Hoje Macau 1 JUN 2017 #3823

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DIRECTOR CARLOS MORAIS JOSÉ PUB

AGÊNCIA COMERCIAL PICO • 28721006

PREVIDÊNCIA CENTRAL

Regime aprovado

MOP$10

QUINTA-FEIRA 1 DE JUNHO DE 2017 • ANO XVI • Nº 3823

hojemacau

PÁGINA 5

LEI DE TERRAS LESADOS UNIDOS CONTRA O DIPLOMA

EUA | CLIMA ÚLTIMA

CHINA

Os sapatos de Ivanka PÁGINA 13

Angústia

Reivindica chão Juntaram-se todos em torno do mesmo objectivo: a alteração da nova Lei de Terras. Embora não se saiba se são concessionários que ficaram sem terrenos, ou compradores de apartamentos que não chegaram a ser construídos, todos

reivindicam mudanças na legislação em vigor. A “União dos Lesados” diz já existir consenso na sociedade para o fazer. Ainda ontem, o TSI deu razão ao Governo na recuperação de mais um terreno.

h JOÃO PAULO COTRIM

DAVE NAGEL/GETTY IMAGES

PÁGINAS 8-9

DIA MUNDIAL DA CRIANÇA

O princípio da desigualdade GRANDE PLANO

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MAU AMBIENTE


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ANÁLISE DIA MUNDIAL DA CRIANÇA

O FUTURO TALVEZ SEJA DELAS

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aviso foi feito esta semana: só no último mês, foram registados 55.200 casos de cólera no Iémen, um surto sem precedentes que está a afectar sobretudo crianças. Na semana passada, outro alerta: só este ano, pelo menos 200 crianças morreram afogadas no Mediterrâneo quando fugiam do Norte de África para Itália. É mais do que uma morte por dia, contabiliza a UNICEF, que tem detectado um aumento do número de crianças a fazer a perigosa travessia por mar. Muitas delas viajam sozinhas. Para as crianças do Iémen e para aquelas que, neste momento, fogem da casa que conheceram, nada dirá a data que hoje se assinala em vários pontos do mundo. Foi em 1925 que o dia surgiu, mas só começou a ser comemorado com regularidade depois da Segunda Guerra Mundial, como forma de pensar nas crianças que, então, precisavam de muita ajuda. Na altura, como hoje, o mundo faz-se de desigualdades. A UNICEF estima que, da cólera do Iémen aos ataques em hospitais na Síria, os conflitos armados ameacem a vida de mais de 24 milhões de crianças no

O mundo fez progressos espantosos na redução da mortalidade infantil e na saída de milhões de crianças da pobreza extrema. As tecnologias levam a ajuda a locais outrora inacessíveis. Mas há a guerra, os desastres naturais, os milhões de refugiados. E falta sobretudo um compromisso político para que o mundo dos mais pequenos se escreva com outras linhas

SHUTTERSTOCK

GRANDE PLANO

Médio Oriente e no Norte de África. Além das mortes que resultam de bombardeamentos, balas e explosões, a violência impede o acesso a alimentos, serviços de saúde, água potável e condições sanitárias que permitam crescer. No relatório mais recente sobre a situação das crianças ao nível mundial, a agência das Nações Unidas congratula-se com os progressos que o mundo tem feito na redução da mortalidade infantil e da pobreza extrema. Mas faz uma ressalva: na maior parte dos locais onde a infância é um pesadelo, as restrições não são técnicas, devendo-se, isso sim, à falta de compromisso político para que os recursos cheguem a quem precisa deles. É tudo ainda uma questão de vontade colectiva, acrescenta a UNICEF, que traça objectivos muito concretos para 2030.

AGORA OU NUNCA

O tempo certo para agir é agora, diz a agência da ONU. Se não for feito um grande esforço para combater a desigualdade, daqui a 13 anos quase 70 milhões de crianças poderão morrer antes de completarem o quinto aniversário, sendo que aquelas que

vivem na África Subsariana são as que se encontram em maior risco. É também neste ponto do globo que, em 2030, poderão viver nove em cada dez crianças em risco de extrema pobreza. O cenário mais pessimista da UNICEF aponta ainda para que mais de 60 milhões de crianças estejam excluídas do ensino primário, ou seja, sensivelmente o mesmo número que hoje se verifica. Mais uma vez, a maioria será da África Subsariana. Prevê-se ainda que 750 milhões de meninas contraiam matrimónio durante a infância. “Estes enormes perigos e desigualdades não representam apenas

A UNICEF estima que os conflitos armados ameacem a vida de mais de 24 milhões de crianças no Médio Oriente e no Norte de África


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na África Subsariana e menos 1,3 milhões no Sul da Ásia.” Outro factor a ter em conta é a maternidade na adolescência. Apesar de ser um número em queda, todos os anos existem 15 milhões de raparigas que casam antes de terem feito 18 anos. “Estas meninas são um grupo muito vulnerável: é-lhes negada a infância, têm poucas oportunidades de educação e, com muita frequência, são mães demasiado novas”, destaca a UNICEF.

Infância aprisionada Macau com valores materialistas e pouco espaço

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Á zonas do mundo onde nascer é, em si, um factor de risco. Por cá, as crianças enfrentam dificuldades muito típicas do ambiente social e geográfico que Macau oferece. “Estão muito constrangidas no desenvolvimento por vários factores”, adianta Gertina Van Schalkwyk, professora de psicologia da Universidade de Macau, especializada em desenvolvimento infantil. Em primeiro lugar, a própria cidade, com elevada densidade populacional e falta de espaço físico, constringe os movimentos e oferece poucas oportunidades para brincar no exterior. Esta peculiaridade de Macau leva a “uma carência de actividades de lazer que beneficiem o desenvolvimento de capacidades de motricidade fina e grossa”, explica a académica. Estas competências habilitam a criança a aprender a manusear objectos com destreza e a ter controlo corporal. Depois, há a questão comportamental. Nesse capítulo, as crianças enfrentam o desafio de crescerem com pais ausentes, sobrecarregados com pesadas cargas horárias de trabalho. “Se por um lado crescem sem controlo parental, por outro os pais têm a tendência para serem altamente exigentes, sem darem resposta às necessidades psicológicas dos filhos”, destaca Gertina Van Schalkwyk. Exigem notas e desempenhos elevados aos filhos, num ambiente altamente

a violação dos direitos. Colocam em causa o futuro de cada uma destas crianças e perpetuam ciclos intergeracionais de desequilíbrio que minam a estabilidade a segurança das sociedades”, sublinha a UNICEF. Entre os principais objectivos para 2030, estão as questões relacionadas com a maternidade, os recém-nascidos e o combate à mortalidade infantil. Pretende-se reduzir o número de mortes à nascença para 12 em cada mil bebés e garantir que as crianças que morrem antes dos cinco anos não são mais do que 25 por cada mil. O acesso generalizado a cuidados de saúde – outra das metas – contribuirá para que estes números possam tornar-se reais. Desde 1990 que a morte de mães e recém-nascidos, bem como de crianças em tenra idade, tem estado a diminuir, e houve progressos extraordinários nalguns dos países mais pobres do mundo. A China encontra-se no grupo que registou avanços mais significativos. No entanto, ainda há muito por fazer: a Índia e a Nigéria, por exemplo, continuam a mostrar dificuldades em resolver este

dilema. A UNICEF chega a uma grande conclusão: o crescimento económico pode ajudar a garantir a sobrevivência de mães e filhos, mas não é garantia de que tal aconteça, se em falta estiver um compromisso político nesse sentido. Também a nutrição desempenha um papel determinante. Metade das mortes com crianças menores de cinco anos deve-se à falta de uma alimentação adequada. O dinheiro que existe em casa é essencial, mas também a educação dos progenitores: no Sul da Ásia e na África Subsariana, as crianças com mães sem acesso a educação correm riscos muito maiores. “Se todas as mães tivessem completado o ensino secundário, haveria menos 1,5 milhões de mortes por ano de crianças com menos de cinco anos

Há 124 milhões de crianças a quem não é dada a possibilidade de entrar na escola ou concluir os estudos

Se tem havido progressos nalguns aspectos, não se pode dizer o mesmo sobre o acesso à educação. Desde 2011, aumentou o número de crianças em idade escolar que estão excluídas do sistema de ensino. São quase 124 milhões que a quem não é dada a possibilidade de entrar na escola ou concluir os estudos. A pobreza e a guerra contribuem para este número, mas há ainda outro problema: as meninas continuam a ser aquelas com maiores dificuldades de acesso ao sistema educativo. Se esta tendência global se mantiver, em 2030 haverá 60 milhões de crianças sem escola, sendo que, nos países com maiores índices de pobreza, 76 por cento dos alunos do ensino primário não chegarão sequer a concluir este ciclo. Os padrões actuais levam ainda a UNICEF a dizer que, a não ser que haja uma profunda alteração do cenário, só na viragem para o próximo século é que se poderá esperar ensino primário e secundário universal em todos os países. A situação vivida por milhões de pessoas obrigadas a deixarem as suas casas também não deixa margem para optimismo. No final de 2014, metade dos refugiados estava no exílio há mais de dez anos. Mas os conflitos armados não são o único obstáculo à vida das crianças de vários pontos do mundo. As alterações climáticas têm vindo a aumentar os riscos associados a tempestades e cheias. São desastres naturais que impedem o acesso à educação e à saúde, e que aumentam os riscos de negligência, tráfico e trabalho infantil. Para tentar minimizar todos estes problemas, a UNICEF defende que é necessário criar programas de ajuda que correspondam às necessidades reais. Os programas de emergência de pouco adiantarão se não houver apoios a longo prazo, o tempo que as crianças precisam para serem crianças. Isabel Castro

isabelcorreiadecastro@gmail.com

João Luz

info@hojemacau.com.mo

ARQUIVO

FORA DA ESCOLA, LONGE DE CASA

competitivo, mas sem suporte emocional. Outro dos aspectos que a especialista em psicologia infantil denota no desenvolvimento das crianças de Macau é uma mudança de mentalidade e de sistema de valores que levou a um crescendo do materialismo. “São inundadas com coisas, bens materiais, e começam a achar que esse é um direito seu, que devem ter tudo aquilo que querem”, explica. Esta ligação a bens materiais tende a substituir a aprendizagem de resolução de problemas e a interacção social. Esta viragem para uma sociedade mais materialista sente-se na educação das crianças e, para a académica, é a grande diferença no desenvolvimento infantil da última década. De resto, as crianças em Macau sempre tiveram “desafios em termos de identidade, nomeadamente pela ausência dos pais”. Este tipo de crescimento pode levar a problemas na adolescência, nomeadamente a comportamentos de risco tais como o alcoolismo, o crime, o consumo de drogas. “São crianças vulneráveis em relação a problemas de saúde mental”, revela Gertina Van Schalkwyk. Os adolescentes que cresceram neste contexto precisam de regras dos pais, assim como os jovens em qualquer parte do mundo. Regras, autoridade e limites mas, também, amor e compreensão.

BICHOS-CARPINTEIROS

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ealiza-se hoje, ao final da tarde, uma palestra sobre perturbação de hiperactividade e défice de atenção, da responsabilidade do médico Jorge Sales Marques. O pediatra vai falar da realidade e dos mitos associados a este tipo de perturbação. A sessão tem início às 18h30, na Fundação Rui Cunha.


4 POLÍTICA

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Vagas para todos Si Ka Lon pede integração das creches no ensino público gratuito

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mais um rol de críticas ao Instituto da Habitação (IH). No plenário de ontem da Assembleia Legislativa (AL), o deputado Au Kam San acusou o organismo de ter diversas casas sociais vazias. “Quem mais desperdiça habitações públicas é o Governo”, começou por dizer o deputado, no período de interpelações antes da ordem do dia. Au Kam San referiu que, depois da implementação de um plano de aumento das rendas das casas sociais, os valores triplicaram, o que obrigou vários arrendatários a deixarem as fracções. Muitas chaves foram devolvidas ao IH, “mas quase nunca se viu o IH a arrendá-las novamente”, apontou. Au Kam San considera que o Governo optou por deixar as casas vazias, o que considera “inadmissível”. O período de interpelações de antes da ordem do dia serviu ainda de palco para outros deputados apresentarem as suas queixas relativamente à habitação pública. Kwan Tsui Hang pediu

Habitação pública GOVERNO

ACUSADO DE DESPERDIÇAR RECURSOS

Ao Deus dará O deputado Au Kam San considera que o Executivo é o primeiro a desperdiçar fracções de habitação pública, dando como exemplo as casas sociais cujas rendas triplicaram, obrigando os moradores a sair. Contudo, o Instituto da Habitação não as arrendou de novo um planeamento antecipado para os terrenos que podem vir a ser recuperados pelo Executivo. “O Governo vai recuperar cada vez mais terrenos: os que não estão aproveitados, os que estão relacionados com subornos e outros ocupados ilegalmente.” A deputada alerta ainda para a estagnação da oferta de habitação

pública, com valores nulos de atribuição, entre 2005 e 2010, numa fase em que “as rendas tiveram uma subida louca e em flecha”. Kwan Tsui Hang lembrou que só recentemente é que o Executivo divulgou o arranque da construção de cerca de 3500 fracções. No entanto, “a quantidade e o ritmo da referida

construção não conseguem dar resposta às necessidades da sociedade”, disse.

