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O combate à pandemia na maior cidade catarinense
Coronavírus
O combate à pandemia na maior cidade catarinense m dos mais expressivos polos industriais do país, Joinville enfrenta, com muito planejamento e união de esforços de vários setores da comunidade, a mais grave pandemia da história do planeta desde a chamada Gripe Espanhola que, em dois anos, infectou 500 milhões de pessoas – um quarto da população mundial –, matando entre 17 e 50 milhões. A doença da vez, batizada de Covid-19, é provocada pelo Sars-CoV-2, que se manifestou primeiro na China, nos últimos dias de 2019. Dali se alastrou velozmente pelo globo.
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No início de janeiro deste ano, a partir das primeiras notícias do problema, o Hospital Dona Helena acendeu a luz vermelha, reunindo seu corpo clínico e técnico a fim de preparar a instituição para a iminente chegada do vírus, que teve o primeiro registro no Brasil em fins de fevereiro. Para seguir garantindo a sua reconhecida qualidade de atendimento e segurança da comunidade, a instituição criou, ainda em janeiro, um comitê de contingência, para elaboração, constante atualização, treinamento e prática dos protocolos de atendimento a epidemias.
Danilo Abreu, superintendente médico, explica que o protocolo foi montado com base em diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Center for Disease Control and Prevention (CDC), posterior e sistematicamente atualizado conforme sucessivas notas técnicas emitidas pelo Ministério da Saúde. Ele frisa que o Dona Helena tem o processo de contingência em seu DNA por ser certificado pela Joint Commission International (JCI), acreditação internacional de referência no segmento da saúde. “Além das boas práticas orientadas por essas renomadas instituições, montamos um fluxo de atendimento especial para total qualidade e segurança dos pacientes, familiares e colaboradores. Dispomos de uma estrutura em funcionamento e outra preparada na hipótese de aumento muito grande do número de casos em Joinville.”
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No plano de contingência, foram contemplados diversos aspectos: área exclusiva para pacientes com suspeita de contaminação pelo vírus, fluxo de acessos, uso de máscaras, orientações pós-alta com os esclarecimentos sobre o período de isolamento, dentre outros pontos. Os casos suspeitos são notificados ao Ministério da Saúde e à Vigilância Epidemiológica do Estado, que encaminha o material coletado para análise junto ao Laboratório Central de Saúde Pública.
Participam do comitê, além do superintendente médico, a gerência de enfermagem, o Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH), coordenadores médicos e de enfermagem, profissionais de gerenciamento de risco e do laboratório de análise clínica. A equipe de comunicação também está envolvida para orientar o público em seus meios on-line e off-line. O comitê se reúne sempre que há uma atualização do Ministério da Saúde e ao término de cada atendimento, para discutir cada caso e verificar se existem oportunidades de melhoria. Além disso, representantes do hospital foram convidados para fazer parte do Comitê de Contingência do Coronavírus em Joinville, formado por hospitais públicos e privados, ao lado de integrantes da Secretaria de Saúde.
Conforme o superintendente médico, a orientação aos pacientes é a mesma de quem utiliza o sistema público: as pessoas não devem buscar o serviço de saúde, salvo diante de sinais de gravidade. No SUS, há uma peculiaridade porque vários profissionais precisam de atestado. E o órgão orienta as pessoas com sintomas gripais que precisem de atestado a procurar as unidades básicas de saúde para obter o documento. “Essa não é uma realidade aqui. Fizemos ações com grandes empresas para que o paciente com sinal gripal fosse afastado pela própria empresa, evitando aumento no movimento da Emergência”, explica Danilo.
Rotinas de uma pandemia Como a ação do vírus já atingiu há tempo a fase de transmissão comunitária, Danilo Abreu detalha que a emergência do hospital atua, hoje, em duas áreas: uma voltada a pacientes com sintomas respiratórios e outra para demais patologias. Potenciais gripados, por exemplo, são atendidos pela triagem e ganham uma máscara descartável. Toda a recepção foi reorganizada com espaços maiores entre um assento e outro e os profissionais da saúde trabalham com os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados à nova situação. O hospital suspendeu visitas e acompanhantes a fim de reduzir o número de pessoas circulando na unidade.
