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ACADEMIA Editora Piantino|Edição 1 - Ano 1 - n°1|03 de Setembro de 2019
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editora piantino
O futuro das universidades públicas Cortes, falta de recursos e o declínio da ciência brasileira.
Universidades públicas respondem por mais de 95% da produção cientíca do brasil Governo atual desfavorece
Bolsas CAPES de pósgraduação Capes corta 5.613 bolsas a partir de Setembro.
A função social da escola em discussão Artigo da USP sob a perspectiva da educação inclusiva.
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Revista Academia Edição Especial Limitada Projeto Editorial: Letícia Piantino Projeto Gráfico e Diagramação: Letícia Piantino Assistente Editorial: Letícia Piantino Revisores: Letícia Piantino Apoio e Orientação: Projeto Editorial: Prof. Heliza Faria Identidade Visual: Prof. Cleiton Hipólito Colaboradores: Letícia Piantino
Carta ao leitor Esta publicação é parte integrante do Projetor Integrador do 3º ano do curso Técnico em Comunicação Visual integrado ao Ensino Médio do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas - Campus Passos.
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas - Campus Passos. Reitor IFSULDEMINAS: Prof. Marcelo Bregagnoli Diretor geral do Campus Passos: Prof. João Paulo de Toledo Gomes
Oi!
Neste trabalho busco trazer para você, leitor ou leitora, as novidades sobre o mundo da educação brasileira, seu problemas, suas vitórias e suas lutas. Tal tópico está sendo cada vez mais calado no atual cenário brasileiro, e é essencial retratá-lo e homenageá-lo. Trago trechos de artigos de pesquisadores renomados, conversas sobre a inclusão escolar, as mudanças e cortes que o governo Bolsonaro trouxe, histórias de superação na educação carcerária, entre outros assuntos importantíssimos para trazer nossa educação a tona e para a mídia. Espero que apreciem a revista, fruto de um trabalho do curso técnico em Comunicação Visual do IFSULDEMINAS Campus Passos: educação gratuita e de qualidade! Um grande beijo,
Técnico em Comunicação Visual integrado ao Ensino Médio. Coordenador: Profª Kelly Cristina D’ Angelo Setembro 2019
Letícia Piantino
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Índice
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O futuro das universidades públicas
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Meia-entrada: veja perguntas e respostas sobre o tema
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Galileu lança campanha para valorizar cientistas mulheres
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A função social da escola em discussão, sob a perspectiva da educação inclusiva
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Infográfico: Capes corta 5.613 bolsas de pesquisa.
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Projeto IFPLUVIAL: captação de água e reuso
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Universidades públicas realizam mais de 95% da Ciência no Brasil
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Os adolescentes infratores que brilham na Olimpíada de Matemática
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O futuro das universidades públicas Charles Mady é professor associado da Faculdade de Medicina da USP e diretor de unidade do Instituto do Coração (Incor).
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recursos humanos é gigantesco, gerando descrença e desesperança nos funcionários de todos os níveis, mesmo sendo eles, em sua maioria, altamente eficientes. Esses sentimentos constituem o maior veneno para a produtividade de nossas instituições, com queda evidente na qualidade de trabalho. Para complicar, a evasão de cérebros é uma triste realidade, tanto para o setor privado como para outros países. Os que ficam procuram outras formas de subsistência, dedicando seu tempo cada vez menos para as finalidades para as quais foram preparados e contratados. Este perfil se dissemina como uma doença contagiosa, tornando-se até cultural.
de forma clara e evidente, os problemas maiores enfrentados s universidades pelas academias. Nesta quespúblicas brasileiras, estatão, além da sobrevivência, há duais e federais, estão em fatos políticos importantes, que constante declínio nestas estão colaborando muito para últimas décadas. As razões afastar professores de elevado são sobejamente conhecidas, nível humano e profissional de mas pouco abordadas de fornossos centros de ensino. É trisma construtiva por motivos váte observar indivíduos que derios, muitas vezes relacionados dicaram décadas de suas vidas, a corporativismos poderosos, com carreiras universitárias que deveriam ser enfrentados exemplares, serem preteridos, de forma corajosa. Agudamenindo procurar meios de sobrete, a falta de recursos finanvivência outros que não as acaceiros é, sem dúvida, causa de demias, diminuindo muito sua enormes dificuldades, além da dedicação ao ensino, pesquisa dificuldade de se aplicar critée extensão. Esse lado político rios para um melhor emprego é causa importante da decado pouco que há. Para comprodência intelectual dos recursos var, basta consultar os órgãos humanos. Muitas carreiras brida imprensa sobre problemas lhantes foram interrompidas de gestão nas mais variadas por essa associação maligna de áreas, levando a população a fatores. Temos, portanto, uma concluir que o dinheiro público As dificuldades financei- receita perfeita para o constanestá sendo mal administrado. O impacto sobre os ras ajudaram muito a colocar, te declínio de qualidade, apesar
Universidade de São Paulo - Campus São Paulo
Em nosso sistema universitário não há espaço para grandes trocas ou contratações, como comumente ocorre em times de futebol. Nesse sentido, o professor também deve e deverá ser julgado periodicamente por um órgão colegiado, devidamente formado, com análises de produção em todos Professor Charles Mady – Foto: os setores nos quais deveria Incor-HCFMUSP atuar. O topo da carreira devede ainda termos centros que se ria ser atingido pelo mérito, e mantêm pela alta resiliência de não por decisões corporativas, grupos de docentes e funcioná- fisiológicas, ou por nepotismos. rios. Deveríamos ter mais titulares, que seriam escolhidos entre os Há solução ou soluções? Acre- docentes atuantes, com perfis dito que sim, a longo prazo, heterogêneos, assim diminuincom vontade política que gere do o risco da formação de olimudanças no padrão cultural garquias dominantes. Teríamos hoje vigente. Muitas opiniões certamente mais eficiência dos deverão ser colocadas e con- funcionários, dada pelo bom frontadas, em sérios e saudá- exemplo, aumentando a proveis diálogos. Vamos aos meus dutividade. Com isso, poderípensamentos. amos remunerar melhor para que houvesse uma sobrevivên O professor deve e deve- cia mais digna, tornando a acará sentir orgulho de ocupar essa demia um fim em si, e não um posição, demonstrando um real meio. Traríamos dignidade e comprometimento. Ele deve respeito aos corpos docentes, ser professor, e não “es- fundamentais para qualquer tar” professor. Ele deve ter centro de produção e educação. a missão primeira de ser professor, dedicando o tempo ne- Os professores devem se cessário para ser um bom pro- distanciar do pensamento utilifessor. Um bom professor deve tário, voltado à realização uniensinar ciência e também a camente pessoal, e ter em menarte com ética em exercer a sua te a realização institucional, em profissão. Deve e deverá ser a comum acordo. Infelizmente, missão primordial em sua vida predomina o conveniente pesprofissional. Deve “vestir a ca- soal, em detrimento do avanmisa” de sua universidade, em ço da entidade. Essa forma de detrimento de outras ativida- pensar se tornou cultural, com des, não se tornando professor raízes profundas, difíceis de seempresário, preenchendo inte- rem extirpadas. Se o meu meio gralmente as necessidades de de trabalho avança, eu avanço. suas instituições, não criando, Como sabiamente disse Cíceassim, conflitos de interesse. ro: “Cada um deve, em todas
as matérias, ter um só objetivo, qual seja, conformar o seu próprio interesse com o interesse geral”. O mesmo pensamento teve o genebrino Rousseau, um dos ícones do Romantismo, assim como muitos outros pensadores de outras escolas, que têm, ou tinham, opiniões saudáveis sobre sistemas sociais. Não são, portanto, ideias novas, estando presentes com o ser humano desde que ele existe. É só saber explorá-las com sabedoria. Infelizmente, na atualidade, não se faz o certo institucional, mas apenas o conveniente pessoal. As reformas não podem ser cosméticas, para consumo imediato. Portanto, uma mudança cultural profunda deve ser iniciada. É um árduo trabalho, e esta é a nossa opinião, sempre aberta ao diálogo. Este país dispõe de recursos humanos de alta qualidade intelectual e moral, nos mais diversos setores. Basta reconhecê-los e agrupá -los. Peguem como exemplo o que está ocorrendo na Petrobras. Pensamentos divergentes deverão ser colocados, em saudável diálogo, pois as contradições são positivas e produtivas, gerando evolução. Os resultados dessas iniciativas virão apenas a longo prazo, pois mudanças culturais ocorrem com muito trabalho e discussões, e não com revoluções de momento. Comparo essas mudanças à reforma política em nosso país, difícil de ser feita, mas necessária. É uma bela herança que poderíamos deixar.
