Hoje Macau 25 NOV 2016 #3704

Page 1

DIRECTOR CARLOS MORAIS JOSÉ

LAG 2017

CORTA E COLA PÁGINA 4

OPINIÃO

SEXTA-FEIRA 25 DE NOVEMBRO DE 2016 • ANO XVI • Nº 3704

MOP$10

hojemacau

Loiça suja PAUL CHAN WAI CHI

Caladinhos ISABEL CASTRO

EPM

Palavras para quê?

h

GRANDE PLANO

Feira Industrial JOSÉ SIMÕES MORAIS

Nem pena nem paixão SOFIA MOTA

ANABELA CANAS

Estatuto estragado Queixam-se da arbitrariedade das operadoras na aplicação dos regulamentos e estão contra a proposta do Governo de revisão do Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública. Os inspectores de jogo vivem com medo e reivindicam novas regras para o papel que desempenham.

NJO KONG KIE

VIDA NO CEMITÉRIO AGÊNCIA COMERCIAL PICO • 28721006

PUB

EVENTOS

PÁGINA 6

www.hojemacau.com.mo•facebook/hojemacau•twitter/hojemacau

JOGO


2

A Livraria Portuguesa foi ontem palco de um debate sobre o futuro da Escola Portuguesa de Macau. Manuel Gouveia, líder da Lista B, uma das candidatas à associação de pais, afirma que a escola contribui hoje para a ausência da integração da comunidade portuguesa na sociedade e para a manutenção do “gueto”. A aposta no ensino do cantonense é, por isso, um dos objectivos

DEBATE EPM ACUSADA DE CONTRIBUIR PARA GUETO DA COMUNIDADE PORTUGUESA

PALAVRAS DE C T

ODOS estavam convidados, inclusivamente a Fundação da Escola Portuguesa de Macau (EPM) e a direcção da própria instituição de ensino. Pais, docentes, alunos e individualidades receberam o mote para debaterem ontem o futuro da EPM na Livraria Portuguesa, mas a verdade é que o debate acabou por ficar centrado nos membros da Lista B, uma das duas candidatas à associação de pais da EPM (APEP). Manuel Gouveia, rosto principal da lista, disse lamentar que, 17 anos após a transição de Macau para a China, a EPM continue a fomentar a “guetização” da comunidade portuguesa, ao não promover um verdadeiro ensino bilingue de português – cantonense. “Gostaria de poder começar com o cantonense”, começou por dizer. “Esta escola não é igual à escola portuguesa de Angola ou de Moçambique. É uma escola portuguesa que está no Oriente, onde o português é língua oficial, mas minoritária. Desde o início que deveria ser uma escola que permitisse a integração da comunidade portuguesa na sociedade.” “Se no tempo da Administração portuguesa não foi feita uma escola que formasse bilingues, seria desejável que após a transição isso tivesse acontecido, e que ao fim de 17 anos houvesse alunos que falassem a língua da terra. Não sei se não valeria a pena, nos primeiros três anos, introduzir o cantonense para que os nossos filhos pudessem estar bem integrados em Macau, em vez de estarem na EPM apenas para passarem para as universidades portuguesas e regressarem a Macau com o mesmo handicap que tivemos há uns anos atrás”, apontou. Para Manuel Gouveia, “a escola é muito boa para aqueles alunos que não falam português, mas para nós permite que continuemos no gueto em que vivemos.” Quanto ao mandarim, o candidato voltou a pedir uma auditoria externa aos custos e eficácia das aulas, tal como já tinha dito na entrevista que concedeu esta semana ao HM. Uma das encarregadas de educação presente no debate

TIAGO ALCÂNTARA

GRANDE PLANO

questionou mesmo qual o universo de alunos que, neste momento, é visado pela EPM. “Quem é que a escola serve? Servem os novos alunos que chegam e que acabam por gerar uma certa pressão para a escola, por necessitarem de aulas suplementares de Português, e que representam um terço das turmas?

“Há uma cultura que se instalou no tempo da Administração portuguesa que é a ideia de que não se pode confrontar o outro. O facto de haver duas listas é extraordinário.” ARNALDO GONÇALVES MODERADOR


3 hoje macau sexta-feira 25.11.2016 www.hojemacau.com.mo

CANDIDATO

É complicado. Quem é que a escola pode servir?”, apontou. Para Manuel Gouveia, a EPM pode servir alunos portugueses, chineses e estrangeiros, desde que “dê apoios, diferenciados para todos”. Arnaldo Gonçalves, académico que moderou o debate, frisou que a EPM sempre foi uma questão de fundo no seio da comunidade portuguesa. “Dezassete anos depois da transição conseguimos encontrar um equilíbrio no projecto de gestão, não termos apenas uma escola portuguesa mas sim uma escola de Macau? O principal problema é haver uma fundação da escola e haver uma direcção local. Não se percebe como actuam os trabalhadores da fundação e quase parece que é como o funcionamento das fundações em Portugal, das quais existe pouca informação. A responsabilidade curricular é de Portugal, os alunos fazem os exames portugueses, mas tem de haver uma partilha de responsabilidades”, defendeu.

LIVROS E INSTALAÇÕES

“É uma escola portuguesa que está no Oriente, onde o português é língua oficial, mas minoritária. Desde o início que deveria permitir a integração da comunidade portuguesa na sociedade.” MANUEL GOUVEIA CANDIDATO

O facto da EPM se deparar com problemas da falta de espaço foi outro dos assuntos abordados, tendo Manuel Gouveia falado da falta de modernização de instalações como a biblioteca ou os laboratórios. “Já estamos numa era tecnológica em que há livros electrónicos, mas desconheço se a escola tem alguns. Está na altura da escola se modernizar e também ao nível dos livros electrónicos. Quando cheguei em 2008 vi que a secretaria tinha uns computadores usados por designers, que talvez estariam melhores noutros departamentos. A escola tem de mostrar que está a ser bem gerida.” Um dos pais falou da ausência de responsabilização em vários aspectos, nomeadamente no fornecimento de livros. “Algumas escolas em Macau fornecem os livros, os pais pagam as propinas e não têm de se preocupar com mais nada. Nós continuamos na mesma situação, há uma confusão com o fornecimento dos livros em Portugal e isso não é culpa da EPM.

“A ESCOLA É PRIVADA MAS ISSO É ABSOLUTA FICÇÃO”

A

s eleições para a APEP decorrem na próxima terça-feira e não são conhecidos quantos pais têm a possibilidade de ir votar. Manuel Gouveia recusou que haja uma “guerra” contra a Lista A. “É para o que for. Não é uma guerra, queremos reforçar e melhorar a escola. O nosso papel aqui é quebrar o silêncio e as barreiras e dizer o que é preciso dizer.” Manuel Gouveia falou ainda sobre a auditoria externa que propôs aos custos da escola, mas sobretudo das disciplinas. “A auditoria externa é algo que será aconselhável se não houver uma demonstração de que a EPM tem

Mas a verdade é que teoricamente os livros são para cinco anos, mas na prática são dois, porque há sempre novas edições.” As críticas foram feitas também ao nível dos conteúdos. “O livro de Matemática não serve para nada, nem o de Filosofia. É um mistério total quem escolhe os livros e não temos acesso aos professores, só ao director de turma. Não sabemos onde estão os bons manuais onde os alunos podem aprender. Os pais agora é que têm a responsabilidade sobre os manuais, mas nós não somos professores. Há a ideia de que aparentemente está tudo bem, mas não está, e ninguém assume a realidade. Se mais de dez por cento dos alunos não têm bons resultados na Matemática temos de apurar responsabilidades.”

O DIREITO A TER OPINIÃO

O encontro de ontem acabou por se focar no facto de, pela primeira vez, existirem duas listas candidatas à APEP. “Há uma cultura que se instalou no tempo da Administração portuguesa que é a ideia de que não se pode confrontar o outro”, disse Arnaldo Gonçalves. “O facto de haver duas listas é uma coisa extraordinária”, acrescentou. Para o académico, esta é uma boa forma de pensar abertamente os problemas da EPM. “Quando vêm os ministros da Educação o processo é igual, os seus discursos

capacidade [de subsistir]. A comunidade portuguesa não pode admitir que a EPM, se não tiver viabilidade, acabe. Os pais podem apoiar com mais propinas, mas tem de se decidir algo. A participação dos pais tem de ser estimulada e não reprimida, como tem sido ultimamente. Se a escola é privada mas isso é uma absoluta ficção, porque tem uma fundação mas se essa fundação está dependente de fundos públicos, a escola é privada com ponto e vírgula e muitas aspas. Devem toda a informação ao público e não é o que se passa. Porque é que as contas não são apresentadas?”, lançou.

fazem as paragonas dos jornais. Tem de se perceber que a EPM é um problema imediato para o qual existem várias soluções que têm de se pôr em cima da mesa. É uma pena que a própria escola não tenha dinamizado um debate entre as duas listas. É assim que se faz nos sindicatos.” “A EPM está a ser prejudicada por quem se cala”, acrescentou Manuel Gouveia. “Se há coisa que em Macau não nos podemos queixar é da falta de meios, porque temos é falta de vontade. Não queremos continuidade, queremos progresso e inovação. Não vamos pugnar por uma manutenção, por aquilo que em Macau é muito estimado, a harmonia. Queremos uma harmonia com uma evolução. A nossa postura é de complementaridade”, rematou. Andreia Sofia Silva

andreia.silva@hojemacau.com.mo

NOTA DA EDIÇÃO

Porque defendemos a pluralidade e o equilíbrio na abordagem que fazemos dos temas tratados neste jornal, tentámos, por diversos meios, entrar em contacto com a Lista A – o outro grupo que se apresenta às eleições da próxima terça-feira. Tendo sido negada a possibilidade de uma entrevista, foi-nos prometido um comunicado que, até à hora de fecho desta edição, não tinha chegado à nossa redacção.


4 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

É um clássico da Assembleia Legislativa: vários deputados manifestaram ontem preocupações antagónicas no que respeita aos trabalhadores vindos de fora. O secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, deu a entender que não há alterações nesta matéria

LAG IMPORTAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA DIVIDE OPINIÕES

Mais do mesmo TIAGO ALCÂNTARA

POLÍTICA

TNR, APENAS OS NECESSÁRIOS

Lionel Leong, em resposta, afirmou que “em relação à política de importação de mão-de-obra estrangeira, os TNR que existem estão a suprir as faltas de trabalhadores locais”. O secretário da Economia e Finanças justifica a contratação de TNR como necessidade no processo e diversificação da economia. “Temos de dar oportunidade às indústrias emergentes que vão precisar de recursos humanos”, afirmou.

A

questão da importação de trabalhadores não residentes (TNR) foi ontem um dos assuntos de relevo em mais um debate das Linhas de Acção Governativa para 2017. Sem conclusões, os deputados manifestaram-se contra estes trabalhadores ou no sentido de consolidar a necessidade de importação de exterior, de modo a garantir o desenvolvimento do território. Para a deputada Ella Lei, representante dos Operários, os TNR são uma ameaça ao emprego dos residentes, sendo que a situação é tanto mais grave quando se fala de empregos de gestão, nomeadamente na área dos casinos. “São poucos os trabalhadores locais que trabalham nas áreas de gestão das operadoras de jogo e deviam ser mais. Nas áreas de restauração e hotelaria há muitos empregos, mas muitos são TNR”, afirmou ontem na Assembleia Legislativa. Para Lei, a questão já não se prende com a “falta de talentos, porque Macau já está a formar a população que depois não tem oportunidades de emprego”. Segundo a representante dos Operários, é necessário “impedir a contratação de TNR e criar um mecanismo de retirada dos trabalhadores estrangeiros”, ao mesmo tempo que é necessário assegurar os direitos dos locais. Ella Lei sustenta a posição com números que, garante, afectam os salários da população. “Também temos cerca de 45 mil empregados com salário abaixo das cinco mil patacas. Que políticas e medidas é que o Governo pode tomar para estas pessoas?”, perguntou. “Também temos trabalhadores na restauração com salários pouco acima das 10

lhadores locais, se possa exigir a saída dos que existem. “Depois ainda dizem que os TNR têm de sair e como é que as empresas vão desenvolver os seus negócios?”, questionou. As medidas apresentadas por Ella Lei “só vão aumentar os custos suportados pela entidade patronal e não vejo nenhumas medidas que favoreçam a parte patronal”, destacou o empresário. “Não conseguimos ter aqui nada para combater a falta de recursos humanos”, rematou.

Lionel Leong mencionou que o facto de se registar uma baixa taxa de desemprego “não o deixa satisfeito”

mil patacas. Como é que estas pessoas conseguem suportar a inflação com estes salários que são condicionados pela contratação de mão-de-obra estrangeira?”. Para a deputada, é necessário tomar medidas, entre as quais requerer um salário mínimo na contratação

ao exterior capaz de competir com o dos locais.

