Hoje Macau 10 JAN 2016 #3730

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DIRECTOR CARLOS MORAIS JOSÉ

MOP$10

TERÇA-FEIRA 10 DE JANEIRO DE 2017 • ANO XVI • Nº 3730 PUB

AGÊNCIA COMERCIAL PICO • 28721006

hojemacau

CASO HO CHIO MENG

A dança dos milhões ÚLTIMA

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VIOLÊNCIA DOMÉSTICA IAS PONDERA REVER LEI SEMESTRALMENTE

SINTO-ME ´ FRAGIL

O caso de um agressor reincidente veio trazer a lume algumas fragilidades que poderão existir no diploma da violência doméstica. Perante a situação, a lei que entrou em vigor em Outu-

bro passado e que estaria para ser revista de três em três anos, poderá ser alterada muito em breve. O IAS admite que a frequência de revisão semestral pode vir a ser uma realidade.

CORRUPÇÃO | CHINA

A LUTA CONTINUA GRANDE PLANO

5

SALÁRIOS | JOGO

SUBIR

POR CENTO ÚLTIMA

Tempo no tempo

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PAULO JOSÉ MIRANDA

PÁGINA 7

LIVRO

Reviver a ópera EVENTOS


2 GRANDE PLANO

A Comissão Central para a Inspecção da Disciplina esteve reunida e chegou à conclusão de que é preciso continuar o combate à corrupção, com novos mecanismos de fiscalização e mais intensidade. A luta vai fazer-se também dentro da própria estrutura e o objectivo é chegar ao Outono com a casa mais limpa

CHINA CAMPANHA CONTRA A CORRUPÇÃO

IR AO˜ FUNDO E NAO VOLTAR N

ÃO, ainda não chega. O organismo que luta contra a corrupção na China promete reforçar a acção durante este ano, para cortar pela raiz um mal de que sofre o Partido Comunista Chinês (PCC). A Comissão Central para a Inspecção da Disciplina (CCIC) pretende assegurar “um ambiente político limpo” nos preparativos para o 19.o Congresso Nacional do Partido Comunista Chinês (PCC), uma reunião de extrema importância que acontece este ano. Vários membros do Comité Permanente do Politburo atingem a idade máxima este ano, pelo que o encontro é visto como sendo decisivo, uma vez que vai servir para escolher os futuros grandes políticos do país, com Xi Jinping a começar a preparar a sucessão. Para o académico da Universidade de Macau Wang Jianwei, não é à toa que surge este anúncio de reforço da pressão na campanha anticorrupção no PCC. A causa é precisamente a reunião da estrutura partidária agendada para o Outono. “A motivação será atingir objectivos decisivos antes do congresso, de modo a que a direcção do Partido possa mostrar, perante o congresso, que a batalha contra a corrupção é algo a levar a sério”, observa o professor ao HM.

TODOS COM XI JINPING

A

Comissão Central para a Inspecção da Disciplina aproveitou o plenário para fazer um apelo: é imperioso que haja união em torno de Xi Jinping, para que se mantenha a “solidariedade e unidade do Partido”. Em comunicado, reforça-se uma das grandes ideias deixadas no Sexto Plenário do PCC, realizado no último trimestre de 2016: a autoridade do Comité Central deve estar sustentada em Xi Jinping. É a única forma de “desenvolver o socialismo de características chinesas”. “Para governar com rigor o PCC, é necessário aumentar a disciplina na vida política intrapartidária e reforçar a supervisão” dentro da estrutura, indica o documento.

O novo sistema de supervisão vai absorver as funções das autoridades que neste momento desempenham a tarefa, bem como os departamentos que fazem o tratamento dos subornos

A Comissão Central para a Inspecção da Disciplina esteve reunida três dias, um plenário que terminou no passado domingo com um comunicado de que a Agência Xinhua deu conta. No documento, defende-se a ideia de aumentar a supervisão dentro do PCC, bem como tornar mais rígidos os procedimentos para a selecção e escolha de altos funcionários, de modo a garantir que o Governo Central e as estruturas locais são constituídas por pessoas que não alinham em esquemas de corrupção. “A confiança não pode substituir o trabalho de supervisão”, indica o comunicado da comissão

de disciplina, acrescentando que as várias agências responsáveis pela matéria devem ser também elas alvo de “autodisciplina” com outros métodos de fiscalização, incluindo inspecções feitas pelo Partido Comunista Chinês e pela sociedade. O Presidente chinês e secretário-geral do PCC, Xi Jinping, falou durante o plenário da CCIC, que contou ainda com a presença do primeiro-ministro Li Keqiang e de figuras de relevo da política nacional como Zhang Dejiang, Yu Zhengsheng, Liu Yunshan, Wang Qishan e Zhang Gaoli. A reunião serviu para analisar e aprovar regras de trabalho para os órgãos responsáveis pela disciplina. As normas vêm clarificar procedimentos sobre o modo como os casos devem ser geridos, nomeadamente no que toca à recolha e verificação de factos, à acusação, à inquirição, e ao destino do dinheiro e bens materiais envolvidos nos casos.

UM SUPER-ÓRGÃO E UMA SUPER-LEI

A Comissão Central para a Inspecção da Disciplina anunciou ainda que vai criar uma comissão nacional de supervisão e contribuir para que haja uma lei de supervisão nacional, como parte dos esforços para reforçar o sistema estatal. Há três locais onde já há um sistema de supervisão a funcionar de forma experimental: no município de Pequim, e nas províncias de Shanxi e Zhejiang. Este projecto-piloto vai permitir avaliar a criação de comissões locais de supervisão a três níveis – nas províncias, nos municípios e nos condados –, que deverão ser articuladas num sistema integrado que será “unificado, imperativo e eficiente”.

O novo sistema de supervisão vai absorver as funções das autoridades que neste momento desempenham a tarefa – as agências de prevenção da corrupção –, bem como os departamentos que fazem o tratamento dos subornos e outro tipo de crimes relacionados com a corrupção. Citado pela Xinhua, Zhuang Deshui, um especialista da Universidade de Pequim, defende que o novo sistema nacional de supervisão será crucial para o rumo da luta contra a corrupção, sendo que se espera a divulgação de “mais medidas substanciais”.

FELICIDADE COM A LUTA

Apesar do anúncio de novas medidas e de uma estrutura diferente de combate ao fenómeno, nas declarações mais recentes, proferidas na passada sexta-feira, Xi Jinping considerou que “a propagação da corrupção foi efectivamente controlada e a batalha chegou ao ritmo desejado”. Mas o líder político do país continua a apelar a um governação rigorosa do PCC, feita de forma “sistemática, criativa e efectiva”. “O objectivo de assegurar que os funcionários não se atrevem a ser corruptos foi basicamente alcançado”, declarou o secretário-geral do PCC, que encontra uma “nova atmosfera a emergir da vida política partidária”. A agência oficial de notícias dá conta de um estudo da Escola do Partido do Comité Central do PCC que indica que quase 93 por cento da população está satisfeita com as campanhas anticorrupção levadas a cabo no ano passado. Em 2017, os esforços deverão ser no sentido de consolidar o que já foi feito, indica o comunicado da CCIC, reiterando que a corrupção praticada ao nível hierárquico mais


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do líder de Pequim tem, entre os objectivos principais, a necessidade de afastamento de opositores políticos e de pessoas incómodas ao sistema.

“Muitas pessoas interrogam-se quando será o fim desta campanha, muitos previram que, como no passado, iria atenuar-se, mas a liderança do PCC está a tentar garantir que a campanha anticorrupção é sempre uma prioridade.” WANG JIANWEI PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE MACAU

baixo também deve ser tratada com seriedade. “Os casos típicos devem ser expostos e algumas confissões de funcionários corruptos devem ser tornadas públicas, para que sirva de aviso para outros”, entende a comissão. “A liderança do Partido Comunista Chinês será enfraquecida se se isolar das pessoas. A maior conquista política do PCC advém da confiança cada vez maior do povo”, vinca-se no comunicado. Wang Yukai, professor da Academia Chinesa da Governança, avisa que a população está sobretudo preocupada com a corrupção ao nível mais baixo, porque são os funcionários que têm contacto directo com os cidadãos que mais poderão prejudicar os seus interesses. Vai daí, é importante aumentar a fiscalização. O académico aponta que, só entre Janeiro e Dezembro do ano passado, foram punidos por

má conduta e corrupção 16.487 funcionários que trabalhavam nos programas relacionados com o combate à pobreza. No comunicado, destaca-se igualmente a necessidade de assegurar uma selecção de líderes “limpos e capazes” para as comissões de inspecção da disciplina a todos os níveis.

“O objectivo de assegurar que os funcionários não se atrevem a ser corruptos foi basicamente alcançado.” XI JINPING SECRETÁRIO-GERAL DO PCC

Gao Bo, vice-presidente da equipa de disciplina da Academia das Ciências Sociais Chinesa, considera que o trabalho feito até agora consistiu em afastar funcionários corruptos, pelo que, daqui para a frente, a preocupação deverá ser encontrar as pessoas certas, com competência e elevados padrões morais. De acordo com as contas do China Daily, mais de 7900 funcionários ligados ao combate à corrupção foram punidos desde 2012. Deste total, 17 foram investigados por terem recebido subornos.

PRIORIDADE CONTÍNUA

Para Wang Jianwei, professor da Universidade de Macau, as notícias que chegam agora vêm confirmar que “não há sinal que mostre redução, ou enfraquecimento, da campanha” de luta contra a corrupção iniciada logo após Xi Jinping ter chegado ao poder, no final de 2012.

