Hoje Macau 31 OUT 2016 #3686

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DIRECTOR CARLOS MORAIS JOSÉ

AGÊNCIA COMERCIAL PICO • 28721006

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MOP$10

SEGUNDA-FEIRA 31 DE OUTUBRO DE 2016 • ANO XVI • Nº 3686

hojemacau LAG 2017 ACM ENTREGA PROPOSTAS A CHUI SAI ON

FESTIVAL LITERÁRIO

EVENTOS

ENSINO SUPERIOR

O Porto aqui tão perto PÁGINA 7

h

Diário de Pequim Pintores antigo ANTÓNIO GRAÇA DE ABREU

YAO ZUI

OPINIÃO

Escape RUI FLORES

BEBÉ COM HIPÓXIA

As razões de um hospital PUB

PÁGINA 9

São oito as propostas concretas deixadas pela Associação Comercial de Macau ao Chefe do Executivo. Revisão e análise de questões ligadas às relações laborais, ao Regime de Previdência Central, aos

condomínios ou às pequenas e médias empresas são, entre outras, medidas que a mais influente associação de Macau quer ver concretizadas. O Chefe ouviu e promete estudar o assunto.

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CENTENÁRIO

BENJAMIM VIDEIRA PIRES

O LEGADO E O HOMEM GRANDE PLANO

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NA ROTA DE BALI

Os oito mandamentos


2 GRANDE PLANO

E

NTENDO não ser o calendário que determina ou regula a evocação, a celebração, a reprodução da memória. Mas ajuda. Sobretudo se for democraticamente gerido. Porque há que conciliar disponibilidades, recursos, oportunidades, mesmo numa era dita de informação, cada vez mais desinformada pela atoarda da ilusão de que toda ela está acessível à distância de um “click”. A memória, a sua reprodução, o apelo que lhe fazemos são processos selectivos, e muito, todos o sabemos. Como indivíduos, cidadãos, profissionais, afiliados, amigos, precisamos, utilizamos e reproduzimos pedaços de memória(s), nela nos visitando, revisitando e representando, quer individual, quer colectivamente. Uns mais, outros menos. E Macau é um local de memórias, de muitas diversas memórias, nem sempre partilhadas, nem sempre plenamente conhecidas, nem sempre unanimemente aceites ou reconhecidas por todos, a ela arribados de um sem número de proveniências e por outras tantas vias. Memórias nem sempre evocadas, ou dados a conhecer por aqueles que reclamam o direito à cidadania e à intervenção num espaço que também assumem como seu. Vem tudo isto a propósito da passagem, neste 30 de Outubro, do centenário do nascimento do padre jesuíta Benjamim Videira Pires (1916-1999), um homem que dedicou a sua vida a Macau, onde permaneceu de 1949 a 1998, e nela se afirmou pela acção educativa, criando uma instituição de ensino de elite, vocacionado para a instrução da população chinesa, mas também pelo contributo intelectual honesto, rigoroso, e marcante nas décadas de 50 a 80 do século passado.

ANTROPOLOGIA E OUTROS ESTUDOS

Ensaísta, versou sobretudo temas antropológicos, como é o caso da sua conhecida obra Os Extremos Conciliam-se (1988), que foi vertida para chinês; e históricos, de que destaco a história da Companhia de Jesus, Ordem na qual ingressara jovem, em 1932, e o estudo da actividade marítima de Macau. Recorreu para isso a fontes primárias, pesquisando e disponibilizando documentos até então inéditos, anotando-os e comentando-os profusa e cuidadosamente, deixando obra de relevo, em grande parte ainda hoje dispersa. Mas foi

BENJAMIM VIDEIRA PIRES UM CENTENÁRIO... também poeta, dramaturgo, jornalista e interventor político, para além de pedagogo e de sacerdote, naturalmente. Menos conhecida é actividade de Videira Pires em prol do estudo, classificação e perservação do património edificado de Macau, realizada no seio da Comissão de Estudo do Património Artístico e Histórico de Macau, criada em 1960 e reformulada em 1962, que integrou, sobre o que lavrará relatório em 1963. Coube-lhe o estudo detalhado das igrejas e cemitérios antigos (o que constituí uma novidade), o que é testemunhado pela bibliografia que produziu neste domínio, onde pontuam, entre outros, textos sobre vestígios e achados arqueológios. Também será chamado a integrar a comissão incumbida da recuperação e reorganização do espólio do Arquivo do Leal Senado, após os incidentes do 1,2,3, em 1966 — onde aliás teve um papel activo na defesa das Escolas Católicas de Macau, cujo Conselho secretariava —, embora a tarefa tenha sido maioritariamente realizada por Luís Gonzaga Gomes (1907-1976), à época (1962-1967) director da Biblioteca Pública Municipal, situada no edifício da mesma câmara de Macau, como se sabe. É certo que, de quando em vez, o nome de Videira Pires vem sobretudo à baila nos escritos de António Aresta e de Jorge Rangel, um dos poucos a relebrarem o centenário e a promover, através do Instituto Internacional de Macau, discreta sessão assinalando a efeméride e relembrando o homem, o padre e o intelectual, Benjamim Videira Pires, na qual foi oradora Beatriz Basto da Silva. Tratou-se, tanto quanto julgo saber, da única homenagem institucional que a memória e o legado de Benjamim Videira Pires suscitaram, pelo menos em Macau. Não que os seus méritos não tenham sido reconhecidos, entre outros, pela Academia Portuguesa de História, que o fez sócio correspondente em 1988, quando já era sócio-efectivo da Academia de Marinha de Lisboa. É de lamentar. Relembro a forma esforçada e proveitosa como a Biblioteca Central de Macau, do Instituto Cultural, assinalou a passagem do 90º aniversário de Monsenhor Manuel Teixeira (1912-2003) com iniciativas que se prolongaram até 2004, tal como aconteceu com outras instituições, ou grupos ad-hoc, em Portugal. Manuel Teixeira foi indubitavelmente o mais mediático e célebre de todos os estudiosos de Macau

UMA VIDA DEDICADA A MACAU


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“Macau tem uma palavra a dizer sobre o valor e a utilidade destes e de outros legados, deve relembrá-los e ensiná-los como homens de Macau e do seu património, cultural, histórico, literário e historiográfico.” nela residentes do Século XX. Não pretendendo aqui estabelecer comparações entre as personalidades, contributos e legados destes dois homens de vulto, Teixeira e Videira Pires, que partilharam interesses comuns, conviveram, colaboraram (rivalizando um pouquinho é certo, de quando em vez), trilhando caminhos idênticos e atravessando os mesmos tempos. Apenas pretendo sublinhar que não pode a nossa memória colectiva, não podem as nossas instituições, não devemos nós pautar-nos pelo brilho das luzes da ribalta e pelo volume do eco com que esses nomes soam na cidade a partir de além-fronteiras. Macau tem uma palavra a dizer sobre o valor e a utilidade destes e de outros legados, deve relembrá-los e ensiná-los como homens de Macau e do seu património, cultural, histórico, literário e historiográfico, para nos ficarmos por aqui. Quero com isto dizer que instituições públicas como o Instituto Cultural e a sua Biblioteca, ou privadas como a Companhia de Jesus e o seu Instituto Ricci de Macau, estabelecimentos de ensino superior como, por exemplo, a Universidade de S. José, entre outros, e para apenas citar os mais óbvios, deviam uma palavra e um gesto de atenção a Benjamim Videira Pires. Ignoro se o seu tão querido colégio, rebaptizado de “Mateus Ricci” em detrimento de “Melchior Carneiro”, e não obstante todos os tristes percalços por que passou nos finais dos anos 1990, relembrou ou não o homem que com tanto esforço e dedicação o criou em 1961.

POR FAZER

Mas, para além da evocação e da homenagem, muito há a fazer: Urgentemente ― não sou a primeira a dizê-lo, mas nunca será de

mais repeti-lo ―, a inventariação e localização da obra de Benjamim Videira Pires, sobretudo a que se encontra dispersa pelas muitas revistas e jornais que dirigiu ou onde colaborou, assim acontecendo também com as inúmeras entradas que preparou para a Enciclopédia Luso-Brasileira, da editora Verbo. E, neste campo, a Biblioteca Central podia e devia oferecer o seu prestimoso contributo, na pesquisa de todo este acervo, tal como o fez para Monsenhor Manuel Teixeira, actualizando o trabalho que iniciou em 1992 e desenvolveu em 1997, se bem que ainda bastante lacunarmente, como reconheceu o mesmo Jorge Arrimar, que à época dirigia a instituição e assinou as notas introdutórias desses dois pequenos catálogos. Há ainda a considerar a reunião de manuscritos, alguns eventualmente inéditos, levantando-se aqui a magna questão da localização presente do espólio(s) do próprio Videira Pires, sobre o que não me detenho, a que acresce toda a informação iconográfica e registo audio-visual que lhe respeitem. Depois, a reunião em volume(s) dessa obra dispersa, e a reedição de alguns dos seus livros, hoje já inacessíveis, sem pôr de lado, a eventual tradução para língua chinesa, ou até inglesa, do que se considerar mais relevante para o desenvolvimento dos “estudos de Macau”, em que se empenham grupos e instituições, domínio em que o contributo de Benjamim Videira Pires tem lugar de direito próprio. Finalmente, o próprio estudo da vida, obra e pensamento de Benjamim Videira Pires, na suas diversas vertentes, para o que já dispomos de textos biográficos, mais ou menos emotivos, como é o caso de P. Benjamim Videira Pires, Meu Irmão, da autoria de Francisco Videira Pires, dado à estampa pelo Instituto Internacional de Macau em 2011, e alguns contributos deAntónio Aresta, de que destaco “AIdentidade Cultural de Macau no Pensamento de Benjamim Videira Pires, SJ”, incluso no seu livro, Macau Histórico Cultural, que acaba de ser dada à estampa pela editora Livros do Oriente. Mas há certamente muito a dizer sobre o pedagogo, o pensador, o mediador e o político. Uma ressalva final, esta sim, contendo talvez alguma novidade, e que reputo da maior importância. Qualquer edição ou reedição da obra de Benjamim Videira Pires deverá ser cotejada com os exemplares dessas mesmas obras que lhe pertenceram já que, atendendo ao rigor e seriedade intelectual que o caracterizavam, tudo anotava,

Homem na cidade

C

HEGOU a Macau em 1948 e aqui passou grande parte da vida. “Foi um homem de Igreja, mas foi um homem com impacto social”, diz Luís Sequeira. É assim que o jesuíta começa por descrever Benjamim António Videira Pires, um retrato que “não é fácil de fazer para conseguir ser objectivo”. É que Videira Pires, cujo centenário do nascimento se assinalou ontem, 30 de Outubro, foi um homem com várias dimensões. Transmontano nascido em Mirandela, saiu de casa cedo, como acontecia à época, para estudar. Depois de passar pelo seminário em Guimarães, entrou na Companhia de Jesus, em 1932. Quatro anos depois, concluiu o curso superior de Humanidades Clássicas e de Literatura Portuguesa. Já em

corrijia, acrescentava, mesmo após a publicação dos textos, o que, naturalmente, merece e é de justiça ser considerado, para além de ser urgente recuperar. E isto enquanto

“Há ainda a considerar a reunião de manuscritos, alguns eventualmente inéditos, levantando-se aqui a magna questão da localização presente do espólio(s) do próprio Videira Pires.”

