sua carreira artística em 1961 integrando um trio, juntamente com Edu Lobo e Dori Caymmi. Nessa época, começou a compor suas primeiras músicas em parceria com o irmão e letrista Paulo Sérgio Valle. Uma parceria que rendeu muito sucessos. De “Sonho de Maria”, em 1963, interpretada lindamente

por Elis Regina tempos depois, a “Samba de Verão”, sucesso mundial com direito a mais 200 versões em vários idiomas, em pouco mais de um ano, e através de Walter Wanderley, organista brasileiro radicado nos Estados Unidos, atingiu o segundo lugar nas paradas de sucesso norte-americanas, em uma versão instrumental chamada “Summer Samba”. Logo ganhou versão em inglês, agora com o título “So Nice”. “Samba de Verão” abriu as portas do mercado internacional para Marcos Valle e até hoje é seu cartão Revista Keyboard Brasil / 11


Foto maior: Gravação da música de abertura da novela 'Véu de Noiva' para o programa Fantástico, da TV Globo, em 1969. Fotos menores (da esquerda para a direita): (1) Milton Nascimento e Marcos Valle. (2) Sérgio Mendes sentado ao lado de Marcos Valle com a banda Brazil'65. (3) Nelson Motta, Dori Caymmi e Marcos Valle.

de visitas. O sucesso o fez partir rumo aos Estados Unidos, onde trabalhou com Airto Moreira, Eumir Deodato e fez parte do conjunto de Sérgio Mendes, o Brasil'65. Com a possibilidade de ser recrutado para servir o exército norteamericano na Guerra do Vietnã e a saudade da família e dos amigos, Marcos Valle desembarcou no Rio de Janeiro nos últimos dias de 1967. No ano seguinte, cantou música interiorana “Viola enluarada” (1968), em dueto com Milton 12 / Revista Keyboard Brasil

Nascimento, futuro semideus do clube da esquina. Na década de 70 e, ao lado do irmão Paulo Sérgio, do amigo Nelson Motta e do então presidente da gravadora Philips, André Midani, montou a empresa Aquarius Produções Artísticas. Também passou a compor trilhas sonoras de filmes, temas para novela (dentre elas Pigmalião 70, Os Ossos do Barão e Selva de Pedra) e jingles (como a canção “Um novo tempo”, parceria com Paulo Sérgio e Nelson Motta, um sucesso tão grande que nunca


mais saiu do ar, sendo presença

obrigatória em todos os Natais da Rede Globo - até hoje). Em 1971, o rapaz loiro de olhos claros, compôs “Black is Beautiful”, hino Soul gravado pela branca de alma negra Elis Regina. E assim, longe da inocência juvenil dos primeiros anos de sua carreira, um novo Marcos Valle passou a ser associado à modernidade, à tecnologia e a uma imagem de cidadão do mundo ao flertar, além da Bossa Nova, com o Rock'n Roll, o Pop, o Rock Progressivo, as influências psicodélicas, o Jazz, o Soul, o Funk, a Disco e muitos estilos populares brasileiros, dentre eles o Baião e o Samba. Em 1972, sentindo-se limitado em sua criatividade pelas imposições dos trabalhos encomendados, Marcos Valle quis dar vazão a tudo o que o influenciava naquele instante. Surfista desde a juventude, começou a frequentar o vilarejo de Búzios e alugou ali uma casa, onde permaneceu com alguns amigos por alguns dias e idealizou parte do repertório de seu novo disco. Queria então contestar preconceitos e explorar uma maior sensação de liberdade criativa. Acompanhado pelo grupo O Terço (Sérgio Hinds, Cezar de Mercês e Vinícius Cantuária), mergulhou na contracultura, na psicodelia e no Rock'n'Roll. Na faixa “Mi Hermoza”, Valle se aproxima até mesmo do Heavy Metal através de um riff pesado com ecos de Led Zeppelin e Black Sabbath. Porém, em 1974 e com a ditadura

militar tornando a vida e o trabalho no Brasil cada vez mais hostil, Valle

exilou-se nos Estados Unidos, onde compôs músicas para a cantora de Jazz Sarah Vaughan, para a banda de PopRock-Jazz Chicago e para o soulman Leon Ware (parceiro de Marvin Gaye). Em 1980 retornou para um Brasil em processo de redemocratização e disposto a ficar de vez no Rio de Janeiro, ansioso com a possibilidade da nova vida musical brasileira. E, assim, deu uma guinada mais pop surgindo sucessos como “Bicicleta” e o Funk “Estrelar” explodindo como trilha sonora para academias de ginástica. Na década de 90, seu estilo suingado e dançante, apoiado em grooves inovadores, adaptou-se à demanda das pistas de dança europeias e jovens DJs de música eletrônica, em especial da Inglaterra e do Japão, redescobriram sua obra antiga, notadamente a da fase Soul. No meio da febre do drum'n'bass, criaram um novo estilo, o drum'n'bossa. Dessa maneira, seus discos foram relançados e outros gravados, especialmente pela gravadora londrina Far Out Records. A década de 2000 foi regada a

prêmios, inúmeras turnês e parcerias inéditas. Pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA) e com o prêmio TIM, foi contemplado por seu trabalho “Jet-Samba”, cuja produção foi assinada pelo próprio artista. Pelo Instituto Cultural Cravo Albin foi homenageado na série “Sarau da Pedra”, projeto realizado com patrocínio da Repsol YPF e apoio da gravadora Biscoito Fino. No evento, foi afixada no Mural da Música do instituto, uma placa com seu Revista Keyboard Brasil / 13


nome e a ele dedicada pela relevância de sua obra musical. Em 2008, participou do espetáculo “Bossa Nova 50 anos”. Com repertório autoral, apresentou-se em 2012 no Brasil, ao lado da cantora norte-americana Stacey Kent. Os shows contaram ainda com a participação do marido d e S t a c e y, o s a x o f o n i s t a J i m Tomlinson. Em 2013, foi premiado no “Worldwide Awards”, evento realizado no espaço Koko, em Londres. Nesse mesmo ano, comemorou seus 50 anos de carreira e lançou o CD “Ao vivo”, gravado na casa Miranda (RJ), ao lado da cantora e amiga Stacey Kent. Atualmente aos 72 anos e casado com a cantora Patrícia Alví, o incansável Marcos Valle percorre os quatro cantos do planeta como se fosse daqui-ali, realizando grandes turnês e lançando e relançando sucessos.

Norman Gimbel O nova-iorquino Norman Gimbel, de 89 anos, é um letrista profi ssion al. Mais que isso, um homem de negócios que vive do comércio de música popular. Caiu por acaso na obra de Tom Jobim quando este, precisando de letras em inglês para gravar suas canções nos Estados Unidos, recorreu a uma editora, que lhe indicou Gimbel. Foi o americano que transformou ‘‘Insensatez’’ em ‘‘How Insensitive’’, ‘‘Água de Beber ’’ em ‘‘Drinking Water ’’, e, naturalmente, ‘‘Garota de Ipanema’’ em ‘‘The Girl from Ipanema’’. Gimbel tem a seu crédito a letra em inglês para ‘‘Samba de Verão’’, de Marcos e Paulo Sérgio Valle, em ‘‘So Nice/Summer Samba’’, entre tantos outros sucessos. Desde 1984 está no Songwriters Hall of Fame.

No Rock in Rio 2015, Al Jarreau deu um bonito depoimento sobre a importância da MPB em sua carreira antes de chamar o amigo Marcos Valle para participar de seu show: “Vocês mudaram a minha vida. Os discos de Baden Powell, Vinícius de Moraes e Hermeto Pascoal mudaram a minha vida. A Bossa Nova mudou a minha vida. Por isso estou profundamente feliz de tocar hoje com meu amigo Marcos Valle”.

14 / Revista Keyboard Brasil


Samba de Verão A canção contada... Uma espécie de temporão da Bossa Nova, “Samba de Verão”, escrita pelos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle, lembra o estilo que consagrou a dupla Menescal e Bôscoli. Aliás, um ídolo de Marcos Valle, Roberto Menescal seria, não por acaso, um dos primeiros a conhecer “Samba de Verão”, quando o próprio autor mostroulhe a composição, ao violão, na Pedra do Arp oad or, provocan do o ausp icios o comentário: “Vai ser um estouro.” Marcos havia concluído a música sem maior esforço, tentando transmitir o seu lado esportivo de surfista, bem como o clima de sensualidade das praias cariocas. Como acreditava Menescal, “Samba de Verão” foi um grande sucesso. Lançada ainda sem letra pelo grupo “Os Catedráticos”, de Eumir Deodato, a composição teve a sua estreia cantada no LP O compositor e o cantor, que foi o segundo de Marcos Valle,

seguindo-se várias versões que a tornaram uma das mais gravadas em 1965. Dois anos depois, estourou nos Estados Unidos, em gravação inst rum enta l do orga nist a brasileiro Walter Wanderley. Por conta desse sucesso, Marcos seria convidado para se apresentar no show de TV de Andy Williams, que também gravou “Samba de Verão”, além de outros artistas como Johnny Mathis, Caterina Valente e Connie Francis, em versão de Norman Gimbel que, curiosamente, aparece nos discos ora como “Summer Samba”, ora como “So Nice”. Décadas depois, a música continua sendo gravada, dentre os artistas nomes como Bebel Gilberto, Stacey Kent, Eliane Elias, Diana Krall e Emma Bunton. (FONTE: A Canção no Tempo – Vol. 2 – Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello – Editora 34).

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Entrevista Revista Keyboard Brasil – Primeiramente, quero agradecer pela atenção dada à nossa publicação desde o início de nosso contato! Marcos Valle: Com grande prazer o faço. Revista Keyboard Brasil – Você nasceu no bairro mais conhecido do Brasil: Copacabana. Como foi a sua infância? Por que seguiu o caminho da música? Marcos Valle: Minha avó materna era pianista clássica e, por conta disso, eu ouvia música clássica frequentemente. Na casa dela havia um piano/armário e sempre que eu ia lá procurava dedilhar coisas. Isso desde 3, 4 anos de idade. Mamãe também tocava peças clássicas. Então, eu era cercado por música. Também a música popular, pois meu pai, mãe e amigos, tocavam discos de vários artistas populares em casa. Me lembro especialmente de Dorival Caymmi. Ou seja, eu estava cercado pela música e a tinha também dentro de mim. Aí , deu no que deu. Revista Keyboard Brasil – Sabemos que aprendeu piano aos 6 anos de idade, tocando música clássica. O que seus pais ouviam quando criança? Marcos Valle: Além dos clássicos, Bach, Brahms, Beethoven, os populares como Caymmi, Jackson do Pandeiro, Nora Ney, Luiz Gonzaga, Ary Barroso, etc...

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Revista Keyboard Brasil – Além do piano e do violão, você toca outros instrumentos? Marcos Valle: Toquei bateria durante uma época e também acordeom, por influência de Luiz Gonzaga e Chiquinho do Acordeom. Revista Keyboard Brasil – Você pertence à segunda geração da Bossa Nova, ao lado de Edu Lobo, Dori Caymmi e Francis Hime. De onde vem suas influências musicais? Quais músicos faziam sua cabeça? Marcos Valle: Ravel, Debussy, Chopin, Caymmi, Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Ary Barroso, Dolores Duran, Antonio Maria, Nora Ney, Marlene, Marvin Gaye, Benny Goodman, Nat King Cole, Little Richard, James Brown, Henry Salvador, Sammy Davis Jr., Ray Charles, Stevie Wonder, Lucio Alves, Dick Farney e, mais tarde, Johnny Alf, Sergio Ricardo, Tom Jobim, Carlos Lyra, Menescal, Durval Ferreira e outros. Revista Keyboard Brasil – Você era um jovem quando a Bossa Nova surgiu além de ter sido um esportista na juventude. O Brasil daquela época era conhecido pela música de Vinícius, Tom e companhia e pelo futebol de Pelé. Conte como foi a sua juventude. Marcos Valle: Foi uma mistura de música e esporte. Pois, ao mesmo tempo que comecei a estudar piano, solfejo e teoria, aos 6 anos de idade, meu pai levava a mim e meu irmão, Paulo Sergio, para os esportes, sendo que ele também praticava


com a gente: JiuJitsu, Natação, Futebol, Basquetebol, Voleibol, Ciclismo, Surfe, Esqui, Windsurf, Atletismo, Musculação, Ginástica Aeróbica, Tênis, de tudo e mais um pouco fizemos! Namorei bastante, estudei no Colégio Mello e Souza (em Copacabana), no Santo Inácio (em Botafogo, para onde íamos e voltávamos de bonde), no Brasileiro de Almeida (em Ipanema ). Estudei música também em Ipanema, no Conservatório Haydée Lázaro Brandt. Tendo nascido em Copacabana, morávamos em uma travessa que ficava entre a Djalma Urich e a Miguel Lemos quando eu nasci. Poucos anos depois, mudamos para a Rua Sá Ferreira. Somos 5 irmãos, 3 homens (Paulo, eu e Flávio ) e 2 moças (Ângela e Patrícia). Flávio é advogado e Ângela e Patrícia, professoras de dança e ginástica. Com uns 13 anos, fomos morar no Leblon. Participei de alguns conjuntos, tocando em festinhas, em troca do prazer de tocar, de algumas Coca-Colas e paquerar algumas meninas. E, tocando acordeom, cheguei a tocar em alguns programas diurnos na televisão. Revista Keyboard Brasil – Estudou Direito por imposição de seu pai? A música foi uma difícil escolha? Teve o apoio de sua família? Marcos Valle: Estudei Direito, não por imposição, mas para agradar a meu pai, que era advogado, assim como meu avô paterno. Cheguei a cursar o 1º ano de na PUC, mas então, com uma música já gravada pelo Trio Tamba (Sonho de Maria), decidi seguir o caminho da

música, com o apoio de minha mãe e a preocupação de meu pai. Revista Keyboard Brasil – E o início de sua carreira profissional? Como conheceu Edu Lobo e Dori Caymmi e de quem foi a ideia de criar o trio em 1961? Marcos Valle: Edu Lobo havia sido da minha classe de aula, no Colégio Santo Inácio, quando tínhamos uns 11, 12 anos, acho eu. Anos mais tarde, estava eu, com uns 19 anos, em um lotação (como eram chamados aqueles ônibus menores), ainda em Ipanema e a caminho de casa, no Leblon, quando vi o Edu com um violão. Apesar dos anos passados, nos reconhecemos e motivados pelo violão que ele carregava, começamos a falar sobre música. Ele então, me disse que era filho do Fernando Lobo, conhecido compositor e que era amigo de Dori Caymmi, filho de Dorival, e que adoravam música. Então lhe disse que eu também. Marcamos um encontro, nos identificamos imediatamente, fizemos um trio onde eu tocava piano, e eles dois, violão, e nós 3 cantávamos nossas primeiras músicas. Nos apresentamos na TV, em programas do Fernando Lobo e Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta). E através do Edu e Dori, comecei a frequentar as rodas de música e Bossa Nova, já que seus pais eram famosos. Revista Keyboard Brasil – Suas composições passaram a fazer sucesso entre os grandes músicos da Bossa Nova como Tom, Baden, Lyra, Vinícius, Menescal, entre outros. Fale-nos sobre esses Revista Keyboard Brasil / 17