“Muitas pessoas interrogam-se quando será o fim desta campanha, muitos previram que, como no passado, iria atenuar-se e ser substituída por outras prioridades, mas acho que a liderança do partido está a tentar garantir que a campanha anticorrupção é sempre uma prioridade”, nota. O analista pensa ainda que o Partido Comunista Chinês deverá ter de “arranjar formas mais estruturantes de lutar e prevenir a corrupção porque, apesar da campanha severa, ainda se apanham oficiais corruptos, alguns ainda estavam a cometer crimes não obstante a pressão alta exercida pelo Estado”. Todo o discurso da Comissão Central para a Inspecção da Disciplina assenta na ideia de que, no centro do PCC e da China, está Xi Jinping. Há vários analistas que não têm qualquer problema em afirmar que a grande empreitada

Wang Jianwei considera que a teoria da caça às bruxas tem sobretudo que ver com uma abordagem ocidental à questão. “É da sabedoria tradicional da imprensa ocidental que a campanha anticorrupção é sobre a luta pelo poder, dizendo que o Xi Jinping está a tentar consolidar o seu poder antes do congresso do Partido”, entende. “Não estou certo sobre esta teoria. Talvez haja alguns incidentes em que os oficiais que foram apanhados em casos de corrupção tenham visões políticas diferentes acerca do rumo que a China deve levar, existem algumas diferenças de opinião, mas mesmo que não se seja corrupto e se tenham opiniões diferentes, é difícil para o Estado justificar a purga desses oficiais”, diz. “É difícil estabelecer uma ligação e dizer que isto serve só para a luta de poder. Não vejo um padrão claro para concluir que os oficiais detidos pertencem a uma facção do PCC e é por isso que estão a ser eliminados, porque são de diversas proveniências”, continua Wang Jianwei, recordando que a campanha contra a corrupção tem provocado também baixas junto das forças armadas. O politólogo conclui dizendo que “a campanha anticorrupção é mais ampla do que a luta pelo poder, é mais sobre a reputação, a imagem, sobre o futuro do PCC no global, e não só sobre uma facção do Partido”. Isabel Castro (com João Luz) info@hojemacau.com.mo


4 POLÍTICA

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Recusa de entrada POLÍCIA NÃO REVELA NÚMEROS, NEM RAZÕES

Os segredos dos deuses As autoridades de Macau recusam-se a revelar o número de pessoas que proibiram de entrar no território. Também não dizem por que o fizeram ou a procedência de quem bateu com o nariz na porta. O argumento? Essas informações são confidenciais

O

S dados estatísticos de ‘recusas de entrada’ são classificados como dados e informações ‘reservados’, pelo que não há lugar para a sua divulgação”, afirmou a Polícia de Segurança Pública (PSP) em resposta escrita enviada à Agência Lusa. Contudo, nem sempre foi assim. Pelo menos durante o mandato do anterior secretário para a Segurança – que terminou em Dezembro de 2014 –, a PSP chegou a divulgar dados sobre as pessoas proibidas de entrar em Macau a pedido dos jornalistas. O impedimento de entrada em Macau acontece com alguma regularidade, com a grande maioria dos casos a serem tornados públicos pelos próprios visados, muitos dos quais são políticos ou activistas de Hong Kong. A PSP não tem por hábito apresentar motivos concretos, invocando, com frequência, razões de segurança. Na mais recente resposta à Lusa, a PSP reitera que “cumpre a inspecção e o controlo de entradas e saídas” da RAEM, em “estrita conformidade” com a lei e “rigorosamente conforme as disposições legais e de acordo como os procedimentos estabelecidos, para examinar as condições de entrada de todas as pessoas e assim decidir autorizar ou recusar a entrada de visitantes”. Os mais recentes casos de interdição de entrada – pelo menos tornados públicos – ocorreram no último dia de 2016. Dois antigos deputados pró-democracia de Hong Kong, que viajaram separadamente, viram-lhes ser negada entrada sob o argumento de que “constituíam uma ameaça à segurança e estabilidade internas” de Macau, segundo a imprensa da antiga colónia britânica. Em Outubro, aquando da visita do primeiro-ministro da China, Li Keqiang, foram proibidos de passar a fronteira pelo menos dez residentes de Hong

Kong, incluindo activistas, mas também um deputado e um cineasta.

HISTÓRIA COM BARBAS

Em 2015, o caso mais notório foi o da deputada e presidente do Partido Democrático de Hong Kong, também impedida de passar a fronteira por motivos de segurança interna. Em declarações à Lusa, Emily Lau mostrou-se então “perplexa” até porque a visita era de lazer e não havia figuras importantes da China a visitar Macau, nem protestos a acontecer.

No final de 2014, um episódio inédito envolvendo um bebé de um ano levou mesmo o chefe do Executivo, Chui Sai On, a pedir desculpa. A criança figurava num grupo de 14 activistas pró-democracia e quatro jornalistas de Hong Kong proibido de entrar em Macau que, por aqueles dias, recebia a visita do Presidente da China, Xi Jinping. Aparentemente, a criança tinha o mesmo nome de uma das pessoas inscritas na “lista negra” de Macau. Após anos a negar a sua existência, as autoridades de se-

Nem sempre foi assim. Pelo menos durante o mandato do anterior secretário, a PSP chegou a divulgar dados sobre as pessoas proibidas de entrar em Macau

gurança defendem a legalidade dessa “lista negra” que, argumentam, é “elaborada tendo em consideração que essas pessoas podem constituir uma ameaça à segurança em Macau”. A proibição de entrada sobretudo de políticos de Hong Kong tem sido uma preocupação levantada pela União Europeia e Estados Unidos. Em Outubro, a Associação Novo Macau adiantou estar a trabalhar na criação de uma base de dados sobre violações dos direitos humanos, dando conta de que informações específicas sobre as proibições de entrada seriam compiladas num ficheiro especial. Os pró-democratas pretendem colocar a base de dados à disposição de organismos da ONU, quando for a altura de rever a ratificação de instrumentos relacionados com a protecção de direitos humanos em Macau.

É melhor estar de fora

Analista duvida de sucesso de candidatura da voz do Pearl Horizon

K

OU Meng Pok, presidente da Associação dos Proprietários do Pearl Horizon, confirmou esta semana que pretende ser candidato à Assembleia Legislativa (AL). Segundo os jornais Ponto Final e Tribuna de Macau, foi convocada uma conferência de imprensa onde foi referido que só com uma candidatura a um lugar de deputado é possível lutar pela revisão da Lei de Terras e conclusão do empreendimento habitacional, localizado na Areia Preta. Ao HM, Larry So, sociólogo e politólogo, considera que será melhor a Kou Meng Pok lutar pela sua causa fora do hemiciclo. “Mesmo que seja eleito, não será assim tão fácil ver uma proposta de alteração aprovada. No lugar dele preferia fazer pressão de fora, em vez de fazer de dentro. De fora pode atrair as atenções ao nível internacional ou até da China. Mas dentro da AL será facilmente absorvido por toda a Administração. Não vejo que alterações venham a acontecer caso venha a concorrer, porque o hemiciclo é controlado por forças conservadoras e pró-Governo”, diz. “Todos os residentes permanentes são elegíveis para participarem nas eleições. [Kou Meng Pok] tem o direito de fazer a sua campanha e, estando na AL, tem sempre o direito a dar voz às suas preocupações. Mas para que uma proposta passe há que ter uma moção antes de avançar para um acto legislativo ou um debate, há duas barreiras a passar antes. Não será muito fácil ultrapassar isso”, considera ainda Larry So. Gabriel Tong, deputado nomeado e autor de uma proposta de clarificação da actual Lei de Terras, não quis comentar se uma eventual candidatura pode alterar o rumo dos acontecimentos. “Respeitamos todos os interessados que tenham a iniciativa de participar na vida política. Tudo o resto tem de ser o próprio candidato a avaliar”, afirma apenas. Citado pelo Ponto Final, Kou Meng Pok deixou clara a ideia de participar na vida política. “Se ninguém se prontificar a liderar a candidatura, poderei pensar no assunto. Se os restantes sócios considerarem que necessitam de mim e do meu contributo, não virarei a cara à luta. Se for eleito, prometo que farei tudo o que está ao meu alcance para resolver o diferendo.” Na cabeça do líder dos investidores do Pearl Horizon, só uma candidatura ao hemiciclo pode alterar a situação. “Se conseguirmos eleger um deputado, poderemos trabalhar para proteger a justiça e ajudar a manter certos valores universais, como o direito à propriedade privada. Em suma, estamos disponíveis para trabalhar para a população do território”, concluiu. Andreia Sofia Silva

andreia.silva@hojemacau.com.mo


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O empresário Chui Sai Cheong, irmão do Chefe do Executivo, e Vong Hin Fai, advogado, fazem parte da nova Associação de Agentes da Área Jurídica de Macau. Pretendem juntar advogados e juristas, e já reuniram com Chui Sai On

H

Á uma nova associação na área do Direito que visa juntar advogados e juristas, sejam eles do sector público ou privado. É a mais recente entidade desta área, juntando-se à Associação dos Advogados de Macau (AAM) – entidade de direito público – e a cerca de uma dezena de associações que constam do Boletim Oficial (BO). PUB

Os estatutos da Associação de Agentes da Área Jurídica de Macau foram publicados em BO em Novembro, mas os seus responsáveis, Chui Sai Cheong e Vong Hin Fai, já conseguiram um encontro com o Chefe do Executivo, Chui Sai On, realizado “há uns dias”, segundo um comunicado oficial. Paulino Comandante, ligado à direcção da AAM, também faz parte desta nova entidade associativa. Vong Hin Fai, director-geral da associação, é advogado, sendo também deputado nomeado por Chui Sai On à Assembleia Legislativa (AL). Vong Hin Fai foi também mandatário de Chui Sai On na última campanha para a eleição do Chefe do Executivo. Já Chui Sai Cheong, presidente da associação, é irmão de Chui Sai On e é também deputado à AL, eleito por via indirecta. Sendo mais conhecido por empresário do sector imobiliário, ao ser administrador da “Companhia de Investimento Predial Chui’s, Limitada”, Chui Sai Cheong tem, no entanto, um doutoramento em Direito. Citado no mesmo comunicado, Chui Sai Cheong deu algumas explicações sobre as razões de criação de uma nova associação. “A RAEM, estabelecida há 17 anos, necessita de unir os profissionais da área, incluindo

Prata da casa Dois deputados ligados a nova associação

advogados, juristas privados e de entidades públicas, criando, deste modo, uma plataforma no reforço do diálogo, do profissionalismo, bem como numa contribuição para o Governo”, pode ler-se. Chui Sai Cheong disse ainda acreditar “que o presente Governo manterá o grande volume de trabalho na revisão de leis”, sendo que a Associação dos Agentes da Área Jurídica de Macau “está preparada para apresentar opiniões”. Por sua vez, Vong Hin Fai referiu que a entidade visa “reunir os

sectores que se dedicam ao trabalho prático e ao estudo jurídico”.