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Meia-entrada:
perguntas e respostas Jair Bolsonaro assinou em 06/09 medida provisória relacionada à emissão de carteirinhas estudantis. Entenda como funciona o uso das carteirinhas e o que vai mudar.
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nizada por essas entidades, o hamado “ID Es- texto do Estatuto da Juventude tudantil”, o documento valerá não invalida o uso de carteiripara alunos dos ensinos funda- nhas emitidas por instituições de ensino para a comprovação mental, médio ou superior. do benefício. A Associação Nacional Como funciona hoje? Uma lei de 2013 prevê de Pós-Graduandos (ANPG), que as carteirinhas devem ser as entidades estudantis muniemitidas por entidades estu- cipais e os diretórios estudantis dantis de representatividade e acadêmicos das faculdades nacional. O documento assegu- também podem emitir o docura meia-entrada aos estudantes mento. A medida provisória em atividades de entretenimen- aprovada nesta sexta (6) não to. Vale para alunos de todos os níveis e modalidades de ensino prevê veto à emissão de carteirinhas por Une, Ubes e outras básico e superior. entidades.
Quem emite as carteirinhas? Tem direito a meia-entrada em eventos de lazer e desportivos os estudantes que comprovarem matrícula em instituição de ensino com o uso de carteirinha expedida “preferencialmente” pela Associação Nacional de Pós-Graduandos, pela União Nacional dos Estudantes (UNE), pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e por entidades estudantis estaduais e municipais filiadas a essas organizações nacionais. Isso quer dizer que, embora haja preferência para a carteirinha de estudante padro-
los musicais, devem ser disponibilizados como meia-entrada. O prWojeto foi protocolado em 2007 pelos ex-senadores Eduardo Azeredo e Flávio Arns. O texto original foi aprovado pelos senadores e seguiu para a Câmara, onde sofreu modificações.
Por que existe a regra dos 40%?
Na justificativa da proposta, os autores argumentam que a cota para concessão da meia-entrada é importante para que os empresários responsáveis pelos eventos de laO que é a lei da meia-entra- zer e desportivos possam ter da? uma estimativa mais precisa da O projeto de lei 4.571, receita com entrada inteira e de 2008, estabelece que pelo com meia-entrada. Defensores menos 40% dos ingressos para da proposta argumentam que, eventos de lazer e esportivos, com isso, o preço dos ingressos como cinema, teatro e espetácu- deveria cair.
9 Quem tem direito à meia-entrada hoje? Estudantes, deficientes e seus acompanhantes, idosos e jovens de baixa renda de 15 a 29 anos, que façam parte de programas sociais do governo, e cuja renda familiar seja de até dois salários mínimos.
Ela é válida para quais estabelecimentos? - salas de cinema; - cineclubes; - teatros; - espetáculos musicais e circenses; - eventos educativos, esportivos, de lazer e de entretenimento.
Qual estudante não tem direito a meia-entrada? - Estudante de qualquer idade portando carteirinha de escola de idiomas; - Estudante de qualquer idade com comprovante de matrícula de curso que não seja o de ensino regular, profissional, especial e de jovens e adultos.
Qual a opinião dos produtores culturais? Profissionais ouvidos pelo G1, quando passou a valer a regra dos 40%, disseram que a medida iria fazer com que o preço dos ingressos diminuísse com o tempo. Segundo a maioria dos produtores, a média da cota de meia-entrada em eventos, antes da então nova regra, oscilava entre 60% e 95%. Antes, o Estatuto do Idoso garantia a venda sem limites de meia-entrada para maiores de 60 anos. No caso dos estudantes, cada estado regulamentava a cota mínima de venda de meia-entrada.
ENTENDA MEDIDA EM 8 PONTOS 1. Emissão será gratuita por meio de lojas de aplicativo no celular; 2. Caixa Econômica vai oferecer o documento físico de graça; 3. Emissão está prevista para começar em 90 dias para o ensino superior e até seis meses para alunos da educação básica; 4. MP não prevê veto à emissão de carteirinhas por Une, Ubes e outras entidades; 5. Estudante que emitir o “ID Estudantil” vai ter que fornecer dados para banco do MEC; 6. Sem citar entidades, Bolsonaro diz que MP é “bomba” e evita que “certas pessoas” promovam o socialismo nas universidades; 7. Em maio, polêmica sobre as carteirinhas levou a demissão do presidente do Inep; 8. Documento permite que estudantes paguem meia entrada em shows, teatro, cinema e outros.
O secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Lima (dir.), apresenta o projeto da ID Estudantil.
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Para o ingresso em 2020, a prova para entrar na Universidade Federal de Santa Catarina ou na Universidade Federal da Fronteira do Sul será a mesma. Essa medida aumenta o número de cidades para fazer o vestibular e facilita sua inscrição!
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INSCRICOES ’
16 de setembro a 14 de outubro
provas
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7, 8 e 9 de dezembro
Nao deixe seu futuro passar!!
