Expressao 1 maio 2016

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ano 23/número 1 maio/2016

jornalismo universitário levado a sério

jornal laboratório do 4º ano de jornalismo

usjt

Kaique Santos

Faces da

intolerância

Conflitos que se transformam em ódio nos desafiam a encontrar saídas


#hashtag

#caro leitor, Ânimos aflorados na sociedade

ano 23 |no1 | maio/2016

#fração de segundo fotolegenda

Olá, olá!! Finalmente voltamos a circular pelos corredores e arredores da São Judas (Mooca e Butantã). Estamos de volta!! A edição no l do Expressão em 2016 chega para você com muitas novidades, assuntos relevantes e jornalismo de primeira!! Nossa reportagem especial traz um tema hiper atual e que afeta cotidianamente todos nós: as várias faces da intolerância. Afinal, o que é ser intolerante? Estamos preparados para exercitar o diálogo civilizado com pessoas que antagonizam com nossas ideias e posicionamentos? Os repórteres do Expressão saíram a campo para apurar os vários aspectos que envolvem as mais diversas formas de intolerância explicitadas na sociedade contemporânea. A intolerância pode estar na política, nos relacionamentos afetivos, no trabalho, na religião, no futebol... É uma forma intensa de aversão e rejeição ao outro. Talvez por isso, os ambientes de redes sociais no mundo virtual tenham se transformado no principal espaço de visibilidade da intransigência na atualidade. E, não paramos aí!! Nosso jornal laboratório está recheado de boas reportagens. Na editoria Educação, vamos conhecer o trabalho inovador desenvolvido na EMEF Amorim Lima, que adotou um projeto pedagógico integrador. Em Vida Digital, apresentamos a “Era dos Biochips”, numa perspectiva de aprimoramento da interação do ser humano com os robôs. Já em Artes, nos aproximamos do universo das drag queens para compreender o processo artístico de transformação pelo qual passam estes personagens. E, vamos nos despedindo na editoria de Esporte&Lazer com uma aventura pela cidade de São Paulo. Convidamos o leitor a explorar a metrópole unindo ciclismo e passeio cultural, com pitadas de muita história. Venha conferir!! Aceite nosso convite à aventura!!! É isso!! O Expressão inicia suas atividades em 2016 com muita garra, muita disposição e uma equipe de destemidos repórteres para trazer o melhor jornalismo para você, caríssimo leitor. Então, vamos lá?!

Profa Iêda Santos e Profa Jaqueline Lemos

Monumento da Independência

O símbolo de uma das mais importantes conquistas do nosso país, visto de sua base. - Ipiranga, SP Kaique Santos - aluno do 40 ano de Jornalismo - Campus Mooca

Pablo,

#protagonista

o andarilho do sorriso

Taine Santos Vagando pelas ruas de São Paulo, a cidade mais movimentada do país, existe um uruguaio que ganha a vida levando até as pessoas um motivo para sorrir. Existem muitas formas de contar uma história, e existem muitas histórias para se contar, a do Pablo O Palhaço é mais uma dentre tantas outras. Com as piadas prontas, um nariz vermelho e uma maquiagem singela, ele sai às ruas da capital para ganhar uns trocados, que ajuda na sua sobrevivência. Talvez, você já tenha tropeçado com ele por aí, mas como existem tantos outros artistas que ganham a vida assim, ele tenha passado apenas como mais um. Com seu sotaque "portunhol", Pablo cativa. Sua aparência transmite um ar de quem já passou por poucas e boas. Aos 20 e poucos anos ele abandonou seu país e deu vida ao seu personagem, largou sua esposa e filhos para viajar o mundo e acabou ficando com malas e cuias no Brasil, onde vive há uns 17 anos. Sua primeira experiência aqui foi em território de extremo sul, em Gramado. Lá ele vendia sua arte e começou a desenvolver seus dons com o malabares. Quando viu a oportunidade de ser palhaço ele começou a se aperfeiçoar, comprou 3 bolinhas e deu início às aulas de malabares. Encontrou dificuldade no início porque treinava sozinho, mas desistir é uma palavra vaga para quando não se tem alternativa, a não ser a de persistir. E utilizando do adjetivo “persistente”, o palhaço nasceu! Já dormiu na rua, passou fome, usou drogas, mas nunca perdeu o bom humor, e foi isso que o salvou. Afinal, um sorriso tem mais poder do que se imagina. E essa curva de felicidade no seu rosto, mesmo sem dentes, traçou a alegria. “Quando você se permite conhecer novos horizontes, pode entender melhor que todo mundo tem algo interessante que pode mudar a sua vida de alguma forma, e ai deixa de lado a aparência”, comenta Pablo. Hoje, após cinco anos vivendo em São Paulo, Pablo diz que nas ruas conheceu gente boa e ruim, pois ali não existe lei, a sobrevivência se torna algo inesperado. Mas agora, com um novo amor para dividir seu barraquinho, ele tem para onde voltar no fim da tarde. “É uma vida simples, cheia de erros, arrependimentos, mas no fim, cada um ganha um final surpresa”. Não se arrepende de nada, inclusive da tatuagem escrita “Luciana” no seu braço, o nome da mulher que mais amou. Já na panturrilha tem o desenho de uma folha de cannabis. Sua última frase antes de voltar ao trabalho foi: “Eu apenas aguardo pela morte”.

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Diagramação: Profa Iêda Santos

#fica a dica

Crime e Castigo

Taís Cruz "Quando é preciso, afoga- de um personagem que se enmos até nosso senso moral, a contra em situação de miséria, liberdade, a tranquilidade, até frente a grandes cobranças soa consciência, tudo, vendemos ciais. E tudo isso se passa em tudo por qualquer preço!". Esse é uma cidade grande, com doenum trecho do livro Crime e Cas- ças psicológicas que podem ser tigo, clássico da literatura russa e comparadas às das metrópoles mundial. Escrito por Fiódor Dos- atuais”, relata. Ao longo da história, o leitoiévski em 1866, já foi traduzido tor é guia do pelos labirintos da para mais de 65 línguas. O romance narra a história mente do protagonista, deixando estudante Raskólnikov, que do claras as angústias e motitenta se manter quase sem recur- vações que levaram o personasos financeiros em São Peters- gem a cometer um crime. Bem burgo. Fortemente pressionado como o seu posterior arrepenpela família e pela sociedade, o dimento, provocando quem o jovem encontra-se sem perspec- lê a refletir sobre a sutil diferentiva em relação ao futuro. Depri- ça entre certo e errado, justiça e mido, passa os dias imerso em outros temas universais. “O livro tem um apelo psipensamentos. A sua introspecção o leva cológico muito grande e trata a questionar se ele, sendo um de sentimentos como angústia, homem comum, seria também compaixão, insegurança, inveja. inocentado se cometesse um cri- Acredito que os jovens acabam me. Assim como Napoleão, que se identificando bastante, pormatou milhares e foi absolvidos que ele aborda também os anpela história. Será que se ele seios e o medo de um fracasso matasse a velha agiota de mise- profissional”, conta Clayton. Na narrativa é marcante a ráveis, não estaria fazendo um bem à humanidade? Essa ideia é presença de uma consciência um ponto de partida da sua saga analítica que aponta para a salvação da humanidade através por redenção. É por isso que o profissio- da ética. Quando julgado em nal de tecnologia da informa- tribunal Raskólnikov conclui que ção Clayton Souza acredita que cada pessoa tem a sua verdade e essa é uma leitura imperdível. “ com ela há de acertar suas conÉ interessante observar a forma tas perante um único tribunal como Dostoiévski faz a análise eficaz: o da própria consciência.

expediente

Reitor José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Vice-reitor Fabrício Ghinato Mainieri Pró-Reitor de Graduação Luís Antônio Baffile Leoni Diretor da Faculdade de LACCE Prof. Rosário Antonio D’Agostino Capa Foto: Kaique Santos

Jornalistas Responsáveis Profª Iêda Santos (MTB 31.113) Profª Jaqueline Lemos (MTB 657/GO) Revisão Prof. César Zamberlam Projeto Gráfico e Supervisão Profª Iêda Santos Redação Alunos do JOR4AN-MCA1 Impressão Folha Gráfica (11) 3224.7667

As matérias assinadas não representam, necessariamente, a opinião da Universidade.