Braga, estudou Filosofia e, em Granada, Teologia. A ordenação enquanto sacerdote aconteceu em 1945. Três anos depois chegou a Macau. Luís Sequeira conta que Videira Pires se “impunha pelo seu valor intelectual e sensibilidade aos problemas da sociedade”. Foi este lado do jesuíta que o levou a ser voz activa na Macau administrada então por Portugal. “Mantinha num jornal uma série de textos chamada ‘Calçada das Verdades’, escrevia artigos de opinião”, explica. “Sendo um homem da Igreja, era um homem com impacto e tinha presença na sociedade de Macau. Ao mesmo tempo, recordo que era uma pessoa com um temperamento delicado, respeitoso, com muito boas relações humanas, expressando-se até na recolha de fundos, ao nível internacional, para as suas obras” no território. À chegada a Macau, Benjamim Videira Pires estudou chinês e foi professor do Liceu Nacional Infante D. Henrique, além de exercer funções pastorais. “A sua grande obra foi o Instituto Melchior Carneiro – foi ele que lançou esse grande colégio – embora na parte final da sua vida tivesse sido transformado no Colégio Mateus Ricci”, contextualiza Luís Sequeira. O padre jesuíta faz referência à vertente das humanidades e literatura que Videira Pires cultivava: deixou obra poética, “era um homem sensível, delicado, era culto, lançou-se na poesia e fazia-o bem”. Depois, há a dimensão da história, “com muita repercussão ao nível internacional, com pequenos artigos ligados à presença portuguesa no Oriente – sempre manteve esta linha – e teve uma postura que lhe granjeou respeito no campo da história”. Luís Sequeira repara que, “por vezes, era demasiado patriótico, embora fosse uma pessoa com o sentido da interculturalidade”. A espiritualidade é outro lado recordado: “Foi sempre um homem muito dedicado, atento à comunidade cristã, particularmente à de língua portuguesa”. Benjamim Videira Pires deixou Macau em Agosto de 1998. Morreu no ano seguinte em Portugal.

tivermos acesso àquela que foi, pelo menos em parte, a sua biblioteca pessoal ou/e da residência dos jesuítas (outro tema a merecer a atenção de especialidade, tanto mais que anotava e criticava profusamente o que lia e consultava), e que integra hoje o espólio do Instituto Ricci de Macau. Exemplifico apenas com um conjunto de textos, profusamente documentados, que o nosso autor preparou sobre os “Jesuítas e Macau”, tema de investigação que o ocupou desde cedo mas que terá ganho maior fôlego quando pretendia assinalar a passagem do IV centenário do estabelecimento dos inacianos na cidade, em 1964, dando então à estampa um pequeno volume sobre o assunto. Sabe-se que o Padre Videira Pires preparava a edição de vários

Isabel Castro

isabel.castro@hojemacau.com.mo

volumes sobre o tema, o que tudo já estaria mais ou menos delineado em 1994, tratando-se muito possivelmente da reunião dos artigos que vinha publicando desde os inícios da década de 1950 nas páginas da “Religião e Pátria”, do “Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau”, da Enciclopédia Luso-Brasileira, da “Brotéria” e noutras sedes. Por onde andará tal trabalho desconheço, mas talvez valesse a pena indagar. O padre Videira Pires teria certamente em mente uma versão revista e anotada desses textos, contemplando as aludidas correcções, acrescentos e actualizações bibliográficas, que atrás referi e de que junto exemplos que bem atestam da relevância do legado que temos entre mãos e de que urge cuidar. Tereza Sena

Historiadora


4 POLÍTICA

hoje macau segunda-feira 31.10.2016

AL HO IAT SENG QUER TERMINAR ANÁLISE DE PROPOSTAS NESTA SESSÃO LEGISLATIVA

O

presidente daAssembleia Legislativa (AL), Ho Iat Seng, espera que as mais de dez propostas que estão sob análise do hemiciclo cheguem ao fim de apreciação ainda nesta sessão legislativa. A informação é divulgada pelo Jornal do Cidadão em que Ho

Iat Seng, em entrevista, apela também à entrega de propostas para que estas não caiam no abandono. O presidente da AL assegurou que o organismo “ iria fazer tudo ao seu alcance para ajudar o Governo a concluir as apreciações”. “Quanto às propostas

que ainda não foram entregues, a AL vai tentar coordenar com o Governo”, afirma. Por outro lado, Ho Iat Seng considera que é necessário ter em conta o tamanho das propostas, “se é uma proposta completamente nova ou se só vai alterar alguns artigos da lei,”

explicou, exemplificando com a revisão do Código Penal relativamente aos crimes sexuais, cuja revisão pode passar pela adição de artigos que já obtiveram consenso social. Quando questionado acerca do processo da Lei de Terras, Ho Iat Seng voltou a

explicar que não se trata de uma revisão mas sim de uma interpretação legal, sendo que a AL ainda está na fase de audição das reuniões tidas a esse respeito. O presidente estima que a presente análise termine entre Março e Abril do próximo ano. A.K. (revisto por SM)

LAG 2017 ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE MACAU APRESENTA PROPOSTAS A CHUI SAI ON

Os oito pedidos de quem manda presidente rematou pedindo que “se aproveite ao máximo as oportunidades trazidas pela ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, no sentido de reforçar o desenvolvimento da cooperação regional”.

GCS

A revisão da lei laboral, os tradicionais incentivos às pequenas e médias empresas, a cautela em tempos de prosperidade para evitar a desgraça nos dias difíceis. A mais influente associação foi falar com o Chefe e levou os recados por escrito

BOA-FÉ NO EQUILÍBRIO

Quanto à reacção do Chefe do Executivo, Chui Sai On concedeu que “diferentes opiniões da sociedade” indicam que existem “dificuldades e problemas” na aplicação prática da lei das relações laborais, pelo que “a equipa governamental procura estudar as necessidades de uma eventual revisão”.

“A equipa governamental procura estudar as necessidades de uma eventual revisão” da lei das relações laborais, disse Chui Sai On

A

economia de Macau “é saudável”, a “estrutura de finanças públicas é estável e a taxa de desemprego é baixa”, mas o território “enfrenta vários desafios”, pelo que é preciso “manter a orientação de sempre, isto é, haver uma preparação para adversidades em tempos prósperos e ter planos face às eventuais conjunturas que surjam”. A ideia foi defendida pelo presidente da Associação Comercial de Macau (ACM), Ma Iao Lai, junto do Chefe do Executivo, em mais uma reunião de Chui Sai On no âmbito da preparação das Linhas de Acção Governativa para 2017. De acordo com um comunicado oficial, Ma Iao Lai disse ainda que há que “aproveitar, ao máximo, as medidas vantajosas que o Governo Central tem oferecido”. Princípios orientadores à parte, a ACM deixou oito propostas concretas que gostaria de ver concretizadas no plano de acção

do Executivo do próximo ano, a começar pela revisão das leis que digam respeito às relações entre as partes patronal e laboral. Ma Io Lai disse ainda é preciso auscultar opiniões sobre a proposta de lei referente ao Regime de Previdência Central Não Obrigatório. A associação entende também que convém estipular, “o mais rápido possível”, os diplomas e

regulamentos no âmbito da Lei da Actividade Comercial de Administração de Condomínios, da lei sobre a profissão dos seguranças dos prédios e do regime de trabalho a tempo parcial. Uma ideia muito contestada pelo sector laboral, mas que Ma Io Lai defendeu, tem que ver com a revisão da política de importação de motoristas profissionais, profis-

são neste momento vedada a não residentes. “Garantir o espaço de desenvolvimento das pequenas e médias empresas, concretizar a diversificação adequada da economia de Macau, bem como participar na estratégia “Uma Faixa, uma Rota; e acelerar a formação e atrair quadros qualificados, aprofundando o papel de plataforma” são ideias que fazem também parte da lista da ACM. O

O líder do Governo pronunciou-se ainda sobre o Fundo de Segurança Social (FSS), garantindo que, “com base no princípio de boa-fé”, o Executivo tenta “manter o equilíbrio dos devidos interesses das partes patronal e laboral”. “Os vários sectores da sociedade percebem a situação do Fundo de Segurança Social”, disse ainda Chui Sai On, citado na nota à imprensa. “Além da injecção de capital nos últimos anos, o FSS necessita aumentar as receitas, através do aumento do montante e da proporção das contribuições, por forma a que funcione, a longo prazo, de forma saudável, pois só assim é que se poderá salvaguardar ambas as partes patronal e laboral.”


5 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

É

a primeira reivindicação de uma lista de seis propostas deixadas a Chui Sai On, num encontro mantido para se falar das Linhas de Acção Governativa para 2017: a Associação Geral das Mulheres de Macau (AGMM) quer que o Executivo leve por diante o processo de legislação sobre a licença de paternidade com vencimento. Neste momento, a lei do território indica que os pais podem faltar apenas dois dias ao trabalho, após o nascimento dos filhos, sendo as faltas em questão justificadas. Tina Ho, presidente da AGMM, quis deixar claro ao Chefe do Executivo que a associação apoia a iniciativa do Governo em relação à licença de paternidade, tendo deixado uma proposta por escrito a Chui Sai On. Há outros assuntos que preocupam o organismo liderado pela antiga deputada: de acordo com uma nota à imprensa, a AGMM quer que seja promovida “a política favorável à família e generalizada a educação familiar”. Em matéria de saúde, as Mulheres defendem a generalização do rastreio do cancro cervical e do cancro da mama, e gostariam de ver acelerada a construção do Hospital das Ilhas. A construção da habitação pública – com maior qualidade –, os transportes públicos e medidas para facilitar a mobilidade da população são as restantes sugestões deixadas pela associação. O comunicado oficial não deixa pistas sobre a questão da licença de paternidade, mas diz que Chui Sai On concorda com “o reforço da educação junto dos pais, e a cooperação entre família e escola”, por corresponderem “à ideologia de educação moderna, favorecerem o estreitamento das relações entre pais e filhos e um crescimento saudável para as crianças”. Por isso, a questão “merece um estudo cuidadoso da parte do Governo para apoiar as escolas a desenvolver mais trabalhos neste sentido”. Quanto às medidas relacionadas com o bem-estar da população, o Chefe do Executivo afirmou, à semelhança do que tinha já feito em encontros com outras associações, que se prevê que possam ser mantidos os apoios actuais, atendendo à situação financeira que Macau vive.

Pais com direito a serem pais

Associação Geral das Mulheres quer ver licença de paternidade resolvida

A construção da habitação pública, os transportes públicos e medidas para facilitar a mobilidade da população são sugestões deixadas pelas Mulheres

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POLÍTICA


6 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

CPU VISITA A SUZHOU PARA TROCA DE EXPERIÊNCIAS

O Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) encontrou-se, em Suzhou, com membros dos departamentos locais, de modo a trocar ideias e opiniões acerca da conservação e revitalização dos bairros antigos bem como sobre o desenvolvimento articulado entre espaços históricos e as novas zonas urbanas. A visita decorreu entre 16 e 19 de Outubro e “embora o progresso histórico de Macau e de Suzhou seja diferente, também são cidades que fazem parte do património mundial, por isso, partilham aspectos comuns”, lê-se em comunicado emitido pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes.

HOJE MACAU

POLÍTICA

FAOM DIREITOS LABORAIS RECOLHEM 20 MIL ASSINATURAS

A Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) entregou na semana passada uma petição com mais de 20 mil assinaturas, recolhidas desde Setembro, a exigir a revisão da Lei Laboral de modo a contemplar a inclusão de recompensa na sobreposição dos feriados e a licença da paternidade com vencimento. Segundo a informação adiantada pelo Jornal do Cidadão, a FAOM solicita as mesmas regalias dadas aos funcionários do Governo no que respeita a sobreposição de feriados para que abranja todos os trabalhadores locais. Por outro lado, e segundo a Lei Laboral actual, os homens gozam de dois dias de licença de paternidade sem vencimento pelo que os Operários recordam que o Chefe do Executivo já mostrou apoio ao pagamento da licença de paternidade e que este é um assunto que reúne o consenso social e que necessita de ser revisto.

DEPUTADA QUER NÚMEROS MÓVEIS IDENTIFICADOS

Chan Hong, em interpelação escrita, questiona o Governo acerca da obrigatoriedade dos cartões telefónicos estarem associados ao nome dos seus titulares. A questão é cada vez mais premente, avança a deputada, dado o aumento das situação de assédio ou de fraude que em acontecido via telemóvel. “Como em Macau não é exigida a associação de um número móvel a uma pessoa, os casos criminosos têm tido dificuldades em avançar”, afirma. Chan Hong dá ainda o exemplo da China continental em que já foi implementado o registo de identificação de números, sendo que considera que Macau deve seguir os mesmo passos no que respeita a cartões pré-pagos.