CANDIDATURAS DISTANTES

Au Kam San quis também saber quando abre um novo concurso para as candidaturas à habitação pública. Para o deputado, “não passa de mera retórica” o facto de

Kwan Tsui Hang alerta para a estagnação da oferta de habitação pública, com valores nulos de atribuição entre 2005 e 2010, numa fase em que “as rendas tiveram uma subida louca e em flecha”

o Chefe do Executivo ter dito que as novas candidaturas só avançam após o planeamento dos terrenos da Avenida Wai Long. “O método de só avançar com o concurso quando a construção já está em curso só se aplica à habitação económica e não à social”, acrescentou. Por outro lado, “há sempre quem defenda que as candidaturas à habitação social devem ser regulares, tal como acontece com outros serviços prestados pelo Governo”. Já Ng Kuok Cheong pediu que as casas de Macau sejam para os locais. Para o deputado, a questão tem que ver com o aproveitamento dos novos aterros. Apesar das promessas do Executivo sobre a construção de mais de 50 mil habitações públicas nos novos aterros, o deputado considera que não há garantia de que estas fracções sejam efectivamente destinadas aos residentes. Para que haja certezas, Ng Kuok Cheong sugere que o Executivo implemente medidas que garantam o destino destas habitações a residentes permanentes. Sofia Margarida Mota

sofia.hojemacau@gmail.com

deputado Si Ka Lon pediu ontem ao Executivo que as creches do território passem a estar sob a alçada da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ). A razão, apontou ontem Si Ka Lon durante o período de antes da ordem do dia na Assembleia Legislativa, tem que ver com a necessidade de dar mais importância à vertente educativa destas instituições, para que possam ser abrangidas pela escolaridade gratuita. O objectivo é a redução da pressão económica nos jovens casais. Para Si Ka Lon, trata-se de uma medida que pode contribuir para um fomento real de um ambiente favorável às crianças no território. O deputado salientou que, apesar das medidas anunciadas pelo Governo para promover “o nascimento saudável e o aumento da respectiva taxa”, Macau continua a não ultrapassar uma das maiores dificuldades sentidas pelos pais trabalhadores: “Conseguir inscrever os filhos numa creche”. “Como [os pais] têm de trabalhar, se não podem deixar os filhos ao cuidado dos avós ou parentes, só os podem entregar às creches”, referiu o deputado. Si Ka Lon recordou que, de acordo com informações disponibilizadas no ano passado,

CANÍDROMO HO ION SANG QUER CONSULTA PÚBLICA

as creches de Macau tinham cerca de 8600 vagas, sendo que o Governo terá garantido que, para este ano, o número aumentaria para as 10 mil. No entanto, olhando para os nascimentos registados entre 2014 e 2015, o número já ultrapassou os 14 mil. O resultado é óbvio: “Nalgumas creches financiadas pelo Governo são 30 crianças a disputar uma vaga”, enquanto nas creches privadas “o preço é elevado, podendo chegar a mensalidades de 3700 patacas, ou seja, duas vezes mais caras que as creches financiadas”, ilustrou Si Ka Lon. A mensalidade de uma creche privada em Macau pode ainda atingir as nove mil patacas, sendo “mais cara do que a propina das universidades”. A solução passa pela integração das creches na DSEJ. Hoje em dia, é o Instituto de Acção Social que trata desta matéria. S.M.M.

A pouco mais de um ano do fim do prazo que o Governo deu à concessionária que explora o Canídromo para procurar outro lugar, Ho Ion Sang interroga o Executivo sobre o destino a dar ao terreno. O deputado concorda com a linha que o Governo anunciou pretender seguir, ou seja, aproveitar o espaço para interesses públicos, e não para fins comerciais, hoteleiros ou relacionados com jogo. Ho Ion Sang alerta para o facto da zona onde fica o Canídromo ter crescido muito em termos de densidade populacional, faltando equipamentos que sirvam a comunidade. Como tal, o deputado interpelou o Governo para que tenha sensibilidade social e faça uma auscultação pública abrangente quanto ao destino a dar aos terrenos em questão. O concessionário tem de sair do espaço até 21 de Julho de 2018.


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Previdência central PROPOSTA DE LEI APROVADA COM REPAROS

RELATÓRIOS CHAN MENG KAM PEDE RESPONSABILIZAÇÃO DE SERVIÇOS

MAK SOI KUN QUER COMISSÃO A ANALISAR LEIS

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deputado Mak Soi Kun recorreu ontem ao período de antes da ordem do dia, no plenário da Assembleia Legislativa (AL), para pedir a criação de uma comissão que analise todas as leis em vigor no território e eventuais disparidades que possam existir entre as duas línguas oficiais. “Gostaria de sugerir que fosse criada uma comissão especializada para, quanto antes, verificar a correspondência das versões das leis, em português e em chinês. É, pois, através desta verificação, enquanto forma de remedeio e correcção, que se vai conseguir apurar se igual situação também acontece noutros diplomas e se alguns direitos e interesses legítimos dos residentes terão sido afectados na aplicação das leis ou políticas, por essas mesmas razões”, disse no hemiciclo. Esta questão surgiu no âmbito da alegada existência de divergências entre as versões portuguesa e chinesa do regime eleitoral da AL. Para o deputado, “esta pode ser apenas a ponta do icebergue, pois não se sabe se a desconformidade entre essas versões também acontece noutros diplomas legais”.

Regime avança sem acordo O regime de previdência central não obrigatório foi ontem aprovado na especialidade. O diploma, contudo, não reuniu consenso. Deputados e Governo discordaram quanto à incidência das contribuições GCS

Na sequência das várias investigações levadas a cabo pela Comissariado contra a Corrupção (CCAC) e pelo Comissariado da Auditoria (CA), Chan Meng Kam diz que a sociedade exige consequências das irregularidades encontradas. O deputado diz que, após a detecção de erros, é importante que sejam introduzidas melhorias de funcionamento e sejam feitos esclarecimentos à população. Chan Meng Kam salienta que o Governo está sempre de acordo com os resultados das auditorias e dos relatórios, mas que pouco é feito. O deputado, em intervenção no período de antes da ordem do dia, defendeu que sem um sistema de responsabilização transparente e eficaz, as promessas de reforçar a prevenção não passam de um slogan. Chan Meng Kam aludiu ainda à ironia de, na avaliação de desempenho das chefias em 2016, menos de um por cento ter obtido nota negativa.

POLÍTICA

F

OI ontem aprovada na especialidade o regime de previdência central não obrigatório. No entanto, o debate ficou marcado por algumas divergências entre deputados e Governo. O valor de incidência das contribuições de patrões e trabalhadores esteve no centro da discórdia. De acordo com a proposta de lei, “as contribuições para os planos conjuntos de previdência são mensais e têm como base de cálculo o salário de base do trabalhador referente ao mês em causa”. Para alguns dos deputados, a designação de salário não se mostrou justa e Ella Lei manifestou-se contra esse artigo do diploma. Para Ella Lei, a terminologia da proposta apresentada deve ser mudada de “salário” para “remuneração”. A razão, apontou a deputada, é estarem em causa valores diferentes. Quando se fala de remuneração é tido em conta um montante em que estão incluídas as gorjetas, prémios e outras recompensas que são dadas aos trabalhadores. A deputada deu ainda como exemplo a situação de Hong Kong, onde já existe este regime e onde que é aplicada a remuneração de base dos trabalhadores. Ella Lei acabou por pedir ao hemiciclo que fosse feita uma alteração.

UM ARTIGO DE LIBERDADE

O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, defendeu que “neste momento há 70 mil trabalhadores que utilizam

o salário base, pelo que o Governo entende que este é o método mais adequado”. De acordo com o secretário, o mais importante é o facto de a proposta de lei dar a liberdade para que as entidades envolvidas possam optar pela solução que lhes for mais conveniente. “É a própria proposta que prevê que o valor seja alterado pelas respectivas entidades, caso considerem que é a melhor opção”, sublinhou Alexis Tam. De modo a afastar cepticismos, o secretário reiterou: “Este artigo não afasta a hipótese de o empregador escolher critérios melhores para os seus trabalhadores para que possam fixar um método melhor”. Por outro lado, “o salário base é mais fixo e estável e, por isso, é mais fácil para fazer cálculos”. Com a possibilidade de o artigo em causa poder vir a ser votado em separado, e ser mesmo chumbado,

“Este regime tem como objectivo proteger os aposentados e, por isso, não deve ser calculado no salário base, mas sim na remuneração.” ELLA LEI DEPUTADA

os juristas da AL e do Governo foram chamados a dar explicações. Para o especialista que acompanhou Alexis Tam, sem o artigo em causa a lei ficaria “coxa”, ou seja, não se saberia como calcular a incidência. “Torna-se impraticável”, referiu. O deputado Gabriel Tong não deixou de se manifestar perante a situação e chamou a atenção para a abertura de precedentes que podem ser seguidos em votações futuras. Já Vong Hin Fai considerou que, “sem este artigo, toda a proposta de lei deixa de ser exequível”. A alínea do artigo em causa acabou por ser aprovada com 22 votos a favor, três contra e uma abstenção. Os votos contra couberam a Ella Lei, Kwan Tsui Hang e Leong Veng Chai.

LUTA DE CLASSES

O debate ficou ainda marcado por outro assunto polémico, relacionado com o facto de o diploma não prever a dedução das contribuições, mas sim o pagamento de uma taxa sobre o montante salarial. Para o deputado José Chui Sai Peng, a solução encontrada não agrada à maioria, em especial às entidades patronais. Já Kou Hoi In, que se apresentou como porta-voz dos empresários, explicou que os empregadores sempre quiseram que os valores fossem deduzidos. “Quando um trabalhador é despedido, além da indemnização, o empregador ainda tem de devolver o fundo que pagou”, afirmou. O deputado

mostrou-se também preocupado com a situação das pequenas e médias empresas, sendo que, afirmou, “há companhias que nem para pagar impostos têm capacidade”. O Governo entende que a solução é a mais adequada, não sendo o momento ideal para mais alterações. “Já discutimos isso há muito tempo e não podemos agora introduzir esta figura da dedução”, referiu o presidente do Fundo de Segurança Social (FSS), Iong Kong Io. Foi ainda discutido o direito de reembolso do pagamento aos trabalhadores com menos de três anos de trabalho. Patrões e trabalhadores dividem-se. Quem emprega considera que o facto de os trabalhadores com menos de três anos de serviço não poderem receber as suas contribuições é justo e ajuda á estabilidade da mão-de-obra; quem trabalha por conta de outrem defende que é uma medida que não deveria constar do diploma. Alexis Tam referiu que, daqui a três anos, será altura para realizar uma nova consulta pública e implementar o regime de contribuições de carácter obrigatório. Na reunião plenária de ontem foram ainda aprovadas na especialidade, por unanimidade, as propostas de lei referentes ao controlo do transporte transfronteiriço de numerário e de instrumentos negociáveis ao portador, e ao regime jurídico da troca de informações em matéria fiscal. Sofia Margarida Mota

sofiamota.hojemacau@gmail.com


6 POLÍTICA

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GCS

Cartas na mesa

CAEAL reúne com operadoras para lançar alerta

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Cimeira GOVERNO PROMETE LIGAÇÃO COM EMPRESAS DOS PLP

Pontapé de saída

Na primeira cimeira sobre a construção de uma plataforma de serviços para a cooperação com os países de língua portuguesa, o Chefe do Executivo, Chui Sai On, destacou o papel que Macau pode ter como elemento de ligação entre as empresas do espaço lusófono e as que estão localizadas na China

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Chefe do Executivo apresentou ontem algumas ideias sobre o papel que o território poderá desempenhar na ligação entre as empresas sediadas no Continente e as que fazem parte dos mercados lusófonos. Chui Sai On discursou na Cimeira sobre a Construção da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa de Macau, que se realizou ontem. No seu discurso, o governante “prometeu que Macau irá apoiar activamente o sector industrial e comercial dos países de língua portuguesa no desenvolvimento da cooperação com as empresas estatais nacionais e o mercado do Interior da China”. O Chefe do Executivo garantiu que o Governo “já elaborou o planeamento geral de estratégias, mecanismos e recursos” nesta área. Além disso, “estão a ser desenvolvidos diversos trabalhos programados para a construção da plataforma”, estando a ser “continuadamente introduzidos novos elementos”. Nesta perspectiva, “torna-se entusiasmante o futuro

do desenvolvimento [de Macau]”, acrescentou Chui Sai On.

O LADO BOM

O Chefe do Executivo afirmou ainda que a cimeira que ontem teve a sua primeira edição vai proporcionar “uma ligação mais estreita entre as empresas estatais nacionais, as empresas de Macau e as empresas dos países de língua portuguesa”. No caso de Macau, “as empresas estatais nacionais têm

“As empresas estatais nacionais têm contribuído, de forma ímpar, para o desenvolvimento económico [do território], trazendo-lhe novas energias nas diversas fases.” CHUI SAI ON CHEFE DO EXECUTIVO

contribuído, de forma ímpar, para o desenvolvimento económico [do território], trazendo-lhe novas energias nas diversas fases”, frisou. O território está ainda a posicionar-se em prol de uma maior integração no “desenvolvimento nacional”, participando em políticas implementadas por Pequim, como é o caso de “Uma Faixa, Uma Rota”, sem esquecer a integração na zona da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, entre outras medidas. Chui Sai On lembrou ainda os diversos projectos que já estão em curso no âmbito do Fórum Macau, tal como a concretização das 18 medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, Li Keqiang, onde se inclui o início da construção do Complexo da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. A primeira fase do concurso público para a construção daquela que será a sede do Fórum Macau terminou em Fevereiro deste ano, tendo a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes recebido propostas de nove empresas. A.S.S.

Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) esteve reunida com os representantes do sector do jogo para avisar que devem cumprir com a obrigação de neutralidade e imparcialidade. “As operadoras e promotoras de jogo, durante o processo eleitoral, não podem fazer de forma directa, ou indirecta, actos que favoreçam ou prejudiquem quaisquer listas de candidaturas”, disse Tong Hio Fong à saída da reunião. O presidente da CAEAL acrescentou ainda que estes deveres se estendem aos funcionários dos casinos durante o seu período de trabalho, inclusive nas salas de descanso. André Cheong, responsável máximo do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), esclareceu que “as operadoras podem estimular os seus trabalhadores a participarem na eleição, mas não podem, sob qualquer ameaça ou violência, exigir que votem numa determinada lista”. Para evitar que haja propaganda eleitoral nos casinos, o CCAC, em parceria com a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), promete tratar as queixas que recebam. Além dos casos que cheguem pela DICJ, a entidade fiscalizadora conta com as denúncias de cidadãos para a linha aberta durante o período do processo eleitoral. O comissário André Cheong revelou que sensibilizou as operadoras para as alterações ao Artigo 72.º da Lei Eleitoral, nomeadamente quanto aos poderes atribuídos ao CCAC para iniciar investigações a irregularidades. O responsável acrescentou que “o âmbito da fiscalização inclui os casinos, todas as salas VIP, assim como as salas de descanso dos trabalhadores”. Cheong espera contar com a total colaboração das operadoras. Quanto à possibilidade de o CCAC emprestar mão-de-obra à

DICJ para proceder à fiscalização dos casinos, o comissário não foi claro se haverá deslocação de quadros entre as entidades. Apenas comentou que o Governo é uma equipa e que cada serviço tem as suas atribuições estatuídas na lei. Além disso, André Cheong esclareceu que não há nada na lei que impeça um alto quadro de um casino de concorrer às eleições, nem sequer tem de abandonar o cargo que ocupa na operadora de jogo. João Luz

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FÓRUM MACAU MOK IUN LEI NOMEADA PARA GABINETE DE APOIO Foi ontem nomeada, por despacho do Chefe do Executivo, a nova coordenadora do Gabinete de Apoio ao Secretariado Permanente do Fórum Macau. Mok Iun Lei assume o cargo pelo período de um ano, a partir do dia 5 de Junho. Em Boletim Oficial, refere-se que Mok Iun Lei “possui competência profissional e aptidão para o exercício” das novas funções. Licenciada em Estatística, a nova coordenadora ingressou na Função Pública em 1998, tendo trabalhado vários anos na Direcção dos Serviços de Estatística e Censos. É subdirectora-geral do Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau desde 2007. Em 2012, acumulou novas funções, ao ser escolhida para vogal do Conselho Consultivo do Centro de Formação do Fórum Macau.