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ano 23 |no1| maio/2016 Victória Durães

Educação

Testes de proficiência são necessários para intercâmbio Exames necessários para estudantes que buscam uma vaga de intercâmbio são concorridos no Brasil Ingrid Pap

Alunos do Ciclo I, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, na aula de música ministrada no pátio da secretaria do colégio Amorim Lima

Amorim Lima reconecta: aluno, escola e comunidade

Instituição paulistana é pioneira na revolução metodológica inspirada na portuguesa Escola da Ponte Victória Durães

U

m professor com violão em meio ao pátio próximo à secretaria, rodeado de alunos sentados no chão esperando a aula de música começar. Esqueça a divisão de série por idade, as provas e a hierarquia dentro da sala de aula: a metodologia de ensino da EMEF Desembargador Amorim Lima tem em sua proposta pedagógica o aluno como centro, respeitando seu tempo e sua singularidade. A escola foi criada em 1956, no Butantã, mas a transformação com a nova metodologia aconteceu em 2004. Buscando solução para as altas taxas de evasão e índice de insatisfação dos alunos, a diretora Ana Elisa Siqueira – que assumiu o cargo em 1996, em conjunto com professores e pais do Conselho Escolar, aceitaram o projeto pedagógico exposto pela psicóloga Rosely Sayão, inspirado no trabalho da Escola da Ponte, em Portugal. O novo modelo de aprendizagem foi implementado e, desde então, o colégio trabalha a partir de uma lógica completamente diferente da que estamos acostumados. “As crianças gostam muito da Amorim, o índice de satisfação é muito grande porque é uma escola que cria uma atmosfera leve, de liberdade, diálogo, e acho que é isso que falta nos espaços”, conta Flávia Ferrari, professora do Ensino Fundamental I há dez anos na instituição. A metodologia de ensino se apoia na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB), foi aprovada pela Secretaria Municipal de Educação e está de acordo com as linhas pedagógicas dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Em vez de professores fixos, os estudantes têm educadorestutores que os auxiliam de acordo com as dúvidas surgidas durante os estudos. O conteúdo do ano letivo é agrupado

em apostilas com roteiros de pesquisa, que tem cerca de 18 objetivos. As salas de aula são formadas por dois grandes salões, divididos em Ciclo I e Ciclo II. Os alunos sentam em mesas com quatro lugares e realizam pesquisas em grupo para responderem seus roteiros individuais. Os professores, cerca de quatro por salão, circulam no espaço para sanar dúvidas e auxiliar, se necessário. Quando um roteiro é finalizado, o aluno escreve um portfólio com tudo o que aprendeu e entrega para seu tutor, que avalia se ele pode ou não receber a próxima apostila. Não há provas, e o conhecimento é avaliado de acordo com a participação do aluno na escola e por seus portfólios. “Toda vez que eu converso com quem não estuda lá me perguntam ‘mas você não tem nota? Como você é avaliada?’, e nós não somos avaliadas desse jeito”, conta Reinará Siniscashi, 12 anos, estudante do Ciclo II. “Na prova, se você erra, não tem a chance de consertar. Na Amorim não, o professor corrige e te ajuda”, completa Gabriela Frittoli, também do Ciclo II. Além da Amorim, há duas escolas com a pedagogia chamada “Fazer a Ponte” em São Paulo: EMEF Presidente Campos Sales (Heliópolis) e Escola Âncora (Cotia). “Para os professores [o método] é desafiador, por que você está o tempo inteiro ali, sendo questionado, precisando estudar para acompanhar os alunos”, relata Flávia. “A educação tradicional tem sido questionada e muitas escolas vêm procurando caminhos para se reinventarem. Uma escola inspira a outra”, completa a educadora.

Os estudantes que procuram universidades fora do país buscam certificados específicos para serem aceitos no exterior. O relatório Anual Open Doors, do Instituto de Educação, mostrou que de 2003 a 2013 houve um aumento de 500% entre os brasileiros que fizeram intercâmbio. Destes, mais de 70% têm entre 18 e 30 anos. O exame mais procurado é o TOEFL (Test of Englisk as Foreign Laguage), que tem como objetivo avaliar o potencial da fala e entendimento de inglês em nível acadêmico. O resultado é valido por apenas dois anos e é aceito em mais de 2.400 faculdades e universidades nos Estados Unidos e Canadá. O que muitos não sabem é que existem outros testes, de níveis e qualificações especificas, para diferentes países e faculdades internacionais. Quem pretende fazer algum curso em universidades internacionais, seja graduação, pós ou mestrado, precisa se atentar às exigências de visto e de currículo de cada uma. Essas especificidades variam conforme os critérios dos governos locais para imigração e com os fatores que cada instituição leva em consideração para o processo seletivo. “As pessoas que querem emigrar têm como motivação principal a busca pela experiência de morar fora, estudo, realização profissional, qualidade da educação e de vida entre outros. Com isso, procuram a certificação da língua inglesa antes de viajar, dessa maneira, conseguem ingressar em universidades internacionais”, afirma Alberto Costa, Senior Assessment Manager de Cambridge English, departamento da Universidade de Cambridge responsável pela aplicação dos testes no Brasil. Os principais testes são: Proficiency (CPE), qualificação mais avançada de proficiência, seguido pelo Advanced (CAE), que testa o alto nível de habilidade do aluno na língua inglesa e o First (FCE), exame que leva em consideração conhecimentos de nível intermediário superior. Os exames são adequados para quem precisa comprovar alto desempenho no idioma inglês e sua conquista demonstra que um estudante tem conhecimento linguístico para efetuar pesquisas complexas, comunicar-se de modo efetivo em nível profissional e se diferenciar. “Pretendo cursar uma universidade no Reino Unido em breve, soube que o exame que se encaixa é o Advanced (CAE). Venho me preparando, estudando muito. É algo complicado em um país onde o idioma não é usado”, afirma Thiago Navarro, biólogo que está se preparando para prestar o exame de proficiência. Taís Cruz

Universidade conhecida por aceitar exames de proficiência

Professores ainda lutam para cumprir lei de ensino afro brasileiro e africano

Nico Cruz

Assinada há mais de dez anos, norma precisa de esforço de docentes para ser executada Nico Cruz

Marcos Pacanaro

O reconhecimento das origens do Brasil e de sua população, valorizando sua diversidade, é um dos temas hoje propostos pelos professores e educadores da rede pública para que diminuam os casos de discriminação entre os jovens. Baseados na Lei 10.639/03, profissionais buscam especializações para que possam ensinar sobre a História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. A lei trabalha com a desconstrução do preconceito e do racismo e a garantia dos direitos e a oportunidades iguais para a população negra. Embora a norma esteja prevista há mais de uma década, desde 2003, o ensino pode encontrar certas barreiras, como a falta de preparo de professores, a solidificação das aulas de história direcionadas para um ponto de vista eurocêntrico e outros problemas. “Não há a fiscalização do cumprimento [da lei], que é um dos fatores que contribui para seu fracasso”, diz Mariana Carvalho, professora de história do colégio Luiz Bianconi, em Suzano. Além disso, “a falta de vontade da maioria dos professores em trabalhar a temática, como também da falta de conhecimento sobre a riqueza histórica e cultural da África complicam a prática da lei”, completa a educadora. Quando se trata da aceitação da cultura afro-brasileira, Mariana esclarece que há preconceito por parte dos alunos, às vezes herança da família: “A quantidade de alunos evangélicos é muito grande, então, eles já trazem de casa e também da igreja a demonização da arte africana”, relata. Mesmo assim, ela cria e se envolve em projetos, como o Sarau Africanidades, criado a partir de um caso de preconceito religioso com uma aluna candomblecista. Após o sarau a aluna teve uma receptividade muito melhor da turma. Para a professora, as aulas ministradas sobre o tema garantem que os estudantes percam o imaginário de que a África é um continente que contém apenas pobreza, fome, doenças e guerras, passando a reconhecer a sua riqueza cultural e histórica, deixando bem evidente a mudança no pensamento e contribuindo para erradicar o racismo institucional e naturalizado no Brasil. Em longo prazo, ela acredita que o racismo diminuirá na sociedade e que, desde a infância, negros e negras serão construídos com conhecimento e orgulho de suas origens.

Sistema prisional, agora educacional

Parcerias investem no ensino a detentos no Brasil Taimara Paschoaletti

Direito universal e indispensável para a cidadania, a educação no sistema carcerário brasileiro começou a ser repensada. Desde o ano passado o Brasil ampliou a garantia desse direito, passando a oferecer aos mais de 607 mil detentos também o Ensino Médio. O país, que hoje tem 53% dessa população com Ensino Fundamental incompleto e quase 6% analfabeta*, não tem um sistema educativo unificado. Cada estado tem a sua própria política prisional (com iniciativas públicas, privadas e mistas) – o que gera certa inconsistência no auxílio prestado a nível nacional.