Imobiliário NOVOS ÍNDICES SEM DADOS SOBRE ARRENDAMENTO

Mais do mesmo

O Governo vai começar a divulgar novos índices de compra e venda de casa a partir de Janeiro, com base em novos factores. O economista Albano Martins alerta para o facto de o arrendamento e a especulação imobiliária continuarem de fora

É

já a partir de Janeiro que a população terá acesso a um novo índice de preços do imobiliário, feito com base nos dados já publicados pela Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) e pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC). Foram analisadas as declarações de liquidação do imposto de selo por transmissão de bens, referentes à compra e venda de habitação. Os valores dizem respeito aos anos de 2011 a 2015. O índice será feito com base num estudo realizado pela Universidade de Macau (UM), que teve em conta factores como a localização das casas, o número de quartos de cada apartamento, a existência

de varandas e até a proximidade a escolas e supermercados. Rose Neng Lai, académica da UM responsável pelo estudo, referiu que, caso os residentes queiram saber os valores do mercado, “vão à DSEC ver o preço do metro quadrado, e essa também é uma forma razoável”. “Mas estes dados reflectem apenas as transacções daquele

mês e não diferenciam o piso das fracções e ano de construção, entre outras características.” Apesar disso, o relatório elaborado pela UM assume que “é irrelevante a diferença” entre os novos dados e os que já vinham sendo publicados. De acordo com o relatório, o valor mais alto verificado na tran-

“Vamos continuar a ter uma enorme lacuna que poderia facilmente ser colmatada com uma publicação trimestral, onde seriam analisadas as rendas em várias áreas de Macau.” ALBANO MARTINS ECONOMISTA

sacção de imóveis remete para o terceiro trimestre de 2014, com um índice de 257,16, mais 1,72 vezes face ao primeiro trimestre de 2011.

SEM RENDAS

Para o economista Albano Martins, este índice pouco difere dos dados que são habitualmente lançados pelo Governo. “Isso não vai acrescentar nada e está dito no relatório. Não vai acrescentar muito mais ao que já existe, porque a maior parte dos dados vão ser buscados nas transacções divulgados pela DSF e DSEC, onde está especificado onde estão os imóveis e a sua área. Há apenas um tratamento em termos de índice. Não é louvável que o Governo continue a esquecer que há uma grande fatia da população que não tem habitação própria e que não vai adquirir casa alguma”, aponta. “Vamos continuar a ter uma enorme lacuna que poderia facilmente ser colmatada com uma publicação trimestral, onde seriam analisadas das mesmas formas as rendas em várias áreas de Macau”, acrescenta. “Era muito importante que o Governo repensasse que há uma outra grande componente que é o arrendamento, num local onde grande parte da população não tem acesso à sua habitação própria. Devia haver essa componente”, concluiu. Andreia Sofia Silva

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7 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

A

possibilidade de os alunos do ensino secundário da China Continental e de Macau verem reconhecidos os seus exames nacionais pela Universidade do Porto (UP) é um objectivo a cumprir nos próximos tempos. A garantia foi dada ao HM por Maria de Fátima Marinho, vice-reitora para as relações externas e cultura da UP, que esteve no território por ocasião da Feira Internacional do Ensino Superior de Macau, que se realizou no fim-de-semana. “Estamos a analisar as várias possibilidades com o exame unificado de Macau e o exame nacional da China. Estamos a iniciar conversações. Terá de ser feito um acordo, podemos fazer uma coisa semelhante ao que fazemos com o Brasil, pois aceitamos o exame do ensino médio do Brasil. O estudante pode depois candidatar-se como estudante internacional a uma licenciatura”, explicou a vice-reitora. Maria de Fátima Marinho admitiu ainda a vontade de reforçar a oferta curricular ao nível do Direito do Jogo, área que, garantiu, está muito pouco desenvolvida em Portugal. “É uma área que pode ser desenvolvida na UP pois Portugal não tem grande tradição, dado o sector do jogo ser incipiente. A cooperação que temos com a Faculdade de Direito da Universidade de Macau (UM) pode ser interessante também a esse nível. Ainda não há protocolo, e poderemos ter uma especialização ou pós-graduação.” A ideia é que a oferta curricular da UP se possa debruçar sobre áreas pouco desenvolvidas no ensino superior português. “Pode haver estudos sobre o Direito do Jogo ou outros, como Economia do Extremo Oriente, por exemplo. Podemos abordar áreas específicas que, em Portugal, ainda não são muito conhecidas ou estudadas, e que podem ser enriquecidas com a colaboração com Macau e China”, contou Maria de Fátima Marinho.

Ensino Superior UNIVERSIDADE DO PORTO QUER ACEITAR EXAMES DA CHINA E DE MACAU

Um canudo para a Europa A Universidade do Porto está a analisar a possibilidade de aceitar os exames finais do ensino secundário da China e de Macau para que os alunos se possam inscrever nas licenciaturas. Maria de Fátima Marinho, vice-reitora da instituição, fala ainda da necessidade de reforçar a cooperação na área do Direito do Jogo

“Não há muitos portugueses a estudar na China. Ainda é um grande desafio, por causa da língua. Há casos de Medicina, de estudantes que não conseguiram entrar em Portugal. Temos cinco casos de alunos que estão na China a fazer ligação com a nossa faculdade. Temos também estudantes que estão a fazer mestrado na China com uma bolsa da China Tree Gorges. A mobilidade no sentido da Europa-Ásia é uma coisa muito recente, que só surgiu em 2015. É necessário fazer mais cooperações e que as universidades portuguesas se tornem atractivas para um público diferenciado, de países que tradicionalmente não procuravam Portugal no ensino superior. O novo programa Erasmus Mais, que começou em 2015, está a ser um bom incentivo para começar”, concluiu. Andreia Sofia Silva

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CENTRO DE SEAC PAI VAN A CAMINHO

UM MUST DE ACORDO

A UP arrancou com um novo ano lectivo com as vagas totalmente preenchidas, mas ainda assim a presença de alunos chineses é importante do ponto de vista académico e cultural, disse a vice-reitora. As áreas das ciências, engenharia e aprendizagem ou ensino do português são as mais procuradas numa entidade que, desde 2004, já recebeu mais de 190 alunos chineses. A UP está ainda a pensar na melhor forma de aprofundar a investigação na área da medicina tradicional chinesa. “Em Portugal é uma área que não está muito desenvolvida e onde isso pode acontecer com a participação de investigadores chineses em Portugal. Estamos a preparar uma cooperação com a UM, no

SOCIEDADE

sentido de melhorarmos o ensino da medicina tradicional chinesa.” Actualmente, a UP tem um mestrado nesta área, ministrado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Maria de Fátima Marinho não deixou o território sem assinar um acordo com a Universidade de Ciências e Tecnologia (MUST). “Está em preparação um acordo com a MUST na área da engenharia”, referiu, adiantando que “outra universidade privada” de Macau poderá também colaborar com a UP. “A cooperação com as universidades portuguesas é também

“É uma área que pode ser desenvolvida na UP pois Portugal não tem grande tradição, dado o sector do jogo ser incipiente.” MARIA DE FÁTIMA MARINHO VICE-REITORA DA UNIVERSIDADE DO PORTO

importante para a UM. Macau foi uma região sob administração portuguesa durante muitos anos e essas raízes culturais não podem ser esquecidas, e vemos como prioritário para as universidades portuguesas a cooperação com o ensino superior de Macau”, disse a vice-reitora. Se começa a ser comum os estudantes chineses optarem por Portugal para fazerem os seus cursos, pelo facto de as propinas serem mais baixas do que noutros pontos do globo, a verdade é que a ida de alunos portugueses para a China e Ásia só começou a verificar-se o ano passado.

O Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) anunciou, na passada sextafeira, a construção de um centro de actividades polivalente no complexo de habitação pública de Seac Pai Van. A informação adiantada pelo canal de rádio da TDM dá ainda a conhecer que o espaço vai ter um parque infantil, uma zona de leitura, uma sala de pingue-pongue e dois auditórios. “Nasceu ali uma nova comunidade que, não obstante pequena, respira vida. O IACM, para ajustar esse rápido desenvolvimento comunitário e satisfazer as aspirações dos seus moradores no quadro de instalações públicas, planeia criar, no complexo de equipamentos de habitação pública de Seac Pai Van, um centro de actividades polivalente. O centro (...) ocupará uma área de cerca de 2600 metros quadrados”, avançou Pang Teng Hong do IACM, segundo a mesma fonte. O espaço deverá entrar em funcionamento em 2017.


8 SOCIEDADE

hoje macau segunda-feira 31.10.2016

Turismo HISTÓRIA RELIGIOSA CONVERGE EM MUSEU

Religião e diversificação Inaugurou este mês o museu do Seminário de São José que reúne objectos de carácter religioso vindos de vários cantos do mundo. A iniciativa não só é um contributo para a história local como uma possibilidade de atrair mais diversificação turística

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ESOURO de Arte Sacra do Seminário de S. José”, é o museu inaugurado este mês em Macau e que mostra a história da cidade e a sua relação com a igreja católica, através de objectos trazidos por missionários de várias partes do mundo, como Goa ou Portugal. “Temos objectos de Portugal, de Goa [Índia], e de outros sítios, porque os missionários vieram de diferentes países, especialmente os jesuítas, que trouxeram muitos coisas dos seus países e das suas próprias culturas, e isto tem um valor acrescido para a população local”, disse à agência Lusa o padre Jojo Ancheril, que esteve na organização do museu, ao longo dos últimos três anos. O espaço está organizado em sete salas, exibindo desde pinturas a óleo e imagens de santos, a vestuário e objectos usados nas eucaristias. Uma das zonas é dedicada a documentos e livros escritos pelos próprios missionários, que testemunham a introdução do catolicismo na China e que são relíquias culturais de Macau protegidas, inscritos na lista “The Memory of the World Regional Register for Asia/Pacific da UNESCO” em 2010. “Temos alguns dicionários em português e inglês. (As pessoas têm curiosidade em saber) como os missionários tiveram curiosidade em aprender a língua e como foram capazes de escrever um dicionário. Na verdade, isto mostra o compromisso dos missionários”, afirmou.

O projecto está a ser desenvolvido com o apoio do Instituto Cultural, e tem margem para crescer, uma vez que ainda há objectos armazenados no Seminário de São José que podem vir a ser expostos ao público, explicou.

CONGREGAR INTERESSES

O espaço está organizado em sete salas, exibindo desde pinturas a óleo e imagens de santos, a vestuário e objectos usados nas eucaristias

O padre Jojo Ancheril destacou também a importância do museu no âmbito do turismo religioso. “[O museu] também enriquece o turismo em Macau porque muitos visitantes vêm do Japão, da Coreia do Sul, etc, para visitar as igrejas, especialmente para ver a relíquia de São Francisco Xavier e como este museu está adjacente à igreja (do Seminário de São José), as pessoas estão bastante interessadas em visitá-lo”, disse. Segundo o padre JojoAncheril, nas últimas três semanas o museu tem registado “boa afluência, sobretudo entre sexta-feira e domingo”, tanto por locais, como por visitantes estrangeiros, que chegam do Japão, da Coreia do Sul e até de Portugal para percorrer os dois pisos do edifício adjacente à igreja do Seminário de São José, fundado em 1728 por missionários jesuítas e património classificado pela UNESCO desde 2005. Macau, território administrado por Portugal durante mais de 400 anos, até 1999, é considerado o berço do catolicismo na Ásia e a diocese de Macau é a mais antiga do Extremo Oriente ainda em funcionamento – a primeira foi a Arquidiocese de Pequim, erguida em 1307, seguida da de Quanzhou, também na China, mas ambas desapareceram ao fim de pouco tempo. HM/LUSA

ÁGUA NOVAS TARIFAS ENTRAM EM VIGOR AMANHÃ

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ajustamento das tarifas de água tem início amanhã. A informação, divulgada em comunicado pela Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), pretende “promover o papel de mecanismo regulador das tarifas de água como alavanca económica e aumentar a motivação para a poupança de água”. O aumento previsto será moderado, informa a DSAMA, e as tarifas de consumo residencial correspondentes aos quatro esca-

lões será de 4,48, 5,18, 6,04 e 7,27 patacas por metro cúbico, sendo que mais de 90% dos utentes “irão pagar um aumento inferior a 4,5 patacas. “Com o ajustamento, tornar-se-á maior o fosso entre os escalões implementando o princípio de quem mais consome , mais paga”, lê-se em comunicado. A mesma ideia é aplicado ao consumo não residencial em que o metro cúbico passa a ter o valor de 6,04 patacas e o Governo apoia com um subsidio

de 1,7 patacas por unidade de medida, num total de 22%. Por outro lado, e de modo a promover a poupança, a DSAMA continuará a implementar o Plano de Bonificação. “Durante o período entre Outubro de 1016 e Março de 2017, de entre todos os utentes de água da torneira de Macau, a quem tiver economizado de 10% a 30% face ao período homólogo do ano transacto, será atribuída a bonificação”, explica a entidade, avançando que esta “ajuda” pode ir das 30 às 250 patacas.