DESENVOLVER O FUTURO

No encontro, o Chefe do Executivo felicitou “a criação de um órgão cívico com características jurídicas”, que poderá “apoiar e impulsionar a sociedade, no âmbito da sensibilização sobre o sistema jurídico e a sua legalidade”. Chui Sai On terá dito ainda que “os temas relacionados com a legislação e execução da lei foram sempre tópicos de interesse na

POLÍTICA

sociedade”, esperando “ver ambas as partes reforçar a cooperação, através de parcerias, com vista a promover consultas e estudos no âmbito do Direito, bem como o aperfeiçoamento do sistema jurídico local”. O Chefe do Executivo apontou ainda que deseja “testemunhar o incremento do sector jurídico e do sistema legal de Macau, para assim corresponder às necessidades da população e ao desenvolvimento da sociedade”. Sónia Chan, secretária para a Administração e Justiça, também esteve presente no encontro e falou do “trabalho que o Governo tem vindo a desenvolver gradualmente para concretizar a reforma jurídica”, esperando futuras cooperações com a associação ao nível da “concretização da Lei Básica, desenvolvimento e aperfeiçoamento do sistema jurídico e formação de pessoal jurídico de nova geração”. O HM tentou, até ao fecho desta edição, contactar Vong Hin Fai e Paulino Comandante, mas os causídicos não se mostraram disponíveis. Também não foi possível chegar à fala com Jorge Neto Valente, presidente da AAM, para um comentário sobre a nova associação. Andreia Sofia Silva

andreia.silva@hojemacau.com.mo


6 SOCIEDADE

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Economia EXPECTATIVA DOS CONSUMIDORES EM BAIXA

Uma questão de confiança A fé económica dos consumidores de Macau continua em baixa, de acordo com o inquérito à confiança realizado pela Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. No entanto, alguns números desafiam a mais elementar lógica da ciência, alerta Albano Martins

O

S consumidores de Macau continuam insatisfeitos quanto à evolução dos principais indicadores económicos que afectaram o seu quotidiano no último trimestre do ano passado. Essa é a principal conclusão do relatório que analisa os índices de confiança, publicado pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentado da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. Se olharmos para os itens analisados, percebemos que, no campo do emprego, houve um declínio significativo, mantendo-se, no entanto, a níveis acima da do nível de satisfação. Com uma pontuação entre zero e 200, o índice fixou-se no último trimestre de 2016 nos 100.28, sendo o mais elevado entre os assuntos analisados. Ainda assim, este nú-

mero representou um decréscimo de 2.2 pontos, em relação ao terceiro trimestre. Os autores do estudo justificam este número com a tendência dos consumidores de Macau para serem pessimistas acerca do mercado de trabalho. Uma justificação que não convence o economista Albano Martins, uma vez que “a economia evoluiu positivamente, os números do desemprego mantém-se estáveis, nos 1,9 por cento, dentro do pleno emprego, não se entendendo esta incongruência”. No que diz respeito à confiança quanto aos preços, o índice foi de

72.74 pontos, o que representou uma descida de 1.65 pontos, ou 2,2 por cento em relação ao terceiro semestre de 2016. Estes números são justificados com a preocupação da inflação no futuro. Mais um dado que, para Albano Martins, não tem qualquer reflexo na realidade. “Explicam com a subida do índice dos preços, claro, mas isso sobe sempre, a variável a medir aqui seria a inflação, e essa tem vindo a descer”, indica o economista. Tirando em casos esporádicos de deflação, é normal que os preços mantenham uma trajectória ascendente. De facto, a inflação em

“Estamos a somar galinhas com patos e a dividir por dois, somamos o que não é somável.” ALBANO MARTINS

Novembro último situava-se nos 2,56 por cento, um valor muito baixo, tendo em conta uma perspectiva evolutiva. Em Novembro de 2015, a inflação era de 4,71 por cento e, para se ter um contexto mais alargado, o ano de 2014 terminou com a inflação nos 6,05 por cento. Outro indicador que desceu significativamente foi o dos padrões de vida, situando-se nos 97.24 pontos, o que representa uma quebra de 1.35 pontos em relação ao trimestre anterior. O estudo justifica esta descida com a inflação, uma razão que não tem reflexo com a realidade, como vimos já.

ESTUDO DUVIDOSO

Os números mais baixos foram no sector da confiança no mercado imobiliário, com uma confiança de 54.89 pontos, ou seja, bastante insa-

tisfatório. Aqui, a descida foi de 4.39 pontos, ou 7,4 por cento em relação ao trimestre anterior. Este é um item onde Albano Martins vê alguma lógica, “embora a expectativa ainda possa ser de redução dos preços”. Porém, os indicadores apurados vão de encontro à recuperação do sector do jogo, aliado à falta de terrenos, o que pode resultar numa nova subida do mercado imobiliário. De resto, o que se retira de mais substancial do inquérito é a sua falta de validade. “Uma coisa é o consumidor ter uma percepção errada, outra é os autores do estudo, no final, justificarem os resultados de uma forma incongruente com o que, de facto, se passa na economia”, explica Albano Martins. Para o economista, não basta dizer que os inquéritos foram feitos aleatoriamente, há outros requisitos científicos a cumprir. “Estes índices deviam vir com a informação detalhada da forma como são feitos, como é composta a amostra, coisa que aparece em qualquer país civilizado, assim como as margens de erro deste tipo de extrapolação.” Sobre o índice global, depois de feitas as somas, repara-se que a mesma foi conseguida através de simples médias aritméticas dos vários componentes analisados. “Como s e a economia local fosse algo que nada tivesse que ver com o emprego, ou o consumo”, explica o economista. Para Albano Martins, este tipo de estudos não tem qualquer validade económica. “Estamos a somar galinhas com patos e a dividir por dois, somamos o que não é somável”, remata o economista. João Luz

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AMBIENTE GASOLINA SEM CHUMBO E GASÓLEO LEVE EM MACAU

Vão finalmente entrar em vigor normas que obrigarão todos os postos de abastecimento e reservatórios de combustíveis a disporem de gasolina sem chumbo e gasóleo leve. A iniciativa pretende controlar as emissões de gases dos escapes dos veículos motorizados que enchem as ruas de Macau. A medida insere-se no Plano Quinquenal de Desenvolvimento da RAEM, mais propriamente no Planeamento da Protecção Ambiental de Macau. As normas, que tinham previsto um período de transição que termina hoje, têm metas equivalentes à norma Euro V, apresentado na União Europeia em 2009. Hoje em dia, na UE vigora o Euro VI, que veio condicionar ainda mais as emissões de gases poluentes, em particular no que toca ao gasóleo.


7 hoje macau terça-feira 10.1.2017

IAS LEI DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA REVISTA SEMESTRALMENTE

O problema da reincidência

O

Instituto de Acção Social admite mexer em breve na lei da violência doméstica, que entrou em vigor em Outubro último. Um caso de um agressor que reincidiu veio gerar um novo debate, desta feita sobre lacunas no diploma O Governo pondera rever a lei da violência doméstica com uma frequência semestral. A ideia foi lançada pela presidente do Instituto de Acção Social (IAS) ao Jornal do Cidadão. Celeste Vong referiu, no entanto, que “ainda é demasiado cedo para admitir a existência de lacunas legais no diploma”. Era suposto o diploma ser revisto de três em três anos. A presidente do IAS referiu que a primeira alteração pode vir a ser realizada em Fevereiro ou Março. Em análise estarão os possíveis problemas que tenham decorrido na aplicação da legislação. A necessidade de uma revisão prematura partiu de um caso registado no passado mês de Dezembro, em que as autoridades

O

S protestos de 2014 de Macau “não surgiram do nada”, numa cidade que “nasceu da corrupção”, e foram impulsionados pelos media de Hong Kong e redes sociais, conclui um estudo publicado este mês. Entre Maio e Agosto de 2014, Macau assistiu a três frentes de protesto que levaram milhares de pessoas à rua, numa das ocasiões gerando a maior manifestação (cerca de 20 mil pessoas) desde a transferência de Administração em 1999: um movimento contra uma lei que previa regalias para titulares dos principais cargos políticos, um referendo civil sobre a eleição do chefe do Governo (considerado ilegal pelas autoridades) e múltiplos protestos dos trabalhadores do jogo. Estes “foram únicos na história da cidade” desde a

Celeste Vong considerou que ainda será cedo para confirmar a existência de fragilidades e apontou que o caso em questão será devidamente acompanhado. “É necessário mais tempo para avaliar a situação”, disse, sendo que “a lei oferece às vítimas plena protecção e prevê medidas de restrição de contacto por parte do agressor com carácter obrigatório, ao mesmo tempo que incentiva o recurso à denúncia e pedido de ajuda voluntário por parte das vítimas”.

UMA QUESTÃO GERAL

policiais detiveram o primeiro homem suspeito de um crime de violência doméstica. O arguido foi condenado, tendo ficado proibido de manter contacto com a vítima. No entanto, o agressor acabou por voltar a agredir a vítima. O episódio veio levantar a questão da existência de lacunas no diploma.

O agressor acabou por voltar a agredir a vítima. O episódio veio levantar a questão da existência de lacunas no diploma

Para Melody Lu, representante da Coligação Anti-Violência Doméstica, o caso registado pode não ser uma consequência de uma lacuna legal. “Penso que não é um problema da lei em si, mas uma situação que requer uma revisão constante das acções que são tomadas”, disse ao HM. A activista, que lutou pela passagem da violência doméstica a crime público, refere como exemplo Taiwan, onde a lei já tem cerca de 20 anos e está

Os dedos de Hong Kong Estudo detecta contribuições para maiores protestos pós-99

transferência, “em termos de escala, meios de participação e parcialmente devido à natureza das próprias exigências”, argumenta Albert Wong no estudo da Universidade de Macau “The Summer 2014 protests in Macau: their contexts and continuities”, publicado este mês na Asian Education and Development Studies.

Wong aponta para uma confluência de factores correntes e históricos numa cidade com “história de corrupção e protestos contra ela”. Macau, diz, “nasceu de corrupção”, indicando que quando os portugueses chegaram à cidade em 1553 “subornaram” um dirigente chinês para que os deixasse secar as mercadorias após uma tempestade, “e

eventualmente acabaram por se estabelecer”. O investigador refere depois as suspeitas de corrupção em torno do governador Carlos Melancia, nos anos 1990, e a condenação do secretário para os Transportes e Obras Públicas Ao Man Long, em 2008. A este contexto, Wong adiciona o falhanço da reforma política de 2012, que não resultou numa maior voz dos eleitores, e elementos como a instalação de ‘conselhos distritais’ não eleitos. Assim, “não é difícil perceber porque é que o público sentiu grande desespero e uma acção directa se tornou necessária pela altura dos protestos

em revisão praticamente todos os anos porque é descoberta alguma falha ou situação que necessita de mais atenção. “No entanto, a questão é sempre complexa”, ressalvou, e em Macau ainda mais, visto os processos relativos ao delito envolverem vários departamentos diferentes. Melody Lu recorda que, aquando da fase final do processo legislativo, a coligação que representa mostrou-se apreensiva quanto à protecção das vítimas: “Em particular nos casos em que já foi feita queixa à polícia, muitas vezes não existe uma acção imediata das autoridades, pelo que o crime acaba por se repetir”. Para a representante da coligação, uma das questões que se levantam é o facto de o agressor poder mesmo continuar a conviver com a vítima. “Seria suposto que a polícia se encarregasse da protecção de potenciais vítimas que já tenham sofrido agressões, mas isso ainda não está claro no diploma”, disse, salientando que “está escrito na lei, mas ainda não é possível perceber bem como é que a polícia colabora com o IAS”. Ao HM, Juliana Devoy, directora do Centro do Bom Pastor, afirmou desconhecer a intenção do Governo, pelo que não quis fazer qualquer comentário.

contra a lei das garantias”, uma proposta apresentada pelo Governo a três meses das eleições para o Chefe do Executivo e que previa elevadas compensações para os titulares dos principais cargos políticos após o fim das funções políticas.