MACAU PRECISA DELES

Do outro lado da bancada está Kou Ho In. O deputado e empresário afirma, baseado numa pesquisa levada a cabo pela sua companhia,

SECRETÁRIO EM LISBOA NA PRÓXIMA SEMANA

O secretário para a Economia revelou ontem que na próxima semana vai a Portugal, mas não deu detalhes sobre a visita. “Muito em breve, na próxima semana, irei a Portugal e também irei ter contactos com as autoridades portuguesas, irei manifestar o nosso desejo de melhorar esses trabalhos protocolares, aquando da recepção de autoridades da outra parte. (…) Vamos continuar a manter uma boa relação entre Portugal e Macau”, disse, ao justificar a falta de presença oficial na recepção do primeiro-ministro António Costa na sua vinda a Macau. No âmbito da cooperação, Lionel Leong afirmou aos deputados que, no próximo ano, o Governo vai apoiar a organização de “uma visita ao Brasil para os representantes das províncias e regiões do Pan-Delta do Rio das Pérolas”.

que “há falta de trabalhadores em Macau”. Por outro lado, ao ser sugerido por Ella Lei um aumento de salários médios de modo a restringir a contratação de pessoas de fora, “a média que vai ser exigida pode vir a ser considerada a referência para o salário mínimo no território”. Se a medida pode não ser um problema para áreas como o jogo, já para as pequenas e médias empresas que necessitam de mão-de-obra especializada tal requisito pode impedir o seu desenvolvimento. “As operadoras de jogo têm um mercado e as PME têm outro. As grandes podem contratar com grandes salários, mas as outras não”, explicou. Para Kou Ho In não é admissível que, com a falta de traba-

Para o governante, a integração de TNR em cargos de topo não vai influenciar as possibilidades de ascensão de carreira dos residentes. “Algumas destas indústrias podem não ter profissionais desde o nível mais básico ao intermédio ou ao mais alto, pelo que temos de facultar a ascensão de carreira para que os locais possam agarrar as suas oportunidades para subir nos quadros. Ao mesmo tempo, temos de identificar as necessidades e dar oportunidade para que possam ter os melhores profissionais”, explicou Lionel Leong. O secretário para a Economia e Finanças não deixou de mencionar que o facto de Macau registar uma baixa taxa de desemprego, que atinge apenas 1,9 por cento, “não o deixa satisfeito” sendo uma taxa nula o ideal a atingir. O Governo salienta ainda que já “tem um mecanismo de intervenção para os TNR que saem de Macau em 2017 e 2018, de modo a preencher as vagas por trabalhadores locais”. Sofia Mota

sofiamota.hojemacau@gmail.com


5 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

POLÍTICA

PEARL HORIZON NÃO AFECTA SISTEMA FINANCEIRO

A

Pearl Horizon lesados com os investimentos feitos pode vir a afectar a estabilidade bancária local. “Pode atacar a estabilidade bancária porque as pessoas podem não pagar atempadamente aos

bancos, o que implica riscos financeiros”, justificou. Em resposta, Anselmo Teng, presidente da Autoridade Monetária de Macau (AMCM), tentou relativizar as preocupações afirmando

que o caso em questão “não afecta muito o sistema financeiro de Macau”. De modo a clarificar a situação, Anselmo Teng apresentou dados: os empréstimos contraídos para aquisições

no empreendimento representam 0,58 por cento dos empréstimos bancários, pelo que “não é um número muito elevado e não temos qualquer caso de risco nos bancos”.

No entanto, o presidente da AMCM sublinhou que a situação está a ser devidamente acompanhada, de forma a que as respostas aos lesados possam ser dadas atempadamente.

GCS

questão da sustentabilidade do sistema financeiro foi levantada pelo deputado Mak Soi Kun, que argumentou que o facto de existirem mais de três mil proprietários do

N

O debate sectorial das linhas de Acção Governativa de ontem, dedicado à Economia e Finanças, Lionel Leong, secretário da tutela, admite a possibilidade de criar um segundo programa de apoios às pequenas e médias empresas. Desta vez, e para além dos apoios para a criação de negócios, a medida pode representar uma segunda oportunidade para aqueles que, em caso de insucesso na primeira iniciativa, pretendam agora, com formação e experiência, ter uma nova oportunidade. “Estamos a pensar criar um segundo programa de apoios às PME”, afirmou Lionel Leong. No entanto, a medida não pode ser tomada sem avaliação de outros factores. “Temos de ter muito cuidado porque o primeiro fracasso pode ser desmotivador e o segundo pode agravar ainda mais a situação”, sublinha, sendo que afirma estar disposto a “ouvir propostas e repensar sobre este eventual programa acerca da atribuição do segundo subsídio a jovens empreendedores”. A ideia de criar uma segunda oportunidade aos empreendedores locais foi dada pelo deputado Ma Chi Seng que contou ter conhecimento de casos que faliram no primeiro investimento e numa segunda tentativa obtiveram suces-

LAG PME PODEM TER NOVOS SUBSÍDIOS E FORMAÇÃO ADEQUADA

Uma segunda oportunidade A aposta nos apoios a pequenas e médias empresas é vista pelos deputados como estratégia a seguir para a diversificação económica. Na sequência dos apoios que têm sido dados, Lionel Leong não deixa de lado a ideia de atribuir, uma segunda vez, subsídios àqueles que não tiveram sucesso aquando da criação do primeiro negócio so. “Houve um empreendedor que queria apoios para cerimónias de casamento. Depois de montado o negócio, não teve sucesso e agora, numa segunda oportunidade em que alargou a oferta, está a ser bem-sucedido”, explicou. O deputado solicita ainda um maior apoio no que respeita a serviços de consultadoria oferecidos pelo Executivo, à semelhança do que se passa noutras regiões.

FORMAR PARA INVESTIR

Outra questão levantada por Ma Chi Seng foi a necessidade de formar os jovens que querem vir a ser empreendedores. “Quando os jovens querem ter negócios precisam de ser

formados tanto moralmente, como no que respeita a contas, finanças e modos de expansão do negócio”, explicou.Asugestão justifica-se com o facto de que “as pessoas terem dificuldades em perceber como gerir as suas empresas”. Por outro lado, Ma Chi Seng sugere ainda a cooperação entre os diferentes gabinetes do Gover-

no, de modo a dar aos empreendedores “uma mentalidade e pensamento mais diversificados e a saberem melhor em que saídas apostar”. Com números na mesa, o deputado questionou Lionel Leong sobre as medidas que tenciona tomar: “Sabemos que 32 por cento dos inquiridos que tiveram fracasso

“Estamos a pensar criar um segundo programa de apoios às PME”, afirmou Lionel Leong. No entanto, a medida não pode ser tomada sem avaliação de outros factores

no primeiro negócio querem abrir o segundo”. O governante não deixou de sublinhar que os candidatos vão ter como requisito de candidatura a formação adequada e garantiu “pensar na ideia” deixada por Ma Chi Seng. “O Executivo tem dado muitos incentivos e apoios aos jovens para terem o seu negócio.Ao verificar que os candidatos apresentam alguma inexperiência, vamos implementar cursos de formação para os ajudar a saber como realizar os seus sonhos.” Sofia Mota

sofiamota.hojemacau@gmail.com


6 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

HOJE MACAU

SOCIEDADE

António Lopes e João Vieira

N

ÃO gozam fins-de-semana, não têm rotatividade ao nível dos turnos com horários difíceis, não têm direito a tolerâncias de ponto, recebem os subsídios de turno fora do horário de trabalho. Estas são algumas das reivindicações que os inspectores dos casinos têm vindo a exigir à Direcção dos Serviços de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) e que ainda não foram ouvidas. Em entrevista ao HM, João Vieira, dirigente da Associação Sindical dos Inspectores de Jogo, já reformado, confirmou que a maioria dos trabalhadores está contra a proposta do Governo de revisão do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública (ETAM) e pede um estatuto próprio para a sua profissão. “Não somos pessoal de secretaria, mas também não somos pessoal militarizado. Deveríamos ter um estatuto próprio, com condições quase iguais a qualquer funcionário, mas sem a sobrecarga que tem um polícia ou um bombeiro”, defendeu João Vieira. Também António Lopes, inspector no activo desde 1989, acredita que esta seria a melhor solução. “Muitas coisas ficariam mais claras e tudo estaria estipulado na hora de irmos trabalhar. Saberíamos o que podemos ou não podemos fazer, porque actualmente há coisas que não estão claras: a lei diz uma coisa, o superior diz outra.” António Lopes e João Vieira fazem parte de um grupo de trabalho criado esta quarta-feira em parceria com a Associação dos Trabalhadores da Função Pública

Casinos INSPECTORES DE JOGO PEDEM ESTATUTO PRÓPRIO

Desilusão e revolta Os inspectores de jogos estão descontentes com a proposta de revisão do Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública e desejam ter um estatuto próprio. João Vieira, da Associação Sindical de Inspectores de Jogos, fala na redução de direitos e na arbitrariedade do cumprimento da lei pelas operadoras (ATFPM), do qual fazem parte Rita Santos e José Pereira Coutinho. É este grupo de trabalho que promete lutar com uma outra força pelos direitos laborais dos inspectores. “Se isto não for resolvido vamos ter mais acções. Vamos andar um pouco mais à frente, vamos promover umas greves pacíficas, há muitos métodos que conhecemos. Se o Governo não responder aos nossos apelos até poderemos

“Há casos de ameaças quando saem do trabalho e muitos deles foram espancados. Sempre tivemos este receio e continuamos a tê-lo.” JOÃO VIEIRA INSPECTOR

recorrer ao Direito Internacional. Isto é uma machadada enorme em toda a lei”, disse João Vieira. João Vieira diz-se mesmo “desiludido” com Paulo Chan, o novo rosto da DICJ. “Esperava muito mais de uma pessoa que percebe de leis, porque veio do Ministério Público. Compreendo que possa estar muito ocupado, mas podia olhar para os nossos pedidos. Reunimos assim que ele assumiu o cargo. Focamos vários pontos e dissemos que o pessoal não se sentia confortável. Ele atendeu a alguns pedidos, mas dentro desse atendimento não foi feita uma correcção completa.”

OPERADORAS É QUE DECIDEM

O dirigente garante ainda que os inspectores se sentem inseguros desde que, em 2001, deixaram de ser equiparados a agentes da autoridade no período de trabalho, que dava direito a uso e porte de arma. Hoje os cerca de 400 inspectores

a trabalhar por turnos dizem ter de responder por situações que os podem comprometer. “Há casos de ameaças quando saem do trabalho e muitos deles foram espancados. Sempre tivemos este receio e continuamos a tê-lo. Apenas digo que não nos obriguem a fazer tarefas que impliquem essas situações, como se fossemos agentes. Somos obrigados a identificar indivíduos que estão a fumar em locais proibidos nos casinos quando não temos esse direito de pedir a identificação. Também não temos o direito de pedir a um indivíduo as fichas de jogo”, explicou João Vieira. O antigo inspector denuncia ainda a arbitrariedade no cumprimento dos regulamentos por parte das concessionárias. “Cada casino tem os seus próprios regulamentos em termos de modalidade de jogos. Isso faz com que, quando um cliente reclama, o inspector não saiba o que fazer, porque é tudo diferente dos regulamentos que estão definidos por

lei. A culpa é da DICJ, que permite que haja várias sentenças sobre o mesmo caso. O que fizemos? Reunimos e dissemos aos nossos colegas para, no momento das ocorrências, pegarem no regulamento em vigor e seguirem o que lá está escrito. Pedimos para não seguirem as leis do casino.”

GOVERNO PROMETE RESOLVER

José Pereira Coutinho levou ontem este assunto ao hemiciclo, no âmbito do primeiro dia de debate das Linhas de Acção Governativa para a área da Economia e Finanças. Paulo Chan prometeu resolver a situação. “Estamos a acompanhar a situação, mas não domino os detalhes. Vamos reunir com os inspectores para conhecer de perto as suas necessidades e reivindicações. Os trabalhadores estão, de facto, a trabalhar de mais”, disse o director. João Vieira assumiu que a falta de pessoal sempre foi uma realidade, mas que não justifica o incumprimento dos seus direitos. “Não há férias, nunca nos compensam os feriados na totalidade, roubam-nos um pouco diariamente. O Chefe do Executivo dá tolerâncias de ponto, mas nós nunca temos direito. E esta revisão vem tentar por isso na lei. É uma vergonha.” Também em épocas de tufão os inspectores assumem não ter qualquer apoio por parte da DICJ. Actualmente, o ETAM está em processo de consulta pública, sendo que a primeira fase acaba em Dezembro. Andreia Sofia Silva

andreia.silva@hojemacau.com.mo


7 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

SOCIEDADE

CRIMES RELACIONADOS COM O JOGO SUBIRAM 16 POR CENTO ATÉ SETEMBRO

Os bandidos não andam na rua Não há razões para preocupações, garante Wong Sio Chak. Os números indicam uma subida dos delitos ligados à principal indústria do território, mas são praticados e têm como vítimas pessoas que não são de cá

A

criminalidade relacionada com o jogo aumentou 16 por cento entre Janeiro e Setembro, comparando com os mesmos meses de 2015, com os sequestros a subirem 13,3 por cento (para 349 casos) e a usura 45 por cento, segundo dados ontem divulgados. No entanto, “registou-se um abrandamento na subida” destes crimes, realçou o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, destacando que no primeiro trimestre os sequestros – normalmente relacionados com jogadores com dívidas – tinham subido 32,8 por cento e no primeiro semestre 27,1 por cento.