James Packer

Segue jogo Detidos da Crown sem impacto na indústria local

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detenção na China de 18 funcionários da australiana Crown Resorts, há duas semanas, por crimes relacionados com o jogo, não teve impacto na indústria em Macau, de acordo com a entidade reguladora. “Até ao momento, não vemos qualquer impacto [das detenções] em Macau. Pelo contrário, este caso é um ‘lembrete’ para as operadoras de jogo aqui [em Macau] de que quando realizam as suas operações de ‘marketing’ no interior da China têm de ter um claro entendimento das suas leis e cumpri-las”, afirmou o director da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), Paulo Martins Chan na quinta-feira, citado pelo portal GGRAsia, de acordo com a agência Lusa. O secretário para a Economia e Finanças de Macau, Lionel Leong, já tinha dito, no final da semana passada, que as detenções não deveriam ter uma relação directa com as empresas de jogo que operam casinos em Macau. Na sequência das detenções, houve um encontro entre o director da DICJ e as seis operadoras de jogo de Macau no sentido de as “lembrar” da estrita necessidade de cumprirem as leis locais e as de outros lugares.

SEM LIGAÇÕES ?

Paulo Martins Chan afirmou ainda que nenhum dos detidos tem ligações a Macau: “Daquilo que percebemos, nenhum dos 18 detidos no interior da China eram funcionários de Macau, e as empresas de jogo aqui disseram-nos que sempre cumpriram as leis no interior da China”. A imprensa australiana noticiou, contudo, na quarta-feira, que mais dez indivíduos foram detidos posteriormente no interior da China, descrevendo-os como “organizadores chineses de ‘junkets’ [angariadores de grandes apostadores]” com ligações a Macau. O magnata de jogo australiano James Packer afirmou, na semana passada, estar “extremamente preocupado” com as detenções que, segundo disse, terão ocorrido no âmbito de uma investigação sobre os esforços do grupo para convencerem chineses endinheirados a gastar as suas fortunas em casinos no estrangeiro. HM / LUSA


9 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

MULHER ENCONTRADA FERIDA EM CAIXOTE DE LIXO

CONCURSO PARA CENTRO DA TAP SEAC EM 2017

A abertura de concurso público para projecto do Centro Juvenil de Actividades Culturais, Recreativas e Desportivas da Tap Seac pode ter lugar em 2017. A informação é dada pela Direcção de Serviços da Educação e Juventude (DSEJ) que, após consulta pública, verificou que há um “maior apoio por parte dos cidadãos” ao projecto de transformação do antigo Hotel Estoril num Centro Juvenil de Actividades Culturais que inclui a construção de um auditório para espectáculos e de um conservatório. Faz ainda parte do complexo, o reaproveitamento da Piscina Municipal que passa a ter água aquecida e a estar aberta durante todo o ano e a construção de um parque de estacionamento subterrâneo.

Uma mulher, de cerca de 20 anos, foi encontrada, na noite de sábado, num caixote de lixo na Av. do Gn. Castelo Branco. O Jornal do Cidadão adianta que a mulher foi encontrada despida e com manchas de sangue, e segundo a Polícia Judiciária (PJ), quando o Corpo dos Bombeiros (CB) chegou ao local, ainda estava viva. A PJ está a investigar o sucedido.

É

uma história que aconteceu já em Julho, mas que só agora chegou às redes sociais e que mereceu, nos últimos dias, dois esclarecimentos dos Serviços de Saúde. Na primeira nota à imprensa, o Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ) explica que teve conhecimento de que há afirmações que estão a ser feitas e que não são verdadeiras: a unidade é acusada de atrasos na assistência médica no parto, o que teria provocado baixos níveis de oxigénio ao bebé em causa. “Como essas afirmações não correspondem à verdade, o Centro Hospitalar Conde de São Januário entende divulgar o histórico da situação para verdadeiro esclarecimento público”, começam por escrever os Serviços de Saúde. De acordo com CHCSJ, no passado dia 5 de Julho deu entrada no hospital uma parturiente de 40 semanas e 6 dias, de nacionalidade vietnamita, que não tinha feito a avaliação pré-natal em Macau. Uma vez que já apresentava “manifestos sinais do início do processo de parto”, o médico especialista de obstetrícia “cumpriu, de forma rigorosa, as orientações previstas para realizar o parto, após o conhecimento e consentimento da parturiente”.

O hospital é acusado de atrasos na assistência médica no parto, o que teria provocado baixos níveis de oxigénio ao bebé em causa. O bebé nasceu no dia seguinte, a 6 de Julho, às 17h15. Foi enviado para a Unidade de Cuidados Intensivos Pediátrica, local onde acabaria por ficar até 9 de Setembro. O hospital

SOCIEDADE

SÃO JANUÁRIO GARANTE QUE AGIU DE FORMA CORRECTA EM CASO DE BEBÉ COM HIPÓXIA

Um difícil início de vida O caso de uma criança que nasceu no São Januário com baixos níveis de oxigénio tem estado a dar que falar nas redes sociais. O hospital garante que o que se diz por aí é falso e vinca que fez o que podia explica que depois de feitos “diversos exames foi confirmada a existência de uma doença genética rara que provoca deficiência múltipla de carboxilase, ou seja, perante esta doença e após o nascimento, o bebé manifesta hipóxia e uma série de sintomas conexos”. Por outras palavras, os baixos níveis de oxigénio não se deveram a atrasos na assistência médica mas sim à doença do bebé.

O São Januário garante que “os médicos efectuaram de imediato os tratamentos indispensáveis e recomendaram à mãe a realização de exames indispensáveis, por forma a evitar a repetição de uma gravidez futura com o mesmo tipo de doença genética”. No comunicado, lê-se ainda que a mulher recebeu aconselhamento de um

técnico do Serviço de Acção Social do hospital.

O PROBLEMA DOS MEDICAMENTOS

O CHCSJ esclarece ainda que não exigiu aos pais o pagamento imediato das despesas médicas: “Para facilitar o pagamento autorizou os pais do bebé, cidadãos não residentes, a reunir as quantias necessárias para proceder, posteriormente, à liquida-

ção das despesas médicas. Nunca foi exigido o pagamento imediato”. Aexplicação dada pelos Serviços de Saúde não terá sido suficiente para apaziguar as vozes mais críticas, pelo que, um dia depois, é publicada nova nota à imprensa, em que se explica que “a mãe do bebé doente procedeu ao exame pré-natal”, sendo que fica por se perceber onde é que a cidadã vietnamita realizou o procedimento em questão. “Mas ao bebé foi diagnosticada uma doença genética rara e metabólica que provoca deficiência múltipla de carboxilase congénita. (...) O diagnóstico da doença em causa é obtido através de um exame ao sangue ou teste genético”, continuam os Serviços de Saúde, que salientam que “caso não haja história clínica ou história genética, normalmente esta doença só pode ser diagnosticada após o nascimento”. No novo esclarecimento, são ainda divulgadas novas datas: depois do nascimento, a 6 de Julho, o hospital procedeu “ao tratamento sintomático e ao diagnóstico etiológico”, a 12 de Agosto “estabeleceu o diagnóstico preliminar” e dez dias depois “adquiriu os medicamentos necessários para o bebé doente proceder ao tratamento”. O São Januário adianta que o estado clínico da criança é estável e não correu risco de vida. “Dado que a doença é rara, neste momento não existem medicamentos para tratamento em Macau. Os pais do bebé terão de os adquirir e o CHCSJ está já a planear a compra dos medicamentos para prestar apoio a este caso”, diz ainda o comunicado.


10 SUBDIRECTOR DO ROTA DAS LETRAS FALA EM BALI DA EXPERIÊNCIA DE MACAU

EVENTOS

Macau inspira tertúlia de poesia «

Casa cheia em Lisboa para ouvir poetas da terra

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poesia é uma grande ligação entre os povos e os homens». As palavras foram ditas pelo ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, na sessão sobre poetas de Macau que teve lugar na Fundação Casa de Macau, no sábado em Lisboa. Parte do programa do Fórum do Livro de Macau, foi o primeiro evento unicamente dedicado à poesia e aos vários poetas, portugueses e chineses, que escreveram e escrevem sobre Macau. A sessão, coordenada por Fernando Sales Lopes, que a abriu com poemas de Camilo Pessanha, passou por vários nomes e várias línguas. Ouviram-se versos em Português, em Mandarim e em Patoá com um poema de Adé. A barreira linguística, sempre a maior, continua a dificultar o conhecimento de poetas chineses e poucos são traduzidos para Português. Mas, e apesar do grande obstáculo linguístico, Fernando Sales Lopes acredita que é importante qualquer passo de aproximação. E o encontro de sábado, organizado pela Associação de Amigos do Livro em Macau e pela Fundação Casa de Macau, realizou-se nesse sentido. A casa estava cheia com muitos amigos a trocarem palavras de reencontro num espaço onde se partilha o amor pelo Oriente. Na sua breve comunicação, o ministro da Cultura fez questão de referir que por ocasião da recente visita do primeiro-ministro à China, pôde testemunhar «o interesse genuíno do governo central chinês em Macau». As marcas da nossa histó-

ria, disse o ministro Castro Mendes, são fundamentais para a construção do futuro. «Macau é uma charneira entre a grande nação chinesa e o mundo de língua portuguesa», acrescentou.

A BOLEIA COM `

RECORDAR É DIZER

Para Fernando Sales Lopes, com a sessão em Lisboa queria igualmente recordar amigos como o poeta Alberto Estima de Oliveira que faleceu em 2008. Presente na sala, foi o jornalista Hélder Fernando quem recordou os versos de Estima de Oliveira. Numa tarde em que o sol quente entrava pelas janelas do icónico edifício em Lisboa, várias foram as palavras de saudade sobre o poeta Estima de Oliveira. A sessão que se estendeu por quase duas horas deixou o “palco” aberto para todos os poetas e, a alguns presentes no público, foram dados sinais a chamá-los para ouvir a poesia dita pelo próprio. Foi o que sucedeu com Jorge Arrimar mas também com Ana Cristina Alves que leu uma tradução chinesa de um poema. António Bondoso, António Graça de Abreu, José Augusto Seabra, Cecília Jorge, Yao Jingming, Fernanda Dias, Alberto Estima de Oliveira, Fernando Sales Lopes, e a lista dos poetas lembrados podia continuar. A poesia encheu a Fundação Casa de Macau numa sessão onde estiveram igualmente presentes o general Garcia Leandro e o general Rocha Vieira, antigos governadores de Macau durante a administração portuguesa. Maria João Belchior info@hojemacau.com.mo

Falou-se de Macau por estes dias em Ubud, onde se realiza um dos mais importantes festivais literários do Sudeste Asiático. Hélder Beja, co-fundador do Rota das Letras, esteve em Bali. Uma viagem que se pode reflectir nas próximas edições do evento do território

À VENDA NA LIVRARIA PORTUGUESA OS MONSTROS TAMBÉM AMAM • Clara Sanchez

Sandra tem 30 anos, está grávida de um homem que não ama e decide ir viver para uma pequena aldeia da costa leste espanhola. Num dos seus passeios pela praia conhece os Christensen, um casal de octogenários noruegueses e estabelece com eles uma relação de proximidade. Nada faria supor que estas três vidas, unidas por acaso, pudessem ser a razão de viver de Julián, um homem recém-chegado da Argentina que segue, passo a passo, os noruegueses. Repleto de suspense e emoção, “Os Monstros Também Amam” é, acima de tudo, um romance sobre as ambiguidades do ser humano, entre a maldade e o amor, e sobre a forma como as aparências escondem o lado mais negro de cada um de nós.

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NOCTURNO INDIANO • António Tabucchi

Uma conjectura do autor é a de que este livro poderia servir de guia a um amante de viagens absurdas. E não deixa de ser absurda esta busca de um amigo que desapareceu, sombra que pertence a um passado também ele conjectural, numa Índia que se conhece quase só através de quartos de hotel, de hospitais, de estações de caminho-de-ferro. Uma Índia que todavia transparece em conversas com profetas nómadas, Jesuítas portugueses, prostitutas de Bombaim, uma repórter que fotografa a miséria de Calcutá. Mas este misterioso ballet de sombras é sobretudo um hino às faculdades criativas da linguagem, pois é graças a uma palavra evocada em várias línguas que o viajante se aproxima daquele que procura. E é graças à escrita que esta viagem se transforma em livro, passa da insónia ao sonho e do sonho ao texto.