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Galileu lança campanha para valorizar cientistas mulheres Muitas cientistas brilhantes não foram reconhecidas só por serem mulheres. Na reportagem de capa de março, lembramos os feitos de 10 delas e torcemos para que, dessa vez, a história não se repita
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O problema é que, em al á cerca de 3,7 bi- lhões de mulheres no mundo, gum momento entre a escola e ou 49,56% da população do a vida profissional, as mulheres planeta. Na ciência, porém, são escanteadas do ambiente elas não passam de 28%. A científico. Mesmo as que seguem carreira na área enfrenconta não fecha. tam o desafio de se manter nela: Segundo a Unesco, em uma pesquisa divulgada pela 47% dos países não há nenhu- Catalyst mostrou que mulheres ma diferença de notas entre em indústrias científicas têm meninos e meninas na primeira maior probabilidade de trocar série do Ensino Fundamental, de área do que os homens — e o percentual sobe para 67% 53% delas contra 31% deles. no Ensino Médio. Os números para ciências em geral variam “É quase uma praga. Se pouco ao longo do ensino bási- a menina é boa em matemáco.
Lugar de mulher é na ciência (Foto: Tomás Arthuzzi / Produção: Ina Ramos)
tica, é como se ela não fosse considerada mulher”, afirma a economista Hildete Pereira de Melo, professora da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense e pesquisadora de temas relacionados a gênero e trabalho. De acordo com o relatório Cracking the Code: Girls’ and Women’s Education in Science, Technology, Engineering and Mathematics de 2017, o autopreconceito é um dos maiores motivos para que as meninas desistam de carreiras nas ciências. Essa visão, no entanto, é influenciada por construções sociais que vêm de longa data e reforçam uma noção de que mulheres são menos aptas para a área.
Basta olhar para a história. Em dezembro de 1881, Caroline Kennard, uma feminista de Brookline, Massachusetts, enviou uma carta a Charles Darwin. Apaixonada por ciência, ela tinha uma pergunta simples: é cientificamente comprovado que as mulheres são inferiores aos homens? “Eu certamente
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penso que, embora as mulheres sejam moralmente superiores aos homens, elas são inferiores intelectualmente”, respondeu Darwin. “E, com base nas leis de herança, parece-me haver uma grande dificuldade de elas se tornarem intelectualmente iguais aos homens.” Ideias como essa impediram as mulheres de buscar a formação necessária para uma carreira na área. Além disso, a maioria das universidades não aceitava mulheres até o início do século 20. Uma das faculdades mais prestigiadas de Cambridge, o Magdalene College, por exemplo, só passou a aceitar estudantes do sexo feminino a partir de 1988. Na ocasião, alguns dos alunos teriam feito um funeral, com caixão e tudo, para lamentar o fim da faculdade. Parte do desafio se deve ao fato de que refletir sobre esses preconceitos tão enraizados pode ser difícil em uma área que se baseia na crença de ser objetivo e lidar somente com evidências. Foi o que sugeriram os editores do The Lancet, periódico científico que, em fevereiro deste ano, dedicou uma edição inteira ao debate sobre desigualdade de gênero. Foram apresentaram dados para mostrar que, quando o assunto é discriminação de gênero, a ciência pode ser um tanto quanto enviesada.
Ilustração: Camila Rosa que os homens para receber o mesmo reconhecimento. Feito no Canadá, o levantamento analisou 23.918 inscrições para financiamento de pesquisa e descobriu que as cientistas tinham 0,9% menos chances de conseguir o acordo simplesmente por serem mulheres. Para os pesquisadores, não havia nada que demonstrasse menor qualidade dos projetos — com exceção do gênero. No Brasil, a dificuldade é observada nas bolsas de produtividade do CNPq. Um levantamento de 2004 mostrou que havia 283 bolsistas homens para 23 mulheres. O motivo principal para um número tão baixo é a maternidade: elas apresentam queda significativa na produtividade na faixa dos 40 anos, quando geralmente se dedicam a cuidar dos filhos. Ao voltar à vida científica, ficam para trás em relação aos colegas.
Um dos estudos usados como exemplo é o que comprova que mulheres precisam ter um desempenho muito maior
Ainda que superem as
barreiras e persistam na carreira científica, não raro são reduzidas à condição de assistentes, sem reconhecimento. “As mulheres sempre deram um jeito de fazer ciência, o problema é que o mundo não reconhece isso”, diz a jornalista Zing Tsjeng, autora de Forgotten Women: The Scientists (Mulheres Esquecidas: As Cientistas), no qual perfila 48 cientistas esquecidas pela história.
“Eu gostaria que, quando questionadas sobre mulheres cientistas, as pessoas conhecessem outros nomes além de Marie Curie”, diz Hildete Pereira de Melo. Nós também. Por isso, para a capa de março de 2019 da GALILEU, selecionamos um exemplo das novas gerações, Sabrina Lisboa, e, na reportagem, contamos as vidas de dez grandes cientistas de gerações passadas. E esperamos que esse conteúdo contribua para um futuro no qual listas desse tipo não precisem existir.
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A função social da escola em discussão, sob a perspectiva da educação inclusiva
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uando Vygotsky (1997) argumenta que os objetivos educacionais em relação às crianças com deficiência precisam ser os mesmos para as crianças tidas como normais, ele se ancora nas leis gerais do desenvolvimento cultural. Não se trata, portanto, de reduzir as expectativas em relação ao processo de ensino e aprendizagem, tampouco, de ignorar as especificidades da condição orgânica e idealizar a deficiência, admitindo que todos podem aprender tudo ou qualquer coisa, em determinado tempo/ momento, desconsiderando as condições e a história de cada pessoa.
A forma como esse autor refere-se aos objetivos educacionais diz respeito às ações que devem ser orientadas para o potencial do processo de humanização, sem o estabelecimento de limites a priori e sem tomar como ponto de partida a falta, embora (re) conhecendo as condições e peculiaridades das lesões. Essa forma de conceber o trabalho educacional implica atenção aos modos de participação da criança com deficiência nas práticas sociais e, em especial, à significação das ações mediadas que se produzem na dinâmica das relações. Assim, a questão que se evidencia é como considerar no trabalho de mediação pedagógica as
especificidades da deficiência tendo como horizonte as possibilidades de desenvolvimento cultural, uma vez que a condição orgânica não é impeditiva da ação educacional. Salientamos aqui uma diferença fundamental nos modos de se conceber a dimensão social: por um lado, se tomamos o desenvolvimento como acontecimento de natureza individual, a socialização é vista como um objetivo a ser atingido: o indivíduo se abre para a convivência social na interação com os outros, vai aprendendo a conviver, vai se tornando cada vez mais socializado; por outro lado, assumindo-se a natureza social
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Foto: Freepik do desenvolvimento humano, a dimensão social é condição de realização, ou seja, o social ganha uma dimensão mais ampla que condensa a história de produção e relação humana, tornando-se lócus de constituição do desenvolvimento individual e coletivo. Se entendermos que “a história do indivíduo está fortemente condicionada pela história de seu meio” (PINO, 2000, p. 59), pensamos não na socialização das ações individuais, mas na tensão da constituição social dessas ações, na apropriação dos signos, sentidos, artefatos produzidos nas relações e no modo como esse processo de significação afeta e impulsiona a emergência de novas formações psicológicas, o que torna possível transpor os limites orgânicos.