encontros. Marcos Valle: Minha primeira roda de música foi na casa de Ary Barroso, no Leme, onde então conheci, além do anfitrião, Menescal, Bôscoli, Tom, Vinicius, Lucio Rangel e outros. Mas sendo eu muito tímido, nem ousei tocar nada. Mas o segundo encontro foi na casa de Vinicius de Moraes, no Parque Guinle. Estavam ali as Garotas da Bahia, que iriam se transformar no Quarteto em Cy, e várias outras pessoas. Apesar de minha timidez, no final da noite, toquei para Luis Fernando Freire (Lula Freire), as 5 músicas que eu já tinha composto, entre elas, 'Sonho de Maria'. Lula, que é letrista, parceiro de Durval Ferreira e Menescal, adorou e combinou comigo um encontro no apartamento dele, na Rua Joaquim Nabuco, daí a uma semana, acho eu, onde haveria outra roda de Bossa Nova. E pediu que eu chegasse mais cedo, pois ele também ia combinar com o Trio Tamba de chegar mais cedo para ouvir minhas músicas. Assim foi feito. Eu toquei as 5 e quando eles ouviram 'Sonho de Maria', disseram que apesar de já estar com o repertório fechado para o próximo disco, queriam gravar a minha, de qualquer maneira. E realmente gravaram. O disco saiu com 13 faixas, ao invés de 12. Para mim foi um sonho! Eu, que era um grande fã deles! Depois, nessa mesma reunião, pude tocar as músicas para todos os que estavam ali: Tom, Menescal, Carlos Lyra, Luis Bonfá, Durval, Lennie Dale, Donato, etc… Menescal adorou as músicas e me levou à casa do Severino Filho, no Leblon, maestro de Os Cariocas. Resultado: eles 18 / Revista Keyboard Brasil

adoraram minhas composições e gravaram 2 'Amor de Nada' (parceria com Paulo Sérgio) e 'Vamos Amar' (parceria com Edu Lobo). Mais um sonho para mim realizado. Revista Keyboard Brasil – Conte-nos como surgiu o convite da Odeon para gravar seu primeiro disco. Marcos Valle: Através de uma namorada eu conheci a cantora e compositora Tita (há muito tempo casada com o baixista Edson Lobo que, mais tarde, tocaria comigo). A Tita era amiga da Leni Andrade e Johnny Alf e assim, os conheci. E eles gostaram muito de minhas composições e passaram a frequentar a casa no Leblon (Rua Codajás, 52), onde todos os irmãos morávamos com nossos pais. Maravilhosas tardes e noites de músicas e, para mim, aulas de bom gosto. Quem também passou a ir lá em casa foi o Sérgio Ricardo. Ou seja, aquele piano de ¼ de cauda (que hoje tenho em meu apartamento), guarda em seus teclados, as almas desses grandes músicos, além de vários outros que lá tocaram (aquela casa passou a ser um centro de música de todos os estilos): Milton Nascimento, Herbie Hancock, Tom Jobim, Henry Mancini, Donato, Quincy Jones e muitos outros… Aí, o Menescal e a Tita combinaram de me levar ao estúdio da ODEON para eu mostrar minhas composições para os artistas que lá gravavam, e também para os diretores musicais (Milton Miranda e Ribamar). Entrei na sala do Milton Miranda, onde estava também o Wilson Simonal. E me disseram: “Toque sua


músicas“. Eu, com 20 anos, tímido, toquei uma por uma (eram 5). Quando acabei eles se comunicaram baixinho e o Milton Miranda me disse: “Ninguém aqui vai gravar música sua“. Aí eu pensei: – Acabou, não agradei! Mas aí ele continuou: “Porque quem vai gravar é você. Só faremos um pequeno teste de microfone no estúdio e dependendo dele, você será contratado“ . Sem acreditar, fui para o estúdio, fiz o teste e fui contratado como intérprete por 5 anos! Revista Keyboard Brasil – A parceria entre você e seu irmão, Paulo Sérgio Valle, rendeu bons frutos. Samba de Verão foi levada aos Estados Unidos por Walter Wanderley com grande êxito mas, em versão instrumental. Aqui eu tenho três perguntas: Como Summer Samba se tornou So Nice? Foi uma imposição a escolha do nova-iorquino Norman Gimbel para a versão em inglês? E, o que essa música representa para você? Marcos Valle: ‘Samba de Verão’ estourou no Brasil em versão instrumental de Os Catedráticos (Eumir Deodato). Só depois vieram as muitas gravações também com letra. Também nos Estados Unidos, o estouro foi instrumental, com Walter Wanderley Trio. Traduziram o título para o inglês, então se tornou 'Summer Samba'. Quando o Norman Gimbel (que havia feito a letra de 'Garota de Ipanema'), fez a letra em inglês, ele fugiu do tema em português, se concentrando na ideia de ‘So Nice’, por isso o título de ‘Samba de Verão’, com letra em inglês, passou a ter esse nome. Essa música representa para mim, meu cartão de visitas no mercado

americano, europeu e japonês. Sendo a 2ª música brasileira mais gravada no mundo (depois de ‘Garota de Ipanema’). Ela abriu as portas de tudo que aconteceu e acontece para mim, no exterior . Revista Keyboard Brasil – Li que certa vez tentou acertar Marlon Brando após o ator paquerar sua então esposa Ana Maria numa festa em Hollywood quando fazia parte do grupo de Sérgio Mendes. Pode nos contar essa passagem? Marcos Valle: Acho que era 1964. A ODEON havia lançado meu primeiro disco 'SAMBA DEMAIS'. O Sérgio Mendes queria me levar para os Estados Unidos, junto com a Wanda Sá para fazer parte do Sergio Mendes 65. Eu não quis. Então, ele levou a Wanda e o Jorge Ben. Mas no ano seguinte, ele me chamou outra vez. Eu falei que só iria se levasse minha namorada, Ana Maria. Ele disse para eu levar. Só que eu queria que ela participasse do grupo também, senão o dinheiro não dava. Ele concordou. Então, lá fomos nós. No meio do show, ele me apresentava como um dos novos grandes compositores brasileiros e, no violão, cantava algumas de minhas músicas, acompanhado pelo Sérgio, no piano, Tião neto, no baixo e João Palma, na bateria. E, depois disso, junto com o percussionista Suarez e Ana Maria, cantávamos alguns sucessos brasileiros. Bem, durante esse tempo, houve uma festa em Los Angeles, cidade onde morávamos todos, lá na casa de um ricaço, que era o rei dos enlatados (salsichas, presuntos e por aí vai…). Os convidados eram VIPs: Henry Mancini, Revista Keyboard Brasil / 19


Marlon Brando tocando tumbadora.

tocar aquela tumbadora em nenhum momento! E como tocava mal (risos)... Essa é a estória.

Quincy Jones, Johnny Mandel, Laurindo de Almeida, Petula Clark, Sergio Mendes, eu e vários outros…) Microfones caíam do teto, para pegar o som. Mas haviam também os convidados atores: Tony Curtis, Christine Kaufmann, Vincent Price, novatos de Holywwod, etc… . E, um dos convidados era o Marlon Brando, que não largava a tumbadora, sendo para acompanhar quem quer que fosse. Eu passei a noite conversando com o Gabrielle Tinti, bonito ator italiano, que foi casado com Norma Benguell. Minha mulher-namorada Ana Maria, que tinha uns 19 anos (eu tinha 21), era muita bonita, morena, do tipo que Marlon apreciava. Ele a notou e, na hora que íamos embora, enquanto nos despedíamos de nossos anfitriões, o Marlon Brando (que estava muito gordo) puxou o braço da Ana Maria e pediu que ela ficasse. Ela se revoltou, berrou com ele, e me disse o que ele havia feito. Eu então parti para cima dele, mas a turma do 'deixa disso' me segurou, explicando que ele estava bêbado. O mais impressionante é que ele não parou de 20 / Revista Keyboard Brasil

RKB – Ao longo de sua surpreendente carreira de seis décadas, você vai além da Bossa Nova, infiltrando Pop, Samba, Rock Progressivo, influências psicodélicas, Jazz, Soul e Funk em seus trabalhos e em suas parcerias. Esse dom de transitar por diferentes estilos musicais o torna surpreendente. Como funciona o seu processo de composição? No que você se inspira? Como as ideias aparecem? MV: Como disse, minhas influências musicais foram variadas, e isso acabou formando meu estilo. Às vezes, a melodia me puxa. Outras vezes, o ritmo ou as harmonias. Pode ser no piano ou no violão. Ou, longe deles. Gosto muito de caminhar à beira do mar, e ali as ideias chegam, muitas vezes. A natureza é uma grande aliada nas minhas composições. Mas também gosto de trabalhar sob a pressão de um projeto com um prazo definido pela frente. Às vezes, nessas horas, recorro a ideias que mantenho gravadas. E então, desenvolvo. RKB – Li que você é apontado como um dos precursores do beatbox que, em um português bem claro significa “caixa de


batida”, som realizado com a boca. Podese ver esse recurso utilizado na faixa ‘‘Mentira’’ (Previsão do Tempo, 1973). Fale sobre isso. MV: Essa coisa do ritmo é muito forte em mim. Utilizei e utilizo muito isso em meu canto. Fiz isso em 'O Cafona', 'Ossos Do Barão', 'Nem Paletó Nem Gravata', 'Garra', em 'Diferenças' (uma das músicas da trilha que fiz para Vila Sésamo) e mais explicitamente em 'Mentira'. Desde garoto gostava de fazer isso. RKB – A censura da década de 1970 era muito forte aqui no Brasil. Este foi um dos motivos para sua permanência nos EUA. De certa forma, esse auto-exílio o fez conhecer muitos nomes da música internacional. Fale sobre isso. MV: Sim. Durante bastante tempo, burlar a censura era um estímulo. Conseguir ter músicas aprovadas como ‘Viola Enluarada’, ‘Black is Beautiful’ , e tantas outras, era uma vitória. Mas depois, enfraqueci. Perdi a vontade de ir para o palco. A voz travou. Nessa hora, parti para o autoexílio. Sem tempo de voltar, sem planos. Mas aí, as coisas foram surgindo. Em Nova York, Eumir Deodato gravou minha música ‘Adams Hotel’ , em seu disco The First Cuckoo. A música foi muito tocada. Mudando para Los Angeles, surgiu Sarah Vaughan, o grupo Chicago, Leon Ware (parceiro de Marvin Gaye), Airto Moreira, etc... RKB – Como surgiu a amizade com Sarah Vaughan? Foi na gravação de sua participação no disco Songs of The

Beatles? MV: Quando cheguei em Los Angeles, mais ou menos em 75, recebi um telefonema de Marty Paich, que estava produzindo e arranjando (junto ao seu filho David Paich, do grupo TOTO) , um novo disco do Sarah Vaughan, só com músicas dos Beatles. Ele havia pego meu telefone com Sergio Mendes e queria saber se eu não gostaria de gravar cantando com a Sarah, uma das músicas dos Beatles (’Something’, do George Harrisson ), numa levada Bossa. Fui à casa dele. escutei a ideia, fui para casa e fiz uma letra em português. Fiz um demo, mandei para o Marty, David e Sarah, eles gostaram demais. Então, marcamos o estúdio e gravei com ela. Também foi uma das mais tocadas do disco. Sarah então me disse que queria gravar músicas minhas. Fui à casa dela, levei o ’Preciso Aprender a Ser Só’ (If You Went Away) e ‘Seu Encanto’ (The Face I Love), e ela gravou as duas, uma abrindo o Lado A do Vinil, e a outra, o Lado B. E ela fez do ‘Preciso Aprender a ser Só’ o carro chefe, a música de trabalho do disco. Aí, então, dei a ela a ideia de gravar um disco só com músicas brasileiras, que ela comprou. Levei à casa dela o produtor brasileiro Aloysio de Oliveira e ela acabou gravando 2 ou 3 discos com composições brasileiras. RKB – Você foi contratado para escrever músicas para a TV brasileira, para o cinema e jingles. Pode enumerar as músicas desses trabalhos que mais te deram prazer em fazer? MV: As trilhas de TV eram sempre Revista Keyboard Brasil / 21


estrangeiras. Mas aí, o Nelson Motta deu a ideia ao Boni de começar a fazer trilhas brasileiras e me indicou, pela versatilidade que eu apresentava em meu estilo. Foi feito o convite. A novela era sobre corrida de automóveis. Chamar-se-ia ‘VÉU DE NOIVA’, com Cláudio Marzo e Betty Faria nos papéis principais. Eles queriam um tema instrumental, dinâmico e foi isso que fiz, com meu parceiro Novelli. Um solo meu de piano, cheio de energia, a que dei o título de ‘Azimuth’. Virou sucesso. Anos mais tarde, Roberto Farias e Hector Babenco me chamaram para fazer a trilha de ‘O fabuloso Fittipaldi’, e me pediram para usar essa música na abertura do filme. Assim foi feito. RKB – Este ano tivemos um Grammy através da pianista brasileira Eliane Elias, músicas consagradas como ‘Águas de Março’, ‘Você’ e ‘Esse seu olhar’. Um feito para a atual situação cultural em que se encontra nosso país. Existem sim, excelentes músicos com Marcelo Jenecy, Tulipa Ruys, Céu, Mallu Magalhães, Tiê, Seu Jorge, Marcelo Camelo entre outros. Porém, a grande mídia continua a glorificar outros tipos de música, carregadas de vulgaridade, erotização e violência. Qual a sua posição sobre isso visto que você realizou há pouco tempo, um show em Santos, com outros 2 grandes músicos da atualidade Max de Castro e Moreno Veloso? MV: Tem lugar para tudo. Como você acabou de citar, por exemplo, músicos

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fantásticos, que surgiram, surgem e vão continuar a surgir, apesar da grande mídia. Com a Internet hoje em dia, você forma seu público. Esse show em Santos que você cita, onde eu e Moreno fomos convidados do Max, é uma prova disso. Teatro lotado, lindo, que público. E nós ali no palco, felizes em estarmos juntos trocando ideias e influências musicais, com o aval da plateia, nos dá a certeza de nunca esmorecer em fazer o que acreditamos, pois sempre haverá um público querendo conferir isso. RKB – Você é cultuado na Europa, nos Estados Unidos, no Japão, na Austrália, no Brasil, enfim. Em que parte do mundo pode-se dizer que você vive melhor da sua música? MV: No conjunto. Uma coisa depende da outra. De repente é na Europa, de repente é no Japão ou Austrália. Ou então, por aqui, no Brasil. Então, é tudo uma coisa só para mim. Se você me perguntar do que eu mais gostei, certamente foi o 'Glastonbury Festival', O 'Sonoridades no Parque Lage', o 'Rock in Rio' ou o show em Santos com Max e Moreno, eu irei te dizer, todos, igualmente, por serem diferentes um dos outros.