O QUE O POVO DIZ

SOCIEDADE

Com as “sementes lançadas”, as redes sociais vieram dar um contributo essencial. Além de convocarem os protestos, plataformas como o Facebook foram usadas para pressionar os deputados a rejeitar a proposta de lei. Segundo Wong, alguns tiveram mesmo de encerrar as suas contas perante o influxo de mensagens. Apesar de o descontentamento não vir expresso nos jornais chineses de Macau, o assunto era debatido “em restaurantes e autocarros,

Angela Ka com Sofia Mota info@hojemacau.com.mo

tanto entre a classe média, como na baixa”. Houve ainda outro empurrão fundamental: “Foram os jornais e revistas de Hong Kong, disponíveis nos quiosques e lojas de conveniência de Macau, que disponibilizaram uma fonte imparcial de comentário aos cidadãos de Macau”. Apesar desta convergência de “precedentes e influências da actividade contemporânea acima do expectável”, o desenvolvimento social e político desde 2014 “não parece prometedor”, com a detenção temporária de alguns activistas, o afastamento de pelo menos dois académicos e a introdução de educação patriótica nas escolas, entre outros factores, remata Wong.


´ 8 Livro SHEE VA PUBLICA OBRA SOBRE A ÓPERA NO TERRITÓRIO

EVENTOS

espectáculo irlandês Riverdance assinala o 20.o aniversário com passagem pelo palco do Venetian. “Riverdance” é uma apresentação “única” de sapateado irlandês, conhecido pelo rápido movimento de pernas dos bailarinos e aparente imobilidade da parte superior do corpo. A produção foi elaborada para um intervalo de sete minutos, no Festival da Eurovisão de 1994, por Bill Whelan. A formação musical é composta por Davy Spillane, o violinista espanhol Rafael Riqueni, a búlgara multifacetada Nikola Parov, o acordeonista Máirtín O’Connor e o percussionista Noel Eccles. “Riverdance” é considerada uma das grandes produções internacionais, sublinha a organização, tendo já sido apelidado de “evergreen Broadway show”, “tesouro nacional irlandês” e “livro de dança do mundo”. Durante os últimos 20 anos, já foram apresentadas maios de 18 mil performances em cerca de 100 países. Para a digressão que integra o 20º aniversário, a equipa original – constituída pelo compositor Bill Whelan, o produtor Moya Doherty e o director John McColgan – voltou a reunir-se para assinalar o momento. Os bilhetes já estão à venda para os espectáculos que se realizam entre 24 deste mês e 5 de Fevereiro.

É o primeiro de três tomos dedicados às óperas a que a cidade assistiu. O médico Shee Va foi à procura do passado musical da cidade e passou-o a livro, com a ajuda de uma personagem que tem o tempo de vida do Festival Internacional de Música

À VENDA NA LIVRARIA PORTUGUESA URBAN SKETCHERS EM LISBOA - DESENHANDO A CIDADE • Eduardo Salavisa Cerca de duzentas pessoas de mais de vinte países encontraramse em Lisboa com o único intuito de desenharem e falarem sobre desenho. Dezoito espaços no Chiado e zonas envolventes foram objecto da observação e do registo por parte dessas pessoas, que usam regularmente o caderno como suporte para este tipo de desenho. Este desenho, essencialmente de observação foi também motivo de reflexão por desenhadores experimentados. O livro é o resultado dessa troca de experiências.

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OUCO antes de Macau se ter despedido da administração portuguesa, a “Aida” veio ao território. Onze anos antes, Ileana Cotrubas explicava, numa “Traviata” na cidade, porque é que tinha conquistado um lugar de destaque no mundo das sopranos. Há ópera em Macau há quase 30 anos – o tempo de vida do Festival Internacional de Música – e desde o mês passado que existe um livro que recupera a memória deste género musical no território. É o resultado de uma iniciativa de Shee Va, médico amante de música erudita, e trata-se apenas do primeiro de três tomos. A ideia é escrever sobre todas as óperas desde o estabelecimento do festival. “O meu gosto pela ópera vem desde criança”, explica ao HM o autor de “Ópera no Festival Internacional de Música de Macau (FIMM)”. O gastrenterologista regressou a Macau em 2012 e, desde então, tem sido um activo divulgador do género, com várias sessões na Fundação Rui Cunha, em parceria com o advogado Frederico Rato. Na sequência dos ciclos de que foi co-autor, decidiu recordar as óperas anuais de Macau – aquelas que são trazidas pelo festival. “Claro que escrever sobre óperas, não tendo formação musi-

HOJE MACAU

RIVERDANCE SAPATEADO IRLANDÊS NO VENETIAN

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A MEMORIA DOS ´

cal, é difícil mas, de qualquer modo, quis transmitir o meu gosto, como melómano que sou, pela música e pela ópera”, explica. A volta ao texto que se impunha pela falta de formação específica sobre a matéria foi dada com a construção de uma espécie de romance: há uma

personagem com a idade do festival, um homem de 30 anos, que foi à ópera pela primeira vez em 1999. Foi ver a “Aida” levado pelo pai, que lhe deixa em herança todas as memórias relacionadas com a presença da ópera no FIMM. “Fiz com que esse rapaz nascesse com

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A MAÇONARIA UNIVERSAL • Miguel Martin-Albo

Uma análise da Maçonaria ao longo dos tempos de rara imparcialidade e amplitude histórica. Fenómeno associativo singular, a Maçonaria, na sua expressão mais ancestral - as lojas operativas - surge, sobretudo durante o apogeu do estilo gótico, entre as corporações de construtores (arquitectos, canteiros e pedreiros) da Europa Medieval, mas é a partir do início do século XVIII que, com o novo modelo de lojas especulativas - cujo papel nas revoluções liberais foi fundamental -, começa a desfrutar de grande reconhecimento social e político. Este livro, escrito com rara imparcialidade e amplitude histórica, pretende abordar as práticas que essas associações de “homens livres e de bons costumes” têm vindo a desenvolver ao longo dos séculos, penetrando, tanto quanto possível, o seu significado simbólico.


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S SONS

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Existe ópera no FIMM desde a segunda edição do evento, mas as dificuldades de uma produção do género e a inexistência de uma sala de espectáculos com boas condições fizeram com que o então director, Adriano Jordão, não tivesse incentivado este tipo de espectáculo. “Depois, com o segundo director, João Pereira Bastos, que já tinha sido director do São Carlos, o género foi cultivado”, explica Shee Va. As óperas produzidas ao tempo de João Pereira Bastos eram bastante diferentes daquelas que surgiram depois da transferência de administração, conclui o autor. Antes de 1999, a produção tinham uma participação local maior, apesar dos artistas que chegavam da Europa. “As produções eram mais vividas”, refere.

“Escrever sobre óperas, não tendo formação musical, é difícil mas, de qualquer modo, quis transmitir o meu gosto pela música e pela ópera.”SHEE VA AUTOR

o Festival e o acompanhasse durante estes 30 anos.”

OS PRIMEIROS ANOS

O exercício de recuperação do passado do FIMM permitiu descobrir diferenças no modo como a ópera foi sendo apresentada ao público local. “‘O Barbeiro de Sevilha’ foi

feito na Fortaleza do Monte. Aproveitou-se o edifício antigo que, naquela altura, era a Meteorologia, acrescentou-se umas pinturas a imitar Sevilha e tocou-se a ópera ao ar livre”, conta o escritor sobre a primeira apresentação do género verdadeiramente encenada.

Depois da transferência de administração, passou-se por um período em que Macau tinha um contributo modesto na produção, uma tendência que terá terminado no ano passado. “Aprodução foi completamente local e, portanto, vive-se muito mais. Quando vem de fora não existe a mesma envolvência. Mesmo em termos de aprendizagem, é mais interessante para a formação das pessoas ter as coisas feitas localmente.” “Ópera no Festival Internacional de Música de Macau” é uma edição da Associação dos Médicos de Língua Portuguesa de Macau.

FESTIVAL DE ARTES ABERTAS INSCRIÇÕES PARA ATELIER DE DANÇA

No âmbito do Festival de Artes de Macau, que se realizará entre o final de Abril e Maio deste ano, haverá um workshop de dança com o coreógrafo japonês Hiroaki Umeda. No entanto, o workshop realizar-se já no próximo mês de Fevereiro, estando as inscrições abertas ao público interessado. O evento, organizado pelo Instituto Cultural, procura estabelecer o intercâmbio entre bailarinos locais e um artista de renome como Hiroaki Umeda. A participação é gratuita, mas tem um número de participantes limite. Se as inscrições ultrapassarem as duas dezenas, serão seleccionados os melhores bailarinos. Findo o workshop, os dançarinos locais terão oportunidade para demonstrar de imediato as valências adquiridas. Como tal, os bailarinos subirão ao palco com o próprio Hiroaki Umeda, fazendo parte do espectáculo “Programa Duplo (Double Bill), integrado no XXVIII Festival de Artes de Macau.

EVENTOS

HOJE NA CHÁVENA Paula Bicho

Naturopata e Fitoterapeuta • obichodabotica@gmail.com

Polígala NOME BOTÂNICO: POLYGALA SENEGA L. TAMBÉM SÃO USADAS OUTRAS ESPÉCIES APARENTADAS. FAMÍLIA: POLYGALACEAE. NOMES POPULARES: POLÍGALADA-VIRGÍNIA; SÉNEGA; SERPENTÁRIA-DOS-SÉNECAS.