11 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

M OS LIVROS Hélder Beja

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EMPRE que pode, Hélder Beja faz as malas e viaja até à cidade onde está prestes a acontecer um festival literário. Foi assim com o festival literário de Paraty, em 2014, e foi assim também há uns meses, quando viajou até à Colômbia para a Feira do Livro de Bogotá. Desta vez, o destino foi mais próximo, mas há muito desejado. “Era um festival a que queria vir há muito tempo”, conta ao HM, ao telefone a partir de Bali. “Vim à semelhança da forma como estive nos outros festivais. A decisão de vir aos encontros literários é minha, venho por minha conta. Mas como sou um dos organizadores do festival literário de Macau, acabo por ter um tipo de envolvimento diferente

nos festivais do que tem um visitante normal”, explica o subdirector do Rota das Letras. “No caso de Ubud, quando entrei em contacto com os organizadores fui convidado para fazer parte de um painel precisamente sobre festivais literários.” Hélder Beja participou, no final da semana passada, numa das muitas sessões que constituem o intenso programa principal do Festival de Escritores e Leitores de Ubud, uma iniciativa organizada na ilha indonésia há já 13 anos. O subdirector do Rota das Letras partilhou a mesa com a directora do festival de Bali, a australiana Janet DeNeefe, a escocesa Jenny Niven, responsável pelo aparecimento do festival literário de Pequim, e com Michael Williams, director do Wheeler Centre na Austrália, para uma sessão sobre “a vida secreta dos festivais” em torno dos livros e da escrita. Das ideias que deixou na sessão acerca do Rota das Letras, Hélder Beja destaca o facto de ter causado muito interesse a particularidade de ser trilingue – em Ubud, apesar de haver tradução para bahasa, a língua mais usada acaba por ser o inglês. “As pessoas ficaram muito curiosas com essa parte, com a parte linguística”, relata, assim como com a duração mais prolongada do festival de Macau, em comparação com outros eventos do género. A ideia da “memória palpável”, com a publicação dos livros de contos no âmbito do Rota das Letras, também foi um aspecto que mereceu atenção: “Acharam muito curioso o convite que lançamos aos escritores, todos os anos, para

Hélder Beja destaca o facto de ter causado muito interesse a particularidade de o Rota das Letras ser trilingue: “As pessoas ficaram muito curiosas com essa parte, com a parte linguística.”

escreverem sobre Macau e depois traduzirmos tudo”. O festival literário de Macau é ainda diferente da maioria dos certames do género pelo facto de a grande maioria dos conteúdos do programa ser de entrada livre. “Expliquei porquê, porque é de facto bastante diferente do que acontece aqui, em Paraty ou em Bogotá.”

O OUTRO UNIVERSO DE ESCRITORES

Sobre a experiência em Ubud, Hélder Beja refere ainda a possibilidade de conhecer escritores do Sudeste Asiático – e aqui a viagem até Bali poderá ter influência em futuras organizações do Rota das Letras, sobretudo no que toca à lista de autores convidados.

Este ano com o tema “Tat Tvam Asi” – qualquer coisa que, em português, poderá ser traduzida como “eu sou tu, tu és eu” – o festival de Ubud juntou centenas de escritores, pensadores, artistas, analistas e activistas. Num dos painéis desta edição, que terminou ontem, esteve em análise o trabalho da jornalista e escritora portuguesa Susana Moreira Marques, autora do livro “Agora e na Hora da Nossa Morte”, uma obra que resulta da experiência ao lado de uma equipa de prestação de cuidados paliativos ao domicílio, em Trás-os-Montes. A diversidade de convidados vai ao encontro do objectivo da organização – reforçar “a identidade colectiva da Indonésia” – num palco que, avalia Hélder Beja, é “o sítio ideal para um festival cultural de qualquer natureza”. “Dizia na sessão que, depois de chegar, um organizador de um festival literário de qualquer parte do mundo fica um bocadinho deprimido com o seu próprio festival, porque a localização é imbatível. São indiscritíveis os espaços, só comparáveis – mas até superiores – aos que vi em Paraty, e não comparáveis a nada do que tenha visto noutros sítios. Ubud é um sítio especialíssimo”, afirma. Macau não tem o mesmo cenário, é “menos idílico”, mas o subdirector do Rota das Letras espera que o festival de cá possa vir a ser também “uma referência no mapa dos festivais literários da Ásia”. Isabel Castro

isabel.castro@hojemacau.com.mo

EVENTOS

Manuel da Silva Mendes, o homem e o seu legado À volta dos livros, lembrou-se o autor do primeiro livro sobre socialismo libertário em português

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MA figura pública em Macau e um homem da letras que ficou, injustamente, quase desconhecido em Portugal, Manuel da Silva Mendes foi uma personalidade em destaque no Fórum do Livro de Macau em Lisboa. Duas apresentações no Museu do Oriente retrataram a figura e a vida – em Portugal e Macau – daquele que, escreveu António Aresta, está no coração dos macaenses. Um intelectual com um papel de referência na história do território, Silva Mendes foi professor e reitor do Liceu de Macau, aonde chegou no início do século XX, tendo exercido também advocacia na jurisdição. Asessão no Fórum começou com uma apresentação porAntónioAresta, intitulada “Razão e Mistério”, seguida por uma de Amadeu Gonçalves, sobre a vida do intelectual Silva Mendes entre Vila Nova de Famalicão e Macau. Apesar de não haver edição da sua obra completa, Manuel da Silva Mendes não

foi totalmente esquecido em Portugal. Originalmente publicado em 1896, antes da sua ida para Macau, o livro “O Socialismo Libertário ou Anarchismo” foi a primeira obra em Portugal sobre o tema, influenciado pela corrente europeia do socialismo utópico. Em 2006, foi reeditado em fac-simile pela editora independente Letra Livre. No entanto, e disto se falou em Lisboa, as suas várias contribuições e em diversos jornais, mesmo antes de Macau, levam a que assuma grande importância o estudo da sua obra na totalidade. Na Ásia, Silva Mendes desenvolveu uma paixão e um interesse pela arte chinesa, particularmente pela porcelana que coleccionou. Dedicou-se, por outro lado, ao estudo da filosofia e da religião popular chinesas, envolvendo-se particularmente na compreensão e divulgação do taoismo. M.J.B.


12 CHINA

hoje macau segunda-feira 31.10.2016

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Partido Comunista da China (PCC) declarou na quinta-feira o seu secretário-geral, Xi Jinping, líder “central” da organização, confirmando a sua ascensão como o mais forte Presidente que o país conheceu nas duas últimas décadas. Num comunicado difundido pela imprensa oficial, a liderança apela a todos os membros do partido para que “se mantenham fortemente unidos em torno do Comité Central do PCC com o Camarada Xi Jinping no centro”. O anúncio surge após uma reunião entre 400 altos quadros do PCC, que durou quatro dias e abordou as “regras da disciplina interna” na organização e “as directrizes para a vida política” dos seus membros. Desde que ascendeu ao poder em 2012, Xi Jinping conseguiu acumular mais poder do que todos os Presidentes chineses desde Mao Zedong, o fundador da China comunista. Em Dezembro do ano passado, os líderes locais adoptaram a referência a Xi como “líder central”, mas deixou de ser usada pouco depois, sugerindo que o Presidente chinês encontrou resistências na consolidação do seu poder. Analistas ocidentais admitem já que Xi Jinping ficará no poder para além do período previsto de dez anos.

Sexto Plenário PCC DECLARA XI JINPING LÍDER “CENTRAL”

O poder mora aqui

“Uma liderança central pode durar para sempre” LAW UNIVERSIDADE CHINESA DE HK Xi “reflecte as aspirações comuns de todo o partido, todo o exército, todo o país e o seu povo”, disse. O sexto plenário do Comité Central foi a última reunião de alto nível antes da liderança do partido ser remodelada no próximo ano.

PARA DURAR

CRIME E CASTIGO

A decisão do Comité Central de elevar Xi a “líder central” é “muito significativa”, afirmou à agência France Presse Willy Law, professor de ciência política na Universidade Chinesa de Hong Kong. Na política chinesa, “o termo ‘central’ refere-se a um nível de autoridade individual sem restrições”, explicou. “Uma liderança central pode durar para sempre”, disse, acrescentando: “Não existe ideia de mandato limitado ou idade para se retirar”. A constituição chinesa define um limite de dois mandatos de

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homem mais rico de Hong Kong, Li Ka-shing, acordou a venda de um complexo de escritórios e espaços comerciais em Xangai, a “capital” económica da China, no seu mais recente desinvestimento no país asiático. O negócio, avaliado em 20.000 milhões de yuan foi anunciado na quinta-feira, num comunicado enviado à bolsa de Hong Kong, mas sem detalhar o nome do comprador. A venda do complexo, que tem uma área total de 269.000 metros quadrados e fica localizado em Pu-

Outras aplicações

Homem mais rico de Hong Kong continua a desinvestir na China

dong, o centro financeiro de Xangai, permitirá ao grupo de Li Cheung Kong Property Holdings Ltd. arrecadar lucros no valor de 802 milhões de dólares, refere o comunicado. Na mesma nota diz-se que o negócio deverá ficar concluído em 2018.

MUDANÇA E “INGRATIDÃO”

Nos últimos anos, Li Ka-shing tem vindo a vender investimentos imobiliários na China - onde o cresci-

cinco anos para o Presidente do país, mas não estabelece um limite para secretário-geral do PCC, o cargo mais importante na China. Deng Xiaoping, o “arquitecto-chefe das reformas económicas” que abriram a China à economia de mercado, e que liderou o país durante os anos 1980 e 1990, era referido como o “centro” da liderança do partido. O seu sucessor, Jiang Zemin (governou entre 1989 e 2002), era apenas designado como “centro” da terceira geração de líderes, enquanto Hu Jintao (2002 a 2012) nunca chegou a atingir aquele estatuto. “Um líder central é necessário para a nação e para o partido”, apontou o Diário do Povo, jornal oficial do PCC, num editorial difundido após a reunião, que decorreu esta semana.

mento económico abrandou para o ritmo mais baixo em 25 anos -, após ter investido fortemente no país nos anos 1990. Ao mesmo tempo, o magnata tem reforçado os seus investimentos na Europa, alimentando especulações de que está a perder confiança no mercado chinês. No ano passado, o Diário do Povo, jornal oficial do Partido Comunista Chinês, acusou o magnata de ser

ingrato por vender os bens na China continental, numa altura em que o país enfrenta desafios económicos. “Partilhou a prosperidade enquanto estivemos numa boa fase, mas não consegue enfrentar as adversidades connosco, agora que temos dificuldades.

Emocionalmente, isto é realmente inaceitável”, escreveu o jornal na sua conta oficial no Wechat (o WhatsApp chinês). A venda dos activos de Li na China continental surge também numa altura de depreciação da moeda chinesa, o yuan, que atingiu na quinta-feira o seu valor mais baixo dos últimos seis anos, face ao dólar norte-americano. Em Outubro de 2015, um grupo controlado por Li Ka-shing pagou mil milhões de euros ao fundo Magnum pela Iberwind, o segundo maior operador eólico em Portugal.

Após ascender ao poder, Xi lançou uma campanha anti-corrupção, hoje considerada a mais persistente e ampla na história da China comunista, e que resultou já na punição de um milhão de membros do partido. Os alvos incluíram oficiais menores, a que Xi se refere como “moscas”, mas também mais de uma centena de “tigres” - altos quadros do partido, com a categoria de vice-ministro ou superior. Os dois casos mais mediáticos envolveram a prisão do antigo chefe da Segurança Zhou Yongkang e do ex-diretor do Comité Central do PCC e adjunto do antigo presidente Hu Jintao, Ling Jihua. No braço político do exército, a Comissão Militar Central (CMC), que era considerada intocável até então, dois ex-vice-presidentes foram investigados por corrupção. O comunicado difundido na quinta-feira decreta “tolerância zero” para a má conduta entre os membros da organização. O partido deve “construir com perseverança um sistema em que [os seus membros] não se atrevem a ser corruptos, não podem ser corruptos e nem pensam em corrupção”, afirma. A mesma nota apela ao reforço do controlo interno no PCC, incluindo a conformidade ideológica e um sistema de vigilância mais rigoroso sobre os seus membros.