Mas apesar dessa carência, já foram dados alguns passos no processo de educação para a reintegração: no ano passado, 23 mil sentenciados cursaram o EJA e fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio para Pessoas Privadas de Liberdade. “Depois que eu conclui os estudos, fiz a prova, passei com uma boa nota e me tornei monitor no cárcere, ministrando aulas para as turmas de 8º e 9º ano”, conta o egresso Carlos Nogueira Andrade, que além de estudante também foi professor dos cursos da Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel.

No estado de São Paulo, os programas educativos acontecem por meio de uma parceria entre a Secretaria da Educação e a FUNAP – que atua nas unidades de regime fechado e semiaberto com projetos de formação social e qualificação profissional. Só em 2015 foram prestados pela fundação mais de 100 mil atendimentos, que vão do apoio no ensino formal ao desenvolvimento de projetos de capacitação, atividades culturais (teatro, música, dança, artes plásticas), clubes de leitura e conscientização ambiental.

Diagramação e Revisão da página: Marcos Pacanaro, Taís Cruz, Victória Durães, Taimara Paschoaletti, Ingrid Pap

“Precisamos ampliar isso, criar outras oportunidades e rever o modelo de encarceramento de massa. Só assim vamos garantir que essas pessoas, a partir do momento em que são privadas de liberdade, possam repensar seus caminhos... E precisamos ver isso como um direito, não um privilégio do preso” – destaca José Antônio Leme, Superintendente de Educação da FUNAP. * Dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias de 2014

FUNAP

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especial

INTOLERÂNCIA

Quem?

Nunca antes na história desse mundo ouvir alguém se tornou uma tarefa tão complicada Christh Lopes Um jogo de palavras reflete a sua sombra, que não vinham o que se encontra nas rodas de a público. conversa, nas mesas de bares e Como, por exemplo, a proem exibição nas telinhas de um pagação do ódio. “As pessoas aparelho conectado à internet. se esquecem de avaliar o peso Um palavrão para cá, um termo daquilo que afirmam como verculto para lá. E no fim, amigos dades absolutas. O problema está param de se falar por terem opi- em acusar, ofender, considerar o niões distintas. outro inferior por ter uma opinião A intolerância é um tipo de diferente da sua. Diálogos e discomportamento em forma de cussões fundamentadas são semrepulsa a algo que vai contra o pre bem-vindas, isso é praticar a que se acredita, seja na política, tolerância”, comenta Anailza. na religião ou na cultura. Pode Segundo o dicionário, o ser aparecer como ofensa, aversão tolerante é aquele que suporta ou até mesmo levar as vias de pacientemente algo ainda que fato. E não está ligado ao grau contra a própria vontade. Quade conhecimento. lidade de reconhecer a diversiO resultado da repugnância dade que há na sociedade. Mas, ao que vem de fora pode ser um ela também pode implicar um sinal de que o problema real está sentimento negativo de certa redentro. É o que afirma a jorna- pulsa: a negligência. lista especializada, em direitos Mas como identificar o mohumanos, Ivy Farias. “A gente mento para ser tolerante ou omistem que parar de conjugar na so? Autora de um manual sobre primeira pessoa e entender que política, a jornalista Miriam Monão sou eu ou você, somos nós. raes destaca a linha tênue entre É na terceira do plural que te- ambos. “A suposta tolerância tirou mos que conjugar”, declara Ivy. a máscara e se revelou omissão. Ao se deparar com o aflorar E a consequência da omissão é de ânimos na sociedade, a his- alimentarmos um monstro que sotoriadora Anailza Guimarães mos hoje incapazes de combater”, Costa não perdeu tempo e foi afirma Miriam. entender o que acontecia. Ela A tendência tem sido não faz parte do Grupo de Estudos debater para evitar inimizades. do Tempo Presente (Getempo) “Sem espaço para confronto e escreveu um artigo sobre a in- das ideias, o confronto físico cidência do tema. torna-se inevitável. Se antes Segundo Anailza, é uma discutiam a pertinência da livre era um tanto contraditória. expressão do ‘não saber’, hoje Ao mesmo tempo em que se se discute o risco de uma guerra conquistaram direitos so- civil”, declara Miriam. ciais, e se difundiu o ideal A reportagem do Expressão de democracia, as pessoas foi conferir as diversas formas começam a revelar certas ca- de intolerância que existem nos racterísticas que mantinham dias atuais. Christh Lopes

Somos todos iguais? Wellington Soares Playboy na edição 433 em junho de 2011. A cada hora, um homossexual é agredido no Brasil, segundo a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Mais um dado alarmante com relação à intolerância que a comunidade LGBTT sofre. A Constituição Federal não cita a homofobia,

Psicofobia:a discriminação aos doentes mentais

Pacientes com transtornos psíquicos não expõem a sua condição para não sofrerem preconceito ou serem demitidos Eduardo Nemer O termo psicofobia refere-se à discriminação aos indivíduos que possuem deficiências mentais e comportamentais, sendo elas a esquizofrenia, depressão, dislexia, ansiedade e entre outras doenças. A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), criadora da campanha do combate à psicofobia desde 2011, luta pela criminalização do ato no Brasil. Ivy Marie Gimenes Dante, psicanalista e gestora em uma empresa de comércio exterior, explica que a terapia dá todo o apoio necessário para o paciente, e que a psicofobia precisa ser ainda muito mais divulgada para acabar com o tabu de que esse preconceito não existe.

Expressão: A intolerância contra os portadores de doenças mentais está mascarada? Ivy Marie: Os pacientes, dependendo da gravidade daquilo que possuem, tendem a esconder a sua real condição, seja por medo de ser demitido do seu trabalho, seja por receio em procurar ajuda de um profissional, com temor do diagnóstico e do preconceito que podem sofrer futuramente. Expressão: Como a psicanálise se posiciona diante da psicofobia? Ivy Marie: A psicanálise, posso dizer, acende a “luz da caverna” para o paciente encontrar o caminho e livrar-se do preconceito que o cerca, desenvolvendo a coragem e a descoberta da origem do transtorno.

O problema é quando a pessoa terceiriza suas dificuldades e não assume a sua parcela de vontade para enfrentá-las. Expressão: No papel de gestora da empresa em que desenvolve sua função, como você identifica e contém os casos de psicofobia? Ivy Marie: Eu percebo quando o colaborador falta muito ou se isola das outras pessoas. Deste modo, o chamo para conversar e para descobrir como a empresa pode ajudá-lo. A maioria do pessoal sabe que sou psicanalista, então eles acabam se sentindo acolhidos para falar. Dessa maneira, consigo indicar tratamentos e evitar qualquer ato de preconceito no ambiente de trabalho.

Eduardo Nemer

Escutar... ouvir...

“Seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí.”A frase homofóbica foi dita pelo Deputado Federal Jair Bolsonaro, filiado ao partido PSC-RJ, em entrevista sobre homossexualidade à revista

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Ivy Marie, psicanalista

Conectados com o ódio Território sombrio

As redes sociais se transformam no espaço privilegiado da intrasigência

Eu superior

Leomar Duarte

Longe de casa

Raízes profundas Oprimindo a dignidade

apesar de estar incluso no art. 3°, IV no item que a frase diz: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. “Pra falar sobre intolerância, basta recorremos aos filósofos políticos, como John Locke. Temos que respeitar a dignidade, a liberdade e a vontade do outro. Nós temos que aceitar as diferentes manifestações da liberdade e elas dizem respeito a minha opção sexual ou ao meu gosto político. E é por aí que deve ser tratada a questão da tolerância, pelo viés da filosofia política, que esta por traz do estado moderno”, Rogério Baptistini, professor e doutor em direito. O Brasil também é hoje o país mais que mais mata travestis e transexuais no plane-

ta. Pelo menos é o que aponta o site da ONG internacional Transgender Europe (TGEU). Em 2016, apenas em 19 dias, foram mortas cerca de 50 mulheres transexuais e travestis, segundo o blog Blogueiras Feministas. Números que nos dão esse negativo primeiro lugar. “Tudo isso esta em base da educação, aprender a respeitar o próximo, a conviver com as diferenças, acho que todo mundo tem o direito de ser quem é.”, desabafa Melissa Hudson, agredida em fevereiro no centro de São Paulo, por ser uma mulher transexual. A intolerância, por vezes, está mais perto do que imaginamos, pode estar entre uma piada entre amigos, no distanciamento de alguém do gênero diferente ao seu ou mesmo dentro da família.