7 hoje macau quinta-feira 1.6.2017

A Associação Islâmica de Macau propôs ao Governo o alargamento da via de sentido único na Estrada de Cacilhas, junto ao projecto residencial que quer erguer na zona do Ramal dos Mouros. As Obras Públicas vão analisar mais uma vez o projecto. Os membros do Conselho do Planeamento Urbanístico questionaram a necessidade de uma segunda votação

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Á um ano, o Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) aprovava a construção de um edifício residencial de 127 metros de altura, na zona do Ramal dos Mouros. Contudo, o projecto está longe de arrancar. O concessionário do terreno, a Associação Islâmica de Macau, fez uma nova proposta para o alargamento da faixa de rodagem na Estrada de Cacilhas, para que haja circulação nos dois sentidos. A Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) levou novamente o projecto para discussão no seio do CPU, mas os membros criticaram

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Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) aprovou ontem um novo projecto de construção na Avenida Almirante Sérgio, que poderá levar à destruição da fachada histórica do edifício em causa. O arquitecto Rui Leão foi o único membro a apontar o dedo ao Governo quanto à possibilidade do fim de mais um símbolo arquitectónico na zona do centro histórico. “Estes edifícios mantêm a traça original e estão numa localização especial, pois faziam todo o alinhamento com o antigo porto e funcionavam como armazéns. Qualquer razão burocrática ou administrativa que exista para não proteger este edifício deveria

Ramal dos Mouros DSSOPT VAI ANALISAR DE NOVO O PROJECTO

Baralha e volta a dar

SOCIEDADE

nismo, também ligado à Aliança do Povo de Instituição de Macau. “Se não é uma anedota. Para que serve este conselho? O proprietário quer alargar a via, mas não deve preocupar-se com este assunto e sim o Governo”, frisou. Paulo Tse também fez acusações. “Duvido de mim mesmo e da eficiência do CPU. Porque é que temos demasiadas opiniões sobre os processos? Os concessionários alteram a sua proposta várias vezes e há outros factores que causam ineficiência.”

“Acho que não cabe ao concessionário fazer um estudo da viabilidade do tráfego nesta zona a longo prazo.” RUI LEÃO ARQUITECTO

a decisão, por considerarem que a votação final já foi feita e que cabe agora às autoridades decidir as questões mais técnicas. “Acho que não cabe ao concessionário fazer um estudo da viabilidade do tráfego nesta zona a longo prazo”, defendeu o arquitecto Rui Leão. “O que é preciso é que se permita um alargamento para que, no futuro, daqui a cinco ou dez anos, se possa fazer uma adaptação viária. Isso deve ser assegurado pela DSSOPT”, acrescentou. Outro membro do CPU referiu não considerar necessária uma nova discussão. “Depois de aprovarmos o projecto houve uma nova

proposta por parte do concessionário. Parece que está tudo igual, só está em causa o alargamento da via pública. Não sei por que temos de discutir este assunto de novo no CPU”, adiantou. Confrontado com estes comentários, o director das Obras Públicas, Li Canfeng, garantiu que será emitido um novo parecer sobre o edifício residencial que a Associação Islâmica de Macau quer ver construído. “Não temos novos dados para saber se este alargamento da via será bom ou não. É melhor deixarmos este caso para a DSSOPT analisar porque, até agora, só há dúvidas”, referiu o director.

O fim dos pórticos

Rui Leão fala de ataque ao património no Porto Interior

ser ultrapassada. Estou contra e estou incomodado com a demolição destas fachadas”, apontou. A responsável do Instituto Cultural (IC) presente na reunião referiu que o edifício em causa não só não é classificado, como não tem valor histórico suficiente para que seja considerado património. “Poderemos manter o mesmo modelo [arquitectónico], mas será uma opinião não vinculativa. Pelo valor histórico deste edifício, não achamos necessário manter a fachada.”

Rui Leão voltou a apontar o dedo à postura do Executivo. “Já foram demolidos edifícios à volta e não devemos estar aqui a brincar. Houve uma altura em que não havia CPU e não tínhamos como preservar o património. Não custa nada manter a fachada e fazer ali um recuo qualquer.”

UMA DISNEYLÂNDIA?

O arquitecto considerou ainda que “não podemos deixar que o centro histórico se transforme numa Disneylândia”. “Julgo que este conselho existe para

Outro representante da DSSOPT adiantou que as restantes entidades públicas concordam com o alargamento da via na Estrada de Cacilhas. “Achamos que a proposta traz uma contribuição positiva para a zona e fizemos um novo projecto de acordo com a proposta. A maioria dos representantes do Governo deu uma opinião positiva”, apontou.

CPU INEFICIENTE?

A possibilidade de uma segunda votação levou muitos membros do CPU a acusarem o organismo de ineficiência. “Mesmo que seja preciso eu não vou votar”, apontou Chan Tak Seng, membro do orga-

deliberar e tratar casos como este, que estão fora da zona de protecção e que não estão sob alçada do IC. O que está em causa são edifícios em pórtico, que ligavam o Porto Interior de uma zona à outra.” Li Canfeng, director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), referiu apenas que o Governo pode incentivar o proprietário do terreno a não demolir as fachadas na fase de construção do novo projecto, mas será sempre uma opinião não vinculativa. “Podemos exigir ao proprietário que faça como o Governo quer mas, muitas vezes, temos de respeitar a opinião do proprietário”, rematou. A.S.S.

“Já passou um ano [face à votação do projecto do Ramal dos Mouros] e ainda precisamos de fazer uma nova análise. Teremos de esperar mais um ano?”, questionou Tse, dando como sugestão o prazo de três meses para a tomada de uma decisão final. Li Canfeng defendeu que três meses podem não ser suficientes, tendo recusado ainda as acusações dos membros do CPU. “Não concordo com as opiniões aqui ditas, porque em cada reunião temos analisado cerca de 20 casos. Temos de tornar os casos o mais transparentes possível. Não queremos simplesmente despachar os casos, mas queremos sim tomar decisões que sejam as mais correctas”, concluiu. Andreia Sofia Silva

andreia.silva@hojemacau.com.mo

CPU VAI ANALISAR URBANIZAÇÃO DE SEAC PAI VAN

O Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU) vai analisar o projecto de urbanização da zona de Seac Pai Van, da autoria do Governo. A garantia foi dada ontem por Li Canfeng, director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, no âmbito da apresentação de uma planta de condições urbanísticas referente a um terreno localizado na Avenida Vale das Borboletas, no Cotai. Um membro do CPU defendeu que o Executivo deve olhar para o panorama dos terrenos em Seac Pai Van por inteiro, para que haja um planeamento global das construções privadas e públicas.


8 SOCIEDADE

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Lei de Terras TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DÁ RAZÃO AO CHEFE DO EXECUTIVO

Sem justificação possível

O

processo andou para a frente e para trás. Da Segunda Instância foi para a Última e chegou a realizar-se um novo julgamento. Mas a decisão final, ontem tornada pública pelo Tribunal de Última Instância em comunicado à imprensa, é basicamente igual à que foi inicialmente tomada: o colectivo do Tribunal de Segunda Instância (TSI) julgou improcedente o recurso contencioso contra o acto do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão de um terreno no Pac On. A recorrente era a SINCA – Sociedade de Indústrias Cerâmicas, concessionária do lote “D” situado no aterro da ilha da Taipa. A empresa alegou “total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários” do Governo, por não ter tido em consideração três factores que levaram a que a parcela não tivesse sido aproveitada dentro do prazo estabelecido no contrato firmado com a Administração. A SINCA deu vários argumentos para tentar justificar a falta de aproveitamento do terreno. Em primeiro lugar, lembrou a crise económica conjuntural em Macau entre 1994 a 2004. Depois, no período entre 2004 a 2006, aumentaram os custos da produção, houve alterações às quotas da indústria têxtil e o Governo Central

A

comparação é anual: o comércio externo de Macau atingindo 27,14 mil milhões de patacas, o que representa um crescimento de cinco por cento nos primeiros quatro meses do ano. Segundo a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), entre Janeiro e Abril, Macau exportou bens avaliados em 3,78 mil milhões de patacas – mais 9,3 por cento – e importou produtos avaliados em 23,36 mil milhões de patacas – mais 4,4 por cento em termos anuais homólogos. Por conseguinte, o défice da balança comercial atingiu 19,57 mil milhões

TIAGO ALCÂNTARA

O caso foi julgado duas vezes mas a decisão foi a mesma: a concessionária de um terreno no Pac On, que ficou sem ele por não o ter aproveitado, não tem por que se queixar. O Governo cumpriu com a sua parte do acordo. A empresa não fez o mesmo, diz a Segunda Instância

incentivou novos investimentos na China Continental, pelo que a recorrente temia “sofrer prejuízos irrecuperáveis” caso insistisse em executar o plano original. Por último, a concessionária invocou “a própria inércia da Administração na revisão do Plano do Aterro de Pac On a partir do ano de 2007”.

ADMINISTRAÇÃO E BONDADE

O TSI não acolheu as justificações apresentadas, afirmando que, tal como em qualquer negócio, o

“Não se pode só ponderar os interesses do particular e ignorar os interesses públicos subjacentes à concessão.” TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA

concessionário do terreno tem de suportar o risco do negócio, “não podendo fruir dos benefícios de uma concessão a longo prazo e, ao mesmo tempo, alegar que não podia realizar já a finalidade que esteve na base dela, reservando para si, e por seu livre alvedrio, o momento mais conveniente para a concretizar”. O tribunal diz ainda que, “no domínio de uma relação contratual estabelecida por acordo e conjugação dos interesses das partes, não se pode só ponderar os interesses

O problema da balança Comércio externo subiu cinco por cento até Abril

de patacas, traduzindo um agravamento de 3,5 por cento comparativamente aos primeiros quatro meses do ano passado. Em termos de mercados, as exportações para a China totalizaram 548 milhões de patacas até Abril, reflectindo uma diminuição de 4,2 por cento.As vendas de mercadorias para os países de língua portuguesa foram de 300 mil patacas, valor que traduz uma queda de 85,4 por cento em termos anuais homólogos.

Em contrapartida, as exportações para Hong Kong cresceram 16,8 por cento entre Janeiro e Abril. A mesma tendência foi verificada nas vendas de mercadorias para a União Europeia (71 milhões de patacas) e para os Estados Unidos (62 milhões de patacas) que aumentaram, respectivamente, 22,2 por cento e 27,1 por cento.

DIAMANTES E RELÓGIOS

Em termos de mercadorias, exportaram-se 3,54 mil mi-

lhões de patacas de produtos não têxteis, mais 11,8 por cento, em termos anuais. As exportações de joalharia com diamantes cresceram 46 por cento, enquanto as de máquinas, aparelhos e das suas partes (193 milhões de patacas) diminuíram 45,2 por cento, aponta a DSEC. Já do lado das importações, Macau comprou à China produtos no valor de 7,72 mil milhões de patacas – menos seis por cento em termos anuais homólogos.

do particular e ignorar os interesses públicos subjacentes à concessão”. O colectivo de juízes pronuncia-se ainda em relação à alegada inércia da Administração na revisão do Plano do Aterro de Pac On. “Esta circunstância também não constitui causa justificativa da falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo, já que se trata de uma circunstância muito posterior (mais de dez anos) do termo do prazo do aproveitamento.” A decisão judicial indica ainda que “a Administração chamou várias vezes a atenção à recorrente da necessidade do cumprimento do prazo do aproveitamento”, tendo ainda convidado a concessionária para justificar por que não o fez e requerer a prorrogação do prazo em questão. “É a própria recorrente que ignorava a bondade da Administração pois, só em Agosto de 2003, decorridos já mais sete anos do termo do prazo do aproveitamento, é que veio justificar o atraso e formular o pedido da prorrogação.” O TSI continua dizendo que, mesmo assim, a Administração ainda realizou, em 2003, uma reunião com o advogado da concessionária, em que lhe comunicou que a empresa deveria apresentar de imediato o projecto de arquitectura, essencial para que as Obras Públicas avaliassem o pedido de prorrogação. Só em 2008 é que a recorrente apresentou o requerimento para a alteração da finalidade da concessão, de indústria para habitação e comércio. “Não obstante a entidade recorrida não ter declarado atempadamente a caducidade da concessão por falta de aproveitamento dentro do prazo, a sua actuação nunca conferiu à recorrente qualquer expectativa de que o prazo do aproveitamento poderia ser prorrogado, muito menos a prorrogação do prazo da concessão provisória”, conclui ainda a Segunda Instância.