Nativa do Leste da América do Norte, onde habita em terrenos abertos, secos e pedregosos e em bosques, a Polígala é também cultivada como planta medicinal. Trata-se de uma herbácea, que cresce a partir de um rizoma nodoso e pode atingir cerca de 40 cm de altura; apresenta folhas lanceoladas de bordo dentado e belas flores brancas ou rosadas, pequenas e agrupadas em espiga na extremidade dos caules. O nome do género botânico, Polygala, teve origem na Antiga Grécia e provém de poly, muito, e gala, leite. Nessa altura, as espécies europeias de Polygala eram usadas para aumentar a produção de leite das vacas e cabras. Por outro lado, o nome da espécie, senega, alude a uma tribo de índios norte-americanos, os Sénecas, que usavam a raiz desta planta para tratar a tosse e as mordeduras de serpentes. A Polígala foi tão apreciada pelos povos indígenas daAmérica como pelos colonos europeus.Actualmente, os investigadores já comprovaram os seus usos mais importantes. Em fitoterapia são usadas as raízes e rizomas. Composição Saponósidos triterpénicos em teor elevado (ácido poligálico, senegina), lípidos, glúcidos, poligalitol (um derivado do sorbitol), sais minerais, ácidos fenólicos (ácido salicílico), fitosteróis e traços de óleo essencial (salicilato de metilo). Sabor áspero e acre. Os saponósidos, com propriedades detergentes, tornam a água espumosa ao diminuir a sua tensão superficial. Acção terapêutica Em virtude do seu conteúdo em saponósidos, a Polígala dissolve as mucosidades, tornando-as menos viscosas e mais espumosas e abundantes, e facilita a expectoração, aliviando as dificuldades respiratórias. Além disso, desinflama e regenera as mucosas respiratórias e combate os espasmos; também estão descritos efeitos moduladores do sistema imunológico.

É muito recomendada para o catarro, tosse, tosse convulsa, bronquite, asma, gripe, pneumonia e enfisema; está igualmente indicada para as inflamações das vias respiratórias superiores, como constipação, faringite, laringite, traqueíte e rouquidão. Nas afecções febris, esta erva induz a sudação, favorecendo a eliminação das toxinas, e é depurativa; tem ainda propriedades tonificantes do organismo. Outras propriedades Popularmente, a Polígala é usada como anti-inflamatório para combater as doenças reumáticas. Tem propriedades diuréticas e pode ser benéfica em caso de retenção de líquidos e inflamação da bexiga. Como laxante é útil para os obstipados. Tem ainda efeitos benéficos para a mulher, pois estimula a menstruação quando atrasada e combate as dores associadas. Como tomar Uso interno Decocção: 1 colher de café por chávena de água fervente, 3 minutos de fervura. Tomar 3 ou 4 chávenas por dia. Nas afecções respiratórias, adoçar com mel. Precauções A Polígala está contra-indicada na úlcera gastroduodenal e colite ulcerosa. Respeitar as posologias – em doses elevadas pode ocasionar vómitos e diarreia. Como os saponósidos aumentam as secreções, esta erva, em tratamentos prolongados, em doses elevadas ou por hipersensibilidade individual, pode provocar irritação gastrintestinal. Tomar sob vigilância de um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu profissional de saúde. Observações Embora a Polygala senega seja a espécie mais utilizada, devido à maior riqueza em princípios activos, existem outras espécies do mesmo género botânico com uma composição semelhante e também utilizadas: a Polygala amara L., nativa do Norte da Europa e Ásia Ocidental; a Polygala vulgaris L. da Europa Ocidental e do Norte; a Polygala rupestris Pourr. do Sul da Europa; e, a Polygala tenuifolia Willd. da China e Japão.


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Anúncio O Pedido do Projecto de Apoio Financeiro do FDCT para à 1ª vez do ano 2017 (1)

Fins O FDCT foi estabelecido por Regulamento Administrativo nº14/2004 da RAEM, publicado no B. O. N° 19 de 10 de Maio, e está sujeito a tutela do Chefe do Executivo. O FDCT visa a concessão de apoio financeiro ao ensino, investigação e a realização de projectos no quadro dos objectivos da política das ciências e da tecnologia da RAEM.

(2)

Alvos de Patrocínio

(i) Universidades, instituições de ensino superior locais, seus institutos e centros de investigação e desenvolvimento (I&D); (ii) Laboratórios e outras entidades da RAEM vocacionados para actividades de I&D científico e tecnológico; (iii) Instituições privadas locais, sem fins lucrativos; (iv) Empresários e empresas comerciais, registadas na RAEM, com actividades de I&D; (v) Investigadores que desenvolvem actividades de I&D na RAEM. (3)

Projecto de Apoio Financeiro

(i) Que contribuam para a generalização e o aprofundamento do conhecimento científico e tecnológico; (ii) Que contribuam para elevar a produtividade e reforçar a competitividade das empresas; (iii) Que sejam inovadores no âmbito do desenvolvimento industrial; (iv) Que contribuam para fomentar uma cultura e um ambiente propícios à inovação e ao desenvolvimentodas ciências e da tecnologia; (v) Que promovam a transferência de ciências e da tecnologia, considerados prioritários para o desenvolvimento social e económico; (vi) Pedidos de patentes. (4)

Valor de Apoio Financeiro (1) Igual ou inferior quinhentos mil patacas. (MOP$500.000,00) (2) Superior a quinhentos mil patacas. (MOP$500.000,00)

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Data do Pedido Alínea (1) do número anterior Alínea (2) do número anterior

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Todo o ano A partir do dia 3 até 16 de Janeiro de 2017 (O próximo pedido será realizado no dia 2 ao 16 de Maio de 2017)

Forma do Pedido Devolvido o Boletim de Inscrição e os dados de instrução mencionados no Art° 6 do Chefe do Executivo nº 273 /2004,«Regulamento da Concessão de Apoio Financeiro», publicado no B. O. N° 47 de 22 de Nov., para o FDCT. Endereço do escritória: Alameda Dr. Carlos d’Assumpção, n° 411-417, Edf. “Dynasty Plaza” 9° andar, Macau. Para informações: tel. 28788777; website: www.fdct.gov.mo.

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Condições de Autorizações Por despacho do Chefe do Executivo nº 273 /2004, processa o «Regulamento da Concessão de Apoio Financeiro». O Presidente do C. A. do FDCT, Ma Chi Ngai 2016 / 12 / 30


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CONFIANÇA NO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE 6,7% EM 2016

A China está confiante de ter alcançado um crescimento económico de 6,7 por cento em 2016, dentro da meta determinada para o ano, disse no domingo o vice-ministro de Finanças, Zhu Guangyao. A economia da China expandiu 6,7 por cento nos três primeiros trimestres do ano passado, e Zhu afirmou estar confiante de que a taxa de crescimento alcançou o mesmo nível ou mais no quarto trimestre de 2016. As declarações de Zhu foram dadas num fórum da Universidade Tsinghua em Pequim. A China que procurava um crescimento económico entre 6,5 e 7 por cento para 2016, aumentou os gastos governamentais, viu uma subida do sector imobiliário e níveis recordes de empréstimo bancário no ano passado, o que entretanto também levou a um forte aumento da dívida. Muitos analistas acreditam que o crescimento foi mais baixo do que os dados oficiais sugerem, mas reconhecem que o boom da construção sustentou de forma significativa a economia.

CHINA

GETTYIMAGES

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Nathan Law (direita)

Hong Kong DEPUTADO PRÓ-DEMOCRACIA ATACADO NO AEROPORTO

Amargo fado de um activista Depois de ter sido confrontado com os protestos de grupos pró-Pequim em Taiwan, Nathan Law foi agora agredido no regresso a Hong Kong por manifestantes anti-independência

MCDONALD’S VENDE OPERAÇÕES NA CHINA

O gigante de fast-food McDonald’s, abalado por uma feroz concorrência, irá vender 80% das suas operações na China continental e em Hong Kong ao grupo Citic e ao fundo americano Carlyle Group, por 2,08 mil milhões de dólares, anunciaram as empresas esta segunda-feira. A transacção, que será realizada em dinheiro e em acções, dará origem a uma sociedade que administrará a franquia chinesa, controlada pelo grupo Citic com 52% dos activos, à frente do Carlyle, com 28%, e do McDonald’s, com 20%. A nova administradora estará a cargo da rede de fastfood nos próximos 20 anos, anunciaram as três empresas em comunicado conjunto. A McDonald’s já tinha anunciado no ano passado as suas intenções de vender cerca de 2.000 estabelecimentos na China, na sequência das tensões entre Pequim e Washington no Mar do Sul da China que afectaram as suas actividades.

O

mais jovem deputado de Hong Kong, Nathan Law, foi atacado por manifestantes anti-independência no aeroporto da cidade, no domingo à noite, depois de regressar de um fórum político em Taiwan. Law, de 23 anos, foi confrontado com um protesto pró-Pequim na zona das chegadas do aeroporto. O grupo gritava e atirou um líquido à cara do deputado, tentando também bater-lhe, ao mesmo tempo que a polícia tentava retirá-lo do local. O incidente aconteceu depois de Law e outros activistas pró-de-

mocracia de Hong Kong, incluindo Joshua Wong, terem sido recebidos com protestos em Taipé, ao chegarem para o fórum no sábado. O evento de dois dias tinha como objectivo ligar os movimentos democráticos de Hong Kong e Taiwan. Law faz parte de uma nova vaga de deputados que apoia a ideia de autodeterminação para Hong Kong, uma Região Administrativa Especial da China com elevado grau de autonomia.

EM ACÇÃO

Imagens televisivas do ataque mostram Law a tropeçar numas

escadas depois de lhe atirarem uma garrafa de água. Os manifestantes gritaram “tropeça e morre” e um chamou “traidor” a Law. O grupo empunhava também cartazes com as frases “Sai de Hong

Imagens televisivas do ataque mostram Law a tropeçar numas escadas depois de lhe atirarem uma garrafa de água

Kong” e “Destruir a independência de Hong Kong”. De acordo com a imprensa local duas pessoas foram detidas, informação que não foi ainda confirmada pela polícia. O partido de Law, Demosisto, informou que o jovem ficou ferido, mas não deu mais pormenores. A ideia de independência para Hong Kong – um tema em tempos tabu – tem ganhado força desde os protestos pró-democracia de 2014, que não conseguiram obter a reforma política desejada. Ao mesmo tempo, aumenta na cidade o receio de Pequim estar a aumentar o seu controlo.

PEQUIM OPÕE-SE AO TESTE BALÍSTICO DA COREIA DO NORTE

O

governo da República Popular da China disse hoje estar “profundamente preocupado” depois da Coreia do Norte ter anunciado a capacidade para testar um míssil balístico intercontinental “a qualquer momento e em qualquer local”. “A situação atual na península coreana continua

a ser complexa e sensível. Urgimos todas as partes a abster-se na escalada da tensão”, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Lu Kang, durante uma conferência de imprensa em Pequim. O porta-voz recordou que o Conselho de Segurança das Nações Unidas tomou posição “de forma

explícita” contra o desenvolvimento de mísseis balísticos por parte de Pyongyang, referindo-se às sanções adotadas em 2016 sobre o regime de Kim Jong-un. “A China vai continuar a acompanhar de perto a situação e a contribuir para manter a paz e a estabilidade na região”, acrescentou.