RKB – Quais são seus próximos shows? Tem projetos futuros? MV: Tenho show no Rio com o grupo Azymuth em breve; tenho show em Montenegro, Portugal e Estados Unidos; tenho um DVD/CD que gravei com a Stacey Kent, só com músicas minhas e que será lançado pela Sony no início de abril e traz uma parceria inédita: Marcos Valle e Vinicius de Moraes. Quero avisar que é uma letra inédita de Vinicius, entregue à Carlos Lyra por um jornalista que descobriu essa letra (com uma indicação de uma possível melodia de Lyra). Carlos viu a letra, não se lembrou de alguma melodia feita e resolveu formar essa parceria que nunca havia acontecido: eu e Vinicius. Me entregou a letra, fiz a melodia, o Carlos adorou e eu gravei com a Stacey para o DVD/CD. Chama-se ‘‘Amando Demais’’. Também tenho um novo CD em andamento. Projetos futuros? Sempre. Não posso parar! RKB – Gostaria de deixar uma mensagem aos leitores de nossa Revista Keyboard Brasil? MV: Um grande beijo a vocês todos, e agradeço a energias que me trazem, com seu interesse pela música que faço! Marcos Valle e Patrícia Alví no Festival Glastonbury em 2015, no Reino Unido.

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Fotos: Luis França

Lançamento

Baby Shoes Primeiro álbum autoral de Paulo Moreira TODA A MATURIDADE DE UMA OBRA PRIMA É ENCONTRADA NO DISCO DE ESTREIA DO MULTI-INSTRUMENTISTA - UM TRABALHO MUITO BEM COMPOSTO, ARRANJADO, GRAVADO E MIXADO! Da Redação 26 / Revista Keyboard Brasil


Sobre o CD...

B

aby Shoes começou a ser

gravado em 2008, no estúdio Batucadas 1000 de Marcelo Domingos, onde Paulo Moreira captou as guias das músicas. Em seguida, partiu para captação de cozinha e a gaita de Joe Cirullo no estúdio de Jorge Peña (lendário percussionista de Mercedes Sosa), onde captou também baixos e baterias. A partir daí partiu para a captação de teclados onde foi acolhido com toda generosidade pelo grande Adriano Magoo (Zeca Baleiro) que gravou grande parte do disco. Para outros teclados teve sorte de ter André Arroi, captando no home studio de Mirton de Paula. Em seguida, conheceu Nando Pires, conhecido

guitarrista de Araras. Resultado: gravou as guitarras em seu estúdio e contou também com sua participação six stringuiana!! Posteriormente, precisou de mais alguns amigos que o assistiram maravilhosamente nos saxofones: Maurício Mohamed e Marcelo Monteiro (dois tenores). Captados no home Studio de Rogério Rochlitz, mais um gênio que gravou duas faixas. O disco foi produzido por Paulo Moreira e mixado também pelo músico e por Rogério Rochlitz. Masterizado por Rogério Rochlitz. Ao todo, esse trabalho passou por 6 estúdios. O CD, com 10 composições conduzem o ouvinte a 46 minutos por uma viagem musical! Experimente!

Sobre o autor...

O

multi-instrumentista (prioritariamente contrabaixista), produtor, arranjador e compositor,

Paulo Moreira nasceu em Ipirá – Bahia,

mudou-se para a periferia da zona Sul da cidade de São Paulo com a família aos três anos de idade. Vindo da pulsante escola da Black Music, a qual foi apresentado nos tempos de criança por seus pais, somou a esse estilo o Blues e o Jazz. O Rock surgiu também bem cedo e, aos 14 anos de idade, ganhou seu primeiro contrabaixo. Assim, Paulo constituiu uma miscigenação musical muito rica. Desde então, se reconheceu como músico passando a tocar na noite de São Paulo, em bares no Bexiga, Bela Vista, Vila Madalena... E, em aprendizado autodidata. Hoje, com mais de 20 anos de carreira, tem uma bagagem

para lá de interessante. Relevantes e duradouras experiências profissionais com grandes artistas da música brasileira e internacional estão em seu currículo, tais como: Ben Charles, Tatá Erê, Kiko Zambianchi, Batucada Phoderosa, D. Drumm Elétrons, Sergio Buneka, Banda Rosemary's Garden (CA), Lamparina Lazer, Ortinho (part. Arnaldo Antunes, Chico Cezar, Zeca baleiro), Arnaldo Antunes, Chico Cezar, Zeca baleiro, banda Reciclagem, banda The3 (prod. Roy Cicala), Kamau, Marcelo D2, Marquinhos Moura, Rogério Rochlitz, entre outros inúmeros nomes e bandas de diversos estilos musicais. No momento, lançando seu primeiro disco solo autoral de música instrumental ‘‘Baby Shoes’’ (produzido pelo próprio). Revista Keyboard Brasil / 27


Especial

As teclas bombรกsticas do Rock Progressivo 28 / Revista Keyboard Brasil


Foto: Michael Tweed Revista Keyboard Brasil / 29


The Nice.

O estilo agressivo nas teclas: sua marca registrada.

O FALECIMENTO DE KEITH EMERSON ESTE MÊS ABALOU O MUNDO DA MÚSICA. SUICÍDIO OU NÃO O CERTO É QUE O MÚSICO ALÉM DE TRANSFORMAR SEU EL&P EM UM DOS PRIMEIROS SUPER GRUPOS DE ROCK, AJUDOU A POPULARIZAR O ÓRGÃO HAMMOND E O SINTETIZADOR MOOG, MISTURANDO A MÚSICA CLÁSSICA, O JAZZ E O ROCK DE MANEIRA ÚNICA NA HISTÓRIA DA MÚSICA. * Por Amyr Cantusio Jr.

Emerson, Lake & Palmer

eith Emerson nasceu na Inglaterra em 2 de novembro de 1944. Teve formação clássica em piano. Depois partiu para o órgão Hammond. Além disto, teve aulas de harmonia com o famoso

EL&P durante os ensaios para a tour 'Obras', no Estádio Olímpico, em Montreal, Canadá (1977). 30 / Revista Keyboard Brasil

tecladista JON LORD (Deep Purple). Influenciado pelo jazz americano e pela música clássica europeia, aprendida na infância, o músico ganhou notoriedade na década de 1960, liderando o


grupo The Nice, após passar por vários conjuntos locais. Com os músicos Greg Lake (ex-King Crimson) e Carl Palmer (ex-Atomic Rooster), fundou a lendária

EL&P. The Nice foi a primeira banda do virtuose (R.I.P.) Keith Emerson. Bombástica, com músicos extremamente treinados e eruditos, tinha tudo para acontecer no final dos idos de 60... mas não aconteceu. Keith Emerson foi estourar nos anos 70, criando a lendária EL&P. A diferença básica dos 2 projetos é que THE NICE utilizava órgão e piano. Com EL&P, Keith já incluía arp strings, mellotron, sintetizadores (principalmente a inauguração do protótipo MOOG no palco ao vivo!!)

Considerado um dos melhores tecladistas do Rock, Keith Emerson tornou-se uma lenda. Conhecido por ser um virtuoso e por suas teatrais apresentações ao vivo, em que “fritava” teclas específicas de seu órgão Hammond durante seus solos, tocando-o de cabeça para baixo enquanto o instrumento ficava em cima dele ou fazendo com que seu piano ficasse girando enquanto o tocava. Juntamente com seus contemporâneos Richard Wright, do Pink Floyd, Tony Banks, do Genesis, e Rick Wakeman, do Yes é amplamente considerado um dos melhores tecladistas do Rock, dono de uma técnica muito apurada. Inclusive o estilo agressivo de tocar piano lhe rendeu uma série de complicações em seus punhos. Uma característica marcante das músicas de Keith Emerson são seus arranjos de Rock para composições eruditas, de autores que iam desde Bach e Modest Mussorgsky até compositores do século XX como Béla Bartók, Aaron Copland e Alberto Ginastera.

Sua aparição na Ilha de Wight (Festival 1970) foi destruidora. Daí para frente o EL&P foi a banda mais

complexa e virtuose dos anos 70, na história do Rock Progressivo.

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The Nice: Keith Emerson (órgão e piano), Keith Lee Jackson (baixo, guitarra e vocal), Brian ‘‘Blinky’’ Davison (bateria e percussão) e David O'List (guitarra, trompete e vocal de1967-1968).

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The Nice A banda The Nice foi formada em maio de 1967 para servir de apoio à cantora de soul P.P. Arnold. Após algumas apresentações com Arnold durante meados do mesmo ano, o The Nice acabou ganhando reputação própria. Em agosto, Davison substituiu o baterista original, Ian Hague. O primeiro álbum do The Nice foi gravado ainda no mesmo ano. Trabalhos iniciais tendiam a um som psicodélico, mas logo elementos mais ambiciosos vieram à tona. As influências clássicas e do jazz manifestaram-se em citações musicais a Carl Philipp Emanuel Bach e Dave Brubeck. Em seu segundo single criaram um arranjo para America de Leonard Bernstein, que Emerson descreveu como a primeira música instrumental de protesto. A obra não só usa a peça de Bernstein como também inclui fragmentos de da Sinfonia nº 9 de Antonín Dvořák. O'List deixou o grupo durante a gravação do segundo álbum. Participou brevemente do Jethro Tull após a saída de Mick Abrahams e em uma formação antiga do Roxy Music antes de juntar-se ao Jet, em 1973. A banda considerou substitutos, sendo um deles ninguém menos que Steve Howe antes de entrar para o Yes, mas decidiu posteriormente manter-se como um trio. O controle de Emerson sobre a direção musical se tornou ainda maior, resultando em trabalhos mais complexos. A ausência de uma guitarra na banda e a liderança do teclado de Emerson no rock 34 / Revista Keyboard Brasil

tornou o The Nice uma banda bastante distinta de suas contemporâneas. Os primeiros trabalhos do pianista francês Jacques Loussier e do quarteto de Charles Lloyd também podem ser vistos como influência da banda. Loussier criava arranjos de jazz a partir de obras clássicas, especialmente de Bach. O The Nice apresentou duas peças do repertório de Lloyd, Sombrero Sam e Sorcery. Parte do trabalho da banda era a transferência de invasões dos artistas de jazz em um som mais elétrico, o que também influenciou bandas como The Who, Jimi Hendrix, The Beatles. Outra influência foi Bob Dylan, cujas canções eram bastante famosas na época. O segundo LP Ars Longa Vita Brevis apresentava arranjos da suíte Karelia, de Jean Sibelius, e o outro lado era um suíte com arranjos de um movimento de Johann Sebastian Bach. O grupo usou uma orquestra pela primeira vez em algumas partes da suíte.

As apresentações ao vivo da banda eram marcantes, principalmente por Emerson. Com seu órgão Hammond, realizava movimentos inspirados por Jimi Hendrix, Don Shin e Jerry Lee Lewis. Durante uma longa e popular turnê que seguiu o lançamento do segundo álbum, o grupo chamou atenção do público com Emerson queimando uma bandeira dos Estados Unidos no palco durante uma apresentação de America. O terceiro álbum apresentava em um dos lados gravações da turnê pelos


EL&P Estados Unidos e outro lado de materiais de estúdio. Por volta de 1969,

Emerson não via mais nos seus colegas alguma possibilidade de atingir maior grau técnico para alavancar a carreira do grupo, que ainda tinha sucesso modesto. Durante a turnê americana que acontecia simultaneamente com a banda King Crimson, Emerson teve um encontro com o baixista Greg Lake nos bastidores de um show e conversaram sobre trabalhar juntos em outro projeto, o que culminou no fim do The Nice, abrindo caminho para a formação do Emerson, Lake & Palmer. Um lançamento póstumo intitulado Elegy incluiu uma versão do trio para a Sinfonia Patética de Tchaikovsky e My Back Pages de Bob Dylan, ambas gravadas em estúdio, além de apresentações ao vivo de Hang on to a Dream e America durante a turnê de 1969 pelos Estados Unidos. Após o fim da banda Lee Jackson formou o Jackson Heights, que lançou cinco álbuns entre 1970 e 1973. Brian Davison formou o Every Which Way, que lançou um álbum em 1970. Tanto Jackson quanto Davison formaram o Refugee com o tecladista suíço Patrick Moraz em 1974, mas se desapontaram novamente quando Moraz foi convidado a se juntar ao Yes, substituindo Rick Wakeman.

Com o EL&P, Keith Emerson abriria um vasto leque na mistura complexa de sintetizadores Moog, Hammond organ, grand piano com flertes profundos misturando a música clássica, o jazz e o rock de maneira única na história do rock. Os discos mais marcantes seriam: – O primeiro LP de 1970 (chamado “LP da Pomba” já que não possui título, somente EL&P) trazia já o que seria a combinação dinamite do power trio; – Quadros de Uma Exposição (baseado na obra de M. Mussorgsky séc. XIX). Uma magnífica explosão ao vivo no álbum homônimo de 1971; – Trilogy é uma obra especial com capa dupla que traz os rostos dos três integrantes. Um dos melhores álbuns dos anos 70; – Tarkus é a bomba H e EL&P com longas suítes destruidoras e extremamente difíceis de se executar com é o caso da faixa “Eruption”; – Depois vem Welcome Back My Friends (ao vivo, um álbum triplo destruidor e o melhor deles já gravado no auge de sua carreira); – Ainda vem o Duplo Works Capa Preta - com hinos inesquecíveis como a balada Cest La Vie. Neste disco, cada músico ocupa solitário um lado da bolacha, mostrando suas qualidades técnicas, e um lado todos juntos. E o Works Capa Branca - uma obra prima para estudantes do experimental aliada ao ragtime de Scott Joplin, à quem o álbum é dedicado. Obra imperdível; – Mas o BOMBA que mostra EL&P no TOPO dos anos 70 é o álbum a seguir denominado Brain Salad Surgery, onde há uma melhor descrição da complexidade da pesquisa do grupo.