ERRATA

Também a usura (ou agiotagem) tinha crescido 55,9 por cento nos primeiros três meses do ano e 52,3 por cento no primeiro semestre. Entre Janeiro e Setembro, manteve-se, por outro lado, o padrão de os crimes relacionados com o jogo envolverem, na sua maioria, “ofendidos e suspeitos” não residentes em Macau, de a maioria dos casos ocorrer dentro dos casinos e de os processos terem sido “abertos por iniciativa própria da polícia”. “O que quer significar que a sua ocorrência não constituiu impacto na segurança da sociedade de Macau”, afirmou o secretário, que voltou a referir os três casos de sequestro que resultaram em três mortes que romperam com o padrão e saíram do espaço dos casinos, ocorridos no final de Agosto e início de Setembro, e que eram já conhecidos. Eram casos de pessoas com dívidas de jogo, sequestradas pelos credores: duas delas cometeram suicídio e uma morreu numa queda quando tentava fugir, segundo a polícia. “Embora os casos tenham sido resolvidos e não tenham trazido consequências negativas para a segurança da sociedade, não significa que não mereça a nossa atenção”, disse Wong Sio Chak, que garantiu que as autoridades de Macau “acompanham de perto” estas situações de “disputas de empréstimos para o jogo”.

mentou 8,4 por cento nos primeiros nove meses do ano, mas também aqui, sublinhou o secretário, houve um abrandamento em relação à taxa de crescimento anterior de 14,8 por cento no primeiro semestre, e crimes como homicídios ou raptos mantiveram-se sem qualquer ocorrência. No entanto, neste capítulo da criminalidade grave e violenta, duplicaram os crimes de “asso-

“O ajustamento no sector do jogo não trouxe quaisquer consequências para a situação de segurança de Macau.” WONG SIO CHAK SECRETÁRIO PARA A SEGURANÇA

ciação criminosa”, que passaram de 11 para 22 nos primeiros nove meses do ano, comparando com 2015. O secretário disse que estão em causa seis casos ligados à imigração ilegal, outros seis a sequestros, quatro a usura, e três a prostituição, entre outros, atribuindo este aumento “ao reforço das operações” contra estes crimes. Entre Janeiro e Setembro foram também detectados dois casos de “associação secreta” (não tinha havido nenhum no mesmo período de 2015), relacionados com imigração ilegal e prostituição, que estão ainda em investigação, afirmou. No entanto, até agora, a polícia continua a não detectar “qualquer anormalidade no comportamento de associações secretas” devido à quebra das receitas dos casinos, durante 26 meses, entre meados de 2014 e Julho deste ano, afirmou o secretário, que conclui, mais uma vez, que “o ajustamento no sector do jogo não trouxe quaisquer consequências para a situação de segurança de Macau”. A evolução da criminalidade ligada ao jogo, com o abrandamento no terceiro trimestre do ano, continua, assim, a evidenciar “as relações entre a segurança e o ajustamento” no jogo, disse ainda.

FACTOS E ARGUMENTOS

Por causa dos sequestros, a criminalidade violenta em Macau au-

CENTRAL NUCLEAR DOS VIZINHOS NÃO PREOCUPA

Na edição da passada segunda-feira, este jornal publicou um artigo da Agência Lusa em que se indicava que, nos últimos cinco anos, 99 pessoas morreram em acidentes de trabalho em Macau. A pedido da Direcção dos Serviços de Assuntos Laborais, e na sequência da correcção entretanto feita pela Agência Lusa, esclarecemos que o número de vítimas mortais no período em análise foi .

81

U

MA delegação de Macau esteve ontem em Taishan, na província de Guangdong, para visitar a central nuclear da cidade chinesa, que fica a 67 quilómetros do território. A estrutura ainda não está em funcionamento: o objectivo foi ficar a perceber de que modo vai o projecto operar e que medidas de segurança existem. “O Governo da RAEM está muito atento às preocupações da

comunidade local em relação à segurança das centrais nucleares nas regiões vizinhas”, garante, em comunicado à imprensa, o Grupo de Trabalho Conjunto para a Segurança Nuclear. Durante a deslocação, os responsáveis da central referiram que está a ser cumprida a legislação nacional.Aárea onde a estrutura está construída é dividida por sectores: a zona de preparação de evacuação

tem um raio de cinco quilómetros e, com um raio de 50 quilómetros, existe uma zona de preparação de controlo de alimentos e de água. “Em caso de incidentes nas centrais nucleares, mesmo do nível 7, considerado o mais elevado, nas zonas com uma distância superior a 20 quilómetros das mesmas não há necessidade de tomar medidas de protecção completa”, explica-se na nota à imprensa.

“Macau está fora da zona do plano de emergência nuclear, por isso, não é necessário tomar medidas especiais”, garante-se ainda. Além disso, a escala definida pelaAgência Internacional de Energia Atómica contempla sete níveis de ocorrências, sendo que as centrais nucleares da China nunca registaram qualquer incidente acima do nível dois, o que mostra “um bom funcionamento” deste tipo de estruturas.


8 CHINA

hoje macau sexta-feira 25.11.2016

No fim de um périplo pela América Latina, o Presidente chinês promete continuar a impulsionar o livre comércio e alerta para os desafios da globalização

O

isolacionismo patente nos discursos de Donald Trump, Presidente eleito dos Estados Unidos, parece contrastar com a nova dinâmica da diplomacia chinesa, com Pequim a assumir agora a defesa do livre comércio e da globalização. Na América Latina, uma região conhecida como o “quintal” dos EUA, o Presidente chinês, Xi Jinping, prometeu esta semana “impulsionar a construção de

XI JINPING CONTRA ISOLACIONISMO DE DONALD TRUMP

O homem do leme uma área de livre comércio na Ásia Pacífico e uma economia mundial aberta”. Xi terminou ontem um périplo por Equador, Peru e Chile. Em Lima, participou da cimeira dos líderes da APEC (Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico), que teve como um dos principais temas a criação de uma área de livre comércio para a região. Durante a cimeira, Xi lembrou que a globalização é “uma faca de dois gumes”, questionada por “muitas vozes” e instou a comunidade internacional a abordar seriamente estes “desafios”. No Equador, que atravessa uma recessão, o líder da China inaugurou a maior barragem hidroeléctrica do país, construída por uma firma chinesa e paga com parte dos quase oito mil milhões PUB

STOP VIOLENCE TOWARDS WOMEN November 25, 2016

HOW MUCH DO You Know ? Take this simple quiz for cash coupon prizes 1.

What country is most advanced a) Iceland in gender equality? b) France c) USA

2. What country hosted the 1995 a) Switzerland World Conference on Women? b) Italy c) China 3. When was Macau DV law passed? a) Jan 2, 2015 b) May 20, 2016 c) Oct. 5, 2016 Name_______________________ Tel. _________________________ ID__________________________

Prizes from $300 to$ 2,000 Plus consolation prizes of $50one person one entry, cut off date Dec. 3rd

Send or bring to GS Women’s Centre 111 Rua Do Centro Lucky Draw DEC 10th - Dec 13th winners notified via http://www. gssmacau.org Organizer: Good Shepherd Sisters

de dólares que Pequim emprestou ao país desde 2007.

OS MAIORES

A China tem acordos de livre comércio com Costa Rica, Chile e Peru e está a negociar novos acordos com o Uruguai e a Colômbia. Em 2015, o país asiático ultrapassou os EUA como o principal investidor externo na América Latina. O investimento directo chinês na região subiu no ano passado 67,1%, em termos homólogos, para 21,45 mil milhões de dólares, segundo dados do Ministério do Comércio da China. A estratégia de Trump para a região inclui rom-

per com o Tratado Norte-Americano de Comércio Livre (NAFTA) e abandonar o Acordo de Associação Transpacífico (TPP), para além de construir um muro na fronteira com o México. “A China insiste que a globalização é um processo

irreversível, para nós e para o mundo”, diz à agência Lusa Cui Shoujun, director do centro de estudos para a América Latina da Universidade Renmin, em Pequim. “Histórica, geográfica e até politicamente, a América Latina é vista como o quintal

Na América Latina, uma região conhecida como o “quintal” dos EUA, o Presidente chinês, Xi Jinping, prometeu esta semana “impulsionar a construção de uma área de livre comércio na Ásia Pacífico e uma economia mundial aberta”

dos EUA”, nota. “Mas agora estamos numa era global”, acrescenta. Face ao anúncio de que Trump vai retirar os EUA do TPP, vários países voltam-se para tratados alternativos, nomeadamente o Acordo Integral Económico Regional (RCEP). Esta zona de livre comércio incluiria a China, os dez países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), Austrália, Coreia do Sul, Índia, Japão e Nova Zelândia. Esta semana, um porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros afirmou que Pequim espera que as conversações para a criação do RCEP “possam produzir resultados em breve”. No ano passado, Xi anunciou que, até 2025, o comércio bilateral entre a China e a América Latina alcançará os 500.000 milhões de dólares, enquanto o investimento chinês na região atingirá os 250.000 milhões. “A China pode ajudar a América Latina a internacionalizar a sua economia”, defende Cui Shoujun. “Partilhamos das mesmas aspirações com os países da região, de que enquanto nação em desenvolvimento, não estamos devidamente representados no novo milénio”, acrescenta. Em entrevista à Lusa, o novo embaixador do Brasil em Pequim, Marcos Caramuru de Paiva, notou que a China “impõe-se naturalmente” e “força todo o mundo a adaptar-se a uma nova realidade”. “Você precisa incorporar esta realidade e tentar extrair o melhor que puder”, disse, acrescentando: “Não adianta brigar com a realidade como ela é”.

QUEDA DE ANDAIME CAUSA 40 MORTOS

P

ELO menos 40 pessoas morreram no sudeste da China, após a queda de um andaime numa central eléctrica em obras, enquanto o número de encurralados sob os escombros continua por determinar, segundo a imprensa oficial. O acidente ocorreu às 07:00 de ontem, na cidade de Fengcheng, província de Jiangxi. A agência oficial Xinhua detalhou que, até ao meio dia de ontem, o balanço era de 40 mortos, indicando que ainda se desconhecia o número de trabalhadores presos nos escombros. Imagens do local difundidas na televisão estatal mostravam tubos de

ferro e pranchas de madeira amontoadas junto a uma torre de refrigeração. Segundo dados oficiais, em 2015, a China registou 281.000 acidentes laborais, que causaram a morte de 66.182 pessoas. Organizações não governamentais dizem que o número é maior, atendendo aos casos que permanecem encobertos. Segunda maior economia mundial, a seguir aos Estados Unidos da América, a China é o país que regista mais acidentes industriais fatais. A Organização Internacional do Trabalho estima que 20% das mortes causadas por acidentes laborais em todo o mundo ocorreram no país asiático.

Um responsável por uma empresa de logística foi recentemente punido com pena de morte suspensa, devido à explosão num armazém no porto deTianjin, no norte do país, por causa da armazenagem ilegal de químicos, que provocou 173 mortos. Um deslizamento de terras, em Dezembro passado, causado pela excessiva acumulação ilegal de resíduos de construção, enterrou 33 edifícios num parque industrial em Shenzhen (Sul), e causou 81 mortos. Nas últimas três décadas, a economia chinesa cresceu em média quase 10% ao ano, mas as sucessivas tragédias são cada vez mais fonte de descontentamento popular.


9 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

A

maior agência de viagens ‘online’ da China, a Ctrip, vai comprar o Skyscanner, o site que procura e compara preços de centenas de companhias aéreas, por 1,4 mil milhões de libras. As duas empresas confirmaram ontem o negócio, que será feito quase todo em dinheiro. A Ctrip, que é detida em parte pelo motor de busca chinês Baidu, permite aos utilizadores fazer reservas pela Internet de bilhetes de avião e comboio e de hotéis. No ano passado, gerou 350 mil milhões de yuan em receitas brutas, segundo informações no site oficial da empresa. “A Ctrip é claramente a líder de mercado na China e uma empresa que nos poderá dar muito a ganhar”, afirmou em comunicado o chefe executivo da Skyscanner, Gareth Williams. A aquisição permite à Skyscanner “dar mais um passo no sentido de tornar as buscas o mais simples possível para os viajantes de todo o mundo”, acrescentou. Com sede em Edimburgo, na Escócia, a Skyscanner disponibiliza serviços semelhantes ao da Ctrip e tem 60 milhões de usuários, a maioria na Europa. O negócio permitirá à empresa manter a sua actual

Dinheiro vivo

CHINA

PUB

Empresa chinesa compra portal de viagens Skyscanner

equipa de gestão, detalha o comunicado. O fundador e presidente executivo da Ctrip, Liang Jianzhang, afirmou que “a aquisição vai fortalecer os motores de crescimento de ambas as empresas a longo prazo” e que a Skyscanner “irá complementar” a posição da empresa chinesa “à escala global”. No relatório relativo aos resultados do terceiro trimestre, a Ctrip anunciou ainda a aquisição de “dois grandes operadores turísticos norte-americanos especializados em servir turistas chineses”, sem mencionar os nomes.