A mesma tendência foi verificada nas importações de mercadorias dos países de língua portuguesa (195 milhões de patacas), que diminuíram 6,1 por cento. Em sentido inverso, as compras à União Europeia aumentaram 14 por cento. Ao nível dos produtos, destaca-se as importações de joalharia em ouro e de relógios de pulso que subiram, respectivamente, 25,5 por cento e 37,4 por cento, de acordo com a DSEC. Já as compras de combustíveis e lubrificantes (1,75 mil milhões de patacas), de telemóveis (1,45 mil milhões de patacas) e

Isabel Castro

isabelcorreiadecastro@gmail.com

de materiais de construção (625 milhões de patacas) registaram descidas de 2,8 por cento, 9,7 por cento e oito por cento, respectivamente. Só em Abril, Macau exportou produtos avaliados em 839 milhões de patacas – mais 11 por cento face ao mesmo mês de 2016 – e importou mercadorias no valor de 5,42 mil milhões de patacas, ou seja, menos 1,1 por cento, indica a DSEC. Por conseguinte, o défice da balança comercial de Abril alcançou 4,58 mil milhões de patacas.


9 hoje macau quinta-feira 1.6.2017

Lei de Terras LESADOS JUNTAM-SE E PEDEM ACÇÃO AO GOVERNO

A união quer a mudança Um grupo de pessoas que dizem ter sido prejudicadas pela aplicação da nova Lei de Terras decidiu constituir uma união. Ontem, o movimento fez publicar uma carta na imprensa de língua chinesa. Entre outras reivindicações, pede a alteração da controversa legislação

N

ÃO se sabe se eram concessionários de terrenos e ficaram sem eles, se compraram apartamentos que não foram construídos, ou se o movimento junta este dois tipos de investidores. Também se desconhece quantos são. Para já, conhecem-se apenas as suas reivindicações, que vão da aplicação da nova Lei de Terras ao modo como o Governo gere a distribuição de habitação pública. A União dos Lesados da Nova Lei de Terras – tradução livre para português – publicou ontem uma carta na imprensa de língua chinesa em que defende que existe consenso suficiente para se avançar com a alteração à legislação que dispõe sobre os terrenos da RAEM. Para os autores da missiva, é “uma injustiça” o Governo declarar a caducidade de terrenos findo o prazo de 25 anos da concessão

“mesmo quando a responsabilidade do não aproveitamento não é dos promotores” dos projectos em causa. O movimento entende que as consequências da recuperação das terras “não são nada racionais”, não obstante reconhecer que as decisões tomadas pelo Governo estão de acordo com a legislação em vigor. Precisamente porque o Executivo está a cumprir a lei é que os lesados pedem que se avance para uma alteração do diploma. Os membros desta nova união mostram-se compreensivos com os deputados à Assembleia Legislativa e com o facto de a actual lei ter dado espaço a consequências indesejáveis. Recordam que,

na audição feita às reuniões em sede de comissão da AL, houve preocupações sobre os problemas que a lei poderia causar.

E OS OUTROS TAMBÉM

“O consenso que é preciso para a alteração da lei já existe na sociedade”, garante o grupo, que acrescenta que advogados, Comissariado contra a Corrupção (CCAC), presidente do Tribunal de Última Instância e “altos funcionários públicos” manifestaram já a ideia de que se deve avançar para uma revisão do polémico diploma. A união recorda ainda a recente mensagem deixada pelo presidente do Comité Perma-

O movimento entende que as consequências da recuperação das terras “não são nada racionais”, não obstante reconhecer que as decisões tomadas pelo Governo estão de acordo com a lei

nente da Assembleia Popular Nacional, Zhang Dejiang, que defendeu a necessidade de alteração dos articulados que não se adeqúem à realidade de Macau. O movimento reserva espaço na carta publicada para aqueles que dependem da habitação pública do território. A união faz referência ao relatório do CCAC referente aos promitentes-compradores que estavam prestes a ficar sem as casas que lhes tinham sido entregues, um caso em que o Instituto de Habitação tomou decisões que não estão de acordo com a lei. No mesmo relatório, o CCAC alertou para a necessidade da revisão da lei da habitação económica, uma ideia que os subscritores da carta também defendem, para que seja possível “garantir a atribuição e a utilização justa dos recursos” públicos. Isabel Castro (com Vítor Ng) info@hojemacau.com

SOCIEDADE

PATRIMÓNIO UNESCO ANALISA CENTRO HISTÓRICO DE MACAU

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Instituto Cultural (IC) vai estar presente na 41.ª sessão do Comité do Património Mundial da UNESCO, agendada para Julho. Em nota à imprensa, o IC explica que a organização analisa anualmente os relatórios sobre o estado de conservação do património classificado. Este ano, durante a reunião, vai estar em cima da mesa o relatório da China sobre o estado de conservação de cinco itens do património mundial, incluindo o Centro Histórico de Macau. O IC acrescenta que já apresentou o “projecto de decisão” e afiança estar atento “aos trabalhos de acompanhamento do estado de conservação” do património reconhecido pela UNESCO, incluindo as obras junto à Casa de Lou Kau e o planeamento urbanístico do território, assim como o Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico de Macau. “Como na ordem de trabalhos da reu-

nião há muitos assuntos para discutir, o projecto poderá não vir a ser analisado”, avisa desde já o IC. “Após a tomada de decisão na reunião, o resultado vai ser comunicado ao Governo da RAEM através da Administração Estatal do Património Cultural da República Popular da China.” O relatório explicativo apresentado pelo IC sobre o Centro Histórico de Macau foi submetido à UNESCO pelo Governo Central. “A Administração Estatal do Património Cultural elogiou os esforços do Governo da RAEM nos trabalhos de salvaguarda do património cultural, e considerou que se encontram efectivamente na direcção certa, tendo confiança na determinação e capacidade de salvaguardar o Centro Histórico de Macau”, lê-se ainda no comunicado. A 41.ª sessão do Comité do Património Mundial da UNESCO realiza-se na Polónia.

HOSPITAL DAS ILHAS PROJECTO NAS MÃOS DO GABINETE DE INFRA-ESTRUTURAS

Os trabalhos de planeamento do futuro Complexo Hospitalar das Ilhas já estão concluídos, avançou ontem o subdirector dos Serviços de Saúde. Citado pelo canal chinês da Rádio Macau, Kuok Cheong U – que é também o director do Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ) – explicou que o projecto já foi remetido para o Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas (GDI). O novo hospital vai permitir a adopção de tecnologias que, neste momento, não são utilizadas no território. O responsável referiu que está a ser dada a devida atenção aos recursos humanos que serão necessários no futuro. Kuok Cheong U recordou as indicações dadas pelo secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, que pretende ir preparando no CHCSJ o pessoal que, depois, será transferido para o Complexo Hospitalar das Ilhas. Quanto ao modo como está a trabalhar o São Januário, o director afiançou que a maioria das especialidades clínicas já estendeu o horário de expediente para que possam ser atendidos mais utentes.


´ 10

PEGGY CHAN

EVENTOS

“Macau cresce com demasiada velocidade” ARTISTA PLÁSTICA

ORQUESTRA DE MACAU FESTA MUSICAL COM CINEMA

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Orquestra de Macau apresenta, no dia 24 de Junho, o concerto “Festa Musical de Fim-de-Semana – Memória da Juventude”. O espectáculo está marcado para as 16h, no Teatro Dom Pedro V, e os bilhetes já se encontram à venda. Em nota de imprensa, o Instituto Cultural (IC) indica que o repertório é constituído por temas de filmes e séries de televisão populares, seleccionadas especialmente pela Orquestra de Macau. Pretende-se partilhar antigas memórias com o público, “levando-o a experimentar as personagens, diálogos e bandas sonoras clássicos de filmes”. “O concerto contará com várias canções clássicas chinesas e estrangeiras, como ‘Triumph in the Skies’, ‘Really Love You’, ‘Red Sun’, ‘Close to You’, ‘Big Big World’, entre outros”, elenca o IC. “Estas canções familiares não deixarão de evocar, junto do público, as mais preciosas e inesquecíveis memórias da sua juventude.” Após o concerto, será apresentado, no mesmo local, pelas 19h30, o filme “Our Seventeen”, realizado pela cineasta local Emily Chan e protagonizado por Pang Veng Sam, Angela Yuen, King Wu, Kyle Li, Mary Ma e Kate Leong. “O público poderá deixar-se levar pelas memórias dos seus dias de juventude ao assistir a esta história sobre a paixão arrebatada de um grupo de adolescentes pela música”, promete a organização. O bilhete para o concerto garante a entrada na sessão de cinema.

Abre amanhã ao público a exposição “Cem Espécies – Obras de Peggy Chan”, no Museu de Arte de Macau. A mostra leva-nos numa interacção entre pessoas, a sua manifestação no espaço e a natureza em asfixia. Em discurso directo ao HM, Peggy Chan levanta uma ponta do véu da nova exposição

“E Todavia” é o mais recente livro de poesia de Ana Luísa Amaral. Fulgurante e surpreendente, nele encontramos alguns dos mais belos poemas da obra da autora.

O que é o público pode ver em “Cem Espécies”? Pode ver três séries de trabalhos gráficos, assim como um estúdio que montei na galeria. A primeira série é centrada em torno de “Bobo”, o urso preto, que vive no Parque Erlogyan com os seus amigos. Este animal faz parte do meu imaginário infantil enquanto crescia em Macau. A segunda série é focada na imagem de uma espécie de ecossistema, o mangal. Enquanto a terceira série se centra na ideia de uma floresta de mangal. O que pretende dizer com esta exposição? Quero que as pessoas prestem mais atenção ao meio ambiente, algo que é fundamental para a nossa existência. Especialmente em Macau, uma cidade que cresce com demasiada velocidade. Por que quis recrear na galeria um estúdio experimental? Durante a exposição vou estar, “in loco”, a fazer alguma pesquisa para trabalhos futuros, assim como a produzir peças novas. Além disso, também quero experimentar a interacção com o público enquanto crio. Tenta explorar a relação entre humanos e a natureza. Porquê o interesse neste tópico? Durante a pesquisa que fiz para um documentário sobre ecologia em Macau, cruzei-me com variadíssimos estudos e relatórios sobre o assunto. Ver como o meio ambiente tem evoluído no território é uma experiência, como observar a evolução de uma ilha artificial. Como vê essa relação entre humano e natureza? Esta relação... Entristece-me tanto. É um relacionamento que serviu apenas para extinguir a pureza natural de Macau. Visitei os pântanos e zonas ecologicamente protegidas onde vi, e senti, o confronto entre o desenvolvimento urbano e a protecção ecológica. Na obra que expõe agora trabalhou com cianótipos. Por que escolheu trabalhar com esta técnica? O cianótipo é um processo antigo de impressão de fotografia e tem sido o meu veículo criativo preferido nos trabalhos mais recentes. É um método que, no processo criativo, depende totalmente da luz solar. O cianótipo traz um grau de incerteza natural aos trabalhos que, de certa forma, simboliza a maneira como a nossa vida flui através dos ambientes em constante mudança. Além disso, gosto da tonalidade azul que o processo dá à impressão e que permite fazer camadas de imagens muito bonitas. Sofia Margarida Mota e João Luz info@hojemacau.com.mo

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VIAGEM À VOLTA DO MEU QUARTO • Xavier de Maistre

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“Viagem à Volta do Meu Quarto” é uma sátira escrita no estilo da grande narrativa de viagens, e consiste no relato autobiográfico de um jovem oficial que, detido no quarto durante seis semanas, observa a mobília, os quadros e as decorações como se fossem paisagens de uma terra longínqua. Inspirando-se em Tristram Shandy (que De Maistre muito admirava) e jogando habilmente com a imaginação do leitor, esta Viagem tornou-se rapidamente um clássico da literatura. Como o autor espirituosamente nos demonstra, o mais importante numa viagem não é o destino, é o viajante.


nótipo traz um grau de incerteza al aos trabalhos que, de certa simboliza a forma como a nossa ui através dos ambientes nstante mudança.”

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EVENTOS

HOJE NO PRATO Paula Bicho

Naturopata e Fitoterapeuta • obichodabotica@gmail.com

Quinoa Nome botânico: Chenopodium quinoa Willd. Família: Amaranthaceae (Chenopodiaceae). Originária das vertentes ocidentais da cordilheira dos Andes do Peru, Bolívia, Equador e Colômbia, onde se encontra em estado selvagem até aos 4.000 metros de altitude a Quinoa sobrevive em condições climatéricas muito adversas. Trata-se de uma herbácea cujas sementes são grãos redondos, muito pequenos e de variadas cores – desde o amarelado, ao vermelho, castanho e preto –, conhecendo-se mais de 8.000 variedades. Embora em termos botânicos não pertença à família dos cereais, a das Gramíneas, estes grãos apresentam um valor nutritivo e usos alimentares similares, razão pela qual é considerada um pseudocereal. Referida como chisaya mama, ou seja, mãe de todos os grãos, a Quinoa era uma planta sagrada para os Incas, sendo o próprio imperador a deitar todos os anos as primeiras sementes à terra. De facto, este alimento era um recurso básico não só na dieta do Império Inca como dos povos andinos em geral, desde há cerca de 5.000 anos. Porém, com a chegada dos conquistadores espanhóis no século XVI, os alimentos autóctones foram substituídos pelos consumidos na Europa e a sua cultura quase desapareceu. Nos anos 80 do século passado, a Quinoa foi redescoberta e divulgada pelo movimento de alimentação natural. Devido ao seu valor proteico e aporte em vitaminas, minerais e fibras, e à sua resistência às condições adversas, úteis para fazer face à fome no mundo, a ONU declarou 2013 como o Ano Internacional da Quinoa.ANASAintroduziu-a na dieta dos astronautas. Composição Considerada um superalimento, a Quinoa contém mais proteínas do que qualquer outro cereal; além disso, são de elevado valor biológico, contendo todos aminoácidos essenciais (proteínas completas). Tem um elevado conteúdo em hidratos de carbono (amido), fibras, vitaminas (A, B1, B2, B3, B5, B6, biotina, ácido fólico, C, E) e minerais (cálcio, cloro, cobre, ferro, fósforo, magnésio, manganês, potássio, selénio e zinco); contém ainda uma pequena quantidade de gorduras insaturadas (com ácidos gordos linoleico, linolénico e oleico), fosfolípidos (lecitina), polifenóis e flavonóides antioxidantes, e saponinas triterpénicas. Textura leve e macia, estaladiça no final; sabor suave semelhante ao da Avelã. Acção terapêutica Extraordinariamente nutritiva e facilmente digerível, a Quinoa é um alimento muito saudável cujo sabor agradável facilita a sua introdução na alimentação. É particularmente recomendado durante a gravidez, lactação e para os bebés e crianças. É também um importante alimento na dieta dos vegetarianos, em especial os que não consomem lacticínios, e dos adeptos de uma alimentação saudável; além disso, não contém glúten, constituindo