tanto, diferente de falar em socialização das ações individuais, e demanda outras implicações educacionais. Com base nisso, argumentamos que a função social da escola não se resume à socialização/convivência; relaciona-se, sim, ao trabalho de ensino e à apropriação do conhecimento valorizado, condição de desenvolvimento cultural orientador da personalidade.
de uma educação inclusiva, que visa ao atendimento às diferenças individuais, a escola passa a cumprir função assistencial de convivência entre diferentes. Tomando como eixo do desenvolvimento humano as necessidades mínimas de aprendizagem, essa abordagem economicista e tecnicista da educação coloca em segundo plano o direito ao conhecimento e o papel da mediação pedagógica no pro Libâneo (2012) anali- cesso de ensino-aprendizagem. sa as políticas educativas do As consequências no Banco Mundial assumidas funcionamento interno na espelo Brasil a partir dos acor- cola são visíveis nos dados dos internacionais e mostra que discutimos neste artigo. que, sob a ótica de premissas Na análise dos casos, notamos pedagógicas humanistas atra- como a função que a escola vai vés das quais se manifestam assumindo em relação aos alucritérios econômicos, estabele- nos com deficiência traz a rece-se o diagnóstico da homo- percussão do discurso médico/ geneidade, do autoritarismo, estimulação, as marcas do da discriminação e da exclusão trabalho assistencialista/cui Falar de constituição atrelado ao modelo tradicional dado, os ecos de um modo de social do indivíduo é, por- de escola. Com isso, em nome conceber a inclusão escolar/so-
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Foto: Freepik cialização; e como isso impacta o processo de escolarização dos alunos, afeta as relações de ensino. As histórias de aprovação escolar de Gustavo e Alan ancoraram-se no argumento da idade, da necessidade de se socializar com alunos da mesma faixa etária e na suposição de melhor aproveitamento da situação de reprovação por alunos que teriam, em princípio, condições de adquirir os conteúdos escolares. Os alunos com deficiência são aprovados não pela condição de conhecimento e sim de desconhecimento e impossibilidades pressupostas pela escola. Como vimos, Gustavo retorna, inclusive, para a instituição especializada. Alan, embora continue na escola até se formar no 9º ano, passa a frequentar apenas duas aulas durante dois dias na semana e volta a ficar em estado sonolento e com a atenção dispersa na maior parte do tempo. O desfecho do processo de escolarização do aluno
Gustavo faz-nos indagar ainda a respeito do lugar das instituições especializadas que, embora na legislação sejam apresentadas enquanto serviços de apoio, complementar ou suplementar, continuam recebendo e assumindo o aluno que o setor público não dá conta de acolher para assegurar um processo de ensino significativo. Novamente, seja diante da função socializadora da escola inclusiva, seja diante do ensino homogêneo de conteúdos circunscritos em disciplinas fragmentadas, o aluno com deficiência parece continuar tornando-se responsabilidade de instituições especializadas filantrópicas e assistencialistas. A escolha da família, frente à ausência de opções, merece ser destacada não como uma opção individual, mas como um grave problema de política pública de educação.
cificidades e modos de participação nos indicam, portanto, a possibilidade de trabalho educacional e de desenvolvimento cultural que pode ser vislumbrado socialmente, mas em condições escolares adequadas. No nosso trabalho investigativo na escola, na vivência com professores e alunos, podemos dizer que são imensos os desafios que se colocam quando levamos em conta o trabalho com o conhecimento acumulado na história de produção humana. A formação e a atualização do professor, a atividade de ensino e pesquisa envolvendo escola-universidade, as turmas com menor número de alunos, o vigor do coletivo de trabalho na escola, a organização do trabalho pedagógico considerando as especificidades e projetando possibilidades de participação de cada aluno no processo de ensino e aprendizagem, o sentido da atividade no contex A investigação das si- to escolar, o apoio pedagógico tuações vividas no cotidiano constante, a disponibilização escolar levam-nos a chamar a e o uso de recursos diversos atenção para as especificida- e atualizados são dimensões des de cada caso na sua sin- essenciais e que vêm sendo gularidade. Vemos o quanto o incansavelmente ressaltadas ao aluno Gustavo pôde responder considerarmos a qualidade do positivamente à situação de en- funcionamento da escola. sino e como nos faz pensar nos muitos modos de compreen- Estando a atividade são e possibilidades de con- de ensinar/significar orientaceitualização, na criação de da para o desenvolvimento novas vias de ensino-apren- humano, cabe-nos criar condizagem, viabilizando a sua dições efetivas de participação participação nas mais diversas da pessoa com deficiência nas formas de atividades humanas. atividades sociais, laborais, Também, diante da dependên- alargando as formas de relação cia radical da condição de Alan, com o conhecimento. Mas isso é possível ressaltar a importân- demanda, sem dúvida, repencia da posição do outro na sig- sar, ressignificar a função social nificação e mediação constante da escola nas condições – mais de suas ações. Diferentes espe- abrangentes – da contempora-
neidade. O caso de um aluno com síndrome de Down e deficiência intelectual na escola Gustavo apresenta síndrome de Down e deficiência intelectual. Comunica-se, sobretudo, por uso de gestos e de algumas poucas palavras isoladas como “não”, “meu”, além de emitir vocalizações e se expressar por meio de várias expressões faciais. O aluno entrou na escola em 2007, no 1º ano, com 7 anos, foi aprovado para o 2º ano em 2008 e, no ano de 2009, passou para o 3º ano, mas ficou na situação de aluno ouvinte em uma turma do 2º ano. Em 2010, quando chegamos à escola, estava frequentando o 4º ano em uma turma de 35 alunos. Ao longo desse ano foram várias as situações difíceis vivenciadas: o aluno passava pelas carteiras derrubando os materiais escolares dos colegas; fugia da sala de aula e entrava em outras salas, inclusive na sala da direção e dos professores; se jogava no chão, gritava, beliscava os colegas e a professora. A professora frequentemente trancava a porta da sala com a chave na tentativa de manter o aluno na sala de aula. Também ouvimos e registramos falas de professores e gestores como: “Ele está sendo o aluno problema da escola”; “É muito difícil segurar ele dentro da sala de aula”; “Ele tem dificuldade de obedecer regras”. (Condensados Registros
Diário de Campo e Videogravação, 2010). Essas falas e gestos nos dizem sobre o lugar que o aluno vai ocupando na trama das relações e que indicam a direção segundo a qual está sendo orientada a ação pedagógica – manter o aluno com deficiência na sala de aula –, responsabilidade atribuída à professora e dela cobrada institucionalmente. Diante de situações de conflito com o aluno, a professora do 4o ano questionava-se em relação às regras escolares e acreditava na relevância de Gustavo estar na escola para a socialização: Talvez para ele na escola o que seja mesmo importante é se socializar, a convivência com os colegas, então por que não deixar ele ir para outras salas de aula, andar pela escola livremente? (Registro Diário de Campo 07.05.2010). Podemos notar como o discurso da socialização, incorporado pela professora, ao mesmo tempo pressupõe e justifica a impossibilidade de o aluno com deficiência apropriar-se das normas institucionais e participar da/na produção do conhecimento. No entanto, contraditoriamente, deparamo-nos com outros modos de participação do aluno nas situações de ensino. Após exercidas as propostas de como lidar
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com Gustavo, a atividade torna-se significativa para o aluno e o modo de envolvimento é potencializado. A convocação das professoras em relação a Gustavo altera-se: não é necessário mais trancar a porta para que o aluno permaneça na sala de aula. O modo dele comportar-se e participar da dinâmica social da aula transformase. O aluno impossível torna-se possível; o aluno que atrapalha passa a colaborar; o aluno que não compreende o dizer do outro passa a agir de maneira a coincidir com a orientação das professoras, ou seja, por meio de uso de gestos indicativos e representativos ele se insere na dinâmica de enunciação de forma a atingir o desejável em termos de uma atitude escolar. O aluno apresenta um trabalho, filma a apresentação do colega e orienta o foco da câmera para o produto em pauta – o cartaz –, vai à lousa quando a professora solicita e retorna ao seu lugar. Participa do movimento interativo de aula de maneira a cooperar e a contribuir com a realização compartilhada da atividade de instrução. Vemos como o aluno, que não obedecia às regras, pode se apropriar delas e, com isso, muda a forma de conduta, a dinâmica afetivo-intelectual. A mudança na posição social incide na dinâmica afetiva-volitiva que influi na dinâmica intelectual e transforma o sentido da vivência. Débora Dainez Ana Luiza Bustamante Smolka
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Capes corta 5.613 bolsas a partir deste mês e prevê economia de R$ 544 milhões em 4 anos Órgão diz que medida é um “congelamento” por falta de verba. As bolsas estavam previstas e não serão oferecidas, ao menos, pelos próximos quatro anos.