Wellington Soares

Casal homoafetivo enfrenta dificuldades no dia a dia

Radicalismo político compromete a democracia brasileira O cientista político Aldo Fornazieri afirma que o discurso de ódio está presente na cultura desde a Era Vargas e ganhou força novamente após campanha eleitoral de 2014

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Nacional, houve práticas de intolerância política. A intolerância política mais efetiva e evidente ocorreu no regime militar, quando houve violência física politicamente orientada contra os opositores do regime.” Durante a década de 30, o governo de Getúlio Vargas, inspirado no autoritarismo de Franco, na Espanha, e Mussolini, na Itália, utilizou do discurso de intolerância contra os comunistas da época. A mesma retórica foi utilizada durante a ditadura militar brasileira, entre os anos

Felipe Mascari Felipe Mascari

Atualmente, a política brasileira é uma das principais pautas de debate da sociedade. Desde as eleições de 2014, os discursos da direita e esquerda inflaram e tornaram-se parte do atual ativismo político. Entretanto, em meio às discussões, a diversidade ideológica sofre com a intolerância. O cientista político Aldo Fornazieri, explica que o discurso de ódio é algo histórico no Brasil. “Na era do Varguismo, nós tivemos altos graus de intolerância. Porém, a partir da ascensão da União Democrática

Manifestações contra impechament de Dilma Rousseff

de 1964 e 1985, que, segundo a Comissão Nacional da Verdade, resultou em mais de 400 mortos e desparecidos políticos. Fornazieri explica que esse discurso de ódio ganhou voz novamente por causa das campanhas eleitorais de 2014, o que influenciou no comportamento social. “Houve excesso dos dois lados, tanto do governo, quanto da oposição. Porém, a partir de 2015, nós tivemos uma acentuada militância política intolerante por parte dos grupos extremistas que emergiram.”

Diagramação e Revisão da página: Eduardo Nemer, Wellington Soares, Christh Lopes, Felipe Mascari, LeomarDuarte

O mestre em Comunicação Social e professor da Universidade São Judas, Moisés Barel, afirma que a intolerância é baseada na falta de conhecimento. “A pessoa tem esse discurso negativo por causa de uma total ignorância, pois agir através do ódio é sinal de carência de intelectualidade.” O cientista político afirma que a principal arma para enfrentar o radicalismo é o pluralismo no debate e evitar que tal ativismo “gere mais especialistas em sua própria opinião”.


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INTOLERÂNCIA

Dinheiro x Dignidade

especial

De onde vem a diferenciação de classes e como isso afeta diretamente a sociedade Desde que o mundo é mundo, a desigualdade social está atrelada à relação de poder. Para se estabelecer a diferenciação, os aspectos mais relevantes eram físicos e sociais. Com a consolidação do sistema capitalista que tem por característica o acumulo de capital, a sociedade foi dividida em classes sociais: a burguesia e o proletariado. O Mestre em Educação pela, Sociólogo e Professor de Sociologia, Carlos Fernando Almeida, acredita que essa divisão gera um povo com autoestima baixa e mais vulnerável a ser dominado pelas elites capitalistas, o que contribui com a existência da luta de classes. “Há os que se rebelam e bus-

Alline Carvalho cam espaços políticos para defender necessidade de maior igualdade de classe. Há também aqueles que se acomodam com a situação e se esforçam para manter o consumo”, afirma o professor. Segundo pesquisa divulgada pela organização não-governamental britânica, Oxfam, 1% da população detém metade da riqueza de todo o planeta, o que ilustra bem o nível de diferenciação que há entre as classes. Esse extremo tem a violência como um dos desdobramentos desse processo. “Vejo que o Brasil possui um grande número de jovens envolvidos com tráfico de drogas, roubos, assassinatos e outros crimes, muitas vezes em

Alline Carvalho

busca do tal status, de poder consumir na sociedade capitalista”, diz Carlos Fernando. Mas a intolerância de classes é somente contra os pobres? Para o representante do Coletivo Anarquista de Luta de Classe – CAB, Mateus de Moraes, não. Ele acredita que a organização e a mobilização política de uma categoria de trabalhadores/as por um reajuste salarial seria intolerância contra o patrão. “Isso toca diretamente no que constitui o Ser Patrão, a mais-valia que é de onde se origina, ameaça seus planos de investimento, de expansão de sua fábrica/loja etc. E, portanto, o que temos nesse caso, é um choque de interesses”, diz o militante.

Família moradora de rua torna-se atração de manifestantes em protesto

Intrigante e fatal

Ângulo perfeito

O poder da misoginia O preconceito contra mulheres em uma sociedade feita para homens Tainá Carvalho

Cúmplices online

Na mesa, famintos

Ainda humanos, porém tolerantes

Segundo o Ipea, a cada uma hora e meia, uma mulher é vítima de violência masculina, e entre os anos de 2009 e 2011, cerca de 17 mil mulheres sofreram agressão, só por serem do sexo feminino. Os dados são enormes, e só não são maiores porque algumas vítimas não denunciam os seus agressores, que na maioria das vezes são seus parceiros. A morte também é alarmante. Entre 1980 e 2010, quase 92 mil mulheres foram assassinadas e, somente na última década, foram 43,5 mil. Mas por que esses atos acontecem? A professora e Historiadora, Vanessa Bortulucce explica: “Creio que reflete uma visão social ainda fortemente marcada pela figura central do homem. Trata-se de um percurso extenso, que atribui ao feminino determinados valores morais, comportamentais e intelectuais tidos como inferiores. Criou-se uma espécie de polaridade entre os valores estimados pela sociedade. Neste sentido, por exemplo, a figura da mulher sempre está associada ao sub-

jetivo, ao emocional, distante da força masculina. Embora os debates atuais estejam desconstruindo esta questão, o senso comum legitima e perpetua estas visões”. Alguns movimentos a favor do “empoderamento” feminino surgiram nos últimos anos, a maioria com o intuito de mostrar o valor dessa existência na sociedade. Mas esse movimento ainda é minoritária, e pode vítima de discursos de ódio. “No discurso social se diz que ambos os sexos são iguais, que possuem as mesmas oportunidades, mas os padrões estabelecidos por ela foram feitos para homens, e quando a mulher não se encaixa leva a culpa. Com essa ideia de liberdade, a violência fica escondida e só ganha visibilidade quando a mulher sofre violência física, mas também é violência quando a mulher ganha menos que o homem, ou tenha que se masculinizar para ser aceita em uma empresa. E isso é pior, pois são questões cotidianas”, completa o sociólogo Marcos Horácio Gomes Dias.

Desconfiança, temor, antipatia

Conheça o que pode originar o pensamento xenofóbico Kaique Santos

Os incomodados com a fé alheia O medo nas arquibancadas Problemas podem ser causados pelo fanatismo religioso

Diego Cruz Sob ameaças, os habitan- Social da Universidade de São tes do vilarejo de Bamiyan, no Paulo, obrigar os indivíduos Afeganistão, foram obrigados a seguirem uma outra religião a escalar grandes estruturas de também é uma dessas facetas. rocha, recheá-las de dinamites “Onde há uma conversão obrie detoná-las. Pode não pare- gatória a uma religião, há incer, mas este breve relato é um tolerância religiosa. Há a ideia exemplo histórico e recente de de que o outro professa uma fé intolerância religiosa. Em mar- que é errada, e o dominador se ço de 2001, o grupo fundamen- coloca na obrigação de convertalista islâmico Taleban organi- ter esse outro para a sua fé, que zou a destruição dos chamados é tida como certa”, completa o “Budas de Bamiyan”. Eram professor. duas estátuas que foram consJá a advogada Daniela Nastruídas no século V e declaradas cimento, a intolerância religiosa Patrimônio Mundial da UNES- em si não tem nenhuma conseCO. O motivo? O islã proíbe a quência jurídica. Porém, algo idolatria de imagens. ilícito que pode ser cometido Mas esse tipo de agressão em virtude de intolerância, sim. possui diversas facetas, como “Não somente a prática, mas perseguição a grupos ou indiví- também a indução ou incitação duos, proibição de cultos, des- de qualquer discriminação por respeito a símbolos religiosos motivos religiosos enquadra-se ou até mesmo a ameaça à inte- na lei, e é tida como crime. Por gridade moral e física de pesso- isso, destruir, difamar ou qualas que praticam algum rito, por quer forma ao desrespeito de exemplo. Segundo o antropó- símbolos religiosos, ou incitar logo Vagner Gonçalves da Sil- alguém a fazê-lo, é ilícito e pasva, professor e pesquisador do sível de penalização nas formas Departamento de Antropologia da lei”, diz a advogada.