uma excelente alternativa ao Trigo, Centeio e Cevada (cereais com glúten) e podendo ser ingerida por pessoas com doença celíaca (doença auto-imune), sensibilidade ao glúten não celíaca ou alergia ao Trigo. A Quinoa beneficia o funcionamento do sistema nervoso e a síntese de hormonas, e fortalece o sistema imunológico contribuindo para a manutenção da saúde: tem actividade antioxidante, anti-inflamatória e anticancerígena; aumenta a formação de anticorpos, sendo considerada um adjuvante de vacinas, e é cicatrizante. Protege contra as doenças cardiovasculares, reduzindo os níveis de colesterol e triglicéridos no sangue; previne a hipertensão arterial e a diabetes; pelo conteúdo em ferro, é útil na anemia. É alcalinizante, tonifica os rins e auxilia a fixação do cálcio nos ossos, fortalecendo-os e prevenindo e combatendo a osteoporose. Outras propriedades Apesar do seu aporte calórico, a Quinoa é um alimento interessante nos regimes de emagrecimento: pelo teor em fibras, estimula a mastigação e diminui o esvaziamento gástrico, proporcionando saciedade; os seus hidratos de carbono, de libertação lenta, evitam os picos de insulina no sangue e atrasam a sensação de fome; tem ainda actividade laxativa. Acresce dizer ainda que a sua riqueza em proteínas favorece o aumento da massa muscular, redefinindo a silhueta, e auxilia à recuperação após a prática desportiva! Como consumir AQuinoa encontra-se comercializada em grão, flocos, farinha e como ingrediente de diversos produtos alimentares. Quando usada em grão, a Quinoa deve ser previamente lavada em água corrente para eliminar os resíduos de saponinas; estes fitoquímicos são amargos e podem fazer espuma na água. Muito versátil, a Quinoa pode ser usada em diversas preparações culinárias, sendo um excelente substituto do Arroz em diversas receitas. Sugestões: • Em grão, como acompanhamento em pratos de vegetais, aves, carne, peixe ou marisco, ou como base para saladas frias. • Na elaboração de hambúrgueres e croquetes. Na confecção de quinoto, o tradicional risoto, mas com Quinoa em substituição do Arroz. Na polenta pode substituir a farinha de Milho. • Como cereal de pequeno-almoço, ingerido com leite, iogurte ou fruta fresca. • Com os flocos podem fazer-se sopas, papas, sobremesas e engrossar molhos. • A farinha de Quinoa pode substituir a do Trigo, total ou parcialmente, sendo usada na panificação e na elaboração de massas e bolos. • As suas folhas são tradicionalmente consumidas como os Espinafres. Precauções Apesar de não conter glúten, a Quinoa pode encontrar-se em produtos alimentares juntamente com outros cerais que o contenham – ler os ingredientes no rótulo. Em caso de dúvida, consulte o seu profissional de saúde.


12 CHINA investimento por empresas europeias na China registou uma queda homóloga de 23%, no ano passado, em parte devido aos obstáculos no acesso ao mercado chinês, e apesar da retórica pró-abertura e globalização adoptada por Pequim. No total, as firmas dos países da União Europeia (UE) investiram 8.000 milhões de euros no país asiático, segundo um relatório ontem difundido pela Câmara do Comércio da UE em Pequim. Este valor “seria substancialmente maior se fossem eliminados os obstáculos no acesso ao mercado e melhorado o ambiente jurídico”, lê-se no documento, assinado pelo presidente da Câmara, Mats Harbon. O responsável afirma que 54% das empresas se sentem descriminadas face às firmas locais. A falta de reciprocidade é mais evidente no acesso ao mercado. Em 2016, a China investiu um total de 35.000 milhões de euros na UE, uma subida homóloga de 77%.

INVESTIMENTO EUROPEU NO PAÍS CAI 23%

Dias difíceis Além do referido favorecimento, as empresas europeias observam também que as firmas chinesas são cada vez mais inovadoras, um fenómeno que devem “seguir com cuidado”, aponta o documento.

REUTERS/KIM KYUNG-HOON

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hoje macau quinta-feira 1.6.2017

MAIORIA DOS FUMADORES NÃO QUER DEIXAR O VÍCIO

AINDA ASSIM

Apesar da percepção pouco optimista das empresas europeias sobre o mercado chinês, 55% destas registaram um aumento dos lucros no país, em 2016. As firmas dos sectores transportes, logística e distribuição apresentaram os piores resultados, mas os esforços de Pequim para atacar a poluição sustentaram um forte crescimento entre as empresas na área do ambiente. Ainda assim, apenas seis por cento das empresas europeias nota menos dificul-

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PUB HM • 1ª VEZ • 1-6-17

ANÚNCIO Apesar da percepção pouco optimista das empresas europeias sobre o mercado chinês, 55% destas registaram um aumento dos lucros no país, em 2016

Autos de Habilitação nº FM1-15-0007-CAO-A Juízo de Família e de Menores Por apenso aos autos de Acção ordinária nº.FM1-15-0007-CAO do Juízo de Família e de Menores

RAEM, 12 de Maio de 2017

dades em fazer negócios na China, enquanto 49% dizem que piorou. O sector mais afectado é o da engenharia civil e construção, com 79% das empresas a considerar que o acesso ao mercado se tornou mais difícil, com Pequim a conceder os contratos a em-

NEW CHINA

REQUERENTE: HO TENG MAN, residente na Rua Marginal do Canal das Hortas, Edifício Hou Kong (Bloco 3), 12º andar G, Macau. REQUERIDOS: MOU IOK FONG (também utilizou o nome de CHONG LIN SENG), residente na Rua Marginal do Canal das Hortas, Edifício Hou Kong (Bloco 3), 12º andar G, Macau. HO FONG IENG, residente na Rua Marginal do Canal das Hortas, Edifício Hou Kong (Bloco 3), 12º andar G, Macau. HO KUN MENG, residente na Rua Um da Cidade Nova de Tói Sán, Edifício Weng Heng Kok, 19º andar G, Macau. HERDEIROS INCERTOS do HO IONG SENG (também utilizou o nome de 黃和建). *** FAZ-SE SABER que pelo Tribunal, Juízo e processo acima referidos, correm éditos de TRINTA DIAS, contados da segunda e última publicação do anúncio, citando os incertos acima referidos, para no prazo de DEZ DIAS, findo o dos éditos, contestar, querendo, o pedido formulado pelos requerentes supra nos autos do incidente de habilitação dos sucessores da parte falecida, ora do Réu falecido HO IONG SENG (também utilizou o nome de 黃和建), com a última residência conhecida em Macau, na Rua Marginal do Canal das Hortas, Edifício Hou Kong (Bloco 3), 12º andar G, devendo com a contestação oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova. Findo o prazo dos éditos sem que os citados compareçam, a causa segue com o Ministério Público nos termos aplicáveis do artº 51º do CPC. Tudo como melhor consta do duplicado do requerimento dos presentes autos, que se encontra nesta Secretaria do Juízo de Família e de Menores à disposição do citando. A intervenção do citando nos autos implica a constituição de advogado – artº74º do Código Processo Civil.

presas chinesas, sobretudo estatais. As empresas europeias enalteceram ainda a campanha anti-corrupção lançada pelo Presidente chinês, Xi Jinping, mas criticaram o pesado e imprevisível quadro regulamentar e a ambiguidade das leis no país.

MA investigação desenvolvida ao longo da última década indica que a maioria dos fumadores na China, o maior consumidor mundial de tabaco, não tem intenção de deixar de fumar e continua a desconhecer os riscos para a saúde. O estudo, divulgado ontem pelo Centro Chinês para o Controlo de Doenças e investigadores do Canadá, apura que 316 milhões de chineses fumam, um número que tem vindo a crescer. A grande maioria dos fumadores são homens, entre os quais 59% diz não querer deixar de fumar. Geoffrey Fong, coautor do estudo, afirma que um em cada três homens chineses vai morrer de doenças relacionadas com o tabaco e que 60% destes homens não sabem que fumar pode provocar ataque cardíaco. Algumas cidades chinesas proíbem o consumo de cigarros em espaços públicos. Funcionários chineses e estrangeiros da área da saúde defendem que aquela proibição deve ser alargada a todo o país. Seria um “passo crucial”, afirmou Yuan Jiang,

um dos responsáveis pelo estudo, em comunicado. A decisão de alargar a todo o país a proibição de fumar em espaços públicos era para ser aprovada no final de 2016, segundo anunciou o Ministério da Saúde chinês, mas até agora não avançou. “Eles têm que perceber o que é importante como política”, afirmou Fong. “Quando tens tabaco barato, as pessoas vão fumar”, acrescentou. Em linha com a tendência mundial, os índices de consumo de tabaco caíram lentamente nos últimos 25 anos na China. Cerca de um por cento por ano, entre os homens, e 2,6%, entre as mulheres, segundo um outro estudo, publicado em Abril pela revista médica The Lancet. No entanto, devido ao aumento da população chinesa, para cerca de 1.375 milhões de habitantes, o número de fumadores aumentou. O aumento do poder de compra significa que fumar se tornou também mais barato, enquanto os baixos impostos mantêm o preço de algumas marcas a menos de um euro por maço de cigarros.

LI KEQIANG A CAMINHO DE BERLIM

A convite da chanceler alemã, Angela Merkel, Li Keqiang partiu ontem de Pequim rumo a Berlim para dar início a uma visita oficial à Alemanha. Durante a sua visita, Li deverá reunir com o Presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e participar na reunião de primeiros-ministros entre a China e aAlemanha. Li e Merkel também participarão do fórum de inovação ChinaAlemanha. O chefe de Governo chinês visitará ainda a Bélgica. Li assistirá à 19ª conferência de líderes China-União Europeia (UE) em Bruxelas, e participará Cimeira de Negócios China-EU, bem como no diálogo sobre cooperação para a inovação. Li deverá ainda ser recebido pelo Rei Philippe da Bélgica e pelo o primeiroministro Charles Michel. A visita de Li é parte de um conjunto de reuniões de alto nível China-UE a terem lugar este ano, com o objectivo de consolidar a cooperação entre a China e a Europa.


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O

RGANIZAÇÕES não-governamentais questionaram se os interesses comerciais da família Trump na China influenciam a posição norte-americana na promoção dos direitos humanos, após a detenção e desaparecimento de investigadores numa fábrica chinesa que fornece a marca Ivanka Trump. “A vontade de membros da família em fazer negócios na China, enquanto ignoram o histórico do país em Direitos Humanos e laborais é preocupante”, afirmou Nicholas Bequelin, director para o leste da Ásia da Amnistia Internacional. “Vamos ter que esperar para ver até que ponto os negócios estão a diminuir o capital diplomático norte-americano na promoção dos direitos humanos, direitos dos trabalhadores e democracia”, acrescentou. Um grupo de defesa de direitos cívicos denunciou na terça-feira que um homem que investigava condições de trabalho numa empresa chinesa que produz sapatos da marca Ivanka Trump foi detido e dois outros desapareceram. Os homens trabalhavam para a organização não-governamental norte-americana China Labor Watch na elaboração de um relatório que incluía acusações de salários PUB

Pedra no sapato

ONG questionam posição dos EUA sobre direitos humanos

baixos, tempo de trabalho excessivo e abuso de estagiários. Segundo o director executivo da organização, Li Qiang, os homens devem estar detidos pela fábrica ou pela polícia. Nos últimos 17 anos, este grupo tem investigado as condições de trabalho nos fornecedores chineses de algumas das empresas mais conhecidas a nível mundial, mas nunca

tinha atraído o escrutínio do aparelho de segurança chinês, afirmou Li. A investigação da China Labor Watch tem também um alvo inédito: uma marca detida pela filha do Presidente dos Estados Unidos. “A marca da Ivanka deve imediatamente suspender a colaboração com este fornecedor, e a administração Trump deve inverter o seu curso actual e confrontar a China sobre

abusos dos Direitos Humanos”, disse Adrienne Watson, porta-voz do Comité Nacional Democrata dos EUA, citado pela agênciaAssociated Press. Ivanka Trump deve decidir “se pode ignorar uma aparente tentativa do Governo chinês de silenciar uma investigação sobre abusos no trabalho”, acrescentou.