Apelo de profissionais de saúde, já no início do combate ao novo coronavírus: isolamento social
Duas unidades de internação foram preparadas para receber pacientes sem gravidade, o que totaliza 14 leitos, com possibilidade de extensão em contingência para 35. Já na UTI, 19 leitos foram destinados para a internação de casos graves, com possibilidade de extensão, em contingência, para 29. Segundo as projeções feitas pelo hospital, é possível que sejam internadas entre 50 ou 60 pessoas na UTI. “A questão é quando. Com as medidas de isolamento social, isso deve acontecer de forma gradual, e não com um pico, como se viu em outros países”, completa.
Naquele mesmo 18 de março, quando o Estado catarinense decretou situação de emergência, começaram a entrar em prática, no Dona Helena, as ações estratégicas para fazer frente ao enorme desafio que a pandemia mundial representava. Uma primeira e importante mudança dizia respeito às alterações no atendimento aos pacientes com sintomas gripais e respiratórios, deslocados para uma área específica, na Emergência.
Com a mudança, foi fundamental a publicação de documento interno, baseado em pareceres do Ministério da Saúde e outros órgãos de referência, direcionando o trabalho da equipe assistencial e de apoio. As orientações do Ministério da Saúde e as mudanças relevantes na área física e nos processos provocaram necessidades imediatas de disseminar as novas informações entre as equipes – um esforço diário, aliás, considerando a volatilidade da epidemia e o pouco conhecimento que ainda se tinha do novo vírus.
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Preparo das equipes é total e constante A enfermeira Nadia Cristina Bach, coordenadora do Programa de Educação Continuada do HDH, reforça que já em janeiro a instituição desenhou um fluxo para atendimento a pacientes suspeitos de infecção pelo coronavírus. Esse plano foi projetado para ser executado conforme algum gatilho no país pudesse impactar a cidade. Foi o que ocorreu com o primeiro caso confirmado de contágio comunitário em Santa Catarina, em 18 de março, quando o Estado computava apenas 14 casos – em pouco mais de um mês, este número saltava para 1.500, ou mais de 107 vezes maior.
Uma das áreas do Dona Helena que foram preparadas para receber pacientes da Covid-19
Foram promovidos vários treinamentos com equipes de enfermagem, médica, fisioterapia, de higiene, manutenção, nutrição, entre outras, abordando as orientações do Ministério da Saúde para cada área específica. “Nossa primeira ação foi um vídeo sobre a forma correta de paramentação: avental, luvas, óculos, máscaras cirúrgicas etc., e como colocar e retirar cada um dos EPIs sem causar contaminação”, lembra Nadia.
Logo em seguida, todos os times passaram por treinamento sobre o novo fluxo na Emergência e, consequentemente, dos setores para onde o paciente poderia ser internado, sobre o correto transporte do paciente, para evitar contaminação dos ambientes e das pessoas, o preparo do corpo após o óbito, intubação em sistema fechado (abordando os materiais que deveriam ser utilizados e o auxílio ao médico), além de eventos específicos para as equipes de apoio falando de prevenção, com higiene das mãos e o uso restrito de máscaras quando os profissionais tiverem contato com pacientes suspeitos.
“Basicamente, os treinamentos seguem as orientações do Ministério da Saúde e, a cada atualização, ficamos atentos para verificar a necessidade de novos treinamentos para as equipes. Já houve casos de orientações alteradas totalmente – e fizemos reorientação no mesmo dia do treinamento. Como isso pode causar alguma confusão, também somos frequentemente abordados por equipes nos corredores para tirar dúvidas”, diz a enfermeira.
Entre março e abril, o Dona Helena realizou cerca de 230 horas de treinamentos registrados, abrangendo várias áreas de assistência e apoio. Para facilitar ainda mais o entendimento, a instituição desenvolveu vídeos acerca dos temas que ainda possam gerar dúvidas. “O principal objetivo é manter a equipe ciente dos processos para exercer suas funções de forma segura”, conclui Nadia.