A República Popular da China, principal apoiante da Coreia do Norte, distanciou-se de Pyongyang nos últimos tempos por causa dos últimos testes armamentísticos mas opõe-se igualmente à presença do escudo antimíssil THAAD, instalado pelos Estados Unidos, na Coreia do Sul.


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ARTES, LETRAS E IDEIAS

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máquina lírica

Paulo José Miranda

O tempo dentro do tempo escândalo de se existir e a vida nem saber disso é do que este livro trata. Ao passearmo-nos pelas páginas damo-nos conta de ser mortos-vivos, estamos numa vida que já não é, nem nossa nem de ninguém, onde só o passado poderia ser uma possibilidade de futuro, como o diz tão bem este verso do poema 99 “O futuro é a Primavera”, ou ainda os versos do poema 20: “Tu, um vendaval / que perdeu o ânimo / que envelheceu sem festejar. / Sabes, às vezes parece-me que sabes / que ainda podias ser feliz, / que há sempre tempo dentro do tempo, / mas há tanto tempo que não andas de bicicleta (...)”. Há sempre tempo dentro do tempo, mas esse tempo dentro do tempo é sempre um tempo dorido, um tempo de memória, um tempo que mede a distância entre o nada em que vamos ficando e o tudo que já fomos. A distância entre “tenho milhões de anos / de solidão dentro de mim” (58) e “todos os sonhos em embrião / a vida no princípio e cheia de tesão” (55). Por vezes sentimos o sopro de Pessanha, em alguns dos poemas, naquela sua exigência de delapidação do verso em torno do som e da dor, como no poema 21:

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M “Aves de Incêndio” (poética edições, 2016), de Raquel Serejo Martins, há dois tons a percorrer os poemas, que se interligam: a dor que se carrega no dia a dia, tentando ligar as horas umas às outras; e a memória que nos assalta, à nossa revelia, e contra a qual não podemos nada, acabando quase sempre por trazer mais dor. Veja-se apenas como exemplos estes versos: “(...) / tudo é uma dor pungente, / tudo é nada, / e o nada / finge-se em gente” (62) ou o poema 64 “Só quero dizer que sofro tanto / que até a dor me alivia”; e como exemplos do segundo tom, leiam-se “Um amor velho e seco / como uma giesta, / folha de ervário, / corolário de todos os que o seguiram, / porque o amor quando acaba, / no âmago do coração quieto, / fica sempre amargo.” (5. Primeiro Amor) Neste livro fica-se a saber que o tempo foi. Aqui, o tempo nunca é, o tempo nunca será, o tempo sempre foi; nunca é e nem será, foi. É o mundo da memória que nos fustiga continuamente os dias, a memória dos dias bons, dos dias maduros, que caem da árvore e nos sabem bem ao comer. “E a cada Verão o amor acontecia, / sem palavras de preâmbulo, / nem palavras de adeus. / O amor acontecia (...)” (11.) Este pretérito imperfeito, “acontecia”, não acusa apenas o amor, acusa também a poeta que o escreve, o humano que se dá conta de que tudo acontecia, “eu acontecia” ou “o amor acontecia” partilham a mesma desinência imperfeita, a mesma desinência de um acontecido que já não volta, a não ser em forma de memória, para nos magoar, para nos mostrar que afinal não é só “eu” e “amor” que partilhamos a imperfeição pretérita, mas também a vida. A vida humana é um inteiro pretérito imperfeito. A vida humana, toda ela, a vida de cada um de nós, acontecia. A vida humana é “um coração que o tempo quase apagou. / Enquanto ao longe, / na melancolia do passado, / um violino gemia (...).” E como viver, se a vida está lá atrás? E como viver, se a vida ficou lá atrás, como se entrássemos no comboio e tivéssemos deixado na estação o amor da nossa vida e tivéssemos disso consciência? Como viver, se deixámos a vida de onde partimos? O amor, hoje, e adivinha-se que também assim seja a vida, é como o final do poema 17: “(...) um cardume de peixes dourados / a boiar sem vida no aquário / dos meus pensamentos, / todos teus / e nem percebes que existo.” Se eu vivo soterrado pelo passado, pela infância, pelos anos de fruta madura e farta da juventude, tenho de sentir a vida como se ela nem percebe que eu existo. Este

Corpo corroído pela saudade, uma saudade que transpira lágrimas, que se desfaz em dor, que se acumula em pó, que fermenta dia após dia, que se multiplica ao segundo, que quase abarca o mundo, que nasce e morre no quarto do fundo. A vida é triste, “ tal como uma lágrima / sentindo saudade” ( versos finais do poema 22, que parece querer continuar o 21, e que encontra eco no último verso do 35: “pois não há mal que não me venha.” Mas, e como já ficou claro, a vida não é triste pelo que é, pelo que acontece, a vida é triste porque ela revelou-se-nos como sendo um pretérito imperfeito, esse tempo dentro do tempo: acontecia, era, vinha. “O amor era o avô / a descascar uma romã / para a avó.” Esta consciência acaba por trazer sabedoria, ou pelo menos alguma, em forma de pragmatismo e versos belos, como no caso do poema 24: “Difícil é ser feliz, / quando tudo se perde por um triz. (...) e come todo o amor antes que o amor acabe.” Ou ainda a consciência de que mesmo quando a vida parece estar a ser, e não ter sido, ainda assim ela é só aparência, como viver num hotel: “Pensei, que metade do amor é isso, pensar / e que é fácil ser feliz num quarto de hotel, / a cama sempre feita, as garrafinhas no minibar / um pequeno arco-íris particular / no fim do qual quase uma esperança, / um quadradinho de chocolate em cada almofada / de penas de pato depois do foie gras, / um sossego, allegro, andante, fugaz / como se a vida pudesse ser menos voraz.” A dor que percorre este livro, que na nossa cartografia poética nos remete a António Nobre, advém de se entender a vida não apenas, como já se disse atrás, uma espécie de sermos mortos-vivos, pois a vida ficou lá atrás, mas também de a memória estar continuamente a lembrar-nos disso. O livro faz-nos ver a vida segundo o ponto de vista daquilo a que usualmente chamamos de “saudosista” – e realmente a palavra saudade aparece inúmeras vezes ao longo do livro –, com uma diferença, que parece ser substancial: a da consciência. De modo geral o saudosista sente saudades do “tempo em que tudo era bom”; aqui, neste livro, pelo contrário, há a consciência de que não era o tempo que era bom, mas a poeta é que era boa. Todos os tempos são bons, porque em todos os tempos há quem esteja a estender as asas, esteja a abrir sonhos pela primeira vez, esteja de pés bem firmes na alegria dos beijos frescos como as primeiras manhãs de Natal. Raquel Serejo Martins, pelo contrário, não sente saudades do tempo, sente saudades de si mesma, como fica bem vincado no poema 67:

Às vezes ando à minha procura como uma mãe à procura de um filho desaparecido. Esta consciência, e que muda tudo, de que não era antes que tudo era bom, éramos nós que antes éramos bons, éramos nós lá, onde nada ainda se tinha partido de importante, nem a confiança, nem a esperança, nem corações, só braços, cabeças e uma ou outra perna, faz deste livro um espécie de escarro na cara da vida. Vida essa, que também é mostrada nos seus momentos escatológicos e quotidianos, e sempre ligados à solidão da vida, à irrecuperabilidade da verdadeira vida, a que antes acontecia, como nos versos finais do poema 70: “A série da BBC. / A leitura de uma revista na latrina. / A higiene íntima da vagina. / A solidão / ou Napoleão no exílio sem Josefina.” Antes de deixarmos um poema da poeta, resta dizer que o livro, alem dos poemas de Raquel Serejo Martins, traz ainda desenhos de Ana Cristina Dias. 9. Aves de incêndio Era Verão e as tardes infinitas, duas garrafas de Sumol, um pacote de batatas fritas, e os dois na esplanada na sombra-aquário do guarda-sol. Eu um peixe, a tua boca isco no anzol. Lábios que não sabiam beijar, que aprendiam a beijar que beijavam por tudo e por nada, sofregamente, por tudo e por nada. O corpo a arder, os pés descalços, o chão em chamas, vá lá, diz que me amas. Era Verão, a estação dos incêndios, das flores na pele a queimar, dos corpos em brasa, do grão na asa, do na minha ou na tua casa. Era verão, as noites tão vivas como os dias. Nos céus luas, estrelas, foguetes a explodir em flores coloridas, sobre o som da banda a tocar no coreto. No chão o bulício de cigarras em cantatas de Bach e tu a dançar. A dançar comigo, até ao romper da aurora. Dizias sempre bela aurora, como a canção e não gostavas de dançar, mentias, fingias que eu te pisava e rias. E a dançar chegou a tarde do nosso adeus, uma tarde igual a todas as tardes sem nuvens no céu ou ameaças de chuva, apenas levemente mais fria, porque já Outono e nós aves de uma só estação, aves de incêndio.


13 hoje macau terça-feira 10.1.2017

TEMPO

MUITO

?

NUBLADO

O QUE FAZER ESTA SEMANA Diariamente EXPOSIÇÃO “VELEJAR NO SONHO” DE KWOK WOON Oficinas Navais N.º1

MIN

17

MAX

23

HUM

60-90%

EURO

8.41

BAHT

EXPOSIÇÃO “PÓ E PEDRA” DE RAFAELA SILVA E FERNANDO SIMÕES Fundação Rui Cunha (Até 15/01)

O CARTOON STEPH

EXPOSIÇÃO “33 ANOS NA RÁDIO DO LOCUTOR LEONG SONG FONG” Academia Jao Tsung-I (Até 05/02) EXPOSIÇÃO “52ª EXPOSIÇÃO DO FOTÓGRAFO DA VIDA SELVAGEM DO ANO” Centro de Ciência (Até 21/02) EXPOSIÇÃO “SOLIDÃO”, FOTOGRAFIA DE HONG VONG HOI Museu de Arte de Macau EXPOSIÇÃO “AD LIB” DE KONSTANTIN BESSMERTNY Museu de Arte de Macau (Até 05/2017) PROBLEMA 153

SOLUÇÃO DO PROBLEMA 152

UM FILME HOJE

SUDOKU

DE

C I N E M A

YUAN

1.15

MERGULHO NA VELHA CHINA

E EXPOSIÇÃO “ÁRVORES E ARBUSTOS DE MACAU” DE CATARINA FRANÇA E MAFALDA PAIVA Instituto Internacional de Macau (Até 13/01)

Cineteatro

0.22 AQUI HÁ GATO

EXPOSIÇÃO “CHANGE OF TIMES” DE ERIC FOK Galeria do IFT

EXPOSIÇÃO “ART FOR ALL , 9º ANIVERSÁRIO” Macau Art Garden (Até 22/01)