13 hoje macau segunda-feira 31.10.2016

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EZENAS de milhares de tailandeses deslocaram-se sábado ao Grande Palácio de Banguecoque, onde a população foi autorizada a entrar, pela primeira vez, na sala do trono, onde se encontra o corpo do rei Bhumibol Adulyadej. Bhumibol, que morreu há duas semanas, era adorado por muitos dos seus súbitos e visto como uma âncora de estabilidade num país frequentemente abalado por uma política turbulenta. A sua morte, aos 88 anos, fez o país entrar num ano de luto oficial, com a maioria dos tailandeses a vestirem apenas roupas pretas e brancas. Nas duas últimas semanas, multidões juntaram-se no exterior do Grande Palácio, um complexo de templos e pavilhões sumptuosos na zona antiga de Banguecoque, para prestarem homenagem junto do retrato do monarca. No entanto, sábado foi a primeira vez que o público pôde entrar na sala do trono, onde o seu corpo descansa deitado num caixão. “Estou à espera desde a 1:00”, disse Saman Daoruang, de 84 anos, enquanto esperava na fila em ‘s’ que ocupava um vasto terreno junto ao palácio. Segundo as autoridades, cerca de 10 mil pessoas vão poder entrar na sala por dia, em pequenos grupos.

O imenso adeus

Milhares fazem fila para visitar o caixão do rei da Tailândia

Tal como muitos outros, Saman tem dormido numa tenda desde que chegou a Banguecoque de comboio, vindo da província de Nakhon Sawan, no norte do país. “Não tenho sido capaz de dormir porque estava tão entusiasmado e orgulhoso de aqui vir”, disse

à AFP, enquanto segurava vários retratos do monarca.

CIMENTO DA NAÇÃO

Bhumibol Adulyadej era considerado o único “cimento” de uma nação muito dividida politicamente e tinha um estatuto de semideus.

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Open Tender Notice Request for Proposal - “MIA - Design and Build for Generator Installation in SS3 SS4 and SS5” (RFQ-219) 1. 2. 3.

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Company: Macau International Airport Co. Ltd. (CAM) Tendering method: Open tendering Objective: To select a suitable Contractor to supply and install three new diesel generators for sub-stations SS3, SS4 and SS5 in Macau International Airport, and design and build a generator room beside sub-station SS3. Request for tender documents: Tender Notice and Tender Document can be downloaded from CAM’s website www.camacau.com . Please regularly check the website for any clarification or changes/ modification/ amendment in the Tender Document. Location and deadline for submission of Bidders’ tenders: Macau International Airport Co. Ltd. (CAM) 4th Floor, CAM Office Building, Av. Wai Long, Taipa, Macau Before 12:00 pm (noon) on 5 December 2016 (Macau Time). The addressee of the tender shall be Mr. Deng Jun – Chairman of the Executive Committee. The tenders received after the stipulated date and time will not be accepted. CAM reserves the right to reject any tender in full or in part without stating any reasons. -END-

Subiu ao trono em 1946 após a inexplicável morte de seu irmão e muitos tailandeses nunca conheceram outro soberano. Após a sua morte, o chefe da junta militar, que tomou o poder em 2014, anunciou um período de luto de um ano e uma redução de todas as actividades de divertimento durante 30 dias. As televisões com emissões difundidas na Tailândia apenas poderão apresentar programas relacionados com a casa real, também no decurso de 30 dias.

Cerca de 10 mil pessoas vão poder entrar na sala por dia, em pequenos grupos Intensificou também a aplicação das leis de lesa-majestade, que punem as críticas à monarquia com até 15 anos de prisão por ofensa. Esta lei reprimiu a discussão pública sobre o herdeiro ao trono, o príncipe Maha Vajiralongkorn. Ao contrário de todas as expectativas, algumas horas depois da morte de Bhumibol, o príncipe herdeiro, de 64 anos, disse necessitar de tempo antes ocupar o lugar de seu pai.

REGIÃO

JAPÃO CONDUZ PRIMEIRO INQUÉRITO SOBRE O RACISMO

O Ministério da Justiça do Japão vai realizar o primeiro inquérito de grande escala sobre o racismo no país, avança a imprensa local. O inquérito vai abranger 18.500 residentes estrangeiros, com 18 ou mais anos, noticia o jornal Asahi, acrescentando que o resultado será divulgado no final de Março e terá reflexos na governação. A sondagem vai decorrer em 13 línguas, incluindo, além de japonês e inglês, português, chinês, coreano e vietnamita. Os inquiridos serão questionados sobre se já experienciaram ou assistiram a discriminação racial na vida diária e local de trabalho, e que medidas gostariam que o Governo adoptasse para eliminar a discriminação. O número de estrangeiros a residir no Japão aumentou nos últimos anos, mas o rácio em relação à população total é ainda reduzido, abaixo dos 2%, de acordo com dados do Ministério da Justiça.


h ARTES, LETRAS E IDEIAS

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BEIDAIHE, 30 de Julho de 1978

Além da praia, bem agradável, mais uma visita, agora a uma fábrica de vidros, de nome Yao Hua, o que significa “Glória da China”, começada a construir em 1924 por um cidadão belga perdido por estas paragens e por um filho de Yuan Shikai, o tal general que em 1916, após a fundação da república chinesa, se auto-proclamou imperador de uma nova dinastia e, entre os conluios pelos corredores do poder, acabou por ser morto logo a seguir, por envenenamento. A fábrica, ocupada pelos invasores japoneses em 1936, conta hoje com 4.100 operários, e tem muitas histórias para contar. Está a laborar em pleno, com dois enormes fornos e dezoito complexos de maquinaria. Produz desde berlindes a vidraças de grande dimensão, 9.000 caixas de vidro por dia, cada com 200 quilos, 25% das quais destinadas à exportação. Eu vou aprendendo. A vidraça é fabricada com nove espécies diferentes de materiais, a saber, areia, quartzo, óxido de cálcio, manganésio, óxido de sódio, sulfato de sódio, cal, carvão em pó e fluoreto de cálcio. Fabricam também fibra de vidro para uso electrónico, seda de vidro e tela de fibra para isolamentos. Mas dizem-me que a tecnologia de que dispõem ainda é baixa e atrasada, não corresponde às exigências da indústria moderna. Pensam produzir vidro estampado, com desenho de flores, automatizar grande parte da maquinaria, utilizando computadores. O salário máximo é de 160 yuan por mês para os engenheiros veteranos, o médio, de 60 yuans e o mínimo é de 37,5 yuans. Os operários que trabalham junto aos fornos re-

cebem um subsídio extra de alimentação. Muito interessante o complexo vidreiro. Tenho a sorte de poder conhecer na China tanta coisa, tanto lugar onde jamais entraria no meu Portugal.

PEQUIM, 9 de Agosto de 1978 Na calma do Verão continuo a estudar, a ler tudo o que me chega sobre a China, e não é nada pouco. Estou a organizar um ficheiro “chinês” por temas, autores, personalidades, história. Tenho trabalho para o resto da vida. PEQUIM, 29 de Setembro de 1978 Ida à comuna popular de Dong Beiwang, que significa “Prosperidade do Nordeste”, uns quarenta quilómetros a norte de Pequim. Como de costume nestas visitas, logo à chegada somos brindados com uma longa explanação sobre as realidades e virtudes do lugar, desta vez por parte do camarada Wang Chong, um dos vice-directores da comuna. Aí vai parte do relatório: A comuna foi fundada em 1958, juntando quatro cooperativas agrícolas. Engloba 3.700 famílias, num total de 14.000 pessoas, 6.000 das quais aptas a trabalhar todos os dias. A cada um segundo o seu trabalho. Contam com uma superfície de 33 km 2 e 1.500 hectares de terra cultivada. Têm uma estação agro-técnica com armazéns para adubos, oficinas para a reparação de tractores e outras alfaias agrícolas. Existe ainda uma

policlínica, uma fábrica de papel, outra de ferramentas. Assim se diversifica a economia da comuna popular. Têm 500 vacas, cada uma produz 14 litros de leite por dia, já com ordenha mecânica. Criam 60.000 patos por ano, cevados, alimentados à força para engordarem rapidamente e, depois de bem assados, resultarem no famoso pato lacado de Pequim, uma das delícias da cozinha chinesa. Fui ver como alimentam as aves. É um bocado deprimente olhar para os patos com uns canudos enfiados pelas goelas as abaixo, sendo obrigadas a engolir enormes quantidade de farinha. Escavaram diversos poços ou tanques largos onde criam milhares de peixes de água doce, outra fonte de rendimento. O trigo, o milho, o arroz são as principais culturas mas não tem sido fácil estender as terras cultivadas. Os terrenos são acidentados, necessitam de ser nivelados, de se unir as parcelas separadas, de se fazerem obras de irrigação, enfim para bem dos homens é preciso alimentar, dar de beber a estas terras. Parece estarmos numa economia colectiva que se auto-abastece do que necessita, e ainda sobra alguma coisa para vender. Mais dados:

Têm 27 tractores e 300 moto-cultivadoras, mais 11 ceifeiras-debulhadoras. Só a transplantação do arroz é manual, os outros trabalhos já estão mecanizados. 2/3 das sementes são produto da investigação científica da comuna. A produção tem aumentado, em 1958 era de 2.520 quilos de cereal por hectare e agora é de 7.500 quilos. As máquinas e as pequenas fábricas só surgiram depois da formação da comuna, em 1958. O salário médio dos camponeses varia entre 380 a 400 yuans, por ano. Eu próprio, como estrangeiro tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras, ganho 550 yuans por mês, com casa, água, luz e assistência médica, tudo à borla. Mas os dezanove chineses que comigo trabalham nas Edições auferem quantias entre 45 e 70 yuans por mês, dez vezes menos do que eu, um pouco mais do que estes camponeses. É verdade que esta boa gente da comuna popular não paga renda, nem infantário ou escola para os filhos, e beneficia também de assistência médica gratuita. Cada família tem direito a uma parcela privada de terra com 66 metros quadrados. Aí cultivam alguns legumes e criam porcos, galinhas, ovelhas e cabras que vendem como muito bem entendem. Na comuna funcionam dez escolas primárias e duas secundárias. Dizem-me que este ano 62 jovens da comuna entraram na universidade. Cada equipa de produção tem direito a um televisor, a preto e branco. Na visita à Comuna Dong Beiwang, avanço sozinho pelas humildes casas, pelos campos bem tratados. Um rancho de crianças faz-me companhia, curiosas por verem um estrangeiro na sua aldeia.

Esta é a China rural, ainda carente de quase tudo, centenas de milhões de chineses sobrevivendo em economias de subsistência, gente pobre que hoje já não morre à fome mas merece uma vida melhor.

a pintar de cinza a labuta dos homens. Esta corda atada em volta do brilho do olhar e do prateado da lua. Estes perfumes de saudade estendendo-se pelas margens cintilantes do Outono. Estas mãos gretadas, puras na certeza de guardar e dar, Esta voz soluçante, cantando. PEQUIM, 21 de Outubro de 1978

PEQUIM, 2 de Outubro de 1978 Outra vez o faustoso banquete no Grande Palácio do Povo nas comemorações dos vinte e nove anos de fundação da República Popular da China. Exactamente igual aos outros dois onde já estive presente, Outubro e Dezembro do ano passado. A única, e parece que decisiva mudança, foi a presença de Deng Xiaoping que no seu discurso surgiu poderoso e confiante quase a subalternizar dentro do Partido o sucessor designado por Mao Zedong, o cada vez mais apagado Hua Guofeng. PEQUIM, 4 de Outubro de 1978 Esta tristeza de viver dias solitários, plenos de gente ecoando na redoma do ser. Esta surdez capaz de ouvir o espiralar do silêncio e a música do vento nas florestas. Esta fome jamais saciada, à solta por campos de sorgo e trigais dourados de pão. Estes olhos serenos, cerrados, abertos para madrugadas de coral e maresia. Estes dias, com o sol difuso