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Brain Salad Surgery banda britânica de rock da o di tú es de um álb to Quar 1973 e o ke & Palmer, lançado em La n, so er Em o iv ss re prog a Manticore Records. primeiro pela gravador ery é a de Brain Salad Surg A faixa mais conhecid ert lo composto por Hub be to ui m o in H um ’’, ‘‘Jerusalém LIAM BLAKE. Parry com letra de WIL 2’’ - 1st Impression, Part 9 il Ev n ar ‘‘K m ve is Depo the show ome back my friends to elc W ão rd bo lo pe a os (fam ser como um todo teve que 9’’ il Ev n ar ‘‘K . ...) ds en that never . nos lados A e B do álbum originalmente dividida mais avançado existia em de e qu o ha in nt co um O álb Keith eletrônicos até então. is ica us m s to en um instr

músico a utilizar o o ic ún e ro ei im pr o i fo Emerson pela ellation desenvolvido st on C g oo M o ip ót ot pr do pela primeira vez an nt se re ap c, In ic us Moog M ,o ico. Nos créditos do álbum ôn lif po or ad iz et nt si um ensemble, e pode

o Moog polyphonic aparato é descrito com enny The ouvido nas faixas ‘‘B te en m ra cla ais m r se foi pression’’. O protótipo Im d 3r 9: il Ev n ar ‘‘K e Bouncer’’ após o final de volta à Moog Music n so er Em r po e gu tre en s foram produzidas outra o nã e , um álb ste de das turnês unidades. no ‘‘Toccata’’, baseada l ta en um str in a ix fa Na inastera piano de Alberto G ra pa to er nc co o eir im pr de ose), efeitos especiais rtu vi or sit po m co e (pianista erson mas uzidos não por Keith Em od pr m ra fo r do iza tet sin da de nica recém desenvolvi téc a do an us , er lm Pa por Carl ente não ia. Ginastera aparentem ter ba de s re do iza tet sin ou ra pela banda, nem cobr ob a su de o çã za ili ut a ligou para sitor gostou Pelo contrário, o compo is. ra to au s ito re di us se da nova versão. Greg foram co-escritas por Para finalizar, as letras son -membro do King Crim ex e o eir nh pa m co u Lake e se a por H. R. do álbum foi desenhad pa ca a e ; ld fie Sin ter Pe u a arte do filme Alien. Giger, que também crio

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Emerson, Lake & Palmer: Keith Emerson (sintetizadores - principalmente a inauguração do protótipo Moog no palco ao vivo, grand piano e Órgão Hammond), Greg Lake (baixo, guitarra e vocais) e Carl Palmer (bateria e percussão). Revista Keyboard Brasil / 37


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Emerson, Lake & Palmer não estão no Rock and Roll Hall of Fame, mesmo tendo sido um grupo de Rock Progressivo incrivelmente famoso por suas grandiosas orquestrações e bombástico em suas apresentações. Influente e admirado por muitos músicos e bandas, EL&P vendeu mais de quarenta milhões de álbuns e encabeçou grandes shows em estádios. Revista Keyboard Brasil / 39


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Keith Emerson com Robert Moog, engenheiro norte-americano que projetou o Moog. Revista Keyboard Brasil / 41


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Keith Emerson ainda realizava apresentações pela Europa. Aqui, na Itália, com orquestra. Revista Keyboard Brasil / 43


Enfim a banda EL&P lança um dos últimos álbuns dos anos 70 , o famigerado LOVE BEACH em que realmente não se salva muito coisa, exceto a bela faixa “Canário”. Aqui o EL&P já apontava para seu fim infelizmente. Keith Emerson foi responsável pela trilha sonora de vários filmes a partir de 1980, como Inferno e World of Horror, de Dario Argento, e os filmes de 1981 Nighthawks, Genma Taisen e Godzilla: Final Wars. Ele também foi o compositor da curta série de televisão Iron Man, de 1994. Em 2004, Emerson publicou sua aclamada autobiografia, intitulada “Pictures of an Exhibitionist” (uma referência ao disco “Pictures At An Exhibition” do EL&P), que perpassa toda a sua carreira, enfocando especialmente o começo, com o The Nice, e a cirurgia de enxerto nervoso na mão direita que quase acabou com ela, em 1993 – essa era a causa de sua depressão: uma doença degenerativa nos nervos das mãos que o impediam de tocar. A depressão foi a causa mais provável para a sua morte. Agora é descansar Keith!

*Amyr Cantusio Jr. é músico (piano, teclados e sintetizadores) compositor, produtor, arranjador, programador de sintetizadores, teósofo, psicanalista ambiental, historiador de música formado pela extensão universitária da Unicamp e colaborador da Revista Keyboard Brasil.

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Cultura

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O menino e o mundo O FILME DE ANIMAÇÃO DIRIGIDO POR ALÊ ABREU, “O MENINO E O MUNDO” GANHOU UMA NOTORIEDADE RARA ENTRE NÓS, BRASILEIROS, NÃO SÓ PELA PREMIAÇÃO INUSITADA DO ANNIE AWARDS DESTE ANO (UM PRÊMIO BEM IMPORTANTE A NÍVEL MUNDIAL PARA FILMES DE ANIMAÇÃO) E DE TER OBTIDO MENÇÃO ESPECIAL DO JÚRI NO FESTIVAL DE OTTAWA MAS, PRINCIPALMENTE PELO FATO DE TER SIDO INDICADO AO OSCAR NA CATEGORIA DE MELHOR ANIMAÇÃO (BEST ANIMATED FEATURE FILM OF THE YEAR). ALÉM DO BELÍSSIMO TRAÇO DO FILME CONSTATEI QUALIDADES (QUE SÃO MUITAS) E DEFEITOS (QUE SÃO POUCOS) EM SUA PARTE MUSICAL. A UNIDADE, FRENTE A ESTILOS TÃO DIVERSOS, É A GRANDE CONQUISTA DESTA TRILHA SONORA. EXPONHO MINHA OPINIÃO SOBRE ESSE BELÍSSIMO FILME AQUI NA MINHA COLUNA! ** Por Maestro Osvaldo Colarusso

Revista Keyboard Brasil / 47


Tecnica do “Leitmotiv” e outros recursos magicos ´ ´

O

aspecto musical mais facilmente memorizável é a melodia singela tocada numa flauta doce que no filme o pai toca para o menino ao se despedir. Aquela melodia que o menino até acredita capturar em uma velha latinha é deformada diversas vezes durante o filme, na incansável busca da criança por seu pai. O sonho do reencontro se reflete na distante recordação, muitas vezes incompleta, daquela simples sequência de notas. Um outro personagem que também toca flauta doce utiliza uma melodia parecida, mas o menino sabe que aquele não é seu pai: a melodia é outra. Neste aspecto, o filme usa aquilo que chamamos em composição musical de “Leitmotiv” ou, em

português, “motivo condutor” – termo muito associado ao compositor alemão Richard Wagner. A música original do filme foi composta por Gustavo Kurlat e Ruben Feffer, e percebemos em diversos momentos as mágicas sonoridades que o saudoso percussionista Naná Vasconcelos obteve de um vasto leque de 48 / Revista Keyboard Brasil

instrumentos. Mas não há dúvida que o “GEM – Grupo Experimental de Música” acaba dando o verdadeiro contorno sonoro que se relaciona diretamente ao desenho. A criatividade sonora do grupo, com a utilização da percussão e sintetizadores, parece mesmo tornar som as imagens caleidoscópicas do desenho. Outro achado é o grupo Barbatuques, notável conjunto experimental brasileiro (que utiliza sons extraídos do corpo humano sem instrumentos), dá um aspecto onírico às festas populares que o personagem principal do filme presencia. Da singela melodia da flauta doce, aos sons inusitados de sintetizadores e os ritmos extraídos do corpo vemos um único fio condutor, uma unidade vitoriosa. Num filme que

abre mão de palavras não há a menor dúvida de que uma trilha sonora de qualidade é mesmo um instrumento indispensável para a empreitada. Neste aspecto, a trilha sonora de “O menino e o mundo” está mesmo num nível raramente atingido por um filme brasileiro.


O Rap que destoa e os creditos falhos ´

Não há dúvida que colocar no filme um nome de grande popularidade como Emicida, um dos mais famosos brasileiros dedicados ao hip-hop e ao rap, torna o trabalho mais atrativo. Mas, no caso, há uma enorme contradição entre o que se passou em todo o filme com a sequência final. Retratando a visão da criança em idade pré-escolar, as palavras nas placas e anúncios se tornam sinais indecifráveis. Mesmo as palavras trocadas por outros personagens são incompreendidas por nós e pelo menino. A inocência de seu olhar torna-se a grande qualidade do trabalho. No final do filme Emicida passa de trator na inocência da criança usando um texto óbvio. Não só

pela primeira vez no filme ouvimos alguma palavra inteligível como pela primeira vez no filme ouvimos algo musicalmente previsível. Outra falha que considero grave do filme tem a ver com os créditos. Se há alguém a destacar na parte musical é o flautista Helcio Muller, que executa de maneira ideal as melodias pensadas para flauta doce. Nem na ficha técnica do filme, que é exibida no site do mesmo, seu nome aparece. Só descobri quem era o flautista vendo lentamente os créditos finais da película onde aparece seu nome. Uma injustiça, pois não há dúvida que o flautista assume uma parte importantíssima nesta bela trilha sonora.

* Texto retirado do Blog Falando de Música, do Jornal paranaense Gazeta do Povo. ** Osvaldo Colarusso é maestro premiado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA). Esteve à frente de grandes orquestras, além de ter atuado como solista. Atualmente, desdobra-se regendo como maestro convidado nas principais orquestras do país e nos principais Festivais de Música, além de desenvolver atividades como professor, produtor, apresentador, blogueiro e colaborador da Revista Keyboard Brasil. Revista Keyboard Brasil / 49


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A Sala - Parte 3

50 / Revista Keyboard Brasil


SALA DE CAPTAÇÃO E SALA TÉCNICA: NECESSIDADES ACÚSTICAS BEM DIFERENTES. PARA ISSO, A CRIATIVIDADE E A CONSCIÊNCIA SÃO FUNDAMENTAIS! LEIA A SEGUIR.

U

* Por Murilo Muraah

m estúdio profissional geralmente contará com ao menos dois ambientes diferentes: a sala de captação, onde os instrumentos serão posicionados e microfonados durante a gravação, e a sala técnica, onde o técnico de áudio opera os equipamentos disponíveis durante a gravação, edição, mixagem ou masterização. Estas duas salas possuem necessidades acústicas bem diferentes: a sala técnica exige um tratamento acústico que ofereça um som equilibrado, nos permitindo ouvir o som vindo de nossos monitores sem sofrer grandes alterações causadas pelas reflexões da sala. Já a sala de captação pede um ambiente acústico que não seja necessariamente equilibrado, pois o que buscamos geralmente é o som do instrumento enriquecido pelo som da sala, com diferentes possibilidades de sonoridade de acordo com o posicionamento dentro dela. É importante que tenhamos consciência da diferença entre isolamento acústico e tratamento acústico: o objetivo do isolamento é fazer com que o som tenha a menor quantidade de vazamento possível entre um ambiente e outro, ou seja, fazer com que o som de um ambiente não seja ouvido em outro; o objetivo do tratamento acústico é fazer com que a sala tenha a sonoridade desejada, algo que definimos de acordo com as atividades que acontecerão dentro dela. A sonoridade de uma sala se dará não apenas pela forma como foi construída, pelos materiais presentes em sua estrutura e por aqueles que colocamos como parte do tratamento Revista Keyboard Brasil / 51


acústico, mas também por tudo o que estiver dentro dela - inclusive nossos móveis e equipamentos. Claro que muitos estúdios oferecem bem mais do que apenas duas salas, possibilitando diferentes configurações dependendo do projeto que será gravado. Também existem estúdios profissionais de boa qualidade com apenas uma sala, o que traz uma dinâmica diferente e limitações durante a gravação, pois o técnico fica no mesmo ambiente dos instrumentos que estão sendo captados. Assim, seus próprios movimentos e os ruídos dos equipamentos podem interferir na qualidade do áudio. Além disso, a monitoração do que está sendo gravado precisa ser feita com fones de ouvido. Isso significa que o técnico provavelmente estará ouvindo o som dos fones de ouvido junto com o vazamento do som dos instrumentos na sala, o que pode exigir uma abordagem diferente durante a gravação, além de muita concentração e capacidade auditiva. É justamente essa a situação que geralmente encontramos em nossos home studios: muitas vezes teremos apenas um ambiente à disposição, que servirá como sala de captação e como sala técnica. E o que é pior, esse ambiente talvez não seja utilizado apenas para o home studio pode ser o quarto onde dormimos, o escritório que compartilhamos com a família, uma garagem que virou depósito, etc. Essa situação nos obriga a ser criativos para poder aproveitar o espaço da melhor maneira possível. Pensar em isolamento acústico em 52 / Revista Keyboard Brasil

home studios é um grande desafio, não só por causa dos altos custos envolvidos, mas também pelas próprias características de ambientes residenciais. Se projetar um estúdio do zero já é complicado, muito mais difícil é adaptar uma sala que não foi planejada para isso. Conseguir o isolamento necessário para deixar seus vizinhos em paz e para ter o silêncio que você precisa para realizar suas gravações a qualquer momento só seria possível com medições adequadas e um projeto muito bem realizado, de preferência por pessoas com amplo conhecimento na área de acústica. Não adianta apenas colocar portas e janelas acústicas e encher a sala de revestimento acústico. Dessa forma, você mata o som do ambiente e ainda assim não impede o vazamento através, por exemplo, de armários, de pontos como caixas de elétrica e da própria vibração do seu teto, piso e paredes. O tratamento acústico é também um desafio, porém a criatividade pode nos oferecer oportunidades fantásticas para realizar gravações dentro de nossas casas. Podemos aproveitar as diferentes características acústicas de diferentes espaços da casa para buscar sonoridades diferentes. O som da sala, da cozinha, dos banheiros, dos quartos e até dos armários podem inspirar a busca por características diferentes de acordo com os instrumentos que vamos gravar. Se pensarmos ainda que painéis acústicos e até os móveis da casa podem ser utilizados para alterar o som de um ambiente, esse trabalho de exploração sonora pode gerar resultados


bem interessantes. Coloquemos então em uso a nossa criatividade, conhecimento e paciência para testar diferentes possibilidades. Se a opção for mesmo por um projeto de tratamento acústico, novamente é recomendado o auxílio de pessoas capazes de realizar as medições e cálculos necessários para desenvolver um bom projeto. Algumas dicas que também podem ajudar quem está começando a se aventurar nesse universo: – Como já mencionei em colunas anteriores, saber o que será feito em seu home studio te permitirá tomar decisões mais adequadas. O isolamento da sua sala, por exemplo, pode exigir soluções completamente diferentes dependendo do seu uso. Se você vai gravar instrumentos com alta intensidade sonora e seu maior problema é a reclamação dos vizinhos, o isolamento precisará ser muito eficaz. Mas se você grava apenas instrumentos de baixa intensidade sonora e seu maior problema é o vazamento do som que vem de fora da sala e atrapalha suas gravações, outras medidas podem ser pensadas (gravar em horários onde o som de fora é menor, buscar soluções de isolamento compatíveis com o problema, etc.). – Se o som da sua sala não permite realizar gravações com a qualidade que você deseja, o uso de uma cabine acústica (daquelas de locução, por exemplo) pode ajudar a secar o som e permitir que você utilize efeitos (como delay e reverb) para criar uma ambientação virtual para os instrumentos gravados.

– Os monitores são ferramentas muito importantes na mixagem, mas a sonoridade de uma sala desequilibrada pode nos iludir a achar que algo está soando melhor ou pior do que a realidade. Antes de pensar em investir uma fortuna em tratamento acústico, o investimento em um bom fone de ouvido pode te oferecer uma solução interessante para realizar suas mixagens. – Quando pensamos na sala, frequentemente nos preocupamos com a acústica e podemos nos esquecer da parte elétrica, igualmente importante. O auxílio de um especialista em elétrica é fundamental para que possamos trabalhar em um ambiente seguro, aterrado e livre de ruídos. Se possível, podemos separar a elétrica do nosso home studio do restante da casa, inclusive da iluminação do próprio home studio, para evitar ruídos transmitidos pela rede elétrica. *Murilo Muraah é Bacharel em Comunicação Social pela FAAP e proprietário da Muraah Produções, onde atua como professor de áudio analógico e digital, produtor musical, compositor de trilhas sonoras e músico. Possui vasta formação, com cursos realizados dentro e fora do Brasil, incluindo: Diploma de Música (Southbank Institute of Technology Brisbane/AUS), Formação de Apresentadores de Rádio (Rádio 4EB FM – Brisbane/AUS), Radialista – Sonoplastia (SENAC), além de diversos cursos de composição, produção musical, áudio e acústica em escolas onde atuou também como professor. Atualmente vem apresentando cursos, palestras e workshops em importantes eventos e instituições de ensino, como a Campus Party Brasil, a Faculdade de Música do Centro Universitário FIAM-FAAM e a SAIBADESIGN, além de atuar como técnico de áudio no estúdio da Fábrica de Cultura Jardim São Luis. Revista Keyboard Brasil / 53


Tecladistas

Técnicas básicas e diárias A PARCERIA ENTRE A REVISTA KEYBOARD BRASIL E O PORTAL WWW.TECLADISTAS.COM.BR TRAZ ESTE MÊS O MÚSICO E COLABORADOR MATEUS SCHANOSKI !