(F)UTILIDADES

Ontem à noite encontrei o pássaro no fio do costume. Chilreava numa língua que nunca tinha ouvido, naquilo que depreendi ser cantonês aviário. Tem andado desaparecido, surgindo muito amiúde, sempre com poucas palavras. Acho que se está a fartar da minha imobilidade. Mas ontem abriu o bico no sentido conversacional da expressão. Falou-me de uma China profunda, antiga, mercantil, tradicional no coração da parte velha da cidade que lhe encheu as penas de fuligem. Falou-me de cheiros que vão do terrível ao delicioso em dois bateres de asas. Nada de construções megalómanas, ou repousos para gentes de bolsos fundos, nada de Lamborghinis, ou mulheres carregadas de Gucci. Não, esta é a China dos vasos de formol com serpentes lá dentro, dos produtos sem tradução ocidental, dos pátios labirínticos de velha construção chinesa, dos tijolos escuros. Relatou-me também a imensa actividade rastejante que faz a delícia da comunidade felina. Da Rua da Felicidade, às artérias do bazar chinês, becos e travessas sujas, cheias de vida, velhos em roupa interior a jogar mahjong de porta aberta para o mundo, a desafiar todas as convenções ocidentais. Longe do brilho do Cotai, do movimento das grandes avenidas, a velha China que se esconde da Macau cosmopolita é o seu verdadeiro sangue, a sua alma. Ai, se eu fosse um gato de rua, capaz de entrar em lutas de becos por pedaços de peixe seco, se pudesse perseguir um rato até à sua toca, seria tão mais livre. Fico-me pelo meu trono dourado e pelas descrições do meu alado amigo. Pu Yi

REPÓRTER DA NOITE | DAN GILROY | 2014

Um filme que nos faz reflectir sobre o respeito pela vida humana na hora de noticiar acontecimentos e até que ponto deveríamos permitir, enquanto leitores e telespectadores, o sensacionalismo que diariamente está presente nos noticiários das televisões e nos jornais. “Repórter da Noite” conta a história de um homem sem escrúpulos que, desempregado, começa a vender imagens de incidentes a uma estação de televisão. O negócio cresce e o repórter de imagem não olha a meios para conseguir as melhores imagens e subir na vida. Andreia Sofia Silva

ALLIED SALA 1

SALA 3

Filme de: Robert Zemeckis Com: Brad Pitt, Marion Cotillard 14.30, 16.45, 19.15, 21.30

Filme de: J.A. Bayona Com: Lewis MacDougall, Felicity Jones, Sigourney Weaver 14.30, 16.30, 21.30

ALLIED [C]

SALA 2

A MONSTER CALLS [B]

A STREET CAT NAMED BOB [B]

SING [A]

Filme de: Roger Spottiswoode Com: Luke Treadaway, Joanne Froggatt 14.30, 16.30, 19.30, 21.30

FALADO EM CANTONENSE Filme de: Garth Jennings 19.30

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Propriedade Fábrica de Notícias, Lda Director Carlos Morais José Editores Isabel Castro; José C. Mendes Redacção Angela Ka; Andreia Sofia Silva; Sofia Mota Colaboradores António Cabrita; António Falcão; António Graça de Abreu; Gonçalo Lobo Pinheiro; José Drummond; José Simões Morais; Julie O’Yang; Maria João Belchior (Pequim); Michel Reis; Paulo José Miranda; Rui Cascais; Rui Filipe Torres; Sérgio Fonseca Colunistas António Conceição Júnior; André Ritchie; David Chan; Fernando Eloy; Jorge Rodrigues Simão; Leocardo; Paul Chan Wai Chi; Paula Bicho; Rui Flores; Tânia dos Santos Cartoonista Steph Grafismo Paulo Borges Ilustração Rui Rasquinho Agências Lusa; Xinhua Fotografia Hoje Macau; Lusa; GCS; Xinhua Secretária de redacção e Publicidade Madalena da Silva (publicidade@hojemacau.com.mo) Assistente de marketing Vincent Vong Impressão Tipografia Welfare Morada Calçada de Santo Agostinho, n.º 19, Centro Comercial Nam Yue, 6.º andar A, Macau Telefone 28752401 Fax 28752405 e-mail info@hojemacau.com.mo Sítio www.hojemacau.com.mo


14 OPINIÃO

hoje macau terça-feira 10.1.2017

macau visto de hong kong

muito alargado. Como é sabido, o período para estas valiosas peças estarem fora da China é limitado. Em geral esse prazo tem o limite de três meses. Neste caso o período alargado quer dizer que irá ultrapassar os três meses. A exposição destas peças em Hong Kong pode ajudar os seus cidadãos a compreender melhor a China, a sua História e a sua cultura. Também pode incentivá-los a emigrar para a China. Aparentemente não há razões para que esta SHAWN LEVY, NIGHT AT MUSEUM

N

A sexta-feira, o South China Morning Post de Hong Kong fez saber que a segunda figura do Governo da cidade, a Secretária Carrie Lam Cheng Yuet-ngor, tinha aprovado a construção de um museu no West Kowloon Cultural District. Em reunião extraordinária do Conselho Legislativo, realizada no dia anterior, alguns deputados expressaram a sua insatisfação por não terem sido consultados antes da tomada de decisão, que resultou do acordo entre o Governo de Hong Kong e o Director do Museu do Palácio de Pequim, Shan Jixiang. Perante este protesto a Secretária afirmou: “Tive uma conversa informal com o Director Shan e ele louvou a qualidade dos curadores dos Museus de Hong Kong. A seguir perguntou-me se o West Kowloon Cultural District teria espaço para construir um edifício onde se pudesse expor peças do Museu do Palácio de Pequim.” O acordo secreto só mais tarde foi efectuado. O investimento, no valor de 3,5 biliões de HK dólares, será da inteira responsabilidade do Jockey Club de Hong Kong. O Museu será construído no West Kowloon Cultural District, na zona ribeirinha do cais. Durante a reunião extraordinária do Conselho Legislativo, a Secretária Carrie avançou ainda: “Hoje em dia se os representantes do Governo não tomarem decisões, Hong Kong não se pode desenvolver.” A deputada Claudia Mo man-ching comentou: “Os habitantes de Hong Kong foram privados desta informação, ela pura e simplesmente ignorou-os.” Kwok Ka-Ki, membro do Partido Cívico, pronunciou-se desta forma: “Esta atitude demonstra na perfeição a distorção dos valores fundamentais. Os representantes do Governo não podem fazer tudo o que querem só para capitalizarem politicamente.” A resposta de Carrie foi simples: “Penso que não violei nenhum procedimento legal.” Não há dúvida que a construção de um museu em Hong Kong para exposição de relíquias culturais é, não só o melhor para a China, mas também para Hong Kong. De acordo com a informação disponibilizada pela Wikipédia, existem cerca de 1,8 milhões de relíquias culturais no Museu do Palácio de Pequim. Como tal, é impossível expô-las a todas no Palácio. Segundo notícia do jornal de Hong Kong, Wen Wei Po, publicada no passado dia 4, 900 peças pertencentes a este espólio serão deslocadas para Hong Kong, por um período de tempo

A polémica do museu acção não seja apoiada pela população. Se Macau tiver as instalações adequadas, será bom vir a ter mais um Museu. Pode ajudar o “Centro Mundial de Turismo e Lazer” a atrair mais turistas. Mas se esta iniciativa é tão positiva para Hong Kong, porque é que alguns deputados se lhe opuseram? A resposta é provavelmente bastante simples. O artigo 73(2) da Lei de Bases de Hong Kong estipula que o Conselho Legislativo está investido do

DAVID CHAN

poder de aprovar o orçamento do Governo. No entanto, como a construção do Museu vai ser custeada na totalidade pelo Jockey Club de Hong Kong, a aprovação do Conselho Legislativo é desnecessária. Mesmo que alguns deputados discordem, nestas circunstâncias, não haverá consequências. O Museu de Hong Kong pode ser construído. Contudo, o artigo 73 (5) da Lei de Bases de Hong Kong investe os deputados do poder de questionar as acções do Governo, e o artigo 73(6) garante-lhes a possibilidade de debater qualquer assunto de interesse público. Mas, como no presente caso, não existem verbas públicas envolvidas, os deputados apenas se podem ater a estes dois sub-artigos para questionarem a acção do Governo. Para além disso, a reconstrução da zona do West Kowloon Cultural District está actualmente sob consulta pública. No entender de alguns deputados essa consulta peca por ser posterior à assinatura do acordo, o que implica que já não há oposição possível. Compreende-se o mal-estar destes deputados, visto que se sentiram ignorados pelo Governo. Nesta perspectiva, a afirmação “Penso que não violei nenhum procedimento legal” é questionável.

A construção deste Museu é um bom exemplo de como uma acção positiva pode, mesmo assim, gerar bastante polémica. O facto de se ter ignorado os deputados gerou confusão e não cooperação Hong Kong é uma cidade desenvolvida. Os seus cidadãos são sensíveis a questões que envolvam conflitos de interesse e procedimentos legais. A construção deste Museu é um bom exemplo de como uma acção positiva pode, mesmo assim, gerar bastante polémica. O facto de se ter ignorado os deputados gerou confusão e não cooperação. De hoje em diante, se todas as questões foram tratadas desta maneira em Hong Kong, as acções positivas podem vir a ser uma fonte de polémica. Se a Secretária Carrie pudesse ter compreendido de antemão a sensibilidade destes deputados, e estes pudessem compreender que rejeitar a construção do Museu seria prejudicial para Hong Kong e uma ofensa ao Governo chinês, nada disto teria acontecido. E Hong Kong teria ficado em paz. Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog


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OPINIÃO

sexanálise

Ode ao traseiro

JEAN-LUC GODARD, CONTEMPT

TÂNIA DOS SANTOS

H

Á uma fascinação contemporânea pelo rabo. Talvez sempre tenha existido, mas só recentemente me apercebi que um rabo grande está na moda. Há quem aumente os seus rabos, há quem proteja os seus rabos com um seguro contra todos os riscos (estava a pensar na Jennifer Lopez especificamente, mas há quem diga que é mito urbano)! O traseiro está no centro de todas atenções, tanto masculinas como femininas. Porque é que o traseiro é especial? Porque é que é tão desejado? Há partes do corpo feminino que são mais obviamente sexuais, como as mamas ou a vulva. Mas o rabo informa-nos da perfeita razão entre a cintura e as ancas, um grande sinal de fertilidade e, por isso, é uma grande fonte de atracção pelo sexo masculino, dizem-nos os biólogos da evolução (porque os homens só vão para cama com mulheres de corpos potencialmente paridores, claro). Assim, as razões para o fascínio masculino são muito mais facilmente entendidas – evolução isto, evolução aquilo, quer dizer que consegue ter