Racismo ainda é pauta diária Yuri Cavichioli

De geração em geração, o conceito que a pessoa já vem com uma pré-definição para fazer ou ser algo por conta de sua etnia é transmitido. Por exemplo, uma pessoa de origem oriental por definição deve ter facilidade com matérias de exatas, enquanto pessoas negras tem de estar presentes muito mais em servi-

Preconceito e violência afastam o bom torcedor dos estádios

Gabriel Oliveira Clássico no final de sema- jogador negro”, afirma Renan na, expectativa de casa cheia Prates, editor de comunidades para um dos mais tradicionais do portal torcedores.com. encontros entre equipes do fuAtualmente, a violência tebol. Uma rivalidade construí- nos estádios não se resume da durante décadas de confron- apenas ao Brasil. Em divertos históricos que ajudaram a sos países do continente euroconstruir a história desse espor- peu, como Turquia e Escócia, te. Na arquibancada, estão mi- o combate entre torcedores lhares de pessoas, espalhadas organizados atingem granpelos quatro cantos do estádio, des proporções, e causam um cada uma delas vestida com a grande número de vítimas. Um camisa do seu time do coração, dos exemplos são os extintos cantando e gritando frases de Hooligans, da Inglaterra. apoio aos seus jogadores e, ao Caso parecido acontece mesmo tempo, de ódio e pre- com os nossos vizinhos argenconceito ao seu adversário. tinos, onde os chamados “Bar“Acredito que a intole- ra-bravas” são os principais rância no futebol versa prin- causadores de brigas e os rescipalmente sobre dois temas: ponsáveis pela intolerância que homossexualismo e raça. Infe- ocorre nos estádios do país. “A lizmente, o público consumi- violência desses grupos nos imdor de futebol, principalmente pede de acompanhar as equipes o que frequenta os estádios, de perto. Quando acontecem ainda manifesta comportamen- clássicos aqui na cidade (Rosátos um tanto quanto primitivos, rio), a opção mais segura é ficar como chamar um goleiro de em casa”, conta Eric Curdumi, bicha ou jogar banana em um modelo e torcedor argentino. ços braçais como domésticas, seguranças ou pedreiros. E como poderíamos pensar em acabar com essa intolerância? O professor José Luís Landeira pensa o seguinte em relação ao assunto: "acredito em um projeto amplo de educação centrado principalmente na educação não formal: televisão,

igreja, concursos literários etc. E a escola, mas com cautela, que escola não pode ser campo de experiências. Alunos não são ratinhos de laboratório." A intolerância racial está presente em diversos lugares, muitas vezes mascarada, em forma de piada, com olhares maliciosos, com pessoas tentando fazer o mo-

A “desconfiança, temor ou antipatia por pessoas estranhas ou pelo que é incomum”, xenofobia, segundo o dicionário Michaelis, não é uma mera situação gerada pelas diferenças humanas, é um problema sério e um dos principais motivos de um dos piores conflitos do planeta: a Segunda Guerra Mundial. Mas afinal, qual é o real motivo por trás dessas atitudes? Da ideia de que o “outro” é um inimigo? Do popular medo de perder seu emprego? O temor de que sua cultura deixe de existir? O pavor de ver seu país infestado de estranhos? Da antipatia ao diferente? Da negação do novo?

“Não há um perfil único de quem é xenofóbico, mas podemos especular que é uma pessoa muita rígida consigo. Ele traz um medo muito grande daquilo que não conhece e não domina em si mesmo, estendendo essa intolerância aos outros”, diz a psicanalista do Núcleo Psicanalítico de Aracaju, Petruska Menezes. Muitos são os motivos que podem originar esse tipo de atitude, mas como explica Petruska, com certeza, o maior deles é o medo. “Um medo extremo de desamparo e abandono. O medo de não ser bom o suficiente e não ser amado. O medo de se perder na sensação de ser mais do que se sabe que é”. Kaique Santos

Hideki Tukahara, descendente de japonês

vimento perder força por medo da proporção que ele pode tomar. "Sou mais adepta da terminologia racismo. Pra mim, intolerância racial é uma maneira de esconder o real problema. Após quatro séculos de escravidão, vemos ainda uma elite majoritariamente branca e racista no congresso, que não quer perder seus privilé-

Diagramação e Revisão da página: Alline Carvalho, Yuri Cavichioli, Diego Cruz, Gabriel Oliveira, Kaique Santos, Tainá Carvalho Diagramação e Revisão da página:

gios e vão continuar perpetuando construções políticas fascistas e racistas, enquanto não tiver números consideráveis de negros, mulheres, quilombolas nos representando politicamente e criando políticas públicas que promovam nossa dignidade," diz a militante do Movimento Negro e Feminista, Maria Carolina Famezi.

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vida digital

ano 23 |no1 | maio/2016

Streaming do Twitter aumenta opção de transmissão ao vivo Forma de integração através de vídeos chega às lojas virtuais da Google e Apple Mayumi Kavazuro O aplicativo que permite a transmissão em tempo real de vídeos em seu smartphone: O Periscope é ferramenta única do Twitter, disponível para iOS, e também a versão mais recente para, Android. Este meio atrai cada dia um novo adepto, você transmite aquilo que quer - com muita velocidade - através da câmera do seu celular. Revolucionando os anteriores como o aplicativo Vine ou Snapchat, em que somente era disponível postar vídeos gravados, o Periscope abre mais o leque e traz a ideia do “ao vivo, e em cores”. Além do vídeo ser postado exatamente no momento da gravação, ele tem uma duração de mais ou menos 24 horas para poder ser visualizado pelos seguidores do usuário do app. “Essa possibilidade de compartilhamento daquilo que se vive, em tempo real, é o maior chamariz, estimula a criatividade e o usuário é capaz de criar novos conteúdos de interação, que recebe respostas instantâneas dos seguidores. É muita praticidade, eu uso sempre que vejo algo informativo, ou sobre minha rotina pessoal”, conta Cristina Carmona, usuária do aplicativo de vídeos. A ferramenta surgiu em 2013, quando Kayvon Beykpour esteve

Biochips chegam ao país para aprimorar a relação entre seres humanos e tecnologia Matheus Narcizo arquivo pessoal

Biochip implantável tem o tamanho de um grão de arroz e está disponível por noventa e nove dólares Não há saída! Seja pelos smartphones avançados ou geladeiras que fazem a lista de compras, todos nós, queiramos ou não, somos impactados pelo avanço da tecnologia nos últimos vinte anos. E para quem acha que o núcleo de descobertas do ser humano acabou, é simples: ainda há muito à sua espera. No Brasil, desde 2013, os biochips implantáveis através da tecnologia Near Field Comunication (NFC) – que permite troca de informações em curta distância entre equipamentos sem fio – são a prova de que o ser humano não para de se reinventar. E agora, sem surpreender a muitos, quer aprimorar suas próprias limitações através da experiência de ser como um robô. Já bastante utilizado nos Estados Unidos, o biochip NFC funciona basicamente como um pen-drive sem fio no qual é possível adicionar e compartilhar arquivos como cartões de visita, currículo online, além de realizar comandos pré-determinados – como abrir portas, pagar contas, etc.

Para o doutor em Engenharia Biomédica e professor de Ciências da Computação do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), João Carlos Fernandes, a explosão dos biochips, além de representar uma revolução na interação homem – robô, pode contribuir ao controle à privacidade, visto que dados importantes ficariam guardados dentro do corpo humano. “Na área de segurança já existem soluções para animais de estimação. Todas as vezes que passar por um local que tenha o leitor universal do chip, ele será identificado. Sendo assim, podemos ter um controle maior sobre as pessoas, principalmente a preocupação com a invasão de privacidade”. Apesar de esperançoso e empolgado com o futuro das experiências a partir do uso dos chips, o professor pontua a necessidade de mudanças para o boom do equipamento no Brasil. “Para funcionar como um sistema de controle, algumas modificações devem ocorrer. Dentre elas, a adaptação para captação do sinal pelos dispositivos NFC”.