NEGÓCIOS DA CHINA

Os acessórios e vestuários da marca Ivanka Trump são quase todos importados da China, segundo dados oficiais. O Presidente norte-americano, Donald Trump, tem também vá-

Um grupo de defesa de direitos cívicos denunciou na terça-feira que um homem que investigava condições de trabalho numa empresa chinesa que produz sapatos da marca Ivanka Trump foi detido e dois outros desapareceram

CHINA

rias marcas registadas no país, apesar de não ter uma presença forte no sector do imobiliário ou do retalho. No mês passado, a irmã de Jared Kushner, marido de Ivanka e conselheiro de Trump, esteve na China para promover o investimento de privados chineses num projecto imobiliário na cidade norte-americana de New Jersey. A mulher de Hua Haifeng, um dos investigadores detidos, informou que este foi acusado de vigilância ilegal, acrescentando que a polícia lhe ligou na tarde de terça-feira e, sem lhe dar qualquer detalhe, anunciou-lhe que não lhe iria ser possível ver, falar ou receber dinheiro do seu marido, que é o ‘ganha-pão’ da família. Li Qiang disse que os homens relataram que os funcionários trabalhavam às vezes mais de 18 horas por dia, por salários abaixo do mínimo legal. Os desaparecidos estavam a trabalhar para confirmar evidências de que os estagiários trabalhavam horas excessivas em tarefas que não estavam relacionadas com a sua área de estudo, em violação da lei chinesa.


h ARTES, LETRAS E IDEIAS

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A nódoa negra da nossa idiossincrasia “A ambição dos homens por uma parte, e pela outra a vaidade, tem feito da terra um espectáculo de sangue: a mesma terra que foi feita para todos, quiseram alguns faze-la unicamente sua”

M

ATIAS Aires mau grado as coordenadas do barroco mental que acompanham permanentemente as suas reflexões pensa e algumas vezes pensa muito bem. E por isso não é fácil isolar na sua obra a explicitação de um paradigma temático de uma forma escorreita e límpida. Prevalece alguma promiscuidade entre pressupostos ideológicos barrocos e pressupostos ideológicos clássicos. Quando por exemplo ele diz que «a solidão nos desterra para a solidão do ermo», ele analisa o evento segundo a ideia clássica horaciana de que «nunca podemos fugir de nós», mas ao mesmo tempo o que ele identifica como a nossa sombra negra é a barroca ilusão e vaidade, de tal modo que “somos como a ave desgraçada, que por mais que fuja do lugar em que recebeu o golpe, sempre leva no peito atravessada a seta”1, querendo com isso dizer que ælun, non animum mutant, qui trans mare currunt. Aquilo que em Horácio é assumido como uma especificidade própria da condição humana substantiva, torna-se em Matias Aires um elemento de reforço do dispositivo barroco. Para Matias Aires o que nos persegue é a vaidade, nódoa negra da nossa idiossincrasia, enquanto que para Horácio o que nos persegue é simplesmente nós-mesmos, a nossa idiossincrática auto-individuação, independentemente desta ou daquela virtude. E de tal ordem é assim que a possibilidade do retiro integral não é admissível em Matias Aires. Todas as

modalidades de retiro não se adaptam ao modelo do ensaísta português de Setecentos. Para ele o retiro absoluto não é possível porque ao “deixarmos livremente o comércio dos homens, não renunciamos o viver na admiração, e notícia deles”2, o que significa que “consentimos em apartar-nos de sorte, que nunca mais sejamos vistos, mas não consentimos em não ser lembrados”3. O dispositivo ideológi-

MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA nasceu no Brasil, a 27 de Março de 1705, vindo a falecer em Lisboa a 10 de Dezembro de 1763). Filho de José Ramos da Silva e de sua mulher Catarina de Orta, nasceu como já vimos no Brasil, na Capitania, depois Província e hoje Estado de São Paulo. Foi Cavaleiro da Ordem de Cristo e Provedor da Casa da Moeda de Lisboa, obtendo e sucedendo neste emprego a seu pai, José Ramos da Silva, por sua morte. Foi Bac harel em Filosofia pela Faculdade de Ciências e Mestre em Artes pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Formou-se numa Universidade Francesa em Dire ito Civil e Canónico. Fez estudos de Matemática e Ciências Físicas. Conhecia o Hebraico e outras línguas. Foi em 1716 que acompanhando seus pais se mudou para Portugal, tendo

co através do qual Matias Aires concebe a sua antropologia persegue os seus pensamentos. Para Matias Aires o retiro é uma dissimulação, não um retiro de facto, é uma representação teatral, é uma máscara. E é a máscara e a encenação que persistem com o seu valor ontologicamente dramático e não o retiro que deveria significar o que de facto significa no classicismo, assunção de modéstia, de humildade,

ingressado no Colégio de Santo Antão. Em 1722, estudou nas Faculdades de Leis e de Cânones de Coimbra, onde recebeu o grau de Licenciado em Artes, graduando-se mais tarde na cidade de Baiona, na Galiza. Foi notável literato e naturalista e grande amigo do malogrado António José da Silva, o Judeu, que procurou ardentemente salvar da fogueira, o que não conseguiu. Escreveu obras em Francês e Latim e foi também tradutor de clássicos latinos. É considerado por muitos o maior nome da Filosofia de Língua Portuguesa do seu tempo, o que não era muito difícil tendo em conta a pobreza franciscana da nossa cultura filosófica e literária do século XVIII. Só, talvez António Soares Barbosa, autor de um tratado de filosofia moral, mas que é também um tratado jusnaturalista, se lhe pode comparar. Enfim, há Verney,

de procura regenerativa da vida simples, discreta. Não é a lathe biosas epicurista (vida discreta e simples), que fundamenta este retiro, não é a completa separação e rejeição do modelo da ubris ou culto do excesso. A ubris é o que persegue o homem desesperado no seu exílio encenado. Falta aqui um ingrediente determinante do modelo da mediania: a tranquilidade que só advém por intermédio da realização da sabedoria clássica ou estóico-epicurista da phronesis e da sophrosyne. Eu sei que Matias Aires desenvolve o seu modelo sob uma forma crítica. A sua análise é realista e não idealista. Mas o simples facto de não conceber uma alternativa mostra o quanto está prisioneiro do seu próprio quadro conceptual. O realismo, que de resto é próprio do barroco, não deixa entrever a possibilidade de uma escapatória. O seu pessimismo de fundo sapa tanto a possibilidade da eutopia quanto da utopia. A verdade é que o que fomenta o retiro clássico, quer dizer salvífico e regenerativo, é a rejeição da ubris e esta no dispositivo clássico é profundamente marcada pela sua imbricação com o problema do mal. Desde a conceptualização ontológica, metafísica e religiosa do limite4 e da ordem até à definição do papel ético-moral da medida, que culmina no sacrossanto apotegma apolíneo do ne quid nimis (nada para além da medida), é sempre o bem e o mal que estão no horizonte. Ora em Matias Aires é o binómio conjuntivo ilusão / vaidade que enforma a sua aproximação teorética. O que quer dizer que lhe falta desde o princípio um modelo concep-

Teodoro de Almeida e Frei Manuel do Cenáculo Villas Boas, mas que para mim são autores menores, pois lhes falta originalidade e arrojo. Em Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, cuja primeira edição é de 1752, o autor tece suas reflexões a partir do trecho bíblico extraído do Eclesiastes: Vanitas vanitatum et omnia vanitas, ou seja, “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Como um dos exemplos da vaidade dos homens, é citada a sumptuosidade dos mausoléus. Inocêncio Francisco da Silva informa no seu dicionário que “Quanto à data de seu óbito é por ora ignorada, sabendo-se contudo que já era falecido no ano de 1770”. Ernesto Ennes informa data de 10 de dezembro de 1763, a partir de documentação comprobatória. O Dicionário Biobibliográfico de Autores Brasileiros informa a mesma data.


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fichas de leitura

tual decisório, e analítico, que pela sua natureza se encontre acima do material em análise. Matias Aires julga questões morais com conceitos morais, procura compreender uma realidade empírica através da operatividade de ferramentas empíricas. Não há separação entre o modelo e a realidade, logo o seu esforço de desconstrução não é verdadeiramente operatório. Ele diz por exemplo: “A vaidade é cheia de artifício, e se ocupa em tirar da nossa vista, e da nossa compreensão o verdadeiro ser das cousas, para lhes substituir um falso, e aparente”5. Nada se passa no plano ontológico ou metafísico, mas apenas no plano das consequências fenomenológicas da crise aberta pela ruptura com o paradigma da permanência e da estabilidade. A crítica e a condenação da ubris no barroco resulta do facto de que tudo é aparente, vão, ilusório, etc. enquanto que no classicismo a ubris simboliza o mal. E é só porque é o mal que a ubris configura uma ilusão, ou melhor um nada, um não-ser. O classicismo valoriza o texto, a substância e o barroco valoriza a cenografia, e o décor. A opção pela aparência desloca logo a questão do plano ontológico para o plano fenomenológico, sendo que esta fenomenologia não é hermenêutica mas gnoseológica. O mundo não possui uma alma que é enganadora ou não, uma vez que é da natureza da alma do mundo ser enganadora. Trazendo o que deveria ser um epifenómeno para o centro do debate gnoseológico o barroco dessubstancializa o problema do bem e do mal na sua raiz metafísica e assim acaba a explicar o equívoco pelo equívoco, a falha pela falha, a máscara pela máscara até ao infinito. Um jogo de espelhos, um labirinto. Não há fuga possível do labirinto, não há retiro possível do mundo. O retiro é uma aparência de

Aires, Matias (1705-1763), Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens, Fundação Biblioteca Nacional, Lisboa, 2007 Descritores: Literatura Barroca, Ensaio, Século XVIII, 288 p. ; ISBN: 9788533304529 Cota: 821.134.3(81)-4 Air retiro6. E não é assim por acaso que o problema do mal seja profundamente relativizado. “É raro o mal, de que não venha a nascer algum bem, nem bem, que não produza algum mal”7. A única fuga concebida por Matias Aires é uma ascética fuga de nós-próprios, isto é das nossas paixões. O neo-estoicismo do barroco informa aqui o pensamento do nosso autor. Neste domínio Matias Aires é um autor previsível. A presença de Santo Agostinho no seu ideário empurra-o para uma análise de tipo voluntarista em que finalmente aparece a questão do mal agora já indissociável do pecado, da queda e da culpa. Nem sinais de classicismo e de argumento onto-gnoseológico. Pelo contrário sente-se a presença do video melior proboque de Ovídio, das reflexões de Santo Agostinho, das Epístolas de S. Paulo, em particular a Epístola aos Romanos, e da Medeia de Eurípedes, entre muitas outras reflexões que colocam o mal no plano de uma oscilação da vontade ditada pela condição miserável do homem. Oscilação que o autor enfatiza de modo explícito: “Parece que cada um de nós tem duas vontades sempre opostas entre si; ao mesmo tempo queremos, e não queremos; ao mesmo tempo condenamos, e aprovamos; ao mesmo tempo buscamos e fugimos, amamos e aborrecemos, Temos uma vontade pronta para conhecer, e detestar o vício; mas também outra

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ANÚNCIO CONCURSO PÚBLICO N.o 18/P/17 Faz-se público que, por despacho de Sua Excelência, o Chefe do Executivo, de 11 de Abril de 2017, se encontra aberto o Concurso Público para «Fornecimento de Vacinas aos Serviços de Saúde», cujo Programa do Concurso e o Caderno de Encargos se encontram à disposição dos interessados desde o dia 31 de Maio de 2017, todos os dias úteis, das 9,00 às 13,00 horas e das 14,30 às 17,30 horas, na Divisão de Aprovisionamento e Economato destes Serviços, sita no 1. º andar, da Estrada de S. Francisco, n.º 5, Macau, onde serão prestados esclarecimentos relativos ao concurso, estando os interessados sujeitos ao pagamento de MOP 70,00 (setenta patacas), a título de custo das respectivas fotocópias (local de pagamento: Secção de Tesouraria dos Serviços de Saúde) ou ainda mediante a transferência gratuita de ficheiros pela internet no website dos S.S. (www.ssm.gov.mo). As propostas serão entregues na Secção de Expediente Geral destes Serviços, situada no r/c do Centro Hospitalar Conde de São Januário e o respectivo prazo de entrega termina às 17:45 horas do dia 27 de Junho de 2017. O acto público deste concurso terá lugar no dia 28 de Junho de 2017, pelas 10,00 horas, na “Sala Multifuncional”, sita no r/c da Estrada de S. Francisco, n.º 5, Macau. A admissão a concurso depende da prestação de uma caução provisória no valor de MOP100 000,00 (cem mil patacas) a favor dos Serviços de Saúde, mediante depósito, em numerário ou em cheque, na Secção de Tesouraria destes Serviços ou através da Garantia Bancária/Seguro-Caução de valor equivalente. Serviços de Saúde, aos 24 de Maio de 2017 O Director dos Serviços, Substituto Cheang Seng Ip

Manuel Afonso Costa

3 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 32. 4- O que não poderia deixar passar em claro é que tal como deixei entrevisto há pouco, Matias Aires é um autor ecléctico e portanto nada melhor para mostrar esse eclectismo do que sublinhar aquilo que ele disse sobre o limite. Um autor clássico ou um teorizador do classicismo não o diria melhor: “cada cousa tem o seu limite certo, entre cuja extremidade se deve conter, e regular”, in Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 80. 5 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 34. 6 - É verdade que na Carta sobre a Fortuna confessa que vive retirado completamente desiludido, sem esperança, sem vaidade e sem amor. Aproveita para dizer que deve ao retiro a independência relativamente à fortuna, o que estabelece um momentâneo acordo com o epicurismo, logo desmentido pelo triunfo do desengano. “por isso vivendo retirado não sigo as bandeiras da fortuna, e já lhe disse adeus. Milito nos campos do desengano, campos solitários ou menos frequentados, porém mais seguros”, in Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 188 e 189. Em Epicuro é o próprio retiro que em articulação com a prudência protege da fortuna (tyche).

pronta para o abraçar”8. Mas no essencial a nossa natureza propende para o mal, o que significa que triunfa em nós a vontade má, a concupiscência. A nossa vida consiste em combater esta má inclinação. As paixões, quer dizer a carne são o nosso inimigo, até porque a carne não é frágil só por um princípio, mas por muitos”9. 1 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 28. 2 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 32.

7 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 38. 8 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 44. 9 - Matias Aires [Reflexões sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a fortuna], in Prado Coelho 1980: 45. *No quadro da colaboração de Manuel Afonso Costa com a Biblioteca Pública de Macau-Instituto Cultural, que consiste entre outras actividades no levantamento do espólio bibliográfico da biblioteca e na sua divulgação sistemática, temos o prazer de acolher estas “Fichas de Leitura” que, todas as quintas-feiras, poderão incentivar quem lê em Português.