APOSTA EXTERIOR

Vários grupos privados chineses têm investido em activos do sector turístico fora do país, à medida que a China reforça a sua posição como maior emissor mundial de turistas. O grupo Fosun, que este domingo anunciou ter investido 174,6 milhões de euros para ser o maior accionista do banco português BCP, e que detinha já em Portugal a Fidelidade e a Luz Saúde, comprou em 2015 o Cirque du Soleil e concluiu a compra do Club Med.

Aquele consórcio detém também uma participação no operador turístico Thomas Cook, com sede no Reino Unido.

“Obra da Renovação do Sistema do Ar-condicionado no Edifício Chi Un do Instituto Politécnico de Macau – Elaboração do Projecto”

CONCURSO PÚBLICO N.º 06/DOA/2016

“A Ctrip é claramente a líder de mercado na China e uma empresa que nos poderá dar muito a ganhar”

Faz-se público que, de acordo com o despacho de 11 de Novembro de 2016, do Exm.o Senhor Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, se encontra aberto concurso público para a prestação de serviços de consultadoria sobre a elaboração do projecto para a obra de renovação do sistema de ar-condicionado no Edifício Chi Un do Instituto Politécnico de Macau.

GARETH WILLIAMS CHEFE EXECUTIVO DA SKYSCANNER O grupo chinês HNA, accionista da TAP através do consórcio Atlantic Gateway e da companhia brasileira Azul, anunciou no mês passado a compra de 25% do capital da cadeia hoteleira norte-americana Hilton. Pelas contas do Governo chinês, 120 milhões de chineses viajaram para fora da China Continental em 2015, um aumento de 19,5% face ao ano anterior.

1.

Entidade que põe o serviço a concurso: Instituto Politécnico de Macau.

2.

Modalidade de concurso: Concurso Público.

3.

Local do projecto: Edifício Chi Un do Instituto Politécnico de Macau, sito na Rua de Luís Gonzaga Gomes, em Macau.

4.

Objecto de concurso: prestação dos serviços de consultadoria sobre a elaboração do projecto de renovação do sistema do ar-condicionado dos Blocos A e B, Auditório e Galeria de Exibição do Edifício Chi Un do Instituto Politécnico de Macau.

5.

Prazo de execução: 120 dias, a contar do dia seguinte da data de notificação da adjudicação.

6.

Prazo de validade das propostas: 90 dias, a contar do dia seguinte à cerimónia do Acto Público do Concurso.

7.

Caução provisória: MOP40.000,00 (quarenta mil patacas), a prestar mediante depósito em dinheiro no Serviço de Contabilidade e Tesouraria do Instituto Politécnico de Macau ou garantia bancária aprovada nos termos legais.

8.

Garantia definitiva: 10% do preço global da adjudicação (em cada um dos pagamentos parciais são deduzidos 4% das importâncias que o adjudicante tiver a receber, para juntamente com o valor da caução servirem de garantia ao cumprimento do contrato).

9.

Preço base: não há.

10.

Condições de admissão: entidade inscrita na DSSOPT na modalidade de elaboração de projectos.

11.

Local, data e hora do limite da apresentação das propostas: 11.1. Local: Divisão de Obras e Aquisições do Instituto Politécnico de Macau, sita na Rua de Luís Gonzaga Gomes, em Macau. Dia e hora do limite: 9 de Dezembro de 2016 (sexta-feira), antes das 17H30. 11.2. Em caso de encerramento dos serviços públicos da Região Administrativa Especial de Macau ao público em virtude de tempestade ou outras causas de força maior, a data e a hora para o termo do prazo de entrega das propostas serão adiados para o primeiro dia útil imediatamente seguinte, na mesma hora.

12.

Sessão de Esclarecimento: Os interessados podem assistir à sessão de esclarecimento na sala M603 do Edifício Meng Tak do IPM, no dia 28 de Novembro de 2016 (segunda-feira), pelas 10H00.

13.

Local, dia e hora do acto público do concurso: 13.1. Local: Sala A309 do Edifício Chi Un do IPM, Rua de Luís Gonzaga Gomes, R/C, Macau. Dia e hora: 12 de Dezembro de 2016 (segunda-feira), pelas 10H00. 13.2. Em caso de encerramento dos serviços de entidades públicas da RAEM por motivos de tufão ou de força maior, a data e a hora estabelecidas para o acto público da abertura das propostas serão adiadas para a mesma hora do primeiro dia útil seguinte.

14.

Critérios de apreciação das propostas e respectivos factores de ponderação:

15.

- preço

50%

- experiência de serviço de mesmo tipo de elaboração do projecto

30%

- recursos humanos para execução do serviço

10%

- proposta técnica

10%

Local, hora e preço para exame do processo e obtenção da cópia do processo: Local: Divisão de Obras e Aquisições do Instituto Politécnico de Macau, sita na Rua de Luís Gonzaga Gomes, em Macau. Hora: de 2.ª feira a 5.ª feira das 09H00 às 13H00 e das 14H30 às 17H45. 6.ª feira das 09H00 às 13H00 e das 14H30 às 17H30. Preço: MOP300,00 (trezentas patacas). Informações: 85996208, 85996228 ou 85996181. Macau, aos 21 de Novembro de 2016 O Presidente do Instituto, Lei Heong Iok


10 EVENTOS

NJO KONG KIE DIRECTOR MUSICAL

“Aquilo que fazemos com a arte, às vezes, é tão limitado demograficamente que sabe muito bem podermos expandir-nos e chegar a mais pessoas.”

“Estamos a sair das fron O que é que vamos ver neste “Um Piquenique no Cemitério”? A peça é, na sua essência, um concerto. Por isso vamos ouvir música. Numa outra camada do espectáculo temos diferentes elementos que incluem vídeos e interpretação dramática e, por último, é uma peça em que tivemos o cuidado de incluir o público. Contracenam com a audiência? Quando começámos esta peça, há três anos no LMA, enquanto parte do Festival de Artes de Macau, tivemos o cuidado de desenhar um espaço em que o público e os artistas partilhassem a mesma área, o que possibilita a interacção e a integração de novos elementos. Agora, estamos a transferir a ideia para o pequeno auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) em que a sala, dadas as suas características, implica uma certa separação dos espectadores mas, ainda assim, queremos manter o espírito de partilha do espectáculo entre as duas partes. Há vários aspectos que estamos a tentar contornar com novas escolhas cénicas em que as interacções com a audiência serão mantidas, e vamos tentar fazer com que o público sinta que estamos a dialogar e que está no mesmo espaço. Mas, acima de tudo, esperamos que as pessoas tenham oportunidade de assistir a um bom espectáculo e de ouvir boa música. Que música é que foi, especificamente, concebida para o espectáculo? Vamos ter um conjunto de composições que integram a música clássica e contemporânea com um toque experimental, misturadas com alguns sons mais comerciais e populares. Gosto de pensar que, algures neste espaço musical, estamos perto da música clássica, mas não demasiado perto. Tem raízes clássicas, o que faz parte da minha formação, mas algumas pessoas poderão pensar que é música minimalista e não estarão erradas. Temos também tido feedback de que o som se assemelha a música para cinema, o que quer que isso seja. Acho que, possivelmente, é porque o som desta peça, de alguma forma, evoca algumas imagens

e, por isso, o mais próximo dos adjectivos que as pessoas encontram para a descrever é a de ‘música para cinema’. Certamente que tem muito ritmo e ao mesmo tempo é muito lírica. É um instrumental para piano, violino e violoncelo, que são o coração da orquestra, mas também temos guitarra clássica e eléctrica, por exemplo. Qual foi o maior desafio na concepção desta peça? Penso que o maior desafio foi enquadrar as interpretações dramáticas num espectáculo musical. Muitos dos temas saíram de um álbum que criei há uns anos e escrevi as peças enquanto estava em digressão. Estivemos na estrada durante dois anos e a fazer sempre o mesmo repertório. Depois de alguns meses, comecei a tentar encontrar formas de manter a orquestra motivada, de modo a combater a rotina, e comecei a escrever pequenas peças para que nos divertíssemos. Incorporei essas peças nos ensaios para manter as pessoas entusiasmadas e isso foi um sucesso.Após um tempo, tinha acumulado uma dúzia de pequenas peças musicais em que cada uma tinha a sua própria personalidade. A parte musical acabou por ser relativamente simples na medida em que estava praticamente composta. Mas os músicos não estavam muito habituados a tocar música mais minimalista. É um género em que é difícil manter a concentração e alguns dos músicos acharam, por exemplo, difícil a precisão rítmica que tinha de ser mantida quase como se se tratasse de uma máquina para que a peça se mantivesse una. Isto foi um desafio nos ensaios: manter a peça coesa. No entanto, sem dúvida que o maior dos desafios foi manter esta coesão em formato teatral. Incorporar todos os elementos, os músicos com os actores com quem estou a trabalhar e toda a encenação. É como conceber toda uma história nova porque apenas a música seria uma abordagem muito abstracta. Um piquenique no cemitério não é uma imagem ou tema comum... Quando temos um título, especialmente um título como este, as pessoas esperam encontrar algum tipo de respostas no

SOFIA MOTA

“Um Piquenique no Cemitério” é o nome da peça que vai estar no Centro Cultural de Macau a 2 e 3 de Dezembro. O espectáculo conta com a direcção musical de Njo Kong Kie que, apesar de radicado em Toronto, aproveita as vindas a Macau para trabalhar em projectos locais. O compositor falou ao HM do espectáculo, dos desafios que enfrentou e do mundo da arte alternativa local


11 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

nteiras da arte” espectáculo. Quando estamos a apresentar a peça num espaço alternativo, é mais fácil as pessoas sentirem a peça e enquanto a sentem não fazem perguntas que poderiam, eventualmente, fazer. Apesar de a peça ser, muitas vezes, pouco clara, essa característica também permite às pessoas terem a liberdade de sentir. “Um Piquenique no Cemitério”, apesar de ser acerca da morte é, acima de tudo, acerca da vida e de como é que pode ser abordada num cenário como o sugerido pelo nome. A peça acaba por ser irónica e questiona um pouco o que é que fazemos durante a viagem que nos leva da vida à morte.

“A peça acaba por ser irónica e questiona um pouco o que é que fazemos durante a viagem que nos leva da vida à morte.” Apeça tem andado em digressão há três anos. Sim, temos estado em vários sítios e estivemos em Portugal também, por exemplo. Penso que a recepção em Portugal foi muito especial por termos estado em diferentes tipos de espaços – desde espaços convencionais, como a Fundação Oriente e o Centro Cultural de Famalicão, a um restaurante em Vila Real. Estivamos também no Maus Hábitos, no Porto. Cada um destes espaços era muito diferente e tinha características próprias, e com audiências também características. No restaurante, por exemplo, o público que tínhamos era de pessoas que iam lá regularmente. Era um público muito pequeno e em que estávamos todos muito próximos e correu muito bem. Por outro lado, quando estivemos no Maus Hábitos, o ambiente era muito idêntico ao do LMA, muito independente e correu tudo muito bem, acabámos por integrar objectos que apareciam no espaço

na própria encenação, o que também resulta. Esta é uma peça muito dinâmica. Gostamos de transferir a energia que sentimos no espaço para o espectáculo e queremos estar relaxados. Afinal, estamos a falar de um piquenique num espaço inusitado: o cemitério, por não se saber o que se passa além da morte, é sempre um lugar do desconhecido. É uma espécie de humor negro. Uma peça para todos e em todo o lado? Sim, até porque não tem um idioma. É universal. É uma coisa que tem, acima de tudo, que ver com tempo. Há um sentimento de nostalgia na peça. Usamos em alguns pontos legendas idênticas às que se usam no cinema mudo com pequenos trechos de texto, em inglês e chinês que, basicamente, servem para guiar o pensamento consoante o que se vai ouvindo. Tem sido um grande caminho até ao CCM... Agora sentimos que já podemos ir a esta sala sem correr o risco de sermos mal entendidos. Já é uma peça conhecida e temos alguma experiência em preparar o PUB

público antes da sua entrada, para que não entendam mal o nosso trabalho. O que têm planeado para o futuro? Vamos continuar com “Um Piquenique no Cemitério”. Já temos um espectáculo agendado para o Japão na continuação das nossas apresentações internacionais. Estamos na presença de um espectáculo alternativo e experimental. Da sua experiência, como é que Macau olha para este tipo de criações? Quando comecei a colaborar mais regularmente com artistas locais, em 2008, fiquei logo surpreendido com a quantidade de pessoas ligadas a trabalhos experimentais. Parece existir um grande fosso entre os clássicos tradicionais, que já não fazemos muito, e aquilo que muitos artistas contemporâneos estão a fazer e que são as suas próprias criações. Por exemplo, em Macau não há muita gente a fazer Shakespeare ou, tirando um ou dois que tenha visto, peças do Tchekhov. As pessoas estão a apostar em trabalhos contemporâneos e o público está na mesma linha. Temos ainda, no