E qual é a visão das cobaias? Um dos primeiros brasileiros a implantar o chip, o jornalista especializado em tecnologia, Ramon de Souza, descreveu extasiado a agora ainda mais intensa relação com os robôs: “Ser metade homem e metade máquina é um sonho que eu possuo desde criança”. Biohacker autoentitulado – humanos que aprimoram o corpo através da tecnologia – ele implantou o chip na mão esquerda, em 2014. Ao preço de cem dólares [cerca de R$ 400,00], agora utiliza o acessório para compartilhar dados básicos (telefones, e-mail, site) com “seres pareáveis”. “O biochip é revestido de material compatível para que possa ficar dentro do corpo humano sem rejeição”, diz Ramon, que foi acusado por religiosos de “mancomunar com a besta”. Ele, no entanto, só quer saber de curtir a fase Robocop. “No começo, houve preconceito. Eu enxergo o implante como uma simples tatuagem tecnológica. Foi a forma que encontrei de provar o meu amor pela tecnologia”.

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Lego e Warner Bros lançam jogo interativo e de peças colecionáveis

Companhia dinamarquesa expande ainda mais sua coleção de títulos para vídeo games e transforma experiência dos fãs Yury Ferrero Depois de reproduzir grandes sucessos da cultura geek como Marvel Super Heroes, Harry Potter, Star Wars e Indiana Jones, a empresa dos famosos montáveis inovou com seu roteiro para o novo jogo Lego Dimensions. No entanto, não é apenas sua trama que merece destaque, mas também a experiência proporcionada. O título contará com peças para montar os personagens jogáveis no console e com uma riqueza de detalhes enorme. Jon Burton, diretor de criação e design na TT Games, é o responsável pela ideia de unir desenhos e séries famosas à animação Uma Aventura Lego, lançada em 2014. Em síntese, cada uma das produções que compõe a história é afetada pelo caos provocado entre as dimensões que levam os protagonistas Batman, Gandalf e Mega Estilo a navegar entre os universos paralelos das histórias. Segundo Mark Warburton, produtor também da TT Games, em entrevista à Eurogamer, o título não ficará velho tão cedo. As notícias são acerca do conteúdo e atualizações do jogo que irão continuar acontecendo até 2018. Os lançamentos

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gradativos de miniaturas vão até o mês de maio. Clássicos como Os CaçaFantasmas, De Volta para o Futuro e Os Simpsons são alguns dos multiversos compartilhados nessa história. “Eu cresci assistindo desenhos como Scooby-Doo e brincando com Lego. Ver o anúncio do game na E3 foi muito empolgante”, disse Matheus Macedo, fã das séries e do jogo.

O título contará com peças para montar os personagens jogáveis no console e com uma riqueza de detalhes enorme. Aos amantes brasileiros, o maior problema é a disponibilidade. Lançado no dia 15 de novembro de 2015, nos Estados Unidos, o jogo era esperado pelos fãs, o que acabou não acontecendo. O motivo? A princípio, a impossibilidade de produzir aqui os brinquedos. Também foi descartada a importação, devido ao preço do dólar e à instabilidade econômica nacional, o que fez a Warner Brasil, distribuidora do produto, cancelar a versão nacional.

Os valores desta coleção devem ser altos. Com a importação sendo o único meio de compra, o pacote inicial contendo o CD, uma base com portal, os três protagonistas e uma miniatura do Batmóvel sairia, na melhor das hipóteses, por cerca de R$260,00, sem contar frete e impostos. Além disso, claro, ainda existem as caixas promocionais que variam de R$30,00 a R$82,00. Após tanta informação pesada aos bolsos e à emoção de quem havia se animado com a obra, entramos em contato com a distribuidora para saber das novidades. As notícias não são boas. Segundo Viviane da Silva, atendente da Warner Brasil, o jogo não tem estimativa para a data de lançamento em nosso país.

Acesse o site oficial de Lego Dimesions e tenha maiores informações sobre o game:

Diagramação e Revisão da página: Luana Felix, Matheus Narcizo, Mayumi Kavazuro, Rebeca do Vale e Yury Ferrero

por acaso em uma manifestação enquanto passava uns dias em Istambul, notou que um vídeo para informar seus seguidores do que ele estava vivendo naquele momento. Logo após chegar de viagem, colocou logo a ideia em prática, e foi um sucesso. “Todos esses modelos de interação são importantes, as tags do Twitter, por exemplo, são importantes para elencar e ranquear o que esta acontecendo na rede, e, com apenas um premir de um botão, elas funcionam como mecanismos de busca avançada, muito utilizada em SEO (Search Engine Optimization). É de extrema importância propagar de maneira eficaz e levantar opiniões acerca de assuntos, ou seja, informação ao ser transmitida rapidamente, permite maior desdobramento”, é o que aponta Nichollas Mafra, coordenador de mídia online. O programa, por enquanto, é gratuito, e ainda demonstra pequenas falhas em relação ao carregamento de informações, porém ele garante aos seus usuários que vai cumprir o seu papel de interação social, sem a limitação de 140 caracteres. Isso em um mundo que hoje se encontra inundado por meios visuais e instantâneos.


artes

ano 23 |no1 | maio/2016

Desconstruir gêneros e criar personagens

Felipe Flores

O movimento das drags começou nas décadas de 50 e 60, principalmente nos Estados Unidos

Da esquerda para a direita: Kiddo Wadahell, Seashell e Fiddo Candy se montam para o ensaio fotográfico “VIRA-LATA”, de Felipe Flores Arthur Avila

A

s sobrancelhas já estão escondidas com cola bastão e uma base líquida bem resistente. O rosto é coberto com paint stick (base) da cor da pele, de tons mais escuros e claros para dar mais profundidade, e o pó translúcido dá

um toque aveludado. As novas sobrancelhas, bem arqueadas e desenhadas a lápis de olho, dão dramaticidade ao olhar. O côncavo do olho é ampliado e cílios gigantescos são colados, deixando os olhos exorbitantes. Contornos acentuados, que vão

das têmporas até a bochecha e no nariz, afinam o rosto. As cores das sombras, do blush e do batom vão do gosto pessoal. “Ser drag é arte, pois, por trás da personagem, existe o trabalho artístico da transformação de homem para mulher (maquiagem, Reprodução

roupas, comportamento). É outra pessoa que você mesmo criou, montou e esculpiu! ”, diz Thiago Kazys, o cabeleireiro por trás da drag Samy Queen. “Tinha 16 anos na minha primeira vez. A transformação de menino para menina sem-

pre me fascinou, então conheci uma drag queen que já estava na noite há algum tempo e resolvi tentar. Eu uso várias técnicas de maquiagem artística e convencional, mas sempre dando um toque pessoal e um pouco mais excessivo. No cabelo, gosto sempre de ondas e volume, balançando sempre pra chamar atenção. Minhas roupas dependem do que eu quero passar no momento: existem dias que quero parecer mais mulher e outros que quero algo mais exagerado”, completa Thiago. As drags não tratam suas vestimentas como objetos da moda, elas usam como fantasia, para, além de causar impacto, ser o clímax de sua personagem. O colorido, o exagerado e o brilho são as principais características de sua indumentária, que junto com uma maquiagem carregada, compõem o visual performático e artístico. “Sempre tive influências drag da Pabllo (Vittar) e ele sempre me mostrava a série RuPaul’s Drag Race. Daí eu me apaixonei e queria tentar fazer também. Me montei pela primeira vez com 20 anos. Fazendo, eu me descobri. Hoje amo fazer drag”, diz Matheus Moura, também conhecido como Kiddo Whadahell. Kiddo, que apareceu no videoclipe da música “Open Bar”, da cantora Pabllo Vittar, também é DJ e disse que se baseia em looks que encontra na internet ou em alguma conta do Instagram. Para ela, ser drag, além de ser arte, é um leque de possibilidades.

As drags têm ganhado mais espaço no mercado e na mídia. O reality show americano, RuPaul’s Drag Race, está em sua 8ª edição e a versão brasileira, Academia de Drags, pode ser assistida no YouTube. É uma competição entre drags e, dentre elas, uma é escolhida como vencedora. No Brasil, as cantoras e performers, Pabllo Vittar, Gloria Groove e Lia Clarck são conhecidas por suas músicas vibrantes.