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Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (Capes) anunciou nesta segunda-feira (02/09) o corte de 5.613 bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado no Brasil a partir deste mês. É o terceiro comunicado do tipo neste ano. Ao todo, a Capes vai deixar de oferecer cerca de 11 mil bolsas e não serão aceitos novos pesquisadores neste ano. O Ministério da Educação (MEC) divulgou nesta tarde que, em 2020, a Capes só terá metade do Orçamento de 2019. Na proposta de orçamento para 2020, a perda prevista para todo o MEC é de 9%. A crise no financiamento das pesquisas afeta também o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado ao Ministério da Ciência. O CNPq também suspendeu a concessão de novas bolsas e os atuais bolsistas ainda correm risco de não receber a partir de setembro.
Bolsas e ‘congelamento’ A Capes e o MEC tratam o novo anúncio como um “congelamento” e afirmam que a medida não vai afetar quem atualmente já recebe o benefício. Entretanto, apesar de afirmar que as bolsas estão congeladas, a Capes admite que elas não serão mais oferecidas nos próximos 4 anos, que é o período de vigência previsto caso elas tivessem sido concedidas neste mês.
“O contingenciamento será mantido até o início da vigência de novas concessões”, informou o órgão. Histórico de cortes No primeiro anúncio de corte, em 9 de maio, a Capes comunicou o bloqueio de 3.474 bolsas. Depois, em 4 de junho, a Capes avisou que deixaria de oferecer 2,7 mil bolsas, sendo que esse número foi aplicado em cursos com conceito nota 3.
Considerando todos os anúncios feitos até agora, o total de bolsas que deixarão de ser oferecidas em 2019 chega a A Capes possui, ao todo, 11.811. 211.784 bolsas atividade em toAinda no ensino supedas as áreas de atuação. Desse rior, o MEC também anunciou total, 92.680 são da pós-graduação. Assim, o corte anunciado neste ano o bloqueio de verbas para universidades. A vai representar o bloqueio de suspensão de repasses e os cor2,65%. tes de bolsas motivaram protestos estudantis, e a Associação De acordo com o gover- Nacional de Pós-Graduandos no, a medida vai representar (ANPG) afirmou que os “cortes uma economia de R$ 37,8 mi- (...) ferem de morte o ensino lhões em 2019. Ainda segundo superior, a pós-graduação e a a Capes, as bolsas têm vida útil ciência nacional”. de 4 anos e a economia no período pode chegar a R$ 544 milhões.
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´ HISTORIA DOS CORTES 2016 PEC 241. Esta PEC congelou o teto de inves�mentos do governo em diversas áreas, como educação e saúde, por 20 anos. Na prá�ca, a PEC 241 determinou um limite máximo de inves�mento nessas áreas.
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Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse na época que não havia a possibilidade de prosseguir economicamente no Brasil gastando muito mais do que a sociedade poderia pagar por meio de impostos.
2019 Ministro da Educação, Abraham Weintraub, declarou o con�ngenciamento de 1,7 bilhão de reais dos 49,6 bilhões de reais do orçamento das universidades públicas
2019 Como uma das consequências deste con�ngenciamento, em setembro, o presidente da CAPES, Anderson Ribeiro Correa, anunciou o bloqueio de mais de 11,8 mil bolsas de pósgraduação.
o que mais está por vir?
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Projeto IFPLUVIAL prevê dobrar a capacidade de captação de água de reuso no IFSULDEMINAS até final de 2019
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ançado pelo reitor Marcelo Bregagnoli na última reunião do Conselho Superior do Instituto Federal do Sul de Minas (IFSULDEMINAS), que ocorreu no Campus Inconfidentes, em 29 de agosto, o projeto IFPLUVIAL é mais uma iniciativa da gestão de empregar ações sustentáveis aliadas à economia de recursos financeiros. O objetivo do projeto institucional é implantar e/ou adaptar, em todas as nove unidades da instituição, sistemas de captação, armazenamento e uso de água da chuva a fim de utilizá-la na limpeza de áreas externas (pátios e ruas), na irrigação (jardins e plantações), em instalações para animais (freestal, hospital e clínica veterinária), na preservação das condições hidrossanitárias, ou seja, saúde e higiene (vasos sanitários e mictórios) e para reserva técnica de combate a incêndio.
Ao lançar mão da água
de reuso, o IFSULDEMINAS pretende diminuir a utilização da água potável, proveniente de tratamento químico ou de águas subterrâneas, pois este produto, essencial para a vida humana, é bastante oneroso devido à necessidade de passar por tratamento com produtos químicos; de ter estruturas físicas e mão de obra especializada para seu tratamento ou extração; sem falar que é um produto cada vez mais escasso.
reuso em sete de suas nove unidades. O prédio principal da reitoria, por exemplo, já foi construído com o sistema de tubulação adequado para trabalhar com água de reuso. De 2015 até hoje, mais que dobrou a capacidade de armazenamento de água pluvial na unidade: de 40 mil para 85 mil litros.