EVENTOS

mundo da dança, coisas muito interessantes a ser feitas. A Comuna de Pedra, por exemplo: desloca-se aos bairros antigos de Macau para apresentar coreografias contemporâneas. O público olha para eles com um ar intrigado, mas eles fazem-no e é uma forma de mostrar o desejo de que a arte chegue a todos. O público, mesmo sem saber muito do assunto, acaba por se aproximar, ver e falar disso. Podem não entender mas acabam por gostar. Da mesma forma, fizemos uma apresentação desta peça em Taiwan num mercado, o que é também um cenário inesperado. Quando estávamos a actuar, as pessoas deixavam o que estavam a fazer e vinham ver-nos. Ter este tipo de proximidade com o público é muito especial. Aquilo que fazemos com a arte, às vezes, é tão limitado demograficamente que sabe muito bem podermos expandir-nos e chegar a mais pessoas. Por exemplo, quando pensamos no CCM não estamos a pensar que estas pessoas – dos mercados e da rua – venham ver o nosso trabalho e, com apresentações alternativas, estamos a sair das fronteiras da arte. Sofia Mota

sofiamota.hojemacau@gmail.com


h ARTES, LETRAS E IDEIAS

12

indiferença. Na realidade exijo tão pouco dos outros que sempre sou colhida de surpresa. A raiva. O ódio a fermentar numa matéria estranha em rejeição. Mas a encontrar caminho nas palavras e na lógica dos critérios. Sentir palavras infelizes e forasteiras a invadir espaço que não lhes é destinado a desenvolver diálogos que me cansam e calam. A evocar palavrões de violência a desmedir e a libertar de caixas fechadas para o efeito. De guarda. De não querer. De ferir. De recusar. E da recusa sobra o abalo do abalroar sem ter querido. Tonalidades, texturas e cores de que não gosto, a invadir-me a forma das palavras. Timbres e cheiros a putrefacção e a biis. Perpectivas militares e explodidas, estratégias. Já bastam as guerras. Deformações como doenças dolorosas da pele, dos dias, a vista de cada janela a enrugar de irascibilidade. E nessas alturas todas as palavras amargas e corrosivas se juntam em meu socorro, ansiando por se escapar do lugar fechado onde vivem e fazem alarido incómodo. Mas não as quero para mim, como não as quero para ninguém. Só que me abandonem reabsorvidas numa matéria inócua qualquer. Há dias em que o meu mundo me aparece coberto de tons de negro, um vozerio desmesurado e agreste, repleto de palavras que não quero dizer. Uma fractura que não quero sentir, um sentido que não quero medir. Há um corpo. E o meu. Imune às palavras. Último reduto a ignorá-las. E apago a luz. A paisagem de que preciso. Para sentir de que cor ficam afinal todos os negros. De que espessura se faz afinal o silêncio relativo. De que formas se prende o tacto às coisas. De que temperatura se lembra o corpo nelas. De que memória se desprendem os objectos. Tudo novo em escuro e silêncio. Mesmo as vozes esparsas da rua, parecem ignorar melhor e mais. Mais exteriores. Assim. E há felizmente pequenas réstias de quase não-luz, a entrar pelas frinchas das portadas, tábuas compridas e gonzos empenados dos anos. Pela janela das traseiras sempre aberta para o lado do avesso das coisas da casa e da rua, por debaixo da porta e por trás da qual se desce e sobe em outras vidas que não tenho que saber e não me falam. E aí ando um pouco pelas cadeiras e cadeirões das divisões imprecisas. Nocturnas de vez, mas silenciosas nunca. Sinto a frescura de paredes e o gelo da pedra e de um copo esquecido talvez no tampo de uma mesa. Bebo um resto de um vinho escuro e apalpo as roupas que não lembro de ter despido espalhadas por ali. Algo de formas invisíveis se me enrodilha nos pés -o gato ou a roupa - que devem ser meus sem os ver e o soalho é macio e não demasiado fresco. Devem estar descalços. Todos. Mesmo a roupa indistinta. Ele é silencioso. Roupas misturadas, minhas, da véspera, de há três dias, dele. Estendo-me na cama feita já noite. Nunca me deito sem a fazer. E há um corpo morno e adormecido. Minto. As costas frescas. Senti ao de leve com a mão. As omoplatas assimétricas da posição. Toco de novo. Não, não cresceram asas. O corpo dorme. Não é meu. O meu não dorme. Vigiante. Cansado. Inquieto. O outro volta-se no seu silêncio completo e a temperatura atinge-me como uma carícia. Boa. O hálito sereno e lento. Não lembro nomes nem factos ali no alo daquela

ANABELA CANAS

Q

UANDO penso que há tanto lugar no mundo. Que ainda não se estragou tudo. Mas que estamos no bom caminho para isso, enrubescidos de vergonha mas irrascíveis de vontade e intensão egocêntrica. Apetece-me mais que muito mergulhar na micro planície calma de uma distância impossível de conseguir senão na consciência. Na alienação de todas as palavras de uma desconstrução que não tem nada de bem querer, de bem querer fazer. Bolas de bilhar sem olhar definido e permeáveis a um toque seco de uma intensão de jogo. Coloridas mas cegas em si. Reacções em cadeia. Empurrões de gotas do mesmo líquido na inquietação febril de impulsos físicos, na inércia da agitação da matéria de uma individualidade contranatura. De entidades que somos, parte de um todo indivisível. A tessitura da matéria atómica e social, a rede universal. O realismo global é a nova corrente. A nova prisão. Diálogo universal a fazer contas às estrelas. Gotas e partículas previdentes na expectativa de assistir a qual evapora, qual congela de um frio maior, qual salta por imperativos de dinâmica das mesmas e cai na margem do todo. Qual se infiltra na terra, vítima de um engano do estado do tempo e pelo mesmo erro alimenta uma partícula seca, engelhada e feia, que era afinal a invisível semente de algo. Aqueles dias, em que me apetece encolher os ombros, os joelhos, tricotar rapidamente um casulo de lã Mohair desde as pontas dos dedos dos pés pintados, até às pontas dos cabelos lineares e bidimensionais. Espalmar toda a subjetividade num pedaço pequeno papel e fechá-lo num livro bom. De palavras boas. Cantilenas de embalar e de encantar. Já agora, com umas pétalas de flores para não esquecer as sensações e ir cheirando um perfume bom. Ou driblar uma bola rapidamente e atirá-la a uma tabela mal desenhada, vezes sem conta, encestar ou não. Com aquele ruído específico, e aquele ruído e aquele ruído do impacto, e de novo, e repetir até à exaustão. E uns calções compridos e contornados a preto para pintar depois num dia mais contente. Ou atirar pedras ao rio e ouvir o ruído do baque na água. E de novo. E de novo. Ou sentar-me e abanar o tronco para a frente e para trás. E vontade de fugir. Para fora deste circuito viciado de violência a que já nem as palavras me fogem. Vontade de ouvir tudo coado pela imensidão da água sobre mim, à minha volta, à minha frente e atrás de mim. Por todos os lados. Em todos os lados e em todos os sentidos. Fechar qualquer coisa por momentos como um casaco pesado de inverno. E esses dias em que tudo me aparece da esquina mais negra da realidade, tão real e tão reais como os outros em que se alternam momentos de maior lirismo e apaziguamento, tão real este e tão nítidos esses, mas bem mais construtivos. Dos anjos só os mais negros e ausentes. Há uma arquitectura de destruição de que não gosto. As grandes cidades como os pequenos castelos de areia, de nuvens, ou de saber ir indo com os dias sem exigir nada de ninguém, merecem o mesmo respeito. As construções sociais e as empatias coerentes. As pequenas mortes como os grandes genocídios. Todos me fazem aversão. Os grandes princípios edificantes, os pequenos gestos demolidores. De tudo se fazem palavras e mortes. Que arremessadas ao vento ferem rostos de caminho, de passagem ou de

Nem pena


13 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

de tudo e de nada

Anabela Canas

nem paixão proximidade viva e adormecida sem ausência. Assim. Só a enorme objectividade mesurável em graus centígrados e confortavelmente destituída de sentido. Um sono imperturbável e não perturbador. Não gosto de o acordar. Nem ninguém. Mas também porque me apetece andar por ali e pela casa solitária assim no escuro. Ele, ali. Noutros dias, não. As luzes acesas contra o desconhecido monstro da casa. Apagam-se para tudo dormir. Está quente. São dois calores, agora. Três. Se contar com o da porta fechada da noite. Viro a almofado do outro lado. O que está sempre fresco por um tempo. Não o toco. Não o quero acordar. Quero sentir toda a casa secreta e confortável. Tudo ao negro sem temor. Sem sombras. Sem relógio. E de repente, lembro-me, e avanço no outro corredor até ao fundo, com a mão na parede para não tropeçar e com uma alegria infantil dou um piparote no pêndulo do relógio do corredor, que acorda como se nada fosse. Como a iniciar o tempo do escuro. Sempre parado e preguiçoso, mas que deixo em paz para não acordar os vizinhos. E o tempo retoma em cinza fechado, fino e muito, muito escuro. E todos os sons ficam abafados lá muito atrás de qualquer realidade, por esse som ritmado que preenche a casa de uma ponta à outra. Como se fosse ela própria o interior dele. Do relógio. Dele, há um coração a reger serenamente um corpo em descanso. E em mim há algo indefinido a instalar-se sem pressa e sem palavras. Abro um livro sem nome e leio com os dedos as páginas lisas. Palavras baralhadas de vez. Tenho uma suave vontade de rir sem ter bem razão para tal. Porque tropecei, talvez no pé de um banco. Talvez o outro lado, o do ridículo daquilo tudo ao negro e assim. Lembro-me do perfume que não tenho usado e vou senti-lo. Sabe bem, também. Assim na frescura da memória meio esquecida. Como acontece com luz acesa. Tudo igual mas mais suave e mais escuro. Na verdade, tudo finalmente invisível mas palpável. Com uma densidade nova. Como uma cegueira. Uma frescura e uma novidade. E toda a subjectividade da não significação de tudo. Ali, aqui, ao negro de todas as cores. Esquecidas por detrás da luz ausente. Da pele glabra camuflada de noite mais escura, tornada escura e secreta mais do que é sentido normal. Existência discretamente apagada das cores. Apagada das horas, apagada do olhar. 36 graus acima do nada Ou além da solidão. Ou aquém dela. Ai sentada à beira e prestes a cair no sono, também. Sem olhos, sem respiração, sem ruído, sem nada. Acordo sobressaltada pelas badaladas imprevistas e histéricas de alegria, do relógio do corredor, a que nunca me lembro de dar corda. E que mesmo com corda, muitas vezes adormece esquecido de si. Também. E dou mais uma volta hesitante pela casa, a estender a perfeição do momento nocturno embalado pelas badaladas raras e pelo tique taque do relógio, a que nunca me lembro de dar corda e cujas badaladas não quero que acordem os vizinhos e que por isso deve estar quase a parar de novo. E depois a noite esgota-se e tudo volta a sofrer da luz. Ela dizia daquelas crianças sossegadas, que brincam sozinhas, que não inspiram cuidado nem preocupação: “não dá pena nem paixão”. Não era uma coisa má na voz dela. Mas há uma literalidade estranha e indivisível aí. E ele tem esse sono sossegado, ali.


14

h

hoje macau sexta-feira 25.11.2016

José Simões Morais

O lago na Feira da Exposição Industrial S

OBRE Macau, o jornal A Pátria de Janeiro de 1926 refere, “que os atractivos diurnos não eram de grande monta. De feito, não temos para oferecer aos estudiosos e investigadores uma biblioteca pública, um museu; um parque bem ensombrado e de ruas asfaltadas ou cimentadas, facilitando o passeio a pé e onde não houvesse tanques sem os beneméritos peixes que devoram as larvas dos mosquitos; lanchas a motor ou embarcações a remos, de aluguer, que permitissem o passeio na Baía da Praia Grande. Oh! A bela baía que estamos em riscos de perder conspurcada pelo aterro a que Carlos da Maia sempre se opôs por destruir toda a linda perspectiva do lugar, não só pelas futuras construções, como também pela maculante modificação do conjunto. A linda avenida marginal onde se pode contemplar a sua curva graciosa de 1300 metros de extensão” iria ser “sacrificada à execução de uma ideia por alguém sugerida de uma avenida de luxo rectilínea e de mais um campo desportivo”. Então “o que nos resta para oferecer ao turista como passatempo às horas do dia? ... E a noite?” Contradizendo este texto de Gregório Fernandes, o próprio, a 24 de Abril, durante a quarta reunião da Comissão, apresentou “a proposta de que fosse coberto, pelo menos com óla o coreto de música do Jardim Vasco da Gama, não só para conforto dos músicos, abrigando-os da chuva, como também por motivos de condições acústicas”. Em 1926, era extraordinário o número de novas construções. “Num abrir e fechar de olhos surgem-nos grandes edifícios e novas ruas, sobretudo para os lados de Patane, onde a Avenida Lacerda, que se estende até às alturas da Ilha Verde, já se vê literalmente ladeada de grandes fabricados, servindo quase todos de estaleiros”. Era a géneses da nova cidade de Macau, fora da parte cristã, ainda muralhada no tempo do Governador Ferreira do Amaral quando, após Portugal ser instado a tomar posse de Macau e torná-la independente da China, se não, esta seria ocupada por outra potência europeia, este mandou abriu as primeiras estradas fora das portas da cidade, expandindo-a. Tudo isso, aliado ao isolar o Campo de Mong-Há do Bazar Chinês e a constante violação das sepulturas dessa área pelos ingleses, que

por aí gostavam de passear a cavalo, tal como Ferreira do Amaral, cujo hábito de cavalgar sozinho por essas paragens em 1849 lhe custou a vida e a cabeça. Era a China a mostrar de quem era Macau, cuja sua terra não era alienável. José Coelho do Amaral, Governador de Macau entre 1863 e 1866, continuou a obra de Ferreira do Amaral, abrindo uma estrada, inicialmente baptizada com o nome de Estrada do Mong-Há e depois, Estrada Coelho do Amaral e que ia da Avenida de Horta e Costa à do Coronel Mesquita.