Felipe Flores

KIDDO

Café quente,

gelado ou

desenhado?

Baristas transformam o tradicional cafezinho em experiência gastronômica Tamiris Versannio

Luiz Laffey tem mais de 15 anos de experiência em dublagem e em seu tempo livre aproveita ao máximo sua vida

A arte de dublar

Como é o cotidiano dos profissionais que dão vida à personagens através de suas vozes Lucas Vinicius de Souza

Meteoro de Pégasus!!!”, “Saori!!!!”, “Revolução Estelar!!!”. Você, caro leitor certamente já ouviu essas frases em algum famoso desenho por aí. Quem acompanhou a série “Os Cavaleiros do Zodíaco” logo vai se identificar e reconhecer estes bordões que marcaram a história de muitos jovens desde a década de 80. Os dubladores são os profissionais responsáveis por dar a vida aos personagens da ficção. Por meio de suas vozes eles representam e caracterizam perfis. Consequentemente suas vozes em determinados momentos se tornam até mais importante que seus donos. Responsável por vozes marcantes da animação, Hermes Barolli definitivamente entregou sua vida ao mundo da dublagem.

Filho dos também dubladores Gilberto Baroli e Zodja Pereira, irmão dos dubladores Letícia Quinto e Luciana Barolli. Ele seguiu a carreira dos pais com dedicação. Participou de diversas montagens e também teve uma participação especial nas telenovelas Kubanacan e Ciranda de Pedra, ambas da TV Globo. Apesar de passar grande parte de seu dia dentro de um estúdio, Hermes não deixa de curtir bons momentos com amigos e sempre que pode está reunido com as pessoas que mais gosta. “Amo dublar, não sei o que faria sem esta vida e acredito que todo profissional desta área seja assim, mas em meu tempo livre, amo estar com minha família e aproveitar a vida com aqueles mais próximos a mim”, diz o dublador.

Ator com mais de 15 anos de experiência em TV, Luiz Laffey tem inúmeros trabalhos em seu currículo além de diversas outras habilidades. Ele já fez novelas, comerciais de TV e longas-metragens. Também é, locutor e apresentador com mais de 25 anos de experiência nas maiores emissoras de rádio no Brasil . Fora dos estúdios, Luiz é um homem alegre e extremamente ativo procurando aproveitar ao máximo sua vida. “O que eu faço quando não estamos gravando? Eu vivo. Faço minhas compras, vou ao teatro, ao cinema . De vez em quando, eu ensaio também para espetáculos além de ir a barzinhos e viajar quando temos condições. Nossa vida fora do estúdio é assim. Intensa”, finalizou o artista.

Enquanto buzinas e carros agitam a Av. Paulista, a paz reinava no Urbe Café, numa esquina da Rua Augusta. No espaço à meia luz, ou somente luz natural, as baristas Janaína Barbosa e Andreia Kaymi cedem essa entrevista sem parar de trabalhar um só instante. Quem responde as primeiras perguntas, meio ao escaldo de pequenos filtros de café, é Andreia “acho que o barismo me escolheu. Comecei a trabalhar aqui e me encantei, fui fazer um curso e hoje é minha profissão”. Barista é a pessoa que é especialista em café, que entende a seletividade no plantio, as melhores e variadas técnicas de moagem, além claro do desenvolvimento de inúmeras receitas e modos de servir a segunda bebida mais consumida no Brasil, perdendo só para água!

Quando Janaína ficou parada por cinco minutos foi possível assimilar o motivo do barismo ser considerado por muitos uma arte. Nesses minutos, a tímida profissional prepara o que parece ser um sorvete e conta que a base de quase tudo no barismo é ou tem café como base. A harmonia se dá com a mistura de outros elementos, lascas de chocolate são exemplo disso. Ela adorna o drink, enquanto ela limpa as bordas do copo e oferece: “quer tirar uma foto?”, sorri e faço o clique. Estigmas de gênero, segundo Andréia, nunca foram um problema na profissão: “o café é muito democrático, se você gosta e estuda tem lugar para todo mundo”. Pergunto se, assim como o modismo vindo para São Paulo no começo dos anos 2000 da degustação de vinhos, a degustação e até a procura por cafés

especiais é passageira. Andréia é enfática: “não, o público que procura por um bom café se torna fiel porque é uma bebida nobre, o sabor conquista o paladar até de quem nunca provou grãos especiais. Além disso, o café combina com cidades como São Paulo, quem nunca para precisa de um cafezinho”. O Urbe Café entende isso e aplica, além de estar na região central da cidade tem um diferencial: funciona durante a madrugada. Sabe aquele velho clichê de escritores que no meio da madrugada precisam refrescar as ideias e vão para uma cafeteria? Pois é, ali isso acontece. Estudantes, pessoas que acabaram seu exercício matinal, com ou sem seus companheiros de quatro patas, encontram na cafeteria um espaço aconchegante como o café e original como as baristas que lá fazem sua arte. Tamiris Versannio

O poder das batidas que comandam os bailes Toda a realidade por trás das batidas que fervem nos fluxos Mauro Camargo Funk. Uma palavra, dois significados musicais e milhares de opiniões, tanto positivas quanto negativas, a respeito. Fora do Brasil, este gênero musical, com bases na soul music é muito respeitado e tem uma história inquestionável de sucesso, com referências como James Brown e Kool & The Gang. Aqui, ele é dividido em duas vertentes: funk realidade, com letras mais leves, e ostentação ou “proibidão”, mais pesado. Os dois estilos dividem o público, que precisa escolher entre escutar letras que denunciem problemas sociais, como o racismo e a violência policial, ou cantar outras que exaltem drogas, sexo e dinheiro. “Existe funk protesto e funk curtição. Cada um escuta o que quiser, mas é errado

odiar um estilo tão abrangente por causa de alguma música dele que fale de drogas e sexo”, afirma Mayara Bonfim, jornalista e entusiasta de funk. Em São Paulo, o funk realidade é mais popular. Cantores como MC Garden abordam temas polêmicos, como o atual governo brasileiro, e apresentam estes conceitos para todos os brasileiros, inclusive crianças de 12 anos, que estão acostumadas a escutar letras quem falem sobre bundas e notas de cem. Já no Rio de Janeiro, o cenário é o inverso: o que reina é a ostentação, com músicas que exaltem garotos que eram pobres e tornaram-se ricos rapidamente com o funk, e por isso mereçam exibir suas conquistas. Essa vertente conta com letras carregadas

Diagramação e Revisão da página:

de palavrões, visto que falam puramente de dinheiro, sexo, drogas e criminalidade. Hoje, é comum que um artista ou grupo de sertanejo, por exemplo, faça uma parceria com um MC e produza uma mistura dos dois ritmos. Isso nunca agrada cem por cento dos fãs. “O funk tornou-se um ritmo indispensável numa boa festa. Por mais que tenha gente que ache vulgar, as batidas dele são extremamente dançantes. Também é muito fácil ‘mixar’ um Funk com uma música eletrônica ou sertaneja e criar algo irreverente”, conta Tulio Araujo, DJ e produtor musical. O gênero satisfaz tanto quem busca algo mais leve, quanto quem prefere uma batida ousada.

Ambiente no Urbe Café com vitrine para algumas das especialidades doces e salgadasque são servidas Tamiris Versannio

Capuccino Urbe, Mocha Café e Coffe Shake são algumas das bebidas servidas com o requinte das baristas

Arthur Ávila, Denize Morais, Lucas Machuca, Lucas Souza, Mauro Camargo, Tamiris Versanio

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esporte & lazer

ano 23 |no1 | maio/2016

São Paulo sob duas r Arquivo pessoal do entrevistado

das

Grupo se reúne mensalmente para visitar museus e prédios antigos da cidade Lucas Galdino

Ciclistas concentrados na Catedral da Sé, em São Paulo, durante trajeto do Projeto Selim Cultural

Milena Perilhão

77%

da prática das atividades que você propõe? Andrezza - Os pais bem pouco, porque meu maior contato com eles é em dias de festinhas na escola ou quando realizamos alguma atividade extra. Mas os professores da sala afirmam que a criança fica mais independente, confiante, participativa, ajuda mais os colegas de sala e até desenvolvem as habilidades cognitivas com mais facilidade. Expressão – Qual sua relação com os alunos? Andrezza - A relação que tenho com meus alunos é bem dinâmica. Eu brinco e desenvolvo as atividades junto com eles, e este contato eles não têm com professores de sala de aula. Ana Carolina Basile

8

Professora Andrezza faz brincadeira cantada com seus alunos

Fonte: Pesquisa Colab e Catraca Livre

Expressão - Os pais ou outros professores costumam te passar um feedback sobre as mudanças dos alunos a partir

da Paulista

Andrezza - Eu trabalho com jogos simbólicos, brincadeiras cantadas, jogos cooperativos, jogos de regras e de habilidades motoras.

a tur

Expressão - Quais atividades você realiza para estimular essas aptidões?