Em relação aos campi, os projetos de instalação deste modelo de sistema também avançam. Os de Passos e Poços de Caldas já passaram por “Sermos sustentáveis é reformas e construções para uma de nossas preocupações adaptar ou instalar sistemas constantes. Para isso, além das de captação e armazenamento obras nos campi, em parceria de água da chuva. Em Passos, este sistema funciona no prédio com seus diretores-gerais, estaadministrativo, no ginásio, no mos trabalhando na estruturabloco pedagógico D e no audição de uma política para a água tório; em Poços, no bloco admide reuso, a cargo da Diretoria nistrativo. de Desenvolvimento Institucional. Junto à água temos vá- Em Inconfidentes foi rias outras ações nesse sentido, executado, no segundo semescomo a geração de energia foto- tre deste ano, o primeiro provoltaica, captação de recursos jeto do IFPLUVIAL no bloco via doações e desfazimento, etc. pedagógico 1 da fazenda-escola, visando à otimização de nossos com capacidade de armazenamento de 15 mil litros de água recursos”, detalhou o reitor. de chuva. O IFSULDEMINAS mantém projetos de água de
Os Campi Machado e
Muzambinho já possuem instalações prontas, mas há ainda grande potencial de expansão na utilização de água de reuso. Atualmente, cerca de 126 mil litros são armazenados nestes locais. O Campus Avançado Três Corações passa por obras de expansão, mas em seu bloco administrativo o sistema já está em funcionamento, com capacidade de armazenamento de 30 mil litros de água de reuso. Por fim, nas unidade de Pouso Alegre e Carmo de Minas os sistemas encontram-se em fase de instalação e a previsão é que até o fim deste ano entrem em funcionamento no prédio onde estão sendo construídas cinco novas salas, em Pouso Alegre, e em grande parte do campus em Carmo de Minas.
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dade de água armazenada para destino cada vez mais efetivo, reuso. visando economicidade e maximização deste recurso; Segundo o coordenadorgeral de Obras de Infraestrutu- - Realizar estudo comra do IFSULDEMINAS, o enge- parativo entre a quantidade de nheiro civil Paulo Roberto de água armazenada x água limpa Oliveira, o IFPLUVIAL estabe- retiradas de poços ou entregue leceu um plano de metas para via Cia de Abastecimento local, a instituição cumprir em médio em cada uma das unidades; prazo. “Nosso objetivo é programar e implementar ações - Promover ações de para o aumento da capacida- conscientização para economia de de armazenamento de água de água limpa. pluvial em todas unidades”.
Veja a seguir outros pontos a serem postos em prática pelo IFPLUVIAL: - Medir periodicamente e acompanhar, por meio de relatórios, a destinação da água de reuso nas unidades, através da instalação de hidrômetros; - Medir periodicamente e acompanhar, por meio de relatórios, a quantidade de água limpa extraída de poços artesianos nos Campi que usam essa forma de acesso;
Investimentos Com os investimentos atuais, a capacidade de armazenamento de água pluvial em toda a instituição, que hoje é de 431.500 litros, deve saltar, até o dia 31 de dezembro de 2019, - Estruturar ações para para 848.613 litros. Um cres- que a água de reuso armazecimento de 96,66% da quanti- nada nas unidades tenham
Sistema de reaproveitamento do Campus Passos. Foto: Letícia Piantino
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Universidades públicas realizam mais de 95% da Ciência no Brasil Q gia e a participação do setor priuem minimamente vado, quer dizer, de empresas, acompanha a questão da pro- ressalte-se, nesse bolo, mal uldução científica no Brasil e do trapassava a marca de 20%. De financiamento da pesquisa em lá para cá, o país fez uma reviraciência, tecnologia e inovação volta nesses números, avançou sabe que, ao lado da meta tão muito, e pode-se mesmo dizer longamente sonhada da apli- que cresceu espetacularmente, cação de 2% do PIB no setor, quando a métrica é o volume um bom equilíbrio entre inves- de artigos científicos indexados timentos públicos e privados em bases de dados internacionessas atividades constitui o se- nais, um indicador mundialgundo grande objeto de desejo mente consagrado. Essa prode boa parte dos estrategistas e dução científica praticamente gestores da área – além, é claro, dobrou do começo para o fim da parcela da comunidade cien- da primeira década do século tífica nacional bem antenada às XXI. E continuou sua ascensão consistente (dados disponíveis políticas de CT&I. até 2016). Isso se apresentou desde a redemocratização do país, na segunda metade dos anos 1980. O espelho em que todos miravam era obviamente o das nações mais desenvolvidas. O pensamento que então se espraiava, muito distante de recentíssimas tentações obscurantistas, era o de que o desenvolvimento científico e tecnológico constituía condição sine qua para um verdadeiro desenvolvimento socioeconômico e para a implantação de uma sociedade mais justa. Na época, o Brasil andava ali pela casa de pouco mais de 0,7% do PIB em investimentos totais em ciência e tecnolo-
capacidade de pesquisa de suas universidades públicas.
Daí o espanto que causou a seguinte afirmação do presidente da República durante entrevista à rádio Jovem Pan, na noite da segunda-feira, 8 de abril: “(…) e nas universidades, você vai na questão da pesquisa, você não tem, poucas universidades têm pesquisa, e, dessas poucas, a grande parte tá na iniciativa privada, como a Mackenzie em São Paulo, quando trata do grafeno”.
A resposta da Acade A expansão notável, fru- mia Brasileira de Ciências to de algumas políticas muito A primeira e tranquila bem estruturadas que estão a reação do presidente da Academerecer outros comentários no mia Brasileira de Ciências, Luiz Ciência na rua, foi baseada na Davidovich, físico, professor da capacidade de produzir ciência UFRJ, pesquisador dos mais das universidades públicas bra- respeitados por seus brilhantes sileiras, com a Universidade de trabalhos em emaranhamento São Paulo (USP) e a Universida- quântico, foi observar que “é de Estadual de Campinas (Uni- importante fornecer ao Presicamp), ou seja, duas grandes dente da República a informauniversidades estaduais pau- ção correta sobre as universilistas, mais algumas grandes dades brasileiras, coletadas por universidades federais, como órgãos internacionais” a do Rio de Janeiro (UFRJ), a de Minas Gerais (UFMG) e a do Relata em seguida que, Rio Grande do Sul (UFRGS), “de acordo com recente publina liderança desse processo. cação feita por Clarivate AnalyMais de 95% dessa produção tics a pedido da CAPES, o Bracientífica do Brasil nas bases sil, no periodo de 2011-2016, internacionais deve-se, assim, à publicou mais de 250.000 ar-
tigos na base de dados Web of Science em todas as áreas do conhecimento, correspondendo à 13a posição na produção científica global (mais de 190 países)”. As áreas de maior impacto, prossegue, “correspondem a agricultura, medicina e saúde, física e ciência espacial, psiquiatria, e odontologia, entre outras”.
cos são produzidos, alternativas energéticas são propostas, novos materiais são desenvolvidos e empresas brasileiras obtêm protagonismo internacional em diversas áreas de alto conteúdo tecnológico, como cosméticos, compressores e equipamentos elétricos”.
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Carlos Henrique de Brito Cruz, a partir da base de dados Incites. O que ele observa é que, “das 100 universidades brasileiras que mais publicaram artigos científicos no quinquênio 2014-2018, há 17 privadas. A melhor colocada é a PUC Paraná, em 37º lugar”.