54 / Revista Keyboard Brasil


E

ste exercício serve tanto como uma técnica para se estudar todos os dias mas, também,

como aquecimento - parte fundamental para adquirir total concentração antes do show! O exercício possui 4 partes. É muito importante fazer as 4 partes no mesmo andamento. Estude também em todas as oitavas do teclado, para adquirir resistência e precisão. Cuidado com a articulação dos dedos. O peso e força dos dedos devem ser iguais para todos. Gradue o peso e distribua para todos os dedos. Estude também, em diferentes tipos de teclados: Teclas pesadas: articule bem os dedos, não faça força e use o peso dos braços. Teclas waterfall: articule mais que nas pesadas e use menos peso dos braços. Teclas leves: menos articulação e peso. E lembre-se: use sempre o metrônomo.

Mateus Schanoski – músico experiente e versátil, Mateus Schanoski é tecladista, organista e pianista, além de arranjador e produtor musical. Já acompanhou nomes como Jimmy Bo Horne, Sharon Corr, Jorn Lande, Wanderléa entre outros. Revista Keyboard Brasil / 55


Fotos: Divulgação

Outros Sons

O sotaque flamenco de

56 / Revista Keyboard Brasil


ATENDENDO AOS MUITOS PEDIDOS A REVISTA KEYBOARD BRASIL A PARTIR DESTE MÊS ABRE UMA SEÇÃO ESPECIAL PARA AQUELES QUE NÃO TOCAM INSTRUMENTOS DE TECLAS. QUER SE MOSTRAR PARA O MERCADO? MOSTRAR SEU TRABALHO? FAÇA COMO O GUITARRISTA RUBÉN DE LIS! * Heloísa Godoy Fagundes

R

ubén de Lis nasceu na cidade

de Vigo, Galícia, na Espanha. Aos 9 anos de idade já cantava no coral da igreja. Aos 13 anos matriculou-se em um conservatório iniciando seus estudos em música clássica ao piano e também harmonia. Aos 15 anos e já interessado pela guitarra mudou-se para Madri matriculando-se na Escola de Música Criativa (EMC), onde aprendeu Flamenco Fussion e Harmonia Moderna. Paralelamente, com grande habilidade para a guitarra tornou-se músico profissional realizando shows e gravando em estúdio, percorrendo toda Espanha e parte da Europa acompanhando várias bandas e artistas. Desse momento em diante, sua carreira não parou. Músico premiado no ano 2013 como um dos 12 guitarristas da Espanha para formação e apresentações ao vivo no projeto "DESNUDOS DE ETIQUETAS" produzido por RDM

EDITORIAL ESPANHA apresentando vários estilos como Jazz, Rock, Blues, Flamenco, Bossa Nova, entre outros. Também trabalhou na TV Galícia. E, assim, Ruben de Lis percorreu o mundo da Espanha, passando para Dubai, Marrocos, Suíça, Áustria, França e Portugal até chegar ao Brasil. Em terras tupiniquins passou a se apresentar como cantor e guitarrista em vários shows, além de ministrar workshops, onde toca músicas de todos os seus discos com uma característica muito versátil e empolgante com seus pedais de efeitos. Sozinho faz todo tipo de sons e acompanhamentos (baixo e bateria) tudo em tempo real agitando o público, de uma maneira bastante peculiar. Rubén de Lis também é colunista mensal da revista brasileira instrumental Som em Campo, com uma coluna sobre Flamenco. A seguir, sua discografia.

Revista Keyboard Brasil / 57


Ponto de Encontro

(da Música, Arte, Beleza, Educação, Cultura, Rigor, Prazer e Negócios)

O QUE ESTAMOS FAZENDO COM A CLASSE MÉDIA? PARTE FINAL

O QUE TEMOS EM COMUM COM OS SOFISTAS GREGOS DO PASSADO? LEIA A SEGUNDA PARTE DO TEXTO DO PROFESSOR BERSOU! * Por Luiz Bersou A RESPOSTA À 7ª PERGUNTA A 7ª pergunta foi: qual é a questão mais forte e de mais impacto entre todas as coisas da vida? A resposta de Tales foi: ‘‘A necessidade, pois é por causa dela que enfrentamos e superamos todas as dificuldades com as quais nos defrontamos’’. O que Tales de Mileto nos deixou há mais 2.500 anos é que o enfrentamento das dificuldades forma o caráter e o mantém no tempo. Ao longo da história essa verdade sempre se confirmou. Quem não conhece a história do avó empresário pioneiro, rude e vigoroso, enfrentou todas as dificuldades, pai bem sucedido mas obediente e confortável, pouco compromissado e neto mimado fracassado, revoltado e perdido na vida por que não 58 / Revista Keyboard Brasil

aprendeu a lutar? Cabe aqui uma conexão de pensamentos. Tal como os sofistas gregos, onde a beleza do discurso era o que importava, os socialistas acreditam que a obediência do gado torna a manada rica. Não entra nesse discurso a luta individual de cada um para superar a si próprio, superar as dificuldades e ir para a construção de um caráter de sociedade que luta pelo que acredita, lastreada no caráter do indivíduo.

ESPAÇO VITAL Recebi arquivo com um gráfico que fala da importância do Brasil no contexto mundial, argumentando que não temos o reconhecimento dos valores do nosso posicionamento.


A base do raciocínio exposto no gráfico é o conceito de espaço vital e importância do tamanho da população. Cabe lembrar então que muitas guerras aconteceram até recentemente por conta da visão de espaço vital. Os governantes queriam territórios e população. Eram a razão do seu poder. Vem à memória a batalha de Sebastopol na guerra da Crimeia, onde tropas de diferentes países combateram. A história conta que o general inglês, dentro de sua estratégia de combate, enviou milhares de seus soldados para a morte certa. Ele não tinha nenhum apego por eles, simplesmente por que o papel deles ali era morrer. Como sempre não contaram nadado que ia acontecer para as mães deles. Nesse raciocínio nos vem então os valores da época: territórios grandes e população para trabalhar e manobrar. Trabalho bruto. Visão de espaço vital antiga. Hoje em dia o conceito de espaço vital não está mais no território e tamanho da população. Espaço vital está associado à capacidade de produzir conhecimento e o transformar em riqueza e capacidade de investimento. Outro jogo. Entra a classe média.

A EMERGÊNCIA DA CLASSE MÉDIA É pouco comentado que no seio da classe média aconteceu mudança fundamental em todas as nações. Foi nela que a sociedade começou a evoluir do trabalho físico bruto para o trabalho

inteligente. Ela foi o espaço vital dessa transformação. Foi na classe média, na burguesia, que os filhos iam estudar onde houvesse escola e por conta do conhecimento armazenado na família, foram dados os grandes saltos da humanidade em termos de conhecimento. Foram os fundadores das primeiras universidades. Percebemos que foi lá que a noção de liberdade e independência do cidadão promoveu a melhor luta para a superação das dificuldades. É na classe média que se verifica o valor de um discurso de Paulo Guedes, quando ele diz que no progresso não é o capital que interessa, mas a capacidade de cooperação e apoio mutuo livre entre os atores da sociedade. De uma base sólida de conhecimento na classe média países como Japão, Coreia do Sul, Finlândia e Estados Unidos alimentam as grandes universidades e fazem a sua caminhada para a Sociedade do Conhecimento, Sociedade da Inteligência e Sociedade da Sustentabilidade. Lembro então a conversa com políticos experientes aqui no Brasil. A classe média era formadora de opinião. Tinha esse “status” pelo reconhecimento de valores e méritos. Tinha condição de elaborar o pensamento independente. Incomoda, atrapalha os planos de condução da manada em eleições.

CONDUZIR MANADAS, A 7ª PERGUNTA, A CLASSE MÉDIA E MARILENA CHAUÍ Na resposta da 7ª pergunta, vem a mensagem: Faz das dificuldades o teu Revista Keyboard Brasil / 59


caminho para a superação e para o progresso. Luta. Mostra a tua independência e capacidade de superar desafios. Assistimos então o discurso de Marilena Chauí aplaudida por Lula. Odeio a classe média!Joga os mais simples e mais pobres contra uma classe média que é justamente o espaço vital onde se transita do trabalho bruto para o trabalho inteligente e muito melhor remunerado. Algo que é de todo interesse do mais simples e mais pobre. Uma enorme contradição, mais uma vez um discurso vazio, falso de uma sofista oportunista.

100 MILHÕES DE MORTOS Registros nos apontam que na formação da União Soviética, os russos mataram mais de 100 milhões de habitantes da classe conservadora da classe média. A razão é muito simples, socialismos, petismo e comunismo, tudo uma ideologia só, não convivem com quem tem inteligência e liberdade de pensamento para agir de forma livre. Vamos permitir que os sofistas, vazios como sempre, permaneçam e se perpetuem no poder?

* Atualmente dirigindo a BCA Consultoria, Luiz Bersou possui formação em engenharia naval, marketing e finanças. É escritor, palestrante, autor de teses, além de ser pianista e esportista. Participa ativamente em inúmeros projetos de engenharia, finanças, recuperação de empresas, lançamento de produtos no mercado, implantação de tecnologias e marcas no Brasil e no exterior.

http://www.jazzsinfonica.org.br/ 60 / Revista Keyboard Brasil



Memória

A Paddymania de uma das figuras mais importantes da história da Polônia!

IGNACY JAN PADEREWSKI 62 / Revista Keyboard Brasil


Tela de Sir Lawrence Alma-Tadema, 1891

QUEM FOI IGNACY JAN PADEREWSKI? MUITO MAIS DO QUE UMA ESTRELA DA MÚSICA CLÁSSICA, O HOMEM DE CABELOS COR DE FOGO ERA ADORADO PELO PÚBLICO EM TODO O MUNDO. UM POLÍTICO FEROZMENTE PATRIÓTICO CONSIDERADO O "GEORGE WASHINGTON DA POLÔNIA". UM FILANTROPO INCANSÁVEL QUE LEVANTOU MILHÕES EM AJUDA PARA REFUGIADOS DE GUERRA. ESTES SÃO ALGUNS DOS ATRIBUTOS QUE O DISTINGUIU COMO UMA DAS MAIORES PERSONALIDADES DA CENA CULTURAL E POLÍTICA NA POLÔNIA E NO MUNDO, DURANTE A PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX. CONHEÇAM ESSE GRANDE HOMEM! Por Heloísa Godoy Fagundes

Revista Keyboard Brasil / 63


Quem foi Paderewski?

D

iferentemente de sua vida profissional, a vida pessoal de Ignacy Jan Paderewski, (1860-1941) foi mar-

cada por muito sofrimento. O músico cresceu sem mãe, seu pai foi preso, sua primeira esposa morreu aos 20 deixando-o um filho, de nome Alfred, portador de uma doença incurável, além de um amor platônico pela princesa de Brancovan que nunca poderia acabar em casamento... Contudo, Paderewski foi declarado o

maior artista desde a época de Chopin.

Ignacy Jan Paderewski criança e aos 15 anos, sentado ao piano.

64 / Revista Keyboard Brasil

Um pianista tão famoso e popular que até mesmo o presidente americano Franklin Roosevelt chamou-o de “pianista moderno imortal”, em 1932. Embora desencorajado por seus professores para se tornar um pianista, Paderewski lançou sua carreira artística em 1885 e, literalmente, varreu o mundo com sua forma de tocar e sua personalidade dinâmica. Em 1923, recebeu o título de doutor honorário do grau em Direito pela Universidade do Sul da Califórnia por suas conquistas políticas. Outras universidades que honraram Paderewski incluem Lwów, Yale, Jagiellonian, Oxford, Columbia, Poznań, Glasgow, Cambridge, e New York University. Em 1934, Charles Phillips escreveu um livro sobre Paderewski, cujo título era A História de um Moderno Imortal, onde a introdução, escrita por Statesman, orador, pianista e compositor, começou da seguinte forma: “É difícil escrever sobre Paderewski sem citar a palavra emoção. Ele é um homem superlativo, e seu gênio transcende o de qualquer pessoa que eu já conheci. Aqueles de nós que amam a Polônia estamos contentes por ela reclamá-lo como um filho, mas deixemos sempre lembrar que Ignace Jan Paderewski pertence a toda a humanidade”.


O início... Um dos pianistas mais sensacio-nais dos tempos modernos, Paderewski recebeu treinamento musical precoce de Peter Sowinski. Seu primeiro concerto de piano para o público foi aos 11 anos de idade. Seu modo de tocar despertou interesse sendo levado para Kiev. Mais tarde, entrou para o Conservatório de Varsóvia, onde aprendeu a tocar trombone. Fez parte da banda da escola, continuando seus estudos pianísticos. Em 1875, visitou as cidades russas provinciais com o violinista polonês Cielewicz e, em 1878, foi contratado para ministrar aulas de piano no Conservatório de Varsóvia. Em 1882 Paderewski foi para Berlim estudar composição com Kiel e, subsequentemente. orquestração em Berlim com Heinrich Urban. Foi lá que ele conheceu Anton Rubinstein, reiniciando seu emprego de professor mudando-se para Viena onde estudou com Leszetycki (Leschetizky).

O famoso vistuoso... Adorado, admirado e amigo, não apenas pelas pessoas mais importantes de sua época, mas por pessoas de todas as esferas da vida. Viajou por todo o mundo a partir de África para a Austrália e em todo o continente europeu; cruzando o Atlântico mais de trinta vezes. Realizou mais de 1500 concertos nos EUA, recebido por multidões em um momento em que o recital solo ainda estava em sua infância. Paderewski foi o primeiro a dar um recital sozinho no recém-construído Carnegie Hall, em Nova York, com aproximadamente 3.000 pessoas na plateia. Um grande showman!

Acima: Ignacy Jan Paderewski e Camille Saint-Saëns em 1900. Abaixo: Paderewski e sua esposa.

Revista Keyboard Brasil / 65


Por que era tão popular? Por que ele era tão popular? Uma razão era a sua aparência física magnífica. Admiravam seus longos cabelos vermelhos. O termo “long haired music” pode ter se originado com ele. Muitos músicos tentaram imitá-lo, usando chapéus, casacos longos e cabelos compridos. Doces, brinquedos e sabonetes foram criados com sua imagem.