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diário de um editor

João Paulo Cotrim

Angústia do não conseguir CIAJG, GUIMARÃES, 20 MAIO Subo para ajuizar, na companhia do Jorge [Silva] e da Margarida Noronha, os candidatos ao Prémio Nacional e Revelação da novíssima Bienal de Ilustração de Guimarães, neófito que se saúda, com a originalidade de atribuir prémios pecuniários, os que resultam da concurso como o de carreira. Aguardemos por Outubro para saber mais, de projecto gizado pelo mano Tiago [Manuel], com o apoio do Rui Bandeira Ramos. Habituei-me a ser surpreendido a torto e a direito pelo Norte, não tanto pela arquitectura ou pelo modo como as gentes se fazem casa, não apenas pelas comidas e bebidas ou pela maneira como as pessoas se dão comendo e bebendo, nem sequer pelos carvalhos ou os freixos ou pela forma como os sujeitos se erguem na paisagem. Surpreendem-me na singeleza com que fazem acontecer. Naturalmente, como se criar tivesse alguma coisa de natural. Bato no peito e grito por me mexer tão pouco. Recolho a papelada que posso para passeios de dedo e olho, coisa mental. Alimento para a quotidiana angústia do não conseguir. Perdi «Teatro da Alma, uma peça de dor e de sonho a partir de Raul Brandão», escrita e encenada por João Pedro Vaz, apresentada como assombração do teatro popular: «de espada em riste, à procura de Deus e do Homem». Pouso a espada, mas interessa-me este teatro, que «não é nem para jornalistas nem para burguesas serigaitas. É para toda a gente», dizia Brandão. Invejo a programação do Teatro Oficina em torno do imenso autor de Húmus. Conservo ainda os ecos da leitura encenada do poema homónimo de Herberto, pelo Paulo Campos dos Reis, na última noite da vida de um solar em Paredes de Coura. Momentos telúricos, de andar descalço pelas ruínas. «Ouve-se/ a dor das árvores. Sente-se a dor/ dos seres/ vegetativos,/ ao terem de apressar a sua/ vida lenta.» Nem na ida, menos ainda na vinda, consegui espreitar a exposição «Raul Brandão: 150 anos», que abria as portas na Casa Guerra Junqueiro e na Biblioteca Municipal do Porto, pela mão sabedora do Vasco [Rosa]. Esta não posso perder. A ignorância também se faz fábrica de muita surpresa. Desconhecia a doravante indispensável «Guimarães», revista semestral que vai no quarto número, este com «paisagem» dentro. Lá volto a entusiasmar-me com as ideias do João Pedro Vaz e a irritar-me por ver tão pouco, por subir tão pouco. Bato no peito e reencontro Brandão, com o

Vasco a contar da nossa maneira descuidada de sermos, das décadas que foram passando sem que este autor sublime fosse devidamente editado. Vais sendo agora a injustiça reparada. Percebo que nunca visitei a Casa do Alto, nem que fosse para aquilatar fantasmas. Para meu deleite, ainda posso ouver as «Dissonâncias» do João Alexandrino aka JAS, cujas exposições recentes em Lisboa perdi (é dele a ilustração ao lado), bem apresentadas pelo Daniel Jonas: «nesta dança macabra, a peça exibida é anatómica e participa desse modo do silêncio espectral das coisas que confessam em silêncio. É um tipo de urna, de sarcófago, uma espera numa câmara frigorífica.» CASA DA CULTURA, SETÚBAL, 23 MAIO Conferência de imprensa para apresentar a Festa da Ilustração ’17. Na boa companhia do Pedro Pina, vereador capaz da loucura de encher uma cidade de ilustrações, e do mano orquestrador-mor, José Teófilo [Duarte], perco-me em números. Manuel Ribeiro de Pavia, o ilustrador

clássico que será homenageado este ano, nasceu há 117 anos e morreu 50 anos depois, no mesmo dia, a 19 de Março, na miséria. Neo-realismos cá dos nossos. Preparemo-nos, que oiço Zeca: «Tenho muitos anos para sofrer/ Mais do que uma vida para andar/ Bebo o fel amargo até morrer/ Já não tenho pena sei esperar». HORTA SECA, 24 MAIO «”E coisa mais preciosa no mundo não há”. Falamos de canções, certo? Não vejo maneira de crescer sem elas, miopia minha, que não distingo o longe horizonte sem degrau mínimo, este íntimo à mão de semear. As paisagens que fomos construindo no último século, hesitando ou correndo, sentados no passeio ou comendo alcatrão, seriam impossíveis de percorrer sem estes seres particulares. Chamemos-lhe canções, para facilitar, embora sejam bastante mais do que isso, síntese letal de poder que invoca diamantes e granadas. Não conheço melhor maneira de cruzar ciência e poesia, pensamento

e prazer, quotidiano e intemporalidade do que nestes nós que nos acompanham vida fora, por causa do verso estilhaço ou da melodia tatuagem. Os dias deixam-se oxidar, amarelando sensaborões até que a batida nos invade, aquela que sendo de todos parece apenas nossa. E logo Lisboa amanhece. Ou o Porto fica perto. Tão fácil falar de lugares comuns! Lá está, se se tornaram comuns devemo-lo a autores como Sérgio Godinho. E se estamos neste texto habitamos tal nome. Década após década, SG fez-se gigante construtor de canções que traçaram pontes, ruas e túneis, aliás, mapas entre gerações e géneros, temas e estilos, personagens e imagens. Foram relâmpagos que continuam acontecendo à medida que vivemos, para nos ajudar a perceber a dimensão exacta do que fomos mal o ouvimos, mal ouvimos as canções. Esta arte do Sérgio assenta na peculiar atenção ao que fica do que passa; na raiz mergulhada na experiência pessoal mas de um modo tal que rima com universal; nas coreografias com que a palavra arrasta os ritmos. Nisto e nos enigmas da curiosidade que recolhe, mistura, amadurece e atira. Para voar e nos levar também.» Não consegui desenvolver estas ideias, impressas muito antes do Dylan feito Nobel ou vice-versa, a tempo de alinharem na fotografia feita pela exposição e catálogo, que agora me chega às mãos e com que a Câmara de Grândola celebrou vida ímpar: «Sérgio Godinho – Escritor de Canções». Desconsegui. Calquemos o detalhe, que ainda haverá tempo para lá ir, à vila morena, reconhecer a banda sonora dos meus dias. Não se contam pelos dedos, as alegrias que o Sérgio me foi dando, desde que me conheço a torcer destinos, sendo a mais vibrante uma recente fraternidade de projectos partilhados. «Dias úteis/mesmo se a dor nos fizer frente/a alegria é de repente/ transparente/quem a não receberia?/ Mesmo por pretextos fúteis/a alegria é o que nos torna/os dias úteis.» RODRIGUES SAMPAIO, 25 MAIO Reunião para fecho de contas anual com o Vitor [Couto], parceiro de há tantos anos, ali pertinho da Smarta, cidade da ilha chamada Natália Correia. Tão triste a paisagem, tão entediante o assunto. Os números cantam-me sempre a mesma canção. «Dias úteis/ são tão frágeis, as verdades/ que se rompem com a aurora/ quem as não remendaria?»


17 hoje macau quinta-feira 1.6.2017

diários de próspero

António Cabrita

Perplexidades e equilíbrios

Maria João Cantinho com Vasco Gato e Miguel Manso

28/05/2017 Leio no DN, com perplexidade: «Nesta semana, o candidato derrotado nas primárias republicanas, o neurocirurgião Ben Carson, atual secretário da Habitação e do Desenvolvimento Urbano, responsável pelos programas de habitação social, afirmou que “a pobreza é um estado de espírito”. Ontem, um congressista republicano, questionado numa entrevista radiofónica sobre se considerava a alimentação como um direito de cada americano, hesitou, demorou e acabou por recusar subscrever essa afirmação. Trump é apenas a face mais visível de uma América que sempre existiu, mas que com o novo presidente parece ter perdido a vergonha.» Leio e cogito: é difícil imaginar pior e um cenário mais tenebroso. Porque nos começamos a situar numa orbe perigosamente próximos desta descrição: «Não se dá os mortos à sua mãe, aqui, mata-se a mãe conjuntamente, e come-se o seu pão, e arranca-se o ouro da sua boca para se poder comer mais pão, e faz-se sabão com os seus corpos. Ou então enfeita-se com as suas peles os abat-jours das fêmeas SS». Quem o conta é Roberto Antelme, no seu livro A Espécie Humana, onde testemunha a monstruosa desumanização do universo concentracionário. Políticos para quem a pobreza não passa de um estado de espírito e que não consideram a alimentação como um direito, já podiam ser carcereiros de um campo de extermínio. Já estamos a lidar com diferenças de grau mas não de natureza – isso é que se me afigura assustador. Falta pouco para começarem a

Maria João Cantinho

falar de castas. E quando se pensa assim, igualmente o consentimento para se obter de uma mulher o que se pretende é um percalço menor, que se ultrapassa com a violência. É desta massa que se forma a personalidade dos novos líderes da direita. Se se associar a esta mentalidade a abstracção algorítmica, fica o futuro duro de roer. Isto pedia aqui uma tirada de génio de Groucho Marx, mas (não digam a ninguém) o comediante perdeu a dentadura e nenhum osso se rói por delegação. 30/05/2017 A Maria João Cantinho ganhou o Prémio Glória de Sant’Anna com o seu excelente livro de poesia Do Ínfimo. Para se entender o que isso significa teria de se começar por saber quem foi a Glória de Sant’Anna, uma estupenda poeta portuguesa que teve “o azar” de ter feito toda a sua carreira poética em Moçambique. É uma poeta da geração da Sophia de Mello Breyner e não lhe deve em rigor e talhe poético. Terá menos volume de trabalho (a sua obra completa não ultrapassará as duzentas páginas), mas a qualidade pede-lhe meças. O problema é que poucos sabem e quando regressou a Portugal o seu caminho estava condenado a ser discreto. Do Ínfimo é um livro à altura da sua patrocinadora. A Maria João Cantinho é muito mais conhecida como ensaísta e crítica, e agora como directora de revistas literárias (cf. revistacaliban.net), mas este é o seu quar-

to livro de poesia. Como poeta, apareceu numa altura que lhe era adversa, nos anos noventa, um período em que tudo o que não fosse “poesia do quotidiano” era claramente descriminado. Houve uma ditadura do quotidiano e a sua poesia mais metafórica e de laivos existenciais e mesmo metafísicos foi silenciada. Até por causa das suas influências, mais alemães e francesas, contra a vaga anglo-saxónica que sobraçou o país. Do Ínfimo é uma magnífica oportunidade para a conhecer. É um livro de grande equilíbrio, que tem arquitectura e é meditado, denotando ampla consciência do seu ofício. Sendo discursivo não cai no vício da retórica; o seu léxico medido e uma expressividade controlada não perdem de vista os seus efeitos emocionais embora prescinda de se meter em ponta dos pés, no afã de cativar o leitor por um “sensacionalismo das imagens”. Para além do conjunto, coeso, Do Ínfimo alia duas coisas que raramente casam com esta eficácia: a sobriedade não neutraliza a capacidade digressiva de quem reflecte e faz o poema reflectir-se. Como disse atrás, nestes poemas a ênfase não está no brilho (as imagens fulgurantes) mas antes na justeza das palavras. São versos que testemunham um desencontro com as idealidades, disfóricos, versos de onde se parte ou nos quais se vinca que algo se perdeu e que quando encenam um retorno recortam um céu plúmbeo em fundo. Contudo, a tristeza que neles se plasma

foge de consolidar-se como a abstracção de um saber, ou da congelação melancólica. Daí que surdam laivos de revolta e vários poemas reclamem um certo cariz social. E, característica tanto mais curiosa quanto o poeta alemão tem sido um dos objectos de estudo dos seus ensaios, dir-se-ia que contra o Paul Celan, estes poemas desencadeiam-se discursivamente, de forma articulada, por vezes apoiados em refrões que lhes marcam o ritmo, com Cantinho a procurar ainda balbuciar uma unidade (na sua leitura do mundo), um rosto, mesmo que amarrotado, como é o que se alude no primeiro poema do livro. Se este é um livro que coou de alguma tristeza (o mundo não está bonito) a autora não se lhe entrega num trânsito irreversível e final, da mesma forma que a clausura do círculo se liberta pela espiral, impondo a sua dignitas, uma ética. E aqui deixo um dos seus poemas, DA VISÃO EM FILIGRANA: Desdobra-se o nojo, o sangue, a vida/ que se celebra no avesso da noite,/ o olhar acossado no nada, esta raiva/ uma bomba prestes a detonar/ na flor amaldiçoada/ de um silêncio esventrado.// Porque passas tu sem ver/ as sombras e o escuro incêndio da folhagem/ o cheiro e o dia, onde tudo se entorpece/ as ruas antigas de um muro/ onde sentiste que as palavras/ te tinham abandonado em definitivo.// Para que nos serve a língua, o coração/ em salmo adiado, se a linguagem nos abandonou/ e nos sentámos na grande pedra/ a olhar o vazio/ a decifrar modos de sentido/ que nos traem, sempre/ fugindo na sombra dos dias.// É esta a pobreza/ que nos faz voar/ ao encontro das árvores/ e do céu.”


18 (F)UTILIDADES TEMPO

hoje macau quinta-feira 1.6.2017

?

AGUACEIROS

O QUE FAZER ESTA SEMANA Amanhã CONCERTO DE JOÃO CAETANO Centro Cultural de Macau | 20h00

Domingo

MIN

25

MAX

30

HUM

75-95%

EURO

9.01

BAHT

Diariamente FAM – EXPOSIÇÃO “A ARTE DE ZHANG DAQIAN” Museu de Arte de Macau | Até 5/8

O CARTOON STEPH

ALFREDO MATOS

SOLUÇÃO DO PROBLEMA 47

PROBLEMA 48

UM FILME HOJE

C I N E M A

SUDOKU

DE

EXPOSIÇÃO “AMOR POR MACAU” DE LEE KUNG KIM Museu de Arte de Macau | Até 9/7

Cineteatro

1.17

EMO-VIRAIS

ESPECTÁCULO “NO PRECIPÍCIO ERA O VERBO”, DE ABYSMO Teatro D.Pedro V | 20h00

EXPOSIÇÃO | “TENTATIVE NOTEBOOK - WORKS BY RUI RASQUINHO” Art for All Society, Jardim das Artes | Até 14/06

YUAN

AQUI HÁ GATO

EXPOSIÇÃO “FOLLOWING THE CHANGES IN HENGQIN 2011-2014-2017” Armazém do Boi | Até 16/7

EXPOSIÇÃO DE DANIEL VICENTE FLORES Albergue SCM | Até 4/6

0.23

Desafio o mundo a encontrar algo mais ternurento que uma ninhada de gatinhos. “A sério, pá, tão fofos.” Os humanos ficam doidos, enchem as redes sociais com imagens de micro Pu Yis a derreter corações e a multiplicar “gostos” como uma praga imparável. Já agora, prefiro usar a adjectivação “pandémica” para retratar algo que enche a Internet de reflexos condicionados, à terminologia viral. Vírus aponta para a possibilidade de existência de retroviral, que não conhecemos, até hoje, para a disseminação de estupidez. Procuram-se emoções básicas, à superfície da sensibilidade mais rasteira, instantâneas como uma dose condensada de algo indizível. Não sei o que isto significa, este apego à imagem de gatinhos, ou pandas bebés, não percebo esta exaltação carinhosa numa sociedade que come leitão e ovos das mais variadas espécies. Guerras deflagram, a corrupção tinge corações, fel corre como um rio desalmado pelas ruas... Mas já viram como este bichano reage a um fio de lã suspenso? Somos um circo emocional que multiplica “oooohs” vazios de conteúdo, sem apego à realidade do abandono animal. Querem a gratificação da suavidade no nosso pêlo, mas longe, dentro de um ecrã onde um afago se faz com um “gosto” de polegar em riste. Curiosamente, acho o mesmo. Os humanos são tão queridos quando não controlam os intestinos, nem qualquer outro fluido corporal. O problema chega quando ganham a capacidade para falar e agir no mundo. Uma espécie, por natureza, viral. Pu Yi