A realidade que os dados Artigo de Mariluce Moura, mostram publicado em 11 de abril no Davidovich ressalta que Coordenador do projeto Ciência na Rua “todos os estados brasileiros Métricas, da Fundação de Amestão representados” nessa paro à Pesquisa do Estado de produção, “o que mostra uma São Paulo (Fapesp), o professor evolução em relação a períodos Jacques Marcovich, ex-reitor anteriores e o papel preponde- da USP (1997-2001), enviou a rante desempenhado pelas uni- pedido do Ciência na rua duas versidades públicas que estão tabelas também muito revelapresentes em todos os estados”. doras da produção científica das universidades brasileiras. Outro ponto fundamen- A primeira, baseada no Leiden tal de sua fala: “Mais de 95% Ranking, “mostra que das 20 das publicações referem-se às universidades que mais publiuniversidades públicas, fede- cam no Brasil, não há nenhuma rais e estaduais. O artigo lista privada”, ele comentou. as 20 universidades que mais publicam (5 estaduais e 15 fe- A segunda, modificada derais), das quais 5 estão na re- do capítulo de autoria de Sogião Sul, 11 na região Sudeste, 2 lange Santos na obra coletiva na região Nordeste e 2 na Cen- Repensar a Universidade (Retro-Oeste”. pensar a universidade: desempenho acadêmico e comparações internacionais, organizado Essas publicações, des- por Jacques Marcovitch, 256 taca o presidente da ABC, “es- pp, São Paulo, ComArte, 2018, tão associadas a pesquisas que disponível para download), beneficiam a população bra- mostra resultados de todas as sileira e contribuem para a ri- universidades no Brasil em queza nacional. Graças a essas rankings internacionais e, ele pesquisas, o petróleo do pré-sal observa, “aparecem apenas as representa atualmente mais de PUCs em termos de privadas, e 50% do petróleo produzido no em posições relativamente baipaís, a agricultura brasileira so- xas”. fisticou-se e aumentou sua produtividade, epidemias, como Uma terceira tabela, a do vírus da zika, são enfren- mais extensa e bastante atuatadas por grupos científicos de lizada, foi obtida pelo diretor grande qualidade, novos fárma- científico da Fapesp, professor
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Foto: Diego Padgurschi/ BBC
Os adolescentes infratores que brilham na Olimpíada de Matemática
Vanessa*, de 18 anos, foi uma dos 18 milhões de alunos brasileiros que participaram neste ano da primeira fase da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) neste ano. Mas, diferentemente da maioria dos outros concorrentes, ela não prestou a prova na escola. A jovem fez o teste em uma sala com lousa e carteiras, mas que tem grades nas janelas pequenas e altas e uma porta que normalmente fica trancada a cadeado. Também não usava uniforme de escola, mas chinelos e o conjunto cáqui obrigatório para crianças e adolescentes infratores internados na Fundação Casa, instituição em São Paulo, onde ela está há 5 meses. Vanessa sempre gostou muito de matemática, mas como estava sem estudar há 2 anos quando foi internada, ela não imaginou que iria bem na prova.
Internados na Fundação Casa, em São Paulo, tiveram boas notas e se classificaram para fase final de competição, mesmo tendo a educação interrompida em diversos momentos da vida. Quando a professora deu “parabéns”, no mês seguinte, dizendo que ela tinha passado para a segunda fase da Olimpíada, superando milhares de alunos que não estavam privados de liberdade, ela achou que tinham confundido seu mês de aniversário. “Eu não achei que ia passar. Para mim foi difícil, porque eu não lembrava muito das matérias.” As adolescentes fazem aulas de manhã e atividades à tarde — Aluna do 1º ano do Ensino Médio, Vanessa voltou a estudar dentro da Fundação Casa. Ela havia saído da escola em
2017, mas seus estudos foram interrompidos diversas vezes ao longo da vida — ela chegou a morar na rua e em abrigos algumas vezes. Poucas visitas Na Unidade Chiquinha Gonzaga, ela não recebe muitas visitas, o que é comum entre as 103 adolescentes internadas ali. Assim como nos presídios para mulheres adultas, as meninas internadas na Fundação Casa recebem menos visitas que os meninos. Na pequena biblioteca da unidade, ela conta à BBC News Brasil que sua mãe morreu de câncer quando tinha 5 anos e seu pai foi preso por trá-
fico de drogas quando ela tinha o pai não era fácil, diz Vanessa, 9. e sua vida não demorou muito para sair dos trilhos de novo. Nos seis anos em que “Conheci um menino de abrigo o pai ficou preso, ela chegou a e ele me chamou para ir ficar morar com o irmão, mas os dois com ele no abrigo. Mas eu bripassavam “mais tempo na rua guei com ele, os outros me chano que em casa”. maram para ir roubar, eu fui roubar e fui presa”, conta ela, “Eu gostava de estudar, que tinha 17 anos na época. mas era difícil, com minha fa- “Agora, eu tô vendo que a vida mília. Meu irmão tem proble- que eu tinha não era para mim. ma de cabeça, eu não tinha Que eu posso estudar, posso muito incentivo.” trabalhar. Que eu não preciso ficar na rua usando droga. Aos 12 anos, Vanessa começou a usar drogas e largou Retorno às aulas a escola. Depois saiu de casa. Usuária de várias drogas Chegou a morar em abrigos, desde criança, teve fortes crises tinha dificuldade em ficar, por- de abstinência nos primeiros que é proibido usar drogas nes- meses internada, mas com o ses locais. Acabou indo viver uso de remédios e o acompana rua com outras crianças, no nhamento nos Centros de Atencentro de São Paulo. ção Psicossocial (CAPS), ela diz “Não passava fome, porque eu que as crises passaram. pedia. Mas a gente passa mui- Com isso, ela pôde retomar as to frio, e quando chove é muito aulas, dadas todos os dias de difícil achar lugar para dormir.” manhã no centro de detenção. À tarde tem outras atividades, Voltou a estudar quan- como participação no coral. do o pai saiu da prisão e pode voltar a morar com ele, na zona O sucesso na primeira norte de São Paulo. Começou a fase da Olimpíada não foi apefazer supletivo para chegar ao nas uma surpresa, mas um inensino médio. Mas viver com centivo para Vanessa continuar
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os estudos e fazer faculdade. Ela quer cursar engenharia civil ou assistência social.