Andrezza - Através dos jogos de cooperação, porque eles buscam uma maior socialização do grupo. E noto a interação quando eu aplico jogos simbólicos, nos quais elas brincam do faz de conta e criam inúmeras situações através da imaginação de cada uma.

aprovam

os são favoráve n a is à st i l u a Pa

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Professora de educação física desde 2006, Andrezza Simoní leciona a matéria para crianças de 4 a 5 anos. Ela chega cedo à escola UME Estado do Acre, onde trabalha, em Cubatão, para preparar suas aulas. Andrezza direciona o conteúdo que aplica ao desenvolvimento psicossocial dos alunos. Além disso, procura propor atividades que envolvam músicas, danças e saltos, auxiliando também a parte cognitiva e a motricidade, através do lúdico e de materiais como cordas e bambolês. Ela falou à reportagem do “Expressão” sobre a relevância da educação física para essa faixa etária e como ensina às crianças que a disciplina vai muito além de aprender práticas esportivas como futebol, vôlei, handebol ou basquete.

Andrezza Simoní - Uma aula de educação física direcionada ao conteúdo programado pela professora de sala junto da educadora física só ajuda a criança a ter melhores resultados dentro da sala de aula, assim como lateralidade, tomada de decisões, liderança, cooperação, consciência corporal entre outros.

ca Mário de Andrade, a Estação Pinacoteca, o Centro Cultural da Caixa, a Casa da Imagem e o Solar da Marquesa de Santos. Os trajetos são sempre guiados por colaboradores do projeto, chamados de “bikers culturais”. Além de Ricardo, a doutoranda em História, Deborah Neves, já participou do projeto como guia em outra edição, abordando o tema “São Paulo: de Vila de Comércio à Belle Époque (1870-1930)”. Presente neste dia, o comerciante Vagner Cereda se impressionou com a história dos locais visitados. “Todos os pontos que visitamos são maravilhosos, cada um com sua história. Mas o que mais me chamou a atenção foi a imponência do Theatro Municipal”, conta. Para 2016, o projeto pretende ter dois passeios mensais, mas, ainda não foram divulgadas as datas. Para participar, os interessados devem ficar atentos à página oficial do Selim Cultural no Facebook. As inscrições para os passeios, bem como as datas e os roteiros, são divulgadas por lá.

Ruas abertas aos finais de semana são nova forma de democratização da cidade

Ana Carolina Basile

Expressão - Além do aumento da capacidade motora, a educação física pode promover, especificamente, benefícios sociais e de relacionamento. Como você alcança estes benefícios? E em quais situações percebe que as crianças interagem mais umas com as outras?

pelo tema abordado no passeio. “Uma experiência enriquecedora, o museu [do futebol] é um lugar que todos devem conhecer”, comenta. A ideia de juntar duas atividades distintas em um projeto surgiu na viagem de Aline a Bogotá, em 2013, quando ela participou de um passeio guiado pela capital colombiana em cima de uma bike. O percurso contou com paradas para visitar espaços culturais, arenas de tourada, cafeterias, praças e parques, isso a fez imaginar o efeito de levar os paulistanos para perto das belezas da “selva de pedra brasileira”. “Imaginar estas duas áreas, esporte e cultura, unidas, levando aprendizado e valorização da cultura local às pessoas, e de quebra ocupar as ruas com bicicletas, me fez ter a sensação de ter descoberto meu caminho no mundo”, comenta. Contabilizando mais de 50 integrantes durante as quatro edições, o Selim Cultural já rodou bairros como: Luz, Bom Retiro, Campos Elíseos, República e Sé; além de adentrar outros espaços, como o Centro Cultural São Paulo, a Bibliote-

Saem os carros, entram as pessoas

Além das quatro linhas

Expressão - Qual a importância da educação física para o desenvolvimento escolar das crianças?

Unir a prática do ciclismo nos passeios culturais pode até não ser convencional, mas é algo que acontece em São Paulo pelo projeto Selim Cultural, criado por Aline Riera. Gratuito, o programa reúne grupos de até 20 pessoas para irem a museus, a parques e a feiras pedalando. A finalidade do projeto é incentivar a população paulistana a vivenciar a cidade em cima das magrelas. A reportagem do Expressão acompanhou o passeio realizado no dia 20 de março. Os ciclistas conheceram mais sobre a história do esporte por meio da aula sobre rodas de Ricardo Machado, que abordou o tema “Futebol em São Paulo: pedalando pelas histórias de uma paixão”. O trajeto durou cerca de duas horas e passou por pontos que remetem a momentos peculiares do esporte, com o Museu do Futebol, localizado no Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho, popularmente conhecido como Estádio do Pacaembu. Machado, o guia da quarta edição, saiu extasiado da experiência por ter sido o condutor e

33% reprovam

Desvia de um skatista. Sorri com a criança que começa aprender a andar de bicicleta. Agrada o cachorro que passeia com seu dono. Nossa, carrinhos de rolimã ainda existem? E não, você não está no Parque do Ibirapuera. Pelo contrário. É aquilo que se observa, ao som dos carros que passam no sentido oposto, na Avenida Sumaré, na Zona Oeste, em seu trecho fechado para pedestres e ciclistas. Este é só um dos, agora, muitos exemplos de lazer visíveis por toda a capital graças ao Programa Rua Aberta, em vigor desde outubro do ano passado, que abre para uso da população vias de grande expressão, aos domingos e feriados. A recente iniciativa da Prefeitura que começou (e polemizou) na Avenida Paulista, hoje já tem, pelo menos, um endereço em cada grande bairro paulistano, sob a responsabilidade das subprefeituras. E tudo com acompanhamento e Zona oeste Avenida Sumaré Zona norte Avenida Luiz Dumont Villares

opinião dos cidadãos de cada uma dessas regiões, sendo eles os mais beneficiados. A ideia é estimular a tomada do espaço público para a realização de atividades que visem o entretenimento, a prática de esportes, a cultura e a uma interação maior entre as pessoas. Sem concentração: ambientes disponíveis seja qual for a localização, do centro à periferia. “A nossa geração ainda teve a oportunidade de brincar na rua, coisa que a deles por uma série de fatores, não tem. Além da liberdade, nós também incentivamos que eles cresçam com uma mentalidade mais ativa”, diz Fernando Gonçalves Dias, contador, acompanhado dos filhos e da esposa. Também na Zona Oeste, são contempladas pelo projeto as ruas Major Walter Carlson e Medeiros de Albuquerque. Na Zona Norte: as avenidas Koshun Takara, José da Natividade Saldanha, Antonio Cesar Neto, Piero Trica e Luiz Du-

Perto de você

Diagramação e Revisão da página: Ana Carolina Basile, Caroline Beraldo, Débora Britto, Lucas Galdino, Milena Perilhão e Monise Cardoso

mont Villares; e as ruas Salvador Albano, Professor Onésimo Silveira e Curuçá. Na Zona Leste são atendidas: as avenidas dos Metalúrgicos, Professor Antonio de Castro Lopes, Barão de Alagoas, Miguel Ignácio Curi, Antônio Estêvão de Carvalho e Arquiteto Vilanova Artigas; além das ruas Benedito Galvão, Salvador Gianetti, Abel Ferreira, Nebulosa e Luiz Pereira da Silva. E na Zona Sul: as avenidas Carlos Caldeira Filho, Santa Catarina, Luiz Gushiken e Engenheiro Luís Gomes Cardim Sangirardi; e as ruas Aida, Terezinha do Prado Oliveira e José Pedro de Borba. Apesar das opiniões controversas, a adesão pelo Programa é cada vez maior. “Sei que ainda tem muita gente que não aprova, mas é uma questão de abrir mão do conforto individual pelo coletivo. Podemos uma relação totalmente nova com essa São Paulo que conhecemos de tantas outras maneiras”, afirma Renata Brandão, advogada. Zona Leste Avenida dos Metalúrgicos Zona suL Avenida Carlos Caldeira Filho


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