As mudanças, no dia a dia Na linha de frente do combate ao novo coronavírus, profissionais da saúde são os que lidam com o maior risco, por estar mais expostos à doença. No Dona Helena não é diferente. Marcelo Amorim, médico cardiologista, conta que a rotina mais alterada foi a do volume de trabalho, que se intensificou. “Diariamente, precisamos modificar os cuidados, avaliar novas perspectivas de tratamento. É um desafio constante para identificar os sintomas de maneira cada vez mais precoce e definir quais pacientes precisam de cuidado maior”, detalha. Quando não está no hospital, o profissional permanece em casa. “Isso alterou a minha rotina de saúde. Tive que mudar alguns hábitos, como o de praticar atividades físicas.”
A restrição de fluxo pela cidade, com medidas de isolamento social, tem reflexos positivos, segundo Sarah Augusta Lima dos Santos, enfermeira coordenadora da UTI. “Como profissionais de saúde, estamos na busca incessante de aprendizado e adaptação para atender da melhor forma possível. Trata-se de algo novo para todo mundo, o que nos força a intensificar as nossas atividades”, explica. Sarah frisa que o setor de saúde dispõe de muito mais recursos científicos e tecnológicos, o que favorece o sistema. “Todavia, o recurso humano não mudou, então temos, sim, os nossos receios, e enfrentamos tudo isso como pessoas. Também temos os nossos familiares e as nossas limitações. Apesar da dificuldade do profissional frente à atividade, percebo a equipe totalmente empenhada na busca de um desfecho favorável.”
Comitê de contingência reúne profissionais de vários setores do hospital
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Visitas virtuais ajudam pacientes na recuperação Empenhado em amenizar as restrições de acesso decorrentes da pandemia, o Dona Helena implementou, já no início de abril, as chamadas “visitas virtuais”, flexibilizando o uso de celular para garantir o contato de pacientes internados na UTI, em isolamento, com seus entes queridos. Também podem ser feitas videochamadas, com apoio da equipe de psicologia, aos pacientes em UTI aberta, sem isolamento. “Manter o paciente conectado com a família pode influenciar na sua condição emocional e, consequentemente, na recuperação física”, enfatiza Maria José Varela, psicóloga clínica e coordenadora do programa de humanização. As visitas virtuais são voltadas para todos os pacientes que se encaixam no perfil, seja qual for a patologia. “A população está com o olhar focado nos efeitos da pandemia do novo coronavírus, porém, não podemos esquecer que outras condições de saúde trazem os pacientes para o hospital, e a eles devem ser impostas as mesmas regras de proteção e isolamento social”, pontua Maria José. O recurso é utilizado com orientações específicas que resguardam a privacidade de pacientes e equipe.
Ventilador mecânico doado pelo HDH à campanha organizada pelo Instituto Senai de Inovação
Campanha +Respiradores Os respiradores mecânicos passaram a ser peças-chave para o tratamento de pacientes de coronavírus, já que a falta de ar é um dos principais sintomas – e se agrava com o avanço da doença. Santa Catarina lançou a campanha +Respiradores, unindo empresas e instituições para buscar recursos e ampliar a disponibilidade do equipamento. O Dona Helena cedeu um ventilador mecânico para o Instituto Senai de Inovação em Sistemas de Manufatura e Processamento a Laser, com a finalidade de estudo para consertos. Também doou outro em desuso, consertado e repassado para o Hospital Nossa Senhora Imaculada Conceição, do município de Nova Trento, que até então não tinha qualquer equipamento respiratório para atendimento.
“Um dos nossos equipamentos estava sem uso, devido ao alto custo de manutenção. Quando o Senai recebeu a demanda, entrou em contato e fez o reparo para doação”, conta Paulo Afonso Benkendorf, gerente de infraestrutura do Dona Helena, que incentiva a participação de outros hospitais. “Por intermédio da empresa SLS Hospitalar, parceira da iniciativa ‘+Respiradores’, tivemos um treinamento básico sobre como proceder na manutenção dos ventiladores mecânicos. Montamos a estrutura e fizemos contato para parcerias com outras empresas. Agora, estamos atendendo toda Santa Catarina na manutenção desses equipamentos”, detalha Fabio Fernando Karnopp, especialista técnico do Instituto Senai e líder de operações na ação.