A aparência de Paderewski, junto com seu refinamento aristocrático e poder sobre as massas foi certamente o que o transformou em uma pessoa tão popular. Porém, a principal razão para sua popularidade eram seus magníficos recitais. Cada um considerado um “acontecimento espiritual.” Conhecido por ter aperfeiçoado o toque que poderia literalmente fazer o piano cantar e suas representações musicais, não importando o quão diferente poderiam ser, foram frutos de estudo profundo e sério. Mesmo sendo criticado por alguns pelo uso excessivo de "tempo rubato", isso pode ser facilmente explicado: Paderewski pertencia ao último grupo de pianistas “românticos”, cujo estilo foi se tornando fora de moda e não utilizada pela nova geração de pianistas. No entanto, ele continuou a usar estes dispositivos, a fim de conseguir efeitos dramáticos.

Paderewski foi considerado o melhor intérprete das obras de Chopin de seu tempo e ninguém poderia tocar as Rhapsodies do húngaro Liszt como ele fazia. A carreira musical de Ignacy Jan Paderewski estendeu-se por mais de 50 anos. Acompanhando sua popularidade, veio o sucesso financeiro destinado às atividades públicas. Em reconhecimento ao mérito artístico e patriotismo sua figura tem recebido inúmeros prêmios até hoje. 66 / Revista Keyboard Brasil


Revista Keyboard Brasil / 67


Admirado...

mais famoso retrato dele foi feito por Sir Edward Byrne-Jones, que acidentalmente passou por ele na rua um dia. Voltou para casa dizendo que tinha visto um arcanjo e começou a esboçar a partir da memória. Poucos dias depois, Paderewski foi levado para o estúdio do artista que gritou: “Você é meu arcanjo!” E, em duas horas, o pintor completou o retrato. Richard Gilder e John H. Finley compuseram poemas para Paderewski. Compositores como Edward Elgar dedicaram obras a ele. Paderewski compôs várias dezenas de obras que incluem duas óperas, uma sinfonia, duas peças orquestrais, várias canções e muitas, muitas peças para piano. Suas duas obras para piano mais poderosas e criativas são a Sonata, op. 21 e as Variações e Fuga, op. 23. Ele também fez uso de ritmos de danças polonesas em muitas de suas composições. Ao longo de sua música pode-se ouvir os idiomas nacionais do seu país. Duas das mais populares peças para piano em miniatura que ele incluiu em seus próprios programas foram o Cracovienne Fantastique e Chants du Voyageur, op. 8. Na Polônia, muitos ouviram seu famoso Minueto em Sol. Ente 1920 e 1930, todos os pais aguardavam o dia em que seu filho poderia, finalmente, realizar o Minueto em um recital local. Este foi o objetivo de toda criança nas aulas de piano e, por isso, é considerado um marco de sua realização. 68 / Revista Keyboard Brasil

Foto: Koncern Ilustrowany Kurier Codzienny, 1-K-6816-5

Paderewski inspirou artistas, poetas, pintores e compositores. O


Em Nova York, durante uma turnê pelos Estados Unidos no ano de 1932. Da esquerda para a direita: Edward S. Witkowski, presidente da recepção em homenagem ao músico; Sylvine Strakacz, secretário pessoal; S. Mann, diretor do City Hall e o músico Ignacy Jan Paderewski.

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O modelo humanitário... Paderewski precisou retomar sua carreira pianística em 1923 por razões financeiras, mesmo tendo ganhado muito dinheiro, mais do que qualquer artista. E por que? Simplesmente porque entregou tudo o que tinha para seu país e para a humanidade. Já em 1895, ele fundou o Paderewski Fund, em Nova York para estabelecer prêmios trienais para compositores americanos, independentemente de raça ou religião. Alguns desses vencedores foram David Diamond, Gardner Reed e Wallingford Rieger. Também estabeleceu um fundo semelhante para Composição em Leipzig, em 1898. Em Londres, ele ajudou o Transvaal War Fund para os feridos, viúvas e órfãos da guerra. Para expressar gratidão a Herbert Hoover e outros americanos, ajudou com seu Polish Relief Fund, entregando os ganhos de uma série de concertos para a compra de comida aos desempregados americanos na década de 1920. Em 1932, tocou para um público de 16.000 no Madison Square Garden, o maior público da história da música na época, arrecadando $50.000 em benefício aos músicos americanos desempregados.

Ao longo dos anos, Paderewski fez contribuições substanciais para várias causas: para músicos desempregados na Inglaterra, fundos para dramaturgos, compositores poloneses, para a construção de uma sala de concertos na Suíça, para a reconstrução de uma catedral em Lausana, para os trabalhadores desempregados, para os órfãos na Itália em tempos de guerra, para a construção de dormitórios para estudantes de música na França, para o Hospital do Soldado Allied, para refugiados judeus-alemães, vítimas de Hitler, em Paris no ano de 1933 e tantas outras. Sua maior contribuição individual ($28,600) foi destinada à Legião Americana de veteranos deficientes.

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Funeral de Ignacy Jan Paderewski em 3 de julho de 1941, na cidade de New York. Revista Keyboard Brasil / 71


O patriota...

Ignacy Jan Paderewski: primeiro ministro da Polônia independente depois da Primeira Guerra Mundial, além de virtuoso pianista, compositor, diplomata, político, incansável ativista e um modelo humanitário.

Suas amizades com muitos dos principais estadistas da Europa e América abriram o caminho para a futura atividade política. Em questão de poucos anos, Paderewski passou a ser considerado um dos peritos em assuntos relacionados aos problemas da Polônia.

Através de suas mãos de pianista, Paderewski conquistou e ajudou a moldar uma Polônia independente em 1918, após a Primeira Guerra Mundial. O país que tinha sido varrido do mapa no século XVIII e era dividido por seus vizinhos Prússia, Rússia e Áustria, agora gozava da restauração da soberania do povo polonês. Em 1919, tornou-se o Primeiro Ministro da Polônia independente, bem 72 / Revista Keyboard Brasil

como Ministro dos Negócios Estrangeiros e representante da Polônia na Liga das Nações em Genebra. Seus discursos foram considerados entre as melhores realizações de oratória da Liga. Muitos expressaram, por unanimidade, sua opinião em uma carta conjunta: “Nenhum país pode desejar um defensor melhor”. Em 1920, Paderewski recebeu uma ovação em pé antes e depois de seu discurso, falado em francês e em inglês. Para seus colegas, Paderewski era um

grande estadista, um orador incomparável, um linguista brilhante que deu ao mundo, um exemplo de patriotismo e coragem e de grande caráter humano.


Incansável artista, ativista... Registrando para a posteridade, no ano de 1936, Paderewski fez um filme produzido por cineastas britânicos chamado Moonlight Sonata retratando-se em um recital de obras de Beethoven, Chopin, Liszt e sua Menuet. O músico foi tão bem quisto por todos os que entraram em contato com ele durante as filmagens que foi inundado com flores como forma de homenagem e gratidão. Na época, Paderewski tinha 76 anos de idade. Após a eclosão da Segunda Guerra Mundial, Paderewski realizou, em 1939, uma campanha anti-nazista de sua casa na Suíça. Embora enfrentando problemas de saúde, Paderewski viajou para Paris e inaugurou um novo governo, com a única objeção: não ser identificado como primeiro-ministro novamente. Sua casa na Suíça era um lugar de refúgio para os emigrantes de muitas nacionalidades durante a Segunda Guerra Mundial. Ninguém foi mandado embora sem ter

sido alimentado. A p e s a r d e v i ve r n a S u í ç a , Paderewski voltou para os EUA para continuar os esforços em ajudar a causa polonesa. Porém, em Nova York, alguns dias depois enfrentando um clima extremamente quente, Paderewski ficou doente e faleceu. Seu funeral na Catedral de St. Patrick, em Nova York, no ano de 1941, teve a participação de 4.500 pessoas em seu interior e 35.000 do lado de fora, incluindo estadistas e líderes do mundo político e musical. Por decreto presidencial (uma medida tomada apenas uma vez antes na história dos EUA), foi enterrado no cemitério de Arlington, em Washington. Em 1992, o corpo de Paderewski foi devolvido para a Polônia e enterrado na Royal Crypt of the Warsaw Cathedral, numa cerimônia presenciada pelos presidentes da Polônia e dos Estados Unidos.

Desde 1992 o corpo de Ignacy Jan Paderewski se encontra enterrado na Royal Crypt of the Warsaw Cathedral, Polônia.

Revista Keyboard Brasil / 73


Novidade

74 / Revista Keyboard Brasil


MOMENTOS ESPECIAIS PREPARADOS COM EXCLUSIVIDADE PARA OS ALUNOS QUE DESEJAM APRENDER MÚSICA SEM SAIR DE CASA. ESSE É UM DOS DIFERENCIAIS DO PROJETO MÚSICA DELIVERY® IDEALIZADO POR ILCA LEANZA PARA AS AULAS DE MUSICALIZAÇÃO INFANTIL, PIANO, CORAL, CANTO, VIOLÃO, GUITARRA E PRÁTICA DE BANDA! * Da Redação

N

ão quer sair de casa? Não tem instrumento? Quer experimentar? O Música Delivery® vai até

você! Pode ser na sua casa, em seu

Entrevista Revista Keyboard Brasil – Como surgiu o delivery musical? Ilca Leanza: Desde pequena percebi que eu era uma pessoa que gostava de lecionar. Com o tempo, essa sensação de passar tudo que aprendi na minha história musical aos outros, só foi aumentando. Há algum tempo me mudei para um grande condomínio que oferece muitas atividades e fiquei surpresa ao perceber que lá não havia música, foi minha deixa! Naturalmente, a ideia do Música Delivery® foi surgindo e acontecendo. O sucesso foi imediato! Quando dei por mim, minha agenda estava completamente recheada de aulas de piano, musicalização infantil, violão e o

condomínio, no salão de festa, aulas individuais ou em grupo! E mais, seus professores são profissionais, atuantes no meio musical!

projeto só tende a crescer. Revista Keyboard Brasil – Diferentemente do projeto Pianosofia, do grande pianista Christian Budu, que tem por objetivo, levar música às residências através de saraus, o Música Delivery® tem o intuito de oferecer aulas de música. Uma ideia muito legal nos dias de hoje, pensando na falta de tempo, nos congestionamentos e na criminalidade. Atualmente, esse projeto abrange apenas a cidade de São Paulo? Pensa em estender a outras cidades? Ilca Leanza: Sim, no momento, por conta da grande demanda, estou só na Capital, mas já recebi convites para implementar o Música Delivery em algumas cidades do interior. Logo teremos franquias. Revista Keyboard Brasil / 75 02


Revista Keyboard Brasil – Além de você, existem outros músicos que fazem parte desse projeto? Ilca Leana: O Música Delivery® tem uma equipe de profissionais de vários estilos e instrumentos, todos com experiência no meio musical e pedagógico. Conforme conheço o aluno, direciono para determinado profissional, pois tudo passa por um processo de estudo, de conhecimento dos níveis do alunos, do perfil, suas características psicológicas para assim encaminha-lo. Aqui, não damos apenas aulas de música mas também proporcionamos experiências e vivências agradáveis a cada aula, a cada encontro. Revista Keyboard Brasil – Qual a faixa etária para participar do Música Delivery®? Ilca Leanza: Para quem quiser ter contato com a música, da gestação até a melhor idade. O Música Delivery® proporciona essa experiência musical desde a barriga, com a parceria da profissional Isadora Canto fundadora do Projeto Acalanto que vivencia música desde a gestação, ela cuida da parte de gestantes e bebês até 6 meses, eu assumo dos 7 meses até 10

76 / Revista Keyboard Brasil

anos. As aulas são em grupo, divididas por faixa etária, respeitando o ritmo e desenvolvimento de cada criança. Também trabalhamos com aulas individuais e grupo de adultos. Essas aulas em grupo são muito divertidas, pois são profissionais de diversas áreas que em algum momento se interessaram em montar uma banda, são grupos de amigos antigos ou que através do Música Delivery® se conhecerem e juntos passam momentos de muita diversão e relaxamento. As aulas são preparadas exclusivamente para cada aluno e seu gosto musical. Revista Keyboard Brasil – Qual o diferencial de seu projeto? Ilca Leanza: Penso que as aulas de música são momentos especiais e procuro cuidar de todos os detalhes com muita atenção e zêlo, passando até pelo cheiro agradável do local das atividades, mantendo o ambiente harmonioso, bem equipado e organizado para receber os alunos. Há um grande diferencial nas aulas do Música Delivery que vem chamando bastante atenção e que, na minha opinião de professora, mãe e musicista é


Ilca Leanza: “Aulas especialmente planejadas!!”

Revista Keyboard Brasil / 77


de extrema importância para o progresso das aulas: conhecer o aluno profundamente através de conversa e um questionário bem detalhado (anamnese). Descubro os seus padrões de comportamento e, partindo dessas descobertas, direciono suas aulas e profissionais. Por exemplo, se percebo que há alguns pontos que o atrapalham na vida, como problemas com alimentação, faço uma aula de música na cozinha, onde cantamos e tocamos com colheres, panelas e essa nova experiência faz com que o ato de comer acabe se tornando algo bem atraente e divertido, provamos vários alimentos saudáveis. Também há um foco para pessoas com problemas especiais como autismo, down, na maioria das vezes em

conjunto com psicólogos, fonoaudiólogos ficando nítido que a música ajuda verdadeiramente no desenvolvimento. Eu me sento muito feliz por ser esse elo! É gratificante! Revista Keyboard Brasil – Nós, da Revista Keyboard Brasil, desejamos vida longa ao projeto! Ilca Leanza: Eu agradeço a todos os alunos e as pessoas que acreditaram nesse projeto, à Tokai por Juliano pela parceria e por acreditar nesse projeto e vocês da Revista Keyboard Brasil, por esse apoio aos músicos em geral, prestando serviço de informação e pontuando essa profissão tão abençoada!

Depoimentos dos pais

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“A Ilca tem um trabalho incrível, feito com carinho e dedicação. Abriu a porta da sua casa para proporcionar aos nossos filhos momento s mágicos através da música, onde pode mos acreditar que no momento da aula, os noss os filhos alem de estarem aprendendo música estã o adquirindo cultura e se divertindo. E vou além.....os nossos filhos estão tendo a oportuni dade de vivenciar os efeitos terapêuticos da musica através da escuta e do próprio manusei o com os instrumentos!! Quer saber mais ? Dentro da minha própria casa!!! Não é demais?” (Elisangela, mãe do Breno 8 ano s.) “Por indicação da minha irmã (que já tinh a os filhos fazendo musicalização) comecei eu gráv ida de 5 meses a fazer canto e piano com a Ilca, onde cantava e me encantava a cada aula ! Repleta de canções doces e com uma ama bilidade essa professora me conquistou! Até o momento em que ela conseguiu se superar (se é que seria possível) no meu chá de bebê ela fez uma música linda para a minha filha Ann a Letícia! Eu não parava de chorar parecia eu a bebê!! Foi encantador um dos momentos mais mágicos da minha gestação! Hoje minha filha com 11 meses comecei a fazer musicalizaçã o com ela! E todo aquele sentimento que tinh a durante as aulas de acalanto hoje são reais ! Obrigada Ilca por trazer mais música e mais alegria pra esse mundo!” (Milena) “Ilca é uma pessoa cheia de talentos: o mus ical, claro, que deixa nos seus alunos o gosto pela música e o pedagógico, de quem sabe passar com amor aquilo que mais conhece! Lidar com crianças é algo que ela domina como ninguém . Gratidão é oque sinto por ela!” (Adriana, mãe de dois filhos).