“ONE FROM THE HEART” | FRANCIS FORD COPPOLA

Numa era de espampanantes musicais produzidos por Hollywood, “One From the Heart” foi uma película que fugiu à regra. Elegante, subtil e musicado com a mestria de Tom Waits. O filme, de 1981, vive da relação amorosa entre Hank, protagonizado por Frederic Forrest, e Frannie, interpretada por Teri Garr. O elenco conta ainda com a hipnótica Nastassja Kinski. A narrativa é movida a ingenuidade e emoções puras de dois amantes que buscam o sonho de escaparem para um paraíso tropical. Só pela banda sonora vale as quase duas horas de filme. João Luz

WONDER WOMAN SALA 1

WONDER WOMAN [B] Fime de: Patty Jenkins Com: Chris Pine, Connie Nielsen, Robin Wright, Danny Huston 14.30, 16.45, 19.15, 21.30 SALA 2

GET OUT [C] Fime de: Jordan Peele Com: Daniel Kaluuya,

Allison Williams, Bradley Whitford 14.30, 16.30, 19.30, 21.30 SALA 3

BAYWATCH [C] Fime de: Seth Gordon Com: Dwayne Johnson, Zac Efron, Alexandra Daddario 14.30, 16.45, 19.15, 21.30

www. hojemacau. com.mo

Propriedade Fábrica de Notícias, Lda Director Carlos Morais José Editores Isabel Castro; José C. Mendes Redacção Andreia Sofia Silva; Sofia Margarida Mota Colaboradores António Cabrita; Anabela Canas; Amélia Vieira; António Falcão; António Graça de Abreu; Gonçalo Lobo Pinheiro; João Paulo Cotrim; João Maria Pegado; José Drummond; José Simões Morais; Julie O’Yang; Manuel Afonso Costa; Maria João Belchior (Pequim); Michel Reis; Paulo José Miranda; Paulo Maia e Carmo; Rui Cascais; Rui Filipe Torres; Sérgio Fonseca; Valério Romão Colunistas António Conceição Júnior; André Ritchie; David Chan; Fa Seong; Fernando Eloy; Jorge Rodrigues Simão; Leocardo; Paul Chan Wai Chi; Paula Bicho; Rui Flores; Tânia dos Santos Cartoonista Steph Grafismo Paulo Borges, Rómulo Santos Ilustração Rui Rasquinho Agências Lusa; Xinhua Fotografia Hoje Macau; Lusa; GCS; Xinhua Secretária de redacção e Publicidade Madalena da Silva (publicidade@hojemacau.com.mo) Assistente de marketing Vincent Vong Impressão Tipografia Welfare Morada Calçada de Santo Agostinho, n.º 19, Centro Comercial Nam Yue, 6.º andar A, Macau Telefone 28752401 Fax 28752405 e-mail info@hojemacau.com.mo Sítio www.hojemacau.com.mo


19 hoje macau quinta-feira 1.6.2017

bairro do oriente

LEOCARDO

RUSH HOUR, SUMMER TIME, ZINNI VESHI (PORMENOR)

Dia do adulto (com birra)

E

IS-NOS em Junho! Chegou o Verão, e com ele chega o calor insuportável, a chuva das monções, os tufões, e o período em que começamos a contar os dias até desopilar daqui para fora por um mês ou menos, para “arrefecer o radiador”. Espero ainda que tenham aproveitado bem o feriado do Barco Dragão, da última terça-feira, que agora o próximo é só em Outubro. Sim, e para quem está no rectângulo, lembre-se de nós, “os sortudos de Macau”, quando estiver a levar a cabo as sardinhadas, os arraiais, os concertos pimba e tudo mais que arranca em Junho e só acaba em Setembro – e depois ainda se arranja mais qualquer coisinha, aposto. Enquanto isso, é Macau porta-fora, porta-dentro. Ainda na segunda-feira de manhã saí de casa todo bem disposto, com aquela sensação de “falsa sexta-feira”, pois no dia a seguir era feriado. Eram oito e meia da manhã, uma hora perfeitamente razoável para percorrer 1200 metros a pé até ao buliço. Ou seria, não fossem os percalços começar logo à saída da porta. Um vizinho meu partiu recentemente uma perna (coitado) e resolveu nesse mesmo dia sair de casa à mesma hora que eu, acompanhado da anda de metal, proporcional à sua larga moldura,

uma perna no chão e a outra pendurada (outra vez, coitado), a mulher a dar-lhe o braço, e atrás vinha o seu pai, com a cadeira de rodas. Isto tudo para caber dentro de um elevador com uma área de seis metros quadrados. Saindo dez ou quinze minutos depois para ir passar a manhã toda a apanhar o tão necessário solinho, não me deixava a rogar-lhe pragas o dia todo. Até porque depois o elevador pára noutros andares, e lá vão as mui-muis e os pi-pis, acompanhados das avós e das empregadas, e normalmente nunca falta aquele senhor obeso que entra no quarto andar para sair na garagem dois pisos abaixo. É por isso que é gordo. Curiosamente em matéria de civismo ganha o meu vizinho do sétimo andar, um taxista dono

Quem está no rectângulo, lembre-se de nós, “os sortudos de Macau”, quando estiver a levar a cabo as sardinhadas, os arraiais, os concertos pimba e tudo mais que arranca em Junho e só acaba em Setembro – e depois ainda se arranja mais qualquer coisinha, aposto

de um cão daquelas raças tipo “mastim”, e que nunca entra no elevador se estiver acompanhado do animal. Trata-se aqui de uma muito honrosa excepção. Depois na rua é outra aventura. A desvantagem de trabalhar quinze minutos a pé de casa é não se poder alegar um atraso por “greve dos transportes”, porque aqui também não há (greves, pois os transportes “vão havendo”). Mas andar na rua já foi mais fácil. Ainda nessa tal segunda-feira passada, evitei um individuo que vinha na minha direcção direito que nem um foguetão norte-coreano, enquanto olhava para o infinito, certamente à espera de ver a deusa A-Má montada num dragão. Enquanto noutros pontos podíamos sensibilizar o indivíduo no sentido de “olhar para onde anda”, nestas situações o melhor mesmo é ligar o escudo anti-míssil, e irmos à nossa vida, para evitar conversas de surdos. Finalmente o último terço do percurso, mais sinal ou menos sinal vermelho lá se vai chegando a horas, por entre uma multidão de gente com a cara espetada no telemóvel a ler os comentários às fotografias pirosas que partilharam no fim-de-semana, ou a jogar ao “Bubble-qualquer-coisa” no Facebook. É tudo gente muito ocupada, a quem ainda foram dar essa enorme chatice que é ter que ir de manhã para o emprego. É a esses heróis que dedico este artigo, e não é com este discurso de tosse de catarro que estou a tentar educar ninguém. Sabe bem desabafar, e ainda por cima hoje tenho um desconto; se é o dia mundial da criança, porque não também do adulto com birra?

OPINIÃO


Mas sendo incerto o destino/de ir tão certo em tanto mar/em tanta aventura/fica-me o caminho aberto/para estar mais só/somente/no curso tão vário e deserto.” José Valle de Figueiredo

Clima TRUMP DEVERÁ TIRAR EUA DO ACORDO DE PARIS PYONGYANG AMEAÇA LANÇAR MÍSSIL INTERCONTINENTAL

A

Coreia do Norte ameaçou ontem estar prestes a lançar um míssil balístico intercontinental (ICBM) depois de Washington ter anunciado ter realizado um teste de intercepção de mísseis no Pacífico. Na terça-feira, os Estados Unidos indicaram que um míssil intercontinental lançado da base da Força Aérea de Vandenberg na Califórnia foi interceptado com êxito por um míssil disparado do Centro de Testes Reagan instalado nas ilhas Marshall, no Pacífico. Na sequência do teste norte-americano a Coreia do Norte diz estar “preparada” para um novo ensaio. “Nós estamos preparados para lançar os ICBM para onde quisermos, sob as ordens do comandante supremo (Kim Jong-Un) refere o Rodong Sinmun, órgão oficial do partido único no poder em Pyongyang. “Os Estados Unidos devem ser conscientes de que não é em vão quando falamos do nosso poder para reduzirmos a cinzas o ‘antro do diabo’ com as nossas armas nucleares”, escreve o jornal norte-coreano. Pyongyang anunciou terça-feira o lançamento o disparo de um míssil sobre o mar do Japão o que provocou a condenação de vários países, em todo o mundo. Tratou-se do terceiro ensaio da Coreia do Norte em três semanas e o décimo segundo desde o princípio do ano, apesar das resoluções das Nações Unidas que interditam Pyongyang a manter o programa balístico e nuclear.

Arrogantemente sós

O

Presidente norte-americano, Donald Trump, deverá anunciar ainda esta semana que os Estados Unidos vão sair do Acordo de Paris, um documento negociado por 195 países que estabelece metas mundiais para a redução das emissões de dióxido de carbono. A informação foi avançada pelo site norte-americano Axios, que cita “duas fontes com conhecimento directo da decisão”. O jornal The New York Times avançou um pouco mais tarde a mesma informação, citando três responsáveis, também sob anonimato, mas na notícia do jornal norte-americano também é dito que “os responsáveis da Casa Branca salientam que a decisão ainda não é final”. Numa mensagem publicada no Twitter depois de o site Axios ter avançado a informação, o Presidente Donald Trump disse que a sua decisão será anunciada “nos próximos dias”. Segundo o site Axios, os detalhes da saída estão a ser ultimados por uma equipa que inclui

o administrador da Agência de Protecção Ambiental dos Estados Unidos, Scott Pruitt. O mesmo site garante que a escolha agora é entre uma retirada formal que poderia demorar até três anos e o abandono do tratado das Nações Unidas que

O

secretário-geral da ONU considera que é «absolutamente essencial» que o acordo de Paris contra as alterações climáticas seja concretizado. Num discurso dedicado ao aquecimento global e às alterações climáticas, António Guterres considerou que os objectivos fixados pelo acordo, merecem ser encarados «com uma ambição acrescida». O acordo alcançado em Paris visa limitar o aquecimento global do planeta a menos de dois graus centígrados, através da redução da emissão de gases com efeito de estufa. «Se um governo coloca em causa a vontade e a necessidade mundiais quanto ao que respeita a este acordo, é uma razão para todos os outros se unirem ainda mais. Os que falharem na transição para a economia verde, vão conhecer um futuro cinzento», disse, sem citar directamente os EUA ou Donald Trump.

serve de base ao Acordo de Paris, o que seria mais rápido. Mesmo assim, como o acordo coloca o início do cumprimento das metas em 2020, os Estados Unidos poderão voltar a comprometer-se com o documento nesse ano, se os eleitores puserem outro candidato ou candidata na Casa Branca.

SUSPENSE À AMERICANA

Trump esteve na cimeira do G7 no passado fim-de-semana e disse aos seus parceiros que ainda não tinha tomado uma decisão. No comunicado final da cimeira, os outros seis países comprometeram-se com o Acordo de Paris e sublinharam que os EUA ainda não tinha uma posição clara. O Acordo de Paris foi discutido durante anos e acabou por ser adoptado em Dezembro de 2015.

LIGA DOS CAMPEÕES ASIÁTICA SHANGHAI SIPG, DE VILLAS-BOAS, NOS QUARTOS DE FINAL

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Depois disso, foi assinado por 195 países e ratificado por 147 (Portugal ratificou em Setembro do ano passado), tendo entrado em vigor em Novembro de 2016. Se os Estados Unidos decidirem sair do acordo, juntam-se aos únicos dois países que não participaram nas suas negociações – a Síria, porque está envolvida numa violenta guerra civil há seis anos; e a Nicarágua, que boicotou o acordo por considerá-lo pouco ambicioso nas suas metas e frágil devido ao facto de ser de adesão voluntária.

Segundo o site Axios, os detalhes da saída estão a ser ultimados por uma equipa que inclui o administrador da Agência de Protecção Ambiental dos Estados Unidos, Scott Pruitt

GUTERRES DEIXA AVISO

O Shanghai SIPG, treinado por André Villas-Boas, venceu ontem em casa do Jiangsu Suning por 3-2, na segunda mão dos 16 avos de final da Liga dos Campeões asiática de futebol, apurando-se para os quartos de final. O Shanghai, que já tinha vencido a primeira mão em

quinta-feira 1.6.2017

casa por 2-1, marcou primeiro por Elkeson, aos 34 minutos, e depois num auto-golo de Yang aos 43, antes de Hong e Wu empatarem para a equipa da casa aos 75 e 90 minutos, com o ex-FC Porto Hulk a dar a vitória a Villas-Boas já nos descontos. Nos quartos de

final, o segundo classificado da liga chinesa irá defrontar uma de três equipas da chamada ‘zona este’ da competição: o líder do campeonato chinês Guangzhou Evergrande ou os japoneses Kawasaki Frontale ou Urawa Red Diamonds.

Apesar de tudo indicar que Donald Trump vai anunciar a retirada dos Estados Unidos do Acordo de Paris, não faltam exemplos de mudanças de decisão à última hora nos últimos meses – em Abril, quando toda a gente esperava que os EUA saíssem do NAFTA, Trump acabou por anunciar que iria renegociar o acordo comercial com o México e o Canadá; e, na semana passada, era quase certo que Donald Trump iria deixar explícito no seu discurso na cimeira da NATO a sua defesa do Artigo 5.º, o que não aconteceu. Antes de anunciar a sua decisão, Trump vai encontrar-se com o secretário de Estado, Rex Tillerson, antigo presidente executivo da Exxon Mobil e defensor da continuidade dos EUA no Acordo de Paris. Público


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