Algum dia teria de me calhar a sorte ir trabalhar no campo, com os camponeses de uma comuna popular. A directiva do presidente Mao datada de 7 de Maio de 1966, institucionalizando as “Escolas 7 de Maio” 五 七干校 , logo no início da Revolução Cultural, pressupunha reeducar os quadros e os intelectuais lançando-os num contacto intenso com a labuta dura e diária dos camponeses. Vieram-me buscar ao Hotel da Amizade, às cinco da manhã, num mini-bus. Fomos a Adélia Goulart, o Hans que trabalha na secção alemã da revista Beijing Informação e depois, junto à Rádio Pequim, entrou a Angelina Martins, brasileira, a viver e trabalhar na China, na Rádio, com o marido, o Jayme Martins, há mais de dez anos. Seguimos, numa estirada de quase cem quilómetros, por maus caminhos mas quase sem trânsito madrugador, para a comuna popular de Waiwengu, no distrito de Guhang, já na província de Hebei. Era a nossa “Escola 7 de Maio”, apenas por um dia. Chegados à aldeia, pobre mas organizada, fomos ouvir o relatório do chefe da comuna, o camarada Su Xiangyu. Começa por nos dizer que o solo da comuna é arenoso e difícil de cultivar. Quase só dá arroz, por isso têm de gerir cuidadosamente a água, as outras culturas crescem com dificuldade,


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diário (secreto) de Pequim (1977-1983)

a produção depende das condições climatéricas e não é estável, produzem 400 quilos de cereais por mu (cada mu são 666,7 m 2) e consideram que apesar da seca são números razoáveis. O trabalho é sobretudo manual, possuem poucas máquinas, quase nenhuns tractores e debulhadoras mesmo assim contam com uma pequena fábrica de parafusos e de sacos de papel onde trabalham os familiares dos quadros do Partido. Têm um autocarro que transporta os alunos para a escola e que também é alugado às outras comunas próximas, o que acrescenta algum dinheiro ao magro pecúlio da terra. Três tardes por semana são dedicadas ao estudo. Aprendem mais chinês e lêem textos escolhidos do presidente Mao. Concluída a arenga sobre as realidades da comuna de Waiwengu, era tempo de nós arregaçarmos as mãos e trabalhar. Destinaram-nos umas dezenas largas de fardos de palha que estavam alinhados ao longo do campo e nós devíamos agarrar, levantar do chão e colocar cuidadosamente no atrelado de um tractor que circulava a nosso lado. Esta era a labuta inicial dos recém-chegados filhos de uns tantos “diabos estrangeiros”. A minha roupinha, tipo fato-macaco maoista, começou a ficar coberta de fiapos de palha. E eu já suava. Mas em mim gosto do dever cumprido. Às onze e meia foi tempo de almoço, uma pobre vianda camponesa para enganar a fome e às treze horas era tempo de recomeçar o trabalho. Agora tínhamos de descarregar os fardos de palha dos atrelados do tractor e de os empilhar a preceito num dos grandes armazéns da aldeia. Tudo concluído, chegámos ao fim da tarde, exaustos, cansados. Vida de camponês chinês não é fácil, no entanto penso que

era capaz de passar aqui um ou dois meses, ia aprender, não me fazia mal nenhum. 75% da população da China vive no campo, este é o país mais do que real, tão mal conhecido pelos estrangeiros. Yulan, uma das chinesas jovens que comigo trabalha nas Edições, contou-me que há uns tempos atrás foi mandada para uma comuna a fim de ser “reeducada pelos camponeses”, também numa Escola 7 de Maio. Puseram-na a plantar arroz, afundada na lama de um arrozal. Menina da cidade, de mãos limpas e mimosas, desabituadas a qualquer esforço para além da pena e da caneta, disse-me que tinha tanta a sua falta de jeito que eram mais os molhos de arroz que arrancava do que os plantava. Não foi o meu caso, nem o da Adélia, do Hans, da Angelina. Demos o nosso melhor, trabalhámos bem, quase até à exaustão, no meio daqueles calejados camponeses, que sorriam sempre face a tanta dedicação, labor e entusiasmo destes estranhos intelectuais chegados do outro lado do mundo. Já no regresso a Pequim, a Angelina Martins, brasileira de São Paulo, contou-nos uma interessante história acontecida com o Jayme, o seu marido. Trabalham ambos na Secção Portuguesa da Rádio Pequim e há uns tempos atrás mandaram o Jayme para uma comuna popular, 300 quilómetros a norte de Pequim, para ser “reeducado”. Necessitando cagar, o Jayme dirigiu-se à latrina colectiva da aldeia, um grande buraco ao ar livre onde os camponeses depositavam as suas fezes e urinas que, depois da devida fermentação, eram utilizadas para adubar a terra. O Jayme agachou-se, tirou as calças e ali ficou, de bunda ao vento, tentando evacuar os seus cocós, o que não

foi fácil, os seus intestinos estavam algo presos. Face à demora, olhou para trás e, para seu espanto, tinha

já ali, do outro lado, quase uma centena de camponeses chineses contemplando curiosos o seu rabo. Rabos

António Graça de Abreu

há muitos mas uma bunda estrangeira, brasileira, ao léu, numa comuna popular, no nordeste da China, ca-

gando lentamente na brisa da tarde, é raríssima. 五七干校


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h

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Paulo Maia e Carmo tradução e ilustração

YAO ZUI

«Xu Huapin»

Continuação da Classificação dos Pintores

De qualquer modo, ainda hoje existem pinturas feitas por homens que já desapareceram há muito tempo mas só aqueles que alcançaram grande erudição conseguem distinguir o vulgar, o grosseiro, do excelente; evitar as armadilhas e compreender o seu significado. Mas à medida que as coisas se vão degradando, e depois corrigidas e à medida que a Humanidade vai passando por períodos de florescimento e decadência, alguns alcançam grande fama muito novos, outros só quando já ultrapassaram a meia-idade, e seria um erro comparar o génio dos primeiros com o talento dos últimos. Quanto à arte de Gu Kaizhi1, ela alcançou a mais alta fama na História. Ele era poderoso e independente e nunca teve quem o igualasse no que respeita à expressão espiritual. Nenhum homem vulgar o poderia alcançar. É como se ele excedesse em brilho o sol e a lua. Como é que tal homem se poderia preocupar com meros detalhes?

1 - No início da defesa entusiástica de Gu Kaizhi (c. 344-406), Yao Zui não poupa nos adjectivos. Figura lendária da pintura e do pensamento, nas poucas pinturas que hoje lhe são atribuídas não está ainda claro o extraordinário efeito que causou nos seus contemporâneos e em consecutivas gerações posteriores. Nelas ressalta o rolo horizontal com 25 cm de altura intitulado «Conselhos da Instrutora às Damas da Corte», que se conserva em Londres, no British Museum. Nele estão plasmados conselhos de moral prática. A nona ilustração, por exemplo, é acompanhada de um texto que diz: «Ninguém pode agradar sempre; o afecto que for monopolizado numa única pessoa acabará por se transformar em desgosto.»

(in James Cahill, Peinture Chinoise, Éditions Albert Skira, Genève, 1960, p.15) O estilo das figuras pintadas denota uma preocupação com o desenho das roupas, em traços contínuos esvoaçantes, que escondem as formas dos corpos e envolvem as personagens e que lhes dão vida. Numa outra pintura em rolo horizontal de 24 cm de altura intitulada «A Ninfa do Rio Luo», (Washington, Freer Gallery of Art) a paisagem ainda parece só um apontamento e não o assunto fundamental em que se tornaria, correspondendo a uma concepção da totalidade do cosmos como um organismo único, como ele mesmo exprime nos tratados que lhe são atribuidos.


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TEMPO

POUCO

O QUE FAZER ESTA SEMANA Diariamente

?

NUBLADO

MIN

22

MAX

27

HUM

55-85%

EURO

8.77

BAHT

YUAN

1.17

O CANTO DA CIDADE

EXPOSIÇÃO “SE EU ESTIVESSE EM SÃO FRANCISCO/MACAU” Fundação Rui Cunha

O CARTOON STEPH

ESCULTURA “LIGAÇÃO COM ÁGUA” DE YANG XIAOHUA Museu de Arte de Macau (até 01/2017)

PROBLEMA 111

SOLUÇÃO DO PROBLEMA 110

UM DISCO HOJE

SUDOKU

DE

EXPOSIÇÃO “MEMÓRIAS DO TEMPO” Macau e Lusofonia afro-asiática em postais fotográficos Arquivo de Macau (até 4/12)

EXPOSIÇÃO “EDGAR DEGAS – FIGURES IN MOTION” MGM Macau (até 20/11)

0.22

AQUI HÁ GATO

EXPOSIÇÃO WORLD PRESS PHOTO Casa Garden

EXPOSIÇÃO “O ARAUTO DOS TEMPOS: O POETA F. HUA-LIN” Academia Jao Tsung-I (até 13/11)

(F)UTILIDADES

Olham para mim enquanto fumam um cigarro por entre as rugas e as mãos cheias de terra. Ao meu lado um semáforo maluco e um grupo de pessoas tresloucadas com sacos de biscoitos nas mãos. Autocarros expiram gases tóxicos, os automóveis preenchem as estradas e há umas motas pelo meio. Hora de almoço. O tráfego prossegue. O mesmo homem olha-me com os mesmos olhos duros. A obra não pode parar, as tábuas no chão, e logo ali outra obra ao lado. Tudo tem de ser feito já, tudo tem de prosseguir e ai de quem ouse gritar “Basta!” no meio da rua. Esse “Basta!” decerto não se ouviria. Pessoas acotovelam-se e não têm sequer tempo para olhar para o lado. Leio nos jornais que há calendários para que este canto da cidade ruidoso um dia acabe. Custa-me a acreditar que o centro de Macau e da Taipa sejam um dia locais agradáveis para se passear ou para frequentar à hora de almoço, quando todos saem dos edifícios. Por isso vou ao lago. Ali o sol arde e as águas trazem alguma tranquilidade. A sede do Governo mantém a mesma serenidade de sempre e nem sequer se altera quando há protestos. À noite o sossego vem, por fim. Pu Yi

GOODBYE LENIN SOUNDTRACK (YANN TIERSEN, 2003)

Yann Tiersen nunca desilude e este álbum não é excepção. O filme que conta a história do muro de Berlim ganhou uma banda sonora à altura, cuja sonoridade tem também história dentro. Cada música encaixa na perfeição com momentos do filme, o que nem sempre acontece no cinema. Este é um álbum que se ouve sem que necessitemos das imagens, ainda que elas não nos larguem. DOCTOR STRANGE

Cineteatro

C I N E M A

SALA 1

NEVER GO BACK [C]

Filme de: Scott Derrickson Com: Benedict Cumberbatch, Chiwetel Ejiofor, Rachel McAdams 14.30, 16.45, 21.30

Filme de: Edward Zwick Com: Tom Cruise, Cobie Smulders, Danika Yarosh, Austin Hebert 14.30, 16.45, 19.15, 21.30

DOCTOR STRANGE [B]

DOCTOR STRANGE [B][3D] Filme de: Scott Derrickson Com: Benedict Cumberbatch, Chiwetel Ejiofor, Rachel McAdams 19.15 SALA 2

JACK REACHER:

Andreia Sofia Silva

SALA 3

HEARTFALL ARISES [C] FALADO EM CANTONÊS LEGENDADO EM CHINÊS E INGLÊS Filme de: Ken Wu Com: Nicholas Tse, Sean Lau 14.30, 16.30, 19.30 21.30

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Propriedade Fábrica de Notícias, Lda Director Carlos Morais José Editores Isabel Castro; José C. Mendes Redacção Angela Ka; Andreia Sofia Silva; Sofia Mota Colaboradores António Falcão; António Graça de Abreu; Gonçalo Lobo Pinheiro; José Drummond; José Simões Morais; Julie O’Yang; Maria João Belchior (Pequim); Michel Reis; Paulo José Miranda; Rui Cascais; Sérgio Fonseca Colunistas António Conceição Júnior; André Ritchie; David Chan; Fernando Eloy; Isabel Castro; Jorge Rodrigues Simão; Leocardo; Paul Chan Wai Chi; Paula Bicho; Rui Flores; Tânia dos Santos Cartoonista Steph Grafismo Paulo Borges Ilustração Rui Rasquinho Agências Lusa; Xinhua Fotografia Hoje Macau; Lusa; GCS; Xinhua Secretária de redacção e Publicidade Madalena da Silva (publicidade@hojemacau.com.mo) Assistente de marketing Vincent Vong Impressão Tipografia Welfare Morada Calçada de Santo Agostinho, n.º 19, Centro Comercial Nam Yue, 6.º andar A, Macau Telefone 28752401 Fax 28752405 e-mail info@hojemacau.com.mo Sítio www.hojemacau.com.mo


18 DIREITO DE RESPOSTA

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Exm.º Senhor Director do Jornal Hoje Macau

ral, na expectativa de que possa aproveitar a oportunidade impar de promover uma lista com propostas alternativas em saudável ambiente democrático.