“O trabalho da Ilca Leanza é muito espe cial: meus dois filhos foram seus alunos e tinh am nela mais do que uma professora de música. Ilca era a amiga que os estimulava para se solta rem na arte e na expressão. Muita gratidão pela nossa divina amizade de todos esses anos, Ilca. ” (Maeve, mãe de dois filhos). “Para meus amigos que amam a música como eu!! Conheço a Ilca de longa data e quan do a conheci , resolvi voltar a tocar piano apes ar de minha idade !!! Ela é uma pessoa mui to sensível, doce, competente e sabe ensinar e estimular seus alunos! Meus netos tam bém foram seus alunos, criando gosto pelos inst rumentos musicais!! Eles tem um jeitinho mui to especial para lidar com crianças, jove ns e, porque não, com idosos com eu!! Sendo assi m, estou certa de que a EMPRESA DE MÚSIC A DELIVERY terá todo o sucesso que merece, com a competente coordenação de Ilka Lenza. Tenh o enorme GRATIDÃO por tudo de bom que Ilca fez por mim e os meus!!!” (Dona Zilia, mãe, avó e aluna). “Eu chamo a Ilca de encantadora de pessoas, ela nos encanta a cada vinda dela aqui em casa , ela conquistou todos por aqui. As aulas dela vão além da música, ela traz vida. Estimula todo sa pensar diferente, ela introduziu a música na vida da gente, e vem sempre com coisas nov as. Somos muito gratos a ela. Eu recomendo a Ilca para a vida de todos! ” (Júlia e Roberto, mãe e pai de 3 filhos e alunos dela também). “Meus filhos chegaram na mão da Ilca bem desanimados, até achei que seria impossível ela resgatar a música, mas agora eles fazem 3 aulas com ela por semana e são adolescentes, uma fase difícil que com a música está sendo mar avilhoso. E o mérito é todo da Ilca.” (Bruna, mãe de 2 filhos).

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Fotos: Vivi Arts Fotografia

Novidade

O polivalente

Hamilton de Oliveira 80 / Revista Keyboard Brasil


COM GRANDE ALEGRIA TEMOS A HONRA DE ANUNCIAR A PARCERIA DA REVISTA KEYBOARD BRASIL COM O PRODUTOR MUSICAL HAMILTON DE OLIVEIRA COMO UM DE NOSSOS NOVOS COLABORADORES. * Heloísa Godoy Fagundes

M

úsico profissional e produtor musical há 23 anos, Hamilton

de Oliveira Santos estudou

com professores particulares em Sorocaba e no Conservatório de Tatuí, interior de São Paulo como pianista popular. Mais tarde, formou-se em Licenciatura pela UNISO - Universidade de Sorocaba, no curso de Música e Pós Graduação pelo SENAC em Docência no Ensino Superior. Já tocou em muitos países, entre eles Cuba, Argentina, Panamá, República Dominicana, Espanha, Portugal, Ilhas Canárias, Peru, Uruguai. Apresentouse e deu canja com alguns artistas como: Pedro Mariano, Billy Paul, Belchior, Ivete Sangalo, Carlinhos do Cavaco, Afonso Nigro, Roberto Justus, Marina Elali, Don Betto, Izzy Gordon, Soweto, Leonardo, Mano Jr., Carlos e Alessandro, Priscila Alcântara, Caio Mesquita, Sandra Belê, Banda Dimensão 5, Banda Santa Maria, Banda Live Karaoke, Banda Chroma, Banda

da Feira, Banda Sweet Summer Salt, Banda Tangos, Banda The Mutts, Mayara Prado, SP3, entre outros. Também tocou durante um tempo em navios de cruzeiro pelo mundo.

TRABALHOS EM TV: SBT: Maestro do Qual é a Música, banda do programa Gente que Brilha, banda do programa Código Fama. Produtor e arranjador do CD da Priscilla Alcântara “Meu sonho de criança” em 2010. Globo: Mano Jr. e Leonardo (Programa do Faustão), Belchior (Jô Soares). Record: Soweto e Banda Santa Maria (1999). Gazeta: Banda Santa Maria (Ronnie Von)

DIRETOR MUSICAL DE VÁRIOS PROJETOS MUSICAIS, COMO: Tina Turner tribute, Banda Yellow Music, The Mutts, Toto Cover e Banda Chroma.

Revista Keyboard Brasil / 81


TRABALHOS ATUAIS: Atualmente, além de cantor, tecladista, acordeonista e pianista Hamilton se divide como: –Diretor musical Mayara Prado –Diretor musical Tina Turner Tribute –Tecladista Banda Toto Cover –Tecladista Banda Chroma –Sanfoneiro Banda da Feira –Sanfoneiro Sandra Belê –Tecladista Banda Os Figurantes –Tecladista Banda Live Karaoke

Com a Banda da Feira no Sesc Bertioga.

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–Tecladista Kazara Live –Sanfoneiro Serenata Naquele Tempo –Tecladista Trio The Mutts –Duo piano e voz com Patricia Andrade –Diretor musical Banda Yellow Music –Regente do coral do Projeto Sementinha da ACM Sorocaba –Professor de teclado, piano e regente do coral da ACM Sorocaba para a melhor idade –Editor de Vozes do Programa Raul Gil.



Revolução Musical

´ ´ A MUSICA VISIONARIA DE

Stockhausen

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ESTE MÊS, A REVISTA KEYBOARD BRASIL TEM A HONRA DE APRESENTAR O MAIS NOVO COLABORADOR, O GRANDE MÚSICO SERGIO FERRAZ, DISCORRENDO EM SUA PRIMEIRA COLUNA SOBRE ALGUMAS COMPOSIÇÕES PARA PIANO, TECLADOS E MÚSICA ELETRÔNICA DO VISIONÁRIO ALEMÃO STOCKHAUSEN. * Por Sergio Ferraz

‘ ‘

O artista há muito tem sido considerado como um indivíduo que refletia o espírito de sua época. Acho que sempre houve diferentes tipos de artistas: os que eram principalmente espelhos do seu tempo, e então alguns muito poucos que tinham um poder visionário, os quais os gregos chamavam de áugures: os que eram capazes de anunciar o próximo estágio no desenvolvimento da raça humana, realmente escutar o futuro, e por meio de sua obra preparar as pessoas para aquilo que estava para chegar...

‘ ‘

K. Stockhausen¹

F

azia pouco tempo que a Segunda Guerra Mundial havia chegado ao fim. A

Europa encontrava-se destruída, literalmente aos pedaços; contudo um grupo de jovens músicos altamente talentosos, que estava levando às últimas consequências a escola serialista de Schoenberg, Alban Berg e Webern e as inovações rítmicas de Stravinsky, achava-se pronto a continuar

o que de certa forma os anos do mundo em guerra interrompeu bruscamente. Dentre esses jovens estavam o francês Pierre Boulez e o visionário alemão

Karlheinz Stockhausen. Karlheinz Stockhausen nasceu em 22 de agosto de 1928 em Mödrath, perto de Colônia, numa pobre família camponesa de agricultores. Seu pai, primeiro em sua família a ser um

1. STOCKHAUSEN, Karlheinz, MACONIE, Robin. Stockhausen sobre a música- palestras e entrevistas compila-

das por Robin Maconie. São Paulo: Ed. Madras, 2009. Revista Keyboard Brasil / 85


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Foto: Kathinka Pasveer

intelectual, estudou por um curto período de tempo após a Primeira Guerra Mundial e se tornou um professor escolar; sua mãe tinha talentos para a música e era dispensada do trabalho no campo para estudar piano em casa. Stockhausen, entre seis e sete anos, surpreendia as pessoas ao escutar uma melodia apenas uma vez no rádio, depois sentar-se ao piano e tocá-la imediatamente, com todas as harmonias corretas. Entre 1947 e 1950 estudou em Colônia no Conservatório Estadual de Música (piano e educação musical) e na Universidade de Colônia (Filologia alemã, Filosofia, Musicologia). Em 1952, viajou a Paris para estudar ritmo e estética com o Mestre Olivier Messiaen; foi nessa estada em Paris que Stockhausen travou conhecimento com a Musique Concrète, fato que iria nortear sua composição e desbravar o mundo da composição eletrônica, até então um campo totalmente novo e inexplorado. Em 1953 Stockhausen tornou-se colaborador permanente do Estúdio para Música Eletrônica da Rádio Alemã Oeste, em Colônia. Durante o período em que esteve no Estúdio da WDR realizou profundos estudos que resultaram nas suas primeiras composições eletrônicas, como Elektronische Studien I und II (Estudos eletrônicos I e II) e Gesang der Jünglinge (Cântico dos Adolescentes), nascidos da música espacial e da música aleatória. Entre 1954 e 1956, enquanto continuava a dar segmento às pesquisas e a compor no Estúdio para Música Eletrônica da WDR,

Stockhausen em 1994 no Studio Für Elektronische Musik (Estúdio para Música Eletrônica) da WDR em Colônia, Alemanha.


Revista Keyboard Brasil / 87


estudou também, Fonética, Informação e Teoria da Comunicação com Werner Meyer-Eppler, na Universidade de Bonn. Stockhausen foi também uma das principais figuras da Escola de Darmstadt.

Suas composições e teorias foram e continuam sendo amplamente influentes, não apenas sobre compositores de música erudita, mas também no jazz e na música popular. Suas obras, compostas ao longo de um período de quase sessenta anos, evitam formas tradicionais. Além de música eletrônica, tanto com ou sem performance ao vivo, variam de miniaturas de caixas de música até obras para instrumentos solo, canções, música de câmara, coral, música de orquestra e óperas. Suas composições notáveis incluem a série de dezenove peças para piano, Klavierstücke, Kontra-Punkte para dez instrumentos, Gesang der Jünglinge, para música eletrônica e voz, Gruppen para três orquestras, Zyklus, Kontakte para percussão, a cantata Momente, para música eletrônica ao vivo Mikrophonie I, Hymnen, Stimmung para seis vocalistas, Ausdensieben Tagen, Mantra para dois pianos e equipamento eletrônico, Tierkreis, Inori para solistas e orquestra, e o gigantesco ciclo de ópera Licht. O conceito da espacialização sonora foi amplamente estudado e difundido por Stockhausen. Ele entendia que os sons deveriam não vir apenas na mesma direção, mesmo na divisão esteriofônica, mas que deveriam envolver o ouvinte em todas as direções e

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distâncias diferentes. Desde meados da década de 1950, Stockhausen vinha desenvolvendo conceitos de espacialização não só na música eletrônica, mas também em diversas obras, como o Gesangder Jünglinge em 5 canais (19551956) e Telemusik (1966), Kontakte (1958 60) e Hymne (1966-1967) em 4 canais. Gruppen para três orquestras (1955-57) e Carré para quatro orquestras e quatro coros (1959-60) também apresentam essa característica. Em 1968, o governo da Alemanha convidou Stockhausen para colaborar com o pavilhão alemão na Feira Mundial de Osaka, no Japão que viria a acontecer em 1970, com a criação de um projeto multimídia conjunto com ele e Otto Piene. O resultado foi uma grande esfera onde o público entrava na mesma através de uma escada rolante até uma plataforma em seu centro. Caixas de som foram fixadas em diversas partes e alturas da estrutura e, de uma mesa de som, Stockhausen controlava os diversos canais criando uma música tridimensional para a audiência. Karlheinz Stockhausen morreu de insuficiência cardíaca súbita aos 79 anos, em 5 de Dezembro de 2007 em sua casa em Kürten, Alemanha, deixando uma extensa, monumental e visionária obra, muito ainda a ser compreendida e estudada pelas próximas gerações. Abordaremos aqui algumas de suas composições para piano, teclados e música eletrônica.


Mantra para dois pianos e dispositivo eletronico

Essa obra foi composta no início dos anos 1970 e marca o início de sua abordagem da Fórmula Momento, uma quase volta aos anos das suas composições de serialismo integral, porém com uma abordagem com maior sentido de liberdade e misticismo transcendental. Mantra é também música e teatro: dois pianistas encarando um ao outro como em um dramático e místico duelo. Durante a performance, os dois pianistas têm de, além de tocar a parte do piano que exige um alto rigor técnico, tocar woodblock, fazer ajustes nos controles eletrônicos, ficar em pé e cantar sílabas místicas e se esforçarem em um profundo drama musical que varia da mais intensa experiência humana à quase comédia.

A fórmula de Stockhausen é admirável na sua simplicidade e Mantra parece ser o exemplo perfeito da sua ideia. A peça começa com um curto motivo, “o mantra”; dentro desse simples fragmento pode ser achado a semente de toda a peça, porém de forma microcósmica. Stockhausen disse sobre sua forma-momento: “O grau de mudança é uma qualidade que pode ser composta tanto

Mantra é baseada numa melodia de treze notas (uma série de doze notas com a primeira nota repetida no final – esse é um dos dispositivos preferidos de Stockhausen). Esta série é então continuamente repetida e expandida. Stockhausen a amplia horizontalmente em duração e verticalmente em altura intervalar. Cada nota do mantra tem sua própria duração e dinâmica que as confere características próprias.

quanto a característica da música que está de fato mudando. Posso compor com uma série de graus de mudança, ou podemos chamar esses graus de renovação. Então, posso começar com qualquer material musical e acompanhar o padrão de mudança, e ver onde leva, de mudança zero a um máximo definido. É isso que entendo por forma momento.” (Stockhausen Sobre A música, Ed. Madras). Mantra é baseada numa melodia de treze notas (uma série de doze notas com a primeira nota repetida no final – esse é um dos dispositivos preferidos de Stockhausen). Esta série é então continuamente repetida e expandida. Stockhausen a amplia horizontalmente em duração e verticalmente em altura intervalar. Cada nota do mantra tem sua própria duração e dinâmica que as confere características próprias. A série de treze notas com suas características são as seguintes: 1 A (repetição regular), 2 B (acento ao final), 3 G# (normal), 4 E (grupo Revista Keyboard Brasil / 89


Alfons e Aloys Kontarsky realizando Mantra com Stockhausen (primeiro plano), Shiraz Arts Festival, 02 de setembro de 1972.

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Stockhausen na mesa de som para a apresentação de Mantra, no mesmo festival em 02 de setembro de 1972.