O LAGO DA FEIRA

A Exposição Industrial e Feira de Macau realizou-se no Campo de Mong-Há, vulgarmente denominado Campo dos Aviadores, onde a 1 de Maio de 1926 aterraram vindos de Hanói o aviador espanhol, Capitão E. Gallarza e o mecânico Arosameña, no voo Madrid-Manila. O recinto com 8 hectares era parte do terreno com aproximadamente 360 mil metros quadrados expropriado em 1901 aos chineses locais, graças ao prestígio e influência de Lu Cao. Essa zona, de várzeas, prédios, casebres e barracas, compreendida entre as estradas da Flora, Adolfo Loureiro e Coelho do Amaral e a povoação de Mong-Há, devido ao sistema de cultura era a causa do paludismo e febres, que atacavam os locais. Por isso, em 1901 planeava-se, depois de saneado o terreno, construir ruas, largos e avenidas, devendo-o transformar num bairro que podia vir a ser o mais belo de Macau. Mas parte

À entrada do recinto da feira, situada na Avenida Horta e Costa, pela forma original impunha-se o pavilhão nº 9 da Portugal-Oriente, expondo produtos de origem portuguesa. Recebeu o segundo lugar dos pavilhões com Diploma de Medalha de Ouro desse terreno em 1926 encontrava-se ainda livre de construções e por isso, foi decidido usá-lo como local para o recinto da Feira e Exposição. Situado entre a Rua Conselheiro Ferreira de Almeida e as avenidas Coronel Mesquita, Sidónio Pais e Horta e Costa, havia na parte NE do seu interior um lago situado em frente à entrada do Kun Iam Tong. Este lago foi criado a partir de uma depressão que formara uma lagoa e pertencia à bacia hidrográfica de Mong-há, tal como o do Jardim do Sr. Lu-Lim-Ioc, sempre cheio de água corrente renovada diariamente e por isso não eram estes de água estagnada. O médico subchefe dos Serviços de Saúde, o Dr. Nascimento Leitão refere numa entrevista de 1926, “Os terrenos baixos e alagadiços do vale, ou melhor, da bacia de Mong-há, impropriamente

conhecida pela designação de várzeas, que ainda há vinte anos se estendiam de Long-Tin-chin até ao rio (Xijiang), tem ido pouco a pouco desaparecendo sob os aterros de um bem necessário saneamento. Havia naqueles terrenos quatro depressões, permanentemente cobertas de água, que os aterros têm poupado, circunscrevendo-os num contorno mais ou menos caprichoso. Três destas depressões estão transformadas em lagos de jardins particulares, restando ainda uma delas, a mais vasta, cortada por duas estradas em três porções, uma das quais foi, por feliz ideia, convertida em lago de diversões da presente Exposição”. É este lago alimentado pela drenagem pouco profunda dos terrenos circundantes, sendo a génese da sua água nada mais do que dos poços naturais e era com ela que contavam os Serviços de Incêndios colocados no recinto da Feira.

VISITA AOS PAVILHÕES

À entrada do recinto da feira, situada na Avenida Horta e Costa, pela forma original impunha-se o pavilhão nº 9 da Portugal-Oriente, expondo produtos de origem portuguesa. Recebeu o segundo lugar dos pavilhões com Diploma de Medalha de Ouro. Em primeiro ficou o Holland Pacific Trading Co. que levantou na ilha do lago um imponente moinho holandês com casa anexa. “Estas duas construções imprimem à feira uma nota original, quer pela sua forma, quer pelo feliz local escolhido. Expõe produtos de origem holandesa, como leite condensado, chocolates, etc.. Esta firma, que é também agente de várias companhias de navegação, apresenta várias fotografias de vapores. No meio da casa, toda ladrilhada, vê-se um pequeno monte de carvão de Moçambique que o Sr. Van Genepp”, representante em Macau da Companhia, pretende aqui introduzir. Já o terceiro lugar coube à Companhia Netherlands Harbour Works. Desde Maio de 1923 adjudicatária das Obras dos Portos, fez-se representar por um pavilhão também de gosto holandês, tendo em exposição vários modelos de barcos, gruas das obras feitas em H.K., assim como um gráfico com as diferentes fases dos trabalhos realizados no porto de Macau. Estes alguns dos pavilhões que participaram comercialmente na Feira da Exposição Industrial.


15 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

C

OMEÇOU no passado dia 11 de Novembro o campeonato mundial de xadrez em Nova Iorque, em plena Manhatan no Southsea Sport, ao lado de Wall Street e da Ponte de Brooklin. Coloca frente a frente o ucraniano naturalizado russo Sergei Karjakin e o bi-campeão mundial, o norueguês Magnus Carlsen. Karjakin tem 26 anos e sagrou-se o mais jovem Grande-Mestre da história do xadrez com 12 anos. Tal feito foi logo no ano seguinte batido por Magnus Carlsen, actualmente com 25 anos, por alguns dias de diferença. Somadas as idades de ambos os rivais (51 anos) trata-se do mais jovem campeonato do mundo até hoje. Além do título, o vencedor arrecadará cerca de um milhão de dólares. Carlsen é o nº 1 do mundo, enquanto Karjakin é o nº 9, daí que a generalidade dos aficionados veja naturalmente o norueguês como favorito. Mas um jogo não é um torneio e tudo pode acontecer. Como disse antes do jogo se iniciar um dos mais reputados comentadores, Daniel King, Grande Mestre ligado ao mais popular website xadrezístico (www.chessbase.com) : “Although on paper Carlsen is favorite, in this kind of match I don’t see the World Champion’s usual strengths coming into play. Carlsen has great physical stamina that often allows him to power through in the latter half of a tournament; Karjakin has been training hard on his physical fitness and will match the Norwegian in this regard. Carlsen is deadly at killing off the weaker players in a tournament, but there is only one opponent here. Carlsen’s nerves are strong; the same can be said about the stolid Karjakin. His calm performance in winning the Candidates was impressive. Although Carlsen has won two World Championship finals, this is the first time he is facing a player of his own generation, so to some extent he is also facing a new challenge. “ E, na verdade, ao início da segunda metade do jogo, isto é, decorridas as primeiras sete partidas das doze previstas, o resultado era um estonteante 3,5/3,5, correspondente a sete empates. Nas partidas 1 e 2 Karjakin empatou sem grande esforço, mas nas partidas 3 e 4, que duraram umas boas 7 horas cada uma, Carlsen esteve quase a conseguir alcançar a vitória. Todavia, Karjakin exibiu miraculosos recursos defendendo uma posição inferior e acabando por conseguir obter o empate. O mundo xadrezísitico, boquiaberto, não tardou a encontrar um epíteto à altura das circunstâncias, cognominando-o de Sergei “Houdini” Karjakin. Carlsen acusou psicologicamente a pressão decorrente da frustração de possivelmente ter tido “o pássaro na mão para o ver fugir” e na quinta

DESPORTO

CAMPEONATO MUNDIAL DE XADREZ

O sábio contra o génio

partida esteve menos bem, tendo sido Karjakin a deixar escapar a vitória. A consequência foi que o actual campeão em título procurou dois empates balsâmicos nas partidas 6 e 7, sem que o aspirante também tenha corrido quaisquer riscos, o que produziu as duas partidas menos interessantes do match até agora. Anteontem tudo foi diferente. A oitava partida trouxe uma batalha intensa e dramática. Magnus Carlsen jogava com as brancas e queria ganhar a todo o custo. Infelizmente para ele o tiro saiu-lhe pela culatra. Após a abertura e algumas longas manobras de peças no meio jogo a partida estava equilibrada e nada parecia indicar outro resultado à vista senão mais um empate. Mas Carlsen estava disposto a tudo para evitar mais um empate. Ao 19º lance decidiu arriscar através de um movimento de Cavalo para “b5”que “convidava” Karjakin a preparar um ataque pelo seu flanco de Rei, enquanto que Carlsen lançaria o seu ataque pelo flanco de Dama, em qualquer caso, um jogo que dificilmente terminaria com um empate. Aqui, o aspirante tinha duas opções: aceitar mudar para um jogo agudo jogando 19...Dg5, recheado de possibilidades mas com alguns riscos, ou recusar esta via e continuar no caminho que tem vindo a seguir, de preferir ter que defender uma posição menos boa mas com fortes chances de empate se tal defesa for mesmo excelente. Karjakin optou pela segunda via jogando antes 19 ...Bc6.

Em consequência, Carlsen viu a sua posição melhorar. Mas entretanto a complexidade dos cálculos reflectia-se no relógio e chegou uma altura em que ambos os jogadores poucos minutos dispunham para realizarem vários lances a fim de atingirem o 40º lance nas duas horas de tempo regulamentar. Seguiu-se uma troca de golpes rápidos onde parecia que Carlsen melhorava cada vez mais a sua posição até que ao 35º lance este faz um duvidoso sacrifício de peão na casa “c5”. Aqui, Karjakin aceita o peão logo depois de trocar torres com 35...TxT, 36. DxT Cxc5. Agora é este último quem adquire uma pequena vantagem posicional. Porém, de novo o tempo é implacável e ao 37º lance, depois de Carlsen jogar 37. Dd6, Karjakin não vê a jogada de Dama que lhe daria uma vantagem ainda mais significativa (37...Da4) e escolhe a casa errada para a colocar jogando 37...Dd3. Imediatamente a seguir Carlsen sacrifica um Cavalo por um peão para recuperar o Cavalo na jogada seguinte com 38.Cxe6 fxe6, 39.De7 + Rg8, 40.Dxf6 a4, 41.e4 Dd7. Atingido o controle de duas horas com ambos os jogadores a terem completado 40 jogadas e dissipado o fumo da pólvora, as brancas estão ao ataque, mas as negras têm dois perigosos peões passados em “a” e “b”. A partida prosseguiu com 42.Dxg6+ Rg7, 43.De8+ Df8, 44.Dc6 Dd8, 45.f5 a3, 46.fxe6 Rg7 e concluído o 46º lance, as

brancas conseguem também ter um peão passado em ”e6” e até têm um peão a mais, mas os peões “a” e “b” das negras são perigosíssimos. Nada está decidido. As brancas sacrificam o seu peão em “e” mais avançado mas capturam o peão “b” das negras, com: 47. E7 Dxe7, 48.Dxb6 Cd3. Agora, as negras têm um peão passado em “a3” e as brancas um peão passado em “e4”. Resultado imprevisível. A partida prossegue com: 49. Da5 Dc5, 50.Da6 Ce5. Todos estão à espera de um complexo final em que o mais pequeno passo em falso é a derrota. É então que acontece um momento de génio. Karjakin aproveita uma jogada das brancas ao lance 51. De6 que parecia boa, para uma resposta profunda e refinada, tão simples quão eficaz, e joga 51. h5, ameaçando jogar de seguida 52... “h4” furando as defesas do Rei branco. Carlsen sente o perigo e faz uma jogada que parecia perfeitamente normal: jogou 52.h4, evitando o tal plano de ruptura das negras. É então que Karjakin responde com uma jogada que vai chocar os largos milhões de aficionados que seguiam a partida, os comentadores e o próprio campeão mundial, movendo o seu peão de “a3” para “a2”, a uma casa de “a1” onde seria promovido a Dama selando o desfecho da partida. Mas essa casa “a2” está controlada pela Dama branca em “e6”. Que significa isto? Terá o russo endoidecido, oferecendo

NOVA IORQUE, 21/11/2016 CARLSEN VS KARJAKIN Relativamente a esta partida que será sem dúvida histórica, aqui vão todos os seus lances, do princípio até ao fim:

1. d4 Cf6 2. Cf3 d5 3. e3 e6 4. Bd3 c5 5. b3 Be7 6. 0-0 0-0 7. Bb2 b6 8. dxc5 Bxc5 9. Cbd2Bb7 10. De2 Cbd7 11. c4 dxc4 12. Cxc4 De7 13. a3 a5 14. Cd4 Tfd815. Tfd1 Tac8 16. Tac1 16... f8 17. De1 Cg6 18. Bf1 Cg4 19. Cb5 20. a4 Bd5 21. Bd4 Bxc4 22. Txc4 Bxd4 23. Tdxd4 Txc4 24. bxc4 ago. 24... Nf6 25. Dd2 Tb8 26.g3 Ce5 27. Bg2 h6 28. f4 Ced7 29. Ca7 Da3 30. Cc6 Tf8 31. h3!? Cc5 32. Rh2 Cxa4 33.Td8 g6 34. Dd4 Rg7 35. c5? Rxd8 36. Cxd8 Cxc5 37. Dd6 Dd3? 38. Cxe6+ fxe6 39. De7+ Rg8 40. Dxf6 a4 41. e4Dd7 42. Dxg6+ Dg7 43. De8+ Df8 44. Dc6 Dd8 45.f5 a3 46. fxe6 Rg7 47. e7 Dxe7 48. Cd3 49. Da5?! Dc5! 50.Da6 Ce5 51. De6? h5! 52. h4?! a2! 0-1

assim a mais-valia das negras e a partida ao seu adversário? Não, nada disso. É que se o Campeão captura o peão em “a2”, as negras têm mate em 3 lances a menos que as brancas sacrifiquem a sua Dama Cavalo das negras (ver diagrama da posição final). Aqui, nesta posição, a ameaça é que se 53. Dxa2? As negras jogam 53....Cg4+ e o Rei branco só pode fugir para “h3”, única casa de fuga. Mas aí, segue Dg1!! , com ameaça de mate na jogada seguinte através de Dh2++. As brancas não têm um contra-ataque disponível, por exemplo através de um xeque perpétuo ao Rei negro com a sua Dama, e a sua única defesa será responder com Bf3 abrindo a fila “2” à sua Dama que, assim, pode defender a casa crítica do mate à vista, “h2”. Só que aí as negras jogam antes Cf2 + e as brancas teriam que trocar a sua Dama pelo Cavalo, para evitar xeque-Mate, o que equivaleria a uma derrota certa alguns lances mais à frente. Daí que, assim que Karjiakin jogou 52...a2, Carlsen depois de reflectir um pouco abandonou a partida. No fim do jogo o campeão mundial estava em estado de choque e não foi capaz de participar na conferência de imprensa. Quanto ao russo, sempre modesto e acessível, apesar da vitória sabe que ainda é muito cedo para celebrar o título apesar de só faltarem 4 partidas. “ é claro que estou muito contente porque tenho um ponto de vantagem, mas ainda faltam 4 partidas e Carlsen é bem capaz de recuperar. Não posso pensar em ganhar o título até que o duelo tenha terminado realmente”. Simferópol (Crimeia), 1995. Os participantes do torneio que está prestes a começar reúnem-se para votar se permitem a participação do prodigioso Sergei Karjakin, que aos cinco anos joga como os anjos mas que, porém, ainda não sabe apontar as jogadas. Decidem que sim, Sergei ganha a primeira partida e sai da sala dando piruetas acrobáticas, de que gosta quase tanto como do xadrez. Depois desta partida, Karjakin deve ter saído anteontem do Southsea Port, Fulton Market Building, como um menino com vontade de fazer piruetas. Podem acompanhar gratuitamente o jogo através do website www.chess24.com, mas as partidas começam às duas da manhã locais. João Valle Roxo

info@hojemacau.com.mo


16 (F)UTILIDADES TEMPO

C H U VA

hoje macau sexta-feira 25.11.2016

O QUE FAZER ESTA SEMANA Diariamente VAFA - SALÃO DE OUTONO Casa Garden

?

FRACA

MIN

14

MAX

18

HUM

65-95%

EURO

8.44

BAHT

EXPOSIÇÃO “MEMÓRIAS DO TEMPO” Macau e Lusofonia afro-asiática em postais fotográficos Arquivo de Macau (até 4/12) ESCULTURA “LIGAÇÃO COM ÁGUA” DE YANG XIAOHUA Museu de Arte de Macau (até 01/2017)

O CARTOON STEPH

PROBLEMA 128

SOLUÇÃO DO PROBLEMA 127

SHUT IN

SHUT IN [C] Filme de: Farren Blackburn Com: Charlie Heaton, Naomi Watts, Jacob Tremblay 14.15, 18.00, 21.45

YOUR NAME [B] FALADO EM CANTONENSE LEGENDADO EM CHINÊS E INGLÊS Filme de: Makoto Shinkai 16.00, 19.45

Sou quadrúpede mas, como é de conhecimento público, gosto de andar por aí, de me escapar, na maioria das vezes à noite, que é quando todos os gatos são pardos. Às vezes, enfio a minha ligeira obesidade debaixo de bancos de táxis, principalmente quando me apetece atravessar pontes e ir até ao outro lado. Não há uma única vez em que não regresse com alguma história. Um dia destes, chovia que Deus a dava. Aproveitei a entrada de um humano e escondi-me dentro do veículo. Ouvi a conversa. Um dizia o destino, enquanto o motorista visivelmente perdido reiterava que sabia perfeitamente onde estava a ir. Ao primeiro cruzamento errado, o coitado do humano alertou o homem do volante e ofereceu-se para indicar a direcção. Estaria tudo bem se não aparecessem as obras, as malfadadas obras da Taipa. Eis que o cruzamento que nos salvaria de meia volta à ilha estava cortado. Como se não bastasse, o motorista, que já não sabia a quantas andava, parou o carro e pediu ao coitado do tripulante para sair ali. Esta gente não sabe por onde anda, nem como anda e muito menos tem a hombridade de o admitir. Não contentes, atrevem-se a tentar despejar gente porque “estão perdidos”. Caros senhores, sois motoristas de táxi, certo? E mais não digo, porque eu não falo. Pu Yi

I´M NOT THERE | TODD HAYNES

Um filme que nos fala de Bob Dylan com personagens referentes a cada uma das suas épocas. O músico e poeta de muitas fases e personalidades é aqui mostrado em algumas delas. Um filme para quem gosta de música e não só, com interpretações brilhantes, especialmente de Cate Blanchett. Uma película para ver e ouvir. Sofia Mota

Alison Sudol, Ezra Miller 14.15, 16.45, 19.15, 21.45 SALA 3

SHOW ME YOUR LOVE [B] FALADO EM CANTONENSE LEGENDADO EM CHINÊS E INGLÊS Filme de: Ryon Lee Com: Nina Paw, Raymond Wong, Ivana Wong, Michelle Wai 14.30, 16.30, 21.30

SALA 2

FANTASTIC BEASTS & WHERE TO FIND THEM [B] [3D]

Filme de: David Yates Com: Katherine Waterston, Dan Fogler,

Filme de: David Yates Com: Katherine Waterston, Dan Fogler, Alison Sudol, Ezra Miller 19.00

FANTASTIC BEASTS & WHERE TO FIND THEM [B]

UM FILME HOJE

SUDOKU

DE

SALA 1

1.15

SEM SABER PARA ONDE VAI

Fundação Rui Cunha (Até 8/12)

C I N E M A

YUAN

AQUI HÁ GATO

EXPOSIÇÃO CONJUNTA DE PINTURA DE WANG LAN E GU YUE

Cineteatro

0.22

www. hojemacau. com.mo

Propriedade Fábrica de Notícias, Lda Director Carlos Morais José Editores Isabel Castro; José C. Mendes Redacção Angela Ka; Andreia Sofia Silva; Sofia Mota Colaboradores António Cabrita; António Falcão; António Graça de Abreu; Gonçalo Lobo Pinheiro; José Drummond; José Simões Morais; Julie O’Yang; Maria João Belchior (Pequim); Michel Reis; Paulo José Miranda; Rui Cascais; Rui Filipe Torres; Sérgio Fonseca Colunistas António Conceição Júnior; André Ritchie; David Chan; Fernando Eloy; Isabel Castro; Jorge Rodrigues Simão; Leocardo; Paul Chan Wai Chi; Paula Bicho; Rui Flores; Tânia dos Santos Cartoonista Steph Grafismo Paulo Borges Ilustração Rui Rasquinho Agências Lusa; Xinhua Fotografia Hoje Macau; Lusa; GCS; Xinhua Secretária de redacção e Publicidade Madalena da Silva (publicidade@hojemacau.com.mo) Assistente de marketing Vincent Vong Impressão Tipografia Welfare Morada Calçada de Santo Agostinho, n.º 19, Centro Comercial Nam Yue, 6.º andar A, Macau Telefone 28752401 Fax 28752405 e-mail info@hojemacau.com.mo Sítio www.hojemacau.com.mo


17 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

contramão

isabelcorrreiadecastro@gmail.com

E ´

Os caladinhos

uma boa notícia: há duas listas candidatas às eleições para a Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau. É uma boa notícia por várias razões, a começar pelo facto de dois, neste tipo de situações, ser sempre melhor do que um. Dois significa possibilidade de escolha, é sinónimo de pluralidade de ideias, oferece debate. Dois é um número que vem para a rua e trás com ele aquilo que não deve ficar dentro de portas, no segredo de deuses empedernidos. Dois é bom porque é mais – e há alturas em que ser mais é ser saudável, forte, visível. Quando se é apenas um, corre-se o risco de se ficar esquecido, escondido, perdido na unitária solidão. A existência de duas listas candidatas é também sinal de interesse visível pelo projecto da Escola Portuguesa. Acredito que todos – ou pelo menos a grande maioria – dos pais que tiveram filhos no estabelecimento de ensino ao longo destes anos se interessaram pela escola. Mas todos sabemos como é que as coisas são: os dias passam depressa, os anos também, há o trabalho e há os filhos, os que andam na escola e os outros, há tudo e não há tempo para tudo. Há que fazer escolhas e essas opções passam, muitas vezes, por deixar de fora uma certa participação cívica que faz bem e que, acima de tudo, é necessária, muito necessária. O facto de haver pessoas suficientes para a constituição de duas listas revela uma dinâmica interessante numa comunidade que nem sempre tem espaço, oportunidade e margem de manobra para trabalhar por ela e para ela. É uma comunidade – e é da minha comunidade que falo – que também falha por, frequentes vezes, emudecer perante as coisas que lhe estão mais próximas e pelas coisas de Macau, aquelas que são transversais a questões identitárias. Faz parte do modo como se organiza – ou como não se organiza, porque não tem necessariamente de se agrupar. Faz essencialmente parte da maneira como se tem constituído: de forma esparsa e provisória, como se Macau fosse um favor, como se fosse um acto de caridade, como se fosse uma realidade temporária, com os dias contados. Nota-se isto em quem chega agora, em que tem chegado nos últimos anos. Com os dias da Administração portuguesa cada vez mais distantes, com os obituários que se vão acumulando sobre pessoas da comunidade que, numa e noutra área, pelas mais diversas razões, deixaram marcas na cidade, o grupo (em sentido alargado) vai crescendo de forma desencontrada. De forma silenciosa.

CLYDE BRUCKMAN, BUSTER KEATON, THE GENERAL

ISABEL CASTRO

O silêncio deve ser respeitado – mas não é necessariamente bom se for justificado com o medo de, o receio de, os problemas com, o não tenho nada que ver com isto. Toda a gente tem tudo que

Toda a gente tem tudo que ver com isto, porque é aqui que vive

ver com isto, porque é aqui que vive. O silêncio deve ser respeitado, mas virar as costas ao exercício da cidadania e querer que os outros façam o mesmo é um caso mais complicado. A cidadania assume muitas formas. Tem muitos contornos. O associativismo é só um deles, mas é importante. Dois é melhor do que um porque nos obriga a tirar a poeira dos ombros. Que haja sempre tudo em duplicado, que o silêncio da solitária unidade tem dias é que é insuportável.

OPINIÃO


18 OPINIÃO

hoje macau sexta-feira 25.11.2016

um grito no deserto

PAUL CHAN WAI CHI

Linhas de Acção Governativa para 2017

ARCHIE MAYO, MY MAN (1928)

C

“Macau é um lago de águas estagnadas com umas pequenas ondulações. A loiça suja é tanta que não fica a dever nada à do 16º Festival de Gastronomia!”