Se este nosso saudável fascínio vale a obsessão actual ao que o rabo é sujeito, ao ponto de incentivar mulheres de todo o mundo ou a pôr implantes de silicone nas bochechas, ou a usar daquelas cuecas com umas próteses almofadadas para criar a ilusão perfeita de que as calças estão bem cheiinhas... Isso é que não muitos filhos, consegue subir escadas com genica, um rabo redondinho e musculado é sinal de saúde... E não nos podemos esquecer que um rabo com o ângulo perfeito de 45 graus consegue aguentar uma garrafa de cerveja como se fosse uma prateleira (afinal de contas para que é que serve um bom rabo?). Ou que um bom tamanho de rabo é preditor de uma mulher mais empática, com melhores qualidades sociais e maior inteligência emocional. Eu podia estar a brincar, mas não estou. É desta forma que os grandes mestres da informação sexual e cibernética andam a espalhar a sua sabedoria, a objectificar o rabo o mais que podem, e torná-lo na obsessão mais tonta da cultura pop contemporânea. Esta tendência de naturalizar a objectificação feminina mascarada em teorias simplistas da evolução humana já me chateia. Chateia-me mesmo. Nem tudo é tão dramático, claro. Um bom rabo é giro de se ver, de se tocar e

de se fazer o que nos bem apetecer (com consentimento, óbvio). Tanto para homens como para mulheres! Mas alvitrar razões para as mulheres gostarem de um bom rabo, não é tão fácil para os mentores do sexo das revistas cor-de-rosa. Se os homens gostam de rabos das mulheres pela fertilidade, não faz muito sentido que o contrário também se aplique, i.e., as mulheres gostarem dos traseiros fofinhos masculinos porque garantem produção filial. Talvez um rabo mais musculado seja capaz da palpitação incessante para o coito bem sucedido, não sei. A psicologia da evolução não tem ajudado na explicação do fenómeno. Acho que muitos estarão de acordo quando digo que o rabo é uma área de conforto, é fofo, macio, dá gosto em beijar e deixa todos os envolvidos no acto amoroso verdadeiramente felizes. O rabo é daquelas zonas do

nosso corpo que é de muito difícil acesso, e por isso é que a sua fascinação é crescente, e a tentativa de tirar proveito dos rabos dos outros faz parte da nossa auto-descoberta. Os nossos traseiros, para além de simplisticamente bonitos, são misteriosos e dignos de alguma atenção amorosa e sexual. Como dizia o James Joyce nas suas cartas de amor muito traseiro-cêntricas, quão grande é o prazer de observar umas ‘nádegas frescas e roliças’. Agora, se este nosso saudável fascínio vale a obsessão actual ao que o rabo é sujeito, ao ponto de incentivar mulheres de todo o mundo ou a pôr implantes de silicone nas bochechas, ou a usar daquelas cuecas com umas próteses almofadadas para criar a ilusão perfeita de que as calças estão bem cheiinhas... Isso é que não. Pelo menos que haja uma aceitação da diversidade de rabos que há por aí. Essas razões para a procriação não valem nada se não se gostar da pessoa, parece uma coisa demasiado óbvia de se dizer, mas vale sempre a pena reforçar. Nós não vivemos na idade da pedra. Quando quisermos assentar e constituir família, quem é que vamos escolher? A pessoa que tem os mesmos valores que nós, as mesmas ideias de como criar um filho, os mesmos planos de vida, ou escolher alguém que tem um rabo grande para garantir que se dá bem a parir um bebé?


Proposta interessante: Assembleia em mesa de mahjong Atlântido

Ho Chio Meng 9,3 MILHÕES DE PATACAS FORAM PARAR A SALA VIP

Os irmãos de apostas Em mais uma sessão do julgamento do antigo procurador da RAEM, Ho Chio Meng confirmou que transferiu 9,3 milhões de patacas para o irmão, que acabaram por ir parar a uma sala VIP

A

FIRMA não ter estado ligado ao negócio, mas a confirmação foi ontem feita no Tribunal de Última Instância (TUI). Segundo a Rádio Macau, Ho Chio Meng, ex-procurador da RAEM, afirmou ter transferido 9,3 milhões de patacas para o irmão, de nome Ho Chiu Shun, através da compra de participações na Sociedade de Promoção de Jogos Seng Ou Limitada. A transferência foi feita no início de 2015 mas, segundo o arguido, a ideia era que o dinheiro fosse investido na compra de um apartamento na zona da Praia Grande, que estava em nome do irmão desde 2006. O dinheiro terá sido investido ainda em imóveis, um parque de estacionamento e depositado em várias contas poupança em Macau e na China. De acordo com a emissora, que está a acompanhar o julgamento, Ho Chio Meng alegou não saber que aquele dinheiro seria, meses mais tarde, investido numa sala VIP. Com base na versão do Ministério Público (MP), o arguido cometeu este crime quando já tinha conhecimento da investigação levada a cabo pelo Comissariado contra a Corrupção (CCAC). Ho Chio Meng recordou perante o juiz uma conversa com o irmão, em que este lhe terá dito que o sector VIP dos casinos

DINHEIRO LAVADO?

O ex-procurador admitiu ter omitido bens da declaração de rendimentos, alegando desconhecimento da lei: “Não fiz de propósito.”

CLUBE MILITAR MÁRIO SOARES É RECORDADO AMANHÃ

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Um “grupo de amigos” de Mário Soares promove amanhã uma “sessão evocativa da figura e acção” do antigo Presidente da República Portuguesa, que morreu no sábado aos 92 anos. A homenagem ao político “por muitos considerado o ‘pai da liberdade e democracia portuguesa’” vai ter lugar no Clube Militar. “Toda a comunidade é convidada a estar presente nesta sessão que pretende homenagear um político que, enquanto Presidente da República Portuguesa, responsável pela vida política do território, muito contribuiu para a pacificação interna e para o reforço da ligação fraterna entre Portugal e a República Popular da China, que em última análise levou à criação da Região Administrativa Especial de Macau”, lê-se num anúncio publicado pela organização da iniciativa.

As cartas saíram à rua Manifestação exige aumentos e lei sindical

E

representava um negócio “com futuro”, mas disse que a decisão de investir o dinheiro no sector junket partiu exclusivamente de Ho Chiu Shun. O ex-procurador não conseguiu mostrar provas da compra do apartamento, por, segundo a sua versão, não ter tido tempo de assinar as escrituras, por já estar sob investigação. Na tese do MP, o investimento numa sala VIP faz parte de um esquema de branqueamento de capitais. Ho Chio Meng não conseguiu explicar as transferências de dinheiro feitas entre o seu irmão e os sócios de dez empresas que, durante dez anos, ficaram com os contratos atribuídos pelo MP. A acusação diz que coube ao antigo procurador a atribuição de instruções a dois sócios destas empresas, também arguidos, para abrirem contas, receberem e movimentarem dinheiro vindo de subornos pagos. Essa ideia parte de conversas telefónicas alegadamente mantidas entre Ho Chio Meng, o irmão, um cunhado e mais dois sócios de duas empresas. Ho recusou e disse ter feito “um jogo” quando leu a sua própria acusação: “adivinhar” qual era a sua voz no meio dos telefonemas. O ex-procurador reiterou a inocência, alegando que a tese do MP é apenas uma “dedução”. “Para a acusação, é impossível [descrever] factos objectivos. Não há factos que possam apresentar. Apenas dizem: ‘O fulano pediu, o fulano deu instruções’. Isto é

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uma presunção”, declarou. E insistiu: “Têm de dizer quais os factos, a data, a hora [a que foram cometidos], como dei instruções e qual foi o resultado”. Na mesma sessão de julgamento, o antigo procurador admitiu ainda ter omitido bens da sua declaração de rendimentos, alegando desconhecimento da lei. Deixou ainda uma frase: “Não fiz de propósito”. Ho Chio Meng ilibou a sua mulher, Chao Sio Fai, de ter culpas no cartório. “Fui eu quem fez as declarações. A minha mulher não teve conhecimento, nem se meteu no assunto. A responsabilidade cabe a mim.” Chao Sio Fai é também arguida, acusada de prestar falsas declarações, algo que causa “tristeza” ao antigo procurador. As declarações de rendimentos dizem respeito ao período entre 2010 e 2015. Contas na China e em Macau, 300 mil patacas num cofre de uma das casas do casal, um apartamento e um parque de estacionamento na Areia Preta serão os bens que faltam nessas declarações. Ho Chio Meng disse que comprou esta fracção para o pai.

NQUANTO o Governo estuda, o povo reclama. Enquanto o Governo promete avançar com um concurso público para estudar a implementação da lei sindical, mais uma associação ligada ao sector do jogo voltou a pedir a legislação do Artigo 27.o da Lei Básica. Cloee Chao voltou à rua com a sua Associação Nova dos Direitos e Interesses dos Trabalhadores do Jogo e com 300 croupiers. Exigem aumentos salariais na ordem dos cinco por cento às operadoras e pedem uma lei sindical, para que “nunca mais seja preciso ir à rua apresentar a mesma reivindicação”. No protesto estava Lo, de 50 anos, que disse ao HM que não vê o seu salário aumentado há dois anos, algo que não acompanha a inflação. A carta entregue na sede do Governo, dirigida ao Chefe do Executivo, refere que em 2016 apenas a Sands China ajustou os salários dos seus trabalhadores, sendo que as restantes operadoras não fazem aumentos desde 2015, tendo “prejudicado de forma disfarçada” os direitos sociais dos empregados. “No início de 2016, as empresas de jogo publicaram os juros líquidos de 12,5 mil milhões de patacas após o pagamento de impostos. Apesar de o sector ter sofrido um ajustamento profundo, os dados mostram que todas as empresas ainda obtiveram enormes lucros.” Cloee Chao alertou para o facto de os salários pagos na indústria não serem tão bons como a maioria das pessoas pensam, tendo em conta ordenados pagos a pessoal administrativo, técnicos, empregadas de limpeza, pessoal de segurança e condutores. Estes trabalhadores estarão a ser substituídos por não residentes, que ganham salários mais baixos. “Há mais de dez anos um croupier recebia 14 mil patacas, mas hoje em dia recebe 18 mil, o que está de acordo com a média salarial revelada pelas estatísticas oficiais (15 mil patacas). Onde está então o emprego com alto salário? Podem imaginar os salários que são pagos noutras posições”, lê-se na carta. Cloee Chao explicou que deseja recolher assinaturas do sector, caso os aumentos não se realizem após o Ano Novo Chinês. As reivindicações também deverão chegar às mãos dos deputados do hemiciclo. Angela Ka (revisto por A.S.S.) info@hojemacau.com.mo


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