“Como eu já passei em abrigo, acho muito bonito o trabalho que elas (as assistentes sociais) fazem. Eu lembro muito do tio Moacir, que quando eu estava triste conversava comigo, fazia de tudo para eu não sair do abrigo, para eu não ficar na rua.” Agora, ela se prepara para a segunda fase — diz que adora resolver problemas como a fórmula de Bhaskara (usada para resolver equações do segundo grau, ela explica) — que será no dia 28 de setembro. A Olimpíada foi criada em 2005 e seu objetivo é estimular o estudo da disciplina e identificar talentos na área, incentivando o ingresso de alunos na universidade nas áreas de ciência e tecnologia. Só mais uma prova A alguns quilômetros dali, na unidade masculina da Fundação Casa, a Rio Tâmisa, Aurélio* de 17 anos, também se
As jovens podem começar cursos do Senac e terminar depois do período de internação — Foto: Diego Padgurschi/BBC
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Os meninos recebem visitas com mais frequência do que as meninas — Foto: Diego Padgurschi/BBC
prepara para a segunda fase da Olimpíada de Matemática. Participam da competição alunos do 6º ano do Ensino Fundamental até último ano do Ensino Médio; 54.831 escolas participaram. A prova da 2º fase será em 28 de setembro. As melhores provas serão premiadas com medalhas de ouro, prata e bronze - centenas delas são distribuídas a cada ano. A unidade em que Aurélio está internado se parece bem mais com uma prisão. Ele fez a prova da Olimpíada sem saber: achou que era só mais uma prova bimestral do 7º ano do Ensino Fundamental, que voltou a cursar desde que foi internado na instituição. Aurélio trabalha desde os 15, como ajudante de pedreiro, e morava com quatro irmãos, a
mãe e o padrasto na zona norte de São Paulo. Fazia supletivo à noite para tentar recuperar os anos de escola perdidos por falta, mas às vezes ficava muito cansado e acabava não conseguindo ir. Desde os 10 sonhava em ter uma moto, diz, porque “gostava muito de adrenalina”. Mas nunca conseguiu comprar uma com seu salário, e admite que acabou não seguindo os conselhos da família que dizia para “se afastar das amizades ruins e procurar coisas melhores”. “Eu tava com um amigo e a gente viu uma moto e fomos roubar. E aí estávamos quase chegando em casa quando apareceu a polícia”, admite. “Foi muito triste, minha mãe ficou arrasada.”
Olímpiada trouxe uma esperança de continuar os estudos após sair da instituição para muitos jovens Como costuma acontecer com mais frequência para os meninos do que para as meninas, Aurélio recebe visitas frequentes da família - da mãe, da madrinha, do padrasto e do pai. Ficou muito feliz ao descobrir que tinha passado para a segunda fase da Olimpíada e diz que isso é um grande incentivo para continuar a estudar. “A gente estava jogando dominó quando a professora veio e disse que eu tinha tido as três melhores notas da casa.” Expectativas Aurélio conta que quer fazer um curso profissionalizante quando sair da instituição. “Arrumar um emprego, construir alguma coisa para mim. Comprar uma moto que aí, sim, seja minha, né?.” A surpresa com o bom resultado na Olimpíada de Matemática é um traço comum entre todos os seis adolescentes infratores que conversaram com a BBC News Brasil. “Essa questão da autoestima é uma questão muito difícil e um ponto central a se trabalhar, porque muitas vezes eles não acham que são capazes de coisas boas”, diz Priscilla Iris Jerônimo, diretora da Casa Rio Tâmisa. Aline*, de 17 anos, fez a prova com Vanessa, na Casa Chiquinha Gonzaga. Entre os alunos que brilharam na primeira fase, ela é quem tinha mais dificuldade na disciplina.
O bom resultado na
Mas é esforçada - além
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das aulas normais de manhã, faz aulas de reforço à tarde e foi a última a sair da sala no dia da prova. “Todo mundo saindo, e eu na metade ainda, mas eu não queria chutar”, diz ela, que havia deixado a escola no ano passado e retomou as aulas quando foi internada na instituição, em fevereiro deste ano.
morando com amigos - sua mãe não sabia onde ela estava. “Ela ficou desesperada atrás de mim.”
profissionalizantes no Senac — como de garçonete e de atendimento telefônico — e pretende terminá-los quando sair.
Quando sair, diz ela, quer arrumar um primeiro emprego em uma lanchonete, para poder fazer faculdade de matemática. “E depois quero me tornar professora.”
“Na minha sala (na escola) ninguém ligava para escola, e eu acabei fazendo amizades erradas, eu mentia para minha mãe dizendo que estava na aula e não ia”, conta ela, que morava em uma comunidade com a família no interior de São Paulo.
“Fui traficar e foi assim que eu caí aqui”, conta. “No começo não era ruim, quando você começa, conhece uma droga, você acha que é a popular da escola. Depois que eu vi que não era bem isso”, reflete.
Aline diz que está ansio “Antes eu falava para sa para contar para a mãe que se minha mãe que eu queria ter 17 classificou na Olimpíada. “Acho anos para trabalhar e hoje eu que ela vai ficar feliz, porque tenho 17 anos e estou privada ela fala tanto por telefone, ‘fida minha liberdade.” lha, estuda, a mãe quer te ver no serviço, com uma vida boa, “Foi muito difícil, por- que essa vida não é para ninque ninguém na minha família guém’.” me ensinou essa vida errada. Mas também ninguém colocou “Eu achava que minha uma arma na minha cabeça e mãe nunca ia me perdoar. Mas me forçou, eu fui pela minha ela me perdoou.” própria vontade. Depois eu percebi que eu errei, que essa *Os nomes dos adolesvida não era para mim”, diz centes foram alterados para ela. preservar suas identidades
Com sete irmãos e a mãe cuidando da irmã pequena, a renda da família era pouca. Aline percebeu que poderia ganhar algum dinheiro fazendo como as amigas que vendiam drogas na comunidade.
Erros e acertos Aline ficou quase um ano Durante a internação, fora de escola e fora de casa, começou a fazer diversos cursos
O bom resultado na Olímpiada trouxe uma esperança de continuar os estudos após sair da instituição para muitos jovens — Foto: Diego Padgurschi/BBC
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Brasil
Ciência
Galeria de fotos de contribuidores para nossa ciência!
Pioneiras da Ciência no Brasil Em parceria com a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, o CNPq lança a quinta edição das Pioneiras da Ciência no Brasil, com a divulgação do trabalho de várias cientistas e pesquisadoras brasileiras que contribuíram para o desenvolvimento cientifico e a formação de recursos humanos para a ciência e tecnologia no Brasil.
Ayda Ignez Arruda (1936-1983)
Gioconda Mussolini (1913-1969)
Formada em Matemática pela PUCPR; Foi professora da UFPR e Unicamp.
A primeira mulher no Brasil a fazer da Antropologia Social a sua profissão, dando aula na USP.
Diana Mussa (1932-2007)
Lucilia Tavares (?-?)
Formada em História natural e Geologia pela UFRJ; Realizou o maior estudo já realizado no Brasil sobre madeiras fósseis.
Ester de Camargo Fonseca Moraes (1920 -2002) Formada em Farmárcia e Odontologia pela USP; Batalhou pela implantação da Toxicologia como ciência.
Autora do que até agora se conhece como o primeiro livro de psicologia publicado no Brasil por uma mulher: “Psychologia do Pensamento”, de 1930
Sonia G. Andrade (1928 - )
Formada em Medicina pela UFBA, atua na patologia. Tem 124 artigos publicados em importantes revistas nacionais e internacionais.
Leia os verbetes completos em: http://memoria.cnpq.br/web/guest/pioneiras-da-ciencia-do-brasil5 Fotos: Arquivo do CNPq.
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