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Sem dúvida, Mantra é uma obra prima da música para piano. Um dueto místico incrivelmente inventivo e complexo inteligentemente elaborado, um portal para novos mundos sonoros e estéticos.

no tempo forte em torno de uma nota central), 5 F (tremolo), 6 D (acorde), 7 G (acento no inicio) , 8 Eb (link cromático), 9 Db (staccato), 10 C (raiz de uma repetição irregular – código morse), 11 Bb (raiz para trillos), 12 Gb (sforzando), 13 A (arpejo link). As muitas repetições do mantra aparecem em diferentes expansões e em diferentes níveis. A expansão temporal mais extrema dura por toda a peça e, assim, controla sua estrutura de grande escala. Cada uma das treze notas, com as suas características dominantes, torna-se toda a base de uma sessão musical. Dessa forma, a sessão um da peça é baseada na “repetição regular”, a sessão dois no “acento ao final” e, assim por diante. A seção com base na “repetição irregular” é especialmente marcante, sendo apoiada pela repetição irregular na gravação do código morse em transmissão de ondas curtas. Cada uma das treze sessões da obra também contém uma versão de todo o mantra (novamente com as suas treze características), e dentro de cada uma destas versões mais curtas ouvimos ainda doze repetições mais curtas e rápidas. São, portanto, mundos dentro de mundos - do macro ao micro. Em Mantra, Stockhausen leva a cabo a sua teoria da expansão do som na qual ele afirma uma equivalência de altura, ritmo e forma como diferentes escalas de periodicidade em um tempo continuum unificado. Outro ponto importante em Mantra é a transformação eletrônica do som dos pianos usando Ring Modulation,

Sergio Ferraz - violinista, tecladista e compositor.

através do qual o som do piano é modulado com um som sintetizado, afinado no tom central de cada sessão. O grau de transformação sônica depende do intervalo entre o som sintetizado e a nota do piano: com intervalos simples (oitavas e quintas...) a transformação é súbita, porém com intervalos mais complexos (segundas menores ou sétimas maiores), a transformação é mais dramática resultando em sons como de sinos metálicos e quase vibrato. Depois de mais de uma hora de uma infinita transformação imaginativa do material original, Mantra termina com um momento de profunda reflexão e uma compostura quase clássica, como o próprio mantra entonado tranquilamente pela última vez. Sem dúvida, Mantra é uma obra prima da música para piano. Um dueto místico incrivelmente inventivo e complexo inteligentemente elaborado, um portal para novos mundos sonoros e estéticos.


KLAVIERSTÜCK X (Peça para Piano no 10)

São impressionantes 22 minutos de uma poderosa, vigorosa, criativa e virtuosa peça para piano solo. Klavierstück X é dominada pela utilização de clusters, que ocorrem numa variedade de tamanhos, bem como em glissandos, os quais são os aspectos mais importantes dessa obra de sabor aural único. Para a performance dos clusters recomenda-se que o executante use luvas para proteção. Stockhausen media a peça equilibrando-a entre momentos de relativa ordem e desordem. Com a ajuda de escalas dispostas em relacionamento de desordem e ordem, Stockhausen cria figuras fazendo uso de séries com diferentes graus de ordem. Ele explica que um alto nível de ordem são caracterizados por maior clareza (ausência de casualidade), baixos níveis por maior grau de casualidade equilibrando diferenças (aumentando a permutabilidade, dimi-

nuindo clareza). Maior ordem é amarrado à menor densidade e maior isolamento dos eventos. Ao longo da peça, há um

processo de mediação entre desordem e ordem. De um estado inicial de grande desordem, emerge um crescente número de figuras concentradas. Por fim, as figuras tornam-se unificadas numa mais alta supra ordenada Gestalt (forma). Alguns analistas também sugerem que Klavierstuck X pode ser vista como uma “forma Sonata”. A “exposição” seria o início da peça seguidos por um “tema de clusters” a peça segue com “ecos” do “tema principal” dos clusters até finalizar com uma “cadência” de um acorde de sete notas. O “desenvolvimento” segue e consiste de vários ciclos de prelúdios, grupos de clusters e grupos de ecos. A “recapitulação” é finalmente alcançada por um trêmulo e a obra termina com uma “coda”, a qual lentamente expande-se Revista Keyboard Brasil / 95


verticalmente na altura intervalar. Essa é uma analise alternativa para entender uma obra com tamanha

complexidade, profundidade e beleza. Um outro aspecto de Klavierstuck X é a aura espontânea e solta que a obra respira parecendo ser uma improvisação livre. Altamente recomendo esses poderosas obras para piano do mestre

alemão que apontou na sua obra, a flexa para o futuro. Um caminho que ainda há de ser explorado e compreendido por muitos. Gravações recomendadas: K. Stockhausen – Mantra (Pestova/Meyer Piano Duo – Naxos). K. Stockhausen – Zyklus / Klavierstück X (Cristoph Castel, Max Neuhaus, Frederic Rzewski – Wergo Studionreihe).

Sergio Ferraz é violinista, tecladista e compositor. Possui seis discos lançados até o momento. Também se dedica a composição de músicas Eletroacústica, Concreta e peças para orquestra, além de ser colunista da Revista Keyboard Brasil.

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A vista do meu ponto

MÚSICA! MÚSICA! MÚSICA! 98 / Revista Keyboard Brasil


“MÚSICA É REVELAÇÃO”. ESTA FRASE FOI DITA PELO FANTÁSTICO E INCONTESTÁVEL BEETHOVEN. PORÉM, COMPLEMENTEI COM “ACIMA DE QUALQUER FILOSOFIA OU CIÊNCIA”. PARECE UMA COISA SIMPLES. ENTRETANTO, NESTE CONTEXTO, NUMA ÚNICA PALAVRA, ESTÁ INSERIDA UMA SABEDORIA UNIVERSAL: REVELAÇÃO. ENTENDA O QUE EU QUERO DIZER LENDO A SEGUIR! * Por Luiz Carlos Rigo Uhlik

Revista Keyboard Brasil / 99


Q

uando você toca um instrumento, você se revela. É como o ato de escrever. Os traços que você

determina quando escreve indicam a sua personalidade. É fácil de visualizar a escrita de quem está tenso, de quem está tranquilo, de quem tem muito para ensinar, de quem tem muito a aprender. Com a música é a mesma coisa: revelação da alma, revelação do espírito, revelação da personalidade da pessoa. Isto é fantástico! Entretanto, todos os

caminhos que levam ao conhecimento musical são confusos, não é verdade? Parece uma coisa que vai muito além da nossa compreensão. Muitas pessoas dizem por aí: - Ele tem ouvido, toca como ninguém! - Não tenho vocação para a música! - Não consigo tocar uma nota! - Acho que música não é para mim! - Só pode ser coisa de Deus... - Já tentei e não cheguei a lugar algum! Na verdade, o aprendizado musical, exatamente como está enunciado por aí, envolve muita teoria, muito conhecimento que, somado, na maioria das vezes, não causa efeito algum; não faz a pessoa se revelar. Conheço uma quantidade imensa de músicos, aliás, a grande maioria, que toca música muito bem mas nem sabe o que realmente está fazendo. Nem eu sei explicar o que acontece com estas pessoas. São focadas no aprendizado da leitura musical, desenvolveram uma habilidade incrível entre leitura, memorização e 'tocabilidade', que 100 / Revista Keyboard Brasil

você nem percebe que de música, no verdadeiro sentido da palavra, no contexto da revelação, não tem nada. É só um processo repetitivo. A pessoa aprende a ler uma partitura, repete esta partitura infinitas vezes e pronto. A música está feita. Mas é um processo repetitivo. Só isso! E a revelação? Onde está? Infelizmente, apesar de estarmos vivendo no século XXI, ano de 2016, com os recursos impressionantes à nossa disposição, as academias, escolas, conservatórios, professores e afins não tratam a música ou o conhecimento musical, como realmente deveria ser. Percebo, ao conversar com os amigos, que a grande maioria das pessoas que se interessa por música se sentem frustradas por não terem tido a oportunidade de conhecê-la na sua essência. Mais uma vez: Impressionante! Como

alguém consegue adentrar o mundo da música sem se permitir conhecê-la? Música é Revelação! Através da música, como através da escrita, você determina os traços da sua personalidade. Isso é fantástico! Por quê? Através desta revelação tudo pode acontecer. Quem consegue se revelar através da música não precisa de nenhum tipo de subterfúgio para viver melhor. É uma questão de qualidade de vida. Terapias? Tratamentos? Exercícios para aliviar o stress? Que nada! Música, música, música! Esta

é a real solução. Se existe uma linguagem que é entendida por Deus, com certeza ela se


chama Música. Portanto, nem as mais profundas orações, tampouco os mais complexos e perspicazes mantras, atingem o âmago da sabedoria universal, do que através da música. Deveria ser obrigatório. Sim! Assim como aprendemos a falar, deveríamos aprender a tocar, pelo menos, um instrumento. Aliás, quem conhece música pela música, toca qualquer instrumento. É uma questão, somente de coordenação. Quem “realmente” toca piano, por exemplo, aprende com extrema facilidade a tocar trompete. As notas são as mesmas. É exatamente isso o que acontece na Química, por exemplo. A Tabela Periódica dos Elementos Químicos é exatamente igual aqui, na Europa, nos Estados Unidos, em Marte, em Saturno, na Galáxia de Andrômeda. A Química é igual! É a mesma coisa! Com a música acontece o mesmo. Não me surpreendo quando vejo pessoas que tocam vários instrumentos. O conhecimento é igual para todos. A questão é a sonoridade, o “feeling”, a identidade com o instrumento, a interpretação e, principalmente, a Revelação. Conheço bateristas, contrabai-

xistas que são exímios arranjadores. Incrível, não? Conhecem profundamente harmonia, melodia e ritmo como se tivessem estudado instrumentos que incorporam estes três elementos num único, como é o caso do piano. E olha que o trompete toca somente “melodias”, contra-baixo somente a linha base da harmonia, bateria somente o ritmo... Você quer realmente aprender música? Eu tenho a fórmula. E ela é extremamente simples, fácil e não requer nenhum tipo de esforço. Só música! Onde se deve trilhar o caminho do conhecimento musical? Ouvir, observar onde está a melodia da música, a harmonia, o ritmo, repetir as partes em separado várias vezes, tocar o tema em vários tons. Música relaxa! Música faz bem! Música promove o interrelacionamento com as pessoas! Música atrai pessoas! Música impressiona! Música é Revelação! Se você aliar alguns dos elementos citados acima com pequenos períodos de contato com a música, diariamente, com certeza a sua destreza, o seu entendimento, a sua Revelação se fará presente. Revele-se!

Não era isso que você estava procurando? Avante!

*Amante da música desde o dia da sua concepção, no ano de 1961, Luiz Carlos Rigo Uhlik é especialista de produtos e Consultor em Trade Marketing da Yamaha do Brasil.

Revista Keyboard Brasil / 101


Opinião O sucesso dos Beatles era tamanho que foi criado um termo denominado ‘beatlemania’ para descrever o intenso frenesi de seus fãs, demonstrado principalmente por garotas adolescentes, nos locais em que a banda se apresentava durante seus anos iniciais de sucesso. O termo adquiriu um significado mais amplo, referindo-se ao forte interesse mundial pela banda.

Antes de pensar no

sucesso, ame a

Música!

102 / Revista Keyboard Brasil


DESEJAR O SUCESSO NÃO É O PROBLEMA. PRINCIPALMENTE QUANDO TRABALHAMOS NO QUE NOS DÁ PRAZER. MAS A DEDICAÇÃO EXCLUSIVA PELO SUCESSO A QUALQUER CUSTO JÁ RENDEU EXEMPLOS DESASTROSOS NA HISTÓRIA DA MÚSICA. VAMOS REFLETIR UM POUCO? LEIA O TEXTO! * Por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa

N

estes 14 anos editando minha revista Ritmo Melodia fiz contato com vários músicos; os

que entrevistei ou não e percebi que muitos músicos amam mais o sucesso do que a própria música: os que já chegaram ao sucesso e aqueles que ainda nem começaram subir a montanha. Muitos não dão importância à arte musical. Não se preocupam em ter uma formação musical, seja teórica, histórica, estética ou filosófica. Acreditam que nasceram com o DOM musical e isso já basta. Estudar para quê? Isso é coisa para os músicos eruditos; que vivem nas cavernas e labirintos dos sons complexos e que não sonham com a fama nem com suas músicas tocando nas FMs, muito menos gostariam de aparecer nos programas de TV. Para alguns que fazem música popular, o importante é ser ídolo. Querer ter êxito na profissão é legítimo e ganhar o sustento e ser reconhecido pelos frutos do próprio trabalho é digno. Desejar o

sucesso não é o problema. Principalmente quando trabalhamos no que nos dá prazer. Mas a dedicação exclusiva pelo sucesso a qualquer custo já deu exemplos desastrosos

na história da música; tragédias, problemas com a polícia, com a justiça e tratamento psiquiátrico. O deslumbramento quando vem antes de uma obra musical consistente é o grande “Calcanhar de Aquiles” do músico. Na história da música erudita também existiram e existem os egocêntricos, megalomaníacos e pescadores da fama. Mas estes músicos, de alguma forma, amam a arte musical, seja por vocação ou por dedicação exaustivas aos estudos. Da mesma forma que existem músicos populares que se dedicam aos estudos da música e do seu instrumento musical. Mas, a maioria que não lê biografias de músicos ou livros sobre a história da música; repetem os erros do passado, ao invés de corrigir-los. E, quem não conhece o passado não evolui no futuro. O sucesso midiático espontâneo é uma ilusão e, para atingir este sucesso a qualidade da obra musical é o que menos importa. No passado, o músico recebia cachê para se apresentar em programa, de auditório, tanto na na Rádio quanto na TV. Hoje, quem quiser ter a sua música na mídia (Rádio e TV) paga um jabá bem caro. Alguns músicos ingênuos sonham Revista Keyboard Brasil / 103


com a sorte de ouvir suas músicas tocando gratuitamente nas rádios. Alguns músicos vão pagar “mico” em programas dominicais mostrando a sua arte. Na internet ainda existem espaços que não cobram ao músico para divulgar a sua obra, por enquanto. Em breve, acredito que adotarão a metodologia mercadológica das Rádios e TVs. Quem não faz música como arte, mas só como entretenimento, ama mais o sucesso que a arte musical. O músico que ama a música e faz música como uma expressão artística já atingiu o sucesso por deixar a sua obra musical para os contemporâneos e para futuras gerações. O êxito profissional do músico é conquistado degrau por degrau como em qualquer profissão. Ter uma obra importante e atemporal é o grande desafio. O músico é um profissional liberal, autônomo e empreendedor. Responsável pelo planejamento da gravação das suas músicas, a prensagem do seu disco (CD), a distribuição online e física do seu CD. E, principalmente, por manter o contato direto com seus ouvintes. Recebe elogios, críticas por e-mail, redes sociais e outros aplicativos de bate papo em tempo real. É preciso descer do trono intocável de ser “O Artista”. O músico que no passado fazia sucesso por sua áurea misteriosa e divina já não tem mais espaço no mundo cibernético. Seja

músico sem deixar de ser humano. Seja simples e não simplório. Seja mais músico do que artista. *Antonio Carlos Da Fonseca Barbosa é jornalista, músico, letrista e poeta paraibano criador da revista online Ritmo Melodia com o intuito de divulgar a música popular, regional, instrumental e erudita, além de músicos - brasileiros ou não. 104 / Revista Keyboard Brasil




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