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Telemedicina reforça assistência médica durante a pandemia O Conselho Federal de Medicina (CFM), em ofício encaminhado ao Ministério da Saúde em março, reconheceu o uso da telemedicina no país, além do estabelecido na Resolução CFM nº 1643/2002, que continua em vigor. A decisão vale em caráter excepcional, enquanto durar o combate à pandemia de Covid-19. Segundo o documento, com esse anúncio, o CFM contribui para o aperfeiçoamento e a máxima eficiência dos serviços médicos prestados no Brasil.
A telemedicina poderá ser exercida nos seguintes moldes: teleorientação, que permite que médicos realizem orientação a distância, além do encaminhamento de pacientes em isolamento. Podem realizar, também, telemonitoramento (possibilita que, sob supervisão ou orientação médicas, sejam monitorados a distância parâmetros de saúde e/ou doença), e teleinterconsulta, que permite a troca de informações e opiniões exclusivamente entre médicos, para auxílio diagnóstico ou terapêutico.
Para todo o sistema da saúde, a crise gerada pelo coronavírus traz desafios sem precedentes. A expectativa de um aumento de demanda em curto espaço de tempo, sem estimativa de prazo ou de quantidade, exigiu um exercício de criação de cenários, no entendimento da Associação Médica Brasileira (AMB). O pior cenário, segundo a entidade, é aquele em que a curva de infecta
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dos suba em velocidade semelhante ou pior que a vista na Itália e que se tenha um nível alto de médicos retirados da linha de frente, por terem também se transformados em pacientes.
“A manifestação do CFM foi assertiva e fundamental para o hoje e para o amanhã, pois assegura as condições legais para o uso da telemedicina no combate ao coronavírus nos termos que preservam a relação médico-paciente e as práticas necessárias para que a ferramenta não se transforme em uma panaceia, útil apenas aos que enxergam nela uma maneira de vender produtos e serviços, sem a preocupação com questões caras como a efetividade da utilização, os benefícios e riscos reais à prática médica, com a deturpação da questões éticas”, registra Lincoln Ferreira, presidente da AMB.
CFM reconheceu a prática da telemedicina em algumas modalidades, enquanto durar a pandemia
“O mundo não será mais o mesmo”, afirma infectologista O infectologista Luiz Henrique Melo, presidente da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Dona Helena, é um dos nomes de referência na área em Joinville. Em seu perfil nas redes sociais, costuma fazer posts esclarecedores sobre vários aspectos da pandemia. Veja algumas destas reflexões: • “O mundo não será o mesmo após a pandemia do Covid-19. A ciência já vem se modificando de forma jamais vista. Nunca, na história da medicina, tantos cientistas focaram seus estudos em uma doença. Algo parecido, mas em menor escala, aconteceu na década de 1980, com a Aids. A capacidade de trabalhar em colaboração, deixando de lado o progresso acadêmico pessoal, está ocorrendo agora porque é questão de sobrevivência da população.” • “Se a medicina não será mais a mesma após a pandemia, com a economia não será diferente. O modelo da cadeia de suprimentos global baseado no baixo custo com foco na China se modificará. Precisamos ser autossuficientes na produção de insumos localmente.” • “O assunto é bioética. Como priorizar os pacientes graves com Covid-19 quando o sistema de saúde ficar saturado? A ética médica é uma disciplina prática. Para que seja útil, não pode simplesmente fazer perguntas interessantes. Ele deve fornecer conselhos concretos para os médicos na linha de frente. Quaisquer que sejam as conclusões sobre a alocação justa de recursos limitados, elas devem ser comunicadas ao público. Fazer o contrário pode levar a pânico e protestos no pior momento possível, quando os hospitais estão sob extrema pressão.”