OMO habitualmente o Chefe do Executivo, Chui Sai On apresentou na Assembleia Legislativa o Relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para o ano financeiro de 2017. Seguidamente as várias áreas administrativas serão analisadas e os debates vão prolongar-se até 6 de Dezembro. Mas que ninguém inveje a sorte dos jornalistas encarregados de cobrir as discussões plenárias, porque serão inevitavelmente maçadoras e vai ser muito difícil encontrar temas que valha a pena destacar. Como já era esperado o documento não contém nada de inovador ou surpreendente, para além da habitual menção à distribuição de dinheiros e aos aumentos de salários. O Governo da RAEM continua a colocar em primeiro lugar a defesa da estabilidade e da prosperidade, especialmente porque convém levar as coisas com calma, atendendo à proximidade das eleições para a Assembleia. Quanto à criação do Novo Órgão Municipal, aparentemente antes de 2018 não haverá novidades. Mas se olharmos para assuntos como a eleição directa de 50% dos deputados e o sufrágio universal na escolha do Chefe do Executivo, chegamos à conclusão que estas matérias nunca passarão de slogans e “agendas” para matar o tempo na Assembleia Legislativa, a menos que muitas vozes populares se ergam para as fazer valer. Os debates da Área de Administração e Justiça limitam-se a ser sessões de interpelação oral, resumindo-se a infindáveis sequências de perguntas e respostas. Os leitores mais curiosos podem verificar que as próximas sessões justificam o que acabei de dizer. Macau é um lago de águas estagnadas com umas pequenas ondulações. A loiça suja é tanta que não fica a dever nada à do 16º Festival de Gastronomia! Ultimamente tem-se ouvido dizer que o Mar Morto pode secar um dia. E este lago de águas estagnadas, será que um dia destes começa a cheira mal? Nos últimos anos a economia de Macau tem lucrado com as reformas verificadas na China e com a política dos “Vistos Individuais”. No entanto a taxa de câmbio entre o yuan e o

HKD caiu recentemente de 1000 HKD = 830 Yuans, durante Agosto de 2015, para 1000 HKD = 883 Yuans. Quando as pessoas se apercebem que o dinheiro que possuem está constantemente a desvalorizar, quem é que tem vontade de o guardar? O crescimento anormal do mercado imobiliário, a emissão descontrolada de dinheiro em papel e o aumento do crédito mal-parado, são fenómenos prejudiciais que, a manter-se, podem fazer com que a economia chinesa decaia à medida que a americana dispara. Depois da 6ª Sessão Plenária do 18º Comité Central do Partido Comunista Chinês, o Presidente tem-se deslocado constantemente para tratar de assuntos de política interna e de crescimento financeiro. Em Hong Kong, o Chefe do Executivo movido pelo desejo de ser reeleito, utilizou a questão da “independência do território”, um conceito sem pernas para andar, para levar o Comité Permanente do Partido a interpretar a Lei Básica. Talvez, do seu ponto de vista, o Governo Central não esperasse que os tumultos fossem uma ameaça de mudança e quantas mais facções e desentendimentos houver em Hong Kong, mais hipóteses terá de ser reeleito. Já o Chefe do Executivo de Macau só quer que as coisas se mantenham o mais sossegadas possível até ao fim do seu mandato, e o resultado das eleições do próximo ano vai certamente assegurar que assim seja. No que respeita à eleição de 2019 para a chefia do governo, os candidatos que se vão apresentar serão aqueles que forem aprovados pelo Governo Central já que não há muitas opções no pequeno círculo político de Macau. É possível que o Governo Central saiba mais sobre Hong Kong e Macau do que os seus habitantes. Se Leung Chun Ying for sensato retira-se de cena enquanto mantiver a boa forma. Em Macau, com o início do julgamento do antigo Procurador do Ministério Público – que, alegadamente, cometeu muitíssimos crimes -, espera-se que ainda saiam muitos coelhos da cartola. O que está para vir dos desenvolvimentos do “caso da permuta do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long” pode funcionar como um detergente para desinfectar as nódoas da corrupção espalhadas por Macau. Oxalá possa lançar uma luz de esperança sobre as sombras que cobrem a cidade. É certo que as Linhas de Acção Governativa para 2017 não trazem surpresas, mas é possível que grandes surpresas estejam à vista num futuro não muito distante. Ex-deputado e membro da Associação Novo Macau Democrático


19 hoje macau sexta-feira 25.11.2016

PERFIL

MARIETA DA COSTA, ARQUITECTA

J

Á conhecia Macau antes de vir para cá morar: o território era destino de férias por causa de ligações familiares. Há cinco anos, fez as malas e decidiu deixar Londres, cidade onde nasceu o primeiro filho, e mudou-se para a terra do marido. “O espírito de comunidade em Inglaterra não existe da mesma maneira que em Macau e foi também isso que nos fez voltar, além de que o meu marido tem cá família”, diz Marieta da Costa, arquitecta. Um salto no tempo para o início do percurso que, feitas as contas, a fez chegar aqui. Marieta da Costa chegou ao final do 9o ano e, à semelhança de quase todos os miúdos com 14 ou 15 anos, não fazia ideia do que queria ser quando fosse grande. A mãe ainda lhe recordou que gostava de desenhar, tinha jeito e era criativa, mas a arquitecta não imaginava, na altura, que fosse possível colocar a criatividade ao serviço de uma profissão. “A minha mãe decidiu pôr-me numa universidade a fazer exames psicotécnicos. Nessa altura, ainda não se ouvia falar muito disso. Estive um dia inteiro a fazer exames muito rigorosos e, quando vieram os resultados, dava tudo para Arquitectura, Design de Interiores, Design de Equipa-

A fazedora de mundos mentos, professora de Educação Visual”, conta. A mãe decidiu procurar “a melhor escola de Artes em Portugal, ao nível do secundário”, e foi assim que acabou por ir parar à António Arroio, onde estudou Design de Equipamentos, “com uma componente técnica muito grande”. Curso terminado, quis ser arquitecta. “Não me adaptei, porque vinha de um ensino muito artístico e a universidade de arquitectura onde estive era muito ‘vamos copiar o Siza Vieira’, ‘porque é que ele é muito bom?’, ‘porque é o ‘Souto de Moura é fantástico?’. Queria fazer coisas à minha maneira”, explica. Primeiro ano feito, esteve de férias em Inglaterra para melhorar o inglês. Ao final de um mês, voltou para Portugal, fez as malas e regressou a Londres. “Foi um grande choque para os meus pais, porque o ano lectivo em Inglaterra já tinha começado e normalmente prepara-se a entrada no ano anterior.” Os pais tinham medo que perdesse o interesse pelos estudos. “Disse-lhes que ia trabalhar e ver qual era a melhor universidade para fazer arquitectura, e assim fiz.” Marieta da Costa começou a trabalhar, enquanto preparava as candidaturas às universidades de Arquitectura. Porque também

se interessava por Design de Interiores, concorreu a um curso nesta área. Entrou em todas as instituições de ensino superior, mas a escolha foi para a Chelsea College of Arts. A licenciatura em Arquitectura exigia sete anos, um tempo que, à época, era em demasia. O Design de Interiores tinha vencido. “No último ano conheci o meu marido, estávamos a fazer o mesmo curso, mas faltava-nos qualquer coisa. Eu sabia que me faltava arquitectura. Então acabei o curso e fui para a London Metropolitan University.” Foram anos “muito bons”, de “muito trabalho”. “Entretanto, engravidei. Tive de fazer a minha defesa de projecto enquanto o Lio ficava nos braços do pai à espera que a mãe acabasse. Foi um bocado complicado, mas correu tudo muito bem.” A mudança para Macau foi fácil, mas ao nível profissional a integração foi “um pouco complicada”, sobretudo porque decidiu por um caminho alternativo. “Não queria ir trabalhar para casinos, nem no sector privado. Decidi abrir a minha empresa. Não andei à procura de trabalho. Ia fazendo muito design de interiores, fazia muito restauro. Há dois anos comecei com um projecto novo”, explica.

O “projecto novo” chama-se arquitectarte: aulas de arquitectura para crianças com idades compreendidas entre os três e os cinco anos. “Não é ensinar Arquitectura no verdadeiro sentido da palavra. É pegar numa forma, num objecto, e dar uma série de ideias para que percebam o que é habitar o sítio onde estamos, olhar em redor e ver as coisas de forma diferente”, descodifica. “É pegar num quadrado e explicar que dá para fazer uma coisa 3 D, um objecto. Trabalho muito a tridimensionalidade.” Quanto a Macau, é uma cidade que a faz sentir-se em casa. Cinco anos depois de se despedir de Londres, as comparações continuam a ser inevitáveis. “Toda a gente diz que Macau é difícil e eu vejo muitas lacunas mas, comparando com outros sítios, existe imenso apoio”, aponta. Além do factor familiar, há “os amigos que se constroem e que se adoptam como parte da família”. Marieta da Costa encontra “um espírito de comunidade” que não existia no sítio onde viveu década e meia. Isabel Castro

isabel.castro@hojemacau.com.mo


Restaurantes com estrelas Michelin são bons para a dieta do cliente e da sua carteira.

sexta-feira 25.11.2016

Atlântido

YOHAN SOUSA NO GP INTERNACIONAL DE KARTING

Estreia em Coloane

P

ORTUGAL vai a ter um piloto no Grande Prémio Internacional de Karting. A emblemática competição que será disputada no Kartódromo Coloane, em Macau, entre 8 e 11 de Dezembro, contará com Yohan Sousa no Campeonato CIK FIA Ásia-Pacífico KZ, a corrida cabeça de cartaz. O jovem luso – que não tem passado despercebido às principais estruturas de Karting internacional –, será a aposta dos italianos da CRG, apesar do piloto português nunca ter disputado a categoria KZ, onde se inserem os karts mais rápidos e equipados com caixa de velocidades. Um marco muito importante para Sousa mas também para Portugal.

“Será a minha estreia na competição, bem como na categoria KZ onde actuam os melhores pilotos do mundo e que, curiosamente, vi correr nas categorias de topo mundial quando ainda me estava a iniciar no Karting.”

DESAFIO JOVEM

Com quatro títulos de campeão nacional de Karting, quatro Taças de Portugal e um ‘inesquecível’ terceiro lugar no Mundial Iame em Le Mans, França, entre outras conquistas importantes, Yohan Sousa, com apenas 16 anos de idade, tem necessariamente de apostar nas competições onde alinham os melhores do mundo para assim poder evoluir mais e tentar conquistar resultados de relevo internacional, não só importantes para si mas também para Portugal, que passará assim a ter mais pilotos do desporto automóvel a dignificar as cores nacionais além-fronteiras. Por isso mesmo, Yohan Sousa aceitou o

Campeonato Ásia-Pacífico é muito importante e também para a Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting. Será a minha estreia na competição, bem como na categoria KZ onde actuam os melhores pilotos do mundo e que, curiosamente, vi correr nas categorias de topo mundial quando ainda me estava a iniciar no Karting.”, sublinhou Sousa, na antevisão da prova.

YOHAN SOUSA PILOTO

desafio lançado pelos italianos da CRG e vai correr na RAEM. “Gosto muito de correr em Portugal onde já conquistei vários títulos, mas naturalmente se quero evo-

luir como piloto e alcançar algo mais para mim e para o meu país, tenho de disputar as melhores competições internacionais. Por isso mesmo, a minha participação no

O jovem piloto vai correr aos comandos de um kart equipado com chassis CRG e motor TM. Sousa não será o único português em pista, pois João Afonso vai novamente estar presente, mas em representação da RAEM. Sérgio Fonseca

info@hojemacau.com.mo

Violência e caixão

Conflitos entre grupos de artes marciais em Díli causam um morto

P

ELO menos uma pessoa morreu em confrontos entre dois grupos rivais de artes marciais que ocorreram esta quinta-feira na zona ocidental da capital timorense, Díli, confirmou à Lusa fonte policial. Os confrontos, explicou a mesma fonte, envolvem elementos de pelo menos três grupos de artes marciais, o 77, que tem particular força no bairro de Bebonuk, e os Kera Sakti e PSHT (Persaudaraan Setia Hati Terate). A mesma fonte explicou que dezenas de jovens dos grupos se envolveram em confrontos com muita tensão a manter-se ontem, ao final do dia, nas zonas de Bebonuk, Fatuhada, Marconi e próximo da zona de depósitos da Pertamina. “Temos mais polícia no terreno, onde tem estado e vamos acompanhar a situação durante a noite”, disse a fonte policial. A tensão aumentou quando o cadáver da vítima dos confrontos de quarta-feira começou a ser velado na casa da família. Confrontos entre elementos de grupos rivais de artes marciais são comuns e já no início deste mês

se registaram disputas violentas na zona de Hera, a cerca de 10 quilómetros leste de Díli, que terminaram com dois feridos, cinco casas queimadas, várias motas destruídas e oito detidos. Nos últimos meses têm circulado pelas redes sociais vídeos que mostram combates entre elementos de grupos rivais de artes marciais, tanto em Timor-Leste como na Irlanda, onde estão imigrados muitos jovens naturais de Timor-Leste. Esses confrontos suscitaram já alertas das autoridades irlandesas que tiveram que intervir em alguns casos, detendo e levando a julgamento alguns timorenses. Fundada em Java Oriental, na Indonésia, em 1922, a PSHT tem actualmente mais de um milhão de membros naquele país, bem como elementos na Malásia, Singapura, Holanda, França e Portugal, entre outros. Em Timor-Leste, onde a PSHT chegou em 1983, a organização tem cerca de 3.500 “gurus”, os instrutores mais graduados, com mais de 30 mil membros em todo o país. A Korka e a Kera Sakti têm milhares de apoiantes.

AL CANDIDATOS A DEPUTADOS VÃO TER DE PRESTAR FIDELIDADE

S

PUB

Ó vai poder candidatar-se a deputado quem declarar fidelidade a Macau como RegiãoAdministrativa Especial da China e nunca tiver agido contra a Lei Básica. A notícia foi avançada ontem pela Rádio Macau e é a primeira consequência para o território da interpretação do Comité Permanente da Assembleia Popular

Nacional sobre a questão do juramento dos deputados de Hong Kong. A decisão sem precedentes de Pequim contra os movimentos independentistas de Hong Kong motivou um aditamento a uma lei local que está a ser discutida na Assembleia Legislativa – a lei eleitoral para as legislativas. O

Governo entregou ontem aos deputados uma nova versão da proposta que obriga os candidatos a assinar uma declaração de fidelidade ao regime. Chan Chak Mo, presidente da 2ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, explicou que têm também de provar que o compromisso é verdadeiro.

“Mesmo que tenham assinado a declaração, se houver factos comprovados de que não defendem a RAEM, pode-lhes ser retirado o estatuto. Ou seja, são inelegíveis”, frisou Chan Chak Mo, em declarações transmitidas pela emissora. O deputado diz que “a comissão não tem opinião” sobre esta matéria

por entender que está perante um facto constitucional, um resultado óbvio e directo da aplicação da Lei Básica. Chan Chak Mo disse ainda que nenhum dos actuais deputados corre o risco de perder o mandato ao abrigo desta obrigação.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.