(Att Exm.ª Senhora Sofia Mota) Em nome da lista candidata aos órgãos associativos da Associação de Pais e Encarregados de Educação da Escola Portuguesa de Macau (APEP) agradecia a publicação, ao abrigo do direito de resposta, da seguinte posição da Lista admitida :

3. Saudar a douta deliberação da mesa da Assembleia Geral, a qual permite duplamente sanar a irregularidade e promover uma estimulante e genuína eleição, caso se venha a verificar a constituição e admissão de outra lista, com outra equipa e outras prioridades de acção.

1. Saudar a deliberação da Direcção da APEP de admissão da nossa lista, após terem dado prazo para a mesma ser completada e que permitiu, desde já, renovar e aumentar o efectivo de associados da APEP em mais de uma dezena. Revelou boa fé e “fair play democrático”. Sendo certo que já tinham declarado não desejar continuar o possibilitar o aperfeiçoamento da lista está conforme com o principio democrático sendo sempre, em nosso entendimento, preferível esta mera irregularidade do que obrigar quem não tem vontade e/ou força anímica a continuar.

4. Exortar todos os associados da APEP a contribuírem com ideias e a participarem na vida associativa, designadamente no acto eleitoral que, previsivelmente, decorrerá no próximo dia 24 de Novembro. Macau, aos 28 de Outubro de 2016 Pela Lista Candidata aos Órgãos Associativos da APEP Manuel Gouveia manuelggouveia@gmail.com Candidato a Presidente da Direcção da APEP

2. Saudar o empenho associativo de quem impugnou o acto eleito-

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EDITAL Notificação relativa à audiência sobre a reparação de edifício em mau estado de conservação Edital n.º : 44/E-AR/2016 Processo n.º : 7/AR/2016/F Local : Rua de Francisco Xavier Pereira n.os 51-53B e n.º 5, EDF. Fong I, Macau. Li Canfeng, Director da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, faz saber que ficam notificados os condóminos, os inquilinos ou demais ocupantes do edifício acima indicado, do seguinte: Em conformidade com o Auto de Vistoria da Comissão de Vistoria constante do processo em curso nesta Direcção de Serviços, o edifício acima indicado carece de reparação e encontra-se em mau estado de conservação, pelo que, nos termos do n.º 2 do artigo 54.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M (Regulamento Geral da Construção Urbana) de 21 de Agosto, foi instaurado o procedimento administrativo relativo à notificação da sua reparação. No uso das competências delegadas pela alínea 12) do n.º 2 do Despacho n.º 11/ SOTDIR/2016, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) n.º 21, II Série, de 25 de Maio de 2016, o Chefe do Departamento de Urbanização da DSSOPT, Lai Weng Leong, homologou o Auto de Vistoria acima indicado através de despacho de 20 de Outubro de 2016. Notificam-se os interessados que no prazo de 10 (dez) dias, contados a partir da data da publicação do presente edital, devem dar cumprimento à ordem emanada no Auto de Vistoria, ou apresentar no mesmo prazo, conforme o disposto no artigo 94.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro, as alegações escritas relativas à decisão do procedimento da reparação do edifício acima indicado, podendo requerer diligências complementares acompanhadas de documentos. Se findo o prazo acima referido os interessados não derem cumprimento à respectiva ordem nem apresentarem quaisquer alegações escritas, tal não afecta a decisão tomada por esta Direcção de Serviços. Além disso, caso necessário, esta Direcção de Serviços pode aplicar aos infractores a multa estabelecida nos artigos 66.º e 67.º do citado diploma legal. Os interessados podem consultar o processo durante as horas normais de expediente nas instalações da Divisão de Fiscalização do Departamento de Urbanização desta DSSOPT, situadas na Estrada de D. Maria II, n.º 33, 15.º andar, em Macau. RAEM, 24 de Outubro de 2016 O Director dos Serviços Li Canfeng

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dissonâncias ruiflores.hojemacau@gmail.com

A

A válvula de escape

libra esterlina encontra-se em mínimos históricos. Os bancos internacionais que durante anos tiveram as suas sedes europeias em Londres estão a anunciar a saída do Reino Unido até ao final do ano, não esperando pela invocação do artigo 50.° do Tratado da União Europeia pelo governo britânico. A responsável pelo governo escocês já anunciou que a Escócia vai preparar-se para um novo referendo sobre a independência. As consequências iniciais da recuperação da soberania nacional britânica em relação a Bruxelas parecem ser desastrosas. As perspectivas de dias mais risonhos não parecem convencer muitos. Pelo menos por ora, enquanto as consequências financeiras continuarem a afectar o bolso dos britânicos que estão a ver o seu poder de comprar diminuir ao ritmo da desvalorização da sua divisa. As sondagens mostram que o número de eleitores que se encontram arrependidos por terem votado “leave” no referendo de 23 de Junho seria suficiente para ter dado a vitória ao campo do “remain”. Isto tudo além do “vox populi”, dito por vários britânicos, meio a sério, meio a brincar, de que nunca o termo “União Europeia” foi tão pesquisado quanto na noite em que foram anunciados os resultados do referendo. Que ninguém parece ter alguma vez pensado em todas as consequências do Brexit é um dado adquirido. Havia umas suposições. Supunha-se que a libra pudesse flutuar mais do que quando a Grã-Bretanha estava dentro da União Europeia, embora nunca tenha adoptado o euro como divisa nem tenha aderido ao espaço Schengen, expressão máxima da livre circulação de pessoas no interior das fronteiras da União Europeia. Mas a possibilidade da desvalorização da libra seria algo, pois, que precisaria de ser confirmado pela realidade dos factos. Supunha-se que a União Europeia não aceitaria que um futuro acordo de comércio livre entre o Reino Unido e a União não contemplasse a livre circulação de pessoas. Mas isso poderia ser discutido. Negociado. Em política nada é certo, embora o acordo que existe entre a União e a EFTA (Associação Europeia de Comércio Livre, composto pelo Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça), tenha como uma das suas premissas a livre circulação de pessoas entre os quatro estados e a União. Alias, a intransigência dos suíços em relação à circulação de pessoas levou a que as negociações com a União Europeia se prolongasse por 20 anos. E só foi desbloqueado depois de as autoridades helvéticas terem aberto as portas à entrada de estrangeiros sem restrições. Ainda assim,

CHARLIE CHAPLIN, MODERN TIMES

RUI FLORES

supunha-se que a Grã-Bretanha conseguiria travar a imigração de europeus. E isso seria um dado positivo, pois os britânicos haveriam de ter recuperado a sua soberania. Quatro meses passados sob o referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia, os vários sinais que saem de Londres apontam num só sentido. Ninguém sabe muito bem como se vai processar a retirada do Reino Unido. À cabeça de todos os responsáveis britânicos, Theresa May – para quem Brexit alegadamente “significa Brexit”, como ela disse quando substituiu David Cameron na chefia do governo – não parece estar particularmente empenhada numa solução rápida. Anunciou para Março a invocação do artigo 50.° do Tratado da União Europeia, mas o conteúdo da proposta da futura relação com o bloco europeu não é nada clara. Aliás, caso não cumpra a promessa de iniciar formalmente negociações com Bruxelas até Março qual será a consequência desse incumprimento? Se do ponto de vista politico, tudo indica que Theresa May está longe de ter definido o que será o conteúdo da proposta da fu-

Blair veio dizer o que muitos pensam. A angústia sobre a futura relação da GrãBretanha agravou-se esta semana com as dificuldades colocadas pela Valónia, região belga com pouco mais de três milhões de habitantes, governo e parlamentos próprios, em aceitar o acordo de comércio livre com o Canadá

tura relação do Reino Unido com a União Europeia, do ponto de vista institucional sucedem-se as vozes que pedem que seja o parlamento britânico a ter a palavra final no conteúdo do novo acordo a estabelecer com Bruxelas. A justiça britânica já foi chamada a tomar posição, determinando qual deverá ser o papel destinado ao parlamento em todo este processo. Enquanto o caso aguarda superior decisão pela justiça britânica, durante este fim-de-semana o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair veio contribuir um pouco mais para a confusão. Segundo Blair, a Grã-Bretanha deve manter as suas opções abertas sobre o Brexit, o que é como quem diz “devemos considerar a possibilidade de não avançar com a saída do bloco europeu”. Como o parlamento britânico deve ser soberano em matéria de relações externas, dizem muitos juristas, estaria encontrada uma porta de saída para o imbróglio do Brexit. Blair veio dizer o que muitos pensam. A angústia sobre a futura relação da Grã-Bretanha agravou-se esta semana com as dificuldades colocadas pela Valónia, região belga com pouco mais de três milhões de habitantes, governo e parlamentos próprios, em aceitar o acordo de comércio livre com o Canadá – um documento com mais de 1600 páginas negociado entre Bruxelas e Otava nos últimos sete anos. As dificuldades colocadas pela Valónia estão a ser interpretadas em Londres como um sinal dos inúmeros trabalhos que o Reino Unido ainda vai ter de superar para consumar o seu divórcio com o clube dos 28. É que a seguir a qualquer acordo estabelecido com Bruxelas, os termos da relação futura entre britânicos e a Europa a 27 vão ter de ser ratificados por pelo menos 38 dos parlamentos nacionais e regionais da Europa. E poderão nessa altura surgir outras Valónias. E depois há outras feridas pelas quais poderá ainda brotar muito sangue. Feridas anunciadas como o novo referendo sobre a independência da Escócia. Tudo consequências muito pesadas para quem queria ver restaurada a sua soberania nacional.

OPINIÃO


Caipirinha sim, caipirinha não, é uma grande confusão...

segunda-feira 31.10.2016

Atlântido

HILLARY PREOCUPADA COM REABERTURA DE CASO DOS E-MAILS

Cartas na mesa

A

candidata democrata à Casa Branca, Hillary Clinton, considerou domingo um caso «sem precedentes» e «profundamente preocupante» a reabertura da investigação do FBI aos seus e-mails. “É muito estranho que uma coisa assim seja publicada, com tão pouca informação, pouco antes de uma eleição”, disse a candidata a Presidente num comício em Daytona Beach, Florida, referindo-se à carta que o director do FBI, James Comey enviou ao Congresso, a dizer que os investigadores terão descoberto novas mensagens “pertinentes” ligadas ao caso dos e-mails. E acrescentou a candidata: “Na verdade não é só estranho, é sem precedentes e é profundamente inquietante, porque os eleitores merecem conhecer os factos como um todo. Já pedimos ao director Comey para PUB

“Não é só estranho, é sem precedentes e é profundamente inquietante, porque os eleitores merecem conhecer os factos como um todo” HILLARY CLINTON

que explique tudo agora, para meter tudo em cima da mesa”. Donald Trump também já comentou a carta do FBI, sugerindo que a reabertura da investigação, a 11 dias das eleições, só pode ser justificada por um “crime atroz” de Hillary Clinton. O FBI tem analisado o possível uso inapropriado de informação classificada por parte de Hillary Clinton quando era secretária de Estado. O caso foi encerrado, mas agora terão surgido novas informações, segundo o FBI. Hillary Clinton utilizou, quando dirigia a diplomacia dos EUA, entre 2009 e 2013, um endereço de correio electrónico privado -- hdr22@clintonemail. com --, através de um servidor privado instalado no seu domicílio em Chappaqua, no Estado de Nova Iorque, em vez de ter usado uma conta governamental, expondo potencialmente informações confidenciais à pirataria. A candidata democrata à Presidência apresentou as suas desculpas neste assunto, mas continua a sustentar que não fez nada de ilegal. O chefe do FBI, James Comey, é um jurista republicano, ex-procurador federal e antigo vice-ministro da Justiça.

SISMO EM ITÁLIA TEVE MAGNITUDE DE 6,1

O sismo que abalou ontem de manhã a região da Úmbria, no centro de Itália, teve uma magnitude 6,1 na escala Richter, esclareceu o Instituto Nacional de Vulcanologia. O Instituto tinha informado inicialmente que o terramoto teve uma magnitude de 7,1. O sismo, com profundidade de 10 quilómetros, ocorreu às 07:44 e fez derrubar várias casas afectadas por sismos anteriores, mas parece não ter causado vítimas.


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